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1.

TÉCNICA

1.1 Sobre a técnica em geral.


1. Aprendemos a superar dificuldades específicas em estudos específicos, e logo não
conseguimos os mesmos resultados em outros contextos. É necessário aprender a
desmembrar as dificuldades em seus elementos técnicos, compreendê-los e aplicar–
lhes os conhecimentos específicos já assimilados.
2. É necessário dedicar uma parte do dia a técnica. Ao se praticar a técnica durante as
obras, se forma uma “seqüência de dificuldades”.
3. Não deve haver, durante o estudo da técnica, um movimento inadequado da mão.
Interpretando uma obra em público podemos admitir alguma falha, mas ao estudar
técnica isto não é admissível, pois estamos criando bons hábitos.
4. Estudar mal é como tentar pegar um objeto que está no chão enquanto andamos de
bicicleta: mesmo que passemos cem vezes pelo lugar, nunca iremos pegá-lo. É preciso
parar, descer da bicicleta, recolher o objeto e seguir.
5. Se não a evitarmos, a tensão muscular vai se acumulando de uma dificuldade a
outra. Para evitar isso, praticar a primeira dificuldade, parar, relaxar e então praticar a
segunda, e assim sucessivamente.
6. “Se podes fazê-lo uma vez bem, podes fazê-lo sempre bem”.
7. Ao digitar, buscar sempre a fluidez no fraseado. Deve-se tocar a frase em questão
por partes, e ver onde se pode cortar o som e onde não se pode, para estabelecer a
digitação mais adequada.
8. Um bom truque para achar digitações mais fáceis é ler uma peça ao contrário, ou
seja, começar colocando a posição difícil, aquela que sempre se chega mal, e ir
reconstruindo a frase
desde do fim até o começo da mesma.
9. Numa frase com salto (translado), buscar que este não coincida com um ponto
importante da frase, para que não se perceba tanto o necessário corte de som na
frase.
10. Se há uma passagem extremamente difícil, buscar produzir uma mensagem
unitária. Não importa se não se toca todas as notas, o importante é dotá-las de sentido,
tocar “nos lugares” (precisão rítmica) e com consciência da direcionalidade.
11. Distribuir a dificuldade entre as mãos. Ás vezes é necessário tirar dificuldade de
uma para colocar na outra.

1.2. Mão esquerda


1.2.1 Traslado longitudinal
12. Não acentuar a nota inicial após um traslado longitudinal, a não ser que a
musicalidade assim o peça. Muitas vezes se acentua uma nota por razões puramente
mecânicas, num momento que musicalmente não é desejado.
13. É melhor aceitar que “se vai chegar tarde” após um deslocamento
(desplazamiento) muito difícil, que encurtar a nota anterior para ter mais tempo para a
troca de posição, pois no segundo caso, estaríamos chamando a atenção do público
precisamente para o ponto mais difícil.
14. Quando é necessário cortar uma nota, é melhor tocá-la piano, vibrá-la um pouco, e
tocar um pouco mais forte a nota que retoma a frase, mas nunca acentuar a nota que
será cortada, se musicalmente não for necessário.
15. Se for inevitável cortar uma nota, procurar uma maneira de justificar
musicalmente: sustentar (com vibrato) a nota anterior ou, ainda melhor, ir preparando
o corte com um rallentando que vá deixando espaço entre as notas, como se estivesse
nos avisando que a nota do corte vai demorar a chegar.
16. Para disfarçar os traslados longitudinais, diminuendo, mas a tempo: evitar o
impulso de acelerar para passar mais rápido pela dificuldade, pois assim só
conseguiríamos, ao acelerar, chamar a atenção do público para a dificuldade.
17. Terças consecutivas nas cordas agudas: evitar deslocamentos contínuos. Mover o
polegar apenas quando for necessário, procurando (e memorizando) os pontos de
apoio, de modo que seja possível que cada ponto sirva para duas terças. Considerar e
planificar os lugares mais adequados para situar os inevitáveis cortes de som.
18. Se há uma nota repetida antes de um deslocamento, não repetir com o mesmo
dedo, mas substituir o segundo dedo por um que favoreça o deslocamento que se
seguirá.

1.2.2. Contração – abertura (extensión)


19. Os músculos da mão servem para fechá-la. Estão constituídos de tal maneira que
quando a mão está aberta, eles estão tensionados, sendo a contração sua tendência
natural. Portanto, antes de uma abertura (extensión), é necessário enviar uma ordem
de “relaxamento suplementar” para compensar a tendência natural a contração.
20. Sempre é preferível uma abertura 1-2 a uma 3-4.
21. Diante de uma abertura muito grande: “conduzir” a atenção do público para um
dos extremos da textura, ou seja, soprano ou baixo (estudar qual pode ter mais
interesse musical), com o qual o outro fica num segundo plano, disfarçando-se assim,
sua perda de qualidade sonora.
22. Depois de uma abertura deve-se relaxar, e então deslocar a mão, não deslocar com
a mão em posição de extensão (forçada ou tensa), pois assim, durante o deslocamento
a mão descansa (é o braço que trabalha).

Significado dos termos, de acordo com Abel Carlevaro:


Traslado de mão esquerda é a troca de posição. Estas trocas de posição se realizam
com a participação ativa do braço, sendo este fator importante em todo traslado.
Traslado por substituição: Ocorre quando o dedo, ao trocar de posição, é substituído
por outro no mesmo lugar. São realizados sempre em posições próximas.
Traslado por deslocamento (desplazamiento): Ocorre quando um mesmo dedo (ou
dedos), ao mover-se, determina a nova posição. Podem ser realizados em posições
próximas ou distantes.
Entende-se por posição distante aquela que ultrapassa o alcance normal dos quatro
dedos.
Traslado por salto: No traslado por salto, não existem elementos comuns; a mão deve
saltar totalmente da posição inicial para situar-se em uma nova. Não se desloca ou
substitui o dedo, simplesmente troca-se a posição da mão por uma nova, com a qual
não há nenhum elemento comum que possa servir de guia.

1.2.3. Vibrato
23. O vibrato é um dos principais efeitos expressivos do violão, no entanto, a maioria
dos violonistas o realiza de forma intuitiva, e não é comum encontrar nos métodos um
estudo sistemático de como praticá-lo. Particularmente, me dediquei muito ao estudo
do vibrato, talvez por minha formação inicial como violinista.
24. Evitar o “vibrato nervoso descontrolado”: praticar com metrônomo. Pode-se
começar colocando a 60 BPM e tocar notas longas com duas oscilações por pulsação.
25. Praticando o vibrato como indicamos no ponto anterior, podemos ir aumentando
progressivamente a velocidade, sem alterar demasiadamente a posição da mão, até
chegar a 120 BPM para um vibrato tranqüilo, e 160 BPM para um vibrato intenso.
26. Para mais força e maior controle, pode colocar-se dois dedos para fazer o vibrato.
27. Quando a música nos pede um vibrato e temos uma posição com pestana, é
aconselhável soltar a pestana (se possível) e não vibrar imediatamente, mas um pouco
atrasado e mais devagar.
28. Planificar numa obra o emprego de vibratos em diferentes velocidades, ou seja,
determinar um “esquema de vibratos” e não abusar deste recurso.
29. Quando se deseja fazer uma nota mais alegre (principalmente as agudas): vibrar
um pouco mais rápido.
30. Numa nota rápida não se pode fazer um vibrato lento: não dá tempo e soa como se
houvéssemos desafinado.
31. Se não podemos manter um som agudo no canto, devemos vibrá-lo em pianíssimo
com uma nota bastante redonda e atrair depois a atenção para o baixo ou outra voz. A
nota aguda ficará “soando” na memória do ouvinte.
32. Pode fazer-se um pequeno drama em uma nota culminante da frase vibrando-a, e
para acentuar a expressão, suspender momentaneamente o tempo, mas isso tem que
ser feito de forma muito sutil: imaginemos que ao atirar um objeto para cima, há um
momento em que ele fica imóvel antes de começar a cair.
33. O vibrato na melodia é uma “arma musical” para atrair a atenção. Se o usamos de
forma exagerada, deixa de ter efeito.

1.2.4. Ligados. Ornamentos.


34. Os ligados úteis são os que nos obrigam a formar frases musicais. Já os demais (os
puramente mecânicos) é necessário tirá-los ou, se não se pode, compensá-los com a
tímbrica (para que não se perceba a imposição mecânica sobre a musicalidade).
35. Os grupetos românticos são mais sensuais, mais lentos, quase sem tocar a nota
inicial. Os grupetos barrocos são mais abstratos, mais rápidos e com mais acentuação
na nota inicial.
36. Geralmente podemos interpretar os grupetos atrasando um pouco seu começo e
acelerando progressivamente para recuperar o tempo “roubado” do início.
37. Após um mordente, que costuma terminar com um inevitável ruidinho, vibrar um
pouco a última nota, para disfarçar.
38. Apoggiaturas: acentuar a apoggiatura e piano para a resolução. Ainda melhor: em
vez de acentuar, deixá-la mais interessante, vibrando-a na segunda metade da nota.
39. Grupetos longos (quatro ou mais notas): não atacar forte a nota inicial; esse ataque
forte costuma ser devido ao “medo de perder som”, mas é um absurdo: o som vai se
renovando a cada ligado. A única coisa que conseguimos com isso é desequilibrar o
grupeto.
40. Digitação aconselhada para os trinados a duas cordas: a-i-m-p, tocando a e m na
corda mais aguda.
41. Se num trinado está indicado um crescendo e não é possível fazê-lo, devido a
estarmos fazendo-o em uma corda só: fazer um ligeiro acelerando, pois o efeito sonoro,
ao aumentar o interesse, compensará a carência.

1.2.5. Glissando (Arraste)


42. É melhor não tocar a nota inicial, mas sim “decolar” da corda a partir de um ponto
indefinido.
43. Em Tárrega e em música do romantismo tardio: é preciso chegar antes a nota de
destino e então tocá-la também.
44. O glissando é muito empregado e soa muito adequado, ainda que não esteja
escrito, nas trocas de posição de trêmolos românticos.
45. No período clássico, o glissando é muito suave e discreto, com notas inicial e final
muito claras.

1.2.6. Pestana
46. Considerar a possibilidade da pestana “corrida” ou “móvel”, para facilitar
digitações (principalmente para evitar o “traslado transversal” inútil do dedo um) e
para não interromper a continuidade do fraseado.
47. O problema da pestana, mais que a pressão, é a distribuição da força ao longo do
dedo. Ao se aprender a controlar com que ponto do dedo devemos fazer pressão, o
problema é resolvido.
48. Se apertarmos muito, mas com uma postura inadequada, o dedo tende a curvar-se,
e assim nunca soarão todas as notas. A falha comum é no centro, onde se perde som
por falta de força. É necessário aprender a fazer pressão na parte central, e empregá-la
apenas quando for necessária.
49. A “pestana virada” (que abarca dois trastes consecutivos) pode ser muito útil.
Exercício: partindo de uma pestana reta, virar a parte da base do indicador um
semitom abaixo, mantendo o resto do acorde. Então endireitar a pestana para voltar a
posição inicial (um semitom abaixo) e continuar descendo assim por quatro ou cinco
trastes.

1.3. Mão Direita


1.3.1. Arpejos. Acordes arpejados.
50. O terceiro ou quarto acorde de um grupo, se tiver a função de resolução, pode ser
interpretado arpejado (em contraste com os anteriores), mais forte e um pouco
atrasado.
51. Nos arpejos, evitar que o braço direito se movimente traçando um percurso ao
longo das cordas (de trajetória circular, tendo o cotovelo como centro).
52. É melhor tocar os acordes arpejados onde estiver a instabilidade tonal (dominante,
acordes dissonantes). Em outros casos, os acordes de resolução da tensão podem soar
melhor “plaquê” e piano.
53. Ao encontrarmos um arpejo longo (mais ou menos duas oitavas) que termina em
uma nota no registro sobreagudo: apoiar a nota final e vibrá-la um pouco.
54. Se vamos tocar vários acordes arpejados consecutivos: não arpejar todos com a
mesma velocidade.
55. Para que uma progressão de acordes fique mais fluente e fácil: afrouxar um pouco
o andamento e arpejar com rubato o acorde anterior à progressão.

1.3.2 Braço direito


56. Evitar o movimento do braço tendo o cotovelo como eixo, (ver 51) num plano
paralelo a caixa, para realizar arpejos ou escalas (no geral, para deslocamentos do
grave ao agudo, ou vice-versa). A mão tem de posicionar-se numa posição que permita
o fácil acesso dos dedos a todas as cordas sem movimentação do braço.
57. Evitar manias gestuais da mão e do braço direto, que não acrescentam nada
musicalmente e tecnicamente deslocam a posição do braço.

1.3.3 Ataque dos dedos i-m-a


58. Solto (“puxando”) é o ataque normal, mas não puxando para fora nem
paralelamente a caixa, mas sim apertando um pouco a corda em direção ao tampo.
59. Apoiando ou puxando? O importante é buscar uma postura de mão que nos
permita ter facilidade em ambos os ataques, e dar homogeneidade para ambos, de
maneira que não exista uma diferença qualitativa (contraste tímbrico), mas apenas
uma diferença quantitativa (de maior volume e plenitude sonora no ataque com apoio).
60. Também é preciso uma postura de mão que nos permita apoiar um dedo enquanto
ficamos com os outros livres para o toque sem apoio.
61. O dedo anular ataca a corda, além do movimento normal (para a palma da mão),
de uma forma muito leve, quase imperceptível, ele gira em sentido horário, ou seja,
tendendo a virar ligeiramente a polpa para o dedo médio.
62. O ruído da unha se produz porque o dedo atravessa a corda mais lentamente que o
devido. É necessário atacar a corda com um só golpe, o mais rápido possível. É uma
questão de velocidade, para evitar o ruído do atrito com a unha, mas não é uma
questão de força. Deve se dominar esta alta velocidade de passagem pela corda,
mesmo aplicando muita ou pouca força.
63. Para as cordas revestidas: procurar um ataque de “menor ângulo”, isto é, ataque
perpendicular, para não “roçar” a corda.
64. Para escalas rápidas nos bordões, é muito boa a digitação p – i.
65. Nos ligados de duas notas ou movimentação simultânea e repetida de dois dedos
(por exemplo: i-m), manter a mesma distância de separação entre os dedos.
66. Tentar a digitação p-m-a, em vez de p-i-m, se a intenção é destacar a nota
intermediária.
67. Para destacar o baixo numa nota dobrada nas cordas 5 e 6: tocar o bordão com o
indicador e a quinta corda com o polegar, cruzando os dedos.
N.T. Neste caso considera-se que a voz do baixo esteja na quinta corda. O polegar se
posicionará à frente do indicador, resultando no destaque da quinta corda e num efeito
muito bonito.

1.3.4 Polegar
68. Antes do toque, manter fixa (mas não esticada) a última falange do polegar para o
toque com unha.
69. O polegar apoiado é quase um luxo. Não podemos empregá-lo constantemente
porque nos desloca a posição da mão, por isso é preciso selecionar cuidadosamente os
toques que queremos dar com esse ataque.
70. Uma vez emitida a nota, pode se dobrar a última falange, pois não afetará o som.
71. Pode levantar-se um pouco mais o pulso para dar mais mobilidade ao polegar, de
maneira que não seja uma extensão do braço, mas sim um dedo independente, como
os demais.
72. Para apagar baixos com o polegar, o pulso tem que estar baixo, mas uma vez
apagados, voltar imediatamente a posição natural.

1.3.5. Volume
73. Dividir e dosar bem o volume: é preciso planejar a distribuição do volume por todo
o movimento ou pela peça inteira.
74. Acentuar notas com qualidade e pureza de som, é mais que simplesmente
aumentar o volume.
75. Se na voz soprano, após um forte vier um pianíssimo: atacar com ângulo menor,
buscando um som mais claro e pungente, pois se buscarmos um som mais redondo, no
pianíssimo não se ouvirá nada.
76. Se tivermos que acentuar um acorde final (não arpejado) de uma frase que já está
em forte: atrasar um pouco seu ataque, pois o silêncio criará uma expectativa que
servirá para acentuar ainda mais sua aparição.
77. Se o objetivo é dar mais força para a nota, procure alongar a movimentação do
dedo, mas sem mover a mão. A trajetória do dedo deve empurrar a corda para dentro.
78. Quando há uma nota “tenuto” na voz soprano e duas notas intermediárias
simultâneas (i,m) como acompanhamento em semicolcheias repetidas, deixar que
essas duas notas sejam como um eco da soprano, sumindo gradualmente.
79. Em música a duas vozes, quando há um pianíssimo na voz superior e no baixo há
um fortíssimo súbito, pisar a nota e já ir preparando seu ataque um pouco antes de
tocá-la, para evitar o “efeito pinça” (as duas vozes em forte).
80. Na música barroca, mesmo que existam os crescendo e diminuendos, o mais
adequado é pensar em termos de diferentes planos sonoros de volume, com alguma
autonomia entre si.

1.3.6. Timbre
81. O que efetivamente produz o som é o último contato do fim da unha com a corda,
ou seja, a saída da corda.
82. Ao se fazer um desenho ruim e colorir com tons berrantes, o resultado será um
desastre. É preciso fazer um desenho bonito (frasear corretamente) e se puder colorir
com alguma cor ou nuance (recurso tímbrico) que seja tão sutil que quase não a
percebamos, ficará melhor ainda. Deve-se evitar cometer o erro de estragar um bom
desenho com cores exageradas (efeitos tímbricos mal trabalhados ou descuidados).
83. Para conseguir tais “cores sutis”, melhor do que ficar buscando ícones entre os
violonistas, podemos consegui-las, escutando com atenção, em boas obras orquestrais.
84. Para os bordões nas posições I e IV, ao se deslocar a mão para um pouco mais
perto do cavalete, obtemos de fato um timbre um pouco mais metálico, porém mais
eficiente.
N.T. Embora mesmo no original não fique claro o que se diz por eficiência, neste caso
creio que ele se refira ao contraste tímbrico em relação às primas.
85. Quando forem feitas mudanças de timbre, é preciso deixar clara a intenção, pois
caso contrário, podem parecer erros de falta de uniformidade sonora, devido a
insuficiência técnica.
86. Se quisermos aparentar uma velocidade maior que a que estamos tocando,
articular um pouco staccato.
87. Nas cordas soltas ou nas primeiras posições é mais adequado uma sonoridade mais
aberta (ângulo menor), para as posições posteriores é mais adequado uma sonoridade
mais fechada (mais arredondada, ângulo menor).
88. Ao nos depararmos com uma melodia em harmônicos artificiais sendo
acompanhada por notas normais, nunca devemos cortar as notas da melodia. Devemos
buscar as digitações que nos permitam fazer o acompanhamento em outras cordas,
sem jamais cortar a melodia.
89. Harmônicos artificiais em cordas revestidas: usando o polegar, obteremos uma
nota mais limpa.
90. A quinta corda, em sua região aguda, não costuma soar muito bem em nenhum
violão. Se isto ficar muito evidente, o melhor é tentar outra digitação, que a evite em
tal sonoridade.
91. É necessário investigar a sonoridade de cada nota do nosso violão, para termos
consciência de quais são as melhores e as piores notas que nosso violão oferece. Assim
poderemos evitar ou aproveitar cada nota, sempre que nos seja possível.
92. Paradoxalmente, os bons violões costumam acentuar os defeitos típicos de todos os
violões, pois também são muito mais sensíveis para isso.

1.3.7. Tremolo
93. Um bom tremolo precisa de um bom anular, pois ele costuma ter menor
coordenação, por ser a unha mais comprida e um dedo mais lento na maioria das
pessoas.
94. Para se estudar o tremolo com metrônomo, é aconselhável acentuar um dedo de
cada vez durante alguns minutos, para assim nos sentirmos em condições de tocar
equilibradamente.
95. Para ligar o tremolo com o que vier em seguida, podemos ou manter o ritmo ou
fazer um ritardando exagerado nas últimas notas do tremolo. Em seguida, começar “a
tempo” a frase normal, deixando bem claro que começamos outro trecho.

1.3.8. Trinado
96. O trinado tem que soar mais, não menos, pois é um destaque e um fator de tensão.
Costuma dar um bom resultado fazer um crescendo dentro do trinado, começando
devagar e acelerando até o final.
97. Existem várias formas de obter um trinado que permita o que foi dito no ponto
anterior. Pessoalmente, o trinado em duas cordas me parece muito satisfatório. Pode
fazer-se:
a) com “p-i”, como os alaudistas, ou
b) com “a-i-m-p”.(ver #40).
98. Para praticar o trinado a que nos referimos em “b”, pode praticar-se
simultaneamente “p-a” e “i-m”, e assim sucessivamente, até obtermos uma integração
de continuidade sonora em ambos os grupos.

1.4. Coordenação entre as mãos


99. Quando se toca forte é preciso ter atenção para não se apertar mais que o
necessário com a mão esquerda.
100. A maioria das pessoas que tocam involuntariamente com uma sonoridade
“staccato”, assim fazem devido a um problema de coordenação entre as mãos.

2. MÚSICA

2.1. Fraseado / Acentuação


101. Regra geral: Que a mecânica dos movimentos não seja notada. Os acentos que
são
impostos pela técnica muitas vezes não estão de acordo com os acentos musicais.
102. Pra estudar o fraseado é conveniente, principalmente nos casos de música
contrapontística, estudar uma só voz e depois ir acrescentando as demais, que deverão
soar
igualmente bem.
103. O melhor é primeiro tocarmos a peça sem acentuar nada, como se estivéssemos
tocando um cravo, para só então decidir onde acentuar e experimentarmos, sem
préjulgamentos, as mais variadas possibilidades.
104. Os intervalos que resultariam difíceis de entoar podem demorar-se um pouco, pois
assim obtemos uma sensação de estar mais “cantabile”.
105. Ter consciência de que no contraponto é necessário dar personalidade aos temas.
Buscar uma linha melódica tal que seja reconhecível mesmo quando aparecer dentro
de uma complexa trama polifônica.
106. Fraseado barroco: a obra de Bach é toda ela um exercício de equilíbrio. Para obtê-
lo,
podemos trabalhar em duas fases:
A - Colocar os dedos nos seus lugares.
B - Tirar os acentos restantes de cada voz, e que nos fazem pensar mais vertical que
em
horizontalmente.
Quando está bem fraseado, “soa fácil”.
107. É preciso frasear as peças barrocas sem ligados, para poder conduzir livremente
as frases para as suas finalidades. Após isso, verificar se ficará adequado inserir algum
ligado.
108. Ao interpretar Bach, pode-se aplicar trinados ou mordentes nos momentos de
tensão ou para enfatizar notas importantes.
109. Existe uma forma de acentuar sem dar mais volume: atrasando um pouco a nota.
Assim fazem os cravistas.
110. Para suavizar os cortes que às vezes são inevitáveis: empregar um rápido e sutil
rubato.
111. Quando temos uma melodia na voz soprano (mais aguda) que é interrompida por
freqüentes trocas de posição, é preciso atrair a atenção para outra voz.
112. Quando a última saída é cortar a melodia, conduzir a frase de tal maneira que “o
corte seja justificável”, ou seja, que se perceba um motivo musical para o corte.
113. Não abusar da acentuação inicial do compasso, pois especialmente no
renascimento e no barroco, o sentido da frase é mais importante que o acento do início
do compasso. Por exemplo: não se devem acentuar as notas que coincidam com um
final de frase e que caiam no tempo forte do compasso.
114. As frases precisam ter suas respirações, como se estivéssemos tocando um
instrumento de sopro.
115. Nas repetições é interessante testar uma troca de acentuação na frase. Nem
sempre é satisfatório, mas às vezes uma troca sutil faz a diferença necessária.
116. Duas notas sucessivas, em cordas diferentes, não dão a sensação de “formar uma
palavra”, ou seja, não contribuem com o fraseado, a não ser que se tenha uma técnica
suficiente para que não se faça perceber que estão em cordas diferentes.
117. Uma frase que tenha crescendo, acelerando, ou ambos, não tem por quê ser
executada sempre de forma gradual. Às vezes fica melhor mudar muito pouco no início
e preservar-se para dar uma “arrancada” no final.
118. Dois segredos para o repouso no fraseado: ligeiramente rubato no
acompanhamento e diminuir o volume.
119. Se tivermos uma frase formada por três partes que vão acumulando tensão,
podemos tocar a primeira rubato, a segunda um pouco menos e a terceira bem
precisa.

2.2. Harmonia
120. Quando a harmonia mudar, pensar numa sensação: Alegre, triste, cansativa,
sedutora, etc.
121. O foco costuma estar justamente na nota que precisa de resolução (ver também
#52).

2.3. Ritmo
122. Geralmente se descuida do ritmo com uma freqüência excessiva, pois quase
sempre estudamos ou tocamos sozinhos. É preciso prestar muita atenção no ritmo,
especialmente em passagens rápidas com acordes arpejados, onde o movimento da
mão direita num só gesto repetido pode produzir “acelerandos” em cada arpejo,
resultando numa movimentação rítmica ondulante, ao invés de regular.
123. Não adiantar os baixos, recurso expressivo muito freqüente. Consideremos que
podem haver alguns ouvintes que sigam a linha do baixo, neste caso eles se verão
surpreendidos ao encontrarem repentinamente uma nota antes do esperado.
124. Para fazer as escalas rápidas parecerem mais virtuosas, iniciar contido e acelerar
até o final da escala.
125. Quando há troca de ritmos dentro de uma peça, é preciso dar-lhe uma razão de
ser, fazer algo musical nos elos. Caso contrário poderá resultar um efeito parecido a
quando se dá um golpe no toca-disco e a agulha salta para outra peça.
126. Tocar “rubateando” todos os arpejos (por exemplo, no primeiro movimento de “La
Catedral”, de Agustín Barrios) pode dar demasiada ênfase ao acompanhamento:
rubatear apenas os arpejos que estejam juntos com as notas que se quer destacar.

2.4. Algumas notas a respeito de aspectos de forma e estilo.


127. É conveniente sermos cuidadosos com a fórmula de compasso em que está
escrita a peça. Como exemplo, geralmente uma Allemande se escreve em 2 por 4, não
em 4 por 4, então ao interpretá-la, temos que pensarem binário, não em quaternário.
128. A interpretação das Sarabandas costuma ficar mais interessante quando
acentuamos o segundo tempo.
129. Uma suíte para alaúde que está em mi bemol se transpõe para o violão ao tom de
ré, e com a sexta corda em ré. Mas pode se tocar no tom original (mi bemol) apenas
colocando uma pestana na primeira casa.
130. Cuidado com os tempos ternários do romantismo. A típica valsa vienense, que
influencia grande parte do nosso repertório desta época, tem o terceiro tempo
acentuado, em vez do primeiro.
131. As “variações” não precisam soar como se fossem um conjunto de peças
minúsculas que reiteram o mesmo esquema. É preciso integrá-las, pois é o conjunto
que temos que comunicar como mensagem musical.
132. Os silêncios entre as variações são importantíssimos, pois são os momentos de
maior comunicação e de acumulação progressiva da tensão, que se mantém para a
variação seguinte e se conduz até o final.
133. As fugas são verdadeiros exercícios de equilíbrio e controle. Pode-se começar
pianíssimo e a tempo, e cada vez que entra uma voz, pode-se subir um pouco o
volume.
134. Nos prelúdios há sempre um momento de caos (rubato) antes do final.
135. Sor e Aguado acrescentavam algumas notas para completar as harmonias nas
repetições. Podemos nos atrever também a tentar isso em nossas interpretações.
136. Focalizar as obras pelo ponto de vista orquestral e característico: os “solos”
podem ser feitos mais rubatos e pianos.
137. Assim como é feito hoje na música flamenca, na escrita violonística de Sor é muito
comum o emprego de padrões melódicos que permitam a continuidade da pestana
fixa. É conveniente tê-la presente em alguns casos.

3. TÉCNICAS DE ESTUDO

138. Técnica para memorizar: começar do final da peça e ir até o início. Parece um
pouco rebuscado e trivial, mas o que se almeja com isso é inverter a atitude normal do
intérprete: sempre começamos no que nos é mais familiar e seguimos para o que
conhecemos recentemente e está menos seguro. Ao memorizar do final até o principio,
vamos tocando do menos conhecido até o mais conhecido, e com isso, ganhamos
segurança.
139. Não memorizar involuntariamente, sem ter a intenção de fazê-lo, mas sim se
propor a memorizar de maneira consciente e por vontade própria.
140. Ainda que dure apenas dez minutos, na primeira fase da memorização é
fundamental voltar a memorizar após meia hora (reforço). A motivação também é
muito importante: é preciso fixar prazos, mesmo que sejam fictícios.
141. Após ter memorizado a obra, é conveniente gravá-la e, com a partitura em mãos,
dar uma aula a si mesmo, anotando os erros da gravação.
142. O cérebro pode funcionar como um gravador, e podemos aplicar esta habilidade
especialmente para depurar a mecânica. Falo em repetir bem devagar as passagens
difíceis para fixar na memória o movimento correto, mas é essencial que não gravemos
o movimento se o estivermos tocando errado, pois nesse caso gravamos os erros e fica
muito trabalhoso corrigí-los após termos memorizado.
143. Concentração: para trabalhá-la, às vezes podemos estudar em um “ambiente
dispersante”, como em frente à TV, com alguém conversando ao lado, ou que te
incomode. Se nos superarmos nessa situação, teremos melhorado nossa capacidade de
concentração.
144. Tocar apenas a melodia ou apenas o acompanhamento para estudar uma peça.
145. Não estudar por mais que 50 minutos seguidos. Mudar de atividade e
rapidamente voltar a estudar.
146. Planejamento para uma sessão de estudo de três horas:
- Meia hora de técnica.
- Duas horas de estudo uma peça, com um intervalo no meio.
- Meia hora para se revisar o que se sabe.
147. Durante a manhã, é melhor estudar obras novas, pois se está mais receptivo.
Durante a noite, praticar “situações de concerto”.
148. A leitura á primeira vista é muito prática, pois nos permite encontrar digitações
alternativas instantaneamente. Para iniciar, são muito recomendáveis os estudos de
violino, pois os estudos de violão são mais difíceis para se ler com fluência em um nível
básico.
149. Lendo à primeira vista, há duas regras de ouro.
“Tocar o que vê”. Não é necessário tocar todas as notas, mas não se detenha e
mantenha a pulsação com precisão. “Olhe sempre de relance para o compasso
seguinte, para o meio do compasso seguinte ou para o compasso á frente do que se
toca.”
150. Ler devagar mas sem parar. É muito mais importante evitar paradas que cortam a
continuidade do discurso musical e nos impedem de dar sentido as frases, que tentar
aumentar a velocidade. Mesmo que esteja marcado “Allegro”, se dará atenção a isso
após o primeiro contato com a obra, não se deve dar uma interpretação que exija uma
velocidade determinada.
151. Antes de tocar uma peça em um concerto, é necessário ser capaz de escrevê-la,
revisá-la mentalmente e, ainda melhor, com o violão invertido, em contato com o
corpo, tocando sobre o braço do violão.

4. ATITUDE DO MÚSICO NA APRESENTAÇÃO EM PÚBLICO

152. Para combater o nervosismo temos que controlar nossa atitude. Em vez de nos
deixar levar pela situação e pela responsabilidade, devemos pensar que somos como
guias turísticos, que vamos conduzir o público, que vamos mostrar-lhes nossa forma de
ver a música.
153. Considerar os concertos como situações que nos brindam com a oportunidade de,
ao mesmo tempo que aprendemos sobre nós mesmos, ensinar aos demais.
154. Ao estudarmos, temos que fazer que a atitude física (rosto, corpo e gestos) passe
a sensação de que é algo fácil, sem agressividade, pois caso contrário, fixaremos uma
atitude de tensão, de dificuldade, que se prolonga para a interpretação em público.
155. Tentemos escutar a nós mesmos enquanto estamos tocando.
156. É preciso ter segurança após termos trabalhado uma interpretação. Podemos
pensar: “essa é minha forma de ver esta peça, tão válida como a de qualquer outro
violonista, por melhor que ele seja”.
157. Levamos muito a sério as pequenas falhas ocorridas quando estamos tocando
para alguém. Não devemos achar que estamos sendo julgados a todo instante. Uma
falha que cometemos já pertence ao passado.
158. Podemos cometer um erro num concerto, mas temos que saber a origem do erro.
Caso contrário, adquirimos um mau hábito: esperar um acerto fortuito no concerto ante
uma dificuldade que não resolvemos durante o estudo.
159. Dirigir-se sempre musicalmente para um ponto, ainda que apareçam falhas no
caminho.
160. É impossível tocar um concerto sem equivocar-se. É preciso aprender e praticar a
ligação de um erro com o que vier em seguida. Se isso não se pratica como se pratica o
resto, nos desconcertaremos quando ocorrer e um pequeno erro pode se tornar um
erro enorme, perderemos a concentração e possivelmente ficaremos impedidos de
seguir tocando.
161. Podemos praticar, em vez da habitual repetição voltando um compasso a cada
vez que se erra, saltar um compasso adiante.
162. Talvez a maior causa de preocupação e nervosismo não seja um pequeno erro,
mas que tenhamos um “branco”. É preciso praticar a memória formal ou estrutural e
trabalhar pontos de referência para saltarmos nos casos de urgência.
163. Quando estamos um pouco nervosos: exagerar o fraseado (um pouco rubato),
pois com isso, suavizaremos a tensão.
164. Um pensamento positivo para ajudar nos movimentos difíceis: “está saindo mal,
mas sei que tenho recursos para supera-lo”.
165. Não percamos a paciência com nós mesmos, pois às vezes pensamos que o
público não vai ficar atento num movimento lento, por exemplo, e aceleramos. Mas na
maioria das vezes, o público presta mais atenção quando o intérprete está mais
tranqüilo que quando ele está angustiado.

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