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O que esconde o entusiasmo pela reindustrialização – Estrutura textual


Gérard Duménil e Dominique Lévy

Argumento central dos autores:

1) “Difícil duvidar da urgente necessidade de uma volta da indústria, após um deslocamento maciço da
produção para os países periféricos”. Porém, saudar a ideia de que está havendo uma reindustrialização,
expressa pelos “...gritos de vitória saudando a retomada em marcha da indústria automobilística nos
Estados Unidos”, corresponde a não enxergar a nova dinâmica do capitalismo. Esses gritos de vitória são
“... muito oportunos em um período eleitoral...”, mas podem “...se revelar prematuros, até mesmo
otimistas”.

▪ “Qualquer que seja a diversidade das experiências nacionais, os processos de desindustrialização e


de reindustrialização devem ser compreendidos como engrenagens das mecânicas neoliberais” (grifo
meu). Por um lado, o objetivo era o de cortar custos e tentar retomar ciclos positivos de rentabilidade.
Por outro lado, as “mecânicas neoliberais” se inscrevem na financeirização, a partir da qual parcelas cada
vez maiores dos ganhos empresariais são produto de investimentos deslocados para operações cambiais,
com papéis etc..

Conceitos-chave:

1) Desindustrialização\reindustrialização; 2) deslocalização\relocalização; 3) neoliberalismo.

Argumentos de subsídio:

1) Lembremos em primeiro lugar que a desindustrialização é um processo mais amplo e antigo que a
deslocalização.

▪ A primeira, diz respeito à transição da indústria manufatureira para o setor de serviços.

▪ A segunda é o deslocamento da produção dos países centrais para países periféricos (asiáticos,
sobretudo) ou de antigas regiões industriais (mesmo dentro de países periféricos) para novas regiões.

2) Os autores questionam: O presidente Obama enfrentará as empresas transnacionais, obrigando-as a


colocar um fim à estratégia de deslocar a produção?

3) De fato, há um aumento dos custos de produção – sobretudo salariais – nos países do sudeste
asiático, além da valorização de algumas moedas, como o Yuan chinês.
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▪ Com isso, algumas empresas, em busca da redução de custos salariais, têm feito o caminho de volta
para os Estados Unidos, inclusive valendo-se de uma estratégia discursiva da “América construída para
durar” ou o “fazer a América grande novamente”.

▪ Assim, a redução de custos e a busca por rentabilidade, somada aos incentivos (fiscais, creditícios)
governamentais, seria justificada.

4) Mas, é preciso relativizar bastante esse “retorno” da indústria. Os autores falam dos EUA, e também
comparam a Alemanha com a França.

Conclusões dos autores:

1) “Enquanto o quadro neoliberal geral, em todos os seus aspectos – hegemonia das classes capitalistas
e das instituições financeiras, adesão dos quadros gerenciais e administrativos aos objetivos neoliberais,
financeirização e globalização –, não for questionado pelo que poderíamos chamar, pensando nos
Estados Unidos do pós-guerra, “de uma repressão financeira”, todas as tentativas para lutar contra o
processo de desindustrialização, qualquer que seja seu grau de sucesso, são regressivas e continuarão a
ser”.

2) A luta contra o processo de desindustrialização, cujo cerne é a exigência de uma retomada do


emprego da massa salarial igual ou pelo menos próxima a épocas anteriores, por desconhecerem o
fulcro da era neoliberal, não contribuem para o “restabelecimento do crescimento” e da “restauração
do emprego”.
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Como a visão utópica do Vale do Silício pode estar levando o mundo ao


capitalismo brutal – Estrutura textual
Jaime Bartlet

Argumento central do autor:

1) “O mantra do Vale do Silício é que a disrupção sempre é boa. Que com os telefones inteligentes e a
tecnologia digital é possível criar serviços mais eficientes, mais cômodos e rápidos. E que todo mundo
ganha com isso. Entretanto, por trás do desenho desse aplicativo maravilhoso ou dessa impecável
plataforma está se desenvolvendo uma forma brutal de capitalismo, que está deixando de fora alguns
dos setores mais pobres da sociedade” (os grifos são meus).

Conceitos-chave:

1) Disrupção; 2) capital de risco; 3) contradições da disrupção; 4) capitalismo brutal.

Argumentos de subsídio:

1) Há um fetiche da tecnologia: “Com a tecnologia em nossos bolsos, podemos recuperar nossas


cidades”. Essa capacidade de mudar o mundo através da tecnologia tem seu motor na “disrupção”,
expressa pela mistura entre medo e, ao mesmo tempo, o desejo pela mudança.

2) A narrativa das empresas de tecnologia é que elas têm um propósito social de melhorar o mundo, para
além do simples ganho econômico. “como nos desfazemos desta indústria, arquitetura ou sistema
anterior e encontramos uma nova e melhor forma de fazer as coisas?”.

3) Ao mesmo tempo, junto com os ideiais do “novo”, da “disrupção”, “... há uma realidade empresarial
mais tradicional”.

4) As startups alimentam-se do “capital de risco”, o qual investe no desenvolvimento das ideias trazidas
por diferentes pessoas que aportam no Vale do Silício. E esses investimentos exercem uma enorme
pressão sobre essas empresas, já que eles estão em busca de resultados positivos, em termos de
possibilidade de rentabilidade futura.

5) A Uber é um exemplo de iniciativa gestada em uma startup, cuja narrativa faz apelos à ideia de
mobilidade, de sustentabilidade. “Uma pura expressão da utopia do Vale do Silício. Trata-se de uma
empresa lucrativa ou de uma missão social?”.

6) O outro lado da Uber: rebaixamento de preços da indústria tradicional dos taxistas, através de uma
alternativa popular e barata. Para os motoristas, a promessa foi de ganhos muito acima do que
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comumente se obtinha, maior autonomia em termos de tempo e financiamento para aquisição de


veículos.

7) Mas os ganhos prometidos não foram obtidos, o que se somou à retirada dos incentivos aos
motoristas por parte da Uber.

8) A narrativa do Airbnb também fala em melhora do mundo. Seus fundadores afirmam que “...estão
conectando o mundo, não simplesmente permitindo que as pessoas coloquem avisos para alugar casas.

9) O outro lado do Airbnb: de acordo com seu fundador, o “...único perdedor com sua disrupção é a
tradicional indústria hoteleira. Mas, isso não é o que se sente em Barcelona. Os locais se queixam de que
os aluguéis na cidade estão subindo para todos, pois os proprietários só pensam nos turistas”.

10) O argumento utilizado pela empresa é que disruptora “...é que os reguladores, os governos, os
políticos eleitos, precisam se atualizar, mudar suas políticas tendo em conta a nova realidade”. Contudo,
no local onde estão Google, Apple e Facebook, os impostos sobre a propriedade para por elas é cobrado
“...a uma taxa de 1% do valor de todos os seus edifícios e equipes”. De acordo com Larry Stone, assessor
do Condado de Santa Clara e cujo trabalho é calcular o valor das propriedades da região, os “gigantes
tecnológicos” “...tendem a não concordar com o valor que devem contribuir”.

Conclusões do autor:

1) Diferentemente das ondas de disrupção anteriores, a atual seria diferente, pois “...tem o potencial de
romper com a forma como funciona o capitalismo”, podendo transformar completamente a vida das
pessoas.

2) Ao final, o autor deposita suas crenças na “política”, isto é, na regulação estatal sobre os ímpetos da
indústria de alta tecnologia.

Guerra aos “vagabundos”: sobre os fundamentos sociais da militarização em


curso – Estrutura textual
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Maurílio Lima Botelho

Argumento central do autor:

1) A reforma trabalhista, com toda a catástrofe que traz consigo, revela a contradição contida no coração
do processo de reprodução social capitalista, objetivamente expressa na “desintegração da socialização
baseada no trabalho”. Nas palavras do autor, trata-se de uma “...barbarização social crescente criada pela
concorrência econômica desenfreada” (p.02, os grifos são meus).

▪ Ao mesmo tempo, a “...manutenção de uma compreensão da realidade em que o trabalho aparece


como a única possibilidade efetiva de dar significado às trajetórias individuais e compor, pelo seu
somatório, um conjunto social, reproduz e alimenta o discurso de que aqueles que, por algum motivo,
estão de fora desta socialização, são descartáveis” (p.02, os grifos são meus).

Conceitos-chave:

1) Ética do trabalho; 2) socialização pelo trabalho; 3) crise do capitalismo; 4) crítica radical.

Argumentos de subsídio:

1) O discurso aparentemente progressista de que o combate direto à criminalidade deve ser


acompanhado de medidas de integração econômica e geração de empregos gira em falso.

2) Os dados do IBGE revelam que a “melhora” no mercado de trabalho no Brasil é, na verdade, resultado
de um mecanismo individualizado de criação de atividades precárias, de “trabalhos por conta própria”,
“microempreendimentos” etc. que foi combinado, graças à reforma trabalhista, com uma crescente
substituição de assalariados registrados por terceirização irrestrita.

3) Há uma percepção crescente na sociedade brasileira (e mesmo em outras sociedades) de que aqueles
que não conseguem se socializar por meio do trabalho são percebidos como um peso para o restante
dessa sociedade. São os “não rentáveis”, os “sobrantes” de toda ordem.

4) As medidas de “compensação social” da era petista funcionavam muito mais como uma tentativa de
administração da crise do que um verdadeiro reconhecimento de que a socialização pelo trabalho já não
é mais possível.

▪ Nesse caso, a “ampliação do Bolsa Família aparecia assim como uma necessidade estrutural diante
do cobertor cada vez mais curto do mercado de trabalho e não como um processo temporário de
amparo aos excluídos” (p.03).
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5) Já o fundamentalismo de mercado não vê o esfacelamento da socialização pelo e para o trabalho


como uma condição objetiva, e sim como um fracasso pessoal daqueles que não têm conseguido se
“inserir” no mercado de trabalho (a chamada “autonomia econômica”).

6) É a partir das manifestações de 2013 que a “caixa de pandora” dos ressentimentos da “classe média”
contra o “vagabundismo remunerado” parece se abrir de fato. Discursos e palavras de ordem contra essa
condição “confortável” e a favor do “trabalho” e do “mérito” (a atualização “ética do trabalho”)
multiplicaram-se nas falas cotidianas, nos programas televisivos e nas redes sociais.

7) Na medida em que a realização dos “fins do Estado” no processo econômico também se inscreve no
“capital fictício” – via endividamento crescente – e nos desequilíbrios fiscais daí derivados e também da
necessidade de financiar os desequilíbrios decorrentes do endividamento do setor privado, o cobertor
fica cada vez mais curto, gerando um “...conflito distributivo [que] se transforma pouco a pouco numa
guerra de todos contra todos” (p.03).

▪ E, paradoxalmente, são os mais pobres, aqueles sobre os quais recai de forma precária ou mesmo
inexiste o auxílio estatal, os que mais sofrem.

8) “O ponto culminante desse processo de regressão social é exatamente a intervenção militar no estado
do Rio de Janeiro”. “Entretanto, é um equívoco considerar a escalada desse processo como um ponto de
descontinuidade frente aos governos anteriores” (p.04).

9) A “ética do trabalho” se revela no discurso petista através da diferenciação entre “trabalhadores” e


“vagabundos”, entre “honestos” e aqueles que querem “viver na bandidagem”. “Genocídio de negros e
encarceramento em massa de pobres ‘improdutivos’ é a consequência lógica mais avançada desta
constatação” (p.05).

10) Os programas de “inserção social” que chegaram junto com a “reconquista territorial” na favela,
baseados no “empreendedorismo”, mostraram-se pífios, pois não abandonaram a lógica da suposta
“inclusão pelo trabalho” para os moradores da favela em uma quadra da história em que há cada vez
menos empregos até mesmo no “asfalto”.

11) A sobrevivência dos pobres na trajetória brasileira “...demonstra que o discurso ‘progressista’ da
busca de geração de emprego, de ampliação do mercado de trabalho e da capacitação individual como
uma alternativa à intervenção militar não está em desacordo, dado o seu conteúdo completamente
vazio, com a política de guerra aos pobres e excluídos” (p.05).

▪ A “alternativa” à guerra social deve se dar “pelo trabalho”. O discurso de se “dar oportunidades”,
“capacitando” e “assistindo” a todos, torna-se a senha para justificar essa guerra social contra aqueles
que, mesmo diante desses “auxílios”, não conseguem “andar na linha” e seguirem uma trajetória social
“normal”.

Conclusões do autor:
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1) “O que se apresenta como uma necessidade é a crítica radical da concepção de que o “mundo do
trabalho” oferece uma alternativa à militarização” (p.06).

2) “Quem fala em nome do trabalho, fala em nome da guerra – historicamente, a principal fonte de
empregos na sociedade capitalista. A única paz possível está além de uma sociedade de mercado que
define a moribunda forma do trabalho como o único destino, individual e social” (p.06).
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A racionalidade taylorista e sua atualização no século XXI – Estrutura textual


Ludmila Abílio

Argumento central da autora:


1) A “revendedora Natura é o que há de ultramoderno no mercado”. E essa ocupação sintetiza a
atualidade e a centralidade de formas precárias e pouco reconhecidas como trabalho, que estão
plenamente conectadas com as inovações tecnológicas e as reorganizações dos processos de produção.

Conceitos-chave:

1) Flexibilização; 2) polivalência precária; 3) “viração”; 4) plena atividade; 5) emprendedorismo.

Argumentos de subsídio:

1) É preciso pensar o trabalho das revendedoreas de cosméticos dentro do quadro das transformações
do trabalho das duas últimas décadas.

2) A flexibilização do trabalho, a generalização do empreendedorismo e a permanente ameaça do


desemprego são bons pontos de partida para se interpretar o crescimento exponencial de revendedores
nas últimas décadas.

3) O trabalho da revendedora encarna os preceitos da flexibilização: não ter jornada de trabalho


definida, não ter local de trabalho preestabelecido, nem sempre ter patrão definido, e até mesmo não
ter remuneração definida.

4) As ocupações tipicamente femininas estão no cerne da flexibilização do trabalho: indistinção entre o


que é trabalho e o que não é, indistinção entre o que é e o que não é tempo de trabalho, ausência de
regulações públicas, trabalho não pago e não reconhecido, ausência de proteções e direitos, polivalência
e demanda permanente pela mobilização de seus atributos e saberes pessoais.

5) Há outros contornos da flexibilização, e um deles é a tranformação do trabalhador em “pessoa


jurídica”. A ideia de uma “prestação de serviços”, em verdade, corresponde à transferência dos riscos,
custos e responsabilidades da atividade laboral para o trabalhador.

6) Já as terceirizações, ao remodelarem as cadeias produtivas, eliminam muitos postos de trabalho, ao


passo que também eliminam direitos e garantias trabalhistas historicamente conquistadas através de
lutas sociais. A novas demandas de trabalho, dentro e fora da fábrica, impõem ao trabalhador que este
seja “proativo”, “polivalente”, que “saiba lidar com pressões” e com as “constantes transformações” nas
relações de trabalho.
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7) As mudanças na regulação do trabalho tornam quase que indiscerníveis as relações entre patrão e
empregado, o “quem trabalha para quem”.

8) O trabalho realizados pelas mulheres nas revendas de cosméticos materializa aquilo que a autora
denomina por “polivalência precária”.

▪ Isso quer dizer que as “...relações informais de trabalho, ocupações de baixa qualificação e
remuneração também hoje são permeadas pela mobilização de atributos e saberes que são centrais para
as próprias atividades e é impossível fixar critérios, medidas e regulações envolvidos nesta mobilização”
(p.03).

9) Em relação às revendedoras, igualmente uma série de saberes são delas demandados para que se
possa destacar dentre as demais: “...saber mobilizar suas relações afetivas para vender nos encontros
familiares, saber ser secretária e vendedora ao mesmo tempo, saber estabelecer novos contatos-clientes
na fila do banco, no salão de beleza, na casa da patroa, saber aproveitar as promoções de forma
estratégica que lhe gere rendimento, saber lidar com as negociações informais sobre o pagamento e as
recorrentes inadimplências, conhecer os produtos, saber vender...” (p.03), etc.

10) Em países da periferia do mundo, como o Brasil, a polivalência precária é uma marca do que a autora
diz ser uma das condições características de muitos dos nossos trabalhadores que, tradicionalmente,
tiveram na informalidade o seu meio de vida: a “viração”.

▪ A novidade é que tais condições deixaram de ser restritas a esse estrato ocupacional e passou a
incorporar também os trabalhadores qualificados.

11) A questão do empreendedorismo expressa a narrativa contemporânea do indivíduo “empresário de


si mesmo”, que conforma suas estratégias pessoais para se sobressair em um mercado competitivo.
Trata-se da atualização da teoria do capital humano.

12) Torna-se preciso reflextir sobre o avanço da “plena atividade”, nas relações que esse fenômeno tem
com as transformações do trabalho das últimas décadas e nas relações de tais transformações com as
lógicas do consumo.

▪ Em um mundo em que cada vez mais pessoas vivem ligadas à rede mundial de computadores,
acessando páginas e plataformas digitais, fornecendo dados e informações para corporações e outros
agentes, torna-se preciso entender de que modo eles são apropriados sem que por eles tenhamos
qualquer tipo de remuneração. E aí a noção de crowdsourcing.

Conclusões da autora:

1) “[E]ste imenso exército de revendedoras e seu crescimento exponencial na última década têm de ser
pensados à luz das recentes mudanças na estratificação social brasileira” (p.05).
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2) “De saída, o que as revendas indicam é que concessão de benefícios sociais, aumento real do salário
mínimo, aumento do trabalho formal e redução da taxa de desemprego, concessão de crédito, trazem
mudanças não só para o mercado consumidor” (p.05).

3) “É preciso pesquisar e compreender o que está em jogo no mundo do trabalho a partir e para além
dos pares trabalho formal/informal, emprego/desemprego”. É preciso “...recuperar o debate sobre a
relação entre exploração do trabalho, desenvolvimento e acumulação capitalista brasileira” (p.05).

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