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FICHAMENTO DA OBRA

HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL
PETER HÄBERLE

Jacarezinho - 2018
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 2
2 Hermenêutica Constitucional ............................................................................... 3
2.1 DADOS CATALOGRÁFICOS .............................................................................. 3
2.2 OBJETIVO DA OBRA .......................................................................................... 3
2.3 RECORTE HISTÓRICO ....................................................................................... 3
2.4 tese fundamental, estágio do problema ............................................................... 4
2.4.1 Situação atual da teoria da interpretação constitucional ............................... 4
2.4.2 Novo questionamento e tese ........................................................................ 4
2.4.3 Esclarecimento da tese e conceito de interpretação ..................................... 5
2.5 OS PARTICIPANTES DO PROCESSO DE INTERPRETAÇÃO
CONSTITUCIONAL ..................................................................................................... 6
2.5.1 Considerações preliminares sobre o método ................................................ 6
2.5.2 Catálogo sistemático ..................................................................................... 6
2.5.3 Esclarecimento do catálogo sistemático ....................................................... 7
2.6 APRECIAÇÃO DA ANÁLISE DESENVOLVIDA ................................................... 8
2.6.1 Possíveis objeções e críticas ........................................................................ 8
2.6.2 Legitimação do ponto de vista da toeira do direito, da teoria da norma e da
teoria da interpretação ................................................................................................ 9
2.6.3 Legitimação decorrente das reflexões teorético-constitucionais ................. 10
2.6.4 Reflexões sobre a Teoria da Democracia como Legitimação ..................... 10
2.7 CONSEQUÊNCIAS PARA A HERMÊNEUTICA COSNTITUCIONAL JURÍDICA
12
2.7.1 Relativização da interpretação jurídica – novo entendimento de suas tarefas
12
2.7.2 Dimensão e Intensidade do controle judicial – Diferenciação em face da
medida de participação ............................................................................................. 13
2.7.3 Consequências para a conformação e utilização do direito processual
constitucional............................................................................................................. 14
2.8 Novas indagações para a teoria constitucional .................................................. 15
2.8.1 Sobre a existência de diferentes objetivos e utilização de diversos métodos
de interpretação ........................................................................................................ 15
2.8.2 Funções da teoria constitucional ................................................................. 15
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 17
REFERÊNCIAS utilizadas para compreensão da obra ............................................. 18
2

1 INTRODUÇÃO
A leitura da obra de Peter Häberle: “Hermenêutica Constitucional: A
sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação
pluralista e ‘procedimental’ da Constituição”, é de importância ímpar para uma
melhor compreensão do contexto sócioconstitucional que é experimentado pelo
Brasil.
Embora seja uma tese com vários anos de produção, se mantém viva e
atual, fornecendo subsídios para o estudo do Direito Constitucional em cotejo com
os acontecimentos dentro e fora da jurisdição constitucional. Isto é, a reflexão sobre
como se dá a última palavra sobre o sentido da Constituição encontra em Häberle a
exposição da carência de participação da sociedade de uma forma mais efetiva e
produtiva.
Com o intuito de servir ao aporte teórico de uma pesquisa inserida na
temática das Teorias da Justiça: Justiça e Exclusão, que é objeto do Programa de
Mestrado da Universidade Estadual do Norte do Paraná, especialmente na linha de
pesquisa Função Política do Direito, é valiosa a contribuição a respeito da medida de
participação do processo interpretativo da Constituição por tornar visível as camadas
plurais que compõem a sociedade.
Como o tema da pesquisa que se que pretendemos tornar em dissertação é
“Legitimidade das decisões e democracia: A judicialização da política e a politização
da justiça”, a escolha da obra se justifica por trazer conceitos a respeito da teoria da
democracia, da legitimidade democrática, da opinião pública, dos grupos de
interesse e como todas estes podem e devem influenciar na interpretação da
Constituição.
Preferimos aqui uma abordagem mais profunda que um fichamento simples
da obra, para tentar encontrar semelhanças entre a Lei Fundamental da Alemanha e
a Constituição Federal Brasileira, respeitando os recortes geográficos, jurídicos e
temporais, para buscar uma aproximação da teoria com a realidade. Para isso, todas
as referências que não fidelizam com o livro não apresentam indicação autoral de
Häberle e são explicadas em notas específicas. Incialmente são apresentados
dados catalográficos e explicativos da obra, para o desenvolvimento foram
respeitadas as divisões originais do texto e ao final são apresentadas considerações
conclusivas.
3

2 HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL
2.1 DADOS CATALOGRÁFICOS
Sobre a Obra
Nome do Autor Peter
Sobrenome do Autor HÄBERLE
Die offene Gesellschafi der Verfassungsinterpreten.
Título da Obra Ein Beitrag zur pluralistischen und "prozessualen“
Verfassungs interpretation
Hermenêutica Constitucional
A sociedade aberta dos intérpretes da Constituição:
Título Traduzido
contribuição para a interpretação pluralista e
"procedimental" da Constituição
Tradutor Gilmar Ferreira Mendes
nº da Edição 1
Cidade Porto Alegre
Nome da Editora Sergio Antonio Fabris Editor
Ano 1997

2.2 OBJETIVO DA OBRA


Häberle, ao refletir sobre a hermenêutica constitucional, traz a noção da
necessidade de adequar tal atividade ao que denomina de sociedade aberta, ou
seja, uma sociedade pluralista e multidinâmica que ao mesmo tempo concentra
interesses, consensos e dissensos.
A partir de uma concepção de que a interpretação judicial ou jurisdicional da
Constituição não é a única, Häberle adota a ideia de que cidadãos, grupos de
interesse, órgãos estatais, o sistema público e a opinião pública são notáveis forças
produtivas de interpretação que não podem ser desconsideradas na atividade de
buscar o sentido e o alcance das expressões da Constituição.
Neste sentido, a ampliação do, por assim dizer, “rol de intérpretes” é, para
Häberle, uma consequência da necessidade de integração da realidade no processo
de interpretação, mais a fundo, é a própria democratização da interpretação
constitucional, que em algum momento da história foi monopolizada pelo Poder
Judiciário.

2.3 RECORTE HISTÓRICO


Originalmente a obra de Peter Häberle foi publicada em 1975, inserida em
uma temática de Direito Constitucional moderno e foi traduzida por Gilmar Ferreira
Mendes, publicada no Brasil em 1997.
4

Desta forma, a crítica inserida no texto de Häberle é contemporânea à


Alemanha (e ao mundo) de 1975 e aos contextos históricos de tal época.

2.4 TESE FUNDAMENTAL, ESTÁGIO DO PROBLEMA


Nesta parte, Peter Häberle apresenta sua tese fundamental e o estágio do
problema que pretende enfrentar, colocando os principais pontos teóricos e já
iniciando, de certa forma, um cotejo com os problemas práticos do então vigente
modelo de hermenêutica constitucional.

2.4.1 Situação atual da teoria da interpretação constitucional


Fazendo uma análise, Häberle (1997, p. 11) menciona que a teoria da
interpretação constitucional tem colocado até aqui (1975) duas questões essenciais:
(i) a indagação sobre as tarefas e os objetivos da interpretação constitucional; e (ii) a
indagação sobre os métodos que são processo da interpretação constitucional e as
regras de interpretação.
Sobretudo, a teoria da interpretação constitucional esteve ligada a um
modelo interpretacional reduzido a uma "sociedade fechada", concentrando-se na
interpretação constitucional dos juízes e nos procedimentos formalizados e deixando
escapar questões abordadas pelas ciências sociais e teorias jurídico-formais,
prejudicando a relação entre a Constituição e a realidade Constitucional (HÄBERLE,
1997, p. 12).

2.4.2 Novo questionamento e tese


A questão volta-se a examinar os participantes do processo da
interpretação, passando de uma sociedade fechada dos intérpretes da Constituição
para uma interpretação constitucional pela e para a sociedade aberta. Para isso a
tese de Häberle propõe a seguinte tese: “no processo de interpretação constitucional
estão potencialmente vinculados todos os órgãos estatais, todas as potências
públicas, todos os cidadãos e grupos, não sendo possível estabelecer-se um elenco
cerrado ou fixado com numerus clausus de interpretes da Constituição” (HÄBERLE,
1997, p. 12-13).
Partindo desta tese, fica evidente uma situação de tangenciamento na
atividade interpretar a Constituição, ou seja, todos estão direta ou indiretamente
envolvidos, mas nem todos são ouvidos. Com isso, a interpretação tradicional
5

considera tão somente aqueles juridicamente vinculados às corporações, em sua


essência, tão somente o Poder Judiciário dominaria a atividade interpretativa. Ao
passo que uma abertura desse “rol de legitimados” significaria uma interpretação
mais próxima da realidade constitucional, conferindo um sentido e alcance plural e
adequado à Constituição, incluindo toda a sociedade.

2.4.3 Esclarecimento da tese e conceito de interpretação


O esclarecimento da tese se dá na formulação seguinte: “quem vive a norma
acaba por interpretá-la ou pelo menos por cointerpetá-la” (HÄBERLE, 1997, p. 13). A
partir disso toda atualização da Constituição (leia-se processos de emenda e de
mutação constitucional), constituem uma interpretação constitucional antecipada.
A interpretação é, originariamente, apresentada como uma atividade que, de
forma consciente e intencional, aponta a compreensão e a explicitação de sentido de
uma norma. Fica estabelecido o método consciente ou intencional para nortear a
interpretação. Mas, para a investigação realista da tarefa de interpretar a
Constituição, há que se exigir um conceito mais amplo de hermenêutica em que os
cidadãos e grupos, órgãos estatais, o sistema público e a opinião pública são forças
produtivas de interpretação, interpretes em sentido lato, ou podem, no mínimo serem
considerados como pré-interpretes (HÄBERLE, 1997, p. 14).
O autor também faz o alerta:

Subsiste sempre a responsabilidade da jurisdição constitucional, que


fornece, em geral, a última palavra sobre a interpretação (com a ressalva da
força normatizadora do voto minoritário). Se se quiser, tem-se aqui uma
democratização da interpretação constitucional. Isso significa que a teoria
da interpretação deve ser garantida sob a influência da teoria democrática.
Portanto, é impensável uma interpretação da Constituição sem o cidadão
ativo e sem as potências públicas mencionadas. (HÄBERLE, 1997, p. 14)

Não se pode desconsiderar qualquer indivíduo na interpretação


constitucional, ainda que a pessoa não possa exprimir sua vontade ou que essa
vontade seja sufocada pelos demais, o sentido e o alcance da Constituição
determinam a representação dos valores, das minorias e da pluralidade de culturas
e pensamentos da sociedade, assim cada destinatário da norma é e deve ser
entendido como um participante do processo hermenêutico em uma democracia.
A relevância das opiniões plurais, públicas e individuais é um importante
vetor para se conceber os sentidos dos direitos fundamentais em uma análise
progressista de seu conteúdo, pois através da participação da sociedade na
6

interpretação, é possível alcançar conceitos e ideias que não são percebidas por
uma jurisdição constitucional que se internaliza nas Cortes.

2.5 OS PARTICIPANTES DO PROCESSO DE INTERPRETAÇÃO


CONSTITUCIONAL
Aqui Peter Häberle, basicamente, apresenta considerações sobre o método
de interpretação e sobre o catálogo sistemático de participantes da interpretação
constitucional.

2.5.1 Considerações preliminares sobre o método


Diversas são as questões que envolvem o processo de interpretação. A
partir de uma perspectiva socioconstitucional, são investigados os que participam do
processo interpretacional, considerando um conceito “republicano” de interpretação
aberta e seu objetivo, é preciso ter em vista variáveis provisórias como o tempo, a
esfera pública pluralista e a realidade, que são capazes de colocar os problemas
constitucionais e fornecer materiais para uma interpretação constitucional,
ampliando suas necessidade e possibilidade (HÄBERLE, 1997, p. 19).

Uma teoria constitucional que se concebe como ciência da experiência deve


estar em condições de, decisivamente, explicitar os grupos concretos de
pessoas e os fatores que formam o espaço público (Öffentlichkeit), o tipo de
realidade de que se cuida, a forma como ela atua no tempo, as
possibilidades e necessidades existentes. (HÄBERLE, 1997, p. 19)

A investigação dos participantes precisa, necessariamente percorrer o


caminho de algumas perguntas, em especial, indagando de forma realística, “que
interpretação foi adotada, a forma ou maneira como ela se desenvolveu e que
contribuição da ciência influenciou decisivamente o juiz constitucional no seu afazer
hermenêutico”. Essas questões enriquecem e complementam a teoria da
Constituição, no que pertine aos seus objetivos e métodos, que posteriormente são
contemplados de forma mais sistemática, considerando consequências e novas
indagações (HABERLE, 1997, p. 19-20).

2.5.2 Catálogo sistemático


Häberle (1997, p. 20-23) sugere um catálogo provisório, na tentativa de
apresentar de forma sistemática os participantes da interpretação:
1 as funções estatais a) na decisão vinculante (da Corte Constitucional):
7

decisão vinculante que é relativizada mediante o


instituto do voto vencido;
b) nos órgãos estatais com poder de decisão vinculante,
submetidos, todavia, a um processo de revisão:
jurisdição, órgão legislativo (submetido a controle em
consonância com objeto de atividade): órgão do
Executivo, especialmente na (pré) formulação do
interesse público
a) o requerente ou recorrente e o requerido ou recorrido,
no recurso constitucional (Verfassungsbeschewerde),
autor e réu, em suma, aqueles que justificam a sua
pretensão e obrigam o Tribunal a tomar uma posição ou
a assumir um "diálogo jurídico" (“Rechtsgespräch”);
b) outros participantes do processo, ou seja, aqueles que
têm direito de manifestação ou de integração à lide (...)
2 os participantes do processo de ou que são, eventualmente, convocados pela própria
decisão nos casos 1a e 1b, que não Corte Constitucional;
são, necessariamente, órgãos do c) pareceristas ou experts, tal como se verifica nas
Estado Comissões Especiais de Estudos ou de Investigação
d) peritos e representantes de interesses nas audiências
públicas do Parlamento (...)peritos nos Tribunais,
associações, partidos políticos que atuam, sobretudo,
mediante a "longa manus" da eleição de juízes;
e) os grupos de pressão organizados;
f) os requerentes ou partes nos procedimentos
adminsitrativos;
mídia (imprensa, rádio, televisão, que, em sentido estrito,
não são participantes do processo, o jornalismo
3 a opinião pública democrática e profissional, de um lado, a expectativa de leitores, as cartas
pluralista e o processo político de leitores, de outro, as iniciativas dos cidadãos, as
como grandes estimuladores: associações, os partidos políticos fora do seu âmbito de
atuação organizada, igrejas, teatros, editoras, as escolas
da comunidade, os pedagogos, as associações de pais
4 o papel da doutrina constitucional tematizar a participação de outras forças e, ao mesmo
nos n°s 1, 2 e 3 tempo, participar nos diversos níveis

2.5.3 Esclarecimento do catálogo sistemático


A interpretação constitucional, como desenvolvida no item anterior, não é
uma atividade exclusivamente estatal, em certo ponto, todas as forças da
comunidade política têm potencial acesso ao processo, seja um cidadão que formula
um recurso constitucional1 ou um partido político que propõe um conflito entre
órgãos2 (HÄBERLE, 1997, p. 23).

A interpretação constitucional é, todavia, uma "atividade" que,


potencialmente, diz respeito a todos. Os grupos mencionados e o próprio
indivíduo podem ser considerados intérpretes constitucionais indiretos ou a
longo prazo. A conformação da realidade da Constituição torna-se também
parte da interpretação das normas constitucionais pertinentes a essa
realidade. (HÄBERLE, 1997, p. 24)

1 Que no Brasil pode ser um Recurso Extraordinário, ou até um Habeas Corpus utilizado como
recurso para fazer a matéria transcender ao STF.
2 Que pode ser uma Ação Constitucional nos termos do art. 103 da CF/88.
8

Nas funções estatais e nas relações entre elas, servidores públicos,


parlamentares e juízes são intérpretes da Constituição, podendo estabelecer
diálogos institucionais e se se firmando como amigos ou inimigos da Constituição.
Os processos políticos (executivos e legislativos) são interpretações da
Constituição que não podem ser eliminados, pois são tidos como elemento vital ou
central na atividade interpretativa, assim como o movimento, a inovação e a
mudança se firmam como materiais dessa intepretação:

Esses impulsos são, portanto, parte da interpretação constitucional, porque,


no seu quadro, são criadas realidades públicas e, muitas vezes, essa
própria realidade é alterada sem que a mudança seja perceptível. O poder
de conformação de que dispõe o legislador enquanto intérprete da
Constituição diferencia-se, qualitativamente, do espaço que se assegura ao
juiz constitucional na interpretação, porque este espaço é limitado de
maneira diversa, com base em argumentos de índole técnica. (HÄBERLE,
1997, p. 26)

O processo político não é apartado da Constituição, antes, é responsável por


uma notável função de formular pontos de vistas, provocar e impulsionar
desenvolvimentos importantes da perspectiva constitucional, principalmente quando
reconhece em cada agente uma responsabilidade específica e constitucionalmente
determinada para um objetivo certo. Em um Estado de Direito, o juiz tem a
competência de dizer ao legislador sua tarefa e este último tem a responsabilidade
de criar uma parte da esfera pública e da realidade da Constituição, trazendo, em
certa medida, condições para a aplicação dos princípios constitucionais. Há uma
tarefa precursora e uma tarefa predecessora, ou seja, o interpreta a Constituição
criando vínculos sociais com o texto e também viabiliza a revisão em um momento
posterior, envolvendo demais intérpretes. Essas concretizações podem integrar o
conteúdo da Constituição (HÄBERLE, 1997, p. 27).

2.6 APRECIAÇÃO DA ANÁLISE DESENVOLVIDA


Häberle desenvolve possíveis críticas e objeções à sua análise, explora a
questão da legitimação de diversos pontos de vista, reflexões e teorias,
estabelecendo importantes cotejos que servem de variáveis ou contrapontos à tese
inicial.

2.6.1 Possíveis objeções e críticas


A possibilidade de a interpretação constitucional se “dissolver” em várias
9

interpretações e intérpretes é uma objeção com a qual a teoria constitucional tem de


conviver, se a Constituição é pensada como uma unidade política. No entanto esta
questão precisa ser observada a partir da legitimação dos diferentes intérpretes da
Constituição (HÄBERLE, 1997, p. 29).
A legitimação precisa compreender intérpretes além dos formais que são os
constitucionalmente vinculados aos procedimentos3, pois um esquecimento de
intérpretes não formais, seriam supor uma vinculação limitada à Constituição e
excepcionar uma série de pessoas do processo interpretativo, consequentemente
tornado a legitimação restrita e não corroborando na tese da sociedade aberta.

2.6.2 Legitimação do ponto de vista da toeira do direito, da teoria da norma e da


teoria da interpretação
A vinculação à Constituição e legitimação para a interpretação perdem sua
correspondência diante da premissa de que a interpretação é um processo aberto e
capaz de conhecer possibilidades e alternativas diversas. Na medida que a
vinculação se converte em liberdade, possibilita novas orientações hermenêuticas e
consegue contrariar a ideologia da subsunção. A integração da realidade plural no
processo de interpretação implica em reconhecer a necessidade de ampliação do
círculo de intérpretes, para dar sentido às normas, já que não se tratam de decisões
prévias, simples e acabadas, mas precisam de um desenvolvimento no plano
concreto, pelas mãos de todos. “Qualquer intérprete é orientado pela teoria e pela
práxis. Todavia, essa práxis não é, essencialmente, conformada pelos intérpretes
oficiais da Constituição”. (HÄBERLE, 1997, p. 30-31).
Diante da falta de conformação é que a vinculação à lei e a independência
pessoal e funcional dos juízes não podem esconder o fato de que interpretam a
Constituição na esfera pública e na realidade:

Seria errôneo reconhecer as influências, as expectativas, as obrigações


sociais a que estão submetidos os juízes apenas sob o aspecto de uma
ameaça a sua independência. Essas influências contêm também uma parte
de legitimação e evitam o livre arbítrio da interpretação judicial. A garantia
da independência dos juízes somente é tolerável, porque outras funções
estatais e a esfera pública pluralista (pluralistiche Öffentlichkeit) fornecem
material para a lei (...Material "zum" Gesetz liefern). (HÄBERLE, 1997, p.
31-32)

A objeção da unidade da Constituição deve observar regras que

3 No Brasil, seriam essencialmente, os legitimados dos incisos art. 103 da CF/88.


10

compreendem a inserção de todos no processo de interpretação, como num


“concerto” que conjuga diferentes percepções de acordo com suas funções e
particularidades, imbricadas sobre um mesmo fato: “a unidade da Constituição surge
da conjugação do processo e das funções de diferentes intérpretes” (HÄBERLE,
1997, p. 32-33).

2.6.3 Legitimação decorrente das reflexões teorético-constitucionais


No aspecto teorético-constitucional as forças pluralistas da sociedade têm
legitimação para participar da interpretação constitucional porque representam uma
parte da publicidade e da realidade da Constituição:

Uma Constituição, que estrutura não apenas o Estado em sentido estrito,


mas também a própria esfera pública (Öffentlichkeit), dispondo sobre a
organização da própria sociedade e, diretamente, sobre setores da vida
privada, não pode tratar as forças sociais e privadas como meros objetos.
Ela deve integrá-las ativamente enquanto sujeitos. HÄBERLE, 1997, p. 33)

O povo atua na interpretação constitucional exercendo forçar de forma


inicialmente difusa e no final de forma concentrada, se consideradas a realidade e a
publicidade estruturadas. Essas forças participam do processo interpretação mesmo
quando formalmente excluídas, porque são parte da realidade constitucional e da
publicidade da Constituição. Nesta linha, são exigidos esclarecimentos sobre o
conteúdo da Constituição e sobre a influência no desenvolvimento de uma
sociedade liberal-democrática: “limitar a hermenêutica constitucional aos intérpretes
"corporativos" ou autorizados- jurídica ou funcionalmente pelo Estado significaria um
empobrecimento ou um autoengodo” (HÄBERLE, 1997, p. 34).

Constituição é, nesse sentido, um espelho da publicidade e da realidade


(Spiegel der Öffentlichkeit und Wirklichkeit). Ela não é, porém, apenas o
espelho. Ela é, se se permite uma metáfora, a própria fonte de luz (Sie ist
auch die Lichtquelle). Ela tem, portanto, uma função diretiva eminente.
(HÄBERLE, 1997, p. 34)

Outra questão especial tem relação com a legitimidade da Ciência


Constitucional, uma vez que ela tem uma função catalisadora e por traduzir
publicamente a interpretação metodicamente refletida e conformar a preparação dos
interpretes oficiais de forma simultânea (HÄBERLE, 1997, p. 34-35).

2.6.4 Reflexões sobre a Teoria da Democracia como Legitimação


A legitimação sob a perspectiva da democracia é uma questão de
11

abordagem necessária em um Estado constitucional-democrático, pois a Ciência do


Direito Constitucional, as Ciências da realidade, os cidadãos e o grupos em geral
não possuem legitimação democrática para a interpretação da Constituição em
sentido estrito. No entanto, a democracia não se desenvolve somente em âmbito de
delegação de responsabilidades do Povo aos órgãos estatais, na sociedade aberta
ela se desenvolve através de mediações do processo público e pluralista da política
e da práxis cotidiana, principalmente na realização de direitos fundamentais
(HÄBERLE, 1997, p. 36).

Democracia desenvolve-se mediante a controvérsia sobre alternativas,


sobre possibilidades e sobre necessidades da realidade e também o
"concerto" científico sobre questões constitucionais, nas quais não pode
haver interrupção e nas quais não existe e nem deve existir dirigente.
(HÄBERLE, 1997, p. 36-37)

O Povo não se resume a um referencial quantitativo que se manifesta na


eleição e que confere legitimidade ao processo de decisão, mas é também um
elemento pluralista para a interpretação que se faz presente de forma legitimadora
no processo constitucional sob várias estruturas: partido político, opinião científica,
grupo de interesse, cidadão. A competência objetiva para a interpretação
constitucional é um direito da cidadania4, pois os direitos fundamentais constituem a
base para a legitimação democrática de uma interpretação aberta, considerando o
resultado e o círculo de participantes (HÄBERLE, 1997, p. 37).

Povo enquanto uma dimensão determinada (verfasste Grösse) atua,


universalmente, em diferentes níveis, por diferentes razões e em diferentes
formas, especialmente mediante a cotidiana realização de direitos
fundamentais. Não se deve esquecer que democracia é formada pela
associação de cidadãos. Democracia é o "domínio do cidadão" (Herrschaft
des Bürgers), não do Povo, no sentido de Rousseau. Não haverá retorno a
Rousseau. A democracia do cidadão é mais realista do que a democracia
popular (Die Bürgerdemokratie ist realistischer als die Volks-Demokratie).
(HÄBERLE, 1997, p.38)

Essa democracia do cidadão está mais próxima da ideia de democracia a


partir dos direitos fundamentais e não da concepção de que o Povo soberano se
limita a ocupar o lugar do monarca. Tal concepção é uma consequência da
relativização do conceito de Povo a partir da ideia de cidadão, a liberdade
fundamental, e não o Povo, converte-se em referência para a Constituição

4 De acordo como o art. 33 da Lei Fundamental Alemã: “Todos os alemães têm, em qualquer Estado,
os mesmos direitos e deveres cívicos”. Em semelhante condição, dispõe o art. 5º, I: “Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, (...) homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta
12

democrática. O referencial monárquico de povo que visa sua diminuição precisa ser
compreendido a partir da liberdade do cidadão e do pluralismo (HÄBERLE, 1997, p.
39). A legitimação democrática se dá com uma desvinculação do pensamento linear
e eruptivo da democracia tradicional, possibilitando aos cidadãos a interpretação das
normas constitucionais:

A possibilidade e a realidade de uma livre discussão do indivíduo e de


grupos "sobre" e "sob" as normas constitucionais e os efeitos pluralistas
sobre elas emprestam à atividade cie interpretação um caráter
multifacetado. (Acentue-se que esse processo livre está sempre submetido
a ameaça e que também a nossa ordem liberal-democrática apresenta
déficit em relação ao modelo ideal). Teoria de Democracia e Teoria de
Interpretação tornam-se consequência da Teoria da Ciência. A sociedade é
livre e aberta na medida que se amplia o círculo dos intérpretes da
Constituição em sentido lato. (HÄBERLE, 1997, p. 39-40)

2.7 CONSEQUÊNCIAS PARA A HERMÊNEUTICA COSNTITUCIONAL


JURÍDICA
No quarto capítulo da obra, Peter Häberle faz um aporte teórico a respeito
dos impactos da tese da sociedade aberta sobre a interpretação jurídica,
apresentando sua relativização e o novo entendimento de suas tarefas, a dimensão
e intensidade do controle judicial e as consequências para a conformação e
utilização do direito processual constitucional.

2.7.1 Relativização da interpretação jurídica – novo entendimento de suas tarefas


Diante das reflexões a respeito da interpretação constitucional e da
necessidade de se observar um processo aberto e plural, a hermenêutica
constitucional jurídica passa por algumas relativizações que podem ser expressadas
no quadro a seguir, a partir das ideias de Häberle (1997, p. 41-42):

1. O juiz constitucional já não interpreta, no processo constitucional,


de forma isolada: muitos são os participantes do processo; as formas de
participação ampliam-se acentuadamente;
2. Na posição que antecede a interpretação constitucional "jurídica" dos
juízes (Im Vorfeld juristischer Verfassungsinterpretation der Richter), são
muitos os intérpretes, ou, melhor dizendo, todas as forças pluralistas
públicas são, potencialmente, intérpretes da Constituição. O conceito de
"participante do processo constitucional" (am Verfassungsprozess
Beteiligte) relativiza-se na medida que se amplia o círculo daqueles
que, efetivamente, tomam parte na interpretação constitucional. A
esfera pública pluralista (die pluralistische Öffentlichkeit) desenvolve força
normatizadora (normierende Kraft). Posteriormente, a Corte Constitucional
haverá de interpretar a Constituição em correspondência com a sua
atualização pública;
3. Muitos problemas e diversas questões referentes à Constituição material
não chegam à Corte Constitucional, seja por falta de competência

Constituição”.
13

específica da própria Corte, seja pela falta de iniciativa de eventuais


interessados. Assim, a Constituição material "subsiste" sem interpretação
constitucional por parte do juiz. Considerem-se as disposições dos
regimentos parlamentares! Os participantes do processo de
interpretação constitucional em sentido amplo e os intérpretes da
Constituição desenvolvem, autonomamente, direito constitucional
material. Vê-se, pois, que o processo constitucional formal não é a
única via de acesso ao processo de interpretação constitucional.

O processo de interpretação, colocado no tempo, é infinito e o


constitucionalista é um mediador. O resultado da interpretação é submetido à
reserva de consciência, sendo que este precisa se apresentar como adequado e
apto a fornecer justificativas diversas e variadas ou submeter-se a mudanças
mediante alternativas racionais. É necessária a ampliação da interpretação
constitucional para além do processo constitucional, o que se dá mediante a atuação
dos intérpretes da Constituição da sociedade aberta, que são participantes
fundamentais no processo de descoberta e obtenção do direito (HÄBERLE, 1997, p.
42-43).
No âmbito das funções públicas, o processo de interpretação constitucional
apresenta-se disciplinado e organizado por métodos jurídicos, legislativos e
administrativos, operando de forma racional. Todavia a forma de participação da
opinião pública não apresenta estas características, firmando-se aberta e
espontânea. Sob este aspecto os princípios e métodos de interpretação
constitucional apresentam uma nova função de filtrar a força normatizadora da
publicidade, disciplinando e canalizando as formas de influência dos diferentes
participantes do processo (HÄBERLE, 1997, p. 43-44).

2.7.2 Dimensão e Intensidade do controle judicial – Diferenciação em face da


medida de participação
A fim de fazer um cotejo entre os objetivos e métodos de interpretação e os
participantes da interpretação constitucional, é de se considerar as suas
consequências sobre a interpretação constitucional abrangendo estas duas
questões. Desta forma, Häberle (1997, p. 44-46) faz uma análise da Corte
Constitucional Alemã, o Bundesverfassungsgericht, para expor que: (i) de uma
perspectiva jurídicofuncional: os tribunais devem ser extremamente cautelosos na
aferição da legitimidade das decisões do legislador democrático; (ii) na aferição da
legitimidade do direito estadual pela Corte Constitucional é aplicado o mesmo
14

raciocínio do item (i), pala leis polêmicas (reforma do Código Penal, ensino superior,
aborto), todavia, a Corte deveria levar em conta a peculiar legitimação democrática
que as orna, decorrente da participação de inúmeros segmentos no processo
democrático de interpretação constitucional e para as leis menos polêmicas (normas
técnicas) não seria necessário um controle tão rigoroso.

É que, no caso de uma profunda divisão da opinião pública, cabe ao


Tribunal a tarefa de zelar para que se não perca o mínimo indispensável da
função integrativa da Constituição. Ademais, a Corte Constitucional deve
controlar a participação leal (faire Beteiligung) dos diferentes grupos na
interpretação da Constituição, de forma que, na sua decisão, se levem em
conta, interpretativamente, os interesses daqueles que não participam do
processo (interesses não representados ou não representáveis.
(...)
Um minus de efetiva participação deve levar a um plus de controle
constitucional. A intensidade do controle de constitucionalidade há de variar
segundo as possíveis formas de participação. (HÄBERLE, 1997, p. 46)

O controle judicial importa num reconhecimento da participação ampla da


sociedade, sob condição de legitimidade democrática, o papel da Corte além de
observar a reserva de consciência constitucional, é mediar opiniões públicas não
para um consenso – que seria utópico – mas para proteger o conteúdo nuclear da
Constituição de maus intérpretes. Não se tratar de votar de acordo com a maioria, se
trata de apreciar racionalmente o conteúdo das proposições em cotejo com as
possibilidades de sentido e alcance das expressões constitucionais sem desfigurar a
Constituição em seu aspecto valorativo e de potencial concretização.

2.7.3 Consequências para a conformação e utilização do direito processual


constitucional
No âmbito do direito processual constitucional, os instrumentos de
informação dos juízes constitucionais precisam ser aperfeiçoados e ampliados para
alcançar formas gradativas de participação e a própria participação no processo
constitucional. É necessário desenvolver novas formas de participação das
potências públicas pluralistas, tornando o direito processual constitucional em parte
do direito de participação democrática, possibilitando à interpretação dos juízes
características de correspondência, elasticidade e ampliação, para chegar a uma
identidade de posições com a interpretação do legislador (HÄBERLE, 1997, p. 47-
48).
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Em resumo, uma ótima conformação legislativa e o refinamento


interpretativo do direito constitucional processual constituem as condições
básicas para assegurar a pretendida legitimação da jurisdição constitucional
no contexto de uma teoria de Democracia. (HÄBERLE, 1997, p. 49)

2.8 NOVAS INDAGAÇÕES PARA A TEORIA CONSTITUCIONAL


Na última parte da obra são apresentadas novas indagações para a teoria
constitucional, pautando-se na existência de diferentes objetivos e de diversos
métodos que podem ser utilizados para a interpretação, bem como questionando as
suas funções.

2.8.1 Sobre a existência de diferentes objetivos e utilização de diversos métodos de


interpretação
A questão da teoria constitucional que busca a produção do consenso e a
obtenção da unidade política como fim do processo constitucional e do processo
político não pode ser simplificada e mal entendida como uma concepção meramente
harmonizadora: o Direito Constitucional é um direito de conflito e compromisso
(HABERLE, 1997, p. 51).
Na relação entre requerente e requerido, nitidamente são estabelecidos
objetivos diferentes (e antagônicos) e por isso são escolhidos métodos diferenciados
de interpretação a fim de abrigar o conteúdo da controvérsia. É a mesma situação
que ocorre em discussões nas Comissões do Parlamento e na oposição partidária.
Destes dissensos resultam repercussões dos princípios de hermenêutica de caráter
jurídico-funcional para a interpretação constitucional que precisam ser muito mais
discutidos em razão dos impactos que causam sobre a Constituição e o processo
constitucional (HÄBERLE, 1997, p. 51-52).

O Direito Constitucional material - vivido - surge de um número enorme de


funções "corretamente" exercidas.: aquelas desempenhadas pelo legislador,
pelo juiz constitucional, pela opinião pública, pelo cidadão, mas também
pelo Governo e pela oposição. Essa reflexão sobre a interpretação
constitucional demonstra que, de uma perspectiva funcional-processual,
correção funcional da interpretação constitucional leva praticamente a uma
diversidade da interpretação constitucional. A interpretação correta
depende, pois, de cada órgão, do procedimento adotado, de sua função e
de suas qualificações. (HÄBERLE, 1997, p. 52)

2.8.2 Funções da teoria constitucional


É pertinente a indagação acerca de uma interpretação correta, mas para a
teoria constitucional a questão fundamental se desdobra sobre a possibilidade de
16

vincular normativamente as diferentes forças políticas para lhes apresentar “bons”


métodos de interpretação. A indagação é sobre a amplitude a ser dada ao círculo de
interlocutores da doutrina constitucional que atua como crítica e conselheira, de
certa forma, participando da discussão e do consenso da Corte Constitucional
(HABERLE, 1997, p. 53).
Aliás, a doutrina constitucional integra não só a jurisdição, mas atua como
interlocutora do legislador, a “teoria constitucional enquanto teoria de legislação
deveria pesquisar - o que até então não foi feito - as peculiaridades da interpretação
constitucional levada a efeito pelo legislador (contemplar-se-ia, assim, a alta
relevância do Direito Parlamentar)” (HÄBERLE, 1997, p. 54).
Tudo o que envolve a jurisdição constitucional tem impactos sobre a
atividade do legislador e é preciso encontrar uma conformação nos limites do
“sistema axiológico” da Constituição ou mediante uma utilização de forma negativa
para impedir arbitrariedades. A atividade do juiz constitucional não pode permanecer
somente no aspecto negativo, mas precisa abranger a “compreensão positiva para o
legislador, enquanto intérprete da Constituição seja enquanto ele, o legislador, pré-
formula, no processo político, seja enquanto participa formalmente do processo
constitucional” (HÄBERLE, 1997, p. 55).
O exercício entre a atividade da jurisdição constitucional e a atividade
legislativa se apresenta como um desafio, da mesma forma é difícil questão sobre
em que medida outros participantes devem ser normativamente
constitucionalizados. No entanto, a resposta de Häberle (1997, p. 55) é diferente:

Constitucionalizar formas e processos de participação é uma tarefa


específica de uma teoria constitucional (procedimental). Para conteúdos e
métodos, isto se aplica de forma limitada. Fundamentalmente, o processo
político deve ser (e deve permanecer), tanto quanto possível, aberto,
devendo também uma interpretação "diversionista" ter oportunidade de ser
sustentada, em algum momento. É verdade que o processo político é um
processo de comunicação de todos para com todos, no qual a teoria
constitucional deve tentar ser ouvida, encontrando um espaço próprio e
assumindo sua função enquanto instância crítica. Porém, a ausência (ein
Zuwenig) de "academical self-restraint" pode levar a uma perda de
autoridade. A teoria constitucional democrática aqui enunciada tem também
uma peculiar responsabilidade para a sociedade aberta dos intérpretes da
Constituição.
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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma compreensão da obra exige um conhecimento prévio da teoria
constitucional, especialmente das ideias de Lassale, Loewenstein, Hesse e Schmitt,
para contextualizar a leitura e ter um suporte de entendimento de vários conceitos
que são dispostos pelo autor. Consignando a ideia de que a Constituição é um
documento político e que possui uma consciência que não pode sofrer erosão, não é
uma simples folha de papel, mas tem a capacidade de impor tarefas a todos, a ideia
de interpretação aberta consegue uma maior fluência.
A partir da tese dos intérpretes da Constituição da sociedade aberta, é
possível perceber que a interpretação não é uma atividade estática e estatal. A
hermenêutica constitucional não é restrita às Cortes e juízes constitucionais,
conceito aplicável no Brasil em qualquer grau de jurisdição graças ao sistema
híbrido de controle constitucional pela via concreta, difusa ou incidental e pela via
abstrata, direta e concentrada.
As possibilidades de interpretação se espalham para fora da jurisdição e
cotidianamente se aperfeiçoam no espaço público e na realidade. Não só juízes e
membros do STF são intérpretes, mas todos são potencialmente intérpretes da
Constituição direta ou indiretamente.
O tempo da interpretação não é mensurável, pode-se dizer que a
hermenêutica constitucional é intertemporal e dinâmica, se produzindo em fatos e
decisões, daí a importância de reconhecer nos legisladores, servidores públicos,
grupos de interesse, cidadãos, partidos políticos, enfim num rol sem número definido
de pessoas ou categorias, a legitimidade para interpretar.
Nos direitos fundamentais, principalmente, a participação aberta é plural é
uma condição para determinação do sentido e do alcance das expressões da
Constituição e um reconhecimento positivo pela jurisdição constitucional é um vetor
de validade da palavra final emanada da Corte.
Embora Häberle seja categórico com relação à concepção de povo – que
muitas vezes toma uma forma diminutiva de sua importância – é necessário tecer
uma crítica suave com relação à ideia de democracia do cidadão, pois nem todos os
potenciais intérpretes são cidadãos em sentido estrito, por exemplo apátridas,
menores, presos com direitos políticos suspensos, precisam ter a voz ouvida e no
mínimo ter representatividade na busca por uma boa interpretação constitucional.
É óbvio que a sistemática da obra não permite uma leitura restritiva da ideia
de cidadão, mas é necessário o esclarecimento para que não se contamine a ideia
do autor com um pensamento predominantemente categorizado e fechado em um
numerus clausus de intérpretes.
Por fim, medidas como audiências públicas no STF, a roupagem do amici
curiae trazida pelo novo CPC, plenários virtuais, e-cidadão e principalmente a
aplicação do princípio da transparência em todas as funções do Estado dão um tom
de validade e necessidade na aplicação da tese de Häberle para uma sociedade
aberta.
Entre tantos avanços e retrocessos é somente a partir de um diálogo entre
todos é que o processo de interpretação constitucional firma sua validade e se
afeiçoa com a justiça.
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REFERÊNCIAS UTILIZADAS PARA COMPREENSÃO DA OBRA

ALARCÓN, Pietro de Jesús Lora. Ciência política, estado e direito público. 2ª Ed.
São Paulo: Editora Verbatim, 2014.

ALVES, Fernando Brito. Constituição e participação popular: a construção histórico-


discursiva do conteúdo jurídico-político da democracia como direito fundamental.
Curitiba: Juruá, 2013.

ARISTÓTELES. A política. Tradução de Nestor Silveira Chaves. Coleção


fundamentos da filosofia. São Paulo : Ícone, 2007, p. 178.

BOTELHO, Marcos César. A legitimidade da jurisdição constitucional no


pensamento de Jürgen Habermas. São Paulo: Saraiva, 2010.

HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução: Gilmar Ferreira


Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991.

LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de la constituición. 2ª Edición. Traducción de


Eduardo Espin. Barcelona: Editora Ariel, 1979.

MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental da democracia.


Tradução: Peter Naumann. São Paulo: Editora Max Limonad, 2003.

SCHMITT, Carl. Teoria de la constitución. Traducción de Francisco Ayala. Madrid:


Alianza Editorial, 1996.

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