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DESAFIOS

CONTEMPORÂNEOS
CAPÍTULO 4 – QUAIS OS DESAFIOS
DA SOCIEDADE MODERNA?
Maicon Costa Borba Macedo

INICIAR
Introdução
O século XXI trouxe imensos desafios para as sociedades. A maioria,
entretanto, é consequência de acontecimentos históricos vivenciados ao
longo do século XX e que continuam a influenciar os dias atuais. A Guerra
Fria é um bom exemplo. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, iniciou-se
um período de tensão, que dividiu o cenário internacional em dois blocos:
um liderado pelos Estados Unidos, e outro pela União Soviética. Esse
conflito reestruturou a geopolítica mundial, tendo como vencedor os
Estados Unidos e seu modelo econômico. Além da vitória americana, ao
longo da segunda metade do século XX, tem início uma nova forma de
integração mundial, chamada de globalização, que vem reconfigurando o
capitalismo internacional. Outra característica marcante do fim do século
passado e início do XXI são as novas ondas migratórias, que desafiam,
sobretudo, os países de destino dos migrantes. Completando o panorama,
verificamos o risco do terrorismo em diversos países.
A verdade é que o cenário atual é marcado por grandes incertezas. Por isso
se faz necessário identificar as principais características deste momento,
buscando compreendê-lo dentro de um contexto histórico, construído
desde a Segunda Guerra Mundial e intensificado durante e após a Guerra
Fria. Nesse sentido, são pertinentes as seguintes indagações: quais as
consequências do fim do mundo socialista para a economia mundial?
Como a globalização está interferindo na sociedade, principalmente sobre
o Estado e a política? E qual o perfil das migrações e do terrorismo nesse
início de século? Com isso, poderíamos refletir, ainda, quais seriam os
desafios para a construção de sociedades mais justas. Deveriam as
sociedades e suas organizações adotar medidas de responsabilidade
social? Ao estudar essas questões, aprendemos um pouco mais sobre os
contornos que a sociedade moderna vem tomando e podemos nos
preparar melhor para as transformações que ainda virão.
Acompanhe a leitura e bons estudos!

4.1 As tendências sociopolíticas do


mundo global
Para compreender as tendências atuais do mundo globalizado, é
necessário fazer um recuo histórico até a Guerra Fria, pois foi neste
período, nas décadas de 1950 a 1980, que se intensificou as disputas
ideológicas permitindo o rearranjo do capitalismo verificado no presente.
Mas o que foi a Guerra Fria? Quais suas principais características? E,
finalmente, quais fatores contribuíram para o seu fim?

4.1.1 Guerra Fria: capitalismo X comunismo


Com o fim da Segunda Guerra, duas potências mundiais emergiram: os
Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS). De acordo com Miranda e Faria (2003), países como
Alemanha, França, Inglaterra e Japão, que eram as potências tradicionais,
ao fim da guerra encontravam-se com grandes dificuldades econômicas
devido às perdas materiais e humanas durante os confrontos. Esse fato,
dentre outros, abriu caminho para que os Estados Unidos e a União
Soviética passassem a desempenhar o papel de líderes, disputando assim
a hegemonia mundial. Aliados durante a Segunda Guerra, a
incompatibilidade de seus interesses logo ficou evidente e os dois países
travaram uma batalha ideológica, sempre na iminência de uma guerra.
Devido ao fato de a guerra militar nunca ter ocorrido entre os dois países,
recebeu o nome de Guerra Fria (BIAGI, 2001; MIRANDA; FARIA, 2003).
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Figura 1 - Ao longo da Guerra Fria, a tensão devido ao desencadeamento de uma guerra


“quente”, ou seja, com conflito bélico, esteve sempre presente. Fonte: Scanrail1,
Shutterstock, 2018.

Durante a Guerra Fria, os Estados Unidos e a União Soviética estenderam


suas influências a diversos países, muitas vezes de forma violenta. Além
disso, os dois países patrocinaram uma série de episódios que viriam a
intensificar as tensões mundiais, com a constante iminência de conflitos
militares. Como pano de fundo dessa disputa de poder, estava a ideologia
comunista ou socialista, por parte da União Soviética, e a ideologia
capitalista, pelo lado dos Estados Unidos. O modelo comunista
caracterizava-se pela economia fortemente controlada pelo Estado e
fechada ao livre comércio global, ao passo que a ideologia capitalista
apregoava o livre comércio, sem intervenção estatal (MIRANDA; FARIA,
2003).
Um dos acontecimentos mais marcantes do período foi a construção de
um muro dividindo a cidade de Berlim, capital da Alemanha,
representando a separação do mundo em dois blocos, o comunista e o
capitalista. O muro de Berlim passou a ser o símbolo da Guerra Fria
(MIRANDA; FARIA, 2003). Com o passar do tempo, entretanto, a União
Soviética foi perdendo forças. Com a economia estagnada e o
desenvolvimento comprometido, era evidente que os comunistas estavam
perdendo a corrida do desenvolvimento econômico e tecnológico. São
apontadas como causas do fim da União Soviética, dentre vários fatores, a
sua defasagem tecnológica, os custos para manter sua defesa, a falta de
democracia e liberdade, e o isolamento dos países comunistas, além das
grandes transformações tecnológicas e sociais que estavam ocorrendo no
ocidente (RODRIGUES, 2006).
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Figura 2 -
A queda do muro de Berlim, em 1989, representou o fim da Guerra Fria travada entre
Estados Unidos e União Soviética desde o final da Segunda Guerra Mundial. Fonte:
neftali, Shutterstock, 2018.
A queda do muro de Berlim, que reunificou a Alemanha em 1989,
simbolizou o fim da Guerra Fria. A União Soviética desapareceu logo
depois, em 1991. O fim da Guerra Fria e a dissolução da União Soviética
representaram a ascensão do sistema capitalista mundial, que a partir de
então prevalece sem que nenhum modelo econômico alternativo o
ameace.

4.1.2 Mundo globalizado


O fim da Guerra Fria prenunciou um novo modelo de organização social.
Contribuíram significativamente para isso os avanços tecnológicos que
começaram a ser desenvolvidos a partir da segunda metade do século XX.
As novas tecnologias de informação e comunicação, as TICs, aproximaram
o mundo, intensificando o chamado processo de globalização (CASTELLS,
1999). Com o fim da União Soviética e a ascensão da ideologia capitalista,
o fluxo de capitais entre os países passou a ser cada vez mais intenso
(OLIVEIRA; COSTA, 2016).
O fenômeno da globalização atinge, desde então, todos os países, mas em
graus diferentes, variando de acordo com sua abertura comercial. Uma das
principais características do modelo de globalização é o seu caráter liberal,
ou seja, a liberalização econômica extrema. Consequentemente,
instituições financeiras internacionais passaram a exercer influência
crescente na política econômica dos países, sobretudo, nos
subdesenvolvidos. Exemplos destas instituições são o Fundo Monetário
Internacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o Banco
Mundial (BIRD). As orientações das instituições aos países podem ser
resumidas nos seguintes pontos principais: redução da interferência do
Estado na economia; privatização de empresas Estatais; e livre comércio,
sem barreiras alfandegárias e sem proteção às empresas nacionais
(OLIVEIRA; COSTA, 2016).
VOCÊ QUER LER?
O livro A Globalização e seus malefícios (STIGLITZ, 2002) do economista estadunidense e
vencedor do Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz é um relato provocativo e
contundente do cenário da política econômica mundial. O autor demonstra como a
expectativa das nações mais pobres por maior participação na riqueza global não é satisfeita
pela globalização, mas que observa o efeito contrário: países ricos tornam-se cada vez mais
ricos, enquanto países pobres toram-se cada vez mais pobres.

Joseph Stiglitz (2002) argumenta que a globalização possui muitos


aspectos positivos, uma vez que reduziu o isolamento de alguns países,
propiciando seu desenvolvimento econômico e também colaborou em
campanhas globais, como as de combate a AIDS. Entretanto, o autor
também salienta que para muitos países a globalização foi um desastre,
porque as políticas de cunho neoliberal geraram desemprego e pobreza.
Uma das causas foi que os países ricos não seguiram as orientações que
eles próprios recomendavam aos países pobres, ou seja, enquanto
orientavam maior abertura econômica aos países periféricos, eles
protegiam setores da sua própria economia. Dessa forma, os países
subdesenvolvidos tiveram suas economias enfraquecidas (STIGLITZ, 2002).
A globalização tem implicações nas mais diversas esferas da vida social
como, por exemplo, na questão da imigração e as consequências que esse
fenômeno traz, tema do nosso próximo tópico de estudo.

4.2 Terrorismo e deslocamentos


populacionais
Impulsionada pela revolução nas tecnologias da comunicação nas últimas
décadas, especialmente a partir da década de 1980, a globalização
impacta a economia, a política, a cultura, a organização social e a questão
ambiental. Suas consequências se fazem sentir também nos movimentos
da população em torno do globo: com as possibilidades em termos de
comunicação e transporte oferecidas pelo mundo globalizado, ao mesmo
tempo em que se observa o aprofundamento das desigualdades sociais e a
eclosão de guerras, uma grande massa populacional vislumbra na
imigração uma nova oportunidade de vida. Tais projetos de vida, não raro,
esbarram no protecionismo e nas barreiras impostas pelos países
desenvolvidos para a imigração, barreiras estas que, cada vez mais,
encontram no medo do terrorismo o argumento para promoção de
políticas racistas e xenófobas. Mas antes de entrar na questão da relação
imigração e terrorismo, é preciso abordar as características da
globalização, o que vamos fazer a seguir.

4.2.1. As características políticas da globalização


Desde a queda do Muro de Berlim e o avanço da liberalização econômica e
da livre iniciativa de mercado, as consequências da globalização na
economia se fazem sentir em todos os países do globo, o que reflete na
organização política. O filósofo e sociólogo Jürgen Habermas (2002) tem
chamado atenção para duas consequências políticas: por um lado, a
desestruturação do Estado de bem-estar social (Welfare State), pois a
globalização acarretaria uma diminuição da autonomia política dos países,
e, por outro lado, o estabelecimento e a consolidação de blocos de países
com enorme poder político e econômico ao mesmo tempo em que as
desigualdades entre as nações se aprofundam (DANNER, 2014). O
processo de acumulação econômica do capitalismo globalizado é avesso
ao controle político das nações e, neste sentido, as funções regulatórias de
promoção de parâmetros equitativos e de justiça social, derivados de
diretivas políticas, seriam dificultadas (DANNER, 2014). Assim, uma das
principais características da dimensão política da globalização é a crise do
Estado Nacional e a perda da soberania diante de grandes conglomerados
econômicos globais. O Estado, portanto, tem perdido a autonomia para
gerir a economia por suas próprias determinações políticas.

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Figura 3 - O mercado econômico e a especulação financeira governam a economia


mundial e impactam todos os países do globo. Fonte: JMiks, Shutterstock, 2018.

Se por um lado a expansão global de grandes empresas para países


periféricos reflete em investimentos, circulação da economia e geração de
empregos, é inevitável observar que – em sua saga expansionista – as
grandes empresas buscam a maximização de seus lucros por meio de um
rol de concessões que garantam mão de obra e matéria-prima mais
baratas, menor carga tributária e menor regulação estatal sobre a força de
trabalho. Bauman (2012) observa que a fragmentação das demandas
sociais, a limitação da ação política tradicional e a desilusão com as
alternativas ao capitalismo, após a queda do muro de Berlim, contribuem
para a fragilização do poder político nos dias de hoje. O esvaziamento do
Estado como espaço de ação coletiva de construção de um projeto de
sociedade abre espaço para o crescimento do poder da economia
globalizada e para a ideologia de mercado, que é por si mesma
individualista e sem preocupações éticas. Sendo assim, quais as
consequências dessa ideologia para a sociedade?

4.2.2. As consequências sociais da globalização


Para Bauman (2012), as grandes corporações são, em termos econômicos,
os maiores beneficiários da globalização. O que caracteriza as grandes
corporações nesse período de mercado global é a sua não localidade, ou
seja, estão presentes no mundo inteiro, mas os donos das empresas, os
investidores, são estrangeiros. Sendo estrangeiros, eles visam, via de regra,
o lucro de seus empreendimentos e não partilham do conhecimento da
realidade e das condições de vida dos trabalhadores de suas empresas
localizadas em outros países. Além disso, enquanto a empresa é global,
isto é, pode se movimentar pelo globo de acordo com seus interesses e
oportunidades, os trabalhadores são locais, estão presos ao seu espaço
geográfico – cidade, país – e sofrem as consequências das decisões
tomadas pelas grandes corporações (BAUMAN, 2012).
Ao se sujeitar às regras do mercado global, os Estados-Nação –
especialmente os países periféricos – ficam à mercê dos interesses da
especulação financeira e da barganha de vantagens promovidas pelas
empresas em troca de alguns poucos empregos e investimentos no país.
Além disso, ficam obrigados a seguir regras que mantenham a estabilidade
financeira e econômica mesmo que seja em detrimento de investimentos
sociais. Bauman (2012) denuncia que a propalada igualdade social
advinda do desenvolvimento econômico e do livre comércio tem se
mostrado uma falácia. O que se verifica na realidade é um aumento do
acumulo da riqueza entre os mais ricos e uma queda vertiginosa das
condições de vida dos mais pobres. Ao contrário das maravilhas sonhadas
pelos crentes no poder da ciência e da tecnologia em tornar o mundo
menos injusto, a distribuição real das riquezas na era da globalização tem
se mostrado extremamente desigual (BAUMAN, 2012).

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Figura 4 - No mundo globalizado, a desigualdade social, especialmente em países


periféricos, tem se aprofundado cada vez mais. Fonte: Fred Cardoso, Shutterstock, 2018.

Se a lógica da globalização amplia os processos de pobreza e desigualdade


social, especialmente nos países periféricos, é necessário pensar em
formas de subordinar a economia global a valores éticos e humanos. Em
1999, a Organização das Nações Unidas (ONU) publica o relatório
“Globalização com uma face humana”, que denunciava a sobreposição de
interesses financeiros e materiais aos interesses da nação e de seu povo. O
relatório é um desdobramento de publicações e reuniões anteriores, como
o primeiro Relatório do Desenvolvimento Humano, publicado em 1990, no
qual a ONU defendia que “o objetivo do desenvolvimento é a criação de
um ambiente que permita às pessoas desfrutarem de uma vida longa,
saudável e criativa” (PNUD, 1999, apud RAMOS, 2002, p. 106).
Portanto, para uma versão mais humana do processo de globalização é
necessário o estabelecimento de parâmetros éticos para o livre mercado e
sua atuação local. Ramos (2002) sugere tratar a globalização em termos de
política internacional de modo que haja uma ética nas comunicações, na
economia, na política e na cultura, ética esta presidida pelas noções de
justiça e solidariedade, valores universalmente presentes. A partir desse
panorama sobre os impactos da globalização na economia e política,
vamos agora para a questão dos deslocamentos populacionais e as novas
configurações que o processo traz para as sociedades.

4.2.3. A migração na era da globalização e os impactos do


terrorismo internacional
As migrações internacionais no século XXI são profundamente marcadas
pela globalização. A diminuição de distâncias e o amplo acesso à
informação colocam no horizonte do aspirante à migração não apenas o
espaço geográfico mais próximo – outra cidade, outro estado – mas o
mundo inteiro. Por outro lado, as possibilidades migratórias se
apresentam de formas distintas em função do perfil do migrante.
Enquanto o capital financeiro flui livremente à revelia das fronteiras entre
os países, a mobilidade dos trabalhadores é fortemente controlada por
barreiras impostas pelos países desenvolvidos.

VOCÊ QUER LER?


O livro Americanah (ADICHIE, 2014) da escritora nigeriana Chimamanda Ngozie Adichie conta
a história de dois nigerianos que precisam fugir do Regime Militar de seu país e descobrem-se
exilados nos Estados Unidos e na Inglaterra. As trajetórias dos protagonistas são marcadas, a
partir de então, por questões culturais e raciais, pois são vistos sempre como “o outro”, o não
branco, o não europeu, o não americano.

O aumento do fluxo de informações acerca das oportunidades em países


mais desenvolvidos seduz uma grande massa de trabalhadores de países
periféricos, que partem em busca de melhores condições de vida. Mas se o
acesso a informações e a facilidade de deslocamento, representada
atualmente pelos meios de transportes globais e baratos, estimula o
desejo de migração, as oportunidades para os migrantes ainda são muito
restritas. Países desenvolvidos tendem a fechar suas fronteiras devido ao
temor de receber enormes massas de migrantes sem estrutura e reais
oportunidades para fixá-los. Porém, estudiosos do tema têm apontado
uma série de possíveis vantagens da migração, considerando os ganhos
dos lugares de destino: barateamento dos custos e da qualidade de vida da
população, uma vez que migrantes realizam trabalhos que os nativos não
têm interesse em fazer, e por custos mais baixos; a revitalização de
sociedades envelhecidas, a partir da migração de pessoas jovens; o acesso
a recursos humanos qualificados, cujos custos de qualificação foram
assumidos por outros países; o aumento da produtividade; e o aumento de
consumidores e contribuintes (MARTINE, 2005).
A apreciação das vantagens da imigração esbarra, porém, em movimentos
sociais cada vez mais numerosos no mundo e caracterizados por seu viés
antimigrantes, racistas e xenófobos. Após os atentados terroristas de 11 de
setembro de 2001, tais movimentos ganharam força e a identificação do
outro – especialmente se o “outro” for de uma etnia, religião, idioma ou
aparência diferente dos nativos locais – com o “inimigo” ou com o
“terrorismo” vem aumentando a rejeição aos migrantes por parte das
populações de países desenvolvidos (MARTINE, 2005).
CASO
A tendência da grande maioria dos países desenvolvidos
atualmente é de fechar suas fronteiras para a imigração, tanto em
decorrência da crise econômica que o mundo vem enfrentando,
quanto pela pressão de grupos de extrema direita que alegam o
receio de ações terroristas em seu território. Na contramão dessa
tendência, países como o Canadá têm facilitado e incentivado o
fluxo de imigrantes ao seu território, acolhendo, inclusive,
refugiados de guerras como as que acontecem no Oriente Médio.
Quais as razões que levam o Canadá a adotar essa postura diante
do atual fluxo migratório global? Além das causas humanitárias
em relação a refugiados de guerra e a postura enfática contra os
crescentes movimentos xenófobos e racistas que eclodem no
mundo, o governo canadense tem apostado nos fatores positivos
da imigração: com uma população envelhecida, necessita de
pessoas jovens para movimentar a economia e suprir o setor de
serviços. Mas como colocar em prática essa postura? O sucesso
do empreendimento repousa no planejamento e na criação de
políticas que visem auxiliar e acompanhar a adaptação e
inserção dos migrantes na sociedade canadense.

A eclosão de guerras em vários locais do globo, especialmente no Oriente


Médio, tem deslocado um grande volume de pessoas que precisam fugir
por questões de sobrevivência. A resistência dos países desenvolvidos em
recebê-las encontra argumento nas precauções contra o terrorismo.
Martine (2005) ressalta, porém, que a relação entre migração e terrorismo
é complexa, mas o que desencadeia ações terroristas não é a imigração,
mas a crescente desigualdade entre os países. Uma maior abertura
poderia, inclusive, reduzir o terrorismo, na medida em que reduz a
desinformação e desconfiança entre os povos.
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Figura 5 - Dados da ONU apontam que, atualmente, 65,3 milhões de pessoas estão na
condição de refugiadas de seus países. Fonte: Sadik Gulec, Shutterstock, 2018.

As grandes ondas migratórias que assistimos atualmente são reflexo da


condição de mundo globalizado: por um lado, a facilidade tecnológica em
acessar informações e deslocar-se pelo globo; de outro, o protecionismo
de países desenvolvidos e as barreiras à livre circulação dos trabalhadores,
fenômeno que se retroalimenta do medo xenofóbico ao imigrante,
identificado como inimigo da pátria e potencial terrorista. A livre circulação
do capital e o liberalismo econômico acarretam consequências drásticas à
autonomia dos Estados-Nação: em nome da economia global, impõe-se a
economias periféricas uma série de obrigações que as obrigam a deixar em
segundo plano as políticas de desenvolvimento social e distribuição de
renda. Como consequência, observamos um aprofundamento das
desigualdades sociais e aumento da pobreza, enquanto poucos
conglomerados econômicos acentuam sua acumulação econômica. Vamos
continuar nosso estudo sobre os desafios da sociedade moderna com o
tema da responsabilidade social.

4.3. Responsabilidade Social


Atualmente, tanto a atuação das empresas quanto a dos indivíduos tem se
pautado cada vez mais por um viés sustentável, ético, e que considere a
responsabilidade social junto à sociedade e ao meio ambiente. Quando
pensamos em desenvolvimento sustentável, nos remetemos a um
equilíbrio entre os objetivos de desenvolvimento econômico,
desenvolvimento social e conservação ambiental. A responsabilidade
social corporativa vem atraindo olhares da sociedade e de estudiosos
sobre o tema, especialmente em uma época de acentuamento das
desigualdades sociais e do aprofundamento da degradação do meio
ambiente. Mas quais são os fundamentos da responsabilidade social? E
como ela se aplica na atuação das empresas e corporações?

4.3.1. Os fundamentos da responsabilidade social


O conceito de responsabilidade social tornou-se central a partir da
emergência da discussão sobre a necessidade de um desenvolvimento
sustentável, que leve em consideração a preservação do meio ambiente e
a utilização consciente de recursos naturais. Mas a ideia de não é recente.
Iniciativas empresariais que visam à atuação das corporações na
sociedade de modo mais amplo, extrapolando seu objetivo imediato, que
é a obtenção de lucro, existem desde o final do século XIX e início do século
XX. Porém, nesse período, as ações das empresas orientavam-se por um
viés mais filantrópico e assistencialista na sua atuação junto à sociedade.
Atualmente, a utilização do termo “filantropia”, quando se trata de ações
de responsabilidade social, é visto de forma pejorativa, pois remete a
ações que não buscam a transformação da sociedade.
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Figura 6 - Diante dos desafios sociais e ambientais de nossa época, o conceito de


responsabilidade social está cada vez mais presente na atuação empresarial. Fonte:
wk1003mike, Shutterstock, 2018.

A noção de responsabilidade social só ganhou forma a partir das décadas


de 1960 e 1970, coincidindo com grandes transformações sociais, políticas
e culturais do mundo, especialmente a crescente crítica às guerras e ao uso
de armas químicas e nocivas à sociedade e ao meio ambiente. Já a partir
da década de 1980 e a crise no Estado de bem-estar social nos países
centrais do capitalismo, como Estados Unidos e da Europa, a participação
das empresas e das corporações na manutenção dos níveis de emprego foi
sendo cada vez mais valorizada (ALENCASTRO, 2012).
No Brasil, a consolidação do termo “responsabilidade social” se deu a
partir dos anos 1990, principalmente em função do crescimento de
movimentos sociais que pressionavam setores da sociedade – como
governo e iniciativa privada – pela diminuição da pobreza e da fome, bem
como da desigualdade social. A criação do Instituto Ethos, em 1998, e a
atuação do sociólogo Herbert de Souza na campanha contra a fome, foram
grandes molas propulsoras da discussão sobre responsabilidade social nas
empresas (ALENCASTRO, 2012).

VOCÊ O CONHECE?
Herbert de Souza, o Betinho, foi sociólogo mineiro que se notabilizou pela criação da
Campanha contra a Fome, a Miséria e Pela Vida e notabilizou a discussão sobre a miséria e a
desigualdade no país. Sua atuação em prol da dignidade humana lhe rendeu uma indicação
ao prêmio Nobel da Paz em 1993. Hemofílico e soropositivo, Betinho faleceu em 1997, vítima
de Hepatite B.

É do Instituto Ethos, que tem como objetivo orientar e incentivar empresas


acerca de sua responsabilidade socioambiental, umas das definições mais
corrente para o conceito de responsabilidade social:

Responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela


relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os
quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais que
impulsionem o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando
recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a
diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais
(INSTITUTO ETHOS, apud ALENCASTRO, 2012, p. 134).
O sociólogo John Elkington formulou o conceito de triple bottom line, ou
tripé da sustentabilidade, isto é, para o autor, uma empresa é sustentável
quando respeita três princípios básicos: ser financeiramente viável, ser
socialmente justo e ser ambientalmente responsável (ALENCASTRO, 2012).
Mas como podemos pensar a atuação da empresa dentro do paradigma da
responsabilidade social e do tripé da sustentabilidade?

4.3.2. A responsabilidade social na atuação empresarial


Dentro das empresas, o conceito de responsabilidade social refere-se,
segundo Alencastro (2012), ao oferecimento de produtos socialmente
corretos, ao estabelecimento de um relacionamento ético com clientes,
fornecedores e funcionários, bem como a preocupação com o passivo
ambiental gerado pela atividade da empresa. A prática da
responsabilidade social deve alcançar tanto o público interno, tais como
os funcionários e seus familiares, quanto o público externo, a comunidade
na qual se insere o meio ambiente. Na prática, a responsabilidade social
refere-se a liderar e apoiar, dentro dos limites de recursos da corporação,
ações de interesse social.

VOCÊ QUER VER?


O documentário Uma Empresa Decente, a Decent Factory em inglês, (BALMÈS, 2004) apresenta
o dilema de uma grande empresa de telecomunicações entre guiar-se pelo lucro ou obedecer
a princípios morais. A reflexão do filme centra-se na questão sobre o que significa ser uma
empresa correta em uma época que se valoriza a responsabilidade social.
No Brasil, o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) realizou, em
2006, a pesquisa “Ação Social das Empresas”, que demonstrou as
principais áreas e ações de responsabilidade social no país, bem como os
públicos-alvo. Ações relativas à segurança alimentar, assistência social,
saúde, educação e lazer e recreação formam os principais focos da
responsabilidade social (IPEA, 2006).
Empresas podem se guiar também por normas e indicadores de
responsabilidade social, que estão na pauta da discussão pelo
estabelecimento de referências e parâmetros para este tema. A ONG
internacional Social Accountability International (SAI) propôs nove itens de
verificação no que se refere ao público endógeno da
empresa (ALENCASTRO, 2012):

1) não emprego de trabalho infantil;


2) não emprego de trabalho forçado;
3) garantia de saúde e segurança no local de trabalho;
4) garantia de liberdade de associação e negociação coletiva aos
funcionários;
5) não discriminação de qualquer natureza;
6) proibição de práticas disciplinares;
7) respeito à lei quanto à jornada de trabalho;
8) remuneração digna; e
9) garantia de que todos os requisitos da norma sejam aplicados
corretamente.

VOCÊ SABIA?
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou dados que
mostram que mais de 40 milhões de pessoas em todo o mundo foram
vítimas de trabalho escravo em 2016. Estimativas apontam que as
mulheres são as mais afetadas pelas modalidades modernas de
escravidão, representando quase 29 milhões de meninas e mulheres,
inclusive vítimas de trabalho forçado na indústria do sexo (CAZARRÉ,
2017). Leia mais em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-
humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit-
pede-mais-empenho-dos (http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-
humanos/noticia/2017-09/com-40-milhoes-de-escravos-no-mundo-oit-
pede-mais-empenho-dos)>.

Aliar a responsabilidade social aos objetivos de produtividade e


competitividade das corporações não é uma tarefa simples. Para obter
maiores chances de êxito, é necessário que o compromisso com a
responsabilidade socioambiental esteja presente já no planejamento
estratégico das empresas, de modo a ser fator constitutivo de sua atuação
desde a concepção do negócio.
Antes de ser um entrave para os objetivos financeiros - que são legítimos
em qualquer empresa privada - a responsabilidade social pode ser uma
aliada e deve ser encarada como um investimento em médio e longo
prazo. Os ganhos para a imagem da empresa, a identificação com setores
progressistas da sociedade, cada vez mais preocupados com o impacto
socioambiental das corporações, bem como o reconhecimento social e
estatal, que pode reverter-se em futuros incentivos fiscais, são algumas
das vantagens para enquadrar-se no paradigma cada vez mais presente no
mundo corporativo: de atuação responsável e ética junto à sociedade e o
meio ambiente. Em nosso próximo item, vamos abordar quais são os
desafios para se chegar a uma sociedade justa e igualitária.

4.4. Os desafios para a construção


de uma sociedade justa
Diante do cenário globalizado e regido pela lógica mercantil que
caracteriza nosso tempo, as sociedades e nações, especialmente das
economias periféricas, enfrentam grandes desafios para alcançar níveis de
desenvolvimento social e econômico satisfatório em termos de igualdade,
equidade e justiça social para sua população. Mas o que significa justiça
social? Qual a sua relação com os desafios que marcam nossa época?
Como dar materialidade à justiça social?

4.4.1. O conceito de justiça social


Com o advento da globalização e o agravamento das desigualdades sociais
em grande parte dos países do mundo, a discussão acerca do que é uma
sociedade justa e de como alcançá-la tornou-se uma questão de grande
relevância. Nesse contexto, o conceito de justiça social é central e refere-
se, de forma sucinta, ao problema de como uma sociedade deve,
eticamente, distribuir os bens por ela produzida (SANTA HELENA, 2008).
A construção de uma sociedade que se pretende justa não pode prescindir
de dois princípios fundamentais: a igualdade e a equidade. A necessidade
da construção de políticas públicas que leve em conta tais princípios é
especialmente forte nas sociedades expostas ao sabor do livre mercado.
Como vimos ao longo deste capítulo, o liberalismo econômico vem
aprofundando as diferenças sociais, especialmente nos países periféricos,
o que deve ser contrabalançado com políticas sociais que tenham como
foco a redistribuição dos bens.
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Figura 7 - Em contextos de grande desigualdade, cabe ao Estado a aplicação de políticas


e programas que zelem pela igualdade e equidade social. Fonte: maxim ibragimov,
Shutterstock, 2018.

Dessa forma, é na justiça distributiva que se ancora atualmente a


discussão sobre justiça social. O conceito moderno de justiça distributiva,
de acordo com Fleischacker (2006), tem no Estado o agente garantidor de
que os bens sejam distribuídos na sociedade de modo a suprir
necessidades e direitos básicos para a condição da cidadania. Já o filósofo
John Rawls, em sua obra “Uma teoria da Justiça”, expõe as bases da teoria
de justiça como equidade. Para o autor (2002), alcançar a equidade,
condição da justiça social, são necessários três pontos fundamentais:

a garantia de liberdades fundamentais: refere-se ao direito de cada


pessoa a um conjunto de liberdades básicas, que seja compatível
com o conjunto de liberdades de toda a população, tais como a
liberdade política, de associação, de palavra, de consciência e de
direito à propriedade.
a igualdade de oportunidades;
a garantia de que as pessoas menos favorecidas na sociedade
recebam benefícios que os alcem a condição de cidadania.

A ênfase do conceito de justiça social no acesso aos direitos básicos da


cidadania a toda população, o que demanda esforços distributivos por
parte do Estado, é especialmente importante em países periféricos do
capitalismo, nos quais a globalização impacta mais fortemente em suas
características negativas. Políticas de compensação e distribuição de renda
para pessoas em desvantagem social são fundamentais para que se
alcance uma condição mínima de justiça social. E o que vem a ser justiça
social? Aliás, justiça e direito tem o mesmo significado? Estes serão alguns
dos assuntos tratados no tópico a seguir.

4.4.2. As interfaces da Justiça


Embora as noções de Direito e Justiça pareçam sinônimos, é possível
observar, ao longo da história, períodos de maior ou menor afastamento
entre os dois conceitos. Na consciência coletiva, porém, essas noções se
entrelaçam a ponto de ser considerada uma coisa só. Mas na prática, é
possível afirmar que nem tudo o que direito é justo, do mesmo modo que
nem tudo o que é justo, é direito (CAVALIERI FILHO, 2002).
Enquanto a noção de justiça se refere a valores que são inerentes ao ser
humano, como a liberdade e a igualdade, dignidade, equidade etc., que se
relacionam com valores morais da sociedade, a noção de direito refere-se
a um instrumento criado para a realização da justiça. Conforme Cavalieri
Filho (2002), como a justiça é um sistema de valores em constante
transformação, nem sempre o Direito é capaz de satisfazer as necessidades
da Justiça. Isso pode se dar por diversos motivos: dificuldade do direito em
acompanhar as mudanças sociais, dificuldades na própria concepção das
regras do direito, falta de disposição política para implementá-lo, dentre
outros.

VOCÊ QUER VER?


O documentário Justiça (RAMOS, 2004) retrata a rotina do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, expondo a necessidade de mudanças drásticas no sistema judicial do país. A justiça é
retratada em toda sua burocracia, desigualdade e injustiça, na qual setores marginalizados da
sociedade são duplamente culpabilizados: por seus supostos delitos e pelo lugar que ocupam
na escala social.

O direito, assim, torna-se um direito injusto. Para o autor, a finalidade do


direito é a realização da justiça. Já a finalidade da justiça, é a
transformação social, ou seja, a condução de uma sociedade à justiça
social. Se o direito deve ser um instrumento para alcançar a justiça, o
alcance da verdade é finalidade do direto para obter uma decisão justa
(LUNARDI; DIMOULIS, 2007).
A discussão sobre a realização da justiça por meio da aplicação do direito
evoca também outra faceta: a distinção entre justiça universal e justiça
particular. Esta questão vem de Aristóteles e está intrinsecamente ligada
ao debate sobre justiça como equidade (RAWLS, 2002). A justiça universal
relaciona-se à legalidade, ou seja, remete ao todo da sociedade. A lei e a
justiça aplicam-se a todos e a todas as situações, de forma abstrata,
genérica e universal.
Porém, existem casos particulares e específicos cuja justiça universal pode
não alcançar critérios de justiça, mas ao contrário, provocar injustiça.
Nestes casos, entra em cena a justiça particular. Essa segunda forma de
justiça relaciona-se à igualdade (ARISTÓTELES, 1979). Isso quer dizer que,
casos em que a justiça universal não satisfaça os critérios de equidade de
um indivíduo ou um grupo em particular, devendo então a justiça guiar-se,
não pela lei genérica, aplicável a todos, mas por critérios particulares que
atendam a uma decisão justa e equitativa. A seguir, vamos tratar dos
desafios enfrentados pela justiça social.

4.4.3. Os desafios da Justiça Social


O desenvolvimento econômico sem preocupação com o bem-estar
coletivo favorece a concentração de renda nas mãos de poucas pessoas e,
por consequência, a desigualdade social. O resultado disso são países que,
mesmo com índices econômicos em ascensão, não conseguem traduzir
esse crescimento em melhoria na condição de vida da população. O fato é
que o mercado não é capaz de gerar justiça social e acesso à cidadania. É
necessário que ações partam do Estado, tanto em termos de regulação da
economia, quanto em termos de programas e ações que visem garantir a
toda população diretos básicos e condições de vida dignas.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 3º, contempla
aspectos referentes à diminuição da desigualdade social e promoção de
uma sociedade justa:

Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: i)


construir uma sociedade livre, justa e solidária; ii) garantir o
desenvolvimento nacional; iii) erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais; e iv) promover o bem de todos,
sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminação (BRASIL, 2002, p. 13).
A aplicação dos desígnios da Constituição na prática, porém, é tarefa árdua
e complexa. Ao longo de sua história, o Brasil sempre se estruturou como
uma sociedade desigual, cujos interesses de uma parcela pequena da
população prevaleciam sobre os interesses – e direitos – da grande
maioria. Desde os primeiros anos do século XXI, observamos alguns
avanços no sentido de universalizar o acesso a direitos básicos da
população: programas de distribuição de renda, aumento do acesso de
pessoas de baixa renda à educação superior, programas de segurança
alimentar, regulamentação de profissões historicamente marginalizadas,
como o caso do emprego doméstico, dentre outros.

VOCÊ SABIA?
O Programa Bolsa Família, criado em 2003 pelo Governo Federal, tornou-
se um programa de referencia mundial em distribuição de renda. Estudos
sobre o impacto do programa mostram que, com um baixo custo aos
cofres públicos, o Bolsa Família contribui para o aquecimento da
economia; superação da extrema pobreza; melhorias na saúde e na
educação da população de baixa renda; redução do trabalho infantil; e
empoderamento das mulheres (CAMPELO; NERI, 2013).

Os esforços, porém, são frágeis diante do abismo social vivenciado no país:


segundo ranking de desigualdade social da ONU, o Brasil é o décimo país
mais desigual do mundo (PNUD, 2016). John Rawls (2002), a partir de sua
teoria da justiça como equidade, busca estabelecer princípios e
instituições necessários para que se alcance a justiça social. Em primeiro
lugar, aponta que o sistema educacional deva ser subsidiado pelo governo,
de modo a garantir liberdade de consciência e igual acesso à educação
para todos os cidadãos. Em segundo lugar, o governo deve garantir uma
renda mínima a todas as famílias, de modo que os direitos básicos sejam
garantidos. Rawls (2002) defende também que as instituições
governamentais devam comportar programas de apoio para, por um lado,
garantir a eficiência da economia do mercado, mantendo o sistema de
preços em patamar competitivo e garantindo níveis de emprego; e por
outro, garantir a equidade social por meio de impostos sobre herança e
consumo e por políticas de transferência de renda para os setores mais
fragilizados da população.
Como vimos, os desafios da justiça social em tempos de globalização e
livre circulação do capital econômico são imensos. Para que os países
logrem sucesso, é necessário atentar para o fortalecimento de políticas do
Estado frente às demandas e exigências do mercado. Além disso, ações de
inclusão social e diminuição da desigualdade - em curto, médio e longo
prazo - devem ser pensadas envolvendo todos os setores – sociedade civil,
mercado e Governo.

Síntese
Chegamos ao final do capítulo e pudemos refletir sobre as principais
tendências sociopolíticas do mundo pós-socialista, ou seja, do mundo
globalizado. Estudamos os problemas contemporâneos relacionados às
migrações, à responsabilidade social e à noção de justiça social.
Neste capítulo, você teve a oportunidade de:
estudar a Guerra Fria e suas consequências para as sociedades
contemporâneas, bem como identificar as características e
tendências da globalização;
conhecer os dilemas ensejados pelos deslocamentos populacionais,
seus motivos e consequências, e desafios frente à globalização e à
reestruturação econômica das últimas décadas;
compreender a responsabilidade social como questão importante da
sociedade contemporânea, sobretudo, quando se trata da atuação
das empresas;
entender o conceito de justiça social e pensar sobre os desafios para
a construção de uma sociedade com mais igualdade social.

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