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A Palavra, enfim, sentou-se ao trono.

A Grécia antiga – Hélade, como então se chamava – era habitada por um povo
inteligente e artista, que cultivava harmoniosamente corpo e espírito. Para exprimir as suas
idéias dispunham de uma língua clara, sonora e rica, apta para todas as formas do
pensamento. Esse povo produziu uma literatura que se distingue pela sua espontaneidade.
Não tiveram mestres e criaram todos os gêneros obras-primas que serviram de modelos à
literatura romana e posteriormente às literaturas dos povos modernos. É a literatura clássica
por excelência começando a valorizar a palavra. As idéias eram debatidas em praça pública
e todos os cidadãos poderiam participar.
A palavra oral sempre teve importância fundamental, pois através das histórias
formaram-se o caráter, a cultura e a identidade dos povos antigos. Porém, com a palavra
escrita, nasceram obras-primas como a Ilíada e Odisséia, escritas por um aedo cego
chamado Homero. É nesta primeira fase da literatura grega que apareceram os primeiros
aedos, como Orfeu, Museu e Lino.
Na segunda época da literatura grega, (Ática, V e IV séculos a. C.) foi o tempo em
que surge na filosofia a escola dos sofistas (Protágoras, Górgias, Pródico etc.) os quais
submetem à crítica os sistemas filosóficos anteriores, analisam os instrumentos de
conhecimento e aprofundam a dialética, arte da discussão e do diálogo. A partir desta data,
a palavra, literalmente, passa a valer ouro. Além do valor literário, artístico e histórico, a
palavra passa a representar o poder. Nas praças públicas, onde cidadãos defendiam seus
direitos, quem dominasse a arte do bem falar adquiria fama, poder e riquezas.
Por estas razões, os sofistas que trabalhavam com a arte de persuasão, do
convencimento através da palavra, cobravam por cada aula preços comparados ao salário
de dez mil operários, ou de cem minas. E a elite, por ser a única classe que poderia pagar o
preço do “verdadeiro conhecimento” e melhor defender as suas idéias, minou a democracia
até chegar a governar o povo. A palavra se tornou rainha, dividindo o poder com quem teve
o dinheiro para fazer da retórica, o seu trono.
Retórica e Sofistas, qual a relação ?

Podemos dizer que a relação dos sofistas com a retórica é a mesma relação que
possui Aristóteles com a lógica. Os sofistas eram os filósofos contemporâneos de Sócrates
que chamavam a si a profissão de ensinar a sabedoria e a habilidade, entre os quais se
destacaram Protágoras e Górgias. Atribuindo grande importância à linguagem os sofistas
criaram e desenvolveram a retórica.
A retórica, discurso de forma primorosa porém de conteúdo vazio, é bastante
sofistica. A serviço do belo e do convencimento, prima não pela verdade e sim pelo
convencimento, poder de persuasão.
Como Protágoras diz, o homem é a medida de todas as coisas, ou seja, todos os
parâmetros que possuem os homens dos discernimentos da realidade, do objeto, do mundo
são filtrados através de sua própria visão. O homem extrai do mundo, o conhecimento
através da sua percepção, dos seus cincos sentidos. Porém cada homem processa a
informação captada através desses sentidos de acordo com si mesmo, sendo a sua medida a
medida de todas as coisas exteriores a ele.
A retórica, como poder de persuasão pode agir de duas formas distintas. A primeira
é sobre o objeto do discurso. Com sua arte de falar bem, os sofistas dotados com a beleza
da palavra e a ornamentação das idéias, exercem sobre os objetos de que se fala, uma visão
sofisticada e inverossímil. A segunda forma é atuar diretamente sobre percepção do homem,
distorcendo sua visão sobre os objetos.
E se, com a retórica podem os sofistas mudar a visão do homem ou a aparência dos
objetos que o homem possui, podem alterar todas as suas medidas, moldando a realidade de
acordo com os seus interesses.
O mundo dos sofistas é um mundo sem verdade, sem realidade objetiva,
convencendo pela aparência de lógica e encanto do estilo. A finalidade desta retórica não é
encontrar o verdadeiro, mas dominar através da palavra. Além de criarem e desenvolverem
a retórica, os sofistas foram responsáveis pela sua má utilização, não estando devotados ao
saber, e sim ao poder, tiveram grande culpa no declínio da democracia.
A Palavra e a Retórica
André Scucato

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