Você está na página 1de 8

As informações sensoriais para o controle postural

AS INFORMAÇÕES SENSORIAIS PARA O


CONTROLE POSTURAL

Running title: sensory information for posture

Luis Mochizuki1
Alberto Carlos Amadio2

Resumo
O equilíbrio na postura ereta ocorre por meio da atuação do controle postural, que obtém informações
sensoriais do sistema visual, vestibular e somatossensorial. É tema de discussão se existe a predominância
ou combinação de informação sensorial para o controle postural e se o conjunto de informações sensoriais
é organizado de forma hierárquica ou não. Assim, como as informações sensoriais são organizadas para o
controle postural? Qual é o papel de cada informação sensorial no controle da postura ereta? Para buscar
respostas para estes questionamentos, o objetivo deste artigo é discutir o papel das informações sensoriais
no controle da postura ereta.
Palavras-chave: Postura; Equilíbrio; Sistema sensorial.

Abstract
The postural control acts keeping in balance the standing posture, using sensorial information from visual,
vestibular e somatosensorial systems. Although those systems are anatomically separated and independent,
and the quality degradation of sensory information in different normal situations, like keeping eyes closed,
standing over a soft or moving surface, we stand still. So, how sensory information is organized to control
balance? Which is position for each kind of sensory information for balance control during standing? To
answer these questions, the aim of this paper is to discuss the position played for sensory information in
balance control.
Keywords: Posture; Balance; Sensory system.

1
Doutor em Educação Física. Escola de Artes, Ciências e Humanidades USP. Avenida Arlindo Bétio, 1000. Ermelino Matarazzo,
São Paulo, SP. CEP 02838-080. E-mail: mochi@usp.br

2
Doutor em Ciência do Esporte, professor titular da Escola de Artes, Ciências e Humanidades USP.

Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006 11


Luis Mochizuki; Alberto Carlos Amadio

Introdução control, sensory information, vestibular system,


visual system, somatosensory system.
O equilíbrio na postura ereta ocorre por Os artigos foram selecionados por rele-
meio da atuação do controle postural, que obtém vância e por afinidade com o assunto do controle
informações sensoriais do sistema visual, vestibu- da postura ereta parada.
lar e somatossensorial. Apesar da separação
anatômica dos sistemas sensoriais envolvidos com
o controle postural e a degradação significativa das Revisão e discussão de Literatura
informações sensoriais, com os olhos ou sobre O controle da postura
superfícies móveis ou macias nos mantemos em
pé. Isto sugere que o sistema nervoso tem a habi- A estabilidade postural depende da no-
lidade de mudar discretamente a fonte principal ção da posição e movimento do corpo, em rela-
de informação sensorial (1). A transição de fontes ção ao campo gravitacional e do ambiente (5). Esta
sensoriais corresponde, por exemplo, a passar da noção é formada a partir da informação sensorial
dominância da informação visual para a de diferentes fontes (sistema visual, vestibular e
somatossensorial (2). somatossensorial). O conjunto de informações sen-
Assim, o sistema nervoso escolhe a fonte soriais cumpre esta função criando um quadro de
principal para controlar a postura (1) e quando faz referências (6). Por exemplo, a visão informa o
a transição de uma fonte de percepção para outra, movimento do corpo em relação a um objeto para
a faz de forma abrupta e usa uma informação sen- respostas adequadas para garantir estabilidade (6,
sorial de cada vez. Massion & Woollacott (3) pro- 7). O controle da postura ereta precisa de uma
põem que a dominância de um sistema sensorial variável ou mais variáveis para monitorar o corpo
sobre o outro é forma do sistema nervoso para e atuar quando for preciso. Para a definição das
evitar conflitos de informações. variáveis de controle, a representação do efeito do
Por outro lado, Oie et al. (4) discutem as ambiente na postura é importante e afeta sua sele-
evidências da seleção do nível de importância da ção. A representação da gravidade é um impor-
informação sensorial como base do mecanismo de tante quadro de referência (3), conhecido como
fusão e integração multissensorial no controle da quadro de referência geocêntrico, onde duas for-
postura. ças musculares aparecem: para atuar contra a ação
É tema de discussão se existe a predo- da força gravitacional e para estabilizar centro de
minância ou combinação de informação sensori- massa (COM) sobre o suporte. Para a postura ere-
al para o controle postural e se o conjunto de ta, Massion (9) sugere que as variáveis que cons-
informações sensoriais é organizado de forma hi- troem o quadro de referências são o eixo vertical
erárquica ou não. Assim, como as informações (formado pela cabeça e tronco e dependente da
sensoriais são organizadas para o controle configuração geométrica do corpo) e/ou o alinha-
postural? Qual é o papel de cada tipo de informa- mento da projeção vertical do COM na base de
ção sensorial no controle da postura ereta? Para apoio (depende da configuração geométrica e das
responder tais questões, o objetivo deste artigo é propriedades inerciais do sistema). Outro parâmetro
discutir o papel das informações sensoriais no de equilíbrio é a margem de segurança para o
controle da postura ereta. movimento do centro de pressão (COP). Patton,
Lee & Pai (10) mostram aumento na margem de
segurança com o treinamento, sugerindo que o
Materiais e método sistema nervoso pode usar estas margens para an-
tecipação e controle de feedback. A busca desta
Este artigo foi feito por meio de uma re- margem de segurança promove mudanças nas ca-
visão de literatura não sistemática que usou como racterísticas do COP; assim, as mudanças na am-
fontes de pesquisa os bancos de dados do Medline plitude do COP dependem do nível de instabilida-
e Web of Science para a busca de artigos publica- de que afetam o equilíbrio (11). Desta forma, o
dos em periódicos nas décadas de 70, 80, 90 e fluxo de informação sensorial sobre a postura é
primeira década do século XXI. As palavras-chave imprescindível para o sucesso do uso adequado
utilizadas para a busca foram posture, postural da margem de segurança do COP.

12 Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006


As informações sensoriais para o controle postural

O controle da postural se baseia no se de difusão (14). Observando os variogramas


monitoramento da representação interna da pos- (gráfico das variações quadráticas dos deslocamen-
tura (esquema corporal - 3) para criar uma repre- tos do COP expressas por intervalos de tempo em
sentação geométrica e cinética do corpo humano, escala bilogarítmica) verifica-se que o ponto de
principalmente das forças aplicadas no apoio e da transição entre o comportamento persistente e
orientação do corpo em relação à gravidade. A antipersistente desloca-se para a esquerda no
representação geométrica permite a comparação variograma em comparação com a situação de
da atual postura com a postura esperada, de for- ausência de feedback. Estes resultados suportam a
ma que os ajustes posturais surgem sempre que hipótese que os regimes de longa latência (com
há discrepância entre essas posturas. A represen- maiores intervalos de tempo no gráfico) provavel-
tação cinética inclui o monitoramento das condi- mente operam no regime de feedback.
ções do apoio e a mensuração da inercial dos seg- Buchanan & Horak (15) mostram que o
mentos corporais. Quando alterada esta função, sistema visual contribui para manter o balanço
os ajustes podem ser afetados. natural do corpo distante dos limites da base de
apoio, informando como fixar a posição da cabe-
ça e do tronco quando COM é perturbado pela
Informações sensoriais do Sistema visual translação da base de suporte. Para lenta translação
da base de suporte, Buchanan & Horak (15) pro-
O sistema visual detecta a luz que permi- põem que o sistema nervoso central tolera oscila-
te identificar imagens do mundo. Estas imagens ções do campo visual e escolhe informações vesti-
informam sobre forma, cor e movimento de obje- bulares e proprioceptivas para controle postural.
tos e do próprio corpo. A percepção dessas infor- Perrin et al. (16) verificam as conseqüên-
mações é processada paralelamente e a incapaci- cias da supressão da informação visual em um tes-
dade de perceber um tipo de informação visual é te de equilíbrio postural (manutenção da postura
verificada clinicamente (12). Por exemplo, a agnósia ereta sobre uma plataforma que apresenta oscila-
espacial é o déficit na visão estereoscópica, en- ções regulares na direção ântero-posterior). A re-
quanto a agnósia de movimento é a incapacidade petição do teste mostra o padrão do COP de olhos
de perceber o movimento. Na agnósia de movi- abertos nas primeiras tentativas com os olhos fe-
mento, a pessoa apenas identifica que o objeto chados. O grupo experimental apresenta uma adap-
mudou de posição, mas é incapaz de perceber tação postural menos dependente das informações
quando ele está se movendo. A percepção visual posturais, refletindo o efeito do treinamento pro-
é o processo de dar significado para as imagens porcionado pela participação em modalidades es-
no sistema nervoso. O mecanismo de percepção portivas no uso de todas informações sensoriais
visual inicia-se na retina. A luz entra na córnea e é para a manutenção da postura. Os autores suge-
projetada na parte de trás do olho, atingindo a rem que o controle postural envolve dois compo-
retina. A luz é transformada em um sinal elétrico e nentes: um sistema de referência estável baseado
conduzida pelo sistema nervoso. Ao contrário de no conhecimento anterior e outro sistema de cor-
outros órgãos sensoriais como a cóclea ou recep- reção dinâmica que intervém quando surgem per-
tores somáticos, a retina não é um órgão periféri- turbações.
co, mas pertence ao sistema nervoso central (12). Perrin et al. (16) comparam as conseqü-
A informação baseada na detecção do movimento ências no controle postural da supressão de
serve para perceber o movimento de objetos, man- aferência visual em teste de posturografia dinâmi-
ter o movimento ocular para perseguição contí- ca com sujeitos que praticam ou não esportes. O
nua de objetos e guiar o movimento corporal no principal resultado é que esportistas têm um me-
ambiente. A detecção do movimento é baseada lhor controle de postura. A análise das séries indi-
no movimento da imagem observada e pelo mo- ca a transição na forma de resposta de um padrão
vimento acoplado da cabeça e dos olhos. de olhos abertos para um padrão de olhos fecha-
Rougier (13) observa que o feedback vi- dos. Os esportistas demonstram uma melhor adap-
sual permite menor variabilidade dos deslocamen- tação à supressão de informação visual. O padrão
tos do COP na manutenção da postura ortostática de transição demora menos para os esportistas que
de longa duração. Este estudo é baseado na análi- para os não-esportistas.

Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006 13


Luis Mochizuki; Alberto Carlos Amadio

Quando estudados apenas pessoas que lho vestibular (22). O aparelho vestibular consiste
praticam esportes, notamos que o efeito da remo- dos órgãos do otolito, o utrículo e a sácula e os
ção da visão no controle postural depende da pos- canais semicirculares do labirinto, que são cavida-
tura estuda. Asseman et al. (17) mostram que as des no osso temporal associadas à cóclea. Estas
diferenças na oscilação do COP surgem quando cavidades semicirculares preenchidas por um flui-
atletas de ginástica olímpica realizam posturas ins- do que acompanha o movimento da cabeça, ati-
táveis, como a unipodal e o apoio invertido (para- vando células que contêm extensões como pêlos.
da de mãos). Destaca-se o fato de que a postura Este sistema é enervado pelos tratos da via
que apresenta maior oscilação e maior velocidade ventromedial (são quatro os tratos: o trato vestíbu-
de oscilação foi a postura unipodal. Desta forma, lo espinhal e o trato tecto espinhal controlam a
o efeito da remoção da visão no controle da pos- postura da cabeça e do pescoço, e os tecto espi-
tura não está diretamente associado à instabilida- nhal controla a postura do tronco e dos músculos
de que a postura provoca. antigravitacionais dos membros). Pela forma dos
O limiar de percepção de balanço postural semicanais, o labirinto apenas percebe as acelera-
depende da fonte sensorial. Fitzpatrick & Mccloskey ções angulares da cabeça, causadas por movimen-
(18) mostram que isoladamente cada um dos sis- tos de flexão e extensão e rotação do pescoço. O
temas sensoriais para o controle postural apresen- utrículo e a sácula contêm máculas que estão re-
ta um diferente limiar de percepção. O limite de pletas de células pilosas cobertas por substância
percepção de movimentos do sistema visual é maior gelatinosa (a membrana do otolito) que contém
que o do sistema proprioceptivo em baixas veloci- cristais de carbonato de cálcio, o otolito. Como a
dades de movimento (1 mrad/s), mas em veloci- mácula do utrículo forma um plano horizontal
dades mais altas (3 mrad/s) esses limites de per- quando a cabeça está ereta, sacudidelas em rela-
cepção são semelhantes. ção à gravidade ou acelerações lineares que a ca-
Além de diferentes limiares, o papel da beça experimenta são percebidas. Por outro lado,
informação sensorial no controle postural sofre a mácula da sácula está na vertical (23).
efeito da parte do corpo que é monitorada. As células dos canais semicirculares res-
Buchanan & Horak (19) sugerem a existência de pondem às acelerações angulares, enquanto as
processos de controle separados para o controle células das máculas do utrículo e sácula respon-
da parte superior e inferior do corpo. Assim, o uso dem ao movimento linear do corpo ou às oscila-
das informações sensoriais, ponderado pelo efeito ções do peso da cabeça. O sistema vestibular for-
mecânico das partes do corpo, pode selecionar a nece informações sobre as variações temporais das
melhor forma de produzir movimentos com o cor- velocidades angular e linear da cabeça. O sistema
po a fim de controlar a postura. Rougier (20) mos- vestibular, diferentemente de outros instrumentos
tra que a visão afeta de forma a oscilação do COP que mensuram acelerações lineares, consegue se-
e do COM. A informação visual tanto afeta a osci- parar o componente da aceleração do sistema e a
lação do COM quanto o COP, mas torna a diferen- aceleração da gravidade (24).
ça entre os dois maior na sua ausência, como tam- A função vestibular no controle postural é
bém afeta forma que o COP é utilizado para corri- explorada por diferentes abordagens experimentais.
gir o balanço postural. O sistema vestibular envia informações sobre a ori-
entação da cabeça, em relação ao campo gravitacional
terrestre, percebendo a variação de aceleração linear
Informações sensoriais do sistema e rotacional da cabeça (24, 25, 26).
vestibular A estimulação elétrica galvânica pode ser
aplicada sobre o aparelho vestibular em indiví-
A principal função do ouvido concerne duos normais em postura ereta sobre uma plata-
ao sistema auditivo; mas, no ouvido interno, a fun- forma móvel (27). Quando o estímulo ocorre com
ção sensorial não está relacionada ao ouvir (21). o movimento da base de suporte, a resposta
O ouvido interno é composto pela cóclea, parte postural é baseada em uma interação de ambas
do sistema auditivo, e o labirinto, que não perten- as informações. Quando esses estímulos são apre-
ce a este sistema. O labirinto auxilia a manutenção sentados com considerável atraso, as informações
do equilíbrio e é uma parte importante do apare- são tratadas sem nenhuma interação. Hlavacka,

14 Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006


As informações sensoriais para o controle postural

Shupert & Horak (27) concluem que a contribui- Informações sensoriais do sistema
ção das informações vestibulares acontece prin- somatossensorial
cipalmente no final de uma tarefa de equilíbrio
dinâmico. O sistema somatossensorial difere de ou-
A ausência ou falha da informação sen- tros sistemas sensoriais porque seus receptores
sorial pode alterar o controle da postura. Para estão pelo corpo e não estão concentrados em lo-
manter a postura ereta, o controle postural sele- cais especializados do corpo humano e porque
ciona estratégias apropriadas. Duas das mais es- responde a muitos diferentes tipos de estímulos,
tudadas estratégias posturais são a estratégia do agrupados em quatro categorias: toque, tempera-
tornozelo e a estratégia do quadril (28), que se tura, posição do corpo e dor. Um estímulo
diferenciam, entre outros aspectos, por qual gru- somatossensorial pode ativar muitos receptores
po muscular é primeiro utilizado quando surge porque o sentido somatossensorial é o conjunto
uma instabilidade postural no plano sagital. Horak de todos os sentidos que não são ouvir, cheirar,
et al. (29) reportam que a ausência da informa- ver, sentir o gosto, e o sentido de equilíbrio do
ção vestibular resulta na ausência da estratégia sistema vestibular. Cabe ao sistema nervoso cen-
do quadril e sugerem que a informação vestibu- tral interpretar a atividade dos receptores e usá-los
lar é necessária quando a tarefa de equilíbrio di- para gerar percepções coerentes com a realidade.
nâmico requer o uso da estratégia do quadril. Koenderink (33) sugere que esta escolha é basea-
Também observam que na ausência da informa- da no nível de correlação da atividade dos
ção somatossensorial, o ajuste postural compen- neurônios de cada receptor sensorial. Os recepto-
satório baseia-se na estratégia quadril. No entan- res somatossensoriais de toque e de posição têm
to, a ausência de um desses sistemas é suficiente especial relação com o controle postural. Estes
para atrasar ou desorganizar a resposta postural. sensores estão na pele e nas paredes do corpo,
Dietz et al. (30) mostram que no ambi- nos músculos, tendões, ligamentos, nos tecidos
ente aquático, o mecanismo de reflexo conectivos das articulações e nos órgãos internos.
proprioceptivo ou reflexo vestibuloespinhal não A sensação de toque é estimulada mecanicamente
é responsável pelos ajustes posturais. É sugerido na superfície corporal e a sensação de posição é
que a resposta eletromiográfica associada ao ajuste dada pelo estímulo mecânico dos músculos e arti-
que ocorre quando alguém é perturbado com a culações (12). A maioria desses receptores é
translação da base de suporte dentro da água é mecanoreceptora porque responde às distorções
mediada pelos pressoreceptores associados ao físicas como alongamento e flexão. O
monitoramento da posição da projeção do COM mecanoreceptor é principalmente encontrado na
na base de apoio. pele e responde ao tato e deformações da pele.
Welgampola & Colebatch (31) evocam o Além do mecanoreceptor, temos os re-
reflexo vestibuloespinhal e vestibulocólico pela ceptores proprioceptivos, que respondem sobre
estimulação galvânica. Reforçando a importância onde está o corpo no espaço, a direção e a inten-
do sistema vestibular em condições de déficit de sidade do movimento. Os receptores pro-
informação visual e somatossensorial, os autores prioceptivos servem para duas funções: identificar
mostram que os reflexos vestibulo-espinhais são a posição do corpo para auxiliar na identificação
maiores quando os sujeitos permaneciam sobre de coisas ao nosso redor e guiar os movimentos.
uma base de suporte estreita, em superfície ma- Assim, os músculos esqueléticos têm dois
cia, e desprovidos de visão e apoios externos. mecanoreceptores proprioceptivos: os fusos mus-
Os efeitos do treinamento esportivo não culares e os órgãos tendinosos de Golgi. Os fusos
são transferidos para a sensibilidade do sistema musculares informam sobre a intensidade de alon-
vestibular. Balter et al. (32) mostram que garotas gamento e a taxa de alongamento dos músculos.
atletas e não atletas de ginástica olímpica não Os órgãos tendinosos de Golgi informam sobre o
mostraram efeito da estimulação galvânica na sen- nível de força gerado pelo músculo em um ten-
sibilidade do sistema vestibular. A sugestão é que dão.
os atletas não têm um sistema sensorial melhor, Além disso, há vários tipos de receptores
mas que aprendem a usar a informação sensorial proprioceptivos nos tecidos conectivos de articu-
de forma mais adequada. lações sinoviais, especialmente nas cápsulas e li-

Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006 15


Luis Mochizuki; Alberto Carlos Amadio

gamentos, como as terminações de Rufini, as termi- constrói um mapa que indica o vetor resultante da
nações de Golgi, e corpúsculos de Pacini e também posição do COM e da orientação vertical do cor-
terminações nervosas livres. As terminações nervo- po, em relação à base de suporte. A interação de
sas livres estão nas superfícies internas das articula- diferentes fontes de informação sensorial para o
ções (23) enquanto os outros sensores controle postural é amplamente abordada (2, 4, 6,
proprioceptivos nas articulações estão dispersos nos 38, 39, 40, 41). O estudo desta interação é impor-
ligamentos e cápsula articular. Eles respondem a tante para propor modelos sobre a representação
mudanças de ângulo, direção e velocidade de mo- da organização postural.
vimento de uma articulação. Para os receptores ar-
ticulares, Gandevia & Burke (34) verificam que pou-
cas fibras aferentes estão ativadas durante todo Considerações finais
movimento da articulação. Fibras apresentam diver-
sos disparos nas extremidades do movimento, ge- O controle postural é o controle dos ar-
ralmente quando há o movimento em mais de um ranjos dos segmentos corporais baseado em infor-
eixo de rotação articular. Ou seja, os receptores ar- mações sensoriais de diferentes fontes. Estas in-
ticulares provêm uma informação fraca sobre posi- formações permitem formar uma representação
ção intermediária de uma articulação. Apesar de interna do mundo externo, relatando e reconhe-
conhecer a posição de uma articulação, se for mo- cendo a posição e o movimento de cada parte do
vida lentamente (menos de um grau por minuto), corpo. O controle postural usa informações dos
não existirá informação sobre movimento, mas ape- sistemas visual, vestibular e somatossensorial (1,
nas a indicação de mudança de posição. 5, 23, 28, 42, 43). Observa-se que abundância de
A informação do mecanoreceptor se une informações é um fato que garante a estabilidade
à informação do fuso muscular e de receptores postural mesmo na deficiência de um sistema. Acre-
cutâneos para estimar o ângulo articular. Logo, a dita-se que o nível de importância das informa-
remoção de um dos receptores é compensada por ções sensoriais seja modulável e redundante (1, 4,
outros receptores na estimação da posição, mas 9, 18, 39, 44). A modulação de informação senso-
com redução da capacidade de adaptação (29, 35) rial depende de estados de atenção e mesmo da
ou na qualidade da resposta (36). saúde de cada um dos sistemas sensoriais (38).
Na ausência de informação dos recepto- A separação anatômica dos sistemas sen-
res cutâneos, o movimento é prejudicado. As soriais envolvidos com o controle postural e a de-
neuropatias periféricas que causam perda da sen- gradação significativa das informações sensoriais,
sação de tato nas extremidades do corpo podem quando fechamos os olhos ou permanecemos em
estar associadas pelo sinal de Romberg: os pacien- superfícies móveis ou macias, sugerem que o sis-
tes são incapazes de permanecer em pé sem assis- tema nervoso tem a habilidade de mudar discreta-
tência externa com os pés juntos com os olhos mente a fonte principal de informação sensorial
fechados (23). Assim, sem a informação das dife- (1). Mccollum et al. assumem que a transição de
renças de pressão plantar, os reflexos vestibulares uma fonte sensorial para outra fonte é ajustada
são incapazes de manter a postura. Da mesma for- por uma simples dica sensorial, escolhida em uma
ma, a manipulação de objetos é grosseira quando lista limitada de opções, em vez da combinação
há anestesia cutânea. A visão não pode substituir de dicas sensoriais ou sobre aspectos gerais do
a perda dos mecanoreceptores cutâneos (23). ambiente. Isso significa que o controle postural
Meyer et al. (37) indicam que a informação senso- não usa todas as informações sensoriais disponí-
rial da região plantar tem uma importância mode- veis, mas escolhe. A transição de fontes sensoriais
rada para a manutenção da postura ereta. Entre- corresponde, por exemplo, a passar da dominância
tanto, o impacto da perda sensorial da região plan- da informação visual para a somatossensorial (2).
tar pode ser aumentado caso exista simultanea- Logo, o sistema nervoso escolhe a fonte principal
mente outros déficits de informação proprioceptiva, para controlar a postura (1) e quando faz a transi-
como são comuns nos casos das neuropatias peri- ção de uma fonte de percepção para outra, a faz
féricas. de forma abrupta, assim usa uma informação sen-
Ao integrar o conjunto de informações sorial de cada vez. Massion & Woollacott (3) pro-
de diferentes locais do corpo, o sistema nervoso põem que a dominância de um sistema sensorial

16 Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006


As informações sensoriais para o controle postural

sobre o outro é forma do sistema nervoso para 10. Patton JL, Lee WA, Pai YC. Relative stability
evitar conflitos de informações. Esta dominância é improves with experience in a dynamic standing
dinâmica e depende essencialmente da tarefa, da task. Exp Brain Res 2000; 135(1):117-26.
disponibilidade de informação sensorial e da meta
11. Mochizuki L, Duarte M, Amadio AC, Zatsiorsky
que o controle postural visa (4, 37; 44).
VM, Latash ML. Changes in Postural Sway and
Its Fractions Conditions of Postural Instability.
Este trabalho contou com o apoio da
J Applied Biomech 2006; 22: 51-60.
Fapesp 01/10712-0.
12. Ghez C. Posture. In: Kandel ER, Schwartz JH,
Jessell TM. eds. Principles of neural science.
3.ed. London: Prentice-Hall, 1991.
Referências
13. Rougier P. Influence of visual feedback on
1. Mccollum G, Shupert CL, Nashner LM. sucessive control mechanism in upright quiet
Organizing sensory information for postural stance in humans assessed by fraction Brownian
control in altered sensory environments. J motion modelling. Neuroscie Lett 1999; 266:157-
Theorical Bio 1996;180(3):257-70. 60.

2. Maurer C, Mergner T, Bolha B, Hlavacka F. 14. Collins JJ, De Luca CJ. Open-loop and closed-
Vestibular, visual, and somatosensory loop control of posture: a randon-walk analysis
contributions to human control of upright of center-of-pressure trajectories. Exp Brain
stance. Neuroscie Lett 2000; 281:99-102. Res 1993; 95: 308-18.

3. Massion J, Woollacott MH. Posture control. In: 15. Buchanan JJ, Horak FB. Emergence of postural
Bronstein AM, Brandt T, Woollacott MH. Clinical patterns as a function of vision and translation
disorders of posture and gait. London: Arnold, frequency. J Neurophysiol 1999; 81: 2325-39.
1996. 16. Perrin, Schneider D, Deviterne D, Perrot C,
4. Oie KS, Kiemel T, Jeka JJ. Multisensory fusion: Constantinescu L. Training improves the
simultaneous re-weighting of vision and touch adaptation to changing visual conditions in
for the control of human posture. Brain Res maintaining human posture control in a test of
Cogn 2002 Jun;14(1):164-76. sinusoidal oscillation of the support. Neuroscie
Lett 1998; 245(3):155-8.
5. Horstmann GA, Dietz V. A basic posture control
mechanism: the stabilization of the centre of 17. Asseman F, Caron O, Cremieux J. Effects of the
gravity. Electroencephalograph Clin removal of vision on body sway during different
Neurophysiol 1990; 76:165-76. postures in elite gymnasts. Int J Sports Med
2005;26(2):116-9.
6. Isableau B, Ohlmann T, Crémieux J, Amblard
B. Selection of spatial frame of reference and 18. Fitzpatrick R, Mccloskey DI. Proprioceptive,
postural control variability. Exp Brain Res 1997; visual and vestibular thresholds for the
114:584-9. perception of sway during standing in humans.
J Physiol 1994; 478(1):173-86.
7. Guerraz M, Thilo KV, Bronstein AM, Gresty
MA. Influence of action and expectation on 19. Buchanan JJ, Horak FB. Voluntary control of
visual control of posture. Cognitive Brain Res postural equilibrium patterns. Behav Brain Res
2000; 11:259-66. 2003;143(2):121-40.

8. Latash ML. Neurophysiological basis of human 20. Rougier P. Visual feedback induces
movement. Champaign: Human Kinetics, 1997 opposite effects on elementary centre of
gravity and centre of pressure minus centre
9. Massion J. Postural control systems in of gravity motions in undisturbed upright
developmental perspective. Neuroscie Behav stance. Clin Biomech (Bristol, Avon)
Rev 1998; 22(4):465-72. 2003;18(4):341-9.

Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006 17


Luis Mochizuki; Alberto Carlos Amadio

21. Schubert, MC; Minor, LB. Vestibulo-ocular 34. Gandevia SC, Burke D. Does the nervous-system
physiology underlying vestibular hypofunction. depend on kinesthetic information to control
Phys Ther 84(4) 2004: 373-385 natural limb movements? Behav Brain Scie 1992;
15(4):614-32.
22. Bear MF, Connors BW, Paradiso MA.
Neuroscience: exploring the brain. 2 ed. Baltimore, 35. Allum JHJ, Honegger F. Interactions between
Lippincott Williams & Wilkins, 1996. vestibular and proprioceptive inputs triggering
and modulating human balance-correcting
23. Rothwell J. Control of human voluntary movement.
responses differ across muscles. Exp Brain Res
2. ed. London, Chapmann & Hall, 1994.
1998; 121: 478-94.
24. Merfeld DM, Zupan L, Peterka RJ. Humans use
36. Simoneau GG, Ulbrecht JS, Derr JA, Cavanagh R.
internal models to estimate gravity and linear
Role of somatosensory input in the control of the
acceleration. Nature 1999; 398(6728):615-8.
human posture. Gait & Posture 1995; 3:115-22.
25. Gusev VM. Transformation of angular
37. Meyer PF, Oddsson LI, De Luca CJ. The role of
accelerations by the system of semicircular canals
plantar cutaneous sensation in unperturbed stance.
of the vestibular apparatus. Biofisika 1975;
Exp Brain Res 2004;156(4):505-12.
20(6):1110-4.
38. Day BL, Cole J. Vestibular-evoked postural
26. Mergner T, Rosemeier T. Interaction of vestibu-
responses in the absence of somatosensory
lar, somatosensory and visual signals for postural
information. Brain 2002;125(Pt 9):2081-8.
control and motion perception under terrestrial
and microgravity conditions: a conceptual model. 39. Horak FB, Hlavacka F. Somatosensory loss
Brain Res Rev 1998; 28:118-35. increases vestibulospinal sensitivity. J
Neurophysiol 2001; 86:575-85.
27. Hlavacka F, Shupert C, Horak FB. The timing of
galvanic vestibular stimulation affects responses 40. Roll JP, Popov K, Gurfinkel V, Andre-Deshays C,
to platform translation. Brain Res 1999; 821:8-16. Gilhodes JC, Quoniam C. Sensorimotor and
perceptual function of muscle proprioception in
28. Nashner LM, Mccollum G. The organization of
microgravity. J Vest Res 1993; 3(3):259-73.
postural movements: a formal basis and experi-
mental synthesis. Behav Brain Scie 1985; 8:135- 41. Roll R, Gilhodes JC, Roll JP, Popov K, Charade O,
72. Gurfinkel V. Proprioceptive information
processing in weightlessness. Exp Brain Res
29. Horak FB, Nashner LM, Diener HC. Postural
1998; 122(4):393-402.
strategies associated with somatosensory and
vestibular loss. Exp Brain Res 1990; 82:167-77. 42. Lackner JR, Dizio P.Vestibular, proprioceptive,
and haptic contributions to spatial orientation.
30. Dietz V, Horstmann GA, Trippel M, Golhofer A.
Annu Rev Psychol. 2005;56:115-47.
Human postural reflexes and gravity: an under
water simulation. Neuroscie Lett 1989; 106:350-5. 43. Winter DA. ABC of balance during standing and
walking. Warterloo: Graphic Services, 1995.
31. Welgampola MS, Colebatch JG. Vestibulospinal
reflexes: quantitative effectes of sensory feedback 44. Lackner JR, DiZio P. Aspects of self-calibration .
and postural task. Exp Brain Res 2001; 139:345- Trends Cogn Sci 2000;4(7):279-88
53.
32. Balter SG, Stokroos RJ, van de Laar MM, Hendrice
N, Kingma H. Habituation to galvanic vestibular Recebido em: 18/08/2003
stimulation for analysis of susceptibility to Received in: 08/18/2003
carsickness. Acta Otolaryngol 2004;124(6):690-4.
Aprovado em: 18/08/2005
33. Koenderik JJ. Simultaneous order in nervous nets
Approved in: 08/18/2005
from a functional standpoint. Bio Cybern 1984;
50:35-41.

18 Fisioterapia em Movimento, Curitiba, v.19, n.2, p. 11-18, abr./jun., 2006

Você também pode gostar