Você está na página 1de 6

DEBATE IGOR X MIORIM

SOBRE AS TROCAS DE PROPOSIÇÕES COMO TROCAS INTERPESSOAIS


U m olhar acentuado para as questões da epistemologia, da visão de
direito e de ética libertária como conjuntas de uma filosofia da liberdade

IGOR:

Sim, trocas de proposições são trocas interpessoais, coincidindo com trocas


de bens, mas isso não te tira do erro comparativo de caráter equívoco
pretensamente análogo referente às trocas e do erro pretensamente análogo
(mas unívoco) referente ao mercado.

Minha resposta começa apontando o óbvio, como já apontado anteriormente: essa comparação é
resultado de uma análise em prol de um realismo jurídico escandinavo que descreve as métricas
jurídicas e conceitos jurídicos como resultado de uma percepção assistemática entre as partes
vividas da comunidade social necessariamente jurídica.

Vivemos em função de nossas necessidades, vivemos através das nossas trocas e toda ação é em
primeira ou segunda instância uma ação numa esfera pública lida pelo poder em que as nossas
ações se transladam como instrumentos derradeiros da nossa vontade pessoal em contato
com a vontade do poder em si mesmo.

O poder é então uma métrica de todas as nossas ações e mais do que isso, como possibilidade de
limitar e restringir determinado conjunto de ações, DIREITO É PODER. Ainda mais, essa expressão
de poder se dá numa seara de consciência jurídica onde numa atitude desinteressada de aprovação
ou reprovação frente a uma norma social, ELA É DIRECIONADA A UMA ORDEM SOCIAL E
INFLUÊNCIA E É INFLUENCIADA PELA ORDEM JURÍDICA VIGENTE. (Ross, 2003)

Nesse sentido, quando eu digo que qualquer troca de proposições tem caráter de trocas
interpessoais, eu estou dizendo o seguinte:

O simples fato de você estar trocando proposições é em si um ato com relevância jurídica,
conquanto o conteúdo das nossas proposições se estabelecem na ordem social ainda que de
ordem descritiva, ao enunciar conceitos, ou de ordem normativa, ao emitir juízos.
IGOR:

Quando você comparou mercado de ideias com mercado de bens, dando o


exemplo de uma pessoa comunicativa que pega do mercado de ideias uma
ideia, ficou claro que você tomou isso em sentido unívoco comparativo, pois
escolasticamente (e até peripateticamente) analogar não se resume a
comparar, caso contrário, toda comparação eidética entre entes dotados do
mesmo conteúdo formal seria uma analogia, o que seria quebrar o elemento
ostensivo da linguagem, que justamente uma das forças motrizes da atividade
comunicativa que permite o conhecimento e o acordo, tão prezado por Quine,
em seu livro From a Logical Point of View, no capítulo sobre a ostensão,
hipóstase e identidade (salvo engano cáp. IV).

Fica claro nesse segundo momento quão distantes dos meus pontos foram os argumentos
apresentados aqui. Se eu estou apresentando uma tese que toma as categorias jurídicas, social e
comunicativa como intersubjetivamente dependentes, não pode haver outra possibilidade senão a
de pensar a ação como plural e em si uma ação a valorar necessariamente como interdisciplinar e
interpessoal. Ao invés de restringir o acordo de sentido e a interpretação lógica, estou ampliando
esse caráter seguindo a linha da própria linha habermasiana como abaixo:

A COMUNICAÇÃO POLÍTICA, CIRCULANDO DE BAIXO PARA CIMA E DE CIMA PARA BAIXO ATRAVÉS
DE UM SISTEMA DE MÚLTIPLOS NÍVEIS (DESDE A CONVERSAÇÃO COTIDIANA NA SOCIEDADE

CIVIL, PASSANDO PELO DISCURSO PÚBLICO E PELA COMUNICAÇÃO MEDIADA ATÉ OS DISCURSOS

INSTITUCIONALIZADOS NO CENTRO DO SISTEMA POLÍTICO), ASSUME FORMAS BASTANTE

DIFERENTES EM ARENAS DIFERENTES DO SISTEMA POLÍTICO (HABERMAS, 2006:415).

E nesse sentido, mais ainda; que esse mercado de ideias se trata de uma relação constante,
percebida apriori entre a linguagem e o direito, conquanto a linguagem é justa interprete de um
ser que se expressa conquanto seus valores através da mesma, primeiramente a nível pessoal e
então a nível de membro ativo de uma consciência jurídica para o qual a semiótica jurídica das
proposições é direcionada.

Essa relação de mútua dependência se lê como:

“A APLICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA NÃO SIGNIFICA, NESSA CONCEPÇÃO, SUBSUNÇÃO DE UM


CASO PARTICULAR A UMA HIPÓTESE GERAL, MAS UM SALTO PARA ALÉM DO DUALISMO TEXTO-

NORMA, UMA VEZ QUE “A NORMA SERÁ SEMPRE O RESULTADO DA INTERPRETAÇÃO DO TEXTO”.

UMA HERMENÊUTICA JURÍDICA COM CARACTERÍSTICAS ONTOLÓGICO-EXISTENCIALISTA


IMPLICA, ASSIM, UMA POSTURA DE COMPROMETIMENTO DO INTÉRPRETE, O QUE EXIGE UM NOVO

OLHAR PARA O DIREITO, QUE PASSA A SER COMPREENDIDO A PARTIR DO PARADIGMA DA

LINGUAGEM. ISSO SIGNIFICA DIZER QUE A INTERPRETAÇÃO SOMENTE É POSSÍVEL SE EXISTIR

COMPREENSÃO, QUE, POR SUA VEZ, DEPENDE DA PRÉ-COMPREENSÃO DO INTÉRPRETE, UMA VEZ

QUE ESTE JÁ COMPREENDE ANTES MESMO QUE PERGUNTE SE COMPREENDEU.” (BISOLLI


FILHO, 2009, P.107)

IGOR:

Miorim igualando troca proposicional às trocas autísticas e, além disso,


iguala as trocas autísticas às trocas jurídicas. Numa concepção misesiana,
quando se trata, segundo o próprio Mises, no Human Action, do mercado
puro e simples (conjunto ativo de pessoas dentro da atividade voluntária das
trocas) é desprovido de qualquer juízo de valoração, enquanto toda troca
jurídica carrega, em si, elementos valorativos, a saber, a parte axiológica da
normatividade, isto é, a parte não-factual. Não se pode reduzir trocas
jurídicas às trocas mercadológicas nem vice-versa.

Meu ponto aqui sobre Mises está contido na seguinte ideia; trocas proposicionais são advindas
de proposições que esperam por outras proposições, sua proposição tem a intenção de adicionar
conteúdo a argumentação, interferindo na ação de outro agente, sendo assim trocas
interpessoais. (Mises, 2010:242)
IGOR:

Além disso, uma troca assertiva não se iguala a uma troca de bens,
justamente porque as proposições não são recursos escassos. Não se dá, em
sentido de transferir posse, uma proposição a outrem e se recebe, também, a
posse de outra proposição. Isso sequer faz sentido. Ninguém pode possuir em
sentido estrito de posse empírica qualquer elemento linguístico.

Estamos aqui a tratar do conteúdo da troca das proposições como troca interpessoal necessária
devido ao seu conteúdo interdisciplinar e complexamente intersubjetivo, não da mera enunciação
de uma proposição como elemento formal de uma transferência.
IGOR:

Mas é disso que estou falando, você entendeu errado! Não disse que, segundo
você, SÃO trocas mercadológicas, mas disse que, segundo você, são COMO
(conjunção comparativa, gramática básica) trocas mercadológicas, e isso
você endossa justamente por ver, erroneamente, nelas uma representação
fidedigna das trocas de mercado
Eu não estou vendo trocas de mercado propriamente ditas, mas antes, estou apontando que a
estrutura de análise econômica se aplica ás ações porque essa troca de proposições é em si uma
ação voltada a influenciar a conduta, principalmente a nível jurídico do interlocutor conquanto
parte de uma consciência jurídica.
IGOR:

Meu Deus, você que não entendeu nada. Eu disse que você afirmou que trocas
de proposições são COMO (elemento gramatical conjuntivo que representa
COMPARAÇÃO) trocas de proposições, mas você nega isso e afirma, em
seguida, o que eu disse, falando "[...] correspondem a asserções valorativas
entrepartes conquanto a ideias (representações fidedignas de propriedade)".

Além disso, não são representações fidedignas, justamente porque: 1) não


são recursos escassos e 2) por não o serem, não são possessivamente
transferíveis.

"Isso significa que o mercado não surja de juízos de valoração? Claro que
não. É evidente que qualquer processo de ação intramercado é valorativo,
como diz Mises: "Não há nenhum critério 'natural' para estabelecer o que é
desejável e o que é indesejável na evolução biológica do homem. Qualquer
padrão que se escolha é arbitrário, meramente subjetivo, em suma, um juízo
de valor" (Ação Humana, pág. 207, "A Sociedade Humana"), mas isso não
significa que o mercado enquanto DADO (isto é, enquanto funcionamento
orgânico COMPOSTO, não simples, tais como os homens que neste operam)
seja, também, valorativo, muito menos valorativo em sentido JURÍDICO; é
puro fato."

Acredito que a oposição feita até aqui precise de uma afirmação de volta em Rothbard onde em
Power & Market, ele demonstra como todas as ações são percebidas em si como ações de poder
por sobre a natureza e ação de poder por sobre homens:
THE LIBERTARIAN DOCTRINE, THEN, ADVOCATES THE MAXIMIZATION OF MAN’S POWER OVER
NATURE AND THE ERADICATION OF THE POWER OF MAN OVER MAN. (ROTHBARD, 2004)

IT IS EASY TO SEE THAT AN INDIVIDUAL’S POWER IS HIS ABILITY TO CONTROL HIS ENVIRONMENT
IN ORDER TO SATISFY HIS WANTS. (ROTHBARD, 2004)

E o que precisa ficar claro aqui é que a ação interpessoal especificada aqui, a troca de proposições,
é uma manifestação da expressão do poder de alteração das dinâmicas do mundo que está
incrustada no indivíduo.

Uma troca em sentido mercadológico não significa que ela está formalizada
dentro do escopo do mercado. O predicado mercadológico refere-se àquilo
que é componente deste, isto é, segundo a própria economia austríaca, a
interação orgânica de entes intencionados pretendendo satisfazer suas
necessidades. Fica claro que, por trocas mercadológicas, me referi àquilo
que mais de elementar é constituinte DO mercado, não que necessariamente
se opera NO mercado.

Nesse ponto, acredito que para o leitor atento é possível identificar que aquilo que ele acredita
que eu esteja espantalhando é justamente aquilo que eu estou afirmando como minha tese
principal; a de que as trocas proposicionais são essencialmente trocas interpessoais e que são
constitutivas necessárias do mercado como ente meio das trocas através da linguagem.

O mercado é um conjunto complexo composto (isto é, evidentemente tem


elementos que o compõem) e estes podem ser, ou não, avulsos a ele,
justamente por serem elementos simples (dento do âmbito da interação) e
dissociáveis daquilo que por eles é composto. Um destes elementos são as
trocas; uma dissociação parte-todo;

Não ignoro que as trocas são apenas parte da complexidade do mercado, meu ponto é justamente
na formulação que consiste na valoração das trocas proposicionais como elementos ativos de uma
consciência jurídica e mais ainda das ações mercadológicas como expressão derradeira
consumadora dessa vontade.

Não disse que é de valor jurídico nulo por ser assistematizado, mas disse que
não tem caráter de TITULARIDADE, isto é, não existe um título de posse
meramente empírica, justamente por esta não estar legitimada e, claro,
titularidade referir-se à qualidade daquele que é titular por direito;

O fato de você não estar trocando a proposição em si nada diz do próprio conteúdo dessa
proposição que altera a conduta alheia e tem efeitos jurídicos conquanto elemento do discurso
jurídico.

Nem todas as trocas mercadológicas são ações jurídicas. Uma ação


mercadológica (que é diferente do MERCADO, pois a ação mercadológica é
um aspecto componente deste, mas não este propriamente dito) pode se dar
dentro de um escopo livre de qualquer normatividade, pela mera
transferência de posse, que já é uma realização ativa do homem enquanto
homo economicus;

Há arcabouços que definem todas as trocas mercadológicas como ações jurídicas, eis que o caráter
normativo existe antes do estabelecimento de um ordenamento jurídico, como elemento
necessário das interações sociais e jurídicas de uma sociedade.

Evidentemente, a questão é que uma analogia relacionando ambas as noções


precisa ser cuidadosamente traçada, coisa que você não fez em sua live,
tentar não simplesmente analogar em sentido tomista (relacionar
predicativamente um mesmo nome em ocasiões distintas em gênero e espécie
de forma a criar, por familiaridade conceitual, uma relação entre as ideias),
mas, sim, comparar de forma genericamente unívocas dias noções, basta ver
que o gênero "mercado" é uno, no entanto, suas atribuições referiram-se a
uma diversidade específica: mercado de bens e mercado de ideias. Uma
relação de univocismo, não de analogia (reparar que me refiro à analogia
em sentido escolástico, não senso-comum);

Podemos ver então que ao invés de atacar os motivos pelos quais eu igualei os dois, os
argumentos se concentraram em até aqui apontar uma incoerência entre essas equiparações,
tomando as minhas posições quanto a normatividade intermitente e intersubjetivo das
proposições e seu caráter proposicional interpessoal como errados desde o início, assim
tornando as minhas afirmações levianas e desprovidas de sentido.

Você também pode gostar