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Secretaria Especial de Políticas para Mulheres para a implementação de ações voltadas ao enfrentamento da
violência contra a mulher, seja por meio da formação de profissionais de segurança pública no tema, da
elaboração de normas técnicas e protocolos de atendimento, bem como por meio do financiamento de projetos.
Esses projetos são voltados ao fortalecimento das unidades policiais especializadas, bem como:
Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM) e Núcleos ou Seções de Atendimento à Mulher em
Situação de Violência na Área de Segurança Pública. Essas unidades desenvolvem campanhas de prevenção à
violência contra as mulheres; pesquisas sobre o tema da violência contra as mulheres e sobre as condições de
funcionamento das DEAMs e/ou a outras atividades que são desenvolvidas pelos estados, Distrito Federal e
municípios.
A atualização e a oferta deste curso fazem parte das ações promovidas no âmbito desse acordo, pois,
a magnitude do problema (com números cada vez mais altos de denúncias de casos de violência contra as
mulheres) e as consequências da violência para a vida das mulheres reforçam a necessidade de formação e
aprofundamento de conhecimento na temática pelos profissionais da segurança pública.
Elaborado com base em questões importantes (que podem ajudar na compreensão do tema) e com
base na apresentação dos aspectos legais e procedimentais (que podem orientar a sua conduta como
profissional da área de segurança pública), espera-se que o curso possa contribuir para o atendimento
qualificado e humanizado à mulher em situação de violência para sua proteção nos casos de ameaça e risco de
morte.
Bom Curso!
Objetivo do curso
Ampliar o conhecimento sobre o tema a partir da análise de dados referentes aos custos e aspectos
econômicos, sociais e culturais relacionados a desigualdades de gênero;
Compreender a definição e as causas da violência contra as mulheres a partir da compreensão do
conceito de gênero;
Compreender o conceito e identificar os casos de violência doméstica e familiar;
Identificar a legislação referente ao enfrentamento à violência contra as mulheres e aos deveres do
Estado;
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Enumerar as medidas protetivas que devem ser tomadas em relação aos casos de violência doméstica e
familiar;
Reconhecer a importância e as atribuições da rede de atendimento às mulheres em situação de violência;
Reconhecer a importância do respeito dos profissionais da Segurança Pública e Defesa Social para com
as mulheres em situação de violência e aos autores.
Estrutura do curso
Para que os objetivos deste curso sejam alcançados, o conteúdo foi dividido nos seguintes módulos:
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MÓDULO
OS DADOS E AS CAUSAS DA VIOLÊNCIA CONTRA
1 AS MULHERES
Apresentação do módulo
Antes de iniciar seus estudos, assista a um vídeo que mostra alguns dados sobre a violência contra a
mulher (disponível em https://youtu.be/lGspk1NkYZs).
A cada quinze segundos, uma mulher sofre violência de gênero no Brasil (Perseu Abramo/Sesc, 2010).
Neste módulo, você estudará aspectos importantes que a/o auxiliarão a compreender o tema.
Objetivo do módulo
• Analisar dados referentes aos aspectos econômicos, sociais e culturais relacionados à violência contra
as mulheres.
• Compreender a definição e as causas da violência contra as mulheres a partir da compreensão do
conceito de gênero e do conceito de interseccionalidade.
• Reconhecer a importância do profissional da área de segurança pública no enfrentamento da violência
contra as mulheres.
Estrutura do Módulo
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Aula 1 – Violência contra as mulheres: um tema complexo
A violência contra as mulheres constitui uma das principais formas de violação de direitos humanos,
atingindo-as em seus direitos à vida, à saúde e à integridade física. É um fenômeno que apresenta distintas
expressões e contextos – podendo ser de ordem psicológica, física, moral, patrimonial, sexual, ou relacionado
aos crimes de tráfico de mulheres e assédio sexual, entre outros contextos e formas – e que requer, portanto,
que o Estado Brasileiro adote políticas acessíveis e integrais.
Entende-se por políticas acessíveis, as políticas que respeitem às diversidades de gênero, raça, etnia,
deficiência, idade, orientação sexual, identidade de gênero*, inserção social, econômica e regional existentes
entre as mulheres.
* Na aula 1, do módulo 2, você estudará mais sobre este tema.
Já, políticas integrais são políticas que englobam as diferentes modalidades pelas quais o fenômeno
da violência contra as mulheres se expressa, além de abranger ações de prevenção, enfrentamento à violência
contra as mulheres e de assistência e garantia de direitos às mulheres em situação de violência, conforme
normas e instrumentos internacionais de direitos humanos e legislação nacional.
Importante!
“Os direitos humanos das mulheres e das crianças do sexo feminino constituem uma parte inalienável,
integral e indivisível dos direitos humanos universais”
(Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, 1993) (Encontre-o nos anexos dentro do curso)
A violência contra as mulheres constitui um problema que atinge mulheres de diferentes classes sociais,
procedências regionais e/ou nacionalidade, idades, orientação sexual, identidade de gênero, regiões, estados
civis, escolaridade e/ou raças/etnias. Os números relativos aos casos de violência contra as mulheres são
alarmantes e demonstram como a violência repercute sobre a saúde física, mental, capacidade de
desenvolvimento saudável e profissional para diversas cidadãs. Um dos impactos sociais da violência contras as
mulheres é o alto custo para governos, com gastos nas áreas da saúde, jurídica, do trabalho, entre outras
(FALEIROS, 2007; JACOBUCCI & CABRAL, 2004).
Importante!
5
“notificação compulsória, no território nacional, do caso de violência contra a mulher que for atendida em
serviços de saúde públicos ou privados”.
A Énois I Inteligência Jovem, em parceria com o Instituto Vladimir Herzog e o Instituto Patrícia Galvão,
divulgou em 2015, os dados da pesquisa #meninapodetudo: Como o machismo e a violência contra a
mulher afetam a vida das jovens das classes C, D e E?. (Encontre-o nos anexos dentro do curso)
Essa pesquisa foi realizada com 2.285 jovens, de 14 a 24 anos, de 370 municípios brasileiros, com renda
familiar de até R$6.000, e os dados são alarmantes:
• 77% já sofreram algum tipo de violência sexual (são as “encoxadas” no transporte público, o tapa na
bunda durante um passeio, o beijo forçado na balada);
• 90% já deixaram de fazer algo por medo da violência, especificamente por serem mulheres.
O relatório da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 destaca que foram realizados 749.024
atendimentos em 2015, destes, 76.651 apresentaram relatos de violências, conforme mostra o gráfico a seguir:
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Importante!
Homens e mulheres são atingidos pela violência de maneira diferenciada. Enquanto os homens
tendem a ser vítimas de homicídios por desconhecidos, as mulheres têm maior probabilidade de morrer em
decorrência da violência praticada em grande parte das vezes por seus (ex-)companheiros e familiares.
Considerando as circunstâncias em que as mortes das mulheres ocorreram, a Secretaria de Políticas para
as Mulheres (SPM) ressalta que:
[...] sobre o local da ocorrência, predominam aquelas praticadas em via pública (31,2%), e no domicílio
(27,1%). Embora haja forte associação entre a violência contra as mulheres e o ambiente doméstico, os dados
sugerem que essa violência também ocorre em outros contextos e circunstâncias que devem ser objeto de
atenção quando se realiza sua classificação como feminicídio, ou seja, como mortes violentas, intencionais e
evitáveis que decorrem das desigualdades de poder que afetam as mulheres de forma desproporcional. Sobre
os meios empregados, a maior parte das lesões foram produzidas com o emprego de armas de fogo (48,8%)
e armas brancas (25,3%), sendo também significativo o emprego de outros instrumentos e meios (25,9%).”
(BRASIL, 2016)
De acordo com os dados do Mapa da Violência – 2015 (Encontre-o nos anexos dentro do curso) o Brasil
ocupa o 5º lugar no ranking internacional de homicídio de mulheres. Entre 2003 e 2013, o número de vítimas
do sexo feminino passou de 3.937 para 4.762, incremento de 21,0% na década. Essas 4.762 mortes em 2013
representam 13 homicídios femininos diários.
Segundo Minayo (2009), estima-se que a violência de gênero seja responsável por mais óbitos das
mulheres de 15 a 44 anos quando comparado com o câncer, a malária, HIV, problemas respiratórios,
metabólicos, infecciosos, acidentes de trânsito e as guerras. As repercussões dessa violência incluem lesões
permanentes e problemas crônicos.
A violência doméstica afeta todas as áreas da saúde da mulher: física, reprodutiva e mental. Pesquisas
mundiais apontam que 35% dos motivos de procura das mulheres aos serviços de saúde estão relacionados às
consequências da violência doméstica, e não são puramente queixas decorrentes de lesões físicas.
O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde (Krug et. al, 2002) aponta que a mulher passa a ser mais
suscetível à depressão; tentativas de suicídio; síndromes de dor crônica; distúrbios psicossomáticos; lesão física;
distúrbios gastrintestinais; síndrome de intestino irritável; além de diversas consequências na saúde reprodutiva.
O Estudo sobre saúde da mulher e violência doméstica (OMS, 2005) reporta que o percentual de
mulheres que tem pensamento suicida aumenta de 17% (entre aquelas que não sofreram violência) para 41%
(entre aquelas que sofreram). Em relação às tentativas de suicídio, o percentual se eleva de 25% (entre aquelas
que não sofreram) para 40% (entre aquelas que sofreram).
As violências sofridas pelas mulheres são um problema complexo que necessitam de atendimento
médico, psicossocial e também da segurança pública e justiça, como forma de coibir sua prática, prevenir novos
eventos e proteger as mulheres e meninas para que possam viver sem violência.
Agora que já sabe mais sobre o tema, estudará a seguir as causas da violência contra as
mulheres.
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Aula 2 – As causas da violência contra as mulheres
2.1 Conceito de gênero: ponto de partida para a compreensão das causas da violência contra as
mulheres
As causas da violência contra as mulheres podem ser compreendidas a partir da definição de violência
contra a mulher, apresentada na Convenção de Belém do Pará (disponível em
www.cidh.oas.org/basicos/portugues/m.Belem.do.Para.htm)
Art. 1º- A violência contra a mulher constitui qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte,
dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado. (Grifo
nosso).
Observe que o grifo na definição apresentada demarca o ponto de partida para entender as causas da
violência contra as mulheres, pois é preciso começar pelo conceito de gênero. E, para entender a definição de
gênero, é preciso discutir os papeis masculinos e femininos na sociedade.
Agora que já sabe mais sobre o tema, estudará a seguir as causas da violência contra as mulheres. Para
você, o que é ser homem e o que é ser mulher? Anote quais características de comportamento são
consideradas masculinas e femininas.
Frequentemente, ao fazer essa pergunta são listadas as seguintes características masculinas: coragem,
força, raciocínio, liderança, provedor, violento. Em relação às características femininas, geralmente são listadas
as seguintes: sensibilidade, emoção, espiritualidade, intuição, diálogo, cuidado.
Você acha que essas características são biológicas (as pessoas já nascem com elas) ou foram e
são construídas pela sociedade ao longo da história?
A partir da diferenciação entre o que é biológico e o que é construção social, foi elaborado o conceito
de gênero. São diversas as correntes que debatem o termo, na definição de KABEER, gênero deve ser entendido
como:
“Um processo por meio do qual indivíduos que nasceram em categorias biológicas de machos ou fêmeas
tornam-se categorias sociais de mulheres e homens pela aquisição de atributos de masculinidades e
feminilidade, definidos localmente.” (KABEER, 1999, p. 15)
O termo gênero problematiza o determinismo biológico suposto no uso de palavras como “sexo” e
evidencia que os papéis desempenhados por homens e mulheres são uma construção social.
Saffioti (2001, p. 129) afirma que o único consenso existente sobre o conceito de gênero reside no fato
de que se trata de uma modelagem social, estatisticamente, mas não necessariamente, referida ao sexo.
8
“Distinguir entre o que é natural e biológico, o que é social e culturalmente construído e, no processo,
renegociar as fronteiras entre o natural - e por isso mesmo, relativamente inflexível - e o social - relativamente
transformável” (KABEER, 1999).
Segundo a autora que difundiu o conceito gênero, esse termo refere-se a “uma maneira de se referir às
origens exclusivamente sociais das identidades subjetivas dos homens e das mulheres. O gênero é, segundo
essa definição, uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado” (SCOTT, 1989)
Para uma diferenciação entre os conceitos de sexo e gênero, veja tabela a seguir:
SEXO GÊNERO
Importante!
A construção social com base nas diferenças biológicas atribui diferentes espaços de poder para homens e
mulheres, nos quais a mulher em geral ocupa lugares de menor empoderamento, de desvalorização e de
subalternidade. Não se fala, portanto, em diferenças, mas em desigualdades que são produzidas e
reproduzidas em diferentes espaços – no âmbito doméstico, no trabalho, nas religiões, nas profissões etc.
A violência contra as mulheres só pode ser entendida no contexto das relações desiguais de gênero, como
forma de reprodução do controle do corpo feminino e das mulheres numa sociedade sexista e patriarcal. As
desigualdades de gênero têm, assim, na violência contra as mulheres sua expressão máxima que, por sua vez,
deve ser compreendida como uma violação dos direitos humanos das mulheres. (POLÍTICA NACIONAL DE
ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES, 2011, p. 8)
Assim, as violências baseadas no gênero, entre as quais se destaca a violência contra as mulheres, surgem
como uma estratégia de manutenção desta hierarquia social, segundo a qual as mulheres devem ser submetidas
ao poder masculino.
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2.2 Caracterizando a violência contra as mulheres a partir do conceito de interseccionalidade
Estudos sobre violência contra as mulheres mostram que a violência pode atingir todas as mulheres ao
longo de suas vidas, mas existem características que contribuem para que a violência baseada no gênero atinja
com mais frequência alguns grupos de mulheres que outros. Essas características se referem à: classe social ou
situação financeira, entre outras.
Da mesma forma como ocorre com gênero, essas diferenças são construídas socialmente como fatores
de desigualdade social que hierarquizam as diferenças dentro de estruturas de poder – razão pela qual levam a
denominação de “marcadores de diferenças sociais”. A análise do cruzamento desses marcadores de
diferenças sociais com as desigualdades de gênero é tratada por meio do conceito de interseccionalidade.
O conceito de interseccionalidade parte da necessidade de pensar a associação de sistemas múltiplos
de dominação: “é uma conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas
da interação entre dois ou mais eixos de subordinação” (CRENSHAW, 2002).
No Brasil, raça e cor são elementos fundamentais para a compreensão e enfrentamento do processo de
violação de direitos das mulheres, dentro e fora de casa.
O Mapa da Violência (2015) descreveu o perfil das mulheres vítimas de homicídio. Segundo o estudo, as
principais vítimas são meninas e mulheres negras. As taxas de homicídio por 100 mil mulheres mostram que as
mortes de mulheres brancas caem na década analisada (2003 a 2013): de 3,6 para 3,2 por 100 mil mulheres,
queda de 11,9%; enquanto as taxas entre as mulheres e meninas negras crescem de 4,5 para 5,4 por 100 mil,
aumento de 19,5%. Com isso, a vitimização de negras, que era de 22,9% em 2003, cresce para 66,7% em 2013.
Houve, nessa década, um aumento de 190,9% na vitimização de negras.
A publicação Retratos da Desigualdade de gênero e raça (IPEA) (Disponível em:
http://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/revista.pdf) apresenta dados que demonstram que mulheres negras
procuram menos os serviços policiais.
Ao se indagar o motivo de não terem procurado apoio nas instituições de segurança pública, as mulheres
informaram que:
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Esses dados refletem diretamente sobre os obstáculos para acesso à justiça da população negra.
Importante!
“Estamos convencidos de que racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata revelam-se de
maneira diferenciada para mulheres e meninas, e podem estar entre os fatores que levam a uma deterioração
de sua condição de vida, à pobreza, à violência, às múltiplas formas de discriminação e à limitação ou negação
de seus direitos humanos” (DECLARAÇÃO DA III DECLARAÇÃO DA III CONFERÊNCIA MUNDIAL CONTRA O
RACISMO, XENOFOBIA E INTOLERÂNCIAS CORRELATAS, parágrafo 69)
Saiba Mais...
A violência de gênero é desencadeada pela não aceitação de que as mulheres possam questionar ou
não desempenhar os papéis femininos que lhes são designados na sociedade (submissão, cuidado, entre outros).
Esses papéis se constroem com base numa visão heteronormativa e biológica do sexo, ou seja, reconhece
como “normal” e adequada a mulher que nasce com sexo feminino e se relaciona sexual e afetivamente com
homens. Nesse sentido, a violência se agrava quando as mulheres têm orientação sexual ou identidade de
gênero diferentes daquela considerada a norma.
Uma pessoa que sente atração física, sexual e/ou afetiva por uma pessoa do mesmo sexo/gênero é uma
pessoa homossexual. Uma mulher que sente atração por outra mulher é uma mulher lésbica. Uma pessoa que
sente atração por pessoas de ambos os sexos é bissexual. Isso diz respeito à orientação sexual, que pode ser
entendida como “a capacidade de cada pessoa de ter uma profunda atração emocional, afetiva ou sexual por
indivíduos de gênero diferente, do mesmo gênero ou de mais de um gênero, assim como ter relações íntimas e
sexuais com essas pessoas”. (Princípios de Yogyakarta, p. 10 disponível em
www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios_de_yogyakarta.pdf)
Quando uma pessoa se identifica com um gênero diferente daquele que ela foi designada quando nasceu
(como homem ou como mulher), ela pode ser uma pessoa transgênero ou travesti. Uma pessoa que nasceu
com um pênis ou que tenha sido designada como do sexo masculino, mas que se identifica como mulher, é
uma mulher transexual.
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A identidade de gênero, então, tem a ver com a :
A identidade de gênero, então, tem a ver com a sentida experiência interna e individual do gênero de cada
pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo
(que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal por meios médicos,
cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismos
(PRINCÍPIOS DE YOGYAKARTA, s. d., p. 10).
A violência motivada pela homofobia e transfobia é muitas vezes particularmente brutal e, em alguns
casos, caracterizada por níveis de crueldade superior a de outros crimes de ódio. Esses (atos violentos)
constituem violações graves dos direitos humanos, muitas vezes realizadas com impunidade, o que indica que
as atuais disposições para proteger os direitos humanos dos LGBT e intersexuais são inadequadas. (RELATÓRIO
DO ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS DE DIREITOS HUMANOS, s. d.)
O Brasil lidera o ranking dos países das Américas com maior número de mortes de pessoas LGBT,
segundo relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH, 2015).
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Importante!
Durante o atendimento a pessoas travestis e transexuais deve-se adotar o nome social, ou seja,
designação pela qual essa pessoa se identifica e é socialmente reconhecida. O cumprimento desse decreto é
passo fundamental para ampliação do acesso a direitos por parte da população transexual e travesti.
(DECRETO Nº 8.727, 2016) (Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2016/Decreto/D8727.htm)
Além das expectativas relacionadas aos papéis sociais relacionados ao gênero, as mulheres com
deficiência deparam-se também com a corpo normatividade, ou seja, com padrões funcionais e corporais
hegemônicos na sociedade. Essa realidade tem reflexo na violência de gênero praticada contra essas mulheres.
Segundo estimativa feita pela Human Rights Watch (2012), mulheres com deficiência têm 10 vezes mais chances
de sofrerem abusos.
Em pesquisa realizada no Canadá (RIDINGTON, 1989), entre as mulheres com deficiência entrevistadas,
40% relataram que foram sujeitadas a abuso e 12%, que foram estupradas.
No Brasil, segundo o Censo de 2010, 25,6% da população feminina apresenta pelo menos um tipo de
deficiência.
“Mulheres e meninas com deficiência estão frequentemente expostas a maiores riscos, tanto no lar como
fora dele, de sofrer violência, lesões ou abuso, descaso ou tratamento negligente, maus tratos ou exploração”
(CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA - DECRETO Nº 6949,
2009)
Além dos tipos de violência cometidos contra mulheres em geral, de acordo com estudo Violência
contra Mulheres com Deficiência (disponível em
www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/violencia_mulheres_deficiencia.pdf) da The
International Network of Women with Disabilities (INWWD) (Rede Internacional de Mulheres com
Deficiência) os seguintes atos e atitudes podem constituir violência contra mulheres com deficiência:
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• ameaças de cancelar a utilização de apoios ou animais assistentes;
• colocação de mulheres em desconforto físico ou em situações constrangedoras por longo período de
tempo;
• ameaças de abandono cometidas por cuidadores;
• violações de privacidade;
• estupro e abuso sexual cometidos por membro da equipe ou por outro paciente internado em
instituições;
• aborto forçado; e
• esterilização forçada.
Cabe atentar, também, ao fato de que muitas mulheres após serem submetidas a violências de gênero
adquirem deficiências como sequela. Um caso emblemático é o de Maria da Penha Maia Fernandes que, em
decorrência de um tiro de espingarda disparado pelo seu então marido, tornou-se paraplégica.
Algumas barreiras para que as mulheres com deficiência procurem ajuda são forte dependência (física,
emocional, financeira) em relação ao/à agressor/a (companheiro/a, membro da família, cuidador/a), falta de
informação, dificuldades de acesso aos serviços especializados, medo de institucionalização, além das limitações
institucionais pelos órgãos de segurança pública em relação ao atendimento às pessoas com deficiência (NIXON,
2009).
Portanto, é preciso estar atenta/o às interseccionalidades de gênero, raça/etnia, deficiência, orientação
sexual, identidade de gênero. Além das situações descritas acima, é preciso ter atenção à interseccionalidade
relativa a classe, idade, local de habitação (rural/urbano), pois todas podem repercutir sobre formas de violência
contra as mulheres.
Finalizando...
• A violência contra as mulheres constitui uma das principais formas de violação dos seus direitos
humanos, atingindo-as em seus direitos à vida, à saúde e à integridade física e que requer, portanto, que o
Estado Brasileiro adote políticas acessíveis e integrais.
• Violência contra as mulheres constitui uma forma de violência que foi definida pela Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – “Convenção de Belém do Pará”
como qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico,
sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado. (ART. 1º DA CONVENÇÃO DO
PARÁ, 1994).
Interseccionalidades entre gênero, raça/etnia, classe, idade, deficiência, orientação sexual, identidade de
gênero, local de habitação (rural/urbano) devem ser levadas em consideração no atendimento às mulheres
em situação de violência.
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Exercícios
1. Tendo por base as estatísticas sobre a violência contra mulher, responda (V) para as sentenças
verdadeiras e (F) para as falsas:
( ) O Brasil é um dos países no mundo que conta com o menor índice de homicídios de mulheres, segundo
Mapa da Violência 2015.
( ) Em pesquisa realizada pelo instituto Énois Inteligência Jovem, em 2015, 90% das entrevistadas já
deixaram de fazer algo por medo da violência, especificamente por serem mulheres.
( ) A violência sofrida é igual para todas as mulheres, independentemente de raça/etnia, orientação sexual,
identidade de gênero, deficiência e classe.
( ) Segundo dados da Central de Atendimento à Mulher- Ligue 180, em 2015, entre as agressões mais
sofridas, as mais citadas foram a física (50,15%) e a violência psicológica (30,33%).
( ) Não há relação entre a violência contra a mulher e a saúde mental da mulher.
2. Tomando por base a diferenciação entre gênero e sexo, correlacione os itens com as afirmativas:
( ) Sobre o local da ocorrência, predominam aquelas praticadas em via pública (31,2%), e no domicílio (27,1%).
( ) Os dados mostram que a exclusividade da violência contra as mulheres está relacionada ao ambiente
doméstico.
( ) Sobre os meios empregados, a maior parte das lesões foi produzida com o emprego de armas de fogo
(48,8%) e armas brancas (25,3%).
( ) Quando considerado o emprego de outros instrumentos ou meios, na prática de violência contra as
mulheres, eles não foram significativos.
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Gabarito
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MÓDULO
OS TIPOS E OS MITOS SOBRE A VIOLÊNCIA
2 CONTRA AS MULHERES
Apresentação do módulo
Neste módulo, você estudará os tipos e definições das diferentes violências contra as mulheres,
tanto no âmbito público como privado.
Estudará, também, que a violência doméstica e familiar vai além da violência física, incluindo
diversos tipos de violência. Por fim, verá que a violência contra as mulheres é um fenômeno complexo e
está envolta em alguns mitos. A última aula propõe reflexões para romper alguns desses mitos.
Objetivo do módulo
Estrutura do Módulo
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Aula 1 – Tipos de violência contra as mulheres
Como você estudou no módulo anterior, a violência contra as mulheres constitui uma forma de violência
definida pela Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção
de Belém do Pará) em seu Artigo 1º, como:
Art 1º- A violência contra a mulher constitui qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause
morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público quanto no privado.
(grifo nosso)
Para compreender a definição de violência contra as mulheres, é importante considerar que esse
fenômeno social abarca diferentes formas de violência e em diferentes contextos. Assim, com base na
Convenção de Belém do Pará, há:
• A violência ocorrida na comunidade e que seja perpetrada por qualquer pessoa e que compreende,
entre outros, violação, abuso sexual, tortura, tráfico de mulheres, prostituição forçada, sequestro e assédio sexual
no lugar de trabalho, bem como em instituições educacionais, estabelecimentos de saúde ou qualquer outro
lugar;
• A violência institucional que é perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes, onde quer que
ocorra;
• A violência doméstica ou em qualquer outra relação interpessoal, em que o/a agressor/a conviva ou
haja convivido no mesmo domicílio que a mulher e que compreende, entre outras, as violências física,
psicológica, sexual, moral e patrimonial*.
* A Lei Maria da Penha, nº 11.340/2006, está adequada à Convenção de Belém do Pará e cria mecanismos para coibir a violência
doméstica e familiar contra as mulheres, prevendo as cinco tipologias mencionadas.
Importante!
Segundo a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, “a violência contra as mulheres
não pode ser entendida sem se considerar a dimensão de gênero, ou seja, a construção social, política e
cultural da(s) masculinidade(s) e da(s) feminilidade(s), assim como as relações entre homens e mulheres. A
violência contra a mulher dá-se no nível relacional e societal, requerendo mudanças culturais, educativas e
sociais para seu enfrentamento e um reconhecimento das dimensões de raça/etnia, de geração e de classe na
exacerbação do fenômeno” (SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES, 2011, p. 8).
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1.2 Alguns tipos de violência cometidas contra as mulheres
É um abuso de poder, um constrangimento para obtenção de favores sexuais pelo superior hierárquico
(chefe, por exemplo), com a promessa de tratamento diferenciado em caso de aceitação, ou pelo uso de ameaça
e atitudes concretas de represálias no caso de recusa, como a perda de emprego, ou de benefícios.
“Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da
sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função."
(CÓDIGO PENAL , Art. 216-A)
Pessoas que estejam na posição de superior hierárquico/a, ou seja, quem está, por qualquer motivo, em
uma posição mais elevada que outra pessoa. Pessoas que estejam na posição de superior hierárquico/a, ou seja,
quem está, por qualquer motivo, em uma posição mais elevada que outra pessoa. Em uma empresa, o/a dono/a,
o/a gerente ou o/a chefe de seção tem superioridade hierárquica sobre os/as empregados/as. Na igreja, o padre
e o pastor têm superioridade sobre os coroinhas ou os/as fiéis. Nas instituições de Segurança Pública,
investigadores chefes, delegados, coronéis, etc.
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Discriminação e violência de gênero nas instituições policiais
Fonte: FGV, FBSP, SENASP, 2016 – Pesquisa “Mulheres nas Instituições Policiais”
Saiba mais...
Então, leia mais informações na cartilha Assédio Moral e Sexual no Trabalho (Disponível em:
acesso.mte.gov.br/data/files/8A7C812D3CB9D387013CFE571F747A6E/CARTILHAASSEDIOMORALESEXUAL%2
0web.pdf).
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1.2.3 Cárcere privado
O cárcere privado é caracterizado pela privação da liberdade (CÓDIGO PENAL, Art. 148). Quando a vítima é
mulher, essa violência se manifesta de diferentes formas, como:
A exploração sexual ocorre quando um indivíduo obtém lucro financeiro por conta da prostituição de
outra pessoa, seja em troca de favores sexuais, incentivo à prostituição, turismo sexual, ou cafetinagem
(rufianismo). Em casos envolvendo crianças e adolescentes, o crime se torna agravado por ser classificado como
crime contra vulnerável.
O crime está previsto no Código Penal, art. 228:
“Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar
que alguém a abandone”.
No Brasil, a prostituição NÃO constitui crime, desde que praticada por pessoa maior de idade que
não esteja sob ameaça ou coação, e que, a própria pessoa fique com a renda da atividade. As prostitutas não
precisam de controle penal, e sim, de acesso a políticas públicas, inclusive para proteção de seus direitos.
1.2.5 Feminicídio
O Feminicídio* é o crime hediondo relacionado ao assassinato de mulheres por razões de gênero. São crimes
decorrentes das desigualdades estruturais associadas aos papeis masculino e feminino na sociedade.
Assassinato relacionado à inferiorização e à subordinação das mulheres aos homens, em uma estrutura social
que estimula o desejo de controle e posse sobre o corpo feminino, e que justifica o menosprezo pela condição
social feminina. Você estudará mais sobre o tema no módulo 3.
21
companheiro ou marido. Mesmo que a vítima tenha consentido em fazer fotos ou vídeos, existe um crime
quando eles são divulgados sem o consentimento da mulher.
Saiba mais...
Que tal se aprofundar no assunto?
É aquela praticada, por ação e/ou omissão, nas instituições prestadoras de serviços públicos. A violência
institucional compreende desde a dimensão mais ampla, como a falta de acesso aos serviços e a má qualidade
dos serviços prestados, até expressões mais sutis, mas não menos violentas, tais como os abusos cometidos em
virtude das relações desiguais de poder entre profissional e usuária. Assim, ela é, muitas vezes, praticada por
agentes que deveriam garantir uma atenção humanizada, preventiva e reparadora de danos.
Uma forma comum de violência institucional ocorre em função de práticas discriminatórias, em geral
com base no gênero, raça, etnia, orientação sexual e religião.
22
1.2.9 Violência obstétrica
De acordo com a pesquisa “Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado (2010)”
(Disponível em: http://www.apublica.org/wp-
content/uploads/2013/03/www.fpa_.org_.br_sites_default_files_pesquisaintegra.pdf), uma em cada quatro
mulheres sofre violência no parto.
A violência obstétrica existe quando os/as profissionais de saúde tratam as mulheres de maneira
imprópria e violenta durante a gestação, durante o parto, o puerpério e durante o atendimento em situações de
abortamento. São comuns os relatos de tratamento desumanizado, abuso de medicalização, tratamento de
estados naturais do corpo como doença e desconsideração de escolhas livres e informadas das mulheres no
momento dos tratamentos.
O conceito é amplo, pois inclui todos os procedimentos, físicos ou não, pelos quais as mulheres passam
durante a gestação, trabalho de parto, parto, pós-parto e abortamento, e que não estão de acordo com
princípios da humanização. Alguns dos tipos mais comuns são agressões verbais, recusa de atendimento,
privação de acompanhante, lavagem intestinal, raspagem dos pelos, jejum, episiotomia e separação de mãe e
bebê saudável após o nascimento.
Envolve práticas sexuais não consentidas seja por desconhecido, seja por pessoa familiar/conhecida.
Pode ser praticada por namorado, marido, vizinhos, amigos, conhecidos, familiares ou estranhos.
O crime de estupro está previsto no Código Penal, como:
“Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou
permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” (CÓDIGO PENAL, Art. 223).
É comum encontrarmos pessoas que entendem que o namorado e, principalmente, o marido podem
praticar sexo com a mulher mesmo sem consentimento dela. No entanto, qualquer prática sexual não desejada
constitui uma violência sexual e é considerada estupro. Ao estabelecer uma relação com outra pessoa, a mulher
não deixa de ter direito ao próprio corpo ou de ter liberdade para decidir o que quer ou não fazer.
23
“Qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause à mulher morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou
psicológico e dano moral ou patrimonial no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da família ou em
qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida,
independentemente de coabitação”. (LEI Nº 11.340, 2006).
• Violência física - entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal.
• Violência psicológica - qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima
ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações,
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação,
isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e
limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à
autodeterminação.
• Violência sexual - qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação
sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a
utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a
force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou
manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.
• Violência patrimonial - qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou
total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos
econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.
Saiba mais...
Então, leia a cartilha sobre a violência doméstica e familiar! (Disponível em: www.spm.gov.br/central-de-
conteudos/publicacoes/publicacoes/2015/livreto-maria-da-penha-2-web-1.pdf).
24
Aula 3 – A formulação de hipóteses e o modelo de análise
No dia a dia você já deve ter ouvido frases que são utilizadas para justificar a violência contra as
mulheres. Leia os mitos sobre a violência doméstica e familiar contra as mulheres, apresentados a seguir, e os
argumentos que auxiliam a sua desconstrução.
Uma das razões para que as mulheres sofram violência doméstica e familiar ou tenham dificuldades para
romper uma relação violenta é a dependência financeira. Porém, os dados dos relatos de violência registrados
no Ligue 180 demonstram que é preciso desmistificar esse como o único ou o fator principal para permanência
em uma relação conjugal violenta.
Nos casos de relatos de violência registrados (BALANÇO LIGUE 180, 2015), somente 34,67% das
mulheres em situação de violência dependem financeiramente do/a agressor/a, 65,33% não dependem.
Esse dado problematiza o senso comum de que a dependência financeira é a motivação principal para a
permanência de mulheres em relações marcadas por violência de gênero. A violência contra as mulheres é um
fenômeno complexo que precisa ser avaliado em sua amplitude de fatores socioculturais.
25
Uma das indagações mais intrigantes acerca da violência contra as mulheres diz respeito aos fatores que
levam as mulheres a permanecer numa relação conjugal violenta, a despeito de seu sofrimento. É comum que
as pessoas, no cotidiano, busquem explicações para tal baseando-se em ideais pré-concebidas relacionadas às
mulheres em situação de violência. Entre essas ideias, uma crença comum é a de que elas permanecem com
parceiros/as agressores/as porque, decerto, “gostam de apanhar”.
Na pesquisa Tolerância Social à Violência contra as Mulheres (Disponível em:
www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/SIPS/140327_sips_violencia_mulheres.pdf) (IPEA, 2014), 65% das
pessoas entrevistadas concordaram que “a mulher que é agredida e continua com o parceiro gosta de apanhar”.
Contudo, vale refletir sobre os resultados de pesquisa que possibilitou identificar as razões para manutenção
do vínculo conjugal.
Essas e outras razões são explicadas na cartilha Enfrentando a Violência contra as Mulheres:
Orientações Práticas para Profissionais e Voluntários (Disponível em:
www.lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/cgvs/usu_doc/ev_vio_ta_2005_enfrentando_a_violencia_contra_
a_mulher.pdf), como por exemplo:
Riscos do rompimento: Talvez você já tenha tido notícia de casos de mulheres que são mortas quando
estão tentando deixar o/a agressor/a. A violência e as ameaças contra a vida da mulher e dos filhos se tornam
mais intensas no período da separação. Exigir que a mulher em situação de violência rompa o relacionamento
com o/a agressor/a pode ser uma enorme irresponsabilidade, se não pudermos oferecer a ela as condições
mínimas de segurança para que possa dar esse passo tão arriscado.
Vergonha e medo: Imagine o que significa para uma mulher denunciar seu próprio parceiro! Não é a
mesma coisa que apontar um ladrão desconhecido que lhe rouba a bolsa na esquina. Além disso, há o perigo
dele se tornar ainda mais violento, por ela o ter denunciado. Ainda, considere que há a vergonha de ter que
26
reconhecer que seu romance fracassou e seu projeto de ser feliz ao lado da pessoa amada acabou em uma
delegacia de polícia.
Esperança de que o marido mude o comportamento: Um homem violento faz mais do que pedir
perdão, durante a fase de lua de mel do ciclo da violência (Encontre-o nos anexos dentro curso). Ele pode pedir
ajuda e começar a fazer algum tipo de tratamento: entrar para os Alcoólicos Anônimos, procurar um psiquiatra
ou uma igreja. Ele pode demonstrar o amor, admitir seus erros e jurar que vai fazer o que estiver ao seu alcance
para mudar. Se a mulher ama seu companheiro, ela tenta evitar o fim da relação. Quem poderá julgá-la por isso?
Isolamento: As mulheres em situação de violência perdem seus laços familiares e sociais. Os maridos
violentos são muito ciumentos e controlam os movimentos da parceira. Querem saber onde ela foi, com quem
falou ao telefone, o que disse, porque usou tal roupa, para quem olhou na rua etc.
Negação social: Quando pedem ajuda, as mulheres em situação de violência se defrontam com pessoas
despreparadas e desinformadas sobre o problema que elas estão vivendo. Cada vez que um médico, um
psicólogo, um líder religioso, um policial ou um advogado as trata com indiferença, desconfiança ou desprezo,
contribuem para aumentar a violência. Quando isso acontece, essas mulheres, muitas vezes, perdem a esperança
de encontrar apoio externo.
Dependência econômica: Muitas mulheres em situação de violência de gênero não têm capacitação
profissional para iniciar uma vida no mercado de trabalho ou para estabelecer novas relações de trabalho em
outra cidade ou estado, onde poderiam encontrar as condições ideais de segurança.
Antes de ler sobre esse mito, assista ao vídeo Abuso em Público – Violência contra mulher
(experimento social) (Disponível em: youtu.be/3ukIHRW6HGU)
Apesar de 82% das pessoas entrevistadas na pesquisa Tolerância Social à Violência contra as Mulheres
(IPEA, 2014) afirmarem que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, é preciso estar consciente de
que a violência contra as mulheres é um problema de toda a sociedade e precisa do envolvimento – inclusive
para denunciar as agressões – das pessoas que estão ao redor dessa mulher.
Essa mudança começa aos poucos a acontecer. A maioria das pessoas que denunciaram ao Ligue 180
alguma forma de violência contra a mulheres em 2015 foram as próprias vítimas (63,48%), esse percentual,
contudo, reduziu-se em relação a 2014 (70,75%).
27
Gráfico - Perfil Denunciante
Apesar dessa mudança, ainda se nota que a maior solidariedade ocorre por parte de outras mulheres. O
Ligue 180 é majoritariamente procurado por pessoas do sexo feminino. Mesmo quando a pessoa que realiza o
relato de violência não é a vítima, as mulheres (80,55%) predominam na quantidade de pessoas que buscam a
Central (BALANÇO LIGUE 180, 2015). É preciso que os homens também se envolvam no enfrentamento da
violência contra as mulheres.
Assista ao Vídeo da campanha (Disponível em: www.youtu.be/3ukIHRW6HGU) #ElesPorElas, da ONU
Mulheres e do GNT, sobre a igualdade entre mulheres e homens.
Finalizando...
• Existem vários tipos de violência contra as mulheres, que podem ocorrer em relações interpessoais, na
comunidade ou em instituições. Alguns desses tipos mais comuns são: o assédio moral, o assédio sexual, o
cárcere privado, a exploração sexual, a pornografia sem consentimento, o tráfico de pessoas, a violência
institucional, a violência obstétrica e a violência sexual.
• A violência doméstica e familiar contra a mulher deve ser entendida como qualquer ação ou omissão
baseada no gênero que cause à mulher morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da família ou em qualquer relação íntima de afeto, na
qual o/a agressor/a conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. (LEI Nº
11.340 , 2006).
• Os mitos sobre a violência contra as mulheres precisam ser desconstruídos para que possa ser prestado
um atendimento humanizado, baseado no respeito e na autonomia das mulheres. Alguns desses mitos: só as
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mulheres com dependência financeira sofrem violência de gênero, mulher gosta de apanhar e “em briga de
marido e mulher, não se mete a colher”.
Exercícios
2. Você estudou que a violência doméstica compreende várias formas de violência. De acordo
com essa afirmativa, associe a 2ª. coluna de acordo com a 1ª:
Violência
2 Qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
psicológica
29
Qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da
autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou
que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e
Violência decisões, mediante ameaça, constrangimento ou humilhação, entre outras
moral situações.
4
Violência
5 Qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal.
sexual
3. Entre as razões para manutenção do vínculo conjugal, expressas no gráfico 8, não aparece:
( ) Condições econômicas
( ) Vergonha de separar
30
Gabarito
31
MÓDULO
ANALISANDO OS ASPECTOS LEGAIS
3
Apresentação do módulo
A Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio trouxeram uma série de mecanismos para coibir e
prevenir a violência contra as mulheres, você estudará sobre eles neste módulo.
Objetivo do módulo
Estrutura do Módulo
32
Aula 1 – Lei Maria da Penha
Antes de iniciar seus estudos, assista ao clipe “Lei Maria da Penha” (Disponível em:
youtu.be/gO2pmqIFVNo?list=PL9rDbq60f2Z6VmuF83dYw159wAj4Hi-RA) das DJs Luana Hansen e Drika
Ferreira.
Aspectos históricos
Somente a partir de 1988, com a promulgação da Constituição Federal, a mulher passou a ter
reconhecida sua igualdade, em direitos e obrigações em relação à sociedade conjugal, notadamente em relação
ao homem (ART. 226, §5º).
O Art. 226 também determinou ao Estado que criasse mecanismos para coibir a violência doméstica:
“Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando
mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações” (ART. 226, § 6º).
Em 07 de agosto de 2006, o então Presidente da República sancionou a Lei n° 11.340: Lei Maria da
Penha (Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm), criando
mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, dispondo sobre a
criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher, alterando dispositivos do Código Penal
33
e da Lei de Execuções Penais, versando sobre o atendimento da autoridade policial (Art. 10, 11 e 12) e
estabelecendo medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Esta lei foi denominada “Lei Maria da Penha” em homenagem à luta de Maria da Penha Maia Fernandes,
mulher que foi sujeitada à violência doméstica e, que, durante quase 20 anos, lutou para que o sistema de justiça
criminal punisse o seu agressor (seu ex-marido), que tentou matá-la por duas vezes, deixando-a tetraplégica
após desferir tiros em suas costas, enquanto dormia, e tentando eletrocutá-la durante o banho.
Somente após a responsabilização do governo brasileiro junto à Comissão Interamericana de Direitos
Humanos – que, dentre outras recomendações, apontou a necessidade da devida reparação simbólica e material
à Maria da Penha – foi promulgada uma legislação que propusesse medidas efetivas de enfrentamento da
violência doméstica e familiar.
Saiba mais...
Veja um vídeo em que a Maria da Penha conta sua história (Disponível em: youtu.be/TRSfTdaBbvs)
e leia um breve histórico da criação da Lei (Encontre-o nos anexos dentro do curso).
A lei, finalmente, regulamenta o Art. 226, parágrafo 8º da Constituição Federal, e insere no ordenamento
jurídico interno os preceitos estabelecidos na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência
contra a Mulher (CEDAW), na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra
Mulher (Convenção de Belém do Pará) e em outros tratados internacionais ratificados pelo nosso governo
federal.
A Lei Maria da Penha trouxe várias conquistas. Entre elas podemos destacar:
Vedou a aplicação da Lei nº 9.099/95, Lei do Juizado Especial Criminal (criada para crimes de menor
potencial ofensivo), que, entre outras determinações, previu que, no âmbito criminal, seja instaurado
Inquérito Policial, impedindo a elaboração de Termo Circunstanciado.
Acabou com uma prática antiga utilizada pelas Delegacias de Polícia que encarregavam a mulher de
entregar ao/à agressor/a a intimação para comparecimento, o que gerava mais problemas para essa
34
mulher, que muitas vezes desistia de denunciar o/a agressor/a. Hoje o parágrafo único do Art. 21 da lei
determina que: “a ofendida não poderá entregar intimações ou notificação ao agressor”.
Vedou a aplicação de penas de cesta básica ou outra prestação pecuniária. O/a agressor/a não temia o
processo criminal, pois sabia que seria condenado ao pagamento de cesta básica, o que, muitas vezes,
era usado como forma de humilhar a mulher e fazê-la desistir do processo.
Trouxe a possibilidade da decretação da Prisão Preventiva do/a agressor/a, conforme o disposto no Art.
20 da Lei. Essa medida foi possível de ser adotada porque o Art. 42 da Lei Maria da Penha modificou o
Código de Processo Pena.
Importante!
Embora a lei não utilize o termo “rede de atendimento”, sobre as quais você estudará mais a frente,
percebe-se que ela tem como pano de fundo, ou princípio, o atendimento da mulher em situação de
violência doméstica ou familiar em “rede”, ou seja, estabelece medidas integradas de prevenção da
violência doméstica e familiar.
Em 2012, a Lei Maria da Penha foi considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) um dos
exemplos mais avançados de legislação sobre violência doméstica e familiar.
35
Aula 2 – Medidas Protetivas
A Lei Maria da Penha traz um rol de medidas que podem ser decretadas pelo/a juiz/a a requerimento do
Ministério Público ou a pedido da mulher. Essas medidas visam garantir maior efetividade à lei e proteção à
mulher em situação de violência, resguardando sua integridade física além de proteger seus bens.
Importante!
Para garantir que esse instrumento de fato proteja a mulher em situação de violência, é importante
que, após feito o registro da ocorrência, a autoridade policial remeta, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas,
ao/à juiz/a o pedido para a concessão de medidas protetivas de urgência (conforme inciso III do artigo 12 da
Lei Maria da Penha).
O/A juiz/a pode obrigar o/a agressor/a a, conforme o disposto no art. 22 da Lei:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos
termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
Para proteger os bens do casal ou de propriedade particular da mulher, o/a juiz/a pode determinar, segundo
o Art. 24 da Lei:
De todo modo, deve-se destacar que o rol de medidas trazidas pela Lei Maria da Penha não se caracteriza
como taxativo, mas sim exemplificativo. Ou seja, não existe restrição aos representantes legais ou do próprio
Ministério Público em solicitar e nem mesmo ao juiz em conceder somente as medidas elencadas na lei. A partir
de avaliações, pode-se adotar outras medidas como forma de assegurar a eficácia daquelas previstas
expressamente pelo legislador.
Sendo assim, as “Diretrizes nacionais de investigação criminal com perspectiva de gênero” apresentaram
algumas sugestões de atuação das instituições de segurança pública e do sistema de justiça, que poderão
colaborar com a garantia de direitos e a proteção das mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Entre elas, têm-se, na página 48, orientações que auxiliam a comunicação entre o Ministério Público e a
segurança pública, tais como as listadas abaixo:
• O Ministério Público deverá fomentar a criação de programas, no âmbito dos serviços policiais, de
colaboração para o acompanhamento e vigilância do cumprimento das medidas protetivas de urgência ou
cautelares decretadas. Tais programas têm como propósito permitir que as Polícias Civil e Militar tenham acesso
à informação sobre o deferimento ou revogação de medidas protetivas de urgência, se possível com
informações da ofendida e do/a suposto/a agressor/a, bem como sobre a intimação deste.
• Se o risco for considerado médio ou alto, além do plano de segurança já exposto, os serviços policiais
serão avisados para que mantenham frequentemente contatos telefônicos ou por qualquer outro meio.
37
• Além disso, deve-se atentar para a possiblidade de realização de visitas periódicas de vigilância ao
domicílio e ao local de trabalho da mulher, bem como vigilâncias das entradas e saídas da escola, caso haja risco
para a/o(s) filha/o(s).
Saiba mais...
Essas e outras orientações sobre a adoção ou solicitação de medidas protetivas de urgência ou cautelares,
sobre avaliação de risco, sobre a elaboração do plano de segurança para as mulheres em situação de
violência doméstica e familiar podem ser encontradas nas Diretrizes nacionais de investigação criminal
com perspectiva de gênero: Princípios para atuação com perspectiva de gênero para o ministério
público e a segurança pública do Brasil (EUROSOCIAL, 2016) (Disponível em: sia.eurosocial-
ii.eu/files/docs/1460019818-DP_28%20(montado).pdf).
O assassinato de mulheres tem grande correspondência, no Brasil, com a violência doméstica e familiar
e a sexual, uma realidade empírica e cotidiana ao longo da vida das brasileiras e que têm na morte o desfecho
fatal diante da realidade de uma série de episódios em que se tem danos irreversíveis à saúde física e mental
dessas mulheres em situação de violência.
Deve-se ter em mente que o aumento dos índices de morte violenta de mulheres, identificável a partir
desses números absolutos, não são suficientes para revelar que esse crescimento poderia, ainda, ser muito
38
maior, se não houvesse um processo de implementação e fortalecimento de políticas preventivas e de
acolhimento às mulheres em situação de violência.
Segundo pesquisa do Ipea de 2015, em que se avaliou a efetividade da Lei Maria da Penha, concluiu-se
que a Lei evitou cerca de 10% dos homicídios contra mulheres, praticados dentro das residências das
vítimas. Considerando que essa violência letal é apenas o topo da pirâmide da violência, o estudo afirma que
“a Lei Maria da Penha foi responsável por evitar milhares de casos de violência doméstica no País”.
Apesar de o contexto de violência doméstica e familiar constar como significativo no total de homicídios
de mulheres, sabe-se que a morte violenta das mulheres por serem mulheres não se circunscreve unicamente a
esse contexto.
A Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015) (Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2015/Lei/L13104.htm) trouxe a amplitude para as causas de morte pelo menosprezo à condição de mulher
e permitirá o fortalecimento da política e das ações de prevenção a todas as formas de violência contra mulher.
A Lei de Feminicídio foi criada a partir de uma recomendação da Comissão Parlamentar Mista de
Inquérito (CPMI) que investigou a violência contra as mulheres nos Estados brasileiros, de março de 2012 a
julho de 2013.
O que muda com a Lei de Feminicídio
Íntimo
Morte de uma mulher cometida por uma pessoa com quem a vítima tinha, ou tenha tido, uma relação
ou vínculo íntimo: marido, ex-marido, companheiro(a), namorado(a), ex-namorado(a), amante ou pessoa com
39
quem tem filho(a)s. Inclui-se a hipótese do amigo que assassina uma mulher – amiga ou conhecida – que se
negou a ter uma relação íntima com ele (sentimental ou sexual).
Não íntimo
Morte de uma mulher cometida por uma pessoa desconhecida, com quem a vítima não tinha nenhum
tipo de relação. Por exemplo, uma agressão sexual que culmina no assassinato de uma mulher por um estranho.
Considera-se, também, o caso do vizinho(a) que mata sua vizinha sem que existisse, entre ambos, algum tipo
de relação ou vínculo.
Infantil
Morte de uma menina com menos de 14 anos de idade, cometida por uma pessoa no âmbito de uma
relação de responsabilidade, confiança ou poder conferido pela sua condição de adulto sobre a menoridade da
menina.
Familiar
Morte de uma mulher no âmbito de uma relação de parentesco entre vítima e agressor. O parentesco
pode ser por consanguinidade, afinidade ou adoção.
Por conexão
Morte de uma mulher que está “na linha de fogo”, no mesmo local onde uma pessoa mata ou tenta
matar outra mulher. Pode se tratar de uma amiga, uma parente da vítima – mãe, filha – ou de uma mulher
estranha que se encontrava no mesmo local onde o agressor atacou a vítima.
Sexual sistêmico
Morte de mulheres que são previamente sequestradas, torturadas e/ou estupradas. Pode ter duas
modalidades:
• Sexual sistêmico desorganizado – Quando a morte das mulheres está acompanhada de sequestro,
tortura e/ou estupro. Presume-se que os sujeitos ativos matam a vítima num período de tempo determinado;
• Sexual sistêmico organizado – Presume-se que, nestes casos, os sujeitos ativos atuam como uma rede
organizada de feminicidas sexuais, com um método consciente e planejado por um longo e indeterminado
período de tempo.
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Por prostituição ou ocupações estigmatizadas
Morte de uma mulher que exerce prostituição e/ou outra ocupação (como strippers, garçonetes,
massagistas ou dançarinas de casas noturnas) cometida por um ou vários homens. Inclui os casos nos quais o(s)
agressor(es) assassina(m) a mulher motivado(s) pelo ódio e misoginia que a condição de prostituta da vítima
desperta nele(s). Essa modalidade evidencia o peso de estigmatização social e justificação da ação criminosa
por parte dos sujeitos: “ela merecia”; “ela fez por onde”; “era uma mulher má”; “a vida dela não valia nada”.
Morte de uma mulher que exerce prostituição e/ou outra ocupação (como strippers, garçonetes,
massagistas ou dançarinas de casas noturnas) cometida por um ou várias pessoas. Inclui os casos nos quais o(s)
agressor(es) assassina(m) a mulher motivado(s) pelo ódio e misoginia que a condição de prostituta da vítima
desperta nele(s). Essa modalidade evidencia o peso de estigmatização social e justificação da ação criminosa
por parte dos sujeitos: “ela merecia”; “ela fez por onde”; “era uma mulher má”; “a vida dela não valia nada”.
Transfóbico
Morte de uma mulher transgênero ou transexual, na qual o(s)agressor(es) a mata(m) por sua condição
ou identidade de gênero transexual, por ódio ou rejeição.
Lesbofóbico
Morte de uma mulher lésbica, na qual o(s) agressor(es) a mata(m) por sua orientação sexual, por ódio ou
rejeição.
Racista
Morte de uma mulher por ódio ou rejeição à sua origem étnica, racial ou aos seus traços fenotípicos.
41
Por mutilação genital feminina
Saiba mais...
Dada a sua realidade social, política e jurídica, o Brasil foi selecionado como país-piloto para o processo de
adaptação do Modelo de Protocolo latino-americano para investigação para investigação das mortes
violentas de mulheres por razões de gênero (femicídio/feminicídio).
O documento das Diretrizes tem como objetivo orientar a prática de profissionais das áreas da Segurança
pública, Defensoria Pública, Ministério Público e Magistratura para que apurem, a partir de uma perspectiva
de gênero – ou seja, treinando o olhar para identificar a presença de elementos que indiquem motivação de
gênero – o crime. Seja em sua forma consumada ou tentada.
Conheça as Diretrizes Nacionais Feminicídios: investigar, processar e julgar com perspectiva de gênero
as mortes violentas de mulheres (Disponível: em www.spm.gov.br/central-de-
conteudos/publicacoes/2016/livro-diretrizes-nacionais-femenicidios-versao-web.pdf) e incorpore ao seu
trabalho.
Saiba mais...
Leia o estudo “A Violência Doméstica Fatal: o problema do feminicídio íntimo no Brasil” (Disponível em:
www.compromissoeatitude.org.br/wp-content/uploads/2015/04/Cejus_FGV_feminicidiointimo2015.pdf) que
aponta para alguns aspectos recorrentes nos casos de feminicídio.
Saiba mais...
42
Saiba mais...
Finalizando...
• Em 07 de agosto de 2006, o Presidente da República sancionou a Lei nº 11.340: Lei Maria da Penha, criando
mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, dispondo sobre a
criação dos juizados de Violência Doméstica e familiar contra a mulher, alterando dispositivos do Código Penal
e da Lei de Execuções Penais e estabelecendo medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de
violência doméstica;
• A lei Maria da Penha traz um rol de medidas que podem ser decretadas pelo juiz, a requerimento do Ministério
Público ou a pedido da mulher. Essas medidas visam garantir maior efetividade à lei e proteção à mulher em
situação de violência, resguardando sua integridade física além de proteger seus bens.
• Em 09 de março de 2015, a Presidenta da República sancionou a Lei nº 13.104: Lei do Feminicídio, criando a
qualificadora do feminicídio, quando o homicídio ocorrer por razões de gênero, ou seja, quando envolver
violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Esses crimes devem
ser investigados, processados e julgados com base nas Diretrizes Nacionais para investigar, processar e julgar
com perspectiva de gênero as mortes violentas de mulheres (feminicídios).
Exercícios
1. Tomando por base a Lei nº. 11.340, de 7 de agosto de 2006, julgue a veracidade das seguintes
afirmações:
I. A referida lei criou mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a
mulher.
II. A nova lei não modificou o procedimento apuratório, que continua a utilizar o termo
circunstanciado.
43
III. As condutas delituosas inseridas no contexto da violência doméstica e/ou familiar contra a
mulher receberam uma conceituação legal a partir da Lei Maria da Penha.
O resultado do julgamento é:
A. F-V-F
B. F-F-V
C. V-F-V
D. V-V-F
2. Tomando por base a Lei nº. 11.340, de 7 de agosto de 2006, julgue a veracidade das seguintes
afirmações:
I. Embora a nova lei seja compatível com a aplicação de penas alternativas, ela proíbe
explicitamente, no Art. 17, a aplicação de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária.
II. De acordo com a referida lei, o pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial
e deverá conter somente a qualificação da ofendida e do agressor e descrição sucinta do fato e
das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.
III. Após feito o registro da ocorrência, a autoridade policial deve remeter, no prazo de 48 (quarenta
e oito) horas, ao/à juiz/à o pedido para a concessão de medidas protetivas de urgência.
O resultado do julgamento é:
A. F-V-V
B. F-F-V
C. V-V-F
D. V-F-V
3. Após a promulgação da Lei nº 13.104/2015, Lei do Feminicídio, houve alterações penais em relação
ao homicídio de mulheres pelo fato de elas serem mulheres. Escreva ANTES ou DEPOIS, levando em
consideração a promulgação da Lei do Feminicídio:
44
Defesa alega crime passional, com o argumento de o crime ter cometido sob
violenta emoção, havendo, portanto, diminuição de pena
45
Gabarito
46
MÓDULO
Apresentação do módulo
Objetivos do Módulo
Estrutura do módulo
47
Já a Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência faz referência ao conjunto de ações e
serviços de diferentes setores (em especial, da assistência social, do sistema de justiça, da segurança pública e
da saúde), que visam à ampliação e à melhoria da qualidade do atendimento, à identificação e ao
encaminhamento adequado das mulheres em situação de violência e à integralidade e à humanização do
atendimento.
Rede de Enfrentamento
• Contempla todos os eixos da Política Nacional (combate, prevenção, assistência e garantia de direitos);
• Inclui órgãos responsáveis pela gestão e controle social das políticas de gênero, além dos serviços de
atendimento;
• É mais ampla que a rede de atendimento às mulheres.
Rede de Atendimento
• Refere-se somente ao eixo da Assistência/Atendimento;
• Restringe-se a serviços de atendimento (especializados e não especializados);
• Faz parte da rede de enfrentamento da violência contra as mulheres.
48
Rede de Enfrentamento da Violência Contra as Mulheres
Saiba mais...
Saiba mais sobre a Rede de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres (Disponível em:
http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/publicacoes/2011/rede-de-enfrentamento/view).
As mulheres em situação de violência podem contar com uma série de serviços especializados que após
a promulgação da Lei Maria da Penha passam a ser fortalecidos e ampliados, a saber:
49
1.3.1 Casas-Abrigo: são locais seguros que oferecem moradia protegida e atendimento integral a
mulheres em risco de vida iminente em razão da violência doméstica. É um serviço de caráter sigiloso e
temporário, no qual as usuárias permanecem por um período determinado, durante o qual deverão reunir
condições necessárias para retomar o curso de suas vidas.
1.3.2 Casas de Acolhimento Provisório: são casas de abrigamento temporário de curta duração (até
15 dias), não-sigilosas, para mulheres em situação de violência que não correm risco iminente de morte
(acompanhadas ou não de seus filhos) como, por exemplo, em casos de mulheres que estão aguardando a
concessão de uma medida protetiva (de acordo com a Lei Maria da Penha) ou aguardando o beneficio do
pagamento de passagens para retorno ao seu município de origem, migrantes em situação irregular, deportadas
e não admitidas. Vale destacar que as Casas de Acolhimento Provisório não se restringem ao atendimento de
mulheres em situação de violência doméstica e familiar, devendo acolher também mulheres que sofrem outros
tipos de violência, em especial àquelas em situação de tráfico. O abrigamento provisório deve garantir a
integridade física e emocional das mulheres, bem como realizar diagnóstico da situação da mulher para
encaminhamentos necessários.
Saiba mais...
1.3.3 Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180: A Central de Atendimento à Mulher é um serviço
do Governo Federal que auxilia e orienta as mulheres em situação de violência através do número de utilidade
pública 180. As ligações podem ser feitas gratuitamente de qualquer parte do território nacional. O Ligue 180
foi criado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República em 2005 e funciona 24 horas
diárias, inclusive nos feriados e finais de semana - ocasiões em que o número de ocorrências de violência contra
a mulher aumenta. As atendentes da Central são capacitadas permanentemente em questões de gênero,
legislação, políticas governamentais para as mulheres. Cabe à Central o encaminhamento da mulher para os
serviços da rede de atendimento mais próxima, assim como prestar informações sobre os demais serviços
disponíveis para o enfrentamento à violência. A Central Ligue 180 também recebe e encaminha as denúncias
das mulheres em situação de violência.
Saiba mais...
Assista ao vídeo sobre os 10 anos do Ligue 180 (Disponível em: https://youtu.be/BVDMAcIAfK4).
50
1.3.4 Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM): são espaços de
acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação de
violência, que devem proporcionar o atendimento e o acolhimento necessários à superação de situação de
violência, contribuindo para o fortalecimento da mulher e o resgate de sua cidadania (Norma Técnica de
Padronização- Centro de Referência de Atendimento à Mulher, SPM: 2006). O Centro de Referência deve exercer
o papel de articulador das instituições e serviços governamentais e não-governamentais que integram a Rede
de Atendimento. Assim, os Centros de Referência devem, além de prestar o acolhimento e atendimento da
mulher em situação de violência, monitorar e acompanhar as ações desenvolvidas pelas instituições que compõe
a Rede.
Saiba mais...
* No Estado de São Paulo, as DEAMs são denominadas DDMs – Delegacias de Defesa da Mulher.
Saiba mais...
Leia aqui a Norma Técnica de Padronização das Delegacias Especializadas de Atendimento Às Mulheres
– DEAMs (Disponível em: http://www.spm.gov.br/lei-maria-da-penha/lei-maria-da-penha/norma-tecnica-de-
padronizacao-das-deams-.pdf).
51
1.3.6 Postos, Núcleos e Seções de Atendimento à Mulher nas Delegacias Comuns: constituem
espaços de atendimento à mulher em situação de violência (que, em geral, contam com equipe própria) nas
delegacias comuns.
Saiba mais...
1.3.8 Juizados e Varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher: Os Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher são órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, que são
criados pela União (no Distrito Federal e nos Territórios) e pelos Estados para o processo, julgamento e a
execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher. Segundo a Lei nº
11.340/2006 (Lei Maria da Penha) que prevê a criação dos Juizados, esses poderão contar com uma equipe de
atendimento multidisciplinar a ser integrada por profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e
da saúde.
Saiba mais...
Consulte o Manual de Rotinas e Estruturação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher (Disponível em: http://www.amb.com.br/fonavid/Documento_Manual%20Maria%20da%20Penha.pdf)
52
1.3.9 Promotorias Especializadas: têm como objetivo central promover a ação penal e oferecer a
denúncia, quando legalmente cabível. Além disso, atende as mulheres que necessitam de amparo legal para a
garantia de sua integridade física, psicológica, moral e patrimonial. A atuação da Promotoria é determinante
para possibilitar às mulheres a fiel aplicação dos dispositivos legais referentes à violência contra as mulheres, e
também, para a promoção das medidas de proteção em favor da mulher, na fiscalização das entidades de
atendimento, ou na proposição de ações cíveis públicas de interesse das mulheres.
Saiba mais...
Consulte aqui a cartilha O Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher: Uma
Construção Coletiva (Disponível em:
https://www.mpmt.mp.br//storage/webdisco/2012/03/14/outros/afd52803a0f0e58a9fc8c22086c9e557.pdf)
da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (COPEVID).
1.3.10 Serviços de saúde voltados para o atendimento aos casos de violência sexual – A área de
saúde é responsável pela prestação de assistência médica, de enfermagem, psicológica e social às mulheres que
sofreram violência sexual, inclusive quanto à interrupção da gravidez prevista em lei nos casos de estupro,
conforme estabelecido pela Norma Técnica de Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da
Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes (Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf) do
Ministério da Saúde.
IMPORTANTE!
A Lei n.º 10.778, de 24 de novembro de 2003 (Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2003/L10.778.htm), estabelece a notificação compulsória, no território
nacional, dos casos de violência contra a mulher, atendidos em serviços públicos e privados de saúde. O
cumprimento da medida é fundamental para o dimensionamento do fenômeno da violência sexual e de suas
consequências, contribuindo para a implantação de políticas públicas de intervenção e prevenção do
problema.
Em casos de gravidez, suspeita ou confirmada, deve-se considerar a demanda da mulher ou adolescente,
identificando se manifesta desejo ou não de interromper a gravidez. Cabe aos profissionais de saúde fornecer
as informações necessárias sobre os direitos da mulher e apresentar as alternativas à interrupção da gravidez,
como a assistência pré-natal e a entrega da criança para adoção.
53
Saiba mais...
Leia a Norma Técnica: Atenção Humanizada às Pessoas em Situação de Violência Sexual com Registro
de Informações e Coleta de Vestígios. (Disponível em: http://www.spm.gov.br/central-de-
conteudos/publicacoes/publicacoes/2015/norma-tecnica-versaoweb.pdf).
Em março de 2013, em continuidade às ações do Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra
as Mulheres, foi lançado o Programa “Mulher: Viver sem Violência, que tem por objetivo integrar e ampliar
os serviços públicos existentes voltados às mulheres em situação de violência, mediante a articulação dos
atendimentos especializados no âmbito da saúde, da justiça, da segurança pública, da rede socioassistencial e
da promoção da autonomia financeira (DECRETO Nº. 8.086, 2013) (Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Decreto/D8086.htm).
O Programa propõe o fortalecimento e a consolidação, em âmbito nacional, da Rede de Atendimento às
Mulheres em Situação de Violência, por meio da articulação das diversas áreas envolvidas. O Programa também
promove a articulação entre órgãos e serviços públicos das três esferas de Estado e instituições integrantes do
sistema de justiça, como copartícipes na sua implementação, e ampliou a concepção da Rede de Atendimento
com dois novos serviços: Casas da Mulher Brasileira e Unidades Móveis.
1.3.11 Casas da Mulher Brasileira: é um espaço de acolhimento e atendimento humanizado e tem por
objetivo geral prestar assistência integral e humanizada às mulheres em situação de violência, facilitando o
acesso destas aos serviços especializados e garantindo condições para o enfrentamento da violência, o
empoderamento e a autonomia econômica das usuárias.
Conforme as Diretrizes Nacionais e Protocolos de Atendimento da Casa da Mulher Brasileira
(Disponível em: http://www.spm.gov.br/central-de-conteudos/publicacoes/publicacoes/2015/diretrizes-gerais-
e-protocolo-de-atendimento-cmb.pdf), constitui um serviço da rede de enfrentamento à violência contra as
mulheres e deve atuar em parceria com os serviços especializados da rede de atendimento (Delegacia
Especializada de Atendimento à Mulher/ DEAM, Centros de Referência de Atendimento à Mulher, Casa-Abrigo,
Defensoria Especializada, Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Promotoria Especializada)
e com os demais parceiros (rede socioassistencial, rede de saúde, órgãos de medicina legal, entre outros).
Saiba mais...
54
1.3.12 Unidades Móveis: são ônibus e barcos especialmente adaptados que levam serviços
especializados da Rede de Atendimento às Mulheres em Situação de Violência ao campo, floresta e águas. Esses
serviços incluem prevenção, assistência, apuração, investigação e enquadramento legal. As unidades também
têm função educativa, com a promoção de palestras e esclarecimentos sobre a Lei Maria da Penha e sua
aplicação.
Saiba mais...
Consulte o documento Mulheres do Campo e da Floresta: Diretrizes e ações nacionais (Encontre-o nos
anexos dentro do curso).
Encontra-se em tramitação no Congresso Nacional, desde agosto de 2015, um Projeto de Lei que visa
à inclusão de artigo na Lei Maria da Penha que prevê a instituição do Programa Patrulha Maria da Penha.
O Programa prevê, em âmbito nacional, a realização de visitas periódicas às residências de mulheres em
situação de violência doméstica e familiar, para verificar o cumprimento das medidas protetivas de urgência do
Art. 22 e reprimir eventuais atos de violência.
A execução do Programa, conforme o Projeto de Lei, será realizada pelos órgãos de segurança pública
dos Estados e do Distrito Federal, ou, no caso dos Municípios, pelas guardas municipais de acordo com o
disposto na Lei nº 13.022, de 8 de agosto de 2014.
O programa tem como base as experiências exitosas de algumas cidades brasileiras, como Curitiba, Porto
Alegre, São Paulo, Campo Grande, Fortaleza, Salvador e Manaus.
Além dos serviços disponíveis para as mulheres, a Lei Maria da Penha prevê a criação de serviços de
responsabilização e educação do/a agressor/a, responsável pelo acompanhamento das penas e das decisões
proferidas pelo juízo competente, no que tange aos/às agressores/as, conforme previsto na Lei n° 11.340/2006
e na Lei de Execução Penal.
IMPORTANTE!
Por meio da realização de atividades educativas e pedagógicas, que tenham por base uma perspectiva
feminista de gênero, o serviço deve contribuir para a desnaturalização sobre a violência de gênero – sendo
essa uma violação dos direitos humanos das mulheres - e para a responsabilização pela violência cometida.
O serviço poderá contribuir para a desconstrução de estereótipos de gênero; a transformação da
masculinidade hegemônica; e a construção de novas masculinidades. Não constitui um espaço de ‘tratamento’
dos agressores/as e deverá se restringir ao acompanhamento das pessoas processados/as criminalmente
(apenados ou não), com base na Lei Maria da Penha.
55
Não cabe ao serviço a realização de atividades referentes ao atendimento psicológico e jurídico dos
agressores, à mediação, à terapia de casal e/ou terapia familiar e ao atendimento à mulher em situação de
violência. (SPM, 2010)
Saiba mais...
Leia, também, um pouco mais sobre a Rede de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres
(Disponível em: http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/publicacoes/2011/rede-de-enfrentamento).
O que a sociedade pensa sobre o atendimento realizado pela Segurança Pública nos casos de violência
contra as mulheres?
Uma das formas de diálogo estabelecidas com cidadãs e cidadãos sobre os direitos das mulheres e sobre os
serviços especializados da Rede é a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, por meio das reclamações.
Em seis anos de atendimento (2010 a 2015), foram realizadas cerca de 22.500 reclamações a respeito dos
serviços. Nesse período, considerando as DEAMs e os Departamentos de Polícia, 55,41% dessas reclamações
referiam-se à segurança pública. Quando somado ao Disque 190, esse percentual chega a 73,98%.
56
Gráfico - RECLAMAÇÃO (%)
Tanto nas DEAMS quanto nos outros Departamentos de Polícia, as principais reclamações referem-se à
recusa de registrar boletim de ocorrência nos casos de violência contra as mulheres, à falta de providência sobre
os BOs e ao despreparo em casos de violência doméstica e familiar.
Veja o gráfico abaixo.
57
também demonstrou opiniões – em alto percentual de entrevistados/as – ainda não reconhecedoras de racismo
e preconceituosas em relação à homossexualidade.
O primeiro contato entre o/a policial e a mulher é muito importante e pode determinar o desenrolar
da queixa-crime e/ou da investigação criminal. Desse modo, a postura do/as policiais deve proporcionar um
atendimento com base em algumas premissas.
Como você estudou anteriormente, diferentes mulheres são submetidas a diferentes formas de
violências de acordo com os grupos sociais dos quais fazem parte. Essas diferenças – para não serem tornadas
desigualdades – devem ser levadas em consideração no momento do atendimento.
Para se aprofundar mais no assunto, leia o capítulo “Direitos das mulheres em situação de violência
doméstica e familiar: informação, participação e acompanhamento ao longo do processo” das Diretrizes
nacionais de investigação criminal com perspectiva de gênero: Princípios para atuação com perspectiva
de gênero para o ministério público e a segurança pública do Brasil (Disponível em: http://sia.eurosocial-
ii.eu/files/docs/1460019818-DP_28%20(montado).pdf) (EUROSOCIAL, 2016).
58
2.3 Diretrizes para o atendimento às mulheres
2.3.1 Igualdade e respeito à diversidade – Mulheres e homens são iguais em seus direitos. A promoção
da igualdade implica no respeito à diversidade cultural, étnica, racial, inserção social, situação econômica e
regional, assim como os diferentes momentos da vida das mulheres.
2.3.2 Equidade – A todas as pessoas deve ser garantida a igualdade de oportunidades, observando-se os
direitos universais e as questões específicas das mulheres.
2.3.3 Autonomia das mulheres – O poder de decisão sobre suas vidas e corpos deve ser assegurado às
mulheres, assim como as condições de influenciar os acontecimentos em sua comunidade e seu país.
2.3.4 Laicidade do Estado – As políticas públicas voltadas para as mulheres devem ser formuladas e
implementadas independentemente de princípios religiosos, de forma a assegurar os direitos consagrados na
Constituição Federal e nos instrumentos e acordos internacionais assinados pelo Brasil.
Outras diretrizes que devem basear o atendimento de mulheres em situação de violência podem ser
encontradas nas Diretrizes Nacionais e Protocolos de Atendimento da Casa da Mulher Brasileira
(Disponível em: http://www.spm.gov.br/central-de-conteudos/publicacoes/publicacoes/2015/diretrizes-gerais-
e-protocolo-de-atendimento-cmb.pdf):
2.4.2 Empoderamento das mulheres – No nível individual, empoderamento refere-se à habilidade das
pessoas de ganharem conhecimento e controle sobre forças pessoais, para agir na direção de melhoria de sua
situação de vida. Diz respeito ao aumento da capacidade de os indivíduos se sentirem influentes nos processos
que determinam suas vidas. Assim, o empoderamento de mulheres é o processo da conquista da autonomia,
da autodeterminação e implica mudanças nas relações de desigualdades de gênero.
59
2.4.3 Liberdade de escolha das mulheres – Os atendimentos devem respeitar o direito à autodeterminação
das mulheres em situação de violência, assegurando-lhes a participação nos processos de decisão em todos os
momentos do atendimento. Isso significa que o plano de intervenção deve ser elaborado em conjunto com a
usuária do serviço e que suas escolhas devem ser respeitadas.
2.4.4 Respeito – O conceito se refere à atitude de reconhecimento de outra pessoa, sem juízo de valores
pessoais, morais ou sociais para com a questão apresentada. Respeitar é a atitude que se manifesta nos gestos
e nas palavras adequadas dirigidas a outra pessoa.
2.4.6 Inclusão/acessibilidade – Inclusão é o ato de aproximar, abranger, inserir, não distinguir outra pessoa
por sua condição física, intelectual ou de mobilidade, por seu idioma, escolaridade, atividade laboral, orientação
sexual, cultura ou nacionalidade. A acessibilidade refere-se à adaptação de ambientes e capacitação de
profissionais no sentido de favorecer a mobilidade e a inserção de pessoas com deficiência. É a capacidade de
ofertar bens ou serviços à população de forma direta e simplificada.
A base de todo atendimento deve ser a escuta qualificada, sigilosa e não julgadora. A escuta qualificada
é o princípio básico do atendimento humanizado e deve estar pautada no respeito, na ética, na busca do
fortalecimento da mulher diante da situação vivida, na orientação pelos parâmetros humanitários e de cidadania
e no compromisso do sigilo profissional.
A escuta qualificada, a ser realizada para o atendimento de mulheres em situação de violência, está baseada
nos modelos recomendados pela Política de Humanização do SUS, nas vertentes do Direito Fundamental, na
Declaração Universal dos Direitos Humanos e nas Políticas Públicas em Resolução Adequada de Disputas (RES.
125 - CNJ, 2010).
Os componentes da escuta qualificada passam pela atenção proporcionada à mulher em atendimento e pela
tranquilidade e segurança da equipe durante o processo para que a mulher compreenda que não é a responsável
pela violência.
60
Ciclo do Atendimento Humanizado e Qualificado de Mulheres em Situação de Violência
Fonte: SPM, 2015, Diretrizes Gerais Protocolos de Atendimento da Casa da Mulher Brasileira.
Finalizando...
• A Rede de Enfrentamento à Mulher em Situação de Violência é uma ação que reúne recursos públicos e
comunitários em um esforço comum para enfrentar a violência doméstica e contra a mulher em nosso país.
• A Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência faz referência ao conjunto de ações e serviços
de diferentes setores (em especial, da assistência social, do sistema de justiça, da segurança pública e da saúde),
que visam à ampliação e à melhoria da qualidade do atendimento, à identificação e ao encaminhamento
adequado das mulheres em situação de violência e à integralidade e à humanização do atendimento.
61
• O atendimento às mulheres em situação de violência deve ser humanizado e baseado em alguns princípios,
como: igualdade e respeito à diversidade, equidade, autonomia das mulheres, laicidade do Estado,
empoderamento das mulheres, respeito, prevenção da revitimização, inclusão/acessibilidade e escuta
qualificada.
Exercícios
62
7 Defensorias da Mulher Têm como objetivo central promover a ação penal e acusar
o/a agressor/a nos crimes de violência contra as mulheres.
Além disso, atende as mulheres que necessitam de amparo
legal para garantia de sua integridade física, psicológica,
moral e patrimonial.
C.C.B. foi vítima de agressão física por parte do ex-marido, e, apesar de já ter sofrido outras agressões
anteriores, nunca teve coragem de denunciar ou tomar qualquer tipo de providência devido ao nível social,
econômico e cultural da família e pelo medo das ameaças que ele fazia.
Na última agressão, tomou coragem e telefonou para um advogado que a orientou a ir ao hospital e depois
na delegacia registrar a ocorrência, e, posteriormente, submeter-se ao exame de corpo de delito. A mulher,
apesar da vergonha e da humilhação, seguiu todas as instruções desse advogado.
No hospital, quando o médico pediu que ela tirasse a roupa para o exame foi quando ela se deu conta da
situação do seu corpo, tomado por hematomas e arranhões. Teve uma crise de choro, tremedeira e naquele
momento ficou sem saber se continuava ou se voltava para casa novamente e deixasse que ele continuasse
impune.
Saiu do hospital e chegou à delegacia por volta das 14:00; ficou na delegacia sentada das 14:00 às
22:20, sem almoço e extremamente deprimida, quando o policial que lhe atendeu resolveu pegar a viatura e
acompanhá-la até o condomínio onde o casal morava para prender o ex-marido em flagrante. Quando
chegaram na citada casa, o policial percebeu o nível do condomínio e mudou completamente a atitude. Ele
apenas pediu que a mulher e o ex-marido lhe acompanhassem até a delegacia para prestar depoimentos.
O agressor negou a acusação e disse que a própria mulher havia se ferido, embora a empregada que
trabalhava na casa tivesse presenciado toda a cena. Saíram da delegacia no mesmo carro, e a mulher veio
sentada no banco de trás, morrendo de medo que ele a matasse, pois estava com um ódio estampado nos
olhos e gritava ordenando que ela retirasse a queixa senão ele tornaria sua vida um inferno.
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Gabarito
65
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