Na relação de emprego, o trabalhador encontra-se sempre em estado de sujeição.
O estado de submissão do trabalhador ao capital está no alicerce do direito do trabalho e as pessoas. Dá se que o trabalho subordinado é tomado como “elemento” central da relação de emprego. Sem ela, pode haver trabalho, mas não há relação de emprego. A leitura do direito do trabalho não irá se ocupar dos fundamentos da subordinação, no sentido filosófico. Não interessa aos juristas dizer o que é subordinação, mas sim explicar como ela se revela externamente.
Teoria sobre subordinação no direito do trabalho:
1) CONTRATUALISTA: na teoria jurídica sobre os fundamentos da subordinação, a primeira grande aproximação tem origens no Iluminismo. É a chamada corrente contratualista, nas quais o epicentro é o contrato de compra e venda da força de trabalho. A propriedade privada em si mesma é justificada pelo trabalho que, como sublinha Locke, transforma bens que se encontram em estado natural e os ajusta para atender às necessidades humanas, legitimando sua apropriação. Esse processo de apropriação, porém, não se dá de modo inteiramente natural e indolor. Implica restrições, definidas por regras pactuadas pelos contratos entre particulares e por um pacto maior, o contrato social, que enfeixa a legitimação mesma do Estado capitalista. A sujeição do operário ao proprietário dos meios de produção é, com efeito, decorrência de conduta racionalmente pactuada, explicada pela polaridade jurídica da relação de débito e crédito, gerando a responsabilidade do vínculo contratual. Em razão desse negócio jurídico bilateral, e exclusivamente em razão dele, o trabalhador obriga-se não apenas a determinada atividade, mas a uma espécie de dever geral, que o vincula a determinações diversas, emitidas após a celebração do contrato, e nele não previstas. É um tipo de sujeição obrigacional genérica, pois o conteúdo real das prestações será dado unilateralmente pelo empregador, “a posteriori”, porque o contrato o legitima a tanto, e atribui a ele, de quebra, uma espécie de poder penal privado: ele poderá definir condutas faltosas, julgar o trabalhador e impor as sanções respectivas, em razão do inadimplemento contratual. O núcleo duro da fundamentação contratual da subordinação repousa, pois, na autonomia privada, autorizada pela igualdade formal dos contratantes. A corrente contratualista nasceu a partir dos grandes filósofos da ilustração — Locke, Rousseau, Montesquieu — e entre os clássicos do século 20, embora com abordagens muito diferentes, seguindo firme pela pena de autores como Alonso Olea, Edoardo Ghera, Santoro-Passarelli, Délio Maranhão e Montoya Melgar.
2) RELACIONISTA: em oposição aos contratualistas nasce a ideia de empresa-instituição,
conformando-se assim uma outra grande corrente de pensamento no direito do trabalho: o relacionismo. Em essência, os institucionalistas veem o fundamento da subordinação na disciplina do trabalho própria da empresa como comunidade capaz de fundir interesses privados, sociais e estatais. Nessa medida, a subordinação decorre do pertencimento à instituição cuja autoridade se funda no interesse racional e nacional. Afinal, é essa instituição quem produz as riquezas e viabiliza a força do Estado. Com efeito, para eles a sujeição do trabalhador não provém do contrato, mas da sua inserção na “comunidade” que é a empresa. Para o institucionalismo o empregado é colaborador ativo, é partícipe dessa comunidade produtiva vista como ente superior no qual se adensa o interesse geral no ordenamento positivo.
IDEIA DO AUTOR DO PREFÁCIO: o prefaciador rascunhou uma teoria crítica questionando
essas visões e procurando revelar a relação de poder entre capital e trabalho como algo mais complexo e dinâmico, baseado em fatores intrínsecos à relação contratual e fatores exógenos (Poder e sujeição, publicado pela LTr). Nele tentou articular uma aproximação ao tema a partir de Karl Marx, mostrando que a subordinação é originária da subsunção formal e material do trabalho ao capital e nas formas contemporâneas de organização da produção capitalista ela se consubstancia desde o panoptismo eletrônico até ferramentas contratuais como as formas remuneratórias adotadas à maneira de mecanismo de intensificação do trabalho, passando, naturalmente, pela cooptação do inconsciente coletivo do trabalhador enquanto classe e da chantagem do exército proletário de reserva anabolizado pelo avanço tecnológico e científico do século 21.
IDEIA DO AUTOR DO LIVRO: para o autor a sujeição do operário ao capital é um dado
do inconsciente, o autor está ocupado em buscar os fundamentos da subordinação no seu sentido ontológico, perseguindo sua ratio, suas entranhas, e articulando uma teoria que explique algo mais do que simplesmente as bases de sua simples exteriorização. Na melhor tradição freudiana, Bessa sustentará que a subordinação (suas causas, suas dimensões, suas angústias, seus medos) somente é cognoscível pela análise de processos inconscientes, relacionados à superação do complexo de Édipo. Remete à culpa e à ansiedade pelo pai, traduzindo-se na servidão “voluntária” alicerçada no medo ao imponderável, na memória atávica e na devoção mítica que extrapolam os limites do contrato e os espaços da empresa capitalista. Com efeito, Bessa resgata no texto, didaticamente, a teoria da libido, os tabus, as pulsões, e mostrará que a subordinação só pode ser compreendida a partir da sexualidade e do conflito de excitações e energias entrecruzadas nos domínios também entrecruzados do intelectual, do inconsciente e do somático. A subordinação do trabalhador e a subordinação da classe trabalhadora é fundamentalmente ansiedade e decorre também do complexo de castração.
JURISPRUDÊNCIA: Alguns dirão que a subordinação é decorrente do rigor da hierarquia
militar, outros da supremacia econômica, outros da prevalência social, cultural, política e, como se o fácil estivesse oculto, dirão alguns que é uma questão jurídica que se resolve contratualmente com a previsão na lei. Todas as explicações podem se ajustar a um convencimento parcial sobre a matéria, e o objetivo deste trabalho não é rechaçá-las, mas apresentar outra vertente, de que a subordinação provém da submissão condicionada pelos afetos construídos pela mente humana. Com base no encosto teórico advindo da psicanálise ao Direito do Trabalho, especialmente das sementes germinadas deixadas por Freud, formulam-se respostas às indagações sobre a origem da servidão humana e, a partir daí, é possível verificar a intimidade dessa servidão com a relação de trabalho e seu desenvolvimento na forma de contrato de submissão do empregado ao empregador.