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Pedro Valdo

Rico mercador de Lyon (c. 1140-c. 1217) que deixou em 1170 os seus bens aos pobres e
fundou um movimento espiritual de tipo pauperizante, que redundou numa heresia que
conheceu forte repressão da Igreja. Excomungado pelo Papa Lúcio III em 1184, Valdo e
o seu movimento laico resistiram às perseguições e mantiveram o seu projeto espiritual,
organizando a Igreja Valdense, que ainda hoje subsiste. Pedro Valdo nasceu cerca de
1140, em Lyon (França) e faleceu cerca de 1217. Era um rico mercador daquela cidade
francesa. Em 1170, desfez-se de todos os seus bens e fortuna, tudo doando aos pobres e
doentes, e abraçou a causa da pobreza, um tema extremamente recorrente em fins do
século XII. Atrás de si carregou um grupo cada vez maior de seguidores, constituindo
em 1175 uma "fraternidade" laica, que se assumia como um conjunto de pregadores
mendicantes e sem qualquer clericalização ou hierarquia. Aos pares, deambulavam
pelas povoações pregando a humildade, a penitência e os valores evangélicos.
Naturalmente, esta ousadia causou celeuma na diocese de Lyon, cujo arcebispo logo fez
saber que desautorizava semelhante iniciativa. Apelou então para Roma, para o papa
Alexandre III. Nessa altura, em 1179, estava reunido o III Concílio de Latrão. O
pontífice, escutado o concílio, não desautorizou de todo o movimento de Pedro Valdo,
mas desde logo lhe recomendou que para pregar, ele e os seus seguidores, teriam que
possuir autorização da hierarquia, nomeadamente do ordinário do lugar onde levassem a
efeito as suas atividades.
Pedro Valdo não se mostrou muito preocupado com a recomendação papal e em 1180
fez uma profissão de fé perante Roma mas não deixou, ousadamente, de insistir na sua
independência face ao clero e mesmo nas críticas à hierarquia. Estas audácias de Valdo
e seus companheiros eram cada vez mais condenadas pela hierarquia, que tudo fez para
fulminar o movimento com a pena de excomunhão. Esta tornou-se inevitável a partir do
momento em que Valdo passou a defender publicamente o regresso da fé cristã ao
Evangelho, de forma exclusiva e sem adendas ou glosas, chegando também a traduzir a
Bíblia para a sua língua, o provençal. Valdo recusou submeter-se aos bispos das
dioceses onde pregava, pelo que no concílio de Verona de 1184, o papa Lúcio III sobre
ele disferiu a pena de excomunhão. Lançou-se então no sudeste de França e Noroeste de
Itália, regiões de maior implantação valdense, um conjunto de perseguições, obrigando
Valdo e seus discípulos à fuga e à clandestinidade, acolitando-se nos vales escondidos
dos Alpes, onde conseguiram sobreviver até aos dias de hoje, principalmente no
Piemonte e na Lombardia (Itália). Para complicar a situação de marginalização e
acusação de heresia, Valdo e seus sequazes associaram-se ao ideário cátaro, sob cuja
influência gravitaram, em certa medida.
A sua radicalidade acentuou-se, com as perseguições a aumentarem, com destaque na
Lombardia. Apenas a Bíblia era autoridade perante a fé e como luz para a vida dos que
seguiam Pedro Valdo, que intransigentemente recusava a ideia de Purgatório, o culto
dos Santos, as Indulgências e os Sacramentos, para além de rejeitarem a pena capital e o
serviço militar. Apesar da luta contra a hierarquia romana e seus desmandos, Valdo
acabou ele próprio por se assumir como um chefe supremo e definiu também uma
hierarquia valdense, com bispos, sacerdotes e diáconos, perdendo a ideia laica e
desclericalizada da intuição pauperística inicial. Valdo permaneceu na clandestinidade e
foi sempre perseguido até à sua morte em 1217, em circunstâncias obscuras.
Existe ainda hoje a igreja valdense, que se associou em 1532 ao movimento das igrejas
reformas protestantes, embora sem pertencer a qualquer uma delas. Perseguidos desde a
Idade Média, em 1488 viram aumentar e intensificar as dificuldades e obrigar a uma
existência difícil. Subsistem essencialmente na Itália, onde ascendem a perto de 30 000
fiéis.

A história de Pedro Valdo, sua vida exemplar, seu zelo na causa da verdade e justiça, o nobre sacrifício
que ele fez a favor do princípio religioso, e o extraordinário sucesso que coroou seus trabalhos na
promulgação do evangelho da paz, o qualifica para ter mais que uma mera menção acidental na história
do tempo em que viveu.

Era um rico comerciante na cidade de Leon, - a cidade que, no segundo século da era cristã, foi
abençoada com a clara luz da verdade divina - onde Cristo havia plantado uma numerosa igreja para
servir como um pilar no qual a sua verdade devia ser inscrita; ou um candeeiro no qual Ele havia
colocado a lâmpada da vida. Mas a lâmpada a muito tempo havia sido apagada, e o pilar removido.

Leon, nos tempos de Pedro Valdo, havia submergido em um estado da mais espessa escuridão e
superstição. Cerca do ano 1160 a doutrina da transubstanciação, que posteriormente foi confirmada
pelo papa Inocêncio IV, de maneira mais solene; era exigido pelo clero de Roma ser reconhecido por
todos. A mais perniciosa prática de idolatria achava-se ligada com a recepção desta doutrina. As
pessoas se ajoelhavam diante da hóstia consagrada e a adoravam como se fosse Deus.

Tal abominação, o absurdo e impiedade desse ato, possivelmente agitou a mente de Pedro Valdo, que
se opôs a esta prática de forma corajosa.

Mas embora a consciência e a razão de Valdo se revoltasse contra esta nova superstição, parece que
ele não entretecia naquele tempo qualquer idéia distante de separar-se da comunhão da igreja de Roma,
nem tampouco de manifestar intenso interesse pela religião em sua mente.

Deus, porém, que tem o coração dos homens em suas mãos, e que os movimenta como as águas dos
rios, havia destinado para Pedro Valdo uma obra importante no Seu reino. Um extraordinário incidente
foi um meio de despertar a mente de Pedro Valdo para "aquela única coisa. "Certa noite, após a janta,
estava conversando com amigos e , um dos companheiros caiu morto instantaneamente para o espanto
de todos os presentes. Tal é a lição sobre a incerteza da vida humana, e isto impressionou a mente de
Valdo.
A Bíblia Vulgata Latina era a única edição das Escrituras naquele tempo na Europa. Mas a linguagem
não era acessível a todos, exceto alguns poucos. A condição financeira de Pedro Valdo, felizmente, o
habilitou a vencer aquele obstáculo. "Sendo um pouco erudito" diz Reinerius Sacco, quando comenta
sobre Pedro Valdo "ele ensinou o povo o texto do Novo Testamento na própria língua nativa. "

A súbita morte de seu amigo o levou a pensar em sua própria experiência dissoluta, e, sob o terror de
uma de uma consciência despertada, recorreu às Escrituras Sagradas para instrução e conforto. Ali, no
conhecimento do verdadeiro caráter de Deus, como um Deus justo, e o conhecimento do Salvador,
Pedro Valdo encontrou a pérola de grande valor - o meio para escapar da ira vindoura. A crença no
testemunho que Deus deu a respeito de Cristo, infundiu-lhe paz e alegria na mente; elevou seus
pensamentos e afeições para acima da "fumaça e nuvem escura em que se achava envolvido"; guiou-
o para olhar e lutar pela glória, honra e incorruptibilidade, para a vida eterna, no mundo que há de ser.

Mas o amor cristão é um princípio que opera. Alarga a mente onde habita, e enche-o com generosos
sentimentos - com supremo amor para com Deus, e a mais desinteressada benevolência para com o
homem. Valdo ansiava para comunicar aos outros uma porção daquela felicidade que ele desfrutava.
Abandonou, portanto, suas atividades no comércio, distribuiu suas riquezas para os pobres à medida
que a ocasião requeria. E enquanto os pobres iam a ele para usufruírem de sua benevolência, ele
trabalhava para despertar a atenção deles para as coisas que pertencem à paz eterna.

Um dos primeiros objetivos foi colocar nas mãos do povo a Palavra da Vida. E ele mesmo traduziu ou
pagou para outros traduzir os quatro Evangelhos para o francês. Matthias Illyrius, um escritor que
prosseguiu seus estudos sob Lutero e Melancton, e era um dos Maqdeburgh Centuuriators, falando de
Pedro Valdo diz: "Sua bondade para com os pobres sendo difundida, seu amor pelo ensino, e o amor
deles para aprender, crescendo cada vez mais forte, grandes multidões vieram a ele, e Valdo lhes
explicava as Escrituras. Ele mesmo era um homem erudito. Assim eu posso entender de alguns antigos
manuscritos - nem foi ele obrigado a empregar outros para traduzir os evangelhos para ele como seus
inimigos afirmam. "

Quer Pedro Valdo tenha traduzido estas Escrituras ou empregado outros para fazê-lo, ou
possivelmente, tenha ele mesmo executado a tarefa com a assistência de outros, - o certo é, que os
habitantes da Europa são devedores a Valdo da primeira tradução da Bíblia para uma língua moderna
desde a época que o latim havia cessado de ser uma língua viva - uma dádiva de inestimável valor.

A medida que Pedro Valdo tornava-se mais familiarizado com as Escrituras, começava a descobrir
que uma multidão de doutrinas, ritos e cerimônias que haviam sido introduzidos na religião romana,
não tinham fundamento algum na Palavra de Deus, e eram claramente condenados no Livro Sagrado.

Inflamado com zelo pela glória de Deus, de um lado, e a preocupação pela salvação das almas de seus
compatriotas, de outro lado, ele ergueu sua voz como de trombeta contra estes erros, condenando a
arrogância do papa e o reino de corrupção do clero.

Tampouco ele se satisfez em combater o que era errado nos outros. Ensinou a verdade em sua
simplicidade; fez aplicações práticas de sua influência no coração e vida; e pelo seu próprio exemplo,
como também apelando para as vidas daqueles que primeiramente creram em Jesus, Valdo trabalhou
para demonstrar a grande diferença que existia entre o cristianismo da Bíblia e o cristianismo pregado
pela igreja de Roma.

O resultado de tudo isto pode ser facilmente visto pela mente pensante. O arcebispo de Leon ouviu a
respeito desses trabalhos e ficou irado. A tendência era obvia. A honra da igreja achava-se nela e, em
perfeita harmonia com os métodos então usado de procurar silenciar os opositores, o arcebispo proibiu
o novo reformador de ensinar sob pena de excomunhão, e ser processado como um herege.

Pedro Valdo respondeu que embora sendo leigo, não podia ficar em silêncio em um assunto tão
importante que envolve a salvação de seu próximo. Tentativas foram feitas para prendê-lo. Mas o
grande número e a bondade de seus amigos; o respeito e a influência de suas relações pessoal, muitos
dos quais eram homens de posições; o reconhecimento geral em que era tido por seu caráter puro e
religião piedosa; e a convicção de que sua presença era altamente necessária entre o povo, que neste
tempo haviam formado uma igreja, sendo ele mesmo o superintendente; - todos estes fatores
cooperaram fortemente em seu favor, de formas que ele viveu oculto em Leon durante o espaço de
três anos inteiros.

Informações do que se passava em Leon foram levadas ao papa Alexandre III, que tão logo se deu
conta de tais procedimentos heréticos, promulgou anátema contra o reformador e seus adeptos,
ordenando o arcebispo mover perseguição contra eles com o máximo rigor.

Pedro Valdo foi compelido a fugir de Leon. Seu rebanho em grande medida seguiu os seu pastor. E
desta circunstância surgiu a dispersão como a igreja de Jerusalém fora dispersada por ocasião da morte
de Estevão. Os resultados foram semelhantes. O próprio Valdo retirou-se para o Dauphiny, onde ele
pregou com grande sucesso. Seus princípios se aprofundaram qual raiz de uma árvore grande, e
produziu numerosa colheita de discípulos que foram denominados de - Leonistas, Vaudois, Albigenses
ou Valdenses. Pois a mesma classe de cristãos é designada por estes vários nomes em épocas
diferentes, e de acordo com os diversos países ou lugares nesses países onde eles surgiam.

Perseguido de lugar em lugar, Pedro Valdo retirou-se para o Picardy, onde grande sucesso atendeu
seus trabalhos. Expulso dali, prosseguiu para a Alemanha, levando consigo as boas novas da salvação.
E de acordo com o testemunho de Thuanus, um historiador francês de grande credibilidade, Pedro
Valdo finalmente se estabeleceu na Boêmia, no ano de 1179, depois de um ministério de cerca de vinte
anos.

Certamente ele foi um homem de dons singulares, e uma daquelas pessoas extraordinárias que Deus,
em Sua Providência, chamou e qualificou para realizar importante obra no Seu reino. Contudo,
quase nenhum historiador descreve com justiça seus talentos e caráter.

PEDRO VALDO

Antes da Reforma, alguns grupos de cristãos se


opuseram ao caminho que a Igreja Católica
tomava. Um desses grupos foi o dos valdenses,
fundado por um mercador francês que estava
descontente com a igreja medieval.
Certo dia, Pedro Valdo ouviu um trovador viajante cantar sobre um jovem rico que
deixara sua família, e, anos mais tarde, voltou para casa, mas estava tão malvestido e
desnutrido que sua família não conseguiu reconhecê-lo. Somente no leito de morte
revelou sua verdadeira identidade. Ele viveu entre os pobres e enfrentou a morte
alegremente, feliz por se encontrar com o Deus que sorria para os menos favorecidos.

Profundamente tocado pela história, Valdo agiu rapidamente. Separou uma quantia de
dinheiro suficiente para a esposa, colocou as duas filhas em um convento e doou o
restante das posses aos pobres. Contratou dois sacerdotes para traduzir a Bíblia para o
francês e começou a memorizar longas passagens bíblicas. A seguir, saiu para ensinar
sobre Cristo ao povo.
Embora os monges e as freiras pregassem e ensinassem a pobreza e a autonegação — a
despeito, muitas vezes, de sua incapacidade de manter esses votos — a igreja via isso
como algo que apenas eles precisavam praticar. Poucos esperavam que a pessoa comum
vivesse uma vida religiosa profunda.

Valdo e seus seguidores — que chamavam a si mesmos “pobres de Lião” —


acreditavam que Jesus queria que seus ensinamentos fossem colocados em prática por
todas as pessoas. Saindo de dois em dois, os valdenses visitavam os mercados, falavam
com as pessoas e lhes ensinavam o Novo Testamento.

O contraste entre a igreja e esses pregadores ficou bem aparente para o arcebispo de
Lião. Ele ordenou que parassem de fazer aquilo. Valdo citou o apóstolo Pedro: “É
preciso obedecer antes a Deus do que aos homens!” (At 5.29). Embora o arcebispo
tivesse excomungado Valdo, isso não o impediu nem tampouco o movimento que
mantinha seu nome de prosseguir em suas atividades. Os valdenses apelaram ao papa
Alexandre. Embora estivesse ocupado com o Concilio de Latrão (1179), aqueles
homens — que caminhavam “de dois em dois, descalços, vestidos com, roupas simples,
que não possuíam nada e mantinham todas as coisas em comum, como os apóstolos” —
impressionaram o papa. Contudo, pelo fato de serem leigos, o papa não podia permitir
que pregassem sem a aprovação de um bispo; algo que, dificilmente, conseguiriam.

Fundamentados nas palavras de Atos, dos apóstolos, Valdo e seus seguidores


continuaram a pregar e acabaram por ser excomungados pelo papa Lúcio II, em 1184.

Os valdenses não ensinavam heresias, a despeito das afirmações que a igreja fez contra
eles. Eram ortodoxos, mas, pelo fato de estarem fora da estrutura da igreja, os
seguidores de Valdo não puderam obter a aprovação da hierarquia eclesiástica. Na Idade
Média, para os clérigos, qualquer pessoa que estivesse fora da igreja era considerada
herege.

Muitos cristãos franceses e italianos, desanimados com a igreja que havia se


mundanizado, voltaram-se para os valdenses, que ensinavam o sacerdócio de todos os
crentes. Eles rejeitavam as relíquias, as peregrinações e as parafernálias, como a água
benta, a vestimenta dos clérigos, os dias santos e outros dias de festa, assim como o
purgatório. Para eles, a comunhão não precisaria ser celebrada todos os domingos; os
pregadores valdenses falavam diretamente às pessoas e liam a Bíblia para elas em sua
língua.

Em 1207, o papa Inocencio se dispôs a receber os valdenses de volta se eles se


submetessem às autoridades da Igreja Católica. Muitos retornaram, mas outros não, e,
em 1214, o papa os condenou como hereges e pediu sua supressão. A Inquisição fez o
melhor que pôde para eliminá-los.

Apesar de tudo isso, os valdenses prosseguiram. Eles se espalharam por toda a Europa.
Quando houve a Reforma, foram calorosamente recebidos pela maioria dos protestantes.
Hoje em dia, eles se consideram protestantes também. Os valdenses são uma lembrança
viva de que, a despeito dos momentos obscuros da história da igreja, novos movimentos
para corrigir a direção sempre surgiram dentro dela mesma.

Fonte:A. Kenneth Curtis, J. Stephen Lang, Randy Petersen.

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