Antes de discutirmos o conhecimento científico, torna-se necessário informar sobre um outro tipo de conhecimento:
o de senso comum; também denominado como vulgar. A importância de se falar sobre esse reside no fato desse
nortear o nosso comportamento no cotidiano, resolvendo, muitas vezes, uma grande gama de problemas que
experimentamos no dia-a-dia. Esse tipo de conhecimento - definido como aquele que todas as pessoas adquirem na
vida cotidiana, seja através da(s) experiência(s) vivida(s), seja através da transmissão ou repasse por alguém - é uma
forma de conhecer a realidade e/ou de resolver problemas que por seu nível de complexidade não requerem
procedimentos sistemáticos. Em outras palavras, o pouco que se conhece sobre o assunto pode ser suficiente para
resolver o problema que se está vivenciando, ou mesmo para concluir que esse existe mas não temos capacidade de
resolvê-lo e, nesse caso, busca-se quem possa fazê-lo.
O conhecimento científico deve, necessariamente: ater-se aos fatos, transcender aos fatos, ser sistemático, analítico,
aberto, verificável, explicativo, comunicável, útil, visar a busca e aplicação de leis e, por fim, fazer predições
Para atingir o acima exposto, o conhecimento científico requer: investigação metódica, exatidão e clareza
Para se alcançar este tipo de conhecimento é necessário recorrer a pesquisa, pois esse é o instrumento através do
qual é possível a produção do conhecimento científico. De acordo com Gil (1993:19),
1
Texto elaborado para subsidiar os alunos na elaboração de projetos de pesquisa, sujeito a
críticas e sugestões.
2
Professora do Departamentos de Ciências Sociais da PUCMinas.
qualificativo de científica, a pesquisa deve ser feita de modo sistematizado,
utilizando para isto método próprio e técnicas específicas e procurando um
conhecimento que se refira à realidade empírica.”
A realização de pesquisa científica requer utilização de método e de técnicas. Nesse caso torna-
se indispensável definirmos o que é método e o que é técnica. De acordo com Galliano (1986: 6)
Técnica é o modo de fazer de forma mais hábil, mais segura, mais perfeita algum tipo de
atividade, arte ou ofício.
Método é a orientação básica para se atingir determinado fim. Assim, por analogia,
podemos entender método como estratégia.
Técnica é a forma de aplicação do método. Ainda por analogia, podemos comparar a
técnica com a tática.
O planejamento da pesquisa
A pesquisa científica deve ser planejada, antes de ser executada. Isso se faz através de uma
elaboração de um projeto de pesquisa.
Fazer um projeto de pesquisa é traçar um caminho eficaz que conduza ao fim que se pretende
atingir, livrando o pesquisador do perigo de se perder, antes de o ter alcançado. Diz Churchman
que “planejar significa traçar um curso de ação que podemos seguir para que nos leve às nossas
finalidades desejadas”. (...) O objetivo do planejamento é organizar a ação de tal maneira que
nos leve a evitar surpresas, pois “para o planejador, a surpresa é uma situação insatisfatória” e
que “se pensarmos bem naquilo que vamos fazer, com antecedência, estaremos em melhores
condições.
Para Belchior3, um projeto serve essencialmente para responder às seguintes perguntas: o que
fazer? Por que, para que e para quem fazer? Onde fazer? Como, com que, quanto e quando
fazer? Com quanto fazer? Como pagar? Quem vai fazer?
a) decisão
b) especificação dos objetivos o que se vai estudar/analisar?
por que?
para que?
para quem?
c) elaboração de um esquema ante-projeto
d) constituição da equipe de quem? (recrutamento e treinamento)
trabalho
e) levantamento de recurso quanto?
f) cronograma quando?
No momento da decisão de se fazer a pesquisa é indispensável, para quem pretende realizá-la, ter claro qual é o
seu objetivo. Em outras palavras, antes de iniciar a elaboração de um projeto de pesquisa é imprescindível definir
o tipo de pesquisa que será realizado já que essa decisão permitirá estabelecer o marco teórico da pesquisa.
têm como objetivo maior familiaridade com o problema, com vista a torná-lo mais explícito ou
a construir hipóteses. Pode se dizer que essas pesquisas têm como objetivo principal o
aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Seu planejamento é bastante flexível, de
modo que possibilite a consideração dos mais variados aspectos relativos ao fato estudado. Na
maioria dos casos essas pesquisas envolvem: a) levantamento bibliográfico; b) entrevistas com
pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado e c) análise de exemplos
que, de acordo com Selltiz et al4., estimulem a compreensão. (grifos nossos)
Pode-se inferir, a partir do exposto por Gil (1993:45), que as pesquisas exploratórias, como a própria denominação
já indica, são aquelas que têm por objetivo propiciar ao pesquisador:
3
Citado por Rudio, 1989 p. 46.
4
SELLTIZ, Clairem et al. Métodos de pesquisa nas relações sociais. São Paulo: Herder, 1967.
3
(...) São incluídas nesse grupo as pesquisas que têm por objetivo levantar as opiniões,
atitudes e crenças de uma população. Também são pesquisas descritivas aquelas que visam
descobrir a existência de associações entre variáveis. (...)
Algumas pesquisas descritivas vão além da simples identificação da existência de relações
entre variáveis, pretendendo determinar a natureza dessa relação. Neste caso tem-se uma
pesquisa descritiva que se aproxima da pesquisa explicativa. (...).(grifos nossos)
têm como preocupação central identificar os fatores que determinam ou que contribuam
para a ocorrência dos fenômenos. Este é o tipo de pesquisa que mais aprofunda o
conhecimento da realidade, porque explica a razão o porquê das coisas. Por isso mesmo é o
tipo mais complexo e delicado, já que o risco de cometer erros aumenta consideravelmente.
Pode-se se dizer que o conhecimento está assentado nos resultados oferecidos pelos estudos
explicativos. (...)
As pesquisas explicativas nas ciências naturais valem-se quase exclusivamente do método
experimental. Nas ciências sociais, a aplicação deste método reveste-se de muitas
dificuldades, razão pela qual recorre também a outros métodos, sobretudo o observacional.
Nem sempre se torna possível a realização de pesquisas rigidamente explicativas em
ciências sociais (...). (grifos nossos)
Já nas áreas que se situam nas Ciências Sociais e/ou Humanas, não podemos por
imposição do próprio objeto de estudo (sujeitos sociais) utilizarmos, salvo raras
exceções, os experimentos e modelos. Nessas emprega-se método observacional mesmo
sabendo de suas limitações.
Ressalta-se que para efetuar pesquisas dos tipos descritivas e explicativas é necessário antes realizar a do
tipo exploratória.
Definição do tema
A definição do tema é talvez, ou melhor, com certeza, a parte mais difícil da elaboração
de um projeto, plano ou proposta quando não nos é dado. Cabe a quem quer, seja por
obrigação (alunos) ou por puro prazer/deleite (pesquisadores) escolher o que irá
trabalhar. A decisão não é fácil de ser produzida. São milhares de assuntos em cada uma
das áreas/disciplinas e a escolha chega mesmo a doer. Essa dor a qual me refiro é a da
decisão numa realidade múltipla, onde tanto está por fazer e só se pode fazer um, pelo
menos um de cada vez. Não dá para abarcar o mundo, pelo contrário. O bom andamento
4
do trabalho requer, por um lado, que sejamos objetivos, claros, precisos e, por outro,
que a escolha recaia sobre algo que de fato, reconhecendo as nossas capacidades, nível
de formação e área de conhecimento, seja possível de ser realizado.
Chamamos a atenção para o fato de que só se deve propor trabalhar sobre algo (tema)
que já se conhece, caso contrário, não que seja de todo inviável, mas certamente o
tempo e o esforço para a realização do trabalho será infinitamente superior se
considerarmos que os assuntos sobre os quais já temos conhecimento, por menor que
esse seja, nos permitirá partirmos de ponto já iniciado, ou melhor, por caminhos pelos
quais já começamos a caminhar e, por isso, não nos é de todo estranho e assustador.
(...) os problemas surgem, como diz Popper, quando algo não ocorre conforme
esperávamos, quando algo não está em ordem, quando nossas teorias ou expectativas não
são confirmadas5. (...) Os problemas nascem a partir de algum conhecimento prévio (...).
(...) a formulação e resolução de problemas científicos só podem ser feitas por quem tem
um bom conhecimento das teorias científicas de sua área.
No início de qualquer pesquisa, em qualquer área de conhecimento, seja qual for a sua
estratégia, ativa ou não, junto com a definição do tema e dos objetivos, torna-se necessário
dar atenção à colocação dos principais problemas, a partir dos quais a investigação será
5
desenvolvida. Em outros termos, trata-se de definir uma problemática na qual o tema
escolhido ou hipótese adquira sentido.(...)
Toda pesquisa científica começa pela formulação de um problema e tem por objetivo
buscar solução do mesmo. (...)
(...) o problema é uma questão proposta para ser discutida e resolvida pelas regras da lógica
e de outros meios de que se dispõe. Carosi diz “uma questão é um enunciado acerca de um
dado objeto, proposto de maneira interrogativa, de modo que se possa responder por dois
termos de uma alternativa, contraditoriamente opostos entre si”. (...)
Para se resolver a dificuldade, formulada no problema (...) o pesquisador não pode apenas
adivinhar, fazer suposições gratuitas ou emitir opiniões superficiais e inconsistentes, mas
deve realizar um processo pelo qual, ao mesmo tempo, se busca, examina e prova a solução
e ao qual se denomina pesquisa científica.
Nº Etapas
1. Escolha do tema
2. Pesquisa exploratória (levantamento de informações sobre o tema escolhido)
3. Formulação do problema
4. Especificação dos objetivos
5. Construção de hipóteses
6. Definição do tipo de pesquisa (descritiva ou explicativa)
7. Determinação da estratégia a ser empregada na coleta de dados
8. Elaboração do(s) instrumento(s) de coleta de dados
9. Determinação do plano de análise dos dados
10. Previsão da forma de apresentação dos resultados
11. Cronograma da execução da pesquisa
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Elaboração de Projetos de Pesquisa
Um projeto só pode ser definitivamente elaborado quando se tem o problema claramente formulado,
os objetivos bem definidos e o plano de coleta e análise dos dados previamente determinado.
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Diagrama da pesquisa
Bibliografia
BRUYNE, Paul et alli. Dinâmica da pesquisa em Ciências Sociais: os pólos da
prática metodológica. (Trad. de Ruth Joffily). 3ª Ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
s/d.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 1993
8
Modelo para elaborar um projeto de pesquisa
Título
Formulação do Problema
Justificativa
Por que fazer esse trabalho? Qual a sua importância e relevância para a área de conhecimento,
(no caso Ciências Sociais? Para o Curso ? Para quem pretende realizá-lo?)
Procedimentos Metodológicos
Como será feito o trabalho? Descrição detalhada do método e das técnicas a serem empregadas
para alcançar o objetivo a que se propõe. Nessa fase deverão ser respondidas as seguintes
questões:
Qual método e técnica serão utilizados para coletar as informações necessárias? Por que de suas
escolhas? No caso da(s) técnica(s), deve estar explicito nessa etapa, como será(ão) aplicada(s)?
Cronograma
Exemplo: Indicar no espaço apropriado a atividade que será realizada e, a seguir, com um “X”
indicar o período em que se pretende realizá-la.
Atividade Mês/Quinzena
Ago. Set. Out. Nov.
1ª 2ª 1ª 2ª 1ª 2ª 1ª 2ª
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Elaboração das Técnicas/Instrumentos de Coleta de dados
Observação Participante • fatos tais como são para os • recusa possível do observador, ou • participação máxima do pesquisador;
(observador conhecido ou sujeitos observados; integração e socialização excessivas; • relação menos artificial.
oculto) • fenômenos latentes (que • o acontecimento que interessa
escapam aos sujeitos mas não freqüentemente é fortuito;
ao observador). • problemas de ética
Entrevista (oral) • fatos observados e/ou opiniões • barreira para comunicação, relação • Incitações a responder (acolhimento, desejo de
Estruturada; expressas sobre: artificial; comunicar etc.);
Em profundidade; - os acontecimentos; • mecanismos de defesa (fuga, recusa, • quantidade e qualidade aumentadas das informações,
Painel (entrevistas repetidas); - os outros; racionalização, conformismo etc.); problemas mais complexos ou mais carregados
Discussão em grupo - a própria pessoa • estado de informação aleatório dos afetivamente;
• mudanças de atitudes, de respondentes; • flexibilidade.
influências; • subjetividade;
• evolução dos fenômenos; • disparidade entre declarações e
• significação das respostas; comportamentos;
conteúdo latente. • inadequação dos conceitos com o real,
dificuldades de linguagem,
incompreensões
Instrumento Tipos de informação Obstáculos a minimizar Vantagens relativas
Questionário Idem aos obtidos através da idem aos encontrados na entrevista e mais: • economia de tempo
entrevista • desvios devidos à rigidez; • uniformidade das respostas
• exame e ordenação mais difíceis; • anonimato dos respondentes
• interpretação delicada (risco de erros); • facilidade de exame das respostas
• custo mais elevado. • filtragem das perguntas
Pesquisa Bibliográfica • fatos/acontecimentos, • dificuldade de acesso (não disponibilidade • conhecer o que foi já produzido sobre o assunto/tema
comportamentos, evoluções da obra, título); que está trabalhando ou quer trabalhar;
históricas, tendências. • dificuldade de interpretação (textos não • instrumentos “não reativos”;
traduzidos, não domínio da língua em que • economia de tempo
está escrito).
Análise Documental • fatos/acontecimentos, • dificuldade de acesso (segredo); • instrumentos “não reativos”;
atributos, opiniões, • dificuldade de interpretação (sentido das • economia de tempo e de dinheiro.
comportamentos, evoluções palavras, contexto);
históricas, tendências. • “reemprego” numa perspectiva de
pesquisa;
• o importante nem sempre está escrito.
Fonte: BRUYNE, P. et. al. Dinâmica de pesquisa em ciências Sociais. 3ª ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, sd. p. 211-213
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