EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA E PENHORA DE BENS PÚBLICOS

PROPOSTA DO INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO PROCESSUAL PARA A

REFORMA DO ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
PETRÔNIO CALMON FILHO
142 Série Cadernos do CEJ, 23
E
xcelentíssimo senhor desem-
bargador Federal Frederico
José Leite Gueiros, presidente
da mesa; excelentíssimo senhor mi-
nistro José Augusto Delgado, do Su-
perior Tribunal de Justiça, senhoras
e senhores.
Em primeiro lugar, gostaria
de agradecer a gentileza do convite
que me foi formulado pelos
organizadores do evento, o Centro de
Estudos Judiciários do Conselho da
Justiça Federal (CJF) e a Universidade
Federal Fluminense (UFF), na pessoa
do querido amigo, professor e Juiz
Ricardo Perlingeiro que tão bem sou-
be organizar este evento que está se
revelando de bastante sucesso e, por
certo, marcante na história deste tema
da execução contra a Fazenda Públi-
ca no Brasil.
Antes de iniciar, gostaria de as-
sociar-me ao ministro José Delgado na
homenagem que Sua Excelência fez
aos nordestinos. Sou baiano e fico fe-
liz em saber que o desembargador
Frederico Gueiros é natural do Recife,
sendo cidadão carioca certamente por
opção emocional, pois aquela cidade
é maravilhosa. Temos, portanto, uma
mesa de nordestinos.
Tenho absoluta certeza de que,
sobretudo depois das palavras do mi-
nistro José Delgado, no sentido de
conclamar a todos para uma luta de
mudança de mentalidade, de coloca-
ção em prática das nossas idéias, pos-
so assegurar que não estarei errado em
já prever que este evento está sendo e
será sempre considerado um marco na
história deste país, porque sairemos
dispostos a buscar para o futuro um
posicionamento diferente, a efetividade
da prestação jurisdicional que todos os
brasileiros tanto estão almejando e
aguardando de seus mandatários, que
modifiquem a prestação jurisdicional
brasileira para que possamos ter, real-
mente, efetividade.
O INSTITUTO BRASILEIRO DE
DIREITO PROCESSUAL E A EVOLUÇÃO
DO DIREITO PROCESSUAL NO BRASIL
O Instituto Brasileiro de Direito
Processual (IBDP) é, na linguagem da
moda, uma organização não-governa-
mental – o que antes se chamava mais
simplesmente de associação de fins ci-
entíficos e culturais. Fundado em 1958,
pelo eminente professor Alfredo
Buzaid, seu primeiro presidente, dele
participaram desde o início renomados
juristas, como os professores paulistas
Luís Eulálio de Bueno Vidigal, José
Frederico Marques, Moacyr Amaral San-
tos, os gaúchos Alcides de Mendonça
Lima e Galeno Lacerda e o mineiro Cel-
so Agrícola Barbi. Alguns já nos deixa-

ram, outros ainda estão nos brindan-
do com os seus conhecimentos, como
é o caso do professor Celso Neves, de
São Paulo. Na época de sua fundação,
os debates sobre o Direito Processual
visavam a aprimorar as categorias fun-
damentais, estabelecendo-se, assim, a
base científica do processo, ocasião em
que se iniciou a segunda fase do Direi-
to Processual no Brasil, a denominada
fase científica, que redundou no proje-
to do próprio Alfredo Buzaid, concluí-
do no início da década de 1960, mas
que esperou que seu autor fosse, mui-
to depois, Ministro da Justiça, para que
tivesse apoio político suficiente para
que o Congresso Nacional aprovasse
o projeto.
O IBDP já nasceu com o objeti-
vo de repensar a ciência do Direito Pro-
cessual e o ordenamento posto no sis-
tema legislativo. Unir ciência e direito
positivo sempre foi um grande desa-
fio. E foi com esse objetivo que, em
1986, operou-se grande renovação,
pois verificou-se que a legislação não
atendia mais ao que reclamava a dou-
trina. Nessa ocasião, os estudos do Di-
reito Processual apontavam para a
efetividade e instrumentalidade do pro-
cesso; para o acesso à justiça, para a
participação no processo. Foi assim que
um dos fundadores do Instituto, o pro-
fessor Celso Neves e a força renovado-
ra de Ada Pellegrini Grinover se junta-
Execução contra a Fazenda Pública 143
ram e promoveram um novo impulso
ao Direito Processual, renovando o Ins-
tituto e ampliando o desafio de reno-
var a legislação. Nessa época foi reali-
zado em São Paulo um importante en-
contro chamado “Participação e Proces-
so” –, percebeu-se que a evolução an-
terior da dogmática e ciência do Pro-
cesso Civil foi muito forte, importante
e positiva, mas os tempos já haviam se
passado e era necessária uma nova di-
nâmica para o Direito Processual. Co-
meçou-se a falar em instrumentalidade
e efetividade do processo, tema tão
bem desenvolvido pelos professores
José Carlos Barbosa Moreira e Cândi-
do Rangel Dinamarco.
Hoje, vivemos uma época em
que consideramos a necessidade de
partir para uma quarta fase do Direito
Processual: já tivemos o nascimento
do Direito Processual no início do sé-
culo, a fase metodológica-científica e
o período instrumental. Agora, estamos
partindo para a concretização de uma
verdadeira reformulação das institui-
ções processuais. Talvez aí, não sei
se interpreto bem, mas, atendendo à
postulação do ministro José Delgado,
precisamos deixar um pouco de lado
até mesmo a terceira fase em que se
“fala” de efetividade e instrumen-
talidade, e partir para a fase em que
possamos, realmente, “praticar ”
efetividade e instrumentalidade.
144 Série Cadernos do CEJ, 23
Em uma das sessões do Supe-
rior Tribunal de Justiça (STJ), de que
participou a Ministra Eliana Calmon, Sua
Excelência dizia, com muita proprieda-
de, que o Direito Processual é compa-
rado a um alicate ou a uma chave de
fenda, servindo apenas como instru-
mento para que se faça alguma coisa.
Essa constatação da ministra Eliana
Calmon, a mesma que acompanha,
desde 1986, os eminentes pro-
cessualistas do IBDP, precisa, agora, ser
colocada em prática. Se concordamos
que o Direito Processual é um instru-
mento, continuaremos a falar, agora, a
mesma coisa? Ou será preciso que um
Thomas Edson invente uma lâmpada
maravilhosa que possa transformar
esse período de conversas e estudos
na efetividade que precisamos adjetivar
como verdadeira, como se precisásse-
mos adjetivar aquilo que já é em si um
conceito forte, mas que, como tantos
outros que encontramos hoje no nos-
so Direito, no exercício da prestação
jurisdicional, nas leis, na Constituição,
já deveria valer pelo seu próprio signi-
ficado, mas que precisa ainda ser
complementado?
AS ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS,
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS
E MUDANÇA DE MENTALIDADE
Começo fazendo uma pequena
comparação de modelos. Estive moran-
do na Itália para estudar Direito Pro-
cessual e o primeiro assunto que pen-
sei em abordar seria vinculação das de-
cisões das cortes superiores – já que
no Brasil se ouvia falar sobre esse as-
sunto em todas as rodas de discussões
jurídicas. Fui com a idéia de saber como
funciona na Europa o mecanismo de
interação entre as cortes superiores e
os juízes de grau inferior. Seria um
mecanismo de obediência, de respei-
to, de obrigatoriedade ou de imposi-
ção? Me pus a buscar as normas a res-
peito, mas para não deixar de realizar
uma pesquisa jurídica tive que mudar
de tema, porque não havia nada a
pesquisar na legislação italiana sobre
vinculação das decisões superiores. Um
juiz italiano segue a orientação da Cor-
te de Cassação porque segue; segue
uma decisão (que possui caráter
incidenter tantum) da Corte Constitu-
cional porque espontaneamente resol-
ve seguir. Assim como o professor Karl-
Peter Sommermann nos falava há pou-
cos dias, que, no Direito alemão, a Fa-
zenda Pública paga as dívidas oriun-
das de decisões judiciais porque tem
que pagar. Não há precatório. Em dé-
cadas, na Alemanha, só houve cinco
casos de penhora.
A concepção que aprendi de
norma jurídica, me levou a pensar que
o simples temor da sanção seria sufici-
ente para a obediência espontânea da

norma, mas no Brasil temos que estar
criando leis para obrigar as pessoas a
cumprirem a lei. Se formos pensar um
pouco, já que estamos falando de pro-
posta legislativa, comecemos com essa
reflexão, com essa autocrítica que faço
das atividades do IBDP em tantas mu-
danças legislativas, muitas delas para
obrigar o juiz, a Fazenda ou o advoga-
do a cumprir a lei. Temos uma lei que
dispõe sobre o que tem de ser feito;
outra para dizer “cumpra-se a lei ante-
rior”; outra para dizer que, se não cum-
prir, é crime; outra para dizer que, em
decorrência desse crime há outra con-
seqüência (porque muitas vezes o cri-
me não é apurado ou a pena é alterna-
tiva) e assim por diante.
A primeira reflexão que faço,
não obstante o tema específico de hoje,
é a de que tenhamos a convicção de
que alguma mudança legislativa preci-
sa ser feita, mas cuidado com ela. Aon-
de vamos parar por estar sempre mu-
dando a lei, com o objetivo de fazer
simplesmente com que a lei anterior
seja obedecida?
Um exemplo interessante: Te-
mos, hoje, na Constituição Federal uma
norma que deixa os juízes perplexos,
sobretudo os presidentes dos tribunais.
Eles podem ser responsabilizados cri-
minalmente se não atenderem à ordem
dos precatórios, mas não existe norma
Execução contra a Fazenda Pública 145
semelhante dirigida àqueles que devem
cumprir esses mesmos precatórios. O
presidente do Tribunal tem que ficar
atento para saber se há algum equívo-
co. Como o volume de trabalho é mui-
to grande, tem de confiar em assesso-
res, mas a responsabilidade criminal é
dele. Esse é o primeiro alerta.
É verdade que faço uma
autocrítica, porque no IBDP não temos
feito outra coisa a não ser propostas
de leis. Começamos por aquelas que
os senhores conhecem, que é a cha-
mada Reforma Processual Civil de
1994/1995, que o IBDP realizou em
conjunto com a Escola Nacional da Ma-
gistratura. Temos trabalhado também,
como trabalhamos alguns anos antes,
com a Lei da Ação Civil Pública, com o
Código de Defesa do Consumidor e
outros institutos legislativos que estão
em vigor, mas, sobretudo, a marca dos
últimos anos tem sido a reforma dos
códigos de processo.
Atualmente, estamos trabalhan-
do com três projetos de lei elaborados
e encaminhados pelo Instituto ao Con-
gresso Nacional. Para os senhores te-
rem uma idéia, há um decreto do Pre-
sidente da República, determinando
que todas as comissões, a maioria no-
meada no Ministério da Justiça para a
reforma legislativa tenham que ter um
advogado da União como seu integran-
146 Série Cadernos do CEJ, 23
te, sendo que um decreto anterior di-
zia que nenhum projeto ou estudo po-
deria ser feito em qualquer um dos
ministérios sem que fosse verificado,
de início, o atendimento aos interesses
da Fazenda Pública; decreto, também,
do Presidente da República, que só fal-
ta dizer: “Só legislaremos em causa
própria”.
Tive a oportunidade de dizer, há
poucos dias, em reunião com o minis-
tro Pedro Parente e sua assessoria:
Vocês estão sendo excelentes auxilia-
res do Chefe de Governo. O Chefe de
Estado, no entanto, está precisando de
assessores, porque, agindo na defesa
de curtíssimo prazo dos interesses do
Governo, deixam, às vezes, de atender
aos interesses do Estado e que não
necessariamente são coincidentes.
É essa a realidade política em
que vivemos hoje. Falarmos sobre mo-
dificações de leis, sem atentarmos para
a realidade política, é fazer um dis-
curso utópico. Temos que pensar si-
tuação atual e respondermos à minha
primeira reflexão: é necessário que
haja, agora, uma alteração legislativa?
Qual mudança deve ser feita? Deve-
mos pensar também se é politicamente
adequado assumir uma responsabili-
dade que não é nossa. A pergunta é:
Por que os credores da Fazenda Pú-
blica não estão exercendo a pressão
política (que sabem exercer em ou-
tras situações) para obter do Congresso
Nacional e da própria administração
pública uma reação positiva à situa-
ção da Fazenda devedora, da Fazen-
da com sentença transitada em julga-
do? Onde estão esses empresários cre-
dores que já demonstraram o quanto
sabem fazer lobby na hora do orça-
mento e não estão se movimentando
com relação a este tema?
Concordo, mais uma vez, com o
ministro José Delgado, quando diz que
falta no país que as associações – tenho
certeza de que Sua Excelência, ao se re-
ferir à Associação dos Magistrados e à
OAB, não está estendendo essa crítica a
outras que não estão aqui ouvindo,
mas eu a estenderia – e outros segmen-
tos da sociedade também se mobilizem
para uma efetividade da jurisdição no
que diz respeito à chamada execução
contra a Fazenda Pública.
O IBDP E
AS REFORMAS LEGISLATIVAS
Por nomeação do então minis-
tro José Carlos Dias e, depois, nas pror-
rogações, pelo atual ministro José
Gregori, o IBDP também está promo-
vendo estudos para a reforma do Có-
digo de Processo Penal. Estão sendo
apresentados ao governo diversos an-
teprojetos de lei que irão promover evo-

lução e eficácia da justiça penal. A res-
peito dos meios alternativos de solu-
ção dos conflitos civis, há duas sema-
nas, foi realizado um grande debate em
São Paulo sobre a mediação obrigató-
ria no processo civil. No campo do Di-
reito Processual Civil, foram apresen-
tados três projetos de lei: os Projetos
de Lei nos 3.474, 3.475 e 3.476. Passa-
da a eleição municipal – o chamado re-
cesso branco –, teremos a primeira reu-
nião com o relator na próxima sema-
na. Por sinal, foi este o motivo da men-
cionada reunião com o Chefe da Casa
Civil. Porque, nesse quadro político,
quando o relator de um projeto de lei
é do grupo que apóia o governo, o pro-
jeto somente é examinado depois da
orientação da Casa Civil. Quando o
relator é da oposição, acontece o con-
trário: a Casa Civil vigia os passos se-
guintes, mas não aquele inicial. Tudo
isso é importante, porque, se pensa-
mos em reforma legislativa, temos de
saber como as coisas acontecem.
Reafirmo a minha concordân-
cia a respeito do movimento das as-
sociações. Lembro-me bem, ministro
José Delgado, de que, durante a As-
sembléia Nacional Constituinte, a nossa
Associação do Ministério Público se
reuniu para formar comissões para
fazer o trabalho de lobby no Congresso
Nacional a respeito dos postulados do
Ministério Público. Fui uma voz discor-
Execução contra a Fazenda Pública 147
dante, até fiquei antipatizado, porque
cobrei: “Onde está a comissão que tra-
tará do direito do menor? A comissão
que tratará do sistema penal?” As nos-
sas associações estão no Congresso
Nacional todos os dias; sabem tudo a
respeito da questão remuneratória, da
lei da mordaça, da aposentadoria, das
garantias que estão querendo retirar,
sobretudo do Ministério Público, e,
quando muito, da questão da súmula
vinculante. Ou seja, em toda essa ques-
tão pessoal e funcional, as associa-
ções funcionam muito bem. Mas as
associações precisam lutar, também,
pelos temas jurídicos não relaciona-
dos às carreiras jurídicas; têm que
cuidar deste, da execução contra a
Fazenda Pública, do contrário, gran-
de parte do serviço judiciário estará
desmoralizado.
A REFORMA CONSTITUCIONAL
DO PODER JUDICIÁRIO
A reforma do Poder Judiciário
começou em 1992, com a proposta do
então deputado Hélio Bicudo, vice-pre-
feito eleito de São Paulo, que apresen-
tou a Proposta de Emenda Constituci-
onal (PEC) nº 96 que, por questão re-
gimental, foi arquivada. O regimento
prevê algumas possibilidades de arqui-
vamento, sobretudo, quando não há in-
teresse político na continuidade do exa-
me de alguma proposição legislativa.
148 Série Cadernos do CEJ, 23
Todos lembramos que, quando surgiu
no Senado Federal a idéia da Comis-
são Parlamentar de Inquérito (CPI) do
Poder Judiciário, formaram-se duas
correntes no Congresso: uma partidá-
ria da CPI; e outra que entendia que o
Congresso deveria estar atuando não
para buscar apurações a respeito de
ações individuais de membros do Po-
der Judiciário, mas, sobretudo, para
promover uma reforma constitucional
significativa que pudesse abalar as es-
truturas arcaicas que temos hoje e pro-
mover a verdadeira reforma do Poder
Judiciário.
Então, o deputado Michel Te-
mer, Presidente da Câmara dos Depu-
tados, em um jogo de forças com o
então Presidente do Senado Federal,
Senador Antônio Carlos Magalhães, por
um simples despacho, desarquivou a
PEC nº 96 e constituiu uma Comissão
Especial, prevista no Regimento da Câ-
mara dos Deputados, para análise da
proposta de emenda constitucional, re-
tomando-se o debate a respeito da re-
forma do Poder Judiciário. Obteve
apoio, inclusive do Poder Judiciário,
exatamente como uma espécie de
contraposição à CPI.
Faço-lhes uma pergunta: seria
essa a maneira mais genuína e politi-
camente legítima de se começar um de-
bate a respeito da reforma do Poder
Judiciário? Hoje, quando encontramos
essa reforma um pouco capenga, ca-
minhando devagar, para rumos não
genuínos e não genuinamente propos-
tos no início, podemos identificar as
condições adversas nessa origem es-
tranha. Que vontade política havia, na
época, para se promover a reforma do
Poder Judiciário? Qual seria essa von-
tade política? Se houvesse vontade
política, ela continuaria existindo até
hoje. Foi criada uma Comissão, e
i n i c i a d o u m t r a b a l h o, m a s , e m
contraposição a um trabalho do Se-
nado Federal que visava a punição,
desarquiva-se, assim, rapidamente,
uma proposta. O deputado Aloysio
Nunes Ferreira é nomeado relator e
apresenta seu célebre relatório, que fi-
cará na história, sobretudo para os
juízes do trabalho, porque pretendia
extinguir a Justiça do Trabalho, levan-
do seus dezessete ministros para o
Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para
sorte de alguns (ou de muitos), o relator
foi convidado a exercer o cargo de Se-
cretário-Geral da Presidência da Repú-
blica, e a deputada Zulaiê Cobra ocu-
pou o seu lugar na relatoria. Valendo-
se de prerrogativa regimental, apresen-
ta novo relatório. Aliás, isso já é passa-
do, mas, para quem acompanhou à
época, talvez não tenha percebido os
equívocos, até de jornais, a respeito
das proposições da deputada, por-
que na realidade ela apresentou três

relatórios. Quem não estava atento não
viu que ela apresentou um segundo re-
latório uma semana após apresentar o
primeiro, e, dias depois, apresentou
um terceiro. Então, temos três
substitutivos da deputada Zulaiê Cobra;
até o segundo há previsão regimental,
mas o terceiro só tem previsão na polí-
tica. Ela fez aquilo que achava que de-
veria fazer e obteve o apoio e o silên-
cio necessários.
Esse projeto foi votado pela
Comissão Especial e muitas emen-
das foram apresentadas, muitas de-
las, aprovadas – estou suprimindo
uma etapa. Depois disso, foi a Ple-
nário e, novamente, muitas emen-
das foram apresentadas e aprova-
das. Então, o que temos hoje, que
está no Senado Federal, é um pro-
jeto de emenda constitucional bas-
tante diferente do original da depu-
tada Zulaiê Cobra, que é diferente
do relatório do deputado Aloysio
Nunes e que é diferente do projeto
do deputado Jairo Carneiro, que
presidia essa comissão na Câmara,
mas foi o primeiro relator, quando
o deputado Hélio Bicudo apresen-
tou a proposta, em 1992.
E o que temos, hoje, no Sena-
do Federal, a respeito do artigo 100 da
Constituição Federal? Nada!
Execução contra a Fazenda Pública 149
A proposta do deputado
Aloysio Nunes Ferreira a esse respeito
foi modificada pela deputada Zulaiê
Cobra, que foi modificada pela co-
missão, e o Plenário a retirou. En-
tão, retirando-a, prevalece a Consti-
tuição atual. Porém, nesse meio tem-
po, caminhou mais rápido, por fora,
a Emenda Constitucional nº 30, já
aprovada. Temos, hoje, a pérola mais
brilhante da legislação brasileira dos
últimos tempos, acertadamente co-
mentada pelo desem-bargador
Gueiros, que mostra o quão distan-
te da realidade social e constitucio-
nal, como disse o ministro José Del-
gado, estão os parlamentares no mo-
mento em que promulgam uma
emenda constitucional dessa impor-
tância. Apesar de eu ser muito naci-
onalista – temos, hoje, em relação à
execução contra a Fazenda Pública,
no Brasil, uma disposição constitu-
cional que nos envergonha.
A PROPOSTA DO IBDP
Qual foi, então, a nossa propos-
ta? Há uma peculiaridade, porque a
deputada Zulaiê Cobra – amiga da pro-
fessora Ada Pelegrini Grinover, que pre-
side o Conselho do IBDP e que presi-
diu a comissão do IBDP, da qual fiz par-
te junto com os professores Sidnei
Beneti e Kazuo Watanabe, para as pro-
150 Série Cadernos do CEJ, 23
postas relacionadas à PEC do Poder Ju-
diciário – procurou a professora Ada e
trabalharam juntas nas idéias apresen-
tadas. Posso lhes adiantar que o traba-
lho técnico realizado em conjunto com
a relatora foi por ela deixado de lado
em razão das conjunturas políticas que,
naturalmente, haveriam de prevalecer.
A nossa primeira proposta ha-
via sido no sentido de tratar apenas
dos créditos de natureza alimentícia.
Cuidava, em primeiro lugar, que to-
dos os créditos de natureza alimentí-
cia seriam excluídos da técnica dos
precatórios, observando-se a ordem
das intimações e possibilitada a pe-
nhora dos bens patrimoniais, não afe-
tadas as atividades estatais, como já
ocorre em vários países.
Fizemos também uma propos-
ta que, em relação a esses mesmos cré-
ditos, a entidade pagadora deveria con-
signar dotação orçamentária específi-
ca, mas vejam a distinção do atual sis-
tema. Nossa proposta é que a previsão
orçamentária seja anterior à formação
do título judicial, ou seja, ao transitar
em julgado a sentença condenatória,
o pagamento seria imediato, em face
da previsão orçamentária genérica ope-
rada no exercício anterior.
Essa é uma resposta à crítica
que se faz quando pretendemos excluir
os precatórios, pois a primeira crítica
que se ouve é a de que não se pode
pagar sem previsão orçamentária, o
que legitimaria a técnica dos
precatórios.
Fizemos, então, uma segunda
proposta, dizendo que, em relação a
esses créditos alimentares, a entida-
de pagadora deveria consignar dota-
ção orçamentária suficiente ao seu
pronto pagamento, que não poderá
ser inferior ao montante dos créditos
para satisfação dos precatórios refe-
rentes ao mesmo exercício. Explico: se
promulgada, hoje, a Emenda Consti-
tucional, surge a obrigação que se in-
clua no orçamento do ano seguinte,
como norma transitória, o pagamen-
to dos precatórios já expedidos de igual
valor, portanto, valor dobrado, como
previsão para o pagamento do ano pos-
terior. E, retirada essa transição, para
o orçamento de 2002, teremos que
consignar o dobro para poder recu-
perar. Então, pagaremos todos os
precatórios de 2001 e, em 2002, já
não teremos mais precatórios, e, sim,
uma dotação suficiente. Depois, há que
ser feito um estudo do crescimento
vegetativo dessa importância para sa-
ber que não é prever apenas o que
foi pago no exercício anterior, mas
buscar uma média dos últimos cinco
anos, fazendo-se, assim, uma previ-
são com aquele determinado cresci-

mento. E, a partir de 2002, extintos
os precatórios para as dívidas alimen-
tares, os orçamentos estariam, na ver-
dade, recuperando um ano, contanto
que esse dispositivo seja cumprido.
Todavia, anteriormente, a nos-
sa proposta era no sentido de facultar
a penhora dos bens patrimoniais. E o
fizemos da seguinte forma:
1 - A Lei estabelecerá as hipó-
teses de penhora dos bens, não afeta-
dos às atividades estatais, a ser decre-
tada em processo de execução, tam-
bém prevendo a compensação de dé-
bitos do credor.
2 - O presidente do Tribunal
competente deverá, vencido o prazo,
ou em caso de omissão no orçamento,
de preterição ao direito de precedên-
cia ou de descumprimento das obriga-
ções assumidas, requisitar ou determi-
nar o seqüestro de verba de qualquer
dotação da entidade executada, sufici-
ente à satisfação do débito.
Fizemos essa proposta que ti-
nha (e ainda tem, pois continuamos a
lutar por ela) o escopo básico de aten-
der à perplexidade que a sociedade
brasileira vive em face de um dispositi-
vo, que é constitucional, mas, antes de
sê-lo, parece-me intrínseco à socieda-
de humana, que é o princípio da
efetividade do exercício jurisdicional. A
função do juiz não é emitir um coman-
Execução contra a Fazenda Pública 151
do que possa ser considerado uma
obra de arte, presa à parede e admira-
da por todos, mas, sobretudo, um co-
mando que terá um efeito prático e que
possa dar ao credor a satisfação exata
do seu direito, tanto no aspecto quan-
titativo como temporal; que essa não
seja, como o ministro José Delgado dis-
se aqui, vinte, trinta anos depois, en-
quanto o cidadão está morando em-
baixo da ponte.
Pensamos, também, em ter um
dispositivo claro que pudesse demons-
trar que, a partir dali, a administração
pública, ainda querendo protelar, não
estaria mais como um ente superior
aos outros, imune às ações do Poder
Judiciário, para a efetivação da tutela
concedida.
Esse era o escopo da proposta.
É, ainda, o nosso norte e é nisso que
pretendemos caminhar, buscar uma
reformulação, retirando esses dispositi-
vos esdrúxulos que, agora, estão sendo
acrescentados à nossa Constituição,
para buscarmos um dispositivo efetivo.
OS BENS PÚBLICOS PATRIMONIAIS
A fonte de nosso pensamento
reside, por um pouco, na compara-
ção de modelos e na concepção
tripartida dos bens públicos, de acor-
do com o Código Civil. Temos um claro
152 Série Cadernos do CEJ, 23
dispositivo de classificação dos bens
públicos, que estabelece uma faixa
de bens meramente patrimoniais. Es-
ses bens não estão de forma alguma
vinculados com a função pública, muito
pelo contrário; vinculam-se com o sis-
tema político que adota maior interfe-
rência do Estado na economia ou até
com a distorção do Estado, que se diz
liberal, mas, na prática, detém ainda
uma parcela grande de patrimônio e
não o disponibiliza para pagar os seus
débitos. Não podemos deixar de aten-
tar à realidade.
Disse há pouco a um dos cole-
gas aqui presentes, que buscaria em
Fernando Henrique Cardoso, em Pedro
Malan, em Pedro Parente e no FMI a ar-
gumentação favorável a essa nossa pro-
posta. Ao final de 1994, tive a oportu-
nidade de assistir “ao vivo” e o cuidado
de examinar, há poucos dias, o vídeo
do discurso de despedida do então se-
nador Fernando Henrique Cardoso do
Senado Federal. Na ocasião, Sua Exce-
lência fez uma confissão, ou, como di-
ria, até mais que uma confissão, um
verdadeiro reconhecimento da sua in-
capacidade de governar o País, caso a
Constituição não fosse alterada. O pre-
sidente eleito fez um apelo aos sena-
dores: “Não fui eleito para governar o
País com a Constituição atual; fui eleito
com a proposta de modificá-la. Somen-
te saberei governar o País com a mu-
dança constitucional”. Tudo que ele
quis, ele obteve, toda a reforma cons-
titucional que entendeu necessária ele
realizou, sobretudo as que tiveram
como escopo a privatização dos bens
públicos meramente patrimoniais.
Ora, isso é ou não uma confis-
são de que o Brasil possuía e ainda
possui bens disponíveis em abundân-
cia, que não estão vinculados ao servi-
ço público, que não estão vinculados à
finalidade do Estado e que podem
muito bem ser expropriados e aliena-
dos para o pagamento das suas dívi-
das? Aliás, senhores juízes e senhores
credores da Fazenda Pública, que tal
requerer, segunda-feira, a penhora de
R$7,1 bilhões, oriundos da venda do
Banespa, que serão depositados na
conta do Tesouro e que serão utiliza-
dos para o pagamento da dívida públi-
ca com os credores estrangeiros? Tal-
vez até com os credores brasileiros da
dívida pública (da administração), mas,
com certeza, não os da dívida oriunda
das demandas judiciais. Se eu fosse
credor, pediria a penhora desse bem
na segunda-feira, pois na terça já não
estará mais aqui.
Querem prova maior de que
este é um bem disponível, pois, afinal
de contas, foi o próprio Estado que dis-
se: “Devemos vender o Banespa. Não
é bom para o Brasil ter esse banco; esse

dinheiro está sobrando”. Recentemen-
te, o ex-ministro Mário Henrique
Simonsen foi lembrado, quando foi dito
que usar o dinheiro da venda das esta-
tais para a atividade social do Estado é
o mesmo que liberar a hipoteca da casa
sem pagamento da dívida, e, ao ven-
der a casa, viajar de férias com a famí-
lia para o exterior. Essa foi a declara-
ção de Mário Henrique Simonsen, re-
petida pelo ministro Pedro Malan no
“Bom Dia Brasil” e, também, pelo ex-
ministro Maílson da Nóbrega. Então,
não podemos dissociar a Política do Di-
reito. É evidente que o direito tem a
sua finalidade e o seu espaço. Quantas
vezes houve distorções no sentido de
buscar na Justiça solução para proble-
mas políticos e buscar na política solu-
ção para questões jurídicas, mas Direi-
to e Política são instrumentos de uma
mesma sociedade. Quando faço uma
referência um pouco jocosa, um pou-
co crítica, talvez até agressiva, aos nos-
sos mandatários do Poder Executivo, é
exatamente porque creio que estamos
falando do mesmo fenômeno.
Falamos de um Estado liberal,
que pretende vender seu patrimônio
para pagar dívidas e, nós, do Poder
Judiciário, não tomamos a iniciativa de
tomar esse mesmo patrimônio para
pagar dívida. Disse que poderia colo-
car na fundamentação da sentença di-
Execução contra a Fazenda Pública 153
versas palavras já repetidas pelo Presi-
dente da República e pelo Ministro da
Fazenda, de que o Brasil tem
patrimônio disponível e precisa desfa-
zer-se desse patrimônio para pagar as
suas dívidas.
EXECUÇÃO CONTRA
A FAZENDA PÚBLICA
Podemos constatar que a base
de toda essa argumentação está na
afirmação de que o Brasil não tem exe-
cução contra a Fazenda Pública; lem-
bro-me, dentre outros tantos trabalhos,
daquele do professor Juvêncio Vascon-
celos Viana, que se encontra aqui pre-
sente, que publicou uma excelente
obra: Execução contra a Fazenda Pú-
blica, confrontando-a com a teoria do
processo de execução. O autor, de-
monstra, ao final, o que chamamos
de execução contra a Fazenda Públi-
ca, na página 64 de sua obra: “a téc-
nica prevista no artigo 100 da Consti-
tuição Federal, com a previsão do pa-
gamento do sistema de precatório, não
consiste, não-obstante autorizadas vo-
zes em contrário, em uma execução
forçada contra o poder público”. Es-
sas suas palavras, que são também
de outros brilhantes doutrinadores, for-
ma a base da nossa proposta, ou seja,
precisamos criar no Brasil a execução
contra a Fazenda Pública.
154 Série Cadernos do CEJ, 23
Podemos dizer, sem nenhuma
crítica aos organizadores deste encon-
tro, que estamos organizando um even-
to sobre algo que não existe; a execu-
ção da Fazenda Pública. Ou então dire-
mos que o evento postula pela sua
existência. Então o evento deixaria de
ser denominado Curso de Extensão
“Execução contra a Fazenda Pública”,
para se chamar “Por uma Execução con-
tra a Fazenda Pública”. Também nos
lembremos das lições do professor
Vicente Greco Filho, que estará aqui
conosco, um dos pioneiros na tratativa
do tema da Execução contra a Fazen-
da Pùblica e, nesse roteiro, cuja cópia
deixei com os senhores, podemos ver
sua proposta, apresentada na Assem-
bléia Nacional Constituinte, exatamen-
te no mesmo sentido, que determina
não somente a penhora dos bens,
mas, sobretudo, a penhora das verbas
públicas, penhora de dinheiro, como
diz o Código de Processo Civil (CPC), já
mencionado pelo ministro e pelos
palestrantes estrangeiros de ontem. Na
Espanha, a Corte constitucional enten-
de que é possível a penhora dos bens
patrimoniais, mas não entende possí-
vel a penhora do dinheiro.
Por último deixo registrado que
a Comissão do IBDP teve como fonte
primária de sua proposição a obra do
professor Ricardo Perlingeiro, que bri-
lhantemente conclui: “...desta manei-
ra, de lege ferenda, cabível no Direito
brasileiro a execução forçada contra
a Fazenda Pública, responsabilizando
seu patrimônio por meio de penhora
ou outro meio de constrição judicial
sobre os bens dominiais a serem de-
fendidos em lei. É até mesmo de du-
vidosa constitucionalidade o preceito
legal que torna impenhoráveis os bens
públicos de uso não essencial do Es-
tado, privilégio absolutamente inócuo
que limita a atuação jurisdicional do
Poder Judiciário”. (página 226 da obra
Execução contra a Fazenda Pública,
Ed. Malheiros).
Foi inspirado nesse texto que
resolvemos apresentar esta proposição.
Entendemos que há maturidade sufici-
ente para caminharmos rapidamente
para esse objetivo, e refiro-me à matu-
ridade, porque, sabe-se muito bem
(permitam-me estar conversando entre
amigos) que uma porta aberta de uma
prisão pode ocasionar uma reação des-
proporcional no sentido contrário. E
como tenho certeza de que dentro de
pouco tempo teremos a penhora con-
tra a Fazenda Pública, teremos, portan-
to, a execução contra a Fazenda Públi-
ca. A alteração proposta, no entanto,
não deve dar azo a que se promova a
penhora desmedida de todo e qualquer
bem público dominial, sem que antes
se conheça a verdadeira situação finan-
ceira da Fazenda Pública. Antes mes-

mo de qualquer inovação legislativa é
importante conclamar a que se tenha,
no futuro, maturidade e prudência, para
que o novel instituto não seja alvo de
críticas fundadas apenas no mau uso
que dele se possa fazer.
Gostaria de acrescentar apenas
uma crítica ao trabalho do Dr. Ricardo,
na parte em que diz: “até mesmo de
duvidosa constitucionalidade o precei-
to legal, que tornam impenhoráveis os
bens públicos, de uso não essencial ao
Estado”. De duas, uma: ou a impe-
nhorabilidade é constitucional ou não.
Fica, então, para a segunda etapa de
sua obra tratar da legitimidade consti-
tucional de forma conclusiva, para que
possamos contar com sua colaboração
também nesse tema.
Mas será se precisamos real-
mente alterar a Constituição Federal?
OS CRÉDITOS DE
NATUREZA ALIMENTÍCIA
Não consegui até hoje aceitar o
posicionamento do STF, quando não
afirmou a exclusão dos créditos alimen-
tares do sistema de precatórios. Tenho
esperança de que esse entendimento
ainda possa ser modificado, pois não
consigo chegar a outra conclusão se-
não a de que não foi o objetivo do cons-
Execução contra a Fazenda Pública 155
tituinte instituir outra fila de credores.
Como outra fila? Espera-se o último
crédito alimentar para começar a pa-
gar o primeiro precatório? Escolhe-se
cinco de cá e um de lá? É como fila de
idoso em banco? Como funciona isso?
Realmente, não sei como está funcio-
nando, até porque temos 5 mil e tan-
tos municípios, 27 unidades da Fede-
ração (estados e Distrito Federal). Pode-
se argumentar como queira, mas ou-
tra fila para créditos alimentares não
me parece ser, de forma alguma, a in-
tenção do legislador constitucional.
A EMENDA CONSTITUCIONAL NO 30
Agora, vejam bem, o que diz a
Emenda Constitucional nº 30, que traz,
como já comentei, a terrível inclusão
dos precatórios no orçamento do exer-
cício seguinte e, ainda, institui crime
para juiz. Isso quer dizer que o coman-
do de obrigatoriedade se dirige ao ad-
ministrador público, mas o crime pelo
seu descumprimento ao juiz.
“Artigo 100 – À exceção dos créditos de
natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela
Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em vir-
tude de sentença judiciária, far-se-ão exclusiva-
mente na ordem cronológica de apresentação dos
precatórios e à conta dos créditos respectivos,
proibida a designação de casos ou de pessoas
nas dotações orçamentárias e nos créditos adi-
cionais abertos para este fim.
156 Série Cadernos do CEJ, 23
§ 1º – É obrigatória a inclusão, no orça-
mento das entidades de Direito Público, de verba
necessária ao pagamento de seus débitos oriun-
dos de sentenças transitadas em julgado, cons-
tantes de precatórios judiciários, apresentados até
1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final
do exercício seguinte, quando terão seus valores
atualizados monetariamente.(NR) (redação dada
pela Emenda Constitucional nº 30, de 13/09/00).
§ 1º – Os débitos de natureza alimentí-
cia compreendem aqueles decorrentes de salá-
rios, vencimentos, proventos, pensões e suas
complementações, benefícios previdenciários e
indenizações por morte ou invalidez, fundadas
na responsabilidade civil, em virtude de senten-
ça transitada em julgado. (AC) (parágrafo incluído
pela Emenda Constitucional nº 30, de 13/09/00).
§ 2º – As dotações orçamentárias e os
créditos abertos serão consignados diretamente
ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do
Tribunal que proferir a decisão exeqüenda deter-
minar o pagamento segundo as possibilidades
do depósito, e autorizar, a requerimento do cre-
dor, e exclusivamente para o caso de preterimento
de seu direito de precedência, o seqüestro da
quantia necessária à satisfação do débito. (reda-
ção dada pela Emenda Constitucional nº 30, de
13/09/00).
§ 3º – O disposto no caput deste artigo,
relativamente à expedição de precatórios, não se
aplica aos pagamentos de obrigações definidas
em lei como de pequeno valor que a Fazenda
Federal, Estadual, Distrital ou Municipal deva fa-
zer em virtude de sentença judicial transitada em
julgado. (NR) (redação dada pela Emenda Cons-
titucional nº 30, de 13/09/00).
§ 4º – A lei poderá fixar valores distintos
para o fim previsto no § 3º deste artigo, segundo
as diferentes capacidades das entidades de direito
público. (AC) (parágrafo incluído pela Emenda
Constitucional nº 30, de 13/09/00).
§ 5º O presidente do Tribunal compe-
tente que, por ato comissivo ou omissivo, retar-
dar ou tentar frustrar a liquidação regular de
precatório incorrerá em crime de responsabili-
dade. (AC) (parágrafo incluído pela Emenda
Constitucional nº 30, de 13/09/00).
A POSSIBILIDADE DE PENHORA
DO BEM PÚBLICO DOMINICAL
O novo § 3º do artigo 100 diz:
“O disposto no caput deste artigo,
relativamente à expedição de pre-
catórios, não se aplica...”. Não que-
ro me estender em interpretação.
Como disse, o professor Ricardo es-
creverá sobre a matéria e leremos
depois. Mas, quando o § 3º diz: “o
disposto no caput deste artigo, rela-
tivamente à expedição de precatórios”,
está mostrando exatamente que o
caput deste artigo não trata somen-
te da expedição de precatórios, mas
de alguma outra coisa, porque o §
3º diz: “a parte que trata de pre-
catórios”. Então o caput está tratan-
do de alguma outra coisa que não
sabemos o que é, e, no meu ponto
de vista, quando diz: “à exceção dos
créditos de natureza alimentícia, os
pagamentos devidos à Fazenda Pú-

blica”, é porque o caput do artigo
está tratando de duas coisas: dos cré-
ditos de natureza alimentícia, que
nada têm a ver com precatório, e,
dos precatórios.
Não acompanhei a fundamen-
tação do STF nos vários casos em
que já se enfrentou a matéria e,
tampouco, talvez me dedique a fa-
zer essa análise. Posiciono-me como
observador, mas não consigo admi-
tir essa construção e não entendo,
também, por que tantas vezes o STF
enfrenta o governo, mas não o faz
em relação aos precatórios de natu-
reza alimentícia.
O único mandamento brasi-
leiro sobre a impenhorabilidade do
bem público é o CPC, pois a Consti-
tuição do tema não trata. Temos que
interpretar à luz da Constituição Fe-
deral os artigos 67 do Código Civil e
o artigo 649, inciso II do CPC no que
dizem respeito à impenhorabilidade
dos bens públicos patrimoniais. Em
uma interpretação, conforme a Cons-
tituição atual, ficariam impenhoráveis
apenas os bens públicos de uso co-
mum do povo e de uso especial, e,
pelo menos para os créditos de na-
tureza alimentar, não tenho absolu-
tamente nenhuma dúvida dessa afir-
mação.
Execução contra a Fazenda Pública 157
CONCLUSÃO
Para concluir, representando o
IBDP, gostaria de dizer que estamos
muito preocupados, porque realiza-
mos uma obra que considero impor-
tante, embora sempre sujeita a mui-
tas críticas, a reforma do Código de
Processo Civil, que marcou muito o
Brasil. É claro que é impossível con-
cordar com todas as disposições da
reforma. A Lei nº 9.756 tem dado
muito trabalho ao STJ. Mostrei e di-
vulguei o projeto para muitas pes-
soas que não o conheciam – esse
projeto não é do Instituto, foi elabo-
rado pelo STJ e modificado, depois,
em um substitutivo do relator. O Pre-
sidente da Associação dos Advoga-
dos de São Paulo publicou um arti-
go, intitulado: “Advogados, os últimos
a saber”, e, quando mostrei esse ar-
tigo a dois ministros do Supremo,
eles disseram: “Avisa para o José
Rogério que os advogados são os pe-
núltimos, porque os últimos somos
nós”. Então, mostramos para outros,
e eles disseram: “Não, os últimos so-
mos nós”. Na verdade, todos têm ra-
zão, porque não está havendo deba-
te prévio político.
Agora, façamos também uma
outra crítica: muitos não querem par-
ticipar. Se fizermos um evento ape-
158 Série Cadernos do CEJ, 23
nas para discutir propostas de refor-
mas legislativas, não sei se teríamos
um número tão grande de pessoas,
pois a nossa atividade do dia-a-dia é
tão intensa e dramática que precisa-
mos nos alimentar daquilo que preci-
samos para exercitar, hoje, na nossa
experiência profissional. O nosso tempo
é escasso para participação em deba-
tes sobre proposições legislativas, por
isso, penso eu, não teria tanto suces-
so. Agora, se fazemos essa crítica e
muitos não querem participar das re-
formas, até mesmo para depois bater
à vontade, também fazemos uma
autocrítica, e a colocamos em primei-
ro lugar: Nós, do IBDP, fizemos a re-
forma do Código de Processo Civil sem
um debate com todos os partícipes e
operadores do Direito.
Então, tentando corrigir as fa-
lhas passadas, é que realizamos am-
plos debates com a reforma do Códi-
go de Processo Penal e com o ante-
projeto que institui a “mediação” no
processo civil. Temos de mudar, mas
devemos ter cautela na mudança. Em
primeiro lugar, a nossa simples pro-
posta vai de encontro à nossa inter-
pretação constitucional de que a
Constituição de hoje já garante a pe-
nhora dos bens patrimoniais para os
créditos alimentares. Temos que ter
cuidado, porque não basta propor,
temos de aprovar a lei. Temos de
aprovar a emenda constitucional. Te-
mos que ter cuidado, porque tudo
isso faz parte de um jogo político, que
está difícil, em virtude do poder que
hoje tem a Advocacia-Geral da União.
Nas próprias palavras do atual
subchefe do Gabinete Civil, houve
“um deslocamento de poder”. Tem-
pos antes, quando o Ministério Públi-
co fazia a defesa da União, detinha
um poder maior na administração
pública. Há um poder grande na
interligação entre sociedade e Judici-
ário, mas os espaços jurídicos da ad-
ministração pública foram ocupados
pelos advogados da União, sobretu-
do agora que há um quadro
consolidado.
Temos uma questão muito im-
portante também a ser vista: Para pen-
sar os problemas de toda a legislação
brasileira, sobre quase todos os as-
suntos, sobretudo os temas jurídicos,
o Poder Executivo dispõe, no Ministé-
rio da Justiça da Secretaria de Assun-
tos Legislativos, que conta com a Dra.
Ivete Lund Viegas como titular, à sua
frente há mais de vinte anos, fazendo
um trabalho espetacular, duas direto-
ras de departamento, que são direto-
ras delas próprias e mais nada. Aca-
ba aí a equipe técnica do Ministério
da Justiça e, por isso, ela se vale das
 Execução contra a Fazenda Pública 159

diversas comissões para as reformas

legislativas. Então, qual é o corpo ju-
rídico permanente hoje do Estado? Não
há. Temos, então, que fazer essa re-
flexão e caminhar adiante, envolver as
associações e reconhecer que não
temos execução contra a Fazenda Pú-
blica e temos que ter a penhora dos
bens patrimoniais, pelo menos para
os créditos alimentares.

_____________________________________
PETRÔNIO CALMON FILHO: Procura-
dor de Justiça do MPF-DF, Professor de
Direito Processual do IESB, Doutoran-
do em Direito Processual pela USP e
Secretário-Executivo do Instituto Brasi-
leiro de Direito Processual.