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» 1980/1990- mais de 290 titulos

INTRODUCGAO Este livro esta dividido em quatro partes que pro- ‘curam dar conta de uma maneira bem geral do que seja 0 anarquismo, ou melhor, os anarquismos; uma vez que existem indmeras correntes distintas que formam o que se convencionou chamar de movimen to libertario. 0 primeiro capitulo, A ingénua lucidez, funciona ‘come uma introdugao ao tema. Alli estao historica mente apresentadas as correntes mais marcantes no seio_ do movimento anarquista: 0 Mutualismo, inspirado no que deixou escrito o francés Pierre- Joseph Proudhon no século passado; 0 Coletivismo Bakuninista, que como diz © nome foi propegandea do por Michail Bakunin; 0 Anarco-comunismo im- pulsionado por P. Kropotkin; o Anarco-sindicalisimo riado na Franga e desenvolvido posteriormente na Caio Tidio Vieira Costa Europa e nas Américas e, finalmente, o Individualis mo Anarquista que desembocou na violéncia de cu ho politico, © segundo capitulo, que tem por titulo Os ingo verndveis, apresenta um resumo da vida e da obra de alguns dos mais significativos e mais conhecidos lideres anarquistas: William Godwin, Max Stirner, Proudhon, Bakunin, Kropotkin, Leon Tolstoi, Errico Malatesta e Emma Goldman, esta altima in corporada ao livra por ter sido uma das primeiras mulheres que amou, escreveu e combateu em nome do anarquismo. No terceiro capitulo foi feito um pequeno histo: rico das aspiragdes internaciona istas dos I O capitulo comega com a historia da Associacao In ternacional dos Trabalhadores, mais conhecida como | Internacional, onde Karl Marx e Bakunin travaram duras batalhas pelo controle do movimento operério europeu na segunda metade do século passado. 0 ce: pitulo segue acompanhando todas as iniciativas anér- quicas na tentativa de criar um orgenismo revolu: cionério internacional. © quarto capitulo, A parte maldita, mostra e relata um pouco dos fatos do movimento anarquis ta onde ele foi mais forte e participante: Russia, Franca, Itélia e Espanha. Af pode-se encontrar 2 historia da repress ao anarquismo na Russia antes e depois da revolueso de outubro de 1917; (© desdobrar dos atentados de violéncia politica na Franga e na Itélia e uma simula do vigoroso O que €0 Anarguisme movimento libertério espanhol. No final, um peque to panorama do anarquismo nas Américas @ no Brasil Para este estudo segui criteriosamente os rotei ros tragados pelos estudiasos do anarquismo como, entre outros, James Joll, Daniel Guérin, Paul Avrich @ George Woodcock de cuja obra, Anarchism, reproduzo @ cronologia e subscrevo a maioria das opinides. A INGENUA LUCIDEZ Richard Wagner, além de combater nds barrica das de Dresden ao lado de Sakunin, compés uma peca grandiosa, “O Holandés Voador”, musica do cataclisma, apocaliptica; os metais vibram com uma intensidade extraordindria, 0 som arrebata os ‘uvidos, & quase o fim do mundo, ou 0 comeco, © ainda jovers idealista Michail Alexandrovich Bakunin a0 passar em 1849 por Dresden conheceu Wagner © apaixonou-se pelo “Holandés Voador”. Foi quando cruzou também com a musica de Bee thoven, prometendo, apés a revolucdo, quando nada mais restasse em pé, salvar a partitura da “No: na Sinfonia" em troca de sua vida, se fosse 0 caso, Esta paixdo de Bakunin pela misica grandiosa, pelo espectro do caos, da destruigo, onde as ima: | gens se confundem e reviram céus e terra engolin Pec cece es O que 0 Anarquismo n | do a vida, a natureza e os homens, estendeu'se por toda a sua existéncia. Nao foi gratuitamente que ele mesmo sentenciou a criatividade do caos, pois a paixdo pela destruiggo — em seu proprio dizer — também é uma paixdo criadora. No sentido comum, a anarquia sempre foi 0 caos, a desordem, A palavra transformou-se em sindni: mo de bagunca e os cronistas e historiadores de hoje jamais lograram repor o significado veraz de um pasado glorioso ©, no minimo, construtivo, Por paradoxal que pareca, anarquia nao é bagunca, muito menos ordem. Mas ndo com apenas uma pequena dose de purgante que se limpam quase dois séculos de distoredes acumuladas na cabeca dos homens @ alimentadas dia a dia. Também, no hé divida, foram os proprios anarquistas a colaboyer para a’ imagem que se faz deles; como nunca quise ram tomar 0 poder, é Sbvio que jamais iriam fazer dde suas representacdes as imagens oficiais na mente dos homens. Os anarquistas, se é que se pode encontrar algo de comum entre eles, tém em mira apenas o indivi- ‘duo, sem representantes, sem delegacées, produtor, | naturalmente em sociedade, Positivamente, eles pre- conizam uma nova sociedade e indica alguns meios para isto. Como em todas as revolugdes, diria Camus, a fi berdade esté no seu principio. A justia também, inimaginavel sem a liberdade, Mas chega 0 momento do terror, da violéncia, do assassinio; € a justiga 2 Caio Tito Vieira Costa 0 que 60 Anarquism cobrando e exigindo a suspensio da liberdade. © paradoxo deixa a pergunta da inevitabilidade da revolugéo e expulsa do rosto dos revolucionérios © ar de felicidade, Quase todos 0s anarquistas pro- curaram a revolugdo, alguns foram violentos, outros simplesmente apoiaram a violéncia. Do anarquismo cristo de Leon Tolstoi — passan do pelas bombas de Ravachol em Paris do fim do sé culo, as comunidades libertérias espanholas, os Kibutz israelitas de antes de 1948 — aos Indios Metropolitanos na Itélia, que surgiram das ruas ar- mados de arco e flexa aos gritos de “estais atentos, 16S somos os verdadeiros delinquentes”, esto pre sentes os principios que 0 anarquistas plantaram no século pasado. E como tudo que vive, nao existe somente um anarquismo, abstrato ¢ detinido, con’ ceitualmente manejével concretamente percep- tivel. Existem varios anarquismos. A tentativa é detecté-los historicamente para compreendé-los um pouco antes que nos obriguem a esquecé-los. A idéia de caos na sociedade esta bem distante do que um dia pensou Talstoi, Godwin, Thoreau ou Kropotkin. A palavra anarchas, em grego, pode ser usada para definir desordem na falta de um governo, ou quando nao existe a necessidade dele. Portanto, anarquia etimologicamente quer dizer sem governo, sem autoridade, sem superiores. Somente. (Os franceses tiveram a honra de usar a palavra pe: jorativamente pela primeira vez. Durante a Revolu 0 Francesa, 0s girondinos usaram-na para injuriar seus adversdrios da esquerda, Brissot xingava os En: ragés de anarquistas. Robespierre foi vitima da mes ma pecha. Coube a Pierre Joseph Proudhon a recu peracdo e cunhagem do termo anos depois, ao rei | vindiear para si o titulo de anarquista, usando-o de maneira positiva e aproveitando a ambiglidade dda palavra original grega, Sébastien Faure, outro te6: Fico anarquista, diria depois: “quem negue a autori dade e a combata ¢ um anarquista’”. Woodcock, fem 1960, completou a definicdo relativizando-a’ “todo anarquista nega @ autoridade, muitos a com- batem’’ E a idéia do caos continua distante. Oferecendo um exemplo mais proximo, numa vo! ta a historia com alhos mais complacentes, Noam Chomsky lembra, numa entrevista, que os anarquis- tas sempre se referiram favoravelmente ao ideal da democracia jeffersoniana {Thomas Jefferson, pre sidente dos EUA de 1801 a 1809), para o qual o me- hor governo 6 © que governa menos. Chomsky adi ciona ainda a observaggo de Henry David Thoreau para quem © melhor gaverno & 0 que nao governa em absolute. As forcas sociais que erigiram o que hoje se chama de século XIX encontraram pela frente duras bata- Ihas. Foram tempos de coroacao do capitalismo, da consolidaco da burguesia, ‘mas foram tempos também de uma critica social violenta, de ensaios revoluciondrios como o da Franca em 1848 ou mes mo 0 da Comuna de Paris, entre milhares de exem: plos; de produgao filoséfica constante e critica, 14 Caio Titio Vieira Costa O gue bv Anarquisons CC (econ ree ae er eciai pelo homem, de questionamentos. {edo seguramente com a aparigdo, no cenério poli tico, de Bakunin, um russo curioso e instigante Antes dele os historiedares detectam outros perso: hagens. fora do contexto conturbado da luta pol tica, das barricadas, das reunides.internacionais, das greves e das fugas espetaculosas. William Godwin, Thoreau ou Max Stirner, por exemplo, desenvolve- ram seus projetos 2 parte do movimento dito anar auista, frutos apenas do espirito do tempo. Os anarquistas sempre estiveram de acordo em relagio a0 fim Ultimo de seus propésitos, divergin do apenas quanto tética mais convincente para consequi-lo. Os partidérios de Tolstoi, prdximos a0 que se pode chamar de anarquismo eristéo, nao admi- tiem @ violéncia em nenhuma circunstancia. © in alés William Godwin esperava determinar mudancas mediante discussées. Proudhon e seus partidérios propugnavem a mudanca social através. da_proli feragdo das organizages cooperativas. Kropotkin aceiteva a violéncia, mas a contragosto © somente Porque a considerava inevitével na revolugio e esta por sua ver inevitével na etapa do progresso huma no. Bakunin em vérios momentos teve divides, mas combateu em barricades e exaltou 0 caréter sanguindrio da insurreigéo camponesa. Contrito, chegou a dizer que as revolugdes cruéis s#0 neces sérias, Unica e exclusivamente por causa da estupt ddez humana; mas @ erueldade seria sempre um mal, aes tum mal monstruoso e um grande desastre i aig Tito Vieira Costa ee een eae Sige are ae | Exfeatem que 0 hamem seja bom por natures, sy Sees a ite arena ae on Cae ar Se Sieg oe acura | Sears Sr leimmncncnntens i cue te ae ieee erro fen amen gts ean | Sieg ocipeictas Sa | Sesion Se ic "caste case stern ovens eat soi teareias | Sections Cre Ss reat atin ae | mente as tendéncias essenciais e desemberacar 0 Caminho para um melhor e mais répido desenvol } vimento. 10 dio visceral de todos os anarquistas @ contra este teviatd da sociedade moderna, este organismo imenso e todo-poderaso, a sintese da autoridade ¢ da centralizacao, a espada de Damocles que, pendi Ga sobre a cabega de cada cidadao, foi paulatinamen- 0 queen Anarguisme te conquistando 0 poder politico, ecandmic Ciats0 Estado, Todos o fulminam corm invectivas e Adjetivos, Considerarmno seu inimigo. Bakunin en laca 0 coneeito de Estado com 0 de Deus e os pro: clam principais adversirios da liberdade humana Proudhon ago cansa de repetir que 0 governo do hhomem pelo homem a servidio e define dramatica mente o que é ser governado: "é ser quardado a rents o ave ardado a vis f,nspetonado,espionado, dingo, epsiado, re gblomentado,poraieade, endoutrinad, predic conta, calculads, aprecinde, consrado, omandado, por sores que nao tém nem o titulo, nem a ciéncia, nem a virtude (..). Ser governado é ser, a cada operagio, a cada transagio, a cada movi mento, nota, regstrade, recenseado, taritado, se ad, medio, cota, avatad,patentendo ene dio, avtorizedo, ratulado, admoestado, impedico, reformado, reenviado, corrigido. €, sob o pretexto da utilidade piblica © em nome do interesse gera sersubmetido @ contibutgEo, tiizado, resgatado, plorado, monopotizado, extorquide, pressionado, mistificado, roubado; e depois, @ menor resistencia, @ primeira palavra de queixa, reprimido, multad 7 , fo, muitado, vi lpeniado, vexodo,acssdo, malvatdo,espece fo, desarmado, garroteado, aprisionado, fuzilado, metralhado, julgado, condenada, deportado, sacriti- cado, vendo, ido e, no méxime ga, sed, ularizado, ultrajado, desonrado. Eis 0 governo, eis a sua justica, eis a sua moral! {...) Oh! persona. lidade humana! Como foi possivel deixares-te afun ” 1% Caio Taio Vieira Costa dar, durante sessenta séculos, nesta abjecéo?” Proudhon esqueceuse de acrescentar: torturado, Também pudera, esta atribuigdo 0 Estado sofisti cou apenas neste século, Para Stimer, todo Estado € uma tirania, Para Bakunin, é uma abstragdo de voradora da vide popular, um imenso cemitério, Para Malatesta, 0 governo rouba, destr6i e paralise pelos seus métodos de aco. E os anarquistas ndo fizeram mals, até hoje, do que combater 0 Estado, 0 governo, a autoridade. Certo, todos hdo de convir, jamais se encontraré 1a historia do anarquismo, sé olhada desde o panto de vista oficial, uma vitéria duradoura. A observagio de Susan Sontag, ensafsta norte-americana, acerca das revolugdes nos paises capitalistas do ocidente encaixa'se Como uma luva para 2s revolucdes que os libertérios impulsionaram: parecem quase sempre ser expressamente planejadas para nunca triunfar. As comunidades falharam @ continuam falhando, as barricadas no vingaram ¢ 0 proprio internacio: nnalismo nunca encontrou um organismo a altura das aspiraces dos que o planejaram, a revolugao es panhola de 1936 (quando 2 Confederagdo Na ional do Trabalho — CNT contava com nada menos do que 1 milhdo de militantes anarco-sindicalistas) {oi pisoteada e sufocada por Francisco Franco em 1939 com o apoio dos nazi-fascistas, Anarquismo, grosso modo, talvez possa signifi car também comunidades federadas © autonomas, L Por isto os anarquistas criticaram em primeiro lu oO. . ype 6 Anarquismes gar a democracia burguesa que criou e garantiv a existéncia permanente de uma aristocracia gover- namental, nunca deixaram de denunciar 0 sufragio Universal, apesar de Proudhon ter sido eleito depu: tado @ Assembléia Francesa em junho de 1848, Rejeitaram categoricamente a participacio poli tica © boicotaram as urnas. Afirmaram fundamen talmente, € aqui vai uma conceituagao-chave para entendé-los, que 2 prioridade na luta de classes estaria no campo econdmico e nao rejeitaram a poli- tica_mas sim a politica burguesa. Profetizaram o fracasso do comunismo de Estado ¢ denunciaram (0 autoritarismo presente em Marx quando 0 comba- teram dentro da sua orgenizagao, a | Internacio: ral, ¢ levaram a melhor. Antologica a observacdo de Kropotkin, na Russia, em outubro de 1917, quando os boicheviques pu blicaram os primeiros decretos tornando oficial 0 que jd era fato consumado, a expropriagso das ter ras e das industrias, criticando a usurpacdo pelo Es: tado do que ja era conquista das massas trabalhado ras: “Eles estdo sepultando a revolug3o”, Pode-se argumentar que outra atitude nao seria possivel 08 bolcheviques no momento. Mas tanto Kro: potkin como os outros anarquistas foram até a mor te contrarios 4 tomada do poder, & tomada do Es tado. Em carta a Lenin tés anos depois, Kro potkin deixaria novamente transparecer seus receios pela sorte da revalucao russa e temia que a palavra socialismo se transformasse num andtema por forga (Caio Taio Vieira Costa @ obra do governo sovittico. Cada comunidade, cada ind{viduo, para os anar uistas, deve determinar sua vida. As minorias tém todo 0 direito de discordar e fazer diferente- mente, 0 homem precisa ser livre. Ingenuidade? Talvez. Nao hd como negar este componente em to das as formulagdes dcratas (acracia significa, em gre go, sem govern; é sindnimo de anarquia). Cada anarquista lutou a seu modo, agindo direta mente. Mais uma pedra de toque do anarquismo: 8 agdo direta, Isto quer dizer simplesmente aceitar a responsabilidade com todas as consequéncias, sem delegéla 2 um terceiro. Isto foi definido recente mente por um teérico simpatizante, Rudolf De Jong. A aco direta é um conceito de maturidade Frente 2 um conceito de infentilismo, pelo qual © homem desiste de suas cesponsabilidsdes e as delega a outros, a seus representantes, abstendo-se de fazer e pensar por sua conta e risco. Fazer 0 que tem de fazer ele mesmo, nunca como um indivi duo solitério, mas como um participante consciente em uma unidade social. Abaixo 0 Estado, os depu tados, 0 prefeitos, 0 partido, 2 autoridade. Acdo ‘em casa, na fabrica, no escritério, na terra, no amor, nna vida. Em suma: no delegar responsabilidades, autogerirse a partir de certas organizacdes que esto dads. Desde 0s primeiros tempos da Internacional dos Trabalhadores os anarquistas aficmam que todos jé esto organizados desde cima pelos senhores, pelos que é 0 Anarquismo a capitalistas, pelo Estado, pelos burocratas, enfim, Os homens, os trabalhadores esto unidos e reunidos na empresa, nos bairros, no trabalho. A luta propos 1a é no sentido de que o trabalhador subverta esta relago_organizando ele mesmo a sua vida, as suas cocupacies, a sua organizagdo dentro de sua empresa e de sua comunidade Na comunidade ou fora dela alquém 36 pode ser livre se 0s outros também o forem, ensinou Baku: rnin nun momento caloroso de seu histérico debate dentro do movimento internacional dos trabalha dores, Convidados a participar da Associaeo Inter- nacional dos Trabalhadores, os membros da Liga da Paz e da Liberdade, da qual Bakunin foi parte ativa e influente, realizaram um congresso em Ber- nna, na Sulga, ao ano de 1868. Ocasido muito prop cla para Bakunin definirse politicamente frente a Karl Marx — uma das figuras mais notérias da In- ternacional. Seu discurso foi particularmente interes: sante: “Detesto a comunhio, porque é a negago da liberdade e porque no concebo a humanidade sem liberdade. Nao sou comunista, porque 0 comu: ismo concentra e engole, em beneficio do Estado, todas as forcas da sociedade; porque conduz inevi tavelmente & concentracio da propriedade nas mos do Estado, enquanto eu proponho a abolicao do Estado, @ extingdo definitiva do principio mesmo da autoridade e tutela, proprios do Estado, 0 qual, com 0 pretexto de moralizar e civilizar os homens, conseguiu até agora somente escravizé-los, perse- 2 Caio Tilo Vieira Costa gui-los e corrompé-los. Quer que a sociedade @ a propriedade coletiva ou social estejam organizadas de baixo para cima por meio da livre associago e nao de cima para baixo mediante a autoridade, seja de que classe for. Proponho a aboligao do Es: tado, proponho ao mesmo tempo a abolicgo da pro: priedade pessoal recebida em heranca, a qual nao @ Sendo uma instituigdo do Estado, uma conseqiién: cia direta dos principios do Estado. Eis af senhores or que eu sou coletivista e ndo comunista”” Logo depois, dentro da internacional, seguiu-se uma violenta disputa entre os bakuninistas e os au: toritérios (este era o apelido dos partidérios de Marx), tendo como fulcro esta questéo da heranga Marx, apesar de ter teorizado brilhantemente sobre © capitalismo e detectar-Ihe a maiswvalia produtora do lucro, a exploragdo desenfreada e até a perpe tuacio do modelo através da sucesso e ter deixado todo um _compacto corpo doutrinério, um tijolo de erudi¢go, foi contra Bakunin na questdo da he: ranga, Mas isto € outra historia, uma velha rixa na qual Marx langou mao de mecanismos pouco reco- mendaveis contra seus adversérios, principalmente Bakunin, como se vera adiante. Os fundamentos do coletivismo bakuniniano es ‘to neste discurso. A revolugao seria feita pela acdo espontanea e continua das ‘massas. Os coletivistas eram favordveis as vastas organizagdes operdrias que seriam guiadas por elites de anarquistas convictos, a vanguarda consciente, ndo 0 chefe do povo, ape: O queer tn nas @ parteira que auxiliaria a autolibertago, Sob © coletivismo anarquista cada membro das coope- rativas operdrias estaria obrigado a realizar um tra balho manual e receberia uma retribuicgo propor- ional a sua contribuiedo direta ao trabalho. Poderia desenvolver qualquer atividade intelectual. Trocando fem mitidos, 0 critério da distribuigao basear-se-ia no trabalho e no na necessidade, © Estado seria substitu(do por uma federagao livre de associagbes auténomas que destrutariam de liberdade de separa coe garantiriam uma total liberdade pessoal Anteriormente a Bakunin desenvolveu-se na Fran. ca e por inspiracdo direta dos Ultimos escritos de Proudhon 9 Mutualismo. Foi a doutrina que deu 0 tom nos primeiros tempos da Internacional e era confundida facilmente com aquilo que nossas avés chamam de reformismo, Ao contrario da maioria dos grupos anarquistas, os mutualistas ndo se abs- tinham de votar nos pleitos eleitorais. Seus lide: tes mais notéveis foram Henry Tolain e Charles Limousin, Tiveram muita influéncia nas organiza cBes de orientacdo cooperativa e 0 movimento ere de carater naorpolitico. Seu principal drgio_ de idéias foi 0 La Tribune Ouvriére techado em 1865, Eram conhecides pelo seu ferrenho anticlerica lismo e contrérios a qualquer atividade clandestina [esta muito a0 gosto de Bakunin, que fundou vé rias organizagGes to secretas que de muitas nem seus discipulos mais fieis ouviram falar). Atuaram ‘nas associages operdrias e propuseram um banco Caio Tilo Vieira Costa ‘comum de crédito gratuito. Apés a segunda meade do século perderam sua fora para os coletivistas © posteriormente para 0 comunismo-andrquico & anarco-sindicalismo. © comunismo-andrquico ¢ de inspiragSo. kro: potkiniana, Na Espanha os anarco-comunistas sustentaram durante anos 2 necessidade de orga nizagdo de grupos formados somente de propagan distas ativos da causa libertaria, Kropatkin conside- rava 0 comunismo-andrquico como uma verdadeira antitese do sistema de salérios em todos os seus as Pectos. Nenhum centro de poder poderia obrigar inguém a trabalhar. Substituiu o principio da re- muneracao salarial pelo principio das necessidades: cada pessoa seria 0 juiz de suas préprias exigéncias, tomando dos armazéns comuns tudo que conside- rasse necessirio, contribuindo ou nao com sua parte no trabalho. Este que foi considerado 0 generoso otimismo de Kropotkin levou-o a estabelecer que, uma vez eliminados 0 poder politica e a explora. $80 econémica, todos 0s homens trabalhariam vo- luntariamente, ‘sem nenhum tipo de obrigaco e nao pegariam dos armazéns comunais nada mais do que 0 necessério para uma existéncia confortével. © anarquismo individualista tem suas bases nos escritos de Max Stirner (considerado por Nietzsche um dos espiritos mais férteis de seu tempo), para quem 0 ideal é 0 egoista: o homem que se realiza 2 si mesmo em conflito com a coletividade e com 08 outros individuos, que ndo foge do uso de ne: O que 6.0 Anarquismo hum meio na luta de qualquer um contra todos, que desapiedadamente avalia qualquer coisa do pon’ to de vista do seu bem e que, tendo proclamado a sua soberania, pode formar com autras individuos ‘que pensam como ele uma “unidio de egoistas”, sem normas nem regras, para providenciar as ques. tes de interesse comum, Max Stirner publicou O unico e sua propriedade em 1843. Seus herdeiros politicos (muitos historiadores acrescentam ao. individualismo anarquista a influéncia de Sergei Nechaev, como se verd no préximo capitulo} procu: raram destruir totalmente os valores aceitos pela so- ciedade burquesa: politicos, morais e culturais. Exi giam a libertacdo total da pessoa humana dos elos da sociedade organizada. Baseavam-se na convicgo de que a liberacdo, antes de ser coletiva e material, tinha de ser individual e mental, Esta purificacgo, como observa De Jong, pode-se buscar atualmente por meios pacificos (o vegetarianismo, o esperanto, © naturalismo, 0 espiritismo, 2 ioga, as tendéncias orientalistas) ou por meios violentos, como no fi nal do século passado: atentados e sacrificios pes soais, a prova definitiva da pureza revoluciondria ou de desespero. Quanto ao terror moderno, nao se pode dizer que seja de inspiragao anarquista ou que tenha tracos stirnerianos, As Brigadas Verme: thas ou Baader Meinhof, por exemplo, funddm-se num modelo militarista e centralizado e apesar da semelhanga com 0s atentados praticadas a0 grito de Viva a Anarquia! do século passado e comeco as g Caio Titio Vieira Costa deste no ha nada que possa afirmar categorica- mente sua vincula¢o explicita com os ideais liber: trios detendidos pelos anarquistas. Neste século, enquanto 0 anarquismo individue lista conformou-se com uma radical critica tedri- ‘ca da sociedade burguesa ou levou a acdo individual (tanto a terroriste do inicio de 1900 quanto 2 intimista), 0s outros anarquismos, comunitarios, coletivistas, comunistas etc., desembocaram no anarce-sindicalismo, a expresséo mais forte © mas siva que encontrou 0 anarquismo em eral Para os anarcosindicalistas a greve geral seria ‘9 supremo instrumento estratégico revolucionario, Concebiam a sociedade formada de produtores de um lado e parasitas do outro. O sindicato unia estes produtores com uma Gnica finalidade: a luta, © anarco-sindicalismo apareceu depois da organi zagdo, na Franca, dos syndicats, a versio francesa do trade-unionismo ingles. Imbufdos do fervor anarquista a maioria dos sin dicatos franceses tomou, no final do século pasado no comego deste, posicdes hostis frente ao Estado e foi contréria a tomada do poder politico. Incli nou-se para uma revolugo social que destruiria © sistema capitalista e inauguraria uma sociedade sem Estado, cuja economia seria dirigida por uma confederagao geral de sindicatos. Posteriormente, na Espanha, o anarco-sindicalis: mo desenvolveu'se e criou a CNT, a maior oF ganizagao anarquista que 0 mundo jé conheceu. ~ O que co Anarguione No comege do século, com a constante imigrago para a América, 0 anarquismo chegaria robusto na Argentina, no México, nos Estados Unidos e até no Brasil, através principalmente dos italianos e es panhéis. Malatesta e Buenaventura Durruti, para citar somente um italiano e um espanhol, estive ram na América do Sul e criaram varias organiza Bes Scratas, No Brasil é famosa sobretudo a greve geral de 1917, organizada e comandada pelos mi litantes andrquicos aqui radicados, muitos dos quais depois perseguidos pela repressdo do Estado e pe lo stalinismo, que literalmente tentou arrasar com 0 anarquismo @m todo o planeta — tendo-o fogrado ‘completamente na URSS. Numa conversa entre Lenin e Krapotkin perce bese facilmente a dureza de um ¢ a fragilidade de outro, sintetizando'se assim uma briga de quase cinguenta anos entre os autoritérios e os liberté Flos que combateram juntos pela mesma causa’ © socialismo, Logo apés a revolucdo de outubro, um emigo comum promoveu um encontro entre Lenin e 0 jd velho Kropotkin. Este chamou a aten: G0 do lider bolchevique para a proibicdo das co: ‘operativas. O caso concreto era a perseguicgo de alguns cooperados em Dimitrov, uma pequena ci dade russa, pelos bolcheviques. Lenin concordou que havia cometido e cometeria muitos erros, mas disse também que a revolugéo nao poderia ser feita de outra maneira @ no iria permitir estas coope- rativas, perguntando a Kropotkin se ele acreditava Fo Caio Tito Vieira Costa frente ao movimento cooperativista. Levantando-se energicamente da cadeira, seus olhos flamajaram a0 sentenciar categoricamente que estas pequenas co: operativas, esses “grupinhos de trabalhadores sem poder algum"” acabariam esmagados e transfor mados sem piedade em servidores do capital, O ve. Iho Kropotkin no retrucou e acreditou na boa von tade de Vladimir llich. Este o elogiou e falou da necessidade de publicar os wrés volumes da obra de Kropotkin sobre a Revolugio Francesa. Kropotkin ‘concordou mas, altivamente, disse que nao con cordaria com uma edic&o estatal. Lenin sorriu e mudou de assunto. Uma das iiltimes manifestacdes de massa que | 0s anarquistes russos conseguiram realizar depois | da revolugio foi durante 0 enterro de Kropotkin. | Desapareceram todos depois, alguns assassinados | nas prisées bolcheviques, outros doentes e desam pparados. Poucos consequiram sobreviver no exilio, | longe da primeira patria do socialismo, Nao se pode negar que a0 combater © autori- tarismo e todas as formas de poder os anarquis- tas tocaram 0 cerne do problema da modernidade. ‘A ingenuidade das teorizac®es e a fraqueza da dou trina que nunca se apresentou coma um corpo sis- temético completo e acabado é da génese do pré- prio anarquismo. O Estado, a autoridade que se so: brepde 20 individuo e 0 transforma num verme, num réptil submisso, eresceu @ tomou forma tanto | 0 que 60 Anarquismo = no capitalismo come no proprio socialismo, Pode-se argumentar, concordando com um im portante jornalista brasileiro, que sem 3 URSS o mundo hoje talvez estivesse muito pior. Outro jor nnalista, também brasileiro, Paulo Francis, defini isto numa imagem particularmente feliz: a Unigo Soviética é um breque que os EUA convertam o mundo numa gigantesca Cingapura ou implantem um Pinochet em cada lingua ou nag, Mas deve se arqumentar também que sem os anar: quistas singelos e aventureiros Marx no teria pre conizado o fim do Estado apés a ditadura do pro letariado e a aboliego das classes sociais. O Estado ainda nfo foi abolido em parte alguma, as classes sociais, na URSS, “acabaram” por um decreto de Stalin, mas a autoridade continua, E 0 anarquismo, esta peradoxal mescla de positi vismo com idealismo, néo conseguiu jamais formar lum organismo aglutinador e impulsionador de seus objetivos; apesar de seus esforgos néo logrow sequer abalar as estruturas do solid Estado moderno. Eis seu fracasso e seu fascinio, OS INGOVERNAVEIS Em 20 de novembro de 1977 matou'se aos 63 anos Luis Mercier Vega, ou Santiago Parene, ou Charies Ridel. Dedicou toda sua existéncia a pesqui sa histérica do anarquismo, o qual, para ele, sur gia da vontade de conhecer-se @ conhecer a socie: dade em que se vive para, com os outros, chegar a ser dono de seu proprio destino; para que a socieda: de seja uma comunidade livre e fraterna de seres livres, Dizia que 0 anarquismo nao é uma repeticac uma autojustificaggo, uma ideologia, mas uma pergunta, uma inquietacgo, uma curiosidade, Que 0 anarquismo nao sdo as querelas de grupos e orga: nizagées em torno da verdade ou da linha correta, nas uma atene3o permanente aos probiemas sociais, &s manifestagdes de rebeldia, 20s mecanismos de poder e as resisténcias aos mesmas. O que éo Anarquisno Num de seus uitimos artigos citou uma frase de Emile Henry: “Uma vontade que chega até ao sui cidio pode engendrar afetos definitivos @ sem es peranca". Morreu de lucidez, disseram os amigos. Boa parte da producdo dos teéricos e militantes anarquistas revelam esta atengo permanente aos problemas sociais, uma desconsolada e paradoxal desesperanca, uma busca incessante de mecanismos de resisténcia a0 poder em todos os seus matizes, Nao seria arriscado concordar com Gearge Wood cock quando afirma a procura que os anarquistas empreenderam de um equilibrio entre a necessidade de uma geral solidariedade humana e os direitos do individuo livre. Os fundamentos desta busca po dem ser encontrados no que alguns pensadores liga dos ~ uns diretamente, outros fraternalmente — 20 movimento anarquista deixaram eset na pratica, William Godwin (1756 — 1836) nunca se definiu como um anarquista, mas sem divida exerceu notdvel infludneia entre os militantes Acratas do sé: culo XIX, Proudhon e Bakunin pauco ouviram falar dele, mas Kropotkin leu a sua obra mais conhecida. Godwin via a sociedade como um fendmeno que se desonvolve naturalmente. Filiou'se 4 tradi¢ao ilu minista quando deu 3 educagdo 2 funedo de verda deira chave da liberdade. Repeliu de fata todo sis tema social dependente de um governo. Formulou uma sociedade simplificada e descentralizada, com umn minimo decrescente de autoridade. Negou a va ou fizeram a 2 Caio Tilo Vieira Costa lidade de todos os governos e afirmou que © homem moral no teria nada a repartir com 0 Estado. No pice de seus projetos socials esbocou uma rede de pardquias independentes (comunidades) sem nin guém a governé-las, como estrutura ideal de base | para uma sociedade libertaria. Sobre sua cabeca, infelizmente, pairou o Estado inglés. Godwin teorizou sobre ele e recomendou que © aceitassem como um mal necessario. ..na medida m/nima indispensdvel e observassern atenta: mente que, em conseqiiéneia da gradual ilumina: ao da mente humana, aquele mfnimo poderia ser futuramente reduzido. Os historiadores déo-no como um filésofo politico, um intérprete fiel dos enciclopedistas franceses e autor da prifneira e mais completa exposicgo dos principios anarquistas em Political justice. Permaneceu descanhecido fora da Inglaterra pelo menos até que Stirner desenvolvesse suas idéias. ‘Max Stirner (1806 — 1866) era alemio; seu verdadeiro nome foi Johann Caspar Schmidt. Re- cebeu dos historiadores 0 eplteto de “O Egoista’ Muitos aspectos de sua obra ainda continuam obs: curas © carecem de um estudo mais profundo & sistemético. Escreveu entre 1840 e 1850 0 livro que deu as bases ao individualismo anarquista do sécu- lo XIX. Negou todo o absoluto e todas as insti tuigdes baseando-se unicamente na incondicional soberania do individuo humano. Negou todas as leis naturais e uma humanidade comum. O que é0 Anarquismo Se para Godwin o principio supremo era a Razio, para Stirner era a Vontade e os Instintos. Foi radicalmente contra a realidade dos conceitos abs- tratos e generalizantes como Homem e Humanidade. Para ele 0 individuo humano era a Unica coisa de que se podia ter um conhecimento seguro e cada individuo era Gnico. Aconselhou cada pessoa que cultivasse essa singularidade, sua unicidade. eu seria a Unica lei, Nao existiriam direitos, somente © eu em luta contra o resto da humanidade do mundo. A dnica regra de conduta para o individuo realizar-se a si mesmo seria sua necessidade, seus desejos. A liberdade para Stirner esteve em segundo plano em respeito a singularidade e originalidade do indi- viduo. Escreveu em 0 unico e a sua propriedade: “Ser livre é uma coisa que nao posso verdadeiramen: te querer, porque a liberdade ndo posso fazt-la, No poso crié-la; posso somente desejé-la, aspirar ‘a esta que permanece um ideal, um fantasma. A cada momento a realidade escava sulcos profundos na minha carne. Mas eu permaneco”” Propés formalmente a destrui¢&o da sociedade humana para transformé-la numa propriedade formar em seu lugar uma Unido dos Egofstas. Sem Estado de qualquer espécie, claro, pois este se ‘2 negagdio da vontade individual. Nao concebeu este mundo da nova ordem egofstica como 0 reino da rapinagem universal e do perpétuo massacre. Nunca. O individuo nao deveria, em hipétese 34 Caio Vio Vieira Coma nenhuma, exercitar seu poder sobre 0 outro. Além disso, como Gnico, ninguém teria nada em comum com 0 outro. Partidos ndo existiriam. Cada indivi duo teria liberdade para unirse a alguém e livre mente separar-se. Detalhes sobre a forma de organizagdo social dos egoistas Stimer ndo deixou. Mas afirmou que este tal mundo ndo poderia realizar'se sem luta. Enquanto existisse 0 Estado, o egoista deveria combaté:lo com tudo o que tivesse 2 mao, com to: dos os meios disponiveis. Para os historiadores Stirner antecipa a idéia da insurreiggo espontanea das _massas, desenvolvida depois pelos anarquistas. Como Albert Camus ele negou @ revolugdo e exaltou a rebeligo. Fol um su ‘eessa escandalosa. Influenciou militantes politicos, escritores e artistas. O século XIX, sem divida, seria outro sem ele, Pierre-Joseph Proudhon (1809 — 1865) é mais conhecido hoje pelo que Marx disse dele do que realmente pelo que escreveu e fez. Qualquer mi tante liberal ou de esquerda com certeza leu ou tem na estante A miséria da filosofia mas no leu nem tem na estante 0 Sistema das contradie¢des econémi cas ou Filosofia da Miséria de Proudhon. Este mes mo militante jamais imaginou que o ataque que Marx dirigiu a Proudhon tivesse sido extremamente pessoal e carecesse de uma fundamentacdo filos6- fica maior (0 que sem duivida Marx poderia ter feito, pois sobravam-the méritos, conhecimento e talento. Oaue ey Anarquismo para isto). Os dois foram o que se pode chamar de conheci dos cuja amizade terminou em 1847 com a publi cago da Miséria de Marx. Proudhon sequer se aba ou com as criticas, escrevendo nas paginas do seu exemplar que na verdade Marx estava enciumado. Mas isto no vem ao caso e sim 0 que aprontou aquele tipograto francés de origem plebéia que em fevereiro de 1848 lancou o primeiro jornal anarquis: ta de publicagio periddica regular, o Le Repre sentant du Peuple, Stirner tornou-se conhecido como o individualis: ta ego(sta. Proudhon também foi um individualist mas seus comentadores taxam-no de individualista social. Homem dos paradoxes, também ¢ conhecido como um aficionado do pensamento antindmico. ‘Ao mesmo tempo em que definiu 0 pove camo um ser coletivo, intalivel e divino, execrou-o como Plebe ignorante. Stimer considerou o individuo Tudo a sociedade sua inimiga Para Proudhon 0 individuo seria justamente ponto de partida ea meta dltima dos esforcos huma- nos. A sociedade representaria a matriz na qual @ personalidade de cada homem deveria encontrar @ sua funglo e realizaco. O homem néo poderia viver 86, na natureza nenhum ser era isolado. Nova- mente ~ e isto parece ser uma obsessio entre os anarquistas — Proudhon viu a tiberdade individual profundamente radicada no processo natural de de- senvolvimento da sociedade humana, 3 Calo Titio Vieira Costa Odiou 0 Estado € as fronteiras 20 mesmo tempo fem que professou conviceées nacionalistas e um regionalismo apaixonado. ‘A justica obsedoulhe a mente, foi seu tema pre: dileto € a0 qual se entregou ardosamente. O igua- litarismo — a teoria de que 0 actimuto da proprie- dade 6 um mal — e 0 senso de uma justica natural € imanente so elementos essenciais no pensamento proudhoniano. Nao foi sem razo que uma frase sua tornou-se slogan dos libertéris do mundo inteiro: “A pro: priedade é um furto”. Esta, a propriedade, no pas seria da soma do abuso do roubo. Incompativel com a justia pois determinaria a exclusio da maio: ria dos produtores a uma justa parte do produto do trabalho comum. Para o libertario francés 0 comunismo negava @ independéncia. A propriedade destruie a igual dade. Somente na anarquia ou liberdade os indivl duos poderiem encontrar uma sintese que elimina ria a deficiéncia de todos 0s outros sistemas socials. Proudhon esbocou uma sociedade onde poderiam florescer juntos a iqualdade, a justica, @ indepen: déncia e 0 reconhecimento dos méritos individuais ‘em um mundo de produtores unidos por um sistema de livres contatos. Foi 0 chamado Mutualismo de senvolvido e propagado pelos seus discipulos Seu primeiro livro O que € a propriedade?, publi cado em 1840, trouxe embrionariamente todos os elementos das Sucessivas doutrinas libertérias. Prou: 0 que» Anarquisms hon acabara de sair da pequena Besancon para a industrializada Lyon, 0 que ampliou sua visd0 dos problemas de seu tempo. Mas no foi ali, ainda, que previu a revolucao violenta. Teorizou acerca da transformacdo social mediante uma agdo econd: ‘mica ou industrial em contrapartida a idéia marxis. ta de ago politica, Deus também seria um mal, esgrimiu Proudhon, Na convidativa Paris de 1848 foi as barricadas, participou do assalto a Tuelleries, entregando-se de coracdo 2 insurreiggo — sonho, combate, festa 1 decepedo de tantos revoluciondrios. ‘Apés seu fracasso disse ter sido uma revoluggo sem idéla, pois a vitoria viria mais da debilidade dda monarquia que da forca da revolugdo. Em junho de 1848 com o apoio de 37 mil eler tores (o poeta Charles Baudelaire foi um deles) Proudhon clegeuse a Assembiia Constituinte francesa. Usou a tribuna para denunciar a pro- priedade, Cavaignac fechou seu jornal, Proudhon fundou outro, 0 Le Peuple. Atacou Luis Bonapar- te, foi julgado e condenado; fugiu e no regresso 2 Paris ficou preso durante 3 anos, amargados na imi: da Conciergerie de onde Maria Antonieta safra para a guilhotina. Livre da cadeia foi ajudado por um exi: lado russo, importante por suas idéias progressistas, amigo de Bakunin e de quase todos 08 revoluciond: rios do século passado, Alexandr Herzen. Proudhon publicou ainda dois jornais: La vorx du Peuple e Le Peuple. 3 38 Caio Tilo Vieira Costa Em seu livro L‘idée générale de la revolution pode'se encontrar algumas de suas idéias centrais. Um dos pontos mais importantes nesse livro é © fato de o remédio aos males sociais no estar no nivel politico. As origens desses males estariam na raiz econdmica da sociedade. Nem seus herdeiros mais chegados se convenceram depois de que a solu. G80 poderia ser tao simples; um mero acordo con- tratual como sugeriu Proudhon num de seus momen- tos mais otimistas. Publicou ainda varios escritos, Em seu Gltimo livro De /a capacité politique des classes ouvriéres afirmou que 0 proletariado deveria emancipar-se por si $6, celebrando assim 0 advento dos trabalhadores como classe independente no cam: po da politica, Morreu em 1865, doente, sem ter visto a | In. ternacional, Woodcock vé nele uma ponte entre 0 idealismo de Godwin e o empenho social de Bakunin e seus sucessores. Foi o teorico emergente de uma sociedade indus. trial que brotava ¢ se tornava mais e mais receptiva os confrontos de uma doutrina que parecia ofere: Cer uma saida ao frustrado impasse das democracias politicas. Suas idéias deram os contornos e emba: saram todo um vasto setor revolucionério da classe operdria. Seguramente, no foi Proudhon o funda: dor do movimento anarquista; esta honra coube a Bakunin, mas junto com Godwin pode ser consi derado fundador da anarquia, No que escreveu estiveram presentes os mais relevantes elementos O que be Anarquisny 39 que caracterizariam as visbes dos anarquistas e de- pois dos sindicalistas: a descentraliza¢do, 0 fede- ralismo e 0 controle direto da produego por parte dos trabalhadores, a famosa autogestao. Quanto a0 caos, “L’anarchie c'est l'ordre” — sentencionou Proudhon, Para ele nao havia contra. digdo entre 2 ordem e o anarquismo, Michail Alexandrovich Bakunin (1814 ~ 1876) era filho de aristocratas russos. Nasceu na pequena chacara Premugino — na provincia russa de Tver — de propriedade de seu pai, um liberal conservador, de familia enorme e influente. Abandonou a Russia em 1839 para dedicarse a uma vida repleta de pe- ripécias que o fariam dar a volta ao mundo parti cipando de quase todas as barricadas que os insur. | tectas do século XIX levantaram, fundando organi- zagbes clandestinas, impulsionando movimentos massivos, elaborando cédigos secretos, polemizan’ do com Marx e explorando os amigos, dos qu dependeu da ajuda financeira durante toda sua vida. De figura enorme e impressionante, andava nas ruas acompanhado de um séquito formado pelos amigos e criangas embasbacadas pelos seus 120 quilos e enorme cabeleira. Discursava arrebatando 08 auditérios, persuadia até os inimigos que se dei xassem ouvito, lia durante noites inteiras e bebia licor como se fosse vinho. Os detratores, amigos & estudiosos de sua vida so undnimes em conside- rarem-no inteligente, culto, ingénuo, espontaneo, impotente sexual, elogiiente, generoso, astuto, ar: 0 Caio Titi Vieira Costa rogante, leal, imprudente. Foi revolucionério, conspirador, organizador e propagandist de sua Nunca teve uma idéia original; falhou como es critor pois jamais deixou um livro pronto. Fol sobretuda um homem de ago. Impossivel isolar suas iddias e separé-las de suas agdes que inaugura: ram um estilo e marcaram o advento do anarquismo nos combates socials pela destrui¢go da autoridade © pela instauragao de uma outra sociedade que Bakunin, conscientemente, sequer esbocou, pois seria parte e criacdo das massas, Suss peripécias comecaram cedo. Aos dezesseis anos fingiu uma doenga para abandonar 0 exérci 10 russo, obrigatério para todos 0s jovens. Foi para Moscow ‘estudar e fazer amizades com todo o ci culo literdrio da época; ficou fascinado pela filoso- fia alema e decidido a estudéla in loco, inicial mente Fichte e depois Hegel. Saiu da Rdssia com @ ajuda do amigo Alexandr’ Herzen. Em Berlim, inguieto, passava das leituras de um filésofo para outro. Aos pouces foi perdendo seu anterior orto. doxismo hegeliano. Em 1841 foi para Dresden, Conheceu Arnold Ru ge, um proudhoniano, critico feroz de Hegel, @ quem 05 historiadores atribuem o inicio da conversio de Bakunin ao anarquismo. Esta foi celebrada publica ‘mente nas piginas do joral de Ruge, 0 Deutsche Jehrbiicher, onde, sob 0 pseudénimo de Jules Elysard, Bakunin produziu 0 seu primeiro e sem O que 60 Anarquisms 4 diivida importante ensaio: A reagiio na Alemanha. Nele estigmatizaria uma de suas maximas mais co nhecidas: “o impulso destrutivo também é um im- pulso criador’” Mas ainda no se apresenta todo 0 seu vigor andrquico, embora jd se declarasse em perpétua revolta, ‘Aos 26 anos foi para Paris, conhecendo pessoal mente Proudhon e tendo a oportunidade de discutir ‘com alguém que seria muito importante na sua vida de incorrigivel insurrecto: Karl Marx. Sete anos de pois consequiu ser expulso da Franca por causa de lum discurso em que oferecia ajuda e conclamava os poloneses a derrubar seu governo carista. Voltou fem fevereiro de 1848 e foram as revolucées deste ‘ano que fizeram crescer sua fama em toda a Eu- ropa. Em abril foi detido em Berlim, de passage rumo 8 conspiracdes na Poldnia, Escreveu artigos breves © ensaios nesta epoca, Nos Fundamentos de uma politica estava (Bakunin foi partidério desde sempre do pan-eslavismo, a unio de todos os povos esla: vos} propés claramente a destruiggo do que con: siderava a decadente ordem social impotente e estéril: “o problema social — escreveu — ha de resolver'se mediante 0 aniquilamento da sociedade atual”. Numa carta a um amigo atacou toda a ins tituicdo republicana: “os dias dos parlamentares fe das assembiéias nacionais se extinguiram. Quem ‘quer que coloque cruamente a questo deverd con: fessar que ndo encontrou utilidade nenhuma nestas formulas anacranicas (...). Nao creio na_ cons tituigéo nem nas leis, a mais perteita constituiggo do conseguiria satisfazer-me, Necessitamos algo diferente: inspiragdo, vida, um mundo sem leis e, portanto, livre”. Acreditou na perfeicdo das instituig’es humanas na bondade natural do homem. Estas virtudes, entretanto, estavam corrompidas € somente o ato inicial de revolucdo violenta as libertariam. Consi- | derava 0 campesinato russo a encarnagSo dessas virtudes e davathe o papel virtuoso de deflagra- dor e carro-chefe do movimento pela redengdo da Europa, Muito perto das convicg&es proudhonianas, mais tarde definiria seu socialismo desejando que no- vamento se praclamassem os princ{pios da revoluco francesa, onde cada homem teria os meios materiais, € morais para desenvolver toda sua humanidade. Prin: cipios traduzidos da seguinte maneira: que se organi: zasse a sociedade de modo tal que cada individuo, homem ou mulher (como Louise Michel e Emma Goldman, precursoras das reivindicagdes que hoje se chamam de feministas, Bakunin também se preo- ‘cupava com as mulheres por quem nutria um profun- do respeito}, encontrasse ao nascer possibilidades iguais para o desenvolvimento das suas diferentes faculdades manuais ou mentais para sua methor utilizago no trabalho; organizando uma sociedade que tornasse impossivel a exploracéo de um pelo outro, permitindo que cada um participasse da ri queza desta sociedade somente na medida em que Caio Tio Vieira Costa Oqueéo Anarquisoms 4B | com seu trabalho tivesse contribuide para produ 7ila Como foi dito no primeiro capitulo, mais tarde Kropotkin discordou do mestre Bakunin, modelan- do 0 socialismo anarquiste diferentemente; resumi damente assim: “de cada um segundo suas possibi Vidades, @ cada um segundo os seus desejos” Livre da prio em Berlim com a promessa de no ir para a Polénia, Bakunin encontrou-se por acaso ‘em Dresden na primavera de 1848. 0 cima estava tenso, a populaedo se insurgia em apoio & Constitu: go por uma Alemanha democrética e confederada | rejeitando a autoridade do rei. Bakunin, como se sabe, no tinha simpatia alguma por estas reivind: cagoes que ele chamaria desdenhosamente de de- mocratico-burguesas.ultrapassodas. Mas 9 convite do amigo Richard Wagner visitou 0 quartel-general dos rebeldes endo resistiu & tentaggo de entrar na lta: 0 cheiro dos combates e das barricadas vira vane a enorme e cabeluda cabeca. Combateu e | organizou, viu-se repentinamente metido no seio da violenta revolta em Dresden. Foi preso e condenado a morte pela primeira ver. Teve sua pena comutada, entregue aos austria Cos sequiosos pela sua cabera por ter predicado a destruigdo do império austriaco num congresso pan-eslavista em Praga. Foi novamente condenado 4 morte. Afortunadamente, os austriacos preferi ram entregé-lo aos russos que insistiram em casti gélo enauanto cidado russo Pere eeaeeaces ae Caio Titio Viewa Costa Pee ee oe | € pedia perdao. Esta confiss8o foi encontrada depois ee Gates coe ee eana eae ne egemen aguas no fe ne ene ee Soa imetensts ee cena pores occ or one cua 7 O que b Anarquisme 4 coroamento e condi¢do estaria na revolucao social Apés mais uma tentativa frustrada de participacdo na insurreicdo polonesa, Bakunin resolveu mudar de ares e escolheu a bela Fiorenga, na Itélia, para mo- rar e sediar suas aces, durante 1864, 0 primeiro ano da Associacdo Internacional dos Trabalhadores. Mas no foi em Florenca que Bakunin encontrou seus primeiros discipulos, foi em Népoles, ao sul da Ilia: Giuseppe Fanelli, Saverio Friscia e Alberto Tucci Na Itdlia seu impeto destrutivo iria influenciar decisivamente a politica italiana, Bakunin chegou quando um dos grandes precursores da _unidade italiana, Giuseppe Mazzini, comecou a perder sua as cendéncia sobre os jovens. As caracter/sticas do pafs — nao ter aristocracia operdria, possuir um campesinato numeroso ~ eram as condigdes ideais para desenvolver suas idéias de revolugao social (a0 contrario de Marx que achava possfvel a revolugsio somente nos paises industrializados). Recrutou se: guidores em meio 30s proudhonianos que achavam vidvel a cooperagao entre artesios e camponeses. Em Nipoles fundou oficialmente a primeira das suas incriveis sociedades secretas: a Fraternidade Internacional. Seu programa combatia qualquer tipo de autoridade, o Estado e a religido. Propugnava pelo federalismo e autonomia comunat, aceitava 0 socialismo @ afirmava que a revoluggo social no poderia fiar-se nos meios pacificos. A estrutura so 46 Caio Tito Vieira Costa bre a qual se montou @ sua Fraternidade parecia fazer piada 8s mais legitimas aspiracdes libertérias: rigida hierarquia e uma férrea disciplina interna, No seu topo estaria a “familia internacional”, uma aristocracia de militantes com passado glorioso que teria o mérito de formular os planas estratégi cos da revolucao. Na base estaria a “familia nacio ral ‘ cujos membros prestariam um juramento de in- condicional obediéncia & “junta nacional", N3o exis. tem indicios de participacgo massiva nesta sua pri moira organizacSo, apesar de Bakunin, por varias ve- 2es, ter afirmado 0 contrario. Em 1867 Bakunin mudou-se para a Su(ca, onde exerceu considerdvel influéncia entre os relojoeiros, artesaos da regiéo montanhosa do Jura, perto da fronteira da Franca, Ali aumentou também sua fé no potencial revoluciondria da Russia, Itélia e Es panha, 0 que o animou a montar na Suica um verda- deiro centro de encontros, conjuras, intrigas e proje- 108 conspirativos. Participou em Genebra do congresso da Liga da Paz e da Liberdade, organizacdo onde Giuseppe Garibaldi teve muita influéncia, Mas era uma organi zag liberal demais para o temperamento de Ba: kunin, € dela ndo tardou a demitir-se para somar seus esforeos a Associac8o Internacional dos Traba |hadores, na qual teve participacdo decisive como se veré no proximo capitulo. Por ora é bom que se sai 'ba que fundou também a sua Alianca Internacional da Democracia Socialista com 0 objetivo de com ela que bo Anarquisme a atuar exatamente dentro da | Internacional, mas Seria quiada, sem dovida, pela Fraternidade Interna ‘onal : No programa da Alianca bakuninista, entre outras coisas, constava 0 dusej0 de totale definitive aboli G0 das classes sociait; a proposta de igualdade pol fica, econamica social para os dots sexos. Para isto propunha como tatica primeira 2 aboligdo da heran Ger liana fo! convlada deur esertorio conta fan Genebra, rsidencia de Bakunin, eteve vida pro pra, fundando secdes em Barcelona, Madrid, Lyon, | Marsa, Nipotes ena Sica, Bor esta ‘época, Bakunin viveu um episodio que marcou profunda | mente sua vide e fol tema de controvérsia para os Mistoriadores etearicas do anarquismo 'N2 primavera. de 1869 deserbareou em Genebra Sergei Nechoev, estudante da Universidade de Mos cou. Procurou Bakunin e contourlhe como heroica monte havia escapada da Fortaleza de S, Pedro Paulo. © que em parte era mente, pois Nechaev tinhe sido apenss perseguido pela policia por causa {de suas atividades polticas na universidade. O joven serescentou sua contigo de delegado de um comite tevolucionario gue controlava uma rede de organi tagbes clandestings em toda 2 Rossa. Bakunin acre Gitou piamente na conversa do rapaz mas ndo dei wou por mens. Imediatamente retriculou Nectaev agente Ua seqdo russa de uma tal Aliangs Revolucio nuria Mundial ¢ deu-lhe um papel com sua assinaturs tnde Nechgev vinha inserito sob o numero 2.771 48 Jamais, nem antes nem depois deste caso, ouviu-se falar em semelhante organizacdo. episddio Nechaev ndo teria maior repercussBo nao fossem as caracter(sticas do mogo: fanatismo niilista, uma total falta de compaixéo e calor huma. no, uma amoralidade calculada, uma visio do ho- mem e da mulher apenas como instrumentos para a causa revoluciondria e indmeras justificatives para © assassinato, 0 furto e a chantagem que ele mesmo praticava, Varios especialistas em historia do anar ‘quismo — James Jol, George Woodcock e mesmo © competente bidgrafo de Bakunin, E. Cart ~ co- mentam a “‘influéncia maléfica” de Nechaev so- bre a personalidade de Bakunin. Woodcock insinua um latente fascinio homossexual escudado na co- nhecida impoténcia sexual de Bakunin. Os dois, Bakunin © Nechaev, escreveram vérios opisculas, ou melhor, Nechaev escreveu e assinou também com o prestigioso nome de Bakunin. Entre 08 escritos que levam as duas assinaturas esto o Catecismo do Revolucionério e Principios da revolu. 40. Neles podem-se encontrar coisas como “ndo reconhecemos outra atividade que a aco de exter. minio, admitimos que esta atividade pode manifes- ‘tar'se de muitas formas: 0 veneno, 0 punhal, a cor- da etc. Numa contenda como a nossa a revolugéo santifica este género de procedimento”. Realmente, Bakunin nunca havia escrito dessa maneira. Mas bastou esta proclamacdo, escreve James Joll, para introduzir 20 anarquismo um ele (Caio Tito Vieira Costa Oaque ev Anarauisme 0 mento que iria marcar época no final do século: “la propagande par le fait”, a “propaganda pela acdo", onde se estimulou a a¢do violenta pessoal & imediata, como se vera mais adiante, Depois de orientar Bakunin no sentido de ngo traduzir O Capital de Marx para 0 russo (Bakunin, que de vez em quando tinha recaldas e decidia ganhar um dinheirinho que nao fosse o emprestado dos amigos, resolveu traduzir 0 livro mais importan te de Marx para 0 russo, recebendo um adiantamen: to por isto), Nechaev tentou namorar 2 filha de Herzen @ roubar um monte de documentos secretos de Bakunin; voltou a Riissia e fundou a sure organi- zacio: Justiga Popular. Teve um fim misterioso e repulsive depois de 10 anos de cércere. Nao sem antes deixar selado e vinculado 0 anarquismo ‘com a pratica da terror individual Mas Bakunin ainda viveria emocionantes momen: tos na sua pentiltima incurséo nas barricadas do s¢- culo pasado. Em setembro de 1870 explodiu a re: volta em Lyon durante @ guerra franco-prussiana, A‘ Bakunin vislumbrou fortes possibilidades de se realizar 0 infcio da revolugdo mundial. Escreveu as Cartas a um francés {que por sinal eles no chega- ram a ver em tempo) propondo a reviravolta da guer- a e sugerindo a revolugio social: “uma sublevacdo, elementar, possante, apaixonadamente enéraica, destrutiva, sem freios"”. Depois da derrota de Sedan fo! proclamada a repiiblica em Paris, Em Lyon al: gumas fabrices foram nacionalizadas e um Comité { 50 Caio Tito Vieira Costa de Saiide Péblica foi nomeado para depois ceder seu lugar a um Consetho Municipal eleito pela popula- $80. A convite de uns amigos anarquistas da cidade, Bakunin chegou € resolveu dar a situagdo o seu ver. dadeiro destino: um tom revoluciondrio. Junto com ‘05 amigos criou 0 Comité pela Salvagao da Franca, Numa reuniéio massiva realizada em praga pdblica @ populagdo aprovou uma resolugZo que tributaria 0 ricos © democratizaria o exército da cidade atra. vés da elei¢ao direta dos oficiais. Bakunin e seus asseclas, esperando capturar 0 poder, publicaram imediatamente uma proclamagao abolindo o Estado, © qual seria substituido por uma federacéo de co. munas; institufram a justia do povo no lugar dos tribunais ¢ suspenderam os impostos e as hipotecas ‘As mesmo tempo exortaram as outras cidades fran. ccesas_ a mandar seus delegados a Lyon para uma con. venedo do Comité pela Salvagio da Franga. Entreta to, 0 Conselho Municipal, desastradamente, decreta fa uma redugdo nos salérios dos trabalhadores das, industrias e organismos nacionalizados. Contrarios a isto 08 operarios safram as ruas com 0 apoio do Comité bakuniniano. O estrategista apocaliptico © desmesurado que habitava Bakunin havia se es forcado para que salssem todos armados, mas foi voto vencido em seu propria comité. Mesmo assim a massa insurrecta tomou a sede mu: nicipal. Instalou-se o caos criador. A quarda nacional tentou impedir e foi escorracada até que chegaram O queéo Anarquisne st oe ee porao da prefeitura onde roubaram-lhe todo o di- | icles Seger re ee a etait stderr be eg ee ee eee Before enlinee iota ei ee ale venterrs vel estado da condi¢ao humana. Feeney uae ee eet deey aoe ate Ppa ree See ee re oer ae Sol teat eg Soe etter ee ed Ee on pie AOC ee baa Sheree Se = Caio Tito Vieira Costa Um acidente precipitou seu desgosto pelos mé: todos autocréticos: a quarda czarista assassinou © exilados poloneses em fuga, Kropotkin demi- tiu-se e voltou aos estudos de geografia em Petro: grado. Notabilizou-se como cientista mas abando- ow a carreira aos 30 anos, quando foi para a Suf- a, conheceu James Guillaume e entrou para as fileiras da | Internacional, solidarizando-se de ime: | diato com a ala antiautoritéria, Piotr Kropotkin (1842-1921), 0 que bo Anarguisme Voltou & Russia em 1872 para desenvolver ati vidades revolucionarias pelas quais foi preso e fugiu ramaticamente quatro anos depois, retornando $'Sulea, Le Revolte toi seu primeiro jornal em 1878. | Expulso da Sufga pelas suas atividades politicas, passou pela Franca e pela Inglaterra em 1882, | voltando a franca acompanhado por uma escalada de explosies e violencia politica |’ A polieia 0 deteve, acusando-o pelos atentados, No inicio de janeiro de 1883 Kropotkin e mais 53 camaradas compareceram ante 2 corte de Lyon para um espetacular julgamento onde os acusados Fealizaram uma brilhante defesa publica em favor Gas idéias andrquicas. Kropotkin redigiv e lev uma declaracio de principios denunciando © governo 9 capitalismo, Pregou a igualdade como condiggo dda liberdade, numa retumbante defesa que causou algun efeito entre os juizes mas ndo os impediu de condenar Kropotkin juntamente com 3 com: panheiros a cinco anos de prisdo. Ele aproveitou 2 reclusdo para escrever verbetes para a Enciclopé- dia Britanica e artigos para a Geografia Universal do camarad, anarquista, gedgrato e amigo Elisée Reclus. Livrau-se apds tr8s anos de pena curprida e retor rou 8 Inglaterra. Contribui na fundaeo do jornal Freedom, talver @ tinica e duradoura organizacdo narquista inglese, fazendo de seus artigos apenas tima atividade esporddica, Retirou-se das lides para tm suburbio londrino, entregando-se a seus estudos a Caio Tio Vieira Costa € 20 cultivo de um belo e invejado jardim. Fre dalientaram sua casa intelectuais ingleses das mais variadas tendéncias. Escreveu no Times. Devagar. modificou e aprimorou suas idéias dando um relevo maior a0 aspecto evolutivo da mudanga social, deso conselhando a violencia como método, angustiado com 05 atentados anarquistes do fim do século, De qualquer forma, sua presenga e sua atuacéo colaboraram decisivamente para “melhorar” a ima gem do anarquismo junto 2 opinigo publica, Em 1891 ele acreditava e acenava com 2 possibilidade de que © anarquismo se formasse gracas a ““maturagio da opinio pablica e com o minimo poss(vel de agitagdo e desordem”. Entretanto sua desespera da tentativa de dar a0 anarquismo ‘um cardter evalutivo € positivo no encontraria respaldo maior na propria histéria da ago andrquica, nem antes nem depois dele mesmo. Aproveitou seus dias de paz em Londres para co. tocar no papel suas Memdrias de um revolucionério, ‘um dos seus livros mais importantes. Escreveu tam bém A ajuda muitua que nada mais foi do que a cléssica formulagdo das idéias comuns a quase todos 5 anarquistas de que a sociedade no passa de um fendmeno natural existente antes da apari¢go do ho: mem que por sva vez e por sua natureza respeitaria a8 leis sem precisar de regulamentos artificiais, onde 8 pessoas se solidarizariam ajudando-se umas as ‘outras, como sugere o titulo. © espocar da Primeira Guerra Mundial trouxe 0 que &0 Anarquismo 7 junto a cis8o entre Kropotkin @ os anarquistas, Ele foi a favor da guerra, ele foi a favor principal- mente de que @ Russia entrasse na guerra contra a Alemanha Desembarcou triunfalmente na Petrogrado de 1917 recebido e abracado por Kerensky. Mais uma vez exortou ¢ fatigado povo russo a prosseguir a guerra. Isolado completamente da esquerda russa (anarquis: tas, socialistas-revolucionérios, bolcheviques etc.), este valvez tenha sido o seu principal engano, pois 2 tradiggo anarquista nunca apoiou a participacso ‘militar nas forcas de um Estado, principalmente con- tra outro Estado, Finda 2 guerra e a revolucdo rus- sa {a qual Kropotkin deu seu apoio e ajudal, recon: Ciliou-se com oS anarquistas contra os bolchevi ques ndo s6 pelo sentido ditatorial que a revolu¢ao assumiu, mas também pela violenta perseguicao que ‘sofreram da Cheka, a polfcia secreta soviética. Mor- reu em 8 de fevereiro de 1921, enquanto Nestor Machné sublevava os camponeses na Ucrania, a0 sul da Russia, e um ano antes da revolta dos ma rinheiros e trabalhadores de Kronstadt. Bernard Shaw, que conheceu a freqiientou 1a casa de Kropotkin, confessou certa vez sua admi- ago por aquele homem “doce e amavel até a san tidade”. Sua importéncia no anarquismo, ressalta Woodcock, deveu-se sobretudo a sua personalidade @ a seus escritos, De inspiragao nitidamente positi: vista amou sobretudo o aspecto construtivo do anar- quismo. Apesar de acreditar sempre na inevitabili ee 7 Caio Tito Vieira Costa ativo como o foi Bakunin, Preferia a discuseso aber ta e romantica & conspiracao secreta, Contrério & violéncia por temperamento, escre veu que a revoluedo social ndo seria possivel pelos meios pactficos unicamente porque a burguese ndo cederia sem tuta, persistia até os dltimos me mentos. Viu através dos tempos duas correntes de Pensamento se digladiando: uma anérquica, “» forca criadora e construtiva das massas, que elebor ‘ara as instituigdes da lei comum com 6 fito de de fenderse da minoria dominadora. A outra corrente seria @ formada dos magos e sacerdotes represen lando a ciéncia e @ religifo que se juntaram ass chefes e conquistadores. Para 0 seu triunfo futuro 3 _anarquia teria a seu lado 2 eficdcia construtive dos povos € 0 auxilio do poder da ciéncia v de tée mica modernas no fomento da nova sociedade, 20 Gesbancar as minorias governamentais privilegiadas Viu desde a Grécia antiga individuos ¢ tendén, Cias de a¢do que perseguiam no a substituigao de uma autoridade por outra, mas a destruigio. de autoridade mesma sem criar uma nova em seu lugar. ‘Considerou a revolugao como um evento concreto 0 Qual os trabalhadores rebveldes deveriam renderee & Conseaiiéncias de sua agdo, a fim de que a revol, 13 nao desagliasse na criacdo de novos drgios de Poder. A revolueéo deveria assegurar imediatamente duas coisas: a frustragéo de qualquer tentativa -_ O que Eo Anarquisme de eriagdo de um “governo revo tum substance) progreso 4 igueldade soci Nel, 0 gradalixmo seria Taal exatamente porque todos cecaspactor da via soil econdmica esto come tadon, #0 4 complets © imediata varsformacto da sociedad poderia garantr uma arma eftez cons Deservolveu at idfiss do comunismo-andrquico, camo diz 2 palavra, uma combinagdo de dees do Cornunisa com o anarquisma. © que odstingue det outrar doutriat liberia & a ala da "ure dst bu", segundo. os historiadores, mat valha do ue 2 prépria snaraui, onde cada incividuo part Cina com sa trabalho e ead wn retra Je 260100 3608 deseos ee Charles Fourier — considerado pelos marxis: tas como um dor representantes do scilismo vt pico Kropotkin etomou a tla do trabalho are dlivel: a tratgo do trabaino pelo indviduo que nfo sera explorado por outer uma das chavs doce dade livre. E 0 prequigso? Kropotkin defini como tm homer inate portante a sociedade lure tera O direrte de presionsio moralmente, 7 adia do comunismoandrauiceteve uma répida disominagio, Em. 1877 todo 0 credo Nbertirio savas, oilanor, como, Gr Caro 6 rico late, ember Em 1000, com a aud de Calero ¢ Reels, Kropotkin persuadis 0 conse $0 da Federoedo do Jura acta como doutting 8 Caio Tito Vieira Costa ezanoie of sn propo pare 8 noe soi. | dade libertaria Leon Tolstoi (1823 — 1910) também nasceu de uma familia nobre da Russia. Desenvolveu o que os estudiosos chamam de anarquismo cristo, apeser de deixar a patavra anarquista apenas aos partidarios da transformagéo violemta e de preferir definirse apenas como um cristo fiel ao evangelho. Mas tem seu lugar reservado na histéria do anarquismo, pois refutou incansavelmente 0 Estado e a propriedade. Influenciado desde cedo pelos escritos de Prou dhon (a quem conheceu pessoalmente) no sentiu ‘nenhuma atragio por Bakunin mas nutri um grande respeito peas idbies & pelo homem que tol Kro._ | Potkin. Seu racionalismo cristo e sua’ teoria do Fomor er com Que seus comentaores ae | ximassem das idéias da “ajuda mitua” de Kropo- tkin. A guerra da Criméia e alguns anos passados no Céucaso tornaram-no um pacifista e um apeixona do das virtudes de ume sociedade simples. Uma exe. cugo capital na Paris de 1857 feriu profundamente seus sentimentos; a guilhotina encarnou para ele, entdo, 0 simbolo do Estado, Prometeu a si mesmo jamais servir a nenhum governo, de qualquer parte do mundo, A interpretagdo da obra de Tolstoi ¢ contrad: toria @ sobre ‘ela os criticos raramente chegam um acordo, felizmente. George Woodcock acena ‘com a importancia de se recanhecer a continuidade O que to Anarguisme da veia anirquica no pensamento de Tolstoi, do Comeco de seus escritos até a sua morte, Neles Solstor exprimis sempre um profundo dessjo de justiga ¢ amor, fescinado pela Beleza singela do tmundo natura ‘A tensio entre 0 esritor e 0 reformador sempre esteve presente nele. Em seus. primeiros livros Guerra’ e Paz, Anna Karenina, Ressurreicdo etc.) pode-se sentir 0 seu desejo de uma universal frater Ridade humana, Posteriormente deixou claro qual {ua maior ana: @ negaggo da obediéncia. O recurso 2 tezdo seria 0 principal melo para a trarsformaro da sociedade e em Ultima instancia apelou 8 persua soe 205 exemplos. Pediu aos que queriam abolir @ Estado ue denasm de oper com ee ne | gando-se 2 servi a0 exército, 8 policia, ndo pagando Os impostos.Ensinou que a forea moral do hemem | alia mais que a forga de uma multiddo de eseravos Sileneiosos. Como observou Woodcock, sua regio nao teve misticismo; humanizada, 0 reino de Deus tstaria aqui na terra entre of homens Exereeu uma imensa influéncla, Milhares de rus: sos ¢ ndorussos fundaram, tanto.na sua terra como fo exterior, colonias tolstoianas beseadas na coma nhdo dos bens e num ascético cegime de vida. A tnaioria fay em um perfodo relativamene Breve © Sigumas comunidades estiveram em atividade ‘até 1930. Tolstoi influenciou também os anarquistas pacifistas holandeses, ingleses e norteamericanos Seu maior dscipulo foi Mahatma Ghandi 60 (Caio Tiilio Vieira Costa Errico Malatesta (1853 — 1932} foi caso a parte entre os anarquistas italianos. Teve uma vida to aventureira quanto a de Bakunin, insuflando rebo. lies, insurrei¢&es, organizando movimentos de card. ter anarquista, viajando e deixando as sementes libertérias na América do Sul Preso diversas vezes, condenado, fez greve de fome, discordou e propés idéias novas e totalmente contrérias aos dogmas anérquicos. Filho de peque- no-burgueses, néo foi rico mas, como se diz, bem de vida. Estudou medicina em Népoles, foi socialis. ‘ta para depois aderir a ala libertéria da | Interna. cional. Todo dinheiro que teve dedicou a sua causa. Publicou jornais, reuniu artigos em livros (Anarquia & 0 mais conhecido), foi o fundador do Snico jornal anarquista que ainda sobrevive desde. sua fundagao, em 1920: 0 Umanité Nova, iniciaimente cotidiano; publicado semanalmente em Mild nos dias de hoje. Seu ingresso na | Internacional deveu-se a forte im- ressio que the causou a Comuna de Paris em 1871. Conheceu pessoalmente Bakunin e fez presenca no congresso antiautoritério que fundou a Internacional de Saint-Imier apés 0 fim da | Internacional. Promo- veu pequenas insurreigdes na Itdlia em 1874, Depois Ge ser preso, julgado e colocado em liberdade, defen. deu no mesmo ano em Florenga a passagem do cole. tivismo bakuninista para o comunismo-anarquista de Kropotkin. Nesta mesma época ele e seus camaradas tentaram capitalizar 0 descontentamento geral das O que é0 Anarquismo st opulacdes citadinas e camponesas italianas, insul- Flando uma insureisdo @ parr das montanes do Meiodia napolitano. Foram tra(dos, tentaram ante- cipar a rebelio mas acabaram presos. Malatesta saiu da cadeia somente quatro anos depois. No foi bem recebido no Egito, na Siria, na Franca e na Su(ca. Resolveu radicar-se em Londres, © Gnico local possivel para os exilados politicos da época. Freqiientou Kropotkin, admiraram-se @ confiaram-se mutuamente, concordaram no geral com respeito as premissas do comunismo-anar: quista, mas tiveram profundas divergéncias que apa receram claramente por ocasigo da primeira grande guerra, na_qual Malatesta foi contrério a qualquer participagio. Segundo seu amigo, correspondente @ bidgrafo Max Nettlau, Malatesta achava que 0 co: nhecido otimismo e certas expectativas de Kro- potkin careciam de base realista Contrério 30 espontaneismo, achava-o impos: sivel em qualquer acordo para a acéo revolucio- néria, Buscou, e isto valeu-lhe severas criticas dos proprios anarquistas, concérdia com os socialis: tas autoritérios para destruir 0 capitalismo e o Es tado; esperava no momento oportuno separar-se deles caso 0 impedissem de suas realizagdes. Lutou muito para dar uma efetiva coesdo a Internacional que queria reorganizar. Sua maior investida contra (0s dogmas libertérios deu-se ao propor a formagao de um partido socialista andrquico_revolucionério. Acreditou ser til e possivel uma internacional Speer ees @ (ia Tio Vieira Costa libertaria revoluciondria que unisse os elementos | anarquistas revolucionsrios de todas ax tendBecne Pode'se imaginar o impacto que estes ideias cou, soram numa comunidade politica que até endo havia vivido sem nenhumeorganizapdo conten da, pols © que consequiram facer foi a mancton G0 de eszritérios de correspondéncia que noe peu. 0s iam perdendo suas fungdes. Resist. tambon 3 inimizede des anarquists quando estes comers ram a teorizar acerca da greve gel como suprene instrumento da revolugao, ingpitados pelos sree lstas franceses, Para Malatesta, a greve geral neo sendo a prépriarevolucio, ndo passava de urncontlitg passagero. Kropotkin eo fiel amigo e companheltg | de Malatesta, Saverio Merlino, saram ef sua deters | Tentou, depois, relacionar o comunismo-anartuiss com 0 ’sindicalismo, experando arejar ot sindicatee 20 institu a prtics da agdo direta, Solideriecade 0 federalisno. | _Viveo muito tempo em Londres sempre partici pando de todas as inicativas locas e internacional, | escrevendo para jornais italianos com o objetivo 42 unio. No congresso de. Amstorda, que fundos uma abortada Internacional Anarquista ele esteve Dresente e foi eleito membro do. Comite Organica tivo. Ne Italia fer eampanhe contra 2 participey © 8 propria guerra de 1914, Ecitou além do Umantd AMova uma revista, Pensiaro e Volont, fechada em 1926 pelos fascistas. Morreu seis anos depois doente recluso domiciirmente por erdem de Mussolint 0 que é0 Anarquismo a Emme Goldman {1869 — 1940} nascou na Rasa emigrou ainda jover para of Estados Unio, Esta presente agul por ser uma das prineiras mulheres Que apaixonadamente eserevey, amou e combate plo anarquisina. Fol ume des melores detensorat Gs emanciagso e dos deter de mulher, pionera no. dolsa, dos antconoepcionals, Foi presa e de Portada Jos EUA em fungdo de sues atvidades liber Considerava @ humanidade ainda do temanha de ury plgmeu e 0 amor algo desconhesido para malo ra dos gentes. Nao peda 40s homens que perdoas ee ee a verdadeira emancipacao social, que se entendessem todos mutuamente, Detestave, 9 propesto, a fase de Modame do Steel que dizi “entender tudo sig nica perdosr tudo “Griucou.volentarnente of que achavam que @ emancipayao ds mulher vira pelo direito 20 ¥ot0 Gorgainou em elma isto ¢ perguntou © que havia Conseguigo 2 mulher com 0 voto, pas ete ndo hovia purfeado @ vida poltioa da sociedade em se todo. Proclamavo que casartento © amor ads tnham em comum, apesar de alunseasomentosserem pro dutos do amor. Oradoraretumbante,colaborou com sue vor para a causa libertra em indmeras conte Tencio, Defenceu os mmigos e amantes com uma Gelidade exasperada. Ficou famaro 0-ces0 em que, errata de um latego, chizotaau em public, vilen ibinente 0 resto deJohan Most, um orador anar Calo Taio Viein Costa tho cometde gor Acad Berar compunns. | Scena Goran ns €UA Emma Goran mosou ave nen sb de probie | rae paca ow grantee soya actos Sem vin tr Invidcs noes bas bertres que tba clout on chu oo 36 2*voleade capita, ms oer a ess on io esamor ene a pesrur eaves elo O INTERNACIONALISMO | A bandeira negra do anarquismo internaciona: lista esteve novamente hasteada em 1976 na Franca @ mais recentemente, em setembro de 1979, em Ve- reza. Em Paris houve mais um conaresso da Associa: | 40 Internacional dos Trabalhadores, 0 ultimo de que se tem noticia, exatamente 112 anos depois | que sob 0s auspicios de alguns sindicatos briténi- cos @ franceses e sob 0 comando do férreo pulso de Karl Marx se estabeleceu em Londres pela pri meira vez 0 organismo que se tornou mundial mente conhecido como a | Internacional. Modes: tamente, em Veneza houve apenas um encontro so: bre a autogesto com representantes de pafses euro: ppeus © americanos. Neste Gltimo congresso anarco-sindicalista em Paris de 1976 0 clima, sem divida, foi mais para a tristeza do que para 0 otimismo e a curiosidade dos primeiros e gloriosos tempos da internacional operd fia. Quase disseminados e praticamente condenados 4 exist no exilio, os anarco sindicalistas em 1876 onseguiram reunir apenas cinco delegacdes: @ fran esa, a venezuelana, a britinica e os exilados a CNT espanhola e bilgars. Portugal, desinteressado, ndo_mandou representantes; as anteriormente com bativas sees argentinas © uruguaias estavam e cont nam na clandestinidade. Do resto des organizagées sindicalistasandrquicas sequer existiam noticias ¢on cretas na época. Mas a década de 70 marcou também © vigoroso ressurgir da CNT espanhola e uma pro metedora reorganizacdo e atuapio de vérios ncleos anarquistas na Itéia, Holanda, Estados Unidos, Ja pao e Suécia, Antes de entrar nas explicagdes, fatos, méritos © deméritos dos anarquistas que teimam em exist na atualidade é preciso retomar & incomum e qui¢d desconhecida histéria da | Internacional, onde a‘in- fluéncia de Marx e 2 de Bakunin se mesclarom, se confundiram e se separaram em conjunto com & histéria do movimento operério. Proudhon sonhou um dia com 2 perspective ambiciosa de uma associago internacional de Produtores, um orgenismo que aglutinasse em todos 0s paises os partidérios das cooperativas e que pu esse impulsionar os produtores dos bens materiais uma luta comum em torno de sua causa. Os mu twalstas, sequidores figis das idéias proudhonianos, Caio Tito Vieira Costa 0 que és Anaryuirne - jogaram a grande cartada na fundacio da | Inter nacional. No camego de setembro de 1864, Henry Tolain, Charles Limousin e E. C. Fribourg, Ifderes sindicalistas franceses, proudhonianos, desembarca: ram em Londres para participar de uma grande reu niido no St, Martin’s Hall, onde os briténicos e alguns exilados europeus (Marx entre eles, representando (0s alemées) esperavam-nos para ouvir a proposta de uma Associa¢o Internacional dos Trabalhadores, Entretanto, Marx tinha na cabeca idéias muito claras a respeito do futuro que queria dar aquela | ‘organizagio. Os mutualistas franceses também. Endo era nada daquilo que 0 alemgo imaginava, Aspiravam a uma sociedade em que todos 0s ho- ‘mens seriam proprietérios e cada um teria de volta 105 frutos de seu proprio trabalho, Para isto tinham ‘esbogado um sistema genial: uma instituicgo pabli- a, auténoma, inclu fda em ConstituigSo, uma espé- ie de banco de crédito popular que instituiria o cré dito gratuito concedendo aos produtores.lindivi- duais ou em grupo) adiantamentos de capital livre de interesses. Eram contrarios 4 igualdade econd- mica e cada individuo deveria ser remunerado con: forme seu servico. Defendiam apenas uma reforma no sistema da propriedade para torné-lo livre da ex- ploracdo de classes. Consideravam a familia a base essencial da sociedade e a propriedade da terra e dos outros meios de producdo condigao necessaria para 2 existéncia social da familia, Quanto a Internacio- nal, aspiravam, com apoio dos sindicalistas ingleses, Caio Tito Vieira Cota 2 que esta mantivesse suas bases nos sindicatos operdrios endo fosse jamais uma federagdo de partidos, livrando-a assim da participagdo nas insti tuigdes politicas da democracia burguesa. Ndo foram somente os marxistas que os criticaram pela es séncia de suas aspiragbes, mas também os anarquis tas de cunho bakuninista e anarco-sindicalista (estes mais tarde), que viam nos mutualistas prow dhonianos apenas uns reformistas incorrigiveis. Mas nao foram os mutualistas que levaram a melhor nesta reuniéo em St, Martin’s Hall. Nomes: dos os 21 membros para redigir os regulamentos uma constituiggo, este Comité Central eaiu nas maos dos representantes das trade-union inglesas, de alguns refugiados franceses, italianos é de Marx. A situa¢o continuo a mesma quando dois anos mais tarde se estabeleceu 0 primeiro congresso interna clonal em Genebra. Prevaleceu, entretanto, a argiicia ® sutileza de Marx que redigiu 0 regulamento usando alguns jogos de retorica para passar suas proposig&es politicas, sem entrar em conflito aberto com as idéias contrérias 4 sua. © congresso de Genebra decidiu-se pela aprovacgo do sonhado Banco de Crédito Gratuito e a favor das sociedades cooperativas de produgdo dos mutualis- tas. Marx apresentou e conseguiu aprovar sua tese gue dava importéncia as greves e organizagées sindicais contra os patrdes, objetivando acabar com © sistema salarial e criar uma outra ordem social sob © poder da classe trabalhadora; introduzindo habil: Oque mente © conceito de “estado operirio”. Com alguma oposic¢go aprovou se também uma proposta fem favor da lei regulamentando a jornada de traba tho em 8 horas e outra propugnando a educagio publica para todas as criancas, No final, Marx teve razdo em rejubilarse, o ccongresso foi uma vitéria contra os anarquistas franceses, Mas sua alegria duraria pouco. Dois anos depois 0 congresso da Internacional em Lausanne, na Suica, apoiou a Liga da Par e da Liberdade (organismo sob a inspiracao de Garibaldi € aglutinador de varias personalidades politicas e culturais da época) na sua luta contra a guerra e pela unigo de toda a Europa sob um governo repu: blicano, Mas esta mesma Liga ndo aprovou depois as condicdes pedidas pela Internacional para apoiéla fato foi importante porque causou uma profunda desiluséo em Michail Bakunin, dirigente da Liga, dela demitindo-se por consideri-la muito pouco radical. Foi engrossar as fileiras da Internacional que jd estava Ihe dando 4gua na boca Desta data em diante os proudhonianos perderam a primazia de disputar com Marx as concorridas discuss6es no seio da Internacional, O cenério deu lugar a uma ferrenha briga entre dois gigantes, intermediados por Georg Eccarius, um alfaiate alemo, lugar-tenente de Marx que tinha por hébito 1ndo participar das reunides plenarias dos congressos imternacionais O conflito ngo seria apenas politico, mas tempera- Anarausr 6 70 Cio Tilo Vieira Costa O que €0 Anarquisme m mental. Segundo G.O.H. Cole e James Joll, podemos favordveis aos intoresses da classe trabalhadora (mais encontrar em Marx. algumas caracteristicas bésicas direitos politicos ov reducdo da jornada de trabalho, autoritério; centralista; aspirou 3 ativa intervengio por exemplo). Bakunin, neste ponto, era bem mais politica dos trabalhadores; namorou ardentemente expedito © claro: literalmente contra qualquer tipo © poder do Estado e teorizou acerca da nacionali de apoio aos politicos burgueses, zago dos meios de producio. € Bakunin: um © advento de Bakunin na Internacional deu-se de Dartigério’ da uniBo de todos os poves. eaves, mmaneira.pouco eonvencional. final ele era. um tim spaixonado da revolucSo espontanea cuja base focohecide dirigente, "das. masses © N80. podia seriam os camponeses es elementos margingis da Simplesmente chogar 0 eseritrio. da AssocagSo sociedade urbana; um libertario; federalista; opositor Internacional dos Trabalhadores e pedir sua inscri¢go. ané as riot da inoldncia da agdo politica nos ava tcartirnha, No, fundou entdo a sua. Alianea dros parlamentares; irado com qualquer tipo de Internacional da Democracia Socialista para atuar Estado apenas queria velo abaino. enquanto com ea dentro da’ Internacional, aproveitando 8 precicava_o controle dos wabalhadores sobre os Faireedtrutura ‘que esta [8 organicara em. quate meios de producio. quatro. anos_de atividades. A nova organizacdo 7A mente ordenadissima e disciplinada de Marx fkuniniane, por sua. ver” seria contvolada pele jamais poderia se convencer de que, como queria | indefectivel Fraternidade Internacional (a organi Bakunin, Unica cols importante era a aitagao das | Sido secrets“ Bakunin que por sus ver seria masias para a apocaliptica destrugdo revolucondria, |. GGhtvolade pelo Familia Internacional, que por sua deixando 4 sua espontaneidade a. treta de crat ter estara Sob 0 inquestionivel controle de Mestce uma nova ordem social, Marx concebia a Internacio._| Bakunin). A rissdo da. Alianga bakuniniana serie nal como um movimento sob uma diregdo central e treinar e formar “propagandistas, apéstolos, e por Uniicada, apesar de permiir uma relativa liberdade Utmo.ergenizadores" assim como recrutar, caso is sogdes nacionas. Para Bakunin, cada movimiento, hecairio, as. forces’ de_choque revolucionrias ro #6 nacional, ras local, deveria ter complaté para dirgir os wabalhos na Europa, Uma organi utonomia pare Yormular sua propria politics sem Yeedo\avancada que injetaria.em sous membros um receber instrugies de fora. continuo fervor revolucionario, Em 1868 foram Marx, que realmente ndo tee limites eas censuras Imediatomente criadas segdes em Lyon © Marsctha que 0pés & burguesia, achava necessério apoid-la alam do envio de Giuseppe Fanelli para organizar a taticamente quando tentasse implantar reformas Alianga em territério espanhol. Foi assim que n Caio Tito Vieira Costa Bakunin requereu seu ingresso nos quadros da Internacional; com outra organizacdo, Desconfiado e receoso, Marx, de Londres, acom panhava as manobras de Bakunin e podia sentir a eficdcia da Alianca com sede estabelecida em Gene- bra, A reagdo nao tardou; de Londres, o Conselho Geral_da_ Internacional pronunciou'se contra a Alianga bakuniniana, manifestando que no toleraria um segundo corpo organizado dentro da AIT. Bakunin relutou um pouco, escreveu elogiosas infrutiferas cartas @ Marx, mas acabou concordando em dissolver sua Alianca e passar suas secBes para 0 controle direto da Associagdo Internacional dos Trabathadores. Finalmente institucionalizou-se seu ingresso, Os conflitos maiores dentro da_ Internacional ‘comecaram no congresso de Basiléia em 1869. Entrou na pauta a célebre questio da heranca Bakunin exigiu do congresso que incorporasse 20 Programa da AIT um item sobre a necessidade da abolicio dos direitos a heranca. Argumentou que a propriedade hereditiria era a base sobre a qual se assentava a ordem social existente e sua abolicéo essencial na dissolucdo do Estado. Foi mais longe, considerou as fortunas hereditérias em onosiggo 4 igualdade entre 0s homens, pois ndo existiriam diferengas baseadas nos dons naturais de cada um, G. Eccarius, anteriormente instruido por Marx, argumentou ‘ponderadamente que 2 abolicso da heranca seria consequida com 0 préprio aconteci: O que é0 Anarquismo 7 mento revoluciondrio e no via a necessidade de transformer uma reivindicacao imediata em primor- dial, na primeira fase revolucionéria Em seu intimo, Marx achava 0 ataque bakunini ‘ano a heranga uma perda de tempo, uma atitude pequeno-burguesa e no arredou pé de sua tese segundo a qual as condig8es econdmicas eram as que fundamentalmente determinavam as relagdes de propriedade. Bakunin concordava com isto mas fopunha a questo da heranca como tética principal na luta pela emancipacgo da sociedade. Ninguém levou a melhor, Apesar de expressiva votagdo obtida pela tese de Bakunin, ela foi derrotada pela grande ‘quantidade de votos brancos que contavam contra. No entrevero armouse o cisma e descobriv-se a pouca influéncia do Conselho Geral, comandado por Marx, no seio da Internacional. Bastou Bakunin ‘opor outra tética que ndo a anteriormente planejada 2 0 confronto se instalou entre os delegados inter- rnacionais. Desta date em diante Marx e Engels partiram diretamente para um ataque politico e pessoal contra Bakunin, convencidas de que ele preparava luma vastissima conspiracdo. Por dois anos nenhum congresso se realizou. Os internacionalistas assistiram ‘20 mesmo tempo ao colapso da Comuna de Paris e 2 violenta repressao que se seguiu. Preocupado com esta situacdo e concomitantemente com a da Inter- nacional, Marx convocou para o vero de 1871 luma conferéneia de cardter privado em Londres, ” Gaia Tito Vieira Costa com a participacdo da maioria dos congregados marxistas, expressando'se a favor da criagao de um partido opergrio. Nesta conferéncia alguns delegados defenderam pontos de vista contrérios aos de Marx, de cardter anarquista, mas no foi em funcao deles que @ maioria rejeitou o plano de um partido dirigido por Marx e pela Internacional. ‘Ao mesmo tempo, em novembro de 1871, a ié estabelecida ala antiautoritéria_da_ Internacional reuniu-se em Sonvillier, numa conferéncia que ‘marcou 0 inicio das conversagbes para a fundagio de uma internacional exclusivamente anarquista Participaram os delegados da Federacdo do Jura, varios expatriedos radicados em Genebra, represen: tantes de federacdes bakuninistas da Espanha e Itélia, sequidores de Cesar de Paepe (italiano andr quico com tendéncias sociais-democratas), partidé rios anarquistas da Holanda ¢ da Inglaterra. Todos estavam com Bakunin pelo menos em uma questo: eram contra 0 modo de Marx tentar controlar autoritariamente o Conselho Geral da internacional. Subscreveram a Circular de Sonvillier que formulou ‘uma organizago operéria descentralizada, Entretanto, de Londres, @ persequigio movida contra os libertérios continuava. Em 1872, Marx convocou um congresso em Haia (longe da Suica, Espanha ou Italia, onde ele sabia que teria proble mas com 0s antiautoritérios) e os congressistas aprovaram a expulsdo de Bakunin e seus partidérios O que eo Anarquismo Si da tnternacional, Para maior seguranga, os marxistas, ino aff de se verem longe das idéias “nocivas” dos anarquistas, mudaram a sede do Conselho Geral da Internacional exatamente para Nova York, com isto selando, inadvertidamente, sua morte. ‘As causas ditas imediatas da derrocada da | Inter: nacional estdo af, limpidas. Muitos estudiosos do anarquisma do marxismo aprofundaram um pouco esta questéo e James Joll parece dar uma das explicagdes mais plausivels, Para ele, 0 comunismo de Estado baseado em um partido centralizado & disciplinado foi criticado pelos anarquistas que propunham em troca comunas livremente federadas @ independentes, Nelas, o capital, as fabricas, as maquinas e as _matériasprimas pertenceriam a5 ‘associagBes e as terras seriam dos que a cultivassem. Para Karl Marx, a revoluco ocorreria por causa do fatal proceso historico e da gradual consciéncia por parte do proletariado do lugar que the cabia na inevitével luta de classes. Bakunin, como ja foi visto, achava que esta revalucdo poderia ser provoca: da por uma vanguarda que explorasse inteligente mente 0 potencial revoluciondrio ja existente Enquanto Bakunin deu nitida preferéncia as socie: dades secretas como condutoras do proceso, Marx preferia os massivos partidos politicos. Sem davida, uma radical diferenga tética embora ambos sonhas- sem com @ mesmo fim, apesar de, sempre @ bom frisar, 0 primeiro desejar ardentemente ver-se livre do Estado & 0 outro usé-lo como instrumento de 16 Caio Tidio Vieira Costa transi¢ao. ‘Adiante! Os libertarios e simpatizentes que pparticiparam da conferéncia de Sonvillier resolveram levar em frente o movimento internacional, Reuni ram-se entdo em Saint-Imier e ocuparam-se da criagio de uma nova internacional, ou, como que- iam, 2 reforma da antiga. Inauguraram assim um segundo periodo no internacionalismo anarquista, na divisio feita por George Woodcock que 0 separa em cinco periodos distintos. Os anarquistas em Saint-Imier tinham sobretudo lum grande trunfo:0 apoio das bases. Este passou-thes 5 mos devido em grande parte a transferéncia do quartel-general marxista para Nova York, Antes do cisma de Haia, a Internacional contava'com quase 1 milhdo de filiados em todos os paises. De 1873 fem diante este nimero baixou muito, mas até 0 ano de 1877 0s anarquistas conseguiram muitos adeptos entre os que antes professavam o marxismo. Sabe-se também que em 1873 05 marxistas tentaram realizar um congresso em Genebra, 0 qual do passou de “uma coisa piedosa” no dizer dos observadores. Marx, em Nova York, exclamaria quando soube dos frustrados resultados: “A partida estd encerrada”. Das resolugdes de Saint-Imier pode-se ressaltar que esta nova Internacional no assumiu um caréter especificamente andrquico. Proclamou a autonomia de todas as segdes e federagdes. Negou terminante. mente a competéncia legislativa dos congressos O que éo Anarguismo - ( periédicos. Recebeu apoio incondicional dos grupos antimarxistas, dos tradeunionistas ingleses ¢ dos anarquistas considerados extremistas. A nica resoluco de carster nitidamente andrquico foi a que condenou a importancia dada 8 aco politica nos congressos anteriores, e em seu programa pode'se ler que propunha “'a destruiggo de qualquer tipo de poder politico”. Este segundo periado do internacionalismo anarquista estendeu-se até 1881, quando os liberté: rigs tentaram novamente criar um outro organismo internacional. No entreternpo ocorreram congressos, nada originais, em Genebra, Bruxelas, Berna e Veviers. A Internacional foi proscrita na Franga, Espanha e Itélia. Teve uma existencia tempestuose ea partir de 1875 adquiriu novas cores, sua influén- cia aumentou na Franca, fundaram-se federagbes na ‘América Latina, apareceram sees em Portugal, Grécia e Alexandria. Infortunadamente, durante 05 ‘anos 70 do século pasado, ela assistiu também & sua propria desagregacdo, em parte motivada pelo rescimento da social-democracia junto as bases. ‘0 iltimo congresso anarquista desta década, na cidade francesa e industrial de Veviers, contou somente com a participa¢do de Kropotkin, Paul Brousse (da delegaco francesa e depois socialista), Gonzales Morago (da delegagdo espanhola), James Guillaume (representando os suigos de lingua francesa), Werner (representando 0s suicos de lingua alema}, mais os delegados de grupos anarquis * Caio Titio Viera Costa tas da Alemanha, México, Uruguai e Argentina, além de Andrea Costa, ecompanhado da belissima ‘Anna Kuliscioff, ambos importantes na posterior fundagio do Partido Socialista Italiano, mas até 0 momento libertérios. Neste congresso faleceu a Internacional de Saint-Imier, ou melhor, deixou de existir pois jamais foi dissolvida oficialmente. Londres seria mais uma vez sede de um impor tante movimento conspirativo contra a espoliaggo burguesa. Numa pequena taberna em Carrington Street, quarenta e cinco anarquistas representando 59 grupos individuais de quase cinqdenta mil mili tantes inauguraram em 1881 mais uma arganizagio internacional sob os olhos preocupados do governo francés e britanico. Alem de Errico Malatesta, Saverio Merlino e Kropotkin estavam presentes 2 lider feminina francesa Louise Michel ¢ Emile Pouget. A parte um delegado mexicano — insofismavelmente o precursor do napalm, da guerra bacteriolégica, pois defendia 0 ‘emprego da quimica como arma na luta de classes —, @ reunigo pautou-se por uma grande indeciséo variedade de posicionamentos, Uns preferiam 0 movimento na clandestinidade e outros, como Kropotkin, defendiam bravamente 0 ponto de vista em favor de um vasto e espontineo movimento insuflado pelo impulso popular. Apenas em um ponto estavam de acordo: a inevitabilidade da violéncia revolucionéria contra a prépria violéncia desencadeada pela represso. Os historiadores 0 que éo Anarquismo ” afirmam que ainda ndo existia nenhuma corrente pacifista dentro do movimento libertério e que a fase terrorista também ndo comegara com toda sua forge. Mas 0 assassinato de Alexandre II, na Russia, por obra da organizagdo Nerodnaja Volja {A vontade do povo), influenciou muito nas discus: ses. Apesar da incerteza entre a criagdo de uma organizagdo legal ou clandestina, 0 fato concreto & que de 1881 até o final do século os libertérios abandonarem a idéia dos movimentos massivos pela ‘dos grupos secretos de ativistas, inaugurando os pequenos grupos de aco direta que promoveram atentados ou insurreigoes. Foi a famosa cra da “propaganda pela acdo”. Este seundo periodo continuou com uma série de congressos abortados — 0 tereviro periodo foi de 1889 até 1896, quando | 98 anarauistas eoncantraram seus esforos na fracas sada tentativa de se insinuarem dentro da I Inter nacional Socialista, Esta nascera em 1869 em Paris com a unificagdo de dois congressos_socialistas, rivais: 0 dos partidérios de Jules Guesde, com apoio ‘dos marxistas europeus, e o congresso dos partidé rios de Paul Brousse, anteriormente em luta contra 0 exanarquista Guesde pelo controle do socialismo parlamentar na Franga. Dizem os observadores que ‘98 anarquistas se infiltraram nas duas organizagoes com louvavel imparcialidade. (Os leitores poderdo encontrar maiores detalhes no volume O que é 0 a desta mesma colegao.) 80 Caio Tito Vieira Costa A definitiva expulséo do congresso socialista de Londres {e ndo seria mais uma que iria abalar quem mais se exercitara nestes casos) em 1896 marcou 0 inicio do quarto periodo, cujo pice foi 0 ccongresso em Amsterd3 no ano de 1907 onde os incorrigiveis libertérios, numa das reunides mais vivazes que consequiram fazer, buscaram uma orga: nizagio composta apenas de anarquistas convictos, O ‘sindicalismo revolucionario. (anarco-sindicalis mo) desabrochou com toda sua plenitude. Daniel Guérin considera que somente a partir dai o anar: quismo mostrou-se em toda a sua forca, poisacredita que no século passado ele mal chegou a esborar 0 seu papel. Concorda que, gragas a Bakunin, o ‘anarquismo participou de um verdadeirs movimento de_massas_no século XIX: 0 da I Internacional. Guérin aproveita e ressalta 0 papel do francés Fernand Pelloutier, um dos responsiveis pela entra da triunfal dos anarquistas nos sindicatos, passando da tatica da dinamite para 2 do contato direto com ‘as_massas, criando uma escola prética onde as idgias antiautoritarias puderam vicejar. E preciso lembrar também de outro grande impulsionador do sindicalismo revolucionério, o francés Pierre Monat: te, defensor no congresso de 1907 das idéias sind calistas, contra Malatesta que via no sindicalismo apenas um meio ~ e imperfeito — de combate, pois levava ao descuido de outros meios de luta. Apesar de todos, Malatesta inclusive, 0 anarco- Sindicalismo venceu, deu 0 tom, definiu-se e apon. 0 que é0 Anarquisme A tou como o grande movimento massivo libertario do século XX. 0 quinto periodo do internacionalis mo anarquista foi do fim da primeira grande guerra até 0 auge da guerra civil na Espanha. Este periodo assistiu ao episodio de Nestor Machné e Kronstadt, ‘ambos na Riissia, como se verd adiante, Ainda nesta Spoca os anarquistas refundaram, em 1923 na cidade de Berlim, a sua Associagao Internacional aos Traba thadores que existe até hoje com sede em Estocolmo na Suécia, O congresso contou com o apoio de delegacdes anarco-sindicalistas da Argentina, Chile, México, Noruege, Suécia, Dinamarca, Alemanha, Teheco:Eslovaquia, URSS, Italia, Franga, Holanda, Portugal e posteriormente da Espana Depois 0 mundo viu e participou da Segunda Guerra Mundial, acompanhou a querra fria e 0 espetacular crescimento do capitalismo. Burocrati zou'se, persequiu'se e reformouse a AIT. Faltou Ihe a flexibilidade para acompanhar os variados matizes de um novo anarquismo, autogestiondrio, antiautoritario, ecolégico, autnomo, grupos dé afinidade, comunitario ou nome ou rétulo que Ihe queiram dar. Alguns anarquistas nostélgicos recu: sam-se até a comentar a atual situagdo da AIT, pensam que nunce retomard o vico e 0 vigor do século pasado quando os libertérios de toda a Europa enfrentavam cansativos dias de viagem para ouvir a voz de Bakunin ou Malatesta em aigum ‘congresso ou encontro internacional. ‘Apesar de tudo, proliferaram de alguns anos para 2 Caio Tito Vieira Costa 0 que £0 Anarquismo 3 Leon Tolstoi {1828- 1910) Albert Camus (1913 1960) Caio Titio Vieira Costa podem acrescentar a gosto seus pensadores antiau toritarios de preferéncia: Antonin Artaud, André Breton, Albert Camus, Augustin Garcia Calvo, Andy Warhol, Anyon Pannekoek, Baltasar Porcel, Bertrand Russell, Boris Vian, Cioran, Carlos Diaz, C. Castoria dis, Claude Lefort, Carlos Semprun, D. H, Lawrence, David Cooper, Edgar Wind, Edgar Rodrigues, Fer nando Arrabal, Felix Guattari, George Bataille, Giles Deleuze, Groucho Marx, Cohn Bendit, Georges Sorel, Henry Miller, Herbert Marcuse, Hans Mayer, Herbert Read, H. M, Enzensberger, Henri Simon, Jean Paul Sartre, Jacques Monod, Jean Baudrillard, Joan Peird, Luis Bufiuel, Luis Nazario, Lima Barreto Maurice Bianchot, M. J. Harner, Michel Foucault Noam Chomsky, Paul Goodman, R. Dutscke, Ri chard Gombim, Samuel Beckett, Susan Sontag, Simone de Beauvoir, Savater, Schumacher, Theodor Adorno, Tristan Tzara, Valerie Solanas, Victor Serge, Victor Garcia, Walter Benjamin, W. Bour roughs e Yona Friedman, A PARTE MALDITA Na Russia Era uma festa animada na casa daquele latifun- digrio russo. As garrafas de bebida iam-se esvaziando as canges enchendo a noite. De repente, como nu: | ma magica, caiu do céu, pulou os muros e se esque: rou pelas paredes gritando frases incompreensiveis um bando enorme de soldados da milcia ucraniana. ‘N3o sobrou um convidado em pé, foram todos sub- jugados e muito tempo depois ainda nio tinham compreendido como 6 que sua policia poderia té-los assaltado. Estavam enganados. Erem os militantes do Exército Insurgente da Ucrinia distarcados e co- mandados por Nestor Machn6. Vinham expropriar as terras dos nobres e distribu*-las entre os campone: ses, no verdadeiro estilo de Robin Hood. Travestidos de oficiais do exército para melhor chegar até o fa zendeiro, aproveitavam-se dessa condigao para ga ‘ther sua contianes © hospitalidade, e, depois, com um dramético golpe teatral, revelaremse e justica rem o inimigo do povo. Por alguns anos no houve nem lei nem autorida de a0 sul da Ucrénia, numa regio que abrangia uma 4rea de 280 km de comprimento por 250 de largura, om aproximadamente 7 milhoes de_habitantes Nestor Machné ou simplesmente “o pai” como era chamado, quer queira, quer néo, reinou absoluta mente. Expulsou 0s soldados do Exército Branco que vinham acabar com a revolucao, distribuiu terra 208 camponeses, criou comunas livres, combateu ‘ombro a ombro e também contra o paderoso Exér- ito Vermetho comandado por Leon Trotsky para depo's ser esmigalhado por este, criandd mais uma historia das momentaneas e espetaculares conquistas desastrosas derrotas do anarquismo, Todos 0s estudiosos que se debrugaram sobre a Russia concordam que o anarquismo somente se ma nifestou em toda a sua plenitude, organizativamente, a partir do finzinho do século passado, Apesar disto, 0 passado russo assinala violentos le vantes populares, principalmente nas regibes frontei- rigas, com fortes caracteristicas libertias devido ao Seu espontanefsmo. Abundaram seitas anarco-eli giosas, pacifistas, que se revottaram contra qualquer coergio externa, tanto da parte religiosa como da das autoridades leigas, recusando'se a pagar os im postos © @ pegar em armas para servir a0 Czar Conta a lenda que por volta de 1875 formaram-se Caio Pilio Vieira Costa O que 6 Anarquism "7 em Kiev e Odessa alguns grupos comunitarios escon: endo armas e sequiosos por uma insurreigao campo- nnesa 30 gosto e delicia das idgias de Bakunin. Trés jovens empolgados pelos escritos anarquistas organi zaram entio uma pequena conspiragdo que iria no: tabilizar-se pelos métodos nada ortodoxos do ponto de vista snarquista. Aproveitaram-se das noticias di fundidas entre os camponeses de que 0 Czar amava seu povo e no sabia em absoluto das atrocidades ‘que cometiam em seu nome, Num distrito pert de Kiev soltaram dois docu- mentos em meio @ populagéo camponesa. O primei ro era uma Carta Imperial Secreta na qual 0 Czar reconhecia os direitos dos camponeses as terras mas lamentava ago ter bastante forca para obrigar os nobres a ceder suas fazendas e exortava os trabalha dores rurais a formar milicias secretas @ ficar de prontidgo para a revolta quando soasse 0 momento. (0 segundo documento era o Estatuto da Milicia Se ereta que trazia instrucées particularissimas para @ lorganizagao dos rebeldes. Os camponeses cairam na arapuca € a milicia se formou com mais de mil vo luntarios. Guardaram todo 0 processo em segredo por mais de um ano até que uma indiscri¢ao colocou a policia czarista em seu encalgo. Centenas de cam poneses foram presos e deportados para a Sibéria, Os trés responsaveis também foram detidos mas es caparam com a ajuda de um amigo que se empregou ‘como carcereiro na prisdo onde estavam. : Entretanto, o que correu bem profundo na Réssia L Caio Tito Vieira Costa rias através dos escritos dos exilados anarquistas que tinham seus textos reproduzidos e distribuidos de mo em mao entre os jovens e os conspiradores. Os deratas russos aprenderam muito com Bakunin e Kropotkin, devem muita coisa a Alexandr Herzen, que foi sempre um socialists, mas também um dos iniciadores de toda tradi¢ao revoluciondria russa e um dos primeiros a difundie as idéias de Proudhon entre os radicais de Moscou. No comeco dos anos oitenta do século XIX meernaeaeecmnmee delineou'se a tendéncia ao terrorismo, heranca de Nechaev. Alguns grupos anarquistas no foram corr ‘tra. mas também néo participaram dos atentados que perpetrou o famoso grupo Naradnaja Votja, respon sivel pelo assassinato de Alexandre Il em 1881 Este golpe selou também uma onda de prisées e exi: lio e somente nos iltimos anos do séeulo XIX for: maram-se na Russia os primeiros grupos declerada mente anarquistas. Publicaram varios jornais como o Jeb i Volia que ‘em 1903 ~~ um ano de grandes fermentagdes sociais, greves, tumultos no campo, demonstragdes estudan. tis e descontentamento no exército — deu a estas manifestaces um sentido libertario. Em todo caso, até mesmo para gs anarquistas foi dificil dizer em que medida estes jornais e grupos co- laboraram para o estoura da revolucgo de 1905. Kropotkin creditou-a apenas a espontaneidade e ex: plosdo do descontentamento popular e considerou-se O que se Anarguismo ego de surpresa pelos acontecimentos anteriores a0 “Domingo Sangrento” (quando o exército czarista reprimiu e assassinou centenas de manifestantes), marcados pelo estouro de areves, operdrios nas ruas, ‘camponeses incendiérios e saqueadores; e 2 humilha ‘sao da Russia nas derrotas frente ao Japo na guerra ‘que comeeara um ano antes. Realmente eram poucos os anarquistas ativos du: rante a revolugdo de 1905. Paul Avrich diz que 0 ni mero nunca passou de 200. No ano seguinte, 0$ anarquistas conseguiram ter grupos em quase todas as grandes cidades russas e 0 movimento se tornou particularmente forte nos Urais. Em 1907 veio a vigorosa reagio oficial e 0 anarquismo, j8 dividido, perdeu sua forga. Quatro grupos distintos atuaram nesta época: 05 comunistas- ‘anarquistas, 08 individualistas, os anarco-sindicalis: {as e 05 pacifistas tolstoianos. | ‘Com a Primeira Guerra Mundial a atividade anar- ‘quista cessou quase que completamente. Na revol do de outubro de 1917 os anarquistas participaram € sua aco se confundiu com a de todas as forgas de esquerda que batalharam para fazer da Russie uma repiblica soviética. Nao obstante, foi preciso que re: tornassem todos 0s exilados para que o anarquismo russo, enquanto tal, retomasse o seu brilho. Nao faltaram acasiBes. A principio os anarquistas divergiram quanto & participagao no governo bolche- vique, alguns colaboraram ativamente. Rapidamente 1a grande maloria compreendeu que 0 governo im: 89 90 Cain Taio Vieira Costa plantado na Russia era a ditadura de um partido, ab- solutamente inconcilidvel com toda a tradigdo ¢ os Iideais libertarios. Afinal de contas, eles sempre com bateram qualquer forma de autoridade, e o Estado sempre foi 0 maior inimigo. Dai ao combate aos bol cheviques foi um passo. Este combate assumiu varias formas. Sepatei o episédio da Machndvschina e de Kronstadt (apesar deste Ultimo no ter sido dirigido diretamente por anarquistas) pela relevancia com que se expressaram 0s sentimentos andrquicos e pela violéncia dos bol cheviques na sua repressio. Em abril de 1919, na cidade de Jarkov, reuni- ram‘se anarquistas de todas as tendéncias — com exceeio dos sindicalistas — numa conferéncia que ficou conhecida depois como Nabat (Alerta) e lar garam 0 embrigo do “anarquismo Unica” preconiza- do por um anarquista russo, Voline, que insistia na unio dos anarco-comunistas, individualistas e anar- co'sindicalistas. Criaram a Confederacéo de Organi: zacdes Anarquistas. Opuseram:se taxativamente a0 conceito de ditadura do proletariado, mas concorde: ram que a investida dos contra-revolucionérios “brancos” era um perigo maior para a revolucao rus se. Decidiram organizar ou apoiar qualquer grupo guerrilheiro que estivesse fora da estrutura oficial do Exéreito Vermelho. Estavam de olho naquilo que chamavam de "ndcleo fundamental” deste novo exército, um bando de guerrilheiros organizados en: tre as massas camponesas e liderados por um jovem o Ararquism a teimoso, Nestor Machné. & Conferércia de Nab estluiambém Bo apolar nenhum soviete ou sind toro que estvese sob tnfludnciaparticria Prope Tarn erm troca comites noo ico aglutnadores de (Ss as enters oe oer, comporeae pulando revoldciondia em gol re Machnbvschine, como fol batizada pelos histo riadores comenou corn figura deste jover TUS, Nestor Mechno, nasido ern 1869, sho de campo. hoses uoterianos. Battante ativo a revoluggo. de 7905, quando tomou conato. com at dios aner usstis eonhectu bom as prises cra stas, onde pe fl eto. anos de trabalnosForeados, depos dao” mmutgedo de uma pena de morte em vrtuge de sua participagao num ato terrorista que custou a vida de dim ofa somentelivrouse por deretode anistia do governo prowsori em margo de 1917. Nesta époce chou pore sua terra, a cidade de GullatPole, onde {oi nomeado presidente do sovete local. Em agosto teste mesmo ano organizou uma quadritha de cam nese: artados pars expropriar a5 trrs dos ices e Thtnbui tes entre os deovalidos. Comeau af umacar fea fulminante que ina calocélo no posto de um dos mals formidives entre todos os chefes do anar quis. Na primavera sequinte ot Boleheviquesassinarim 9 tatedo do BrestLitovse e 8 Urania fot ocupada or tropes austrfacase elem. Pei gachno ficou profundamente indignado com este compromisso assurmido com of inimigos imperiais Le 92 Caio Tilio Vieira Cost tas alemées. Viajou até Moscou para parlamentar com Kropotkin. Este recusou-se @ dar-Ihe qualquer consetho mas causou-lhe uma grande impressao. Conferenciou com Lenin e disse-Ihe que quem esta: va fazendo a revolucao no Sul eram os anarquistas € 0s socialistas revoluciondrios. O chefe bolchevique fez pouco caso, falou do “fanatismo vazio” dos anarquistas mas ofereceu ajuda para Machno voltar para sua terra. Uma grande surpresa 0 aquardava, Guliai-Pole estava totalmente ocupada pelas tropas austriacas, sua casa fora invadida e seu irmao execu. tado sumariamente, Imediatamente Machno organizou, sob a bandeira ‘negra do anarquismo, mais um destacamento guerri Iheiro © atacou os ocupantes, tomandd a cidade. Em novembro foi beneficiado pelo armisticio conseqiiente retirada das tropas, 0 que Ihe rendeu grande quantidade de armas e munigées. Partiu en: to para cima dos seguidores do lider nacionalista ucraniano Petliura e os expulsou da regio de Ekaterinoslav, para perder a posi¢go pouco depois Para o mesmo Petliura que, por sus vez, foi poste riormente arrasado pelo Exército Vermelho. Nos primeiros meses de 1919 manteve relagBes ‘amistosas com os bolcheviques sendo continuamen. te saudado pela imprensa saviética. Em marco deste mesmo ano o seu Exército Insurgente da Ucrania aceitou um acordo com o Exército Vermelho para ‘combater as tropas brancas do General Denikin que marchava sobre Moscou, onde no chegou pois so- | ' | O que 60 Anarguisme 9 freu um sério revés provocado pelos homens de E a istas jachné, Nesta unio tempordria, os machnovist tuisvam ome cldusula que preservasre fue InGepen dincia organizativa com relagéo aos. vermelhos. Convoraram 0 3° Congreso Regionale o mesmo ‘oi proibido pelo Exército Vermelho sob a alegapao dai em diante as relagdes nunca mais foram muito amistosas entre ambas as partes. Para of bolcheviques os outrora valorosos comba tantes ueranianos se transformaram ern “anarco ban dios ou simplesmente “bandidos” como os aval ficava Trotsky, Em abril os bolcheviques ordenaram também o cessar das atividades da Nabat. Em maio foram capturados e executados agentes da Cheka, a policia secreta bolchevique, que tinham por missa0, 6 assessinato de Machn. Er julho varios anarquistas, reuniram-se ao quartelgeneral de Machno em Guliai Pole. oe ‘A ruptura final ocorreu com a convocacio do 4: Congresso Regional pelos Machnovistas que convida tam of soldados de bose do Exército Vermetho a articipar. Trotsky ficou literalmente possesso e de: bretou a protbieao do congresso eolocando Machn® fora da lei, acusando-o de alta traigo e combate 20 poder dos sovietes na Ucrénia, Ordenou @ captura dos delegados do congresso. No final de 1919, raposamente, mandou instru 0es taticas a Machné para que se destocasse com seu exército até os combates na frente potonesa, ten: Me 94 Caio Palio Vieira Costa {ando tirar Machné dali e partir para a bolchevizagao Gefinitiva de Ucrania, Machné recusou-se a cumprir 2 ordem eo Exército Vermelho dispés-se a marchar Sobre @s forcas do insolente desobediente. A batalha de guerrithas teve inicio e nela somente Cs Insurgentes machnovistas levaram a melhor. Sus 8 5 | xe or eens ord ra | Sse opupc ote calan a aroma Estas unidades de produco eram federades em dis- | fconomico conjunto independente de qualquer par Jue Politico. A autogestdo foi praticada. Voline, Baron @ Ashinov publicarsm um jornal e organize, fam uma Comissao de Cultura e Educacdo: conferen, ciavam as tropas e planejaram escolas de acordo com Os métodos de Francisco Ferrer (um educador es Panhol anarquista), tendo como base a espontanei Gade ¢ a independéncia entre os alunos; abrivam um teatro experimental & prepararam um programa de O que éo Anarguisme 9s ai a comuna era compos- educagdo para 0 adultos. Cada comuna rac ta de mais ou menos 200 casas num total de 300 pessoas. A primeira comuna recebeu 0 nome de Rosa Luxemburgo © o soviete live local gaanta a Cada uma © gadoe as ferramentas oa eolas contisea das aos nobres e latitundirios. O Exereito Insur gente, que chegou a ter quase 50 mil homens ato, garantia cada comune t As experinels comunitiris urbanas no deram cero, em parte pela pouca dsposiege de Machn6 om relagdo as clades pois sempre exaltara asim plicdade do campo e via nel o unico lugar posive ara sas ealizagbes, . Entretanto, em detrimento de toda sua terminolo- sia libertiria, seu exéreito foi asin somente no ne me. Woodeock resaltou 0 grande dominio que ee 2 seus comendantes exeriam sobre a mass Insur gente. Voline, om sua monumental A Revoluedo Dosca dter magnanimo e Desconhecida,pintuine um cardter og formidivel apesar de sua queda pelo alcool que 0 fea, inimerahvezes, perder cabece, Machné e 0 Exérito Vermeth, no seu entrevero, areomaram nova isu quando combatram con juntamente at tropas.brances do. Bardo Weangel, sucessor de Denikin, na segunda metals de 1920. AS foxes inate de Mecnd mana ro, Em novembro deste ano océrebro de Trotsky lou ame de us roe franan. Convio para um conselho oficeis do exéreito machnovista p militar na Crimi fim do conversare comemorer aaa aac eee eee eect eeaaeeR EEE = < Gtio Taio Vieira Costa uns “amigos espanhdis sak gone Wvaram-no ‘da morte pela 0 gato finland Goria quara cil na Re © Caos na industria, sap eclosd de grover cidade. Os reba com, mat com em 1921. A fome, 4 insatisfacdo politica levaram 4 m Petrogrado, Moscou e outras wadores, nas rues, solicitavam mals Se ais combustivels © mais meias de trans patna geciam a supresséo dos “Batalhies de Tra. Poe ee glfotsky: a reaparicéo dos sovietes e on iés de fabrica livres; liberdade de palavra; restay 80 da Constituinte; supressio da policia secrete © @ liberacdo imediata dos presos politics, 0 queéo Anarquiimo ” Uma delegacdo de marinheiros e trabalhadores de Kronstadt dirigiu-se a Petrogrado para levar solida riedade aos grevistas e foi obrigada a retroceder. Realizaram entio na Praga da Ancora em Kron stadt duas grandes assembléias apoiando as reivindi cages dos grevistas ¢ adiantando outros pedidos, Nao existia exatamente nenhum anarquista desem: penhando papel de lideranca em Kronstadt, mas os slogans formulados traziam fortes caracteristicas libertérias (como “onde ha autoridade no hé liber dade”), Pediram o fim do trabalho obrigatdrio, a restauragio do controle operario, a substituiggo do Exército Vermelho por grupos guerrilheiros auto- nomos e clamaram pela destruicéo da “comissario- cracia”. Fizeram chacotas de Lenin e Trotsky e exi giram a imediata restauraco das liberdades e ele ‘c6es livres para todos os drgios da democracia sovie- tica, Imaginem a surpresa dos chefes comunistas. Ve rem-se criticados exatamente pelos trabalhadores © marinheiros de Kronstadt que haviam dado um vigo: roso impulso 8 revolucao em 1917. A reagao foi ins- tantnea. Trotsky chamou a si a dire¢ao das opera Bes, Bradou no microfone aos amotinados: “Se persistirem na vossa atitude, cagar-vos-emos como perdizes”. € cagou mesmo. Alexandr Berkman — que junto cam Emma Goldman e mais dois anarquis: tas se ofereceram para mediar 0 conflito, inutilmen- te — contou que de Petrogrado podie-se ouvir o rui 98 Caio Titio Vieira Costa do surdo dos canhdes vermelhos transformando Kronstadt num matadouro, numa orgia de sangue. Num ultimo apelo os sitiados proclamaram: “Que ‘© mundo o saiba! O sangue dos inocentes caird sobre 1 cabeca dos comunistas sedentos de poder! Viva 0 Poder dos sovietes!”. A 18 de margo de 1921 estave Gebelada a rebeligo na ilha e os trabalhadores em Petrogrado sob o jugo da lei marcial impossibilitados de qualquer reacao. No fim do ano seguinte os anarquistas que resta: vam na Russia estavam na cadeia ou mortos. A maio- ria tinha-se exilado e os que permaneceram e no fo- ram detidos reduziram-se a um completo mutismo, Na Franga “Vive lanarchie.”” Assim Ravachol, ou melhor Koenigsten, acolheu sua sentenca de morte. O ex: ladrao, ex-contrabandista e ex falsério sem sucesso e depois anarquista de sucesso subiu os degraus que © levaram & guilhotina recitando versos anticlericais. Sua importancia, como notou Barbara Tuchman, ndo reside em suas bombas, mas na sua execucao. A partir dela Paris ouviria constantemente o estri biho “‘Chegara, chegard. Cada burgués sua bomba receberdl”” ‘Mas nao foi Ravechol 0 pai do “terror anarquis ta’ na Franga. Vale a pena relembrar um pouco da - O que éo Anarquis histaria de terra de Proudhon, de onde seus discipu: los impulsionaram a | Internacional; pela primeira ver se desenvolveu 0 anarco-sindicalismo; 0 indivi dualismo anarquista, no terrorismo, alcangou as mais sinistras proporcées ¢ os poetas, escritores e pintores. se influenciaram perdidamente pela doutrina dorata no apotedtico fim de século. Na metade do século pasado, & parte Proudhon e seus discipulos, desenvolveramse na Franca nume- rosas correntes anarquistas. Destas se destacaram a de Ernest Coeurderoy, um apaixonado da destrui io, € a de Joseph Déjacque, um dos precursores da posterior “propaganda pela acdo” Mas, até o final dos anos setenta do século XIX, prevaleceu na Franga a doutrina mutualista, como jé foi visto no capitulo anterior, Perderam sua influén: cia depois para as idéias coletivistas, através dos | bakuninistas franceses: Elisée Reclus, Bendit Malon, | Albert Richard e outros. Foi visto também o fiasco da Comuna de Lyon, levado a cabo diretamente por Bakunin. Mas no pararam em Lyon as pretensbes comunitarias ¢ os anarquistas jogaram tudo na Co- muna de Paris. Woodcock anota muito bem que a Comuna de Pa: ris foi marcada por um fato singular: nao foi blan: quista, nem anarquista, nem marxista @ sua historia se mesclou com a de todas as correntes politicas de seu tempo. Com a queda da Comuna em 1871 veio a perseguigao Internacional dos anarquistas, decla rada subversiva e posta na clandestinidade, provo- 99 | es 100 Caio Taio Vieira Co cando 0 exilio de toda a turma libertaria. Somente no final dos anos setenta os diversos gru pos tentaram a unificago do seu movimento. O ano de 1879 marcou a anistia aos participantes da Co- muna, a revigorago das diversas tendéncias politicas © 0 consequente aprofundamento das divergéncias. Em 1881 um movimento declaradamente andraui co iniciou sua carreira independente na Franca. O Prestigio do anarquismo nesta época, um pouco an tes das dinamites, deveuse menos a suas agdes do que 4 eminéncia ‘dos intelectuais que professavam sua doutrina. Estavam no auge de suas produgies: Sébastien Faure, filésofo e pedagogo; Emile Pouget, diretor do corajoso e influente periddico Pére Peinard; Jean Grave, jornalista; Louise Michel, lider feminina e participante ativa da Comune de Paris; e Elisée Reclus, ge6grato, De 1881 até 1894 2 burguesia francesa, os pode: 0308 @ varios “inocentes” sofreriam na carne e no espirito as agruras da violéncia politica que congre. gou uma exiqua minoria entre os anarauistas, mas Provocou um enorme tumulto e muita sedugdo, Os historiadores creditaram o sucesso da violéncia poli- tica na Franga também a sinistra influéncia de um delegado de policia, Louis Andrieux, e de um agente Provocador belga conhecido por Serreaux, cujo ome verdadeiro era Egide Spilleux. Este Ultimo in filtrou-se entre os grupos parisienses e defendeu elo qiientemente a violéncia. Com um dinheiro arrume: do pela poticia ajudou a fundagSo de um jornal li- O que be Anarquismo, ia er aac ates eee ae AE ee ce SancGonan mast emt Sea eta ores te in ae eee etn 88h cbqou ora baron ranma Lace Grane ae a cae suns omc arate ones ene cal esee So pent tie honeasse vite ce omic | cane oa one ene we abs ont Se eet eone ma Sabena ee Staou a eve oder = anarte tas. Em 1883 promoveu em Lyon o célebre processo Serbs ere No mesmo ano, Louise Michel e Emile Pouget gies 360 manent Re Sane ania lata de yore raat Im a a pinot corer pals FOS sear titania", rabato ou chm! ee ae ne ee ee eae stor Pas, Laws tele 102 Caio Talis Vieira Costa Pouget foram condenados. Frente a violenta indigna ¢0 da opinido pablica 0 governo foi forcado a anis tié-los em conjunto com 0s condenados no proceso de Lyon. Ficaria por conta de Ravachol a estréia de mais uma fase violenta de margo de 1892 a junho de 1894. No entretempo foram cometidos onze atenta dos a dinamite com um saldo de nove mortes. Na Sérvia, 0 ministro residente foi gravemente ferido, 0 presidente da republica apunhalado e morto, quatro assassinos justicados. O pais inteiro tremia e os ins trumentos postos em acio pelo Estado destrutram a imprensa libertéria, processaram os lideres e dis persaram todos os grupos autdnomes. Contrapondo-se 20 individualismo exaterbado, 0 tradicional comunismo-anérquico reagiu opondo & “propaganda pela aco” a propaganda pela palavra; experimentou @ inovou, foi para 0 campo e criou co- lénias anarquistas (algumas comunidades sobrevive ram até 1940) e fundou escolas libertarias como a conhecida La Ruche de Faure. ‘A reago ao individualismo nao ficou por conta somente dos tradicionais anarco-comunistas__kro- potkinianos. © ano de 1894 assinalou 0 inicio da escalada do anarco-sindicatismo que, no inicio, con viveu amigavelmente com os anarco-comunistas depois substituiu-os enquanto corrente dominante ‘no movimento libertério. O apogeu de sua influéncia entre 08 trabalhadores franceses seria marcado pela famosa Charte d’Amiens, de 1906, onde se procla O que én Anarauisme 2 (pou » completa atorenia do mouinento sea | tista & negava-se qualquer solidariedade pol/tica aos partidos ce esquerda e de direta. Aos poucos, @ par Te de 1908, apos uma série de groves desastrosas © prisbes de Iieres, 0s singieatos nacionais, menos ra Seas, foram conguistando o poder da Confederarao Geral'dos Trabalhadores, a entdo dominada pelos Srarco-sindicaistes. Com a guerra viram também as | divergéncias entre os anarquistas com respeito a0 mi- | fitarsmo, e, com 2 Revoluedo Russo, a desagregacio total dentro da CGT. Somente em 1920 os anarquistas tentaram uma reamroximagio mais duradoura e eriaram 3 Unido tiot Anarquistas Franceses — UAF, reagrupando to des. at tendéncias dispersas, © jornal O Libertdrio, Grado desta associapdo,stria diariamente de 1923 2 | 1925. Novas amarguras e dispersdes aguardavam os libertarios com 2 ascensio do fascismo europeu ‘Os exilados russos em Paris (Piotr Archinof, Nes tor Machné e Ida Mett entre outros) tentaram em Conjunto com Sébestien Faure riar uma nova Plata forma de Organizaedo Geral dos Anarauistas. A UAF fo. 0 paleo estas tentatives. Em sintese, eles que J Harr snitiear os individualises, oF anarco-comunis | tare os anreosindenines. Sébastien Faure, 3 txemplo de Voline nd Rosia, teorizou 9 respeito Gesta unio e escreveu a Sintese Anarquista. Mas 0 rojeto de unido acsbou levando os anarquistas a ine cisao entre os organizacionais e 0s antiorgani avionais, De 1926 até 08 dias de hoje 0 anarquismo Louise Michel (1830-1905). (io Tito Vieira Cosa ‘Fmma Goldman 11869-1940), O que é Anarquisme 10s francés viu ¢ participou de varias cisées que criaram siglas e mais siglas ou pequenos grupos. Alguns acei- taram @ sintese anarquista, outros a repudiaram. Mas, orgenizativamente, nada permaneceu de muito conereto e as grandes manifestagdes antiautoritérias, | como no caso da revolta estudantil em maio de 1968, pouco tiveram a ver com os tradicionais nucleos | snérquico, Em junto de 1977 em Toulon um con (gress0 perecia tirar do estancamento a Federagao Anarquista Francesa — FAF, reconstitufda em de- zembro de 1953 sob © principio da pluralidade de tendéncias, Na Italia Os herdeiros de Malatesta assistiram aténitos o enfraquecer do anarquismo na Itélia depois da t Guerra Mundial. Fracassada a reconstrucao imedie- ta da Unido Sindieal Italiana ~ USI, os debates des locaram-se apenas para o nivel ideoldgico; e 0 tradi ional humanisme anarquista, de cunho malatestia no, influiu e orientou 0s anarquistas apenas em suas preocupagdes organizativas em detrimento do sin- dicalismo-anarquista, que via o reformismo dominar totalmente as organizacdes dos trabalhadores. Este reformismo pode ser traduzido assim: lutas esporadi cas apenas por reivindicagbes imediatas sem nenhum conteddo mais radical ou profundamente revolucio: 106 Caio Titio Views Costa Um pouco antes de 1968 os anarquistas italianos impulsionaram decisivamente 0 seu movimento através do Umanité Nova. Criaram a Federagio Anarquista Italiana — FAl, que procurou um pacto federativo entre os humanitaristas, os anarco-comu: nistas e os sindicalistas. Em 1965 comecaram as cisdes dentro da FAI e dela surgiram os Grupos de Iniciativa Anérquica ~ GIA, uma pequena federaco de grupos de orientacao pacifista em defesa da auto: nomia pessoal e contra a participago em qualquer Orgdo do sistema, os sindicatos inclusive. Outra cisio provocou o nascimento dos GAF — Grupos Anarquistas Federados, que resistiram até 1967, tentando criar uma base tedrica para os gru pos de afinidade. Outra corrente paralela foi a formada pelos "Co: munistas libertérios” ou anarco-comunistas centra dos sob a antiga plataforma organizativa elaborada pelos exilados russos na Franga. Em conjunto com outros grupos anarco-comunistas organizados fora da FAI, os “comunistas libertarias" formaram ni cleos de defesa sindical nos bairros e nas fabricas, Os anarcovsindicalistas sdo ainda fortes sobretudo na Toscana e trabalham na reconstrucio de uma ‘oposi¢ao sindical revoluciondria dentro dos sindice- tos existentes e considerados reformistas. A ascensao dos “auténomos” foi marcada princi palmente em 1977 com a ocupagdo das universide ‘des pelos estudantes. Defendiam a autonomia na es cola e nas fabricas. Apoiaram as reivindicacbes fe- = O que br Anarguivme 107 ay — mulher de Bakunin, advogado napolitano, intimo do proprio Bakunin e fiel colaborador, Alberto Tue ci, membro da céipula internacional da Fraternidade, napolitano, A partir de 1869 firmou se na Itélia um influente movimento anarquista. A principio com muita forca Ro centro do pais depois revigorado com a adesso de mais de 4 mil membros na regigo napolitana ¢ Posteriormente adesées na Campania e na Sictlia Em 1871 alguns jovens entraram em cena, Eram eles: Malatesta, Carlo Cafiero e Carmello Palladino, todos com pouco mais de 20 anos e uma fantéstics Gisposi¢go para os combates libertérios. Com o eres. imento da Internacional cresceu também 0 apoio dos italianos a Bakunin contra Marx e Engels. O centro maior das atividades anarquistas foi a Romagna sob a batuta de Andrea Costa. Em 1873 0 governo reprimiu e prendeu varios de legados de um congresso nacional anarquista em Bo. lonha. Neste congresso a principal resolugdo exorta- va a propagande libertérie no seio dos 14 mithdes de camponeses da Lombardia e regigo Meridional que Passavam fome e febre. Durante 0 ano de 1874 os internacionalistas registraram 30 mil membros ete. tivos na Itélia, Em 1876 Carlo Cafiero e Malatesta Partiram para o campo aberto da luta revolucioné ria e passaram a propor a “propaganda pela aqa0"" como tética para os anarquistas de todo o mundo. Esta nova doutrina dominou as atividades dos anar. quistas na Europa até 10 anos antes do fim do sécu- aio Tio Vieira Costa -) 109 Oque éy Anarquiome 1. Conforme salientou Andrea Costa, também um des primers inpubonadores do novo cred, fagdo violenta era necessiria, principalmente na its iia, para iluminar o novo ideal entre os velhos ga ribaldinos e mazzinistas que estavary esmorecendo. Griaram organizacées secretas e planejaram insurrei oes em diversas regides italianas, todas fracassadas, © que acarretou varias prises e 0 estancamento des atividades anarquistas durante muito tempo | apesar da simpatia papular que encontraram os anar. qhstes, pinelpalmente contra 0 einado de Vittorio | EKGs poucos os italanos eequeceram 0 cousin Juniniano e passaram a0 comunismo anéraui | o'mesme tempo, em 1878, comezaram oon de violencia. Um cozinheico, Giovanni Passamante, ten tou golpear 0 novo Rei Umberto; um dia depois ex plodiu uma bombs matando 4 pessoas nui cortejo Mondrquico em Florenca e dat a dois dias foi deto nada outra bomba em Piza, Intensificaram os aten tados, as mortes € as prisbes entre os anarquistas. | ‘Andrea Costa desertou das ides libertirias © se elegeu para a Camara dos Deputados, siudando logo | depois na fundagio do Partido Socialista Italiano Carlo Catiero, em 1882, conclamou os anarquistas 4 entrar massivamente na Social-Democracia. O pro: letariado italiano partiu quase em bloco em apoio a0 Socialsmo parlamentar @ os anarquistasfiaram re duzidos 2 uma progresiva minora, Sobreiveram funcdo das atividades incansdveis de Saverio Merlino Caio Tito Vieira Costa € Malatesta. Como na Franca ena Espanha,o ome. Ge do séeuloaxsatu na Nala ao reer ds cre es libortiias através do araveosindiealinng ee i812 um conjeso em Bolom tundou 2 Ust em oposgdo aberta Confedercto Geral go Tebak Em 1819 a USI tinha S00 ml membros pear de estorcos de Malatesta om Tevver um anetig tals ortodoxo em opesgdo sos norcosinacaieen A Primera Guerra Mural depos 6 tosis eriaram um fongohiate do cual © anarcuene nae no no saiia com a mesrna paviipaglo meena influente de antes. goles eid Na Espanha A Expanhs foi 0 Gnico pais do mundo teorias revolucionérias de Bakurin se comereees erm um poder real. A airmagio & de HM Eneern berger em O curto veréo da anarquia, uma espécie de biogratia de Buenaventura Durr uin des noe importantes lideres anarauistos eapanfon, Denes Guerin considera os anarquistas expan esherne 198 epiriuais de Bakunin, Os dos tem vaste goo Geria ser acrescentado que na Espanha osnarcese, Aieaismo eeangou seus meiores momantes, O quedo Anarguims m1 bem maior e mais interessante na Espanha, muito antes da chegada de Fanelli, o emissério elogdente de uma doutrina brava, calorosa e criativa Nos anos quarenta do século passado 0 parlamen- to espanhol produziu entre os camponeses uma ver- dadeira revolugio ao confirmar a posse das terras ‘aos “novos fazendeiros” citadinos, desapropriando fas pequenas propriedades. Os camponeses, defen: dendo-se daqueles que vinham de longe tomar suas terras, armaram-se e criaram uma das formas mais primitiva de defesa: 0 bandoleirismo. Isto obrigou ‘a nova “classe” de fazendeiros a desenvolver uma es pécie de exército de ocupagio das terras dando int ‘cio. a uma permanente guerra de guerrilhas. Segundo os historiadores, as insurreigdes sequiam um roteiro prefixado: os camponeses ‘matavam os ‘quardas civis, sequestravam os padres e funcioné: rios, incendiavam as igrejas, queimavam os regis: tros cadastrais e oS contratos de arrendamento, aboliam o dinheiro, deciaravam-se_independentes do Estado, proclamavam comunas livres e explora: vam coletivamente a terra. Tudo isto na melhor tra digo, embora muito antes, dos ensinamentos li bertarios. Max Nettiau nota a propésito que em 1845 um discipulo proudhoniano, Ramén de La Sagra, con: siderado 0 primeiro anarquista espanhol, fundou em Corufia o jornal Ef Porvenir, fechado imediatamente pelas autoridades, mas que pode ser considerado 0 mm Caio Pilg Vieira Costa primeiro entre todos os jornais anarauistas Tsolade da Europe, com fortes caracterfsticas con servadoras e a0 mesmo tempo revolucionéras, a Bs pana produziu um potent, movimento anorauista entre 0s operdrios de Barcelona, Madrid e sobretudo entre os eamponeses da Andaluzia, Aragio, Levante Galicia Antes do aparecimento dos bakuninistas aconte ceram greves em Barcelona, tumultos em Madr, sublevagdo de camponeses e insurregdes rurals na | Catalunia, “Aragio e Valencia, Em setembro de 1868 0s espanhois forcaram o exilio da Rainha Isa bella, quando comecou imediatamente a historia de uro' do anarquismo espanhol. Em outubro, apro veitondo um perodo de grandes fermentagées 50. | ais, Faneli disseminou entre of jovens intelectuals © operarios das eidades as idéias antiautortaras de. i fendidas dentro da I Internacional. A adesio foi qua se_unanime e imediata, Apareceram os primeiros jornais e as primeiras segdes da Internacional em An: daluzia, Valencia e na Espanha setentrional. No ano de 1870 fundou-se 2 Federacdo Espanhola da In. ternacional com a presenca de 90 delegados em Bar: celona. Dois anos depois, apesar das gestées contré: rias do genro de Marx, os anarquistas tomaram as mesmas decisdes da Internacional de Saint-Imier, descentralizando as segdes locais que ganharam ple. ‘na autonomia e criaram um escritério central apenas ara correspondéncia e estatistice. Na proclamaggo a repiiblica, em 1873, a Federagdo Espanhole esta 0 que bu Anarquivmo 4B va com 50 mil membros. ‘pos a efémera e desafortunada presidéncie do federalista Pi y Margall — com a abstinéncia politica dos anarquistas —, 0 exército tomou 0 poder e sus pendew a Federagéo Espanhola da internacional, prendeu anarquistas e obrigou muitos @ se exilarem. | Na clandestinidade, porém, os anarquistas continua | ram atuando com relative sucesso. Em 1878 um jovem consertador de barris tentou assassinar Alfonso XII. A repressio_contra-atacou violentamente e provocou greves na Catalunha e in: céndios nas fazendas de Andaluzia. Em 1881 um mi histério mais liberal legalizou as organizacdes operé- rias ea se¢do espanhola da Internacional voltou as. | claras mas 2 onda de violéncia implantada por alguns fgrupos que se diziam anarquistas levou-a novamente 3 clandestinidade um ano depois. Como na Franca & na Italia, # Espanha do Ultimo decénio do século pasado presenciou insurrei¢Bes, bombas detonadas E assassinatos. Ao mesmo tempo os anarquistas es | panhdis dividiam-se em comunistasanarquistas (sus | tentando a necessidade de levar adiante a propagan da pela a¢do) e coletivistas (fidis 8 linha politica da finada Internacional, favoréveis és vastas organiza ‘goes operdrias guiadas pelas elites de anarquistas Convictos). Estas duas correntes persistiram dividi das_mas mantendo relagdes amigaveis até 1940. ‘0 movimento sindical espanho} nasceu da ala co letivista totalmente revigorada a partir do finzinho do século. A importancia da greve geral na revolugao | 14 Caio Titio Vieira Costa imediatamente aceita pelos libertérios espanhiis. Varias insurreigdes tracassadas ¢ a morte de muitos militantes nos confrontos abertos contra a policia desnudaram a necessidade de uma forte organizagao de luta. Em outubro de 1910, em Sevilha, num his- torico congresso, os representantes dos sindicatos de toda a Espanha fundaram a CNT ~ Contederagio Nacional do Trabalho, faltando-Ihes apenas 0 apoio dos socialistas, federados anteriormente na UGT — Unido Geral dos Trabalhadores. Inspirada diretamente na CGT francesa, a CNT destacou-se logo da irm& mais velha principalmente Porque os anarquistas souberam tomé-la nas maos rapidamente sem perder seu controle. Fundou-se so- bre os sindicatos locais tnicos de cada cidade, orga- rnismos nos quais se reuniam operdrios de todos os tipos. A CNT evitou a criacdo de uma burocracia permanente, Até 1936 existiu somente um funcio- ério pago para toda a organizagao que chegou a ter tum milhao de mifitantes ativos. Em 1912 0 premier Canalejas declarou ilegal a CNT. Um anarquista matou-o, Quatro anos depois a CNT voltou 3 legali dade e obteve um relativo sucesso durante a Primeira Guerra. Em 1917 apoiou a UGT numa greve geral fracassada © devido as suas posigdes e a Revolugao Russa adquiriu mais prestigio. Cortejada pela II In: temacional a CNT foi receptive no inicio. Entre tanto, frente as persegui¢des bolcheviques aos anar- quistas russos retirou-se da INI Internacional reafir mando sua 1 no socialismo libertério e aderiu em One eo Anarquiome ae > 1923 a recém-fundada Associagae Internacional dos | a a ET aa nde Ss ee HSAs! seen om Sop 116 Caio Titi Vieira Costa continuaram sua politica de manter o pa(s num per marente estado de expectativa e agitacéo. A revolu- ‘edo, no entender dos cenetistas, era iminente. Com a revolt dos generais em julho de 1936, estourou a guerra civil. No primeiro perfodo a CNT ea FAI es- tiveram entre os grupos dominantes da Espanha re- publicana, tendo participado, imaginem, inclusive do governo. A partir de 1937 perderam a influéncia para os comunistas e dois anos depois toda a Espa: rnha caiu sob o jugo de Francisco Franco. Como ressalta George Woodcock, as razées para © insucesso dos anarquistas na Espanha, tanto no | plano militar quanto no plano politico, esto no fa- | to de que eles nao podiam permanecer figis & sua doutrina e ao mesmo tempo participar do governo e da guerra total Em compensagio, os anarquistas podem somar ‘0s seus lauréis uma vitoriosa experiéncia durante a guerra civil: praticaram com sucesso extraordinario 2 coletivizacao industrial e agricola, realizando na pratica a autogestao na Espanha. Muito ainda se tem a dizer sobre as maltiptas for- mas sob as quais se desenvolveu 0 anarquismo em outras partes do planeta. Nada devem em criativida de as experiéneias espanholas, francesas ou russas, por exemplo. E nada perdem em termos de perse- ‘quigGes, detencdes, mortes ou exitio. Juntamente ‘com a histéria destas idéias e expedi¢&es deflagradas por alguns anarquistas, como foi visto neste livro, correu bem profunda a historia do anarquismo em O que bo Anarquismo uy toda a Europa, na China, no Japao, nas Américas. Nas Américas ‘A América Latina conheceria os ideais anérquicos no fim do século passado, por idéia e obra dos imi: Uma Enciclopédio Critica one Aucols Amcwionas SRaa roms aoe Bens Nt: mid, A ae IAN asus miei MEARE erase SEE mean Stic ony PBELMES ounces SS hu riowoon Sidi Ae a esha a Ete Hows Sesto ‘ake ECE onevon Fea Eaten sme sae repre EB wowne rth stub Fae Swe atneaSSCE nas ta rea cto Ne rene eh Nas reales, eos raesiimest> tS mount HN ean SRR rey raed Tee, ease eis Bee cost TeNStur cme colt USS ‘eoRaM bau Rn Beek est Peet BE uo sate ee Seno Ron BAAN Mito Shack Nini esto tion Beet msc ats TSE cosa ne tithe von nage ri HERO saves ie Bron seRa

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