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Work in Progress Paper

O uso do Chat em EaD: uma proposta metodológica

Eduardo S. Junqueira
Instituto UFC Virtual

1 Introdução

Parece haver uma forte concordância entre os pesquisadores da área: a


autonomia (do aluno) e o diálogo (entre alunos e professores) são pilares fundamentais
de boas práticas em Educação a Distância (EaD). Pretti (1996), citando Pineau, diz que
autonomia “significa a capacidade que o sujeito tem de ‘tomar para si’ sua própria
formação, seus objetivos e fins; isto é, tornar-se sujeito e objeto de formação para si
mesmo” (p. 6). O diálogo parece tornar-se produtivo em EaD ao constituir-se em linha
com as formulações da Teoria da Ação Comunicativa de Habermas (1987, 1987a). O
autor propõe que essa competência comunicativa forma-se no evento do agir
comunicativo mediado simbolicamente, o que estabelece e preserva sentidos, ou seja,
confere significação aos atos dos alunos. Tal agir se orienta por normas estabelecidas,
que definem expectativas recíprocas (entre o aluno e o professor) quanto aos modos de
intercâmbio, que devem ser compreendidos e reconhecidos pelos participantes.
Pesquisadores têm apontado as razões e os benefícios do desenvolvimento de
experiências em EaD alicerçadas por esses dois pilares pedagógicos visando a
satisfatória aprendizagem dos alunos e o bom uso dos recursos tecnológicos digitais
(Peters, 2001; Andrade e Vicari, 2006, Belloni, 2001). Menor atenção tem sido dada, no
entanto, à aplicação desses dois pilares nos momentos de ação pedagógica em EaD.
Sabe-se que a realização de um debate na sistemática do Fórum de Discussões deve
privilegiar ações que visem o incremento do diálogo e da autonomia, o que em geral
tem sido buscado em muitas experiências de EaD documentadas em diversas regiões do
país1. Procura-se fugir das práticas tradicionais baseadas em pedagogias conteudistas,
em que o papel do professor centra-se na transmissão de “saberes” ao aluno. As práticas
correntes em geral adotadas no Fórum de Discussões ajudam a concretizar os pilares

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Os vários grupos de pesquisa que se dedicam à compreensão dessas práticas podem ser localizados
através do Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/

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fundamentais da EaD, além de utilizar os recursos tecnológicos disponíveis e de abrir
caminhos para que se estabeleçam laços afetivos entre os participantes. No caso do
Fórum de Discussões parece haver, portanto, um alinhamento bastante produtivo entre
os pilares pedagógicos da EaD, os objetivos de aprendizagem e os recursos tecnológicos
da ferramenta tecnológica digital.
Tal sintonia não tem sido observada, porém, no caso das ferramentas para a
realização de bate-papos virtuais (os chamados chats). Segundo Gonzalez (2005), “essas
ferramentas promovem discussões interativas entre duas ou mais pessoas
simultaneamente, disponibilizam uma ou mais ‘salas’ (canais) para discussão de
assuntos distintos e permitem que se enviem mensagens para todos os usuários
conectados num canal ou apenas para um usuário, privativamente” (p. 62).
Levantamentos informais junto a designers de cursos em EaD e a tutores que atuam na
modalidade têm revelado o desuso dessa ferramenta. Curiosamente, a justificativa para
tal desuso tem se constituído a partir de considerações acerca dos dois pilares da EaD já
mencionados, a autonomia e o diálogo. Em outras palavras, designers e tutores têm
desenvolvido o senso de que o uso da ferramenta Chat instrumentaliza – de modo
excessivo – a autonomia e o diálogo dos alunos. Isso tem gerado dificuldades no
desenvolvimento da experiência do Chat em EaD.
Há relatos de experiências em que o tutor reclama da dificuldade em gerir o
Chat, pois os alunos “não paravam de falar”. Referem-se ao ritmo frenético em que
alunos teclam para expressar suas idéias, o que gera sucessivos blocos de textos dos
vários alunos na tela, surgindo e se movendo muito rapidamente a dificultar a leitura.
Tal ocorrência caracteriza práticas de diálogo ou, mais especificamente, de multiálogo.
Esse termo caracteriza “conversas realizadas simultaneamente, sobre assuntos
relacionados direta ou indiretamente com o foco principal do encontro, com
participantes envolvidos, às vezes em mais de uma discussão ou ‘ saltando’ de uma para
a outra” (Borba, p. 42). Ainda segundo o autor (op. cit.) parece haver “uma adaptação
‘natural’ por parte dos participantes, que após alguns encontros não mencionam mais
suas dificuldades diante da ‘avalanche’ de informações e questões que ocorrem
simultaneamente” (p.43).
Há também relatos de que os alunos não se concentram somente no debate do
tópico sugerido pelo professor, propondo outros tópicos que desviavam o foco
planejando do Chat. Trata-se de uma ocorrência que, em alguns casos, está ligada à
prática da autonomia pelos alunos. Existem outros elementos que dificultam o uso da

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ferramenta Chat, em particular no campo das Ciências Exatas. Nesse caso, a interface
predominantemente textual em que as atividades do Chat se processam não favorece o
uso de recursos gráficos necessários para que alunos e professores possam se comunicar
e avançar a compreensão sobre conteúdos específicos da área. Ocorrem também
dificuldades de caráter mais geral quanto à utilização da ferramenta, em particular a
necessidade de agendamento prévio de horário e comparecimento com hora marcada, o
que limita a flexibilidade do aluno, dado o caráter síncrono das comunicações que se
processam durante a atividade (troca de mensagens entre os participantes em tempo
real). Acredita-se também que, em muitos casos, o uso da ferramenta seja associado a
práticas menos formais, até mesmo de lazer, pelo alunos, o que diluiria o potencial
educativo e reflexivo de atividades desenvolvidas através do uso da ferramenta.
A despeito de tais dificuldades, é importante atentar para a importância do uso
da ferramentas em ações de EaD. O Chat tem forte potencial interativo. Mesmo em
situações com frágil acesso a internet, o Chat permite trocas entre alunos e professores
que parecem suprir, de forma mais satisfatória, a carência dos alunos por espaços e
práticas que remetam às tradições da sala de aula presencial. Muitos alunos revelam
prazer em poder contar com um horário marcado em que certamente terão acesso ao
professor, ainda que mediado pela tecnologia digital, quando poderão trocar idéias e
receber imediata resposta dos colegas e do tutor. Segundo Leal, “o retorno imediato,
síncrono, ao retorno do aluno, incentiva cada vez mais sua participação no curso de
EaD; muitas vezes o aluno passa um e-mail que só será respondido dias depois, e isso
desestimula” (Leal, 2007, p.58). Além disso, o Chat permite ao professor ou tutor obter
imediata percepção sobre compreensões ou dificuldades de compreensão dos conteúdos
trabalhados, permitindo correções de rumo no curto prazo. Isso tem impactos positivos
na aprendizagem e na relação com os alunos. Afinal, sentir a presença do professor e
dos colegas é um dos princípios para o sucesso de cursos a distância (Palloff e Pratt,
2002). Faz-se necessário, portanto, buscar respostas mais adequadas para a pergunta
fundamental proposta por Kenski (2003): “Como utilizar as tecnologias interativas de
comunicação e informação na docência para superar a solidão e viver a emoção da
‘aula’?” (p.120).

2 Chat Educativo

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Antes de prosseguir, porém, deve-se frisar que a proposta delineada a seguir não
contradiz as práticas mais avançadas de EaD que se constituem em linha com uma
perspectiva pedagógica sócio-interacionista, à qual se relacionam os pilares, já
mencionados, do diálogo e da autonomia. De acordo com tal perspectiva, busca-se
cooperação ativa dos alunos, e não meramente o acúmulo de dados por eles. Na
perspectiva sócio-interacionista (Vygotsky, 1978), portanto, a aprendizagem se constitui
como processo social em um dado contexto, a partir das trocas (atividades
complementares e interdependentes) entre os participantes no uso de “ferramentas” e na
manipulação e produção de textos.
Muitos problemas vivenciados por professores e tutores na realização do Chat
podem ser evitados com planejamento do tutor e com disciplina dos alunos, que devem
ser informados sobre o caráter educativo do Chat – ou seja, a dinâmica do Chat
educativo será um pouco diferente do Chat tradicional, destinado ao bate-papo informal
entre amigos. O tutor deverá evitar o “excesso democrático”, prática que “pode levar ao
caos da discussão” (Leal, 2007, p.50).
Nesse caso, o tutor deverá preparar as etapas-chave da conversa que será
desenvolvida com os alunos previamente, como se faz ao planejar uma aula. O tutor
deverá escrever, antecipadamente, as questões-chave que deverão ser debatidas ao longo
do Chat para certificar-se de que os conteúdos mais importantes sejam abordados
durante a sessão de Chat programada. Durante o Chat, o tutor terá essas questões já
escritas e poderá apenas copiar e colar essas questões na “janela” do Chat. Além disso, o
tutor deverá escrever previamente as saudações e orientações iniciais do Chat, bem
como as informações finais. Como todos esses textos já estarão escritos
antecipadamente, o tutor não perderá tanto tempo digitando durante o Chat e poderá
prestar mais atenção aos textos postados pelos alunos durante a atividade. Isso irá ajudar
o tutor a acompanhar as mensagens trocadas pelos alunos durante o Chat de forma mais
adequada.
Também não será demérito do tutor se não conseguir ler todas as mensagens
enviadas pelo alunos. O importante é que o tutor tenha um senso geral do
desenvolvimento do debate no Chat, ou seja, deve perceber se os principais elementos
da temática proposta estão, de fato, cobertos pela “conversa” que se desenrola durante o
Chat. Não se recomenda que o tutor procure responder perguntas individuais dos alunos,
mas, sim, que concentre a atuação em pontos comuns propostos por ele no planejamento
prévio ou pelos alunos ao longo do Chat. Em casos de perguntas muito específicas, o

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tutor deve optar por responder ao aluno por e-mail após o encerramento do Chat. Isso
ajudará o tutor a não perder o eixo do debate ao longo do Chat, ou seja, manterá uma
ação voltada a todo o grupo e não a alunos isolados.
Outro problema comum está em compreender o Chat educativo como uma
atividade isolada, Não é. Pode-se, por exemplo, associar ao Chat uma atividade
complementar, que ajudará os alunos a refletirem um pouco mais detidamente sobre as
principais questões debatidas ao longo da atividade, como exemplificado mais adiante.
Por fim, é preciso atentar para o caráter afetivo do Chat, pois constitui um
momento de “encontro” do tutor com os alunos, que em geral estão ávidos por trocar
idéias e impressões com seu “professor virtual”. Isso reduz a sensação de “distância” e
de isolamento do aluno e constitui prática importante para o bom desenvolvimento dos
estudos. Pode, em certa medida, reduzir índices de evasão discente. Por isso, é
importante que o tutor procure dar atenção a todos, mesmo que tenha que dizer que só
poderá responder uma questão do aluno posteriormente, por e-mail. Dessa forma, o
aluno perceberá que há um canal de comunicação efetivo com o tutor e que sua
participação não foi desconsiderada.

3 Desenvolvimento de Chat educativo estruturado

A seguir será apresentada uma proposta de chat educativo a partir dos


parâmetros formulados anteriormente.

Duração – 60 minutos (frisando junto aos alunos que o Chat terá início efetivo no
horário agendado)

00-05 min.: Orientações iniciais


Comentário:
O tutor deve se mostrar muito amistoso, cumprimentando os presentes pelo nome e de
outras formas que indiquem valor afeito na relação com os alunos.
Tipos de mensagens formuladas pelo tutor:
[O tutor aguarda cerca de 5 a 10 segundos entre a postagem de cada mensagem, para
que os alunos possam ter tempo de lê-las. Pode-se usar maiúsculas para se destacar
palavras ou frases, evitando-se o excesso, ou uma fonte gráfica diferenciada]

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1) “Caros(as) alunos(as), durante o Chat não serão aceitas conversas paralelas e fora do
tópico”.
2) “Não responderei questões individuais dos alunos. Ou seja, ao enviar uma mensagem
use sempre a opção falar com TODOS. A troca de mensagens dirigidas a indivíduos
tumultua e atrapalha o andamento de Chats educativos, como o que está proposto”.
3) “Evite digitar muitas mensagens seguidas – caso contrário ficará um pouco caótico e
difícil de acompanhar os comentários. Fiquem atentos”.
4) “Vamos focar o debate em uma questão de cada vez, para não nos perdermos ao
longo do debate”.
5) “Procure contemplar e completar idéias e posições diversas, ainda que conflitantes”.

06-10 min.: Espaço para que alunos formulem as principais questões que levantaram
sobre as leituras realizadas.
Comentário:
O tutor deve se mostrar interessado nas questões formuladas pelos alunos, se possível
parabenizando-o pelo nome após cada comentário realizado no Chat. Não será preciso
responder essas questões nesse momento, mas o tutor deve deixar claro que está ciente
do que foi perguntado pelo aluno.
Tipo de mensagens formuladas pelo tutor:
1) “Caros(as) alunos(as), essas questões são muito importantes e demonstram que
vocês procuraram explorar muitos aspectos do texto. Iremos debater alguns desses
tópicos ao longo do nosso Chat.”

11-20 min.: Tutor formula primeira questão-chave e convida alunos ao debate desta
questão.
Comentário:
O tutor deixará claro que a participação e contribuição de todos é fundamental para o
bom desenvolvimento no Chat. No entanto, caberá ao tutor conduzir o desenvolvimento
do Chat, o que implica em promover um debate na esfera dos principais elementos
conceituais que integram a temática específica do Chat educativo, evitando-se a pura
transmissão de conceitos. Caso os alunos comecem a fugir da temática proposta o tutor
deverá solicitar que se mantenham dentro do tema e informar que outras questões serão
abordadas ao final do Chat.
Tipo de mensagens formuladas pelo tutor:

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1) “Caros(as) alunos(as), a partir de agora debateremos algumas questões-chave que
preparei para o nosso Chat educativo. Essas questões irão permitir uma melhor
compreensão dos conceitos relacionados à temática do Chat. A primeira questão para
debate é ... [para maior destaque, o tutor poderá digitar essa questão em letras
maiúsculas, essa questão em maiúsculas poderá ser repetida pelo tutor após 5 minutos,
para reforçar o tema em debate no momento]”.
21-30 min.: Tutor formula segunda questão-chave e convida alunos ao debate desta
questão.
31-40 min.: Tutor formula terceira questão-chave e convida alunos ao debate desta
questão.

41-50 min.: Tutor utiliza esse tempo para retomar outras questões formuladas pelos
alunos durante o Chat.
Comentário: Ao longo do Chat recomenda-se que o tutor memorize ou tome nota das
principais questões que foram levantadas pelos alunos dentro da temática proposta.
Podem surgir aí novas idéias ou conceitos que o tutor poderá explorar, seja no próprio
chat ou em momento posterior. Esta será a etapa em que o tutor irá retomar algumas
dessas questões, dando crédito aos seus autores. O tutor irá solicitar que os demais
debatam o ponto levantado pelo colega. O tutor também poderá utilizar esse tempo para
solicitar que alunos com menor índice de participação durante o Chat se manifestem. Ao
final do tempo reservado a essa etapa o tutor deve se desculpar com os demais alunos
cujas questões não foram abordadas devido à exigüidade do tempo.
Tipo de mensagens formuladas pelo tutor:
1) “Nessa etapa do Chat gostaria de retomar algumas questões levantadas por vocês. Por
exemplo, [citar o nome do aluno] perguntou algo interessante. Ele disse que [reproduz a
questão do aluno]. O que vocês acham?”

51-60 min.: Tutor esclarece dúvidas remanescentes e encerra o Chat educativo


Comentário:
Nessa etapa o tutor avisa aos participante que o Chat será encerrado dentro de 10
minutos. Pergunta se ainda restam questões específicas sobre a temática do Chat que
deverão ser abordadas. Pode propor também algum tipo de síntese sobre o que foi
debatido durante o Chat indicando, por exemplo, pontos comuns entre as três questões-
chave que nortearam boa parte do debate. O tutor também deve avisar os alunos que

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enviará cópia do Chat por e-mail e que será necessário realizar uma atividade
complementar, com detalhes a serem enviados também por e-mail ou postados em área
específica do AVA. Por fim, caso restem perguntas não respondidas, o tutor deve
solicitar a seus autores que a reenviem por e-mail para posterior resposta.
Tipo de mensagens formuladas pelo tutor:
1) “Caros(as) alunos(as), o Chat de hoje está sendo muito produtivo. No entanto
deveremos encerrar dentro de 10 minutos. Alguém tem alguma questão final que
gostaria de debater?”
2) “Para finalizar, gostaria de indicar uma breve síntese dos pontos abordados hoje no
Chat. É importante que vocês percebam que o conceito .... [o tutor demonstra algumas
conexões entre os diversos aspectos discutidos no Chat dentro da temática]”.
3) “Gostaria de agradecer a todos pela pontualidade, pelo interesse e pela disciplina que
fizeram desse encontro virtual uma ótima oportunidade para que pudéssemos debater
importantes tópicos [citar os tópicos] da temática [citar a temática]. Como sempre,
estarei à disposição para esclarecer outras dúvidas por e-mail. Aguardem nova
mensagem minha com a cópia do Chat de hoje e a atividade complementar [o tutor deve
incluir algum tipo de mensagem pessoal de agradecimento para o encerramento]”.

4 Chats educativos nas diversas áreas das Ciências Exatas

Para os Chats educativos nas áreas de Ciências Exatas o tutor poderá encaminhar
previamente aos alunos materiais diversos, além de textos tradicionais, que poderão
servir de suporte ao trabalho a ser desenvolvido durante o Chat. Por exemplo, pode-se
distribuir via email ou através do AVA do curso figuras e equações com questões
associadas para que os alunos possam refletir sobre a atividade ou até mesmo
desenvolver alguma atividade antes da realização do Chat, incluindo o uso de softwares
gráficos para a realização de experimentos que poderão ser debatidos durante o Chat.
Deve-se recomendar que os alunos mantenham esse arquivo aberto em outra janela do
computador durante todo a atividade para que possam consultar, ao longo do Chat, o
material enviado previamente pelo professor. Alguns Chats contam com convidados, em
geral professores especialistas no tema enfocado que procuram ajudar os alunos na
compreensão de temas complexos, evitando-se a pura transmissão de conhecimentos ou
a apresentação de uma resposta às indagações dos participantes.

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Também será possível desenvolver um Chat sobre uma atividade que foi
realizada anteriormente pelos alunos no laboratório. Nesse caso o Chat servirá para
esclarecer dúvidas e para auxiliar a compreensão dos fenômenos observados durante
aquela atividade.

5 Atividades complementares ao Chat educativo

Recomenda-se que o tutor armazene o texto completo do Chat em arquivo do


tipo doc (basta selecionar e copiar o texto completo do Chat e colar o material em
arquivo do processador de textos, de preferência sem formatação para se evitar a criação
de arquivos muito extensos, de difícil transmissão pela internet; alguns AVA possuem a
função “gerar cópia do Chat”). O tutor pode então enviar o material a todos os alunos
como um anexo de e-mail ou postar em área específica do AVA. Deve-se orientar os
alunos quanto ao uso da função “Localizar” do processador de textos. O uso dessa
função permitirá, por exemplo, localizar o próprio nome ao longo do Chat, permitindo
verificar a participação na atividade. O uso do recurso “Localizar” facilita muito a
pesquisa no texto, pois o arquivo completo de um Chat contem uma enorme quantidade
de texto, o que em geral desmotiva a releitura do material bruto.
Recomenda-se, também, que o tutor proponha uma atividade complementar em
que o aluno poderá fazer um resumo dos principais temas debatidos no Chat. Isso
ajudará a reduzir a sensação de superficialidade e de falta de síntese vivenciada por
alguns alunos que participam dessa atividade. Esse resumo pode ser desenvolvido em
diálogo com os textos indicados para leitura em preparação para o Chat. Por exemplo, o
aluno poderá produzir um resumo do Chat indicando como as principais idéias dos
autores dos textos foram criticadas durante a sessão de Chat; ou os alunos poderão partir
das principais conceitos dos textos lidos e identificar idéias debatidas ao longo do Chat
que estenderam e aprofundaram as proposições iniciais dos autores, se for o caso. Tudo
isso permitirá que o aluno reflita, de forma mais detida e crítica, sobre os conteúdos
gerados durante o Chat. Isso possibilitará uma melhor compreensão dos conceitos por
parte do aluno.
Ao reexaminar os conteúdos do Chat o aluno também poderá desenvolver um
senso mais preciso de sua participação na atividade: se participou muito ou pouco, se os
comentários realizados estavam mais ou menos em linha com as questões propostas
pelo tutor e as contribuições dos colegas, e como poderá aprimorar a participação para o

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próximo evento. Isso também terá valor educativo para a autonomia do aluno na medida
em que lhe permitirá desenvolver uma meta-avaliação sobre seu próprio processo de
aprendizagem podendo, inclusive, dialogar com o tutor sobre como aprimorar a
participação em Chats futuros.
Por fim, o tutor poderá retomar algumas idéias ou conceitos apresentados pelos
alunos durante o chat e desenvolver novas atividades de aprendizagem que propiciem
uma melhor compreensão das mesmas. Isso não só caracterizará uma valorização da
participação discente no curso. Permitirá também que o tutor desenvolva novos
momentos de aprendizagem em maior sintonia com os interesses e curiosidades dos
alunos a partir de prática dialógica.

6 Relato de experiência

Durante um curso de extensão para a formação de tutores para o programa


Universidade Aberta do Brasil, no qual participam alunos graduados e pós-graduandos,
foram realizada duas atividades programadas pelo Chat. Em ambas os alunos foram
divididos em grupos de cerca de 10 alunos e receberam um texto para leitura prévia, que
deveria nortear os debates durante a atividade. O primeiro Chat foi realizado de forma
estruturada, com a proposição de perguntas pelo tutor que deveriam ser debatidas pelos
alunos. Utilizou-se um sistemática semelhante à detalhada anteriormente neste artigo. A
proposta do Chat era “conversar sobre as idéias apresentadas por José Manuel Moran no
texto intitulado ‘O que é um bom curso a distância?’”. O segundo Chat também contou
com leitura prévia dentro da temática e foi realizado de forma não-estruturada, com
abertura para o debate de qualquer questão proposta pelos alunos dentro da temática
estabelecida. A orientação fornecida ao aluno para o Chat era “Leia o artigo ‘O Que os
Aprendizes Esperam dos Professores na Educação a Distância On-line’, Fonte: Site
Comunicar, e reflita sobre as estratégias de moderação que os alunos da EaD
consideraram mais significativas” para debate durante o Chat. Não houve atividade
complementar específica para nenhum dos dois Chats, mas, sim, outras atividades ainda
dentro da mesma temática (leituras adicionais, participação em Fórum e redação de
texto).
Após a realização dos chats o tutor solicitou aos alunos, por mensagem de e-
mail, que avaliassem os Chats realizados e sugeriu as seguintes categorias para essa
avaliação comparativa: melhor ou pior compreensão de conceitos; melhor ou pior

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intercâmbio de idéias e opiniões; maior ou menor interesse e prazer com a atividade;
outros. As respostas dos alunos oito alunos que responderam, através de mensagens
enviadas individualmente ao tutor por e-mail, estão listadas a seguir:
A aluna 1 achou que o primeiro Chat foi “mais organizado” e que “a
compreensão, o intercâmbio de ideias e opiniões foram melhor colocadas”2. A aluna 2
escreveu: “Gostei mais do primeiro Chat quando vc direcionou toda a discussão, pois no
segundo algumas colegas se afobaram, não esperaram pra refletir sobre o que estava
sendo falado e já foram dizendo que não entendiam nada...achei desnecessária toda
afobação. Tudo o que estava sendo dito fazia parte das leituras propostas anteriormente.
De alguma maneira isso me desestimulou e tirou meu prazer de discutir”. A aluna 3
corrobora a perspectiva da aluna 2, ao afirmar que achou “o primeiro Chat bem mais
organizado e estruturado, o que facilitou mais a compreensão dos conceitos e as idéias
também foram expostas de forma mais organizada. Eu não tive dificuldade em
participar e compreender o segundo Chat, mas observei que algumas pessoas (...)
estavam bem confusas. Acredito que isto ocorreu devido a liberdade inicial de
exposição do tema para debate, pois cada aluno poderia propor um tema no início do
Chat”. Ela conclui dizendo que “as duas formas foram prazerosas e válidas, mas o que
observei foi que quando o Chat é mais direcionado as pessoas participam mais”. A aluna
4 avaliou que houve “pior compreensão de conceitos e pior intercâmbio de idéias [no
segundo Chat] em relação ao primeiro”, mas afirmou que houve “interesse igual porque
é necessário para o processo, mas [com] menor prazer na realização da atividade [no
segundo Chat]”. Outras três alunas responderam com comentários que sustentam as
opiniões anteriores.
A aluna 5 mostrou-se mais favorável ao modelo estruturado, mas não deixou de
apontar qualidades no segundo Chat. Ela disse: “particularmente gostei mais do
primeiro. Acho que as idéias ficam um pouco mais organizadas, mas um ponto negativo
para mim foi a pouca possibilidade de interação que tivemos, talvez devido ao tempo
‘cronometrado’ para as discussões de cada idéia ou tópico central. No segundo, apesar
de ter participado apenas durante 20 minutos, senti que houve mais debate, mais troca
de idéias, mas a estrutura mais livre me deixou um pouco confusa”.
A aluna 6 foi a única a avaliar em sentido contrário ao das colegas. Ela disse, ao
comparar o primeiro Chat e o segundo, que “acho este último de maior abrangência na
questão de desenvolver assuntos, inclusive a própria abordagem na qual pudemos
2
Transcrição literal das mensagens recebidas pelo tutor.

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demonstrar como compreendemos o texto; o desenrolar das idéias foram fluindo mais
espontaneamente, não tínhamos a preocupação com conceitos, era tudo natural.
Resumindo, foi bem mais interessante e prazeroso [o segundo Chat]”.
Observa-se, portanto, uma forte tendência dos alunos, que serão futuros tutores
de EaD, em apreciar as vantagens do Chat estruturado para o ensino de conceitos,
apesar do esforço demonstrado em reconhecer a importância e a necessidade de
participar em ambas as modalidades. Nota-se também uma apreciação do caráter
“prazeroso” da atividade, o que parece estar associado ao caráter afetivo constituído
pelas trocas entre os participantes durante a atividade. Esses relatos estão em linha com
prática reportada por Leal (2007). Segundo a autora, “nas experiências [de chat
educativo] realizadas, quando era lançada uma pergunta (referente ao texto proposto)
para a turma, presencialmente, apenas um, no máximo dois, alunos manifestavam-se.
Durante o bate-papo virtual, ao lançarmos uma pergunta, mais alunos conseguiram
escrever alguma idéia sobre o assunto” (p.61). Essas experiências positivas e
animadoras contrastam com a baixa freqüência do uso de tal ferramenta nos processos
de EaD e indica a necessidade de sua inclusão de forma mais sistemática.

7 Para concluir

Os pilares do diálogo e da autonomia sustentam as boas práticas de EaD,


norteadas por um projeto pedagógico que procura, também, maximizar as
potencialidades educativas e interativas das ferramentas digitais, como o Chat. Faz-se
necessário, porém, especificar e detalhar metodologias de utilização da ferramenta que a
tornem um auxiliar adequado – e não um entrave – ao profícuo desenvolvimento de
práticas dialógicas e autônomas em EaD, a partir de uma perspectiva sócio-
interacionista.
A metodologia apresentada neste artigo propõe uma estrutura básica que
preserva tais elementos, ainda que enfatize a necessidade de uma atuação mais
acentuada e pontual do tutor a fim de garantir a consecução dos objetivos de
aprendizagem traçados. Vale salientar que a utilização do Chat em processos de EaD
não constitui apenas a exploração dos recursos interativos de uma ferramenta digital.
Configura um rico momento de trocas e de aprendizagem entre os participantes,
podendo ser precedido por atividades propostas pelo tutor e podendo criar novos
momentos de aprendizagem a partir, principalmente, das contribuições e questões dos

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alunos. O uso do Chat ganha destaque pelo seu potencial de reproduzir, ainda que de
maneira restrita, práticas comunicativas que, ao simularem a dinâmica da sala de aula
tradicional, também produzem efeitos de motivação e de coesão entre os participantes.
Isso é benéfico aos processos de EaD e ultrapassa o aspecto técnico do uso da
ferramenta eletrônica, sem no entanto desprezá-lo.
Dessa forma, ao concluir parece adequado resgatar a experiência do navegador
Amir Klink, que, durante suas longas travessias marítimas, diz nunca se sentir só,
apenas se sente desacompanhado. Como elaborou Kenski (2003) sobre as experiências
de Klink, “pela aparelhagem eletrônica que dispõe em seu barco, ele consegue interagir
e se comunicar o tempo todo com os técnicos que o auxiliam na viagem, a família, os
amigos e muitas outras pessoas. Sem a interação e a colaboração permanente dessas
pessoas, o navegador jamais conseguiria levar adiante seus audaciosos projetos”
(p.120).

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Referências bibliográficas

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