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PSICOLOGIA DA

MOTIVAÇÃO E EMOÇÃO

autora do original
ANNE MELLER

1ª edição
SESES
rio de janeiro  2016
Conselho editorial  sérgio cabral, claudia behar, roberto paes, gladis linhares

Autora do original  anne meller

Projeto editorial  roberto paes

Coordenação de produção  gladis linhares

Projeto gráfico  paulo vitor bastos

Diagramação  bfs media

Revisão linguística  bfs media

Revisão de conteúdo  claudia behar

Imagem de capa  jason l. price  |  shutterstock.com

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2016.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)

M525p Meller, Anne


Psicologia da motivação e emoção / Anne Meller.
Rio de Janeiro: SESES, 2016.
112 p: il.

isbn: 978-85-5548-243-4

1. Motivação intrínseca. 2. Motivação extrínseca. 3. Emoções.


4. Crenças. I. SESES. II. Estácio.
cdd 150

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento


Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário

Prefácio 5

1. Introdução ao Estudo da Motivação 7


1.1  Os motivos internos 14

2. A História das Teorias Motivacionais 25

3. As Necessidades Fisiológicas e Psicológicas 55

3.1  Relembrando o conceito de necessidades 57

4. Motivação Intrínseca e Tipos de Motivação


Extrínseca 77

4.1  A aprendizagem 79
4.2  Motivação Intrínseca 79
4.3  Motivação Extrínseca 79
4.3.1  Tipos de motivação extrínseca 80
4.4  Cognições: Crenças Pessoais de Controle 86

5. As Emoções 95
Prefácio
Prezados(as) alunos(as),

Porque estudar motivação e emoção juntas?


Podemos pensar na origem etimológica das palavras. Motivação se origina
da palavra latina movere que significa mover, tirar do lugar. A palavra emoção
também deriva do latim emotionem, "movimento, ato de mover" desta forma,
tanto emoção quanto motivação geram comportamentos.
Coincidentemente a primeira teoria de motivação remonta a Wiliam James.
Este influenciado pela teoria evolucionista de Charles Darwin, segundo a qual
cada espécie nasce com alguns comportamentos específicos que são necessá-
rios para garantir a sobrevivência da mesma.
Asssim, a primeira teoria de motivação proposta por James, propõem que os
serem humanos nascem com a capacidade de correr diante do perigo ou lutar
diante da frustração em função das emoções. Desta forma as emoções seriam
aspectos motivadores que disparam os comportamentos instintivos.
Inclusive a teoria das emoções proposta por Wiliam James, sobre as emo-
ções, que ficou conhecida como James-lange, propõe que primeiro a pessoa
corre e depois que ela tem a consciência do medo. Isso porque a emoção dispa-
ra uma resposta comportamental que ocorre antes da consciência da emoção.
Os cognitivistas vão afirmar que existe algum nível de interpretação cogni-
tiva para que o comportamento possa ocorrer, desta forma para que a pessoa
fuja, é necessário que interprete a existência de algum risco. Caso contrário
nossas reações seriam totalmente inapropriadas.
A teoria dos instintos foi duramente criticada em função da diversidade
do comportamento humano considerado muito influenciado pela aprendiza-
gem. Contudo Izard e Ekman, na década de 80, confirmam a teoria proposta
por Darwin sobre as semelhanças entre as expressões faciais provocadas pelas
emoções entre humanos e animais, apresentadas no livro “Expressões faciais
em humanos e animais”.
A partir de uma pesquisa transcultural, os autores conseguiram que as pes-
soas, em todas as culturas, inclusive em crianças cegas, reconhecessem inicial-
mente 6 expressões faciais. São elas: alegria, tristeza, raiva, surpresa, medo e
nojo.

5
Todas essas questões, e muito mais, vamos encontrar neste livro de psicolo-
gia da motivação e emoção.

Bons estudos!

6
1
Introdução
ao Estudo da
Motivação
OBJETIVOS
•  Conceituar motivação
•  Apresentar os motivos básicos
•  Diferenciar motivos internos de eventos externos
•  Apresentar formas de verificação da motivação
•  Entender como a motivação, a adaptação e a resiliência se relacionam.

8• capítulo 1
Uma das questões primordiais quando se pensa na Psicologia refere-se ao en-
tendimento sobre porque as pessoas fazem o que fazem. O que causa compor-
tamento das pessoas? O que acarreta o início de um comportamento? Por que
ele termina? Por que duas pessoas podem possuir dois comportamentos com-
pletamente distintos numa mesma situação?

Exemplo:

Um exemplo foi o caso do atirador Wellington Menezes de Oliveira, 23 anos,


sem antecedentes criminais, que entrou na sua ex-escola, Escola Municipal
Tasso da Silveira, em Realengo, e, com um revólver calibre 38, iniciou um ata-
que contra crianças a partir das 8h30 da manhã, deixando 11 mortas e mais 13
feriadas. Em seguida, o rapaz suicidou-se. Este fato ocorreu no Rio de Janeiro,
no dia 07 de abril de 2011.
O que levou Wellington a cometer este ato de barbárie? Seria algum trauma
sofrido na infância ou ele teria sido assediado no local? Será que ele possuía
algum quadro psicopatológico? Ou será que Wellington premeditou o evento
antecipadamente porque possuía raiva ou algum impulso incontrolável de vin-
gança vinculado a aspectos inconscientes? Será que se fosse outra pessoa na
mesma situação que Wellington, funcionaria da mesma forma que ele?
É disso que o estudo da motivação trata. O que causa o comportamento hu-
mano? O que faz com que ele mude de intensidade em momentos diferentes
na vida de uma mesma pessoa? O que faz com que um comportamento inicie
e termine? Por que um mesmo objeto, por exemplo, um brinquedo (carrinho,
boneca) pode ativar o interesse e o comportamento de brincar de uma criança
e de outra não?

capítulo 1 •9
CONCEITO
O estudo da MOTIVAÇÃO busca compreender o que queremos e porque queremos. A Mo-
tivação está relacionada com o que energiza e direciona o nosso comportamento, que está
fundamentado nas nossas atitudes.

CONCEITO
A ATITUDE, diferente daquilo que o senso comum entende, não significa “ter iniciativa”, mas é
um conceito utilizado pela Psicologia Social (RODRIGUES; ASSMAR & JABLONSKY, 2007)
que possui três aspectos inter-relacionados: o cognitivo, o afetivo e o comportamental. O as-
pecto cognitivo diz respeito às crenças, valores, conhecimentos, representações, opiniões que
as pessoas possuem sobre o mundo. O aspecto afetivo relaciona-se com o sentimento pró ou
contra algum objeto ou fenômeno social. E o aspecto comportamental refere-se ao fato de que
se sabendo como a pessoa pensa sobre determinado assunto e como ela se sente sobre o
mesmo, os outros aspectos se tornam bons preditores do comportamento da mesma.

ATENÇÃO
O conhecimento do senso comum é aquele construído no cotidiano, nas comunicações e
informações. Serve para entendermos a realidade que nos cerca. O conhecimento científico
constitui-se em outro tipo de conhecimento, que se propõe descortinar valores escondidos
e avaliar as evidências, entender causalidades através de métodos rigorosos e uma lingua-
gem específica.

EXEMPLO
Atitude
G. é uma mulher de 38 anos, solteira, que possui um relacionamento estável com J. há 5
anos. O casal planeja o casamento para dois anos e ainda não decidiu sobre a pertinência de
ter ou não filhos. G. possui uma carreira em ascensão, mas ainda não chegou aonde deseja

10 • capítulo 1
e sempre planejou. Sempre admirou seu pai, grande administrador de empresas e, como ele,
investe praticamente toda a sua vida na sua qualificação profissional, pensando novos proje-
tos e planejando da sua carreira. O tempo que sobra, que não é muito, curte com o namorado
J. Esta vida independente nunca foi problema para os dois, até porque J pensa o mundo de
forma muito parecida que G., sempre focado no trabalho. Entretanto, na volta de uma viagem
a dois, G descobre que está gestante de dois meses e meio. O que fazer? Conversa com J. e
ele considera que ter um filho no momento atual estaria prejudicando os dois porque inter-
feriria no planejamento de vida de ambos. Apesar de pensarem em casamento num futuro
próximo, J. sugere um aborto. E G. começa a refletir.

Exercício 1
A – Quais são as crenças de G sobre a vida, trabalho, família?
B – Quais são os sentimentos de G sobre família e filhos?
C – A partir das respostas acima, o que se pode inferir sobre um possível comportamento
de G relacionado ao ABORTO?

Exercício 2

Entretanto, com a consideração de J sobre o aborto, G inicia uma pesquisa na internet


para verificar os processos de aborto que existem, a sua legalidade, se causa sofrimento no
feto e se pode prejudicar a saúde da gestante ou trazer infertilidade. Diante das descobertas,
ela fica reticente sobre o procedimento a ser realizado.
D – As crenças de G sobre o aborto mudaram?
E – Será que estas crenças sobre o aborto podem alteram o comportamento de G da
realização ou não do aborto?

No caso relatado acima, pode-se ter uma ideia de quantos eventos estão en-
volvidos na tomada de decisão e na realização de um comportamento. A consu-
mação de um comportamento está impregnada daquilo que as pessoas são, das
suas histórias de vida, dos seus contextos atuais, das suas memórias e das suas
expectativas e projetos para o futuro.
Diante da complexidade da existência humana e da diversidade de objetos
que a variedade de teorias psicológicas propõe para explicar os fenômenos psi-
cológicos (e a motivação é uma delas), uma definição abrangente sobre o pro-
cesso motivacional é o de Feldman (2015)

capítulo 1 • 11
A motivação apresenta aspectos biológicos, cognitivos e sociais, e a complexidade
do conceito levou os psicólogos a desenvolver uma variedade de abordagens. Todas
elas procuram explicar a energia que guia o comportamento das pessoas em direções
específicas. (p.289)

Neste sentido, entender o que causa o comportamento de uma pessoa, é


procurar atingir tanto os mecanismos biológicos que colocam o organismo em
prontidão para uma determinada ação, sua história de vida; é verificar como as
aprendizagens contribuem para a construção dos autoconceitos, metas e ex-
pectativas e, também, como os fatores sociais, os incentivos e os valores trans-
mitidos em cada cultura iniciam, perpetuam e finalizam as condutas humanas.

A motivação (do latim, “mover-se”) é a área da ciência psicológica que estuda os


fatores que energizam, ou estimulam, o comportamento. Especificamente, diz respeito a
como o comportamento é iniciado, dirigido e sustentado. Questões de motivação estão
disseminadas pelos muitos níveis de análise da ciência psicológica. Por exemplo, os
conceitos de recompensa e reforço (...) e os mecanismos fisiológicos (...)” (GAZZANIGA;
HEATHERTON: 2007; 280-281)

Se no âmbito individual conhecer o que nos motiva significa entrar em con-


tato com a própria existência a partir de uma autoanálise, este conhecimen-
to permite a realização de um processo de planejamento e direcionamento de
metas visando o bem estar e a qualidade de vida. Enquanto profissionais da
psicologia, a análise motivacional permite o acesso à subjetividade das pessoas
que são atendidas e o embasamento para a construção de intervenções visando
atingir a saúde em sua totalidade, direcionada ao bem estar de forma ampla
e plena.

CONCEITO
A ANÁLISE MOTIVACIONAL permite e tem como objetivo compreender de que modo a
motivação participa, influencia e ajuda a explicar o fluxo comportamental de uma pessoa.
Para o profissional de a Psicologia este processo é de extrema relevância porque viabiliza o
planejamento da técnica de intervenção.

12 • capítulo 1
O que muda a intensidade do comportamento?
Por que determinados objetos são tão relevantes em períodos específicos
da vida e de repente deixam de sê-lo? E por que outros passam ao longo da vida
sempre possuindo um valor muito forte?
Isto não acontece apenas com objetos, mas com expectativas, metas e obje-
tivos de vida também. Por que algumas pessoas centram suas vidas no trabalho
e, de repente, passam a focar somente na família e vice-versa? Por que jogos e
brinquedos que nos entusiasmavam quando éramos crianças não o fazem mais
quando somos adultos?
Estas questões são mais alguns dos “enigmas” de que trata o estudo da mo-
tivação. É interessante perceber que esta alteração de intensidade pode ocorrer
entre períodos longos, como etapas da vida (infância, adulto, velhice), mas pode
também ocorrer em fases menores, como de um dia para o outro. Por exemplo,
a mesma pessoa pode chegar altamente motivada para um dia de trabalho e
superar sua meta de vendas e no dia seguinte estar apática e ter o rendimento
bem abaixo do esperado.
Cabe ressaltar que a motivação é um processo. E que, apesar de todas as
pessoas possuírem os mesmos processos motivacionais básicos, aquilo que
motiva cada uma delas é que vai influenciar a especificidade e a intensidade de
seu comportamento.

CONCEITO
O estudo da motivação refere-se à compreensão dos processos que energizam e direcionam
o comportamento.

ATENÇÃO
As motivações básicas são compartilhadas por todos, o que muda é O QUE MOTIVA
cada pessoa.
O MOTIVO MUDA → O COMPORTAMENTO VARIA
Em pessoas diferentes

Na mesma pessoa em momentos diferentess

capítulo 1 • 13
Aquilo que motiva cada pessoa vai estar vinculado à sua história de vida
e suas experiências, às memórias afetivas de prazer e desprazer, a aprendi-
zagem anterior sobre o que é benéfico ou não num determinado momento.
Estes conhecimentos se tornam preciosos num momento decisório sobre
quando iniciar ou não um comportamento e de que forma fazê-lo e quando
interrompê-lo.

Os processos que energizam e direcionam o comportamento de um indivíduo emanam tanto


das forças do indivíduo como do seu ambiente. Os motivos são as experiências internas
– necessidades, cognições e emoções – que energizam as tendências de aproximação ou
de afastamento do indivíduo. Os eventos externos são incentivos ambientais que atraem ou
repelem o indivíduo em relação a um curso particular de ação. (REEVE: 2006, p.4)

EVENTOS EXTERNOS
Fisiológicas

MOTIVAÇÃO NECESSIDADES Psicológicas

Sociais
MOTIVOS INTERNOS COGNIÇÕES

EMOÇÕES

Figura 1.1  –  Hierarquia das quatro fontes de motivação. Fonte: REEVE: 2006.

1.1  Os motivos internos


Um motivo interno é uma condição interna ao organismo que energiza e dire-
ciona um comportamento. Podem ser classificados como necessidades, cogni-
ções e emoções. As necessidades são condições internas ao corpo e indispen-
sáveis à manutenção da vida, do equilíbrio homeostático, bem estar e pleno
desenvolvimento. Como exemplo, pode-se citar a fome, a sede e o sono.
As necessidades podem ser divididas em fisiológicas, psicológicas, so-
ciais. As fisiológicas são fundamentais para a manutenção da vida do organis-
mo. Caso não sejam saciadas, os tecidos do corpo começam a danificar-se e o

14 • capítulo 1
organismo pode ir a óbito. Com relação às necessidades psicológicas, a foco é a
qualidade de vida e o pleno desenvolvimento do indivíduo. Como exemplo, po-
dem ser citadas as necessidades de competência, autonomia e relacionamento.
Já as necessidades sociais, se não trabalhadas, afetam a vida social do sujeito.

CURIOSIDADE
Existem também as quase necessidades, que se referem a questões circunstanciais que
ocorrem no dia a dia de qualquer pessoa. Por exemplo: tenho uma conta para pagar e tenho
necessidade de? Dinheiro! Estou na rua e começa a chover; tenho necessidade de? Um
guarda-chuva!

As cognições fazem referência aos nossos estados mentais, como pensa-


mentos, crenças expectativas, opiniões, autoconceito, representações, metas.
São construídas ao longo da nossa vida e implica na conjunção de outros pro-
cessos cognitivos atuando concomitantemente, como a atenção, sensação, per-
cepção, memória, resolução de problemas, consciência, tomada de decisão etc.
Cognição significa o processo de construção de conhecimento, base para
o nosso entendimento sobre o mundo e a realidade, para o relacionamento e
a comunicação com as pessoas e, desta forma, determina o posicionamento
diante das situações e os comportamentos realizados.

CURIOSIDADE
A cognição humana é fundamental para a construção de toda a base de conhecimentos que
permite as pessoas terem suas próprias identidades e reconhecerem-se como únicas no
mundo, diferente de todas as outras. Para isto, a memória é um dos processos fundamentais,
porque através do armazenamento de conteúdos durante longos períodos de tempo, permite
que as pessoas construam sentimentos de pertença em relação a um determinado grupo
familiar, uma comunidade e uma nação.

As emoções são o outro motivo interno. Elas são fundamentais à vida hu-
mana e permitem que a vida ganhe um colorido especial e não fique somen-
te no preto e branco (ou cinza). As emoções são importantes no processo de

capítulo 1 • 15
socialização dos seres humanos, pois viabilizam a construção de vínculos e re-
lacionamentos, indispensáveis à construção de laços sociais, transmissão do
conhecimento adquirido pela espécie e valores, proteção aos elementos mais
fracos do grupo (os filhotes) e defesa.

CURIOSIDADE
As emoções surgiram na espécie humana como um processo evolutivo e adaptativo impor-
tante. Através das emoções o cérebro consegue processar estímulos ambientais mais célere
do que a consciência, permitindo uma prontidão fisiológica e comportamental bem rápida ao
organismo em momentos decisivos de vida e morte que, se dependessem da consciência para
processar o que está acontecendo ao seu redor, o organismo não teria nenhuma chance.

As emoções possuem quatro aspectos básicos que devem funcionar de for-


ma harmoniosa, são eles:
1. Sentimento – é a experiência subjetiva da emoção; como as pessoas re-
latam que estão se sentido, como elas conseguem verbalizar conscientemente
e fenomenologicamente o que percebem que se passa com elas;
2. Prontidão fisiológica – toda emoção possui uma alteração fisiológica
subjacente, como batimento cardíaco, arrepio, embrulho no estômago entre
outros; se o que a pessoa sente não vem com uma alteração fisiológica, não é
emoção, mas somente um sentimento;
3. Expressividade – as emoções vêm carregadas de expressividade corpo-
ral e facial. Este é um dos aspectos que viabilizam a comunicação e empatia (ou
não) entre os seres humanos. Ao longo da vida, os seres humanos aprendem a
fazer esta leitura emocional através da educação familiar, escolar, social e a lidar
com as pessoas em cada situação. Caso esta leitura emocional não seja aprendi-
da de forma adequada o processo de socialização pode ficar prejudicado;
4. Funcionalidade – a função das emoções pode ser considerada de uma
forma mais abrangente, relacionada à adaptação do organismo ao ambiente,
e de uma forma mais específica, relacionada à emoção em si. Um exemplo é
o medo: esta emoção possui a função de nos deixar em estado de alerta para
a defesa diante da possibilidade de um estímulo que gere risco à integridade
do organismo.

16 • capítulo 1
ATENÇÃO
Existem emoções primárias ou inatas como o medo, a raiva, a repugnância, a alegria, a triste-
za e o interesse e emoções secundárias ou aprendidas.

Eventos externos
Além dos motivos internos, há os eventos externos que também energizam e
direcionam o comportamento. Estes eventos são incentivos ambientais que an-
tecedem o comportamento e geram tendências de aproximação ou afastamento,
dependendo das circunstâncias e do efeito que seu resultado provocará na pessoa.
De uma forma geral, podemos dizer que os seres humanos possuem uma
disposição de aproximação de situações e objetos que lhes tragam prazer, pois
são interpretados como benéficos para o organismo de alguma forma, e de afas-
tamento de situações e objetos que lhes tragam desprazer, entendendo que po-
dem ser tóxicos ao organismo. Estas situações e ou objetos podem ser encarados
como comidas, situações, relacionamentos, eventos e até crimes que vão de en-
contro com os nossos padrões morais e que geram repugnância. Esta interpreta-
ção é edificada ao longo da vida e das aprendizagens do sujeito e de todas as expe-
riências de prazer e desprazer que foram vivenciadas e arquivadas na memória.
Diante desta premissa, eventos que prenunciam uma probabilidade de re-
compensa, possuem a capacidade de energizar e direcionar o organismo na
realização do que se almeja.

Verificando o surgimento, a intensidade e a qualidade da motivação


Na realização de uma Análise Motivacional é importante identificar a inten-
sidade e a qualidade da motivação nos comportamentos das pessoas. Existem
quatro possibilidades de identificar a expressão motivacional das pessoas: pela
fisiologia, pelo comportamento manifesto, pelo autorrelato e pela história dos
antecedentes do comportamento.

REFLEXÃO
A Análise Motivacional permite ao profissional da Psicologia compreender, explicar e intervir
no fluxo comportamental de uma pessoa.

capítulo 1 • 17
A fisiologia
O processo de análise da fisiologia relacionada à motivação para realização
de comportamentos requer exames laboratoriais e outros como: de sangue,
urina, EEC (eletroencefalograma), pressão cardíaca, batimento cardíaco, pois
em um organismo motivado, há toda uma sustentação biológica relacionada a
hormônios e neurotransmissores que viabilizam o início da ação.

ATIVIDADE A atividade do coração e dos vasos sanguíneos aumenta quando se está


CARDIOVASCULAR diante de tarefas difíceis ou desafiadoras ou de incentivos atraentes.

Substâncias contidas na corrente sanguínea, particularmente nas cateco-


ATIVIDADE laminas, tais como epinefrina e norepinefrina, reguladoras da reação que
PLASMÁTICA prepara o indivíduo para luta ou fuga.

Comportamento ocular – tamanho da pupila, frequência de piscadelas e


dos movimentos oculares. O tamanho da pupila tem relação com o nível de
ATIVIDADE atividade mental; piscadelas involuntárias expressam alterações nos estados
OCULAR cognitivos, além de pontos de transição no fluxo de processamento da infor-
mação; e os movimentos laterais dos olhos laterais dos olhos aumentam de
frequência durante o pensamento reflexivo.

Alterações elétricas na superfície da pele, como nos momentos em que a


ATIVIDADE pessoa sua. Estímulos novos, emotivos, ameaçadores e capazes de aprender,
ELETRODÉRMICA de prender a atenção, evocam, todos, uma atividade eletrodérmica para
exprimir ameaça, aversão e significância dos estímulos.

ATIVIDADE Atividade muscular, tal como ocorre com as expressões faciais e os gestos
ESQUELÉTICA corporais.

ATIVIDADE Atividade de várias partes do cérebro, tais como o córtex e o sistema límbico.
CEREBRAL

Tabela 1.1  –  Expressões Psicofisiológicas da Motivação. Fonte: REEVE, 2005: p. 6.

O auto-relato e a história dos antecedentes do comportamento


A verificação da motivação através do autorrelato da própria pessoa traz ques-
tões relacionadas à sua fidedignidade, pois em locais onde falta clima apoia-

18 • capítulo 1
dor, em termos motivacionais, e que são percebidos como coercitivos e auto-
cráticos, como escolas e locais de trabalho, pode haver distorções nos discursos
das pessoas entrevistadas.

CURIOSIDADE
Ambientes apoiadores da motivação são aqueles nos quais as pessoas se sentem à vontade
para expressar o que pensam, para exercer sua criatividade e sua autonomia de pensamento.
Nestes lugares, as pessoas não se sentem diminuídas ou coagidas porque são acolhidas em
suas singularidades, consideram o erro como uma etapa para o crescimento e para a evolu-
ção do processo de aprendizagem.

Além disso, a técnica do autorrelato geralmente é realizada através da apli-


cação de questionários e entrevistas e estudos indicam que a interpretação das
pessoas sobre o que elas sentem, dizem e a correspondência psicofisiológica
verificada através de exames realizados, não equivale. Por exemplo, uma pessoa
pode dizer que não está ansiosa, mas exames laboratoriais mostram que ela
está extremamente ansiosa. (REEVE, 2005: p.7)
No que se refere ao histórico dos antecedentes do comportamento, este ca-
minho torna-se interessante porque permite acessar os interesses, desejos e
um recorte da história de vida da pessoa. Esta é uma boa técnica complementar
às outras.

A observação comportamental
Podem-se verificar sete aspectos no comportamento das pessoas que aju-
dam a identificar a intensidade, a qualidade e a presença da motivação. São
eles: (REEVE, 2005: p.6)
1. O esforço – quantidade de energia empregada na tentativa de execução
de uma tarefa;

ATIVIDADE
C. 24 anos, é assistente administrativa de uma grande empresa. Trabalha no setor contábil
e necessita realizar uma infinidade de relatórios para manter os dados em dia e passíveis de
controle e planejamento.

capítulo 1 • 19
Caso 1: C. está fazendo contabilidade e acha que nasceu para fazer relatórios contábeis
e esforça-se ao máximo para que todos saiam perfeitos.
Caso 2: C. está cursando fisioterapia, e não vê sentido nenhum em tantos números...
Esforça-se ao máximo para realizar aqueles relatórios, que acha muito enfadonho, mas o
emprego é necessário para pagar a graduação. Não vê a hora de sair daquele emprego.
No caso 1 o esforço realizado por C. significa que ela está motivada ou não? E no caso 2?

2. A latência – tempo durante o qual uma pessoa adia sua resposta após
ter sido exposta a um estímulo;

ATIVIDADE
D. possui 13 anos e está na fase de deixar o quarto muito bagunçado. Sua mãe pediu que
ele arrumasse o quarto às 13h, logo após o almoço. D. prometeu à mãe que faria isso após
escutar uma música que ele adorava no seu celular. Quando a mãe de D. voltou ao quarto
do menino, verificou que ele não havia guardado nenhum brinquedo ou peça de roupa no
armário. Já eram 16h.
CASO 1: Na situação apresentada, a latência foi grande ou pequena? Esta latência
representa que D. estava motivado ou não para arrumar o quarto?
CASO 2: Se D., ao pedido da mãe, iniciasse a organização do quarto imediatamente, a
latência seria grande ou pequena? Esta mudança demonstra alguma diferença em termos
motivacionais em D.?

3. Persistência – tempo decorrido entre o início e o fim da resposta;

ATIVIDADE
H., 15 anos é viciado em jogos matemáticos tipo sudoku. Fica horas absorto e concentrado
jogando desafios cada vez maiores. Não importa o quão difícil possa ser como ele gosta, ele
não inicia outra etapa enquanto não termina aquela que ele está, pode demorar horas, dias
ou meses.
CASO 1: A persistência de H. num mesmo jogo durante horas ou dias significa que ele
está motivado ou não?

20 • capítulo 1
4. Escolha – Quando se está diante de duas ou mais possibilidades de
ação, mostra-se preferência por uma delas, em detrimento das demais;

5. Probabilidade de resposta – número (ou porcentagem) de ocasiões em


que se verifica uma resposta orientada para um determinado objetivo, quando
ocorrem diversas oportunidades diferentes para o comportamento ocorrer;

EXEMPLO
Cecília foi novamente considerada a funcionária do mês. A análise de desempenho levou em
conta a qualidade do trabalho realizado, o prazo de entrega, o bom humor da funcionária, o
senso de responsabilidade e solidariedade com os colegas e a tranquilidade na resolução
dos problemas quando surgem as adversidades. Cecília demonstrou que possui a melhor
constância de características de personalidade e a melhor porcentagem de respostas
adequadas aos padrões da empresa no último mês de recessão

6. Expressões faciais – movimentos faciais (torcer o nariz, levantar o lábio


superior, baixar as sobrancelhas etc.)
Exemplo:

Figura 1.2  –  Acesso em: <https://www.google.com.br/search?q=charge+sobre+moti-


va>,11 de outubro de 2015.

capítulo 1 • 21
7. Sinais corporais – postura, mudança no apoio do peso, movimentos das
pernas ou dos pés, braços e mãos etc.
Exemplo

Figura 1.3  –  Acessado em: http://www.ciclosempresasfamiliares.com.br/2013/01, 11 de


outubro de 2015.

A relação entre motivação, adaptação e resiliência.


Os seres humanos são sistemas complexos que habitam ambientes em
constante mutação. A capacidade de evolução e desenvolvimento de novas res-
postas às mudanças ambientais são fundamentais e podem fazer a diferença
entre a manutenção da vida das pessoas e de sua espécie, ou sua extinção.
Desta forma, a capacidade que o organismo humano possui em lidar com
novos desafios e aprender com eles, alterando, muitas vezes, sua conformação
neurocognitiva, é o que nos permitiu (e continua a permitir) permanecer como
espécie dominante até os dias atuais.
Sem dúvida, a motivação enquanto processo é básica nesta economia sistê-
mica, onde o homem influencia o ambiente e o ambiente retorna esta influên-
cia dialeticamente, um alterando o outro naquilo que lhe é necessário enquan-
to suporte vital.
O ser humano, ao longo de seus milhares de anos de evolução, conseguiu
um feito que nenhuma outra espécie realizou. Aliou mecanismos biológicos,
cognitivos e simbólicos com a função de manter a vida, e a motivação tornou-se
um deles.

22 • capítulo 1
A possibilidade de um humano auto motivar-se para realizar algo que ne-
cessita mesmo que não haja nenhum impulso biológico de base, como fome
ou sede, somente para a aprendizagem ou para sentir prazer ou, ainda, para
atingir a proficiência (competência) em determinado assunto, alimenta vida
individual daquele respectivo sujeito, mas, de forma abrangente, alimenta
também a cultura e a civilização humana. Traz a evolução da espécie. A própria
ciência e as grandes (e pequenas) invenções da humanidade, como o avião, a
lâmpada, a eletricidade, a geladeira, o cinema entre outras, são testemunhas
deste processo.
Num sentido mais estrito, a incapacidade de automotivação e de resolução
dos próprios problemas, prejudica as pessoas em suas existências tornando sua
adaptação prejudicada. Por exemplo, uma pessoa que apresenta um quadro de-
pressivo, possui uma baixa capacidade de automotivação, o que vai afetar sua
vida de uma forma geral, como a higiene, alimentação, trabalho, socialização
e relacionamentos.
Por outro lado, as pessoas que possuem uma alta qualidade e capacidade
de automotivação, tendem a ser mais flexíveis diante das adversidades e ser
mais resilientes.

CURIOSIDADE
Resiliência é a capacidade das pessoas de ultrapassarem adversidades da vida mantendo
a condição de resolver os problemas de forma eficiente. Não significa que serão imunes a
tristeza ou lutos, mas que diante de uma situação difícil, a opção a ser escolhida será aquela
voltada para o crescimento e evolução enquanto pessoas.

Tópicos importantes do capítulo


1. A Motivação é um processo básico relacionado ao comportamento das
pessoas que, a partir de motivos internos e eventos externos, iniciam perpe-
tuam e terminam os comportamentos.
2. Motivos são condições internas ao organismo que energizam e dire-
cionam o comportamento. Podem ser divididos em necessidades (fisiológicas,
psicológicas e sociais), cognições e emoções.

capítulo 1 • 23
3. Os eventos externos são incentivos ambientais que energizam e dire-
cionam comportamentos. A tendência comportamental de aproximação ou
afastamento estará vinculada à aprendizagem da pessoa ao longo de vida, rela-
cionado com aquele objeto e com as experiências de prazer e desprazer.
4. Existem várias formas de verificação da existência da motivação.
Algumas delas são, a observação comportamental, o autorrelato através de
entrevista, exames psicofisiológicos e análise da história dos antecedentes
do comportamento.
5. A motivação, enquanto processo cognitivo, que vincula aspectos bioló-
gicos, emocionais, cognitivos e simbólicos do organismo humano é mais uma
das ferramentas evolutivas que a espécie humana possui para lidar com as ad-
versidades. Quanto maior a capacidade de automotivação, mais flexibilidade
para lidar com as desventuras e maior a capacidade de adaptação ao ambiente.

No próximo capítulo serão apresentadas as teorias motivacionais ao longo


na história do estudo da motivação e da emoção na ciência psicológica.

24 • capítulo 1
2
A História
das Teorias
Motivacionais
OBJETIVOS
•  Historicizar brevemente a Psicologia, desde sua raiz filosófica até seu nascimento enquan-
to ciência;
•  Identificar na historia da Psicologia os principais conceitos que influenciarão as teo-
rias motivacionais;
•  Apresentar as Teorias motivacionais.

26 • capítulo 2
A Psicologia é uma ciência nova. Consensualmente, considera-se que seu
“nascimento” ocorreu no século XIX, com Wilhelm Wundt, especificamente
em Leipzig, na Alemanha, pois, apesar de já existirem outros filósofos e fisiolo-
gistas interessados nos fenômenos psicológicos, é creditado à Wundt a ambi-
ção de organizar o campo e fundar a ciência Psicológica. No prefácio de sua obra
Principles of Physiological Psycology (Princípios de Psicologia Fisiológica, de
1873-74, consta sua expressa intenção em delimitar um novo campo científico.
(SCHULTZ; SCHULTZ, 2005, p.79)
Entretanto, apesar de Wundt ser fundamental para
circunscrever a Psicologia enquanto nova ciência, ele
não foi o seu criador, pois muitos outros filósofos, fisio-
logistas, cientistas diversos, trabalharam criativamente
para construir o campo científico diversificado que é a
Psicologia na atualidade.
Dois fisiologistas e intelectuais foram de notável im-
portância para o trabalho de Wundt: Ernst Weber (1795-
1878) e Gustav Theodor Fecher (1801-1887). Deve-se Figura 2.1  –  W i l h e l m
ao primeiro a descoberta do Limiar de dois pontos e o Wundt (1832 – 1920)
princípio da Diferença mínima perceptível, e ao segundo, o Limiar absoluto e
o Limiar diferencial.
De acordo com Ernst Weber, as pessoas são capazes de diferenciar se são
estimuladas por um ou dois estímulos, dependendo da distância entre eles.
Para chegar a esta conclusão, usou um aparelho parecido com um compasso
que aplicava na pele de seus sujeitos sem que eles vissem o aparelho. Quando
as pontas estavam próximas, as pessoas respondiam
que sentiam um estímulo. Gradativamente, Weber
separava os pontos até que atingiam um espaço onde
os sujeitos respondiam que estavam sentindo dois es-
tímulos diferentes. A esta sensação onde se consegue
distinguir dois estímulos diferenciados, ele nomeou
como Limiar de dois pontos. A pesquisa de Weber
marca a demonstração sistemática experimental do
conceito de limiar (o ponto em que começa a se pro-
duzir o efeito psicológico), noção amplamente usa-
Figura 2.2  –  Ernst Weber
da na Psicologia desde seu início até os dias atuais.
(1795-1878)
(SHULTZ; SCHULTZ, 2005, p.68)

capítulo 2 • 27
Weber continuou suas pesquisas até chegar à primeira lei quantitativa da
ciência psicológica, a Diferença mínima perceptível ou DMP, que significa a
menor diferença detectável entre dois estímulos físicos. (id.)
Apesar de Ernst Weber não ter interesse nos resultados do seu trabalho para
a ciência psicológica, eles foram fundamentais, pois comprovaram a existên-
cia direta entre a estimulação e a percepção do sujeito sobre esta estimulação.
Além disso, seus estudos propiciaram uma sistemática para as novas pesquisas
que floresciam na investigação entre corpo e mente.
Gustav Fechner descobriu a possibilidade de encontrar a ligação mente e
corpo através de uma relação quantitativa por meio da sensação mental e do
estímulo material.

Fechner apresentou duas propostas para medir as sensações. Primeiro, determinar se o


estímulo está presente ou ausente, se foi sentido ou não. Segundo, medir a intensidade
do estímulo na qual as pessoas relatam a primeira sensação, ou seja, o limiar absoluto da
sensibilidade, que é o ponto de intensidade abaixo do qual a sensação não é percebida e
acima do qual é sentida. (ibid., p.71)

Em seguida, determinou o limiar diferencial da sensibilidade, que refere-se


ao ponto de sensibilidade em que a menor alteração em um estímulo provoca
uma mudança na sensação. (id.)

COMENTÁRIO
FECHNER cujo nome está relacionado à obra “Elementos de Psico-
física”, publicado em 1860, acreditava que existia uma relação ente
o físico e o psíquico que poderia ser matematizada através de uma
equação que levasse em conta a quantidade de excitação do estímu-
lo e a sensação que ocasionaria.
Figura 2.3  –  Gustav Theodor Fechner (1801-1887)

Apesar da contribuição significativa de Weber e Fechner para que a


Psicologia conseguisse ser reconhecida como ciência de fato, Wundt recebe o
mérito de ter construído o primeiro curso de Psicologia, o primeiro Laboratório
e a primeira revista. (FREIRE,1997, p.91)

28 • capítulo 2
Se a Psicologia enquanto ciência é nova, isto não se configura enquanto ver-
dade quando se pensa sobre o questionamento acerca da existência humana,
da mente, da relação mente X corpo, da construção do pensamento e do conhe-
cimento, da memória, das sensações e necessidades humanas, das emoções e
de como o ser humano se comporta. E, para se entender como tudo começou, é
importante fazer uma digressão histórica.
Quando se pensa em início, sabe-se que toda a raiz do pensamento ociden-
tal começa na Antiguidade, com os filósofos Gregos. E a Psicologia também ini-
cia naquele momento, no âmbito da filosofia, devido à sua preocupação com
as questões relacionadas à existência humana que perduram até os dias atuais.

As raízes filosóficas da psicologia

O período cosmológico
As primeiras ideias filosóficas que se têm conhecimento surgiram por volta
do século IV a.c., no período denominado Cosmológico. A preocupação prin-
cipal pautava-se em compreender e elucidar do que era formado o COSMO.
Perguntas como: do que é feito (matéria), como funciona, quais são as leis que
regem o universo, eram comuns e produziam milhares de especulações mitoló-
gicas e posteriormente filosóficas para explicar a realidade e o funcionamento
da natureza.
Esta construção de conhecimento é fundamental e intrínseca ao homem,
visto que o ser humano depende deste movimento para poder atuar no ambien-
te, entendê-lo, satisfazer as suas necessidades básicas. Através da construção
do conhecimento, o ser humano consegue, diante de suas inabilidades físicas
em determinadas situações, construir ferramentas para lidar com as respecti-
vas necessidades.
Estes filósofos do período cosmológico possuíam como princípio básico
de suas teorias a ideia de que o cosmos e o universo eram formados por uma
substância única, um elemento (átomo), e que o mundo somente poderia ser
compreendido se se aproximasse deste elemento básico ou mais simples da na-
tureza ou universo. (FREIRE,1997, p.25)

capítulo 2 • 29
CONCEITO
Atomismo, elementismo ou monismo refere-se à busca da verdade ou conhecimento através
da redução das questões complexas, fatos, objetos ou fenômenos, aos seus mais simples.
Esta ideia ainda hoje é utilizada pela ciência, quando reduzimos os fenômenos complexos
em seus elementos mais simples para estabelecer relações de causa e efeito e entender o
seu funcionamento.

PSICOLOGIA FILOSÓFICA OU PRÉ-CIENTÍFICA PSICOLOGIA CIENTÍFICA


IDADE
IDADE ANTIGA IDADE MÉDIA IDADE CONTEMPORÂNEA
MODERNA
Período Período Período
Período Antropocêntrico
Cosmológico Antropocêntrico Teocêntrico
Preocupação: co- Preocupação Reação à
Busca enten- nhecer o homem, em submeter tendência Nasce a Reestrutu-
der e explicar seus processos o saber à dogmática Psicolo- ração da
o cosmo. mentais; sua inte- fé cristã do gia 1879 Psicologia
Séc.VI a.c. gração social Séc. V a Séc. pensamento Séc. XIX Séc. XX
Séc. IV a.c. XIV Séc. XV

Tabela 2.1  –  Freire: 1997, p.20

O primeiro filósofo considerado importante no período cosmológico foi


Tales de Mileto (640 – 584 a.c.). Segundo ele, a substância primordial de todas
as coisas era a água, porque permanecia estável apesar das transformações que
tudo sofria e, também, porque fazia parte da composição da maioria dos ele-
mentos e espécies dos reinos mineral, vegetal e animal.
Heráclito de Éfeso (540 – 475 a.c.) concentrava sua atenção ao processo de
transformação de todas as coisas, ou devir. Para este filósofo, o elemento fun-
damental era o fogo, pela sua natureza instável e não estática, visto que pensava
não existir nenhum elemento fixo ou duradouro no Universo. (FREIRE, 1997,
p.26) No pensamento psicológico, suas ideias trazem a atenção para o psicólo-
go de que os fenômenos psíquicos são mutáveis e permanecem em constante
transformação, onde não se consegue experienciar a mesma coisa duas vezes.
Pitágoras de Samos (570 – 496 a.c.) apresentou o número como o fundamen-
to de todos os fenômenos diante da mudança e transformação dos eventos. Os
números são imutáveis e atemporais, constituindo uma linguagem universal,
(...) expressam as relações fixas e numéricas de todas as coisas, dentro de uma

30 • capítulo 2
ordem rítmica. (FREIRE, 1997, p.26). Suas ideias foram e permanecem de gran-
de importância para a construção do modelo científico pautado em métodos
quantitativos. Nesta perspectiva, através da quantificação matemática, é possí-
vel se chegar ao fundamento e a base de funcionamento dos fenômenos para a
verificação de sua validade. Para a Psicologia, a matematização dos fenômenos
psíquicos através da pesquisa experimental, viabilizou que o campo fosse reco-
nhecido como ciência.

A tentativa de conhecer o mundo em termos quantitativos foi de muita importância. Esse


é o procedimento das ciências, no sentido de obter um conhecimento mais exato dos
fenômenos. Na Psicologia, o uso dos métodos quantitativos foi um dos fatores decisivos
para fazer dela uma ciência. (FREIRE, 1997, p.27)

CONCEITO
Um experimento é definido como um estudo onde as variáveis são medidas e manipuladas.
A ideia é manipular uma das variáveis e verificar como ela afeta a outra que se deseja medir.
Neste modelo de pesquisa, deseja-se estabelecer uma relação causal entre as duas variá-
veis, a que se manipula e aquela que se deseja medir. (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005)

Anaxágoras de Clazômenas (499 – 428 a.c.) aventurou-se a explicar o univer-


so, porém não era elementista no sentido estrito, mas considerava a possibili-
dade de uma diversidade de elementos, ou sementes, que trariam o gérmen das
coisas. (FREIRE, 1997, p. 27)

Essas sementes estariam contidas no magma (massa natural) original e foram separadas
por uma inteligência ordenadora. Dizia que “tudo está em tudo, pois cada coisa há uma parte
de todas as outras”. Sendo assim, o cerne da questão era saber como se uniam e como
se relacionavam esses elementos, cujas transformações e mudanças seriam mecânicas. O
que vai designar a diversidade dos seres é a disposição e a combinação dos elementos no
todo. (FREIRE,1997, p.27)

A contribuição de Anaxágoras para a Psicologia está na ênfase oferecida à


disposição e ordem dos elementos relacionados ao todo, ideias que serão base
para a Psicologia da Gestalt no século XX.

capítulo 2 • 31
Demócrito de Abdera (460-370 a.c.), último elementista do período cosmo-
lógico, acreditava que o elemento essencial do universo eram os átomos, que se
distinguiam quanto à forma, tamanho, ordem, posição e movimento. Segundo
este filósofo, o corpo e até a alma são compostos por átomos, que estariam
sujeitos à degeneração e a morte. Os átomos moviam-se de acordo com uma
lei “rígida ou cega” e os movimentos que unem ou separam os átomos são pu-
ramente mecânicos. (FREIRE, 1997, p. 28) Demócrito acreditava, ainda, que a
natureza não possui uma causa a priori e que somente poderia ser elucidada
por si própria; e, ainda que os episódios da vida humana fossem determinados
por agentes externos. Na sua teoria, cabe destaque na influência dos estímulos
externos para a determinação dos comportamentos humanos, que aparece em
contraposição a possibilidade de livre-arbítrio. Essas ideias serão retomadas
pelos behavioristas na construção de seu projeto de uma psicologia objetiva e
passível de experimentação através da relação entre organismo e ambiente, ou
estímulo – resposta.

Tales – Água Heráclito – Fogo Pitágoras - números


Início do Período Mudança, dialética, Quantificação e
Cosmológico eterno devir visão estatística

Período Cosmológico:
entender o cosmo, sua
constituição,
seus princípios e leis

Anaxágoras – diversidade Demócrito – Átomo


Relação e ordenação Visão estática; ordem;
entre os elementos determinismo externo X livre arbítrio

Figura 2.4  –  O período Cosmológico. FREIRE, 1997.

32 • capítulo 2
Os Filósofos Clássicos

Sócrates e o “Conhece-te a ti mesmo”


Sócrates (436 – 336 a.c.), de Atenas, é considerado um dos expoentes da fi-
losofia grega. Criador da maiêutica, acreditava que o objetivo final da filosofia
era a educação do cidadão e que somente através da mesma poderia se chegar
ao conhecimento, à moral e à vida ética, pois a maldade, segundo ele, resultaria
da ignorância. Sua pedagogia pautava-se no diálogo crítico e na argumentação,
através do qual instruía que o conhecimento do meio através dos sentidos era
imperfeito, pois estes estariam sujeitos a ilusões. Então, priorizava o conheci-
mento de si mesmo como o válido, e condição para se levar uma vida virtuosa
pelo caminho dos preceitos morais. Para isto era preciso admitir o princípio
“sei que nada sei”, logo de início, visto a imersão da humanidade na ilusão do
saber através da via dos sentidos.
A importância de Sócrates é a de trazer uma ruptura crítica ao conhecimen-
to e tradições da época, o que resulta numa transformação radical nas ideias
filosóficas gregas, como também em todo o pensamento filosófico ocidental.
(FREIRE, 1997)

CONCEITO
A Maiêutica socrática refere-se a um método de construção do conhecimento através do
diálogo, conduzido por perguntas e argumentações. A ideia central era evidenciar às pessoas
que seus próprios conceitos sobre as coisas eram contraditórios e confusos, ou seja, mostrar
sua ignorância, para a partir daí “dar a luz” a uma conhecimento claro e generalizável.

Platão (427 – 347 a.c.) de Atenas, foi discípulo e intérprete de Sócrates e


também acreditava que o conhecimento que chegava através dos sentidos hu-
manos era imperfeito. Para este filósofo, existia outro mundo pertencente às
ideias e considerado imutável, perfeito e transcendente, porém vinculado ao
homem desde o nascimento através de sua alma.

capítulo 2 • 33
CONCEITO
O entendimento de que há ideias presentes desde o nascimento, conforme o pensamento de
Platão é denominado inatismo e os respectivos seguidores são os nativistas. Em contraposi-
ção a estas ideias surge o empirismo e os denominados empiristas, seguidores de Aristóte-
les, com a perspectiva de que todo o conhecimento advém da experiência.

Seu pensamento era de que a alma humana, antes do nascimento e de sua co-
nexão com o corpo, teria contato com este mundo das ideias. Neste sentido, para
Platão, o corpo é um obstáculo ao conhecimento, visto que a alma ao se conectar
com o corpo físico esquece desta experiência no mundo superior das ideias.
Esta visão traz a dualidade no pensamento de Platão relacionada à alma
imaterial e ao corpo material torna-se um dos fundamentos do pensamento
ocidental e a raiz mestra da Psicologia, pois será retomada em todo o percurso
da história e dela surgiram muitas outras pequenas raízes ou questões. (FREIRE,
1997, p.34)

Depois de estabelecer a distinção entre mente e matéria, Platão associou a esses dois
termos um conjunto de valores opostos. A mente foi identificada com o belo e o bem,
enquanto a matéria representava a parte inferior do homem e do universo. A alma seria
imortal, mas, unida ao corpo, teria três partes: uma sensual, ligada as necessidades
corpóreas; outra ligada aos afetos, impulsos e emoções, e a terceira, a racional, que inclui a
inteligência e a vontade livre. Essa divisão foi o que mais tarde foi chamada de faculdades
da alma. (FREIRE, 1997, p.34)

ATENÇÃO
As três partes da alma de Platão influenciarão a Psicologia no entendimento dos motivos psi-
cológicos, ou melhor, a base do que causa os comportamentos humanos. Já na teoria deste
grande filósofo, podemos citar as necessidades, os impulsos, as emoções e a vontade. Esta
última, considerada a 1ª Grande Teoria Motivacional.

Aristóteles de Estagira, Macedônia (384-322 a.c.) foi discípulo Platão, po-


rém se opunha às suas ideias inatistas e sobre a dualidade mente X corpo. Para

34 • capítulo 2
Aristóteles, mente e corpo podem ser entendidos como indivisíveis e o conheci-
mento é construído a partir da experiência da criança no mundo, do seu conta-
to com o ambiente através dos seus órgãos dos sentidos. Os sentidos e as sensa-
ções ganham importância na teoria aristotélica que considerava que

Os órgãos dos sentidos, quando estimulados, provocam reações, ou sejam, impressões, por
exemplo, de bem-estar, de mal-estar, gustativas, visuais, térmicas etc. Essas impressões são
o que se denomina de sensações. As sensações seriam, assim, o elemento mais simples e
primitivo do conhecimento. (FREIRE, 1997, p.37)

Aristóteles é considerado um filósofo de grande importância para a


Psicologia. Escreveu duas obras sobre assuntos psicológicos, De anima e A res-
peito da mente, onde abordou os sentidos, as sensações, a memória, o sono
e a insônia, a juventude e a velhice. Acreditava, ainda, que a Psicologia estava
vinculada à biologia.
Epicuro de Samos (341-270), também foi um filósofo grego, reconhecido
por ser o criador do epicurismo, filosofia elevava a natureza humana como
meio para alcançar a felicidade. Para ele, o bem estaria conectado ao prazer de
toda práxis humana. Entretanto, para Epicuro a felicidade apropriada era a do
espírito. Os discípulos epicuristas deturparam suas ideias levando à confusão
entre epicurismo e hedonismo, pois entenderam que a felicidade significava
deleitar-se ao prazer material e à imoralidade.

CONCEITO
Hedonismo vem do grego hedonê que significa prazer, gozo. Alguns teóricos consideram que
a filosofia hedonista foi introduzida por um discípulo de Sócrates chamado Aristipo, e não
Epicuro. Sua ideia central baseia-se em fugir da dos e buscar o prazer. (FREIRE, 1997, p. 39)

O período Teocêntrico
O período teocêntrico pouco contribuiu para o desenvolvimento da
Psicologia. Este período foi marcado pela ascensão do cristianismo e teve a
duração de aproximadamente dez séculos, V a XIV, relativos à Idade Média.
A Igreja concentrava a produção do conhecimento e identificava todos os as-
pectos da natureza como obras divinas. A explicação para todas as coisas es-
tava pautada em Deus. Suas ideias se disseminaram com tamanha força que

capítulo 2 • 35
adentraram todos os aspectos da vida neste período histórico: filosofia, edu-
cação, artes, literatura, arquitetura. A partir do século XV há uma mudança no
pensamento que leva à saída do teocentrismo e retorno ao antropocentrismo.
Entretanto, as ideias construídas naquele momento ainda permanecem enrai-
zadas no solo da civilização ocidental.

A Idade Moderna e o surgimento da ciência


A Idade Moderna, período que vai do Séc. XV ao Séc. XVIII, possui como prin-
cipal característica o surgimento e a consolidação do capitalismo. Entretanto,
outras características muito importantes ocorreram neste período como as
grandes navegações e a expansão dos territórios, a oposição contra o conhe-
cimento dogmático da Igreja possibilitando a recuperação dos autores Greco-
romanos e a evolução do conhecimento através da investigação científica de
forma empírica e pautada na dúvida metódica de Descartes, culminando na
ciência moderna.
No campo da Astronomia, o Sistema Geocêntrico, que considerava a Terra
como o centro do Universo, é substituído pelo Sistema Heliocêntrico, com o Sol
como centro. Para o desenvolvimento destas ideias, foi necessário o aprimora-
mento do método científico e da observação metódica e mensuração sistemáti-
ca, bases fundamentais para a ciência moderna.
No âmbito da biologia, a dessacralização do mundo com a saída do teocen-
trismo, permitiu avanços na fisiologia e na anatomia, permitindo a dissecação
de cadáveres, o estudo do cérebro e sua estrutura.
No Século XIX, o estudo do cérebro permitiu o conhecimento dos neurô-
nios, das sinapses da mielinização, dos axônios das correntes elétricas, o que
incrementou os estudos sobre as sensações, os movimentos e os reflexos, es-
tudos fundamentais para o início da Psicologia científica. Estudou-se ainda a
relação entre o cérebro e a personalidade, surgindo a Frenologia. O interesse
era explicar a função do cérebro com relação às questões mentais e corporais.
Surgem, além dos Frenologistas, outros teóricos que aceitavam a ideia de que o
cérebro funcionava como um todo e que possuía lobos responsáveis por deter-
minadas funções.

36 • capítulo 2
CONCEITO
A Frenologia originou-se a partir dos trabalhos do médico e anatomista alemão Franz Josef
Gall (1758-1828). Segundo Gall, a cranioscopia (como chamava a frenologia) o cérebro
era o órgão dos componentes intelectuais e emocionais. Apesar de ser identificada como
a primeira teoria séria sobre localizações cerebrais e respectivas funções, sua metodologia
foi considerada falha. O responsável pela disseminação da frenologia na Europa e Estados
Unidos foi seu colaborador Johannn Spurzheim. Os princípios básicos da frenologia são:
a) o cérebro é o órgão da mente; b) A mente é composta por cerca de 40 capacidades ou
faculdades cognitivas e emocionais; c) Cada faculdade pode ser localizada no cérebro; d) Al-
gumas pessoas são mais dotadas do que outras em determinadas faculdades, o que faz com
que elas desenvolvam mais tecido cerebral nos lugares correspondentes a estas faculdades
nos respectivos cérebros; e) A intensidade de diversas faculdades pode ser inferida pelo
formato do crânio. (GOODWIN, 2005)

Figura 2.5  –  Crânio Frenológico. Fonte: http://www.cerebromente.org.br/

Após a Idade Média e a ruptura com os dogmas da Igreja Católica, o avan-


ço relacionado ao conhecimento foi enorme, mas a construção do método
de investigação científica pautado na observação empírica controlada jun-
tamente com a mensuração sistemática através de aparelhos cada vez mais
precisos, viabilizou o surgimento dos vários campos científicos como conhe-
cemos hoje.

capítulo 2 • 37
CONCEITO
O método científico pressupõe a utilização de teorias, consideradas um conjunto de princí-
pios explicativos sobre fenômenos ou objetos da realidade/ cotidiano, para a formulação de
hipóteses, ou seja, predições (perguntas) testáveis que surgem a partir do problema que se
deseja pesquisar. Em seguida o cientista utiliza uma metodologia rigorosa a partir da obser-
vação, coleta e análise dos dados obtidos que podem confirmar ou rejeitar suas hipóteses/
predições. Ou, ainda, uma terceira possibilidade, é a necessidade de revisar a pesquisa. (MY-
ERS, 2012)

Na esteira desta mudança social, econômica, política e intelectual, algumas


figuras foram de grande importância para entendermos não somente a constru-
ção da Psicologia, mas estão vinculadas diretamente às Teorias Motivacionais.

As Teorias Motivacionais
As questões abordadas até então, como a dualidade mente X corpo e as raí-
zes filosóficas e fisiológicas da Psicologia, estão intrinsecamente ligadas ao de-
senvolvimento das Teorias Motivacionais.
Desde à Antiguidade, passando por Descartes, durante o que se chama de
Psicologia pré-científica, até a formalização da Psicologia enquanto ciência, a
explicação para a motivação dos comportamentos era a vontade, como uma fa-
culdade mental.
Com a Teoria da evolução de Charles Darwin e a respectiva influência na
Psicologia Funcionalista, a motivação deixa de ser mental e passa a ser estrita-
mente biológica, através do Instinto.
Em seguida, surge a Teoria do Impulso, visto que tanto a Teoria da Vontade
como a Teoria do Instinto colocam a motivação em lados opostos (mente ou cor-
po), inviabilizando uma explicação adequada para o fato. Com relação à Teoria
do Impulso, podem-se considerar dois expoentes que possuem visões comple-
tamente diversas para o fenômeno: Sigmund Freud, criador da Psicanálise e
Clarck Hull, que participou do segundo período da Escola Behaviorista.
Entretanto, apesar dos avanços que o conceito de impulso traz, vinculando o
biológico ao psicológico/mental, as críticas continuam relacionadas à possibi-
lidade de realização de comportamentos sem que haja nenhuma base biológica

38 • capítulo 2
como fundamento. As teorias behavioristas relacionadas ao Incentivo, reforço
e punição ganham espaço.
Cabe destaque para a psicologia humanista com a Pirâmide das Necessidades
de Abraham Maslow, muito utilizada em contextos organizacionais, porém
muito criticada por não poder ser generalizada em termos individuais.
E ainda, com a evolução dos estudos do cérebro surge a teoria da excitação,
vinculando a motivação a um sistema no tronco cerebral.
A insatisfação com as grandes teorias, que apesar de ter a pretensão de ex-
plicar a motivação de forma abrangente não conseguiam, fez surgir, entre as
décadas de 60 e 70 do século XX a época das miniteorias. As grandes influências
históricas que estão por trás deste movimento são:
1. A Natureza ativa da pessoa - reavaliaram da idéia de que os seres huma-
nos são inerentemente passivos e necessitavam, devido a isto, de um impulso
para torná-los ativos. Neste sentido, o papel da motivação era excitá-los, fazê
-los chegar à ação. O próprio significado de MOTIVAR é MOVER e, desta forma
o impulso era considerado como o motor do comportamento Então, o estudo
da motivação é hoje o estudo do direcionamento do propósito nas pessoas ine-
rentemente ativas. (REEVE, 2006, p.21)
2. A Revolução Cognitiva - A motivação, como todo o campo da psicologia,
tornou-se acentuadamente cognitiva, enfatizando os processos cognitivos da
motivação (crenças, planos, metas expectativas, as atribuições, o autonconcei-
to) retirando o peso biologicista/ fisiologicista e ambiental dos aspectos moti-
vacionais. (REEVE, 2006)

CONCEITO
A Psicologia Cognitiva enfoca o como e o porquê do pensamento, busca formas de com-
preender, entender e descrever a cognição (construção do conhecimento humano) e qual
a implicação / aplicação deste conhecimento no comportamento humano. Considera, ainda
que o biológico é importante, mas não determinante do comportamento. Neste sentido, a
aprendizagem é imprescindível às estruturas inatas (bio/fisiológicas) para compor a especi-
ficidade dos SERES HUMANOS.

3. A pesquisa aplicada à relevância Social - Os pesquisadores motivacio-


nais tornaram-se cada vez mais interessados nos problemas motivacionais

capítulo 2 • 39
enfrentados pelas pessoas na sua vida cotidiana (trabalho, escola, no enfren-
tamento contra o estresse, na solução de problemas de saúde etc.), evidencian-
do o interesse na aplicação prática do conhecimento motivacional. Este movi-
mento acarretou a disseminação das teorias mutivacionais e sua utilização por
psicólogos de outras áreas (saúde, escola, indústria etc.) e distanciamento dos
experimentos com animais. Este movimento levou os pesquisadores do campo
motivacional a se questionarem sobre “O que causa o comportamento?” (Ibid.)

EXEMPLO
Algumas Miniteorias (REEVE, 2006)
•  Teoria Motivacional de Realização (Atkinson, 1964)
•  Teoria atribucional da motivação de realização (Weinwer, 1972)
•  Teoria do Fluxo (Csikszentmihalyi, 1975)
•  Motivação Intrínseca (Deci, 1975)
•  Teoria do estabelecimento de metas (Locke, 1968)
•  Teoria do desamparo aprendido (Seligman, 1975)
•  Teoria da auto eficácia (Bandura, 1977)

Na atualidade, os estudos sobre os processos motivacionais continuam


com bastante energia.

Com a virada do novo milênio, as grandes teorias acabaram. E o que surgiu para substituir
um campo outrora unificado e dominado por um compromisso consensual a uma série de
grandes teorias foi a adoção de três pontos em comum por parte de um eclético grupo de
pesquisadores: (1) questões fundamentais (p. ex., o que causa o comportamento energético
e direcionado?); (2) constructos fundamentais (ou seja, necessidades, cognições, emoções
e eventos externos) e (3) uma história compartilhada. (REEVE, 2006, p.27)

40 • capítulo 2
PERSPECTIVA ORIGEM DOS MOTIVOS
Comportamental Incentivos e recompensas ambientais
Fisiológica/ neurológica Atividade cerebral e hormonal
Cognitiva Pensamentos, metas, expectativas
Modos de pensar a partir da exposição a
Cognitivo-social
outros indivíduos
Evolucionária Dotação genética de cada indivíduo
Humanista Desenvolvimento do potencial humano
Psicanalítica Inconsciente

Tabela 2.2  –  As diversas perspectivas relacionadas a origem dos motivos. (REEVE, 2006)

René Descartes e a Primeira Grande Teoria Motivacional


Descartes (1596-1650) foi um filósofo e cientista, do século XVII, fundamen-
tal para o despontar da ciência moderna. Seus interesses iam da filosofia até
a física, ótica, geometria e fisiologia. Era um racionalista, pois acreditava que
a verdade só era possível de ser acessada através da razão e não dos sentidos,
visto que idem iludir. Desta forma, aquilo que podia ser considerado como ver-
dadeiro era, também aquilo que não se podia duvidar. Então, o caminho para a
verdade estava na capacidade humana do raciocínio. Descartes defendia, ainda
que existiam ideias que seriam inatas, como a capacidade do raciocínio, mas
que os homens possuíam ideias derivadas das experiências no mundo.
Descarte ainda foi um dualista proeminente, destacando a separação entre
mente e corpo, onde a mente seria imaterial e o corpo material. Ambos seriam
feitos de substâncias distintas e estariam vinculados através da glândula pi-
neal. Ele era considerado um mecanicista e interacionista, pois argumentava
que a mente interagia com o corpo (máquina) influenciando-o através da von-
tade, naquilo que era necessário realizar uma ação. (GOODWIN, 2005)

Para Descartes, a principal força motivacional era a vontade. Descartes pensava que, se
houvesse condições de entender a vontade, seria possível compreender a motivação.
Segundo ele, a vontade inicia e direciona a ação; cabe a ela decidir se e quando agir. Já
as necessidades corporais, as paixões, os prazeres e as dores criam impulsos à ação, mas
esses impulsos só excitam a vontade. A vontade é uma faculdade (ou poder) que a mente,
agindo no interesse da virtude e da salvação e exercendo seu poder de escolha, tem para
controlar os apetites corporais e as paixões. (REEVE, 2006, p.15)

capítulo 2 • 41
Figura 2.6  –  René Descartes (1596-1650) – www.biography.com

ATENÇÃO
A Primeira Grande Teoria motivacional é a da VONTADE, considerada como faculdade da
mente que possui o poder de guiar o corpo para a ação.

A Segunda Grande Teoria – o Instinto


Charles Darwin (1809-1882) foi o naturalista britânico que traz uma das rup-
turas epistemológicas fundamentais da civilização humana. Com a sua obra
“Sobre a Origem das Espécies” defendeu a sobrevivência das espécies através da
evolução e transmissão de determinadas características intergeracionais com
o objetivo de que os tornassem mais aptos e melhor adaptados ao ambiente.
Nesta proposta, Darwin utiliza as ideias malthusianas que considera que os
seres vivos que sobrevivem à batalha e atingem a maturidade tendem a transmi-
tiraosseusdescendentesasmesmashabilidadesevantagensquelhespermitiram
prosperar. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2007, p.127)

CURIOSIDADE
Tomas Malthus foi um economista britânico do século XIX, responsável pela teoria de que
a população cresce em proporção geométrica enquanto o suprimento alimentar cresce em
proporção aritmética. Neste modelo, é inevitável que muitos seres humanos passem necessi-
dades e somente poucos terão o necessário à sobrevivência. O resultado é que somente os
mais fortes, espertos e adaptáveis sobrevivem.

42 • capítulo 2
Darwin também explorou a evolução humana a partir de espécies mais sim-
ples, o que abriu as portas para a Psicologia comparada e a experimentação com
animais. Estudou as expressões emocionais, posturas e gestos em humanos e
animais e sugeriu que estas características poderiam ser entendidas baseadas
na teoria da evolução.
Na esteira do biologicismo determinista de Darwin, surge a Teoria dos
Instintos para explicar o que causa o comportamento humano. Segundo ele,
haveria uma dotação genética, mecânica e automática responsável por iniciar
os comportamentos. Então, independente da experiência do animal, se o estí-
mulo for adequado, o instinto fará com que ele realize o comportamento gene-
ticamente herdado.

EXEMPLO
Alguns exemplos de comportamentos instintivos nos animais são: a construção do ninho pelo
João de Barro, as galinhas que chocam seus ovos, as tartarugas que voltam na praia onde
nasceram para colocarem seus ovos etc.

O feito de Darwin foi que seu conceito motivacional tinha condições de explicar o que a
vontade dos filósofos não conseguia – ou seja, de onde a força motivacional provém em
primeiro lugar. (REEVE, 2007, p.16)

Desta forma, a motivação sai de uma perspectiva totalmente mentalista e


vai para o “outro lado da moeda”, torna-se determinada pela biologia.
Dois foram os autores responsáveis por disseminar o instinto como mola
propulsora do comportamento: William James e William McDougall.
James fundamentou-se bastante na teoria de Darwin para atribuir vários
instintos aos seres humanos, que eram divididos basicamente em físicos, como
a sucção e a locomoção, e mentais, como a imitação e a sociabilidade. (REEVE,
2007) Para iniciar um instinto, o único fato necessário era o gatilho, ou a pista
contextual adequada.
Para William McDougall, os instintos eram compostos de componentes
cognitivos, afetivos e a tendência de aproximação ou afastamento do obje-
to. (GAZZANIGA; HEATHERTHON, 2005) Para ele, sem os instintos, os seres
humanos seriam incapazes de iniciar qualquer ação. Sem esses “motores

capítulo 2 • 43
primários”, os seres humanos seriam como massas inertes, corpos sem quais-
quer impulsos para a ação. (REEVE, 2007, p.17)
Entretanto, após a aceitação da Teoria dos Instintos como uma explicação
para o processo motivacional, quando se iniciou a identificação de quais eram
os instintos humanos e verificou-se a complexidade dos comportamentos huma-
nos que originaram mais de 6.000 possibilidades diferentes de instintos, obser-
vou-se que esta teoria não conseguia atingir seu objetivo, pois todos os seus con-
ceitos pautavam-se numa lógica circular, onde a causa explica o comportamento
e inversamente, o comportamento explica a causa. Reeve (2007) explica que

O problema aqui é a tendência a confundir a nomeação com a explicação (p. ex., dizer que as
pessoas são agressivas porque elas têm o instinto de serem agressivas). Confundir nomeação
e explicação é algo que nada acrescenta ao entendimento da motivação e da emoção. (p.17)

CURIOSIDADE
Apesar da Teoria dos instintos ter perdido a força para a explicação dos comportamentos
humanos, é inegável a existência de padrões de comportamentos estereotípicos e não
aprendidos nas espécies animais. Para estes comportamentos, os Etologistas, consideram a
existência de estruturas neuronais herdadas que não são modificadas e que se relacionam,
não com padrões de comportamentos gerais, mas com fragmentos de comportamentos si-
tuacionalmente bem delimitados, denominados padrões de ação-fixa. (REEVE, 2007)

A Terceira Grande Teoria – o Impulso


O conceito que surge para substituir o instinto é o impulso. Com a Teoria do
Impulso, chega-se ao “meio termo” entre o biológico e o psicológico, pois o im-
pulso serve às necessidades corporais, energizando o comportamento através
do entendimento cognitivo do que está lhe ocorrendo organicamente.
O mecanismo básico se inicia com um déficit corporal, gerando uma neces-
sidade (fome, sede, sono). Este déficit/ desequilíbrio orgânico gera tensão que
impulsiona o organismo para a meta, ou aquilo que permitirá a saciedade do
corpo e sua volta à homeostase/ equilíbrio orgânico.

44 • capítulo 2
Os dois teóricos proeminentes relacionados à Teoria do Impulso são
Sigmund Freud e Clarck Hull.

A Teoria do Impulso (Pulsão) de Freud


Sigmund Freud (1856-1939) foi um médico austríaco que, ao criar a
Psicanálise, como teoria e método clínico deixa marcas profundas no pensa-
mento ocidental. Traz uma ruptura epistemológica ao retirar a razão do seu
“trono” e defender que o ser humano possui forças, que ele não domina, e que
o submetem aos seus desígnios na realização de comportamentos, pensamen-
tos, emoções, sentimentos. Para Freud, a sexualidade e o inconsciente e as pul-
sões possuem um lugar fundamental na construção da estrutura psíquica e na
existência humana.
Para Freud, a pulsão está na fronteira entre o psíquico e o corporal, o que
não significa ser ou estar numa interseção entre soma e psique. Entretanto, a
fonte da pulsão é a excitação de um órgão e sua meta é o cancelamento da exci-
tação. (GARCIA-ROZA, 1999)
Freud explica, ainda que a pulsão não é equivalente à necessidade corporal,
pois há uma diferença fundamental entre as duas: a necessidade é uma força
momentânea provocada por um déficit que pode ser saciado; já a pulsão não.
Ela é uma força constante, considerada um estímulo para o psíquico, ou seja,
situa-se fora dele, e da qual não se tem como fugir. (GARCIA-ROZA, 1999)
Neste sentido, os órgãos do corpo possuiriam duas fontes de excitação: as
necessidades, que são fisiológicas (como a fome e a sede), e outra de natureza
pulsional, vinculada ao corpo considerado erógeno/ sexual (corpo voltado para
o prazer) onde a satisfação total da pulsão é impossível e a saciedade temporá-
ria ocorre quando se alcança o objeto de desejo.
Garcia Roza (1995) esclarece que,

O que está em jogo não é a totalidade do organismo, sua relação com o meio circundante
e sua finalidade adaptativa, mas sim um aparelho cuja regulação, pelo princípio do prazer e
pelo princípio da realidade, funciona em termos de trama das representações e cujo produto
final é uma ação específica (que nada tem a ver, necessariamente, com um comportamento
adaptativo). (p.89)

capítulo 2 • 45
CONCEITO
O princípio do prazer refere-se ao modo de funcionamento da parte inconsciente do aparelho
psíquico que busca o prazer imediato.
O princípio da realidade é o modo de funcionamento da parte consciente do aparelho
psíquico com o objetivo de dar o juízo de realidade e mediar a satisfação do desejo as possi-
bilidades do mundo real e normas sociais.

Para Freud, o conceito de pulsão depende de outros quatro, que são pres-
são, fonte, objeto e alvo.
1. Pressão: é considerada o fator motor ou a exigência de trabalho da pul-
são; pode ser entendida como um quantum de excitação que tende à descarga.
(GARCIA-ROZA, 1999, p.88); entendida como uma força constante impossível
de ser saciado apenas com a descarga motora, mas implica na discriminação
do seu alvo e não o retorno à homeostase de uma função orgânica.
2. Alvo: é aquilo que gera a satisfação da pulsão e o seu desaparecimento,
através da eliminação do estado de tensão da fonte. Entretanto, como a pul-
são é uma força constante, este alvo somente pode ser atingido parcialmente,
porque ele representa a própria satisfação plena e a eliminação total da tensão
pulsional, o que é impossível no âmbito da realidade. Esta busca pela satisfação
procura reeditar a pré-história individual, uma satisfação plena e primeira, que
se perde pelo simples fato da impossibilidade de se tê-la. (GARCIA-ROZA, 1995)
3. Objeto: considera-se o objeto da pulsão aquele que possui a proprie-
dade ou potencial de fazê-la atingir o seu alvo. Não existe um único objeto, é
aquilo que é mais mutável e não permanece vinculado a ela. O objeto do inves-
timento pulsional, assim como o objeto do desejo, é uma representação e não
um objeto externo no sentido de uma coisa-mundo. GARCIA-ROZA, 1995, p.94)
4. Fonte: a pulsão possui uma fonte somática, advém de uma excitação de
um órgão do corpo.

46 • capítulo 2
Fonte da Pulsão (Impulso) Pressão da Pulsão
Excitação de algum órgão Força de trabalho

Alvo da Pulsão (meta) Objeto da Pulsão


Aquilo que traz a Representação capaz
satisfação e reduz a tensão de satisfazer a pulsão

Figura 2.7  –  Componentes da Pulsão

A Teoria da Redução do Impulso (Drive) de Clarck Hull


Clarck Hull (1884–1952) foi um dos comportamentalistas que participa-
ram do segundo período da Escola Behaviorista, junto com Edward Tollman e
Skinner. Ele era engenheiro, formulava uma teoria sobre o comportamento ba-
seada nas leis de condicionamento de Pavlov. Hull era mecanicista e considera-
va o comportamento humano automático e passível de ser reduzido e explicado
na linguagem da física.
Hull acreditava que a base da motivação era um estado geral de necessidade
corporal provocado por um déficit global das condições corporais ideais. Este
desequilíbrio orgânico provocado por todas as necessidades momentâneas do
corpo gera um impulso, que é uma fonte de energia agrupada e origem básica
da motivação.
Entretanto, apesar de ativar o comportamento, o impulso não possui a ca-
pacidade de direcioná-lo. O direcionamento para a meta, ou para aquilo que
saciará o déficit orgânico, aprendido durante a existência a partir de processos
de reforço e consequência. Para Clarck Hull, a base do reforço que proporciona
a aprendizagem e o hábito é a redução do impulso.
Nesta teoria, os impulsos eram divididos em primários e secundários:
•  Impulsos primários: estão associados aos estados de necessidades bioló-
gicas inatas e vitais, como: alimento, água, ar, a temperatura, micção, defeca-
ção, sono, a atividade, a relação sexual e o alívio da dor;
•  Impulsos secundários: configuram outros impulsos passíveis de motivar
o organismo e estão relacionados aos estímulos situacionais ambientais. São
aprendidos e possuem a capacidade de reduzir os impulsos primários.

capítulo 2 • 47
EXEMPLO
IMPULSO PRIMÁRIO: IMPULSO SECUNDÁRIO:
Fome Cozinhar

Sono Dormir

Frio Vestir-se

Apesar da Teoria do Impulso ter sido amplamente aceita, ao longo da déca-


da de 50 do século XX e com o desenrolar das escolas psicológicas, as críticas
começaram a atingir sua base: (REEVE, 2007)
1ª) Se o impulso emerge das necessidades corporais, como explicar a exis-
tência de motivos que não tenham como fonte os desequilíbrios corporais?
2ª) Se a aprendizagem acontece através do reforço que está pautado na
redução do impulso, como explicar as aprendizagens que não possuem ne-
nhuma vinculação com necessidades orgânicas e a correspondente redução
do impulso?
3ª) Se é o impulso que energiza o comportamento, como explicar as fontes
externas de motivação?
Sem dúvida, estas críticas deixam a base para o surgimento de outra teoria
da motivação pautada na escola behaviorista, a Teoria do Incentivo.

A Teoria do Incentivo
Um incentivo é considerado um evento externo que possui a capacidade de
energizar ou direcionar um comportamento de aproximação ou afastamento,
dependendo de suas aprendizagens anteriores relacionadas aos incentivado-
res. (REEVE, 2007)
Um princípio desta teoria é o hedonismo, ou a tendência á aproximação
daquilo que gera prazer e afastamento daquilo que gera dor. Neste sentido, a
motivação primária não seria desencadeada pela redução de um impulso, mas
a expectativa sobre a gratificação do objeto. (ibid.)

48 • capítulo 2
CURIOSIDADE
De uma perspectiva evolutiva, os comportamentos associados ao prazer estão entre os que pro-
movem a sobrevivência e a reprodução do animal, ao passo que os comportamentos associados
à dor interferem na sobrevivência e na reprodução. Um bom exemplo disso é a doçura, que é a
preferida pela maioria dos animais. (GAZZANIGA; HEATHETORN, 2005, p. 284-85)

CONCEITO
Qualquer recompensa decorrente de comportamentos motivados, seja pela redução do impulso
ou pela tendência de aproximação de objetos que geram prazer (Teoria do Incentivo), acionam
o sistema de recompensa no cérebro que se refere à ativação dos neurônios de dopamina do
núcleo accubens. Cabe esclarecer que os comportamentos adaptativos também estão baseados
na liberação da dopamina e, desta forma, a liberação da dopamina pode ajudar a orientar os
comportamentos adequados direcionados à sobrevivência. (GAZZANIGA; HEATHETORN, 2005)

A Teoria da Autorrealização e a Pirâmide das Necessidades de


Abraham Maslow
Abraham Maslow (1908-1970) foi um psicólogo americano considerado um
dos fundadores e líderes da Psicologia Humanista. Para ele, a Psicologia não
deveria enfatizar os pontos negativos do paciente, criar intervenções de forma
a retirar os impedimentos que fazem com que as pessoas não desenvolvam ple-
namente o seu potencial.
Segundo Maslow, toda pessoa nasce com uma tendência à autorrealização, ou
seja, ao desenvolvimento pleno de suas habilidades e potencial. Entretanto, para
conseguir chegar a este estado de plenitude, onde o indivíduo consegue utilizar
inteiramente seu potencial, Maslow defendia que existiam necessidades inferio-
res que precisariam ser satisfeitas para se chegar até este patamar mais elevado.
Na década de 40 do século XX, Maslow apresentou sua pirâmide das neces-
sidades que abordava desde as mais básicas até a mais complexa, a de autorrea-
lização. A pirâmide seria composta por cinco “degraus”, onde as necessidades
biológicas relacionadas à sobrevivência estariam na base. Em seguida viriam

capítulo 2 • 49
as de segurança, pertencimento e amor, estima e, a última e mais complexa, de
autorrealização.
O movimento de satisfação das necessidades seria da base para o cume, pois a
prioridade é a saciedade das necessidades que colocam em risco a vida (fisiológi-
cas) e a segurança, consideradas primárias. Em seguida, viriam as necessidades se-
cundárias, relacionadas ao sentimento de crescimento positivo e desenvolvimen-
to das habilidades e potenciais: pertencimento e amor, estima e autorrealização.

Necessidade de
auto-realização
Necessidades (desenvolvimento pessoal,
secundárias conquista)

Necessidade de estima
(auto-estima, reconhecimento, status)

Necessidade sociais
(relacionamento, amor, fazer parte de um grupo)

Necessidade de segurança
(defesa, proteção, emprego, abrigo)
Necessidades
primárias
Necessidades fisiológicas
(fome, sede, sexo, sono, etc...)

Figura 2.8  –  A Pirâmide das necessidades de Maslow

De acordo com Maslow (SCHULTZ; SCHULTZ, 2005)

Os indivíduos dotados da característica de autorrealização apresentam em comum as


seguintes tendências:

50 • capítulo 2
1. percepção objetiva da realidade; 6. experiências de “pico” ou místi-
2. plena aceitação da natureza; cas intensas;
3. compromisso e dedicação a algum tipo 7. empatia e afeição pela humanidade;
de trabalho; 8. resistência ao conformismo;
4. simplicidade e naturalidade 9. estrutura de caráter democrático;
do comportamento; 10. atitude de criatividade; e
5. necessidade de autonomia, privacidade 11. alto grau do que Adler chamava de
e independência; interesse social. (p.412)

CURIOSIDADE
Segundo Maslow, a possibilidade de satisfazer a necessidade de autorrealização estaria
vinculada aos primeiros dois anos de vida da pessoa. Dentre os pré-requisitos para este
acontecimento estavam a suficiência de amor e a garantia da satisfação das necessidades
primárias (fisiológicas e de segurança). A criança que conseguisse atingir, por meio dos
pais, a saciedade das necessidades primárias e se sentisse amada, consequentemente,
se sentiria amada, respeitada, segura e confiante, o que lhe permitiria o empoderamento
de si mesma e a autonomia necessária para chegar até a sua autorrealização. (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2005)

As críticas realizadas à Pirâmide das Necessidades são relacionadas ao seu


nível empírico. Se de fato Maslow conseguiu descrever várias necessidades hu-
manas e, inclusive, a autorrealização vinculada à felicidade, é difícil verificar
no cotidiano das pessoas o movimento proposto pela teoria. Por exemplo, mui-
tas pessoas possuem sua necessidade de pertença e amor satisfeita através de
amizades e relacionamentos duradouros e vínculos verdadeiros e acolhedores,
porém não têm a necessidade de segurança e estabilidade satisfeita, como uma
casa ou emprego estável. Outra crítica PE a dificuldade de definir o que é au-
torrealização, visto que para cada pessoa será algo diferente. Neste sentido, A
hierarquia de Maslow, portanto, é mais útil no nível descritivo do que no nível em-
pírico. (GAZZANIGA; HEATHETORN, 2005, p.283)

capítulo 2 • 51
Teoria da Excitação
A base desta teoria está na descoberta de um sistema no tronco cerebral re-
lacionado à excitação neurológica. A relação que se estabelece é entre a excita-
ção do sistema neurológico, o ambiente estressor e a emoção que se sente. As
ideias centrais eram as de que (1) os aspectos do ambiente (o grau a que eles são
estimulantes, novos, estressantes) afetam a maneira do cérebro ser excitado e (2)
as variações no nível de excitação apresentam uma relação (...) com o comporta-
mento. (REEVE, 2007, p.20)
Desta forma,

(...) os ambientes não-estimulantes geram baixos níveis de excitação e emoção, tais como
o tédio; já ambientes um pouco mais estimulantes geram níveis ótimos de excitação e
emoção, tais como o interesse; e ambientes extremamente estimulantes geram excitações
e emoções como o medo. (...) as pessoas preferem um nível ótimo de excitação, evitando
seus níveis muito altos ou muito baixos. (id.)

EXEMPLO
Nível alto de excitação: quando um bebê está num lugar extremamente agitado e barulhento;
Nível baixo de excitação: apresentar um jogo para crianças de três anos a crianças de
12 anos (sem problemas cognitivos);
Nível ótimo de excitação: apresentar uma estimulação adequada à habilidade da pessoa:
leitura de histórias recomendadas à faixa etária de personagens favoritos das crianças.

Tópicos importantes do capítulo


1. A filosofia na Antiguidade e sua relação com as teorias Psicológicas de
base para as teorias motivacionais.
2. A Primeira Grande Teoria da Motivação foi a da Vontade, de Descartes,
que a entendia como uma capacidade mental para guiar a ação do corpo, consi-
derado uma simples máquina.
3. A Segunda Grande Teoria ou Teoria dos Instintos surge pautada da teo-
ria da evolução de Darwin. Considerava que os comportamentos são instintivos
e geneticamente herdados e que estariam vinculados ao processo de evolução

52 • capítulo 2
das espécies, onde os mais adaptáveis sobreviveriam a partir da transmissão de
genes para seus descendentes.
4. A Terceira Grande Teoria Motivacional foi a Teoria do Impulso. Os dois
teóricos principais são Clarck Hull e Freud. Para Clarck Hull o impulso tem a
ver com as necessidades corporais, déficit geral do organismo num determi-
nado momento, o que energiza um comportamento que será direcionado para
uma meta a partir da aprendizagem, ao longo da vida, daquilo que satisfaz ou
não as necessidades. Já para Freud, a pulsão é decorrente de uma excitação or-
gânica e não está a serviço da adaptação do sujeito ao ambiente. É diferente do
conceito de necessidade, pois enquanto esta é uma força temporária regulada
pelo retorno ao equilíbrio orgânico, a pulsão é uma força constante que não
possui um objeto de satisfação total.
5. A Teoria da Pirâmide das necessidades de Maslow. Maslow foi um psi-
cólogo norte-americano humanista que considerava que as pessoas possuem
uma tendência inata ao pleno desenvolvimento das suas habilidades e poten-
ciais. Para chegar a este estágio de desenvolvimento, Maslow construiu uma
teoria explicativa sobre as necessidades humanas diferenciando em necessida-
des primárias ou de sobrevivência, e as secundárias que levaria à autorrealiza-
ção pessoal.
6. Após as três grandes teorias motivacionais, surge um período de tran-
sição para as miniteorias que abarca as teorias do incentivo e da excitação. A
Teoria do Incentivo enfoca os eventos externos gratificantes e a tendência he-
donista de aproximação dos mesmos e afastamento daqueles que geram des-
prazer. A Teoria da Excitação está vinculada à excitação cerebral e às emoções e
comportamentos correspondentes.
7. Historicamente, a era das Grandes teorias motivacionais e a entrada
das miniteorias pode ser explicada por três fatores: a consideração sobre a na-
tureza ativa das pessoas; a revolução cognitiva e a pesquisa motivacional aplica-
da à relevância social.

No próximo capítulo serão apresentadas as necessidades e suas bases bio-


lógicas para o entendimento do estudo da motivação na ciência psicológica.

capítulo 2 • 53
54 • capítulo 2
3
As Necessidades
Fisiológicas e
Psicológicas
OBJETIVOS
1. Apresentar as necessidades fisiológicas;
2. Explicar a base biológica das necessidades fisiológicas;
3. Abordar os principais transtornos alimentares;
4. Apresentar as necessidades psicológicas e sua importância no processo de crescimento
e bem-estar humano;

56 • capítulo 3
3.1  Relembrando o conceito de
necessidades

Uma necessidade é uma condição interna ao organismo importante para a ma-


nutenção da vida, para o seu desenvolvimento e o seu bem estar. Se a necessi-
dade estiver vinculada a questões orgânicas, será denominada fisiológica, se
estiver vinculada a características psicológicas, será considerada psicológica e
se implicar em alguma questão relacionada a sociabilidade, será nomeada de
social. Existem, também, as quase-necessidades, que são aquelas circunstan-
ciais, quando precisamos de um objeto naquele momento para realização de
um trabalho, por exemplo.
Quando se está num estado de necessidade, significa que o organismo está
com um déficit ou desequilíbrio e precisa retornar ao seu estado normal, caso
contrário o corpo poderá sofrer danos nos tecidos ou, dependendo da gravida-
de da situação e do tempo de privação, ir a óbito.
Se os danos podem afetar o corpo, surgem as necessidades fisiológicas,
como a fome, sede, sono. Caso os danos possam afetar o “self” e prejudicar o
crescimento, desenvolvimento e a qualidade de vida da pessoa, surgem as ne-
cessidades psicológicas, como autonomia ou autodeterminação, relaciona-
mento e competência. Se os danos podem afetar nossa relação com o mundo
social, coibindo a preservação da identidade do grupo das relações interpes-
soais, das crenças e valores surgem as necessidades de: realização, afiliação,
intimidade e poder. (REEVE, 2007)
Como uma necessidade está vinculada a um estado de desequilíbrio, ela
sempre estará energizando um comportamento para que o déficit não provo-
que nenhum dano físico ou psíquico ao organismo. Neste sentido, o que muda
é a direção que o comportamento terá a partir das experiências prévias.
Cabe destacar que existem necessidades que são motivadas por deficiên-
cia, como as fisiológicas, e outras que podem ser geradas por um movimento
voltado para o crescimento, como as psicológicas. No primeiro caso, as emo-
ções desencadeadas serão negativas e com a resolução do déficit haverá o alí-
vio. Entretanto, na segunda situação, as emoções geradas são positivas, o que
alimenta cada vez mais a possibilidade de automotivação.

capítulo 3 • 57
EXEMPLO
Motivação desencadeada por déficit: Fome depois de 10 horas de privação
Emoções geradas: dor, estresse, ansiedade, alívio
Motivação desencadeada por vontade de crescimento: Vontade de ser proficiente
em determinado assunto
Emoções geradas: interesse, diversão vitalidade

As Necessidades Fisiológicas
As necessidades fisiológicas, vinculadas ao organismo, necessitam de um
sistema de regulação complexo que envolve os sistemas neurais, os órgãos e
os hormônios para o funcionamento adequado do corpo e a manutenção da
homeostase.
Neste sentido, o organismo possui diversos guias de autorregulação que
monitoram o corpo para saber quando ativar e desativar um comportamento a
partir da saciedade na necessidade. Estes guias de autorregulação quando per-
turbados ou rejeitados, são monitorados pelo cérebro, que desencadeia uma
elevação dos estados motivacionais, que irão continuar até que o indivíduo rea-
lize um comportamento para corrigir os reguladores que foram perturbados.

ATENÇÃO
A garantia da homeostase do organismo é mito importante para a saúde. Por isso, as neces-
sidades, os sistemas biológicos, os estados motivacionais e os comportamentos se organi-
zam como uma verdadeira orquestra, atuando naquilo que lhes competem, mas em harmonia
com os demais para garantir a saúde do indivíduo.

Os fundamentos da Regulação
A Regulação fisiológica de uma necessidade ocorre através da redução do
impulso. No Capítulo 2 foi abordada a Teoria da Redução do Impulso (Drive)
de Clarck Hull. É através dela que será explicada a regulação fisiológica do ciclo
Impulso-Homeostase.

58 • capítulo 3
Para Hull, a motivação seria de base biológica a partir de um déficit fisio-
lógico global do organismo. Tal défict criaria um estado de tensão que se acu-
mularia e intensificaria até o ponto de “chamar” toda a atenção do indivíduo
para a sua satisfação, gerando o impulso psicológico. Cabe ao impulso ener-
gizar o comportamento, mas a direção será baseada através das experiências
anteriores.
A base da aprendizagem para Clarck Hull é a redução do impulso, entre-
tanto esta redução deve estar vinculada ao sentimento de prazer. Num sentido
geral, as consequências recompensadoras de uma ação indicam que ela deve
ser repetida, pois é uma forma de leitura que o cérebro dispõe para registrar as
boas e más consequências de ações passadas com o intuito de orientar as ações
futuras.
A ideia que permeia este processo é a de que o prazer tende a estar associado
a estímulos que aumentam nossa capacidade de sobreviver ou a capacidade de
sobreviver da nossa prole e consequências dolorosas ou frustrantes estão asso-
ciadas a eventos que ameaçam nossa sobrevivência: dano físico, doença.

Interação com Desequilíbrio fisiológico,


Indivíduo saciado
o ambiente gerando déficit orgânico

Intensificação do déficit, gerando


Indivíduo motivado pelo IMPULSO
estado de tensão que produz
é direcionado para a META
um impulso psicológico

Satisfação da necessidade, redução


Realização de comportamento Feedback do impulso e retorno à homeostase,
consumatório negativo
gerando estado de saciedade

Figura 3.1  –  Padrão Cíclico de Impulso-Homeostase. Fonte: REEVE, 2006.

capítulo 3 • 59
Nesta regulação, as necessidades fisiológicas correspondem a uma condi-
ção de deficiência biológica que aparecem a partir dos tecidos e pela corrente
sanguínea, como por exemplo a erda de água e nutrientes. O impulso psicoló-
gico é considerado a manifestação consciente de uma necessidade fisiológica
e possui características motivacionais. A homeostase refere-se à tendência/
capacidade do organismo de manter um estado estável/ de equilíbrio. O fee-
dback negativo está relacionado ao sistema de brecagem fisiológica do im-
pulso, ou seja, aos guias de autorregulação do corpo que indicam a satisfação
da necessidade a partir da redução do impulso. Os inputs múltiplos/ outputs
múltiplos correspondem às diversas possibilidades/ vias de ativação do im-
pulso e de realização do comportamento comsumatório para a redução do
mesmo. (REEVE, 2006)

EXEMPLO
A sede pode surgir a partir de vários inputs (entradas), como: alimentos salgados, sudo-
rese, respiração, espirro, doação de sangue, entre outros. E pode ser saciada através de
vários outputs (saídas): água, água de coco, suco de frutas etc.

Cabe ressaltar que, apesar deste sistema estar fundamentalmente emba-


sado em esquemas biológicos, o ambiente e a cognição interferem muito nas
escolhas dos indivíduos em como lidar com as suas necessidades. Desta for-
ma, o impulso pode ser considerado uma variável interveniente, pois existi-
rão vários inputs que o antecederão e vários outputs a serem utilizados. Para
clarificar, estes outputs estarão vinculados ás consequências das ações ante-
riores relacionadas aos respectivos inputs ocorridos no passado.

 
Input antecedente 1   Output – Consequencia 1
 
Input antecedente 2  IMPULSO  Output – Consequência 2
Input antecedente 3   Output – Consequência 3
 

Figura 3.2  –  O impulso como variável interveniente. Fonte: REEVE, 2006.

60 • capítulo 3
Neste processo, podemos destacar

os mecanismos intra-organísmicos que incluem todos os sistemas reguladores biológicos


da pessoa que atuam em comum acordo para ativar, manter e cessar as necessidades
fisiológicas subjacentes ao impulso. As estruturas cerebrais, o sistema endócrino e
os órgãos do corpo constituem as três principais categorias de mecanismos intra-
organísmicos (REEVE: 2006, p.49)

Com relação aos mecanismos extra-organísmicos, estes envolvem todas


as influências cognitivas (crenças, valores, autoconceito), culturais, am-
bientais e sociais que influenciam a ativação, manutenção e finalização de
um impulso.

As bases biológicas do comportamento motivado


Qualquer função exercida pelo corpo, seja consciente ou incosciente, mo-
tivado ou não, e onde haja participação das emoções envolve a participação
do cérebro. Nas necessidades fisiológicas, psicológicas, nas cognições e nas
emoções, certas estruturas cerebrais são ativadas juntamente com neuro-
transmissores e determinados hormônios que permitem a regulação do nos-
so organismo e a realização de comportamentos.
Para entender o funcionamento e a comunicação entre cérebro e os ór-
gãos relacionados aos estados motivacionais específicos, como fome e sede
por exemplo, primeiro é necessário entender que as estruturas cerebrais pos-
suem receptores altamente especializados nas fendas sinápticas que permi-
tem a transmissão das informações necessárias entre os neurônios a partir
de substâncias chamadas neurotransmissores. Já a comunicação realizada
entre os órgãos do corpo e o cérebro é realizada por outro tipo de substância,
os hormônios, através da corrente sanguínea.
As principais estruturas cerebrais envolvidas na motivção e na emo-
ção são: o hipotálamo, o feixe prosencefálico medial, a amígdala, o circuito
septo-hipocampal, a formação hipocampal, a formação reticular e o córtex
pré-frontal.

capítulo 3 • 61
1

2
10

4
8

7
6 5

1. Córtex 6. Hipocampo
Funções motoras Ajuda a estabelecer memória de longo prazo
Funções sensíveis (tato, visão, olfato, audição e gustação)
Memória, planejamento, emoção, julgamento 7. Amídala
Batimento cardíaco
2. Gânglia Basal Funções vicerais
Controle de movimento e funções cognitivas Medo
3. Tálamo 8. Glândula Pitutária
Centro de informação para o cérebro Controla produção hormonal

4. Cerebelo 9. Hipotálamo
Coordenação de movimentos Hormônios sexuais
Pressão sanguínea
5. Medula Oblongata Temperatura
Respiração
Circulação 10. Corpo Caloso
Digestão Conecta informações dos hemisférios direito e esquerdo

Figura 3.3  –  As estruturas do cérebro e suas funções. Fonte: www.scielo.br

O Hipotálamo
O hipotálamo é uma estrutura fundamental para a sobrevivência do orga-
nismo, pois regula as funções vitais, como: regulação da temperatura corporal,
pressão sanguínea, regula o nível de glicose e impulsiona o organismo através
dos motivos da fome, sede, sexo e as emoções. Por meio de suas projeções para
a medula espinhal, ele governa grande parte das funções dos órgãos internos. (...)
elecontrolaaglândulapituitária,a“glandulachefe”docorpo,que,aoliberarhor-
mônios na corrente sanguínea, controla todas as outras glândulas.(GAZZANIGA;
HEATHEERTON: 2007, p.130)
É uma região que recebe estimulação e interfere direta ou indiretamente
quase em todos os lugares do corpo, através da irradiação para as outras partes
do cérebro, ele interfere e influencia os impulsos motivacionais e os respectivos
comportamentos consumatórios. (ibid.)

62 • capítulo 3
Feixe Prosencefálico Medial
Constitui-se em um conjunto de fibras nervosas conectadas ao hipotálamo.
Sua relação com os aspectos motivacionais refere-se ao seu funcionamento
como uma espécie de “centro de prazer” no cérebro. Nos seres humanos, a esti-
mulação do feixe prosencefálico medial não produz sensações intensas de prazer
ou êxtase, mas gera sensações positivas. (REEVE:2006, p.34)

A Amígdala
A amígdala é uma estrutura que fica localizada na frente do hipocampo e
faz a sua ligação com o córtex cerebral, exercendo importante papel na apren-
dizagem e na associação de fatos com as respectivas respostas emocionais. Esta
estrutura também possui a propriedade de fortalecer, reforçar as memórias du-
rante momentos de grande excitação emocional, além de conectar as lembran-
ças do córtex as emoções.
A amígdala também possui um papel fundamental na resposta a estímu-
los que produzem medo, pois O processamento afetivo de estímulos assustado-
res na amígdala é um circuito resistende, que se desenvolveu no curso da evolu-
ção para proteger os animais do perigo. (GAZZANIGA; HEATHEERTON: 2007,
p.132)

Segundo REEVE (2006)

Em geral a amígdala detecta e responde a eventos ameaçadores, embora cada um de


seus núcleos tenha uma função distinta. A estimulação de uma parte da amígdala gera
raiva emocional, enquanto a estimulação de outra parte gera a emoção do medo e o
comportamento de defesa. Assim, a amígdala regula as emoções que a autopreservação, o
medo, a raiva e a ansiedade envolvem. (p.34)

A Formação Reticular
A formação reticular constitui uma grande rede de neurônios, no tronco ce-
rebral, que se projeta para o cértex e para os gânglios basais e que estão vincula-
dos com os processos de sono-vigília e na excitação geral.

capítulo 3 • 63
Estimulação do Hipotálamo lateral:
aceleração dos batimentos cardíacos,
aumento da pressão arterial

Estimulação do núcleo paraventricular:


liberação de hormônios de estresse

Estimulação parabraquial:
Evento Estimulação da
palpitação, desconforto respiratório
Ameaçador amígdala
devido a aumento do ritmo respiratório

Estimulação da massa cinzenta central:


comportamento defensivo como
paralisação e supressão da dor

Estimulação do nervo facial trigêmeo:


expressão facial de medo

Figura 3.4  –  Conexões da amígdala que expressam medo em resposta a um evento amea-
çador. Fonte: REEVE: 2006)

Córtex Pré-frontal
O córtex cerebral é a camada mais externa do cérebro. É rico em neurônios
e configura o local do processamento cognitivo complexo, como pensamento,
linguagem, memória, atenção, consciência e percepção. Esta estrutura ocupa
cerca de 30% do cérebro humano e localiza-se atrás da testa. Especialmente
proeminente nos humanos, está vinculado à memória de trabalho, ao compor-
tamento social e a personalidade. A sua importância na cognição humana re-
verbera no comportamento motivado, pois qualquer sensação ou necessidade,
acionará determinadas memórias que:
1. Permitiram a tomada de consciência sobre o fato (necessidade, meta
ou expectativa);
2. Acesso a aprendizagens a partir de experiências anteriores;
3. Tomada de decisão sobre o comportamento a ser realizado.

64 • capítulo 3
ESTRUTURA CEREBRAL Experiência motivacional/ emocional associada
Sensações prazerosas relacionadas ao ato de comer,
HIPOTÁLAMO
beber e ter relações sexuais
FEIXE PROSENCEFÁLICO MEDIAL Prazer, reforço

ÀREA SEPTAL Centro de prazer associado à sociabilidade e à sexualidade

Elaboração de planos, objetivos, formulações de intenções,


CÓRTEX CEREBRAL tendências emocionais de aproximação (pré-frontal esquerdo),
tendências emocionais de afastamento (pré-frontal direito)
Detecção e respostas às ameaças e ao perigo (medo,
AMÍGDALA
raiva, ansiedade)
Sistema de inibição comportamental durante eventos
HIPOCAMPO
inesperados
FORMAÇÃO RETICULAR Excitação; sono-vigília

Tabela 3.1  –  Estrutura cerebral e estado motivacional associado. Fonte: REEVE, 2006.

A Sede
A sede é o estado motivacional que ocorre quando nosso corpo faz a leitura
de que estamos com cerca de 2% abaixo do nível ótimo de água no nosso orga-
nismo. Cabe ressaltar que o corpo humano é constituído em sua maioria por
água, aproximadamente dois terços, e se a sede for ignorada pode-se chegar à
desidratação com apenas a redução de 3% do nível ótimo de água.

ATENÇÃO
Como as porcentagens relacionadas à sede e desidratação são muito pequenas, é impor-
tante ficar muito atento com crianças e principalmente bebês que ficam doentes e perdem o
apetite e o desejo pela ingestão de líquidos, porque como o peso deles é pequeno, o volume
de água também é, e a possibilidade de desidratação é alta e rápida podendo chegar a qua-
dro grave de desidratação.

Nosso corpo está constantemente na relação com o ambiente, perdendo lí-


quidos através da transpiração, urina, comunicação (fala), respiração e, sem a
ingestão de liquidos para normalizar a necessidade do organismo, pode-se vir a
óbito em aproximadamente 48 horas.

capítulo 3 • 65
A regulação fisiológica da sede ocorre a partir de dois processos: pelo líqui-
do que é encontrado dentro das células (intracelulares) e fora das células (ex-
tracelulares). No primeiro caso, temos a sede osmométrica e no segundo caso,
tem-se a sede volumétrica.
A sede osmométrica implica na regulação da concentração de sódio, potás-
sio e cloro dentro da célula e pode ser ocasionada, por exemplo, pela ingestão
de alimentos ricos em sódio que desregulam o ambiente intracelular.

EXEMPLO
Ida à lanchonete Fast Food da moda. Quando se chega lá, pede-se o combo gigante com
o maior sanduiche de todos recheado de molho gorduroso (com MUITO sódio), uma batata
frita gigante (com MUITO sódio) e um refrigerante enorme para matar a sede. Entretanto, o
refrigerante também tem MUITO sódio, ou seja, a sede não vai ser saciada, mas o meio intra-
celular vai ficar cada vez mais desregulado.
Lembre-se: o que mata a sede são líquidos saudáveis: água, água de coco etc.

A sede volumétrica ocasiona a diminuição do volume do plasma sanguíneo,


desregulando a pressão sanguínea. Estudos sugerem que é a sede osmométrica
que mais desencadeia a sede nos seres humanos.
No ato de beber, é necessário um sinalizador orgânico (feedback negativo)
para informar quando o organismo já esta satisfeito e pode parar o comporta-
mento. Estudos indicam que o comportamento de beber em excesso, mesmo
líquidos saudáveis, podem trazer danos ao organismo e levá-lo a óbito.
No comportamento de beber, o caminho realizado pelo líquido é primei-
ramente a boca, depois o esôfago, estômago e intestinos. Neste órgão, o líqui-
do será absorvido pela corrente sanguínea regulando o ambiente extracelular
e, através do processo de osmose, regulará também o ambiente intraceclular.
Estudos revelam que a saciedade da sede ocorre a partir do feedback negativo
gerado pela boca a partir da quantidade de goles, pelo estômago e do feedback
sobre a rehidratação das células. (REEVE, 2006)
Destaca-se a influência que o ambiente possui no esquema do consumo de
bebidas, por exemplo, a percepção da disponibilidade de líquido, o sabor, a in-
lfuência da cultura para a ingestão de bebidas a base de álcool ou cafeína ou,
também, a prescrição cultural de beber dois litros de água por dia.

66 • capítulo 3
A fome
A fome é uma necessidade impulsionada quando há necessidade de repo-
sição de glicose no sangue para a regulação homeostática do organismo ou a
regulação metabólica de armazenamento de energia. A primeira situação é de-
nominada modelo de curto prazo e o segundo modelo é o de longo prazo.

CURIOSIDADE
Determinados hormônios como a grelina e a leptina também influenciam a fome e a sacie-
dade. Quando o estômago está vazio, há a produção de grelina, também conhecido como
hormônio da fome, o que desencadeia um processo excitatório no hipotálamo e o impulso
para o comportamento de alimentação.
Já leptina é um hormônio produzido pelo tecido adiposo e possui importante função para
o controle do peso e redução do apetite.

Entretanto, a fome pode ser considerada um motivo bastante complexo


porque envolve além das funções orgânicas, vários processos cognitivos, cultu-
rais e sociais que influenciarão o ato de comer e o aparecimento de transtornos
alimentares.

Hipotálamo

Receptor
glicose Distensão
gástrica
Fígado

Leptina
Estômago
Colecistocinina
Intestino
delgado
Tecido
Intestino adiposo
grosso

Figura 3.5  –  Processos de regulação da fome: processo de curto prazo e de longo prazo
Fonte: www2.ibb.unesp.br

capítulo 3 • 67
O modelo de curto prazo, ou apetite de curto prazo, está vinculado ao início,
manutenção e término do ato de comer. O nível de glicose no sangue é monito-
rado pelo fígado a todo o momento e, caso a glicose fique abaixo do seu limite
desejável, o fígado envia um sinal excitatório para o hipotálamo lateral (HL),
que desencadeia a experiência consciente da fome e o impulso direcionado à
meta de comer.
Num segundo momento, durante a alimentação, quando o nível de glicose
aumenta no sangue, o Hipotálamo Ventromedial (HVM) é acionado, desenca-
deado o processo de feedback negativo para a fome, ou seja, indicando a sen-
sação de saciedade. A ativação do HVM ocorre devido à detecção pelo fígado
dos altos níveis de glicose no sangue, depois pelo nível de intumescimento do
estômago (distensão estomacal) e a liberação da colecistocina. (REEVE, 2006;
FELDMAN, 2015)
Na hipótese lipostática, ou de longo prazo, há o controle metabólico do
armazenamento de energia através da manutenção de determinada quanti-
dade de células adiposas no organismo. Quando esta quantidade fica abaixo
da normalidade, há a liberação do hormônio grelina, que promove o aumento
do apetite na intenção do ganho de peso retorno homeostático. (REEVE, 2006;
FELDMAN, 2015)
As influências ambientais também são poderosas no comportamento ali-
mentar e devem ser tema relacionado à educação das crianças desde cedo. A
alimentação deve iniciar em casa e privilegiar uma dieta saudável para minimi-
zar riscos de transtornos alimentares. As influências culturais se sobressaem
no comportamento alimentar, desde a escolha até a quantidade do que se vai
comer. A disposição das comidas mostrando grande variedade de pratos, cores
e sabores em restaurantes, a alimentação como evento social e a disponibilida-
de e facilidade de acesso à comida são incentivos ao excesso de alimentação.
(REEVE, 2006; FELDMAN, 2015)

Os transtornos alimentares
O processo alimentar é complexo e envolve muitas variáveis, desde as fisio-
lógicas, genéticas, cognitivas e sociais. Neste sentido, qualquer alteração em
alguma delas, pode provocar um transtorno alimentar, como a Obesidade, a
Anorexia ou a Bulimia.

68 • capítulo 3
A Obesidade
A Obesidade ocorre quando a pessoa está 20% acima do peso ideal e cons-
titui o mais comum dentre os transtornos alimentares e é considerada como o
desvio mais comum na regulagem homeostática da alimentação. Atualmente é
avaliado como um problema complexo que envolve fatores genéticos, nutricio-
nais, metabólicos, sociais e psicológicos. (GAZZANIGA, HEATHETORN, 2007;
FELDMAN, 2015)
Os fatores genéticos explicam que as pessoas podem ficar obesas porque
são geneticamente predispostas a metabolizar nutrientes em gordura mesmo
que não comam mais do que as outras. Quanto aos fatores psicológicos, po-
de-se entender o ato de comer como um modo de ativação do circuito de re-
compensa do cérebro, devido ao prazer decorrente do ato de alimentar-se, para
compensar emoções como ansiedade, estresse ou aliviar a tensão. Com relação
aos fatores sociológicos, as culturas encaram a obesidade como status e, em
outras, falta dele, tornando-se estigmatizadas. (GAZZANIGA, HEATHETORN,
2007; FELDMAN, 2015)

Anorexia nervosa
A anorexia pode ser definida como um transtorno alimentar onde as pes-
soas recusam-se a comer por possuírem uma imagem corporal distorcida de si
mesma e uma percepção irreal de seu comportamento.
Este transtorno geralmente inicia na adoles-
cência, mas pode acometer pessoas adultas. A
ideia básica construída é o medo de engordar, o
que gera uma obsessão perigosa pela magreza,
aonde chegam de 15% a 25% abaixo do se peso mí-
nimo ideal. Um fato comum para a pessoa que de-
senvolveu o transtorno é o estado de inanição ficar
muito grave necessitando de intervenção médica e
podendo, inclusive levar a óbito. A taxa de mortali-
dade devido à anorexia é de 15-20%.
Figura 3.6  –  Anorexia nervosa.
Fonte: descrevendonuvens.com

capítulo 3 • 69
Bulimia
A bulimia é outro transtorno alimentar caracterizado pela ideia excessiva
de fazer dieta, realizar farras alimentares e purgar os alimentos. Esta purgação
pode ser através de vômitos ou laxantes.
Este transtorno, da mesma forma que a anorexia, desenvolve-se na ado-
lescência. Entretanto, diferente da anorexia, as farras alimentares costumam
acontecer escondido.
A bulimia, apesar de não ser fatal como a anorexia, também está associada a
sérios problemas de saúde, como problemas dentários e cardíacos.

A necessidade fisiológica do sono


O sono é uma necessidade fisiológica essencial para o organismo. Estudos
indicam que durante o sono o cérebro continua o processamento das informa-
ções, apesar da alteração do estado de consciência.
A teoria restauradora do sono defende que o durante o sono o cérebro e o
corpo realizam a restauração de tecidos lesados e fortalece o sistema imune.
Estudos mostram que a privação de sono crônica, por períodos muito longos,
começa a afetar o humor e o desempenho cognitivo, podendo desencadear lap-
sos de memória, falta de atenção e microssonos. Estudos realizados com ratos
evidenciaram que a privação de sono por períodos muito longo pode ser fatal.
Os microssonos são os episódios de adormecimento que ocorrem durante o
dia, quando se está cansado e em estado de privação de sono, que podem durar
de segundos a minutos, mas que podem ter efeitos desastrosos dependendo da
atividade se está realizando, como, por exemplo, dirigir um automóvel e ador-
mecer durante alguns segundos. (GAZZANIGA, HEATHETORN, 2007)
O mecanismo regulador do sono está vinculado à formação reticular no
tronco cerebral. Sua excitação promove o despertar e a vigília e os baixos níveis
de excitação promovem o sono.

O Sexo
A motivação sexual nos seres humanos, diferente do que nos animais infe-
riores, sofre influências da biologia através dos hormônios sexuais, mas não é
determinada por estes.
A partir do momento em que a espécie humana evoluiu em termos cogniti-
vos e construção cultural, o determinismo biológico não é passível de explicar
a complexidade do comportamento humano. Então deve-se entendê-lo a partir

70 • capítulo 3
da articulação entre ambiente e organismo, onde cada um se retroalimenta nas
respectivas transformações.
Os hormônios sexuais são os androgênios e os estrogênios e sua liberação
na corrente sanguínea, sob controle do hipotálamo, influenciam na motivação
sexual.
A liberação dos hormônios sexuais aumenta durante o período de ovulação
da mulher, predispondo-a a relação sexual com vistas à reprodução. Entretanto,
como o comportamento humano não é puramente determinado pela biologia,
a atração e o comportamento sexual feminino torna-se mais complexo e não
estará pautado somente no processo hormonal e reprodutivo.
Com o passar do tempo, em torno dos 40 anos, há um decréscimo dos hor-
mônios e do desejo sexual em ambos os sexos, correspondendo a metade do
que ocorre para uma pessoa de 20 anos.
Homens e mulheres apresentam modelos de reação com relação ao desejo
sexual bem diferentes. Os homens apresentam um ciclo de resposta sexual que
envolve o desejo, a excitação, o platô e o orgasmo. Então, enquanto nos homens
a relação entre excitação fisiológica e o desejo psicológico e muito forte, nas
mulheres não ocorre o mesmo.
Para as mulheres o contexto, a relação de confiança, o vínculo construído
e a intimidade do casal influenciam e sensibilizam seu corpo para a excitação
sexual. (REEVE, 2006)

As necessidades Psicológicas
Os seres humanos estão em permanente contato com o ambiente, consti-
tuindo uma dialética complexa e mutável, onde os humanos necessitam cres-
cer e desenvolver novas capacidades e habilidades para poderem lidar com os
desafios que se colocam cotidianamente.
A tendência humana inata é no sentido da aprendizagem, que constitui um
processo cognitivo fundamental para a adaptação da espécie; são seres sociali-
zados que a partir da criação de vínculos constroem sua alteridade, aprendem
os conhecimentos já construídos pela civilização humana e internalizam as
normas e regras de convivência.
Neste contexto, as necessidades psicológicas possuem a qualidade de pro-
mover a motivação para o crescimento e o desenvolvimento pleno das pessoas.
Diferente das necessidades fisiológicas, que geram emoções negativas cau-
sadas pelos déficits orgânicos, as necessidades psicológicas geram interesse,

capítulo 3 • 71
satisfação e prazer se são acolhidas em ambientes apoiadores onde é possível
satisfazê-las.
A satisfação das necessidades psicológicas alimentam a motivação intrínse-
ca e a capacidade de automotivação, tornando as pessoas mais flexíveis e com
melhores possibilidades de superar adversidade e se adaptar.

Autonomia
A necessidade de autonomia ou autodeterminação pode ser expressa como
a possibilidade de escolher como iniciar e regular o próprio comportamento,
sem a interferência de eventos externos.
Neste sentido autonomia pode ser entendida como: (REEVE, 2006)
•  Necessidade de flexibilidade e possibilidade de escolha em nossa tomada
de decisão;
•  Necessidade de ligação do nosso comportamento com os nossos interes-
ses, nossas preferências, nossas vontades e nossos desejos;
•  Necessidade de liberdade de construir nossos próprios objetivos, de deci-
dir o que é importante.

Para que a pessoa consiga experienciar a autonomia, ela precisa vivenciar


três qualidades subjetivas: o lócus de causalidade percebido, a escolha perce-
bida e a volição.
1. O Lócus de causalidade percebido (LCP) está relacionado à percepção
da pessoa sobre a origem do comportamento: ela própria (LCP interno) ou o
ambiente (LCP externo);
2. A escolha percebida refere-se à percepção sobre o sentido de escolha e
a flexibilidade na tomada de decisão versus a obrigação no direcionamento de
um determinado curso de ação em ambientes coercitivos.
3. A volição (ou vontade) refere-se ao sentimento de liberdade versus coa-
ção que uma pessoa possui para a realização de algo.

A autonomia pode ser apoiada criando-se ambientes propiciadores e apoia-


dores para o seu desenvolvimento. Os ambientes apoiadores diferenciam-se de
ambientes controladores porque os primeiros incentivam que as pessoas: es-
tabeleçam metas, direcionem seus comportamentos e escolham a maneira de
resolver os próprios problemas respeitando suas crenças e valores.

72 • capítulo 3
A motivação se dá através da identificação e do apoio aos interesses, às pre-
ferências e à autorregulação autônoma dos indivíduos. Quando recebem apoio
à sua autonomia, as pessoas experimentam maior motivação intrínseca, maior
competênciapercebida,maiormotivaçãoparaalcançaremproficiênciaetambém
emoções positivas, além de maior grau de aprendizagem, de desempenho e de per-
sistência. (REEVE, 2006, p. 69)

Algumas estratégias para se promover ambientes apoiadores são:


1. Promover recursos motivacionais internos através do incentivo a
iniciativa na realização de ações a partir de suas preferências, interesses
e competências;
2. Utilização de uma linguagem informacional realizando feedbacks posi-
tivos e constritivos às pessoas, mas nunca negativos ou de forma a depreciá-las;
3. Promover a valorização das tarefas consideradas desinteressantes ex-
plicando o motivo e a importância das mesmas e, ainda,
4. Reconhecer e aceitar o afeto negativo, pois as pessoas são diferentes
que pensam diferente, então muitas vezes não possível deixar todos satisfei-
tos, mas utilizar estes momentos para aprendizagem e construção de soluções
melhores.

Em oposição, os ambientes controladores ignoram as necessidades dos


indivíduos pressionando e sempre enquadrando a uma determinada maneira
prescrita de pensar e agir, sentir e comportar-se. Neste ambiente, motivação
geralmente acontece a partir de incentivos externos juntamente com uma lin-
guagem coercitiva.
Os benefícios relacionados à satisfação da necessidade de autonomia são
muitos e influenciam profundamente o desenvolvimento da pessoa, que se
sente mais realizada, mais empoderada da sua própria vida, com a autoestima
elevada e maior senso de valor próprio e competência percebida, melhora a
criatividade e a aprendizagem.

A competência
A necessidade de competência envolve o desejo de melhorar cada vez mais
as habilidades e potencialidades num determinado assunto, de adquirir a pro-
ficiência numa determinada temática.

capítulo 3 • 73
A competência pode ser verificada pela vontade de interagir de forma efi-
ciente em ambientes que se frequenta regularmente (trabalho, escola, relações
pessoas, esporte), na busca pelo desenvolvimento de habilidades, capacidades
e talentos e quando se experimenta o desejo de progredir e ser bem-sucedido.
(REEVE, 2006)
O envolvimento da necessidade de competência acontece quando a pessoa
se depara com um desafio num nível ótimo e a sua satisfação ocorre quando ela
recebe um recebe um feedback positivo sobre como ela realizou a tarefa. Este
feedback pode vir de outra pessoa através de um elogio, da comparação do seu
desempenho atual com os seus anteriores, da comparação do seu desempenho
com o de outras pessoas ou da tarefa propriamente dita.

CONCEITO
Um desafio num nível ótimo é aquele que está de a cordo com as habilidades da pessoa,
porém, como é um desafio, possui potencial para fazê-la progredir. Nesta situação, a emoção
desencadeada é de interesse e absorção quanto ao que se deve realizar.
Quando o desafio ultrapassa o nível de habilidade (desafio alto e ansiedade baixa), ocor-
re preocupação e ansiedade devido à sensação de ameaça relacionada a competência.
Quando a habilidade ultrapassa o desafio (habilidade alta e desafio baixo), há uma re-
dução na concentração, falta de engajamento na tarefa e tédio emocional devido a falta
de interesse porque a necessidade de compotência do indivíduo não está sendo envolvi-
da adequadamente.

A relação entre competência e fracasso é importante quando se pensa na


satisfação desta necessidade. Pessoas criadas em ambientes com baixa tolerân-
cia fracasso e que desenvolvem o medo de fracassar, podem ser prejudicadas na
satisfação da sua necessidade de competência, pois tenderão a evitar ocasiões
desafiadoras e, portanto, tendem a permanecer estagnadas ou acomodadas em
suas posições no trabalho, nas suas relações etc.
A tolerância ao erro ou fracasso e a assunção de riscos estão balisados na
crença de que aprendemos mais com os fracassos (tendo em vista a possibilida-
de de criação de novas estartégias para lidar com os erros) do que com o suces-
so. Por isto, as pessoas sentem-se mais competentes em ambientes que apoiam

74 • capítulo 3
a autonomia e são tolerantes ao fracasso do que em ambientes controladores e
que não toleram o fracasso. (REEVE, 2006)

A necessidade de Relacionamento
A necessidade de relacionamento caracteriza-se pela na necessidade de
pertencimento, de interação social, desejo de estabelecer vínculos emocionais
com outras pessoas, pelo desejo de aceitação e de possuir relações calorozas e
afetuosas com outras pessoas.
O ser humano é um ser social e desenvolve a necessidade de relacionamen-
do desde cedo através da relação com a mãe ou quem cumpre este papel. Esta
necessidade possui uma função fundamental para a vida e desenvolvimento do
bebê, pois viabiliza o cuidado carinhoso e amoroso dispensado a ele e, também
importância social no sentido de que através dos relacionamentos familiares
são transmitidos os valores sociais.
O indivíduo que consegue construir vínculos satisfatórios, sente-se mais
amparado diante das adversidades, apresenta melhor desempenho e é menos
sucetível a estresse. Entretanto um vínculo, para ser considerado satisfatório é
necessário que o indivíduo tenha a percepção de que a outra pessoa preocupa-
se com o seu bem-estar, gosta dele (a) e possuui a percepção de que seu "self
autêntico" foi percebido e considerado importante aos olhos da outra pessoa.
Neste sentido, a tendência para o envolvimento da necessidade de relacio-
namento é a de aproximação de pessoas que trazem sentimentos positivos, se-
gurança e que proporcionam bem-estar e afastamento de pessoas que trazem
sentimentos negativos e que não despertam confiança.

CURIOSIDADE
Tipos de relação
As relações de comunhão são aquelas que ocorrem entre pessoas que se importam com o
bem-estar e com as necessidades do outro, tal como nas amizades, na família e nos relacio-
namentos românticos;
As relações de troca são aquelas que não satisfazem a necessidade de relacionamento,
pois ocorrem entre conhecidos ou entre pessoas que fazem negócios entre si; não existe
qualquer obrigação ou preocupação com as necessidades ou o bem-estar do outro.

capítulo 3 • 75
Tópicos importantes do capítulo
1. Caracterização das necessidades fisiológicas e psicológicas;
2. Apresentação das bases biológicas que dão sustentação aos comporta-
mentos motivados relacionados às necessidades fisiológicas;
3. Apresentação das necessidades fisiológicas da fome, sede, sono e sexo
e seus respectivos processos regulatórios.
4. Apresentação das necessidades psicológicas de autonomia, competên-
cia e relacionamento e sua importância para o desenvolvimento.

No próximo capítulo abordaremos como as Cognições afetam a motivação e


suas relações com a motivação intrínseca e extrínseca.

76 • capítulo 3
4
Motivação
Intrínseca e Tipos
de Motivação
Extrínseca
78 • capítulo 4
4.1  A aprendizagem
•  Todos os ambientes oferecem uma discriminação entre comportamentos
desejáveis e comportamentos indesejáveis;
•  Os ambientes também tendem a recompensar os comportamentos ade-
quados e a punir os comportamentos inadequados;
•  Os seres humanos tendem a se comportar de modo a se aproximar do pra-
zer (tendências hedonistas) e a evitar o desprazer (sofrimento).
•  O processo de internalização/socialização mostra aos seres humanos
quais os comportamentos que geram a recompensa e quais os que são punidos.

4.2  Motivação Intrínseca


•  Refere-se à propensão interna da pessoa, que surge espontaneamen-
te, em se comprometer com seus próprios interesses, exercitar suas pró-
prias capacidades.
– Vinculada às necessidades psicológicas de autonomia e competência.
– Quando as necessidades psicológicas são satisfeitas, geram sensa-
ção de bem-estar e alimentam a MOTIVAÇÃO INTRÍNSECA.
•  Vinculada à satisfação de realização da atividade em si. Ex.: leitura, pintu-
ra, resolver um desafio etc.

4.3  Motivação Extrínseca


•  Nem sempre as pessoas conseguem gerar a sua motivação a partir de
si mesmas;
•  As pessoas voltam-se para o ambiente em busca de uma motivação exter-
na (EXTRÍNSECA):
– Incentivo externo com o objetivo de viabilizar um determina-
do comportamento;
– Exemplos: notas, elogios, remuneração, risco de desemprego etc.
•  Surgem de alguma consequência proveniente do meio e distinta da ativi-
dade em si.
Ex.: “Faça aquilo e receberá isto”; “O que eu ganho com isto?”
– Motivação intrínseca ≠ Motivação extrínseca

capítulo 4 • 79
•  Diferença na fonte que energiza e direciona o comportamento.
– Motivação intrínseca: surge das necessidades psicológicas e da sa-
tisfação espontânea que a atividade oferece;
– Motivação extrínseca: surge dos incentivos e das consequências do
comportamento.
•  Funcionamento da Motivação Extrínseca
•  Condicionamento operante: modo como a pessoa aprende a operar de
modo eficiente no seu ambiente.
– Adotar comportamentos que PRODUZEM consequências atrativas;
– Adotar comportamentos que PREVINEM/EVITAM consequências
desagradáveis.

4.3.1  Tipos de motivação extrínseca

•  INCENTIVOS – precedem o comportamento; excitam ou inibem a inicia-


ção do comportamento.
– CONSEQUÊNCIAS – sucedem o comportamento; aumentam ou di-
minuem a persistência do comportamento.
•  INCENTIVOS
•  Evento ambiental que atrai para um comportamento ou a repele
para longe;
– POSITIVO: sorriso, companhia de amigos, aroma atraente, paga-
mento etc;
– NEGATIVO: careta, presença de inimigos, aroma desagradável, etc.
– NÃO causam o comportamento, mas AFETAM a PROBABILIDADE
de sua ocorrência.
•  PISTA SITUACIONAL que assinala se o comportamento terá consequên-
cias compensadoras ou punitivas (que á aprendida através da experiência
no mundo).
•  CONSEQUÊNCIAS
•  Tipos:
Positivo
Reforço
Negativo
Punição

80 • capítulo 4
•  REFORÇO POSITIVO
•  Estímulo ambiental que, quando apresentado, aumenta a probabilidade
futura de ocorrência do comportamento desejado.
– Exemplos: dinheiro, elogio, atenção, notas da escola, bolsas de estu-
dos, comida, troféu, reconhecimento público e privilégios.

•  REFORÇO POSITIVO
•  Definições: (segundo a análise motivacional)
– Estímulo que diminui o impulso. Ex. FOME;
– Estímulo que diminui a excitação. Ex. ansiolítico para acalmar
a ansiedade;
– Estímulo que intensifica a excitação. Ex. concerto de Rock;
– Objeto ambiental atraente. Ex. dinheiro;
– Estimulação cerebral hedonicamente prazerosa.
– Oportunidade de realizar um comportamento habitual. Ex. realizar
o dever de casa para depois ver televisão.

•  REFORÇO NEGATIVO
– Estímulo ambiental que, quando removido, aumenta a probabilida-
de de ocorrência do comportamento desejado.
– São caracterizados como estímulos AVERSIVOS e IRRITANTES.
– Motivam os comportamentos de FUGA e EVITAÇÃO.
Exemplos: barulho do despertador, lamúrias, reclamações, choro de bebê,
policiamento, prazos a serem cumpridos, dor, latidos e miados incessantes.

• PUNIÇÕES
– Estímulo ambiental que, quando apresentado, diminui a probabili-
dade de ocorrência do comportamento indesejado.
– Tem como objetivo CONTROLAR o comportamento do indivíduo.
– Exemplos: críticas, encarceramentos, exposição ao ridícu-
lo público.
– Motivos para a utilização da punição

capítulo 4 • 81
– Para impedir a ocorrência de comportamentos indesejáveis
no futuro;
– Para que o indivíduo obedeça imediatamente e não repita os com-
portamentos indesejáveis;
– Para fazer com que alguém “receba o que merece” – servindo como
uma espécie de justiça;
– Para exprimir um estado emocional negativo (raiva, frustração etc);
– Para fazer alguma coisa a respeito do comportamento indesejável (e
na impossibilidade de fazer algo melhor)
– A Punição Funciona?
– Pesquisas mostram que a punição é ineficiente no objetivo de reti-
rar o comportamento indesejável;
– A punição pode gerar “efeitos colaterais”:
– Emocionalidade negativa: choro, gritaria, medo;
– Danos na relação entre quem pune e quem é punido;
– Modelagem inadequada para o enfrentamento de comporta-
mento indesejável em outras pessoas.
– O castigo físico (surra) traz mais efeitos negativos que positivos
– Castigo físico
– Consequência Pretendida (curto prazo)
– Obediência Imediata
– Consequência Indesejada (Longo prazo)
– Na infância:
– Agressividade exacerbada;
– Comportamento antissocial: roubo, consumo de drogas;
– Saúde Mental deficiente: depressão, falta de própósito na vida;
– Internalização moral deficiente;
– Qualidade deficiente na relação entre pais e filhos;
– Vítimas de abuso físico
– Castigo Físico
– Consequências indesejadas (longo prazo)
– Adultos:
– Agressividade exacerbada;
– Saúde Mental deficiente: depressão, alcoolismo;
– Autoria de abusos na criação dos próprios filhos;
– Comportamento criminoso e antissocial.

82 • capítulo 4
– Custos ocultos das recompensas
– A imposição de uma recompensa extrínseca em uma atividade motiva-
da intrinsecamente, enfraquece a motivação intrínseca.
– Ou seja, a recompensa não é positiva quando há uma motivação intrín-
seca com relação a um determinado comportamento.
– O Lócus de causalidade deixa de ser percebido como interno e gradati-
vamente tende a ser percebido como externo.
– Diminuem a capacidade a longo prazo da autorregulação autônoma de
um comportamento.
Ex. comportamentos autônomos, se recompensados, aos poucos deixam de
ser autônomos e passam a ser condicionados pela recompensa.
– Recompensas esperadas – enfraquecem a motivação;
– Recompensas inesperadas – não possuem este efeito;
– Recompensas tangíveis (dinheiro, brinquedo, etc.) – tendem a enfra-
quecer a motivação intrínseca;
– Recompensas verbais (elogio), simbólicas ou abstratas – não diminuem
a motivação intrínseca.
– Teoria da Avaliação Cognitiva
– Eventos externos como incentivos e consequências (motivação extrín-
seca) tem como objetivo:
– MOLDAR, INFLUENCIAR ou CONTROLAR o comportamento do ou-
tro, ou seja, estimular comportamentos desejáveis; (afeta a necessidade
de autonomia)
– Servem de FEEDBACK que informa à pessoa sua competência na ta-
refa que realizou. (afeta a necessidade de competência)
•  Proposição 1 – O evento externo tem o objetivo de controlar comporta-
mento da pessoa?
– Não – a autonomia e a motivação intrínseca permanecem intactas;
– Sim – a autonomia e a motivação intrínseca serão afetadas à medida
que a motivação extrínseca for substituindo a motivação intrínseca.
•  Proposição 2 – O evento extrínseco tem o objetivo de informar a pessoa a
competência que ela sente?
– Eventos que aumentam a competência percebida aumentam a mo-
tivação intrínseca e o contrário enfraquecem a motivação.

capítulo 4 • 83
•  Proposição 3 – O propósito de apresentação de um evento externo é con-
trolar o seu comportamento ou informar-lhe sobre sua competência?
– Os incentivos e as consequências devem focalizar a tenção não
só em como o evento extrínseco afeta o COMPORTAMENTO, mas
em como afeta as NECESSIDADES PSICOLÓGICAS das pessoas
– Motivação intrínseca diminui
Controlar o
Comportamento
– Motivação extrínseca aumenta
– Evento externo
– Informação POSITIVA: a compe-
tência e a Motivação intrínseca aumentam
Informar sobre
A competência
• Informação NEGATIVA: a compe-
tência e a Motivação intrínseca diminuem
•  Um mesmo evento externo pode aplicado de maneira controladora
ou informativa.
•  Elogio:
– Controladora: “excelente trabalho, você fez como deveria ter feito”;
“você fez o que era bom que você fizesse”;
– Informativa da competência: “excelente trabalho”; “sua produtivi-
dade melhorou 10%”.
•  Competição:
– Quando o importante é a vitória: diminui a motivação intrínseca;
– Quando o importante não é a consequência da vitória (troféu, bolsas
de estudo): o evento serve como informativo da competência e aumenta
a motivação intrínseca.
– Os Benefícios dos Facilitadores da Motivação Intrínseca
•  A promoção da motivação intrínseca acarreta em:
– Persistência;
– Criatividade;
– Melhoria da compreensão conceitual/ aprendizagem de
alta qualidade;
– Bem-estar.

84 • capítulo 4
•  Teoria da Autodeterminação
•  Existem três tipos de motivação que variam gradativamente na sua auto-
determinação e no lócus de causalidade percebido:
– Falta de motivação:
– Motivação intrínseca
– Motivação extrínseca
•  Falta de motivação
•  Lócus de causalidade: Impessoal
•  Não há motivação intrínseca ou extrínseca;
•  Sensação de falta de controle sobre o meio/ incompetência
•  Tipos de Motivação Extrínseca
•  Regulação Externa: os comportamentos são regulados pela recompensa
recebida. Ex. “eu estudo para tirar nota boa na prova, e não porque gosto”;
•  Regulação Introjetada: implica em obedecer, mas não necessariamente
aceitar ou aprovar por si próprio as demandas situacionais. Ocorre em função
da culpa ou da “Tirania do dever”;
•  Regulação Identificada: representa a motivação extrínseca internalizada
e autodeterminada. A pessoa aceita voluntariamente uma determinada forma
de comportamento porque acredita ser importante ou útil;
•  Regulação Integrada: transferência completa dos valores e comporta-
mentos identificados para dentro do SELF.
•  Motivação Extrínseca
Lócus de causalidade Processos Regulatórios
•  Externo Externo: obediência,
punição, recompensa
•  Pouco externo Introjetado: autocontrole,
envolvimento do ego, punição e
recompensas internas
•  Pouco Interno Identificada: importância
pessoal, valorização consciente
•  Interno Integrada: congruência,
preocupação, síntese com o
SELF
•  Motivação Intrínseca
•  Lócus de causalidade: Interno
•  Regulação: intrínseca

capítulo 4 • 85
•  Processos regulatórios: interesse, alegria, satisfação inerente

4.4  Cognições: Crenças Pessoais de


Controle

•  A motivação e as cognições
•  As cognições referem-se aos eventos mentais tais como: crenças, expecta-
tivas e autoconceito.
•  Relacionam-se ao modo de pensar do indivíduo sobre suas habilidades
em relação aos próprios sucessos e fracassos.
•  As expectativas sobre o próprio futuro e sobre as capacidades de enfren-
tamento dos problemas (crença de controle pessoal) têm importantes implica-
ções motivacionais.
Ex.: Correr 5Km se de antemão você sabe que não conseguiria chegar nem
aos 3km.
•  Motivação para exercitar
o controle pessoal
•  O desejo de exercitar o controle pessoal baseia-se na crença de que se pos-
sui o poder de produzir resultados favoráveis.
•  A intensidade que cada pessoa tem de exercitar seu controle pessoal rela-
ciona-se com a intensidade das expectativas que tem de serem capazes realizar
o que esperam.
OBS.: EXPECTATIVA – predição subjetiva da probabilidade de ocorrência
de um evento.
•  Tipos de Expectativas
– Expectativas de eficácia: julgamento sobre a própria capacidade
para executar um determinado ato ou ação. Estimam a probabilidade de
um indivíduo comportar-se de uma determinada maneira.
– Expectativa de resultado: julgamento sobre a produção de um de-
terminado resultado, após o curso de uma ação. Estimam a probabili-
dade de ocorrência de determinadas consequências após ocorrido o
comportamento.

PESSOA COMPORTAMENTO RESULTADO

86 • capítulo 4
Expectativa de Expectativa de
eficácia resultado
“Consigo fazer isso?” “Isso dará certo?”

•  A autoeficácia (A. Bandura)


Expectativa de eficácia ≠ autoeficácia
•  Autoeficácia: capacidade da pessoa em utilizar seus próprios recursos,
orquestrar suas habilidades/capacidades, para enfrentar as demandas e as cir-
cunstâncias desafiadoras. Julgamento próprio de quão bem (ou quão mal) a
pessoa enfrentará a situação.
•  Quanto maior a autoeficácia, maior a expectativa de eficácia.
Autoeficácia ≠ Capacidade
•  A competência requer a capacidade de organizar as próprias habilidades
com o objetivo de um desempenho eficaz, especialmente em circunstâncias
desafiadoras e difíceis.
•  Capacidade de improvisar, traduzir suas habilidades para melhor resolu-
ção do desafio, para um desempenho eficiente.
Ex.: dirigir um carro em situação normal e dirigir um carro em situa-
ção arriscada.
Autoeficácia ≈ autoconfiança ≠ dúvida
•  Numa situação desafiadora/difícil/perigosa, é necessário:
– Controlar a inquietação;
– Tomar decisões conscientes;
– Evitar perigos;
– Ter capacidade de negociação;
– Saber exercer liderança
– Na situação oposta, no caso de dúvida, a situação desafiadora
pode produzir:
– Ansiedade;
– Confusão;
– Pensamentos negativos;
– Tensão corporal;
– Comportamentos de evitação.
A quantidade de autoeficácia (versus dúvida de si) é a variável motiva-
cional que determina a quantidade em que o indivíduo é bem-sucedido (ou

capítulo 4 • 87
malsucedido) ao enfrentar a situação quando suas habilidades e capacidades
estão submetidas a pressão.
•  Fontes da autoeficácia
1) História do comportamento pessoal
2) Experiência vicária
3) Persuasões verbais (conversas preparatórias)
4) Estados fisiológicos
Obs.: A história do comportamento pessoal e a experiência vicária são os
fatores mais fortes e influentes da autoeficácia, constituindo-se possibilidades
de intervenções terapêuticas promissoras. A persuasão verbal e a regulação de
estados fisiológicos funcionam como oportunidades para se alterar crenças
pessimistas de autoeficácia.
•  História do comportamento pessoal
•  As pessoas aprendem sua autoeficácia atual a partir de interpretações de
suas tentativas anteriores de executar o mesmo comportamento.
– Quando as tentativas anteriores são consideradas competentes, ele-
va-se a autoeficácia;
– Quando as tentativas de execução da tarefa são consideradas incom-
petentes, diminui-se a autoeficácia.
Ex.: elogios e sentimento de orgulho pelo trabalho bem-feito.
Importante: se a história do comportamento produziu um forte sentimento
de eficácia, a autoeficácia do indivíduo não será abalada por uma situação de
incompetência.
•  Experiência Vicária
•  Relaciona-se com a observação de um modelo realizando a mesma ação
que um indivíduo está para executar, e a percepção das consequências deste.
A partir de um processo de comparação social, o ato de observar uma pes-
soa realizando eficientemente uma tarefa, aumenta no observador seu senti-
mento de autoeficácia.
Quanto maior a semelhança percebida entre o modelo e o observador,
maior a identificação com o comportamento do modelo.
Ex.: “Se até ele não conseguiu fazer, como eu conseguirei fazê-lo?”; “Se ele
consegue, eu também consigo.”
•  Persuasão verbal
•  A comunicação persuasiva (fortalecendo as qualidades) faz a pessoa des-
viar a atenção de suas fontes de ineficiência para as fontes de eficiência.

88 • capítulo 4
Ex.: treinadores esportivos, pais, professores, patrões, colegas, amigos etc.
“ Faz que você consegue.”; “Você tem competência para realizar este
trabalho!”
•  Estado Fisiológico
•  Um estado fisiológico anormal (fadiga, dor, tensão muscular, confusão
mental, tremor etc.) são sinais de que as demandas das tarefas estão sendo
maiores que a capacidade do indivíduo de enfrentá-las, ou seja, aumentam seu
senso de ineficácia.
•  Por outro lado, a ausência de tensão, medo, ansiedade fornecem um fee-
dback corporal de que a pessoa está apta a enfrentar o desafio.
•  A Autoeficácia e o comportamento
•  As crenças de autoeficácia contribuem de várias formas para o desenvol-
vimento humano.
•  Quanto maior a esperança na realização adequada da ação, maior sua
vontade de dedicar esforço e persistência nas dificuldades que ocorrerão no
curso de tal ação.
•  Quanto menor a esperança na realização da ação, mais suscetíveis a aban-
donar a tarefa, ou se contentar com resultados medíocres, as pessoas serão.
•  Efeitos da autoeficácia no comportamento
1) Escolha das atividades e seleção dos ambientes
2) Quantidade de esforço e persistência no desempenho
3) Qualidade do pensamento e tomada de decisão no desempenho
4) Reações emocionais (stress e ansiedade)
•  Escolha: seleção de atividades e ambientes
•  As pessoas tendem a procurar e se aproximar das atividades e situações
na qual experimentam sentimentos de controle e tendem a evadir-se na situa-
ção contrária (autoproteção, pois a sensação de dúvida supera a sua sensação
de eficácia).
Ex.: evitar uma aula difícil; evitar um encontro social.
•  As escolhas de evitação possuem um efeito nocivo e durável sobre
o desenvolvimento.
•  Crenças fracas de autoeficácia (dúvida) inviabilizam a vontade de par-
ticipar das atividades afetando negativamente o exercício de potenciais
em desenvolvimento.
•  A evitação de situações causada pela dúvida gera uma limitação gradativa
do campo de ação do indivíduo.

capítulo 4 • 89
•  Esforço e Persistência
•  As crenças de autoeficácia influenciam a quantidade e a duração dos es-
forços que as pessoas empregam diante das adversidades;
– Crenças fortes de autoeficácia produzem esforços persistentes para
lidar com as adversidades;
– Crenças baixas de autoeficácia geram o desinteresse na ação a partir
do primeiro obstáculo.
•  As crenças de autoeficácia silenciam as dúvidas e potencializam uma re-
cuperação rápida (resiliência) da autoassertividade após as dificuldades.
“ É a resiliência da autoeficácia diante do martelar ininterrupto do fracasso
que fornece o apoio motivacional necessário para continuar o esforço persis-
tente para o alcance de um funcionamento competente e para o desenvolvi-
mento proficiente.” (Bandura)
•  Pensamento e tomada de decisão
•  Em situações estressantes, o desempenho de pessoas que acreditam na
sua eficácia é melhor do que aquelas que não possuem esta crença.
•  Na tomada de decisão, a dúvida distrai e tira o foco da ação/ problema.
•  Emocionalidade
•  Se a crença de autoeficácia prevalece (emocionalidade positiva):
– Atenção focada nas demandas e desafios da tarefa;
– Visualização de formas de resolução do problema;
– Otimismo;
– Interesse no feedback;
•  Se a dúvida prevalece (emocionalidade negativa):
– Evidencia/ foco nas deficiências pessoais;
– Visualização de obstáculos para o cumprimento da tarefa;
– Pessimismo, ansiedade e depressão.
•  Emocionalmente, a crença de autoeficácia protege os indivíduos da an-
siedade e do stress das situações cotidianas.
•  Terapeuticamente, um aumento da autoeficácia significa diminuição da
ansiedade.
•  Autoeficácia e dotação de Poder
•  Envolve a posse de conhecimentos, competências e crenças que permi-
tem ao indivíduo exercer controle sobre sua própria vida.
•  Refere-se a percepção do controle que se tem para guiar sua própria vida.

90 • capítulo 4
•  Para a dotação de poder, além do conhecimento sobre como deverão agir,
as pessoas necessitam de:
1) traduzir seu conhecimento e suas competências em um desem-
penho eficaz;
2) Exercer seu controle sobre pensamentos aversivos e intrusivos
Exemplo: Violência contra a mulher – não adianta saber que é necessário
fazer a denúncia; mas a crença na autoeficácia precisa alimentar a dotação de
poder pessoal e evitar pensamentos aversivos (medo da morte) para se ter co-
ragem e denunciar.
•  Modelagem de domínio: dotando as pessoas de poder
•  Programa formal que emprega um treinamento de autoeficácia com o
propósito de dotar as pessoas de poder.
•  Um especialista em determinada habilidade trabalha com o grupo mos-
trando-lhes como enfrentar situações desafiadoras.
Ex.: Treinadores, professores, instrutores de artes marciais, psicólogos etc.
•  O programa possui sete passos:
1) Identificação das habilidades para um enfrentamento eficaz e mensu-
ração da expectativa de eficácia para cada habilidade, por aluno;
2) Apresentação de um modelo para cada uma das habilidades;
3) Os estudantes realizam cada habilidade modelada e o professor lhes dá
um feedback;
4) Os estudantes integram as habilidades num desempenho geral numa
situação de desafio pelo professor;
5) Os estudantes participam cooperativamente em grupos
de aprendizagem;
6) Individualmente, os alunos executam tarefas bem próximas de uma si-
tuação da vida real, sob a orientação do professor, que lhe serve de modelo e
lhes dá o feedback corretivo;
7) O professor serve de modelo para que os estudantes vejam como é
ter um comportamento confiante e como utilizar técnicas que controlam
a excitação.
Ex.: artes marciais, falar em público, medo de dirigir; aprender matemática.
•  Crenças pessoais de controle
•  Refletem o grau com que um indivíduo acredita que será capaz de produ-
zir os resultados que deseja e impedir a ocorrência de resultados indesejáveis.

capítulo 4 • 91
– Crenças de controle fortes: atribuição de causalidade pessoal aos re-
sultados das ações;
– Crenças de controle fracas: atribuição de causalidade impessoal (o
indivíduo percebe que tem pouco domínio no resultado da ação).
•  Orientação motivacional de domínio versus orientação motivacional de
desamparo
•  Orientação motivacional de domínio: imagem forte e resistente do self
mesmo em casos de fracasso; motivação para a proficiência;
•  Orientação motivacional de desamparo: visão frágil do self; motivação
para o desempenho – quando é baixa, ocorre o desinteresse pela tarefa.
•  Desamparo apreendido
•  Refere-se ao estado psicológico que resulta quando um indivíduo espera
que os resultados de sua vida são incontroláveis.
•  Sensação de fatalidade (falta de controle) com relação às situa-
ções cotidianas.
•  As expectativas de resultados influenciam o desamparo aprendido, tal
como a expectativa de eficácia influencia a autoeficácia.
•  A aprendizagem do desamparo
•  O desamparo não é inato, mas aprendido.
•  Tal aprendizagem depende de três componentes:
– Contingência
– Cognição
– Comportamento
•  Contingência
•  Refere-se à relação objetiva entre o comportamento da pessoa e os resul-
tados do ambiente (casa, trabalho, relação interpessoal, etc.).
•  A contingência acontece em um continuum que varia desde os resultados
aleatórios (incontroláveis) até os resultados que ocorrem em sincronia com o
comportamento voluntário (controláveis).
•  Então, o grau de contingência serve para avaliar a possibilidade de con-
trole sobre o ambiente e, consequentemente, a realização de um determinado
comportamento.
Ex.: possibilidade de receber multa, ganhar um prêmio na loteria, ser assal-
tado etc.
•  Cognição

92 • capítulo 4
•  Referem-se às tendenciosidades (ilusões de controle), atribuições (de mo-
tivos pelo qual acreditamos ter o controle) e as expectativas (crenças subjetivas
de controle que aprendemos com as experiências passadas).
•  Situam-se na interseção entre as contingências reais e objetivas e a com-
preensão subjetiva que o indivíduo tem do seu controle pessoal.
•  Então, para compreender o desamparo aprendido, é importante conside-
rar a relação que a pessoa faz sobre as contingências ambientais objetivas e as
crenças pessoas e subjetivas de controle.
•  Comportamento
•  Refere-se ao comportamento voluntário de enfrentamento, que varia
num continuum de muita atividade para a muita passividade (letargia).
– A letargia, passividade e a desistência são característicos de um
comportamento de desamparo;
– A atividade, o sentido de alerta e a assertividade são características
de quem não sofre desamparo (possuem alguma expectativa de controle)
•  Efeitos do desamparo
1) Deficiências motivacionais: consiste numa diminuição da vontade
para tentar. (“Por que tentar, se eu não tenho controle do resultado?”)
2) Deficiências de aprendizagem: referem-se à aquisição de um pes-
simismo capaz de interferir na capacidade de aprendizagem da pessoa;
sentimento de impotência.
3) Deficiências emocionais: consistem em rupturas afetivas acarretan-
do reações emocionais depressivas e letárgicas em situações que exigem
atividade e assertividade (sentimento de impotência).
•  Desamparo e Depressão
•  O desamparo aprendido e a depressão são eventos similares e baseados
no sentimento de impotência do sujeito diante de algo que é inevitável.
•  Há o compartilhamento dos seguintes sintomas: passividade, baixa esti-
ma, perda de apetite.
•  Crenças de controle e Estilo explicativo
•  Reflete a maneira como as pessoas explicam os motivos pelos quais os
eventos ruins lhes acontecem.
– O estilo explicativo otimista: manifesta-se como uma tendência a
explicar os maus eventos com atribuição de causalidade externa e con-
troláveis. Ex.: “Perdi o jogo porque o outro trapaceou.”

capítulo 4 • 93
– O estilo explicativo pessimista: manifesta-se como a tendência a ex-
plicar os maus eventos com atribuição de causalidade interna e incon-
troláveis. Ex.: “Perdi porque tenho pouca coordenação motora.”
•  Crenças de controle e a Teoria da Reatância
•  A Teoria da Reatância, tal como a teoria do desamparo aprendido, tenta
explicar o comportamento diante de situações consideradas incontroláveis.
•  Reatância refere-se à tentativa comportamental e psicológica de restabe-
lecer (“reagir” contra) uma liberdade que foi eliminada ou ameaçada.
– Se a pessoa espera exercer controle sobre a situação: uma situação
incontrolável ativa a reatância, tornando as pessoas mais ativas, hostis
ou agressivas.
– Se a crença de controle é baixa: uma situação incontrolável ativa o
estado de desamparo e sentimento de incompetência e impotência.

94 • capítulo 4
5
As Emoções
96 • capítulo 5
As emoções são fenômenos multidimensionais essenciais para a adaptação
e sobrevivência do ser humano na sua relação com o ambiente. Ocorrem como
reações a eventos situacionais importantes e funcionam em conjunto com os
outros processos cognitivos, como o raciocínio lógico, para garantir tomada de
decisões mais eficientes. São fenômenos de curta duração fundamentais para a
lida com os desafios cotidianos.
Pode-se verificar a relação entre a motivação e as emoções a partir de dois
aspectos. Primeiro, a emoção é um dos motivos básicos porque tem a proprie-
dade de energizar o comportamento e, devido à sua função propositiva, tam-
bém direcioná-lo para uma meta. Além desse, outro aspecto é que as emoções
permitem a leitura sobre a adaptação do indivíduo, o que se torna fundamental
para profissionais da área da saúde.

EXEMPLO
A alegria pode revelar inclusão social e progresso em direção as metas que se deseja, en-
quanto que a angústia pode revelar exclusão social e fracasso.

Então, como as emoções são fenômenos de curta duração e estão sempre


em mudança, pois o ambiente está sempre em mudança, esta leitura emocio-
nal torna-se eficaz no sentido de que a prevalência de emoções positivas signifi-
ca que o indivíduo consegue envolver-se com os desafios diários de estabelecer
recursos internos de forma a resolvê-los.
Em outras palavras, a prevalência de emoções positivas pode servir como
indicativo para a análise das necessidades psicológicas, como está seu envol-
vimento e satisfação. Outra consequência é que a satisfação das necessidades
psicológicas alimenta a motivação intrínseca e a capacidade de automotivação,
tornando as pessoas mais flexíveis e mais adaptáveis na relação com ambientes
com estímulos estressores e aversivos.

capítulo 5 • 97
No entanto, se a prevalência são as emoções negativas, pode haver o indica-
tivo de uma fragilidade, que pode ser relacionada a um determinado momento
da vida (a perda de um parente, por exemplo) ou algum traço de personalidade
na pessoa. Neste caso, cabe ao psicólogo (a) investigar e criar estratégias de in-
tervenção para cada caso que ele vier a atender. Contudo, é importante destacar
que, seja um fator ou outro, a prevalência de emoções negativas indica que a
relação adaptativa com o ambiente não vai bem.

ATENÇÃO
As emoções possuem funções adaptativas porque têm um propósito. Mas quando a emoção
torna-se exagerada, ela deixa de ser adaptativa e vira desadaptativa. Por exemplo: a função
do medo é alertar o organismo, antes mesmo do processamento consciente do estímulo, de
que algo pode colocar a vida em risco. Mas um medo exacerbado de algo vira uma patologia:
a fobia.

As dimensões das emoções são:


1. O sentimento que refere-se a experiência subjetiva da emoção, como
a pessoa vivencia existencialmente a situação e possui origens nos proces-
sos cognitivos;
2. O aspecto biológico desencadeado e que desperta respostas mobiliza-
doras que preparam o corpo para adaptar-se às situações que enfrentadas;
3. O aspecto social porque as emoções se expressam através de sinais fa-
ciais, posturas e gestos que comunicam aos outros a qualidade e a intensidade
da emoção;
4. O aspecto funcional, pois são agentes de um propósito; uma vez aciona-
das, ativam o corpo para a ação através de estados motivacionais que possuem
finalidades e objetivos específicos.

98 • capítulo 5
Primeiro momento - modelo

EVENTO SIGNIFICATIVO DA VIDA

SENTIMENTOS EXCITAÇÃO CORPORAL


– Experiência subjetiva; – Ativação fisiológica;
– Consciência fenomenológica; – Preparação do corpo para ação;
– Cognição. – Respostas motoras.

EMOÇÃO

SENTIDO DE PROPÓSITO SOCIAL-EXPRESSIVO


– Estado motivacional direcionado – Comunicação social;
para uma meta; – Expressão facial;
– Aspecto funcional. – Expressão vocal.

No segundo momento...
FRACASSO EM UMA TAREFA IMPORTANTE

SENTIMENTOS EXCITAÇÃO CORPORAL


Sensação aversiva e negativa Diminuição da frequência cardíaca,
de angústia. baixo nível de energia.

TRISTEZA

SENTIDO DE PROPÓSITO
SOCIAL-EXPRESSIVO
Vontade de tomar uma atitude
Sobrancelhas erguidas, choro,
para vencer ou reverter a
tremor.
separação ou o fracasso.

Figura 5.1  –  As dimensões da Emoção. Fonte: REEVE, 2006.

capítulo 5 • 99
Figura 5.2  –  As faces das emoções. Fonte: alinguagemdosnegocios.blogspot.com.br

O que causa a emoção?


A emoção é um processo humano multidimensional que envolve tanto fa-
tores biológicos quanto cognitivos. Uma das questões que permeiam os teó-
ricos que estudam as emoções é se elas são inicialmente de caráter biológico
ou cognitivo. Se a causa das emoções for biológica, seu início estará relaciona-
do ao sistema límbico. Caso a perspectiva seja a cognitiva, o que prevalece é a
percepção que as pessoas têm das situações que vivenciam que se pautam na
aprendizagem e memória de experiências anteriores.
Os argumentos para a corrente biológica são que a ativação de reações bioló-
gicas não depende de processos cognitivos. Na verdade, as reações fisiológicas
das emoções ocorrem antes da capacidade de processamento da consciência.
Então as emoções podem ocorrer sem um processo cognitivo prévio, mas não
sem um processo biológico. Esta perspectiva está apoiada em três descobertas:
(REEVE, 2006, p.193)

1. Como os estados emocionais são difíceis de verbalizar, eles devem, pois, ter origens
não-cognitivas (não baseadas na linguagem).
2. A experiência emocional pode ser induzida por procedimentos não-cognitivos, tais
como estimulação elétrica do cérebro ou da musculatura facial.
3. As emoções ocorrem em bebês e animais não-humanos.

100 • capítulo 5
Figura 5.3  –  Emoção em bebê humano. Fonte: http://www.revistacarasenomes.com.br

EXEMPLO
Bebês respondem emocionalmente a certos eventos apesar de limitações cognitivas: o bebê
de 3 semanas sorri em resposta a voz humana; o bebê de 2 meses exprime raiva em resposta
à dor. (REEVE, 2006)

Figura 5.4  –  Emoções em animais. Fonte: http://thebiologicalmind.blogspot.com.br/

A perspectiva cognitiva defende que não é possível responder emocional-


mente à eventos onde não se consegue processar cognitivamente o sentido. Se
um evento for irrelevante para uma pessoa, não haverá estimulação ou ativação
de respostas emocionais porque ela será indiferente ao mesmo.

capítulo 5 • 101
EXEMPLO
Se a pessoa está na frente de um leão e não sabe o significado do animal nem o risco que
está correndo, não terá ativada a reação fisiológica do medo.

Uma terceira perspectiva articula os aspectos biológicos e cognitivos.


Considera que nos seres humanos os sistemas biológico e cognitivo são sin-
crônicos para a ativação das emoções. Entretanto, o sistema biológico é inato
e espontâneo, reagindo involuntariamente a situações potencialmente estimu-
lantes para as emoções. O outro está relacionado com a aprendizagem do indi-
víduo através da modelagem do seu comportamento.

Estruturas e Interpretação do significado


Aprendizagem
vias do evento e da sua
do indivíduo
corticais relevância pessoal

Coordenação paralela das


Evento
duas vias para ativação da
significativo
resposta emocional

História evolutiva e Estruturas e Reação instantânea, automática


filogenética da vias e inconsciente às características
espécie subcorticais sensoriais do evento

Figura 5.5  –  Modelo dos dois sistemas

Teorias das Emoções


Quantas emoções existem?
De uma forma geral, os teóricos que estudam as emoções concordam que
existem emoções inatas (primárias ou básicas), como o medo e a raiva, por
exemplo, e emoções secundárias ou aprendidas.
Existem várias teorias, tanto na perspectiva cognitiva quanto na perspectiva
biológica que consideram números bastante diferenciados em termos de emo-
ções. Entretanto, há um consenso com relação a algumas emoções básicas:
medo, raiva, repugnância, tristeza, alegria e interesse.
Pode-se dizer que essas emoções possuem características que as diferen-
ciam das outras, como: (REEVE, 2006, p. 198)

102 • capítulo 5
1. São inatas, e não adquiridas ou aprendidas por experiência ou socialização.
2. Surgem nas mesmas circunstâncias para todas as pessoas (perdas pessoais entristecem
a todos, independente da idade, cultura e assim por diante).
3. São expressas de maneira própria e distinta (tal como por meio de expressão
facial universal).
4. Provocam um padrão de respostas fisiológicas distinto e altamente previsível.

As Emoções Básicas

Medo
O medo constitui-se numa reação desencadeada por uma experiência po-
tencialmente arriscada para o organismo, seja com relação a sua sobrevivência
ou ao seu bem-estar. Os eventos perigosos ou arriscados podem ser percebidos
como fisiológicos ou psicológicos e podem ser sentidos vulnerabilidades em
qualquer dimensão da vida humana: afetiva, moral, física, psíquica e outras.
Segundo REEVE (2006, p.198)

As situações mais comuns que ativam o medo são as que se originam na antecipação ao
dano físico ou psicológico, a vulnerabilidade diante da expectativa de que a capacidade de
lidar com problemas não seja suficiente para as circunstâncias que estão para acontecer.

O medo é uma emoção altamente adaptativa porque motiva a defesa e funciona


como um sistema de alerta para o organismo de algum risco iminente ativando
fisiologicamente e de forma comportamental o organismo para atos relacionado
à fuga ou luta. O medo, ainda, pode favorecer a base motivacional para a apren-
dizagem de novas respostas de manejo (coping) que evitem a pessoa de encontrar
o perigo.

MEDO
Sobrancelhas levantadas e juntas

Pálpebras superiores levantadas

Pálpebras inferiores contraídas


Lábios levemente esticados
horizontalmente em direção
às orelhas

Figura 5.6  –  Expressão do medo. Fonte: https://facesdamentira.wordpress.com

capítulo 5 • 103
A Raiva
A raiva surge como uma resposta diante de uma limitação relacionado a
algo desejado. Alguns eventos desencadeadores da raiva são a traição da con-
fiança, rejeição, sentimento de injustiça, humilhação e outros. Ou seja, a raiva
é ativada quando o organismo interpretação que há uma interferência externa
sobre os padrões de bem-estar da pessoa.
A raiva é a emoção mais passional
•  É a emoção mais passional. E pode aumentar o senso de controle da pes-
soa. Torna as pessoas mais sensíveis e perceptíveis às injustiças do que os ou-
tros. Ativa o comportamento de luta e controle para superar os corrigir a restri-
ção não-legítima.
•  A raiva pode servir a uma função positiva, através da assertividade, para
causas sociais (movimentos sociais) ou como sinal de alerta (“ Eu estou falando
sério!”). Mas pode, também, servir a uma função negativa e com alto potencial
destrutivo, tornando-se a função mais perigosa (agressão, destruição de patri-
mônio etc).

Repugnância
•  A repugnância implica livrar-se ou afastar-se de um objeto contaminado,
deteriorado ou estragado. Tal objeto será aprendido conforme a cultura (co-
mer insetos).
•  Na primeira infância a repugnância limita-se a sabores amargos ou aze-
dos. Na segunda infância, a as reações de repugnância incluem para repulsas
psicologicamente adquiridas. Na fase adulta, a repugnância surge quando en-
contramos qualquer objeto que consideramos contaminados, tal como:
– Contaminações corporais: má higiene, sangue coagulado, morte
– Contaminações interpessoais: contato físico com pes-
soas indesejáveis
– Contaminações morais: abusos de crianças, incesto, infidelidade
•  A função da repugnância é a rejeição e possibilitam a aprendizagem de
comportamentos de evitação de objetos considerados repugnantes cultural-
mente: higiene, violação moral etc.
Tristeza
•  A tristeza ou angústia é a emoção mais negativa e desagradável. Surge
principalmente de experiências de separação ou fracasso.

104 • capítulo 5
•  A tristeza motiva o indivíduo a assumir qualquer comportamento neces-
sário para suavizar as circunstâncias que provocam a angústia antes que elas
ocorram novamente. Motiva a pessoa a fazer o ambiente voltar ao estado ante-
rior à situação angustiante.
•  A tristeza possui a função positiva de manter a coesão grupal.

Alegria
•  Os eventos que trazem alegria incluem resultados desejáveis (bom êxito
na tarefa, realizações pessoais, progresso em direção a uma meta, obtenção do
que se quer, ganho de respeito).
•  As causas da alegria são basicamente o oposto da tristeza.
•  Quando estamos alegres, sentimos entusiasmo, otimismo e so-
mos sociáveis.
•  A função da alegria é facilitar nossa disposição de exercer atividades so-
ciais e possui uma função “calmante”, equilibrando as experiências de frustra-
ção, decepção, e afeto negativo geral.

Interesse
•  O interesse é a emoção que mais prevalece no funcionamento do dia-a-dia.
•  O interesse cria o desejo de explorar, investigar, buscar, manipular e ex-
trair informações dos objetos que nos cercam, determina o grau de atenção di-
rigida e facilita a compreensão e memorização da informação, aprimorando a
aprendizagem.

Qual a utilidade das emoções?


•  Função de enfrentamento (coping): ajudar na adaptação do organismo
ao meio, seja desencadeando comportamentos para se proteger (fugir, lutar,
vomitar substâncias tóxicas), seja para construir ou manter relações sociais.
As emoções servem para: proteção, destruição, reprodução, reunião, afiliação,
rejeição, exploração, orientação. Servem para nos preparar para uma resposta
automática às tarefas fundamentais da vida.
•  Funções sociais: comunicam aos outros os nossos sentimentos, influem
no modo como os outros nos tratam, promovem e facilitam a interação social,
criam, mantêm e dissolvem nossos relacionamentos.

capítulo 5 • 105
Emoção X humor
•  As emoções surgem em resposta a um evento específico, motivam com-
portamentos adaptativos específicos e têm curta duração;
•  Os estados de humor surgem de fontes mal definidas, afetam os proces-
sos cognitivos e têm longa duração.
•  O Humor existe como um estado de afeto positivo (estado geral cotidiano
de bem-estar), ou negativo.

106 • capítulo 5
ANOTAÇÕES

capítulo 5 • 107
ANOTAÇÕES

108 • capítulo 5
ANOTAÇÕES

capítulo 5 • 109
ANOTAÇÕES

110 • capítulo 5
ANOTAÇÕES

capítulo 5 • 111
ANOTAÇÕES

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