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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

A Instalação artística – Um desafio para a prática


museológica contemporânea.

Luciana Nemes Xavier


São Paulo, 04 de Junho de 2006.
1
Luciana Nemes Xavier

A Instalação artística – Um desafio para a prática


museológica contemporânea.

Monografia apresentada a USP -


Universidade de São Paulo como
requisito para obtenção do título de
especialista em Museologia, sob a
orientação do Prof. Dr. Marcelo
Mattos Araújo.

São Paulo, 04 de Junho de 2006.

2
Dedico esse trabalho a minha família em
especial aos meus pais Guilherme Correa
Xavier e Eva Nemes Xavier, pelo amor e
carinho.

3
Agradeço a EXPOMUS em especial a
Maria Inês Mantovani e Alessandra L.
Rosso por acreditarem em mim e
contribuírem no meu crescimento
profissional.
A Museu de Arte Contemporânea de
Niterói e toda sua e equipe, pela atenção
e contribuição com minha pesquisa.
Aos amigos Flávia Panisse, Laís Chiavone,
Márcio Renne e todos aqueles que
colaboraram com o meu trabalho e
estiveram ao meu lado.

4
“A leitura que se faz não é da obra de arte
em si, mas da obra em relação com a pessoa
que com ela se confronta.‘O essencial não é
já o objeto em si mesmo, mas a confrontação
dramática do espectador com a situação
perceptiva’”. Mario Moutinho

“(...) estender o sentido de apropriação às


coisas do mundo com que deparo nas ruas,
terrenos baldios, campos, o mundo ambiente,
enfim – coisas que não seriam
transportáveis, mas para as quais eu
chamaria o público à participação – seria
isto um golpe fatal ao conceito de museu,
galeria de arte etc., e ao próprio conceito de
‘exposição’ – ou nós modificamos ou
continuamos na mesma. Museu é o mundo; é a
experiência cotidiana...” Helio Oiticica,
1986.

5
Resumo

O objetivo deste trabalho é discutir os desafios


apresentados pela Instalação entendida como uma linguagem artística da
arte contemporânea, para a prática museológica, no desenvolvimento
das atividades salvaguarda e comunicação e seus desafios. Será
analisado como estudo de caso o Museu de Arte Contemporânea de
Niterói.

Palavras-chave: Instalação; Museu; Museologia; MAC de Niterói; MAC


USP; Museu Castro Maia (Museu do Açude); Salvaguarda e
Comunicação;

6
Sumário

Introdução .................................................................................. 12
1. Instalação: o fio tênue de uma categoria ................................. 14
2. Histórico do Museu de Arte Contemporânea de Niterói: Um
laboratório de experiência. ........................................................... 39
2.1 MAC de Niterói – salvaguarda: documentação e conservação .. 43
2.2 MAC de Niterói – comunicação: expografia. ......................... 54
2.3 MAC de Niterói – Arte-Educação ........................................ 60
3. MAC USP e Espaço de Instalações Permanentes do Museu do
Açude: outras observações ............................................................ 64
Considerações Finais ................................................................... 72
Bibliografia ................................................................................ 74
ANEXO 1 ................................................................................... 77
Frente da Obra ............................................................................ 77
Condições da Obra....................................................................... 77
Verso da Obra ............................................................................. 78
Rio de Janeiro, 27 de setembro de 2005. ......................................... 80

7
Índice de Imagens

F i g u r a 1 – L i s s i t z k y , P r o j e t o d o ‘ G a b i n e t e A b s t r a t o ’ , 1 9 2 7 . ...................... 15
F i g u r a 2 – L i s s i t z k y , G a b i n e t e A b s t r a t o , 1 9 2 7 . ................................................. 16
F i g u r a 3 – S c h w i t e r s , M e r z b a u , 1 9 3 1 ( I ) . ........................................................... 17
F i g u r a 4 – S c h w i t e r s , M e r z b a u , 1 9 3 1 ( I I ) . ......................................................... 17
F i g u r a 5 – S c h w i t e r s , M e r z b a u , 1 9 3 1 ( I I I ) . ........................................................ 18
F i g u r a 6 – S c h l e m m e r , D e s e n h o T e ó r i c o – P r o j e t o , s / d . ............................... 19
F i g u r a 7 – M o n d r i a n , S a l ã o d e M a d a m e B , 1 9 7 0 . ............................................. 19
F i g u r a 8 – D u c h a m p , 1 2 0 0 B a g s o f C o a l , 1 9 3 8 . ................................................ 20
F i g u r a 9 – D u c h a m p , 1 2 0 0 B a g s o f C o a l , 1 9 3 8 ( D e t a l h e ) . ........................... 21
F i g u r a 1 0 – K l e i n , L e V i d e , 1 9 5 8 . ........................................................................... 21
F i g u r a 1 1 – A r m a n , L e P l e i n , 1 9 6 0 . ........................................................................ 22
F i g u r a 1 2 – B e u y s , M a t i l h a , 1 9 6 9 . ........................................................................... 23
F i g u r a 1 3 – S o t o , D o i s q u a d r a d o s n o e s p a ç o , 1 9 5 3 . ........................................ 24
F i g u r a 1 4 – S o t o , E s t r u t u r a C i n é t i c a , 1 9 5 5 . ........................................................ 24
F i g u r a 1 5 – S o t o , P r é - P e n e t r á v e l , 1 9 5 7 . ............................................................... 25
F i g u r a 1 6 – S o t o , P e n e t r á v e l , 1 9 7 3 ( 1 9 9 5 ) . ......................................................... 25
F i g u r a 1 7 – L y g i a C l a r k ( 1 9 2 0 - 1 9 8 8 ) n o R i o d e J a n e i r o , 1 9 5 8 . ................ 26
F i g u r a 1 8 – C l a r k , B i c h o , 1 9 6 0 . ................................................................................. 27
F i g u r a 1 9 – L y g i a , A c a s a é o c o r p o , 1 9 6 8 . ......................................................... 27
F i g u r a 2 0 – O i t i c i c a , N i l d o d a M a n g u e i r a v e s t i n d o P a r a n g o l é s , 1 9 6 4 . .. 28
F i g u r a 2 1 – O i t i c i c a , M e t a e s q u e m a , 1 9 5 7 . ......................................................... 29
F i g u r a 2 2 – O i t i c i c a , R e l e v o E s p a c i a l , 1 9 5 9 . ..................................................... 29
F i g u r a 2 3 – O i t i c i c a , O g r a n d e n ú c l e o , 1 9 6 0 . ..................................................... 30
F i g u r a 2 4 – O i t i c i c a , T r o p i c á l i a , 1 9 6 7 . ................................................................. 30
F i g u r a 2 5 – P a p e , B a l l e t N e o c o n c r e t o n . ° 1 , 1 9 5 8 . ........................................... 31
F i g u r a 2 6 – P a i k , T V G a r d e n , 1 9 7 4 . ....................................................................... 32
F i g u r a 2 7 – V i o l a , T h e c r o s s i n g ( f i r e ) , 1 9 9 6 . ..................................................... 33
F i g u r a 2 8 – V i o l a , T h e c r o s s i n g ( w a t e r ) , 1 9 9 6 . ................................................. 33
F i g u r a 2 9 – G a r y H i l l , T a l l S h i p s , 1 9 7 2 . .............................................................. 34
F i g u r a 3 0 – G a r y H i l l , T a l l S h i p s , 1 9 7 2 ( d e t a l h e ) . .......................................... 34
F i g u r a 3 1 – B e i g u e l m a n , E g o s c ó p i o 2 . 0 , 2 0 0 4 . .................................................. 35

8
F i g u r a 3 2 – G r u p o C h e l p a F e r r o , S i s t e m a n . ° 1 , 2 0 0 1 . .................................... 36
Figura 33 – Dias e Riedweg, Projeto da vídeo-instalação Mera Vista
P o i n t , 2 0 0 2 . ................................................................................................................. 38
F i g u r a 3 4 – D i a s e R i e d w e g , M e r a V i s t a P o i n t ( v i s t a s u p e r i o r ) , 2 0 0 2 . .. 38
F i g u r a 3 5 – M A C d e N i t e r ó i - v i s t a n o t u r n a – m a r ç o / 2 0 0 6 . ........................ 39
F i g u r a 3 6 – M A C d e N i t e r ó i – v i s t a e x t e r n a d a v a r a n d a – m a r ç o / 2 0 0 6 . 43
F i g u r a 3 7 – P á g i n a d e a b e r t u r a d o B a n c o d e D a d o s – M A C d e N i t e r ó i . . 44
F i g u r a 3 8 – P á g i n a d e c o n s u l t a d o B a n c o d e D a d o s – M A C d e N i t e r ó i . 46
F i g u r a 3 9 – L e i r n e r , T e r r a V i s t a , 1 9 8 4 . ................................................................ 49
F i g u r a 4 0 – L e i n e r , T e r r a à V i s t a ( v i s t a p a r c i a l ) , 1 9 9 8 ( 2 ª m o n t a g e m ) . 49
Figura 41 – Leirner, O dia que o Corinthians foi campeão de futebol
( d e t a l h e I ) , p a r t e d a o b r a T e r r a à V i s t a , C o l . M A C d e N i t e r ó i . ......... 50
Figura 42 – Leirner, O dia que o Corinthians foi campeão de futebol
( d e t a l h e I I ) , p a r t e d a o b r a F u t e b o l , C o l . B r i t o C i m i n o . ......................... 50
F i g u r a 4 3 – R u f i n o , I n c e r t a e S e d i s , 2 0 0 4 . ............................................................ 54
F i g u r a 4 4 – L e i r n e r , M o n a l i s a s , 1 9 9 8 / 9 9 . ............................................................ 54
Figura 45 – A obra Atenção... Sentido faz parte da exposição de Nelson
L e i n e r , P o r q u e M u s e u ? , 2 0 0 6 . .......................................................................... 55
F i g u r a 4 6 – S i n i s e , Q u a s e I n f i n i t o , 2 0 0 3 . ............................................................ 56
F i g u r a 4 7 – L e i n e r , P o r q u e M u s e u ? , 2 0 0 5 . ......................................................... 58
F i g u r a 4 8 – L e i n e r , P o r q u e M u s e u ? , 2 0 0 5 . ......................................................... 58
Figura 49 – Tessler, Horizontes Provável (vista interna da varanda do
M A C d e N i t e r ó i ) , 2 0 0 4 . ......................................................................................... 59
Figura 50 – Tessler, Horizontes Provável (vista interna da externa do
M A C d e N i t e r ó i ) , 2 0 0 4 . ......................................................................................... 59
F i g u r a 5 1 – T e s s l e r , H o r i z o n t e s P r o v á v e l ( v i s t a i n t e r n a ) , 2 0 0 4 . ............... 59
Figura 52 – Tessler, Horizontes Provável (vista interna do Museu),
2 0 0 4 . ............................................................................................................................... 59
Figura 53 – O publico participando da atividade desenvolvida pela Ação
e d u c a t i v a , M A C d e N i t e r ó i . ................................................................................. 60
Figura 54 – Material de apoio da Ação Educativa utilizado durante a
e x p o s i ç ã o I n c e r t a e S e d i s d e J o s é R u f i n o , 2 0 0 6 . ........................................ 63
Figura 55 – Material de apoio (detalhe) da Ação Educativa utilizado
d u r a n t e a e x p o s i ç ã o I n c e r t a e S e d i s d e J o s é R u f i n o , 2 0 0 6 . ................... 63

9
F i g u r a 5 6 – B a r r i o , C a n c e l a d e c a r n e , 1 9 9 4 . ....................................................... 65
F i g u r a 5 7 – B a k k e r , O j a r d i m d o É d e n e o s a n g u e d a G ó r g o n a , 1 9 9 4 . ... 65
F i g u r a 5 8 – T u n g a , G a b i n e t e e n t o m o l ó g i c o , 1 9 9 4 . ........................................... 65
F i g u r a 5 9 – F r e i t a s , D o r a M a a r n a p i s c i n a , 1 9 9 9 . ............................................ 65
F i g u r a 6 0 – M a i o l i n o , A q u i e s t ã o , 1 9 9 9 . .............................................................. 66
F i g u r a 6 1 – E s q u e m a d e H é l i o O i t i c i c a p a r a M a g i c S q u a r e n ° 5 . ............... 66
F i g u r a 6 2 – A p o n t a m e n t o s d e H é l i o O i t i c i c a p a r a M a g i c S q u a r e n ° 5 . .... 67
F i g u r a 6 3 – O i t i c i c a , M a g i c S q u a r e n ° 5 , p . 1 9 7 8 – m . 2 0 0 0 . ........................ 67
Figura 64 – Meireles, Espaços Virtuais – Cantos, 1973..................... 69
Figura 65 – Silveira, Projeto da Instalação, Paradoxo do Santo, 1994. 70

10
Apresentação

Esta pesquisa tem o intuito de demonstrar os desafios


apresentados pela categoria Instalação para o trabalho das instituições
museológicas. Nos propomos apresentar um breve levantamento
histórico/cronológico mundial da categoria; Da sua origem as produções
atuais, visualizando a construção do pensamento conceitual dessas
obras, bem como os diferentes recursos utilizados pelos artistas e na
singularidade da espacialidade construída pela instalação; Para
contribuir com a compreensão da importância dessa linguagem artística
e assegurar que a museologia cumpra seu papel como disciplina
aplicada, compreendendo que esta “propicia transformações das
r e f e r ê n c i a s p a t r i m o n i a i s e m h e r a n ç a c u l t u r a l 1” .

1
MENSCH, Peter van. Objeto de estudo da museologia. Rio de Janeiro : Uni-Rio/UFG, 1994.

11
Introdução

O presente trabalho tem como objetivo investigar e


demonstrar como a categoria Instalação vem sendo trabalhada através
da análise dos procedimentos de salvaguarda e comunicação 2 realizados
pelo Museu de Arte Contemporânea de Niterói.

Este trabalho propõe a observação do “objeto” Instalação,


que será exposto no capítulo “Instalação o fio tênue de uma
categoria”, partindo da apresentação cronológica de sua origem, sua
produção e conceito. Referências da produção no mundo serão
levantadas, assim como sua produção no Brasil, procurando entender
esse fenômeno na arte enquanto linguagem, sua relevância histórica e
sua inserção sócio-cultural.

Na seqüência apresentaremos “Museu de Arte


Contemporânea de Niterói: Um laboratório de experiência”, onde o
histórico institucional será visto, seguido por exemplos de Instalações
realizadas em suas dependências, que serão analisados separadamente
considerando os procedimentos museológicos adotados.

Esta obra apresentará também um paralelo com outras


instituições como Museu de Arte Contemporânea da Universidade de
São Paulo no que se refere aos procedimentos de Salvaguarda e o
Espaço de Instalações Permanentes pertencente ao Museu Castro Maia -
Museu do Açude nos procedimentos de comunicação, aspectos estes que
atestam a importância do trabalho museológico.

Os elementos que compõe este trabalho serão devidamente


analisados e exemplificados de forma a evidenciar a importância de se
entender a categoria Instalação para que os procedimentos de

2
Segundo Cristina Bruno em seu texto: “Museologia: princípios-metodológicos e a historicidade do fenômeno museal”. 2001. Define
salvaguarda como: “conservação da materialidade dos bens patrimoniais e gerenciamento de informação correspondente” e comunicação
como: “ação expositiva e educativa”.

12
salvaguarda e comunicação sejam realizados de forma correta sem que
nenhum dado se perca.

Enfim, ressaltamos a relevância do trabalho museológico


nos seus aspectos técnicos nas palavras Cristina Brumo (2001), “a
museologia em sua dinâmica interdisciplinar tem colaborado para que
os museus refinem as suas formas de representação e se estabeleçam
c o m o l u g a r e s d e c o n t e s t a ç ã o e n e g o c i a ç ã o c u l t u r a l 3. ”

3
Trecho retirado da tese de livre docência “Museologia: a luta pela perseguição ao abandono”.

13
1. Instalação: o fio tênue de uma categoria

“A Instalação, ocorra ou não em um lugar específico,


surgiu como um idioma flexível”.
David Deitcher, 1992.

Segundo o Dicionário Aurélio este define Instalação


como:

“Ato ou efeito de instalar (-se)... Na arte contemporânea,


obra tridimensional concebida e montada para ocupar uma
área num determinado recinto, e cujos diversos elementos
ou dispositivos agem sobre o imaginário do espectador.
Sua exposição é temporária e a obra, desmontada, subsiste
apenas através de registros fotográficos”.

A Instalação tem como característica uma obra que ocupa


um determinado “espaço”, construído ou não, com os mais variados
meios e diversidade de materiais a partir de um conceito criado pelo
artista, tendo como objetivo, a participação e a interação do visitante
com o projeto proposto. No seu contexto antiarte 4 que nega os critérios
de valor atribuídos às obras de arte.

Muitos conceitos são atribuídos para o termo aqui usado


Instalação - In Situ, Site Especificity, Ambientações, Vídeo Instalação,
Instalação Interativa, Instalação performática, entre outros.

Para entendermos o porque da sua origem e desse diversos


conceitos acreditamos ser importante pontuar alguns artistas que
trouxeram contribuições para a cena dessa categoria na arte.

4
Corrente adotada por alguns movimentos de vanguarda do séc. XX (dadaísmo, pop art). O termo é atribuído a Marcel Duchamp (1887-
1968). Dicionário Aurélio - Século XXI.

14
O pintor, projetista e artista gráfico russo El Lissitzky
(1890-1941) em 1926 projetou para a Exposição Internacional de Arte
de Dresden um “Sistema Inovador para instalar Obras de Arte”. Este
sistema incluía painéis móveis, com superfícies metálicas e madeira.
Entre as obras que se expunham nesse trabalho de Dresden, além de
seus próprios trabalhos, encontravam obras de outros artistas como
Mondrian, Leger, Moholy-Nagy, entre outros. Pensar o espaço
expositivo, ou o conjunto exposto não seria uma forma de ver que ao se
apropriar de um espaço, pensado e executado, este poderia ser uma obra
de arte?

Lissitzky responde essa questão com a primeira obra que


foi especificamente pensada para um espaço museológico. De 1927 à
1928, El Lissitzky cria para o Museu de Hannover o “Gabinete
A b s t r a t o 5” , um espaço ativo que apresentava obras fixadas em
diferentes alturas e planos variados, onde o espectador tinha que
interagir com um espaço transformado de forma singular. Esse trabalho
foi pensado para ser um ambiente reservado à exibição de obras de arte
contemporâneas.

Figura 1 – Lissitzky, Projeto do ‘Gabinete Abstrato’, 1927.

5
O “Gabinete Abstrato” foi destruído em 1937, depois foi recriado segundo projeto original em
1969.

15
Figura 2 – Lissitzky, Gabinete Abstrato, 1927.

El Lissitzky propunha uma discussão sobre a relação


espaço-tempo nas artes visuais, um tipo de visualidade que anula as
costumeiras três dimensões, propondo espaços abstratos, onde se
confundem os referenciais espaciais. Para esta definição ele
conceituava como “Proun” novos modos de visão e que segundo o
Dicionário Oxford de Arte é o “nome dado a uma série de pinturas
abstratas as quais deu esse nome genérico” (sem qualquer significado e
manifesto), qualificando-as de estação de intercâmbio entre a pintura e
arquitetura.

Outro artista importante para a questão da origem da


Instalação é Kurt Schwiters (1887-1948), que desenvolveu um trabalho
intitulado Merzbau 6 (merzsaüle – coluna Merz/ construção Merz); Merz
é para Schwiters uma forma de arte feita a partir de sucata. Este projeto
foi executado em Hannover pelo artista, entre 1923, quando abandonou
a Alemanha devido a Segunda Guerra Mundial.

Merzbau só veio a público em 1931, quando Kurt


Schwiters permitiu a divulgação de imagens de sua obra, esta que foi
6
Merzbau construída na própria residência do artista em Hannover e foi desenvolvendo a ocupação e apropriação daquele espaço durante 14
anos. Destruída em 1943, pelos bombardeios da Guerra, Merzbau foi montada novamente na Noruega e em seguida na Inglaterra; essa porem
não foi finalizada; Schwiters vem a falecer antes do término da obra em 1948, essa obra é conservada pela Hatton Gallery, em Newcastle
Uponn Tyne.

16
concebida, a priori sem a intenção de ser uma Instalação, porque
Schwiters a pensara como um cenário para o ‘Merz Theather’ na
Alemanha e depois porque não havia ainda a noção do conceito
Instalação no campo das artes visuais. Para Schwiters “Ela cresce
q u a s e c o m o u m a c i d a d e 7” .

Figura 3 – Schwiters, Merzbau, 1931 (I).

Figura 4 – Schwiters, Merzbau, 1931 (II).

7
O’DOHERTY, Brian. Inside the White Cube: The Ideology of the Gallery Space. San Francisco: lapis Press, 1986.

17
Figura 5 – Schwiters, Merzbau, 1931 (III).

Percebemos que a obra de El Lissitzky e Kurt Schwiters


possuem duas diferenças bastante claras, em “Gabinete Abstrato”,
Lissitzky tem a concepção de sua obra a partir de um espaço
determinado, no caso o Museu de Hannover, propondo trabalhar o
espaço e o tempo com a percepção do espectador. Já Kurt Schwiters traz
em Merzbau, uma obra em constante construção, sem um projeto pré-
estabelecido e que hoje conhecemos somente a partir de registros
fotográficos.

Diferentes artistas ainda trazem outras questões sobre a


categoria como Oskar Schlemmer (1888-1943), pintor, escultor,
projetista cênico, teórico de arte alemã e um importante professor da
Bauhaus, que aprofundou seu interesse nas linguagens cênicas e no
trabalho de palco; pesquisou profundamente as potencialidades dos
espaços teatrais e criou importantes trabalhos que relacionavam o corpo
e o espaço, como em seus desenhos teóricos e seus Stäbetanz (1927) e
Equilibristik (1927).

18
Figura 6 – Schlemmer, Desenho Teórico – Projeto, s/d.

Em 1926, o pintor holandês Piet Mondrian (1872-1944)


projeta o “Salão de Madame B”, em Dresden, executado apenas em
1970, após a sua morte. Ao revestir o cômodo inteiro com suas cores
características, o artista explora a relação da obra com o espaço,
inserindo o espectador no interior do trabalho.

Figura 7 – Mondrian, Salão de Madame B, 1970.

19
Diferentemente dos artistas mencionados acima o artista
francês Marcel Duchamp (1887-1968) questionou três elementos
importantes ao apresentar a obra “1200 Bags of Coal” (1938): espaço,
matéria e a participação efetiva do público. Invertendo as relações mais
convencionais e habituais que são: a noção de paredes, teto e chão.
Duchamp usou sacos de carvão, e os pendurou por todo teto e chão,
usou também um braseiro com luz simulando fogo: “... foi a primeira
vez em que um artista subsumiu uma galeria inteira com uma única
i n t e r v e n ç ã o – e o f e z q u a n d o e l a e s t a v a l o t a d a d e o u t r a s o b r a s ” 8.

“1200 Bags of Coal” deslocou o público da condição de


observador, tornando-o quase uma condição da obra. Desenvolveu na
galeria a recriação do espaço ao intervir esteticamente e fisicamente,
apropriando-se com a reconstrução. Traz para seu trabalho o corpo do
espectador e recepção da arte, privilegiando o conceito, ao invés dos
tradicionais critérios da arte.

Figura 8 – Duchamp, 1200 Bags of Coal, 1938.

8
O’DOHERTY, Brian.No Interior do Cubo Branco . P . 7 5

20
Figura 9 – Duchamp, 1200 Bags of Coal, 1938 (Detalhe).

Em 1958, o artista francês Yves Klein (1928-1962) causa


sensação e tumulto quando produz a Instalação “Le Vide”, na Galeria
Iris Clert em Paris, o artista nada coloca no recinto expositivo, apenas
o espaço da galeria em si é o “objeto de arte”, uma exposição de
“vacuidade” segundo o Dicionário Oxford de Arte, um espaço
transcendental para Klein.

Figura 10 – Klein, Le Vide, 1958.

21
Em 1960, Armand P. Arman (1928-2005) realiza a
exposição “Le Plein”, respondendo a Klein sobre a exposição da
Instalação “Le Vide”, onde este enche de lixo o espaço também da
Galeria Iris Clert.

Figura 11 – Arman, Le Plein, 1960.

Na Alemanha, em Düsseldorf por volta da década de 1960


o desenhista, escultor e artista performático alemão Joseph Beuys
(1921-1986) juntamente com o Grupo Fluxus 9 enfrentavam os velhos
sistemas da arte. Beuys em sua produção propõe o deslocamento da obra

9
Grupo internacional de artistas, fundado na Alemanha 1962, que se opunha à tradição e ao profissionalismo nas artes. Dicionário Oxford de
Arte. P.60

22
de arte para fora dos espaços da galeria; ocupar espaços externos foi
uma atitude que ele desenvolveu junto ao então Jovem Partido Verde
Alemão, na direção do que é hoje a Land Art. Podemos citar como
exemplo a obra “Matilha” produzida por Beuys de 1969, onde uma
Kombi Volkswagen e vinte quatro trenós de madeira, contendo feltro,
lâmpada e gordura ocupam o espaço.

Figura 12 – Beuys, Matilha, 1969.

Na Venezuela o artista Jesus Soto (1923-2005) buscou


entender a questão do tempo e da tridimensionalidade da pintura em
relação ao espectador. Influenciado fortemente pela busca de Mondrian
(um plano pictórico concreto, sem profundidade), Soto chega à
conclusão que o abandono da bidimensionalidade era a melhor forma de
incorporar o fator tempo e espaço em sua obra.

O tempo e tridimensionalidade na obra “Dois quadrados


no espaço” de 1953, em acrílico e esmalte sobre madeira (30X60X7,2),
permite a Soto dar um grande salto em seu trabalho rumo ao espaço,
“(...) como se uma das camadas que antes estratificavam a pintura em
profundidade tivesse se separado das outras por meio de uma

23
dobradiça, o que se expressa na obra pela superposição em diagonal de
u m a c r í l i c o t r a n s p a r e n t e 10 ” .

Figura 13 – Soto, Dois quadrados no espaço, 1953.

Figura 14 – Soto, Estrutura Cinética, 1955.

10
JIMÉNEZ.Ariel Paralelos. Arte brasileira da segunda metade do século XX em contexto: Colección Cismeros. Museu de Arte Moderna de
São Paulo: MAM, 2002. p.29.

24
Em 1956, pesquisa a entrada do espectador no espaço,
transcendendo radicalmente as dimensões pictóricas. Soto chega ao Pré-
penetrável de 1957. A partir desse momento desenvolve-se uma
dimensão ambiental e participativa em sua obra.

Figura 15 – Soto, Pré-Penetrável, 1957.

Em 1967, uma exposição individual de Soto é realizada na


Galerie de Denise René em Paris, apresentando seu primeiro Penetrável,
usando finos tubos de plástico, pendentes do forro ao piso da galeria,
no meio dos quais os visitantes são convidados a andar livremente. Soto
abandona as linhas impressas em acrílico, essas linhas se tornam
matéria, onde finos tubos de náilon pendem de uma rede, e interage com
o corpo do visitante que se torna uma condição de percepção da obra.

Figura 16 – Soto, Penetrável, 1973 (1995).

25
No Brasil essa percepção participativa não é diferente,
percebemos isso através da produção nacional. Os artistas participantes
do Grupo F r e n t e 11 e posteriormente do movimento N e o c o n c r e t o 12
apresentam trabalhos de relevância internacional. A relação espaço,
matéria e espectador são preocupações inerentes a estes artistas mesmo
não seguindo uma linha única de produção.

Lygia Clark (1920-1988) como afirma Paulo Herkenhoff


“ f o i a a r q u i t e t a d o i n s t á v e l n o e s p a ç o ” 13 u m a d a s m a i s i m p o r t a n t e s
artistas brasileiras e um doa grandes nomes da vanguarda internacional.
Desde a série “Quebra da Moldura” da década de 1950, Clark
problematiza a fronteira da obra e o mundo, essa quebra significou a
incorporação da moldura como elemento participante da obra e não mais
a divisão de dois mundos (obra e realidade).

Figura 17 – Lygia Clark (1920-1988) no Rio de Janeiro, 1958.

11 Formado por: Lygia Clark, Hélio Oiticica, Décio Vieira, Ivan Serpa, Franz Weissmann, Aluísio Carvão, Lygia Pape. O Grupo Frente
informado pelas discussões em torno da abstração e da arte concreta, com obras que trabalham sobre tudo no registro da abstração
geométrica, o grupo não se caracteriza por uma posição estilística única, sendo o elo de união entre seus integrantes a rejeição à pintura
modernista brasileira de caráter figurativo e nacionalista. Sendo um precursor do movimento neoconcreto brasileiro.
12
Os Neoconcretos pretendiam realizar uma visão crítica do concretivismo; partindo da convicção básica de que a obra de arte não é uma
ilustração de conceitos apriorísticos, objetivam uma redução do pragmatismo concreto mediante o resgate de expressão e da subjetividade
presentes em Malevitch e Mondrian.
“O neoconcreto, nascido de uma necessidade de exprimir a complexa realidade do homem moderno dentro da linguagem estrutural da nova
plástica, nega a validez das atitudes cientificistas e positivistas em arte e repõe o problema da expressão, incorporando as novas dimensões
"verbais" criadas pela arte não-figurativa construtiva”. Ferreira Gullar.
13
Arte Brasileira na coleção Fadel da inquietação do moderno à autonomia da linguagem. Rio de Janeiro 2002. p.165.

26
Na série “Bicho” (peças móveis que podem ser
manipuladas) a vida concreta do plano reivindica a ação do sujeito.
Clark posteriormente em seu trabalho reafirma a importância do sujeito
com seus objetos sensoriais.

Figura 18 – Clark, Bicho,1960.

A poética do corpo e os aspectos terapêuticos da arte se


afirmam na década de 1960. A busca de Lygia Clark foi pela obra como
corpo aberto ao diálogo, uma arte que vai além da interatividade, uma
obra terapêutica.

Em 1968 “A casa é o corpo” é instalada na Bienal de


Veneza, essa obra foi recentemente montada na exposição “Lygia Clark
- do objeto ao acontecimento” na Pinacoteca do Estado de São Paulo,
em uma retrospectiva da artista.

Figura 19 – Lygia, A casa é o corpo, 1968.

27
O carioca Hélio Oiticica (1937-1980) criador dos
14
Parangolés busca na discussão de seu trabalho, integrar a arte à
experiência cotidiana, o espectador com a obra criada, superando a
distância entre a arte e a vida.

Figura 20 – Oiticica, Nildo da Mangueira vestindo Parangolés, 1964.

Segundo ele: “Já não é mais possível aceitar o


desenvolvimento dentro do quadro (...) Longe de ser a ‘morte da
pintura’, é a sua salvação, pois a morte seria a continuação do quadro
como tal... Como está tudo tão claro agora: que a pintura teria de sair
para o espaço, ser completa”. Hélio Oiticica 1961.

Em seus guaches “Metaesquemas” (1957-1958), onde


planos saturados de cor não apresentam tanta “rigidez”; A relação
forma e fundo dá autonomia à composição pela cor, a dinâmica
adquirida questiona a bidimensionalidade, solicitando uma nova base:
um suporte tridimensional. Percebemos isso na obra “Monocromáticos”
14
Parangolé- parafernália carnavalizante (composta por capas , tendas, estandartes coloridos etc.) associável (ou não) a dança e a música -
espécie de desdobramento final de toda uma visão (des)integralizadora do mundo (...). Dicionário Oxford de Arte.p.384

28
(1958-1959) onde desaparece a diferença entre pintura e suporte, o
plano se torna ativo e a cor age livremente no espaço.

Figura 21 – Oiticica, Metaesquema, 1957.

No final da década de 1950, o artista já participante do


movimento neoconcreto produz os “Relevos Espaciais” (1959)
superfícies pintadas, suspensas por fios presos ao teto. Nesse período
Oiticica rompe com superfície bidimensional do quadro, passa a operar
com diretamente com o espaço real. A busca pelo envolvimento total
(visual, conceitual e sensório) é atingida em 1960 com “Os Núcleos”
que incorporam o espaço, através de placas de madeira – com dupla
superfície pintada – presa a uma estrutura no teto, que possibilitando o
movimento das mesmas e incorporando o espaço.

Figura 22 – Oiticica, Relevo Espacial, 1959.

29
A participação do espectador nos “Bilaterais”, “Relevos”
e “Núcleos” acontecem pela vivência visual da forma e da cor. Mas com
os “Pentráveis”, “Bólides” e “Parangolés” a manipulação das obras se
torna plurissensorial. Com os “Penetráveis” de 1960, Oiticica inicia as
manifestações ambientais, com característica de espaço geográfico,
social e político que se abrem em estruturas penetráveis, onde o sujeito
interage com a cor materializada nas estruturas arquitetônicas.

Figura 23 – Oiticica, O grande núcleo, 1960.

Podemos citar as obras: “Tropicália” (1967), “Penetrável


PN2 e PN3” montadas novamente 1990 na Universidade do Rio de
Janeiro e a Instalação “Bilateral Equali” de 1960.

Figura 24 – Oiticica, Tropicália, 1967.

30
Em 1958, Lygia Pape (1929-2004) apresenta o “Ballet
Neoconcreto I” (8 sólidos geométricos; madeira, tecido pintado; 4
cilindros brancos de 200 X 75 cm; 4 paralepípedos laranja de 200 x 75
x 60 e oito bailarinos) respectivamente no Copacabana Palace com
música de Reynaldo Jardim. E no ano seguinte 1959 o “Balé
Neoconcreto II” (madeira, tecido pintado, 200 X 200 X 100 cm cor de
rosa e azul e dois bailarinos) no Teatro da Praça em um palco italiano e
novamente com o poema de Reynaldo Jardim.

Figura 25 – Pape, Ballet Neoconcreto n.°1, 1958.

Lygia nessa série criou peças de grandes proporções com


os cascos ocos e dentro de cada um estava uma pessoa que tinha
autonomia de deslocamento de acordo com um roteiro básico pré-
determinado pela artista e pela música. O espaço um palco italiano era
uma questão fundamental do trabalho, com a luz pontual sobre as peças,
deixando o fundo totalmente escuro.

Segundo Brett (2000), “(...)Para Pape, a instalação é, em


parte, um meio de reunir em massa um grande número de objetos que
pode representar um grande número de pessoas. E cada uma por tanto,
vem a ter uma instância humana de um dilema ou problema de grande
escala (ou lendo-se em ordem imersa, o problema geral, como sugere a
forma abstrata da peça no seu todo, é de fato composto por milhões de

31
casos individuais). Tanto“sedução”: “Perda” quanto “narizes e
línguas” exploram temas altamente significantes das fendas ou abismos
existentes entre os sentidos de uma grande maioria de pessoas em um
país como o Brasil: por exemplo, a dicotomia dolorosa entre o que olho
vê ou o nariz cheira e o que a barriga sente”. (Gruy Brett. Lygia Pape
- Gávea de Tocaia. 2000. p.312.)

Podemos também citar o trabalho de alguns artistas não


menos importantes, entre as décadas de 1960 e 1970:

• Antonio Manuel (1947) - “Urnas quentes”, 1968.


• Mira Schendel (1919-1988) – “Ondas paradas de probabilidade”, 10ª
Bienal Internacional, 1969;
• Cildo Meireles (1948) - “A diferença entre o círculo e a esfera é o
peso”, 1976;

O coreano Nam June Paik (1932-2006), foi pioneiro no


uso de aparelhos de televisão, vídeo-cassete e satélites de
telecomunicação em projetos artísticos, dando início à chamada
videoarte; Uma de suas obras mais citadas é TV Garden (1974),
instalada na XIII Bienal de São Paulo, em 1975. Considerado por alguns
autores como o pai da vídeoarte e da vídeo-instalação.

Figura 26 – Paik, TV Garden, 1974.

32
Nas décadas de 1980 e 1990, o uso da categoria em todo o
mundo é enorme, dificultando o levantamento da produção recente.
Neste período alguns artistas começam a misturar outras mídias dentro
de uma mesma Instalação.

Bill Viola (1951), nascido em Nova Iorque, é referência


no campo da vídeoarte e na experimentabilidade contemporânea. Ele
acredita que a vídeo-instalação é uma experiência física que se apropria
do espaço. Segundo Viola “the real place the work exists is not on the
screen or within the wall of the room, but in the mind and heart of the
person who has seen it.”

Figura 27 – Viola, The crossing Figura 28 – Viola, The crossing


(fire), 1996. (water), 1996.

Com o avanço dos aparatos tecnológicos as Instalações,


ficam cada vez mais complexas e amplas. Gary Hill traz a palavra, o
som, a imagem e o espaço ocupado para dialogar com suas projeções,
como na obra “Tall Ships”:

“(...) um corredor absolutamente escuro, medindo


aproximadamente 20m de comprimento, 3m de altura e 3m
de largura. Há 12 projetores no teto. As imagens

33
projetadas alteram-se uma a uma, respectivamente
dirigidas para a parede de cada lado. As projeções são de
pessoas de diferentes origens étnicas, idades e sexo... A
luz é emitida apenas pela própria figura que é vista
diretamente na parede... À medida que os espectadores
caminham pela sala, chaves eletrônicas ocultas são
acionadas e as pessoas/projeções movimentam-se em
direção ao espectador até atingirem um tamanho que se
15
aproxime do real(...) ”.

Figura 29 – Gary Hill, Tall Ships, 1972.

Figura 30 – Gary Hill, Tall Ships, 1972 (detalhe).

15
Marcelo Dantas. Lugar do Outro. Where the other takes place.1997

34
Ou mesmo o trabalho da artista brasileira e pesquisadora
Giselle Beiguelman no Projeto “Egoscópio 2.0”, uma instalação
i n t e r a t i v a 16 , o n d e e l a p r o p õ e u m d i á l o g o e n t r e o e s p a ç o t a n g í v e l , o
espaço virtual e o público. São imagens codificadas em diferentes
protocolos e mídias, em apenas alguns segundos a informação pode ser
particular, pública, comercial. O trabalho propõe a descentralização e
hibridização do conhecimento, mudando a natureza da informação de
modo livre e criativo. O participante do “Egoscópio 2.0” pode interagir
com o sistema transmitindo imagens e textos para um painel eletrônico
situado em diferentes pontos da cidade de São Paulo.O acesso pode ser
feito pela Internet, celular, IPOD entre outros, desde que tenhamos o
e n d e r e ç o d o I P 17 .

Figura 31 – Beiguelman, Egoscópio 2.0, 2004.

16
Segundo Cristiane Paul Instalação Interativa é “(...) a exploração do mundo virtual
distribuído. Outro modelo de projeto é o para web em que o participante está interagindo a
distancia ou quando o participante está no espaço da instalação para promover uma relação
entre o aspecto físico e o virtual, criando um balanço perfeito entre eles. Alguns projetos
pretendem transmitir as qualidades do virtual para o espaço físico real e outros ainda tentam a
fusão dos dois espaços. Resumindo as instalações interativas pretendem sempre promover uma
relação entre o espaço físico e o virtual, para ser interagido no virtual pelo usuário que pode
estar dentro ou fora do espaço físico da obra”. ·
17
Sigla de Internet Protocol.

35
Atualmente o grupo Chelpa Ferro formado por artistas:
Barrão (1959), Sérgio Mekler (1963), Luiz Zerbini (1959) vem se
destacando por suas Instalações Performáticas nas quais, “a par de
instrumentos musicais convencionais, são empregados materiais os
mais originais: cinzeiros cantantes, máquinas de amolar facas,
máquinas de costuras, aparelhos domésticos de todo tipo, até mesmo
alto-falantes dentro de um aquário” (...) “os sons estão em um diálogo
constante com o emaranhado de cabos elétricos, que acrescenta às
instalações sonoras de Chelpa Ferro a dimensão de um desenho
complexo. São laços negros e suaves que se refestelam lascivos pelo
chão ou novelos confusos e grosseiros, tão pouco desenredáveis como
as disposições sonoras. Desenho e composição são igualmente
fragmentários e nervosos. O que de início parece provisório e frágil
possui uma força e uma robustez intrínseca. Aos acessos de fúria se
seguem momentos de alegre elegância. Ora o elemento de desenho e
escultura tem supremacia ora o elemento sonoro. E, eventualmente, os
arranjos levam àquele ponto misterioso em que os sons se extinguem,
t r a n s i t a n d o i m p e r c e p t i v e l m e n t e p a r a o c a m p o d a s i m a g e n s 18 ” .

Figura 32 – Grupo Chelpa Ferro, Sistema n.°1, 2001.

18
htm:www.wooz.org.br.

36
No Brasil a atenção no estudo e no desenvolvimento de
projetos especiais em instituições culturais vem crescendo, tanto para a
Instalação “real” quanto à “virtual”, alguns exemplos serão citados:

• A publicação do livro “Poéticas do Processo, Arte Conceitual no


Museu” de Cristina Freire, onde a autora levanta questões entre a
obra e sua documentação, no texto intitulado “A Instalação e o
Espaço da Exposição”, Freire afirma, a importância do espaço
para a obra e a reconstrução, como também, as preocupações que
norteiam os Museus de Arte Contemporânea.

• Nas Instalações Interativas, Giselle Beiguelman aborda em seu


livro: “Link-se, arte/mídia/política/cibercultura”, a relação da
ocupação das obras virtuais interativas nos espaços culturais
tradicionais, os problemas enfrentados para que a leitura da obra
e a sua intenção não se percam, como no caso de obras on-line,
que as instituições “lacram” os sites, apresentando os projetos em
modo “tela cheia”, impedindo que o visitante processe
“multitarefas”; Giselle Beiguelman foi agraciada pelo Prêmio
Sérgio Mota, que investe na descoberta de novos artistas
envolvidos com arte/tecnologia; onde premiou artistas que
desenvolve projetos de instalação interativa;

• Em São Paulo o Arte Cidade trouxe para as ruas essa categoria,


um bom exemplo é a Vídeo Instalação da dupla MAU WAL
(Maurício Dias e Walter Riedweg) com a obra “Mera Vista Point”
de 2002, onde é feita uma Instalação ou Intervenção Urbana no
meio do Lago da Concórdia, com os camelôs que ali trabalhavam.

37
Figura 33 – Dias e Riedweg, Projeto da vídeo-instalação Mera Vista Point,
2002.

Figura 34 – Dias e Riedweg, Mera Vista Point (vista superior), 2002.

38
2. Histórico do Museu de Arte Contemporânea
de Niterói: Um laboratório de experiência.

Figura 35 – MAC de Niterói - vista noturna – março/2006.

O Museu de Arte Contemporânea de Niterói - MAC de


Niterói foi escolhido como objeto de estudo para este trabalho pelo
grande número de Instalações que tem sido realizada nesse dez anos de
vida, completos agora em 2006. Instalações essas que muitas vezes não
fazem parte de seu acervo, mas que é constante nas mostras idealizadas
pelo museu.

Localizado no Mirante da Boa Viagem, o MAC de Niterói


acolhe a arte contemporânea e a entende como poucas instituições, traz
na sua história a experiência e a vontade de se recriar continuamente.

Projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, o MAC de


Niterói coloca-se como um ‘Museu Aberto’, pela sua arquitetura, pelo
que comunica, pela sua proposta como instituição.

O Museu de Arte Contemporânea de Niterói traz junto com


sua arquitetura e seu acervo, a linda vista para a Baía de Guanabara,

39
com 360° graus de janelas na varanda do museu. Inaugurado em 1996,
pela administração dos prefeitos Jorge Roberto Silveira (1989, 1997 e
2000) e João Sampaio (1993), o museu logo se tornou um ícone da
cidade, o que motivou a municipalidade a idealizar uma intervenção
urbana, de revitalização da orla, denominada Caminho Niemeyer.

Um museu projetado com o intuito de receber a coleção de


João Sattamine, o MAC não se limitou a isso, nas suas mostras com
obras de outros acervos, colecionadores ou obras criadas para a própria
instituição, ele se transforma, trazendo a surpresa, o estranhamento e a
vontade de ser sempre próximo. Com toda complexidade e dificuldade
que a obra contemporânea possui para se comunicar com todos, o
espaço projetado por Niemeyer a acolhe, para o que está dentro e fora,
a arte contemporânea encontra um local de ativação, para questionar,
para criar estranhezas, para se fazer admirada, tanto quanto a beleza
que envolve o MAC, e todo seu redor com o mirante da Boa Viagem.
Arquitetura, Natureza e Arte, em uma união perfeita.

O MAC de Niterói é subordinado a FAN (Fundação de


Arte de Niterói), entidade que possui estatutos próprios e se sustenta
com a verba destinada pela Prefeitura, o museu desenvolve nesses dez
anos um trabalho de compromisso com sua missão enquanto instituição
museológica e com a comunidade, um trabalho ‘extramuros’. São
publicações, exposições dentro e fora do museu, trabalho social com as
comunidades próximas e de preservação ambiental. O MAC de Niterói
abre-se e se faz ativo, ele se deixa ser instrumento, para criar novas
possibilidades de transformação.

Percorremos a cidade, e o ícone do museu está em toda


parte, bem sinalizado para quem quiser encontrá-lo, são placas de
sinalização nas ruas, em ponto de ônibus, em empresas imobiliárias, na
rodoviária, folhetos em hotéis e restaurantes, o MAC é o grande ícone,
é impossível mesmo desassociar a nome desse museu com o que ele
representa para essa cidade e seus habitantes “MAC de Niterói”, se até

40
alguns anos atrás ela era considerada uma cidade com um certo
potencial a ser explorado, hoje é considerada o pólo turístico-cultural
da região Leste fluminense.

As premissas que abordaremos nesse trabalho vão além da


arquitetura deste museu, já tão trabalhado por outros autores, a
pesquisa propõe trazer os desafios que esta instituição traz como um
todo, partindo da missão que o MAC de Niterói se propõe.

"O MAC - Niterói é um museu de arte contemporânea


brasileira, criado com o compromisso de abrigar a
importante coleção de João Sattamine, e a partir dela
estudar e divulgar todos os conceitos emergentes que
alimentam a constante renovação da arte nas suas
relações com a sociedade e a nossa época”. (Direção do
MAC - dezembro de 2005.)

Toda peculiaridade do MAC de Niterói levanta questões


para os processos de salvaguarda e comunicação da cadeia operatória da
Museologia. A Instalação será o ponto de partida escolhido levando em
consideração sua relevância na instituição. Como afirma Alvarado:

“A História da Arte nos museus desta tipologia


desempenha o papel dialético de revelação dos
significados dos objetos, por quanto o estudo das peças
da coleção, a sua interpretação é um dos princípios
fundamentais da museologia, juntamente com sua função
da preservação. Isso porque os objetos de uma coleção se
não são estudados, interpretados, expostos, perdem seu
significado e, portanto o apagamento da memória seria a
própria morte desses. Portanto a memória que a pesquisa

41
desenvolve é condição ‘sine qua non’ para a própria
e x i s t ê n c i a d o m u s e u 19 ” .
Para Mario Pedrosa:

“Diferentemente do antigo museu, do museu tradicional


que guarda, em suas salas, as obras-primas do passado, o
de hoje é, sobretudo, uma casa de experiência. É um
paralaboratório. É dentro dele que se pode compreender o
que se chama de arte experimental, de invenção. É, já
agora, lugar-comum da crítica contemporânea à
verificação da mistura de todos os gêneros de arte
tradicional (...) Outra característica também das
atividades artísticas contemporâneas é o direito ilimitado
à pesquisa e, sobretudo, à experiência, à invenção... a
função do museu moderno entra aí: é ele sítio
privilegiando onde essa experiência se deve fazer e
decantar". (Mario Pedrosa. Arte Experimental e Museus.
Jornal do Brasil.).

E seguindo a afirmação de Pedrosa é que nomeamos no


título desse capítulo como um ‘museu de experiência’ o Museu de Arte
Contemporânea de Niterói, não somente pela vivência que ele
proporciona, mas pela competência em traduzir a experiência
museológica nas suas atividades. Assim pretendemos compartilhar essa
“experiência” da pesquisa nessa Instituição, e esclarecer premissas
levantadas sobre a categoria Instalação no dia a dia desse museu. A
premissas serão levantadas no decorrer dos capítulos de Salvaguarda e
Comunicação sobre o MAC.

“... o MAC, antes de mais nada, é rever as lições da


experiência. Nelas ficaram evidente a dimensão subversiva
(paradigmática/emblemática) de uma forma que reinventa a função
19
ALVARADO, Daisy V. M. Peccinini. Museu, História da Arte e Internet: uma pesquisa.

42
original museu, mesmo que ainda não completamente consciente ou
sempre no tempo presente do porvir. Assim, o MAC é como uma obra de
arte aberta, ela própria como materialização de uma poética do infinito
– mas lembrando Haroldo de Campos: no horizonte do provável, do
imprevisível, inusitado, mas concreto”. Guilherme Vergara.

Figura 36 – MAC de Niterói – vista externa da varanda – março/2006.

2.1 MAC de Niterói – salvaguarda: documentação e


conservação

A Diretoria de Museologia e Acervo do MAC de Niterói


d e s e n v o l v e r a m u m B a n c o d e D a d o s c o m b a s e e m A c c e s s 20 q u e a u x i l i a e
viabiliza as informações necessárias no desenvolvimento das atividades
do museu nos processos de salvaguarda e comunicação, assim como o
levantamento de informações para empréstimos para outras instituições
e outras atividades de pesquisa. O Banco de Dados documenta a
Coleção João Sattamine, a Coleção Particular João Sattamine (as duas

20
Microsoft® Office Access 2003 © 1992-2003. Microsoft Corporation. Todos os direitos reservados.

43
em comodato) e a Coleção do Museu de Arte Contemporânea de Niterói
( d o a ç õ e s 21 ) .

Figura 37 – Página de abertura do Banco de Dados – MAC de Niterói.

O processo de documentação é desenvolvido pela equipe


i n i c i a l m e n t e c o m o p r e e n c h i m e n t o d e f i c h a s 22 d e r e g i s t r o q u e c o n t é m o s
mesmos campos do Banco de Dados, nele são inseridas as informações
levantadas e depois as fichas são arquivadas nas pastas das obras. A
ficha contém os seguintes itens transcritos abaixo:

• Nº de registro;
• Coleção;
• Categoria;
• Título (frente e verso – referente a sua localização) (outros e não
titulada pelo artista);
• Datada/Período;
• Técnica;

21
O Museu de Arte Contemporânea de Niterói possui uma política de aquisição de doação de arte contemporânea brasileira, as obras a serem
doadas passam por uma comissão que seleciona as obras que tem relevância para a instituição, essa comissão é formada pela direção do
museu, pela divisão de teoria e pesquisa e a diretoria museológica.
22
Há também uma ficha de registro das partes do “objeto museológico”, onde praticamente os mesmos campos citados acima são usados
para o levantamento de informações sobre as partes da obra.

44
• Material;
• Dimensões (levando em consideração: peça, moldura, área
impressa, base), (altura x largura x profundidade/ espessura;
diâmetro; peso e formato);
• Moldura (se há ou não na obra e também passe-partout), (estado
de conservação);
• Assinatura do autor (localização)
• Estado de conservação (seguindo os critérios: ótimo, bom,
regular, ruim e observações).
• Localização/ Marcas/ Inscrições/ Etiquetas (transcritas);
• Descrição da peça (termo geral/ termo específico/ Escola – grupo
e série);
• Descrição;
• Histórico da peça (exposições que participou; prêmios,
referências bibliográficas, proprietários anteriores);
• Observações gerais;
• Números anteriores;
• Modo de aquisição; data de entrega da peça; valor de aquisição;
valor de seguro; procedência;
• Foto e negativo com numeração;
• Identificação do responsável pela catalogação da peça e revisor;
• Data.

O Banco de dados administra as informações do acervo


para o museu, mas a emissão de relatórios, uma ferramenta importante
que o programa A c c e s s 23 que proporciona um cruzamento de
informações sobre o acervo, ainda não foi desenvolvido. A equipe
pretende futuramente desenvolver no Banco de Dados esta ferramenta
de emissão de relatórios e o cruzamento de dados, ou utilizar o Banco
d e D a d o s D o n a t o 2 . 4 24 .

23
Microsoft® Office Access 2003 © 1992-2003. Microsoft Corporation. Todos os direitos reservados.
24
Banco de dados desenvolvido pelo Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro, patrocinado pela VITAE.

45
Figura 38 – Página de consulta do Banco de Dados – MAC de Niterói.

A documentação da categoria Instalação no MAC de


Niterói, ainda gera dúvidas, como:

• A Instalação possui um fio tênue entre ela e outras categorias de


arte o que provoca dúvidas para quem cataloga a obra. Será suficiente
para a documentação no gerenciamento das informações o uso do termo
Instalação para a classificação dessa categoria?
• O processo de documentação é eficiente para atender as
necessidades dessa categoria, uma vez que o banco de dados ou livro de
tombo tem que ser generalizado, pois um acervo não se limita a uma
única categoria?

Tendo em vista essa problemática a divisão de museologia


do MAC de Niterói assumiu a categoria, mas esta só é empregada pela
equipe de documentação no processo de catalogação, quando não existe
nenhuma dúvida sobre a obra; geralmente é feito uma pesquisa com o
artista ou doador da Instalação, nessa pesquisa uma ficha detalha
informações importantes para que assegure sua veracidade no seu
processo de documentação (catalogação). O formulário é composto
pelos seguintes pontos transcritos:

46
• Dados Pessoais do Artista – (Nome Completo, Nome Artístico, Nome
do Pai, Nome da Mãe, Local de Nascimento, Data de Nascimento);
• Formação;
• Materiais Empregados (“Levando em conta que as marcas dos
materiais empregados são de fundamental importância, se possível,
indique-as:”);
• Técnicas Utilizadas;
• Questões tais como:
• Poderia situar estes trabalhos dentro de sua obra/carreira?
• Poderia situar suas referências nesta época (artistas por quem se
interessava, com quem dialogava na época, contexto, etc.).
• Há algum fato relevante que mereça destaque?
• Histórico de exposição que a obra participou
• Forma correta de montar:
• Indicaria uma melhor forma para sua conservação?
• Observações; data e assinatura do artista.

Para a completa compreensão da importância da


documentação e a conservação da categoria ‘Instalação’, veremos a
seguir a obra: “O dia em que o Corinthians foi campeão de futebol”
montada no MAC de Niterói na exposição “Porque Museu?” de Nelson
Leiner no período de 15 de outubro de 2005 a 15 de outubro de 2006,
um dos objetos de estudo deste projeto.

A Instalação: “O dia em que o Corinthians foi campeão de


futebol”, nasce da junção da obra: “O grande desfile” (1984) integrada
ao acervo do MAC de Niterói em 1998, logo após ser exposta no museu
de costas para o público e de frente para a Baía de Guanabara,
recebendo o título de “Terra à Vista”. Na montagem dessa exposição
mencionada anteriormente, “Terra à Vista” se transforma mais uma vez,
acrescida de Futebol (2001), pertencente à Galeria Brito Cimino até
então. Transformando-se em “O dia em que o Corinthians foi campeão
de futebol”.

47
Partindo da observação de Agnaldo Farias sobre a obra:

“ ... é na verdade a versão atualizada de uma obra maior


e metamorfoseante: O grande desfile (1984). Obra em
processo que não só varia quanto a sua configuração
como cresce a cada vez que é montada. Que se apropria
vorazmente de imagens e objetos, de toda gama de
bugigangas relacionadas com a religião e com o
entretenimento e que o comércio oferta em lojas
especializadas, em bancas de miudezas montadas nas
portas de confusos bricabraques, nas tendas precárias
com que os camelôs vão ocupando as calçadas das
cidades, índices de sua progressiva decadência e
ilegalidade. Portanto, se quer averiguar sua verdadeira
data de nascimento, O dia em que o Corinthians foi
campeão começou há vinte anos sobe o título O grande
desfile, uma enorme fila indiana que serpenteava desde o
lado de fora do Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro, entrava pelo seu saguão, subia a bela escada em
caracol para morrer no assim chamado espaço
monumental, o majestoso ambiente de pé-direito duplo, a
primeira sala do Museu, marco da arquitetura moderna
brasileira e mundial. O público deliciava-se com a
insólita intrusão organizada e sofrida pelo sagrado e
sisudo espaço reservado à arte, de um sem-número de
estatuetas e brinquedos pertencentes ao mundo cá fora.
(...)”.

Essa mesma obra teve também outras versões como:

“Primeira Missa, organizado em círculo e tirando partido


de um espelho no alto, que ‘elevava’ a montagem. As duas
versões anteriores haviam sido O Grande Combate,
organizada em 1985 na Galeria Luisa Strina, quando a

48
mesma multidão, aglomerada em forma de bloco,
estancava diante de uma parede pintada de azul onde
versões infantis de velhos aviões de guerra travavam uma
batalha sem quartel; e O Grande Enterro, realizada na
Pinacoteca do Estado de São Paulo em 1986, quando o
grupo, possivelmente inspirado pelas hierárquicas e
históricas colunas do prédio de Ramos de Azevedo,
quedava-se solene, com a gravidade compatível com o
4
cenário e com o título.”

Figura 39 – Leirner, Terra Vista, 1984.

Figura 40 – Leiner, Terra à Vista (vista parcial), 1998 (2ª montagem).

Todo processo de metamorfose dessa obra até ser

49
adquirida pela instituição causa um certo estranhamento, afinal uma
obra pode ser transformada após ser adquirida por uma instituição?
Essa transformação gera novas obras, logo elas pertencem ao museu?
Quais os critérios adotados pela documentação quando uma obra passa
por esse processo de metamorfose tão peculiar na arte contemporânea e
aqui na obra de Leiner?

Figura 41 – Leirner, O dia que o Figura 42 – Leirner, O dia que o


Corinthians foi campeão de futebol Corinthians foi campeão de futebol
(detalhe I), parte da obra Terra à (detalhe II), parte da obra Futebol,
Vista, Col. MAC de Niterói. Col. Brito Cimino.

Na montagem da obra “O dia em que o Corinthians foi


campeão de futebol”, a informação histórica de sua metamorfose (duas
Instalações que se tornam una) perde-se para o público, pois a legenda
da Instalação não menciona a Coleção MAC de Niterói, que compõe a
mesma. A história da obra só é comunicada através do catalogo da
exposição. No Banco de Dados (campo “histórico da obra”) a
informação é anexada pela catalogação. A sua documentação original
segue com as informações dos documentos de aquisição.

Leiner tem a peculiaridade de inserir novos objetos cada

50
vez que a obra é remontada, a catalogação da obra acompanha essas
mudanças no “crescimento” do número de peças inseridas. Acreditamos
que um critério para a documentação para a “aquisição” dessas obras
geradas por esse processo ‘metamorfoseante’ deva ser estabelecido para
que futuramente a obra “original” não se descaracterize. Claro que o
papel do campo histórico do banco de dados tem grande relevância e a
documentação fotográfica também, mas um critério estabelecido pode
ser fundamental futuramente, assegurando ao museu o direito de
pertencimento das obras geradas (que deve ser discutido pela direção do
museu e o artista).

No procedimento de salvaguarda-conservação o critério de


conservação preventiva é adotado, mesmo para as Instalações, levando
em consideração a intenção do artista e as características físicas da
obra, segundo a divisão de museologia não há Instalações efêmeras no
acervo, portanto não existem registros fotográficos e nem projetos
dessa categoria, mas caso venham a adquirir uma obra com este perfil
acreditam ser mais adequado o tratamento específico para o projeto
como obra e o registro seria encaminhado a divisão de pesquisa e
curadoria do mesmo.

Na conservação de uma Instalação outras interrogações


são levantadas como:

• Laudo de conservação, como proceder?


• Restaurar? Ou adquirir um objeto novo e substituí-lo? (no caso de
Leiner ou de outros artistas que usam objetos fabricados). Quem
decide, o conservador ou o artista?
• Como atender as necessidades de conservação de uma Instalação que
pode vir a usar diferentes tipos recursos e pode ser efêmera?
• Como armazenar? Caso a obra seja efêmera o registro e o projeto
deve ser armazenado com a qualidade de obra?

51
A partir dessas formulações sugerimos:

• Um laudo de conservação para uma Instalação deve ser prático e


objetivo, porém atentando as necessidades da obra, portanto ele deve
também ser flexível na sua elaboração, se feito em formato ficha.

• Estar atento à técnica usada pelo artista e ao objetivo proposto por


ele. No caso de Leiner na obra Terra a Vista, este permitiu a
reposição das peças, caso essas sofram algum dano, a reposição com
a compra de uma nova peça é mais econômica para a Instituição do
que um restauro, por isso é importante ter todos os dados de
procedência (endereço de fornecedores e descrição de cada uma
delas);

• A armazenagem deve levar em consideração o perfil da instalação,


usar um material que não reaja em relação à obra, produzir uma
embalagem que possa sempre ser reaproveitada (que tenha
durabilidade).

• Acreditamos que os projetos e registros da obra necessitam de


cuidados especiais sim, levando em consideração que esses são
fundamentais para que uma Instalação seja montada. O projeto e os
registros são documentos, portanto devem seguir os critérios
adotados para sua conservação.

No armazenamento segue o exemplo da obra de Leiner


“Terra à Vista” que ainda não possui uma embalagem adequada, devido
ao grande número de peças e a logística da estrutura da reserva técnica
do museu; (O artista muitas vezes adiciona novas peças o que
impossibilita a confecção de uma embalagem “definitiva”. Essa
embalagem já está sendo estudada pela equipe de conservação levando
em conta as necessidades da obra e uma melhor acomodação na reserva
técnica). Em relação ao restauro ou substituição de uma peça, também é

52
levado em conta às orientações do artista que deixa por escrito na ficha
já mencionada, quais decisões que serão tomadas, fornecedores de
materiais usados são citados e o restauro geralmente só é feito quando
uma informação não existe.

É interessante perceber que as coleções de arte


contemporânea em especial neste caso a Instalação necessita de um
contato direto com o artista ou que se obtenham todas as informações
necessárias na aquisição da obra para que uma tomada de decisões
assegure a sua documentação, conservação, comunicação e
“legitimidade” da categoria Instalação. A pesquisa é fundamental para
que se traduza a necessidade implementada pela arte contemporânea.
Segundo Chenhall:

“ (...) qualquer documentação de objetos numa coleção


deve ter índices cruzados de tantas formas quantas sejam
possíveis ou as informações contidas nos registros não
poderão ser usadas” (1975:9). Um objeto a ser
documentado e conservado, encontra-se imbricado a áreas
específicas do conhecimento, dotados de organização,
discurso e terminologia própria, inserido no ambiente de
documentação de museu, e dele se distinguindo, mas
também dele necessariamente participante e atuante”.

Os procedimentos de salvaguarda (documentação)


precisam estar atentos que são o eixo condutor de uma rede de central
para a difusão de dados, e que através dele toda a cadeia operatória da
museologia depende, para que a produção da memória seja
sistematizada, preservada e reutilizada como agente de extroversão e
produção de conhecimento.

53
2.2 MAC de Niterói – comunicação: expografia.

Figura 43 – Rufino, Incertae Sedis, 2004.

Figura 44 – Leirner, Monalisas, 1998/99.

Durante a pesquisa de campo efetuada no MAC de Niterói,


no período de 08 (oito) a 15 (quinze) de Março de 2006, foram
observadas as exposições de “Incertae Sedis” de José Rufino, com
curadoria de Claudia Saldanha e Guilherme Vergara; “Por que Museu?”

54
de Nelson Leiner com curadoria de Agnaldo Farias; Partindo desta
observação ‘in loco’ trataremos da categoria Instalação no processo de
comunicação, através da expografia e do serviço educativo da
instituição.
Segundo Lisbeth Rebollo Gonçalves,

“Enquanto o museu consolida o seu espaço expositivo


como lugar que quer ser “neutro”, a idéia de lugar para
os artistas contemporâneos vai assumir importância
enquanto linguagem. Isso quer dizer que, nesse momento,
a arte assume a vocação de explorar a construção do
espaço e, como sintaxe básica da criação artística,
u t i l i z a - s e d a d i m e n s ã o e s p a c i a l . ” 25

Figura 45 – A obra Atenção... Sentido faz parte da exposição de Nelson Leiner,


Por que Museu?, 2006.

Anteriormente mencionamos as dimensões arquitetônicas


do MAC de Niterói, projetado por Niemeyer (com seu caráter
monumental), tratamos da complexidade da disputa da paisagem da
varando do museu e da obra pelo público. Através dessas exposições de

25
GONÇALVES, Lisbeth Rebollo. Entre Cenografia. O Museu e a Exposição da Arte no Século XX. Edusp/ FAPESP. SP.
2004. p. 54

55
arte contemporânea “Incertae Sedis”, “Por que Museu?” e outras
proporcionadas pelo Museu, pretendemos trazer a categoria Instalação e
sua complexidade como obra que reconstrói o espaço e sua paisagem e
como esta comunica-se com o público.

Como observa Cristina Freire: “Se o contexto da galeria


ou do museu é parte fundamental da Instalação, a primeira observação
a ser feita é que ela não ocupa o espaço, mas o reconstrói,
criticamente”. Levantamos desta forma os seguintes pontos a serem
discutidos:

• Qual a importância do espaço expositivo em relação à Instalação? Já


que a arte começou a se apropriar desse espaço como matéria e
unidade de um discurso estético.
• Como o espaço expositivo acolhe a obra sem prejudicar a realização
desta?
• Quais são os danos que uma proposta de instalação pode vir a trazer
para o espaço que a apresentará?
• Como a expografia trabalha a “intenção do artista” nessa instituição?

Figura 46 – Sinise, Quase Infinito, 2003.

56
A categoria Instalação ‘reconstrói um espaço
criticamente’ como afirma Freire, portanto a instituição que a acolhe
tem de estar aberta a recebê-la, percebemos no MAC de Niterói uma
abertura imensa para o acolhimento das obras dessa categoria, o espaço
se metamorfoseia a cada nova exposição mesmo possuindo critérios
adotados para a utilização do espaço, um bom exemplo foi à exposição
de Daniel Senise intitulada “Quase Infinito” realizada no período de
22/03/2003 a 01/06/2003 na galeria central do museu. Na obra o artista
usou o tapete original do MAC (que estava sendo trocado) para compor
seu trabalho. Retirado e recortado, o tapete foi vazado com uma série
de grandes gaivotas recolocado na parede branca da galeria do Museu.
Percebemos que a união Museu e obra permitiram-se recriar. Retirando
uma parte deste espaço, Senise se apropria do material (tapete) e o
recoloca como paisagem (obra).

Na exposição “Por que Museu?” deparamos com a


Instalação de Leiner “Porque Museu?” 2005 na varanda, onde o artista
cria no local, uma sala de meditação ou espera - uma série de pufes
pretos dispostas ao longo da parede da varanda, acima de cada um deles
está um gancho para que o visitante pendure seus pertences, acima
espelhos emoldurados em cabeças de macacos pelo qual se pode olhar.
Segundo o curador, a questão levantada por Leirner é a
indissociabilidade entre obra de arte e aquele que entra em contato com
ela, mas acreditamos que além dessa questão, a obra estando instalada
na varanda de frente para a paisagem do Museu, também discute o que
está fora, porque direcionar o olhar do visitante ao que ele mais quer
ver naquele local, muitas vezes chamado de mirante? O olhar e a
postura “acomodada” ou “aconchegante” proposta pelo artista nessa
instalação voltada para a Baía de Guanabara, pode ser muito mais que a
indissociabilidade entre obra e visitante? “Porque Museus?” Leirner
pergunta. E para o Museu, porque instalar essa obra na varanda? Porque
criar projetos especiais para esse local?

57
Figura 47 – Leiner, Por que Museu?, 2005.

Figura 48 – Leiner, Por que Museu?, 2005.

Estar atento às qualidades e desafios que o espaço nos


oferece é a grande arma para proporcionar ao público um momento de
reflexão e aprendizagem. Ora, o MAC de Niterói poderia ter assumido
uma postura passiva frente ao seu grande concorrente (a paisagem que o
museu tem e sua própria arquitetura), diante disso esse espaço foi
estudado, suas potencialidades levantadas e uma série de projetos
especiais para esse local foi se concretizando e estão em andamento.

58
A artista gaúcha Elida Tessler (1961), no ano de 2004
realizou a uma instalação onde uma série de pratos brancos foram
dispostos na varanda formando um grande colar, e em cada prato um
verbo no infinito foi gravado; Esses verbos foram retirados do Livro
“Arte no Horizonte do Provável” de Haroldo de Campos.

Figura 49 – Tessler, Horizontes Figura 50 – Tessler, Horizontes


Provável (vista interna da varanda Provável (vista interna da externa
do MAC de Niterói), 2004. do MAC de Niterói), 2004.

Figura 51 – Tessler, Horizontes Figura 52 – Tessler, Horizontes


Provável (vista interna), 2004. Provável (vista interna do Museu),
2004.

Segundo Mario Moutinho, no catálogo da Documenta


V(1972),

59
“Cada vez mais, o tema de uma exposição tende a não ser
mais a exposição de obras de arte, mas a exposição da
exposição como obra de arte... As obras apresentadas são
manchas de cor - cuidadosamente escolhidas - do quadro
que compõe cada secção (sala) no seu conjunto. Há mesmo
uma ordem nas cores, sendo estas escolhidas e compostas
em função do sentido/desenho (dess(e)in) da secção
(seleção) na qual se espraiam e se apresentam... A
exposição é assim o “receptáculo valorizado”, onde a arte
não só se assume como se destrói, pois se ainda ontem a
obra se revelava graças ao museu, ela hoje só serve de
“gadget” decorativo para a sobrevivência do museu
enquanto que quadro, quadro esse onde o autor não seria
outro que o próprio organizador da exposição”.(Moutinho,
Documenta V, 1972).

2.3 MAC de Niterói – Arte-Educação

Nesse emaranhado de questões que a Arte Contemporânea


aponta e que o MAC de Niterói se propõe a comunicar; como o público
usufrui dessas experiências? Quais os recursos que esta instituição usa
para ser mediador obra, público, museu?

Figura 53 – O publico participando da atividade desenvolvida pela Ação


educativa, MAC de Niterói.

60
Como observa Márcia Campos, arte educadora do museu
no seu texto - A experiência da visitação de grupos escolares ao Museu
de Arte Contemporânea de Niterói: relatos, recursos e ocupações:

“No que se refere às sensações experimentadas durante o


percurso da visitação, foi observado a sensação de
entusiasmo. Outros declararam ter experimentado
sensações que mesclavam entusiasmo e estranhamento.
Observamos que a reação de entusiasmo se referia à
experiência no espaço arquitetônico, ao passo que as
reações de estranhamento se relacionavam com o percurso
no espaço museológico, provocado pelo contato com certas
obras de arte em exposição”.·

Segundo Márcia Campos essa estranheza em relação às


Instalações também acontece, para que a vivência da obra se dê, esse
estranhamento não é perdido, é aproveitado para um início de diálogo
com o visitante, no trabalho de mediação, pois é essa a primeira
impressão ou “leitura” que está sendo realizada pelo espectador.
Nenhuma informação da leitura do visitante é contestada, apenas
informações são inseridas para que aprofunde a mediação e leve o
indivíduo ou grupo a refletir sobre o trabalho exposto. O processo de
mediação tem seqüência com o material de apoio produzido para cada
exposição.

A equipe de Arte - Educação do MAC coordenada por


Beatriz Jabor desenvolve hoje no Museu um trabalho intenso na
produção e pesquisa, para a produção de um material de apoio para cada
exposição são: folder sobre a proposta do serviço educativo (para
divulgação e orientação ao público para solicitar o trabalho de
mediação) e material de apoio à exposição, material de mediação para
os grupos atendidos bem como para o público espontâneo, encontro com
educadores (para preparar os alunos previamente a visita), entre outro.

61
A ação educativa do MAC conta hoje com um programa de
atendimento a diferentes públicos como:

• MAC Escolas: grupos escolares e um programa especial para


professores e alunos;
• MAC Comunidades: projeto Arte Ação Ambiental - Módulo de ação
comunitária MAC-BNDES;

Tendo como parceiros nesses programas: a Secretaria de


Assistência Social; Fundação Municipal de Educação - Secretaria
Municipal de Educação; Secretaria Municipal de Desenvolvimento,
Ciência e Tecnologia e o Programa Médico de Família.

• Espaço para visitantes participativos: atividades para famílias nos


fins de semana (O MAC como obra de arte e Contação de histórias no
MAC);
• Atendimento para grupos de ONGs e fundações sociais.

A Divisão de Arte Educação não possui um programa de


atendimento específico para público especial, porém esse não deixa de
ser atendido pela equipe de mediadores.

A missão do educativo “(...) nasce e se desenvolve a


partir do que chamamos de desafio comunicativo, que se estabelece
sempre que a produção artística contemporânea está exposta em um
espaço público. Reconhecendo nossa diversidade cultural, entre o
exercício da liberdade artística e a capacidade de entendimento e
recepção pública, a Divisão de Arte Educação elabora estratégias de
participação e formação de públicos que propõe atividades de
e s t í m u l o s à i n t e r p r e t a ç ã o i m a g i n a t i v a d a o b r a 26 ” .

26
Folder da Divisão de Arte Educação do MAC de Niterói.

62
Figura 54 – Material de apoio da Ação Educativa utilizado durante a exposição
Incertae Sedis de José Rufino, 2006.

Figura 55 – Material de apoio (detalhe) da Ação Educativa utilizado durante a


exposição Incertae Sedis de José Rufino, 2006.

A ação educativa do MAC de Niterói conta hoje com um


espaço nas galerias, onde após o percurso o visitante pode entrar em
contato com uma série de atividades pensadas para cada exposição. Um
grande ganho para a educação nos museus e que serve de exemplo a
tantas instituições que escondem a ação educativa nos seus “porões”,
pois muitas vezes é ela que salva uma exposição mal realizada ou de
difícil acesso ao público em geral. Acreditamos que a bandeira
levantada à educação de museus, não deve ser erguida somente para uso
de marketing cultural, mas um trabalho que deve ser apostado pela sua
eficiência no processo de comunicação do objeto exposto, acreditando,
apostando e investindo na formação de seus educadores.

63
3. MAC USP e Espaço de Instalações Permanentes do
Museu do Açude: outras observações

Após levantarmos as premissas da categoria Instalação, no


Museu de Arte Contemporânea de Niterói, veremos de forma específica
como o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo –
MAC USP realiza os procedimentos de documentação; E o Espaço de
Instalações Permanentes pertencente aos Museus Castros M a i a 27 -
Museu do Açude, como o único espaço específico – a céu aberto – para
exposição permanente de Instalações no Brasil. Essas instituições
mostram outras possibilidades de trabalho museológico que a categoria
Instalação possibilita.

O Espaço de Instalações Permanentes localizado na


Floresta da Tijuca nasceu em 1999 com o objetivo de ser um museu de
instalação. Em uma área de 150.000m², artistas foram convidados a
estabelecerem seus projetos de Instalação.

Porém antes da implantação do projeto foram realizadas


experiências de Instalação no museu, como a da artista inglesa Shelagh
Wakely (1932) com a obra “Aguadorado” em 1993, um espelho d´agua
localizado no pavilhão do museu foi coberto com pó de ouro sobre a
água.

Em 1994, com a curadoria de Márcio Doctors foi realizada


a exposição: “As potências do orgânico”, que propunha trabalhar o
paradoxo da transitoriedade da matéria/permanência da arte.
Participaram dessa mostra Tunga com “Gabinete Entomológico”; Arthur
Barrio com “Cancela de carne”; Claudia Bakker com “O jardim do Éden
e o sangue da Górgona”.

27
Museus Castro Maia- composto pelos Museus Chácara do Céu e Museu do Açude e Espaço Permanente de Instalações.

64
Figura 57 – Bakker, O jardim do
Figura 56 – Barrio, Cancela de Éden e o sangue da Górgona, 1994.
carne, 1994.

Figura 58 – Tunga, Gabinete entomológico, 1994.

O Projeto foi iniciado em 1999, com apoio da Petrobrás


trazendo para esse espaço ao ar livre as obras de Iole de Freitas e Anna
Maiolino, projetadas especialmente para essa área.

Figura 59 – Freitas, Dora Maar na piscina, 1999.

65
Figura 60 – Maiolino, Aqui estão, 1999.

Após 22 anos o Espaço Permanente de Instalações


possibilitou concluir a concepção de “Penetráveis Magic Square nº5 –
de luxe” de Oiticica projetado em 1978, com o apoio do Projeto Hélio
Oiticica.

Figura 61 – Esquema de Hélio Oiticica para Magic Square n°5.

66
Figura 62 – Apontamentos de Hélio Oiticica para Magic Square n°5.

Como parte do programa de comunicação do Museu


publicações sobre as instalações realizadas foram lançadas: “A forma
na floresta”, 1999; “Hélio Oiticica”, 2000; “José Resende – Lygia Pape
– Nuno Ramos”, 2003; com texto e curadoria de Marcio Doctors.

Figura 63 – Oiticica, Magic Square n°5, p.1978 – m. 2000.

67
Os Museus Castro Maia com essa iniciativa demonstram a
preocupação com a preservação da Floresta da Tijuca e enriquecem o
debate visual e teórico da categoria Instalação.

No estudo realizado no Museu de Arte Contemporânea da


Universidade de São Paulo foi levantado o sistema de documentação
desenvolvido ao longo dos anos, pela equipe de catalogação, um Banco
de Dados que funciona hoje como um grande administrador de
informações das obras do acervo, possibilitando uma melhor logística
para o funcionamento da cadeia operatória da museologia. Com base em
A c c e s s 28 o B a n c o d e D a d o s i m p r i m e r e l a t ó r i o s , v i a b i l i z a i n f o r m a ç õ e s
para a divisão de conservação e restauro, expografia, setor educativo e
atende pesquisadores.

Com uma enorme diversidade de obras que compões o


acervo, a equipe de documentação sentiu necessidade de criar um Banco
de Dados que apresente relações entre os dados catalogados, para
facilitar o levantamento de informações para os setores requisitantes.
As Instalações que estão no acervo, incorporadas a partir de doações,
foram documentadas com as categorias:

• Tridimensional - instalação;
• Tridimensional - instalação / objeto;
• Tridimensional - instalação multimídia;
• Tridimensional - instalação modular;
• Tridimensional - pintura / instalação;
• Tridimensional - escultura / instalação;
• Projeto de ação - instalação;
• Fotografia - fotomontagem / instalação;
• Desenho - projeto de instalação;

28
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68
Segundo Cristina Cabral, o critério adotado para a
categoria, possibilita uma pesquisa mais satisfatória quando apresenta
indicações de como ela é composta. Um exemplo é a obra de Evelyn
Roth “Teia Musical” de 1983, composta por tiras de Jersey tramadas,
fotografias em cores sobre papel envolto em plástico, auriculares
adornados com pena, feltro, couro e fita cassete; com a dimensão de
151 X 120 X 130 (obra montada), sendo catalogada como
‘Tridimensional - instalação multimídia’.

A catalogação leva em consideração também dados


fornecidos pelo artista no momento da doação ou em entrevista
posterior, assim como a documentação quando fornecida por ele. Muitas
Instalações são incorporadas ao acervo apenas como projetos por isso o
uso de uma categoria ‘Projeto de ação - instalação’. Como exemplo
temos os desenhos de Cildo Meireles “Espaços Virtuais - Cantos” de
1973, em acrílica e grafite sobre papel, com dimensões de 50,6 X 36,3
cm.

Figura 64 – Meireles,
Espaços Virtuais – Cantos,
1973.

Um detalhe importante adotado pela catalogação foi não


fazer mais o uso do campo ‘descrição’ da obra, o uso da imagem digital
atende bem as necessidades do Museu segundo Cristina Cabral, porém
ainda se faz necessário o campo observação para detalhar algumas
informações e/ou descrições cedidas pelo artista. Quando o artista envia
uma planta, registro ou uma observação qualquer sobre a montagem,

69
essa é digitalizada e inserida no banco de dados. Como a obra de
Regina Silveira, “Paradoxo do Santo” (1994), doada pela artista.

Figura 65 – S i l v e i r a , P r o j e t o d a I n s t a l a ç ã o , P a r a d o x o d o S a n t o , 1 9 9 4 .

Segundo Cristina Cabral no acervo não há Instalações


efêmeras. Porém o Museu realiza obras de caráter efêmero, e o ‘objeto’
produzido por essa “ação” pode vir a ser entendido como objeto do
acervo, quando produzido pelo artista, obras assim entram na categoria:
Fotografia / Registro de Ação.

O número de tombo é dado ao conjunto da instalação, cada


peça é numerada, e identificada com detalhes, levando em consideração
os dados obtidos e de relevância para a catalogação tais como:

• Artista;
• Título da obra
• Data / Local;
• Técnica;
• Dimensões;

70
• Observações;
• Etc.

Informações de conservação são inseridas no Banco de


dados, porém, grande parte dos detalhamentos técnicos fica com a
equipe do Laboratório de Conservação e Restauro. Segundo Ariane
Soeli Lavezzo, Especialista em Conservação e Restauro da Divisão de
Pintura, por serem mais relevantes a essa equipe e a manutenção das
obras. O Banco de Dados somente é acessado pela equipe de
catalogação; para a equipe de conservação, relatórios são emitidos
conforme as necessidades, o mesmo acontece para as outras equipes da
divisão e do Museu.

71
Considerações Finais

Esta pesquisa foi iniciada com o intuito de apresentar os


desafios enfrentados pela categoria Instalação nos procedimentos
museológicos. O apanhado histórico levantado demonstrou as
peculiaridades de sua produção e uso de diferentes matérias, bem como
sua re-criação do espaço e sua produção no mundo.

O Museu de Arte Contemporânea de Niterói em relação à


Instalação desenvolve no seu trabalho de pesquisa e comunicação,
grande relevância sobre a categoria em suas mostras e publicações.
Dando possibilidade de provocar nas suas dependências a criação de
“novas paisagens”, deslocando o olhar do visitante também para dentro
do museu. Potencializando o seu trabalho institucional também através
dessa categoria. O mesmo acontece com o Espaço de Instalações
Permanente criado na Floresta da Tijuca pelos Museus Castro Maia que
assume seguramente que se trata de um espaço para Instalações e não
um jardim de esculturas, porque a proposta estabelecida é de um
território capaz de diluir as fronteiras entre arte e vida, proporcionado
pela categoria. E o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de
São Paulo, que possui uma documentação detalhada sobre Instalações de
seu acervo, para catalogação, e gerenciamento das informações, o
diferencial desse trabalho está na “dissecação” feita a partir do
conceito Instalação para determinar sua categoria e relacionar esta com
outros dados obtidos.

A pesquisa mostra que o as instituições apresentadas


possuem pontos diferenciais em seus trabalhos museológicos, é de suma
importância para essa categoria, um intercâmbio entre instituições,
contribuindo uma com as outras, no aperfeiçoamento de suas atividades
museológicas, bem como dentro dela.

72
Percebemos que a Instalação é uma experiência corpórea,
uma categoria que rompe com as tradicionais classificações de belas-
artes, não podendo ser mais pensada apenas como visualidade nem só
como espacialidade, mas perceber que ela é presença, que articula as
imagens do mundo por meio da matéria, com a ação artística. E a
museologia como ciência aplicada deve estar pronta e qualificada
através de seus profissionais para desenvolver um trabalho que a
permita desvendar esses desafios apresentados.

73
Bibliografia

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2001.

TASSINARI, Alberto. O Espaço Moderno. São Paulo: Cosac & Naif


Edições, 2001.

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Galery Space. San Francisco: lapis Press, 1986.

FREIRE, Cristina. Poéticas do Processo: Arte Conceitual no Museu. São


Paulo: Iluminuras, 1999.

D’HARNONCOURT, A. Marcel Duchamp. Munique: Prestel, 1989.

ZEVI, B. Saber ver la arquitectura, Ensayo sobre la interpretación


espacial de la arquitectura. Buenos Aires, Poseidón, 1971.

ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das


Letras, 1992.

CAMARGO-MORO, Fernanda de. Museus, Aquisição/Documentação.


Rio de Janeiro: Livraria Eça Editora, 1986.

MENSCH, Peter van. Objeto de estudo da museologia. Rio de Janeiro:


Uni-Rio/UFG, 1994.

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Janeiro: Museu do Açude, 1999.

74
DOCTORS, Márcio. Espaço de instalações permanentes do Museu do
Açude - Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Museu do Açude, 2000.

DOCTORS, Márcio. A forma na floresta: espaço de instalações


permanentes/ José Resende, Lygia Pape, Nuno Ramos. Rio de
Janeiro: Museu do Açude, 2003.

JIMÉNEZ, Ariel e RAMÍREZ, Mari Carmem. Paralelos: Arte Brasileira


da segunda metade do século XX em contexto: Colección
Cisneros. São Paulo: MAM, 2002.

GONÇALVES, Lisbeth Rebollo. Entre Cenografia. O Museu e a


Exposição da Arte no Século XX. Edusp/ FAPESP. São Paulo,
2004.

DANTAS, MARCEL. Lugar do Outro. Where the other takes place.


Museu de Arte Moderna de São Paulo e Centro Cultural do Banco
do Brasil, São Paulo, 1997.

BRETT, Gruy. Lygia Pape - Gávea de Tocaia. Cosac & Naif. São Paulo
2000.

HERKENHOFEFF, Paulo. Arte Brasileira na coleção Fadel da


inquietação do moderno à autonomia da linguagem. Rio de Janeiro
2002.

PECCININI, Daisy V. M. de Alvarado. Lucia Py: Landsmark artscapes.


Dublin, 2002.

AMARAL, Aracy. Museu de Arte contemporânea da Universidade de


São Paulo: perfil de um acervo. São Paulo : Ex Libris, 1988.

75
AMARAL, Aracy, HERKENHOFF, Paulo. Ultramodern: the art of
contemporary Brazil. Washiton D.C.: The National Museum of
Womem in the Artes, 1993.

ANDERSON, Perry. As origens da pós-modernidade. Rio de Janeiro:


Jorge Zahar, 1999.

ARCHER, Micheael. Arte contemporânea: uma história concisa. São


Paulo: Martins Fontes, 2000.

BASBAUM, Ricardo (org). Arte contemporânea brasileira. Texturas,


dicções, ficções, estratégias. Rio de Janeiro: Rios Ambiciosos,
2001.

CANTON, Katia. Novíssima arte brasileira: um guia de tendências. São


Paulo: EDUSP, 2001.

DOMINGUES, Diana. A arte no século XXI. A humanização das


tecnologias. São Paulo: UNESP, 1997.

FARIAS, Agnaldo. Arte brasileira hoje. São Paulo: Publifolha, 2002.

BASBAUM, Ricardo. Arte Contemporânea Brasileira, texturas, dicções,


ficções, estratégias, Rio de Janeiro, Rios Ambiciosos, 2001.

GÁVEA - Revista de história da arte e arquitetura. Rio de Janeiro.


Volume nº14. Setembro de 1996.

BORER, Alian. Joseph Beuys. Cosac & Naif. São Paulo, 2001.

BEIGUELMAN, Gisele. Linke-se, arte/mídia/política/cibercultura.


Editora Peirópis. São Paulo, 2005.

76
ANEXO 1

Museu de Arte Contemporânea de Niterói


Diagnóstico de obras de arte

Autor/Obra:

Diminsões:

Exposição:
Local: Data:

Frente da Obra

Condições da Obra
1 Abrasão 9 Dobra / Vinco 17 Lasca 25 Rompimento
2 Achatamento/ 10 Empenamento 18 Mancha de 26 Sujidade
Mossa umidade
3 Arranhão 11 Estria / Fissura 19 Marcas Outros:
4 Bolhas 12 Ferrugem 20 Ondulação
5 Craquelê 13 Foxing 21 Oxidação
6 Defeito próprio 14 Fungo 22 Perda
7 Descolamento 15 Furo 23 Rasgo
8 Desfiado 16 Impressões 24 Restauro Visível
digitais

77
Verso da Obra

OBSERVAÇÃO:
________________________________________________________
________________________________________________________
________________________________________________________

DATA Responsável/cargo

MAC
Saída do MAC ____/____/____ Niterói

MAC
Chegada a ____/____/____ Niterói
Instituição

MAC
Saída da ____/____/____ Niterói
Instituição

MAC
Chegada ao ____/____/____ Niterói
MAC

78
ANEXO 2

Ilmo(a). Sr (a)
Nelson Leiner

Niterói, 13 de fevereiro de 2004


Prezado (a) Sr.(a):

O Museu de Arte Contemporânea de Niterói vem, ao longo destes últimos anos,


implementando o serviço de documentação e catalogação das obras pertencentes
tanto à Coleção João Sattamini quanto à sua própria coleção. Este serviço realizado
pela Divisão de Museologia do MAC, visa não só o registro das obras, mas tem,
dentre outras finalidades, o propósito de reunir as informações as mais acuradas
possíveis acerca de sua, montagem, manutenção e conservação.
Tendo em vista estes fatores, estamos lhe encaminhando este questionário e os
formulários anexos para que nos forneça informações adicionais sobre
procedimentos referentes à sua obra Terra a Vista, doada ao MAC Niterói e as obras
Sem título e Santa Ceia, da Coleção João Sattamini. Pedimos a gentileza de
preencher os itens abaixo e reenvia-los ao MAC.

1. Em caso de avaria e/ou impossibilidade de restauro é permitido trocar um objeto


pertencente a obra por outro semelhante e/ou igual?

_____ SIM _____NÃO

2. Em caso de avaria e/ou impossibilidade de restauro e/ou substituição por


semelhante/igual é permitida e exclusão de um objeto?

_____ SIM _____NÃO

3. Informações adicionais que considere úteis acerca da montagem da obra:


_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

Agradecemos a atenção e reiteramos que as informações fornecidas serão


de importância relevante para o estudo de sua obra.
Márcia Muller
Angélica Pimenta assinatura do artista
DIVISÃO DE MUSEOLOGIA
Ilmo. Sr.
Luiz Guilherme Vergara
Diretor do Museu de Arte Contemporânea/MAC – Niterói
Mirante da Boa Viagem s/nº
Niterói RJ

79
Rio de Janeiro, 27 de setembro de 2005.

Eu, (nome completo) (profissão), (estado civil), RG_____________________, emitido


pelo_________em _____/_____/____, CIC ____________________________ domiciliado
à Rua (endereço completo e telefone), gostaria de fazer a doação da obra de arte de minha
autoria, abaixo relacionada, ao acervo do Museu de Arte Contemporânea da Prefeitura de
Niterói.

1.
Título:
Data:
Técnica:
Dimensões:
Valor para seguro: US$

(acrescentar individualmente as obras a serem doadas)

Conto com o apoio de V.Sa. para que a obra acima descrita seja encaminhada a Comissão de
Aceite e possa fazer parte desta instituição. Desde já, agradeço e me coloco a disposição para
qualquer esclarecimento.

Cordialmente

(assinatura)

80

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