1 Introdução.
O Electromagnetismo é a parte da Fı́sica que se ocupa das interacções entre
partı́culas carregadas. A estrutura da matéria e muitos processos biológicos
são determinados por este tipo de interacções. A nossa sociedade está também
muito dependente das propriedades das cargas em movimento: sem electri-
cidade, quase nada funciona! Michael Faraday (1791-1867), um fı́sico auto-
didacta, que começou por ser encadernador e aprendeu muito lendo os livros
que lhe davam para encadernar, foi contratado para a Royal Institution, em
Londres, para descobrir maneiras de obter vidros mais perfeitos. Na altura,
os métodos de fabricação do vidro conduziam a vidros com bolhas de ar e
outras imperfeições que tornavam difı́cil a aplicação a lentes. Mas aquilo que
Michael Faraday gostava realmente de investigar, e que no princı́pio só con-
seguia fazer nas horas vagas, era o electromagnetismo. As suas investigações
permitiram perceber a ligação ı́ntima que existe entre o campo eléctrico e o
campo magnético, pelo que ele deve ser considerado o fundador do electro-
magnetismo.
2 Carga eléctrica.
Já os Gregos antigos sabiam que se se esfregasse um pedaço de âmbar, este
levantaria pedacinhos de palha. Há uns 200 anos tornou-se claro que há
dois tipos de cargas, a que se convencionou chamar positivas e negativas. As
designações “positiva” e “negativa” e os sinais das cargas foram escolhidos
arbitrariamente por Benjamin Franklin (1706-1790).
L.
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A carga eléctrica constitui uma grandeza fı́sica com uma natureza própria
e não é redutı́vel às grandezas mecânicas (massa, espaço e tempo) ou ter-
modinâmicas (temperatura, pressão, etc). A sua unidade no sistema SI é
o coulomb. Por razões que têm a ver com a precisão das medidas (é mais
fácil medir uma corrente do que medir cargas elementares), a unidade de
carga define-se a partir da unidade de corrente, o ampere: 1 coulomb é a
quantidade de carga que é transferida através de uma secção de um fio num
segundo quando nele flui uma corrente de 1 ampere. Em coulomb, a carga
de um electrão é:
e = −1.602 × 10−19 C (1)
3 Condutores e isoladores.
Nalguns materiais, como os metais, a água da torneira e o corpo humano,
parte da carga negativa pode mover-se mais ou menos livremente. Chamamos
L.
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4 Conservação da carga.
Podemos carregar um objecto de vidro esfregando-o com um pedaço de seda.
O objecto de vidro fica carregado positivamente, enquanto a seda fica car-
regada negativamente. Isto acontece porque houve electrões que fluiram do
vidro para a seda. Ou seja, a carga não pode ser criada, só pode ser trans-
ferida de uma região para outra. Este é mais um princı́pio de conservação,
o Princı́pio de Conservação da Carga Eléctrica, que foi proposto primeira-
mente por Franklin e que tem sido essencialmente provado como verdadeiro,
tanto em processos macroscópicos, como em processos microscópicos, que
envolvem átomos, núcleos e partı́culas elementares.
e− + e+ ⇒ γ
L.
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Pode à primeira vista parecer que este processo viola o princı́pio da con-
servação de carga, porque no inı́cio do processo temos duas partı́culas car-
regadas e no fim temos só energia. Mas se contarmos a carga total antes
e depois do processo, no princı́pio temos uma carga total nula e no fim
temos a mesma coisa, pelo que a carga total se conservou neste processo. A
este processo chama-se aniquilação. Existe também o processo inverso em
que um fotão (radiação electromagnética) de alta energia, ao atravessar a
matéria, cria um par electrão-positrão. Estes processos chamam-se processos
de criação de pares electrão-positrão. Eles podem-se observar numa câmara
de bolhas, porque as partı́culas carregadas ionizam a matéria por onde pas-
sam e as regiões ionizadas agem como núcleos para a condensação da água.
5 Força de Coulomb.
Um princı́pio fundamental é também que cargas de sinal contrário se atraem
e cargas de sinal igual repelem-se. A lei que descreve a força de interacção
entre partı́culas carregadas em repouso chama-se lei de Coulomb, em honra
do fı́sico francês Charles Augustin de Coulomb (1736-1806) que fez um estudo
intensivo dessas forças em 1785, usando uma balança de torsão semelhante
à usada por Henry Cavendish (1731-1810) no estudo da força gravitacional.
O resultado é que a força que a carga q1 exerce sobre a carga q2 é dada por:
q1 q2
F~E = K 2 ~e12 (2)
r12
onde r12 é a separação entre as cargas, ~e12 é um vector unitário (versor)
que indica a direcção da carga 1 para a carga 2 e K é chamada a constante
electrostática. O ponto de aplicação desta força é na carga 2, mas a força é
devida à presença da carga 1.
Aplicação.
6 O Princı́pio de sobreposição.
Se tivermos não uma, mas várias cargas eléctricas, podemos calcular as forças
que elas exercem umas sobre as outras considerando que elas interagem se-
paradamente, duas a duas. Assim, a força eléctrica que actua sobre a carga
q, devida à presença das cargas q1 , q2 , q3 , q4 , etc, é a soma das forças F~1 , F~2 ,
F~3 , F~4 , etc:
F~tot = F~1 + F~2 + F~3 + F~4 + · · · (8)
L.
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onde, para cada uma das forças, F~i , se aplica a expressão da força de Coulomb
(2). A equação acima traduz o chamado Princı́pio de sobreposição das forças
eléctricas e diz-nos que a força total resulta da sobreposição linear das forças
individuais, devidas a cada uma das cargas. As forças são vectores e portanto
esta soma é uma soma vectorial, ou seja, o módulo da soma não é, em geral,
igual à soma dos módulos de cada uma das forças.
7 O campo eléctrico
Quando se aproximam duas cargas e elas interagem pela força de Coulomb
(2), como é que elas sabem da existência uma da outra, não estando em con-
tacto directo? Esta mesma questão já tinha sido considerada por Newton ao
estudar a força gravitacional, a qual pode interagir através de vastas regiões
de espaço vazio. Tão longe, que um objecto pode começar a sentir o efeito
dessa força muito antes de poder ver o objecto que a cria. É a chamada
acção à distância, que é explicada em termos da existência de um campo
criado pelas cargas. O conceito de campo é um conceito misterioso do ponto
de vista fı́sico porque significa que o efeito das cargas não fica confinado
ao local onde elas se encontram ou ao volume que ocupam, como no caso
dos choques mecânicos entre partı́culas, mas estende-se por toda a região do
espaço à volta delas. Mas, embora do ponto de vista fı́sico não seja muito
fácil perceber como é que isto acontece, do ponto de vista matemático há
formalismos bem definidos para descrever campos e as suas propriedades.
Já vimos uns exemplos de campo, por exemplo, a pressão. Numa sala,
a pressão tem um certo valor médio. Isso quer dizer que podemos tomar as
várias regiões dessa sala e atribuir-lhes um valor para a pressão. No caso
dessa sala, essa pressão é aproximadamente igual em todos os pontos. Do
ponto de vista matemático, o volume ocupado por essa sala é um campo de
pressões uniforme. Na atmosfera terrestre, ou seja, numa camada esférica
a certa distância da superfı́cie terrestre, a pressão não é igual em todos os
pontos. São estes gradientes de pressão que geram os ventos e contribuem
para as variações climatológicas. A este conjunto de pontos, cada um dos
quais com certo valor da pressão, chama-se um campo de pressões. Como a
pressão é um escalar, o campo das pressões é um campo escalar.
L.
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carga negativa −Q medindo essa força com uma carga de prova1 . Como a
carga de prova é positiva, a carga de prova é atraı́da pela carga que cria o
campo. As linhas de força são radiais, dirigindo-se todas para o local onde se
encontra a carga. No caso de uma carga positiva, as linhas de força têm ainda
a mesma direcção radial, mas têm um sentido inverso, dirigindo-se para fora
da carga. Como se pode ver pela definição de campo eléctrico (9), as linhas
de campo são colineares com as linhas de força e como a carga de prova é
positiva, têm também a mesma direcção (ver Figura 1). A direcção destas
linhas é igual à da força em cada ponto (ver figura 1).
forem curvas, a tangente às curvas em cada ponto dá a direcção do campo
eléctrico nesse ponto. A intensidade do campo numa região é proporcional
ao número de linhas de campo numa área perpendicular à direcção das linhas
de campo.
temos assim o campo eléctrico, no ponto P2 , criado por uma carga, q1 , situada
no ponto P1 . Do princı́pio de sobreposição para as forças electrostáticas pode-
L.
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~ =E
E ~1 + E
~2 + E
~3 + · · · + E
~n (11)
ou !−2 !−2
~ =K q 1− d
E − 1+
d ~j (13)
z2 2z 2z
Considerando o desenvolvimento em série de McLaurin:
1 00
f (x) = f (0) + f 0 (0) x + f (0) x2 + · · · (14)
2
para a funções (1 ± x)−2 , onde x = d
2z
, temos:
ou seja,
f 0 (0) = ∓2 ; f 00 (0) = +6
fica: !2
d d d
(1 ± )−2 = 1 ∓ + 3 + ··· (15)
2z z 2z
L.
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d
e temos, até à terceira potência de 2z
:
!−2 !−2
d d d
1− − 1+ =2 (16)
2z 2z z
~
~ = K q 2 d ~j = 2 K q d j = 1 p~
E (17)
z2 z z3 2π0 z 3
A expressão (17) tem várias limitações, já que foi deduzida para pontos
no eixo do dipolo e suficientemente afastados dele para o desenvolvimento
em série de Taylor ser válido. Mas pode-se provar que o campo eléctrico
de um dipolo é inversamente proporcional ao cubo da distância, em todos
os pontos, onde a distância é a distância ao centro do dipolo. Notar que o
campo criado por uma carga varia proporcionalmente ao inverso do quadrado
da distância e portanto decresce muito mais devagar que o campo dipolar.
A grandes distâncias, um dipolo parece um conjunto de duas cargas iguais
em módulo e de sinal diferente que quase coincidem. Os campos criados por
elas são quase iguais e opostos, mas não se cancelam completamente.
dq = λ ds (18)
Podemos considerar este elemento de carga como uma carga pontual e aplicar
ao campo por ele criado a expressão (10):
~ = λR z 1 qz
|E| 2 2 3/2
= (22)
20 (z + R ) 4 π 0 (z + R2 )3/2
2
~ = 1 q
|E| (23)
4 π 0 z 2
o que quer dizer que a grande distâncias o anel de carga cria um campo
idêntico ao de uma carga pontual com a mesma carga. Isso é natural porque
a grande distância, um anel é indistinguı́vel de uma carga pontual.
10 Fluxo de um campo.
Já vimos como se obtêm expressões para o campo eléctrico de várias dis-
tribuições de carga usando essencialmente a lei de Coulomb. Agora vamos
ver como se podem obter expressões para o campo eléctrico gerado por dis-
tribuições de carga com um elevado grau de simetria. Nestes casos podemos
usar a chamada Lei de Gauss. Antes de falarmos da lei de Gauss, temos que
definir um conceito aplicável a qualquer campo vectorial: o conceito de fluxo.
Vejamos, por exemplo, como definimos o fluxo de ar através de um plano. O
movimento do ar é representado por um campo de velocidades, ou seja, cada
região do ar move-se com uma certa velocidade. Chama-se fluxo do campo
de velocidades através da superfı́cie S à quantidade Fv :
~
Fv = ~v · S (32)
LS V
Fv = vS = = (33)
t t
o que mostra que o fluxo do campo da velocidade corresponde ao volume
que passa através da área S por unidade de tempo. Mas é também o fluxo
do campo de velocidades através da área S. Esta outra definição é extensiva
a qualquer campo vectorial. O fluxo desse campo vectorial através de uma
superfı́cie é assim a quantidade desse campo que intercepta essa superfı́cie.
De modo geral, os campos não são uniformes, ou seja, o valor do vector
L.
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~= q
Z
Fe = ~ · dS
E (35)
0
onde o integral é feito sobre uma superfı́cie fechada que delimita a carga to-
tal, q. Temos pois que a quantidade de campo eléctrico que intercepta essa
superfı́cie é igual à carga total contida na superfı́cie.
Devemos notar que estas superfı́cies não têm que ser reais, em muitas
aplicações são conceptuais e podemos escolhê-las como quisermos. Em e-
xemplos veremos que a forma mais conveniente é escolher superfı́cies que
têm a mesma simetria da distribuição de carga.
~ 4πr2 = q ⇒ |E|
~ = 1 q
Z
~
|E| dA = |E| (37)
0 4π0 r2
onde a última expressão é a lei de Coulomb.
distância r do fio?
Aplicação.
Podemos aplicar a expressão (40) à descarga eléctrica de um raio durante
uma trovoada. O raio é precedido de um estágio invisı́vel durante o qual
uma coluna de electrões se forma entre as nuvens e o chão. Estes electrões
ficam livres devido à ionização das moléculas de ar dentro da coluna. A
distribuição de carga dentro da coluna é tipicamente de −1 × 10−3 C/m.
Quando a coluna atinge o chão, os electrões dentro dela são rapidamente
despejados para o solo. Esta corrente gera muitas colisões entre os electrões e
o ar dentro da coluna, da qual resultam as emissões de luz do raio. Assumindo
L.
c Cruzeiro, 2004, todos os direitos reservados Electromagnetismo 25
~ = 1 q
E ~er (44)
4π0 r2
igual ao de uma carga pontual com o mesmo valor e centrada no mesmo
ponto.
11 Potencial eléctrico.
O trabalho realizado pela força eléctrica para levar uma carga q de um ponto
para outro numa região onde existe um campo eléctrico pela expressão que
estudaram na Mecânica:
dW = F~ · dr ~ (45)
Usando a expressão da força de Lorentz (31) e integrando entre um ponto
inicial, i, e um ponto final, f , esse trabalho fica:
Z f
Wif = q E ~
~ · dr (46)
i
Considerando o campo eléctrico criado por uma carga pontual, (10), podemos
calcular o trabalho de levar uma carga, q1 , de um ponto, i, à distância ri dessa
carga pontual, até um ponto, f , a uma distância rf dessa carga:
!
Z rf 1 q1 q q1 q
Wif = K q1 q 2
=− K −K (48)
ri r rf ri
1 V = 1 J/C. (51)
Uma outra unidade de energia que se usa para descrever processos micros-
cópicos é o electrão-volt. Esta unidade corresponde ao trabalho necessário
para transportar um electrão entre dois pontos com uma diferença de poten-
cial de 1 V:
1 eV = e × 1V = (1.602 × 10−19 C) × (1V) = 1.602 × 10−19 J (52)
Os processos atómicos e moleculares, por exemplo as reacções quı́micas,
envolvem trocas de energia da ordem do eV. Os raios X, que resultam de
transições de nı́veis electrónicos mais profundos do que aqueles que partici-
pam nas reacções quı́micas, têm energias de 103 eV (keV). As reacções nu-
cleares envolvem energias de 106 eV (MeV) e as interacções entre partı́culas
elementares, como as que se produzem nos aceleradores de partı́culas, en-
volvem energias de 109 eV (GeV). Apesar de ser uma energia considerável
para uma só partı́cula, 1 GeV representa uma quantidade pequena em termos
macroscópicos, sendo “apenas” 1.6 × 10−10 J. Um meteorito de 0.1 g que caia
na Terra a uma velocidade de 50 km/s tem uma energia aproximada de 8 x
1014 GeV! Neste caso, faz mais sentido escrever a sua energia em J (12.5 x
105 J).
~
e um caminho geral dr:
~ = dx~i + dy ~j + dz ~k
dr (57)
∂Φ ∂Φ ∂Φ
Ex = − Ey = − Ez = − (59)
∂x ∂y ∂z
Estas igualdades podem também escrever-se de forma mais condensada como:
~ = −∇Φ
E ~ (60)
Aplicação.
No modelo do átomo de hidrogénio de Bohr, o electrão move-se numa órbita
circular com um raio 0.53 Å. Qual o campo eléctrico e o potencial eléctrico
na posição onde se encontra o electrão? Usando (10) temos:
1 Z R σ (2πr) σ Z R r dr σ √ 2
Φ= √ dr = √ = ( z + R2 − |z|) (77)
4π0 0 z 2 + r2 20 0 z 2 + r2 20
11.4 Condensadores.
A um par de superfı́cies condutoras separadas por um meio isolador chama-se
um condensador. Um condensador pode ser carregado quando se ligam as
suas placas a uma bateria que gera uma diferença de potencial entre elas.
Uma bateria é um instrumento com dois terminais: um terminal positivo,
chamado ânodo, e um terminal negativo, chamado cátodo. Para carregar o
condensador nós ligamos o ânodo a uma placa do condensador e o cátodo
à outra placa por meio de um fio condutor. Este fio e a placa que lhe está
ligada tornam-se extensões do terminal da bateria ao qual estão ligados. As-
sim, carga negativa acumula-se na placa que está ligada ao terminal negativo
e carga positiva acumula-se na placa ligada ao terminal positivo. Esta acu-
mulação de carga continua até que a diferença de potencial entre as placas
seja igual à diferença de potencial da bateria. Esta é a condição de equilı́brio
eléctrico estático (ou seja, na ausência de corrente eléctrica). No equilı́brio,
a quantidade de carga positiva, Q, na placa positiva é igual à quantidade
de carga negativa na outra placa. Seja σ a densidade superficial de carga
L.
c Cruzeiro, 2004, todos os direitos reservados Electromagnetismo 34
12 Corrente Eléctrica.
Chama-se corrente eléctrica ao movimento de cargas de uma posição para
outra. As partı́culas que constituem as correntes eléctricas nas células são
muitas vezes iões, mas nos meios materiais sólidos as correntes são devidas
a movimentos de electrões. Como os núcleos dos átomos têm massas que
são entre 2,000 e 100,000 vezes maiores que a massa dos electrões, os núcleos
mantêm-se relativamente estacionários e são os movimentos dos electrões que
produzem correntes eléctricas. Quando dizemos que uma placa de um con-
densador é carregada positivamente se ligada ao terminal positivo de uma
bateria, isso é devido a um fluxo de electrões da placa do condensador para o
terminal da bateria. Para que um material seja condutor é preciso que tenha
electrões livres. Na ausência de campo eléctrico estes electrões deslocam-se
com igual probabilidade em todas as direcções e a corrente média em qual-
quer direcção é nula. Quando as extremidades de um condutor são ligadas a
uma bateria, estabelece-se um campo eléctrico e gera-se uma corrente através
do condutor. Como a força que age sobre os electrões é F~ = e E ~ e a carga
do electrão é negativa, gera-se um movimento de electrões com a direcção
contrária à do campo eléctrico aplicado. Mas, por convenção, considera-se
como o sentido positivo da corrente o do movimento correspondente de car-
gas positivas, que é igual ao do campo eléctrico. Assim, nos condutores, as
correntes são devidas a movimentos de electrões, mas o sentido positivo da
corrente é contrário ao sentido do movimento dos electrões. Quando ligamos
uma bateria, o sentido positivo da corrente é do terminal positivo da bateria
para o terminal negativo da bateria, mesmo que o que esteja a acontecer seja
um fluxo de electrões do terminal negativo para o terminal positivo. Quando
falamos em corrente ou fluxo de corrente referimo-nos à corrente convencional
que tem a mesma direcção que as linhas de campo.
electrões a fluir num sentido do que no sentido contrário e geramos uma cor-
rente. A corrente I que passa num condutor define-se como a quantidade de
carga que passa através de uma secção do condutor por unidade de tempo:
dq
I= (85)
dt
Sabendo o valor da corrente que circula num condutor nós podemos calcular
a quantidade de carga que passa através da secção de um condutor num
intervalo de tempo de 0 a t por integração de (85):
Z Z t
q= dq = I dt (86)
0
onde a corrente I(t) pode, ou não, ser constante no tempo. Quando a corrente
é constante no tempo diz-se estacionária. Neste caso, a conservação da carga
implica que a quantidade de carga que passa através de qualquer secção
que atravessa o condutor completamente é igual seja qual for a orientação
dessa secção , ou a sua localização. Para as correntes estacionárias, por cada
electrão que entra no condutor tem que haver um electrão que sai. Este
princı́pio de conservação também implica que se temos um fio eléctrico que
se bifurca, a corrente que flui no fio antes da bifurcação tem de ser igual à
soma das correntes que circulam em cada um dos fios a seguir à bifurcação :
I0 = I1 + I2 (87)
No sistema internacional, a unidade de corrente é o ampere e temos que
1 ampere é a corrente que transporta uma carga de 1 coulomb por segundo.
A definição da unidade de corrente, independente da unidade de carga, faz-
se a partir das forças magnéticas entre fios condutores, como veremos mais
adiante.
∆q = (n A L) e (90)
Aplicação.
Os electrões de um condutor estão em agitação permanente e podemos q cal-
cular esta velocidade devida à agitação térmica através da fórmula 3 kmBe T ,
o que conduz a velocidades da ordem dos 105 m/s. Mas esta agitação
térmica não produz qualquer corrente, porque os movimentos são igualmente
prováveis em todas as direcções. Vamos ver que a velocidade de deriva é
muito mais baixa. Consideremos um fio de cobre com um diâmetro de 1.8
mm e no qual flui uma corrente eléctrica de 1.3 A. O módulo do vector den-
sidade de corrente é I/A, onde A é a área do fio, A = πr2 = π(0.9 × 10−3 )2 =
2.54 × 10−6 m2 , pelo que o módulo da densidade de corrente é:
~ = I 1.3 A
|J| = = 5.1 × 105 A/m2
A 2.54 × 10−6 m2
~
|J| 5.1 × 105 A/m2
|~vd | = = = 3.8 × 10−5 m/s
ne (8.47 × 1028 elec/m3 ) (1.6 × 10−19 C/elec)
= 14 cm/h
sentidos. As correntes eléctricas são o que sobra quando se subtrai todo este
ruı́do. Então vemos que, subjacentes, há correntes com velocidades muito
menores. Mas são essas correntes que fazem funcionar os aparelhos eléctricos.
~ = ∆Φ
|E| (96)
L
Usando (88) fica:
~
|E| ∆Φ
∆Φ A
L
ρ= = I = (97)
~
|J| A
L I
L.
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ou
∆Φ = R I (98)
que é a lei de Ohm na sua forma mais conhecida e onde R, a resistência do
condutor, é:
L
R=ρ (99)
A
A resistência de um condutor estima-se medindo a corrente que passa entre
dois pontos onde se aplicou uma diferença de potencial dada, ∆Φ. A unidade
da resistência no sistema internacional é o ohm, onde 1 ohm corresponde a
1 volt por ampere.
Nos ciruitos eléctricos há elementos cuja única função é introduzirem uma
certa resistência. A esses elementos chama-se também resistências. Para uma
dada diferença de potencial, quanto maior for a resistência de um condutor,
tanto menor é a corrente. Por isso, o nome está bem escolhido. Enquanto
a resistência depende da forma do condutor, a resistividade só depende do
material de que o condutor é feito.
13 O Campo Magnético.
Já há mais de 2,000 anos que se sabe que certas pedras (ı́manes) têm a par-
ticularidade de se atraı́rem umas às outras e de atraı́rem pequenos pedaços
de ferro. Estas pedras encontram-se numa região chamada Magnésia, da
Turquia, e são por isso conhecidas por magnetes. Quando suspensas livre-
mente, elas orientam-se sempre segundo a direcção norte-sul da Terra e foram
por isso usadas como bússulas na navegação.
e que a sua presença só se faz sentir sobre as cargas em movimento. Assim
a força que actua na partı́cula de carga q que se desloca a uma velocidade ~v
num campo magnético B ~ é:
F~B = q ~v × B
~ (102)
~ sin θ, sendo
ou seja, a força magnética é um vector cuja intensidade é |~v | |B|
~
θ é o ângulo que ~v faz com B, e a sua direcção e sentido são dados pela regra
da mão direita (ver abaixo). Sabendo a velocidade, direcção e sentido do
movimento da carga e medindo a força que actua sobre a partı́cula é possı́vel
definir completamente o vector campo magnético. A direcção e sentido do
campo magnético assim definido coincide com a determinada pela posição de
um ı́mane no mesmo local.
~ a direcção e sentido
dedos se fechem no sentido da rotação de ~v para B,
da força são a direcção e sentido apontados pelo polegar estendido. Se
a carga for negativa, a direcção da força magnética é ainda a mesma
mas o sentido é o oposto ao apontado pelo polegar.
Como se pode ver pela expressão (102) a unidade do campo magnético no
sistema SI é Newton/ [coulomb (m/s)]. Outra possibilidade é em função do
ampere e fica: N/[(C/s) m] = N/ (A m). A esta unidade chama-se também
1 Tesla (T). Outra unidade também muito usada para o campo magnético é
o Gauss (G):
1 T = 104 G (104)
O campo magnético responsável pela orientação dos magnetes à superfı́cie da
Terra tem uma intensidade de 1 G (10−4 T), enquanto o campo magnético
à superfı́cie da Lua tem uma intensidade de 10−4 G (10−8 T). O campo
magnético em torno de um pequeno magnete é da ordem de 102 G (10−2 T).
v2 mv
FB = q v B = m ac = m ⇒R= (105)
R qB
Se o campo magnético for suficientemente forte, o raio é suficientemente
pequeno para a trajectória da partı́cula ficar completamente contida dentro
da região onde está o campo magnético. Nesse caso, a partı́cula, uma vez
tendo entrado nessa região, já não consegue sair dela. A velocidade angular
do movimento, ω = v/R, é:
qB
ω= (106)
m
e a frequência do movimento, f , é:
ω qB
f= = (107)
2π 2π m
donde se deduz que o perı́odo, T , é:
1 2π m
T = = (108)
f qB
Notemos que tanto o perı́odo, como a frequência, como a velocidade angular,
não dependem da velocidade da partı́cula. As partı́culas que se deslocam
a velocidades elevadas movem-se em circunferências de raios maiores que as
partı́culas que se movem a velocidades menores, mas todas as partı́culas que
possuam a mesma razão de carga/massa levam o mesmo tempo a completar
uma circunferência.
Se uma partı́cula tem uma velocidade inicial com uma componente não
nula paralela ao campo magnético, ao longo desta direcção o campo magnético
não exerce qualquer força e essa componente da velocidade vai manter-se
constante. O movimento da partı́cula pode então decompôr-se num movi-
mento circular, que ten lugar num plano perpendicular à direcção do campo
magnético, com um movimento uniforme, ao longo da direcção do campo
magnético. Ou seja, o movimento da partı́cula vai ser em espiral (vide figura
8 (a)), sendo o eixo da espiral paralelo ao campo magnético. Quando o campo
magnético não é uniforme, o raio da circunferência varia ao longo da espiral,
sendo menor onde o campo é mais intenso (vide figura 8 (b)). Em pontos
L.
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FE = FB ⇒ q E = q v B (109)
∆Φ ∆Φ
q =qvB⇒v= (110)
d Bd
Medindo a diferença de potencial (que se chama a diferença de potencial de
Hall) que se estabelece entre os dois lados de uma artéria após a aplicação
de um campo magnético, podemos calcular a velocidade do fluxo sanguı́neo.
Na prática, estas diferenças de potencial são muito pequenas. Considerando
uma artéria com 1 cm de diametro, e uma velocidade de v = 30 cm/s, num
campo magnético de 1000 G, a diferença de potencial é:
~ B = I dL
dF ~ ×B
~ (113)
A força total que o campo magnético, B,~ exerce sobre o fio, obtem-se in-
tegrando (113) ao longo do fio. É preciso notar que não há correntes em
elementos isolados de um fio. A corrente entra sempre de um lado e sai do
outro. As expressões que derivámos aplicam-se nesses casos.
15 Lei de Biot-Savart.
No inicio do século 19 pensou-se que a electricidade e o magnetismo eram
fenómenos independentes. Mas, em 1820, o fı́sico dinamarquês Hans Chris-
tian Oersted (1777-1851) descobriu, por acidente, que uma corrente eléctrica
pode influenciar a orientação de uma bússula. Isto acontece porque uma
corrente eléctrica cria um campo magnético local, que se sobrepõe ao campo
magnético terrestre, desviando a bússula da sua posição normal.
A lei que descreve o campo magnético criado por uma corrente, I, que
flui num elemento de circuito, d~s, situado num ponto P, chama-se lei de
Biot-Savart e diz o seguinte:
µ0 Id~s × ~r
~ =
dB (118)
4π r3
onde ~s representa um elemento do circuito, dirigido no mesmo sentido que
a corrente e ~r é o vector que descreve a posição do ponto P em relação ao
elemento d~s. Notemos que o módulo do campo magnético é inversamente
proporcional ao quadrado da distância de um ponto ao fio, de forma semel-
hante ao que sucede com o campo eléctrico. Àquela lei chama-se lei de
Biot-Savart. Esta lei é o correspondente magnético da lei de Coulomb. A lei
de Coulomb permite-nos calcular o campo eléctrico de uma carga pontual,
ou seja, diz-nos que as fontes do campo eléctrico são as cargas eléctricas. A
lei de Biot-Savart permite-nos calcular o campo magnético a partir de uma
distribuição de correntes. Diz-nos que uma das fontes do campo magnético
são as cargas em movimento.
L.
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Aplicações.
~ =|
Z
~ =
Z
~ µ0 I Z +∞ sin θ|ds|
|B| dB| |dB| = (119)
fio fio 4 π −∞ r2
onde θ é o ângulo que o elemento do fio, d~s, faz com o vector ~r, que liga esse
elemento ao ponto P . Temos que:
R R
tan (180 − θ) = ⇒s= (120)
s tan (180 − θ)
onde R é a distância a que o ponto P se encontra do fio e portanto:
R R
ds = − 2 = − 2 dθ (121)
sin (180 − θ) sin θ
Por outro lado, temos também:
R 1 sin2 θ
= sin (180 − θ) = sin θ ⇒ 2 = (122)
r r R2
Substituindo (121) e (122) em (119) fica:
µ0 I Z θ2 sin θ µ0 I µ0 I
~
|B| = dθ = [− cos θ]θθ21 = (cos θ1 − cos θ2 ) (123)
4 π θ1 R 4πR 4πR
Quando o fio é infinito θ1 = 0o e θ2 = 180o e o campo magnético no ponto P
fica:
~ = µ0 I
|B| (124)
2πR
O módulo do campo magnético num ponto P só depende da distância do
ponto ao fio. As linhas do campo magnético criado por um fio rectı́lineo
L.
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~ = µo I
|B| (128)
2πr
como já tı́nhamos concluido pela lei de Biot-Savart.
Vemos assim que enquanto cargas que são postas em movimento por um
campo eléctrico criam um campo magnético, magnetes em movimento, ou
mais geralmente, uma variação do campo magnético gera um campo eléctrico.
A indução magnética mostra pois a ligação que existe entre os fenómenos
eléctricos e os fenómenos magnéticos.
Aplicação.
Considere um circuito com uma área de 0.6 m2 e que consiste em 20 espiras.
Seja R = 12 Ω a resistência do circuito. Supondo que o campo magnético é
reduzido a uma taxa constante de 8000 G para 3000 G em 2 s, qual o valor
da corrente que se gera no circuito? Podemos escrever a lei de Faraday como:
∆FB ∆B
∆Φ = −20 = −20 A (133)
∆t ∆t
porque neste caso a área é constante e o que está a diminuir é a intensidade
do campo magnético. A f.e.m. ∆Φ gerada por esta diminuição é pois:
(0.8 − 0.3) T
f.e.m. = −20 × (0.6 m2 ) × = −3 V (134)
2s
Pela lei de Ohm, a intensidade da corrente que flui no circuito enquanto o
campo magnético diminui é:
∆Φ 3V
I= = = 0.25 A (135)
R 12 Ω
Assim que o fluxo magnético deixa de variar no circuito, esta corrente cessa.