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8/25/2019 Entenda como o cinema brasileiro vem sendo financiado até agora - 25/08/2019 - Seminários Folha - Folha

2º SEMINÁRIO ECONOMIA DA ARTE (HTTPS://WWW1.FOLHA.UOL.COM.BR/ESPECIAL/2019/ECONOMIA-DA-ARTE2)

Entenda como o cinema brasileiro vem sendo


financiado até agora
Estrutura de fomento viabilizou desde obra mais autoral festejada pela crítica até
franquia que é sucesso de público

25.ago.2019 à 1h00

EDIÇÃO IMPRESSA (https://www1.folha.uol.com.br/fsp/fac-simile/2019/08/25/)

Pedro Butcher

SÃO PAULOO atual modelo de financiamento do audiovisual brasileiro é


resultado de uma lenta reconstrução que se seguiu ao blecaute causado pela
extinção da Embrafilme e de órgãos de apoio, pelo então presidente Collor,
em 1990.

Entre 1992 e 1994, a participação da produção nacional


(https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/04/tcu-da-prazo-de-14-meses-para-ancine-rever-fiscalizacao-de-

nas salas de cinema, que no fim dos 1980 estava em 20%, caiu a


contas.shtml)

quase zero. Com a TV ainda fechada à produção independente, a atividade só


não entrou em colapso total graças a um mercado publicitário em expansão
e à realização mais pontual de videoclipes, documentários e curtas.

A produção e a circulação foram aumentando na medida em que surgiam


mecanismos e instituições de suporte, em um processo de recuperação. 

A tecnologia digital, que chegou primeiro à produção, democratizando e


barateando a realização de filmes, alcançou a distribuição e a exibição,

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causando terremoto na cadeia, com efeitos nas formas de circulação das


obras e nos hábitos do consumidor.

Já marcado por imprevisibilidade, o setor ganhou novas camadas de risco.

Na base desses mecanismos criados está a constatação de que o audiovisual


é marcado por grande assimetria, simbolizada pela força econômica e
cultural do cinema anglófono e de conglomerados de mídia de capital
transnacional. Países que desejam alguma visibilidade nesse setor
estratégico adotaram medidas de proteção e estímulo.

Hoje, o audiovisual brasileiro conta com uma série de ferramentas que foram
sendo criadas enquanto o mercado crescia e se transformava. No decorrer do
tempo, tiveram importância maior ou menor, mas cumpriram algum papel.
A Lei (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2016/06/1781532-o-que-saber-para-nao-passar-vergonha-ao-discutir-lei-
rouanet-na-internet.shtml)Rouanet (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2016/06/1781532-o-que-saber-para-nao-

passar-vergonha-ao-discutir-lei-rouanet-na-internet.shtml) (1991) e a Lei do Audiovisual (1993)


deram um primeiro impulso à recuperação do cinema. Com a Agência
Nacional de Cinema, em 2001, teve início uma nova fase, que tinha entre seus
objetivos romper os ciclos de euforias e depressões para desenhar um
desenvolvimento sustentado.

 “A Ancine foi criada com a ideia de um fomento regulador, da constatação de


que não há como regular o mercado audiovisual sem o fomento, por conta da
assimetria que existe na atividade”, diz Vera Zaverucha, que foi secretária do
Audiovisual, integrou a diretoria do órgão, é autora de “Desvendando a
Ancine” e consultora de audiovisual.

A política de fomento ganhou impulso em 2006, com o Fundo Setorial do


Audiovisual (FSA) e depois, em 2011, com a “Lei da TV Paga”, que regulou e
criou meios para estimular a produção independente brasileira e sua
presença na TV por assinatura.

“A lei 12.485 não teria vingado se não fosse o fomento. A premissa é


inteligente: criar a obrigação, mas também as condições para que a produção
exista”, diz Vera.

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A produção de longas-metragens passou por uma polarização entre os títulos


de maior orçamento e ambição mercadológica, que encontram espaço nas
salas multiplex, e os de baixo orçamento, que em geral circulam por festivais
e “salas de arte”.

Talvez a melhor forma de compreender o funcionamento do financiamento


audiovisual seja por meio de casos específicos de obras com ambição
comercial, em geral circunscritas ao mercado interno, e filmes de baixo
orçamento, com maior potencial nos mercados externos.

Vejamos, primeiro, o exemplo da franquia “Minha Mãe é uma Peça”,


produzida por Iafa Britz, da Migdal Filmes. O filme é a adaptação da comédia
escrita e estrelada por Paulo Gustavo, que começou num teatro em Niterói e
se tornou fenômeno de público.

Lançado em 2013, o primeiro longa levou 4,6 milhões de pessoas às salas de


cinema e gerou R$ 49,5 milhões. O segundo, de 2016, dobrou os valores: 9,3
milhões de ingressos e receita de R$ 124,2 milhões. O terceiro tem
lançamento previsto para dezembro.

Parece uma trajetória suave e previsível. Nada mais enganoso. “O primeiro


filme era só dúvidas. Um roteiro baseado num monólogo, um homem
atuando como mulher. Enquanto buscava investimento, parceiros potenciais
duvidaram do projeto e o recusaram. Entre as sugestões que ouvi, estava a de
trocar Paulo Gustavo por uma atriz conhecida. Estávamos naquele lugar de
aposta que só conseguimos concretizar com subsídio”, diz a produtora.

A engenharia financeira do primeiro “Minha Mãe é uma Peça” recebeu


recursos via Lei do Audiovisual, um aporte significativo do FSA e uma
pequena parcela com “product placement”.

“Minha Mãe é uma Peça 2” contou com percentual menor de dinheiro da Lei
do Audiovisual, o restante foi investimento privado. “Com o sucesso de
bilheteria do primeiro, e a confirmação de Paulo Gustavo como fenômeno
em crescimento, criou-se uma expectativa importante em torno do segundo
filme”, lembra Iafa.

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Para o terceiro, o percentual de valores incentivados é de 30%, e 70% vêm de


investidores privados. “Foi uma evolução saudável em direção ao
autofinanciamento”, diz Iafa. “Estávamos conseguindo nos planejar com os
mecanismos existentes. Hoje, não só por conta do novo governo, mas
também do próprio mercado, com a ascensão das companhias de streaming,
não consigo prever como um projeto será viabilizado. Como serão as
negociações com os novos players, Netflix e Amazon? Os mecanismos são
totalmente diferentes e não são óbvios”.

O segundo exemplo, no outro extremo, é o da produtora mineira Filmes de


Plástico, que lançou longas consagrados pela crítica, com visibilidade
internacional.

Em 2018, “Temporada”, de André Novais Oliveira, foi selecionado para o


Festival de Locarno, na Suíça, e ganhou o prêmio de melhor atriz (Grace
Passô) no Festival de Turim, na Itália. Por aqui, foi o grande vencedor do
Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.

Neste ano, “No Coração do Mundo” (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/08/no-coracao-do-


mundo-comeca-singelo-e-muda-para-acao-hollywoodiana.shtml), de Maurílio Martins e Gabriel

Martins, chegou ao mesmo tempo ao cinema e ao vídeo on demand após


carreira internacional.

Apesar de ter estreado em 2019, “No Coração do Mundo” é um projeto


anterior ao “Temporada” (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2018/11/longa-temporada-discute-
injustica-social-e-racismo-nas-entrelinhas.shtml), explica o produtor Thiago Macedo Corrêa:

“Submetemos o roteiro de ‘No Coração do Mundo” ao Filme em Minas, edital


do governo estadual que não existe mais. Como nunca tínhamos feito longa,
colocamos o orçamento no limite mais baixo, para tornar o projeto mais
competitivo”. 

O roteiro foi selecionado, mas todos os vencedores do edital receberam a


metade do dinheiro que pediram. “Corremos para aprovar o projeto na
Ancine. Nosso orçamento era de R$ 714 mil, e a metade, R$ 357 mil, estava
garantida pelo Filme em Minas. Foi o grande erro desse nosso início de
carreira”, lembra Thiago. 

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“Precisávamos buscar uma complementação, mas sempre com esse teto,


valor baixíssimo, sobretudo para um filme como esse. Submetemos o projeto
ao edital de Baixo Orçamento do Ministério da Cultura, e fomos
contemplados. Poderíamos ter ganhado R$ 1,2 milhão, o limite do edital por
filme, mas só pudemos ficar com R$ 357 mil”. Por isso, o longa levou três anos
para ficar pronto, com a filmagem dividida em etapas.

“Temporada”, por sua vez, foi mais simples, com uma só fonte de
financiamento, o Filme em Minas. “Foi na sétima edição do edital, que só
existiu graças à pressão da classe e pelo fato de ter coincidido com a abertura
do Fundo Setorial da Ancine para os arranjos regionais”, lembra Thiago.

Nesses arranjos, pensados para reduzir a concentração da produção, o fundo


se comprometia a complementar recursos de estados e municípios que
abrissem editais. Projetos contemplados receberam R$ 750 mil: R$ 300 mil
vinham do governo do Estado e R$ 450 mil do FSA.

Thiago diz que quando a Filmes de Plástico foi criada, a ideia era realizar
vídeos institucionais para pagar as contas e poder fazer os filmes.

“No fim, viabilizamos nosso trabalho sem precisar fazer vídeos. Houve
coincidência entre o surgimento da produtora e o momento crescente que
vivemos até pouco. Os arranjos regionais foram fundamentais, mas muitos
acham que estão sob ameaça. Nossa esperança é que com a rede que
formamos em festivais seja possível levantar recursos fora do Brasil”.

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