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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO


COMARCA DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
FORO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
VARA DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL
AV. BRIGADEIRO FARIA LIMA, 4929, São José do Rio Preto - SP -
CEP 15090-000

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/pg/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1039396-29.2016.8.26.0576 e código 1B083EB.
SENTENÇA

Processo nº: 1039396-29.2016.8.26.0576


Classe - Assunto Procedimento do Juizado Especial Cível - Extravio de bagagem
Requerente: Monize Sarracini
Requerido: Deutsche Lufthansa Ag

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por CRISTIANO DE CASTRO JARRETA COELHO, liberado nos autos em 15/09/2017 às 16:43 .
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Cristiano de Castro Jarreta Coelho

Vistos.

Relatório dispensado nos termos do art. 38 da Lei 9099/95.

Decido.

Por primeiro, consigno que a presente sentença compreende este processo


e o de número 1039390-22.2016, em razão da conexão de ações já determinada.

Aduzem os autores, em síntese, que contrataram os serviços da empresa


aérea requerida, no trecho compreendido entre Munique (Alemanha) e Lisboa (Portugal).
Prosseguem alegando que sua bagagem foi extraviada e somente lhe foi restituída 30 horas
depois. Diante de tais fatos, propôs a presente demanda pleiteando indenização por danos
morais e materiais sofridos no evento.

Em defesa, a requerida confirma haver restituído a bagagem do 30 horas


depois do desembarque mas também sustentou (a) inexistência de comprovação dos danos
materiais; (c) tarifação da indenização; (d) inexistência de abalo moral, tendo em vista a
devolução da bagagem do autor de forma rápida.

No mérito, não assiste razão à requerida, ainda que na essência da defesa.

Em primeiro lugar, o que é importante deixar bem frisado, é que a tentativa


das empresas aéreas, em especial aquelas chamadas estrangeiras, de se furtarem da
incidência do CDC não tem amparo constitucional. Não olvida o juízo que o governo
brasileiro não só subscreveu a Convenção de Montreal, mas também introduziu em nosso
ordenamento jurídico o teor de tal tratado por meio do Decreto nº 5910/2006. De fato, ao
introduzir a convenção em nosso ordenamento por meio de tal decreto, a presidência da
república deu vigência jurídica ao quanto regulado pela Convenção de Montreal. Ocorre
que nenhuma lei, que dirá um Decreto, tem a força jurídica de suplantar uma previsão
constitucional. Tal se coloca porque no art. 170, V, da CF, estatuiu o legislador
constituinte originário que na ordem econômica brasileira os agentes observarão, dentre
outros princípios, o princípio da defesa dos interesses do consumidor. Em outras palavras,

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CEP 15090-000

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é possível afirmar que Constituição determinou, daí porque o tom imperativo da norma,
que a única atividade econômica legitimamente aceita no Brasil é aquela que prestigia a
defesa do consumidor. Daí porque, o princípio instituído no art. 6º, VI, do CDC, segundo
o qual é direito básico do consumidor a efetiva reparação dos prejuízos patrimoniais e
morais, é daqueles que se sobrepõem, por conta do amparo constitucional, a qualquer
limitação de indenização prevista na convenção ou até mesmo a previsão da convenção de

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por CRISTIANO DE CASTRO JARRETA COELHO, liberado nos autos em 15/09/2017 às 16:43 .
inexistência de direito a dano moral por parte dos passageiros.

Não se pode permitir que nos contratos firmados dentro do Brasil, visando
ao transporte de pessoa e bagagem por via aérea, ainda que por passagem no exterior,
inexista dano moral indenizável por conta de uma previsão da convenção de Montreal, que
vai totalmente contra a própria essência constitucional de defesa do consumidor. Como
não é possível admitir no ordenamento jurídico brasileiro a existência de letra morta na lei,
o juízo, buscando coadunar a aplicação do CDC e da Convenção de Montreal, entende que
havendo prova, ainda que indiciária, da extensão do dano material sofrido pelo passageiro,
é o caso de se afastar a aplicação da convenção, que prevê indenização tarifada, para
aplicar o CDC e reparar o efetivo prejuízo. Se, noutro giro, não há prova sequer indiciária
da extensão do dano material, opta o juízo por aplicar a reparação tarifada prevista na
convenção. Tal pressuposto jurídico é importante porque, em primeiro lugar, há prova nos
autos de que a bagagem do autor extraviou e não foi encontrada.

Neste contexto, sem elementos indiciários nos autos do exato ou próximo


real valor do prejuízo material do autor, considerando que a bagagem lhe fora restituída,
ainda que com atraso, aplica-se o supramencionado art. 16, par. único, da mencionada
Resolução da ANAC, que tarifa a indenização em 100 DES (direitos especiais de saque).
Conforme ensina o E. Magistrado e professor da USP Marco Fábio Morsello, na obra
“Responsabilidade civil no transporte aereo”, Ed. Atlas, 2006, p. 214, 1.000 DES
equivalem a aproximadamente US$ 133,00. Aplicando-se proporcionalmente referido
parâmetro e tomada a cotação do dólar de hoje junto ao sítio do BCB (www.bacen.gov.br),
que é de R$ 3,11, conclui-se que a indenização devida à autora pela perda temporária de
sua bagagem equivale a R$ 413,63.

Todavia, é inegável que os requerentes também sofreram no evento dano


moral. Basta que se imagine a situação do mesmo de, viajando ao exterior, lá chegar e
descobrir que toda a sua bagagem se perdeu.

É inegável, e, portanto, despicienda a produção de provas, que qualquer


pessoa que tenha sua mala inteira extraviada, sofre sim um dano psíquico que em muito
ultrapassa o dano moral.

Ao contratar o transporte próprio e de sua bagagem junto à empresa área, o


consumidor, que recebe o serviço prestado por aquela em caráter final, espera que
cheguem bem ao ponto final do transporte os dois bens confiados àquela. Daí porque a
responsabilidade da empresa área, no caso do autor, nos termos do artigo 14 do CDC, é

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objetiva frente aos danos causados pela execução defeituosa do serviço.

Não é um mero aborrecimento chegar ao destino e ver que a sua bagagem


não veio.

Nesse quadro, configurada a existência de danos morais experimentados

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pelo autor em decorrência (nexo) de má prestação de serviço da empresa ré, não havendo
qualquer causa de exclusão, nasce a obrigação de indenização (artigo 14, caput, do CDC).

Passo, então, à liquidação.

Sem parâmetros legais que auxiliem o juiz na fixação do dano moral, deve
ele se pautar por dois basilares princípios: o quantum deve ser o suficiente para fazer com
que o ofensor evite reiteração da conduta, mas não pode configurar valor excessivo capaz
de gerar enriquecimento sem causa.

Em casos análogos, o juízo, com o intuito de criar parâmetros objetivos,


vem adotando o critério de fixar um salário mínimo por dia de extravio momentâneo,
respeitando-se um piso de cinco, a fim de evitar indenizações ínfimas, descaracterizando o
viés punitivo. No caso dos autos, tendo em vista a devolução da bagagem trinta horas
depois do desembarque, arbitro os danos morais em cinco salários, liquidando-os em R$
4.685,00.

Posto isto, e tudo mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE
PROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial e, em consequência:

(a) condeno a ré a pagar aos autores a quantia de R$ 413,63 (quatrocentos e


treze reais e sessenta e três centavos), a título de danos materiais, quantia esta que deverá
ser atualizada desde a propositura da demanda e acrescida de juros de mora de 1% ao mês
a contar da citação;

(b) condeno a ré a pagar aos autores a quantia de R$ 4.685,00 (quatro mil,


seiscentos e oitenta e cinco reais) a título de danos morais. Em relação ao termo a quo da
incidência da correção monetária, consignando alteração de posicionamento diante da
Súmula 362 do STJ, deverá tal quantia ser atualizada monetariamente a partir da presente
data. Outrossim, com o mesmo raciocínio, como até então não havia valor líquido, não
havia mora, pelo que determino a incidência também dos juros moratórios de 1% ao mês a
partir da presente. Frise-se, aliás, que este entendimento vem sendo recentemente aplicado
pelo E. STJ, conforme REsp 903.258.

Sem sucumbência.

P.R.I.

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"Valores a recolher ao Estado em caso de Recurso: Preparo do recurso: R$ 358,07, em
guia DARE-SP, código 230-6 (ATENÇÃO ao preenchimento da guia nos termos do Provimento CG nº
33/2013), sob pena de deserção. Recolher valor referente à Carteira de advogados, se necessário (caso ainda
não conste dos autos) – taxa de procuração: R$ 18,74 em guia DARE-SP, código 304-9. Os prazos nos
Juizados são contados de forma contínua (prazos contados de forma contínua, conforme Enunciado 74
FOJESP: "Salvo disposição expressa em contrário, todos os prazos, no Sistema dos Juizados Especiais,

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serão contados de forma contínua, excluindo o dia do começo e incluindo o dia do vencimento.")" "

São José do Rio Preto, 15 de setembro de 2017.

Cristiano de Castro Jarreta Coelho

Assinatura digital, nos termos da Lei 11.419/2006,


conforme impressão à margem direita.

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