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“A arte é um exercício
de liberdade”
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DentalPro: Quando despertou para este lado porque eu já misturava as cores intuitivamen-
mais artístico? te. Aconselhou-me a ir para outra escola, mas
Afonso Pinhão Ferreira: Quando era miúdo di- não fui.
ziam que desenhava bem. Mas, olhando para
trás, acho que tive péssimos professores de DP: Decidiu aprender sozinho?
desenho e talvez tenha sido isso que me parou APF: As pessoas costumam dizer que sou au-
no tempo. Só depois de casado é que voltei a todidata, o que é verdade, mas sou um autodi-
dedicar-me ao desenho e à pintura. Tenho o data que sabe procurar o conhecimento sobre
privilégio – e reconheço que é um privilégio – a cultura da arte. Como eu e a minha mulher
de ser polivalente. sempre fomos apaixonados por arte, quando
juntávamos algum dinheiro comprávamos al-
DP: Começou a estudar desenho e pintura? gumas peças. [Lembro-me de ainda não ter
APF: Abriu um curso de pintura numa coope- sala de jantar e de ter comprado uma peça de
rativa artística que existe na Póvoa de Varzim, arte às prestações. Isto é engraçado relem-
A Filantrópica. As aulas eram noturnas e co- brar...] Temos hoje uma pequena coleção de
mecei a frequentá-las com o meu colega arte, mas para “montar” essa coleção foi pre-
Carlos Silva, também médico dentista. Na pri- ciso ler, estudar, conhecer o artista, ir às ex-
meira sessão, puseram-nos lá uma jarra para posições, ver os catálogos, comprar livros de
fazermos desenho à vista, para o professor arte, etc.. E ainda hoje é assim, vamos de fé-
ver a nossa capacidade e em que ponto está- rias para ver exposições. Foi esta assimilação
vamos. Quando o mestre viu o meu desenho cultural, oriunda do colecionismo, das visitas,
disse que tinha muita dificuldade em fazer o da leitura e dos vídeos, que me deu uma for-
que eu tinha feito. “Isto está um espetácu- mação abrangente. Atualmente, acho que já
lo! Em desenho não tenho nada para lhe ensi- posso dizer que sou um artista. Tenho um cur-
nar”, afirmou. Mas eu respondi que tinha ido rículo engraçado que, apesar de ser pequeni-
para aprender a pintar. E, na segunda aula, pe- no, não me envergonha. Também escrevo so-
diu-nos para fazer a mesma jarra numa hora, bre arte e apresento conferências sobre esta
em vez das duas estipuladas na aula anterior. temática. E só possuo essa formação porque
E depois em meia hora e em 15 minutos, de- procuro o conhecimento.
pois em sete minutos e meio, até chegar aos
15 segundos. Só na terceira aula comecei a DP: Sente-se especial ou é apenas um aluno
pintar. Uma pessoa posou para esse efeito muito aplicado?
e, no fim, o professor disse-me que também APF: As pessoas não são umas mais especiais
não tinha nada a aprender ali, nesse campo, do que outras. As pessoas distinguem-se pela
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fui colhendo informações e técnicas de pintu- DP: Tem ideia do número de obras que já
ra… e tudo isso contribuiu para a minha for- criou?
mação nos primeiros tempos. Depois comecei APF: Cerca de 300. Mais ou menos 12 escultu-
a alargar os meus horizontes, pois, quando se ras, quase todas em bronze, e as restantes são
estuda a história e a evolução da arte, come- pinturas. A escultura surgiu muito mais tarde
ça-se a ver que há imensos campos para além na minha vida, só há cerca de seis anos.
do vanguardismo. Hoje tenho uma formação
muito mais abrangente, como é lógico. DP: E como surgiu?
APF: Tenho um grande amigo, um dos maiores
DP: Que tipo de pintor é? escultores em Portugal neste momento (José
APF: 90% das vezes faço retratos, mas tam- António Nobre), que tem tido um papel muito
bém pinto algumas paisagens. Porém, sou es- importante na minha vida. Um dia fiz-lhe um
sencialmente retratista. Adoro observar a ex- retrato a óleo e uns meses depois fez uma es-
pressão humana. Hoje temos a sorte de poder cultura minha, em barro. Ele disse: cada um
pintar através de uma fotografia, mas nem dá ao outro aquilo que sabe fazer. Quando me
sempre isso chega. Muitas vezes peço para as encontrei com ele, para poder executar uns
pessoas posarem para mim, para as poder re- acabamentos na escultura, aquela arte encan-
tratar em condições, em toda a sua essência. tou-me. Na altura, disse-lhe que talvez fosse
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capaz de fazer a cara de uma pessoa em bar- contemporânea, que pode ser visitado tanto
ro. E ele afirmou que tinha a certeza disso, pelos utentes da Ortopóvoa como pelos seus
dada a minha arte retratista. No Natal seguin- familiares ou por qualquer outro apreciador
te, ofereceu-me uma caixinha de ferramentas, de artes plásticas. A Póvoa de Varzim tem as-
com todos os utensílios para trabalhar o bar- sim mais um espaço dedicado a manifestações
ro. Foi a partir daí que comecei a dedicar-me à culturais e artísticas, onde se realizam expo-
escultura. sições periódicas de vários artistas. Portanto,
além de fazer arte, patrocino arte. Sou eu que
DP: A Ortopóvoa possui uma galeria de arte. invisto nos artistas, sem qualquer tipo de cus-
Qual é o papel deste espaço? tos para eles. Já tivemos 20 exposições de pin-
APF: Quando edificámos esta nova clíni- tura, escultura, desenho e colecionismo. A 20ª
ca, há cerca de seis anos, decidimos criar inaugurou em julho passado e englobou a pin-
um espaço para divulgação de obras de arte tura de Josep Ros, um surrealista/simbolista
espanhol. A terceira exposição
foi minha (risos). Chamava-se
60x70, porque todos os qua-
dros tinham essas medidas, e
incluiu cerca de 20 telas de re-
tratos de pessoas influentes.
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