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1994; 44: 1: 25 - 33
Transmissão Sináptica
Luiz Fernando de Oliveira,TSA1
Propriedade Sinapse
Elétrica
Sinapse
Química
1. Tamanho da Fenda Sináptica 3,5 nm 30-50nm
cia. Essa propriedade é possível graças à existência 2. Continuidade Citoplasmática sim não
de dois mecanismos de sinalização: a condução axô- entre as células pré e pós
nica e a transmissão sináptica. 3. Componentes Ultraestruturais Canais Vesículas pré-
típicos iônicos sinápticas e
A transmissão sináptica é o processo pelo através a Receptores pós-
qual informação gerada ou processada por um neu- sinapse sinápticos
rônio é transmitida a outro neurônio ou célula efetora.
4. Agente da transmissão Corrente Transmissor
Dois processos são utilizados com esse objetivo: a) Iônica Químico
Eletrônico (Transmissão Eletrônica); b) Químico 5. Retardo Sináptico Ausente Em geral entre
1 a 5 ms
(Transmissão Neuro-Química).
6. Direção da Transmissão Nos dois Sentido único
A transmissão eletrônica é encontrada no sentidos
sistema nervoso central dos mamíferos, no coração,
no músculo liso e em células epiteliais. Tem como Estudos mais recentes revelaram que os
principal vantagem sua velocidade e como principal canais iônicos da sinapse eletrônica não estão sem-
desvantagem não poder ser modulada ou ter sua pre abertos, ao contrário, podem ter sua abertura
eficácia alterada. Já as sinapses neuro-químicas, modulada pelo pH intracelular, pelo Ca2+ e até mes-
embora mais lentas, podem ter suas propriedades mo por segundo-mensageiros, embora de forma limi-
funcionais e plásticas alteradas, variando sua efi- tada.
ciência ao longo do tempo. As sinapses eletrônicas são encontradas no
coração (discos intercalares), no músculo liso (úte-
SINAPSES ELETRÔNICAS ro), e no sistema nervoso central (dendritos). Por
serem praticamente insensíveis à ação das drogas
Na sinapse eletrônica a corrente elétrica são refratárias à manipulação farmacológica, não
(iônica) flue diretamente do terminal pré-sináptico sendo alvo de maior interesse terapêutico.
para o elemento pós-sináptico através de canais de
baixa resistência que unem as duas células na região SINAPSES QUÍMICAS
de contato sináptico (gap junction). As sinapses ele-
trônicas, em função de suas características morfo- Nas sinapses químicas os neurônios pré e
funcionais, apresentam algumas diferenças pós-sinápticos não entram em contato, estando se-
características para as sinapses neuro-químicas, parados por uma fenda sináptica com distância entre
que estão expostas no quadro I. 20 e 40 nm. O transmissor químico liberado pelo
Quadro I - Propriedades Características das Sinapses Químicas e
elemento pré-sináptico tem de se difundir pelo líquido
extracelular da fenda até alcançar a membrana pós-
1 Livre-Docente em Anestesiologia e Farmacologia pela UFRJ, Prof sináptica e interagir com seus receptores farmacoló-
Titular de Farmacologia - ICB - UFRJ e Prof Adjunto de Anestesiologia gicos para dar início à resposta pós-sináptica. As
- FCM - UFRJ várias etapas envolvidas no processo de transmissão
Correspondência para Luiz Fernando de Oliveira química o tornam mais lento, gerando um retardo
Estrada da Gávea 681 Bl. 3 / 304 - S. Conrado sináptico de 1 a 3 ms. Apesar da transmissão química
22610-000 Rio de Janeiro - RJ ser um processo mais lento que a eletrônica, apre-
senta a vantagem do sinal pré-sináptico poder ser
© 1994, Sociedade Brasileira de Anestesiologia amplificado, permitindo que pequenos terminais pré
possam ativar grandes neurônios pós-sinápticos. como por exemplo nas terminações pós-gangliona-
Dois tipos de mensageiros químicos são res que inervam o músculo liso. As vesículas sinápti-
encontrados nos terminais pré-sinápticos: cas, embora possam ser vistas em todo o terminal,
se agrupam em maior número nas vizinhanças da
a) Neurotransmissor - substância química que ao
membrana pré-sináptica. Elas são sintetizadas no
interagir com seu receptor determina o apare-
corpo celular pelo complexo de Golgi, e transporta-
cimento de um potencial pós-sináptico exci-
das ao terminal pelo fluxo axoplasmático, onde são
tatório rápido (PPSE) ou inibitório (PPSI);
montadas.Elas são recicladas inúmeras vezes.Após
b) Neuromodulador - substância química que ao
cada liberação elas são remontadas,carregadas com
interagir com seu receptor altera a liberação
o neurotransmissor e novamente utilizadas (Fig 1).
de um neurotransmissor ou altera a excitabili- O elemento pós-sináptico é caracterizado
dade pós-sináptica facilitando ou dificultando pela presença dos receptores, macromoléculas pro-
a ativação do elemento pós-sináptico pelo téicas que atravessam a membrana de lado a lado e
neurotransmissor. Enquanto os neurotrans- com as quais os transmissores interagem, abrindo ou
missores são moléculas de pequeno fechando um canal iônico, (alterando a condutância
tamanho e peso molecular, em geral aminas da membrana e conseqüentemente seu potencial
ou aminoácidos, os neuromoduladores são elétrico), ou ativando ou inibindo um sistema
em sua maioria peptídos (neuropeptídios). enzimático (o que leva indiretamente a abertura ou
fechamento de canais iônicos ou à secreção ou pro-
Morfologia da Sinapse Química dução de hormônios). Dependendo do tipo de recep-
Identifica-se numa sinapse química 3 ele- tor existente na membrana, o mesmo transmissor
mentos básicos: 1- Terminal Pré-Sináptico; 2- Fenda pode excitar ou inibir, ou mesmo cumprir função
Sináptica e 3- Membrana Pós-Sináptica (Figura 1). apenas moduladora (regulando a sensibilidade da
O terminal pré-sináptico é caracterizado célula a outro(s) neuromediadores). Receptores far-
pela presença das vesículas sinápticas que contém macológicos também são encontrados nos terminais
o transmissor e pela presença de regiões especiali- pré-sinápticos onde exercem papel regulador da libe-
zadas na superfície citoplasmática da membrana, ração e da taxa de renovação metabólica (turn-over)
denominadas de ‘‘zonas ativas’’, que se agrupam do transmissor químico. Muitas vezes a membrana
formando arranjos hexagonais (neurônios centrais) pós-sináptica não é plana, mas enrugada, cheia de
ou em barras (junção mio-neural), na proximidade dobras ou digitações, o que aumenta muito a super-
das quais as vesículas se ligam e se fundem no fície de contato, como na membrana da Placa Mo-
momento da liberação do transmissor (exocitose). tora.
Essas zonas ativas nem sempre estão presentes,
Fig 1 - A= Sinapse Neuro-Química - a fusão das vesículas contendo o neurotransmissor se faz nas zonas at ivas (Corpos Densos), através
acoplamento da vesícula com a proteína (poro) de fusão, que ao se abrir permite a descarga do c onteúdo vesicular na fenda.
B= Seqüência de Eventos Sinápticos.
I- Glutamato - A grande maioria das sinapses VI- Acetilcolina - Encontrada no córtex, nos
excitatórias no cérebro utiliza glutamato ou aspartato gânglios da base, no cerebelo e na formação reticu-
como transmissor. Esses amino-ácidos transmis- lar. Circuitos colinérgicos estão envolvidos com o
sores interagem com dois grandes tipos de recep- ciclo do sono, controle da motricidade, funções cog-
tores o NMDA e o AMPA. Este último divide-se em nitivas, e doença de Alzheimer.
kainato e quisqualato (A e B). O receptor quisqualato
B é do tipo ligado a proteína-G e ativa fosfolipase C,
enquanto os receptores NMDA e AMPA são ligados
diretamente a canal-iônico Na/Ca. Embora seja o Neurotransmissão no Sistema
mais importante sistema neurotransmissor no SNC, Nervoso Autônomo
sua fisiologia e farmacologia são ainda em grande
parte desconhecidas. Sabe-se que está envolvido na
transmissão nociceptiva, na memória, nos processos Sistema Para-Simpático - O neurotrans-
epilépticos, na manutenção do estado consciente missor, tanto pré quanto pós-ganglionar é a acetil-
etc. O desenvolvimento de agonistas e antagonistas colina. Ela interage com dois tipos de receptores, o
do glutamato abre novas e promissoras perspectivas nicotínico e o muscarínico. Esses receptores não só
para o conhecimento das patologias do SNC e seu pertencem a famílias distintas, mas também apre-
tratamento. sentam distribuição e função diferentes. Sub-tipos de
receptores colinérgicos já foram identificados,
II- Dopamina - Três sistemas de projeção con- podendo sua classificação e distribuição ser apre-
tendo fibras dopaminérgicas já foram identificados: ciada no Quadro II.
a) mesolímbicofrontal, que conecta o tronco cerebral
com áreas do sistema límbico e córtex pré-frontal. Sistema Simpático - Tanto no sistema sim-
Envolvido com as funções afetivo-emocionais e, pático quanto no para-simpático o mecanismo de
aparentemente, com a gênese da esquizofrenia; b) transmissão ganglionar é o mesmo, funcionando a
nigroestriado, circuito extra-piramidal envolvido no acetilcolina como transmissor entre o elemento pré-
controle do tono muscular. Sua lesão acarreta sín- ganglionar e o pós-ganglionar. No para-simpático a
drome de Parkinson; c) túbero-infundibular, circuito transmissão ganglionar é mediada por receptor ni-
hipotálamo-hipofisário envolvido no controle da se- cotínico responsável pelo PPSE rápido, enquanto
creção de prolactina e hormônios hipofisários. receptores muscarínicos do tipo M1 mediam PPSE
lento que modula a excitabilidade pós-ganglionar.
III- Noradrenalina - Encontrada em circuitos
neuronais do tronco cerebral, como no locus co- Perifericamente o mediador simpático é a
eruleus, e em projeções tegumento-corticais. En- noradrenalina. Liberada pelos terminais adrenérgi-
volvida em mecanismos de controle reticular do cos ela interage com dois tipos de receptores, o α e
sistema simpático, manutenção do estado de alerta, o β. Subtipos de receptores já foram caracterizados
sistema de modulação inibitória retículo-espinhais (Quadro III), embora todos os receptores pertençam
etc. à mesma família dos receptores acoplados a proteína
G. Na figura 5 pode-se observar esquematicamente
IV- Serotonina - Encontrada principalmente no como esses receptores interagem com a proteína G.
tronco cerebral e no sistema límbico (amígdala e
hipocampo). Envolvida em comportamento emo-
cional, mecanismo do vômito, regulação do estado
Bloqueio do Receptor -
Colinérgico Muscarínico - atropina
Colinérgico Nicotínico - curare
Adrenérgico α- fenoxibenzamina
Adrenérgico ß1,2 - propranolol
Dopaminérgico - antipsicóticos
Fig 5 - Receptores Adrenérgicos e Proteína G.
Inibição do Metabolismo -
Colinérgico - anticolinesterásicos
Implicações Farmacológicas
Adrenérgico - inibidores da MAO
Cada passo da transmissão neurohumoral
representa um possível alvo de ação farmacológica.
Oliveira LF - Transmissão Sináptica
Interferência com a Síntese e a Liberação
Liberação do Transmissor -
Colinérgico - veneno da viúva negra produz liberação
maciça de ACh nos terminais colinérgicos.
Adrenérgico - anfetamina libera NA, daí sua atividade
simpaticomimética.