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Claudio Veiga da Trabalho premiado pela Academia Francesa Edicdo bilingtie ‘29 EDICAO AMPLIADA EDITORA RECORD RIO DE JANEIRO * SAO PAULO 1999 iP-brit. Cuslogsto-aefone Sino Nasional doe ators de fos, ‘Antclogad pata rane: (oslo 1X20 seo aar gis de lta Vlga~ >. amplads — ee) Rode lnc: Resor Sader, BA: Sewer da Cura 6 Tris, 1998 alto binge ISBN 8501057304 2. Aatlogis Poesia fnceat) cop - 84.08 91-0183 ou e0.10822) Copyright © 1991 by Cléudio Veiga Direitos de distibuigdo reservados & DISTRIBUIDORA RECORD DE SERVICOS DE IMPRENSA S.A Rio de Janeiro, RJ ~ 20821-380 ~ Tel: $85-2000 impreso no Bel ISBN 85-01-05730-4 a 'PEDIDOS PELO REEMBOLSO POSTAL 46). Cana Pons! 28082 eS fo de lac R= 20522970 ——e Prefacio ‘A obra que exté sendo ofececida generosa corajosamente & nossa leieura — 20 mesmo tempo ensinamento e distrago — ¢ que tenho a honra de prefaciat é fruro de um labor do qual eu fui, em parte, a testemunha privilegiada durante quase vinte anos; labor benedi- tino 20 qual o Prof. Claudio Veiga consagrou os seus mais legitimos instamtes de lazer. Cotagem e generosidade, Sem diivida, ha uma enor- me generosidade nesta antologia bilingiie que nos apresenta uma vibrante colheita de obras-primas da poesia francesa do século IX 20 século XX, como também — e af aparece ao lado do criador sen- sSivel 0 tebtico seguro e discreto — um Panorama da Poesia France- sa, A Traducao de Poesia Francesa no Brasil ¢ pot fim Problemas ida Tradugao, todos cles temas que, pela clareza e concisio com que foram abordados, haverio de despertat a curiosidade ¢ o interesse de um piblico muito numeroso ‘Quanto & coragem, ela reside antes de mais nada na escolha de um género, a poesia, que nas atuais sociedades faz figura de fés- sil diante dos romances descarcaveis, que nio sio lidos, mas com- pulsivamente devorados, deixando na boca ¢ na mente um travo de sexo e de sangue. A grande culindria, ao mesmo tempo artesanal cc artistica, nao deveria desaparecer atris dos fast-food da vida ¢ das ‘esquinas. Semelhante a ela, a poesia € quintesséncia, quintesséncia do prazet literério, ‘A coragem esté também na propria traduso da poesia, ‘A rradugio nao € um exercicio menor, uma atividade secundé- ria ou paralela, “escolar” ¢ desprezivel, mas um ato de criacio por cexceléncia, um constante e inesgotivel vaivém que se estabelece en- te dois seres, dois textos, duas culturas. Quem haveri de apontar as sectetas raz6es que fazem com que se escolha um poema em lu- gar de outro, a fim de mergulhar, com o isco de perder-se, no ‘Uma troca se estabelece, sem di ., a0 nivel da substincia como também do espitito, e af estao os deslumbrantes éxitos de Net- val, no Fausto de Goethe, ou de Baudelaire nos Contos de Edgar ide, existem os encontros fortuitos que ra o prazer da descoberta. A traducio francesa de Wat Maisie Knew de Henry James no lembra o estilo das Mémoires d'Hadrien? Ela foi efetivamente realizada por Mar- guerite Yourcenar em 1947. Nao deveria haver nenhuma surpresa fem reencontrat-se 0 sopro ¢ 0 estilo de Charles Mauron, o pai da psicoctitica, na tradugio de Tristram Shandy, de Sterne: ele realizou-a efetivamente 1946. mais estreito pode ainda manifestar-se frente a um texto dificil ¢ até mesmo he proveito que soube tirar Maurice Edgar Coin- dreau das longas conversagées que teve com Faulkner, abrindo assim as portas de sua alquimia verbal. Os exemplos poderiam multiplicar- se 20 infinito, mas preferimos citar somente dois cuja evidéncia sal- 20 lado de Valéry Larbaud, e a edigio francesa do Der evista pelo préprio Freud. ar de representarem casos extremos, esses exemplos encer- ram um ensinamento da maiot monta: pot mais intuitivas que se- que seja, algum método deve ser aplicado. O jé citado Coi ‘tentou apresentar certas indagacSes quando precisamente estava em penhado de corpo e alma na traducio de The Sound and the Fury. resultado, sem daivida louvavel, limitou-se a reflexbes fragmen- tas. ‘Na segunda parte do Apéndice, intitulada Problemas da Tra- dugao, ¢ cuja leitura devers tornar-se obtigat6ria devido 3 quali- dade ¢ & penetracio dos preceitos ali contidos, Claudio Veiga con- segue sistematizar 0 ato de traduzic a partir da investigaco minudente de sua experiéncia cotidiana. Nao hé nada mais afastado das teori- zaghes abstratas ¢ estéreis do que este modo de proceder. Nio hi nada mais fecundo do que esta procura incessante, n dica e as vezes hostil, do diamante que talvez nao seré jamais en- contrado. ‘As duss disciplinas enja falta, na maioria das nossas Univers dades, se faz profundamente sentir, quero dizer a Bvtilistica ea Li- teratura Comparada, Cliudio Veiga as conhece ¢ pratica h muito tempo, ¢ isto explica, em parte pelo menos, algumas de suas mais belas traducSes. Latinista brilhante, ele se sente & vontade tanto na prética do francés quanto de sua lingua materna. Além diso, ele € um dlssico, um classico no me sentido do termo, como s6 iados do planeta ou da ima- dizia o mestre da nossa disci- a: “disputar palmo a palmo de Salles, a quem ele dedicou o modelar Sete Tons de uma Poesia Maior, um verso retorna ao seu espirito, como um /eitmoriv: Na pirpura do Verso 0 ouro do Sonho ardente, Fio a fio teci. Toda a realizacio do poeta, como também a do tradutor, estfo con- tidas nestas poucas e preciosas palavras. £ esta seguramente a linha ténue em que os dois se encontram. (s poetas franceses tecendo ao longo desses onze séculos seus textos/tecidos, e 0 nosso tradutor Claudio Veiga, ap6s haver reen- ccontrado as i vyerniculo mais cristalino 0 Poema oferecido ao nosso deleite. Aqui esto, revisitadas redivivas, as flores da poesia francesa, como que ‘magicamente ressuscitadas peles qualidades do artista e as virtudes do artesio. Mais uma vez a Franga ¢ a Cultura francesa contrairam com 0 Prof. Claudio Veiga uma nova ¢ imeasa divida. JACQUES SALAH. Doutor em Letras Cénsul da Franca na Bahia Introdugio PANORAMA DA POESIA FRANCESA. ‘Antologia da Poesia Francesa IDADE MEDIA AUTOR ANONIMO (Século IX) Cantiléne de Sainte Eulalie Cantilena de Santa Euldlia AUTOR ANONIMO (Século XII) La mort de Roland Amorte de Rolando AUTOR ANONIMO (Século XII) Chanson d'amour Cantiga de amor CHARLES D’ORLEANS (1394-1445) En regardant ces belles fleurs.. ‘Ao contemplar to lindas flores. Ecolier de Mélancol Eu sou aluno da Tris Priez pour paix, douce Vierge Marie , pedi pela paz, Virgem Maria FRANGOIS VILLON (1431-1463) Ballade rier Notre-Dame Balada para implorar Nossa Senhora Ballade des Pendus 7 23 38 39 42 43 Balada dos Enforcados Ballade des Dames du Temps Jadis Balada das Damas doutros Tempos SECULO XVI MAURICE SCEVE (1501-1560) Comme des rais du Soleil gracieux Como dos raios deste Sol formoso Quand je te vis orner ton chef doré Quando eu te vi omando a loura coma JOACHIM DU BELLAY (1525-1560) Tout ce quici la Nature environne... Tudo quanto rodeia a Natureza... Si notre vie est moins qu'une journée... Se ao pé da eternidade nossa vida.. France, mere des arts Franga, mie das leis Las! Od est mai Ail Onde agora LOUISE LABE (1524-1566) Prédit me fut... Foi predito... PIERRE DE RONSARD (1524-1585) Comme on voit sur la branche... Qual no ramo se vé... Je vous envoie un bouquet... O ramo que vos dou... I faut lasser maisons... Cumpre deixar mansio... REMY BELLEAU (1528-1577) Dun bouquet envoyé le mercredi des cendres. Um buqué oferecido quarta-feira de cinzas 8 61 65 PHILIPPE DESPORTES (1546-1606) AGRIPPA D’AUBIGNE (1550-1630) La flore du martyre A flora do martirio JEAN DE SPONDE (1557-1595) Mais si fauril mouri ‘Mas todos vio morrer.. SECULO XVII FRANGOIS MALHERBE (1555-1628) Pritre pour le roi Henti Prece pelo rei Henrique, o Grande Paraphrase du Psaume CXLV Pardfrase do Salmo CXLV GOMBERVILLE (1600-1674) Sur exposition du Saint Sacrement Sobre o Santissimo Sacramento exposto ‘TRISTAN LHERMITE (1601-1655) Le promenoir des deux amants passcio dos dois enamorados PIERRE LE MOINE (1602-1671) La Madeleine nouvellement convertie Madalena recém-convertida PIERRE CORNEILLE (1606-1684) La pri Accincia principal 92 95 96 7 98 99 100 101 102 103 106 107 108 109 10 M1 112 3 JEAN DE LA FONTAINE (1621-1695) Invocation a la Volupeé Invocacio & Volipi Solitude, oi je trouve Solidio, que me Les deux pigeons (Epilogue) Os dois pombos (Eptlogo) La jeune veuve Aviuvinha NICOLAS BOILEAU (1636-1711) LArt poétique . A Ane poética JEAN RACINE (1639-1699) Plainte d’un chrétien Pranto de um cristéo SECULO XVIII JACQUES DELILLE (1738-1813) ANDRE CHENIER (1762-1794) La Possie A Poesia SECULO XIX ALPHONESE DE LAMARTINE (1790-1869) Un paysage lyrique (LIsolement) Paisagem lirica (O Isolamento) 10 116 7 121 122 123 124 125 128 129 132 133 136 137 140 141 142 143 Le livre de la vie O livro da existéncia ALFRED DE VIGNY (1797-1863) La Nature tattend... ‘A Natureza esta chamando VICTOR HUGO (1802-1885) sol ‘Mes deur filles ‘Minhas duas filhas Mors Mors Jai cueilli cette fleur. Eu te dou esta flor... Demain, dés l'aube.. ‘Amanhi, muito cedo... La fete chez Thérése A festa de Teresa Saison des semailles. Le soir O semeador GERARD DE NERVAL (1808-1855) El Desdichado El Desdichado Delfica Délfica Arcémis Artémis, ALFRED DE MUSSET (1810-1857) Tristesse ‘Tristeza La Nuit Octobre ANoite de Outubro ‘THEOPHILE GAUTIER (1! LAr AAre -1872) LECONTE DE LISLE (1818-1894) Les Montreurs O espetéculo Levent froid de la nuit... Annoite, 0 vento frio.. Sacra-Fames Sacra-Fames Villanelle CHARLES BAUDELAIRE (1821-1867) Correspondances Correspondéncias Les chats Os gatos La dloche félée O sino rachado Harmonie du soir Harmonia do entardecer Recueillement Recolhimento Spleen Spleen 174 175 176 17 182 183 184 185 188 189 192 193 194 195 198, 199 200 201 202 203 204 205 207 210 21 212 213 Les petites vieiles As velinhas JOSE-MARIA DE HEREDIA (1842-1905) Loubli O esquecimento Vitrail Vieral Epiphanie Epifania Les conquérants Os conquistadores STEPHANE MALLARME (1842-1898) Brise marine Brisa marinha Le vierge, le vivace... Hoje o dia vivaz. Ses purs ongles... Unhas puras... Sainte Santa ~Salut Brinde PAUL VERLAINE (1844-1896) Lombre des arbres Asombra do arvoredo ‘Aprés trois ans ‘Ties anos depois Le piano... O piano... Art poétique Arte poética LAUTREAMONT (1846-1870) Invocation &FOcéan Invocagéo 0 Oceano 13 214 215 218 219 ARTHUR RIMBAUD (1854-1891) Ophelie Ofélia Aube Aurora ALBERT SAMAIN (1858-1900) Jeréve de vers doux. Doces versos son! JULES LAFORGUE (1860- 1887) Couchant d’hiver Pér-do-sol de inverno SECULO XX JULES RENARD (1864-1910) Le chant du crapaud O canto do sapo HENRI DE REGNIER (1864-1936) Odelerte Ode singela FRANCIS JAMMES (1868-1938) Par le petit gargon... Pelo menino... PAUL CLAUDEL (1868-1955) Le temps a fui. O tempo fuga Pouvoir du potte Poder do poeta La sainte face A santa face 250 251 254 255 256 257 258 259 262 263 264 265 269 273 274 275 276 277 PHILEAS LEBESGUE (1869-1958) Cette veille chanson Esta velha cangio souris et le rossignol O gato, o ratinho e rouxinol ‘Chanson de charrue Cangio de charrua PAUL VALERY (1871-1945) ‘As romis Cimetidre marin Cemitério marinho CHARLES PEGUY (1873-1914) Laveugle (Homere) O cego (Homero) Hymne é la nuit Hino & noite Présentation de Paris & Notre-Dame Apresentacio de Paris a Nossa Senhora ANNA DE NOAILLES (1876-1933) Jéctis pour que le jour. Escrevo para quando... Surprise Surpresa Des coeurs furent heureux... Quando voce nasceu.. 280 285 307 OSCAR VENCESLAS DE LUBICZ-MILOSZ (1877-1939) Une rose pout... Uma rosa para... Les pottes de Dieu... Os poetas de Deus... 308 309 312 313, GUILLAUME APOLLINAIRE (1880-1918) Le Pont Mirabeau LaJolie Rousse Alinda Ruiva JULES SUPERVIELLE (1884-1960) Aun arbre Auma érvore Pridre l'Inconnu Prece ao Desconhecido SAINT-JOHN PERSE (1887-1975) Poisson. Os libios deixando Jours de nos yeux Luz de meus olhos Miroir d’un moment Espelho de um momento Bonne justice Boa justiga La courbe de tes yeux ‘A-curva de teus olhos PHILIPPE SOUPAULT (1897-1990) Larmes de soleil Légrimas de sol 314 315 318 319 320 321 326 327 328 329 LOUIS ARAGON (1897-1982) Je vous salue ma France... Eu te satido 6 Franca, I ny 2 pesd’amour heureux ‘Amor feliz nio hé na vida La Rose et le Réséda ‘ARosa eo Resedé ROGER VITRAC (1899-1952) Humorage & Picasso Humoragem a Picasso HENRI MICHAUX (1899-1984) ‘Une téte sort du mur Sai da parede uma cabeca FRANCIS PONGE (1899-1988) Pluie Chuva Le soleil titre la nature sol inticula a narureza La bougie Avela ROBERT DESNOS (1900-1945) Conte de fée Conto de fada JACQUES PREVERT (1900-1977) ‘Chanson des escargots qui vont & Penterrement ‘Canso dos caracéis a caminho do enterro Le char et l’oiseau 388 (O gato eo passarinho 389 Coridge 392 Cortejo 393 On frappe 394 Estio batendo 395 LeCancre 396 © Aluno Vadio 397 7 JEAN TORTEL (1904-) ‘Vay je sais & peu pres... Bem, mais ou menos sei... EUGENE GUILLEVIC (1907-) Le ruisseau coule... O regato corte. Non, tout le mond Nao, nem todo mundo, Jai vu le menuisier Tenho visto 0 marceneiro Is ne sauront pas... Jamais as rochas... RENE CHAR (1907-1988) Lecarreau Avidraga Alla santé du serpent A satide da serpente PIERRE EMMANUEL (1916-1984) Lart de mourit Aarte de morrer Mes yeux mes mains ‘Meus olhos minhas maos FAN CLAUDE RENARD (1922-) re des cendres 3 limite das cinzas ‘YVES BONNEFOY (1923- ) 422 426 427 JACQUES DUPIN (1927- ) Ce tison Ia distance Esta brasa a distincia Une ford nous préctde.. Uma floresta nos precede... JACQUES ROUBAUD (1932-) Escargot © Caracol APENDICE 1. A tradugéo da poesia francesa no Brasil TI. Problemas da tradugio Suplemento 428 429 430 431 432 433, 435, 444 463 Suplemento ALPHONSE DE LAMARTINE (1790-1885) Lelac O Lago VICTOR HUGO (1862-1885) Ecrit sur la vitre d'une fenétre flamande Escrito na vidraga de uma janela flamenga MARCELINE DESBORDES-VALMORE (1786-1859) Les roses de Saadi As rosas de Saadi BAUDELAIRE (1821-1867) La mort des amants ‘Armorte dos amantes La mort des pauvres ‘A morte dos pobres La mort des artistes A morte dos artistas ARTHUR RIMBAUD (1854-1891) Le bateau ivre ‘Acembarcacio embriagada JANE CATULLE-MENDES (1867-1965) Arrivée dans la baie de Guanabara (Chegada & bafa de Guanabara 21 ANDRE BRETON (1896-1966) Vigilance Vigilancia EUGENE GUILLEVIC (1907- ) Lorsque j’écris nuage Quando escrevo nuvem PHILIPPE JACCOTTET (1925-) Ignorant Ignorance Fruits Frutas 22 498 499 502 503 504 505 506 507 Introdugaio PANORAMA DA POESIA FRANCESA primeito texto literério em Iingua francesa surgi no final do século IX. Ea Cantilena de Santa Eulalia. Adaptacao de um hi- no religioso tedigido primitivamente em latim, exalta a cantilena, em vinte e nove versos, a beleza, virtude ¢ coragem de uma joven cristd, vitima da perseguicdo ordenada por Maximiano. Enaltecen- do a santidade, ideal humano prestigiado naqueles tempos, a Car. tilena de Sante Eulélia eré seguida, nfo imedistamente, de irtimeros ‘outros pocmas hagiogrificos, tal a Cangdo de Santo Aleixo (1040), que, neste séeulo, foi adaptada a0 teatro por Henri Ghéon. Ganha novas dimens6es a poesia francesa quando, durante as ‘guertas feuds e os comecos das cruzadas, surgiram as cangées de gesta, que celebram 0 cavaleiro denodado, pronto para lutar por Deus, pelo senhor feudal, sendo Carlos Magno o prot6tipo dos su- seranos. Florescendo nos séculos XI e XII, tém as cangBes de geste como cspécime mais antigo ¢ mais belo a Cangao de Rolando. £ infima nesses poemas a presenga da mulher. Assim, quando Rolando, em sua agonia, faz um retrospecto de sua vida, lembra-se da doce Franja, de Carlos Magno, de seus companheiros de luta, de suas proezis, mas nflo tem pensamento algum para a noiva. Ou- tro ideal ilumina a poesia cortés, sob a forma natrativa ou sob a for- ‘ma litica, Nos romances, 0 cavaleito lutava no mais por Deus ou pelo suserano, mas pela dama. Em ver de Carlos Magno, seu gran. de heréi sera principalmente o Rei Artur. Ao contririo do decassf- 2B labo, que predominava nas cangées de gesta, passou-se a usar 0 coctossflabo, E, em vez de cantado ou salmodiado para um grande mance cortés era lido em ambientes mais restitos. 40 cortés, que obedece ao mesmo cédigo sentimental, (o, no entanto, a aventura herbica por uma ascese do amor foi cultivada, a comeso pelos poetas provencais que influirioo lris- ‘mo francés propriamente dito. Gradativamente, softe a cangio acon- corréncia dos chamados géneros de forma fixa: /ai, virelai, canto real, ¢ sobretudo a balada e 0 rond6. ‘Associada, a comego, & miisica, a poesia era recitada ou canta- dae, até mesmo, acompanhada de danca. No século XIV, separa- se da miisica, passando os poetas a escrever, ndo para serem ouvi- ddos, mas para serem lidos, substituindo-se o recitante pelo copista. 0 dltimo grande poeta-mésico foi Guillaume de Machaut. Procu- rando entio a poesia criar sua propria mésica, estabeleceu uma re- gulamentago complicada e quase passou a consistir em_vencer dificuldade: as. E 0 reinado dos poemas de forma fixa que perdurard a scenga. No entanto, € com esse cOdigo que se representantes da poesia medieval: Charles d’Orléans e Frangois Villon. Bastante diferentes, cruzam- se, no entanto, os seus caminhos. O poeta vagabundo conheceu a corte do refinado senhor aristocratico. Charles d'Orléans ja como prisioneiro dos ingleses, durante vinte ¢ cinco ja vivendo de novo em sua pitria, fez sempre da poesia seu ‘¢ sua distracio. Sente-se @ vontade nos géneros de forma tr fixa (rond6s ¢ baladas) e, reanimando o velho cortejo de alegorias, ad canta a volta da primavera, a tristeza do inverno e da vel ‘quenos espetdculos da v diana, a separacio da amada, dei- xando, 2s vezes, entrever as misérias do tempo. Nao é um inovador, mas um herdeiro feliz, re clatdes da poesia cortés. £ 0 tiltimo dos trovadores. Pouco volumosa a producao de Frangois Villon, nela se mani- festa uma vida aventurosa e destegrada, com seus desencantos ¢ seus remorsos. Por scu espitito profundamente religioso ¢ pelas formas wu € um homem da Idade Média, de cuja poesia Iitica € -presentante, Mas jé € também um autor modemo. De- tar alguns versos da Balads dos Enforcados, assim se pro- uum estudioso da poesia medieval: “Bisa grande ate. Poucas 24 ‘vezes foi atingida antes de Francois foi, sem dtivida alguma, ultrapassad: de entio para cf, no * ‘Embora nao houvesse constitufdo, certamente, uma escola, cos- ‘uma ser reunido sob a etiqueta poetas Honeses um grupo de poetas radicados em Lito, cidade que, nos comegos do século XVI capital francesa do humanismo. Tendo concey ‘as, acolheram o petrarquismo ¢ 0 platonism grupo Louise Labé e, particularmente, Mauri ‘que prefigu- tatia o hermetismo de Mallarmé. Conquanto Albert-Marie Schmidt prefetisse considerar 0s poetas Hioneses mais como os inventores da literatura pessoal do que como precursores da Piéiade, Ronsard ¢ du Bellay os reverenciaram como precursores. Tntegrando a Péade, Ronsard, como animador, du Bellay, como te6tico, e outros como Rémy Belleau e Antoine Baif, pretenderam, ‘em meados do século XVI, renovar a poesia francesa. Tencionava ‘esse grupo de jovens fazer tabua rasa do passado e, com o objetivo de ctiar uma grande pocsia, tomar o francés uma lingua de culeura, comparivel as linguas antigas ¢ ao italiano. Segundo 0 manifesto da escola, lancado em 1549, Défense et illustration de la langue fran- aise, atingir-se-iam os objetivos, de um lado, gracas ao enriqueci- mento do vocabulirio: criagio de novas palavras, empréstimos tomados 20 latim, grego ¢ italiano, emprego de termos téenicos € regionais; de outro lado, mediante a tejcigio das especiarias medie- vais, isto €, rondés, baladas, ais, vrelas, cantos reas ea utlizacio dos géneros poéticos usados pelos antigos, ¢, mais ainda, o soneto italiano. Enquanto pregavam a imitacio dos Antigos, animava-os tuma concepgio modema do lirismo que, em vez de reduzir-se as acrobacias da versficaga0, deveria brocar da inspiagio. Em grande parte, a Piéiade honrou os seus compromissos, particularmente com ‘a obra de seus principais representantes — du Bellay ¢ Ronsard. ( primeico livro da Piéiade e o primeiro livro de sonetos de poeta francés € L'Ofive (1549), de du Bellay que também excreveu Les Antiquitts de Rome e Les Regrets, Pela atencio as rainas e pela ‘emogio que se manifesta em seus versos, aparenta-se aos roménti- cos. Mais variada ¢ extensa € a producio de Ronsard, Nela exprime sentimentos pessoais ou os grandes sentimentos da humanidade e, vivendo numa época bastante conturbada politicamemte, apresenta- lay e de Ronsard constitui um grande momento do lirismo francés. Malherbe encamnaria, talvez, as duas feigdes do século XVII — mes de Saint Pierre (1585), etiquadra-se pacificamente entre os bar- rocos franceses. Naquele poema, em que imita o italiano Tansillo, Malherbe, em busca da maior expressividade, prodigaliza hipérbo- les, antiteses, metaforas desmedidas, comparagdes detalhadas. In- tegra, desse modo, a longa sétie de poetas que, na Franca, ilustariam, de 1580 a 1660, a poesia barroca: Philippe Desportes, Jean Spon- de, Agrippa d’Aubigné, Jean de la Ceppéde, Théophile de Viau, Saint-Amant, Tristan I'Hermie, Le Moine, entre outros. ‘Além de haver renegado Les Larmes de Saint Pierre, tornat-se- jerbe, pela teoria ¢ pela pritica, um arauto do classicismo. ado oenrigoecimento d Kinga fxncessprogramado , um simples arrumador de stlabas, est de mago, profeta ou vidente. Com itismo formal, impessoal, que propor- ciona mais um praze! do que u: rem que preponde- re a sensibilidade. Boileau vulgarizou a douttina do poeta parcimonioso e exigente cujo verso deverd subsistir até a revolucio ds indo 2 opiniio de Jonge de Ihe Malherbe, depara tempos modernos e talvez de todos os tempos, o génio superio Franca) 26 Em meio da poesia impessoal, condicionada pelo classicismo, © lirismo desabrocha nos versos de La Fontaine. Nos poetas- dramaturgos, Corneille e Racine, o lirismo suscitaria a ambiéncia que envolve suas pecas. Nos estudos sobre a poesia francesa no século XVIII, séo en- contradicas expresses como as seguintes: deserto poético, longa noite poética. Enue isritado ¢ desolado, um critico assim se desabafa: ‘‘O siléncio da poesia francesa € a vergonha do século XVIII.’ Nao faz muito, $. Menant publicou um livro intitulado: La chute d'Tea- re— la orise de la Frangaise au XVUlsiécle. opinito de Vauvenargues: “Os grandes poetas, em favor do género humano, poderiam empregar seu espirito em algo mais til que a poesia.” Apesar do clima antipoético, utiliza-se copiosamente 0 verso, sendo cultivado o lirismo de aparato, os discursos filos6ficos ou reli- giosos, poemas didatico-descritivos etc. Delille, um dos poctas mais ilustres de scu tempo, celebraré, com punhos de renda, as virtudes do café e Ihe adoga o sabor com uma engenhosa perifrase. Trata-e, no entanto, de uma poesia 2 base de receitas poéticas, predominan- do uma linguagem incada de sinénimos elegantes, perifrases, in- ‘verses, ornamentos mitolégicos. E tudo vazado nos modelos iros de regras encané No século XVIII, a poesia se refugiard na prosa de grandes es- ctitores, como Rousseau e, jé perto do Romantismo, encontrar em André Chénier um digno representante Em conhecido hemistiquio, Boileau satida efusivamente 0 pre- cursor do classicismo — Enfim chegou Malherbe." No século XIX, a € outro o pensamento de Théodore de Banville, para quem a poe- icada com aquele aparecimento, foi embora.’ Se 0 par- F080, dia nao podiam fazer dele os romainticos ¢ os simbolistas. tbe € 0 oposto do poeta modelado pelo romantismo e pelo simbolismo. As confidéncias de um Musset ou Lamartine, a dade ritmica e esilistica de um Victor Hugo nao se harmonizariam ‘com a teofiae a pritica de Malherbe, tampouco o hermetismo de || Mallarmé, as nuances de Verlaine, as visbes de Rimbaud, nem as audicias métricas que descambarao no verso livre ¢ no poema em prosa No renascimento da poesia francesa, verificado no século XIX, © primeiro grande momento € 0 romantismo, reptesentado cularmente por Lamartine, Vigny, Hugo ¢ Musset. A data of de seu surgimento € 0 1820, quando foi publicado o livro | Méditations poétiques, de Lamartine. Acolhendo em seus vers0s © eu, anatureza, e escrevendo um Verso harmonioso, Lamartine trou- xe de volta Franca a poesia: “Fui eu o primeiro que fez @ poesia descer do Pamnaso ¢ deu ao que se chama a musa, em vez de uma lira de sete cordas convencionais, as fibras mesmas do coracéo do homem, tangidas e sensibilizadas pelas vibragGes sem ntimero do hhomem’e da natureza.'” Nao serd essa, potém, a nota exclusiva da . Tera vigéncia cada vez maior uma poesia de ins- retudo a partir da revolucZo de 1830 até a revolu- radas f cero a tendéncia Victor Hugo. Além s grandes romanticos, : poesia os chamados ‘pequenos roméanticos, dos quais se destaca Gérard de Nerval que ~\0"" Seria, para alguns, o nico romdntico francés comparivel aos roman- ticos ingleses e alemaes. Sua importincia avulta, enquanto decresce _ a antiga estima votada a Lamartine e Musset. Apesar das proclama- | | goes e audacias, nao houve uma verdadcira revolucio prosédica na pocsia roméntica: Hugo est4 muito mais perto dos poetas do século XVII do que das inovacdes de Rimbaud. Deixando de lado preocupagées generosamente utilitérias, a poe- sia id delimitar seu campo de acto. Ne havido uma atualizacao daquele aspecto do Rom: tales, livro em que 0 cuidado com a do ritmo deveria conduzir a poesia a rivalizar com as artes plisticas. 28 +¢ (Nas Orientaledse encontram os germes da arte pela arte. Hugo niio ‘persist Tessa tendéncia, compenetrando-se, cada vez mais, bem ‘como Lamartine, da “‘funcio do poeta” na soci de. Quem reco- Ihe a licao € Théophile Gautier para quem a poesia devia bastar-se asi mesma, sem aplicagio prética ou alcance moral: ser bela, eis 4 Ginica missao da art. Tais idéias revigoram nas imediagSes de 1850 contaro com apoio de escitores como Banville, Baudelaire, Fiau- ert, Fromentin. Em 1852, a publicacao de Emaux et Camées, de Gautier. Fortemente hostis 20 Romantismo, os poetas parnasia- ‘nos seguem a inspiraco da arte pela arte, exacerbam 0 culto da for- ‘ma, pretendem suptimir o lirismo ¢ impor a impersonalidade, jlustrando esse artigo importante do credo parnasiano 0 soneto de Leconte de Lisle — Les Montrezrs. No entanto, esse adversirio fesso do liismo sentimental seria “um litico camuflado de de vo" A perfeicio da arte ¢ da técnica parnasiana se encontraria em Les Trophées, de José-Matia de Heredia. Ctiada em 1886 a escole simbolista, 0 movimento simbolista Ihe € bastante anterior, sendo seu grande precursor Charles Baude- Iaite e, seus verdadeiros mestres, Mallarmé, Verlaine ¢ Rimbaud. ia moderna e desses trés mestres, diré Paul Valéry: **A maior gléria de Baudelaire €, sem dvida, ter ge- rado alguns altfssimos poetas. Verlaine, Mallarmé ¢ Rimbaud nfo fam sido o que foram sem a leitura que fizeram das Flores do /, na idade decisiva (...) Enquanto Verlaine ¢ Rimbaud conti: ‘nuatam Baudelaire na ordem do sentimento e da sensagio, Mallar mé o prolongou no que se refere & perfeicio ¢ 4 pureza pottica. Em tomo da escola simbolista enxameia uma quantidade de poe- tas, como Jules Laforgue, considerado decadent; Jean Moréas, au- tor do manifesto simbolista e, em breve, renegado; René Ghil, autor ‘erbe, que mereceu um prefécio, ou melhor, um: ‘outros. No Simbolismo, caberia a déncias horizontais, sias), mas ainda comrespondéncias verticas, isto €, entre o mundo das aparéncias ¢ um mundo ideal. Para uns, seri o Simbolismo uma Yerdadeira aventura espicitual, ganhando a poesia uma dimenséo .. Outros dardo mais énfase ao lado artistico ¢, retomando a correspondéncia das vogais de Rimbaud, pretenderio criat uma ‘ jnstrumentagdo verbal". Simbolista sem grandes mistérios, Albert 29 Mallarmé: ‘‘Nomear o objeto é suprimir trés quartos poema."”" Em sua demanda, nao recua o pocta simbolista diante do vago ¢ da incoeréncia mesma das imagens, a contrastar com a precisio ¢ 2 nitidez parnasianas. Nao serd levada em conta 2 pro- priedade vocabular nem a e 40. Sera banida a eloqién- cia que, proveniente da poesia clissica, atravessara incSlume 0 “Romantismo ¢ o Pamasianismo. A poesia ser tratada como uma “Iniisica € no como uma arte da organizacio espacial, como faziam os parnasianos. Na pros6dia, a libe desde a preferéncia pe- \[ Jos versos impares até a ctiacgo do vers Jaudeliano € 20 aptego pelo poema em prosa. O exemplo mais ilustre do simbolismo em ‘Les Chants de Maldoror, de Lauttéamont. Conforme -aforicamente Jacques Roubaud, o assassinato do alexan- ocorrido nos anos 1870-1880 e, de envolta com aquele sec um anacronismo aristocta- restauracio (La Vieillesse dl'Ale- Em 1910, o fégil Demoiselle de Santos Dumont, voando en- tre Saint-Cyr e Buc, estabelece o recorde de 95 quilémetros por ho- ra, Naquele mesmo ano, Guillaume Apollinaire, que ndo se arreceia em admitir na poesia 0 mundo moderno, acolhe a maquina voado- ta, exigindo apenas que ela se chamasse avion e nao aéroplane. E a torre Eiffel, em tomo da qual fizera evolucées 0 ‘pai da aviacio”’, figurara nos versos do poeta como se fosse uma pastora a apascentat tum rebanho de pontes. Segundo André Billy, € Apollinaire “o Prin- cipe do espitito moderno". Quis o poeta aplicar 3 literatura as teo- rias da pincura cubista, banindo a l6gica na apresentagio das idéias, imagens e sensagdes. Escreveu versos regulates, vetsos livres e, por fim, caljgramas, nos quais 0s versos, graficamente, fazem ver 0 a5- sunto, 05 objetos evocados. Blimina, de sua poesia, a pontuasio Em sua obra se fundem o gosto pelas audécias de vanguarda e a veia clegiaca. Poeta da aventura, sem haver renegado a ordem, influen- 30 ciow o surrealismo, palavra que ele forjou, ¢ 2 poesia contemporines. Paralelas & atividade de Apollinaire, hé manifestagoes de um neo-romantismo, de um neo-simbolismo eo surgimento de novas escolas como o unanimismo, o grupo fantasista ¢ o naturismo. Cum- pre lembrar a eclosio de uma poesia feminina que, marcada por algum simbolismo, acolhia a efusio e a espontaneidade romanti- cas. Anna de Noailles seria a sua maior represet regnados de sentimento cristo, “se ‘evapora a @gua pura e deliciosamente perfumada com que soube orvalhar a poesia francesa no final \bolismo”’."' Também na- a seu modo, mas teligiosas, 0 braslianisa escreveu uma das mais sugesti- vas poesias da navureza ‘Péguy terd sido, sem divida, o maior poeta frances assassinado pela primeira guerra mundial. Seus versos, liberados ou tradicio- iis, estZo impregnados de suas conviegGes de crente ¢ francés. Apoi- da na repeticdo de palavras e frases, sua poesia progride num de- senrolar seguro ¢ musical, sendo realgada com imagens sugestivas € um tom simples e familiar. Desaparecidos na guerra mundial, Péguy, logo no comeso do conflito ¢ Apollinaire, nas vésperas do armisticio, aos olhos dos fran- ceses, Claudel e Valéty setéo, nas imediacoes de 1920, os dois gran- des poetas vivos. Poeta-dramaturgo, Claudel € dos maiores poetas ctistdos. Critico mordaz do verso tradicional francés, empregou quase tunicamente o versiculo que € animado por um ritmo bastante pes- soal. Sua aco se estendeu do comeco do século até o tiltimo apés- ‘guerra. Valéry, que veio do simbolismo, tendo sido discfpulo de Mal- larmé, conservou o uso do simbolo, das aliteragdes ¢ assonincias E aproximado de Malherbe e Racine por aceitar 0 verso tradicional com todas as suas exigéncias. Escreveu em um dos seus ensaios: “A verdadeira condicdo de um verdadeiro poeta € o que hi de mais dis- tinto do estado de sonho.”” E um antipoda do surrealism. fas solides € 2 rabrica sob a qual um crtico reuniu, 20 lado , Milosz ¢ Supervielle.” Nascido na Lituinia, Milos, por ieitos poemas, esta ligado aos simbolistas. Por sua evolu- io, situa-se entre os iniciadores da poesia contemporinea. Aban- donando 0 mundo intermediério dos simbolos, busca a visio dos 31 arquétipos. Vindo também do estrangeiro, Supervielle nasceu no Uruguai como Lautséamont e Leforgue. Nao € um poeta maldito, mas da reconciliacio, simpatizando com os seres ¢ 28 coisas. Ja se apontou nele certa ingenuidade 4 La Fontaine, uma religiosidade que lembra a de Francis James ¢ também certa percepcio do misté- rio que o aproxima de Gérard de Nerval. Usando uma linguagem harmoniosa, néo cultiva o hermetismo: “Quanto a mi ipre me recusei a escrever poesia para especialistas do mist ‘Surgiu ¢ floresceu o surtealismo no imediato af primero conflito mundial. Filiando-se a Lautréamot i ¢ Apollin surrealistas ampliatfo 0 espaco poético. Marcados pelos ensinamentos de Freud, propunham-se os seus promotores ¢s- tudar sistematicamente o inconsciente. Fundou 0 movimento An- dé Breton, juntamente com seus companheios Philippe Soupaule, Benjamin Péret, Paul El realismo, Breton Louis Aragon e outros. Papa do sut- 10 poeta e, sobretudo, gracas a seus manifestos :0 do grupo. O seu poeta mais representative é Paul Eluard que, aos poucos, se afastou do movi- ‘mento — sem contudo deixé-lo por completo — em direcio da sim- ples tealidade e da politica, havendo-se filiado ao partido comunista. Poeta do amor e poeta engajado, sua inspiracgo se alargari durante a ocupagio alema. Aragon também se distanciou de Breton. Dono de uma rica producao romanesca, salientou-se principalmente por sua obra poética. Ingressando no partido comunis bém poeta engajado. Retemperou durante 2 guerra sua pocsia, mer- gulhando no passado onde se afina com Charles d'Orléans, Vietor Hugo, Verlaine e Péguy. Com essa inspiracio, seus grandes temas sdo 2 Franca e a mulher amada, a poetisa Elsa Triolet. ‘Como a primeira guerra mundial favoreceu a eclosdo do sur- realismo, 0 curso da Gltima guerra prog que a pattir de Mallarmé tem a propensio de diti co restrito — tornar-se cristalina e alcangar larga audiéncia. Assim, nao s6 Aragon ¢ Eluard, mas ainda outros poctas como René Char e Pierre Emmanuel, alimentaram a esperanga nos dias da Resistén- cia, Terminado 0 conflito, as atengées que iam para a poesia se vol- taram para a filosofia e para o romance. Prévert, transfuga do surrealismo, mas conservando-Ihe com originalidade a tendéncia li- bertiria e certo funambulismo com as palavras, conseguiu mantet uma grande audiéncia popular. 32 poesia cris veio 3 tona. O pattiar- ‘ainda a sua voz, respigow as suas a Paul Claudel, fazendo 01 ‘ltimas produgées. Sob a inspiracio de temas cristaos, juntaram-se ‘ou sucederam 20 velho poeta poetas mais moses: Pierre-Jean Jouve, Pierre Emmanuel, Jean-Claude Renard. . “Ao lado desses poetas que testemunham da existéncia de Deus, Pierre de Boideffre agrupa, sob o titulo — Sacré sans Diew — certo ntimero de ilustres figuras. Saint-John Perse celebra solenemente fquilo que, mesmo sem o influxo de Deus, parece sagrado. Pelo fitmo ¢ pompa de seus versos, costuma ser comparado a Claudel, lum ¢ outro diplomatas. Haveriam criado 0 lirismo dos embaixado- res. A poesia de Yves Bonnefoy, que pouco se afasta das normas classicas, tem uma dimensio espiritual, embora num mundo sem Deus. Sua “obra esti voltada para 2 busca de um impossivel mais além e questiona o poder da linguagem ea legitimidade do ato poe tico”.* Francis Ponge, visto por Sartre como 0 poeta do existencia- fismo, anulou, segundo o mesmo ctitico, "'sarro romantico € ctistZo”” das palavras. Ponge escreve uma poesia de uma quase cien- tifica minGcia descritiva em que as palavrasfrateznalmente abragam no das coisas. Em virtude de sua afinidade com as coisas, Guillevic se aproxima de Ponge. Considerado como 0 mais puro poeta do século ¢ consideran- do a poesia com a maior desconfianga, Michaux € posto a0 lado de Ponge, ambos, com suas caracerisicas prOprias, ultrapassando ex- instaurada na Franca por Baudelaire, Mal- pressivamente a tradi larmé e Rimbauc Recentemente, uma revista, 20 focalizar os dlsimos 50 anos de poesia na Franca, fez, com uma complacéncia que denota certo hu- ras seguintes constatagGes ou afirmagies: 1° 0: 0808 que 0s eitotes de tom: setiam mais numerosos que seus provaveis 9 a poesias seria um rendoso negécio, se 0s poe- tas lessem os seus confrades." Nao somente alguns poetas acrescen- tam periodicamente mais uma coletinea 3 sua obra, tes € OUttOs ‘vio publicando suas produces, em Paris ou na provincia, numa in- Finidade de revistas de vida mais ou menos efémera. Conforme a ‘mencionada revista, em meio a essa exuberante vitalidade, seria pre- ciso, no momento, mais tempo para avaliar os méritos de um poeta do que de um romancista 33 ‘Também, em recente compéndio de literatura francesa, 0 au- tor, ao chegar aos poetas de hoje, declarou que s6 podia conceber ‘um panorama como uma escolha subjetiva.” Assim como tera si- do forgosamente lacunoso esse desenrolar de onze séculos de poesia francesa, seta também inevitavelmente subjetiva esta conclusfo, a escolha dos tiltimos nomes que compdem esse longo cortejo que se és a andar desde a centtiria distante em que motteu o Imperador Carlos Magno. Um serf o poeta Jacques Dupin, 2 cujo respeito as- sim se pronunciou Georges Raillard: “Como alguns poctas de sua sgetacdo, Jacques Dupin deposita as suas esperancas todas na poesia, por meio da qual descobriu, em Breton e Rimbaud, em Nictzsche € nos pré-socriticos ser ela nosso Gnico recurso para atingit 0 real.’”" © outro, Jacques Roubaud, erudito, lingitista, professor de matemética, lembraria Pail Valéry, mais preocupado em ctiat uma -ntemente controlada.”” 3 poesia francesa teria nascido em 881, com (0s versos que celebram Euldlia, a jovem mértir cuja alma, em forma de pomba, subju ao céu. De encio para cf, vem seguindo o seu ca- ‘minho, com ou sem alexandrinos, cultivando o soneto ou o rejei- tando ou lhe conferindo um feitio japonés, revolrada ou acolhedos despida ou paramentada, cifrada ou crisalina, afagando ou b: do 0 eu, cedendo a iniciativa aos temas ou as palavras, autodestru- indo-se, refazendo-se, dando continuidade, para retomar seu voo milenar e sempre novo. NOTAS Franaise dept les orgies jug a fn 52, pag aedens, Une histoire de la litsérasure francaise, Pats, Sel pig. 214 fesquieu apad Marcel Braunschig, Notre listérature éhudige dans les tex 40, Putis, Armand Colin, 1964, pig. 244 AK poétique, "Assim glosou Théodore de Banville, em Les Carataes, a efusiva saudacio de Boileau: baile et tout ce qui I'amuse appillat les rubis dans ses vers Fille metait son bonnet de travers, Les bons rythmeuss, pris d'une frénés Comme les dicux gaspil ‘aml Si bien qu'enfin, pour metre le h la poésie ‘en alla "Lamactine, "Paul Valery, “Litéracure de Baud in Variété II, Pasis, Gallimard, 1930. Mallarmé apud Henri Lemattce, La Poésie depuis Baudelaire, Pats, 1965. sie pour tous, Adaptation de Yves Pérés, Pats, Seg- hers, 1953, pag. 105. °Georges-Emmanuel Clancier in Litératare Frangise Il, Pats, Larousse, 1968, pig. 299, “Tony Cartano in Dictionnaire de lisérature frangaise contemporaine, Pats Jean-Pierce Delarge, 1977, pag. 59. “Gf. Germaine Brée, Edouard Morot Sit, Livérature Francaite - 9. Du surréa lisme 3 lempire de la critique, Pats, Artaud, 1984 Gf J-J.Boucher, “50 ans de poésie francaise” in Magazine Littéraire, Pats, in? 247, Nov. 1987, pag. 16. "Gf L, Forester in Histoire de la littrasure frangaite, II, Pais, Armand Co- Lia, 1970, pég. 1005. — O poeta Jean Tortel foi acolhido nesta ancologia por sugestio de uma crdnica de Georges Mounin. Segundo o conhecido mestre, ‘os verso de Toreltraduzidos neste trabalho seriam dos mais belos que foram csctitos, em 1955, na Fransa: "Dans une anthologie de la poésie de nowre aud mertte ces quatre quacrains...)" Les Cabiers du Sud, n? 334, Seghers, 1974 op. cit. pig. 215, Antologia da Poesia Francesa Soe estos anigosvém numa versio modernizada. Mas €apresentado, em 90- tao weto oiginal da Cantlone de Sainte Eelale © da Mort de Roland. IDADE MEDIA Autor Anénimo (Século IX) CANTILENE DE SAINTE EULALIE Bonne pucelle était, Eulalie. Beau corps avait, ame plus belle encore. Voulurent la vaincre les ennemis de Dieu. Voulurent lui faire diable servir. Elle n'écoute pas les mauvais conseillers (lui disant de) renier Die qui demeure au ciel, ni pour or, argent mi parare ‘pour menace royale ni pritre. Nulle chose me put jamais plier la pucelle 2 n'aimer pas toujours le service de Dieu. Aussi fut-elle amenée devant Maximien (gud rbgnait en ces jours sur les paiens. lle none eskoltet es mals conse Qu’elle Deo ranciet chi maent sus en cel, 38 CANTILENA DE SANTA EULALIA Era uma ver Eulél Seu corpo era fe mocelinha, 80, a alma inda mais. Quiseram dominé-la os infiis. ‘Ao demonio quiseram que servis. Jamais ela seguit os maus conselhos De renegar a Deus que est no céu, Nem por jéia nenhuma, ouro nem prata, Intimagdo do rei, nenhum pedido. Nada péde fazer que a mocelinha Deixasse de servir ¢ amar a Deus. Por isso foi levada a Maximiano Que era rei dos pagios, naquele tempo. 3 ne paramenz ne peeiement la pouret omque pleier La polle sempre non amast lo Deo menestir. E poto fur presentede Maximiien, ‘Chi rex exet a ces dis sowre pagers I Vexhorte — de quoi elle n'a souci — 2 renoncer au nom chrétien. Elle rassemble son énergie: (plutht supporter les tortures que de perdre sa virginité! ‘Aussi mourut-elle en grand honneur. ‘Au feu ils la jettrent pour qu'elle brit ausstos, ‘Mais elle n'auait pas de faute et ne brila pas. ‘A quoi ne voulut s'en tenir le r0i paien, ‘commanda qu'on lui coupat la tate avec une Epée. a jeune fille n'y contredit pas: lle veut quitter le siele et prie le Christ En figure de colombe elle vola au ciel. Nous demandons tous qu'elle daigne prier que de nous ait pitié le Christ pres la mort et qu'a lui il nous laisse venir par sa clémence. Ii enoner, dont Ii none ‘Qued elle fuiet lo nom ch Ell'ent adunet lo suon element ‘Melz sostendreet les empedement Qued elle perdese sa viginites Poros furet morte a grand honeset. Enz enl fou la gerterent, com arde 10s Elle colpes aon avret; poro nos cos. 40 Sem poder demové-la o rei pedi Que renunciasse 20 nome de crista. Quanto ela pode as forcas concentrou, Torturas preferindo padecer ‘A corromper a sua vitgindade, ‘Assim imaculada ela morreu. ‘Viva, numa fogueira foi jogada, Potém, nao se queimou por nao ter culpa. ‘A isso nio se rendeu o rei pagio E mandou que a cabesa lhe cortassem. ‘A jovem nao se opde: reza a Jesus, Néo quer mais neste século viver. Em figura de pomba aos céus vou. Roguemos que pot nés ela interceda [A fim de que 0 perdio de Deus tenhamos, Depois da morte ¢ que Ele nos acolha Por compaixio ‘Acao nos voldee concrete Ii rex pabiens; ‘Ad une spede Hi roveret tlt lo chief La domnizelle celle hose non contredist Volt fo seule laser, si uover Krist In figure de colomb volat 2 ci. ‘Tuit oram que por aos degnet preier Quad avuiset de nos Christus merce, Post la mort, et @ Ini 90s last venir ‘Par souve clementia. a1 Autor Anénimo (Século XI) LA MORT DE ROLAND Comte Roland repose sous wn pin. Face & l'Espagne ill a tourné son vis ‘A sa mémoire monte maint souvenir: Tous les pays que le ber a congs La douce France, et ceux de son lignage, Et som seigneur, Charles, qui I'a nour Ex les Frangais dont il est tant aimé. UL est contraint de pleurer et gémir, Mais ne veut pas négliger son salut: U bat sa coulpe, implorant Diew merc “Pare tres vrai qui jamais ne mentis, Ex rappela saint Lazare de mort, Ee garantit Daniel des lions Préserve-moi des infernaux périls, Gar j'ai commis maint péché dans ma viel" 1L quens Rollant se jut desuz un pin; Envers Expaigne en ad turer sun vs. De plusuts choses a remembrer lip teres cum li bers cunquis, France, des humes de san De Carlemagne, sun seignor, kil nu Ne poet muer n'en plurt ee suspi 42 A MORTE DE ROLANDO A sombra de um pinheiro, estende-se Rolando, E volta para Espanha a sua face. Muitas coisas comega a recordar: As terras que, batZo, tem conquistado, A doce Franca, 0s seus iguais no sangue, © Imperador, que protegio Ihe deu, Os franceses, dos quais € tanto amado. E contra o seu querer, chora ¢ suspira; De si, porém, deseja se lembrar: Bate no peito e pede a Deus perdio: “0 verdadeiro Pai, que nunca mentes, Que Lézaro da morte libertaste ‘A minha alma preserva do Pelos pecados que na vida Seine Lazaro de more resutexis Guatis de mei 'anme de ez petlz Pur les pecehez que en ma ve fis!” 43 Il a offert @ Dieu son dextre gant; Saint Gabriel de sa main I'a regu. U tient le chef incliné sur som bras, Et doucement rend l'dme les mains jointes. Dieu lui envoie un de ses chérubins Ex saint Michel au péril de la mer; Saint Gabriel est venu avec eux: En Paradis portent V'ame du comte, ‘Sun deste guant a Deu en puff. Seint Gabriel de sa mai I'ad pris. Desur sun braz teneit Ie chef encin; JJuntes ses mains estat asa fin. 4 ‘A Deus entrega a luva da dis ‘Sdo Gabriel a toma em sua mao. A cabeca, no brago, reclinando, De mios postas, chegou ao fim da vida. Juntamente com E a alma do conde levam para o céu. ‘Deus tamist sun angle Cherubia 45 Autor Anénimo (Séeulo XT) CHANSON D'AMOUR Fleur ni verdeur ne m'auront plu Ni douceur de rose en msi, Pais que du pays je suis mu Oa je laissai ce que j'aimai Pour ce me soucie et esr, Rien ne me plait que j'ai ex Hors la pensée qu'a ma dame ai Qui me rallage mon esmai. sme, ‘os() dire le nom, En qui tous biens sont amassés, De courtoisie avez renom, Et de valeur toutes passé; Des maux d'amour dont sus lassé Ne puis guérir, si par vous non. Sid moi, dame, me pensex Ji de co mal naurai santé. Segundo Jean Guéhenno, Plaisr de Lire, A. Colin. 46 CANTIGA DE AMOR Flor nem verdor me do prazet Nem rosa em maio e seu dulcor, Porque o pais eu vou deixar Onde ficou o meu amor. Por isso tenho grande dor E tudo agora faz softer, Salvo pensar no meu amor, (O que faz bem a minha dor. Dizer teu nome eu nao faria, G tu que encertas todo ber Exemplo que é de cortesi teu valor nenhum tem; ‘Ao mal de amor que me devém Tao-s6 de ti vem melhoria. Se teu pensar a mim nao vem, Nunca este mal remédio tem. 47 Charles d’ Orléans (1394-1445) EN REGARDANT CES BELLES FLEURS... En regardant ces belles leurs Que le temps nouveau a’ Amours prie, Chacune alles s'ajolie Ex farde de plaisants couleurs. Tant embaumées sont d'odeurs Qu 'il n'est coeur qui ne rajennit En regardant ces belles flenrs Les oiseaux deviennent danseurs Dessus mainte branche fleurie Et font joyeuse chanterie Dé contres, déchants et teneurs, En regardant ces belles flewrs. 43 AO CONTEMPLAR TAO LINDAS FLORES... ‘Ao contemplar tio lindas flores, Que esta sazdo de Amor convida, Cada uma delas, mais garrida, ‘Se embelezou com vivas cores. E cheiram tanto 0s seus olores Que o coragio tem nova vida, ‘Ao contemplar tio lindas flores. ‘As aves feito dancadores Pulam, gentis, no hastil florido E esto cantando, em alarido, anges, acordes, bons cantores, Ao contemplar tao lindas flores. 49 ECOLIER DE MELANCOLIE... Ecolier de Mélancolie, Des verges de Souci battu, Je suis 2 "étude tenu ‘Auce ultimes jours de ma vie. Si j'ai ennui, n'en doutez mie, Grane we sme vieillard devenu ‘lier de Mélancolie, Des verges de Souci battu. Convient que Pitié pour moi prie, Qui me trouve tout éperdu; ‘Mon temps je perds et j'ai perdu, Gomme rasioté en folie, Ecolier de Mélancolie. 50 EU SOU ALUNO DA TRISTEZA.. Eu sou aluno da Tristeza, Pela Incerteza flagelado, E nesse estudo, assoberbado, Quando da morte jé sou presa. Nao duvideis que a dor me pesa, Quando a velhice sou chegado, Eu sou aluno da Tristeza, Pela Incerteza flagelado. Perdao venha com presteza ‘A mim que estou desesperado; Fora de mim, qual dementado, Foi-se-me a vida sem defesa, Bu sou aluno da Tristeza 31 PRIEZ POUR PAIX, DOUCE VIERGE MARIE Priez pour paix, douce Vierge Marie, Reine des cieux, et du monde maitresse, Faites prier, par votre courtoisie, Saints et saintes, et prenex votre adresse Vers votre Fils, requérant sa hautesse, Qu'il lui plaise som peuple regarder, Que de son sang a voulu racheter, En déboutant guerre, qui tout dévoie. De prigres ne vous veuillez lasser: Priez pour paix, le vrai trésor de joie! Priez, princes qui avez seigneurie, Rois, ducs, comstes, barons pleins de noblesse, Genuilshommes avec chevalerie, Gar méchant(e)s gens surmontent geniillesse; En leurs mains ont toute votre richesse, Débats les font en haut état monter, Vous le pouvez chaque jour voir ax clair, Et sont riches de vos biens et monnaies Dont vous dussiez le peuple supporter: Priex pour paix, le vrai trésor de joie! 52 ©, PEDI PELA PAZ, VIRGEM MARIA ©, pedi pela paz, Virgem Maria, Soberana dos céus, nossa defesa, Fazei orar, por vossa cortesia, Santos, santas € chegue a vossa reza ‘A vosso Filho, instando & sua Alteza Haja por bem no povo reparar, Que com seu sangue veio resgatar, Nao dando & guerra e convulsio guatida. Nao vos canseis, Senhora, de rezar: Pedi a paz, fortuna desta vida! Pedi, 6 vés que haveis a senhoria, Reis, duques e bardes de alta nobreza, © vés que pertenceis a fidalguia: De uma gentalha sois agora presa, Em cujas mios ficou vossa riqueza, Lhe dando a dissensio forga invul E isto se pode, as claras, comprovar: E deles a abastanca ja perdida, Que vos cabia 20 povo repas Pedi a paz, fortuna desta vidal 33 Priex, peuples qui souffrez tyrannie, Car vos seignenrs sont en selle faiblesse Qu'ils ne peuvent vous garder, par maistri, Ni vous aider en votre grand détresse; Loyetex marchands, la selle si vous blesse Fort sur le dos; chacen vous vient presser Et ne pouvex marchandise mener, Car vous n’avex sir passage ni voie, Et maints périls vous comvient-il passer: Priez pour paix, le vrai trésor de foie! Dieu tout puissant nous veuille conforter Toutes choses en terre, ciel ef mer, Priez vers lui que bref en toxt pourvoie, En lui seul est de tous maux amender: Priez pour paix, le vrai trésor de joie! 54 Pedi, povos que oprime a tirania, Pois quem governa exibe tal fraqueza Que vos ndo pode dar mais garantia E nem vos socorrer em tal pobreza; Bons mercadores, por demais vos pesa O fardo, ¢ todos vém vos agravar, Sem que possais as producées levar, Pois no tendes estrada garantida, Perigos mil devendo suportar: Pedi a paz, fortuna desta vida! Nosso Senhor nos queira acomodar E logo nos ampate nesta lida, Pois o mal ele s6 pode afastat: Pedi a paz, fortuna desta vida! Francois Villon (1431-1463) BALLADE POUR PRIER NOTRE-DAME Dame du ciel, regente terrienne, Emperitre des infernasee pals, Recevez moi, votre humble chrétienne, Et m'inclusex au nombre des élus, Ge non obstant qu'oncques rien ne valus, Les biens de vous, ma Dame et ma Maitresse, Sont bien plus grands que ne suis pécheresse, Sans lesquels biens ame ne peut mérir Niavoir les cieux. Je n'en suis jangleresse: En cette fois Je veux vivre et mourir. A votre Fils dites que je suis sienne. De lui soient mes péchés abolus; Pardonne moi comme 2 |'Egyptienne Ou comme il fit au clerc Théopbilus, Lequel par vous fut quitte et absolus Combien qu'il cit au diable fait promesse. Préservex moi de faire jamais ce, Vierge portant, sans péché ni fallr, Le sacrement qu'on célebre & la Messe: En cette foi je veux vivre et mourir. 56 BALADA PARA IMPLORAR NOSSA SENHORA Dos eéus € tetta, 6 Imperattiz do pi A vos, humilde filha se abandona E alcancard, no c€u, gozo imortal, Sem ter valido mais do que um real. ‘Vosso favor, Patrona, Gri-Seahora, Suplanta as culpas desta pecadora, Sem ele, ninguém pode merecer, Ganhar o céu. Nao sou enganadora: Viver quero na fé, nela morte. Minha alma a vosso Filho-Deus se imana; Que ele me dé o seu perdio total, Tal como fez com a Santa Egipciana E 20 fiei que se enttegou ao Pai do Mal, Mas por vés salvo do rigor final, Conquanto ja no inferno, por penhora. E sempre me livreis dessa ma hora, Vos, de quem, na pureza, quis nascet, Jesus, héstia sagrada, redentora: ‘Viver queto na fé, nela morrer. 7 Femme je suis, pauvrette et ancienne Qui riem ne sais, oncques lettres ne lus. Au moutier vois, dont je suis paroitsienne, Paradis peint, oi sont barpes et /ushs, Et un enfer oit damnés son boullus: L'um me fait peur, l'autre foie et liesse. La joie avoir me fais, haute Déesse, A qui pécheurs doivent tous recourir, Comblés de foi, sans feinte mi paresse: En cette foi je veux vivre et mourir. Vous portéses, digne Vierge, princesse ‘Jésus régnant qui n'a ni fin mi cess. Le Tout Puissant, prenant notre faiblesse, Laisa les ciewx ef nous vint secouri, Offs a mort sa tres chore jeunesse; Noire Seigneur est tel, je le confeste; En cette foi fe veux vivre et mourir. f sou, numa pobreza insana, (© que eu sei, bem pouco val fem que sou paroquiana, Num céu pintado, um coro angelical E almas penando, em fogaréu mortal: Me alegra o céu, o inferno me apavora, ‘A alegria me dai, Nossa Senhora, ‘A quem 0 pecador deve acorret Cheio de f€, sem finta nem demora: Viver quero na f€, nela motrer. Vis gerastes, 6 Virgem Protetora, Jesus, Rei pelos séculos afora. igou-se Deus a carne sofredora, Leixando o céu pra vit nos socorrer, Ofertando uma vida redentora; ‘Nosso Senor € tal e eu, sabedora: Viver quero na fé, nela motrer. 39) BALLADE DES PENDUS Freres humains qui aprés nous vivez, Niayez les cocurs contre nous endurcis, Gar, si pitié de nous pauores avez, Dieu en aura plus tot de vous merci Vous nous voyez ci attachés cing, six: Quant de la chair que trop avons nourrie, Elle est pitga devorée et pourri, Et nous, les os, devenons cendre et poudre. De notre mal personne ne s'en rie; Mais priez Diew que tous nous veuille absoudre! Si fréres vous clamons, pas n'en dever Atoir dédain, quoique fimes occis Par justice. Toutefois, vous savex Que tous hommes n'ont pas bon sens rassis; Excusex-nous, puisque sommes transis, Envers le fils de la Vierge Marie, Que sa grice ne soit pour nous tari, Nous préservant de V’infernale foudre. Nous sommes morts, dme ne nous harie; ‘Mais priez Diew que tous nous vewille absoudre! BALADA DOS ENFORCADOS Homens itmios, que a nés sobreviveis, Nio tenhais vosso peito calejado, Porque, se algum pesar por nds haveis, Cedo, 0 perdio de Deus tereis ganhado. Mais de um vedes, na corda, pendurado: ‘A carne que gozou, em demasia, Foi devorada, podre, dia a dia, E as ossadas em p6 se mudatio. De nosso padecer ninguém se tia. E a Deus rogai nos dé o seu perdao! Se de irmfios vos chamamos, nao deveis Mostrar desdém, embora justigados Com razio. E, no ent vos sabeis Que nem todos sto Bedi por n6s, agora, trespassados, A Jesus Cristo, filho de Matia, De sua graca venha a nés valia ‘Que nos livre da eterna perdicio. A nés, mortes, poupai outra agonia. E a Deus rogai nos dé o seu perdao! 6 La pluie nous a débués et lavés, Et le soleil désséchés et noircis; Pies, corbeaux, nous ont les yeux cavés Ex arraché la barbe et les sourcils. Jamais nul temps nous ne sommes assis; Pais 62, puts 12, comme le vent varie, A som plaisir sans cesser nous charrie, Plus becquetés d'oiseaux que dés @ coudre. Ne soyez done de notre confrérie; Mais priez Diew que tous nous veuille absoudre! Prince Jésus, qui sur tous a mattrie, Garde qu'Enfer n'ais de nous seigneurie: A lui n'ayons que faire ni que soudre Hommes, ici n'a point de moquene; Mais priez Dieu que tous nous veuille absoudre! e Secos, negros, enfim, 0 sol nos fez, ‘A chuva nos gastou. Foram cavados, s olhos pelos corvos, com avidez, Sendo a batba e 0s sobrolhos arrancados, Nao podemos jamais ficar parados; De c4 pra ld, ao leu da ventania, Pelas aves bicados, 2 porfia, Como um dedal os corpos ficarao. Nao sejais, pois, de nossa conftatia; E a Deus rogai nos dé o seu perdao! Senhor Jesus, que sois 0 nosso guia, Nao petmitais do inferno a senhoria, ‘Nem Ihe devamos soldo, sujeicao. Homens, aqui nao calha zombaria; E a Deus rogai nos dé 0 seu perdio! 6 BALLADE DES DAMES DU TEMPS JADIS Dites-moi o, n'en quel pays, Est Flora, la belle Romaine, Archipiades, ni Thais, Qui fut sa cousine germaine, Echo parlant quand bruit on mine Dessus riviére ou sur Etang, Qui beauté eut trop plus qu'bumaine Mais o@ sont les neiges d'antan? Oa est la ts sage Hélots, Pour qui fut chatré et puis moine Pierre Abélard @ Saint-Denis? Pour som amour eut cette essoine. Semblablement, of est la reine Qui commanda que Buridan Fis jeté en un sac en Seine? Mais o sont les neiges d'antan? BALADA DAS DAMAS DOUTROS TEMPOS Dizei-me v6s em que pais Flora, a belissima romana, Se encontra agora, ¢ onde Tals E sua prima doidivana; Ea Ninfa cuja voz promana Dos ecos d’égua que se aflora, E tem beleza mais que humana... Mas onde estais, neves d’outrora? Onde a mui letrada Helots, Por quem sofreu vindita insana Abelardo, amante infeliz, Que, no convento, a dor engana? E onde a rainha desumana Que lancou Buridan, na aurora, Ao tio que em Paris dimana? Mas onde estais, neves d’outrora? 6 La reine Blanche comme lys Oui chantait 2 voix de sirene Berthe au grand pied, Biétis, Alis, Haremburgis qui tint le Maine, Ex Jeanne, la bonne Lorraine Qu'Anglais brilerent & Rouen, Oat sont-ils, oft, Vierge souvensine? Mais ou sont les neiges d'antan? Prince, n'enquerez de semaine Oi elles sont, ni de cet an, Qu'a ce refrain ne vous remaine: ‘Mais oft sont les neiges d'antan? 66 ‘A tainha, alva como um lis, Com sua vor. que doce emana, Berta, mais Alis, Beatriz, E essa do Maine, suserana, E a boa lorena, Joana, Que o fogo ingiés em Rudo devora Onde, onde, Virgem Soberana? Mas onde estais, neves d’outrora? Principe, nem nesta semana Buscai sabé-lo, nem agora, Pois o tefido vos desengana: Mas onde estais, neves d’outrora? SECULO XVI Maurice Scéve (1501-1560) COMME DES RAIS DU SOLEIL GRACIEUX Comme des rais du: Soleil gracieux Se paissent fleurs durant la Primev?re, Je me recré_ aux rayons de ses yeu, Et loin, et prés autour d'enx persévere. Si que le Coeur, qui en moi la révere, La me fait voir en cette méme essence Que ferait U’Ocil par sa belle présence, Que tant j’honore, et que tant je poursuis: Par quoi de rien ne me nuit son absence, Vu qu'en tous liewx, malgré moi, je la suis. COMO DOS RAIOS DESTE SOL FORMOSO ‘Como dos raios deste Sol formoso Toma alimento a flor na Primavera, Me sinto bem 2 luz dos olhos seus, E longe e perto deles, persevero. De modo que, gentil, meu Corago Me deixa vé-la nesta mesma esséncia, Como 0 Olhar me faria, ela presente, Cuja beleza, perseguindo, adoro: Por isso, em nada afeta a sua auséncia, Pois, sem querer, eu vou sempre a seu lado. 0 QUAND JE TE VIS ORNER TON CHEF DORE Quand je te vis ormer ton chef doré, ‘Au clair miroir mirant plus claire face, LU fut de toi si fort enamouré, Qu'en se plaignant il te ait 3 voix basse: “Détourne ailleurs tes yeux, 6 Uoutrepasie! — Pourquoi? dis-tu, tremblant d'un ardent rile. — Pour ce, répond, que ton oeil, Demoiselle, Ex ce divin et immortel visage ‘Non seulement les hommes brile et gile, ‘Mais moi aussi, o2 est ta propre image." 70 QUANDO EU TE VI ORNANDO A LOURA COMA. Quando eu te vi omando a loura coma No espelho que reflete 0 rosto claro, TTéo suspirando ele ficou pot ti Que se queixou dizendo bem baixinho: "De mim afasta os olhos, maravilha! — Por qué? dizes, fremindo de cuidados. sponde, o teu olhar, Menina, esta imortal feisio Nio somente enregela e queima os homens, Também 2 mim que sou a tua imagem.” Joachim Du Bellay (1525-1560) TOUT CE QU'ICI LA NATURE ENVIRONNE..- Tout ce qu'ici la Nature environne, Plus t6¢ i! nait, moins longuement il dure; Le gai printemps s‘enrichis de verdure, Mais peu fleurt U'houneur de sa couronne. Liire du ciel facilement Etonne Les fruits d'61€ qui craignent la froidure, Contre I'biver ont l'écorce plus dare Les fruits tardifs, omements de Vautomne. De ton printemps les fleurettes séchées Scront un jour de leur tige arrachées, Non la vertu, Vesprit et la raison. A ces doux fruits, en toi mirs devant lage, Ne fait !'&12 ni l'automne dommage, Ni la rigueur de la frotde saison. R TUDO QUANTO RODEIA A NATUREZA... Tudo quanto rodeia a Natureza, Quanto mais cedo nasce, menos dura; Da primavera o manto de verdura Em breve perde a florida beleza. No calor, do trovdo sao ficil presa E contra o inverno tém pele mais dura 0s tardos, que do outono sio riqueza. ‘As flotinhas de twa mocidade Breve serio colhidas sem piedade, Nio a virude, o espitito, a razio. A esses frutos, em ti tio promissores, Nao da outono nem verdo temores, Nem o rigor da gélida saz. 3 SI NOTRE VIE EST MOINS QU'UNE JOURNEE... Si notre vie est moins qu'une journée, En l'éternel, si l'an qui fais le tour Chasse nos jours sans espoir de retour, Si périssable est toute chose née, Que songes-tu, mon ame emprisonnée? Pourquoi te plait U'obscur de notre jour, Si, pour voler en un plus clair séjour, Tu as au dos l'aile bien empennée? Li est le bien que tout esprit désire, Li le repos on tout le monde aspire, Ta est Pamour, [a le plaisir encore 1a, 6 mon ame, au plus haut ciel guidée, Tu y pourras reconnaitre I'Idée De la beauté qu'en ce monde j'adore. 74 SE AO PE DA ETERNIDADE NOSSA VIDA. Se 20 pé da erernidade nossa vida E quase nada ¢ os anos que s¢ vio ‘Arrascam nossos dias sem perdao, E se o que vem & luz vai de vencida, © que esperas ainda, alma sofrida? Por que te apraz da vida a escuti ida mansio, E ls que existe 0 bem que a alma deseja, Li, toda paz por quem 0 mundo almeja, verdadeiro amor, delicia tanta! Els, minha alma, te elevando ao céu, His de reconhecer, entao, sem véu, ‘A Idéia da beleza que me encanta, FRANCE, MERE DES ARTS France, mere des arts, des armes et des lois, Tu m'as nour longtemps du lait de ta mamelle: Ores, comme un agneau qui sa nourrice appelle, Je remplis de ton nom les antres et les bois. Si tu m'as pour enfant avoué quelquefois, Que ne me réponds-tu maintenant, 6 cruclle? France, France, réponds a ma triste querelle. Mais nul, sinon Echo, ne répond 2 ma voix. Entre les loups cruels j'erre parmi la plaine; Je sens venir l'hiver, de qui la froide haleine D'une tremblante horreur fait bérisser ma peau. Las! Tes autres agneaux n'ont faute de piture, Us ne craignent le loup, le vent, ni la froidure: Sine suis.je pourtant le pire di troupean. 16 © FRANCA, MAE DAS LEIS leis, das artes ¢ das Iuras, amamentou-me outrora: , como um cordeiro, agora, Teu nome eu vou dizendo as florestas ¢ as grutas. Eno, cre, por que sm repost me deixas, -omo filho teu, jé fui reconhecido? Fung, Franca, responde a meu triste gemido. Somente me responde 0 eco das minhas queixas. Entre 0s lobos emuéis, os campos percorrendo, Sinto chegar o inverno, o seu gclo trazendo ‘A meu corpo transido arrepio tamanho. ‘A cordeiro nenhum tem faltado alimento, Nenhum receia o lobo, a ftiagem ¢ 0 vento: E no entanto nfo sou a escéria do rebanho. LAS! OU EST MAINTENANT... Las! Oi est maintenant ce mépris de Fortune? Oa est ce coeur vaingqueur de toute adversite, Cet honnéte désir de l'immortalité, Ex cette honnéte flamme au peuple non commune? Oa sont ces dou plaisrs qu'au soir, sous la nuit brune, Les Muses me donnaient, alors qu'en liberté, Dessus le vert tapis d'un rivage écarté, Je les menais danser aucx rayons de la lune? Maintenant la Fortune est maitresse de moi, Et mon coeur, qui soulait étre maitre de soi, Est serf de mille maux et regrets qui m'ennuient. De la postérité je n'ai plus de souci, Cette divine ardeur, je ne U'ai plus aussi, Ext les Muses de moi, comme étranges, s'enfuient. 78 AI! ONDE AGORA ESTA. ‘Ail Onde agora esté meu desdém da Fortuna? E 0 peito vencedor de todo contratempo, ‘A honesta pretensio de uma gloria imortal, ‘A inspiragdo ardente a0 povo no comum? Onde o ameno prazer que, nas sombras noturnas, Das Musas recebia, enquanto em liberdade, ‘Num discteto jardim tapizado de relva, Bailavam para mim, 3 doce luz da lua? ‘Mas, agora, a Fortuna é senhora de mim, Eo coracio que outrora foi senhor de si, Escravo se tornou de queixas ¢ tormentos, Com as geragdes que vém nao tenho mais cuidado, ‘Aquele ardor divino eu ja ndo tenho mais, E esquecidas de mim, as Musas me deixaram Louise Labé (1524-1566) PREDIT ME FUT... Prédix me fut que deuais fermement Un jour aimer celui dont la figure Me fut décrite, et sans autre peinture, Le reconnus quand vis premitrement. Puis le voyant aimer fatalement, Pitié je pris de sa triste aventure Et tellement je forgai ma nature Qu'autant que tui aimai ardentement. Qui nett pensé qu'en faveur devait crotire Ge que le Ciel et destins firent naitre? Mais quand je vois si nébulewx appréts, Vents si cruels et tant horrible orage, Je crois qu’ étaient les infernaux arréts ‘Qui de si loin m'ourdissaient ce naufrage. 80 FOI PREDITO... Foi predito eu devia firmemente Amar, um dia, alguém cuja figura Me foi desctita, e sem melhor pintura, encontrei quando o vi primeiramente. Depois o vendo amar to fatalmente, Me condoeu a sua desventura. De tal modo forcei minha natura Que a exemplo dele amei ardentemente. Quem no pensou devesse florescer © que o Céu, com o destino, fez nascer? Mas quando vejo fiinebres aprestos, ‘Ventos cruéis, horrivel furacio, Creio que foram infernais arestos Que, 20 longe, urdiram minha perdicio. al Pierre de Ronsard (1524-1585) COMME ON VOIT SUR LA BRANCHE... Comme on voit sur la branche, au mois de mai la rose, En sa belle jeunesse, en sa premitre fleur, Rendre le ciel jaloux de sa vive couleur, Quand Vaube, de ses pleurs au point du jour Varrose; La Grace dans sa feuille, et 'Amour se repose, Embaumant les jardins et les arbres d odeur; Mais, battue ou de pluie ou d'excessive ardeur, Languissante, elle meur, feuille & feuille déclose. Ainsi, en ta premitre et jeune nouveauté, Quand la terre et le ciel honoraient ta beauté, Ia Parque 8'a tube, et cendre tu reposes. Pour obsiques regois mes larmes et mes pleurs, Ce vase plein de lait, ce panier plein de fleurs, Afin que, vif ou mort, ton corps ne soit que roses. 82 QUAL NO RAMO SE VE... Qual no ramo se vé, no més de maio, a rosa, Em bela floragio e recente frescor, CCauser inveja 20 c&u, por sua viva cor, Quando, a0 ptanto da aurora, estremece formosa; Repousam Graga ¢ Amor na pétala cheirose, Perfumando o jardim e as plantas 20 redor; ‘Mas, vitima da chuva ou de excessivo ardor, ‘A se despetalar, fenece a flor mimosa. Assim, quando floria a tua formosura, Honrando a tetra ¢ o céu tua gentil figura, Em cinzas te tornou a Parca rigorosa. Como exéquias recebe o meu pranto ¢ gemido, Esta jarra de leite, este cesto florido: (© teu corpo hi de ser, vivo ou morto, uma rosa 83 JE VOUS ENVOIE UN BOUQUET... Je vous envoie un bokguet que ma main Vient de trier de ces fleurs Qui ne les eit @ ce vépre Chutes 2 terre elles fusse Cela vous soit un exemple certain Que vos beautés, bien qu'elles soient fleuries, En peu de temps cherront toutes fétries, Et, comme fleurs, périront tout soudain. Le temps s'en va, le temps s'en va, ma Dame, Las! le temps non, mais nous nous en allons, Et t6t serons étendus sous la lame. Et des amours desquelles nous parlons, Quand serons morts, n'en sera plus nouvelle: Pour ce aimez-mot, cependant qu'étes belle. ‘© RAMO QUE VOS DOU... © tamo que vos dou a minha mao Entrelacou com as flores mais gartidas. ‘Se nao fossem 20 pér-do-sol colhidas, ‘Amanba jazeriam pelo chao. Que este exemplo vos sirva de licio: As vossas seduces, hoje floridas, Muito em breve estario emurchecidas E, iguais a flor, em breve morterio. Foge o tempo, Senhora, no perdura. Meu Deus! O'tempo no, mas n6s mortais, Que vamos logo estat na sepuleura. E desse amor que, agora, em nés palpita, ‘Ao morrermos, ninguém se lembra mais: ‘Amai-me, pois, enquanto sois bonita 85 IL FAUT LAISSER MAISONS. IU faut laisser raisons, et vergers et jardins, Vaisselles et vaisseaux que l'artison burine, Es chanter som obseque en la fazon du cygne, Qui chante som trépas sur les bords méandrins. C'est fait; j'ai dévide le cours de mes destins, J'ai vécu, j'ai rendu mon nom assex insigne; ‘Ma plume vole au ciel pour étre quelgue signe, Loin des appas mondains qui trompent les plus fins. Heureux qui ne fut onc, plus heureux qui retourne En rien comme il était, plus heureux qui séjourne, Dibomme fait nouvel ange, aupres de Jésus-Christ, Laissant pourir ¢&-bas sa dépouille de boue, Dont le sort, la fortune et le destin se joue, Franc des liens du corps, pour n'étre qu'un esprit. CUMPRE DEIXAR MANSAO.... Cumpre deixar mansio, jardim, veiga florida, Baixela que o artesio adomna cinzelando, Sua morte cantar, a0 cisne semelhando, Que canta em seu pais, quando Ihe foge a vida. Acabou-se! Gastei da existéncia a medida, Vivi, pude tornar meu nome venerando; ‘Um ‘inal hé-de ser minha pena a0 céu voando, Longe de encantos que nos levam de vencida, Feliz quem nfo viveu, mais feliz quem regressa ‘Ao nada que jé foi, mais feliz quem, depressa, Homem que anjo se fez, volta ao Cristo clemente, Deixando aqui morrer seus despojos de lama, De que a fortuna ti, 0 fado ¢ sua trama, Pra ser, livre do corpo, espitito somente. 87 Rémy Belleau (1528-1577) D'UN BOUQUET ENVOYE LE MERCREDI ‘DES CENDRES- Ce bouguet de menu flenrage Vous servira de témoignage Que nos beaux jours coulent soudain, Comme la fleur, et qu'il faut prendre Le plaisir sans le surattendre Nile remetire au lendemain. Sans attendre que la viellesse Diune froide et more paresse Rende ‘nos membres froids et gourds, Passoms en douceurs amoureuses Et mignardises gracieuses Ce qui reste de nos beaux jours. Aussi bien cette Parque fltre Pour nous coucher dedns la bidre Déja nous attend sur le port; ‘Mon coeur, croyez-moi je vous prie, Passons doucement notre vie: On ne sent rien apres la mort. 88 ‘UM BUQUE OFERECIDO QUARTA-FEIRA DE CINZAS Este buqué de tenras flores ‘Vos sio, meu bem, figis penhores De que esta vida € tempos ‘Como este ramo e que 0 prazet, Deveis colher, deveis colher, Sem o deixar para amanha. Sem esperar que o fim da vida, De frio torpor adormecida, © nosso corpo assaz degrade, E mui gentis encantamentos ( que sobrou da mocidade. Porquanto a Parca, sem dogura, Pra nos deitar na sepultura, ‘Ja nos lancou a sua sorte; ‘Acreditai, amor, em mim, Vivamos bem até o fim: Nada se sente apés a morte, 3 Rien n'y a d'apparence humaine, n'y a sang, ni pouls, ni veine, Coeur, poumon, wi foie, ni nerfs: Ce n'est rien qu'une ombre légere Sans sentiment et sans artere, Proie de la terre et des vers. Vous savex ce que dit le prétre, Quand plus dévot, de sa main dextre, De cendre il nous croise le front, Clairement nous faisant eniendre Que nos corps sont venus de cendre Et qu'en cendte ils retourneront. Nossa feigio se desfigura, Vai-se pulmdo, sangue, nervura, Figado, pulso ¢ coracio; Fica somente sombra, espuma, Nenhum sentir, veia nenhuma, Presa dos vermes ¢ do chao. Sabeis do padre o que ele diz, Quando nos traca na cerviz A santa cruz com devogio: Nos faz ouvir que somos $6 Corpos que vém do mesmo pé E a0 mesmo pé se voltarao. o Philippe Desportes (1546-1606) ICARE Teare est chut ici, le jewne audacieux, Qui pour voler ax: ciel, eut assex de courage: Ici tomba son corps dégarni de plumage, Laissant tous braves cocurs de sa chute enviewx. 0 bienbeureux travail d'un esprit gloriewx Qué tire un si grand gain d'un si petit dommage! 0 bienbeurenx malbeur plein de tant d'avantage, Qu'il rende le vaincu des ans victorieux! Un chemin si nouveau n'étonna sa jeunesse, Le pouvoir lui failit, mais non la bardiesse UW eut pour le briler des astres le plus beau; I mourut poursuivant une haute aventure; Le ciel fui son désir, la mer sa sépalture: Exe-il plus beau dessein, ou plus riche tombeau? 92 fcaRO Precipitou-se aqui o jovem audacioso, Que para ao Céu voar mostrou muita coragem: Seu corpo aqui tombou, despido de plumagem, Deixando todo her6i dessa queda invejoso. 6 venturoso aft de um peito glorioso Que um bem enorme extrai de exigua desvantagem! Venturoso revés que merece homenagem, Pois o vencido faz tornar-se vitorioso! Nao temeu seu verdor aquela estranha via, ‘A forca lhe faltou, nao faltendo ousadia: ‘Abrasou-o do Astto-Rei o ardente fogaréu, Morreu porque buscou generosa aventura, O Cén foi seu desejo, 0 mar a sepultura: Houve anseio mais belo ou tico mausoléu? 93 SOMMEIL, PAISIBLE FILS... Sommeil, paisible fils de la Nuit solitaire, Pere alme nourricier de tous les animaux, Enchanteur gracieux, doux oubli de nos mau, Es des esprits blessés V'appareil salusaire: Dieu favorable @ tous, pourquoi m'es-tu contraire? Pourquoi suis-je tout seul rechargé de travaux, Or que Vhumide nuit guide ses noirs chevaus, Et que chacun jouit de ta grace ordinaire? Ton silence o& est-il? ton repos et ta paix, Es ces songes volant comme un nuage épais, Qui des ondes d’Oubli vont lavant nos pensées? 0 frare de la Mort, que tu m'es ennemil Je tinvoque a secours, mais tu es endormi, Ex j'ards, toujours veillant, en tes borreurs glactes. SONO, QUE VENS... Sono, que vens na paz da Noite solitétia, © pai mantenedor de toda criaga0, Encantador gentil, consolo na aflicfo, E da alma ressentida, ajuda necessisia: mao contrétia? Por que a mim s6, bom Deus, € Por que tanto sofier na minha solidao, ‘Quando os negros corcéis da noite Ié se vao, E todo mundo frui tua graga ordinéria? “Teu siléncio onde es? A paz, serenidade, E estes sonhos, voundo em plena escuridade, Que apagam nosso afi no mar do Esquecimento? ‘Tu que 65 irmfo da Mone, é 0 meu inimigo! Imploro teu socotto € ests adormecido, Me fazendo abrasar teu gélido tormento. % Agrippa d’Aubigné (1550-1630) IA FLORE DU MARTYRE Le printemps de l'Eglise et I'été sont passés. ‘Si serex-vous par moi, verts boutons, ancass Encore Gclorex-vous, fleurs si franches, si 2 Sans vous voir et fairer ax. cé Une rose d’autonane est plus qu'une autre exquise: Vous avez Sjoui Vautomne de l'Eglise. ‘A FLORA DO MARTIRIO imavera € 0 verdo jé passeram. Mas v6s sereis por mim, verdes bot6es, colhidos; ‘Ainda vos abrizeis, flores simples ¢ vivas, Embora parecais detradeiras, tardias: Ninguém vos deixarf, 6 florinhas preciosas, ‘Sem vos ver ¢ cheirar no celeste jardim. Uma rosa de ourono é a mais linda das rosas: Trouxestes alegria & Igreja em seu outono. Jean de Sponde (1557-1595) MAIS SI FAUT-IL MOURIR. Mais si faut-il mourir, et lq vie orgueilleuse, Qui brave de la mort, sentira ses fureurs Les soleils hileront ces journaliéres fleurs, Et le temps crevera cette ampoule venteuse. Ce beau flambeau qui lance une lamme fumense Sur le vert de la cire éteindra ses ardeurs; Uhuile de ce tableau ternira ses couleurs, Et ces flots se rompront a la rive écumeuse. J'ai vu ces clairs éclairs passer devant mes yenx, Et le tonnerre encor qui gronde dans les Cieux, OR, dune ou d'autre part, éclatera V'orage. J'ai vu fondre la neige, et ses torrents tarir, Ces lions rugissants, je les ai vus sans rage: Vivex, hommes, vivex mais si faut-il mourir. MAS TODOS VAO MORRER... Mas todos vio morrer, ¢ esta vida orgulhosa, Que insulea a morte, vai sentir os seus furores; Os sbis hao de queimar as efémeras flores, Eo tempo romperd esta ampola vaidosa Ea tocha que difunde uma chama fumosa, ‘Na cera apagard do pavio os ardores; 0 oleo deste painel perdera suas cores, Ea onda se quebrati junto 2 praia espumose. Dos relimpagos vi fuzilar 0 clario, Ea trovoada que ruge ainda na amplidao, Onde rebentari, perto ou longe, a torments. ‘A neve que se esfaz, vi deixar de correr E vi mais de um leio, que agora se apascenta: Vivei, homens, as todos vo motte. SECULO XVII Frangois Malherbe (1555-1628) PRIERE POUR LE ROI HENRI, LE GRAND La terreur de son nom rendra nos villes fortes On n'en gardera plus ni les murs ni les ports, Les veilles cesseront au sommet de nos tours; Le fer mieux employé cultivera la tere, Este peuple, qui tremble aux frayeurs de la guerre, Si ce n'est pour danser, n'orra plus de tambours. Tu nous rendras alors nos douces destinées; ‘Nous ne reverrons plus ces ficheuses années Qui pour les plus heureux n'ont produit que des pleurs. Toute sorte de biens comblera nos famille, La moisson de nos champs lassera les faucilles, Et les fruits passeront la promesse des fleurs. PRECE PELO REI HENRIQUE, O GRANDE terror de seu nome as cidades resguarda, Os muros € portdes dispensam toda guarda, Nas ameias, rorredes, as rondas vo cessar. 0 ferro, noutro emprego, h-de romper a terra Eo povo, que se assusta ao ruido da guerra, Vai ouvir o tambor somente pra dancar. Mais risonhas, enfim, tornaris nossas vidas, ‘Nao veremos de novo essas horas softidas Que ao mortal mais feliz causaram tantas dores. Toda sorte de bens proverd nossa gente, A messe cansard a foice diligente Eos frutos passardo a promessa das flores. 101 PARAPHRASE DU PSAUME CXLV Nrespérons plus, mon ame, aug promesses du monde: Sa lumitre est un verre, et sa faveur une onde, Que toujours quelque vent empéche de calmer: Quittons ces vanités, lassons-nous de les suivre: Crest Diew qui nous fait vivre, Crest Diew qu'il faut aimer. En vain, pour satisfaire @ nos liches envies, Nous passons prés des rois tous le temps de nos vies, A souffrir des mépris et ployer les genoux; Ge qu'ils peuvent m'est rien: ils sont comme nous sommes, Vérisablement hommes, Es meurent comme nous. Ont-ils rendu Vesprit, ce n'est plus que poussire, Que cette majesté si pompeuse et si fire Dont 'éclat orgueilleux étonne I'univers; Ex dans ces grands tombeaux oi leurs ames hautaines Font encore les vaines, Us sont mangés des vers 102 PARAFRASE DO SALMO CXLV Renunciemos, minha alma, a esse mundo terreno: Vi sua luz, seus dons, fingido mar sereno, ‘Mas sempre encapelado, a0 minimo soprar; Deixemos 0 ouropel, nao the demos guarida: Foi Deus quem deu a vida, ‘A Ele cumpre amar. Em vio, para servir coitadas ambigbes, De principes € reis, vivemos nas mansbes, Inclinando a cerviz, sofrendo insulto atsoz; E € nada o scu poder: humanos so apenas, Curtindo as mesmas penas, Morrendo como nés. CChegando a vida ao fim, transforma-se em poeira Essa grandeza toda, espléndida, alraneira, Cujo brilho soberbo ascombra a mulkidao; E nesses mausoléus, onde homens orgulhosos ‘Continuam vaidosos, Come-os a podridao. 103, Lise perdent ces noms de maitres de la tere, Diarbitres de la paix, de foudres de la guerre: Comme ils n'ont plus de scepsre, ils n'ont plus de flatteurs, Es tombent avec eux dune chute commune Tous ceux que leur fortune Faisait leurs serviteurs, E ld nao tém mais vez monarcas, potentados, Os atbitros da paz ou célebres soldados: Se Ihes falta o poder, no tém adulador; ‘Com o grande softer idéntica ruina, © que, por sua sis $6 era servidor. 105 Gomberville (1600-1674) SUR L'EXPOSITION DU SAINT SACREMENT Tel qu'aux jours de ta chair tw parus sur Ia terre, Tel montre-toi, mon Dieu, dans ce siécle effronté, On des hommes armés contre ta vérité Osent impudemment te déclarer la guerre. Tu tousris un chemin au travers de la pierre, Pour porter dans les Ciewx ton corps ressuscité. Romps cet ausre tombeau, reprends ta majesté, Et sors comme un soleil de cette urne de verre. Ulumine la terre aussi bien qi En m'échauffant le coeur, éclaire- Et ne sépare plus ta clarté de ta flamm Mais que dis-je, Seigneur, pardonne 3 mes transports: C'est assez que la Foi montre aux yeux de mon ame Ce qu'un peu de blancheur cache aux yeux de mon corps. SOBRE O SANTISSIMO SACRAMENTO EXPOSTO ‘Como outrora desceste aos homens encarnado, ‘Surge assim, 6 meu Deus, neste tempo atrevido, ‘Quando tantos mortais, havendo a Fé banido, Arti, com despudor, a guerra hao declarado. A pedra do sepulero houveste atravessado, Para aos Céus transportar teu corpo ressurgido. Desfaze outra priséo, toma 0 cetro caido, E da custédia sai como um sol inflamado, ‘Aclara todo 0 Céu, aclara todo o cho, Eo peito me aquecendo, acende-me a visio Tua luz, teu calor, juntos, deves manter. Mas que digo, Senhor? Perdoa-me a loucura: Basta que aos olbos da alma a Fé me face ver (© que aos olhos do corpo esconde esta brancura, Tristan L’Hermite (1601-1655) LE PROMENOIR DES DEUX AMANTS Aupris de cette grotte sombre Et la lumitre avec l'ombre... Liombre de cette fleur vermeille Ex celle de ces joncs pendants Paraissent éire la-dedans Les songes de U'eau qui sommeille. Jamais le vent ni le tonnerre ‘N'ont trouble la paix de ces lieux, Fais.moi boire au crewx de tes mains Si l'eau n'en dissout point la neige... 108 © PASSEIO DOS DOIS ENAMORADOS ‘Ao lado da gruta sombria Onde bafeja um ar tao brando, ‘A vaga e 0 seixo vio lutando, Também a sombra ¢ a luz do dia... wulto em brasa desta flor Ea sombra do juncal pendente ‘Fazem lembrar, ld na torrente, Os sonhos d’égua em seu langor... Jamais 0 vento nem trovio ‘A paz roubaram do lugar, E ali o céu vem derramar ‘A sua graca em profusto... Em tua mio me faz beber, Se a Sgua nio lhe dissolve a neve... Pierre Le Moine (1602-1671) LA MADELEINE NOUVELLEMENT CONVERTIE ci d'un repentir célebre et glorieux, Madeleine, 2 soi-méme indulgente et cruelle, Guéris de son péché la blessure mortelle Et par ses larmes tire un nouvean feu des ciewx. Son luxe converti devient religieux. Liesprit de ses parfums se fait dévot comme elle Ces rubis sont ardents de sa flamme nouvelle Et ces perles en pleurs se changent en ses yeux. Beaux yeux, sacrés canaux d'un prévieux déluge, Innocents corrupteurs de votre amoureux juge, (Ne serez-vous jamais sans flammes et sans dards? Au moins pour le moment faites cesser vos charmes: La terre fume encor du feu de vos regards, Es déja vous briilez le ciel avec vos larmes. 110 MADALENA RECEM-CONVERTIDA. Num arrependimento afamado € glotioso, Madalena, a si mesma indulgente e cruel, Cura de seu pecado a ferida mortal E outro fogo, no céu, com ligrimas acende: Religioso ficou seu luxo, a0 converter-se, E devoro se fez de seu perfume a esséncia. ‘Um rubor diferente abrasa 0s seus rubis E as pétolas em pranto, em seus olhos, se tornam. Belos olhos, canais de precioso diliivio, Que, santos, corrompeis 0 juiz amoroso, Por que nunca deixais vossos dardos e flamas? Suspendei vosso encanto, agora, pelo menos: Ainda abrasa a terra 0 vosso olhar de fogo, E jf se inflama 0 c€u com o ardor de vosso pranto. ul Pierre Corneille (1606-1684) A PRINCIPALE SCIENCE Le désir de savoir est naturel aux hommes; U nait dans leur berceau, sans mourir qu'avec eux: ‘Mais, 6 Dieu! dont la main nous fait ce que nous sommes, Que peut-il, sans ta crainte, avoir de fructueux? Un paysan stupide et sans experience, Qui ne sait que t'aimer et n'a que de la foir Vaut miewx qu'un philosophe enflé de sa science, Qui pénetre les ciewx sans réflécbir sur soi. Au grand jour di Seigneur, sera-ce un grand refuge D'avoir connu de tout et la cause et l'effet? Etce qu'on aura su fléchire-til un juge Qui ne regardera que ce qu'on aura fait? uz ‘A CIENCIA PRINCIPAL E proprio dos mortais 0 anseio de saber. Briste desde 0 berco € 36 a morte apaga. Mas, 6 Deus! cuja mio nos faz 0 que n6s somes, Sem teu temor, pode o saber ser proveitoso? Um made camponés, sem nenhuma instrugio, Que 36 sabe te amar € tem somente a fé, Que um sébio vale mais, inchado de ciéncia, Tadagador dos céus € néscio de si mesmo. ‘Aos olhos do Senor, ter grande valia Ter tudo conhecido, as causas ¢ 0s efeitos? Pode o nosso saber aplacar um juiz Que apenas considera 0 que tivermos feito? U3 Porte toute la Bible en ta mémoire empreinte; Sache tout ce qu'ont dit les sages des views temps; Joins, si tu le peux, tous les traits Elatants De W'histoire profane et de U'bistoire sainse De tant d’enscignements U'impuissante langueur Sous leur poids inutile accablera tom coeur, ‘Si Diew n'y verse entor son amour et sa grace; Es unique science of tu dois prendre appui, Clest que tout n'est ici que vanité qui pasie, Hormis d'aimer sa gloire et me servir que lui Vanité d'entasser richesses sur richesses; Vanité de languir dans la soif des honnewrs; Vanité de choisir pour souverains bombeurs De la chair ot des sens Jes damnables caresses; Vanité d'aspirer & voir durer nos jours, Sans nous mettre en souci d'en mieux régler le cours, Diaimer la longue vie et négliger la bonne; Diembrasser le présent sans soin de l'avenir, Es de plus estimer un moment qu'il nous donne Que attente des biens qui ne sauraient finir. (mitacdo, liv. 1, cap. 2) 4 Conserva toda a Biblia impressa na meméria; © que 0s sibios d’antanho ensinaram aprende, Se podes, acrescenta os lancos mais brilhantes Da historia secular e da histOria sagrada: ‘De tanto ensinamento o impotente langor, Qual peso sem valor, oprime 0 corasio, Se Deus nfo traz também seu amc E 0 singular saber em que terés apoio E que tudo, no mundo, € vaidade que passa, ‘Menos amar de Deus a gloria e seu servigo. ia Braga Vaidade acumular riquezas mais riquezas; Vaidade enlanguescer na sede de honratias; Vaidade procurar, por soberanos bens, Dos sentidos, da came os danosos carinhos; Vaidade pretender prolongar nossos dias Sem que nos incomode o seu curso regrar; ‘Amat a vida longa e a boa desprezar; ( presente cingir sem cuidar do fururo Eo instante preferir, a nés dado por Deus, A esperanga dos bens que nao passam jamais. us Jean de La Fontaine (1621-1695) INVOCATION A LA VOLUPTE douce Volupté, sans qui, ds notre enfance Le viore et le mourir nous deviendraient Egaux; Aimant universel de tous les animaus, ! Nous autres nourrissons, st, pour fruit de nos veilles, Un bruit déliciewx ne charmait nos oreilles, Si nous ne nous sentions chatouillés de ce son, Ferions-nous um mot de chanson? Ge qu'on appelle gloire en te Ge qui seruait de pric dans Nest que toi, proprem Es le plaisir des sens n'e Les foréts, les eaux, les prairies, Mares des douces réveries? 116 INVOCAGAO A VOLOPIA Sem ti, doce Votipia, 0 viver ¢ 0 morrer Tetiam, desde o bergo, idéntico valor: De toda a criacio, universal pendor, Com que forca fatal, tu consegues prender! Tudo, por ti, aqui se passa. Por tua causa € tua gtaca, ‘A duras penas todos vao: ‘Nao hi soldado, capitio, Nem fidalgo, plebeu, nem Ministro de Estado, ‘Que em ti ndo tenha o olhar pregado Das Musas na afeicio, se, de ser6es nascido, Um agtadavel som nfo nos encanta 0 ouvido, E se ele nao nos traz amena sensacdo, ‘Tentamos nds uma cancio? © que, pomposamente, € chamado de gloria E, nos jogos d’Olimpo, exalcava a vit6ria, Precisamente, é tu, Voltpia divinal. E seu preco nfo tem o prazer sensual? E ento por que os dons de Flora, © pérdo-sol, a linda Aurora, Pomona e seus finos manjares, Baco, razio dos bons jantares, Florestas, fontes, pradarias, Mies de fagueiras fantasias? Pourquoi tant de beaux arts qui sont tous tes enfants? Mais pourquoi les Chloris aux appas triomphants Que pour maintenir ton commerce? J'entends innocemment: sur soit propre désir Quelque rigueur que Von exerce, Encore y prend-on du plaisir. Volupté, Voluptt, qui fus jadis maitresse Du plus bel esprit de la Grece, Ne me dédaigne pas, viens-t'en loger chex moi; S'aime le jeu, Vamour, tes livres, ta 1a ville et la campagne, enfin tous; Qui ne me soit souversin Jusqu’au sombre plaisir d'un coeur mélancolique Viens donc; et de ce bien, 6 douce Volupté, Veux-tu savoir au vrai la mesure certaine? I m’en faut au moins un sidcle bien compté: Car trente ans, ce n'est pas la peine. us Belas artes, por qué? de quem é a nascente, Por que tanta beldade, amével, atraente, Se no pra vires, at€ nés, sempre morar? Eis o meu parecer, por mais procure alguém O seu desejo castigar, Algum prazet inda lhe vem. 6 Voldpia gentil, que, na Grécia de outrora, De um pensador foste senhora, ‘Nao me desprezes no: vem 3 minha morada, ‘Nao ficards sem fazer nada: ‘Amo os livros, 0 amor, miisica ¢ diversio, Cidade, campo, enfim; 0 mundo nada tem ‘Que no me seja enorme bem, Mesmo o aflito prazer de um triste coracto. Vem, pois, ¢ desse bem, 6 Voldpia querida, Quetes entdo saber a medida acertada? Belo menos preciso uns cem anos de vida, Pois trinta s6 € quase nada... 9 SOLITUDE, OU JE TROUVE... Solitude, oi je trouve une douceur secréte, Lieux que j'aimai toujours, ne pourrai-je jamais, Loin du monde et du bruit, goitter, l'ombre et le frais? Ob! qui m'arrétera sous 208 sombres axles? Soeurs, loin des cours et des villes, Woccuper tout entier, et m'apprendre des ciewx Les divers mouvements inconnus 2 nos yeux, Les noms et les vertus de ces clartés errantes Par qui sont nos destins et nos moeurs différentes! Que si je ne suis né pour de si grands projets, Du moins que les ruisseaux m'offrent de doux objets! Que je peigne en mes vers quelque rive fleurie! La Parque & filets d'or n'ourdira point ma vie, Je ne dormirai point sous de riches lambris: ‘Mais voit-on que le somme en perde de son prix? En est-il moins profond, et moins plein de dilices? Je tui voue au désert de noxveaux sacrifices. ‘Quand le moment viendra d'aller trouver les morts, Faurai vécu sans soins, je mourri sans remords. 120 SOLIDAO, QUE ME DAS... Solidio, que me dés um deleite profundo, Sitios que sempre amei, no poderei jamais, Bem longe dos salées, gozar de sombra e paz? Quando vio me prender as guatidas amenas, E poderao, longe dos pasos, as Camenas Me atrair ¢ ensinar dos céus, do firmamento O que aos olhos escapa — 0 errante movimento, Os nomes € o valor dos astros peregrinos, Por quem marcados sio condutas ¢ destinos? Se & vida ndo cheguei pra grandes aparatos, ‘Ao menos aprecie 0 encanto dos regatos! Que em meu verso apareca uma veiga florida! De outo nao teceré a Parca a minha vida, Eu nunca dormirei rodeado de lambris: E, por isso, em meu leito, hei-de ser infeliz? ‘Menos profundo o sono e menor seu pruzer? Nos ermos, oblagdes Ihe haverei de fazer. Quando o instante vier de os mortos alcancar, Sereno jé vivi € morro sem pesar. 121 LES DEUX PIGEONS (Ebilogue) Amants, beureux amants,'voulex-vous voyager? Que ce soit aux rives prochaines. Soyez-vous U'un & Vautre un monde toujours beau, Toujours divers, toujours nouveau; Tenez-vous lieu de tout, comptex pour rien le reste J'ai quelquefois aimé: je n'aurais pas alors, Contre le Louvre et ses trésors, Contre le firmament et sa voite céleste, Changé les bois, changé les hiewx Honorés par les pas, éclairés par les yeux De l'aimable et jeune bergore Pour gui, sous le fils de Cythire, Je servis, engage par mes premiers serments. ‘Hélas! quand reviendront de semblables moments? Faut-il que tant d' objets si doux et si charmants Me laissent viore au gré de mon ame inquibte? Ab! si mon coeur osait encor se renflammer! Ne sentira-je plus de charme qui m'arréte? Ai-je passé le temps d’aimer? 122 OS DOIS POMBOS: (Epilogo) © vés que vos amais, quereis entdo viajar? ‘Nao seja nunca muito longe. E sede mutuamente um mundo sempre lindo, Sempre novo, sempre sortindo. ‘A 6s, tudo supri, nada vos dé cuidado, Eu amei uma ve2: e por isso, jamais, Por tesouros, pagos rea Por todo o firmamento ¢ 0 céu Eu trocaria algum lugar Hontado pelos pés, aceso pelo olhar Da querida pastora em flor Jo estrelado, A quem, ferido pelo Amor, Servi, pteso por meus primeitos juramentos. i! quando voltardo semelhantes momentos? Tanta amével mulher, cheia de encantamen ‘Ao léu, me deixaré, de minha alma inconstante? ousara se inflamat! ‘igGo que me encante? ‘meu tempo de amar? 123 LA JEUNE VEUVE La perte d’un époux ne va paint sans soupirs. On fait beaucoup de bruit; et puis on se console; Sur les ailes du Temps la tristesse s'envole; Le Temps ramine les plaisrs Entre Ia veuve d'une année Et la veuve d'une journée La différence est grande: on ne croirait jamais Que ce fut la méme personne. L'une fait fuir les gens, et Vauire a mille attraits. Aux soupirs vrais ou faux celle-la s'abandonne; C'est toujours méme note et pareil entretien; On dit qu'on est inconsolable; On le dit, mais il n'en est rien, Comme on verra par cette fable, Ou plusoe par la vérté L'époux d'une jeune beauté Parsait pour V'autre monde. A ses Lui criait: “‘Astends-moi, je te suis; et mon ame, Aussi bien que la tiene, est préte a s‘envoler.”” Le mari fait seal le voyage. Ia belle avait un pere, homme prudent et sage: U laissa le torrent couler. A la fin, pour la console: 124 A VIUVINHA A perda de um marido inspira muitos ais. Brada aos céus a vitiva e depois se consola, Pois nas asas do Tempo a ttsteza se evola. De novo o Tempo 0s goz0s traz. Entre a recente viuvez Ea que tem pouco mais de um més [A diferenca € grande ¢ quase que se pensa ‘Que nao seja a mesma pessoa. ‘Uma nos faz fugir, a outra linda presenga. ‘Aquela, um pranto falso ou verdadeiro entoa; £ sempre a mesma nota € conversa sem fim; Diz que no tem consolacio; Fala, mas ao € bem assim, Como neste conto verdo, Que bem traduz uma verdade. esposo de jovem beldade Partia pata o além. A seu lado, a mulher Lhe gritava: “Me espera, eu ao quero viver, ‘A minha alma, com 2 tua, esté pronta a voat!”” ‘Quem partiu foi ele somente. ‘A bela tinha um pai, vatdo experiente, ‘Que o tempo deixando rolar, Ihe disse, enfim, pra consolat: 125 “Ma fill, lui ditil, c'est trop verser de larmes: Qu'a besoin le défunt que vous noyiex vos charmes? Puisqu'il est des vivants, ne sqngez plus aux mort. Je ne dis pas que tout 2 Vheure Une condition meilleure Change en des noces ces transports; Mais apres certain temps, souffrex qu'on vous propose Un époux beau, bien fait, jeune, et tout autre chose Que le défunt. — Ab! dit-elle aussitot, Un clottre est 'époux qu'il me faut."” Le pore lui laissa digérer sa disgrace. Un mois de la sorte se passe; Liautre mois, on l'emploie & changer tous les jours Quelque chose 2 M'habit, ou linge, 2 la coiffure: Le deuil enfin sert de parure, En attendant d'autres atours; Toute la bande des amours Revient au colombier; les jews, les ris, la danse, Ont aussi leur tour 2 la fin: On se plonge soir et matin Dans la fontaine de Jouvence. Le pire ne craint plus ce défunt tant chéri Mais comme il ne parlait de rien & notre belle: “On donc est le jeune mari Que vous m'avex promis?” dit-elle. 126 “Minha filha, € demais o teu copioso pranto: Exige 0 morto, entio, que afogues teu encanto? Se a vida continua, esquece os falecidos. ‘Nao digo que, mui brevemente, Melhor partido se apresente, Transforme em bodas teus gemidos, Considera, mais tarde, a proposta, porém, De um jovem, belo esposo melhor, 6 meu bem, Que o finado. — O meu casamento, ‘A filha respondeu, ha de set um convento.”” A desgraca engolir, deixou-lhe o velho pai. Desse modo, um més lé se vai; E ela gasta 0 outro més, cada dia mudando, No adoro, alguma coisa, os cabelos, 0 fato: Into, enfim, serve de omnato, Outros enfeites esperando. Dos amores, 0 alegre bando Volta logo ao pombal; a danga, a alactidade, Tero depois a sua vez: E noite e dia a viuvez A fonte vai da Mocidade. Nao teme mais o pai o defunto querido; Deixando de falar de casamento a bela: "Mas onde esté o jovem marido Que voct promereu?"” diz ela. 127 Nicolas Boileau (1636-1711) L'ART POETIQUE Quelgue sujet qu'on sraite, ou plaisant ow sublime, Que toujours le bon sens s'accorde avec la rime: L'un Vautre vainement ils semblent se hair, La rime est une esclave, et ne doit qu'obtir, * Aimez donc la raison: que toujours vos écits Empruntent d'elle seule et leur lustre et leur prix, Qui ne sait se borer ne sut jamais écrve Enfin Malberbe vint, et, le premier en France, Fit sentir dans les vers une juste cadence; Diun mot mis en sa place enseigna le pouvoir, Et réduisit la muse aux régles du devoir. Par ce sage écrivain la langue réparée Noffrit plus rien de rude 2 U'oreille épurée; Les stances avec grice apprirent @ tomber; Ex le vers sur le vers n’osa plus enjamber. Tout reconnut ses lois, et ce guide fiddle ‘Aux auteurs de ce temps sert encor de modale. 128 ‘A ARTE POETICA Qualquer que seja 0 assunto, engracado ou sublime, Deve nele casar 0 bom senso com a tima. Parece, em vio, que os dois nfo se dio muito bem: Cabe & rima servir, sendo simples escrava. * Amai, pois, a razio ¢ dela tdo-somente Venha o brilho ¢ 0 valor que houver em vossos livros. ‘Quem conter-se no sabe escrever nunca soube. Enfim chegou Malherbe e, por primeiro, em Franga, Nos versos fez sentir uma justa cadéncia, E no texto o lugar que realga a palavra, A tima reduzindo 3s regras do dever. Pelo sibio escritor, a lingua reparada, ‘Nunca mais ofendeu ouvidos afinados; ‘As estrofes, com graca, a cair aprenderam, E nfo mais cavalgou 0 vetso sobre 0 verso. ‘Accita a sua lei, esse exemplo seguro De modelo inda serve a quem tenta escrever. 129 Avant donc que d’écrire, apprenex 2 penser. Hiitez-vous lentement; et sans perdre courage, Vingt fois sur le métier remetter votre ouvrage; Polissez-le sans cesse et le repolissex; Ajoutex quelquefois, et souvent effacez. Un sonnet sans défaut vaut, seul, un long podme. Un rimeur, sans péril, dela les Pyrénées, Sur la scene, en un jour, renferme des années. 12, souvent, le béros d'un spectacle grossier, Enfant au premier acte est barbon au dernier. Mais nous, que la raison 2 ses regles engage, Nous voulons qu'avec art U'action se menage, Quen un lieu, qu'en un jour, un seul fait accompli Tienne jusqu'a la fin le shéatre rempli. 130 ‘Antes, pois, de excrever aprendei a pensar tamente € sem desfalecer; ‘a mesa de trabalho, polindo ¢ sempre repolindo; As vezes acrescei, sobretudo apagai. Longo poema vale um soneto sem falha. * ‘Um rimador, impune, além dos Pireneus, ‘Num dia sé, na cena, abarca muitos anos. 1, quanta vez, 0 her6i de grosseiro espeticulo, £ menino ao comeso ¢ velho ao fim da pesa. ‘Mas, nés, pela razdo, as regtas apegados, [Nos queremos que a aglo, com arte, se desdobre, ‘Num s6 lugar, num dia, um fato se conclua E, até o fim, mantenha o teatro repleto. Jean Racine (1639-1699) PLAINTE D'UN CHRETIEN Mon Dieu, quelle guerte cruelle! Je trouve deux hommes en moi: ‘L'un veut que plein d'amour pour toi ‘Mon coeur te soit toujours fidele, Liautre & tes volontés rebelle ‘Me révolte contre ta loi L'un tout esprit et tout céleste, Veut qu'au ciel sans cesse attaché, Ex des biens éternels touché, Je compte pour rien tout le reste; Es l'autre par son poids funeste Me sient vers la terre penché. Hélas! en guerre avec moi-méme, Ot pournai-je trouver la paix? Je veux, et m'accomplis jamais, Je veux, mais, 6 mistre extrémel Je ne fais pas e bien que j'aime, Ex je fais le mal que je bats. 132 PRANTO DE UM CRISTAO © meu Deus, que combate cruel! Em mim, dois homens a lurar: Se um deles me manda te amar Com grande amor sempre fiel, ‘Ati, meu Deus, 0 outro revel Me faz tua lei desprezar. ‘Um, a este mundo sendo infesto, ‘Manda que, sempre 20 céu ligado, E pela graca sustentado, Eu menospteze todo o resto; E 0 outro com peso bem funesto ‘Me traz 4 tetra sujeitado. Ai! Comigo mesmo lutando, ‘Onde achar poderei a paz? Quero, mas no cumpro jamais. Quero, mas, 6 crime nefando, Nao faco o bem que estou amando, $6 0 mal que odeio, nada mais. 133, O grice, 6 rayon salutaire, Viens me mettre avec moi d'accord; Et domptant par un doux effort Cet homme qui test si contraire, Fais ton esclave volontaire De cet esclave de la mort. 134 6 graca, lume necessitio, Da intima paz, me aponta 0 norte, E sujeitando, suave ¢ force O pecador, que te € contirio, Transforma em servo voluntitio Um pobre servo preso & morte. 135 SECULO XVII Jacques Delille (1738-1813) LE CAFE Us est une liqueur au podte plus chore, Qui manguait 2 Virgile et qu'adorait Voltsire. C'est toi, divin café, dont Paimable liqueur, Sans aliérer la téte épanouit le coeur. Aussi, quand mon palais est émoussé par lige, Avec plaisir encor je goite ton breuvage Que j'aime & préparer ton nectar précteux! Nal n'usurpe chex moi ce soin délicieux. Sur le réchaud brilant moi seul tournant ta graine, Alor de ta couleur fais succéder l’ébene; ‘Moi seul contre la noix, qu'arment ses dents de fer, Je fais, en le broyant, crier tom fruit amer. ‘Charmé par ton parfum, c'est moi seul qui dans Vonde Infuse 8 mon foyer ta poussidre féconde; Qui, tour 2 tour calmant, excitant tes bouillons, Suis d'un ocil attentif tes légers tourbillons. Enfin de ta liqueur lentement reposée, Dans le vase fumant la lie est déposte; ‘Ma coupe, ton nectar, le miel américain Que du suc des roseaux exprima I’ Africain, Tous est pré; du Japon I'émail recott tes ondes Et seul tu réunis les tributs des deux mondes. Viens donc, divin nectar, viens donc, inspire-moi: Je me veux qu'un désert, mon Antigone et toi. ‘A peine j'ai senti ta vapeur odorante, Soudsin de ton climat la chaleur pénétrante 136 © CAFE Mais bem-vinda ao poeta, existe uma bebida, Que a Virgilio faltou e de Arouet foi querida: Ta, divino café, cujo amivel licor, ‘Sem ser nocivo 4 mente, ao peito da vigor. Entorpecendo, assim, a idade ao paladar, Teu filtro, com agrado, ainda sei tomar. E quanto € bom fazer a preciosa pocio! ‘Ninguém me rouba, em casa, a amena ocupacio. E, 20 revirar teus gros, do braseiro ao calor, Eu mudo em azeviche 0 ouro de tua cot. teu fruto amargoso eu trituro sozinho, Fazendo-o ctepitar nos dentes do moinho. Preso por teu olor, vou derramando, cu s6, Na linfa, para o lar, 0 teu fecundo pé. Também, a comedir, mover teus borbotdes, Sigo, de atento olhar, teus leves turbilhes. Jade tua infusio lentamente acalmada, ‘No vaso a fumegar, eis a borra ascentada, Eis 2 taca, teu sumo, o mel americano Que dos canaviais espremeu o Afticano, E ondeias, todo pronto, em louca do Oriente, ‘Te oferecendo, assim, cada mundo um presente. ‘Vem, inspira-me, vem, 6 divina pogio: Uma Antigone quero € a ti na solidao. No instante em que senti ten vapor odorante, Bem logo, do teu clima, o calor penetrante 137 Réveille tous mes sens; sans trouble, sans chaos, ‘Mes pensers plus nombreux accourent @ grands floss. Mon idée était triste, aride, depouillée; Elle rit, elle sort richement habillée; Sorti agora e vem tic: Et je crois, du génie Eprouvant le revel, E até ceio, do génio entrevendo o arrebol, Boire dans chaque goutte un rayon de soleil. Beber em cada gora um reflexo do sol. 138 39 André Chénier (1762-1794) LA POESIE Seale, et la re en main, et de fleurs couronnée, De doux ravissements partout accompagnée, Aux liewx les plus déserts, ses pas, ses jeunes pas, Trowvent mil Le buisson a ses yeux rit et jette une rose. Elle sait ne point voir, dani un juste dédain, Les fleurs qui srop souvent, courant de main en main, Ont perdu sous Véclat de leurs frsicheurs vermeilles; Elle sait méme encore, 6 charmantes merveilles! Sous ses doigts délicats réparer et cueillir Celles qu'une antre main n'avait su que flétrir; Elle seule connait ces extases choisies, Dun esprit tout de feu mobiles fantaisies, Ces réves d'un moment, belles illusions, D'un monde imaginaire aimables visions, Qui ne frappent jamais, trop subtile lumidre, Des serrestres esprits Voeil pais et vulgaire. Seule, de mots beurewx, fuciles, transparents, Elle sait revétir ces fantomes errants... 140 ‘A POESIA De flores coroada e empunhando uma lira, Sozinha, ¢ sempre em sedugdes embevecida, ‘Até na solidao, seus pasos, jovens passos, Tesouros vio achar que ninguém suspeitava, Scus olhos repousando em atido silvedo, 0 silvedo, a sort, Ihe arremessa uma rosa. Ela sabe evitar, em seu justo desdém, Flores que, muita vez, passando em outras mis, ‘Nao tém mais o fulgor de seus tons purpurinos. E sabe mesmo, encantadora maravilha! Com dedos maternais, reparar e colher ‘Aquelas que outta mfo tio-s6 fez machucar. Somente ela conhece esses raros enlevos, Ligeiras eriagBes de espiritos ardentes, Os sonhos de um momento, ilusoes to bonitas, De um mundo imaginatio amorosas visbes, Que no prendem jamais, luz por demais sutil, O embmutecido olhar de espiritos terrestres. Com palavra feliz, ficil e transparente, Ela sabe vestir as errantes vis0es... 1 SECULO XIX Alphonse de Lamartine (1790-1869) UN PAYSAGE LYRIQUE (L'lsolement) Souvent sur la montagne, 2 ombre da viewx chine, ‘Au coucher du soleil, sristement je m'assieds Je promine au basard mes regards sur la plaine, Dont le tableau changeant se déroule @ mes pieds, Ici gronde le flewve aux vagnes écumantes; Il serpente et s'enfonce en un lointain obscur; La, le lac immobile étend ses eaux dormantes 08 W'évoile dit soir se lave dans l'axur Au sommet de ces monts couronnés de bois sombres, Le crépuscule encor jette un dernier rayon; Et le char vaporeux de la reine des ombres Monte, et blanchit déj2 les bords de I’borizon. Cependant s'élangant de la fleche gothique, Un son religieux se répand dans les airs Le voyageur s'arréte et la cloche rastique Aux derniers bruits du jour méle de saints concerts. Mais 2 ces dowx tableaux mon ame indifférente Néprouve devant eux ni charme ni transports; Je contemple la terre ainsi qu'une ame errante: Le soleil des vivants n’échauffe plus les mort. 142 PAISAGEM LIRICA (O Isolamento) 14 no alto da montanha, a sombra do carvalho, ‘Ao triste por-do-sol, descanso muita vez; ‘Um distraido olhar vagueio na planicie, Caja cena fagaz se desdobra a meus pés. ‘Aqui, 20s borbotdes, 0 rio vai passando; Coleia até sumir nas raias da campina; Mais longe, o Iago estende as aguas sonolentas, Donde se cleva ao céu a estrela vespertina. E nesses alcantis coroados de arvoredo, sol que morre ainda lanca o sew clatio; Ea rainha da noite, em traje vaporoso, Vai subindo ¢ alvejando as fimbrias da amplidao. No entanto, 0 carrilhdo de sua flecha gética Expalha pelo céu devota melodia: viajor detém-se e aquele sino ristico Num sopro de oracio envolve 0 fim do dia Ea tal visio de paz, minha alma indiferente Deixa aflorar t20-s6 0 desencanto meu. E olho, como um fantasma, a terta a meu redor. sol dos vivos nao aquece quem morreu, 143, LE LIVRE DE LA VIE Le linre de la vie est le lore supreme Quion ne peut ni fermer, ni rounrir 3 son choix; Le passage attachant ne s' lit pas dews fos, Mais Je feuillet fatal se tourne de lus On voudrait revenir & Ja page o’ l'on aime Et la page oft l'on meurt est déj2 sous vos doigts. 14 O LIVRO DA EXISTENCIA O livro da existéncia € o livro soberano Que nao se pode, ao léu, abrir, fechar de novo; trecho mais feliz nfo se 1é duas vezes, Ea pagina fatal é virada sozinha; Seria bom voltar a folha em que se amou E 0 dedo esta passando a folha em que se morre. 45 Alfred de Vigny (1797-1863) 1A NATURE T’ATTEND... Pars courageusement, laisse toutes les villes; Ne ternis plus tes pieds aux poudres du chemin; Du haut de nos pensers vois les cités serviles Comme les rocs fatals de 'esclavage bumain. Les grands bois et les champs sont de vastes asiles, Libres comme la mer autour des sombres ils. Marche a travers les champs une fleur 2 la main. La Nature t'attend dans un silence austere; Lherbe love a tes pieds som nuage des soir, Et le soupir d'adiew du soleil a la tere Balance les beaux lis comme des encensoirs La forét a voilé ses colonnes profondes, La montagne se cache, et sur les pales ondes Le saule a suspendu ses chastes reposoirs. Le crépuscule ami s‘endort dans la vallée, Sur Uherbe d'émeraude et sur I'or du gazon, Sous les timides joncs de la source isolée Et sous le bois réveur qui tremble @ I'horizom, Se balance en fuyant dans les grappes sauvages, Jette son manteau gris sur le bord des rivages, Et des fleurs de la nuit entrouve la prison... 146 ‘A NATUREZA ESTA CHAMANDO- Abandona a cidade e parte com firmeza; ‘Nao sujes mais teus pés na poeita do caminho; ‘As cidades servis em tua alma despreza, ‘Como se fossem dos mortais um pelourinho. Sao guatidas sem fim os prados ¢ arvoredos, ‘Tio livres quanto o mar em volta dos rochedos. Com uma flor na mio, 20s campos vai sozinho. ‘Ao seu regaco a Natureza esté chamando: Sobe, a noite, a teus pés, da verde relva a bruma; Eo suspiro de adeus do sol que vai baixando Agita as pétalas do litio ¢ 0 céu perfuma. ‘A floresta escondeu a enorme colunada, Oculta-se a montanha, ¢ na Agua sossegada, Os seus castos dosséis alto salgueito apruma, ‘A penumbra da noite adormece no val, Na relva de esmeralda e loura florasg0, ‘Na timida nascente a banhar o juncal, No bosque sonhador que treme na amplidio, Se balouca, fugindo, entre buqués selvagens, © seu manto sombrio estende pelas margens, E das flores da noite abre um pouco a prisio. M47 Victor Hugo (1802-1885) EXTASE J'étais seul pris des flots, par une nuit d'étoiles. Pas un nuage aux cies, sur les mers pas de voiles, ‘Mes yeux plongeaient plus loin que le monde réel, Es les bois, et les monts, et toute la nature Semblaient interroger dans un confus murmure Les flots des mers, les feux du ciel Eke 'or, légions infinies, voix basse, avec mille harmonies, inant leurs couronnes de feu; Es les flots bleus, que rien ne gouverne et n'arréte, Disaient, en recourbant Vécume de leur créte: — Crest le Seigneur, le Seigneur Dieu! EXTASE Na praia, estava s6, numa noite de estrelas. Nuvens nao tinha o c&u, 0 mar nao tinha vels. Bem longe, muito além, perdeu-se meu olhat. Eo bosque e a serrania, e toda a natureza, Em confuso rumor sondavam com certeza ‘A luz do céu, a agua do mar. cestrelas brilhando, infindas legises, Eos vor alta, em wor baixa, em mil modulasSes, Diziam, inclinando 0 aceso resplendor; Eos vagalhes azuis, que nao temem barreira, Diziam, recurvando 2 espuma sobranceira: — E Deus, € Deus, 0 meu Senhor! 149 SOLEIL COUCHANT Le soleil s'est couché ce soir dans les nutes, Demain viendra l'orage, et le soir, et la nuit; Puis U'aube, ef ses clartés de vapeurs obstraées, Puis les nutts, puis les jours, pas du temps qui s'enfuit. Tous ces jours passeront; ils passeront en foule Sur la face dei mers, sur la face des mons, Sur les fleuves d'argent, sur les foréts 02 roule Comme un bymne confus des morts que nous aimons; Et la face des eaux, et le front des montagnes, Ridés et non vieilis, et les bois toujours verts SViront rajeunissant; le flewve des campagnes Prendra sans cesse aux monts le flot qu'il donne aux mers. Mais moi, sous chaque jour courbant plus bas ma téte, Je passe, et, refroidi sous ce soleil joyeux, Je m'en irai bientbt, au milieu de la fete, ‘Sans que rien manque au monde immense et radieux. 150 POR-DO-SOL A tarde, o sol se pés, envolto em nuvens negras: Amanba, a procela, a tarde ¢ a escuridio, Depois, a aurota e seus clardes esmaccidos; Passos do tempo, o dia ea noite 1 se vao. Os dias passardo, em chusma atravessando Os tios cor de prata, os mares desmedidos, Encostas da montanha e selvas que parece Cantar 0 cantochio dos mortos mais queridos. Ea face do oceano e a fronte das montanhas, Rugosas, perenais, ¢ 0 bosque a verdejar Sempre remocarlo; 0 rio das campinas Tira sempre do monte a Agua que di 20 mar. A cabeca, potém, curvando sempre mais, Eu caminho, transido, 4 luz do sol brilhante. Em breve, me apartando, a festa deixarei, Sem fazet falta ao mundo, imenso ¢ radiante 1 ‘MES DEUX FILLES Dans le frais elair-obscur die soir ait en tombe, Un bouquet d'ceillets blancs aux longues tiges fréles, Dans une ume de marbre agité par le vent, Se penche, et les regarde, immobile et vivant, Ex frissonne dans Vombre, et semble, au bord du vase, Un vol de papillons arrété dans U'extase. MINHAS DUAS FILHAS Na dace meia-luz do entardecer que tomba, 153 MORS Je vis cette faucheuse. Elle était dans son champs. Elle allait & grands pas, moissonnant et fauchant, Noir squeleite laissant passer le crépuscale Dans Vombre oi l'on dirait que tout semble et recule, Lihomme suivait des yeux les lueurs de la fax, Ex les sriompbateurs sous les arcs triomphaux Tombaient; elle changeait en désert Babylone, Le tréne en échafaud et l &chafaud en trbne, Les roses en fumier, les enfants en oiseaux, Lior en cendre et les yeux des mires en ruiiseaux Ex les femmes criaient: “Rende-nous ce petit 8 Pour le faire mourir pourquoi avoir fait nattre? Ce n'était qu'un sanglot sur terre, en haut, en bas; Des mains aux doigts ossenx sortaient des noirs grabats; Un vent froid bruissait dans les linceuts sans nombre; Les peuples éperdus semblaient sous la faux sombre Un troupeou frissonnant qui dans Vombre ' Tout était sous ses pieds deuil, Epouvante et nuit. Derritre elle, le front baigné de douces flames, Un ange souriant portait la gerbe dimes, 154 MORS (© campo atravessando, a Morte me aparece, ‘Com uma foice as maos, a ceifar sua messe, ‘No ermo em que tu ‘Ao homem que espt E nos arcos triunfais, Babilénia mudava em Ressoava em toda terra um queixoso clamor; Safam de enxergécs crispadas maos de dor; E era tudo, a seus pés, noite, pavor, tristeza. ‘Autis dela se vé, com a fronte reluzente, ‘As almas sobragando, um anjo sorridente. 155 J'AI CUEILLI CETTE FLEUR. J'ai cueil cette fleur pour toi sur la colline. Dans V'épre escarpement qui sur le lt sincline, igle connait seul et seul peut approcher, Paisible, elle croissait aux fentes du rocher. Lombre baignait les flancs du morne promontoire; Je voyais, comme on dresse au lieu d'une victoire Un grand arc de triomphe éclatant et vermeil, A Vendroit of s'était englouti le soleil, Des woiles s'enfuyaient, au loin diminuées; Quelques toits, s’éclairant au fond d'un entonnoir, Semblaient craindre de luire et de se laisser voir. J'ai cueilli cette fleur pour toi, ma bien aimée. Elle est pile, et n'a pas de corolle embaumée. Sa racine n'a pris sur la créte des monts Que Vamire senteur des glaugues goémons; Moi, j'ai dit: “Pauvre fleur, du haut de cette cime, “Tu devais t'en aller dans cet immense abime “On Valgue et le nuage et les voiles s'en vont. “Va mourir sur un coeur, abime plus profond. “Fane-t0i sur ce sein en qui palpite un monde. “Le ciel, qui te créa pour teffeuiller dans Vonde “Te fit pour l'octan, je te donne a l'amour." 156 EU TE DOU ESTA FLOR... Bu te dou esta flor que apanhei na colina. No fragoso alcantil que sobre o mar se inclina E que as dguias somente acometem sem medo, Ela crescia em paz, nas fendas do rochedo. Ganhava a escuridao 2 triste penedia; Como se eleva, onde houve uma grande porfia, Vermelho ¢ reluzente, um arco triunfal, Vi, a0 longe, onde o sol apagou seu fanal, ‘Um nevoento portal surgit na noite escura. ‘Velejavam batéis na longingua planura. Luzindo, um casario, oculto num desvio, Parece que temia espalhar seu clarzo. Esta flor que apanbei, eu te dou, 6 meu bem. Sem brilho sua cor, nenhum perfume tem. Bebeu sua raiz, no alissimo tertaco, “Apenas 0 amargor ¢ 0 cheiro do sargaco; Een disse; ‘Pobre flor, nascida junto 20 céu, “Tew fim eta cair neste enorme excarcéu, “Onde as algas, a bruma ¢ as barcas ld se vio. “Morrerés noutro abismo, o amado coracao. “Fenece neste seio em que palpita um mundo, “0 céu te destinou 20 pélago profundo, “Para as ondas te fez, ao meu amor te dou.” 157 Le vent mélait les flots; il ne restait du jour Qu'une vague lueur, lentement effecte. Ob! comme j'tiais triste au fond de ma pensée Tandis que je songeais, et que le gouffre noir M'entrait dans V'ame avec tous les frissons dis soir! 158 © mar se encapelava ¢ somente ficou, ‘Ags poucos se apagando, alguma luz do dia. ‘Oh! quio grande, em minha alma, a tristeza crescia, Enquanto eu meditava ¢ 0 mistério, ao redor, ‘Me enchia 0 corag4o com 0 noturno pavor! 159 DEMAIN, DES L'AUBE... Demain, des Uaube, 2 Uheure.o® blanchit la campagne, Je partirai, Vois-tu, je sais que tu m'attends. Tirai par la fords, j'ai par la montagne. Je ne puis demeurer loin de toi plus longtemps. Je marcherai les yeux fixés sur mes pensées, Sans rien voir au dehors, sans entendre aucun bruit, Seul, inconnu, le dos courbé, les mains croistes, Triste, et le jour pour moi sera comme la nuit. Je ne regarderai ni Vor du soir qui tombe, ‘Ni les voles au loin descendant vers Harfleur, Et quand j'arriverai, je mettrai sur ta tombe Un bouquet de hows vert et de braytre en fleur. 160 AMANHA, MUITO CEDO. Amanha, muito cedo, alvejando a campina, ‘Vou partir. Que me estés esperando, eu bem sei Eu vou pela floresta ¢ vou pela montanha. Ficar longe de ti, nfo mais suportarei. Eu andarei com o olhar preso em meu pensamento, Sem ouvit som nenhum e a0 redor nada ver, Curvado, estranho € 6, tendo os bragos cruzados, Triste € o dia pra mim noite escura ha-de ser. Nao olharei o sol dourado que se esconde, Nem junto a Harfleur, ao longe, as velas pequeninas, E quando la chegar, eu deixo em teu jazigo Alguma flor silvestre, um camo de boninas 161 LA FETE CHEZ THERESE La nuit vint; tout se tu; les flambeaux s'éteignirent; Dans les bois assombris les sources se plaignirent; Le rossignol, caché dans son nid ténébreuc, Chanta comme un poste et comme un amoureux. Chacun se dispersa sous les profonds feuillages; Les folles en riant entrainérent les sages; Liamante s'en alla dans Vombre avec U'amant; Et, sroublés comme on V'est en songe, vaguement, Us sentaient par degrés se méler @ leur ame, A leurs discours secrets, 3 leurs regards de flamme, A leur coeur, & leurs sens, 2 leur molle raison, Le clair de lune bleu qui baignait l’horizon. 162 A FESTA DE TERESA Veio a noite, o siléncio; as tochas se apagaram; Na escuridio do bosque as fontes se queixaram; Na teva, 0 rouxinol, em seu ninho abrigado, Cantou como um poeta ¢ como um namorado. Cada um se dispersou sob as ramas frondosas, ‘As loucas a sorrir, puxando as cautelosas; , no peito ena mole razéo, sul que iluminava 2 imensidio. 163 SAISON DES SEMAILLES. LE SOIR Crest le moment crépusculaire. J'admire, assis sous un portail, Ge reste de jour dont s'éclaire La demnitre heure du travail. Dans les terres, de nuit baignées, Je consemple, mu, les bailions Dun vieillard qui jette & poignées La moisson future auc sillons. Sa haute silhouette noire Domine les profonds labours. On sent 2 quel point il doit croire A la fuite utile des jours. Ui marche dans la plaine immense, Va, viens, lance la graine au loin, Rowore la main, ef recommence. Et je médite, obscur témoin, Pendant que, déployant ses voiles, Liombre, ose méle une rumeur, Semble élarger jusqu'aux étoiles Le geste auguste du semeur. 164 © SEMEADOR E quando o sol desaparece ‘Admiro, 3 sombra de uma arcada, resto de luz que incendeia instante final da jomnada ‘Nas terras, que a noite citcunda, Eu fico olhando, com emocio, Um velho que langa, 20s punhados, ‘A messe futura no chio. Exguido e sombrio, o seu vulto, No torrao lavrado, crescia. Senti quanto ele acreditava Na fecunda evasio do dia. © campo imenso palmilhando, Vai, vem, joga a0 longe a semente, Reabre a mio € recomeca, Medito, andnimo vidente, ‘Enquanto, alargando os seus véus, ‘A sombra, que um rumor permeia, Parece levar as estrelas © gesto augusto que semeia. 165 Gérard de Nerval (1808-1855) EL DESDICHADO Je suis le ténébrewx, — le veuf, — l'inconsolé, Le prince d'Aquitaine 2 la tour abolie: it morte, — et mon lush constellé it de Ja Mélancolie. Dans la nuit du tombeau, toi qui m'as console, Rends-moi le Pausilippe et la mer d'talie, La fleur qui plaisait tant a mon coeur désolé, Ex la treille oh Je pampre a la rose salle. Swis.je Amour ou Phébus?... Lusignan ou Biron? ‘Mon front est rouge encor du baiser de la reine; J'ai révé dans la grotte on nage la syréne. Et j'ai deux fois vaingueur traversé 'Achérom: ‘Modulant sour & tour sur la Ire a Orphite Les soupirs de la sainte et les cris de la fee. EL DESDICHADO. Eu sou 0 tencbroso, — o vitvo, — 0 inconsolado, senhor da Aquitinia em torre sem valia Morreu-me a estrefa ¢ meu latide constelado Oseenta o negro Sol da attoz Melancolia. Na noite sepuleral, tu que me has consolado, Devolve 0 Posilipo e da Iria a onda fria, AA flor que me alegrava 0 peito desolado, E 0 vinhedo onde a rosa a0 pampano se alia Sou Biron, Lusignan?... Sou Febo, sou Amor? ‘Ainda me queima a fronte o beijo da rainha; Sonhei na gruta em que a sereia esta sozinha. Jai passei 0 Aqueronte ¢ sempre vencedor, Transpondo, qual Orfeu, na lira dedilhada, Os suspios da santa ¢ os cicios da fada. 167 DELFICA La connais-tu, Dafné, cetig ancienne romance, ‘Au pied du sycomore, ow sous les lauriers blancs, Sous l'olivier, le myrthe, ou les saules tremblants, Cette chanson d'amour qui toujours recommence?... Reconnais-tu le Temple au péristyle immense, Et les citrons amers oi s‘imprimaient tes denis? Et la grotte farale aux hotes impradents, Oa du dragon vaincu dort l'antique semence?... Us reviendront, ces diewx que tu pleures toujours! Le temps va ramener V'ordre des anciens jours, La terre a tressailli d'un souffle prophétique... Cependant la sibylte au visage latin Est endormie encor sous l'are de Constantin: — Et rien n'a dérangé le sévere portique. 168 DELFICA Voct conhece, Dafne, a romanca de outrora, Junto 20 sicémoro ou debaixo dos loureiros, ‘Do mirto, do olival, ou t1émulos salguciros, Esta cangio de amor que nunca vai embora?... © Templo reconhece, © peristilo enorme, E 0s amargos limées, mordidos por seu dente? Mais a grta, fatal ao héspede imprudente, ‘Onde, do dragio morto, 0 antigo sémen dorme?... s deuses por quem chora hio de voltar um dia! tempo vai trazer a ordem que entdo havia; Com um sopro de profeta, a terra se agitou... ‘A sibila, porém, com seu rosto latino, Permancce, a dormir, no arco de Constantino: — Eo portico severo em nada se alterou. ARTEMIS Aimex qui vous aima du berceax dans la bidre; Celle que j'aimai seul m'aime encor tendrement: C'est la mort — ou la morte... O délice! 6 tourment! La rose qu'elle tient, c'est la Rose wremitre Sainte napolitaine aace mains pleines de feux, Rose au coeur violet, fleur de Sainte Gudule: As-tu trouvé ta croix dans le désert des ciewx? Roses blanches, tombex! vous insultex nos dieux: Tombex fantomes blancs de votre ciel qui bride: — La sainte de Vabime est plus sainte ® mes yeux! 170 ARTEMIS ‘Ainda a frente voltou... a Décima Terceira; Est sempre sozinha, — ou sozinho um instante: Entéo, rainha, és tu! primeira ou derradeira? E rei és tu, 0 36 ou derradeiro amante? Amai quem vos amou do bergo a sepultura; Aquela que eu amei me adora ternamente: Morte — ou morta sera... Delicial Dor pungente! E a Rosa-d'além-mar a flor que ela segura. Santa de Napoles que tens nas maos a luz, Rosa, rosa lilés, florindo noutra igreja, No deserto dos céus achaste a tua cruz? Rosas brancas, descei! ultrajais tanto deus: Descei, brancas vis6es, do céu que felampeja: — A santa deste abismo € a santa aos olhos meus! a1 Alfred de Musset (1810-1857) TRISTESSE J'ai perdu ma force et ma vie, Et mes amis et ma gaité; J'ai perdu jusqu'a la fierté Qui faisait croire 2 mon génie. Quand j'ai connu la Verte, Tai cru que c'était une amie; ‘Quand je I'ai comprise et sentie, Ten tits dij dégoné. Ex pourtant elle Et ceux qui se ‘Ici-bas ont tout Diew parle, il faut qu'on lui réponde. Le seul bien qui me reste au monde Est d'avoir quelquefois pleuré. 172 ‘TRISTEZA ‘Nao tenho mais forca nem vida, ‘Uma amizade ou distracio; E mesmo a glotia esté perdida, Que me fez crer na inspirasio. Quando 2 Verdade eu dei guarida, Pensei ganhar sua afcicio; Quando por mim foi compreendida, ‘$6 me causou grande aversio. ‘Mas, neste mundo, ela perdura E se esquect-la alguém procura Vivendo esté na insensatez. Deus fala. E a resposta da gente? © bem que me resta somente E ter chorado alguma vez. 173, LA NUIT D'OCTOBRE (.)Bitrce done sans motif qu'agit la Providence? Et nul ne se connait tant qu'il n'a pas souffert. Crest une dure loi, foi supréme, Vieille comme le mon! fatalité, Qu'il nous faut du voir le baptéme, Es qu'a ce triste prix t dire acheté. Ia joie « pour symbole une plante brsée, Humide encor de pluie et couverte de fleurs. 174 A NOITE DE OUTUBRO Seri que € sem motivo a agio da Providéncia? E acaso € distraido o Deus que te afligiu? horas talvez um golpe vindo em teu favor, Crianga; 0 teu coragio, por isso, renasceu. O homem € um aprendiz, sendo seu mestre a dor, Ninguém a conhoce enguamo nfo sof PSibiome de leaed ums placa aba, De chuva gotejada e coberta de flor. 175

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