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COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS.

Estimativa da Resistência à Compressão Diametral de um Solo


Cimentado Reforçado com Fibras de Polipropileno
Rafael Rizzatti de Moraes
UFRGS, Porto Alegre, Brasil, rr_moraes_14@hotmail.com

Lucas Festugato
UFRGS, Porto Alegre, Brasil, lucas@ufrgs.br

Nilo Cesar Consoli


UFRGS, Porto Alegre, Brasil, consoli@ufrgs.br

RESUMO: Ensaios de resistência à compressão diametral foram realizados para a obtenção de uma
metodologia de dosagem de misturas solo-cimento-fibra, através da quantificação da influência do
teor de cimento e da porosidade. Foram utilizados solo residual de arenito Botucatu, fibras de
polipropileno de 24mm e 3,3dtex, cimento Portland de alta resistência inicial e água destilada.
Utilizaram-se corpos-de-prova cilíndricos de 5cm de diâmetro e 10cm de altura. Os resultados
indicam, de maneira preliminar, o aumento da resistência à compressão diametral das misturas de
solo-cimento-fibra com o aumento da quantidade de cimento adicionada ao solo, bem como com o
aumento da massa específica aparente seca das amostras. Além disso, é verificado um acréscimo
exponencial da resistência mecânica em função da diminuição da porosidade.

PALAVRAS-CHAVE: Reforço de Solos, Solo-Cimento-Fibra, Compressão Diametral.

1 INTRODUÇÃO Dupas e Pecker, 1979; Thomé et al., 2005;


Consoli et al., 2007).
A grande disponibilidade e o baixo custo No entanto, ainda não há metodologias de
tornam o solo um material vastamente dosagem das misturas solo-cimento-fibra
empregado. Por se apresentar de forma amplamente difundidas na prática de engenharia
heterogênea, complexa e variável, com como há, por exemplo, no concreto.
freqüência, suas propriedades não se enquadram Nesse sentido, este estudo tem por objetivo
às características e às necessidades de projeto. quantificar a influência do teor de cimento e da
A inclusão de fibras aos solos tem sido porosidade sobre a resistência mecânica de uma
estudada por diversos pesquisadores nos mistura solo-cimento-fibra à tração por
últimos anos para numerosas aplicações, desde compressão diametral.
estruturas de contenção até a estabilização de
solos sob fundações e pavimentos (Gray e
Ohashi, 1983; Gray e Al-Refeai, 1986; Freitag, 2 METODOLOGIA
1986; Maher e Gray, 1990; Fatani et al., 1991;
Maher e Ho, 1993; Santoni et al., 2001; 2.1 Materiais
Zornberg, 2002; Casagrande, 2005; Festugato,
2008). Além disso, a técnica de tratamento de 2.1.1 Solo
solos com cimento vem sendo empregada com
sucesso, por exemplo, na construção de bases Utilizou-se solo residual de arenito da chamada
para pavimentos, na proteção de taludes em Formação Botucatu. É classificado como areia
barragens de terra e canais, para execução de fina siltosa, não uniforme (NBR 6502/95 –
camadas de apoio para fundações superficiais, ABNT, 1995). A massa específica real dos
para contenção e escavações, na prevenção de grãos de solo é 26,4kN/m³. Sua curva
liquefação em areias (Ingles e Metcalf, 1972; granulométrica é apresentada na Figura 1.

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para cada mistura era calculada em relação à


2.1.2 Agente Cimentante massa de solo seco utilizada e a quantidade de
água (teor de umidade) e de fibras em relação à
O agente cimentante utilizado foi o cimento soma das massas de solo seco e de cimento. A
Portland de alta resistência inicial (CP V – quantidade total de mistura permitia a
ARI). A massa específica real dos grãos de moldagem de um corpo-de-prova e uma
cimento é 31,5kN/m³. quantidade adicional para determinação do teor
de umidade.
Após a mistura dos materiais, a quantidade
de solo-cimento-fibra necessária para confecção
de um corpo-de-prova era dividida em três
partes iguais, armazenadas em recipientes com
tampa para evitar a perda de umidade, para
posterior compactação. Ao final deste processo,
duas pequenas porções da mistura eram
retiradas e colocadas em cápsulas para
determinação do teor de umidade. A média dos
dois teores de umidade medidos era adotada
como sendo o teor de umidade de corpo-de-
prova. A amostra era, então, compactada
estaticamente em três camadas no interior de
Figura 1. Curva granulométrica do solo residual de um molde de metálico tripartido, devidamente
arenito Botucatu. lubrificado, de maneira que cada camada
atingisse as especificações de teor de umidade e
2.1.3 Fibras peso específico aparente seco, tomando-se o
cuidado de se escarificar levemente os topos
As fibras utilizadas como elemento de acabados da primeira e da segunda camada para
reforço são poliméricas de polipropileno. aumentar a integração entre as camadas
Possuem 24mm de comprimento e título de superpostas. Concluído o processo de
3,3dtex, correspondente ao diâmetro de moldagem, o corpo-de-prova era imediatamente
0,023mm. Os micro-reforços apresentam extraído do molde, sua massa e medidas
densidade de 0,91, módulo de elasticidade de (diâmetro e altura) devidamente anotadas com
3GPa, resistência última à tração de 120MPa e resolução de 0,01g e 0,1mm respectivamente, e
deformação de ruptura de 80%. acondicionado em um saco plástico
adequadamente identificado e vedado para
2.2 Métodos evitar variações significativas do teor de
umidade.
2.2.1 Moldagem e Cura dos Corpos de Prova Os corpos-de-prova assim obtidos eram,
então, armazenados e curados por um período
Foram utilizados, para os ensaios de de seis dias em um ambiente com temperatura e
compressão diametral, corpos-de-prova umidade controladas (temperatura de 23º ± 2 ºC
cilíndricos de 10cm de altura e 5cm de e umidade relativa do ar maior que 95%).
diâmetro. Após a pesagem dos materiais (solo, Foram considerados aptos para ensaios os
cimento, fibra e água), o solo e o cimento eram corpos-de-prova que atendiam as seguintes
misturados com o auxílio de uma espátula tolerâncias:
metálica, até que a mistura adquirisse uma • Peso específico aparente seco (γd): grau
coloração uniforme. Em seguida, era adicionada de compactação de 99% a 101%, sendo o
a água, continuando o processo de mistura até grau de compactação definido como o
que a homogeneidade fosse obtida. valor de γd obtido na moldagem dividido
Posteriormente, eram adicionadas e misturadas pelo valor de γd definido como meta.
as fibras. A quantidade de cimento necessária • Teor de umidade (ω): valor determinado

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± 0,5 pontos percentuais


• Dimensões: diâmetro 50 ± 0,5mm e
altura 100 ± 1mm.

2.2.2 Ensaios de Compressão Diametral

Ensaios de resistência à compressão simples e


de resistência à compressão diametral têm sido
utilizados na maioria dos programas
experimentais relatados na literatura quando se
deseja verificar a efetividade da adição de
cimento e de fibras ou acessar aspectos relativos
à importância de fatores influentes sobre a
resistência de misturas solo-cimento-fibra. Uma
das razões para tal é a experiência acumulada
com este tipo de ensaio na área de concretos, Figura 2. Ensaio de compressão diametral em andamento.
além de ser um ensaio de simples e rápida
execução, baixo custo, confiável e amplamente 2.3 Programa de Ensaios de Compressão
difundido no meio técnico. Diametral
Para os ensaios realizados neste estudo, foi
utilizada uma prensa automática com A principal etapa desta pesquisa é o ensaio de
capacidade máxima de 50 kN, além de anéis compressão diametral, cuja elaboração permitiu
dinamométricos calibrados com capacidade de avaliar a influência do teor de cimento e da
10kN e 50kN e resolução de 0,005kN (0,5kgf) e porosidade sobre a resistência mecânica de
0,023kN (2,3kgf) respectivamente. A misturas de solo-cimento-fibra.
velocidade de deformação destes ensaios foi de O programa de ensaios de compressão
1,14mm por minuto. Os corpos-de-prova, após diametral é apresentado na Tabela 1.
serem curados por 6 dias na câmara úmida, Os pontos de moldagem foram posicionados
eram submersos em um tanque com água por em uma linha, denominada linha “A”. A
um período de 24 horas, visando aproximar a característica da linha “A” é apresentar o teor
condição de saturação e minimizar a sucção. A de umidade constante (10%) e variar o peso
temperatura da água do tanque era controlada e específico aparente seco.
mantida em 23 ± 3° C. Imediatamente antes do
ensaio de compressão diametral, os corpos-de- Tabela 1. Programa de ensaios de compressão diametral.
prova eram retirados do tanque e PONTOS DE MOLDAGEM
superficialmente secos como o auxílio de um Ponto γd (kN/m³) W (%)
tecido absorvente. Procedia-se então a execução A1 17,3 10
do ensaio, como mostra a Figura 2, e anotava-se A2 18,0 10
a carga máxima atingida pelo corpo-de-prova. A3 19,0 10
A4 19,7 10

Cada ponto da linha “A” foi moldado com 5


diferentes porcentagens de cimento (C): 1%,
2%, 3%, 5% e 7%, e iguais porcentagens de
fibra (0,5%). Partindo da experiência
(internacional e brasileira) com o solo-cimento
em nível experimental, foram escolhidas as
porcentagens de cimento.
Com o objetivo de diminuir a dispersão
características dos ensaios de compressão
diametral e, dessa forma, aumentar a

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confiabilidade dos resultados, cada corpo-de-


prova foi moldado três vezes. Na Figura 4, são apresentadas as curvas de
ajuste da variação da resistência à compressão
diametral em função da porosidade do solo-
3 RESULTADOS cimento-fibra compactado. Cada curva,
isoladamente, possui o mesmo teor de cimento.
3.1 Efeito do Teor de Cimento e da Todos os pontos possuem o mesmo teor de
Porosidade. umidade (ω = 10%).
Verifica-se um ganho potencial da
Como cada ponto da linha A foi moldado com 5 resistência à compressão diametral com a
diferentes porcentagens de cimento (1%, 2%, redução da porosidade das misturas de solo-
3%, 5% e 7%), será possível avaliar a influência cimento-fibra.
desta variável, já que o peso específico aparente C = 1%
seco e a umidade das amostras permaneceram C = 2%
C = 3%
constantes. C = 5%
Na Figura 3, são apresentadas as curvas de C = 7%

ajuste da variação da resistência à compressão


diametral em função do teor de cimento das
misturas. Cada curva, isoladamente, possui a
mesma massa específica aparente seca e todos
os pontos possuem o mesmo teor de umidade
(ω = 10%).
Observa-se, através da Figura 3, o aumento
linear da resistência à compressão diametral
com o aumento do teor de cimento. Percebe-se
também que a cimentação e a adição de fibras
são mais efetivas nas misturas mais compactas,
pois nas misturas com maior peso específico
seco, há uma maior taxa de aumento da
resistência (representada pela inclinação das
retas de ajuste da Figura 3). η(%)

γd = 17,3KN/m³ Figura 4. Variação da resistência à compressão diametral


γd = 18,0KN/m³ em relação à porosidade das misturas.
γd = 19,0KN/m³
γd = 19,7KN/m³
Verifica-se que, de maneira similar à
quantidade de cimento, a porosidade da mistura
compactada exerce uma forte influência sobre a
resistência à compressão diametral do solo-
cimento-fibra. Independentemente da
quantidade de cimento utilizado, a redução na
porosidade do material promove ganhos
significativos de resistência. Em média a
redução de cinco pontos percentuais na
porosidade do material aumentou em 1,7 vezes
a resistência à compressão simples do solo-
cimento-fibra testado.

C(%)
Figura 3. Variação da resistência à compressão diametral 4 CONCLUSÕES
em relação ao teor de cimento.

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A partir da análise dos resultados, bem como da Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil,
avaliação da influência das variáveis estudadas Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre.
(teor de cimento e porosidade) sobre a
resistência à compressão diametral das misturas Freitag, D.R. (1986). Soil randomly reinforced with
solo-cimento-fibra, foram estabelecidas as fibers, Journal of Geotechnical Engineering, New
seguintes conclusões: York, v.112, n.8, p. 823-826.
* A adição de cimento, mesmo em pequenas
Gray, D.H.; Al-Refeai, T. (1986) Behavior of fabric
quantidades, provocou ganhos significativos de versus fiber-reinforced sand, Journal of Geotechnical
resistência no material. Na faixa de teores Engineering, New York, v.112, n.8, p. 804-820.
estudados, a resistência à compressão diametral
cresceu linearmente com o aumento do teor de Gray, D.H.; Ohashi, H. (1983) Mechanics of fiber
cimento. Além disso, a taxa de resistência, reinforcement in sand, Journal of Geotechnical
Engineering, New York, v.109, n.3, p. 335-353.
representada pela inclinação das retas de
ajustes, cresceu com o aumento do peso Ingles, O. G. e Metcalf, J. B. (1972). Soil Stabilization –
específico aparente seco do material estudado, Principles and Practice, Australia: Butterworths Pty.
indicando que o reforço através da cimentação e Limited, 366p.
da adição de fibras é mais efetivo nas misturas
Maher, M.H.; Gray, D.H. (1990). Static response of
mais compactas. sands reinforced with randomly distributed fibers,
* A redução na porosidade do material promove Journal of Geotechnical Engineering, New york,
ganhos significativos de resistências. Verificou- v.116, n.11, p.1661-1677.
se que a resistência à compressão diametral
aumentou potencialmente com a redução da Maher, M.H.; Ho, Y.C. (1993) Behavior of fiber-
reinforced cemented sand under static and cyclic
porosidade da mistura solo-cimento-fibra. loads, Geotechnical Testing Journal, Philadelphia,
v.16, n.3, p.330-338.
AGRADECIMENTOS
Santoni, R.L.; Tingle, J.S.; WEBSTER, S.L. (2001).
Os autores agradecem ao CNPq, à Capes e à Engineering Properties of sand-fiber mixtures for
Sesu/MEC pelo apoio financeiro para a road construction, Journal of Geotechnical and
Geoenvironmental Engineering, New York, v.127,
realização da pesquisa. n.3, p.258-268.

REFERÊNCIAS Zornberg, J.G. (2002). Discrete framework for limit


equilibrium analysis of fibre-reinforced soil,
Casagrande, M. D. T. (2005). Comportamento de Solos Géotechnique, London, v.52, n.8, p.593-604.
Reforçados com Fibras Submetidos a Grandes
Deformações, Dissertação de Doutorado, Programa de Thomé, A., Donato, M., Consoli, N. C. and Graham, J.
Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade (2005). Circular footings on a cemented layer above
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. weak foundation soil, Canadian Geotechnical Journal,
42(6), 1569-1584.
Consoli, N. C.; Foppa, D. (2007). Key Parameters for
Strength Control of Artificially Cemented Soils,
Journal of Geotechnical and Geoenvironmental
Engineering, ASCE, Vol. 133, N.2 p. 197-205.

Dupas, J. M. E Pecker, A. (1979). Static and dynamic


Properties of Sand-cement, Journal of Geotechnial
Engineering Division, ASCE, v. 105, n. 3, p. 419-436.

Fatani, M.N.; Bauer, G.E.; Al-Joulani, N. (1991)


Reinforcing soil with aligned and randomly oriented
metallic, Geotechnical Testing Journal, Philadelphia,
v.14, n.1, p. 78-87.

Festugato, L. (2008). Análise do comportamento


mecânico de um solo micro-reforçado com fibras de
distintos índices aspecto, Dissertação de Mestrado,

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