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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE BELAS-ARTES

ESTUDO E TRATAMENTO DE CONSERVAÇÃO E


RESTAURO DA PINTURA FETO DO ARTISTA
JORGE PINHEIRO

Margarida dos Santos Fernandes

Trabalho do Projeto orientado pelo Professor Doutor Fernando Rosa Dias e


coorientado por Dr.ª Mariana Basto

Mestrado em Ciências da Conservação, Restauro e Produção de Arte Contemporânea

2015
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RESUMO

No seguimento da oportunidade de integrar um estágio na empresa Argo – Arte,


Património e Cultura, nasce também a oportunidade de poder estudar e intervir uma
obra do artista Jorge Pinheiro (Coimbra, 1931), o qual conta com uma vasta produção
artística e está representado em coleções particulares e públicas, nacionais e
internacionais.

Este trabalho de projeto descreve o estudo e intervenção de conservação e restauro da


obra Feto, datada de 1965 da autoria de Jorge Pinheiro, realizado durante o estágio no
âmbito do Mestrado em Ciências da Conservação, Restauro e Produção de Arte
Contemporânea, na empresa Argo – Arte, Património e Cultura, entre Novembro de
2014 e Abril de 2015.

A crescente variedade de materiais que se verificou na produção artística a partir dos


inícios do século XX, e as problemáticas face à sua respetiva conservação e restauro,
integram também um dos temas em estudo nesta dissertação.

Da conservação e restauro à vida e obra de o artista, este relatório além de descrever


detalhadamente todo o estudo e intervenção de conservação e restauro na pintura a óleo
Feto (1965), revela também um olhar aproximado sobre a vida e percurso artístico de
Jorge Pinheiro.

Palavras-chave: Jorge Pinheiro; pintura; arte contemporânea; conservação; restauro.

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ABSTRACT

Followed by the opportunity of attending an internship at Argo – Art, Heritage and


Culture, emerges the opportunity of studying and become responsible for the
conservation and restoration of a painting by Jorge Pinheiro (Coimbra, 1931), whom is
responsible for a wide artistic production that is vastly renowned and featured in
particular and public collections, both nationally and internationally.

This dissertation describes the study and the intervention of conservation and restoration
of the contemporary painting Feto, executed in 1965 by Jorge Pinheiro, which was
carried out during my internship of the Master’s in Science of Conservation, Restoration
and Production of Contemporary Art, that took place in the company Argo, between
November 2014 and April 2015.

The issues in the conservation and restoration of contemporary art, related with the
increasingly variety of materials that artists have been using since the beginning of the
twentieth century, it’s also one of the main themes explored in this dissertation.

From conservation and restoration, to the life and work of an artist, the following
dissertation, besides describing in detail all the studies and steps that I took in the
conservation and restoration of the oil on canvas painting, Feto (1965), it also reveals a
closer look into the life and artistic career of Jorge Pinheiro.

Keywords: Jorge Pinheiro; painting; contemporary art; conservation; restoration.

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Doutor Fernando Rosa Dias o meu mais profundo agradecimento por me
ter transmitido o seu conhecimento assim como pela disponibilidade imediata para a
orientação da presente dissertação. Sem a sua elevada competência, conhecimento e
disponibilidade, certamente não teria sido possível a concretização da presente
dissertação, que certamente se traduziu em muito do seu tempo e dedicação.

À Doutora Mariana Basto o meu mais profundo agradecimento pelo conhecimento que
me transmitiu e por todo o apoio prestado desde a escolha do tema à escolha da
estrutura de todas as questões abordadas ao longo da dissertação. Sem a sua cooperação
e orientação desde o primeiro instante não teria sido possível o desenvolvimento da
vertente prática da presente dissertação.

Ao artista Jorge Pinheiro pela sua simpatia e disponibilidade, assim como pela gentil
cedência da sua obra Feto. Sem a sua disponibilidade e apoio não teria sido possível
desenvolver a presente dissertação.

À Conservadora Restauradora Inês Magalhães demonstro o meu mais profundo


agradecimento pela sua simpatia e disponibilidade imediata, assim como por me ter
transmitido todo seu conhecimento e auxiliado sempre que eu necessitava. Sem o seu
elevado conhecimento, paciência, apoio e dedicação não teria sido possível a elaboração
da intervenção de conservação e restauro da obra Feto.

E o meu especial agradecimento à Júlia, ao Luís, à Bruna, ao Vítor, ao Carlos, e a todos


os profissionais da empresa Argo, pela simpatia, por me terem acolhido tão bem e
mostrarem sempre disponibilidade para tudo o que precisasse. O meu muito obrigado.

À Professora Doutora Ana Paula Gato, por todo o carinho, disponibilidade, apoio e
esclarecimento de dúvidas que foram surgindo ao longo do desenvolvimento da
dissertação.

Ao Bernardo por toda a paciência e disponibilidade oferecida, pela sua total


compreensão e por todas horas passadas ao computador a rever os meus textos. E pelas
longas conversas nas fases mais difíceis e em momentos de desânimo, nunca deixando
de me incentivar e de me fazer acreditar que era possível.

5
Por fim e de não menor importância, agradeço à minha família por todo o entusiasmo e
disponibilidade para tudo o que eu necessitasse. Aos meus amigos por toda a
compreensão e apoio incondicional.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 9

1. ENQUADRAMENTO HISTÓRICO E ARTÍSTICO – OBRA PICTÓRICA ............................... 11

1.1. OBRA PICTÓRICA E EVOLUÇÃO ARTÍSTICA ......................................................... 12

Período “escolar” e primeira fase Figurativa .......................................................... 14

Fim da Primeira Fase Figurativa ............................................................................ 15

Os “Objetos pictóricos” .......................................................................................... 16

Le Plis ..................................................................................................................... 18

O Triângulo, o Quadrado e os “Objetos Tridimensionais” .................................... 19

O grupo Os Quatro vintes....................................................................................... 22

O ponto não estruturado, escritas e o ponto estruturado......................................... 24

Série Os Reis ........................................................................................................... 27

Série Os Mapas ....................................................................................................... 29

Última fase do ponto estruturado............................................................................ 30

Regresso à figuração ............................................................................................... 32

Nos dias de hoje...................................................................................................... 37

2. CONSERVAÇÃO E RESTAURO DE ARTE CONTEMPORÂNEA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES


39

3. CASO DE ESTUDO – FETO DE JORGE PINHEIRO .......................................................... 48

3.1. ENQUADRAMENTO HISTÓRICO E ARTÍSTICO .......................................................... 48

3.2. DESCRIÇÃO FORMAL ............................................................................................. 51

4. DIAGNÓSTICO E TRABALHO DESENVOLVIDO ............................................................ 54

4.1. TÉCNICAS E MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO .......................................................... 54

4.2. AVALIAÇÃO DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO ...................................................... 57

4.3. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO ............................................................................. 62

4.4. RELATÓRIO DE INTERVENÇÃO DE CONSERVAÇÃO E RESTAURO ......................... 66

CONCLUSÃO .................................................................................................................... 66
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BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................. 80

ANEXOS ........................................................................................................................... 89

I. A OBRA DE JORGE PINHEIRO (1931) EM DATAS................................................... 90

II. JORGE PINHEIRO – EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS E COLETIVAS, PRÉMIOS E

REPRESENTAÇÃO EM COLEÇÕES PÚBLICAS ................................................................. 113

III. REGISTO FOTOGRÁFICO DO DIAGNÓSTICO E TRABALHO DESENVOLVIDO .......... 125

IV. ENTREVISTA AO ARTISTA JORGE PINHEIRO – A OBRA FETO............................... 140

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho de projeto pretende descrever o estudo e posterior intervenção de


conservação e restauro da obra Feto, datada de 1965 da autoria de Jorge Pinheiro, no
decorrer do estágio no âmbito do Mestrado em Ciências da Conservação, Restauro e
Produção de Arte Contemporânea, na empresa Argo – Arte, Património e Cultura, entre
Novembro de 2014 e Abril de 2015.

O estágio realizado proporcionou-me a oportunidade de integrar o espaço de uma


empresa especializada nas áreas de Conservação e Restauro, Reabilitação Arquitetónica,
Gestão de Coleções, Museologia, Empreendedorismo Cultural e Comunicação, que
conta com anos de experiência e um histórico de intervenções em obras de artistas
como, Paula Rego, Amadeo de Souza-Cardoso, Júlio Pomar, José Escada, entre outros.

No decorrer deste estágio, tive igualmente a oportunidade de estabelecer contacto e


conhecer pessoalmente o artista em estudo, que privilegiadamente me cedeu a sua obra
para intervir, assim como me recebeu no seu atelier e me permitiu entrevistá-lo. Esta
experiência proporcionou-me uma visão um pouco mais intimista sobre o autor e
contribuiu significativamente para um estudo técnico e artístico mais apurado da obra
Feto. A obra em estudo pertence ao espólio pessoal do artista e enquadra-se na transição
entre a primeira fase figurativa que este teve e o início da sua fase abstrata. A pintura
Feto de 1965 é uma das últimas pinturas que o artista compõe antes de terminar a sua
primeira fase de exploração figurativa, a qual denomina por “fase escolar”, que
terminará no decorrer de meados da década de 60.

O trabalho de projeto inicia-se com o enquadramento histórico e artístico de Jorge


Pinheiro, descrevendo todo o seu percurso e evolução artística, contextualizando as
épocas e correntes nacionais e internacionais, assim como as influências que fizeram da
sua obra pictórica o que conhecemos nos dias de hoje. Este estudo permite um melhor
entendimento sobre o artista e Professor, e o seu desenvolvimento foi também fulcral na
descrição formal, diagnóstico e intervenção da obra Feto.

Face às questões e problemáticas em torno da conservação e restauro de pintura


contemporânea, dedico também parte do trabalho à reflexão deste tema. A presença e a
intenção do artista, a variabilidade e efemeridade dos materiais, e a degradação
intencional, são alguns dos temas que são apresentados e que considero relevantes, face

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à intervenção que realizei, assim como para um melhor esclarecimento das
problemáticas que enfrentamos durante uma intervenção de conservação e restauro em
obras de arte contemporânea, e como isso pode refletir nas nossas escolhas e no nosso
trabalho. Com o propósito de dar inicio à intervenção na obra, foi realizada uma
observação à vista desarmada, para levantamento do estado de conservação, apontando
os diversos agentes de deterioração e possíveis intervenções que a obra poderia ter
sofrido posteriormente à sua execução. Seguidamente procedeu-se a um estudo
aprofundado sobre a obra, para a sua devida caracterização e identificação das técnicas
de execução, de forma a definir uma proposta assente numa metodologia que fosse a
mais apropriada possível. Dada por concluída esta fase, foi então possível determinar
uma proposta de tratamento viável e dar início à intervenção.

Pretendeu-se com a intervenção proposta, restabelecer a unidade potencial da obra,


preservando a sua autenticidade e o seu carácter e importância histórica. Foi tido sempre
em atenção a compatibilidade dos materiais a utilizar, tentando sempre a intervenção
mínima, de modo a salvaguardar a integridade física e o carácter de autenticidade da
obra.

Este trabalho de projeto é ainda, composto por anexos que acompanham e


complementam toda a informação descrita ao longo de cada um dos capítulos. Estes
incluem a entrevista realizada ao artista Jorge Pinheiro, uma cronologia do percurso
artístico do mesmo, e todo o registo fotográfico e respetivas descrições de todo o
diagnóstico e trabalho desenvolvido na obra Feto.Devo também salientar que durante o
estágio realizado tive a oportunidade integrar uma equipa de conservação e restauro, na
intervenção da Igreja do Santíssimo Milagre em Santarém. Realizei também, uma visita
a um colecionador particular com o intuito de realizar a manutenção do espólio de
pintura, e a intervenção de conservação e restauro em três pinturas de carácter religioso
e respetivas molduras.

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1. ENQUADRAMENTO HISTÓRICO E ARTÍSTICO – OBRA
PICTÓRICA

Jorge Manuel Pinheiro Marques Pinto nasceu em Coimbra a 7 de outubro de 1931 e


desde muito novo terá demonstrado aptidão e gosto pelas práticas artísticas, mas esse
seu gosto não terá sido abraçado durante a sua juventude, o que originou um
desabrochar mais tardio para o que viria ser a sua carreira artística.

Depois de ter terminado o ensino preparatório foi-lhe destinada uma formação na Escola
Comercial e Industrial de Brotero em Coimbra (Molder, et al., 2002). O curso
profissional tornou-se monótono e desinteressante e direcionava-o para empregos que
não o satisfazeriam pessoalmente, no entanto concluí-o. Contudo ainda que não o tenha
terminado com qualquer gosto ou interesse, frequentou duas cadeiras que puderam ter
contribuído para o seu gosto e vontade de prosseguir pelas áreas artísticas, que
consistiram nos quatro anos de Desenho de Ornato e numa cadeira de Caligrafia
(Pinharanda, 2001).

Através de um emprego que arranjou num atelier de arquitetura em Coimbra, teve a sua
primeira encomenda para uma obra artística pública de sua autoria. Na mesma época
Jorge Pinheiro decide voltar ao primeiro ano do curso liceal, para que desse modo
pudesse adquirir as habilitações que necessitava para ingressar na Escola Superior de
Belas-Artes de Lisboa. Em 1955 escolhe ingressar nessa instituição, no Curso de
Pintura. A primeira exposição em que participa, “A VII Exposição do Grupo Português
de Aguarelistas” ocorre na Sociedade Nacional de Belas Artes, na qual expõe pequenas
aguarelas de género naturalista (S/Autor, 1954). Mas a sua estadia pela Escola não irá
ser longa, apenas dois anos foram o suficiente para Jorge Pinheiro decidir que não era
na capital que encontraria o ensino que procurava e que ia ao encontro das suas
convicções, apontando a incapacidade mobilizadora e o desfasamento histórico que
impedia a liberdade expressiva e artística. Sendo incapaz de prosseguir os seus estudos
na Escola de Lisboa, transfere-se para a Escola Superior de Belas-Artes do Porto, onde
se mantivera a fama de que os parâmetros de ensino estariam em contínuo
acompanhamento com os das vanguardas que se faziam sentir pelo panorama
internacional. Simultaneamente ao seu percurso enquanto estudante, Jorge Pinheiro
ainda exerceu cargo de professor provisório na Escola de Artes Decorativas de Soares

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dos Reis, no ano letivo de 1959/60, na Escola Industrial e Comercial da Póvoa do
Varzim em 1960/61 e na Escola Preparatória de Gomes Teixeira, entre 1691 e 1963
(Molder, et al., 2002).

Após ter concluído o curso superior na Escola Superior de Belas-Artes do Porto em


pintura no ano 1963, foi admitido como assistente nessa mesma instituição, onde veio a
estabelecer várias amizades dentro do meio académico, algumas que já vinham de anos
anteriores da altura de estudante e foi nesta altura também que se iniciou na sua carreia
artística. É num período de transição para a década de 60 e no seu decorrer, que Jorge
Pinheiro adquire experiência e conhecimento, e dá os seus primeiros passos no que viria
a ser uma grande carreira artística.

1.1. OBRA PICTÓRICA E EVOLUÇÃO ARTÍSTICA

A crise política que se manifestava em Portugal, o tardio afastamento de Salazar, e a


sucessão de Marcelo Caetano, levaram ao isolamento do País, que cada vez mais
acentuava a dificuldade da criação artística ter a sua aceitação oficial (Tavares, 2001).
Em 1959, face à situação política e ao desagrado da situação artística, os artistas mais
significativos recusariam participar na representação nacional, que estaria a cargo da
S.N.I., na Bienal de S. Paulo, repetindo-se em diversas situações, como por exemplo,
nos “Salões Nacionais de Arte”, criados pelo S.N.I. em 1966. Estas manifestações
prolongam-se até ao ano de 1970 (França, 1972).

No entanto, a intervenção de algumas instituições privadas, com o financiamento de


prémios e exposições de arte contemporânea, vieram beneficiar o País, foi o caso da
Fundação Calouste Gulbenkian, que em 1957 realiza a sua primeira intervenção pública
na vida cultural nacional, organizando uma exposição nas instalações da Sociedade
Nacional de Belas Artes. Esta exposição proporcionou aos artistas uma nova
oportunidade de estabelecerem contacto com o público, e permitiu aos responsáveis pela
Fundação obterem uma visão geral do estado atual das artes plásticas em Portugal. Em
1961, a Fundação Gulbenkian repete a experiência de 1957, organizando a “II
Exposição de Artes Plásticas”, desta vez realizada nas instalações da Feira Internacional
de Lisboa, atribuindo mais relevância à arte moderna, assim como à arquitetura,

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premiando Viana de Lima. À Fundação coube a criação de prémios de história, e de
crítica de arte, a publicação da revista de artes e letras Colóquio, e a atribuição de bolsas
de estudo no estrangeiro (França, 1972).

“O optimismo possível ao princípio dos anos 60 repousou assim sobre esta instituição a
que, por efeito do inestruturamento e da preguiça profissional da vida artística do País,
seriam atribuídas enormes responsabilidades.” (França, 1972)

A atribuição de bolsas de estudo permitiram simultaneamente uma atualização


internacional do panorama artístico, através do contacto com os artistas portugueses que
estavam radicados no exterior e frequentavam as escolas de arte europeias (Tavares,
2001). Contudo, as perspetivas oferecidas aos bolseiros após regressarem, eram
escassas, razão que levou alguns artistas a emigrarem. Alguns pintores viriam então a
firmar-se no estrangeiro, em Paris, Londres, na Alemanha, e conseguiam inserir-se no
circuito internacional, como foi o caso de Costa Pinheiro na Alemanha, e também de
René Bertholo e Lourdes Castro em Paris (França, 1972).

René Bertholo e Lourdes Castro estiveram na origem do Grupo KWY, KWY – três
letras que não têm lugar no alfabeto português (Acciaiuoli, 2001), deram origem a uma
Revista (1958-1963) e ao grupo integrado por René Bertholo, Lourdes Castro, Christo,
Costa Pinheiro, Gonçalo Duarte, Escada, João Vieira e Jan Voss. A Revista foi criada
em Paris por René Bertholo e Lourdes Castro, era impressa em serigrafia e lançou doze
números durante seis anos, com a colaboração dos membros integrantes do Grupo e de
outros amigos pintores, poetas, escritores, críticos e historiadores (Acciaiuoli, 2001).

“(...) publicaremos serigrafias originais e reproduções dos pintores que formam o KWY
como também trabalhos de outros artistas, portugueses ou estrangeiros, com pesquisas
relacionadas com as nossas. Além dos ensaios ou estudos críticos, que também
publicaremos, pensamos manter uma secção de breves apontamentos sobre as
exposições que aqui em Paris vão aparecendo e (...) poderão servir como simples
informação (...)” (Acciaiuoli, 2001)

A união de um grupo de artistas permitia-lhes também atuar e marcar presença mais


eficazmente em diferentes contextos. Caso não apenas do KWY, mas também, anos
mais tarde em 1968, do grupo “Os Quatro Vintes”, que juntava Ângelo de Sousa, Jorge
Pinheiro, Armando Alves e José Rodrigues, quatro artistas notáveis, estudantes e

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posteriormente docentes da Escola de Belas Artes do Porto, que contribuíram para a
existência de um núcleo artístico atual e ativo no Porto (França, 1972).

“(...) o seu surgimento e acção breve marcaram de forma decisiva o plano da afirmação
da arte portuguesa, num magro contexto da mesquinha falta de visão e inserção
internacional.(...) sobretudo pela própria sinergia que as obras surpreendentes do grupo
vinham trazer ao debate português.” (Almeida, 1999 p. 230)

As dificuldades que o país colocava aos seus artistas, tanto economicamente como
intelectualmente, devido ao isolamento politico em que o país se encontrava, impedia-os
de conseguirem alcançar grande visibilidade internacional, mas mesmo assim foi o que
Jorge Pinheiro procurou alcançar tentando garantir o equilíbrio entre a sua
sobrevivência e a ética que mantinha em cada uma das obras que concebia (Pinharanda,
2001).

Período “escolar” e primeira fase Figurativa

As primeiras obras que Jorge Pinheiro cria entre os finais da década de 50 e 1963, são
trabalhos onde investiga e pratica a sua técnica e paleta de cores, explorando o género
figurativo. O artista classifica este seu início, de fase “escolar” (Pinheiro, 2015 [Anexo
IV]). As obras que compõe neste período são trabalhadas através de uma técnica
expressiva e texturada, de tons terrosos e escurecidos ou de contrastes fortes com
brancos, vermelhos e/ou verdes, provocando um contraste forte de cores. Através da
presença de figuras paralisadas, inexpressivas e graficamente muito simplificadas de
contornos geometrizados e posicionadas de forma ordenada, o artista representa os
corpos como seres sem nome que carregam em si a fatalidade e a realidade humana que
se vivia em Portugal durante o período de ditadura (Vidal, 2005).

Os temas representados nesta primeira fase figurativa são criados de uma forma
ilustrativa, onde utiliza esquemas de composição muito simples onde as figuras e os
elementos que ocupam a superfície do quadro, em alguns casos ocupam a totalidade da
composição, são posicionados e organizados segundo eixos de simetria, horizontais,
verticais como se pode observar na obra O velório de 1961 (v. fig. 5, Anexo I) ou
posicionadas sobre diagonais pouco claras. Neste período inicial a escolha iconográfica
recai sobre figuras de diferentes géneros, mulheres, homens, figuras idosas e/ou jovens

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(a pares ou individualmente), de rostos vazios e de gestos codificados. As figuras por
vezes encontram-se embebidas numa cena ritualizada com significados ainda em aberto
e por resolver aos olhos do observador, como se pode observar na obra o Espaço Verde
de 1963 (v. fig. 6, Anexo I), a qual transmite um desconcertante peso trágico.

São introduzidos nas composições elementos que funcionam como adereços, em alguns
casos surgem apenas como complementos, noutros casos surgem com o intuito de
quebrar a cena de forma irónica, como o caso das flores vermelhas, sardinheiras, que
surgem na composição como uma flor mortuária (mas nunca o foram), na obra O
velório de 1961 (v. fig. 5, Anexo I).

“As suas figuras oscilam entre uma ingenuidade, muito evidente nos óleos que tem
crianças como tema, e uma força quase trágica, mas muito discreta, sóbria, nada
retórica, por vezes puramente alusiva (…).” (S. Autor, 1963)

Ainda durante a sua primeira fase de produção figurativa, Jorge Pinheiro cria um
conjunto de obras onde explora o género de Natureza-Morta, estas são composições
ricas em texturas e cor, como se pode ver numa das pinturas que concebeu durante este
período, à qual atribuiu o título Natureza-morta datada de 1963 (v. fig. 7, Anexo I),
estas foram concebidas seguindo estritos programas escolares. Apesar de ser evidente o
distanciamento destas composições com o rumo que a obra de Jorge Pinheiro irá tomar,
existem elementos iconográficos e/ou cromáticos que estarão sempre presentes nas suas
composições pictóricas posteriores.

Fim da Primeira Fase Figurativa

Devido à atividade pedagógica que Jorge Pinheiro se encontrava a exercer desde 1963
na Faculdade de Belas-Artes do Porto, o autor sente a necessidade de voltar a estudar
mais aprofundadamente os estudos de composição, o que o levou de imediato a refletir
sobre novas soluções formais e compositivas, para a sua obra.

Durante um período que vai desde 1964 a 1965, Jorge Pinheiro procura incessantemente
sentido para a sua linguagem representativa, a qual já sentia forçosamente esgotada. A
impossibilidade que o artista começa a sentir de figurar e afirmar a sua linguagem na
composição, irá originar o fim da primeira fase da sua pintura. Os conceitos e o

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conhecimento teórico que gradualmente ia conhecendo e aprendendo de obras teóricas
dos movimentos pelos quais se foi interessando, conduziram-no a uma rotura inevitável
no que estava a realizar a nível pictórico.

As obras que compõe possuem uma atitude mais expressionista, conseguida através da
libertação do gesto, como é visível no homem que se debruça na varanda, na obra Sem
título datada de 1964 (v. fig. 8, Anexo I), e pela desconstrução do desenho ou, por
vezes, através da aplicação e do tratamento da matéria pictórica, como se pode ver na
figura ao centro da composição, na obra O Cão de 1965 (v. fig. 9, Anexo I) ou em O
Circulo de Giz datada do mesmo ano, que apesar de apresentar um tratamento menos
acentuado da matéria pictórica, apresenta uma maior expressão corporal da figura ao
centro criada pela libertação do desenho.

O momento expressionista que Jorge Pinheiro explorou, foi uma manifestação pictórica
do que o artista estaria a sentir naquela altura. Mas irá durar pouco, muito devido ao
facto de o artista se identificar com um registo poético, dramático e emotivo, e recusar a
simples exploração das emoções e suposições de estruturas narrativas, que a
frontalidade do expressionismo transmitia (Pinharanda, 2001).

Esta necessidade de mudança pictórica acentua-se após o ano de 1965, no qual Jorge
Pinheiro realiza pela primeira vez uma viagem a Londres, organizada pela Fundação
Calouste Gulbenkian para os artistas portugueses. Durante esta viagem Jorge Pinheiro
tomou contacto direto com obras de artistas internacionais, surgindo a vontade de
experimentar e estudar mais aprofundadamente as regras de composição, dando origem
a uma transição que interrompe com o seu último ciclo figurativo, é nesta altura que
compõe a obra Feto de 1965 (v. fig. 11, Anexo I), a qual definiu como sendo a sua
última obra de género figurativo, e o inicia numa nova fase de intensa investigação em
torno da abstração, que vai predominar a obra e o pensamento de Jorge Pinheiro até aos
anos 80.

Os “Objetos pictóricos”

Jorge Pinheiro interrompe bruscamente com o género figurativo no ano de 1966 depois
de ter recebido pela segunda vez uma da bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, desta
vez destinada a proporcionar a experiência de viajar pelos museus e escolas de arte da
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Europa, durante um ano (Holanda, Inglaterra, Bélgica, Suíça, França, Itália, Espanha e
Alemanha) (Vidal, 2005). Ao regressar a Portugal, Jorge Pinheiro entra num longo
período de reflexão acerca dos mecanismos das “formas de expressão”, gerando através
de essa reflexão, várias etapas e múltiplas formas e entendimentos desse conceito,
interrompendo com tudo o que antes executara, gerando no artista, tal como este
confirma, uma espécie de “metamorfose” (Marques, 1968).

Nesta sua segunda viagem pela Europa, Jorge Pinheiro toma contacto direto com uma
Europa de abundância consumista, um mundo de intenso dinamismo social, económico
e também cultural e artístico cheio de correntes como a Pop Art, a Op Art e Arte
cinética (Pinharanda, 2001). A experiência e o conhecimento que trouxe dessa viagem
levaram-no a ter uma atitude expressionista de carácter sensorial, nas obras que irá
compor a partir de 1966.

A partir de uma nova vontade de produzir e investigar um novo género de pintura, de


simplicidade na forma e subtileza ótica, surge a pintura abstrata na obra de Jorge
Pinheiro, que de certo modo corresponde a um retorno às disciplinas onde se utilizavam
as formas de geometria Euclidianas, caracterizadas pelas suas linhas marcadas com
rigor e o abandono das texturas e da matéria que pudesse deixar as marcas do gesto do
pintor ou sugerir formas imprevistas. O artista passa a apresentar superfícies lisas e
impessoais, nas quais os elementos não estabelecem entre si tensão, ou qualquer
composição narrativa (Gonçalves, 1968).

“A simplicidade da forma caracteriza também a pintura actual de Jorge Pinheiro. Mas


há uma subtileza óptica que nada tem de impressionístico e recusa qualquer alusão às
aparências visíveis do mundo exterior. (…) Estabelece-se uma nova sintaxe que procede
por aposição e não por articulação de formas.” (Gonçalves, 1968)

A primeira obra abstrata que cria foi, Homenagem a Amesterdão, (v. fig. 12, Anexo I)
datada de 1966, terá sido esboçada ainda enquanto viajava pela Europa, e foi executada
no mesmo ano em que regressou a Portugal.

A série de obras que Jorge Pinheiro compõe entre 1966 e 1969, à qual se atribui a
denominação de “Objetos Pictóricos”, define uma nova situação através princípio de
torção do suporte, (v. fig. 16, Anexo I) cuja característica permite a interação do objeto
artístico com o espaço adjacente (França, 1985). As obras atingem uma “Nova-
abstração”, a exploração da imagem e a interação com o espaço fazem com que estas,

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através de torções e jogos de planos adquiram o estatuto de imagem-objeto, operando
simultaneamente em torno da visualidade da gestalt e da Op Art (Dias, 2012).

“(…) aqui a forma rectangular tradicional foi desde há muito destruída, e são os limites
circulares que frequentemente se impõem nestas peças. Pelas suas dimensões e formato
e pelo intenso e imediato jogo da cor elas ganham por isso uma presença forte e
envolvente – estamos de facto perante ema objectualização da imagem.” (Bronze, 1968)

Nestas peças a tela é substituída pelo suporte de madeira por questões de estrutura e de
posicionamento no espaço. As cores são aplicadas de forma inexpressiva, em listas
paralelas que determinam o próprio formato do suporte (v. figs. 17, 18 e 19, Anexo I).

O que se tornava evidente seria então, não a relação entre as diversas cores e as formas
numa superfície, mas sim as relações que se estabeleciam entre o próprio objeto na sua
totalidade, enquanto acontecimento complexo, e o espectador (Gonçalves, 1970).

“Não representa nem conforma; adquire um carácter presentativo, simplesmente. E é a


própria forma do suporte que adquire actividade no espaço real.” (Gonçalves, 1968)

Le Plis

Nesta sua série de composições criadas no ano de 1969, as suas obras são caracterizadas
por um “jogo cenográfico”, que provém da torção criada a partir de dobras (Le Plis), as
quais dominam o discurso visual das imagens desta fase.

“ (…) uma continuidade de pesquisas que se traduz em novos objectos, cujas formas
recortadas e pintadas ganham no espaço uma dimensão escultórica. (…) Pinheiro
distingue-se pela sua inspiração construtivista, as suas obras são definidas sempre por
um rigor geométrico.” (Bronze, 1969)

As formas recortadas e pintadas criam intencionais jogos de ilusão de perspetiva,


através de falsas sombras e concebendo dobras irreais através do jogo de linhas
organizadas em bandas. Cada imagem concebida transporta o observador para a
perceção de um volume que não existe. Através de um esquema geométrico simples e
perspetiva primária, jogos de cor e justaposição de tonalidades que simulam relevo, as
formas pintadas “dobram-se” e “desdobram-se”, criando uma ilusão espacial (v. fig. 28,
Anexo I).

18
“Jorge Pinheiro conclui duas coisas dessa sua pesquisa: que as formas pintadas podem
avançar pelo “espaço físico” e que dentro delas esse mesmo “espaço” pode definir-se
em relação com o “espaço exterior”.” (França, 1985 p. 29)

As obras são concebidas a partir de módulos simples, onde as formas são dispostas na
vertical e horizontal, simétricas ou ligeiramente desalinhadas por desvios propositados.
O artista compõe a partir de um esquema base e vai reconstruindo-o, criando uma
combinação de interseções, entre dobras e planos. Ao compor o artista evitou a
utilização de cores de tonalidades contrastantes e brilhantes (como sucedeu
anteriormente), tentando, através de simetrias criadas pelas dobras, simular um padrão,
concebendo efeitos visuais dinâmicos e padronizados, mas já claramente articulados e
estruturados (v. figs. 29 e 31, Anexo I).

As formas assumem dobras sem se dobrarem, e assumem um volume e uma dimensão


no cenário que na realidade não possuem. A contradição integrada neste jogo de formas
é sem dúvida inédito. Com estas obras, Jorge Pinheiro saíra do domínio da pintura de
cavalete, para intervir no espaço físico (v. fig. 30, Anexo I). No entanto, suscitam-lhe
dúvidas relativas ao impacto visual, que afirma não responder satisfatoriamente em
termos de leitura (França, 1985). O artista detém-se perante esta incerteza, decide então
avançar para um novo tempo de reflexão.

“Tratava-se então de se retirar para uma meditação “gestáltica”, regressando à tela, ao


quadrado objecto e recolhendo nele o resultado estético da pretendida “intervenção
espacial”.” (França, 1985 p. 30)

O Triângulo, o Quadrado e os “Objetos Tridimensionais”

Durante os anos de 1969 e 1970, acentua-se a influência do abstracionismo europeu nas


composições de Jorge Pinheiro. A sua atividade pedagógica na Faculdade de Belas-
Artes do Porto direcionou-o para uma constante aprendizagem, que o levou
simultaneamente a adquirir conceitos dos movimentos que lhe interessavam. Nas
“raízes” do seu ciclo abstrato o artista afirma estar o estudo da obra teórica de
Kandinsky e de Klee, de Moholy-Nagy, dos construtivistas, de Malevitch, dos
neoplasticistas, de Gyorgy Kepes, do espirito da Bauhaus, e consequentemente da
psicologia da forma de Arnheim, comum a isto tudo, a gestalt (Gonçalves, 1970).

19
“Era preciso ter a coragem de voltar à intimidade da pintura de cavalete e à folha de
papel de desenho, e perguntar de novo aos «gestaltistas» como é que os elementos
podem ser, no todo, «elementos de linguagem». (…) Ao ser-me dado um formato
prévio, tive que pensar a composição de fora para dentro, tendendo para a intimidade.”
(Gonçalves, 1970)

As descobertas que irá fazendo ao longo dos estudos que realiza, permitir-lhe-ão aplicar
os conhecimentos adquiridos e usufruir deles na sua atividade artística enquanto pintor,
essa influência é visível desde o começo das suas primeiras experimentações abstratas.
A evidência de um meio de criação concebido através de uma regra pré definida e
pensada será pela primeira vez claramente visível neste ciclo de produção.
Anteriormente Jorge Pinheiro já teria iniciado o estudo das formas e da dinâmica das
imagens, neste ciclo o artista irá conduzir a sua obra para a desmaterialização das
formas e das superfícies, perdendo o seu estatuto de objeto pictórico anteriormente
conquistado, voltando aos limites quadrangulares da tela tradicional.

“As soluções que encontro são consequência duma lógica a que pertencem raciocínios
puramente plásticos. Componho somente com elementos que pertencem ao todo.
Considero os problemas plásticos deste tipo de objetos matéria suscetível de ser
equacionada em termos tais que conduzem inevitavelmente a um resultado, «e só um».
Como no cânone grego, a obra deste tipo está impregnada de um narcisismo que pode
terá a ver com os conceitos que lhe são alheios. Basta-se a si própria e como tal se
oferece ao contemplador.” (Gonçalves, 1970)

Sobre as obras produzidas neste ciclo de produção Jorge Pinheiro afirma que são obras
menos espetaculares e correspondem a retorno a experiências que realizou
anteriormente (Pinheiro, 1970). Durante este período Jorge Pinheiro faz como que uma
estabilização do seu método de produção, deixa de sentir necessidade de compor a partir
de uma vontade expressiva, passando a ter estratégias que o conduziram às soluções que
procurava para os problemas de organizações visuais.

É durante um período entre 1969 e 1970, que Jorge Pinheiro produz uma série de
pinturas onde mostra um interesse na vibração rítmica das superfícies geradas em
composições derivadas do quadrado e do triângulo. Através das combinações de
diagonais e medianas, e a aplicação

de contrastes de cor, Jorge Pinheiro questiona os aspetos que criara anteriormente de


ilusão no espaço, transportando-os para o “espaço interno” das suas composição. As

20
suas soluções formais passam agora para o campo abstrato tradicional, numa pesquisa
que irá desenvolver em torno da relação entre os ângulos da composição da figura,
realizando numerosas pinturas quadradas ou retangulares, onde em alguns casos,
apoiando a forma sobre um dos vértices, torna uma das diagonais, vertical (v. figs. 43,
44 e 45 Anexo I) (França, 1985).

“Mas quer se coloque o quadrado deste modo quer de outro qualquer, tem que se
considerar sempre que, para compor com o quadrado – e isto deve ser sublinhado:
compor com ele e não compô-lo – tem que se atender aos elementos e leis que lhe são
próprios: tensões exteriores e interiores em relação ao centro, elementos que
estruturalmente lhe pertencem, diagonais, medianas, etc.” (Pinheiro, 1970)

Os lados do suporte tornam-se assim oblíquos e dinâmicos, tornando a estrutura


independente das linhas verticais e horizontais que a compõem, existindo um maior
foco na escolha cromática das tensões exteriores e interiores em relação ao centro e a
outros elementos que estruturalmente pertencem ao quadrado (as medianas, as diagonais
e os lados). A cor aplicada é feita através de um controlo rígido baseado em associações
de famílias cromáticas e nas regras de consonância ou de dissonância (v. figs. 35 e 36
Anexo I) (Gonçalves, 1986).

“A vibração rítmica das superfícies geradas sente-se geralmente de dentro para fora, ou
de fora para dentro, conforme o jogo cromático.” (Pinheiro, 1970)

Nas obras onde explora o Quadrado, observa-se que as formas são compostas a partir da
sua própria desconstrução, que são utilizados para criar novos elementos, todos eles
subdivisões de um único elemento, o Quadrado (v. figs. 41 e 42 Anexo I). No entanto, o
estudo do Triângulo terá sido menos exaustivo, em alguns casos a exploração destas
formas recorrem ainda à “dobra” que está presente em obras anteriores do artista, como
é o caso da obra Sem título, de 1969 (v. fig. 33, Anexo I) (Pinharanda, 2001).

Após a reflexão da pintura que assumia uma “espacialização” na relação com o seu
espaço intrínseco, no caso das suas obras “Objetos Tridimensionais”, Jorge Pinheiro
mantém-se fiel ao quadrado, mas assume uma nova relação com o espaço, partindo de
formas tridimensionais (v. fig. 38, Anexo I) (França, 1985). A composição torna-se
mais complexa devido ao risco de esta ser uma abordagem a um sólido e onde os
elementos de criação são materiais volumétricos. Nesta abordagem, os materiais
pictóricos são substituídos por materiais transparentes ou por translúcidos brancos ou

21
com cores, alcançando assim a desmaterialização que realizou anteriormente nas suas
pinturas, mas que agora se transformam em objetos tridimensionais, assumindo uma
espacialização concreta (v. figs. 39 e 40, Anexo I). Apesar da tridimensionalidade
destas obras, Jorge Pinheiro nega o seu volume e a massa dos materiais, ao utilizar
formas perfuradas ou transparências.

A esta série de obras do artista Jorge Pinheiro, pode-se atribuir a classificação de


abstracionismo “pós-pictural” (França, 1985). Pode-se afirmar que um dos progenitores
do termo “pós-pictural” (ou “post-painterly”) terá sido o artista Josef Albers, estudante e
professor durante treze anos, na mesma escola que Jorge Pinheiro afirma ter sido umas
das suas influências para este seu ciclo abstrato, a Bauhaus. A obra de Josef Albers teve
como importante influência a psicologia Gestalt, que o levou à exploração de efeitos de
ilusão ótica (Lucie-Swith, 2000). A obra de Albers, assim como o termo “pós-pictural”,
estão também relacionados com a obra do artista suíço Max Bill, (também ele aluno da
Bauhaus), com a qual a de Jorge Pinheiro partilha os mesmos princípios de pensamento
e pesquisa do quadrado. No entanto, Jorge Pinheiro conclui que teria chegado ao mesmo
método de composição, aplicação e escolha de cor, sem nunca de elas ter alguma vez
tomado conhecimento. Após se ter apercebido de visíveis parecenças com as obras do
mestre, o autor assume a hipótese de que toda a pesquisa e trabalho de exploração e
organização das imagens provavelmente lhe permitiu encontrar o caminho certo e
válido (Pinharanda, 2001).

O grupo Os Quatro vintes

É no ano de 1968 que, Jorge Pinheiro, Ângelo de Sousa, Armando Alves e José
Rodrigues, após terminarem a sua formação na Escola Superior de Belas Artes do Porto,
todos eles com média de 20 valores, formam o grupo “Os Quatro Vintes”, cujo nome
ironizava sobre as suas classificações finais (França, 1985). Este grupo de artistas, que
haviam sido colegas durante a sua formação na ESBAP e posteriormente docentes dessa
mesma instituição, decidem agrupar-se com a intenção de criarem oportunidades
estratégicas e de mercado.

“Assim estão, mais visivelmente ou mais documentalmente do que os outros, porque


multiplicam por quatro o seu estar em grupo, e, sendo quatro, mais mostra, cada um

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deles, o que mostraria, de si, se estivesse sozinho. Mais mostra de artista português.”
(França, 1985 p. 19)

Cada um dos membros integrantes do grupo veio parar ao Porto voluntariamente, por
acharem ou saberem que a Escola na capital não lhes serviria, assim como não serviu a
muitos dessa mesma geração. Apesar de as suas estadias no Porto inicialmente poderem
ter resultado em menos encomendas, a cidade dava-lhes uma independência e uma
vivência mais “arejada”, que a capital dificilmente permitia (França, 1985). O facto de
os quatro artistas viverem afastados de Lisboa, e o impacto diminutivo que pode ter tido
para a sua arte, é rapidamente corrigido com o tempo. O surgimento do grupo e as suas
ações marcaram de forma decisiva o plano da afirmação da arte portuguesa e a sua
inserção no plano internacional, não apenas pelo caminho individual de cada artista,
mas sobretudo pela ação conjunta das suas obras (Almeida, 1999).

“As propostas de escultura de José Rodrigues e de Ângelo de Sousa contam entre as


raras que nos anos 60 foram feitas em Portugal (...) Os objectos-murais de Armando
Alves garantem uma situação moderna, no mundo dos signos, a esta mesma arte
portuguesa (...). Jorge Pinheiro leva a sua pesquisa formal a uma profundidade jamais
atingida, em Portugal, em linhas concretistas ou de discurso gráfico auto-significativo.”
(França, 1985 p. 34)

O campo de maior exploração técnica e formal por parte dos membros do grupo foi o da
escultura, através de conceção tridimensional. Quem introduziu num primeiro momento
dentro do grupo de forma determinante a conceção de obras tridimensionais foi Ângelo
de Sousa, o qual compunha as suas esculturas movíveis como se de refletores de luz se
tratassem, através de peliculas que se moviam. A abordagem de obra tridimensional por
parte de Jorge Pinheiro, Armando Alves e José Rodrigues, foi um pouco diferente do
seu contemporâneo. Nestas criações os artistas concebiam as suas obras com o intuito
de estas interagirem com os espaços em que se encontravam, mas cada um deles
compunha de forma própria. Armando Alves apresentava obras com características
gráficas, Jorge Pinheiro introduziu um cunho puramente pictórico, e José Rodrigues
situações de ligação com o meio em que se encontrava (Pinharanda, 2001).

A atividade docente do grupo “Os Quatro Vintes”, teve uma considerável influência e
importancia na Escola Superior de Belas Artes do Porto, e a qualidade de artistas que
por lá passaram ou que a escola vai tendo, é algo que a arte portuguesa não deve ignorar
(França, 1985).

23
“(...) era a quarta geração da arte portuguesa do séc. XX a iniciar-se, no Porto também.
(...) eles abriram um processo estético cuja validade maior resta ainda apurar. Mas que
desde já, se sabe depender da influência futurante de cada uma das suas específicas
personalidades, retrospectivamente projectando de potencial sentido dinâmico a efémera
sigla que os ligou.” (Pernes, 1985 p. 106)

O ponto não estruturado, escritas e o ponto estruturado

Ainda no ano de 1970 e depois de uma longa fase de exploração das formas planas e
bidimensionais surge uma nova fase de exploração, que já teria dado indícios do seu
surgimento em 1969 com algumas obras de características, ainda nessa altura
tridimensionais, onde se pode apenas considerar que foi uma exploração e modelação de
formas elementares como o círculo, como se observa na obra Sem título datada de 1969
(v. fig. 23, Anexo I), num período onde faz a junção entre a ainda intencionalidade
objetual do ciclo dos “objetos pictóricos” e a investigação puramente geométrica que irá
explorar durante o resto da sua fase abstrata.

Desta vez a sua pesquisa entra no campo dos conhecimentos estruturalistas e passa a
compor segundo os preceitos desta teoria. Jorge Pinheiro ao estudar teóricos da área da
linguística como Saussure e Hjelmslev, estabelece o seu próprio entendimento, em que
obras de cariz abstrato não deveriam conter simbologia, por outro lado as obras de
carácter figurativo eram um espaço aberto ao simbolismo (Pinharanda, 2001). Pode-se
afirmar que esta época do seu trabalho foi concebida a partir de um grande racionalismo
de pensamento.

Ao ter escolhido elementos para as suas composições como o ponto e a linha, afirma
que esta escolha se deve ao facto de estes elementos possuírem a menor conotação
possível e deste modo não terem qualquer simbolismo que os relacione, quer numa
situação de imagem ou numa situação de escrita. Nesta sua nova fase de exploração o
artista pretende unir a não-representação com o rigor, que finalmente conseguiu
alcançar através da criação de uma malha estrutural de padrão formal de disposição não
relacional, que tem como função delimitar a construção e organização visual dos
elementos, dando à obra coesão e identidade (Pinharanda, 2001).

24
Nos seus primeiros exercícios desta etapa, o Ponto e em seguida a Linha, são
representados sem grandes estruturas definidas, sendo a escrita por eles criada
intuitivamente e empiricamente (v. figs. 46 e 47, Anexo I). As grelhas de composição
que utiliza não indicam nada além de elas mesmas, o significado da sua obra não vai
além do que o artista apresentou (Pinharanda, 2001).

Ainda no decorrer do ano de 1970, Jorge Pinheiro começa a compor com elementos
cada vez mais fragmentados, concebendo autênticas situações de “escrita”, que surgem
nas suas pinturas bidimensionais segundo uma lógica de desenvolvimento nesse mesmo
espaço. Surgem, no plano da pintura registos explorados conceptualmente, a partir do
desenvolvimento de formas simples como pontos e segmentos de reta (v. figs. 48, 50 e
51, Anexo I). Abordagem que Jorge Pinheiro vai explorar até ao ano de 1975.

As complexidades das rotas dinâmicas geradas entre as formas torna-se iludida pelo
resultado final de toda a composição, cuja complexidade anula a compreensão da regra
utilizada, tornando inútil qualquer leitura ou interpretação da “escrita” que está registada
ou de qualquer grelha estrutural subjacente que contenha (Pinharanda, 2001).

Simultaneamente em 1970, e estendendo-se até 1977, Jorge Pinheiro cria um esquema


para utilizar num novo ciclo de composições, às quais se atribui o nome “Ponto
Estruturado”. O esquema de composição que irá utilizar foi criada através da aplicação
da Sequência de Fibonacci, a qual consiste numa sequência de números inteiros e
resulta sempre da soma de um número com o seu anterior (Pinharanda, 2001). A
utilização de uma malha como estrutura para a realização de toda a composição assume
uma complexidade visual, que veio substituir o anterior ilusionismo, utilizando agora
uma estrutura também ela vibratória e desmultiplicadora dos elementos que são
introduzidos sobre o plano, que surgem a partir de formas simples, como pontos,
segmentos de reta ou de circunferências, articulando as formas com cor, tal como
podemos observar nas suas obras Sem título datadas de 1975 e 1976 (v. figs. 72, 73, 74
e 75, Anexo I).

“Ao longo dos anos setenta a sua pintura depurou-se, a cor é sabiamente utilizada e os
sinais adquirem um ritmo e transformam-se numa escrita em que a musicalidade e o
lirismo estão sempre presentes.” (Bienal de São Paulo, 1981)

A escolha de uma regra matemática assenta no facto de o artista não querer chegar às
proporções pretendidas apenas empiricamente (Pinharanda, 2001). A função desta

25
estrutura era ser utilizada como solução compositiva das obras, problema que tinha
vindo a acompanhar o seu trabalho desde o seu primeiro período abstrato.

Durante este período de exploração o autor vai alargando o seu leque de


experimentações e passa das afinidades com a escrita, para as analogias à escrita
musical, e passa também a associar o ponto estruturado a imagens de pautas musicais.

“ (…) não tarda que segmentos de recta e de círculo se organizem também em


sequencias verticais e horizontais, em que combinatórias exaustivas por vezes análogas
aos temas e variações da música.” (Gonçalves, 1986 p. 160)

Em algumas das obras que compôs segundo este novo preceito, tentou reproduzir
visualmente utilizando os seus elementos compositivos, a imagem de uma pauta,
procurando mesmo integrar os elementos do sentido rítmico da música que tentou
reproduzir (Pinharanda, 2001).

“… E que, depois, há-de levar o pintor a sistemas seriados de sinais, em pautas


minuciosamente codificadas, ao fim (1973) de uma investigação de ritmos gráficos em
que a cor entra como elemento de escrita, no correr melancólico (…) marcando o tempo
do discurso que se diria musical, por propositada semelhança e engano.” (França, 1985
p. 30)

No ano de 1974, inspirado pelo artista Max Bill, que entre 1935 e 1938 publicara uma
série de dezasseis litografias, datadas entre às quais intitulou de 15 Variations sur le
Même Thème (15 variações sobre o mesmo tema), Jorge Pinheiro organiza uma recolha
criteriosa de uma série de quinze gravuras que concebera em anos anteriores. O objetivo
de Max Bill seria que esta seleção servisse de exemplo a quem não sabia como compor
um quadro, e como deveria ser a sua estrutura interna e externa. No entanto, a seleção
de Jorge Pinheiro deixava de parte o estudo da cor e não pretendia alcançar qualquer
objetivo pedagógico (Pinharanda, 2001). A sua escolha recaiu apenas sobre
composições em que a linha é aplicada e orientada sobre a malha, que é a estrutura de
toda a composição, e que foi criada através da aplicação da Sequência de Fibonacci.

À sua série de quinze gravuras realizadas entre 1970 e 1974, Jorge Pinheiro atribuiu o
título, Quinze ensaios sobre um Tema ou Pitágoras Jogando xadrez com Marcel
Duchamp (v. figs. 53 - 68, Anexo I). Na sua escolha, apesar de num primeiro momento
se parecer com a intenção de Max Bill, é percetível a atribuição de uma forte intenção

26
de ironia crítica à sua série. Transformando um título apenas descritivo, num título
carregado de conotações (Pinharanda, 2001).

Jorge Pinheiro refere-se ao encontro entre Pitágoras e Marcel Duchamp, como uma
metáfora para o apelo de pensar no desenho como um meio de comunicação, e não
como um meio de informação, fazendo um apelo aos sentidos não-plásticos e
conceptivos. No qual, ao contrário das teorias pitagóricas (através das quais podemos
interpretar que um “número” é belo por si só), determinado individuo possa considerar
que algo é belo apenas porque ele quer que o seja, tal como Duchamp terá afirmado
anteriormente (Pinharanda, 2001).

“Pensar o desenho como meio de comunicação e não como meio de informação;


organizar, com rigor estrutural, elementos de fraca ou nula conotação; recusar a história
e favorecer o discurso; aguardar que a poesia se faça no tempo é uma forma possível de
compartilhar a criação. Colocar Pitágoras jogando Xadrez com Marcel Duchamp.”
(Galeria Módulo, 1977-1978)

O artista pretende neste período, ir além do pragmatismo, da história e da simples


objetividade da obra. Pretende usar elementos com muito pouca, ou até nula, conotação,
que ao invés de nos remeterem para determinada história/acontecimento, favoreçam o
discurso e a interpretação por parte de cada individuo.

“ (…) há nestas obras um desejo de reinvenção mecanicista. (…) Sublinhemos a


pertinência significacional deste muito sério encontro. Ele sinaliza da parte de Jorge
Pinheiro uma originalíssima leitura do pitagorismo, aliando-o à contemporaneidade por
via do ready-made. A visão de Jorge Pinheiro é original por abrir um decisivo
comentário sobre a crise da arte conceptual que toma por matriz a invenção
duchampiana.” (Vidal, 2005 p. 26)

Série Os Reis

A década de 70 em Portugal foi marcada por uma grande mudança no paradigma


político e social português, com o fim do Regime do Estado Novo em 25 de Abril de
1974, acontecimento que Jorge Pinheiro terá antecipado com a elaboração de uma série
de obras de género figurativo às quais designou de Os Reis (v. figs. 77 - 81, Anexo I),
série que iniciou ainda no ano de 1973, e que só terminará no ano seguinte em 1974.

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Surge pela primeira vez desde a última fase figurativa que terminou no ano de 1965, um
desejo de comunicação mais direta que é dominado por uma vontade crítica. A série Os
Reis contem representações carregadas de conotação e de evidente ataque a um poder
concreto através da representação irónica que cria em cada uma das situações.

““Os Reis” sinalizam de modo irónico várias facetas da ditadura: o rei come, o rei
discursa, o rei olha criticamente um quadro abstrato de Jorge Pinheiro, o rei é senhor
colonial (…) ” (Pinharanda, 1996 p. 3)

As situações recriadas em cada uma das telas, são carregadas de ironia e de forte
conotação e sátira política, embebida de uma constante encenação dirigida ao poder
totalitário e a todas as formas de exercício de poder (Vidal, 2005).

“ (…) dum poder monstruoso e actual que se visualiza num personagem unitário de
todo o ciclo de imagens. Olhando em fria distância crítica, fixado por indizível
inquietante, desnudado em escárnio e grutesco, misto de sacerdote ocidental e de
visconde castrado(r), é ele “El-rei” (“O dos banquetes”, “O dos microfones”, “Olhando
um quadro de Jorge Pinheiro”).” (Pernes, 1985 p. 100)

Esta foi uma série que produziu ainda durante o seu período de pesquisa e exploração
pictórica de carácter abstrato. No entanto, a série Os Reis revela um diferente apelo
comunicativo, já enraizado anteriormente nas suas primeiras manifestações pictóricas
dos anos 60. De comunicação mais direta e de vontade crítica, na qual ironiza e
caricatura diferentes aspetos do regime através da ridicularização de situações.

“ (…) figuras duma história hipotética, irónica e minuciosamente descritas, no seu


teatro que não se sabe qual seja – ou venha a ser, tal como a própria, súbita e inesperada
mudança do pintor (…)” (França, 1985 p. 31)

Em comparação com o que até este momento estava a realizar de tradição da prática
abstrata geométrica, a série Os Reis estabelece um novo paradigma técnico do autor.

“ (…) a procura de uma realização académica perfeita, fria, equilibrando desenho e cor,
eliminando o corpo da pincelada, artificializando as luzes, estabelecendo com minúcia
extrema a composição e a perspectiva.” (Pinharanda, 1996 pp. 3-4)

Apesar das mudanças sociais e políticas que vieram a influenciar toda a análise da
realidade artística nacional, Jorge Pinheiro irá conservar a sua exploração abstrata que
se irá manter até 1981.

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Série Os Mapas

Depois da série Os Reis, Jorge Pinheiro volta-se para um registo novamente de


expressão abstrata, série que data do ano 1976, altura que coincide com o seu pedido de
transferência da Escola Superior de Belas-Artes do Porto para a Faculdade de Belas-
Artes da Universidade de Lisboa, onde irá lecionar até ao ano de 1996 (Molder, et al.,
2002).

Esta é uma série de obras cuja criação foi isolada das suas longas experimentações do
ponto ou das Escritas, ou de outras derivações das suas malhas de estruturação que
criou para as suas composições. Assim como Fernandes Pernes afirma em, Os Quatro
Vintes (1985), esta sua série seria mais uma vez uma fuga (que já acontecera com a série
Os Reis) à abstração e já uma vontade evidente de criar obras de carácter figurativo
“(…) seria sobretudo o apelo de regresso que toda a viagem traz consigo, (…) aspirando
ao reencontro dos paraísos perdidos.” (Pernes, 1985 p. 99)

Os seus mapas funcionam como um ícone de uma realidade impossível, cada um dos
mapas que cria são imagens de algo, de um sítio que pode não existir. Na exploração da
série, Jorge Pinheiro faz um aprofundamento do seu trabalho exploratório sobre o signo
e sobre as convenções linguísticas no plano do discurso (Pinharanda, 2001). Cada um
dos Mapas consiste em uma junção de convenções ficcionadas, criadas através de
formas puramente artísticas, onde o artista joga com as regras da determinação e
disposição gráfica dos signos, utilizando um jogo de descodificações, como forma de
escapar à tentação de representar o real, abstratizando o resultado final das imagens.

Colocando de parte toda a especulação intelectual sobre os mecanismos de


representação e focando-se apenas na pura manifestação poética e visual de uma ideia,
Jorge Pinheiro acaba por defender que a abstração é uma forma de linguagem e essa
linguagem pode ser imagem (Pinharanda, 2001).

“Jorge Pinheiro continua a mostrar-se um verdadeiro estudioso dos problemas da


comunicação visual, abordando um mundo em que o espetáculo do exacto se associa a
valores especificamente poéticos.” (S. Autor, 1976).

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É através do mecanismo que utiliza nesta série, onde substitui o real por convenções do
real, que podemos perceber uma das principais intenções composicionais das suas
obras, o artista pretende criar uma linguagem através da sua obra, aproximando-se da
representação (Pinharanda, 2001).

Os signos que utiliza nas suas composições, associados a uma realidade concreta, têm
como função transmitir através da sua representação, o significado e ao mesmo tempo
proteger a forma real, permitindo ao observador desvendar e conhecer os significados
codificados da composição (Pinharanda, 2001). A ligação de convenções gráficas e os
seus deslocamentos na superfície da tela, assim como todos esses diálogos/jogos que o
artista estabelece, não deixam de remeter o observador para a referência da viagem.
Como é possível observar em algumas das obras desta série, Sem título datadas de 1976
(v. figs. 82 - 86, Anexo I).

“Imagens concebidas em função duma escala que as abre da sua dimensão real e órbitas
de potencial ambição cósmica, organizadas em função de um rigor matemático que se
aceita e desfaz pelo seu outro subjacente sentido subjectivo de “convites à viagem”,
expressões de uma linguagem codificada que aqui se toma e se provoca, pela inserção
de caligrafias e poética leitura, eis o que serão os mapas revistos nestas obras de Jorge
Pinheiro e, através da sua visão, propostos à nossa imaginação.” (Pernes, 1976)

Última fase do ponto estruturado

Jorge Pinheiro durante o seu percurso artístico nunca se aproximou tanto da


desmaterialização da obra de arte, como quando fez a seleção de quinze gravuras, às
quais atribuiu o nome de Quinze ensaios sobre um Tema ou Pitágoras Jogando xadrez
com Marcel Duchamp, no ano de 1974. A partir desta série, entre os anos de 1977 e
1981, voltou-se novamente para a tela, investigando de novo os caminhos de articulação
dos seus signos gráficos, como ocorreu na sua fase das escritas, mas desta vez com uma
complexidade maior, onde introduz figuras matemáticas e geométricas, as coordenadas
(abcissas e ordenadas) e espirais logarítmicas, onde em alguns casos foram
representadas com mais que um centro (Pinharanda, 2001). As espirais que introduziu
nas suas composições deram uma forte conotação ao mundo natural (animal, vegetal e
cósmico), apresentando desse modo fortes conotações simbólicas, o que até ao

30
momento o artista tinha evitado com a utilização dos signos gráficos. Apesar de,
também nesta altura, acentuar a utilização e exploração da linha curva. A introdução
destes elementos irá condicionar as mudanças de estilo que irão conduzir a sua
produção artística ao fim da abstração. As obras que produz durante este seu último
ciclo de experimentação, e a sua seleção de quinze ensaios, foram os seus últimos
impulsos de composições abstratas.

No ano de 1981 expõe no contexto da representação portuguesa na Bienal de S. Paulo,


onde apresentou a série Ulisses, das telas emergia a forma da espiral (Pernes, 1985).
Nesta série, Jorge Pinheiro expõe pela primeira vez desde a sua exploração abstrata,
com clareza a conjunção de elementos que deram forma à sua linha de pensamento
composicional. Cada obra da série Ulisses nasce de uma reflexão sobre uma narrativa
literária do artista, contagiando toda a composição com a mensagem semântica em que
se inspirou (Pinharanda, 2001).

Durante este seu último ciclo do ponto estruturado, Jorge Pinheiro estuda novas formas
de composição, em torno da representação de espirais logarítmicas e de esquemas de
coordenadas, que conduziram a sua obra para um campo pictórico e semântico mais
complexo. As primeiras obras que compõe nesta sua fase são nítidas e de fácil perceção
construtiva, mas visualmente muito complexas, como se pode observar na obra
Mensagem Inequívoca VI pertencente à série Ulisses datada de 1977 (v. fig. 88, Anexo
I). Numa segunda fase, utilizando como exemplo, a pintura Ulisses contra Polifemo,
também pertencente à série Ulisses datada de 1981 (v. fig. 94, Anexo I), a sua perceção
construtiva torna-se complexa nos mecanismos matemáticos que utiliza, mas de muito
simples visualização e apreciação. Jorge Pinheiro explorou extensas curvas ou longas
retas, deixando para trás os simples segmentos utilizados na sua série de Escritas, as
suas novas formas ocupam de forma geral a superfície da tela, deixando que a estrita
regra que até então era evidente nas suas composições deixasse de ser percetível. Nesta
sua fase o artista opta por tons mais harmoniosos através da introdução de meios-tons
nas suas composições, que dão origem a uma simulação de espaço, fazendo assim surgir
profundidade na tela, deixando esta de ser apenas uma superfície plana (Pinharanda,
2001).

“ (…) a clareza de cada signo surge no espaço emblemático do «quadro» graças a uma
harmonia clássica. (…) As linhas e os pontos, e cor infindável na sua convocação de um
espaço que está ainda por explorar. (…) ” (Barroso, 1987 p. 5)

31
A atribuição de títulos às suas obras é outra das atitudes onde Jorge Pinheiro mostra,
talvez inconscientemente, a sua vontade de se afastar da representação abstrata e levar o
seu registo para outras direções de linguagem na sua composição (Pinharanda, 2001).
Segundo o artista a atribuição de um título a uma obra é como que uma forma de
direcionar o espectador para o que está a observar. Surge como uma forma de discurso
verbal entre o espectador e a obra que está a observar, assume-se como uma pista para o
seu entendimento, seguindo a linha de pensamento do artista.

Jorge Pinheiro atinge com a série Ulisses e com algumas das telas que foram criadas em
simultâneo, uma grande complexidade compositiva e um grau de excelência superior na
sua realização pictórica. O espaço da tela é preenchido com espirais que se desenrolam
proporcionalmente a partir do centro da tela, através de movimentos giratórios (v. figs.
89 e 90, Anexo I). Surgem também neste espaço coordenadas, abcissas e ordenadas que
emanam linhas desde uma origem, distribuindo-se pelo espaço que irá ocupando ao
longo da superfície pictórica (Pinharanda, 2001). A dinâmica que ambas as linhas
introduzem na superfície da tela invade o vazio preenchendo-o através de formas de
expressão e dos jogos visuais que criam, como na obra Penélope (série Ulisses) datada
de 1981, onde o artista simula a interseção de um plano tridimensional com elementos
bidimensionais, fazendo com que estes assumam um lugar no espaço (v. fig. 95, Anexo
I).

“Artista cujo sentido da modernidade se tem amplamente fecundado na meditação de


antigas regras canónicas do número de oiro, Jorge Pinheiro é, não menos, autor duma
obra que tem crescido entre a objectividade da geometria e a individualidade da
caligrafia, entre o rigor matemático dos sistemas seriais e a surpresa de variantes lúdicas
ou aleatórias, numa palavra: entre a obsessão da normal e a libertação da fuga (…)
(Pernes, 1978)

Regresso à figuração

Entre os anos de 1979 e 1980, Jorge Pinheiro é pela segunda vez, bolseiro da Fundação
Calouste Gulbenkian, para realizar estudos na área da semiótica das artes visuais, na
École des Hautes Études en Sciences Sociales, em Paris, França (Molder, et al., 2002).
Irá continuar as suas produções de género abstrato até ao ano de 1981, mas sente um

32
duplo esgotamento da obra e do método que estava a explorar, razão que o leva ainda no
ano de 1980 a optar simultaneamente por um registo figurativo. Em 1981 Jorge Pinheiro
opta definitivamente pelo género figurativo, terminando assim a sua longa fase abstrata.
Posteriormente, Jorge Pinheiro esclarece a razão que o levou à transição de género
artístico.

“A polémica questão “arte figurativa” – “arte abstracta”, (…) não era mais, na sua base,
do que a aceitação ou a recusa da incorporação de um discurso verbal na obra de arte,
entendido este como “história”. Não era, portanto, na ausência de uma querela
iconoclasta como erradamente se pode supor. Julgo que será antes a incompatibilidade
da existência simultânea dos dois sistemas semióticos.” (Pinheiro, 1989).

O fim do seu processo pictórico abstrato pode também ser justificado pela
consciencialização de um esgotamento estético do seu modo compositivo, e a
necessidade de comunicar e exprimir mais do que aquilo que meios abstratos permitiam,
com o entendimento poético da necessidade de utilizar a imagem como forma de
narrativa. O processo deve-se, no entanto, a uma passagem gradual entre duas situações
ou linguagens de procedimentos compositivos, pois já na série abstrata Ulisses, eram
visíveis ícones que facilmente denotavam uma vontade comunicativa, como podemos
também perceber que cada figura exibida nos fundos figurativos posteriormente
concebidos, é desenvolvida segundo as grelhas de composição (v. fig. 112, Anexo I)
utilizadas durante toda a prática de exploração abstrata (Pinharanda, 2001). A
necessidade disciplinar funde-se com os elementos figurativos.

“ Expressão visual e plástica, que na pintura de Jorge Pinheiro determina-se então num
discurso lógico e racional, autêntico e único, de que o universal e a modernidade das
propostas se constrói e se adquire em permanência, e perceptivamente, entre a
“disciplina” e a “surpresa”.” (Barroso, 1983)

De forma não premeditada, o simbolismo, a metafisica, e uma atitude espontânea,


começaram a assumir uma presença preponderante no pensamento do artista, o que se
refletiu nas suas composições (Pinharanda, 2001).

Na sua mudança de linguagem, Jorge Pinheiro foi ao encontro de alguns dos temas e
sentimentos que explorou no decorrer dos anos 60. No decorrer do seu novo período
figurativo, deixa para trás as suas primeiras obras, nas quais o plano principal do
discurso pictórico centrava-se no corpo individualizado, onde a intencionalidade

33
compositiva carregava um desconcertante peso social e trágico. Jorge Pinheiro regressa
a temas que abordara nas suas obras iniciais, mas com outra maturidade e experiência
composicional e cromática, que estudou e aprofundou durante o seu percurso abstrato.

“Cumpriu, antes, uma “necessidade interior” longamente amadurecida (…).


Considerando esgotadas as possibilidades de trabalho plástico no campo das variações
abstractas, desejou ansiosamente aproximar-se do discurso verbal.” (Pinharanda, 1996
p. 3)

O retomar de Jorge Pinheiro à linguagem figurativa, a qual o pintor interrompera no ano


de 1965, inicia-se em 1980 com a série Os Bispos. Porém, ainda nos anos de 1973/74,
no tempo imediatamente anterior à queda do regime do Estado Novo, Jorge Pinheiro
cria a série Os Reis, “Fê-lo, então, através de uma série de telas protagonizadas por uma
única personagem que se desmultiplicava em várias situações compondo o grupo d’Os
Reis.” (Pinharanda, 1996 p. 3) Com esta série, Jorge Pinheiro já ensaiava um
significativo regresso ao género figurativo e uma vontade evidente de comunicar
dominada por uma opinião crítica. No entanto este conjunto de obras ficou isolado no
seu percurso abstrato que só termina no ano de 1981.

A série Os Reis e Os Bispos são obras onde pintor introduziu um grande peso irónico
onde a crítica política e social estava também implícita.

“Mais conhecido pela sua obra abstrata e com a qual conquistou um seguro prestigio na
arte portuguesa contemporânea, este artista assume abertamente a figuração com a série
“Os Bispos” (1976/81) (…). Sem a crueldade de Bernini, Goya ou Bacon, com os quais
tem relação, Jorge Pinheiro propõe uma requintada e sensível (embora ligada à tradição
pictórica) visão particular.” (Maggio, 1982).

Jorge Pinheiro entre 1980 e 1981 retrata dois Bispos com os seus símbolos, como o
manto, báculo e mitra, objetos que simbolizam a ligação das suas personagens com o
sagrado e a relação com o seu poder (v. figs. 98 e 99, Anexo I). As personagens são
representadas com rostos alongados estudados previamente através de desenhos
preparatórios (v. fig. 97, Anexo I). Nas suas composições distancia-se da mensagem
política ou social imediata, preferindo uma abordagem de peso cultural numa análise
crítica e através de um comentário direto do real.

O momento de viragem também pode ter sido estabelecido no momento em que o


artista pinta a obra Homenagem ao Povo Alentejano datada de 1980 (v. fig. 96, Anexo

34
I), onde o artista representa um corpo amortalhado que carrega em si citações formais e
compositivas, e possui também elementos definidos em obras dos anos 60, como a
referência à morte ou as papoulas aos pés do corpo.

“Dois degraus, um corpo que adivinhamos morto sobre um xaile e sob um sudário,
espigas e papoulas aos pés preenchem o terço inferior de um espaço que o (céu) escuro
completa.” (Porfírio, 1980).

No ano de 1986/87 personifica, a imagem de um mundo através do Retrato de Bernarda


de Alba (v. fig. 96, Anexo I), nela carrega a consciência e a essência da sociedade
ibérica tradicional, mãe-castradora, mergulhada numa aura de poder escurecido, surge
como uma personagem imponente e teatral.

“ (…) num jogo de contrários cujos polos se situam na febre de uma insidiosa pulsão de
morte, por um lado, e na reclamação de uma justiça social inerente, por outro.”
(Campos, 1983)

Jorge Pinheiro já explorava desde o início da década de 80, um abrandamento dos meios
e efeitos expressivos, uma purificação e especificação da linguagem e esquemas de
composição, uma procura de reforço cultural e uma busca maior por simbologias no ato
de pensar e compor a obra (Pinharanda, 2001).

No ano de 1987/88 Jorge Pinheiro cria a série Discurso para uma mulher da Palestina,
onde representa mulheres de rostos marcados pelo pavor, agonia e o grito que a
expressão parece prever, ficam abafados por entre as mãos que impedem a voz de se
ouvir. De uma expressividade de traço marcante, onde o desenho carrega toda a força e
medo da palavra.

“ (…) o rosto de uma jovem mulher, marcada pelo pavor, a angústia, a fome e a
ansiedade; a mobilidade das mãos nervosas e a atitude corporal, inquieta e expectante,
envolta em panos, num cenário, onde o grito sufoca a dor. (…) Notável o sentido de
composição, rigorosa, serena, clássica.” (Gonçalves, 1988)

As figuras de mulheres retratadas, onde a pintura capta o momento exato em que a


personagem se dá a ver, alcançando o gesto do momento e o olhar profundo de pavor
das figuras, que remetem o expectador para o espaço exterior de onde a personagem
provem.

“ (…) estes retratos aparentam «instantâneos», um «flash» de cor e de luz a reter o que
de si é efémero, ou seja o gesto de uma mão que resguarda o corpo próprio, a boca, o

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sexo, seja balanço rítmico de um movimento inseguro, seja o som que se escapa ou se
retém num momento.” (Babo, 1998)

A partir deste momento a sua forma de compor atinge uma nova fase, compondo com
base num discurso espiritual. Surge um momento de viragem que irá conduzir a sua
obra pela intemporalidade dos adereços clássicos até alcançar um discurso de
dominação espiritual, simbólica e metafisica (Pinharanda, 1996).

Jorge Pinheiro adota uma atitude formal, ou culturalmente diversificada, sempre


coerente, procurando as suas referências na história de arte e da cultura. A sua crescente
necessidade discursiva originou o recurso a ícones recolhidos de produções artísticas
originárias da cultura clássica, greco-romana ou em ícones provenientes de cultura
ocidentais onde a cultura renascentista esteve presente (Pinharanda, 2001). Cada um dos
ícones figurativos que introduz nas suas composições foi perdendo gradualmente a sua
referência a uma realidade histórica até alcançar a dimensão de símbolo.

Nestas obras surge um simbolismo crítico distanciado, onde nos é oferecida uma
angústia transcendente. Em muitos casos surgem nestas pinturas representações
carregadas de uma aura mística, as quais são interpretações de cerimónias de união, de
despedida e de solidão (Pinharanda, 1996). Apresentam-se como imagens ritualizadas,
onde através destas é possível aceder a uma teoria do comportamento das figuras
presentes em cena. Jorge Pinheiro compõe através de uma reflexão e exercitação de um
autoconhecimento com o intuito de atingir a revelação composicional que procura.

Jorge Pinheiro coloca em confronto nas suas obras, a natureza, o homem e as suas
relações interpessoais. Enumeram-se composições onde explora rituais de união, como
o exemplo da obra O Casamento datada de 1990 (v. fig. 1990, Anexo I), onde é visível
a troca de alianças entre as figuras em cena. De impossibilidade, presente na obra
Porquê? datada de 1991 (v. fig. 109, Anexo I), onde as figuras transparecem de uma
frieza e nudez na relação do casal. Ou de corporificação da despedida, na pintura Solus-
Ipse, datada de 1993/95 (v. figs. 111 e 112, Anexo I), onde situações se cruzam e
acumulam, com a representação do momento em que se concretiza a separação e se
inicia o momento de solidão. De facto, cada uma destas obras carrega em si o
sentimento de angústia e impossibilidade. Razão que leva Jorge Pinheiro,
posteriormente, a querer romper com o clima de seriedade, em obras tais como Era uma
vez uma princesa datada de 1996 (v. fig. 113, Anexo I) ou Homenagem a Josefa de

36
Óbidos a qual foi realizada entre 1992-1995 (v. fig. 110, Anexo I), nas quais o autor
recria alegorias através de situações de humor irónico, e simultaneamente de melancolia
e distância.

“A construção da imagem vive da modalidade da citação. E do excesso de dados


cenográficos: os palcos onde as figuras se situam, a sua artificial ligação com os
cenários paisagísticos, a multiplicidade de fontes de iluminação e a manipulação do
contra-luz. Esta realidade acentua a artificialidade da imagem, o grau da sua existência
ideal e não real, o seu papel especulativo contra qualquer veleidade naturalística.”
(Pinharanda, 1996 p. 5)

Nos dias de hoje

Podemos encarar a obra de Jorge Pinheiro como mais de 60 anos de um percurso


artístico reflexivo e incontestavelmente individualizado. Mas isso não significa que
Jorge Pinheiro não fosse sensível a todas as alterações históricas e estéticas que
ocorreram no panorama artístico internacional, sem nos esquecermos que foi também
professor de consecutivas gerações de artistas que estudaram nestas sucessões
temporais.

No ano de 1996, após 20 anos a lecionar na Faculdade de Belas-Artes da Universidade


de Lisboa, Jorge Pinheiro aposenta-se. Volta a lecionar novamente nos anos letivos de
1999/2001, como professor catedrático convidado, na Universidade de Évora (Molder,
et al., 2002).

Durante o seu percurso artístico Jorge Pinheiro nunca fechava por completo os seus
ciclos artísticos, deixando-os sempre em aberto para que mais tarde pudesse novamente
estudar e voltar a criar, segundo novos esquemas de composição. Atualmente Jorge
Pinheiro divide a sua atividade artística entre o desenho (v. figs. 130 - 133, Anexo I) e a
pintura, e recentemente materializou alguns dos seus projetos artísticos abstratos que
concebeu entre os anos de 1966 e 1970 (objetos pictóricos e objetos tridimensionais),
que estariam ainda apenas em papel e nunca tinham sido produzidos, é o caso de
algumas das obras que produziu no ano de 2010, as quais são conceções dos anos de
1968 (v. figs. 121 - 124, Anexo I) e vão ao encontro dos “Objetos pictóricos” que o
artista concebeu entre 1966 e 1969. Ainda durante este ano concebeu obras

37
tridimensionais, que são também conceções dos anos 70, como o caso da peça Paulo e
Virgínia, onde o artista intercepta dois planos de cores complementares, no interior de
uma estrutura de ferro. (v. figs. 125 - 129, Anexo I).

Tendo em conta o percurso que conhecemos da obra de Jorge Pinheiro, parece ser
desenvolvido ao longo de um antagonismo máximo, que de um lado apela à figuração,
mas por outro, apela a formas essencialmente geométricas. Não é comum encontrar
outro artista que tenha desenvolvido um percurso artístico no qual a oposição entre fases
seja tão extrema, tornando-se até difícil aceitar que obras tão diversas sejam autoria do
mesmo artista, ou como no caso da obra Eco e Narciso, onde introduz novamente
elementos que refletem dando a ilusão de continuação de espaço (Molder, 2002).

Apesar dos evidentes afastamentos, se acompanharmos o percurso do artista, assim


como os movimentos que acompanhou durante a sua constante formação, apercebemo-
nos que realmente existe união na sua obra. Mas sempre foi esta a trajetória de Jorge
Pinheiro, a busca pela aplicação de princípios claros e exatos para a construção de
formas (Molder, 2002).

“ (…) investigou como poucos o outro lado das coisas, descobrindo-lhe a coerência e a
estrutura interiores, através de um longo percurso com passagem por Siqueiros e
Picasso, Modigliani e os construtivistas, pela filosofia da gestalt de onde saltou para o
estruturalismo e a semiótica até redescobrir os elementos de um classicismo depurado,
projectando, enfim, uma obra sem paralelo no panorama da pintura portuguesa. Uma
arte erudita, dir-se-á. Com efeito. Mas em Jorge Pinheiro a erudição é apenas um dos
suportes de uma procura, por vezes desesperada, da sua própria identidade (…) “
(Campos, 1983)

38
2. CONSERVAÇÃO E RESTAURO DE ARTE
CONTEMPORÂNEA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Referindo-me ao termo “arte contemporânea” como toda a arte criada a partir do início
das primeiras vanguardas do século XX, com maior evidência a partir dos meados dos
anos 50 do século XX até aos dias de hoje, é percetível que a arte contemporânea se
libertou e quebrou cânones e as exigências narrativas e imitativas associadas à
representação do real. Grande parte destas expressões artísticas foram vastamente
desenvolvidas na primeira metade do século XX. Pode-se afirmar que os antecessores
do Informalismo sejam, entre outros, artistas como Jackson Pollock com a sua técnica
de dripping e Carl Buchheister com a incorporação de objetos nas suas pinturas.
Simultaneamente, o Expressionismo, com as suas obras não envernizadas e de
estruturas “cruas”, foram também uma forte influência para o futuro da pintura. Assim
como o Surrealismo com os seus conceitos de técnicas de pintura e o Cubismo com as
colagens presentes nas obras de Pablo Picasso e Georges Braque, que conduziram à
crescente utilização, de forma não tradicional, do papel na produção artística. O uso do
plástico enquanto material artístico surgiu também durante este período, assim como a
degradação enquanto intenção artística, que terá sido primeiramente referenciada
durante o Modernismo (Althöfer, 2006). O início das primeiras vanguardas terá sido
também marcado por movimentos como, o Fauvismo, o qual foi considerado o primeiro
grande movimento artístico do seculo XX, e teve o seu início no ano de 1905, liderado
por Henri Matisse, que influenciado pelas paisagens do sul de França e as suas cores
vivas e brilhantes encontrara o seu próprio estilo, marcando uma grande diferença no
que ele fazia e no que os seus antecessores fizeram. Recorrendo a cores vibrantes e a
composições ordenadas, Matisse utilizava cores intensas devido ao forte impacto que
estas causavam e por lhe permitirem alcançar melhor o resultado pretendido, mesmo
que nem sempre fossem as cores “corretas” (Lambert, 1984).

“In essence, from the time of Cézanne and the cubists, the work of the artist has
gradually freed itself from any imitative or narrative exigencies associated with the
virtual and formal representation of reality other than its own. Thus, it has acquired the
status of an autonomous object with its own independent and self-referential aesthetic
value with regards to the linguistic and compositional criteria in play and, particularly,

39
the equally important choice of materials and their technical elaboration.” (Poli, 2012 p.
7)

Acima de quaisquer normas estéticas standardizadas, a arte contemporânea assenta


sobre a criatividade individual de um artista. Assente nestes termos, os artistas
contemporâneos procuram incessantemente todos os meios físicos necessários para
atingirem a expressão desejada. Partindo da utilização de objectos banais do nosso dia-
a-dia, à reinvenção e exploração das técnicas tradicionais, como a escultura e a pintura
que gradualmente desafiava, quebrava e reinventava as técnicas passadas, desde a
procura de formas quase tridimensionais ao uso de telas sem preparação e sem verniz
(Althöfer, 2006).

“Foi sobretudo aos artistas da primeira metade do século que coube a árdua tarefa de
destronar a tradição, recorrendo em muitos casos a soluções traumáticas. Não houve
cânone pictórico que tivesse sido poupado, a começar justamente pela forma e pela cor,
que foram dramaticamente distorcidas pelo expressionismo, que deixou de se preocupar
com a verosimilhança cromática e formal de pessoas e objectos retratados.” (Bossaglia,
2001 p. 13)

A introdução de materiais do dia-a-dia e sem qualquer conotação artistica teve o seu


primeiro impulso com as colagens e com a técnica papier collé aplicada nas obras de
Pablo Picasso e Georges Braque, criadas entre 1912 e 1913 (Poli, 2012). Pode-se dizer
que a partir dos inícios do século XX a utilização de materiais do quotidiano nas obras
de arte emergiu e integrou o ciclo da produção artistica e da experimentação, como por
exemplo, nas assemblages dos Cubistas, Futuristas e Dadaístas, assim como, os ready-
made de Marcel Duchamp, que se apropria de materiais do quotidiano, de origem
industrial e finalidade prática, e os transporta para fora do seu contexto, elevando-os à
categoria de obra de arte.

De certa maneira, pode-se afirmar que muitas obras de arte contemporânea são
reinvenções estéticas da sua realidade contextual, criadas com muitos dos objetos dessa
realidade, mas de uma forma criativa.

Se refletirmos sobre a arte contemporânea e tudo o que foi referido até este ponto, e
compararmos com o título deste capítulo, que se refere à conservação e restauro de arte
contemporânea, podemos à primeira vista julgar que se trata de uma contradição, pois
tendo em conta que a definição de arte contemporânea se atribui às obras de arte mais

40
recentes, pressupõe-se que estas não deveriam requerer qualquer tratamento relativo ao
seu envelhecimento e degradação. Mas não é o caso.

“The number of materials that artists have used over the last seventy-five years must be
little short of infinite, and for each of those different materials, there is only, at best,
limited – and, more usually, nonexistent – knowledge of the ways in which they might
alter with age, respond to different environmental conditions, or react to any number of
potential conservation treatments.” (Learner, 2009 p. 5)

Os artistas contemporâneos exploraram combinações de materiais e técnicas sem


precedentes. A combinação de determinados componentes pode por vezes ser
incompatível, resultando num acelerado processo de envelhecimento e desgaste. Não
esquecendo também de referir que, em muitos casos, a própria deterioração faz parte da
intenção do artista. No entanto, as obras de arte contemporânea são produtos cuja
função consiste em representar ao melhor nível, o património cultural contemporâneo
(Poli, 2012). O artista tem todo o direito e liberdade de expressar os seus sentimentos e
experiências na sua obra. E caso os artistas executem as suas obras sem preocupações
associadas aos materiais que utilizavam, é incubido ao conservador-restaurador a tarefa
de preservar tais expressões do “nosso tempo” para as futuras gerações (Berger, 2000).
Esta é uma das raízes na ética da conservação e restauro, temos que assumir a
responsabilidade de garantir que as futuras gerações tenham um passado, assim como
nós tivemos um (Wetering, 2005). Estes aspetos devem ser respeitados, não interferindo
nem criando interpretações anacrónicas do seu passado que possam ser irreversíveis.

É irrelevante afirmar, assim como algumas críticas o fazem, que certas obras de arte
contemporânea carregam em si as sementes da sua destruição. A instabilidade dos
materiais acompanha a arte desde sempre. Afirmar que Leonardo da Vinci não deveria
ter pintado A Última Seia utilizando uma mistura de óleo e têmpera sobre gesso seco,
numa parede húmida é irrelevante, teríamos sofrido uma grande perda, se não fosse pelo
esforço e trabalho árduo por parte dos conservadores-restauradores ao longo dos séculos
para manter o mural (Janson, H W; [et al.], 2010).

A multiplicidade de formas e manifestações é uma das principais características da arte


contemporânea. Consequentemente esta característica conduz a uma infinidade de
técnicas expressivas e materiais utilizados. Em inúmeras obras, os materiais tradicionais
são misturados ou substituídos criativamente por materiais originalmente concebidos
para o uso doméstico ou industrial (Chintore, et al., 2012). Estes materiais acabaram por
41
assumir o seu lugar, significado e função na arte, assim como, em muitos casos eram a
chave para a obra atingir o carácter desejado. Este é um dos fatores pelos quais, a
conservação e restauro de arte contemporânea apresenta requisitos tão únicos. Por um
lado, existe uma elevada possibilidade de conhecermos a obra quando esta é concebida,
mas por outro lado, sem o conhecimento das técnicas utilizadas na construção da obra e
sem conhecer a intenção do artista, pode rapidamente apresentar sinais de deterioração e
envelhecimento (Chintore, et al., 2012).

Uma outra questão que tem vindo a preocupar conservadores, colecionadores e


curadores na arte contemporânea, são obras de arte que contenham materiais efémeros
como folhas, manteiga, gordura animal, açúcar e chocolate ou outros materiais
degradáveis, que são utilizados com o intuito de dar novas formas de vida às obras de
arte, mas que contribuem diretamente para o seu declínio. Na década de 1970, o
movimento Arte Povera descobriu e fez uso das propriedades expressivas de alguns dos
materiais referidos acima, assim como de materiais manufaturados, como o tecido, vidro
e papel (Chintore, et al., 2012). A preocupação por parte dos conservadores,
colecionadores e curadores face a este tipo de obras, provém do facto de que muito
poucas obras do passado constituído pelo mesmo tipo de materiais sobreviveram até ao
presente.

Ao contrário das metodologias aplicadas pelos artistas do passado, que tinham um


conhecimento íntimo da natureza dos materiais e das técnicas utilizadas aperfeiçoadas
ao longo de séculos, a relação dos artistas contemporâneos com os seus materiais é
completamente livre, descomprometida e variada. Um dos fatores que terá também
contribuído para tais características, terá sido o aparecimento das tintas produzidas
industrialmente, dos tubos de tinta e a crescente disponibilidade de colorantes orgânicos
sintéticos. Os artistas rapidamente aperceberam-se das possibilidades destas soluções
inovadoras, assim como rapidamente descobriram qual a marca que preferiam ou
conseguiriam adquirir facilmente a partir de vendedores locais (Chintore, et al., 2012).
A qualidade consistente destes produtos conduziram a que os artistas pudessem
aprimorar os seus métodos tradicionais de aplicação e experimentarem novas
possibilidades expressivas, a partir de uma enorme variedade de cores agora
disponíveis.

“It has been said that without these pre-mixed tubes of paint, we could not have the art
of Cézanne, Monet, Sisley, and Pisarro.” (Chintore, et al., 2012 p. 16)

42
É seguro afirmar que, em muitos casos de conservação de arte contemporânea podem-se
aplicar princípios utilizados na conservação de arte tradicional, mas muitas vezes
requerem considerações específicas. Apesar de, como já referi anteriormente, em alguns
casos assistirmos à obra após esta ter sido concluída ou termos acesso à intenção do
artista, se tivermos em consideração a vasta diversidade de materiais utilizados na arte
contemporânea, esses aspetos acabam por não facilitar propriamente o trabalho do
conservador-restaurador. A diversidade na utilização e aplicação de novos materiais e
técnicas conduz a uma variabilidade superior de patologias provenientes de cada
material, as quais não são tão conhecidas como as utilizadas em obras tradicionais
como, pinturas a óleo, tempera, trabalhos em mármore ou em bronze (Chintore, et al.,
2012). Não existem dois objectos iguais e nunca diferentes objectos estão expostos às
mesmas condições desde o momento em que foram produzidos, significando que cada
objeto contém uma evolução diferente (Viñas, 2005). O aglomerado destas
características remete a que em muitos casos, o conservador-restaurador não possua
conhecimento prévio de como o tratamento irá resultar em uma obra de arte moderna,
quais as suas consequências e quanto tempo poderá levar.

Contrariamente à conservação de obras de arte tradicionais, a qual passa por conservar


os materiais que a constituem, na arte contemporânea as obras podem ser imateriais,
baseadas em som, sombras ou luzes (Chintore, et al., 2012). Nesses casos, a sua
conservação consiste em salvaguardar o seu suporte que permite a reprodução dessa
obra, ou até mesmo o sistema eletronico que o ativa.

Todos os materiais sofrem alterações com a passagem do tempo, até os mais resistentes.
É seguro afirmar que o comportamento e o resultado de técnicas e metodologias de
conservação e restauro aplicados em materiais tradicionais, já foram testados e
estabelecidos. Ainda assim, em cada intervenção de conservação e restauro, devem-se
identificar os materiais constituintes, analisar as causas da degradação e avaliar as
opções de tratamento. Mas se tivermos em consideração os “novos” materiais utilizados
nas obras de arte contemporânea, a situação torna-se mais complexa, visto que em
muitos casos não se conhece a exata composição de determinados materiais ou não
existe qualquer informação relativamente a métodos de limpeza, consolidação e a como
estes podem reagir ao serem expostos a diferentes condições ambientais, ou como vão
reagir à passagem do tempo.

43
No caso da conservação e restauro de arte contemporânea, mais do que em qualquer
outro, o conservador-restaurador deve satisfazer alguns critérios: identificar os materiais
constituintes da obra e perceber como estes foram aplicados ou misturados; recolher
informação detalhada de como estes materiais podem reagir à passagem do tempo; e
preservar a intenção do artista, a qual deve ser documentada. Antes de começar
qualquer intervenção numa obra, o conservador-restaurador deve ter a preocupação de
reunir toda esta informação, fazendo uso de resultados obtidos através de testes
científicos e sempre que possível, de informação recolhida diretamente do artista, em
relação aos materiais que utilizou, o seu modo de aplicação e a sua intenção expressiva,
entre outras questões que o conservador considere relevantes e que possam além de
contribuir para o seu trabalho, fazer com que este vá simultaneamente ao encontro da
vontade do artista (Chintore, et al., 2012). Ainda assim, além ter que se conhecer e
dominar as técnicas de conservação e restauro, o conservador-restaurador tem que
entender o universo intelectual e filosofia do artista, para garantir que a intervenção
parte de um ponto correcto (Althöfer, 2006).

A conservação de arte contemporânea requer um nível de conhecimento das técnicas e


dos materiais, mais amplo que o da conservação de arte tradicional. Tudo isto tem não
só um grande impacto nos conservadores-restauradores, assim como tem para os artistas
que utilizam novos materiais e técnicas de execução. Estes deveriam ser os primeiros, a
serem conscientes da estabilidade e durabilidade dos materiais que utilizavam. Mesmo
que para eles sejam irrelevantes as consequências relativas à durabilidade e alterações
da obra, eles devem ter consciência dos riscos de saúde a que podem estar sujeitos ao
utilizarem determinados materiais e técnicas. Por estes motivos, as escolas de belas artes
e conservação, conservadores-restauradores e instituições associadas, devem
desempenhar um papel importante na sensibilização para a arte contemporânea e
moderna, especialmente para os seus materiais (Chintore, et al., 2012).

Como já foi referido, a presença do artista é um elemento de enorme relevância na


conservação e restauro de arte contemporânea. Este pode contribuir com informação
essencial em relação aos materiais e técnicas utilizadas. No caso de se estarem a lidar
com obras gravemente danificadas e que contenham partes que não podem ser
recuperadas, se o artista estiver presente, este pode ser contactado por parte de
colecionadores ou museus para que reconstitua parcialmente ou totalmente a sua obra.
No entanto, esta intervenção do artista não deve ser considerada propriamente, uma

44
intervenção de restauro, nem uma cópia fiel da sua obra, por variadas razões: no
momento em que o artista concebeu a obra em causa, a sua intenção expressiva, assim
como a sua habilidade técnica e inspiração não são idênticas às do “mesmo” artista que,
passado um determinado número de anos volta a trabalhar nessa mesma obra (Chintore,
et al., 2012). Por este motivo, não é considerada uma substituição do original, mas sim
uma obra “nova”, com qualidades que diferem da versão original. O mesmo se aplica à
intenção do artista, que apesar de ter grande peso na intervenção na obra, pode por
vezes gerar controvérsia, em sintuações por exemplo, em que o artista pode preferir um
tratamento que compromete preceitos profissionais, ou expressar incerteza
relativamente a possiveis soluções (Learner, 2009). É importante referir que, não só a
habilidade técnica ou inspiração do artista mudaram com o decorrer do tempo, mas
também a sua atitude.

A intervenção por parte de um conservador-restaurador é diferente. Após toda a recolha


de informação sobre os materiais e execução técnica de uma obra de arte danificada, o
conservador pode proceder à sua reconstituição utilizando os mesmos materiais e
técnicas, de modo a alcançar um resultado inteiramente aceitável, também para o artista.
Com uma reconstrução apropriada é possível recuperar as obras de situações nas quais a
legibilidade teria sido vastamente ou totalmente perdida, a tal ponto que esta
intervenção integre fielmente a obra e reconstitua a sua leitura e forma original. Durante
cada intervenção tudo deve ser explicitamente documentado, não deixando espaço para
especulações (Chintore, et al., 2012). Se a reconstrução fizer parte da intervenção, então
deve ser facilmente identificável o que é original, do que foi reconstruído.

Os artistas sempre utilizaram e vão continuar a utilizar os materiais que considerem


mais apropriados para expressar a sua criatividade. Mas esta contínua expansão de
possibilidades criativas não deve ser limitada pela perecibilidade dos materiais. Em
causa está o nosso património, a nossa arte, o nosso lugar na história que seguramente
vai influenciar as futuras gerações. Até mesmo os materiais tradicionais utilizados no
período Clássico envelhecem, mas faz parte da tarefa do conservador-restaurador
retardar este envelhecimento e intervir estas obras, para que a sua leitura não se quebre e
continuem a manifestar a sua ideia. Alguns artistas levam estas questões mais em
consideração e são cautelosos nas escolhas e técnicas que aplicam nas suas obras, mas
por outro lado outros mostram indiferença face à longevidade das obras e deixam essa
questão à responsabilidade do museu ou colecionador (Chintore, et al., 2012).

45
Tendo em conta todos estes fatores, é importantíssimo reunir e documentar o máximo
de informação relativa à conservação e restauro de arte contemporânea. Por vezes o
trabalho do conservador-restaurador pode chegar a uma fase mais experimental e em
que o risco é elevado. Por esse motivo, todas as intervenções devem ser o máximo
possível reversível e seguirem as normas da profissão, e cada especto da intervenção
deve ser acuradamente documentado, assim como todos os materiais utilizados e
justificar porque razões se optou por determinado tratamento (ou rejeitou), e a avaliação
dos resultados (Chintore, et al., 2012). Caso a reversibilidade não seja uma opção
viável, ou dependendo do propósito da conservação, Salvador Muñoz Vinãs apresenta
na sua obra Contemporary Theory of Conservation (2005), o conceito de “intervenção
minima”, como alternativa, no qual o tratamento de conservação deve ser mantido no
minimo e realizado por razões especificas, não intervindo em demasia na obra (Viñas,
2005). Os principios da reversibilidade e da intervenção minima foram criados por
motivos semelhantes, sendo uma delas a eficiência da preservação. Mas se tivermos em
consideração alguns casos em que a intervenção não é minima, e é adicionada à obra
uma parte em falta, isto pode ter um efeito negligivel na preservação da obra. Dito isto,
o principio da intervenção minima pode ou não ser o método mais apropriado em
determinados casos, mas pode ser útil no sentido em que não são feitas alterações
desnecessárias na obra (Viñas, 2005).

Relativamente ao parágrafo anterior, é importante salientar que o conceito de


reversibilidade é um pouco distorcido, este refere-se a um principio ético que defende
que deve ser possivel regressar ao estado original da obra após esta ser intervida (Viñas,
2005). Para os profissionais de conservação e restauro este método poderia reduzir os
riscos e a responsabilidade, contudo, não é possivel alcançar a reversibilidade total. Não
é possivel, segundo as leis da fisica, fazer com que um objeto volte ao seu estado
precedente. Por estas razões, em alguns casos, o principio da reversibilidade tem vindo
gradualmente a ser substituido por alternativas como a “retratibilidade” (Viñas, 2005).
Mas disto isto, o conceito de reversibilidade não deixa de ser uma opção viável, desde
que não não seja encarado como um requisito aboluto. Determinados tratamentos devem
ser caracterizados por “pouco reversiveis” ou “muito reversiveis”, a reversibilidade não
deve ser um requisito, mas sim uma mais valia que contribua para a qualidade da
intervenção (Viñas, 2005).

46
“In spite of these criticisms, reversibility is still a valid notion, as long as it is not
understood to be a requisite or an absolute notion. Rather, it is more useful when used
as an adjective modified by an adverb: there is no such thing as a ‘reversible’ treatment,
but rather treatments that are ‘quite reversible’, or ‘slightly reversible’, or ‘very
reversible’, etc., when compared with common contemporary treatments. Reversibility
is not (cannot be) a requisite, but it is indeed a bonus, a value added to any conservation
treatment, which increases its overall quality: it should be porsued, but not at all costs.”
(Viñas, 2005 p. 188)

Todo este capítulo foi desenvolvido em torno da arte contemporânea e respetivamente


nas suas técnicas e materiais, e questões ligadas a intervenções de conservação e
restauro. Dito isto, é importante salientar que, a conservação é um meio e não um fim,
ou seja, deve agir como um meio para um fim.

Relativamente a questões e decisões mais sensíveis, Salvador Muñoz Vinãs refere que
estas devem ter em consideração os valores e o significado que os objetos constituem
para o público (Viñas, 2005). Em algumas situações na conservação, mais do que prever
como determinadas alterações químicas vão influenciar a obra, deve ser mais importante
prever como o público vai ser afetado pelo processo de conservação. O principal
objetivo da conservação não deve ser apenas o de conservar os materiais da obra, mas
sim de manter, recuperar ou melhorar o significado que esta tem para o público (Viñas,
2005).

“In fact, conservation is a means, and not an end in itself. It is a way of maintaining and
reinforcing the meanings in an object; it is even a means through which the appreciation
for what an object symbolizes is expressed.” (Viñas, 2005 p. 213)

47
3. CASO DE ESTUDO – FETO DE JORGE PINHEIRO

A obra em estudo pertence ao fim da primeira fase figurativa de todo o percurso


artístico de Jorge Pinheiro. A pintura em estudo, o Feto de 1965, é uma das últimas
pinturas que o artista compõe antes de terminar a sua primeira fase de exploração
figurativa, a qual o artista denominou por escolar, que terminará no decorrer de meados
da década de 60.

Figs. 1 e 2 - Frente e Verso, da obra Feto datada de 1965, do artista Jorge Pinheiro, antes da intervenção de
conservação e restauro.

3.1. ENQUADRAMENTO HISTÓRICO E ARTÍSTICO

Jorge Pinheiro cria a obra o Feto depois de um período de pesquisa e experimentação,


quando regressa a Portugal após uma viagem que realiza a Londres em 1965, enquanto
bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian. Durante essa viagem Jorge Pinheiro toma
contacto direto com obras de vários artistas, em particular com a obra de Francis Bacon.
Este contacto provocou uma rutura inevitável com o que estava a realizar a nível
pictórico, originando uma mudança de atitude, colocando-o perante uma nova pesquisa
e reflexão formal. Jorge Pinheiro sente a necessidade de voltar a estudar mais
aprofundadamente meios de composição, o que o leva a refletir sobre o modo como
componha. Durante aproximadamente dois anos, Jorge Pinheiro busca incessantemente
o sentido para a sua linguagem representativa, a qual já sentia forçosamente esgotada. A

48
impossibilidade que o artista começa a sentir de figurar e afirmar a sua linguagem na
composição, irá originar o fim da sua primeira fase figurativa.

“Isto foi feito num período que eu tive uma primeira fase figurativa muito próxima da
escolar e depois andava a morrer, por isso uma série de coisas que eu fiz eram muito
desconstrutivas como esta, no fundo o que eu estava a matar era essa primeira fase
figurativa.” (Pinheiro, 2015 [Anexo IV])

A tomada de consciência de um esgotamento do que estava a criar, originou o seu


último ciclo de criação figurativa, o qual deu origem a um conjunto de pinturas, entre
elas O Circulo de Giz, O cão e a obra em estudo - o Feto. As três pinturas fazem parte
de um conjunto que Jorge Pinheiro realizou no decorrer do ano de 1965, composições
onde explora a libertação do gesto, originando a desconstrução do desenho, explorando
o tratamento técnico e pictórico. Ambas as obras são circunscritas por um tratamento do
limite interior de uma forma circular, são pinturas que demonstram na sua composição
os extremos de inscrição da nudez sentida naquela altura pelo artista (Pinharanda,
2001). O artista depara-se com uma necessidade de experimentar e estudar mais
aprofundadamente as regras de composição, dando origem a uma transição que
interrompe com o seu último ciclo figurativo e o inicia numa nova fase de intensa
investigação em torno do quadrado e do círculo, que será o seu ponto de partida para um
novo percurso assente na abstração.

A obra o Feto aborda a temática da criança, representando um feto em


desenvolvimento, quase como uma referência a uma situação que lhe estaria no
pensamento naquela altura, uma inquietude ou apenas um pensamento, despontaram o
desejo de querer representar a vida humana nos seus primeiros momentos de existência.
Jorge Pinheiro compõe a pintura o Feto numa fase de exploração pictórica, sendo esta
pintura uma nova experimentação, exploração técnica e desconstrução pictórica, que
começa a surgir de entre os elementos figurativos da sua iconografia, integrante de um
grupo de obras, mas que simultaneamente as ultrapassa, devido à redução do gesto,
sistematização e procura pela abstração das formas.

“… a importância desta obra dentro da arquitectura iconográfica de Jorge Pinheiro


deriva da própria iniciativa da sua realização mais do que da qualidade do seu resultado
final.” (Pinharanda, 2001 p. 34)

49
A experimentação e a intenção primordial de toda a composição, resultou no despertar
de uma nova situação plástica, algo novo se começava a denotar nas áreas
monocromáticas de cor que até então não eram trabalhadas nem exploradas pelo artista,
surgem sinais de um nova vontade de rigor, ordem e simetria na forma de compor.

José Augusto França menciona no livro Os Quatro Vintes1, a obra o Feto, como um
perfeito exemplo da transição de géneros que se deu na obra pictórica do artista, a
pintura é o exemplo da conjugação do passado com o que iria ser o seu futuro modo de
exploração compositiva, que durante vários anos irá ser o foco do seu estudo e
experimentação técnica e composicional.

“É uma forma abstrata, exigência interior, e que se impõe já num “espaço” nela mesma
assumido. O diálogo entre a forma e o espaço (a “figura” e o fundo”) não pode mais ser
entendido como tal: ambos os valores físicos se integram num único, e a pintura de
Jorge Pinheiro alcança ai a definição que vai convir-lhe ao longo dos anos seguintes.”
(França, 1985 p. 29)

A pintura o Feto pertence a uma fase de exploração que desencadeou o fim da sua
primeira fase figurativa, foi considerada uma obra que representa uma época de rutura
com o que até então era a sua linha de pensamento e trabalho. Em entrevista conta como
encarou a fase e em particular a pintura que realizou nessa altura“… portanto isso foi as
últimas facadas na primeira fase figurativa…” (Pinheiro, 2015 [Anexo IV]). Diz
também não perceber em que estava a pensar naquele momento de criatividade, algo
espontânea surgiu, sem explicação nem premeditação. Diz também que em mais
circunstância nenhuma compôs algo parecido, o que criou nesta tela foi único e sem
precedentes. Com ironia afirma: “É tão estranho, tão estranho que eu nunca mais na
vida fiz coisa parecida nem igual…” (Pinheiro, 2015 [Anexo IV]).

O rumo expressionista que Jorge Pinheiro explorou, foi uma manifestação pictórica do
que o artista estaria a sentir naquela altura (Pinharanda, 2001). Mas irá durar pouco,
essencialmente devido ao facto de o artista se identificar com um registo poético,
dramático e emotivo, e de se recusar à simples exploração das emoções e suposições de
estruturas narrativas que a frontalidade do expressionismo transmitia.

1
“Os quatro vintes” - Ângelo de Sousa, Armando Alves, Jorge Pinheiro, José Rodrigues. Publicação
editada na cidade do Porto, no ano de 1985, pela editora O oiro do dia & Simão Guimarães.

50
Devido às suas características materiais e técnicas, a obra Feto constitui um exemplo
único de um momento de transição no percurso artístico de Jorge Pinheiro. Foi possível
perceber com base na entrevista realizada ao artista (ver anexo IV) que a obra Feto é o
último exemplo de pintura figurativa antes de encerrar com o seu último ciclo
figurativo, que o levou à sua fase de abstração. A obra que irá compor depois desta,
datada de 1966 e à qual chamou de Homenagem a Amesterdão, é a sua primeira obra
abstrata.

“E depois a primeira coisa abstrata que fiz, pertence ao Museu do Chiado, foi um tombo
de madeira, eu estava com bolsa em 1966, portanto isso foram as últimas facadas na
primeira fase figurativa.” (Pinheiro, 2015 [Anexo IV])

Foi o primeiro exemplo de uma intensa pesquisa formal, marcada por uma
sistematização e exploração de novos elementos, através de uma abordagem abstrata
que irá realizar ao longo de quase 15 anos.

A pintura o Feto, desde o momento da sua conceção nunca foi exposta e pertenceu
sempre ao artista, acompanhando-o para todos os locais onde durante a sua vida
estabeleceu atelier. O artista descreve-a como uma obra que foi concebida e do seu seio
não saiu, contando esse facto com ironia, “Foi um assassinato”, que ficou em casa
(Pinheiro, 2015 [Anexo IV]).

3.2. DESCRIÇÃO FORMAL

Na superfície da tela, ergue-se uma forma vermelha que, num primeiro olhar, se
assemelha a uma raiz que cresce de um solo preto e se desenvolve numa forma circular
e grande, contra um fundo onde se observa a mistura de tons azuis e brancos
amarelecidos, transmitindo a ideia de ambiente aquático. A cor vermelha expande-se
pela zona inferior da composição, ao centro a representação da figura, a referência
iconográfica à temática da criança com a representação do feto. A posição em que este
foi representado lembra a posição do embrião dentro do ventre materno, a sua presença
na composição remete para o que seriam as suas obras anteriores, que fecham o seu
primeiro ciclo figurativo do artista, mas o enredo em que a composição é pensada e
executada é como que um anúncio de uma nova situação poética (França, 1985).

51
Além da descrição que apresentei, a composição não necessita de uma explicação
prévia. Qualquer interpretação pode ser válida, não existe uma ideia pré-definida pelo
artista, o observador é livre de fazer a sua apreciação.

O autor trabalha a obra sobre o verso de uma tela reaproveitada, a qual já teria sido
utilizada anteriormente para representar algo que deixara de ter importância para ele,
cobrindo-a com uma camada não uniforme de tinta branca. Deste modo, trabalhou sobre
o verso da tela não preparada, a óleo, compondo sobre a textura e rugosidade da tela,
obtendo uma pintura mais crua, seca e sem brilho.

“… isto é pintado como vê do lado da tela não preparada… Foi algo que eu vi na altura
em Londres e eu suponha que o Bacon (Francis Bacon) fazia isso, não sei se fazia, se
não fazia, mas pelo menos parecia que fazia e achei graça e dava esta textura e
rugosidade completamente seco sem brilho nenhum…” (Pinheiro, 2015 [Anexo IV])

A razão para essa escolha foi apenas experimental, Jorge Pinheiro terá visto esse tipo de
tratamento nas obras de Francis Bacon, na viagem que realizou no ano de 1965 a
Londres. Foi uma opção técnica que não voltou a utilizar por considerar que não obtinha
o resultado que pretendia em termos de resultado final e de texturas.

Toda a composição é delineada por uma linha de cor preta realizada, muito
provavelmente, a pincel e a tinta óleo, podemos afirmar que poderia ser a linha do
desenho preparatório, mas que o artista utilizou como linhas de composição do próprio
resultado final. A linha percorre o corpo do feto e delimita toda a forma vermelha.

Ao centro da tela encontra-se representada a única figura da composição, o Feto, a


figura foi concebida a partir de transparências e densidades de tinta. As cores utilizadas
foram o vermelhão misturado com branco, e o artista admite que também pode ter
misturado amarelo.

Ao longo da superfície da tela o artista aplicou uma técnica que explora várias
concentrações da tinta de óleo, concebendo transparências, criando o impacto visual que
pretendia de textura visual e brilhos ao longo de toda a composição. A paleta de cores
utilizada é reduzida, as cores predominantes variam entre o vermelho, preto, branco,
azul e o amarelo. O azul é aplicado através de pinceladas rápidas e quase aleatórias,
denotando-se através da camada de óleo branco, onde possivelmente existe também a
mistura de amarelo, aplicado de forma muito diluída, deixando a camada azul
transparecer como fundo. Também é possível observar ao longo da superfície manchas

52
de forma circular e de vários tamanhos de cor branca, as quais foram introduzidas
intencionalmente, pois segundo Jorge Pinheiro, “Tentei imitar as células observadas ao
microscópio….” (Pinheiro, 2015 [Anexo IV]). Toda a cena que o artista criou através de
pequenos jogos de ilusão, com a aplicação de três níveis de cor, proporcionou à
composição uma sensação de atmosfera liquida dando a ilusão de objeto submerso. Esse
jogo de transparências é visível também na zona vermelha que circula a figura do Feto,
de certa forma é visível que o tratamento de brancos amarelecidos entra na zona
vermelha dando luz e dinâmica a toda a cena que envolve o feto, dando mais enfase à
ideia de este estar vivo e em fase de gestação.

É possível observar, podendo até causar alguma estranheza ao observador, a


diferenciação técnica que surge entre a zona superior da composição e a zona inferior.
Na zona inferior da composição predomina um tratamento monocromático e de formas
geométricas, técnica que até ao momento não tinha explorado em nenhum dos seus
trabalhos pictóricos. Predominam duas cores, o vermelho e o preto, aplicados de forma
uniforme.

A questão fundamental desta obra é a sua exploração técnica, assim como a evidência
de que se trata de um momento de transição entre duas fases muito distintas no percurso
artístico de Jorge Pinheiro. Tais características fazem com que esta seja uma obra a
preservar, devido à sua relevância e contribuição para a perceção da transição artística
de Jorge Pinheiro, entre o seu último ciclo de figuração, e a sua fase abstrata, que teve
início em meados dos anos 60.

53
4. DIAGNÓSTICO E TRABALHO DESENVOLVIDO

IDENTIFICAÇÃO DA OBRA

Titulo: Feto2 (v. fig. 138, Anexo III)

Autor: Jorge Pinheiro3 (v. fig. 138, Anexo III)

Data de execução: 1965 d.C. (v. fig. 138, Anexo III)

Categoria: Pintura

Técnica: Pintura a óleo sobre tela

Dimensões máximas (cm): 150 x 150 x 1.8 cm (altura x Largura x comprimento)

Proprietário: Jorge Pinheiro

4.1. TÉCNICAS E MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO4

SUPORTE DA PINTURA │ A tela onde o artista realizou a pintura é de fibra de


linho, (tal como em entrevista o artista referiu que foi sempre o que utilizou) a qual
possui uma densidade média e um aspeto regular com uma estrutura de tafetá5 1:2 – fio
no sentido vertical mais grosso e escuro, e dois fios no sentido horizontal, mais finos (v.
fig. 144, Anexo III).

Mesmo não conseguindo observar a zona de remate da tela, depreende-se que a trama
da estrutura de tafetá esteja no sentido vertical, pois os fios da trama normalmente são
identificados por possuírem a característica de serem fios mais fortes, pois são estes que
sustentam toda a tensão que se aplica no momento da confeção da tela.

2
Obra intitulada no verso – Feto (zona superior esquerda).
3
Obra assinada e datada: Jorge Pinheiro – 1965 (zona superior esquerda).
4
Ver, como complemento aos resultados abaixo apresentados: Registo Fotográfico do Diagnóstico e
Trabalho Desenvolvido, Anexo III, pp. 125 – 139, figs. 136 – 211.
5
Estrutura de tafetá – Indica o número de fios que tem a urdidura e a trama de uma tela. (Villarquide,
2004 pp. 120 -121)

54
A tela foi concebida industrialmente, pois apresenta textura regular e o modo de
entrelaçamento dos fios corresponde a tafetá simples6 de urdidura acentuada7 de teia
fechada. Quanto à densidade da tela, por 1 cm2 é visível uma média de 20 fios na
vertical, por 12 fios no sentido horizontal. O fio da teia apresenta uma torção em “S”8.

A tela terá sido comprada pelo artista, mas apesar de ser uma tela industrial, apresenta
um corte irregular, sendo visíveis alguns fios soltos, visualizando-se também a presença
de remates assimétricos que não correspondem a um acabamento industrial.

CAMADA DE PREPARAÇÃO │ Apenas com uma análise à vista desarmada e


segundo a confirmação do autor, a pintura foi realizada sobre o suporte sem preparação.
Como referenciado anteriormente o artista realizou a pintura reaproveitando uma tela
que teria no seu atelier, dando uma camada de óleo de cor branca aplicada de forma
irregular no verso, de modo a cobrir parcialmente a pintura que estava sobre camada de
preparação industrial, tornando-a indecifrável (v. fig. 137, Anexo III). O artista afirma
que a sua opção foi apenas experimental e que pretendia uma pintura mais texturada e
sem brilhos.

CAMADA PICTÓRICA │ Na camada pictórica o artista utilizou uma paleta bastante


reduzida, e onde afirma que misturou alguns pigmentos para obter tonalidades
diferentes (v. fig. 140, Anexo III), diz também ter utilizado nesta tela óleos da marca
Rembrandt os quais utiliza até aos dias de hoje, ou Winsor and Newton, marcas de óleos
que terá utilizado também durante algum tempo nas suas obras.

“…mas não tenho a certeza absoluta se em 65, já vão lá tantos anos, se era o Rembrandt
que eu utilizava mas é muito provável que sim, Rembrandt ou Winsor, se não fosse o
Rembrandt era a Winsor.” (Pinheiro, 2015 [Anexo IV])

6
Tafetá simples – Consiste numa estrutura de tela simples e é a partir desta que derivam as outras.
Compõe-se através de um fio de trama que passa por cima e por baixo do fio de urdidura sucessivamente
O resultado final do tecido será uma tela sólida e homogénea, devido à elevada quantidade de pontos de
interseção. (Villarquide, 2004 p. 121)
7
Urdidura acentuada – Consiste numa estrutura de tafetá que contém mais fios de urdidura do que fios de
trama.
8
Torção em “S” – Compreende-se por um fio que ao ser enrolado no sentido contrário ao ponteiro do
relógio, adquire uma inclinação para a esquerda.

55
A paleta revela uma predominância de tons como o vermelhão, o preto, o branco, o azul
e o amarelo (que segundo o artista foi utilizado apenas para misturar com o branco, com
o intuito de criar um tom mais amarelecido para o fundo).

Em termos de execução o artista optou por uma técnica onde explora várias
concentrações do óleo, obtendo variações entre transparências e opacidades, criando o
impacto visual pretendido de textura visual ao longo da composição (v. fig. 136, Anexo
III).

No decorrer do diagnóstico foi possível afirmar que o artista delineou primeiro a figura
do Feto e a forma da grande estrutura vermelha com uma linha, possivelmente a pincel
com tinta de óleo preta e em seguida aplicou as formas azuis de uma forma muito
fluida, fruto possivelmente de gestos mais livres, e em seguida aplicou no fundo um
branco amarelecido, devida à junção de pigmento amarelo. São visíveis também ao
longo do fundo da área superior da pintura, vários círculos de diâmetros variáveis de cor
branca os quais se misturam e aproximam dos tons que o artista utilizou no fundo da
composição, tal como um contorno realizado de forma fluida e espontânea ao longo do
círculo vermelho ao centro. Na área inferior da composição são visíveis duas zonas de
cores distintas, o vermelhão e o preto, ambas trabalhadas de forma monocromática. A
forma vermelha liga o círculo ao centro onde se encontra o Feto, e todo o tratamento da
tinta torna-se mais translucido e de várias tonalidades que são obtidos a partir da sua
mistura de pigmentos e do jogo com a cor da tela de linho, deixando transparecer a
trama e os fios da tela. O Feto é acentuado por subtis sombras realizadas a pincel e a
pigmento de cor preta, que proporcionam enfase à posição do Feto.

No verso da pintura, na zona superior esquerda, executada a pincel e tinta preta é visível
a assinatura “Jorge Pinheiro”, o ano em que foi realizada “1965”, e o título da obra
Feto.

CAMADA DE PROTEÇÃO │ A pintura não possui qualquer indício de presença de


uma camada de revestimento final.

GRADE │ Como suporte estrutural, a pintura apresenta uma grade de madeira de


natureza resinosa, possivelmente pinho, composta por quatro travessas laterais, de

56
sistema regulável, apresentando um sistema de cavilhas simples9, extensível através de
doze cunhas, das quais só continha uma que se deduz ser original. Ao centro apresenta
uma travessa de reforço em forma de cruzeta10, em sistema de encaixe macho/fêmea.

O sistema de fixação da tela à grade foi realizado através de tachas metálicas, aplicadas
de forma irregular ao longo das arestas laterais e pontualmente na face da grade, sendo
visível em algumas zonas, a sua inexistência.

4.2. AVALIAÇÃO DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO11

Todas as pinturas começam a ganhar alterações a partir do momento em que o pintor


começa a seu processo de criação. Os efeitos do envelhecimento natural, dos agentes
atmosféricos12, os fatores ambientais os danos acidentais, as ações introduzidas pelo ser
humano, como proprietários e restauradores, todos estes fatores pelos quais a obra vai
passando influenciam o seu ciclo de envelhecimento (Bomford, et al., 2009a).

O envelhecimento e degradação dos materiais é inevitável, mas cada obra pode ser mais
ou menos sensível às condições exteriores, e com o passar do tempo o seu
comportamento em relação a estes fatores pode variar, podendo aumentar a sua
tendência a modificar-se. As alterações que a obra sofre com o passar do tempo, podem
estar também, por vezes, associados a materiais de má qualidade ou técnicas incorretas
aplicadas pelo artista no ato de conceção da obra, podendo ser a causa de muitas das
alterações que a obra poderá sofrer, que por vezes se revelam em muito pouco tempo. O
envelhecimento natural é intrínseco aos materiais da pintura, mas este estado natural de
envelhecimento pode ver-se acelerado devido a condições inadequadas de conservação,

9
Sistema de cavilhas simples – Sistema em que as traves de madeira se encaixam sem necessitarem de
pregos. A grade consiste num sistema que se move em duas direções e é extensível a partir da utilização
de cunhas, que são introduzidas em locais ocos existentes entre as zonas de cruzamento das traves.
(Villarquide, 2004 p. 134)
10
Reforço em forma de cruzeta – Consiste numa travessa de reforço em forma de cruz e que tem como
função reforçar a grade evitando que esta sofra deformações. (Villarquide, 2004 p. 135)
11
Ver, como complemento aos resultados abaixo apresentados, o anexo: Registo Fotográfico do estado de
conservação, Anexo III, pp. 127 – 130, figs. 146 – 163.
12
Agentes atmosféricos – Elementos que compõem o ar, aos quais devem ser adicionados os agentes
poluição ambientais. Todas estas substâncias interferem de diferentes maneiras, no estado de conservação
dos materiais.

57
surgindo patologias13 que podem chegar a causar a destruição da obra, caso não seja
submetida a um tratamento de conservação e restauro (Villarquide, 2005).

Antes de se decidir qual a proposta de tratamento mais adequada a ser aplicada num
tratamento de conservação e restauro, é necessário entender e estabelecer quais as
patologias que a obra apresenta e quais estão a comprometer a estabilidade da pintura.
Cada uma das patologias identificadas serão indícios das causas que as provocaram, e
serão base, para proceder com o diagnóstico e subjacentes propostas de tratamento.
Deste modo, é possível minimizar que no futuro a obra sofra das mesmas patologias,
precavendo ao máximo as condições adversas que foram a causa da sua degradação
(Villarquide, 2005).

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INTERVENÇÕES ANTERIORES │ Não se observam quaisquer indícios de ter


sofrido intervenções de conservação e restauro anteriores.

SUPORTE DA PINTURA │ De um modo geral encontra-se em bom estado de


conservação e com grande estabilidade estrutural.

Camada de preparação no verso da pintura │ O suporte possui apenas uma


camada de preparação industrial, sobre o verso da pintura (v. fig. 146, Anexo III).

Sujidade generalizada │ Sobre o verso do suporte foram observadas


acumulações de poeira por toda a superfície, que originaram o seu escurecimento.
Observara-se também a presença de pequenas zonas de acumulação de sujidade na zona
inferior da obra, entre a grade e a pintura (v. fig. 147, Anexo III).

Biodeterioração14 │ Ao longo de toda a superfície são visíveis pequenas


manchas escuras de forma generalizada e não uniforme, manchas estas causadas pela

13
Patologia – Uma obra é constituída por diversos componentes, que ao estarem expostos a agentes de
deterioração de diversas origens, podem provocar numerosas alterações nos materiais que a compõem, às
quais se atribui o termo patologias. O estudo das patologias de uma obra consiste na averiguação e estudo
das origens, dos sintomas e da natureza destas alterações. (Giannini, et al., 2008 p. 88)
14
Biodeterioração – Mudança das propriedades do material através de micro-organismos ou por produtos
que estes micro-organismos produzem. O ataque de micro-organismos ocorre sobretudo em componentes
naturais, como as proteínas ou os hidratos de carbono. (Villarquide, 2005 p. 34)

58
presença de micro-organismos orgânicos vegetais, heterótrofos15, fungos (v. fig. 145,
Anexo III).

Excrementos de insetos │ Presença pontual de excrementos de mosca,


dispostos de forma não uniforme pelo verso do suporte.

Deformação pontual │ A deformação que o suporte sofreu, deveu-se


essencialmente ao indevido tensionamento em que a tela se encontrava. Por este motivo
é visível uma pequena deformação junto à aresta superior da grade (v. fig. 148, Anexo
III). A inexistência de alguns elementos de fixação, originaram também a falta de tensão
da tela e por consequência a sua ligeira deformação, sendo visível que os dois vértices
do lado direito da pintura se encontravam soltos (v. fig. 149, Anexo III).

O suporte não apresenta graves níveis de deformação pelo facto de ser uma tela
de linho, é um material que apresenta grande estabilidade quando sujeito a mudanças de
temperatura e humidade relativa (Scicolone, 2002).

Fragilidade e desgaste pontual das bandas │ O suporte apresenta, como já foi


referido anteriormente, um corte irregular, apesar de ser uma tela industrial de compra.
Levanta-se a hipótese de a tela ter sido cortada e engradada pelo próprio artista. Esse
procedimento originou uma maior ocorrência de fragilidade das bandas e a presença de
cortes irregulares ao longo de todas as arestas, nas quais são visíveis rasgões feitos
possivelmente a partir de um corte mecânico (v. fig. 150, Anexo III). No vértice direito
da pintura observa-se um desgaste pontual da tela, este pode dever-se ao mau
acondicionamento da obra, o que originou a fragilidade do suporte (v. fig. 151, Anexo
III).

Oxidação provocada por elementos de fixação metálicos │ Os elementos


metálicos de fixação da tela à grade, neste caso foram utilizadas tachas, encontram-se
em elevado estado de oxidação. A oxidação ocorreu devido a alterações químicas que o
material metálico sofreu com o passar do tempo. Por este motivo, o seu contacto com a
tela provoca a sua oxidação, e por consequência a sua degradação (v. fig. 152, Anexo
III).

Lacunas │ Observam-se pequenas lacunas ao nível das arestas laterais do


suporte, as quais foram provocadas pela colocação e neste caso desaparecimento dos
15
Heterótrofo - São organismos incapazes de produzir matéria orgânica a partir de substâncias
inorgânicas.

59
elementos metálicos de fixação do suporte à grade. Esta extensão de lacunas nas
extremidades resulta na fragilidade das margens da pintura (v. fig. 153, Anexo III).

CAMADA PICTÓRICA │Encontra-se no geral em bom estado de conservação.

Sujidade generalizada │ Em toda a superfície pictórica é visível a acumulação


de poeiras, que originaram o escurecimento generalizado da superfície (v. figs. 154, 155
e 156, Anexo III).

Presença de elementos externos à composição │ Observou-se a presença de


materiais posteriores à realização da obra que terão sido provenientes do contacto com
outras obras ou materiais de possíveis acondicionamentos. Verifica-se sobre a zona
central da superfície pictórica (área de cor preta), a presença de resíduos de tinta (verde
e rosa) e a presença de um elemento à base de pasta de papel (v. fig. 157, Anexo III). A
sua presença supõe-se que se deva à sobreposição de materiais e à sua inevitável
fricção, possivelmente devido ao contacto com outras obras, ao mau manuseamento e
acondicionamento da obra, tendo em conta que esta foi encontrada no atelier do artista
entre outras obras de tamanhos variáveis, sem qualquer tipo de acondicionamento.

Desgaste pontual │ Nas extremidades da pintura, em particular na extremidade


inferior da composição, são visíveis desgastes pontuais da camada de óleo vermelha.
Deduz-se que poderá ter ocorrido devido a tensões resultantes da pressão feita pela
grade ao ter sido consecutivamente apoiada no chão (v. figs. 160 e 161, Anexo III). É
também visível desgaste em algumas zonas pontuais da superfície da camada pictórica,
que pode ter ocorrido devido à sobreposição desta obra com outras, mau manuseamento
e acondicionamento.

Biodeterioração │ São visíveis manchas de tonalidade escura e de tamanho


variável ao longo da superfície de cor preta e na zona superior da composição onde
predominam os brancos, provocando alterações na cor e no brilho da tinta. As
infestações existentes foram causadas por micro-organismos orgânicos vegetais,
heterótrofos, fungos. E foram provocadas possivelmente devido a condições ambientais,
não controladas, onde a peça se encontrava armazenada, como a exposição a níveis de
humidade não controlada e a mau acondicionamento (v. fig. 158, Anexo III).

60
Excrementos de insetos │ Observa-se a presença de pequenos pontos de cor
escura que foram causados por excrementos de insetos. São visíveis essencialmente na
zona onde está representado o Feto e na zona de fundo da composição onde
predominam os tons claros, que correspondem à zona superior da composição (v. fig.
154, Anexo III).

Alterações de brilhos │ São visíveis variações de brilho dispersas de forma não


uniforme ao longo da superfície onde foi aplicada a cor preta. Estas variações podem ter
surgido devido a uma maior quantidade de médio16 utilizado durante a produção da
obra, ou devido a uma mistura não uniforme do médio com a tinta de óleo, originando
zonas de maior e menor brilho. Por outro lado, o facto de a pintura não possuir camada
de preparação pode ter influenciado a forma como a tinta foi aplicada, podendo esta não
ter sido aplicada de uniformemente devido à forma como a tela absorvia a tinta, e por
consequência ter influenciado a sua densidade ao longo da superfície e a forma como
esta reflete a luz (v. fig. 159, Anexo III).

GRADE │ Encontra-se em bom estado de conservação geral. É a grade original e não


sofreu nenhum tipo de alterações.

Sujidade superficial │ A grade possui uma camada superficial de poeiras e


também a presença de várias marcas de pigmento de tonalidade branca. São marcas
feitas possivelmente a pincel e em forma de salpicos, depreende-se que o artista aplicou
parte da camada de tinta de óleo de cor branca de forma irregular no verso, com a grade
colocada, devido a estas marcas de tinta serem mais visíveis na trave de reforço ao
centro e nas traves laterais nas zonas interiores da grade.

Ausência de cunhas │ É visível a ausência de onze das doze cunhas originais,


originando inevitavelmente a perda de tensão da tela, podendo também originar a sua
deformação, colocando em risco a estabilidade da obra (v. figs. 162 e 163, Anexo III).

16
Médio – Também designado de Aglutinante.

61
4.3. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO

Após ter sido realizado um estudo detalhado da obra, foi possível realizar uma possível
proposta de tratamento para o caso que a obra apresenta. A proposta que se realizou
seguiu os princípios éticos intrínsecos à atividade de conservação e restauro17.
Pretendendo-se com a intervenção proposta, restabelecer a unidade potencial da obra,
preservando a sua autenticidade e o seu carácter e importância histórica.

As pinturas que foram realizadas durante as vanguardas do século XX, são obras nas
quais muitas vezes a experimentação é uma constante. Os procedimentos artísticos e a
utilização de técnicas pouco convencionais, embora intencionais por parte dos artistas,
muitas vezes estão na origem das alterações precoces dos materiais utilizados na sua
criação, que se verificam em várias pinturas deste século de exuberância artística.

No caso de estudo apresentado, a obra Feto, conta com 50 anos de existência, mas
apesar de se enquadrar na situação de obras que referi anteriormente e de ser um
exemplo de experimentação, concebida durante o percurso artístico de Jorge Pinheiro,
não apresenta sintomas de degradação provenientes dos procedimentos pictóricos ou da
escolha de materiais que o artista levou a cabo. Neste caso, o cuidado na escolha dos
materiais e na sua compatibilidade, foi revelado pelo artista ao longo da entrevista. A
sua degradação não se deve possivelmente ao seu processo e incompatibilidade
material, mas sim ao acondicionamento e armazenamento ao longo da sua existência,
provavelmente devido à falta manutenção, e também ao facto de esta ter sido uma obra
de pura exploração técnica, num período de transição entre fases artísticas, o que
originou o seu armazenamento, pelos ateliers que o artista frequentou até aos dias de
hoje.

Foi essencial para um correto diagnóstico e realização da proposta de tratamento, a


averiguação da natureza dos diferentes materiais que constituem a obra, assim como o
seu processo de fabrico. Como tal, foram realizados exames de área detalhado com
métodos de observação complementares, como a observação com luz rasante e luz
ultravioleta, utilizando a fotografia, e a análise por microscopia ótica (v. figs. 139 - 145,
Anexo III). Foi também realizada uma entrevista ao próprio artista, deste modo foi
possível chegar a conclusões sobre a metodologia que se iria implementar.

17
Princípios éticos consultados em – E.C.C.O. Profesional Guidelines. (E.C.C.O. (European
Confederation of Conservator-Restorers' Organisations), 2002)

62
Pretende-se com o tratamento proposto, a limpeza18 e interrupção imediata dos
processos de degradação ativos na obra, com o intuito de recuperar a sua estabilidade
material e leitura integral, restabelecendo a unidade potencial da obra, de modo a que
possa desempenhar novamente o seu papel expositivo. O que se pretende é a execução
de uma intervenção que atue sobre a obra com a finalidade de retardar futuras
deteriorações, propondo-se assim, a estabilização19 dos materiais.

Toda a proposta de intervenção foi discutida e orientada pelos profissionais em


conservação e restauro da empresa Argo.

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 A intervenção terá início com a realização de testes de solventes20 com vista a


limpeza da superfície pictórica e respetivos testes de concentração, com o intuito
de verificar se os solventes que irão ser utilizados, na limpeza da camada
pictórica não se tornam demasiado nocivos quando utilizados.
 Limpeza mecânica21 frente e verso, de modo a remover as partículas sólidas,
isto é, a sujidade superficial.
 Limpeza da camada pictórica por via húmida22 e por via química23, com a
intenção de remover sujidades que se encontrem mais impregnadas, como
poeiras, elementos exteriores à obra e manchas causadas por infestações
produzidas por organismos orgânicos vegetais, fungos.

18
Limpeza - Intervenção de caráter principalmente estético, que consiste em eliminar qualquer tipo de
objetos exteriores à obra, como as sujidades superficiais ou impregnadas e os vernizes opacos ou
amarelecidos, de modo a conseguir uma melhor leitura da obra. (Giannini, et al., 2008 p. 124)
19
Estabilização – Operação aplicada nos materiais de uma obra que tem como objetivo eliminar a
fragilidade que apresentam, tornando-os mais consistentes. A estabilidade designa a resistência intrínseca
das obras, ou das combinações de materiais que delas fazem parte, em relação às tensões normais de
deterioração. (Giannini, et al., 2008 p. 88)
20
Solvente – Líquido de diversas naturezas, que ao ser disperso homogeneamente com substâncias
solidas, liquidas ou gasosas, denominadas de soluto, forma soluções. (Giannini, et al., 2008 p. 72)
21
Limpeza mecânica – Entende-se como uma limpeza superficial, atuando apenas sobre sujidades pouco
aderidas. (Villarquide, 2005 p. 170)
22
Limpeza por via húmida – Intervenção que se efetua mediante extração aquosa. Este tipo de limpeza só
se realiza mediante o grau de adesão que a capa ou objeto a eliminar apresenta (Villarquide, 2005 p. 168)
23
Limpeza por via química – Intervenção que se efetua com solventes que levam os materiais resinosos a
um estado de aspeto de cola fácil de eliminar, ou com reativos que rompem com as cadeias moleculares
das capas que se querem eliminar. (Giannini, et al., 2008 p. 124)

63
 Testes de adesivos24 que serão aplicados, com vista a realização de um facing25
e de bandas de tensão, apurando qual o adesivo26 e a concentração que mais se
adequa a cada um dos casos.
 Realização do facing, com o intuito de proteger a camada pictórica, durante o
processo de tratamento do suporte.
 Remoção dos elementos metálicos oxidados, tachas. Tornando-se inevitável
desengradar a obra, removendo-se a grade.
 Limpeza mecânica do verso, de modo a remover sujidade superficial como
partículas solidas e poeiras.
 Planificação das bandas da pintura, de modo a conseguir-se eliminar as
deformações que esta apresenta.
 Aplicação de bandas de tensão, a sua realização deve-se ao mau estado de
conservação em que as bandas se encontram e devido à falta de tecido que
apresentam, consequência do corte irregular que foi executado no suporte, este
fator não possibilita engradar novamente a pintura depois de se desengradar,
com o intuito de tratar o suporte.
 Limpeza da grade, realização do boleamento das arestas e realizar as cunhas
em falta, utilizando como molde a única cunha original que a obra continha.
 Remoção do Facing, através de uma limpeza por via húmida.
 Engradamento da obra, utilizando elementos de fixação inoxidáveis,
prevenindo a sua oxidação prematura.
 Desinfestação27 do suporte, através da aplicação de um fungicida, pretendendo
com o tratamento prevenir o aparecimento futuro de novas atividades biológicas.
 Preenchimentos das lacunas pontuais, existentes nos vértices da pintura ao
nível do suporte, e respetivo nivelamento das zonas preenchidas.

24
Testes de adesivos - Teste que tem como função averiguar a compatibilidade e resistência do adesivo
quando em contacto com os materiais da pintura.
25
O processo de realização do facing consiste em cobrir a superfície da obra com um papel protetor
colado por meio de um adesivo apropriado às características da obra. (Villarquide, 2005 p. 155)
26
Adesivos - Substância que estabiliza uma união sólida entre as superfícies em contacto. Os adesivos
dividem-se em naturais e sintéticos e classificam-se segundo a sua capacidade para permanecerem rígidos
ou alongarem-se, e a sua resistência ao color. (Giannini, et al., 2008 p. 18)
27
Desinfestação – Libertar os materiais de infestações de organismos que podem encontrar as condições
ideais para se estabelecerem-se e prosperarem. (Giannini, et al., 2008 p. 70)

64
 Reintegração cromática28 com o objetivo de recriar a unidade da imagem,
restabelecendo-se novamente a leitura da obra, que se encontra alterada devido
aos desgastes pontuais existentes ao nível da superfície pictórica.
 Proteger as zonas reintegradas, aplicando-se uma camada protetora nas zonas
reintegradas, evitando deste modo a sua alteração cromática com a passagem do
tempo.
 Reposição das cunhas em falta na grade, com o propósito de corrigir a tensão
que a tela necessita.
 Tratamento de um número simbólico de tachas, que se encontram oxidadas,
pretendendo guardar como exemplo o que seriam os elementos de fixação
originais da tela. O tratamento consistirá na limpeza, estabilização e proteção
dos elementos metálicos.

28
Reintegração cromática – Na prática do restauro pictórico na arte contemporânea, a reintegração
cromática tem como objetivo recriar a unidade da imagem alterada ou perdida. Nos casos em que é
possível, reconstroem-se as lacunas existentes sobre bases filológicas tentando restabelecer a forma
figurativa ou o ornamento que falta, com o intuito de recuperar a legibilidade e compreensão da obra.
(Giannini, et al., 2008 p. 174)

65
4.1.RELATÓRIO DE INTERVENÇÃO DE CONSERVAÇÃO E RESTAURO29

Data de início da intervenção: 27 de Janeiro de 2015

É da responsabilidade do conservador-restaurador, assegurar que as obras cheguem nas


melhores condições às gerações futuras. Devido às variadas condições de cada obra, a
decisão de intervencionar uma obra é tomada tendo em consideração diversos fatores,
que incluem, nomeadamente as suas características intrínsecas (Bomford, et al., 2009a).

Ao longo da abordagem da metodologia apresentada no capítulo anterior, alguns


aspetos tiveram que ser modificados, devido a questões que foram surgindo,
relacionadas com a incompatibilidade de determinados tratamentos com os materiais
que foram utilizados na obra, cujas especificidades e patologias que apresentam
determinam cuidados particulares. As alterações foram realizadas, com o intuito de
optar sempre por uma solução que se mostrasse o mais apropriada possível de acordo
com a obra e a especificidade do problema que apresenta, sempre com o intuito de
salvaguardar a integridade física da obra, sem nunca colocar em risco a sua importância
histórica e artística.



A intervenção foi iniciada com a realização de uma limpeza mecânica a nível


superficial, da frente e do verso da pintura (v. figs. 164 e 165, Anexo III), utilizando um
aspirador e um pincel largo de pelos macios. O processo teve o intuito de remover
sujidade e poeiras presentes na superfície de ambas as faces da pintura. Ao longo da
limpeza mecânica foi visível que o pigmento vermelho, que anteriormente já dava
provas de pouca resistência mecânica, também apresentava sinais de falta de coesão
quando em contacto com os pelos do pincel. A falta de coesão do pigmento vermelho
pode dever-se à perda de aglutinante utilizado, acentuada pelo facto de a obra ter sido
executada diretamente sobre o suporte. Uma das consequências desta técnica de
produção é o estado de pulverulência30 da camada pictórica (Villarquide, 2005).

29
Ver como complemento aos resultados abaixo apresentados, o anexo: Registo Fotográfico da
Intervenção de Conservação e Restauro, Anexo III, pp. 131 – 139, figs. 164 – 211.
30
Pulverulência – Denominação dada a uma superfície cromática cujo aglutinante perdeu a sua
capacidade de coesão, perdendo a sua função e fragmentando-se em micropartículas. (Giannini, et al.,
2008 p. 165)

66
Após se verificar que o pigmento vermelho apresentava pouca coesão, a proposta de
realização direta de um facing tornou-se indesejada. O tratamento seria realizado com o
intuito de proteger a camada pictórica, durante o processo de tratamento do suporte.
Depois de se concluir que este procedimento seria prejudicial à obra e poderia causar o
destacamento do pigmento vermelho, optou-se por não o realizar.

Após a limpeza mecânica a nível superficial, de ambas as faces da pintura, foram


realizados testes de humidade à camada pictórica e ao suporte. Os testes tinham como
intuito verificar a resistência e estabilidade dos materiais.

Realizou-se primeiramente o teste de resistência aos pigmentos e aglutinantes 31,


realizado com água destilada32. O teste abrangeu todas as cores presentes na obra, tendo
o cuidado de começar pelas tonalidades mais claras, as quais à partida teriam um maior
nível de resistência. Todas as cores à exceção do vermelhão apresentaram boa
resistência mecânica e química.

Foram realizados testes de solventes antes de iniciar a limpeza da superfície pictórica,


com o intuito de averiguar quais as misturas de solventes mais adequadas para a limpeza
da obra. Após vários testes, tendo o cuidado de começar por solventes com menos
capacidade de penetração, dissolução e maior poder de evaporação, determinou-se que
seriam utilizados diferentes solventes para cada uma das zonas de cor. Decisão
fundamentada pelo facto de cada zona de cor apresentar diferentes alterações.

A superfície pictórica foi dividida em quatro áreas de tratamento diferentes, o critério de


seleção consistiu na divisão da superfície por zonas de cores, delimitando o preto, o
vermelhão, a zona de tons claros (branco amarelecido, branco e azul) e a figura do feto
(mistura de vermelhos e brancos). Na zona de cor preta, os solventes testados que
apresentaram melhores resultados, foram a mistura de água destilada e etanol33 (200
ml:10 gotas). O solvente que mostrou ser mais eficaz quando em contacto com o
pigmento vermelho, o qual demonstrou fraca resistência aos testes de humidade, foi o

31
Aglutinante – Ou ligante, é um material que possui a característica de promover a coesão entre os grãos
de pigmento em forma de pó. O aglutinante fornece propriedades de coesão e adesão, entre a cor e as
camadas subjacentes. (Giannini, et al., 2008 p. 20)
32
Água destilada – Água que não contem substâncias não voláteis (sais, sólidos e outras substancias)
através da passagem do estado liquido ao gasoso (ebulição) e vice-versa (condensação). Consultado em:
Giannini, & Roani, 2008, p.21.
33
Etanol – Ou Álcool Etílico, comummente conhecido por álcool, substância líquida, incolor e volátil.
Composto orgânico que contem um ou mais grupos hidróxidos. (Giannini, et al., 2008 p. 23) O etanol
utilizado continha uma concentração a 96%.

67
White Spirit34, o qual foi utilizado na zona delimitada pela cor vermelha e na zona de
representação do feto. Relativamente à zona de tons claros, zona do fundo da
composição, definiu-se que se iria realizar uma limpeza por via húmida, utilizando
apenas água destilada.

Depois de concluídos todos os testes de solventes com vista à limpeza da superfície


pictórica, foi possível realizar o teste de humidade ao suporte da pintura, o qual
demonstrou grande estabilidade quando em contacto com a água destilada, o que se
pode dever ao facto da fibra de linho apresentar grande resistência e estabilidade
(Villarquide, 2004).

Iniciou-se o processo de limpeza por via húmida e por via de solventes da camada
pictórica. A ordem e o método de limpeza foi definido de acordo com as características
de cada cor. Quando a limpeza é realizada antes de qualquer tipo de tratamento na
pintura, é necessário ter em atenção se a pintura se encontra em bom estado e se mostra
boa adesão da camada pictórica. O método de limpeza dependerá do tipo de elementos
que se pretendam eliminar.

O processo de limpeza foi dividido e executado por quatro áreas de tratamento, como já
foi mencionado anteriormente. Devido às diferentes características de cada cor, foi
necessário utilizar diferentes solventes. A limpeza da superfície da pintura foi realizada
com a obra posicionada na vertical, de modo a facilitar a execução dos tratamentos,
tornando também o processo mais seguro, evitando a elevada tensão superficial35
provocada por excesso de humidade sobre a camada pictórica, não intencional, o que
poderia provocar o aparecimento de manchas e marcas de escorrimentos ao longo da
camada pictórica. O tratamento de limpeza foi efetuada ao longo de toda a superfície e
tratou-se de uma intervenção controlada, gradual e essencialmente a nível apenas
superficial, sem nunca se tornar demasiado abrasiva e nem contínua.

No caso da zona de cor preta, a mistura de solventes utilizada, de água destilada e etanol
(200 ml:10 gotas), teve como função atuar não só como agente de limpeza mas também
como meio de desinfeção, operação que tinha por vista a eliminação das manchas que se
encontram ao longo da superfície da camada pictórica, causadas por fungos. Foi

34
White Spirit – É um Hidrocarboneto saturado, produzido através da destilação do petróleo. Produto
formado através da mistura de hidrocarbonetos, predominantemente alifáticos, com um conteúdo variável
de hidrocarbonetos aromáticos. (Villarquide, 2005 p. 456)
35
Tensão superficial – Força que atua sobre a superfície de um líquido e tende a reduzir a sua área de
expansão. (Giannini, et al., 2008 p. 199)

68
possível também a eliminação de alguns dos elementos de pasta de papel, após o seu
humedecimento, que facilitou a sua posterior remoção mecânica (v. fig. 170, Anexo III).

Em seguida foi realizada a limpeza da área delimitada pelo pigmento vermelho, no qual
era evidente o seu estado de pulverulência, e que demonstrou fraca resistência aos testes
de humidade. O solvente que demonstrou os melhores resultados, sem se tornar
demasiado abrasivo quando em contanto com a superfície, foi o White Spirit, o qual foi
utilizado com o intuito de remover apenas a sujidade superficial (v. fig. 166, Anexo III).
A zona onde se encontra a representação do feto também demonstrou fraca resistência
quando em contacto com humidade. Optou-se também por uma limpeza com White
Spirit, pois nesta zona é visível a utilização, do mesmo pigmento vermelho misturado
com outras cores (v. figs.167 e 168, Anexo III).

Por fim, realizou-se a limpeza da zona de tons claros, zona do fundo da composição, na
qual apenas se realizou uma limpeza por via húmida, utilizando água destilada. A
intenção foi de apenas remover as poeiras e sujidade impregnadas, eliminando o
escurecimento pontual que a obra continha, restabelecendo a cor original de tons mais
claros (v. fig. 169, Anexo III).

Após terminada a limpeza por via húmida, realizou-se apenas em algumas zonas
pontuais a limpeza mecânica utilizando o bisturi, removendo os excrementos de insetos,
existentes ao longo da zona superior da composição e a removendo os elementos
exteriores à composição da obra, como os elementos de base de pasta de papel mais
impregnados. A presença de outros pigmentos de cor verde e cor-de-rosa forte não
foram removidos, inicialmente determinou-se que poderiam fazer parte da história da
obra, mas após algum tempo de reflexão chegou-se à conclusão que se deviam a um
mau acondicionamento que a obra teria sofrido anteriormente, ao estar em contacto com
outros materiais.

Dada por terminada a limpeza de superfície pictórica, procedeu-se com a consolidação36


das zonas onde o pigmento vermelho foi utilizado pelo artista, zona de vermelho e zona
de representação do feto.

36
Consolidação - Operação que tem como função devolver a coesão e a estabilidade a um material.
Realiza-se em caso de perda de coesão da camada pictórica ou de um elemento da estrutura da obra,
quando este demonstra a perda de consistência, de elasticidade, e da resistência a esforços mecânicos.
(Giannini, et al., 2008 p. 59)

69
Quando a pintura apresenta problemas de pulverulência e falta de coesão entre os
pigmentos, causado pela falta de capacidade do aglutinante, é introduzido um
consolidante que penetre profundamente no estrato pictórico alterado, preenchendo os
vazios existentes e substituindo o aglutinante que já não cumpre a sua função
(Villarquide, 2005).

O consolidante escolhido foi um Metilcelulose37 o qual foi testado, no intuito de


averiguar se ocorria alguma diferenciação de brilhos do pigmento, o que não se
verificou. Deste modo foi aplicada uma concentração de Metilcelulose em água
destilada tépida (1:400), o consolidante penetra por capilaridade, necessitando de estar
fluído e pouco viscoso, aplicando-se por esta razão muito diluído. Existem diversas
formas de aplicar o consolidante, mas neste o método escolhido foi, através de um
sistema de pulverização utilizando um nebulizador38 (v. figs. 171 e 172, Anexo III), é
importante que a impregnação seja o mais homogénea possível para evitar tensões, ou
ficar na superfície (Villarquide, 2005). O consolidante foi aplicado num total de três
vezes, o que se revelou suficiente quando se realizaram novamente os testes de
resistência.

Após ter concluído o tratamento de consolidação, iniciou-se o tratamento do suporte,


para se poder prosseguir com o desengradar da pintura, facilitando também o tratamento
do suporte da pintura. Devido às suas grandes dimensões, foi necessário colocar a
pintura sobre uma superfície lisa na qual a superfície pictórica ficasse totalmente
assente. Em seguida foram removidos, todos os elementos metálicos de ligação, tachas
(v. figs. 173 e 174, Anexo III). Após terem sido removidos todos os elementos de
fixação foi possível proceder com a remoção da grade e colocação desta na vertical de
modo a que pudesse também ser intervencionada (v. fig. 175, Anexo III).

Em seguida procedeu-se com o tratamento do suporte, realizou-se uma limpeza


mecânica do verso, através da utilização de um aspirador e uma trincha, e a limpeza
através de aparas de borracha, de modo a remover a sujidade superficial, como poeiras e
resíduos pouco impregnados (v. figs. 176 e 177, Anexo III). Devido ao facto de a
limpeza por via mecânica do suporte não se ter mostrado suficientemente eficaz, foi
37
Metilcelulose – Frequentemente utilizado como adesivo, devido aos bons resultados que apresenta.
Possui um especto transparente e apresenta um bom nível de envelhecimento, expeto quando sujeita a
humidade relativa alta. Possui uma resistência média/boa a fungos e a microrganismos. Apresenta muito
bons resultados quando aplicado em pinturas de características mate, portanto, muito frequente em
tratamentos de arte moderna. (Villarquide, 2005 p. 658)
38
Nebulizador - Aparelho que serve para pulverizar um líquido em pequenas gotas.

70
necessário proceder com uma limpeza por via húmida, com o intuito de desinfetar e
eliminar sujidades mais impregnadas e manchas causadas por fungos. Para isso foi
testada previamente e utilizada uma mistura de água destilada e etanol (200 ml:10
gotas), solução que se apresentou eficaz e proporcionou os resultados desejados (v. figs.
178 e 179, Anexo III).

Após se ter concluído o processo de limpeza obra, foi possível começar a preparar as
bandas para posteriormente se proceder com a sua aplicação. A limpeza prévia da tela é
essencial para que ocorra uma boa adesão do adesivo que se irá utilizar para fixar as
bandas de tensão à tela original.

As bandas de tensão consistem em tiras de tela (cortadas e preparadas previamente) que


são fixadas por todo o perímetro do verso da tela e são aplicadas com o intuito de
reforçar as bandas originais da obra, este tratamento é geralmente utilizado quando as
bandas originais se encontram em mau estado de conservação e/ou devido à falta de
tecido, como sucede no caso em estudo, não possibilitando engradar de novo a pintura
(Villarquide, 2005). Deste modo é necessário proceder com a aplicação de bandas de
tensão para se poder realizar o tratamento, foi necessário preparar quatro tiras de tela,
com o tipo de tela que mais se aproximava com a tela que o artista utilizou, como tal
utilizou-se uma tela de linho de espessura média, conferindo o reforço necessário, sem
adicionar grande espessura e peso à zona de dobra do suporte. A tela escolhida foi
lavada com o intuito de remover a goma e posteriormente cortada e desfiada (v. figs.
180-183, Anexo III). O adesivo escolhido para a aplicação das bandas foi uma resina
acrílica, Beva 371 em gel®39, esta escolha recai sobre a sua boa estabilidade, a sua
baixa penetração e a sua elevada resistência e flexibilidade (Villarquide, 2005). O
adesivo foi aplicado apenas nas bandas de tensão que se iriam aplicar e foi deixado a
secar, o processo de secagem do solvente deve ser completo, evitando deste modo o
aparecimento de manchas na tela (v. fig. 184, Anexo III). Após ter secado e adquirido
consistência, foi possível proceder com o acerto das franjas nas zonas onde o adesivo se
encontrava em excesso.

No decorrer do processo de preparação das bandas, procedeu-se também com a


planificação, eliminando as deformações que as bandas originais do suporte

39
Beva 371 em gel® - É uma resina acrílica disponível em gel, adequada para consolidações e fixações,
proporcionando a coesão e a adesividade necessárias no interior de cada camada, e entre estas. Apresenta
uma boa elasticidade química, pode ser reativada a temperaturas baixas (65° C), apresenta um baixo nível
de viscosidade e é também possível controlar o seu nível de penetração. (Scicolone, 2002 p. 92)

71
apresentavam. Este melhoramento das bandas foi realizado por pressão. O tratamento
consistiu na humidificação e hidratação das zonas onde a tela se apresentava vincada.
De seguida aplicou-se calor, através da utilização de espátula quente, procedimento que
foi protegido com a utilização de uma folha de papel siliconado, evitando assim o
contacto direto da espátula com o suporte (v. fig. 185, Anexo III). Por fim foram
aplicados pesos sobre as zonas deformadas, de modo a auxiliar a sua planificação (v.
figs. 186, Anexo III).

Ao longo dos tratamentos referenciados, a grade da pintura foi simultaneamente tratada.


Iniciou-se o tratamento com a limpeza da estrutura, utilizando-se uma mistura de água
destilada e etanol (2:3). O intuito de utilizar esta mistura foi que além de se proceder
com a limpeza, também se efetuou com a desinfeção da grade, eliminando atividades
biológicas que pudessem existir (v. fig. 187, Anexo III). Deu-se seguimento ao
melhoramento da grade, boleando as arestas vivas que possuía (v. figs. 188 e 189,
Anexo III). Realizaram-se também as onze cunhas que se encontravam em falta,
utilizando como referência a única cunha original que a grade possuía (v. fig. 162,
Anexo III). As cunhas novas foram realizadas em madeira de casquinha vermelha por
ser uma madeira que apresenta uma maior resistência a ataques biológicos (v. fig. 190,
Anexo III).

Por fim, realizou-se a desinfeção do suporte, operação com vista à eliminação da


biodeterioração provocada por fungos que se encontravam ainda ativos, através de um
sistema de pulverização e de uma mistura de água destilada e etanol (2:3), aplicada de
forma uniforme pelo verso da obra utilizando um borrifador manual (v. fig. 191, Anexo
III). O principal objetivo consiste em alcançar uma boa impregnação de forma uniforme
e controlada, com o intuito de prevenir o aparecimento futuro de novas atividades
biológicas.

Dada por terminada esta fase, iniciou-se a aplicação das bandas, de modo a conferir
maior resistência às margens da pintura e possibilitar o engradamento da tela. O
processo de aplicação das bandas teve como intuito reforçar e consolidar o suporte
original . Consolidaram-se também as lacunas existentes ao nível das arestas laterais do
suporte, as quais foram pelos elementos metálicos que se encontravam oxidados e que
tinham a função de fixar o suporte à grade. Também são visíveis pequenas lacunas em
dois dos vértices da tela, devido ao contacto com o vértice da grade, o que provocou o
desgaste da tela. A extensão de lacunas nas extremidades resultou na fragilidade das
72
margens da pintura, além de que o contacto das tachas com a tela provocaram a
oxidação pontual do suporte. Esta consolidação ocorreu através da aplicação do adesivo
nas zonas fragilizadas.

O processo de aplicação das bandas à pintura será por meio de ativação do adesivo de
Beva 371 em gel®. Para se proceder com o processo de adesão teve que se aplicar calor,
através da utilização de uma espátula quente a aproximadamente 65°C. O calor fez com
que o adesivo amolece-se, e as duas superfícies se unissem através de um processo de
impregnação do adesivo, mas sempre mantendo uma viscosidade apropriada para
impedir que impregne demasiado nas telas, algo que acontecerá se a temperatura for
excessivamente elevada. A aplicação de calor através da espátula quente foi aplicada
pelo verso da tela, utilizando papel siliconado de ambos os lados do suporte, de modo a
evitar riscos de queimaduras na pintura (v. fig. 192, Anexo III) (Villarquide, 2005).

O processo de secagem deve acontecer sempre debaixo de pressão, pelo menos até
atingir os 40 °C, baixando a temperatura do adesivo, até se tornar novamente
consistente, assegurando deste modo a união das duas faces (Villarquide, 2005). O
processo foi repetido ao longo de todas as arestas da tela. Os cantos foram ajustados e
acertados, de modo a não permitir que a tela ao cruzar nos vértices se sobrepusesse (v.
fig. 193, Anexo III).

Com a grade e o suporte intervencionados, foi possível realizar o engradamento da


pintura. A fixação da tela à grade foi efetuada com agrafos inoxidáveis posicionados na
oblíqua, do centro para a periferia, em laterais diretamente opostas à grade (v. figs. 194
- 196, Anexo III). O processo foi realizado com agrafos inoxidáveis, retardando a sua
prematura oxidação.

Em seguida foi necessário retificar, aplicando calor e posteriormente pressão, nas zonas
da pintura que sofrerem ligeiros descolamentos e levantaram durante o processo de
engradamento da tela. Seguidamente prosseguiu-se com a aplicação das cunhas,
corrigindo o tensionamento da tela necessário (v. fig. 197, Anexo III).

Prosseguiu-se a intervenção com o preenchimento de lacunas pontuais, existentes nos


vértices da pintura ao nível do suporte, optou-se pela utilização de uma preparação
sintética de tom branco, Modostuc®40, devido às características que o material de

40
Modostuc® – Pasta sintética de tonalidade branca, usada como material de preenchimento.

73
preenchimento apresenta, sendo um material estável de fácil modelação e secagem
rápida. Posteriormente realizou-se o respetivo nivelamento das zonas preenchidas.

Foi necessário realizar a planificação de uma zona pontual que apresentava uma ligeira
ondulação, junto à aresta superior da obra ao centro. O processo de planificação da zona
foi idêntico ao processo utilizado na planificação das bandas.

Em seguida foi necessário executar novamente a limpeza por via húmida, apenas da
zona de cor preta, desta vez a limpeza foi realizada apenas com água destilada.
Descobriu-se durante o processo de limpeza da superfície de cor preta que, além de
serem visíveis variações de brilho, esta também possuía uma característica pegajosa,
aderindo facilmente a qualquer substância que a esta se encostasse. Durante o processo
de tratamento do suporte, alguns dos filamentos do papel Reemay, que foi utilizado com
o intuito de proteger a superfície pictórica, acabaram por ficar colados à superfície de
cor preta.

Foi necessário solucionar a característica pegajosa da superfície de cor preta. Em


conjunto com os profissionais da Argo, decidiu-se que a melhor solução seria aplicar
um produto que atuasse diretamente sobre a superfície e anulasse essa propriedade.

O produto escolhido foi Metilcelulose, este foi testado no intuito de averiguar se a


concentração escolhida adicionava brilho à superfície da obra, o que não se verificou.
Deste modo foi aplicada uma concentração de Metilcelulose diluída em água destilada
tépida (1:200). Foi aplicado por meio de impregnação, aplicando-se com um pincel por
cima da zona que se pretende tratar, penetrando no interior da pintura através da
porosidade da obra (v. figs. 198 e 199, Anexo III) (Villarquide, 2005). A capacidade de
penetração do adesivo deve ser homogénea e profunda de modo a não criar tensões ou
ficar à superfície. O consolidante foi aplicado apenas uma vez, o que se revelou
suficiente quando se realizaram novamente os testes de aderência.

Assim o consolidante restitui estabilidade ao material, eliminando a característica


pegajosa da superfície de cor preta e homogeneizando as variações de brilhos que se
encontravam de forma não uniforme ao longo desta.

Por fim, deu-se início à reintegração cromática. O método escolhido, para esta
intervenção foi a reintegração mimética executada com aguarela, por ser um material
com o poder de cobertura pretendido e de fácil remoção. A técnica escolhida teve em

74
conta fatores como, a extensão reduzida do número de lacunas existentes e a forma
simples e tamanho reduzido que apresentavam. Tendo em consideração que as lacunas
se situavam em zonas que não apresentavam qualquer tipo de elemento mais detalhado
de desenho ou figurativo, optou-se pela reintegração mimética41, o que se pretende com
esta reintegração é manter uma leitura homogénea da obra, restabelecendo o seu
potencial expressivo (Bailão, 2011). Um dos fatores que teve elevada importância nesta
decisão foi o facto de que várias pinturas do artista foram anteriormente
intervencionadas pelos profissionais da empresa Argo, e este foi o método escolhido.

Deste modo a reintegração foi executada cobrindo as zonas que continham lacunas,
desgaste da superfície pictórica e os resíduos de tinta que se encontravam sobre a
superfície da obra. Os tons aplicados foram criados de modo a que se aproximassem o
mais possível das cores originais e da característica monocromática de tom mate que a
obra apresenta (v. figs. 200 - 205, Anexo III). Concluído o processo de reintegração, foi
necessário cobrir as zonas reintegradas, aplicando-se uma camada protetora nestas
áreas, evitando também deste modo a sua alteração cromática com a passagem do
tempo, pois a aguarela é uma tinta de muito fácil remoção e que facilmente pode sofrer
alterações de cor. Foi escolhido um verniz de retoque42, o qual ao ser aplicado não
adiciona brilho excessivo à superfície além de que, a sua aplicação produz apenas uma
camada de filme fina e de fácil remoção.

Foi também realizado o tratamento de um número simbólico de tachas que se


encontravam oxidadas, pretendendo guardar como exemplo o que seriam os elementos
de fixação originais da tela. O tratamento consistiu na limpeza, estabilização e proteção
dos elementos metálicos.

O processo teve início com a limpeza mecânica, retirando o excesso de oxidação


utilizando um bisturi, após a limpeza, as tachas foram submersas em Ácido
Ortofosfórico43 em gel diluído em Metylan (1:10), o ácido tem como função atuar sobre

41
Reintegração mimética – Ou ilusionista, consiste na reintegração da cor, da forma e da textura das
zonas em falta com objetivo de ser invisível para o observador comum (Bailão, 2011 pp. 47 - 49).
42
O verniz de retoque utilizado pertence à marca Talens®, e dentro da gama de vernizes já preparados
que existem no mercado, foi o que se revelou mais apropriado, devido às características que apresenta.
Não amarelece tão rapidamente e forma um filme de proteção muito fino e de fácil remoção através da
utilização de White Spirit.
43
Ácido Ortofosfórico - também designado por Ácido Fosfórico, é um ingrediente comum na remoção e
dissolução de ferrugem, e geralmente adquire-se em estado liquido ou em gel. Na maioria das situações,
remove manchas de ferrugem sem dificuldade. A sua aplicação deve ser breve, pois pode causticar a
superfície (Buys, et al., 2011 p. 183).

75
o metal, abrandando o processo de oxidação que se encontra ativo. Em seguida lavaram-
se as tachas em água e mergulhando-se em seguida em acetona. Depois de bem secas,
foi aplicada uma camada de uma mistura de Ácido Tânico44 diluído em água destilada
(1:10), com o intuito de aumentar a estabilidade química do metal e por fim foi aplicada
uma camada de proteção, através da aplicação de uma resina acrílica Paraloid B-72®45
diluído em tolueno46 (18:100) (v. figs. 206 e 207, Anexo III).

Concluiu-se a intervenção com a aplicação de um fungicida em ambas as faces da


pintura. Esta decisão foi tomada em conjunto com os profissionais da empresa Argo,
devido ao facto de se ter chegado à conclusão de que a obra iria ser novamente colocada
no espaço de armazenamento no atelier do artista, de onde foi retirada e voltaria para as
condições ambientais que possivelmente provocariam novamente a sua biodeterioração.
Por esta razão, foi determinado que se aplicaria uma mistura de Nitrato de Econazol47
diluído em água destilada (1:100), numa concentração muito baixa, aplicada através de
um sistema de pulverização utilizando um nebulizador, possibilitando um maior
controlo de todo o processo. O fungicida foi aplicado, num total de três vezes, no verso
e na frente da pintura, o principal objetivo desta aplicação sucessiva, deveu-se ao facto
de deste modo, se poder alcançar uma impregnação o mais homogénea possível, com o
intuito de prevenir o aparecimento futuro de novas atividades biológicas.

A pintura foi acondicionada com espuma de polietileno48 de baixa densidade antes de


ser entregue ao artista. O seu acondicionamento teve como intuito proteger a obra,
amortizando as vibrações e para isolando a pintura das alterações ambientais durante o
transporte e manuseamento da obra (v. figs. 208 e 209, Anexo III) (Calvo, 2006).

44
Ácido Tânico - É um tanino naturalmente encontrado em algumas madeiras, mas também é fabricado
sinteticamente. É geralmente aplicado com a função de atrasar ou retardar corrosão. O ácido tânico
representa um perigo potencial para a saúde, durante a sua aplicação devem ser tomadas as devidas
precauções.
45
Paraloid B-72® - Resina acrílica utilizada como fixativo e consolidante. Transparente, apresenta uma
boa flexibilidade, possui uma boa resistência quando em contacto com água, álcool e petróleo. Possui boa
estabilidade química, sendo muito estável à luz e às radiações ultravioletas. (Giannini, et al., 2008 p. 150)
46
Tolueno – também designado por metilbenzeno, é um solvente aromático, incolor e insolúvel em água.
Apresenta um elevado nível de toxidade e é extremamente volátil. (Giannini, et al., 2008 p. 202)
47
Nitrato de Econazol - É um componente antifúngico, normalmente utilizado no tratamento de
documentos gráficos.
48
A espuma de polietileno que foi utilizada apresenta um bom nível de impermeabilidade quando em
contacto com água e é muito flexível, possui uma baixa com condutividade térmica, ajudando a manter
estável a temperatura da obra, além de contribuir para a absorção do ruído de impacto.

76
Data de fim da intervenção: 31 de Março de 2015

Data de devolução da obra: 06 de Maio de 201549

Figs. 3 e 4 - Frente e Verso, da obra Feto datada de 1965, do artista Jorge Pinheiro, depois da intervenção de
conservação e restauro.

49
Outras obras foram intervencionadas entre o período que passou entre o fim da intervenção da obra o
Feto e a sua entrega ao artista.

77
CONCLUSÃO

Devido às suas características materiais e técnicas, a obra Feto constitui um exemplo


único de um momento de transição no percurso artístico de Jorge Pinheiro. O Feto é o
último exemplo de pintura figurativa, antes de Jorge Pinheiro encerrar o seu ciclo
figurativo e iniciar a sua fase de abstração. No entanto, a obra nunca foi exposta
anteriormente, embora tenha acompanhado o artista para todos os locais em que este
estabeleceu atelier durante a sua vida.

As particularidades desta obra, são a sua exploração técnica e a evidência de que se trata
de um momento de transição entre duas fases muito distintas no percurso artístico de
Jorge Pinheiro. Tais características fazem com que esta seja uma obra a preservar,
principalmente devido à sua relevância e contribuição para a perceção da transição
artística de Jorge Pinheiro, entre a sua primeira fase figurativa, e a sua fase abstrata, que
teve início em meados dos anos 60.

Muitas pinturas realizadas durante as vanguardas do século XX, são obras em que a
experimentação e a efemeridade são uma constante. Os procedimentos artísticos e a
utilização de técnicas pouco convencionais, embora intencionais por parte dos artistas,
estão muitas vezes na origem das alterações precoces dos materiais utilizados na sua
criação.

No entanto, a obra Feto completa este ano 50 anos de existência, e apesar de se


enquadrar na situação de obras que referi anteriormente e de ser um exemplo de
experimentação durante uma transição entre fases artísticas de Jorge Pinheiro, não
apresenta sintomas de degradação provenientes dos procedimentos pictóricos ou da
escolha dos materiais utilizados. Durante a entrevista realizada, Jorge Pinheiro
manifesta que o cuidado na escolha dos materiais e a sua compatibilidade é uma das
suas preocupações, sendo importante referir que atualmente é muito cauteloso na
execução das suas pinturas, utiliza sempre tela de linho, tintas e médio de marca
Rembrandt, não mistura outros materiais, e identifica no verso da obra quais os
materiais que utilizou, e se aplicou ou não verniz.

A causa da degradação da obra não se devia às técnicas utilizadas na sua conceção, nem
à incompatibilidade de materiais, mas sim à falta de acondicionamento e más condições
de armazenamento, a que esteve exposta ao longo da sua existência, resultado que está

78
na origem de esta ter acompanhado o artista por todos os ateliers que este frequentou,
estando assim sujeita a transportes e condições ambientais irregulares.

A intervenção realizada, restabeleceu a unidade potencial da obra, preservando a sua


autenticidade e o seu carácter e importância histórica. A obra apresenta-se agora em
condições de poder ser exposta.

A intervenção a que a obra foi sujeita, incluindo a sua descrição formal e diagnóstico,
constituem importante documentação e contribuem para a ampliação de conhecimento
relativo à identificação das técnicas e materiais das obras de Jorge Pinheiro, e pode ser
relevante em futuras intervenções de conservação e restauro em obras do artista.

É importante referir que a oportunidade de conhecer pessoalmente o artista Jorge


Pinheiro, e o privilégio de poder intervir numa das suas obras, foi para mim uma
experiência muito gratificante. Deste modo, espero que toda a componente teórica desta
dissertação, e a metodologia prática aplicada na intervenção de conservação e restauro
da obra Feto, venham a contribuir para futuros estudos e intervenções de conservação e
restauro em obras do artista Jorge Pinheiro, e em alguns casos pinturas de artistas seus
contemporâneos.

79
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84
PINHEIRO, Jorge. Jorge Pinheiro. Lisboa : Galeria Buchholz.

S. AUTOR. 1954. Catálogo da 7ª Exposição do Grupo Português de Aguarelistas.


Lisboa : Sociedade Nacional de Belas Artes.

PUBLICAÇÕES PERIÓDICAS

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1 de Março de 1983, Jornal de Notícias. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível.
Almada : Casa da Cerca, Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

BRONZE, A. 1969. Quatro Artistas do Porto na SNBA. Lisboa : s.n., 9 de Maio de


1969, Vida Mundial. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da
Cerca, Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

BRONZE, Francisco. 1968. Os Quatro Vintes. Lisboa : s.n., 19 de Dezembro de 1968,


Diário de Lisboa. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca,
Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

CAMPOS, Jorge. 1983. Jorge Pinheiro e o Poder : Uma Hidra de Sete Cabeças. Porto :
s.n., 3-9 de Março de 1983, Norte Popular. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível.
Almada : Casa da Cerca, Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

GONÇALVES, Eurico. 1988. Jorge Pinheiro. Lisboa : s.n., 15-21 de Março de 1988,
Jornal Ilustrado. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca,
Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

GONÇALVES, Rui Mário. 1970. Jorge Pinheiro. Lisboa : s.n., 4 de Abril de 1970, A
Capital. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca, Centro de
Arte Contemporânea, 1994.]

LEARNER, Thomas J. S. 2009. Modern and Contemporary Art, New Conservations


Challenges, Conflicts, and Considerations. Modern and Contemporary Art -
Conservation Perspectives, The GCI Newsletter . n.a. de Outono de 2009, Vol. 24, pp.
5-8.

85
MAGGIO, Nelson. 1982. Alguns Autores a ter em conta. Lisboa : s.n., 17 de Dezembro
de 1982, O Jornal. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca,
Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

MARQUES, Alfredo. 1968. Os Novos Caminhos Estéticos de Jorge Pinheiro. [In Jorge
Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca, Centro de Arte
Contemporânea, 1994.]

PINHEIRO, Jorge. 1989. Excertos de discurso da arte, "Arteopinição". Lisboa : s.n.,


1989. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca, Centro de
Arte Contemporânea, 1994.]

PORFíRIO, José Luis. 1980. Quem diz, diz alguma coisa... Lisboa : s.n., 10 de Maio de
1980, Expresso. [In Jorge Pinheiro - Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca,
Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

S. AUTOR. 1963. S. Título. 25 de Maio de 1963, Jornal de Notícias. [In Jorge Pinheiro
- Retórica do Indizível. Almada : Casa da Cerca, Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

S. AUTOR. 1976. S. Título. Julho de 1976, Opção. [In Jorge Pinheiro - Retórica do
Indizível. Almada : Casa da Cerca, Centro de Arte Contemporânea, 1994.]

WEBGRAFIA

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http://www.artistasunidos.pt/pessoas/artistas-plasticos/860-jorge-pinheiro.

BAILÃO, Ana. 2011. As Técnicas de Reintegração Cromática na Pintura: revisão


historiográfica. Grupo Español de conservacion - International Institute for
conservation of historic and artistic works. [Online] [Citação: 20 de Setembro de 2015.]
http://www.ge-iic.com/ojs/index.php/revista/article/view/41/0.

BASTO, Mariana. 2005. Arte contemporânea: quais os critérios de conservação e


restauro? Argo-cr. Publicações. [Online] Abril, Maio, Junho de 2005. [Citação: 20 de
Setembro de 2015.] http://argo-cr.com/wp-
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CUDELL, Ana; MARQUES, Nicole. Contexto histórico da obra pictórica de Júlio
Pomar. Materiais e Técnicas de Pintores do Norte de Portugal. [Online] [Citação: 25 de
Junho de 2014.]
http://artes.ucp.pt/citar/mtpnp/estudos/arte_contemporanea_01_contexto_historico_julio
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CUDELL, Ana; MARQUES, Nicole. Estudo Científico e Tratamento de Conservação


na pintura "O Cabouqueiro". Materiais e Técnicas de Pintores do Norte de Portugal.
[Online] [Citação: 25 de Junho de 2014.]
http://artes.ucp.pt/citar/mtpnp/estudos/arte_contemporanea_04_estado_conservacao.pdf.

CUDELL, Ana; MARQUES, Nicole. Levantamento do estado de conservação da


pintura "Retrato de Marcel Duchamp" de Albuquerque Mesndes. Materiais e Técnicas
de Pintores do Norte de Portugal. [Online] [Citação: 25 de Junho de 2014.]
http://artes.ucp.pt/citar/mtpnp/estudos/arte_contemporanea_03_estado_de_conservacao.
pdf.

E.C.C.O. 2002. (European Confederation of Conservator-Restorers' Organisations) -


Professional Guidelines. E.C.C.O. (European Confederation of Conservator-Restorers'
Organisations). [Online] 1 de Março de 2002. [Citação: 5 de Setembro de 2015.]
http://www.ecco-eu.org/about-e.c.c.o./professional-guidelines.html.

PINHEIRO, Jorge; PINHARANDA, João. 2012. Teatro da Politécnica inaugura a 7 de


Março a exposição “JORGE PINHEIRO Realmente real”. Gazeta dos Artistas.
[Online] Setembro de 2012. [Citação: 26 de Maio de 2015.]
http://www.gazetadosartistas.pt/?p=2513.

S. AUTOR. As Exposições de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian (1957,


1961 e 1986). Biblioteca de Arte - Fundação Calouste Gulbenkian. [Online] [Citação:
22 de Outubro de 2015.]
http://biblarte.gulbenkian.pt/Biblarte/pt/Coleccoes/UmaObraDaBiblioteca/Obra?a=333.

ENTREVISTAS

PINHEIRO, Jorge. 2015. Entrevista ao artista Jorge Pinheiro - A obra "Feto".


[entrev.] FERNANDES, Margarida; BASTO, Mariana. 21 de Janeiro de 2015. [Anexo
IV]
87
88
ANEXOS

89
I. A OBRA DE JORGE PINHEIRO (1931) EM DATAS

90
91
92
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111
112
II. JORGE PINHEIRO – EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS E COLETIVAS,

PRÉMIOS E REPRESENTAÇÃO EM COLEÇÕES PÚBLICAS50

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EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS

2015
- Matosinhos (Galeria Municipal de Matosinhos), De Tempos a Tempos III
2014
- Porto (Cooperativa Árvore), De Tempos a Tempos
2012
- Lisboa (Teatro da Politécnica), Realmente real
2011
- Oeiras (Palácio do Egipto), Abstração Arte Partilhada
- Porto (Fundação da Juventude), Depois dos Quatro Vintes
- Porto (Galeria Fernando Santos), Realmente real
2010
- Guimarães (Galeria Gomes Alves), Da gaveta dos croquis
- Alcobaça (Armazém das Artes), O Jorge e Eu, Eu e o José, com José Aurélio
2009
- Vila Nova de Gaia (Museu Teixeira Lopes), Discursos sem histórias dentro
- Porto (Galeria Fernando Santos), Coisas Várias
2007
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), Com Pathos
- Guimarães (Galeria Gomes Alves), Desenhos anos 60 e 70
2004
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), O Jogo da Macaca
- Porto (Palacete Viscondes de Balsemão), Os Lugares do Desenho
2003
- Gondomar (Fundação Júlio Resende), O Lugar do Desenho

50
Com base na informação presente no catálogo: MOLDER, Jorge; et al. 2002. Jorge Pinheiro - 1961 -
2001. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian. Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão.

113
2002
- Lisboa (Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão, Fundação Calouste
Gulbenkian), Jorge Pinheiro - Exposição Antológica
1999
- Lisboa (Feira de Arte Contemporânea – Galeria Palmira Suso)
1998
- Madrid (Galeria Palmira Suso, Arco´98), O sono de Eros
1997
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), O sono de Eros
1996
- Porto (Cadeia da Relação), A Eternidade Agora
- Guimarães (Galeria Gomes Alves), Era uma vez uma Princesa
- Figueira da Foz (Museu Municipal Dr. Santos Rocha), Solus Ipse
- Faro (Galeria Municipal de Arte Trem), Solus Ipse
1995
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), Solus Ipse
- Porto (Galeria Degrau Arte), Anamnese
- Lisboa (Galeria Arte Periférica – Edificio do Centro Cultural de Belém), Anamnese
1994
- Almada (Casa da Cerca - Centro de Arte Contemporânea), Retórica do Indisível
1993
- Porto (Cooperativa Árvore), Retórica do Indízivel
1988
- Porto (Galeria Nasoni), Discurso para uma Mulher da Palestina e o Pão e o Silêncio
1987
- Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), Pinheiro - Obra Gráfica, exposição
integrada no âmbito da IV Exposição Nacional de Gravura
1983
- Braga (Casa Museu Nogueira da Silva), Oito Pinturas da Série Ulisses
- Porto (Coopertiva Árvore), Os Bispos 1976-1981
- Porto (Galeria do Jornal de Notícias), Oito Pinturas da Série Ulisses
1982
- Lisboa (Galeria Quadrum), Os Bispos 1976-1981

114
1978
- Milão (Galeria Morone), Ulisses il percorso e la fuga
1976
- Lisboa (Galeria Quadrum), Os Ensaios - Os Mapas
- Porto (Galeria Módulo), Os Ensaios - Os Mapas
1973
- Porto (Mini Galeria)
1972
- Óbidos (Galeria Ogiva), 9 variações sobre um tema
1970
- Lisboa (Galeria Buchholz)
- Porto (Galeria Alvarez)
1968
- Lisboa (Galeria Buchholz)
1964
- Porto (Galeria Divulgação)
1963
- Porto (Escola Superior de Belas-Artes do Porto)
1958
- Porto (Centro Transmontano)

EXPOSIÇÕES COLETIVAS

2012
Lisboa (Museu do Chiado), 30 anos Prémios AICA
2010
- Almada (Casa da Cerca), Processo e transfiguração -19 Junho a 05 de Setembro
- Alcobaça (Armazém das Artes) O Jorge e eu eu e o José
2009
- Lisboa (Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão, Fundação Calouste
Gulbenkian), Anos 70 Atravessar Fronteiras
- Porto (Museu de Serralves), Serralves 2009 - A colecção

115
2008
- Póvoa de Varzim (Biblioteca Municipal Rocha Peixoto), Da Escrita à Figura -
Desenhos da Fundação de Serralves
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas-Artes), Escultura com Afectos
2007
- Alcobaça (Armazém das Artes), Escultura com Afectos
- Lisboa (Museu do Chiado), Anos 60, Momentos transformadores. Sec. XIX e XX,
- Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), 50 Anos de Arte Portuguesa
2006
- São João da Madeira (Centro Cultural de S. João da Madeira), Da Escrita à Figura,
Desenhos da Colecção da Fundação de Serralves.
- Lisboa (Assembleia da República), O Poder da Arte, Serralves na Assembleia da
República.
- Lisboa (Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa), Aula Extra
2005
- Lisboa (Palácio Galveias), Paisagens - 250 Anos de Belas-Artes
- Porto, Paisagens - 250 Anos de Belas-Artes
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), Arte Lisboa
- Guimarães (Centro Cultural de Vila-Flor) Da Escrita à Figura, Desenhos da colecção
da Fundação de Serralves
- Vila Nova de Cerveira, XII Bienal de Vila Nova de Cerveira (artista homenageado)
- Algés (Palácio Miramar), O Plano Atravessado - Obras da Colecção do Museu de
Serralves
2004
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), Arte Lisboa´2004
2003
- Lisboa Arte Lisboa´2003, Galeria Palmira Suso,
- Cascais (Centro Cultural de Cascais - Fundação D. Luís I), Diálogo (com Rui Sanches)
- São João da Madeira (Centro Cultural São João da Madeira), Diálogo (com Rui
Sanches)
2002
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), Arte Lisboa ´2002
2001
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), Arte Lisboa ´2001

116
2000
- Lisboa (Galeria Palmira Suso), FAC´00
1999
- Madrid (Fundación ICO), Antes y Después de la Revolucion
- Lisboa (Armazém 7), Artistas com Timor
- Macau (Museu de arte de Macau), Tesouros de Portugal
- Porto (Museu de Serralves), Circa 1968
- Lisboa (Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão, Fundação Calouste
Gulbenkian), Linhas de Sombra
1998
- Porto (Edifício da Alfândega) Pessoa e Desenvolvimento - A Arte Contra a Pobreza
1996
- Matosinhos (Galeria Palmira Suso), FAC 96/FORUM 96
1995
- Almada (Casa da Cerca), O Desejo do Desenho
- Porto (Museu dos Transportes e Comunicações), ESBAP/FBAUP
1994
- Caldas da Rainha (Museu José Malhoa), Imagens de Família 1800/1992
- Lisboa (Palácio Galveias), Anos 60: uma Perspectiva
1993
- Seixal (Forúm Cultural do Seixal), Desenho I: Jorge Pinheiro, José Rodrigues,
Manuel Cargaleiro, Rogério Ribeiro e Sá Nogueira
- Portimão (Antigo Mercado Municipal), Colectiva 20+3 (Vinte Finalistas da ESBAL e
Três Professores
1992
- Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), Arte Portuguesa Contemporânea na
Colecção da Fundação Luso-Americana Para o Desenvolvimento
- Vila do Conde (Galeria do Auditório Municipal), 25 Artistas Plásticos
- Porto (Cooperativa Árvore), 100 Anos de Arte no Porto: Subsídios para para uma
Portugalidade Portuense
- Almada (Galeria Municipal de Arte), Conflito e Unidade da Arte Contemporânea
1991
- Viana do Castelo (Centro Cultural do Alto Minho), Exposição Colectiva de Artes
Plásticas

117
- Seixal (XV Festa do Avante), VII Bienal de Artes Plásticas: Aspectos da Arte
Contemporânea Portuguesa
- Caldas da Rainha (IV Bienal de Escultura e Desenho)
- Porto (Associação Industrial Portuense), IV Exposição de Pintura e Esultura da AIP
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), A Gaveta do Artista (Anos 60)
- Braga (Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral, Casa do Crivos), I Exposição
Colectiva de Pintura e Desenho
1990
- Lisboa (GaleriaQuadrum), 17 Anos da Quadrum
- Amadora (Galeria Municipal da Amadora), III Exposição de Gravura
1989
- Porto (Cooperativa Árvore), Os Quatro Vintes nos 25 da Cooperativa Árvore
- Monte Carlo (Fondation Prince Pierre de Monaco), XXIIIèeme Prix International
d´Art Contemporain de Monte Carlo
- Porto (Cooperativa Árvore), Arte & Sábado: Exposição Comemorativa do Primeiro
Aniversário da Revista Sábado
- Almada (Galeria Municipal de Arte), Ver Desenho Hoje: As irresoluções Resolvidas
1988
- Vila do Conde, Mom´Arte
- Vila Franca de Xira, Exposição de Arte Portuguesa Contemporânea
- Lisboa (Galeria Nasoni), Forúm de Arte Contemporânea
- Lisboa (Reitoria da Universidade de Lisboa), Arte e Ciência
- Porto (Cooperativa Árvore), 25 Anos da Cooperativa Árvore
- Porto (Casa de Serralves), Obras da Colecção Particular de Jaime Isidoro
- Madrid (Galeria Nasoni), ARCO 88
- São João da Madeira (Centro Cultural de São João da Madeira), A Década de Setenta
1987
- Lisboa (Galeria Altamira), A Galeria Nasoni na Altamira
- Lisboa (Instituto Alemão), Os Desenhos Realistas - Oito Artistas Portugueses
- Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), Azares da Expressão ou a Teatralidade na
Pintura Portuguesa
- Porto (Mercado Ferreira Borges), III Exposição Nacional de Desenho - Desenhos
Portugueses do Século XX
- Miramar (Hotel Mirasol), IV Salão de Artes Plásticas Rotary Clube

118
- Campinas, (Museu de Arte Contemporânea de Campinas), I Bienal Internacional de
Gravura Campinas
- Porto (Casa de Serralves), Exposição Nacional de Arte Moderna Amadeo de Souza-
Cardoso
1987
- Madrid (Galeria Nazoni), ARCO 87
1986
- Bruxelas (Centre Albert Borchette), Le XXème au Portugal
1985
- Porto (Casa do Infante), Os Quatro Vintes 15 Anos Depois
- Porto/Lisboa (Galeria Nasoni / Galeria de Arte do Casino Estoril) 20 Artistas
Contemporâneos
- Wieslock / Mainz / Offenbach / Munique, Klunster aus Nord Portugal
- Porto (Museu Nacional Soares dos Reis), Os Portugueses e o Mundo
- Lisboa (Atelier 15), Três Artistas do Porto (com Armando Alves e José Rodrigues)
1984
- Lisboa (Galeria Altamira), Exposição de Grupo (com Armando Alves, José Rodrigues,
Mário Américo e Zulmiro de Carvalho
- Fredrikstad, 7 Norske Internasjonale Grafikk Biennale Fredrikstad
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Comemorações do X Aniversário do 25
de Abril
- Porto (Palácio de Cristal), Exposição de Serigrafias
1983
- Porto (Palácio de Cristal), I Exposição Nacional de Desenho
- Mirandela (Museu Municipal Armindo Teixeira Lopes)
- Vila Nova de Cerveira (Pousada de Dom Diniz), Artistas do Porto
- Porto (Galeria Módulo), Artistas do Porto sobre Papel
1982
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Representação Portuguesa na XVI
Bienal de São Paulo
- Bilbao, Arteder 82 - Muestra Internacional de Obra Gráfica
- Viana do Castelo (Centro Cultural do Alto Minho) Miscelânea
- Fredrikstad, 6 Norske Internasjonale Grafikk Biennale Fredrikstad

119
1981
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes) Aspectos da Arte Abstracta Portuguesa
- São Paulo, XVI Bienal Internacional de São Paulo
- Lisboa (Fundação Caloute Gulbenkian), III Exposição Nacional de Gravura
- Baden-Baden, II Biennale der Europaischen Grafik
- Berlim (Galeria Weidendam), Exposição de Desenho e Gravura
1980
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Convenções do Dizer
1978
- São Paulo (Museu de Arte Moderna de São Paulo), Gravura Portuguesa
Contemporânea
- Porto (Galeria Jornal de Notícias), Artistas Actuais do Porto
- Basileia (Galeria Quadrum), Basel Art Fair 78
1977
- Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), I Exposição Nacional de Gravura
- Lisboa, Alternativa Zero
- Brasília / São Paulo / Rio de Janeiro, Arte Portuguesa Contemporânea
- Cagnes Sur Mer, IX Festival International de la Peinture
- Madrid (Palácio de Congressos), Cultura Portuguesa en Madrid
- Basileia (Galeria Módulo), Basel Art Fair 77
- Colónia (Galeria Módulo), Art Fair 77 - A New Section
- Bolonha (Galeria Quadrum), Arte Fiera
- Belgrado, International Exhibition of Arts - Portuguese Paintings and Prints
- Porto (Galeria Módulo), Colectiva de Desenho
1976
- Caracas (Centro de Arte Euro-Americano de Caracas), Pintores Contemporaneos de
Portugal
- Paris (Musée d´Art Moderne de la Ville de Paris), Art Portugais Contemporain
- Roma (Galeria Nazionale d´Arte Moderno), Arte Portoghese Contemporanea
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Exposição de Arte Moderna Portuguesa
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Salão de Abril
1975
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Levantamento da Arte do Século XX no
Porto

120
- Porto (Museu Nacional Soares dos Reis), Levantamento da Arte do Século XX no
Porto
- Paris (Fundação Calouste Gulbenkian), Gravure Portugaise Contemporaine
- Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), Gravura Portuguesa Contemporânea
1974
- Lisboa (Galeria de Belém), Painel Colectivo de Homenagem ao 25 de Abril
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Exposição AICA
1973
- Espinho, Exposição de Arte Moderna
- Bratislava, Bienal Internacional de Bratislava
- Óbidos, (Galeria Ogiva), 9x5 - 5 Inéditos de 9
- Barcelona / Salamanca / Lisboa, Pintura Portuguesa de Hoje- Abstractos e
Figurativos
- Porto (Galeria Espaço), Gravura Portuguesa Contemporânea
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), 26 Artistas de Hoje
1972
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Exposição AICA
- Espinho (Galeria Abel Salazar), Espinho 72
1971
- Óbidos (Galeria Ogiva), Homenagem a Josefa de Óbidos
- Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian), Algumas Obras de Pintura Contemporânea
das Colecções da Secretaria de Estado da Informação e da Fundação Calouste
Gulbenkian
- Porto (Galeria Zen), Os Quatro Vintes
1970
- Óbidos (Galeria Ogiva), 35 Artistas
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Salão de Verão
- Paris (Galerie Jacques Desbrière), Os Quatro Vintes
- Porto (Galeria 2), Exposição de obras favor do TEP
1969
- Caldas da Rainha (Museu José Malhoa), Arte Portuguesa
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Os Quatro Vintes
- Amarante (Biblioteca-Museu Municipal Albano Sardoeira), Cinquentenário da Morte
de Amadeo de Souza-Cardoso

121
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), Exposição BPA
1968
- Óbidos (Galeria Ogiva), Natal 1968
- Porto (Cooperativa Árvore / Galeria Alvarez), Os Quatro Vintes
1967
- 14 Artistas do Porto, Galeria Divulgação, Lisboa
1965
- Guimarães (Sociedade Martins Sarmento), 1º Salão da Primavera
- Amarante (Biblioteca-Museu Municipal Albano Sardoeira), Exposição de Arte
Moderna
1964
- Funchal (Galeria Tempo), Sete Pintores Portugueses
1963
- Porto (Cooperativa Árvore), Exposição Inaugural da Cooperativa Árvore
1960
- Porto, II Exposição Extra Escolar dos Alunos da ESBAP
1959
- Porto / Lisboa / Coimbra, I Exposição Extra Escolar dos Alunos da ESBAP
1958
- Porto, Exposições Magnas da ESBAP
1957
- Coimbra (Galeria O Primeiro de Janeiro), com Isabel Leonor e Maria Conceição
Veloso Salgado
1956
- Porto / Lisboa, 3ª Exposição dos Alunos da ESBAP
1955
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), 8ª Exposição do Grupo Português de
Aguarelistas
1954
- Lisboa, Sociedade Nacional de Belas Artes, XVII Salão de Inverno da SNBA
- Lisboa (Sociedade Nacional de Belas Artes), 7ª Exposição do Grupo Português de
Aguarelistas

122
PRÉMIOS

1954
- Menção Honrosa S. N. B. A.
1969
- Medalha de Prata Cinquentenária da Morte de Amadeo de Souza-Cardoso
1970
- Menção Honrosa do Prémio SOQUIL
1973
- Certificate of Honour – The International Board of Young People (prémio obtido pela
ilustração do livro “O Príncipe que guardava ovelhas” de Luísa Dacosta, Livraria
Figueirinhas, 1971)
1981
- Prémio da III Exposição Nacional de Gravura – Lisboa (Fundação Calouste
Gulbenkian)
1983
- Prémio de Aquisição
- I Exposição Nacional de Desenho – Porto
- (Cooperativa Árvore) Obra Estudo para “O Guarda. O Pão e o Camponês”, 1982
1989
- Prix du Gouvernement Princer de Mónaco
1991
- Prémio da Bienal das Caldas da Rainha

COLEÇÕES PÚBLICAS

Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian – Lisboa


Museu Nacional de Soares dos Reis – Porto
Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado – Lisboa
Museu de Serralves – Porto
Casa Museu Amadeo de Souza-Cardoso – Amarante
Caixa Geral de Depósitos – Lisboa
Ministério da Cultura – Lisboa

123
EDP – Lisboa
Ministério das Finanças – Lisboa
Fundação Luso-Americana - Lisboa

124
III. REGISTO FOTOGRÁFICO DO DIAGNÓSTICO E TRABALHO

DESENVOLVIDO

125
126
127
128
129
130
131
132
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136
137
138
139
IV. ENTREVISTA AO ARTISTA JORGE PINHEIRO – A OBRA FETO

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Margarida Fernandes, Mariana Basto e Jorge Pinheiro

Margarida Fernandes (M.F.): A obra tem como titulo “Feto” e é datada de 1965,
confirma?

Jorge Pinheiro (J.P.): Certo.

M.F.: Em que contexto foi produzida e qual a razão para a sua criação?

J.P.: Ora bem, era mesmo esse tipo de perguntas que não me apetece nada falar.

M.F.: Mas pode só dar uma resposta simples?

J.P.: Vamos falar de coisas técnicas e ponto final agora de facto de conceitos estéticos,
não me apetece falar. Sei lá porque fiz isso, porque estava chateado com qualquer coisa
… (risos) … não tenha a menor dúvida, quem faz um quadro desses é porque está
chateado, não é porque está contente, não é? É tão estranho, tão estranho que eu nunca
mais na vida fiz coisa parecida nem igual, portanto só pode ser porque estava chateado,
portanto deixemos o lado conceptual e vamos sim a, pintou com quê? com água, com
tinta, com óleo, a pincel, com mesinhas corriqueiras, técnicas...

Mariana Basto (M.B.): Conte a história desta obra, como é que aconteceu, o que se
lembra?

J.P.: O que lhe posso dizer Mariana, isto é pintado como vê do lado da tela não
preparada, que é uma coisa que lhe interessa, foi pintada do lado não preparado,
porquê? Foi algo que eu vi na altura em Londres e eu suponha que o Bacon (Francis
Bacon) fazia isso, não sei se fazia, se não fazia, mas pelo menos parecia que fazia e
achei graça e dava esta textura e rugosidade completamente seco sem brilho nenhum,
tecnicamente ou tecnologicamente não sei se é acertado ou não, porque eu hoje talvez
não fizesse porque a tela ficava sem preparação e a tinta de óleo ia cair exatamente
sobre a tela sem preparação, em termos de conservação olhe pelos vistos ele aguentou
estes anos todos. Os defeitos que ele tem, ou tinha, é porque quando eu mudei de casa
embalei-o e nunca mais o mexi durante anos e deve ter estado uma coisa encostada a ele
de cartão, e portanto o que tenho a dizer em termos técnicos é isso, o óleo vulgar, não

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sei se neste tempo já era Rembrandt, é o óleo que eu uso, é a marca que eu uso não sei
se já era, provavelmente já seria.

M.B.: Lembra-se de à quanto tempo utiliza o óleo Rembrandt?

J.P.: 65 quase de certeza, mas não tenho a certeza absoluta se em 65, já vão lá tantos
anos, se era o Rembrandt que eu utilizava mas é muito provável que sim. Rembrandt ou
Winsor, se não fosse o Rembrandt era a Winsor.

M.F.: Disse-me que a pintura não tinha brilho, mas eu verifiquei que nas zonas de cor
preta e vermelha existem variações de brilhos.

J.P.: Não sei se, já passaram tantos anos, que não sei se depois disso lhe passei algum
brilho ou alguma coisa, são tantos anos que já não sei.

M.F.: (olhando para a imagem da obra) Nestas zonas mais claras são alguns brilhos que
a pintura tem...

J.P.: Talvez possa nesse momento nesses pontos ter aplicado menor quantidade de
médio. Pode ser por isso…

M.B.: O professor utilizava secativo?

J.P.: Também houve uma altura que utilizei secativo.

M.B.: Pergunto isso porque também pode fazer a variação ao contrário.

J.P.: Também houve uma altura que utilizei, era uma coisa que suponho que se chamava
“rápidol”.

M.F.: A paleta que utiliza na composição é bastante reduzida…

J.P.: Completamente pobrezinha…

M.F.: Porquê a utilização dessas cores?

J.P.: Tem um vermelhão, tem um preto, tem um branco com qualquer coisa à mistura,
este branco também amareleceu, mas é possível que tenha qualquer coisa de amarelo…

M.F.: Tem uma camada azul por baixo do branco, uma camada de azul claro….

J.P.: Ai tem?

M.F.: Sim tem.

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J.P.: Se calhar houve qualquer coisa por baixo deste quadro, não sei se por baixo deste
quadro houve outro, talvez não, acho que não.

M.F.: Também na zona branca existem uma espécie de manchas, que dá a sensação que
o feto está a…

J.P.: Mas essas manchas são intencionais…

M.F.: Sim, eu sei… eu sei…

J.P.: Tentei imitar as células observadas ao microscópio, não sei com o que as fiz, mas a
ideia devia ter sido essa...

M.F.: E o azul, neste caso eu pensei que era…

J.P.: Que coisa tão esquisita (risos) ….

M.F.: Que era uma ideia de algo a flutuar num líquido, daí o azul…

J.P.: A ideia terá sido essa, de facto dá um ar de ver a criancinha, o feto assim lá para
dentro, não sei… Isto foi feito num período, que eu tive uma primeira fase figurativa
muito próxima da escolar e depois andava, a morrer, por isso uma série de coisas que eu
fiz muito desconstrutivas como esta, no fundo o que eu estava a matar era essa primeira
fase figurativa.

M.F.: E estava a entrar na fase…

J.P.: E depois a primeira coisa abstrata que fiz, pertence ao Museu do Chiado, foi um
tombo de madeira, eu estava com bolsa em 1966, portanto isso foram as últimas facadas
na primeira fase figurativa.

M.F.: Então é como se fosse uma transição?

J.P.: Não, um assassinato. (risos)

M.F.: A obra sempre foi propriedade sua?

J.P.: Sempre foi propriedade minha e acho que nunca a expus…

M.F.: Eu não encontrei referência em nenhum catálogo a esta obra.

J.P.: Acho que não, só se foi na retrospetiva, não acho que não, deixe-me ver…

M.B.: Foi um assassinato que ficou em casa.

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J.P.: Não me lembro se foi mas não deve ter sido, não deve ter sido de facto, nunca
exposta, penso que não, mas não posso garantir… não sei se quando terminei o meu
curso nessa altura … não sei, se foi, foi num sítio assim qualquer, não sei…

M.F.: Então nesse caso a obra nunca possuiu moldura?

J.P.: Não, pois não.

M.F.: Lembra-se dos locais onde a obra esteve armazenada?

J.P.: Os locais onde a minha vida tem andado (risos), pois os locais… no atelier do
Porto, não sei se no primeiro se no segundo, armazenada no atelier depois aqui em
Lisboa em Carcavelos, nos ateliers sempre da minha casa, nas casas por onde eu me fui
mudando.

M.F.: O que tem a dizer relativamente às condições dos locais a que esteve sujeita?

J.P.: Era às três pancadas… (risos)

M.F.: Com outras obras?

J.P.: Sim olhe e pronto eram lá metidas, e pronto lá ficavam (risos) sem condições
nunca especiais.

M.F.: A obra aparentemente não sofreu nenhuma intervenção de conservação e restauro.


Confirma? Nenhuma limpeza?

J.P.: Nunca sofreu bons nem maus tratos desses, não nunca, nunca houve nenhuma
intervenção sobre ela. Só de maus tratos.

M.F.: Em relação à apreciação da obra, acha que o seu envelhecimento pode provocar
uma mudança da sua aparência, a seu ver esse fator prejudica a leitura da obra?

J.P.: Penso que ela não sofreu muitas modificações, penso que não, as tintas também
eram boas e o autor... (risos)

M.F.: E qual é a sua opinião em relação à intervenção de conservação e restauro que eu


irei realizar?

J.P.: À sua eu ainda não sei, mas à daquela senhora, excelente (risos) à competência
daquela senhora cinco estrelas… (risos) agora à sua ainda não sei, não é, ainda não sei,
mas vai ser bem…

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M.F.: As suas expectativas são positivas?

J.P.: As minhas expectativas são positivas, ai de si que não fossem (risos) … e lá se


estragava o monstro… (risos)

M.F.: Não isso não, em principio a metodologia está correta por isso nada correrá mal.
Após a intervenção e de lhe ser entregue a obra, onde a irá colocar?

J.P.: Vai outra vez lá para cima para o atelier claro. (risos)

M.B.: Mas se calhar acondicionada não? Pode ficar acondicionada para evitar outra
vez…

J.P.: Vai para lá assim… encostas assim.

M.B.: Mas pode ser protegida com aquela espuma à volta para que não hajam outra vez
fungos, poeiras e tudo mais…

J.P.: A Mariana conhece-me… (risos)

M.F.: Uma última questão, até que ponto está sensível às questões da conservação nas
obras da sua criação?

J.P.: Quando faço um trabalho, eu tenho o maior cuidado possível para que ele dure tal
como eu o fiz, eu utilizo todos os cuidados, eu utilizo tintas da Rembrandt, médios da
Rembrandt faço o que eles dizem no catálogo para fazer, não misturo outros materiais,
utilizo tela de linho, faço o melhor possível para não fazer asneiras, e dou a maior
importância a isso.

M.B.: E normalmente identifica os materiais que utiliza no verso, hoje em dia, não é
Professor?

J.P.: É sim, escrevo atrás da tela normalmente se dou verniz, que verniz dou, agora não
dou a pincel que dá muito trabalho, utilizo spray, mas da própria marca, porque eu não
sei, embora em principio eles digam tudo e mais alguma coisa, a gente não sabe de facto
o que lá está e não vale a pena agora estar a estudar as tecnologias do não sei quê, de
como se faz, de como se mói o pigmento ou como não sei quê, não vale a pena, eles
sabem isso tudo, dizem-nos e nós fazemos o nosso trabalho, não acha?

M.B.: Eu acho, está perfeito, acho que é um artista exemplar nos cuidados.

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J.P.: Tenho muito cuidado com o desenho a carvão também, tenho muito cuidado com
isso.

M.F.: Acha que esta obra tem desenho subjacente?

J.P.: Não sei, ao fim de cinquenta anos ou lá o que é, impossível, não sei que desenho é
que estava por baixo, é possível que sim, não me lembro nada, nem sequer de a fazer,
não me lembro de nada.

M.B.: Comprou aquela grade já com a tela engradada?

J.P.: Já lá vão tantos anos, mas eu não a fiz! De certeza que comprei a grade com a tela.
Não, nem lembro.

M. B.: Mas a tela encontra-se pregada ao contrário.

J.P.: Posso ter comprado a tela e pregado eu. Não me lembro! 65 quantos anos vão?

M.F.: Faz 50 anos este ano. Muito obrigado pela disponibilidade.

Entrevista ao artista Jorge Pinheiro conduzida pela Dr.ª Mariana Basto, Diretora Geral
da empresa ARGO, e por Margarida Fernandes, aluna do mestrado em Conservação,
Restauro e Produção de Arte Contemporânea, na Faculdade de Belas Artes da
Universidade de Lisboa. Realizada no dia 21 de Janeiro de 2015.

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