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Anais

VIII Congresso Brasileiro


de Psicologia do Desenvolvimento
Universidade de Brasília

Organizadores:
Maria Cláudia S. L. de Oliveira
Diva Maria Albuquerque Maciel
Jane Farias Chagas
Maristela Rossato
Mônica Neves Pereira
Patricia Maria Campos Ramos
Sylvia Regina Magalhães Senna De 12 a 15
de Novembro
de 2011
C749 Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento
(8. : 2011 : Brasília).
Anais do VIIII Congresso Brasileiro de Psicologia do De-
senvolvimento / Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira ...
[et al.], organizadores. – Brasília : Associação Brasileira de Psi-
cologia do Desenvolvimento, 2011.
1352 p. ; 21 cm.

ISSN 2177-1413

1. Psicologia do desenvolvimento – Congressos. I. Oliveira,


Maria Cláudia Santos Lopes de (org.).

CDU 159.922
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Sumário

Apresentação ..................................................................................... 5

Comissões........................................................................................... 7

Estrutura do evento............................................................................ 8

Programação Científica....................................................................... 9

Sábado, 12/11 .................................................................................... 9

Domingo, 13/11.................................................................................. 9

Segunda-feira, 14/11 .......................................................................... 473

Terça-feira, 15/11 ............................................................................... 985

Índice por atividades .......................................................................... 1329

Índice Remissivo ................................................................................. 1333


VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

APRESENTAÇÃO

Prezados Participantes do
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento,

É com grande prazer que apresentamos os Anais do VIII CBPD, um evento da


Associação Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento que neste ano tem por tema
A Psicologia do Desenvolvimento para a Transformação da América Latina.
O VIII CBPD traz à capital federal cerca de 600 participantes, entre pesquisa-
dores, profissionais, estudantes de graduação e pós-graduação de Psicologia e áre-
as afins, oriundos de quase todos os estados brasileiros e de países das Américas e
Europa. Este número constitui um recorde e dá testemunho da importância deste
evento, que se consolida no calendário científico da Psicologia brasileira.
São apresentados aqui aproximadamente 500 trabalhos, entre mesas redon-
das, simpósios, comunicações orais e pôsteres, relacionados a sete áreas temáticas.
Constituem eles relatos de pesquisas e abrangem uma pluralidade de contextos,
objetos e metodologias, em torno dos quais se tem construído a Psicologia do De-
senvolvimento. Mas, encontramos também relatos de experiência profissional, tra-
balhos que enfocam o estado da arte da pesquisa da área e ensaios críticos, os quais
expressam a diversidade de leituras do fenômeno do desenvolvimento humano na
linha do tempo, uma pluralidade de perspectivas que temos buscado preservar neste
Congresso!
Este ano, o CBPD apresenta outras novidades. Abraçamos a vocação de pro-
mover e qualificar a interlocução e as redes de colaboração acadêmica com nossos
colegas pesquisadores e profissionais de outros países da América Latina. Contamos
com a presença de congressistas e renomados conferencistas de diferentes países do
continente americano, com destaque para Colombia, Peru, Argentina, Cuba, Estados
Unidos, além da Alemanha. Deste modo, visamos contribuir para dar expressão à
riqueza do pensamento psicológico que se produz nos diferentes países desse conti-
nente, além de debater questões comuns a nossas realidades socioculturais de países
constituídos a partir de relações coloniais.
Desta forma, adotamos intencionalmente uma posição distinta da que marcou
a construção histórico-social da nação brasileira que, ao longo dos cinco séculos de

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

história manteve o olhar direcionado para a Europa e a América do Norte, e as costas


para o continente latinoamericano. Que essa realidade, que já vem se alterando, seja
positivamente afetada pelos debates ocorridos neste Congresso!
Aproveitamos a oportunidade para expressar nosso agradecimento à CAPES,
CNPq, Universidade de Brasília e a todos aqueles participantes, membros das Co-
missões, avaliadores ad hoc, parceiros e patrocinadores, sem os quais não teríamos
chegado até aqui.

Brasília, 15 de novembro de 2011.

Maria Cláudia S. L. de Oliveira


Presidente da ABPD
Comissão Organizadora do VIII CBPD

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

COMISSÕES Maria Helena Vilares Cordeiro


Maria Regina Maciel
Mário Sergio Vasconcellos
Maristela Rossato
Diretoria da ABPD Miriã Alves de Alcântara
Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira Mônica Neves-Pereira
Adeiaide Alves Dias Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues
Ana Paula Soares da Silva Patricia Alvarenga
Miriã Alves de Alcântara Rosalia Duarte
Zena Winona Eisenberg Rosangela Francischini
Ruben de Oliveira Nascimento
Comissão Científica Sávio Silveira de Queiroz
Silviane Bonaccorsi Barbato
Vera Maria Ramos de Vasconcellos
Tania Mara Sperb
(Coordenadora)
Vera Maria Ramos de Vasconcellos
Zena Winona Eisemberg
Avaliadores Ad Hoc
Adelaide Alves Dias Comissão Organizadora Local
Alba Cristiane Santanna
Alessandra Oliveira Machado Vieira Diva Maria Albuquerque Maciel
Alexsandra Zanetti Jane Farias Chagas Ferreira
Ana Cecília de Souza Bastos Maristela Rossato
Ana Paula Soares da Silva Mônica Neves-Pereira
Anamelia Lins e Silva Franco Sandra Ferraz Castilho Freire
Angela Donato Oliva Gabriela Souza de Melo Mieto
Angela Maria Uchoa de Abreu Branco Sylvia Magalhães Senna
Bernadete de L. Alexandre Mourão
Carolina Lampreia Comissão Executiva
Cecília Guarnieri Batista Ana Carolina Villares Barral Villas Boas
Cláudia Broetto Rossetti Ana Paula Carlucci
Débora de Hollanda Souza André de Carvalho Barreto
Diva Maria Albuquerque Maciel Francisco Rengifo Herrera
Elaine Pedereira Rabinovich Julia Escalda Mendonça
Eliane Maria Fleury Seidl Julio Cesar dos Santos
Elton Hiroshi Matsushima Manuela Smith
Gabriela Souza de Melo Mieto Marina Kohlsdorf
Ivalina Porto Mônica Rocancio Moreno
Jane Correa Patricia Cristina Campos Ramos
Jane Farias Chagas Ferreira Polllianna Galvão Soares
Julio Rique Neto Rute Morais Nogueira Bicalho
Leila Regina de O. d’ Paula Nunes Sueli de Souza Dias
Leila Sanches de Almeida
Tatiana Yokoy de Souza
Lucia Helena Cavasin Zabotto Pulino
Lucia Vaz de Campos Moreira
Secretaria Executiva
Maria Cláudia S. Lopes de Oliveira
Maria Helena Fávero Cláudia da C. Freire

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ESTRUTURA DO EVENTO

Dia 12/11 - sábado Dia 14/11 - segunda-feira

17h-17h30 – Mesa de abertura 8h30-10h – Programação Científica


17h30-18h30 – Conferência de 10h-10h30 – Coffee Break
abertura 10h30-12h30 – Programação
18h30-19h30 – Apresentação Científica
musical 12h30-14h – ALMOÇO
19h30 – Coquetel 14-15h30 – Programação Científica
15h30-16h – Coffee Break
Dia 13/11 - domingo 16h-18h – Programação Científica
18h-20h – Programação Científica
8h30-10h – Programação Científica 19h30 – Lançamento de Livros
10h-10h30 – Coffee Break
10h30-12h30 – Programação Dia 15/11 - terça-feira
Científica
12h30-14h – ALMOÇO 8h30-10h – Programação Científica
14-15h30 – Programação Científica 10h-10h30 – Coffee Break
15h30-16h – Coffee Break 10h30-12h – Programação
16h-18h – Programação Científica Científica
18h-20h – Programação Científica 12h-14h - Programação Científica

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

DIA 12/11 - Sábado valorização da competição, e até mesmo


da agressão física e verbal como estratégia
de resolução de conflitos, minimizando-se
o sofrimento emocional do aluno humi-
CONFERÊNCIA lhado e discriminado pelos colegas. No
contexto escolar, a mídia noticia com fre-
“La Psicología del desarrollo en la actuali- qüência situações de bullying, onde crian-
dad. Una mira desde lo histórico cultural“, ças e adolescentes vivenciam incontáveis
proferida pelo prof. Dr. Guillermo Arias Be- constrangimentos como apelidos relacio-
aton, da Universidad de La Habana, Cuba. nados à sua aparência e agressões por
parte dos colegas. Observa-se que nesses
contextos de violência gratuita e repeti-
tiva muitas vezes a escola e os professo-
res não encontram alternativas para lidar
DIA 13/11 - Domingo com a situação, uma vez que o bullying é
um fenômeno complexo, sintoma de uma
sociedade onde valores sociais positivos
8h30-10h e a ética são colocados em segundo pla-
no. Dessa forma, é necessário destacar a
importância de se discutir sobre as emo-
CONFERÊNCIA ções, as raízes afetivas e motivacionais do
fenômeno bullying, e promoção da ética
e cooperação entre os alunos, articulando
“Bullying: Prevenção da Violência e Pro-
o tema com a realidade da escola, com as
moção da Cultura da Paz nas Escolas
características e conteúdos das próprias
Angela Uchoa Branco – UnB disciplinas e atividades pedagógicas e com
as interações sociais que se dão no âmbito
educacional. Nesta palestra, irei analisar
Diversos estudos voltados para a investi- e discutir estas questões, trazendo da-
gação de crenças e valores entre crianças, dos empíricos obtidos em pesquisa por
adolescentes e professores têm demons- mim coordenada sobre o tema, onde en-
trado que, na maioria dos contextos esco- trevistas e observações foram feitas com
lares, os professores orientam seus alunos professores e crianças do quinto ano de
a competirem entre si ou a serem individu- escolas públicas e particulares. Tendo em
alistas (e.g. Branco, 2003; Kohn, 1992; Pal- vista a relevância da escola nos processos
mieri, 2003). Essa orientação é geralmen- de socialização e desenvolvimento moral
te implícita nas variadas formas de mani- de crianças e adolescentes, e necessário
festação do “currículo oculto” associado a co-construção de uma Cultura de Paz.
à comunicação e à metacomunicação. O A Paz, porém, não é sinônimo de um es-
currículo oculto se expressa pela canali- tado estático de harmonia, caracterizado
zação, geralmente sutil, das crenças, valo- pela ausência de conflitos, mas sim deve
res e ações dos alunos em certa direção, ser entendida como um permanente pro-
e pode ocorrer, por exemplo, por meio da cesso (Jares, 2007) co-construtivo motiva-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do por valores de justiça, solidariedade e interações humanas saudáveis, éticas e


negociação de conflitos, onde sentimen- respeitosas, promovendo valores relativos
tos de empatia e compreensão mútua à justiça, dignidade humana e responsa-
permeiem os processos de comunicação bilidade social. Quanto mais cedo isto for
e as estratégias de ensino adotadas pe- feito, mais os alunos serão beneficiados
los professores. Para a paz ser promovida em seu desenvolvimento. Daí a necessi-
na escola, é necessário a re-significação dade de prevenção da violência na escola,
subjetiva da violência e da competição especialmente a prevenção do bullying,
por parte da cultura escolar como um por meio da promoção da educação para
todo, no sentido de se promover, diante a paz como eixo transversal presente em
de conflitos, a negociação cooperativa e todas as atividades exercidas no contexto
inteligente. Nosso trabalho em relação à escolar, das matérias estudadas às aulas
questão do bullying tem se inspirado par- de educação física, sempre passando pela
ticularmente na perspectiva sociocultural qualidade atenciosa, respeitosa porém fir-
construtivista (e.g. Branco, 2006; Madu- me dos educadores. Afinal, os alunos pre-
reira & Branco, 2005; Valsiner, 2007). Esta cisam conhecer e compreender o signifi-
abordagem teórica se apresenta bastante cado da convivência pacífica, da mediação
produtiva em abranger a complexidade construtiva de conflitos e da construção
do fenômeno bullying, e promover ações permanente de um contexto democráti-
efetivas em prol de uma cultura de paz co baseado na ética. O certo é que todos,
na escola. Internalizar desde a infância o professores e alunos, são sujeitos ativos
princípio de que o “outro merece ser tra- na transformação de sua própria realida-
tado como eu gostaria de sê-lo”, preve- de, e somente a partir de suas convicções
niria situações de violência e bullying na e motivações algo poderá ser transforma-
escola e, possivelmente, contribuiria para do. A programação e implementação de
a construção da paz em contextos sociais atividades cooperativas entre os profissio-
mais amplos, como a família, o ambien- nais que atuam na instituição educativa e
te de trabalho e outros. Entretanto, para nas salas de aula, bem como atividades
a construção do respeito mútuo e de um cooperativas incluindo as famílias, todas
ambiente de paz na escola, é essencial são relevantes para o sucesso de projetos
que haja o empenho político e local para integrados de prevenção do bullying e de
a formação dos professores, no sentido promoção de uma Cultura de Paz. Somen-
de prepará-los para prevenir o bullying e te com base em um trabalho conjunto de
saber atuar caso este ocorra no ambien- todos os profissionais envolvidos no con-
te escolar, de forma cooperativa e com o texto da escola, um trabalho de equipe no
trabalho conjunto de todos os participan- qual todos—inclusive funcionários como
tes da comunidade escolar. Não é mais porteiros, merendeiras etc—participem
possível desconsiderar a importância da ativamente, é que poderão ser gerados
promoção das interações sociais positivas processos de transformação da cultura
para o desenvolvimento global da criança escolar no sentido da inclusão de todos,
e do adolescente no âmbito das institui- e do trabalho efetivo em relação a promo-
ções educativas. Estas podem e devem ção da paz e da prevenção do bullying nas
atuar no campo da promoção concreta de escolas.

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 01-LT01 relacionada ao desenvolvimento de todo


o primeiro ano de vida. É essa revisão
Emoção/Afetividade que será aqui apresentada. Para o levan-
tamento bibliográfico, realizou-se revisão
nacional e internacional sobre a temática
LT01-951 - REVISÃO BIBLIOGRÁFICA:
seguindo as etapas: 1ª) escolha das bases
A EMOÇÃO NO DESENVOLVIMENTO DO
de dados para pesquisa: uma base de da-
BEBÊ NO PRIMEIRO ANO VIDA
dos nacional (BVS-Psi) e uma internacional
Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo Ferreira (PsycINFO); 2ª) traçou-se critérios de in-
- USP/RP clusão (artigos, teses e dissertações; sem
melolud@yahoo.com.br restrição de data na base nacional e restri-
Kátia de Souza Amorim - USP/RP ção dos últimos cinco anos na internacio-
katiamorim@ffclrp.usp.br nal; idiomas inglês, português, espanhol e
Financiamento: FAPESP, CNPq francês; trabalhos com disponibilidade de
resumos) e exclusão (livros, capítulos de
A emoção é tema presente em diversas livro e resenhas; revistas exclusivamente
áreas do conhecimento, dentre eles, a da área médica); 3ª) pesquisa e definição
psicologia do desenvolvimento. Henri das terminologias indexadas (emoções,
Wallon se destaca pelos seus estudos so- desenvolvimento emocional, desenvolvi-
bre a emoção, tornando-se um referencial mento infantil (BVS-Psi e PsycINFO), esta-
para a investigação deste tema. Em sua dos emocionais e bebês (BVS-Psi), e early
teoria, a emoção é elemento central nos childhood development (PsycINFO); e 4ª)
primeiros meses de vida, a qual propicia- busca pelas palavras-chave (bebê, infant
ria a constituição do vínculo entre bebê e e emoção), e os cruzamentos entre elas e
ambiente social; representando, assim, o os descritores. Algumas palavras buscadas
primeiro plano de sociabilidade que con- - como emoções/emotions, bebê/infant,
tribuiria para promover a solidariedade desenvolvimento infantil/infant develop-
de comportamento e de atitudes entre ment - resultaram em expressivos núme-
o bebê e as pessoas no entorno. A par- ros de artigos; por outro lado, a partir dos
tir da leitura deste autor e de alguns de cruzamentos, houve queda considerável
seus estudiosos, no entanto, percebeu-se deste número. Considerando que o obje-
a exploração da emoção mais restrita ao tivo desta revisão foi analisar o que tem
plano teórico e aos primeiros meses de sido produzido sobre emoção especifica-
vida. Buscando aprofundamento dessa mente no desenvolvimento de bebês no
questão, traçou-se o objetivo de desen- primeiro ano de vida, a partir dos resu-
volver um estudo empírico para investigar mos e dos critérios de inclusão/exclusão,
a emoção ao longo do primeiro ano de optou-se por afunilar as buscas aos cruza-
vida, investigando suas manifestações em mentos, chegando-se a 249 trabalhos, 247
processo de transformação ao longo deste artigos e 2 teses. Ao analisar estes traba-
período. Para a realização deste trabalho, lhos, percebe-se a diversidade de estudos
um dos percursos foi verificar o que tem e, ao mesmo tempo, a escassez dos mes-
sido produzido na literatura, em termos mos relacionados à emoção no desenvol-
de estudos empíricos, acerca da emoção vimento de bebês, pois a maior parte dos

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

trabalhos é realizada somente com o pai de/em transformação da emoção no de-


ou com a mãe dos bebês, analisando os senvolvimento do bebê. Sendo assim, os
aspectos emocionais dos pais no proces- estudos encontrados na literatura ofere-
so da maternidade e paternidade. Ainda, cem material empírico para a discussão
encontram-se relatos clínicos enfocando da temática, e também apontam direções
alguma dificuldade ou patologia materna, para estudos prospectivos.
ou até mesmo a relação mãe-bebê de for-
ma teórica ou clínica, predominantemente Palavras-chave: Emoção, bebê,
a partir da psicanálise. No entanto, foram desenvolvimento, revisão bibliográfica.
encontrados trabalhos sobre o desenvol- Contato: Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo
vimento de bebês considerando a emoção Ferreira - melolud@yahoo.com.br
como um dos processos deste desenvolvi-
mento. Estes estudos podem ser divididos
entre teórico, revisão de literatura e em- LT01-1305 - RECONHECENDO EMOÇÕES:
píricos. Os primeiros apontam para a im- UM OLHAR DESENVOLVIMENTAL SOBRE
portância e necessidade de novos estudos O PAPEL DA MÚSICA NA ONTOGÊNESE
na área, principalmente longitudinais e da HUMANA
abordagem sociocultural e evolucionista. Nara Côrtes Andrade - UFBA,
Os segundos são estudos realizados com andrade_nara@yahoo.com.br
bebês entre 0 e 2 anos, principalmente
em laboratório, transversais, com vídeo- A emoção é intrínseca à experiência que
gravação ou observação e focando a díade temos com a música, sendo que diferentes
mãe-bebê. Estes trabalhos têm analisado afetos podem ser expressos através dela, a
e discutido as expressões faciais, voca- exemplo de serenidade, tristeza, angústia,
lizações, resposta ao meio e construção medo, entre outros. Apesar das reflexões
do repertório emocional, propondo, de sobre as relações entre música e emoção
uma forma geral, que as expressões fa- remontarem a pensadores como Platão,
ciais dos bebês estão intimamente e re- pesquisas científicas são recentes e vêm
lacionalmente conectadas ao contexto e apontando que “as respostas emocionais
aos estímulos que lhes são apresentados, para a música dentro de uma cultura apa-
mostrando sintonia e reciprocidade com o rentam ser altamente consistentes dentro
ambiente e também a variabilidade indi- da mesma e entre ouvintes, acurada, ra-
vidual das respostas emocionais. Compre- zoavelmente imediata e precisa” (Viellard
ende-se que estes trabalhos colaboram et al, 2008, p. 721). As emoções são fe-
para a visualização dos aspectos emocio- nômenos complexos e multidimensionais
nais e expressivos dos bebês ao longo do que compreendem desde fenômenos bio-
primeiro ano de vida, e contemplam o ca- lógicos a fenômenos subjetivos e sociais,
ráter biológico e social da emoção. Por ou- sendo, muitas vezes, acompanhada de
tro lado, a análise mostra algumas lacunas uma intensa reação fisiológica e psicológi-
entre esses estudos, como a ausência de ca. Defende-se que as emoções possuem
investigações longitudinais, realizadas no três funções principais: 1) Social - comu-
ambiente do bebê, que não seja em labo- nicar informações sobre estado de ânimo,
ratórios, e que acompanhem o processo além de prováveis comportamentos e in-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tenções; 2) Adaptativa - preparar fisiologi- formações relativas ao estado afetivo dos


camente o indivíduo para a ação, aumen- mesmos. A criança começa a desenvolver
tando suas chances de sobrevivência; Mo- a capacidade de percepção relativa às ex-
tivacional – facilitar os comportamentos pressões vocais e faciais no seu primeiro
motivados (Fernandez-Abascal et al, 2010; ano de vida (Flom et al, 2008), sendo que
Freitas-Magalhães e Castro, 2009). Segun- aos 4 meses de idade, os bebês podem
do Reeze (2006, p. 191), “as emoções são discriminar expressões bimodais (facial e
fenômenos expressivos e propositivos de vocal) de felicidade, tristeza e irritação e
curta duração, que envolvem estados de aos cinco meses diferenciam expressões
sentimento e ativação, e que nos auxiliam unimodais vocais de raiva, felicidade e
na adaptação às oportunidades e aos de- tristeza. As crianças prestam atenção pre-
safios que enfrentamos durante eventos ferencialmente a estímulos auditivos que
importantes da vida”. Pesquisas sobre expressem emoções. No caso da fala, por
emoções básicas expressas por músicas exemplo, as crianças atentam mais a falas
vêm apontando que as respostas emo- emotivas do que a falas neutras (Kitamu-
cionais podem ser bastante consistentes ra & Burnham, 1998; Singh, Morgan &
e coincidentes entre as diferentes idades Best, 2002). Em pesquisa realizada como
(Peretz, 2009). Muitos autores defendem bebês de seis meses de idade, encontrou-
que emoções como alegria, medo e triste- -se que as crianças apresentavam maior
za podem ser induzidas através da música, atenção sustentada a episódios de canto
sendo que estas estão presentes em diver- materno do que a episódios de fala ma-
sos espaços do nosso cotidiano, como, por terna (Nakata & Trehub, 2004). Estes auto-
exemplo, em trilhas sonoras de filmes, es- res salientam que a fala é um importante
pecialmente aqueles dirigidos às crianças. meio de transmitir emoções, entretanto,
Em termos ontogenéticos, as emoções possivelmente a música é uma maneira
dependem do amadurecimento de es- mais eficaz de fazê-lo, especialmente en-
truturas neurais que dêem sustentação a tre crianças em estágio pré-linguístico, as
seu funcionamento. Segundo Férnandez- quais podem as mensagens verbais em
-Abascal e cols. (2010), as emoções primá- sua forma, mas não em seu conteúdo.
rias, a exemplo da alegria, da surpresa, da Segundo Peretz e Sloboda (2005), estes
repugnância (nojo), da tristeza e do medo, achados sugerem que, possivelmente, a
se desenvolvem no início da vida, enquan- música pode ser considerada como mais
to as emoções secundárias ou sociais, tais poderosa que a fala no que diz respeito à
como ciúme, culpa, vergonha, precisam expressão de emoções. Flom et al (2008),
tanto do desenvolvimento de estrutu- em pesquisa realizada com crianças sau-
ras neurais quanto aspectos referentes a dáveis nascidas a termo e sem complica-
aprendizagem e socialização, tais como in- ções neonatais, observaram que crianças
ternalização de algumas normas sociais ou entre 5 e 7 meses foram capazes de dis-
desenvolvimento de identidade pessoal. criminar trechos felizes e tristes quando
Do ponto de vista adaptativo, é essencial habituados a trechos tristes e não quando
que o bebê compartilhe seus estados in- habituados a trechos alegres. Com 9 me-
ternos com seus parceiros sociais (Berga- ses, entretanto, as crianças discriminaram
masco, 1997) e seja capaz de processar in- todos os trechos musicais avaliados como

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

afetivamente diferentes. Kastern e Cro- ças muito pequenas, caracterizadas pelas


wder (1990), em estudos realizado com canções de ninar; socialização e interação
crianças entre 3 e 12 anos, apontam que, entre pares, a exemplo das brincadeiras
mesmo as crianças mais jovens, de 3 anos cantadas (Pinto & Lopes, 2009); entre ou-
de idade, mostram reconhecer a valência tras dimensões. Entretanto, como ressalta
afetiva da música de sua própria cultura - Baruch (2010), as pesquisas em psicologia
negativa, positiva - associando-a aos mo- da música com crianças são relativamen-
dos em que estas são compostas, modo te recentes, sendo ainda mais escassas
menor e maior, respectivamente. Segun- no Brasil. As diversas pesquisas que têm
do Cunningham & Sterling (1988), aos 4 sido realizadas acerca da à discriminação
anos as crianças já são capazes de reco- e ao reconhecimento de emoções em mú-
nhecer explicitamente emoção de alegria sica com diferentes faixas etárias apontam
expressa pela música. Entretanto, o estu- para uma compreensão de como este
do realizado por Dalla Bela e cols. (2001) fenômeno ocorre durante o desenvolvi-
encontrou que crianças de 3 e 4 anos não mento infantil. Entretanto, como pode-
apresentam ainda habilidade no reco- mos notar acima, é importante salientar
nhecimento de emoções alegres e tristes. que estas são, em sua maioria, recentes e
Estes autores destacam que questões me- pouco consensuais, sendo ainda escassas
todológicas, tais como a tarefa apresen- e apontando um campo de estudos em
tada de apontar para faces esquemáticas expansão.
representando as reações emocionais, po-
dem haver interferido no resultado, já que Palavras-chave: música, emoções,
esta pode requerer habilidades ainda pou- desenvolvimento humano.
co desenvolvidas nesta faixa etária. Sendo
que aos 5 anos as crianças são capazes de
reconhecer músicas alegres e tristes (Dalla LT01-1307 - O TESTE DO DESENHO DA
Bella & cols., 2001) e aos medo e ameaça FAMÍLIA COMO UMA REPRESENTAÇÃO
(Dolgin & Adelson, 1990; Terwogt & Van DOS MODELOS INTERNOS DE
Grinsven, citado por Vielard e cols., 2008). FUNCIONAMENTO
É importante salientar que estas pesqui- Débora Matos - UFPE
sas se referem a uma melhor acurácia no debkrm@gmail.com
reconhecimento de emoções alegres e Antônio Roazzi - UFPE
tristes, enquanto as emoções de medo e roazzi@gmail.com
raiva são muitas vezes confundidas entre Financiamento: CNPq
si. A música, historicamente, tem sido um
elemento recorrente em todas as culturas John Bowlby postulou que o comporta-
conhecidas (Schellenberg & cols., 2008) mento de apego no ser humano, assim
com a qual a criança convive, a exemplo como em várias outras espécies é de or-
das canções de ninar, brincadeiras canta- dem primária e instintiva, cuja função
das, etc. A mesma a dimensão emocional adaptativa seria a preservação da vida,
intrínseca à sua experiência é de imenso tendo em vista que o filhote sozinho
valor ao desenvolvimento, a exemplo da não tem a mínima chance de sobreviver.
regulação emocional que exerce em crian- Assim, a criança tem uma tendência na-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tural para buscar o contato e a proteção mudanças durante a vida, de acordo com
de um adulto, seja ele a mãe ou a figura outras experiências vividas pelo indivíduo.
de um outro cuidador. O tipo de cuida- O desenho tem sido usado há muito tem-
do oferecido pela mãe ou cuidador, ou po pela psicologia como forma de acessar
seja a figura de apego primária, oferece as representações do indivíduo acerca de
um protótipo de relacionamento sobre o si mesmo e do mundo que o cerca. Par-
qual a criança é capaz de construir suas tindo do mesmo pressuposto o desenho
expectativas diante de relacionamen- da família foi estudado por diversos au-
tos outros que surgem ao longo da vida. tores de forma a classificar características
Ainsworth (1978), em seu experimento no mesmo que tivessem correlação com
“Situação Estranha” observou três estilos os estilos de apego (Kaplan, May, 1986;
de apego, que se desenvolviam na crian- Fury, Carlson, Sroufe, 1997; Attili, Ruby,
ça conforme os critérios de sensibilidade 2000; Maddigan, Ladd, Golberg, 2003).
desta figura primária para responder aos Mais recentemente Roazzi, & cols., (2011)
sinais do bebê e a quantidade e a nature- também verificaram a possibilidade de
za da interação entre os mesmos. Assim, acessar as representações acerca das re-
crianças com estilo de apego seguro (B) lações afetivas por meio do desenho da
apresentam um bom equilíbrio entre au- família em crianças de educação infantil e
tonomia e proximidade, sendo capazes de ensino fundamental. Tal pesquisa, já rea-
utilizar a figura de referência como base lizada na Itália, está sendo trazida para o
segura. A qual é percebida pela criança Brasil por meio deste trabalho, tendo em
como positiva, sensível e sempre dispo- vista a necessidade de pesquisas com o
nível às suas requisições de ajuda. Nas tema, contextualizadas nesta realidade
crianças com apego evitante (A) há uma específica. Analisar a correlação entre as
ênfase na autonomia e independência, características do desenho da família e os
mostram-se indiferentes à figura de ape- Modelos Internos de Funcionamento, to-
go, a qual é percebida como impaciente, mando como base os estudos anteroires.
negativa e rígida. As crianças com apego Prover uma base para futura validação
ambivalente (C), por sua vez, apresentam do desenho como uma representação
excessiva ativação do sistema de apego, do apego por meio do uso de um instru-
buscando uma contínua confirmação da mento já conhecido. Avaliação de uma
presença e proteção da figura de apego. amostra composta por 25 alunos do 1º
É interessada, mas não consegue estabe- ano do Ensino Fundamental de uma es-
lecer rotinas sincronizadas, apresentando cola pública do Recife com relação aos
incoerências. Está convencida de não ser estilos de apego por meio de uma versão
amável, enquanto que o outro é percebi- modificada (Attili, 2001) do Separation An-
do como confiável e positivo. Os estilos de xiety Test, de Klagsbrun e Bowlby (1979).
apego discriminados por Ainsworth (op. Aplicação individual do teste do desenho
Cit.) sofreram uma evolução no sentido da família validado para classificação dos
de não serem mais vistos como formas es- estilos de apego por Fury e colaboradores
tanques de relacionamento. Os modelos (1997). A versão italiana do presente estu-
Internos de funcionamento (MIF), como do demonstrou que o desenho da família
agora são denominados, podem sofrer pode ser considerado um método válido

15
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para assessar os estados atuais de apego A, C; ʤ2 (2)= 2.78 n.s.). Também desenha-
em crianças. Por meio de testes estatísti- ram mães com expressões faciais positivas
cos tradicionais, utilizando o SSA (Smallest (B>A, C; ʤ2 (2)= 8.2 p<0.05). Crianças evi-
Space Analysis - Bloombaum, 1970; Gutt- tantes desenharam com maior probabili-
man, 1965; Shye, 1985; or Similarity Struc- dade barreiras entre os representantes da
ture Analysis - Borg & Lingoes, 1987), mui- família (A > B, C; ʤ2 (2)= 8.7 p<0.05). Assim,
tas características do desenho mostraram temos fortes evidências que nos embasam
relação com as tipologias de apego. Dados no sentido de que os resultados do pre-
obtidos por meio de simultâneas inercor- sente estudo têm contribuições similares,
relações lançaram luz sobre as complexas porém respaldadas pela singularidade da
estruturas representacionais da criança cultura brasileira. De forma que se apre-
acerca de seus laços familiares. As seguin- sente como uma contribuição relevantes
tes variáveis dimensionais mostraram-se no aprofundamento da temática da Teoria
relevantes: Crianças coma pego ambiva- do Apego no país.
lente demonstraram maior probabilidade
de situar seu próprio desenho mais pró- Palavras-chave: desenho da família;
ximo do desenho da mãe que os segura- representação interna; teoria do apego.
mente apegados (os quais se desenhavam
a uma distância equilibrada da mesma:
C < B, A; ʤ2 (2)= .28 p<0.05), além disso LT01-1329 - WALLON E BOWLBY:
localizavam o desenho da família a uma AFETIVIDADE EM DISCUSSÃO
distância maior da borda inferior da folha
que as crianças seguras (C > B; ʤ2 (2)= 5.4 Fabíola Lira Gonçalves - UFPE
p<0,001), seus desenhos cobriam uma fmsgoncalves@ig.com.br
pequena área da folha em comparação Débora Matos - UFPE
comos desenhos das crianças com apego debkrm@gmail.com
seguro (C < B; ʤ2 (2)=2.81 p<0.05).As crian- Financiamento: CNPq
ças seguras se desenharam mais ao centro
da folha que as crianças de apego evitante O ponto de partida deste ensaio deu-se
(B<A; ʤ2 (2)=3.8 p<0.01). Variáveis catego- pela articulação entre teorias psicológicas
riais relevantes: Houve uma tendência por do desenvolvimento humano que tratam
parte das crianças inseguras , em compa- da afetividade. Neste sentido, propõe-se
ração às seguras, de desenharem figuras um diálogo entre as abordagens teóricas,
incompletas (B < A, C; ʤ2 (2)=3.41 p<0.05). a saber: a teoria psicogénetica de Wallon
No desenho de crianças ambivalentes ha- e a teoria do apego de Bowlby, já que es-
via ausência de chão em maior proporção tes autores defendem uma concepção in-
que no desenho das demais (C < A, B; ʤ2 tegrada do ser humano em seus aspectos
(2)= 10.9 p<0.05) e frequentemente suas cognitivos e afetivos. Historicamente, as
figuras estavam flutuando (C > B, A; ʤ2 teorias psicológicas têm gerado uma visão
(2)= 13.3 p<0.001). Crianças seguramen- dicotômica entre cognição e afetividade.
te apegadas mostraram maior probabili- A teoria psicogenética de Piaget (2007)
dade, embora não significativamente, de ressalta o aspecto cognitivo no desenvol-
desenhar figuras com braços abertos (B > vimento do indivíduo. Por outro lado, se

16
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

contempla na psicanálise a ênfase na sin- vas emoções que surgirão durante toda a
gularidade do sujeito, tendo a afetividade existência. Por essa via explicativa, o pres-
um papel central na constituição deste. suposto integrador entre os aspectos bio-
Na teoria walloniana as emoções e o afe- lógicos, cognitivos e afetivos funcionam de
to, tem papel fundamental na constituição modo sincrético, portanto indissociáveis.
da pessoa. A emoção teria primeiramente Wallon ressalta dois mecanismos regula-
a função biológica calcada na concepção dores do desenvolvimento psicogenético,
evolutiva de Darwin, tendo em vista que a a saber: alternância e preponderância,
espécie humana, em geral, tem um único estes se articulam num jogo interacional
filho por gestação, e um longo período de intenso entre os componentes biológicos
dependência deste em relação aos cuida- e sociais do psiquismo humano. À medida
dos do adulto para o seu desenvolvimento que as interações entre os indivíduos vão
pleno. A primeira manifestação de emo- ocorrendo, vão surgindo novas formas de
tividade na vida humana, conforme esta afetividade, por exemplo: o sentimento e
abordagem é o choro, que é concebido a paixão que podem se manifestar tanto
como a garantia de que as necessidades de modo verbal, pois há palavras que a
do bebê serão prontamente atendidas expressam, bem como gestos e atitudes
pela mãe. Daí tem-se uma emoção, car- motoras que podem expressá-las do mes-
regada de sua característica contagiosa mo modo, sem que haja uma hierarquia
e epidêmica, sendo à base da relação na forma escolhida pelo sujeito para ex-
eu-outro. Esta manifestação emotiva se pressar a afetividade. O que demarca a
constitui na relação entre os aspectos escolha da expressão afetiva é o contexto
biológico e social, pois o choro também interacional instaurado entre os sujeitos
é considerado por Wallon como uma ex- envolvidos no ato comunicacional. Para
pressão de linguagem, uma vez que a mãe Bowlby, o vínculo da criança à sua mãe é,
ouve o choro do bebê, é contagiada por também, um comportamento inicialmen-
sua reação emocional de desconforto e te de ordem primária e instintiva, cuja
reage atendendo às suas solicitações. Para função adaptativa seria a preservação da
Dantas (1992), na teoria walloniana, cuja vida. Assim a criança tem uma tendência
orientação filosófica é o materialismo dia- natural para buscar o contato e a proteção
lético, a emoção é simultaneamente bio- de um adulto, seja ele, a mãe ou a figura
lógica e social, circunscrita em um tempo de outro cuidador. Essa busca de contato,
historicamente situado, a premissa básica manifestada primeiramente pelo choro,
é da unicidade do sujeito nas dimensões provoca determinado tipo de reação na
que o integram. Desse modo, a emoção mãe, que a partir de então, se configura
humana, se constitui por meio das mani- como cuidadora. Constitui-se, assim, um
festações de linguagem verbais e não ver- estilo de relacionamento primário entre
bais que só acontecem em função da me- mãe e filho, ou cuidador e criança. O tipo
diação cultural e social entre sujeitos. As de cuidado concedido por este, oferece
etapas do desenvolvimento humano em um protótipo de relacionamento sobre o
Wallon não são estanques. O sujeito não qual a criança é capaz de construir, por
perde, ou substitui totalmente as emo- meio de generalização, suas expectativas
ções primárias, elas coexistirão com as no- diante de relacionamentos que surgem ao

17
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

longo de sua vida. Há, assim, duas condi- indissociável, afetando todas as esferas da
ções que contribuem na formação ou não vida do indivíduo. Assim as duas teorias
do apego a uma figura primária, ou ainda integram a base orgânica e contato com o
ao estilo de apego proveniente desta re- outro, com o social, os quais impulsionam
lação: a) a sensibilidade desta figura para o afeto e a cognição. Este homem comple-
responder aos sinais do bebê; b) a quan- to e total tem todos estes componentes
tidade e a natureza da interação entre os constantemente interagindo entre si. Ele
componentes do par. Conforme estas va- está, ao mesmo tempo, se adaptando ao
riáveis, três padrões básicos de apego po- meio, aprendendo o mundo ao seu redor,
dem se desenvolver (Ainsworth, 1978): a) significando o mesmo e se relacionando
Crianças com estilo de apego seguro apre- com o outro a partir de suas experiências.
sentam um bom equilíbrio entre autono- Todas estas atividades coexistem e se nu-
mia e proximidade, sendo capazes de uti- trem mutuamente.
lizar a figura de referência como base se-
gura, a qual é percebida pela criança como Palavras-chave: Afetividade, Psicogênese da
positiva, sensível e sempre disponível às Pessoa Completa, Teoria do Apego.
suas requisições de ajuda; b) Nas crian-
ças com apego evitante há uma ênfase na
autonomia e independência, mostram- LT01-1373 - O DESENVOLVIMENTO DO
-se indiferentes à figura de apego, a qual OLHAR NO BEBÊ E SUA RELAÇÃO COM
é percebida como impaciente, negativa e O DESENVOLVIMENTO POSTURAL:
rígida; e c) As crianças com apego ambiva- REFLEXÕES SOBRE RELAÇÃO, CULTURA E
lente, por sua vez, apresentam excessiva COMPLEMENTARIDADE
ativação do sistema de apego, buscando Natália Meireles Santos - FFCLRP/USP
uma contínua confirmação da presença e nmeireles@aluno.ffclrp.usp.br
proteção da figura de apego. É interessa- Kátia de Souza Amorim - FFCLRP/USP
da, mas não consegue estabelecer rotinas katiamorim@ffclrp.usp.br
sincronizadas, apresentando incoerên-
cias. Está convencida de não ser amável, O primeiro ano de vida é uma etapa de
enquanto que o outro é percebido como grandes transformações no desenvolvi-
confiável e positivo. Estes estilos de apego mento humano, em que inúmeras habili-
tornam-se relativamente estáveis entre o dades são adquiridas (Pio, 2007). Estudar
primeiro e o segundo ano de vida e se ma- o bebê é uma forma de aprender sobre
nifestam como uma “tendência geral” que quem somos e como somos constituídos
influencia as relações do sujeito consigo, (Bussab, Carvalho & Pedrosa, 2007). O
com o outro e com o meio. Estes estilos, bebê apresenta formas particularizadas de
porém, podem ser alterados a partir de interação, reveladas por episódios “mais
outras experiências significativas ao lon- fugazes, desordenados, pouco estrutura-
go da vida. Autonomia, autoconfiança, dos e pouco intencionais” (Anjos, Amorim,
confiança para explorar e conhecer, são Rossetti-Ferreira & Vasconcelos, 2004).
características intimamente relacionadas Apesar disso, o bebê apresenta formas de
a um apego seguro. Percebe-se uma rela- expressão significativa, (gestos, expres-
ção entre afetividade e cognição, de forma sões faciais, vocalizações, postura corpo-

18
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ral) com indícios importantes de intenção, desenvolvimento postural, em dois bebês


desejos, incômodos, capazes de suscitar analisados em situação de interação em
reações no outro, quer seja um adulto ou dois contextos (ambiente domiciliar e cre-
outra criança. No processo, o bebê mostra- che). Para a condução do projeto, o mes-
-se ativo dentro de um sistema cultural mo foi submetido à avaliação do Comitê
ao utilizar-se de capacidades interativas de Ética em Pesquisa (CEP), da Faculdade
empregadas a partir de meios convencio- de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão
nais de comunicação direcionados ao ou- Preto (FFCLRP/USP), sendo aprovado, em
tro, como o sorriso e o olhar (Anjos et al., concordância com a Resolução n° 196/96.
2004). O olhar destaca-se como recurso A coleta e análise de dados estão sendo
comunicativo, indo além da visão, atingin- conduzidas fundamentalmente através da
do a esfera relacional e propiciando comu- perspectiva da Rede de Significações (Ros-
nicação (Belini & Fernandes, 2008). Nesse setti-Ferreira, Amorim, Silva & Carvalho,
sentido, Elmôr (2009) aponta o olhar como 2004). Estão sendo realizados dois estudos
uma ferramenta importante para estabe- de caso (Yin, 2005), com acompanhamen-
lecer comunicação entre seres humanos. to longitudinal. Entende-se que o estudo
Fogel e cols. (1999) acrescentam a postu- de caso propicia a observação em ambien-
ra como aspecto influente no desenvolvi- te natural, de forma a apreender a comple-
mento do olhar no bebê, destacando que, xidade em que os processos estão imersos;
nos primeiros meses de vida, o posiciona- e, de maneira a preservar as características
mento corporal do bebê ainda está muito significativas dos acontecimentos, dentro
subjugado ao manejo adulto. Os autores de seus contextos e relações (Freitas & Po-
ressaltam a importância de investigar o pa- zzebon, 1998). Criança em domicílio: Os
pel de fatores motores e sociais envolvidos sujeitos são um bebê (Marina), sua mãe
nessa associação da postura e do olhar. (Júlia) / o pai (Pedro) e a avó (Mirian). O
Amorim (2008) aponta como a mudança material empírico é do Banco de imagens
postural proporciona uma modificação do projeto Processos de (Trans)formação
significativa na percepção e participação da Comunicação e Linguagem, ao Longo
no ambiente por parte do bebê. Bebês do Primeiro Ano de Vida: Um Estudo de
que antes demonstravam certo isolamen- Caso (Rodrigues, 2008). Esse estudo acom-
to em relação às coisas ao redor passam a panhou o bebê, semanalmente, desde seu
ter maior atenção ao ambiente e a buscar nascimento, ao longo de todo seu primei-
ativamente a proximidade com outros. Os ro ano de vida, investigando o desenvol-
processos envolvidos na co-construção do vimento da comunicação e da linguagem
engatinhar estariam ligados à emergência durante esse período. Serão utilizadas ce-
de maior intencionalidade e autonomia no nas da criança a partir do quarto mês de
bebê. Mas, há a necessidade de estudos vida. Criança em creche: O sujeito pivô é
mais sistemáticos a essa questão. Traçou- Nisete, 5m e 6d ao ingresso na creche. Seu
-se assim, o objetivo do estudo. O objetivo estudo se fará a partir do banco de Ima-
tem sido investigar como se dá o processo gens do Projeto Integrado Processos de
de transformação do olhar como recurso Adaptação de Bebês à Creche (Rossetti-
expressivo no bebê; e como se dá a relação -Ferreira, 1994). Este projeto acompanhou
daquele com diferentes momentos de seu os processos de ingresso e frequência de

19
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

21 bebês, em uma creche universitária. gociação do olhar por parte da mãe que
Acredita-se que esses contextos permitam suscita reflexões sobre a inserção desse
evidenciar processos de desenvolvimento recurso em nossa cultura e como o bebê
significados de diferentes maneiras, pelas se apropria deste na interação, inclusive
particularidades de organização dos espa- quando não há pontos de encontro; nem
ços, bem como pelas práticas discursivas sempre Marina retribui o olhar à mãe, mas
do contexto e das pessoas no entorno e antes se volta para seu próprio corpo. Cha-
em interação. As gravações dos bebês es- ma ainda a atenção o contato e manejo
tão sendo vistas e algumas cenas, transcri- corporal do bebê realizado pela mãe em
tas. Nessas são buscadas particularidades uma relação também negociada. Marina
nos processos de olhar e da postura corpo- não é simplesmente subjugada às ações da
ral. As cenas são analisadas microgenetica- mãe , mas esta também reage à comunica-
mente (Goes, 2000), de modo a apreender ção do bebê (choro, movimento corporal,
mudanças ao longo do tempo, através de olhar), numa relação de complementarida-
recortes de episódios de diferentes mo- de (Seidl de Moura & Ribas, 1999).
mentos do desenvolvimento postural e do
olhar no bebê. A partir do mapeamento Palavras-chave: olhar, comunicação,
realizado, foi recortado um episódio inte- desenvolvimento postural
rativo no ambiente domiciliar: Júlia leva
Marina (quatro meses) para o quarto para
dar-lhe banho. Deita-a virada para cima LT01-1435 - A COMPREENSÃO
na cama. Marina começa a choramingar. INTERDISCIPLINAR DA RELAÇÃO
Júlia senta Marina na cama, segurando-a MÃO-BEBÊ: UMA APROXIMAÇÃO DE
de modo que ambas ficam frente a fren- WINNICOTT À NEUROCONCIÊNCIA DO
te (Júlia abaixa-se ao lado). Marina olha e DESENVOLVIMENTO
passa a mexer nos pés. Começa um movi- Célia Regina de Souza Cauduro - USP/SP
mento em que Júlia insistentemente tenta crcauduro@uol.com.br
chamar a atenção de Marina, utilizando-se Vera Silvia Raad Bussab - USP/SP
de vários recursos auditivos e táteis. Nem vsbussab@gmail.com
sempre Marina retribui com o olhar, mas
quando o faz ambas sorriem. Júlia levanta- Na teoria psicanalítica de Donald W. Win-
-se então e pega Marina no colo, e leva-a nicott ((1983; 1988 a, b, c, d; 1990; 1994;
para frente de um espelho, com ambas 1997; 1999 a, b, c, d, e) sobre a constitui-
voltadas para o mesmo. Enquanto isso, a ção do sujeito e nos trabalhos da Neuro-
pesquisadora passa por detrás com a câ- ciência do Desenvolvimento, existem afir-
mera, chegando a aparecer no espelho. O mações sobre a importância da qualidade
olhar de Marina volta-se para a imagem da experiência vincular nas primeiras eta-
da pesquisadora. Marina movimenta-se e pas da vida pós-natal. A correspondência
esforça-se para virar-se para trás. Quando entre estas duas teorias se organiza por
a mãe o percebe, vira seu próprio corpo, meio do conceito winnicottiano de expe-
tornando possível que Marina olhe direta- riência intersubjetiva: “o bebê no colo da
mente para a pesquisadora. No episódio, mãe, que precisa crescer, isto é, consti-
fica evidente a insistente e custosa ne- tuir uma base para continuar existindo e

20
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

integrar-se numa unidade” (Loparic, 2008, tas não verbais dos comportamentos do
p.145). Segundo Loparic (2008), “Winni- bebê, crucial para o estabelecimento de
cott introduziu um novo modelo ontoló- um vínculo seguro (Schachner, Shaver, &
gico do objeto de estudo da psicanálise, Mikulincer, 2005). A autoregulação emo-
centrado no conceito de tendência para cional é a habilidade para controlar esta-
a integração, para o relacionamento com dos internos ou respostas relacionadas
pessoas e coisas e para a parceria psicos- aos pensamentos, emoções, atenção e
somática“ (p.145). Esta afirmação de Lo- desempenho. Os mecanismos neurais que
paric (2008) é apoiada pelas pesquisas sustentam os processos regulatórios po-
neurocientíficas sobre o desenvolvimento dem ser os mesmos que fundamentam os
humano que afirmam que o corpo ma- processos cognitivos superiores. Existem
terno é a principal fonte de provisão das processos complexos pelos quais a emo-
informações ambientais, e funciona como ção relaciona-se à cognição e ao compor-
um regulador externo que organiza os tamento, que, conseqüentemente, inter-
sistemas neurológico, perceptual, emo- ferem no processo de desenvolvimento
cional e relacional pela sua presença físi- (Bell & Wolfe, 2004; Bell & Kirby, 2007).
ca e pelo seu comportamento interativo A autoregulação emocional desempenha
(Feldman, 1996; 1999; 2003; 2006; 2007). um papel central na socialização e no de-
A Neurociência do Desenvolvimento - As senvolvimento do comportamento moral,
conclusões dos estudos da neurociência depende do desenvolvimento do córtex
do desenvolvimento descrevem como as pré-frontal; está associada ao desenvolvi-
experiências vividas na interação entre a mento de diferentes estratégias de adap-
criança e o cuidador primário no período tação durante as etapas subseqüentes do
neonatal, podem alterar o processo de ciclo vital (Levesque, A., 2004; Lewis &
desenvolvimento do sistema nervoso. Os Stieben, 2004). As situações de negligên-
bebês, ao nascerem, apresentam consi- cia e maus tratos, eventos traumáticos
derável individualidade, são sensíveis aos que quando duradouros, representam
estados afetivos do outro e mobilizam res- risco ao desenvolvimento psiconeurobio-
postas em seu meio ambiente. Tal capaci- lógico infantil; estas situações podem es-
dade requer um grau significativo de inter tabelecer uma vulnerabilidade ao estresse
coordenação pré-funcional entre o cére- pós-traumático (PTSD), e uma predisposi-
bro e o corpo. Atualmente, existe grande ção à violência na idade adulta. Situações
evidência que a organização do cérebro de privação ou trauma que promovem
do neonato é altamente dependente da interrupções no processo de formação do
estimulação dos cuidadores, e que estas vínculo, causadas por fatores maternos
interações quando validadas por experi- (ex. depressão pós-parto) e/ou relaciona-
ências adequadas, constituem um regula- das ao bebê (doenças hereditárias, congê-
dor da epigênese social da mente infantil, nitas ou adquiridas), podem desorganizar
isto é, promovem as condições necessária a regulação psicobiológica e neuroquímica
para a autoregulação emocional. Estas ex- no desenvolvimento cerebral, conduzindo
periências adequadas são proporcionadas à neurogênese, sinaptogênese e diferen-
por um cuidador primário (mãe) sensível ciação neuroquímica anormais.Os dados
capaz de decodificar ou entender as pis- da pesquisa de Chelini et al., (2010) inclu-

21
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ída no Projeto Ipê -Temático FAPESP no. sutis interações emocionais alteram os ní-
06/59192-2, que estuda possíveis efeitos veis da atividade cerebral e exercem um
da Depressão Pós-Parto (DPP) no desen- papel importante no estabelecimento e
volvimento numa população atendida manutenção dos circuitos do sistema lím-
pelo sistema público de saúde apontam bico (Ziabreva, I., Poeggel, P., Reinhild, S.,
que “ a resposta do cortisol a um estres- Braun, K., 2003; Wilkinson,2004; Cirulli,
sor leve foi maior em filhos de mães de- Berry, Alleva, 2003; Bradshaw, Schore,
primidas (análise de medidas repetidas; Brown, Poole, & Moss, 2005; Fonagy &
t = 2,44, 94df, p = 0,0166). Este resultado Target, 2005; Ovstscharoff e Braun, 2001;
indica que aos quatro meses após o parto Balbernie, R.(2001); Graham, et al.,1999;
o eixo HPA pode ter sido afetado pela DPP Schore, 2005). “A “mãe suficientemente
materna, já que filhos de mães deprimidas boa” tambem não existe sem os outros.
não mostraram a esperada supressão da Ela não existe sem um campo sociocul-
resposta do cortisol comumente observa- tural, que lhe dê possibilidades de exer-
da em torno de três meses”. Em concor- cer suas funções” (Safra, 2002).Coerente
dância com Ovstscharoff e Braun (2001), com afirmação de Fonseca, V.R.J.R.M. et
a interação diádica entre o recém-nascido al. (2010) - Projeto Ipê -Temático FAPESP
e a mãe funciona como um regulador do no. 06/59192-2, “A sensibilidade materna
desenvolvimento da homeostase inter- é influenciada por fatores sócio-cognitivos
na infantil. Interferem no funcionamento e afetivos”. As conclusões da pesquisa de
normal do eixo HPA (Hipotálamo-Pituitá- Defelipe, (2009) - Projeto Ipê -Temático
ria-Adrenal) resultando na alteração do FAPESP no. 06/59192-2: “A DPP1 parece
ritmo circadiano, elevando os níveis ba- capaz de perturbar os arranjos interativos
sais e reduzindo o volume cerebral. Os tornando-os menos consistentes. Porém,
efeitos podem ser de longo prazo, con- apesar desta possível limitação, por vezes,
duzindo a uma intensa resposta do eixo mães com DPP podem interagir adequa-
HPA a qualquer situação desafiadora, damente com seus bebês. Por fim, a DPP
atrofia hipocampal e prejuízos no desem- por não se tratar de um fenômeno capaz
penho cognitivo na vida adulta. Winnicott de incidir linearmente sobre a interação
e a Neurociência do Desenvolvimento: a mãe-bebê, e sobre o desenvolvimento
construção de uma hipótese interdiscipli- posterior, deve ser investigada em asso-
nar - A hipótese formulada a partir desta ciação com outros fatores psicossociais
aproximação é que a relação de mutuali- de risco.” Confirmam a compreensao de
dade entre o biológico, o emocional e o Aitken & Trevarthen (2001) que conside-
social (e não o emocional enquanto uma ram o vínculo como resultado de um con-
conseqüência linear da condição biológi- junto complexo de fatores individuais e
ca, ou o biológico como condição direta ambientais que interagem de uma forma
do emocional) apontada pela neurociên- não linear.
cia, no processo de desenvolvimento hu-
mano, é estabelecida por meio de uma Palavras-chave: Psicanálise, Neurogênese,
relação intersubjetiva fundada em uma Vínculo
maternagem que Winnicott (1988) cha-
mou de “mãe suficientemente boa”.Estas 1
DepressãoPós-Parto.

22
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 10 - LT01 criança podem antecipar seu diagnóstico.


O presente estudo teve por objetivo inves-
Depressão Pós-parto tigar se os efeitos da DPP sobre a função
adrenal da criança podem ser detectados
no recém-nascido. Também foi avaliada a
LT01-901- DEPRESSÃO PÓS-PARTO:
relação entre a interação mãe/bebê e os
O IMPACTO SOBRE A RESPOSTA AO
níveis de cortisol. Hipotetizamos que: 1)
ESTRESSE DO BEBÊ É MODULADO PELO
recém-nascidos cujas mães desenvolverão
COMPORTAMENTO MATERNO
DPP apresentam concentrações de corti-
Marie-Odile Monier Chelini - IPUSP sol salivar mais altas do que aqueles cujas
marodiche@gmail.com mães não apresentarão DPP, 2) filhos de
Vera Regina J. R. M. Fonseca - IPUSP mães com DPP apresentam aos 4 meses
veraregina.fonseca@gmail.com de idade concentrações basais de cortisol
Vinicius Frayze David - IPUSP mais altas do que filhos de mães sem DPP,
viniciusfdavid@gmail.com 3) filhos de mães deprimidas apresentam
Emma Otta - IPUSP aos 4 meses reação endócrina ao estresse
emmaotta@usp.com mais acentuada do que filhos de mulheres
Financiamento: FAPESP sem DPP, e 4) há correlação negativa entre
concentrações de cortisol dos recém-nas-
A depressão pós-parto (DPP) afeta, mun- cidos e intensidade da interação positiva
dialmente, uma entre cada cinco partu- mãe/bebê. Metodologia: A amostra conti-
rientes (Miller, 2002; Nemeroff, 2008), nha 74 mães e filhos, participantes de um
comprometendo o desenvolvimento e estudo longitudinal sobre DPP. O cortisol
comportamento dos seus filhos (Essex dos bebês foi mensurado em amostras de
et al., 2002; Herrera et al., 2004; Pearls- saliva coletadas dois dias após o nascimen-
tein et al., 2009). Particularmente, uma to (alta) e 4 meses depois do parto, antes
relação significante entre depressão ma- e depois de um exame clínico. As mães fo-
ternal após o parto e disfunções do eixo ram classificadas quanto à DPP três meses
hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) de após o parto, através da escala de depres-
seus filhos foi evidenciada, com níveis de são pós natal de Edimburgo (EPDS) (Cox
cortisol aumentados em bebês, crianças e et al., 1987), validada no Brasil (Santos et
adolescentes (Brennan et al., 2008; Kaplan al, 1999). Foram consideradas deprimidas
et al., 2008). Em geral, os sintomas da DPP mães que receberam escores superiores
ficam evidentes algumas semanas após o a 11. Interação mãe/bebê: Foram anali-
parto (Robertson et al., 2004). Entretanto, sados os 3 primeiros minutos da filma-
uma detecção antecipada dos seus efei- gem do primeiro encontro da mãe com o
tos sobre o bebê permitiria implantar-se bebê. Baseado na escala de Biringen, et al.
cuidados preventivos para limitar sua se- (2000), foi criada uma escala de 4 pontos
veridade. Uma reatividade psicológica e (0 ausência e 3 máximo) para seis catego-
adrenal aumentada ao estresse psicosso- rias de comportamento materno (vivacida-
cial durante a gestação foi associada a um de, falar espontâneo com o bebê e sobre
risco maior de DPP (Nierop et al., 2006), o bebê, sorrir, tocar o bebê e olhar para o
sugerindo que efeitos da DPP sobre a bebê) e quatro do bebê (vivacidade, exci-

23
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tação, olhar e ser acalmado pelo contato (19.9 ± 3.3 nmol/L vs 9.3 ± 1.8 nmol/L), aos
com a mãe). Dados dos recém-nascidos 4 meses antes (8.2 ± 2.3 nmol/L vs 2.7 ±
foram obtidos dos prontuários. Análise es- 0.5 nmol/L) e depois do evento estressor
tatística: Utilizamos testes t e chi quadra- (11.1 ± 2.3 nmol/L vs 4.0 ± 0.6 nmol/L).
do entre os grupos com e sem DPP para Discussão: O nível de cortisol dos bebês
identificar possíveis variáveis de confusão. aos 4 meses é semelhante entre os grupos,
Depois, foi formulado e ajustado um mo- contradizendo alguns resultados (Brennan
delo linear misto (LMM), descrevendo a et al., 2008) mas consistente com Azar et
concentração do cortisol dos bebês como al. (2007). Diferentemente de Azar, não
função da condição da mãe (DPP) e do foram encontradas diferenças na variação
tempo (Demidenko, 2004). Foram então do cortisol frente ao estresse, entretanto,
testados efeitos possíveis de variáveis do observou-se maior variação interindividual
recém-nascido e dos escores de relação no grupo filhos de deprimidas, sugerindo
mãe/bebê sobre cada medida de cortisol. reação mais heterogênea ao estresse. A
O nível de significância adotado foi < 0,05. análise mostrou uma explicação possível,
Resultados: Foram consideradas deprimi- evidenciando correlação entre maior res-
das 16 mulheres (23,8%). Não houve dife- posta endócrina ao estresse e menores es-
renças da interação avaliada para mães e cores de interesse materno apenas no gru-
bebês entre grupos, nem para nenhuma po com DPP. A análise inferencial mostrou
variável de confusão. O LMM mostrou efei- também diferença entre os grupos nas
to do tempo no cortisol (F2/71 = 25.52, p < concentrações basais de cortisol. Os níveis
0.0001). Nos dois grupos, a concentração de cortisol estimados depois do controle
de cortisol era maior na alta que na linha de para efeito do interesse materno sugerem
base aos 4 meses e aumentou após o exa- que a qualidade da interação materna de-
me clínico. Não houve efeito da DPP nem pois do parto pode tamponar o efeito da
da interação DPP e tempo sobre os níveis depressão no eixo HPA dos bebês, mesmo
de cortisol. Verificou-se, contudo, um coe- apenas 2 dias após o nascimento, quando
ficiente de variação (CV) maior na resposta a DPP ainda não é detectável. Efeitos si-
endócrina de filhos de mães deprimidas milares foram reportados (Gunnar, 1998;
em resposta ao estressor (CV = 124.54) do Kaplan et al., 2008). Nossos resultados su-
que no outro grupo (CV = 75.47). O modelo gerem que intervenções visando melhorar
mostrou interação no tempo entre escore a qualidade dos cuidados maternos, suge-
de interesse materno e DPP apenas entre ridas em estudos prévios (Gunnar & Don-
filhos de mães deprimidas (F1/51 = 4.18, p = zella, 2002; Wachs et al., 2009) podem ser
0.046). Especialmente, foi evidenciada cor- implantadas desde os primeiros momen-
relação negativa entre escore do interesse tos de vida do bebê.
materno e variação do cortisol do bebê
após o evento estressor apenas no grupo Palavras-chave: Depressão pós-parto; cortisol;
com DPP (Pearson r = -0.904, p = 0.005). interação mãe-bebê.
Com o modelo, foi possível controlar as Contato: Departamento de Psicologia
concentrações de cortisol pelo interesse Experimental, Instituto de Psicologia,
materno, que então se mostraram maio- Universidade de São Paulo, São Paulo
res em filhos de mães deprimidas na alta marodiche@gmail.com

24
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-937 - RELAÇÃO ENTRE distinguir e preferir um agente cooperati-


DEPRESSÃO PÓS-PARTO MATERNA E vo a um não cooperativo (Hamlim, Wynn,
DESENVOLVIMENTO DA COOPERAÇÃO Bloom, 2007), o que é, em si mesmo, in-
EM CRIANÇAS dicativo da importância deste desenvolvi-
Laura Cristina Stobäus - IP/USP mento precoce. A cooperação entre pares
stobaus@usp.br, Capes parece emergir ao final do segundo ano,
Maria Lucia Seidl de Moura - UERJ através de jogos imitativos. No terceiro
mlseidl@gmail.com ano as crianças se tornam mais compre-
Vera Silvia Raad Bussab - IP/USP ensivas quanto às ações e desejos dos
vsbussab@usp.br outros, podendo entender quando estes
não foram alcançados (Brownell, Rama-
Financiamento: Capes, CNPq, FAPERJ e FAPESP ni, Zerwas, 2006), condição básica para a
potencial oferta de ajuda. As descobertas
Estudos em diferentes ambientes socio- que as crianças fazem a respeito das emo-
culturais têm mostrado uma incidência de ções e de estados mentais dos outros são
depressão pós-parto (DPP) em 10 a 20% centrais para o desenvolvimento de suas
das mulheres. Dentre as decorrências re- relações sociais e vão se aprimorando
levantes do quadro, tem havido um inte- através da experiência comunicativa nas
resse especial nos potenciais comprome- relações familiares (Dunn e Brophy, 2005).
timentos da interação mãe–bebê (Field, Em pesquisas anteriores do presente pro-
2010), no desenvolvimento cognitivo e jeto, microanálises mostraram diferen-
emocional da criança (Murray e Cooper, ças nesta experiência comunicativa: por
1997) que repercute, entre outras dimen- exemplo, arranjos interacionais mãe-bebê
sões, no desenvolvimento do comporta- (4 meses) apresentaram-se menos estru-
mento cooperativo da criança. Este tra- turados na presença de DPP (De Felipe,
balho é parte do Projeto longitudinal “De- 2009), bem como nos padrões gerais des-
pressão Pós-Parto como um fator de risco tas crianças que com 1 ano brincaram me-
para o desenvolvimento do bebê: estudo nos e ficaram mais ansiosas em situações
interdisciplinar dos fatores envolvidos na de separar-se da mãe (Vicente, 2009). O
gênese do quadro e em suas consequên- desenvolvimento da capacidade de “teo-
cias” (temático Fapesp nº 06/59192). Día- ria da mente” na criança está diretamente
des mãe-bebê, usuárias do sistema públi- relacionado a aspectos essenciais desta
co de saúde, têm sido acompanhadas des- experiência interacional, como o da aten-
de a gestação até o terceiro ano da crian- ção compartilhada e da linguagem. Ambas
ça, de modo a investigar fatores ligados à passam por etapas de aquisição e aprimo-
DPP e seus possíveis efeitos no desenvol- ramento (Baron-Cohen e Swettenham,
vimento infantil. A ontogênese da coope- 1997; Carpenter, Nagel e Tomasello, 1998)
ração envolve uma representação interna e propiciam à criança compartilhamento
das próprias intenções e objetivos, base e troca de experiências com as pessoas
para a inferência de que o outro também significativas da sua convivência, em es-
possui desejos e intenções semelhantes, pecial a mãe (Peterson, 2000). Dentre as
isto é uma “Teoria da Mente” (Tomasello, inúmeras influências maternas, ligadas
2009). Com um ano, a criança consegue ao desenvolvimento do apego e da regu-

25
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lação emocional, pode-se destacar a que significativamente mais do que os me-


se inicia no “mamanhês”: as referências ninos (x²=6,04, p=0,02, 71% x 30%). Não
maternas ao classificar objetos presentes houve diferença na ajuda à mãe: a grande
no foco de atenção da criança favorecem maioria das crianças ajudou, independen-
a aquisição da linguagem e o entendimen- temente da DPP (80% das com DPP e 88%
to social (Ensor e Hughes, 2008). Eviden- sem DPP), e do sexo (83% dos meninos e
temente, importa o contexto significativo 86% das meninas). Discussão: Concluímos
da composição familiar: embora a mãe que a DPP materna influenciou algumas
em geral ocupe posição central, também das respostas cooperativas das crianças,
podem estar presentes outros adultos e especificamente quanto à pessoa desco-
outras crianças (Dunn e Brophy, 2005). O nhecida. Evidentemente, a mãe, além de
objetivo do presente estudo foi avaliar, conhecida, ocupa lugar central na cons-
através de tarefas de cooperação infantil, telação afetiva da criança e isto deve ser
se a DPP afeta o desenvolvimento do com- levado em conta na discussão. Ainda as-
portamento de cooperação de crianças, sim a familiaridade parece relevante neste
uma vez que esta condição pode afetar contraste de efeitos da DPP: a menor co-
as experiências interacionais e afetivas laboração com a pessoa estranha pode re-
da díade. MÉTODO. Participantes: Foram presentar dificuldade de estabelecimento
estudadas 50 crianças de três anos (16 inicial de relações no caso das crianças de
meninos, 36 meninas), distribuídas igual- mães com DPP. Também merece destaque
mente quanto a indicadores de depressão a interação com o sexo da criança: como
pós-parto de suas mães (DPP) aos 4 meses as meninas apresentaram mais propen-
pós parto (Escala de Depressão Pós-Parto são à ajuda do desconhecido do que os
de Edimburgo). Procedimento: Foi filma- meninos, precisa-se avaliar, cercando-se
do o desempenho da criança em tarefas de novos dados, se os meninos são mais
de cooperação: 1) ajudar a mãe, pessoa afetados neste aspecto pela DPP materna.
familiar, a guardar brinquedos, depois de Os resultados são compatíveis com a su-
uma sessão de brincadeira e 2) ajudar ex- posição de que a condição de DPP afeta
perimentador, desconhecido, a pegar ob- de modo complexo os processos subja-
jeto que ele deixa cair ao solo (adaptadas centes à interação social com pessoas não
de Warneken et col. 2007). Resultados: conhecidas e com a mãe. Conjugados com
Foram encontradas diferenças significa- resultados anteriores que mostravam al-
tivas (qui-quadrado) na ajuda ao experi- terações interacionais das díades com DPP
mentador na situação geral, agrupando (em DeFelipe, 2009 e Vicente, 2009, acima
ausência de ajuda no conjunto com a não apresentados), compõem um quadro de
ajuda na tarefa específica: crianças do gru- efeitos destas peculiaridades das experi-
po DPP, cooperaram menos que as demais ências comunicativas no desenvolvimento
(x²=6,52,p=0,02; 72%x36%). Embora não subsequente. Não indicam um prejuízo
tenha havido diferença significativa entre generalizado na capacidade de assumir a
os sexos nesta categoria, meninas tende- perspectiva mental do outro, uma vez que
ram a cooperar mais (x²=4,17, p=0,67; 56% a ajuda à mãe se processa da mesma ma-
x 26%). Na categoria específica de ajuda neira nos dois grupos. Mas mostram uma
ao experimentador, meninas cooperaram resistência à ajuda ao desconhecido, na

26
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

condição DPP, especialmente no caso dos indivíduo, devido às influências que pode
meninos. De um modo geral, a constata- exercer em seu comportamento. Os pais
ção deste tipo de efeito da DPP no desen- são considerados como a fonte primária
volvimento da criança contribui para uma que o ser humano possui de contato com
compreensão mais ampla do processo. o mundo, e desempenham um papel im-
Além disso, a constatação destes efeitos portante no comportamento e desenvol-
ligados à inserção social da criança confe- vimento da criança e adolescente, como
re importância adicional à prevenção e à mediadores entre eles e a sociedade. Di-
intervenção. versos estudos ressaltam que a convivên-
cia das crianças com mães que apresen-
Palavras-chave: depressão pós-parto, tam transtornos psiquiátricos, incluindo a
cooperação infantil, interação mãe-bebê. depressão, configura-se como um fator de
Contato: Laura Cristina Stobäus risco para o desenvolvimento dos filhos.
e-mail: stobaus@usp.br Nesse sentido, este estudo busca correla-
cionar sintomas depressivos de mães com
problemas de comportamentos internali-
LT01-957 - CORRELAÇÃO ENTRE zantes e externalizantes de seus filhos. Os
SINTOMAS DEPRESSIVOS MATERNOS participantes do estudo foram 21 sujeitos,
E PROBLEMAS DE COMPORTAMENTOS sendo 42% do sexo feminino e 58% do
EM CRIANÇAS COM DESENVOLVIMENTO sexo masculino, com idade média de 8,90
TÍPICO anos (dp=0,91) entre 7 e 11 anos, que fre-
Ana Ribeiro Santana - UFRB/CCS quentam uma escola pública da cidade de
ana.ribeiro_22@hotmail.com Santo Antônio de Jesus-BA. Os instrumen-
Gustavo Marcelino Siquara - UFRB/CCS tos utilizados foram a Escala de Depressão
gustavosiqura@hotmail.com Beck e a Lista de Verificação Comporta-
Thiago da Silva Gusmão Cardoso - UFRB/CCS mental (Child Behavior Checklist – CBCL),
thiago_gusmao1@hotmail.com versão para pais. O Inventário de Depres-
Mariângela Santos de Jesus - UFRB/CCS são de Beck (IDB) é um instrumento de au-
mariangela.santos@msn.com torrelato constituído por 21 grupos de afir-
Patrícia Martins de Freitas - UFRB/CCS mações de múltipla escolha em que a pes-
pmfrei@yahoo.com.br soa deve responder qual a opção que esta
Financiamento: FAPESB e CNPq de acordo com o seu estado na naquela
determinada situação. Os itens estão rela-
A família é uma instituição primária, na cionados aos sintomas depressivos como
qual, o indivíduo tem contato com as pri- desesperança, irritabilidade, culpa além
meiras interações sociais. Esse sistema de sintomas físicos como fadiga, perda de
pode ser compreendido como grupo de peso e diminuição da libido. Já o CBCL é
pessoas que interagem a partir de vín- um questionário que avalia a competência
culos afetivos, consanguíneos, políticos social e problemas de comportamento em
e que estabelecem uma rede infinita de crianças e adolescentes em duas versões
comunicação e de mútua influência. A fa- uma de 1 ano e 6 meses até 5 anos e ou-
mília consolida-se como um importante tra de 6 a 18 anos, a partir de informações
nicho para o desenvolvimento global do fornecidas pelos pais. As escalas do CBCL

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

identificam problemas de comportamento quanto externalizante. Diante desse resul-


frequentemente encontrados na infância tado, juntamente com a literatura atual,
e na adolescência. As subescalas são clas- podemos concluir que os problemas de
sificadas como: Ansiedade/Depressão, Re- comportamentos representam déficits ou
traimento, Queixas Somáticas, Problemas excedentes comportamentais que prejudi-
socialização, Problemas Pensamento, Pro- cam o desenvolvimento cognitivo, físico e
blemas Atenção, Comportamento Que- psicossocial. Esses comportamentos atri-
bra-Regra, Comportamento Agressivo. Os bui nas crianças um sentimento de empo-
pais foram convidados para uma reunião brecimento na capacidade pessoal, e incu-
na qual foi apresentado o projeto. Após te o sentimento de incompetência pesso-
esclarecimentos os pais assinavam o Ter- al, que podem se apresentar na forma de
mo de Consentimento Livre e Esclarecido sentimentos de vergonha, dúvidas sobre
(TCLE) e responderam o CBCL e o BDI. Para si mesmas, baixa estima e distanciamento
análise de dados foi utilizado o programa das demandas da aprendizagem. Assim,
estatístico SPSS 18.0. Os dados foram ana- faz-se necessário que o processo desen-
lisados através da correlação de Pearson. volvimental seja bem sucedido para que
As correlações foram às seguintes entre o: as crianças tornem-se adultos saudáveis
BDI e Problemas de socialização (r= 0,507 e competentes para responder de modo
e p=0,04*); Problemas de Pensamento (r= satisfatório às demandas de seu ambiente
0,509 e p=0,04*); comportamento de que- emocional, social, familiar e profissional.
bra de regra ( r=0,483 e p=0,03*); compor-
tamento agressivo ( r=0,50 e p> 0,05); an- Palavras-chave: depressão; comportamento;
siedade e depressão ( r=0,477 e p=0,053); desenvolvimento.
retraimento (r=0,343 e p=0,177); queixa Contato: Ana Ribeiro Santana, Graduanda em
somática (r=0,232 e p=0,370); problemas Psicologia - ana.ribeiro_22@hotmail.com.
de atenção (r=0,370 e p=0,144). Pode-se
verificar nos resultados que houve uma
correlação moderada positiva entre o BDI, LT01-965 - O SUPORTE SOCIAL COMO
respondido pela mãe e as subescalas so- FATOR DE PREVENÇÃO DA DEPRESSÃO
bre os problemas de comportamentos do EM MÃES DE BEBÊS INTERNADOS EM
filho indicado pelo CBCL nos seguintes cri- UMA UTIN
térios: Problemas de socialização (r= 0,507 Claudia Moura de Sant'Anna C. Oliveira - UVV
e p=0,04*); Problemas de Pensamento claudiamoura@hotmail.com
(r= 0,509 e p=0,04*); comportamento Izabel Lima de Vasconcellos - UVV
de quebra de regra (r=0,483 e p=0,03*); iza_lv@hotmail.com
e comportamento agressivo ( r=0,50 e Luciana Bicalho Reis - UVV
p> 0,05). A proporção de significância foi luciana.reis@uvv.br
igual tanto para comportamentos interna- Marlucia de Souza Thompson - UVV
lizantes e externalizantes. Os resultados marluciathompson@hotmail.com
nos permitem confirmar a pressuposição
de que há correlação entre sinais de de- A internação de um filho, em geral, cons-
pressão materna e problemas de compor- titui-se numa situação geradora de estres-
tamento, tanto para o perfil internalizante se, acompanhada de alterações emocio-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nais e psicológicas para as mães, sendo no transcorrer da vida do indivíduo. Neste


que nem sempre esses sujeitos recebem sentido, Kessler, Price e Wortman (1985,
o apoio social adequado para lidar com ta- citados por Ribeiro, 1999), afirmam que
manha adversidade. A presença de mães o suporte social pode resguardar os indi-
que se encontram em um quadro depres- víduos em risco de possíveis inquietações
sivo se revela comum em Unidades de mentais. Segundo Dessen & Braz, (2000,
Tratamento Intensivo Neonatais (UTIN), citado por Baptista et al., 2006) o amparo
principalmente aquelas que não rece- familiar é o mais importante tipo de su-
bem suporte social adequado (Baptista, porte social para a manutenção da saúde
Batista & Torres, 2006). Mães com bebês mental e o enfrentamento de situações
internados em UTIN podem apresentar estressantes, além de favorecer a ade-
quadros de depressão e outros transtor- quação de comportamentos maternos em
nos, sendo a internação, possivelmente, relação aos filhos. Neste sentido, na situa-
um dos fatores que contribuem para tal ção de internação de um filho, o suporte
episódio. Como nos mostram Linhares et social pode mostrar-se como fator de pre-
al (2006), a prematuridade e a hospitali- venção e proteção da depressão materna.
zação do bebê podem ocasionar às mães Assim, a presente pesquisa propôs veri-
sentimentos conflitantes em relação ao ficar a relação entre depressão e ausên-
bebê real e o imaginado, além de culpa, cia de suporte social em mães de bebês
ansiedade, instabilidade emocional, baixo internados em uma UTIN de um hospital
senso de competência e dificuldade de infantil na região de Vila Velha-ES. OBJE-
contato físico com o bebê, angústia ao ir TIVOS: Delinear o perfil socioeconômico e
à UTIN, medo de apegar-se ao bebê ten- familiar de mães que participam do Grupo
do que encarar a perda devido ao possí- Psicoterapêutico de mães da UTIN; Anali-
vel óbito, luto antecipatório entre outros. sar a percepção que os sujeitos têm acer-
Ainda segundo as mesmas autoras, todos ca do suporte social que recebem (tanto
esses sentimentos podem ser indicativos informal quanto formal) durante o perío-
de estado de depressão. Sarason, Levine, do de internação dos seus filhos; Verificar
Bashan e Sarason (1983, citados por Ri- se a participação das mães no Grupo Psi-
beiro, 1999) definem Suporte Social como coterapêutico constitui-se para os sujeitos
apoio ou auxílio que uma pessoa recebe uma fonte de suporte social; Verificar qual
de outra em quem possa confiar, que a tipo de suporte social é o considerado
valorize e que demonstre que gosta dela. mais importante para as mães no momen-
No entanto, é necessário que o sujeito fa- to da hospitalização de seu filho e correla-
vorecido esteja disposto a ser ajudado e cionar se os sujeitos que têm melhor per-
que perceba o suporte como disponível. cepção do suporte social recebido são os
Existem diversos tipos de suporte social, que apresentam menos sentimentos ne-
dentre eles, o familiar, grupo de amigos, gativos indicativos de depressão durante o
o psicológico e o institucional. Coutinho et período de internação do bebê. MÉTODO.
al. (2000, citado por Baptista et al., 2006) Trata-se de uma pesquisa de caráter quali-
apontam que um apropriado suporte so- tativo e descritivo, realizada em uma UTIN
cial propicia ajuda em diversas ocasiões, de um Hospital Infantil no município de
maior domínio do ambiente e autonomia Vila Velha-ES. Integram a pesquisa mães

29
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de bebês internados há pelo menos 15 nos Grupo Psicoterapêutico de mães da


dias e que participam do Grupo Psicote- UTIN permita a construção de estratégias
rapêutico de mães da UTIN. Na ocasião de de enfrentamento da situação de adoeci-
ingresso na pesquisa, as mães assinarão o mento e internação do filho.
Termo de Consentimento Livre e Esclare-
cido e responderão a uma Entrevista Indi- Palavras-chave: maternidade, depressão,
vidual Semiestruturada, gravada em áudio suporte social.
e posteriormente transcrita para análise.
Os relatos obtidos no grupo também in-
tegrarão os dados. Será utilizada ainda a LT01-974 - TECENDO FIOS: A VIVÊNCIA
Escala de Edimburgo – EPDS que é utiliza- MATERNA E O VÍNCULO ENTRE MÃE E
da para identificar sintomas de depressão BÊBE INTERNADO EM UMA UNIDADE DE
que se manifestam após o parto (Santos, TRATAMENTO INTENSIVO
1995, citado por Ruschi et al 2007). Outro Claudia Moura de Sant'Anna C. Oliveira - UVV
instrumento a ser utilizado será a Escala claudiamoura37@hotmail.com
de Satisfação com o Suporte Social – ESSS Izabel Lima de Vasconcellos - UVV -
(Ribeiro, 1999), que será adaptada ao con- iza_lv@hotmail.com
texto hospitalar. Esta Escala é constituída Luciana Bicalho Reis - UVV -
por 15 itens que se distribuem por quatro lucianabreis@hotmail.com
dimensões, satisfação com amigos (SA), Marlucia de Souza Thompson - UVV
intimidade (IN), satisfação com a família marluciathompson@hotmail.com
(SF) e atividades sociais (AS). Os sujeitos Paula Maria Tonon - UVV
terão assegurados sua identidade e sigi- paulinhamariat@gmail.com
lo das informações fornecidas, que serão
utilizadas somente para fins de produção A maternidade é um acontecimento de
científica e receberão apoio psicológico da muita importância para a mulher. Desde
equipe de pesquisadores. RESULTADOS cedo, ainda menina, nas brincadeiras e na
PARCIAIS. A coleta de dados foi iniciada relação com as mães, a maioria delas co-
como projeto piloto e espera-se verificar meça a “brincar” de ser mãe. Ninam suas
o quanto o suporte social contribui para bonecas, cuidam de sua alimentação, tro-
a prevenção da depressão. Nos dados cam sua fralda, a fim de se preparar para
coletados de forma preliminar, já se per- ter o próprio filho. Durante a vivência da
cebe que as mães entrevistadas relatam maternidade a mulher começa a idealizar
receber pouco suporte social (da família um filho conforme a sua própria imagem
e grupos sociais aos quais pertencem), e e semelhança, esperando o momento de
apresentam sinais indicativos de depres- apresentá-lo à sociedade. Desta forma,
são. Espera-se como benefício da pesqui- a emergência do parto prematuro não
sa uma melhor compreensão das relações está relacionada somente a antecipação
entre a vivência da maternidade na UTIN, do nascimento do bebê, mas também de
a prevalência de sintomas depressivos sua mãe, que despreparada para esse mo-
nestes sujeitos e a relação disso com uma mento, torna-se “prematuramente mãe”,
melhor ou pior rede de apoio social. Para necessitando reajustar-se a essa dura rea-
os sujeitos, espera-se que a participação lidade. Aquilo que muitas vezes foi temido

30
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

durante a gravidez torna-se real e ambos por um bom tempo o lugar onde mãe e fi-
estão agora vulneráveis, inseridos em um lho irão conviver no limiar entre a vida e a
ambiente desconhecido que irá separá- morte. A partir de agora, terão que “tecer
-los ainda muito cedo. O recém-nascido de fios”, criar laços, construir vínculos que po-
risco, também chamado de prematuro ou derão estar fortemente abalados a partir
bebê pré termo, é aquele que nasce com daquele momento. Neste sentido, a pre-
uma idade gestacional menor que 37 se- sente pesquisa tem por objetivo analisar
manas e em casos extremos os que nas- como se dá a qualidade da relação e vín-
cem com menos de 28 semanas de ges- culo entre mães e seus bebês pré-termos
tação. Alguns bebês prematuros podem que estão internados em uma Unidade de
nascer com complicações ou alterações Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), ou seja,
orgânicas, além do baixo peso e respiração conhecer e analisar como a prematuridade
deficitária, necessitando assim de apare- e o ambiente artificial de cuidados iniciais
lhos especializados para a sobrevivência. ao recém-nascido podem trazer dificulda-
Pesquisas revelam que atualmente no des ao estabelecimento deste vínculo ini-
mundo 20 milhões de bebês nascem pre- cial da mãe com o bebê e que recursos e
maturamente, sendo que desses, um ter- estratégias são criados por estas mulheres
ço morre antes de completar um ano de para enfrentar tais adversidades. OBJETI-
idade (Romanoli & Moreira, 2008). A pre- VOS: (1) Identificar e analisar os sentimen-
maturidade traz em seu bojo significativas tos vivenciados pelas mães em relação
consequências emocionais que são marca- ao nascimento prematuro e à internação
das pela perda desse bebê imaginado du- de seus bebês na UTI neonatal; (2) Identi-
rante a gestação. A perda do bebê idealiza- ficar as estratégias de enfrentamento ado-
do, o berço que estará vazio, as roupas que tadas pelas mães em relação à situação de
a princípio não serão usadas, a cobrança hospitalização do bebê e na busca de cria-
da família e do meio social, podem colocar ção de vinculo afetivo com o filho; (3) Ve-
em risco uma relação (mãe-bebê) que ain- rificar que tipo de conhecimentos as mães
da se constrói. A internação de um bebê têm em relação à importância de se man-
em uma Unidade de Tratamento Intensivo ter um vínculo afetivo com o bebê, mesmo
Neonatal (UTIN) contribui para o afasta- que internado na UTI neonatal. MÉTODO:
mento entre a mãe e o bebê, interferindo Trata-se de uma pesquisa qualitativa e
significativamente na relação de vínculo e descritiva, realizada através de entrevistas
apego. A separação, que não poderia ser individuais, com roteiro semiestruturado
de outra forma, traz consigo sentimentos em uma Unidade de Terapia Intensiva Ne-
de culpa, incompetência e luto pelo bebê onatal (UTIN) do Hospital Dr. Alzir Bernadi-
idealizado, o que dificulta ainda mais o no Alves (HIMABA) no município Vila Ve-
estreitamento dos laços parentais (Raad, lha-ES. Fazem parte da pesquisa 10 mães
Cruz & Nascimento, 2006). Assim, pode de bebês prematuros e de baixo peso in-
ocorrer uma ruptura no processo de vincu- ternados na UTIN desde o nascimento e
lação já que muitas mães sentem-se rece- que participam do Grupo Psicoterapêutico
osas de tocar ou conversar com seu filho, de mães da UTIN. Após aceite do convite,
o que pode gerar stress psicológico para as mães serão esclarecidas quanto à sua
ambos (Schumacher, 2002). A UTIN será participação na pesquisa e assinarão o Ter-

31
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mo de Consentimento Livre e Esclarecido LT01-1336 - ANÁLISE DE INDÍCIOS DE


atendendo-se às exigências do Conselho DEPRESSÃO PÓS-PARTO NAS MÃES
Nacional de Saúde. Em seguida, será re- QUE FREQUENTAM UM CENTRO DE
alizada a Entrevista Individual, seguindo- EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA PARA
-se ao roteiro pré-estabelecido. Também ATENDIMENTO PUERPERAL EM
serão colhidas as informações oriundas ENFERMAGEM
dos atendimentos psicológicos individu- Vanessa Cavalcanti de Torres - AEB
ais, bem como dos encontros do Grupo vanctorres@hotmail.com.
Psicoterapêutico das mães da UTIN. Tanto Aliny Valéria Bezerra Cavalcante - FAEB
as entrevistas individuais, quanto reuniões alinyvbc@hotmail.com
em grupo serão gravadas em áudio e seu Grasiela Nascimento da Conceição - FAEB
registro transcrito para posterior análi- grasy_nascimento@hotmail.com
se. Os prontuários dos bebês cujas mães
integram a pesquisa servirão para com- A depressão pós-parto (DPP) constitui fa-
plementar as informações fornecidas pe- tor agravante para dificuldade no período
las mães relativas aos dados de saúde do pós-parto, tendo sinais característicos tais
bebê, tais como idade gestacional e peso como: humor deprimido, falta de interes-
ao nascimento, complicações/alterações se pelas atividades diárias, desinteresse
presentes na ocasião do nascimento. RE- pelos cuidados maternos para com seu fi-
SULTADOS PARCIAIS. A coleta de dados já lho, medo de não ser uma boa mãe, choro
foi iniciada por meio de estudo piloto que fácil, entre outros, que podem ser iden-
pretende verificar a adequação do roteiro tificados para possível diagnóstico, atra-
de entrevista. Pelas entrevistas realizadas vés de uma consulta de qualidade onde
até o momento, observou-se que as mães o profissional deve estar atento a esses
passaram o período da gravidez idealizan- sinais para que seja realizado tratamen-
do um bebê perfeito, sem problemas ou to adequado, ou até mesmo a prevenção
qualquer alteração de saúde. Porém, o da instalação desta patologia. Durante o
nascimento prematuro e a internação na puerpério várias alterações ocorrem tanto
UTIN, constituem-se experiências emocio- na mulher como no recém-nascido, pois
nalmente difíceis. Quanto ao vínculo mãe- é um período que permite a troca de ca-
-bebê, observa-se que não houve entre rinho, de segurança para o bebê durante
as mães já entrevistadas dificuldades em os cuidados prestados pela mãe (Guedes-
constituí-lo e mantê-lo, porém o ambiente -Silva et. al., 2003). O puerpério deve ser
hospitalar e as práticas de assistência ao assim, um período prazeroso para a mu-
recém-nascido foram citados pelas mães lher, pois só dessa maneira ela conseguirá
como um dos principais fatores dificulta- transmitir afeto para o seu filho, contri-
dores na interação com seus bebês. buindo para desenvolvimento saudável
do seu bebê (Mattar et. al., 2007). Se a
Palavras-chave: Maternidade-prematuridade- mesma não apresenta condições emocio-
Unidade de Terapia Intensiva Neonatal nais para cuidar da criança, isto o afetará
Contato: Claudia Moura de Sant’Anna Carvalho diretamente, facilitando o desenvolvi-
de Oliveira - Centro Universitário Vila Velha - mento de patologias (Schwengber & Picci-
claudiamoura37@hotmail.com nini, 2003). Sendo assim, este estudo teve

32
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como objetivo, identificar possíveis indí- t de student que apontou um intervalo de


cios de depressão pós-parto nas mães que 95% de confiança a média da amostra é
freqüentam o CEPAC (Centro de Pesquisa de 0,8; erro padrão de 0,07; mediana igual
e Atenção à Criança), no laboratório da a 1; desvio padrão igual a 0,4 e variância
FAEB (Faculdade de Enfermagem do Belo igual a 0,2. Os resultados apontaram que
Jardim) em Belo Jardim-PE. A atenção à (a) 32% da amostra apresentou indícios de
mulher no puerpério fica facilitada duran- depressão pós-parto suficientes para que
te a consulta quando do encaminhamen- fosse classificada no grupo de risco, (b) o
to de seus filhos para o CEPAC que é um número de mulheres que apresentou re-
Centro de Pesquisa e Atenção à Criança, sultado indicativo foi maior nas de deze-
pois no período em que essas mães levam nove anos, tendo estas como estado civil
seus filhos é o de maior incidência da DPP, respectivamente união estável que repre-
facilitando assim, o diagnóstico inicial des- sentou 32% da amostra, (c) quanto ao grau
sa doença. Portanto, mostra-se a impor- de escolaridade 18% tinha apenas ensino
tância da atenção não só à criança, mas, fundamental incompleto, observando-se
também à mãe que, muitas vezes, deixam desta forma que o número de mulheres
de atentar para a sua saúde, porém seu que possuem pouca escolaridade é sig-
estado físico e mental influenciará na saú- nificativo, estando inclusas neste percen-
de e bem estar de seu filho. Entendemos tual a maioria das mulheres com indícios
que o estado emocional da mãe alterado, de DPP. Diante desses dados, percebe-se
incidirá sobre a qualidade de vida de seu que o profissional de saúde deve estar
filho e como conseqüência, uma dificulda- habilitado para detectar precocemente
de em estabelecer laços afetivos ao longo os indícios de depressão pós-parto, tendo
da vida entre ambos. Nesse estudo foram sensibilidade para entender as mulheres
utilizados um questionário para os dados que apresentem os sinais preditivos nes-
pessoais e a Escala de depressão pós-par- ta fase, podendo intervir no tratamento
to de (EPDS). A EPDS é composta por 10 e encaminhamento para atendimento es-
itens e tem sido amplamente utilizado em pecializado. As consequencias da DPP não
todo o mundo, demonstrando ser um ins- são apenas para a mulher, mais também
trumento útil para detectar mulheres sob para a criança, podendo afetar, inclusive, a
risco de apresentar depressão pós-parto. relação conjugal, pois o comprometimen-
Idealizada por Cox Holder et al. em 1987, to do binômio mãe-filho, pode ser ocasio-
essa escala é de fácil aplicação e pode ser nado por mães menos afetuosas e mais
utilizada por profissionais de saúde de ausentes nas respostas às necessidades
diversas áreas. Quanto à população des- de seus filhos, prejudicando, dessa forma,
se estudo foi composta por 38 puérperas o cuidado com o mesmo.
quando as mesmas levaram seus filhos
para consulta de puericultura no CEPAC. Palavras-chave: Depressão pós-parto; mãe-
A análise utilizou um método estatístico filho; Puerpério.
para o tratamento dos dados, de acordo
com os critérios definidos pelo próprio ins-
trumento empregado para avaliação das
participantes, tendo como base o teste de

33
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-801 - RELACIONAMENTO no desenvolvimento da criança. O obje-


CONJUGAL, CLIMA AFETIVO DA FAMÍLIA tivo da presente pesquisa foi aprofundar
E DEPRESSÃO PÓS PARTO o entendimento das relações entre DPP,
Júlia Scarano de Mendonça - IPUSP avaliada aos 4 e 8 meses da criança, e con-
julia.m@itelefonica.com.br flito conjugal e familiar. Como associações
Vera Sílvia Raad Bussab - IPUSP significativas entre a ocorrência de DPP e
vsbussab@gmail.com a de Depressão Anterior independente da
José de Oliveira Siqueira - IPUSP gestação (DA) foram constatadas previa-
siqueira@usp.br mente (Silva, 2008), as relações entre DPP
Financiamento: FAPESP e conflito serão também analisadas à luz
da presença ou não de DA. Método. Cen-
Essa pesquisa está inserida no Projeto Te- to e treze famílias da classe média baixa,
mático FAPESP Depressão pós-parto (DPP) atendidas pelo Hospital Universitário da
como um fator de risco para o desenvol- USP e pelo SUS. Três entrevistas: na gesta-
vimento do bebê: estudo interdisciplinar ção, aos 4 e aos 8 meses da criança foram
dos fatores envolvidos na gênese do qua- realizadas para coletar informações sobre
dro e em suas conseqüências (Processo a família e a criança. Foram analisadas
06/59192-2). A DPP tem sido apontada questões sobre a relação conjugal, o clima
como um distúrbio emocional com po- familiar, a ocorrência de DA e a de DPP (Es-
tenciais implicações para a mãe e o bebê. cala de Depressão Pós-natal de Edinburgh
Chama a atenção a predominância dos - EDPE), de Cox, Holden e Sagovsky (1987),
estudos com foco exclusivo na mãe e na aplicada aos 4 meses da criança. O teste
criança, sendo o pai e outros membros da exato qui-quadrado de Pearson mostrou
família menos estudados. Recentemente, associações significativas entre conflito
estudos têm mostrado associações entre conjugal e DPP aos 4 (X²=23.108; p=0,000)
DPP e inadequações no funcionamento e aos 8 meses (X²=16.848; p=0,000), com
familiar (Burke, 2003; Johnson & Jacob, percepção materna de baixo nível de con-
1997). Cummings e Davies (1994) sugerem flito associada à ausência de DPP, e de
que além da DPP, o “distúrbio psicossocial alto nível de conflito associada à DPP. O
na família” associado à depressão deva tamanho estimado do efeito obtido por
ser considerado como fator de risco para meio do V de Cramer foi de .474 e .413,
o desenvolvimento da criança. A asso- respectivamente. Resultados análogos
ciação entre DPP e problemas na relação foram obtidos para o conflito familiar, in-
conjugal também tem sido apontada na dicando a percepção de baixo conflito na
literatura da área (Burke, 2003; Cummin- ausência de DPP e o aumento da percep-
gs & Davies, 1994; Silva & Piccinini, 2009) ção do conflito na presença de DPP, aos 4
bem como em análises prévias feitas no (X²= 10.389; p=0,006 e V de Cramer=.303)
presente projeto temático (Silva, 2008). e aos 8 meses ( X²=20.008; p=0,000 e V de
O conflito conjugal tem sido identificado Cramer =.423). Verificou-se associação sig-
como relevante para a qualidade da vida nificativa entre conflito conjugal e familiar,
familiar, para a compreensão das origens independentemente da DPP, aos 4 (X²=
da DPP e para prognósticos mais precisos 28.687, p=0,000) e aos 8 meses da crian-
sobre a influência do contexto familiar ça (X²= 76.689; p=0,000), com magnitudes

34
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de efeito da ordem de .373 e .622, respec- tenha um impacto maior. Importa salien-
tivamente. Com o objetivo de discriminar tar que os conflitos familiares e conjugais
o efeito da DPP de possíveis efeitos de DA, mostraram-se significativamente associa-
os dados foram analisados separando-se dos à DPP, independentemente da DA,
os casos de DPP associados ou não à DA. o que apóia a compreensão de relações
Esta análise fortaleceu a idéia do efeito es- peculiares da DPP com o conflito. Contu-
pecífico da DPP, pois, na ausência de DA, do, pelo fato de as associações verificadas
houve associação significativa com conflito acima serem encontradas somente na au-
conjugal aos 4 (X²=12.213, p=0.007 e V de sência de DA, é possível que esta atue de
Cramer=.440) e aos 8 meses (X²=12.095, forma diferente na constituição da DPP,
p=0.011 e V de Cramer=.438); e com com outras associações entre as variáveis.
conflito familiar aos 8 meses (X²=12.813, Há outra interação complexa entre apoio
p=0.009 e V de Cramer=.451), no mesmo social (afetado por conflitos) e a DPP a ser
sentido dos resultados gerais. Na presen- considerada: as ligações entre baixo apoio
ça de depressão anterior, não houve as- e DPP sugerem causalidade, mas, ao mes-
sociações significativas em nenhum dos mo tempo, a própria DPP poderia evocar
momentos. As associações entre DPP e apoio social no cuidado com a criança.
conflito corroboram a idéia da importân- Evidentemente, deve-se considerar ainda
cia do contexto conjugal e familiar para uma possível bidirecionalidade de efeitos
a compreensão do quadro. Os valores da entre conflitos conjugais e familiares com
magnitude do efeito relativamente bai- a DPP, pois os conflitos podem propiciar o
xos, como frequentemente acontece nos desenvolvimento da DPP, e esta, por sua
dados da literatura, são compatíveis com vez, intensificar os conflitos. As relações
a interpretação de um fenômeno multide- entre DPP e aspectos gerais de harmonia
terminado: ao que tudo indica, um con- e apoio social têm se revelado importan-
junto de variáveis associa-se à DPP, sendo tes para a compreensão da origem e das
uma parcela destas representada pelo conseqüências da DPP e tem merecido
conflito conjugal e familiar. Considerada atenção especial no presente projeto,
a multideterminação, esta magnitude de tanto pelo interesse teórico quanto pelo
efeito passa a representar participação re- interesse em termos de prevenção e de
levante destes conflitos no quadro da DPP. políticas públicas.
A associação entre os conflitos conjugal e
familiar sugere dependência entre essas Palavras-chave: depressão pós-parto, relação
variáveis, conforme previsto. O maior va- conjugal, família
lor do quiquadrado aos 8 meses sugere Contato: julia.m@itelefonica.com.br
aumento da associação com o passar do
tempo. De forma similar, aos 4 meses, os
valores mais altos do qui-quadrado para a
associação entre a DPP e o conflito con-
jugal do que para o conflito familiar suge-
rem que nos primeiros meses após o parto
(coincidentemente com o pico da DPP aos
3 meses após o parto) o conflito conjugal

35
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-925 - ESTILO DE APEGO E DEPRES- gitudinalmente, desde a gestação até o 3º


SÃO PÓS-PARTO ano da criança. O estilo de apego da criança
Carla Cristine Vicente - UFRRJ foi avaliado através dos procedimentos da
carlavicent@gmail.com “Situação Estranha”, segundo protocolo de-
Vera Silvia Raad Bussab - USP senvolvido por Ainsworth, Blehar, Waters e
vsbussab@gmail.com Wall (1978) e Main e Solomon (1990). Uma
equipe de 04 pessoas treinadas participou
Financiamento: FAPESP
das filmagens, feitas quando os bebês fo-
O estilo de apego que a criança constrói, a ram completando 12 meses. Todas as día-
partir das diferentes interações das quais des foram recebidas pela pesquisadora e
participa, se refere a estratégias ontogené- instruídas para participar dos oito episó-
ticas de desenvolvimento social. O apego dios, (duração de 21 minutos), nos quais
se relaciona ao sentimento de segurança ocorria uma seqüência de interações entre
e proximidade do bebê em relação a suas o bebê, a mãe e uma pessoa desconhecida
figuras significativas, o que integrará o seu do bebê, envolvendo separações e reuniões
desenvolvimento global e construirá um mãe-bebê. Foram analisadas 85 díades, di-
modelo de funcionamento interno para vididas em dois grupos: experimental (com
seus relacionamentos futuros (Bolwby, indicativos de DPP) e controle (sem DPP)
1990). A Depressão Pós-Parto (DPP) é um (“Escala de Depressão Pós-Parto de Edim-
distúrbio com sérias implicações potenciais burgh - EDPE” (Cox, Holden, & Sagovsky,
para a mãe, por propiciar a emergência de 1987). A classificação do padrão de apego
sintomas como humor deprimido, labilida- (seguro; inseguro – evitante, ambivalente
de emocional, sentimentos de incompetên- ou desorganizado) foi feita conforme o pro-
cia para lidar com a criança, distúrbio do tocolo de Ainsworth e cols. (1978), que con-
sono, perda de prazer e ideação suicida, o sidera quatro dimensões: Procura de proxi-
que, por sua vez, pode acarretar prejuízos midade; Manutenção de contato; Evitação
para o bebê, associados a atrasos no desen- de proximidade, e Resistência ao contato e
volvimento físico e cognitivo (Patel, Souza conforto, avaliadas via atribuição de valores
& Rodrigues, 2003). Este estudo objetivou de 1 a 7 pontos, detalhadamente definidos.
avaliar estilos de apego em bebês de mães A classificação foi realizada às cegas, sepa-
com e sem indicativos de DPP, a fim de ava- radamente, por duas observadoras para o
liar se a construção do vínculo de apego era índice de DPP da mãe. A confiabilidade das
influenciada pela depressão materna, de observações medida pelo índice Kappa de
modo a aprofundar a compreensão sobre Cohen apontou concordância de 0,833, va-
o desenvolvimento afetivo e da sua impor- lor confiável para avaliações. Dadas as reco-
tância no desenvolvimento geral da criança. nhecidas ligações entre os estilos de apego
Este estudo esteve associado ao projeto e a regulação da segurança afetiva com
temático “Depressão pós-parto como fator autonomia, exploração e brincadeira, foi
de risco no desenvolvimento: estudo inter- desenvolvido um protocolo adicional de ob-
disciplinar dos fatores envolvidos na gênese servação, para avaliar padrões de explora-
do quadro e em suas conseqüências”, no ção do ambiente, de brincadeira e sinais de
qual mães e bebês atendidos pelo sistema ansiedade, como movimentos repetitivos,
público de saúde foram acompanhados lon- desconcerto emocional e cessação de ativi-

36
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade e de interação com a pessoa estranha, ambiente, de brincadeira e ansiedade nas


nas episódios de separação e retorno da crianças também apareceram prejudicados
mãe. Segundo os critérios do instrumento no grupo DPP. Nos episódios de separação
da Situação Estranha, predominou a classifi- da mãe, as crianças do grupo controle agi-
cação de apego seguro (82%), para o grupo ram com mais segurança, como se esperas-
como um todo (inseguros evitantes 11% e sem pelo retorno breve de suas mães. Na
resistentes 7%). O mesmo perfil de distri- comparação com os dados observacionais,
buição de estilos foi verificado no subgrupo a classificação de segurança dos bebês es-
com DPP, com predominância de apego se- teve diretamente associada à desenvoltura,
guro em 87% dos casos. Dos bebês (27) de iniciativa, manutenção e retornos à explo-
mães que tinham indicativos de DPP, ape- ração ambiental e dos brinquedos, quanto
nas 4 foram classificados como inseguros, às oportunidades de interação com a figura
contrariando as expectativas. Apesar de não materna. De acordo com a ênfase atual nos
se refletirem na classificação final do estilo comportamentos dos bebês no retorno da
de apego, verificaram-se relações entre DPP mãe (Waters e cols., 1995), como base para
e dimensões do protocolo da Situação Es- a compreensão da natureza do vínculo, o
tranha, por análise de regressão múltipla presente estudo indicou efeitos relevan-
(método stepwise), que indicou duas di- tes: bebês do grupo controle, mesmo após
mensões como preditivas da DPP materna: a angústia pela separação, demonstraram
mais comportamentos resistentes (B=1,76; apoiar-se mais na mãe como base segu-
t=2,66; sig= 0,01); menos busca de conta- ra para a exploração ambiental. Como os
to (B= -3,40; 7= 2,61; sig= 0,01). As análises bebês de mães com indicativo de DPP, de
do protocolo adicional mostraram peculia- modo geral, não retomaram as atividades
ridades significativas nas crianças do grupo após a separação da mãe, podemos presu-
DPP: menos deslocamento exploratório mir uma angústia maior ou falta de habili-
(x2(1)= 4,307 p=0,038), menos manipulação dade da mãe para restabelecer a confiança
de brinquedo (x2(1)= 5,434 p= 0,02), menos de seus bebês, o que é compreensível na
iniciativa na manipulação de brinquedos (X2 situação em que se encontram. O conjun-
(2)= 5,939, p=0,005), mais comportamen- to de resultados aponta a importância de
tos ansiosos nos dois episódios de separa- questões metodológicas, ligadas a um ce-
ção (X2 (1)= 4,400, p= 0,036; e x2(1)= 3,398 nário de complexidade de determinações,
p= 0,028), e menos retomada de exploração bem como à necessidade de consideração
nos retornos da mãe (x2(1)= 3,896 p= 0,040; de ajustamento dos instrumentos de avalia-
e x2(1)= 3,922 p= 0,038). Não houve predo- ção do apego. Reitera, também, efeitos da
minância de estilos de apego inseguros no DPP no desenvolvimento dos padrões liga-
grupo com DPP, conforme esperada pelos dos à vinculação afetiva e a relevância de
indicadores da literatura sobre o desenvol- estudos de acompanhamento para a com-
vimento de vinculação afetiva. Entretanto, preensão do quadro e para a promoção de
foram constatadas ligações significativas programas de intervenção.
da DPP com as dimensões de comporta-
mento resistente e de busca de contato, Palavras-chave: classificação de apego, depres-
compatíveis com aspectos de inseguran- são pós-parto, desenvolvimento social
ça neste grupo. Padrões de exploração do Contato: carlavicent@gmail.com

37
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 07 - LT01 pode contribuir para melhorar a detecção


dessas patologias. Diversos estudos mos-
Envelhecimento traram que a Escala de Depressão Geriá-
trica (EDG) oferece medidas válidas e con-
fiáveis para diagnosticar a depressão em
LT01-905 - DETERMINANTES DO RISCO DE
idosos, sendo um dos instrumentos mais
DEPRESSÃO EM IDOSOS EM UMA EQUIPE
frequentemente utilizados. Os fatores li-
DA ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA
gados à depressão precisam ser observa-
Cristiane Alves da Fonseca do Espírito Santo - dos de forma cuidadosa e criteriosa pelos
SMS/Goiânia profissionais da saúde, para que se possa
tinina3@gmail.com realizar a prevenção e o tratamento, a fim
Cristina Ferreira Lemos de Castro Carneiro - de evitar sofrimento ao idoso e dificulda-
S.M.S/Goiânia des para seus familiares ou cuidadores,
crislaralemos@gmail.com além de consequências negativas para a
Helizett Santos de Lima - UNB sua qualidade de vida. O presente estu-
helizettlima@yahoo.com.br do teve como objetivos estimar o risco de
Lorena Baía de Oliveira Alencar - SMS/Goiânia depressão em idosos na equipe 1 da Uni-
lorenabaia@hotmail.com dade de Atenção Básica de Saúde da Fa-
Olívia Cândida Pequeno - SMS/Goiânia mília (UABSF) Leste Universitário e avaliar
oliviacpequeno7@gmail.com os determinantes do risco de depressão
Sandro Rogério Rodrigues Batista - UFG em idosos. A pesquisa foi desenvolvida no
sandrorbatista@gmail.com município de Goiânia, Distrito Sanitário
Campinas-Centro, UABSF Leste Universi-
Os transtornos do humor são uma das tário. Foi realizado um estudo quantitati-
desordens psiquiátricas mais comuns em vo, transversal, com 92 idosos (com idade
idosos, sendo responsáveis pela perda de igual ou superior a 60 anos) de ambos
autonomia e pelo agravamento de qua- os sexos, no período de maio a junho de
dros patológicos preexistentes. Dentre 2010, que responderam a um questioná-
eles, a depressão é a mais frequente e rio sobre variáveis demográficas, socioe-
está associada ao maior risco de morbida- conômicas, comportamentais e de estado
de e de mortalidade, ao aumento na utili- de saúde, além da Escala de Depressão
zação dos serviços de saúde, à negligência Geriátrica (EDG-15). A análise dos dados
no autocuidado, à adesão reduzida aos utilizou o programa Excel® (Microsoft),
regimes terapêuticos e maior risco de sui- bem como para a elaboração de gráficos e
cídio. A presença de comorbidades e o uso tabelas. Com relação à análise estatística
de múltiplos medicamentos são habituais foram adotados o teste exato de Fisher e
na população idosa, fazendo com que, o teste estatístico de hipóteses Qui Qua-
tanto o diagnóstico quanto o tratamento drado. Segundo os resultados obtidos com
dos transtornos do humor se tornem mais a pontuação na Escala de Depressão Geri-
complexos. Diante da importância desses átrica, observou-se que 68,5% (n=63) dos
transtornos e da dificuldade diagnóstica, idosos apresentaram risco de depressão,
a avaliação sistemática dos indivíduos ido- pois alcançaram mais de 5 pontos no es-
sos com queixas de tristeza e/ou anedonia core utilizado. Verificou-se também que

38
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

na amostra de 92 idosos, houve predomi- da Família (ESF), a diagnosticar e propor


nância do sexo feminino, com 75 mulheres intervenções mais precoces e adequadas.
(81,5%). Quanto à idade, a maior frequên- É fundamental, portanto, que os profissio-
cia dos idosos estava na faixa etária entre nais de saúde tenham familiaridade com
60 e 79 anos (n=78) e que não houve di- as características desse agravo e estejam
ferenças significativas quanto à presença capacitados, preparados para investigar a
de depressão entre as faixas etárias estu- presença de sintomas depressivos e seus
dadas. Para o estado civil, a frequência de determinantes de risco. Nesse sentido, a
sintomatologia depressiva foi maior entre articulação da saúde mental com a aten-
os idosos casados (83%). Em relação à es- ção básica, principalmente através da ESF,
colaridade, a maioria dos idosos não tinha é essencial para diagnosticar e propor in-
escolaridade (n=36) sendo que 83% destes tervenções mais precoces e adequadas,
apresentaram frequência maior para risco valorizando a inserção familiar e social
de depressão. E ainda, que os idosos com deste indivíduo, através do trabalho mul-
curso superior apresentaram sintomatolo- tiprofissional, baseado na integralidade
gia depressiva, demonstrando que o fato das ações, colaborando para a melhora da
de ter cursado nível superior, demonstrou qualidade de vida do idoso.
não ser fator de proteção para sintomato-
logia depressiva. Em relação à renda fa- Palavras-chave: Saúde Mental, depressão,
miliar mensal, o risco para depressão foi população idosa.
maior entre os idosos com renda familiar Contato: Helizett Santos de Lima, Secretaria
de até um salário mínimo (84,6%) e idosos Municipal de Saúde de Goiânia e Universidade
que não possuíam aposentadoria (66,6%). de Brasília, helizettlima@yahoo.com.br
Em relação à internação, dentre os idosos
que estiveram internados (n=17), houve
risco de depressão alto (83,3%). Para aná- LT01-1206 - CORPO E ENVELHECIMENTO
lise estatística da variável relacionamento EM DEBATE NA UNIVERSIDADE ABERTA
familiar, as respostas foram dicotomizadas À TERCEIRA IDADE
nas categorias ótimo/bom (91,3%) e re- Vilma Valeria Dias Couto - UFTM
gular/ruim (8,7%). E finalmente pode-se vilmacouto@psicologia.uftm.edu.br
afirmar que dentre os participantes que Deise Coelho de Souza - UFTM
consideraram seu relacionamento fami- deisecsouza@hotmail.com
liar como ruim, a frequência do risco de Cecília Fernandes Carmona - UFTM
depressão foi de 87,5%. Há que se consi- ce.zen@hotmail.com
derar que o aumento da população idosa Ana Alice da Silva Pereira - UFTM
vem sendo observado em todo o mundo, ana_alicep@hotmail.com
mas o reconhecimento e o tratamento de
transtornos depressivos na população ido- A iniciativa de trazer os idosos para as uni-
sa, ainda permanecem como um desafio. versidades começou no Brasil em meados
Por isso, a identificação dos fatores de ris- da década de 70 e desde então vem sendo
co para depressão em idosos, associados implantada progressivamente em muitas
com sua incidência pode ajudar os profis- universidades (Cachioni & Neri, 2004). Na
sionais que atuam na Estratégia de Saúde Universidade Federal do Triângulo Minei-

39
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ro, a Universidade Aberta à Terceira Idade objetivo neste trabalho é compreender os


(UATI) é um programa de extensão univer- significados atribuídos ao corpo na velhi-
sitária, interdisciplinar, que tem o objetivo ce, considerando as transformações que
de possibilitar aos idosos acesso a uni- acontecem no envelhecimento. Metodo-
versidade numa perspectiva de educação logia: O projeto contou com a participa-
continuada e visa o resgate da cidadania, ção de 15 idosas. Foram feitos quatro en-
a promoção da saúde e desenvolvimento contros com duração de duas horas cada.
do idoso. O objetivo da psicologia é pro- As atividades foram realizadas por meio
mover debates sobre o envelhecimento, de oficinas e dinâmicas de grupo cujo pro-
considerando os aspectos subjetivos des- pósito era refletir sobre o envelhecimento
te processo e suas implicações no desen- pela via do corpo. A metodologia envolve
volvimento do idoso. Na UATI, elegemos a participação ativa dos idosos na discus-
o corpo como um dos eixos de reflexão são, buscando incentivar a expressão de
do envelhecimento. O corpo passa por ideias e experiências de cada um. Para a
significativas transformações ao longo da apresentação da proposta, foi elaborado
vida e na velhice as perdas que atingem um vídeo contendo diferentes imagens de
seu funcionamento, anunciam a chegada corpos que favoreciam o reconhecimento
desta etapa da vida. Para muitos idosos, o de transformações corporais que advém
corpo é fonte de angústia e preocupação, com a idade e a influência cultural na va-
seja porque é foco de adoecimento ou de- lorização do corpo jovem. Após exposição
vido ao significado que assume na nossa do vídeo, os idosos eram solicitados a falar
cultura que valoriza a imagem do corpo das imagens. Nos encontros posteriores,
jovem. Sobre o corpo humano, o saber trabalhamos com oficinas que abrangiam
da biologia, ao compreendê-lo como uma momentos de realização de tarefas segui-
somatória de órgãos e funções, acaba con- dos de discussões. Na oficina “Espelho,
frontando a pessoa com uma ideia de um espelho meu” todos eram convidamos
corpo interior feito de pedaços sobre o a se mirarem no espelho. Buscamos tra-
qual ele nada sabe, pois sobre ele quem balhar a imagem do corpo e o estranha-
sabe é a medicina. A questão do corpo na mento que experimentamos diante da
psicanálise é abordada num outro regis- imagem do corpo refletida no espelho,
tro, trata-se de um corpo que é mediador especialmente diante da imagem que traz
que organiza a relação entre a psique e o as marcas e sinais da idade. Nesta oficina,
mundo externo e através do qual o sujeito discutimos ainda o conceito de imagem
é reconhecido e com o qual se identifica. corporal como a representação mental do
Na UATI a proposta é ampliar a ideia do nosso corpo. Na oficina “os sentidos do
idoso sobre seu próprio corpo para além corpo”, trabalhamos os sentidos básicos
um corpo físico, falamos de um corpo so- do corpo humano por meio de ativida-
bre o qual os afetos, os prazeres e sofri- des práticas envolvendo a visão e audição
mentos vão deixando marcas, construindo que confirmaram as restrições advindas
história, criando uma imagem corporal com os anos de vida, e também permitiu
que permite reconhecimento, apesar das discutir outras possibilidades de poten-
mudanças que o tempo ou as circunstân- cializar os sentidos, incluindo o resgate
cias impõem (Goldfarb, 1998). O nosso de lembranças relacionadas às sensações

40
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

já experimentadas em outros momentos táveis não são desejáveis:“claro que não


de vida. Para atingir o propósito deste estou melhor agora, as rugas começam a
trabalho de compreender os significados aparecer, esquece as coisas;é normal, mas
do corpo atribuídos pelos idosos da UATI, não ficamos como antes.”; “muda tudo, a
consideramos como material de análise as pele é a matéria que vai envelhecendo”;
falas que foram registradas durante a rea- “nada me agrada”. Destacamos também
lização das oficinas. Trabalhamos com re- algumas falas que marcaram a relevância
cortes de falas e as possibilidades de sen- dos cuidados dispensados ao corpo na
tidos que podem advir. Resultados: Com velhice que são importantes tanto para
base nas falas das idosas, percebemos que garantir saúde como também para favore-
o corpo possibilita diferentes formas de cer uma melhor imagem de si na velhice:
olhar o processo do envelhecimento. Para “é importante cuidar do corpo para ter
algumas idosas, este processo é um even- saúde”; “meu cabelo me agrada, quan-
to natural, decorrente do desenvolvimen- do corto arrumo, fico bem”; “nada como
to humano e as transformações do corpo uma tinta para os branquinhos”; “todo dia
é um evento inevitável, como assinalam acordo e passo batom.” Por fim, uma fala
as falas a seguir: “eu avalio as mudanças em especial aponta a estreita relação de
como consequências da vida, é natural, cuidado entre o corpo e espírito: “...à me-
como a morte é natural”; “envelhecemos dida que você cuida do corpo físico você
desde o dia que nascemos, todos vamos está cuidando do corpo espiritual. temos
envelhecer e morrer.” Outras relacionam que cuidar do corpo para que o espírito
as mudanças do corpo na velhice como esteja bem e temos que cuidar do espírito
aspecto facilitador ao aparecimento de para que o corpo esteja bem.” Considera-
problemas da ordem física, tais como ções Finais: Compreendemos que o corpo
exemplificam as seguintes falas “quan- é alvo de interesse e investimento não só
do fica mais velha engorda mais fácil”; pelo valor estético que assume na nossa
“o peso também pode prejudicar a saú- cultura, mas como importante via de saú-
de, podemos dar colesterol, pressão alta, de e envelhecimento saudável. Verifica-
prejudica tudo isso”; “a gordura deforma mos que é recorrente o discurso em torno
a gente”. Algumas falas apontaram para da responsabilidade do idoso no cuidado
uma imagem do corpo positiva diante dos ao corpo físico, especialmente para pre-
sinais de envelhecimento do corpo: “cada venir ou retardar a ocorrência de adoe-
ruguinha é uma experiência que a gente cimentos que podem advir com a idade.
tem”. Outra fala mostra a satisfação com Quanto à forma como o idoso vê e pensa
o corpo atual quando comparado com o seu corpo, a experiência possibilitou reco-
corpo de sua juventude, aspecto que fa- nhecer que as transformações do corpo
vorece a autoimagem: “quando olho no interferem negativamente na imagem que
espelho vejo uma pessoa que já foi mui- têm de si mesmo. Contudo, existem, igual-
to gorda, hoje é magra, sarada, gostosa. mente, aspectos positivos nessas transfor-
Hoje mudei muito, sei lidar com minhas mações que podem favorecer a imagem
dificuldades, depois dos 50 melhorou mui- de si, especialmente quando significados
to.” Entretanto, outras falas mostram que como sinal de experiência e maturidade.
as mudanças do corpo ainda que inevi- Este trabalho possibilitou compreender

41
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que o corpo ainda que marcado pelos si- que ingressam em cursos de informática.
nais de envelhecimento e limitações pode Foi feita uma pesquisa quantitativa do tipo
continuar sendo alvo de investimentos su- correlacional, junto a 23 idosos que se
ficientemente significativos que possibili- matricularam em cursos de informática,
tam realizações e reconhecimento. utilizando-se uma escala de autoeficácia
geral e outra de autoeficácia de memória.
Palavras-chave: Envelhecimento. Corpo. UATI Os resultados indicam elevado escore de
Contato: Vilma Valéria Dias Couto - autoeficácia geral e um baixo escore da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro autoeficácia de memória. Permitem su-
Departamento de Psicologia Clínica e por que a baixa crença desses idosos em
Sociedade relação ao próprio potencial cognitivo de
vilmacouto@psicologia.uftm.edu.br memória deve estar associada a estereóti-
pos negativos sobre a velhice, todavia, os
resultados da autoeficácia geral são indi-
LT01-1343 - INFLUÊNCIA DA cativos de condições favoráveis ao ajusta-
AUTOEFICÁCIA GERAL E DA MEMÓRIA mento desse público às novas condições
EM IDOSOS QUE BUSCAM CURSOS DE pessoais e contextuais. Com o aumento
INFORMÁTICA da expectativa de vida populacional am-
Laina Jacinto Couto - UNITAU pliam-se as possibilidades de um processo
laina_couto@hotmail.com de envelhecimento ativo e de uma vivên-
Fernanda Rabelo Prazeres cia da velhice como uma fase da vida de
fernandaballet@gmail.com autonomia, independência e qualidade de
Marluce Auxiliadora Borges Glaus Leão - UNITAU vida (Neri, 1995). Frente ao atual progres-
mgleao08@gmail.com so tecnológico, adultos maduros e idosos
buscam se ajustar às demandas da vida
As possibilidades de um processo de en- cotidiana por meio da educação continu-
velhecimento ativo e de uma vivência de ada. A procura por cursos de informática,
velhice com autonomia, independência para além de uma estratégia educativa de
e qualidade de vida tem conduzido ido- inclusão social do idoso, exige um equa-
sos a se ajustarem às demandas da vida cionamento entre seus potenciais e limi-
cotidiana, principalmente aquelas rela- tes biológicos e psicológicos, que por sua
cionadas ao progresso tecnológico atual, vez, pode gerar desequilíbrios em relação
como o domínio sobre conhecimentos de às capacidades do indivíduo para produzir
informática. O enfrentamento de situa- resultados. Fazer esse curso envolve uma
ções novas como essa exige um equacio- avaliação das habilidades sociais necessá-
namento entre seus potenciais e limites rias para o alcance dos resultados. O cons-
biológicos, psicológicos e sociais, mobili- tructo psicológico da autoeficácia tem sua
zando o senso de autoeficácia do idoso, origem na Teoria Social Cognitiva, a partir
ou seja, a crença que tem em relação às de uma visão do homem constituído pelos
suas capacidades para produzir resulta- sistemas sociais, e que por meio das trocas
dos. Este estudo teve como objetivo in- vão ocorrendo adaptações e mudanças no
vestigar a influência da autoeficácia geral comportamento, sendo essa relação de
e da autoeficácia de memória em idosos indivíduo com o meio, denominada reci-

42
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

procidade triádica (Bandura, 2008; Azzi de um projeto socioeducativo destinado a


e Polydoro, 2006). Pajares e Olaz (2008) esta população, em uma cidade do inte-
argumentam que a autoeficácia é consi- rior do Vale do Paraíba Paulista. Esta pes-
derada uma percepção que o indivíduo quisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da
tem sobre suas capacidades, operando Universidade de Taubaté, sob o nº 497/10.
como um dos determinantes que regulam Do total de 48 matriculados, participaram
a motivação, o afeto e a ação humana, so- 23. A coleta dos dados ocorreu nos dias
frendo mudanças de acordo com a dinâ- e horários dos cursos, utilizando-se um
mica de interações desse indivíduo com o questionário de características sociode-
ambiente. As crenças de autoeficácia são mográficas, uma Escala de Autoeficácia
formadas a partir de quatro fontes: expe- Geral (Ribeiro, 1995) e uma Escala de Au-
riência de domínio, experiência vicária, toeficácia de Memória - MAC-Q (Croock
persuasões sociais e estados somáticos, et al, 1992, Mattos et al., 2001), respondi-
determinando quanto de esforço a pessoa dos por eles mesmos, com supervisão da
dedicará em uma atividade e quanto per- pesquisadora. Os resultados estão sendo
severará quando confrontada com obstá- submetidos a provas estatísticas por meio
culos, ou seja, coloca em evidência seu da ferramenta computacional SPSS. Os re-
potencial de resiliência frente a situações sultados demonstram que nessa amostra
adversas. Para Neri (2006) o senso de au- 73,91% são mulheres e 26,8% homens;
toeficácia da pessoa idosa pode ser afeta- 40,5% apresentam experiência anterior
do pelas perdas biológicas das quais está com computador; sendo os principais in-
sujeita, influenciando seu autoconceito, dicadores de escolaridade – 21,7% Ensino
suas emoções e metas pessoais. A crença Superior Completo, 47,8% Médio Comple-
na plasticidade da memória determina a to. Os motivos para busca desses cursos
escolha de tarefas e desafios em idosos, foram: acompanhar o desenvolvimento
evidenciando uma relação recíproca en- tecnológico, estimular a mente, manter
tre o senso de autoeficácia em memória contato social e aumentar a disposição ou
e em sua plasticidade. Considerando es- ânimo de viver. Constatou-se nas escalas
ses pressupostos, entende-se que a busca um índice elevado de autoeficácia geral e
do idoso por cursos de informática pode um baixo escore da autoeficácia de me-
gerar múltiplos benefícios, como a experi- mória, permitindo confirmar os achados
ência de ampliação do contato social e da de Neri (2006) de que a presença de uma
estimulação cognitiva, favorecendo o con- crença negativa desses idosos em relação
trole pessoal sobre os domínios que estão ao próprio potencial cognitivo de memó-
preservados, bem como ajudar nas habi- ria, pode estar baseada em estereótipos
lidades cujo domínio esteja limitado. In- que associam velhice com incapacidade,
vestigar a influência da autoeficácia geral falta de domínio sobre o ambiente e pre-
e da autoeficácia de memória em idosos juízos de naturezas diversas. Todavia, ao
que ingressam em cursos de informática. buscarem esses cursos indicam um com-
Trata-se de uma pesquisa quantitativa, portamento resiliente, uma estratégia de
do tipo correlacional, abordando sujeitos enfrentamento dos obstáculos, corrobora-
com 60 ou mais anos, que se matricula- do pelos motivos que alegam. Serão ainda
ram em 2011 nos cursos de informática aplicadas provas estatísticas de correlação

43
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

entre os resultados dessas escalas, e delas surgimento de algumas doenças, muitas


com a variável gênero, escolaridade e ex- famílias optam pelo asilamento/institucio-
periência anterior com computador. Estes nalização de seus idosos, visando, normal-
resultados preliminares permitem pensar mente, garantir uma melhor assistência e
que a baixa crença de autoeficácia de me- qualidade de vida aos mesmos. Doenças
mória desses idosos não está associada a típicas da idade porém, não exclusivas da
perdas cognitivas advindas do envelheci- mesma, como o Alzheimer, trazem muito
mento biológico, visto apresentarem uma sofrimento para os familiares por não sa-
alta crença de autoeficácia geral, portan- berem lidar com a patologia que o idoso
to, indicativos de potencial para modificar possui. Além disso, os casos de comprome-
o modo como manejam suas vidas e essas timento cognitivo não são tão facilmente
crenças, facilitando assim o ajustamento identificados, deixando as pessoas no en-
deles às novas condições pessoais e con- torno do idoso confusas acerca de sua real
textuais. condição. Engelhardt, Laks, Rozenthal e
Marinho (1997) destacam que os quadros
Palavras-chave: Idosos; Autoeficácia; leves de comprometimento cognitivo são
Memória. freqüentes, passando muitas vezes des-
percebidos, e há uma necessidade de dis-
tinguir (o que muitas vezes é difícil) entre
LT01-1471 - ENVELHECIMENTO, manifestações iniciais de doença e modifi-
DESENVOLVIMENTO E cações associadas com o processo normal
INSTITUCIONALIZAÇÃO: A EXPERIÊNCIA de envelhecimento. As casas de repouso /
DE ESTÁGIO BÁSICO EM PSICOLOGIA asilos para idosos acabam sendo entendi-
Deyse Salatiel de Moura - UVV dos como boa ou única alternativa, já que,
deyse.salatiel@hotmail.com geralmente, acolhem e cuidam de idosos
Pâmella Vitória Moreno dos Santos Rigoni - UVV debilitados fisicamente e/ou psicologica-
pamellamoreno@yahoo.com.br mente. Por outro lado, a internação de
Tainá Barreto Silveira - UVV idosos em asilos ainda é vista com precon-
empresspyriel@hotmail.com ceito, sendo considerada prejudicial ao seu
Sabrine Mantuan dos Santos Coutinho - UVV desenvolvimento, sobretudo por levar ao
sabrine.coutinho@uvv.br isolamento, abandono e exclusão social.
De fato, alguns autores apontam que o
O envelhecimento consiste em um pro- processo de institucionalização é permea-
cesso dinâmico e progressivo, no qual se do por dificuldades relacionadas à adapta-
processam transformações diversas (mor- ção ao novo modelo, à perda de identida-
fológicas, fisiológicas, bioquímicas e psi- de e autonomia, o que pode acarretar pro-
cológicas) que produzem a perda gradual blemas físicos e emocionais, acelerando
da capacidade de adaptação do indivíduo e/ou acentuando a velocidade das perdas
ao meio ambiente, ocasionando maior funcionais dos idosos. Este trabalho con-
vulnerabilidade e maior incidência de pro- siste em relato da experiência de Estágio
cessos patológicos (Papaléo Netto, 1997) Básico em Psicologia vivenciada por alunos
Diante do quadro de comprometimento do curso de Psicologia do Centro Universi-
físico e cognitivo decorrente em geral, do tário Vila Velha em uma Casa de Repouso

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para idosos situada em Vitória/ES. Trata-se tituição sofrem de Alzheimer, doença que
de instituição privada, que se dedica ao traz muitos prejuízos à memória. Entre as
atendimento ao idoso, oferecendo servi- várias atividades desenvolvidas ao longo
ços especializados, e para tanto conta com do estágio, pode-se citar: exibição de fi-
uma equipe composta por enfermeiras guras/imagens que trouxessem aos ido-
gerontólogas, técnicos de enfermagem, sos lembranças de momentos variados de
geriatra (acompanhamento mensal) e fi- suas vidas para compartilharem com o gru-
sioterapeuta (acompanhamento semanal). po; audição de músicas antigas, da época
O estágio, desenvolvido numa perspectiva da juventude e fase adulta dos participan-
psicossocial, teve início em Julho de 2010, tes, com a descrição do que lhes vinha à
e contava com uma carga horária prática memória; leitura de contos e sua repetição
semanal de 04 horas, cumpridas na casa pelo idoso para exercitar a memória; exe-
de repouso por um grupo de três estagi- cução de dinâmicas de grupo que oportu-
árias do quarto período do curso de Psi- nizassem conhecer um pouco mais da vida
cologia. Nessa época a instituição estava de cada idoso e favorecer a interação entre
atendendo, em média, 35 idosos, de ida- o grupo; realização de entrevistas semies-
des variadas. Num primeiro momento, foi truturadas sobre temas relacionados à
realizado estudo bibliográfico referente ao história de vida dos idosos; realização de
tema, e após esse período inicial, foi reali- trabalhos manuais, como a confecção/
zada a entrada no campo, que, inicialmen- ornamentação de um diário pessoal para
te, consistiu em observação participante, cada idoso, buscando o desenvolvimento
visando conhecer a dinâmica institucio- da criatividade e a possibilidade de ex-
nal, levantar as demandas da instituição, pressarem suas emoções e sentimentos
os temas de trabalho a serem explorados diários. Houve situações em que algumas
e o estabelecimento de vínculo com os atividades programadas acabaram não
idosos e funcionários. Posteriormente fo- sendo desenvolvidas em virtude do pouco
ram organizadas atividades que visavam interesse ou indisposição dos idosos. Na
potencializar a interação social do grupo instituição, os idosos eram divididos pela
de idosos que tinham condições físicas e enfermeira responsável para participar das
cognitivas de participar, bem como o es- atividades grupais, geralmente, de acordo
treitamento de vínculo – ressaltando que com o nível de comprometimento físico e
a necessidade de maior interação entre os cognitivo. Nem todos os idosos participa-
idosos foi a principal demanda identifica- vam sempre de todas as atividades, o que
da. Moura, Passos e Camargo (2005) res- variava de acordo com o estado de saúde
saltam que a comunicação é essencial para do idoso naquele dia e de sua disposição
a sobrevivência do homem, em especial para participar. Além de promover a inte-
para o idoso, garantindo a manutenção de ração social entre os idosos, o estágio tam-
suas relações sociais e evitando a carência bém trouxe a possibilidade de criação de
afetiva e emocional. Também foram de- um espaço para acolhimento das questões
senvolvidas atividades grupais que tive- individuais que não emergiam nas ativi-
ram como objetivo a reabilitação cognitiva dades grupais, assim como de um espaço
(exercícios para a memória, por exemplo), permanente de contato com a equipe e
já que muitos dos idosos residentes na ins- com os familiares (realização de encontros

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

periódicos com a equipe e de reuniões população principalmente em países de-


com os familiares). Mesmo reconhecendo senvolvidos. Estima-se que o Brasil, em
todas as dificuldades relacionadas ao pro- 2025, terá a sétima maior população de
cesso de institucionalização, inclusive as idosos no mundo com cerca de 32 milhões
mencionadas pelos próprios idosos (ficar de pessoas com 60 anos ou mais. O avanço
longe da própria casa e da família e ami- da idade faz com que surjam doenças típi-
gos; seguir uma rotina determinada por cas da população idosa como a depressão,
outros; conviver com pessoas desconhe- que, apesar de não ser uma doença exclu-
cidas, entre outras) crê-se que a mesma siva dessa faixa etária, tem sido aponta-
pode ser vivida de uma forma menos dolo- da como um problema de saúde pública
rosa ao se buscar a criação de um contexto e afeta pelo menos um em cada seis pa-
que favoreça as potencialidades do idoso e cientes idosos que recebem tratamento
seu desenvolvimento. É nesse sentido que na atenção básica de saúde, nos pacien-
o trabalho realizado buscou trazer suas tes depressivos há piora da saúde global,
contribuições, mostrando que a Psicologia aumento de custos com a saúde, aumento
tem muito a colaborar na intervenção com de transtornos cognitivos, e mortalidade
idosos institucionalizados. Como destacam relacionada ao suicídio e a doença física.
Neri, Yassuda e Cachioni (2005), a Psicolo- Por outro lado, estudos sobre os estilos
gia conta com “um conjunto de técnicas de o processo reflexivo da consciência
de diagnóstico, avaliação e intervenção têm sugerido que determinados estilos de
voltadas ao tratamento dos problemas pensamento parecem estar associados a
comportamentais e psicológicos que afe- um funcionamento psicológico mais nega-
tam o funcionamento e o bem-estar sub- tivo, colaborando principalmente para o
jetivo dos idosos” (p. 19), podendo, assim, surgimento da depressão e de outras psi-
oferecer importantes contribuições para a copatologias. Estudos constataram que in-
qualidade de vida de idosos, sobretudo os ternações psiquiátricas estão entre os dez
funcionalmente debilitados. principais motivos de internação em ido-
sos. A ruminação é caracterizada por um
Palavras-chave: institucionalização, idoso, tipo de pensamento repetitivo de caráter
desenvolvimento, Psicologia negativo que tende a exacerbar sintomas
depressivos e ansiogênicos. A reflexão é
um tipo de pensamento mais bem adapta-
LT02-950 - A RELAÇÃO ENTRE ESTILOS do à resolução de problemas e pode ame-
REFLEXIVOS E NARRATIVA EM IDOSAS nizar o impacto negativo da ruminação.
Petra Paim Ehrenbrink - UFES Acredita-se que pessoas do estilo reflexi-
petra@intervip.com.br vo compreendem suas vidas de maneira
M. Lima de Souza - UFES positiva e sentem-se mais felizes. Neste
limadesouza@gmail.com sentido, investigar os estilos reflexivos da
Laís Almeida Ambrósio - UFES população idosa pode colaborar para um
lais.ambrosio@gmail.com melhor entendimento dos processos psi-
copatológicos que acometem os indivídu-
A queda da taxa de mortalidade e natali- os dessa faixa etária. Identificar os estilos
dade colabora para o envelhecimento da reflexivos dos idosos e comparar com a

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

estrutura (forma e conteúdo) das narrati- vida”. Participantes com altos escores no
vas sobre suas próprias vidas. Estudo qua- estilo ruminativo produziram narrativas
litativo e exploratório com uma etapa de que focalizavam características pesso-
coleta de dados quantitativa. Participaram ais negativas como, por exemplo: “... Sou
do estudo onze idosas com idades entre uma pessoa muito insegura... A ansieda-
sessenta e dois e oitenta e três anos, que de, muitas vezes me impede de viver feliz
apresentaram condições de se expressar e fazer a felicidade dos outros.” Enquanto
verbalmente através da escrita. Para a ob- participantes com altos escores no estilo
tenção dos dados utilizamos o Questioná- reflexivo produziram narrativas com ca-
rio de Ruminação e Reflexão (QRR) e um racterísticas pessoais positivas como, por
protocolo de redação com o tema “Conte exemplo,” Gosto de ser quem eu sou por
sua história”. A aplicação do instrumento ter realizado minhas aspirações...” Esses
foi realizadas individualmente na casa da dados confirmam nossas hipóteses de que
participante. Inicialmente os dados foram pessoas com o estilo reflexivo compreen-
tratados estatisticamente (média e desvio dem sua vida de maneira mais positiva re-
padrão). A partir dos escores fornecidos latando sentirem-se mais felizes. Enquan-
pelo QRR foram definidos os pontos de to as de estilo ruminativo interpretam os
corte: Reflexivo alto= 42; Reflexivo mé- acontecimentos de forma mais negativa.
dio= 39; Reflexivo baixo= 36; Ruminativo Sete participantes apresentaram o estilo
alto= 43; Ruminativo médio= 36 Rumina- reflexivo ruminativo médio ou alto. O es-
tivo baixo= 29. Os idosos apresentaram tilo ruminativo por ter como característica
cinco estilos de reflexividade: 1. Rumina- um tipo de pensamento mais repetitivo,
tivo baixo+Reflexivo médio (duas partici- faz com que a pessoa rememore, e pense
pantes) ; 2. Ruminativo médio+Reflexivo mais freqüentemente em acontecimentos
baixo (duas participantes); 3. Ruminativo do passado. Isto pode estar relacionado
médio+Reflexivo alto (três participan- com o fato de cognitivamente idosos te-
tes); 4.Ruminativo médio+Reflexivo mé- rem uma diminuição na capacidade de
dio (três participantes); 5. Ruminativo armazenamento de informações e memó-
alto+Reflexivo alto (uma participante). rias recentes, aumentando, assim, o uso
As narrativas apresentaram os estilos de da memória de longo prazo é a mais uti-
gênero gramatical descritivo (predomi- lizada. Assim, acredita-se que os escores
nância de substantivos e adjetivos na nar- do estilo ruminativo na população idosa
rativa – ocorrência em cinco narrativas) tenha sido mais alto. A terceira idade, é
quanto dinâmico (predominância de ver- por muitas vezes, associada sociocultu-
bos e advérbios – cinco narrativas). Uma ralmente como um período de sabedoria,
narrativa não teve predominância de ne- formada por uma vida de experiências,
nhum dos dois estilos de gênero grama- esses indivíduos são vistos como pessoas
tical. Os temas abordados nas narrativas sábias pela sua capacidade de lembrar de
foram “breve relato sobre a história de fatos, fazerem análises éticas e morais, e
vida”, “características pessoais”, “família”, oferecerem soluções e alternativas para
“preocupação com os outros”, “religião” problemas cotidianos. Atividades estas,
e a “importância em manter-se ativa”. Na que exigem muita reflexão, análise e ru-
categoria “breve relato sobre história de minação de algumas idéias, colaborando

47
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

também para um possível desenvolvimen- ro, 2004). Optou-se, então, por trabalhar
to do estilo ruminativo de reflexividade. com as narrativas produzidas por adoles-
centes em interação, mediante a realiza-
Palavras-chave: Idosas; estilos reflexivos; ção de grupos focais em formato virtual,
narrativas. já que a internet vem sendo um dos con-
Contato: Petra Paim Ehrenbrink, UFES, textos de interação privilegiados pelos
petra@intervip.com.br adolescentes (Subrahmanyam, Green-
field, Kraut & Gross, 2001). Os chamados
grupos focais online síncronos são grupos
CO 16 - LT02 em que os participantes interagem via in-
ternet em tempo real (Walston & Lissitz,
Novas tecnologias 2000). Esbarrou-se, contudo, na ausência
de trabalhos científicos nesses moldes, na
área da psicologia. Diante disso, foi neces-
LT02-693 - GRUPOS FOCAIS ONLINE
sário basear-se em alguns procedimen-
SÍNCRONOS EM PESQUISA QUALITATIVA:
tos utilizados por outras áreas da ciência,
ASPECTOS COMUNICACIONAIS
selecionando aquilo que se aplicaria aos
Gabriela Sagebin Bordini - UFRGS objetivos da pesquisa em questão. Em re-
charlestonbordini@yahoo.com.br lação às entrevistas virtuais, por exemplo,
Tania Mara Sperb - UFRGS Nicolaci-da-Costa, Romão-Dias e Di Luccio
sperbt@terra.com.br (2009) sublinham que, comumente, as
Financiamento: CNPq conversas online apresentam rupturas.
Isso pode decorrer do intervalo que existe
O grupo focal é uma técnica de coleta de entre o envio de uma mensagem – que é
dados que vem sendo largamente utili- realizado somente quando o participante
zada em pesquisa desde os anos 80, so- terminou de redigi-la e optou por postá-
bretudo como técnica de investigação -la – e o recebimento da resposta relativa
qualitativa (Schneider, Kerwin, Frechtling à mensagem enviada. Dado que, também
& Vivari, 2002). Comumente, essa técnica nos grupos focais online síncronos, as par-
é usada em seu formato tradicional, isto ticipações de cada um dos membros iriam
é, presencialmente. Sua utilização é usu- aparecer na tela de acordo com a ordem
al principalmente entre os pesquisadores em que tivessem sido enviadas, e não se-
que têm interesse pela coleta de dados ria possível interromper a escrita de cada
por meio da interação grupal (De Antoni um, esperava-se que a comunicação nes-
et al., 2001). Este era o caso da pesquisa ses grupos ficasse fragmentada. Provavel-
aqui relatada, cujo objetivo era conhecer mente as discussões seriam descontínuas,
as concepções de adolescentes sobre o intercaladas com outras discussões ou
que é ser homem e o que é ser mulher na com outros assuntos. Por outro lado, Sch-
atualidade. Tinha-se como base, o pressu- neider et al. (2002) explicam que a alta ve-
posto de que os significados atribuídos ao locidade em que se dá a postagem dos co-
masculino e ao feminino são culturalmen- mentários escritos na comunicação virtual
te construídos e transmitidos socialmente permite que a discussão não pare apenas
através da interação (Diamond, 2002; Lou- porque um dos participantes está escre-

48
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

vendo sua mensagem. Por isso, os compo- te que os fizera apareciam na tela de cada
nentes de grupos focais online síncronos, membro, de acordo com a ordem em que
em comparação com aqueles dos grupos tinham sido postados. As interações nos
presenciais, fariam comentários mais cur- grupos focais online síncronos foram dis-
tos, emitindo pequenas frases simples- cutidas com base na literatura já existente
mente para expressar concordância com sobre o tema. A realização online dos gru-
opiniões já apresentadas, propiciando pos focais pareceu ter influenciado a pro-
uma discussão menos elaborada. Diante dução dos componentes. Confirmando os
disso, esperavam-se dificuldades quanto apontamentos de Schneider et al. (2002),
à profundidade das discussões nos grupos em geral, as participações foram curtas
focais online síncronos e em relação à ob- e os comentários, não muito elaborados
tenção de narrativas longas e individuais. e emitidos rapidamente. A comunicação
O presente trabalho visa colaborar com o entre o grupo mostrou depender da velo-
avanço da pesquisa qualitativa em psico- cidade na qual cada componente era ca-
logia no Brasil, por meio do relato e da dis- paz de escrever suas mensagens e acom-
cussão das especificidades comunicacio- panhar as dos outros. Isso tornou difícil a
nais encontradas nos grupos focais online manutenção de uma sequência de intera-
síncronos realizados.Participaram 41 ado- ções por parte do grupo, pois a comunica-
lescentes com idades entre os 14 e os 15 ção não ocorria de maneira linear. Assim,
anos, estudantes de uma escola estadual também se confirmou a hipótese baseada
e de uma escola particular de Porto Alegre em Nicolaci-da-Costa et al. (2009). A in-
(RS), selecionados por conveniência. Com dependência entre as participações dos
os adolescentes devidamente autorizados componentes dos grupos realizados não
pelos responsáveis, foram realizados 6 foi vantajosa à elaboração de narrativas
grupos focais online síncronos, através do longas ou detalhadas. Ocorreu com fre-
programa de bate-papo MSN, que possi- quência que, enquanto um participante
bilita conferências online. Todos os grupos escrevia uma mensagem mais longa ou
tiveram 7 participantes, exceto um que em resposta a alguma mensagem postada
contou com 6. Dois grupos foram compos- anteriormente, outros já escreviam men-
tos por adolescentes do sexo masculino, sagens relacionadas a outros assuntos. As
2 por adolescentes do sexo feminino, e 2 narrativas produzidas ao longo das discus-
eram mistos. Os grupos tiveram lugar na sões foram, na sua maioria, fragmentadas
sala de informática das escolas em que os e entrecortadas por assuntos diversos do
participantes estudavam e foram mode- tópico proposto. Portanto, a utilização
rados pela pesquisadora. Esta e todos os de grupos focais online síncronos não se-
adolescentes tinham um computador à ria aconselhável quando o pesquisador
sua disposição, conectado ao MSN. A dis- pretende obter as tradicionais narrativas
cussão era realizada por escrito e iniciava longas e sequenciadas. Este método seria
com a questão de abertura, proposta pela mais adequado às investigações que têm
moderadora: “Contem histórias que vocês como foco a interação entre os participan-
acham que mostram bem o que é ser ho- tes. A pesquisa realizada mostrou que gru-
mem ou o que é ser mulher hoje.”. Os co- po focal online síncrono não é uma mera
mentários e a identificação do participan- transposição do grupo focal presencial

49
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para o ambiente virtual. Chamaram aten- educacional e as relações estabelecidas


ção as especificidades marcantes relativas entre os diversos componentes dos fluxos
à comunicação encontradas nessa técnica. nutridores dos processos de aprendiza-
Mais pesquisas são necessárias para que gem e as trocas materiais e informacionais
se conheçam essas particularidades e para provocam mudanças estruturais de cará-
que se possa esclarecer em que situações ter postural, atitudinal e valorativo. Estas
os grupos focais online síncronos são mais relações precisam ser mais congruentes
ou menos vantajosos, ou mesmo comple- com os princípios organizadores da vida,
mentares aos grupos focais tradicionais. com a natureza dinâmica da matéria e da
construção de conhecimento. Nesse senti-
Palavras-chave: Grupos Focais Online; do, o objetivo deste trabalho é descrever
Pesquisa Qualitativa; Internet. arquitetura de curso online com base no
Contato: Gabriela Sagebin Bordini (UFRGS) Modelo Bioecológico de Bronfenbrenner,
charlestonbordini@yahoo.com.br considerando os componentes: pessoa,
processo, contexto e tempo (Bronfenbren-
ner, 2005). A adoção desses pressupostos
LT02-958 - EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA traz implicações para o planejamento de
ONLINE E DESENVOLVIMENTO HUMANO: pesquisa, para o desenvolvimento de de-
INTERFACES E PERSPECTIVAS senhos de cursos a distancia ou modelos
Jane Farias Chagas - FTBB/UnB educacionais. Do ponto de vista da pesqui-
janefcha@gmail.com sa, ressignifica a relação entre pesquisador
e pesquisado, requer análise do espaço
Um dos desafios inerentes a crescente de- de vida em termos de atividades, papéis
manda por cursos a distância na modalida- e padrões de interação e a ampliação e
de online consiste em garantir a qualidade triangulação de estratégias para sondar o
de ensino por meio da incorporação de conteúdo do campo psicológico. No âmbi-
tecnologias de informação e comunicação, to educacional, os conhecimentos produ-
de novos processos espaço-temporais de zidos pela psicologia do desenvolvimento,
interações que efetivamente sejam sus- especialmente os vinculados às teorias
tentados por teorias de aprendizagem e sistêmicas, têm contribuído para uma
de desenvolvimento humano (Carvalho, ampla discussão dos sistemas de ensino,
Nevado & Menezes, 2005; Chagas, 2010). os métodos e teorias de aprendizagem e
Nessa direção, Moraes (2002) chama a promovido uma compreensão das particu-
atenção quanto à necessidade de que os laridades dos processos educativos em in-
desenhos educacionais e as novas práticas terseção com o desenvolvimento humano
pedagógicas reconheçam a natureza viva e com a aprendizagem (Polônia & Senna,
e transdisciplinar do processo de constru- 2005). Desta forma, assumir uma postura
ção de conhecimento, a interatividade dos ecossistêmica solicita repensar a relação
processos cognitivos e sejam capazes de professor-aluno, aluno-aluno, aluno-pro-
recuperar a inteireza humana, os valores cesso, entre outras, a partir da: (a) análise
multiculturais e o respeito às diferentes mais detalhada das atividades, papeis e
maneiras de pensar. Ainda segundo Mo- relações em que esses atores se envolvem
raes (2002), a organização e planejamento nos diversos ambientes ecológicos, (b) for-

50
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mulação ou reformulação do planejamen- drões de interação entre as pessoas e que


to educacional a partir do mapeamento de fomenta uma gama variada de atividades
características individuais e ambientais. É desenvolvidas em mais de um ambiente
importante ressaltar que as mudanças pro- ao mesmo tempo. Essa simultaneidade
duzidas nas concepções e/ou atividades da pode gerar tanto efeitos positivos quanto
pessoa transferem-se para outros ambien- negativos. Entre os efeitos positivos cita-
tes e outros momentos de vida. Ou seja, -se o aumento da capacidade humana em
sugere considerar as triangulações inter- lidar com um volume crescente de dados
pessoais, a transição e validade ecológicas e como efeito negativo destaca-se o ace-
e as acomodações progressivas e mútuas leramento e sobrecarga de informações.
entre um ser humano ativo, criativo, dinâ- Essa estrutura e funcionalidade alteram
mico e em desenvolvimento e as proprie- as características dos processos distais e
dades mutantes dos ambientes imediatos proximais que afetam o desenvolvimento.
e distais (Chagas, 2008). Advém ainda, do Várias tensões interpessoais e psicológi-
emprego desses princípios, a necessida- cas podem surgir a partir das interações
de de utilizar diferentes instrumentos e promovidas em um ambiente online que
abordagem multimetodológica, currículos podem ser semelhantes ou não aquelas já
estruturados de acordo com as transições conhecidas no mundo não-virtual. Contu-
de desenvolvimento do indivíduo, o enten- do, torna-se relevante apontar que mesmo
dimento das mudanças no papel do aluno nos espaços de interação virtual, os parti-
e do professor ao longo do curso de vida, cipantes constroem um senso simbólico
os avanços tecnológicos e a práxis pedagó- de espaço e lugar. Este cenário desafia as
gica (Polônia & Senna, 2005). Para Stokols formas de organização educacional e os
(1999) diferentes contextos afetam de sistemas de crenças e valores dominantes
forma variada os processos de desenvol- (Stokols, 2005). Por outro lado, o envolvi-
vimento, o que leva também a resultados mento ativo em atividade molar constitui
divergentes. Isto significa que as condições indicador do grau e da natureza do de-
ambientais encontram-se mediadas por senvolvimento. Nesse sentido, a atividade
atributos pessoais, pelas disposições cir- molar pressupõe comportamento continu-
cunstanciais e pelo estágio de curso de vida ado que possui um momento (quantidade
dos indivíduos envolvidos em processos de de movimento, impulso) próprio e percep-
qualquer natureza, inclusive os educacio- tível como portador de significado e inten-
nais. Esses resultados podem ser temporá- ção pelos participantes do ambiente. Isto
rios, de curto ou longo prazo e exercem in- posto, as interações em um ambiente de
fluência direta ou indireta sobre os proces- aprendizagem online, devem ser plane-
sos de desenvolvimento, mesmo quando jados de forma a permitir o engajamento
as condições ambientais transcendem o em atividades significativas, intencional-
espaço geográfico. Sendo assim, a educa- mente elaboradas visando a construção de
ção a distância na modalidade online exi- conhecimentos e o compartilhamento de
ge tanto uma influência mútua ativa com experiências que promovam o desenvolvi-
os recursos tecnológicos e informacionais mento tanto intelectual, como afetivo e so-
como também com eventos, informações cial. Ancorados nesta perspectiva, a apren-
e pessoas. Dinâmica que requer novos pa- dizagem e o desenvolvimento constituem

51
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

processos mediados pela participação interligados favorecidos pela tecnologia.


da pessoa em padrões progressivamente A relação entre sociedade e tecnologia
mais complexos de atividades recíprocas, sempre existiu de diferentes maneiras na
permeada por sentimentos positivos de história da humanidade, causando impac-
mutualidade. Com isso, as propriedades tos no desenvolvimento humano. De uma
da pessoa e do ambiente, as estruturas e perspectiva sociocultural, as novas tecno-
funcionalidades dos cenários ambientais e logias da informação e da comunicação
dos processos que ocorrem dentro e entre são realizações atuais, exemplos contem-
os sistemas devem ser considerados como porâneos do processo de humanização
forma interdependente e analisados em que sempre se apoiou, em cada época, em
rede. Os conteúdos das atividades molares aparatos físicos (ferramentas) e culturais
possuem um alcance ampliado dependen- (símbolos, linguagem) para sua realiza-
do da quantidade de interações entre as ção (Wertsch, 1995; Briggs & Burke, 2004;
pessoas, símbolos e objetos presentes em Cook, 2005; Vigotski, 2007). Nos dias de
cada ambiente. A variedade, a qualidade hoje, a Cibercultura é um exemplo do que
e a quantidade de interações influenciam acima apontamos. Pretto, Riccio e Perei-
na durabilidade dos efeitos das aprendiza- ra (2009) comentam que a Cibercultura é
gens ao longo do curso de vida. uma categoria do momento histórico atu-
al, “que possibilita a associação do univer-
Palavras-chave: Educação a distância; so da cultura com o da comunicação e das
Desenvolvimento Humano; Modelo tecnologias, especialmente as digitais” (p.
Bioecológico; Arquitetura Educacional. 85-86). Para esses autores, “a marca prin-
Contato: Jane Farias Chagas, FTBB/UnB, cipal é a liberação do pólo de emissão na
janefcha@gmail.com comunicação, através da implantação das
redes tecnológicas que potencializam a
autoria e colaboração em rede” (Pretto,
LT02-1208 - ANÁLISE DA RELAÇÃO Riccio & Pereira, 2009, p. 85-86). Para es-
ENTRE LINGUAGEM, COGNIÇÃO E ses autores, a interatividade que as novas
INTERSUBJETIVIDADE NO CONTEXTO DA tecnologias abarcam, dinamiza a difusão
CIBERCULTURA COM BASE NA TEORIA de mensagens, diminui fronteiras e auxi-
DE VIGOTSKI lia na colaboração e atuação conjunta dos
Ruben de Oliveira Nascimento - UFU indivíduos, abrindo novas possibilidades
rubenufu@gmail.com de comunicação, interação, aprendizagem
e práticas sociais. A Cibercultura trata de
Nesse trabalho discutiremos, com base em processamento de informação, o que im-
literatura especializada, a noção de que a plica em processos cognitivos. Segundo
interação social na Cibercultura traz consi- Fonseca (2007), cognição é um “sistema
go uma carga psicológica importante em representacional com capacidade de sen-
nível de intersubjetividade, examinada a tir, integrar, pensar, comunicar e agir a
partir de contribuições da psicologia histó- partir de capacidades de processamento
rico-cultural de Vygotsky. Também analisa de informação” (Fonseca, 2007, p. 30-31).
esse tema a partir da relação entre lingua- Mas, Fischer (2009) assinala que “a língua
gem e processos cognitivos, como fatores dá voz à ação humana, de maneiras com-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

plexas e sutis” (p. 219); e como cognição interação com pessoas, objetos, eventos,
implica num sistema representacional, valores, crenças e atitudes culturalmente
a linguagem acaba assumindo um papel desenvolvidas e historicamente constituí-
importante, se observamos o conteú- das (Vigotski, 2001, 2007; Vigotski & Luria,
do representacional, simbólico, de uma 2007). Para Vygotsky (2007) era impor-
produção cultural digital (Costa, 2008). tante “entender o papel comportamental
Fonseca (2007) explica que o desenvolvi- do signo em tudo aquilo que ele tem de
mento cognitivo não se dá somente pela característico” (p. 53). Vigotski (1991) afir-
autoregulação da estrutura, mas também ma que o signo tem um papel importante
pelo envolvimento do indivíduo em “sis- nos processos coletivos, interpsicológicos,
temas de mediatização interindividual sendo meios de comunicação e de influ-
que se co-constroem em contextos sócio- ência. Para Vygotsky (1991), “todo signo,
-históricos” (p. 36). A Cibercultura abarca si tomamos su origen real, es un medio
essa noção e implica situações de inter- de comunicación e podríamos decirlo más
subjetividade. A intersubjetividade tem ampliamente, un medio de conexión de
importante papel nas relações sociais face ciertas funciones psíquicas de carácter
a face (Berger & Luckmann, 2004). Mas, social.” (p. 78). De acordo com Vygotsky
como acima mostrado, na Cibercultura ela (1991a), a função de comunicação do
possui a mesma importância psicológica, signo endossa processos interpsicológi-
dado o caráter transcendente da lingua- cos, direciona a atenção, define papéis na
gem (que independe de tempo e de espa- comunicação e contribui para a internali-
ço), e suas relações cognitivas. No uso de zação do que foi socialmente significado.
computadores, por exemplo, as interfaces A intersubjetividade, na perspectiva vi-
permitem a mediatização tecnológica nas gotskiana, está imbricada nesses fatores.
interações, e ainda afetam nossas formas Wertsch (1995) comenta que a intersub-
de criar e comunicar. Segundo Johnson jetividade é um processo de comunicação
(2001), “os seres humanos pensam atra- humana que transcende o mundo privado
vés de palavras, conceitos, imagens, sons, dos participantes por meio da conduta
associações” (p. 17). O computador lida comunicativa (situações de fala). Wertsch
com representações e sinais, permitindo (1995) coloca que, na teoria vigotskiana,
formas de interação à distância (Johnson, esse é essencialmente um processo semi-
2001). Nas redes sociais, as interações ótico numa dada situação. Entendemos
também assumem um caráter intersub- que em interações sociais produzidas em
jetivo muito importante na medida em ambientes virtuais, tais premissas são
que os indivíduos podem organizar suas válidas, mas, queremos enfatizar suas
ações em rede, em espaços mais infor- possibilidades dialéticas. Nesse sentido,
mais (Marteleto, 2001). A psicologia histó- mencionamos Molón (2010) quando ex-
rico-cultural de Vygotsky traz importantes põem a perspectiva de Smolka e colabo-
contribuições para essas discussões; entre radores sobre intersubjetividade na teo-
elas a importância da mediação simbólica. ria de Vygotsky, ao colocarem ênfase na
Segundo Vygotsky, a mediação simbóli- relação dialética das dimensões intra e
ca tem origem social e assume destaque interpsicológica. Smolka e colaboradores
na formação psicológica e na relação/ comentam que “sendo a palavra e o sig-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no polissêmicos, a natureza e a gênese do LT02-1408 - AS RELAÇÕES ENTRE


processo de constituição do sujeito im- PROFESSOR-ALUNO NA EAD A PARTIR
plicam, necessariamente, o diferente e o DA CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO
semelhante” (Molón, 2010, p. 58). Assim, E DESENVOLVIMENTO DAS FUNÇÕES
entendemos que intersubjetividade numa PSICOLÓGICAS
perspectiva vigotskiana, envolve uma Angélica de Fátima Piovesan - UNIT
concepção interativa e semiótica de sujei- angelicapiovesan@hotmail.com
to, constituída pelo outro via linguagem, Fabricia Borges - UNIT
como processos dialógicos, dialéticos e de fabricia.borges@gmail.com
significação, que não dicotomizam sujeito Salete Peixoto - UNIT
e social. Nesse sentido, a intersubjetivida- saletepeixotog@hotmail.com.br
de ajudaria a constituir socialmente sujei-
tos e saberes, em atividades simbólica e Neste trabalho iremos discutir as relações
cognitivamente formuladas. Segundo Fon- de interação entre professor-aluno na Edu-
seca (2007), a cognição “transformada na cação a Distância. Para isso, utilizaremos a
sua representação pela linguagem, dotou Psicologia Histórico-Cultural através de Vi-
o ser humano da capacidade de raciocí- gotski. Também, usaremos o conceito de
nio e de resolução de problemas” (p. 34). “Inteligência Coletiva” desenvolvido por
A Cibercultura é um ambiente onde essa Pierre Levy, filósofo da informação que es-
premissa ocorre, utilizando-se as ferra- tuda as interações entre internet e socie-
mentas que ela contém. Concluímos que a dade. Sabemos que a construção destes
intersubjetividade no contexto virtual, na conceitos e seus significados são distintos,
Cibercultura, pode diferir em alguns índi- construídos e estudados em épocas e con-
ces ou esquemas comunicacionais daque- textos diferentes, no entanto, acreditamos
les praticados face a face, porém mantém que podemos relacioná-los para entender
efeitos psicológicos semelhantes, porque a construção de conhecimento e o desen-
se vale do caráter transcendente da lin- volvimento das funções mentais supe-
guagem e de processos cognitivos em co- riores através do uso das tecnologias. Vi-
mum, conseguindo realizar a passagem do gotski desenvolveu sua teoria descreven-
privado para o coletivo, que é um aspec- do como o indivíduo se constrói como ser
to marcante da intersubjetividade. Essas humano a partir das relações sociais, en-
questões têm influência nos processos de tre o Eu-Outro e essas relações permitem
desenvolvimento psicológico e social dos que haja uma reconstrução interna (intra-
sujeitos no contexto tecnológico atual. O pessoal) de uma operação externa (inter-
importante é examinar criticamente como pessoal). Esse processo de internalização
as pessoas estão interagindo no ciberes- das formas culturais de comportamento
paço, que construção social/interpessoal se aplica à atenção voluntária, à memória
vem se formando e como têm sido obje- lógica e formação de conceitos com base
tivadas as percepções sociais dos sujeitos nas operações com os signos. No entanto,
nesse contexto. podemos dizer que as funções psicológi-
cas superiores se originam das relações
Palavras-chave: Cibercultura; sociais e que as atividades cognitivas não
Intersubjetividade; Vygotsky. se limitam ao uso de signos e instrumen-

54
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tos. Os signos são representados pela lin- ais de aprendizagens (AVA). Consideramos
guagem oral e gestual, pela escrita, pelos que o uso de tecnologias possibilita o de-
números, não modificando o objeto das senvolvimento das funções psicológicas
operações psicológicas, mas dirigindo-se como também contribui para a formação
para o controle do próprio individuo. Já os da “Inteligência Coletiva”. Nosso objetivo
instrumentos sofrem mudanças humanas foi identificar e descrever os significados
sobre o objeto e são orientados externa- construídos nas narrativas de dois profes-
mente. As relações dialéticas entre as fun- sores da Educação a Distância em relação
ções psicológicas percepção, atenção e as às interações professor-aluno mediadas
operações sensório-motoras são afetadas pelo uso de tecnologias na EAD. Esse tra-
pelo uso de instrumentos quando rela- balho é um recorte de uma pesquisa re-
cionados à fala, auxiliando no desenvolvi- alizada com professores de EAD de uma
mento das funções psicológicas. A partir universidade privada de Aracaju, SE. As
do entendimento do desenvolvimento entrevistas narrativas e de histórias de
das funções psicológicas, vamos tratar do vida foram gravadas, transcritas e realiza-
uso das tecnologias no desenvolvimento das na própria instituição de ensino. Após
psicológico. Lévy (2007) criou o termo “In- as transcrições construímos o mapa de
teligência coletiva”, onde as inteligências significados para cada professor por meio
individuais são somadas e compartilhadas do qual identificamos e descrevemos os
por toda a sociedade a partir do surgimen- significados construídos a partir das en-
to das novas tecnologias possibilitando trevistas sobre as interações entre Pro-
trocas de conhecimento e aprendizagens fessor-aluno na Educação a Distância. Nas
coletivas. "Ela possibilita a partilha da me- entrevistas os professores nos contaram
mória, da percepção, da imaginação. Isso sobre as novas experiências obtidas nas
resulta na aprendizagem coletiva, troca de relações professor-aluno mediadas pelo
conhecimentos". Só existe “Inteligência uso de tecnologias. Para um deles não há
Coletiva” se houver cooperação compe- como falar da Educação a distância sem
titiva (relacionada às relações sociais) ou comparar com o ensino presencial por
competição cooperativa (relacionada à causa do contato físico, visual existente
liberdade). Fazendo uma relação entre os no presencial. Uma forma de esse contato
conceitos de Vigotski e de Levy utilizados ocorrer na EAD é a partir da maior dedi-
neste trabalho, podemos dizer o seguinte: cação do professor ao aluno, dando mais
o desenvolvimento das funções psicoló- atenção para que ele aprenda, identifican-
gicas superiores pode ocorrer a partir da do e re-significando formas de ser e agir
internalização de aprendizagens, da me- no processo dialógico com o aluno. Tam-
diação semiótica nas interações professor- bém foi narrado sobre o desenvolvimen-
-aluno e o uso de tecnologias interfere no to de relações de afetividades a partir do
processo de desenvolvimento da Zona de uso de emails, chats e fóruns, como nos
Desenvolvimento proximal (ZDP) mediado contou um dos professores que recebeu
pelo professor quando abordamos a EAD. emails de agradecimentos pelo aprendi-
O professor propicia a aquisição de novos zado. Para ele, é um reconhecimento que
conhecimentos ao aluno através de ativi- muitas vezes não acontece no ensino pre-
dades desenvolvidas nos ambientes virtu- sencial. Outro ponto refere-se a melhora

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do desempenho profissional na educação A EAD é realizada por meio de tecnologia


presencial. Isso ocorre devido a maior da informação e da comunicação; com
dedicação prestada ao aluno e a necessi- os sujeitos separados temporal, espacial
dade de melhor planejamento das aulas e fisicamente; com destaque em proces-
na EAD. A consideração do Ambiente Vir- samento de informação, interatividade/
tual como um “ambiente frio” também é interação e produção escrita, entre ou-
central nas narrativas, por isso enfatizam tros (Moore e Kearsley, 2008; Dias e Leite,
maior dedicação ao aluno. Esses discursos 2010; Menezes, 2010). Como qualquer
permeiam o imaginário dos professores processo educacional a EAD tem relação
possibilitando transformação no modo de com fatores de desenvolvimento cogniti-
dedicar-se ao aluno como também, propi- vo, afetivo e social de seus sujeitos. Por
ciam maior interação e afetividade, que é isso, nosso objetivo com este estudo é
tema central abordado pelos professores apontar teoricamente que a Psicologia
na melhoria da relação professor-aluno. pode contribuir com a EAD também inves-
Diante destas narrativas percebemos tigando variáveis de desenvolvimento hu-
que a interação professor-aluno na EAD é mano dos sujeitos que ela atende, em seu
marcada pelo desenvolvimento de novas contexto educacional. Um caminho para
formas de relacionamentos tanto para o isso é analisar o perfil do estudante de
professor como para o aluno. EAD. De acordo com o Censo EAD 2009,
a idade dos alunos na EAD, “concentra-se
Palavras-chave: Interação Professor-aluno, na faixa etária de 25 a 39 anos, a maio-
Inteligência Coletiva, Educação a Distância. ria dos estudantes possui renda média de
Contato: Angelica de Fatima Piovesan, 1 a 10 salários, sendo que o grupo mais
Universidade Tiradentes, UNIT, Mestranda representativo (29%) recebe de 1 a 3 sa-
em Educação, bolsista PROSUP CAPES. lários mínimos mensais” (p. 23). Além dis-
Integrante do Grupo de Estudos GPECS. so, o Censo EAD 2009 aponta que “apesar
de um perfil diversificado, os estudantes
angelicapiovesan@hotmail.com
de EAD não são constituídos por uma
maioria de jovens recém-saídos do ensi-
no médio” (p. 23). Ferreira e Mendonça
LT01-859 - INTER-RELAÇÕES ENTRE
(2007) mostram que a maioria dos alunos
DESENVOLVIMENTO HUMANO
de EAD é de profissionais em atividade
E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NA
produtiva, casados, e que buscam a EAD
PERSPECTIVA DA APRENDIZAGEM
para aumentarem seus conhecimentos.
Ruben de Oliveira Nascimento - UFU Nesse sentido, “os cursos a distância são
rubenufu@gmail.com uma maneira que as pessoas encontram
de ficarem informadas e ainda assim dis-
A Educação a Distância (EAD) é uma mo- por de tempo para a família, visto que po-
dalidade educacional recente no Brasil, dem acessar os cursos até mesmo de suas
que vem crescendo bastante nos últimos residências” (Ferreira e Mendonça, 2007,
anos. Esse crescimento deve vir acompa- p. 7). O aluno de EAD também precisa “se
nhado de muita pesquisa e discussão so- empenhar em definir horários fixos de
bre seu processo ensino-aprendizagem. estudo em casa e/ou no trabalho para se

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dedicar ao curso e ter disciplina para tal” comportamento e que variáveis contex-
(Behar, 2009, p. 26). Pela faixa etária dos tuais influenciam para que se perceba,
alunos, podemos situá-los na fase inicial em um dado momento, a consecução de
da vida adulta (Papalia e Olds, 2000). A algumas como sendo mais viáveis do que
definição de adulto somente pelo fator outras” (p. 162). Motivação é um compo-
idade é uma questão complexa, porque o nente pedagógico fundamental na EAD.
desenvolvimento depende de diversos fa- Paralelo a isso, a Andragogia (ensino de
tores físicos e psicológicos que variam de adultos) considera que os alunos adultos
indivíduo para indivíduo, e entre contex- apreciam ter certo controle e responsabi-
tos socioculturais (Rogoff, 2005; Feldman, lidade pessoal sobre o que está aconte-
Papalia e Olds, 2009). Mas, o fator idade cendo; preferem definir o que é relevante
ajuda a situar estatisticamente os alunos para suas necessidades; preferem tomar
de EAD num determinado momento do decisões sozinhas ou pelo menos serem
desenvolvimento, cujas características consultados; têm muita vivencia e gostam
gerais permitiriam pensar sobre as ou- de utilizá-la no aprendizado; preferem
tras variáveis do perfil. Assim, uma inter- adquirir informações ou conhecimen-
-relação entre EAD, desenvolvimento hu- to relevantes para resolver problemas
mano e aprendizagem, pode ser notada, no presente; geralmente tem motivação
especialmente se tratarmos a EAD como intrínseca para aprender (Moore e Ke-
meio para formação continuada ou atu- arsley, 2008, p. 173-174). Essas caracte-
alização profissional. Abordando forma- rísticas podem ter impacto no processo
ção continuada com alunos adultos, Al- de aprendizagem na EAD, que valoriza
varado Prada (1997) assinala que “o que muito a autonomia do estudante frente
caracteriza as pessoas adultas são suas ao seu programa de formação. Segun-
experiências, sua história de vida, seus do Moore e Kearsley (2008) autonomia
saberes” (p. 76). Papalia e Olds (2000) do aluno de EAD significa que o mesmo
comentam que o aluno adulto costuma deve tomar decisões a respeito de seu
empregar mais a experiência de vida, en- aprendizado, organizando os recursos dis-
riquecendo com isso sua aprendizagem. ponibilizados. Contudo, toda autonomia
Para o aluno adulto no contexto social é relativa. Assim o sistema também tem
atual, a aprendizagem formal continuada responsabilidades com essa autonomia,
“é uma maneira importante de desenvol- e compreender aspectos relacionados ao
vimento de seu potencial, bem como de desenvolvimento humano e à aprendiza-
acompanhar as mudanças no mundo do gem, contribui nesse sentido. Em termos
trabalho” (Papalia e Olds, 2000, p. 453). de psicologia da aprendizagem, Brans-
Assim, o aluno de EAD, adulto, trabalha- ford, Brown e Cocking (2007) mostram
dor, casado, tem prerrogativas pessoais e que conhecimentos, habilidades, crenças
sociais que podem representar boa parte e conceitos prévios influenciam o modo
de sua motivação para os estudos e o que como se percebe um ambiente educa-
espera deles. Segundo Tapia e Garcia- cional e a organização do conhecimento.
-Celay (1996), a motivação na aprendiza- Essas questões afetam as “capacidades de
gem envolve “que tipo de metas os alunos recordação, raciocínio, solução de proble-
perseguem, de que modo influem em seu mas e aquisição de novo conhecimento”

57
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(Bransford, Brown e Cocking, 2007, p. 27), CO 31 - LT4


de modo que aprender é mudar. Carvalho
(1996) também mostra que desenvolver é
Cognição e Aprendizagem
mudar. O adulto continua seu processo de
desenvolvimento, aprendendo, vivendo LT04-723 - INVESTIGANDO O
mudanças e estabelecendo metas e possi- DESENVOLVIMENTO SOCIOCOGNITIVO
bilidades. A EAD deve assimilar essas dis- INFANTIL
cussões ao seu contexto educacional, mas Jaqueline Pereira Dias - USP
não para simplesmente adequar o aluno jaquepdias@gmail.com
ao seu processo pedagógico. Segundo Edna Maria Marturano - USP
Vigotski (2003) a educação não deve so- emmartur@fmrp.usp.br
mente comunicar hábitos e conhecimen-
tos, mas promover a “formação de vários Financiamento: CAPES
vínculos novos dentro de um sistema de
comportamento previamente forma- O desenvolvimento sociocognitivo com-
do” (Vigotski, 2003, p. 82). Para Vigotski preende o conhecimento sobre o mundo
(2003), “deve-se considerar como carac- social; o pensar sobre as pessoas, o que
terística da educação o momento de não- elas fazem ou deveriam fazer e como elas
-consolidação, de fluidez do crescimento se sentem. (Rodrigues & Tavares, 2009) De
e de mudanças originais no indivíduo” acordo com Bee (2003) tais conhecimen-
(p. 82). Assim, defendemos que na EAD tos envolvem processos e mecanismos da
deve-se promover uma “aprendizagem cognição social. A referida autora ressalta
que passa à frente do desenvolvimento que a compreensão da criança em relação
e o conduz” (Vigotski, 2001, p. 332). Essa a ela mesma, as pessoas e os seus rela-
perspectiva pode ajudar na discussão cionamentos sociais reflete ou baseia-se
dos modelos de formação em EAD. Neste em seu desenvolvimento cognitivo geral.
trabalho consideramos alguns aspectos Para tanto, aponta que a criança mais jo-
gerais da vida adulta que não esgotam a vem direciona-se sua atenção a caracte-
discussão colocada, porém, indicam que rísticas externas das situações, enquanto
o processo de aprendizagem na EAD tem, as crianças com mais idade buscam as
em especial, uma inter-relação com fa- causas (princípios internos); as crianças
tores do desenvolvimento humano a ser pequenas tiram conclusões por meio de
considerada pedagogicamente em seu suas observações, enquanto as crianças
contexto educacional. mais velhas já são capazes de realizar
inferências. Tais dimensões de mudança
Palavras-chave: Aprendizagem, caracterizam, também, um desenvolvi-
Desenvolvimento, Educação a Distância. mento natural da cognição social (Bee,
2003). Segundo Fenning, Bake e Juvonen
(2011) para se investigar a cognição social
teóricos da área recorrem ao modelo do
processamento da informação social, que
esclarece como as informações são pro-
cessadas e organizadas em uma situação

58
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

social. O modelo que tem evidenciado da história. Para a seleção das perguntas
mais resultados empíricos é o de Dodge mais pertinentes a investigação realizou-
e Crick (1994); por meio do modelo em -se uma análise textual e das ilustrações
questão é possível compreender como a do livro selecionado para o levantamento
informação social se processa. dos indicadores verbais e visuais de pistas
sociais, internas e externas, em cada pá-
Teglasi e Rothman (2001) aplicaram o gina. Com base nessa análise, as pergun-
modelo à exploração do conteúdo de his- tas para a sondagem sociocognitiva foram
tórias infantis, com base em seis passos organizadas em categorias de acordo com
mentais que se expressam nas seguintes os seis componentes propostos por Tegla-
questões: - o que está acontecendo? - o si e Rothman (2001). Sendo assim, tem-se
que os personagens estão pensando e 23 itens investigando o que está aconte-
sentindo? - quais são as intenções e me- cendo; 24 itens investigando o que os per-
tas dos personagens? - o que os persona- sonagens estão pensando e sentindo 12
gens alcançam com suas ações? - como os itens investigando as metas e intenções
personagens executam e monitoram seus dos personagens; 6 itens para o que os
comportamentos? - quais as lições apren- personagens alcançam com suas ações;
didas? No presente estudo, os seis passos 12 itens para como os personagens exe-
do processamento da informação social cutam e monitoram seus comportamen-
propostos por esses autores são empre- tos; e 3 itens para as lições aprendidas.
gados para avaliar o desenvolvimento Para a investigação propriamente dita,
sociocognitivo de crianças. Seu objetivo cada criança era retirada, individualmen-
é verificar se há diferenças desenvolvi- te, da sala de aula e participava da leitura-
mentais na qualidade das respostas de -dialogada da história com base no rotei-
crianças pré-escolares e escolares, ao se- ro de perguntas. A avaliação, com dura-
rem questionadas, com as seis perguntas ção média de 20 minutos, era gravada e
exploratórias, sobre uma história infantil posteriormente transcrita para a análise
rica em pistas sociais. Método – Sujeitos de dados. Após todas as avaliações trans-
- Participaram do estudo 49 crianças, 19 critas, realizou-se uma junção de todas as
crianças de 5-6 anos, pertencentes a uma respostas a cada item, tanto para crianças
escola de educação infantil e 30 crianças de 5-6 anos quanto para crianças de 8-9
de 8-9 anos, pertencentes a uma escola anos. As respostas foram organizadas em
de ensino fundamental. Ambas as esco- níveis de reflexão sócio-cognitiva estabe-
las são de rede pública e situam-se em lecidos por três juízes mediante consen-
uma cidade do interior de Minas Gerais. so. Resultados - Para o componente o que
Materiais e procedimentos - Para a inves- está acontecendo? Em que a investigação
tigação sociocognitiva selecionou-se um direciona-se para a codificação e interpre-
livro de história infantil, rico em pistas tação das pistas sociais, nota-se que as
sociais, pertencente à pesquisa de Rodri- crianças de 8-9 anos captam mais pistas
gues e cols. (2007). A fim de sistematizar se comparadas às crianças de 5-6 anos.
a investigação foi elaborado um roteiro de Estas últimas também são capazes de de-
aplicação, estruturado em 80 perguntas, codificar pistas e algumas delas apresen-
que visa explorar e discutir o conteúdo tam respostas ricas em detalhes, no en-

59
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tanto as crianças de 8-9 anos destacam- corrobora a afirmação de Bee (2003) de


-se na qualidade da respostas. A referida que crianças pequenas se prendem a ob-
observação vai ao encontro das informa- servações e crianças mais velhas já estão
ções apontadas por Bee (2003) em que o aptas a realizarem inferências.
pensar na infância altera-se com o desen-
O roteiro de investigação se mostrou sen-
volvimento. Em relação ao componente
sível para a avaliação sociocognitiva. As
o que os personagens estão pensando e
crianças mostraram-se interessadas pela
sentindo? Nota-se que as crianças peque-
história e os resultados encontrados são
nas apresentam um vocabulário restrito
corroborados pela literatura do desenvol-
de nomeação de sentimentos. Além disso,
vimento infantil.
em algumas situações tais crianças fazem
referência a uma situação e não a um sen-
timento; já as crianças mais velhas, de um Palavras-chave: desenvolvimento
modo geral, são capazes de nomear senti- sociocognitivo; infância, história infantis.
mentos e discriminá-los coerentemente a
historia. Ao investigar metas e intenções,
terceiro componente, observa-se que as LT04-970 - GRUPOS DE CONVIVÊNCIA:
crianças mais velhas apresentam respos- RELAÇÃO ENTRE CONCEITOS
tas mais completas, no entanto as crian- COTIDIANOS E CIENTÍFICOS
ças pequenas são capazes de identificar Camila Lima Nascimento - UNICAMP
corretamente a meta/intenção presente camifono@fcm.unicamp.br
na cena. Ao se explorar a elaboração de Cecília Guarnieri Batista - UNICAMP
alternativas de resolução de problemas cecigb@fcm.unicamp.br
para o personagem, as crianças mais ve-
lhas apresentam soluções mais conse- O processo de desenvolvimento infantil,
quenciadas. Para a investigação de resul- mais especificamente, referente a crian-
tados alcançados, quarto componente, e ças com queixas de alterações no desen-
monitoramento e execução de compor- volvimento e/ou dificuldades escolares,
tamentos, quinto componente, muitas pode sofrer influências negativas, advin-
das crianças, incluindo ambas as idades, das dos efeitos das repetidas histórias de
compreendiam o que estava sendo ques- fracasso nas tarefas educacionais. Uma
tionado, porém as crianças mais velhas das possibilidades de redução desses
apresentaram respostas mais detalha- problemas é a participação da criança
das, apontando maior compreensão. Em em projetos de educação não formal, em
relação ao último componente, quais as grupos de convivência. Essa participação
lições aprendidas, observa-se que a maio- pode favorecer interações em que predo-
ria das crianças mais velhas foi capaz de minem momentos de aquisição e troca
compreender a história como um todo, de experiências entre os participantes,
extraindo lições pertinentes do livro. Já as permitindo a exploração de capacidades
crianças mais novas, geralmente, ficaram e o desenvolvimento de competências
presas aos acontecimentos da história, com diferentes propostas, como projetos
não sendo capazes de extrair as lições e voltados para a formação de conceitos.
transpô-las para a vida cotidiana. Tal fato Cavalcanti (2005) destaca a formação de

60
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

conceitos como sendo um processo cria- sobre formação de conceitos, realizado


tivo, que se orienta para a solução de pro- com crianças que apresentam dificulda-
blemas e que depende, fundamentalmen- des escolares em grupos de educação
te, da experiência, na qual a apropriação não formal, buscando identificar exem-
de significados depende do contexto, da plos de apropriação de conceitos científi-
atividade e da participação do indivíduo. cos, com base na análise da dinâmica das
Oliveira, Chaves e Alves (2006) afirmam interações entre adultos e crianças. Os
que a formação de conceitos depende de dados apresentados foram selecionados
um movimento coletivo, trazendo a im- do conjunto de filmagens das atividades
portância do contexto grupal, com flexibi- desenvolvidas em grupos de convivência,
lidade nas atividades propostas, baseada constituídos por crianças com queixas de
na percepção dos comportamentos e co- dificuldades escolares e, a maioria, com
nhecimentos trazidos pelos participantes. diagnósticos de alterações orgânicas no
Vygotsky diferencia os conceitos aprendi- desenvolvimento. Os encontros eram se-
dos nas interações cotidianas (cotidianos) manais, realizados em um serviço de saú-
daqueles adquiridos no contexto escolar de de uma universidade pública, com du-
(científicos) e os relaciona, afirmando que ração de 60 minutos, sendo coordenados
os cotidianos conferem sentido aos cientí- por uma equipe envolvendo docentes e
ficos, por terem significados emocionais e estudantes de pós-graduação. A atividade
pessoais (Van der Veer & Valsiner, 2001). dos grupos era fundamentada em propos-
Dessa forma, fundamenta as afirmações ta de educação não-formal, envolvendo o
segundo as quais a formação de concei- desenvolvimento de projetos temáticos
tos pode ser facilitada por um contexto de (Batista & Laplane, 2007). Participaram do
grupo em que adultos encorajem o esta- estudo quatro crianças com faixa etária
belecimento de relações entre vivências entre doze e catorze anos, matriculadas
do cotidiano e conhecimentos formais. em escolas regulares. O projeto foi apro-
Gerhardt (2010) destaca dois aspectos vado por Comitê de Ética, e os pais assi-
relacionados ao processo de formação de naram um Termo de Consentimento Livre
conceitos: o descolamento da realidade e Esclarecido. A coleta de dados consistiu
imediata e a articulação entre conceitos. na transcrição das sessões do estudo dos
Para a autora, o aprendizado consiste na Solos, que foi parte do projeto temático
formação de um espaço emergente, re- “Geografia do Brasil”, das quais foram re-
sultante do encontro dos processos in- cortados episódios significativos (Pedrosa
dividuais e ambientais em um momento & Carvalho, 2005). As sessões envolveram
único. O processo de aprendizado deve demonstrações práticas, aula teórica com
ser apresentado como uma realidade especialistas, estudo de campo, jogos de
a ser construída (envolvendo conceitos tabuleiro com tarefas relacionadas aos
científicos), baseada nas realidades já conteúdos apresentados, atividades de
conhecidas (conceito cotidianos), permi- leitura e escrita permeadas por diálogos,
tindo que ambas as realidades sejam per- incentivando os relatos das crianças par-
cebidas e conceptualizadas pelo sujeito ticipantes, cujos nomes apresentados são
em desenvolvimento. O objetivo do pre- fictícios. A análise consistiu no levanta-
sente trabalho é apresentar um estudo mento dos conhecimentos que as crian-

61
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ças já tinham previamente e dos indica- tribuir para a articulação entre diferentes
dores de apropriação de conhecimentos eventos, todos relacionados aos “danos
pelas crianças, buscando problematizar a ao solo”, tendo o adulto atuado de forma
identificação de articulação de conceitos a propiciar essa busca de articulação. Os
e descolamento da realidade imediata, episódios analisados permitiram identifi-
na construção de conceitos cotidianos e car exemplos de apropriação de conceitos
científicos. Como parte dos resultados, científicos pelas crianças, muitas vezes,
um dos episódios do estudo é apresenta- enunciados de forma não canônica e rela-
do para exemplificar a análise realizada, o cionados a conceitos cotidianos. A partir
Episódio 3-3, em que o adulto apresenta dos estudos apresentados foram permi-
questões relacionadas a noções já apre- tidas reflexões acerca das competências
sentadas. e capacidades das crianças participan-
tes. Observou-se que a apropriação dos
Cecília (ad): O que estraga o solo?
conceitos nem sempre é completa, mas,
Evandro: Produtos químicos, matadores foram evidenciadas construções e apro-
de insetos artificiais. priações por parte das crianças, sendo
Camila explica o perigo dos pesticidas e que cada criança apresentou sua própria
agrotóxicos e continua as perguntas. maneira de demonstrar a apropriação de
um conceito. A participação dos adultos
Camila (ad): Por exemplo, quando chove mostrou-se importante, uma vez que as
muito e não tem planta em cima? O que crianças apoiaram-se, constantemente,
acontece com o solo? nas relações por eles apresentadas entre
Tamara: Entra dentro. (referindo-se ao as experiências cotidianas e os conceitos
deslocamento do solo) apresentados, durante o processo de ela-
boração de conceitos. Desta forma, os da-
Camila (ad): A professora mostrou uma dos indicaram capacidades e competên-
foto, vocês lembram? O que aconteceu cias nas crianças participantes, cada uma
com a estrada que estava em cima do a seu modo. Foi possível, assim, evitar a
solo? cristalização de incapacidades e queixas,
Tamara: Rachou. possibilitando mudanças significativas
nas formas de lidar com o aprendizado da
Celso: Rachou.
criança e contribuindo para o seu desen-
Nesse episódio, o adulto retoma uma per- volvimento.
gunta apresentada duas aulas antes (1).
Evandro responde com elementos não Palavras-chave: desenvolvimento humano,
apresentados em aula (2). O adulto ex- necessidades especiais, grupos de
pande a resposta e detalha mais a pergun- convivência
ta inicial (3). Tamara inicia a resposta (4) Contato: Cecília Guarnieri Batista, UNICAMP,
e o adulto concorda e completa, fazendo cecigb@fcm.unicamp.br
referência à aula expositiva (5). Então, Ta-
mara (6) e Celso (7) respondem, apropria-
damente. Considera-se que, no episódio,
as crianças participaram de forma a con-

62
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1319 - INFLUÊNCIAS DO AMBIENTE Ambiental o campo da ciência psicológica


NA PERCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM cujo foco de estudo é a influência do am-
NUMA SALA DE AULA DE IDIOMAS: biente na subjetividade e comportamento
BREVES CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE humanos (Moser, 1998; Sager, Sperb, Roa-
UMA INVESTIGAÇÃO EM PSICOLOGIA zzi & Martins; 2003), compreende-se que
AMBIENTAL ela surge enquanto possibilidade de com-
Rodolfo Luís Leite Batista - UFSJ preensão da realidade de ensino-aprendi-
rodolfo_rllb@hotmail.com zagem nas salas de aula de LE. Compreen-
Aliene Cássia Carvalho Gonçalves - UFSJ dendo que cada ambiente pode oferecer
alienecassia@hotmail.com variados aspectos de influências ao com-
Tatiane Rose Oliveira de Mendonça - UFSJ portamento humano (iluminação, tempe-
tatianerose@yahoo.com.br ratura, ruídos, sensação de aglomeração e
Larissa Marinho Medeiros dos Santos - apinhamento, por exemplo), optou-se por
DPSIC/UFSJ investigar a percepção dos alunos sobre a
larissa@ufsj.edu.br influência do ambiente em sua aprendiza-
gem de uma língua estrangeira. Segundo
É apresentado o estudo de caso acerca da Tuan (1980), o estudo da percepção per-
influência causada pelo ambiente na per- mite compreender a ambiência, uma vez
cepção de aprendizagem de uma língua que elas envolvem características individu-
estrangeira – LE – entre os alunos de um ais – que variam conforme a idade, sexo,
projeto de extensão do Departamento de gênero e história de vida – e relacionadas
Letras, Artes e Cultura da Universidade Fe- à situação investigada. O processo de co-
deral de São João del-Rei (DELAC/UFSJ). Os leta de dados foi dividido em três grandes
trabalhos foram conduzidos pelos autores etapas: assinatura do Termo de Consen-
durante o primeiro semestre de 2011 e timento Livre e Esclarecido, uma série de
apontam novas possibilidades de compre- observações e aplicação de um questioná-
ensão acerca de uma sala de ensino de LE rio semiestruturado. As aulas observadas
a partir dos conhecimentos provenientes classificadas da seguinte maneira: a) aulas
da Psicologia Ambiental. Tal estudo objeti- expositivas e com carteiras dispostas em
vou investigar a influência do ambiente em fila (consideradas como de situação na-
uma sala de ensino de idiomas mediante tural e utilizadas como base para compa-
a realização de modificações acarretadas rações); b) aula com atividades realizadas
pelo uso de multimídias e modificações na em duplas; c) aula com utilização de mídia
disposição física da sala, principalmente, o auditiva na língua estrangeira; d) aula com
posicionamento do professor e a disposi- audição de música; e) aula com atividade
ção das cadeiras. Assim, buscou-se iden- realizada em círculo sem uso de multimí-
tificar a importância de diferentes meios dia; f) aula em semicírculo, e g) aula com
didáticos para aprendizagem de uma lín- uso de vídeos. As observações foram reali-
gua estrangeira na percepção dos próprios zadas com foco na participação dos alunos,
alunos. Foi realizada breve revisão de lite- sendo contabilizadas as interações entre
ratura que pudesse amparar as modifica- aluno-aluno, aluno-professor e professor-
ções realizadas e subsidiar teoricamente o -aluno com utilização da LE. Cada sessão
trabalho desenvolvido. Sendo a Psicologia durou noventa minutos, período de dura-

63
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ção da aula. A aplicação do questionário tecnológicos na sala de idiomas, criando


se fez após a realização da série de oito a possibilidade da interação em situação
observações, sendo ele construído ten- real de comunicação (Tondelli et al., 2005).
do em vista que o ambiente é vivenciado Portanto, hoje o ensino-aprendizagem não
como campo unitário que se dá abaixo do é um evento que dá primazia à figura do
nível de consciência, isto é, nem sempre é professor ou dos livros do mestre (Miccoli,
experienciado de modo que o percebamos. 2010). No entanto, o uso de multimídias
O questionário foi composto de doze itens, ou modificações no ambiente da sala de
aos quais os voluntários deveriam pontuar aula não pode ser utilizado de modo arbi-
em uma escala crescente de um a doze, in- trário. Desta forma, Miccoli (2010) afirma
dicando as alterações que mais afetaram que para que o professor atue como facili-
seu processo de ensino-aprendizagem. tador no processo de aprendizagem é ne-
Ao serem retomadas as discussões acerca cessário que ele conheça seus alunos e os
do processo de ensino-aprendizagem de diferentes métodos para definir o melhor
LE, deve ser ressaltado que tal processo caminho a ser trilhado. O domínio da lín-
se constitui como uma relação dinâmica gua estrangeira se fará de modo gradual,
e dialógica, ou seja, um acontecimento passando por um processo de refinamento
inédito a cada instante, que se modifica até a obtenção da fluência ambicionada.
constantemente e é marcado pela intera- Ao final do trabalho empreendido, aponta-
ção de duas vias. Professores e alunos en- -se que, de maneira geral, os alunos consi-
tram em contato ao abordarem o conhe- deraram a audição de mídias na língua es-
cimento. Enquanto relação, o processo de trangeira e conversação como os aspectos
ensino-aprendizagem se revela como um mais influentes na aprendizagem; aspectos
processo de natureza complexa, marcado referentes ao ambiente físico não foram
pela afetividade e pela motivação, que mencionados como influências importan-
precisa ser compreendido uma vez que tes na sala de aula; mudanças na ocupação
repercute no desenvolvimento dos indiví- do espaço físico da sala não influenciaram
duos (Miccoli, 2010). Já quanto ao uso de na interação nas categorias consideradas.
multimídias nas salas de idiomas, Tondelli, Considera-se que a fim de otimizar o pro-
Francisco, Reis e Sousa (2005) afirmam cesso, cabe ao professor oferecer diferen-
que seu uso é recente. Desta forma, gra- tes oportunidades de aprendizagem aos
dativamente, a utilização de recursos didá- seus alunos. Portanto, é importante que
ticos que não a tríade lousa-livro-giz vem haja uma integração dos meios disponí-
sendo substituída: os exercícios orais de veis, com atividades que sejam do interes-
repetição foram abandonados em função se dos alunos e que se aliem às técnicas
de uma abordagem comunicativa, pautada pedagógicas, para a obtenção de um am-
pelo ensino de quatro habilidades – escu- biente propício ao ensino-aprendizagem.
ta, fala, leitura e escrita – e com foco na
interação entre professor e alunos na sala Palavras-chave: Psicologia Ambiental, Ensino
de aula através de trabalhos em duplas ou de Língua Estrangeira, Sala de aula.
em grupos e situações simuladas com uso Contato: Rodolfo Luís Leite Batista,
da LE. Esse avanço culminou com o uso do Universidade Federal de São João Del Rei,
computador e da internet como recursos rodolfo_rllb@hotmail.com

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 35 - LT05 aponta para um crescente interesse nes-


ta linha de pesquisa, estando a maioria
Relações Familiares 1 dos trabalhos concentrados nos últimos
cinco anos. Tópicos como adoecimento,
infidelidade, parentalidade, migração, gê-
LT05-762 - CONJUGALIDADE E OS
nero, violência e relações de trabalho são
DESAFIOS DA CONTEMPORANEIDADE
os mais diretamente relacionados com
Camila Ferrari - UCSAL o grande tema. Neste trabalho, visou-se
milaferrari@terra.com.br analisar as relações conjugais, levando em
Cristiane Cavalcanti - UCSAL consideração domínios como satisfação,
cristiane.fisio.ssa@gmail.com investimento do casal na relação e proces-
Juliana Orrico - UCSAL sos adaptativos. Trata-se de um estudo de
juorrico@gmail.com natureza exploratória e multicêntrica, de
caráter qualitativo e quantitativo. Utilizou-
Encontrar alguém para compartilhar a -se um roteiro de pesquisa com itens acer-
vida e ter filhos parece ser uma busca in- ca do casamento e do significado de famí-
cessante, já que esta passagem configura- lia, no qual incluiu duas questões abertas
-se como um rito significativo em muitas (“o que é família pra você” e “quem faz
sociedades. Tal união é bastante cultivada parte da sua família”). Foi realizada em
em nossa cultura, seja pela profundidade Salvador-BA com uma população de 102
e intimidade proporcionadas, seja pela participantes. A população foi composta
companhia e autoafirmação advinda da basicamente pelo sexo feminino em 78%,
relação estabelecida com o parceiro. O ca- casada pela primeira vez (63,7%), com ida-
samento é considerado o mais forte prog- de entre 30-35 anos (36,3%), funcionárias
nóstico de felicidade e bem-estar pessoal. do setor privado (60%), com dois filhos
Por outro lado, o casal contemporâneo é (33,4%) e oriundas da classe média-alta.
confrontado por duas forças paradoxais - O conceito de família recebeu conotações
a individualidade e a conjugalidade - que positivas, associadas à base da pessoa
se tencionam constantemente. Encontrar (12%). Chama atenção a não valorização
o equilíbrio entre essas energias tem sido da relação entre família e sustento (0,7%),
um grande desafio dos cônjuges na atua- mas sim ao suporte incondicional (6,7%) e
lidade. A relevância em estudar conjuga- cuidado ʤ proteção (4%). A família extensa
lidade envolve o fato de que, em algum foi considerada pela maioria dos partici-
momento da vida, as pessoas irão experi- pantes como fazendo parte do seu sistema
mentar a convivência com o outro, apre- (41%), embora os agrupamentos mono-
sentando-se sob as mais variadas formas parentais e reconstituídos já aparecerem
possíveis de organização. Muitos estudos com relativa frequência na pesquisa. Em
sobre amor, casamento, família e divór- relação à conjugalidade, a amostra acredi-
cio, assinalam que a concepção do amor ta ser importante a estabilidade conjugal
romântico ainda ocupa o papel central no (93%), a gratificação pessoal dos cônjuges
imaginário amoroso das relações conju- na relação (90%) e a geração e educação
gais na cultura ocidental. O levantamento dos filhos (86,9%), na medida em que se
bibliográfico do tema da conjugalidade mostraram satisfeitos com suas relações

65
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(89,4%). Ser casado legalmente foi va- dade, um aumento no número dos divór-
lorizado por 49,5%. A conjugalidade, na cios e de recasamentos, bem como o sur-
maioria da população entrevistada, possui gimento da não obrigatoriedade da coabi-
características contemporâneas, ou seja, tação como regra conjugal. Para estudos
homens e mulheres estão envolvidos com prospectivos, pode-se pensar em analisar
o desenvolvimento profissional, a satisfa- os resultados do questionário utilizado sob
ção afetiva na relação com o outro e, no égide do gênero, pois é fato que teríamos
geral, compartilham a preocupação com a definições e percepções diferentes da fa-
o bem-estar do mútuo. O espaço familiar mília e casamento.
é, por conta disso, propiciador de cresci-
mento para todos os envolvidos. Nessa Palavras-chave: conjugalidade, família, laços
pesquisa, observou-se que existe uma conjugais
preocupação com a satisfação do parceiro Contato: Cristiane Cavalcanti, UCSal/FTC,
e uma tentativa de conciliar individualida- cristiane.fisio.ssa@gmail.com
de com conjugalidade, apesar de ser uma
tarefa difícil nos dias atuais. O panorama
social contemporâneo apresenta múltiplas LT05-811 - GÊNERO E GERAÇÃO:
formas de conjugalidade e um crescente DESCONTINUIDADES NAS INFÂNCIAS
aumento de dissoluções conjugais, suce- EM FAMÍLIAS DE UMA COMUNIDADE
didas ou não de recasamentos, tornando- LITORÂNEA
-se cada vez mais importante o desenvol-
Angelina Nunes de Vasconcelos - UFPE
vimento de pesquisas que aprofundem a
vasconcelos.angelina@gmail.com
compreensão sobre as questões relacio-
Heliane de Almeida Lins Leitão - UFAL
nadas ao laço conjugal, pois atualmente o
helianeleitao@uol.com.br
casamento, não necessariamente envolve
Gabriel Fortes Cavalcanti de Macêdo - UFAL
um projeto de filiação e descendência.
fortes-gabriel@hotmail.com
Podem-se observar, da mesma forma,
múltiplas facetas do desejo de procriação, Financiamento: CNPq, FAPEAL
representadas seja pela busca de um filho
quando não existem possibilidades bioló- A família se apresenta como cenário privi-
gicas de concepção, seja por seu inverso, a legiado para a investigação dos processos
escolha voluntária por não ter filhos. Esse de constituição da subjetividade em sua
cenário de dissociação, aliado aos avanços indissociabilidade do contexto relacional
da medicina, permitiu, além de uma sexu- e sociocultural. O estudo de questões de
alidade sem procriação, seu reverso. Isso gênero no contexto familiar é de grande
ocorre graças à outra característica da con- importância, pois é na família que ocor-
jugalidade contemporânea, que diz respei- rem as primeiras experiências de relações
to à busca de satisfação dentro da relação de gênero e da transmissão intergera-
e a garantia do espaço para a individuali- cional de atribuições e papéis de gênero
dade, marcando bem a igualdade dos gê- na cultura. Além disto, é na família que
neros, e não mais o casamento como uma se estabelecem as relações afetivas pri-
condição natural. Pode-se observar, como márias, a partir das quais se constroem
efeito, uma explicitação da homossexuali- importantes processos de identificação

66
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que formam o núcleo da identidade de e 11 anos. As famílias apresentaram nível


gênero. As transformações observadas na sócio-econômico baixo e, em sua maioria,
família contemporânea têm levado a uma eram nativas da comunidade. Os instru-
crescente necessidade de pesquisa acer- mentos utilizados foram: entrevistas se-
ca das relações familiares na atualidade, miestruturadas; histórias semiprojetivas;
considerando-se particularmente as mu- produção de “Retratos de família” através
danças no comportamento feminino e o da realização de fotografias e desenhos;
enfraquecimento dos valores tradicionais e estudo observacional nas casas de duas
e suas repercussões nos papéis e relações das famílias participantes e no espaço co-
de gênero. Entretanto, as mudanças ob- munitário. Foram observadas importantes
servadas na família não afetam todos os descontinuidades intergeracionais entre a
grupos sociais da mesma maneira, sendo infância vivida pelas crianças desta comu-
necessário investigar os diferentes con- nidade e aquela vivida por seus pais. As di-
textos comunitários em que ocorrem. A versas influências e informações apreendi-
organização familiar nas camadas popula- das pelas crianças na rua, na escola e atra-
res apresenta especificidades, tornando- vés da mídia, geram descontinuidades de
-se necessário compreender questões de gênero entre as gerações, principalmente
gênero neste contexto. Com freqüência por produzir novas expectativas de futu-
prevalece um modelo tradicional de famí- ro. A centralidade da escolaridade na vida
lia com uma rígida divisão de papéis entre destas crianças marca a principal diferença
homens e mulheres. O homem é conside- intergeracional na família e na comunida-
rado o detentor da autoridade, estando de. Em relação à nova geração, a oportu-
este poder sustentado principalmente no nidade da escolarização formal equipara
seu papel de principal provedor da família, as experiências de gênero, na medida em
o que lhe garante, ainda, uma privilegiada que são oferecidas igualmente a meninos
relação com o mundo social e do trabalho. e meninas. Em relação aos meninos, a
O presente trabalho apresenta uma dis- escolarização aponta para a aquisição de
cussão dos resultados obtidos numa pes- conhecimentos não acessíveis aos pais,
quisa sobre gênero com famílias nucleares o abandono de profissões tradicionais e
de uma comunidade litorânea do Nordes- novas possibilidades de inserção no mer-
te. A comunidade estudada caracteriza-se cado de trabalho. No caso das meninas, a
como sendo de baixa renda, localizada escolaridade cria a expectativa de prepa-
numa área litorânea de forte potencial tu- ração para o mercado de trabalho, priori-
rístico, sendo sua história recente marcada zando o desenvolvimento profissional e a
por grandes transformações ambientais e autonomia financeira, em detrimento do
culturais decorrentes da chegada do turis- casamento e da maternidade precoce vi-
mo de massa. O estudo buscou conhecer venciadas por suas mães. Além disto, com
a infância nestas famílias, focalizando os a proibição do trabalho infantil, as crianças
indicadores de transmissão intergeracio- já não acompanham seus pais na rotina do
nal de gênero. Os participantes do estudo trabalho adulto, enfraquecendo-se expec-
foram seis famílias de uma comunidade li- tativas de transmissão de saberes e habi-
torânea, constituídas por pai, mãe e, pelo lidades relacionadas a ocupações tradicio-
menos, duas crianças com idades entre 06 nais, tais como a pesca para os homens e o

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

artesanato para as mulheres. Estas experi- riência feminina, sendo esperado que as
ências promovem profundas modificações meninas estejam mais familiarizadas com
na vida familiar, causando estranhamento estas situações e apresentem um repertó-
nos adultos. As mães relatam que acompa- rio mais amplo de estratégias de soluções
nhavam suas mães nas atividades domés- aos dilemas fictícios apresentados. Expec-
ticas, assumindo-as como suas principais tativas diferenciadas de quais emoções
responsabilidades. Constatam, entretanto, são apropriadas para cada gênero podem,
que as meninas de hoje vivenciam roti- de fato, produzir diferentes níveis de acei-
nas diferentes daquelas vividas por elas, tação, enfrentamento e integração de de-
priorizando a experiência na escola e as terminadas experiências emocionais. Ob-
decorrentes expectativas com relação ao servamos que nestas famílias predominam
futuro. As falas das meninas corroboram papéis, funções e atitudes ligadas a um
esta realidade, revelando que a escola se modelo tradicional de organização fami-
constitui em importante ambiente de refe- liar, os quais são transmitidos através das
rência e pertencimento no seu cotidiano. conversas, das práticas disciplinares e da
Por outro lado, numa clara reprodução dos organização do ambiente doméstico e co-
estereótipos de gênero, observou-se que munitário. Como resultado, as crianças exi-
os meninos são mais “livres”, gozando de bem comportamentos consistentes com
maior permissão para explorar o espaço os estereótipos de gênero. Por outro lado,
da rua, enquanto as meninas sofrem res- constata-se a valorização da escolarização
trições, devendo permanecer no espaço das crianças que, gerando rupturas com a
da casa, geralmente cuidando das tarefas tradição, tende a igualar as experiências de
domésticas. Verifica-se aí a manutenção meninos e meninas quanto ao acesso a no-
da tradição e das desigualdades que carac- vos conhecimentos, experiências sociais e
terizam os espaços aos quais se vinculam expectativas para o futuro.
homens e mulheres adultos. Entretanto,
contrariando a expectativa de que mais Palavras-chave: família, gênero,
liberdade geraria maior autonomia dos intergeracionalidade
meninos, sugere-se sua maior dependên- Contato: Angelina Nunes de Vasconcelos,
cia emocional. Os homens, em suas res- UFPE, vasconcelos.angelina@gmail.com
postas às histórias semiprojetivas retratam
os filhos como menos autônomos do que
as filhas, recorrendo muito mais aos pais, LT05-820 - TEMPO DA CRIANÇA
principalmente à mãe, para a solução dos NO LITÍGIO PARENTAL NA JUSTIÇA:
problemas emocionais apresentados. Esta REFLEXÕES SISTÊMICAS
diferença se confirma nas respostas dos Marcia Regina Ribeiro dos Santos - TJDFT
próprios meninos às histórias em compa- marciarrsantos@gmail.com
ração com as das meninas. Uma possibi- Liana Fortunato Costa - UnB
lidade de compreensão dessa diferença lianaf@terra.com.br
estaria baseada numa concepção estere-
otipada destes pais de que sentimentos Trata-se do recorte de uma pesquisa qua-
de tristeza, medo, fracasso e culpa sejam litativa realizada em mestrado acadêmico
mais aceitáveis e “apropriados” à expe- cujos dados foram coletados em um Tribu-

68
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nal de Justiça. O estudo versou sobre as lúdico junto aos seus familiares durante o
significações do tempo entre as decisões período da entrevista. O espaço utilizado
em ações que envolvem litígio em Varas foi uma das salas do setor psicossocial que
de Família, na perspectiva dos vários par- estava equipada com os seguintes recur-
ticipantes envolvidos durante a execução sos: brinquedos, papéis, lápis coloridos,
do processo judicial: família, advogado, mesinha e cadeirinhas, dentre outros.
juiz de direito, promotor público e psicó- Depois que todos os componentes da fa-
logo – profissional do setor psicossocial da mília responderam às indagações formu-
Justiça. Tendo como objetivo discutir o sig- ladas, a pesquisadora se dirigiu à criança
nificado do tempo dado pela criança, foi e lhe fez perguntas que são apresentadas
selecionada uma dada família cujo proces- nos resultados. A primeira pergunta feita
so retornou para estudo psicossocial pela a criança foi se ela se lembrava a idade
segunda vez. O primeiro havia sido reali- que tinha quando o processo teve início.
zado há um ano. O processo era referente Ela respondeu que tinha seis ou sete anos.
à disputa de guarda da filha em comum, Foi perguntado como ela esperava que o
em que a mãe era a requerente e o pai, o processo terminasse e ela disse que não
requerido. Para a realização da pesquisa, sabia. E, tal como seus familiares, aguar-
obteve-se aprovação do Conselho de Ética dava a decisão judicial. A exemplo de sua
e todos os participantes tiveram acesso ao família materna, ela se queixou do tempo
Termo de Compromisso Livre e Esclareci- que passava com a mãe – fins de sema-
do-TCLE. Para identificar o significado do na quinzenais e quartas-feiras com per-
tempo para cada participante das decisões noite – considerando-o pouco. Por fim,
ao longo da tramitação processual, foram verbalizou o desejo de ficar mais tempo
realizadas entrevistas semiestruturadas com a mãe. Ela não fez referência ao pai
direcionadas a cada um dos membros par- nem aos familiares desse senhor durante
ticipantes da família envolvida. Além des- a realização da pesquisa. A despeito disso,
ses, realizou-se entrevista com o juiz que observou-se boa interação entre ela e o
encaminhou os autos para o setor psicos- núcleo familiar do pai. A análise e a dis-
social, com o promotor que se manifestou cussão tiveram como base as expressões
no decorrer do processo, com os advoga- da criança e o padrão interacional familiar
dos da requerente e do requerido e com o observado. Depreendeu-se que os pais e
psicólogo que efetuou o estudo no referi- os outros membros da família percebiam
do setor. Apesar de a criança participante o sofrimento da filha. Eles, no entanto,
(sexo feminino, nove anos de idade) estar não conseguiam evitar que a criança parti-
incluída durante a realização da entrevista cipasse dos desentendimentos existentes
com os componentes da família presentes e, para amenizar as tensões, delegavam
– pai, mãe, avó materna e companheira a ela o papel decisório. O litígio parental
do pai – não foi elaborada entrevista ex- envolveu delegacia de polícia e documen-
clusiva para ela. A criança tinha estabele- tos que buscavam comprovar a incompe-
cido vínculo de confiança com a psicóloga tência de um e de outro no exercício dos
e com a pesquisadora, demonstrando es- papéis materno e paterno. Lembranças
tar à vontade no ambiente oferecido para oriundas do convívio interrompido gera-
a realização da pesquisa. Ela teve espaço vam desconfianças e também contribuíam

69
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para dificultar a livre prática das funções as relações existentes foram fundamen-
parentais. A partir das intervenções reali- tais para a sugestão da psicóloga do setor
zadas pela psicóloga do setor psicossocial psicossocial para subsidiar o processo de-
que acompanhou o estudo, a família pas- cisório do julgador. Entendeu-se que para
sou a aguardar a decisão do juiz, evitando a criança, o tempo mensurável, isto é, a
sobrecarregar emocionalmente a criança. quantidade de tempo que lhe era dispo-
Do ponto de vista sistêmico, depreendeu- nibilizada a passar com a mãe era consi-
-se que os conflitos que permeavam as derada reduzida, preferindo aumentá-la.
relações afetavam a todos, em especial a O desejo da mãe e da avó em acolhê-la
criança, por ainda depender emocional e por mais tempo no ambiente doméstico,
financeiramente de adultos responsáveis. poderia ser traduzido pela criança como
Os resultados mostraram que o tempo de espaço de segurança, proteção e afeto.
tramitação processual, três anos, era o A noção de sociedade, evidenciada pela
tempo que a criança lembrava, ao se re- criança, foi representada em sua fala
ferir à idade que tinha quando este teve quando mencionou que o juiz decidiria
início. Observou-se que, do mesmo modo sobre sua guarda.
que faziam seus familiares, ela passou
a transferir para o juiz a decisão de sua Palavras-chave: tempo, criança, Justiça
residência principal. A criança, ao fazer Contato: Marcia Regina Ribeiro dos Santos,
referência ao juiz como participante im- TJDFT, marciarrsantos@gmail.com
portante naquele momento de sua vida,
evidenciou que tinha noção de sociedade
e que dela fazia parte. Ademais, por ser LT05-945 - O CRACK E A FAMÍLIA: UM
leal ao afeto materno, a criança verba- ESTUDO SOBRE A DINÂMICA FAMILIAR
lizou o desejo de residir com ela. Parece DO USUÁRIO VICIADO
que no entendimento da criança, o sofri- Heron Flores Nogueira - UCB
mento da mãe e da avó diminuiria a partir heronfn@uol.com.br
dessa nova organização familiar. A criança Maria Alexina Ribeiro - UCB
demonstrou ter noção de tempo ao fazer alexina@solar.com.br
menção de sua idade quando do início do
processo judicial e de medida temporal ao A droga sempre existiu e é normatizada de
dizer que era pouco o tempo que passava acordo com compreensão legal de cada
com a mãe. Ela demonstrou também no- país, tornando a lícita e/ou ilícita. Pesqui-
ção de espaço, ao indicar o local em que sando a temática droga verifica-se que ela
gostaria de permanecer por mais tempo. e o seu consumo são assuntos historica-
A expressão da criança foi fundamental mente antigos na discussão política, social
para subsidiar o relatório da psicóloga que e cultural, além disso, sabe-se que a moti-
realizou o estudo. A profissional concluiu vação para o uso de drogas sofreu modifi-
pela sugestão da casa materna como resi- cações no decorrer do tempo, pois antiga-
dência principal, modificando a sugestão mente, as drogas eram utilizadas em situ-
fornecida no primeiro estudo psicossocial ações e ocasiões específicas e com grupos
realizado, que era a casa paterna. Depre- determinados. Autores como Ribeiro e
endeu-se que as expressões da criança e Laranjeira (2010) dizem que a característi-

70
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ca comum das drogas com potencial para reira (2004), se propuseram a ampliar o
induzir adicção é o fato de terem a capa- olhar para a problemática das drogas no
cidade de alterar o comportamento ao ali- ambiente familiar buscando uma compre-
viarem sintomas desagradáveis como dor, ensão transgeracional dessa temática e
ansiedade, ou estresse ou, no pólo opos- automaticamente retirando o foco da re-
to, ao promoverem sensações de extremo lação linear descrita acima da tríade. Nes-
prazer e bem-estar. Com relação a estudos se sentido, objetivou-se com esta pesqui-
envolvendo o crack no Brasil não há dados sa compreender numa perspectiva trans-
precisos sobre quando e como essa droga geracional a dinâmica familiar de usuários
chegou ao país e tomando os dados epi- de crack. Os objetivos específicos deste
demiológicos feitos com a população em estudo foram: investigar como ocorriam
situação de rua, eles demonstram não as relações intrafamiliares entre membros
são apontados uso do crack até o ano de nos diferentes subsistemas; identificar
1989. O primeiro estudo sobre o consumo possíveis padrões de heranças transgera-
de crack no Brasil aconteceu em São Pau- cionais; descrever os principais aspectos
lo com um grupo de 25 usuários. O perfil da dinâmica e estrutura familiar como pa-
descrito pelos autores sobre esse grupo péis, fronteiras, limites, autoridade, afeti-
estudado: homens desempregados, com vidade; investigar o significado atribuído
menos de 30 anos de idade, baixa esco- pela família à droga; descrever a expecta-
laridade e poder aquisitivo, provenientes tiva dos membros sobre o futuro da vida
de famílias conflituosas. Os primeiros es- familiar. Participaram desta pesquisa três
tudos mostram que, de um grupo de 131 famílias, todas com um membro usuário
pacientes internados como dependentes de crack com pelo menos dois anos de uso
de crack, 18% morreram nos cinco anos da droga e em tratamento de internação
que sucederam a alta, sendo homicídio a numa clínica de reabilitação psicossocial
causa mais frequente. Tanto em São Paulo no Distrito Federal. Esta foi uma pesquisa
quanto em Belo Horizonte, onde foram fei- qualitativa na modalidade de Estudo de
tas pesquisas, o resultado apontou a mes- Caso e foi adotada como aporte teórico
ma relação intrínseca entre homicídios e a Teoria Sistêmica. Para coleta dos dados
crack, correlacionado ao tráfico de drogas. foram utilizados três instrumentos con-
De acordo com Penso et. al. (2004) nos úl- siderados por autores sistêmicos como
timos anos foram realizados estudos que fundamentais para a compreensão da di-
objetivavam compreender como as famí- nâmica familiar: entrevista semiestrutu-
lias de dependentes químicos se estrutu- rada do ciclo de vida familiar, construção
ram e como as relações se constituem. Es- do Genograma e colagem em família. O
tas autoras ressaltam que a compreensão contato inicial com os participantes se deu
era focada na tríade família - pai, mãe e o por meio de um convite verbal e pessoal
filho dependente de droga. O pai foi a figu- para a participação na pesquisa, obede-
ra vista como desatento e distante e a mãe cendo aos critérios de disponibilidade de
como super protetora e envolvida com a toda a família nuclear em participar da
vida do filho. No entanto, recentemente, pesquisa nas duas etapas. O contato ini-
estudiosos como Penso, Costa e Sudbrack cial possibilitou o agendamento dos dois
(2008), Trindade e Bucher (2008) e Fer- encontros que ocorreram separadamen-

71
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

te e tiveram uma duração média de uma zar os sentimentos gerados pelos conflitos
hora e meia cada. No primeiro encontro familiares; “Uma vida sem drogas”, ape-
os participantes responderam ao ques- sar de diversos estudos apresentarem a
tionário semiestruturado e construíram o devastação que o crack representa para a
Genograma familiar. No segundo encon- saúde do usuário e as dificuldades apre-
tro foi realizada uma colagem familiar. Os sentadas pelo adicto de manter-se abs-
dados foram coletados no próprio local tinente, as famílias preservam otimismo
de internação, sendo cada encontro gra- quando o assunto é o futuro, acreditam
vado em áudio e seu conteúdo transcrito que a droga deixará de fazer parte de sua
na íntegra. Para compreensão das respos- realidade ao mesmo tempo em que dele-
tas adotamos o enfoque da Epistemologia gam essa responsabilidade apenas para o
Qualitativa, numa postura de produção de usuário.
conhecimento construtivo-interpretativo.
Foram construídas Zonas de Sentido que Palavras-chave: crack, família, dinâmica
são categorias representadas aqui por me- familiar
táforas relacionadas ao conteúdo obtido Contato: Heron Flores Nogueira, UCB,
durante a coleta das informações. Como heronfn@uol.com.br
principais resultados apresentamos aqui
algumas categorizações: “O uso do crack:
uma herança familiar”. Onde é discutida LT05-1030 - MEU TEMPO, SEU TEMPO:
a transmissão geracional do uso do crack, REFLEXÕES SOBRE O RELACIONAMENTO
existente no sistema familiar como uma ENTRE AVÓS E NETOS A PARTIR DO
possibilidade de herdar os “valores” fami- DESENVOLVIMENTO DE UM PROGRAMA
liares; “Relações violentas: o carinho da INTERGERACIONAL NO CONTEXTO
família é a chibata”, apontada pelos par- ESCOLAR
ticipantes a violência aparece como uma Jacqueline F. C. Marangoni - GDF
das maneiras dos subsistemas se relacio- jac.marangoni@gmail.com
nar, é também interpretada como uma Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB
forma de comunicação e de transmissão claudia@unb.br
de “afetos”; “O filho-pai”, os filhos usu-
ários acabam assumindo o papel de pai A importância da família no desenvolvi-
da própria família, invertendo papéis, ao mento humano é inegável. Esta consiste
mesmo tempo, sendo “esposo” da própria no primeiro espaço de convivência e cons-
mãe, onde há ausência do genitor e super trução de significados do ser humano,
proteção da genitora. Essa dinâmica difi- promovendo a transmissão de valores e
culta o processo de desenvolvimento do práticas socioculturais por meio dos rela-
sistema familiar; “Crack: uma maldição ou cionamentos entre as gerações. Ao longo
uma salvação?”, uma visão contraditória é da história as famílias mudaram e na con-
encontrada quando as famílias atribuem temporaneidade, não se pode falar em um
um significado para a droga. Para uns ela é modelo familiar único, devido à flagrante
vista como uma maldição que acaba com heterogeneidade das configurações fa-
a harmonia e com a saúde, para outros ela miliares encontradas no cenário social.
é considerada uma salvação para ameni- Novos modelos familiares se apresentam,

72
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

motivados pelas transformações intensas busquem compreender as transferências


que perpassam as relações de gênero, as intergeracionais e as possibilidades de
atitudes e valores humanos. A crescente interações entre avós e netos nos dife-
inserção da mulher no mercado de traba- rentes contextos familiares. Como espaço
lho, a intensa circulação de informações encarregado da promoção de desenvolvi-
e inovações tecnológicas e o aumento da mento, a escola, nesse contexto, assume
expectativa de vida, as separações e no- o compromisso de formar cidadãos, pes-
vos casamentos modificam a organização soas comprometidas com a compreensão,
afetiva e social dos contextos familiares a crítica e a transformação da realidade
(Barros, 2006; Biasoli-Alves, 1997, 2000; sociocultural, na direção de trocas sociais
Dessen & Braz, 2005; Rocha-Coutinho, mais justas e equânimes (Milani, 2003).
2006). Temos assim na experiência de Entre as possíveis ações com as quais a
diferentes famílias as expressões das mu- escola deve estar comprometida, desta-
danças históricas e culturais que podem camos a construção de programas que
ou não gerar conflitos, mas demandam favoreçam a interação entre gerações. O
constantes negociações entre as gerações presente estudo parte de uma interven-
jovens e as mais velhas, que tendem a ção realizada em uma escola pública do
conviver por um período maior de tempo Distrito Federal (DF). Seu objetivo é iden-
(Oliveira, 2007; Rocha-Coutinho, 2006). tificar e analisar os sentidos construídos
Tataravós, bisavós, avós, netos e filhos por avós e netos em encontros interge-
interagem em diferentes espaços sociais, racionais delineados pela técnica do gru-
marcados por dimensões socioculturais po focal. A metodologia está baseada na
e históricas próprias. As relações que se epistemologia qualitativa e desenvolvida
estabelecem entre eles são atravessadas como um processo construtivo-interpre-
por um conjunto de significados e senti- tativo. Participaram do estudo, oito avós,
dos importantes para a contextualização e com idades que variaram de 50 a 69 anos.
entendimento da família transgeracional Entre os netos adolescentes, foram nove
ou multigeracional. Um aspecto relevan- participantes, com idades que variaram de
te é o processo de trocas intergeracionais 13 a 18 anos. Dois moravam com os seus
no contexto familiar, em decorrência das avós e eram criados por estes; os outros
dificuldades socioeconômicas de nosso relataram já terem vivido a experiência de
país. Os idosos, ainda considerados em coabitar com os avós, em algum momento
muitos discursos sociais como dependen- da infância. A análise dos dados foi realiza-
tes, começam a configurar-se como uma da por meio da Epistemologia Qualitativa
geração que oferece suporte afetivo e fi- proposta por González-Rey (1997). Para o
nanceiro para as gerações mais jovens. Os autor, pesquisador e pesquisados estabe-
avós emergem nesse cenário como perso- lecem uma relação dialógica e dinâmica
nagens centrais na vida de suas famílias, em que as informações são coconstruídas.
participando ativamente da educação dos A análise das informações permitiu iden-
netos e proporcionando apoio afetivo- tificar quatro “zonas de sentido”: 1) avós
-financeiro aos filhos (Dias, 2004; Dias & como cuidadores principais ou correspon-
Silva, 1999, 2001; Oliveira, 2007). Essa re- sáveis na educação dos netos - As narrati-
alidade complexa demanda estudos que vas ofertadas pelos participantes permiti-

73
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ram reconhecer os avós como pessoas ati- às representações que uma geração atri-
vas no processo de desenvolvimento dos bui à outra, assim como influenciam os re-
netos e esteio emocional e financeiro da lacionamentos entre elas. Ficou evidente
família; 2) conflitos intergeracionais - Foi também que para entender as relações
possível perceber que o relacionamento intergeracionais é preciso atentar-se para
entre avós e netos se dá em um movimen- temas como a violência no contexto urba-
to dinâmico, marcado por atritos, con- no, a relação de codependência afetiva e
frontos e conflitos que tendem, em alguns financeira entre as gerações de no con-
momentos, a distanciá-los. Os netos apon- texto familiar, as dificuldades socioeconô-
taram as lacunas históricas que estabele- micas e educativas na relação avós-netos,
cem diferenças de gerações (“meu tempo, a negociação entre valores tradicionais e
seu tempo”) e a insistência dos avós em modernos, as representações sobre ve-
tratar de questões atuais a partir de valo- lhice e adolescência na perspectiva dos
res coerentes com a lógica sociomoral de envolvidos e aquelas presentes no imagi-
sua época como fatores que dificultam a nário social mais amplo. Por fim, o estudo
relação com os avós; 3) realidade sociocul- indica a necessidade de pesquisas sobre
tural contemporânea marcada pelo medo os relacionamentos intergeracionais, em
- O sentimento de medo foi sustentado especial, a relação avós-netos, no mundo
discursivamente por avós e também por contemporâneo e reitera a importância da
netos. O temor e a sensação de inseguran- escola como contexto para a realização de
ça atravessaram as narrativas coerente- programas de integração entre gerações.
mente com a cultura do medo que marca
a atualidade, de modo a alterar a vida dos Palavras-chave: relação avós-netos,
participantes, restringindo a convivência programas intergeracionais, escola
nos espaços sociais e tornando-se alvo Contato: Jacqueline Ferraz da Costa
recorrente das preocupações dos avós na Marangoni, GDF, jac.marangoni@gmail.com
educação de seus netos; 4) realidade so-
ciofamiliar dos avós marcada por dificul-
dades - A experiência em grupo suscitou CO 41 - LT07
uma série de recordações por parte dos
avós que remeteram às suas relações com Violência/Gênero
os seus próprios avós, na infância, assim
como trouxeram a experiência do começo
de suas vidas conjugais e do nascimento LT07-895 - VIOLÊNCIA E GÊNERO: O
de seus filhos e de seus netos. As narra- PODER DAS MULHERES NA REDE DO
tivas dos avós contextualizaram situações TRÁFICO DE DROGAS
e condições sociais, econômicas, históri- Dayane Martins José dos Santos - UFF
cas e culturais marcadas por dificuldades day_martinss@hotmail.com
e sofrimento que influenciam a relação Financiamento: FAPERJ
que estabelecem com seus netos. A aná-
lise das narrativas de avós e netos permite O presente trabalho tem por objetivo dis-
pensar que os valores da sociedade atual cutir as relações de poder estabelecidas
se mostram, intimamente, relacionados pelas internas em um presídio feminino.

74
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

A pesquisa é realizada com mulheres que do Rio de Janeiro. Essa instituição abrange
cumprem penas por envolvimento com o a maioria maciça de mulheres sentencia-
tráfico de drogas em um presídio na re- das pelo envolvimento com a atividade do
gião norte fluminense, no Rio de Janeiro. tráfico de drogas. Outros dados analisados
Na pesquisa, a literatura foucaultiana é to- na pesquisa foram coletados no Presídio
mada a fim de conceituar o poder nos dias Nelson Hungria, localizado no município
atuais e diferenciá-lo da concepção de po- do Rio de Janeiro. Esses dados fazem par-
der tanto do Estado absolutista quanto da te do grupo de pesquisa “Violência e Gê-
teoria marxista. Foucault (1979) vai dizer nero”, que iniciou suas atividades no ano
que o poder é disperso e é encontrado em de 2007. Os dados a serem analisados são
todas as relações e campos sociais. Tais re- as entrevistas abertas em profundidade
lações de poder assumem formas distintas realizadas com as internas do presídio ci-
nos contextos intra e extramuros em um tado acima. Todas as mulheres entrevista-
presídio. No encarceramento, por exem- das foram condenadas por tráfico de dro-
plo, o poder pode ser refletido no com- gas. A metodologia utilizada para analisar
portamento de algumas mulheres que se os dados é a Análise do Discurso Crítica
“transformam” em homens e assumem o (FAIRCLOUGH, 1992), que prima pela cen-
papel tradicional masculino numa relação tralidade das relações do poder evidencia-
homossexual. O poder é visto aqui como das pelos relatos das participantes. A aná-
atrelado ao gênero. Fora do encarcera- lise do discurso possibilita analisar as falas
mento, a menção ao poder é recorrente que atravessam a constituição subjetiva
quando analisamos as motivações expres- de tais mulheres, emergindo assim sua
sas por essas mulheres para o ingresso no contradição, submissão e os discursos que
tráfico de drogas. Tais mulheres almejam são produzidos pela própria instituição.
a obtenção de dinheiro a fim de satisfazer De início, podemos desmistificar a ideia
seus desejos de consumo de bens mate- de que tais mulheres se inserem nas ativi-
riais, fomentados pela mídia e pela própria dades do tráfico exclusivamente como um
sociedade, além de almejarem o poder de meio de sustentabilidade. A atualidade se
ser bandida, que é um poder reconheci- caracteriza pela produção de necessida-
do socialmente como um poder masculi- des que não se referem à sobrevivência
no. Nosso objetivo no presente trabalho biológica do corpo, mas, principalmente,
é discutir as relações de poder estabele- à sobrevivência num contexto social em
cidas pelas internas em contextos intra e que o consumo é altamente valorizado
extramuros de um presídio. Em um pri- e possibilita a inserção em espaços mais
meiro momento, abordaremos o contexto privilegiados. A ditadura de mercado é in-
extramuros prisional, analisando como as centivada cotidianamente, seja pelo meio
relações de poder influenciam na inserção midiático, seja pela própria sociedade,
dessas mulheres no tráfico de drogas. Pos- modificando e produzindo necessidades
teriormente, iremos problematizar a mes- pessoais. Os dados coletados nos mos-
ma questão em contexto prisional. O tra- traram que a maioria das mulheres entre-
balho de campo está sendo conduzido no vistadas inicia as atividades ilícitas com o
Presídio Feminino Carlos Tinoco da Fonse- propósito de obter dinheiro para gastar
ca, na região norte fluminense do estado com roupas, acessórios, carros, etc. Tendo

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

esses objetos de consumo, elas acabam LT05-1032 - O PAPEL DAS RELAÇÕES


por ganhar uma maior visibilidade e sta- AFETIVAS NA CONSTITUIÇÃO
tus perante à sociedade. Num segundo DA IDENTIDADE DE MULHERES
momento, ao analisarmos as relações de ENCARCERADAS
poder intramuros prisionais, notamos que Carolina Ferreira Barbosa - UFF/PURO
há uma continuidade desse status con- cfbarbosa@id.uff.br
quistado fora da prisão. As mulheres que
chegaram a ocupar cargos importantes O presente trabalho visa apresentar o
na hierarquia do tráfico, ao serem presas, papel das relações afetivas no processo
continuam a exercer e ocupar um certo constitutivo da identidade de mulheres
lugar de destaque na prisão, devido à sua encarceradas. Diversos autores, em con-
trajetória de vida alcançada nas atividades sonância com os estudos em Criminologia,
de drogas. Outra forma de poder nota- atentam para o fato de que a criminalida-
da nas entrevistas é atrelada ao gênero. de feminina é, em geral, desprezada ou
Destacamos aqui a relação homossexual explicada em virtude dos relacionamentos
presente nas instituições, que é bastante amorosos com parceiros envolvidos em
comum devido à dificuldade que se tem atividades criminosas (Barcinski, 2009a;
para conseguir autorização para a visi- Barcinski 2009b; Guedes, 2006; Souza,
ta íntima e ao abandono afetivo e sexual 2009; Zaluar, 1993). Uma atividade cri-
experimentado pela maior parte das mu- minosa de extrema violência e constante
lheres no encarceramento. Porém, o que risco de morte para aquele que exerce tal
nos instigou e gerou questionamentos é atividade é, em geral, relacionada aos ho-
que, em algumas dessas relações, havia mens. Eles são os “chefes” do negócio, os
uma “transformação” de uma das parcei- que são munidos de armas de fogo e que,
ras em “homem”. Essas mulheres traves- fortes e destemidos, assumem a frente
tidas se caracterizavam como homens, de combate (Zaluar, 1993). Por deman-
assumiam comportamento, vestimentas e dar uma série de características físicas e
codinomes masculinos. Para elas, o “virar psicológicas particulares, podemos dizer
homem” dentro da prisão possibilita uma que o mundo do crime faz parte do domí-
maior visibilidade dentro da instituição e nio masculino e, desse modo, a inserção
também um maior respeito das demais in- masculina em atividades transgressoras é
ternas. Por fim, os resultados obtidos na mais facilmente esperada. As mulheres,
atual pesquisa nos possibilitaram refletir e portanto, têm assumido um papel secun-
questionar sobre as relações de poder que dário no cenário do crime, vinculando-
perpassam a vida dos indivíduos, princi- -se em atividades menos violentas como
palmente em um contexto prisional. roubo a lojas e supermercados ou, no
caso específico do tráfico de drogas, por
Palavras-chave: gênero, poder, criminalidade, amor a um bandido ou pelo vício (Zaluar,
tráfico de drogas 1993). Assim, como a inserção feminina
Contato: Dayane Martins José dos Santos, em atividades criminosas é menos evi-
UFF, day_martinss@hotmail.com dente e como a figura feminina desperta
menos desconfiança neste meio, as mu-
lheres são tidas, tradicionalmente, como

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

coadjuvantes neste cenário e os homens, permanência das mulheres no tráfico de


como protagonistas. Para entendermos o drogas e o período de encarceramento. O
papel dos homens/parceiros na iniciação estudo se baseia em reflexões realizadas
criminosa de mulheres, podemos pensar a partir de entrevistas qualitativas, em
que as relações afetivas estão no centro profundidade, com cinco mulheres encar-
da constituição da identidade feminina, ceradas com histórico de envolvimento
tal como afirma Miller (1987). Assim, o no tráfico de drogas no Rio de Janeiro. A
envolvimento das mulheres em atividades partir da análise crítica de discurso (Fair-
criminosas estaria intimamente relaciona- clough, 2008), a análise versa sobre as
do à figura do homem como bandido e à tensões entre os discursos hegemônicos
proteção, por parte das mulheres, da re- e os discursos de resistência constitutivos
lação estabelecida com seus parceiros cri- da identidade das participantes. Portanto,
minosos e à proteção/criação dos filhos. A importa para a compreensão deste pro-
partir da ênfase no papel preponderante cesso a fluidez dos significados produzidos
do afeto na constituição da subjetividade pelo discurso no contexto sócio-histórico
feminina, podemos entender que as re- e cultural no qual as participantes estão
lações afetivas estabelecidas no contexto inseridas e o modo como deles se apro-
prisional feminino evidenciam sua impor- priam. As entrevistas evidenciam o papel
tância enquanto estratégia de sobrevivên- preponderante que as relações afetivas
cia emocional neste espaço e, consequen- têm na constituição da identidade das
temente, contribuem para a constituição mulheres, tanto no contexto intra muros,
da identidade destas mulheres. Assim, as como no extra muros. Os dados demons-
vinculações amistosas e amorosas entre tram que a vinculação amorosa dessas
as mulheres encarceradas, o “casamento” mulheres com traficantes contribui para a
que reproduz papéis hegemônicos de ma- inserção delas no tráfico de drogas, e esta
rido e mulher no cárcere, a homossexuali- participação, em relação à inserção mas-
dade e o fenômeno do “travestismo”, por culina em tal atividade, acontece de modo
exemplo, contribuem para o enfrentamen- muito particular. Após o encarceramento,
to do sofrimento advindo do abandono estereótipos afetivos passam a ser super-
familiar na condição de encarceramento. valorizados, como a idealização da figura
Não excluindo o protagonismo e a iniciati- materna e da maternidade em si. As re-
va pessoal das mulheres como motivado- lações amorosas entre as mulheres, que
res para um percurso criminoso feminino se estabelecem na prisão, são marcadas
(Barcinski, 2009a), o objetivo deste traba- pelos referenciais heterossexuais tradicio-
lho é investigar o lugar das relações afe- nalmente conhecidos, ou seja, há entre
tivas e as peculiaridades desse processo elas a exigência de uma figura masculina
num contexto intra e extra muros prisio- de atividade e uma feminina de passivida-
nal, bem como sua influência no percurso de. No caso das “sapatões” (mulheres que
de construção da identidade de mulheres se travestem de homens e adotam nomes
encarceradas. Em outras palavras, o foco masculinos), embora haja uma recusa ao
está na análise do papel dessas relações relacionamento afetivo com homens, es-
afetivas para a constituição da identida- sas mulheres acabam por se aproximar
de nesses dois contextos: a inserção e deles no modo como se comportam e

77
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

exercem um poder diferenciado sobre turavam as potencialidades políticas dos


as outras mulheres, poder este que está corpos, a fim de explorá-los como riqueza
atrelado à figura masculina. Diante do ex- econômica. Os saberes se articularam ao
posto, percebemos que a inserção de mu- Estado, produzindo modos de conceber a
lheres em atividades criminosas evidencia realidade, revestidos de veracidade. Essa
uma ruptura com os discursos hegemôni- articulação produziu efeitos significativos
cos sobre o tipo de comportamento pró- no modo de compreender os sujeitos,
prio do feminino, em especial no que se inserindo-os numa norma considerada
refere à capacidade de cometer crimes ti- ideal para experimentar a vida (Foucault,
dos como de dominância masculina, como 2009). O exercício da disciplina apropria-
a inserção no tráfico de drogas e o prota- va das forças sociais suas habilidades. O
gonismo dessas mulheres diante de seus objetivo principal era docilizar os corpos
atos – apesar de haver uma negociação aos dispositivos. O poder sobre a vida,
deste lugar com o da vitimização. Sendo através dos saberes, tinha como alvo criar
a prisão e a favela espaços marcados pela mecanismos reguladores que afetassem
violência, as mulheres encontram meios a população e os indivíduos, de maneira
para existir e até mesmo sobreviver nes- que se autorregulassem (Foucault, 2009).
ses contextos, na tentativa de conciliar As instituições, como família e prisão, as-
as marcas constitutivas que determinada sumiram funções pedagógicas. Na primei-
cultura convenciona como ser mulher e o ra, cabia ao homem disciplinar sua casa e,
envolvimento em atividades criminosas ti- na segunda, cabia ao Estado assumir esta
picamente masculinas. função, já que a família não conseguia
exercer com êxito seu processo de cons-
Palavras-chave: gênero, discurso, tituir-se como nuclear. Isso porque nem
criminalidade, relações afetivas, identidade todas as famílias conseguiram se organi-
Contato: Carolina Ferreira Barbosa, zar segundo os padrões de heterossexua-
cfbarbosa@id.uff.br / caroldoicm@gmail.com lidade e papéis bem delimitados dos seus
membros. As determinações de gênero
são produções de verdades construídas
LT07-1231 - CRIMINALIDADES E historicamente para a regulação dos cor-
MULHERES: OS DESAFIOS DO EXISTIR NA pos. Sobre isso Saffioti (2010) diz que “o
CONTEMPORANEIDADE Estado tem ratificado um ordenamento
Carolina Ferreira Barbosa - UFF/PURO social de gênero através de um conjunto
cfbarbosa@id.uff.br de leis que se pretendem objetivas e neu-
Milena Rezende de Moraes - UFF/PURO tras, porque parte da errônea premissa de
milena.psi@hotmail.com que a desigualdade de fato entre homens
e mulheres não existe na sociedade” (p.
A atualidade possui configurações sociais 445). Narvaz e Nardi (2007), a partir de
dos tempos anteriores, o que possibilita Foucault, dizem que não cabe “libertar”
dizer que hoje há fusão de valores mo- o indivíduo do Estado, mas dos indivíduos
dernos e contemporâneos convivendo na estarem liberados quanto às práticas indi-
sociedade. A Modernidade se caracteri- vidualizantes que as instituições estatais
zou pela criação de dispositivos que cap- promovem. Em seus estudos, Foucault

78
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

não atribuiu devida importância às lutas foram convidadas a contar suas histórias
das mulheres contra aos valores andro- de vida. O interesse maior foi em relação
cêntricos que historicamente pautavam às formas pelas quais elas (re) criavam
as relações humanas. Acreditamos que é suas histórias, considerando os lugares
estratégia estatal a segregação dos gru- que ocupavam nos seus grupos sociais
pos sociais, para despolitizá-los. Um olhar (intramuros e extramuros) e o lugar que
atencioso para as questões de gênero se esse grupo ocupava na sociedade global.
faz urgente para intervir nas práticas e As participantes foram avisadas do cará-
discursos que colocam as mulheres como ter voluntário de sua participação e pude-
“minorias sociais” ou minorias políticas. ram interromper a gravação ou mesmo a
Em relação à prisão, o que se tem visto é a entrevista em qualquer momento. Os da-
reclusão de certos grupos sociais despro- dos foram analisados a partir da Análise
vidos de riqueza econômica e que se per- Institucional do Discurso (Guirado, 2010).
cebem com pouca visibilidade e poder so- Considerando as participantes como “su-
cial (Ciarallo, 2009). O lugar ocupado pela jeitos institucionais” (Galvão e Serrano,
mulher criminosa é traçado nesse contex- 2007), buscamos compreender os lugares
to de estigmas socialmente construídos, que as mulheres ocupavam a partir de
associados à classe e, principalmente, ao regras socialmente construídas e o papel
gênero. As representações sociais acerca que as práticas institucionais possuíam na
do feminino constituem certos modos de construção da subjetividade. O sujeito é
se envolver afetivamente com o outro e objetivado por práticas institucionais, pois
com o trabalho. Essas representações são é regulado e normatizado a partir dos mo-
fortemente impulsionadas pelas práti- dos de funcionamento das instituições. O
cas prisionais, que acabam constituindo processo de subjetivação se refere à for-
formas de se existir pautadas no que se ma pela qual o sujeito apropria tais expe-
espera de uma mulher na sociedade em riências (Foucault, 2009). As entrevistas
geral. Este trabalho objetiva conhecer mostram que os lugares ocupados pelas
os lugares ocupados pelo feminino na mulheres criminosas são construídos a
prisão e fora da prisão no que se refere partir do conflito de conciliar os relacio-
aos contextos de trabalho e família, dian- namentos amorosos, familiares e o traba-
te da fusão de valores que caracterizam lho. Fora dos muros prisionais, os lugares
a contemporaneidade. Entendemos que ocupados não se restringem ao espaço
as relações nesses contextos são perme- privado do lar, mas são lugares marcados
adas por relações de poder e de tensão. A por estigmas sociais de gênero. Na prisão,
busca das mulheres por visibilidade e po- elas ocupam o lugar máximo de privação,
der é constante, sendo o protagonismo, a abandono, exclusão e humilhação social.
intencionalidade das ações das mulheres Sobre as perspectivas para a vida pós-
e a centralidade de gênero, norteadores -encarceramento, algumas mulheres não
de suas relações sociais (Barcinski, 2009). vêem possibilidade de construir seu lu-
No presente estudo foram entrevista- gar no mundo fora da ilegalidade. Outras
das cinco mulheres encarceradas em um cogitam a possibilidade de “sair da vida
presídio do Rio de Janeiro. As entrevistas do crime”, mesmo que isto signifique o
foram qualitativas, em que as mulheres exercício de menos poder social. Dentro

79
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da prisão, alguns fenômenos conferem cluindo, os adotivos – e por laços de con-


mais poder como a homossexualidade, o sangüinidade entre irmãos. (DURHAM,
trabalho devido ao bom comportamento 1983; LÉVI-STRAUSS, 1986 apud ROMA-
e o tipo de crime cometido. Fora da pri- NELLI, 2003, p. 249). Nos dias atuais, é
são, “ser mulher de traficante”, estar en- inegável que as constituições familiares
volvida no tráfico de drogas e exercer a estão em crise. Um desequilíbrio que não
maternidade são posições de prestígio no pode ser considerado patológico, mas sim
grupo social das encarceradas. O papel da um rearranjo frente às novas proposições
instituição prisional é de promover ativi- e atuais condições históricas e sócio-eco-
dades em que a mulher esteja adequada nômicas (ROMANELLI, 2000). A conhecida
aos papéis domésticos. Dentre as ativi- família nuclear, composta por pai, mãe e
dades e medidas tomadas, encontramos filhos, deixa de ser o modelo comum e vi-
atividades de artesanato, dinâmicas feitas gente no arcabouço social para dar lugar
por religiosos que incentivam a afetivida- a instituições familiares de diversas cons-
de e impedimentos para visitas íntimas tituições e dinâmicas de funcionamento
com os parceiros, por exemplo. Por fim, (NEVES, 2006), como famílias constituídas
as mulheres entrevistadas, marginaliza- por marido, esposa e filhos; aquelas cons-
das economicamente, constroem seus lu- tituídas por uniões estáveis, onde o enlace
gares ora se colocando como vítimas, ora matrimonial jurídico não existe; famílias
como protagonistas das relações sociais, matrifocais chefiadas por mulheres, com-
buscando sempre maior exercício do po- postas por mães e filhos; famílias amplia-
der. Esse poder pode ser exercido de for- das agregando parentes do lado materno
ma explícita, pela violência ou de maneira e/ou paterno; famílias recompostas, as
implícita, camuflada, constrangida. quais um parceiro ou ambos já possui ou
possuem filhos de união anterior e tam-
Palavras-chave: criminalidade, mulheres, bém famílias compostas por casais homo-
lugares sociais afetivas. No âmbito das relações homoa-
Contato: Carolina Ferreira Barbosa, UFF, fetivas, de acordo com o senso comum, os
cfbarbosa@id.uff.br / caroldoicm@gmail.com casais formados por homens possuiriam
um grande número de parceiros e seriam
infiéis ou inconstantes, não raro com his-
LT07-1414 - VIOLÊNCIA E tórico de violência entre os parceiros. Já
DESENVOLVIMENTO SUBJETIVO EM nos casais do sexo feminino, por vários
RELAÇÃO HOMOAFETIVA FEMININA fatores, entre eles os fisiológicos, as mu-
Carlos Felipe de Freitas Rossi - UNICESP lheres supostamente baseariam suas re-
lações no afeto, respeito, cumplicidade
O conceito de família tem sido utilizado e instinto materno, sendo isentadas da
para dar referência à unidade de repro- violência relacional. Entretanto, em qual-
dução biológica e social, criada por laços quer relacionamento, hetero ou homoa-
consangüíneos ou de aliança, instituído fetivo, masculino ou feminino, existem ca-
pelo casamento e/ou pelas uniões con- sos de violência real, física e/ou simbólica
sensuais, por vínculo de descendência que constituem fatores que determinam
entre pais e filhos – biológicos ou não, in- o curso do desenvolvimento da subjetivi-

80
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade destes atores (ARIÉS, 1981). O obje- caberia àquela sustentá-la na união. Era
to deste trabalho é apresentar um estudo tratada como inferior e incapaz de prover
de caso sobre violência entre um casal suas próprias necessidades. Você é burra,
homoafetivo do sexo feminino. O fato das pobre, incompetente e incapaz de apren-
uniões estáveis entre pessoas do mesmo der qualquer coisa [...] ela tem 3 carros,
sexo ainda não serem plenamente reco- eu tinha que andar de ônibus porque ela
nhecidas, ainda que já legalizadas, pode não me deixava pegar nenhum. Era eu
fazer com que casais vivam à margem que dirigia sempre, mas só podia dirigir se
da sociedade e com que o preconceito e fosse pra sair com ela do lado (sic). A des-
a falta de informações de parcela da so- peito do cenário de violência, V não ten-
ciedade incitem estes membros a perma- tou estudar ou trabalhar por acreditar-se
necerem escondidos como casais, muitas incapaz para qualquer atividade exceto as
vezes, obturando violências. O caso em obrigações de casa. Os atos de violência a
foco é o de Vitória (V), residente de uma que era exposta apareceram como inibi-
capital brasileira, sexo feminino, 38 anos dores da construção de seu autoconceito
de idade, divorciada, desempregada, sem e tornar-se sujeito em desenvolvimento
filhos. Caçula de três irmãs, aos 18 anos constituía um desafio quase impossível
perdeu o pai e até seus 23 anos não pode e desnecessário, desvelando o quanto
casar-se, pois cuidava da mãe. Seis meses M subtraia qualidades e capacidades de
depois do falecimento da genitora, após V, mantendo uma relação de domina-
7 anos de namoro, casou-se com José (J), ção, de provedora e detentora da razão.
negro, 5 anos mais velho que ela, com O relacionamento ruiu. Com o término
quem viveu junto por 9 anos. Segundo da relação, V procurou ajuda psicológica.
seu relato, nunca precisou (não lhe foi Encontrava-se em estado de sofrimento
permitido) trabalhar, pois J era muito ciu- profundo, queixando-se de depressão,
mento e não me deixava sair de casa para falta de vontade de viver e sensação de
trabalhar ou estudar (sic). Ainda casada, culpa, além da preocupação do que os ou-
conheceu Maria (M), 63 anos, funcionária tros vão pensar de mim por ter terminado
pública aposentada, de alto poder aquisi- com ela (sic). Por ser constituída através
tivo, integrante de um círculo de amigas das relações sociais, a subjetividade é en-
homossexuais, todas com elevado poder tendida como uma realidade do ser hu-
sócio-econômico. M incitou V a separar- mano; como um sistema de significações
-se de J e, apesar da diferença de idade, e sentidos constituídos nas relações que
mantiveram um relacionamento estável o indivíduo estabelece em seus mais va-
durante 6 anos, morando na casa de M. riados estágios de desenvolvimento (REY,
V relatou que, durante o relacionamen- 1999). Qualquer forma de violência pode
to, M a tratava com desdém, utilizado modificar, interferir, inibir, prejudicar ou
expressões ofensivas e menosprezando até evitar o processo de desenvolvimen-
todo esforço de desenvolvimento pesso- to da subjetividade, que está inserida
al e/ou profissional: você é um resto de em um contexto histórico sócio-cultural
preto, não sabe fazer nada direito (sic). único; o sujeito se torna um ente datado,
À semelhança de J, M afirmava que V histórico. V busca a psicoterapia e inicia a
não precisava trabalhar ou estudar, pois ressignificação de ser e estar no mundo.

81
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

No processo, começa a compreender que LT01-853 - A CRIMINALIDADE


a construção subjetiva é um dado social COMO RECURSO PARA A SAÍDA DA
e que cada parceiro tem seu objetivo na INVISIBILIDADE FEMININA
trama relacional. A descoberta de seu Mariana Barcinski - PUC/RS
valor e papel social tem possibilitado o mariana.barcinski@pucrs.br
enfrentamento da posição autocrática e
final do outro. Paulatinamente, vem su- O ingresso de jovens de camadas mais
perando dificuldades, estigmas e infanti- pobres brasileiras na rede do tráfico de
lização a ela imputados. V terminou seu drogas como estratégia de fuga da invisi-
curso técnico, planeja cursar um curso su- bilidade social e da falta do sentimento de
perior e aguarda ser contratada por uma pertença que marcam suas vidas tem sido
empresa onde já estagia. A violência pode discutido na literatura (Cruz Neto, Moreira,
engendrar formas limitadoras do desen- & Sucena, 2001; Pereira, 2009). Excluídos
volvimento subjetivo e da constituição do de um sistema social que não reconhece
sujeito como pessoa. Quando velada, não sua existência no cotidiano ou em suas
deixa marcas visíveis no corpo da vítima, necessidades básicas de proteção, educa-
mas apresenta severas seqüelas no apa- ção e trabalho, esses jovens optariam por
relho psíquico, podendo agravar-se, des- atividades criminosas para se tornarem
cambar-se para somatização de sintomas visíveis. Causar medo nas pessoas, através
ou para o processo de violência física com da associação com facções criminosas e da
efeito em cascata. Por estarem “fora dos ostentação de armas ou tornar-se parte
padrões sociais”, muitos casos de violên- das estatísticas acerca da violência urbana
cia em casais homoafetivos não são no- são formas de adquirir visibilidade, mesmo
tificados, pela dificuldade de apresentar que carregada de conotações e sentimen-
provas da violência simbólica. Nas agres- tos negativos que, em última instância,
sões físicas, a vítima passa pelo constran- servem para aprofundar a realidade de
gimento exigido pela burocracia legal de exclusão social experimentada por esses
abertura de inquérito e buscas de provas jovens. Quando tratamos da participação
para as investigações. Mais um golpe de feminina no tráfico de drogas, a questão
violência é desferido contra a vítima, que da invisibilidade como motivadora de com-
poderá sentir-se envergonhada, exposta, portamentos criminosos ganha contornos
humilhada, quando almejava proteger-se peculiares. Como o tráfico é, indiscutivel-
através dos métodos legais. Submeter-se, mente, reconhecido como uma atividade
paradoxalmente, configura ato de prote- masculina, participar dele dá às mulheres
ção. Este estudo mostra que a violência e traficantes a possibilidade de se distinguir
a opressão, embora sirvam de elemento de outras mulheres. Elas se tornam visíveis
limitador do desenvolvimento, dialeti- (diferentes de outras) ao desempenharem
camente podem forjar sua superação e tarefas reconhecidas como masculinas. A
engendrar papel catalizador no desenvol- saída da invisibilidade, no caso das mulhe-
vimento, como no caso de V., realçando res envolvidas no tráfico, portanto, se dá
capacidades e potencialidades. primordialmente pela diferenciação, pela
afirmação de um poder antes exclusivo
dos homens e pelo reconhecimento exter-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no deste poder. O objetivo deste trabalho, violentos (Walker, 2003). Sob esta mesma
portanto, é compreender como mulheres perspectiva, Goetting (1988) sugere que a
traficantes definem a sua participação na falta de atenção em relação aos crimes fe-
rede do tráfico de drogas e de que forma mininos se deve, em grande parte, ao fato
a descrição desta participação – desde a de as expectativas sociais sobre os papéis
motivação para a entrada até os papéis de- desempenhados pelas mulheres legitima-
sempenhados na atividade – está permea- rem a posição das mesmas como vítimas,
da pela tentativa de saída da invisibilidade mas nunca como perpetradoras de vio-
que marca determinado grupo socialmen- lência. Além das características associadas
te marginalizado, especialmente as mu- ao feminino servirem teoricamente como
lheres que o compõem. O engajamento elementos protetivos à prática criminosa,
de mulheres em atividades criminosas, a socialização feminina, com sua ênfase no
notadamente no tráfico de drogas, é des- espaço privado como domínio privilegiado
crito de maneira geral na literatura como de atuação das mulheres, seria a origem
subordinado à participação dos homens da participação subalterna das mulheres
nessas mesmas atividades. Sem ignorar o em atividades ilícitas e da característica
fato de que parecem, de fato, ser os ho- não violenta dos crimes femininos. A invi-
mens os maiores motivadores para a en- sibilidade das mulheres nas teorias acerca
trada das mulheres na rede do tráfico de da criminalidade seria, então, justificada
drogas (Zaluar, 1993), a ênfase quase que pelo caráter atípico dos crimes por elas
exclusiva na criminalidade feminina como cometidos. Através da análise discursiva
decorrente de suas relações afetivas retira sistêmica (Falmagne, 2004) de entrevistas
o protagonismo e reforça a invisibilidade com duas mulheres com uma história pas-
feminina na prática de crimes violentos e sada de envolvimento no tráfico de drogas,
atividades ilícitas. Ao ignorar as especifici- o presente trabalho discute a forma como
dades dos crimes cometidos por mulheres, o envolvimento das participantes na ativi-
a própria literatura atesta ou reforça a in- dade representou uma estratégia de saída
visibilidade feminina no que se refere aos da invisibilidade que marca a existência
fenômenos sociais da violência e da trans- de mulheres nas favelas. Através do de-
gressão. A partir de uma perspectiva de sempenho de tarefas reconhecidamente
gênero podemos compreender que, para masculinas, como carregar armas, entrar
além da reduzida relevância social atribu- em confrontos armados com a polícia e
ída à criminalidade feminina, a ausência com facções criminosas rivais e gerenciar
de estudos sobre mulheres envolvidas em pontos de venda de drogas em suas co-
atividades criminosas se deve também ao munidades, tais mulheres marcaram uma
fato de a violência, da agressividade e da distância significativa em relação a outras
transgressão não estarem previstas nos mulheres ao seu redor. Tal diferenciação,
discursos acerca do feminino. As explica- e especialmente o reconhecimento social
ções tradicionais para a diferença entre do caráter atípico de suas atividades como
as taxas de criminalidade feminina e mas- traficantes, representou na história de vida
culina baseiam-se na imagem da mulher dessas duas mulheres a saída (mesmo que
como naturalmente dócil, passiva e menos temporária) da invisibilidade feminina na
suscetível à prática de comportamentos favela. Os dados analisados no presente

83
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

trabalho refletirão as especificidades da para a análise dos estudos sobre trabalho,


participação feminina no tráfico de drogas poder e gênero, sob a ótica da psicologia
e a forma como as mulheres traficantes do desenvolvimento? Primeiro ele revela
constroem esta participação primordial- e desvela as especificidades da atividade
mente em oposição a outras mulheres laboral e seus aspectos psicossociais: gru-
ao seu redor. As referências ao poder e pos, organizações e comunidades em situ-
ao status adquiridos como traficantes ga- ações do dia-a-dia, sem separar indivíduo
nham significado especial quando tratadas e coletividade, afeto e razão, processos
sob uma perspectiva de gênero, se enten- inconscientes e processos sociais. O seu
dermos a violência e a transgressão como enredo explicita duas questões centrais
prerrogativas masculinas. O discurso das para este trabalho: o tácito e o explícito
participantes, portanto, reflete o investi- nas relações de poder dentro de uma or-
mento das mesmas em constituírem as ganização, que Fávero (2010) discute como
suas identidades através da marcação de políticas organizacionais e que dizem res-
elementos que distinguem as suas traje- peito ao processo cotidiano por meio do
tórias (e o reconhecimento externo desta qual as abstrações sobre poder e organiza-
distinção) da história de outras mulheres, ção são vividas e ainda os processos mas-
em geral. carados destas políticas, nas quais estão
implicadas os processos gendrados e são
Palavras-chave: gênero, criminalidade, intimamente relacionadas à masculinida-
invisibilidade social. de competitiva que age nos meios de tra-
balho. Tais questões inspiraram o presente
trabalho que analisa artigos publicados em
LT01-980 – RELAÇÕES DE PODER E periódicos nacionais sobre as relações de
GÊNERO NO MUNDO DO TRABALHO: poder e gênero no mundo do trabalho.
APORTES TEÓRICO-CONCEITUAIS2 Consultamos as bases de dados do Scien-
Vânia Maria Lopes Venâncio - UnB tific Electronic Library Online (Scielo) e do
vmvenancio@gmail.com Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PeP-
Maria Helena Fávero - UnB sic). Elegemos os seguintes critérios: (a) a
faveromh@unb.br articulação entre os descritores trabalho,
poder e gênero em todos os índices e em
O filme O Diabo veste Prada (2006), da pares; b) sem demarcação de período e de
obra de Lauren Weisberger (2003), explo- tempo e (c) autoria de pesquisador brasi-
ra o mundo do trabalho de uma revista de leiro. Encontramos 39 artigos, publicados
moda liderado por uma mulher autoritá- em 24 revistas, de 1998 a 2010, sendo 31
ria, ambiciosa e de uma ética singular no do Scielo e 8 do Pepsic. A pesquisa com-
trato das pessoas e dos negócios. Quais preendeu três démarches: identificação
aspectos deste filme podem contribuir pela internet, leitura e análise dos artigos.
Nesta última sistematizamos a análise em
2
Este estudo foi desenvolvido no âmbito da disciplina Psi-
tabelas, como proposto por Fávero e Souza
cologia do Desenvolvimento Adulto, do Programa de Pós- (2001), nas quais a primeira coluna forne-
-Graduação em Processo de Desenvolvimento Humano ce um contador relativo às referências; a
e Saúde, da Universidade de Brasília, sob a docência da
Profa. Dra. Maria Helena Fávero. segunda apresenta a referência completa

84
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do estudo; a terceira, o país de origem do e desigualdade entre mulheres e homens,


estudo; a quarta identifica o referencial agravados quando entram os fatores de
teórico; a quinta identifica os objetivos classe social, etnia e raça; a práxis nas or-
do estudo; a sexta, o método e a sétima, ganizações e nas relações privadas e públi-
os principais resultados. Identificamos di- cas apresentam aspectos que corroboram
ferentes abordagens em diferentes áreas a tese da situação desigual da mulher nas
do conhecimento: da Psicologia, da Socio- esferas sociais, econômicas, políticas e fi-
logia, da Educação, da Administração e da losóficas; algumas categorias profissionais
Saúde. Entendemos que tal fato ressalta a foram ressaltadas com base nessa ques-
necessidade de uma visão multidisciplinar tão, como os profissionais da área de en-
na análise da complexa teia de significados fermagem; grupos sociais informais foram
que a articulação dos temas trabalho, po- sujeitos de vários estudos de casos como
der e gênero suscita, assim como revela a mulheres indígenas, mulheres em situação
necessidade de se intensificar a produção prisional e travestis. Temas particulares
científica sobre esta articulação, amplian- também foram evidenciados: as políticas
do o escopo de grupos sociais, incluindo públicas aparecem no questionamento do
diferentes categorias profissionais, consi- Programa Bolsa Escola, no aparato legal à
derando a Psicologia do Desenvolvimen- questão da violência doméstica, na revisão
to do Adulto, que, como ressalta Fávero dos programas de saúde coletiva e na ade-
(2007), “permaneceu muito tempo como quação da legislação trabalhista. Em suma,
um espaço vazio entre o desenvolvimento os resultados dessa pesquisa bibliográfica
do adolescente e o do idoso” (p.194). Nos- apresentam importantes questões para
sa análise bibliográfica evidenciou que: reflexão: 1. A necessidade de incremento
a produção científica nacional apresenta teórico-metodológico que fundamente os
publicações a partir de 1998 e se intensi- estudos para que se considerem efetiva-
fica a partir de 2007; em sua maioria, os mente os temas trabalho, gênero e poder,
artigos discutem a tríade trabalho-poder- tomados articuladamente; 2. Tal incre-
-gênero, articulando os três descritores, mento deve considerar o aporte da psico-
mas prevalecendo a relevância em um dos logia do desenvolvimento e em particular
temas, com o predomínio do tema traba- da psicologia da vida adulta, considerando
lho, seguido de gênero e em menor monta os temas em questão do ponto de vista do
a questão do poder; a complexidade do ciclo de vida; 3. Que se assuma o desafio
mundo do trabalho se revela e se desvela da Psicologia crítica e reflexiva na conside-
em relações de poder gendradas que con- ração do referido aporte, isto é, se consi-
tribuem para condições desiguais entre dere os chamados vieses culturais e políti-
trabalhadores e trabalhadoras, como nos cos não como um problema metodológico,
revela a análise de Anzorena (2008); traba- mas sim, por meio dos quais se considere
lho, poder e gênero também estão configu- as dinâmicas do gênero (Jill Morawiski,
rados de acordo com algumas abordagens 1997, 2005). Esta é a nossa pretensão em
de referência; nas abordagens que tratam futuros estudos.
da liderança e gestão, em sentido lato, as
condições materiais da produção apare- Palavras-chave: trabalho; poder; relações de
cem como justificadoras da discriminação gênero.

85
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-1190 - "OS MENINOS ESTÃO universitários, como nas concepções de


PRONTOS PARA A MATEMÁTICA"; professores e pais de alunos. Os dados
"OS MENINOS SÃO INTELIGENTES POR destes estudos foram confirmados em ou-
CAUSA DA GENÉTICA? O EMBATE ENTRE tro estudo desenvolvido em duas fases: 1/
AS ADOLESCENTES, OS ADOLESCENTES E entrevista com professores de matemáti-
OS PROFESSORES DE MATEMÁTICA.” ca que atuam do 6º ao 9º ano do Ensino
Francisca Zuita Alves Paiva - FAJESU/DF Fundamental, todos de uma mesma es-
zu.alves@gmail.com cola da Rede Particular de Ensino de uma
Maria Helena Fávero - UnB cidade satélite do DF. As entrevistas foram
faveromh@unb.br. semiestruturadas em 4 eixos – o desem-
penho de alunas e alunos em matemática;
Embora tenha havido nas últimas décadas as possíveis explicações para as possíveis
um aumento significativa no número de diferenças de desempenho; gênero e área
mulheres na Educação Básica e no Ensino do conhecimento. 2/ participaram 8 alu-
Superior, as pesquisa apontam que as mu- nos do sexo masculino, entre 14 e 15 anos
lheres superaram os homens em escolari- de idade, do 9º ano do Ensino Fundamen-
dade, estão em maior número nas áreas tal, todos de uma mesma escola da Rede
de humanas e biológicas e os homens es- Particular de Ensino de uma cidade satéli-
tão em maior número nas áreas de exa- te do DF, a quem propusemos a discussão:
tas. Evidencia-se ainda que esta tendência “na opinião de vocês quem se sai melhor
se mantém nos cursos de pós-graduação em matemática, os meninos ou as meni-
(Godinho, 2005; Ristoff, 2006; Chamom, nas?” A análise da discussão evidenciou
2005). Por isto mesmo, Fávero (2010 a) dados contraditórios com os das professo-
enfatiza uma das linhas de pesquisa sobre ras e professores. Segundo os estudantes:
a relação entre gênero e socialização, fo- as meninas são mais inteligentes na mate-
cando a diferença que persiste nos dados mática; elas são mais maduras; elas estu-
dos estudos nacionais e internacionais dam mais; aprendem com mais facilidade;
sobre a entrada de mulheres na área de a maioria dos meninos só quer “vadiar”;
ciências e de tecnologias em comparação os meninos têm ter alguém “empurran-
à entrada e permanência dos homens. Um do”, senão “a gente não aprende não”.
dos aspectos ressaltados por esta autora Para comprovar sua posição o grupo for-
diz respeito ao ensino de matemática e neceu dados: na sua classe de 35 alunos,
a natureza da mediação do conhecimen- 15 do sexo feminino e 20 do sexo masculi-
to na instituição escolar. Fávero (2010 b) no, 8 alunas se destacam em matemática
defende a tese segundo a qual, a institui- contra 2 alunos. O estudo apontou indícios
ção educacional mantém a ideologia do sobre o chamado “currículo oculto das es-
patriarcado na sua forma contemporânea, colas”, em referência aos valores sociais
por meio da mediação significados so- gendrados que permeiam as informações,
bre papéis de gênero em articulação aos os procedimentos e as próprias atividades
significados sobre as diferentes áreas do escolares e que se constituem em peças
conhecimento. Assim, Fávero & Salgado fundamentais da socialização. Ficou evi-
(2006; 2007) evidenciaram tal articula- denciado que os professores e professoras
ção tanto nas concepções de estudantes têm expectativas diferentes para meninos

86
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e meninas e isso ainda permanece como as alunas discordaram dos professores;


um dado particularmente presente no acordaram que os alunos do sexo mascu-
caso do ensino da matemática (Paiva e Fá- lino não são melhores em matemática; ar-
vero, 2010). E as meninas o que será que gumentaram que a sociedade é machista e
pensam sobre estas expectativas? Para desqualificam a inteligência feminina. Ex:
responder a esta questão desenvolvemos “então eles querem dizer que os meninos
o presente estudo, que se focou nesta são inteligentes por causa da genética? A
questão por meio da discussão entre ado- inteligência dos meninos está no DNA?”.
lescentes do sexo feminino. Constituímos Os resultados da segunda discussão evi-
quatro grupos focais: dois de seis alunas denciaram que: as alunas acordaram que
de sexto ano cada (um de uma escola da os alunos não são bons em matemática
Rede de Ensino Público do DF e outro de porque eles só pensam em “curtir a vida
uma escola da Rede Particular de Ensino e deixam os estudos para depois; os me-
do DF); e dois grupos de seis alunas do 3º ninos só pensam em som”; alegaram que
ano do ensino médio cada (um de uma apesar disto, os homens ocupam melho-
escola da Rede de Ensino Público do DF e res posições no mercado de trabalho com
outro de uma escola da Rede Particular de melhores salários: “às vezes as mulheres
Ensino do DF). A todos os grupos foi pro- fazem o mesmo trabalho do homem, mas
posto para discussão duas frases obtidas recebem um salário menor”. Quanto as
de estudo anterior prescrito acima. A pri- suas escolhas profissionais evidenciou-se
meira foi obtida junto a professores e pro- a opção prioritária por áreas de humanas
fessoras de matemática da Rede Particu- tais como: Nutrição, Educação, Medicina,
lar de Ensino do DF: “As meninas vão bem Biologia, Arquitetura e outras. Podemos
em matemática porque se esforçam; os dizer que nossos dados apresentam uma
meninos estão prontos para o raciocínio questão particular que necessita de novos
matemático”. A segunda foi obtida junto estudos: apesar de partilharem a concep-
a estudantes do sexo feminino do 9º ano ção de que os alunos do sexo masculino
do Ensino Fundamental de uma escola da não são melhores em matemática, as ado-
Rede Particular de Ensino do DF: “As me- lescentes declaram opções profissionais
ninas são mais inteligentes em matemáti- por áreas tidas como próprias aos papéis
ca; elas são mais maduras; elas estudam femininos. Assim concluímos sobre a ne-
mais; os meninos só querem vadiar”. Cada cessidade, como outras autoras já salien-
frase foi apresentada separadamente, se- taram (Abramo, 2004; Anzorena, 2008;
guida do convite a sua discussão. Após o Arnot, 2006; Fávero, 2010 a; 2010 b). de
término da discussão da primeira frase foi se desenvolver pesquisas que fundamen-
apresentado a segunda e feito um novo tem ações para promover a mudança nas
convite a discussão. Ao término da discus- concepções sobre a relação entre gênero
são foi proposto as alunas que relatassem e capacidade intelectual e a relação entre
suas escolhas profissionais. As discussões gênero e escolha profissional.
nos grupos foram registradas em vídeo e
os atos da fala foram tomados como uni- Palavras-chave: gênero, ciência e matemática;
dades de análise. Quanto a primeira dis- concepções sobre a matemática; escolarização
cussão, os resultados evidenciaram que: e socialização gendradas.

87
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

DIA 13/11 - Domingo taram um projeto de intervenção a ser


implantado nos seus locais de atuação, a
partir das demandas percebidas no seu
10h30-12h cotidiano. A capacitação foi realizada com
base em aulas expositivas dialogadas, tra-
balhos em grupos e discussão de filmes.
MR LT06 - Mesa Redonda Além disso, contou com a realização de
um pré-teste, avaliação de cada módulo
Convidada (Direitos Humanos, Violência e Mediação
de Conflitos) e um pós-teste, ao final dos
três módulos da capacitação. Os trabalhos
MR LT06-973 - DESCRIÇÃO E AVALIAÇÃO que serão apresentados dizem respeito
DE UMA CAPACITAÇÃO PARA aos dados quantitativos do pré-teste e aos
PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO dados qualitativos obtidos nos diários de
À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO campo da equipe que participou da pri-
INTERIOR DO RS meira edição do Pronex. A mesa será com-
Normanda Araujo de Morais - UFRGS posta de três trabalhos. O primeiro deles
normandaaraujo@gmail.com buscará descrever a capacitação que foi
realizada (organização dos temas, crono-
O objetivo desta Mesa Redonda é descre- grama, caracterização dos participantes),
ver e avaliar o processo de implantação assim como apresentar os primeiros da-
de uma tecnologia social, proposta pelo dos qualitativos que resultaram da mes-
Programa de Apoio a Núcleos de Excelên- ma (impressões da equipe sobre o envol-
cia – PRONEX, realizado em um município vimento dos participantes, temas centrais,
do noroeste do RS. Trata-se de um pro- fragilidades identificadas na rede, etc). O
jeto de pesquisa multicêntrica, realizada segundo trabalho buscará descrever os
com a parceria de 10 Universidades, que índices de esgotamento profissional e de
tem como objetivo implementar e avaliar bem-estar no trabalho, apontados pelos
uma proposta de capacitação de profis- participantes no momento do pré-teste.
sionais das áreas da saúde, da educação Por fim, o terceiro trabalho buscará apre-
e da rede de proteção de crianças e ado- sentar, também com base em dados quan-
lescentes nas seguintes temáticas: direi- titativos do pré-teste, os principais valores
tos humanos, violência e mediação de que têm embasado a prática desses pro-
conflitos. O processo de capacitação teve fissionais, bem como a sua percepção so-
a duração de 30 horas e trabalhou os se- bre como se sentem desde que começa-
guintes temas: direitos das crianças e de ram a trabalhar com essa população. Os
adolescentes, mulheres e minorias étni- dados aqui avaliados dizem respeito aos
cas e sociais; maus-tratos contra crianças; 30 participantes que responderam ao pré-
consequências psicológicas da violência; -teste, sendo a maioria do sexo feminino
fatores de risco e de proteção; resiliência; (n=28; 93,3%) e com média de idade de 38
comportamento infrator; uso de drogas anos (DP=10,93). A apresentação do con-
na adolescência e mediação de conflitos. junto de trabalhos permite estabelecer os
Além disso, ao final, os participantes mon- pontos centrais dessa primeira edição do

88
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

PRONEX, quais sejam: a relevância de pro- ao longo dos módulos de trabalho. Este
postas de capacitações como essa, espe- trabalho busca descrever dados iniciais,
cialmente, para trabalhadores do interior referentes a uma proposta de intervenção
do estado, para quem o acesso a cursos e junto a uma amostra de 30 profissionais da
capacitações é mais limitado; a relevância rede de proteção às crianças e adolescen-
das estratégias de avaliação do impacto tes vítimas de violência da Região Noroes-
e do processo da tecnologia proposta; e, te do RS. Especificamente, busca-se com
por fim, o importante papel multiplicador esse trabalho: descrever a capacitação
que estratégias desse tipo podem ter, ao realizada nessa primeira etapa do PRONEX
criarem um espaço nos quais os profis- e apresentar dados qualitativos acerca do
sionais da rede local podem se encontrar, processo de avaliação da mesma. A inter-
discutir temas relevantes ao seu cotidiano venção foi planejada a partir de três mó-
e identificar estratégias que venham a for- dulos, os quais contemplam os temas dos
talecer a rede. direitos de crianças e adolescentes, mulhe-
res e minorias étnicas e sociais (6 horas);
maus-tratos contra crianças, consequên-
DESCREVENDO A CAPACITAÇÃO PARA cias da violência, fatores de risco e de pro-
PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO teção, resiliência, comportamento infrator
À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO e uso de drogas na adolescência (16 ho-
INTERIOR DO RS ras); bem como mediação de conflitos (4
Jeane Lessinger Borges - SETREM horas). Além disso, um turno de trabalho
jeanepsico@yahoo.com.br (4 horas) foi dedicado à montagem de um
Normanda Araujo de Morais - UFRGS projeto de intervenção pelos participan-
normandaaraujo@gmail.com tes, a partir das demandas percebidas no
seu cotidiano. A intervenção totalizou 30
Trata-se de um recorte de um projeto de horas, e buscou-se avaliar a efetividade
pesquisa multicêntrica, sobre a efetividade desta através de um levantamento pré e
de uma tecnologia social junto a 1.200 pro- pós-teste. Além disso, foram adotados di-
fissionais da rede de proteção no estado ários de campo para o registro de dados
do Rio Grande do Sul (RS), realizado atra- qualitativos, os quais foram elaborados
vés do Programa de Apoio a Núcleos de Ex- pela equipe de psicólogas palestrantes e
celência (PRONEX). O objetivo da pesquisa bolsistas de iniciação científica. Os partici-
mais ampla é o de capacitar profissionais pantes são, predominantemente, do sexo
das áreas da saúde, da educação e da rede feminino (93,3%), sendo que 40% têm en-
de proteção de crianças e adolescentes sino superior completo e 46,7% têm pós-
para a identificação de indicadores de vio- -graduação. A idade média da amostra era
lência, futuros encaminhamentos e acesso de 38 anos (DP=10,93). Os participantes
à rede de atendimento, bem como avaliar desta amostra incluem profissionais da
o impacto e o processo da capacitação. Psicologia (30%), do Serviço Social (23,3%),
Visa-se que, ao final da intervenção, os da Enfermagem (26,7%) e da Educação
participantes possam instrumentalizar-se (15,3%), representantes de cinco muni-
e serem multiplicadores dos conhecimen- cípios da referida região. A renda mensal
tos adquiridos e da vivência desenvolvida variava de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = R$

89
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

2.004,90 reais). O principal vínculo de tra- e o fortalecimento do trabalho em rede.


balho foi celetista e concursado (ambos Verificou-se que tais projetos abordaram
com 26,7%; n = 8), seguido de estatutário tanto intervenções primárias quanto ter-
(13,3%; n = 7). O tempo médio de trabalho ciárias junto às crianças e suas famílias, a
na ocupação atual variava entre 1 mês e 30 partir de um viés interdisciplinar. Nesse
anos (M = 7,3 anos) e o tempo médio de sentido, de um modo geral, os resultados
atuação profissional com o fenômeno da encontrados nesta etapa inicial do PRO-
violência contra criança era de 4 anos (DP= NEX contemplam os objetivos da proposta
4,0). Em relação aos dados qualitativos, os mais ampla desta pesquisa. O recorte pro-
resultados preliminares desta intervenção posto neste trabalho problematiza o traba-
apontam: (a) a satisfação dos participan- lho que vem sendo desenvolvido na rede
tes com os temas abordados, sobretudo, de proteção à criança vítima de violência,
com temáticas como resiliência e Psicolo- apontando suas lacunas e possibilidades,
gia Positiva, vistos pela primeira vez pela num grupo de profissionais do interior do
maioria deles; (b) a grande participação e RS. Os resultados encontrados podem ofe-
motivação dos presentes no processo de recer subsídios para políticas públicas no
capacitação; (c) a oportunidade criada na atendimento a crianças e suas famílias ex-
capacitação da rede local de proteção ser postas a situações de violência. Além dis-
avaliada e discutida, inclusive, apontando so, aponta-se a necessidade de uma maior
suas fragilidades. Dessa forma, ficou visível articulação entre os serviços da rede de
a falta de uma rede de proteção articulada, proteção, em prol de uma maior integrali-
ou seja, observou-se a existência de vários dade das ações e de um atendimento mais
serviços da rede de proteção na cidade, humanizado.
porém, com atuações individualizadas;
(d) predomínio de encaminhamentos da Palavras-chave: rede de proteção, criança e
rede para os serviços de assistência so- adolescente, capacitação.
cial especializados (por exemplo, CREASs),
como sendo o serviço de referência para
as situações de violência contra a criança; NÍVEIS DE BEM-ESTAR E SÍNDROME
(e) a alta rotatividade dos profissionais nos DE BURNOUT EM PROFISSIONAIS
serviços da rede, sendo que os participan- DA REDE DE PROTEÇÃO A CRIANÇA E
tes demonstraram perceber a perda do ADOLESCENTE DO INTERIOR DO RIO
vínculo do usuário com a equipe e com o GRANDE DO SUL
profissional como sendo uma dificuldade Juliana das Neves Nóbrega - UFRGS
no trabalho cotidiano em seus serviços de julli.nobrega@gmail.com
origem; e (f) a necessidade de formação Clarissa Pinto Pizarro de Freitas - UFRGS
permanente para os profissionais que atu- clappdf@gmail.com
am na rede de proteção. Os dados aponta- Normanda Araujo de Morais - UFRGS
ram, ainda, que a capacitação possibilitou normandaaraujo@gmail.com
um momento para a elaboração de proje- Bruno Figueiredo Damásio - UFRGS
tos de intervenção sobre diferentes temas, brunofd.psi@gmail.com
envolvendo infância e adolescência em Silvia Helena Koller - UFRGS
situação de vulnerabilidade psicossocial silvia.koller@gmail.com

90
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Este trabalho é um recorte do projeto bem-estar e síndrome de burnout em pro-


“Avaliação de uma tecnologia social apli- fissionais da rede de proteção à criança e
cada para a capacitação de profissionais ao adolescente, de cinco municípios do
da área da educação, saúde e da rede de interior do Rio Grande do Sul. Participaram
proteção a crianças e adolescentes sobre 30 profissionais, dos quais 28 mulheres e
direitos humanos, violência e mediação de dois homens. A média de idade foi de 38
conflitos”, o qual foi direcionado aos pro- anos (DP= 10,9). A maioria era de religião
fissionais da rede de proteção à criança e católica (n=24; 80%), possuía nível superior
ao adolescente, do estado do Rio Grande (n=14; 46,7%) ou algum tipo de pós-gradu-
do Sul. Discutir-se-ão dados referentes à ação (n=12; 40%). A área predominante de
primeira etapa da capacitação, com profis- formação foi a Psicologia (n=9; 30%), segui-
sionais de cinco municípios da região no- da pelo Serviço Social (n=8; 26,7%) e pela
roeste do Rio Grande do Sul. A satisfação Enfermagem (n=5; 16,7%), e a renda men-
que as pessoas têm com o seu trabalho sal variou de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = R$
pode ser explicada, em parte, pelos seus 2.004,90 reais). Quanto ao vínculo de tra-
níveis de bem-estar no trabalho, sendo balho, os principais foram celetistas e con-
tal indicador uma importante ferramenta cursados (ambos os grupos com 26,7%; n =
para avaliar o desempenho ocupacional 8), seguido de estatutários (13,3%; n = 7).
e o comprometimento organizacional. O O tempo médio de trabalho na ocupação
bem-estar é um construto amplo, o qual atual variou de 1 mês a 30 anos (M = 7,3
tem sido associado à felicidade, satisfação, anos). Os instrumentos utilizados foram a
afetos positivos e avaliação subjetiva de Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho
qualidade de vida. Quando vinculado ao e Maslach Burnout Inventory (MBI). A pri-
trabalho, o bem-estar torna-se útil à me- meira avalia os níveis de bem-estar no tra-
dida que expõe a não equivalência entre balho, por meio da subescala de afetos po-
a satisfação e insatisfação, demonstrando sitivos e da subescala de afetos negativos; o
que uma não está diretamente vinculada à MBI investiga os níveis de burnout através
outra. Associado à insatisfação no ambien- das três escalas: exaustão emocional, des-
te ocupacional, identifica-se o burnout, ou personalização e realização profissional.
síndrome do esgotamento profissional. Os dados foram analisados por meio de es-
Essa se caracteriza, entre outras coisas, tatísticas descritivas e da correlação de Pe-
pela predominância de sintomas emocio- arson. Os valores do alpha de cronbach (α)
nais disfóricos; de sintomas psicológicos e da Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho
comportamentais, em detrimento de sin- na subescala de afetos positivos foi α=0.86
tomas físicos; e diminuição gradativa no e na subescala de afetos negativos foi α =
rendimento ocupacional. Apesar de não 0.86. Os valores do α do MBI para o fator
haver consenso na definição de burnout, exaustão emocional foi α = 0.79, para o fa-
existe uma significativa concordância em tor despersonalização α = 0,25 e para baixa
relação às dimensões que a constituem. realização pessoal no trabalho α = 0,72 in-
São elas: exaustão emocional, desperso- dicando, em geral, uma consistência inter-
nalização e baixa realização pessoal no na significativa. Os resultados encontrados
trabalho. Considerando o exposto, o ob- na Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho
jetivo desse estudo foi analisar o nível de indicaram que os profissionais apresentam

91
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

uma relação positiva com o trabalho. Isso PERCEPÇÃO SOBRE VALORES


pode ser notado na média ponderada da QUE INFLUENCIAM A PRÁTICA DE
subescala de afetos positivos M = 4,43 (DP PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO
= 0,41); complementando essa percepção, A CRIANÇAS E ADOLESCENTES DO
a média ponderada da subescala de afetos INTERIOR DO RS
negativos foi de 2,50 (DP = 0,88). No MBI, Normanda Araujo de Morais - UFRGS
a média ponderada para o nível de exaus- normandaaraujo@gmail.com
tão emocional foi de 2,08 (DP = 0,48), para Juliana das Neves Nóbrega - UFRGS
despersonalização foi de 1,53 (DP = 0,43) julli.nobrega@gmail.com
e de baixa realização profissional foi de Clarissa Pinto Pizarro de Freitas - UFRGS
1,79 (DP = 0,41). Os achados indicam que clappdf@gmail.com
os profissionais apresentam baixos níveis Bruno Figueiredo Damásio - UFRGS
de burnout. As análises de correlação de brunofd@gmail.com
Pearson indicaram que as dimensões afe- Silvia Helena Koller - UFRGS
to negativo da Escala de Bem-estar Afetivo silvia.koller@gmail.com
no Trabalho está positivamente relaciona-
da às dimensões de exaustão emocional Este trabalho tem como objetivo avaliar os
(r=0,71; p=0,001) e baixa realização no principais valores que embasam a prática
trabalho (r=0,54; p=0,002) do MBI. Com de profissionais da rede de atendimento a
relação ao afeto positivo da Escala de crianças e adolescentes do interior do Rio
Bem-estar Afetivo no Trabalho, observou- Grande do Sul, assim como as percepções
-se que o mesmo está negativamente re- destes profissionais, sobre como têm se
lacionado às dimensões de exaustão emo- sentido desde que começaram a trabalhar
cional (r=-0,53; p=0,003) e baixa realização com essa população. Esses profissionais
(r=-0,59; p=0,001) no trabalho do MBI. No (n=30) participaram da Capacitação pro-
que se refere à dimensão de despersonali- movida pelas Universidades Federal do
zação do MBI, essa não está significativa- Rio Grande do Sul (UFRGS) e pela Facul-
mente relacionada com a Escala de Bem- dade Três de Maio (SETREM) acerca das
-estar Afetivo no Trabalho. As correlações temáticas de direitos humanos, violência
demonstraram que os dois instrumentos e mediação de conflitos, com duração de
foram adequados para acessar os aspectos 30 horas. No início das atividades, os pro-
constituintes da relação dos profissionais fissionais responderam a um questionário
com o próprio trabalho. Neste sentido, de pré-teste, no qual constavam questões
pode-se inferir que os profissionais que se de caracterização sociodemográfica, além
disponibilizaram a participar da primeira de escalas específicas, sobre esgotamento
etapa da capacitação apresentavam re- profissional, bem-estar no trabalho, valo-
lações positivas com o trabalho por eles res que fomentam suas práticas e percep-
desenvolvido, aspecto corroborado pelos ções de como se sentem desde que come-
índices da Escala de Bem-estar Afetivo no çaram a trabalhar com crianças e adoles-
Trabalho e pelo MBI. centes. Os resultados destas duas últimas
escalas foram analisados para o presente
Palavras-chave: burnout, bem-estar, rede trabalho. Na escala de valores (seis itens;
proteção alpha = 0,70), o participante deveria apon-

92
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tar um valor entre 1 a 5 para avaliar a fre- sociodemográficas (idade, escolaridade,


quência (nunca a sempre) com que valo- tempo médio de trabalho na ocupação
res familiares, religiosos, institucionais, atual, tempo de trabalho com direitos da
do Estatuto da Criança e do Adolescente criança e renda mensal) mostraram as
(ECA), formação técnica e experiência pro- seguintes correlações: valores familiares
fissional influenciam a sua prática. Na es- e idade (r = 0,39; p < 0,05); valores fami-
cala de percepção sobre como se sentem liares e tempo de trabalho (r = 0,45; p <
desde que começaram a trabalhar com 0,05); valores religiosos e idade (r = 0,36;
crianças e adolescentes (13 itens; alpha p < 0,05); valores religiosos e tempo de
= 0,89), o participante deveria destacar trabalho (r = 0,46; p < 0,05); valores reli-
numa escala de 1 a 5 (discordo totalmente giosos e tempo de trabalho com direitos
a concordo totalmente) o quanto se sente da criança e do adolescente (r = 0,51; p <
mais otimista, cansado, feliz, preparado, 0,01); influência da legislação do ECA com
pessimista e outros, desde que vem tra- escolaridade (r = 0,43; p < 0,05) e da le-
balhando nessa área. A amostra foi pre- gislação do ECA com a renda mensal (r =
dominantemente do sexo feminino (n=28; 0,37; p < 0,05). Ou seja, os valores fami-
93,3%) e tinha, em média, 38 anos de ida- liares e religiosos tenderam a ser aponta-
de (DP = 10,93). A maioria declarou-se ca- dos por profissionais mais velhos e com
tólica (n=24; 80%) e possuía nível superior mais tempo de trabalho; os valores reli-
(n=14; 46,7%) ou algum tipo de pós-gra- giosos também foram mais mencionados
duação (n=12; 40%). A área predominan- pelo grupo de profissionais que trabalha
te de formação foi Psicologia (n=9; 30%), há mais tempo com direitos da criança;
seguida por Serviço Social (n=8; 26,7%) e e, por fim, os valores do ECA foram mais
Enfermagem (n=5; 16,7%) e a renda men- mencionados pelo grupo de profissionais
sal variou de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = com maior escolaridade e renda. Quando
R$ 2.004,90 reais). O principal vínculo de convidados a avaliarem como se sentiam
trabalho foi celetista e concursado (ambos desde que começaram a trabalhar com
com 26,7%; n = 8), seguido de estatutário crianças e adolescentes, os participantes
(13,3%; n = 7). O tempo médio de trabalho ressaltaram que: (a) começaram a buscar
na ocupação atual variou entre 1 mês e conhecimentos que julgavam necessários
30 anos (M = 7,3 anos). Já o tempo médio (M = 4,52; DP = 0,50); (b) estavam certos
do trabalho com direitos da criança e do que queriam continuar trabalhando na
adolescente foi inferior (M = 4 anos; va- área (M = 4,45; DP = 0,63); (c) sentiram
riando de 1 mês a 21 anos). Entre os par- que agregaram conhecimentos que jul-
ticipantes, a experiência profissional (M = gavam necessários à atuação (M = 4,38;
4,66; DP = 0,55) foi apontada como o item DP = 0,56); (d) desenvolveram uma visão
que mais influencia a prática, seguida pe- menos preconceituosa da população (M =
los demais valores: formação técnica (M = 4,21; DP = 0,92); e (e) uma visão menos
4,50; DP = 0,78), valores institucionais (M idealizada desta (M = 4,14; DP = 0,59). Os
= 4,17; DP = 0,87), valores familiares (M itens que obtiveram as menores médias
= 4,00; DP = 1,2) e valores religiosos (M = foram aqueles que expressavam uma vi-
2,87; DP = 1,33). Análises de correlação são negativa, dentre eles: sentir-se mais
envolvendo esses valores e características pessimista (M = 2,10; DP = 0,90), sentir-se

93
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mais cansado (M = 2,21; DP = 0,98) e sen- ta por Ana Luiza Bustamante Smolka, uma
tir-se mais frustrado (M = 2,28; DP = 1,03). das pesquisadoras vygotskianas do Brasil
Análises de correlação dos itens dessa de maior proeminência, com destaque
escala com variáveis sociodemográficas nos cenários nacional e internacional; pelo
mostraram apenas uma correlação po- professor Bernd Fichtner, da Universidade
sitiva, a saber: o tempo de trabalho com de Siegen na Alemanha, que repensa a
direitos da criança esteve correlacionado teoria de Vygotsky no contexto da produ-
com o item “sentir-se mais otimista quan- ção das ciências humanas; pela professora
to ao sucesso do trabalho” (r = 0,48; p < Marta Sforni, pesquisadora ativa na área,
0,05). Em síntese, os resultados sugerem com enfoque na Teoria da Atividade; e,
a importância da experiência profissional por fim, Zoia Prestes, tradutora das obras
na prática cotidiana dos participantes. de Vygotsky que levanta questionamentos
Inclusive, eles ressaltam a busca pelo co- atuais acerca da interpretação da teoria
nhecimento na área como um passo que vygotskiana no Brasil.
deram desde que começaram a trabalhar
com a temática de direitos da criança e do
adolescente. Há, ainda, por parte dos par- VYGOTSKY NA CONTEMPORANEIDADE:
ticipantes, uma visão positiva da sua práti- CONTRIBUIÇÕES, INSPIRAÇÕES E
ca, a qual é relacionada a sentimentos de PROVOCAÇÕES
felicidade e realização. Ambos os aspectos Ana Luiza Bustamante Smolka - UNICAMP
(busca de conhecimento técnico, senti-
mento de felicidade e realização) ficaram L. S. Vygotsky nos deixou uma obra ex-
visíveis nos depoimentos e na forma como tensa, densa e inacabada, repleta de in-
se mostraram engajados na capacitação. tuições fecundas. Ao mesmo tempo em
que nos inspira e nos fornece as bases
Palavras-chave: profissionais, rede de de uma consistente sustentação teórico-
proteção, infância e adolescência -metodológica, a obra se abre a múltiplas
Contato: Normanda Araujo de Morais, UFRGS, interpretações. Vygotsky privilegiou em
normandaaraujo@gmail.com seus estudos o desenvolvimento cultural
da criança, chamando a atenção para a
história do desenvolvimento cultural do
MR LT02 - Mesa Redonda ser humano. Apontando insistentemente
Convidada para a importância de se considerar a his-
tória – das funções mentais superiores, da
atividade humana, do desenvolvimento
MR LT02-1503 - VIGOTSKI NA do gesto de apontar, dos signos, da lingua-
ATUALIDADE, UMA DISCUSSÃO gem, da consciência -, ele argumentava
TEÓRICO-METODOLÓGICA sobre a constituição social da personalida-
de individual forjada numa história de re-
A mesa redonda tem por objetivo reunir lações sociais. Vygotsky dizia que a histó-
especialistas em Vygotsky que trazem uma ria do desenvolvimento cultural nos leva,
perspectiva atual na leitura dos textos e de cheio, aos problemas da educação.
na prática de pesquisa. A mesa é compos- Suas preocupações se orientavam, assim,

94
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para os modos de ensinar, para os modos a Vygotsky, em interlocução com outros


de estudar as relações de ensino, e para autores contemporâneos. Tomando como
os resultados ou efeitos dessas relações. foco e lugar de análise as enunciações
Em sua perspectiva do desenvolvimento dos professores em reuniões de estudo, a
humano, a educação e o ensino, como o proposta é refletir sobre as possibilidades
trabalho do homem sobre o homem, ad- de (investigação do) desenvolvimento dos
quiriam fundamental relevância. Buscan- sujeitos e de desenvolvimento da própria
do compreender como a criança se apro- da atividade de ensinar, considerando as
pria da cultura, ou como o coletivo cria as con(tra)dições da contemporaneidade.
funções mentais superiores na criança, ele
defendia a tese da participação do outro
e dos instrumentos técnicos e semióticos A ABORDAGEM DE VYGOTSKY COMO
como constitutivos da emergência de no- PROVOCAÇÃO PARA AS CIÊNCIAS
vas formas de atividade humana no curso HUMANAS
da história. Perseguindo essas questões Bernd Fichtner - Universidade de Siegen/
no campo da Psicologia e da Educação, Alemanha
Vygotsky não se cansou de levantar e dis-
cutir a questão do método. Interessado na Nos últimos vinte anos vivenciamos o co-
emergência e no engendramento de no- lapso e a dissolução de três fronteiras im-
vas formas de atividade, ele desenvolveu o portantes: 1. a fronteira entre o homem e
que chamou de método instrumental, his- o animal foi definitivamente desconstruí-
tórico genético, ou de dupla estimulação, da pelos resultados da pesquisa sobre os
no estudo das relações desenvolvimento/ primatas; 2. a fronteira entre organismo e
aprendizagem/ pensamento/linguagem / maquina foi aniquilada pelas pesquisas da
experiência/consciência. Nos últimos anos neuro-informática e nanotecnologia; 3. a
de sua vida, chegou a afirmar que “a aná- fronteira entre o físico e o não físico desa-
lise semiótica é o único método adequa- pareceu. Com o desaparecimento destas
do para estudar a estrutura do sistema fronteiras todos os velhos dualismos, com
e o conteúdo da consciência” (Vygotsky, os quais estávamos compreendendo a re-
1996:188). Sua obra plural e “em aberto” alidade, perderam a sua credibilidade, es-
repercute e se desdobra hoje em uma di- pecialmente aqueles fundamentos das
versidade de tendências. São muitos os distinções dicotômicas: matéria/espírito,
aspectos que demandam aprofundamen- corpo/mente, indivíduo/sociedade. Neste
to. Participando das atuais discussões e contexto, a abordagem histórico-cultural
visando a incitar o debate, trago para essa de Vygotsky é uma provocação irritante
apresentação fragmentos do material em- formulando perguntas inúmeras. Quando
pírico referente a um projeto de pesquisa nós hoje estamos examinando e analisan-
em andamento que assume o referencial do as obras de Vygotsky podemos dizer
em questão e que tem como objetivo a que ele também nos examina de perto.
melhoria do ensino público. A intenção Nós mesmos somos o objeto de pesquisa
aqui é problematizar e explorar o poten- quando queremos compreender um autor
cial teórico, conceitual e analítico de al- do passado. Nessas tentativas de compre-
guns pressupostos e construtos atribuídos ender o pensamento de Vygotsky constru-

95
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ímos sempre conhecimento novo sobre o ”Nenhum vôo é permitido, exceto aquele
nosso presente quer dizer a nossa com- que obedece às regras do que é requerido
preensão da psicologia de desenvolvimen- para a construção de novos enunciados”.
to torna-se quase mais transparente nas Uma polícia discursiva (ou, uma polícia
suas estruturas, seus contornos, suas das ciências disciplinares) está pronta
fronteiras e, sobretudo nos seus aspectos para voltar ao já firmado, ao já previsto,
problemáticos. As ciências humanas se es- ao já estatuído, ainda que estivesse lá por
forçam – com maior ou menor êxito – para ser dito. E há que fazer isso com rigor.” Sa-
conseguir aproximações cada vez mais bemos realmente o que é o desenvolvi-
precisas à realidade pesquisada. Com essa mento de uma criança, de um adolescente
lógica as ciências humanas acreditam que – ou mais geral o que é uma criança, o que
essa realidade na sua essência já é enten- é um adolescente? Nas Arte e Filosofia en-
dida e compreendida. Assim a psicologia contramos que o conhecimento não tem
de desenvolvimento pode-se afirmar o nem uma acumulação linear nem uma
que é desenvolvimento psíquico. A psico- hierarquização desse conhecimento. Alei-
logia de desenvolvimento define também jadinho não é mais avançado do que Ve-
o que é uma criança ou o que é um adoles- lásquez e Cézanne não é mais avançado
cente. As crianças são pesquisadas há do que Aleijadinho. Espinosa não é mais
mais de cem anos. Encontramos uma acu- avançado do que Descartes. Nem Hegel
mulação impressionante de conhecimen- que Descartes. A filosofia e a arte estão
to cientifico. Nessa lógica com certeza sa- indicando que esta ideia de uma “aproxi-
bemos hoje mais sobre crianças do que se mação a realidade” é uma ilusão. Mas, o
sabia na época de Vygotsky. Porém, en- que arte e filosofia realmente têm em co-
contramos aspectos sobre este tema que mum? Na lógica de uma obra de arte ou
ainda não são plenamente compreendi- de um conceito fundamental de filosofia
dos. Como exemplo podemos questionar se encontra “a Perspectiva do Novo/o
o pouco que realmente se sabe sobre os Ponto de Vista do Novo”. Isso significa ver
adolescentes e suas ligações com as novas e olhar um fenômeno, uma realidade
tecnologias de informação e comunica- como se os olhássemos pela primeira vez.
ção, a mudança atual de valores morais e No olhar da filosofia e no olhar da arte, a
éticos destes adolescentes, etc. Na pers- realidade nunca é já totalmente compre-
pectiva linear da lógica da pesquisa cienti- endida. Ao contrário, ela é indeterminada,
fica como aproximação cada vez mais pre- aberta. Nesse sentido uma obra de arte e
cisa à realidade todos os problemas apa- um conceito fundamental de filosofia são
recem resolvíveis. Uma conseqüência dis- sempre pressupostos e tematizam uma
so: a importância dos métodos e da meto- relação formal com a realidade. A relação
dologia (metodologia: a avaliação e a com essa realidade ou com esse fenôme-
análise do sistema dos métodos a respeito no é precisamente e absolutamente de-
da sua “objetividade”, de sua “reliabilida- terminada pela forma enquanto, que a
de” e sua “validade”). Wanderley Geraldi realidade, o fenômeno fica aberto e inde-
(2005) critica esta direção e orientação, terminado. O formal, a representação
mais ou menos técnica, para os métodos e possibilita aqui a escolha de uma perspec-
para a metodologia com estas palavras: tiva: conceitos teóricos e obras de arte

96
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como modelos de um diálogo com a reali- acaba por introduzir e apontar caminhos
dade mediando uma relação. “A Perspecti- para todas as ciências humanas. Gostaria
va do Novo/o Ponto de Vista do Novo” de mostrar como nas obras de Vygotsky a
exige aceitar o metafórico no processo de lógica geral de arte e de filosofia atua con-
olhar e de ver, o que significa ver algo cretamente nas disciplinas humanas, so-
como algo (isso é isto). A metáfora não re- bretudo na psicologia do desenvolvimen-
flete semelhanças; não apresenta algo to. No centro da metodologia vigotskiana
que seja comum entre objetos, como fe- encontra-se o “Método Histórico” ou tam-
nômenos e processos; algo que está já bém o assim chamado “Método Genéti-
pronto, disponível e preestabelecido. A co” ou “Método Histórico” pelo qual
metáfora cria e constrói fundamentalmen- Vygotsky tematiza o seu pressuposto fun-
te relações. Metáforas são como crianças: damental: entender cada fenômeno vivo
impressionam o seu ambiente de uma exige entendê-lo no seu início e também
maneira específica. Elas portam o novo, o no processo do seu desenvolvimento. A
não previsto. Representam enfoques de este método está incorporado o famoso
relevâncias junto com uma orientação lema de Hegel: "O inteiro é sempre o resul-
para o futuro. Como uma criança é uma tado compreendido junto com o processo
promessa de vida, vida que não é preesta- de seu desenvolvimento". Este lema foi as-
belecida em seus passos. Metáforas não sumido por Vygotsky como um principio
têm só uma função constitutiva na forma- universal metodológico. Este problema
ção cítrica de nossa experiência, mas tam- principal do desenvolvimento foi analisa-
bém para as mudanças, transformações e do e pesquisado através de três perspecti-
reestruturações delas. As fronteiras e limi- vas metodológicas: (1) A abordagem de
tes de uma área preestabelecida de expe- Vygotsky apresenta uma perspectiva mo-
riências podem ser destruídos, quebrados nística, quer dizer, toda separação entre
e alargados. Uma relação estandardizada indivíduo e sociedade, corpo e mente, en-
e automatizada pode ser assim rompida. tre cognição e emoção, entre físico e espí-
Muitas obras de Vygotsky se caracterizam rito, entre ações exteriores e ações inte-
pela confrontação e ruptura com o esta- riores foram rigorosamente negadas. (2) A
belecido, com o sistema estereotipado, abordagem de Vygotsky apresenta uma
fechado e fixado. O seu trânsito por e o perspectiva holística, que se opõe a qual-
interesse pela Arte e Filosofia lhe propor- quer reducionismo, ou seja, processos
cionaram condições de ter uma visão mais complexos não se podem reduzir a pro-
ampla das questões psicológicas, incorpo- cessos elementares. Por exemplo, um pro-
rando contribuições dessas outras áreas cesso psíquico não se pode explicar redu-
de conhecimento. Encontra-se na aborda- zindo-o a processos físicos ou químicos.
gem de Vygotsky uma enorme riqueza e Segundo Vygotsky se deve encontrar ou
diversidade de temas, passando pela neu- construir unidades de análise que permi-
ropsicologia, pela linguagem, pela educa- tam considerar os processos complexos.
ção, nomeadamente quando enfrenta (3) A abordagem histórico-cultural apre-
problemas de deficiências, pelas questões senta uma perspectiva interdisciplinar ou
semióticas do cinema, aliando questões multidisciplinar. A base desta perspectiva
teóricas e metodológicas, de modo que são sempre problemas sociais ou proble-

97
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mas práticos. Um problema social sempre gado à fundamentação lógico-psicológica


tem aspectos diferentes: individuais, psí- da estruturação das disciplinas escolares.
quicos, culturais materiais etc. Os próprios Isto é, o conteúdo e os meios didáticos
especialistas em interdisciplinaridade não por meio dos quais o conteúdo é ensina-
se encontram nos estudiosos ou nos pes- do determinam o tipo de consciência e de
quisadores, mas nos práticos, que devem pensamento que se formam nos estudan-
resolver problemas práticos sempre multi- tes. Assim, a organização do ensino não é
dimensionais. Na palestra vou tentar de um assunto exclusivamente didático, mas
concretizar esses aspectos ao respeito da está relacionado também ao potencial de
conceitualização de “desenvolvimento” desenvolvimento psíquico dos estudan-
na abordagem de Vygotsky. tes. Nesse sentido, as respostas aos dois
questionamentos, expostos acima, podem
oferecer conhecimentos importantes para
PESQUISA SOBRE ENSINO, a Didática e para a Psicologia. Mas para se
APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO: chegar a tais respostas é necessário en-
CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DA contrar procedimentos de pesquisa que
ATIVIDADE permitam identificar se uma forma de
Marta Sueli de Faria Sforni - UFSC organização do ensino tem o potencial de
promover o desenvolvimento dos estu-
As discussões acerca do papel da esco- dantes. A necessidade de analisar como
larização sobre o desenvolvimento psí- têm sido ensinados conceitos científicos
quico desencadeadas pela abordagem na escola, bem como de identificar condi-
Vigotskiana ressaltaram o valor da edu- ções teórico-metodológicas para a organi-
cação escolar na constituição dos su- zação do ensino em que a aprendizagem
jeitos. Porém, quando Vygotsky fala de conceitual contribua para a promoção do
ensino, não se refere a qualquer ensino, desenvolvimento psíquico (Sforni, 2004),
mas àquele que se “adianta ao desenvol- tem nos acompanhado desde a pesquisa
vimento”, ao “bom ensino”, a uma “cor- de doutorado. Atualmente, as pesquisas
reta organização da aprendizagem” ou, que temos realizado conjuntamente com
ainda, ao “aprendizado adequadamente os membros do Grupo de Pesquisa Ensino,
organizado” (VYGOTSKY, 2001). Ou seja, Aprendizagem e Conteúdo Escolar - UEM,
não basta ao indivíduo freqüentar esco- e com os membros do GEPAPe-USP – Gru-
las, não lhe basta ter acesso a conceitos po de Estudos e Pesquisas sobre Atividade
científicos para que seus processos inter- Pedagógica, têm como objetivo “Investi-
nos de desenvolvimento sejam acionados. gar princípios teórico-metodológicos da
Tal fato suscita dois possíveis problemas atividade pedagógica, tendo como funda-
de investigação: O que qualifica um bom mento a Teoria Histórico-Cultural”. Além
ensino ou uma correta organização da dos estudos de Vygotsky, contamos tam-
aprendizagem? Em que sentido a organi- bém com os subsídios da Teoria da Ativi-
zação do ensino pode influenciar qualitati- dade de Leontiev (1983, 2004). Como pro-
vamente o processo de desenvolvimento? cedimento metodológico para coleta de
Davidov (1992) considera que o ensino dados, temos organizado “experimentos
que impulsiona o desenvolvimento está li- didáticos” ou “experimentos formativos”

98
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que permitem acompanhar o processo que a operação se constitui na ação auto-


de aprendizagem dos sujeitos, quando matizada, Leontiev oferece pistas para se
inseridos em uma situação de ensino or- pensar uma orientação metodológica para
ganizada de acordo com alguns princípios o ensino de conceitos. Mesmo que mui-
teórico-metodológicos que consideramos tos conhecimentos sejam já operacionais
favoráveis ao desenvolvimento dos estu- ou automatizados na cultura, para que
dantes, sendo que, esses modos de orga- eles sejam desenvolvidos no sujeito como
nização do ensino também são objetos de operações conscientes é preciso que elas
investigação. Alguns conceitos desenvolvi- se formem primeiramente como ações
dos por Leontiev (2004) são orientadores (Leontiev, 2004). É preciso que um dado
de nossas ações, dentre eles os conceitos conteúdo seja objeto direto da atenção,
de objetivação e apropriação do conheci- da percepção, do raciocínio do sujeito
mento. Na compreensão dos conhecimen- para que passe a compor o conteúdo e o
tos científicos como instrumentos psico- modo de ele operar com os fenômenos da
lógicos, nos quais estão objetivados pro- realidade, ou seja, para que, de fato, seja
cessos mentais já alcançados pelo gênero apropriado como instrumento simbólico
humano, encontramos valiosos indícios pelo sujeito. Por quais meios investigar o
que podem orientar a tomada de decisões impacto do ensino sobre aprendizagem
na organização do ensino. Apropriar-se de e desenvolvimento dos sujeitos, já que
um conceito, nessa perspectiva, significa esses são processos tão subjetivos? Se
tomar posse desses processos mentais, o aprender é mais do que recitar definições,
que implica colocar em movimento esses implica “fazer uso” dos conceitos na rea-
processos à medida que interagimos com lização de ações e operações mentais, é
o conhecimento. Daí a relação entre en- preciso buscar elementos externos que
sino, aprendizagem e desenvolvimento, explicitem os processos psicológicos en-
destacada por Vygotsky. Nesse sentido, é volvidos em determinadas atividades do
preciso que os conceitos – objetos de en- sujeito, já que essas atividades podem
sino – estejam inseridos em uma ativida- revelar a forma pela qual o sujeito opera
de na qual sua função como instrumento com os conceitos. Assim, em nossas pes-
seja explícita. Pensar a aprendizagem de quisas temos tomado como objeto de
conceitos nessa perspectiva implica reco- análise a própria atividade do sujeito com
nhecer que a sua apropriação não se re- objetos e fenômenos. Observamos se ele
sume à definição e memorização, como realiza a atividade por meio de um pen-
normalmente ocorre no contexto escolar. samento categorial, em nível teórico, ou
Também os conceitos de ação e operação, se depende de representações sensoriais,
apresentados por Leontiev (2004), têm limitando-se ao pensamento empírico, o
nos permitido algumas inferências signifi- que significa diferentes níveis de desen-
cativas. Esse autor explica que a assimila- volvimento. Considerar a atividade como
ção do conhecimento implica a formação objeto de análise “significa a possibilidade
de ações mentais. Ao afirmar que no pro- de se analisar um elemento observável e,
cesso de aprendizagem motora ou intelec- por meio dele, desvelar a forma e o con-
tual, o sujeito passa da ação à operação teúdo da subjetividade” (Sforni & Galuch,
com o objeto do conhecimento, sendo 2009, p. 127). Partindo do princípio de que

99
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

há unidade entre linguagem, pensamento tva (Psicologia da Arte), escrito em 1925 e


e ação, tomamos como fontes de análise a publicado somente em 1965; Pedagogui-
linguagem e a ação, como meios que nos tcheskaia psirrologuia (Psicologia Pedagó-
permitem inferir, mesmo que parcialmen- gica) de 1926, e Michlenie e retch (tradu-
te, o pensamento conceitual promovido zido no Brasil como Pensamento e lingua-
pelo ensino. Cabe destacar que tais proce- gem ou Construção do pensamento e da
dimentos investigativos constituem-se em linguagem), de 1934; e uma série de livros
um caminho em construção, marcado por didáticos para o ensino à distância (por
dúvidas e algumas limitações, mas que correspondência), tais como Pedologia da
tem apresentado resultados promissores, idade escolar (Pedologuia chkolnogo vo-
o que nos estimula a continuar caminhan- zrasta), de 1928, Pedologia da juventude
do, apesar das incertezas. (Pedologuia iunochevskogo vozrasta), de
1929, e Pedologia do adolescente (Pedo-
loguia podrostka), escrito entre 1930 e
L. S. VYGOTSKY: A FORÇA E A 1931. Alguns capítulos deste último livro
ATUALIDADE DE SUA OBRA didático foram republicados no volume 4
Zoia Prestes - UniCEUB de Obras reunidas (Sobranie sotchineni).
Os livros publicados, principalmente após
Lev Semionovitch Vygotsky foi um pensa- a morte de Vigotski, reúnem artigos, tex-
dor soviético e seu nome é bem conheci- tos e estenografias de aulas proferidas ou
do hoje no Brasil, principalmente entre os discursos em eventos científicos. O levan-
que se dedicam aos estudos nas áreas da tamento mais completo e sistematizado
pedagogia e psicologia. A trajetória acadê- até o momento está apresentado em ane-
mica no Brasil das obras de Vygotsky, seus xo à biografia escrita por Guita Vigodskaia,
colaboradores e alunos teve início no fim filha de Vygotsky, e Tamara Lifanova
dos anos 70. Seus estudos estão presentes (1996) que relaciona 274 títulos. Embora
no mundo inteiro, editados e publicados Daniil Borissovitch Elkonin, contempo-
nas mais diferentes línguas, tais como in- râneo, aluno e colaborador de Vygotsky,
glês, francês, italiano, espanhol, alemão, relacione cerca de 180 trabalhos (Elkonin,
japonês, português, húngaro e dinamar- 1984). Essa divergência nas informações a
quês. Se fizermos hoje uma rápida busca respeito de sua produção teórica mostra
nas publicações das obras de Vygotsky não apenas o interesse que ainda desper-
na Rússia, por exemplo, veremos que, na ta sua obra em seu país, mas também é
última década, seus três principais livros uma divergência que está prestes a ser
foram relançados por diferentes edito- reduzida a zero com a publicação da obra
ras, assim como foram reeditados artigos completa. Um dos motivos da divergên-
publicados apenas nos anos 30, antes de cia é que na lista de Guita estão indica-
serem proibidos, em coletâneas que estão dos até mesmo artigos e textos que ainda
surgindo novamente nas prateleiras das permanecem na forma de manuscritos e
livrarias da Rússia. Quando se analisa a estão guardados nos arquivos da família
extensa produção escrita de Lev Semiono- que, atualmente, prepara o lançamento
vitch Vygotsky, nota-se que foram poucos de dois volumes das obras completas que
os livros que escreveu: Psirrologuia iskuss- deverão conter 16 volumes, cada um com

100
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

uma média de 400 páginas. Além de proi- Mais recentemente, em 2001, no Brasil,
bidas na URSS por quase 20 anos, as obras foi publicada pela mesma Martins Fontes
de L.S. Vygotsky nem sempre tiveram um a versão completa de Michlenie e retch,
destino digno. Ao analisarmos detalha- sob o título A construção do pensamento
damente o percurso de algumas de suas e da linguagem, traduzida diretamente do
publicações, pode-se afirmar, sem medo, russo por Paulo Bezerra. Na ficha técnica
que foram muitas as adulterações, os cor- do livro não está indicada a edição russa
tes, as censuras que sofreram ao longo da da qual foi traduzida para o português,
história, tanto em sua pátria como fora mas, ao comparar com a edição russa in-
dela. Desde a publicação de seus primei- tegral de 2001, pode-se afirmar que é o
ros livros nos Estados Unidos e de tradu- texto completo, pois contém todos os tre-
ções para o português a partir das versões chos suprimidos na edição soviética reta-
norte-americanas, já se passaram mais de lhada de 1956 (González, 2007, p. CXXXI).
30 anos. Sem dúvida, essas primeiras ini- Mas parece que não foi somente a obra
ciativas de trazer para o Brasil os estudos de Vygotsky que sofreu adulteração. Sua
de um dos mais importantes pensadores vida também é cercada de mistérios e fa-
soviéticos do século XX merecem reco- tos pouco esclarecidos. As divergências
nhecimento. No entanto, atualmente, a entre as interpretações de fatos importan-
própria Rússia reconhece que muitos tex- tes de sua vida permanecem ainda como
tos do autor, para que fossem publicados um campo bastante nebuloso na história
ainda no fim dos anos 50, foram cortados da psicologia soviética. Se forem feitas
e alterados pelos editores (Zaverchneva, comparações entre textos biográficos pu-
2009, 2010). É desconcertante descobrir, blicados na União Soviética (por exemplo,
por exemplo, que o livro Michlenie i retch Levitin, 1990), na Argentina (por exemplo,
(traduzido como Pensamento e lingua- Blanck, 1984) e nos Estados Unidos (por
gem) teve alguns parágrafos cortados e exemplo, Kozulin, 1990) é possível detec-
que, somente em 1996 (González, 2007, tar discrepâncias acerca de fatos impor-
p. CXXXIV), foi publicada a primeira edição tantes da vida e obra do autor. Assim, o
do texto original que se encontra microfil- estudioso de Vygotsky vê-se diante de in-
mado na biblioteca da Universidade Esta- formações, por vezes, até contraditórias e
tal de Moscou. Mais perturbador ainda é a melhor alternativa na busca de um qua-
o fato de que, no Brasil, uma mesma edi- dro mais coerente da vida e obra do autor
tora publica duas versões (Vygotsky, 1987 é a realização de exames comparativos
e 2001) dessa obra de Vygotsky como se das diferentes biografias disponíveis. Atu-
fossem livros diferentes. Na verdade, até almente, além das biografias citadas, há a
são, já que uma delas, a edição resumida, escrita por sua filha, em colaboração com
não pertence de fato à pena do pensador, T. M. Lifanova e encontra-se publicada em
mas sim aos seus editores que a adultera- russo e em inglês (1996, 1999 a, b, c), esta
ram, atribuindo a autoria a Vygotsky. Essa última não totalmente na íntegra (faltam
edição apareceu em 1987 pela editora fotos e fac-símiles de alguns documentos).
Martins Fontes traduzida do inglês por Je- A outra biografia é de autoria de Iaroche-
fferson Luiz Camargo, a partir da edição do vski (2007) e foi publicada somente em
Instituto Tecnológico de Massachusetts. russo. Além disso, em 2011, foi publicada

101
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

na Rússia mais uma biografia do pensa- andressagonzalez62@gmail.com


dor Misl i sudba psirrologa Vigotskigo (O Juliane Rosa - UnB
pensamento e o destino do psicólogo Vi- jullyll@hotmail.com
gotski), de autoria de Igor Reif. Diante des- João Luís X. M. de Negreiros - UnB
se quadro, não resta dúvida de que há em jlnegreiros@gmail.com
todo o mundo um grande interesse pelas Brisa Oliveira - UnB
ideias e pela vida de Vygotsky. brisa-oliveira@hotmail.com

De acordo com a perspectiva do life-span,


MR LT01 - Mesa Redonda o envelhecimento humano é um processo
Convidada multidimensional e multidirecional que
engloba um delicado equilíbrio entre limi-
tações (perdas) e vantagens (ganhos). Con-
MR LT01-1508 - O ENVELHECIMENTO sonante com essa visão, o envelhecimento
BEM SUCEDIDO E A APOSENTADORIA: e a velhice constituem experiências hete-
A PRÁTICAS DE HOMENS IDOSOS rogêneas e, como tal, devem ser aborda-
E DIFERENTES PROGRAMAS DE dos em sua complexidade e diversidade. A
PREPARARO PARA A APOSENTADORIA passagem para aposentadoria, é uma fase
difícil e nem sempre enfrentada de forma
Samia Abreu - UnB
positiva por alguns trabalhadores. Os Pro-
abreu.samia@gmail.com gramas de Preparação para Aposentadoria
Lilian Maria Borges Gonzalez - UCB surgem como medida preventiva para me-
limaborgesg@gmail.com lhorar a qualidade de vida das pessoas que
Cristineide Leandro França - UnB se encontram nessa fase e necessitam de
cristineide@unb.br ajuda para atravessá-la de forma saudável.
Sheila Giardini Murta - UnB O envelhecimento bem sucedido e a apo-
murta@cultura.com.br sentadoria serão apresentados em suas
Eliane Seidl - UnB manifestações frente a um estudo sobre
seidl@unb.br a concepção e práticas de homens idosos
Isolda Gunther - UnB (estudo 1), a implantação de um programa
isolda.gunther@gmail.com de preparação para aposentadoria (estudo
Juliana Seidl - UnB 2) e avaliação de um intervenção preventi-
juliana.seidl@gmail.com va breve no planejamento da aposentado-
Ana Carolina da Conceição ria (estudo 3). O presente estudo buscou
anakarou@gmail.com investigar as percepções de treze homens
Marina Pedralho - UnB com idades entre 62 e 78 anos, todos ca-
pedralho3@gmail.com sados, aposentados e portadores de dife-
Nadielle Lira - UnB rentes doenças crônicas, recrutados em
nadiellelira@gmail.com um centro de convivência para idosos, os
Rochely Karen Moreira Carvalhedo - UCB quais foram entrevistados individualmente
rochellykaren@hotmail.com acerca de suas concepções de envelheci-
Andressa Gonzáles Azevedo Pinheiro Soares mento bem sucedido e das práticas adota-
Macedo - UnB das na busca de uma velhice saudável. As

102
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

respostas obtidas foram submetidas à aná- da Instituição. Criação de identidade visual


lise de conteúdo de Bardin. Os relatos dos e cartilha para os participantes - Consistiu
participantes foram agrupados em fatores na elaboração de todo o material gráfico,
físicos e psicossociais. Dentre os fatores fí- design da cartilha, convites e cartazes de
sicos mencionados, foi possível identificar divulgação. Sensibilização e Divulgação -
duas subcategorias, que apresentavam em Foram realizadas visitas aos sindicatos e à
comum o fato de enfatizarem as necessi- diretoria de saúde da universidade. Infor-
dades ou limitações orgânicas da pessoa mações sobre o programa foram disponibi-
idosa, a saber: busca de serviços médicos e lizadas no site da UnB e convites entregues
uso da medicação e reconhecimento e res- individualmente. Formação dos grupos e
peito às limitações físicas. Os fatores psi- conteúdo da intervenção - Foram forma-
cossociais, por sua vez, foram organizados dos dois grupos, 13 servidores concluíram
em oito subcategorias: manutenção de a intervenção. O programa contou com
hábitos saudáveis; ausência de hábitos no- intervenções estruturadas em 8 módulos
civos à saúde; manutenção de atividades informativos e módulos vivenciais em um
de trabalho ou recreativas; esquiva ou ma- formato psicoeducativo, com duração de
nejo de situações estressantes; satisfação três horas semanais, totalizando 24 horas
em viver; manutenção de bom relaciona- de programa. A partir da análise dos da-
mento familiar; prática de ações solidárias dos, foram encontradas seis dimensões de
e controle das finanças. Os participantes maior investimento pelos participantes,
relataram manter em seus cotidianos prá- a saber: Aposentadoria, Finanças, Laços
ticas preventivas e promotoras da saúde, Afetivos e Sociais, Ocupação, Autoconhe-
as quais foram organizadas tomando por cimento e Saúde. Os temas citados pelos
parâmetro três eixos temáticos: busca e participantes, relacionados à categoria
utilização dos serviços de saúde, hábitos Aposentadoria, foram: a tomada de cons-
saudáveis e vida ativa. A promoção do en- ciência em relação à aposentadoria e o
velhecimento saudável e a prevenção de planejamento de questões legais relativas
incapacidades devem assumir um papel à mesma. Na categoria Finanças, os parti-
central nas pesquisas e cuidados no cam- cipantes indicaram a realização de ativida-
po da saúde dos idosos, considerando que des com fins lucrativos e o cuidado com as
podem assegurar um uso mais eficiente finanças, como a quitação de dívidas ban-
dos serviços de saúde e melhorar a quali- cárias. Quanto à categoria Laços Afetivos e
dade de vida destas pessoas, ajudando-as Sociais, foi mencionado o cultivo de ami-
a permanecerem independentes e produ- zades, laços familiares e da relação com o
tivas. O objetivo do estudo é descrever as parceiro. Além disso, investimento na ativi-
etapas de implantação do Programa de dade profissional, cumprimento de obriga-
Preparação para Aposentadoria adotado ções, lazer e responsabilidades com bens
pela Universidade de Brasília, chamado materiais foram temas que apareceram na
Viva Mais!. O modelo seguiu as seguintes categoria Ocupação. Por fim, na categoria
etapas: Avaliação de necessidades - Inclui Autoconhecimento, foram apontados os
a revisão da literatura, elaboração do ro- seguintes temas: lidar com mudanças e re-
teiro de entrevistas individuais e dos gru- flexão sobre seus comportamentos. Pode-
pos focais com trabalhadores aposentados -se observar que os objetivos do programa

103
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

vêm sendo alcançados o que justifica a sua dos recursos significativos para enfrentar
continuidade e propõe uma agenda de as vulnerabilidades originadas nessa fase
pesquisa para adaptação de procedimen- de transição. Sugere-se que esse modelo
tos, novas formas de avaliação e aprimora- breve de intervenção seja investigado em
mento desse modelo preventivo. Esse es- um número maior de sujeitos e em outros
tudo teve como objetivo testar e aprimorar ambientes organizacionais.
os procedimentos e estratégias de uma in-
tervenção breve no planejamento da apo- Palavras-chave: envelhecimento bem
sentadoria. Utilizou-se para esse fim uma sucedido, programa de preparação para
oficina breve com técnicas psicoeducativas aposentadoria, intervenção preventiva breve.
pré-estabelecidas. Participaram da pesqui-
sa 09 trabalhadores, com a idade entre 22
e 63 anos, sendo 03 homens e 06 mulhe- MR LT01 - Mesa Redonda
res. Para coleta dos dados foram utilizados
os seguintes instrumentos: Questionário Convidada
Sociodemográfico para trabalhadores em
situação de pré-aposentadoria e a Escala
de Estágio de Mudança em Comportamen- MR LT01-717 - “AS MELHORES COISAS
to de Saúde. A intervenção ocorreu em DO MUNDO” COMO ESTÍMULO
sessão única, em grupo, com aproximada- EVOCATIVO AOS DESAFIOS DA
mente 180 minutos de duração. Consistiu JUVENTUDE NA UNIVERSIDADE
na utilização de estratégias psicoeduca- Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC
tivas e teve como base o modelo “FRA- fscavalcantejunior@gmail.com
MES” (Feedback, Responsability, Advice,
Menu de Option, Empathy, Self-eficacy). Utilizando-nos do filme “As melhores coi-
Para tratamento dos dados, utilizou-se a sas do mundo” (BODANSKY, 2010) como
técnica de análise conteúdo de Bardin. O estímulo evocativo, os trabalhos propos-
tratamento dos dados permitiu identificar tos por esta Mesa Redonda apresenta um
que os preditores de uma aposentado- conjunto de autores que se debruçam so-
ria promissora envolvem sentimentos de bre suas experiências docentes em cursos
persistência, iniciativa, suporte familiar, de graduação para refletir sobre os desa-
busca de uma nova carreira e continuar os fios da juventude com a qual convivem em
estudos. Como fatores de risco destacam- suas aulas. Uma análise das condições de
-se as doenças, solidão, diminuição nas valia introjetadas por jovens universitários
relações sociais, pouco dinheiro, condi- que os impedem de seguirem um cami-
ções de trabalho inapropriadas, ausência nho de desenvolvimento autônomo de
de políticas públicas para esse segmento suas trajetórias de vida é o primeiro tema
populacional e falta de apoio da família e abordado. Inovações metodológicas apli-
amigos. A segunda categoria investiga o cadas na disciplina de Psicologia da ado-
que a intervenção breve possibilitou aos lescência, vida adulta e velhice permitem
participantes descobrir, pensar e sentir que professora e estudantes estudem, de
sobre a transição para a aposentadoria. forma autobiográfica, as condições valora-
A terceira categoria abrange a descrição tivas que os impedem de navegarem em

104
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fluxo vital pleno pelos estágios da vida. Na do sujeito como pessoa. E, desde muito
sequência, o professor visa compreender pequenina, a criança percebe que espe-
fenômenos das expressões e linguagens ram algo dela. Ao mesmo tempo em que
adolescentes que são expressas no cibe- começa a sentir a necessidade de consi-
respaço, a partir da exibição do filme “As deração positiva de seus pais e de outras
melhores coisas do mundo”, em sala de pessoas significativas. Passa a perceber o
aula, abordando o crescente uso dos ser- comportamento de aprovação ou repro-
viços das novas tecnologias por jovens vação daqueles que aprecia e a necessi-
universitários, assim como os variados dade de aceitação é tão importante que
“novos” fenômenos que se desdobram passa a guiar seu comportamento a partir
a partir desse espaço virtual que passa a dessas experiências. Isso sugere que a ex-
ser amplamente utilizado e propagado. periência poderá não mais estar seguindo
Narrativas adolescentes em redes sociais um fluxo natural de aperfeiçoamento de
são registradas e analisadas neste estudo. nosso organismo, mas caminhando em
Por fim, o desafio da tríade da neurose direção ao valimento do amor de nossos
coletiva que se apresenta na juventude pais e aceitação da sociedade. Essas ex-
atual, ao matar, se matar ou se drogar, pectativas, essas condições para ser aceito
é ampliado, quando a morte passa a ser e amado é o que chamamos de condições
apresentada por adultos jovens na univer- de valia. É uma valoração do amor a ser
sidade como a única liberdade encontra- recebido. E todos nós trazemos condições
da, tema também evocado e densamente de valia assinaladas em nossas vidas, que
trabalhado no filme “As melhores coisas foram passadas por pais, professores, ins-
do mundo”. Orientados por uma perspec- tituições, sociedade e por tudo que impõe
tiva da Abordagem Centrada na Pessoa algo a partir de um apreço condicional,
cuja aprendizagem significativa emerge da que leva a pessoa mudar o curso de nos-
experiência, os professores universitários sas escolhas para podermos ser aceitos ou
aqui reunidos compartilham transforma- amados e que frustra a nossa força moti-
ções que se constroem em suas práticas vadora em direção ao crescimento. Deno-
docentes, de forma espontânea, com uma minei essas condições de rodinhas da bici-
capacidade transformadora de mobiliza- cleta emocional. Neste momento, preten-
ção de todos os envolvidos no processo de do lançar mão dessa metáfora que venho
ensino e aprendizagem do adulto jovem desenvolvendo a partir de uma pesquisa
no contexto da universidade brasileira. realizada com uma jovem em final de ado-
lescência, que buscava irromper com as
condições de valia impostas pelo meio e
PEDALANDO NAS TRILHAS DA VIDA que disparava uma luta pelo seu próprio
Terezinha Teixeira Joca - UNIFOR crescimento, tomando como abordagem,
terezinhajoca@unifor.br para o estudo, a etnográfica centrada
na pessoa, proposta por Harry Wolcott
Desde a concepção, o bebê carrega uma (1999). Ampliei esse estudo através de mi-
bagagem impregnada de expectativas de nhas observações e das impressões apre-
seus pais. Dessa forma, a família e o meio sentadas pelas pessoas ao lerem o texto,
exercem forte influência na constituição utilizado em sala de aula para jovens uni-

105
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

versitários, que imprimem suas reações, melhores coisas do mundo” (Bodanzky,


seus sentidos dados após o contato com 2010) e encantei-me com as reações emo-
essas rodinhas, que os remetem à infân- cionadas e as experiências trazidas pelos
cia e à adolescência. Aprofundado minha estudantes da evocação que essas duas
percepção sobre as condições de valia, obras geraram. Assim como os estudan-
percebi que, durante o percurso de vida, o tes, passei a visitar as fases de desenvolvi-
sujeito não se torna isento das condições mento e, como propõe Amstrong (2011),
impostas pelo meio, pois poderá sobrevi- fizemos uma navegação pelos estágios da
ver uma ou outra que tropeçará no desejo vida, enveredamos pela “Odisseia do de-
de ser amado e aceito. Essa situação de senvolvimento humano” e resolvi desbra-
condicionalidade poderá levar a pessoa à var esses novos caminhos, pedalando nas
incongruência e, consequentemente, ao trilhas da Vida, cujas descobertas serão
desenvolvimento de patologias. Dilatando compartilhadas nesta comunicação.
o olhar, quando é conseguido retirar as
rodinhas da bicicleta emocional segue-se Palavras-chave: condições de valia,
adiante e passa a fazer uso de algo mais desenvolvimento humano, fluxo vital.
sofisticado, as marchas da bike. Esse novo
recurso representa as formas que se pos-
sui para reagir aos problemas, modo como LINGUAGENS ADOLESCENTES NO
se percebe que não pode direcionar todas CIBERESPAÇO: VIDAS PÚBLICAS E
as culpas dos problemas ao meio e aos PRIVADAS
outros, passa-se a tomar consciência das Márcio Silva Gondim - FANOR
próprias incapacidades e competências. mgondim@fanor.edu.br
Descobre-se e reconhece o seu valor in-
terno. Lembrando que a adolescência não Este estudo visa compreender fenômenos
é só balada, diversão, papos livres e aven- das expressões e linguagens adolescen-
tura e que os problemas surgem como ter- tes que são expressas no ciberespaço, a
renos diversos, enlameados, pedregosos, partir da exibição do filme “As melhores
asfaltados, arenosos, que só se consegue coisas do mundo” (Bodansky, 2010), em
sair se souber fazer uso da marcha ade- sala de aula do Ensino Superior. Trata-se
quada. Lembro, também, que as rodinhas de um tema relevante e atual, tendo em
da bicicleta emocional não estão presen- vista o crescente uso dos serviços das no-
tes apenas na infância. Andar com rodi- vas tecnologias, assim como os variados
nhas pode representar o sentir-se amado, “novos” fenômenos que se desdobram a
amada. Um amor atarraxado à sua condi- partir desse espaço virtual que passa a ser
ção de crescimento, um amor atrelado ao amplamente utilizado e propagado. Além
pequeno espaço seguro, que não conse- disso, enfatiza-se que as narrativas adoles-
gue vislumbrar novos caminhos a serem centes precisam ser registradas (Oliveira,
conquistados. Com a minha chegada à 2006). Optou-se pela delimitação na ado-
disciplina Psicologia da adolescência, vida lescência, por ser o público representado
adulta e velhice, apresentei o texto “Das no filme e pela possibilidade de debater
Rodinhas da bicicleta as marchas de mi- temas atuais relacionados à juventude
nha bike” logo após a exibição do filme “As brasileira. O filme foi exibido em três sa-

106
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

las de aulas, cada uma com uma média de gem do filme remeteu os estudantes (em
quarenta estudantes, que foram convida- sala de aula) a lembranças, pensamentos
dos a escreverem as reações ao filme por e sentimentos (Cavalcante Jr, 2001) acerca
meio de textos-sentidos (Cavalcante Jr, da escrita de si. Pode-se, então, conside-
2001). O filme citado apresenta cenas que rar que as histórias de vidas são carrega-
demonstram situações específicas dos das de particularidades e modos singula-
usos do ciberespaço: um blog em que um res de perceber a existência. Sendo assim,
jovem registra escritos acerca de si e uma podemos verificar momentos em que as
jovem que sofre agressividades e precon- histórias de vidas permitem às pessoas
ceitos por ter imagens íntimas expostas fazerem um processo retrospectivo: olhar
na Internet. “As melhores coisas do mun- a um caminho percorrido, para aconte-
do” foi apresentado a estudantes do En- cimentos, situações, atividades, pessoas
sino Superior da cidade de Fortaleza (CE). significativas que encontraram, destacan-
Destacaram-se, como pontos de reflexão, do que tudo o que é dito é importante,
neste estudo: 1) Manifestação da escrita no sentido de descobrir a riqueza interior
de si – pensamentos e emoções; 2) Ma- da experiência. Entende-se, assim, que se
nifestações da linguagem do preconceito, deve somar novas ferramentas estético-
intolerância e agressividade. Em ambas as -crítico-culturais no exercício pessoal e
manifestações, com características e refle- engajado de tornamo-nos sujeitos em-
xões peculiares, observam-se em comum poderados (Olinda, 2010). Recordações
a exposição da vida privada por meio das evocadas pelas pessoas mostram-se como
novas tecnologias (especificamente blo- ricos materiais para que os sujeitos enten-
gs). Tendo em vista que os serviços tecno- dam o que são (presente), porque são o
lógicos são utilizados de modo crescente, que são (passado) e para onde querem
nota-se também que a interioridade e as direcionar as vidas (futuro). Dessa forma,
vidas íntimas ganham espaço e repercu- os estudantes envolveram-se em uma
tem entre os adolescentes, de modo veloz atitude de reflexividade crítica acerca do
e ágil, propagando informações privadas mundo que nos rodeia, também escreven-
de modo amplo: tanto reflexões diárias do sobre si (Brandao, 2008). Ocorreu uma
acerca da vida e morte, como informações interação propiciada por um grupo reflexi-
da vida íntima e sexual que ganham noto- vo em sala de aula, no qual se contou, ou-
riedade pública na comunidade escolar. viu-se e representou-se imageticamente,
A possibilidade de uma hipervisibilidade conduzindo a aprendizagens biográficas.
(intencional ou não) parece haver em am- Desse modo, verificou-se a relevância de
bos os casos. Também é pertinente pensar compartilhar experiências autobiográfi-
acerca das motivações acerca das histórias cas, proporcionando reflexões e relações
dos outros (a espetacularização da vida em que as pessoas descobrirão nelas a ca-
pública, assim como um modo de anun- pacidade de utilizarem essas relações para
ciar publicamente uma importante deci- crescerem e se transformarem. Conforme
são pessoal). No primeiro ponto discutido, Delory-Momberger (2006), a história de
“1) Manifestação da escrita de si – pensa- vida é a ficção verdadeira do sujeito: é a
mentos e emoções”, percebeu-se que as história que o narrador tem como verda-
experiências de escrita do jovem persona- deira, e ele se constrói como sujeito no

107
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ato de sua enunciação. O sujeito é objeto teriza-se como uma violência psíquica na
incessante de sua própria construção. Ve- qual se destacam atitudes intimidadoras
rifica-se que o ato de registrar por escrito conscientes com caráter de ridicularizar.
as experiências e percepções, inscreve-se Nesse caso, discutiu-se o quanto pode ser
na dinâmica do projeto de si e concretiza extremamente negativo a publicação de
uma forma particular dele, compreenden- si no ciberespaço. Neste estudo, perce-
do a vida contada como uma construção bemos um movimento que Josso (2004,
de si, sempre aberta e sempre a refazer. p. 171) denomina de uma “estranheza do
Nessa primeira discussão, percebeu-se a outro” e “estranheza de si”, ou seja, diante
publicação de si como algo transformador de relatos de experiências de vida, somos
e útil aos sujeitos. No segundo ponto tra- levados a reflexões acerca de nós mesmos.
balhado, “2) Manifestações da linguagem A partir das descrições das cenas do “As
do preconceito, intolerância e agressivi- melhores coisas do mundo”, compreen-
dade”, verificou-se a relevância de sen- de-se outras situações semelhantes que
sibilizar criativamente os estudantes em ocorrem na vida cotidiana, possibilitando
relação às questões psíquicas relaciona- assim uma significativa reflexão acerca
das ao bullying, fenômeno conhecido vul- desse tema. Espera-se, assim, promover
garmente como assédio moral e físico em reflexões nas quais o saber psicológico
ambientes escolares, que vem crescendo possa contribuir ao entendimento desses
em vários ambientes; desde o doméstico, fenômenos.
empresas , escolas, universidades , peni-
tenciárias, forças armadas e mais recen- Palavras-chave: sala de aula, psicoeducação,
temente nos meios virtuais (ciberespaço), filme brasileiro.
onde a intolerância, discriminação e as
minorias são alvos de ataque a indivíduos
reconhecidos como mais frágeis. O filme QUANDO A MORTE É A ÚNICA
retrata exatamente o “cyber bullying”, LIBERDADE NA JUVENTUDE: “NINGUÉM
quando uma jovem é submetida a vários ESCUTA A MINHA DOR”
constrangimentos públicos. O bullying Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC
é um problema social que deixa fissu- fscavalcantejunior@gmail.com
ras, muitas vezes, irreversíveis no sujeito André Feitosa de Sousa - FANOR
(Antunes, 2008; Bandeira, 2010; Zaine, asousa3@fanor.edu.br
2010). Tratando-se de uma pesquisa-ação
qualitativa, convidaram-se os estudantes A tríade da neurose coletiva que se agrava
do Ensino Superior pro que expressarem nos dias atuais é um problema que ocupa
reações ao filme (Cavalcante Jr, 2001), os estudos da Psicologia Humanista há
emergindo as seguintes discussões: a) longo tempo. Em uma trilogia de ações
pensar sobre o assunto, não refletido an- que findam a vida ou subtraem os anos
teriormente; b) atenção para a gravidade de existência, o ser humano mata, se
do problema social; c) mobilizar-se com as mata ou se droga (Frankl, 2010). De todos
situações vividas pela jovem personagem. os tipos de morte, o suicídio é analisado
Considerou-se, no filme, que o (cyber) como o problema mais alarmante da vida
bullying sofrido pela adolescente carac- (Hillman, 2009). Entretanto, em nenhuma

108
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

população do mundo, a aceitação da dizendo ter desistido da vida, que não


morte é recebida de forma natural quando aguentava mais...”. Analisamos, portanto,
acontece na juventude (Armstrong, o papel do professor de Psicologia do
2011). No caso do suicídio, torna-se ainda Desenvolvimento no contexto de uma
mais desafiadora a sua compreensão. juventude que sofre e pede ajuda ao
Abordando as várias facetas da juventude professor “da área”, muitas vezes o
no Brasil, a temática do suicídio também único profissional psicólogo no âmbito
está presente no filme “As melhores dos cursos de licenciatura para os quais
coisas do mundo” (Bodansky, 2010). Nele, esta disciplina é obrigatória. Por outro
acompanhamos o sofrimento do jovem lado, desenvolvemos a proposta de
Pedro (interpretado por Fiuk) para quem o que a abordagem da morte e do morrer
blog é o principal veículo de expressão de em cursos de graduação torne-se uma
suas emoções: “Ninguém escuta a minha temática transversal que não fique
dor... Podem te arrancar os braços, as restrito à disciplina de Psicologia. O
pernas... mas sem a alma, você é apenas conhecimento de teorias sobre a morte e
uma caixa de ovos boiando por aí... O meu o morrer, em suas orientações teóricas e
desejo comanda o meu destino e a morte suas variações culturais, pode representar
é a única liberdade”. O presente trabalho um conhecimento importante para ser
objetiva promover uma reflexão, no desenvolvido por profissionais com
âmbito da Psicologia do Desenvolvimento, diferentes formações. No caso em estudo,
sobre a morte como a única liberdade precedido por um episódio de suicídio
encontrada na juventude e será ilustrado consumado de uma outra estudante na
com um estudo de caso de uma jovem mesma instituição, a preparação de texto
universitária, acompanhada em uma de informativo sobre a morte e o morrer
nossas disciplinas na Universidade, cuja permitiu aos professores de diferentes
vida foi colocada em risco em tentativas disciplinas, a abordagem do tema em
recorrentes de consumar a sua morte. suas salas de aula, com foco na vida como
Utilizando-se de e-mail escreveu-nos: dádiva da morte; a compreensão do fato
“professor me ajuda a morrer”. Em uma de que refletir sobre a morte pode ser um
de suas contas em redes sociais, postou importante estímulo para a descoberta do
durante dias seguidos narrativas de significado de viver de forma consciente
seu sofrimento, o que gerou uma onde (Armstrong, 2011) dos adolescentes e
de sucessivos e-mails que nos foram adultos jovens que estão na universidade.
enviados por seus colegas de turma com Os episódios inesperados narrados nesta
compartilhamento de preocupações comunicação tiveram o potencial de
e pedido de ajuda: “Eu estou muito promover importantes aprendizagens e
preocupada, tenho medo que ela consiga mudanças no corpo docente e discente:
enfim o que quer. Por favor, professor, o interesse pelo estudo dos temas
tenta fazer alguma coisa.” Um outro dizia: integrantes do ensino da Psicologia
“Estou a lhe enviar este e-mail pelo motivo do Desenvolvimento foi despertado;
do sr. ser da área e sabe como lhe dar docentes e discentes passaram a escutar
com pessoas como ela. Recentemente ela mais atentamente as dores de seus alunos
tem colocado... mensagens depressivas, e colegas, e um programa de tutoria para

109
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os estudantes de graduação foi priorizado. abrange o debate teórico e possibilidades


Por fim, renovamos o potencial de uma de intervenção partindo das contribuições
aprendizagem que emerge da experiência, de duas importantes abordagens, a Psica-
conforme difundiu amplamente Carl nálise e a Centrada na Pessoa. Abrangem
Rogers (1983: 22) na Abordagem Centrada também atividades de extensão universi-
na Pessoa: “Aprender, e especialmente tária realizadas, que enfocaram, no caso
aprender com a experiência, tem sido um dos trabalhos de base psicanalítica, so-
elemento fundamental que faz com que a bretudo as situações advindas de relações
vida valha a pena”. familiares disfuncionais que favorecem o
recrudescimento da agressividade e a ma-
Palavras-chave: juventude, ciclos de vida, nifestação da violência, e que culminam
suicídio. em problemáticas no campo da saúde e
da escola, dificultando o desenvolvimento
saudável da criança, do adolescente e do
MR LT01 - Mesa Redonda adulto. Os diferentes enfoques trazem em
comum a importância da clínica, que não
Convidada se coloca à parte das questões sociais que
envolvem o desenvolvimento humano,
mas permite direcionamentos que visem
MR LT01-1304 - A ÉTICA DO CUIDADO
ao cuidado às famílias, à subjetividade de
NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO
seus membros e às relações interpessoais
HUMANO: COMPREENDENDO AS
que ocorrem em seu seio. Assim, esses
RELAÇÕES FAMILIARES
direcionamentos não se orientam por ati-
Maria Regina Basílio Teodoro Dos Santos - tudes de avaliação, julgamento e medidas
UNIUBE de correção, mas sustentam modos de
Vilma Valeria Dias Couto cuidar que garantem a autonomia e a in-
Conceição Aparecida Serralha dependência das famílias.

O conjunto de trabalhos apresentados


nesta mesa redonda propõe discutir o de- A ÉTICA DO CUIDADO: PLATAFORMA
senvolvimento humano como corolário do E VIA DE POSSIBILIDADE DO
cuidado propiciado pelo ambiente fami- DESENVOLVIMENTO HUMANO3
liar, bem como pelos espaços educacionais Conceição Aparecida Serralha – UFTM
que complementam este cuidado. Discute serralhac@psicologia.uftm.edu.br
a importância dos papéis parentais e as re-
lações que se estabelecem dentro da famí- MEC/SESu/DIFES – PROEXT 2010
lia, independentemente da configuração
que esta apresenta. Atenta para a questão Em se tratando de bebês e crianças pe-
ética do cuidado, que deve estar presente quenas, uma rede de cuidados, que se
não só em um contexto natural de cuida-
do, mas também em toda e qualquer in-
3
tervenção político-social, educacional e Agradeço à FAPEMIG o apoio para a apresentação deste
trabalho no VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do
profissional de apoio à família. A proposta Desenvolvimento

110
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

caracteriza por articulações que diversi- condição de poder desejar, e é a essa sa-
ficam, integram e ampliam os cuidados tisfação que podemos relacionar uma éti-
oferecidos, tem se expandido abarcando ca, uma vez que a dependência do ser hu-
a mãe e a relação mãe-bebê, bem como a mano de outro ser humano para a satisfa-
relação educador-criança. Contudo, essa ção de suas necessidades é um fato. Isso
rede ordinariamente tão necessária, me- implica uma responsabilidade de atender
rece cuidados ela própria, pois, em alguns ao que o bebê necessita de uma maneira
casos pode alterar-se rapidamente, asse- que favoreça o desenvolvimento de suas
melhando-se mais a outro tipo de rede tendências herdadas, que lhe possibilite a
(de pesca) com uma característica apri- sua pessoalidade. Este estudo pretende,
sionadora, imobilizadora e sufocante, do portanto, discutir a natureza e a qualida-
que a um apoio efetivo que leve em conta de do cuidado ao indivíduo, as caracte-
as reais necessidades dos envolvidos. A rísticas do ambiente cuidador, a relação
ideia de que se pode ter um método, uma deste com a cultura em que se insere e
técnica, ou um saber mais certo e perfeito da qual sofre influências, que são impor-
que outros tende a se implantar com incrí- tantes para o desenvolvimento de suas
vel facilidade. Isso nos faz pensar sobre a tendências herdadas ou geneticamen-
questão ética envolvida nos cuidados que te determinadas. Tem por base a teoria
são oferecidos, pois chama a nossa aten- do amadurecimento de D. W. Winnicott,
ção sobre os equívocos gerados a partir bem como experiências em atividades de
de determinados saberes. A psicanálise, extensão realizadas com profissionais da
em suas várias escolas ou abordagens, educação infantil e familiares de crian-
discute a questão ética relacionada à na- ças na primeira e segunda infância, que
turalização das necessidades humanas e apresentavam alto grau de agressividade.
a proposição de cuidados universalizada e Para tanto, foram realizadas leituras de
utópica, que retira a dimensão subjetiva textos winnicottianos e outros autores,
daqueles que recebem e fornecem cuida- bem como observações dos ambientes
dos. De acordo com Motta (2011), “a éti- da criança, encontros com educadores e
ca do cuidado,” [pensada pela psicanálise, cuidadores, que possibilitaram diálogos
...] é a do cuidado enquanto experiência importantes para a troca de conhecimen-
essencialmente humana, se tiver por di- tos, dúvidas e angústias próprias ao edu-
reção a localização subjetiva”, “não se re- car/cuidar. Sem um reconhecimento das
fere a nenhum código [...] se refere ao su- questões inconscientes envolvidas no cui-
jeito, enquanto sujeito do desejo incons- dado, uma ênfase em instruções técnicas
ciente (p. 149)”. Winnicott (1989/1994), para este é cada vez mais realizada, ob-
entretanto, considerou-se “a figura de jetivando o atendimento às necessidades
proa do movimento no sentido de um da criança para um desenvolvimento inte-
reconhecimento da satisfação da neces- gral saudável. As atividades de extensão
sidade como mais inicial e fundamental realizadas permitiram ver que, se por um
que a realização de desejos” (p. 357), sem lado, a partir do momento que essa no-
deixar de considerar o bebê necessitado ção de cuidado é difundida, mais e mais
como uma pessoa. É essa satisfação que pessoas reconhecem o seu valor e se em-
irá possibilitar ao ser humano chegar à penham em oferecer cuidados adequa-

111
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos aos bebês e crianças pequenas, como sempre esses ambientes serão possíveis.
também apoio às mães e às famílias; por Correlatamente, podemos entender a im-
outro lado, vê-se crescer a construção de portância de várias políticas públicas, que,
projetos de “escolas de pais”, “educação apesar de não serem ideais, podem aten-
em saúde”, “orientações aos pais”, que der minimamente às necessidades das
passam a exigir condutas adequadas por crianças e de suas famílias, o que é essen-
parte das mães e dos pais, sem considerar cial, mas o que não quer dizer conseguir
seus contextos de vida e seus padrões de que elas alcancem um amadurecimento
defesas individuais. Além disso, a “mãe psicossomático. Para esse alcance, é ne-
suficientemente boa”, pensada por Win- cessária a presença de alguém que esteja
nicott (1988/1990), perde sua condição física e emocionalmente bem, “vivo”, ca-
de adequação às necessidades de seu paz de ver e ouvir este bebê, ou criança,
próprio bebê e se torna uma mãe pa- como uma pessoa que tem necessidades
dronizada, repleta de instruções a serem próprias e preferências, podendo atendê-
seguidas, ignorando individualidades e -las; e não é raro o fato de que esse al-
subjetividades. Esse tipo de vivência, em guém não seja a própria mãe, até porque
graus variados, pode ser frequentemen- a esta pode estar faltando o apoio e a
te encontrada. Crianças rotineiramente sustentação emocional necessários a um
estimuladas e obrigadas a dar conta do cuidador. O cuidado essencial não pode
que não conseguem entender ou que não ser automático ou mecânico e, como bem
conseguem dar um único sentido sequer, disse Winnicott (1988/1990), desde que
fomentando a criação de novos diagnós- seja um cuidado propiciado por um am-
ticos psiquiátricos, que abarquem sua biente humanamente envolvido, pode até
desorganização. Os pais e os educado- ter falhas. O ambiente pré-escolar espe-
res, enquanto crianças que, muitas vezes, cialmente pode complementar bem esse
cresceram sob esse tipo pressão, se vêm papel. Contudo, compreender as ques-
agora pressionados a cuidar/educar, sem tões das relações primárias da criança,
uma base da qual possam se sentir segu- que afetam o seu desenvolvimento e de-
ramente apoiados. As reações de negati- sempenho escolar, não retira a importân-
vidade não são incomuns, e os cuidados cia de se pensar sobre as multidetermina-
que poderiam ser naturalmente intuídos ções dos problemas encontrados tanto no
a partir de uma sustentação emocional cotidiano familiar quanto escolar, ou seja,
adequada, não são realizados por recusa, sobre as características macrossociais e
negligência ou indiferença. E então, os culturais também na constituição desses
profissionais responsáveis pela “educação problemas, para que mudanças sejam
em saúde”, ou “pela educação continua- promovidas.
da”, não entendem, e se perguntam por
que os pais e os educadores não realizam Palavras-chave: ética do cuidado;
as orientações dadas e aprendidas. Por agressividade; ambiente.
mais que tenhamos consciência da im-
portância de ambientes suficientemente
bons para o amadurecimento emocional
de nossas crianças, sabemos que nem

112
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

A IMPORTÂNCIA DAS a apreciação desta. A consideração positi-


RELAÇÕES FAMILIARES PARA O va incondicional sugere um cuidado não-
DESENVOLVIMENTO -possessivo, como forma de apreciação
Maria Regina Basílio Teodoro dos Santos – do outro como uma pessoa individualiza-
UNIUBE da, a quem é permitido ter os seus pró-
reginabasilio@terra.com.br prios sentimentos e experiências. Con-
gruência, por sua vez, pode ser entendida
A concepção e existência do outro origi- como atitude de integrar-se, vivenciando
na-se numa díade e conclui-se numa trí- plenamente os sentimentos que fluem na
ade ou grupo maior. A organização dessa pessoa no momento. A pessoa está con-
vivência e de sua dinâmica, observados os gruente quando está livre e é profunda-
papéis de cada membro, indubitavelmen- mente ela mesma. Por isso, ser congruen-
te, favorece a manutenção da homeosta- te significa ser real e genuíno. São estas
se familiar. atitudes que permitem o crescimento e a
atualização das potencialidades criativas e
Em se tratando de abordagem, a Centra- positivas dos indivíduos em qualquer for-
da na Pessoa prima pelas relações inter- ma de relação interpessoal. Isto nos ajuda
pessoais. A mesma parte do pressupos- a compreender a amplitude do campo de
to de que em todo indivíduo existe uma aplicação da Psicologia através da referida
disposição à atualização, uma tendência abordagem, incluindo as áreas da psico-
inerente ao organismo para o crescimen- terapia, educação, resolução de conflitos,
to, desenvolvimento e atualização de suas relações familiares, grupos de encontro,
potencialidades numa direção positiva e grupos de crescimento e grandes grupos
construtiva. Esta tendência promovida de comunidade. Segundo Rogers (2009),
em uma relação interpessoal é cercada como conseqüência de uma psicoterapia
por atitudes de empatia, consideração centrada no cliente, os clientes modifi-
positiva incondicional e congruência. Por cam sua vida familiar, da seguinte manei-
empatia entende-se que é a atitude de ra: expressam melhor seus sentimentos
tentar se colocar no lugar da outra pessoa – retiram a máscara que usavam; as rela-
e tentar "ver com os olhos dela". É com- ções podem ser vividas numa base real –
preender a pessoa a partir de seu quadro o cliente descobre que pode-se viver uma
de referência; neste sentido, na situação relação com base nos sentimentos reais,
familiar, consideram-se todos os aspec- podendo exprimir sentimentos de ver-
tos que constituem a pessoa como idade, gonha, de angústia e de aborrecimento
estrutura em todos os sentidos, persona- e que a relação sobrevive a isso, em vez
lidade e outros. Para isto, é preciso dei- de fundar numa aparência defensiva; me-
xar de lado nossas próprias perspectivas lhora a comunicação nos dois sentidos:
e valores para poder penetrar no mundo compreendem a fundo as idéias e os sen-
do outro sem julgamentos. Por conside- timentos de outra pessoa e é compreen-
ração positiva incondicional, entende-se dido por ela, isso é uma das experiências
que é a atitude de aceitar cada aspecto mais humana, rara e compensadora; e,
da experiência da uma pessoa e não co- finalmente, desejar que o outro seja inde-
locar condições para a aceitação ou para pendente – os clientes tendem a permitir

113
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que cada membro da família tenha seus “à medida que eu aceito melhor ser eu
próprios sentimentos e seja uma pessoa mesmo, descubro que me encontro mais
independente. Em se tratando, especifi- preparado para permitir ao outro ser ele
camente das relações familiares, pode- próprio, com tudo o que isso implica. Isso
mos dizer que a família é um contexto significa que o círculo familiar tende a
único e dinâmico para o desenvolvimento encaminhar-se no sentido de se tornar
do ser humano. Portanto, para se falar em um complexo de pessoas independentes
desenvolvimento é necessário compreen- e únicas, com valores e objetivos indivi-
der o indivíduo nesse contexto. A família dualizados, mas unidas por verdadeiros
é algo singular e complexo, especialmen- sentimentos – positivos e negativos – que
te se for considerado a forma como as existem entre elas, e pela satisfação do
relações acontecem nesse conjunto. Po- laço da compreensão recíproca de, pelo
deríamos dizer: famílias – meio ambien- menos, uma parte do mundo particular
te/cultura - problemas/conflitos - possibi- de cada um dos outros. É desse modo
lidades de soluções. A condição familiar, que as pessoas descobrem maior satisfa-
por mais complexa que seja, nos remete ção nas relações familiares, o que facilita,
ao sentimento de pertencer a um grupo, em cada membro da família, o processo
nos tirando da solidão, que, segundo Ca- de descobrir-se e de vir a ser ele mesmo.”
mon (1993), “na maioria das vezes, é di- (Rogers, 2009). No que se refere às rela-
retamente associada com desespero, so- ções familiares é fundamental discutir so-
frimento e com o suicídio.” Segundo este bre contexto histórico, social e econômico
autor, é como se, suportar a questão de em que as pessoas estão inseridas, enfim,
ser só, fosse dicifil ou desesperador para a analisar a diversidade cultural existente.
maioria das pessoas. Camon, ainda com- Pois as alianças e os conflitos existentes
pleta que a solidão distancia quando se nas relações familiares, influenciam, sig-
mantem um relacionamento estreito ou nificativamente, no comportamento e
íntimo com uma pessoa que se ama, com desenvolvimento das pessoas, especial-
a qual se tem proximiadade e afinidade. mente, crianças e adolescentes. Assim,
E a conclusão inevitável a que se chega pode-se dizer que a família, enquanto um
é “cada um é um”, porém, como parte espaço em que se pode desenvolver uma
de um grupo ou de uma família (Camon, comunicação aberta entre os membros e
1993). De acordo com Rogers (2009), ve- eles podem expressar seus desejos e pre-
rifica-se que um indivíduo pode encontrar ocupações, favorece sobremaneira a coe-
satisfação em exprimir atitudes emocio- são do próprio grupo familiar.
nais fortes no contexto em que surge, no
caso, no contexto familiar. Dessa forma, Palavras-chave: Família. Conflito.
para este autor, a pessoa descobre que Compreensão.
é melhor viver em condição mais real do
que numa relação dissimulada, exprimin-
do mais livremente, renunciando atitudes
defensivas e ouvindo o outro. Compreen-
dem, assim, o que a outra pessoa sente e
porque é que sente. Salienta, ainda que,

114
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

A RESPONSABILIDADE DOS PAIS NA compreensão da influência dos pais na


PROBLEMÁTICA DA AGRESSIVIDADE DOS questão emocional próprias à adolescên-
ADOLESCENTES cia. Consideramos também a influencia da
Vilma Valeria Dias Couto - UFTM dimensão da cultura nas características da
vilmacouto@psicologia.uftm.edu br família contemporânea que dificulta a su-
peração da experiência da adolescência e
MEC/SESu/DIFES – PROEXT 2010
contribui para o aumento da agressivida-
de e violência dos adolescentes. Em torno
Na atualidade uma das problemáticas que
da família de um adolescente dito agres-
perpassa a adolescência diz respeito à re-
sivo normalmente circulam discursos que
corrência das manifestações de agressivi-
culpabilizam os pais pelas dificuldades dos
dade e violência. As estatísticas revelam o
filhos. É freqüente ouvirmos falas que re-
impacto da violência na população adoles-
metem para uma lógica de compreensão
cente. Estudos mostram que a violência é
das perturbações dos adolescentes como
um dos fatores determinantes nos índices
decorrente de famílias desestruturadas,
de mortalidade na adolescência e apon-
pais ausentes, negligentes ou permissivos
tam os jovens como os seus autores (Mi-
demais. Somando a este entendimento
nayo, 1990; Adorno, Lima & Bordini, 1999;
generalizante e culpabilizante, encon-
Waiselfisz, 1998). Essa situação exige dos
tramos estudos (Rutter, 1961, citado por
profissionais diferentes possibilidades de
Marcelli & Branconnier, 2007) que asso-
compreensão e enfrentamento que os le-
ciam as dificuldades dos adolescentes aos
vam a propor intervenções nos contextos
indicadores de patologia familiar de divór-
clínico, social, educacional e familiar. Com
cio, separação dos pais, doença mental e
base num projeto de extensão universitá-
alcoolismo parental.
ria que sustenta intervenções junto a ado-
lescentes de uma instituição socioeduca- Buscando avançar na discussão, recorre-
cional, propomos discutir a influência dos mos a Marcelli (2007) que distingue três
pais na agressividade dos adolescentes. perspectivas de análise da influência da
Uma das etapas do projeto propõe o de- família nos conflitos da adolescência. A
bate de temáticas ligadas à agressividade primeira compreende os conflitos entre
na adolescência. De um modo geral, veri- pais e adolescentes como conseqüên-
ficamos que o entendimento da agressivi- cia do processo de adolescência e desse
dade e violência do jovem é associado a modo é o adolescente que entra num em-
problemas familiares, especialmente dos bate com os pais, se opondo a eles para
pais. Essa constatação justifica a discussão marcar sua autonomia. Nesta perspecti-
da implicação dos pais na problemática da va, a revolta e hostilidade do adolescen-
agressividade do adolescente. Ainda que te dirigida aos pais é um mecanismo de
as intervenções sejam realizadas direta- encontrar-se a si mesmo e constitui uma
mente com os adolescentes, reconhece- pressão necessária para superar os laços
mos que este trabalho deve visar também de dependência com os pais. Ainda que
os pais na medida em que eles, de algu- o adolescente deprecie seus pais, ele não
ma forma, estão implicados nos conflitos deseja destruí-los como modelos para sua
que favorecem a agressividade. Neste vida adulta. Por outro lado, numa segun-
trabalho, apresentamos algumas vias de da perspectiva, alguns autores julgam que

115
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

as condutas problemas dos adolescentes ram o arranjo da família contemporânea,


resultam em grande parte de atitudes sustentam o enfraquecimento das figuras
patológicas dos pais que se vêem amea- parentais. Mayer (1997, citado por Saviet-
çados pelas tentativas de independência to, 2006), por exemplo, vai apontar a am-
do filho adolescente. Trata-se de pais frá- bigüidade do lugar ocupado por homens
geis que não suportam os esforços de se- e mulheres como pais na atualidade. Ele
paração do adolescente. Por último, uma considera que a família atual está em cri-
terceira perspectiva, agrega autores que se, e remete essa situação à falta de esta-
consideram que os conflitos entre os ado- bilidade e à incerteza que estão em jogo
lescentes e seus pais testemunham tanto no desempenho dos papéis dos membros
dificuldade do adolescente de assumir da família. Para Levisky (2001), a confusão
seu crescimento e sua autonomia como de papéis na família atual é fruto da au-
dificuldade dos pais de superarem o que sência de hierarquia dos seus membros,
é chamado de crise parental. Nesta pers- que gera uma indiferenciação entre pais e
pectiva, os conflitos do adolescente não filhos. Para ele, a falta de clareza dos pa-
são vistos simplesmente como resultado péis promove uma desorganização interna
da adolescência, mas testemunham tan- e externa que é capaz de gerar um senti-
to as dificuldades dos adolescentes como mento de insegurança no adolescente que
dos pais. Apesar destes três pontos de vis- neste momento, precisa ter ao seu lado
tas não serem excludentes, acreditamos um adulto para confrontá-lo em suas rein-
que é possível reconhecer um entre eles vidicações e ajudá-lo a pensar e a se de-
que parece mais pertinente a cada ado- senvolver. Este breve exame da influencia
lescente e sua família. Compreendemos dos pais na problemática da agressividade
que os adolescentes precisam desafiar os dos adolescentes mostra que na clínica,
pais, hostilizar sua autoridade já que este não só o adolescente deve ser olhado e
desafio é fundamental para o desenvolvi- escutado, mas também a própria família.
mento de sua autonomia. Os pais devem Hoje a avaliação do ambiente familiar de
suportar as provocações e os desafios de um adolescente em dificuldade deve fazer
uma forma ativa, por meio de uma postu- parte da abordagem dos profissionais. En-
ra coerente e firme. Mas como os pais de tretanto, não se trata de tomar os pais em
hoje acompanham o adolescente em sua consideração para culpabilizá-los, mas de
crise? Será que eles estão sendo capazes reconhecer a responsabilidade dos mes-
de reconhecer as reivindicações dos seus mos no processo de subjetivação do ado-
filhos adolescentes? Em acréscimo à dis- lescente. Nesta perspectiva, destacamos
cussão da agressividade dos adolescen- a proposta de intervenção clínica que en-
tes, consideramos que o funcionamento volve um trabalho de apoio narcísico pa-
da família também é influenciado pelo rental (Marty, 2006). Trata-se de uma pro-
contexto social. Estudos mostram que as posta de tratamento da agressividade que
características da família contemporânea passa pela tomada de consciência, por
dificultam a superação do processo da parte dos pais, do papel que devem exer-
adolescência. Vários autores (Roudinesco, cer na constituição do self, em particular
2003; Figueira, 1987), analisando a trans- no momento da adolescência. Os resulta-
formações socioculturais que influencia- dos do projeto de extensão apontam que

116
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

apesar das resistências é possível maior insistido, então, em expor a ideologia do


implicação dos pais na problemática dos patriarcado contemporâneo - que funda-
filhos adolescentes desde que se sintam menta, por meio da tese da naturaliza-
apoiados e não culpados pela instituição ção, as ideologias da masculinidade e da
e profissionais. feminilidade - para sustentar a necessi-
dade de reflexão sobre as práticas sociais
Palavras-chave: Adolescência. Agressividade. e institucionais vigentes e sobre nossas
Família. próprias práticas profissionais e pessoais
em relação ao gênero, que sustentam em
última análise, um processo gendrado
MR LT01 - Mesa Redonda de socialização que mantém a ideia das
chamadas escolhas profissionais adequa-
Convidada das segundo o gênero. Temos insistido
também que este processo gendrado de
socialização mantém padrões gendrados
MR LT01-785 - A CONSTRUÇÃO de emoção que mediam as aquisições
DA ESCOLHA PROFISSIONAL NO individuais. Assim, as crenças gendradas
CURSO DA VIDA: UM LOCUS DE sobre a emoção podem atuar na interpre-
INTERLOCUÇÃO ENTRE A PSICOLOGIA tação dos indivíduos sobre suas próprias
DO DESENVOLVIMENTO E A PSICOLOGIA experiências emocionais vividas em de-
DO GÊNERO. terminadas circunstâncias. Considerando
Maria Helena Fávero - UnB o exposto, esta mesa redonda discutirá,
faveromh@unb.br através de relatos de pesquisas as seguin-
Financiamento: CNPq tes questões particulares: (a) o acesso às
diferentes áreas do conhecimento segun-
Nossas pesquisas têm focado o desen- do o gênero e suas implicações na escolha
volvimento psicológico e a Psicologia profissional; (b) a desigualdade da parti-
do Conhecimento e elas nos ensinaram cipação de homens e mulheres nas áreas
que as áreas de conhecimento mantêm de ciências e tecnologia; (c) o ensino e a
representações sociais próprias e parti- aprendizagem da matemática como um
culares e que essas se articulam com os filtro crítico na manutenção desta desi-
significados dos papéis de gênero. Há gualdade; (d) o acesso ao conhecimento
duas décadas nossos dados já evidencia- sobre o gênero e a tomada de consciên-
vam que em uma situação de resolução cia da sua relação com a própria subjeti-
de problemas o desempenho dos alunos vidade; (e) a implicação da consideração
e das alunas variava se as informações do gênero na pesquisa desenvolvimental.
para a realização da atividade eram da- Em suma, por meio do aporte e da arti-
das por um homem ou por uma mulher. culação entre a Psicologia do Desenvolvi-
Temos desenvolvido uma linha de pes- mento, a Psicologia do Conhecimento e a
quisa para nos dedicarmos ao estudo Psicologia do Gênero esta mesa redonda
da Psicologia do Gênero tendo em vista abordará ambos: as interações particula-
uma maior compreensão dos processos res de gênero na construção e na media-
psicológicos desenvolvimentais. Temos ção do conhecimento científico e que tais

117
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

interações particulares dizem respeito à filiamos aos significados do feminino e do


igualdade de gênero, educação e cidada- masculino (Fávero, 2010a). Temos assumi-
nia democrática inclusiva. do dois desafios. O mais óbvio é evidenciar
a manutenção da ideia de que homens e
Palavras-chave: Socialização de papéis de mulheres constituem duas categorias dife-
gênero; Escolha profissional, Cidadania. rentes de indivíduos; o mais sutil diz res-
peito às noções de objetivo e de subjetivo,
culturalmente e historicamente associa-
ESCOLHA PROFISSIONAL E GÊNERO: dos a essas duas categorias: a objetivida-
UMA RELAÇÀO QUE DEMANDA UMA de, associada à razão, à masculinidade e ao
PSICOLOGIA REFLEXIVA E CRÍTICA. mundo público; a subjetividade, associada
Maria Helena Fávero - UnB à afetividade, à feminilidade e ao mundo
faveromh@unb.br privado. Por exemplo, em um estudo so-
Financiamento: CNPq bre as representações de gênero com es-
tudantes universitários, professores e pais
O consenso nas publicações sobre episte- de alunos obtivemos, frente à questão “Na
mologia, filosofia e história da psicologia sua vida escolar, entre professores e pro-
critica a ideia de se considerar os chamados fessoras, qual ou quais lhe marcaram mais,
vieses culturais e políticos como um pro- eles ou elas? Por quê?” duas proposições-
blema metodológico e defende o interesse -chave: as professoras são mais afetivas;
nos vieses sociais e históricos do conhe- os professores são mais competentes. No
cimento científico (Janice Haaken, 1988; geral, as professoras foram relacionadas às
Ronald Mather, 2000; Jill Morawiski, 2005; áreas sociais e humanas e os professores
Jan Smedslund 2009; Kenneth J. Gergen, às áreas exatas (Fávero & Salgado, 2006).
2010). Neste consenso, a perspectiva femi- Em outro estudo, a análise dos atos da
nista tem insistido na constituição de uma fala produzidas em grupos focais (Fávero,
psicologia reflexiva e crítica que considere 2007 b) de professores indicaram 5 temas
as dinâmicas do gênero (Jill Morawiski, predominantes: 1º – gênero e exercício do
1997; 2005). Assumindo esta perspectiva magistério nas séries iniciais – evidencian-
temos defendido a tese da interação dia- do duas proposições: a sociedade espera
lética entre o ser humano e a sociocultura que a mulher alfabetize; a instituição esco-
para evidenciar a importância do gênero lar concorda; 2º – a competência masculi-
nessa interação, tanto nas construções na no magistério – foco na racionalidade,
pessoais como nas socioculturais (Fávero, autoridade e controle, segundo a premissa
2010 a; 2010 b). Assim, temos procurado de que a figura masculina impõe respeito;
fundamentar a articulação entre desenvol- 3º – magistério e maternagem – sensibili-
vimento, conhecimento e gênero, defen- dade, natureza e cuidado fundamentaram
dendo que o plano do funcionamento in- a premissa de que a relação entre magis-
terno não é dado: ele é construído (Fávero, tério, mulher e maternagem é natural; 4º
2007 a). É nessa perspectiva que entende- – habilidades femininas – separação entre
mos a socialização: uma construção gen- áreas de conhecimento e gênero: a mulher
drada cujo ponto central reside no modo apresenta, naturalmente, mais habilidades
como entendemos a emoção e como a linguísticas, artísticas e manuais; 5º – o

118
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

homem como chefe de família e provedor nas se esforçam para aprender, mas “não
–os sujeitos defendem melhores salários, têm o raciocínio matemático desenvolvi-
não pelo magistério em si, mas por serem do”. Levando tais premissas para a discus-
homens e provedores (Fávero & Salgado, são com alunos da 9ª série, entre 14 e 15
2007). Estes dados confirmam a análise anos, obtivemos concepções distintas: “as
de Abramo (2004) e Anzorena (2008). Ou meninas são mais inteligentes na mate-
seja, um sistema de diferenças como o gê- mática”; “elas são mais maduras”; “elas
nero, torna-se um princípio organizador estudam mais”; “aprendem com mais fa-
das relações sociais: como os homens e cilidade”; “a maioria dos meninos só quer
mulheres mantêm intensa interação, seja ‘vadiar’” (Alves & Fávero, 2010). Por outro
no contexto privado, como nos contextos lado, nossas pesquisas de intervenção com
públicos, o gênero difere de outras formas estudantes com dificuldade em matemáti-
de desigualdade; esta interação constrói ca (Fávero, 2007 c) apontam como Dweck
experiências que confirmam, ou poten- (2007) que, ver a competência em mate-
cialmente determinam as crenças sobre mática como um dom fixo e “natural”, leva
as diferenças e desigualdades de gênero os estudantes a questionarem sua própria
(Ridgeway e Smith-Lovin, 1999; Ridgeway capacidade e perderem a motivação quan-
e Correl, 2004). Portanto, defendemos que do encontram dificuldades; ver a compe-
a escolha profissional é uma construção tência como um processo de desenvolvi-
vinculada a uma socialização gendrada. mento leva-os, diante de dificuldades, a
Estas questões nos permitem focar duas procurar procedimentos ativos e efetivos.
questões particulares: 1. A desigualdade Nossos estudos têm nos permitido ampliar
da participação de homens e mulheres nas esta discussão para a questão mais ampla
áreas de ciências e tecnologia; 2. O ensi- da relação entre conhecimento e cidada-
no e a aprendizagem da matemática como nia e de trazer à pauta de discussão, “no
um filtro crítico na manutenção desta de- contexto das diferentes áreas do conheci-
sigualdade, já que está no centro das cren- mento científico, a relação entre ensino, fi-
ças parentais sobre as escolhas ocupacio- losofia e cidadania, com o intuito de tornar
nais tidas como “apropriadas” aos papéis explícita a possibilidade efetiva de conside-
de gênero (Watt e Eccles, 2008). Igualmen- rar a responsabilidade humana e cidadã e
te, os professores e professoras têm ex- pleitear que a instituição escolar assuma,
pectativas diferentes para alunos e alunas por princípio, educar o cidadão e prover
particularmente no caso da matemática e educação para a cidadania” (Fávero, 2009,
isto se inicia muito cedo na escolarização p.16). Por isto mesmo concluímos, parti-
(Mosconi, 2001). Comprovamos isto em lhando os aspectos consensuais dos es-
um estudo sobre as concepções de profes- tudos da linha de pesquisa que focamos
sores e professoras de matemática: para as aqui: 1. Pleitear uma educação que funda-
professoras, as alunas têm bom desempe- mente, por meio de sua prática, uma rela-
nho em matemática porque se esforçam; ção entre igualdade de gênero, pedagogia
os alunos estão prontos para o raciocínio e cidadania (Arnot, 2006; Enslin e Tjiattas,
matemático; para os professores, as alu- 2006); 2. Conquistar justiça social, tanto no
nas tendem naturalmente para as áreas nível doméstico como no nível global (Ho-
humanas e os alunos para as exatas; as alu- well, 2007); 3. Sustentar a tese segundo

119
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a qual a afirmação dos direitos humanos ofreciendo así, subsidios para la Psicología
universais caminha junto com a decisão de cognitiva y educativa (ver Watson & Mor-
desafiar a distinção entre público e privado ritz, 2001). Presentamos los resultados de
(Kaplan, 2001). estudios en lo que hemos propuesto tare-
as sobre el contenido de dos conjuntos de
Palavras-chave: psicologia critica; socialização cajas de fósforo de diferente marca (X e
gendrada e escolha profissional; cidadania. Y), que involucra en su solución la media
aritmética, la mediana y la moda, a estu-
diantes de ambos sexo, de quinta y octava
LA RESOLUCIÓN DE PROBLEMAS: serie de enseñanza fundamental, de una
INDICIOS ACERCA DE EL PROCESO DE escuela de Brasilia, DF (150 estudiantes) y
CONSTRUCCIÓN DE LA ESCOGENCIA DE de dos escuelas de Popayán, Colombia (85
UNA PROFESIÓN estudiantes). En cada una de las 3 tareas
Yilton Riascos Forero - UNICAUCA/COLÔMBIA se buscaba que los estudiantes determi-
yirifo@gmail.com naran la marca de fósforos que, segundo
Maria Helena Fávero - UnB/DF los datos presentados tendrían más con-
fáveromh@unb.br. tenido en sus cajas: “Las empresas X e Y,
fabrican fósforos que venden en cajitas.
La literatura nacional e internacional en- Todas las cajas presentan una etiqueta que
fatiza la importancia de la relación entre indica 40 fósforos de contenido. Se sabe,
género, ciencia y matemática y la relación por observación y conteo que algunas ca-
entre desarrollo psicológico, conocimiento jas no siempre tienen el mismo número
y género (Fávero, 2010 a). Se trata de una de fósforos. Algunas veces ellas presentan
cuestión de punta que compara la igual- más o menos cantidad de fósforos; otras
dad en el acceso al conocimiento entre los veces, presentan efectivamente la canti-
géneros; sobre todo las áreas de ciencia dad indicada (40)”.Se evidenció diversos
y tecnología y su relación con las creen- comportamientos en el desarrollo de es-
cias culturales sobre género. Defendemos trategia para la resolución, encontrando
como Fávero (2010 b) que las instituciones que las estrategias de mayor complejidad
educativas, lugar donde tales creencias las desarrollaron los estudiantes brasile-
están en juego, deben ser consideradas a ros. De las estrategias identificadas, se en-
través de la articulación entre a psicología contró con más frecuencia la de sumar los
del desarrollo, la psicología del género y la valores; pocos estudiantes utilizan divisi-
psicología del conocimiento. La resolución ón y tablas de frecuencias.Se identificó un
de problemas se presta para esto porque comportamiento diferente entre las alum-
evidencia las interacciones entre regula- nas de 5ª serie y las de 8ª serie, contrario
ciones cognitivas y regulaciones sociales y al de los estudiantes hombres respecto al
expone el papel de la mediación semiótica número de tareas no resueltas. En el caso
en el desarrollo psicológico (Riascos & Fá- de los alumnos brasileiros, todos los de
vero, 2010). En particular, la resolución de sexo femenino de la 5ª serie procuraron
problemas estadísticos evalúa la lectura, desarrollar una estrategia para resolver
análisis e inferencia sobre la distribución el problema, mientras que el 18,42% de
de los datos y los conceptos estadísticos, los de sexo masculino no lo hicieron; este

120
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dato se invierte en la 8ª serie: 27,91% de O GÊNERO DA MATEMÁTICA NA


los de sexo femenino no desarrollan una FORMAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA: O
estrategia de resolución, para 10% de los DESAFIO DA PESQUISA NA DOCÊNCIA
de sexo masculino que no lo hicieron. Este Regina da Silva Pina Neves - SBEM
dato no fue observado en los estudiantes reginapina@gmail.com
colombianos, sin embargo se observó el Maria Helena Fávero - UnB
uso de estrategias más simples por los alu- faveromh@unb.br
mnos de sexo femenino. Las conclusiones
corroboran las evidencias de otros estu- Da última década do século passado para
dios (Berger, 2004; Fávero e Soares, 2002; cá, houve uma ampliação significativa do
Gonzalez-Pienda & Coll., 2006; Fernandes número de mulheres na Educação Básica
& Healy, 2007; Fávero, 2009; Fávero & Pina e no Ensino Superior (Godinho, 2005; Ris-
Neves, 2009; Muniz, 2009) y apuntan a las toff, 2006): as mulheres superaram os ho-
dificultades de los alumnos brasileiros y mens em escolaridade; estão em maior
colombianos en la utilización de instru- número nas áreas de humanas e biológi-
mentos matemáticos en la solución de los cas; os homens estão em maior número
problemas propuestos; la interacción par- nas áreas de exatas e, isto permanece nos
ticular del medio escolar con la lógica del cursos de pós-graduação (Chamom, 2005;
sistema numérico decimal y su notación y INEP, 2011). Fávero (2010) discute essas
una práctica de enseñanza que se viabiliza diferenças argumentando que é necessá-
a través de reglas no efectivas en la media- rio compreender a natureza das relações
ción de este sistema lógico y su utilización que crianças, adolescentes, jovens e adul-
como instrumento para la construcción tos têm construído com as diferentes áre-
de nuevos instrumentos de pensamien- as de conhecimento e como tais relações
to, como analizado por Fávero & Soares têm influenciado a escolha profissional.
(2002); la importancia de la enseñanza de Assim, Fávero (2010) defende uma linha
la estadística en currículo de matemática de pesquisa particular, focada na investi-
de enseñanza fundamental; la importan- gação da escolha “profissional de postos
cia de considerar la articulación entre el relacionados à ciência, matemática e tec-
género y la enseñanza y el aprendizaje de nologia; sobre a permanência da mulher
las diferentes áreas del conocimiento de nas carreiras tecnológicas e sua relação
modo que se pueda asegurar la paridad com os fatores emocionais; a relação en-
entre los géneros en lo que respecta a las tre gênero e tempo dedicado ao trabalho
profesiones relacionadas con la ciencia, (p.188).” Dentro dessa linha de pesquisa,
la tecnología, las ingenierías, como pro- temos desenvolvido estudos focados par-
puesto por Fávero, 2010 a ; el papel de la ticularmente na formação de pedagogas e
psicología en esta cuestión, que se refiere psicólogas, estudantes de pós-graduação
a la escogencia de una carrera profesional em psicopedagogia de uma universidade
y, en última instancia, respecto a la cons- pública. Temos perseguido o duplo desa-
trucción de la ciudadanía. fio de, primeiro, definir um procedimento
didático para abordar o estudo do desen-
Palabras-clave: resolución de problemas, volvimento de competências conceituais
desarrollo cognitivo, género. em matemática como uma disciplina do

121
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

curso em questão, considerando-se que de uma abordagem qualitativa segundo


ele deve responder à necessidade de dis- os quais existe um viés cultural relaciona-
cutir as questões pertinentes à Educação do com gênero no desenvolvimento dos
Matemática e, ao mesmo, mediar o co- currículos de matemática (isto é, exem-
nhecimento matemático. Segundo, tal si- plos mais relacionados com o universo
tuação didática deve se constituir em um simbólico de meninos, a partir sexto ano,
lócus de pesquisa. Assim, num primeiro por exemplo) e com a própria prática di-
estudo, apresentamos a 26 pedagogas dática, como diferentes tipos de pergun-
e 6 psicólogas, estudantes do já referido tas e incentivos para meninos e meni-
curso, duas tarefas: a resolução de uma nas (Walden e Walkerdine, 1985; Freire,
situação-problema e a análise dos regis- 2002; Andrade et al, 2003; Souza, 2008).
tros de sete alunos produzidos na resolu- Insistindo na perspectiva de que a docên-
ção de três situações-problema. Os resul- cia universitária pode e deve ser um lócus
tados evidenciaram que, no geral, as par- de pesquisa, recentemente desenvolve-
ticipantes descreviam o erro sem levantar mos um terceiro estudo junto aos atuais
hipóteses, atribuindo-o ao aluno e apre- estudantes do curso já mencionado, com
sentavam um discurso construtivista, in- o intuito de refinar nosso procedimento
compatível com suas respostas e dúvidas didático com os seguintes objetivos: 1/
conceituais (Fávero & Pina Neves, 2009). compreender como avaliam a relação
No segundo estudo colocamos em expe- que estabeleceram com a matemática,
rimentação um procedimento didático seu ensino e aprendizagem ao longo da
focado na relação entre resolução de pro- sua escolarização; 2/ analisar o seu de-
blemas, didática e história da matemáti- sempenho sobre a conceituação mate-
ca, visando capacitá-los a intervir como mática relacionada a tópicos curriculares
psicopedagogos na mediação do conhe- presente na Educação Básica, 3/ compre-
cimento matemático na prática clínica e ender como a crença sobre sua própria
institucional. Evidenciou-se que a maio- competência impacta sua futura prática
ria associava a matemática ao medo, ao profissional de psicopedagogo. Participa-
fracasso e à dificuldade. O procedimento ram 23 mulheres, entre 23 e 48 anos, pro-
didático que desenvolvemos desarticulou venientes dos cursos de fonoaudiologia,
tal associação e desenvolveu: a compe- psicologia e pedagogia. Tendo em vista os
tência para analisar a notação de alunos e objetivos anunciados, lhes propusemos
colegas segundo o campo conceitual nos uma atividade em quatro etapas: 1ª / res-
quais as resoluções se inseriam; a com- ponderam perguntas que identificavam
preensão da mediação e da notação na idade, formação, local de trabalho, ativi-
conceituação matemática; a tomada de dade desenvolvida, atuação profissional;
consciência sobre a importância do currí- 2ª / completaram as duas frases: “Na mi-
culo de matemática e das práticas de ava- nha vida escolar a matemática...”; “ Os
liação; a prática da pesquisa na formação professores de matemática na minha vida
inicial e continuada de professores. Nos- escolar...”, 3ª / resolveram uma situação-
sos dados corroboraram os estudos que -problema sobre conceitos algébricos e
têm investigado a relação entre gênero e geométricos, extraída do Programa Inter-
aprendizagem de matemática por meio nacional de Avaliação de Alunos (PISA) e,

122
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

4ª / descreveram seus sentimentos du- medo, angustia e dúvidas sobre a própria


rante a 3ª etapa. Os dados foram analisa- competência diante da tarefa. Por fim,
dos considerando-se a filiação entre com- assumem a importância de desenvolver
petências e dificuldades Fávero (2001, competências sobre o conhecimento ma-
2005b), e a natureza da tarefa proposta. temático para a sua futura prática profis-
Os dados da 1ª etapa evidenciaram atu- sional em psicopedagogia. Tais resultados
ações, como psicóloga, docente dos anos reforçam a necessidade de procedimento
iniciais, orientadora educacional e coor- didático que articule resolução de proble-
denadora educacional, todas envolvendo mas, didática e história da matemática
trabalho com crianças e adolescentes em para o desenvolvimento de competências
situação de risco, necessidades especiais matemáticas fundamentais para a prática
e situação de dificuldade de aprendiza- profissional em psicopedagogia.
gem, na maioria relacionada à matemá-
tica. Os dados da 2ª etapa evidenciaram: Palavras-chave: conhecimento matemático,
a consideração da matemática como im- gênero, pesquisa didática.
portante área de conhecimento para a
inserção dos sujeitos na sociedade atual;
relatos de experiências escolares positi- MR LT04 - Mesa Redonda
vas com a matemática nos anos iniciais
do Ensino Fundamental; relatos de que Convidada
tais experiências mudam de natureza e
passam a ser negativas na medida em
que avançam na escolaridade, atingin- MR LT04-1232 - CONTRIBUIÇÕES DA
do níveis de desinteresse, dificuldade e PSICOLOGIA ESCOLAR À PROMOÇÃO DO
aversão no ensino médio; relatos sobre a DESENVOLVIMENTO HUMANO ADULTO
diferença na mediação do conhecimento Cynthia Bisinoto - UnB
matemático por parte de seus professo- cynthia@unb.br
res e professoras a depender do nível de
ensino, sendo mais acolhedores nos anos Baseando-se em uma perspectiva crítica,
iniciais, menos acolhedores nos anos fi- positiva e progressista da Educação, as
nais do ensino fundamental e no ensino práticas profissionais, de pesquisa e de
médio, assumindo métodos mais investi- produção de conhecimento em Psicologia
gativos, nos anos iniciais e mais formais Escolar vêm se disseminando para diver-
nos demais níveis, influindo seus próprios sos espaços educativos nos quais a atua-
modos de ver e aprender matemática. Os ção e mediação da área se comprometem
dados da 3ª etapa – resolução de proble- com os processos de aprendizagem e de
ma – evidenciaram dificuldades na análi- desenvolvimento (Araujo, 2003; Guzzo,
se de padrões geométricos, na interpre- 1996, 2001; Martínez, 2003). Se, histori-
tação algébrica e na resolver da equação, camente, o trabalho da Psicologia Escolar
evidenciando a não compreensão de fór- se consolidou no contexto da escola da
mulas matemática e o significado de seus educação básica, outros espaços de de-
termos. Os dados da 4ª etapa eviden- senvolvimento humano, também respon-
ciam relatos associados a sentimento de sáveis por promover processos educacio-

123
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nais de diferentes naturezas, vêm sendo Leontiev (s.d./2004) seus maiores expo-
reconhecidos como campos legítimos de entes, concebe o homem como um ser
inserção do psicólogo escolar (Marinho- ativo, social e histórico, e assume que
-Araujo, 2009; Oliveira & Marinho-Araujo, ele se constitui a partir das interações
2009; Soares & Marinho-Araujo, 2010). sociais que são mediadoras da constru-
Alguns destes contextos são as creches, ção de suas características, sentimentos,
orfanatos, abrigos, asilos, organizações pensamentos, crenças, conhecimentos e
não governamentais, cursinhos pré-ves- concepções, enfim, da sua subjetividade.
tibular, Instituições de Educação Superior, Essa perspectiva incita-nos a pensar sobre
entre outros. Nesses diferentes espaços os espaços contemporâneos do trabalho
tem sido recorrente a preocupação e educativo como lócus para a elaboração
compromisso, sobretudo dos psicólogos de processos formativos e de mediação
escolares, com as múltiplas possibilidades de competências que busquem favorecer
de mediação em prol do desenvolvimento o desenvolvimento, tanto individual quan-
humano, particularmente o desenvolvi- to coletivo, sob uma perspectiva sistêmi-
mento humano adulto, o qual é um tema ca, dinâmica e relacional (Araujo, 2003;
lacunar na Psicologia de forma geral (Fá- Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Nessa
vero & Machado, 2003; Marinho-Araujo, perspectiva, a mesa redonda aqui propos-
2009). Por conseguinte, têm crescido as ta apresenta relatos e pesquisas que dis-
discussões em torno das competências cutem contribuições da Psicologia Escolar
dos profissionais que atuam na educa- ao desenvolvimento humano adulto em
ção, cujo trabalho deve comprometer-se diferentes espaços educativos e almeja
com o desenvolvimento e aprendizagem suscitar reflexões sobre os desdobramen-
(Marinho-Araujo & Almeida, 2005; Soa- tos das ações interventivas do psicólogo
res & Marinho-Araujo, 2010). Com base escolar junto aos profissionais desses con-
em ações contextualizadas e ampliadas a textos. Assim, o primeiro trabalho apre-
outros atores e instâncias institucionais, senta e discute uma proposta de atuação
a Psicologia Escolar tem investido no de- para os Serviços de Psicologia Escolar na
senvolvimento humano adulto por meio Educação Superior. O segundo, apresenta
de ações que visem à formação de com- experiências de intervenção do psicólogo
petências profissionais dos agentes da escolar em espaços de trabalho cotidiano
educação, sejam os próprios psicólogos e de formação continuada. Na sequência,
escolares ou outros atores (coordenado- serão abordadas possibilidades de media-
res, professores, pais e alunos) envolvidos ção da Psicologia Escolar junto a educa-
no processo educativo. Como campo de dores sociais em organização não gover-
reflexão teórica, os pressupostos concei- namental, visando o desenvolvimento de
tuais e metodológicos que orientam a competências profissionais.
prática dos psicólogos escolares têm se
alicerçado, especialmente, nas proposi-
ções da abordagem histórico-cultural do
desenvolvimento humano. Essa aborda-
gem, que tem em Vygotsky (s.d./1999,
s.d./2003, s.d./2009), Luria (s.d./2008) e

124
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

PROPOSTA DE ATUAÇÃO PARA A cação Superior é qualitativamente distinta


PSICOLOGIA ESCOLAR NA EDUCAÇÃO daquela que transcorre em outros contex-
SUPERIOR tos. O conhecimento científico, artístico
Cynthia Bisinoto - UnB e cultural intencionalmente contemplado
cynthia@unb.br nos planejamentos de ensino, as informa-
ções divididas, os saberes apropriados, as
Um dos contextos emergentes de atuação posturas éticas e ideológicas partilhadas,
e pesquisa em Psicologia Escolar é a Edu- bem como as vivências pessoais e as rela-
cação Superior, a qual tem como finalidade ções intersubjetivas que se fomentam no
formar sujeitos para a vida em sociedade. contexto educativo são mediadoras do pro-
Para além do foco na competência profis- cesso de aprendizagem e, por conseguinte,
sional, que é uma das dimensões do de- do desenvolvimento humano que tem nela
senvolvimento dos sujeitos, a formação em sua base (Oliveira, 2011). Por essa razão, a
nível superior deve incidir na preparação Educação Superior como contexto no qual
de pessoas capazes de enfrentar de forma transcorrem múltiplos e complexos proces-
ética e socialmente comprometida os de- sos de aprendizagem tem papel primordial
safios extremamente contraditórios, am- na mediação das funções psicológicas su-
bíguos e complexos que são característicos periores dos sujeitos adultos que frequen-
da sociedade contemporânea. Mais do que tam esse espaço, seja como estudantes ou
habilitar sujeitos a exercerem com compe- como profissionais (Marinho-Araujo, 2009;
tência e sucesso sua atividade profissional, Oliveira & Marinho-Araujo, no prelo). En-
a Educação Superior tem como finalidade tretanto, em virtude das inúmeras e com-
formar cidadãos conscientes do seu poder plexas transformações características da
transformador no combate à exclusão, in- sociedade contemporânea, as Instituições
justiças, desigualdade, enfim, questões re- de Educação Superior (IES) têm se confron-
levantes na área social, econômica, política tado com desafios e dilemas relacionados
e cultural de uma nação (Dias Sobrinho, ao seu papel frente às demandas do merca-
2004, 2005; Goergen, 2008; Marinho-Arau- do; à expansão quantitativa das instituições
jo, 2009; Morosini, 2005, 2006; Ristoff, e dos cursos; à efetividade dos programas
1999, 2008; Severino, 2000, 2002; Sguissar- de apoio ao acesso e permanência; à ade-
di, 2006, 2008). Nesse sentido, a Educação quação dos objetivos pedagógicos e institu-
Superior é um dos espaços sociais privile- cionais à realidade dos estudantes; à qua-
giados e fecundos à promoção do proces- lificação do corpo docente; à necessidade
so de desenvolvimento humano adulto de inovações curriculares e pedagógicas;
justamente pelo fato de que as diferentes entre outros. Para enfrentar de forma mais
aprendizagens ali propiciadas são propulso- eficiente estes desafios, as IES têm desen-
ras do desenvolvimento. Por meio da rela- volvido algumas estratégias como a criação
ção com os vários objetos de conhecimento de Serviços de Psicologia voltados ao apoio
científico, a crítica, a reflexão e o exercício ao estudante, ao sucesso acadêmico, à in-
político da participação social, além das serção profissional, entre outros objetivos.
relações interpessoais que se constrói en- Se, por um lado, nos países europeus e
tre os sujeitos adultos e jovens adultos, a norte-americanos estes serviços estão em
natureza da mediação que ocorre na Edu- funcionamento há muitos anos, por outro,

125
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no Brasil, a produção científica relativa à a um desenvolvimento saudável e pleno


atuação da Psicologia Escolar no Sistema em suas potencialidades, é extremamente
de Educação Superior e a presença dos psi- pertinente haver uma variedade de ativi-
cólogos escolares nas IES são consideradas dades que tenham como meta a promoção
restritas e recentes (Bariani, Buin, Barros desses processos. Relativamente à propos-
& Escher, 2004; Oliveira, Cantalice, Joly & ta de criação e estruturação dos Serviços de
Santos, 2006; Serpa & Santos, 2001). Dessa Psicologia, ela se ancora na perspectiva his-
maneira, a Psicologia Escolar tem um gran- tórico-cultural do desenvolvimento psico-
de desafio que é o de ampliar suas pers- lógico humano (Leontiev, s.d./2004; Luria,
pectivas de atuação por meio de práticas s.d./2008; Vygotsky, s.d./1999, s.d./2003,
diferenciadas em um contexto ainda pou- s.d./2009) e na abordagem preventiva e
co explorado pela área. Com o intuito de institucional de atuação em Psicologia Es-
conhecer o trabalho realizado nestes Ser- colar (Araujo, 2003; Marinho-Araujo & Al-
viços, desenvolveu-se um estudo com ob- meida, 2005). Se, por um lado, pretende-
jetivo de investigar a atuação da Psicologia -se, com este modelo de atuação, propor
Escolar em IES do Brasil e, em especial, do algumas linhas de intervenção para os psi-
Distrito Federal. Nesta apresentação, pre- cólogos que trabalham nestas instituições,
tende-se, portanto, discutir alguns dos re- por outro, aspira-se que ele venha figurar
sultados relativos à atuação dos psicólogos como detonador de um movimento de re-
escolares na Educação Superior brasileira flexão, estudo, investigação e problemati-
e, na sequência, apresentar uma proposta zação acerca das possibilidades de atuação
de criação e estruturação para os Serviços da Psicologia Escolar na Educação Superior.
de Psicologia na Educação Superior. No que A proposta de atuação se organiza em seis
tange aos resultados da pesquisa, nota-se eixos: (a) a fundamentação teórica que a
que os Serviços de Psicologia distribuídos sustenta, baseada na abordagem histórico-
nas IES brasileiras não são privilégio de um -cultural do desenvolvimento humano; (b)
tipo de instituição; ao contrário, eles se fa- os objetivos que se entende pertinentes
zem presentes tanto nas universidades com aos serviços desse tipo; (c) o público alvo
perfil acadêmico quanto nas faculdades para o qual podem ser dirigidas as interven-
com perfil mais profissionalizante; em rela- ções; (d) a descrição dos recursos humanos
ção à natureza administrativa das IES com que podem compor os serviços, destacan-
serviços, são as instituições privadas as que do as características do perfil dos psicólo-
mais os têm. O foco principal da ação dos gos escolares, o número de profissionais e
psicólogos nestes serviços são os estudan- o vínculo de trabalho com a IES; (e) alguns
tes, fundamentalmente os de graduação, elementos importantes sobre o funcio-
todavia, apesar do objetivo principal estar namento e organização do serviço; e, por
centrado neste segmento da comunidade fim, (f) possíveis atividades que podem ser
acadêmica, alguns Serviços já estendem desenvolvidas pelos profissionais, as quais
suas ações para outros públicos da insti- estão organizadas em três dimensões inter-
tuição, ampliando seu foco de intervenção. dependentes.
Considerando que são muitos e diversifi-
cados os espaços de aprendizagem, bem Palavras-chave: Psicologia Escolar, Educação
como são múltiplos os caminhos que levam Superior, Serviços de Psicologia.

126
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

PSICOLOGIA ESCOLAR: Le Boterf, 2003; Wittorski, 1998; Zarifian,


RESSIGNIFICANDO METODOLOGIAS 1993), esta apresentação tem, dentre seus
PARA ATENDER ÀS NOVAS DEMANDAS objetivos, compartilhar experiências de
DA ATUAÇÃO trabalho cotidiano e de formação continu-
Rejane Barbosa - SEEDF/FA, ada para profissionais da educação, mais
rejmariab@bol.com.br especificamente voltada para professores
e psicólogos que atuam no contexto da
O estudo acerca do desenvolvimento escola. O psicólogo escolar é um dos pro-
adulto vem se configurando como um fissionais que deve contribuir com a ressig-
importante e necessário campo de pes- nificação e oxigenação dos espaços subje-
quisa, haja vista os avanços tecnológicos tivos presentes no contexto educacional.
e a atual configuração sociocultural, que Pode atuar por meio da promoção de es-
demandam o exercício de novas capaci- paços coletivos e individuais de reflexão,
dades intelectuais, sociais e afetivas. Em no qual compareçam assuntos relaciona-
uma perspectiva histórico-cultural, pode- dos à prática profissional, reconhecimento
-se dizer que o ser humano desenvolve-se dos desafios e avanços presentes no con-
ao longo de todo seu curso de vida, uma texto escolar, das potencialidades do gru-
vez que é capaz de manter e aperfeiçoar po, discussão das concepções de desen-
as interações com seus pares, com instru- volvimento e aprendizagem presentes no
mentos e com o ambiente por meio das grupo escolar, entre outros. O contexto de
mais diferentes linguagens e signos cultu- ensino atual solicita um profissional que,
rais presentes no seu cotidiano (Vygostky, mediante o desenvolvimento de novas
s.d./2007). Neste contexto, a Psicologia habilidades de compreensão da escola em
Escolar constitui-se como área de conhe- sua conjuntura social, cultural, política e
cimento que contribui fundamentalmen- econômica, seja capaz de planejar estraté-
te para que a escola possa atingir seus gias de favorecimento ao desenvolvimento
objetivos enquanto espaço de promoção dos profissionais que ali atuam (Almeida,
das diversas aprendizagens, do desenvol- 2001, 2002; Araujo, 2003; Barbosa & Ma-
vimento humano e da cidadania. Não so- rinho-Araujo, 2010; Campos & Jucá, 2003;
mente para os estudantes, mas principal- Campos, Lopes, Onofre, Alexandre & Silva,
mente para os profissionais que ali atuam. 2005; Cruces, 2003; Guzzo, 2001, 2005;
Dessa, forma torna-se relevante pesquisar Guzzo & Weschsler, 1993; Marinho-Araujo
e apresentar possibilidades de formação & Almeida, 2003, 2005; Neves, 2007; Sou-
continuada que favoreçam o desenvolvi- za, 2004, 2007; Vectore & Maimoni, 2007).
mento de habilidades e recursos pessoais, A título de ilustração, serão apresentadas
interpessoais, profissionais, cognitivos, éti- três experiências intervenção do psicólogo
cos, entre outros que corroborem à forma- escolar em espaços de trabalho cotidiano
ção de competências do psicólogo e dos e de formação continuada desenvolvidas
demais atores da escola (Barbosa, 2008). entre os anos de 2009 e 2010. O primeiro
Com base na abordagem histórico-cultu- focaliza o trabalho desenvolvido no âm-
ral (Leontiev, s.d./2001; Luria, s.d./1990; bito da Secretaria de Estado de Educação
Vygotsky, s.d./ 2000, s.d./2007) e na abor- do Distrito Federal (SEEDF) com o grupo
dagem por competências (Kuenzer, 2002; de psicólogos escolares, o qual se refere a

127
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

reelaboração do documento norteador da vimento adulto, as quais vêm sendo utili-


atuação em Psicologia Escolar no DF, deno- zadas, nos últimos cinco anos de trabalho
minado Orientação Pedagógica do Serviço em Psicologia Escolar, na esfera da SEEDF,
Especializado de Apoio à Aprendizagem de modo a cooperar com a ressignificação
(OP/SEAA). O modelo inovador do traba- da atuação psicológica no contexto esco-
lho realizado proporcionou a todos os par- lar, numa perspectiva preventiva, para
ticipantes a discussão acerca das concep- além da remediação/tratamento das difi-
ções institucionais que balizam a atuação culdades de aprendizagem apresentadas
e a construção coletiva das ações que hoje pelos estudantes. Igualmente, abre novas
estão presentes no cotidiano de muitos possibilidades de compreensão das quei-
psicólogos escolares do Distrito Federal xas escolares em um contexto muito mais
(Marinho-Araujo, Neves, Pena-Moreira & complexo e permeado por possibilidades
Barbosa, no prelo). O segundo apresenta a de desenvolvimento subjetivo de todos e
dinâmica de atuação do psicólogo escolar por oportunidades de promoção do suces-
que compõe as equipes multidisciplinares so escolar e social.
de apoio à aprendizagem da SEDF, imple-
mentada em uma cidade do Distrito Fe- Palavras-chave: desenvolvimento humano
deral proposta a partir da pesquisa desen- adulto, atuação institucional, desenvolvimento
volvida por Barbosa (2008). O modelo de de competências.
trabalho foi organizado em três dimensões
denominadas: (a) intraequipe; (b). intere-
quipes e (c) extraequipe, cujo objetivo ge- ATUAÇÃO DA PSICOLOGIA ESCOLAR
ral foi viabilizar para os próprios psicólogos EM ONG: CONTRIBUIÇÕES PARA O
e para os demais membros da comunidade DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS
escolar – pedagogos, gestores, professo- DE EDUCADORES SOCIAIS
res, alunos, pais, entre outros – o desen- Pollianna Soares - UnB
volvimento de habilidades e recursos que polliannagalvao@yahoo.com.br
subsidiem ações competentes e promoto-
ras do sucesso escolar. O terceiro e último Nas últimas décadas, a Psicologia Escolar
exemplo refere-se à atuação do psicólogo tem revisto seus fundamentos epistemoló-
escolar no programa de acompanhamento gicos para o estabelecimento de novas di-
ao aluno com altas habilidades, também retrizes de atuação profissional e produção
da SEDF, que pautada pelas mesmas bases de conhecimento nos contextos de educa-
epistemológicas e teóricas vem ratifican- ção formal e não formal (Campos & Jucá,
do este tipo de intervenção relacional e 2003; Cruces, 2003, 2005; Marinho-Arau-
institucional já utilizada nas experiências jo, 2007, 2009; Marinho-Araujo & Almei-
anteriores como uma possibilidade de am- da, 2005; Oliveira & Marinho-Araujo, 2009;
pliação e ressignificação do trabalho do Soares & Marinho-Araujo, 2010; Souza,
psicólogo escolar com vistas à promoção 2006, 2010). O redirecionamento de sua
do desenvolvimento humano adulto no práxis, que amplia seu escopo de atuação
contexto escolar. Portanto, a apresenta- para distintos contextos educacionais, tem
ção do tema aqui exposto contribui com ocorrido em meio a diversas mudanças no
estratégias para a promoção do desenvol- campo político da educação no Brasil, ins-

128
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tigando a Psicologia Escolar a comparecer no desenvolvimento e consolidação da


com um posicionamento crítico e levan- identidade profissional do educador social.
tando novas questões sobre a realidade Tradicionalmente, se reconhece a Psicolo-
educacional do país. Nesse cenário, as gia Escolar como uma das áreas científicas
organizações não governamentais (ONGs) que contribuem para a discussão da for-
de natureza educacional vêm ganhando mação do professor da educação formal
atenção da Psicologia Escolar por promo- (Facci, 2009). Nesse novo panorama social,
verem atividades educativas não formais, há de se pensar sobre as possibilidades de
visando o desenvolvimento humano (Soa- mediação dos psicólogos escolares junto
res, 2008; Soares & Marinho-Araujo, 2010; ao educador social nos contextos de edu-
Souza, 2009). As ONGs educativas surgem cação não formal, que visem à transfor-
no cenário brasileiro, especialmente entre mação da realidade social. Dessa forma,
as décadas de 70 e 80, vinculadas a movi- considera-se que a Psicologia Escolar deve
mentos sociais que visam ao incentivo de estar voltada para a mediação do desen-
ações direcionadas à garantia dos direitos volvimento humano adulto, por meio da
civis relacionados à educação básica públi- promoção de intervenção e mediação psi-
ca. A inauguração desses espaços tem de- cológica que objetive contribuir para a for-
mandado profissionais da educação com mação das competências necessárias ao
um perfil específico à natureza e filosofia exercício pedagógico crítico e politicamen-
institucionais, vinculado fortemente ao te comprometido com a transformação
compromisso com a transformação social social (Barbosa, 2008; Guzzo, 2003, 2005).
(Gohn, 2009, 2010). A esses profissionais, Para isso, é importante compreender o per-
Romans, Petrus e Trilla (2003) têm deno- fil necessário do educador social no recen-
minado de educadores sociais, os quais te cenário educativo brasileiro (Caro & Gu-
proveem mediação pedagógica distinta zzo, 2003; Gohn, 2009). Entendendo que a
dos contextos formais de educação. Surgi- constituição das competências do trabalho
do em meio às emergências da sociedade esteja ligada diretamente à subjetividade
civil, o educador social ainda se encontra humana e ao desenvolvimento psicológico
com um perfil profissional pouco definido, dos sujeitos (Araujo, 2003), considera-se o
principalmente em virtude da falta de for- trabalhador como um sistema complexo e
mação adequada, tanto inicial como conti- em contínua evolução nas esferas sociais,
nuada, para o exercício competente de sua cujo processo de formação profissional
atuação. Conforme Caro e Guzzo (2004), está relacionado à constituição histórica
“muitas vezes, observam-se inadequações do seu processo de subjetivação. Assim,
de educadores sociais bem intencionados, ao se considerar o desafio da construção
pela falta de formação, de apoio e até de do perfil profissional do educador social,
uma orientação por parte de profissionais percebe-se a relevância em compreender
das diversas áreas de desenvolvimento” o caráter político, social, econômico e cul-
(p. 16). Diante desse desafio, entende- tural intrínseco aos problemas sociais que
-se que a área da Psicologia Escolar pode emergem na sociedade e que se presentifi-
trazer contribuições às ONGs educativas cam na constituição da subjetividade des-
e, entre as suas possibilidades de atuação, se sujeito trabalhador em especial. Nessa
destaca-se urgência de ações que auxiliem direção, defende-se que a perspectiva his-

129
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tórico-cultural do desenvolvimento (Leon- psicólogo escolar deve privilegiar o acom-


tiev, s.d./2001; Luria, s.d./1990; Vygotsky, panhamento das práticas pedagógicas no
s.d./2000, s.d./2007), em articulação à próprio contexto educativo, lócus privile-
abordagem por competências (Le Boterf, giado para o desenvolvimento de proces-
2003; Wittorski, 1998; Zarifian, 1993), são sos de formação contínua dos educadores
aportes teórico-metodológicos relevantes sociais. A formação continuada em serviço
à formulação de estratégias de desenvol- se constitui como estratégia bastante útil
vimento adulto. Em virtude do campo de para o desenvolvimento de competências
atuação do educador social estar relacio- que promovam reflexões e processos de
nado a compromisso e militância em favor conscientização contínuos na práxis pro-
dos setores sociais mais desfavorecidos, fissional (Guzzo, 2005; Marinho-Araujo &
sua postura deve estar para além do cará- Almeida, 2005). Tal conscientização, me-
ter pedagógico, assumindo, também, po- diada pelo psicólogo escolar, poderá evi-
sições de cunho político e ideológico (Ro- denciar, criticar e denunciar concepções
mans, Petrus & Trilla, 2003). O comprome- deterministas de desenvolvimento huma-
timento dos profissionais envolvidos nes- no; práticas domesticadoras e autoritárias
se setor reflete uma atuação em prol da de ensino e de aprendizagem; processos
transformação social, o que se torna fator de exclusão, marginalização e discrimina-
imprescindível para a conscientização de ção camuflados em processos avaliativos
sua responsabilidade como agente do de- ou em procedimentos pedagógicos pouco
senvolvimento e emancipação social dos críticos e autônomos em sua intencionali-
sujeitos (Caro & Guzzo, 2004). É com essa dade (Guzzo, 2003, 2005; Marinho-Araujo
conscientização que o Psicólogo Escolar & Almeida, 2005).
deve estar comprometido quando sua in-
tervenção direciona-se ao desenvolvimen- Palavras-chave: psicologia escolar, desenvolvi-
to adulto. Assim, a atuação em Psicologia mento de competências, educador social.
Escolar nesse contexto deverá vincular-se
ao desenvolvimento de competências de
educadores sociais, considerando a cons- MR LT04 - Mesa Redonda
tituição histórica e social das ONGs que
requerem, em suas atividades institucio- Convidada
nais, a expressão de recursos subjetivos e
objetivos de seus profissionais, manifestos
por meio de habilidades, conhecimentos, MR LT04-1399 - ESCOLA INCLUSIVA,
saberes e capacidades que compõe o perfil ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS E
pessoal e profissional do ser educador. A FOSSILIZAÇÃO DE APRENDIZAGEM
trajetória de vida pessoal e profissional do Tânia Maria de Freitas Rossi - UNICESP
educador e a própria história social dos es- taniamrossi@gmail.com
paços educacionais configuram a subjeti- Financiamento: FAP-DF
vidade social que constituem a identidade
dessa categoria (Araujo, 2003; Marinho- Esta mesa redonda discute a escola inclu-
-Araujo & Almeida, 2005). Defende-se, siva, focalizando quatro temas interrela-
nessa apresentação, que a atuação do cionados: O primeiro, Sobre o conceito

130
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de fossilização analisa o uso do termo pelas professoras contribuem para o de-


fossilização na Psicologia e na Linguística, senvolvimento dos conceitos nos dois gru-
um conceito não monolítico dada a falta pos, mas suscitam melhor compreensão
de uniformidade entre objetos de estudo. da (1) internalização dos conceitos pelas
O uso abarca (1) construtos complexos crianças, a ponto de tornar-se automa-
vinculados falhas, desvios e estabilização tizados, (fossilizados); (2) dos processos
de funcionamento cognitivo resistente que asseguram a continuidade do desen-
à alterações; (2) causas individuais, não volvimento. O terceiro tema, O processo
generalizáveis, subjetivas, com conota- de inclusão em salas regulares: pontos
ção histórica e cultural e, (3) efeitos da críticos, possibilidades pedagógicas e de-
aprendizagem hebbiana nas construções safios na formação de professores, discute
lingüísticas em um nível não-ótimo de o modelo educativo tendo como referên-
proficiência em relação à língua mater- cia a concepção de inclusão nas escolas,
na, de caráter dinâmico. Na Psicologia, a se valorizam e atendem à diversidade hu-
fossilização é estudada como sucessão de mana/cultural. Sustenta que, atualmente,
estágios necessários ao desenvolvimento há reconhecimento das diferenças, não
e formação de hábitos histórico-culturais, como incapacidades, e que o objetivo é
urgindo se retomem a abordagem genéti- ensinar a todos dado que aprender é con-
ca do fenômeno, transcendam sua iden- dição inerente aos seres humanos. Com-
tificação e focalizem a dinâmica de seu preende a realidade educacional como
desenvolvimento. Sugere a investigação multifacetada e as propostas pedagógicas
dos processos de mediação semiótica e de devem refletir a ação educativa, embasa-
internalização do conhecimento, ou seja, da na autonomia, na construção coletiva
do ensinar e do aprender, base da fossili- do conhecimento e nas potencialidades
zação. O segundo, Estratégias pedagógicas a serem estimuladas no processo de en-
para o ensino-aprendizagem de conceitos sino e de aprendizagem. O quarto tema,
científicos em uma escola inclusiva inves- Atendimento especializado aos alunos
tiga estratégias pedagógicas de quatro inclusos em salas regulares, mostra que o
professoras na construção de conceitos atendimento educacional especializado às
científicos em quatro turmas de crianças pessoas com deficiência deve realizar-se,
com desenvolvimento típico e deficiência preferencialmente, na rede regular de en-
intelectual. Analisou-se atividades realiza- sino, com estabelecimentos profissionais
das na introdução de um novo conceito e especializados próprios ao atendimento
sua apropriação pelas crianças, baseado do aluno e professores capacitados à real
nos pressupostos vygotskianos. Foram re- integração, nas classes comuns. Entretan-
alizadas entrevistas semiestruturadas com to, o quadro atual afigura-se outro: fal-
as professoras e filmadas interações entre tam material específico para atender aos
estas e as crianças, especialmente aquelas alunos e profissionais especializados para
com desenvolvimento atípico, retratando atender à criança especial. Lembra que o
três momentos: apresentação, desenvol- papel a ser assumido pelos profissionais
vimento e conclusão na constituição de educacionais especializados seria o de ca-
um conceito novo. Os resultados indicam talisar demandadas e coordenar ativida-
que as estratégias e recursos utilizados des coletivas que fomentem os processos

131
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de discussão, reflexão e resolução coletiva que foram erroneamente identificadas


e colaborativa dos problemas educativos. com formas equivalentes dessa segunda
língua, para elas transferidas, tornando-se
fossilizadas. Em 1961, Nemser (citado por
SOBRE O CONCEITO DE FOSSILIZAÇÃO Percegona, 2005) sustentou que, na aqui-
Tânia Maria de Freitas Rossi - UNICESP sição de língua não-nativa, o sujeito cria
taniamrossi@gmail.com um sistema intermediário (interlíngua) no
qual a língua em estudo não é exatamente
Vigotski (1997), ao estudar o desenvolvi- como a língua “oficial” e tampouco como
mento das funções psicológicas, deparou- a nativa. A fossilização compreenderia to-
-se com processos que, ao longo do tem- dos os estágios de competência lingüística
po, tornaram-se rígidos/mecanizados, não nativa, considerados permanente-
sem que sua aparência externa sofresse mente adquiridos. Selinker (1972; 1993),
modificação, enquanto que sua aparência descreveu o fenômeno afirmando que são
interna era modificada e esmaecida. Em itens, regras e subsistemas lingüísticos
analogia à paleontologia, os denominou que os falantes de uma língua nativa parti-
“processos fossilizados”. A fossilização re- cular tendem a manter em sua interlíngua
fere-se ao automatismo e à mecanização em relação a uma outra língua em estudo,
de comportamentos e é o final de uma li- não importando a idade do aprendiz, ou
nha que une o presente ao passado, os es- a quantidade de explicações que recebeu
tágios superiores do desenvolvimento aos sobre esta. Nakuma (1998) examinou os
estágios primários (Vigotski, 2003). O ter- pressupostos implícitos na definição de
mo fossilização, de uso freqüente na Lin- fossilização e concluiu que algum conhe-
guística, possui definições e entendimen- cimento desviado foi instaurado como pa-
tos distintos, apresentação de argumentos drão cognitivo e, nesse caso, estaria rela-
teóricos e dados empíricos para descrição cionado ao sucesso ou fracasso do sujeito
e explicação do fenômeno e conceituação ao adquirir certas regras de uma segunda
que seguem a mesma diversidade. Assim, língua. As formas fossilizadas seriam o re-
o objetivo deste estudo é analisar alguns sultado da esquiva, do desejo intencional
desses usos correntes. A Linguística con- de não adquirir uma dada forma porque
grega grande parte das investigações e acredita que ela já esteja disponível em
focaliza processos de automatização de sua bagagem cognitiva. Crer que a fossi-
comportamentos e seu uso não delibera- lização manifesta-se apenas através de
do em situações de aprendizagem de uma formas desviadas fornece uma conotação
segunda língua, com uso contínuo de for- pejorativa, como se formas não desviadas
mas desviadas da forma correta da língua não fossem fossilizáveis. A fossilização sur-
em estudo. Todavia, há mais tentativas de ge da percepção individual do aprendiz da
descrição que de explicação do fenômeno. segunda língua a respeito das equivalên-
A noção de fossilização inicia-se em 1953, cias entre esta e a língua materna, cujo
quando Weinreich (1953) demonstrou resultado pode ser positivo ou negativo.
a existência da transferência gramatical Selinker e Lakshmanan (1993) demons-
permanente nas formas da língua nativa tram, posteriormente, que a estagnação
de um aprendiz de uma língua não-nativa na fossilização deve ser considerado ape-

132
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nas a estabilização do processo de apren- potenciação de longo prazo (PLP), resul-


dizagem em um patamar, focalizando tando na descoberta de um caso típico de
algumas áreas localizadas. O estudante plasticidade sináptica entre um neurônio
apresenta um desenvolvimento contínuo pré e um neurônio pós-sináptico, tal como
em algumas áreas da segunda língua e, ao proposto por Hebb. (Lent, 2001). Se a PLP
mesmo tempo, uma relativa estabilização for adequada e possuir significado para o
de erros em outras (Percegona, 2005). A sujeito, ocorrerão a aquisição e a manu-
falta de uniformidade quanto ao processo tenção das habilidades cognitivas dese-
de fossilização na Linguística mostra que jáveis. Se a ativação for inapropriada, o
não se está diante de um conceito mono- ajuste sináptico hebbiano tenderá a forta-
lítico. Há construtos complexos vinculados lecer as tendências existentes, impedindo
a manifestações de falhas, desvios e a o progresso na aquisição do efeito deseja-
estabilização de um funcionamento cog- do. No caso da aprendizagem de uma se-
nitivo resistente às alterações. Há o deli- gunda língua, se o sujeito não perceber as
neamento de possíveis causas individuais, diferenças entre as formas da língua ma-
não generalizáveis, nas quais cada sujeito terna e da nova língua a ser aprendida, os
percebe a realidade de forma idiossin- padrões do sistema da sua língua materna
crática, o que institui uma conotação his- continuarão sendo fortalecidos indevida-
tórica, cultural e, ainda, subjetiva. Há a mente, ou seja, haverá uma fossilização
concepção da fossilização não como esta- de determinadas formas da interlíngua.
bilização permanente da interlíngua, mas Na Psicologia, dentre os raros autores que
como efeitos da aprendizagem hebbiana se debruçam sobre o fenômeno e adotam
nas construções lingüísticas em um nível a acepção vigotskiana, estão Gallimore e
não-ótimo de proficiência e complexidade Tharp (2002) que afirmam ser a fossili-
em relação à língua materna, o que lhe as- zação o conhecimento interiorizado, no
segura caráter dinâmico e não estável. De qual o sujeito passa a resolver situações-
fato, interessantes contribuições da neu- -problema sem precisar de ajuda assistida.
rociência e de simulações computacio- Eles definiram quatro estágios genéticos
nais têm sido desenvolvidas sobre como situando-os na zona de desenvolvimento
se realiza a aprendizagem na micro e na proximal (ZDP). O sujeito gradualmente
macroestrutura cerebral e faz lembrar da necessita de menos assistência para exe-
hipótese de uma estrutura latente de lin- cutar uma atividade, aumentando sua
guagem, de caráter biológico de Weinsrei- capacidade de autoregulação e o compor-
ch (1967). Bliss e Lomo (citados por Lent, tamento assistido torna-se não assistido
2001) realizaram uma estimulação elétrica e autorregulado. O estágio I refere-se às
repetitiva nas fibras colaterais de Schaffer, atividades que o sujeito pode operar com
situadas no hipocampo e registraram a auxilio de pessoas mais capacitadas para
atividade resultante nas células piramidais que, mais tarde, ele aja com independên-
da região responsável pela consolidação cia. No estágio II, ele realiza tarefas sem
da memória (Cornos de Amon – regiões assistência externa e ainda que sob influ-
CA). Eles constataram significativo aumen- ência do modo de funcionamento de outra
to no potencial pós-sináptico excitatório pessoa e sem autodireção. No próximo es-
na célula piramidal após a estimulação de tágio, a assistência e a autoassistência não

133
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

são necessárias, pois há interiorização e Analisar a dinâmica do processo de ensi-


automatização do conhecimento, ou seja, no e aprendizagem que ocorre nas escolas
fossilização. No último estágio há a desau- torna-se, pois, fundamental, uma vez que
tomatização do funcionamento anterior é nesse espaço que o desenvolvimento
(desfossilização), com a retomada de uma psicológico da criança pode alcançar níveis
nova ZDP. No limite, as contribuições de de aprimoramento de determinadas fun-
Gallimore e Tharp (2001) são aproxima- ções e estabelecer mudanças dos vínculos
ções que descrevem o comportamento e das relações interfuncionais tal como in-
fossilizado por meio da sucessão de está- dicadas por Luria e Yudovich (1985). O de-
gios necessários ao desenvolvimento, com senvolvimento de cada função psicológica
formação de hábitos histórico-culturais. particular, por sua vez, depende dessa mu-
Carece sobremaneira, retomar a aborda- dança, como no caso do desenvolvimen-
gem genética do fenômeno, transcender to de conceitos. Na aprendizagem de um
sua identificação e buscar a dinâmica de conceito, as funções psicológicas superio-
seu desenvolvimento. O conceito de fos- res que pressupõem o uso das ferramentas
silização é ainda uma grande lacuna e na intelectuais, são ativadas pela interação
psicologia reclama que se focalize e in- social, especialmente, sob a orientação ou
vestigue os processos envolvidos com a a supervisão de pessoas mais experientes.
mediação semiótica e a internalização de Por isso, no tocante ao desenvolvimento
um dado conteúdo, em outros termos, do de conceitos, as propostas pedagógicas
ensinar e do aprender. devem levar em conta a adequação do ma-
terial ao nível real e potencial dos sujeitos
Palavras-chave: fossilização, aprendizagem. aprendizes, considerando a diversidade
da aprendizagem e os ritmos diferencia-
dos de cada um. Nesse sentido, o estudo
ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS PARA O ora apresentado buscou analisar as estra-
ENSINO-APRENDIZAGEM DE CONCEITOS tégias pedagógicas adotadas por quatro
CIENTÍFICOS EM UMA ESCOLA professoras, para o ensino-aprendizagem
INCLUSIVA de conceitos científicos em quatro turmas
Divaneide Lira Lima Paixão - UCB formadas com crianças que apresentam
divaneide@ucb.br desenvolvimento típico e crianças com de-
ficiência intelectual (DI). Foram realizadas
As atividades humanas são construídas, filmagens das professoras e seus alunos,
segundo Vygotsky (1984), ao longo da vida buscando identificar e analisar as ativida-
e são resultado de aprendizagens media- des realizadas com vistas à introdução de
das na e pela cultura, o que imprime às um novo conceito e sua apropriação pelas
relações sociais e à atividade psicológi- crianças, tendo como base os conceitos
ca traços comuns que transcendem suas propostos por Vygotsky (1984), no que diz
qualidades particulares. No seio dessa respeito à Zona de Desenvolvimento Proxi-
discussão, o processo de escolarização mal. Nas filmagens em vídeo foram privi-
surge como uma significativa experiência legiadas as interações entre as professoras
que abre possibilidade de aprendizagem e, e as crianças, especialmente aquelas com
consequentemente, de desenvolvimento. DI, retratando três momentos distintos da

134
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

constituição do conceito científico: apre- mento de crianças com DI, Vygotsky (2002)
sentação, desenvolvimento e conclusão. analisa que elas apresentam certa dificul-
Foi realizada, também, com cada profes- dade em constituir o pensamento abstra-
sora uma entrevista semiestruturada para to, e que se o conteúdo e as situações de
investigar aspectos da ação pedagógica aprendizagem não forem mediadas, isso
no decurso da apresentação de um con- fica mais difícil. Nesta direção é que a esco-
teúdo novo. Os dados apontam que entre la e professores devem assumir a iniciativa
as estratégias utilizadas pelas professoras e a intervenção no processo de aprendiza-
para introduzir um novo conceito científi- do de forma competente e consciente, na
co estão: contextualização do conteúdo e medida em que os esforços devem se focar
vivências por meio de dinâmicas variadas; para estágios de desenvolvimentos ainda
o processo de aplicar, avaliar, fortalecer e não alcançados. O trabalho educativo deve
reavaliar os conteúdos programados; o uso fomentar novos conhecimentos, habilida-
da leitura pausada do material seleciona- des e competências, reconhecendo o nível
do. Quanto aos recursos acionados, são real de desenvolvimento do aluno. Os pro-
identificados: material concreto, música, cedimentos utilizados pelas professoras e
figura/imagem, poemas, material do tipo o modo como elas os justificam corrobo-
impresso e cartazes. As professoras elabo- ram a perspectiva teórica histórico-cultural
ram materiais diversificados para permitir ao passo que elas buscam introduzir um
e imprimir diferentes modos de abordar conceito paulatinamente, ressaltando sua
o assunto, evidenciando considerar o pro- construção social. Das quatro professoras,
cesso como diferenciado para cada um de três salientaram empregar estratégias di-
seus estudantes, o que possibilita a todas versificadas para atender especificamente
as crianças com ou sem DI a construção as crianças com DI. Ao serem planejadas
de conhecimentos e de modos de funcio- estas atividades levam em consideração
namento para lidar com o desenvolvimen- a necessidade e o direito de adaptação
to dos conceitos. Alternam momentos curricular e isso pressupõe o emprego de
de atendimento individual ao aluno com situações de aprendizagem em pequenos
aprendizagem colaborativa, buscam em- grupos ou duplas, considerando os níveis
pregar atividades lúdicas e de fixação de de aprendizagem e as dificuldades apre-
conteúdos, de forma a motivar os estu- sentadas, frente a um dado conteúdo. As
dantes e levá-los a perceber a vinculação professoras relatam fragilidades variadas
entre certos elementos estruturantes do no decorrer do processo, especialmente
conceito. São promovidas condições para com relação à aprendizagem das crianças
o desenvolvimento de competências e in- com DI, como manter a concentração, tra-
ternalização dos conceitos científicos, por balhar a memória e otimizar o tempo de
intermédio de jogos, reálias, que, para elas a realização das atividades; a não fixação
contribuem para promover as funções psi- dos conceitos e informações; a não com-
cológicas superiores como memória téc- preensão e acompanhamento das ativi-
nica, criatividade, raciocínio, comparação, dades, como acontece com o restante da
discriminação e generalização de idéias, turma. Tal posição corrobora os achados
além do pensamento abstrato. Ao discu- de Bogoyavlensky e Menchisnskaya (1991)
tir o processo de construção do conheci- que sustentam não existir uma relação

135
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

direta entre a construção de noções e de- uma necessidade educativa especial e,


senvolvimento cognitivo e, portanto, nem possibilitar o seu acompanhamento edu-
toda aprendizagem escolar possibilita ao cacional, em uma sala regular, com cole-
aluno o desenvolvimento das funções gas que tenham desenvolvimento típico.
mentais superiores. De fato e também Ele projeta também, os anseios da socie-
para Vygotsky (1995), as pessoas com dade em constatar que todas as pessoas
DI apresentam um desenvolvimento das são capazes de aprender, independente
funções psíquicas superiores com ritmo de suas dificuldades e limitações. Estas
diferenciado, em relação às crianças com condições ressaltam o potencial do ser
desenvolvimento típico, e um dos maiores humano, superando as deficiências físi-
entraves no desenvolvimento de conceitos cas, intelectuais, emocionais, comporta-
para aquele grupo está justamente no pro- mentais, sendo reconhecidamente imple-
cesso de generalização e abstração, que mentado, por um processo pedagógico de
não depende somente do caráter da gravi- qualidade. Este solidamente construído,
dade da deficiência, mas também da reali- sobre bases teóricas e metodológicas e,
dade social na qual ele se desenvolve e dos intrinsecamente, vinculado às ações, às
recursos mediacionais que lhe são apre- estratégias, aos materiais e aos espaços
sentados. As análises até aqui engendra- pedagógicos promotores do desenvol-
das apontam que as estratégias e recursos vimento e aprendizagem. Schwartzman
utilizados pelas professoras participantes (1997 apud Siqueira, 2008) ressalta que a
deste estudo contribuem para o desenvol- legislação brasileira assegura a inclusão e,
vimento dos conceitos científicos nos dois sobretudo, demanda que o sistema edu-
grupos de crianças e suscitam uma melhor cacional, aceite a pessoa com necessida-
compreensão acerca da (1) internalização des educacionais especiais, em classes re-
dos conceitos pelas crianças, a ponto de gulares ou comuns. Paradoxalmente, ele
tornar-se automatizado, isto é, fossilizado; reflete que, se as escolas regularmente,
(2) do processo que assegura a continuida- não têm conseguido, com sucesso, pro-
de do desenvolvimento. mover os alunos denominados ‘normais’,
como estender então este atendimento
Palavras-chave: deficiência intelectual, educacional aos que apresentam neces-
aprendizagem de conceitos científicos, sidades educativas especiais? Enfatiza a
estratégias pedagógicas. responsabilidade do sistema educacional,
na medida em que, este não prepara os
professores do ensino regular para aten-
O PROCESSO DE INCLUSÃO EM SALAS der e trabalhar pedagogicamente com
REGULARES: PONTOS CRÍTICOS, alunos identificados com necessidades
POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS educativas especiais. Sem este preparo
E DESAFIOS NA FORMAÇÃO DE acadêmico, didático e metodológico fica
PROFESSORES precário, mesmo com a experiência e boa
Ana da Costa Polonia - SEEDF/UnB vontade do professor, adotar a premissa
da inclusão. Sem dúvida, a formação ini-
O processo de inclusão, não se restringe a cial, experiência profissional, o domínio
oportunidade de matricular a criança com da estratégias de ensino e das proposta

136
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

didáticas, aliadas à formação profissional sua atuação em sala de aula, refletindo


se em constituem pilares para estabele- mudanças no planejamento, na avaliação
cer uma aprendizagem de qualidade que e na reelaboração das atividades. Fáve-
se estende a todos os alunos, sobretudo, ro, Pantoja e Mantoan (2004) reforçam
aos que demandam constantemente um que para ensinar a turma toda, é preciso
atendimento diferenciado. Como subli- programar atividades abertas e diversifi-
nhado por Vygotsky (1984), o bom ensino cadas, porque estas englobam distintos
é aquele que se adianta ao desenvolvi- níveis de compreensão, conhecimento e
mento, isso implica que, o professor deve até mesmo de desenvolvimento dos alu-
estar ciente e adote abordagens pedagó- nos, sem privilegiar ou persistir na noção,
gicas diferenciadas que possam incidir so- de que alguns sabem mais e outros me-
bre a zona de desenvolvimento potencial nos. Subjacente a esta formação, está a
do aluno, fazendo que, posteriormente, condição de oferta contínua, diversificada
ele adquira a autonomia ao empregar e democrática de cursos ou capacitações
aquele conhecimento. No entanto, condi- para atingir o quantitativo de profissionais
ções como o número de alunos por turma da educação, não apenas os professores,
e o apoio das equipes multidisciplinares que atuam em escolas regulares. Deve-se
e psicopedagógicas, são aspectos que ainda, associar, o espaço de apoio e su-
devem ser avaliados, quando se discute pervisão psicopedagógica que existe nas
o ensino de qualidade e a inclusão es- escolas, resgatando o compartilhamento,
colar. Considerando as condições educa- a discussão e a reflexão, por meio de lei-
cionais brasileiras, Mazotta (2005) indica turas e estudos de temas ligados ao pro-
que são poucos os municípios, cidades e cesso ensino-aprendizagem, estimulando
estados que contam com um sistema de a elaboração de materiais pedagógicos
ensino estruturado, nos aspectos físicos, e uma adequação curricular que aten-
materiais, humanos e políticos, de forma da as condições peculiares dos alunos e
a responder as demandas e a contemplar que permita a superação progressiva de
as condições peculiares do aluno com ne- suas dificuldades. É consenso entre os
cessidades educativas especiais. Sublinha pesquisadores que, a formação docente
que a educação de qualidade perpassa é um dos alicerces do sistema educacio-
pelo equacionamento das políticas edu- nal, enfatizado o investimento constante,
cacionais, voltadas ao atendimento des- na formação continuada, considerando
tes recursos e à formação dos profissio- seus reflexos, na melhoria do ensino e as
nais da escola, não se restringindo à ação repercussões em sala de aula. Enfocan-
pedagógica do professor. Consonante à do temas ou conteúdos que emergem
proposição de uma abordagem educacio- das necessidades e das situações prove-
nal diferenciada, se enfatiza a necessida- nientes do contexto escolar, resgatando
de de cursos de formação continuada, es- a vivência pedagógica como condição im-
pecificamente, aqueles que enfoquem es- prescindível à construção de conhecimen-
tratégias pedagógicas e práticas, métodos to e às transformações geradas nas prá-
e didáticas que atendam as necessidades ticas educativas. Complementando esta
dos alunos inclusos. E que substancial- discussão, Garcia e Yáñez (1997, apud
mente, possam apoiar os professores, em Oliveira, 2009) resgatam que os profes-

137
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sores são profissionais imersos em uma ATENDIMENTO ESPECIALIZADO


organização e, por esta condição, devem AOS ALUNOS INCLUSOS EM SALAS
ser assegurados espaços direcionados ao REGULARES
desenvolvimento de seus próprios pro- Teresa Cristina Siqueira Cerqueira - UnB
cessos de aprendizagem, que de sobre-
maneira, interferem em seu planejamen- A Constituição da República Federativa
to e na dinâmica de suas aulas. Enfim, o do Brasil de 1988 assegura, em seu Artigo
modelo educativo tendo como referencia 208, “o atendimento educacional especia-
à concepção de inclusão, está sedimenta- lizado aos portadores de deficiência, pre-
do nos estabelecimentos de ensino que, ferencialmente, na rede regular de ensino”
prioritariamente, valorizam as diferenças (Oliveira, 2009). Indicando que os sistemas
e se preocupam em trabalhar a diversida- de ensino devem ter em seus estabeleci-
de humana e cultural. Reconhecendo as mentos profissionais especializados para
diferenças, não como incapacidades ou o atendimento do aluno com necessida-
limitações, e objetivam ensinar todos os des educativas especiais, e ainda, profes-
alunos porque o aprender é condição ine- sores capacitados para assegurar a real
rente dos seres humanos. Em geral, rom- integração, nas classes comuns. Ele deve
pem as barreiras entre as disciplinas cur- ser disponibilizado em todos os níveis de
riculares, constroem uma rede de conhe- ensino, notadamente, pelas características
cimentos, evitando a concepção de currí- presentes na escola regular, na medida
culo, sob ótica conteudista, valorizando a em que se constitui em ambiente propí-
integração entre os saberes, tendo como cio para garantir e estimular a convivên-
referência a transversalidade (Gallo, 1999 cia entre os alunos, independente, de sua
apud Montoan, 2006). Nesta perspecti- condição, especialmente, quando se pre-
va, a realidade educacional é compreen- tende romper com rótulos e preconceitos.
dida como múltipla e multifacetada e as Sabe-se que o processo de interação social
propostas pedagógicas, refletem a ação é um fator que atua positivamente no de-
educativa, embasada na autonomia, na senvolvimento global dos sujeitos com ou
construção coletiva do conhecimento e sem deficiências (Montoan, 2006). Uma
nas potencialidades que são constante- preocupação emerge em relação aos re-
mente estimuladas pelo processo ensino- cursos humanos e psicopedagógicos, eles
-aprendizagem. Estas diretrizes edificam devem estar intimamente, associados às
ambientes polissêmicos, estimulando te- estratégias e aos materiais didáticos, es-
mas que partam da realidade do aluno, tando disponíveis no contexto escolar, de
considerando sua identidade sociocultu- forma a atender as demandas dos atores:
ral, estabelecendo espaços criativos e di- professores, familiares, alunos e outros
ferenciados para aprender. profissionais da educação. Principalmente,
quando se vislumbra e se assegura o pro-
Palavras-chave: formação de professores; cesso de inclusão, o considerando como
inclusão; processos pedagógicos. fonte permanente de desenvolvimento e
aprendizagem humana, tendo como eixo a
diversidade cultural. Retomando a função
e o atendimento especializado nos espa-

138
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ços escolares, Alves et al (2006) destaca incluindo o Distrito Federal, englobando


que as salas de recursos multifuncionais 4.564 municípios brasileiros - 82% do to-
são espaços na escola, centrados no aten- tal.4 Outro profissional presente na escola
dimento educacional especializado, obje- e que pode integrar esta rede de apoio psi-
tivando atender os alunos com necessida- copedagógico é o orientador educacional.
des educativas especiais, com o emprego Atualizando as suas funções, Placco (1994,
de estratégias diferenciadas de ensino, de apud Oliveira, 2009) enfatiza que o papel
forma potencializar a aprendizagem e o deste profissional sofreu transformações,
fazer pedagógico. Visa então, favorecer e não sendo mais a porta de ‘entrada de alu-
desenvolver a construção de conhecimen- nos problemas’. Sobretudo, emerge como
tos e, concomitantemente, propiciar que um dos educadores da escola, envolvidos
todos os estudantes possam ativamente em uma ação escolar coletiva, estabele-
participar do currículo da escola, e desen- cendo processos voltados ao desenvolvi-
volver habilidades e competências impres- mento de uma atividade pedagógica de
cindíveis à qualidade do ensino. Nele se qualidade, significativa e inserida no pro-
encontram materiais didáticos, pedagógi- jeto político pedagógico da escola. Assim,
cos, equipamentos e recursos outros, além ele pode atender o grupo de professores
dos profissionais com formação e qualifi- e as demandas particulares de cada um,
cação para o atendimento às pessoas com ainda promover discussões e grupos de
necessidades educacionais especiais, es- estudo, além de buscar outros profissio-
tendendo, quando necessário, orientações nais que possam dar apoio profissional, de
aos professores da sala de aula. A perspec- acordo com as necessidades do grupo de
tiva assegurada neste ambiente, é que o professores. Quanto aos profissionais que
professor responsável considere as dife- compõe o quadro de especialistas, focados
rentes áreas do conhecimento, os estágio no apoio educacional, se pode identificar, o
de desenvolvimento cognitivo dos alunos, supervisor escolar, o orientador educacio-
seu nível de escolaridade, potenciais e difi- nal e o coordenador pedagógico, Oliveira
culdades, aliados aos recursos específicos (2009) retoma que na atualidade a função
para sua aprendizagem, de maneira a pos- deste grupo converge para a qualidade da
sibilitar atividades de complementação e ação pedagógica: oferecer assessoramen-
suplementação curricular. Assim, os alunos to ao docente, adotando uma perspectiva
podem ser atendidos individualmente ou colaborativa de trabalho, fortalecendo as
em pequenos grupos, conforme necessi- bases de uma atividade educacional de
dade e programação especial, em horários cunho coletivo, voltadas ao fazer pedagó-
diferenciados e opostos, de suas aulas, em gico crítico e reflexivo, aliando a compe-
sala regular. Configura-se como um espa- tência à experiência, como fundamentos
ço para atender, com qualidade, os alunos do processo ensino-aprendizagem. Esta ar-
com deficiência, transtornos globais do de- ticulação possibilita trocas de experiência,
senvolvimento e aqueles identificados com
altas habilidades que fazem parte das tur-
mas de ensino regular De 2005 a 2009, fo- 4
Implantação de salas de recursos multifuncionais, disponí-
ram disponibilizadas 15.551 salas de recur- vel em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
content&view=article&id=12295&Itemid=595, acessado
sos multifuncionais para todos os estado, em 21/11/2011, às 1:15.

139
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

conhecimentos e rede de apoio entre os o número reduzido de profissionais, retra-


profissionais da escola. Sobre a constitui- tam as dificuldades de sua implantação. In-
ção da equipe psicopedagógica e seu pa- clusive as políticas educacionais, por vezes,
pel no espaço escolar, Muller et al (2010) negligenciam o investimento nas equipes
aponta entre os seus objetivos: promoção de atendimento especializado, sobrecarre-
da melhoria da qualidade do processo gando o professor, o deixando isolado e se
de ensino e de aprendizagem, adotando sentindo responsável pelo processo peda-
uma perspectiva institucional, centrada na gógico de inclusão.
abordagem preventiva e interventiva, com
vistas ao aprimoramento e contextualiza- Palavras-chave: equipes de apoio à
ção das atividades profissionais, dos distin- aprendizagem, educando com necessidades
tos atores que fazem parte das instituições educativas especiais, sala de aula, sala de
educacionais. Visa então, fomentar e in- recurso, equipes multiprofissionais.
crementar a qualidade educacional, retra-
tada no desenvolvimento e aprendizagem
efetiva dos alunos, fundamentada na cul- SP LT03 - Simpósio
tura de sucesso escolar. Ela é atualmente,
composta por um profissional formado em
pedagogia e outro em psicologia, sendo SP LT03-1244 - AÇÕES EDUCATIVAS
rebatizada, como Equipes Especializadas E O DESENVOLVIMENTO MORAL DA
de Apoio à Aprendizagem. Apesar do reco- SOCIEDADE
nhecimento e da legislação que assegura Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC-Goiás/
este apoio educacional especializado, em UnB
grande parte das escolas, falta material vannuzia@terra.com.br
específico para atender os alunos, pro- Rafael de Almeida Mota - PUC-Goiás
fissionais especializados, como intérpre- rafael.almeida@live.co.za
tes de Libras para atender a criança com Cândido Martins do Santos Neto - PUC-Goiás
necessidade educativa especial, Ainda, o cmsnpsi@gmail.com
coordenador pedagógico e o orientador Luciane Aparecida Muniz Mols - PUC-Goiás
educacional, e entre outros profissionais luciane_muniz_@hotmail.com
especializados que estariam catalisando as Roberta Alves Dionisio - PUC-Goiás
demandadas e coordenando atividades co- roberti.alves@hotmail.com
letivas, que fomentassem os processos de Marina Magalhães David - PUC-Goiás
discussão, reflexão e proposição, visando à marinadavidpsi@hotmail.com
resolução coletiva e colaborativa dos pro-
blemas educativos. Mazotta (2005) ressal- Com base nos resultados de pesquisa
ta que este atendimento é restrito e, não qualitativa sobre a “Expressão Moral do
atingem uma boa parte dos municípios, ci- Goianiense”, realizada em quatro semes-
dades e estados. E a precariedade engloba tres consecutivos por alunos do Curso de
desde o espaço físico destinado a sala de Psicologia da Pontifícia Universidade Cató-
recurso ou destinada ao atendimento por lica de Goiás, foram desenvolvidas ações
parte das equipes atuarem. Além disso, os educativas com adolescentes, adultos e
materiais didáticos, os recursos humanos e idosos na perspectiva da psicologia histó-

140
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rico-cultural da subjetividade de Gonzá- tes de torcidas organizadas, para que elas


lez Rey. Com o objetivo de criar espaços pudessem através de si mesmas, de sua
sociais de desenvolvimento moral, essas subjetividade e de sua capacidade de aná-
ações consistiram na construção de diá- lise compreender quais atitudes necessita-
logos e reflexões sobre a invisibilidade do vam ser metamorfoseadas para que a rela-
outro, a despersonalização do sujeito e a ção homem – sociedade estivesse pautada
produção da violência nas relações, den- na Moral, abortando assim atitudes que
tre outras categorias construídas no pro- são contrárias ao viver social harmônico,
cesso da pesquisa. Para isso foram utiliza- como a violência exacerbada, que se vê tão
dos cartazes, panfletos, vídeos e jogos de vinculada a estes meios que supostamente
ação envolvendo todos os participantes deveriam propiciar formas de lazer límpi-
que foram escolhidos aleatoriamente e do, mas que na realidade só reafirmam a
deram seu consentimento livre e esclare- posição de Sujeitado de seus participantes.
cido ao serem convidados nos diferentes Foi realizada uma ação educativa, de cará-
espaços da cidade, dentre eles um clube ter qualitativo (González Rey, 2005) em
de futebol e duas escolas, uma de ensino um clube de time local, quando teve-se a
fundamental e outra de ensino médio. O priori uma perspectiva de construção de
envolvimento ativo dos participantes no conhecimento, com integrantes da torcida
diálogo e reflexão sobre as categorias e e estudantes de psicologia refletindo sobre
sobre os temas delas decorrentes, pos- este “indivíduo torcedor” e como o grupo
sibilitaram a construção do indicador de o posiciona frente à agressividade, rivalida-
sentido de que é premente a realização de de, revanchismo e incapacidade de discer-
ações educativas que desafiem e compro- nimento que o precipita à uma agressão
metam os sujeitos com práticas sociais, cega em decorrência de desdobramentos
atividades e relações que privilegiem o futebolísticos. Mostrou-se visível como em
desenvolvimento moral da sociedade. organizações populares, grupos de massa,
no caso, as torcidas organizadas, o proces-
so de morte do Sujeito. Ele se torna exau-
A MORAL NO ESTÁDIO DE FUTEBOL – A rido de sua própria voz, sua capacidade de
ESSENCIA DO FUTEBOL NAS TORCIDAS decisão não está mais pautada em si, mas
ORGANIZADAS no grupo, abdicando-se deste modo da
sua subjetividade e agindo de acordo com
A partir de um estudo realizado por quatro a direção acenada pelo grupo, o que torna
semestres na matéria “Psicologia do De- visível a compreensão do por que da vio-
senvolvimento III”, que visava compreen- lência estar tão latente nestes meios, ten-
der a expressão moral do Goianiense em do em vista que as amarras impossibilitam
vários espaços sociais, sendo um deles o a autonomia e tornando-os sujeitados,
estádio de futebol, teve-se direcionamen- fazendo com o que seu corpo grite a todo
to à segunda parte deste projeto, que an- instante para ser retomada a posse de ser
siava práticas de modelos educativos para Sujeito de si mesmo.
possibilitar a reflexão, consciência e envol-
vimento cognitivo-emocional das pessoas Palavras-chave: subjetividade, sujeito, torcidas
vinculadas aos times, no caso, participan- organizadas

141
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

EDUCAÇÃO MORAL DE JOVENS presente em todas as ramificações sociais


NA ESCOLA – SERIA A ESCOLA UM dos meios de ensino, possibilitando assim
DELIMITADOR CRIATIVO E SOCIAL? a mudança nesta concepção de como se
dá o ensino, o aprendizado e as relações
Tal trabalho surgiu da necessidade de se dentro do ambiente escolar, para formar
compreender como o sujeito moral, isto sujeitos morais.
é, aquele que se orienta a partir da moral
constitutiva de sua personalidade (Gon- Palavras-chave: escola, educação moral,
zález Rey, 1989) emerge de relações de subjetividade
extrema complexidade, muitas vezes rís-
pidas e que camuflam com discursos do-
ces o marasmo, a estagnação e práticas ESCOLA E EDUCAÇÃO MORAL:
deletérias que muitas vezes dão formas MUDANÇA OU MANUTENÇÃO DO
as silhuetas das Escolas. Como podemos STATUS QUO?
discorrer sobre sujeitados sociais e sobre
a incapacidade reflexiva de um grande Com base na psicologia histórico-cultural
número de pessoas, se em nosso modelo da subjetividade de González Rey foi reali-
de educação vigente, as escolas, um dos zada ação educativa em uma escola, com o
primeiros passos das crianças à um meio objetivo de criar um espaço de expressão
social além de sua família, só impõem ain- autentica dos alunos, no tocante as suas
da mais o desligamento do homem de si relações cotidianas com os professores.
mesmo, de suas sensações, sentimentos, Participaram da ação educativa, alunos
manifestações, destituindo-o daquilo que do sexto ano do ensino fundamental de
o torna único, a sua subjetividade? A pro- uma escola estadual. Motivados por car-
posta de nosso trabalho de ação educativa tazes ilustrativos de situações de opressão
era desafiar pais e professores a levarem e violência, os alunos foram desafiados a
em conta a necessidade de expressão da expressarem suas idéias e emoções pro-
duzidas no espaço da sala de aula, com
criança, de tornar-se sujeito e se envolver
relação à escola e aos professores. Nesta
de forma ativa com o mundo que a cir-
atividade lúdica os alunos expressaram,
cunda, para romper com uma relação de
por meio da arte, emoções produzidas nas
obrigatoriedade, automatizada e, assim,
práticas delimitadoras de suas relações no
abandonar o patamar de sujeitada e tor-
âmbito escolar, tais como: insatisfação,
nar-se sujeito de seu próprio aprendizado.
raiva, desmotivação, desconsideração.
Tendo como direção teórica a perspectiva Deste modo, pôde-se perceber sua neces-
histórico-cultural da subjetividade de Fer- sidade de participar ativamente da vida
nando Gonzalez Rey, tivemos a oportuni- da escola, necessidade esta que se mostra
dade de construir junto aos pais e profis- escassa numa realidade escolar que busca
sionais da educação a representação de a homogeneização. Se para Edgar Morin
uma escola onde o sujeito não fosse ne- (2003), a moral é “a constituição do ou-
gado a todo instante, mas sim enxergado tro em mim”, como podemos pensar em
e valorizado. O abordar dessa escola tão Moral em um espaço onde a figura de au-
pouco humanizada exigiu a reflexão sobre toridade desconsidera os anseios dos alu-
este fatídico da educação que se mostra nos? Portanto, existe constituição deste

142
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

outro moral em mim? Ele é simplesmen- apenas ser uma obrigação. Impor leis e pu-
te ignorado? O profissional da educação, nições para pessoas que não respeitam a
ao tornar-se o detentor da verdade, não faixa pode ser uma medida imediata, mas
dificultaria o desenvolvimento do aluno não a solução quando para o desenvolvi-
enquanto sujeito? Na perspectiva de Gon- mento humano, o que significa não apenas
zález Rey (2006) o desenvolvimento do obedecer às fiscalizações, mas respeitar os
sujeito somente é possível pela aprendiza- direitos do outro.
gem, o que implica em envolvimento do
aluno no processo de educação e, portan- Palavras-chave: desenvolvimento moral,
to, na mudança deste status quo. subjetividade, faixa de pedestres.

Palavras-chave: escola, moral,


desenvolvimento A MORAL DO GOIANIENSE NAS
AGÊNCIAS BANCÁRIAS

A MORAL DO GOIANIENSE NA FAIXA DE No primeiro semestre de 2011, na Ponti-


PEDESTRES fícia Universidade Católica de Goiás (PUC-
-Goiás), com base no conceito de Gon-
A partir de pesquisa sobre a expressão mo- zález Rey de que a moral é um elemento
ral do goianiense, na disciplina de Psicolo- da personalidade que orienta o sujeito
gia do Desenvolvimento do curso de Psico- nas suas relações e práticas sociais, foi
logia da Pontifícia Universidade Católica de realizada uma ação educativa visando
Goiás, foi realizada uma ação educativa no o desenvolvimento moral de usuários e
trânsito, na perspectiva da teoria histórico- funcionários de duas agências bancárias
-cultural da subjetividade, com o intuito de da cidade de Goiânia, uma de um bairro
mobilizar as pessoas para refletirem e pro- periférico e outra de um bairro nobre. É
duzirem uma subjetividade sobre a impor- importante enfatizar que as gerências
tância de respeitarem a faixa de pedestres. de ambas as agências foram devidamen-
Para isso foram utilizados panfletos, a par- te esclarecidas sobre o intuito da ação e
tir dos quais as pessoas eram abordadas permitiram que fosse realizada desde que
e convidadas a participarem da ação. Ob- a identidade da instituição fosse preser-
servou-se que a grande maioria dos par- vada. A ação consistiu na distribuição de
ticipantes mostrou interesse e motivação panfleto contendo, como disparador para
para a discussão sobre o tema, bem como reflexão e discussão, a seguinte pergunta:
preocupação com a educação de motoris- “Como está sua moral dentro da agência
tas e pedestres para se respeitarem mutu- bancária? As reflexões e discussões sobre
amente. Sobre a questão, ainda há muito a moral, tanto com os usuários quanto
que fazer, as pessoas precisam se cons- com os funcionários de ambas as agên-
cientizar que respeitar a faixa de pedestres cias, trouxeram aos estudantes a oportu-
é um problema do âmbito da moral. Essa nidade de entrarem em contato com uma
noção de respeito precisa ser desenvolvida realidade complexa, em que cada pessoa
por cada pessoa, fazer parte de sua orien- pensa e age diferentemente da outra, ou
tação moral (González Rey, 1989) e não seja, existe aquela que está indiferente,

143
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aquela que ironiza sobre a problemática inserem-se como experiências de aprendi-


da moral e aquela que está atenta à ela, se zagem (Gonçalves & cols. 2008; Rodrigues
interage com os estudantes e se mobiliza & Oliveira, 2009). Neste contexto, as estra-
para ajudar a mudar a realidade. Entretan- tégias preventivas e promotoras de saúde
to, o fato de pessoas terem dado atenção vêm ganhando cada vez mais destaque
à ação é um importante indicador de que (Borges & Marturano, 2009; Rodrigues,
o tema pode e precisa ser retomado em Dias & Freitas, 2010). Matinez (1996) as-
outras oportunidades. Uma vez registra- segura que a escola é um espaço poten-
do em vídeo, com a permissão dos par- cial para se prevenir problemas e promo-
ticipantes, o processo da ação educativa ver saúde. Um recurso promotor de saúde
permitiu aos estudantes produzirem um são as histórias infantis (Borges & Martu-
pequeno documentário que deverá, en- rano, 2009; Kalyva & Agaliotis, 2009; Ro-
tão, servir a outras ações educativas que drigues, 2009; Teglasi e Rothman, 2001).
serão realizadas por outros estudantes em Rodrigues e Oliveira (2009) salientam que
futuro próximo. o relato e a leitura de histórias favorecem
a ampliação da realidade da criança, a
Palavras-chave: agências bancárias, escuta e observação dos outros em uma
desenvolvimento e moral. perspectiva de aprendizagem e conscien-
tização de que as outras pessoas também
possuem sentimentos, pensamentos, mo-
CO 24 - LT4 tivos e desejos e que cada ação tem uma
consequência nos diversos contextos que
Literatura e Brincar vivenciam. Teglasi e Rothman (2001), uti-
lizando a literatura infantil, elaboraram
um programa para promover o desenvol-
LT04-722 - LIVROS DE HISTÓRIAS: UM vimento sociocognitivo de crianças agres-
RECURSO PROMOTOR DE SAÚDE NA sivas, com base nos seis componentes do
EDUCAÇÃO INFANTIL modelo de processamento da informação
Jaqueline Pereira Dias - USP social proposto por Dodge e Crick (1994).
jaquepdias@gmail.com Como resultados obtiveram redução de
Edna Maria Marturano - USP comportamentos externalizantes em alu-
emmartur@fmrp.usp.br nos de 4º e 5º ano. Tendo como apoio
Financiamento: CAPES teórico o mesmo modelo, o presente es-
tudo teve por objetivo promover habili-
A permanência na educação infantil acon- dades sociocognitivas, por meio da leitura
tece em uma fase crucial para o desen- de livros de histórias infantis, em alunos
volvimento social, escolar e emocional da da educação infantil. Esperava-se que,
criança. O Referencial Curricular Nacional com o desenvolvimento do pensar socio-
para a Educação Infantil (1998) ressalta cognitivo propiciado pela intervenção, as
que é função social da escola capacitar a crianças melhorassem suas habilidades
criança para sua inserção na sociedade; sociais e seu comportamento nas relações
para isso a formação pessoal e social e a com os companheiros. Método – Sujeitos
aquisição do conhecimento de mundo - Participaram do estudo até o momento

144
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

25 crianças de 5-6 anos, matriculadas no dos junto aos professores, antes e depois
Pré III de uma escola de educação infantil da intervenção, de modo a aferir os seus
filantrópica, no interior de São Paulo. Ma- efeitos. Para avaliar as habilidades sociais
teriais e procedimentos - Para implemen- das crianças, foi utilizado o Questionário
tar a intervenção, foram selecionados 25 de Respostas Socialmente Habilidosas -
livros ilustrados de histórias infantis, ricos QRSH-RP (Bolsoni-Silva, Marturano & Lou-
em pistas sociais, com base na pesquisa reiro, 2009), composto por 24 itens agru-
de Rodrigues e cols. (2007). A intervenção pados em três fatores - Sociabilidade e
foi conduzida durante três meses, em 25 Expressividade Emocional, Iniciativa Social
sessões, com cerca de 50 minutos cada, e Busca de Suporte. Para avaliar proble-
em grupos com até 9 crianças. Em cada mas de comportamento, empregou-se o
sessão, a interventora lia um livro de his- Questionário de Capacidades e Dificulda-
tória interativamente, visando explorar e des – SDQ (Fleitlich, Cortázar & Goodman,
discutir o seu conteúdo com as crianças, 2000), composto por 25 itens em cinco
de acordo com o modelo de seis compo- escalas: sintomas emocionais, problemas
nentes do processamento da informação de conduta, hiperatividade, problemas
social. Na exploração do primeiro compo- de relacionamento e comportamentos
nente - o que está acontecendo? - as crian- pró-sociais. Um procedimento de avalia-
ças observam e interpretam as pistas so- ção sócio-cognitiva também foi utilizado,
ciais. No segundo - o que os personagens porém seus resultados ainda não estão
estão pensando e sentindo? - as crianças disponíveis. Os resultados das avaliações
são incentivadas a observar o “mundo pré- e pós-intervenção foram comparados
interno” dos personagens por meio das por meio do teste de Wilcoxon. Resulta-
ilustrações e leitura. No terceiro compo- dos e discussão - Os resultados apontaram
nente - quais são as intenções e metas incrementos significativos (p < 0,05) da
dos personagens? - relacionam-se os sen- pré para a pós-avaliação nos escores to-
timentos e pensamentos, já identificados, tais de dois fatores do QRSH-PR. No fator
com os objetivos e as metas. No quarto sociabilidade e expressividade emocional,
- o que os personagens alcançam com com 14 itens, aumentaram os escores nos
suas ações? - Discute-se com as crianças itens comunica-se positivamente, cumpri-
a relação entre os objetivos e metas dos menta, expressa carinhos, expressa dese-
personagens e os resultados alcançados. jos, expressa frustração e desagrado de
No quinto - como os personagens execu- forma adequada, faz elogios e tem rela-
tam e monitoram seus comportamentos? ções positivas. No fator iniciativa social (6
- as ações dos personagens são avaliadas itens), houve incremento nos itens toma
levando em consideração as consequên- a palavra, participa de temas de discus-
cias do comportamento. O sexto e último são, negocia. Os itens usualmente está de
componente - quais as lições aprendidas? bom humor e toma iniciativas mostraram
- abre para a criança a oportunidade de tendência a aumento (p < 0,10). No SDQ,
estabelecer relações entre as experiências houve melhora da pré para a pós-avalia-
vivenciadas pelos personagens da história ção nas escalas relativas a problemas de
e aquelas vividas por ela própria em seu relacionamento e comportamentos pró-
dia a dia. Dois instrumentos foram aplica- -sociais. Os resultados demonstraram

145
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

uma redução de problemas de relaciona- Os projetos sociais são hoje uma realida-
mento e aumento nas taxas de compor- de muito comum à sociedade brasileira.
tamentos pró-sociais. Não tendo havido São iniciativas individuais ou coletivas
mudança nos indicadores de busca de que visam a proporcionar a melhoria da
suporte (QRSH-PR), sintomas emocionais, qualidade de vida de pessoas e comuni-
hiperatividade e problemas de conduta dades. A sociedade se mobiliza, por meio
(SDQ), pode-se supor que os resultados de contribuições voluntárias, organizando
refletem a especificidade do programa e desenvolvendo projetos e ações sociais
para promover comportamentos social- para transformar determinada realidade
mente habilidosos e reduzir problemas de para o bem comum. A arte e a música,
relacionamento. A evolução encontrada mais especificamente, representam a ma-
nos referidos resultados denota que com nifestação cultural de um povo e contri-
o programa de leitura de histórias infantis buem para qualificar a vida das pessoas,
as crianças se tornam mais colaboradoras, na medida em que, através da arte, o ser
empáticas, atenciosas e, provavelmente, humano manifesta sua cultura e, correla-
mais capazes de analisar as consequên- tivamente, suas emoções, ou seja, aquilo
cias de cada comportamento (Rodrigues, que compartilha socialmente e seu mun-
2009; Rodrigues & Oliveira, 2009), o que do subjetivo. Sendo assim, elas se tornam
pode contribuir para a melhora da con- uma importante ferramenta para que os
vivência na escola (Borges & Marturano, projetos sociais atinjam seus objetivos.
2009). Conclusão - Programas promotores Os resultados de pesquisas anteriores
de habilidades infantis são de grande va- (Kebach, 2003; 2008) evidenciam que a
lia para favorecer o relacionamento inter- educação musical nos espaços informais
pessoal; a literatura infantil vem se mos- demonstra ser algo bastante produtivo
trando benéfica dentro desta proposta. em termos de musicalização e de trocas
Por meio dos livros de história as crianças sociais, o que motivou a realização da
esclarecem de modo interativo, contex- pesquisa atual. Diante disso, o objetivo
tualizado e reflexivo o processamento da desta pesquisa é investigar no âmbito de
informação social tornando-se cada vez projetos sociais no Vale do Paranhana/RS,
mais ajustadas ao meio social. como ocorrem as práticas musicais para
compreender de que modo estes espaços
Palavras-chave: desenvolvimento podem contribuir para a construção mu-
sociocognitivo, livros de histórias infantis, sical, para a inclusão e resgate da cultura
educação infantil local dos sujeitos envolvidos neste proces-
so. Através da pesquisa, poder-se-á mape-
ar a Educação Musical informal na região
LT04-744 - A MUSICALIZAÇÃO NO de estudo e sua repercussão na sociedade
CONTEXTO DOS PROJETOS SOCIAIS DO local, legitimando-se este espaço. Pre-
VALE DO PARANHANA/RS tende-se também contribuir para que os
Alexandre Herzog - FACCAT atuantes nos projetos sociais aprimorem
alexandre.herzog@hotmail.com seu trabalho e pensar na implantação da
Patrícia Fernanda Carmem Kebach - FACCAT educação musical, obrigatória nas escolas
patriciakebach@yahoo.com.br a partir de 2011, em função da lei 11.769

146
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

publicada no Diário Oficial da União em nesses projetos através do ensino de ins-


agosto de 2008, de modo mais qualifica- trumentos musicais e por meio da realiza-
do e significativo. A metodologia utilizada ção de corais, que permitem a construção
visa compreender o fenômeno em suas do cantar dos participantes e a sensibili-
dimensões individual e social. Os sujeitos zação musical. Nos projetos mapeados
investigados serão os professores (ou ou- até o presente momento, de modo geral,
tros proponentes) e participantes do pro- objetiva-se trabalhar com a prevenção
cesso de musicalização no contexto dos antidrogas, a promoção de saúde, melho-
projetos sociais. Utilizar-se-á a técnica de rar a qualidade de vida dos participantes,
observação coletiva e entrevistas individu- promover a socialização de crianças e sua
ais. Essas entrevistas serão realizadas com permanência na escola, profissionalizar o
base na técnica de aplicação do Método jovem e mantê-lo longe do trabalho sem
Clínico Piagetiano (Delval, 2002), a fim de condições, além de reunir a comunidade
compreender, através da livre conversa- e fomentar o gosto pela espiritualidade e
ção com os agentes do processo, de que cultura local. Caracterizam-se como inicia-
modo ocorrem a produção musical e as tivas movidas por diversos tipos de pro-
interações sociais nos espaços investiga- ponentes, desde igrejas, moradores dos
dos. O método clínico se traduz pelo pro- municípios, secretarias de educação e de
cedimento de coleta de dados através da assistência social até escolas e programas
observação das ações e livre conversação federais. Esta pesquisa está em fase de co-
sobre determinada temática, para seguir leta de dados e poderá contribuir para a
o pensamento da pessoa entrevistada. No construção de conhecimento acerca dos
caso desta pesquisa, os dados referentes projetos sociais e as práticas de educação
às ações musicais dos sujeitos serão regis- musical desenvolvidas na região do vale
trados através de filmagens e as entrevis- do Paranhana. Os projetos já mapeados
tas gravadas e transcritas, para posterior revelam a relação entre a música e a qua-
análise. A eleição da observação das ações lidade de vida e, também, a intenção de
musicais e dos sujeitos entrevistados será promover uma educação musical qualifi-
feita através de entrevista com um propo- cada. Na etapa em que os pesquisadores
nente de atividade musical e um partici- analisarão com mais profundidade os pro-
pante destas atividades de cada uma das jetos eleitos em cada cidade do Vale do
seis cidades do Vale do Paranhana: Taqua- Paranhana, ter-se-á como objetivos os se-
ra, Parobé, Três Coroas, Riozinho, Igreji- guintes: analisar como as pessoas que tra-
nha e Rolante. Serão mapeados espaços balham com musicalização nestes espaços
diversificados de projetos sociais, o que compreendem seu papel e o dos educan-
se caracteriza como pré-requisito para a dos para compreender a fundo os proces-
eleição de determinados projetos, ou seja, sos de ensino e aprendizagem musical;
em cada cidade, será eleito um espaço di- verificar as relações interpessoais estabe-
ferente para ser mapeado. Até o presente lecidas nos projetos para compreender o
momento, a pesquisa permitiu verificar a que une as pessoas em torno das ações de
existência de 25 projetos sociais ocorren- educação musical; investigar a função, na-
do nas cidades do Vale do Paranhana. A tureza e impacto que a Educação Musical
educação musical tem sido trabalhada causa nas localidades dos projetos sociais

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

onde é desenvolvida para compreender crianças. A idéia de educação infantil – en-


como os grupos em situação de vulnera- tendida como aquela que se orienta para
bilidade e risco social podem vislumbrar o desenvolvimento de crianças de zero a
novas perspectivas de estruturação social, seis anos de idade (Brasil, 1998) – está as-
a partir da interação nos cenários de mu- sociada, culturalmente, às dimensões do
sicalização nestes projetos. “cuidar” e do “educar”, visando garantir
a não-fragmentação das experiências de
Palavras-chave: educação informal, projetos ensino-aprendizagem à criança pequena
sociais, musicalização (Angotti, 2000; Machado, 2000; Oliveira,
1999). Porém, muitas vezes, tais contextos
LT04-810 - JOGOS COOPERATIVOS E se encontram à mercê de concepções te-
A PROMOÇÃO DA COOPERAÇÃO NA óricas e práticas não adequadas para ex-
EDUCAÇÃO INFANTIL pressar, em sua plenitude, o caráter edu-
Marilícia Witzler Antunes Palmieri - UEL cativo, pedagógico e formativo, implicado
marilicia@uel.br nas diversas experiências vivenciadas pela
Valéria Queiroz Furtado - UEL criança (Machado, 2000). Dentre as diretri-
valeriauel@uel.br zes apontadas pelo Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil (Brasil,
Em muitas das práticas educativas no âm- 1998) para o desenvolvimento do trabalho
bito da educação infantil, desvelam-se com crianças de quatro a seis anos está à
diferentes procedimentos contemplando promoção de interações que favoreçam a
alternativas educativas e pedagógicas di- troca de idéias, oportunidade de expres-
versificadas. Estas permitem o trânsito de são, de contato com outras vivências e a
uma ampla gama de valores, conceitos, construção conjunta de conhecimentos e
regras, orientações, idéias e concepções, habilidades sociais, sublinhando a coope-
configurando relações motivacionais alta- ração como o principal tipo de interação a
mente complexas e que implicam no de- ser estimulado e promovido. Nessa pers-
senvolvimento de diferentes padrões de pectiva a proposta pedagógica dos jogos
interação social. O eixo central do estudo cooperativos (Correia, 2006, 2007; Brotto,
recai sobre a necessária superação de va- 2000; Salvador e Trotte, 2000; Soler, 2003)
lores atrelados as práticas sócio-culturais apresenta-se como um recurso educativo
competitivas e individualistas das relações promissor para a modificação de práticas,
humanas que se estabeleceu em nossa conceitos e valores competitivos e indi-
sociedade, as quais têm sido enfatizadas vidualistas comumente encontrados na
no exercício do cotidiano escolar (Branco, escola, a qual enaltece o resultado e não
2003, 2006; Crockenberg & Bryant, 1979; o processo, ao valorizar a vitória como
Johnson & Johnson, 1989; Palmieri, 2003; prêmio do sucesso individual (Correia,
Salomão, 2001). Isto porque, dependen- 2006; Salvador & Trotte, 2001). Chama-
do das ações pedagógicas do professor, -se de “cooperativos” jogos que alteram
é ele quem define as normas e as regras, a estrutura dos jogos tradicionais de suas
como também lidera e domina de forma características de exclusão, agressividade,
quase absoluta o espaço comunicativo das seletividade e exacerbação presentes em
atividades a serem desenvolvidas pelas jogos competitivos, para uma estrutura de

148
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

jogos que sejam basicamente pautados na tuição, visando analisar, em nível microge-
cooperação, no envolvimento e na diver- nético, como três educadoras promovem
são (Brotto, 2002). São jogos que aceitam ou inibem a cooperação entre seus alunos
as diversidades e as limitações dos partici- (4 a 6 anos), utilizando como recurso pe-
pantes promovem o exercício da confian- dagógico os jogos cooperativos. O estudo
ça pessoal e interpessoal, cumplicidade, inclui: 1) Registro das atividades diárias re-
solidariedade, respeito mútuo (Correia, alizadas com as crianças (protocolo espe-
2006), uma vez que ganhar e perder são cífico); 2) Entrevistas (inicial e final) com as
apenas referências para um contínuo educadoras (roteiro semiestruturado); 3)
aperfeiçoamento de todos, vislumbrando Planejamento dos jogos para orientar as
um verdadeiro exercício educativo para a professoras a reconstruírem e adaptarem
paz (Brotto, 2002). Neste sentido, o me- jogos a uma concepção não competitiva
lhor momento para introduzir os jogos co- ou cooperativa (categorização de Orlik,
operativos para o exercício da cultura da 1989, apud Correia, 2007); 4) Registro em
cooperação é a educação infantil, consi- vídeo de atividades de jogos cooperativos
derando que a criança ainda foi pouco ex- estruturados pelas educadoras. Como re-
posta a experiências de competição (Soler, sultado parcial, os registros das atividades
2003). Acreditamos que as possibilidades diárias têm revelado um grande volume
e os limites dessa proposta no contexto da de “atividades livres” sendo promovidas
educação infantil contribuirão à análise do às crianças fora da sala de aula, onde pre-
complexo processo construtivo de sociali- domina as instruções das educadoras sem,
zação entre professores e alunos inseridos contudo, considerarem o interesse das
em espaços educacionais que tem por crianças pelas brincadeiras. Quando se
base um contexto heterogêneo e dinâmi- trata de atividades sendo estruturadas no
co, ancorado em diferentes aspectos rela- contexto da sala de aula, as educadoras se
tivos à interdependência humana, aí con- orientam pelo objetivo de obter a atenção
vivendo, em princípio, orientações múlti- das crianças na realização de tarefas indivi-
plas e diversificadas. O presente trabalho duais ou em grupo, com a atenção orienta-
é fruto de estudo anterior sobre o tema lu- da para a professora, desestimulando-as a
dicidade e formação de educadores infan- interagirem entre si. Tais atividades, geral-
tis realizado em um Centro de Educação mente, se reduzem às educadoras contan-
Infantil do município de Londrina-PR. Uma do uma estória para as crianças, repetidas
oficina de Jogos Cooperativos foi promo- vezes por um período determinado e, na
vida a quinze educadoras, as quais reco- seqüência, as instruem para a produção
nheceram a necessária promoção de ati- individual de trabalhinhos (pintura, dese-
vidades verdadeiramente cooperativas na nho, recorte, colagem). Neste caso, não se
educação infantil, e, ao mesmo tempo, re- observa preocupação das professoras com
velaram desconhecer como este tipo de vi- atividades estruturadas para as crianças
vência pode ser promovido nas atividades interagirem cooperativamente que façam
lúdicas que desenvolvem com as crianças com que aprendam novos conceitos e
no dia-a-dia da instituição. Dentro deste experimentem algo novo no contexto da
contexto se insere o presente estudo (em sala de aula. Questiona-se o pouco espaço
fase inicial), desenvolvido na mesma insti- para a criação de um ambiente propício a

149
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

negociações professoras-crianças, o que mente, o desenvolvimento da imaginação


levaria a um posicionamento mais demo- e da criatividade de seus alunos. Definimos
crático na sala de aula. Problematiza-se o os seguintes objetivos específicos: identifi-
caráter educativo das atividades propostas car concepções de leitura, literatura infan-
e o tipo de interação estimulado e promo- til, imaginário e criatividade presentes no
vido no âmbito da instituição. Acredita- ideário das professoras participantes deste
mos que a prática dos Jogos Cooperativos estudo; analisar estratégias pedagógicas
nesse contexto educacional propiciará às utilizadas pelas professoras para realizar
crianças a participação em atividades lúdi- uma leitura prazerosa; descrever os proje-
cas que incentivam a cooperação, visando tos de literatura infantil desenvolvidos na
o alcance de objetivos comuns, adquirin- escola, destacando o desenvolvimento da
do também progressiva autonomia e in- imaginação e criatividade de seus alunos;
dependência para coordenar suas ações identificar os programas da escola para
com a de outros. As educadoras poderão capacitação de professores no que diz res-
explorar as configurações motivacionais peito ao trabalho com projetos literários;
facilitadoras de modalidades construti- identificar as possibilidades de aplicação
vas de interdependência social, o que nos das estratégias pedagógicas desenvolvidas
propiciará analisar os diferentes tipos de no campo da literatura nessa escola, em
inter-relações que ocorrem no conjunto instituições da rede pública do DF. Para que
dos fatores que se apresentam típicos des- tais objetivos fossem alcançados, organiza-
se contexto. mos o referencial teórico que fundamenta
todo o estudo com os trabalhos de Alencar
Palavras-chave: Jogos Cooperativos; (2003); Coelho (2000); Garcez (2008); Ma-
Cooperação; Educação Infantil. chado (2002); Martinez (1997); Vygotsky
(2009); Zilbermam (2005). A metodologia
escolhida para o desenvolvimento da pes-
LT04-1412 - A LITERATURA INFANTIL NO quisa foi a de cunho qualitativo, utilizando
DESENVOLVIMENTO DA IMAGINAÇÃO instrumentos de coleta de dados como a
E CRIATIVIDADE DE ALUNOS DE 2 A 5 observação participante em três turmas da
ANOS DE IDADE educação infantil e a entrevista semiestru-
Priscila Martins do Nascimento da Silva - UnB turada com as respectivas professoras. Os
Norma Lucia Neris de Queiroz - UnB resultados deste estudo revelam que a prá-
normaluciaq@yahoo.com.br tica da literatura realizada pelas professo-
ras da escola investigada, mesmo que em
O presente trabalho caracteriza-se com um alguns momentos precise de maior emba-
estudo de pesquisa, cujo título é A literatu- samento teórico e capacitação profissional
ra infantil no desenvolvimento da imagina- no que diz respeito a intenções pedagógi-
ção e criatividade de alunos de 2 a 5 anos cas pautadas numa prática mais rica em
de idade. Foi estabelecido como objetivo possibilidades de criação e imaginação, faz
geral, analisar a prática pedagógica de um com que a literatura chegue a seus alunos
grupo de professoras da educação infantil de maneira que favorece e possibilita a
de uma escola particular do Distrito Fede- vivência de sua verdadeira essência, sem
ral em relação à literatura infantil, especial- cobranças, ou seja, viver a literatura pela

150
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

própria literatura. Refletindo sobre os re- de terem idéias e hipóteses originais so-
sultados, é possível dizer que para realizar bre aquilo que buscam desvendar” (Rc-
uma prática pedagógica pautada na lite- nei,1998, p.21) Compreender, conhecer e
ratura, mais especificamente na literatura reconhecer a forma particular das crian-
infantil, é preciso ir além dos fantoches e ças serem e estarem no mundo é um dos
dramatizações e sim viver a leitura da pala- grandes desafios da educação infantil. A
vra com encantamento e prazer. escola é uma instituição social privilegiada
e responsável por promover este encon-
Palavras-chave: Literatura infantil; Educação tro com as mais diversas áreas do conhe-
infantil; Criatividade; Imaginação. cimento, dentre elas, a da cultura corporal
de movimento pela qual a Educação Física
é diretamente responsável. Cultura corpo-
LT04-1422 - O CIRCO: UMA PROPOSTA ral são todas as manifestações corporais
DE AÇÃO INCLUSIVA EM EDUCAÇÃO humanas que são geradas na dinâmica
FÍSICA PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA. cultural, são conhecimentos historicamen-
Vivianne Flávia Cardoso - UnB/UAB te acumulados e socialmente transmitidos
vfcardoso@gmail.com (PCN EF, 1992, 1998). Segundo o PCN EF
Juliana Eugênia Caixeta - UnB (1992, p. 27) “É preciso que o aluno en-
eugenia45@hotmail.com tenda que o homem não nasceu pulando,
saltando, arremessando, balançando, jo-
Nesse trabalho, discutimos a inclusão de gando etc. Todas essas atividades corpo-
alunos deficientes nas aulas de educação rais foram construídas em determinadas
física, entendendo que a escola deixa de épocas históricas, como respostas a deter-
ser uma instituição social com forte apelo minados estímulos, desafios ou necessida-
seletivo e passa a ser o lugar em que as des humanas”. Assim, o aluno deficiente
potencialidades devem ser vistas, as difi- deve ser atendido em suas necessidades e
culdades superadas e os resultados apro- desafiado em suas potencialidades como
veitados em prol de uma sociedade me- todas as outras crianças, pois o objetivo
lhor. O processo de aprendizagem aciona das aulas de educação física é a inclusão
vários processos de desenvolvimento do aluno na cultura corporal de movimen-
que sem este estímulo poderiam não vir to por meio da participação e reflexão, de
a acontecer (Vygotsky, 1994). Quando fa- um conjunto de vivencias que contribuam
lamos de inclusão de pessoas deficientes, para seu desenvolvimento global. Descre-
o que temos que fazer é descobrir como ver e analisar o processo de inclusão de
promover zonas de desenvolvimento alunos deficientes nas aulas de Educação
proximal que estimulem estas crianças Física na educação infantil que foram re-
a adquirir e formar o pensamento abs- alizadas em uma escola pública de Vitória
trato. Sabemos que a mediação do mais durante os meses agosto a novembro de
experiente impulsiona o desenvolvimento 2010. Nesse trabalho, realizamos a união
do menos experiente. “No processo de da abordagem qualitativa de pesquisa
construção do conhecimento, as crianças com a pesquisa-ação em um estudo de
se utilizam das mais diferentes linguagens caso. Participaram do estudo 25 crianças
e exercem a capacidade que possuem na faixa etária de 4 anos, incluindo uma

151
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

criança com Síndrome de Down, uma es- se balançar no balanço de pneu. Quanto
tagiária, a professora de Educação Física, a relações mediadas, trabalhamos, além
a professora regente da turma 4A e a pes- da cooperação, soluções de problemas e
quisadora, que também atuou como me- a tomada de decisões, pois assim nossos
diadora das atividades. Como técnicas e alunos poderiam acessar seu repertório
materiais para coleta de dados foram utili- motor, além de ressignificar movimentos
zados observações e composição de diário culturalmente construídos e historica-
de campo, filmagens, fotografias. Como mente acumulados. De acordo com Melo
procedimento foi adotado a implantação (2010, p. 29), “na perspectiva em que o
do planejamento da proposta pedagógica contexto da ação assume papel central
Circo em que cada dia havia uma atividade no processo de desenvolvimento motor, o
diferente. Na medida em que as atividades sujeito é considerado ator do seu próprio
eram avaliadas, o planejamento inicial so- desenvolvimento”. Dentro da temática do
fria ajustes. O tema circo foi escolhido por Circo, realizamos intervenções variadas na
apresentar um universo lúdico muito rico turma, de forma que João tivesse oportu-
para a criança, porque permite o trabalho nidade de ser atendido em suas necessi-
com músicas, com personagens, como: o dades individuais, vindas principalmente
palhaço e o mágico e com diferentes ex- da hipotonia, uma das características da
pressões corporais, como: malabarismo, Síndrome de Down. Esta experiência mos-
acrobacias (como cambalhotas), equili- trou que a Educação Física contribui para
brismo, trapézio, corda bamba, dentre ou- a construção de uma escola inclusiva à
tros. A intervenção foi planejada visando medida que integra saberes e fazeres di-
vivenciar com as crianças práticas corpo- ferentes dentro de um mesmo contexto,
rais atreladas à temática do circo de forma quando tece reflexões sobre os significa-
lúdica e prazerosa. Durante a intervenção dos e sentidos que as ações corporais têm
foi possível observar que todas as crianças dentro da escola e na vida dos indivíduos
participaram ativamente, inclusive João, envolvidos. Acreditamos que intervenções
portador da síndrome da Down. Todos os como as apresentadas nesse estudo evi-
alunos demonstraram parceria e coopera- denciam o papel da educação física como
ção. O processo de mediação professor/ promotora do desenvolvimento integral
aluno foi muito importante para promo- das crianças, integrando o desenvolvimen-
ver um ambiente inclusivo, pois à medida to cognitivo, afetivo e motor. Percebemos
que pensávamos um processo de aprendi- que a intervenção na educação física pode
zagem que incluísse todas as crianças bus- ir além dos “muros” da quadra e integrar
camos também uma prática voltada para ações da escola como um todo. Adultos e
competências dos sujeitos e que contri- crianças, crianças e crianças vivenciaram
buísse para superar as limitações impos- e evidenciaram, neste estudo, as possibi-
tas pela deficiência. Quanto à mediação lidades que se abrem no trabalho coletivo,
aluno/aluno: das relações espontâneas, contextualizado à cultura infantil e, tam-
citamos a cooperação, esta acontecia toda bém, à cultura corporal de movimento.
vez que um colega ajudava o outro a re-
alizar determinada atividade, como: virar Palavras-chave: Inclusão Escolar, Educação
cambalhota, alcançar o trapézio, subir e Física, Cultura Corporal.

152
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1423 - A CONSTRUÇÃO DO tural. É construído porque os significados


SI MESMO E DO OUTRO NAS compartilhados nas interações tornam-se
BRINCADEIRAS DE FAZ-DE-CONTA constitutivos do sujeito e é construtor,
Sônia Regina dos Santos Teixeira - UFPA porque os significados compartilhados
soniaregina.st@uol.com.br são resignificados, recriados pelo sujeito.
Na brincadeira de faz-de-conta é possível
Os princípios teóricos e metodológicos perceber essa co-construção. A criança é
adotados neste estudo tiveram como construída pelos significados partilhados
pressupostos o referencial da psicologia no seu grupo cultural, uma vez que a ma-
histórico cultural e foram utilizados para téria da situação imaginária origina-se das
compreender como determinadas experi- experiências diretamente vividas ou pre-
ências inquietantes vivenciadas por crian- senciadas pela criança. Ao mesmo tempo,
ças ribeirinhas, durante brincadeiras de é construtora, na medida em que recom-
faz-de-conta contribuíram para o processo bina os significados e cria situações ficcio-
de constituição cultural das mesmas. Para nais que são virtuais, não correspondendo
Vygotsky (1984), o indivíduo, ao nascer, a cópias literais dos significados partilha-
ainda não é verdadeiramente humano. dos. Para Simão (2004), o ser humano
Somente passa a sê-lo quando, a partir constrói o si mesmo e a cultura, por inter-
da interação com outros sujeitos, inter- médio do constante diálogo entre o “mim
naliza os significados compartilhados no mesmo” e o “outro”, principalmente, a
seu contexto sociocultural. Para o autor, partir de vivências que ferem as expecta-
em cada fase do processo de constituição tivas do “mim mesmo” e o instigam cog-
cultural do sujeito há uma atividade que nitivo e afetivamente – as “experiências
contribui de forma fundamental para a inquietantes”. A autora questiona a rele-
construção do psiquismo humano. Na fase vância de estudos que buscam o acúmu-
por ele denominada pré-escolar, de três a lo exaustivo e seletivo dos dados visando
seis anos, a brincadeira de faz-de-conta é descrever a ‘interação em si’, ‘o mais obje-
a principal atividade a contribuir para esse tivamente possível’. Para ela, ao examinar
processo. Assim, investigar como as crian- as falas das interações, o pesquisador, ao
ças brincam, como interagem e os signi- invés de procurar os diálogos marcados
ficados construídos durante as brincadei- pelos consensos entre os sujeitos, deve
ras, pode ajudar na compreensão do pro- tomar como objeto de suas análises as fa-
cesso de constituição cultural dos sujeitos. las que expressem ‘momentos de tensão’,
Considerando que, atualmente, muitas investigando para onde elas orientam os
crianças nessa faixa etária participam de interlocutores, na negociação para a dis-
programas de educação infantil, as turmas tensão e reconstrução do conhecimento
de educação infantil constituem-se lócus sobre o conteúdo da conversa, mas, so-
importantes para a investigação dessa ati- bretudo, na reconstrução concomitante e
vidade e, consequentemente, do processo interdependente do conhecimento sobre
de constituição cultural das crianças, que relações eu-eu e eu-outro. Nesse sentido,
delas participam. Valsiner (1997) afirma foi realizado o presente estudo para veri-
que o indivíduo, exerce um papel dialé- ficar as experiências inquietantes viven-
tico no seu processo de constituição cul- ciadas pelas crianças, durante as brinca-

153
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

deiras de faz-de-conta e como as mesmas instante (Simão, 2002, 2004). O estudo re-
contribuem para o processo de constitui- velou momentos de tensão presentes nos
ção cultural das crianças que participavam diálogos entre as crianças, que as exigiam
das interações. O estudo faz parte de uma reconstruções afetivas e cognitivas cons-
pesquisa maior realizada durante o ano de tantes. É evidente na análise, que embo-
2005 e teve como participantes dez meni- ra tenha sobressaído o investimento das
nos e seis meninas, com idade entre qua- crianças na negociação de conflitos para
tro e cinco anos e a professora da classe garantir o processo interativo do brincar,
de uma escola localizada na Ilha do Com- longe de ser um ambiente harmônico,
bu, no município de Belém, Pará. O pro- este era um espaço marcado por tensões,
cedimento de coleta constou de gravações desencontros e disputas. Verificou-se res-
em vídeo das brincadeiras que ocorreram significações de princípios de classificação
no cotidiano da classe. As informações fo- dos sujeitos, presentes no contexto socio-
ram coletadas quinzenalmente, perfazen- cultural das crianças, tais como: mais ou
do um total de 16 registros. Os episódios menos competente; mais velho e mais
de faz-de-conta foram transcritos e exami- novo; adulto e criança; homem e mulher
nados do ponto de vista microgenético, de e feio e bonito. Tais ressignificações esta-
acordo com a forma concebida pela psico- vam na origem de diversas experiências
logia histórico cultural. A análise centrou- inquietantes. Na análise ficou evidente
-se na dinâmica do processo de constru- que o processo de constituição cultural
ção de significados pelas crianças. Ficou ocorre da diferenciação de elementos ini-
evidente na análise dos episódios que as cialmente indiferenciados. Tal diferencia-
experiências inquietantes vividas pelas ção só é possível, por intermédio do dis-
crianças, durante as brincadeiras, contri- tanciamento psicológico crescente, pos-
buíam para a tomada de consciência da sibilidade que as crianças encontram no
diferenciação entre o si mesmo e o outro. faz-de-conta, que as exige uma maior des-
Isso pode ser observado pelo uso frequen- centralização do si mesmo e uma menor
te dos pronomes pessoais e possessivos e contextualização. No faz-de-conta, na me-
pela diversidade de formas de ocupação dida em que a criança discorda da outra,
do lugar do outro da cultura, durante a ela instaura um distanciamento entre o si
representação de diversos papeis sociais. mesmo e o outro. Isto a possibilita tomar
Tais achados confirmam a proposição de consciência cada vez mais abrangente de
Góes (2000), de que a brincadeira de faz- seus contextos, de si mesma, dos outros
-de-conta é um excelente campo para e de suas relações com eles e a participar,
investigar os indícios da construção do si de formas cada vez mais diferenciadas do
mesmo e do outro, pelo fato, da criança, processo de construção da sua subjetivi-
nessa atividade, manejar, constantemen- dade e da sua cultura.
te, imagens de si e dos outros da cultura.
A análise mostrou também como as crian- Palavras-chave: Brincadeira de Faz-de-Conta;
ças estavam constantemente significando Educação Infantil; Crianças Ribeirinhas.
e ressignificando a sua relação com os par-
ceiros, figuras cognitivo-afetivas a quem
alimentavam expectativas diversas a todo

154
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 27 - LT4 tratando de crianças autistas, apresentar


das mais diversas formas e de diferentes
Inclusão 2 maneiras os objetos da cultura ao aluno,
para que este encontre um lugar no mun-
do ou que nele possa advir como sujeito.
LT04-798 - INCLUSÃO ESCOLAR DE
A educação terapêutica (Kupfer, 2001) é
ALUNOS AUTISTAS: CONCEPÇÕES DE
um conjunto de práticas interdisciplinares
PROFESSORES DE ESCOLAS PÚBLICAS DO
que visa à retomada do desenvolvimen-
DISTRITO FEDERAL
to global do sujeito ou a reestruturação
Mara Rubia Rodrigues Martins - SEEDF psíquica interrompida pelo surgimento
mararubiarm@gmail.com do autismo. Na pesquisa, foi utilizada a
Sandra Francesca Conte de Almeida - UCB abordagem qualitativa de tipo etnográ-
sandraf@pos.ucb.br fico, adotando-se como instrumento de
coleta e construção de dados a entrevista
As indagações acerca da possibilidade de semiestruturada. Os resultados indicaram
inclusão escolar de pessoas com autismo congruência e semelhança de concepções
habitam o imaginário dos envolvidos no e práticas pedagógicas entre os profes-
processo educativo e lançam um debate sores entrevistados. Observou-se que a
sobre as condições que vão além da ga- maioria dos sujeitos entrevistados, vinte
rantia dada por lei (acessibilidade) à esco- e um, era favorável à inclusão escolar de
laridade em salas comuns. Assim, é neces- alunos com autismo, embora tivessem re-
sário que a escola e os professores se pre- latado o mal- estar que sentiam frente ao
parem para incluí-las. O presente trabalho aluno autista, cuja “diferença” os remetia
investigou as concepções de 23 professo- ao exercício constante da impotência, da
res regentes de escolas públicas acerca incapacidade, da angústia, marcas signifi-
da inclusão escolar de alunos autistas no cantes da castração. Apesar da formação
ensino regular. A fundamentação teórica acadêmica de nível superior, esta não os
que embasou o estudo é a psicanalítica, autorizava, de “per si”, a implicar-se sub-
enfatizando a compreensão do autismo, jetivamente no trabalho realizado com es-
na perspectiva freudo-lacaniana, o concei- ses alunos. Cabe ressaltar que as concep-
to de educação terapêutica e as relações ções dos professores sobre o processo de
entre psicanálise e educação. A grande inclusão escolar, bem como sua compre-
descoberta da psicanálise, a constituição ensão acerca do autismo, permitiam que
do sujeito no campo do Outro, ensina que se perpetuasse a ideia de que os autistas
a pessoa se torna sujeito pelo desejo e vivem em um mundo à parte, isolados da
que o sujeito só pode se constituir como realidade e que, por tais motivos, as práti-
sujeito desejante se o Outro o desejou, cas inclusivas se restringiam a ações edu-
antes. Para que o sujeito se constitua não cativas de pouco impacto na subjetividade
basta apenas que seja cuidado, é preciso e no comportamento desses sujeitos. Os
também que seja desejado e que o Outro dados relativos aos fatores que facilitavam
responda à sua demanda. Cabe ao profes- ou dificultavam a inclusão de autistas no
sor, na função de suplência do outro, mas ensino regular se expressaram sob a for-
de um outro barrado, sobretudo em se ma de uma aparente contradição. Foram

155
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

apontados como fatores facilitadores: a volvidos no processo de inclusão escolar


informação/conhecimento, a formação é de fundamental importância, pois dar
específica, a presença de um professor voz a esses que são os protagonistas da
auxiliar, em sala de aula, e o envolvimento educação inclusiva, juntamente com os
da família; como fatores que dificultavam alunos, significa apostar no professor e
a inclusão, apareceram esses mesmos as- criar condições para que a educação te-
pectos, mas em situação de falta, de ca- rapêutica aconteça. Os resultados deste
rência ou de ausência. Quanto às práticas estudo confirmaram, ainda, a complexida-
pedagógicas diárias, foi possível observar de do processo de inclusão de autistas no
que a grande maioria, dezenove dos vin- ensino regular e apontaram para a neces-
te e três professores, realizava algum tipo sidade de se dar continuidade a outros es-
de adaptação curricular, quer seja nas tudos e pesquisas que levem em conside-
atividades propostas, no atendimento ou ração essa temática, sobretudo a função
nas avaliações dos alunos autistas, o que da escola e do professor no processo de
nos permitiu inferir que os professores reestruturação psíquica de crianças com
se preocupavam em oferecer atividades graves problemas de desenvolvimento.
pedagógicas que levavam em considera-
ção as peculiaridades e limitações de seus Palavras-chave: Inclusão escolar; autismo;
alunos autistas e as suas próprias. O papel psicanálise.
do educador, nas vicissitudes da constitui-
ção do sujeito, é o de fornecer aos alunos
autistas inscrições primordiais, conteúdos LT04-933 - O BRINCAR EM CRIANÇAS
ideativos, objetos da cultura, a partir de COM DEFICIÊNCIA VISUAL
diversas linguagens, instituindo o simbóli- Letícia Coelho Ruiz - UNICAMP
co em torno do real, diferenciando-se da letsruiz@yahoo.com.br
educação formal, ocupando o lugar de Ou- Cecília Guarnieri Batista - UNICAMP
tro barrado, transmitindo, além de conhe- cecigb@gmail.com
cimentos, valores, ideais e um saber exis-
tencial. A educação terapêutica, prática Muitos trabalhos discutem questões so-
interdisciplinar que visa à reestruturação bre o desenvolvimento de crianças com
psíquica da criança com transtorno global deficiência visual, por meio de compara-
do desenvolvimento, foi sugerida como ções com aspectos do desenvolvimento
proposta de atendimento educacional aos de crianças videntes. Nesses estudos, as
alunos autistas inclusos no ensino regular, dificuldades e os déficits são salientados,
assim como a criação de um espaço de por tomarem por base a relação normal/
interlocução e de escuta dos professores, deficiente. Warren (1994) sugeriu uma
de modo que estes pudessem ressignificar “abordagem diferencial”, que se caracte-
suas angústias e rever suas certezas, des- riza por buscar compreender as variações
construir saberes e aprender a conviver no desenvolvimento entre indivíduos com
com a impossibilidade de uma educação deficiência visual, considerando importan-
ideal, apostando no saber e no desejo de tes os casos de indivíduos que se destacam
que, pelo ato educativo, um aluno-sujeito pelo desenvolvimento de habilidades dife-
possa advir. A escuta dos educadores en- renciadas. A detecção de uma habilidade,

156
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mesmo que em um único participante, já ogravações e análise qualitativa e micro-


é indicação de que a deficiência não impe- genética de episódios, segundo Carvalho
de a sua aquisição. Sugere, portanto, que e Pedrosa (2005) e Góes (2000). O estudo
a pesquisa seja voltada para perguntas so- abrangeu sete crianças de 4 a 8 anos, or-
bre os fatores que levaram essas pessoas ganizadas em dois grupos: (a) no Grupo 1
a adquirir tais habilidades. Um contexto participaram três crianças, duas com baixa
em que podem ser observados aspectos visão e uma cega; (b) no Grupo 2 participa-
do desenvolvimento infantil é durante ram duas crianças com baixa visão e duas
o brincar. Vygotsky (1988) discute sobre com alterações visuais e dificuldades es-
a relação entre o brincar e as funções colares. As filmagens foram feitas de abril
mentais superiores, afirmando que, ao a junho de 2010. Foram videogravadas 8
partir do brinquedo, com destaque para sessões, com cada um dos grupos. As ob-
o brincar de faz de conta, a criança torna- servações foram realizadas em situações
-se capaz de compreender o real e atuar que propiciaram contatos com brinquedos
de maneiras distintas e mais elaboradas, em momentos de interação. Foram prepa-
em relação às que costuma apresentar em rados conjuntos de brinquedos variados,
seu convívio social. A atividade lúdica con- com atenção às necessidades referentes
fere liberdade à criança, por meio destas à deficiência visual (brinquedos coloridos,
ações simbólicas, e lhe permite ultrapas- sonoros, etc). O pesquisador era o coor-
sar os limites determinados por seu nível denador das sessões. Foram analisados
atual de desenvolvimento. Hueara, Souza, episódios relevantes de faz de conta, em
Batista, Melgaço e Tavares (2006) eviden- relação aos seguintes aspectos: modos de
ciaram as competências apresentadas por brincar entre as crianças, modos de ma-
crianças cegas e com baixa visão, durante nuseio de objetos e formas de atuação do
atividades relativamente livres de explora- adulto, de acordo com as categorias cria-
ção de brinquedos. A brincadeira relativa- das para a análise. Os pais das crianças es-
mente livre, encorajada, mas não dirigida tudadas foram entrevistados no que se re-
por adultos, levou à constituição de um fere às formas de brincar dessas crianças.
ambiente muito propício ao desenvolvi- Foi elaborado um sistema de categorias,
mento do faz-de-conta. Na conclusão do abrangendo os seguintes aspectos: For-
estudo, destacaram-se diversos exemplos mas de Interação (adulto- criança e crian-
de capacidades apresentadas por estas ça-criança) e Uso de Objetos. Foi, também,
crianças, na criação de cenas, represen- focada a questão das dificuldades específi-
tação de papéis, estabelecimento de re- cas de crianças com problemas visuais du-
gras, que nem sempre eram evidentes em rante a brincadeira. Dois exemplos de aná-
outros contextos, especialmente, os de lise são apresentados. Na sessão “O lobo e
avaliação formal. Na mesma direção, foi o porquinho” (Grupo 1), no que se refere
proposto um estudo envolvendo crianças à Interação criança- criança, observou-se
com deficiência visual e/ou alterações vi- que o grupo manteve na maior parte do
suais, a maioria com outras alterações no tempo, Ação conjunta. Quanto ao Uso de
desenvolvimento. Procurou-se identificar Objetos, as crianças elaboraram uma Cena
habilidades e competências das crianças, de faz de conta análoga à história dos três
a partir da análise de transcrições de vide- porquinhos, com alguns elementos novos,

157
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como a aparição de um policial, a prisão, ção da criança cega (ex: permitir o contato
o lobo chegando de carro. Na Interação com os brinquedos utilizados pelos ou-
adulto-criança, observou-se que o adulto tros). Quanto às crianças com baixa visão,
apresentou Sugestão para integração das o adulto orientou à exploração de objetos
atividades e, depois que foi observada na (ex: pistas para aproximação, exploração
Atividade conjunta das crianças, passou tátil e comparação entre objetos). Os re-
a apresentar Comentários e Avaliações sultados trazem subsídios para a interven-
Positivas. Na sessão “Mãe, pai e filho” ção educacional, com um modelo voltado
(Grupo 2), quanto à Interação criança- para a facilitação das aquisições das crian-
-criança,observou-se predomínio de Ação ças; apontam, também, para aspectos es-
conjunta. No que se refere ao Uso de ob- pecíficos, relativos a possíveis obstáculos
jetos, as crianças criaram uma Cena de faz para participação na brincadeira de faz de
de conta entre quatro crianças, de “fazer conta por parte de crianças cegas e com
comidinhas”, com papéis de pai, mãe e baixa visão mais severa; descrevem, ain-
filhos, cada um assumindo um papel com- da, soluções propostas pelo pesquisador,
binado entre eles. E quanto à Interação de forma a propiciar brincadeiras em ní-
adulto-criança, a atuação foi semelhante veis crescentes de elaboração e de supe-
à da sessão já descrita. No final da sessão ração dos obstáculos identificados.
surgiu a necessidade, explicitada pelas
crianças, de registro escrito da brincadeira Palavras-chave: brincar, deficiência visual,
para poderem dar continuidade à mesma Educação Especial
na sessão seguinte. Também foi observa- Contato: Letícia Coelho Ruiz, CEPRE/FCM-
do que, nessa sessão, uma das crianças UNICAMP, letsruiz@yahoo.com.br
pegou algumas caixas de alimento e leu
os registros das caixas. É interessante
destacar esses aspectos, pois, indicaram LT04-986 - A CONDIÇÃO
a compreensão da função da escrita, sen- UNDERACHIEVEMENT NO FENÔMENO
do que a maior queixa de aprendizagem ALTAS HABILIDADE/SUPERDOTAÇÃO:
desses alunos estava relacionada à leitura DESDOBRAMENTOS EMPÍRICOS
e escrita. A análise das sessões permitiu Fernanda do Carmo Gonçalves - UnB
identificar estratégias das crianças para a fernandajfmg@yahoo.com.br
exploração dos objetos e elaboração de Vanessa Terezinha Alves Tentes - SEDF
faz de conta. Foi possível identificar alguns psivan@terra.com.br
obstáculos na interação com a criança Denise de Souza Fleith - UnB
cega e alguns exemplos em que a inter- fleith@unb.br
venção do adulto pôde promover melhor
interação entre as crianças. No grupo com Conceber o indivíduo superdotado, en-
a criança cega, o adulto descreveu a locali- xergar o seu potencial e ao mesmo tempo
zação dos brinquedos, aproximou objetos reconhecer suas limitações é um exercício
e deu pistas verbais de direcionamento desafiador, presente nos estudos sobre
para que a criança realizasse deslocamen- a condição de baixa performance acadê-
tos. O adulto também orientou as outras mica ou underachievement (McCoach &
crianças para que facilitassem a participa- Siegle, 2003; Montgomery, 2009; Neihart,

158
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

2002; Ourofino, 2005, 2007; Ourofino & tem cerca de dois milhões de estudantes
Fleith, 2005; Reis & McCoach, 2002). A superdotados e a prevalência de undera-
baixa performance acadêmica em indiví- chievers pode chegar a 50% dos alunos
duos superdotados refere-se, portanto, a identificados no contexto educacional.
uma condição concomitante a de super- Mais recentemente, o Davidson Institute
dotação, que interfere no desenvolvimen- for Talent Development (2009) divulgou
to do indivíduo, em consequência da dis- que a população de superdotados abran-
crepância entre o potencial previamente ge 2.392.300 indivíduos, ou seja, 5% dos
revelado e a performance atual exibida. estudantes norte-americanos. Desse total,
A condição antagônica vivenciada pelo mais da metade é considerada underachie-
superdotado o coloca em situação de ris- ver. Esses dados reforçam a preocupação
co, de vulnerabilidade social e emocional, dos estudiosos da área de superdotação e
acentuando ainda mais suas necessida- confirmam a prevalência de underachie-
des educacionais especiais. As Diretrizes vers em vários países, conforme verificado
Nacionais para a Educação Especial na em estudos conduzidos na Espanha por
Educação Básica reconhece o aluno su- Olivarez (2004), na Áustria por Schober
perdotado, como aquele que apresenta (2004), na Alemanha por Sparfeldt (2006)
“grande facilidade de aprendizagem que e mais recentemente por Doeschot-Bults
o leve a dominar rapidamente conceitos, e Hoogeveen (2010), na Turquia por Bas-
procedimentos e atitudes” (Ministério da lanti e McCoach (2006), em Hong Kong
Educação, 2001, Art. 5°, III). A Política Na- por Phillipson (2007), na República Tche-
cional da Educação Especial, no que tange ca por Dvorakova (2008) e Holesovska
às altas habilidades/superdotação, define (2010), na França por Villatte e Leonardis
o superdotado como aquele que demons- (2010) e na Inglaterra por Montgomery
tra “potencial elevado em qualquer uma (2009), além da extensa produção verifi-
das seguintes áreas, isoladas ou combi- cada nos Estados Unidos da América e no
nadas: intelectual, acadêmica, liderança, Canadá. No Brasil, os estudos sobre de-
psicomotricidade e artes, além de apre- sempenho escolar abarcam os alunos de
sentar grande criatividade, envolvimento modo geral (Pinheiro-Cavalcanti, 2009; Li-
na aprendizagem e a realização de tarefas bório, 2009). No que tange especificamen-
em áreas de seu interesse” (Ministério te à performance acadêmica de indivíduos
da Educação, 2008, p.15). Superdotação superdotados, não foram encontrados es-
e insucesso escolar não se complemen- tudos brasileiros que investigassem esse
tam mutuamente, pois se encontram em fenômeno. No entanto, chamam atenção
extremos opostos no espectro do ensino. os dados oficiais apresentados no Censo
No entanto, apesar da dissonância cogni- Escolar 2010 demonstrando que no país
tiva que essa condição suscita, a realidade existem 53.791.142 estudantes matricu-
mostra que muitos superdotados exibem lados na Educação Básica, sendo que des-
baixo rendimento escolar. Ao longo dos te total, 398.155 são alunos da educação
últimos trinta anos a preocupação com especial, 5.186 alunos são considerados
superdotados underachievers tem ganha- superdotados e, entre estes, apenas 465
do força e espaço de investigação. Para estão matriculados no Distrito Federal
Heacox (1991), nos Estados Unidos exis- (Ministério da Educação, 2010). Diante

159
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

deste quadro, se fortalece a concepção dêmica de Alunos Superdotados, análise


de que muitos alunos superdotados são documental e questionário demográfico.
invisíveis ao sistema e certamente dentre Para o estudo comparativo foi realizada a
estes estão muitos underachievers. Ainda análise de variância multivariada (MANO-
mais complexa é a situação daqueles que VA). Os resultados indicaram prevalência
mesmo identificados como superdotados de alunos superdotados underachievers
apresentam uma produtividade aquém de entre superdotados na razão de 2:1. As
seu potencial, revelando uma desconexão variáveis descritivas que mais se destaca-
entre capacidade, habilidade e o desem- ram na autopercepção desse grupo foram,
penho acadêmico real e, por esse motivo, em sua maioria, coincidentes. Os alunos
acabam, de alguma forma, excluídos do superdotados em comparação aos unde-
processo educacional e os dados oficiais rachievers obtiveram desempenho signifi-
sequer os mencionam. (Ourofino & Fleith, cativamente superior nas medidas de in-
2005). O objetivo deste estudo foi iden- teligência, criatividade total e criatividade
tificar a prevalência de superdotados un- verbal, autoconceito (na dimensão condu-
derachievers entre superdotados de um ta comportamental e autoestima global),
atendimento educacional, descrever as desempenho escolar total e na dimensão
habilidades, as preferências, os interesses, escrita. Por outro lado, os underachievers
os aspectos motivacionais, as característi- se destacaram nas medidas de motivação
cas pessoais, as relações interpessoais e extrínseca, quando comparados aos su-
acadêmicas e os estilos de aprendizagem perdotados. Com relação ao gênero, os re-
de alunos superdotados e superdotados sultados sinalizaram diferenças significati-
underachievers. Investigar ainda possíveis vas a favor do gênero masculino quanto à
diferenças entre os alunos desses grupos, inteligência. Da mesma forma, as alunas
dos gêneros masculino e feminino, em obtiveram resultados superiores, quando
relação à inteligência, criatividade, mo- comparadas aos alunos, nas medidas de
tivação para aprender, autoconceito, de- criatividade verbal, motivação intrínseca
sempenho escolar e atitudes parentais. para aprender, autoconceito na dimensão
Participaram do estudo 96 alunos, sendo autoestima global e desempenho escolar
53 superdotados e 43 superdotados unde- na dimensão escrita. Interações significa-
rachievers. Utilizou-se um delineamento tivas entre grupo e gênero foram observa-
descritivo-comparativo e uma combina- das em relação à inteligência e autocon-
ção de instrumentos para acessar as variá- ceito nas dimensões competência escolar,
veis investigadas. Foram empregados tes- aceitação social e autoestima global. As
tes psicométricos de inteligência não ver- alunas superdotadas underachievers ob-
bal, de pensamento criativo verbal e figu- tiveram resultados inferiores em todas as
rativo e de desempenho acadêmico, bem medidas quando verificados os efeitos da
como aplicadas escalas de características interação grupo e gênero. Quanto às vari-
pessoais, acadêmicas e motivacionais, áveis relacionadas à família, não existem
estilos de aprendizagem, autoconceito e diferenças significativas no que tange às
atitudes parentais. A análise baseou-se atitudes parentais adotadas na educação
também nos dados colimados no Proto- de superdotados e superdotados undera-
colo de Investigação da Performance Aca- chievers. Alunos underachievers são invi-

160
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

síveis ao sistema de ensino e estão de, al- ciais posteriores. Nessa perspectiva, o
gum modo, excluídos dos processos edu- autismo é caracterizado por prejuízos bio-
cacionais. É imperativo que a sociedade se lógicos primários acarretando déficits nas
mobilize para criar alternativas alinhadas interações sociais. Esta pesquisa aborda o
com o movimento de educação inclusiva, transtorno autista que abrange um espec-
a fim de reverter essa realidade paradoxal. tro heterogêneo de quadros comporta-
mentais envolvendo desvios no desenvol-
Palavras-chave: Educação, Superdotação, vimento desde os primeiros anos de vida
Underachievement nas áreas de interação social, comunica-
Contato: Fernanda do Carmo Gonçalves, UnB, ção e imaginação. Inúmeras pesquisas são
fernandajfmg@yahoo.com.br realizadas e muitos aspectos permanecem
inconcludentes, sobretudo em relação à
etiologia, as possibilidades terapêuticas e
LT04-1036 - INCLUSÃO DE CRIANÇAS inserção em escolas regulares. A inclusão
AUTISTAS: UM ESTUDO SOBRE escolar dessas crianças é questionada por
CONCEPÇÕES E INTERAÇÕES NO alguns educadores devido aos prejuízos
CONTEXTO ESCOLAR inerentes às características da síndrome,
Emellyne Lima de Medeiros Dias Lemos - mas este trabalho se apóia em estudos
UFPB que admitem que embora seja uma prá-
emellyne@gmail.com tica difícil, é também realizável e possível,
Nádia Maria Ribeiro Salomão - UFPB considerando os benefícios das vivências
nmrs@uol.com.br escolares tanto em termos de interações
Financiamento: CNPq sociais quanto do desenvolvimento de
habilidades cognitivas nas crianças do
A interação social é de grande relevância espectro. A falta de clareza quando aos
no processo de desenvolvimento infantil benefícios da inclusão escolar dessas
entendendo que o sujeito, inserido em crianças traz implicações às concepções
um contexto histórico-social, é um ser sobre os indivíduos autistas. Nesse senti-
ativo em suas interações desde a mais do, destaca-se a importância de conhecer
tenra idade. Nesse processo destaca-se as concepções de pais e educadores visto
a importância do ambiente interpessoal que tais idéias apresentam implicações
para a aquisição de habilidades comu- nas práticas e nas interações estabeleci-
nicativas ressaltando a convivência com das com a criança. Dada à importância da
outras crianças, assim como o suporte do interação social e a influência dos contex-
adulto, uma vez que, sensível às necessi- tos situacionais e interacionais o presente
dades conversacionais da criança é capaz estudo tem como objetivos principais ana-
de adequar seu comportamento comu- lisar as interações sociais entre as crianças
nicativo às capacidades desta última. O com espectro autista e as demais crianças
presente estudo adota uma perspectiva nos contextos de escolas regulares con-
desenvolvimentista que concebe o desen- siderando a mediação das professoras,
volvimento típico a partir da articulação assim como, analisar as concepções dos
entre capacidades biológicas iniciais para pais e professores acerca da criança e do
o engajamento social e as interações so- processo de inclusão escolar com ela rea-

161
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lizado. Participaram deste estudo crianças mo, alguns abordando que as dificuldades
e professoras de duas escolas regulares na interação social diferiam de preferên-
particulares da cidade de João Pessoa - cia ao isolamento; satisfação com o pro-
PB; sendo analisadas duas turmas de uma cesso de inclusão escolar realizado com
escola e três de outra, totalizando cinco seus filhos e reconhecimento da impor-
professoras, como também cinco crianças tância do papel da família nesse processo.
com diagnóstico do espectro autista, com Outro aspecto foi que embora atribuíssem
idades variando entre 3 e 5 anos, de classe expectativas mais voltadas à socialização,
sócio-econômica média e seus respectivos a maioria enfatizou as diferentes habili-
pais. Para a coleta dos dados, foram uti- dades adquiridas pelos seus filhos após a
lizadas entrevistas semiestruturadas com entrada na escola. Quanto às professoras
os pais e professoras registradas através a maioria demonstrou estar reformulando
de um mini-gravador, como também, fo- suas concepções a partir das experiên-
ram realizadas duas filmagens em cada cias estabelecidas com estas crianças no
turma contemplando 20 minutos em cada cotidiano escolar, adotando concepções
uma das situações de pátio e sala de aula, que embora abordem as dificuldades das
dos quais foram transcritos e analisados crianças, partem de aspectos positivos
10 minutos. Com o objetivo de caracte- que envolvem as possibilidades e os re-
rizar as crianças deste estudo também sultados dos esforços dispensados com o
foi utilizada a escala de avaliação CARS trabalho de inclusão. No que diz respeito
(Childhood Autism Rating Scale). Quanto às interações estabelecidas no contexto
à análise dos dados, as entrevistas foram escolar foram observadas categorias de
transcritas e analisadas a partir da técnica comportamentos verbais e não verbais
de análise de conteúdo, as filmagens fo- em três áreas: comportamentos da crian-
ram transcritas e foram analisadas através ça com espectro autista, comportamentos
de categorias pós-formuladas tendo em da professora e comportamentos das de-
vista a bidirecionalidade nas interações mais crianças. Na primeira área emergi-
estabelecidas nos contextos escolares de ram as seguintes categorias e subcatego-
pátio e sala de aula, assim como, a parti- rias: Olhar, sendo este dirigido a pessoas,
cipação dos membros em termos de fre- ações ou objetos; Iniciativa, sendo esta
quência e duração do comportamento. Os dirigida a pessoas, ações ou a objetos;
resultados apresentados neste trabalho Resposta adequada; Interação passiva;
contemplam parte dos resultados da pes- Imitação; Demonstração de afeto; Sorriso;
quisa de dissertação de mestrado. Em re- Esquiva e Isolamento. Já na segunda área
lação à análise das verbalizações dos pais foram observadas as categorias: Mostrar;
das crianças com espectro autista, embo- Gesticular; Apoio físico; Modelo; Demons-
ra considerando apenas 5 participantes tração de afeto; Diretivos, sendo estes de
alguns aspectos foram encontrados, quais atenção, de instrução e de controle de
sejam: percepção dos filhos como crianças comportamento; Informação e Feedback.
carinhosas e afetuosas, atribuindo a difi- Por último, sobre os comportamentos das
culdade em comunicar-se como sendo a demais crianças emergiram as categorias:
principal característica de criança autista; Olhar; Iniciativa; Esquiva e Demonstração
relatos de dificuldades em definir autis- de afeto. Nos contextos de pátio foram

162
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

enfatizadas as brincadeiras sendo elas em “A lógica da inclusão na rede municipal de


conjunto ou isoladas. Resultados parciais ensino de amparo – estratégias de apoio
indicam a importância da mediação das para a construção da educação inclusi-
professoras, uma vez que as crianças au- va”. O objetivo é contribuir com a prática
tistas do presente estudo demonstraram e a compreensão de algumas das razões
se comportar, nos diferentes contextos, pelas quais é tão difícil saber como lidar
mais frequentemente em resposta a pro- e o que fazer quando temos alunos cujas
fessora ou a situação do que por imitação. características nos evidenciam a necessi-
Pretende-se com este estudo subsidiar dade de trabalhar com as diferenças nos
orientações a pais e profissionais princi- mais variados contextos do cotidiano de
palmente no que se refere à inclusão es- uma educação que se propõe a ser inclu-
colar de crianças autistas, tendo em vista siva. O Programa de Educação Inclusiva,
que as concepções podem influenciar os intitulado “A educação tem muitas faces -
comportamentos dos adultos, como tam- educando e aprendendo na diversidade”,
bém, os comportamentos dessas crianças tem como proposta o apoio aos profes-
podem ser influenciados considerando os sores, no qual consiste no levantamento
contextos interativos, a mediação do adul- de informações sobre o atendimento de
to e, sobretudo, as particularidades de diferentes casos nas escolas, buscando
cada criança. categorizar e caracterizá-los para o conhe-
cimento da realidade e encaminhamentos
Palavras-chave: Espectro autista, Concepções, pedagógicos e clínicos, encontros com
Inclusão profissionais da educação e saúde para
Contato: Emellyne Lima de Medeiros Dias discussão de dificuldades e indicações das
Lemos, UFPB, emellyne@gmail.com intervenções realizadas, levantamento de
propostas, orientações, encaminhamen-
LT04-1197 - A EDUCAÇÃO INCLUSIVA tos e registros. Segundo Sassaki (1998),
E O TRABALHO DAS ASSESSORIAS na escola inclusiva há colaboração e apoio
ESPECIALIZADAS mútuo entre professores, terapeutas e
Simone Cassiani - PM-Amparo consultores para se oferecer orientação
simonecassiani@uol.com.br na própria sala de aula em vez de retirar
Alessandra Rodrigues de Almeida - PM-Amparo alunos do horário de aula para desenvol-
Marisol Regina Pavani de Oliveira - PM-Amparo ver terapias no ambiente escolar, o que
seria muito inadequado, uma vez que a
A Rede Municipal de Ensino de Amparo escola não se confunde com a clínica, e o
vem desenvolvendo um trabalho em prol papel de cada profissional deve ser respei-
de uma educação inclusiva e de qualida- tado. O trabalho clínico deve ser realizado
de visando beneficiar a TODOS. Reconhe- fora do espaço escolar, com profissionais
cendo que a Constituição Federal de 1988 da saúde. Atualmente a Secretaria vem
garante a todos o direito à educação e o crescentemente investindo em formas de
acesso à escola (Art. 1º; 3º; 205; 206 e instrumentalizar os profissionais que atu-
208) e atendendo a esses princípios cons- am nas unidades escolares na perspectiva
titucionais, a Secretaria Municipal de Am- de qualificar o atendimento educacional e
paro, elaborou um documento intitulado, desenvolver uma prática de Educação In-

163
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

clusiva voltada a participação democrática do no processo de ensino e aprendiza-


de todos. Além de todo trabalho desen- gem de seus alunos de maneira integral
volvido pela SME, composto no documen- e inclusiva; b) os alunos são assistidos em
to do Programa, vimos nesse texto enfa- suas necessidades, tendo a possibilidade
tizar uma ação que tem sido de grande e oportunidade de desenvolver todas as
valia ao desenvolvimento dos alunos e à suas habilidades, de participar de todo
prática pedagógica dos professores, que é processo educativo da escola, sendo visto
o trabalho realizado pelas assessorias con- como seres com potencial para aprender;
tratadas pela SME para garantir o apoio e c) os pais estão mais conscientes e infor-
as orientações às unidades escolares e mados sobre as ações da rede e se sentin-
diretamente aos professores que aten- do participantes do processo escolar, va-
dem alunos com as diversas deficiências. lorizados e comprometidos com seu filho
A fim de desenvolver o reconhecimento e com todos da escola; d) a equipe escolar
e a valorização das diferenças humanas que está mais informada e comprometida
em todas as instâncias, minimizando os com todos da escola, não somente com
preconceitos e buscando garantir a imple- os alunos com necessidades educacio-
mentação de práticas inclusivas mais ade- nais especiais. Enfim, TODOS aprendem a
quadas, a qualificação e aprimoramento conviver e a serem pessoas melhores com
do atendimento educacional a todos os nossas diferenças. Em síntese, a inclusão
alunos, considerando suas diferenças, ca- escolar e em todos os âmbitos só ocorrerá
pacidades e ou limitações, e a competên- se TODOS alinharmos nosso leme em dire-
cia de todos os profissionais das escolas, ção ao acolhimento, compromisso com o
a Secretaria Municipal de Educação, dan- próximo, acreditando em sua capacidade,
do continuidade as ações do Programa “A competência e possibilidades, adotando
Educação tem muitas faces – Educando posturas e atitudes que não dê brechas
e aprendendo na diversidade”, vem in- para o surgimento de barreiras, conser-
vestindo desde 2006, na contratação de vadorismo, resistências e ou ações pre-
assessorias especializadas e consultorias conceituosas e ou excludentes que levam
para o desenvolvimento desse trabalho: ao impedimento da Inclusão. Precisamos
Assessoria em Gestão Inclusiva, LIBRAS e rever nossos papéis como cidadãos e as-
Comunicação Suplementar e Alternativa sumir nossa identidade em benefício do
(CSA); Assessoria em Fisioterapia, Psicolo- que acreditamos, numa sociedade mais
gia e Terapia Ocupacional, desempenhan- justa e Inclusiva para TODOS. A Secreta-
do atuação com todos os alunos matricu- ria Municipal de Educação está investindo
lados nas salas regulares e na orientação em ações que beneficiam não somente as
do trabalho do Atendimento Educacional pessoas do âmbito escolar, mas realizan-
Especializado da rede municipal de en- do ações interdisciplinares que envolvem
sino. Foram observados resultados que e sensibilizam toda a comunidade escolar
beneficiaram: a) os professores, que se e a sociedade, ou seja, TODOS nós, sem
sentem mais seguros, esclarecidos, in- exceção.
formados e valorizados, em sua prática e
qualificado para atuar com todos os alu- Palavras-chave: educação inclusiva,
nos com condições de trabalho, pensan- assessorias, saúde.

164
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1352 - CONTRIBUIÇÕES DA PRÁTICA se o professor na condição de sujeito mais


DOCENTE PARA A INCLUSÃO DO ALUNO experimentado e no exercício de um pa-
COM NECESSIDADE EDUCACIONAL pel historicamente comprometido com
ESPECIAL EM TURMA REGULAR mudanças sociais, tem sustentado em sua
Noélia Martins dos Anjos - Unb prática ações que consolidam os pressu-
noeliamartins@ig.com.br postos da educação inclusiva, indo além
de garantias como a socialização e intera-
O trabalho pedagógico concretizado por ção, promovendo antes, a aprendizagem
uma de suas vertentes, o trabalho docen- escolar. Ao passo que a pesquisa se lançou
te, apresenta natureza dinâmica que deve pela elucidação dessa primeira proposta,
reunir teoria e prática como ferramenta moveram também essa investigação os se-
a ser utilizada, dentre outras coisas, no guintes objetivos específicos: conhecer as
desenvolvimento de habilidades sociais. concepções de ensino e de aprendizagem
Nesse sentido, e tendo o professor no es- que norteiam as práticas educacionais
paço escolar posição de sujeito mais ex- dos professores participantes; quais me-
periente e, portanto, mediador de novos didas são tomadas pelo docente no que
conhecimentos, o trabalho docente pode se refere à continuidade de sua formação
vir a ser uma das formas mais eficazes de inicial; quais relações estabelecidas en-
inclusão de alunos com deficiência no en- tre discurso e prática e finalmente como
sino regular. Ao desenvolver meu trabalho são compreendidas pelos professores as
como Pedagoga no Serviço Especializado contribuições de seu trabalho no que se
de Apoio à Aprendizagem - SEAA em uma refere ao desenvolvimento da aprendiza-
escola pública do Distrito Federal, observo gem escolar. Como pressupostos teóricos,
que os professores regentes que atuam no a pesquisa pautou-se nos trabalhos de:
ensino regular e que têm em suas classes Resende (2006), Pimenta (2006) e Dessen
alunos com necessidades educacionais es- e Polônia (2007) para abordagens acerca
peciais – ANEEs, diagnosticadas como de- do trabalho pedagógico e saberes da do-
ficiência apresentam dificuldade em com- cência. Sobre as concepções de ensino e
preender a inclusão deste aluno no ensino aprendizagem compreenderão os estudos
regular por meio do trabalho docente. A de Freire (1997), Tunes, Tacca e Mitjáns
partir dessa observação e para melhor Martinez (2006), Kassar (2006) e Vygotsky
compreensão dessa realidade, busquei (2003). Por fim, as considerações referen-
resposta à seguinte problemática: como as tes ao trabalho docente e educação inclu-
concepções de ensino e aprendizagem que siva apresentam embasamento nas avalia-
nutrem os educadores, bem como as prá- ções de Mantoan (2007), como também
ticas docentes aplicadas em sala de aula na legislação brasileira referente ao tema.
contribuem, ou não, com a inclusão dos A metodologia de pesquisa baseou-se nos
alunos com necessidades educacionais es- pressupostos da abordagem qualitativa,
peciais no ensino regular? Por isso, como cuja coleta de dados foi realizada por meio
objetivo geral de pesquisa, pretendi en- dos instrumentos de observação, questio-
tender de que forma o trabalho pedagógi- nário e entrevista semiestruturada aplica-
co docente pode tornar efetiva a inclusão dos junto aos professores de uma escola
de ANEEs no ensino regular, considerando pública dos anos iniciais do Ensino Funda-

165
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mental do Distrito Federal. O tratamento cias no processo de oferta e procura do


dos dados se deu de acordo os procedi- atendimento especializado, visto que a
mentos próprios do método qualitativo, própria rotina escolar e as incumbências
utilizando de análise interpretativa dos profissionais de cada função envolvida
resultados com vistas à produção de refle- podem ter tido influência significativa no
xão e contribuições para a prática docente afastamento observado entre as profes-
no lócus pesquisado. Dentre os resultados soras regentes e àquelas encarregadas
obtidos pela pesquisa a partir dos objeti- pelo apoio a ser oferecido. Finalmente, a
vos elencados, foi possível perceber que a última proposição a que se lançou esse
passagem do ANEE pela escola e o traba- trabalho foi a apuração de contribuições
lho dos profissionais envolvidos, colabora- do trabalho docente para a aprendizagem
ram para que, de alguma forma, esse alu- escolar. Conforme já sinalizado pela aná-
no experimentasse crescimento em algum lise da principal assertiva levantada pela
aspecto de seu desenvolvimento: tanto pesquisa, não se pode deixar de observar
na socialização, na convivência com seus diversos aportes ao processo de desenvol-
pares ou até mesmo vencendo expectati- vimento do ANEE, efetuados por meio do
vas negativas que são feitas a seu respei- trabalho docente. Porém, muito ainda há
to. Entretanto, verificou-se que dentre as que ser feito para que essas contribuições
concepções de ensino e de aprendizagem contemplem de forma integral a aprendi-
que embasam o trabalho docente, ainda zagem escolar que ainda encontra-se em
permanecem arraigadas na prática dos situação de desvantagem quando com-
professores pesquisados os pressupostos paradas a outras contribuições, que nem
de uma educação voltada para os resulta- sempre perpassam o fazer tipicamente
dos obtidos a partir da aprendizagem de docente e sua função precípua de promo-
conteúdos escolares sem fins específicos, ção dos aspectos que favoreçam a relação
não sendo abertamente defendidas medi- de ensino e de aprendizagem. Dessa for-
das de promoção de aprendizagem esco- ma, o que se pode arrematar de todo esse
lar que resultem na inclusão do ANEE no trabalho é a expectativa de que o investi-
universo dos saberes formais. Outro tópi- mento na formação inicial e contínua do
co proposto pela pesquisa foi a condução professor será o diferencial para que este
do processo de formação continuada e se pense e repense sua ação, não se confor-
esta contemplaria os pressupostos neces- mando com um saber, que ainda válido
sários ao trabalho com o ANEE. Observou- ao seu tempo, encontra-se ultrapassado
-se insuficiência na formação ao longo da e insuficiente para as demandas da edu-
carreira e na condição profissional que cação atual. Considera-se ainda que, para
vincula as professoras ao exercício do seu muitos, a aprendizagem escolar pode não
trabalho, tendo em vista dificuldades im- ser o principal objetivo de quem enfrenta
postas pelo sistema de ensino na seleção tantas adversidades provindas da condi-
dos profissionais para oferta de formação ção imposta pela deficiência, entretanto,
continuada e no processo de escolha de é esse o trabalho que deve ser desenvolvi-
turmas com ANEE que não tem sido con- do por professores e professoras, até para
duzido de forma criteriosa. Também, foi que não se sustente mais uma forma de
possível observar imprecisões e divergên- perpetuação da exclusão.

166
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: trabalho pedagógico, O ato de matar-se expressa, então, além


aprendizagem escolar, inclusão da impossibilidade de contenção do trau-
Contato: Noélia Martins dos Anjos, mático via representação simbólica, a
Universidade de Brasília, única via de descarga possível para uma
noeliamartins@ig.com.br demanda de trabalho para o qual o indi-
víduo não encontra recursos de media-
ção. Assim sendo, muitos desses atos se
CO 38 - LT06 apoiam na insuficiência de recursos men-
tais, na incapacidade de dar figurabilida-
Vulnerabilidades/risco de à dor psíquica. Com isso, deflagram-se
os fatores de risco psicossociais, de de-
senvolvimento, e os quadros psicopato-
LT06-866 - PROCURANDO A MORTE: O lógicos relacionados. Entre os primeiros
ZULLIGER NA AVALIAÇÃO DE PACIENTES destacam-se: nível socioeconômico e de
COM TENTATIVAS DE SUICÍDIO escolaridade baixos; dinâmica familiar
Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS disfuncional, traumas e perdas pessoais;
silvanalba@upf.br baixa autoestima, falta de controle da
Luana Gasparetto Fontanella - FHST, Erechim/RS impulsividade e da agressividade, humor
luluzinhagf@erechim.com.br lábil, precários recursos para o enfrenta-
mento de problemas, tentativas prévias
O suicídio está entre as 10 principais cau- e antecedentes na história familiar. Entre
sas de morte, no mundo, e entre as três as perturbações mentais mais evidentes
primeiras quando se considera a faixa estão os transtornos borderline, a es-
etária entre 15 e 35 anos. No Brasil, a quizofrenia, a dependência química e os
incidência tem aumentado, especialmen- quadros depressivos. Essas organizações
te, entre adolescentes e adultos jovens. permitem perceber que os atos suicidas
O Estado do Rio Grande do Sul registra podem ter motivações totalmente diver-
o maior coeficiente de suicídio no país sas, e que têm relação com rupturas em
- 9,88 casos/100.000 habitantes - com diferentes períodos do desenvolvimen-
maiores coeficientes de mortalidade en- to afetivo-emocional. Considerando ser
tre a população idosa (com mais de 70 esse um problema de saúde pública e a
anos de idade); porém, nos últimos anos, escassez de estudos com esses pacien-
há elevação nas faixas mais jovens, en- tes que, frequentemente, encontram-se
tre 20 e 59 anos. A tentativa de suicídio nas emergências dos hospitais e, em sua
pode ser considerada como uma reação maioria, sobrevivem às tentativas de seus
frente à ação do traumático que, pela atos lesivos, há necessidade de se verifi-
força do irrepresentável, leva o indivíduo car a validade de instrumentos eficientes
ao ato de tentar dar fim à própria vida. e rápidos de avaliação psicológica, para
Algumas dessas situações são resultan- que possam auxiliar na compreensão
tes de contextos nos quais o sujeito se vê da estrutura e da dinâmica psíquica dos
acometido por um excesso, mostrando- mesmos. Com esse propósito, o presente
-se incapaz de processar e metabolizar a estudo buscou investigar as característi-
tensão (trauma/excesso) psiquicamente. cas de personalidade de pacientes com

167
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

várias tentativas de suicídio, os fatores de tem três filhos: duas meninas, uma de 14
risco relacionados e a validade do Zulliger e outra de 27 anos de idade e um meni-
nesse contexto. Foram participantes duas no, de 18 anos. A baixa hospitalar deu-se
mulheres, de 41 e 47 anos de idade, di- pelo consumo de 18 comprimidos de dia-
vorciadas, uma auxiliar de serviços gerais zepam, sua quarta tentativa de suicídio,
e outra de indústria, com ensino funda- sendo uma anterior ao tentar atirar-se
mental e médio, respectivamente. Utili- do quarto andar de um prédio. O início
zaram-se como critérios de inclusão: (a) desses episódios foi relacionado com o
tentativas de suicídio anteriores; (b) hos- excesso de trabalho, quando também co-
pitalização em decorrência da tentativa meçou a apresentar sintomas psicóticos.
de suicídio, por um período de no mínimo Dados da família de origem revelaram a
três dias; (c) não fazer uso de medicações presença de irmãos usuários de drogas,
que pudessem interferir na fidedignidade sendo um deles morto por overdose, e
dos achados. Como instrumentos utiliza- de morte por suicídio nos dois avôs, tanto
ram-se a entrevista clínica semiestrutura por parte de pai quanto de mãe. O Caso
e o teste Zulliger no Sistema Compreensi- “B” pensa em se matar porque não tem
vo ZSC. Os dados foram analisados quanti outra opção; além de querer morrer quer
e qualitativamente, trazendo elementos matar seus filhos. A análise comparativa
sobre a leitura da realidade, defesas psi- dos protocolos de entrevista permitiu ve-
cológicas, autopercepção, percepção in- rificar que ambas as pacientes apresen-
terpessoal e história de vida. A entrevista taram cinco tentativas de suicídio cada
semiestruturada revelou que o Caso “A”, uma, sobretudo pela ingestão de medi-
de 41 anos, é divorciada, mas vive, atual- camentos; possuíam, em seu desenvol-
mente, com um companheiro; é mãe de vimento, histórico familiar disfuncional
um menino de 15 anos e de uma menina e de perdas traumáticas; foram diagnos-
de 25 anos. A baixa hospitalar deu-se pela ticadas com transtorno de personalida-
intoxicação por ingestão de 20 comprimi- de borderline e participam de grupos de
dos de carbamazepina e de amitriptilina, atendimento psicoterápico individual em
sendo sua terceira tentativa de suicídio ambulatório de saúde mental. A inter-
por consumo de medicamentos. As duas pretação dos protocolos do ZSC, por sua
tentativas anteriores foram: uma aos 20 vez, possibilitou confirmar a história do
anos de idade, por ingerir veneno, oca- desenvolvimento pessoal por meio dos
sião em que começou a sentir vontade de dados de personalidade e a identificar
se matar e, a outra, quando tentou cortar prejuízos na apreensão da realidade, de si
os pulsos por sua perícia ter sido negada. mesmo, do outro e nas interações sociais,
O início desses episódios foi relacionado por meio de atribuições de aspectos sub-
com a morte de seus dois irmãos, que fo- jetivos, distorcidos e falhos. Os dois casos
ram assassinados com tiro na cabeça. O apresentaram dificuldades de controle
Caso “A” pensa em se matar porque acre- emocional, impulsividade, instabilidade
dita que irá para um lugar melhor, mas, nos relacionamentos e isolamento. Esses
ao mesmo tempo em que quer morrer, resultados podem ser úteis para ampliar
quer melhorar para cuidar de seu neto. a compreensão de pacientes com tenta-
O Caso “B”, de 47 anos, é divorciada e tivas de suicídio, para predizer as possi-

168
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

bilidades de novas ocorrências e, ainda, brenner, 1996), a Psicologia Positiva e o


para direcionar programas de tratamen- conceito de Resiliência (Paludo & Koller,
tos mais eficientes e adequados. Além 2006, 2007; Yunes, 2006). Nesse senti-
disso, conclui-se que o ZSC pode ser útil do, os pressupostos teóricos subjacentes
em contextos de avaliação clinica e hospi- possibilitam uma melhor compreensão
talar, respeitando-se as limitações de seu do desenvolvimento humano, sobretudo,
emprego. no que se refere a crianças e adolescen-
tes expostos a situações de vulnerabilida-
Palavras-chave: teste Zulliger, tentativa de de psicossocial, uma vez que possibilitam
suicídio, fatores de risco investigar os efeitos dos fatores de risco e
Contato: Silvana Alba Scortegagna, UPF/RS, de proteção no desenvolvimento infanto-
silvanalba@upf.br -juvenil. A Teoria Bioecológica do Desen-
volvimento Humano enfatiza a necessi-
dade de uma melhor compreensão das
LT06-873 - ADOLESCÊNCIA, características do contexto, da pessoa,
VULNERABILIDADE E RESILIÊNCIA: dos processos envolvidos e do tempo no
AVALIAÇÃO DE FATORES DE PROTEÇÃO desenvolvimento humano. A Psicologia
EM UMA AMOSTRA DE ADOLESCENTES Positiva é uma nova sub-área, dentro da
NO INTERIOR DO RIO GRANDE DO SUL Psicologia, que busca investigar os aspec-
Jeane Lessinger Borges - SETREM tos positivos do desenvolvimento do ser
www.setrem.com.br ou humano, fortalecendo as potencialidades
jeanepsico@yahoo.com.br e a saúde do sujeito em desenvolvimen-
Sara Eduarda Pires - SETREM to (Assis, Pesce, & Avanci, 2006; Yunes,
www.setrem.com.br ou 2006). Um constructo teórico importante
saraeduardapires@yahoo.com.br da Psicologia Positiva se refere ao de resi-
liência, que pode ser compreendido como
Este trabalho apresenta os resultados de a capacidade do indivíduo de superar as
uma pesquisa sobre a presença de fatores situações de adversidades. Atualmente¸
de proteção, associados a variáveis indivi- a resiliência vem sendo considerada não
duais e do contexto familiar e escolar, em como um evento isolado e de caráter indi-
uma amostra de adolescentes em situa- vidualizado, mas, sim, como um processo
ção de vulnerabilidade psicossocial. Este dinâmico e abrangente incluindo, além da
estudo foi realizado ao longo do primeiro pessoa, o contexto familiar (Yunes, 2003).
semestre de 2011, durante a etapa inicial Nesse sentido, uma maior compreensão
da prática de estágio curricular da se- da presença de fatores de proteção no
gunda autora, sob orientação da primei- contexto familiar e escolar, bem como de
ra autora, junto a adolescentes que fre- características individuais - por exemplo,
quentavam uma escola pública de tempo autoestima e satisfação de vida - na me-
integral, localizada num município da Re- diação do impacto dos fatores de risco
gião Noroeste, no interior do Rio Grande presentes no desenvolvimento de adoles-
do Sul. Os aspectos teóricos norteadores centes, se tornou o foco de atenção desta
deste estudo são a Teoria Bioecológica pesquisa. A interação entre risco e prote-
do Desenvolvimento Humano (Bronfen- ção necessita ser melhor investigada, a

169
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fim de se compreender como estes inter- maioria, pelo modelo nuclear (65%), em-
ferem na resiliência de adolescentes. Para bora 17,5% vivessem numa família mono-
tanto, foram entrevistados 40 adolescen- parental, chefiada pela figura da mãe. O
tes (52,5% meninos e 47,5% meninas), relacionamento com os pais foi avaliado
com idades entre 11 a 17 anos (M=12,97; de forma positiva (70,7%), sendo que mo-
DP=1,10), residentes na área urbana e nitoramento (63,4%), afeto (56,1%) e es-
periférica de um município gaúcho ca- tabelecimento de regras (61%) foram ava-
racterizado, eminentemente, pela agri- liados pelos adolescentes como aspectos
cultura familiar. Os adolescentes foram importantes na relação pais-filhos. Os
convidados a participarem da pesquisa, relacionamentos com amigos e professo-
tendo sido autorizados por seus pais, que res também foi avaliado de forma positi-
assinaram o Termo de Consentimento Li- va (78,0% e 56,1%, respectivamente). Em
vre e Esclarecido. Foi aplicado um Ques- relação às estratégias de enfrentamento
tionário com 16 questões estruturadas, utilizadas pelos adolescentes frente às
sobre variáveis individuais e do contexto situações adversas, os itens “continuar
familiar e escolar, que pudessem estar tentando resolver o problema” (75,6%),
associadas à resiliência. Este questionário “acreditar em si mesmo frente às dificul-
foi elaborado a partir dos dados de Assis dades que a vida lhe apresenta” (48,8%)
et al. (2006) e aplicado de forma coletiva. e “pedir ajuda a alguém” (46,3%) foram
Os dados foram tabulados e analisados no os mais citados pelos adolescentes en-
programa SPSS versão 13.0. Foram reali- trevistados. Nesse sentido, os resultados
zadas análises estatísticas descritivas e de apontam que, apesar da presença de fa-
frequência simples, bem como cálculo de tores de risco ao desenvolvimento destes
correlação de Spearman. Os resultados adolescentes, sobretudo pela exposição
apontaram que a trajetória de vida des- a eventos estressores, os participantes
tes adolescentes foi caracterizada pela apresentaram boa autoestima e elevada
exposição a eventos estressores (56,1%), satisfação de vida. Observou-se, ainda,
incluindo separação dos pais, morte de um predomínio de estratégias de enfren-
um ente querido, uso de drogas por um tamento adaptativas por parte dos ado-
familiar e violência doméstica. Os parti- lescentes frente a situações adversas. A
cipantes relataram vivenciar algum sofri- presença de fatores de proteção na famí-
mento psíquico frente a estas diferentes lia e no contexto comunitário (grupo de
situações adversas (41,5%). No entanto, pares e escola) pode ser considerada uma
estes adolescentes se percebiam como variável importante para o processo de
tendo uma autoestima alta (58,5%) e uma resiliência. Conclui-se que uma maior in-
elevada satisfação de vida (82,9%), além vestigação da interação de características
de terem planos para o futuro (82,9%). individuais e do contexto de desenvolvi-
Foi encontrada uma correlação positiva mento do adolescente podem dar subsí-
entre alta autoestima e monitoramento dios para os estudos sobre resiliência em
parental (r=.50; p<0,01), bem como entre jovens, na tentativa de potencializar os
satisfação de vida e relacionamento com aspectos saudáveis destes indivíduos e de
os pais (r=.64; p<0,01). A família destes sua capacidade de superação das dificul-
adolescentes caracterizava-se, em sua dades e adversidades da vida.

170
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: infância, vulnerabilidade, do sexo feminino e tinham, em média,


resiliência 15,53 anos (SD = 1,12). Foram utilizados
Contato: Jeane Lessinger Borges, Faculdade os seguintes instrumentos: (a) Inventá-
Três de Maio/SETREM, rio de Eventos Estressores (para avaliar
jeanepsico@yahoo.com.br os fatores de risco), (b) Mapa dos Cinco
Campos (para avaliar a rede de apoio –
número de contatos e fator de proximi-
LT06-898 - REDE DE APOIO, EVENTOS dade) e (c) um bloco de instrumentos que
ESTRESSORES E AJUSTAMENTO NA compôs o Índice Geral de Ajustamento
VIDA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES (Checklist de Sintomas Físicos, Escala so-
EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE bre o Uso de Drogas, Escore de Risco para
SOCIAL Comportamento Suicida, Índice Geral de
Normanda Araujo de Morais - UFRGS Comportamento Sexual de Risco e a Es-
normandaaraujo@gmail.com cala de Afeto Positivo e Negativo). Houve
Marcela Raffaelli - UIUC diferença estatisticamente significativa
mraffael@illinois.edu entre os grupos, sendo que o de base-rua
Silvia Helena Koller - UFRGS (G1) apresentou maior média de eventos
silvia.koller@gmail.com estressores e valores de impacto e pior in-
dicador geral de mau ajustamento, com-
Este trabalho tem como objetivo: (a) parado ao grupo de base-familiar (G2). A
descrever e comparar dois grupos de comparação das médias entre os grupos
adolescentes em situação de vulnerabi- também mostrou diferença estatistica-
lidade social - um grupo em situação de mente significativa na variável “rede de
rua e um grupo que vive com sua família apoio”. G1 apresentou maior número de
- quanto ao número e impacto dos even- contatos no campo “instituição”; maior
tos estressores, à sua rede de apoio social fator de proximidade total e no campo
e afetiva, e ao indicador geral de ajusta- “amigos/vizinhos e parentes”, quando
mento; e (b) verificar se as características comparado a G2. Uma ANOVA fatorial do
da rede de apoio (tamanho e qualidade) tipo 2 (alto vs. baixo nível de proximida-
moderaram o efeito do número e impac- de familiar) x 2 (alto vs. baixo número de
to dos eventos estressores sobre o índi- eventos estressores), em que o nível de
ce geral de ajustamento. Trata-se de um ajustamento representou a variável de-
estudo transversal, que foi realizado com pendente, revelou efeitos principais sig-
98 crianças/adolescentes, em dois gru- nificativos tanto para a proximidade fami-
pos: aqueles que vivem em situação de liar quanto para os eventos estressores.
rua (n=32; 32,7%) e os que moram com Foi encontrado um efeito de interação
suas famílias e frequentam uma institui- significativo entre estas duas variáveis.
ção para jovens em situação de vulnera- A descrição gráfica dessa interação mos-
bilidade social (n=66; 67,3%). No grupo trou que houve moderação da proximi-
de base-rua (G1), a maioria (n=27; 84,4%) dade familiar, no nível de ajustamento de
era do sexo masculino, com idade média indivíduos que vivenciavam alto nível de
de 14,69 anos (SD = 1,85). Já no grupo eventos estressores. Ou seja, na presença
com base-familiar (G2), 38 (57,6%) eram de um alto nível de proximidade familiar,

171
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

o impacto de eventos estressores sobre o de que programas e políticas públicas


ajustamento foi menor do que quando o com foco no indivíduo tendem ao fracas-
nível de proximidade familiar era baixo. so, assim como intervenções pontuais,
Os resultados do presente estudo corro- compensatórias e assistencialistas. Tão
boram, empiricamente, a importância da importante quanto o suprimento de con-
“proximidade” familiar como um fator de dições materiais e econômicas às famílias
proteção na vida de adolescentes que vi- é a existência de programas sociais que
vem em situação de vulnerabilidade so- visem um acompanhamento mais siste-
cial. Mais especificamente, sobre a vida mático destas. Embora a miserabilidade
daqueles/as que estão submetidos a um econômica seja considerada um dos fato-
maior número de eventos estressores. res que mais contribuem para a fragilida-
Nenhum estudo que testava a associação de dos vínculos familiares, isso não signi-
entre rede de apoio e ajustamento, a par- fica dizer que o problema será resolvido,
tir do Mapa dos Cinco Campos, foi identi- quando as famílias receberem apenas o
ficado até então. Quase sempre, as pes- apoio financeiro necessário. Ao contrário,
quisas que utilizam esse instrumento o as propostas assistencialistas vigentes,
fazem para descrever as características da até então, apenas reforçam a percepção
rede de apoio dos participantes. A utiliza- dessas famílias como incapazes e desqua-
ção deste instrumento com adolescentes lificadas para o cuidado de seus filhos.
em situação de vulnerabilidade social (na Urge uma nova concepção de família, a
rua ou na família) mostrou-se apropria- qual esteja baseada não apenas nas suas
do, pela riqueza de dados produzidos e vulnerabilidades e fragilidades, mas, que
pelo aspecto lúdico e terapêutico que sua as reconheça, também, em suas próprias
aplicação possibilita. Durante a aplicação potencialidades e recursos, e que atue
do Mapa, foi frequente a expressão de fortalecendo-as.
sentimentos e relatos de vida que, talvez,
demorassem mais tempo para serem ex- Palavras-chave: rede de apoio, família,
pressos, caso apenas a entrevista tivesse vulnerabilidade social
sido utilizada. À luz desses resultados, Contato: Normanda Araujo de Morais, UFRGS,
confirma-se a necessidade de progra- normandaaraujo@gmail.com
mas e políticas sociais que tenham a fa-
mília como foco de atenção e interesse.
A retomada da família como referência
das políticas públicas é justificada como
a estratégia mais adequada (ao lado das
intervenções sociais tradicionais – saúde,
educação, habitação, renda, etc.) para o
desenvolvimento de programas sociais
efetivos de enfrentamento das diversas
situações que implicam em vulnerabilida-
de social (tais como, pobreza, violência,
situação de rua etc.). Além disso, o foco
na família está relacionado com a visão

172
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT06-1015 - DESENVOLVIMENTO EM de atenção à criança e ao adolescente


RISCO: RELATO DE INTERVENÇÃO em situação de risco se deparam com
PSICOLÓGICA JUNTO A CRANÇAS E mais desafios na busca de melhorar as
ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE precárias condições de vida em que estas
RISCO. UMA EXPERIÊNCIA DE EXTENSÃO se encontram vivendo, muitas vezes, em
UNIVERSITÁRIA um cotidiano de situações extremas de
Emily Souza Gaião - UEPB exclusão social, no qual os direitos asse-
emilygaiao@gmail.com gurados no Estatuto da Criança e do Ado-
Luciano Edgley dos Santos - UEPB lescente não são respeitados (ECA, 1990).
lucianoedgley@gmail.com São consideradas em situação de risco as
Lívia Sales Cirilo - UEPB crianças e adolescentes que apresentam
liviasalesc@gmail.com um atraso no desenvolvimento esperado
Ana Karine Gonçalves dos Santos - UEPB para a sua faixa etária, de acordo com a
anakikags@hotmail.com cultura em que se encontram (Bandeira et
Aline Ribeiro - UEPB al., 1996). Hutz e Koller (1996) classificam
aline_ribeiro15@hotmail.com tais situações em três categorias: risco
Ana Karoliny da Silva Carolino - UEPB físico (doenças genéticas ou adquiridas,
ak-karoliny@hotmail.com prematuridade, problemas de nutrição,
Clarissa Loureiro das Chagas Campêlo - UEPB entre outros); risco social (exposição a
clarissalcc@hotmail.com ambiente violento, a drogas) ou risco psi-
Gabriella Cézar dos Santos - UEPB cológico (efeitos de abuso, negligência ou
gabriellacezar@hotmail.com exploração), podendo, ainda, terem como
Johanna Sales Pereira - UEPB causa fatores externos (relacionados com
iohanninha@hotmail.com condições ambientais adversas) ou inter-
nos (relacionados a comportamentos que
No Brasil, assim como em outros países, acentuem a possibilidade de conseqüên-
a pobreza ainda é um traço marcante na cias adversas para o desenvolvimento do
sociedade, como resultado da má distri- indivíduo). Esta situação de risco acaba se
buição de renda. As dificuldades advindas traduzindo por dificuldades na freqüência
desse fato podem comprometer o desen- e no aproveitamento escolar; nas con-
volvimento de crianças e jovens brasilei- dições de saúde, de forma geral; e nas
ros menos favorecidos economicamente, relações afetivas, consigo mesmo, com
por dificultar o acesso a diversos tipos de sua família e com o mundo, tendo como
informações levando-os, em muitos casos, conseqüências a exposição a um circuito
a começar a trabalhar precocemente, re- de sociabilidade marcado pela violência,
duzindo suas potencialidades e os expon- pelo uso de drogas e pelos conflitos com
do a situações delicadas de violência físi- a lei. Muitas vezes, estas experiências de
ca e psicológica, desestruturação familiar, vida facilitam dinâmicas expulsivas da fa-
uso de drogas (lícitas ou ilícitas), abuso e mília nuclear e da casa, e o ingresso no
exploração sexual, comportamento sexu- circuito da rua e das instituições de abri-
al promíscuo, relações sexuais desprote- gamento. Nos casos em que as situações
gidas, ausência de referência apropriada, de risco são detectadas por órgãos públi-
entre outros. Cada vez mais, as políticas cos como a Vara da Infância e Juventude

173
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ou Conselho Tutelar, geralmente, as crian- Os encontros foram realizados quinzenal-


ças são transferidas para abrigos; em ou- mente, durante o período de um ano. De
tros casos, faz-se um acordo com a família modo intercalado às intervenções, os en-
para que a criança possa estar assegura- contros com as meninas eram avaliados e
da. Um dos aspectos mais observados em os resultados eram discutidos pelo grupo
crianças que adentram nos abrigos é a si- de extensão, possibilitando a elaboração
tuação de abandono que, algumas vezes, de novas atividades para o encontro se-
são encontradas em situação desumana. guinte. Nas oficinas foram trabalhadas
Entretanto, de acordo com Hutz e Koller temáticas como sexualidade, violência na
(1996), os estudos relacionados ao desen- sociedade, relações familiares, violência
volvimento de crianças e jovens tendem doméstica e outros, em dinâmicas de gru-
a focar no desenvolvimento de crianças po, rodas de conversa, grupos de escuta,
brancas da classe média de nossa socie- a partir das sugestões advindas das parti-
dade, fato que se torna mais grave devido cipantes. Os relatos que refletiam uma di-
ao fato de que, apesar do grande número nâmica familiar conturbada, ausência de
de problemas sociais que o país enfrenta, orientação, atos de violência e compor-
os estudos em Psicologia sobre indivíduos tamento sexual não adequado estiveram
expostos aos riscos provocados por estes presentes durante as atividades realiza-
problemas têm merecido pouca atenção das. Os encontros se mostraram impor-
(Hutz & Koller, 1996). O déficit de estu- tantes para o desenvolvimento das meni-
dos nessa temática deixa à deriva essa nas, primeiramente, por terem propiciado
população, tão necessitada de atenção momentos de convívio de maior proximi-
e de cuidados. Uma das ferramentas que dade entre elas, uma vez que a convivên-
as universidades possuem para intervir cia com pessoas da mesma idade, princi-
sobre os problemas sociais é a extensão palmente, quando em relação de amiza-
universitária, que visa contribuir para a de, oferece grandes experiências e contri-
viabilização e fortalecimento da relação buições para o desenvolvimento. Moreno
universidade-sociedade. Objetivando au- (2004) assinala estas contribuições como
xiliar na redução das conseqüências das claramente distintas das proporcionadas
situações de risco ao desenvolvimento pelas relações de parentesco. Ainda de
de crianças e adolescentes usuários da acordo com o autor, o contato com iguais
Organização Não Governamental (ONG) permite ao indivíduo situações de apren-
“Menina Feliz”, residentes em bairros de dizagem ao refletir sobre si mesmo, tecer
periferia da cidade de Campina Grande- considerações do eu a partir da perspec-
-Paraíba, foram realizadas oficinas temáti- tiva do outro, compartilhar experiências
cas e terapêuticas por graduandos do cur- e desenvolver suas competências sociais.
so de Psicologia, como atividade do com- Apesar da resistência em falar sobre os
ponente curricular “Extensão II”, presente temas propostos, algumas participan-
na grade curricular do curso de Psicologia tes abordaram as situações de violência
da Universidade Estadual da Paraíba. O vividas, demonstraram curiosidade em
público atendido por essa atividade era questões de ordem sexual, enfatizando a
de meninas com idades entre 6 e 16 anos, necessidade de realização constante de
de duas unidades da ONG “Menina Feliz”. oficinas de expressão e grupos de escuta,

174
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para que tivessem um espaço para elabo- blematização sobre as possibilidades da


rar seus sentimentos diante das situações práxis “psi” no serviço de proteção social
vivenciadas. Faz-se necessário que essas básica, lócus imprescindível para a pro-
crianças em situação de risco continuem moção do desenvolvimento humano e
sendo acompanhadas através de outros comunitário. A noção de desenvolvimento
projetos de extensão; que as políticas go- humano e comunitário, dentro da política
vernamentais se tornem mais eficazes em de Assistência Social, nos parece um pro-
relação às possibilidades de acompanha- blema que exige atenção e requer apro-
mento, através dos órgãos competentes fundamento teórico, tanto na perspectiva
e que os profissionais possuam um olhar das leis que regem a política de assistência
mais atento, com o objetivo de minimizar social, quanto na perspectiva das possibili-
as conseqüências que podem ser geradas dades de atuação da Psicologia que se faz
pelas situações difíceis, enfrentadas por no cotidiano em movimento. Diante disso
essas crianças. buscamos sistematizar, neste documento,
os conceitos de desenvolvimento humano
Palavras-chave: desenvolvimento, situação de e comunitário; problematizar esses concei-
risco, extensão universitária tos, dentro da política pública de assistên-
Contato: Emily Souza Gaião, UEPB, cia social; e refletir acerca de sua compre-
emilygaiao@gmail.com ensão e importância na práxis do psicólogo
no contexto social e político atual. Como
referência teórica, partimos de Vygostky,
LT06-1018 - DESENVOLVIMENTO entendendo que estudar o desenvolvi-
HUMANO E COMUNITÁRIO MEDIADO mento é estudar o movimento - por isso
PELO SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL a perspectiva histórica – e estudar as rela-
BÁSICA: REFLEXÕES TEÓRICAS ções – por isso a perspectiva social, enxer-
SOBRE PERSPECTIVAS E ATUAÇÃO DA gando o sujeito como interativo, por con-
PSICOLOGIA. ta de uma aprendizagem que se dá pelas
Alexsandra Maria Sousa Silva - UFC suas relações intra e interpessoais de troca
alelexsandra@yahoo.com.br com o meio social. Para Leontiev (1978), a
Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC consciência humana diferencia a realidade
naradiogo@hotmail.com de seu reflexo, o que permite diferenciar
o mundo das impressões, possibilitando o
A presente pesquisa nasce da interface da desenvolvimento da capacidade de auto-
Psicologia do Desenvolvimento e da Psi- -observação. Afirmamos, com isto, que ter
cologia Comunitária. Pergunta-se sobre o consciência de alguma coisa é distinguir
lugar da Psicologia no serviço de Proteção o reflexo entre esta coisa e como este re-
Social Básica, examinando teoricamente flexo se dá em meio à realidade, atentan-
e analisando a noção de desenvolvimen- do para como se dá o desenvolvimento
to humano e comunitário, propostas pela humano, a partir dessa (auto)percepção.
Política Nacional da Assistência Social, à Por desenvolvimento comunitário consi-
luz da Teoria Sócio-histórica e da Psicolo- deramos que, hoje, se fale nessa compre-
gia Comunitária. Experiências de extensão ensão atrelada à formação de lideranças
e estágio em Psicologia instigam a pro- locais e à participação comunitária onde,

175
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

através de vínculos afetivos, cooperação e Assistência Social, a Proteção Social Bási-


solidariedade, os moradores-sujeitos tor- ca se assume com o objetivo de atuar no
nam-se responsáveis pela construção de sentido de “prevenir situações de risco por
sua história coletiva. A isso se relaciona o meio do desenvolvimento de potenciali-
conceito de sujeito da comunidade (Góis, dades e aquisições, e o fortalecimento de
2008), como sendo aquele que, saindo do vínculos familiares e comunitários” (PNAS,
véu da submissão e implicado com a rea- p. 27). Dando-se conta de que a Política de
lidade que lhe afeta, compreende melhor Assistência Social, em nível de Proteção
o modo de vida de sua comunidade e de Social Básica, se constrói no sentido da
si mesmo, enxergando seu valor e poder, prevenção, pode-se perceber que o exercí-
para descobrir-se e desenvolver-se. É vá- cio da atividade comunitária tende a levar
lido, ainda, esclarecer a diferença entre o sujeito a um caminho para além, que é
desenvolvimento comunitário e desen- o da promoção do desenvolvimento e da
volvimento da comunidade, uma vez que autonomia e, portanto, a cidadania. Sendo
este último refere-se a ações mais intensas assim, a concepção de desenvolvimento
de agentes externos e não propriamente humano e comunitário, dentro da PNAS,
ações nascidas do potencial comunitário, busca afastar-se da concepção assistencia-
de comum acordo com o agente externo. lista através da promoção da autonomia,
E perpassando uma dimensão histórica de definindo-se como o desenvolvimento de
como a Psicologia foi adentrando o campo potencialidades e fortalecimento dos vín-
da assistência, afirma-se que o trabalho do culos familiares, e compreendendo o sujei-
psicólogo é priorizar as potencialidades e, to numa dimensão histórico-cultural, con-
assim, é percebida a sua importância para siderando a participação social, a cidadania
a superação do viés assistencialista, bem e o desenvolvimento que se dá ao longo de
como para re-inventar uma práxis capaz toda a vida. Além do que, compreender o
de promover o protagonismo e a auto- ser humano fundando, epistemológica e
nomia, tanto individual quanto coletiva, metodologicamente, no materialismo his-
da família e da comunidade. O CREPOP tórico e dialético, como concebe a teoria
(2007) compreende que “a capacidade sócio-histórica, dá possibilidades ao psicó-
de enfrentamento das situações da vida é logo de apreender os fenômenos humanos
afetada pelas experiências, condições de e sociais na sua mais concreta forma de
vida e significados construídos ao longo existir e se manifestar, favorecendo uma
do processo de desenvolvimento” (p. 17). compreensão contextualizada com a reali-
Esta percepção é consoante com o ideal do dade que nos encharca, transitando entre
psicólogo, de ser um dos responsáveis pela as dimensões que são pessoais, familiares,
facilitação do processo de transformação comunitárias (e, portanto, sociais). Assim,
social. Dessa forma, se pode enxergar a a práxis do Psicólogo perpassa a facilita-
importância a ser dada a compreensão ção humana e comunitária, que pode se
que esses profissionais têm, diante de sua dar pela compreensão de ir aonde o povo
atuação, sobre o que é desenvolvimento está, nas ruas e nas comunidades. Além
humano e comunitário. Utilizamo-nos da disso, atentamos para a atuação conjunta
pesquisa qualitativa e, como guia, da pes- das tantas políticas públicas. Concluímos
quisa bibliográfica. Na Política Nacional de com o compromisso da Psicologia de de-

176
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nunciar e anunciar novas possibilidades de social, à história familiar e à declaração de


se sentir, perceber e transformar a realida- intenções. Com o objetivo de investigar ca-
de, pela via do desenvolvimento humano racterísticas de personalidade de pacien-
e comunitário. tes que cometeram tentativa de suicídio,
foram avaliadas 4 mulheres, com idades
Palavras-chave: desenvolvimento humano, entre 29 e 47 anos, usuárias do SUS, que
desenvolvimento comunitário, proteção social se encontravam internadas em um hospi-
básica tal geral por tentativas de suicídio. As par-
Contato: Alexsandra Maria Sousa Silva, ticipantes – denominadas, simbolicamen-
Universidade Federal do Ceará/campus Sobral, te, de Rosa, Orquídea, Bromélia e Hortên-
alelexsandra@yahoo.com.br cia - eram casadas, tinham filhos, possuí-
am diferentes níveis de escolaridade, não
exerciam atividades profissionais, estavam
LT06-1248 - TENTATIVA DE SUICÍDIO E AS sob auxílio doença e tinham histórico de
CARACTERÍSTICAS DE PERSONALIDADE transtorno mental na família. Como cri-
POR MEIO DO HTP térios de inclusão, consideraram-se: (a)
Luana Gasparetto Fontanella - FHST, tentativas de suicídio anteriores; (b) hos-
Erechim/RS pitalização em decorrência da tentativa de
luluzinhagf@erechim.com.br suicídio, em um período de no mínimo 3
Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS dias, para haver estabilização do quadro
silvanalba@upf.br clínico; (c) não fazer uso de medicações
que pudessem interferir na fidedignidade
O suicídio está entre as 10 principais causas dos relatos da entrevista e do teste psico-
de morte no mundo. No Brasil, a incidência lógico. Como instrumentos, foram utiliza-
tem aumentado e o Estado do Rio Grande dos a entrevista clínica semiestrutura com
do Sul registra o maior coeficiente de mor- as pacientes e os familiares, e o teste HTP.
te por suicídio do país. Entre os principais Os resultados da entrevista revelaram que
fatores de risco relacionados destacam-se: Rosa teve baixa hospitalar devido à tenta-
os níveis socioeconômicos e de educação tiva de enforcamento (amarrou uma corda
baixos; os problemas com o funcionamen- no suporte da televisão e uma na maça-
to da família (dinâmica familiar conturba- neta da porta, subiu num banquinho e se
da); as relações sociais e os sistemas de atirou); fez uso de drogas e medicamentos
apoio precários; as perdas traumáticas; as (clorpromazina, tegretol e haldol) antes da
perturbações mentais como depressão, tentativa; após ser atendida no hospital, a
perturbações da personalidade, esquizo- mesma quis ir embora e seu marido assi-
frenia e abuso de álcool e outras substân- nou o termo de responsabilidade. O ma-
cias; a baixa autoestima; a falta de contro- rido fotografou o episódio, após terem-na
le da impulsividade e os comportamentos encontrado, para que ela pudesse ver e,
autodestrutivos; a labilidade do humor; e quem sabe, se sensibilizar e mudar. Já teve
a inabilidade para gerenciar e enfrentar internação em clínicas para dependentes
os problemas. Outros fatores associados químicos, onde, também, teve tentativa
ao suicídio dizem respeito às tentativas de suicídio devido à abstinência. As de-
prévias, à doença afetiva, ao isolamento mais tentativas foram devido a não aguen-

177
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tar mais viver e a querer terminar com o tentando, sendo que começou há mais ou
sofrimento de sua família. É usuária de menos 6 anos, quando ela se mudou para
cocaína injetável e de medicações anesté- o interior onde não há vizinhos e ela fica
sicas injetáveis (morfina e dolantina). En- sozinha o dia todo. Hortência relata que
contra-se em tratamento no CAPS AD e já fizeram “mal feito” na casa onde ela mora,
apresenta sintomas psicóticos (paranóia, pra separar ela e seu marido, porque ela
alucinações). Orquídea foi hospitalizada diz que fica “possuída” e faz essas coisas.
em decorrência da ingestão de 18 com- Seu marido trabalha de motorista; já mo-
primidos de diazepan e para ser encami- raram em várias cidades, porque ele troca
nhada para uma clínica psiquiátrica, pois, de emprego seguidas vezes. O resultado
tem diagnóstico de transtorno borderline. do teste HTP apresentou características
Encontra-se em tratamento psiquiátrico comuns, considerando-se a localização
e psicológico há, aproximadamente, dois dos desenhos (esquerda), a linha de solo,
anos. Relata que segue o tratamento cor- os detalhes na casa como na porta (aber-
reto até certo ponto: “é que nem criança ta). Na figura da pessoa, detalhes como a
quando ganha chocolate e dizem pra ela presença de dedos indicaram atuação e
comer um pedacinho por dia e ela segue detalhes no pescoço, impulsividade. Essas
isso, mas, de repente, come tudo de uma características são consonantes com as-
vez só... eu faço a mesma coisa, eu tomo pectos relacionados às características de
certinho um comprimido por dia, mas tem personalidade de indivíduos que cometem
dias que dá vontade e eu tomo um mon- tentativas de suicídio, especialmente, no
te pra testar até aonde eu aguento”. Fre- que diz respeito à incapacidade de tolerar
quentemente, faz ameaças, dizendo que frustrações, impulsividade, intolerância e
vai matar seus filhos. Bromélia foi interna- atuação. Na realização do HTP, as narra-
da devido à intoxicação de medicamentos tivas das participantes sobre os desenhos
(20 comprimidos de carbamazapina e de revelaram idéias de morte, sentimentos
amitriptilina); é sua terceira tentativa de de frustração, carência afetiva e evidencia-
suicídio utilizando medicamentos, sendo ram a utilização de mecanismos de defesa
que teve outra tentativa, quando estava como identificação projetiva, o que é, co-
com 20 anos, ingerindo veneno. Bromé- mumente, empregado por pacientes com
lia relata que desde essa idade pensa em Transtorno Borderline. Apesar da amostra
se matar, acreditando que “lá em outro reduzida do estudo, esses resultados au-
lugar vai ser melhor”. Nessa época esse xiliam na melhor compreensão das carac-
sentimento foi agravado com a morte de terísticas de personalidade de indivíduos
um de seus irmãos, assassinado com um que apresentam risco de suicídio e na ca-
tiro na cabeça e, há mais ou menos 8 anos, pacitação de profissionais que atuam nes-
outro irmão foi assassinado da mesma for- se contexto.
ma. Hortência teve baixa hospitalar por-
que queria tentar se matar de qualquer Palavras-chave: tentativa de suicídio, teste
jeito; tentou enforcar-se, atirar-se da ja- HTP, características de personalidade
nela e cortar-se com facas. A família não Contato: Luana Gasparetto Fontanella,
sabe dizer quantas tentativas Hortência Fundação Hospitalar Santa Terezinha,
já teve, sua filha diz que ela esta sempre Erechim/RS, luluzinhagf@erechim.com.br

178
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-976 – TRABALHO INFANTIL: Adolescente (ECA. Brasil, 1990) consolida


CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS PARA O essa idade mínima proibindo qualquer
DESENVOLVIMENTO IDENTIFICADAS trabalho a pessoas menores de 16 anos,
NAS PRODUÇÕES EM PERIÓDICOS DE salvo na condição de aprendiz, a partir dos
PSICOLOGIA. 14 anos. Outro critério relevante na con-
Antonielli Jatobá Bezerra Tinoco - UFRN ceitualização do trabalho infantil é a fre-
antoniellijatoba@uol.com.br quência e regularidade dessas atividades.
Mariana Pinheiro Cabral - UFRN Muitas vezes, as crianças são impedidas
nanathay@hotmail.com de exercitarem outros direitos: frequência
Rosângela Francischini - UFRN à escola, convivência familiar e comunitá-
rfranci@uol.com.br ria, prática do lazer e do esporte, cultura.
No que se refere ao local e ao tipo de ativi-
A inserção de crianças em atividades labo- dade, a Convenção 182 e a Recomendação
rativas é registrada, na história do Brasil, 190 da OIT preconiza que as “piores for-
desde o período colonial. À época, crian- mas” de trabalho infantil são aquelas que
ças escravas trabalhavam para prover a resultam em prejuízo à saúde, à segurança
própria subsistência, situação corroborada e à moral da criança. Diante das questões
tanto pela diferença de classes, como pelo apontadas acima, estabelecemos, como
status secundário que a infância tinha na objetivo deste trabalho, identificar, nas
sociedade de então. Essa concepção sobre produções em Psicologia, enquanto eixos
a infância só veio a ser modificada, não de temáticos: 1.) os conceitos de trabalho
forma abrupta e generalizada, a partir do infantil e suas causas; b) as consequên-
século XVIII, período esse em que a crian- cias para o sujeito. Foi realizada, então,
ça passou a ser vista como sinônimo de uma revisão bibliográfica na Base de Da-
fragilidade e inocência. Embora seja um dos Scielo, no período de janeiro de 1991
fenômeno presente ao longo da história, a dezembro de 2010. Acrescentamos a
o trabalho infantil foi sendo caracteriza- essa fonte, a leitura dos principais livros/
do de formas diferenciadas. Assim, temos documentários impressos recorrentemen-
uma diversidade de conceitos cujos crité- te presentes na bibliografia da área. Na
rios são igualmente diferenciados. Os cri- pesquisa eletrônica, foram empregadas as
térios mais recorrentes são: faixa etária, seguintes Palavras-chave: crianças de rua,
remuneração, regularidade, frequência, crianças e adolescentes em situação de
tipo e local da atividade. Considerando a rua, crianças em situação de rua, crianças
idade mínima recomendada para o tra- em situação de trabalho nas ruas, traba-
balho, a Convenção 138, da Organização lho de menores, trabalho infantil, trabalho
Internacional do Trabalho (OIT, 1973) fixa infantil agrícola, trabalho infantil de rua,
em 16 anos. Por outro lado, para ativi- trabalho infantil produtivo, trabalho infan-
dades que coloquem em risco a saúde, to-juvenil, trabalho precoce. Procedeu-se
a segurança e a moralidade do sujeito, à leitura dos resumos e foram excluídos
essa idade passa para 18 anos. Ainda em os artigos que não atendessem aos obje-
relação a esse critério, a Constituição de tivos deste trabalho. Desse processo, re-
1988 mantém a recomendação da OIT. A sultaram 44 artigos. Procedeu-se, então,
promulgação do Estatuto da Criança e do à leitura desses artigos, observando os

179
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

eixos temáticos aqui definidos. A leitura de baixa renda. (Campos e Francischini,


de livros/documentários centrou-se nas 2003). A pobreza é o principal fator apon-
produções da OIT e foram fundamentais tado pelos autores. Com a insuficiência de
para a compreensão dos conceitos de tra- ganhos, as famílias obrigadas a inserirem
balho infantil adotados pelos autores dos seus filhos no mercado de trabalho, am-
artigos. A partir da leitura e identificação pliando, assim, o orçamento doméstico.
dos eixos propostos, com apoio na Análi- Dentre os fatores microestruturais, des-
se de Conteúdo Temática, sistematizamos tacam-se as relações entre os membros
os elementos e compomos um quadro, das famílias e sua dinâmica interna, mui-
caracterizado a seguir: 1.) Tipos de ativi- tas vezes, permeada por outras formas de
dades desenvolvidas e faixa etária consi- violência. Em relação às consequências do
derada. Iniciando por essa última unidade trabalho para o desenvolvimento da crian-
de sentido, a faixa etária citada e/ou con- ça, destacamos, as consequências para a
siderada pelos autores é aquela proposta escolarização (dificuldades para ingresso
pela legislação, principalmente o ECA e as no sistema educacional, altos índices de
Resoluções da OIT. O Estatuto, em confor- evasão e de repetência, baixo desempe-
midade com as propostas internacionais, nho escolar). Impossibilidades de vivência
e com atenção às especificidades locais, da cultura lúdica, fator importante para o
estabelece, em 1990, a proibição do tra- exercício do Ser Criança, também são indi-
balho infantil para menores de 14 anos, cadas pelos autores. Do ponto de vista da
sendo essa condição sido alterada, pela saúde, muitas consequências são aponta-
Emenda Constitucional de número 20, Ar- das: cansaço físico e mental, dores no cor-
tigo 7º, inciso XXXIII (Brasil, 1998), fixando po e na cabeça, doenças infecto-contagio-
a proibição do trabalho a menores de 16 sas causadas por acidentes com materiais
anos de idade, ressalvando a condição de cortantes e perfurantes contaminados,
aprendiz, a partir dos 14 anos. No que diz contaminação por agrotóxicos ou outros
respeito aos tipos de atividades desenvol- produtos químicos, traumatismos decor-
vidas, comparecem as mais diversas, in- rentes de acidentes de trânsito, dores na
cluindo aquelas consideradas “piores for- coluna e dores musculares, sintomas de-
mas de trabalho infantil”. Em relação aos vidos a exposição às alterações climáticas
fatores explicativos para inserção de crian- e à poeira sem as devidas proteções, DSTs,
ças na condição de trabalhadores - foram gravidez precoce e indesejada, intoxica-
identificados dois grandes grupos, deno- ção decorrente da exposição à nicotina.
minados fatores macroestruturais e fato- Considerando a ampla variedade de con-
res microestruturais. Acrescente-se, no sequências do exercício de atividades de
entanto, fatores considerados de ordem trabalho pelas crianças, resta-nos questio-
cultural, como a importância atribuída ao nar: porque, então, o trabalho infantil per-
trabalho, pelas famílias, a consideração siste e sua erradicação não se torna uma
do trabalho como alternativa única para realidade? Estarão, as produções acadê-
impedir a inserção da criança no mundo micas contribuindo para o entendimento
das ruas, das drogas, da vagabundagem. dessas questões? Em artigo denominado
Acrescente-se, ainda, a ineficiência de po- Trabalho Infantil e Produção Acadêmica
líticas públicas voltadas para a população nos anos 90: tópicos para reflexão, Ferrei-

180
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ra (2001), indica a necessidade de pesqui- Único de Saúde (SUS), tem como objetivo
sas interdisciplinares que possam tornar a expansão de estratégias de prevenção e
visíveis os determinantes e impactos do tratamento relacionadas ao consumo de
trabalho precoce. As instituições de ensi- álcool e outras drogas, mediante ações
no superior têm responsabilidade ímpar intersetoriais, ou seja, ações integradas
nessa tarefa. Os artigos aqui apontados de setores como saúde, justiça, assistên-
sinalizam para algumas respostas e fazem cia social, educação, cultura, esporte e la-
emergir a urgência e seriedade necessá- zer, tanto na esfera governamental como
rias no tratamento dessa questão. não-governamental, com prioridade para
os cem maiores municípios brasileiros,
Palavras-chave: Trabalho Infantil, Crianças, abrangendo todas as capitais. Visa a am-
Trabalho Infanto-juvenil. pliação do acesso, qualificação dos profis-
sionais, prevenção, promoção da saúde e
redução de danos relacionados ao consu-
LT03-906 - PROJETO CONSULTÓRIO mo de substâncias psicoativas e, ainda, o
DE RUA DO MUNICÍPIO DE GOIÂNIA: resgate dos direitos humanos e de cida-
CONQUISTANDO A CIDADANIA dania da população usuária. Os dispositi-
Elaine da Cunha Fernandes Mesquita - SMSG vos consultórios de rua no SUS tem como
elainefmesquita@yahoo.com.br princípios a garantia dos direitos huma-
Helizett Santos de Lima - SMSG/UnB nos, combate ao preconceito e estigma,
helizettlima@yahoo.com.br inclusão e reinserção social, baseadas em
Marcelo Santos Ribeiro - SMSG ações de redução de danos e integradas
olecramribeiro@hotmail.com a outras políticas públicas de saúde no
Rôzi-Mayry Oliveira Soares Duarte - SMSG campo da saúde mental. É composto de
capsgirassol@gmail.com equipe volante multiprofissional, com
Sheila Alves da Cunha - SMSG técnicos da saúde mental, atenção básica,
sheilacunha.mt@gmail.com educadores sociais, oficineiros e reduto-
Roberto Vaz de Abreu - SMSG res de danos que desenvolvem trabalho
robevaz@hotmail.com extramuros nos locais onde se encontram
as pessoas que vivem em situação de rua
O uso de substâncias psicoativas por pes- e fazem uso de substâncias psicoativas,
soas em contexto de vulnerabilidade so- prioritariamente a população jovem. Es-
cial, em situação de rua, tem preocupado ses dispositivos devem integrar a rede de
a sociedade brasileira. No município de saúde mental local, trabalhar com ações
Goiânia esta realidade não é diferente voltadas para a intra e intersetorialidade,
e percebe-se a necessidade de ofertar o para possibilitar aos usuários o acesso aos
acesso aos serviços de saúde existentes diversos serviços de saúde disponíveis e,
para essa parcela da população que se en- ainda, outros serviços como da assistência
contra excluída da sociedade e em condi- social de acordo com as demandas espe-
ções precárias de sobrevivência. O Plano cíficas apontadas pela clientela atendida.
Emergencial de Ampliação do Acesso ao Entre os projetos da rede especializada
Tratamento e Prevenção em Álcool e ou- em saúde mental de Goiânia, que foram
tras Drogas (PEAD 2009-2010), do Sistema aprovados recentemente pelo Ministério

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da Saúde e estão em fase de implantação e CO 03 - LT01


execução, destaca-se o Consultório de Rua
1, projeto de intervenção, que tem equipe
Transtornos de Desenvolvimento
multiprofissional composta de dezesseis
técnicos, sendo três educadores de rua/ LT01-770 - AUTISMO E AMIZADE
redutores de danos, três psicólogos, uma NO CONTEXTO ESCOLAR: ESTUDO A
enfermeira, uma assistente social, um clí- PARTIR DO MODELO PIAGETIANO DE
nico geral com formação em saúde men- INTERAÇÃO SOCIAL.
tal, um oficineiro, um profissional de edu-
Claudia Broetto Rossetti - UFES
cação física e cinco alunos de graduação
cbroetto.ufes@gmail.com
estagiários do PET Saúde Mental. A equipe
Lorena Santos Ricardo - UFES
atua na região Campinas-Centro, próximo
lorena.sricardo@gmail.com
ao Terminal Rodoviário de Goiânia, onde
se encontra parcela considerável de pes- Financiamento: CNPq
soas vivendo em situação de rua do mu-
nicípio. A população atendida é qualquer Jean Piaget afirma que os aspectos sociais
pessoa em situação de alta vulnerabilida- e individuais constituem polos indissociá-
de social, com uso abusivo de substâncias veis de uma única realidade no processo
psicoativas, principalmente o crack, que de desenvolvimento humano. O referido
vive em condições precárias no espa- autor argumenta ainda que as pessoas
ço da rua, com prioridade para crianças, são a fonte de toda classe de cognições e
adolescentes e jovens. É relevante apre- de sentimentos e que, se a criança sente
sentar esse novo dispositivo de atenção necessidade de socializar seu pensamen-
e suas contribuições para o atendimento to, esta necessidade pode satisfazer-se
dessa clientela, pois o mesmo traz inúme- quando esta tem amigos, com os quais
ros desafios, como: mudança no modelo brinca sem constrangimentos. Assim,
de atendimento, busca do contato com o para além dos aspectos científicos, a im-
usuário pelo atendimento in loco (na rua), portância social das amizades também
identificação das necessidades/demandas deve ser considerada. Com o advento da
da clientela a partir da escuta da mesma, inclusão de pessoas com deficiência em
bem como a efetivação das parcerias in- escolas regulares, as crianças passaram
tra e intersetoriais e o atendimento em a ter contato com uma realidade diferen-
rede. Ademais, essa modalidade de aten- ciada na sala de aula. No caso específico
ção pode favorecer o resgate de direitos dos transtornos do espectro autista, a
humanos e de cidadania da clientela-alvo, manifestação dos comportamentos este-
com enfoque em experiências anteriores reotipados, típicos do quadro, pode aca-
e nas políticas públicas voltadas para esta bar afastando as demais crianças, ou, ao
área. contrário, dependendo de como é feita a
inclusão, esse contato pode resultar em
Palavras-chave: redução de danos, uso de novas experiências e aprendizados sobre
drogas, jovens em situação de rua o respeito às diferenças e sobre o convívio
Contato: Helizett Santos de Lima, SMSG/UNB, social. Dessa maneira, a presente pesqui-
helizettlima@yahoo.com.br sa objetivou investigar se há diferença no

182
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

conceito de amizade, no respeito às dife- realizada a entrevista cujo roteiro conti-


renças e na formação de relacionamentos nha 14 questões divididas em três grupos
de amizade no contexto escolar entre 17 temáticos: o primeiro visava investigar a
crianças que estudam com um autista em concepção de amizade dos participantes;
classe inclusiva (CI) e 17 crianças que es- o segundo, compreender a relação entre
tudam em classe não inclusiva (CNI). As- a percepção de diferenças (e respeito
sim, participaram 35 crianças, com idades a elas) e a possibilidade de um relacio-
variando entre 7-8 anos, estudantes do namento de amizade com aqueles que
2º ano do ensino fundamental de duas são vistos como diferentes; e, o terceiro,
escolas da rede pública de um município analisar a formação dos relacionamentos
do interior do Espírito Santo. Para a cole- de amizades na escola, nos contextos de
ta de dados foram criados 14 cartões com classe inclusiva e não inclusiva. Todas as
desenhos de crianças em diversas situa- etapas da coleta de dados foram gravadas
ções, sendo seis específicos para meninas em áudio. Os cartões foram descritos de
(1- duas meninas brincando; 2- duas me- forma bem semelhante pela maioria dos
ninas brigando; 3- uma menina mais ve- participantes. De maneira geral, ambas
lha e uma menina mais nova; 4- um grupo as classes apontaram para a possibilidade
de meninas conversando e uma menina de amizade entre as crianças dos cartões,
isolada, num canto; 5- uma menina cega, embora na CI tal possibilidade apareça
com óculos escuros e bengala, e uma me- em 75% das respostas dadas aos cartões
nina que não é cega; 6- uma menina na enquanto na CNI esse número se reduz
cadeira de rodas e outra menina em pé, (66%). Em relação ao primeiro grupo te-
ao lado), seis cartões específicos para me- mático da entrevista, tanto a CI (40%)
ninos (as mesmas situações dos cartões como a CNI (50%) entendem amizade
detalhados anteriormente, mas com de- como brincar/se divertir e o “brincar” é
senhos de meninos) e dois cartões para apontado como principal facilitador para
ambos (1- um menino e uma menina; 2- se ter amigos. Sobre o que atrapalha a ter
um grupo de crianças, sendo um menino amigos, “fazer mal” é apontado como o
negro, uma menina asiática, uma menina principal fator. Quanto ao segundo gru-
loira, um menino gordo e ruivo). Além po temático investigado, na CI a maioria
disso, utilizou-se um roteiro de entrevis- dos participantes (60%) acha possível ter
ta baseado no método clínico Piagetiano. um amigo que é diferente, enquanto que
O encontro com cada criança ocorreu in- na CNI apenas 40% considera essa possi-
dividualmente, na própria escola, após a bilidade. Quando questionados sobre o
aprovação pelo Comitê de Ética e a assina- que consideravam “diferente”, a maioria
tura dos Termos de Consentimento Livres das respostas da CI (30%) apontou para
e Esclarecidos pela diretora e pelos res- diferenças no comportamento. No caso
ponsáveis. Primeiramente os cartões fo- da CNI o “diferente” foi mais associado a
ram apresentados a cada participante. Em características físicas (55%). Além disso,
seguida, era solicitado que a criança des- enquanto mais participantes da CNI afir-
crevesse o que via, dissesse se as crianças maram haver alguém diferente na sala na
do desenho poderiam ou não ser amigas e qual estudam, mais participantes da CI se
justificasse sua resposta. Logo depois era consideram amigo das crianças apontadas

183
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como diferentes. Por fim, no terceiro gru- Palavras-chave: Teoria de Piaget,


po temático investigado todos os partici- Desenvolvimento Atípico, Inclusão
pantes afirmaram ter amigos na escola. Contato: Claudia Broetto Rossetti.
Quando perguntados sobre quem na sala Universidade Federal do Espírito Santo
tem mais amigos, houve maior coesão en- cbroetto.ufes@gmail.com
tre as respostas dos participantes da CI,
ou seja, poucas crianças foram citadas. Na
CNI foram muitas crianças. O motivo mais LT01-774 - TRANSTORNO DE DÉFICIT DE
apontado pela CI (59%) e pela CNI (79%) ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH):
para determinada criança ter muitos ami- PENSANDO O DESENVOLVIMENTO
gos foi a boa comunicação/interação dela ATÍPICO A PARTIR DA TEORIA
com os demais colegas. Sobre “ficar mais PIAGETIANA
sozinho”, a maioria dos participantes afir- Camila Tarif Ferreira Folquitto - USP
ma que existe alguém assim na sala e tan- ctarif@usp.br
to a CI (33%) como a CNI (46%) apontam Maria Thereza Costa Coelho de Souza - USP
como motivo o fato de ninguém gostar da mtdesouza@usp.br
referida criança. Todos os participantes da Financiamento: FAPESP
CNI e 94% dos da CI afirmam que é bom
ter amigos na escola. Entre os motivos, O Transtorno de Déficit de Atenção e Hi-
a maioria dos participantes assinalou a peratividade (TDAH) é uma das principais
possibilidade de brincar com os amigos causas de procura nos ambulatórios de
no contexto escolar. A maioria dos parti- saúde mental infantil no Brasil. Embora
cipantes de ambas as classe afirmou que não haja consenso a respeito de algumas
ter amigos na sala é benéfico, pois pode características do TDAH, acredita-se que
ajudar a aprender os conteúdos das ma- se trata de um fenômeno biopsicossocial.
térias, uma vez que um amigo pode aju- Assim como ocorre em outros transtor-
dar o outro quando houver dificuldades. nos, os sintomas de TDAH são aspectos
De forma geral, os participantes de ambas que, em certo grau, estão presentes em
as classes conseguem definir bem o ter- crianças de diferentes idades e contextos.
mo “amizade” e percebem o diferente de Portanto, o que diferencia crianças com
forma semelhante, embora os alunos a um desenvolvimento considerado dentro
CI pareçam se dispor a respeitar e se re- do esperado, de crianças com este trans-
lacionar mais com aqueles que são vistos torno é que, nestas, tais aspectos mani-
como diferentes do que os alunos da CNI. festam-se com uma frequência e intensi-
Dessa maneira, espera-se que os resulta- dade consideradas sintomáticas, compro-
dos da presente pesquisa venham a con- metendo a adaptação, socialização e de-
tribuir para uma compreensão maior da senvolvimento. O termo “desenvolvimen-
temática abordada, que possam auxiliar to atípico” é utilizado para descrever tra-
na elaboração de novas estratégias para jetórias de desenvolvimento de crianças
que o processo de inclusão se torne cada nas quais há uma ausência de atributos,
vez mais viável no contexto escolar, em características ou construções essenciais
especial para os portadores de transtor- para o desenvolvimento, ou quando estas
nos do espectro autista. são conquistadas de maneira mais lenta,

184
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

muitas vezes necessitando de mais trocas o TDAH, a partir de dois eixos principais:
e experiências com o meio. No caso do 1) o estudo do desenvolvimento de crian-
TDAH, a literatura demonstra que crian- ças com este transtorno, com ênfase na
ças com tal diagnóstico apresentam um construção de noções operatórias, em
desempenho em baterias neuropsicoló- especial na noção de tempo; 2) a diferen-
gicas comparável aos resultados de crian- ciação entre aspectos estruturais e proce-
ças mais novas não diagnosticadas. Outra dimentais das ações, suas interrelações e
importante característica é a dificuldade funções no desenvolvimento das noções
em “pensar antes de agir”, entendida no operatórias. Em relação ao desenvolvi-
campo da Neuropsicologia como uma mento das referidas noções, pesquisas
dificuldade em inibir pensamentos ou demonstram que, em provas operatórias,
atitudes impulsivas, justamente por uma crianças hiperativas apresentam uma ten-
dificuldade em antever suas consequên- dência em emitir julgamentos e respostas
cias. Portanto, acreditamos que o próprio típicos do período pré-operatório de de-
campo de pesquisas sobre o TDAH aponta senvolvimento, no qual ainda não estão
a necessidade de uma investigação mais construídos aspectos importantes para o
detalhada a respeito do desenvolvimen- desenvolvimento da inteligência opera-
to das crianças diagnosticadas com este tória, como a conservação, interiorização
transtorno. A partir da teoria de Jean da ação em pensamento, flexibilidade
Piaget, temos um referencial teórico que mental e reversibilidade. Os sintomas de
permite realizar pesquisas sobre o TDAH impulsividade podem ser compreendidos
à luz da Psicologia do Desenvolvimento. de forma mais detalhada diante desses
A teoria piagetiana procura responder a indícios de defasagens no desenvolvi-
questão de como é possível a construção mento. Para que a criança consiga “pen-
de conhecimento. Por meio de um pro- sar antes de agir”, é necessário que ela
cesso dialético de interação e adaptação consiga coordenar os eventos passados,
ao mundo, os indivíduos desenvolvem- à luz dos acontecimentos presentes, para
-se progressivamente, em seus aspectos tomar uma decisão acertada, prevendo
cognitivos, afetivos e morais. Embora Pia- as consequências futuras. Para Piaget, a
get não tenha estudado especificamente construção da noção de tempo é o aspec-
crianças diagnosticadas com algum tipo to necessário para a coordenação desses
de transtorno, suas contribuições podem eventos, e, em consequência, para a pos-
ser aplicáveis a este campo de pesquisa, sibilidade do estabelecimento das rela-
já que, na teoria piagetiana temos como ções causais. Portanto, o tempo, para este
foco o sujeito epistêmico e suas ações autor, é compreendido como uma noção
no mundo. Assim, as particularidades e o cognitiva, estruturante do real e organi-
contexto social não são descartados, mas zadora das experiências do indivíduo. O
procura-se entender as regularidades e tempo pode ser apreendido de maneira
semelhanças dos processos de desenvol- objetiva ou subjetiva, e, a respeito dessa
vimento em diferentes contextos. Com questão, Piaget distingue o tempo físico,
base na teoria piagetiana, temos como que se refere à duração métrica do tem-
objetivo realizar reflexões que contribu- po, e o tempo vivido, que seria a duração
am para uma maior compreensão sobre psicológica do tempo, ou seja, a sensa-

185
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ção dos sujeitos em relação à passagem esta construção teórica com dados de
do tempo. Serão apresentados dados de pesquisa em andamento, que busca rea-
pesquisa realizada com 62 crianças, que lizar intervenções em crianças com TDAH
investigou as noções temporais em crian- a partir de jogos e situações problema.
ças com TDAH, e os possíveis efeitos das Assim, esperamos que tais pesquisas e
medicações psicoestimulantes utilizadas apontamentos teóricos possam contribuir
para o tratamento do transtorno no de- para um melhor entendimento de crian-
senvolvimento das noções operatórias. ças TDAH, e contribuir para a elaboração
Crianças com TDAH tenderam a apresen- de estratégias de intervenção no campo
tar dificuldades em mensurar intervalos da Psicologia e da Educação.
de tempo, e demonstraram, em suas res-
postas às perguntas feitas na aplicação Palavras-chave: desenvolvimento atípico;
das provas piagetianas, uma noção tem- TDAH; teoria piagetiana.
poral não dissociada da noção de espaço. Contato: Camila Tarif Ferreira Folquitto.
Em relação ao uso do metilfenidato na Instituto de Psicologia da Universidade de São
amostra clínica, não foi observada dife- Paulo
rença entre o desempenho de crianças E-mail: ctarif@usp.br
com TDAH medicadas e não medicadas.
Portanto, por meio destas pesquisas po-
demos pensar que crianças com TDAH LT01-969 – A MEDIAÇÃO AFETIVA NO
possuem sintomas que as impedem de PROCESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR DO
focar a atenção em estímulos importan- ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO
tes; em decorrência disso, as trocas com DESENVOLVIMENTO - TGD – UM ESTUDO
o meio, que possibilitam construções cog- DE CASO.
nitivas essenciais, ficariam prejudicadas, Érika Goulart Araújo - UAB/UnB
acarretando um atraso no desenvolvi- erikagoulart@hotmail.com
mento, na apreensão de noções abstra- Geane de Jesus Silva - UAB/UnB
ídas das relações dos objetos do mundo enaeg@hotmail.com
físico. A partir desses resultados, realiza-
remos uma discussão teórica a respeito O estudo levanta uma inquietação cientí-
da interação entre os procedimentos, fico-pedagógica e constitui-se num estu-
isto é, as ações pontuais que os sujeitos do de caso evidenciado no contexto de
realizam para atingir determinado fim, e uma escola pública do Distrito Federal na
as estruturas, que dizem respeito ao con- perspectiva de uma criança do sexo femi-
junto das implicações necessárias para a nino diagnosticada com Transtorno Glo-
realização das ações, que são atemporais bal do Desenvolvimento – TGD portado-
e interiorizadas. Refletir sobre as relações ra de Autismo atípico, matriculada no 2°
entre o par procedimentos/estruturas Ano do Ensino Fundamental. A pesquisa
nos permite pensar a respeito da qualida- teve como principal problemática: enten-
de das ações e procedimentos de crianças der até que ponto a mediação afetiva no
com TDAH, sobre o que “sabem fazer” e contexto escolar pode contribuir com o
o quanto elas “compreendem as razões” processo de inclusão educacional de um
destes procedimentos. Exemplificaremos aluno com TGD. Para isso, como objetivo

186
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

geral visou compreender como a media- Participaram da investigação o Professor


ção afetiva pode contribuir para o proces- Regente, a Supervisora Pedagógica e a
so de inclusão educacional de um aluno Professora do Atendimento Especializado
com TGD. Como metas específicas, foi – Sala de Recursos, a Orientadora Educa-
necessário identificar a contribuição da cional e a aluna. Os instrumentos empre-
mediação afetiva entre professor e aluno, gados na estruturação do levantamento
observar a interação entre o aluno e seus das informações foram os seguintes: a
pares, verificar as limitações específicas observação, diário de campo, entrevista
da aluna e sua relação com as trocas afe- semiestruturada e análise documental
tivas e a identificação da mediação peda- sendo discutidos à luz do caráter inter-
gógica que o professor lança mão para a pretativo-construtivo. Sendo assim, fo-
interação com o aluno com TGD. O traba- ram construídas as seguintes categorias
lho de pesquisa embasou-se em teóricos de análise com base nos objetivos espe-
como: Piaget, Vygotsky, Wallon, Sassaky e cíficos desse trabalho: Mediação afetiva;
Documentos e legislação específica sobre Interação social do TGD; Limitações espe-
Educação Inclusiva. Com intuito de esta- cíficas e a Participação do outro no pro-
belecer relação entre afetividade e intera- cesso de inclusão. Tais eixos nortearam a
ção social, buscou-se refletir sobre a me- organização dos dados obtidos por meio
diação no contexto escolar considerando de cada um dos instrumentos utilizados
as teorias construtivistas e sociogenéticas e também a apresentação dos resultados
que evidenciam os aspectos individuais, alcançados. Nesse sentido, os principais
sociais e culturais do desenvolvimento. A resultados obtidos revelaram que com
discussão foi direcionada para educação base na ideia de mediação sendo a inter-
inclusiva, especificamente a inclusão do mediação, de algo interposto entre uma
aluno com TGD, dimensionando o papel coisa e outra tendo como base a afetivi-
da mediação afetiva e do outro no proces- dade, podemos evidenciar que a media-
so de inclusão educacional. Desta forma, ção afetiva proporcionou à aluna um am-
este aluno foi caracterizado e focado em biente de permanente desenvolvimento.
suas especificidades, apresentados fren- Sobre a interação da aluna, suas limita-
te à mediação do outro e de suas intera- ções não implicam em seu isolamento,
ções com o ambiente. Empregou-se na pois há interação, uma vez que respeitada
metodologia a abordagem qualitativa de seu ritmo e sua individualidade. Em rela-
pesquisa, pois seu caráter dialógico possi- ção à possibilidade real de desenvolver e
bilita a obtenção de dados descritivos me- romper com as limitações específicas da
diante contato direto e interativo do pes- aluna a partir da intervenção do outro
quisador com o objeto de estudo no intui- como mediador proporcionou identificar
to de entender os fenômenos segundo a o inexorável papel da medição afetiva
perspectiva dos participantes da situação que revelou ser de extrema importância
estudada. E, nesse caso, como a realida- dentro do processo de inclusão educacio-
de a ser pesquisada refere-se ao contexto nal de um aluno TGD. No que concerne
escolar de um aluno TGD, optou-se pelo à participação do outro no processo de
estudo de caso, pois tal método atende inclusão, os dados sugerem ainda o forta-
ao propósito da pesquisa em questão. lecimento do outro no ambiente escolar

187
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

o qual é espaço privilegiado de interação LT01-1046 – AUTISMO: CONCEPÇÕES DE


social, pois possibilita a apropriação da PROFISSIONAIS DAS ÁREAS DA SAÚDE E
diversidade cultural e aprendizagem de EDUCAÇÃO
conteúdos, base para a constituição da Cibele Shírley Agripino Ramos - UFPB
pessoa em si e também do outro. Portan- Nádia Maria Ribeiro Salomão - UFPB
to, o papel do outro na superação das di- Financiamento: CAPES
ficuldades de aprendizagem e no caso, de
inclusão educacional, tem relevância sig- O autismo é um dos transtornos do de-
nificativa e status de mediador propulsor senvolvimento mais estudados atual-
das potencialidades do indivíduo sendo o mente, cuja compreensão representa um
outro sujeito ativo, concreto que atua em fator relevante para a formação de diver-
sistemas históricos complexos da ativida- sos profissionais. Embora seja um tema
de interativa. Tendo em vista tais resulta- bastante investigado, ainda não existe
dos, chega-se a seguinte resposta para a um consenso a respeito da sua etiolo-
pergunta inicial: a mediação afetiva con- gia, visto que as explicações variam de-
tribui significativamente com o processo pendendo do enfoque teórico adotado,
de inclusão educacional de alunos com o que dificulta a elaboração do próprio
TGD, pois o que se caracteriza como obs- conceito de autismo. Apesar das diver-
táculo dentro de um quadro de espectro gências teóricas envolvendo a sua etiolo-
autista, ou seja, a dificuldade nas relações gia e das mudanças de enfoque ocorridas
e trocas afetivas, é o que substancialmen- ao longo dos anos, pode-se dizer que há
te justifica ações interativas que possibili- um consenso a respeito da existência de
tem seu desenvolvimento. Com este estu- um comprometimento em três importan-
do pôde-se apreender que o processo de tes áreas para o desenvolvimento infantil
inclusão da aluna torna-se efetivo a partir nesse transtorno: interação social, comu-
das trocas afetivas e da participação do nicação/linguagem e comportamento,
outro, o qual compõe o cenário da aluna sendo esta tríade de prejuízos utilizada
de maneira bem particular, pois é a partir como critério diagnóstico de autismo. O
dele que ela se mostra e se constitui. A diagnóstico de autismo deve ser realiza-
contribuição dessas reflexões possibili- do até os três anos de idade, entretanto,
ta reelaborar questões sobre o papel do muitas vezes, ele só é feito mais tardia-
outro no processo de inclusão escolar a mente, por volta dos quatro ou cinco anos
partir da mediação afetiva, indicando sua de vida da criança. Tem sido ressaltada,
eficácia quando resguardada a individua- nos últimos anos, a importância de uma
lidade do aluno com necessidades educa- identificação precoce do autismo, já que
cionais especiais. por meio dela é possível antecipar a in-
tervenção. A identificação e a interven-
Palavras-chave: Educação Inclusiva, ção precoce são de extrema importância
Mediação Afetiva, transtorno global do para que sejam amenizados os prejuízos
desenvolvimento. decorrentes do autismo, o que justifica a
Contato – Érika Goulart Araújo – UAB-UnB – necessidade de os profissionais se infor-
erikagoulart@hotmail.com marem a respeito dos avanços relaciona-
dos a essa área, principalmente aqueles

188
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

referentes ao diagnóstico do transtorno. considerem que fatores ambientais pos-


Vários profissionais estão envolvidos tan- sam desencadeá-lo. Um número menor
to no diagnóstico quanto na intervenção de profissionais caracterizou o autismo
do autismo. No entanto, poucos estudos como sendo de origem multifatorial, isto
têm sido realizados a fim de investigar as é, que envolve uma associação de fato-
concepções ou crenças de profissionais res orgânicos, psicológicos e ambientais.
de diversas especialidades acerca des- Houve ainda profissionais que não se
te transtorno. Nesse sentido, o presente posicionaram a respeito. No que se refe-
estudo teve como objetivo investigar as re à identificação do autismo, os profis-
concepções que profissionais de diversas sionais, em geral, acreditam ser possível
áreas, que comumente lidam com o grupo identificá-lo antes dos três anos de idade.
autista, possuem a respeito de tal trans- Entretanto, nem todos acreditam na pos-
torno. Considera-se que a forma como sibilidade de o fechamento do diagnóstico
eles concebem o autismo influencia na ser realizado antes dessa idade. Dentre os
maneira como será feito o diagnóstico e a aspectos que possibilitam a realização da
intervenção, e, consequentemente, trará identificação precoce, foi destacada a im-
reflexos importantes para o desenvolvi- portância do olhar diferenciado do pedia-
mento da criança com autismo. Participa- tra, cujo acompanhamento contribui para
ram deste estudo 29 profissionais, sendo que as características do autismo possam
sete psicólogos, sete fonoaudiólogos, seis ser percebidas mais facilmente. As carac-
pedagogos, três psiquiatras, três neurolo- terísticas relatadas com maior frequên-
gistas e três pediatras. Estes profissionais cia pelos participantes quanto aos sinais
foram procurados em instituições públi- precoces de autismo foram a ausência do
cas e privadas que recebem indivíduos contato visual, isolamento, movimentos e
com necessidades educativas especiais, atividades repetitivas e chorar demais. A
bem como em consultórios particulares, confusão com outras condições, como dé-
todos localizadas na cidade de João Pes- ficit auditivo, por exemplo, foi menciona-
soa - PB. Os instrumentos utilizados neste da como um dos problemas que interfe-
foram um questionário de identificação rem na identificação precoce, tendo sido
aplicado ao profissional e uma entrevista ressaltada, assim, a importância do diag-
estruturada, com perguntas referentes às nóstico diferencial. No que diz respeito ao
concepções dos participantes quanto às prognóstico do autismo, a grande maioria
causas, indicadores, prognóstico e inter- dos profissionais acredita que é possível
venção no autismo, bem como ao papel haver uma evolução positiva nesse trans-
que a família desempenha no desenvol- torno, mas que esta depende de alguns
vimento das crianças que possuem esse fatores, como o grau de autismo que a
transtorno. A análise das respostas foi criança apresenta e se a intervenção é
realizada buscando-se as convergências e iniciada precocemente. Destacaram-se
divergências entre as concepções dos pro- ainda como importantes para um bom
fissionais das diferentes áreas do saber. prognóstico a necessidade de a criança
Verificou-se que a maioria dos profissio- ser acompanhada por uma equipe multi-
nais acredita em uma causa orgânica para disciplinar e de haver a participação da fa-
o autismo, embora, dentre estes, alguns mília no tratamento. Quanto às propostas

189
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de intervenção mais eficazes para o autis- Palavras-chave: autismo; concepções;


mo, os profissionais, em geral, acreditam profissionais.
que é preciso atentar para as necessida- Contato: Cibele Shírley Agripino Ramos
des de cada criança em particular, bem - Estudante de Pós-Graduação (mestrado) -
como para o seu contexto familiar. Além Universidade Federal da Paraíba
da importância de uma equipe multidis- cibeleagripino@yahoo.com.br
ciplinar no tratamento, destacou-se tam-
bém como importante a integração entre
pais, profissionais e escola. Dentre os pro- LT01-1052 - A CRIANÇA COM SÍNDROME
fissionais que citaram métodos específi- DE DOWN E SUA FAMÍLIA: UM
cos para o tratamento, os mais menciona- ESTUDO SOBRE A DINÂMICA FAMILIAR
dos foram o TEACCH, o ABA, o PECS e o DE ACORDO COM A PERSPECTIVA
Son-Rise. A maior parte dos profissionais SISTÊMICA
considera válidas estratégias alternativas, Luciene Pires de Araújo Lins - UCB
como a musicoterapia, a arteterapia e a Maria Alexina Ribeiro – UCB
equoterapia. Contudo, nem todos acredi- lupsc@uol.com.br
tam que estas estratégias devam ser utili-
zadas isoladamente, mas como um com- A Síndrome de Down caracteriza-se pela
plemento a outras formas de intervenção. existência de um cromossomo extra, ou
Quanto ao papel da família no auxílio ao seja, em cada célula há 47 cromossomos,
desenvolvimento das crianças com autis- quando o esperado são 46 cromossomos.
mo, os aspectos mencionados com maior As crianças com Síndrome de Down pos-
frequência foram a necessidade de haver suem características físicas específicas,
estimulação por parte dela e a aceitação. que podem ser observadas pelo médico
Por fim, considera-se que alguns profis- ao fazer o diagnóstico clínico. O diagnós-
sionais não conseguem definir claramen- tico da Síndrome de Down, atualmente,
te o que causaria o autismo, o que talvez pode ser obtido antes mesmo do nasci-
tenha feito com que eles não se posicio- mento do bebê durante o acompanha-
nassem a respeito. Acredita-se que a falta mento pré-natal. Se o acúmulo de fluído
de um consenso na literatura acerca das na nuca fetal, conhecido como translu-
causas do autismo, bem como a diversida- cência nucal (TN), for excessivo, no perí-
de de quadros clínicos encontrados, pos- odo de 11 a 136/7 semanas, há um risco
sam ter contribuído não apenas para que aumentado para a ocorrência de anoma-
alguns profissionais não se posicionassem lias cromossômicas, malformações fetais
a respeito da etiologia, como também e síndromes genéticas. A revisão da lite-
para a diversidade de explicações sobre as ratura mostrou que há uma escassez de
causas do autismo apresentada por eles. estudos que envolvem todos os membros
Enfatiza-se a necessidade de outros estu- da família e seu funcionamento, necessi-
dos sobre as concepções dos profissionais tando, portanto, de mais investigações na
acerca do autismo que envolvam uma área, principalmente no tocante especifi-
quantidade maior de profissionais, espe- camente ao papel do pai nesse contexto,
cialmente os da área médica, que foram onde foram encontrados poucos estudos.
minoria na presente investigação. Em geral, há certa predominância de tra-

190
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

balhos que priorizam, especificamente, a DF há seis anos. A família foi convidada a


relação da mãe com a criança que possui participar da pesquisa por meio da pes-
Síndrome de Down, bem como os aspec- quisadora e, após ser informado sobre os
tos sócio-educativos, na maioria das ve- procedimentos do estudo, assinou o Ter-
zes com o enfoque particular em um ou mo de consentimento Livre e Esclarecido.
mais membros da família. Dificilmente O projeto foi submetido e aprovado pelo
esses estudos têm enfatizado a família Comitê de Ética em Pesquisa da Univer-
e sua dinâmica como um todo. Estudos sidade Católica de Brasília - UCB. Para o
apontam para a importância da família levantamento dos dados foram realizados
no desenvolvimento da criança com Sín- três encontros com a família com o obje-
drome de Down, pois mesmo com toda tivo de conhecer a história familiar, com
a dificuldade que a família tem que lidar base em um roteiro, elaborar o genogra-
nas várias situações difíceis, é ela que vai ma, o ecomapa e a confecção da colagem
fazer de tudo para que o filho possua um com a participação de todos os membros
atendimento especial e de qualidade. As- da família que teve como tema “Nossa
sim, uma vez que a família é o primeiro família”. A análise dos dados foi feita de
universo de socialização da criança e é a acordo com a abordagem construtivo-in-
mediadora das relações desta com seus terpretativa de González Rey a partir de
diversos ambientes, é fundamental que três Zonas de Sentido: 1) História familiar
pesquisadores e profissionais foquem sua e fases do ciclo de vida; 2) Subsistemas,
atenção para a compreensão da dinâmica fronteiras e hierarquia e 3) “Em Brasília é
de funcionamento de famílias de crianças difícil fazer amizades”: relações da família
com Síndrome de Down. Este trabalho com outros sistemas sociais. Os resulta-
apresenta um estudo sobre a dinâmica dos apontam para a falta de preparo dos
familiar e os padrões de relacionamento profissionais ao atender uma criança com
de uma família com um filho com Síndro- deficiência, sem acolhimento e sensibili-
me de Down. Trata-se de uma dissertação dade ao lidar com família; a dificuldade,
de mestrado da primeira autora orienta- por parte da família, em aceitar a defici-
da pela segunda. O objetivo do estudo ência do filho, tendo que elaborar o luto
foi conhecer a dinâmica de uma família pelo filho ideal perdido; o medo dos pais
com um filho diagnosticado pela Síndro- de terem outros filhos com deficiência; o
me de Down, enfocando alguns aspectos relacionamento entre irmãos permeado
dessa dinâmica, visando contribuir com de cooperação e apoio mútuo, embora
o conhecimento sobre o tema e possibi- haja sentimentos de ciúmes; reestrutu-
litar uma melhor assistência às famílias. ração familiar durante as várias etapas
Privilegiou-se o referencial da pesquisa do ciclo de vida, possibilitando aos mem-
qualitativa de González Rey com utiliza- bros exercerem outros papéis e funções
ção do estudo de caso. A pesquisa teve familiares; pouca permeabilidade das
como participante uma família constituí- fronteiras com os outros sistemas sociais,
da por pai, 39 anos, militar, mãe, 42, uma ou seja, a família possui poucos relacio-
filha, 16, e um filho de 18 anos que possui namentos sociais. A escolha do método e
Síndrome de Down. A família é natural do a abordagem sistêmica foram essenciais
nordeste brasileiro e reside em Brasília/ para o alcance dos objetivos de pesquisa

191
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e proporcionaram um melhor entendi- educação inclusiva. Participaram do es-


mento sobre a dinâmica de uma família tudo quatro professores do Ensino Médio
que possui um membro com Síndrome que atendem alunos com necessidades
de Down. Como sugestões para pesquisas educacionais especiais em uma escola
futuras, consideram-se importantes estu- da rede pública de ensino. Os procedi-
dos que abordassem a questão religiosa mentos e instrumentos utilizados para a
como enfrentamento para aceitar o filho investigação do objeto de estudo foram
com deficiência. Também seria muito in- concretizados através de uma entrevista
teressante a realização de um estudo que semiestruturada que continha doze per-
focalizasse somente o pai, uma vez que guntas, que investigavam a educação in-
a revisão bibliográfica nos trouxe poucos clusiva na perspectiva do professor, para
dados a respeito da relação do pai com o conhecer as impressões que os docentes
filho com Síndrome de Down. têm a respeito dos seus alunos com ne-
cessidades educacionais especiais, bus-
Palavras-chave: Síndrome de Down, dinâmica cando um maior conhecimento quanto
familiar e abordagem sistêmica. aos seus sentimentos, dificuldades, an-
Contato: Luciene Pires de Araújo Lins - gústias e representações que possam faci-
Universidade Católica de Brasília – UCB litar ou dificultar seu desempenho profis-
lupsc@uol.com.br sional diante da proposta inclusiva. Assim
sendo, esta pesquisa se caracteriza por
ser qualitativa pautada por teóricos re-
presentativos. A discussão dos resultados
PO-LT04-A deu-se mediante a análise do conteúdo.
A análise dos resultados obtidos, indicou
a carência de recursos pedagógicos para
LT04-702 - A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA trabalhar com alunos com necessidades
PERSPECTIVA DOS PROFESSORES educacionais especiais, a falta de capa-
Lanusa Menezes da Silveira - UCB citação profissional, a necessidade de
um ambiente adequado aos alunos com
A inclusão de alunos com necessidades necessidades educacionais especiais e a
educacionais especiais (ANEEs) no ensino falta de contato com a família. Esses de-
regular tem encontrado inúmeras barrei- safios estão aliados a uma má formação
ras, e tem sido motivo de muitas discus- dos profissionais da Educação em relação
sões e estudo. O presente trabalho tem à educação inclusiva.
como objetivo contribuir para o estudo
do processo da Educação Inclusiva na Palavras-chave: Educação inclusiva; Alunos
perspectiva dos professores de uma esco- com Necessidades Educacionais Especiais
la da rede pública da cidade do Gama-DF. (ANEEs); Capacitação; Professor.
Deste modo, este estudo buscou anali-
sar: “A Educação Inclusiva na perspectiva
dos professores”, com intuito de promo-
ver reflexões sobre as possíveis soluções
diante das dificuldades encontradas na

192
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-705 - CONCEPÇÕES DE tentação a essas teorias. Vigotski (1991),


PROFESSORES/AS DA REDE PÚBLICA presume do entendimento de que o ser
DE EDUCAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL humano se constitui como tal mediante as
SOBRE INCLUSÃO ESCOLAR relações social, histórica e cultural, e esse
Vanuza Sales - UNB estabelece a aprendizagem como o eixo
vanuzamoreno@yahoo.com.br dessas relações, admitindo ser esta que
Carla Francini H. Terci - UNB promove o desenvolvimento. Segundo
carlaterci@gmail.com Fonte (2005), é na sala de aula que ocorre
o momento crucial da educação escolar, e
A Educação como possibilidade de desen- encontro de duas vidas, ambas buscando
volvimento humano sempre foi uma ma- crescer e alcançar plenitude comunhão
neira que encontramos para nos referir a aluno professor. [...] O relacionamento
capacidade cognitiva do outro.Entretanto, entre estes dois elementos constitui a
na perspectiva da educação inclusiva é chave do processo ensino aprendizagem.
preciso, vislumbrarmos um novo contexto [...] (p. 04). Dos professores espera-se
escolar, onde outras questões e olhares que conduza o seu grupo de estudantes,
possam ser delineados no relacionar-se buscando compreender e negociar os di-
com o diferente, principalmente na ex- ferentes processos de significação que
periência da escola. A educação inclusiva envolvam situações de aprendizagem que
pressupõe essas novas interações, princi- planejou. (Tunes, Tacca & Bartholo, 2005,
palmente no ambiente pedagógico, onde p. 01). Analisar as concepções de profes-
deveriam ser vivenciadas relações que sores da rede pública do Distrito Federal
denominamos de educativas, ou ‘peda- - SEE/DF, ensino básico - sobre a Inclusão
gógicas’. E através dessas, percebemos a Escolar na escolarização formal. Examinar
necessidade de usá-la, como recurso, no que concepções teóricas sobre inclusão
processo educativo. A inclusão escolar é escolar que norteiam a prática pedagó-
entendida como um processo complexo gica dos professores. Identificar na rela-
de profundas transformações: na estrutu- ção professor x estudante que elemen-
ra dos sistemas educacionais e das escolas tos foram favorecedores no processo de
e nas práticas educacionais. Para Maciel e inclusão escolar. Participantes: três (03)
Barbato (2010) é um recente fenômeno professoras de três escolas de ensino fun-
sociocultural que, entre outras caracterís- damental séries iniciais, sendo uma, (01),
ticas, se configura complexo por eviden- de cada uma, das escolas acompanhadas
ciar a separação conflituosa que é habitu- pelo profissional psicólogo escolar. Os
almente feita entre o individual e o social. respectivos profissionais professores são
As concepções de desenvolvimento e de todos pertencentes a escolas públicas do
aprendizagem também já se constituíram DF. Elaborou-se um roteiro de entrevista
em objeto de estudo feito por Vygotski narrativa para os professores. Os profes-
(1977), quando propõe uma análise das sores foram investigados a partir de suas
teorias que enfocam as relações entre es- práticas, para chegar a concepções, o que
sas concepções, investigando quais são as implica, conseqüentemente perceberem
implicações educativas de determinados que concepções construíram no percurso
princípios teórico-práticos que dão sus- de suas práticas de ensino e aprendiza-

193
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gem, e, possibilitando ressignificar essas espaço de aprendizagem para os atores


na perspectiva da educação inclusiva. Foi da escola numa cultura colaborativa de
realizada uma análise qualitativa dos da- desenvolvimento e inclusão escolar.
dos, por aproximação de sentido dos con-
teúdos levantados entre as participantes Palavras-chave: Inclusão escolar, concepções,
entrevistadas. As falas foram organizadas prática, pedagógica, vínculo professor-
e agrupadas em categorias a partir dos estudante.
temas cujos sentidos eram semelhantes,
sendo essas denominadas por uma ex-
pressão que melhor as representasse pela LT04-738 - O ALUNO QUE NÃO
força dos temas recorrentes. Os professo- APRENDE: DIFICULDADE OU
res embora sejam os principais agentes TRANSTORNO DE APRENDIZAGEM?
dessa ação, não percebem ainda, nem Aline Pacheco de Medeiros Ferro - UPM
consideram como elemento principal do alinepmf@yahoo.com.br
processo pedagógico a relação professor Giuliano Michel Mussi - UPM
e estudante, portanto, reestruturar a es- gmussi@terra.com.br
cola deve compreender repensar as práti- Lígia Canellas - UPM
cas, as ações e acima de tudo considerar ligiacanellas@yahoo.com.br
as possibilidades relacionais como espaço Nathália Zoli Sant`Ana – UPM
do processo de ensino e aprendizagem, nzs@uol.com.br
como recurso educativo. A pesquisa por Paulo Roberto Pereira de Souza - UPM
meio da análise dos dados nos permi- paulosouza70@terra.com.br
te concluir que com a fragmentação do Sérgio Martins Lopes - UPM
conhecimento pedagógico influenciado sergio_estagioenf@fmu.br
pelo ecletismo do senso comum, a falta José Salomão Schwartzman - UPM
de diálogo com o conhecimento teórico josess@terra.com.br).
influencia nas concepções dos professo-
res sobre inclusão escolar. Percebe-se nas No Brasil, a evasão escolar ainda é um
percepções das profissionais entrevista- grande desafio para as escolas, para os
das, uma lógica particular que sustenta pais e para o sistema educacional. Se-
a importância crescente da necessida- gundo dados do INEP (Instituto Nacional
de da mudança da prática pedagógica a de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira),
partir da relação professor e estudante. de 100 alunos que ingressam na escola
Verificou-se que o trabalho dos profissio- na 1ª série, apenas 5 concluem o ensino
nais professores não é fundamentado em fundamental, ou seja, poucos terminam
uma única concepção de inclusão, o que a 8ª série. Estudos mostram que em tor-
pôde ser demonstrado pela coexistência no de 15% a 20% das crianças no início
de várias percepções e práticas indistin- da escolarização apresentam dificuldade
tas. Constatou-se que as abordagens dos em aprender e, logo, mau desempenho
profissionais da escola são permeadas escolar. Essas estimativas podem chegar a
pela prática intuitiva, discutindo-se, a par- 30%-50% se forem analisados os primei-
tir da perspectiva sócio interacionista, as ros seis anos de escolaridade. O mau de-
diversas possibilidades relacionais como sempenho escolar (MDE) nestes estudos,

194
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

é definido como um rendimento escolar sidade de fatores etiológicos, quando se


abaixo do esperado para determinada considera o aprendizado da leitura, escri-
idade. O diagnóstico precoce do MDE é ta e matemática. Entretanto, é necessária
um ponto fundamental para a supera- uma adequação nestas terminologias a
ção das dificuldades escolares, pois além fim de possibilitar uma homogeneização
de orientar os educadores e pais sobre quando estes casos são discutidos pelos
a melhor forma de lidar com a criança, profissionais das áreas afins. O DSM-IV
direciona a elaboração de programas de classifica o transtorno de aprendizagem
reforço escolar e a adoção de estratégias (TA) e o define como a situação na qual
clínicas e/ou educacionais que auxiliam a os “resultados do indivíduo em testes pa-
criança no desenvolvimento escolar. Ob- dronizados e individualmente administra-
jetivos: Levantar as principais causas do dos de leitura, matemática ou expressão
MDE; Identificar os fatores intrínsecos e escrita estão substancialmente abaixo do
extrínsecos envolvidos no MDE; Diferen- esperado para sua idade, escolarização
ciar os conceitos dificuldade e transtorno e nível de inteligência. Os problemas de
de aprendizagem; Descrever quais são os aprendizagem interferem significativa-
transtornos de aprendizagem segundo o mente no rendimento escolar e nas ativi-
DSM-IV(Manual diagnóstico e estatístico dades de vida diária que exigem habilida-
de transtornos mentais); Descrever outros des de leitura, matemática ou escrita.” O
transtornos envolvidos no MDE: Transtor- mesmo manual de diagnóstico divide os
no de déficit de atenção/hiperatividade transtornos de aprendizagem em: Trans-
e Transtorno de desenvolvimento de co- torno da Leitura (dislexia); Transtorno
ordenação. O presente estudo trata-se da Matemática (discalculia); Transtor-
de uma pesquisa descritiva, com levan- no da Expressão Escrita; Transtorno da
tamento bibliográfico em bases de dados Aprendizagem Sem Outra Especificação.
científicos: SCIELO, LILACS, DEDALUS. Uti- A dislexia é um distúrbio de linguagem,
lizamos como descritores: mau desempe- de origem constitucional, caracterizado
nho escolar; transtorno de aprendizagem; pela dificuldade em decodificar palavras
transtorno de déficit de atenção/hipera- simples. Mostra uma insuficiência no pro-
tividade; dificuldade de aprendizagem O cesso fonológico, sendo que essas difi-
MDE depende de diferentes fatores: os fa- culdades em decodificar palavras simples
tores extrínsecos (ambientais), como: ca- não são esperadas para a idade. Apesar
racterísticas da escola (físicas, pedagógi- da instrução convencional, adequada in-
cas, qualificação do professor), da família teligência, oportunidade sociocultural e
(nível de escolaridade dos pais, presença ausência de distúrbios cognitivos e sen-
dos pais e interação dos pais com escola soriais fundamentais, a criança falha no
e deveres); e, os fatores intrínsecos, ou processo de aquisição da linguagem com
seja, o próprio indivíduo. Os termos difi- frequência, apresentando problemas na
culdades e transtorno de aprendizagem leitura, na aquisição de novas palavras e
têm gerado muitas controvérsias entre os na capacidade de soletrar. No transtorno
profissionais, tanto da área da educação da matemática (ou discalculia), a capaci-
quanto da saúde. Isto porque, há uma dade matemática, individualmente testa-
sintomatologia muito ampla, com diver- da, encontra-se abaixo do esperado para

195
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

idade cronológica. Corresponde a 6% dos mas que podem atrasar ou comprometer


Tas e ocorre igualmente em ambos os todo um trabalho educacional, uma vez
gêneros. Algumas situações específicas que a educação não tem apenas históri-
podem associar-se a ela como: epilepsia, co de sucessos e aprovações. Muitas ve-
Síndrome de Turner, TDA/H, síndrome al- zes, a criança em idade escolar, por estar
coólica fetal, fenilcetonúria tratada, entre apresentando um MDE é discriminada e
outros. No transtorno da expressão escri- até emocionalmente agredida por pro-
ta, a disgrafia e disortografia, individual- fessores, pais e pelos próprios colegas da
mente testadas, apresentam-se acentua- escola. Porém, o MDE pode estar com-
damente abaixo do esperado para idade pletamente ligado ao ambiente em que
cronológica. Corresponde a 8% a 15% dos ela está inserida, sendo assim uma difi-
TAs e compromete todas as áreas acadê- culdade de aprendizagem ao invés de um
micas. Pode ser resultado de alterações transtorno. Cabem a nós, pais, professo-
motoras, de percepção espacial, de lin- res, orientadores e educadores em geral,
guagem, além de memória e atenção. Já, termos a sensibilidade de enxergar em
o transtorno da Aprendizagem Sem Outra nossos alunos quando algo não vai bem
Especificação envolve, de acordo com e encaminhá-los a uma equipe multidis-
o DSM-IV, os transtornos da aprendiza- ciplinar para que este seja acompanhado
gem que não satisfazem os critérios para de perto e diagnosticado de maneira cor-
qualquer Transtorno da Aprendizagem reta, a fim de obter um bom rendimento.
específico, podendo incluir problemas em É de fundamental importância analisar a
todas as três áreas (leitura, matemática, qualidade das mediações estabelecidas
expressão escrita) que, juntos, interferem em diferentes contextos sociais (como a
significativamente no rendimento escolar. família e a escola), considerando que o
Para o diagnóstico do Transtorno de Dé- esfacelamento das relações entre os in-
ficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) divíduos se tornou uma característica da
é necessário que o profissional tenha pós-modernidade, na qual se verifica o
experiência clínica significativa, conheci- surgimento de verdadeiras epidemias de
mento teórico e, muita reflexão. As esco- desordens de aprendizagem.
las, a cada dia que passa se envolvem em
uma tendência de explicar o MDE de seus Palavras-chave: mau desempenho escolar;
alunos pela presença do TDAH e muitas transtorno de aprendizagem; transtorno
vezes este diagnóstico realizado na escola de Déficit de Atenção e Hiperatividade;
pode estar equivocado. O Transtorno do dificuldade de aprendizagem.
Desenvolvimento da Coordenação (TDC)
que ocorre quando há atraso no desen-
volvimento de habilidades motoras ou
dificuldades para coordenar os movimen-
tos sem causas neurológicas ou sensoriais
identificadas, também causam prejuízos,
contribuindo para o MDE. Infelizmente,
no decorrer do processo ensino-apren-
dizagem, esbarramos com alguns proble-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-751 - O BRINCAR FAVORECENDO O dagógica na escola e capaz de repercutir


DESENVOLVIMENTO E O APRENDIZADO na qualidade da educação infantil: como
DA CRIANÇA PEQUENA NA ESCOLA os estudantes da UFPB, vêem a importân-
Tuana Porto Lima Cordeiro - UFPB cia da brincadeira como meio de favore-
Andréia Dutra Escarião - UFPB cer o desenvolvimento e a aprendizagem
aescariao@gmail.com da criança pequena? Quais os limites e as
contribuições da formação acadêmica na
Financiamento: PROLICEN
ressignificação da identidade dos docen-
Introdução: Este projeto surge da neces- tes da educação infantil? Quais as dificul-
sidade em avançar os estudos na área da dades encontradas pelos professores em
educação infantil, pensando a formação compreender de fato o objetivo pedagó-
do professor numa perspectiva que aten- gico das brincadeiras utilizadas na escola
da a necessidade da criança pequena na infantil? Estas se constituem nas principais
escola. Não há como pensar numa esco- questões de estudo, cujo aprofundamen-
la que favoreça o desenvolvimento e o to a ser realizado, em fase subseqüente,
aprendizado da criança, sem relacionar permitirá perceber a existência ou não de
esses aspectos à brincadeira, a uma prá- mecanismos articuladores da prática na
tica pedagógica que objetive o aprender formação no cotidiano das práticas peda-
brincando. A questão da formação docen- gógicas dos professores, com vistas à me-
te para a educação infantil está longe de lhoria da Educação infantil. Sabemos que
constituir-se em uma questão resolvida no a criança traz consigo um conjunto de ca-
cenário educacional brasileiro. É preciso racterísticas que se expressam, sobrema-
destacar que historicamente temos avan- neira, no campo educacional, ou seja, traz
ços e recuos, tanto no plano teórico, quan- para escola aspectos emocionais próprios,
to no plano da prática, a questão envolve apresentam comportamentos, valores,
debates, por perpassar distintas concep- interesses e dificuldades, aprendizados e
ções da prática educativa e por constituir- cultura decorrentes de sua vivência social
-se numa atividade que envolve um alto e familiar. A partir desta realidade, faz-se
grau de complexidade para a sua realiza- necessário embasar teoricamente os es-
ção. Ainda se constitui um grande desa- tudos sobre a criança da educação infan-
fio para a educação infantil consolidar-se til. Evidentemente, esta pesquisa deverá
enquanto etapa de fundamental impor- analisar o seu objeto tendo como marco
tância na educação básica. Infelizmente é referencial o contexto que essas crianças
comum, educadores demonstrarem falta estão inseridas, e as políticas voltadas
de conhecimento acerca dos fundamen- para educação infantil. Analisar como a
tos da educação infantil e das técnicas que brincadeira pode favorecer os processos
podem ser utilizadas como meio de favo- de desenvolvimento e de aprendizagem
recer o desenvolvimento integral da crian- da criança pequena na escola; Identificar
ça, sendo a brincadeira uma delas. Ligadas as concepções teóricas sobre a criança pe-
a esta problemática, emergem algumas quena e a educação infantil; Identificar as
questões cujas respostas seriam indica- contribuições da brincadeira como ação
doras da possibilidade da formação incidir pedagógica lúdica no desenvolvimento in-
positivamente na melhoria da prática pe- tegral da criança pequena; Verificar se os

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

professores da educação infantil fazem a educativas em prol da melhoria da educa-


relação entre a brincadeira e o desenvolvi- ção infantil, tanto no plano da formação
mento e o aprendizado da criança peque- dos sujeitos envolvidos, quanto no plano
na na escola; Desenvolver atividades lúdi- das escolas do sistema público de ensino.
cas que favoreçam o desenvolvimento in- Portanto, argumentamos a necessidade
tegral da criança pequena em articulação da sua viabilidade em razão da relevân-
com os professores. Nossa pesquisa é de cia do estudo, ressaltando a importância
natureza etnográfica em razão desta abor- de refletir criticamente sobre o brincar na
dagem metodológica permitir aos pesqui- educação infantil como forma de favore-
sadores uma vivência direta na realidade cer o desenvolvimento e o aprendizado da
onde se insere a pesquisa. A pesquisa criança pequena na escola, assim como, a
abrangerá o docente que se encontra em possibilidade de revisão das práticas pe-
pleno exercício de suas atividades docen- dagógicas dos professores da educação
tes na etapa da educação infantil na Escola infantil como forma de garantir uma me-
de Educação Básica do Centro de Educa- lhoria na qualidade da educação atenden-
ção da Universidade Federal da Paraíba. A do às reais necessidades e expectativas da
esse estudo, caracterizado com pesquisa criança pequena na escola.
e intervenção, interessa observar como
a brincadeira vem sendo trabalhada na Palavras–chave: Educação Infantil. Prática
etapa de educação infantil, assim como Pedagógica. Brincadeira.
pretende contribuir com a elaboração de
propostas de atividades lúdicas que pos-
sam ser inseridas no processo de plane- LT04-884 - A EDUCAÇÃO DE ESCOLARES
jamento dos professores que trabalham COM BAIXA VISÃO: PERCEPÇÕES DOS
com crianças pequenas na escola nas suas PRÓPRIOS SUJEITOS.
práticas docentes. O projeto atende direta Marília Costa Câmara Ferroni - UNICAMP
e indiretamente os professores que traba- marilia_ferroni@hotmail.com
lham com a Educação Infantil e às crianças Maria Elisabete Rodrigues Freire Gasparetto
pequenas matriculadas na escola, lócus - UNICAMP
da pesquisa. A metodologia prioriza a par- gasparetto@fcm.unicamp.br
ceria, o trabalho coletivo facilitado pelo
exercício do diálogo e da avaliação perma- Nos dias atuais, a inclusão é uma questão
nente para retroalimentar o projeto, cor- central em todos os ambientes em que
rigido o que for necessário em busca da vivemos: famílias, escolas, mercado de
consecução dos seus objetivos. O trabalho trabalho, espaços de lazer e todas as situ-
de pesquisa está sendo realizado coletiva- ações da vida do ser humano (Amiralian,
mente por meio de reuniões de estudo, 2009). Educar os escolares com baixa vi-
seminários, debates, produção de textos e são é favorecer-lhes condições para que
atividades junto às crianças contando com desenvolvam suas possibilidades naturais
a participação dos professores da escola. e possam contribuir com seu trabalho
A pesquisa encontra-se em andamento. para uma comunidade à qual tenham o
Espera-se que esse estudo favoreça uma sentimento de pertença (Masini, 2007).
ampla reflexão da produção de práticas Considera-se baixa visão quando o valor

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da acuidade visual corrigida no melhor subestimação de suas potencialidades e


olho é menor que 20/60 e igual ou maior capacidades (Bezerra & Pagliuca, 2007).
que 20/400, ou o campo de visão seja me- Esses escolares são, muitas vezes, isola-
nor que 20 graus com a melhor correção dos do contato com parceiros e têm in-
óptica. A baixa visão subdivide-se em três terações restritas à relação com o adulto
categorias: perda visual moderada, em limitando, assim, suas experiências fora
que o indivíduo apresenta acuidade visu- da família. Esse isolamento pode ocorrer
al < 20/60 e ≥ 20/200; perda visual grave nas relações parentais, com a vizinhan-
< 20/200 e ≥ 20/400; e cegueira Legal < ça, escolares e em caráter terapêutico,
20/400 e ≥ 20/1200 (OMS, 2003). Para embora a interação constitua importante
melhorar o desempenho visual de escola- elemento da vida social do escolar, pois,
res com baixa visão, é recomendada a uti- promove um contexto propício ao desen-
lização dos recursos de Tecnologia Assisti- volvimento de suas competências sociais.
va, uma área do conhecimento de caracte- A relação com os pares também é um ele-
rística interdisciplinar que engloba produ- mento importante a ser considerado no
tos, recursos, metodologias, estratégias, processo de construção, desenvolvimento
práticas e serviços que objetivam maior e transformação do indivíduo, da cultura
funcionalidade, autonomia, independên- e da sociedade (Souza & Batista, 2008).
cia, qualidade de vida e inclusão social da As necessidades visuais de cada pessoa
pessoa com deficiência (Gasparetto et al., variam de acordo com cada fase e mo-
2009). Qualquer recurso que potencialize mentos de sua vida, em atividades esco-
o funcionamento visual do indivíduo com lares, de lazer, de vida diária, do trabalho
baixa visão, em suas atividades diárias, é ou na vida adulta e, para o bom desem-
caracterizado como recurso de Tecnologia penho dessas pessoas, se faz necessária
Assistiva e pode ser classificado em re- a parceria entre a área da saúde, escola,
cursos óptico, não óptico, eletrônico e de família e ensino especializado (Carvalho
informática. Em pesquisa sobre a percep- et al., 2005). Os profissionais que atuam
ção de diretores do sistema público sobre na educação, habilitação e reabilitação de
a inclusão educacional, verificou-se que escolares com baixa visão necessitam co-
faltavam recursos de tecnologia assistiva nhecer esta população, para uma melhor
e materiais pedagógicos destinados ao elaboração de programas de habilitação
uso do escolar com deficiência visual (Ja- e/ou reabilitação visual, que propiciem
nial & Manzini, 1999). Quando se trata da desenvolvimento, transmissão de conhe-
educação de escolares com necessidades cimentos de acordo com as necessidades
especiais, questões relacionadas à inte- de cada um, transformação em novos sa-
ração social se tornam ainda mais impor- beres, aprendizagem e preparo para a in-
tantes, por possuírem algumas limitações clusão social. A presente pesquisa tem por
quanto às possibilidades de locomoção e objetivos: conhecer a percepção de esco-
exploração de objetos. Freqüentemente, lares com baixa visão em relação às suas
são considerados incapazes de executar dificuldades visuais; investigar suas opini-
certas atividades, participar, decidir por ões sobre a comunidade escolar; verificar
si mesmos, contribuir nas atividades em o uso de recursos de tecnologia assistiva
grupo e em brincadeiras livres, havendo nas atividades cotidianas. Realizou-se um

199
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

levantamento descritivo, tipo transversal. a matéria. Embora a maioria dos entrevis-


A coleta de dados foi realizada no período tados (52,4%) tenha relatado não possuir
de janeiro a agosto de 2010, com aplica- relacionamento com a direção, coordena-
ção de um questionário semiestruturado ção e outros funcionários da escola, esses
a escolares com baixa visão, observações profissionais fazem parte da comunidade
e leitura de prontuários. Para elaborar o escolar e deveriam ajudar os escolares
instrumento e adequá-lo à realidade es- em relação à orientação, estimulação e
tudada, realizou-se um estudo explorató- integração, já que são responsáveis pela
rio, com a finalidade de descobrir novos inclusão educacional, de modo a favore-
enfoques, conhecimentos, vocabulários cer a aprendizagem, a independência e a
e percepções dos escolares com baixa autonomia dos escolares com baixa visão
visão em relação ao tema estudado. A (Bezerra & Pagliuca, 2007). Sobre o uso
população foi composta por 19 escolares de recursos de Tecnologia Assistiva, pre-
na faixa etária entre 12 e 17 anos, com valeceram os recursos de informática, no
baixa visão congênita (94,7%) ou adquiri- qual 76,7% dos respondentes declararam
da (5,3%), regularmente matriculados no fazer uso de recurso específico para bai-
Ensino Fundamental II (63,2%) ou no En- xa visão. É imperativo que uma atenção
sino Médio (36,8%) e que freqüentavam maior seja dada à educação de escolares
os serviços de Habilitação e ou Reabilita- com baixa visão, pois, as maiores dificul-
ção Visual nos municípios de Campinas dades enfrentadas são do âmbito acadê-
ou em Ribeirão Preto. Destes, 52,6% eram mico. Acredita-se que uma das formas de
do sexo feminino e 47,4% do sexo mascu- minimizar ou sanar as dificuldades é com
lino; verificou-se que os dados do Censo o preparo da comunidade escolar, por
Demográfico de 2000 apresentaram maior meio de palestras, reuniões com profis-
prevalência de pessoas com deficiência sionais especializados, leituras de textos
visual do sexo feminino. De acordo com informáticos, exibição de vídeos e estudos
a classificação de baixa visão, 79,0% dos nos HTPC (hora de trabalho pedagógico
escolares entrevistados apresentam baixa coletivo). Outra ferramenta importante é
visão moderada; 15,7%, cegueira Legal e a utilização de Recurso de Tecnologia As-
5,3%, grave. Verificou-se que 94,7% de- sistiva, destacando o uso da informática,
clararam ter dificuldades visuais na es- um recurso importantíssimo a ser explo-
cola, destacando-se as dificuldades para rado pelos alunos com deficiência visual,
enxergar a lousa (33,3%), ler dicionário pois, pode auxiliar no desenvolvimento da
(22,2%) e realizar leitura de livros (16,7%). programação e conteúdo escolar, propor-
Em relação à autopercepção das dificul- cionando melhor desempenho visual na
dades visuais, verificaram-se: dificuldades leitura de livros e dicionários disponíveis
acadêmicas, pegar ônibus, andar a noite e na internet.
assistir televisão. Enfatizando as relações
com a comunidade escolar, a maioria dos Palavras-chave: educação, inclusão,
alunos possui bom relacionamento com deficiência visual
professores (79,0%) e 68,4% indicaram Contato: Marília Costa Câmara Ferroni,
possuir boa relação colaborativa com os CEPRE- FCM- UNICAMP, marilia_ferroni@
colegas de classe, pois, os mesmos ditam hotmail.com

200
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-995 - APRENDIZAGEM EM tismo?”, “Qual é o papel de um professor


CRIANÇAS AUTISTAS: DUAS VISÕES que trabalha com autistas?” e “Quais são
Ana Karina C. R. de-Farias as dificuldades de aprendizagem de um
akdefarias@gmail.com aluno autista?”. Notou-se que a profes-
Ângela Suzana Rodrigues Guimarães - UniCEUB sora do ensino especial ocupa esse cargo
angela.suzanarg@gmail.com por vontade própria, por causa de even-
Alyne Farias Moreira - UniCEUB tos da sua vida pessoal; apresenta uma
alynefariasmoreira@gmail.com visão interacionista da aprendizagem,
Isabele Raiana de Mendonça Rangel - UniCEUB apropriando-se do papel de mediadora;
belle.rangel@gmail.com recusa o papel de cuidadora; e assume
Thaís Polônio Ribeirinho - UniCEUB a responsabilidade pelas dificuldades de
thais.polonio@gmail.com aprendizagem em sala de aula. Já a pro-
fessora do ensino inclusivo acredita que
O autismo é classificado como um dos o professor tem a função de transmitir o
Transtornos Globais do Desenvolvimen- conhecimento; reconhece a necessidade
to, segundo o Manual Diagnóstico e Esta- de assumir o papel de cuidadora; enfatiza
tístico de Transtornos Mentais, o DSM-IV- as dificuldades de aprendizagem próprias
-TR (Associação Americana de Psicologia, de alunos autistas; e busca a aprendiza-
APA, 2002). Dentre os critérios diagnósti- gem formal. Ambas acreditam na im-
cos, estão falta de reciprocidade nas inte- portância da escola para a melhora do
rações sociais, comportamentos estereo- espectro autista. Sabe-se que visões inte-
tipados, limitação nas atividades e inte- racionistas da aprendizagem consideram
resses, assim como falhas na aquisição e/ o desenvolvimento como advindo das re-
ou na emissão de algum comportamento lações entre o indivíduo e seu meio. Des-
verbo-gestual ou vocal (Martins, 2010). sa forma, essa interação seria uma base
Para o sucesso na aprendizagem de au- propícia a mudanças (Baum, 1994/2006;
tistas, é importante que o professor acre- Vigotsky, 1998). Portanto, compartilhan-
dite na capacidade de aprender desses do de uma visão interacionista da apren-
alunos. Essa interpretação da realidade dizagem, a professora do ensino especial
determinará as práticas e comportamen- parece propensa a acreditar na possibi-
tos do professor e o investimento por ele lidade de desenvolvimento das crianças
creditado aos alunos (Abric, 1998). Dessa autistas. Também, por seu maior inte-
forma, esse estudo se propôs a investigar resse na execução de sua função e por
as crenças e práticas de duas professoras ter investido mais em sua formação, a
que lidam com crianças autistas por meio professora do ensino especial mostra-se,
de dois estudos de caso, sendo que uma atualmente, melhor preparada para lidar
delas trabalha com ensino especial e a com alunos autistas.
outra com ensino inclusivo. O instrumen-
to escolhido para a coleta de dados foi Palavras-chave: Autismo infantil, Ensino
uma entrevista semiestruturada, dentro especial, Ensino inclusivo
de uma perspectiva qualitativa de produ- Contato: Thais Polonio Ribeirinho, UniCEUB,
ção de conhecimento, com itens como, thais.polonio@gmail.com
por exemplo: “Como você definiria o au-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1039 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO conhecimentos. A DI se caracteriza por


APRENDIZAGEM PARA O DEFICIENTE registrar um funcionamento intelectu-
INTELECTUAL al considerado por alguns autores como
Cristiane Alves Cardoso - UAB/UnB significativamente inferior à média, im-
kristalves@hotmail.com possibilitando o indivíduo de responder,
Patrícia Cristina Campos Ramos - UnB conforme se espera, às demandas da so-
pcamposramos@uol.com.br ciedade. Tendo em vista as questões des-
Andrea Moreira Couto Fournier - UAB/UnB tacadas até aqui, o objetivo geral desta
andrea.fournier@hotmail.com pesquisa foi o de buscar compreender o
processo de ensino-aprendizagem de uma
Financiamento: CNPq criança diagnosticada com D.I.; e como
objetivos específicos: conhecer as causas
É na escola que os direitos dos Alunos e conseqüências da D.I e verificar o desen-
com Necessidades Educacionais Especiais volvimento da criança com D.I em relação
(ANEEs) são garantidos. Por esse motivo, ao processo de ensino-aprendizagem du-
a instituição escolar desempenha papel rante o 2º semestre de 2010. A metodolo-
importantíssimo no processo inclusivo gia empregada buscou alcançar resultados
do aluno, já que é através dela que este qualitativos, através do acompanhamento
poderá obter novos conhecimentos e con- da vida acadêmica e sócio-cultural de um
solidar aqueles adquiridos em outros con- aluno com deficiência intelectual, matri-
textos de seu convívio social. Influenciada culado no 4º ano do Ensino Fundamental
por diretrizes internacionais, a educação em turma regular de uma escola públi-
inclusiva brasileira está ampliando seus ca do DF, em que a pesquisadora atuava
horizontes, e vem conquistando espaço como professora regente. A instituição de
na legislação do país, que tem demonstra- ensino fundamental escolhida como fon-
do crescente preocupação em integrar ao te de pesquisa para este estudo possuía
meio os grupos historicamente excluídos 44 turmas em 2010, ano em que foi de-
em função de classe, etnia, idade, gênero, senvolvido o estudo. Além do aluno com
deficiência entre outros. Garantir a quali- diagnóstico de D.I, participaram do estudo
dade de ensino educacional a cada um de a mãe do aluno e a professora da sala de
seus alunos, reconhecendo e respeitando recursos. Para a construção das informa-
sua diversidade, é uma das características ções junto aos participantes foram utili-
do sucesso de uma escola inclusiva. Atu- zados alguns materiais, como livros, arti-
almente, existem avanços significativos gos, roteiro de entrevistas, câmera digital,
ao que se refere à educação especial e, computador. Para iniciar a construção de
mais propriamente para o nosso foco de informações, foi pedida autorização para
interesse, a Deficiência Intelectual (D.I.). a instituição escolar e, após consenti-
A D.I. afeta uma parcela significativa das mento, deu-se início ao processo de es-
pessoas na população em geral e, tam- clarecimentos relevantes ao trabalho. As
bém, das crianças em idade escolar. Essa informações necessárias foram obtidas na
deficiência ainda não é suficientemente própria instituição escolar, pela pesquisa-
compreendida e, por isso, constitui obje- dora. Os envolvidos no processo da cons-
to de investigação de inúmeras áreas de trução destas informações preencheram

202
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e assinaram o Termo de Consentimento por objetivo buscar sua autonomia na rea-


Livre Esclarecido para início das atividades lização das atividades. Contraditoriamen-
de pesquisa. O familiar responsável pelo te, analisando a entrevista com a mãe,
aluno também autorizou a participação observou-se, por parte dela, uma grande
da criança na pesquisa, após conversa em preocupação de que seu filho aprendes-
reunião com a professora pesquisadora, se os conteúdos curriculares; além disto,
que lhes garantiu o sigilo das informações que se sentia incomodada pelo fato de o
e seu uso apenas para fins de pesquisa. Ao filho brincar com crianças de idade infe-
serem informados sobre o processo, tanto rior à dele, além de acreditar que a escola
o responsável quanto o aluno demonstra- já atendia suas necessidades. O diário de
ram satisfação em serem escolhidos para campo e o portfólio, confeccionados com
tal, e seus nomes não foram divulgados, o objetivo de verificar o desenvolvimen-
sendo ambos referenciados apenas por to cognitivo do aluno, traziam atividades
nomes fictícios. Para descrever o aluno e realizadas com o intuito de atingir os ob-
o seu processo de aprendizagem foram jetivos da adequação curricular. Nele, o
utilizadas todas as informações a que tive- aluno apresentou avanço significativo na
mos acesso na instituição escolar, como: realização de suas produções; organizou
relatórios de apoio ao docente, relatórios as ideias e conseguiu transmitir seus pen-
psicopedagógicos, relatório médico e re- samentos. O conhecimento adquirido foi
latório de desempenho escolar. Foram re- expresso através de ilustrações. A percep-
tiradas, desses documentos, informações ção do aluno sobre os conteúdos ministra-
consideradas relevantes para a construção dos, no entanto, foram representados da
desta pesquisa. Os resultados alcançados forma com que ele conseguia interpretar
demonstraram que o acompanhamento os fatos, sendo que, na maioria das ati-
diferenciado e adequado às especificida- vidades, foi necessária a intervenção da
des e necessidades do aluno contribuiu, professora. Conclui-se, então, que o aluno
significativa e positivamente, para o pro- participante desta pesquisa, diagnostica-
cesso de ensino-aprendizagem. Analisan- do com deficiência intelectual, conseguiu
do o histórico da vida escolar do aluno nas manter um bom desenvolvimento educa-
escolas pelas quais passou, percebemos cional, provavelmente, porque a prática
que na primeira escola o aluno não teve educativa esteve direcionada às suas par-
muito progresso e a mãe esteve ausente. ticularidades, já que sabemos que cada
Na segunda escola, com a troca de profes- indivíduo tem o seu tempo para aquisi-
sor, o aluno apresentou melhorias signi- ção de novos conhecimentos e aprimo-
ficativas em seu rendimento escolar. Se- ramento dos antigos. O direcionamento
gundo relatório, naquele período, o aluno das atividades facilitou o aprendizado do
aprendeu a ler, embora tenha continuado aluno e, através dos resultados obtidos,
com dificuldades na resolução de opera- foi possível notar que o atendimento indi-
ções matemáticas; a ausência da mãe foi vidualizado, a adequação das atividades e
um ponto mencionado mais uma vez pela a participação dos colegas como monito-
equipe escolar. Na terceira escola a mãe res contribuíram para que o aluno se de-
também se mostrou ausente e as ativi- senvolvesse e se sentisse incluído naquela
dades desenvolvidas com o aluno tinham instituição. A conclusão que chegamos,

203
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

inspirados em Vigotski, é que o olhar do vimento humano, enquanto sujeitos em


educador deve estar sempre voltado para transformação, inseridos num contexto
as potencialidades do educando e nunca, de relações e condições historicamente
como corriqueiramente ocorre, para as constituídas. Participou dessa pesquisa
suas deficiências e limitações. um total de 26 adolescentes, organizados
em dois grupos, com 14 e 12 participan-
Palavras-chave: Deficiência intelectual, tes, respectivamente, organizados por fai-
Ensino-aprendizagem, Inclusão Escolar xa etária (10 a 14 anos e 15 a 19 anos).
Contato: Cristiane Alves Cardoso, UAB/UnB, Selecionaram-se os temas desenvolvidos
kristalves@hotmail.com durante as vivências nos grupos, a partir
das diretrizes nacionais para a atenção in-
tegral à saúde de adolescentes e jovens,
LT04-1043 - CONTRIBUIÇÕES DA na promoção, proteção e recuperação
PSICOLOGIA PARA A EDUCAÇÃO EM da saúde, do Ministério da Saúde (Brasil,
SAÚDE DE ADOLESCENTES EM UM 2010), os quais incluíram: direitos sexuais
SERVIÇO DE SAÚDE e direitos reprodutivos, projeto de vida e
Etiene Oliveira Silva Macedo - UnB cultura de paz. Além disso, também foram
etienemacedo@gmail.com abordados temas considerados importan-
Maria Inês Gandolfo Conceição - UnB tes pelos participantes, diretamente rela-
inesgand@unb.br cionados aos anteriores, como processos
Financiamento: CNPq identitários e relações familiares. A rele-
vância desse trabalho está na contribui-
O presente trabalho visa apresentar as ção teórico-metodológica que a Psicologia
contribuições da inserção da Psicologia pode oferecer a partir da inserção nos
nas atividades voltadas à educação para a espaços públicos que atendem essa po-
promoção da saúde de adolescentes aten- pulação. Desde a década de 1970, os psi-
didos no serviço público de saúde. Trata- cólogos têm participado do Sistema Único
-se dos resultados parciais de pesquisa de- de Saúde, sobretudo na atenção terciária,
senvolvida pela 1ª autora, sob orientação a partir da Psicologia Hospitalar. Relatos e
da 2ª, para obtenção do título de mestre, pesquisas sobre a inserção do psicólogo
cuja dissertação se encontra em andamen- na atenção primária estão ainda em cons-
to. Tomou-se como referência a realização trução, devido ao pouco tempo de inser-
de grupos temáticos, desenvolvidos den- ção do profissional nesse espaço (Boing,
tro de um Programa de Atenção Integral Crepaldi & Moré, 2010). Especificamente
à Saúde do Adolescente. Essas atividades em relação à promoção da saúde integral
tiveram duração de 3 meses, organizadas de adolescentes, observa-se que esses
em 12 sessões estruturadas a partir do relatos são escassos. Dentre as contribui-
referencial metodológico do sociodrama ções alcançadas por esse estudo, pode-se
(Nery, Costa & Conceição, 2006) e tiveram destacar o fortalecimento da atuação da
como objetivo, propiciar aos participantes psicologia em contextos não-clínicos, mas,
da pesquisa, por meio de jogos e drama- essencialmente, terapêuticos. Nessa pers-
tizações, a vivência sócio-afetiva sobre pectiva, tem-se a expansão da concepção
seu momento no processo de desenvol- de fato clínico: fatos sociais e psicológicos

204
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se complementam ou se suplementam convergir para possibilitar aos participan-


em torno do objeto estudado, o que exige tes a realização de escolhas possíveis em
intervenções terapêuticas cada vez mais prol da saúde; ações que busquem a au-
criativas (Nery & Costa, 2008). Outra con- tonomia e a saída coletiva para problemas
tribuição é a aproximação da Psicologia que também são vividos na coletividade.
com a Saúde, o que requer um posiciona-
mento ético-político junto ao seu objeto Palavras-chave: Adolescência, Psicologia,
de estudo. Para se compreender o sujeito Sistema Único de Saúde
em sua integralidade é preciso reconhecer Contato: Etiene Oliveira Silva de Macedo, UnB,
sua inserção num espaço histórico e cul- etienemacedo@gmail.com
tural. No presente estudo, a adolescência
é concebida como um momento no pro-
cesso de desenvolvimento humano, cuja LT04-1048 - VALIDADE DO ZULLIGER
transição é multifacetada, mediada por re- NA AVALIAÇÃO DA COMPETÊNCIA
lações que se dão num contexto sociohis- INTERPESSOAL
toricamente constituído. De acordo com Jucelaine Bier Di Domenico Grazziotin
Vygotsky (1996), o adolescente só pode jucelainegraz@terra.com.br
ser compreendido a partir de relações que Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS
são objetivadas na cultura: adolescentes silvanalba@upf.br
de contextos diferentes vão se desenvol-
ver também com especificidades diferen- A avaliação psicológica é uma prática fre-
ciadas. Logo, essa transição não pode ser quente no contexto organizacional, pois
tomada como um “a priori”. Do contrário, possibilita melhor compreensão das ha-
corre-se o risco dessa transitoriedade le- bilidades do indivíduo, do seu funciona-
gitimar o caráter de invisibilidade desses mento psicológico e, ainda, dos aspectos
sujeitos, como o vir a ser, o inacabado que preditivos do desenvolvimento de seu
almeja a vida adulta. Em relação à promo- comportamento. Atualmente, as habili-
ção da saúde, buscou-se o entendimento dades de competência interpessoal nes-
da saúde em sua concepção mais amplia- se âmbito, passaram a ser um requisito
da, com dimensões e causalidades múl- imprescindível em todos os níveis ocupa-
tiplas (Brasil, 2010). Além de contribuir cionais, desde aquele que atende à co-
para o desenvolvimento psicossocial dos munidade externa à empresa como aos
adolescentes participantes, essa pesquisa clientes e ao público em geral, até aqueles
discute também a prática da Psicologia no que convivem diariamente com o público
Sistema Único de Saúde, pois comparece interno, no mesmo setor e intersetores.
como um fazer transversal, inseparável Assim, a competência interpessoal é a
dos princípios norteadores dessa políti- habilidade de lidar eficazmente com as re-
ca, na busca de uma saúde possível aos lações interpessoais, de lidar com outras
participantes, neste caso, os adolescentes pessoas de forma adequada às necessi-
atendidos, considerando seus múltiplos dades de cada uma e às exigências da si-
contextos de inserção (Santos, Quintani- tuação. Perceber de forma acurada uma
lha & Dalbello-Araújo, 2010). Discutem-se situação e suas variáveis permite que o
também como as ações e práticas podem sujeito desempenhe melhor o seu traba-

205
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lho, tanto na dimensão técnica requerida desenvoltura social; F4) autoexposição a


pela natureza dessa atividade quanto na desconhecidos e situações novas; F5) au-
de ser capaz de se posicionar de forma ha- tocontrole da agressividade em situações
bilidosa na rede de relações interpessoais, aversivas. Participaram dezenove sujeitos,
interna e externa, no local de trabalho. A entre 18 e 43 anos de idade, média 27,5
competência interpessoal é revelada nas anos (DP=8,83), dez (53%) do gênero fe-
relações estabelecidas entre indivíduo-in- minino e nove (47%) do gênero masculi-
divíduo e indivíduo-grupo, englobando as- no, quinze (78,94%) com ensino médio
sim atitudes individuais e coletivas, sendo completo e quatro (21,05%) ensino mé-
estas jamais indissociáveis. Desse modo, dio incompleto. Todos exerciam ativida-
para avaliar o desenvolvimento e a aquisi- des de atendimento direto ao cliente em
ção da competência interpessoal é neces- uma loja de uma rede de supermercados.
sário a utilização de instrumentos válidos, Destes, sete (36,84%) na função de ope-
que reúnam um conjunto de evidências radores e frente de caixa; sete (36,84%)
que assegurem a sua relevância, a sua como atendentes de perecíveis e cinco
utilidade nos usos propostos e nas inter- (26,31%) no cargo de atendentes de loja.
pretações geradas. É nesse contexto, que Os participantes responderam ao ZSC se-
o teste Zulliger no Sistema Compreensivo guido pelo IHS, de forma individual em
ZSC se insere, especialmente por integrar uma única sessão. Nos resultados, em re-
diversos aspectos da personalidade, com lação ao ZSC, apenas as variáveis SumT e
base tanto nos preceitos da psicometria, Isolamento oscilaram entre os parâmetros
como nos da projeção e por possibilitar normativos. Também os fatores do IHS,
uma investigação mais completa do uni- mantiveram-se nos índices normativos.
verso psíquico do examinando, tão solici- Os resultados, além disso, demonstraram
tada no campo empresarial. Assim sendo, que os indicadores GHR, GPHR, pure H,
o objetivo deste estudo foi verificar as evi- Sum H, que informam sobre o bom re-
dências de validade do Zulliger no Sistema lacionamento e percepção interpessoal
Compreensivo ZSC, focalizando a variável adequada, correlacionaram-se positiva e
relacionamento, a saber: SumT (som- significativamente com fatores GIHS, F3 e
breado textura); Fd (comida ou ação de F1 do IHS. A variável COP, apesar de não
comer); H (humano inteiro), Hd (detalhe ter apresentado índices significativos de
humano),(H) (para-humano inteiro), (Hd) correlação com o IHS, apontou aspectos
(detalhe para-humano); GHR (boa repre- positivos qualitativamente, manteve-se
sentação humana) e PHR (representação na média normativa e em comparação à
humana pobre); a (movimento ativo) e p AG, mostrou-se superior. As variáveis AG,
(movimento passivo); (isolamento); PER PHR, SumT, que podem informar sobre o
(resposta personalizada); AG (movimento relacionamento e a percepção interpes-
agressivo); COP (movimento cooperati- soal prejudicados, correlacionaram-se ne-
vo) que, por hipótese, estariam correla- gativa e significativamente com os fatores
cionadas com os fatores de Habilidade GIHS e F5 do IHS. Portanto, sendo a idéia
IHS: F1) autoafirmação e enfrentamento principal desse estudo, verificar as evidên-
com risco; F2) autoafirmação na expres- cias de validade do ZSC em correlação com
são de afeto positivo; F3) conversação e os fatores do IHS, que teoricamente ava-

206
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

liam construtos similares, relacionamento o desenvolvimento como decorrente do


e habilidade social, a correspondência dos fluxo de interações entre características
resultados obtidos entre os instrumentos, estruturais da pessoa e diferentes con-
forneceu uma importante contribuição textos dos quais ela participa. Entre estes
para a sua legitimidade. Por fim, mesmo contextos, a escola é uma instituição so-
sendo um estudo de caráter preliminar, os cial que faz parte do processo de desen-
resultados contribuíram para afirmar a va- volvimento do indivíduo, com a função
lidade do Zulliger na avaliação psicológica de ampliar as capacidades interpessoais/
da competência interpessoal no contexto intrapessoais, de pensar, planejar, memo-
organizacional. rizar, o que não se diferencia no âmbito
da inclusão de crianças com necessida-
Palavras-chave: competência interpessoal, des educacionais especiais. Portanto, o
Zulliger no Sistema Compreensivo, evidência objetivo geral desta pesquisa foi traçar
de validade. um paralelo entre o funcionamento do
Programa de Educação Precoce no DF, em
dois diferentes momentos e contextos: o
LT04-1193 - A INCLUSÃO NO PROGRAMA atendimento no Centro de Ensino Espe-
DE EDUCAÇÃO PRECOCE NO DISTRITO cial e o atendimento em uma escola de
FEDERAL: DIFERENTES MOMENTOS ensino regular de educação infantil. Os
Andrea Moreira Couto Fournier - UnB objetivos específicos deste estudo foram:
andrea.fournier@hotmail.com observar as diferenças e semelhanças
Patrícia Cristina Campos Ramos - UnB entre estas duas realidades e identificar,
pcamposramos@uol.com.br com base nos depoimentos e opinião
Cristiane Alves Cardoso - UnB dos participantes, os fatores que atuam
kristalves@hotmail.com como facilitadores ou dificultadores no
processo de inclusão da criança. Trata-
O desenvolvimento da criança tem sido -se de uma pesquisa qualitativa, da qual
estudado, ao longo do tempo, sob dife- participaram professores, coordenador e
rentes enfoques. Para a teoria da matu- pais integrantes do Programa de Educa-
ração biológica, por exemplo, o desenvol- ção Precoce em realidades distintas, que
vimento ocorre de forma natural e tem tratam do funcionamento do Programa
uma raiz endógena; a teoria ambientalis- de Educação Precoce em Centros de En-
ta, por sua vez, preconiza que o conheci- sino Especial e em Centros de Educação
mento vem da experiência do indivíduo; Infantil. Os participantes deste estudo fo-
já de acordo com a abordagem constru- ram: uma professora educadora física, a
tivista, a aprendizagem ocorre com a coordenadora do Programa (ambas já tra-
interação sujeito-ambiente, enquanto balharam nas duas realidades citadas), a
teóricos da abordagem histórico-cultural gestora da escola de educação infantil e o
apontam o papel da cultura, da socieda- pai de uma criança que também frequen-
de e da história como essenciais para o tou o Programa em ambos os contextos.
desenvolvimento individual. Assim, cada A referida criança atualmente integra o 2º
criança é singular no modo de aprender e período da Educação Infantil, na mesma
desenvolver-se, e podemos compreender unidade de ensino em que já participou

207
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do Programa de Educação Precoce, tam- vel, por que o preconceito ainda não está
bém tendo participado do mesmo Pro- cristalizado, e as crianças que convivem
grama em Centro de Ensino Especial. A com a diferença na escola tendem a ser
condição definida para esta participação mais compreensivas com a diversidade. A
foi que todos estivessem envolvidos com criança em situação de necessidade espe-
o programa, direta ou indiretamente. As cial, inserida na escola desde cedo e que
entrevistas foram realizadas por meio de faz parte do alunado, aos poucos vai con-
procedimentos similares e pautadas por quistando seu espaço, interagindo com
referenciais teóricos e pressupostos me- funcionários e outras crianças, com os
todológicos comuns. Os três instrumen- próprios colegas em sala de aula e partici-
tos foram idealizados para entrevistas pando das atividades coletivas da escola.
semiestruturadas, sendo que o primeiro Outro aspecto trazido nas entrevistas foi
era destinado ao gestor da instituição que o impacto na percepção dos pais ao leva-
já atuava na escola antes do Programa de rem seus filhos para serem atendidos no
Educação Precoce se iniciar lá. O segundo Programa de Educação Precoce e se depa-
instrumento era aplicado em professores rarem com crianças, jovens e adultos nos
e coordenador do Programa. O terceiro, Centros de Ensino Especial que apresen-
destinado à entrevista com a família da tam um desenvolvimento muito aquém
criança. Buscamos, com isto, valorizar o do esperado, podendo comprometer a
ambiente natural, bem como o significa- frequência da criança no Programa de-
do que as pessoas participantes deram vido ao preconceito, o que pode levar a
e dão à inclusão e à educação. O estudo própria criança a não se desenvolver de
foi realizado em uma escola de Educação forma adequada. Outro aspecto trazido
Infantil localizada em uma Região Admi- nas entrevistas foi relativo à dificuldade
nistrativa de Brasília, no Distrito Federal. no processo de inclusão como as barrei-
As entrevistas foram transcritas em sua ras arquitetônicas, falta de monitor, res-
integridade e foram considerados temas peito à estratégia de matrícula, a qualifi-
recorrentes para a definição das catego- cação profissional, a resistência e a acei-
rias utilizadas para análise. Os entrevista- tação do profissional com a criança com
dos trouxeram, em suas verbalizações, a necessidades especiais. Apesar de tudo,
importância do processo de inclusão e as- foi relatado que com o Programa em fun-
pectos que favorecem o desenvolvimento cionamento na escola comum os profes-
infantil dentro da escola comum, além dis- sores estão mais sensíveis ao processo de
to, salientaram a importância da presença inclusão. Também é reconhecida, pelos
de outras crianças no processo de desen- participantes deste estudo, a importân-
volvimento das crianças em situação de cia do Programa para o desenvolvimento
necessidade especial, como referências das crianças com necessidades especiais
uma para as outras. Segundo eles, esse e sua futura inclusão na rede pública de
processo é uma via de mão dupla, pois as ensino regular. Os trabalhos desenvolvi-
crianças (com ou sem necessidades espe- dos nos Programas de Educação Precoce,
ciais) aprendem com as diferenças. Ainda tanto nos Centros quanto em escolas re-
para os participantes, é importante que gulares, objetivam a inclusão. No entanto,
este processo ocorra o mais cedo possí- através dos relatos, foi possível concluir

208
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que, além do Programa ser particular- as experiências de aprendizagem sejam


mente benéfico para o desenvolvimento apresentadas às crianças de uma forma
infantil, o funcionamento do mesmo em adequada a seu nível de pensamento. É
escolas regulares é mais favorável para o imprescindível que o professor da edu-
processo de inclusão. É consenso entre os cação infantil tenha uma formação espe-
participantes a importância do Programa cífica para trabalhar com seus alunos. O
de Educação Precoce inserido em escola objetivo dessas formações continuadas
regular, devido a vários processos posi- é auxiliar as professoras a problematiza-
tivos inerentes a este modo de inclusão. rem as atividades realizadas por elas na
No futuro, políticas institucionais podem escola, para que possam refletir, ter cons-
ser implementadas, de forma a contribuir ciência do fim a atingir e assumir o papel
ainda mais para o processo de inclusão, de mediadoras entre os alunos e as ativi-
já que esta população de 0 a 3 anos não dades desenvolvidas na escola e na socie-
é amplamente atendida, ainda, no Brasil. dade. Para tanto, a formação continuada
deve ser concebida como um trabalho de
Palavras-chave: Centro de Educação Infantil, reflexibilidade crítica sobre as práticas e
Centro de Ensino Especial, Educação Precoce. de construção permanente de uma iden-
Contato: Andréa Moreira Couto Fournier, tidade pessoal e profissional em interação
UnB, andrea.fournier@hotmail.com. mútua. Com essa premissa, esse trabalho
teve como objetivo propiciar um espa-
ço de reflexão e conscientização sobre a
LT04-1253 - FORMAÇÃO CONTINUADA: prática pedagógica de cada professora e
UM ESPAÇO PARA REFLEXÃO EM transmitir conhecimentos gerais da Edu-
EDUCAÇÃO INFANTIL cação Infantil, para as Agentes de Educa-
Caroline Andrea Pöttker - UEM ção Infantil, visando um melhor desenvol-
Caroline_pottker@hotmail.com vimento das suas atividades pedagógicas.
Participaram do estudo 10 agentes de
Este artigo se originou do relatório de es- educação infantil e 6 professoras. Para
tágio na área de Psicologia Escolar, que isso utilizou-se de encontros quinzenais
ocorreu durante um ano, foi realizado com o grupo das Agentes, e encontros
num Centro de Educação Infantil, loca- grupais, mensalmente, e individuais, se-
lizado em um município de Santa Cata- manalmente, com as professoras. Com as
rina. Para se referir ao local de estágio agentes de educação infantil foram reali-
será usado o nome fantasia, C.E.I. Algo- zados 4 encontros, onde priorizou-se os
dão Doce. A educação infantil sempre seguintes temas: abordagens em apren-
mostrou-se necessária, mesmo que suas dizagem (Tradicional e Integradora), as
finalidades e objetivos mudassem com funções de uma Instituição de Educação
o tempo para atender as solicitações de Infantil: cuidar e educar, desenvolvimento
uma sociedade em transformação. Ela infantil e o brincar. Desse modo, na reali-
exige um ambiente que encoraje e apóie zação do primeiro encontro com as agen-
as expressões de sentimentos, interesses tes de educação infantil foram abordadas
e valores pelas crianças e isso só será pos- as diferenças entre duas abordagens da
sível se o professor assegura-se de que Aprendizagem: a Tradicional e a Integra-

209
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dora. Viu-se como essencial proporcionar (1994) postulam que a brincadeira parece
às agentes um momento de reflexão e ser importante para diversos aspectos do
conhecimento sobre as diferenças entre desenvolvimento, e essas vivências lúdi-
a Tradicional e a Integradora, bem como, cas são necessárias para que a criança se
a relevância de se ter clareza dos concei- desenvolva normalmente. Como as agen-
tos de cada abordagem e seguir cons- tes estão constantemente em contato
cientemente uma teoria escolhida. Pois, com as crianças, principalmente nos mo-
segundo Almeida (2002), ao oportunizar- mentos das brincadeiras, é imprescindível
-se uma formação de qualidade aos pro- que elas compreendam a importância do
fissionais de Educação Infantil, estaremos momento lúdico para o desenvolvimen-
subsidiando-lhes na construção de suas to da criança e, com isso, possam pro-
práticas, proporcionando-lhes consciên- porcionar-lhes um ambiente agradável e
cia das opções teórico-práticas que fazem criativo. Na atividade com as professoras
e, assim, podendo oportunizar que se li- foram realizados encontros grupais e in-
bertem das amarras impostas pelas inse- dividuais. O encontro grupal foi realizado
guranças originárias do desconhecimento mensalmente no turno vespertino, com
de seu objeto de trabalho – a infância. grupo fixo, na sala dos professores. Para
No segundo encontro foram trabalha- a realização do primeiro encontro foi
dos os objetivos da Educação Infantil: o abordado as diferenças entre duas abor-
cuidar e educar. O cuidado e a educação dagens em Aprendizagem: a Tradicional e
são indissociáveis, pois a instituição deve a Integradora. Já para os demais encon-
promover práticas de educação e cuida- tros os temas foram definidos tendo-se
dos, que possibilitem a integração entre como base os encontros individuais com
os aspectos físicos, emocionais, afetivos, as professoras. Os encontros individuais
cognitivos/lingüísticos e sociais da crian- foram realizados semanalmente, tanto no
ça, entendendo que ela é um ser com- período da manhã como no da tarde, com
pleto e indivisível. Já no terceiro encon- duração de aproximadamente uma hora,
tro o tema proposto para discussão foi o sendo que os horários dos encontros fo-
desenvolvimento infantil. Darezzo (2004) ram combinados com as próprias profes-
afirma que algumas informações sobre o soras. Tanto com os encontros individuais
desenvolvimento infantil, as fases que ca- e grupais pode-se perceber a abertura
racterizam seu desenvolvimento em ter- das professoras para novos conhecimen-
mos de habilidades, limites e descober- tos e discussão das dificuldades enfrenta-
tas, ajudam muito o adulto nas decisões das em sala de aula, foi discutido sobre
frente a problemas que surgem no dia a a construção de propostas pedagógicas
dia. Portanto, pode-se dizer que o conhe- e curriculares, que espelhe as conquistas
cimento sobre o desenvolvimento infantil e saberes já existentes nestas práticas, e
permite realizar aconselhamento de pais também sejam capaz de vislumbrar en-
e formação de programas educacionais caminhamentos futuros. O trabalho do
mais eficazes. Por último, no quarto en- professor de educação infantil exige a
contro, foram levados para o debate três mobilização de muitos conhecimentos
conceitos da educação infantil: o brincar, para cuidar e educar as crianças, interagir
a brincadeira e o brinquedo. Sylva e Lunt com as famílias e lidar com as exigências

210
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

institucionais. Diante disso, Nóvoa (1995) autoeficácia compreende um julgamento


aponta que um modelo construtivo de pessoal de capacidade relativa a um do-
formação continuada para professores mínio específico e não necessariamente
parte da reflexão interativa e contextuali- representando a real capacidade de um
zada, articulando teoria e prática. E neste indivíduo, mas o que o mesmo acredita
processo formativo, centrado na profissão ser capaz de realizar, em uma variedade
e na vida da escola, que se entende, deva de circunstâncias (Souza; Brito, 2008).
residir o foco de origem e de retorno da A autoeficácia é conceituada entre dois
formação continuada fundamentada nos componentes: a expectativa de eficácia e
princípios da reflexão crítica compartilha- a expectativa de resultado. A expectativa
da. Formação esta que, longe de consti- de eficácia corresponde, então, à crença
tuir uma formulação acabada, se apre- individual de capacidade ou a falta dela
senta como uma categoria da formação para a realização de uma tarefa específi-
docente. Após a realização das atividades ca. Já a expectativa de resultado é a cren-
percebeu-se que as professoras e agentes ça de que determinado comportamento
refletiram sobre suas práticas profissio- leva a um resultado (Hall; Lindzey; Cam-
nais e, com isso, modificaram algumas de pbell, 2000). Alguns fatores exercem um
suas formas de atuações. Como no caso, papel na origem e no desenvolvimento
as funcionárias relatam terem dificulda- destas crenças: experiências, realizações
des na disponibilidade (falta) de tempo e desempenhos anteriores, experiência
para a realização das atividades progra- vicariante, persuasão social e estados fi-
madas para o dia, após a intervenção pas- siológicos e afetivos (Souza; Brito, 2008).
saram a se reorganizarem e desenvolver As crenças de autoeficácia podem in-
as atividades. fluenciar como as pessoas sentem, pen-
sam, se motivam e se comportam. Tais
Palavras-chave: Educação Infantil, Formação consequências são provocadas através
Continuada, Professores de quatro processos principais: processos
cognitivos, relacionados à antecipação do
resultado dos próprios comportamentos,
LT04-1269 - A PERCEPÇÃO DE processos motivacionais, afetando va-
AUTOEFICÁCIA EM ALUNOS COM riáveis como esforço e tempo que uma
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM pessoa emprega em uma determinada
Fernanda Elis Matte - FACCAT atividade, processos afetivos, relaciona-
Paula Grazziotin Silveira Rava - FACCAT dos às reações emocionais dos indivídu-
paulagraz@yahoo.com os, quando experimentam atividades que
julgam difíceis e os processos de seleção,
A percepção que o indivíduo tem sobre já que as pessoas escolhem realizar as ati-
a sua capacidade para desempenhar de- vidades que pensam ter um desempenho
terminada tarefa é conceituada como eficiente (Souza; Brito, 2008). As dificul-
autoeficácia. Estas percepções acompa- dades de aprendizagem correspondem a
nham o sujeito, podendo ter influências uma falta de habilidade específica, como
positivas ou negativas sobre o seu de- na leitura, na escrita ou na matemática,
sempenho real. Pode-se afirmar que a em crianças que apresentam um rendi-

211
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mento bem abaixo do esperado para seu ao passo que, em situações aversivas, em
nível de desenvolvimento, escolaridade e que consideram não ter capacidade para
capacidade intelectual. O transtorno de desenvolver as atividades, não apresen-
aprendizagem pode ser suspeitado em tam gosto, nem real interesse, apenas re-
um aluno que apresente uma inteligência alizam-nas, pois lhe é solicitado (Dell’agli;
normal, habilidades motoras e sensoriais Caetano; Castanho, 2009). Quando um
de acordo com o esperado, bom ajuste estudante experimenta situações de difi-
emocional e um nível socioeconômico e culdades de aprendizagem, o sentimento
cultural mínimo (Rotta; Ohweiler; Riesgo, é de fracasso, pois, por não obter êxito
2006). As dificuldades de aprendizagem nas atividades escolares, sente-se inca-
são de difícil solução já que são de cau- paz, gerando sentimentos de frustração
sa multifatorial. Dell’Agli, Caetano e Cas- e comportamentos disfuncionais, entre
tanho (2009) sugerem que a chave para outros (Carneiro; Martinelli; Sisto, 2003).
estudarmos uma solução estaria em unir A criança que apresenta dificuldades de
os aspectos cognitivos aos afetivos, pois, aprendizagem, então, encontra-se diante
segundo elas, não podem ser avaliados de um problema de circularidade causal,
separadamente. A afetividade pode ace- quando sua baixa crença de autoeficácia
lerar ou retardar a aprendizagem, pois é a deixa menos motivada e atenta às ati-
considerada o combustível, a motivação vidades acadêmicas, gerando de fato um
para aprender, sendo a inteligência, a mau desempenho e, assim, confirmando
estrutura, a organização. Portanto, para sua ideia de que não é capaz. Há uma for-
aprender o sujeito necessita de uma es- te relação entre o desenvolvimento inte-
trutura de inteligência, mas ainda de lectual e as crenças autorreferenciadas.
um motor que a impulsione, sendo esta Apenas ter habilidades cognitivas, por-
a afetividade (Dell’agli; Caetano; Casta- tanto não explica um sucesso ou fracasso
nho, 2009). Outros estudos também têm escolar. Assim, profissionais da educação
apontado a relação entre afetividade e precisam buscar desenvolver, além dos
inteligência. Alunos que apresentam um conteúdos de cada disciplina, autoper-
alto senso de autoeficácia são capazes de cepções de capacidade positivas (Souza;
realizar atividades utilizando mais estra- Brito, 2008). Este estudo buscou avaliar a
tégias cognitivas e metacognitivas, persis- percepção de autoeficácia de alunos com
tindo por mais tempo do que os alunos dificuldades de aprendizagem e de alunos
com baixa percepção de autoeficácia sem dificuldades de aprendizagem. Para
(Medeiros et al. 2003). Já os alunos que tanto, utilizou-se o Roteiro para a avalia-
apresentam um rendimento escolar fraco ção da autoeficácia (Medeiros; Lourei-
e atribuem isso à incompetência pessoal ro,1999 apud Medeiros et al., 2000) em
distanciam-se das atividades intelectuais, 38 alunos, sendo 19 alunos com dificulda-
demonstrando problemas emocionais e des de aprendizagem e 19 alunos sem di-
comportamentos internalizados (Roeser; ficuldades de aprendizagem. Objetivou-se
Eccles, 2000 apud stevanato et al. 2003). investigar se há relação entre a percepção
Quando os estudantes pensam serem de autoeficácia e dificuldades de apren-
capazes de realizar a tarefa, vivenciam o dizagem, através da comparação entre
momento como prazeroso e interessante, os dois grupos de alunos. Encontrou-se

212
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

diferença significativa entre os dois gru- LT04-1280 - A INFÂNCIA


pos, sendo que os alunos com dificulda- CONTEMPORÂNEA NA PERSPECTIVA
des de aprendizagem apresentaram uma DOS PROFESSORES
percepção de autoeficácia mais baixa que Dayane Aparecida do Nascimento - UFMT
os alunos sem dificuldades de aprendiza- dayane.an@hotmail.com
gem. Diante dos resultados apresentados, Raquel Gonçalves Salgado - UFMT
percebe-se que, alunos que experimen- ramidan@terra.com.br
tam situações de dificuldades de apren-
Financiamento: FAPEMAT e CNPq
dizagem, sentem-se muitas vezes fracas-
sados. Carneiro, Martinelli e Sisto (2003)
As discussões sobre a temática da infân-
afirmam que, por não obterem êxito nas
cia constituem um campo inesgotável de
atividades escolares, alunos com dificul-
informações e descobertas. Por isso, ao
dades de aprendizagem sentem-se inca-
nos depararmos com cenas em que as
pazes, gerando sentimentos de frustração
crianças aparecem como protagonistas de
e comportamentos disfuncionais, entre
outros. Portanto, como sugerem as mes- experiências que atestam saberes e com-
mas autoras, estes alunos apresentam petências nas suas relações íntimas com
um problema de circularidade causal, em as tecnologias e a cultura do mundo con-
que a baixa percepção de autoeficácia os temporâneo, é inevitável que se produza
deixa menos motivados, gerando um real um estado de perplexidade e dúvida com
mau desempenho e, então, confirmando relação aos nossos saberes sobre a infân-
sua ideia de incapacidade no âmbito es- cia. Diante desse fato, surge a necessidade
colar. Dentre a amostra analisada, o teste de considerar o tema da infância contem-
de Mann Whitney apontou não existir di- porânea como um campo para a configu-
ferença significativa entre a variável sexo ração de outros mapeamentos e imagens,
e a percepção de autoeficácia (P=0,928), dada a diversidade de experiências, valo-
refutando a hipótese de que os alunos do res e conhecimentos que as crianças têm
sexo masculino apresentam uma percep- construído. Por outro lado, há de se con-
ção de autoeficácia mais baixa. Entretan- siderar os adultos, principalmente aque-
to, o grupo de alunos com dificuldades les que assumem a tarefa de educar, na
de aprendizagem foi constituído, em sua alteridade que seus saberes, experiências,
maioria, pelo sexo masculino (79%), de- valores e concepções revelam ao se depa-
monstrando que a maioria dos estudan- rarem e se relacionarem com a infância
tes, com dificuldades de aprendizagem, vivida pelas crianças hoje. Diante dessa
nesta escola e nos anos pesquisados, é do dupla tarefa, a pesquisa em questão bus-
sexo masculino. ca compreender a infância contemporâ-
nea no diálogo entre gerações. No sentido
Palavras-chave: autoeficácia, dificuldades de de problematizar a idéia da criança como
aprendizagem, crianças. ser inacabado, em estado transitório para
Contato: Paula Rava, FACCAT, a vida adulta, situamos o escopo teórico
paulagraz@yahoo.com desta pesquisa no campo da Sociologia da
Infância, que se propõe a interrogar a so-
ciedade a partir de uma perspectiva que

213
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

considera as crianças como eixo da inves- jeitos que dela participam e o pesquisador
tigação sociológica, com vistas não ape- se definem ao mesmo tempo como obje-
nas à produção de conhecimento sobre a to de investigação, à medida que se tem
infância, mas sobretudo à compreensão como foco a produção discursiva que se
da sociedade em seu conjunto (Sarmen- processa nesse contexto, e como postu-
to, 2005). Nesta pesquisa, constituem- ra metodológica, haja vista a intervenção
-se como parâmetros de análise tanto os que se efetiva na deflagração dessa produ-
discursos dos adultos (professores) sobre ção discursiva. Nessa dupla dimensão da
a infância vivida pelas crianças hoje (seus pesquisa, os sujeitos que dela participam
alunos) quanto os discursos das próprias não são apenas informantes de dados a
crianças sobre as experiências que reve- serem traduzidos pelo texto analítico do
lam e assumem como legítimas de suas in- pesquisador, posto que constroem conhe-
fâncias. Trata-se, portanto, de analisar as cimentos e refletem sobre suas próprias
tensões entre os modos como os adultos concepções, valores e práticas. Para que
atribuem sentidos à infância vivida pelas as relações entre as crianças e os profes-
crianças nos dias atuais e os modos como sores não sejam capturadas pelas amarras
elas próprias definem as experiências que institucionais da escola, o locus da pesqui-
marcam seu tempo de vida. Nesse diálogo sa é o Laboratório Especial de Ludicidade
de temporalidades e valores, destacam-se (Brinquedoteca) do Campus de Rondo-
os discursos que historicamente atraves- nópolis da Universidade Federal de Mato
sam o conceito de infância e se materia- Grosso. Trata-se de um Laboratório que
lizam em valores para os adultos e aque- funciona, desde 2008, como um programa
les que se apresentam como referências de extensão e tem oferecido atendimento
simbólicas às crianças para a constituição a instituições de Educação Infantil da rede
de experiências próprias de seu tempo de pública municipal de Rondonópolis, situ-
vida. Este estudo, em particular, como um adas nas imediações do Campus. Como
dos subprojetos da pesquisa abordada, as turmas de crianças que frequentam a
enfatiza as experiências da infância con- Brinquedoteca estão sempre acompanha-
temporânea sob a ótica dos professores. das por seus professores, é válido afirmar
Seus objetivos consistem em analisar os que esse espaço oferece condições favo-
sentidos que os professores atribuem às ráveis para que ambos os sujeitos possam
suas experiências de infância e àquelas compartilhar suas experiências, tendo
vividas pelas crianças hoje e compreen- como mediação o brincar. Atualmente,
der, nas interlocuções entre professores e a Brinquedoteca tem atendido três ins-
crianças, os contrapontos em relação aos tituições com o perfil acima descrito. Os
sentidos que atribuem à infância. Além sujeitos participantes desta pesquisa são:
disso, busca-se delimitar como eixo teó- as crianças, de 5 a 6 anos, de três turmas
rico-metodológico a alteridade presente do 2º agrupamento da Educação Infantil,
nessa produção discursiva, uma vez que a sendo duas de uma escola e uma de outra;
criança se apresenta como o outro situa- e os professores responsáveis por essas
do no passado do adulto (Bakhtin, 1992). turmas. Como estratégia metodológica,
Trata-se de uma pesquisa-intervenção, em temos a realização de grupos de discus-
que as relações estabelecidas entre os su- são com as crianças e os professores, or-

214
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ganizados sob a forma de oficinas, como LT04-1340 - O QUE PENSAM OS AGENTE


forma de suscitar debates sobre questões AUXILIAR SOBRE SUAS CRECHES
relacionadas à infância contemporânea. Ana Carolina Monnerat Fioravanti - PUC/Rio
Entendemos que, desse modo, seja pos- ana@fioravantiana.org
sível que todos, à sua maneira, inclusive Amanda Cristina de Freitas Souza - NEIPE/
o pesquisador, participem do processo UERJ
de construção de sentidos (Castro, 2008). achrys.souza@bol.com.br
Outro importante recurso metodológico Daniele Vieira de Azevedo - NEIPE/UERJ
é a realização de entrevistas semiestru- daniele.vieiraazevedo@ig.com.br
turadas com as professoras sobre as suas Vera Maria Ramos de Vasconcellos - PROPED
experiências de infância e os modos como - NEIPE/UERJ
significam as experiências de infância vi- Vasconcellos.Vera@gmail.com
vidas pelas crianças com quem atuam.
Salientamos, nessas entrevistas, o entre- Este trabalho apresenta alguns dados refe-
cruzamento dos valores relativos à infân- rentes aos questionários de “Avaliação das
cia, constituídos a partir das experiências Creches” preenchidos pelos Agente Auxi-
que marcaram a infância das professoras, liar, que atuam em cinco creches munici-
com os sentidos que estas atribuem à in- pais do Rio de Janeiro e que fazem parte da
fância vivida pelas crianças hoje – como se pesquisa Agente Auxiliar de Creche: Edu-
apresentam, seus saberes, suas práticas e cadores da Infância Carioca. Em 2007 hou-
suas relações com os adultos. Nesse diálo- ve um concurso público para esta função
go de temporalidades e gerações, temos (Edital nº1 de 04/08/2007), que desconsi-
observado, nos discursos das professoras, derou as premissas da LDB 9394/96 e não
um estado de perplexidade, com tom sau- exigiu nem mesmo o ensino médio na mo-
dosista, diante da quebra de uma imagem dalidade normal para trabalhar na educa-
tradicional da infância – subordinada ao ção infantil. Apesar de protestos contra a
adulto e inocente – devido à constatação efetivação do mesmo, a partir de junho de
de experiências e saberes manifestos pe- 2008, foram oferecidas 1.519 vagas regula-
las crianças hoje muito mais avançadas e res, e 81 para pessoas com deficiência e, a
complexas do que os de outras gerações partir de então, o quadro de pessoal das
e, por isso, considerados como fora de seu creches públicas passou a contar com no-
tempo. vos profissionais, marcando uma nova tra-
jetória na história dessas instituições.
Palavras-chave: infância contemporânea, Frente à nova realidade, sentimos necessi-
relações intergeracionais, professores. dade de investigar quem eram estes profis-
Contato: Dayane Aparecida do Nascimento, sionais e o que intencionavam ao fazer um
UFMT/Rondonópolis, dayane.an@hotmail.com concurso público. Assim surgiu através do
Núcleo de Estudos da Infância: Pesquisa &
Extensão (NEI:P&E) e na Linha de Pesquisa
Infância, Juventude e Educação do Progra-
ma de Pós-Graduação em Educação, da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(ProPEd/UERJ) a pesquisa que tem por ob-

215
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

jetivo acompanhar e analisar, junto com os to interno, projeto político pedagógico e


educadores a trajetória de formação em centros de Estudos), divisão multiplicidade
serviço dos mesmos e suas concepções so- de experiências e linguagens (desenvolvi-
bre criança, infância, educação e creche. mento infantil, respeito a valores familia-
Realizamos a partir de 2009, um trabalho res, etc), dimensão e interações, saúde e
conjunto com os educadores das cinco cre- prevenção de agravos, materiais e mobiliá-
ches e a Universidade. Dentre outras ações rios, formação e condições de trabalho e
propostas, desenvolvemos encontros cole- cooperação e troca com as famílias. Uma
tivos de formação continuada para os no- ANOVA nas questões objetivas em relação
vos profissionais em setembro, outubro, ao escore total do questionário demons-
novembro de 2009 e outubro 2010. Neste trou que houve diferença significativa en-
trabalho apresentaremos parte dos resul- tre as cinco creches F( 72 ) = 11,224; p <
tados desses encontros e de práticas refle- 0,004. Tal diferença foi marcada principal-
xivas realizadas em cada creche. O objetivo mente pelas creches 3 e 4 por apresenta-
desta apresentação é aumentar o foco, via rem menor média na avaliação total do in-
um olhar mais sistemático às respostas das ventário. Esse padrão de comportamento
práticas das educadores das 5 creche situ- se repetiu em muitas outras dimensões
adas na 1ª e na 3ª CRE do Rio de Janeiro. A avaliadas dentro do próprio questionário.
observação do dia-a-dia e as respostas das Dentro do eixo Planejamento Institucional,
crianças no cotidiano da instituição são foram analisadas as diferenças entre as
trazidas pelas co-pesquisadoras para o ló- creches em 4 subescores. Através da ANO-
cus universitário, através de sessões refle- VA no subescore Regimento Interno (RI)-4
xivas que acontecem de 15 em 15 dias no itens, encontramos diferença entre as cre-
(NEI:P&E – UERJ). O outro olhar foi a res- ches F(72,1)= 8,414477; p<001 atribuída
posta que os demais educadores deram as médias muito baixas das creches 1 e 2.
através do questionário, após dois anos da No subescore Proposta Pedagógica Conso-
pesquisa (2009 – 2010), que incluiu os lidada (PP)- 21 itens, não foi encontrada
Centros de Estudos Coletivos, realizados diferença significativa entre as creches
na UERJ. Foram 74 (setenta e quatro) edu- F(72)= 2,579672; p= 0,044939. No subes-
cadores em 123 que devolveram o ques- core Planejamento, Acompanhamento e
tionário respondido. São eles agentes auxi- Avaliação (PAA)- 4 itens, encontramos dife-
liares de creche, recreadoras e professoras rença entre as medias F(72)=10,03138; p<
articuladoras, divididas em 22 (vinte e 0,001, devido as baixas médias das creches
duas) na primeira creche; 12 (doze) na se- 4 e 5 e no subescore Registro da Pratica
gunda, 24 (vinte e quatro) na terceira, 12 Educativa (RP)- 3 itens encontramos dife-
(doze) na quarta e na quinta creche 9 renças entre as medias F(72)= 35,69113,
(nove) educadores (dos 34 atuantes). O p<0,001, devido a creche 1. Dentro do eixo
questionário foi composto com perguntas - Dimensão Multiplicidade de Experiências
abertas e objetivas, para avaliar tanto e Linguagem foram analisadas diferenças
questões da prática como questões rela- entre 3 subescores. No subescore Crianças
cionadas a estrutura básica de funciona- construindo sua autonomia e tendo expe-
mento das unidades. São sete eixos princi- riências saudáveis com o próprio corpo
pais: Planejamento institucional (regimen- (AE)- 3 itens a ANOVA demonstrou diferen-

216
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ça significativa F(72)= 11,61414; p<0,001 crianças (EM)- 3 itens F(72) = 9,36783;


atribuída as baixas médias das creches 3 e P<0,005 em função das baixas médias dos
4, do mesmo modo, no subescore Crianças itens 3 e 5 e no subescore Espaços, mobili-
relacionando-se com ambiente natural e ários e materiais para responder aos inte-
social (ANS)- 5 itens encontramos diferen- resses dos adultos (EMA) - 4 itens F(72) =
ça significativa F (72)=8,833919; p<0,001, 7,831102; P<0,005, em função das baixas
também em função das creches 3 e 4. Já médias dos itens 2, 3 e 5. Dentro do eixo -
no subescore Crianças expressando-se por Dimensão formação e condições de traba-
meio de diferentes linguagens plásticas, lho das professoras, professores e demais
simbólicas, musicais, teatrais, e corporais e profissionais a ANOVA não demonstrou
tendo experiências agradáveis variadas e diferença significativa no subescore For-
estimulantes com a linguagem oral e escri- mação inicial (FIP) – 3 itens, F(72) =
ta (LOE)- 5 itens não foram apresentadas 2,091485, p= 0,09143, mas por outro lado,
diferenças entre as 5 creches analisadas em função da baixa média da creche 4,
F(72)= 1,449122; p= 0,227418. Dentro do houve uma diferença significativa entre as
eixo - Dimensão Interações, foram analisa- creches no subescore Formação continua-
das diferenças entre 2 subescores: Respei- da e condições de trabalho adequada (FC)
to a dignidade, às diferenças, das crianças – 4 itens, F(72)=9,492752; P<0,005. Dentro
e estímulo a cooperação mútua (RD)- 3 do eixo Escore na Dimensão cooperação e
itens onde a ANOVA encontrou diferença troca com as famílias e participação na
entre as medias das creches F(72)= rede de proteção social, a ANOVA demons-
3,283955; p<0,05 em função da media trou diferença entre os grupos em função
muito baixa da creche 3 e Respeito a idéias das menores medias das creches 3 e 4 no
conquistas e produções das crianças (RCP)- subescore Respeito e Acolhimento (RA) – 4
2 itens onde em função das baixas medias itens F(72)=7,760763; P<0,005. Assim
das creches 3 e 4, também foi encontrada como também foi encontrada diferença no
diferença entre as médias F(72)=3,283955; subescore Garantia do direito das famílias
p<0,05. Dentro do eixo - Dimensão Promo- de acompanhar as vivencias e as questões
ção de saúde e prevenção de agravos, o ligadas as crianças (DF) – 5 itens F(72) =
subescore Constituição de hábitos alimen- 4,479957, p<0,005 atribuído a maior mé-
tares (HA)- 3 itens a ANOVA apresentou dia da creche 1. No subescore Participação
diferença entre as médias das creches da instituição na rede de proteção aos di-
F(72)=5,471698; p<0,005 em função de reitos da criança (DC) – 10 itens a diferença
baixas médias das creches 3 e 4 ao passo entre os grupos foi atribuída as menores
que o subescore Avaliação de riscos, segu- medias das creches 4 e 5, F(72) = 7,092314;
rança e medidas de prevenção de aciden- p<0,005. Uma ANOVA nas Diferenças entre
tes (RSP) - 6 itens, não apresentou diferen- os escores totais do questionário em rela-
ça entre as 5 creches estudadas F(72)= ção as funções (Recreador e Auxiliar) não
2,09616 ; P=0,090814. Dentro do eixo - Di- demonstrou diferença significativa F(70) =
mensão Espaços materiais e mobiliários a 1,865164 p = 0,176465 Estes dois olhares
ANOVA demonstrou diferença significativa (respostas das co-pesquisadoras e avalia-
no subescore Espaços, mobiliários e mate- ção quantitativa do questionário) nos de-
riais que favorecem as experiências das monstraram que houve uma dualidade de

217
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

respostas, entre as observações das co- em tempos distintos, definem e significam


-pequisadoras, que levantam a questão da o que caracteriza a infância nos dias de
discrepância entre a proposta da formação hoje. Ao recusar-se a conceber a infância
continuada e o que acontece no dia-a-dia como tempo de vida em transição para a
das creches e as respostas dadas aos ques- vida adulta, esta pesquisa tem como fun-
tionários pelas educadoras. Apesar das damentação teórica os estudos realizados
respostas dos questionários e as observa- no campo da Sociologia da Infância, que
ções das co-pesquisadoras não correspon- busca compreender os fenômenos sociais
derem, compreendemos que quando elas e culturais a partir da infância, admitindo
nos informam questões distintas das que que a criança não apenas se apropria de
ocorrem no cotidiano, estão demonstran- uma cultura que já encontra constituída,
do conhecimento de como deveria ocor- mas nesta também opera transformações
rer. Externando pelo menos a intenção de ao interpretá-la e a partir dela produzir
realizar melhor no futuro. práticas sociais (Sarmento, 2008). Nessa
perspectiva teórica, dois enfoques assu-
Palavras-chave: avaliação, creche, educadores mem relevância: por um lado, as crianças
e formação continuada. são vistas como atores sociais em seus
mundos de vida e, por outro, a infância
se define como uma categoria geracional
LT04-1348 - A INFÂNCIA NA PERSPECTIVA socialmente constituída. Regida por esses
DAS CRIANÇAS vieses teóricos, esta pesquisa busca com-
Rayssa Karla Dourado Porto - UFMT preender a infância na contemporaneida-
rayssa90@gmail.com de numa perspectiva intergeracional, en-
Rayany Mayara Dal Prá - UFMT tendendo que os adultos em questão são
ray_may_@hotmail.com os professores, sujeitos que assumem a ta-
Raquel Gonçalves Salgado - UFMT refa de educar as crianças, também parti-
ramidan@terra.com.br cipantes da pesquisa. Este subprojeto, em
Financiamento: FAPEMAT particular, tem como foco as experiências
que as crianças constroem a partir dos di-
As experiências, os saberes e as compe- versos aparatos culturais que circulam na
tências que as crianças hoje revelam em cultura contemporânea, bem como os sen-
suas interações cotidianas com os meios tidos e os valores que atribuem a essas ex-
de comunicação, cada vez mais integrados periências. Busca-se, portanto, compreen-
às novas tecnologias, têm feito com que os der como as crianças definem e significam
nossos saberes sobre a infância, na maio- o que, para elas, é próprio da infância tal
ria das vezes assentados como “verdades”, como se apresenta hoje. Este estudo pre-
sejam postos em xeque. Este trabalho con- tende problematizar as verdades e as au-
siste em um subprojeto de uma pesquisa toimagens, como destaca Arroyo (2008),
que busca compreender a infância con- do pensamento pedagógico ao se deparar
temporânea a partir do diálogo entre os com as experiências concretas da infância,
sentidos que crianças e adultos produzem marcadas pela época e pela cultura em
sobre esse fenômeno, ou seja, como esses que são produzidas. Tem se tornado cada
sujeitos, nas suas singularidades e situados vez mais insustentável a manutenção de

218
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

imagens e discursos sobre a infância, so- infância; o que uma criança pode ou não
bretudo aqueles que, produzidos no cam- saber/fazer. Busca-se, com esta pesquisa,
po da psicologia do desenvolvimento, vão desconstruir, tanto teoricamente quanto
ganhar corpo no pensamento e na prática metodologicamente, a idéia de uma infân-
pedagógica, sem a confrontação com os cia apartada da vida, das experiências e
modos como as crianças concretas vivem das culturas produzidas pelas crianças, no
e significam suas próprias experiências. A sentido de redimensioná-la como um tem-
pesquisa, em sua abordagem metodoló- po da vida humana cujo valor e significado
gica, define-se como uma pesquisa-inter- não se efetivam prospectivamente, mas se
venção, na qual as relações estabelecidas configuram no próprio exercício de vivê-lo.
com as crianças são, ao mesmo tempo, Assim, objetiva-se identificar nos discur-
foco de análise e uma postura diante da sos das crianças as experiências que elas
realidade investigada, posto que são ins- próprias assumem como legítimas de seu
tauradas situações desencadeadoras dos tempo de vida. Nas oficinas desenvolvidas,
discursos em torno do objeto em questão até então, observou-se que as crianças,
– a infância. Desse modo, as crianças não diante de figuras de objetos e imagens,
são apenas informantes de dados, mas se que, em grande parte, poderiam ser consi-
apresentam como sujeitos que constroem deradas como próprias do universo adulto,
conhecimentos e refletem sobre suas pró- as definem, na maioria das vezes, como
prias concepções, valores e experiências pertencentes tanto à infância quanto à
no processo de pesquisa. O locus da pes- vida adulta, quando instigadas a situá-las
quisa é o Laboratório Especial de Ludicida- como “coisas” de crianças, de adultos ou
de (Brinquedoteca) do Campus de Rondo- dos dois. Estamos diante de um estreita-
nópolis da Universidade Federal de Mato mento das fronteiras entre esses mundos.
Grosso, que tem oferecido, desde 2008, na Cada vez mais, torna-se evidente a parti-
condição de programa de extensão, aten- cipação das crianças em situações sociais
dimento a instituições de Educação Infantil antes não acessíveis a elas, construindo
da rede pública municipal de Rondonópo- experiências e conhecimentos não previ-
lis, Mato Grosso, situadas nas imediações síveis em décadas passadas. Diante disto,
do Campus. Atualmente, participam da perguntamo-nos: que implicações éticas
Brinquedoteca três escolas municipais de e educativas esse novo mapeamento da
Educação Infantil, que atendem crianças infância em sua relação com a vida adulta
na faixa etária de 4 a 6 anos. Entretanto, nos traz? Como estabelecer, no campo da
da pesquisa participam apenas três turmas educação, um diálogo entre as gerações
de 2º agrupamento, com crianças de 5 a marcado pelo reconhecimento do outro,
6 anos, sendo duas de uma escola e uma ao mesmo tempo, como singular e legíti-
de outra. Consistem em estratégias meto- mo? Estas são questões que mobilizam a
dológicas a observação participante das pesquisa que aqui se apresenta.
brincadeiras e das interações das crianças
no contexto da Brinquedoteca e a realiza- Palavras-chave: infância, contemporaneidade,
ção de oficinas, como espaços de discus- relações intergeracionais
são sobre questões como: o que significa Contato: Rayssa Karla Dourado Porto, UFMT/
ser criança; o que é ou não próprio da Rondonópolis, rayssa90@gmail.com

219
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1445 - CONCEPÇÕES DE orientação de um adulto ou em colabora-


PROFESSORES SOBRE EDUCAÇÃO ção com companheiros mais capazes”. De
INCLUSIVA: UM EXERCÍCIO DE acordo com esse conceito, o autor defende
INVESTIGAÇÃO que o processo de ensino-aprendizagem
Pedro Mar Rebello - UnB na escola deve ser construído na zona de
Luísa Pereira Nishioka - UnB desenvolvimento proximal, tomando como
Carolina Braga Cunha - UnB ponto de partida o nível de desenvolvimen-
Bruna Pedrosa Mundim - UnB to real da criança - num dado momento e
Lúcia Helena Cavasin Zabotto Pulino - UnB com relação a um determinado conteúdo
pedrom.rebello@gmail.com a ser desenvolvido - e como ponto de che-
gada o nível de desenvolvimento potencial,
O que é uma criança? O que é uma criança que são os objetivos estabelecidos pela
com problema de desenvolvimento? Em escola, supostamente adequados à faixa
que aspectos estas crianças se diferem? etária e ao nível de conhecimentos e ha-
Será que deve haver um tratamento dife- bilidades de cada grupo de crianças. Des-
rencial para crianças portadoras de neces- ta forma, uma criança com problemas de
sidades especiais? Tais questionamentos desenvolvimento é vista como uma criança
foram motivadores para este exercício de cujo processo de desenvolvimento pode
investigação, que tem como objetivo co- ser marcado por uma especificidade, o que
nhecer a concepção dos professores sobre não impede os processos mediacionais
as escolas inclusivas, e é de extrema impor- que promovem a sua educação, da mesma
tância para isso o pensar sobre o conceito forma como ocorre com todas as outras
de crianças com problemas de desenvolvi- crianças. Vygotsky (1993) enfatiza que uma
mento, já que é a partir desta concepção condição de deficiência não impossibilita o
que os professores vão trabalhar com tais desenvolvimento da criança, e que a noção
crianças. Para que os professores das es- de que um portador de deficiência se tor-
colas inclusivas possam trabalhar de forma na um cidadão incapaz é uma construção
igualitária com os alunos, é preciso que social e que a própria criança pode se apro-
eles conheçam o processo de desenvolvi- priar dessa ideia. Esta pesquisa foi realizada
mento de uma criança. Segundo Vygostsky como trabalho final da disciplina Psicologia
(1984), o desenvolvimento deve ser pen- da Infância, ministrada para alunos do se-
sado em dois níveis: o nível de desenvol- gundo semestre do curso de psicologia na
vimento real e o nível de desenvolvimento Universidade de Brasília. Utilizou-se me-
potencial. No real, considera-se o que uma todologia qualitativa. Participaram deste
pessoa já tenha alcançado e no potencial, estudo duas professoras de diferentes es-
aquilo que se espera que ela alcance. A colas inclusivas, sendo que a entrevistada
zona de desenvolvimento proximal neste 1 lecionava em uma escola associativa de
contexto, sustenta o teórico, “é a distância educação infantil localizada em um bairro
entre o nível de desenvolvimento real, que nobre de Brasília (DF) e a entrevistada 2 le-
se costuma determinar através da solução cionava em uma escola pública de ensino
independente de problemas, e o nível de fundamental localizada no município de
desenvolvimento potencial, determina- Duque de Caxias (RJ). As professoras foram
do através da solução de problemas sob escolhidas por terem dado aula para crian-

220
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ças com problemas de desenvolvimento ferenças e demonstrou preocupação com a


em contextos diferentes. Na entrevista, foi possibilidade de um preparo formal limitar
utilizado um roteiro de questões orienta- a visão dos profissionais às teorias aprendi-
das para uma entrevista semiestruturada das, cegando-os para as crianças reais com
contendo oito perguntas que focalizavam quem estariam trabalhando, enquanto a
as seguintes dimensões: concepção do que professora 2 afirmou que um preparo for-
é ser professor, ser criança, ser uma crian- mal é essencial para um trabalho adequa-
ça com problema de desenvolvimento, ser do com tais crianças. Além disso, a primeira
professor de uma criança com problemas entrevistada enfatiza que as diferenças de
de desenvolvimento e concepção sobre cada criança devem ser trabalhadas em
escolas inclusivas. Por meio das entrevis- toda a turma de forma a evitar qualquer
tas pode-se constatar que as professoras segregação. A segunda entrevistada acres-
partilhavam concepções semelhantes. centa que todos possuem problemas de
Ambas apresentaram a visão de criança desenvolvimento, na medida em que todos
como um novo ser que chega ao mundo já possuem desenvolvimentos distintos em
construído, como indivíduos que possuem diferentes áreas e que ninguém nunca fica
sua singularidade, individualidade e espe- pronto, acrescentando também que a rela-
cificidades, de forma que as crianças com ção dos alunos com os professores é dialé-
problemas de desenvolvimento devem ser tica e que os professores estão constante-
consideradas crianças como outras quais- mente aprendendo com seus alunos justi-
quer. Elas ressaltaram que o desenvolvi- ficando uma relação menos hierarquizada
mento não é linear e que cada criança tem nas salas de aula. Conclui-se que a questão
seu ritmo e seu caminho, de forma que da inclusão é mais complexa do que mera-
o professor possui a função de trabalhar mente o cumprimento de uma lei; é uma
cada uma em sua individualidade. Segun- questão de transformação do pensamento
do elas, o professor tem uma função mais das pessoas, pois inclusão não é apenas a
ampla do que a de passar conhecimentos; inserção da criança nas escolas regulares,
enfatizam a importância de se ter uma re- mas proporcionar a sua inclusão dentro do
lação de afetividade com os alunos e de contexto escolar. É necessário que o profes-
respeitar as diferenças que se apresentam. sor perceba a singularidade de cada crian-
Elas concordam também na importância ça a fim de adaptar as atividades escolares
da integração de todos na sociedade e no para que esta possa participar juntamente
papel fundamental que escolas inclusivas com as outras crianças. Dessa forma, ela
desempenham nesse âmbito, mas que, em poderá desenvolver suas habilidades de
sua maioria, as escolas não são inclusivas, acordo com o seu ritmo de desenvolvimen-
pois não possuem condições para lidar to, além de poder estabelecer contato com
com a diversidade. As entrevistadas tive- um novo ambiente, diferente do que ela
ram visões diferentes no que diz respeito à está acostumada.
necessidade de um preparo especializado
para professores que lidam com crianças Palavras-chave: educação inclusiva; professor;
portadoras de necessidades especiais: a desenvolvimento
professora 1 acredita que o preparo deve Contato: Pedro Mar Rebello, UnB, pedrom.
vir naturalmente da convivência com as di- rebello@gmail.com

221
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1469 - TDAH: UMA ANÁLISE é facilmente distraído por estímulos exter-


DA ESPECIFICIDADE DO TRABALHO nos, tem dificuldades de esperar sua vez
PEDAGÓGICO em brincadeiras ou em situações de gru-
Evanilda da Silva Correia - FACITEC pos, dispara respostas para perguntas que
nildinha_eva@yahoo.com.br ainda não foram completadas, tem dificul-
Helen Tatiana dos Santos Lima - FACITEC/SEEDF dades em seguir instruções e ordens e tem
helen.tatiana@hotmail.com dificuldades em manter a atenção em tare-
fas ou mesmo atividades lúdicas. Frequen-
Sabe-se que o Transtorno de Déficit de temente, muda de uma atividade inacaba-
Atenção e Hiperatividade (TDAH) interfere da para outra, não conseguindo brincar em
diretamente na vida social e no desempe- silêncio ou tranquilamente e; na maioria
nho acadêmico dos sujeitos nesta condi- das vezes, fala em excesso. Já o TDAH do
ção. Atualmente, a Associação Brasileira tipo combinado, ainda conforme a autora,
de Déficit de Atenção (ABDA), chegou a é aquele que reúne, no mínimo, seis ou
conclusão que o quadro é um transtorno mais sintomas de desatenção associados
neurobiológico cerebral, que acompanha a outros seis de hiperatividade e impulsi-
vários indivíduos desde a infância até a vidade. Silva (2003) afirma que a maioria
idade adulta, e que cerca de 3 a 5 % das das crianças ou adolescentes que possuem
crianças em idade escolar sofrem desse o transtorno, se enquadra nessa última ca-
mal (Silva, 2003). Os sintomas do qua- tegoria. Cabe ressaltar que a criança com
dro podem variar a depender do tipo de o transtorno, independente do tipo, pode
transtorno apresentado pelo sujeito que, desenvolver normalmente sua capacidade
conforme o DSM IV (Silva, 2003), pode ser cognitiva. No entanto, Bee (2003) enfoca
predominante desatento, predominante que estas crianças podem ter uma baixa
hiperativo ou combinado. Em ambos os autoestima caso não seja acompanhada
casos, tais sintomas podem comprometer de forma diferenciada pelo professor no
a vida social e escolar do sujeito. Assim, o que tange ao desempenho escolar. A au-
TDAH predominante desatento, de acordo tora defende que esta criança necessita de
com Silva (2003), é aquele que apresenta uma interação sadia entre família, escola e
falta de atenção; está passivo de erros por o meio onde vivem, para que o transtorno
pequenos descuidos, tanto nas tarefas es- não afete sua estrutura cognitiva, social e
colares como em outras; tem dificuldade cultural no futuro. Para tanto, Silva (2003)
para concluir tarefas; evita atividades que alega que o trabalho pedagógico necessita
exigem esforços mentais e frequentemente ser reorganizado para atender a especifici-
perde objetos pessoais. Rotta et al. (2006) dade dessa criança. Dorneles (2000) corro-
acredita que os alunos desatentos são os bora afirmando que estudantes com TDAH
mais prejudicados com relação ao apren- necessitam de intervenções para que suas
dizado, uma vez que esse transtorno é o dificuldades comportamentais e acadêmi-
que mais influi negativamente na dimen- cas sejam amenizadas. Para isso, segundo o
são cognitiva. O TDAH do tipo hiperativo, autor, os professores precisam perceber as
segundo Silva (2003), é aquele que, com áreas a serem trabalhadas com seus alunos
frequência, mexe ou sacode pés e mãos, se e, com a ajuda de psicólogos e psicopeda-
remexe nos acentos, se levanta da carteira, gogos, descobrir as dificuldades e facilida-

222
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

des vividas pelos mesmos, afim de elaborar não envolvem apenas o professor, mas, a
um planejamento e um programa de inter- família, a criança e toda a comunidade es-
venção acertada. O docente deve, também, colar. Por isso, a interação entre essas par-
saber utilizar a comunicação assertiva; dar tes é de extrema importância, uma vez que
ordens de modo cortês, mas com firmeza e ela reflete diretamente no fracasso ou su-
sempre olhar para a criança antes de emitir cesso escolar do educando.
uma frase ou advertência. Além disso, ele
deve ser democrático, compreensivo, ami- Palavras-chave: Transtorno de Déficit de
go e empático. É importante, portanto, que Atenção e Hiperatividade; Professor; Trabalho
o professor desenvolva recursos de ensino Pedagógico.
para descobrir o estilo de aprendizagem de Contato: Helen Tatiana dos Santos-Lima;
cada sujeito, de modo que possa favorecer FACITEC/ SEEDF; helen.tatiana@hotmail.com
um desempenho escolar mais satisfató-
rio. Sabendo disso, este estudo se propôs
a identificar a forma pela qual o professor LT04-1480 - FOTOGRAFIA E FAZ DE CONTA
trabalha com os alunos que tenham esse Aline do Carmo Oliveira - IESB
transtorno. Para isso, foi realizada uma alinecarmo1@yahoo.com.br
pesquisa qualitativa, por meio de entrevis- Emanuelle Mendes das Chagas - IESB
tas com 3 professoras dos anos iniciais do psicoeste@gmail.com
Ensino Fundamental de uma escola da rede Alice Araujo Costa - IESB
pública de ensino do DF. Os resultados da psicoeste@gmail.com
pesquisa evidenciaram que as professoras Rafael dos Reis Braga - IESB
identificam a necessidade do desenvolvi- psicoeste@gmail.com
mento de estratégias pedagógicas específi- Anaí Haeser Peña - IESB/UnB
cas para com o aluno com TDAH para que anai.hp@gmail.com
haja uma aprendizagem favorecida. Pode-
-se pensar que, na dinâmica pedagógica, Muitas vezes conhecida como uma das
tais concepções são colocadas em prática, formas mais comuns do comportamento
pois elas relatam que sua ação é norteada humano, especialmente durante a infância,
pelo trabalho diversificado, em que usam a brincadeira marca a vida de muitas crian-
recursos diferentes para promover a apren- ças em diferentes sociedades, constituindo
dizagem deste aluno, imagens, movimen- uma prática cultural típica dessas crianças.
tos, histórias, brinquedos lúdicos, músicas Criatividade e espontaneidade casam-se
e jogos. Entretanto, elas denunciam as di- na brincadeira, ao mesmo tempo em que
ficuldades encontradas para trabalhar com regras sociais e morais são exercitadas e
esse aluno, dentre as quais citam a falta de testadas e aprendizagens são construídas.
apoio da instituição escolar, o pouco recur- Segundo Siaulys (2005), a brincadeira per-
so didático disponível e o grande número mite à criança vivenciar o lúdico e desco-
de alunos em sala. Assim, pode-se concluir brir a si própria, pois nessa atividade ela
que ensinar a criança com esse transtorno apreende a realidade ao mesmo tempo em
pode ser uma tarefa difícil se as posturas que se desenvolve. Dito de outra maneira,
e medidas necessárias não forem tomadas. através do brincar a criança se humaniza,
Entretanto, entende-se que estas medidas no sentido de constituir uma forma de

223
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

participação cultural, de permitir o conta- de maneira diferente em relação ao que


to e o exercício com atividades e forma de vê. Assim, é alcançada uma condição que
funcionamento da comunidade na qual a começa a agir independentemente daquilo
criança está inserida. Vygotsky (1998) afir- que vê.” (Vygotsky, 1998, p. 127). A partir
mou que o sujeito se constitui nas relações do exposto, verifica-se a fundamental im-
com os outros, por meio de atividades ca- portância da brincadeira para o desenvolvi-
racteristicamente humanas, mediadas por mento infantil ao permitir a transformação
ferramentas técnicas e semióticas. A brin- e produção de novos significados. Vygotsky
cadeira infantil, nesta perspectiva, assume (1998) defende que a criação de situações
uma posição privilegiada para a análise do imaginárias na brincadeira surge a partir da
processo de constituição do sujeito, pois tensão entre o indivíduo e a sociedade. A
constitui uma atividade em que, tanto os brincadeira libera a criança das amarras da
significados social e historicamente pro- realidade imediata e oferece a oportunida-
duzidos são construídos, quanto novos de de controlar uma situação existente (Ce-
podem ali emergir. A brincadeira e o jogo risara, 2002). A fotografia, por seu turno,
de faz-de-conta seriam considerados como pode ser definida como um verdadeiro ato
espaços de construção de conhecimentos icônico (Dubois, 1993), um encontro entre
pelas crianças, na medida em que os signi- o ato de fotografar um objeto ou cena em
ficados que ali transitam são apropriados circunstâncias específicas, com o ato de sua
por elas de forma específica. Paralelamen- percepção e contemplação. O fotografar
te, os objetos com os quais a criança se re- permite a recriação da realidade, pois apre-
laciona são significados em sua cultura e a sentam um recorte da realidade realizado a
relação estabelecida com eles se modifica partir de uma intenção específica daquele
à medida em que a ela se desenvolve. Des- que fotografa.
sa maneira, num primeiro momento essa O presente trabalho apresenta análises
relação é marcada pela predominância de preliminares de um estudo que tem como
sentidos convencionais, característicos da objetivo identificar o papel da fotografia
cultura em que está inserida, de tal forma como instrumento em brincadeiras de faz
que o objeto diz para a criança, de certa de conta, em duas situações diferentes:
forma, como deve agir. Com o passar do uma na qual as crianças são ao mesmo
tempo, de modo gradativo, a relação entre tempo os fotógrafos e os fotografados, e
objeto significado e ação se altera, tendo outra em que são fotografadas em situação
a brincadeira um lugar de destaque nessa de brincadeira de faz de conta com a par-
mudança. Na situação da brincadeira há ticipação de um adulto. As duas situações
mudança na relação da criança com os ob- são apresentadas para as crianças como
jetos, pois estes perdem sua força determi- brincadeiras. Na primeira situação as crian-
nadora. Dessa maneira, ao brincar a crian- ças são incentivadas a brincar de fazer caras
ça pode dar outros sentidos aos objetos e expressando sentimentos ou a fazer care-
jogos, partindo de sua própria ação, de sua tas em frente a uma webcam e aprendem
imaginação, da trama de relações que esta- a tirar fotos de si mesmas fazendo essas ca-
belece com os amigos com os quais produz ras ou caretas. Depois de um momento de
novos sentidos e os compartilha (Cerisara, aprendizagem e ambientação das crianças
2002). “A criança vê um objeto, mas age são deixadas a vontade e sem a presença

224
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do adulto para brincar e tirar fotografias sabe da importância de comprar as mer-


utilizando a webcam. A situação de brin- cadorias que necessitam, ao contrário do
cadeira de faz de conta com a participação consumista, que compra constantemen-
de adulto consistiu na escolha livre, pelas te produtos supérfluos, seja pelo simples
crianças, de situações para brincarem e re- prazer de comprar ou para mostrar o seu
presentarem. As crianças escolheram brin- poder financeiro frente ao seu grupo so-
car que eram, por exemplo, o Zeca Urubu cial. Os consumidores adultos têm uma
e o Pica-pau em uma situação em que um grande responsabilidade não apenas com
engana o outro, em outro momento brin- a sustentabilidade do planeta, mas, so-
caram de Chapeuzinho Vermelho e Lobo bretudo, com os modelos de comporta-
Mau, e em outro de super-heróis. As ce- mentos transmitidos as crianças. Os pais
nas eram fotografadas tanto pelas crianças ou responsáveis devem ter a consciência
quanto pelo adulto presente. Em ambos os de que a família é o primeiro contexto de
casos as fotografias são apresentadas às socialização da criança e, portanto, ela vai
crianças, que as vezes as identificam como adquirir valores e crenças acerca da vida
produto ou continuidade da brincadeira. e do mundo a partir de suas primeiras re-
lações. Deste modo, é fundamental que
Palavras-chave: faz de conta, brincadeira, os pais demonstrem aos filhos comporta-
fotografia, desenvolvimento mentos de consumo condizentes com suas
Contato: Aline Do Carmo Oliveira, IESB, condições sociais e necessidades. Estudos
alinecarmo1@yahoo.com.br mostram que pais que consumem em ex-
cesso, sejam roupas, alimentos, utensílios
para casa e carro influenciam negativa-
LT04-1513 - PERCEPÇÃO DAS MÃES mente no comportamento dos filhos que,
ACERCA DO CONSUMO INFANTIL provavelmente, vai se tornar uma criança
Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB consumista. A literatura também aponta
eugenia_gba@hotmail.com que pais consumistas geralmente negli-
Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB genciam os filhos e tornam-se permissivos
patynfonseca@hotmail.com do consumo infantil. Na atualidade, há um
Walkyria dos Santos Farias Machado - UFPB crescimento considerável no consumo por
psi_walkyriafarias@hotmail.com parte de crianças, isto tem preocupado
Vivian Kelle Lau Alves - UFPB profissionais de diversas áreas, tais como:
vivian.e@gmail.com psicólogos, educadores, psicopedagogos,
Nájila Bianca Campos Freitas - UFPB sociólogos, nutricionistas e médicos. Tem-
najila.bianca@hotmail.com -se constatado que o consumo em excesso
tem provocado uma série de problemas à
Nas últimas décadas, percebe-se um au- vida das crianças, especialmente, de natu-
mento significativo do consumo em todo reza física, emocional e social. As crianças
o mundo, motivado principalmente pela estão mais propensas a se alimentarem
sociedade capitalista. As empresas inves- inadequadamente, frente à infinidade de
tem muito em produção de bens e anún- opções de comidas, muitas delas gordu-
cios publicitários para atrair cada vez mais rosas sem nutrientes necessários e impor-
o consumidor. O consumidor consciente tantes para a saúde infantil. A isto, tem sur-

225
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gido um aumento no número de crianças contendo quatro questões relacionadas


obesas e com doenças adquiridas a partir ao consumo infantil, especificamente, em
da má alimentação, levando-as a aumen- relação à alimentação, aos brinquedos, a
tar as fileiras dos grupos de risco. O consu- filmes e ao lazer. Na oportunidade foi co-
mo também prejudica a vida emocional da municado que o estudo era voluntário e
criança uma vez que o brinquedo ou o jogo que o nome dos participantes seria manti-
nada mais é do que um substituto da aten- do em sigilo. Foi feito uma análise quanti-
ção e amor dos pais. Na atual realidade tativa das respostas maternas. Os resulta-
social, a criança não é mais um sujeito que dos mostraram que, segundo as mães, as
depende exclusivamente das escolhas do crianças consomem na alimentação mais
adulto na hora de comprar, mas um cliente chocolate (20,8%), refrigerante (16,6%)
decidido, que opina e consome. As crianças e bombons (16,6%); nas compras, conso-
tem se tornado um público exigente quan- mem mais brinquedos (28%) e bonecas e
to ao consumo, pois muitas delas querem bonecos (25%); no lazer, pedem para sair
adquirir objetos de marca consolidada para parques (28,5%) e pizzaria (17,3%).
no mercado. Para assegurar ainda mais o Na aquisição de filmes infantis, as meni-
comportamento consumista da criança, as nas pedem para comprar mais da Barbie
empresas estão investindo em diversidade (17,8%) e os meninos do BEM 10 (17,8%).
de produtos e publicidade voltada para o Conclui-se que o consume das crianças
mundo infantil, especialmente no que se tem sido um comportamento cada vez
referem a brinquedos, alimentos, roupas, mais comum na nossa sociedade, mesmo
objetos de uso pessoal, etc. Há uma varie- em idades tão precoces as crianças deci-
dade de produtos que encantam os olhos e dem e ordenam que os pais correspondam
o paladar da criança. Frente ao crescimen- as suas exigências. Pode-se constatar que,
to do consumo infantil, o Instituto Alana, na alimentação, as crianças demonstram
tem desenvolvido ações relacionadas ao consumir alimentos sem nutrientes neces-
fomento de uma consciência crítica na so- sários ao perfeito funcionamento do orga-
ciedade a respeito do consumo de produ- nismo, ao mesmo tempo em que mostra a
tos e serviços por crianças e adolescentes passividade das mães em corroborar com
e, principalmente, atividades que buscam o filho e não impor as regras de uma boa
debater e apontar meios de minimizar os alimentação. No quesito compras, perce-
impactos negativos do consumismo na in- be-se que os brinquedos e as bonecas/
fância. O presente trabalho teve por obje- bonecos foram os que se sobressaíram,
tivo verificar o comportamento consumis- isto pode indicar que apesar do consumo,
ta das crianças da segunda infância, espe- as crianças da faixa etária do estudo prefe-
cialmente no que se referem a brinquedos, rem este tipo de brinquedo até porque es-
alimentos, filmes e passeios. Participaram tão na época propícia ao desenvolvimento
20 mães com idades entre 25 a 45 anos. das representações simbólicas. No que se
Moravam no interior do estado da Paraí- refere às compras de objetos, constata-se
ba, onze eram profissionais autônomas, a escolha pela marca consolidada da mer-
sete eram donas de casa, uma assistente cadoria, o que revela ser um consumidor
administrativa e uma técnica enfermagem. bastante exigente e até disposto a pagar
Todas tinham filhos com idade entre 3 e 5 mais caro pelo produto. Então, observa-se
anos. Elas responderam um questionário a necessidade de uma discussão sobre o

226
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tema, seja através de campanhas na mídia transmissão da informação. Alguns autores


ou nas escolas, a fim de promover uma mostram que as escolas que adotaram a
reflexão da sociedade, especialmente, de perspectiva de escola como uma comuni-
pais e professores sobre a importância de dade possibilitaram um desenvolvimento
se ter um consumo consciente e o reflexo interpessoal e intrapessoal aos alunos. Com
do consumismo no desenvolvimento da isso, os alunos reduziram os conflitos inter-
formação da personalidade, dos hábitos e pessoais e tiveram maior interesse pelos
dos comportamentos sociais. outros, demonstrando aceitação e confian-
ça nos valores democráticos. Evidenciou-
Palavras-chave: Consumo, crianças, educação -se ainda o envolvimento dos alunos em
infantil. atividades de grupo e um elevado desem-
Contato: Patrícia Nunes da Fonseca, UFPB, penho acadêmico. Como se pode perce-
patynfonseca@hotmail.com ber, o senso de comunidade é um fator de
integração na medida em que promove o
envolvimento entre estudantes na sala de
LT04-1516 - ESCOLA COMO aula e na escola como um todo, a ponto
COMUNIDADE: COMPARAÇÃO destes adotarem as normas e os valores
SOCIODEMOGRÁFICA da escola como uma ação comum. O sen-
Jaciara de Lira Almeida Dantas - UFPB, so de comunidade na sala de aula envolve
jaciaraadantas@hotmail.com dois elementos principais: (a) a percepção
Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB de ajuda e trabalho coletivo em prol de um
patyfonseca@hotmail.com objetivo comum, e (b) a percepção de que
José Farias de Souza Filho - UFPB cada aluno deve contribuir significativa-
farias.mp@hotmail.com mente para o crescimento da classe como
Nájila Bianca Campos Freitas - UFPB um todo. A percepção e avaliação que os
najila.bianca@hotmail.com jovens formavam acerca da escola, das ati-
Samara Pereira Cabral - UFPB vidades nela desenvolvidas e do seu papel
samarapc@hotmal.com na sua vida, verificaram que as percepções
positivas destes jovens estavam diretamen-
Em todas as culturas há sistemas organi- te correlacionadas com a participação em
zados, de maior ou menor complexidade, atividades extra-curriculares, com o ato de
que preparam os jovens para sua incorpo- pegar livros emprestados na biblioteca e de
ração à sociedade. Entretanto, na socieda- estudar com outros colegas da escola. Em
de brasileira, por exemplo, as escolas são, contrapartida, identificaram uma correla-
por excelência, a instituição encarregada ção inversa com gazear aulas e desrespeito
de transmitir conhecimentos, normas e aos professores. Assim, buscando-se com-
valores da cultura, fontes basilares para o preender melhor a realidade brasileira, es-
desenvolvimento adequado do jovem e de pecificamente de João Pessoa/PB, decidiu-
sua inserção à sociedade. A escola consti- -se realizar um estudo com o objetivo de
tui-se um contexto de socialização, que é verificar se há diferenças na percepção dos
presumivelmente, distinto do contexto fa- jovens acerca da escola como comunidade,
miliar. A diferença baseia-se em padrões de considerando o sexo, a faixa etária e o tipo
comportamentos, regras de interação, mé- de escola (particular vs. pública). Partici-
todos de comunicação e procedimentos de param deste estudo 242 jovens matricula-

227
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos regularmente no ensino fundamental hoc de Bonferroni revelando que os jovens


(23,1% e 38,4% cursavam a 6ª e 8ª séries, de 6ª série do ensino fundamental obtive-
respectivamente) e médio (38,5% estavam ram maior média neste fator (m = 3,36) do
cursando o 2º ano). A maioria foi do sexo fe- que aqueles do 2º ano do ensino médio (m
minino (57,7%) e de escola privada (53,7%) = 2,89). Por outro lado, o sexo teve efeito
de João Pessoa, PB. Os participantes ti- principal em relação ao fator influência [F
nham idades entre 11 e 20 anos (m = 14,3; (1, 229) = 2,59, p = 0,04], em que os rapazes
dp = 1,88). Esta foi uma amostra de conve- obtiveram pontuação maior (m = 2,68) do
niência, não probabilística, tendo partici- que as moças (m = 2,46). Nenhum efeito de
pado os jovens que, presentes nas salas de interação foi observado entre as três variá-
aula visitadas e tendo sido requeridos a co- veis consideradas. Os estudantes de séries
laborar, decidiram formar parte do estudo. mais elementares tendem a apresentar
Os participantes responderam a Escala de melhor percepção da escola como comuni-
Percepção da Escola como Comunidade. Os dade do que os de séries mais avançadas.
dados foram analisados no O Statistical Pa- Isso foi exatamente o que se observou no
ckage for the Social Sciences (SPSS). Foi re- presente estudo, em que os estudantes de
alizada uma MANOVA para medidas repe- 6ª série apresentaram médias maiores do
tidas, observando-se diferenças entre suas que aqueles da 8ª série (ensino fundamen-
pontuações [Lambda de Wilks = 0,73, F (2, tal) e do 2º ano do ensino médio. Contudo,
240) = 43,70, p < 0,001]. O teste post hoc de o fizeram unicamente no fator colaboração,
Bonferroni relevou que as pontuações dos ajuda e proximidade. É provável que os alu-
participantes diferiram entre os três fatores nos das séries iniciais mostrem um envolvi-
(p < 0,001), na ordem apresentada: colabo- mento maior com a escola, tendo melhor
ração, ajuda e proximidade (m = 3,1, dp = relação com seus colegas e administrado-
0,80), relações interpessoais positivas (m res da instituição, além de apresentarem
= 2,7, dp = 0,77) e influência do estudante um bom rendimento acadêmico. Isto pos-
(m = 2,5, dp = 0,77). Um passo seguinte foi to, demonstram ser mais responsáveis e
conhecer a influência de três variáveis de- ajustados ao contexto escolar, ou ao menos
mográficas em relação às pontuações dos mais obedientes, cumpridores de normas
participantes, a saber: tipo de escola (pú- sociais convencionais. Por outro lado, os
blica versus privada), série (6ª e 8ª séries alunos de séries mais avançadas podem es-
do ensino fundamental e 2º ano do ensino tar começando a se interessar por ativida-
médio) e sexo. Neste sentido, realizou-se des extraescolares (por exemplo, shoppin-
uma MANOVA considerando como variá- gs, namoro, campeonatos), o que diminui a
veis critérios os três fatores de percepção probabilidade de apresentarem um padrão
da escola como comunidade, e as variáveis consistente de percepção da escola como
demográficas como antecedentes. Duas comunidade, haja vista que esta pode ser
destas variáveis apresentaram efeitos prin- menos influente nas suas vidas do que ou-
cipais: série [Lambda de Wilks = 0,94, F (3, tros grupos ou instituições de referência.
454) = 2,38, p = 0,03] e sexo [Lambda de
Wilks = 0,96, F (3, 227) = 2,74, p = 0,04]. Os Palavras-chave: Escola; Percepção;
testes univariados indicaram a influência Comunidade.
da série em relação ao fator colaboração [F Contato: Jaciara de Lira Almeida Dantas, UFPB,
(2, 229) = 3,78, p = 0,003], com o teste post jaciaraadantas@hotmail.com

228
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

DIA 13/11 - Domingo novidade. Inicialmente faz-se uma reflexão


sobre os possíveis avanços da teoria da
subjetividade com relação à psicologia so-
14h-15h30 viética e, a seguir, sobre as relações entre a
aprendizagem e o desenvolvimento huma-
no nessa perspectiva, quando compare-
CONFERÊNCIA cem os principais conceitos desenvolvidos
por González Rey nessa direção. Por último
são apresentadas duas pesquisas na pers-
“ONDE FICAM OS BEBÊS NOS DIREITOS pectiva histórico-cultural da subjetividade:
DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES?” uma sobre a violência nas escolas e outra
sobre a criatividade infantil, pesquisas es-
Fúlvia Rosemberg - FCC
sas que se articulam e se desdobram na
tensão dos questionamentos e problema-
tizações gerados na construção interpreta-
SP LT04 - Simpósio tiva das produções subjetivas dos sujeitos,
acessadas e expressas no decorrer do mo-
mento empírico e que tem se constituído
SP LT04-845 - A TEORIA HISTÓRICO- em um grande desafio para a educação e a
CULTURAL DA SUBJETIVIDADE: DESAFIOS psicologia do desenvolvimento.
PARA A EDUCAÇÃO E A PSICOLOGIA DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO
Maria Eleusa Montenegro - UNICEUB A TEORIA DA SUBJETIVIDADE NA
memontenegro@terra.com.br PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL DE
Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC-Go/UnB FERNANDO GONZÁLEZ REY: UM AVANÇO
vannuzia@terra.com.br À PSICOLOGIA SOVIÉTICA
Ana Maria Orofino Teles - FE/UnB Maria Eleusa Montenegro - UNICEUB
anaorofino@gmail.com memontenegro@terra.com.br
Geisa Nunes de Souza Mozzer - UFG
geisamozzer@hotmail.com Atualmente, a educação, carente de qua-
lidade e de valorização, busca em dife-
Reflexões e pesquisas na perspectiva da rentes teorias educacionais e psicológicas
teoria histórico-cultural da subjetividade elementos que possam contribuir para o
de Fernando González Rey têm sido reali- processo de ensino-aprendizagem. Em
zadas em diferentes instituições de ensino vista disso é que se pretende, com este
superior, por diferentes professores. Neste trabalho, propiciar aos profissionais da
momento, em que a necessidade é anali- educação a teoria da subjetividade, na
sar os avanços concretos desta proposta e perspectiva Histórico-Dialética do autor
os desafios que ela coloca para as áreas da cubano contemporâneo Fernando Gonzá-
educação e do desenvolvimento humano, lez Rey (2000; 2004; 2005); como uma al-
as autoras vêm expor suas produções com ternativa de continuidade, avanço e apro-
o objetivo de ampliar o debate sobre um fundamento dos teóricos clássicos sovié-
pensamento que é plenamente aberto à ticos, sobretudo de L. S. Vygotsky (1984;

229
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

1987; 1988). Inicialmente houve a preo- A APRENDIZAGEM E O


cupação em conceituar o Materialismo DESENVOLVIMENTO HUMANO
Histórico-Dialético de Marx, filosofia de SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DA
base da Psicologia Histórico-Cultural, e de SUBJETIVIDADE
apresentar os conceitos desta Psicologia Ana Maria Orofino Teles - UnB
e da Educação na perspectiva Histórico- anaorofino@gmail.com
-Dialética. Como aspectos básicos do tra-
balho foram discutidas as categorias de O modelo ou enfoque científico de caráter
sentido, de significado, de subjetividade, empírico e analítico prestigia o controle
do papel do outro e da emocionalidade das variáveis, a objetivação do fenômeno
para os autores L. S. Vygotsky e Fernando estudado e o isolamento do mesmo de
González Rey. Percebeu-se em González seu contexto, o que parece ser impossí-
Rey, por meio da teoria da subjetividade, vel nas investigações que estudam o hu-
uma visão mais aprofundada do homem mano, principalmente em seu atributo de
também como sujeito da própria história. "ser social". Nesse sentido, as abordagens
O papel das emoções e do outro é visto, de ordem hermenêutica e fenomenológi-
para este autor, de uma forma mais sub- ca contribuem para ampliar o sentido do
jetiva. O outro não é percebido com um fazer ciência e da construção do conheci-
papel de caráter instrumental, mas como mento. O saber deve ser contextualizado
ser de relações, detentor de expressões e o mundo como coisa em si cede espaço
diferentes que dependem da qualida- ao mundo como representação e constru-
de do próprio curso no contexto social e ção de um observador que compartilha
cultural. Para González Rey a educação certos consensos sociais. Na esteira des-
é um “processo vivo que não aceita ‘re- se processo de rupturas paradigmáticas
ceitas’ pré-fabricadas e cujo curso define- encontramos em González Rey o pensa-
-se nos sentidos e nos significados que as dor capaz de apresentar uma teoria para
atividades e formas de comunicação im- a integração das diversas partes isoladas
plicadas nesse processo vão produzindo em que se desenvolveu a psicologia como
por meio dos sujeitos que o configuram”. ciência. Talvez seja até possível falar em
A cultura das relações e da comunicação psicologias, ao invés de uma só psicologia,
passa a ter um lugar central para a teoria pela diversidade de teorias que co-habi-
da educação. Acredita-se, também, que tam esse campo de conhecimento resul-
maior aprofundamento da teoria da sub- tante desse modelo de compartimentali-
jetividade de González Rey somente tem zação do saber. A aprendizagem, por sua
a contribuir com o conhecimento do indi- vez, ficou restrita ao campo do compor-
víduo, da educação, do desenvolvimento tamento observável, ou então ao campo
e do processo ensino-aprendizagem, pro- dos processos cognitivos e, na maioria
piciando subsídios para a superação dos das vezes, entendida como algo mecâni-
problemas educacionais. co que se dá através de um processo de
interiorização linear de algo que vem de
Palavras-chave: Teoria da Subjetividade. fora. A teoria da subjetividade de Gonzá-
Histórico-Cultural. Psicologia Soviética. lez Rey (2002, 2004, 2005a, 2005b, 2008)
vem para apresentar um pensamento que

230
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

responda a uma psicologia geral, uma ci- participação ativa de um sujeito concreto
ência de amplitude e reunião dos conhe- que produz. Nessa perspectiva de subje-
cimentos fragmentados. Uma teoria que tividade cultural-histórica a motivação
conjuga a epistemologia e a metodologia não vai estar na atividade, nem na tarefa
necessárias à integração lógica do fazer proposta, muito menos no professor e na
ciência em psicologia. Com González Rey sua simpatia. A motivação está no sujeito
temos uma maneira interessante de en- que aprende e a aprendizagem acontece
tender a aprendizagem, e também o de- quando o conteúdo passa a fazer sentido
senvolvimento, pois ambos passam a ser para o sujeito, implicando nisso também a
concebidos como processos subjetivos. sua emocionalidade. Para a teoria da sub-
Não exclusivamente cognitivo, não uma jetividade existe uma integração complexa
simples interiorização, mas de produção entre o sentir, o pensar e o agir; e existe o
de sentidos subjetivos que reconfiguram a sujeito. Os atos mecânicos de memoriza-
subjetividade da pessoa. Ou seja, o apren- ção não significam aprendizagem, ou seja,
diz irá aprender na medida em que pro- aprender é um processo subjetivo com-
duzir novos sentidos, que são unidades plexo que passa por um sujeito concreto e
subjetivas formadas pela total integração todo e qualquer processo de massificação
entre o simbólico e o emocional. A per- do ensino anularia esse sujeito e sua ca-
sonalidade, entendida como uma confi- pacidade singular de aprender. O próprio
guração de configurações subjetivas, se conceito de desenvolvimento ganha ou-
transforma no processo de aprendizagem tro caráter ao conjugar não só o "andar
e, com isso, aquele que entrou na sala para frente" na aprendizagem e também
de aula será diferente daquele que sair. o "adquirir conhecimentos", mas também
Esse entendimento do humano e de seu as contradições, os processos cíclicos e as
desenvolvimento explica a aprendizagem ambiguidades inerentes ao complexo sen-
como um processo complexo que implica tido da subjetividade humana.
a subjetividade individual da pessoa, seja
criança ou adulto; a sua subjetividade so- Palavras-chave: subjetividade,
cial, pois essa pessoa está subjetivamente desenvolvimento, aprendizagem, sujeito.
imersa no tempo e no espaço e seu con-
texto histórico e social são relevantes;
implica também a tensão entre sua emo- A PRODUÇÃO SUBJETIVA DA VIOLENCIA
cionalidade e sua racionalidade, onde a NAS ESCOLAS
aprendizagem se dá nas contradições e Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC/Goiás
não só nas linearidades e nas transmis- vannuzia@terra.com.br
sões diretas de informação; e também na
produção do sujeito, pois, para González Já não é mais novidade que a violência
Rey esse processo acarreta a produção de nas escolas é um fenômeno mundial. Para
sentidos subjetivos e as reconfigurações isso é só observar as notícias veiculadas
subjetivas e não exclusivamente a inte- nos meios de comunicação de massa,
riorização de algo externo e alheio. Para especialmente a televisão. O problema
a teoria da subjetividade não existe de- é que pouco se sabe, de fato, como essa
senvolvimento e aprendizagem sem uma violência tem sido constituída na com-

231
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

plexidade do real social das diferentes cessos simbólicos e significados, para a


escolas e como diferentes crianças e ado- compreensão da organização psicológica
lescentes poderiam estar subjetivamente subjetiva do sujeito, González Rey (1999,
com ela envolvidos em seus processos 2003, 2011) desenvolve um outro con-
de aprendizagem e desenvolvimento. Na ceito, o de “sentido subjetivo” que nos
abordagem complexa e subjetiva do psi- permite ir mais além e fazermos, final-
quismo humano, proposta por González mente, a seguinte pergunta: que registros
Rey (2011), o primeiro passo para a ex- complexos das experiências de relação
plicação dessa constituição é uma análise na escola, poderiam estar envolvidos na
de como o sistema econômico, o sistema constituição psicológica do sujeito e na
político-social e as ideologias vigentes sua produção subjetiva da violência? Para
estão sendo mediados por professores e González Rey (2011), entretanto, a ênfa-
alunos no cotidiano da escola. Este autor se, ainda hoje, é nas funções cognitivas
compreende que os fatos sociais, econô- mediadas pelos signos, supostamente
micos e culturais que constituem a reali- internalizados, deixando-se de lado a ex-
dade social perpassam pela constituição pressão simbólico-emocional do sujeito,
dos processos psicológicos dos sujeitos, fruto de sua imaginação, sua fantasia e
não de forma imediata, mas por meio de emoção, o que confere à psique um ca-
sua mediação subjetiva que inclui suas ráter gerativo. Essa ênfase no cognitivo,
produções cognitivo-emocionais geradas mediado por aspectos da vida objetiva,
e expressas no espaço escolar. Pergunta- de forma direta e imediata, viria dificultar
-se, então, como o processo ensino/ o desenvolvimento de um modelo teóri-
aprendizagem tem envolvido os professo- co que explicasse como as emoções, os
res e seus alunos na produção subjetiva processos simbólicos e os significados são
do espaço social da escola, que ao mesmo articulados na organização psicológica do
tempo é seu espaço social de constituição sujeito e na sua produção subjetiva de
psicológica? Para González Rey (1999) a seus cenários sociais. Em síntese, a falta
subjetividade integra dialeticamente o in- desse modelo viria dificultar a explicação
dividual e o social, implicando, para isso, de como o cenário social escolar, no qual
o sujeito com sua história e seu espaço o foco deveria ser a aprendizagem e o de-
social que o constitui e é por ele consti- senvolvimento do sujeito, é, ao contrário,
tuído em um processo recursivo. Entre o palco de produção subjetiva da violência,
sujeito e seu espaço social, no qual ele em níveis cada vez maiores. A partir da
atua, há um processo dialético que lhe implantação da disciplina "Estágio Bási-
possibilita constituir sua psique que é ge- co em Psicologia Escolar" na PUC-Goiás,
rativa, não reprodutiva. Buscamos, assim, em 2009, desenvolvemos uma pesquisa
refletir sobre a qualidade do diálogo e da sobre o tema nas escolas estaduais. As
dialética daqueles que atuam nas esco- informações foram construídas pelos alu-
las, especialmente professores e alunos, nos por meio de observações interativas,
e como esse processo poderia estar com- redações, desenhos, discussão de temas,
plexa e subjetivamente envolvido com a complementação de frases e entrevis-
constituição e a expressão da violência tas. Além disso, realizaram ações intera-
entre eles. Ao articular emoções, pro- tivas com professores e alunos nas salas

232
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de aula. Pode-se dizer que, com base na cas que atendam à diversidade da sala de
Psicologia Histórico-Cultural da subjeti- aula quanto na educação para uma con-
vidade de González Rey buscaram fazer vivência pacífica e respeitosa entre eles.
uma leitura das realidades das escolas
e desenvolver ações compatíveis com a Palavras-chave: subjetividade, escola,
proposta de uma psicologia escolar/edu- violência
cacional que visa à aprendizagem e ao
desenvolvimento humano, considerando
a diversidade desses processos em cada A CRIATIVIDADE INFANTIL NA
sujeito concreto. A realização das ações PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL DA
interativas os ajudaram a compreender: SUBJETIVIDADE
1) que a diversidade não é um empecilho Geisa Nunes de Souza Mozzer - PUC/Goiás
para o desenvolvimento do cenário da geisamozzer@hotmail.com
sala de aula, mas a sua riqueza; 2) que o
diálogo deve ser uma prática cotidiana da Esta pesquisa teve como objetivo central
sala de aula para que alunos e professo- buscar compreender como se expressa a
res desenvolvam uma reflexão sobre suas criatividade nas crianças na Educação In-
histórias e necessidades; 3) que as práti- fantil, privilegiando a atividade de ouvir
cas pedagógicas devem atender à diver- e contar histórias, entre crianças de 3 a 6
sidade do processo de aprendizagem e à anos de idade. Para tanto, é apresentado
necessidade de desenvolvimento da ima- um breve levantamento bibliográfico sobre
ginação criativa e da inventividade, ora o conceito de criatividade e criatividade in-
relegadas a segundo plano na maioria das fantil abordando como esses temas estão
escolas, o que torna invisíveis as crianças sendo discutidos na literatura especializa-
e os adolescentes concretos; 4) que a pro- da. Durante a comunicação da pesquisa,
dução subjetiva, possibilitada pelo exercí- buscou-se responder as seguintes ques-
cio da imaginação criativa, ajuda a supe- tões: Por que estudar criatividade? Como
rar as barreiras das condições objetivas ela se expressa? Como a criatividade é
das relações entre professores e alunos, concebida à luz da teoria Histórico-Cultural
tais como o mau humor, a impaciência, da Subjetividade? Com quais recursos sub-
a falta de atenção e a indiferença. Com- jetivos/personológicos a criatividade das
preenderam, ainda, a necessidade que há crianças está relacionada? Quais as maio-
das crianças e adolescentes poderem ex- res barreiras para o seu desenvolvimento?
pressar a realidade social das escolas, nas Como a criatividade se relaciona com a
suas relações com a realidade social mais Literatura Infantil nesta fase inicial da vida
ampla, mediadas por suas emoções mui- da criança? Buscou-se também analisar os
tas vezes contraditórias. Afinal, pudemos, elementos contextuais que podem interfe-
todos nós, vivenciar o desafio da psico- rir na expressão da criatividade das crian-
logia histórico-cultural da subjetividade, ças na Educação Infantil, sempre privile-
isto é, de buscar ultrapassar o pensamen- giando a atividade de conto, reconto, cria-
to da causalidade clássica e considerar ção e interpretação de histórias, a partir
a subjetividade de alunos e professores, da Teoria Histórico-Cultural da Psicologia,
tanto na realização de práticas pedagógi- inaugurada por Lev Vigotski (1896-1937), e

233
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da Teoria Histórico-Cultural da Subjetivida- nos quais as crianças atuam. Diferentes


de desenvolvida pelo pesquisador cubano técnicas qualitativas foram utilizadas à luz
Fernando González Rey (1999, 2007). À luz da concepção epistemológica qualitativa,
desta última, propomos discutir o conceito proposta por González Rey (2002, 2005). A
de subjetividade, personalidade, sujeito, pesquisa empírica se dividiu em duas fases:
sentido subjetivo, unidades subjetivas do a primeira com um grupo de 20 crianças de
desenvolvimento e subjetividade social. 5 anos de idade, quando foram realizadas
Segundo Vigotski (1930-1990), a criança sessões de conto e reconto de histórias de
tem a criatividade menos desenvolvida personagens infantis escolhidos pelas pró-
que o adulto, pois este último estaria mais prias crianças. Nestas sessões foram explo-
capacitado à produção criativa. Para o au- radas questões cognitivas, como escrever
tor, o processo de imaginação e de criação o nome dos personagens da história, des-
não é espontâneo e o mundo cultural é, cobrir as cores das roupas dos persona-
em grande parte, produto da imagina- gens, formar palavras a partir do nome dos
ção, fantasia, memória e imitação. Sendo personagens, dentre outros. Depois desta
assim, a imaginação e a criatividade, jun- etapa foi solicitada a algumas crianças que
tamente com outras funções psicológicas vestissem a fantasia dos personagens das
superiores, são o que distingue o mundo histórias. Elas ficaram fantasiadas durante
cultural do mundo natural. Essas funções o período de um dia, ou seja, todo o perío-
se desenvolvem no contexto histórico-cul- do de permanência no CMEI (Centro Muni-
tural. O domínio histórico-cultural, para cipal de Educação Infantil), quando foram
Vigotski, não representa o histórico social feitas as observações. As análises ainda
do indivíduo nem seu contexto cultural estão sendo realizadas, mas os primeiros
presente, mas refere-se à natureza do de- resultados demonstram que a criatividade,
senvolvimento dos processos psicológicos nesta fase da vida criança, manifesta-se de
humanos (Neves-Pereira, 2007). A concep- forma diferente em cada um dos sujeitos,
ção de criatividade como processo da sub- mas sempre mediada, principalmente,
jetividade, foi analisada à luz dos estudos pela memória, cognição, percepção, aten-
desenvolvidos por Mitjáns Martínez (1997, ção, imitação, afetividade, ou seja, me-
2002, 2006, 2007). Esta autora apresen- diada e relacionada com as configurações
ta a criatividade como uma expressão da subjetivas de cada uma, bem como com
personalidade que se manifesta de forma a subjetividade social constituída nos es-
diferente em cada um dos sujeitos, es- paços sociais nos quais as crianças atuam.
tando relacionada com a sua constituição Assim, nessas pesquisas temos observado
subjetiva. Ou seja, fazendo um contrapon- crianças pré-escolares em diferentes inter-
to com a ideia de que a criatividade é um pretações de histórias através das quais a
traço isolado da personalidade, esta abor- criatividade tem se manifestado de forma
dagem teórica entende que a criatividade bastante relacionada com a personalidade
se expressa e está relacionada com a ca- e subjetividade de cada um dos sujeitos
pacidade cognitiva, com a forma pela qual observados. As crianças, ao interpretar os
o indivíduo interage dialeticamente com o personagens das histórias, demonstram
contexto social, bem como com a subjetivi- características dos mesmos que se mistu-
dade social constituída nos espaços sociais ram à sua própria constituição subjetiva.

234
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Percebemos ainda que o contexto social, Educação e Inclusão Escolar, oferecido


por exemplo, a relação estabelecida com pela Universidade de Brasília, em parce-
a professora e com as outras crianças do ria com a Universidade Aberta do Brasil.
grupo, também interferem na expressão e O curso, de 420 horas, foi oferecido na
manifestação da criatividade das crianças. modalidade a distância e ocorreu duran-
Desta forma, buscamos discutir também te os anos de 2010 e 2011, atendendo a
a relação da criatividade com a Literatura quase 500 alunos advindos de diferentes
Infantil. Ou seja, como a criatividade pode localidades no Brasil. A proposta do curso
ser melhor desenvolvida nas Escolas de buscou dar respostas à demanda de edu-
Educação Infantil através da atividade de cadores que solicitam um curso de quali-
contar, recontar, interpretar e criar his- dade para sua formação continuada, re-
tórias. Assim, buscamos observar quais presentando uma iniciativa conjunta para
características gerais dos contextos que atender à demanda de escolas, hospitais
podem provocar, assim como preconiza e do contingente de profissionais que
Mitjáns Martínez (1997), circuitos nega- trabalham em diversas associações, que
tivos e positivos para o desenvolvimento, procuram instâncias formadoras e espe-
manifestação e expressão da criatividade, cializadas para promover sustentabilidade
dentre outros aspectos. ao processo inclusivo. Seu objetivo era o
de qualificar profissionais que lidam com
Palavras-chave: subjetividade, criatividade, a questão do desenvolvimento humano e
educação infantil com o campo da educação, para atuar na
promoção e sustentabilidade da inclusão
escolar de alunos com necessidades es-
peciais. Entre as atividades de formação
SP LT04 - Simpósio oferecidas pelo curso, incluía-se a constru-
ção de uma pesquisa monográfica orien-
tada, que ocorreu nos últimos seis meses
SP LT04-930 - INCLUSÃO ESCOLAR: de funcionamento do curso. Tal pesquisa
AÇÕES E REFLEXÕES NAS ESCOLAS DA abrangeu todos os diversos componentes
SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO do currículo do curso, como ação integra-
DO DISTRITO FEDERAL dora que visava assegurar a indissolubili-
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB dade teoria e prática. Os trabalhos apre-
rmirian@unb.br sentados representam uma síntese de três
Albenira Alves Rodrigues Soeira - SEE/DF monografias construídas ao longo do cur-
nirasoeira@gmail.com so, todas produzidas nas escolas da rede
Ana Ester Soares Oliveira - SE/DF pública de ensino do Distrito Federal. As
anahadassa@hotmail.com principais pesquisadoras dos três estudos
Claudia Maiana Silva - SEE/DF são professoras dessa rede, em formação
cmaianass@hotmail.com continuada, e cada uma delas, a partir de
suas especificidades, visou refletir a res-
Esse simpósio representa o fruto de um peito do processo inclusivo na escola, bus-
trabalho desenvolvido no Curso de Espe- cando construir recursos teórico-metodo-
cialização em Desenvolvimento Humano, lógicos que pudessem orientar e facilitar a

235
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ação dos diversos participantes desse pro- mento humano. De acordo com Moreira
cesso. Consideramos que seus resultados (apud Dessen & Weber, 2009), tanto a
representaram uma importante contribui- família como a escola podem trazer situ-
ção para a organização do trabalho peda- ações que incentivem o crescimento da
gógico da escola e da sala de aula, uma vez criança, como também podem contribuir
que possibilitaram um exercício reflexivo para o desencadeamento de situações
sobre a prática educacional inclusiva, tan- adversas que podem prejudicar a crian-
to para os pesquisadores em formação ça no seu desempenho educacional. Esse
como para os contextos educacionais nos trabalho pretendeu, portanto, compre-
quais as pesquisas foram desenvolvidas. ender atitudes positivas para a inclusão
nos dois sentidos, ou seja, da família e da
escola. Na visão de Bronfenbrenner, famí-
A INCLUSÃO ESCOLAR DOS ALUNOS lia e escola são microssistemas, entendi-
COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS dos como contextos de maior influência
ESPECIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL E para o desenvolvimento de uma criança
SUAS FAMÍLIAS (apud Dessen & Silva, 2004). A família é
Albenira Alves Rodrigues Soeira - SEE/DF o primeiro local de convivência de uma
nirasoeira@gmail.com criança e deveria ser o maior incentivador
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB de quebra de preconceitos, em se tra-
rmirian@unb.br tando da criança com necessidades edu-
cacionais especiais. Já o papel da escola
O contexto atual em que vivemos, na é o de incluir e criar estratégias para o
sociedade, incentiva o movimento de in- crescimento dessa criança. Aranha (apud
clusão. Esse movimento parte da idéia de Barbosa, Rosini & Pereira, 2007) ressalta
que gozamos dos mesmos direitos e que que a educação inclusiva é um projeto a
todos os cidadãos têm garantias e direitos ser construído por todos os envolvidos na
primordiais para a sua vida, como: saúde, comunidade escolar, e que só terá êxito
educação, segurança, trabalho, previdên- quando as atitudes em relação à inclusão
cia social e lazer (Brasil, 1988). A inclusão escolar forem positivas. Ao se falar de fa-
deve partir da inserção do indivíduo na mília, escola e pessoa com necessidades
sociedade e da garantia de seus direitos. especiais ou com deficiência, tem-se em
De acordo com Madeira Coelho (apud Kel- mente as palavras diversidade, respeito
man, 2010), a inclusão é um termo inte- e igualdade de oportunidades. De acor-
ressante, e serve de bandeira globalizada do com Glat e Duque (2003), o papel dos
para os grupos ditos minoritários e margi- profissionais é fundamental para mini-
nalizados da sociedade. No tocante a edu- mizar os sentimentos de superproteção
cação, o dever do Estado de proporcionar ou segregação e promover orientações
o direito à educação encontra-se em seu e esclarecimentos sobre as capacidades
artigo 205: "Educação direito de todos e do filho com necessidades especiais, bem
dever do Estado" (Brasil, 1988). Bronfen- como provocar um olhar dos pais sobre si
brenner (1996 apud Kelman, 2010) afirma mesmos. Ainda com Glat (2004) uma vez
que a família e a instituição escolar são orientados e sensibilizados para a nova
ambientes que promovem o desenvolvi- situação, os pais podem influenciar, posi-

236
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tivamente, na autoconfiança do filho para rado pelas entrevistadas foi a preparação


o desenvolvimento de suas capacidades. prévia da sociedade, família e escola para
Este trabalho teve por objetivo compre- a inclusão de alunos com necessidades
ender a relação família-escola no proces- educacionais especiais, tanto no meio so-
so de inclusão dos alunos com necessida- cial como educacional. Outro tema foi: A
des educacionais especiais na Educação inclusão - bem comum, já que a inclusão
Infantil do Ensino Regular. Quanto à abor- foi muito citada pelas duas participantes
dagem, a mais indicada foi a pesquisa da pesquisa como o envolvimento de to-
qualitativa. De acordo com Maciel e Ra- dos da sociedade nesta luta; elas citaram
poso (2010), tal pesquisa representa um a inclusão como uma causa não abraça-
processo permanente de construção do da por todos da sociedade, a começar
conhecimento pela interação do pesqui- pelas autoridades que fazem as leis e as
sador, do pesquisado e da pesquisa, em colocam em prática. O terceiro tema mais
si. A escola contexto da pesquisa selecio- explorado foi denominado: A qualida-
nada para o estudo é uma escola da rede de no cotidiano educacional e inclusivo,
pública, inaugurada em 11 de outubro de pela busca na qualidade no atendimento
1978; está localizada na zona urbana de no ambiente escolar, já que o ambiente
uma das regiões administrativas do DF, pode ser educacional, mas, não necessa-
atendendo crianças da própria comuni- riamente, inclusivo; reconhecer e conhe-
dade e de regiões próximas. Participaram cer quais são as atitudes da sociedade,
desta pesquisa uma mãe de aluno NEE in- família e escola nessa etapa de vida do
serido numa turma de educação infantil e ANEE é essencial para assegurar sucesso.
a regente da turma desse mesmo aluno. O último tema levantado foi denomina-
O instrumento mais adequado para as si- do: Os frutos da inclusão nos parâmetros
tuações propostas foi a entrevista semies- de igualdade para todos, tendo recebido
truturada. O roteiro para a efetivação da este título por incluir os resultados de
entrevista foi organizado em três blocos uma boa inclusão e da convivência entre
de questões sobre os entrevistados: (a) sociedade, família e escola. As percepções
apresentação; (b) seus conhecimentos te- e traduções feitas ao longo desse período
óricos sobre o assunto proposto; e (c) sua – de pesquisa, entrevistas e análises - são
prática vivenciada. A entrevista foi reali- que alguns assuntos ou temas são anti-
zada com o auxílio de um gravador. Para gos, mas, com soluções e atitudes ainda
analisar as informações construídas por tímidas e pequenas para o que a realida-
meio das entrevistas, portanto, optamos de pede. A intenção, com este trabalho,
pela construção de categorias teóricas de não é apontar erros e falhas da família ou
análise. As categorias elencadas são fru- da escola, mas, a de buscarmos, juntos,
tos da análise de informações construídas a resolução dos problemas encontrados
por meio das entrevistas. Os títulos das ao longo do percurso. Se a maior tarefa é
categorias foram formulados a partir de da escola, inclusive, ao dar subsídios para
temas que envolviam tanto a sociedade a família, no entanto, precisamos rever
quanto a comunidade escolar, e as cate- nossos conceitos e atitudes. Precisamos
gorias são: conhecimento e vivência com- entender que não adianta estarmos num
partilhada. O segundo tema mais explo- local onde a inclusão deve acontecer, se

237
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

não tivermos mente aberta para aceitar e dizagem; sendo a escola um ambiente
incentivar não somente o aluno NEE, mas que reúne diversidade de conhecimen-
todo o excluído. tos, atividades, regras e valores, permea-
dos por conflitos, problemas e diferenças
Palavras-chave: inclusão, necessidades (Mahoney apud Dessen & Polonia, 2007),
educacionais especiais, relação família-escola ela se transforma em espaço privilegiado
de desenvolvimento. Ressaltando a im-
portância da educação na diversidade,
PROGRAMA DE ATENDIMENTO cabe à escola criar meios que superem
EDUCACIONAL ESPECIALIZADO as dificuldades, assegurem o desenvolvi-
COMPLEMENTAR mento e promovam ações que conduzam
Ana Ester Soares Oliveira - SEE/DF a atividades que transcendam a educação
anahadassa@hotmail.com informativa. O estímulo a atividades des-
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB portivas, recreativas e culturais aproxima
rmirian@unb.br os diferentes, rompendo com as barreiras
do monoculturalismo (Kelman, 2009). A
Atualmente, o grande desafio da educação Secretaria de Educação Especial, por meio
tem sido o de promover o desenvolvimen- dos seus programas e ações, apresenta
to da aprendizagem, onde a diversidade possibilidades para viabilizar o processo
constitui um traço marcante no contexto inclusivo e apoiar os sistemas de ensino
escolar. Diante desta realidade, diversas com programas de formação continuada
ações são sugeridas, a fim de contemplar de professores na educação especial, pro-
as peculiaridades do processo de aprendi- grama de implantação de salas de recursos
zagem dos alunos com necessidades edu- multifuncionais e demais programas que
cativas especiais. A Secretaria de Estado buscam implementar a educação inclusiva
de Educação do Distrito Federal, a partir e o direito à diversidade. Segundo o De-
das Diretrizes Pedagógicas, disponibiliza creto nº 6571/2008, entende-se por aten-
atendimentos educacionais especializados dimento educacional especializado todo
complementares, aos alunos inclusos em o conjunto de recursos de acessibilidade
escolas regulares, a fim de complementar e pedagógicos organizados institucional-
o processo de desenvolvimento da apren- mente, ofertados de forma complementar
dizagem. Hoje, atendimentos como: Edu- ou suplementar à formação dos alunos no
cação Física adaptada, Artes, Informática ensino regular. Este documento enfatiza,
adaptada, Jardinagem e Argila são reali- ainda, a importância da transversalidade
zados pela SEE-DF, em centros de ensino das ações do ensino especial no ensino re-
especial, com caráter complementar, no gular, no intuito de viabilizar e consolidar
horário contrário ao de aula. O Programa o processo inclusivo. Diante destas con-
de Atendimento Educacional Especializado cepções, as diretrizes pedagógicas do DF
Complementar visa contemplar as particu- contemplam o processo inclusivo, ao apre-
laridades e necessidades dos alunos e au- sentarem orientações para a realização do
xiliar no processo inclusivo. A diversidade atendimento educacional especializado na
de conhecimentos é elemento propulsor perspectiva inclusiva. Dentre os programas
do desenvolvimento humano e da apren- apresentados, o Programa de Atendimen-

238
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

to Educacional Especializado Complemen- importância da família como promotora de


tar tem o intuito de oferecer atendimentos possibilidades para favorecer o desenvolvi-
que não são ofertados no ensino regular. mento humano. Segundo Carvalho (2010),
Esta é mais uma ação que sugere o forta- apesar dos avanços, o diagnóstico é dificul-
lecimento do processo inclusivo, a partir tado pela significativa heterogeneidade de
da reelaboração dos ambientes educacio- comportamento e atitudes, pois, as mani-
nais, com o intuito de efetivar o processo festações autísticas variam de pessoa para
de inclusão escolar e embasar a constru- pessoa. Dessen e Polonia (2007) enfatizam
ção da sociedade inclusiva. Neste estudo, que os laços afetivos, principalmente entre
buscamos compreender a importância dos pais e filhos, podem ser aspectos positivos
atendimentos educacionais especializados para desencadear um desenvolvimento
complementares, na implantação e manu- saudável, possibilitando o ajustamento do
tenção do processo de inclusão, bem como indivíduo em diversos ambientes. Proces-
a relevância destes no processo de desen- so de Adaptação da escola à necessidade
volvimento humano e educacional dos do aluno: Inclusão - nesta categoria, per-
alunos com necessidades educativas espe- cebemos que as ações educacionais apli-
ciais. O contexto da pesquisa foi um centro cadas favoreceram o processo educacional
de ensino especial, que disponibiliza vários de um aluno participante do Programa
ambientes para a realização dos atendi- Educacional Especializado Complementar.
mentos complementares. Para este estu- Em dois espaços diferentes, os professo-
do foram selecionados dois professores, res transformaram suas práticas, a fim
sendo um do atendimento complementar de proporcionar o desenvolvimento da
e um do ensino regular; a mãe de um alu- aprendizagem do aluno. Segundo Carva-
no matriculado no atendimento comple- lho (2010), os aspectos educacionais con-
mentar, também foi convidada a participar siderados evidenciam a importância da
desta pesquisa. A entrevista semiestrutu- mediação educacional, favorecendo maior
rada foi o instrumento de construção de aproveitamento dos espaços escolares,
informações, por preservar a naturalidade bem como ações efetivas de aprendiza-
e possibilitar que as informações constru- gem, promovendo o desenvolvimento do
ídas refiram-se aos mais diferentes am- aluno. Rede de apoio à inclusão: Programa
bientes sociais (Gil, 1989). O procedimen- de Atendimento Educacional Especializado
to de análise foi a categorização de dados, Complementar - os participantes definiram
elaborada com base nas transcrições das os atendimentos especializados comple-
entrevistas aqui mencionadas. Através da mentares como atividades essenciais no
elaboração de um quadro, focalizamos, nas auxílio e apoio ao processo educacional re-
falas dos participantes, aspectos essenciais gular; ainda, ressaltaram a importância de
do desenvolvimento do aluno. Como parte profissionais capacitados no atendimento
dos resultados, a partir da categorização a alunos com necessidades especiais. Pro-
das informações, foram levantadas três fessor e aluno, por estarem "mergulhados
categorias: Diagnóstico: compreensão da em diferentes possibilidades interativas",
realidade - os participantes expuseram as constroem um espaço versátil e enrique-
dificuldades na precisão de um resultado cedor para o processo de ensino/aprendi-
diagnóstico de uma criança com TGD e a zagem. Em outra vertente, a ação do pro-

239
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fessor também é pautada pela definição eram intituladas anormais e possuidoras


da função da educação, que não seria só de forças malignas muito ligadas a crenças
a de prover oportunidades para o cresci- sobrenaturais; elas eram consideradas um
mento e expressão, mas, essencialmente, mal para a sociedade (Boaventura, 2008).
de nutrir possibilidades relacionais (Bar- A Declaração de Salamanca de 1994 marca
tholo, Taca & Tunes, 2007). A partir das in- a luta contra o preconceito; a partir dela,
formações aqui apresentadas, verificamos se iniciaram discussões voltadas à inclu-
a importância dos atendimentos especiali- são e de atendimento em todo o mundo,
zados complementares, no apoio e fortale- inclusive, no Brasil (Moraes, 2009). Bueno
cimento do processo inclusivo. As estraté- (2001) refere-se ao movimento brasileiro
gias de divulgação devem ser fortalecidas, de integração escolar que, desde a década
a fim de alcançarem maior quantitativo de de 1970, privilegia a detecção de caracte-
alunos inclusos. Outro aspecto que refor- rísticas individuais que possam prejudicar
çamos é a utilização de todos os espaços a escolarização dos alunos e que, diante
educacionais, de modo a se constituírem deste diagnóstico, incorpora cada aluno
ambientes inclusivos. E, finalmente, rei- à educação regular ou especial. No Brasil,
teramos a importância da elaboração de historicamente, o sistema segregado de
uma política inclusiva, onde todos os seg- ensino, somado à educação bancaria (Frei-
mentos educacionais possam participar da re, 1987), torna ainda maior o desafio de
construção de ações como o Programa de mudanças. Bueno (2001) destaca que, ao
Atendimento Educacional Especializado. lado dessas práticas de reprovação, está o
ensino seriado ou a ausência de qualquer
Palavras-chave: inclusão escolar, atendimento seriação na educação especial. Segundo
educacional especializado complementar, a Orientação Pedagógica da Educação Es-
desenvolvimento humano e da aprendizagem pecial do Distrito Federal (2010), a rede
publica de ensino, visando tornar sua es-
trutura organizacional pedagógica mais
A REALIDADE EDUCACIONAL E A inclusiva e, para efetivar esse processo,
INCLUSÃO ESCOLAR define que ele deverá acontecer de ma-
Claudia Maiana Silva - SEE/DF neira paulatina, tendo em vista a acessi-
cmaianass@hotmail.com bilidade curricular e o aprimoramento das
Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB perspectivas organizativas, de maneira
rmirian@unb.br coerente e responsável, respeitando a fle-
xibilização da dimensão da temporalidade
Atualmente, as diversas demandas edu- e de outros aspectos, para que o sistema
cacionais exigem que as escolas regulares de ensino se torne cada vez mais inclusi-
estejam preparadas para receber alunos vo. Quanto à qualificação profissional do
com necessidades educacionais espe- professor, Leão (2004) entende que essa
ciais, proporcionando-lhes uma educação qualificação seja essencial para a inclusão
de qualidade com condições igualitárias, e deva ser continuada. Ferreira (2005), a
onde as diferenças sejam respeitadas no esse respeito, afirma que o processo de
processo de ensino e aprendizagem. Na inclusão pressupõe uma escola que pos-
antiguidade, pessoas com deficiências sui uma política participativa com cultura

240
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

inclusiva, de maneira que os membros da analise desses instrumentos chegamos a


comunidade escolar sejam colaboradores três categorias: (a) a formação dos profes-
entre si, apóiem-se mutuamente e apren- sores: por meio dessa categoria foi possí-
dam uns com os outros. Esta pesquisa vel observar que a formação do professor
teve por objetivo analisar como gestores deve acontecer durante todo o processo,
e professores de uma escola regular na ou seja, deve ser inicial e continuada, par-
cidade de Ceilândia viabilizam o processo tindo da realidade do professor, da escola
de inclusão. Foi nossa intenção específica e dos alunos envolvidos no processo; (b)
compreender que aspectos da organiza- a família como parceira: percebeu-se a
ção do trabalho pedagógico da escola e profunda necessidade da participação da
da sala de aula poderiam ser consideradas família, numa perspectiva bidirecional, de
fundamentais para o desenvolvimento e a maneira que um possa alimentar o outro
aprendizagem do aluno com necessidades de informações fundamentais que contri-
educacionais especiais. Como parte da buam para o desenvolvimento do aluno
metodologia, entendemos que a pesqui- NEE; (c) o currículo e suas adequações:
sa qualitativa responde a questões muito sugere-se, a partir dessa categoria, que os
particulares; ela se preocupa, nas ciências alunos possam vivenciar, no processo edu-
sociais, com um nível de realidade que cacional, um currículo contextualizado,
não pode ser quantificado. Para a realiza- interdisciplinar e que sofra adequações
ção desse trabalho participaram o diretor compatíveis com as necessidades especí-
da instituição de ensino e uma professora ficas de cada um dos alunos em formação;
que atua com alunos especiais (NEEs) na e (d) avaliar no dia a dia: a avaliação, a
área da surdez. As estratégias empregadas partir dos resultados do estudo, deve ser
para a construção dessa pesquisa foram a processual, contextualizada, formativa e
pesquisa documental e as entrevistas. Foi servir como ponto de referência para re-
elaborado um roteiro com 46 perguntas, organização das atividades escolares. Con-
que foram distribuídas em cinco cate- cluímos que ainda não seja possível rea-
gorias, para a realização da entrevista. lizar a inclusão que desejamos, mas, en-
Após ouvirmos atentamente as entrevis- tendemos que a experiência relatada seja
tas, procuramos transcrevê-las fielmente, relevante, no que diz respeito ao processo
não omitindo nem acrescentando nada evolutivo da escola como espaço inclusi-
além daquilo que foi dito. Dentre os re- vo. O professor pode utilizar as estratégias
sultados, de acordo com o PPP da escola apresentadas para enriquecer o seu tra-
pesquisada, o processo de avaliação não balho e para refletir sobre suas estratégias
se refere, apenas, a uma verificação do e instrumentos utilizados no processo de
rendimento escolar do aluno, mas, sim, a ensino aprendizagem, a fim de alcançar os
todo um processo de adaptação e cresci- objetivos desejados. A inclusão de quali-
mento que consciente de que seu papel dade é possível, apostando numa postu-
apresente domínio sistêmico, evidenciado ra de respeito dos professores frente aos
nas demonstrações e articulações práticas seus alunos com dificuldades de apren-
com a vida. As entrevistas demonstram a dizagens, sendo eles NEEs ou não. Como
concepção do diretor e da professora em formaremos cidadãos que promoverão
relação às práticas da inclusão. A partir da as mudanças necessárias no meio em

241
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que vivemos construindo uma sociedade A proposta apresentada é parte das dis-
melhor? Ansiamos por educadores que cussões e reflexões realizadas no Núcleo
sejam capazes de desencadear ações que de Estudos da Infância: Pesquisa & Exten-
tornem os seres humanos melhores, que são (NEI:P&E) e na Linha de Pesquisa In-
pensem no outro e no futuro do planeta, e fância, Juventude e Educação do Progra-
que utilizem, para isso, criatividade, dispo- ma de Pós-Graduação em Educação, da
sição e, como falou o diretor, sentimento. Universidade do Estado do Rio de Janei-
Acredita-se que este estudo possa ofere- ro (ProPEd/UERJ). Com foco nas Políticas
cer importantes contribuições quanto à Públicas busca estabelecer um trabalho
inclusão escolar de qualidade e propor- profícuo de parceria com a Secretaria Mu-
cionar, aos professores, oportunidade de nicipal de Educação da Cidade do Rio de
reflexão quanto a sua prática pedagógica, Janeiro (SME/RJ), onde a pesquisa Agente
com um novo olhar e uma nova postura, Auxiliar de Creche: Educadores da Infância
em relação à educação inclusiva. Carioca é desenvolvida. Visa, entre outros
objetivos, apoiar a implementação das
Palavras-chave: inclusão/avaliação/ políticas públicas do governo municipal
adequações curriculares, relação família- na formação em serviço dos agentes au-
escola, formação de professores xiliares de creche, aprovados no concurso
Contato: Mirian Barbosa Tavares Raposo, UnB, público realizado em 2007 (Edital nº1 de
rmirian@unb.br 04/08/2007) e dos Professores de Educa-
ção Infantil (Edital nº 91, de 25 de outu-
bro de 2010). A pesquisa está situada nas
SP LT04 - Simpósio áreas de Educação Infantil e Desenvolvi-
mento Humano e visa influenciar na pro-
dução de discussões sobre as questões de
desenvolvimento e formação de subjetivi-
SP LT04 1293 PSICOLOGIA DO
dade de crianças (0 a 42 meses) e adultos
DESENVOLVIMENTO E POLÍTICAS
(educadores da infância e familiares), num
PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL NO
ambiente educacional específico (creche).
MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
Articula temas de pesquisa, valorizan-
Vera Maria Ramos de Vasconcellos - ProPEd/ do a produção nacional da Psicologia do
UERJ Desenvolvimento em interlocução com a
vasconcellos.vera@gmail.com Educação da Infância. Este Simpósio apre-
Fátima Veról Rocha - SME/RJ sentará quatro pesquisas interrelaciona-
fverol@globo.com das, são elas: (i) Formação de Educadores
Maciel Cristiano da Silva - ProPEd/UERJ e de Creche: Compartilhando Experiências;
SEMED/NI (ii) Infância & Inclusão: Olhares sobre as
mcs.pesq@yahoo.it Práticas Pedagógicas e o Desenvolvimento
Flávia Maria Cabral de Almeida - ProPEd/ Humano; (iii) Diálogo entre Família e Edu-
UERJ cadores de Creche; e (iv) De um Concurso
psi.flaviamaria@yahoo.com.br a Outro: a trajetória de um município na
Marcia Gil - ProPEd e SME/RJ Construção de Identidade do Educador
marciagil@globo.com Infantil.

242
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

FORMAÇÃO DE EDUCADORES SIL, 1996). No município do Rio de Janeiro,


DE CRECHE: COMPARTILHANDO por força da legislação, as creches públicas
EXPERIÊNCIAS passaram a integrar a SME/RJ. Desde en-
Fátima Veról Rocha - PROPED/UERJ e SME/RJ tão, mudanças estruturais aconteceram
fverol@globo.com em decorrência do processo transitório.
Ana Lúcia Ferreira - FE/NEIPE/UERJ A principal mudança na estrutura de fun-
ana_ferreira_41@hotmail.com cionamento das instituições ocorreu após
o concurso público (Edital - SME/SMA
As mudanças no cenário nacional após a nº8, de 24/07/2007 ). Em junho de 2008,
promulgação da CF/88, no âmbito educa- o quadro de pessoal das creches públicas
cional, referente à educação das crianças do município do Rio de Janeiro passou a
de zero a seis5 anos, vincula o atendimento contar com os novos profissionais egressos
em creches e pré-escolas à área de Edu- do concurso. Este estudo apresenta parte
cação. Tal fato representou o primeiro dos resultados da pesquisa “Creche Odeti-
passo rumo à superação do caráter assis- nha: um estudo de caso”, desenvolvida no
tencialista que, até então, predominava mestrado em Educação do PROPED/UERJ
nos programas de atendimento à infância (2008 - 2010). A pesquisa teve por objetivo
e seu texto deixa claro que as propostas descrever e analisar o processo de forma-
educacionais devam basear-se em princí- ção de um grupo de 34 educadores7 (AAC),
pios de respeito aos direitos das crianças. recém concursados e atuantes numa cre-
Posteriormente, o Estatuto da Criança e che municipal, localizada na zona norte do
do Adolescente (1990) e a LDBEN6 9394 Rio de Janeiro. Os instrumentos utilizados
(1996) surgem com o objetivo de concre- na pesquisa foram questionários, sessões
tizar e regulamentar seus dispositivos nas reflexivas (em pequenos/grandes grupos),
diferentes esferas da sociedade. Neste ce- além de análise dos relatórios de avaliação
nário, os profissionais que desenvolvem o e registros produzidos pelos educadores.
trabalho com as crianças, também passam Nesta apresentação será destacado o perfil
a ter importância reconhecida legalmente dos educadores, com o objetivo de refletir
e os debates acadêmicos sobre a qualidade sobre a formação em serviço necessária
dos serviços oferecidos aos pequenos têm para atender às especificidades de traba-
enfatizado também, a questão da forma- lho com criança de zero a três anos. Para
ção de profissionais que atuam neste nível produzir esses dados, utilizamos um ques-
da ensino. De acordo com a LDBEN/96, art. tionário que continha itens relativos a: i)
62 “a formação mínima para o exercício do dados pessoais; ii) aos aspectos formativos
magistério na educação infantil [...] é o ní- (trajetória escolar e nível de escolarida-
vel médio, na modalidade normal”. (BRA- de); iii) profissionais (vínculo empregatí-
cio, carga horária de trabalho, experiência
anterior e atividade laboral exercida antes
5
O que já foi alterado pela Emenda Constitucional nº 53, de trabalhar na creche) e iv) sobre as atri-
de 19 de dezembro de 2006 que estabelece: IV - educação
infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco)
anos de idade.
6 7
Lei que disciplina a educação escolar, que se desenvolve, Agente Auxiliar de Creche: educadores das creches
predominantemente, por meio do ensino, em instituições públicas do município do Rio de Janeiro que integram o
próprias. (Art.1º, § 1º). quadro de pessoal de apoio à educação, desde 2008.

243
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

buições profissionais (atividades desen- dessa formação superar o nível fundamen-


volvidas com as crianças e expectativas tal exigido no edital, 50% dos funcionários
em relação ao cargo e a creche). A análise concursados, não possui formação espe-
permitiu conhecer alguns traços da história cífica para o exercício do magistério. Este
de profissionalização dos educadores nesta quantitativo soma 17 funcionários leigos,
creche. Quanto ao gênero, 3 são do sexo sendo que do total, 59% (10 educadores)
masculino e 31 são educadoras (91%). Ní- atualmente estão cursando o PROINFAN-
vel de escolaridade, dos 34 educadores: 1 TIL10. Em relação à experiência profissional
tem pós- graduação lato sensu em educa- anterior ao concurso: 44% dos educado-
ção e 16 possuem 3º grau completo. Des- res nunca tinham trabalhado com criança,
te total, apenas 9 possuem formação em 30% já haviam desenvolvido algum tipo de
pedagogia. O restante compreende outras atividade com a faixa etária acima de qua-
formações como: psicologia, administra- tro anos e, somente, 26% já possuía expe-
ção de empresas, direito, engenharia civil, riência anterior em creche. A não exigência
fisioterapia, marketing e licenciatura em de formação específica em educação como
educação física. Ainda em nível superior, pré requisito para o cargo trouxe, para as
10 possuem 3º grau incompleto: 4 estão creches, educadores leigos, com nível de
cursando a formação superior em peda- escolaridade elevado, entretanto, muitas
gogia e 6 educadores em outras áreas: far- vezes, sem experiência anterior de traba-
mácia, licenciatura em história (2), mate- lho na Educação Infantil. Dados que de-
mática, geografia e educação física. Encon- notam uma mudança significativa do que
tramos ainda, 10 funcionários com ensino havia sido apresentado como a realidade
médio completo e, deste total, somente 6 do cenário nacional, apontado em estudos
concursados possuem formação em curso anteriores: leigos, com baixa escolaridade,
Normal8 , os outros 4 educadores têm en- providos dos saberes da experiência profis-
sino médio regular9. Analisando o grau de sional. (Oliveira et al., 2006; Cerisara, 2002;
escolaridade, constatamos que apesar do Kishimoto, 1999). Dos 4 educadores que
edital do concurso para o cargo de Agente já atuavam na área de ensino, sem expe-
Auxiliar de Creche contrariar a disposição riência em creche, encontramos professor
da LDBEN/96 de que “a formação mínima nível fundamental, de pré-escola, de edu-
para o exercício do magistério na educação cação de jovens e adultos e de curso pre-
infantil [...] [é] a oferecida em nível médio, paratório, todos oriundos da rede privada.
na modalidade Normal” (BRASIL, 1996, art. Dos 9 educadores que tinham experiência
62.), nenhum educador concursado, atu- em creche, 7 já trabalhavam nesta creche,
ante nesta instituição, possui formação mí- antes do concurso. Durante a pesquisa,
nima. Na realidade, nesta creche, 79% do as propostas de intervenção não fugi-
grupo de educadores têm ou estão cursan- ram daquilo que era proposto pela SME/
do o 3º grau (formação superior). Os da-
dos encontrados nos mostram que, apesar 10
Trata-se de um curso semipresencial de formação para o
magistério, em nível médio, na modalidade Normal, ofer-
8
ecido para professores em exercício na educação infantil,
Atualmente, três cursando nível superior (licenciaturas em que atuam em creches e pré-escolas da rede pública e da
áreas diversas) rede privada que não possuem a formação exigida pela
9
Deste total, três estão cursando o PROINFANTIL. legislação vigente.

244
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

RJ como espaço de formação: os Centros discussões referentes ao Estudo de Caso


de Estudos. Tivemos por objetivo, ao lon- da primeira pesquisa mencionada que teve
go de 2009, avaliar o que ia mudando na como foco uma criança com múltiplas de-
concepção destes profissionais em relação ficiências. Inicialmente o diagnóstico era
ao conceito de “creche” e do trabalho por de surdez, porém na instituição os educa-
eles realizado que integrasse “educação e dores perceberam outras dificuldades, que
cuidado”. Esperamos que as considerações prejudicavam a participação da criança nas
ora apontadas, possam contribuir e emba- atividades por eles propostas. Para mergu-
sar as discussões sobre políticas públicas lhar, no cotidiano, das práticas pedagógi-
e sociais voltadas para a infância, assim cas de Educação Infantil fez-se necessário
como na estruturação de diretrizes para a uma proposta metodológica de imersão
formação das profissionais que lidam com do pesquisador na instituição para com-
crianças tão pequenas. preender a dinâmica da mesma. Por ser
uma única criança observada (e seu en-
Palavras-chave: Educação Infantil, Creche, torno), optou-se pelo estudo de caso. Para
Formação de Professores. Yin (2001) esta proposta metodológica é
utilizada para compreender processos na
complexidade social nas quais eles se ma-
INFÂNCIA & INCLUSÃO: OLHARES nifestam: seja em situações problema, em
SOBRE AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E O análise de obstáculos, seja em situações
DESENVOLVIMENTO HUMANO bem-sucedidas, para avaliação de mode-
Maciel Cristiano da Silva - ProPEd/UERJ e los exemplares. Esta proposta possibilita
SEMED/NI compreender um caso particular em sua
mcs.pesq@yahoo.it complexidade. Exige do pesquisador inves-
Fabíola Lira Gonçalves - FE/NEIPE/UERJ tigar a realidade articulada a determinado
Fabibsb5@yahoo.com.br contexto e definir recursos metodológicos
capazes de aprofundar e construir explica-
O presente trabalho enfoca as primeiras ções que permitam captar o real. Para tan-
articulações desenvolvidas na pesquisa to, há que se consideram as dimensões e
de mestrado “Inclusão de Crianças Focais os movimentos da criança e de seus outros
na Educação Infantil”. A pesquisa analisa sociais (educadores e outras crianças). No
dados de um follow-up com crianças parti- primeiro momento da pesquisa decidimos
cipantes de duas investigações anteriores. relativizar o Caso estudado, dialogando
A primeira “Infância, Educação e Inclusão: com as práticas pedagógicas de Jean Itard,
um estudo de caso”11 e a segunda “Crian- tendo por base seus relatórios de 1801 e
ças Focais: uma triangulação educação- 1806 (In: Banks-Leite & Galvão, 2001) e no
-família-saúde na creche”12. Apresenta a filme O Menino Selvagem de François de
Truffaut (1970). Para tal usamos como refe-
11 rencial teórico a perspectiva sócio-histórica
SILVA, Maciel Cristiano da. Infância, Educação e Inclusão:
um estudo de caso. 2009. Monografia (Graduação de Ped- de Lev Vygotsky (1998 e 2007), focando os
agogia) UERJ. Rio de Janeiro. processos de desenvolvimento e sociabi-
12
OLIVEIRA, Miriam P. R. de. Crianças Focais: a triangula- lidade presentes no material empírico de
ção educação-família-saúde na creche. 2009. Dissertação
(Mestrado em Educação) UERJ. Rio de Janeiro. Jean Itard. Para o levantamento de dados

245
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

adotamos como procedimentos metodoló- rais e gestuais não eram consideradas for-
gicos: observações com registro e entrevis- ma de linguagem valida para que houvesse
tas semiestruturadas, com a mãe adotiva13 processo comunicativo. O Dr Itard compre-
do menino e cinco educadores. As entrevis- endia tais manifestações como primitivas
tas aconteceram no decorrer das ativida- e, portanto, um obstáculo ao aprendizado
des de acompanhamento e observação da da verdadeira linguagem: a fala. Sobre essa
criança na creche. Nas análises dos escritos relação Banks-Leite & Souza(2001) escla-
de Itard, percebemos que o médico tinha recem que o fato do jovem Victor usar a
por propósito desenvolver os sentidos de linguagem da ação e através dela ser en-
seu jovem pupilo, dando grande importân- tendido, evidencia que o convívio social
cia aos aspectos sensoriais. A prática desse não lhe era estranho. Como bem é desta-
médico era baseadas na concepção filosó- cado pelas autoras o gesto de apontar só
fica empirista de Condillac (1715-1780), na é entendido como tal, como efeito de um
qual o sujeito era entendido como despro- ato de interpretação por outrem. Passan-
vido de experiência. Dr. Itard intencionava do agora à descrição das observações das
moldar e controlar o comportamento de cenas cotidianas do menino na creche (Es-
seu aprendiz a partir de estímulos senso- tudo de Caso), destacamos a presença de
riais e uso de recompensas e punições. No alguns indícios de interação social que para
que tange ao desenvolvimento de Victor, seus educadores, de forma similar ao mé-
deve-se considerar que enquanto vivera dico-educador Itard, não eram valorizadas.
isolado nas Florestas de Avyeron, não pre- O menino observado mantinha-se, muitas
cisara de nenhum recurso de comunicação vezes, próximo de outras crianças e adul-
humana para satisfazer suas necessidades tos, independente de estar numa atividade
fisiológicas, dependia tão somente de sua de relacionamento com elas. Nos relatos
astúcia física na superação dos obstáculos dos educadores é enfatizado um peculiar
da natureza. Em sua nova fase de vida, Vic- interesse da criança por água, assim como
tor necessitava de da mediação de sujeitos os relatados pelo médico-educador, sobre
sociais para o mundo que lhe era apresen- o menino de Avyeron. No trabalho com
tado. Somente imerso num contexto hu- os educadores buscamos valorizar o que a
mano, poderia atribuir sentido e sentir ne- criança conseguia apresentar. Por exemplo,
cessidade do uso da fala oral. Vale destacar constatamos que seu relacionamento com
que mesmo com um universo interpessoal outros sujeitos ocorria em forma de gestos,
restrito e pela necessidade de comunica- ou seja, a partir do que os outros conse-
ção com os outros sujeitos, Victor desen- guiam perceber na ação dele. Tal fato era
volve o que é chamado de “linguagem da muitas vezes interpretada como agressão.
ação”, constituída de gestos e mímicas Verificamos também que a participação do
(Banks-Leite & Souza, 2001). Tais recursos menino nas atividades da creche era redu-
de comunicação que foram apropriados zida propositalmente pelos educadores,
pelo menino eram ignorados por seu tutor pois solicitavam que o menino chegasse
que só objetivava o desenvolvimento da um pouco mais tarde e saísse sempre antes
fala. Para o médico, as linguagens corpo- das demais crianças. Esta decisão prejudi-
cava a participação da criança em foco nas
13
A biológica faleceu durante o parto. atividades pedagógicas orientadas, ou seja,

246
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

deixava-se de oportunizar momentos de dade do serviço oferecido para essas crian-


interação mediada pelos educadores. Con- ças (BRASIL, 2006). Quando se trata de
forme os relatos e observações partilha- oferta e qualidade das creches, devemos
das, passamos (pesquisador e educadores) levar em consideração as necessidades das
a perceber que a criança compreendia e famílias, especialmente das mães trabalha-
interpretava fatos e ações que ocorreriam doras (Aquino & Vasconcellos, 2005; Mi-
ao seu redor. Do mesmo modo, apresenta- zrahi, 2004) e das famílias que necessitam
va um potencial comunicativo facilmente de uma rede social de apoio (Piccinini et
compreendida pelos sujeitos ao seu redor, al., 2007). Embora legítimas as necessida-
mesmo sendo elas denominadas pelos des dos adultos, a criança deve ser o alvo
educadores de agressivas; na verdade isto principal, sendo reconhecida como sujeito
pode ser alguma possível forma de comu- de direito a ser educado em um ambiente
nicação com os demais sujeitos. Em suma, complementar à família (Brasil, 1996). O
esta fase da pesquisa possibilitou articular objetivo deste trabalho é apresentar parte
uma reflexão dos fazeres cotidianos dos re- da tese que vem sendo construída sobre a
cém chegados agente auxiliares de creche, relação creche-família, apresentando re-
com crianças que demandavam outros sultados obtidos nas análises prelimina-
fazeres pedagógicos, como, por exemplo, res. A tese tem como finalidade analisar o
o menino em estudo. Forneceu suporte à processo de construção da relação família-
formação continuada dos educadores, (re) -educadores ao longo de três anos em uma
significando algumas práticas de cuidar- creche pública municipal do Rio de Janeiro.
-educar. As discussões permitiram aos Estudos sobre o desenvolvimento humano
educadores e ao pesquisador momentos afirmam que a família é a primeira media-
de reflexão sobre o tema, além de prestar dora entre o homem e a cultura, garantin-
apoio técnico-pedagógico à equipe de co- do uma unidade dentro das relações afeti-
ordenação da creche. vas, sociais e cognitivas presentes no grupo
(Dessen & Polônia, 2007). Essa instituição
Palavras-chave: Infância, Inclusão, Práticas depara-se com desafios vindos do mundo
Pedagógicas. do trabalho, das questões de gênero, do
advento de novas tecnologias. A maneira
como se organizam frente a esses desafios
DIÁLOGO ENTRE FAMÍLIA E é relevante para verificar a necessidade de
EDUCADORES DE CRECHE compartilhar o cuidado com os filhos e/ou
Flávia Maria Cabral de Almeida - ProPEd/UERJ contar com o suporte das redes de apoio
psi.flaviamaria@yahoo.com.br social. A formação dessas redes deve ser
Amanda Cristina de Freitas Souza - FE/NEIPE/UERJ estimulada, levando-se em conta que as
Achrys.souza@bol.com.br famílias também estão constantemente
lidando com fatores de estresse próprias
Em nossa sociedade, é crescente o número da dinâmica do relacionamento entre seus
de famílias que decide colocar suas crian- membros (idem). A creche constitui um
ças pequenas na creche. Esta procura deve dos braços dessa rede de apoio e compar-
entrar na pauta das políticas públicas para tilha com as famílias a educação de suas
a ampliação de vagas e a garantia da quali- crianças, representando mais um espaço

247
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para o desenvolvimento. A interação famí- bientes familiares, agora são compartilha-


lia e creche tem sido considerada um palco das com os educadores da creche (Bhering
de negociações de valores e crenças, mas & Sarkis, 2007). Os sujeitos da pesquisa
também de conflitos entre os saberes de são educadores e famílias de 42 crian-
um e de outro. Alguns desses conflitos se ças que frequentam a creche desde 2009
traduzem na falta de confiança, na disputa (quando tinham entre quatro e doze me-
(real ou imaginária) pelo amor da criança ses) até o ano de 2011. Adotamos a pers-
(Maranhão & Sarti, 2008). Investigações pectiva do estudo de caso longitudinal, op-
nesse campo têm demonstrado que, em tando por fontes de dados diversificadas,
geral, os momentos de encontro são bre- que permitem uma visão mais abrangente
ves (na entrada e/ou despedida) e base- do objeto (Alves & Azevedo, 2010). Utili-
adas na solução de problemas imediatos, zamos questionários, entrevistas, diário
porque as professoras se dividem entre de bordo e observações. Para este traba-
as crianças e os familiares, que geralmen- lho, apresentaremos os resultados obtidos
te estão apressados. Tanto as professoras através de 3 questionários: ficha de acom-
quanto as famílias almejam um contato panhamento e observação do período de
mútuo, embora o que geralmente motiva o inserção e avaliação do trabalho da creche
diálogo sejam as insatisfações de ambas as (2009 e 2010). Os questionários foram
partes (Bahia, Magalhães & Pontes, 2009; submetidos a exame quanti e qualitati-
Sarkis & Bhering, 2009). Mesmo quando a vo. Os resultados preliminares do primei-
creche planeja e incentiva a comunicação ro questionário indicam que os aspectos
pode haver constrangimentos entre famí- importantes observados na inserção de
lias e professores (Bhering & Sarkis, 2007). crianças são semelhantes para educadores
Em geral, famílias e professores concordam e famílias, o que diferencia é a ordem de
sobre os ganhos sociais que as crianças ad- importância. As famílias ficam atentas aos
quirem quando frequentam a instituição fatores comumente relacionados ao “cui-
de educação infantil, mas de diferentes dado” (alimentação, sono), deixando em
pontos de vista: os pais não enfatizam os último lugar o que é típico de um ambien-
aspectos pedagógicos; as professoras, por te coletivo: a relação com outras crianças
sua vez, valorizavam a preparação das ati- e adultos. A idade das crianças em 2009
vidades pedagógicas e não mencionam também deve ter contribuído para que os
a relação com pais para a ampliação das aspectos ligados ao “cuidado” apresentas-
possibilidades educativas (Bhering, 2009). sem maior destaque. Os educadores, por
A creche, por ser uma instituição onde as sua vez, estão mais atentos aos aspectos
crianças passam uma grande parte do seu ligados ao trabalho desenvolvido na cre-
tempo, convivendo com outros colegas e che, como a brincadeira e a interação. O
adultos, lidando com as normas coletivas, choro para ambos constitui um forte indi-
é um novo contexto de desenvolvimento. cador para saber se a criança está bem ou
Isto traz implicações para os estudos so- não durante a inserção. Nos outros dois
bre o desenvolvimento humano, já que é questionários, verificamos que a busca
diferente dos contextos que as teorias do pela creche se devia ao fato de a mãe tra-
desenvolvimento até então analisavam. As balhar fora. As famílias respondentes esta-
questões que antes eram restritas aos am- vam satisfeitas com o trabalho promovido

248
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pela instituição, e mais da metade afirmou Educação Infantil no município do Rio de


que colocaria o filho na creche, mesmo se Janeiro. É intenção olhar especificamente
não trabalhasse. Todos os pais disseram a partir do ano de 2005, com a criação da
participar das reuniões, sendo presentes categoria funcional de Agente Auxiliar de
no cotidiano da instituição e estabelecen- Creche14, que passou a integrar o Quadro
do diálogo constante com os educadores de Pessoal de Apoio à Educação, através
e a direção. A presença na creche contri- da Lei 3985 de 08 de abril, até criação do
buiu para que conhecessem o trabalho da cargo de Professor de Educação Infantil
instituição, reconhecendo que a atividade em 201015. Este percurso é analisado a
da creche era educar e cuidar, e comple- partir de concursos públicos realizados
mentar à família. A independência e inte- nos últimos 3 anos, voltados para o pro-
ração foram os aspectos mais destacados fissional que atua com funções pedagógi-
no desenvolvimento do filho, sendo tam- cas junto às crianças pequenas. Em 2007,
bém destacadas quando mencionavam as foi realizado o primeiro concurso público
vantagens da creche. No questionário de para agente auxiliar de creche, através de
2010, a mudança significativa foi a comu- provas e títulos, ocorrendo a seleção de
nicação e socialização como aspectos que forma regionalizada, isto é, por CRE16, com
foram desenvolvidos com a frequência da exigência de formação mínima em nível
criança à creche. Através da análise desse fundamental17 e carga horária de 40 horas
material e dos demais utilizados na investi- semanais. Esta pesquisa analisa as mu-
gação, esperamos ampliar o conhecimento danças nas políticas educacionais públicas
sobre o tema em estudo. Acreditamos que da cidade do Rio de Janeiro, desde o edital
a creche pode contribuir no desenvolvi- conjunto SME/SMA nº8, de 24 de julho de
mento da criança, mas também na própria 2007 (com oferta de 1.519 vagas regulares
relação desta com sua família. e 81 para pessoas com deficiência), para
Agentes Auxiliares de Creche, até o edi-
Palavras-chave: Creche; Família; Infância. tal nº 91, de 25 de outubro de 2010 (com

14
DE UM CONCURSO A OUTRO A No ano de 2005, o poder executivo do município do Rio de
Janeiro, através da Lei 3985 de 08 de abril, criou a catego-
TRAJETÓRIA DE UM MUNICÍPIO NA ria funcional de “Agente Auxiliar de Creche”, que passou
CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE DO a integrar o Quadro de Pessoal de Apoio à Educação. O
EDUCADOR INFANTIL ingresso ao cargo, deu-se através de concurso público re-
alizado em 2007, constituído de provas e provas de títulos,
Márcia de Oliveira Gomes Gil - PROPED/UERJ sendo exigido a formação mínima em nível fundamental
e carga horária de 40 horas semanais. A seleção ocorreu
marciagil@globo.com regionalmente, isto é, pelas Coordenadorias Regionais de
Daniele Vieira de Azevedo - FE/NEIPE/UERJ Educação (CRE).
15
daniele.vieiraazevedo@ig.com.br Projeto de de lei nº 701/2010, cria no quadro permanente
do poder executivo do Município do Rio de Janeiro a cate-
goria funcional de professor de Educação Infantil.
16
RESUMO Coordenadoria Regional de Educação – a cidade do Rio de
Janeiro está divididas em 10 Coordenadorias
17
O presente artigo apresenta um breve his- Em desacordo com a LDBEN 9394/96, que no seu artigo 62
define “a formação mínima para o exercício do magistério
tórico da trajetória de organização do cor- na educação infantil [...] é o nível médio, na modalidade
po docente e de apoio que atuam junto à normal”.

249
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

oferta de 1424 vagas regulares e 76 para no; um professor regente articulador, tam-
pessoas com deficiências). A chegada dos bém professor da rede; cozinheiro ou me-
agentes auxiliares de creche às instituições rendeira; lactaristas, para as creches com
buscava substituir o recreador - profissio- berçário; auxiliar de serviços gerais e recre-
nal contratado junto às Organizações da adores. Estes últimos, mesmo depois de
Sociedade Civil (OSC)18. Também trouxe al- 2008, com a chegada dos agentes auxilia-
guns questionamentos pertinentes à nos- res de creche dependendo da localização
sa discussão. Para começar, as funções dos da unidade, permaneceram nas creches
agentes auxiliares de creche são descritas até junho de 2011. A Professor(a) Regente
no edital do concurso e envolvem ações Articulador(a) tem a responsabilidade de
pedagógicas19, tais como: disponibilizar e coordenar o trabalho pedagógico de toda
preparar os materiais pedagógicos a se- a creche.. Assim, os fazeres cotidianos jun-
rem utilizados nas atividades; auxiliar nas to às crianças ficam centrados no recrea-
atividades de recuperação da autoestima, dor/agente auxiliar de creche ou seja, em
dos valores e da afetividade; observar as profissional sem formação específica para
alterações físicas e de comportamento, de- tal função. Enfatizamos a importância de
sestimulando a agressividade; estimular a uma formação anterior àqueles que se
independência, educar e reeducar quanto dedicam ao trabalho educativo, sem des-
aos hábitos alimentares, bem como con- considerar a formação que ocorre no co-
trolar a ingestão de líquidos e alimentos tidiano das ações. Segundo Vasconcellos
variados. Ainda de acordo com o edital e (2001) a formação de professores e outros
pela própria nomeclatura do cargo, estava profissionais para o trabalho nas institui-
descrito com função esse profissional atu- ções de educação infantil só são possíveis
ar em apoio pedagógico a um professor. pela construção coletiva e reconstrução
Participar da execução das rotinas diárias, pessoal de sentidos, significados e valores
de acordo com a orientação técnica do referentes a uma filosofia de educação in-
educador; Colaborar e assistir permanen- fantil para todas as crianças, independente
temente o educador no processo de desen- de raça, religião ou etnia.(p.?) As questões
volvimento das atividades técnico-peda- apontadas acima contrariam diretamente
gógicas; Receber e acatar criteriosamente a legislação, e parecem demonstrar um
a orientação e as recomendações do edu- caráter de precariedade no atendimento
cador no trato e atendimento à clientela. oferecido às crianças. Com a posse de uma
Na realidade, não havia um educador para nova gestão na Cidade, algumas mudanças
cada grupamento. Um olhar mais aten- tiveram curso, e estão sendo analisadas
to ao documento20 que ainda norteava o nesta pesquisa. Dentre elas está a criação
funcionamento dessas instituições, aponta do cargo de Professor de Educação Infan-
que a estrutura técnico-administrativa da til, com realização de concurso público em
creche conta com: um diretor, professor ou 2010. Desta vez, o edital exigiu a formação
especialista de educação da rede de ensi- mínima Normal Médio (na modalidade
normal), Normal Superior ou Pedagogia
18
Resolução SME nº 816/2004
(com Licenciatura Plena, com habilitação
19
Edital conjunto SME/SMA nº8 de 24 de julho de 2007 para docência na Educação Infantil e anos
20
Resolução SME nº 816/2004 iniciais do Ensino Fundamental ou especí-

250
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fica para Educação Infantil). A carga horária SP LT06 - Simpósio


é de 22 horas e trinta minutos semanais.
O cargo tem como descrição sumária:
Planejar, executar e avaliar, junto com os SP LT06-1404 - AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO
demais profissionais docentes e equipe de EM PSICOLOGIA PEDIÁTRICA: PROPOSTAS
direção, as atividades da unidade de Edu- PARA MINIMIZAR RISCOS AO
cação Infantil e propiciar condições para DESENVOLVIMENTO
o oferecimento de espaço físico e de con-
Kelly Ambrósio Silveira - UFES
vivência adequados à segurança, ao de-
kellysilveira.psicologia@gmail.com
senvolvimento, ao bem-estar social, físico
e emocional das crianças. Com a chegada
O campo da Psicologia Pediátrica tem sido
dos novos profissionais (Professor de Edu-
cação Infantil) às creches um novo dilema definido como um domínio interdisciplinar
se instala, isto é: profissionais com funções e de interface da Psicologia do Desenvolvi-
próximas, carga horária e salários distintos. mento e da Psicologia Clínica. Este campo
Esta pesquisa pretende realizar um estudo se ocupa do funcionamento e do desen-
que acompanhe a constituição/produção volvimento físico, cognitivo, social e emo-
da identidade do educador da infância cional, além do seu relacionamento com
carioca. São questões de estudo: Como a saúde de crianças, adolescentes e suas
será a convivência dos Agentes Auxiliares famílias. No cenário brasileiro, a Psicologia
de Creche e os Professores de educação Pediátrica vem se consolidando como um
Infantil? Como se dará a partilha das ta- campo de saber científico, em que existe
refas diárias? Qual o impacto da entrada uma preocupação bastante clara em en-
dos professores no desenvolvimento e na fatizar uma visão global e psicossocial do
educação da infância carioca? Observar as desenvolvimento humano, sobretudo, nos
duas políticas e buscar entender os signifi- contextos da saúde e da educação. Nesse
cados lá expressos e os sentidos reconstru- sentido, estudos nessa área têm enfocado
ídos por cada profissional é fundamental a eficácia de propostas metodológicas de
para constituir um olhar sobre as políticas avaliação e intervenção, em uma perspec-
de Educação Infantil que se concretizam tiva desenvolvimentista, e que sejam apli-
nesta cidade. Uma nova identidade do cadas a populações em situação de vulner-
Educador da Infância Carioca parece estar abilidade, ou seja, com risco de problemas
se constituindo. O olhar pedagógico vem e atraso no desenvolvimento. No presente
ganhando força com novas políticas que simpósio, pretende-se apresentar e discu-
assentam o professor nesta etapa de ensi- tir pesquisas realizadas em nível de pós-
no, e desta forma, atendem à necessidade graduação, em Psicologia Pediátrica, com
urgente de oferecer atendimento de qua- enfoque na avaliação e intervenção, com
lidade às crianças, na forma de seu direito diferentes tipos de população em condição
assegurado em lei. de vulnerabilidade biopsicossocial: (a) cri-
anças inseridas no contexto hospitalar
Palavras-chave: Agente Auxiliar de Creche, por problemas diversos, como bebês pre-
Concurso Público, Professor de Educação maturos e com baixo peso internados em
Infantil, Identidade do Educador da Infância. UTIN e enfermaria pediátrica, e (b) crianças

251
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

entre 6-11 anos de idade hospitalizadas, e Palavras-chave: Psicologia Pediátrica,


bebês prematuros e com baixo peso, com riscos ao desenvolvimento, estratégias de
idade entre 18 e 36 meses, freqüentando enfrentamento
Ambulatório de Neurologia, em hospi-
tais públicos. O Estudo 1 deste simpósio
abordará as estratégias de enfrentamento HOSPITALIZAÇÃO INFANTIL:
(coping) de crianças entre 6 e 11 anos que ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO DE
se encontram hospitalizadas e de seus cui- CRIANÇAS E CUIDADORES
dadores, utilizando dois instrumentos de Camila Ramos Medalane Cravinho - UVV
avaliação de coping: Instrumento de Aval- millamedalane@hotmail.com
iação do Enfrentamento da Hospitalização Claudia Pedroza Canal - UVV/
(AEH) e Escala Modos de Enfrentamento claudiapedroza@uol.com.br
(EMEP), também analisando os problemas Alessandra Brunoro Motta Loss - UFES
de comportamento entre as crianças estu- alessandrabmotta@yahoo.com.br
dadas por meio do Child Behavior Check-
list (CBCL/6-18 anos). Esta escala também Financiamento: FUNADESP/UVV/CNPq
foi utilizada no Estudo 2 deste Simpósio,
que aborda as percepções maternas sobre A implantação do modelo de assistência
cuidados e problemas comportamentais psicológica e de humanização, em servi-
de filhos prematuros e com baixo peso, ços de saúde pediátrica, tem contribuído
com idade entre 18 e 36 meses. Com essa para que aspectos do desenvolvimento
mesma população, o Estudo 3 analisará físico, cognitivo e emocional da criança
uma proposta de intervenção com mães sejam minimamente afetados pela doen-
de bebês prematuros e com baixo peso, ça. De outro lado, os vários tipos de tra-
internados em UTIN, integrando dados de tamento provocam mudanças na rotina
pesquisas realizadas em hospitais públicos da criança, exigindo freqüentes idas ao
de Vitória, ES e do Rio de Janeiro, RJ, em hospital, internações, afastamento esco-
parceria entre universidades (UFES, UFRJ, lar e familiar, exposição a procedimentos
UVV e Faculdade Salesiana de Vitória). médicos invasivos, entre outras altera-
Enfocando mais diretamente o cuidador ções do cotidiano, que provocam reações
- geralmente a mãe -, pessoa central no de stress e sofrimento (McCaffrey, 2006).
processo de desenvolvimento infantil, os No caso da hospitalização, estudos mos-
dados dessas pesquisas podem contribuir tram que um período de internação su-
ou contêm propostas de intervenção que perior a cinco dias é fator de risco para
conduzem à melhoria nas estratégias de o desenvolvimento de transtornos com-
enfrentamento dos problemas apresen- portamentais (Dias, Baptista & Baptista,
tados pelos filhos, adquirindo, assim, um 2003). Deve ser levado em consideração,
caráter protetor de seu desenvolvimento. ainda, que a hospitalização tem impacto
Pretende-se discutir como essas propostas não somente sobre a criança em desen-
podem contribuir para consolidar a área volvimento, mas, também, sobre sua
da Psicologia Pediátrica como campo de família. O cuidado diário da criança no
estudo, pesquisa e intervenção no cenário hospital implica no abandono temporá-
acadêmico-científico no Brasil. rio das atividades cotidianas e dos outros

252
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

membros da família, bem como a respon- & Meireles, 2005). As informações coleta-
sabilidade de gerenciar os cuidados com das na avaliação foram analisadas quanti-
a criança doente em um ambiente hostil, tativa e qualitativamente, de acordo com
no qual a tomada de decisão sobre esses as normas dos instrumentos. Em relação
cuidados está centrada em pessoas até aos comportamentos apresentados pelas
então desconhecidas (Weisz, McCabe crianças durante a hospitalização, obtidos
& Dennig, 1994). Assim, uma vez que o a partir do AEH, verificou-se o predomí-
comportamento da criança pode afetar nio de comportamentos facilitadores (M
o modo como ela lida com a hospitaliza- = 1,93) sobre os comportamentos não-
ção, interferindo no curso da recupera- -facilitadores (M = 0,77). A análise por
ção, e que o contexto adverso associado tipo de comportamento destaca a média
à hospitalização é suficiente para gerar maior dos comportamentos: assistir TV e
reações de stress e sofrimento, exigindo a tomar remédio. Os comportamentos que
necessidade de enfrentamento da situa- apresentaram menor média foram buscar
ção para a eliminação ou minimização do informações e cantar. Entre os compor-
estressor; este estudo buscou investigar tamentos não-facilitadores, verificou-se
as estratégias de enfrentamento de crian- uma pontuação média maior na prancha
ças hospitalizadas e de seus cuidadores, pensar em milagre e desanimar. Escon-
bem como verificar a presença de proble- der não foi referido por nenhuma crian-
mas de comportamento entre as crianças ça como um comportamento emitido no
estudadas. Para tanto, realizou-se um hospital. A pontuação média superior no
estudo descritivo, de corte transversal, comportamento de assistir TV pode ser
com 15 crianças: 7 meninos e 8 meni- justificada pelo fato de ser o único recur-
nas, com idades entre 6 anos e 3 meses so de distração disponível para a criança
a 12 anos e 11 meses (média de 9 anos durante a internação, mostrando a rele-
e 5 meses), internadas em hospital pú- vância de ações institucionais que pro-
blico de Vila Velha/ES, que responderam movam o brincar nesse contexto. Quando
ao Instrumento de Avaliação do Enfren- se analisam as justificativas das crianças
tamento da Hospitalização (AEH) (Motta para suas respostas, a fim de obter a es-
& Enumo, 2004, 2010), que fornece infor- tratégia de enfrentamento que está sen-
mações sobre os comportamentos duran- do relatada, foi verificada uma proporção
te a hospitalização e permite verificar as maior da estratégia de distração (40,5%),
estratégias de enfrentamento da hospi- seguida da estratégia de ruminação
talização, a partir do relato das crianças; (31,1%), busca por suporte (25,7%) e so-
e ao Child Behavior Checklist (CBCL/6-18 lução do problema (20,3%). A estratégia
anos) (Achenbach & Rescorla, 2004), que que apresentou menor proporção foi re-
avalia a competência social e problemas gulação da emoção (1,3%). A estratégia
de comportamento anteriores à hospita- de distração tem sido predominante em
lização. Para a análise do enfrentamento outros estudos com crianças hospitaliza-
dos familiares, 15 cuidadores - sendo a das por doenças crônicas, como o câncer,
maioria mães - responderam à Escala Mo- mas a freqüência da estratégia de rumi-
dos de Enfrentamento (EMEP) (Faria & nação é um indicador da necessidade da
Seidl, 2006; Seidl, Rossi, Viana, Meneses inclusão do psicólogo na equipe de saúde,

253
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

avaliando e desenvolvendo propostas de busca da religiosidade no enfrentamento


intervenção que favoreçam o processo de problemas, especialmente, em situ-
adaptativo da criança. Na análise de com- ações de pouco controle, como é o caso
petência (CBCL), as crianças foram referi- da hospitalização. Além disso, considera-
das, na maioria, como não-clínica (Social -se a cultura religiosa como variável que
= 87,5%; Escolar = 81,2%). Com relação interfere na resposta de enfrentamento.
ao envolvimento da criança em ativida- Espera-se que a presente avaliação possa
des esportivas e de lazer, a maioria foi contribuir para o subsídio de intervenções
referida como clínica, indicando o baixo com crianças hospitalizadas, bem como
envolvimento em atividades recreativas. com seus cuidadores, prevenindo danos
Já a análise de problemas de comporta- emocionais gerados pela hospitalização.
mento (CBCL) mostrou que a maioria das
crianças foi referida como clínica. A aná- Palavras-chave: estratégias de
lise por tipo de comportamento permitiu enfrentamento, hospitalização infantil,
verificar que a indicação de problemas é cuidadores.
do tipo internalizante, caracterizado por Contato: Camila Ramos Medalane Cravinho,
um padrão de depressão, retraimento Centro Universitário Vila Velha/UVV,
e desânimo. Esses achados ressaltam a millamedalane@hotmail.com
importância da inserção do psicólogo na
Pediatria, uma vez que um padrão de de-
sânimo e depressão anterior à hospita- PERCEPÇÕES MATERNAS SOBRE
lização pode repercutir na variabilidade CUIDADOS E PROBLEMAS
de estratégias da criança para lidar com COMPORTAMENTAIS DE FILHOS
a hospitalização. Com relação à avaliação PREMATUROS E COM BAIXO PESO
das estratégias de enfrentamento dos cui-
dadores, verificou-se que dos quatro fato- Kelly Ambrósio Silveira - UFES/IESFAVI
res da EMEP, o Fator 3 (Busca de prática kellysilveira.psicologia@gmail.com
religiosa/pensamento fantástico) apre- Schwanny Roberta Costa Rambalducci
sentou média de pontuação superior (M= Mofati Vicente - UFES
2,95 e DP= 1,77), seguido do Fator 4: Bus- schwannyv@hotmail.com
ca de suporte social (M= 2,83 e DP= 1,82) Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES
e do Fator 1: Enfrentamento focalizado no soniaenumo@terra.com.br
problema (M= 2,81 e DP= 1,73). O fator Financiamento: CNPq
que apresentou menor média foi o Fator
2: Enfrentamento focalizado na emoção A literatura tem apontado a prematu-
(M= 1,75 e DP=1,21). A análise por itens ridade e o baixo peso como fatores que
destaca médias superiores nos itens 44 podem conferir maior vulnerabilidade
– “Eu me apego à minha fé para superar ao desenvolvimento infantil. Seus efeitos
esta situação” (M = 3,65) e 6 – “Espero podem ser observados durante a primei-
que um milagre” aconteça (M = 3,55), am- ra infância e, até mesmo, na fase escolar
bas as estratégias do Fator 3. A freqüência (Linhares, Bordin & Carvalho, 2004; Ma-
maior de estratégias do Fator 3 mostrou- galhães, Catarina, Barbosa, Mancini &
-se coerente com estudos que indicam a Paixão, 2003). Diversos estudos mostram

254
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que crianças em condições de nascimen- Grande Vitória, ES. Participaram da coleta


to prematuro e com baixo peso (PT-BP), 30 mães de crianças PT-BP, divididas em
quando comparadas a crianças com peso três grupos: mães de crianças de 18 a 24
≥2.500g e >37 semanas de gestação, são meses (G1= 10), 24 a 30 meses (G2= 10) e
mais propensas a apresentar comprome- 30 a 36 meses (G3= 10). Foram aplicados:
timentos no desenvolvimento cognitivo e um questionário sobre dados familiares
comportamental (Espírito Santo, Portu- e de nascimento e uma entrevista se-
guez & Nunes, 2009; Linhares, Chimello, miestruturada contemplando percepções
Bordin, Carvalho & Martinez, 2005). Ao sobre formas de cuidado com os filhos,
mesmo tempo, a Psicopatologia do Desen- métodos de estimulação que as mães uti-
volvimento tem indicado a ação de fato- lizavam e expectativas sobre o desenvol-
res biopsicossociais que tendem a produ- vimento do filho. Também foi aplicado o
zir efeitos diferenciados ao longo da traje- Child Behavior CheckList – CBCL (1½ a 5
tória de desenvolvimento infantil (Laucht, anos) (Achenbach & Rescorla, 2004), que
Schmidt & Esser, 2004). Nesse contexto, a avalia problemas comportamentais do
interação de criança e seus familiares pa- tipo internalizante e externalizante, além
rece ser crucial para o desenvolvimento de conter escalas orientadas pelo DSM-IV
de variadas habilidades (Linhares, Mar- que, no caso do presente estudo, aponta-
tins & Klein, 2004). Ressalta-se, também, ram predominância de problemas exter-
que as condições neurológicas e familia- nalizantes, com 30% da amostra apresen-
res da criança atuam de modo significa- tando perfil Clínico para esse problema
tivo a suavizar ou agravar tais compro- comportamental. Os problemas mais fre-
metimentos. Estudos têm apontado que quentes foram de ordem atencional (50%
mães com filhos PT-BP mostram-se mais da amostra). A maioria das crianças (20)
atentas nos cuidados com os filhos, assim apresentou perfil clínico para pelo menos
como mais sensíveis em relação aos sinais um tipo de problema comportamental,
emitidos por eles (Feldman, 2007). Esses com maior proporção no G1 (7). Conside-
comportamentos maternos podem cons- rando as médias obtidas pelos T scores, os
tituir-se em uma forma de compensação problemas atencionais e a agressividade
perante os riscos aos quais os bebês estão tiveram as maiores pontuações, sobretu-
expostos. Por outro lado, as mães podem do, em G1 (60,5 e 61,3) e G2 (65,0 e 62,2),
apresentar comportamentos menos as- respectivamente. Considerando as esca-
sertivos ao lidar com o filho, em decor- las orientadas pelo DSM-IV, foi observada
rência da fragilidade do recém-nascido e maior frequência em G1 e G2 de Transtor-
sentimentos de culpa vivenciados (Feld- no de Déficit de Atenção e Hiperatividade
man, 2007; Morsh & Abreu, 2008). Diante (5 crianças cada) e Transtorno Desafiador
disso, esta pesquisa investigou queixas e Opositor (2 e 3 crianças, respectivamen-
comportamentais relacionadas aos filhos, te). A partir da entrevista, foi possível
além de formas de cuidado e interação identificar que 80% das mães acredita-
entre crianças PT-BP com idade entre 18 vam que o fato do filho ter nascido PT-BP
e 36 meses e suas mães, inscritos em Pro- não influenciava seu desenvolvimento e
grama de Follow up de um Ambulatório que a assistência que a criança iria rece-
de Neurologia de um hospital público da ber seria primordial. As mães relataram

255
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que levavam sempre a criança para con- interferir (7), bater (3) e não dar atenção
sultas com médico, fisioterapeuta e ou- (2). Observou-se que em G1 houve maior
tras especialidades que fossem necessá- frequência de comportamentos pouco
rias. Costumavam, também, estar muito assertivos, ligados, sobretudo, a ajudar a
presentes na vida dessas crianças, dando criança por achá-la frágil (5), tentar dis-
carinho e apoio, fatores que elas acredita- trair a criança (4) e não interferir, mesmo
vam ser fundamentais para o desenvolvi- nervoso (3). Diante dos resultados obti-
mento de seus filhos. Uma pequena parte dos, é possível concluir que as mães de
das mães (20%) acreditava que a PT-BP crianças PT e BP acreditam que esses fato-
influenciava o desenvolvimento de seus res podem não afetar o desenvolvimento
filhos, mas, todas concordavam que a es- da criança, a partir do momento em que
timulação era essencial. Todas as mães elas se disponibilizam ao cuidado. Sugere-
falaram sobre a importância de sua aju- -se que o sentimento de culpa frente ao
da no desenvolvimento da criança; essa nascimento de risco, porventura, expe-
ajuda foi traduzida, em 72,5% das mães, rimentado pelas mães e demais familia-
em cuidados com a saúde, como acom- res, pode contribuir para a manutenção
panhamento com profissionais de saúde, de repertório comportamental que con-
boa alimentação, uso de remédios e vita- temple a superproteção, como forma de
minas; dar atenção, carinho e cuidar foi compensar a vulnerabilidade apresenta-
relatado por 62,5% das mães; e realiza- da pelos filhos e o desconforto frente aos
ção de atividades lúdicas, por 37,5% das problemas apresentados. G1 apresentou
mães. Foram relatadas outras atividades discurso relacionado à superproteção e
com baixos índices, tais como levar para ao cuidado não assertivo, e teve maior
escola e creche, com 15%, e também pra- frequência de crianças com problemas
ticar natação, com 7,5%. Com relação às comportamentais externalizantes. Os
atividades que realizavam juntos, as mais dados presentes confirmam a literatura
citadas foram: passeio no parque ou pra- quanto à vulnerabilidade de crianças nas-
cinha, visita aos parentes e atividades cidas PT-BP para a manifestação de pro-
realizadas em casa, tais como brincar. Ve- blemas comportamentais, sobretudo, os
rificou-se que, enquanto a frequência de de padrão externalizante, e a presença de
menção às visitas a parentes diminuiu de cuidados familiares pouco assertivos, in-
G1 a G3, a menção de atividades lúdicas dicando a necessidade de apoio aos pais,
e de lazer aumentou. De acordo com as com treinamento de habilidades ligadas à
mães, os pais tiveram um papel secundá- estimulação dos filhos.
rio no cuidado dos filhos, desenvolvendo
atividades voltadas à vigilância e às ativi- Palavras-chave: risco ao desenvolvimento,
dades lúdicas. Na perspectiva das mães, prematuridade, avaliação do
os familiares costumavam lidar com as desenvolvimento
dificuldades externalizantes, demons- Contato: Schwanny Roberta Costa
trando os seguintes comportamentos, em Rambalducci Mofati Vicente, Universidade
ordem decrescente de frequência: tentar Federal do Espírito Santo,
distrair a criança (11), ajudar a criança schwannyv@hotmail.com
por achá-la frágil (9), mesmo irritado, não

256
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ANÁLISE DE UMA PROPOSTA DE de mãe-bebê (Carvalho, Linhares, Macha-


INTERVENÇÃO COM MÃES DE BEBÊS do & Martinez, 2004). A UTIN, dispositivo
PREMATUROS E COM BAIXO PESO que oferece o máximo de suporte para o
INTERNADOS EM UTIN desenvolvimento do recém-nascido, tam-
Ana Cristina B. Cunha - UFRJ bém se constitui em potencial fator de
acbcunha@yahoo.com.br risco, devido às privações de estímulos
Luciana F. Monteiro - UFRJ sensoriais ou excesso de estimulação de-
equipe-psicologia-pediatrica@googlegroups.com corrente da atividade humana e tecnoló-
Cristiane T. Rocha - UFRJ gica presentes nesse ambiente (Raeside,
equipe-psicologia-pediatrica@googlegroups.com 1997). As complicações neonatais podem
Ana Paula A.S. Medeiros - UFRJ constituir indicadores para ocorrência de
equipe-psicologia-pediatrica@googlegroups.com efeitos negativos no desenvolvimento,
Anderson M. Rodrigues - UFRJ tais como: deficiências motoras, visuais
equipe-psicologia-pediatrica@googlegroups.com e auditivas; retardo mental; distúrbios de
Camila S. Pereira - UFRJl atenção; dificuldades de aprendizagem
equipe-psicologia-pediatrica@googlegroups.com em idade escolar e pior desempenho em
Fabiana Pinheiro Ramos - UFES testes de capacidades cognitivas e lin-
ramosfabiana@bol.com.br güísticas, se comparados aos de crianças
Schwanny Roberta Costa Rambalducci Mofati nascidas a termo e com peso adequado
Vicente - UFES (Espírito Santo, Portuguez & Nunes, 2009;
schwannyv@hotmail.com Linhares, Bordin & Carvalho, 2004). Isso
Maria Luiza Guidoni Macedo - UFES tudo pode ser agravado quando a per-
maluguima@hotmail.com cepção materna da condição da criança
Kely Maria Pereira de Paula - UFES resulta em maiores níveis de estresse,
kelympp@terra.com.br ansiedade e depressão, que podem per-
durar mesmo após a alta, indicando a
Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES
necessidade de intervenção psicológica
soniaenumo@terra.com.br
(Feldman, 2007). Nesse contexto, a reali-
Financiamento: CNPq/MCT/CAPES/MEC/ zação de intervenção durante o período
FAPERJ/CNRMS/MEC em que a mãe fica internada com o bebê
pode minimizar os impactos da hospita-
Situações de risco podem acarretar maior lização infantil no bem-estar emocional
vulnerabilidade para atrasos de desen- materno, com possíveis reflexos na inte-
volvimento, sobretudo, quando no nasci- ração mãe-criança e no desenvolvimento
mento de um bebê estiverem presentes infantil (Gasparetto & Bussab, 1994; Me-
condições de risco, como a prematuridade lnyk, Feinstein & Fairbanks, 2006; Melnyk
e o baixo peso (PT-BP). Tais condições po- et al., 2006). O objetivo deste estudo foi
dem, freqüentemente, ser causa de inter- analisar uma proposta de intervenção em
nação dos bebês em Unidades de Terapia Psicologia Pediátrica (Barros, 2003), con-
Intensiva Neonatal (UTIN) e provocar alte- duzida em duas maternidades públicas
rações nas expectativas maternas acerca de referência para assistência pré-natal e
do seu desenvolvimento, modificando, as- perinatal de alto risco - na Região Metro-
sim, as possibilidades de interação da día- politana da Grande Vitória, ES (n=18) e na

257
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Maternidade-Escola da Universidade Fe- “nada confiante”; “um pouco confiante”;


deral do Rio de Janeiro (n=14). Seguindo “o mesmo que antes”; “mais confiante’ ou
as normas éticas, as mães foram aborda- “muito mais confiante”; (g) percepção ma-
das pessoalmente e convidadas a partici- terna do quanto o grupo ajudou a enfren-
par do grupo de intervenção, que ocorreu tar a internação do bebê: “não ajudou”;
em duas sessões consecutivas. O critério “ajudou pouco”; “nem ajudou, nem atra-
de inclusão na amostra era o bebê ser PT- palhou”; “ajudou um pouco” ou “ajudou
-BP e estar internado na UTIN. Na sessão muito”; (h) sentimentos maternos sobre
1 do grupo de intervenção foram explici- participar do grupo: “detestou muito”;
tados às mães os objetivos e as etapas da “detestou um pouco”; “sente-se neutra”;
pesquisa. Após a concordância assinada, “gostou um pouco” ou “gostou muito”. Os
as mães responderam, individualmente, resultados mostraram que todas as mães
um protocolo de registro de dados sobre avaliaram que o grupo ajudou no enfren-
seu perfil psicossocial, sendo entregue um tamento da situação de internação do seu
material de apoio com informações sobre bebê, quer seja porque elas adquiriram
desenvolvimento infantil, prematuridade, conhecimento (n=12), quer seja porque
baixo peso e a internação na UTIN, conte- puderam contar com suporte psicossocial
údos transmitidos às mães nos dois dias (n=14) ou ambas as coisas (n=5). Todas as
do grupo, sob a forma de palestra infor- mães consideraram interessante e impor-
mativa seguida de discussão, com apoio tante o conteúdo transmitido ao grupo,
de material audiovisual. Na sessão 2, as sendo que a maioria (n=20) avaliou como
mães responderam um inventário de sa- interessante e importante o conheci-
tisfação do usuário e um questionário de mento adquirido (características do bebê
avaliação da intervenção psicológica im- PT-BP, como cuidar do bebê, marcos do
plementada, para verificar se a participa- desenvolvimento infantil, por exemplo),
ção no grupo as ajudou a enfrentar me- além da troca de experiência que o grupo
lhor a situação de internação do bebê. As promoveu (n=7), entre outros aspectos.
categorias analisadas foram: (a) se o grupo Sobre como as mães se sentiram após as
ajudou a mãe no enfrentamento da situa- sessões, 8 relataram que se sentiram “um
ção do bebê; (b) o que a mãe achou mais pouco melhor do que antes”, enquanto 24
interessante ou importante (ou não inte- mães declararam se sentir “muito melhor
ressante/importante) no grupo; (c) como do que antes”. Quando questionadas so-
a mãe se sentiu após as sessões: “muito bre o que aprenderam sobre o bebê inter-
melhor”; “melhor”; “igual”; “pior” ou nado em UTIN, a maioria (n=20) disse ter
“muito pior”; (d) o que a mãe aprendeu aprendido “muitas coisas” sobre o bebê
sobre o bebê internado em UTIN: “nada”; internado e “muitas coisas” sobre como
“muito pouco”; “alguma coisa”; “várias lidar com o bebê na UTIN (n= 21). Após
coisas” ou “muitas coisas”; (e) o que a participar do grupo, apenas uma mãe
mãe aprendeu sobre como lidar com o declarou se sentir da mesma forma que
bebê internado: “nada”; “muito pouco”; antes em relação a estar confiante para
“alguma coisa”; “várias coisas’ ou “muitas cuidar do bebê, enquanto que a maioria
coisas”; (f) estado emocional da mãe após se declarou “mais confiante” (n= 13) ou
o grupo para cuidar do bebê internado: “muito mais confiante” (n=18); além dis-

258
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

so, a maioria afirmou ter “gostado muito da inteligência dos surdos é uma ativida-
do grupo” (n= 31) e 27 mães também con- de muitas vezes relevante para decidir
sideraram que o grupo “ajudou muito” a quanto ao encaminhamento e/ou planos
enfrentar a internação do bebê na UTIN. de intervenção para a efetividade dos
Os sentimentos e percepções maternas processos inclusivos. As escalas Wechsler
acerca da participação no grupo indicam de inteligência, em suas diversas edições,
uma avaliação positiva da proposta de in- são amplamente utilizadas na avaliação
tervenção psicológica adotada, capaz de de crianças e adolescentes, estimando a
promover estratégias mais adequadas de capacidade intelectual geral em função
enfrentamento da hospitalização do bebê, dos domínios das habilidades verbais e
a partir do conhecimento adquirido, bem não-verbais. Encontram-se vários estudos
como do suporte psicossocial e da troca que utilizam estas escalas também com
de experiências que o grupo proporcionou surdos, administrando, principalmente,
às mães. o conjunto de subtestes não-verbais, os
quais não exigem respostas que envolvam
Palavras-chave: grupo de mães, estratégias de a linguagem oral do examinando. Devido
enfrentamento, prematuridade e baixo peso ao atraso no desenvolvimento da
Contato: Cristiane Tonnensen Rocha, linguagem, os surdos, geralmente, têm
Universidade Federal do Rio de Janeiro, desvantagens nos subtestes verbais. As
equipe-psicologia-pediatrica@googlegroups.com aplicações costumam ser administradas
de maneira informal (gestualização), oral
(leitura labial) e mesmo, no caso de utili-
CO 17 - LT02 zar a Língua de Sinais, não há referências
de estudos de adaptação. Os resultados
Surdez apontam para escores médios na escala
não-verbal e médios inferiores a limítrofes
na escala verbal. Além de problemas rela-
LT02-1382 - COGNIÇÃO E LINGUAGEM cionados à falta de adaptação do instru-
DOS SURDOS: UM ESTUDO mento, outros fatores podem justificar o
EXPLORATÓRIO COM BASE NO TESTE baixo desempenho dos surdos nos subtes-
WISC-III tes verbais das escalas Wechsler. Segundo
Tharso Meyer - UCPel-RS a literatura, as oportunidades limitadas de
tharso.psico@gmail.com ouvir informações e a falta do reforço au-
Vera Figueiredo - UCPel-RS ditivo prejudicam a aquisição e o aumento
verafig@terra.com.br do vocabulário dos surdos. A limitação em
compreender conceitos científicos pode
Considerando o número cada vez maior estar associada à ausência de algumas
de surdos inseridos na comunidade aca- aprendizagens do cotidiano, previamente
dêmica/escolar, surge uma demanda de adquiridas. A dificuldade ao acesso a uma
profissionais especializados, metodolo- língua que seja oferecida de forma natural
gias e instrumentos adequados para aten- pode levar a criança surda a um tipo de
der às necessidades dessa população com pensamento mais concreto. Os pais de 90
características tão específicas. A avaliação a 95% dos surdos são ouvintes, a maioria

259
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

demonstrando resistência no aprendizado anos, considerando-se o critério mais re-


e na utilização da Libras. Consequente- levante, a escolaridade dos adolescentes,
mente, o filho surdo chega à escola sem uma vez que, normalmente, há um atraso
dominar nenhuma língua, encarregando na escolarização dos surdos. O teste foi
a instituição de criar condições para esta aplicado nas próprias instituições escola-
aquisição. A língua brasileira de sinais – Li- res por duplas de pesquisadores com do-
bras foi reconhecida no país em abril de mínio da Libras; um sinalizava os itens e
2002 e é considerada a língua materna outro registrava as respostas. Em relação
dos surdos. Por ser uma língua recente aos subtestes não-verbais, foram testadas
e em construção, há uma limitação de as instruções e os itens iniciais de cada
expressões, não havendo, ainda, sinais subteste. Os participantes não tiveram
formais para alguns vocábulos do portu- dificuldades de compreender e executar
guês. O sinal utilizado para determinado as tarefas, demonstrando terem poten-
conceito em Libras, pode abranger outros cial para o raciocínio prático-concreto e
significados que representam, no portu- facilidade para percepção e organização
guês, palavras diferentes. Assim, a dificul- de estímulos visuais, confirmando dados
dade dos surdos pode estar associada à da literatura. No subteste Informação, os
privação de ferramentas da competência dados mostraram que os alunos surdos
gramatical. Apresentar alguns resultados parecem ter dificuldade de memorizar
sobre a capacidade cognitiva e o desen- e assimilar conteúdos dos itens relacio-
volvimento da linguagem dos surdos, nados com a vivência pessoal e o currí-
segundo seu desempenho nas provas do culo escolar. Em Semelhanças, o tipo de
teste de inteligência WISC-III. Com intuito estímulo utilizado é breve, já que inclui
de verificar a adequação do instrumento perguntas simples e repetitivas, exigindo
para a comunidade surda, o WISC-III, na que o indivíduo identifique a similaridade
sua forma original, adaptado ao contexto entre os dois conceitos ou objetos apre-
brasileiro, foi apresentado a um grupo de sentados. As respostas referiram-se, ge-
especialistas para analisar a adequação ralmente, às diferenças entre os objetos,
dos itens ao contexto dos surdos. Logo, sendo associadas às situações concretas,
foram feitas algumas modificações perti- demonstrando dificuldade no raciocínio
nentes e, após, os itens e as instruções do abstrato. No subteste Vocabulário, dos 30
instrumento foram traduzidas para Libras. itens que compõe o subteste, 14 palavras
O teste WISC-III traduzido foi filmado e não foram encontradas no dicionário de
gravado em DVD para treinamento e pa- Libras, indicando pobreza lexical da língua.
dronização das aplicações. O instrumento A tarefa no subteste exige que o exami-
foi aplicado em uma amostra-piloto cons- nando identifique o significado da palavra
tituída de 14 escolares surdos de ambos dando sinônimos. Observou-se repertório
os sexos, usuários da Libras, matriculados limitado de vocabulário, uma vez que, um
de quatro escolas públicas, inclusivas e único sinal em Libras, pode ter vários si-
exclusivas, duas cidades da região sul do nônimos e significados diferentes. No sub-
país. Apesar de o teste ser padronizado teste Compreensão, que envolve conheci-
para a faixa de 6 a 16 anos, foi aplicado mento de situações sociais do cotidiano,
em participantes com idades entre 7 a 21 os participantes não conseguiram dar

260
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dois argumentos diferentes nos itens que como uma deficiência que deve ser repa-
exigem duas respostas, sugerindo pensa- rada. Esta perspectiva está referida a um
mento mais concreto e dificuldade para conceito fixo de normalidade. É uma ten-
expressar as ideias. No subteste Dígitos, dência, neste modelo, atribuir-se ao sur-
o examinando deve repetir uma série de do desvantagens maturativas, sejam elas
números, sinalizados pelo examinador. de origem neurológica ou psicológica. Na
Identificou-se dificuldade sequencial vi- psicologia, a concepção clínico-terapêuti-
sual e limitações na memória imediata. ca foi dominante especialmente entre os
No subteste Aritmética que exige cálculos anos 50 e 60, dando origem à Psicologia da
a partir da sinalização do examinador de Surdez, que atribuía ao surdo dificuldades
problemas matemáticos, os participan- de ordens motora, intelectual e compor-
tes evidenciaram dificuldade de executar tamental. (Bisol, Simioni & Sperb, 2008;
cálculo mental, e déficit de atenção. O de- Solé, 2005). Em oposição a esta corrente,
sempenho nos subtestes verbais, que en- surge o modelo socioantropológico, que
volve domínio e aprendizagem da língua e se desenvolve em interface com os Estu-
raciocínio teórico-reflexivo, demonstrou dos Culturais, as antropologias de grupos
pouca qualidade na elaboração das res- minoritários, políticas de educação, polí-
postas. Pode-se concluir que, apesar das ticas identitárias, entre outros. Este con-
limitações em algumas habilidades cogni- junto de estudos é denominado Estudos
tivas dos surdos e restrições na comuni- Surdos. Ele parte de uma compreensão da
cação familiar, a falta de recursos léxicos surdez como diferença, cultural e lingüís-
da própria Língua de Sinais e a estrutura tica, e propõe a construção de saberes e
inapropriada dos subtestes verbais dificul- práticas que considerem as particularida-
tam o processo de avaliação deste grupo des da aquisição da linguagem e constru-
clínico, por meio do teste WISC-III sem um ção do conhecimento pelos surdos como
processo de adaptação. qualitativamente diferentes dos ouvintes.
(Skliar, 2010; Bisol et al, 2008; Solé, 2005).
Um terceiro grupo de trabalhos sobre a
LT02-1448 - OS EFEITOS DO surdez pode ser identificado, ainda que
NASCIMENTO DE UMA CRIANÇA não se constitua como um modelo. São
SURDA EM UMA FAMÍLIA OUVINTE – os trabalhos que se constroem a partir da
CONSIDERAÇÕES DESDE A PSICANÁLISE teoria psicanalítica. Segundo Solé (2005),
Letícia Silveira Vasconcelos - UFBA só recentemente este tema tem sido es-
www.ufba.br tudado por psicanalistas e ainda há um
Sônia Maria Rocha Sampaio - UFBA número pequeno de artigos publicados.
www.ufba.br Esses estudos devem ser considerados
como um grupo a parte, não se alinhando
Duas correntes principais e opostas sobre com nenhuma das correntes citadas ante-
a surdez são encontradas na psicologia e riormente. Em um artigo no qual analisam
nas demais áreas que se ocupam do tema. a produção da psicologia brasileira sobre
A mais antiga, vinculada a um modelo mé- a surdez, Bisol et al (2008) também situ-
dico, denominada modelo clínico-terapêu- am os estudos de concepção psicanalítica
tico, se alinha a uma concepção da surdez como um terceiro grupo. Dos 34 artigos

261
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

encontrados, seis foram identificados pe- ativando áreas corticais relevantes para a
las autoras como pertencentes ao modelo linguagem. Também Kuhl (2007) mostra
clínico-terapêutico, 24 ao socioantropo- que o uso do manhês por adultos encoraja
lógico e quatro à concepção psicanalítica. a reciprocidade nas crianças e demonstra
Desde a psicanálise, a surdez vai ser toma- que mesmo recém-nascidos preferem as
da a partir da forma como se inscreve na falas dirigidas aos bebês, ainda que não
história do sujeito e daqueles com quem sejam produzidas por suas próprias mães
vai estabelecer seus primeiros laços. Des- e mesmo que não sejam ditas em sua lín-
se modo, como afirma Solé (2005, p.35), gua materna. Os estudos sobre a aquisição
a psicanálise “não se atém à normalização da linguagem ressaltam a importância de
e não busca a cura”, mas vai se perguntar que a criança seja, desde seu nascimento,
sobre as especificidades da estruturação inserida em um ambiente lingüístico natu-
subjetiva de cada sujeito marcada pela ral, em que a língua lhe seja apresentada
surdez. Este trabalho parte da idéia de que cotidianamente. Esta compreensão se sus-
a surdez se apresenta para a teoria psica- tenta no entendimento de que a língua e a
nalítica, de cara, como um desafio, uma linguagem são adquiridas em relação com
vez que vai demandar um repensar sobre o outro e com o meio. De modo geral, os
algumas questões centrais à psicanálise, trabalhos sobre a surdez definem a língua
em especial àqueles que trabalham com de sinais como língua natural, ou língua
a psicanálise e o desenvolvimento infan- materna, dos surdos, justamente por ser
til. Porém, justamente por isso, que é na essa uma língua que o surdo pode apre-
própria psicanálise que se poderá produzir ender naturalmente. No entanto, entre
contribuições importantes sobre o tema. 90 e 95% das crianças surdas nascem em
Entre estes pontos destaca-se a centrali- famílias ouvintes, que não dominam a lín-
dade incontestável da linguagem para esta gua de sinais. Algum tempo se passa até
teoria e sua conseqüente importância para que a família possa se adaptar às neces-
a estruturação subjetiva; a importância sidades lingüísticas deste novo membro e
atribuída pela psicanálise, desde Freud, que possa escolher que caminho vai tomar
às primeiras experiências da criança com no que diz respeito à inserção de seu filho
a linguagem, mediada pelo Outro Primor- na língua. Diante do exposto perguntamos
dial; e o papel fundamental da voz mater- o que pode nos dizer a psicanálise sobre
na, e do manhês, para o enlaçamento do os efeitos do nascimento de uma criança
bebê à linguagem. Neste trabalho, busca- surda em uma família de ouvintes. Três
mos artigos empíricos de outras áreas de grupos de efeitos são analisados: os efei-
pesquisa para verificar essas idéias. Entre tos na entrada do bebê na linguagem, os
outros, Beauchemin, González-Franken- efeitos na alienação e separação entre os
berger, Trembla et al., (2010) ressaltam corpos da mãe e do bebê e os efeitos na
a importância da voz, em detrimento de apresentação do mundo ao bebê. Enten-
outros estímulos sonoros, para o córtex demos que, embora apresentados de for-
auditivo, em especial de vozes familiares. ma separada, estes são eventos essenciais
Este estudo demonstrou que bebês não ao processo de estruturação subjetiva. A
só reagem à voz materna de forma mais análise destes três eixos, a partir de arti-
ativa, como reagem de forma diferente, gos teóricos, relatos de casos e experiência

262
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

profissional com crianças surdas e suas fa- ser e o modo como se quer viver” (Puig,
mílias, demonstrou que a surdez, enquan- 1998, p. 26). La Taille (2006) diferencia
to ausência de percepção do estímulo moral de ética, sendo moral referente
auditivo, não impede o processo de estru- aos deveres e ética relacionada às refle-
turação subjetiva. No entanto, ela coloca xões acerca da felicidade. Nesse contex-
algumas barreiras, especialmente por con- to, é possível emergirem perguntas como
ta da diferença lingüística entre o bebê e “quem eu quero ser?” (La Taille, 2006, p.
sua família. Não é a lesão real, mas a lesão 46) e “que vida eu quero viver?” (p. 36),
fantasmática (Bergès, 1988b) que pode instigando a investigação sobre projetos
trazer efeitos mais nocivos e permanentes de vida. Para Damon (2009), o projeto de
para o sujeito surdo. Sob todos os aspec- vida, em uma perspectiva ética, é “uma
tos, ficou bastante clara a necessidade de intenção estável e generalizada de al-
um diagnóstico o mais precoce possível da cançar algo que é ao mesmo tempo sig-
surdez. Do lado estrutural, o saber sobre a nificativo para o eu e gera consequências
surdez e o poder elaborar o luto pelo filho no mundo além do eu” (p. 53). Pesquisas
idealizado é que vão dar início à constru- sobre projetos de vida em tal perspecti-
ção de um novo lugar para o bebê. Do lado va destacam a escassez de projetos de
instrumental, um acompanhamento inter- vida em que o outro comparece de forma
disciplinar poderá ajudar a família a lançar central (D'Áurea-Tardeli, 2005; La Taille
mão de diferentes possibilidades lingüísti- & Madeira, 2004; Miranda, 2007). Para
cas, ainda nos primeiros momentos de sua investigar a relação entre moralidade e
entrada na linguagem. legitimação de atos violentos, La Taille e
Madeira (2004) analisaram projetos de
Palavras-chave: surdez, psicanálise, vida de adolescentes e observaram que,
estruturação subjetiva em linhas gerais, o uso da violência não
Contato: Letícia Silveira Vasconcelos – UFBA – foi condenado moralmente pelos partici-
leticiasvasconcelos@gmail.com pantes. Os autores ressaltam que "grande
parte dos adolescentes justificam hipote-
ticamente a violência [...] e, no plano éti-
LT03-1004 - PROJETOS DE VIDA DE co, não inclui outrem como parceiro nos
UNIVERSITÁRIOS SURDOS EM UMA seus projetos de vida." (p. 30). Em sua
PERSPECTIVA ÉTICA pesquisa, D'Áurea-Tardeli (2005) verificou
que somente 29,55% dos participantes
Alline Nunes Andrade - UFES apresentaram aspirações solidárias em
lineandrade@gmail.com seus projetos de vida. Por sua vez, Miran-
Heloisa Moulin de Alencar - UFES da (2007) também considerou as justifica-
heloisamoulin@gmail.com tivas dos projetos de vida de adolescentes
Financiamento: FAPES em conectados, nos quais outras pessoas
eram incluídas como protagonistas e par-
A moral passa por desenvolvimento (Pia- ticipantes, ou desconectados, quando
get, 1932/1994; Kohlberg, 1992) e se ori- outras pessoas eram consideradas, mas
gina da indeterminação, que “obriga o ser de modo instrumentalizador. As princi-
humano a construir o modo como quer pais justificativas (66,7%) caracterizaram

263
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os projetos de vida como desconectados surdos e de Libras. Os projetos de ‘forma-


(Miranda, 2007). Com base nesses dados, ção acadêmica’ (n=27) destacam cursar
pretendemos investigar o grau de con- uma pósgraduação lato ou strictu sensu e
sideração do outro em projetos de vida concluir a graduação atual ou cursar uma
estabelecidos por universitários surdos, nova graduação. Esse dado vai de encon-
usuários da língua de sinais. Os surdos tro aos resultados apresentados por Mi-
fazem parte de uma comunidade minori- randa (2007), em cujo estudo os projetos
tária que, de acordo com Gesueli (2006), de formação acadêmica foram pouco
é usualmente discriminada, comumente considerados. Os projetos de ‘relacio-
pela adoção de uma perspectiva médica namento afetivo’ (n=20) abrangem tan-
da surdez ou modelo clínico da surdez. to o propósito de casar e constituir uma
Porém, Skliar, Massone e Veinberg (1995) família, como apenas ter filhos, adotar
alegam ser possível assumirmos a pers- crianças surdas, investir na formação dos
pectiva socioantropológica, que considera filhos e cuidar dos próprios pais. Os ‘bens
o surdo como parte de uma comunidade materiais’ (n=11) foram considerados em
para a qual a língua de sinais exerce um menor quantidade e dizem respeito à
papel fundamental. Nebel (2006) observa aquisição de casa e carro, além de ter me-
que por ter sido comum o modelo clínico lhores condições financeiras. Em relação
da surdez na área educacional, “a escola às justificativas, propomos o Grau de Con-
não tinha compromisso com o desenvol- sideração de Si e do Outro (GCSO), pois a
vimento cognitivo do aluno” (p.12). His- maneira como o outro e/ou si próprio fo-
tórias de fracasso escolar e proibição do ram considerados nas justificativas carac-
uso de Libras nos espaços escolares foram terizou a conexão ou desconexão dos pro-
relatadas por pessoas surdas em estudos jetos. Nessa análise, os projetos citados
sobre humilhação (Andrade, 2006; Andra- pelos participantes podem ser do tipo: 1)
de & Alencar, 2008, 2010). Pretendemos, ‘autocentrado’ (n=158), com referência
assim, investigar a existência de projetos às próprias características, necessidades,
de vida em uma perspectiva ética, com a habilidades, possibilidades de satisfação
participação de 16 universitários surdos, pessoal ou benefício pessoal, em que o
da região da Grande Vitória-ES, usando outro pode aparecer, mas figurativamen-
o método clínico piagetiano, por meio te; 2) ‘conectado com a comunidade sur-
de uma entrevista semiestruturada em da’ (n=63), com referência aos integran-
língua de sinais e filmada na íntegra. Per- tes da comunidade surda como protago-
guntamos aos participantes ‘Quem é você nistas; 3) ‘conectado com a sociedade’
no futuro do jeito que você gostaria que (n=32), com preocupação em promover a
fosse?’. Em resposta, foram citados 102 inclusão, considerando o próprio relacio-
projetos de vida. Os principais projetos de namento com os ouvintes como pessoas
vida são de ‘atividade profissional’ (n=29), capazes de conhecer, interagir, respei-
‘formação acadêmica’ (n=27), ‘relaciona- tar e/ou reconhecer o valor positivo dos
mento afetivo’ (n=20) e ‘bens materiais’ surdos; 4) ‘conectado com pessoas pró-
(n=11). Em ‘atividade profissional’ (n=29) ximas’ (n=24), em que o outro é alguém
identificamos como principal intenção ou mais pessoas com relação de proximi-
o desejo de tornarem-se professores de dade com o participante ocupando um

264
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

papel de protagonismo em seu projeto; LT03-1007 - EXPECTATIVAS E


5) ‘desconectado de pessoas próximas’ ESTRATÉGIAS DE UNIVERSITÁRIOS
(n=9), em que o outro é alguém ou mais SURDOS SOBRE SEUS PROJETOS DE VIDA
pessoas com relação de proximidade com Alline Nunes Andrade - UFES
o participante, porém considerado como lineandrade@gmail.com
meio para realizar um projeto. Os dados Heloisa Moulin de Alencar - UFES
apresentados indicam o quão é urgente, heloisamoulin@gmail.com
para esses participantes, o investimen-
Financiamento: FAPES
to em si próprio, haja vista a quantidade
de argumentos categorizados como auto
O mal-estar moral vivido pela sociedade
centrados, ressaltando a importância do
contemporânea tem sido alvo de refle-
sentimento de expansão de si próprio (La
xões (La Taille & Menin, 2009), instigando
Taille, 2006) como crucial para a experiên-
a realização de pesquisas sobre projetos
cia do sentido da vida. Em contrapartida,
de vida. Projeto vital é "uma intenção es-
as justificativas que apontam para a cone-
tável e generalizada de alcançar algo que
xão com o outro, em níveis diferentes de
é ao mesmo tempo significativo para o eu
relação, totalizam um número conside-
e gera consequências no mundo além do
rável (n=119). Em tais argumentos iden-
eu" (Damon, 2009, p. 53). Pesquisas re-
tificamos que o participante se beneficia
centes destacam a escassez de projetos
com o beneficio conquistado ao outro por
de vida em que o outro comparece de
meio de seus projetos de vida, especial-
forma central (D'Áurea-Tardeli, 2005; La
mente projetos de atividade profissional
Taille & Madeira, 2004; Miranda, 2007).
e de formação acadêmica. Lembramos
Em sua pesquisa, D'Áurea-Tardeli (2005)
que projetos de vida que incluíam o outro
verificou que somente 29,55% dos par-
de forma solidária foram pouco encontra-
ticipantes apresentaram aspirações soli-
dos nos estudos mencionados (La Taille
dárias em seus projetos de vida. Miranda
& Madeira, 2004; D’Áurea-Tardeli, 2005;
(2007) também classificou as justificati-
Miranda, 2007). Pretendemos contribuir
vas dos projetos de vida de adolescentes
para a ampliação das pesquisas em Psico-
como conectados, nos quais outrem era
logia da Moralidade, no que tange aos es-
incluído como protagonista, ou como des-
tudos sobre projeto de vida em uma pers-
conectados, quando outras pessoas eram
pectiva ética, tendo pessoas surdas como
consideradas, mas de modo instrumenta-
público-alvo, a respeito de quem existem
lizador. As principais justificativas (66,7%)
poucas pesquisas realizadas.
caracterizaram os projetos de vida como
desconectados (Miranda, 2007). Expecta-
Palavras-chave: moralidade, projetos de vida,
tivas positivas em relação ao futuro são
surdos
verificadas em estudos sobre projetos
Contato: Alline Nunes Andrade, UFES,
de vida de adolescentes (Sarriera, Silva,
lineandrade@gmail.com
Kabbas, Lópes, 2001; Miranda, 2007; Oli-
veira & Saldanha, 2010) e de estudantes
universitários (Callegaro & Zimmerman,
2007). Por outro lado, autores identificam
a indefinição do perfil profissional exigido

265
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pelo mercado como fator de influência profissional’, ‘formação acadêmica’, ‘re-


negativa das expectativas de estudantes lacionamento afetivo’ e ‘bens materiais’
universitários (Gondim, 2002; Bardagi, . Posteriormente, realizamos as seguin-
Lassance, Paradiso, Menezes, 2006). Au- tes perguntas e respectivas justificativas,
tores como Matheus (2003), Furlani & para cada projeto mencionado: 1) ‘Você
Bonfim, (2010) consideram que determi- acredita que você realizará esse projeto?’
nadas condições sociais vivenciadas por e 2) ‘De que maneira você pretende reali-
jovens podem resultar em restrição de zar esse projeto?’. Sobre as expectativas
expectativas a metas mais palpáveis. Fur- de realização dos projetos, obtivemos
lani e Bonfim (2010) observam ainda que como principais respostas: ‘sim’ (n=65)
seus participantes “expressavam a falta e ‘depende’ (n=26). As justificativas das
de criatividade e motivação para projetar expectativas são do tipo ‘autocentrado’
planos objetivos e metas diversificadas (n=71), ‘conectado’ (n=39) e ‘desconec-
para suas vidas” (p. 57), o que pode estar tado’ (n=28). Em geral, argumentos au-
relacionado à condição econômica desfa- tocentrados explicam as expectativas
vorável. Com base nesses dados, preten- positivas de realização dos projetos, pois
demos investigar os projetos de vidas, as os participantes se baseiam em suas pró-
expectativas e as estratégias de realização prias habilidades, desejos e condições.
por parte de universitários surdos. Estu- Também nota-se que a conexão com pes-
dos apontam para a existência de humi- soas próximas, com a comunidade surda
lhação nas histórias de vida de surdos e com a sociedade, presente nas justifi-
(Andrade, 2006; Nebel, 2006; Gesueli, cativas do tipo ‘conectado’, motivam os
2006; Andrade & Alencar, 2008, 2010) participantes a crerem na concretização
marcadas pela exclusão e pela impossibi- de seus projetos. Porém, respostas cate-
lidade de comunicação devido à adoção gorizadas em ‘depende’ revelaram argu-
de uma perspectiva médica da surdez. mentos desconectados, especialmente
Para Skliar, Massone & Veinberg (1995), a aqueles em que o participante está des-
perspectiva médica impõe uma visão pa- conectado de si e centrado no outro. As-
tológica, resultando em estratégias e re- sim, embora desejáveis, alguns projetos
cursos de ‘normalização’ do sujeito surdo; estão dependentes de outras pessoas
em contrapartida, a perspectiva socioan- para que sejam realizados, gerando ins-
tropológica considera o surdo como parte tabilidade na projeção de si no futuro.
de uma comunidade para a qual a língua Sobre como os participantes pretendem
de sinais é central. Considerando esse realizar os projetos, as principais estra-
histórico de restrições às pessoas surdas, tégias foram ‘acadêmicas’ (n=63), ‘profis-
entrevistamos 16 universitários surdos da sionais’ (n=44) e de ‘cuidado com o outro’
Grande Vitória-ES, utilizando o método (n=20). Para esses participantes, a realiza-
clínico piagetiano (Piaget, 1932/1994) em ção dos seus projetos depende principal-
língua de sinais, com filmagem integral. mente de estudar, concluir a graduação e
Perguntamos aos participantes ‘Quem conhecer novas tecnologias. Em seguida,
é você no futuro do jeito que você gos- obter um trabalho futuro, avaliar alterna-
taria que fosse?’. Como resposta, foram tivas de trabalho e participar de concur-
citados 102 projetos de vida: ‘atividade sos configuram estratégias ‘profissionais’.

266
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

O ‘cuidado com o outro’ foi mencionado zação dos projetos de vida apresentavam
apenas pelas mulheres, principalmente justificativas do tipo autocentrado, se-
em relação ao cuidado e à educação dos guido por argumentos conectados. Esse
filhos já existentes. As justificativas das dado parece indicar a valorização que os
estratégias foram categorizadas em ‘au- participantes atribuem a si próprios, mas
tocentrado’ (n=103), ‘conectado’ (n=79) que também assinalam o lugar do outro
e ‘desconectado’ (n=45). As referências em suas aspirações, de forma conectada;
às próprias habilidades, necessidades e sendo que esta última forma foi pouco en-
características foram novamente consi- contrada noutros estudos (La Taille & Ma-
deradas pelos participantes, à frente dos deira, 2004; D’Áurea-Tardeli, 2005; Miran-
argumentos que remetem à conexão com da, 2007). Pretendemos contribuir para a
a comunidade surda, com pessoas pró- ampliação das pesquisas sobre projeto de
ximas e com a sociedade. Argumentos vida em Psicologia da Moralidade, tendo
desconectados foram mencionados pelos pessoas surdas como público-alvo, a res-
participantes, em especial a desconexão peito de quem existem poucas pesquisas
de pessoas próximas e a sociedade des- realizadas.
conectada dos surdos. Logo, se parte das
estratégias eram conectadas devido ao Palavras-chave: surdos; expectativas;
desejo de criar oportunidades de desen- estratégias
volvimento aos surdos, de proporcionar Contato: Alline Nunes Andrade, UFES,
o desenvolvimento intelectual e moral lineandrade@gmail.com
dos filhos e de favorecer a inclusão pro-
piciando o relacionamento entre ouvintes
e surdos, as estratégias desconectadas LT07-1429 - SURDEZ E
sugerem o uso de pessoas próximas – HOMOSSEXUALIDADE: ASPECTOS DA
nesse caso, intérpretes e filhos -, como FORMAÇÃO IDENTITÁRIA DE SUJEITOS
meio para a realização dos seus projetos. SURDOS NO ENFRENTAMENTO DO
Outro tipo de desconexão aparece em ar- DUPLO PRECONCEITO
gumentos nos quais a sociedade está des- Fabrício Santos Dias de Abreu - FE/UnB
conectada dos surdos. Logo, o fato de as fabra201@hotmail.com
políticas de inclusão educacional serem Daniele Nunes Henrique Silva - UnB
criadas sem considerar a opinião dos sur- daninunes74@gmail.com
dos, o mercado de trabalho local não pro-
piciar a inclusão de trabalhadores surdos Aqueles considerados deficientes fogem
e os participantes não saberem como será aos padrões normatizados de desenvol-
seu futuro profissional após a formatura vimento e são concebidos culturalmente
exemplificam essa desconexão. Lembra- como sujeitos incapazes de viverem am-
mos que a indefinição do perfil profissio- plamente em sociedade. No que tange às
nal foi apontada por alguns autores (Gon- limitações sociais impostas a essas pes-
dim, 2002; Bardagi, Lassance, Paradiso, soas, a expressão da sexualidade é uma
Menezes, 2006) como aspecto negativo temática não problematizada; um lugar
da expectativa futura. Constatamos que de negação da dimensão erótica. Em ge-
as expectativas e as estratégias para reali- ral, prevalece a ideia de que as pessoas

267
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

deficientes são assexuadas, consideradas qualificações que se constituem de ma-


infantis e inocentes (incompletas pelo neira dupla; síntese da junção de vários
defeito). O pensamento mais tradicional fatores de desqualificação em um mesmo
dirige-se para o argumento de que a se- individuo como: ser surdo (“deficiente”) e
xualidade do sujeito com peculiaridades ser homossexual. Nos estudos de Beche
no desenvolvimento inexiste, apesar da (2005), em que se discute a relação entre
bibliografia científica recente apontar no deficiência e sexualidade, a autora aponta
sentido de contestar a relação entre de- a percepção dos surdos sobre a homos-
ficiência e assexualidade (ou de proble- sexualidade, evidenciando que o tema
mática sexual) como sinônimos (Beche, ainda causa dúvida e incompreensão,
2005; Bisol, 2008 Maia, 2006 e Moukar- pois há pouca informação disponível (na
zel, 2003). Apesar desses apontamentos, família, na escola e outras instituições de
o que prevalece nos discursos cotidianos apoio) sobre a temática. Além disso, são
a respeito da sexualidade de pessoas com escassos os espaços inclusivos (com uso
deficiência é que ela se manifesta de for- da libras) para sanar dúvidas acerca da se-
ma atípica e infeliz (Maia, 2006). Quando xualidade e suas diversas manifestações.
se fala em homossexualidade relaciona- Segundo Anderson e Kitchen (2000), a
do às deficiências, o assunto é envolto maior dificuldade encontrada na vida de
em uma penumbra, com raros estudos uma pessoa com deficiência, no que tan-
investigativos. O que se percebe são in- ge as questões da sexualidade, é causada
dícios de discussões teóricas ainda inci- pelo fracasso informacional dos recursos
pientes (Maia e Ribeiro, 2010). A escassez educacionais (e de outros serviços) em
dos trabalhos acadêmicos parece refletir proporcioná-los esclarecimentos sobre
a dificuldade de abordagem do assunto. o tema. Nessa linha, Bisol (2008) afirma
Assim, não se imagina uma pessoa com que o surdo não encontra na família es-
deficiência gay ou lésbica. Essa cartogra- paço proveitoso para dirimir suas duvidas
fia subjetiva (forma(to)s de identidades sobre sexualidade, pois, na maioria dos
sexuais) apresenta, no seu fundo de aná- casos, a comunicação é precária devido a
lise, o problema do duplo-preconceito; não fluência em Libras. Dessa forma, é na
ser deficiente e ser homossexual. O que escola e no convívio com surdos adultos
prevalece no discurso hegemônico é a no- que pode acontecer o tratamento da te-
ção de que a sexualidade ora inexiste, ora mática. O presente trabalho aborda con-
é deformada, assim como a pessoa que a ceitualmente essas temáticas interdisci-
expressa. È, portanto, uma dimensão que plinares, tentando preencher, pontual-
se manifesta de forma atípica (quase pa- mente, a lacuna e a carência de pesquisas
tológica) e infeliz. Segundo Ferrari e Mar- nesse campo. A partir de relatos de dois
ques (2010), existem estratégias de des- homens surdos, que assumem uma iden-
qualificação a todos aqueles considera- tidade bilíngue homossexual como fator
dos desviantes dos padrões estabelecidos constitutivo de suas vivências, buscou-se
pela sociedade hegemônica. Muitos indi- problematizar: a) aspectos gerais da con-
víduos, em função disso, se posicionam dição social do surdo; b) experiências e
a partir do lugar de subalternidade. De vivências homossexuais; e c) (duplo)pre-
acordo com Foucault (1999), existem des- conceito. Por meio de entrevistas semies-

268
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

truturadas, contando com a participação CO 32 - LT4


de uma interprete fluente em Libras (já
conhecida e aprovada pelos sujeitos en-
Violência
trevistados), os dados, ainda em fase pre-
liminar de análise, demonstram que, para
LT04-812 - CONSELHO TUTELAR
esses sujeitos, existe um marco (ponto de
E ESCOLA: REPERCUSSÕES DE
transição) definidor do reconhecimento
PRÁTICAS SOCIAIS COM CRIANÇAS E
da sua condição homossexual: a primeira
ADOLESCENTES
relação sexual ocorrida na infância tardia.
Nesses termos, a condição homossexual Maria das Graças Vasconcelos Paiva - UERJ
se refere ao ato sexual propriamente vi-
vido, restrita a genitalidade e ao sexo. Os O objetivo deste trabalho é investigar o
surdos entrevistados parecem identificar impacto produzido pela ação do Conselho
a sexualidade como algo relacionado à Tutelar em escolas do subúrbio, periferia
ação, não necessariamente vinculado à e zona norte da Cidade do Rio de Janeiro.
dimensão do afeto, da comunicação, da Foram realizadas entrevistas com profes-
gratificação libidinosa ou de construção sores das respectivas escolas para verificar
de vínculos. Além disso, observa-se que suas opiniões sobre o Conselho Tutelar. A
os sujeitos ouvidos estabelecem estra- escolha deste órgão foi determinada pela
tégias de ocultamento da homossexua- sua estreita ligação com a comunidade,
lidade como forma de não sofrerem um inovando a forma de interação entre Po-
duplo preconceito. As estratégias mais der Público e a sociedade. Age vinculado
relevantes apontadas dizem respeito ao administrativamente ao Poder Executivo
controle do corpo, no que tange aos tre- Municipal. Recebeu a função de garantir
jeitos estabelecidos socialmente como que os preceitos do Estatuto da Criança
femininos, e ao silenciamento em relação e do Adolescente (ECA) fossem exercidos
à opção sexual nos diversos ambientes pela família e pela sociedade e pelas en-
em que os sujeitos transitam. Os dados tidades de atendimento. Por outro lado,
encontrados revelam que a condição ho- a Psicologia social comunitária, em seus
mossexual ainda é pouco compreendida vários enfoques, mostra seu compromis-
pelos surdos, pois há dúvidas, preconcei- so com qualidade de vida da população e
tos e mitos acerca da experiência sexual. com os direitos humanos. Seu campo de
Desse modo, torna-se relevante ampliar pesquisa em práticas sociais é bastante
os estudos nessa área e sua interface com amplo, pois, considera prática social toda
as políticas públicas de assistência e for- prática de interação entre sujeitos sociais.
mação das pessoas surdas. Neste trabalho, serão enfocadas aquelas
praticadas sobre as crianças e adolescen-
Palavras-chave: surdez, homossexualidade, tes nas escolas que deveriam dizer respei-
identidade to aos seus direitos e deveres infantis e
Contato: Fabrício Santos Dias de Abreu, UnB, juvenis. As práticas educativas constituem
fabra201@hotmail.com um tipo de prática social na infância. De-
nunciar, observar maus tratos e faltas ex-
cessivas são práticas sociais, pois, exigem

269
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a ação do sujeito em favor de outro. Seu relação ao CT. Composta de nove pergun-
sentido se fundamenta em fazer surgir tas transcritas em folha de papel. Os cinco
efeito em outros, planejada, consciente ou temas mencionados anteriormente foram
inconscientemente. O Conselho Tutelar é abordados em questões abertas e os ou-
uma instituição mediadora entre as vidas tros quatro em questões fechadas. Os
da criança e do adolescente e a vida coleti- contatos nas escolas foram feitos através
va, institui, portanto, uma nova prática en- dos diretores ou coordenadores pedagó-
tre outras que podem ser consideradas no gicos. As entrevistas foram respondidas
tratamento das questões da infância. Cabe por escrito por grupos de professores. O
a seguinte pergunta: Em que medida a es- propósito inicial era realizar entrevistas in-
cola receberá a intervenção desta nova dividuais. Contudo, a rotina escolar a que
prática? Este trabalho tem como hipótese: estão submetidos os professores impediu
a cultura solidificada das instituições esco- por falta de tempo de responder individu-
lares torna-se um empecilho para o pleno almente às entrevistas. Como alternativa
desenvolvimento das práticas sociais tute- metodológica, as perguntas foram ofereci-
lares. Professores que lecionam em esco- das transcritas e o registro dos dados foi
las da rede pública estadual e municipal de feito em uma folha de papel onde se en-
ensino fundamental e médio da zona nor- contravam registradas as nove perguntas.
te, subúrbio e periferia da cidade do Rio No primeiro contato com os professores,
de Janeiro Dez participantes são do sexo pedia-se a colaboração voluntária e infor-
masculino, idade: 28 e 52 anos e 48, do mava aos participantes sobre o objetivo e
sexo feminino, idade 23 e 60 anos. Média o tema da pesquisa. Pedia-se também que
de idade, 40 anos (DP=10,16). Exercem o assinassem um termo de consentimento
magistério em média a 15 anos (DP=9,43) informado. O anonimato e a confidenciali-
e residem no subúrbio e da zona norte des- dade dos dados obtidos eram assegurados
ta cidade. A escolaridade varia do segundo a todos. Em cada escola visitada, entrega-
grau à pós-graduação: 4 professores pos- va-se a grupos de professores a entrevista
suem apenas segundo grau, 41, superior que respondiam na presença do psicólogo,
completo e 13, pós-graduação. O nível por escrito, e devolviam a seguir. Conhe-
socioeconômico a partir do grau de esco- cimento do que é Conselho Tutelar- 62%
laridade, embora não homogêneo, pode conhecem; 38% desconhecem o conceito
ser avaliado variando entre o nível mé- de Conselho Celular. Causas de encami-
dio baixo, médio e médio alto. Entrevista nhamentos ao CT- Para 31% da amostra,
visando atender os objetivos subjacentes o CT é uma alternativa para solucionar
considerados pertinentes aos temas cen- problemas de mau comportamento esco-
trais do estudo. O instrumento foi desen- lar, esgotadas todas as possibilidades de a
volvido no sentido de obter informações escola resolver com a família. Para 29%,
dos professores sobre o conceito de con- a causa é o comportamento inadequado
selho tutelar (CT); a relação, dificuldades e na escola provocado por transtornos fa-
barreiras encontradas no relacionamento miliares Relação Conselho Tutelar versus
entre escola e o CT; os encaminhamentos, Escola - Para 28%, o relacionamento com
suas principais causas; credibilidade na o CT é ineficiente, os conselheiros des-
atuação do CT; as atitudes, crenças com preparados, omissos e desinteressados e

270
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

desconhecem a realidade escolar. Os pro- LT04-904 - O BULLYING NA PERSPECTIVA


fessores não têm informação de como o SOCIOCULTURAL CONSTRUTIVISTA
CT funciona, onde situam e afirmam des- Raquel Gomes Pinto - UnB
conhecer as atribuições dos conselheiros raquel.pinto@tjdft.jus.br
(24%). Para 21%, a relação foi considerada Angela Branco - UnB
apenas insatisfatória, sem parceria entre ambranco@terra.com.br
Conselho Tutelar e a escola. Para 17%,
a relação é unilateral, da escola para o No contexto sociocultural do século XXI,
CT e de um cunho disciplinar e punitivo. alcançar o sucesso e a felicidade parece
Apenas uma minoria (10%) considera a significar, para a maioria das pessoas, ad-
relação positiva e que ainda poderia ser quirir bens de consumo e realizar proje-
melhor se o CT fosse menos burocrático tos individualistas considerando-se, cada
e contasse com mais recursos. As atitudes vez menos, as necessidades e a dignida-
pessoais com relação ao Conselho Tutelar de do outro, bem como as condições do
- Os participantes variam desde aqueles meio ambiente no qual vivemos. Desde
que são radicalmente contra, alegando muito cedo, crianças e adolescentes são
que o órgão é ineficaz, inútil, burocrático expostos, de forma explícita ou implícita,
e não devia existir; os de centro, argumen- a situações onde o competir é considera-
tando “que pode melhor”; “que em algu- do a melhor forma do sujeito se consti-
mas escolas funcionam em parceria”. E tuir como pessoa e atingir seus objetivos.
professores que são totalmente a favor e Crenças e valores orientados para a acir-
defendem como necessário para a defesa rada competição e o individualismo têm
dos direitos das crianças e apoio à escola. sido promovidos de forma recorrente,
Credibilidade na intervenção do Conselho em diversos contextos sociais. Situações
Tutelar - Os participantes agrupam-se em onde competição e individualismo são
três grupos gerais: a maioria (55%) não valorizados promovem a progressiva des-
acredita na ação do CT na escola porque valorização da ética e a emergência de
sua intervenção seria “paliativa” e/ou bu- agressões e violência. A incidência cres-
rocrática, e os “episódios” continuam se cente do bullying nas escolas retrata a
repetindo mesmo com sua intervenção. necessidade de mudar o paradigma edu-
25% alegam que não possui conhecimento cacional. Segundo a psicologia científica,
para avaliar a pergunta. Para 21%, a rela- não existem fórmulas mágicas e o fenô-
ção foi considerada apenas insatisfatória, meno precisa ser analisado considerando
sem parceria entre Conselho Tutelar e a o papel da cultura, do sujeito construti-
escola. A minoria (20%) acredita que a es- vo, e da causalidade múltipla. Prevenir
cola precisa de ajuda para casos comple- o bullying implica que a escola assuma,
xos junto às famílias. Com base nos dados intencionalmente, o trabalho dos valores
da pesquisa, conclui-se que o impacto so- sociais positivos com alunos e professo-
bre as práticas sociais educacionais não é res, de forma a incluir a paz como eixo
relevante. transversal no currículo escolar. Com
o objetivo de investigar como a escola
Palavras-chave: Conselho Tutelar; Infância e pretende promover ações preventivas
Juventude; Práticas sociais educacionais e de resolução de situações de bullying,

271
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

analisamos um projeto de prevenção do LT04-1311 - CULTURA DE PAZ,


bullying, desde sua implantação, ainda PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA E
em 2011. A pesquisa inclui análise de SOCIALIZAÇÃO NA PERSPECTIVA DE
documentos, observação das atividades POLICIAIS MILITARES
previstas no projeto e entrevistas com Letícia de Sousa Moreira - PMTO
a coordenadora, com seis professores e leticia_psi@hotmail.com
com seis crianças do quinto ano de uma Angela Uchoa Branco - UnB
escola pública da cidade de Brasília – DF. ambranco@terra.com.br.
Os eixos norteadores da pesquisa foram:
como o projeto define e compreende o A sociedade pós-moderna apresenta uma
fenômeno bullying, quais os seus objeti- configuração social bastante diversifica-
vos e quais as atividades desenvolvidas da, onde crenças e valores são diretamen-
para o alcance destes objetivos. O proje- te influenciados pelo contexto sócio-his-
to é, assim, analisado e discutido a partir tórico-cultural em que a pessoa está in-
das falas dos entrevistados e das obser- serida. As transformações e construções
vações realizadas, buscando-se identifi- humanas decorrem tanto de um processo
car coerência, bem como convergências interno quanto externo, permeados pelos
e divergências no discurso de educado- diversos agentes que compõem a socie-
res e alunos. Consideramos que as insti- dade. O desenvolvimento humano, por-
tuições educativas podem e devem atuar tanto, é fruto da interação de uma série
no campo da promoção concreta da paz, de fatores e, sobretudo, das relações aí
de interações humanas saudáveis, éticas
estabelecidas. A partir dessa idéia, surgiu
e respeitosas, promovendo valores como
o interesse na seguinte questão: como o
justiça, dignidade e responsabilidade so-
ser humano desenvolve suas ações vis-
cial. Consideramos que o presente estu-
lumbrando a paz ou a violência? Entende-
do contribuiu para a análise de iniciativas
-se que os conflitos violentos têm sido
da própria escola sob a orientação e su-
protagonistas de grandes tragédias ao
pervisão da coordenadora, e os resulta-
dos obtidos deverão gerar subsídios para longo do tempo em todo o mundo. Isso
a elaboração e a avaliação de projetos ocorre porque a sociedade persiste pro-
desta natureza, auxiliando na prevenção movendo práticas culturais onde compe-
da violência na escola e promovendo tição, agressão e violência são toleradas
ações concretas em prol da paz. ou mesmo incentivadas, e assim a gran-
de maioria das pessoas não internalizam
Palavras-chave: bullying, sociocultural, o valor, o sentimento e a vivência da paz
violência em suas vidas. A Cultura de Paz está in-
Contato: Raquel Gomes Pinto, UnB, raquel. trinsecamente relacionada à cooperação
pinto@tjdft.jus.br e à resolução não-violenta dos conflitos.
É uma cultura concebida como processo
orientado para a tolerância, solidarieda-
de e compartilhamento em base cotidia-
na, uma cultura que respeita os direitos
individuais, o princípio do pluralismo,
que assegura a liberdade e divergência

272
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de opinião. Ela se empenha em preve- ma que este seja um mediador de confli-


nir conflitos violentos resolvendo-os em tos, utilizando o poder de polícia somente
suas fontes ou origens. Na perspectiva em casos extremamente necessários.
sociocultural construtivista aqui adotada, O ideal da Polícia Comunitária, Jornada
a Paz é concebida como um conceito ca- Formativa de Direitos Humanos e Proerd
racterizado pela convivência cooperativa (programas desenvolvidos pela Secretaria
entre seres humanos em geral, ou seja, Nacional de Segurança Pública), propõem
como um conceito positivo e não como que os policiais estejam preparados para
a simples ausência de conflitos ou en- lidar com os problemas cotidianos dos
frentamentos. Considerando o processo cidadãos comuns, de forma preventiva
de desenvolvimento humano como dinâ- e não somente coerciva, como há anos
mico e contínuo, torna-se possível a (re) se postulava. A metodologia utilizada foi
construção de valores, crenças, emoções baseada na pesquisa qualitativa, a partir
e expectativas para serem desenvolvidos de entrevistas semiestruturadas, onde
na família, escola e sociedade objetivan- os indicadores empíricos foram constru-
do a construção de uma Cultura de Paz. ídos ao longo do processo de interação
Fazendo um recorte para um contexto es- pesquisador-pesquisado. Foram selecio-
pecífico, foi escolhida a Polícia Militar do nadas seis entrevistas, de um estudo mais
Estado do Tocantins como campo de pes- amplo, com quatro homens e duas mu-
quisa, por suas peculiaridades de atuação lheres e o critério de seleção foi a diver-
social, sendo por vezes preventiva e por sidade de posicionamentos apresentados
vezes coerciva, e por ser o campo de tra- pelos policiais entrevistados. Todos os
balho da pesquisadora. Assim sendo, este participantes ingressaram na instituição
estudo buscou investigar e compreender há pelo menos cinco anos, um tempo ra-
como o sistema de crenças e valores pes- zoável para que haja maior familiarização
soais, permeado pela instituição militar, com a cultura institucional militar. Todos
influencia as convicções e ações de poli- os participantes selecionados têm filhos,
ciais militares para a construção de uma pois também buscou-se avaliar possíveis
Cultura de Paz neste contexto específico. preocupações dos participantes com o fu-
Nesse sentido, tornou-se necessário com- turo deles na sociedade de forma geral. O
preender quais as práticas e concepções procedimento de análise seguiu o mode-
estão presentes na vida dos policiais mili- lo construtivo-interpretativo, que busca
tares para pensar em sua atuação, visan- transformar as informações dos partici-
do a construção de uma Cultura de Paz. pantes em algo que tenha sentido para
O desenvolvimento dessa visão de vida eles e para a pesquisa. A partir do discur-
e de trabalho, vinculada à noção da paz, so dos participantes, observou-se que os
busca promover um aprimoramento con- policiais militares têm dificuldades com o
creto na prestação de serviços da institui- tema da Cultura de Paz, em conceituar e
ção, sempre de forma articulada com os admitir a existência de conflitos positivos.
demais setores da sociedade. A realidade Os indicadores obtidos com as entrevistas
atual da Polícia Militar no Brasil tem por revelam crenças permeadas pela cultura
objetivo aperfeiçoar a qualidade das rela- institucional, na qual a paz é vista como
ções entre o policial e a sociedade, de for- algo subjetivo, ligado muito mais à noção

273
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de harmonia interior e espiritualidade do LT04-1349 - PALAVRAS E AÇÕES QUE


que à paz social. A visão de paz no senti- MACHUCAM
do mais preventivo, permeado por ações Claudilene Pereira - Me Ninar Creche Escola
concretas, é algo distante do pensamen- claudilenepereira1@hotmail.com
to dos participantes. Ficou evidenciado Amanda Nogueira Cordeiro - UMINHO
que os participantes da pesquisa não se amandanc_uff@hotmail.com
reconhecem nesse papel de agentes mul-
tiplicadores da paz e transformadores da Atualmente, questões relacionadas à
sociedade, modelo de atuação social e agressão verbal, física, coação e constran-
presença forte do estado nas ruas. Eles gimento entre crianças nas escolas são
não conseguem visualizar a ressonância muito comentadas. Tais atitudes (isoladas
e abrangência de suas ações enquanto ou em conjunto), quando praticadas entre
portadores de uma identidade profissio- pares, numa relação desequilibrada de
nal que, além de tudo, é uma autoridade poderes, de forma regular e intencional
constituída e deve ser usada em favor caracterizam o bullying, podendo causar
da comunidade. No entanto, forneceram transtornos físicos, cognitivos e psicológi-
muitas sugestões para a construção de cos em suas vítimas. Este tema começou
uma Cultura de Paz na instituição e todos a ser estudado na Noruega, nos anos 70.
se colocaram como voluntários para par- Uma pesquisa realizada no Rio de Janeiro
ticipar, mesmo sem definir exatamente pela extinta ABRAPIA, em 2002, com mais
como poderiam colaborar. Nesse sentido, de 5000 crianças, revelou que 40,5% dos
acredita-se que uma mudança de cul- alunos já tinham participado em casos
tura institucional pode favorecer a inte- de bullying, sendo 16,9% alunos vítimas,
gração entre os membros da instituição, 12,7% alunos agressores e 10,9% vítimas/
tão requisitada pelos participantes deste agressor. Mas que providências são con-
estudo, e também deve contribuir para cretamente tomadas? Que trabalho de-
promover diálogos cooperativos, campo senvolver com as crianças? Que caminho
fértil para o cultivo e amadurecimento de seguir? Segundo Barros, Carvalho e Pe-
idéias e sugestões. Dessa forma, a reali- reira (2009): “num primeiro momento há
zação deste trabalho visou construir sub- de reconhecer que a violência é um pro-
sídios para desenvolver valores e compe- blema social e que a escola tem um papel
tências que levem os policiais militares a fundamental na sua redução por meio de
serem promotores da Cultura de Paz no ações e programas preventivos buscando
exercício das diversas funções que de- parcerias com as famílias dos alunos en-
sempenham, dentro e fora da instituição, volvendo-os com o problema.” Por isso,
melhorando a qualidade de vida dos en- apontamos que um programa de preven-
volvidos nesse processo de construção. ção primária pode ser o primeiro passo no
intuito de que as crianças e a comunidade
Palavras-chave: Cultura de Paz, educativa, incluindo pais e professores,
Construtivismo Sociocultural, Polícia Militar. percebam que o tema deve ser tratados
Contato: Letícia de Sousa Moreira, Polícia por todos. Casas (1998) aponta que a pre-
Militar do Tocantins, leticia_psi@hotmail.com venção relaciona-se com realidades co-
nhecidas, onde são conhecidos os efeitos

274
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

negativos que podem ter. Segundo Caplan brincadeiras ofensivas e demasiadas têm
(apud Casas 1998), a prevenção primária sido protagonistas nas interações escola-
caracteriza-se por ter um enfoque comu- res e relações em geral. Diante disto, em
nitário, por ser interdisciplinar e proativa, 2010, foi iniciado o projeto “Palavras e
interconectar os diferentes aspectos da ações que machucam”, surgido da vonta-
vida (orientação bio-psicossocial), utili- de da Equipe Pedagógica e professores da
zando técnicas educativas e sociais orien- Me Ninar Creche Escola (escola particular
tadas para dotar os indivíduos de recursos situada em Niterói-RJ) de trabalhar com
ambientais e pessoais, e assim enfrenta- as crianças (dos 6 aos 10 anos) questões
rem seus problemas e promoverem con- relacionadas aos valores éticos culturais e
textos sociais justos. A prevenção primária de convivência entre as pessoas. Para to-
dirige-se a grupos que não manifestam si- mar uma ação preventiva junto às crian-
nais evidentes de enfermidade ou proble- ças sobre o tema bullying, escolhemos po-
ma social, onde só existe a consideração tencializar as interações dentro da escola,
que alguns membros possam estar em desta com a família e da criança com a
risco. Partindo da teoria de Brofenbren- comunidade, considerando os diferentes
ner, detentora de uma visão bioecológica níveis ambientais de interação. Neste caso
do desenvolvimento humano, adotamos consideramos a escola como microssis-
uma visão sistêmica onde o desenvolvi- tema para as crianças e, a relação entre
mento se dá através de forças emanadas a escola e a família como mesossistema,
por múltiplos ambientes e das relações contudo não desconsideramos a influên-
entre eles, através da interação sinérgi- cia do mesossistema e do macrossistema
ca de quatro núcleos inter-relacionados: no seu desenvolvimento. Os principal
Processo, Pessoa, Contexto e Tempo (Nar- objetivo deste projeto foi diminuir episó-
raz & Koller). Naquele o destaque é dado dios comportamentais nas crianças que
para o conceito de processos proximais, possam interferir de forma negativa o de-
que são formas particulares de interação senvolvimento e as interações entre pares
entre organismo e ambiente que operam na escola. Para isto foi preciso repensar
ao longo do tempo. Em relação a Pessoa, (equipe e crianças) atitudes e palavras di-
parte-se do princípio que suas caracterís- tas no dia-a-dia, para atingir uma melhor
ticas são tanto produtoras, quanto produ- convivência, trabalhando valores como
tos do desenvolvimento. O conceito de respeito, cooperação, entendimento,
Contexto refere-se à interação recíproca compreensão, tolerância e fraternidade.
de quatro níveis ambientais interdepen- A idéia foi promover junto à comunidade
dentes estruturados de forma concêntri- acadêmica um entendimento de questões
ca: microssistema, mesossistema, exossis- sócio-culturais pertinentes à atualidade,
tema e macrossistema. O Tempo também para que percebam que idosos, portado-
influencia o desenvolvimento humano res de necessidades especiais, diferentes
através de mudanças e continuidades. No- etnias, classes sociais, culturais e credos
tamos uma crescente desvalorização de devem ser respeitados e compreendidos
atitudes gentis e cordiais entre as crian- em suas particularidades,e assim aumen-
ças. A busca pela perfeição, competiti- tar o respeito mútuo no ambiente esco-
vidade, intolerância com as diferenças e lar. A primeira ação foi a apresentação do

275
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

vídeo “Palavras que machucam” (sessão pais e crianças sobre a importância da vi-
coletiva), em sequência, conversas com sita foi surpreendente, ficando evidencia-
professores e Equipe Pedagógica e ações da no cuidado que tiveram ao oferecerem
pontuais com as crianças (encontro quin- alimentos que condiziam com as limita-
zenal com a psicóloga da escola denomi- ções biofísicas dos idosos. Publicação de
nado “grupo de reflexão) e atividades em textos coletivos no Informativo Interno da
parceria com professores regentes. Outras escola. Por fim, acreditamos que houve
estratégias utilizadas foram: Leitura dos o despertar de um julgamento moral das
livros “A ovelha rosa da Dona Rosa” e “O atitudes e responsabilização em relação
colecionador de segredos”, e desenvolvi- ao respeito ao próximo, às diferenças e
mento de atividades a estes relacionados. aos seus iguais.
-Dinâmicas de grupos voltadas para o
respeito aos pares e aos demais; Elabora- Palavras-chave: prevenção primária, valores
ção de “combinados” (regras particulares sócio-culturais, bullying
para cada turma) referentes aos compor- Contato: Claudilene Francisco Pereira, Creche
tamentos; Autoavaliação individual das Escola Me Ninar, claudilenepereira1@hotmail.com
crianças; Reunião de pais promovendo
parceria no processo de conscientização
das crianças; Reunião junto à Equipe Pe- LT04-1507 - VALORES HUMANOS E
dagógica para discussão de textos sobre ATITUDES FRENTE À ESCOLA: UM
bulliyng e valores éticos e sociais; Visitas ESTUDO CORRELACIONAL
a espaços promotores de auxílio a idosos Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB
e portadores de necessidades especiais. patynfonseca@hotmail.com
É importante ressaltar que este projeto é Rildésia Silva Veloso Gouveia - UNIPÊ
uma ação preventiva que não se caracteri- rildesia.val@gmail.com
za por ter uma temporalidade determina- Deliane Macedo Farias de Sousa - UFPB
da, por isso buscamos atingir seus objeti- delianemfs@gmail.com
vos constantemente na dinâmica cotidia- Kátia Correa Vione - UFPB
na da escola. Entretanto, no seu período katiavione@gmail.com
de maior intensidade de ações, pudemos Larisse Helena Gomes Macedo Barbosa -
notar alguns resultados concretos: Iden- UFPB
tificação das atitudes e comportamentos larissehelena@hotmail.com
a serem repensados pelas crianças; Cons- Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB
cientização da equipe de professores acer- eugenia_gba@hotmail.com
ca dos resultados de suas falas e atitudes
frente às crianças; Exposição de trabalhos As pesquisas sobre as atitudes no con-
realizados pelas crianças sobre a temática texto escolar têm sido bastante diversi-
na mostra de Arte e Expressão da escola; ficadas e demonstram um novo foco de
Aumento da parceria entre as famílias e interesse na área escolar ou da educação.
a equipe pedagógica; Sucesso da visita a Por mais de vinte anos estas estiveram
Casa de Repouso Lar Esperança, onde as voltadas, predominantemente, a abor-
crianças propuseram atividades de leitura dar o desempenho acadêmico dos estu-
e ofereceram lanche. A compreensão de dantes de uma forma mais objetiva (isto

276
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

é, notas nos exames escolares), o que os valores humanos, uma vez que estes
atendia ao interesse imediato de pensar e são entendidos como um construto que
modificar as políticas públicas de educa- influencia as atitudes e as ações humanas
ção. Entretanto, embora este tema ainda e servem como padrões avaliativos do
ocupe espaço importante na agenda da- comportamento (Gouveia, 2003). No pre-
queles que fazem a educação, aspectos sente estudo, parte-se do modelo acerca
mais subjetivos dos estudantes têm rece- dos valores proposto por Gouveia (1998,
bido cada vez mais destaque, a exemplo 2003; Gouveia & cols., 2008) que define
da satisfação do estudante com a escola, os valores como critérios de orientação
das experiências vivenciadas e das atitu- que guiam as ações do homem e expres-
des apresentadas frente ao contexto es- sam as suas necessidades básicas. Ainda
colar (Daly & Defty, 2001). Coerente com de acordo com este autor seria possível
esta linha de interesse, Willms (2003) observar seis subfunções valorativas, a
constatou, em pesquisa realizada pelo saber: interativa, normativa, suprapesso-
Programa Internacional de Assistência ao al, existência, experimentação e realiza-
Estudante, que os jovens que participa- ção. Deste modo, objetivou-se conhecer
vam mais das atividades oferecidas pela se e em que medida os valores humanos
escola parecem ter melhor relação com e as atitudes frente à escola estão relacio-
seus colegas e administradores da escola, nados.Para lograr tal objetivo, contou-se
além de apresentar um bom desempenho com uma amostra de conveniência (não
acadêmico. Por outro lado, aqueles que probabilística) composta de 291 estudan-
apresentam atitudes negativas, de desa- tes do ensino fundamental, sendo a maio-
feto com as pessoas inseridas na escola ria do sexo masculino (53%), de escolas
podem, gradualmente, vir a demonstrar públicas (53,5%) e com idades variando
comportamentos desajustados. Refor- entre 10 e 18 anos (m = 13,2; dp = 1,76).
çando este aspecto, Duarte (2004) indica Estes responderam a um livreto compos-
que a falta de envolvimento, interesse e to pelos seguintes instrumentos: Questio-
vontade por parte dos jovens refletem nário de Valores Básicos (QVB – Gouveia,
seu descompromisso total frente às ativi- 1998; 2003), Escala de Atitudes Frente
dades da escola, atuando como fator de à Escola (Cheng & Chan, 2003; Fonseca,
risco. Por outro lado, algumas pesquisas 2008), e por fim, questões demográficas
têm mostrado que as atitudes positivas (sexo, idade, tipo de escola). Inicialmente,
dos estudantes em relação à escola com- entrou-se em contato com as escolas, pro-
preendem um fator de proteção quanto curando obter a autorização para coletar
à delinqüência e ao uso de substâncias os dados. Em seguida, enviou-se o Termo
proibidas (Cheng & Chan, 2003). Deste de Consentimento Livre e Esclarecido para
modo, cogita-se que as atitudes apresen- os pais ou responsáveis assinarem, permi-
tadas pelos jovens frente à escola podem tindo a participação dos estudantes. Após
influenciar em seu engajamento na esco- essa etapa, os participantes responderam
la, bem como o seu desempenho acadê- ao instrumento individualmente, porém
mico. Mas a que fatores estariam associa- em ambiente coletivo de sala de aula, e
das essas atitudes? Um desses fatores, de em média, 30 minutos foram suficientes
acordo com Fonsêca (2008), poderiam ser para concluírem o preenchimento do

277
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

questionário. Para a análise de dados foi tre os valores de existência e as atitudes


utilizado o Pacote Estatístico para Ciên- frente à escola pode ser compreendida já
cias Sociais (PASW), versão 19. Foi realiza- que as pessoas que adotam tais valores
da uma análise de correlação de Pearson são pessoas preocupadas em assegurar
entre as seis subfunções valorativas e as sua sobrevivência, planejando o futuro
atitudes frente a escola a fim de verificar em busca de estabilidade e a escola é tida
se existe relação entre tais variáveis. Os como um ambiente onde se adquirem
resultados indicaram que, com exceção ferramentas (sociais e acadêmicas) para
da subfunção experimentação (r = -0,00, assegurar o futuro estável. Por fim, obser-
p < 0,987), as demais apresentaram cor- vou-se a relação entre as atitudes frente
relação direta e significativa com as atitu- à escola e os valores de realização ocorre
des frente à escola, a saber: normativa (r em razão das pessoas que adotam tais va-
= 0,37, p < 0,001), suprapessoal (r = 0,37, lores serem orientadas ao êxito, enfatiza-
p < 0,001), interativa (r = 0,32, p < 0,001), rem a busca pela eficiência sendo capaz
existência (r = 0,31, p < 0,001) e realização de alcançar metas, terem um ideal de re-
(r = 0,17, p < 0,001). Diversos estudos têm alização e orientarem suas vidas nesta di-
corroborado a adequação psicométrica reção. Tais valores estão em consonância
do modelo proposto por Gouveia (1998; a um dos principais objetivo da educação
2003) para o entendimento dos valores que é o bom desempenho, a aquisição
humanos, destacando-se sua capacidade de conhecimentos e habilidades pesso-
para explicar diversos comportamentos ais e sociais, aspectos necessários para
e atitudes sociais (Chaves, 2006; Pimen- progressão satisfatória na vida acadêmi-
tel, 2004; Santos, 2008). Como é possível ca, social e profissional no futuro. Deste
observar nos achados deste estudo, os modo, considera-se de suma importância
valores normativos estão relacionados às ampliar os conhecimentos acerca das di-
atitudes frente à escola, pois estes refle- ferentes formas de influências sofridas
tem, de algum modo, o quanto os jovens pelos jovens acerca dos valores humanos,
aderem ou não às normas existentes na e como estes podem vir a interferir nas
escola, como se integrar, ajustar e engajar atitudes frente à escola para que a lacuna
ao contexto escolar (Fonsêca, 2008). No encontrada no âmbito escolar seja preen-
que diz respeito à relação entre a subfun- chida. Uma vez que, diversos estudos têm
ção suprapessoal e as atitudes em ques- demonstrado que altos níveis de engaja-
tão, justifica-se uma vez que os tais valo- mento escolar e atitudes positivas frente
res refletem a busca pelo conhecimento, à escola estão associados à um melhor
por aprender coisas novas e interessantes desempenho acadêmico e a uma redução
(Gouveia, Fischer & cols., 2008). Além na probabilidade de abandono escolar
destas relações, observou-se ainda que (Finn & Rock, 1997; Fredricks, Blumenfeld
a subfunção interativa também apresen- & Paris, 2004).
tou uma correlação com as atitudes fren-
te à escola, o que faz todo sentido, uma Palavras-chave: Engajamento Escolar; Valores
vez que a escola é um ambiente onde a Humanos; Atitudes.
interação é de fundamental importância
(Gouveia, 2009). Ademais a relação en-

278
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-803 - CULTURA DA PAZ E anti-sociais. A Cultura da Paz é um contexto


PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA NA ESCOLA importante para a internalização e práti-
SEGUNDO PROFESSORES DE ESCOLA ca dos direitos humanos. A promoção da
PÚBLICA DE BRASÍLIA Cultura da Paz em nível mundial tem sido
Bruno Campos - UnB bastante mencionada pela Organização
Lorena Leite - UnB das Nações Unidas, tanto é que a revisão
Alia Barrios - UnB feita em 1989 da Declaração Universal dos
Angela Branco - UnB Direitos da Criança de 1959 foi bastante
influenciada pelo tratado que estabelece
Crenças e valores são frequentemente ci- a necessidade da Cultura da Paz. Portanto,
tados pelos educadores como importantes emerge no âmbito das ciências psicológicas
objetivos da educação formal. Entretanto, a necessidade de se compreender os pro-
a dimensão motivacional, constituída por cessos de internalização de valores como
valores e crenças, não têm sido discutida pré-requisito para a co-construção da paz,
no processo de construção dos currículos uma vez que “co-construir a paz significa
escolares e das metodologias pedagógi- analisar e favorecer as configurações do sis-
cas. Valores ligados a competição e ao in- tema motivacional que sejam compatíveis
dividualismo estão presentes nas salas de com as crenças e valores que caracterizam
aula das escolas brasileiras e estas têm o que denominamos paz” (Branco, 2009).
enfrentado sérias dificuldades em relação Nesse sentido, o presente trabalho teve
às interações agressivas que cada vez mais como objetivo a construção de dados que
se observa no cotidiano escolar. Esses va- permitissem analisar e refletir criticamente
lores competitivos e individualistas, de for- sobre a questão da ontogênese dos valores
ma oculta ou explícita, se fazem presentes humanos, e a possibilidade de contribuir
especialmente nas práticas pedagógicas e concretamente para a promoção de valo-
nas interações sociais que se estabelecem res humanistas, de orientação cooperativa
nas salas de aula. Nos projetos para a edu- e solidária, no contexto escolar, de acordo
cação básica no Brasil existe como objetivo com a Cultura de Paz. Para tanto, foram en-
o desenvolvimento da independência e da trevistados doze professores de quarto ano
autonomia dos alunos, mas não se explicita de escolas públicas do Distrito Federal acer-
a necessidade de que esta autonomia seja ca de sua opinião sobre a socialização de
associada à responsabilidade e a moralida- seus alunos, os valores humanos, o papel
de. Este tipo de socialização, segundo Ro- da educação, o papel do conflito, o desen-
goff (2005), tende a influenciar o individuo volvimento da criança, e sobre estratégias
para uma atuação individualista, orientada para a construção da Cultura da Paz, assim
quase que exclusivamente por interesses como dificuldades e empecilhos para esta
pessoais em detrimento dos interesses co- construção. A realização de projetos para
letivos. E é assim que a competição e o in- a construção de Cultura de Paz na escola
dividualismo têm sido cada vez mais obser- foi considerada importante ou necessária
vados em várias pesquisas e, segundo au- pelos entrevistados, sendo que a maioria
tores como Staub (2002) e Branco (2003), deles afirmou ter disposição para partici-
práticas e valores desta natureza estão sig- par como voluntário de projetos deste tipo.
nificativamente relacionados a motivações Diversos fatores foram apontados como

279
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

empecilhos para a Construção da Cultu- LT03-816 - VIOLÊNCIA NA ESCOLA E


ra de Paz, sendo que a grande dificuldade CULTURA DA PAZ: COM A PALAVRA AS
de comunicação entre a escola e a família CRIANÇAS
foi considerada central. Houve menção às Bruno Campos - UnB
divergências entre família e escola quanto Lorena Leite - UnB
aos papeis e objetivos específicos de cada Alia Barrios - UnB
contexto, e foram discutidos fatores como Angela Branco - UnB
desigualdade social, violência urbana e in-
fluência negativa da mídia sobre as crian- Considerando que todo cientista tem
ças. Os professores apresentaram vários o compromisso de favorecer a saúde e
tipos de definição de Paz, mas quase todas bem-estar dos indivíduos e da sociedade,
eram definições ingênuas e individualistas. o objetivo do presente trabalho consistiu
Entre elas encontramos definições como em construir dados que permitam ana-
a “ Paz é a ausência de conflito” ;“é uma lisar e refletir criticamente a questão da
característica interna”; “é tranqüilidade” violência nas escolas na percepção e ava-
interna ou externa, “é ligada ao convívio liação de crianças do quinto ano do ensi-
harmonioso” e assim por diante. Para a no fundamental, bem como analisar suas
grande maioria dos professores não exis- sugestões acerca do que pode ser feito
tem conflitos desejáveis, os conflitos são para se promover uma cultura de paz
sempre negativos; entretanto alguns, es- no ambiente escola. Nosso objetivo foi
pecialmente quando solicitados a se posi- construir subsídios para contribuir com o
cionar se “existem conflitos desejáveis?”, desenvolvimento de valores humanistas,
diziam que sim e que estes poderiam gerar de orientação cooperativa e solidária, no
crescimento pessoal. Como sugestões e contexto escolar. Para o cumprimento de
passos concretos para a construção da Cul- tal objetivo e como guia teórico-metodo-
tura da Paz, os entrevistados citaram a pro- lógico para a realização do trabalho, parti-
moção de palestras (tanto para pais quanto mos de uma perspectiva sociocultural de
professores), dramatizações, aulas voltadas caráter construtivista cujo foco se dá na
para o tema e discussão de filmes. Foram qualidade semiótica do desenvolvimen-
relatadas e analisadas histórias envolvendo to humano, com ênfase na linguagem e
“alunos problema”, casos de professores na comunicação não verbal das pessoas.
agredidos por alunos, brigas entre alunos e Ainda são poucos os estudos encontrados
bullying. Verificando o grau de desconheci- na literatura que produzem dados na di-
mento dos professores quanto a questões reção da reflexão acerca da origem e do
de socialização e internalização de valores, desenvolvimento dos valores humanos,
o estudo discute a grande necessidade de e em como estes são culturalmente dis-
orientar os educadores para que possam seminados. Segundo Juberg (2000), as
bem conceituar, compreender e saber pessoas são agrupadas de acordo com
posicionar-se na prática de forma a atuar características que, conforme a ideologia
como promotores de uma Cultura de Paz. dominante, são julgadas como boas ou
ruins, positivas ou negativas. Tais julga-
Palavras-chave: cultura da paz; violência; mentos constituem a base de preconcei-
escola pública tos geradores de violência, pois, segundo

280
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a autora, esses estimulam a discrimina- aula; a questão do bullying nas interações


ção social, legitimando a agressividade e em sala de aula e fora dela; E a criação
atitudes segregacionistas. Seguindo essa de atividades e práticas específicas de na-
lógica, os indivíduos passam a serem tureza cooperativa e sugestões diversas
percebidos e tratados em função de es- para a construção da paz e prevenção do
tereótipos e preconceitos associados ao bullying no contexto escolar. Realizados
grupo a que pertencem. Essa tendência, os grupos, observou-se resultados muito
cada vez mais freqüente nos contextos interessantes. Na escola A, as crianças
educacionais atuais, origina o fenôme- revelaram que, para elas, as caracterís-
no do bullying, definido pela execução ticas que definiriam uma vítima de um
de um mal não percebido, causado por agressor seriam diversos atributos físicos,
ações pequenas, mas que são repetidas inclusive antagônicos (como ser baixo ou
frequentemente (Staub, 2003). As ações alto, gordo ou magro), dado esse que con-
violentas são causadas, na maior parte firma a esterotipia criada com padrões
das vezes, psicologicamente produzidas culturais de beleza idealizados no grupo a
por frustrações e aprendizagem de for- que se pertence. Na escola B isso se con-
mas agressivas de resolução de conflito, e firmou, pois um dos sujeitos participan-
múltiplas são as motivações para compor- tes do grupo, que era negro, disse que os
tamentos pró-sociais como o bullying. A outros gostavam de chamá-lo de ‘lacraia’,
metodologia utilizada para a investigação e que ele não gostava disso. Ninguém ex-
das percepções e avaliações das crianças plicou o porquê desse apelido, mas uma
quanto ao bullying e a cultura da paz qua- suposição que podemos fazer é que este
litativa, uma vez que nosso objetivo foi menino tem uma aparência não muito
identificar e analisar os processos de sig- compatível com os padrões de beleza vi-
nificação no contexto da diversidade dos gentes em nossa sociedade. Nessa escola
participantes da pesquisa, que gerou uma evidenciou-se, também, a presença gene-
riqueza de informações ao longo do pro- ralizada do bullying, pois a discussão do
cesso de construção interativa dos dados. tema surgiu antes mesmo do pesquisador
Nesta pesquisa realizaram-se dois grupos lançar a pergunta sobre bullying para ser
focais em duas escolas públicas do Distri- discutida entre as crianças após a exibi-
to Federal (A e B) com crianças de 5º ano, ção do vídeo de um menino que contava
com idade entre 10 e 11 anos de idade, a sua história de vítima de bullying. Além
o grupo A com a participação de quinze dos resultados encontrados que corrobo-
alunos (nove meninos e seis meninas), ram as questões levantadas e discutidas
e o grupo B com a participação de onze na literatura, foi possível verificar a am-
(sete meninas e quatro meninos). Eles pla diversidade de motivações e contex-
aconteceram de acordo com um roteiro tos geradores de bullying, que precisam
semiestruturado, contendo perguntas ser melhores investigados. Tudo indica
que abordavam a reflexão conjunta sobre que um aspecto importante seja a dinâ-
as experiências e avaliação das dificulda- mica das interações e relações que ocor-
des de interação e relacionamento entre rem em contextos competitivos, como a
as crianças, com os professores e entre as escola. A internalização de valores e pa-
pessoas em geral no contexto de sala de drões de agressão e violência como forma

281
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de obter sucesso e popularidade entre passando por profissionais liberais até


os colegas, o que eleva a autoestima do o domínio do Estado, presente na con-
“ganhador”, acaba gerando situações de temporaneidade. A histórica da infância
grande sofrimento para todos, pois nem no Brasil (Pinheiro, 2006) é marcada por
sempre existe apenas uma vítima envolvi- abandono, crueldade, violência. Na Co-
da na situação: como observamos no gru- lônia, já existia o abandono de crianças
po B, quase todos desqualificam-se uns índias, brancas e negras (Leite, 1997).
aos outros. Aprender a resolver conflitos Priore (1996 e 2000) e Marcilio (1997)
de forma pacífica, por exemplo, não faz explicitam práticas de abandono e vio-
parte do cotidiano dessas crianças. Isto lências físicas, morais e sexuais no Brasil,
tudo confirma a necessidade crescente por longo período. No século XIX, emer-
de se realizar ações preventivas tanto no giram tentativas filantrópicas de cuidados
contexto educacional, como em outros à infância abandonada e, no século XX,
surgiram instituições para crianças den-
setores da sociedade. Afinal, a capacida-
tro das exigências produzidas no período
de de resolver conflitos de forma pacífica
(Rizzinni e RizzinniI, 1990): compuseram
e a tolerância exige o desenvolvimento
um sistema de proteção, solidificado na
de estratégias específicas para a promo-
era Vargas, presente até os anos 60; os
ção de práticas, crenças e valores para a
anos 70 configuraram práticas compensa-
construção da paz articulando crianças e tórias de educar crianças asiladas (Nunes,
adultos, família, escola e comunidade. 2009). Pela falência do sistema de acolhi-
mento das crianças abandonadas, o Esta-
Palavras-chave: cultura da paz, violência na do passou a ser cobrado de prover-lhes
escola, escola pública assistência (Rizzinni e RizzinniI, 2004). O
Serviço de Atenção ao Menor, criado du-
rante o Estado Novo, faliu quase de ime-
CO 48 - LT03 diato, surgindo a Fundação Nacional do
Abrigamento e Adoção Bem Estar do Menor, prometendo uma
prática de atenção social a menores em
vias de marginalização ou marginaliza-
dos. A partir dos anos 70, com denúncias
LT03-764 - SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO
regulares na imprensa, principalmente
PARA CRIANÇAS, POLÍTICAS PÚBLICAS E
após o golpe militar e o fracasso do mi-
SOFRIMENTO PSÍQUICO
lagre econômico, voltou a se pensar esta
Ana Maria Monte Coelho Frota - UFC problemática (Passetti, 1996). O Ano In-
anafrota@ufc.br ternacional da Criança, marca o início do
Ângela de Alencar Araripe Pinheiro - UFC enfrentamento da crueldade com o aten-
a3pinheiro@gmail.com dimento à criança abandonada e o abri-
gamento é situação extraordinária, provi-
No Brasil, a política de atendimento à sória e excepcional. O Plano Nacional de
infância e à juventude, em situação de Promoção, Proteção e Defesa do Direito
abandono, vem sofrendo transformações de Crianças e Adolescentes à Convivên-
profundas: do gerenciamento da Igreja, cia Familiar e Comunitária –PNPPDDCA-

282
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CFC- (2006) explicita a provisoriedade do com a Educação será efetivado mediante


abrigamento, e a necessária convivência a garantia de... IV: atendimento em cre-
da criança com a família e comunidade. che e pré-escola às crianças de zero a seis
Contudo, abrigos continuam crescen- anos. Art. 227, Parágrafo 6º. – Os filhos,
do em número e quantidade de abriga- havidos ou não da relação do casamento,
dos. Segundo Arpini (2003), Siqueira, ou por adoção, terão os mesmos direi-
Dell’aglio (2006), Yunes, Miranda, Cuello tos e qualificações, proibidas quaisquer
(2004), os abrigos somente conseguem designações discriminatórias relativas à
atender necessidades de sobrevivência filiação. A Doutrina da Proteção Ingeral e
física, deixando brechas para sofrimentos o PNPPDDCACFC igualmente contribuem
psíquicos, aproximando-se da conceitua- para colocar o abrigamento no campo da
ção de instituição total (Goffman, 1996). cidadania, fortalecendo a concepção de
Políticas Públicas são abordagem recen- abrigamento como direito e situação. As
te (anos 1990) entre psicólogos, e mais reflexões levam-nos a um questionamen-
ainda sua execução e formulação, como to: como garantir o usufruto do direito à
campo de atuação (Bock, 2003; Conti- convivência familiar e comunitária para
ni, 2002; Gonçalves, 2003; Yamamoto, crianças que vivem mais permanência no
2003). A inclusão das políticas públicas abrigo do que provisoriedade? Parece-
no fazer psicológico vincula-se ao reco- -nos quase impossível pensar nesta ga-
nhecimento do ser humano como cons- rantia. Anunciamos como possibilidade
tituidor e constituído pelo contexto; aos que os abrigos sejam construídos como
anseios inolvidáveis da população, des- instituições de pequeno porte, que pos-
tituída de bens e serviços fundamentais, sam construir laços afetivos e de confian-
com implicações em sua subjetivação. ça, e vínculos assemelhados aos dos di-
Campo tenso e contraditório, as políticas ferentes agrupamentos familiares. Neces-
públicas no País são ainda reconhecidas sário atentar para a inserção da criança
mais como benemerências do que como abrigada nos diferentes espaços sociais
instrumentos de universalização de di- da comunidade. Utópico? Certamente, e
reitos humanos. Focalizando práticas de norte para a transformação da sociedade
abrigamento, vale refletir: com prevalên- e do atendimento de direitos da criança.
cia no campo da caridade, têm sido exe-
cutadas prioritariamente por instituições Palavras-chave: Infância, Abrigamento,
religiosas/humanitárias. Concepções dis- Políticas Públicas
criminatórias para crianças tidas fora do
casamento contribuíram para manter a
prevalência de práticas assistencialistas,
repercutindo no processo de subjetiva-
ção (Pinheiro, 2006); CF e ECA trazem
inovações que se contrapõem às práticas
referidas, requerendo reordenamentos
institucionais. Lembremos princípios le-
gais que colocam o abrigamento como
direito: CF, Art. 208 – O dever do Estado

283
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-960 - VERIFICAÇÃO DE UM cidade do observador simpatizar com o


MODELO MEDIACIONAL ENTRE A outro e se inclinar a ajudá-lo e TP como a
EMPATIA E O PERDÃO INTERPESSOAL EM habilidade cognitiva de tomar a perspec-
RELAÇÃO A UM OFENSOR. tiva do outro e entende-lo(a) a partir do
Júlio Rique Neto - UFPB contexto no qual ele(a) está inserido(a).
julio.rique@uol.com.br Rique e cols. (2010) testaram um modelo
no qual a CE é associada ao grau da má-
Nilton Formiga - UFPB
goa e a TP é associada ao grau do perdão,
nsformiga@yahoo.com
porém, tal modelo não permitiu avaliar a
Felipe Fernandes de Medeiros - UFPB
existência de uma mediação entre essas
felipefm1@hotmail.com
variáveis e o perdão interpessoal expli-
Financiamento: CNPq cando o grau da mágoa em relação a um
ofensor. Este trabalho propõe verificar
Este trabalho verificou um modelo de esta mediação. Participaram deste estu-
mediação entre a Consideração Empáti- do, 201 jovens do sexo masculino e do
ca (CE) e a Tomada de Perspectiva (TP) sexo feminino, estudantes secundaris-
para o perdão interpessoal. Buscou-se tas e universitários com media de idade
saber se a CE e a TP influencia na redu- de 19 anos (DP = 2,06) do município de
ção da mágoa em relação a um ofensor João Pessoa – PB. Os sujeitos respon-
facilitando o perdão. O tema do perdão deram as seguintes escalas: a escala do
é presente na ciência, senso comum e perdão – EFI (Enright Forgiveness Inven-
conhecimento religioso. Na psicologia, tory, Enright & Rique, 2000), uma escala
autores têm se interessado em verificar objetiva composta inicialmente por uma
as variáveis preditoras do perdão visan- Folha de Rosto que coleta informações
do uma melhor qualidade nas relações sobre a mágoa e uma breve descrição da
humanas. De acordo com Enright, Free- ofensa, depois um Inventário de 60 itens
dman e Rique (1998) o perdão interpes- divididos em três subescalas de 20 itens
soal é uma atitude moral na qual uma cada (10 positivos e 10 negativos) sobre
pessoa considera abdicar do direito ao afetos, comportamentos e julgamentos,
ressentimento, julgamentos negativos, e é respondido em uma escala de concor-
comportamentos negativos para com ou- dância com seis pontos (1 = discordo e
tra pessoa que a ofendeu injustamente. 6 = concordo) e, finalmente, o Item do
Bem como, o perdão tem a função de fo- Perdão, que corresponde a uma questão
mentar na pessoa a compaixão para com objetiva: "Por favor, indique o quanto que
a pessoa que ofendeu. Para o perdão, você perdoou a pessoa que você avaliou
faz-se necessário um re-enquadramento na Escala EFI". Essa questão é respondida
cognitivo (ou reframing) da situação, ou em uma escala de cinco pontos (1 = não
seja, a vítima reelabora o evento sob uma perdoei e 5 = perdoei completamente).
nova perspectiva. Neste processo, é es- Administrou-se também uma adaptação
perado que a vítima desenvolva a CE e TP das escalas de CE e TP da EMRI (Davis,
do ofensor como variáveis facilitadoras 1983, adaptada por Ribeiro, Koller & Ca-
do perdão (Enright & Fitzgibbons, 2000). mino, 2001). Foram feitas adaptações
Davis (1983) definiu a CE como a capa- semânticas nos itens destas escalas para

284
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que os participantes respondessem pen- mostraram indicadores de ajuste que ga-


sando no ofensor que foi avaliado na es- rantiram a adequabilidade de sua estru-
cala EFI. Após as modificações, os itens tura (c2/gl = 1,12; RMR = 0,05; GFI = 0,96;
adaptados foram aleatoriamente distri- AGFI = 0,93; CFI = 1,00; TLI = 0,99; RMSEA
buídos e medidos em uma única escala = 0,02, CAIC = 365,92 e ECVI = 0,80) ob-
objetiva de cinco pontos (1 = baixo e 5 = servando uma associação positiva entre a
alto) com 14 itens no total. Por último, foi TP e CE (l = 0,77). A EFI também mostrou
utilizada uma escala sócio demográfica índice de confiabilidade interna Alfa sa-
para informações sobre idade, sexo etc. tisfatório de 0,97 na amostra do presente
A ordem das escalas foi a seguinte: pri- estudo. Em seguida, dois modelos foram
meiramente a escala sócio demográfica, testados separadamente. No primeiro
em seguida a EFI com o item do perdão e, modelo, os resultados mostraram que a
por último, a escala de CE e TP. O estudo CE apresentou um escore preditivo po-
atendeu as recomendações éticas da re- sitivo com a mágoa, porém, não signifi-
solução 196/96 do CONEP. Os estudantes cativo. Por outro lado, a CE influenciou
foram convidados verbalmente a partici- positivamente o Perdão que, como predi-
parem do estudo e a administração dos to, influenciou negativamente, a Mágoa
questionários ocorreu em sala de aula, (z = 12,47; p < 0,001) explicando 33%
com cada participante respondendo indi- da amostra na relação entre essas vari-
vidualmente todas as medidas. Para tes- áveis. No segundo modelo, verificou-se
tar o efeito de mediação da variável in- que a TP influenciou significativamente
dependente - VI (CE e TP) na variável me- de forma negativa a Mágoa e positiva-
diadora -VMe (o perdão) sobre a variável mente o Perdão, que por sua vez expli-
dependente – VD (a mágoa), efetuou-se cou negativamente, a mágoa (z = 12,47;
o teste de Sobel. Este teste tem como p < 0,001) 32% da amostra no modelo.
função avaliar a VMe como preditora Nesse sentido, encontrou-se tanto uma
da VD e como a VI deve ser preditora da relação direta da CE e TP sobre a mágoa
VMe. Assim, na presença de ambas – VI como uma relação mediada pela variável
e VMe – uma relação significativa prévia do perdão, influenciando negativamente
entre a VI e a VD decresce em magnitu- a mágoa. Considerando esses resultados,
de, demonstrando o efeito da mediação confirmou-se o modelo de mediação do
(Baron & Kenny, 1986; MacKinnon, Warsi perdão sobre a mágoa. Uma vez encon-
& ,1995; Sobel, 1982). Este cálculo é ca- tradas maiores magnitudes da CE e TP no
racterizado por uma relação que altera perdão e na mágoa, exponencialmente
para mais ou para menos a influência da maior será o impacto do grau de perdão
VI sobre a VD. Sendo assim, modelo pro- sobre a intensidade da mágoa.
posto foi considerar a CE e a TP como VIs
influenciando o perdão. O perdão passou Palavras-chave: perdão interpessoal,
então a ser uma variável de mediação da consideração empática, tomada de
VD (intensidade da mágoa). Para verificar perspectiva, mágoa
o modelo proposto, inicialmente buscou- Contato: Júlio Rique Neto, UFPB,
-se avaliar a validade da escala de CE e julioriqueneto@gmail.com
TP em relação ao ofensor. Os resultados

285
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-1024 - CASAS DE ACOLHIMENTO E relações de respeito mútuo (cooperação)


AS RELAÇÕES DE RESPEITO EXISTENTES promove a autonomia. Para as realidades
EM SUA ROTINA morais se constituírem é relevante que
Carla Andressa Placido Ribeiro - UNESP os indivíduos estabeleçam relações so-
carlaandressap@yahoo.com.br ciais, pois, é nessas relações entre os in-
Adrián Oscar Dongo Montoya - UNESP divíduos que se estabelecem as normas.
Patrícia Unger Raphael Bataglia - UNESP Não há, portanto, moral sem educação
moral. "[...] não há uma única moral e
Financiamento: FAPESP nem haverá tantos tipos de reações mo-
rais quanto as formas de relações sociais
Na Lei nº 8.069, de julho de 1990 no ou interindividuais que ocorrem entre a
Estatuto da Criança e do Adolescente a criança e seu meio ambiente" (PIAGET,
criança é vista como pessoa em desen- 1930/1996, p. 3). Na casa de acolhimen-
volvimento e goza de todos os direitos to pesquisada, apesar dos acolhidos se-
fundamentais intrínsecos ao ser huma- rem assistidos em suas necessidades bá-
no assegurando-lhe o desenvolvimento sicas, as ações educativas junto às crian-
físico, mental, moral, espiritual e social. ças e adolescentes se fundam, sobretu-
No caso das crianças e adolescentes insti- do, em relações de respeito unilateral à
tucionalizadas por razão de maus tratos, autoridade e às regras estabelecidas, as
abandono ou por serem órfãs, seus direi- quais não promovem a responsabilidade
tos são preservados pelo Estado sendo interior e a vida cidadã. O cumprimento
garantido um abrigo, seja em famílias das regras nem sempre solicita, por parte
substitutas ou em casas de acolhimento as crianças e adolescentes, a necessária
(abrigos provisórios). Com o objetivo de tomada de consciência das suas ações.
entender como as relações estabeleci- E sabemos que a participação na elabo-
das nas rotinas dessas casas contribuem ração e exercício consciente das regras
para o desenvolvimento moral de seus é absolutamente necessária para o seu
acolhidos, pesquisamos uma casa de cumprimento responsável. “As crianças
acolhimento na cidade de Marília-SP, e são heterônomas quando fazem um uso
observamos qual o tipo de relação (res- imitativo das regras e quando as conside-
peito unilateral ou respeito mútuo) que ram sagradas, pois vindas da tradição e
predomina em sua rotina e consequente- imutáveis... As crianças são autônomas
mente qual o tipo de educação moral es- quando fazem um uso racional e social
tabelecida, pois, segundo Piaget (1994), das regras, e quando as consideram pro-
a pressão exercida pelo adulto à alma da dutos do e para o grupo” (MENIN, 1996,
criança acarretará resultados diferentes p.46). Observamos que o processo de
do que a livre cooperação entre crianças tomada de consciência na construção
e, dependendo de como ocorre a edu- de regras também não é uma prática
cação moral moldará as consciências e junto aos funcionários da instituição. As
determinará comportamentos de modos crianças pesquisadas não têm um espaço
diferentes, ou seja, a relação educativa social e coletivo onde possam agir e ex-
de caráter unilateral (coação adulta) re- perienciar valores de respeito mútuo. As-
sulta na heteronomia, contrariamente as sim, as relações entre crianças, via de re-

286
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gra, não se pautam pelo respeito mútuo ver o desenvolvimento moral dos acolhi-
e pelos laços de solidariedade, pelo con- dos. A proposta foi aceita pela instituição
trário, são relações de competição que se e encontra-se em sua etapa final no que
sobrepõem a essas relações. Suas noções diz ao trabalho de intervenção junto aos
de justiça se fundamentam no respeito à funcionários (reuniões que promova a re-
autoridade adulta e não em laços de co- flexão crítica das condutas entre adultos
operação entre iguais, de solidariedade e para com os acolhidos) e em andamen-
e respeito mútuo. Esses dados mostram to no trabalho de intervenção junto aos
que as relações que ocorrem no interior acolhidos. Podemos assim, expor os re-
da instituição (entre adultos e acolhidos sultados preliminares divididos em dois
e entre os próprios acolhidos) não esta- grupos: junto aos funcionários, e, junto
riam promovendo a autonomia moral e/ aos acolhidos. No primeiro grupo alguns
ou não estariam conseguindo alterar os funcionários já fazem reflexões críticas
efeitos das práticas educativas vivencia- a respeito de suas práticas colocando-
das com suas famílias e noutros centros -se no processo de educação moral das
educativos. Se para Piaget (1994) o de- crianças e adolescentes e nos problemas
senvolvimento da noção de justiça de um da instituição. Também apresentam inte-
indivíduo se estabelece, principalmente, resse em adquirirem novas posturas que
em função das relações estabelecidas em auxiliem no bom desempenho de seu
seu meio social, podemos afirmar que é trabalho enquanto educador, no entanto
fundamental o papel da educação moral ainda há os que não se enxergam como
motivada na autonomia e na reciprocida- tal e apresentam resistência em se colo-
de. “O alcance educativo do respeito mú- car nos problemas da instituição. Muito
tuo e dos métodos baseados na organiza- ainda devemos percorrer para a consti-
ção social espontânea das crianças entre tuição de um ambiente favorável ao de-
si é precisamente o de possibilitar-lhes senvolvimento moral, mas julgamos que
que elaborem uma disciplina, cuja neces- o principal que é a visão da necessidade
sidade é descoberta na própria ação, ao desse ambiente já tem alcançado grande
invés de ser recebida inteiramente pron- parte dos funcionários e o interesse de
ta antes que possa ser compreendida” alguns em se orientarem para estabele-
(PIAGET, 1973, p.77). Com isso, propo- cerem com as crianças e adolescentes
mos à instituição uma pesquisa de inter- uma relação de respeito mútuo. No se-
venção com o objetivo de constituir junto gundo grupo o trabalho tem sido bem
aos funcionários da casa e acolhidos um minucioso com o propósito dos acolhidos
ambiente favorável ao desenvolvimento perceberem qual o caráter que a regra
moral das crianças e adolescentes, esta- apresenta em sua convivência na institui-
belecendo em suas relações rotineiras o ção (preservar os princípios de respeito,
respeito mútuo. Assim, podemos refle- justiça, igualdade... e de sua reciprocida-
tir se um ambiente favorável à tomada de) e de perceberem que a regra em si
de consciência das regras, baseado no não é imutável, mas seguindo um princí-
princípio do respeito mútuo e na relação pio moral válido, ela pode ser modificada
de cooperação entre todos os membros e constituída pelo grupo. Para isso, traba-
dessa instituição adultos, possa promo- lhamos com brincadeiras, contos e con-

287
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fecções de materiais promovendo identi- crianças, ao invés de se proporcionar


ficação com o grupo e a necessidade de uma reestruturação da família de origem
respeito mútuo e de cooperação para se para que ela exerça seu direito de viver
estabelecer um bom convívio, dentro e com seus filhos. Sendo assim, refletimos
fora da instituição. sobre a importância de um trabalho cujo
foco inclua o desenvolvimento da auto-
Palavras-chave: casa de acolhimento; nomia desses sujeitos. Baseando-se na
educação moral; relações de respeito experiência de trabalho no projeto de ex-
Contato: Carla Andressa Placido Ribeiro, tensão “Os afetos em cena: a brincadeira
UNESP, carlaandressap@yahoo.com.br nas relações em um abrigo para crianças
e adolescentes”, desenvolvido por alunos
de Psicologia da Universidade de Brasília,
LT04-1437 - PROPORCIONANDO vimos pensando e buscando desenvolver
RELAÇÕES QUE FAVORECEM A essa questão. Ao tratar da autonomia, é
CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA importante ser colocado que acredita-
DE CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE mos nesse processo como uma constru-
ABRIGAMENTO ção, como algo que se constitui a partir
Arytanna Zuitá Barbosa Ferreira - UnB das relações interpessoais desenvolvidas
aryryyy@gmail.com em parceria. Acreditamos, também, que
Lorena de Abreu Menezes Araujo - UnB para que se comece a pensar na constru-
nena-menezes@hotmail.com ção de tais relações é preciso adotar um
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB olhar diferenciado sobre a criança, um
rpedroza@unb.br olhar que em si mesmo traga a ideia de
que é possível que esse sujeito seja au-
A realidade das relações interpessoais no tônomo. Um exemplo disso está no ques-
contexto de abrigamento, no Brasil, tem tionamento de Rogers que, ao pensar
sido evidenciada por certo fatalismo da em sua relação com o outro, questiona
impossibilidade de crescimento de re- “como posso proporcionar uma relação
cursos de personalidade que permitam que essa pessoa possa utilizar para seu
a construção da autonomia. Defendemos próprio crescimento pessoal?” (Rogers,
que, apesar desse contexto deparar-se 2001, p.36). Diferentemente disso, o que
com regras rígidas, por exemplo, com os encontramos nos abrigos é, muitas ve-
horários predeterminados e fixos para zes, um olhar assistencialista sobre o ou-
todas as atividades do dia a dia e pouco tro, que, ao se questionar, por exemplo,
espaço para a criança exercer sua indivi- como seria possível mudar ou transfor-
dualidade, é possível criar condições fa- mar aquela pessoa, carrega uma percep-
voráveis ao desenvolvimento da pessoa ção que retira a possibilidade de movi-
como sujeito ativo e de direitos, deveres mento e protagonismo do sujeito. Segun-
e desejos. Entretanto, ainda prevalece do Foucault, conquista-se a autonomia a
a idéia de que a criança só pode se de- partir de uma libertação que ocorre pelo
senvolver por completo no seio de uma exercício individual e conjunto de práti-
família, de forma que a adoção apare- cas de liberdade. No entanto, deve-se en-
ce como única possibilidade para essas tender a construção de autonomia como

288
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mais que um processo de libertação, ou a oportunidade para a criança escolher,


um sinônimo de independência. Dentro experimentar, tentar, sonhar, ser plena-
dessa questão, podemos pensar, então, mente, mesmo em aspectos que normal-
em qual é a medida da liberdade dentro mente seriam reprimidos, como expe-
desse processo. De fato, a autonomia rimentar sentimentos de raiva, tristeza,
está estreitamente ligada ao conceito de angústia e até agressividade – sempre
liberdade; no entanto, tal liberdade não de forma mediada e responsável e den-
significa retirada de limites, pelo contrá- tro dos limites humanos éticos. Por meio
rio, como traz Paulo Freire: “a liberdade do brincar abre- se um espaço em que é
não se autentica sem o limite da autori- possível à criança exercer sua individu-
dade, mas o limite que a autoridade se alidade, sendo respeitada e escutada,
deve propor a si mesma, para propor ao sem censura, pois acreditamos que seu
jovem a liberdade, é um limite que ne- desenvolvimento, como um todo, deve
cessariamente não se explicita através de respeitar sua unicidade e individualidade
castigos” (Freire, 2001, p. 250). Partimos como ser humano. As relações com esses
do pressuposto que esse limite é consti- sujeitos são construídas buscando-se não
tuidor do sujeito e, portanto, necessário carregar olhares e atitudes comumente
para a diferenciação do eu psíquico. O au- pré-concebidas e determinantes, como
tor propõe, ainda, que seja alcançado um estereótipos de crianças em situação de
equilíbrio entre autoridade e liberdade, abrigamento como sendo agressivas ou
já que, quando esse equilíbrio se desfaz possuidoras de desenvolvimento cogni-
em favor da autoridade, nos deparamos tivo e motor inferiores; além disso, não
com uma realidade de autoritarismo; por há espaço para um olhar penoso, que
outro lado, quando se desfaz em favor pensamos ser extremamente nocivo para
da liberdade, tem- se um clima licencio- a constituição de qualquer indivíduo.
so, e, assim, a liberdade não é liberdade, Assumindo as ideias expostas, e tendo
e a autoridade se esvazia como tal. No como norteador de atuação profissional
trabalho desenvolvido pelo projeto de o respeito e a honestidade para o desen-
extensão citado anteriormente, busca-se volvimento de qualquer relação interpes-
manter esse equilíbrio e se acredita que, soal saudável, o objetivo deste trabalho
dessa forma, seja possível estabelecer as é refletir sobre as possibilidades de se
relações interpessoais favorecedoras à construir relações interpessoais diferen-
construção do processo de autonomia. ciadas que favoreçam o desenvolvimento
Referindo-se ainda a esse projeto, ao tra- da autonomia de crianças em situação de
balhar com a questão da autonomia, o abrigamento.
instrumento que se utiliza para construir
não só tais relações interpessoais, como Palavras-chave: Abrigamento;
também o espaço favorável para seu de- Desenvolvimento Infantil; Autonomia.
senvolvimento, é a brincadeira. Busca-se
proporcionar um espaço do brincar segu-
ro, em que a criança pode ser ela mes-
ma, pode ser diferente, ou simplesmente
pode ser. É um espaço em que é dada

289
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT07-1234 - PINTANDO E BORDANDO: autoras citaram estudos que comprova-


UMA REFLEXÃO ACERCA DA INFÂNCIA E vam que crianças em instituições apresen-
DA SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO taram atraso no desenvolvimento, exte-
Alyne Farias Moreira - CEUB riorizado pelo atraso na linguagem, pela
alynefariasmoreira@gmail.com dificuldade de memorização e pelo não
Bianca de Moraes Ávila - UnB reconhecimento de pessoas do convívio.
bdmavila@gmail.com Estudos atuais continuam atribuindo essa
Camila Moura Fé Maia - UnB identidade deficitária particular às crian-
mila.mfm@gmail.com ças de abrigo. Dell’Aglio e Hutz (2004), em
Lídia Furtado Oliveira - UnB pesquisa sobre depressão e desempenho
lidiafurtadoo@hotmail.com escolar em crianças institucionalizadas,
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB colocam que tais crianças possuem mé-
rpedroza@unb.br dias mais baixas relativas ao seu desem-
Thaís Polônio Ribeirinho - CEUB penho escolar e maior depressão quando
thais.polonio@gmail.com comparadas com as que vivem com suas
famílias. Percebe-se, portanto, que pes-
Um levantamento bibliográfico realizado quisas relacionadas a crianças em situa-
por Ayres, Coutinho, Sá & Albernaz (2010), ção de abrigamento, muitas vezes, se limi-
a respeito de crianças que se encontram tam a descrever as diferenças do contexto
em situação de abrigamento, aponta para que teriam como conseqüência déficits
uma delicada situação: a construção de de desenvolvimento cognitivo, afetivo e
uma identidade institucional, a “criança social. Esses estudos classificam tais crian-
de abrigo”. Há uma lógica determinista ças em uma identidade estática e focada
que atribui características psicológicas às nesses déficits (Ayres et al., 2010). As re-
crianças em decorrência dessa situação. presentações sobre a criança no abrigo
Afirma-se a vitimização da criança por es- possuem profunda relação com o proces-
tar vivendo longe de sua família, demar- so histórico-cultural de políticas assisten-
cando um lugar específico de segregação ciais à infância. Historicamente, os abrigos
em relação àquelas não abrigadas. Neste surgiram como instituições que acolhiam
estudo, buscamos fazer uma reflexão crí- tanto adolescentes em conflito com a lei,
tica sobre a identidade institucional que como aqueles que foram separados de
despersonaliza e dificulta a visão da crian- suas famílias por negligência, abandono
ça como sujeito ativo e em constante mu- ou maus tratos. Além disso, as caracterís-
dança com possibilidades de se desenvol- ticas negativas endossadas por concep-
ver em contextos adversos. Já em 1958, ções psicológicas estigmatizantes se ba-
Anna Freud e Burlingham, em estudo so- seiam em comparações entre percepções
bre crianças em situação de abrigamento, sobre as crianças que estão em abrigos e
notaram um atraso de seis meses na lin- as crianças que estão com suas famílias
guagem dessas crianças e atribuíram-no à (biológicas e nucleares). Ou seja, há uma
falta de contato com a mãe. Além disso, concepção de que o único espaço de de-
apontaram que as crianças parecem mais senvolvimento saudável possível é o seio
agressivas do que outras que vivem com familiar. Deve-se lembrar, entretanto, que
a família. Do ponto de vista cognitivo, as a família nuclear é uma construção sócio-

290
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-histórica, como bem aponta Ariès (1978), trabalho de extensão realizado em uma
e não contém, per se, todas as condições instituição de abrigamento no entorno do
que viriam a caracterizar um ambiente Distrito Federal. Esse trabalho é um proje-
saudável. As crianças quando retiradas to de extensão do Instituto de Psicologia
do seu seio familiar, ao serem abrigadas, da Universidade de Brasília, denominado
entram em contato com uma nova orga- Pintando e Bordando: desenvolvimento de
nização de espaço e tempo e passam a crianças e adolescentes em abrigos. Tem
conviver com novas pessoas, normas e por objetivo a criação de um espaço dife-
hábitos. Essas mudanças súbitas podem renciado de relações interpessoais, lazer
causar estranhamentos devido às origens, e comunicação. Utiliza-se a brincadeira
histórias, angústias e dificuldades tão di- como instrumento que favorece essas
versas de cada um. Sendo assim, reações relações, possibilitando o desenvolvimen-
vistas como de agressividade, de depres- to de recursos de personalidade como a
são e déficits podem aparecer em situa- criatividade e a autonomia. Por meio do
ções de abrigamento. No entanto, não brincar, as extensionistas criam um meio
são características inerentes das crianças, ativo de desenvolvimento afetivo e cog-
e sim expressões dos conflitos vividos. nitivo, em que transforma a criança e é
Apontamos, portanto, que a visão estáti- por ela transformado. Isso só é possível
ca desse processo apenas estigmatiza as a partir da disposição das extensionistas
crianças, impossibilitando o acolhimento em se colocarem como psicólogas em
e a ressignificação desses fenômenos. O constante atenção à escuta das demandas
presente trabalho não se propõe a quali- das crianças. Dessa forma, a brincadeira
ficar qual o melhor ambiente de desenvol- permite uma aproximação entre adultos
vimento, mas sim de propor uma reflexão e crianças e entre elas mesmas. Nesse es-
crítica dos conceitos de instituição familiar paço, a criança pode tomar a iniciativa e
e de abrigamento. Nesse sentido, visamos propor novas brincadeiras onde lhe é as-
não só descrever a situação da criança em segurado que possa colocar seus desejos,
abrigo, mas, a partir da construção de di- sendo acolhida nos limites constituintes. A
ferentes tipos de relações, oferecer possi- partir das atividades de brincadeira, cons-
bilidades de produzir novos sentidos para truímos com as crianças uma forma de se
seu desenvolvimento. Assim, o trabalho relacionar pautada no respeito, promo-
volta-se para a criança como sujeito de vendo o desenvolvimento de recursos de
direitos que se desenvolve imersa em re- personalidade que os tornem mais capa-
lações interpessoais. Estamos resgatando, zes de fazer suas próprias escolhas, lidar
portanto, uma visão de criança enquanto com contradições do cotidiano, perceber
sujeito ativo, que é construtor e constru- que existem diferentes tipos de relações
ído em um meio único e próprio. Sendo pessoais, elaborar a questão da separa-
assim, a infância é algo indeterminado, ção e do abandono entre outros. Reafir-
relativo e imprevisível (Larrosa, 2004) que mamos, portanto, a imprevisibilidade do
transforma seu meio em um constante vir sujeito que se constitui nas relações de
a ser. As considerações aqui resumidas a abrigamento, sendo impossível determi-
partir das reflexões dialógicas entre a te- nar a forma como irá ocorrer o desenvolvi-
oria e a prática são provenientes de um mento de cada criança. Sendo assim, nos-

291
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

so trabalho visa proporcionar um espaço pecíficas” abordaremos a noção de valor


de brincadeira que permita a criança lidar que definido por Gerard Legrand traduz
com situações adversas do abrigamento a “passagem do desejo para o conjunto
no seu processo de desenvolvimento. Isso doutrinário e prático que constitui uma
só pode ser feito se a criança é vista como moral fundada (explicitamente ou não)
sujeito único, acolhida e respeitada em em um conjunto de valores que são tam-
seus desejos e suas histórias. bém abstrações representando o que se
tem por desejável”. Nesta perspectiva inú-
Palavras-chave: abrigo, infância, identidade meras são as questões que se colocam na
Contato: Camila Moura Fé Maia, UnB, mila. contemporaneidade sobre a construção e
mfm@gmail.com vivência de valores para os jovens. O Prof.
Fernando Rey a partir de suas pesquisas
realizadas em Cuba, na Guatemala e no
Brasil, abordará o tema dos desafios dos
valores dos jovens em diferentes realida-
DIA 13/11 - Domingo des da América Latina, discutirá alguns dos
processos macro e micro sociais que hoje
vivem esses três países da América Latina
16h-18h e os desdobramentos desses processos
nos problemas específicos do desenvolvi-
mento de valores dos jovens. Serão ana-
Mesa Redonda Convidada lisados os processos de configuração sub-
jetiva dos valores morais, aspecto central
no processo de desenvolvimento da juven-
A JUVENTUDE NA AMERICA LATINA: tude. A Profª.Sílvia Koller apresentará os
VALORES E DESENVOLVIMENTO resultados da pesquisa desenvolvida com
HUMANO Prof.Carlos Nieto sobre o desenvolvimento
Júlia Sursis Nobre Ferro Bucher-Maluschke - UCB de valores em adolescentes e jovens em
Silvia Helena Koller - UFRGS situação de rua no Brasil e na Colômbia.
Fernando González Rey - CEUB/UnB Serão discutidos aspectos relacionados
Normanda Araujo de Morais - UNIFOR às questões biosociodemográficas desta
população, os fatores que os levam à situ-
Esta mesa redonda se propõe a apresentar ação de extrema vulnerabilidade e alguns
e discutir resultados de pesquisas realiza- aspectos protectivos, incluindo valores so-
das no Brasil e em países da América La- ciais e pessoais, que os auxiliam na sobre-
tina que enfocam o desenvolvimento dos vivência e na superação. O Prof. Benedito
jovens e sua relação com a formação de dos Santos apresentará os resultados de
valores. Partindo do conceito de virtude sua pesquisa sobre (In)justiça emocional:
desenvolvido pelos gregos na antiguidade o sentido de justiça de crianças e adoles-
como “um traço de caráter merecedor de centes que fogem de casa. Será abordada
admiração, tornando seu portador melhor, a formação do senso de justiça entre crian-
quer seja do ponto de vista moral ou inte- ças e adolescentes em situação de vulne-
lectual, quer na conduta de matérias es- rabilidade e violência intrafamiliar para ar-

292
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gumentar que o sentido de injustiça emo- crianças. Assim, serão abordadas questões
cional é um componente importante no específicas, relacionadas ao trabalho de in-
entendimento dos atos de fugir de casa. A vestigação com crianças pequenas - bebês
Profª. Normanda Araújo apresentará refle- -, considerando-as, a partir do referencial
xões acerca dos valores atribuídos por jo- da Sociologia da Infância, sujeitos sociais,
vens em situação de vulnerabilidade social portanto, que estabelecem relações com o
acerca de suas famílias a partir da pesquisa outro, grupo geracional ou não e, nessas
realizada com dois grupos de jovens. Um relações, tem um papel ativo na composi-
grupo que ainda mora com suas famílias e ção dos contextos em que estão inseridas.
que frequenta o Trabalho educativo e ou- O contexto eleito para o trabalho empírico
tro grupo que vive em situação de rua. Se- foi uma creche em Braga/Portugal e os re-
melhanças e especificidades dos contextos sultados apontaram para a importância das
familiares para os dois grupos são discuti- ações das crianças/ bebês na condução da
das. A Profª. Júlia Bucher-Maluschke apre- ação do(s) outro(s) e nas transformações
sentará a partir da pesquisa de histórias de de suas próprias ações. Aliando a perspec-
vida de jovens, filhos de pais “fora da lei”, tiva teórico-metodológica da Psicologia
como construíram e vivenciam seus valo- Sócio-Histórica às reflexões sobre as con-
res pessoais num contexto intrafamiliar e dições de exclusão/inclusão dos sujeitos
social contraditório. Esperamos suscitar sociais crianças, considerando, inclusive,
com esta mesa-redonda novos encami- aquelas que vivem em contextos onde a
nhamentos para a investigação nesta área violação de seus direitos se faz presente,
do desenvolvimento humano. a segunda exposição aborda a condição da
criança - e a persistente desconsideração
por essa condição - enquanto sujeito que
MR LT04 - Mesa Redonda produz sentidos e significados aos aconte-
cimentos de seu cotidiano, considerando
Convidada os contextos instituicionais e seus atores.
Assim, afirma a autora: “O reconheci-
mento da criança como sujeito concreto,
MR LT04-979 - REFLEXÕES TEÓRICO-
inserido num contexto que ajuda a produ-
METODOLÓGICAS EM PESQUISAS COM
zir e que o produz, leva a compreender a
CRIANÇAS
posição desse sujeito no contexto social,
Rosângela Francischini - UFRN a situá-lo numa realidade mais ampla e a
rfranci@uol.com.br tentar apreender o processo pelo qual ele
Angela Coutinho - UFSC (sujeito) se forma. Sem esse enfoque, tem-
gi_scalabrin@hotmail.com -se uma análise parcial do problema, uma
Sônia M. Gomes Sousa - PUC/Goiás espécie de ‘psicologismo’, uma abordagem
smgsousa@terra.com.br insuficiente, incapaz de dar conta do pro-
cesso de exclusão–inclusão social a que
O objetivo principal desta Mesa é apre- estão submetidos milhares de seres huma-
sentar trabalhos que se propõem a refletir nos. Portanto, é necessário compreender
sobre questões teórico-metodológicas que a realidade social como uma construção
perpassam a atividade de pesquisa com humana, e não simplesmente como um

293
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dado natural, pois é no processo de produ- bem como as possibilidades de diálogo en-
ção de sua realidade social que o homem tre diferentes áreas do conhecimento no
produz-se a si mesmo como ser histórico estudo de problemáticas interdisciplina-
e cultural.” A terceira exposição tem por res, como são as relacionadas às crianças
objetivo estabelecer um diálogo entre a e às suas infâncias. Para tanto, toma como
Psicologia Sócio-Histórica e a Sociologia da referência uma pesquisa de doutorado de-
Infância. A partir da constatação de que na senvolvida no âmbito de um programa de
bibliografia especializada em Sociologia da doutorado em Estudos da Criança. Trata-
Infância comparecem críticas recorrentes -se de um estudo com orientação etnográ-
à Psicologia do Desenvolvimento, princi- fica, que foi desenvolvido em um contexto
palmente, de vertente piagetiana, a autora de educação infantil do tipo creche, em
se propõe a sinalizar as possibilidades de Portugal, tendo como objetivo conhecer a
aproximação entre essas duas áreas do ação social dos bebês no contexto da cre-
conhecimento, considerando, no entanto, che e, especificamente, identificar a recor-
a Psicologia Sócio-Histórica representada rência e o modo como ocorrem tais ações
por Vygotsky, cujo desafio é pensar o de- sociais. As perguntas que orientaram o
senvolvimento do sujeito a partir do ma- estudo são: Como ocorre a ação social en-
terialismo dialético, das interinfluências tre os bebês, nas relações cotidianas no
e das transformações recíprocas sujeito- contexto da creche? Quais elementos são
-ambiente. Por seu lado, da Sociologia da constituidores de tal ação? As relações e
Infância é chamada à cena a tese da “re- as ações sociais são ideias e práticas simi-
produção interpretativa”, elaborada por lares? O que caracteriza a ação de bebês
Corsaro, que assume a capacidade e o po- na estruturação das suas experiências, no
der que as crianças têm de transformarem contexto da creche? Há uma ordem so-
os elementos de seu contexto, através das cial diferenciada para adultos e crianças,
interpretações que fazem desses elemen- no interior das instituições? Como elas
tos, sinalizando para a importância das re- são estruturadas? Quais indicativos para
lações intrageracionais. a formação das professoras de educação
infantil emergem do conhecimento da
ação social dos bebês na creche? A base
DESAFIOS METODOLÓGICOS PARA O teórico-metodológica selecionada encon-
ESTUDO DAS RELAÇÕES SOCIAIS DOS tra-se na interface das Ciências Humanas
BEBÊS com as Ciências Sociais, nomeadamente
Angela Coutinho - UFSC a Sociologia da Infância, numa perspec-
gi_scalabrin@hotmail.com tiva que situa a criança como ator social
e a infância como construção histórica e
Financiamento: Alβan – Programa de bolsas cultural (Ariès, 1981; James & Prout, 1990;
de alto nível da União Europeia para América Pinto & Sarmento, 1997). Dentre os pres-
Latina supostos a serem abordados está a ideia
de que a infância deve ser estudada a
Esta comunicação tem por objetivo apre- partir de si própria, considerando que as
sentar algumas reflexões sobre os desafios crianças são as melhores informantes so-
metodológicos na pesquisa com bebês, bre as questões que lhe dizem respeito.

294
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Tratando-se de bebês, há questões impor- sobretudo, nas últimas duas décadas, um


tantes a serem debatidas em torno da es- crescente número de estudos que reve-
colha de instrumentos de coleta de dados lam a competência social das crianças (Ja-
e o trato dispensado aos dados coletados. mes, 1998; Hutchby & Moran-Ellis, 1998),
Isso porque, ao buscar superar a ideia de no entanto, as crianças envolvidas em tais
negatividade ou falta atribuída à infância, estudos, quase sempre, encontram-se em
desde a etimologia da palavras infans - uma faixa etária em que as formas de co-
que é aquele que não fala - a legitimidade municação aproximam-se das utilizadas
da competência social dos bebês passa correntemente pelos investigadores-adul-
pela descortinamento de seus modos de tos. Esse dado nos provoca a pensar que,
ser e estar no mundo, não pela ausência mesmo que tais estudos avancem no sen-
da fala, mas, pela presença de múltiplas tido de considerar a opinião das crianças
outras formas de comunicação. A captu- como legítima e relevante, eles ainda não
ração das vozes dos bebês ocorreu, neste conseguem superar a marginalização das
estudo, por meio da utilização de instru- crianças bem pequenas, algo posto como
mentos como o diário de campo e o vídeo, desafio para as diferentes áreas. Mesmo
sendo o último um instrumento valioso, aqueles que têm se proposto a ouvir as
sobretudo, porque essas vozes manifes- vozes das crianças bem pequenas: em que
tam-se pelo gesto, pelo corpo, pelo si- medida as crianças são atores e não meros
lêncio, pelo olhar, enfim, por múltiplas objetos de estudo? O que diferencia esses
formas de comunicação. Ainda na esteira papéis? As questões apresentadas consti-
da abordagem em torno da recolha de da- tuem o eixo orientador da proposta de co-
dos junto às crianças bem pequenas, nos municação ora proposta que, como anun-
deparamos com questões éticas que se ciamos inicialmente, toma como base um
referem não só à utilização de termos de estudo de doutorado, que por preocupar-
consentimento informado dos familiares/ -se com tais questões e tomá-las como
responsáveis ou devolutiva dos resultados fundamentais ao processo de pesquisa,
às partes interessadas - aspectos funda- permitiu compreender que os processos
mentais a qualquer processo de pesquisa constitutivos das ações sociais dos bebês
-, mas, algumas questões bastante sutis, relacionam-se a diferentes categorias sen-
contudo, fundamentais quando partimos do que, neste grupo, em específico, nossa
de perpectivas de pesquisa que tomam as interpretação permitiu relacioná-los com
crianças como atores sociais, pois, como a elaboração cultural e, de modo bastante
respeitar o direito dos bebês de escolhe- recorrente, às situações de brincadeira; ao
rem ou não participar de uma pesquisa? corpo, à sua dimensão social e enquanto
Ou, ainda, de participar da pesquisa ape- expressividade; as relações entre os pares,
nas em determinados momentos? Como com ênfase para as relações de gênero e
“ler” a sua opinião, que nem sempre é di- a problematização das relações a partir
reta, sobre a presença de um outro adulto da classe social. A idéia da competência
em seus espaços de vida, para satisfazer dos bebês, no que tange à estruturação
uma necessidade que lhe é alheia? De- de ações que são sociais, porque são
vemos considerar, ainda, que a partir dos mobilizadas pela ação de outro, se reve-
childhood studies temos acompanhado, lou de modo complexo e nas minúcias de

295
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sua expressividade, seja nas situações de lho, lazer, violência física, sexual e/ou psi-
brincadeira, no revelar das preferências cológica – é uma tentativa de romper com
por determinados pares, assim como da a concepção dominante, que vê a criança
sua condição social enquanto menina ou como o infante, ou seja, ‘aquele que não
menino pertencente a uma determinada tem fala’, para colocá-la num lugar de
classe e estatuto social. Os bebês agem protagonista, em defesa de seu status de
socialmente, determinando a ação de ou- sujeito de direitos. O estudo da infância e
tros, modificando a sua própria ação, as- da criança objetiva, assim, desvelar o real,
sim como atuando sobre a estrutura, que subvertendo a aparente ordem natural das
embora tenha um poder interferente, não coisas, pois, compreende que a criança fala
conforma as suas ações, dada a sua capa- não apenas de seu mundo e de sua ótica
cidade enquanto agente. infantil, mas, também, do mundo adulto
e da sociedade contemporânea (Kramer,
Palavras-chave: pesquisa com bebês, 1996). E, nessa perspectiva, pretende tam-
metodologias de pesquisa, estudos sociais da bém colaborar na elaboração de políticas
infância públicas não excludentes e que vejam a
infância não como risco, mas, fundamen-
talmente, como oportunidade (Rizzini et
O ESTUDO DA INFÂNCIA COMO alii, 2000). A opção por estudar/pesquisar
REVELADOR E DESVELADOR DA a infância parte do pressuposto de que a
DIALÉTICA EXCLUSÃO–INCLUSÃO criança, na vida que vive e nas diversas
SOCIAL formas de subjetivação que produz, reve-
Sônia M. Gomes Sousa - PUC/Goiás, la e desvela o mundo e expressa a história
smgsousa@terra.com.br dos homens. Assim, estuda-se a infância,
buscando captar a criticidade da criança
A psicologia sócio-histórica, que tem como sobre o mundo e a do pesquisador sobre
sujeito principal de investigação a criança a relação criança–mundo. Contudo, essa
ou o adolescente, têm produzido pesqui- perspectiva teórico-metodológica não é
ainda usual, pois, estudar a criança quase
sas que privilegiam aspectos ausentes
sempre parece ao adulto interessar-se por
das investigações em outros momentos
um ‘objeto’ menor. Uma prova disso é que,
históricos. Desse modo, ao voltar-se para
quase sempre, as teorias sobre a infância
temas como a violência contra crianças, o
estão profundamente marcadas pela óti-
abandono, a exploração sexual, o trabalho
ca do ajustamento da criança à sociedade
infantil etc, essas pesquisas contribuem
dos adultos, não apenas esquecendo a sua
para a construção de um campo investiga-
forma específica de ver e viver o mundo,
tivo que alcança e focaliza a dimensão da
mas, tentando transformá-la em adulto
exclusão–inclusão (Sawaia, 1995 e 1998)
idealizado. Geralmente, não se leva em
na vivência infantil. Investigar os sentidos
consideração que tal ajustamento deve
e significados que as crianças atribuem a ser o resultado de um processo histórico
diversos fenômenos da sua vivência co- e cultural e que a transmissão/assimilação
tidiana na contemporaneidade – família, cultural não se dá de uma forma comple-
convivência com os pares, escola, traba- ta, nem tampouco passiva e pacífica. Da

296
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

visão fragmentária da infância, que não mulo exagerado ao consumo, da exposição


permite a compreensão plena da criança à mídia etc. –, a criança continua, cotidia-
em sua singularidade, resultaram teorias namente, não confirmada como sujeito
nas quais se perdeu a dimensão dos con- do seu tempo e da sua história. Refletir
flitos, das crises e das tensões vividas por sobre o sofrimento ético-político em situ-
ela, em seu processo de desenvolvimento. ação de exclusão–inclusão social “é uma
O reconhecimento da criança como sujeito oportunidade de refletir sobre subjetivi-
concreto, inserido num contexto que ajuda dade enquanto fator histórico e confronto
a produzir e que o produz, leva a compre- político e participar do debate transdis-
ender a posição desse sujeito no contexto ciplinar capaz de romper a cisão clássica
social, a situá-lo numa realidade mais am- entre homem/sociedade e subjetividade/
pla e a tentar apreender o processo pelo objetividade”, na compreensão de Sawaia
qual ele (sujeito) se forma. Sem esse enfo- (1998, p. 6). Há um aspecto que não deve
que, tem-se uma análise parcial do proble- nem pode ser esquecido, especialmente,
ma, uma espécie de ‘psicologismo’, uma quando se trata da realização de pesquisas
abordagem insuficiente, incapaz de dar com crianças: o pesquisador é portador
conta do processo de exclusão–inclusão de um poder expresso por sua condição
social a que estão submetidos milhares social, por sua formação, pela hierarquia
de seres humanos. Portanto, é necessá- de idade. E é óbvio que essas condições,
rio compreender a realidade social como presentes nas relações sociais, marcam
uma construção humana e não, simples- sua relação com os sujeitos pesquisados.
mente, como um dado natural, pois, é no Por isso, é sempre importante ele se per-
processo de produção de sua realidade so- guntar e se avaliar – assim como também
cial que o homem produz-se a si mesmo ser avaliado pelos seus pares – a respeito
como ser histórico e cultural. Embora Ariès de como utiliza esse poder nas suas rela-
(1986) tenha, na década de 1960, defen- ções com os seus pesquisados, mais ainda,
dido teses como a de que o sentimento quando estes são crianças. É indispensável
de infância não estava presente no mun- ao pesquisador que investiga a temática da
do medieval e a de que a infância é uma infância, a formação adequada. Ele tem de
construção social, não raro, encontramos, extrapolar a sua área específica, entender
na sociedade atual e no mundo acadêmi- as implicações e os procedimentos jurídi-
co, questionamentos sobre a importância cos, científicos e técnicos atinentes a essa
de seu estudo. Os questionamentos com- área. Sobretudo, deve ter sempre presen-
parecem travestidos pelo discurso do rigor te que “a pesquisa não pode representar
científico – a criança é um sujeito confiá- apenas um momento de coleta de dados,
vel?, como acessar o seu discurso?, o que que beneficie somente o pesquisador e a
ela “fala” tem importância? Na realidade, comunidade científica. Este processo deve
tais questionamentos expressam a condi- representar um fator de proteção para a
ção social subalterna (Charlot, 1986) a que criança que será ouvida, protegida e ajuda-
a infância tem sido submetida. E, mesmo da” (Lisboa & Koller, s.d., p. 20). É fato que
na aparência da sociedade capitalista con- a sociedade reconhece a infância como o
temporânea, em que a infância parece momento da vida em que o indivíduo deve
posta em destaque – em função do estí- ser cuidado, no sentido biopsicossocial.

297
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Todavia, é notório que essa compreensão na Educação, principalmente, com produ-


não encontra suporte na realidade nem ções acadêmicas que sinalizam a filiação
alcança o universo das crianças brasileiras. teórico-metodológica à abordagem sócio-
O reconhecimento dessa fase da vida, em -histórica. Interacionismo, construtivismo,
sua plenitude, exige a garantia – a todas aprendizagem e desenvolvimento passam
as crianças – da possibilidade concreta de a ser focos privilegiados de discussão aca-
ser criança e do direito à infância, resguar- dêmica. Neste trabalho, retomamos alguns
dado pela sociedade e pelos adultos que pressupostos da Psicologia Sócio-Histórica
a compõem. cujo diálogo com os pressupostos básicos
da Sociologia da Infância nos seja possível.
Palavras-chave: Psicologia sociohistórica, Em nosso caso, estaremos considerando
infância, dialética exclusão/inclusão social o sujeito-criança. Com esse propósito, ini-
ciamos com uma abordagem das críticas à
Psicologia do Desenvolvimento que com-
A INFÂNCIA EM QUESTÃO: DIÁLOGOS parecem nas principais obras em Sociolo-
ENTRE A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA E gia da Infância. Observamos, inicialmen-
A SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA te, que as críticas à Psicologia, presentes
Rosângela Francischini - UFRN, nas obras de referência em Sociologia da
rfranci@uol.com.br Infância, centram-se, principalmente, na
Psicologia do Desenvolvimento piagetiana.
O objetivo deste trabalho é estabele- Essa opção deve-se ao fato de que a Epis-
cer um diálogo entre a Psicologia Sócio- temologia Genética teve grande influência,
-Histórica, representada por Vygotsky, e no século XX, principalmente na Psicologia
a Sociologia da Infância. Sua emergência e, também, na Educação, área em que se
deve-se às opções teórico-metodológicas concentram as pesquisas em Sociologia da
que orientam nossas atividades de ensi- Infância. Segundo James e James (2008), a
no, pesquisa e extensão e às inquietações Psicologia do Desenvolvimento concebe o
decorrentes de leituras da produção aca- sujeito a partir de estágios de desenvolvi-
dêmica em Sociologia da Infância. Nesse mento e das estruturas cognitivas que os
contexto, chamou-nos atenção as obser- caracterizam, enquanto processo linear e
vações das críticas recorrentes à Psicologia diretamente relacionado à idade cronoló-
do Desenvolvimento, que comparecem gica. Acrescente-se, ainda, a concepção de
na bibliografia em Sociologia da Infância. desenvolvimento como um processo ca-
Os temas privilegiados nas/das investi- racterizado por aquisições progressivas de
gações são: desenvolvimento cognitivo e determinadas competências, que têm no
desenvolvimento social do sujeito, embo- universo adulto o modelo/ perspectiva a
ra não sejam os únicos. Assim, as princi- ser alcançado. Essa atribuição de uma con-
pais teorias do desenvolvimento, que têm dição de transitoriedade à criança, acres-
em Piaget o teórico de maior destaque, cida de sua condição de dependência em
centram-se nesses domínios. A partir das relação ao adulto, é criticada por Sarmen-
traduções de parte da obra de Vygotsky, to (2006), que afirma: “Neste domínio, a
observou-se a emergência e acentuação psicologia do desenvolvimento tem sido
de grupos de pesquisas, na Psicologia e a mais consistente promotora de uma re-

298
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

presentação social da infância sustentada zhovich, 2009). Dessa forma, os estágios


na incompletude, na incompetência e na de desenvolvimento são pensados a partir
imperfeição das formas de pensamento, da composição de diferentes processos e
que, por isso mesmo, necessita de acom- funções mentais, e das distintas possibili-
panhamento e promoção nas sucessivas dades de combinação entre esses proces-
‘etapas de desenvolvimento’ legitimando sos e funções. Ainda, como indicadores de
não apenas o controlo adulto, mas a assi- diferentes domínios e predominâncias de
metria radical de poderes intergeracionais formas de interação com os contextos. As
na condução da vida das crianças” (Sar- alterações qualitativas que são observa-
mento, 2006, p. 52). Ainda, o mesmo autor das nas interações da criança representam
afirma que coube à Sociologia da Infância momentos de transição e de desenvolvi-
resgatar a infância das “perspectivas bio- mento de novas funções mentais que, por
logistas (...) e psicologizantes, que tendem sua vez, resultam em novas organizações
a interpretar as crianças como indivíduos da consciência como um todo. Consequen-
que se desenvolvem independentemente temente, de novas possibilidades de ação
da construção social das suas condições de e de transformação tanto de si, quanto do
existência e das representações e imagens contexto. À ciência Psicológica, portanto,
historicamente construídas sobre e para e mais especificamente à Psicologia do
elas” (Sarmento, 2006, p. 43). Ressalva, Desenvolvimento, é colocado o desafio
no entanto, é feita pelo autor à Vygotsky, de pensar o desenvolvimento do sujeito
cuja abordagem atenta para os contextos a partir do materialismo dialético, das in-
sociais de desenvolvimento e para o pa- terinfluências e das transformações recí-
pel das crianças nesse processo. Assim, a procas sujeito-ambiente. Por seu lado, a
Sociologia da Infância reivindica a “cons- Sociologia da Infância, aproximando-se do
trução social da infância” nos estudos exposto acima, ao tecer uma revisão crítica
sobre a criança e seu desenvolvimento, sobre os processos de socialização, se opõe
reivindicação esta presente no clássico de a determinadas vertentes da Sociologia
Ariès (1981), História Social da Criança e em que as crianças são “tematizadas como
da Família. Considerando os apontamen- objecto de um processo de inculcação de
tos iniciais deste trabalho afirmamos que, valores, normas de comportamento, e de
em Vygotsky, comparece, igualmente, uma saberes úteis para o exercício futuro de
reflexão sobre o desenvolvimento infantil práticas sociais pertinentes” (Sarmento,
tendo como norteadores os estágios de 2006, p. 54). As crianças são considera-
desenvolvimento; no entanto, esses está- das atores sociais, grupo geracional com
gios não são concebidos como agregados características próprias, com capacidade
de traços psicológicos separados, mas, de ação e de criação da cultura. Portanto,
antes, por estruturas cujo caráter integra- longe de serem reprodutores passivos nos
tivo de seus componentes compõe as ten- processos de socialização, Corsaro (1997)
dências do desenvolvimento nas diversas propõe a tese da “reprodução interpreta-
faixas etárias, ao longo de seu percurso. tiva”, que assume a capacidade e o poder
Considere-se, no entanto, a fluidez entre que as crianças têm de transformarem os
as fronteiras das idades e o caráter qualita- elementos de seu contexto, através das in-
tivo das diferenças que os conformam (Bo- terpretações que fazem desses elementos.

299
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Nesse contexto de discussão, a interação obesidade. Esses transtornos e a obesida-


social assume papel de relevância. Uma de são reconhecidos como graves proble-
aproximação com o conceito de Zona de mas de saúde, atingindo um número gran-
Desenvolvimento Proximal de Vygotsky é de de pessoas, o que tem preocupado as
sinalizada, considerando, no entanto, que autoridades de saúde do nosso país. Parti-
a Sociologia da Infância, diferentemente, ciparão dessa mesa redonda pesquisado-
sinaliza para a importância das relações ras participantes do projeto de pesquisa
intrageracionais. Concluímos com a obser- “Construção de metodologia de atendi-
vação de que outros pontos de diálogo são mento psicossocial a crianças e adolescen-
sinalizados, observando, com James e Ja- tes com transtornos alimentares e suas
mes (2008), que: “precisamente por causa famílias”, em andamento na Universidade
de sua complexidade, um entendimento Católica de Brasília – UCB e coordenado
compreensivo da infância não pode ser pela proponente dessa mesa redonda. A
realizado/alcançado através de uma pers- equipe responsável pelo projeto é forma-
pectiva epistemológica e disciplinar única: da por seis professoras doutoras da UCB e
um fenômeno complexo requer estudo in- UnB, uma médica da Secretaria de Saúde
terdisciplinar, assim, o estudo da infância do DF, quatro alunos de mestrado em psi-
tem que ser compreendido como uma ati- cologia da UCB e oito alunos de iniciação
vidade multi e interdisciplinar” (p. 26). científica cursando graduação em psico-
logia na UCB. A primeira participante da
Palavras-chave: infância, Psicologia Sócio- mesa é a Dra. Denise Leite Ocampos, mé-
-Histórica, Sociologia da Infância dica, atualmente respondendo como che-
fe do Núcleo de Saúde do Adolescente da
Secretaria de Estado de Saúde do Distrito
MR LT01 - Mesa Redonda Federal, que vai apresentar dados sobre o
atendimento aos adolescentes no Distrito
Convidada Federal, contextualizando a questão dos
transtornos alimentares e obesidade. Em
seguida, teremos a participação da psicó-
MR LT01-939 – TRANSTORNOS ALIMEN- loga é Aldenira Barbosa, Cavalcante, Mes-
TARES E OBESIDADE NO CICLO DE VIDA tre em Psicologia pela UCB, apresentando
FAMILIAR: O PAPEL DA FAMÍLIA sua pesquisa de mestrado sobre anorexia
Maria Alexina Ribeiro - UCB nervosa na adolescência, orientada pela
alexina@solar.com.br proponente dessa mesa, que também
participará como co-autora do trabalho. A
O objetivo da mesa redonda é apresentar última participante da mesa é Ana Flávia
dados importantes de pesquisas e inter- Nascimento Otto, nutricionista e Mestre
venções realizadas na Universidade Cató- em Psicologia pela UCB, apresentando sua
lica de Brasília – UCB, bem como discutir pesquisa de mestrado sobre obesidade
questões relacionadas ao tratamento que grave e TCAP em adultos, orientada pela
é oferecido no DF para crianças e ado- proponente dessa mesa, que participará
lescentes com transtornos alimentares como co-autora do trabalho.
– anorexia nervosa e bulimia nervosa – e

300
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DE ADO- em relação ao feminino (43,7%). Dentre


LESCENTES NO DISTRITO FEDERAL: A os principais diagnósticos realizados nos
QUESTÃO DOS TRANSTORNOS ALIMEN- atendimentos de janeiro de 2009 a junho
TARES E OBESIDADE de 2010, os diagnósticos mais frequentes
Denise Leite Ocampos - SES/DF foram: 23 diagnósticos de saúde mental:
denise.sesdf@gmail.com TDAH, Dificuldade com Autoridade, Dis-
túrbio de conduta, Ansiedade, Deficiência
A adolescência é marcada pela experi- Mental, Superproteção Parental, Depres-
mentação de valores, de papéis sociais são, Dificuldade Escolar, Timidez, Alcoolis-
e de identidades e pela ambiguidade en- mo Parental, Violência Familiar, Obesidade
tre ser criança e ser adulto. No entanto, a ou Sobrepeso, Opressão Familiar, Drogas,
adolescência não deve ser vista somente Luto, Fobias, Adoção, Depressão Materna,
como fase, etapa, período provisório ou Conflitos Familiares, TEPT, TPM e/ou cóli-
de transição. Esse momento é marcado cas, Conflitos com a Sexualidade, Rebeldia.
por aprendizados, descobertas e desa- Destes, 10 dizem respeito a diagnósticos
fios biopsicossociais. Tendo em vista esse psiquiátricos propriamente ditos, sejam
momento especial de intenso aprendiza- do adolescente ou de seus pais: TDAH, Dis-
do na vida do ser humano, a Organização túrbio de conduta, Ansiedade, Deficiência
Mundial de Saúde e Ministério da Saúde Mental, Depressão, Alcoolismo Parental,
do Brasil instituíram o Programa de Saú- Drogas, Fobias, Depressão Materna, TEPT.
de de Adolescentes em 1989 e o Distrito Em termos de frequência, a importância da
Federal oficializou o Programa em 1991. prevalência de problemas mentais entre
Atualmente as ações de Atenção Integral os/as adolescentes fica também evidente:
a Saúde de Adolescentes no DF são admi- 70% são de saúde mental e, desses, 37,6%
nistradas pelo Núcleo de Atenção Integral são de quadros psiquiátricos. Entre os diag-
à Saúde do Adolescente da Secretaria de nósticos biomédicos, predominaram Rinite
Estado da Saúde. Essas ações encontram- Alérgica, Acne, Cefaléia, Deficiência Auditi-
-se implantadas nas 15 Regionais de Saúde va ou Visual, Epilepsia, Gastrite e Hiperco-
e têm, como prioridade, três eixos de ação: lesterolemia. Os transtornos alimentares e
crescimento e desenvolvimento saudáveis, a obesidade, embora não constem entre
promoção da saúde sexual e reprodutiva os mais frequentes, têm aparecido como
e redução da morbi-mortalidade por aci- queixa frequente nas consultas dos adoles-
dentes e violências. A população na faixa centes que procuram o Núcleo. Este tem se
etária da adolescência, de 10 a 19 anos, no preocupado com os referidos diagnósticos,
DF, corresponde a 20,1%, cerca de 469.000 o que motivou a busca de parceria com a
adolescentes. O total de atendimentos Universidade Católica de Brasília – UCB, vi-
aos adolescentes chega a 35%, o que é sando proporcionar aos técnicos da Secre-
considerado ideal em relação ao total de taria de Saúde que atendem aos adoles-
atendimentos da população em geral. Há centes um melhor embasamento teórico
uma ligeira predominância de pacientes e instrumental para um atendimento mais
na faixa etária de 10-14 anos (36,4%) em eficaz dos casos. A partir desse cenário, e
relação aos da faixa de 15-19 anos (53,7%) apoiados pelos indicadores, reconhecendo
e de pacientes do sexo masculino (56,3%) a complexidade desses fenômenos, que

301
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

escapam do domínio do indivíduo e alcan- ANOREXIA NERVOSA NA ADOLESCÊNCIA:


çam a família e a sociedade, e adotando a O PAPEL DA FAMÍLIA NO SURGIMENTO E
lógica da vigilância à saúde, são oferecidos MANUTENÇÃO DO TRANSTORNO
serviços de promoção à saúde e prevenção Aldenira Barbosa Cavalcante - UCB
dos agravos aos adolescentes na atenção aldenirapsic@gmail.com
básica: acolhimento, acompanhamento Maria Alexina Ribeiro - UCB
Biopsicossocial, grupo de adolescentes,
grupo interventivo para pais, acompanha- O aumento significativo do número de pa-
mento de pré-natal, planejamento repro- cientes com Anorexia Nervosa nas ultimas
dutivo, acompanhamento nutricional, ofi- décadas, leva a pensar numa verdadeira
cinas temáticas, imunização e articulação “epidemia” do transtorno. O desequilí-
interinstitucional. As equipes são multidis- brio da relação do individuo com a sua
ciplinares e são compostas por: médico(a) forma de se alimentar, tem preocupado
s, enfermeiro(a)s, técnico(a)s de enfer- os especialistas em saúde mental. A Ano-
magem, assistentes sociais e psicólogo(a) rexia Nervosa caracteriza-se por uma per-
s, sendo que a composição da equipe va- da de peso acentuada, resultante de uma
ria de serviço para serviço. As principais restrição calórica voluntária do paciente
atividades realizadas são: acolhimento, devido a um temor exacerbado de en-
atendimento individual, grupo de instru- gordar e a uma busca implacável da ma-
mentalização de pais, grupo para pais de greza. Estudos apontam a incidência de
adolescentes em situação especial de uso pessoas cada vez mais jovens, e a média
de drogas, grupo de adolescentes, grupo de idade das meninas com anorexia caiu
de adolescentes gestantes, grupo de pla- de 12-14 anos para 7-8 anos. Esta disser-
nejamento sexual e reprodutivo, além de tação de Mestrado objetivou compreen-
oficinas e ações nas escolas, por meio do der a dinâmica de famílias que possuem
Programa Saúde na Escola – PSE. Compre- um membro adolescente portador de
endemos que, embora a média de atendi- Anorexia Nervosa, identificando aspectos
mentos alcançou o objetivo quantitativo do relacionamento intrafamiliar específi-
em relação ao ideal estabelecido, é preciso cos de famílias com esta problemática. A
que haja um grande empenho na melhoria adolescência é considerada uma etapa do
qualitativa dos atendimentos, com investi- desenvolvimento humano que pressupõe
mentos variados na qualificação profissio- a passagem de uma situação de depen-
nal e na organização da rede para o aco- dência infantil para a inserção social e a
lhimento desta população, considerando formação de um sistema de valores que
as várias especificidades que apresenta. definem a idade adulta, segundo estudio-
Ao mesmo tempo, é necessário investir na sos. Encarada como uma fase do ciclo de
busca ativa e na atenção integral, já que vida familiar, a adolescência apresenta ta-
a demanda espontânea é principalmente refas particulares, que envolvem todos os
motivada por acidentes, doenças agudas e membros da família. Pode-se dizer, então,
à gravidez na adolescência. que este período se constitui como uma
fase de transição do indivíduo, da infân-
Palavras-chave: adolescência, transtornos cia para a idade adulta, evoluindo de um
alimentares, obesidade. estado de intensa dependência para uma

302
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

condição de autonomia pessoal. Adota- pos multifamiliares: 1) de que não existe


mos uma metodologia baseada na pro- uma única forma correta de lidar com as
posta da pesquisa qualitativa, pesquisa- dificuldades decorrentes da doença; 2) a
-ação e uma adaptação da metodologia conclusão de que precisam observar me-
de Grupo Multifamiliar, o qual se funda- lhor as mudanças de comportamento dos
menta nos pressupostos: a) da Terapia Fa- filhos; 3) a percepção de que o momento
miliar, tendo a visão de família enquanto do diagnóstico causa sofrimento a todos;
sistema, sendo a relação o ponto focal do 4) o grau de importância de buscar infor-
trabalho, priorizando o interpsíquico mais mações sobre os sintomas da filha; 5) o
que o intrapsíquico, e utilizando os recur- entendimento de que o tratamento fa-
sos sistêmicos como a circularização e a miliar é eficaz para a união da família; 6)
provocação; b) da Psicologia Comunitária, o sentimento de que dividir as angústias
visando ao trabalho em equipe com dife- em relação à AN, com as demais famílias
rentes saberes, científicos e populares ; c) é importante; 7) o entendimento que a
do Sociodrama em que o grupo é o pro- adesão ao tratamento exige mudanças no
tagonista e as famílias possuem objetivos ambiente familiar; 8) e por fim, relataram
comuns, além de se identificarem mutu- o fortalecimento dos vínculos familiares
amente; d) e da Teoria das Redes Sociais, após compartilhar seus sofrimentos com
que enfoca a interação humana com a outras famílias. Nessa perspectiva, este
troca de experiência, desenvolvendo a estudo mostrou que as interações que
capacidade autorreflexiva e autocrítica. se estabelecem entre pais, mães, filhos e
Os participantes foram três famílias com filhas permeadas por sofrimentos, confli-
adolescentes do sexo feminino diagnosti- tos, valores e crenças interagem com as
cadas com Anorexia Nervosa, em atendi- questões biológicas, nutricionais e psicos-
mento em uma instituição pública de saú- sociais que envolvem a dinâmica familiar
de da SES/DF, em Brasília. Os instrumen- dos sujeitos pesquisados. Esses dados
tos utilizados foram: roteiro de entrevista mostram a complexidade da doença, cujo
semiestruturada, genograma, colagem, conhecimento exige uma leitura que in-
construção do ciclo de vida familiar e gra- clua várias dimensões do contexto onde
vação em áudio - MP3. Os dados foram está inserida e reforçam a importância da
submetidos à análise de conteúdo e inter- terapia familiar no tratamento dos trans-
pretados de acordo com a abordagem sis- tornos alimentares.
têmica da família. A análise demonstrou
dificuldades múltiplas no sistema familiar, Palavras-chave: anorexia nervosa, família,
tais como: padrão de comunicação pouco adolescência.
claro; presença de conflito conjugal com
a adolescente anoréxica se posicionando
triangulada com os pais; negligência dos
pais da adolescente; depressão das mães;
mães dependentes afetivamente das fi-
lhas, fronteiras internas difusas e evita-
ção de conflitos. Alguns aspectos foram
sinalizados pelas famílias ao final dos gru-

303
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

OBESIDADE E TRANSTORNO DA COM- ligação entre o papel da alimentação no


PULSÃO ALIMENTAR (TCAP) NA IDADE desenvolvimento infantil, pertencimento
ADULTA: CONHECENDO A FAMÍLIA DO familiar e a eclosão da compulsão alimen-
PACIENTE E SUA DINÂMICA tar na fase adulta A literatura aponta que
Ana Flávia Nascimento Otto - UCB a interação da mãe com o bebê, via alei-
anaotto30@yahoo.com.br tamento, e, posteriormente, a interação
Maria Alexina Ribeiro - UCB da família com a alimentação da criança,
constitui fator fundamental no surgimen-
Entre as pessoas com obesidade grave to de alguns casos de obesidade. Muitas
existe uma sub-população com caracte- mães e famílias têm uma excessiva preo-
rísticas semelhantes, que não respondem cupação com a alimentação da criança e
ao tratamento comportamental para per- a alimentam de forma exagerada, criando
da de peso. Este grupo apresenta um tipo um hábito alimentar que pode se manter.
de transtorno alimentar conhecido como Essa relação alimento-afetividade foi in-
Transtorno da Compulsão Alimentar Perió- tensificada na vida de Eva, pela ênfase que
dica (TCAP). Essa patologia é uma nova ca- a mãe dava em alimentá-la, parecendo ser
tegoria diagnóstica proposta pelo Manual essa a única forma de carinho que a mãe
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos lhe dedicava. A expressão de afeto através
Mentais, 4ª edição - DSM-IV, para possível do alimento iniciada na amamentação e
inclusão nos transtornos alimentares, sen- perpetuada com o uso de outros alimen-
do que até o momento, está inserida nos tos, pode ter influenciado ou predisposto
transtornos alimentares sem outra especi- ao surgimento da compulsão alimentar e
ficação. É caracterizada pela presença pe- da obesidade. As perdas são outro aspecto
riódica de compulsão alimentar com sub- que chamou a atenção na história da famí-
sequente angústia, devido à ausência de lia de Eva. Elas permeiam o ciclo de vida
comportamentos regulares voltados para familiar desde a sua família de origem: o
eliminação do excesso alimentar Apesar de pai de Eva abandonou a família assim que
diversos estudos investigarem o ambiente ela nasceu. As perdas sempre provocam
familiar de pessoas com transtornos ali- uma desestabilização do sistema familiar,
mentares, existe uma escassez de estudos e a experiência de superá-la fortalece a
que aliem funcionamento familiar, obesi- capacidade resiliente da família para en-
dade e TCAP. Por isso, o objetivo deste tra- frentamento de adversidades futuras.
balho foi investigar a dinâmica familiar de Entretanto, quando este ajuste ocorre em
um adulto com obesidade grave e TCAP, a apenas parte do sistema familiar, cria-se
partir do arcabouço teórico da Abordagem um desequilíbrio entre os membros, onde
Sistêmica da Família. A pesquisa foi deline- uns tornam-se mais resilientes que outros
ada na forma de um estudo de caso rea- e estas diferenças podem afastá-los, justa-
lizado a partir dos dados levantados em mente nos momentos de reorganização de
duas visitas domiciliares para construção papéis e de vínculos na família. A vivência
do genograma familiar, ecomapa, colagem desta crise pode paralisar a família no seu
da família e realização de duas tarefas: processo natural de desenvolvimento e
tarefa nº 2 de Féres-Carneiro e tarefa nº favorecer o surgimento de sintomas. No
4 de Watzlawick. O estudo demonstra a caso da Família Dias, a saída do pai de Eva

304
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foi a primeira crise enfrentada por ela. A familiar, entendida aqui, como a capaci-
família, na tentativa de adaptar-se a essa dade do grupo familiar de suportar crises
nova realidade, promoveu Eva à condição e adversidades acionando o potencial de
de filha parental. Ela, além de cuidar da reparação e superação. Dessa forma, a
mãe alcoolista, também cuidava dos seus estrutura familiar desligada pode ter difi-
irmãos, apesar de ser a filha mais nova. cultado o manejo da crise iniciada com a
Essa troca de papéis quando temporária morte do irmão e agravada pela doença
constitui a base de identificação da crian- materna, e gerado uma sobrecarga na fa-
ça com os pais e esse arranjo natural não mília nuclear, culminando no surgimento
acarreta, necessariamente, prejuízos para de um novo sintoma, o TCAP. Outras ca-
o funcionamento familiar. Mas se a paren- racterísticas identificadas similares quanto
talização tornar-se um modo habitual e ao funcionamento de sistemas com obe-
prevalente de relação, como no caso de sidade descritos na literatura foram: fron-
Eva, o filho parental é excluído do subsis- teiras internas difusas e externas rígidas;
tema fraterno e inserido no subsistema ênfase à lealdade familiar; forte ligação
parental, assumindo prematuramente entre alimentação, afetividade e pertenci-
uma considerável responsabilidade emo- mento e comunicação marcada por pouca
cional, que o obriga a desenvolver um expressão de sentimentos. Sobre o funcio-
falso-self de autonomia, independência e namento familiar de pessoas com TCAP,
autossuficiência. Esse filho fica triangula- também foi observado características rela-
do e fusionado com figuras parentais in- tadas na literatura, como vulnerabilidade
diferenciadas, transformando esse papel à obesidade e baixa coesão na família de
num aspecto de sua própria identidade. origem. Por outro lado, a pesquisa identi-
Provavelmente, a parentalização de Eva ficou aspectos da dinâmica que não foram
tenha dificultado o seu relacionamento encontrados nos estudos revisados e que
com seus irmãos, referidos por ela como podem estar relacionados com o desen-
“inimigos”, visto que sua permanência no volvimento de obesidade e TCAP: a pa-
papel parental a impediu de desenvolver rentalização do paciente com o sintoma e
uma relação de igualdade no subsistema uma comunicação familiar paradoxal. Com
fraterno. Já na fase adulta, quando Eva já base nesses resultados salientamos que a
era casada e suas filhas eram pequenas, obesidade não se limita ao indivíduo, ela
morre seu irmão mais próximo e em se- está intimamente ligada ao sistema fa-
guida sua mãe adoece gravemente. Nesse miliar e, portanto, precisa ser tratada de
momento de luto e de dificuldades finan- forma sistêmica. Se conseguirmos mudar
ceiras, Eva começa a desenvolver os sinto- o nosso olhar, do indivíduo para o con-
mas de compulsão alimentar. Nos seus re- texto, e incluir a família no tratamento da
latos refere não ter tido apoio dos irmãos obesidade e do TCAP, não como fonte de
para cuidar da mãe, o que demonstra o suporte, mas como agente primordial de
ambiente desligado de sua família de ori- mudança, possivelmente teremos melho-
gem. O desenvolvimento do TCAP parece res resultados ao longo prazo.
estar intimamente ligado a um sistema
familiar desligado. De fato, um baixo nível Palavras-chave: obesidade/TCAP; família,
de coesão familiar enfraquece a resiliência dinâmica familiar.

305
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

MR LT01 - Mesa Redonda cionamento da pessoa, e as implicações


do conhecimento já disponível para ações
Convidada voltadas para a atenção ao idoso, propor-
cionando-lhes mais qualidade de vida.
MR LT01-1013 – IMPLICAÇÕES DO ENVE-
LHECIMENTO PARA A PERCEPÇÃO VISU- O ENVELHECIMENTO DO SISTEMA
AL E AUDITIVA AUDITIVO E A PERCEPÇÃO AUDITIVA EM
Luciana Carelli Henriques de Andrade - InPA IDOSOS: A COMPREENSÃO DA FALA EM
luliandrade@gmail.com DESTAQUE
Maria Ângela Guimarães Feitosa - UnB Luciana Carelli Henriques de Andrade - InPA
afeitosa@unb.br luliandrade@gmail.com
Roberta Ladislau - UnB
robertaladislau@gmail.com O envelhecimento constitui processo
degenerativo progressivo, marcado por
O aumento da expectativa de vida da alterações estruturais e fisiológicas nos
população tem despertado crescente in- sistemas cardiovascular, respiratório,
teresse de pesquisadores em diferentes músculo-esquelético, nervoso e senso-
áreas para estudar o envelhecimento, rial os quais desencadeiam complicações
pelos seus aspectos econômicos, sociais, importantes para os processos sensoriais
biológicos e psicológicos. Na presente e cognitivos (Feitosa, 2001). A perda da
mesa redonda dá-se atenção aos aspec- audição começa em torno dos 20 anos
tos biológicos caracterizados por um pro- de idade, entretanto, nesta fase, esta per-
cesso degenerativo progressivo, marcado da não é notada e nem facilmente men-
por alterações estruturais e funcionais e surável. Ela começa a ser percebida em
aos aspectos psicológicos relacionados a torno dos 50 anos. Em geral, os homens
decréscimo no funcionamento sensorial, apresentam uma perda auditiva notável
perceptual e cognitivo. São apresentadas mais cedo que as mulheres (Yost, 2007).
e problematizadas alterações na percep- Homens a partir dos 69 anos têm limia-
ção que acompanham o processo de enve- res auditivos mais altos do que mulheres
lhecimento, abordando tanto alterações na faixa de 4000Hz. Observa-se a partir
usuais não necessariamente vinculadas a dos 50 anos o aumento progressivo nos
doenças, como as alterações na percep- limiares auditivos detectados por meio
ção de fala e no processamento temporal da audiometria tonal (Syka, 2002). Segun-
auditivo, quanto às alterações associadas do Baraldi, Almeida e Borges (2007) é na
a doenças crônico-degenerativas, como faixa etária de 80 anos que a dificuldade
as alterações na percepção da emoção para ouvir sons em alta frequência está
em idosos com doença de Alzheimer. São mais acentuada, e depois dos 90 o nível
examinadas as implicações destas altera- de perda se estabiliza. A perda auditiva bi-
ções para outros aspectos da percepção lateral e simétrica que ocorre progressiva-
e para a vida social do idoso, as relações mente em função do avançar da idade é
dessas alterações de percepção com as chamada de presbiacusia. A presbiacusia
dimensões biológica e cognitiva do fun- gera dificuldade de localização espacial,

306
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

processamento de informações sobre fre- na amplitude dos reflexos acústicos, b) a


quência, tempo, intensidade dos sons e diminuição dos potenciais de tronco en-
compreensão da fala. As diversas mudan- cefálico, c) a diminuição da inibição do
ças anatômicas que ocorrem no sistema sistema nervoso auditivo central (SNAC)
auditivo do idoso, tanto na parte perifé- e d) o prolongamento das latências das
rica quanto central interferem na eficácia respostas do tronco encefálico. Encon-
do processamento da compreensão da tram-se, também, evidências sobre irre-
fala. A presbiacusia é percebida como o gularidades no processamento da infor-
principal fator explicativo para a dificulda- mação no que tange a: a) alterações no
de de compreensão da fala desta popula- processamento e na resolução temporal,
ção (Humes, Watson, Christensen, Cokely, b) alterações no processamento espacial
Halling & Lee, 1994). A presbiacusia atin- (i.e. localização de sons), c) diminuição
ge cerca de 60% dos idosos acima de 65 progressiva e acentuada da sensibilidade
anos e inclui mudança gradual na sensibi- para frequências altas, d) declínio na re-
lidade auditiva para todas as frequências, solução de frequências, e) o aumento do
sendo as perdas para as altas freqüências limiar de audibilidade para tons puros e
as de maior magnitude (Bess, Hedley- f) lentificação na velocidade de proces-
-Williams & Lichtenstein, 2001). A perda samento. Como a intenção das autoras
da sensibilidade para altas frequências relaciona-se aos processos de percepção
ocorre porque as estereocílias das célu- da fala, serão argumentados de forma
las ciliares da base da cóclea, responsável seletiva os aspectos relacionados a esta
pela transdução do som, são estimuladas temática. Parte da diminuição progressiva
diante de todas as frequências sonoras, na compreensão de fala associada à idade
assim seu desgaste é maior e ocorre pri- avançada é devido a um declínio na capa-
meiro, se comparado com as estereocílias cidade do processamento funcional, a de-
das células do ápice, que demoram um terioração da memória episódica secun-
pouco mais para ficarem flácidas e pro- dária e a diminuição na velocidade dos
cessam apenas frequências baixas. Como processos mentais (Gordon-Salant, 2005;
as células da base da cóclea são especia- Marshall, 1981). Em resumo, observa-
listas em processar sons de alta frequên- -se que a ocorrência da presbiacusia em
cia, o prejuízo na compreensão dos sons idosos compromete várias habilidades re-
agudos ocorre primeiro (Syka, 2002; Yost, lacionadas com a audição. Compreender
2007). O envelhecimento do sistema au- e discutir sobre o processo de envelheci-
ditivo (SA) está correlacionado com várias mento sensorial e os seus efeitos é uma
alterações, as quais podem ser resumidas tarefa importante para os profissionais
em mudanças cognitivas, morfológicas e de saúde que lidam com idosos, pois isto
fisiológicas. Como mudanças morfológi- possibilita a busca de meios mais eficazes
cas constata-se, segundo Syka (2002): a) a e positivos para a comunicação e relacio-
desestruturação das células ciliadas inter- namento com os idosos.
nas e externas e b) as perdas das células
ganglionares espiraladas que formam as Palavras-chave: Envelhecimento, Envelheci-
fibras do nervo auditivo. Nas mudanças mento do sistema auditivo, Percepção de fala.
fisiológicas identifica-se: a) a diminuição

307
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ENVELHECIMENTO E PROCESSAMENTO do a localização de fontes e a percepção


TEMPORAL AUDITIVO de movimento. O processamento tempo-
Maria Ângela Guimarães Feitosa - UnB ral vem sendo estudado em dois aspectos
afeitosa@unb.br centrais e com metodologias comporta-
mentais psicofísicas próprias. De um lado
É de longa data conhecido que com o pro- aquelas situações em que é necessária a
cesso de envelhecimento, as pessoas vão integração de informação ao longo de um
gradualmente perdendo a sensibilidade período relativamente longo, como na
auditiva, com prejuízo em maior grau para detecção de sinais fracos; de outro lado
homens do que mulheres, e para sons de aquelas situações em que é necessário
frequência alta do que frequências baixas. um processamento rápido para evitar o
Acompanha este processo uma dificulda- efeito mascarador de outros sons antece-
de crescente de comunicação oral, com dentes ou subsequentes, ou seja uma boa
eventual prejuízo para a própria autono- acuidade ou resolução temporal (Eddins
mia pessoal, e estes dois tipos de prejuízo & Green, 1995; Helfer & Freyman, 2008).
são componentes centrais da presbiacu- Mais recentemente o aspecto temporal
sia . Uma série de estudos tem analisado da informação tem sido ampliado para o
aspectos específicos do processamento estudo da percepção de fluxos, objetos e
do som que também acompanham o en- cenas auditivas (por exemplo, Sakai, Chi-
velhecimento e há documentação impor- moto, Qin & Sato, 2009). Dentro da temá-
tante de prejuízo crescente em processa- tica de processamento temporal, e mais
mento temporal, em discriminação de fre- especificamente no estudo da resolução
quência e de intensidade, e em uma série temporal, encontramos vários estudos
de tarefas em que o ambiente acústico utilizando procedimentos em que a tare-
inclui ruído ou distorções, especialmente fa do participante é identificar a presen-
se estas tarefas são de reconhecimento ça de falhas, interrupções, em um sinal
de fala. Revisões abrangentes deste ce- contínuo e mostramos a partir de estu-
nário podem ser encontradas em Fozard dos realizados por diferentes grupos de
& Gordon-Salant (2001) e Fitzgibbons pesquisadores que a resolução temporal
& Gordon-Salant (2010). Muitas vezes, diminui com a idade (por exemplo, Snell,
um aspecto importante da informação 1997; Neves, 2005; Ross, Schneider, Sny-
auditiva é a sua organização no tempo, der & Alain, 2010). Procuramos argumen-
demandando que o ouvinte realize um tar que a diminuição da competência do
processamento temporal do som. Nesta processamento temporal não se relaciona
apresentação damos atenção diferencia- com a diminuição na sensibilidade a tons
da ao envelhecimento do processamen- puros, mas se relaciona a outras compe-
to temporal, uma habilidade considera- tências de importante valor adaptativo,
da importante para a percepção de sons como a percepção da fala, do espaço, e de
complexos e com características acústicas aspectos mais subjetivos como a análise
altamente dinâmicas ao longo de interva- de cenas. Por fim, comentamos sobre a
los de tempo razoavelmente curtos, como dificuldade em dissociar os componentes
as envolvidas no reconhecimento da fala e sensoriais e cognitivos do processamento
na percepção auditiva do espaço, incluin- auditivo.

308
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: Processamento temporal, alterações emocionais também. No en-


Envelhecimento auditivo, Desenvolvimento velhecimento normal, o idoso passa por
sensorial. uma série de transformações emocionais
e psicológicas. Sua autoestima e a sua
aceitação de si mesmo podem ficar mais
PERCEPÇÃO EMOCIONAL NO ENVELHE- vulneráveis à medida que sofre alterações
CIMENTO em sua autonomia, em sua liberdade, no
Roberta Ladislau - UnB seu convívio social e nos vínculos afetivos
robertaladislau@gmail.com no grupo. (Gáspari & Schwartz, 2005).
Como consequência, pode-se ter um iso-
O aumento da expectativa de vida da po- lamento social e um cenário facilitador de
pulação despertou o interesse de muitos depressões. Porto, Bertolucci, Ribeiro e
profissionais para estudar o envelheci- Bueno (2008) explicam que os idosos pos-
mento. Falcão e Dias (2006) advertem suem uma maior habilidade na regulação
que em 2025, o Brasil será o sexto país das suas emoções do que os jovens. Con-
com maior população de idosos no mun- forme os autores, os idosos focariam em
do. Esse processo de envelhecimento uma resposta antes de gerar a emoção.
tem trazido diversas consequências. Uma Eles utilizam a teoria da seletividade so-
delas é o aumento de doenças crônico- cioemocional, segundo a qual, os idosos
-degenerativas, como as demências, que valorizariam mais objetivos com significa-
vêm se tornando muito comuns na po- do emocional, investindo mais cognitiva e
pulação mundial, chegando a duplicar a comportamentalmente nessas situações.
cada cinco anos, após os 60 anos (Cara- Assim, a emoção direcionaria processos
melli & Barbosa, 2002). O DSM-IV consi- cognitivos, e, ao direcioná-los, a memó-
dera demência toda síndrome que apre- ria formada poderia sofrer influência em
senta declínio da memória, de alguma seu conteúdo. No caso da DA, Abrisqueta,
outra função superior (e.g. linguagem, Ueta, Oliveira, Bertolucci & Bueno (1998)
gnosias, praxias ou funções executivas) afirmam que essa população apresentam
e que interfira nas atividades de vida di- capacidade de atribuir conteúdo afeti-
ária. Caramelli e Barbosa (2002) e Farah e vo aos estímulos. Contudo, a associação
Feinberg (2005) afirmam que a Doença de entre a emoção e a memória nesses pa-
Alzheimer (DA) é a causa mais comum de cientes não é consistente, pois a emoção
demência, atingindo 50% dos idosos aci- não promove uma melhora na evocação
ma de 65 anos. A DA evolui, inicialmente, de informações. Para os autores, é possí-
com o prejuízo na orientação temporo- vel que o conteúdo emocional seja reti-
-espacial e nas memórias de curto-prazo do pelos idosos. Contudo, essa retenção
e episódica. A seguir, ocorrem déficits na não deve ser suficiente para a evocação
linguagem, nos distúrbios de planejamen- do conteúdo cognitivo dos estímulos. Os
to, nas habilidades visuoespaciais e no autores sugerem ainda que é possível que
processamento emocional. Nos pacientes os pacientes com DA percam, em estágios
mais idosos, é comum a ocorrência de iniciais, a capacidade de evocar o conte-
sintomas psicóticos (Caramelli & Barbosa, údo emocional dos estímulos, provavel-
2002). É comum observar, nesses idosos, mente devido ao comprometimento da

309
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

amígdala. Devido a essa dificuldade no indivíduo, o qual lhe possibilitará lidar, em


processamento das emoções, o presen- diferentes graus de eficácia, com as per-
te trabalho buscou estudar o reconhe- das inevitáveis do envelhecimento” (Néri,
cimento de expressões emocionais da 2000, p. 12-13).
face em idosos com DA por considerar a
importância desse reconhecimento para Palavras-chave: Envelhecimento visual, Reco-
a regulação do comportamento e para a nhecimento de expressões faciais, Doença de
interação social do idoso. Como resulta- Alzheimer.
dos, observou-se que os idosos com DA Contato: Maria Ângela Guimarães Feitosa,
em estágio moderado obtiveram índice UnB, afeitosa@unb.br
de reconhecimento próximo de 80% para
a face de alegria; de 36% para a de triste-
za e as restantes ficaram abaixo de 20% MR LT04 - Mesa Redonda
de reconhecimento. Esses dados sugerem
que o reconhecimento da face de alegria Convidada
é a única que está preservada nesse gru-
po. Como sugerido no estudo de Luzzi,
Piccirilli e Provinciali (2007), o déficit no MR LT04-1235 - TECENDO INFÂNCIAS:
reconhecimento de expressões faciais CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA E DA
emocionais em idosos com DA está rela- EDUCAÇÃO PARA A FORMAÇÃO DE
cionado ao hemisfério direito. Mais espe- PROFESSORES
cificamente, o hemisfério direito está vol- Paula Cristina Medeiros Rezende - UFU,
tado para o processamento de emoções lalamedeiros@netsite.com.br
negativas (Perry et al., 2001). A preserva- Paula Amaral Faria - ESEBA/UFU,
ção do reconhecimento da face de alegria paula_afaria@yahoo.com.br
sugere que ainda há uma memória resi- Pâmela Faria Oliveira - ESEBA/UFU,
dual voltada para essa expressão emocio- pamela8oliviera@hotmail.com
nal facial. Considerando que a emoção é Denise Bortoletto - ITV
eliciada por representação mental e me- debortoletto@yahoo.com.br
mória (Scherer & Ekman, 1984), parece
que os déficits encontrados na percepção Esta mesa pretende contribuir com o de-
de faces emocionais estão mais relaciona- bate sobre a constituição e formação de
dos à progressão da DA, que afeta tanto professores, a partir do encontro entre a
as habilidades visuoespaciais quanto o Pedagogia e a Psicologia, abordando ques-
processamento da emoção. O aspecto tões atuais relativas à Educação Infantil.
emocional, portanto, deve ser bem es- Atualmente, a infância tem-se apresenta-
tudado a fim de favorecer os programas do como tema central na constituição de
de estimulação para os idosos, proporcio- um novo paradigma que convida a com-
nando-lhes mais qualidade de vida. Nes- preender a natureza histórica-cultural da
se trabalho, entede-se qualidade de vida criança, tentando romper com a ideia de
como envelhecer de forma satisfatória e infância enquanto in-fans, ou seja, crian-
isso “depende do delicado equilíbrio en- ça sem fala, sem voz. Concomitante a este
tre as limitações e as potencialidades do movimento de legitimação de uma infân-

310
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cia “rica” e ativa, constatamos que o edu- educação, culminando em uma atuação
cador infantil, diretamente responsável coerente com a perspectiva que compre-
por este universo, se encontra sem espaço ende a criança como produtora de cultura.
para uma interlocução teórica-prática sis- A quarta fala será desenvolvida por uma
tematizada que o ajude a ampliar suas pos- pedagoga que compõe uma equipe de
sibilidades de intervenção neste contexto. apoio pedagógico da Educação Infantil de
Deste modo, a formação em serviço dos uma instituição privada, onde refletirá e
professores da educação infantil coloca-se explicitará as intervenções possíveis neste
em pauta na ordem da urgência, intiman- campo, delineando uma formação de pro-
do os profissionais que atuam na área da fessores que esteja voltada e comprometi-
educação a problematizarem e comparti- da com os processos de desenvolvimento
lharem suas práticas e fundamentações e aprendizagem das crianças.
teóricas. Assim, pretendemos articular
esta temática possibilitando legitimar as Palavras-chave: formação de professor,
diferentes vozes que compõem o cenário educação infantil, infância.
escolar, a saber: professores da educação PARANGOLÉS: Formação em Serviço de
infantil, pedagogo e psicólogo escolar. A Professores da Educação Infantil.
primeira fala abordará a formação em Paula Cristina Medeiros Rezende, UFU,
serviço do educador infantil, destacando lalamedeiros@netsite.com.br
a relevância da arte como ferramenta útil
no processo de ampliação dos sentidos O presente trabalho, desenvolvido a partir
sobre a atuação deste profissional no co- da experiência de uma psicóloga escolar
tidiano da educação infantil. Por meio da com um grupo de formação de educado-
metáfora do Parangolé, proposto pelo ar- res da educação infantil, inspira-se nos Pa-
tista Hélio Oiticica, pretende-se articular rangolés do artista plástico Hélio Oiticica
os recursos e as potências que o educa- quando convida o espectador a assumir
dor da infância pode desenvolver em sua um posicionamento ativo na constituição
prática diária. A segunda apresentação, da atividade criadora, abandonando o lu-
proposta por uma professora da educação gar de mero espectador. Parangolés são
infantil de uma Escola de Educação Básica, capas, estandartes, bandeiras para serem
versará sobre as perspectivas teóricas do vestidas ou carregadas pelo participante
campo da Educação e da Psicologia que de um happening. As capas são constituí-
sustentam as práticas educativas, dando das de tecidos coloridos estampados com
destaque às especificidades deste profis- palavras e imagens que aparecem com o
sional; a formação inicial e em serviço e movimento da pessoa que o carrega. Ao
as possibilidades de diálogos com a pro- vestir o parangolé o participante se consti-
posta educativa de Reggio Emilia. Em se- tui obra de arte e supera a ideia de supor-
guida, por meio das experiências de uma te para a capa. De acordo com Oiticica há
educadora infantil, também de uma Esco- uma “incorporação do corpo na obra e da
la de Educação Básica, pretende-se abor- obra no corpo”. De acordo com Salomão
dar a importância do desenvolvimento de (2003) a “relação artista-propositor com o
habilidades e competências necessárias participante que veste o parangolé não é
para instrumentalizar o profissional da a relação frontal do espectador e do espe-

311
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

táculo, mas como que uma cumplicidade, fio condutor neste trabalho está de acor-
uma relação oblíqua e clandestina, de pei- do com a perspectiva sócio-histórica, que
xes do mesmo cardume”. A intenção do ar- considera o homem como um ser ativo,
tista é provocar o público, convidando-o a social e histórico; e a sociedade, como pro-
abandonar o lugar de espectador em atitu- dução histórica dos homens (Bock; Gon-
de meramente contemplativa e a ocupar o çalvez, Furtado, 2009). Assim, esse sujeito
lugar de participante ativo na constituição se constitui e constrói o mundo dialética
da atividade criadora, experimentado tam- e dialogicamente, não podendo ser com-
bém uma inundação sensorial vibrante no preendido independentemente de suas
corpo inteiro pela cor, tato e movimento relações e vínculos. Deste modo, adulto
rápido e improvisado. Assim, o conceito de e criança se constituem mutuamente du-
exposição de obra de arte para ser aprecia- rante a história e dentro de um contexto
da pelo público passa a ser problematizada, sócio-cultural. Juntos constroem sentidos
inserindo na questão a idéia de invenção e significados do mundo infantil e adulto,
criativa do espectador, agora participante. se opondo, contrapondo e complemen-
O objetivo da participação é oferecer ao tando; demarcando um campo de tensão
homem a possibilidade de experimentar, e confronto presente no cotidiano desses
de se descobrir na criação. A obra, como sujeitos (Prado, 2005). A criança se cons-
objeto de arte em si, não diz nada. Fica à titui e se constrói em relação com adultos,
espera do seu interlocutor para comungar jovens, idosos, não estando para vir a ser
no movimento a experiência artista. De um adulto. É um autor e ator social, um in-
acordo com Favaretto (1992) o interesse terlocutor que se relaciona com o mundo
de Oiticica, ao criar o Parangolé, não foi conversando, brincando, questionando e,
outro senão o de levar o indivíduo ao di- na medida em que realiza esse intercâm-
latamento de suas capacidades artísticas, bio, possibilita a construção de diferentes
para a descoberta de seu centro interior versões de sentido. Para Corsaro (1997),
criativo, de sua espontaneidade expressiva citado por Müller (2006), as crianças são
adormecida, condicionada ao cotidiano. responsáveis pelas suas infâncias, uma vez
A transposição das intenções de Oiticica que contribuem ativamente para a mu-
para a arena da Educação Infantil nos per- dança social e para a construção da cul-
mite refletir sobre como os educadores da tura a partir da interação com seus pares
infância tem se posicionado em relação a e com os adultos. Elas são agentes ativos
práticas educativas que legitimem os di- que constroem suas culturas e colaboram
reitos fundamentais das crianças e colabo- para a produção do mundo adulto, afetam
rem na construção de uma sociedade mais e são afetadas pela sociedade. Dahlberg,
democrática. Quais os espaços que este Moss e Pence (2003) aproximam-se desse
educador tem para dar continuidade ao pensamento à medida que apontam para
seu processo de formação que possibilite o reconhecimento de algumas caracterís-
exercer com autoria uma prática marcada ticas deste novo paradigma da infância, as
por experiências criativas, com sentidos quais são de suma importância para este
voltados para a formação da criança autô- estudo, tais como: a infância como uma
noma, também autora de suas experiên- construção social e sempre contextualiza-
cias? A visão de infância que temos como da; as crianças enquanto atores sociais que

312
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

exercem atividade e função; o direito de para a formação inicial de professores. Em


terem seus relacionamentos sociais e cul- torno da formação em serviço dos pro-
tura estudados, e de contribuírem para os fessores que atuam na primeira infância
recursos e produções sociais; a legitimação alguns tópicos merecem ser destacados
de que as crianças têm uma voz própria e como fundamentais para sustentar uma
devem ser ouvidas de modo a serem consi- prática diferenciada: as especificidades do
deradas com seriedade; a necessidade de professor de educação infantil; formação
se atentar para a maneira como o poder inicial e em serviço; desafios atuais diante
do adulto é mantido e usado, assim como da formação desse setor e possibilidades
a elasticidade e a resistência das crianças a de diálogos com a proposta educativa de
esse poder. Desta forma, os Parangolés de Reggio Emilia. Primeiramente acredita-se
Hélio Oiticica, nos convidam a trabalhar no importante situar o momento atual em
sentido da construção de uma educação que o segmento da Educação Infantil tem
composta por sujeitos criativos, ativos, co- atravessado no cenário da Educação bra-
-responsáveis de práticas educacionais vol- sileira, dado esse relacionado com a for-
tadas para a democracia. A formação em mação dos nossos educadores. Tomam-se
serviço de Educadores da Infância susten- como base as discussões travadas no XV
tada pela teoria sócio-histórica e tramada ENDIPE (2010). Neste foi discutido que o
nas interações cotidianas entre educado- setor da educação infantil está vivendo
res e crianças, pode anunciar-se como uma um intenso processo de revisão de con-
forma alternativa para alcançarmos uma cepções sobre a educação de crianças em
educação infantil de qualidade. espaços coletivos, e de seleção e fortaleci-
mento de práticas pedagógicas mediado-
ras de aprendizagem e do desenvolvimen-
FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA to das crianças. Discutiu-se também sobre
EDUCAÇÃO INFANTIL: DIÁLOGOS a não antecipação de processos para o
TEÓRICOS Ensino Fundamental. Embora o momento
Paula Amaral Faria - UFU, atual apresente um quadro de maior re-
paula_afaria@yahoo.com.br gulamentação, as análises realizadas indi-
cam permanências, redefinições e tensões
O trabalho tem como intenção articular as que ainda demandam mobilizações dos
principais perspectivas teóricas disponí- diferentes setores envolvidos, e das políti-
veis socialmente no campo da Educação e cas públicas voltadas para as questões da
da Psicologia, com o processo de constitui- infância. Um dessas tensões apresentadas
ção e formação de uma educadora infantil durante o referido evento, especificamen-
de uma escola de Educação Básica da Uni- te por Cruz (2010) refere-se à formação de
versidade Federal de Uberlândia. Esta ins- professores da Educação Infantil. Um dado
tituição, por ser uma escola de aplicação, discutido diz respeito à necessidade do
constitui-se também em um espaço que professor da primeira infância constituir
recebe estagiários do curso de pedagogia uma profissionalidade específica relativa
e psicologia para desenvolverem projetos a aspectos diferenciadores do papel de
de pesquisa juntamente com a comunida- professor de crianças pequenas, de zero a
de, o que possibilita ampliar a discussão cinco anos. A formação do professor de-

313
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

veria contribuir para uma ação docente professor acumulou na sua vivência pes-
que inclua, dentre outros aspectos: avaliar soal e profissional – o que é importante
cuidado e educação; planejar experiências para que ele também reconheça e valorize
diversificadas, que atendam aos vários as- o conhecimento da criança. Para desem-
pectos do desenvolvimento infantil; esta- penhar bem seu trabalho cotidiano, esse
belecer e manter uma relação cooperativa profissional precisa aprender a refletir
e amistosa com as famílias; aprender a sobre a sua prática, construindo um pro-
ser parceiro do desenvolvimento infantil, jeto educativo que leve em consideração
estimulando-o, mas não o apressando; a utilização de recursos que possam os
abordar as diferentes áreas de conheci- auxiliar na construção de uma educação
mento de maneira integrada; vincular a para a infância de maior qualidade como:
aquisição de novos conhecimentos e ha- a documentação, a avaliação, a pesquisa e
bilidades pelas crianças aos seus reais de- a observação, desde que não seja suprimi-
sejos e necessidades, promovendo uma da a importância de sensibilizar, de brin-
verdadeira aprendizagem significativa; dar car, de ler, dialogar e escutar a infância.
atenção privilegiada aos aspectos emo- Identifica-se em Dahlberg, Moss e Pence
cionais, especialmente durante o período (2003) que os desafios atuais diante da
de inserção a criança a creche ou a pré- formação do educador para a primeira in-
-escola; dar oportunidade e estímulo para fância referem-se em aceitar as limitações
a criança expressar os seus sentimentos, temporais e espaciais, de que não há con-
desenvolver a sua autonomia, ajudando- certos rápidos e nem projetos universais.
-a a desenvolver a sua identidade cultu- Mas há possibilidades de conhecimento
ral, racial e religiosa. Ao que se refere à e ações locais: o indivíduo interessado
formação inicial do educador, de crianças pode ler e refletir sobre temáticas relati-
pequenas, a autora defende que os cur- vas a sua formação e sobre a infância, bem
sos que cuidam dessa etapa da formação como outras que por ventura surgirem
deveriam repensar, sistematizar e enri- necessidades; o grupo, a equipe de uma
quecer dois conjuntos de informações, instituição, podem discutir e explorar di-
intimamente relacionados: as referentes ferentes recursos e possibilidades para o
ao desenvolvimento e a aprendizagem aperfeiçoamento da sua formação, como
infantil, focalizando a criança concreta, exemplo, a documentação pedagógica.
localizada histórica e socioculturalmente. Podendo assim aprofundar o seu entendi-
Aspectos fundamentais para que o profes- mento do trabalho pedagógico e levando
sor possa desenvolver com qualidade seu a refletir sobre as concepções que cons-
trabalho, contextualizá-lo e posicionar-se truímos sobre a criança e a infância, e nes-
diante dos problemas que a área enfren- ta discussões podemos buscar inspirações
ta, dentre eles: a constituição histórica da em trabalhos como o de Reggio Emilia, e
infância; as políticas públicas da Educação assim fortalecer uma formação docente
Infantil; a identidade profissional docente. de qualidade. Edwards, Gandini e Forman
Sobre a formação em serviço do professor (1999), a partir de suas experiências nas
as leituras indicam que a formação preci- escolas de Reggio, recomendam que os
sa ter como referência o saber docente, professores devem ter o hábito de ques-
o reconhecimento e valorização do que o tionar suas certezas, devem possuir uma

314
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sensibilidade imensa, devem ser conscien- compromisso que a sociedade deve assu-
tes e estar disponíveis, devem assumir um mir em relação à infância. Diante desde
estilo crítico em relação às pesquisas e quadro devemos encontrar novas formas
conhecimento continuamente atualiza- de se trabalhar com crianças, incluindo
do sobre as crianças, devem manter uma entre estas a valorização das múltiplas
avaliação enriquecida do papel dos pais, e linguagens infantis buscando o desenvol-
devem possuir habilidades para falar, ou- vimento integral das mesmas. Também
vir e aprender com. Contudo é fato que a exige um bom entendimento por parte
educação para a primeira infância é um di- do professor sobre este desenvolvimento
reito da criança. A criança não tem direito e aprendizagem das crianças, pois ofere-
apenas ao acesso a creche e/ou a pré-es- cer uma educação de qualidade demanda
cola, mas a uma experiência educativa de conhecimentos profissionais, estratégias
qualidade, que realmente seja prazerosa e cuidado únicos apropriados a infância.
e eficaz na promoção das suas múltiplas E para isso exige-se também uma boa for-
aprendizagens e desenvolvimento. Como mação do professor que atua na educação
o professor é a figura mais importante infantil, pois a qualidade do trabalho com
para a qualidade dessa experiência, é im- a criança é intrinsecamente vinculada à
prescindível que a sua formação inicial e formação e qualificação do profissional da
em serviço seja foco de atenção por parte área. Pensando em dialogar sobre estas
das políticas públicas e dos cursos de for- questões pretendo, a partir da minha ex-
mação desses profissionais. periência como educadora infantil da Es-
cola de Educação Básica da Universidade
Federal de Uberlândia, contribuir com a
DIÁLOGOS SOBRE A INFÂNCIA: reflexão sobre a formação do professor da
EXPERIÊNCIAS DE UMA EDUCADORA educação infantil, destacando a importân-
INFANTIL cia do desenvolvimento de habilidades e
Pâmela Faria Oliveira - UFU, competências necessárias para instrumen-
pamela8oliviera@hotmail.com talizar este profissional da educação para
um trabalho mais rico, prazeroso e efetivo.
Ao longo da história da infância percebe- A partir do diálogo rico entre a pedagogia e
mos uma história da marginalização que a psicologia, temos refletido e estruturado
abrange os mais diversos âmbitos, seja novas formas de compreender a infância
social, cultural ou econômico. As crianças e, por conseguinte, temos buscado expe-
precisavam viver sempre em um mundo rimentar em nosso cotidiano escolar uma
que não era o seu, que não estava feito a atuação coerente com esta perspectiva
sua medida, sendo vista como um adulto que se apresenta. Dahlberg, Moss e Pence
em miniatura. Contudo, atualmente, per- (2003) nos colocam que há muitas crianças
cebemos uma ampliação no modo como e muitas infâncias, a primeira infância é a
temos visto e interagido com a infância. base do progresso bem sucedido na vida
Inicia-se uma configuração de um mapa posterior. É o início de uma jornada de re-
de direitos da infância cada vez mais pre- alização da incompletude da infância para
ciso e comprometido com as novas teorias a condição humana plena da idade adulta.
e políticas educacionais, reafirmando o A infância deve ser entendida como uma

315
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

construção social, elaborada para e pelas prático que nos mostra que a possibilidade
crianças, em um conjunto de relações so- de realizar um desenvolvimento e apren-
ciais, e a principal fase onde se constrói a dizagem significativos, valorizando uma
identidade infantil, portanto merece aten- prática pedagógica em sua dimensão li-
ção especial por parte dos educadores bertadora, criativa, participativa, inclusiva
que trabalham com a educação infantil. e democrática, por um processo de inte-
Faria e Mello (2005) nos mostra que hoje ração com o outro, mediado pela cultura,
temos um acervo bem denso de pesqui- uma prática pedagógica que contemple o
sas revelando infâncias diferenciadas, lúdico, a cultura, a formação humana e a
crianças curiosas e inventivas, capazes de construção de conhecimentos pela crian-
estabelecer múltiplas relações e levantar ça, são as escolas de Educação Infantil de
hipóteses de várias naturezas, derruban- Reggio Emillia. Edwards, Gandini e Forman
do por terra, portanto as concepções da (1999) referem que o respeito a coopera-
criança incompleta, incapaz, egoísta por ção, a solidariedade, a autonomia, a inclu-
natureza, assim desafiando o adulto pro- são, o direito de brincar a manifestação e
fissional da educação a trabalhar de acor- valorização da pluralidade cultural, social e
do com as múltiplas linguagens infantis. ética, ou seja a interação da criança com o
Teóricos como Vygotsky, Piaget e Wallon seu meio promove o desenvolvimento in-
também contribuem para os nossos estu- tegral da criança. Nas escolas de Reggio as
dos, trazendo uma melhor compreensão crianças são encorajadas a tomarem suas
do processo de constituição dos sujeitos, próprias decisões e a fazerem suas pró-
de seu desenvolvimento e de sua cons- prias escolhas. Os educadores exploram
trução de conhecimento. O estudo destes as múltiplas linguagens da infância, incen-
autores tem dado sustentação teórica ao tivam os relacionamentos e entendem as
trabalho do educador infantil e auxiliado crianças como promotoras do seu próprio
na compreensão do desenvolvimento in- desenvolvimento, abrindo as portas para
fantil. As contribuições destes teóricos nos as cem linguagens infantis. Charlot (2005)
fazem compreender que a aquisição de coloca que há uma grande diferença entre
conhecimento é um processo construído ensinar e formar, a idéia de ensino impli-
pelo indivíduo durante sua vida. Assim nós ca um saber a transmitir, e a idéia de for-
educadores devemos desenvolver práticas mação implica em dotar o indivíduo de
pedagógicas alinhavadas aos saberes in- competência. Assim formar o professor é
fantis, pois isto leva a situações privilegia- dotá-lo de competência que lhes permi-
das de aprendizagem infantil onde o de- tirão gerir tensões e construir mediações
senvolvimento pode alcançar níveis mais entre a teoria e a prática. Assim o autor
complexos, exatamente pela possibilidade defende uma formação de professores,
de interação entre os pares em uma situa- onde é necessário trabalhar saberes e prá-
ção imaginária e pela negociação de regras ticas em diversos níveis, e articular estas
de convivência e de conteúdos temáticos. com as lógicas de desenvolvimento da
Uma criança nunca pode perder a curiosi- criança na educação infantil. O professor
dade a respeito do mundo que a envolve, deve formar uma identidade profissional
e esse certamente há de ser um grande estruturada na sua relação com o mundo
objetivo da Educação Infantil. Um exemplo e com teorias. Edwards, Gandini e Forman

316
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(1999) nos mostram que o sucesso da es- ricamente acumulados e culturalmente


cola está intimamente relacionado com comunicados. Nesta instituição, as ações
a boa formação de seus professores. De da autora são realizadas com as crianças
acordo com o autor os professores de Re- e suas famílias e com os educadores. Estes
ggio realizam sua formação em serviço e últimos constituem foco principal desta
desenvolve seus conhecimentos enquanto apresentação. O cotidiano escolar revela
trabalham com as crianças. Estes fazem uma multiplicidade de saberes e práticas,
questionamentos constantes sobre o seu muitas vezes não vivenciados pelos profes-
ensino, e trabalham em conjunto com sores em seu processo de formação inicial.
toda a comunidade escolar, deixando de Por isso, acreditamos ser necessário inves-
lado o modo isolado e silencioso de se tra- tir esforços de modo a viabilizar interven-
balhar. Mostrando-nos a importância do ções que valorizem a formação dos profes-
professor reflexivo. sores em serviço, na tentativa de possibi-
litar a eles novos olhares sobre a infância
e sobre as crianças e, ainda, sobre as suas
NOVOS OLHARES SOBRE A EDUCAÇÃO relações estabelecidas com elas. Além dis-
INFANTIL: A FORMAÇÃO EM SERVIÇO DE so, reflexões sobre as suas salas de aulas,
PROFESSORES COMO POSSIBILIDADES DE as suas práticas didático-metodológicas
DIÁLOGOS SOBRE A INFÂNCIA e sobre a nova realidade escolar tornam-
Denise Bortoletto - ITV -se indispensáveis. Conforme esclarece a
debortoletto@yahoo.com.br literatura educacional, investir em situa-
ções que sejam favorecedoras da apren-
O presente trabalho tem como objetivo dizagem significativa, valorizar o conhe-
apresentar o relato de experiência da auto- cimento prévio dos alunos, relacionar os
ra, junto à equipe de apoio pedagógico da conhecimentos escolares com a realidade
Educação Infantil de uma instituição priva- atual, constituem alguns dos desafios do
da de ensino de Uberlândia-MG. A litera- educador frente ao novo contexto econô-
tura esclarece que o trabalho do Pedagogo mico e cultural. As investigações atuais re-
nas equipes de apoio pedagógico precisa ferentes à formação de professores reve-
estar relacionado ao desenvolvimento de lam a necessidade de se instrumentalizar
projetos e de práticas educacionais que os futuros professores ou os professores
intentem criar condições favoráveis à au- em serviço para pensarem ativamente na
tonomia das crianças e dos educadores, de realidade escolar, bem como em sua pró-
modo a desenvolver suas competências e pria inserção nela. Como pode ser obser-
habilidades, que só serão efetivadas por vado nos estudos de Facci (2009), Sawaya
meio de condições de aprendizagem faci- (2002) e Souza (2002) é na formação em
litadoras (Porto, 2009; Bassedas, 1996). A serviço do professor que se encontra uma
aprendizagem é entendida aqui como de- possibilidade de que suas práticas peda-
corrente de uma construção, de um pro- gógicas sejam refletidas, repensadas e até
cesso permeado por questionamentos, mesmo reestruturadas. Estamos de acor-
hipóteses e reformulações, enfim, uma do com o pensamento de Sawaya (2002)
dinâmica ação pedagógica que envolva ao sugerir que uma das contribuições fun-
o construir e o reconstruir saberes histo- damentais da psicologia ao campo educa-

317
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cional está relacionada à formação de pro- MR LT04 - Mesa Redonda


fessores. Todavia, a autora alerta que este
processo deve estar sustentado em ações
Convidada
que levem o professor a rever criticamen-
te as relações que constituem o seu fazer
MR LT04-1337 - PRÁTICAS SOCIAIS E
educacional, e ao mesmo tempo, que ele
DESENVOLVIMENTO HUMANO EM
possa refletir sobre suas concepções, seus
CONTEXTOS EDUCACIONAIS
modos de atuação e sua relação interpes-
soal na instituição escolar. Como pode ser Luciano Santana Lopes - FAPRO,
visto em Machado (2002), se na escola professorluciano.lopes@gmail.com
não existirem estratégias coletivas para Alice Farias de Araújo Marques - SEE/EMB
pensar os acontecimentos do cotidiano, alicemarques@unb.br
se faltarem recursos para atender aos in- Denise de Oliveira Alves - Anhanguera
teresses diversificados das crianças, se não denisedeoliveiraalves@gmail.com
se realizam discussões que auxiliem o pro- Luciana Câmara Fernandes Bareicha -
cesso ensino-aprendizagem, as dificulda- Anhanguera
des tornam-se fatalidades. Assim, torna-se luciana.bareicha@gmail.com
urgente repensar junto aos professores as
suas concepções de infância, criança e de As temáticas ora desenvolvidas giram em
Educação Infantil e, é no espaço de forma- torno de práticas sociais inseridas nos di-
ção em serviço, que esses saberes pode- ferentes contextos cotidianos, sobretudo
rão ser construídos e reelaborados. Para nos ambientes educacional e esportivo.
isso, busca-se um novo significado ideoló- São ressaltados os princípios e intenções
gico e social da infância a partir das ideias grupais que encorpam as práticas so-
de Piaget e Vygotsky. Tomando por base ciais, em especial as pedagógicas, bem
esses referenciais teóricos, a criança pas- como suas interações que favorecem o
sa a ser vista como agente construtor do desenvolvimento humano. Os trabalhos
conhecimento e sujeito ativo no proces- apresentam proposições conceituais re-
so educacional. Por conseguinte, as con- levantes para a compreensão do desen-
tribuições desses autores sinalizam uma volvimento humano em uma dimensão
nova etapa na história da educação das sócio-histórica, atribuindo centralidade
crianças. Frente ao até aqui exposto pode- aos “processos” e às características da
-se considerar que a formação em serviço pessoa. O primeiro aborda a inclusão
de professores precisa estar pautada em educacional de pessoas com deficiên-
processos e estratégias que permitam tra- cia no ensino superior, tomando como
tar a criança em sua individualidade, para eixo estruturante o acolhimento e a va-
assim buscar melhorias para os processos lorização das diferenças e da diversida-
de desenvolvimento e aprendizagem das de humana, questões socioculturais nas
crianças, especialmente àquelas inseridas quais se apóiam ou deveriam se apoiar
na Educação Infantil. as práticas sociais. O segundo trabalho
relaciona a construção da subjetividade
Contato: Paula Cristina Medeiros Rezende, ligada às representações sociais, compro-
UFU, lalamedeiros@netsite.com.br metimentos de grupos e valores sociais

318
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

estimulados e valorizados nas práticas na aceitação ou não da criança em com-


educacionais. O terceiro discute as prá- preender o mundo em que ela vive. 3) A
ticas esportivas associadas à formação teoria psicológica que discute os aspectos
motora e psicossocial de crianças e ado- do desenvolvimento infantil e adolescen-
lescentes no âmbito do esporte de alto te nem sempre pauta a práticas cotidia-
rendimento. O último trabalho apresen- nas dos profissionais que trabalham com
tado discute a conjunção subjetividade e iniciação esportiva. Daí a importância de
práticas sociais, especificamente as edu- articular suas práticas pedagógicas com
cativas escolares, como uma necessida- o estágio de desenvolvimento no qual o
de de reflexão nos setores da psicologia atleta se encontra, considerando os as-
social e educação. O objetivo da mesa é pectos cognitivo, afetivo, físico e social. 4)
discutir os aspectos relacionais sob dis- É importante considerarmos que durante
tintas perspectivas teóricas, promovendo o processo educacional a subjetividade
um debate que perpasse vários espaços perpassa a inserção do professor na rela-
de práticas sociais. Os autores também ção com os seus pares, de maneira a res-
apresentam posicionamentos episte- ponsabilizá-lo pela intencionalidade de
mológicos, os quais dão visibilidade aos seus atos pedagógicos. Ressaltamos que
aspectos psicológicos da trama social na a subjetividade com características inten-
qual se detém. Os trabalhos apresentam cional e subjetiva, atravessa as interações
proposições conceituais relevantes para sociais também no contexto educacional
a compreensão do desenvolvimento hu- influenciando na construção de valores
mano em uma dimensão sócio-histórica humanos e, portanto sendo necessária
atribuindo centralidade aos “processos” a atenção devida a essas práticas sociais
e às características da pessoa em desen- contemporâneas.
volvimento. Algumas considerações finais
são apresentadas: 1) As ações educacio-
nais para a inclusão refletindo o avanço ACESSABILIDADE DE ESTUDANTES COM
no desenvolvimento dos direitos huma- DEFICIÊNCIA AO ENSINO SUPERIOR
nos devem envolver um rigoroso pro- Denise de Oliveira Alves - Anhanguera,
cesso de planejamento e organização de denisedeoliveiraalves@gmail.com
recursos de acessibilidade, rompendo,
assim, com as barreiras que obstaculizam A inclusão social e educacional de pes-
a plena participação e aprendizagem de soas com deficiência constitui, hoje, pro-
estudantes com deficiência no ensino cesso mundial que eclodiu no Brasil a
superior. 2) Conhecer como a criança é partir da década de noventa e tem como
representada internamente pelos estu- filosofia estruturante o acolhimento e a
dantes de pedagogia nos revela a forma valorização das diferenças e da diversi-
como essa fase do desenvolvimento hu- dade humana. Sua proposição conceitual
mano é retratada pelos formandos da toma como referência alguns documen-
educação. Pode-se considerar que existe tos internacionais que passam a nortear
uma construção subjetiva vinculada às a formulação de políticas públicas. Entre
representações sociais na relação criança eles destacam-se: a Declaração Mundial
e adulto que interfere significativamente Sobre Educação para Todos (Tailândia,

319
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

2009); a Declaração de Salamanca (Espa- importante, para a reflexão que preten-


nha, 1994); a Convenção Interamericana demos trazer aqui, é que se retirarmos
para Eliminação de Todas as Formas de qualquer pedaço ele perde parte de sua
Discriminação contra as Pessoas Porta- beleza. Especificamente relacionado ao
doras de Deficiência (Guatemala, 1999); a âmbito educacional o conceito toma a
Convenção sobre os Direitos das Pessoas dimensão de um redirecionamento das
com Deficiência, (Estados Unidos, 2006). práticas educacionais e dos sentidos sub-
O conteúdo expresso nestes textos cons- jacentes às mesmas. Trata-se de uma pos-
titui um marco histórico em defesa da in- tura ativa de identificação de barreiras
clusão de grupos sociais em situação de que alguns grupos encontram no acesso a
vulnerabilidade e tem importante reper- educação e também na busca de recursos
cussão na educação, exigindo uma rein- necessários para ultrapassá-las. Tal con-
terpretação da educação especial, que cepção difere substancialmente de outras
passa a ser compreendida no contexto formas de inserção escolar de pessoas
da diferenciação adotada para promover com deficiência, requerendo uma visão
a eliminação das barreiras que dificultam ampliada de educação, dos recursos, da
ou impedem o acesso à escolarização por estrutura, do currículo e uma mudança
parte das pessoas com deficiência. Vários estrutural do sistema educacional. Com
autores, ao tratarem da educação inclu- relação à inclusão de estudantes com
siva, traduzem a dimensão de um “proje- deficiência no ensino superior, apesar de
to revolucionário”. Eizirick (2005) utiliza um crescente ingresso deste alunado, o
a guerra como metáfora para defender que confronta as práticas discriminató-
a idéia de ser a inclusão um processo rias e a cultura seletiva da universidade,
complexo, difícil e doloroso e demandar dados do Censo escolar/2009 revelam
a “gestação de uma mentalidade inclu- que, em um universo de 5.954.021 es-
siva”; em Mantoan (2006) encontramos tudantes com matrícula, apenas 20.019
“andar no fio da navalha” para expressar apresentam algum tipo de deficiência, o
o embate, a resistência, a ruptura episte- que equivale a um percentual de 0,34%.
mológica, inerente à proposição de uma Este contingente mínimo que consegue
escola aberta para todos; ainda, Forest e acessar ao ensino superior encontra uma
Lusthaus (1987), pesquisadores canaden- instituição despreparada, em suas bases
ses, utilizam o caleidoscópio como metá- política, organizacional e, principalmen-
fora para a inclusão. Caleidoscópio é um te, na dimensão epistemológica, ou seja,
aparelho formado por um pequeno tubo na concepção que está subjacente a ação
de metal, com pequenos fragmentos de docente dos professores universitários.
vidro colorido, que, por meio do reflexo Para uma melhor contextualização desta
da luz exterior em pequenos espelhos in- realidade precisamos não perder de vis-
clinados, apresenta, a cada movimento, ta uma perspectiva mais ampla que é a
combinações variadas e agradáveis efei- análise das condições nas quais se deu
tos visuais. Quem já teve oportunidade o nascimento da universidade no Brasil.
de conhecer o brinquedo impressionou- Sabemos que sua criação não se concreti-
-se com a infinidade de desenhos que os zou alicerçada às especificidades da nos-
pedaços de vidro podem produzir. O mais sa realidade educacional, nem tampouco

320
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se pautou em políticas governamentais qualidade da educação e apresenta ins-


construídas a partir da preocupação de trumentos de aferição do nível de eficácia
que a universidade viesse a assumir o do ensino ministrado nas escolas brasilei-
papel social de democratizar o direito à ras. Recentemente, em 2008, é publicada
educação. Mesmo com a concretização, a Política Nacional de Educação Especial
em 1931, do Estatuto das Universidades na Perspectiva da Educação Inclusiva. Em
Brasileiras, considerado como um dos seu texto o Documento traz a prerrogati-
grandes marcos estruturais da univer- va de que, na educação superior, a educa-
sidade em nosso país, pouco se alterou ção especial se efetive por meio de ações
do caráter excludente e seletivo que vi- que promovam o acesso, a permanência
nha caracterizando o ensino superior. Ao e a participação dos estudantes com de-
contrário, de acordo com Garcia (2000), ficiência. Estas ações envolvem o plane-
o estatuto corrobora para consolidar a jamento e a organização dos recursos e
“(...) hegemonia dos que se pretendiam serviços para a promoção de acessibilida-
proprietários do saber, que eram também de arquitetônica, nas comunicações, nos
os proprietários das terras e de todas as sistemas de informação, nos materiais
riquezas produzidas, e que se utilizavam didáticos e pedagógicos, que devem ser
do saber para justificar seu poder” (p. disponibilizados nos processos seletivos e
68-69). Isto demonstra que o Documen- no desenvolvimento de todas as ativida-
to revelou-se insuficiente para diminuir des que envolvam o ensino, a pesquisa e
o quadro de exclusão social na educação a extensão. Essas proposições conceituais
brasileira. Em 1994 podemos localizar a têm desencadeado um conjunto de ações
primeira iniciativa por parte do Ministé- e políticas que dão conseqüência aos
rio da Educação com relação ao acesso princípios filosóficos da inclusão. A in-
de estudantes com deficiência no ensino clusão de estudantes com deficiência no
superior.Trata-se da Portaria nº 179/1994 ensino superior é, portanto, uma propo-
que recomenda a inclusão da disciplina sição visionária, que considera a evolução
“Aspectos Ético-Político-Educacionais dos direitos humanos e nos convida a re-
da Normalização e Integração da Pessoa fletir sobre a essencialidade epistemoló-
Portadora de Necessidades Especiais”. gica e o caráter emancipatório desta nova
A recomendação era, prioritariamente, perspectiva.
para os cursos de Pedagogia, Psicologia
e demais licenciaturas, e a inclusão de Palavras-chave: Inclusão, docentes
conteúdos relativos a essa disciplina em universitários, estudantes com deficiência,
cursos da saúde, serviço social e demais acessibilidade.
cursos superiores, de acordo com as suas Contato: Denise de Oliveira Alves,
especificidades. Em 2007 é lançado o Faculdade Anhanguera de Brasília,
Plano de Desenvolvimento da Educação: denisedeoliveiraalves@gmail.com
razões, princípios e programas – PDE,
reafirmado pela Agenda Social, tendo
como um de seus eixos o acesso e a per-
manência das pessoas com deficiência no
ensino superior. O Documento focaliza a

321
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO tidas ao rigor de treinamentos e penitên-


“SER CRIANÇA”: A INFÂNCIA NA cias durante a época colonial. Na expecta-
SUBJETIVIDADE DOS ESTUDANTES DA tiva de conquistar novos adeptos ao pen-
PEDAGOGIA samento católico, elas foram as primeiras
Luciana Câmara Fernandes Bareicha - a serem catequizadas, recorrendo-se a ar-
Anhanguera, tifícios punitivos quando necessários (Del
luciana.bareicha@gmail.com Priore, 1999). Com o passar do tempo, as
crianças indígenas do Brasil tornaram-se
No Brasil, durante o século XVI, como adolescentes ou, como disse Pe. Manoel
nos lembra Del Priore (1992), vislum- da Nóbrega, chegaram aos anos da pu-
bramos o momento áureo da ocupação berdade que eram caracterizados pela
jesuítica. Nesse período, nossas crianças autonomia, iniciando questionamentos
eram retratadas como anjos gordinhos e quanto à necessidade de abandonar seus
bochechudos que brincavam em jardins. costumes (Del Priore, 1992). Esse ponto
Pareciam simbolizar, por um lado, aspec- de vista aponta uma diferença entre a in-
tos místicos da infância e, por outro, os fância e a adolescência, sendo a infância
mártires dos ensinamentos dos professo- suscetível à aceitação direta de informa-
res jesuítas. O que mais chama atenção ções, diferentemente do adolescente que
nas produções artísticas e literárias dessa levanta dúvidas a respeito dos temas en-
época é a elaboração de um modelo de sinados através de avaliações críticas dos
criança que resultou em dois aspectos. conteúdos assimilados. Nesse período,
O primeiro revela uma visão de criança como observa Chambouleyron (1999),
como detentora de poderes místicos, que começa a surgir o entendimento entre os
a levava a suportar provações físicas em educadores de que as crianças poderiam
“nome da sua fé”, valorizando qualidades expressar sentimentos apropriados à sua
intrínsecas ao indivíduo. O segundo revela idade. Os jesuítas estavam determinados
uma criança que incorpora as característi- a imprimir nos indígenas suas concepções
cas do Menino Jesus que, através de uma de homem e de Deus na crença de que
imagem divinizada e associada à inocên- a aceitação incondicional do pensamento
cia que transmitia, era usada para interce- jesuítico, por parte dos nativos que seria
der junto aos fiéis da Igreja Católica e para assimilado utilizando-se, quando neces-
converter os infiéis. A infância era vista sário, de castigos corporais e vigilância
como um momento propício para o que constante como maneira de contenção.
se chamava catequese, sendo a criança, Outra concepção presente na educação
sobretudo a indígena, passível de aceita- jesuítica era a de que ela considerava as
ção dos conteúdos doutrinários. A criança crianças como um papel em branco, no
indígena era tratada como depósito de in- qual os visitantes da terra Brasil registra-
formações, sem se levar em consideração vam condutas “apropriadas” e “valoriza-
suas características físicas, psicológicas e das” (Chambouleyron, 1999). As crianças
de interação social. Usadas como símbo- aderiram com maior rapidez ao que foi
lo para a propagação de informações de ensinado, enquanto que os jovens e os
caráter religioso, as crianças eram subme- adultos retornavam, em pouco tempo, às
tradições de seu povo (Chambouleyron,

322
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

1999). Foi entre os séculos XVI e XVIII, trução de ser criança é apresentada como
de acordo com Del Priore (1999), foi in- um sujeito com características peculiares,
troduzido a conceituação de infância, de- ela tem o brincar como atividade central
nominada por ela puerícia - período en- no seu comportamento social, onde tan-
tre o nascimento e os 14 anos de idade, to pode vivenciar de maneira espontânea
com a qualidade de ser quente e úmida quanto como fazendo parte da rotina de
- que corresponderia à primeira idade do aprendizagem na escola, mas essencial-
homem. A infância seria dividida em três mente ela é o brincar. Essa criança expres-
momentos: 1) entre o nascimento e a ida- sa uma forma de ser que se revela pela
de de 3 a 4 anos - amamentação; 2) entre sua forma de se sentir feliz e de ser alegre
os 4 e 7 anos - a criança acompanharia os quando se relaciona. Não tem medo do
pais durante as atividades diárias; 3) dos mundo, precisa estar nesse mundo para
7 anos em diante, quando a criança ou es- viver todos os momentos o mais intensa-
tudava, ou participava de atividades pró- mente possível e por isso mesmo se re-
prias a sua idade através do aprendizado conhece na possibilidade de dizer o não,
em escolas. É importante enfatizarmos a quando o sim também existe. Então a
participação da sociedade como fator pre- subserviência do início de nossa coloniza-
ponderante para a educação infantil, bem ção tem cada vez menos impacto na vida
como para a manutenção das relações dessas crianças. O aluno da pedagogia
afetivas na e entre famílias. O simbolismo reconhece o poder que a criança tem no
de absolvição ou purificação da alma da ambiente de escola e na vida cotidiana,
criança através do batismo e, ao mesmo sem perder com isso a inocência como
tempo, o apoio da religião católica, anun- inocente que é. Para esses discentes a
ciavam um sentimento de aprovação e/ou criança não tem preocupações, mas como
responsabilidade por parte da sociedade atributo dado pela sociedade é colocado
em ajudar na criação da criança, dividindo os estudos e o aprender que estão sob o
com os pais a responsabilidade educativa seu encargo. Dessa maneira entendemos
(Del Priore, 1999). Na contemporaneida- que o professor em formação se pauta na
de de nossa época podemos conhecer criança que tem muito mais domínio da
como as idéias a respeito do que significa construção de conhecimento e não é in-
ser criança está revelada nas representa- fluenciada de maneira rápida pelo adulto.
ções sociais dos alunos da pedagogia da Existe uma construção na relação criança
Faculdade Anhanguera de Brasília, onde e adulto que interfere significativamente
81 alunos puderam participar e tiveram na aceitação ou não da criança em com-
as suas resposta analisadas pelo software preender o mundo em que ela vive.
EVOCATION 2000 (análise de evocação).
As representações do que é “ser criança” Palavras-chave: Representações Sociais,
estão solidificadas, no núcleo central da Infância, Pedagogia
seguinte maneira: alegre (7), aprender Contato: Luciana Câmara Fernandes Bareicha,
(12), brincar (58), criança (8), estudar Faculdade Anhanguera de Brasília, luciana.
(8), feliz (35), inocente (8), inocência (9), bareicha@gmail.com
medo (12), mundo (11), não (35), poder
(12), ser (89), vida (9), viver (12). A cons-

323
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ASPECTOS PSICOLÓGICOS DA outros) exercem, direta ou indiretamente,


ESPECIALIZAÇÃO PRECOCE NOS ESPORTES sobre crianças e jovens. Discutindo as di-
Luciano Santana Lopes - Projeção ferentes abordagens que o esporte pode
professorluciano.lopes@gmail.com assumir, Tubino (1992 apud Scaglia, 1996)
aponta três áreas de manifestações espor-
A prática desportiva tem assumido lugar tivas, que mesmo sendo distintas estão in-
de destaque na sociedade, na medida ter-relacionadas: 1) Esporte-performance:
em que é associada à promoção de saú- objetivo é o alto-rendimento; 2) Esporte-
de, qualidade de vida, formação motora -participação: promover o bem-estar e a
e psicossocial, sobretudo, de crianças e recreação; 3) Esporte-educação: objetivo
adolescentes. Isso implica na importância de formação sócio-educativa. A interven-
de se compreender melhor como os jo- ção do treinador na iniciação esportiva
vens estão sendo iniciados no ambiente envolve uma discussão sobre em qual
esportivo, bem como se a forma utilizada área ele deveria se inserir. O debate gira
é correta e coerente com suas caracterís- em torno de quais os objetivos prioritários
ticas e necessidades e se há uma adequa- deveriam nortear a prática pedagógica, ou
ção ao seu estágio de desenvolvimento seja, envolve a contraposição entre o cará-
físico, psicológico e afetivo. Para Personne ter pedagógico-educacional-recreativo do
(1987 apud Neto, 2000, p.49), a iniciação esporte e a busca de novos talentos espor-
esportiva precoce “é a atividade espor- tivos, com ênfase na especialização preco-
tiva desenvolvida antes da puberdade e ce. O primeiro momento refere-se à valo-
caracterizada por uma alta dedicação aos rização do desenvolvimento integral dos
treinamentos (mais de 10 horas semanais) atletas, respeitando seu desenvolvimento
e principalmente por ter uma finalidade motor, cognitivo, social e emocional, pro-
eminentemente competitiva”. No que piciando experiências positivas com o es-
pese as grandes e reconhecidas contribui- porte, no intuito de promover a qualida-
ções da prática esportiva para o desenvol- de de vida e a formação do cidadão. Essa
vimento do ser humano, ainda é pequeno proposta está em sintonia com as idéias
o número de estudos realizados conside- de Betti (1991) que encara o esporte não
rando as especificidades e os diversos efei- apenas como um fazer estereotipado, mas
tos do treinamento esportivo com os mais acredita no uso de conhecimentos peda-
jovens (Silva, Fernandes & Celani, 2001). O gógicos com vistas a uma compreensão
esporte não é inerentemente benéfico ou e aprendizado de atitudes, habilidades e
prejudicial a quem pratica. Na realidade, conhecimentos, que leve o atleta a viven-
não é a prática esportiva que determina ciar adequadamente os valores e a cultura
os benefícios e prejuízos na formação do esportiva. A outra possibilidade de atua-
indivíduo, mas sim a natureza do esporte ção do professor, voltada para o esporte
no qual a criança se insere (Weinberg & de alto-rendimento, fixa suas bases no
Gould, 2001). Caracterizam esse contexto ensino e desenvolvimento de habilidades
os objetivos pedagógicos definidos na for- visando à capacitação de seus praticantes
mação dos atletas, bem como as influên- para atuação no esporte de alto nível. O
cias que os protagonistas desse processo enfoque no rendimento esportivo ocasio-
(pais, professores, imprensa, amigos, entre na uma valorização da alta performance

324
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e da vitória, gerando uma cobrança por nível de rendimento”. É relevante que se


resultados que nem sempre as crianças busque compreender como se dá a real di-
estão preparadas para suportar. Segundo mensão da especialização esportiva preco-
Weinberg & Gould (2001) tem se verifica- ce em relação à idade e ao nível de desen-
do com constância a conduta de treinado- volvimento atual da criança e do jovem,
res que criticam duramente a criança na sem deixar de considerar as perspectivas
ocorrência de um erro, criando assim um de desenvolvimento a longo prazo. Não
ambiente permeado pelo estresse e pela se podem desconsiderar questões rele-
ansiedade, que pode causar prejuízos para vantes, que ainda não encontram consen-
o aprendizado, além da ocorrência de le- so no meio científico, nem tampouco no
sões físicas. O nível de compreensão sobre meio esportivo: qual a idade mais adequa-
a adequação da prática desportiva aos es- da para iniciação na prática desportiva?
tágios de desenvolvimento e caracterís- Que pré-requisitos deverão possuir crian-
ticas psicomotoras da criança e do jovem ças e adolescentes participarem de uma
apresenta-se, ainda, relativamente frágil, prática esportiva especializada? Quais são
principalmente se considerarmos as par- as vantagens e prejuízos para aqueles que
ticularidades das várias modalidades des- iniciam precocemente a prática de um es-
portivas e seus efeitos no organismo. Mes- porte? É possível formar um atleta de alto
mo em estudos mais recentes continuam rendimento sem comprometer sua saúde?
a persistir dúvidas sobre as idades em que Qual o papel a Psicologia deve assumir
as crianças e jovens estariam preparados para minimizar os possíveis efeitos nocivos
para se iniciarem numa prática desportiva para o atleta de uma especialização espor-
sistemática e de que forma deveria ocor- tiva precoce? A mudança de um quadro
rer essa inserção. É importante assinalar tão desolador e grave, que coloca em risco
que o treino com crianças e jovens tem o desenvolvimento saudável de crianças
nuances que o diferencia do treinamento e jovens em troca de um sonho quase
dos adultos. Em razão das características sempre inalcançável, é o envolvimento de
e particularidades de cada atleta relacio- diferentes áreas do conhecimento (Socio-
nadas aos estágios de crescimento e de- logia, Psicologia, Biologia, Educação Física,
senvolvimento, torna-se imprescindível Medicina, Fisioterapia, Nutrição, Pedago-
diferenciar os objetivos, os conteúdos e os gia, entre outras) na compreensão desse
processos de treinamento em função da fenômeno. Até então o que se identifica
idade (Silva, Fernandes & Celani, 2001). É é atuação de diferentes profissionais da
preciso considerar que, até pouco tempo e área do esporte sem a devida integração,
ainda hoje em alguns esportes, o treino de ou seja, os conhecimentos sobre a infância
jovens é uma reprodução ou, no máximo, e adolescência produzidos pela Psicologia,
uma simples adaptação dos procedimen- por exemplo, não chegam aos treinado-
tos e organização do esporte de rendimen- res para que estes os incorporem a suas
to. Consonante com tal assertiva, Sobral práticas pedagógicas. Em contrapartida a
(1994, p. 10) afirma que “os treinadores Psicologia possui poucos estudos que ana-
de jovens tendem a pautar seus pensa- lisam essas fases do desenvolvimento em
mentos e condutas pelos estereótipos vi- um ambiente esportivo, ocasionando um
gentes no treino dos atletas do mais alto afastamento da realidade.

325
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: Especialização Esportiva passarão a conjugar-se a outros tantos


Precoce, Psicologia do Esporte, sentidos subjetivos e em suas ações, pala-
Desenvolvimento vras e gestos. Isenta de previsibilidade, a
Contato: Luciano Santana Lopes, Faculdade comunicabilidade dessa relação se reflete
Projeção, professorluciano.lopes@gmail.com nos produtos subjetivos oriundos das inte-
rações desenvolvidas refletindo-se recursi-
vamente nas interações subsequentes. O
PRÁTICAS DE SUBJETIVIDADE sentido subjetivo, uma categoria da sub-
Alice Farias de Araújo Marques - SEE/BEM jetividade, é um produto psíquico envolto
alicemarques@unb.br pelo emocional, intelectual e fisiológico,
Teresa Cristina Siqueira Cerqueira - FE/UnB, ocasionado por estímulos diversos advin-
teresacristina@unb.br dos dos processos vivenciais do sujeito, os
quais, por sua vez, são desenvolvidos em
O presente ensaio busca apresentar a con- seu interior bem como em meio às situa-
junção subjetividade e práticas sociais, ções sociais (González Rey, 2005). Dentre
especificamente as educativas escolares, tantas situações sociais e estímulos vários,
como uma necessidade de reflexão nos se- uma das mais presentes em nossa socieda-
tores da psicologia social e educação. Por de trata-se das práticas educativas escola-
abordar as experiências humanas em seus res. O processo subjetivo pedagógico edu-
aspectos psicológicos mais sutis, a subjeti- cativo possui inúmeros detalhes quanto a
vidade, sob a forma de categoria teórica, suas ações, pois existe uma conjuntura di-
representa para os estudos do ser humano versificada de ações intencionais, as quais
e em sua relação com o mundo a possibi- sujeitam os indivíduos a várias possibilida-
lidade de compreensão, do ponto de vista des de produção subjetiva. Em tal proces-
psíquico, de práticas humanas, as quais so, as ações com intencionalidade pedagó-
contemplam a interação humana em to- gica trazem em sua produtividade subjeti-
dos os níveis. Dentre as interações huma- va, possibilidades que vem somar-se aos
nas mais importantes, estão aquelas de- resultados pedagógicos idealizados pelos
senvolvidas durante o contato face a face mentores pedagógicos. Como toda práti-
– a interação humana mais fundamental ca social, as vivências educativas intervem
da sociedade (Berger E Luckmann, 2008). diretamente nas visões, atitudes, valores
Conforme explica a própria denominação, sociais cotidianos de seus praticantes. Fe-
o contato face a face é aquele no qual tor- cundas de sentido subjetivo (González Rey,
na-se possível o acesso ao outro por meio 2006), as ações, em qualquer âmbito, por
de uma interação direta entre duas ou mais mais planejadas que sejam, se apresentam
pessoas. As práticas sociais definem valo- ao outro sempre somando-se ao que o ou-
res que a própria sociedade guarda para tro já traz - aspecto que impossibilita ain-
si. A mutualidade estabelecida nos vários da mais qualquer perspectiva de previsão
contextos das diversas práticas, nas quais de qualquer resultado subjetivo. Em tais
são constituídas interações pessoais, está condições, os sentidos subjetivos estão
implicada pelas ações, palavras, gestos. estreitamente ligados ao contexto face a
Isso pelo fato de estes imprimirem-se re- face e nesse sentido, o processo subjeti-
ciprocamente sentidos subjetivos, os quais vo pedagógico torna-se fundamental no

326
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

processo educacional, situando o profes- O processo de resiliência se dá no con-


sor em um ponto privilegiado na relação, texto de exposição a situações adversas
o que, ao mesmo tempo, o torna predo- significativas e consiste na capacidade
minantemente responsabilizado por seus de o indivíduo sustentar o seu bem-estar
atos intencionais pedagógicos em função frente a essas adversidades, com a uti-
das possibilidades imprevisíveis de produ- lização individual e coletiva de recursos
ção subjetiva. Isso caracteriza uma subjeti- físicos, psicológicos, sociais e culturais.
vidade que exprime em sua complexidade A resiliência está atrelada aos resultados
a riqueza e a necessidade de se pensar a desenvolvimentais do enfrentamento das
ação com precaução, embora sem perder dificuldades, bem como ao processo pelo
a espontaneidade. Devido a essa conjun- qual o indivíduo sustenta o seu bem-estar.
tura intencional e subjetiva é que a subjeti- Com base na perspectiva que considera o
vidade representa um tema para reflexões desenvolvimento humano como um pro-
dirigidas em vários âmbitos interativos, tal cesso contínuo que segue do nascimento
como no exemplo do âmbito educativo. Se à morte do indivíduo, o objetivo desta
for verdade que ‘as práticas definem os va- mesa é analisar processos de resiliência
lores que a própria sociedade guarda para de populações em diferentes etapas do
si’, então cuidemos dessas práticas como desenvolvimento: infância, adolescência
forma de compromisso e motivação frente e adultez. Três populações em situações
às implicações específicas de cada uma. de risco foram avaliadas quanto a suas
estratégias de resiliência, fatores de risco
Palavras-chave: subjetividade, práticas e proteção em diferentes contextos: (a)
pedagógicas, sentidos subjetivos. crianças e adolescentes com nível socio-
Contato: Alice Farias de Araújo Marques, econômico baixo, estudantes do ensino
SEE/Centro de Educação Profissional EMB público primário em Angola; (b) meninas
(Brasília–DF) - alicemarques@unb.br adolescentes vítimas de exploração sexu-
al; e (c) homens adultos trabalhadores de
construção civil, vivendo em alojamentos
MR LT06 - Mesa Redonda de grandes obras em locais isolados do
Convidada Brasil. São discutidos aspectos de seme-
lhanças e diferenças entre os processos
de resiliência desenvolvidos por essas po-
MR LT06-1180 - PROCESSOS DE pulações. Analisando comparativamente
RESILIÊNCIA, CICLO VITAL E CONTEXTOS os casos conclui-se que, embora diversos
DE DESENVOLVIMENTO entre si, nos três contextos de desenvolvi-
Elder Cerqueira Santos - UFS mento podem ser identificados fatores co-
eldercerqueira@yahoo.com.br muns relacionados ao processo de resili-
Airi Macias Sacco - UFRGS ência: fatores individuais (e.g. habilidades
amsacco@gmail.com de resolução de problemas, objetivos e as-
Silvia Helena Koller - UFRGS pirações, perspectivas de futuro, senso de
silvia.koller@gmail.com humor); relacionais (e.g. relacionamentos
Diogo Araújo de Sousa - UFRGS significativos e aceitação do grupo de pa-
diogo.a.sousa@gmail.com res, percepção de suporte social, compe-

327
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tências sociais); comunitários (e.g. acesso O Índice de Desenvolvimento Humano


à educação e informação) e culturais (e.g. (IDH) de Angola é de 0.403, considerado
afiliação com uma religião, identificação baixo. Além disso, 50% da população não
cultural). O primeiro estudo apresenta um têm acesso à água potável, 71,6% não têm
recorte qualitativo de um estudo que teve energia elétrica e 54,3% sobrevivem com
como intuito conhecer a opinião de crian- uma renda de até US$1,25 por dia. Além
ças angolanas a respeito de suas escolas, de ter sido um obstáculo ao desenvolvi-
investigar como é a escola dos seus so- mento do país, o período de guerras dei-
nhos e identificar aspectos relativos à resi- xou marcas profundas na população que,
liência nessa população. O segundo estu- como usualmente acontece nos países em
do teve como objetivo investigar aspectos situação de conflito armado, aprendeu a
gerais sobre a vida e os fatores de risco e conviver com transgressões cotidianas dos
proteção junto a crianças e adolescentes direitos humanos. As crianças são a fatia da
vítimas de exploração sexual, assistidas população mais vulnerável a esse tipo de
por instituições, com foco nas consequ- situação, que pode oferecer consequên-
ências sócio-psicológicas sobre as vítimas. cias bastante nocivas ao desenvolvimento
Finalmente, o terceiro estudo teve como infantil. Segundo estimativas recentes, An-
objetivo apresentar um levantamento so- gola tem a segunda maior taxa de mortali-
bre quem são e como vivem os trabalha- dade infantil do mundo: 130 mortes para
dores de grandes obras em atividade no cada 1000 bebês nascidos vivos. O mesmo
Brasil, focalizando aspectos de resiliência ocorre com o índice de mortalidade das
desta população frente às adversidades crianças com até cinco anos, segundo o
provenientes das condições de trabalho. qual 220 crianças, de cada 1000 nascidas
vivas, morrem antes de completar essa
idade. Das crianças com até cinco anos de
EDUCAÇÃO E RESILIÊNCIA: ESTUDO idade, 31% estão abaixo do peso ideal. No
QUALITATIVO COM CRIANÇAS E que diz respeito à educação, a população
ADOLESCENTES ANGOLANOS angolana adulta tem escolaridade espe-
Airi Macias Sacco - UFRGS rada de 4,4 anos, o que corresponde ao
amsacco@gmail.com ensino primário incompleto, e 30,4% da
Silvia Helena Koller - UFRGS população não é alfabetizada. Algumas
silvia.koller@gmail.com das principais dificuldades do sistema de
ensino público primário estão relaciona-
Angola, país de língua portuguesa localiza- das à insuficiência de recursos financeiros,
do na costa ocidental da África, enfrentou materiais e humanos; à precariedade das
41 anos de guerras sucessivas, que tive- infraestruturas; à diversidade linguística
ram fim em 2002, e está em período de e à baixa qualidade do ensino. As escolas
reconstrução. Embora rico em petróleo e não têm mobília e manutenção adequa-
diamantes, o país enfrenta uma série de das, além de existir um elevado número
problemas relacionados à desigualdade de salas de aula ao ar livre, funcionando
social. A população angolana tem, em mé- encostadas em muros ou embaixo de ár-
dia, 17,4 anos de idade e a oitava menor vores. A formação do corpo docente é pre-
expectativa de vida do mundo: 48,1 anos. cária, o que acarreta a utilização de poucas

328
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

estratégias de ensino e o despreparo para afastados dos centros urbanos, as crian-


lidar com os alunos que são submetidos, ças precisam percorrer grandes distâncias
cotidianamente, a castigos físicos e humi- até a escola, onde relataram chegar can-
lhações. A comunidade escolar também sadas, com fome e com sede. A falta de
precisa lidar com a falta de merenda, água água potável, merenda e energia elétrica,
potável e energia elétrica. Tendo em vista a comum a todas as instituições, também
realidade descrita, o objetivo deste traba- foi apresentada como um dos principais
lho é apresentar um recorte qualitativo de entraves para a aprendizagem. Ainda no
um estudo que teve como intuito conhecer que diz respeito à relação dos alunos com
a opinião de crianças angolanas a respeito a escola, os elementos que mais se sobres-
de suas escolas, investigar como é a escola saíram nos relatos foram aqueles ligados
dos seus sonhos e identificar aspectos re- ao seu relacionamento com os docentes.
lativos à resiliência nessa população. Parti- A maioria das crianças afirmou gostar dos
ciparam do estudo crianças e adolescentes professores e da maneira como eles ensi-
com nível socioeconômico baixo, de sete a nam, além de valorizar os que brincam e
18 anos, estudantes de 15 escolas de en- contam histórias. Elas se mostraram in-
sino público primário localizadas em cinco comodadas, porém, com a utilização fre-
províncias angolanas: Bié, Cunene, Huíla, qüente de castigos físicos. A escola dos so-
Luanda e Moxico. O método utilizado foi nhos das crianças e dos adolescentes an-
o da inserção ecológica, proposta metodo- golanos é uma escola simples, com chão,
lógica que promove a imersão da equipe paredes, teto e janelas; é um local em que
de pesquisa no ambiente analisado, com o todos têm cadernos, lápis e borracha e que
objetivo de estabelecer proximidade com atende a requisitos básicos promotores de
o objeto de estudo e, assim, responder saúde e de bem estar; nessa escola, os
apropriadamente às questões propostas. professores são seus amigos e não batem.
As crianças e os adolescentes participaram Os participantes deste estudo enfrentam,
de entrevistas em grupo, nas quais foram cotidianamente, uma série de obstáculos
convidados a descrever a escola na qual ao seu desenvolvimento e estão expostos,
estudam e a falar sobre sua relação com na escola, a diversos fatores de risco, que
ela. Eles também foram solicitados a ima- vão desde a ausência de condições básicas
ginar e descrever como seria a escola dos para promoção de saúde – como água, luz,
seus sonhos. No que diz respeito à opinião saneamento e alimentação – até situações
sobre suas escolas atuais, os participantes de violência física e psicológica, perpetra-
demonstraram valorizá-las como o local no das por membros do corpo docente e da
qual aprendem a ler e a escrever. Eles per- direção. Apesar disso, a relação deles com
cebem uma série de questões como pro- a escola é marcada por um forte compo-
blemáticas, a começar pela infraestrutura nente de valorização do ambiente escolar.
oferecida, visto que não há mesas, cadei- A equipe de pesquisa identificou alguns as-
ras, quadros ou material didático disponí- pectos relativos à resiliência nessas crian-
veis. Muitas vezes, as cadeiras são levadas ças e adolescentes, sendo que os princi-
de casa pelos alunos ou são substituídas pais estão relacionados a fatores individu-
por pedras, latas e troncos. Não há trans- ais, como a intensa vontade que têm de
porte escolar e, por isso, nos locais mais aprender, e relacionais, como o apoio que

329
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

recebem de seus amigos e colegas, com os os critérios de interpretação dos dados.


quais se unem para superar as situações As participantes são três adolescentes,
adversas. Os participantes deste estudo residentes em dois diferentes estados
percebem suas escolas como locais reple- do nordeste do Brasil, duas em capitais
tos de problemas relacionados, principal- e uma numa pequena cidade do interior.
mente, à precariedade infraestrutural e à A coleta de dados foi realizada através
falta de condições necessárias para uma de entrevista individual, guiada por um
boa aprendizagem, mas, também deixam roteiro na forma de questionário. Foram
claro, em palavras e atitudes, que a escola realizadas análises de conteúdo. No pro-
é muito importante em suas vidas. cesso de análise, após transcrição, foram
seguidos os seguintes passos: (a) leitura
Palavras-chave: educação, resiliência, Angola exaustiva do material; (b) identificação
das categorias extraídas do texto; (c) va-
lidação das categorias por pares (juízes);
VÍTIMAS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL: (d) transformação dos “dados brutos” em
ESTUDO DE CASOS MÚLTIPLOS SOBRE “dados úteis”, a partir da fragmentação
ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO do texto e estabelecimento de unidades
Elder Cerqueira Santos - UFS semânticas (critério de analogia); (e) cate-
eldercerqueira@yahoo.com.br gorização de cada entrevista por dois pes-
quisadores independentes; e (f) discussão
A exploração sexual de crianças e adoles- das categorias para validação pelo grupo
centes vem sendo investigada como um de pesquisadores do estudo. A partir da
fenômeno de caráter social, com conse- análise de conteúdo, emergiram dos da-
qüências no ajustamento psicológico das dos quatro categorias principais de análi-
vítimas e das famílias envolvidas. A situa- se: vitimização, papel da família no envol-
ção de exploração configura-se como uma vimento com a ESCA, mercado da ESCA, e
ampla situação de risco e alta vulnerabili- dinâmica da exploração sexual. Os resul-
dade. Poucos estudos têm investigado as tados destacam aspectos diferenciados no
conseqüências deste fenômeno para as histórico de exploração vivenciado pelas
vítimas e suas famílias. Este trabalho teve três participantes, especialmente, pelo
como objetivo investigar aspectos gerais tipo de exploração vivenciado: turismo
sobre a vida e os fatores de risco e prote- sexual, exploração familiar e exploração
ção junto a essas crianças e adolescentes, nas estradas. Todas demonstram grande
assistidas por instituições, com foco nas dificuldade de vinculação ao atendimento
consequências sócio-psicológicas sobre as especializado e uma relação contraditória
vítimas. Trata-se de um estudo de casos típica da exploração sexual, que gera de-
múltiplos, com vítimas de exploração em pendência e sofrimento. A família assume
atendimento psicológico. O delineamento papel de destaque no início do processo
de estudo de caso proposto por Yin envol- de exploração, mas, toma uma perspec-
veu cinco componentes interligados: (a) as tiva diferente comparando-se interior e
questões de pesquisa; (b) as proposições; capital. Estratégias de resiliência são ana-
(c) a(s) unidade(s) de análise; (d) a lógica lisadas nos três casos, e alguns aspectos
que vincula os dados às proposições; e (e) considerados no enfrentamento da vivên-

330
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cia da violência sexual são: rede de apoio obras com o abuso de álcool e outras dro-
(amizades, escola e família); atendimento gas, e o envolvimento em comportamen-
profissional (engajamento na psicotera- tos sexuais de risco. No Brasil, pesquisas
pia) e aspectos individuais (elaborações anteriores demonstraram que esses tra-
sobre a sexualidade, culpa e escolhas). balhadores tendem a apresentar uma des-
Discute-se a relação entre atendimento, valorização da sua condição profissional.
vitimização e culpa, como processo de Essas pesquisas também identificaram
afastamento das vítimas do serviço espe- problemas de autoestima e aceitação de
cializado e uma dificuldade em planejar estereótipos negativos nesta população.
tratamento continuado. Os aspectos inerentes às condições de
trabalho em grandes obras afetam tanto
Palavras-chave: exploração sexual, os trabalhadores como as empresas e as
adolescência, sexualidade comunidades onde as obras se inserem.
Este trabalho teve como objetivo apre-
sentar um levantamento sobre quem são
ASPECTOS DE RESILIÊNCIA NA e como vivem os trabalhadores de gran-
PROFISSÃO DE TRABALHADOR DE des obras em atividade no Brasil, focali-
GRANDES OBRAS DE CONSTRUÇÃO CIVIL zando aspectos de resiliência desta popu-
Diogo Araújo de Sousa - UFRGS lação frente às adversidades provenientes
diogo.a.sousa@gmail.com das condições de trabalho. Participaram
do estudo 288 trabalhadores de grandes
Trabalhadores da área de construção civil obras civis (todos homens), vivendo alo-
de grandes obras vivenciam condições de jados nas imediações de grandes constru-
trabalho que, muitas vezes, os expõem a ções, em cinco estados brasileiros: Goiás,
amplas situações de risco. Esses profis- Minas Gerais, Rondônia, Santa Catarina
sionais, responsáveis pela edificação e e São Paulo. A média de idade dos parti-
construção de hidrelétricas, barragens, cipantes foi de 32,78 anos (DP = 10,91),
montagens e outras grandes obras, no variando entre 18 e 64 anos. Dos entre-
Brasil, passam por períodos de emprego vistados, 51,9% eram casados ou estavam
e desemprego e levam boa parte de suas em um relacionamento estável, ao passo
vidas em alojamentos, mudando constan- que 42,9% eram solteiros. Quanto à esco-
temente de cidade, de acordo com o fluxo laridade, 37,5% dos trabalhadores cursa-
de construções pelo país, o que acarreta ram apenas o Ensino Fundamental incom-
no afastamento dos seus lares e famílias. pleto, outros 21,2% concluíram o Ensino
A alta mobilidade e os movimentos migra- Fundamental e 20,8% têm Ensino Médio
tórios são características marcantes dessa completo. A média da renda mensal fami-
profissão, bem como a falta de formação liar foi de R$ 1.497,13 (DP = R$ 1.452,59).
de redes sociais de apoio, o que os coloca Para a realização das entrevistas, os pes-
em uma situação diferenciada de vínculos quisadores inseriram-se no ambiente de
frágeis com as diferentes comunidades pesquisa (alojamentos de grandes obras
em que se inserem ao longo da vida. Es- no país), a fim de estabelecer uma relação
tudos internacionais relacionaram o estilo de maior proximidade com os participan-
de trabalho em construções de grandes tes. Os participantes foram entrevistados

331
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

individualmente e as entrevistas duraram, condições de trabalho em grandes obras.


em média, 40 minutos (variando de 30 Entre eles, a categoria de maior força en-
minutos a 2 horas). O instrumento foi um volveu fatores individuais. Por exemplo,
questionário que servia de roteiro de en- quanto às aspirações profissionais, mui-
trevista estruturada. A análise dos dados tos entrevistados colocaram o trabalho
seguiu um método misto, com análises em construção civil como um trabalho
quantitativas descritivas, de frequências passado de geração em geração nas suas
e médias de comportamentos relatados famílias, ou uma aspiração para “melho-
pelos profissionais e análises qualitativas res condições de vida”. Nesse ponto, al-
de conteúdo, acerca dos dados coletados guns deles comentaram que esta seria
nas questões abertas das entrevistas, so- a única profissão na qual ganhariam um
bre condições de trabalho, vida nos aloja- bom salário tendo estudado tão pouco, e
mentos e caracterização da profissão. Os mostraram-se satisfeitos com a sua renda
resultados apontam importantes aspec- mensal. Em outra vertente de fator indi-
tos relacionados à caracterização do tra- vidual, foi comum o relato de que, para
balho, condições de vida nos alojamentos se ajustar à vida de trabalho em grandes
e noções e percepções dos trabalhadores obras, os profissionais optam por perío-
acerca de sua profissão. O tempo médio dos sem trabalho, pedindo demissão após
de profissão dos entrevistados foi de 8,17 tempo suficiente para retirada do seguro
anos (DP = 9,3). Sobre os maiores proble- desemprego, e passando um tempo sem
mas enfrentados na profissão, destaca- trabalhar antes de recomeçar a jornada.
ram-se para mais da metade da amostra A média de meses em que ficavam alo-
“ficar longe da família” (87,5%) e “riscos jados trabalhando foi de 9,7 meses (DP
de acidente de trabalho” (55,9%). Além = 8,46) e o tempo que ficavam sem tra-
desses, muitos participantes também re- balhar entre uma obra e outra teve mé-
lataram problemas devido à dificuldade dia de 4,1 meses (DP = 5,58). Estiveram
de comunicação, por estarem afastados presentes, também, fatores de resiliência
da cidade, em alojamentos sem torre de relacionais, como a pertença a um gru-
telefonia celular ou telefone público. No po de profissionais. Para alguns (21,1%),
que se refere à visão que pessoas da co- a profissão de trabalhador de grandes
munidade em geral fazem da profissão obras é uma profissão de “homens traba-
deles, 53% dos entrevistados disseram lhadores”, “honestos”, “de bem” e “cora-
ser mal vistos, o que ficou expresso por josos”. Por fim, fatores culturais como a
respostas que caracterizavam os trabalha- afiliação a uma religião se mostraram re-
dores como “arruaceiros”, “refugiados”, cursos para o enfrentamento e possíveis
“bagunceiros”, “baderneiros” ou “sem componentes dos processos de resiliência
vergonha”. Entre esses trabalhadores, as nesta população. Todavia, também foram
denominações de “peão” ou de “barragei- comuns, nos relatores dos trabalhadores,
ro” foram comuns e apareceram, muitas comportamentos de enfrentamento não
vezes, com valor pejorativo. Estratégias funcionais, como o uso de drogas e o en-
de resiliência presentes nos discursos dos volvimento com a exploração sexual. Fo-
trabalhadores envolveram diversos fato- cando os discursos dos trabalhadores que
res relacionados ao enfrentamento das expressaram abertamente o uso de bebi-

332
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da alcoólica e de outras drogas, declara- direciona a vida. A partir desse autor,


ções preocupantes foram relatadas, em avançamos nos estudos que reconhecem
sua maioria associando o uso de drogas a criança como protagonista de seu de-
às condições difíceis de vida e de trabalho senvolvimento e de sua segurança afetiva
do profissional da construção civil. Discu- que até então ficava restrita à relação diá-
te-se a relação entre condições de traba- dica com a mãe ou com alguns outros so-
lho, situações de risco, enfrentamento e ciais, mais próximos (Vasconcellos, 2002,
estratégias de adaptação ao contexto en- Nascimento, 2003). Para este autor, a fór-
tre os trabalhadores de grandes obras. Os mula para entender o processo de desen-
achados servem de subsídio para que se- volvimento está em nos voltarmos à to-
jam estruturadas formas de intervenção talidade das relações das quais a criança
com esses trabalhadores para promoção faz parte e das quais modifica. Para ele,
de resiliência, aplicadas a este contexto a criança é um ser geneticamente social,
específico de desenvolvimento. pois nasce num meio envolvente do qual
depende inteiramente para a satisfação
Palavras-chave: trabalhador de grandes obras, de suas necessidades e a solução de seus
construção civil, resiliência desconfortos, sendo um ser biológico que
Contato: Elder Cerqueira-Santos, UFS, nasce já social por ser membro de um
eldercerqueira@yahoo.com.br grupo com cultura e linguagem próprias
(Vasconcellos, 1996). Nesta Mesa apre-
sentaremos quatro trabalhos que partem
SP LT04 - Simpósio da psicogênese da pessoa de Wallon. No
primeiro Pedroza, apresenta o resultado
de seus estudos sobre a contribuição da
SP LT04-1405 - HENRI WALLON NA psicologia e da psicanálise da educação
INTERFACE DA PSICOLOGIA COM A principalmente no que concerne o pro-
EDUCAÇÃO cesso da aprendizagem. O ponto central
dos seus questionamentos parte do pres-
Maria Letícia B. P. Nascimento - FEUSP
suposto de que a escola ainda valoriza os
letician@usp.br
aspectos cognitivos em detrimento dos
Núbia Schaper Santos - PROPED/UERJ
afetivos. Nesse sentido são priorizadas as
nubiapsi@ig.com.br
teorias de Freud e Wallon que procuram
Vera Maria Ramos de Vasconcellos - PROPED/
estudar o sujeito numa perspectiva de
UERJ
totalidade buscando a superação da dico-
vasconcellos.vera@gmail.com
tomia entre cognição e afeto. No segun-
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB
do, Santos e Santos, discutem o lugar das
emoções de crianças na creche, a partir
Henri Wallon (1879-1862) discute, por
da presença do choro em sua rotina. No
intermédio da criança, uma ciência do
terceiro trabalho Nascimento apresen-
homem por inteiro21 em que a emoção
ta uma análise interessante do lugar do
conflito constitutivo nas interações e no
21 processo de desenvolvimento de crianças
Assim o define René Zazzo no livro Psychologie et marxis-
me (1979, p. 137). com pouco mais de dois anos. Finalizan-

333
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do, Vasconcellos apresenta também um ção permite a passagem da vida orgânica


recorte de pesquisa, no qual a importân- para a vida psíquica. Não é uma simples
cia do processo de percepção de si e a di- reação do organismo a um determinado
ferenciação eu-outro, se dá num ambien- estímulo, mas possibilita a interação en-
te plural de adultos e crianças pequenas tre o sujeito e o meio social. É no movi-
(creche). mento do outro que a criança, ainda sem
condições da consciência de si e de efetu-
ar algo por si, que o outro, por sua ação,
DIÁLOGOS ENTRE WALLON E A CRECHE desencadeará a ação dela. Se a emoção
Núbia Schaper Santos - PROPED/UERJ tem como possibilidade a ativação do
nubiapsi@ig.com.br outro no processo de interação humana,
Tayane Peixoto Bueno dos Santos - FE/NEIPE/ não é difícil supor a relevância do tema
UERJ para o cotidiano da creche e das relações
tay_peixoto@hotmail.com.br nela estabelecidas. A emoção torna-se
afetividade quando é atravessada pelo
Financiamento: FAPERJ
conteúdo e pelas significações dadas pela
cultura (Wallon, 2007). É no movimento
Neste trabalho, apresentaremos uma dis- do outro que a criança, ainda sem con-
cussão sobre as contribuições de Wallon dições da consciência de si e de efetuar
para a compreensão das emoções de algo por si, que o outro, por sua ação, de-
crianças no contexto da creche, em es- sencadeará a ação dela. Se a emoção tem
pecial a questão do choro. Trata-se de como possibilidade a ativação do outro
um estudo teórico, que se apresenta re- no processo de interação humana, não é
levante porque enquanto não aparece a difícil supor a relevância do tema para o
palavra, é o movimento que traduz a vida cotidiano da creche e das relações nela
psíquica, garantindo a relação da criança estabelecidas. Para Wallon, há diferenças
com o meio. As descargas motoras e, um conceituais entre emoção e afetividade.
pouco mais tarde, os gestos do lactente As emoções, os sentimentos e os desejos
são carregados de significados afetivos são manifestações da vida afetiva. A afeti-
que, nesse princípio, nada mais são que vidade é um conceito mais abrangente no
expressão das necessidades alimentares qual se inserem várias manifestações. As
e do humor. A afetividade manifesta-se emoções são constituídas de característi-
primitivamente no comportamento, nos cas mais específicas que as diferenciam
gestos expressivos da criança. Neste sen- das demais manifestações afetivas. Sendo
tido, a creche pode ser pensada como um uma atividade social, provoca, por exem-
espaço que complementa a educação no plo, algumas alterações orgânicas, como
interior da família. O choro engendra a aceleração dos batimentos cardíacos, al-
característica de variadas interpretações, terações no ritmo da respiração, secura
é um processo integrante do desenvol- na boca, dificuldades na digestão, além de
vimento infantil, é linguagem. A emoção alterações expressivas, como mudança na
torna-se afetividade quando é atraves- expressão facial, na postura e nas gesti-
sada pelo conteúdo e pelas significações culações. Nisso se diferencia o sentimen-
dadas pela cultura (Wallon, 2007). A emo- to, que não obrigatoriamente resulta em

334
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

alterações visíveis. Nesta direção, Wallon são esperadas, os conflitos geralmente


sugere o que se convencionou chamar tornam-se objeto de preocupação de pro-
em sua teoria de a psicogênese da pessoa fessoras e professores, e, na maioria das
completa. Isto significa dar ênfase no de- vezes, são considerados como momentos
senvolvimento de maneira integrada, sem perigosos para as crianças ou para a ati-
a possibilidade de privilegiar um aspecto vidade proposta. O objetivo desse texto
em detrimento do outro, uma vez que se é compreender as situações de conflito a
o desenvolvimento é compreendido de partir do conceito de conflito constitutivo,
maneira dialética, não é possível consi- de Henri Wallon, cujos estudos indicam
derar um único aspecto do ser humano que essas situações podem ser momen-
(Wallon, 2007). Neste sentido, que lugar tos de crescimento e avanço na consti-
ocupa na creche? Existe possibilidade de tuição das crianças como pessoas. Em
sua expressão como linguagem? Como duas pesquisas realizadas com crianças
é considerado e como lidamos com ele? no terceiro ano de vida, em creches pú-
Que concepções ele pode revelar nesse blicas do município de São Paulo (Nasci-
contexto? Lidar com o choro das crianças mento, 1997, 2003), tive a oportunidade
evoca a concepção de infância, educa- de filmar e analisar duas cenas nas quais
ção e aprendizagem que se revelam nas as interações entre as crianças geraram
ações dos profissionais no cotidiano nas conflitos constitutivos. Numa das cenas
creches. Pressupomos, então, que o cho- (C1), entre duas meninas, uma com 25
ro faz parte daquilo que convencionamos meses de idade e outra com 28, o conflito
chamar de rotina e que deve ser proble- foi desencadeado pela posse de um livro;
matizado para além do momento de in- na outra (C2), entre uma menina e um
serção das crianças pequenas nas institui- menino, ela com 26 meses e ele com 30,
ções que as recebem. um conflito verbal revela posições anta-
gônicas entre as duas crianças em relação
Palavras-chave: creche, choro, Wallon a uma história contada pela professora.
A C1 acontece durante uma atividade de
livre escolha das crianças. Desde o início
INTERAÇÃO E CONFLITO: UMA da cena o livro parece não ser um objeto
INTERPRETAÇÃO WALLONIANA PARA O em si, mas a extensão do próprio corpo,
COTIDIANO DAS CRIANÇAS PEQUENAS ou seja, há como que uma aderência ao
Maria Letícia B. P. Nascimento - FEUSP objeto, manifesta no sofrimento causado
letician@usp.br pela sua perda (choro). O conflito expli-
cita dois pontos de vista diferentes, ou
As rotinas das instituições de educação seja, observa-se que há um desejo de um
infantil são marcadas por interações entre lado que difere do desejo do outro lado,
crianças e entre as crianças e os adultos. ambos legítimos. A professora interfere
Entretanto, nessas interações surgem con- verbalmente, a princípio; tenta substituir
flitos, que muitas vezes são considerados o livro por outro; apropria-se do livro para
“mal-vindos”, como se os conflitos não mostrá-lo, ela mesma, às duas meninas.
fizessem parte do próprio processo inte- Em todas as ações, o conflito permanece
rativo. Enquanto situações de interação e sugere a constituição do eu através do

335
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

meu. Na C2, durante uma roda de histó- titutivo dos sujeitos, de suas identidades
ria, a menina repete seu ponto de vista (o por meio da preservação e afirmação do
anjinho sobe na serra) e o menino insis- eu. Estes movimentos de preservação e
te no seu (o anjinho sobe nas nuvens). A afirmação vão ocorrendo na medida em
disputa inclui alteração no tom de voz e que as atividades da criança vão se distin-
culmina com insulto. As posições antagô- guindo. As interações com outras crian-
nicas presentes na disputa verbal revelam ças e com o ambiente se tornam fatores
a afirmação de um eu pelas duas crianças. decisivos em seu desenvolvimento, por-
São dois pontos de vista, que se opõem que os conflitos gerados por meio destas
e se excluem um ao outro. Trata-se de interações que fazem com que o sujeito
um conflito constitutivo22, de acordo com reformule suas atividades e objetivos,
Wallon, ou seja, um conflito com uma caminhando rumo ao novo (Corsi, 2010).
função dinâmica no desenvolvimento. A Considerar o conflito constitutivo signi-
professora busca uma adesão à atividade fica reconhecer os diferentes pontos de
desenvolvida, criando uma atmosfera de vista das crianças em relação a tal objeto
curiosidade em relação ao livro, objeto da ou atividade e estabelecer a importância
roda. Tal atmosfera permite que as crian- da constituição de espaços permanentes
ças expressem suas hipóteses e favorece para reflexão sobre a prática pedagógica,
disputas desse tipo, considerando as ca- onde seja possível trocar idéias sobre as
racterísticas de constituição do eu. A dis- dificuldades enfrentadas e buscar apoio
puta é absorvida pela atividade, que se- para encaminhá-las. De acordo com Gal-
gue seu curso. Nas instituições de educa- vão (2001), “para que os conflitos tenham
ção infantil, os interesses das crianças são efetivamente um valor positivo, deve-
delimitados pela organização dos espaços -se assegurar que sejam compreendidos
e tempos e pelos recursos que são ofere- e bem geridos”, ou seja, “para definir o
cidos (brinquedos, livros, tinta etc), que valor de um conflito, se positivo ou nega-
oferecem maior ou menor possibilidade tivo, dever-se-ia levar em conta a forma
de exploração e uso. Segundo Wallon, a pela qual é gerido e menos o fator que o
partir dos deslocamentos possibilitados desencadeia.” (p.139) Por meio da refle-
pelo andar, “o espaço adquire para ela [a xão permanente, parece possível incor-
criança] uma realidade independente dos porar e integrar as ações das crianças aos
objetos que o povoam. É um campo livre- objetivos propostos, valorizando tanto a
mente aberto à sua atividade [...]” (1979, construção de um eu quanto a constru-
p.79). O movimento vai se integrando ao ção do conhecimento sobre o mundo,
pensamento, o que possibilita à crian- reforçando, assim, a função educativa da
ça prever a seqüência dos atos motores, instituição.
cada vez mais complexos. A ampliação da
dimensão cognitiva do movimento torna Palavras-chave: conflito, educação infantil,
a criança cada vez mais autônoma para Wallon
agir sobre o mundo exterior. O conflito
é compreendido como movimento cons-

22
PEREIRA (1998) realizou um detalhado estudo sobre o tema.

336
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

HENRI WALLON E AS TRILHAS SINUOSAS os valores histórico-culturais das pessoas


DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL que compõem e organizam os mesmos.
Vera Maria Ramos de Vasconcellos - FE/ Nossa compreensão de desenvolvimento
NEIPE/UERJ da criança é de um processo socialmente
vasconcellos.vera@gmail.com construído, de emergência de significados
e aquisição da própria identidade, onde
Temos por objetivo compreender, na as contribuições das outras crianças e dos
perspectiva teórica de Henri Wallon, adultos que com ela convivem, são igual-
como se dá o processo de constituição da mente importantes, assim como o é o
pessoa (a percepção de si e a diferencia- aparecimento de novidades nas intera-
ção eu-outro), num ambiente plural de ções e co-construção entre crianças e en-
adultos e crianças pequenas, de idades tre crianças e adultos familiares. Entende-
próximas, como é a creche. Pretendemos mos que as crianças do grupo estão num
também analisar o papel da imitação e o crítico período de transição, entre infân-
do brinquedo no decorrer da emergência cia e meninice, apontada pelos teóricos
de significado produzido entre crianças da Psicologia da Infância como tempo di-
em que a linguagem verbal ainda não está ferenciado de viver. Para Wallon (1975), a
totalmente estruturada. Buscamos anali- linguagem e a fala inauguram as chama-
sar como elas constróem brincadeiras, das “atividades projetivas”, que consis-
dividem afeto e mútua compreensão, na tem em realizações ‘ideomotoras’, quan-
e pela interação com companheiros, além do imagens mentais são projetadas em
de irem formando sua maneira pessoal de ações e nelas se fundem. Neste trabalho
lidar com as coisas do mundo (Vascon- nos propomos a desvendar o papel da in-
cellos, 2002). Observamos os mecanis- teração, da imitação e da brincadeira na
mos utilizados por crianças pequenas produção de subjetividades de crianças
para construir seu conhecimento e consti- pequenas, sendo vista a creche como um
tuir-se num ser social diferenciado, no in- interessante espaço de variadas e mutá-
terior de um grupo constante de compa- veis interações. Pretendemos compreen-
nheiros de idade próxima e adultos cons- der o que, realmente, pode significar este
tantes, onde múltiplas relações novas po- novo lugar de brincar na vida de cada
dem ocorrer a cada momento. Nosso criança, que até bem pouco tempo estava
olhar se volta para o entrelaçamento dos ocupada em conhecer a constituição do
aspectos emocionais, sociais, lingüísticos próprio corpo, voltando-se agora para o
e cognitivo do desenvolvimento, em 8 novo meio emocional, físico e social que a
(oito) crianças, próximas aos dois anos, rodeia, manipulando e explorando, livre-
antes do total domínio da fala. Interessa- mente, distintos objetos, que podem le-
-nos acompanhar, não só a complexidade vá-la ao domínio e compreensão de um
do desenvolvimento intelectual de cada mundo, diferente daquele em que esteve
criança, mas, sobretudo, o processo de imersa desde o nascimento, tão simbólico
construção de competências práticas para e de representação mental das coisas
lidar com o conhecimento dos outros, das como o doméstico. Na perspectiva wallo-
coisas e de si, em ambientes físicos, so- niana, a constituição do “eu” é, ao mesmo
cialmente estruturados, de acordo com tempo, a construção do “não eu”, percep-

337
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ção do que é próprio e do que é exterior a extenso que a subordine e transforme em


si. Entendemos que cada criança, apesar meio” (Dantas, 2002, p. 113). Surgidas
de ser dependente do grupo social para a nas primeiras análises dos vídeos, quando
construção de seu conhecimento, do pró- nosso olhar era mais flutuante23, depará-
prio grupo e do novo ambiente, tem, si- vamos com cenas que prendiam nossa
multaneamente, a possibilidade de, com atenção e, assim, pudemos observar atra-
suas ações livres, modificar o grupo, o vés delas, a existência e a construção de
ambiente e, até, a proposta original da consistência no relacionamento desse
pesquisa. Sequências de episódios de in- grupo de crianças. Nosso interesse princi-
teração social e brincadeiras foram obser- pal é acompanhar a emergência de signi-
vadas sempre que crianças estavam en- ficados entre crianças, que ainda não fa-
volvidas em atividades que dependiam da lam claramente e que estão conhecendo
participação de um outro companheiro e dominando um novo ambiente, com
(adulto ou criança). Sabemos que simples outras crianças e brinquedos novos. O es-
descrições de sequências interativas não paço analisado foi um brinquedo grande,
são suficientes para explicar os significa- chamado por nós de Trilha sinuosa. A Tri-
dos que estão por trás das ações e das lha sinuosa é um pequeno móvel de um
intenções de crianças, muito menos as metro de comprimento e 30 a 40 cm de
que tem na imitação seu fio condutor altura, cuja superfície inclui um plano ho-
(Nadel & Butterworth, 1999). Em nossos rizontal, um trecho em forma de ∪ (como
estudos, muitas vezes, uma breve descri- um vale) e um plano inclinado até o chão.
ção de episódios anteriores foi necessá- Uma primeira criança, um menino, está
ria, para entendermos o significado de com um brinquedo de roda (um elefante
uma simples cena. As relações das crian- rosa de plástico que é montado sobre
ças sempre foram o centro de nossas aná- quatro rodas), que faz andar sobre a pista
lises (Vasconcellos, 1986, 1996, 2002). sinuosa, deixando-o rolar ora com um
Cenas e episódios foram destacados pelos movimento de ida e volta no trecho em ∪
temas que envolviam, em sequência, mas ora no plano inclinado até o chão. Cena
sem linearidade nos fatos, já que as ativi- 01: Louise está perto da trilha sinuosa e
dades da criança nunca ocorrem com es- olha para Catarina, que lá está também.
sas características. Assim, a análise das Catarina desliza pela trilha, pega uma
interações sociais, em crianças pequenas, bola e joga para o pai de Louise. Ela vai
não devem ser realizadas considerando para a trilha sinuosa, desliza, pega outra
todo o entorno, tudo que acontece no bola e joga para seu pai. Há uma triangu-
contexto afetivo, físico e social, porém, lação na troca de interesses, numa brin-
deve-se dar sempre destaque à dimensão cadeira criada por uma criança e que foi
lúdica (Wallon, 1949/2008). “Na concep- copiada e aceita por outra criança. Cena
ção walloniana, infantil é sinônimo de lú- 02: Gabriel vai brincar na trilha sinuosa,
dico. Toda a atividade da criança é lúdica, … Fernando vai atrás de Gabriel, tenta su-
no sentido de que se exerce por si mes-
ma…. Toda atividade emergente é lúdica,
exerce-se por si mesma antes de poder 23 Em outras pesquisas adotamos a metodologia
da Análise de Conteúdo, por isso nosso “modo flutuante”
integrar-se em um projeto de ação mais de iniciar qualquer análise (Bardin,s/data – original 1977)

338
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

bir pela rampa da trilha, sem conseguir. da no objeto à tomada de consciência (da
Fernando abre a porta do armário em bai- criança) de sua próprias e novas habilida-
xo da pia e guarda um brinquedo lá. Fer- des e próprias forças, seja porque ela faz
nando vai para o escorrega (com ajuda de de seu próprio corpo o campo de tentati-
um adulto) A trilha sinuosa também vas de suas possibilidades. A fim de modi-
atuou como local focal, ponto de encon- ficar as relações, antes estabelecidas com
tro, oportunidade para crianças desenvol- o brinquedo ou com os coleguinhas, a
verem e partilharem suas habilidades mo- criança firma suas novas conquistas, con-
toras mais amplas. Objetos grandes com- testando as formas tradicionalmente utili-
portam-se como veículos para brincadei- zadas (transgressão).
ras envolvendo atividades motoras mais
amplas, tema que tem sido bastante dis- Palavras-chave: Interação de crianças,
cutido na literatura relativa à interação de percepção de si e a diferenciação eu-outro
companheiros. Porém, o tom emocional,
que aparece nas atividades de brincadei-
ras nesses espaços, tem sido menos estu- CO 02-LT01
dado, mas nem por isso são menos im-
portantes, pelo contrário, marcam e defi- Hospitalização Infantil
nem o uso do brinquedo. A dialética
walloniana esclarece a simultaneidade da
saída de um estado atual e o domínio de LT01-697 - A UNIDADE DE TERAPIA
uma tendência futura, que pode ser aqui INTENSIVA NEONATAL COMO
exemplificada: - muitas foram as situa- CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO E DE
ções em que a mesma criança, inicial- PROMOÇÃO DE SAÚDE
mente dependente do apoio seguro do Aline Melo de Aguiar - UERJ
adulto, vai, por tentantivas e erros, adqui- melodeaguiar@gmail.com
rindo a habilidade que antes não possuía, Deise Maria Leal Fernandes Mendes - UERJ
chegando ao domínio total de si e do ob- -deisefmendes@gmail.com
jeto. O ponto do prazer do brincar está na Maria Lucia Seidl de Moura -UERJ
transgressão à norma. Explicação comple- mlseidl@gmail.com
mentar é dada por Wallon (1942/2008); Talita Maria Nunes de Aguiar - UERJ
para ele a criança e as coisas estão, inicial- talita_aguiar@yahoo.com.br
mente, misturadas e a criança deverá, por
esforço próprio, separar-se delas. Ela as A Unidade de Terapia Intensiva Neonatal
deseja ou evita, é atraída ou rejeita, solici- (UTI-Neo) representa um cenário comple-
ta ou reprova e neste exercício dialético xo em que há o contraponto das moder-
de reconhecer-se diferenciando-se, vai nas tecnologias disponíveis e utilizadas a
compreendendo os objetos e as outras serviço do salvamento e manutenção da
crianças não como distintas dela, mas vida de bebês prematuros e com proble-
como complementares à perda de seu mas de saúde, mas, ao mesmo tempo,
ser/ter – não ser/não ter. A Criança per- apresenta todo tipo de problemas e pri-
manece associada às coisas através de vações que esse mesmo ambiente pro-
seus movimentos, seja porque está inseri- move. Esse ambiente marca uma ruptura

339
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no contato tão esperado da mãe com seu de saúde na UTI-Neonatal. O presente


filho. Além disso, torna-se um espaço de trabalho relaciona promoção de saúde
confronto para os pais com seu bebê real; e psicologia do desenvolvimento e suas
geralmente magro, preso a fios, sensores, possibilidades de articulação no ambien-
e por vezes, impossibilitado de ser ama- te da UTI-Neonatal. Inicialmente, temos
mentados e restritos ao leito. Assim, os a própria complexidade da definição dos
pais frequentemente apresentam reações dois campos supracitados que envolve
de estresse, medo e ansiedade diante entendimentos variados, sem uma defini-
dessa separação inicial e na aposta na for- ção única de consenso. Segundo a OMS
ça do bebê e na competência da equipe. (1998), a promoção de saúde é “o estado
O bebê, por outro lado, encontra-se cer- de completo bem-estar físico, mental e
cado de cuidados médicos, nutricionais, social e não apenas a ausência de doença
respiratórios, com seu ambiente ‘contro- ou enfermidade”. Ou seja, apresenta uma
lado’ pela equipe, de modo que chega a visão holística perpassada por vários cam-
nos transparecer um espaço causador de pos: o biológico, o psicológico, o social e
incômodo para a criança, e pouco ade- o cultural. Da mesma forma a psicologia
quado para seu desenvolvimento inicial. do desenvolvimento também contempla
Outros protagonistas nesse cenário, na entendimentos diversos. Assume-se nes-
garantia de manter a vida do bebê fora te trabalho uma abordagem evolucionista
do útero, são os próprios profissionais, a do desenvolvimento, com uma visão inte-
equipe de saúde da UTI-Neo. Estes pro- racionista em que biologia e cultura são
fissionais vivenciam a “missão de salvar” imbricadas de modo indissociável. São
estas crianças e neles são depositadas considerados ainda os vários campos de
altas expectativas, muitas vezes, com ex- análise: o microgenético, o ontogenético,
tenuantes rotinas de trabalho, com vários o filogenético e o histórico-cultural. Uma
plantões e uma carga horária pesada. vez que a concepção de promoção de
Diante deste quadro, torna-se fecundo re- saúde descrita pela OMS não traz em si a
fletir sobre o que seja promoção de saúde idéia de um indivíduo em desenvolvimen-
nesse contexto inicial de desenvolvimen- to, a psicologia do desenvolvimento irá
to humano com todas as peculiaridades integrar a uma visão de promoção de saú-
que possui uma UTI-Neonatal. Acredita- de o conceito de ciclo vital, de forma que
-se que nesse ambiente é possível realizar as estratégias em saúde levem em consi-
melhorias na qualidade de vida em vários deração a idéia de um indivíduo com ne-
níveis desse sistema. Isso pode se dá em cessidades e características peculiares em
relação aos pais, às crianças, à equipe, cada momento. Assim, promoção de saú-
em normas e rotinas institucionais e na de ao longo do ciclo vital, quer dizer que,
elaboração e implementação de políticas ter foco em uma criança, é diferente de tê-
públicas. Além disso, é um campo em que -lo para um adulto, adolescente ou idoso.
ainda é pouco explorada, a relação entre Desse modo, ao voltar o olhar para o pro-
desenvolvimento infantil e promoção de cesso de desenvolvimento de uma crian-
saúde. Assim esse trabalho se propõe a ça prematura é preciso considerar suas
discutir sobre a contribuição da Psicolo- especificidades não apenas relacionadas
gia do Desenvolvimento para a promoção à idade, mas também a seu ambiente. Os

340
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

primeiros momentos da vida do bebê irão focam apenas os comprometimentos, se-


ocorrer neste espaço: a UTI-Neonatal. qüelas e até atrasos no desenvolvimento
Neste ambiente começam a se configurar da criança. É necessário pensar que ela
as relações entre pais e crianças e ainda também possui um potencial de saúde
a questão saúde-adoecimento, esboçada que pode advir da interação. A psicologia
pela relação inicial com a equipe, ou seja, do desenvolvimento ainda contribui com
a UTI-Neo é um contexto inicial de desen- orientações aos pais e à equipe sobre
volvimento, de extrema importância para as competências e características do
o desenvolvimento posterior da criança e bebê prematuro e ainda com avaliações
de sua família. Nesse cenário, a psicologia precoces do desenvolvimento da criança
do desenvolvimento contribui com ações e da interação entre pais e filhos. A UTI-
preventivas e interventivas. Em primeiro -Neo pode se apresentar como um am-
lugar, ela sinaliza que não há uma forma biente de muito potencial, um verdadeiro
linear de desenvolvimento, mas irá rela- celeiro de desenvolvimento físico e rela-
cionar-se com vários aspectos: biológicos, cional de pequenos indivíduos que lutam
culturais, ecológicos, genéticos, econô- pela sobrevivência apesar de sofrerem
micos, sociais e históricos, entendendo determinadas privações. Nesse contex-
que as crianças prematuras não se cons- to, a psicologia do desenvolvimento tem
tituem em uma população homogênea. contribuições transformadoras como
Promover saúde de um bebê prematuro exposto. No entanto, pesquisas e estra-
implica conhecer os fatores específicos da tégias de trabalho ainda necessitam ser
ontogenia daquele indivíduo. As estraté- empreendidas e compartilhadas a fim de
gias de políticas públicas voltadas para a promoverem conhecimentos preciosos
infância (amamentação, método canguru, aos que cuidam, sejam pais ou profissio-
política nacional de humanização) devem nais de saúde e à saúde do bebê dentro
ser interpretadas e implementadas de dessa abordagem interacionista.
acordo com as demandas de cada bebê,
e mais ainda, daqueles internados em Palavras-chave: Psicologia do
UTI-Neo, com tantos aspectos diferentes Desenvolvimento, Promoção de Saúde,
em seu quadro de saúde. Outra contri- Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.
buição da psicologia do desenvolvimento Contato: Talita Maria Nunes de Aguiar.
à área dos cuidados em Neonatologia é Mestranda do Programa de Psicologia Social
a compreensão de um modelo bidirecio- da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
nal sobre a interação mãe-bebê, carac- talita_aguiar@yahoo.com.br
terizado pela ênfase na reciprocidade e
na adaptação mútua entre parceiros. As
interações e trocas se estabelecem entre
parceiros de capacidades distintas e são
por eles atualizadas continuadamente.
Uma visão bastante diversa daquela em
que o bebê é apenas estimulado pelas
ações dos adultos. Essa observação é
um alerta importante, para estudos que

341
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-875 - O PROCESSO DE Nesse contexto, se faz urgente encontrar


HOSPITALIZAÇÃO INFANTIL: estratégias que propiciem uma melhora e
ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO uma humanização no atendimento ao ser
Fernanda Rosalem Caprini - CUVV humano em situação de hospitalização
fernandacaprini@gmail.com (Faquinello, Higarashi & Marcon, 2007).
Claudia Patrocinio Pedroza Canal - CUVV Sendo assim, tendo em vista os impactos
claudia.canal@uvv.br que o processo de hospitalização pode
produzir em pacientes infantis e adoles-
O processo de hospitalização no perío- centes, objetiva-se investigar as estraté-
do da infância pode se configurar como gias de enfrentamento ao processo de
uma experiência conflituosa (Santa Roza, hospitalização utilizadas por crianças e
1997). Tal processo está envolto em um adolescentes internados em um hospital
contexto de tensão e insegurança para infantil da rede pública estadual, localiza-
a criança e seus familiares promovendo do na Grande Vitória – ES. Para tanto, foi
inúmeras situações desagradáveis, exa- escolhido como método a pesquisa des-
mes invasivos e dolorosos, afastamento critiva que será realizada com 20 crianças
do ambiente familiar e de amigos, aban- e adolescentes, de ambos os sexos, com
dono da atividade escolar, mudança do idades entre 4 e 16 anos em situação de
contexto social, dentre outras alterações internação na área pediátrica do hospi-
em seu cotidiano (Lima, Jorge & Moreira tal com diagnósticos variados. Para pos-
2006). Segundo Motta e Enumo (2004), terior análise de dados os participantes
pode se acrescentar a esse quadro a ne- serão divididos em quatro subgrupos, de
cessidade de confiar em pessoas até en- acordo com suas idades, com um total de
tão desconhecidas, ter que permanecer cinco componentes em cada um. Assim,
em um quarto, ser impossibilitada de os participantes serão distribuídos em
brincar, dentre várias outras situações grupos de crianças de 4 a 7 anos, de 8 a
que não estavam presentes na vida da 10 anos, de 11 a 13 e, por fim, de 14 a
criança e que se encontram na hospita- 16 anos. O critério de divisão estabeleci-
lização. Adoecer, portanto, pode implicar do pode ser justificado com base em Di
em sentimentos relacionados a perda de Leo (1987), ao colocar que uma avaliação
controle em relação à doença, atrelado válida de qualquer aspecto do compor-
a perda de controle sobre seu próprio tamento requer que seja considerada a
ambiente (Soares & Zamberlan, 2003) idade do sujeito e seu nível de desenvol-
caracterizando-se ainda como um evento, vimento. Dessa forma, as crianças serão
muitas vezes, imprevisto que leva o indi- subdivididas com base em suas idades
víduo a situações de vulnerabilidades em para que sua posterior avaliação permi-
variados contextos. Essas modificações ta a comparação e análise dos conteú-
do cotidiano da criança podem provocar dos expressos por cada indivíduo dentro
estresse, agitação, depressão, retroces- dos subgrupos. Essa pesquisa atenderá à
sos, gritos, choros, ausência no controle resolução 196 de 1996, do Conselho Na-
dos esfíncteres, dentre outras situações cional de Saúde sobre as normas éticas
prejudiciais à criança e ao seu desenvol- para pesquisa com seres humanos. Tal
vimento (Lima, Jorge & Moreira 2006). trabalho será realizado em um hospital

342
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da rede estadual situado no município leitura projetiva acerca dos desenhos


de Vila Velha. Mais especificamente, a infantis (Corman, L., 1970; Di Leo, J. H.,
pesquisa será realizada na área pediátri- 1987; Hammer, E. F., 1969; Van Kolck, O.
ca do hospital, a qual conta atualmente L., 1984 & Cunha, J. A., 2000). Contudo,
com uma classe hospitalar e 50 leitos dis- busca-se na presente pesquisa, realizar
tribuídos entre 15 enfermarias comuns, uma análise mais objetiva e sistemática
dentre as quais uma é de tratamento dos desenhos coletados. Para posterior
semi-intensivo e mais três enfermarias de análise dos dados empregar-se-á a análi-
isolamento. Como instrumento de coleta se do desenho infantil e das entrevistas
de dados, será utilizada uma única ques- que acompanharem tais desenhos. Para
tão aberta, realizada segundo o estado de tal, as categorias de análise serão criadas
saúde e a disponibilidade dos pacientes a partir dos desenhos e das entrevistas
para participar. Entendendo a variação de coletados. Finalmente, com relação aos
idade dos participantes, propôs-se, para resultados, espera-se obter respostas in-
responder a questão, a utilização da lin- dicativas acerca das possíveis estratégias
guagem não verbal, através do desenho, utilizadas por crianças e adolescentes
atrelado a análise da linguagem verbal para enfrentar o processo de hospitaliza-
oral ou escrita, expressa pela criança, no ção, compreendendo sua relevância cien-
intuito de esclarecer o que está sendo de- tífica referente à área da saúde infantil e
senhado. Entendendo ainda que muitos do adolescente.
dos participantes encontram-se em ida-
de pré-escolar ou ainda que enfrentem o Palavras-chave: estratégias de
processo de afastamento escolar, optou- enfrentamento, desenho infantil,
-se por formular uma questão simples e hospitalização infantil.
de fácil compreensão por parte de todos Contato: Fernanda Rosalem Caprini, Centro
os participantes. Para tanto, formulou-se Universitário Vila Velha,
a questão: Faça um desenho dando uma fernandacaprini@gmail.com
dica a um colega que também esteja em
um hospital para que ele possa viver bem
aqui. Posteriormente ao desenho, será LT01-1334 - EXPECTATIVAS DE CRIANÇAS
feita uma investigação sobre o mesmo HOSPITALIZADAS EM RELAÇÃO AO
por meio de perguntas que visem explo- RETORNO PARA A ESCOLA
rar o conteúdo expresso e levar o pacien- Isabelle Maria Bourguignon da Proência -
te a justificar o motivo de ter realizado UVV
aquele desenho. Com relação ao proce- isabellembp@yahoo.com.br
dimento da pesquisa, as entrevistas serão Claudia Patrocinio Pedroza Canal - UVV
desenvolvidas durante os atendimentos claudia.canal@uvv.br
individuais realizados nos leitos das en-
fermarias e na classe hospitalar, segundo De acordo com Nobrega, Collet, Gomes,
os critérios descritos anteriormente, ob- Holanda e Araújo (2010) a doença na in-
tendo duração variada. No que se refere fância geralmente traz consigo algumas
à análise, observa-se que grande parte particularidades. É possível que sejam
do referencial teórico aponta para uma enfrentados problemas como longos pe-

343
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ríodos de hospitalização, reinternações ser implementadas por ele e renunciará a


frequentes e interrupção das atividades outros objetivos ou ações que não lhe in-
diárias, situações essas que, entre outros centivem, porque sabe que não os pode-
prejuízos, ocasionam o afastamento da rá executar. Com crenças de autoeficácia
criança do convívio escolar por pouco ou positivas, o esforço será feito desde o iní-
por muito tempo. De acordo com Ortiz e cio e ao longo de todo o processo, de ma-
Freitas (2002), ao ser prescrita a alta hos- neira persistente, mesmo que aconteçam
pitalar, aciona-se a confirmação do sonho dificuldades. Desta forma, objetiva-se
de cura. Porém, em meio a sensação de analisar as opiniões de pacientes, inter-
bem-estar e alívio, surge a necessidade nados no setor de pediatria de um hospi-
de enfrentamento da vida fora do hospi- tal público da rede de saúde estadual do
tal. Entre questões sobre o retorno a vida Espírito Santo, sobre o afastamento esco-
cotidiana, está o regresso da criança ao lar e verificar as expectativas e motivação
ambiente escolar. Pode-se notar que a dos mesmos em relação ao retorno para
criança, ao retornar à escola, está sujei- este contexto. O hospital recebe crianças
ta a enfrentar dificuldades que vão além e adolescentes de 0 a 17 anos da região
das apresentadas pelo seu quadro clínico, metropolitana e interior desse e de ou-
podendo ser de ordem física, sociointera- tros estados, possui 25 leitos de Unidade
tiva e burocrática. Desta forma, torna-se de Tratamento Infantil Neonatal (Utin) e
indispensável, entre outros quesitos, sua tornou-se centro de referência no aten-
própria motivação para lidar com tais si- dimento materno-infantil do Estado. Na
tuações. As crenças de autoeficácia estão pediatria há 50 leitos distribuídos entre
entre os fatores que compõem os me- 18 enfermarias, sendo 1 delas para trata-
canismos psicológicos de motivação do mento semi-intensivo e 3 isolamentos. Os
aluno. De acordo com Bandura, as cren- pacientes da pediatria contam também
ças de autoeficácia são “julgamentos das com os atendimentos da Classe Hospita-
pessoas em suas próprias capacidades lar e do Serviço Social. Para realização da
para organizar e executar cursos de ação coleta de dados, será utilizado um roteiro
necessários para alcançar certo grau de de entrevista de caráter qualitativo, que,
desempenho” (1986, citado por Pajares e segundo Godoy (1995), fornece dados
Olaz, 2008, p. 101). Na área escolar, essas descritivos a respeito dos pensamentos,
crenças de autoeficácia são convicções sentimentos e comportamentos das pes-
pessoais que a criança tem quanto a dar soas pelo contato direto da pesquisadora
conta de uma determinada tarefa e com com os sujeitos, procurando compreen-
certo grau de qualidade determinada. Se- der os fenômenos pesquisados segundo
gundo Bzuneck (2002), um aluno motiva- a perspectiva dos mesmos. Com as per-
-se a envolver-se nas atividades de apren- guntas do roteiro objetiva-se realizar um
dizagem caso acredite que, com seus levantamento do tempo de afastamento
conhecimentos e habilidades, poderá ad- escolar de cada sujeito, o gosto que têm
quirir novos conhecimentos, dominar um por sua escola, seu interesse em voltar a
conteúdo e aprimorar suas habilidades. estudar, seu relacionamento com colegas
Assim, esse aluno escolherá atividades e e professores, suas crenças em relação ao
estratégias que, segundo supõe, poderão retorno escolar e ao seu desempenho e

344
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

verificar comportamentos como iniciati- didos em três subgrupos de acordo com a


va e persistência e outros que já foram faixa etária, sendo eles: 6 a 9 anos, 10 a
apresentados e poderá apresentar. Parti- 13 anos e 14 a 17 anos. Essas faixas foram
ciparão da pesquisa 21 crianças e adoles- divididas considerando características de
centes em idade escolar, de acordo com desenvolvimento próprias de cada um
o prescrito pela Lei de Diretrizes e Bases desses períodos. A partir do conteúdo
da Educação Nacional (Brasil, 1996), com das entrevistas, será realizada uma aná-
idade entre 6 e 17 anos, que frequentam lise qualitativa do conteúdo das mesmas,
a escola e que estejam internados há, no por meio da criação de um sistema de ca-
mínimo, uma semana. O roteiro contém tegorias que possibilitem uma interpreta-
10 questões a serem respondidas pelos ção dos dados. Para a análise dos dados
21 participantes, uma única vez e de for- será adotada uma abordagem fenomeno-
ma voluntária. Todos deverão ter sua par- lógica, que, de acordo com Lopes e Souza
ticipação na pesquisa autorizada por seus (1997), consiste em compreender o ser
responsáveis, após assinatura de termo humano em seu existir, como um ser que
de consentimento livre e esclarecido, possui uma vivência de consciência única
atendendo a resolução 196 de 1996, do e singular. Para que isso aconteça, a pes-
Conselho Nacional de Saúde, que versa quisadora adotará uma postura de aber-
sobre pesquisa com seres humanos. An- tura para perceber a vivência da criança
tes de cada entrevista será apresentada a partir dela mesma, se abstendo de seus
uma figura com o desenho de uma es- julgamentos e procurando entendê-la da
cola como instrumento de aproximação forma como ela se mostra no momen-
dos sujeitos ao tema das questões a se- to. Com os resultados dessa pesquisa,
rem respondidas, de forma que seja fa- espera-se obter respostas que auxiliem
cilitada a simbolização do que será dito. na compreensão dos comportamentos
Cada visita ao hospital será dividida em apresentados pelos pacientes no contex-
dois momentos. O primeiro refere-se a to apresentado e oferecer embasamento
uma apresentação da estagiária, sempre empírico para novas ações, tanto no am-
necessária já que a rotatividade semanal biente onde se realizará a pesquisa como
dos pacientes é muito alta, seguida de um em outras instituições.
momento livre, no qual os pacientes es-
colherão sobre o que querem conversar Palavras-chave: criança hospitalizada,
e qual brinquedo querem usar. As opções afastamento do convívio escolar, motivação
de brinquedos disponíveis são: quebra- do aluno.
-cabeça, jogo da memória, UNO, dominó,
jogo de dama, carrinhos, bonecas, além
de desenhos para colorir. No segundo
momento, será realizada a entrevista que
visa à coleta de informações sobre as opi-
niões dos mesmos a respeito do afasta-
mento escolar e suas crenças em relação
ao retorno para este convívio. Para análi-
se dos dados, os participantes serão divi-

345
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-1427 - AVALIAÇÃO DA ATENÇÃO foram recrutadas no Ambulatório da


SELETIVA E SUSTENTADA EM CRIANÇAS Criança de Risco da Universidade Fede-
NASCIDAS PREMATURAS E COM BAIXO ral de Minas Gerais (ACRIAR/UFMG). Sua
PESO idade gestacional média foi de 31 se-
Alexandre Ferreira Campos - UFMG; manas e seu peso ao nascimento variou
alexfercam@ig.com.br entre 790g e 1.950g (M = 1.395g ± DP=
Suzan Caroline Such - UFMG; 275g). Os dois grupos não diferiram em
suzancarolinesuch@yahoo.com.br relação à idade cronológica, ao gênero
Vanessa Maria de Almeida - UFMG; e ao nível socioeconômico. Os partici-
vanessapsi22@gmail.com pantes foram submetidos às tarefas de
Leandro Fernandes Malloy-Diniz - UFMG; atenção seletiva e de atenção sustentada
malloy.diniz@gmail.com do Teste de Atenção Visual – 3ª Revisão
Cláudia Cardoso-Martins - UFMG; (TAVIS-3; Coutinho, Mattos, Araujo, &
cardosomartins.c@gmail.com Duchesne, 2007). Tendo em vista que a
distribuição dos escores não foi normal,
Introdução e Objetivo: Há evidência de o teste não-paramétrico Mann-Whitney
que crianças nascidas prematuras e com foi utilizado para avaliar a significância
baixo peso apresentam uma prevalên- estatística das diferenças encontradas
cia relativamente elevada de Transtorno entre os grupos nas medidas do TAVIS-3,
do Déficit de Atenção/Hiperatividade a saber: Tempo Médio de Reação, Erros
(TDA/H) (Aylward, 2005; Böhm, Smed- por Omissão e Erros por Ação. Resulta-
ler & Forssberg, 2004; Shum, Neulinger, dos: De modo geral, as crianças nascidas
O'Callaghan & Mohay, 2008). A maioria prematuras apresentaram um desempe-
dessas pesquisas foi realizada quando nho inferior ao das crianças nascidas a
as crianças já estavam em séries mais termo em todas as medidas do TAVIS-3,
avançadas do ensino fundamental. No sendo a diferença estatisticamente signi-
presente estudo, avaliamos se os deficits ficativa para o número de erros por ação
de atenção presentes entre crianças pre- na tarefa de atenção seletiva (p = .016) e
maturas são observados desde o início para o tempo médio de reação na tarefa
dos anos escolares. Metodologia: Par- de atenção sustentada (p = .004). Discus-
ticiparam do estudo 37 crianças prema- são: Os resultados sugerem que crianças
turas, nascidas com até 34 semanas de prematuras apresentam uma prevalência
gestação e peso inferior a 2.000g (grupo maior de deficits de atenção desde o iní-
dos prematuros), e 28 crianças nascidas cio dos anos escolares. Estudos longitu-
a termo e sem intercorrências neonatais dinais são necessários para determinar o
(grupo controle). Em ambos os grupos, impacto dessas dificuldades no desem-
as crianças tinham, em média, 6 anos de penho acadêmico posterior dessas crian-
idade e estavam matriculadas em classes ças. Ressalta-se ainda, a importância de
do 1º. ano do ensino fundamental de es- programas de seguimento de crianças
colas públicas da região metropolitana nascidas prematuras, com a perspectiva
de Belo Horizonte/MG. Apenas crianças de detectar possíveis dificuldades que
com QI igual ou superior a 85 participa- poderão interferir na aprendizagem e no
ram do estudo. As crianças prematuras comportamento desta população.

346
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: prematuridade; baixo peso Cunha, 2003). Aplicando a teoria da EAM


ao nascer; atenção. ao contexto hospitalar, o mediador (M)
Contato: Alexandre Ferreira Campos; (neste caso, um psicólogo, responsável
Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG; pela condução do grupo de mães) se situa
alexfercam@ig.com.br). entre o indivíduo mediado (a mãe) e os
estímulos desse novo universo (o bebê PT-
-BP, a hospitalização, a equipe de saúde e a
LT06-921 - ANÁLISE DA MEDIAÇÃO EM UTIN), de modo a selecioná-los, mudá-los,
INTERVENÇÃO GRUPAL PARA MÃES DE ampliá-los ou reinterpretá-los, por meio
BEBÊS PREMATUROS E COM BAIXO PESO de estratégias interativas. Para que uma
INTERNADOS EM UTIN experiência seja considerada como EAM
Fabiana Pinheiro Ramos - UFES e a mediação promova mudança em ní-
ramosfabiana@bol.com.br vel do desenvolvimento, faz-se necessário
Schwanny Roberta Costa Rambalducci Mofati que ela atenda a três critérios principais:
Vicente - UFES (a) Intencionalidade e Reciprocidade, que
schwanny.vicente@gmail.com ocorre quando M chama a atenção para
Maria Luiza Guidoni Macedo - UFES um estímulo a fim de alcançar a recipro-
maluguima@hotmail.com cidade do mediado; (b) Significação, que
Kely Maria Pereira de Paula - UFES diz respeito à atitude de M em enfatizar a
kelympp@terra.com.br importância dos estímulos por meio da ex-
Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES pressão de afeto, pela indicação de valor e
soniaenumo@terra.com.br significado dos estímulos; e (c) Transcen-
Financiameno: CNPq/MCT e CAPES/MEC dência, que diz respeito à atitude de M em
conduzir o indivíduo para além de contex-
A aprendizagem das condutas necessárias tos e necessidades mais imediatas, favo-
ao cuidado e à estimulação de bebês em recendo a generalização da aprendizagem
situação de risco ao desenvolvimento, (Lidz, 1991). Adotando os princípios da
como os prematuros e com baixo peso EAM, neste trabalho, objetivou-se avaliar
(PT-BP), internados em Unidade de Tera- o padrão de interação de um mediador
pia Intensiva Neonatal (UTIN), pode ser em situação de intervenção em grupo, di-
facilitada se as mães forem mediadas nes- rigida a mães de bebês PT-BP internados
se processo, de modo a refletir sobre suas na UTIN de um hospital público da Região
práticas nesse contexto, ampliando seu Metropolitana da Grande Vitória, ES. Par-
repertório para lidar com essa situação e ticiparam 35 mães, divididas em sete gru-
com o cuidado e a estimulação do bebê pos, com dois dias de intervenção para
(Linhares, Martins & Klein, 2004; Melnyk, cada grupo, totalizando 14 sessões, nas
Feinstein & Fairbanks, 2006; Melnyk et al., quais a atuação do mediador foi avaliada
2006). Esse contexto pode se caracterizar por três observadores independentes (A,
como uma experiência de aprendizagem B e C, estudantes de Psicologia treinados),
mediada (EAM), na qual a atuação de utilizando-se, para isso, uma tradução
um mediador filtra, interpreta e elabora adaptada do Guidelines for Observing Te-
diferentes estímulos, em um processo in- aching Interactions (GOTI) (Lidz, 2002). O
terativo organismo-ambiente (Fonseca & instrumento é composto por 23 itens que

347
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

avaliam o perfil de mediação, sendo que, no item 5 (“M faz uso de voz, gestos e mo-
para cada afirmação sobre o comporta- vimentos para vivenciar a apresentação
mento do mediador, o juiz deve marcar: dos conteúdos da sessão”) M obteve, na
nível 4, se o comportamento de M ocorrer sessão 1: NM= 3,95 e na sessão 2: NM= 4;
sempre; nível 3, se ocorrer muitas vezes; e no item 6 (“M especificamente aponta
nível 2, se ocorrer poucas vezes; ou nível características extras e elementos dos ma-
1, nunca, caso não ocorra na sessão. As- teriais e conteúdos que são importantes
sim, quanto maior a nota dada pelo juiz, de serem notados”) M obteve, na sessão
melhor o perfil de mediação nos critérios 1: NM= 3,71 e na sessão 2: NM= 3,66. O
avaliados. Foram analisados, neste traba- critério de mediação Transcendência teve
lho, oito dos 23 itens do GOTI, relaciona- IC = 61% (variação: 43%-81%), sendo ava-
dos aos três principais critérios citados da liado, no item 7 do GOTI (“M promove
EAM. O desempenho do mediador foi ana- pensamentos que associam o conteúdo
lisado separadamente por sessão, pois, a da sessão com experiências anteriores”),
intervenção era diferenciada em cada dia. na sessão 1: NM= 3,55; na sessão 2: NM=
Efetuou-se o cálculo das médias das notas 3,71; e no item 8 (“M promove pensamen-
atribuídas pelos três juízes aos níveis de tos que associam o conteúdo da sessão
mediação (NM), bem como do índice de com experiências futuras”) M obteve, na
concordância médio (IC) entre os pares de sessão 1: NM= 3,6; na sessão 2: NM= 3,61.
juízes (AB, BC e AC), para cada um dos três Para os oito itens avaliados, M obteve mé-
critérios da EAM, adotando-se IC ≥70% dia acima de 3 (ocorreu muitas vezes), com
(Fagundes, 1999). O critério de mediação menor IC no critério Transcendência, su-
Intencionalidade e Reciprocidade teve IC = gerindo possíveis problemas na definição
79% (variação: 43%-100%), sendo avalia- do comportamento a ser observado ou no
do em três itens do GOTI: no item 1 (“M treinamento dos observadores. Por ser a
produz uma mensagem clara aos partici- primeira adaptação do instrumento para
pantes do grupo, com objetivo de engajá- esse contexto, consideram-se necessárias
-los nas atividades da sessão”), M obteve, novas revisões para seu aprimoramento.
em ambas as sessões, NM= 4; no item 2 A adequação dos itens com menor IC po-
(“M consegue, com sucesso, manter a derá ser feita, posteriormente, baseada
atenção dos participantes ao longo da ses- em trabalhos que utilizaram a EAM em
são”) M obteve, na sessão 1: NM= 3,85; na outros conjuntos de mães (Cunha, Enumo
sessão 2: NM= 3,71; e no item 3 (“Quando & Canal, 2006), professores (Faria, Mara-
os participantes perdem a atenção, M pro- nhão & Cunha, 2008; Vectore, Alvarenga
cura meios eficazes de fazê-los retomar a & Gomide Jr., 2006) e terapeutas (Cunha
concentração nas atividades do grupo”) & Guidoreni, 2009). No geral, o estilo de
M obteve, na sessão 1: NM= 3,70; na ses- atuação do mediador mostrou-se coeren-
são 2: NM= 3,33. O critério de mediação te com os princípios da EAM e o uso da
Significação teve IC = 78% (variação: 52%- escala GOTI, adaptada para o contexto de
100%) registrando-se, no item 4 do GOTI UTIN, mostrou-se viável, fornecendo feed-
(“M produz suporte apropriado, visível e back à atuação do psicólogo na condução
concreto para o alcance dos objetivos da de grupos de mães. A realização desses
sessão”), em ambas as sessões: NM= 3,90; grupos, com base em uma adequada me-

348
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

diação no período em que a mãe acom- Para alcançar esse objetivo torna-se fun-
panha a internação do seu bebê, pode se damental que o professor crie recursos,
constituir como um fator de proteção ao estratégias pedagógicas que considerem
desenvolvimento desses bebês em situa- as diferentes possibilidades de aprendiza-
ção de risco ao desenvolvimento. gem, que solicitem a construção de refle-
xões, posicionamentos críticos, bem como
Palavras-chave: mediação, grupo de mães, a construção de conhecimentos. Torna-se
riscos ao desenvolvimento infantil necessário, então, a consideração da cria-
Contato: Schwanny Roberta Costa tividade no trabalho pedagógico, compre-
Rambalducci Mofati Vicente, UFES, endida não como um fenômeno ou “dom
schwanny.vicente@gmail.com divino”, mas segundo abordagem teórica
de Mitjáns Martínez (2009a, 2008, 2004),
como um processo complexo da subjetivi-
CO 08 - LT01 dade humana, na qual participam proces-
sos e elementos diversos, tanto da subje-
Criatividade tividade individual, como da subjetividade
social. Fundamentando essa definição da
criatividade está a Teoria da Subjetividade
LT01-1055 – A CRIATIVIDADE NO na perspectiva Histórica-Cultural de Gon-
TRABALHO PEDAGÓGICO E O zález Rey. Esta proposta teórica acerca da
DESENVOLVIMENTO DA SUBJETIVIDADE criatividade, do ponto de vista da pesqui-
DO PROFESSOR sadora, integra dois aspectos centrais, os
Tatiana Santos Arruda - SEEDF e FE/UnB quais justificam sua escolha para a reali-
arruda.tatiana@gmail.com zação da pesquisa que tem como tema a
Albertina Mitjáns Martínez - FE/UnB criatividade no trabalho pedagógico e o
desenvolvimento da subjetividade do pro-
No contexto contemporâneo a diversida- fessor, que são a consideração do sujeito
de social e cultural marcam o contexto e da subjetividade social nos processos
escolar e as relações construídas nesse criativos. Rompe com as dicotomias pre-
espaço. Solicitam, cada vez mais, investi- sentes em diversas concepções de criati-
mentos na construção de estratégias pe- vidade que ora a definem como processo
dagógicas capazes de oportunizarem situ- individual, ora como processo social. Há
ações educativas que viabilizem a aprendi- a consideração do sujeito, compreendi-
zagem e desenvolvimento dos educandos. do como o indivíduo concreto, portador
As prerrogativas legais quanto à finalidade de personalidade e caracterizado por sua
da educação, expressas na Lei de Diretri- condição de ser atual, interativo, inten-
zes e Bases da Educação Nacional – Lei cional, emocional e consciente (González
8.384/1996, legitimam a necessidade Rey, 1995). É esse sujeito que atua, faz
de tais investimentos, ao afirmar no Art. escolhas, constrói representações da rea-
2º que a educação “tem por finalidade lidade e vivencia diferentes emoções em
o pleno desenvolvimento do educando, seus processos de interação nos contex-
seu preparo para o exercício da cidada- tos dos quais participa, segundo Mitjáns
nia e sua qualificação para o trabalho”. Martínez (2000). É ele que em sua função

349
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de professor faz as seleções educativas, entanto, Mitjáns Martínez (2008) desta-


organiza o trabalho pedagógico e o realiza ca que é preciso analisar o seu impacto
no cotidiano de sua sala de aula e de sua para a aprendizagem e desenvolvimento
instituição. Nesse processo de escolhas das crianças. Observa-se, então, que os
pedagógicas, participa a subjetividade critérios para consideração da criatividade
social, definida por González Rey (2003) no trabalho pedagógico são relativos,
como o processo de produção e organi- têm relação com a situação educativa e
zação de significados e sentidos subje- o contexto social em que são produzidos.
tivos que caracterizam o espaço social. A expressão da criatividade no trabalho
Constitui-se nos diferentes meios sociais, pedagógico, assim, torna-se possível no
representando processos simbólicos e “interjogo de configurações subjetivas
emocionais que integram diferentes níveis constituídas no sujeito no percurso de sua
de organização da sociedade. No contexto história de vida individual, da sua própria
escolar, a subjetividade social relaciona-se condição de sujeito e das configurações
com os elementos de sentidos proceden- da subjetividade social (...)” (Mitjáns Mar-
tes de outros espaços sociais (González tínez, 2008, p. 75-76). Da citação de Mi-
Rey, 2003). Para Mitjáns Martínez (2008) tjáns Martínez (2008) chama a atenção a
envolve, ainda, o clima emocional, as for- participação da subjetividade individual
mas de relação, as crenças e valores em do professor na criatividade do trabalho
relação ao ensinar, ao aprender, ao tra- pedagógico. Esta, conforme definição de
balho pedagógico e ao aluno, o significa- González Rey (2003), se configura por
do dado à criatividade e outros aspectos. meio de momentos da subjetividade so-
Participam da subjetividade social da ins- cial, das relações pessoais que o sujeito
tituição educativa elementos de sentidos estabelece dentro de uma cultura, carac-
advindos de outros espaços sociais, ele- terizando-se por seu caráter histórico, sin-
mentos que caracterizam esse cenário em gular e irrepetível. É, além disso, dialógica,
momentos históricos antecedentes. E que complexa, dialética, organiza-se por meio
se perpetuam e se modificam nas relações e concomitante às subjetividades sociais.
que estabelecem entre si (González Rey, Nessa direção, a subjetividade individual
2003). É essa subjetividade social, mais representa para o autor processos e for-
a condição de sujeito, e as configurações mas de organização subjetiva dos sujeitos,
da subjetividade individual que na qual se expressa a história única de
participam da expressão da criatividade cada um deles. De maneira que passa por
no trabalho pedagógico. Nesta pesquisa, diversos contextos sociais de subjetivação,
a criatividade entendida a partir de dois se constitui dentro deles, mas atua simul-
critérios: a novidade e o valor. Isto é, taneamente como elemento diferencia-
como a produção de algo novo e, ao dor no desenvolvimento da subjetividade
mesmo tempo, considerado como valio- social. Considerando, assim, as relações
so para o processo de aprendizagem e entre a subjetividade individual e a subje-
desenvolvimento das crianças (Mitjáns tividade social, os estudos em andamento
Martínez, 2008). Nessa perspectiva, a no curso de doutorado procuram compre-
produção de novidades inclui as situações ender os impactos da criatividade no tra-
em que o “novo” dá-se para o sujeito. No balho pedagógico para o desenvolvimento

350
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da subjetividade do professor. Parte-se do vimento constatada por Feldman (1999)


princípio que as produções novas e com se expressa claramente no conjunto de
valor para a aprendizagem dos educandos pesquisas desenvolvidas na área da criati-
também podem ter repercussões para vidade. Ao empreender uma intensiva re-
o desenvolvimento do professor, solici- visão da produção científica nesse campo
tando-lhe posicionamentos, mediações, em bases de dados nacionais e internacio-
intervenções não planejadas. Com isso, nais, constatamos que as questões rela-
o verdadeiro critério definidor da criativi- tivas ao desenvolvimento da criatividade
dade que está sendo considerado não é o não têm sido um objeto frequente no
valor conferido por outros, nem o produ- debate que acontece no centro da comu-
to. Mais que isso, a criatividade definida nidade científica. Autores como Moran e
como o “processo de novidade, de mu- John-Steiner (2003) destacam que é preci-
dança, assim como sua significação para o so considerar que a criatividade não surge
funcionamento integral da subjetividade” repentinamente na fase adulta e, por isso,
(Mitjáns Martínez, 2009b, p. 35). Trata-se, pesquisar o seu desenvolvimento pode
portanto, de um estudo que foca o desen- ser frutífero para avançar na compreensão
volvimento da subjetividade e suas rela- dos elementos subjetivos que dinamizam
ções com o contexto de atuação docente, e favorecem a emergência desse proces-
que no trabalho pedagógico criativo, gera so. Não obstante, para Simonton (2006,
condições para o desenvolvimento do pro- p. 492), os trabalhos identificados nessa
fessor no que se refere a sua condição de linha de pesquisa estão voltados basica-
sujeito e de configurações subjetivas. mente para “as circunstâncias familiares
e experiências educacionais na infância e
Palavras-chave: criatividade, adolescência que contribuem para o cres-
desenvolvimento, professor. cimento criativo”, mas não abordam o de-
Contato: Tatiana Santos Arruda, professora senvolvimento dos processos subjetivos
da Secretaria de Estado de Educação do que animam esse processo e que estão
Distrito Federal e doutoranda em Educação na vinculados a tais condições contextuais.
Universidade de Brasília. O interesse pelo tema da constituição da
E-mail: arruda.tatiana@gmail.com aprendizagem criativa se insere no debate
atual sobre a importância da formação de
indivíduos em uma sociedade que está em
LT01-1242 – A RELAÇÃO ENTRE O constante transformação. A possibilidade
DESENVOLVIMENTO DA SUBJETIVIDADE de personalizar a informação e torná-la
E A CONSTITUIÇÃO DA APRENDIZAGEM própria é uma condição necessária para o
CRIATIVA ingresso em um mercado de trabalho que
Ana Luiza Snoeck N. do Amaral - UNB está ávido por profissionais criativos que
amaral.analu@gmail.com não apenas executem tarefas, mas consi-
Albertina Mitjáns Martínez - UNB gam criar, inovar, buscar novas soluções.
amitjans@terra.com.br As constatações supramencionadas mo-
bilizaram a nossa pesquisa de Doutorado
A dificuldade de diálogo entre os campos (Amaral, 2011) que teve como objetivo ge-
científicos da Criatividade e do Desenvol- ral compreender a constituição da apren-

351
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dizagem criativa considerando os proces- cendo para que o aluno posicione-se como
sos de desenvolvimento da subjetividade sujeito autor da própria aprendizagem,
individual, tendo em vista os contextos para que ele não seja passivo nesse pro-
de atuação e inter-relação do indivíduo. cesso e fique apenas repetindo, copiando,
Para contemplar tal objetivo frente a um transcrevendo informações, mas que ele
objeto de estudo tão complexo e pluri- possa se implicar efetiva e afetivamente
determinado, optamos pela perspectiva no processo de aprendizagem. O segun-
histórico-cultural do desenvolvimento da do aspecto nuclear para a constituição
subjetividade proposta por González Rey da aprendizagem criativa foi o desenvol-
(1995, 1999, 2008) e pela compreensão vimento de determinadas configurações
da criatividade como processo da subjeti- subjetivas, dentre elas, a aprendizagem,
vidade de Mitjáns Martínez (2005, 2006a, a leitura, a escrita, a autovalorização e o
2008). Desenvolvemos um percurso me- outro como ensinante. Compreendemos
todológico qualitativo em sintonia com a que tais configurações se constituíram em
Epistemologia Qualitativa (González Rey, função da articulação de uma rede que
2002, 2005) e realizamos três estudos de envolvia: a ação do indivíduo, sentidos
caso utilizando instrumentos como entre- subjetivos sociais, e um conjunto de sen-
vista, redação e análise documental. Além tidos subjetivos individuais que ganharam
desses, construímos novos instrumentos: estabilidade e se constituíram numa tra-
Construção da Linha de Vida Escolar, Baú ma simbólico-emocional favorecedora da
de Lembranças, Fotos e Frases e Túnel do aprendizagem criativa. O terceiro aspecto
Tempo para favorecer aos participantes diz respeito à produção de sentidos sub-
não apenas resgatar lembranças, mas, jetivos situacionais no espaço da aprendi-
principalmente, recordar emoções com o zagem escolar. Concordamos com Mitjáns
objetivo de alcançar as sutilezas do desen- Martínez (2006b) quando ela afirma que a
volvimento subjetivo. A análise integrativa constituição da aprendizagem criativa não
que desenvolvemos dos casos nos permi- diz respeito exclusivamente aos sentidos
tiu fundamentar a tese de que a constitui- subjetivos já constituídos que compõem
ção da aprendizagem criativa está vincula- as configurações subjetivas, mas está atre-
da a quatro aspectos nucleares. Primeiro lada também aos sentidos subjetivos que
o desenvolvimento da condição de sujeito o aluno produz no momento da aprendi-
que ocorre mediante vivências de auto- zagem. Identificamos na pesquisa um im-
nomia, momentos de enfrentamento, a portante sentido subjetivo produzido pe-
conquista paulatina da autoconfiança, o los participantes: a realização pessoal. Em
desenvolvimento da capacidade reflexiva, nossa compreensão tal sentido subjetivo
e o próprio exercício da condição de su- relacionava-se com uma satisfação pró-
jeito. No entanto, concluímos que apenas pria vinculada a uma expressão persona-
o desenvolvimento da condição de sujei- lizada no processo de aprendizagem. Per-
to não é suficiente para a constituição da cebemos que para eles a aprendizagem
aprendizagem criativa. Defendemos a im- não estava somente a serviço do outro,
portância primordial de que essa condição do professor, não era um processo vazio,
psicológica se desenvolva e se expresse no direcionado exclusivamente para o reco-
domínio da aprendizagem escolar favore- nhecimento e aprovação social. Eles im-

352
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

plicavam-se na aprendizagem em função um dos obstáculos para a promoção desse


de uma demanda interna engendrada por importante processo da subjetividade hu-
sentidos subjetivos gerados nesse proces- mana. Ao evidenciar nesta pesquisa como
so. O quarto aspecto é o desenvolvimento se desenvolvem os elementos subjetivos
da imaginação criativa. Do nosso ponto constitutivos da aprendizagem criativa,
de vista, o exercício subjetivo de “olhar geramos conhecimentos que podem favo-
para dentro”, favorecido pela imaginação recer a compreensão do papel da escola
criativa foi fundamental para o processo e da família, entre outros espaços sociais,
de constituição da aprendizagem criati- nesse processo.
va. Percebemos que os participantes di-
vidiam a sua atenção: eles se voltavam Palavras-chave: Desenvolvimento.
para o mundo e para eles mesmos cons- Subjetividade. Aprendizagem Criativa
tantemente. Ou seja, eles se ligavam e se
desligavam do contexto, voltando-se para
o que sentiam e pensavam sobre o que LT01-1428 – CRIATIVIDADE E
estavam vivenciando. Compreendemos INTELIGÊNCIA EM ALUNOS
que esse vai e vem é necessário à apren- SUPERDOTADOS: USO DO TESTE DE
dizagem criativa, pois é exatamente esse PENSAMENTO CRIATIVO – PRODUÇÃO
balanço criativo entre o aprendiz e o mun- DE DESENHOS (TCT-DP)
do que favorece para que ele aprenda da Angela M. Rodrigues Virgolim - UnB
nova experiência e avance no seu desen- angela.virgolim@gmail.com
volvimento. Se o aprendiz não inclui suas
imagens e ideias e fica preso nas informa- Um dos grandes desafios que o Brasil ain-
ções transmitidas, as suas ações, muito da enfrenta nos dias atuais é o de prepa-
provavelmente, serão automatizadas e rí- rar professores para trabalhar na educa-
gidas o que dificulta a personalização das ção de alunos superdotados e talentosos,
informações recebidas, condição primei- o que inclui o desenvolvimento de uma
ra de uma aprendizagem criativa. Enfim, concepção coerente de superdotação e
concluímos que a constituição da aprendi- um entendimento efetivo das necessi-
zagem criativa, acontece numa processu- dades acadêmicas, sociais e emocionais
alidade de ordem essencialmente relacio- destes alunos. Clássicas discussões no
nal. Indubitavelmente, nos reconhecemos campo dizem respeito à conceituação da
autor quando nos diferenciamos do outro superdotação, principalmente quando se
e, simultaneamente, nos reconhecemos salientam conceitos como inteligência,
na nossa singularidade. É nesse encontro talento e criatividade. Contudo, como
intersubjetivo que nossos pensamentos inteligência e criatividade não têm uma
e sentimentos ganham contorno, nossas definição única e global, os profissionais
ideias geram impacto, nossa imaginação da área pontuam a necessidade de uma
se materializa, nossas emoções afloram e definição operacional da superdotação e
a nossa autoria nasce. O desconhecimento do talento para tornar possível a aplicabi-
dos professores e pais sobre o que é cria- lidade destes conceitos em sala de aula.
tividade e como ela pode ser desenvolvi- Teorias modernas da superdotação in-
da tem sido apontado na literatura como cluem a criatividade como essencial para

353
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

o desenvolvimento de altas habilidades. todos quantitativos e qualitativos foram


Renzulli e Reis (1997), na Teoria dos Três também utilizados para determinar como
Anéis, concebem os comportamentos de um grupo de alunos altamente criativos
superdotação como compreendendo a e/ou inteligentes (n=22) e seus professo-
interlocução entre habilidades superio- res da sala de recursos (n=15) percebiam
res, envolvimento com a tarefa e criati- a criatividade e a inteligência. Estudos
vidade. Sternberg (2003) desenvolveu de casos múltiplos foram utilizados para
o modelo denominado WICS - Wisdom, coletar dados sobre os alunos e seus pro-
Intelligence, Creativity, Synthesized, se- fessores. Informações obtidas sobre as
gundo o qual a sabedoria, a inteligência habilidades dos alunos, seus interesses,
e a criatividade são fatores sine qua non estilos de aprendizagem, autoconceito e
para os futuros líderes talentosos do futu- características comportamentais foram
ro. Gardner (1999), nas Teorias Múltiplas categorizadas e codificadas em padrões
da Inteligência,define a inteligência como e temas. A análise correlacional indicou
um conjunto de habilidades que permi- uma relação significativa entre os resulta-
tem ao indivíduo resolver problemas ou dos dos alunos nos testes de criatividade
modelar produtos como conseqüência de e inteligência (r=.21), com uma significân-
um ambiente ou cultura particular. Em- cia prática pequena. Os alunos percebiam
bora várias concepções de inteligência e suas habilidades criativas de forma favo-
criatividade tenham sido propostas por rável, o que também foi corroborado por
pesquisadores e educadores nas últimas seus professores. Alunos e professores
décadas, poucas pesquisas foram realiza- consideraram criatividade, inteligência e
das no sentido de investigar as habilida- superdotação como construtos relacio-
des criativas de estudantes brasileiros, de nados. Inteligência foi definida por am-
examinar em que medida a inteligência bos como raciocínio e conhecimento; os
e a criatividade estariam relacionadas professores acrescentaram ainda em suas
e explorar a concepção de alunos e pro- definições o pensamento criativo. Criativi-
fessores sobre estes dois construtos. Par- dade foi definida tanto pelos alunos quan-
tindo desta necessidade, um estudo foi to pelos professores como habilidade de
realizado para investigar a relação entre pensamento divergente, assinalando
os resultados de testes em criatividade e também o papel do conhecimento na so-
inteligência de um grupo de 100 alunos lução de problemas. O presente trabalho
com idades entre 9 e 17 anos, de 4ª a 8ª visa discutir os resultados desta investiga-
séries, que participavam de um programa ção, ressaltando o uso do Teste de Pensa-
de enriquecimento para alunos superdo- mento Criativo – Produção de Desenhos –
tados e talentosos no Distrito Federal (Vir- TCT-DP, de Urban e Jellen (1996), que nos
golim, 2005). A correlação de Pearson foi últimos anos tem sido um dos testes mais
utilizada para determinar a magnitude e utilizados na Europa para acessar a cria-
o grau da relação entre os resultados dos tividade. Percebendo a criatividade como
alunos no teste Matrizes Progressivas de um construto holístico e gestáltico, o teste
Raven – STM, Forma Geral – e no Teste de utiliza 14 elementos figurativos para ava-
Pensamento Criativo – Produção de De- liar dimensões cognitivas e de personali-
senhos – TCT-DP, de Urban e Jellen. Mé- dade, como disposição para correr riscos

354
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e desafiar limites, humor, afetividade e escolar? A partir dessas inquietações, a


pensamento não-convencional e não-es- presente pesquisa busca compreender a
tereotipado. Diferentemente dos testes constituição da aprendizagem criativa em
tradicionais de criatividade, que medem museus e seu vinculo com o desenvolvi-
apenas quantitativamente um sub-fator mento. Ao compreender a criatividade
do pensamento divergente, como a flu- como um processo complexo da subjeti-
ência de idéias, o TCT-DP tenta, também, vidade humana, que resulta entre outros
reconhecer e valorar características qua- importantes elementos da produção de
litativas de execuções criativas. Por ser sentidos subjetivos configurados no de-
um teste não verbal, o TCT-DP tem a van- correr da trajetória de vida do sujeito, a
tagem de ser culturalmente justo, sem a pesquisa busca mediações entre as áreas
dependência de fatores de escolarização de aprendizagens em museus e de Cria-
formal. O uso da modalidade de desenho tividade, sob a perspectiva da Teoria da
deve garantir o mais elevado grau de im- Subjetividade, de González Rey (González
parcialidade cultural, o que normalmente Rey, 1997, 2003, 2004, 2005) e da concep-
não é garantido por testes verbais de cria- ção de criatividade elaborada por Mitjáns
tividade. Além disso, é de fácil aplicação Martínez (2002, 2001, 2004, 2006, 2009).
e avaliação; pode ser administrado em Percebidos como instituições de educa-
uma atmosfera amigável e relaxante; e, ção não-formal, museus ocupam cres-
por isso mesmo, é indicado para acessar centemente um espaço privilegiado de
de forma global o pensamento criativo de reflexão e diálogo sobre nosso patrimônio
crianças e adolescentes. natural e cultural. Nesse sentido, museus
estão umbilicalmente ligados à formação
Palavras-chave: superdotação, criatividade, e ao desenvolvimento de cidadãos aptos
TCT-DP à reflexão-crítica e criativa sobre seu con-
texto sociocultural e histórico-cultural,
em complementariedade com outros
LT04-1195 – A CONSTITUIÇÃO DA contextos da educação formal e informal.
APRENDIZAGEM CRIATIVA NA A aprendizagem em museus caracteriza-
APRENDIZAGEM EM MUSEUS E SUA -se por peculiaridades próprias ao con-
RELAÇÃO COM O DESENVOLVIMENTO texto museal marcado pela relação entre
Pilar de Almeida - FE/UnB o visitante, os objetos museológicos e o
pilar_almeida@hotmail.com contexto físico (expositivo) estruturado.
Albertina Mitjáns Martínez - FE/UnB Elementos comumente relacionados à
amitjans@terra.com.br aprendizagem em museus consistem no
voluntarismo, na não-sequencialidade da
Como compreender a aprendizagem em visita, na autonomia de escolha e ritmo
museus para além do contexto da visita do visitante, na multisensorialidade, na
ao museu em si? Como compreender o ludicidade, no apelo à emocionalidade,
impacto dessa aprendizagem em outros entre outros. Pesquisas em educação em
contextos da vida do indivíduo e em com- museus têm tradicionalmente focado a
plementariedade com outras aprendiza- experiência museal no contexto expositi-
gens como, por exemplo, a aprendizagem vo, evidenciando as relações estabeleci-

355
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

das entre o visitante e os objetos (Mene- perspectiva histórico-cultural, conforme


ses, 2000), a comunicação expositiva e os proposta por González Rey. A Teoria da
visitantes (Hooper-Grenhill, 1999), as in- Subjetividade assume uma abordagem
terações sociais geradas entre grupos de histórico-cultural da psique humana, to-
visitantes entre si, entre visitantes e mo- mando o sujeito como constante produ-
nitores (Falk e Dierking, 1992; Marandino, tor de sentidos subjetivos e configurações
2006; Sapiras, 2007; Gaspar, 1993). Não subjetivas resultantes da interação entre
obstante, é percebida a necessidade de configurações subjetivas prévias, asso-
pesquisas mais horizontais que compre- ciadas a sua trajetória de vida singular, e
endam a experiência museal em conexão configurações subjetivas relacionadas à
com a vida integral dos sujeitos (Bizerra e vivência do momento presente. Segundo
Marandino, 2009). Ou seja, pesquisas que o pensamento de González Rey, a consti-
dêem conta de avaliar o impacto da ex- tuição subjetiva do sujeito que aprende é
periência museal, considerando sujeitos elemento essencial do processo de apren-
constituídos em contextos anteriores e dizagem, na medida em que ela define o
posteriores ao contexto museal em si. A sentido que esse processo tem para o su-
educação em museus tem por finalidade jeito dentro da condição singular em que
o desenvolvimento de cidadãos aptos à se encontra inserido em sua trajetória de
reflexão-crítica e criativa sobre as temáti- vida (González Rey 2006). Dessa forma, ao
cas abordadas no museu, apropriando-se considerar a condição subjetiva do sujeito
do museu para uma aprendizagem autô- em seu processo de aprendizagem, temos
noma e em complementariedade com ou- acesso a emoções geradas em diferentes
tros contextos da educação formal e infor- espaços de sua vida social que aparecem
mal. Não obstante essa finalidade expres- em sua vivência no museu e que consti-
sa sobre o desenvolvimento de cidadãos tuem momentos de sentido subjetivo do
críticos e criativos, cabe a pergunta: como sujeito dentro desse espaço. Este acesso
se constitui um cidadão crítico e criativo a é essencial na compreensão das emo-
partir de sua experiência museal? Sob que ções produzidas na aprendizagem e na
formas essa criatividade se expressa? De aprendizagem criativa. Toma-se a apren-
forma a abordar essas questões, a pesqui- dizagem criativa, a partir da perspectiva
sa buscará compreender os processos de de Mitjans Martínez (2006), como uma
emergência do sujeito na sua experiência aprendizagem realizada por um sujeito,
museal. Quais configurações e sentidos emocionalmente implicado, produtor de
subjetivos esse sujeito produz no decor- sentidos subjetivos e mobilizador de con-
rer da experiência? Como essas configura- figurações subjetivas que de forma recur-
ções impactam sua aprendizagem? Como siva incentivam uma aprendizagem ativa,
acontece o desenvolvimento dos recursos crítica e criativa. A partir desse arcabouço
subjetivos que favorecem a aprendiza- teórico, a pesquisa tem por objetivos fa-
gem criativa nesses espaços? Para com- zer uma análise da aprendizagem criativa
preender os processos de subjetivação em museus, diferenciando-a e correlacio-
do sujeito com relação a sua experiência nando-a com a aprendizagem escolar; e
museal, a pesquisa se utiliza do arcabou- analisar o impacto da aprendizagem cria-
ço teórico da Teoria da Subjetividade, na tiva em museus no desenvolvimento do

356
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

indivíduo. A primeira etapa desta pesqui- homem está destinado a educar-se. Não
sa consistirá uma ampla pesquisa e aná- há saída. É no palco histórico-cultural que
lise bibliográfica nas áreas de educação os processos de aprendizagem e desen-
e aprendizagem em museus, e de criati- volvimento vão executar uma dança dia-
vidade. Em etapas posteriores, a pesqui- lética, promovendo o desenvolvimento
sa buscará, a partir de uma abordagem do sujeito e dotando-o de atributos típi-
metodológica construtivo-interpretativa, cos da condição humana. Também neste
baseada na epistemologia qualitativa de cenário sociocultural surge a escola como
González Rey (1997, 2002, 2005b) definir espaço privilegiado de desenvolvimento e
um grupo de profissionais em museus e aprendizagem e, consequentemente, pro-
analisar seus processos de constituição e moção do potencial criativo. O fenôme-
desenvolvimento de configurações sub- no criativo também será compreendido
jetivas que favoreceram a emergência de como originário na história do comporta-
suas condições de sujeitos de aprendiza- mento do homem, com destaque para as
gem em espaços museais. instâncias sociais e culturais que definem
os processos de subjetivação humana,
Palavras-chave: educação em museus, teoria sempre circunscritos ao tempo histórico e
da subjetividade, criatividade e aprendizagem seus respectivos contextos. Promover um
criativa diálogo sistemático, sistêmico, dialético e
profundo entre criatividade e cultura não
só é necessário como fundamental para o
LT04-1212 – CRIATIVIDADE E entendimento do fenômeno criativo, em
CULTURA: CONSIDERAÇÕES SOBRE especial na primeira infância. Dentre as
OS FATORES SOCIOCULTURAIS NO etapas de vida do sujeito, a primeira in-
DESENVOLVIMENTO DA CRIATIVIDADE fância revela-se um momento privilegia-
Mônica Souza Neves-Pereira - IP/UnB do para o fomento da criatividade e a es-
monicasouzaneves@yahoo.com.br cola destaca-se como cenário central das
Jonathas Nogueira da Rocha - IP/UnB interações entre as crianças, seus pares,
jonathasnr@gmail.com professores e educadores. O ambiente
escolar reveste-se de múltiplas caracterís-
As abordagens sociogenéticas do de- ticas da maior relevância para o pesquisa-
senvolvimento buscam compreender os dor interessado em investigar criatividade
processos de construção da natureza hu- como uma função psicológica humana.
mana partindo do pressuposto central de Ali estão presentes interações e relações
que a gênese das estruturas psicológicas definidoras de rotas desenvolvimentais,
do homem situa-se na dimensão histó- além dos ricos e imprevisíveis processos
rica, social e cultural onde os sujeitos se de mediação que canalizam as mensa-
inserem. A biologia, por si só, não é sufi- gens culturais, orientando processos de
ciente para definir um estatuto de huma- subjetivação. Na escola observamos a
nidade. Para alcançar as potencialidades criança construindo a si mesma, em toda
específicas da espécie homo sapiens, o a complexidade que este processo en-
ser humano necessita pertencer a grupos cerra. Porém, somente por meio de uma
sociais, precisa apropriar-se da cultura. O leitura complexa e abrangente é possível

357
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

enxergar a emergência deste fenômeno de suas características básicas. O domínio


multifacetado - a criatividade - com seus sócio-histórico-cultural passa a ser o palco
elementos que, desafiados ao diálogo, de onde surge a criatividade, a partir da
podem revelar muito. O ser humano, em interação entre o sujeito e o meio, propor-
sua trajetória histórica, sempre tentou cionada pelas linhas do desenvolvimento
explicar os acontecimentos e fenômenos e da aprendizagem. Vygotsky assume cria-
tanto internos quanto externos à sua na- tividade como função psicológica supe-
tureza. Explicar e compreender o fenô- rior, construída nas interações entre ho-
meno criativo não poderia fugir à regra. mem e cultura, mediada por mensagens
As primeiras tentativas de entendimento sociais, mas com características próprias.
desse processo surgiram com a psicologia O homem nasce dotado de potencial para
e algumas de suas ramificações teóricas o desenvolvimento de seus processos psi-
como a Psicanálise, a Gestalt e a linha hu- cológicos, mas isso só acontecerá median-
manista. Os pensadores destas correntes te sua inserção no domínio cultural. Pos-
teóricas formularam propostas que en- suirmos um potencial não significa o de-
fatizavam o sujeito humano como fonte senvolvimento do mesmo. Nascemos com
geradora do processo criativo. O ato de um cérebro dotado de inúmeras compe-
criar passou a ser concebido como ação tências, construímos processos orgânicos
de um sujeito dotado de atributos dife- que serão indispensáveis para nosso de-
renciados, influenciado por um contexto senvolvimento futuro, mas essa herança
sociocultural, mas, essencialmente, de- não garante a constituição de uma dimen-
terminado pelas qualidades e traços pró- são “humana”. Sem modelos culturais e
prios a esse sujeito. O ato criativo poderia processos de aprendizagem mediados por
ser definido como ação individual gera- outras pessoas não conseguiríamos nos
dora de produtos e influenciado por um desenvolver e construir novas estratégias
contexto coletivo. As relações entre cria- de sobrevivência. Articulando as noções
tividade e cultura, nesta perspectiva, não de desenvolvimento, cultura e criativida-
são interdependentes, apenas influentes. de, podemos sintetizá-las numa ideia que
Essa abordagem gerou um pressuposto retrata a posição vygotskiana: o proces-
implícito que vinculou o potencial criati- so de desenvolvimento da criatividade é
vo a “certo” determinismo biológico. Tal construído no contexto cultural ao qual
concepção vai ser discutida por Vygotsky pertence o sujeito agente do ato criativo.
e seus colaboradores quando assumem Sua expressão criativa individual reflete a
que as funções mentais superiores do influência do coletivo, é obra do grupo, da
homem, onde se inclui a criatividade, são dimensão social, onde ele, como agente,
oriundas de um dado contexto cultural e apenas exteriorizou o desejo, necessidade
determinadas por uma instância histórica. ou pensamento oriundo e emergente da
As relações entre criatividade e cultura cultura. Sendo assim, a tessitura de con-
passam, assim, a ter uma feição diferente. siderações acerca das relações entre cria-
Os dois conceitos tornam-se diretamente tividade e cultura atravessa os elementos
vinculados, o segundo passando a ter um socioculturais que canalizam mensagens
papel fundamental na geração do primei- o tempo inteiro, construindo uma teia de
ro e contribuindo para a determinação significados onde o sujeito se “humaniza”,

358
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

internalizando suas relações com o mundo à moralidade: regras morais, virtudes,


para um sistema semiótico intrapsíquico. convenções sociais e noção de justiça. A
É neste mesmo cenário que se desenvolve maioria dos estudos, porém, não conside-
sua criatividade, com possibilidade de re- ra as experiências dos sujeitos investiga-
finamento de seu potencial para imaginar, dos nos contextos socioculturais em que
inovar e transformar esta mesma cultura vivem e se desenvolvem. Sendo assim,
que o originou. Compreender como es- é necessário ampliar as pesquisas sobre
tes fatores atuam, de que modo exercem o tema do desenvolvimento moral estu-
suas ações de mediação no desenvolvi- dando as concepções e crenças morais de
mento da criatividade e como mobilizam pessoas, no caso específico, das crianças,
sujeitos nesta dança dialética representa levando em conta sua inserção histórico-
ponto fundamental para o entendimento -cultural. É importante investigar como as
do processo de tornar-se criativo em um crianças analisam e re-significam suas pró-
contexto sociocultural específico. prias experiências nos diferentes contex-
tos socioculturais e, especificamente, no
Palavras-chave: criatividade, cultura, contexto escolar. Como as crianças anali-
desenvolvimento. sam, avaliam e re-significam experiências
que podem ser significativas para seu de-
senvolvimento moral? Quais as concep-
CO 19 - LT03 ções e crenças morais em formação que
orientam suas análises e re-significações?
Justiça Quais valores morais podem estar em
processo de construção através das inte-
rações com colegas e adultos? Estudar e
LT03-784 – A QUESTÃO DA MORALIDADE
compreender essas concepções e crenças
NA NARRATIVA DE CRIANÇAS DO
pode ser fundamental para construir mé-
ENSINO FUNDAMENTAL
todos educativos que, de fato, levem em
Alia Barrios - UnB conta o processo muitas vezes oculto da
Angela Branco - UnB canalização cultural de crenças e valores,
Financiamento: CAPES/CNPq e o papel ativo das crianças na sua pró-
pria educação e desenvolvimento moral.
A pesquisa sobre o desenvolvimento mo- A complexidade do fenômeno exige a
ral vem se tornando cada vez mais rele- adoção de uma perspectiva que enfatize
vante nos dias atuais. Numerosos estudos a interdependência das dimensões psi-
abrangem o tema da moralidade e do de- cológicas da cognição, do afeto e da ação
senvolvimento moral por vários ângulos intencional na re-significação do conjunto
e diferentes perspectivas, havendo, en- de crenças e valores morais, que orientam
tretanto, uma prevalência da abordagem a ação do sujeito no contexto de suas rela-
construtivista. Algumas pesquisas se cen- ções. Além disso, exige o estudo do tema
tram no estudo do papel que a educação no contexto das práticas socioculturais e a
tem no desenvolvimento moral, outras no partir das narrativas das próprias crianças.
estudo das concepções que as crianças Assim, o presente estudo tem como fun-
têm sobre questões e conceitos relativos damentação teórico-metodológica a pers-

359
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pectiva sociocultural construtivista, e seu das pelas crianças destacam-se o diálogo


objetivo principal consiste em identificar e a compensação, no caso da ocorrência
as concepções e crenças morais apresen- de danos materiais e pessoais. Nos casos
tadas por crianças, entre nove e dez anos em que a situação de conflito não seja
de idade, de uma instituição pública de resolvida pelas crianças envolvidas, faz-
Ensino Fundamental no Distrito Federal. -se necessária a intervenção do professor,
Neste trabalho analisamos as significa- no sentido de estabelecer sanções, assim
ções e re-significações das experiências como regras e normas que orientem a
pessoais das crianças em sua relação com ação e regulem a interação. Entretanto,
as pessoas, que podem ser consideradas as intervenções do professor em deter-
significativas para o seu desenvolvimento minadas situações foram avaliadas pelas
moral. Foram realizadas sessões estrutu- crianças como negativas, uma vez que são
radas pelo professor da turma e pela pró- injustas e não levam em conta as neces-
pria pesquisadora tendo em vista levar as sidades e habilidades sócio-morais das
crianças a discutir estas questões. Reali- crianças. Para a maioria das crianças, mui-
zou-se uma análise microgenética das fa- tas regras e normas do contexto educati-
las e interações filmadas dessas sessões. vo são injustas e estão pautadas na falta
Selecionamos para apresentação e dis- de diálogo. As avaliações realizadas pelos
cussão a sessão de grupo focal realizada participantes do grupo focal apontam a
sob a coordenação da pesquisadora, com importância da intervenção do educador
a participação de dez crianças, sendo qua- nas situações que envolvem questões
tro meninos e seis meninas. Nessa sessão de moralidade em uma posição de me-
de grupo focal, as crianças avaliaram e diador, no sentido de ajudar as crianças
discutiram dilemas morais hipotéticos e a partir de sua experiência e, ao mesmo
reais que são característicos do contexto tempo, deixar o espaço para que elas se
escolar, assim como avaliaram suas expe- responsabilizem por seus conflitos e in-
riências educativas voltadas para o esta- terações sociais, exercendo a autonomia
belecimento e internalização das normas e a criatividade. Com o presente estudo,
que regulam suas interações na escola. pretendemos compreender e apontar
Para a maioria das crianças, a moralidade aspectos que consideramos fundamen-
envolve o respeito e o cuidado na rela- tais para construir métodos educativos
ção com o outro, assim como o respeito que, de fato, privilegiem o papel ativo das
às normas e regras voltadas para o esta- crianças no seu desenvolvimento moral,
belecimento e manutenção de relações entendido como aspecto fundamental do
simétricas e justas. De acordo com elas, desenvolvimento integral do ser humano.
os conflitos interpessoais que envolvem
questões morais devem ser resolvidos pe- Palavras-chave: Desenvolvimento
las próprias crianças que se encontram na Moral, Ensino Fundamental, Perspectiva
situação de conflito, através de diferentes Sociocultural Construtivista, Análise
estratégias de negociação que procurem Microgenética.
minimizar a situação de oposição, assim Contato: Alia Barrios, Universidade de
como o restabelecimento do vinculo in- Brasília, aliabarrios@gmail.com
terpessoal. Entre as estratégias aponta-

360
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-763 – O QUE PENSAM AS CRIANÇAS a ingratidão é um fenômeno comum na


SOBRE A INCAPACIDADE DE RETRIBUIR? infância. A criança nasce sem a capacida-
Gabriela Ballardin Geara - UFRGS, de de reconhecer os benefícios recebidos,
geara.g@hotmail.com tais como o carinho, a atenção e até mes-
Fernanda Palhares - UFRGS, mo a alimentação. Este reconhecimen-
ferzinha.palhares@gmail.com to vai sendo construído ao longo de seu
Lia Beatriz de Lucca Freitas - UFRGS, desenvolvimento e organiza-se a partir
lblf@ufrgs.br da troca de experiências e vivências que
ocorrem em um primeiro momento no
Financiamento: CNPq
âmbito familiar, e depois se estendem
para a sua relação com os pares. Neste pe-
Na maioria das culturas, a gratidão é con- ríodo a criança pode, de acordo com seu
siderada uma virtude, um aspecto dese- aprendizado, desenvolver ou não a cons-
jável da personalidade humana e da vida ciência da importância de se retribuir uma
em sociedade; a ingratidão, ao contrário, ajuda prévia. Apesar de que a ingratidão
é considerada um vício, uma falha moral. possa levar à exclusão social e seja con-
Estudos recentes no campo da psicologia siderada, em diversas culturas, um vício,
indicam que a gratidão pode estar relacio- encontram-se ainda relativamente poucos
nada com melhor qualidade de vida, além estudos sobre a ingratidão na infância. No
de favorecer as relações sociais, contri- entanto, alguns resultados de pesquisa e
buindo com a manutenção da vida social. observações cotidianas indicam que as
Por exemplo, pessoas gratas tendem a crianças e os adultos não julgam o ingra-
ser mais felizes e ter menos estresse (Mc- to da mesma maneira. Assim, realizou-se
Cullough, Tsang, & Emmons, 2004; Wa- um estudo cujo objetivo foi investigar o
tkins, Woodward, Stone, & Kolts, 2003). juízo moral de crianças de 5 a 12 anos so-
Em contrapartida, a ingratidão pode levar bre uma das formas de ingratidão - a não
à exclusão social: o indivíduo ingrato sofre retribuição a um benfeitor prévio (McCon-
desprezo por parte de seus benfeitores e nell, 1993; Suls et al., 1981) - a partir da
de seu grupo social, além de experimentar abordagem construtivista sobre o desen-
toda uma gama de sentimentos negativos volvimento moral. Examinaram-se duas
como ressentimento, hostilidade e indife- questões: (a) o juízo das crianças sobre
rença. Segundo Comte-Sponville (2007), a a ação do ingrato e (b) as suas justificati-
ingratidão é a incapacidade de retribuir. A vas. Entrevistaram-se, individualmente,
pessoa ingrata não retribui o favor e, além 77 crianças (49% meninas) de três grupos
disto, não compartilha com seu benfeitor etários (5-6, 8-9 e 11-12 anos). Contou-se
a satisfação recebida. Segundo McConnell às crianças uma história, na qual um adul-
(1993), há várias maneiras de ser ingrato: to (benfeitor) ajuda uma criança (benefici-
(a) não retribuir um benefício a um ben- ário); posteriormente, o adulto pede um
feitor prévio; (b) não reconhecer a sua favor à criança, mas ela nega-se a ajudá-
ajuda; (c) não retribuir adequadamente -lo. Em um primeiro momento, buscou-se
ou (d) retribuir por razões moralmente certificar-se de que as crianças haviam
reprováveis. Segundo alguns autores (Ber- compreendido a história. Em um segun-
gler, 1945; François, 1953; Freud, 1953), do momento, teve início uma entrevista

361
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

baseada no método clínico, conforme os ou mais; (c) a necessidade de ajuda ao


passos sugeridos por Delval (2002), com benfeitor prévio foi mencionada principal-
a finalidade de proceder à investigação mente pelas crianças de 11-12 anos. Este
das questões levantadas. As entrevistas estudo constitui uma contribuição impor-
foram gravadas e posteriormente transcri- tante para a psicologia moral, examinan-
tas para análise. Verificou-se que todos os do o juízo moral de crianças no domínio
participantes reprovaram a ação do bene- aretaico da moralidade (Lourenço, 2000)
ficiário ingrato, isto é, a não-retribuição. – relacionado aos conceitos de louvável e
Todavia, as crianças justificaram essa re- reprovável – o mesmo também deve ser
provação de maneiras diferentes. Cons- considerado em propostas de educação
tituíram-se quatro categorias de análise moral que visem ao pleno desenvolvimen-
para as justificativas: (a) Consequência da to do ser humano.
ação do ingrato para o benfeitor, na qual
o foco foram as consequências negativas Palavras-chave: juízo moral; ingratidão;
da não-retribuição para o benfeitor prévio crianças
(por exemplo, ele ficaria triste); (b) Custo Contato: Gabriela Ballardin Geara, UFRGS,
da ação para o benfeitor, referente àque- geara.g@hotmail.com
las justificativas que se centraram em um
contraponto entre o prejuízo material do
benfeitor e a ausência de prejuízos mate- LT03-778 – UM ESTUDO DO PERDÃO
riais da retribuição do favor para o bene- INTERPESSOAL EM ADOLESCENTES E
ficiário; (c) Consequência negativa para o JOVENS ADULTOS
beneficiário, a qual enfocou o juízo alheio Renan Pires Maia - UFPB
negativo que a não-retribuição acarreta renanpmaia@gmail.com
(por exemplo, mal-educado, preguiçoso, Júlio Rique Neto - UFPB
etc.) ou o fato de que, provavelmente, o julioriqueneto@gmail.com
beneficiário que não-retribui não recebe-
rá ajuda futura e (d) Ajuda ao benfeitor, Este é um estudo sobre o perdão inter-
na qual foram enfocadas a generosidade pessoal a teoria de Enright (Enright & The
da ação do benfeitor e a necessidade de Human Development Study Group, 1991).
retribuição como uma forma de expressar Os objetivos foram: (1) verificar se existem
gratidão. Três juízes participaram da codi- diferenças entre adolescentes e jovens
ficação dos dados, sendo que cada justi- adultos no tocante ao grau do perdão ofe-
ficativa foi lida por, pelo menos, dois juí- recido aos ofensores após uma injustiça
zes; em caso de diferenças, realizou-se um específica; (2) verificar se existem diferen-
acordo interjuízes. Os resultados indicam ças no padrão de respostas as subescalas
que a maneira como as crianças justificam de afeto, comportamento e julgamento
o seu juízo moral sobre a ingratidão mo- da escala do Perdão - EFI (Enright & Rique
difica-se com a idade: (a) as justificativas 2000) e (3) verificar se existem diferenças
que enfocaram apenas as consequências na frequência de respostas aos itens da
para o benfeitor diminuíram com a idade; EFI por idades. Participaram deste estudo
(b) o custo da ação para o benfeitor apa- 82 jovens, homens e mulheres, divididos
receu somente entre as crianças de 8 anos em dois grupos de idade: 14 a 16 anos (M

362
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

= 15, DP = ,51) e 22 a 24 anos (M = 23, amostras independentes por agentes da


DP = ,76). Foram utilizados: a escala do mágoa mostraram que os adolescentes
Perdão EFI que é composta por uma Folha favoreceram os familiares diferenciando-
de Rosto onde o participante é solicitado -os dos amigos (t = 3,72, df = 34, p < ,05)
a lembrar uma situação na qual ele(a) foi e dos outros ou estranhos (t = 2,93, df =
magoado injustamente e responder em 15, p < ,01). Não foram encontradas di-
uma escala de 5 pontos a intensidade da ferenças significativas no grau do perdão
mágoa (1 = Nenhuma e 5 = Tremenda- no grupo de jovens adultos entre agentes
mente) e o agente da mágoa (família, ami- da mágoa. Verificou-se através de testes-t
gos ou outros). Em seguida, o responden- para amostras emparelhadas comparando
te é solicitado a pensar sobre seus afetos, as médias das subescalas EFI em todas as
comportamentos e julgamentos a respei- combinações que os jovens perdoaram
to do ofensor(a) no presente e responder mais pelos julgamentos do que pelos afe-
um inventário de 60 itens divididos em tos, independente da idade. A média da
três subescalas com 20 itens cada, sen- subescala de comportamentos foi sempre
do 10 positivos e 10 negativos para cada intermediária as médias das subescalas de
categoria. O escore total da EFI é a soma afetos e julgamentos. Uma comparação de
dos escores das subescalas e varia de 60 frequências de concordância com os itens
a 360 pontos. Foi utilizado também o Item da EFI por grupos de idade, através do tes-
do Perdão que é uma medida do grau pelo te de Mann-Whitney, mostrou diferenças
qual o respondente perdoou a pessoa que significativas em seis itens. Por um lado,
o magoou em uma escala de 5 pontos (1 = verificou-se que 63% dos adolescentes
Não perdoa; 5 = Perdoa completamente). concordaram com a ausência de ressen-
Este item é uma última questão na EFI e timento (item 10) para o perdão vs. 39%
serve como medida de validade externa. dos jovens adultos; 83% dos adolescentes
Por último, foi usado um Questionário Só- concordaram com a ausência de desa-
cio-Demográfico com informações sobre provação do outro (item 55) vs. 59% dos
sexo e idade dos participantes. A adminis- jovens adultos e 93% dos adolescentes
tração das escalas foi feita em sala de aula, concordaram com a ausência de condena-
os participantes receberam orientações ção do outro (item 58) vs. 78% dos jovens
verbais e assinaram o TCLE atendendo adultos. Por outro lado, 88% dos adoles-
as normas da resolução 196/96 para pes- centes concordaram com sentir nojo pelo
quisas com seres humanos. Os resultados outro (item 20) vs. 50% dos jovens adultos;
de correlação de Pearson com a amostra 88% dos jovens adultos concordaram em
total entre a intensidade da mágoa, a EFI negligenciar o outro (item 24) do outro vs.
e o Item do Perdão mostraram uma cor- 73% dos adolescentes; e 90% dos jovens
relação positiva e significativa (r = ,293) adultos concordaram que devemos espe-
entre a EFI e o Item do Perdão (p < ,001) rar que o outro tivesse êxitos na vida (item
e uma correlação negativa e significativa 59) vs. 78% dos jovens adolescentes. Estes
(r = -,261) entre Item do Perdão e a inten- resultados corroboraram em diversos as-
sidade da mágoa (p < ,004). Com relação pectos resultados obtidos anteriormente
ao grau do perdão dentro do grupo de 14 sobre o perdão interpessoal (ex., Rique &
a 16 anos, os resultados de testes-t para Camino, 2010, Rique, Camino, Enright &

363
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Queiroz, 2007). O grau do perdão se man- LT03-781 – UM ESTUDO DA VERIFICAÇÃO


tém negativamente relacionado com a in- DA QUALIDADE DO JULGAMENTO
tensidade da mágoa através dos diversos MORAL DE UNIVERSITÁRIOS NOS ANOS
estudos; a idade e o contexto do agente DE 1996 E 2011
da mágoa (ou qualidade da relação entre Pollyana de Lucena Moreira - UFPB
vitimas e ofensores) influenciam o perdão pollyanadelucena@yahoo.com.br
com familiares e amigos recebendo maior Cleonice Pereira dos Santos Camino - UFPB
grau de perdão do que estranhos, porém, cleocamino@yahoo.com.br
note-se que neste estudo os jovens adul- Júlio Rique Neto - UFPB
tos não diferenciaram os agentes de má- julio.rique@uol.com.br
goas com relação ao perdão. As análises
com a EFI também corroboraram que as Este é um estudo em Psicologia Moral na
pessoas perdoam em maior grau de jul- linha do desenvolvimento adotada por Ko-
gamento do que de afeto independente hlberg (1971, 1984) e Rest (1974). A moral
da idade. A novidade deste estudo foi à é definida por Kohlberg como julgamen-
análise das escolhas nos itens da EFI que tos pautados em noções de justiça: igual-
mostrou diferenças significativas em seis dade, respeito e reciprocidade. Segundo
conceitos que correspondem a 10% do to- Kohlberg (1984) o desenvolvimento mo-
tal de itens da escala. Entre estes itens, o ral ocorre em uma seqüência invariante
que mais chamou a atenção foi o padrão de três níveis e seis estágios. Os estágios
de respostas ao Ressentimento (Item 10), são subestruturas psicológicas que repre-
cuja superação é central ao perdão inter- sentam diferentes formas de organização
pessoal. A quantidade de jovens que con- do pensamento. O nível pré-convencional
cordaram com a necessidade da diminui- compreende os estágios 1 (orientação
ção do ressentimento para o perdão dimi- para a punição e obediência) e 2 (hedo-
nuiu significativamente com a idade. Nes- nismo instrumental). O nível convencional
te sentido, ressalta-se que esses dados se compreende os estágio 3 (moralidade do
referem ao perdão oferecido espontanea- bom garoto) e 4 (orientação para a lei e
mente, talvez com o amadurecimento que para a ordem). O nível convencional com-
proporciona maior autonomia e uso dos preende os estágios 5 (orientação para o
princípios morais a pessoa defenda sua contrato social) e 6 (orientação para os
dignidade perante injustiças com maior princípios éticos universais). Para men-
força ou necessite de uma educação para surar o desenvolvimento do julgamento
esclarecimentos sobre a tensão existente moral, Kohlberg criou o Moral Judgment
entre o ressentimento e princípios morais Interview – MJI (1984), uma entrevista
como a justiça, ou seja, a que se refere o semiestruturada com três dilemas morais
perdão quando ganhamos maior autono- que apresentam conflitos entre princípios
mia moral. (e.g. vida vs. lei). Os estágios do julga-
mento moral são avaliados no MJI a par-
Palavras-chave: perdão, moral, tir das respostas dadas às perguntas que
desenvolvimento seguem cada dilema. Baseado na teoria
Contato: Renan Pires Maia, UFPB, de Kohlberg, Rest (1974) criou o Defining
renanpmaia@gmail.com Issues Test - DIT, uma forma objetiva de

364
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mensuração do julgamento moral. O DIT baixos índices de pensamento pós-con-


é composto por seis dilemas morais. Os vencional. Koller (1990), em um estudo so-
respondentes, após lerem cada dilema, bre as diferenças de gênero no desenvol-
avaliam a importância de 12 afirmativas vimento moral, realizado com 180 jovens
numa escala do tipo Likert de cinco pon- com idades entre 18 e 25 anos, também
tos. Em seguida, os respondentes são so- utilizando o MJI, verificou que não exis-
licitados a indicar dentre as 12 afirmativas tiam diferenças entre os sexos e que havia
quatro que consideram mais importantes. uma predominância do nível convencional
Camino, Luna, Alves, Silva e Rique (1989) de julgamento moral em sua amostra de
realizaram uma adaptação do DIT para o jovens adultos. Camino, Rique, Ribeiro e
contexto brasileiro. O instrumento adapta- Araújo (1996) verificaram a qualidade do
do é composto por quatro dilemas morais: julgamento moral em adolescentes secun-
João e o Remédio, O Prisioneiro Foragido, daristas e jovens universitários através do
O Jornal Escolar e A Ocupação pelos Estu- DIT. Os resultados mostraram um pensa-
dantes. Essa versão é respondida da mes- mento convencional para os adolescentes
ma forma da versão original proposta por e um pensamento pós-convencional para
Rest (1974). A literatura indica que exis- os universitários. Em outro estudo, tam-
tem diferenças entre a mensuração do jul- bém realizado com o DIT, Camino et al
gamento moral quando se comparam os (1998) analisaram a relação da idade com
resultados obtidos com o DIT e com o MJI a qualidade do julgamento moral conside-
(Camino, Morais & Galvão, 2006; Biaggio, rando três grupos de idade: 11 a 13, 14 a
2002). O DIT, por se tratar de uma medida 16 e 17 a 19 anos. Os resultados mostra-
de identificação de argumentos morais, ram que o julgamento moral se desenvol-
permite que os respondentes indiquem via com a idade. Nesse mesmo estudo fo-
formas de pensamento mais avançadas do ram encontradas diferenças significativas
que quando respondem ao MJI, uma me- entre os sexos: as mulheres apresentaram
dida de elaboração de argumentos morais. mais julgamento pós-convencional que os
No Brasil, estudos na linha do desenvolvi- homens. Considerando esses estudos, o
mento moral ocorreram primordialmen- presente trabalho tem como objetivo veri-
te nas décadas de 1970 e 1980. Biaggio ficar se ocorreram mudanças na qualidade
(1976) realizou um estudo intercultural, do julgamento moral de jovens universi-
comparando universitários brasileiros e tários no período compreendido entre os
americanos, utilizando o MJI. Os resulta- anos de 1996 e 2001. Com esta finalidade
dos mostraram que 51% dos universitários foi realizada uma pesquisa na qual parti-
brasileiros possuíam um julgamento moral ciparam 103 universitários da cidade de
convencional. Biaggio (1984), em um estu- João Pessoa, com idades de 18 a 32 anos,
do de verificação da relação entre maturi- sendo 46,6 % de homens e 53,4 % de mu-
dade de julgamento moral e internalidade lheres. Foi utilizada a versão adaptada do
de lócus de controle, utilizando o MJI com Defining Issues Test –DIT, realizada por
14 universitários, de 20 a 32 anos, cor- Camino, Luna, Alves, Silva e Rique (1989).
roborou seu estudo anterior verificando O instrumento foi administrado de forma
que o julgamento moral dos universitários coletiva, mas respondido individualmente.
encontrava-se no nível convencional, com Cada participante respondeu ao instru-

365
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mento em aproximadamente 20 minutos. A área da moralidade tem sido objeto de


Uma análise de comparação de médias re- muitos estudos, ganhando destaque com
alizada através de um teste-t para medidas os trabalhos desenvolvidos por Lawrence
repetidas indicou que as médias obtidas Kohlberg (1984) acerca do pensamento
pelos universitários na pesquisa atual para moral da justiça. Nos últimos anos, a área
os níveis convencional e pós- convencional de estudos foi ampliada, surgindo novas
foram significativamente diferentes (t = abordagens e novos campos de abrangên-
2,463; p = .01): os universitários apresen- cia como, por exemplo, os estudos sobre
taram um pensamento convencional su- o desenvolvimento do pensamento moral
perior ao pós-convencional, enquanto que do perdão. Enright, Santos e Al-Mabuk
no estudo de Camino et al (1998) a média (1989) validaram um modelo cognitivo,
do nível convencional foi significativamen- investigando as condições nas quais as
te inferior a do nível pós-convencional (t pessoas perdoam. Neste modelo, os au-
= -3,11; p = .003) Assim, julga-se que hou- tores consideraram que o desenvolvimen-
ve uma regressão no que diz respeito ao to do pensamento do perdão segue uma
nível de julgamento moral em relação ao sequência similar ao desenvolvimento do
pensamento dos universitários. Diante de pensamento de justiça proposto por Ko-
tais resultados fica a questão: que fato- hlberg. O modelo de pensamento do per-
res poderiam indicar a diminuição do uso dão apresenta seis estágios de raciocínio:
do pensamento pós-convencional entre estágio 1 – perdão como vingança; estágio
aqueles que deveriam ser a vanguarda do 2 – perdão por restituição ou compensa-
pensamento moral? Espera-se responder ção; estágio 3 – perdão como expectativa
a essa questão por meio de uma análise social; estágio 4 – perdão como expecta-
de outros estudos empíricos e através de tiva institucional; estágio 5 – perdão para
uma análise das estruturas sócio-econô- a harmonia social e estágio 6 – perdão
micas, política e educacional vigentes no como compaixão. O resultado do estu-
Brasil nos anos de 1996 e 2011. do de Enright et al. (1989) mostrou uma
relação positiva entre o pensamento de
Palavras-chave: moral; desenvolvimento; justiça e o pensamento de perdão, sendo
universitários; que o primeiro antecedia ao segundo no
Contato: Pollyana de Lucena Moreira, UFPB, desenvolvimento do pensamento. Com
pollyanadelucena@yahoo.com.br. base neste resultado, objetivou-se, no
presente estudo, analisar o pensamento
moral da justiça e do perdão em jovens
LT03-825 – RELAÇÃO ENTRE O universitários para verificar se existe re-
PENSAMENTO MORAL DE JUSTIÇA E DE lação entre os dois tipos de pensamento.
PERDÃO EM UNIVERSITÁRIOS Esperou-se encontrar uma relação seme-
Eloá Losano de Abreu - UFPB lhante àquela encontrada pelo estudo aci-
eloalosano@gmail.com ma, ou seja, que o pensamento de justiça
Cleonice Pereira dos Santos Camino - UFPB estivesse mais desenvolvido e relacionado
cleocamino@yahoo.com.br ao pensamento de perdão. Participaram
Júlio Rique Neto - UFPB do estudo 37 estudantes universitários
julio.rique@uol.com.br da cidade de João Pessoa - Paraíba, sen-

366
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do 18 homens e 19 mulheres com idades traram uma relação significativa entre os


de 17 a 24 anos (M= 20,22; DP= 2,56). Foi estágios dominantes de justiça e de per-
utilizado para avaliar o pensamento mo- dão (z=-4,189; p<0,001), indicando que o
ral de justiça um instrumento composto pensamento de justiça foi mais avançado
por um dilema retirado do instrumento do que o pensamento de perdão. Uma
de maturidade do pensamento elaborado análise de conteúdo desses estágios indi-
por Kohlberg, Moral Judgment Interview cou que a relação encontrada foi entre o
– MJI (Colby e Kohlberg, 1987). Para ava- estágio 4 de justiça - orientação para a lei
liar o pensamento de perdão, foi utilizado e para a ordem - e o estágio 2 de perdão
um instrumento constituído por um dile- - perdão por restituição ou compensação.
ma elaborado por Enright et al. (1989), a No que se refere à predominância de ra-
partir do dilema de justiça de Kohlberg. Os ciocínios de estágio 2 de perdão, é preciso
dilemas vêm acompanhados de questões destacar que o dilema apresenta dois ti-
abertas que investigam o tipo de pensa- pos de compensação para a mágoa: o di-
mento de justiça e de perdão que orienta nheiro e o pedido de desculpas. Os partici-
os participantes na resolução do conflito pantes que apresentaram pensamento do
moral. Esses instrumentos foram adap- estágio 2 como dominante não aceitaram
tados no Brasil por Biaggio (1976) e por
a condição do dinheiro como uma repa-
Camino e Rique (1991, não publicado),
ração para a mágoa, mas consideraram o
respectivamente. O estudo atendeu a to-
pedido de desculpas como uma condição
das as recomendações éticas da resolução
facilitadora para o perdão, servindo como
196/96. Os participantes responderam ao
uma compensação moral da mágoa sofri-
instrumento individualmente em ambien-
da. Como conclusão, pode-se dizer que a
te de sala de aula, durante aproximada-
relação verificada confirma as expectati-
mente 45 minutos. As análises seguiram
critérios previamente estabelecidos para vas teóricas e do presente estudo, e que
identificação de estágios na justiça e no a relação encontrada entre o estágio 4
perdão. Estes critérios são baseados no de justiça e o estágio 2 de perdão pode
Manual do MJI (Colby e Kohlberg, 1987) ser explicada pelo fato de que o estágio 4
e no estudo de Enright et al. (1989). As apresenta uma compensação pela justiça
respostas dos dilemas foram avaliadas legal, o que facilita o raciocínio do estágio
por um grupo de cinco juízes, cada um 2 de perdão – compensação por restitui-
atribuindo um estágio de pensamento ção. Ou seja, ambos se utilizam da com-
para cada questão do participante, com pensação no processo de perdoar. Sobre
consenso de 80% entre os juízes. Os es- a aceitação do pedido de desculpas como
tágios dominantes de justiça e de perdão uma compensação moral, o resultado en-
de cada participante foram determinados contrado neste trabalho confirma aqueles
pela freqüência dos mesmos em cada di- obtidos no estudo de Abreu, Moreira e Ri-
lema. Com as freqüências de estágios do- que (2011) realizado com crianças.
minantes de justiça e perdão dos partici-
pantes, foi realizado um teste de Wilcoxon Palavras-chave: perdão; justiça; compensação
para verificar a relação entre os dois pen- Contato: Eloá Losano de Abreu, UFPB,
samentos. Os resultados deste teste mos- eloalosano@gmail.com

367
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-869 – RESOLUÇÃO DE DILEMAS atenderam às seguintes categorias temá-


MORAIS POR ESTUDANTES DO ENSINO ticas: (1) ética e educação, (2) educação
MÉDIO moral e (3) desenvolvimento moral, prio-
Luiz Câmara - PUC/Rio, rizando as principais revistas da área da
luizccamara@hotmail.com educação: (1) Educação e Sociedade, (2)
Revista Brasileira de Educação, (3) Educa-
Financiamento: CAPES/CNPq/FAPERJ
ção e Pesquisa e (4) Cadernos de Pesqui-
sa, com recorte temporal entre os anos
A presente comunicação apresenta uma
pesquisa que analisou como estudantes de 2000 e 2009. Do mesmo modo foi feito
de uma escola pública de ensino médio um levantamento da produção dos GTs
da Cidade do Rio de Janeiro discutem e de Filosofia da Educação (GT17) e Psico-
resolvem dilemas morais que envolvem logia da Educação (GT20) da Associação
questões de justiça, dignidade humana Nacional de Pesquisa e Pós-graduação
e práticas de discriminação e preconcei- em Educação (ANPEd), como também no
to (gênero, etnia e orientação sexual). O banco de teses e dissertações do portal
referencial teórico utilizado foi a ética do da Coordenação de Aperfeiçoamento de
discurso de Jürgen Habermas e a teoria do Pessoal de Nível Superior (CAPES), consi-
desenvolvimento moral de Lawrence Ko- derando as mesmas categorias temáticas
hlberg. O trabalho foi motivado pela cons- e o mesmo período de tempo. A coleta
tatação da existência de muitas relações de dados se efetuou em duas etapas, das
conflitivas no cotidiano escolar, causadas, quais participou toda a equipe de pes-
em grande parte, pela falta de reconheci- quisa do GECEC. A primeira consistiu na
mento e respeito às diferenças interpesso- observação do campo de pesquisa, a sa-
ais, bem como, pelos limites na formação ber, uma escola pública de ensino médio
docente para lidar com esses conflitos. localizada na Zona Sul da Cidade do Rio de
A investigação esteve inserida no proje- Janeiro, cuja clientela pertence às classes
to de pesquisa institucional “Diversidade populares das comunidades do entorno e
Cultural, Prática Pedagógica e Mínimos de alguns bairros mais distantes, nomea-
Éticos” (2008-2010), que foi desenvolvido da aqui Colégio Guarani. Tínhamos como
pela linha de pesquisa “Ética Intercultural foco principal o comportamento e relacio-
e Prática Pedagógica”, do Grupo de Estu- namento dos estudantes nos momentos
dos sobre Cotidiano, Educação e Culturas de intervalo e lazer no pátio da escola, a
(GECEC), do Programa de Pós-graduação partir dos quais construímos algumas ca-
em Educação da PUC-Rio. A investigação tegorias que nos orientaram a interpretar
a que me propus se efetuou através de suas idéias e opiniões expressas na pró-
um diálogo entre a filosofia, a psicologia xima etapa. A segunda etapa foi a reali-
do desenvolvimento e o cotidiano escolar, zação de grupos focais, que discutiram a
levando em conta a complexidade do pro- resolução de dilemas morais, previamen-
blema enfrentado. Para responder aos di- te elaborados. Os dilemas trataram de
ferentes aspectos do problema proposto, conflitos envolvendo questões de justiça,
realizei inicialmente um aprofundamento dignidade humana, preconceito e discri-
teórico dos referenciais que orientaram minação referentes às características de
a pesquisa e uma revisão de artigos que gênero, etnia e orientação sexual. Foram

368
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

realizados quatro encontros com um gru- tam em sua capacidade e em sua autono-
po de 14 estudantes, entre 16 e 18 anos, mia para resolver problemas e conflitos.
de ambos os sexos, que se voluntariaram Voltando à questão inicial que mobilizou
para a pesquisa. Cada encontro, com du- a presente pesquisa, considero que os
ração aproximada de 60 minutos, foi co- elementos e reflexões apresentados ofe-
ordenado por um integrante da equipe de recem uma contribuição, mesmo que par-
pesquisa e acompanhado por outros pes- cial e provisória, para a compreensão so-
quisadores, que observaram e realizaram bre como os jovens pesquisados pensam
anotações para posterior discussão nas e buscam solucionar dilemas morais re-
reuniões do grupo. As discussões foram lacionados à justiça e às diversidades. Al-
registradas em áudio, transcritas e depois gumas lacunas, entretanto, permanecem
analisadas a partir do referencial teórico em aberto e são limites que estão por ser
que orientou a pesquisa. superados, bem como outras questões
Dentre as conclusões a que chegamos, que surgiram no percurso. Penso ser per-
merecem destaque: (1) os estudantes tinente caracterizar a compreensão que
pesquisados organizam seu raciocínio em os adultos (professores, gestores e de-
diferentes níveis e estágios de desenvolvi- mais profissionais da educação) possuem
mento moral, considerando os critérios de sobre as situações apresentadas pelos di-
Kohlberg (1992), o que não está em con- lemas, ainda que hipotéticos, e como as
tradição com sua teoria, pois os estágios enfrentam. No campo teórico, permanece
não são estáticos e não avaliam o desen- a inquietação sobre como a filosofia mo-
volvimento moral dos indivíduos, mas o ral e a teoria do desenvolvimento podem
modo como constroem seu raciocínio; (2) manter suas pretensões de universalida-
os estudantes vivenciam e têm consciên- de e, ao mesmo tempo, respeitar as di-
cia de que em seu ambiente escolar ocor- ferenças culturas, tomando como ponto
rem situações de injustiça, preconceito e de partida o cotidiano escolar e seus con-
discriminação em função das diferentes flitos. Essas são questões sobre as quais
características das identidades dos mem-
pretendo continuar me debruçando, na
bros comunidade escolar; (3) os jovens
tentativa de aprofundar a compreensão
participantes não hesitam quando desa-
das complexas relações entre os sujeitos
fiados a se posicionarem sobre problemas
envolvidos no cotidiano escolar, partindo
que envolvam suas vidas e crenças, o que
pode ser visto como sinal da pertinência e do pressuposto de que a escola deve cada
da importância que as temáticas aborda- vez mais se tornar um espaço em que as
das pela pesquisa possuíam para eles; (4) gerações mais jovens possam construir
os estudantes pesquisados possuem um suas diferentes identidades, reconhecen-
bom grau de maturidade e capacidade de do como riqueza a pluralidade presente
ouvir e respeitar as diferentes opiniões em seu interior.
de seus pares; (5) em geral os jovens pes-
quisados não confiam na capacidade dos Palavras-chave: educação moral, dilemas
adultos de assumirem sua responsabilida- morais, diversidade.
de na resolução de problemas e conflitos; Contato: Luiz Cláudio da Silva Câmara, PUC-
(6) os participantes da pesquisa acredi- -Rio, luizccamara@hotmail.com

369
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-956 – CONSIDERAÇÃO EMPÁTICA E empática como a capacidade de uma pes-


TOMADA DE PERSPECTIVA ASSOCIADAS soa simpatizar com outra e se inclinar a
AO PERDÃO INTERPESSOAL ajudá-la e definiu a tomada de perspectiva
Júlio Rique Neto - UFPB como uma habilidade cognitiva de tomar
julioriqueneto@gmail.com a perspectiva do outro a partir do contex-
Felipe Fernandes de Medeiros - UFPB to no qual ele(a) está inserido. A pesquisa
felipefernandes.ufpb@gmail.com contou com 201 participantes, homens e
mulheres, com idade média de 19 anos
Nilton Formiga - UFPB
(DP=2,6) residentes em João Pessoa, PB.
nsformiga@yahoo.com
Foram utilizados: a escala do perdão – EFI
Cleonice Camino - UFPB,
(Enright Forgiveness Inventory, Enright &
cleocamino@yahoo.com
Rique, 2000), uma escala objetiva dividi-
Verônica Luna - UFPB,
da em três partes: 1. uma Folha de Rosto
veronicaluna@uol.com.br
que coleta informações sobre a mágoa
Financiamento: CNPq e a ofensa; 2. um Inventário de 60 itens
divididos em três subescalas de 20 itens
Segundo Enright e Fitzgibbons (2000), o cada (10 positivos e 10 negativos) sobre
perdão é a capacidade de superar o res- afetos, comportamentos e julgamentos,
sentimento e desenvolver compaixão que deveriam ser respondidos em uma
para o ofensor. Perdoar é um processo de escala de concordância com seis pontos
construção de novas perspectivas acerca (1 = discordo fortemente e 6 = concordo
de uma situação especifica de injustiça. fortemente) e 3. o Item do Perdão, que
Teoricamente, no processo do perdão a corresponde a uma questão objetiva: “Por
vítima desenvolve consideração empá- favor, indique o quanto você perdoou a
tica para com a pessoa que a magoou e pessoa que você avaliou na Escala EFI”.
adota a perspectiva dele(a) ao reelaborar Essa questão é respondida em uma esca-
o evento da injustiça sob uma nova pers- la de cinco pontos (1 = não perdoei e 5 =
pectiva. Rique e cols. (in press) verificaram perdoei completamente). Administrou-se
empiricamente se a consideração empáti- também uma versão das escalas de Con-
ca se associava positivamente a tomada sideração Empática e Tomada de Perspec-
de perspectiva e se esta última também tiva da EMRI (Davis, 1983, adaptadas por
se associava positiva e significativamente Ribeiro, Koller & Camino, 2001). Foram
com o grau do perdão. O modelo testado feitas adaptações semânticas nos itens
foi válido com associações significativas destas escalas para que os participantes
das variáveis critérios para o perdão (p < respondessem pensando no ofensor que
.05). Porém, o modelo testou as habilida- foi avaliado na escala EFI. Após as modifi-
des empáticas sem que essas fossem diri- cações, os itens adaptados foram aleato-
gidas a um ofensor específico após uma riamente distribuídos e medidos em uma
situação real de injustiça. Neste estudo, única escala objetiva de cinco pontos (1 =
o modelo voltou a ser testado a partir do baixo grau e 5 = alto grau) com 14 itens no
ponto de vista de uma vítima ao pensar total. A ordem das escalas foi a seguinte:
sobre uma pessoa que a magôo injusta- primeiramente a EFI seguida do item do
mente. Davis (1983) definiu consideração perdão, da escala de consideração empá-

370
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tica e tomada de perspectiva do outro. O CO 36 - LT05


trabalho respeitou todos os princípios éti-
cos da Resolução 196/96 para pesquisas
Práticas Parentais
com seres humanos. As administrações
foram feitas coletivamente em salas de
LT05-710 - REDE SOCIAL E CUIDADO DE
instituições de ensino. Para as análises,
CRIANÇAS COM PARALISIA CEREBRAL
foi realizado o cálculo de modelagem de
equação estrutural (SEM) para verificar o Camila Ferrari - UCSAL
modelo pretendido por meio do progra- camilaferrari@sarah.br
ma AMOS 7.0. Com base nos indicadores Elaine Pedreira Rabinovich - UCSAL
de bondade de ajuste, o modelo se mos- elainepedreira@gmail.com
trou adequado: c2/gl = 1,16; RMR = 0,05; Financiamento: Rede Sarah de Hospitais de
GFI = 0,97; AGFI = 0,94; CFI = 1,00; TLI = Reabilitação
0,99; RMSEA = 0,02. A consideração em-
pática associou-se positivamente com a O cuidado compõe a vida do ser huma-
tomada de perspectiva (l = 0,64), com o no desde a sua concepção, fazendo-se
grau do perdão (l = 0,27) e com a inten- necessário durante seu processo de de-
sidade da mágoa (l = 0,15). A tomada de senvolvimento; por isso, assume uma di-
perspectiva associou-se positivamente ao mensão existencial. No cuidar de crianças
grau do perdão (l = 0,40) e negativamente que apresentam desordens no desenvol-
à intensidade da mágoa (l = -0,24). Estes vimento, todo o empenho e estimulação
resultados corroboraram o estudo ante- oferecidos em uma dada etapa serão es-
rior indicando que o modelo teórico aten- tendidos para além do esperado, graças
de as expectativas e se adéqua aos dados, ao atraso global que apresentam. A Parali-
a associação da consideração empática sia Cerebral (PC) é considerada a incapaci-
com a tomada de perspectiva e desta com dade física mais comum na infância. Neste
o grau do perdão interpessoal é significa- diagnóstico encontra-se um amplo espec-
tiva. Em outras palavras, a capacidade de tro de apresentações, destacando-se a te-
simpatizar com o outro e motivar-se a aju- traplegia espástica, na qual se pressupõe
dá-lo (consideração empática) se associa que houve dano cerebral difuso e grave,
com a habilidade de se colocar no lugar do com lesão piramidal acometendo os qua-
outro (tomada de perspectiva) que se as- tro membros, tronco e pescoço. Nestes
socia com a atitude de perdoar. O estudo casos, o prognóstico de marcha é desfa-
contribuiu empiricamente para o entendi- vorável e espera-se uma maior associação
mento do processo de perdão, indicando com comorbidades, como por exemplo,
variáveis facilitadoras que podem ser uti- distúrbios de deglutição, fonação e respi-
lizadas em uma orientação terapêutica ou ração, epilepsia e retardo mental. Estudos
educacional para o perdão interpessoal. mostram que há a inscrição do ato de cui-
dar nas relações familiares, mais precisa-
Palavras chave: perdão, empatia, tomada de mente na maternidade. A atenção ofere-
perspectiva cida à criança com limitações, portanto,
Contato: Júlio Rique Neto, UFPB, faria parte de um processo natural do qual
julioriqueneto@gmail.com a mãe seria responsável. Por conta disso,

371
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

as cuidadoras vivenciam o cansaço, isola- neste contexto. Trata-se de um estudo de


mento, sobrecarga e estresse, tendo como um caso, empregando método qualitativo
conseqüência direta dificuldades para de- e descritivo. Utilizou-se um questionário
senvolver seus próprios papéis sociais. sócio demográfico, entrevista semiestru-
Uma fonte importante de apoio neste turada e confecção do mapa de rede, apli-
contexto pode ser oferecida pelas pessoas cados como instrumentos de investigação.
que são significativas para estas mães, ou Foi selecionada uma mãe cuidadora prin-
seja, pelos indivíduos que compõem a sua cipal da filha de sete anos, que freqüenta
rede social. Tal conceito é útil por ampliar um hospital de reabilitação em Salvador-
o enfoque da análise, sendo possível, por -BA há dois anos. A família, e em especial,
exemplo, considerar a família extensa, a a mãe cuidadora, passou por uma transi-
vizinhança, elementos de outros contex- ção ecológica com o nascimento da crian-
tos (como escola e trabalho), os vários ça portadora de desabilidade. O Processo
recursos comunitários e serviços de saúde proximal foi diretamente afetado, na me-
como elementos de uma rede. Estes espa- dida em que se mudaram os seus papéis
ços precisam ser vistos como um todo in- e atividades diárias, culminando com a
tegrado, no qual se discernem elementos alteração da sua dinâmica de vida. O Con-
interconectados num embricamento que texto, em especial o micro e mesossiste-
é necessário serem levados em conta e ma, sofreram impacto. A sua rede social
explorados nos estudos de saúde. Por ser experimentou redução, tornando-se mais
a PC uma condição que exige atenção di- dispersa, homogênea e pouco densa. As
reta ao longo de toda a vida, a cuidadora pessoas que compuseram esta rede acu-
precisa organizar-se para oferecer o apoio mularam funções, embora tendessem a
requerido, gerando necessariamente mo- incentivar comportamentos promotores
dificações na sua forma de relacionar-se de bem-estar, a dividir cuidados e a emi-
interna e externamente com os membros tir reações de alarme, como por exemplo,
do sistema, com a comunidade e centros solicitando ajuda junto a equipes de saú-
de saúde. A compreensão acerca do fun- de. O hospital de reabilitação ocupou lu-
cionamento das redes, sob o enfoque da gar importante na rede social, oferecendo
teoria bioecólogica do desenvolvimento suporte emocional, sendo guia cognitivo
humano é uma instância necessária para e de conselhos, bem como oferecendo
o desenvolvimento de trabalho com as ajuda material e de serviços. O abandono
cuidadores, pois oferece uma ótica ecos- do emprego foi conseqüência da neces-
sistêmica responsável. Objetivo: Compre- sidade de cuidado direto da criança; por
ender o processo do cuidar de crianças conta disso, houve queda considerável
com PC - tetraplegia espástica, levando do padrão financeiro, gerando limitações
em consideração a composição e função sociais. O benefício de prestação conti-
da rede social. Como objetivos especí- nuada, que representa o exossistema,
ficos, foram analisados os aspectos que tornou-se a única fonte de renda da fa-
compõem o cuidar e em que dimensão ele mília; entretanto, parece oferecer pouco
é definido; a estrutura e funcionalidade da a sensação de amparo social. No macros-
sua rede social no processo de cuidar; o sistema, observou-se que a idéia de me-
lugar ocupado pela equipe de reabilitação nos valia imputada à deficiência parece

372
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

perpetuar as noções falta e imperfeição LT05-819 - AMOR DE PAI: INFLUÊNCIA


associadas a ela. Foram muitos os relatos PATERNA NO DESENVOLVIMENTO
de pré-conceito vividos dentro e fora da INFANTIL
família. Em relação à Pessoa, os recursos e Daiany Souza de Jesus - UFRB
a demanda, notadamente, mostraram-se day_souza89@hotmail.com
relevantes no desenvolvimento das mães Tabta Looremberg Carvalho Maia Bezerra -
cuidadoras. As grandes limitações da UFRB
criança, inicialmente, interferiram negati- tabtalooremberg@hotmail.com
vamente na interação desta díade. Após Silvana Batista Gaino - UFRB
o acolhimento em um nível psicológico, silgaino@gmail.com
a mãe pode compreender melhor o prog-
nóstico motor e cognitivo desfavorável e Lançando um olhar sobre a história da hu-
focar sua atenção na qualidade de vida da manidade, podemos fazer uma breve re-
família. A vivência do Tempo foi marcada capitulação sobre o papel do pai no seio
agudamente, pois as perspectivas em tor- familiar. O que os achados históricos nos
no da criança se modificaram, assim como mostram é que a figura paterna sempre
a perspectiva de futuro da própria família manteve um lugar de provedor financei-
(macrotempo). Se por um lado, o tempo ro, educador religioso e moral sobre sua
proporcionou a esperança de ver a filha família (CIA et al., 2005). Com o advento
alcançar as aquisições e independências da Revolução Industrial, o chefe da famí-
tão sonhadas, em contrapartida também lia acabou se afastando do seio familiar,
ofereceu o cansaço da rotina desgastante em busca de vida melhor, sobrecarre-
e a constatação de que com o seu passar, gando assim, o papel da mãe no cuidado
aprender a falar, comer sozinho, andar, re- dos filhos (Coley, 2001, apud Cia, 2005).
conhecer a si próprio e o mundo pode não Após esse período as famílias ditas nucle-
ser possível. Como conseqüência de toda ares (tradicionais) vêm sofrendo grandes
essa vivência, o mesotempo ofereceu à transformações. As mulheres saíram para
mãe sabedoria, que, segundo ela, a aju- o mercado de trabalho, houve inversões
da a viver com serenidade. A abordagem de papéis e funções na família, o número
bioecólogica do desenvolvimento huma- de casais separados aumentou gradativa-
no mostrou-se útil para compreender o mente assim como o de recasamentos e
processo de cuidar, uma vez que parte da pais ou mães homossexuais. O número
premissa que o desenvolvimento só pode de mães solteiras ou filhos criados por
ser entendido se devidamente contextua- apenas um cuidador é também notável.
lizado e a partir da interação dinâmica de A sociedade patriarcal colocou o homem
quatro dimensões: pessoa, processo, con- em um pilar mais alto, e o afastou da sua
texto e tempo. família, no entanto, muitas modificações
foram ocorrendo na dinâmica familiar o
Palavras-chave: rede de apoio, família, que exigiu do homem uma maior respon-
deficiência sabilidade quanto ao seu papel de pai. Os
Contato: Camila Ferrari, Rede Sarah pais passam a ter então participação ativa
de Hospitais de Reabilitação, UCSAL, na vida familiar (Gomes; Resende, 2004).
camilaferrari@sarah.br A identidade paterna está se reconfigu-

373
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rando, pois muitos pais não conseguem o pai representa um sustentáculo afeti-
assumir as responsabilidades que esse vo para a mãe interagir com seu bebê, e
papel configura, sobrecarregando a mãe na adolescência ajudando na construção
que terá que assumir os dois papéis. Des- da identidade do filho (Gomes; Resende,
sa forma, pretendemos trazer contribui- 2004). A criança está sempre em busca
ções sobre como vem sendo modificado o do pai, em qualquer figura masculina, na
papel do pai, bem como suas implicações maioria das vezes, no avô. Quando da si-
para o desenvolvimento infantil, dando tuação da mãe encontrar outro parceiro,
ênfase para as conseqüências da ausência o afastamento do mesmo pode acarretar
paterna no desenvolvimento infantil. Luz na criança sentimentos de abandono, e
e Berni (2010) nos chamam a atenção a esta tem mais uma vez um sentimento
respeito da construção social sobre a pa- de culpa, como se ela fosse a responsável
ternidade. Segundo eles, a mesma é um pela separação. A criança tem um desejo
conceito relacional, pois a paternidade só incessante de conhecer seu pai biológico,
é exercida depois do nascimento da crian- o que se fortalece em algumas etapas da
ça, ao contrário da função materna, que é vida, como se fosse uma necessidade de
sentida e exercida desde a vida intra-ute- fechar sua história, saber sua origem (Ei-
rina. Apesar da importância da figura pa- zirik; Bergmann, 2004). Conclui-se que a
terna, o homem, em vias de se tornar pai, vida afetiva, cognitiva, emocional e social
tende a se fragilizar diante da nova res- da criança ou do adolescente pode so-
ponsabilidade. Para Corneau (1995, apud frer muitas transformações diante da au-
Dantas et al., 2004), o pai tem três papéis sência do pai. Já que o mesmo tem peso
a exercer com os filhos. Primeiro é o de significativo durante o desenvolvimento
“separar” a criança de sua mãe e vice- desta. A presente pesquisa trata de uma
-versa. O próximo papel segundo o autor revisão bibliográfica. Foram utilizados
é o de auxiliar na formação da identidade como descritores os termos: pai, paterni-
do seu filho. O terceiro papel do pai seria dade, relação pai-filho e desenvolvimen-
o de transmitir “a capacidade de receber to infantil. Foram excluídos os livros que
e de interiorizar os afetos, de carregá-los constavam dentro destes descritores, uti-
consigo” (Corneau, 1995, p.51, apud Dan- lizando-se apenas os artigos, de qualquer
tas et al., 2004). Essa aproximação entre natureza, qualitativa, quantitativa, estudo
pai e filho ocasionará cumplicidade e uma de caso ou revisão bibliográfica. Para fins
relação cheia de emoções, afetos e inti- de delimitação da pesquisa foram excluí-
midade, ocasionando um relacionamento dos os artigos que estudaram a respeito
simples, porém saudável. Com base em de pais adolescentes, o foco da pesquisa
uma leitura psicanalítica, é possível afir- foi com pais adultos, com filhos de 0 ano
mar que o pai representa a possibilidade até a adolescência. Sendo assim, treze ar-
do equilíbrio pensado como regulador da tigos foram obtidos na íntegra e utilizados
capacidade da criança investir no mundo com fonte para a pesquisa. Diante desses
real. A atuação paterna é decisiva em dois achados, é inegável a importância do pai
momentos do desenvolvimento da crian- no desenvolvimento infantil, seja exer-
ça, dos 6 aos 12 meses de vida na quebra cendo a função de autoridade, ou dando
da relação simbiótica com a mãe já que apoio às mães no cuidado com os filhos.

374
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Para se desenvolver a criança precisa de teção de seus integrantes, transmissão da


um ambiente propício, principalmente cultura, do capital econômico e dos bens
no que diz respeito ao âmbito emocional. familiares, bem como das relações de gê-
O pai, em parceria com a mãe, mesmo nero e de solidariedade entre as diferen-
que estes não estejam casados, deve to- tes gerações Dada a importância do am-
mar seu lugar de pai, permitindo que a biente familiar, destacam-se as mudanças
criança forme sua identidade, mantendo que vem ocorrendo na família, como a
relação com outra pessoa que não a sua tendência a redução do número de filhos
mãe. Além das implicações referentes à e o adiamento da gravidez, bem como da
divisão da responsabilidade com a mãe, maior participação do pai nos cuidados
a ausência paterna traz conseqüências básicos dos filhos, que têm proporciona-
para a vida emocional da criança, já que a do a emergência de novos modelos de so-
mesma acredita que ela foi a culpada pelo cialização. A família, portanto, é uma das
afastamento do pai, não compreendendo instituições sociais básicas, constituídas
a situação, e sentindo um vazio que tal- através das relações de parentesco cultu-
vez nunca seja preenchido. Em suma, in- ral e historicamente determinadas, e tam-
dependente da organização familiar que bém o ambiente onde as primeiras intera-
o indivíduo faça parte, é imprescindível ções ocorrem. Através dessas interações
que ele tenha uma figura materna, como é que ocorre a socialização e a educação
também a paterna, que será base para a das crianças. As metas de socialização e
construção da sua identidade, seu desen- as práticas educativas utilizadas pelos
volvimento físico e moral. pais têm importante influência nas intera-
ções que são estabelecidas e consequen-
Palavras-chave: paternidade, temente no desenvolvimento infantil. As
desenvolvimento infantil, relação pai-filho práticas parentais educativas são referen-
Contato: Daiany Souza de Jesus, UFRB, day_ tes às estratégias utilizadas para atingir
souza89@hotmail.com objetivos específicos em diferentes domí-
nios, sejam estes acadêmico, social e/ou
afetivo, dentro de determinadas circuns-
LT05-1068 - METAS DE SOCIALIZAÇÃO tâncias e contextos, como por exemplo, o
E PRÁTICAS PARENTAIS EDUCATIVAS uso de recompensas ou punições. Os pais
MATERNAS EM FAMÍLIAS COM UM A esperam que estes objetivos alcançados
TRÊS FILHOS sejam duradouros e que ocorram mesmo
Karla Alves Carlos - UFPB sem a presença parental. Essas práticas
kalcarlos@gmail.com são influenciadas entre outros aspectos,
Nádia Maria Ribeiro Salomão - UFPB pelas metas de socialização dos pais e as
nmrs@uol.com.br experiências destes com os filhos propor-
Financiamento: CAPES cionam a socialização da criança a partir
de seu nascimento. Cabe destacar que a
As ciências sociais apontam a família como socialização ocorre de forma bidirecional,
o elemento-chave não apenas para salva- destacando-se o papel ativo da criança nas
guardar a sobrevivência dos indivíduos, interações. As metas de socialização são
como também para a socialização e pro- os ideais implícitos ou explícitos dos pais

375
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

relacionados com o modo que desejam conteúdo de Bardin, também está sendo
que seus filhos sejam. Os objetivos esta- aplicado um Inventário de Práticas Paren-
belecidos a longo prazo pelos progenito- tais – IPP, com 29 itens respondidos em
res em relação a seus filhos, influenciam uma escala tipo Likert, que servirá para o
as práticas de cuidados dos pais a partir estabelecimento de uma média global de
do conjunto de concepções e valores que envolvimento parental das mães de filho
são construídos culturalmente. A literatu- único e com mais filhos; e um Questio-
ra aponta que há diferença na criação dos nário Sócio-Demográfico para caracteri-
filhos e que o número da prole influencia zação das mães. 21 entrevistas já foram
tanto na quantidade quanto na qualidade realizadas e estão sendo gravadas e trans-
dos recursos e da atenção recebida por critas literalmente. Os dados obtidos es-
eles. Neste trabalho considera-se então o tão sendo tratados de forma a comparar
desenvolvimento humano como um con- os resultados dos dois grupos de mães. Os
junto de processos por meio dos quais as resultados iniciais têm demonstrado dife-
propriedades do indivíduo e do ambiente renças quanto as expectativas em relação
interagem e produzem contínuas mudan- à vida adulta dos filhos das mães de mais
ças nas características da pessoa durante de um filho para as mães de filho único.
toda sua vida. Portanto, o objetivo geral Os dois grupos de mães têm demonstra-
desta pesquisa é investigar quais são as do preocupação com a educação dos fi-
Metas de Socialização e as Práticas Paren- lhos primordialmente, porém, esse nível
tais Educativas em famílias com filho úni- educacional tem sido apontado de forma
co e famílias com dois a três filhos através diferenciada pelas mães com mais de um
do relato materno. Especificamente, ob- filho, que espera que a educação formal
jetiva-se investigar e comparar as metas, das crianças possa transforma-se em boas
as estratégias de socialização e práticas oportunidades de emprego e sustento na
parentais das famílias com filho único e vida adulta, demonstrando expectativas
com mais filhos, além de conhecer como de independência financeira. Além dis-
pai e mãe decidem a educação de seus fi- so, as qualidades que as mães descrevem
lhos e como o pai participa desse proces- como necessárias para atingir estas ex-
so educativo através do relato das mães. pectativas são a honestidade (mais cita-
Esta pesquisa está sendo realizada atra- da entre os dois grupos de mães), sendo
vés de visitas nas residências de mães de a cidadania e o reconhecimento de seus
nível sócio-econômico médio casadas ou direitos e deveres na sociedade citados
conviventes, com ao menos ensino médio frequentemente pelas mães com nível su-
completo e com 1 a 3 filhos; estes entre perior. A participação do pai tem sido re-
5 a 7 anos da cidade de João Pessoa-PB. latada pelas mães principalmente na área
Os dados serão obtidos através da aplica- do lazer, como brincar e passear com os
ção de instrumentos com 40 mães partici- filhos. Quanto ás práticas parentais edu-
pantes de forma não-probabilística e por cativas ressalta-se dentro das práticas ne-
conveniência. Estão sendo aplicados três gativas que 9% das mães utilizam de pal-
instrumentos: uma entrevista semies- madas para educar as crianças com frequ-
truturada sobre metas de socialização ência e 36,4 % das mães frequentemente
que será analisada através da análise de gritam com as crianças quando elas fazem

376
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

algo de errado. Dentre as práticas positi- de – representa o grande conflito da vida


vas destaca-se que 72,8% das mães têm adulta (Slater, 2003). Esse estágio, qualifi-
conversas amigáveis com seus filhos com cado por Erikson (1968/1972) de genera-
frequência e 86,4% dizem frequentemen- tividade versus estagnação, representa o
te que amam seus filhos. Os resultados período que a pessoas avalia o que reali-
iniciais, portanto, têm indicado que o pai zou na vida até aquele momento e o que
está mais participativo, porém é atribuída pretende contribuir para a posteridade
à mãe a maior parte da responsabilidade na produção ou constituição de bens, e
da educação das crianças. na manutenção da humanidade pelo cui-
dado de outras pessoas. Para resolução
Palavras-chave: metas de socialização, de parte da crise dessa fase, a parenta-
práticas parentais, família lidade surge como uma eficaz estratégia
Contato: Karla Alves Carlos, UFPB, afirma Erikson (1968/1972). Isto é, cuidar
kalcarlos@gmail.com de alguém, seja um filho ou outra pessoa,
contribuindo para o futuro (Rothrauff &
Cooney, 2008). Relevante destacar que
LT05-1201 - DESENVOLVIMENTO apesar da paternidade e maternidade po-
HUMANO: A PARENTALIDADE NO derem estar inseridas na parentalidade,
CURSO DE VIDA24 esta está além de ser pai ou mãe. Toman-
André de Carvalho-Barreto - UnB do como base esses conceitos, a presente
andrecarvalhobarreto@yahoo.com.br pesquisa objetivou realizar uma revisão
da literatura em periódicos nacionais re-
Financiamento: CAPES
lacionados à parentalidade. A revisão da
literatura nacional ocorreu em janeiro de
Erikson, originariamente, foi seguidor
2011 pela busca eletrônica na World Wide
do modelo psicossexual freudiano, mas
Web por esse sistema ser o que contem-
discordou dessa perspectiva, propondo
pla a maior quantidade de periódicos na-
um desenvolvimento positivo ligado às
cionais. As bases de dados escolhidas nes-
crises normativas que ocorrem ao longo
sa investigação foram SciELO, o IndexPsi
de toda vida. Para o autor, essas crises
e o PePSIC. A escolha desses indexadores
eram fomentadas pelo contexto no qual a
ocorreu por serem eles os que abrangem
pessoa está inserida (Erikson, 1950/1976,
o maior número de produções nacionais
1968/1972), por essa atenção especial ao
(artigos completos e resumos) na área
fator ambiental no desenvolvimento, sua
da psicologia. As consultas a essas bases
teoria foi, por vezes, nomeada de Teoria
de dados cobriram todas as publicações
do Desenvolvimento Psicossocial (Ben-
existentes até o momento, sendo utiliza-
tley, 2007). O sétimo estágio de sua teoria
das como descritores as palavras: paren-
– que compreende o adulto de meia-ida-
talidade e – seu equivalente em inglês
– parenthood. A amostra compreendeu
24
Este estudo foi desenvolvido no âmbito da disciplina Psi-
somente as produções de artigos comple-
cologia do Desenvolvimento Adulto, do Programa de Pós- tos, selecionados pela leitura prévia dos
-Graduação em Processo de Desenvolvimento Humano seus resumos, sendo excluídos: (a) artigos
e Saúde, da Universidade de Brasília, sob a docência da
Profa. Dra. Maria Helena Fávero. que se repetissem nas bases de dados; (b)

377
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

produções de revistas de divulgação cien- tigação apresentada por Bronfenbrenner


tífica; (c) teses, dissertações, trabalhos (2001) que mostra a relevância de estu-
de conclusão de curso, relatórios, livros dos e práticas de intervenção na parenta-
e capítulos de livros; (d) investigações lidade dado o aumento na desordem do
publicadas em periódicos internacionais; desenvolvimento de crianças, jovens e fa-
e, finalmente, (e) textos que não tives- miliares. Essa preocupação com as gera-
sem relação com a psicologia. A leitura ções futuras ocorre, para o autor, pelo au-
de cada artigo permitiu estabelecer uma mento do individualismo na sociedade e
hierarquização das seguintes informações pelas fragilidades das instituições de pro-
das produções: ano de publicação, mé- teção infanto-juvenil e de apoio à educa-
todo empregado, população pesquisada ção e saúde. Identificar como o fenôme-
(sexo, faixa etária, escolaridade e etnia), no da parentalidade está sendo discutido
sexo do primeiro autor e periódico, pos- nos periódicos brasileiros é, portanto,
sibilitando a emergência de categorias perceber como a psicologia está traba-
de acordo com a análise teórico-meto- lhando com o desenvolvimento adulto e
dológico de seu conteúdo. Nossa análise social, buscando promover um desenvol-
evidenciou seis categorias de publicações vimento mais positivo. Nas contribuições
sobre o tema em questão: (a) a parenta- desta investigação, conseguiu-se mapear
lidade na adoção (f=5, 15,6%); (b) a pa- como os pesquisadores estudam esse fe-
rentalidade em contextos adversos (f=4, nômeno, os métodos empregados, seus
12,5%); (c) a parentalidade homoafeti- interesses e como esse fenômeno está
va (f=3, 9,4%); (d) a relação pais e filhos relacionando com o desenvolvimento hu-
(f=5, 18,8%); (e) as relações de gênero na mano. Destaca-se nos resultados deste
parentalidade (f=2, 6,3%); (f) a parentali- levantamento o maior interesse dos pes-
dade na transição de vida (f=12, 37,5%). quisadores sobre o desenvolvimento não
A análise bibliográfica foi sistematizada normativo dentro do contexto da paren-
em tabelas, como proposto por Fávero e talidade. Nessa direção, recomenda-se
Sousa (2001), nas quais a primeira e se- estudos sobre desenvolvimento positivo
gunda colunas fornecem identificação às que objetivem preencher essa lacuna as-
referências pelo nome do primeiro autor sim como investigações sobre a parenta-
e da revista que ele publicou; a terceira lidade exercida por homens, idosos e ou-
apresenta o referencial teórico utilizado; tros cuidadores.
a quarta, os objetivos da investigação; a
quinta identifica o método utilizado; e a Palavras-chave: parentalidade,
sexta identifica os principais resultados e desenvolvimento adulto, revisão da literatura
conclusões descritos. As categorias oriun- nacional
das das leituras sugerem maior interesse Contato: André de Carvalho-Barreto, UnB,
de pesquisa sobre a parentalidade dentro andrecarvalhobarreto@yahoo.com.br
do desenvolvimento não normativo, re-
lacionado à vivência da parentalidade na
adolescência e às dificuldades apresenta-
das no seu exercício nas relações pais e
filhos. Esse dado converge com a inves-

378
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-1281 - FAMÍLIA E CULTURA: tas produções. Para isto são tecidas con-
A PATERNIDADE RETRATADA EM siderações acerca de algumas produções
DESENHOS ANIMADOS populares da mídia, assim como exami-
Zaíra Mendonça - UFAL nadas outras pesquisas sobre o tema. Em
zairalyra@gmail.com uma pesquisa sobre os programas infan-
Heliane Leitão - UFAL tis na televisão, as relações familiares e o
helianeleitao@uol.com.br exercício das funções parentais, Leila Brito
(2005) analisou os comportamentos de
Considerando-se as profundas mudanças personagens consagrados na televisão,
ocorridas nos modos de organização fami- indo dos seriados como “Papai Sabe tudo”
liar, constata-se a necessidade de reflexão aos super-heróis como “Super-Homem” e
acerca dos papéis e funções atribuídos aos “Zorro”. Como resultado, estabeleceu uma
seus membros na atualidade. O exercício relação entre estes personagens e as con-
da paternidade e suas atribuições, assim cepções de feminino e masculino vigentes
como sua relevância no desenvolvimento no momento de maior circulação de tais
das crianças, tem se tornado importante programas. Inês Hennigen (2003), investi-
alvo de investigação, sob a ótica de refe- gando paternidade e mídia, traça um para-
renciais teóricos diversos (Ramires, 1997; lelo entre a paternidade como construção
Lewis & Dessen, 1999; Levandowiski & social e a mídia na construção das posições
Piccinini, 2002; Resende & Gomes, 2004). de pai. A autora questiona que discursos
É evidente a importância da mídia na con- a mídia vem produzindo sobre e para os
temporaneidade enquanto veículo de in- pais, considerando que a forma de retra-
formação e transmissão de valores e ideais tar o pai se modificou profundamente nas
sociais, com grande inserção no cotidiano últimas décadas, como se pode constatar
das pessoas. A indústria cultural tende a através da comparação entre programas
refletir a realidade de uma época, ao tem- como a série “Papai sabe tudo”, nos anos
po em que é formadora de mentalidades 50/60, e “Os Simpsons” nos anos 90. Nes-
e catalizadora de mudanças sociais. O pre- ta mesma direção, Leitão e Stadtler (1998)
sente trabalho pretende estabelecer uma descrevem os modelos de pai presentes
interlocução entre as mudanças observa- em dois filmes de desenhos animados
das no exercício da paternidade e as ideias em momentos históricos distintos: “Bam-
veiculadas acerca do pai pela cultura da bi” (1945) e “O Rei Leão” (1994). Para as
mídia na atualidade. A mídia sendo aqui autoras, cada filme revela um modelo de
representada por programas televisivos paternidade consonante com a época em
e vídeos de desenhos animados dirigidos que foi produzido, considerando-se tanto
ao público infantil que trazem o tema da as condições psicoafetivas, como a identi-
paternidade como um de seus focos. O dade social de pai eleita como ideal para
objetivo principal deste estudo foi refletir aquele momento histórico. O pai dos anos
acerca de modelos de paternidade veicu- 90 se mostra afetuoso e próximo, em con-
lados pela mídia nas últimas décadas, bus- traste com o pai distante e formal dos anos
cando analisar como as efetivas mudanças 40. Na década de 1990 duas séries televi-
observadas no exercício da paternidade sivas obtiveram grande aceitação da popu-
vêm sendo incorporadas e retratadas nes- lação mundial: “Os Simpsons” e “A Família

379
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Dinossauro”. Os dois programas valorizam pode estar relacionada ao momento histó-


as figuras maternas, dotadas de equilíbrio rico de produção de cada filme e às trans-
e sensatez, atribuindo-as o lugar de refe- formações ocorridas nos papéis parentais
rência familiar. As figuras paternas, no en- nos últimos anos. Além disso, a família no
tanto, são apresentadas sob a ótica da in- “Rei Leão” é baseada na estrutura nucle-
competência para a solução de problemas, ar, na qual as funções e os papéis de cada
atrapalhadas, desprovidas de autoridade e genitor são bem definidos, enquanto que
inseguras no desempenho da função pa- o filme “Procurando Nemo” retrata uma
rental. A figura do ‘pai atrapalhado’ parece família monoparental, na qual a criança
ganhar força na transmissão de uma nova mora apenas com o pai. A tarefa de cuidar
imagem da paternidade, especialmente da criação do filho pequeno sozinho pare-
nas produções a partir dos anos 90. Isto ce ser uma tarefa árdua para Marlin, para
pode refletir a emergência de uma iden- a qual ele se mostra afetuoso e dedicado,
tidade paterna pouco definida, destituída embora inseguro e desajeitado. É possível
do seu lugar tradicional de detentor do perceber que as transformações sociais
poder e do saber. As mudanças sociais que vão sendo gradualmente incorporadas aos
acarretaram novas configurações de rela- filmes e programas dirigidos ao público
ções de gênero impulsionam o surgimen- infantil. Observa-se que o ideal de pai e o
to de uma nova paternidade, a qual vem exercício da paternidade foram sendo vei-
sendo gradualmente construída em meio culados através da mídia de acordo com a
a contradições, incertezas e inseguranças. vivência da sociedade em cada momento
Por outro lado, o novo modelo de pai tem histórico, frequentemente enfatizando as-
sido retratado como mais afetuoso, próxi- pectos associados aos papéis tradicionais,
mo e envolvido com a vida dos filhos. Rosa mas, concomitantemente, atribuindo à
Mariotto (2006) ressalta que atualmente função paterna elementos novos. Ao mes-
os pais estão mais preocupados e envol- mo tempo, reconhecendo-se a intrínseca
vidos com os cuidados e rotina de suas relação entre constituição de subjetivida-
crianças. Para ilustrar distintos modelos de e cultura, destaca-se a necessidade de
contemporâneos de paternidade, a autora examinar os modelos de pai oferecidos
traça um paralelo entre ‘Mufasa’ e ‘Mar- pela mídia, como forma de compreender
lin’, pais dos filmes de desenhos animados os processos de identificação masculina
“O Rei Leão” (1994) e “Procurando Nemo” com determinadas representações de pai
(2003), respectivamente. Mufasa exerce a disponíveis na cultura. Considera-se, por-
autoridade moral baseada na afetividade e tanto, a importância destes produtos da
nas instruções constantes ao filho Simba, indústria cultural enquanto poderosos fa-
constituindo-se como modelo de identi- tores de transmissão de valores e ideais
ficação para ele e influenciando decisiva- que se tornam constituintes das subjetivi-
mente na sua transformação de criança dades, na indissociável dialógica entre cul-
para adulto. Já Marlin, demonstra insegu- tura e modos de subjetivação.
rança e incerteza quanto aos cuidados do
seu filho Nemo, quando se vê obrigado a Palavras-chave: paternidade, cultura, mídia
criá-lo sozinho após a morte da mãe. Esta Contato: Zaíra Rafaela Lyra Mendonça, UFAL,
nítida diferença entre Marlin e Mufasa zairalyra@gmail.com

380
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-1295 - EXPECTATIVAS MATERNAS Alegre: Da Gestação à Escola – ELPA (Pic-


SOBRE O INGRESSO DO BEBÊ NA cinini, Tudge, Lopes & Sperb, 1998/2009).
CRECHE E OS CRITÉRIOS DE ESCOLHA As mães tinham idade entre 20 e 37 anos
DOS CUIDADOS ALTERNATIVOS: DA (M=28; dp=5,13), escolaridade de 13 anos
GESTAÇÃO AO PRIMEIRO ANO DE VIDA em média (dp=3,04), eram primíparas,
DO BEBÊ moravam com o pai do bebê, sendo que
Andrea Rapoport - UNILASSALE 35 mães tinham trabalho remunerado. Foi
deiar@terra.com.br realizado um levantamento de dados, que
Gabriela Dal Forno Martins - UFRGS envolveu três etapas de coleta: último tri-
gdalfornomartins@gmail.com mestre de gestação, 3 e 12 meses do bebê.
Cesar Augusto Piccinini - UFRGS Na gestação, foram realizadas a Entrevista
piccinini@portoweb.com.br de dados demográficos e a Entrevista so-
bre gestação e as expectativas da gestante
Atualmente, é comum que as famílias cui- (questões utilizadas: Tu estás pensando
dem exclusivamente das crianças apenas em colocar o bebê na creche ou deixar
nos primeiros meses, enquanto durar o com alguém para cuidar? Por que esta
período de licença maternidade (Lordelo, escolha? Quando tu pensas fazer isto?).
1997). Na falta de uma rede de apoio para Quando o bebê completou três e doze
compartilhar o cuidado à criança quando meses, as mães responderam a Entrevis-
voltam a trabalhar, muitas mães optam ta sobre a experiência da maternidade no
por inserir o filho na creche, deixar sob terceiro mês do bebê e a Entrevista sobre
cuidados de uma babá ou ainda de um a experiência da maternidade e desenvol-
parente. Embora seja uma demanda social vimento do bebê de um ano (questões
na atualidade, a entrada de bebês em cui- utilizadas: O bebê foi para a creche? Com
dados alternativos, especialmente durante que idade? Por que escolheram colocar na
o primeiro ano, tem gerado controvérsias creche? Porque escolheram a creche que
entre estudiosos e leigos, pois implica em ele está? (Se não foi para a creche) Vocês
separações diárias do bebê e da mãe en- estão pensando em colocar o bebê na cre-
quanto ele ainda é muito pequeno. A revi- che? Quando? Por que escolheram colocar
são da literatura mostra que existem pou- na creche?). Análise de conteúdo (Bardin,
cos estudos que exploram as atitudes dos 1977) foi utilizada para examinar as res-
pais em relação aos cuidados alternativos, postas às diferentes entrevistas com base
como ocorrem suas escolhas e suas ex- em três categorias que emergiram das
pectativas em relação aos mesmos (Long, próprias respostas: 1) Intenção de colocar
Wilson, Kutnick & Telford, 1996). Diante o bebê na creche e a idade que pretendia
disso, este estudo teve como objetivo ca- colocá-lo; 2) Motivos da mãe para colocar
racterizar as expectativas maternas sobre bebê na creche; e 3) Motivos para deixar
ingresso do bebê na creche e os critérios bebê em casa ou na casa de um familiar.
de escolha dos cuidados alternativos, in- Subcategorias também foram utilizadas na
vestigadas longitudinalmente da gestação classificação das respostas. Enquanto na
até o bebê completar um ano. Participa- gestação as mulheres referiram com maior
ram do estudo 44 mães, que faziam parte frequência que pretendiam colocar o bebê
do projeto Estudo Longitudinal de Porto na creche numa idade indefinida (36%); no

381
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

3º mês destacou-se a subcategoria depois segundo mês: 8%). Por sua vez, a atenção
de um ano (23%), e no 12º mês também a individualizada foi citada em um número
subcategoria idade indefinida (28%). Além crescente de respostas, aumentando de
disso, houve um aumento no número de 3% na gestação para 11% no 12º mês. Ape-
mães que tiveram suas falas classificadas sar da importância atribuída aos benefí-
na subcategoria não pretende na gestação cios para o bebê, as facilidades para a mãe
(4,5%) e terceiro mês (9%), em compara- também foram apontadas como um im-
ção com o décimo segundo mês (13%). portante motivo para deixar a criança em
Quanto aos motivos declarados pelas casa (32% das respostas na gestação, 26%
mães para colocar o bebê na creche, pre- aos 3 meses e 39% aos 12 meses), sendo
dominou, na gestação, a restrição ou falta que ter pessoas disponíveis para cuidar do
de provedores de apoio (55%), e no ter- bebê foi a facilidade mais citada. Em con-
ceiro e décimo segundo mês os benefícios junto, estes resultados parecem indicar
para o bebê (56% e 60%, respectivamen- que as mães preferem postergar a entrada
te). A restrição de apoio, na gestação, es- do bebê na creche para uma idade superior
teve relacionada principalmente à necessi- ao primeiro ano, e que diferenciam os cui-
dade da mãe trabalhar (37%). No entanto, dados disponibilizados nos diferentes am-
esta necessidade decresceu para 15% das bientes. O ambiente doméstico garantiria
respostas aos três meses, e para 5% aos 12 ao bebê intimidade e segurança, enquanto
meses, sugerindo que o ingresso na creche o ambiente de creche atenderia as neces-
nesta fase não está condicionado necessa- sidades de socialização e contato com es-
riamente ao emprego materno. Já quanto tímulos diversos. Essa distinção pode estar
aos benefícios da creche para o bebê, as relacionada às crenças maternas de que a
subcategorias socialização e estímulo para criança, em cada fase do desenvolvimento,
o desenvolvimento foram sendo gradati- possuiria diferentes necessidades. Mas, o
vamente mais valorizadas pelas mães: a que chama a atenção, é que as mães consi-
socialização, citada por 11% das gestantes, deram que cada cuidador possui um papel
foi para 27% no terceiro mês e para 22% distinto e atende somente algumas dessas
no décimo segundo; e o estímulo para o necessidades. Talvez, como forma de ga-
desenvolvimento, trazido por 11% das ges- rantir seu lugar na vida da criança depois
tantes, evoluiu para 14,5% aos três meses que ela passa a permanecer muitas horas
e 16% aos 12 meses. Por fim, em relação com outras pessoas, as mães deleguem a
aos motivos citados pelas mães para dei- si mesmas tarefas únicas que não pode-
xar o bebê em casa ou com familiar, des- riam ser supridas por outro cuidador. Isso
tacou-se a subcategoria benefícios para as auxiliaria a lidar de uma forma melhor
o bebê em todas as fases (gestação=63%; com as separações constantes do bebê e
3º mês=68%; 12º mês=57%). Dentre estes com eventuais ameaças ao apego ante-
benefícios, o motivo mais citado foi a ida- riormente estabelecido.
de do bebê, tanto na gestação (45%), como
no terceiro mês (34%). Também foi citada Palavras-chave: expectativas maternas,
a importância da família/lar/contexto co- cuidados alternativos, creche
nhecido em todas as fases de coleta (ges- Contato: Gabriela Dal Forno Martins, UFRGS,
tação: 10%; terceiro mês: 9%; e décimo gdalfornomartins@gmail.com

382
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-1296 - TRANSMISSÃO punição física e privação de privilégios ou


INTERGERACIONAL DE PRÁTICAS ameaças, compelindo a criança a adequar
EDUCATIVAS PARENTAIS: EVIDÊNCIAS o seu comportamento a determinadas si-
EMPÍRICAS tuações e às reações punitivas dos pais
Angela Helena Marin - ULBRA (Hoffman, 1975). Entendendo as relações
ahmarin@hotmail.com que se estabelecem no sistema familiar
Ana Paula Corrêa de Oliveira Freitas - UFRGS como recíprocas, tanto características das
anapaulapsi@gmail.com crianças quanto dos genitores exercem
Gabriela Dal Forno Martins - UFRGS influência sobre os processos de sociali-
gdalfornomartins@gmail.com zação (Belsky, 1984; Biasoli-Alves, 1997).
Isabela Machado da Silva - UFRGS Em se tratando das diversas características
isabela.ms@gmail.com dos genitores, é importante considerar os
Rita de Cássia Sobreira Lopes - UFRGS aspectos intergeracionais de sua história,
sobreiralopes@portoweb.com.br como a criação que eles próprios recebe-
Cesar Augusto Piccinini - UFRGS ram de seus pais ao longo de seu desen-
piccinini@portoweb.com.br volvimento. Portanto, este estudo teve
como objetivo investigar a transmissão
O conceito de família tem passado por intergeracional das práticas educativas
constantes modificações decorrentes das parentais. Participaram 30 mães e 22 pais,
transformações sociais e culturais da so- cujo primeiro filho tinha três anos de ida-
ciedade pós-moderna (Fonseca, 2005). de (70% meninos). As mães apresentavam
Todavia, por ser o primeiro meio social do idade média de 27 anos (SD = 5,81) e 63%
qual o indivíduo participa, a família ainda delas tinha, no máximo, o ensino médio
tem como tarefa fundamental o processo completo; os pais, por sua vez, tinham em
de socialização, através do qual a criança média 29 anos (SD = 7,53) e 67% deles pos-
deve adquirir comportamentos, habilida- suíam ensino médio completo. Em relação
des e valores apropriados e desejáveis em ao nível socioeconômico, 17% das famílias
sua cultura (Biasoli-Alves, 1997; Nichols pertenciam ao nível baixo, 26% ao médio
& Schwartz, 1998; Steinberg, 2000). Para baixo, 20% ao médio, 17% ao médio alto
tanto, os pais utilizam-se de diversas estra- e 20% ao alto. Quanto à situação conjugal,
tégias e técnicas para orientar os compor- 80% tinham companheiro/a, 17% eram
tamentos de seus filhos, chamadas de prá- solteiros/as e 3% separados/as. Todos os
ticas educativas parentais (Hoffman, 1975, participantes fazem parte do Estudo Lon-
1994; Newcombe, 1999), que podem ser gitudinal de Porto Alegre: Da Gestação à
classificadas em estratégias indutivas e de Escola – ELPA (Piccinini, Tudge, Lopes &
força coercitiva, conforme Hoffman (1994). Sperb, 1998/2009). Mães e pais respon-
As práticas indutivas caracterizam-se por deram separadamente à Entrevista sobre
direcionar a atenção da criança para as o Passado dos Pais (Tudge, 1994), a partir
consequências de seu comportamento às da qual se obtiveram informações sobre a
outras pessoas e para as demandas lógi- sua infância e as práticas educativas que
cas da situação; já as práticas coercitivas receberam de seus genitores; e à Entrevis-
caracterizam-se pelo uso da aplicação de ta sobre Estratégias Disciplinares (Tudge,
força direta e do poder dos pais, e incluem 1994), utilizada para a análise das práticas

383
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

educativas que utilizavam com seus pró- das na educação recebida pelos próprios
prios filhos. As respostas dos participantes pais (p<0,05), enquanto a combinação
às diferentes questões da entrevista foram de indutivas/coercitivas foi mais mencio-
transcritas e analisadas através da análise nada entre as práticas utilizadas com os
de conteúdo (Bardin, 1977), a partir de ca- filhos (p<0,01). A proporção de práticas
tegorias pré-definidas, baseadas em Hoff- coercitivas manteve-se estável entre as
man (1975, 1994) e adaptadas por autores gerações. A análise qualitativa indicou um
do presente estudo (Alvarenga & Piccinini, padrão mais claro de reprodução das prá-
2001; Marin, Piccinini & Tudge, no prelo): ticas coercitivas, ainda que estas fossem
práticas indutivas (negocia/troca, explica/ relatadas como evitadas, na medida em
fala, explica baseado em convenção/con- que eram relacionados à idéia de vivência
sequencia, organiza o ambiente/forma de sofrimento quando crianças. Por outro
hábito e comanda sem coerção), práticas lado, alguns genitores mencionaram que,
coercitivas (punição, ameaça, coação física mesmo tendo associado memórias desa-
e punição física), práticas de não interfe- gradáveis às práticas coercitivas, faziam
rência (não se intromete, segue o ritmo uso eventual das mesmas por acreditarem
da criança e cede a vontade da criança), e que se não foram nocivas a eles também
combinação de práticas indutivas/coerciti- não seriam para os filhos. A mudança in-
vas. Foram calculadas as frequências e pro- tergeracional das práticas educativas foi
porções totais em cada categoria e compa- associada à aprendizagem de práticas ou
radas as proporções de práticas recebidas habilidades parentais junto a outras figu-
e utilizadas através do teste Z. Além disso, ras que não somente os próprios pais, em
realizou-se uma análise qualitativa visan- especial o cônjuge, à busca pela correção
do avaliar especificidades da transmissão de experiências prévias na relação com os
intergeracional das práticas educativas filhos, e ao temperamento dos pais e/ou
caso a caso. Os resultados indicaram que das crianças. Em conjunto, os resultados
os participantes relataram ter recebido do presente estudo forneceram indícios
de seus próprios pais mais práticas coer- de que houve a semelhança no uso das
citivas (52%) seguidas das indutivas (40%), práticas coercitivas entre gerações e um
e, com menor freqüência, a combinação aumento na utilização com os próprios fi-
de indutivas/coercitivas (3,5%) e não in- lhos de práticas que combinam estratégias
terferência (4,5%). Tendência semelhante indutivas e coercitivas. Todavia, a análise
ocorreu em relação às práticas utilizadas caso a caso revelou que em apenas me-
com os próprios filhos, onde foram mais tade dos casos houve a transmissão dos
relatadas práticas coercitivas (60%) do que padrões interativos, o que fortalece a idéia
indutivas (26%). Já a combinação de práti- de que a forma como os pais educam seus
cas indutivas/coercitivas foi mais mencio- filhos trata-se de um processo complexo
nada (13%) entre as utilizadas. O teste Z e recíproco que envolve características de
indicou diferença significativa entre as ge- ambos (Belsky, 1984; Biasoli-Alves, 1997).
rações na proporção de práticas indutivas, Nesse sentido, é plausível supor que a
de não interferência e da combinação de transmissão intergeracional das práticas
indutivas/coercitivas. As práticas indutivas educativas não envolve somente a repro-
e de não interferência foram mais relata- dução para com os filhos dos padrões re-

384
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cebidos quando criança, ainda que estes gico, o leitor poderá observar o seguinte
possam levar à construção de modelos so- exemplo na manchete: BOLSA FAMÍLIA
bre o que deve ser seguido ou evitado nas - “Beneficiários usam recurso para com-
relações posteriores (Ângelo, 1995). prar roupas e eletrônicos” Tocadores de
música MP4, celulares, aparelhos de DVD
Palavras-chave: práticas educativas, e brinquedos. Esses são alguns dos arti-
parentalidade, transmissão intergeracional gos adquiridos por famílias em situação
Contato: Gabriela Dal Forno Martins, UFRGS, de pobreza (R$60) ou de extrema pobreza
gdalfornomartins@gmail.com (R$120) beneficiadas pelo maior progra-
ma de transferência de renda direta do
País, o Bolsa Família, em cidades da RMC
LT04-1303 - PSICOLOGIA ECONÔMICA: (Região Metropolitana de Campinas).(
O ESTUDO DO DESEMVOLVIMENTO DO Reportagem jornal Todo Dia, 2008). A re-
COMPORTAMENTO ECONÔMICO portagem traz o fato de famílias que uti-
Maria A. Belintane Fermiano - UNICAMP lizam o benefício na compra de itens que
maria.belintane@gmail.com não são considerados como aqueles que
Sonia Bessa - Unasp/LPG-FE/UNICAMP o programa tem como objetivo. Reynaud
(1967) explicaria que a disponibilidade
O termo Psicologia Econômica ocorreu material (Bolsa-Família enquanto recurso
pela primeira vez em 1881, aplicado por provedor de necessidades) desenvolve
Gabriel Tarde e é pouco conhecido até os possibilidades psicológicas no indivíduo.
dias de hoje. Essa é uma área cujas pes- No exemplo, pressupõe-se que o estímu-
quisas se iniciaram no final do século XIX lo econômico (o recurso do Bolsa-Família)
e, em seu transcurso histórico, houve vá- seja direcionado para o consumo de bens
rios fatores que dificultaram sua constitui- de primeira necessidade, no entanto, não
ção como uma disciplina, bem como seu é utilizado como o esperado, sendo “des-
trânsito entre as áreas da Psicologia e da viado” para a satisfação de outros “dese-
Economia. A Psicologia Econômica busca jos” ou “necessidades”. Observa-se que
identidade e tem a contribuição de psi- tanto a primeira situação, consumo de
cólogos, economistas, neuropsicólogos, bens de primeira necessidade, como a se-
sociólogos, antropólogos e filósofos, que gunda, consumo de eletrônicos e roupas,
procuram explicá-la e localizá-la como fa- contribuem para a movimentação de dife-
zendo parte da vida do homem, desde os rentes setores da economia. Como esses
primórdios da sua história. Compreender objetos figuram na lista de outras tantas
seu conceito implica em estabelecer rela- pessoas, sob a ótica da Psicologia Eco-
ção entre os conhecimentos e peculiarida- nômica é possível elaborar os seguintes
des da Psicologia e da Economia. Reynaud questionamentos: “O que levam pessoas
(1967, p. 9,10) definiu a Psicologia Econô- a valorizarem tais objetos? O que poderia
mica como um “estudo da economia que ser considerado como essencial? Essen-
aborda aspecto subjetivo ou mental e en- cial para quem? Como pode ser avaliado
volve as necessidades, os valores e o bem- o desejo e o poder de compra? Como o
-estar”. Para contextualizar o significado desejo de possuir um determinado obje-
do comportamento econômico e psicoló- to surge e atinge, simultaneamente, pes-

385
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

soas de diferentes segmentos sociais? O se considera o homem como um indivíduo


que pode ser considerado como racional social e psicológico. A Psicologia Econômi-
nesse caso? Tais questionamentos podem ca teve um grande desenvolvimento nos
ser analisados sob aspectos psicológicos e últimos 60 anos. De acordo com Ferreira
econômicos e sua inter-relação é objeto (2007), a formação acadêmica na área,
de estudo da Psicologia Econômica, pois tanto nos Estados Unidos, na Europa e,
os “processos econômicos são o resulta- mesmo na América Latina, ainda não de-
do do comportamento de pessoas e são monstra consolidação e nem constância.
influenciados por diferentes modelos de Já no Reino Unido, na Universidade de
comportamento” (Katona, 1975, p.4). Ao Exeter, há importantes trabalhos. Denegri
longo do processo de estabelecimento (1999, p.5, 10) explica que, na América La-
da Psicologia Econômica, as ideologias e tina, até 1999 não havia estudos sistemá-
a filosofia de cada época, interferiram na ticos com populações latinoamericanas
elaboração de modelos que explicassem sobre o processo de socialização de con-
a economia, a psicologia, as questões sumo “aplicado à nossa realidade cultural
sociais, e no desenvolvimento de teorias e nem quais são os hábitos e condutas de
subjacentes a cada área. Economistas consumo nas diferentes idades a partir da
e neuropsicólogos procuram, por meio adolescência”. A autora elabora em 1995,
de suas pesquisas e teorias, demonstrar um modelo evolutivo da psicogênese do
como as pessoas pensam e como as ati- conhecimento econômico que desen-
vidades cerebrais funcionam. Kahneman cadeou pesquisas no Chile, Colômbia e
(2002), Simon (1979), Egide (2002) bus- Brasil. Tais pesquisas definem uma linha
cam explicar como ocorre o conhecimen- de desenvolvimento contextual distinta,
to. Assim, os estudos sobre comporta- pois conjuga as ideias-chave da Psicologia
mento econômico estão intrinsecamente Econômica com fundamentação na Psico-
relacionados com aprendizagem e cog- logia do Desenvolvimento, em especial a
nição e com maneiras mais racionais, ou Psicogenética. Denegri (2007) apresenta
seja, mais inteligentes em resolver proble- três grandes importantes temas à Psicolo-
mas de forma inovadora, onde o conhe- gia Econômica, os quais contribuem para
cimento desempenha papel fundamental estudos do comportamento econômico:
nas estratégias de ações a serem utiliza- A - Alfabetização Econômica; B - Sociali-
das pelos indivíduos. Com certeza, eis aí, zação Econômica e C - Psicologia do Con-
a implicação de todo esse estudo para a sumo. No Brasil, poucos centros se dedi-
Educação. Nos últimos 30 anos, houve um cam à área. Destacam-se os trabalhos de
salto qualitativo significante em relação às Moreira, Universidade do Pará; a tese de
pesquisas realizadas por economistas que doutorado de Ferreira (2007). E na área
abordam questões pertinentes às emo- da Educação, o Laboratório de Psicolo-
ções e motivos que pessoas possam mani- gia Genética/UNICAMP que, desde 2006,
festar em suas condutas sociais e econô- possui um grupo de pesquisa voltado para
micas. Simon (1979) e Kahneman (2002) Educação Econômica: Araújo (2007); Silva
demonstram que o estudo da racionalida- (2008); Cantelli (2009); Ortiz (2009); Fer-
de ainda mantém-se vivo, diferente do di- miano (2010); Braga (2010). Os autores
fundido no final do século XVII, pois hoje Lea, Tarpy e Webley (1987, p. 371, 381)

386
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

explicam que o estudo das questões que na infância, com o objetivo de obter pro-
envolvem as crianças na economia de hoje ximidade com a figura materna. Tal com-
é recente. E pressupõem que, se a econo- portamento continua durante toda vida,
mia tem influência no comportamento pois, é indispensável para a vida social,
individual, pode-se esperar que também favorecendo a capacidade de manter
tenha no comportamento econômico das relações. Segundo Barros e Fiamenghi
crianças. Os autores apontam pesquisas (2007), mães insensíveis e negligentes às
que demonstram a influência das crian- necessidades de seus filhos acabam por
ças nas decisões de compra de seus pais gerar insegurança nas crianças, tanto em
e outras pesquisas sobre a influência da relação à própria mãe, quanto em relação
propaganda nas crianças. E destacam a aos outros. Quando as crianças têm suas
importância e o compromisso em teorizar necessidades de afeto, trocas subjetivas
tais dados. As pesquisas nas áreas tiveram e cuidados com higiene e alimentação
grande avanço, a partir de 1982, as quais atendidas, tornam-se confiantes e desen-
descreviam “conceitos infantis sobre uma volvem-se emocional, física e intelectual-
série de fenômenos econômicos, desde o mente de forma saudável. O ECA, criado
de banco, até o de desemprego”. Desse em 1990, prevê a proteção integral da
modo, compreende-se que a Psicologia criança, assegurando o desenvolvimento
Econômica e, em especial, a Educação físico, mental, moral, espiritual e social
Econômica, apresentam grandes possibi- (Brasil, 2002). No entanto, segundo We-
lidades de pesquisas inovadoras. Tais te- ber (1995), a institucionalização - criada
mas fizeram parte do referencial teórico com intuito de proteger a criança - sim-
da pesquisa “Pré-adolescentes (“tweens”) plesmente efetiva, na prática, o afasta-
desde a perspectiva da teoria piagetiana à mento da criança ou adolescente do con-
da Psicologia Econômica”. vívio familiar e social. Mannoni (1995)
observa que crianças abrigadas apresen-
Palavras-chave: Psicologia econômica, tam a carência como marca importante
educação econômica, socialização econômica. em suas vivências afetivas e acrescenta
que, muitas vezes, seus efeitos são irre-
versíveis. Azôr e Vectoré (2008) observam
CO 39 - LT06 que, quando abrigadas, as crianças pas-
Acolhimento Institucional sam por um processo de ‘mutilação’ de
sua identidade, pois, a instituição afasta
o individuo da sociedade. Quando consi-
LT06-686 - AVALIAÇÃO DE SINAIS DE deramos o Transtorno de Apego Reativo,
TRANSTORNO DE APEGO REATIVO EM sua característica principal é uma “liga-
CRIANÇAS ABRIGADAS ção social perturbada e inadequada, com
inicio aos 5 anos de idade e associada ao
Renata Hottum Melani - UPM recebimento de cuidados amplamente
patológicos” (Apa, 1995, p. 384). Ainda
Bowlby (1990) afirma que o vínculo afe- segundo o DSM IV (Apa, 1995), tal trans-
tivo (attachment) se dá na atração vivida torno pode apresentar-se sob duas for-
por dois indivíduos e que se desenvolve mas: tipo inibido e tipo desinibido. Sua

387
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

condição está associada a cuidados am- interesse social, sentimentos de imobi-


plamente patológicos, sendo que as ne- lidade, desesperança e incapacidade de
cessidades físicas e emocionais da criança agir com confiança, segundo os critérios
foram negligenciadas, pouco estimuladas propostos por Koppitz (1968). Outro traço
e que a mesma recebeu pouco afeto; ou- observado em 44% das crianças foi uma
tra característica é que, provavelmente, agressão aberta em relação ao ambiente
houve mudanças repentinas de quem cui- e 40% das crianças também mostraram
dava primariamente da criança, evitan- sinais de sentimentos de inadequação
do a formação de vínculos estáveis. Esta ou culpa por não serem capazes de agir
pesquisa, portanto, teve como objetivo adequadamente. Parece existir uma inci-
investigar, por meio de Desenho da Figu- dência de traços do tipo inibido do Trans-
ra Humana (DFH) de crianças abrigadas, torno, que é caracterizado por falhas em
sinais de Transtorno de Apego Reativo na iniciar e manter interações sociais e um
Infância. Foram avaliadas 25 crianças (15 padrão de respostas inibidas em relação
do sexo masculino e 10 do feminino), com ao ambiente. Outro critério do Transtor-
idades entre 4 e 12 anos, que viviam em no Reativo de Apego relaciona-o com
um abrigo na região metropolitana de São cuidados patológicos na infância, o que
Paulo. A diferença no número de meninas é evidente em nossa amostra, pois, as
e meninos se deve ao fato de que existem crianças foram separadas dos pais devido
mais meninos abrigados do que meninas. a maus tratos, negligência e abuso. Nos
Por se tratar de crianças abrigadas - mui- desenhos, segundo os critérios de Koppitz
tas afastadas das famílias por questões (1968), foi percebido que essas crianças
de abuso e maus tratos - as informações possuem um sentimento de desamparo
pessoais não foram fornecidas pela insti- e grande insegurança. Outro sentimento
tuição, como uma tentativa de preservar que chama à atenção foi o de sentirem-se
o sigilo. Assim, dados sobre as famílias, ameaçadas pelo mundo, principalmente,
condições de saúde física e/ou psicológi- por adultos e, especialmente, pelos seus
ca das crianças e tempo de abrigamento pais, demonstrando assim que, de algu-
não foram disponibilizados. O instrumen- ma forma, essas figuras que deveriam
to utilizado para avaliação foi o Desenho representar a segurança falharam. Essas
da Figura Humana (DFH), seguindo os 30 características do transtorno também são
indicadores emocionais propostos por percebidas e relatadas por de Schwartz e
Koppitz (1968). Após a aplicação, os de- Davis (2006), que levantam, ainda, a hipó-
senhos foram realizados e os resultados, tese de que a história de maus tratos di-
comparados com os dos critérios diag- ferencia o Transtorno Reativo dos demais
nósticos do DSM-IV para Transtorno de transtornos. Na verdade, ao se analisar a
Apego Reativo. Sinais importantes foram história do abrigamento no Brasil, chega-
observados, indicando que algumas das -se à conclusão de que, apesar de muitas
crianças da amostra necessitam ser mais tentativas de estabelecer uma vida mais
direta e atentamente observadas, pois, digna a essas crianças, a grande maioria
48% de todas as crianças foram caracte- foi e é frustrada, pois, no dia-a-dia das
rizadas por timidez, afastamento, falta instituições, continua valendo a desper-
de agressividade, assim como com baixo sonalização e o castigo. Uma caracterís-

388
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tica marcante na instituição analisada é LT06-727 - COMPORTAMENTO DE


que os cuidados primários eram realiza- CUIDADO ENTRE CRIANÇAS NA ESCOLA E
dos por figuras pouco constantes e que se NO ABRIGO: UM ESTUDO COMPARATIVO
revezavam evitando, assim, a formação Débora Lisboa Correa Costa - UFPA
de vínculos estáveis. Toda a literatura so- debylisboa2007@yahoo.com.br
bre Transtorno de Apego Reativo mostra Lília Iêda Chaves Cavalcante - UFPA
que os sintomas desaparecem quando as liliaccavalcante@gmail.com
crianças são colocadas em lares afetivos Laiane da Silva Corrêa - UFPA
e com cuidados adequados. Portanto, lai_correa@yahoo.com.br
deve-se tentar ao máximo, como propos- Diene Cristina de Lima Correa - UFPA
to pelo ECA (Brasil, 2002), restabelecer
dienelimassocial@yahoo.com.br
ou mesmo estabelecer uma relação mais
saudável entre as crianças e suas famílias, Financiamento: CAPES
assim como, enquanto abrigadas, que as
crianças tenham figuras de referência com Diversos estudos mostram que, ao intera-
quem possam estabelecer e construir vín- gir, a criança tem a oportunidade de de-
culos. Se as instituições de abrigamento senvolver suas habilidades sociais. Dentre
promovessem treinamento adequado à elas, ações de solidariedade ao próximo,
equipe responsável pelo cuidado com as semelhantes ao cuidado parental, que
crianças, muitas das situações de instabi- têm por objetivo dar suporte ao outro e
lidade vincular seriam evitadas garantin- que são definidas como comportamen-
do, futuramente, relações mais saudáveis to pró-social. Essa modalidade de com-
e indivíduos mais seguros. Podemos dizer, portamento, que pode assumir a forma
também, que a utilização dos critérios de cuidado entre pares, sofre influência
de Koppitz (1968) permite avaliar sinais de fatores físicos e sociais do ambiente.
de Transtorno Reativo de Apego, embora No caso de crianças que estão vivendo e
mais pesquisas sejam necessárias, dadas crescendo em instituições de abrigo, estu-
as limitações da amostra estudada, tanto dos mostram que, devido à sua condição
em termos de número, quanto de infor- peculiar de vulnerabilidade pessoal e so-
mações significativas (tempo de abriga- cial, tais crianças podem se beneficiar da
mento, condições que levaram ao abriga- presença do comportamento de cuidado
mento). Em relação ao Transtorno Reativo nas interações estabelecidas nesse tipo
de Apego, sabemos que as definições e de ambiente. Esta modalidade de com-
critérios utilizados pelo DSM-IV são bas- portamento pró-social lhes possibilita
tante limitados e imprecisos. Portanto, oferecer e obter ajuda e apoio emocional
são realmente necessárias mais pesquisas no convívio com seus pares, auxiliando-os
para clarificar este transtorno, que pode a diminuir o sofrimento ocasionado pelo
levar tantas crianças abrigadas a um erro distanciamento da família. E, ainda, nas
de diagnóstico e prognóstico em relação a situações em que estas crianças freqüen-
seu futuro psicológico. tam a escola, isso lhes possibilita, além do
aprendizado de conteúdos e conhecimen-
Palavras-chave: Transtorno de Apego Reativo, tos, a convivência com crianças em uma
Desenho da Figura Humana, abrigamento instituição diferente do abrigo, em um

389
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ambiente que tem outras características uma a uma das categorias comportamen-
físicas e sociais. Tomando como referência tais, percebe-se que o comportamento de
os benefícios da convivência da criança ajudar, quando emitido na escola (n=14;
institucionalizada em outros ambientes e 53.8%), apresentou freqüências maiores
da constatação do baixo número de pes- que no abrigo (n=7; 41,2%). Contudo, o
quisas que investigam a presença destas Teste Binomial indica que esta diferen-
crianças em mais de uma instituição infan- ça não é estatisticamente significativa
til, este estudo teve como objetivo investi- (p>0,05), sendo semelhantes os percen-
gar aspectos do ambiente que concorrem tuais referentes a ações de ajuda em am-
para a manifestação do comportamento bos os ambientes. O mesmo constata-se
de cuidado entre pares, observados em em relação ao comportamento de brincar
suas interações nos pátios da escola e de cuidar que, em termos percentuais,
do abrigo. Participaram do estudo cinco foi mais presente no abrigo (n=4; 23.5%)
crianças, com quatro a seis anos de idade, do que na escola (n= 2;7.7%); entretan-
que moravam há mais de um ano no abri- to, a análise estatística mostrou que não
go e freqüentavam regularmente a escola. houve significância estatística entre os
Para a coleta de dados, cada sujeito focal e ambientes. A descrição da freqüência do
suas interações com outras crianças foram comportamento estabelecer contato afe-
filmados nos dois ambientes, ao longo de tuoso mostra que este se apresenta com
dez sessões com duração de cinqüenta maior ocorrência na escola (n=7; 26.9%)
minutos cada, totalizando 500 minutos de do que no abrigo (n=6 ; 35.3%), porém, o
observação dos participantes da pesqui- teste mostra que não houve diferença es-
sa. Quanto aos resultados derivados da tatística entre ambos os ambientes. E, por
observação dos sujeitos focais, constatou- fim, verificou-se que o comportamento
-se que os cinco participantes manifes- de entreter não teve nenhuma ocorrência
taram comportamentos de cuidado nos no abrigo, tendo sido observado somente
ambientes da pesquisa. Ao todo, foram no ambiente da escola (n=3, 11.5%), não
registrados 43 eventos de comportamen- sendo possível, assim, a aplicação do teste
to de cuidado, organizados em torno das estatístico. A análise estatística dos dados
seguintes subcategorias: estabelecer con- mostrou que nenhuma das subcatego-
tato afetuoso, ajudar, brincar de cuidar e rias do comportamento de cuidado teve
entreter. Ao descrever a freqüência deste predomínio estatístico em ambos os am-
comportamento no pátio da escola (26) bientes (abrigo e escola). Os resultados do
e do abrigo (17), constata-se que os per- estudo revelam que a escola (n=26) teve
centuais que representam esse tipo de a maior ocorrência do comportamento
evento foram mais elevados no primeiro quando comparada ao ambiente de abri-
ambiente quando comparados aos do se- go (n=17), o que está, provavelmente,
gundo. Entretanto, a avaliação intragrupal relacionado às características sociais da
mostrou que não houve diferença estatís- instituição escolar, onde os profissionais
tica na diferença dos percentuais do com- buscam incentivar os alunos ao cuidado
portamento de cuidado observados nos recíproco, através de atividades grupais e
pátios da escola e do abrigo. Quando se da educação inclusiva de inserção de alu-
considera para análise o desempenho de nos com deficiência neste ambiente. Os

390
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dados apontaram, também, que a escola LT06-754 - REFLEXÕES SOBRE O


não foi somente o ambiente de maior nú- DESENVOLVIMENTO INFANTIL DE
mero de ocorrências do comportamento CRIANÇAS ADOTADAS NO BRASIL
de cuidado, mas, onde houve uma maior Alessandra Themudo Lessa - FMU/SP
variação deste comportamento, visto que dudalessa@uol.com.br
todas as subcategorias estiveram presen- Vanessa Mendonça Lima Borba - FMU/SP
tes nas interações entre as crianças no vmlima@gmail.com
pátio escolar. No abrigo, o número de sub-
categorias manifestadas foi menor, talvez No Brasil, existem algumas formas de
devido ao caráter da instituição, que inclui adoção; dentre elas, quatro são as mais
uma rotina fechada, com poucos horários comuns: adoção legal, que transcorre
de recreação livre e com uma alta taxa de dentro das medidas legais; adoção ilegal,
rotatividade entre os profissionais e as “à brasileira”, que consiste em registrar
crianças acolhidas. Isto dificulta a cons- a criança com o nome dos pais adotivos,
trução de vínculos mais fortes entre as sem passar pelo processo legal; adoção ir-
crianças o que, consequentemente, dimi- regular ou adoção pronta, na qual os pre-
nui as ocorrências do comportamento de tendentes convivem com a criança em seu
cuidado. Esta pesquisa é importante por domicílio, sem registrá-la e, depois, bus-
revelar, a partir dos dados obtidos, como cam legalizar a situação; adoção “intuitus
as crianças em acolhimento institucional personae”, que é a adoção realizada por
interagem com seus pares no ambiente pessoas indicadas pela mãe biológica, que
escolar, o que permitirá uma futura inter- enfrentarão os trâmites do processo legal
venção no sentido de favorecer as mani- (Souza, 2008). Qualquer que seja o pro-
festações de comportamentos pró-sociais cesso enfrentado pela criança, não muda-
em ambos os ambientes. Uma vez que rá o fato de que ela tem uma história e de
se constatou que ainda existem poucas que a conhece, ainda que não tenha sido
pesquisas que investigam esta temática, verbalizada ou confirmada. Dolto (1978)
aponta-se a necessidade de continuação enfatiza que o ser humano “sabe mais
deste estudo, através de outros que per- de si mesmo” do que só aquilo que ele se
mitam a ampliação do número de sujeitos lembra ou que lhe contam. Há um saber
e da investigação das interações de crian- inconsciente que, quando não é posto em
ças acolhidas em outros ambientes além palavras, ou lhe oferecem uma visão dis-
da escola e do abrigo como, por exemplo, torcida, abre espaço para uma vida sim-
espaços da comunidade. bólica assentada em uma base insegura.
Para se desenvolverem satisfatoriamente,
Palavras-chave: comportamento de cuidado, as crianças necessitam de amor, dedica-
interações infantis, acolhimento institucional ção, interação e um ambiente seguro e
acolhedor. No caso das crianças adotivas
Contato: Débora Lisboa Correa Costa,
não é diferente, porém, existem algumas
PPGTPC/LED/UFPA,
peculiaridades que devem ser conside-
debylisboa2007@yahoo.com.br
radas pelos pais pretendentes (Levinzon,
2009). Caso a criança não encontre esse
ambiente e esse lugar real de filho, o seu

391
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

processo de pertencimento e adequação a o seu funcionamento e sem disponibilida-


essa família será prejudicado, pois, a mes- de para o filho real, relembram a sensação
ma poderá desenvolver mecanismos de de impotência e de abandono vivenciada
defesa para proteger-se de um novo aban- na busca por gerar uma criança (Schetti-
dono. Esses mecanismos refletirão na re- ni, 2006). Alguns mecanismos de defesa
lação com os novos pais e, principalmen- ou “proteção” podem ser citados, atrela-
te, em seu desenvolvimento (Schettini, dos ao processo de desenvolvimento da
2006). Dessa forma, avaliando as peculia- criança. A criança adotiva tem uma maior
ridades do universo adotivo, esse trabalho sensibilidade ao abandono e à rejeição.
tem como objetivo investigar, através de Para evitar uma nova situação desse tipo
uma pesquisa de levantamento bibliográ- buscam sempre acertar, e muitas se tor-
fico, como ocorre o desenvolvimento de nam perfeccionistas, não se permitindo
crianças que vivenciaram o processo de errar. Buscam, também, uma identificação
adoção. A base a partir de onde o adulto com os pais, procurando corresponder
opera será a sua família de origem ou, en- às suas expectativas escondendo, dessa
tão, outra nova base que ele formou para forma, sentimentos desagradáveis e ex-
si mesmo, pois, “qualquer indivíduo que plodindo, vez ou outra, em ataques de
não possua tal base é um ser sem raízes raiva (Schettini, 2006). Sem esse lugar de
e intensamente solitário” (Bowlby, 1997). expressão, a criança age de acordo com
Para a criança adotada, segundo Schetti- o que esperam dela e não de modo au-
ni (2006), a construção do vínculo afetivo, têntico, desenvolvendo um falso self. Em
que norteará o seu desenvolvimento, terá casos mais graves, ele pode se implantar
como base suas novas relações parentais. como se fosse real, e a pessoa apresenta-
Dessa forma, a nova família precisa de- rá carências essenciais em seus relaciona-
sejar esse filho e, para tal, as motivações mentos, no trabalho e no plano social (Le-
paternais precisam estar bem definidas. vinzon, 2009). Outro mecanismo que visa
Motivações corretas permitirão que es- protegê-la de um novo abandono é a indi-
ses pais sintam e aceitem essa criança ferença emocional, ou seja, a criança não
como seu filho e que o acolham como tal. se envolve para não sofrer. Muitas vezes,
Segundo Winnicott (1953), a história da por não confiar que isso não irá acontecer,
adoção, quando transcorre bem, é a da poderá “abandonar” primeiro, tanto pes-
história humana comum e, como tal, tem soas quanto relações, projetos, estudo e
suas intercorrências. Sem a motivação aprendizado no qual possa não sentir-se
correta, não haverá disponibilidade emo- aceita (Schettini, 2006). A agressividade
cional para o desejo do filho real. A crian- e rebeldia também são mecanismos atra-
ça perceberá que não tem um lugar de vés dos quais as crianças testam os pais.
pertencimento nessa família, e será mobi- De maneira não proposital, buscam no
lizada por um sentimento de estranheza. comportamento provocativo, saber: “até
O sentimento de não pertencer suscitará, onde vocês vão me agüentar?” (Levinzon,
nela, a possibilidade de um novo abando- 2009). A necessidade de cuidar do próxi-
no; mecanismos de defesa serão criados mo e a autonomia prematura também po-
para protegê-la e elas serão recebidas por dem representar mecanismos de defesa.
pais fragilizados que, não compreendendo A criança cuida como gostaria de ter sido

392
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cuidada e não deseja depender por muito para com a adoção. Ressalta-se, ainda, a
tempo de quem possa abandoná-la. A ne- necessidade de uma ampliação da rede de
gação ao desenvolvimento também é uma Grupos de Apoio à Adoção em todo o país,
forma de se defender; essa defesa será com o objetivo de esclarecer, fortalecer e
criada se a criança não tiver se encontra- incentivar as futuras relações parentais
do com seu passado. “A criança é confron- derivadas da adoção.
tada com um medo do futuro, por conta
de um passado ignorado e concebido em Palavras-chave: adoção, família adotante,
sua fantasia como grotesco e ameaçador” desenvolvimento infantil
(Schettini, 2006). Outra defesa a ser con- Contato: Alessandra Themudo Lessa,
siderada diz respeito ao desenvolvimento Psicologia - FMU, dudalessa@uol.com.br
sexual; se há uma certeza que a criança,
agora já na puberdade tem, é de que ela
é resultante de um ato sexual de seus LT06-844 - CRIANÇAS EM ACOLHIMENTO
pais. Muitas vezes essa é a informação INSTITUCIONAL E SUAS DINÂMICAS
de maior relevância que tem de seus pais FAMILIARES
biológicos, e as crianças se apegam a ela Emmanuelle de Oliveira Ferreira - UFRN
gerando dois possíveis comportamentos: emmanuelle_of@yahoo.com.br
precocidade sexual, como identificação Rosângela Francischini - UFRN
do filho com os pais de origem, ou afasta- rfranci@uol.com.br
mento de sua sexualidade, por associá-la Financiamento: CAPES
a pais biológicos não confiáveis e “maus-
-modelos” (Levinzon, 2009). Sendo assim, O acolhimento institucional de crianças e
conclui-se que o desenvolvimento de uma adolescentes, no Brasil, e o (des)amparo
criança adotiva está intimamente ligado à destinado a eles e suas famílias são temas
relação parental e ao ambiente que essa de extrema relevância para a garantia do
criança estará inserida. Além disso, Winni- direito desses sujeitos. O Estado Brasilei-
cott (1953) revela que o grau de perturba- ro tem sua responsabilidade estabelecida
ção ambiental que a criança sofreu antes em lei sobre a proteção à família e, junta-
da adoção também influencia o seu de- mente com ela e com a sociedade, deve
senvolvimento: quando sua história inicial fazer valer os direitos das crianças e dos
não foi suficientemente boa em relação à adolescentes, o que é confirmado pelo
estabilidade ambiental, os pais adotivos discurso da Constituição Federal (Brasil,
têm que saber que, além de pais, serão 1988), do Estatuto da Criança e do Ado-
“terapeutas de uma criança carente”. É lescente (Brasil, 1990), do Plano Nacional
importante que os pais sejam alertados de Promoção, Proteção e Defesa do Direi-
sobre esse fato, pois, o cuidado da criança to de Crianças e Adolescentes à Convivên-
exigirá, deles, mais do que o simples ma- cia Familiar e Comunitária (Brasil, SEDH,
nejo comum. Com isso, ressalta-se ser de 2006), entre outros documentos do país.
fundamental importância o conhecimento Vicente (2005) expõe a dimensão política
prévio da história de vida dessas crianças do vínculo entre a criança e sua família de
pela família adotante, assim como a ve- origem afirmando que, para a proteção e
rificação das reais motivações da mesma desenvolvimento desse vínculo, é neces-

393
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sária a atuação estatal. Um suporte, como prias falas: vivência de rua, mendicância,
pode se pensar a partir de Vasconcelos, violência e uso de drogas por parte de
Yunes e Garcia (2009) e Cavalcante, Ma- familiares. A partir das interações com
galhães e Pontes (2009), que se faz mais as crianças foi possível destacar e anali-
veemente para as famílias que, muitas sar tais fatores, procurando observá-los
vezes, por enfrentarem toda a sorte de integrados a seus ambientes particulares
privações e situações indignas, também e entender como esses ambientes se ar-
expõem crianças e adolescentes a condi- ticulam à conjuntura geral, constituída
ções precárias, presentes desde antes do por problemas socioeconômicos de toda
nascimento desses sujeitos e culminando ordem, enfrentada por diversas famílias
no seu acolhimento institucional. Este es- no Brasil. Magali e Cascão abordam a vio-
tudo apresenta as percepções de suas di- lência de modo frequente, mesmo que de
nâmicas familiares por três crianças, dois formas distintas e, no caso de Cascão, em
meninos e uma menina: Cascão, Magali e situações hipotéticas/imaginadas, não
Cebolinha (os dois últimos irmãos) com, dizendo respeito diretamente ao seu nú-
respectivamente, oito, nove e sete anos, cleo familiar de origem, como na situação
em uma instituição estadual localizada imaginativa do procedimento com figu-
em Natal, Rio Grande do Norte. Nos pro- ras. Além da forte presença da violência
cedimentos realizados individualmente, nos discursos de Magali e Cascão, a vivên-
foram usados materiais de desenho e fi- cia na rua por parte das famílias compa-
guras. Ao todo foram cinco procedimen- rece nos discursos de ambos os sujeitos,
tos, além de uma conversa inicial com as ao criarem uma família (procedimento de
crianças, todos registrados com gravador imaginar e desenhar uma família que não
e no diário de campo. Cada criança fez: um a deles) e contarem um pouco sobre a
autorretrato, acompanhado ou seguido vida dela, o que pode refletir experiências
de conversa com a pesquisadora; o dese- de suas realidades antes do acolhimento
nho delas junto com sujeitos que estavam institucional, já que relatos de situações
na instituição onde se encontravam e com similares constavam em seus relatórios
outros que haviam sido desabrigados; o ou em falas acerca de suas famílias de
desenhado da própria família e o de outra origem. Cebolinha, quando questionado
que não a deles; além do procedimento sobre o porquê de estar em acolhimento
em que tinham imagens de crianças para institucional, responde de forma a con-
dar nomes, características e imaginar firmar discursos de Magali, pelo menos
suas vidas em contextos familiares e em no que se refere ao abuso de substâncias
instituições de acolhimento. O corpus foi químicas da mãe, relatado pela menina
analisado por meio da Rede de Significa- e, ainda, deixando clara a relação que
ções, perspectiva teórico-metodológica faz disso com sua condição atual. Cascão
adotada ao longo de todo o trabalho, e também aponta o uso de drogas por parte
da Análise de Conteúdo Temática. No cor- da sua mãe, fazendo uma relação dessa
pus constituído, destaca-se a presença de situação com a sua condição de abrigo, de
vários fatores de risco nos contextos de modo similar ao de Cebolinha, mas, adi-
suas famílias, constatados em relatórios ciona a circunstância em que se encontra
psicossociais dos sujeitos e em suas pró- seu pai, preso. Referente à temática que

394
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

emerge das falas das crianças, Vascon- tência aos membros de toda e qualquer
celos et al. (2009), coerentemente com família no Brasil, cabendo-lhe criar meca-
Cavalcante et al. (2009) e Azôr e Vectore nismos para coibir violências nas relações
(2008), afirmam que existe influência, nos entre eles contribuindo, enormemente,
grupos familiares do público de crianças para a garantia do direito à convivência
institucionalizadas, de numerosos fatores familiar e comunitária.
de risco, que são por eles enfrentados e
podem tornar vulneráveis crianças e ado- Palavras-chave: crianças, acolhimento
lescentes a ocorrências de negligência, institucional, famílias
vivência de rua, violência física, psicológi- Contato: Emmanuelle de Oliveira Ferreira,
ca, sexual..., as quais se ligam às dificulda- UFRN, emmanuelle_of@yahoo.com.br ou
des socioeconômicas, culminando com o manumousinho@yahoo.com.br
acolhimento institucional desses sujeitos.
Tais contextos tornam as possibilidades
de vida e desenvolvimento precárias e de- LT06-1012 - CRIANÇAS E ADOLESCENTES
terioradas, contribuintes do não cuidado AFASTADOS DA CONVIVÊNCIA
dos filhos por parte dos pais ou, melhor FAMILIAR: ANÁLISES A PARTIR DE UMA
dizendo, da não garantia dos cuidados INSTITUIÇÃO DE ACOLHIMENTO
mais básicos e essenciais a esses sujeitos. Rita de Cássia de Souza - UFV
Assim, tal conjuntura, que une à pobreza ritasouza@ufv.br
diversos outros problemas sociais, deve
receber mais atenção real do Estado e Esta comunicação propõe uma discussão
dos governos, pois, ao mesmo tempo em sobre os motivos que têm determinado
que os núcleos familiares tratados aqui a retirada de crianças e adolescentes de
não podem ser isentos da responsabili- suas famílias, e o que tem sido feito du-
dade pelas condições de risco impostas rante este período de afastamento. De-
a essas crianças quando sob os seus cui- fendemos que o papel das instituições de
dados, também, são vítimas da falta de acolhimento não se restringe a planejar
suporte social estatal, da ausência de po- o cotidiano das crianças e adolescentes,
líticas públicas eficientes e eficazes para mas, é muito mais complexo e relevan-
o cuidado e o atendimento às famílias te, consistindo em preparar-lhes para, o
que, como um todo (considerando todos quanto antes, realizar a reinserção destes
os seus integrantes), estão mais expostas no ambiente familiar ou a criação de no-
às desigualdades econômicas e a todas as vos vínculos sociais e afetivos. Algumas
dificuldades de sobrevivência que tais de- pesquisas mostram que o estabelecimen-
sigualdades, frequentemente, acarretam. to de vínculos sociais e afetivos é condi-
Para finalizar, é importante refletir, justa- ção fundamental para o desenvolvimento
mente, sobre o que é destinado às famí- humano. René Spitz (1887-1974), psica-
lias violadoras dos direitos dos seus filhos, nalista austríaco, estudou um orfanato e
nos casos apontados, e não ignorar que a um berçário de uma prisão de mulheres
Constituição (Brasil, 1988) - em seu artigo nos EUA e o resultado desta pesquisa foi
226, parágrafo oitavo - estabelece como publicado no livro O primeiro ano de vida
competência do Estado: assegurar assis- do bebê, em 1965. Nesta obra, Spitz rela-

395
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ta que no orfanato, organizado e limpo, as e/ou de cuidadores. A Teoria do Apego


crianças mostravam um sensível retarda- afirma que os bebês, ao nascer, estão
mento em seu desenvolvimento mental e pré-programados para se interessar por
progressiva debilidade física. Uma epide- estímulos sociais e vincular-se a algumas
mia de sarampo matou 23 das 88 crianças pessoas. O vínculo emocional mais impor-
com idade inferior a 2 anos e meio; das tante na primeira infância é o apego, que
sobreviventes, apenas 2 começaram a fa- a criança estabelece com uma ou várias
lar e aprenderam a caminhar no espaço pessoas do sistema familiar e que pos-
da pesquisa; nenhuma aprendeu a comer sui quatro manifestações fundamentais:
sozinha e todas eram incontinentes. Na buscar e manter a proximidade; resistir
prisão de mulheres, o desenvolvimento à separação e protestar se esta se con-
das crianças era tão acelerado e sadio suma; usar a figura de apego como base
que o problema era de como conter as de segurança a partir da qual se explora
manifestações de sua vitalidade e inteli- o mundo físico e social e sentir-se seguro
gência. Nos testes de quociente de desen- buscando na figura de apego o bem estar
volvimento, as crianças do segundo grupo e apoio emocional. As conclusões a que
obtiveram uma média de 105 pontos, en- chegaram mostram que, dependendo da
quanto a média das crianças do primei- relação que as crianças possuem com a
ro grupo foi de apenas 72 pontos. Spitz figura de apego, elas podem desenvol-
concluiu, então, que a falta de contato ver um apego seguro (o mais adequado
materno prejudicava o desenvolvimento e saudável) ou não e o principal determi-
das crianças do orfanato e denominou de nante da segurança do vínculo afetivo é a
hospitalismo o conjunto de perturbações sensibilidade da figura de apego, entendi-
que o bebê pode sofrer devido a carências da como a disposição de prestar atenção
afetivas. Tal situação também pode acon- aos sinais da criança, interpretá-los ade-
tecer quando os bebês possuem mães quadamente e responder a eles rápida e
que não desejam seus filhos ou não lhes apropriadamente. O psicanalista inglês
dão atenção e carinho. Crianças de idades Donald Winnicott (1896-1971) criou o
muito precoces, com privação de contato termo “maternagem”, que consiste em a
afetivo, podem sofrer de problemas tanto criança estabelecer um vínculo emocio-
físicos como psicológicos, como: atraso nal com uma figura de referência e apoio,
no desenvolvimento corporal, insônia, que pode ser qualquer pessoa, desde que
queda de peso, dificuldade de adaptação esta seja sensível às demandas da criança,
ao meio, fragilidade e menor imunidade a fornecendo-lhe apoio emocional que lhe
doenças infecciosas. O psicanalista inglês permita compreender a si própria e seu
John Bowlby (1907- 1990) e a psicóloga meio social, sentindo-se segura. Portan-
canadense Mary Ainsworth (1913-1999), to, conforme estas pesquisas, é evidente
em 1948, dirigiram uma pesquisa sobre a importância do afeto e do acolhimento
crianças abandonadas ou privadas de lar para o desenvolvimento integral do ser
que resultou no desenvolvimento da Te- humano e a necessidade que as institui-
oria do Apego, com base em observações ções de acolhimento não sejam respon-
clínicas de crianças que viviam situações sáveis pela desvinculação familiar, mas,
de separação e perda de figuras parentais pelo estabelecimento de vínculos seguros

396
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e adequados. Considerando estes fatores, LT06-1323 - PRÁTICAS DE CUIDADO


este trabalho pretende apresentar os mo- NAS SITUAÇÕES DE BRINCADEIRA E
tivos para o afastamento familiar e, prin- BANHO: INTERAÇÕES EDUCADOR-
cipalmente, como tem sido o trabalho CRIANÇA EM ESPAÇO DE ACOLHIMENTO
para a reinserção social destes sujeitos INSTITUCIONAL
em uma instituição de acolhimento na ci- Tamires Santos Rufino e Silva - UFPA
dade de Viçosa, interior do estado de Mi- tamiresrufino88@gmail.com
nas Gerais, que atende até vinte crianças Laiane da Silva Corrêa - UFPA
e adolescentes de até 18 anos, de ambos lai_correa@yahoo.com.br
os sexos. Estas crianças e adolescentes, a Lília Iêda Chaves Cavalcante - UFPA
princípio, estão em situação de risco e são liliaccavalcante@gmail.com
retirados de suas famílias pelo Judiciário Celina Maria Colino Magalhães - UFPA
e Conselho Tutelar. O principal objetivo celina.magalhaes@pesquisador.cnpq.br
da instituição é acolher estas crianças e
estes adolescentes, temporariamente, Financiamento: CAPES/CNPq
protegendo-os de situações de violência
e abuso, visando a reintegração ao am- Dados da literatura indicam que ao se
biente familiar, seja o de origem, seja em estudar o cuidado coletivo de crianças
outro ambiente que lhes possa fornecer pequenas em espaço de acolhimento
condições dignas e seguras de desenvolvi- institucional identifica-se que são vários
mento. A instituição foi inaugurada em 06 os aspectos envolvidos neste processo,
de fevereiro de 2010 e sua manutenção dentre os quais destacam-se os cuidados
é feita por um consórcio intermunicipal físicos, sociais e psicológicos, considera-
que envolve prefeituras de seis municí- dos primordiais para o desenvolvimento
pios da região. Os dados coletados para saudável (Cavalcante, 2008). As intera-
este trabalho, através de documentos que ções e relações estabelecidas entre edu-
registram a passagem das crianças e ado- cador-criança nas situações de brincadei-
lescentes pela referida instituição, nos le- ra e de banho são de extrema relevância
vam a questionar se o afastamento fami- nos processos desenvolvimentais, visto
liar é a opção mais adequada em alguns que são momentos ricos de interações e
casos e ressaltar a importância de que aprendizado, oferecem um conjunto de
estas instituições não venham a se tornar práticas voltadas à estimulação, orien-
um abrigo pura e simplesmente, mas que, tação e ensino de habilidades diversas,
efetivamente, contribuam para melhorar além de contribuírem para o processo
a qualidade de vida destas crianças e ado- desenvolvimental da criança que vive em
lescentes, sem afastá-las de referências espaço de acolhimento institucional (Ale-
afetivas importantes e satisfatórias. xandre & Vieira, 2004; Cordazzo & Vieira,
2007). Nestes termos, estudos mostram
Palavras-chave: crianças e adolescentes que um ambiente rico de estímulos pode
vulneráveis, institucionalização, família ser de suma importância para amenizar
Contato: Rita de Cássia de Souza, os efeitos do ambiente de acolhimen-
Universidade Federal de Viçosa, to institucional para as crianças (Bron-
ritasouza@ufv.br fenbrenner, 1996). O presente estudo

397
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

objetivou investigar práticas de cuidado til e o banheiro dos bebês. Observou-se


em situação de brincadeira e banho a que o tempo dedicado às práticas de
crianças, realizadas por educadoras de brincadeira representam 36 horas, o que
um espaço de acolhimento institucional. corresponde a 30% de um total de 120
Participaram da pesquisa dez educado- horas de observação, e é um momento
ras, responsáveis pelo cuidado diário das marcado por recreação, entretenimento
crianças, bem como 62 crianças de zero e diversão proporcionados pelo ato de
a seis anos, de ambos os sexos. Entre os brincar, enquanto o período destinado às
profissionais pesquisados, todas são mu- práticas de banho alcançam um intervalo
lheres, a maioria possui mais de 35 anos, em torno de 11,20 horas, o equivalente
tem filhos, completou o ensino médio a 9,34% do total de horas de observação
e tem mais de 24 meses de experiência das educadoras. Esta forma de cuidado
como educadora. O estudo foi realizado ocorre, em geral, em dois momentos: no
em um abrigo governamental, localiza- final da manhã e da tarde, sendo o tempo
do na região metropolitana de Belém-PA médio de duração do banho de 16 minu-
que acolhe, provisoriamente, crianças tos, compreendendo a limpeza do corpo
cuja integridade tenha sido ameaçada ou e a troca de roupa no dormitório. Para as
violada, em razão de situações típicas de análises das situações de brincadeira na
abandono familiar, negligência e violên- interação educador-criança foram consi-
cia doméstica. Os dados foram obtidos a deradas três categorias (Piccinini, Frizzo &
partir de sessões de observação que fo- Marin, 2007): orienta quanto à natureza,
ram filmadas e tiveram duração de uma função e regras do brincar, caracterizada
hora cada, totalizando doze sessões para quando a educadora guia a criança quan-
cada participante. As sessões foram reali- to às normas, atitudes e aspectos envol-
zadas em momentos diferentes da rotina vidos no brincar, destacando situações
de cuidado dos educadores, compondo de perigo iminente e outras envolvidas
uma sequência de quadro da realidade nesse tipo de atividade; estimula, enco-
institucional. A partir das filmagens, fez- raja e desafia quanto à divisão e compar-
-se um recorte de trechos de episódios in- tilhamento de brinquedos e brincadeiras,
terativos entre o educador e a criança em caracterizada quando a educadora for-
situações de brincadeira e banho. A abor- nece brinquedos, incentiva a ludicidade,
dagem das educadoras e a observação de insere novos elementos, promove a divi-
suas práticas de cuidado no cotidiano da são e o compartilhamento de materiais
instituição foram realizadas em diferen- entre as crianças, as encoraja e desafia
tes ambientes do espaço de acolhimento para o engajamento em novas atividades
institucional, tornando possível registrar usando, para isso, reforços sociais; e en-
situações próprias da convivência e das sino de conceitos e pronúncia correta ao
práticas de cuidado. Os resultados apon- falar, categoria relacionada ao fato de
tam que entre os principais locais em que que a educadora menciona à criança algo
se realizaram as sessões de observação em relação a conceitos, cores, números,
nas situações investigadas estão o quin- partes do corpo, elementos que fazem
tal, o barracão, o playground, a brinque- parte de um conjunto, nomes de frutas,
doteca, os dormitórios, o banheiro infan- além de pronunciar as palavras correta-

398
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mente. Já para as análises das situações de banho, especialmente, em espaço de


de banho foram consideradas, também, acolhimento institucional, visto que as
três categorias (Piccinini, Frizzo & Marin, diversas estratégias utilizadas pelo educa-
2007): orienta quanto à natureza e função dor, nestes momentos, são fundamentais
do banho, onde se destacam ações que ao desenvolvimento infantil, pois, podem
conduzem a criança a como tomar banho proporcionar afeto, segurança e diversão,
e vestir-se; estimula, encoraja e desafia a além de estimular habilidades cognitivas
tomar banho, em que a educadora insti- e sociais as crianças. Logo, identifica-se
ga e reforça a participação da criança no que a avaliação da qualidade do cuidado
banho e na escolha da roupa; ensina con- em ambiente institucional deve ser uma
ceitos e destaca etapas que fazem parte questão de investigação importante para
do banho, que compreende a instrução estudos sobre o desenvolvimento infantil.
de conceitos e descrições sobre as etapas
e procedimentos envolvidos no banho. Palavras-chave: acolhimento institucional,
Os dados indicam que há diferenças cla- práticas de cuidado, interação educador-
ras quanto à qualidade das interações. criança
As educadoras que possuem filhos têm, Contato: Tamires Santos Rufino e Silva, FASS/
em média, 32 anos e menor nível de es- UFPA, tamiresrufino88@gmail.com
colaridade, tendem a adotar práticas de
cuidado que valorizem a criança como um
membro ativo, um indivíduo em desen- PO-LT01
volvimento, que precisa ouvir e ser ouvi-
do. Identifica-se que, diante de regras e
normas institucionais, estas educadoras LT01-776 – A VIVÊNCIA DE APRENDIZES
adaptam-se à situação vivida, levando em COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL NO
consideração o ambiente, a individualida- MERCADO DE TRABALHO.
de, disponibilidade de materiais, número
Adelaine Vianna Furtado -UFJF
de crianças e outras variáveis que fazem
ane_vf@yahoo.com
parte do ambiente físico e social da crian-
ça. Do outro lado, as educadoras que não Nara Liana Pereira-Silva - UFJF
possuem filhos têm, em média, 44 anos naraliana.silva@ufjf.edu.br)
e maior nível de escolaridade, tenden-
do a adotar posturas mais autoritárias, A deficiência intelectual (DI), a partir de
cujas práticas de cuidado marcam o que um enfoque multidimensional, vem sen-
se deve ou não fazer, sem muitas expli- do caracterizada por limitações significa-
cações à criança, manifestando atitudes tivas tanto no funcionamento intelectual
em que o coletivo sobrepõe-se ao indi- como no comportamento adaptativo ex-
vidual, as regras e as escolhas são feitas presso em habilidades conceituais, so-
quase que exclusivamente pela figura do ciais e práticas, originando antes dos 18
educador. Os dados deste trabalho reve- anos de idade (Associação Americana so-
lam como é essencial a presença e a in- bre Deficiência Intelectual e do Desenvol-
teração educador-criança, tanto em situ- vimento – AAIDD, 2010). Dessa forma, a
ações de brincadeira como em situações pessoa com DI apresenta limitações que,

399
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

muitas vezes, se tornam incompatíveis tágio visa propiciar uma reflexão a partir
com as demandas exigidas pelo contexto da descrição das vivências e sentimentos
social. Segundo Bronfenbrenner (1996), sobre a inclusão no mercado de trabalho
a relação entre ambiente e desenvolvi- de aprendizes com DI de uma instituição
mento humano é marcada pelas intera- de educação especial da cidade de Bra-
ções da pessoa com os vários contextos sília. Com um total de quatro aprendizes
de desenvolvimento e em cada um em com DI, o presente relato baseou-se em
particular. De acordo com essa perspec- entrevistas com um roteiro semiestrutu-
tiva, o contexto ocupacional representa rado que objetivaram descrever a respei-
um dos contextos que pode proporcionar to da experiência de inclusão no merca-
à pessoa adulta com DI o desenvolvimen- do de trabalho. Tal roteiro foi adaptado
to de suas habilidades e competências a do estudo de Masson (2009) de acordo
partir das interações estabelecidas neste com as necessidades do presente estudo.
ambiente, bem como fora dele na sua re- Todos os participantes moravam em regi-
lação com outros ambientes, como o fa- ões administrativas do Distrito Federal e
miliar, o educacional e o comunitário. No tinham experiência de trabalho no ramo
caso das pessoas com DI, o contexto edu- do comércio. As idades variavam entre
cacional, tal como os Centros de Educação 19 e 32 anos. Três eram do sexo feminino
Especial são os principais locais de forma- e um do sexo masculino. A entrevista foi
ção profissional. Esta profissionalização é realizada individualmente, na própria ins-
realizada por meio de oficinas que visam tituição de capacitação e de acordo com
estimular a capacidade produtiva e o de- a disponibilidade dos entrevistados, com
senvolvimento de competências voltadas duração média de quarenta e cinco mi-
para o trabalho, tendo, ainda, objetivo nutos. As respostas foram transcritas de
de inclusão no mercado de trabalho ex- acordo com o roteiro de entrevista, sen-
terno, por meio do processo de emprego do analisadas posteriormente. As análi-
competitivo, ou a colocação em serviços ses das entrevistas demonstraram o sa-
internos na própria instituição profissio- lário recebido pelos participantes era de,
nalizante, por meio de emprego apoiado aproximadamente, um salário mínimo
ou trabalho protegido (Sassaki, 2003). A (R$ 465,00). Este valor, para maioria, era
inclusão vem se tornando um tema cada destinado para a compra de objetos pes-
vez mais relevante, especialmente, sob a soais e de interesse próprio, bem como,
perspectiva do desenvolvimento dessas para a ajuda no pagamento das despesas
pessoas (Lancillotti, 2003). Pode se con- domésticas. A administração desse salá-
siderar que investigar e descrever a visão rio, porém, na maioria dos relatos, era
das pessoas com DI, oferecendo dados de responsabilidade da família, principal-
empíricos para melhor compreensão e mente da mãe. Em relação ao sentimento
reflexão de seu processo de inclusão no de satisfação com o emprego, bem como,
mercado de trabalho pode ser um cami- com a realização das atividades que re-
nho promissor para subsidiar o planeja- alizavam no local de trabalho, todos os
mento de atividades na preparação do jo- participantes demonstraram contenta-
vem com DI para o mercado de trabalho. mento no início do emprego, perdendo-o
O presente relato de experiência de es- com o passar do tempo. A dificuldade de

400
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

engajamento no trabalho por parte das que a literatura já vem apontando sobre
pessoas com DI pode ser refletida nos a importância da inclusão no trabalho
dados dos participantes, pois dos qua- para a pessoa com DI, principalmente no
tro sujeitos, dois foram demitidos por pressuposto de que o trabalho para essas
justa causa e um pediu demissão. Para pessoas serve como uma via de inclusão
justificar esse processo os participantes social, permitindo ao indivíduo demons-
relataram motivos pessoais e dificulda- trar suas potencialidades e competên-
des em estabelecer vínculos de amizade cias, além do reconhecimento como
no ambiente de trabalho. Em relação ao cidadãos. O presente relato, também,
outro participante que se manteve no demonstra a necessidade de os serviços
emprego, o mesmo relatou que gostava profissionalizantes adaptarem seu currí-
de exercer sua atividade de trabalho, o culo no desenvolvimento de habilidades
que fez com que tivesse um bom rendi- sociais se adaptando ao real ambiente
mento na produção e, juntamente, com competitivo das empresas. É importan-
as boas condições socais do ambiente te que as empresas estejam dispostas a
da empresa garantiram sua permanência produzir no local de trabalho a acessibi-
no emprego. Como Jahoda et al (2009) lidade física e social. Além disso, que as
encontraram no seu estudo longitudinal empresas e as instituições profissionali-
que visava examinar a experiência das zantes estabeleçam um vínculo para que
pessoas com DI no trabalho, a carência possam conhecer suas necessidades e se
de oportunidades de relacionamentos adaptarem uma a outra. Ressalta-se, ain-
sociais e a ansiedade para atender às ex- da, a necessidade de estudos nessa área,
pectativas dos empregadores foram os que busquem uma maior compreensão
pontos negativos encontrados pelos seus do processo de inclusão no trabalho con-
participantes inseridos no mercado de siderando este como um contexto pro-
trabalho. Quanto às expectativas dos par- motor de desenvolvimento humano.
ticipantes, do presente estudo, em se in-
serir novamente no mercado de trabalho, Palavras-chave: inclusão no trabalho,
foi constatado que todos demitidos apre- deficiência intelectual, profissionalização.
sentavam expectativas de retornarem ao Contato: Adelaine Vianna Furtado.
mercado de trabalho competitivo. Isso Universidade Federal de Juiz de Fora.
demonstra que as dispensas, até mesmo ane_vf@yahoo.com.br
as voluntárias, não acarretaram implica-
ções danosas aos entrevistados. Como
Meletti (1997) ressaltou em seu estudo
com pessoas com DI com e sem experi-
ência no mercado de trabalho, a conquis-
ta de um emprego representa mais que
uma alternativa ao ócio, mas também
uma via de reconhecimento pessoal e
profissional. Portanto, as reflexões alcan-
çadas, com a análise das entrevistas do
presente relato, nos remetem a questões

401
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-784 - AVALIAÇÃO DOS se constituem-se como um fator de risco


INDICADORES EMOCIONAIS DE ESTRESSE que deve ser avaliado devido aos efeitos
EM MÃES DE BEBÊS DE 6 A 13 MESES que podem produzir sobre o desenvolvi-
Elisa Rachel Pisani Altafim - UNESP mento infantil e na relação entre a mãe e
altafim.elisa@gmail.com seu bebê. A presença de diversos fatores
Mariana Biffi - UNESP de risco na vida de um indivíduo tende a
biffi.mariana@gmail.com ter os seus efeitos multiplicados, agravan-
Sária Cristina Nogueira - UNESP do um ao outro e prejudicando o desen-
sariacris@yahoo.com.br volvimento adaptativo e sadio do mesmo
Nathália Charlois Nogueira - UNESP (Linhares; Bordin; Carvalho, 2004). Parece
nathmail@ig.com.br importante identificar os indicadores de
Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues - UNESP estresse de mães de bebês para imple-
olgarolim@uol.com.br mentar ações visando garantir o equilíbrio
emocional delas assim como o desenvolvi-
Durante o ciclo vital da mulher, especifi- mento de seus bebês. O presente projeto
camente, existem períodos em que ocor- pretendeu identificar e descrever a pre-
rem previsíveis crises, ou seja, períodos de sença de estresse em mães de bebês de
temporário desequilíbrio e desorganização seis a 13 meses de idade associando-o a
desencadeados por determinadas circuns- variáveis maternas (idade, escolaridade,
tâncias em que podem estar presentes in- tipo de família e número de filhos) e do
dicadores emocionais como ansiedade, es- bebê (sexo e idade). Participaram do proje-
tresse e depressão. O período da gravidez, to, 25 mães com idade entre 15 e 41 anos
do parto e do puerpério são exemplos des- (Média=25,6; MED=23; DP=7,1) de bebês
ses períodos de transição que fazem par- de seis a 13 meses (Média=9; MED=9;
te do desenvolvimento normal. Durante DP=2,41), sendo que quanto a condição de
o ciclo grávido-puerperal, por exemplo, a risco, 16 não tinham identificação prévia
mulher vivencia mudanças metabólicas e, e, das demais, dois eram prematuros, um
também, instabilidade emocional devido baixo peso e seis eram filhos de mães ado-
às alterações que irão ocorrer com o nasci- lescentes, sendo que destes, dois bebês
mento do bebê, sendo que após o mesmo nasceram prematuros. Quanto à escolari-
a mulher tem que reestruturar o seu papel dade, 16 das mães possuíam pelo menos
social, adaptando-se às mudanças decor- Ensino Médio completo. Quanto ao tipo de
rentes dessa nova fase (Maldonado, 1997). família, prevaleceu a família nuclear (72%)
Nesses períodos de instabilidade emocio- e, delas, 52% tinham apenas um filho. To-
nal, os níveis de estresse costumam au- das as participantes frequentavam o pro-
mentar, expressando a reação do organis- jeto de extensão “Acompanhamento do
mo perante situações extremamente difí- desenvolvimento de bebês de risco: ava-
ceis ou excitantes, sendo que essas provo- liação e orientação” oferecido pelo Centro
cam transformações psicológicas, físicas e de Psicologia Aplicada da UNESP - Bauru.
químicas, influenciando o comportamento No processo de coleta de dados, foi reali-
humano (Gomes; Bosa, 2004). Dessa ma- zada primeiramente uma Entrevista Inicial
neira, evidencia-se que as presenças de in- a fim de coletar informações sociodemo-
dicadores emocionais maternos de estres- gráficas do bebê e de sua família, como

402
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sexo, membros que a compõem, estado mães de bebês com mais de seis meses e
de saúde dos pais e do bebê. As avaliações 57% das mães de bebês com menos de seis
do desenvolvimento dos bebês foram re- meses apresentaram estresse. Os resulta-
alizadas mensalmente, sempre em datas dos apontam para a presença de estresse
próximas ao do aniversário dos mesmos, na amostra estudada, sendo mais presente
utilizando o Inventário Portage Operacio- em mães com menos de 30 anos, com boa
nalizado (Williams; Aiello, 2001). As ava- escolaridade, de família nuclear e com um
liações foram conduzidas na presença das único filho. Quanto às variáveis do bebê
mães, que serviram como mediadores e (sexo e idade), os dados apontam para a
informantes, sendo que o comportamento influência da idade do bebê (mais velhos)
do bebê foi observado a partir da estimu- do que o sexo na presença de estresse. To-
lação ambiental, emissão de comporta- davia, a amostra é reduzida (n=25), o que
mentos espontâneos e, também, obser- dificulta a generalização dos achados.
vações relatadas pelos pais. Entre o sexto
e o décimo terceiro mês, as mães foram Palavras-chave: estresse, mãe de bebê e
convidadas a responderem o Inventário de saúde mental.
Sintomas de Stress de Lipp (ISSL), sendo a Contato: Elisa Rachel Pisani Altafim – altafim.
participação voluntária e conforme dispo- elisa@gmail.com
nibilidade da mesma. O ISSL é um instru-
mento validado por Lipp e Guevara (2004),
que avalia os sintomas físicos e psicológi- LT01-800 - AMIZADE E SUPORTE SOCIAL:
cos vivenciados pelos sujeitos nas últimas DIFERENÇAS DE GÊNERO ENTRE JOVENS
24 horas, na última semana e no último ADULTOS
mês e possibilita realizar um diagnóstico Diogo Araújo de Sousa - UFRGS
da ocorrência do estresse, da fase em que diogo.a.sousa@gmail.com
esse se encontra e também, identificar se Elder Cerqueira Santos - UFS
os sintomas são predominantemente fí- eldercerqueira@yahoo.com.br
sicos ou psicológicos. Os resultados mos-
traram que dezesseis (64%) das 25 mães Na psicologia do desenvolvimento, desta-
apresentaram estresse, sendo que, delas, ca-se a análise de relacionamentos de lon-
12 (75%) apresentarem resistência e qua- ga duração, entre os quais se encontram
tro (25%) exaustão. A presença/ausência as amizades íntimas. A literatura é con-
de estresse foi associada, também, às vari- sensual quanto ao fato de que amizades
áveis sociodemográficas da mãe e do bebê desempenham importante papel ao longo
mais frequentes. Observou-se a presença do ciclo vital; na maior parte do tempo,
de estresse em 76% das mães de bebês para melhorias em habilidades sociais,
com menos de 30 anos, em 62% das mães saúde e qualidade de vida. Estudos apon-
com Ensino Médio completo, em 55% das tam que os relacionamentos de amizade
mães de famílias nucleares e em 69% das constituem entre 60 a 80% da rede social
mães de filhos únicos. Quanto às variáveis de uma pessoa. O suporte social se refe-
do bebê, 69% das mães de meninos e 62% re aos recursos materiais e psicológicos
das mães de meninas mostraram-se es- aos quais as pessoas têm acesso através
tressadas. Considerando a idade, 66% das de suas redes. Assim, relacionamentos de

403
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

amizade têm grande valia no provimento lidade manter o caráter de rede social pro-
de suporte social. O suporte social facilita movido pelo RDS. Foram percorridas cinco
o enfrentamento de crises e a adaptação ondas na amostra. Foram utilizados dois
a mudanças na vida e pode ser dividido instrumentos: um questionário sobre ami-
em: suporte emocional, incluindo apego, zades e uma escala sobre percepção de
conforto e poder confiar e acreditar em suporte social. Foram realizadas análises
uma pessoa; e suporte instrumental, en- estatísticas descritivas (frequências, mé-
volvendo ajuda direta, como empréstimos dias e desvios-padrão), e inferenciais (qui-
ou presentes, e serviços como cuidar de -quadrado, teste t de student e correlação
alguém que está doente, fazer um tra- de Pearson). Os resultados apontaram
balho para a pessoa, bem como o provi- a existência de uma homogeneidade de
mento de informações, orientações e con- características entre amigos íntimos, prin-
selhos. Este trabalho teve como objetivo cipalmente para o gênero. Dos homens
investigar relações entre características participantes, 74,1% foram indicados por
das amizades nas redes sociais de jovens outros homens, enquanto que 71,4% das
adultos e sua percepção de suporte social, mulheres foram indicadas por outras mu-
focalizando diferenças de gêneros entre lheres (p<0,001). Além disso, homens de-
os jovens, tanto para o gênero da pessoa monstraram possuir mais amizades mas-
quanto para o gênero das suas amizades. culinas do que as mulheres e vice-versa
Participaram 98 jovens adultos (45,9% ho- (p<0,001). Foram encontradas diferenças
mens), com idades entre 18 e 30 anos (M significativas entre as melhores amizades
= 23,01 anos; DP = 6,57). Quanto à escola- de homens e mulheres para as funções de
ridade, a maioria possuía ensino superior segurança emocional e intimidade, sendo
incompleto (75,5%). A amostragem se deu que as mulheres obtiveram maiores mé-
pela técnica do Respondent Driven Sam- dias em ambos os fatores (p<0,01). Em-
pling (RDS). O RDS é uma abordagem de bora as mulheres tenham percebido suas
amostragem que vem alcançando grande melhores amizades como preenchendo
popularidade internacional. Os dados são mais funções do que os homens, isto não
coletados por meio de um mecanismo de implica em uma desvalorização dos ho-
bola de neve que começa com o recruta- mens para tais aspectos. As diferenças
mento de poucas pessoas que se encai- se mostraram mais quantitativas do que
xem no perfil da população-alvo – as se- qualitativas. Aos serem questionados so-
mentes. No presente trabalho, a coleta de bre quais as primeiras palavras que lhes
dados teve início com quatro sementes – vinham à cabeça quando pensavam em
dois homens e duas mulheres. As semen- amizades, não houve diferenças signifi-
tes constituem a 1ª onda da amostra; as cativas entre homens e mulheres, tendo
pessoas recrutadas por elas compõem a 2ª ambos indicado palavras como “compa-
onda, e assim por diante. Neste estudo, as nheirismo”, “confiança”, “sinceridade/ho-
sementes responderam os instrumentos nestidade” e “respeito”. Isso é indicativo
e foram requisitadas a indicar, cada uma, de que a importância é dada por ambos
dois outros nomes para participar entre os sexos aos mesmos fatores, embora em
aqueles que apontaram como amizades graus distintos. Além do gênero do partici-
próximas. Tal procedimento teve por fina- pante, também foi considerado o sexo do

404
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

melhor amigo avaliado. Entre os homens, masculina de maior inibição emocional;


melhores amizades com mulheres respon- 2) segundo, independentemente do indi-
deram mais às funções de autovalidação víduo ser um homem ou uma mulher, o
e segurança emocional do que melhores seu nível de percepção de suporte social
amizades com homens (p<0,01). Assim, prático estaria mais associado ao número
melhores amigas preencheram mais, para de melhores amizades com homens do
os homens, as funções de encorajar, es- que com mulheres, pois as características
cutar, tranquilizar, e ajudar a manter a de ajuda objetiva e instrumental seriam
autoimagem de uma pessoa competente mais bem providas pelo sexo masculino.
e digna, e de dar consolo e confiança em Dessa maneira, hipotetiza-se que a per-
situações novas ou ameaçadoras, respec- cepção de suporte social emocional está
tivamente. Em contrapartida, mulheres mais diretamente relacionada ao sexo do
que avaliaram um melhor amigo homem indivíduo enquanto que a percepção de
apresentaram-se mais satisfeitas com a suporte social prático é mais fortemente
amizade do que as com melhores ami- influenciada pelo sexo das suas amizades.
gas (p<0,01). Quanto à percepção de su- Novos estudos devem investigar mais a
porte social, apenas o suporte emocional fundo essas hipóteses.
demonstrou diferença significativa entre
homens e mulheres, tendo as mulheres Palavras-chave: amizade, suporte social,
apresentado maior percepção desse tipo gênero.
de suporte (p<0,05). Já quando considera-
do o sexo das amizades, apenas o número
de melhores amigos homens apresentou LT01-848 - POSSIBILIDADES
relação significativa com o suporte social, DE ENFRENTAMENTO DE
do tipo prático (p<0,05), enquanto que COMPORTAMENTOS AUTOAGRESSIVOS
o número de melhores amigas mulheres PARA PAIS E CUIDADORES DE CRIANÇAS
não demonstrou relações com nenhum AUTISTAS.
dos índices de suporte social. Analisando Larissa Andrade Viriato - UFRB
esses resultados em conjunto com teorias Lary_andrade15@hotmail.com
e estudos anteriores sobre diferenças de Silvana Batista Gaino - UFRB
gênero nas amizades, discute-se que a Silgaino@hotmail.com
percepção de suporte social se daria da
seguinte forma entre os dois sexos: 1) O autismo é um transtorno invasivo do
primeiro, mulheres perceberiam-se como desenvolvimento, caracterizado pelo com-
mais providas de suporte emocional, in- prometimento severo em três áreas: habi-
dependentemente do sexo dos seus ami- lidades de interação social recíproca, habi-
gos, pois elas próprias já cultivam em suas lidades de comunicação, presença de com-
amizades um maior nível de intimidade e portamentos, interesses e atividades este-
apoio emocional, enquanto que homens reotipadas. Além dos sintomas caracterís-
não se diferenciariam em questões de ticos, o transtorno pode vir acompanhado
percepção de suporte emocional, inde- de comportamentos autoagressivos, que
pendentemente do sexo dos seus ami- podem ser entendidos como uma situação
gos, por conta da característica própria extrema de insatisfação e um estado maior

405
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de irritação, em que a criança não mais con- artigos incluídos em base de dados (Scielo,
segue suportar o excesso de sensações, ou Pepsic, Lume) a partir das palavras-chave
quando algo lhe incomoda muito, e a mes- relacionadas ao tema; de uma cartilha e de
ma manifesta comportamentos de ferir-se, 4 livros sobre autismo que mencionavam
morder-se, bater com a cabeça nos objetos sobre comportamentos autoagressivos.
próximos, arrancar os cabelos, entre ou- Foi feita uma leitura completa e seletiva
tros. O presente estudo busca então, inves- de todos os materiais encontrados e um
tigar a literatura científica da área, através agrupamento entre as seguintes catego-
da pesquisa bibliográfica, com o objetivo rias: Autismo; Comportamento autoagres-
de identificar quais as estratégias utilizadas sivo apresentados por indivíduos autistas;
pela Abordagem da Análise do Comporta- Formas de tratamento do comportamento
mento na ocorrência dos comportamentos autoagressivo mais difundidas; Formas de
autoagressivos, visando amenizar os riscos manejo apresentadas pela Análise com-
para a criança e buscando também verificar portamental. Em seguida, os dados foram
quais as variáveis que podem estar influen- fichados de modo a ser identificado as
ciando a ocorrência desses fenômenos. No principais idéias. Por fim, os dados foram
entanto, constata-se que há uma carência revisados e interpretados e foi elaborada a
de estudos sobre os comportamentos de síntese dos resultados. Os resultados apon-
autoagressão que podem ser manifesta- tam para várias tentativas terapêuticas
dos em crianças autistas. E, além disso, que foram ou continuam sendo propostas
entende-se que esses comportamentos no contexto dessa problemática como, por
constituem um estressor para a própria exemplo: 1- neurolépticos em altas doses;
criança, pois podem conduzir o indivíduo a 2- Reforço negativo; 3- Baclofeno; 4- Fen-
um processo de exclusão social, e também fluramina; 5- Antagonistas opióides, além
fazê-lo perder a oportunidade de apren- outros medicamentos, como a combinação
der novas habilidades, além de ameaçar vitamina B6-magnésio, carbamazepina,
a sua saúde e segurança. Para sua família ácido valpróico e lítio. Do ponto de vista
porque esses comportamentos exigem analítico-comportamental, o autismo é
cuidados integrais e desgastam a organi- uma síndrome de déficits e excessos que
zação interna desse grupo. E também para [pode ter] uma base neurológica, mas que
a comunidade, visto que a presença dos está, todavia, sujeita a mudança, a partir de
comportamentos autolesivos necessita da interações construtivas, cuidadosamente
utilização de mais recursos por parte das organizadas com o ambiente físico e social.
instituições, intervenções mais intensas e A Análise Aplicada do Comportamento tem
de maior custo. Nesse sentido, entende-se desenvolvido cada vez mais programas de
que estudar sobre este tema é de grande tratamento buscando analisar os aspectos
relevância. No âmbito metodológico, a re- do ambiente que poderiam estar manten-
visão bibliográfica foi elaborada a partir do o comportamento, enfatizando o ensino
de uma análise descritiva e qualitativa de de novas habilidades aos indivíduos diag-
pesquisas já existentes na área a fim de nosticados com autismo, opondo-se desta
estimular uma maior compreensão do pro- forma, ao tratamento medicamentoso tra-
blema pesquisado. A pesquisa foi operacio- dicional e à exclusão social dessas pessoas.
nalizada por meio de busca eletrônica de 6 Os comportamentos autolesivos apresen-

406
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tados pelos indivíduos autistas podem es- autoagressão não tem a ver com nenhum
tar sendo mantidos por diferentes conse- problema fisiológico, e se é apresentado
quências, como por exemplo, necessidade de uma forma repetitiva e compulsiva,
de auxílio ou atenção dos outros, escapar pode representar uma forma de chamar a
de tarefas que são aversivas para o indi- atenção do cuidador, ou indicar que algo
víduo, obter objetos desejados, protestar não ocorreu como esperava, ou ainda
contra eventos não desejados, para comu- ser uma forma de estimulação sensorial.
nicar involuntariamente a ocorrência de Nesse caso, a Abordagem da análise do
alguma dor ou problema fisiológico que comportamento pode ser uma alternativa
causam sofrimento, e obter estimulação. eficaz, para reduzir a ocorrência dessas
O conhecimento das funções desses com- automutilações. Se não for possível
portamentos permite a compreensão de identificar uma causa ambiental para a
que os mesmos não são atos deliberados autoagressividade, primeiramente deve-
de agressão, mas que têm um valor co- -se recorrer a exames clínicos para averi-
municativo importante. De acordo com guar a existência de alguma dor, problema
a abordagem analítico-comportamental, fisiológico, ou para detectar algum pro-
para diminuir a ocorrência desses com- blema neurológico, como epilepsia, por
portamentos deve-se fazer uma análise exemplo. Nesse tipo de situação os medi-
funcional individualizada, avaliando as va- camentos podem ser uma alternativa a se
riáveis as quais o comportamento autoa- recorrer juntamente com a terapia com-
gressivo é função, para assim, ser possível portamental.
uma manipulação dessas variáveis ensi-
nando a criança meios alternativos de co- Palavras-chave: Autismo, comportamentos
municação e visando a aquisição de novos autoagressivos, Análise do Comportamento.
comportamentos adequados que atuem Contato: Larissa Andrade Viriato. Universidade
exercendo uma função semelhante ao an- Federal do Recôncavo da Bahia
terior que era inadequado. Cabe ressaltar lary_andrade15@hotmail.com
que esta análise deve ser realizada prio-
rizando as diferenças individuais e o con-
texto que influenciam o repertório com- LT01-885 – DESENVOLVENDO AS
portamental de cada criança e que não HABILIDADES SOCIAIS, O CORPO E O
esteja restrita à aplicação de procedimen- PSIQUISMO.
tos baseada exclusivamente em formas Jeane de Souza Pontes Viana - FAP/RJ
generalistas de diagnóstico. É importante jeanepontes@ig.com.br
também que a modificação dos comporta-
mentos ocorra de forma gradativa, tendo O pôster apresentado é referente a um
como objetivo principal a diminuição da trabalho de mediação, desenvolvido com
ansiedade e do sofrimento. Com base nos uma criança de cinco anos e meio diag-
resultados encontrados, entende-se que o nosticada como autista. Teve início em
manejo do comportamento autoagressivo dezembro de 2009, com base no Son-
em crianças autistas é bastante complexo. -Rise, que tem como base a atitude de
Porém, no que diz respeito ao tratamen- amor e apreciação, motivando a criança a
to, é possível compreender que quando a partir da motivação que ela já tem e exi-

407
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gindo que o adulto seja mais responsivo LT01-886 – AS EXPECTATIVAS DA


em relação a sua criança. Autores como GESTANTE COM RELAÇÃO ÀS
Fonseca, acreditam que as crianças me- MUDANÇAS NO CORPO
diatizadas desenvolvem mais capacidades Danusa Thais de Almeida - Inedi
de generalização e de transferência de Evanisa Helena de Maio Brum - Inedi
estratégias para tarefas de aprendizagem
novas e inéditas. O contexto do trabalho Dentre as muitas experiências que for-
é basicamente “o quarto de brincar”, local mam a vida de uma mulher, podemos
fechado, com um espelho, onde aconte- destacar a gestação como uma importan-
cem as atividades mediadas pela autora, te vivência. Durante a gravidez, a mulher
que envolvem brincadeiras, e na casa da passa por transformações físicas e psico-
criança. Junto a esse programa foi reali- lógicas intensas. “As primeiras modifica-
zado um trabalho pedagógico onde nos ções do corpo podem ser vividas, pela
apropriamos da observação, da pesquisa mulher, como uma experiência deses-
e da estimulação, para que ele não só de- tabilizadora e angustiante que anuncia
senvolvesse as habilidades sociais exigi- modificações mais significativas, que po-
das como também as demais dimensões derão ameaçar a sua autoimagem” (Szei-
referentes a corpo e psiquismo. Alguns jer & Stewart, 2002, p.121). Desta forma,
episódios eram fotografados e filmados torna-se importante estudar aspectos re-
pela autora. Com a quantidade de mate- lacionados a este período sensível, como
rial, escrito e fotográfico que conseguimos a vivência materna diante das mudanças
reunir, decidimos produzir um portfólio corporais. Objetivo do Estudo: O objetivo
visual, por meio de um slide, para que pu- desse estudo foi investigar a expectativa
déssemos organizar uma pesquisa e para da gestante com relação às suas trans-
que a família acompanhasse mais de per- formações corporais durante a gestação.
to todo o processo do nosso trabalho, que Também, procurou-se investigar como
foi realizado em casa e na escola, compre- a gestante recebia os comentários do
endendo melhor o resultado. O pôster em companheiro e de familiares sobre essas
questão apresenta o trabalho realizado ao transformações. Método: O método de
longo de dois anos através dos quais pode- estudo empregado neste trabalho foi um
mos enfatizar as principais conquistas que estudo de caso único (Stake, 1994) com
a criança: hoje está cursando o jardim III; análise de dados qualitativos (Bardin,
por meio da mediação podemos apreciar 1977). Participou do estudo uma gestan-
de forma extraordinária como está acon- te de 22 anos no último trimestre de ges-
tecendo o processo de letramento em sua tação. A entrevista foi semiestruturada e
vida, pois ele já faz a leitura de “gestos” e as respostas foram registradas em áudio.
de expressões (feliz, zangado, assustado), Resultados e Discussão: Evidenciou-se na
brinca de contar histórias, tem prazer em entrevista que a gestante relatava mais
“ler” e em escrever. Além disso, escreve pontos negativos do que positivos sobre
lindas e carinhosas cartas e cartões. suas transformações físicas. Sobre pon-
tos positivos das mudanças no seu corpo
Palavras-chave: mediatização, apreciação e a gestante destacou que não havia pon-
desenvolvimento. tos positivos, pois se sentia “horrível”.

408
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Sobre os pontos negativos, ela destacou te em relação ao seu próprio corpo e seus
que ficou com manchas, alergias, en- conflitos com a mãe para a não aceitação
joos e azia. Essa autoavaliação negativa das mudanças corporais experimentadas
foi tão marcante e forte para a gestante pela gestante. Considerações Finais: A
que uma de suas atitudes foi a retirada partir da entrevista, das leituras realiza-
do espelho (de corpo inteiro) que tinha das e da análise comparativa entre am-
em seu quarto. Para enfrentar as mudan- bos foi possível verificar que as expectati-
ças corporais da gestação ela evitava si- vas da gestante em relação às mudanças
tuações nas quais teria de se confrontar de seu próprio corpo estavam relacio-
com a própria imagem. Por exemplo, no nadas com sua própria imagem e com o
momento em que relatou que ao tirar relacionamento com os seus familiares,
fotos para ter de lembrança da sua ges- especialmente com sua mãe. Destaca-se
tação, não conseguia olhar o resultado. o fato de que apenas um aspecto posi-
“De modo geral, a mulher reagirá de uma tivo foi relatado pela gestante durante a
maneira ou de outra a essas mudanças. entrevista e estava relacionado a fala do
Poderá exaltar o seu corpo com grande marido. Por fim, salienta-se a necessi-
satisfação por tomar formas diferentes, dade de intervenções em saúde mental
mais femininas. Ou odiá-lo pela apa- para esta gestante, que objetivariam a al-
rência física que a desagrada” (Szeijer teração da sua percepção corporal, bem
& Stewart, 2002, p.121). Como um pon- como para promover uma relação mãe-
to positivo, a participante destacou que -bebê favorável.
seu companheiro achava-a bonita. Deve-
-se destacar, que a forma como ela fazia
referência a essa opinião era de modo LT01-893 – A CRIATIVIDADE E O
simples e direto, sem muitos detalhes. O PROFESSOR: UM PROCESSO DE
que poderia evidenciar que essa visão do DESENVOLVIMENTO HUMANO.
companheiro não era muito considerada
por ela. Em relação a sua própria mãe a Alessandra do N. Pereira Tinoco - UF/RJ
gestante relatou que se sentia ressentida, alenptinoco@bol.com.br
pois contou que certa vez ela a chamou Financiamento: PIBIC/UFRJ
de feia, também relatou sobre a gravidez
da cunhada, que segundo a gestante, re- A criatividade é algo inerente ao homem
cebeu muito mais atenção e cuidados por e de certa forma, está correlacionada com
parte de sua mãe. “Ela se sentava no sofá o processo de desenvolvimento humano.
e a mãe vinha e alisava a barriga dela, Para desenvolver o potencial criador da
conversava com o nenê. Já comigo a mãe criança, no entanto, se faz necessário que
não faz isso. E eu não esperava isso da esta receba estímulos durante a infância
mãe”. Podemos pensar que a gestante dentro do seu meio social. Os estímulos
tenha internalizado estes aspectos nega- em conjunto aos traços característicos da
tivos contidos na fala da mãe, passando a sua personalidade e da sua capacidade
sentir-se feia. Diante destes dados pode- de correr riscos poderão dar melhores
mos levantar a hipótese de uma relação condições para o seu desenvolvimento
entre as percepções negativas da gestan- evitando desperdício de potencial huma-

409
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no. Vale ressaltar que esses fatores são do aluno. Então, como podemos pensar a
imprescindíveis ao processo criador, sen- docência de modo a estimular o processo
do possível observar que a criança atra- criador? O professor propõe atividades
vés deles, se relaciona com o ato de criar que favoreçam o processo criador da
sem barreiras ao seu desenvolvimento e criança no cotidiano da sala de aula? O
este pode ser espontâneo dentro de um desenvolvimento do processo criador na
ambiente favorável. O desenvolvimento criança é um objetivo observável na esco-
da criatividade encontra-se intrinseca- la pesquisada? Qual a metodologia mais
mente relacionado à apropriação da cul- apropriada para que o aluno desenvolva
tura. Essa apropriação indica uma partici- características de sua personalidade que
pação ativa da criança no seu meio social, o tornem um aluno criativo, autônomo e
tornando próprios dela mesma os modos com a capacidade de formular soluções
sociais de perceber, sentir, falar, pensar diversas para a complexidade que a vida
e se relacionar com os outros. Assim, ela contemporânea nos exige? Estas são as
se manifesta de diversas formas e não questões que pretendemos discutir nesta
se limita apenas às artes, mas em outros pesquisa. Para reconhecermos a impor-
campos de atuação (Smolka, 2009). Pri- tância que a criatividade exerce sobre o
meiramente, a revisão de literatura nos desenvolvimento cognitivo e emocional
informa que a espontaneidade e a criati- infantil, destacamos o que Alencar (1996)
vidade são inatas ao ser humano e essen- descreve sobre o valor da criatividade,
cial para o desenvolvimento. No Brasil, pois para a autora esta é uma habilidade
observamos que muitos desconhecem necessária e que deve ser incentivada no
que o potencial presente no ser humano ambiente escolar, promovendo o bem es-
é imenso, que tem sido utilizado de for- tar emocional mediante as experiências
ma muito limitada, permanecendo mui- de aprendizagem criativas e que contri-
tas capacidades inibidas e bloqueadas bui para uma melhor qualidade de vida
por falta de estímulo, de encorajamento dos alunos. Também ajuda na formação
e de um ambiente favorável ao seu de- profissional do indivíduo, já que a criati-
senvolvimento (Alencar, 2009). Muitos vidade é uma peça fundamental para o
professores, em enfoque os da rede pú- indivíduo lidar com as adversidades do
blica de ensino, ignoram que suas atitu- mundo contemporâneo (Sartori & Fialho,
des, suas expectativas em relação aos 2009). Mediante essa interação do indiví-
alunos, assim como a metodologia utili- duo com o meio no que tange o ambien-
zada no ensino podem favorecer a apren- te escolar, a criatividade está relacionada
dizagem ou, pelo contrário, podem criar com a produção de conhecimento, con-
barreiras para este desenvolvimento, sequentemente a escola é responsável
concorrendo ainda para tornar a aprendi- por garantir meios que possam favorecer
zagem um processo aversivo e doloroso. condições para que o aluno possa criar.
Nesse aspecto, podemos dizer que o pro- Se a criança estiver inserida em um am-
cesso criador da criança sofre uma influ- biente acolhedor e que facilite e estimu-
ência significativa da escola durante a sua le o seu aprendizado, esta terá grandes
construção e a metodologia do professor chances de se tornar um sujeito criativo.
pode contribuir para a produção criativa Buscando conhecer o contexto da sala de

410
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aula em relação ao problema em pauta, e não na compreensão do conhecimento.


foi feita uma pesquisa qualitativa que Contudo, devemos nos preocupar com as
apresenta um estudo de caso realizado atitudes coerentes que o professor deve
em uma escola municipal da cidade do ter para a obtenção do sucesso escolar
Rio de Janeiro. Participaram do estudo de seus alunos, pois ele deverá colabo-
alunos de uma turma de 3º ano do pri- rar com uma aprendizagem facilitadora
meiro segmento do ensino fundamental onde o aluno possa aprender com satis-
e uma professora. Foram sujeitos da pes- fação e não apenas para o cumprimento
quisa 28 alunos, com idades predomi- das exigências da família, da escola e da
nantes entre 8 e 11 anos, sendo 16 me- sociedade e sendo um mediador das re-
ninas e 12 meninos e 1 professora com lações para que o aluno se torne capaz de
idade de 50 anos. Utilizou-se a técnica se apropriar do conhecimento através do
de observação sistemática com relató- prazer e pela busca da criatividade.
rio descritivo num período de três me-
ses com 9h semanais num total de 90h. Palavras-chave: Criatividade, Educação e
Buscou-se identificar nas atividades pro- Aprendizagem.
postas pelo professor a possível relação Contato: Alessandra do Nascimento Pereira
com o desenvolvimento da autonomia/ Tinoco - alenptinoco@bol.com.br
tomada de decisão por parte dos alunos,
assim como propostas de atividades de
autoexpressão. No que diz respeito à ca- LT01-926 – INFÂNCIA, BRINQUEDO E
racterística da professora, seu método de HOSPITALIZAÇÃO: EXPERIÊNCIAS EM
ensino consiste no que Paulo Freire men- UMA BRINQUEDOTECA
ciona como pedagogia bancária, onde Aline Oliveira Furlam Nogueira - UFMT
o professor é o detentor do saber e sua Julia Hueb Perez - UFMT
função é transmitir o seu conhecimento Juliana Rizzini De Sá - UFMT
aos alunos. No tempo observado a pro- Paola Biasoli Alves - UFMT
fessora trabalhou com uma metodologia Shaienie Monise Lima - UFMT
tradicional, não trazendo para sala de
aula atividades que pudessem desenvol- A infância é um dos períodos do desen-
ver o processo criador, assim como ati- volvimento humano sobre o qual diver-
vidades que estimulassem a autonomia. sas ciências humanas e da saúde realizam
Sua prática de ensino pareceu atender a inúmeros estudos e, de maneira geral, é
teoria comportamental (Behaviorismo). caracteriza como processo de grandes
Todavia, nos dias atuais sabemos que o construções cognitivas, sociais, afetivas e
professor não é o único detentor do sa- maturacionais. Para a Psicologia, em suas
ber e raras são as situações criadas nas mais diversas teorias, a infância enfatiza
escolas públicas que estimulam o aluno a a necessidade de espaços de interação
pensar, criticar e ter tomada de decisão. entre ambiente e indivíduo responsáveis
A criança ainda não é vista por seus pro- e recíprocos, apresentando indicações
fessores como construtores do conheci- de configurações protetivas ou de risco
mento e estes focam suas metodologias ao longo desse processo. Nesse sentido,
de ensino na memorização do conteúdo a existência de períodos de internação

411
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

hospitalar na vida da criança cobram o no que diz respeito às suas relações com
estudo de seu desenvolvimento nesse as crianças. A elaboração e efetivação da
contexto, a compreensão das vivências sessão com sucatas, embasada em con-
estressoras e protetivas para a criança, ceitos da Psicologia Sócio-Histórica, em
sua família e equipe de cuidados hospi- especial a mediação e os processos de
talares dentro do ambiente do hospital. significação, buscou aproximar a reali-
Esse trabalho apresenta os processos en- dade externa à interna do hospital, além
volvidos em uma sessão de brinquedos de trazer alternativas para a confecção e
e brincadeiras com sucatas realizada na uso de brinquedos. Ao se considerar as
brinquedoteca do Hospital Universitário dimensões nomeadas por Urie Bronfen-
Júlio Müller (HUJM) em Cuiabá/MT. O brenner (1996/1979) no que diz respeito
HUJM tem sua brinquedoteca organizada à sustentação de processos de interação
e mantida pela Faculdade de Enferma- humana com ênfase na saúde, é possível
gem da Universidade Federal de Mato identificar três pilares: afeto, reciprocida-
Grosso, que realiza diversos projetos em de e equilíbrio de poder entre os partici-
seu interior, entre eles o “Cuidar Brin- pantes das ações sociais. Também, foram
cando”, que traz para as crianças hospi- considerados diversos autores que abor-
talizadas e suas famílias a oportunidade dam a temática do brinquedo e do brin-
de utilizar o espaço lúdico, brinquedos car na promoção do desenvolvimento
e computadores para auxiliar na elabo- infantil (Brougerè, 1995 e outros que vou
ração do processo de hospitalização, na citar)Dessa forma, ao se pensar a inter-
adesão aos tratamentos e nas dinâmicas venção com sucata, foram considerados
das terapêuticas necessárias durante a esses pilares, na busca da sustentação e
internação. Em parceria com esse proje- manutenção de aspectos mediacionais
to, o Curso de Psicologia da UFMT/Cuiabá efetivos e construções de redes de signi-
conduz o projeto “Infância, brinquedo e ficação promotoras de saúde. Para tanto,
hospitalização”, através do qual a inter- as estudantes de Psicologia utilizaram os
venção com sucatas foi realizada, sendo dados informais coletados ao longo de
essa também ligada à prática da discipli- cinco meses de presença na brinquedo-
na Estágio Básico em Contextos Educacio- teca, de uma a duas vezes por semana,
nais e Sociais. A presença dos estudantes o que favoreceu a construção de conhe-
de Psicologia nas atividades da brinque- cimentos e vínculos nesse espaço. Esses
doteca tem três objetivos específicos: dados foram obtidos em conversas com
pesquisar junto às crianças suas expec- as crianças, seus cuidadores imediatos
tativas e demandas quanto ao espaço da e equipe técnica, além de coletados nas
brinquedoteca e o uso dos computado- próprias atividades lúdicas, realizadas
res, identificar e intervir em característi- enquanto brinquedo livre nos encontros
cas do desenvolvimento infantil que pos- comas crianças. O aspecto cognitivo tam-
sam ser implementadas ou melhoradas bém foi valorizado, trazendo essa ativi-
enquanto as crianças estão internadas e dade características de desenvolvimento
fazem uso da brinquedoteca e, por fim, psicomotor, raciocínio lógico e processos
identificar e trabalhar demandas especí- de imaginação, memória e linguagem
ficas das famílias e técnicos cuidadores (Stenberg, 2000). O material utilizado foi:

412
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rolo de papel higiênico, tampinha de gar- obesidade aumentou entre os brasilei-


rafa pet, revista, guache, cola, papelão e ros. A anorexia nervosa na população
canetinha. Os procedimentos incluíram brasileira adolescente e juvenil, está en-
uma explanação inicial para as crianças tre 0,5% e 1% e da bulimia entre 1% e
sobre o que são sucatas e como podem 3%. Esses números vêm aumentando a
ser obtidas e aproveitas para manufatu- cada ano, atingindo idades mais tenras, e
rar brinquedos (aspecto formal do co- preocupando tanto pesquisadores como
nhecimento), e em seguida, a disponibi- autoridades em Saúde. O presente traba-
lização do material para que as crianças lho é um projeto de pesquisa que está em
produzissem seus brinquedos (aspectos andamento na Universidade Católica de
lúdicos e sociais da aprendizagem). Brasília – UCB desde outubro/2010. De-
senvolvido com recursos da CAPES/CNPq,
tem como objetivo construir uma meto-
LT01-944 – CONSTRUÇÃO DE dologia de atendimento psicossocial a
METODOLOGIA DE ATENDIMENTO crianças e adolescentes com transtornos
PSICOSSOCIAL A CRIANÇAS E alimentares e obesidade e suas famílias,
ADOLESCENTES COM TRANSTORNOS a partir do conhecimento dos aspectos
ALIMENTARES E OBESIDADE E SUAS intrapsíquicos, familiares e sociais das
FAMÍLIAS mesmas. Objetiva também formular as
Heron Flores Nogueira - UCB bases para a criação de um Núcleo de
Maria Alexina Ribeiro - UCB Pesquisa e Atendimento aos portado-
Cícero Nunes Menezes - UCB res de Transtornos Alimentares na Uni-
Flora Teixeira Mota de Paula - UCB versidade Católica de Brasília – UCB, a
Luiza Leal Martinez - UCB partir da implantação de um programa
interdisciplinar de atenção às crianças e
Os Transtornos Alimentares são doen- adolescentes com transtornos alimen-
ças psiquiátricas caracterizadas por per- tares e suas famílias com a participação
turbações no comportamento alimen- de representantes dos cursos da área de
tar. Os atuais sistemas classificatórios saúde (Medicina, Enfermagem, Nutrição)
de transtornos mentais descrevem três e Serviço Social. A nova metodologia que
categorias diagnósticas principais nos será construída representará um avanço
transtornos alimentares: Anorexia Ner- em termos científicos e técnicos, uma vez
vosa, Bulimia Nervosa e Transtornos Ali- que os transtornos alimentares e a obe-
mentares Sem Outra Especificação. Para sidade em crianças e adolescentes têm
a Organização Mundial de Saúde a obesi- sido muito discutidos, mas propostas efi-
dade é uma doença endócrina, nutricio- cazes ainda não são conhecidas. A equipe
nal e metabólica, não fazendo parte dos de pesquisa é formada por quatro pro-
transtornos mentais e comportamentais. fessores doutores da UCB e Universida-
No entanto, alguns autores a incluem di- de de Brasília, uma médica da Secretaria
daticamente nesta categoria pelos aspec- de Saúde do DF, três alunos de mestrado
tos de funcionamento semelhantes aos que estão desenvolvendo suas disser-
demais transtornos. Pesquisa realizada tações sobre o tema da pesquisa e oito
pelo Ministério da Saúde mostra que a estudantes de Iniciação Científica, alunos

413
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do curso de Psicologia da UCB. A idéia do de saúde ou escolas. Além disso, foi fei-
projeto surgiu da experiência de profes- ta uma articulação com os PRAIAs - DF
sores e alunos do curso de Psicologia da - Programas de Atenção Integral à Saúde
referida universidade que, nos últimos do Adolescente para identificar casos de
dez anos, tem recebido no seu Centro de transtornos alimentares, via Coordena-
Formação em Psicologia Aplicada, um nú- ção de Saúde do Adolescente da Secre-
mero significativo de encaminhamentos taria de Saúde do DF. O DF tem hoje 15
de crianças e adolescentes com transtor- PRAIAs em 15 regionais de saúde, aten-
nos alimentares, seja de órgãos e profis- dendo adolescentes na perspectiva Biop-
sionais de saúde, escolas ou mesmo pais sicossocial. O referido Programa está en-
que buscam o nosso centro à procura de caminhando os adolescentes e suas famí-
ajuda. Essa imensa demanda deve-se, em lia à UCB para participarem da pesquisa,
parte, à falta de um programa regular e após assinatura de um Termo de consen-
eficaz de atendimento a essa clientela no timento Livre e Esclarecido. As atividades
âmbito do Distrito Federal. A falta de um de pesquisa uis estão sendo realizadas
referencial teórico e prático que oriente no Centro de Formação em Psicologia
o trabalho dos professores, pesquisado- Aplicada da UCB, divididas entre ativida-
res e supervisores de estágio da UCB nos des de pesquisa-ação com as crianças e
motivou a realizar, nos últimos três anos, adolescentes e com as famílias, diagnós-
pesquisas de Mestrado sobre o referido tico com o Método do Rorchach com os
tema, objetivando uma melhor compre- adolescentes, encontros lúdicos em gru-
ensão dos transtornos alimentares e obe- po com as crianças e adolescentes, en-
sidade, buscando ampliar o olhar sobre trevistas e Grupos Multifamiliares com os
o indivíduo que apresenta o transtorno genitores. Os dados parciais da pesquisa
para o seu contexto familiar e social. Por estão em consonância com os trabalhos
outro lado, a gravidade dos transtornos e constantes do levantamento bibliográfico
a falta, ainda, de literatura que embase sobre o tema, ou seja: fatores individu-
o trabalho com essa clientela, exige que ais, familiares e sociais estão na base do
estudos mais aprofundados sejam rea- surgimento e da manutenção dos trans-
lizados. Entendemos que os resultados tornos alimentares e da obesidade em
obtidos com essa pesquisa podem ajudar crianças e adolescentes e precisam ser
a aprimorar os serviços de atendimento levados em consideração quando se pen-
de saúde à comunidade, tanto os do âm- sa em metodologia de atendimento efi-
bito público, como os de âmbito acadê- caz para esses problemas de saúde.
mico dos hospitais e clínicas - escolas das
universidades. O estudo está envolvendo Palavras-chave: transtornos alimentares,
30 famílias de crianças e adolescentes obesidade, dinâmica familiar.
com diagnóstico de transtorno alimen- Contato: Heron Flores Nogueira
tar (anorexia nervosa, bulimia nervosa) heronfn@uol.com.br
e obesidade que procuraram a universi-
dade para atendimento psicológico ou
foram encaminhados por instituições e
profissionais de saúde, hospitais, postos

414
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-983 – CONSTRUÇÃO DE UM frente aos desafios e às questões que sur-


INSTRUMENTO DE ENFRENTAMENTO gem; porém, as que não conseguem lidar
DE CONDIÇÕES ADVERSAS DURANTE A com essas questões e desafios que apare-
INSERÇÃO PRÉ-ESCOLAR INFANTIL. cem no aprendizado, por mais que façam
Elaine Fiorentini da Silva - UNIVIX/ES grande esforço, acabam por falhar (Shapi-
elainefiorentini@hotmail.com ro & Bradley, 1999). Para essas crianças,
Schimeni Andréa Vello Sartório - UNIVIX/ES faltam estratégias de enfrentamento mais
schimeni@gmail.com eficazes de modo a produzir reforçadores
Erika da Silva Ferrão - UNIVIX/ES - UnB/DF suficientes para um bom desempenho
edsferrao@folha.com.br escolar, aumentando, consequentemen-
Bárbara da Silva Ferrão - UNIVIX/ES te, as probabilidades de os mesmos te-
babysfr@yahoo.com.br rem seu desempenho acadêmico afetado
Financiamento: Faculdade Brasileira UNIVIX desde a idade precoce (Brown, 2004).
Para agravar a situação, as crianças com
No contexto pediátrico escolar, a inserção diferentes queixas psicológicas, sejam
da vida acadêmica-escolar faz com que sócio-emocionais, comportamentais ou
a criança se depare com uma realidade cognitivos, inseridas no ensino regular
diferente do seu contexto familiar primá- desde a pré-escola, encontram-se em si-
rio, ou seja, em um ambiente que pode tuação de maior risco psicossocial. Essas
apresentar-se como desafiador e hostil, podem receber tratamento diferenciado
com diferentes regras e limites, pessoas em relação aos demais colegas de classe
e situações não familiares. Tais fatores e serem vítimas de preconceito e discri-
podem ter efeitos importantes sobre o minação. Esses alunos, muitas vezes, es-
desenvolvimento infantil, levando a crian- tão incluídos no âmbito físico, mas não no
ça, inclusive, a ter reações de ansiedade e social e emocional. Pela inexistência de
stress (Lipp e colaboradores, 2002; Souza, um instrumento que avalie as estratégias
2004). Considerando que as experiências de enfrentamento da inserção escolar de
precoces vivenciadas por seres humanos crianças pré-escolares no Brasil, a presen-
influenciam seus comportamentos futu- te pesquisa objetivou construir e aplicar
ros, a maneira pela qual a criança lida com um instrumento para avaliar o enfrenta-
seu estresse pode determinar sua resis- mento da adaptação escolar em crianças
tência às tensões psicossociais até a fase pré-escolares. Participaram desta pesqui-
adulta. O sofrimento vivido pela criança, sa 9 crianças indicadas pelos professo-
somado a fatores familiares significantes, res como tendo alguma queixa escolar,
como a ausência de regras e limites ou de ambos os sexos (3 meninas) e idade
superproteção dos pais, podem desenca- entre 3 a 6 anos (média de 4 anos), que
dear a longo prazo, a fobia escolar, vista frequentavam um Centro de Educação
como uma variante de alguns dos trans- Infantil (CMEI) localizado no município de
tornos comuns na infância, como o Trans- Vitória, ES. O critério de seleção da amos-
torno de Ansiedade de Separação. No ge- tra foi o encaminhamento pela escola de
ral, as crianças que conseguem responder crianças observadas rotineiramente apre-
de forma positiva às condições adversas sentando alguma das seguintes queixas
na quais se encontram, adquirem sucesso escolares no ambiente escolar, desde sua

415
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

inserção: emocionais, comportamentais 11 minutos) com o cuidado para que não


e/ou cognitivas. Nas queixas compor- ficasse muito extensa e cansativa, quanto
tamentais foram identificadas: desor- à atenção focada da criança e na energia
ganização nas tarefas, comportamento despendida nesta faixa etária. Para o de-
obsessivo, agressividade, não cumpri- senho das pranchas, foram feitas obser-
mento das regras, falta de limite, pirraça vações prévias do cotidiano da criança na
e deboche de adultos. Na amostra havia escola a fim de detectar situações aversi-
crianças chorosas por diferentes motivos, vas, indicativas de estratégias de enfren-
tais como ser órfã de mãe, com pais em tamento adequadas e não-adequadas,
processo de separação, e com frequen- específicas ao ambiente escolar. Assim,
te demanda de carinho, consideradas organizou-se um conjunto de 7 Pranchas
pela escola como queixas emocionais. de Situações-Problemas. Da mesma for-
Em relação às queixas cognitivas foram ma, foi organizado um conjunto de situ-
identificadas: falta ou pouca atenção e ações representativas das diferentes ma-
concentração, e déficit de aprendizagem. neiras como as crianças respondem às si-
O instrumento IAE – Instrumento de Ava- tuações aversivas, que foram elaboradas
liação das Estratégias de Enfrentamento sob duas categorias: a) aquelas que se re-
Escolar, elaborado na presente pesquisa, ferem a estratégias consideradas facilita-
foi aplicado em cada uma das crianças doras, tais como Pegar outro brinquedo,
em local reservado, dentro do próprio Obedecer a regra, e Permanecer na fila;
CMEI. Na primeira etapa da pesquisa, es- e b) aquelas que se referem a estratégias
tratégias de enfrentamento facilitadoras consideradas não-facilitadoras, incluindo
e não-facilitadoras de outros trabalhos Fazer birra, Chorar e Desistir e brincar,
(Del Prette & Del Prette, 2006; Motta & por exemplo. Na segunda etapa da pes-
Enumo, 2002; 2004; Skinner, 2007; Skin- quisa, o instrumento construído foi apli-
ner, Edge, Altman & Sherwood, 2003) em cado nas 9 crianças (média 4 anos), que
contextos diferentes foram adaptadas ao tiveram suas estratégias analisadas na
contexto pré-escolar, que compuseram terceira etapa da pesquisa. Considerando
os itens do instrumento construído Ins- os dados obtidos na aplicação do instru-
trumento de Avaliação das Estratégias mento, observou-se que as estratégias de
de Enfrentamento Escolar (IAE). Quanto enfrentamento utilizadas pelas crianças
à quantidade de pranchas, foram criadas com diferentes queixas escolares, foram
7 pranchas com situações-problemas e 7 facilitadoras em 41% das respostas na ca-
pranchas com situações-respostas, sendo tegoria Reestruturação cognitiva, e 24%
esta última composta por 1 resposta faci- das respostas não-facilitadoras na cate-
litadora e 2 não-facilitadoras cada. O IAE, goria Oposição. Assim, tais dados indicam
portanto, foi composto por 21 situações- que crianças identificadas pela escola
-problema acompanhado de 3 respostas como tendo alguma queixa escolar são
possíveis cada uma, que se propõem a capazes de responder de forma adequada
avaliar as habilidades sociais na infância. às situações estressantes vivenciadas no
Por serem crianças em idade pré-escolar, contexto escolar, e a pensar sobre a im-
delimitou-se o número de 14 pranchas, portância e a necessidade de se intervir
devido ao tempo de aplicação (média de no processo de aprendizagem escolar de

416
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

forma mediadora, já que a escola pode 1994) com análise de dados qualitativos
apresentar-se como desafiadora e hos- (Bardin, 1977). Participante: Participou
til. Sendo assim, o presente instrumento do estudo uma gestante multípara no
pareceu identificar e a avaliar qualitativa- terceiro trimestre de gestação, com 28
mente as estratégias de enfrentamento anos de idade que residia com seu com-
de crianças em idade pré-escolar, contri- panheiro. Procedimentos: A coleta de
buindo para o diagnóstico e intervenção dados ocorreu em setembro de 2010,
psicológicos nesse contexto. Entretanto, na casa da participante, onde foi aplica-
tal instrumento se encontra em fase de da uma entrevista semiestruturada. Re-
aprimoramento, sujeito a alterações e sultados: Os resultados revelaram que a
análises estatísticas consistentes, a fim de mãe através da interação, ou seja, com a
ser validado como um instrumento capaz conversa e o toque procurava formar um
de avaliar as estratégias de enfrentamen- laço afetivo com o bebê ainda no período
to (coping) de crianças em pré-escolas. pré-natal, através dos movimentos fetais
a mãe acreditava que seu filho estava cor-
Palavras-chave: Construção de instrumentos; respondendo a suas comunicações com
Avaliação de Coping; Psicologia Pediátrica. ela, o incrementou suas expectativas em
Contato: Bárbara da Silva Ferrão- Faculdade relação a ele. Já as expectativas atribuídas
Brasileira UNIVIX ao sexo e nome ofereceram mais identi-
edsferrao@folha.com.br dade ao bebê. Discussão. A entrevista
corrobora com os achados da literatura
LT01-1000 – EXPECTATIVAS DA científica sobre o tema, pois revela que a
GESTANTE E INTERAÇÃO MÃE-BEBÊ relação mãe-bebê estabelecida durante a
Cleonice Aline Dutra - ACPC gestação é um investimento importante à
Evanisa Helena de Maio Brum - UFRGS constituição psíquica do bebê, e ao exer-
cício materno (Brazelton & Cramer, 1992).
A interação da mãe com seu bebê ainda A participante se mostrou muito presta-
na gestação é uma forma indispensável tiva ao responder os questionamentos
de estabelecer um relacionamento obje- feitos a ela. E segundo a gestante a gravi-
tivo, sendo assim a expectativa da gestan- dez estava sendo um marco em sua vida,
te para com o bebê, reforça ainda mais afinal a forma como o bebê correspondia
esta relação e torna esta interação mais as suas expectativas e a intensidade de
frequente e prazerosa. O bebê anuncia, seus movimentos fetais, faziam com que
então, sua existência no interior dos pais a mãe sentisse seu bebê como mais real.
muito antes do nascimento e os projetos Sendo assim, ela demonstrou também,
e expectativas que envolvem a sua che- estar cooperando para que a relação com
gada preparam o lugar, para acolhê-lo seu bebê fosse estável e “perfeita” após
(Piccinini, Tudge, Lopes & Sperb, 1998). o nascimento. Conclusão. A percepção
Objetivo: Investigar a interação através materna dos movimentos fetais é con-
da comunicação entre a díade e as expec- siderada um grande marco na gravidez,
tativas da gestante durante a gestação. pois, faz com que a mãe sinta o feto como
Método: O método empregado neste es- mais real e personificado, e incrementa as
tudo foi um estudo de caso único (Stake, expectativas referentes a ele. É a partir da

417
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

maneira como são percebidos estes mo- cas. Dentro deste contexto, a existência
vimentos que as gestantes vão atribuin- de determinados problemas clínicos da
do características de temperamento ao gestante e do feto podem também elevar
bebê, além de expressarem que a intera- o nível da ansiedade materna diante de
ção passou a ser recíproca, e elas podem uma gestação de risco. O nascimento pré-
até compreender certas mensagens dos -termo do bebê está entre os fatores que
filhos (Maldonado, 1997; Raphael-Leff, mais afetam a experiência da gestação,
1997; Szejer & Stewart, 1997). A gestante podendo trazer dificuldades específicas
deste estudo afirmou que as expectativas para a mulher. Diante de uma gestação de
atribuídas ao bebê durante a gestação es- risco, a mãe poderá ter de fazer um esfor-
timularam ainda mais a comunicação en- ço maior para conseguir atingir a condição
tre eles. E que esta comunicação se fazia descrita por Winnicott (1956/2000) como
cada dia mais intensa, já que segundo a preocupação materna primária (PMP)
mãe, ela era correspondida por seu filho, que envolve um estado psicológico espe-
com mensagens de companheirismo e ca- cial da mãe, que a torna sensível às ne-
rinho através dos movimentos fetais. cessidades básicas de seu filho. Tal estado
tem início ainda na gestação, sendo acen-
tuado no seu final, estendendo-se até as
LT01-1011 – INDICADORES DA primeiras semanas ou meses após o par-
PREOCUPAÇÃO MATERNA PRIMÁRIA to. Trata-se de uma condição fundamen-
NA GESTAÇÃO DE MÃES QUE TIVERAM tal da mãe para que o bebê tenha suas
PARTO PRÉ-TERMO necessidades atendidas de maneira satis-
Marocco, Carolina - UFRGS fatória desde a gestação, sejam elas quais
caca_mak@hotmail.com forem, e possa, a partir daí, continuar se
Anton, Márcia C. - UFRGS desenvolvendo. Winnicott (1956/2000)
marciacamaratta@gmail.com referiu que esse estado materno é pos-
Piccinini, Cesar A. - UFRGS sível graças a processos identificatórios
piccini@portoweb.com.br maternos que colocam a mãe em uma
Instituição financiadora da pesquisa: CAPES posição de saber o que o bebê precisa.
No que diz respeito aos primeiros conta-
A experiência subjetiva materna frente tos com seu bebê, que começam desde a
à gestação e o nascimento do bebê tem gravidez, a mãe comunica-se com ele es-
sido motivo de inúmeras investigações sencialmente através de gestos e vocali-
nas últimas décadas. Existe um perío- zações. Diante da ameaça do nascimento
do sensível no decorrer da gestação até pré-termo na gestação, a função da PMP
os primeiros dias depois do nascimento, parece ser ainda mais crucial, pois a situ-
dentro do qual as trocas íntimas mãe-re- ação de vida imposta à mãe demandará
cém-nascido são facilitadoras do ajuste dela um esforço maior que o usual para
da díade e da vinculação afetiva posterior. conseguir entrar em sintonia com o bebê
A gravidez, por si só, envolve um intenso e conseguir exercer adequadamente sua
trabalho por parte da mulher, exigindo função. Diante disso, o estudo se propõe
que esta consiga assimilar e enfrentar a investigar indicadores da PMP na ges-
mudanças corporais, sociais e psicológi- tação de mães que tiveram parto pré-

418
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-termo. Participaram deste estudo qua- sobre a gestação e o parto no contexto


tro mães de bebês nascidos pré-termo, da prematuridade. A entrevista, que era
selecionadas na Unidade de Tratamento gravada, investigou retrospectivamente
Intensivo Neonatal (UTINeo) do Hospital diversas questões sobre a gestação em
de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Todas particular sobre os indicadores de PMP.
as mães apresentaram gravidez de risco. A abordagem psicoterapêutica utilizada
As mães tinham idade entre 22 e 28 anos, foi a da Psicoterapia breve dinâmica em
apresentavam nível sócio-econômico bai- UTI e internação neonatal. O material
xo e grau de instrução variado. Todas as derivado dos atendimentos, assim como
mães moravam com o pai do bebê. Os das observações e contatos mantidos
bebês nascidos pré-termo apresenta- com as mães na UTINeo, bem como da
ram uma idade gestacional média entre entrevista foram transcritos e levados à
30 e 37 semanas e peso intermediário supervisão clínica e posteriormente ana-
variando entre 1000g a 2500g (medidas lisados. A análise de conteúdo qualitativa
estabelecidas pela Organização Mundial dos achados sugerem que a PMP também
de Saúde). Os bebês não apresentaram se apresentou nas mães com risco de
complicações clínicas sérias. Foi utiliza- parto pré-termo, apesar deste processo
do um delineamento de estudo de caso ter sido marcado pelo contexto da pre-
coletivo que investigou os indicadores da maturidade. O nascimento pré-termo e
preocupação materna primária com base as intercorrências na gestação relaciona-
em diversas categorias, citadas a seguir: das a ele agregam algumas dificuldades
acompanhamento pré-natal; sentimentos à PMP e aos sentimentos maternos rela-
em relação às mudanças físicas e emo- cionados ao processo de formação da ma-
cionais; sentimentos em relação à função ternidade, que por si só, já é repleto de
materna; sintonia da mãe com o bebê; mudanças, ansiedades e adaptações. Os
preparação para a chegada do filho. As resultados destacam dificuldades impos-
mães dos bebês foram contatadas na UTI- tas à díade diante da gravidez de risco e
Neo do HCPA. Como o tema proposto nos do nascimento pré-termo, entre os quais
pareceu difícil de ser investigado através está a preocupação da mãe com a sobre-
de um contato rápido envolvendo apenas vivência do filho e com a sua própria vida;
entrevistas pontuais com as mães, em a não aceitação inicial da gestação, que
um período considerado difícil como é o pode ter sido agravada pela ameaça do
pós-parto de bebês nascidos pré-termo, parto pré-termo. O aumento da sensibi-
decidiu-se que a primeira autora passaria lidade materna, que já é esperada no pe-
a integrar a equipe de Psicologia do HCPA, ríodo gestacional, pareceu se exacerbar
realizando atendimentos psicológicos das com a possibilidade da prematuridade do
mães, conforme a rotina do Serviço de filho e necessidade de repouso e a pos-
Psicologia desse hospital. A supervisão sibilidade de dependência dos familiares
clínica local foi realizada pela psicóloga por parte das mães. Apesar disto tudo,
responsável pela UTINeo, buscando-se após as mães assimilarem a ameaça do
identificar o melhor momento emocional nascimento pré-termo e, posteriormente
da mãe para que fosse convidada a par- o nascimento prematuro do filho, alguns
ticipar da presente pesquisa Entrevista fatores positivos foram se sobressaindo

419
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no lugar das adversidades vivenciadas ini- cionais, aprendizagem e relacionamento.


cialmente. Entre estes, pode-se destacar Foi realizado acompanhamento ludote-
a construção simbólica, gradual, do lugar rápico, na perspectiva fenomenológico-
do filho nos preparativos para a chega- -existencial. Inicialmente, foi feito contato
da do mesmo; a sintonia das mães com com a mãe e realizada entrevista anam-
os bebês, que começaram a assimilar a nésica, a fim de compreender a queixa e
ideia de que seus filhos poderiam sentir a história da criança. Quando João esta-
o que elas estavam sentido e a percepção va com 2 anos, mudou-se com sua mãe
da dependência do bebê dos cuidados e irmão para a cidade de origem dela,
maternos. Cabe ressaltar que, apesar das em virtude da separação dos pais, e des-
particularidades envolvendo cada uma de então, não houve mais contato do pai
das mães muitas foram as semelhanças com as crianças. Segundo a mãe, as quei-
evidenciadas entre elas. Nesse sentido, xas e questionamentos dos filhos sobre o
é possível pensar que as ansiedades, tris- pai são constantes. João, frequentemen-
tezas e satisfações verificadas entre essas te agressivo na escola, associa e justifica
mães poderão ser encontradas em outras suas ações pelo fato de ter sido abando-
mães que se depararem com nascimento nado pelo pai. A mãe refere que João não
pré-termo do filho e que encontram-se quer ir à escola, não quer aprender a ler
em contextos de vida semelhantes àque- e escrever. Ela também conta que ele tem
las deste estudo. a fala “enrolada e infantil”, com uma pro-
núncia ruim; é muito emotivo, e não tem
Palavras-chave: preocupação materna amigos. A criança “emotiva e agressiva”
primária, gestação, nascimento pré-termo. que então recebo revela-se, na verdade,
Contato: Carolina Marocco, doutoranda como uma criança com baixa autoestima.
UFRGS e endereço eletrônico do autor Ele também traz a necessidade de elabo-
responsável: caca_mak@hotmail.com rar questões para além do aprendizado
escolar, dentre as quais: o abandono do
pai e a vivência do conflito entre a família
LT01-1040 – A CONDUÇÃO E EVOLUÇÃO pensada e a vivida (Szymansky, 2002), e
DO PROCESSO PSICOTERAPÊUTICO revela descobertas e dúvidas no tocante à
COM UMA CRIANÇA DE 07 ANOS SOB A sexualidade. Nas primeiras sessões, João
ÓTICA FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL é uma criança que, sim, apresenta uma
Beatriz Mendes e Madruga - UF/RN fala infantilizada e de difícil compreen-
beatrizmadruga@gmail.com são, além de um brincar repetitivo e pou-
Symone Fernandes de Melo - UF/RN co criativo. As demandas próprias ele já
symelo@gmail.com traz nas primeiras sessões, mas ainda de
modo sutil: a relação pai e filho; a curio-
Neste trabalho será apresentado o estudo sidade sobre a sexualidade e o feminino.
de caso de João. A criança, de 7 anos, foi Há poucos diálogos espontâneos. A con-
encaminhada pela escola para o Serviço versa aberta é evitada pela criança, espe-
de Psicologia Aplicada (SEPA) da Univer- cialmente se o assunto remeter à escola,
sidade Federal do Rio Grande do Norte contudo, há interesse evidente quanto
(UFRN) com queixas de dificuldades emo- aos livros e leitura. Sua baixa autoestima

420
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

é observada na pouca persistência com concebem isso muito positivamente. Ele


brincadeiras que envolvem algum esforço não resiste mais em ir à escola, e agora
cognitivo; a desistência e a frustração são aborda esse assunto de modo positivo.
comuns. Acontecem também episódios Ainda não aprendeu a ler e a escrever,
de autodepreciarão. Aqui, a influência da apesar de continuar expressando o seu
autoestima no seu desempenho escolar interesse nisso. Após 27 sessões, João
é manifesta. Há fuga do assunto que re- aproxima-se da alta terapêutica. A evolu-
mete diretamente à sua dificuldade, en- ção é observada nas demandas trazidas
quanto ele demonstra não acreditar no pela própria criança. A autoestima, que
próprio desempenho em diversas tarefas. a princípio mostrava-se prejudicada, me-
Para Carneiro, Martinelli e Sisto (2003), o lhora ao longo das sessões. A compreen-
fracasso escolar pode advir de condições são e elaboração da sua condição familiar,
internas do indivíduo, destacando-se o da falta de uma figura paterna presente
desenvolvimento cognitivo e fatores de e constante, ou, pelo menos, significativa,
ordem afetivo-emocional, motivacional perpassa as sessões, sendo expressa por
e de relacionamento. Já nas sessões in- meio de diferentes mediadores lúdicos. A
termediárias, João começa a apresentar autonomia e autenticidade da criança vão
evoluções no brincar. Revela-se mais au- emergindo progressivamente. Estar mais
tônomo no faz-de-conta, mostrando-se à vontade na sala de Ludo, dirigir a brinca-
protagonista do processo. As brincadeiras deira, empreender diálogos espontâneos,
são mais demoradas, elaboradas e criati- trazendo deliberadamente episódios do
vas, e João mostra-se persistente e mais seu cotidiano, são expressões importan-
resistente à frustração. Os diálogos es- tes; e novas facetas de sua subjetividade
pontâneos principiam. João utiliza-se bas- aparecem ao longo do processo (cuidado,
tante dos animais, um recurso frequente- zelo, organização), revelando estabilidade
mente usado para representar a dinâmica no comportamento e reconfiguração de
familiar (Feijoo, 1997). Com os animais, self. A expressão lúdica passou de regres-
ele forma famílias de padrões variados, siva e rígida para um brincar elaborado
incluindo a composição mãe e filhos. e criativo. Associado a isso, evidencia-se
Aqui, observamos o início da compreen- a tranquilidade que agora ele tem em ir
são e elaboração da sua condição de viver à escola, e o interesse demonstrado em
em uma família sem a figura paterna. No relação ao aprendizado. Apesar de ainda
bloco das sessões finais, ele usa bonecos haver muito a ser conquistado quanto à
humanos para abordar a temática familiar aquisição da leitura e da escrita, verifica-
– e isso denota a continuidade da elabo- -se uma tendência à evolução também
ração sobre a temática. A identificação fe- nesse aspecto. Um aspecto especialmen-
minina é ainda mais explorada, e ele mos- te interessante de se abordar é a relação
tra-se mais livre para abordar tal questão. entre as demandas trazidas sobre a crian-
Os diálogos espontâneos ocorrem com ça e aquelas trazidas pela própria crian-
frequência, e neles João fala sobre alguns ça. Segundo Oaklander (1980), podemos
amigos, citando nomes e episódios. João descobrir o que se passa na vida da crian-
trocou de turma e de professora no início ça a partir da perspectiva dela própria,
do novo ano letivo. Sua mãe e ele próprio sem precisar recorrer a interpretações

421
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

teóricas apriorísticas. No caso de João, as res, principalmente sociais e culturais,


demandas da criança não são totalmente exercem influencia nos conceitos. É tão
distintas daquelas trazidas pela sua mãe forte a caracterização cultural que órgãos
e escola; mas aquilo que é enfatizado e influentes como a ONU e a OMS estabele-
tem-se como queixa (a agressividade, a cem os 10 aos 20 anos incompletos como
dificuldade de relacionamento com cole- o período cronológico da adolescência,
gas, e a dificuldade escolar) contém um mas permitem e respeitam que cada país
plano de fundo no qual estão demandas estabeleça seus parâmetros considerados
emocionais e existenciais da criança. Por mais adequados. No Brasil, o Estatuto da
trás da dificuldade escolar de João desve- Criança e do Adolescente afirma que ado-
la-se a baixa autoestima, fator associado lescente é toda e qualquer pessoa entre
também às dificuldades interpessoais. A 12 e 18 anos. A adolescência que presen-
agressividade configura-se como um ele- ciamos atualmente é conseqüência das
mento observável das questões existen- condições sociais nas quais estamos inse-
ciais da criança, que sofre pela ausência ridos, a maturação sexual, o surgimento
paterna e apresenta um autoconceito do interesse sexual e o conseqüente trato
comprometido. Mostrar-se agressivo é do início da vida sexual são pontos que
uma forma de colocar-se no mundo, reve- mais se destacam por serem grandes des-
ladora de sua subjetividade. Ao encontrar cobertas inerentes a esta fase. Os com-
um espaço de expressão de si mesma, a portamentos sexuais de risco são ativi-
criança amplia a compreensão de suas dades iniciadas pelo caráter exploratório
experiências, evidenciando-se um movi- do jovem, por influência do meio, podem
mento rumo a uma maior autenticidade. comprometer a saúde física e mental e
mostram-se como grandes obstáculos
Palavras-chave: infância; psicoterapia; ao desenvolvimento biológico e social,
fenomenológico-existencial. principalmente doenças como HIV/AIDS,
Contato: Beatriz Mendes e Madruga - gestações não-planejadas e Doenças Se-
Universidade Federal do Rio Grande do Norte xualmente Transmissíveis (DSTs). Segun-
beatrizmadruga@gmail.com do Relatório do Banco Mundial, pessoas
jovens engajadas em comportamentos de
risco tendem a apresentar baixa autoesti-
LT01-1189 – COMPORTAMENTO SEXUAL ma. Autoestima está relacionada à saúde
E AUTOESTIMA EM ADOLESCENTES mental, ao bem-estar psicológico e a sua
Elder Cerqueira Santos - UFS carência está relacionada a fenômenos
eldercerqueira@yahoo.com.br mentais negativos como depressão, além
Othon Cardoso de Melo Neto - UFS de apresentar engajamento em compor-
othoncxp@gmail.com tamentos delinqüentes. A autoestima
é uma avaliação que o indivíduo efetua
A adolescência é tradicionalmente tra- e comumente mantém em relação a si
tada como uma fase de transição dentro mesmo, a qual implica um sentimento ou
do ciclo do desenvolvimento humano. atitude de valor, de aprovação ou repulsa
Os mais diversos autores se debruçam em relação a si próprio direcionado a si
tentando delimitar esta fase, mas fato- próprio e refere-se ao quanto um sujei-

422
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

to se considera capaz, significativo, bem uma adaptação do Instrumento “Juven-


sucedido e valioso, pode ser entendida tude Brasileira” e abordava questões so-
como um juízo pessoal de valor, externa- cioculturais e econômicas, aspectos sobre
do nas atitudes que o indivíduo tem para saúde, além do uso da escala de autoesti-
consigo mesmo e nas crenças pessoais ma de Rosenberg. A aplicação do questio-
sobre suas habilidades, capacidades, rela- nário foi coletiva, mas anônima, no senti-
cionamentos pessoais e acontecimentos do de garantir aspectos éticos e propor-
futuros. A baixa autoestima caracteriza- cionar mais confiança aos pesquisados e
-se pelo sentimento de incompetência, estes responderem de maneira mais fiel
de inadequação à vida e incapacidade de possível assuntos delicados relacionados
superação de desafios. A alta expressa um à sexualidade e comportamento sexual.
sentimento de confiança e competência. Entre os participantes, maioria cursando
Estudos que avaliam a importância da o 3º ano do ensino médio, 46,8%, mais
autoestima proliferam nos países desen- da metade (57,9%) pertence ao sexo fe-
volvidos, destacando-se dentre os indica- minino e com idades entre 14 e 23 anos
dores de saúde mental e nas análises so- (M= 17,19 anos; DP=1,47). A quase to-
ciais de crescimento e progresso. Apesar talidade dos jovens (99,4%) tem acesso
do reconhecimento internacional sobre aos serviços de saúde disponíveis, sendo
o tema, no Brasil a autoestima ainda é o SUS mais apontado (55,8%). Os resul-
pouco abordada cientificamente, bastan- tados mostraram que 55,8% já tiveram
te popularizada por livros de autoajuda e relações sexuais, com idade média para
senso comum. Menor ainda é o volume o debute sexual de 15,15 anos (DP=2,02)
de estudos que buscam correlações com e média de 2,34 parceiros (DP=2,02) ao
comportamentos sexuais, principalmente longo da vida. A média de idade da pri-
em jovens e adolescentes. Portanto este meira relação sexual apresentou diferen-
estudo teve como objetivo investigar as ça significativa (t=3,179; gl=84; p=0,002)
relações entre autoestima e os compor- entre meninos (14,46 anos; DP=2,14) e
tamentos sexuais de risco (sexo sem ca- meninas (15,78 anos; DP=1,68). Quanto
misinha, relações sexuais precoces, gravi- ao uso de preservativo, 83,3% usam a
dezes, abortos, diversidade de parceiros camisinha, 38% a usam para evitar AIDS,
sexuais, AIDS, DSTs) e níveis de autoesti- 57% para evitar gravidez. 7,4% dos jovens
ma. A amostra foi composta por 159 ado- sexualmente ativos tiveram alguma DST,
lescentes, de ambos os sexos, estudantes apenas 7,9% já engravidaram ou foram
do ensino médio de grandes escolas da engravidados e tem em média 1,43 filhos
rede pública de ensino na cidade de Ara- (DP= 0,787), geralmente, aos 18 anos, em
caju, Sergipe, escolhidas por abrangerem média (DP= 2,64). As correlações entre
populações diversas em termos de locais autoestima e comportamentos sexuais
de moradia e níveis socioeconômicos. O sugerem que quanto maior a autoesti-
delineamento utilizado foi do tipo levan- ma, maior a idade para o debute sexual
tamento exploratório por amostragem (x²=0,076; p=0,614), menor a probabili-
aleatória simples, com coleta de dados dade para o uso de camisinha (x²=1,948;
padronizada, em um estudo de corte p=0,378), maior a chance de ter relação
transversal. O instrumento utilizado foi estável (x²=1,518; p=0,468), menor a pos-

423
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sibilidade (significativa) de envolver sexo LT01-1219 – BRINCANDO DE FAZ DE


com uso de drogas (x²=7,137; p=0,028) e CONTA: UMA FORMA DE APRENDER
mais dias portando camisinha (x²=1,702; SOBRE A MENTE?
p=0,427). Os dados mostram que os altos Natália Benincasa Velludo - UFSCar
índices de alto-estima influenciam em as- nataliabvelludo@hotmail.com
pectos de proteção, como adiamento da Débora de Hollanda Souza - UFSCar
primeira relação sexual, maior probabili- debhsouza@ufscar.br
dade de ter parceiros fixos e assim expor-
Financiamento: PIBIC/CNPq
-se menos à multiplicidade de parceiros,
terem preservativos próximos a si e me-
nor a probabilidade deste jovem transar A teoria da mente pode ser entendida
sob o efeito de drogas, o que potencializa como a habilidade de compreender que
muito a exposição a comportamentos se- as pessoas têm mundos privados que en-
xuais de risco e suas conseqüências. Ou- volvem sentimentos, desejos, crenças e
tros fatores analisados mostram que ter intenções não acessíveis aos outros dire-
alta autoestima favorece comportamen- tamente. Dentro do campo de pesquisa
tos sexuais de risco no que concerne ao da Cognição Social, o faz de conta tem
não uso de camisinha durante as relações sido objeto de estudos por oferecer um
sexuais. Uma possível explicação é que contexto no qual a criança pode aprender
em geral, este jovem tem maior chance sobre os estados mentais que são contrá-
de ter parceiros fixos – namorados, noivos rios à realidade, o que potencialmente
ou esposos. Os resultados desta pesqui- poderia contribuir para o desenvolvimen-
sa podem ser considerados animadores, to de uma teoria da mente. Uma forma
pois sugerem que os jovens, na atualida- de faz de conta comum no universo in-
de, tanto possuem a informação, quanto fantil é o jogo de papéis (role play), du-
vem fazendo uso da mesma por meio da rante o qual a criança temporariamente
adoção de práticas de sexo mais seguras, expressa em ações o papel de outra pes-
como o número reduzido de parceiros se- soa ou criatura inventada, utilizando-se,
xuais, o alto índice de uso de camisinha para tanto, do ponto de vista desse outro,
para ambos os sexos e é possível encon- e caracterizando-o, por exemplo, quanto
trar relações importantes entre níveis de ao seu tom de voz e humor. Consideran-
autoestima e comportamentos sexuais de do a escassez de estudos brasileiros so-
risco na adolescência e que parece sim bre cognição social, bem como as evidên-
existir relações entre autoestima de um cias de uma possível relação entre o faz
adolescente e as maneiras como ele se de conta e a teoria da mente, o presente
comporta sexualmente. projeto pretendeu testar possíveis efei-
tos do treinamento de uma forma especí-
Palavras-chave: Adolescência; fica de faz de conta, o jogo de papéis (role
Comportamento Sexual de Risco; Autoestima play), sobre o desempenho de crianças
Contato: Elder Cerqueira-Santos – pequenas em testes padrão de teoria da
Universidade Federal de Sergipe (UFS) mente. Para tanto, duas condições foram
eldercerqueira@yahoo.com.br criadas, uma de treino em faz de conta
e uma de treino em brincadeiras não re-

424
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

presentacionais, de modo a se comparar va entre o pré- e o pós-teste, tanto para


o desempenho do primeiro grupo (expe- o grupo experimental (t(11) = -3,447, p
rimental) com o segundo (controle). Vin- = 0,005), quanto para o grupo controle
te e duas crianças, com idades entre 3;0 e (t(9) = -3,248, p = 0,009). Contrariamente
5;8 anos, foram recrutadas em duas pré- ao esperado, um teste t de amostras in-
-escolas da rede particular de uma cidade dependentes (t(20) = - 0,613, p = 0,547)
do interior de São Paulo para participa- não revelou uma diferença significativa
rem do presente estudo. Doze crianças, entre o desempenho das crianças do gru-
10 meninos e 2 meninas, com idade mé- po controle e do grupo experimental no
dia de 4;0 anos (DP= 11,72), participaram pós-teste. Algumas hipóteses explicativas
no grupo experimental e 10 crianças (7 para o padrão de resultados encontrado
meninos e 3 meninas), com idade média são oferecidas. Primeiramente, é possível
de 4;3 anos (DP= 10,49), participaram no que os ganhos apresentados em ambas
grupo controle. Com o grupo experimen- condições sejam resultado do próprio
tal, foram realizadas intervenções de faz desenvolvimento cognitivo das crianças.
de conta baseadas em duas propostas de De fato, houve um intervalo de 4 meses
treinamento encontradas na literatura: entre a execução das duas testagens,
a) a Orientação Verbal, atividade durante para o grupo experimental, e de 3 meses,
a qual o adulto faz sugestões com a fun- para o controle. Outra explicação para a
ção de encorajar as crianças a usarem os ausência de diferença significativa entre
elementos do jogo sociodramático (re- os dois grupos seria a de que ambas as in-
presentação simbólica, jogo de papéis, tervenções, de brincadeira simbólica ou
interação social, comunicação verbal e não, são promotoras do desenvolvimen-
persistência); e b) a Brincadeira de Fan- to sociocognitivo, em especial, da teoria
tasia Temática que consiste na apresen- da mente, pois encorajam as crianças a
tação de histórias infantis que posterior- interagir socialmente e assumir a pers-
mente são encenadas a fim de que os pectiva de outros, via simulação de pen-
participantes possam assumir diferentes samentos e emoções. Como evidências
papéis. Com o grupo controle, foram rea- recentes sugerem, diversas habilidades
lizadas atividades lúdicas não simbólicas, são desenvolvidas durante a brincadei-
tais como o jogo de boliche e a brincadei- ra simbólica, tais como: a negociação, a
ra de estátua. Foram realizadas 4 sessões habilidade de entender um objeto como
de 20 minutos em ambas as condições, sendo duas coisas ao mesmo, a capaci-
totalizando 80 minutos de atividades. An- dade de compreender representações
tes e após a intervenção, os participantes externas, a metarrepresentação (a capa-
foram avaliados em tarefas padrão de cidade de representar a representação
teoria da mente (e.g., local inesperado, mental dos outros) e a simulação. Es-
conteúdo inesperado). Surpreenden- sas habilidades também são apontadas
temente, os resultados indicaram que como sendo precursoras de uma teoria
houve ganhos significativos em teoria da da mente mais sofisticada. A hipótese ini-
mente para os participatnes em ambas cial do presente estudo, ou seja, de que
as condições. Testes t de amostras pare- as crianças do grupo experimental teriam
adas revelaram uma diferença significati- um desempenho melhor do que as crian-

425
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ças do grupo controle no pós-teste, não LT01-1241 - QUALIDADE DE VIDA DOS


foi confirmada, apesar das sugestões te- IDOSOS INSTITUCIONALIZADOS
óricas e das evidências empíricas de que Marcelly Cristini Lopes de Mello - UFRRJ
a brincadeira de faz de conta pode con- marcellymachado@gmail.com
tribuir para o desenvolvimento da teoria Marcele Mendes da Silva - UFRRJ
da mente infantil. Deste modo, é impor- marcellymachado@gmail.com
tante avaliar as possíveis limitações da Carla Cristine Vicente - UFRRJ
presente pesquisa, como por exemplo, o carlavicent@gmail.com
número reduzido de participantes. Outra Valéria Marques - UFRRJ
variável que pode ter interferido na efeti- marquesvaleria@globo.com
vidade do treino foi a escolha do tipo de
treinamento de faz de conta. É possível No Brasil a população idosa entre 60-65
que alguns tipos de treinamento de faz anos chegou a 14,5 milhões (IBGE, 2010).
de conta, como evidenciado por estudos Nos grandes centros urbanos tem-se veri-
prévios, levem a ganhos em desenvolvi- ficado um aumento na quantidade de fa-
mento cognitivo, mas não contribuam mílias pequenas, as pessoas estão buscan-
especificamente para o desenvolvimento do ter menos filhos ou não tê-los, devido
da teoria da mente. Novos estudos são a diversos fatores como falta de tempo,
necessários para que se possa obter uma falta de condições financeiras, planeja-
compreensão melhor dos efeitos de di- mento familiar, programas de educação e
ferentes tipos de treinamento de faz de saúde, aumento de mulheres no mercado
conta sobre o desenvolvimento da cogni- de trabalho. Com a diminuição de pessoas
ção social. Há evidências robustas de que
dentro do núcleo familiar diminui-se tam-
a brincadeira de faz de conta pode ser
bém o apoio aos anciãos, o que aumenta
muito útil em intervenções com crianças
a quantidade de idosos Institucionalizados
que apresentam atrasos no desenvolvi-
(Burnside, 1979). O idoso muitas vezes é
mento sociocognitivo, ou que são priva-
asilado a força, tornando-se um prisio-
das dos benefícios da brincadeira infantil
neiro abandonado pela sua família em
de qualidade. Em especial, o treinamento
instituições precárias com profissionais
de faz de conta tem o potencial de con-
pouco qualificados, e seus familiares nem
tribuir para o trabalho com crianças que
sempre voltam para visitá-los (Tier,2004).
apresentam déficits em teoria da mente.
A falta de tempo da família é apontado
como um dos principais aspectos que in-
Palavras-chave: Teoria da Mente; Faz de
fluenciam a internação dos idosos. Cuidar
conta; Crianças pré-escolares.
dos idosos requer assistência específica,
Contato responsável: Débora de Hollanda
alimentação balanceada, medicação, hi-
Souza, Departamento de Psicologia,
giene pessoal, lazer, transporte e outras
Universidade Federal de São Carlos,
demandas que implicam em muitos re-
debhsouza@ufscar.br
cursos (Richards, 1994). Outro fator res-
ponsável pela internação são as doenças
que acometem muitos desses idosos, fa-
zendo-os necessitar de acompanhamento
médico constante. Entre idosos asilados,

426
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a depressão está associada ao desprazer caráter pessoal. As respostas cada partici-


para realização de atividades cotidianas, à pante foram transcritas pelos entrevista-
ausência do convívio familiar e à sensação dores. Os participantes foram questiona-
de isolamento em um ambiente estranho; dos sobre a decisão familiar ou própria da
especificamente em mulheres, ao baixo institucionalização. 63,73% dos idosos en-
nível de escolaridade, à viuvez e a falta de trevistados relataram que a família decidiu
pratica de atividades físicas (Andrade, et pela internação. De acordo com Richards
al, 2005). A qualidade de vida está relacio- (1994), a falta de tempo dos familiares
nado à autoestima e ao bem-estar pessoal influencia a internação dos idosos, con-
e abrange uma série de aspectos como a siderando a necessidade dos familiares
capacidade funcional, o nível sócio eco- trabalharem ou manterem outras ativida-
nômico, o estado emocional, a interação des durante o dia. Quando questionados
social, a atividade intelectual, o autocui- sobre a concordância com a internação,
dado, o suporte familiar, o próprio estado 77,27% disseram que concordaram. É in-
de saúde, os valores culturais, éticos e a teressante que todos os idosos que con-
religiosidade (Santos, 2002). Como as ins- cordaram com a internação estão cientes
tituições nem sempre conseguem suprir a de seu estado de dependência de cuida-
carência afetiva, o sedentarismo e minimi- dos externos e dos riscos de viver sozinho
zar a perda de autonomia causada por in- nessa idade. Considerando o conceito pro-
capacidades físicas e mentais, a qualidade posto por Santos (2002), a qualidade de
de vida de idosos institucionalizados nem vida está relacionada à inúmeros aspectos
sempre é suficientemente benéfica para que incluem o ajustamento emocional e a
manter a capacidade funcional do idoso interação social, assim, ao concordar com
e proporcionar-lhe o bem estar biopsicos- a própria institucionalização, estes idosos
social, através de atividades educativas estariam preocupados com o seu bem-es-
com o propósito de incentivar os idosos a tar, compreendendo que esta é a uma op-
se comunicarem, estabelecendo assim re- ção por sua própria qualidade de vida. Dos
lações interpessoais, pois foi observada a idosos entrevistados, 36,4% relataram não
existência de problemas na comunicação terem tido filhos, 27,3% tiveram um único
entre eles (Moura, 2005). O objetivo deste filho, 4,55% tiveram dois e 31,82% tiveram
trabalho foi investigar aspectos pertinen- mais de dois filhos. Corroborando a idéia
tes a qualidade de vida de idosos institu- de Tier (2004), de que quando o núcleo
cionalizados e as condições relacionadas a familiar é menor, aumenta a decisão pela
situação asilar, por meio de depoimentos institucionalização dos idosos, nesse gru-
dos asilados. O estudo foi realizado no po de idosos a maioria provinha de famí-
asilo Abrigo Doce Morada localizado na lias pequenas. Em relação ao motivo pelo
periferia do Rio de Janeiro, onde viviam qual ocorreu a institucionalização, 36,4%
68 Idosos. A amostra foi composta por 22 dos idosos responderam que foi por falta
idosos, dentre eles 13 mulheres e 9 ho- de condições financeiras, ou por falta de
mens cuja idade varia entre 66 e 99 anos, tempo dos cuidadores 27,3%. Dados em
todos lúcidos e orientados para responder concordância com os apontados por Ri-
a entrevista. As entrevistas compostas de chards (1994), sobre os principais motivos
sete perguntas fechadas e uma aberta de das institucionalizações. Quanto ao rela-

427
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cionamento que os idosos mantém com que também com a própria percepção da
os funcionários da instituição, 68,18% res- sua condição de saúde e dos laços afetivos
pondeu que têm um relacionamento bom que conseguem manter com a família.
e excelente. Entretanto, contrariamente
observado por Moura (2005), este grupo Palavras-chave: Idosos; Institucionalização;
de idosos não mantém dificuldades de Qualidade de Vida.
comunicação dentro da instituição, pois
72,8% dos idosos afirmaram manter bom
relacionamento e trocas experiências com LT01-1279 -EXPECTATIVAS DE FUTURO
outros idosos, apesar de uma maior sele- DE ADOLESCENTES DROGADITAS
tividade na escolha dos parceiros ou ami- Karen Lopes das Neves - UFRRJ
gos, o que vai de acordo com a perspectiva karen.lone@hotmail.com
de que os idosos em geral, são socialmen- Thais Brasil de Oliveira - UFRRJ
te e emocionalmente seletivos (Belsky, brasil_thaisoliveira@ig.com.br
2010). Foi constatado na instituição que Carla Cristine Vicente - UFRRJ
45,45% dos idosos entrevistados rece- carlavicent@gmail.com
bem visitas às vezes, 31,82% não recebem
e 22,73% são visitados com freqüência. A literatura sugere que a pequena parce-
Famílias que institucionalizam os idosos la de adolescentes que se envolvem com
em comum acordo com os próprios, são problemas relacionados ao uso de drogas
quase-sempre as que os visitam durante a tende a já apresentar problemas emocio-
institucionalização (Tier, 2004). Os Idosos nais prévios em sua história de vida (Bel-
entrevistados foram questionados sobre o sky, 2010). Estes adolescentes também
que poderia ser feito para que houvesse costumam apresentar um perfil de má
uma melhoria na sua qualidade de vida e relação social, tanto com seus pares quan-
13,7% responderam que queriam receber to com os seus familiares (Silva, 2007). Ao
visitas familiares, 13,6% disseram neces- provocar uma sensação inicial de euforia e
sitar de mais saúde e 45,45% deles, fala- bem-estar, a droga gera uma falsa sensa-
ram que sentiam falta de atividades que ção de efeito benéfico que atrai a atenção
os distraíssem como dança, canto, cine- dos adolescentes ávidos pela novidade.
ma e jogos, necessidades apontadas por Porém, o seu uso repetido e freqüente
Moura (2005) que preconiza o bem estar acaba conduzindo a um ciclo vicioso, que
biopsicossocial do idoso asilado, através causa danos ao sistema nervoso e afeta
de atividades educativas. Este estudo con- o processo de socialização destes ado-
cluiu que, apesar de o número de idosos lescentes (Soares, Gonçalves & Werner,
investigados ter sido pequeno e proce- 2010). Apesar de uma parcela dos jovens
derem de uma única instituição asilar, os que se envolvem com drogas conseguirem
resultado confirmam, em sua maioria, o de alguma forma chegar a instituições que
que a literatura da área vem descrevendo. ofereçam tratamento para sua drogadição,
A qualidade de vida do idoso instituciona- pouco se sabe a respeito de suas expecta-
lizado está de fato associada a seu bem tivas durante este processo de reabilitação
estar, o que se relaciona com as condições (Marques & Cruz, 2000). O objetivo da
específicas que o asilo pode oferecer, mas presente pesquisa foi de buscar conhecer

428
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

as expectivas de adolescentes drogaditas advindas de famílias com baixa renda ou


pertecentes a famílias de baixa renda e/ou população de rua. A maioria mostrou pos-
a população de rua, em processo de tra- suir uma família desestruturada com pais
tamento em um abrigo especializado na ausentes ou completamente desconheci-
recuperação da dependência química. A dos, confirmando o que Silva e Guimarães
pesquisa foi realizada no Centro de Aten- (2007) relataram sobre um possível maior
dimento à Dependência Química (CADQ) risco de adolescentes virem a tornar-se
Doutor Bezerra de Menezes, localizado drogaditas quando não possuem boas re-
no subúrbio da cidade do Rio de Janeiro. ferências familiares como base de valores
O abrigo é uma Organização Não Gover- éticos e morais. A metade delas, já alter-
namental conveniado à prefeitura do Rio nava com freqüência entre a permanência
de Janeiro e que recebe ajuda de um gru- e abandono dos abrigos. A droga relatada
po de empresários. A instituição é voltada como mais utilizada pelas adolescentes foi
ao atendimento de adolescentes do sexo o crack, sendo comum o uso de múltiplas
feminino dependentes de drogas ilícitas. drogas pelas adolescentes. Com relação
Possui capacidade para vinte internas, mas à expectativa de vida após o tratamento,
no momento da pesquisa abrigava somen- apenas uma das adolescentes relatou não
te dezesseis drogaditas variando entre ter perspectiva alguma para si ou para o
as idades de onze a dezoito anos. Todas filho que estava por vir (adolescente esta-
vinham de famílias pobres ou de popula- va grávida na época da entrevista). Todas
ção de rua. As adolescentes chegam a esta as outras seis apresentaram expectativas
instituição por determinação judicial, pelo relacionadas à retomada dos estudos, vir
conselho tutelar ou responsável. Muitas a trabalhar, melhorar suas relações fami-
são vítimas de abandono, negligência pa- liares e algumas perspectivas de cunho
rental e abuso sexual. Para a presente pes- religioso. Foi observada a necessidade por
quisa foi utilizada uma abordagem qualita- parte dessas adolescentes de deixarem de
tiva através de uma entrevista direcionada viver à margem da sociedade e se sentirem
por um questionário. Foram entrevistadas incluídas num padrão de vida considerado
sete adolescentes que se voluntariaram a digno com direito à educação, trabalho,
responder questões sobre: histórico do uso moradia e estrutura familiar adequada. O
de drogas, expectativa de vida após o tra- desconhecimento da figura paterna ou o
tamento, contexto familiar, preocupações descaso da materna mostrou-se recorren-
atuais e seus desejos. Algumas perguntas te em suas falas. A retomada aos estudos
auxiliares foram desenvolvidas previamen- se mostrou presente como expectativa de
te, porém, foi dada liberdade para que as quase todas as adolescentes, a ponto de
adolescentes falassem de outros temas ser considerada uma prioridade após o tra-
que as interessasse. As entrevistas foram tamento. Além de estudar, as adolescentes
gravadas com a concordância das entrevis- pretendem trabalhar, como um meio para
tadas e foram realizadas individualmente uma mudança de vida e recuperação da
em um local isolado das demais. Depois dignidade. A religiosidade foi outro ponto
de concluídas, foram transcritas e analisa- citado pelas adolescentes, corroborando a
das através do exame de seus conteúdos. afirmação de Sanchez e Nappo (2008) de
Todas as adolescentes participantes eram que a fé é um agente facilitador na recu-

429
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

peração da dependência, pois o indivíduo LT02-775 -CONCEPÇÃO DE CRIANÇA EM


acredita que uma força transcendental é DESENHOS INFANTIS
capaz de ajudá-las a manter-se afastado Andrea Guimarães Tomazela - IMESSM
das drogas, além de preencherem os “va- andreatomazela@gmail.com
zios” deixados pela ausência da família, Débora Conceição Domingos Pereira
como um agente capaz de transformar deboradomingos@hotmail.com
suas vidas. Duas adolescentes apresenta- Jorge Henrique Pilan - IMESSM
ram o desejo de se dedicar a vida religiosa pilan2520@yahoo.com.br
após o tratamento. Quando questionadas Letícia Carla dos Santos - IMESSM
a respeito da sua maior preocupação, as leticiacarla_@hotmail.com
respostas tenderam à questões relaciona- Kelly Cristina de Paula - IMESSM
das com a família. As famílias, geralmente kgini26@gmail.com
desestruturadas ou ausentes, ocupam um Mariana de Cássia Jorgeto - IMESSM
espaço significativo em seus sentimen- mary_jorgetto@hotmail.com
tos, e relatam que ao sair do abrigo estão Suzana Marcolino - IMESSM
determinadas a rever seus familiares. No suzanamarcolino@yahoo.com.br
abrigo, muitas vezes desconheciam à situ-
ação atual da mãe e de seus irmãos, que Nas últimas décadas cresce a oferta de
geralmente encontravam-se em outros desenhos animados dirigidos às crianças,
abrigos ou nas ruas. As adolescentes tam- exibidos em diversos horários na TV aberta
bém apresentaram muita preocupação ou paga com programação exclusiva para
com possíveis recaídas quanto ao uso de as crianças. Existem desenhos com as mais
drogas enfatizando o fato de que mante- variadas temáticas, que vinculam diferen-
rem-se afastadas das drogas seria uma ta- tes valores, condutas e comportamentos.
refa muito difícil. As adolescentes acredi- Um aspecto que nos chama atenção é
tam que a sociedade as enxerga de forma quantidade de desenhos em que os prota-
negativa de modo geral e um dos termos gonistas são crianças. Perguntamos: quais
utilizados recorrentemente nas falas foi as concepções de criança contidas nesses
a de serem consideradas pela sociedade desenhos? Partimos da suposição teórica
como “cracudas /drogadas”. Acreditam de que em cada época histórica a socieda-
que para a sociedade elas não têm mais de produz determinados significados sobre
jeito e nem solução. Deste modo, uma infância que orientam tanto aquilo que os
delas afirma que apenas os funcionários adultos esperam das crianças em cada fase
dos abrigos as têm como filhas e as enxer- de seu desenvolvimento, como a conduta
ga como gente, sendo reduzidas pelo res- da própria criança. No processo de desen-
tante das pessoas, à condição de viciadas. volvimento a criança internaliza os signos
Contraditoriamente, a crença na própria da cultura, que passam, então, a orientar
capacidade de recupera-se não apareceu sua conduta. Ocorre que ao internalizar tais
como uma das expectativas de vida das signos, ela também se apropria dos signi-
adolescentes participantes. ficados da cultura. Por serem construídos
objetivamente no processo histórico, en-
Palavras-chave: Adolescentes, Drogadição, tende-se que esses contêm aspectos ide-
Expectativa de vida, Recuperação. ológicos fruto das relações sociais. Os de-

430
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

senhos infantis não estão livres de concep- contextos, enquanto em outros, meninos
ções de criança, pelo contrário, carregam e meninas brincam juntos, compartilham
ideias, valores, condutas e, desta forma, descobertas e desenvolvem uma relação
difundem uma forma de ser criança. Com- de amizade. A amizade é um traço típico
preendendo os desenhos animados como das relações entre as crianças em idade es-
um dos elementos da realidade social da colar (Petrovisk, 1985). O que fundamenta
criança é possível supor sua influência, o uma relação de amizade é a reciprocidade
que exige daqueles envolvidos com a edu- e interesses comuns. As amizades entre as
cação, uma postura crítica. O presente tra- crianças são relações sociais que permitem
balho analisa o desenho infantil “Ben 10” o desenvolvimento da solidariedade, co-
25
com objetivo de conhecer a concepção municação, conhecimentos dos outros e
de criança contida nele. Dada a brevidade do mundo, além de propiciarem modelos
do presente texto, apresentamos a análise de relacionamento íntimo caracterizados
da quarta temporada (2007-2008). Todos pela confiança (Cole, Cole, 2003). Uma vez,
os episódios foram assistidos (total de dez) que o desenho se passa no período de fé-
e descritos na forma de sinopses. Nossa rias, a escola não é o cenário principal das
atenção, pelo objetivo de nosso trabalho, aventuras de Ben 10. Entretanto, em dois
focou-se no conteúdo dos episódios. Cons- episódios é possível apreender a relação
truímos para nossa análise três categorias, do personagem central com a escola. Em
a saber: a relação criança-criança; a relação um dos episódios Ben tem um pesadelo
criança-adulto e a relação criança-escola. induzido por um dos vilões da estória. O
Ao sair de viagem de férias com seu avô cenário do pesadelo é a escola e ele foge
Maxwell Tennyson e sua prima Gwendolyn da biblioteca com medo dos livros. No epi-
Tennyson, “Gwen”, Ben encontra um reló- sódio final da temporada, Ben irrita-se com
gio que se fixa em seu braço, o omnitrix. o retorno à escola; na escola ele tem que
O omnitrix carrega uma carga de DNA que se conformar em ser um garoto comum,
permite mudar o código genético de Ben, sem superpoderes e exposto a agressões
dando ao garoto o poder de se transfor- de garotos mais velhos. Somente quando
mar, a sua escolha, em 10 alienígenas com a cidade é atacada por monstros e os ga-
super-poderes. A criança que Ben mais se rotos que o agrediram vêm Ben armado e
relaciona nos episódios é sua prima Gwen. se transformando em alienígena, é que ele
O desenho apresenta a relação entre Ben passa a ser respeitado na escola. A escola
e sua prima Gwen de forma caricaturada, para Ben 10 não se constitui como lugar de
estereotipada e marcada pela disputa; não ampliação das relações sociais, pelo menos
se constitui entre Ben e Gwen uma rela- na ampliação de relações que sejam pauta-
ção de amizade que permita o desenvolvi- das em interesses comuns e na reciproci-
mento psicossocial de ambos. A literatura dade. A aprendizagem dos conhecimentos
descreve que crianças escolares passam da cultura, transmitidos pela escola, não
grande parte do tempo em grupos segre- produzem em Ben, nenhum interesse. Pelo
gados pelo sexo (Cole, Cole, 2003). Todavia, contrário, ele demonstra aversão. Nos epi-
essa segregação sexual é forte em alguns sódios da quarta temporada o adulto com
quem Ben mais se relaciona é o avô. Os
25
Animação produzida pelo Cartoon Network Studios dois possuem uma relação de confiança,

431
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pois o avô é o único adulto que sabe dos DIA 13/11 - Domingo
superpoderes adquiridos pelo garoto. Em
um episódio Ben ridiculariza o avô por não
ouvir e enxergar bem. Diz para o avô: “os 18h-20h
idosos não deveriam sair de casa no ve-
rão”. No mesmo episódio o avô bebe água
da fonte da juventude e torna-se jovem CONFERÊNCIA
novamente. No episódio citado, chamou
nossa atenção a forma como Ben ridicula-
riza o avô pelo fato de ser idoso. A impor- ESPAÇO VITAL URBANO:
tância da relação entre adulto e criança se OPORTUNIDADES E DESAFIOS PARA OS
constitui, pois, o adulto é o ser humano JOVENS
mais experiente da cultura que apresenta
o mundo humano para a criança, além de Hartmut Günther - UnB
ser o modelo de conduta para ela: estas
são as bases em que se constrói a relação Um dos primeiros estudos do que viria
entre adulto e criança. Essa relação deve a ser conhecido como Psicologia Am-
ter como princípio o respeito das especifi- biental, a partir dos anos de 1960, foi
cidades de cada idade, que, inclusive, cabe realizado quarenta anos antes. No fim
ao adulto explicitar para a criança. Parece- da década de 1920, Martha Muchow,
-nos que desenho traz implícito uma super aluna de William Stern, estudou o Espa-
valorização da idade adulta inicial. Note-se ço Vital da Criança Urbana, investigando
que quando Ben transforma-se em aliení- três “campos de treinamento”: o espaço
gena, ele deixa de ser criança e assume a no qual a criança vive; o espaço que a
forma de um super-herói adulto, porém, criança experiencia e o espaço do qual a
um adulto jovem. Através da análise das criança se apropria (Muchow & Muchow,
relações travadas pelo personagem princi- 1935/1998). Antecipou, desta manei-
pal concluímos que o desenho apresenta ra, a problemática central da Psicologia
um personagem infantil no interior de um Ambiental, isto é, a reciprocidade entre
círculo pequeno de relações e as relações comportamento e experiência subjetiva
mantidas pelo personagem principal são de um lado e espaço construído ou na-
bastante pobres. Outro elemento que iden- tural do outro. Partindo da diferenciação
tificamos na análise da quarta temporada é feita por Muchow, esta apresentação visa
que ser criança não basta: é preciso ter su- refletir sobre continuidades e mudanças
perpoderes. Ser criança e ter uma vida de históricas e culturais nos três espaços:
criança parece desinteressante e, ao mes- quais as oportunidade e desafios que
mo tempo, é um fator que propicia a falta os mesmos apresentam para os jovens,
de respeito dos demais. hoje? O espaço no qual se vive. De que
maneira o espaço urbano no qual o jovem
Palavras-chave: Criança; Desenvolvimento de hoje vive em Brasília é diferente do es-
Infantil; Televisão. paço urbano de Hamburgo, estudado por
Contato: Suzana Marcolino, IMESSN, Muchow na década de 1920? Sob a pers-
suzanamarcolino@yahoo.com.br pectiva de oportunidades e desafios há

432
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de se considerar as demandas vivenciais tado de maior alocação de espaços para


da transição entre a juventude e a vida as necessidades da vida moderna, isto é,
adulta. Colocado de outra maneira, qual da vida dos adultos, resta questionar so-
a correspondência entre os “campos de bre as oportunidades de viver estes espa-
treinamento” urbanos, não-institucionais ços, de se apropriar dos mesmos. Quais
e a vida futura? Qual a experiência para a as formas de apropriações e de adapta-
vida futura real, que o ambiente urbano ções que existem para os jovens de hoje?
proporciona diante da observação non Chegamos, desta maneira, a um conceito
scholae, sed vitae discimus? O espaço que que não estava presente nestes termos –
se experiencia. Numa comparação entre o espaço público. A formalização do ter-
o espaço de hoje com o espaço de antiga- mo é uma consequência de uma maior
mente há de se constatar que, sem dúvi- competição por um espaço que, no caso
da, os espaços experienciados diferem de de ter aumentado, aumentou de manei-
maneira significativa. As oportunidades ra desigual: cada vez mais é alocado para
e os desafios são diferentes. Hoje, sim- as vias, o transporte individual, para o
plesmente existem mais informações e comércio. Tal competição pode ser verifi-
mais estimulações. Isto implica em maior cada mais diretamente nas formas de lo-
complexidade das vivências e maiores comoção: flanar, andar a pé, de bicicleta,
desafios. As características específicas da no transporte individual, no transporte
vida na metrópole foram teorizadas pela público, no transporte de carga. Igual-
primeira vez por Simmel (1903), quando mente, a competição pode ser observada
apontou a natureza racional, calculista e nas diferentes formas de ocupação e uso
pontual da metrópole; Wirth (1938) ob- do espaço urbano: comércio, depósito,
servou que cidades grandes implicam em recreação, segurança. Esta repartição do
um estilo de vida particular; enquanto espaço urbano freqüentemente implica
Milgram (1970) falou em sobrecarga da numa redução do espaço público, o que
estimulação. Quais as maiores oportuni- induz à pergunta sobre a acomodação
dades desta vida urbana moderna para das necessidades dos diferentes grupos
os jovens? O espaço do qual se apropria. de usuários do meio urbano. Em parti-
Quando Muchow falou em “viver o es- cular, para fins desta apresentação, quais
paço” tratou da apropriação do mesmo. os espaços, quais as oportunidades e os
Apresentou exemplos de espaços criados desafios que estes espaços oferecem aos
por adultos e a sua apropriação e adap- jovens? O propósito desta contribuição é,
tação aos interesses das crianças. Seus em suma, chamar atenção para o papel
estudos incluíram observações realizadas do espaço informal na socialização dos
em um espaço baldio e sem construção, jovens.
em um terminal de descarga de merca-
doria, em um playground feito “para”
crianças, em ruas com diferentes níveis
de movimento de trânsito, em uma loja
de departamento. Ao mesmo tempo que
é possível afirmar que a maior complexi-
dade do espaço urbano de hoje é o resul-

433
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CONFERÊNCIA bretudo do tutor; a qualidade da forma-


ção de agentes educativos para atuarem a
distância e a qualidade da aprendizagem
DYNAMICS IN THE “SABOR” OF dos alunos e seu desenvolvimento nessa
VYGOTSKY modalidade de ensino. Inspirados nes-
ses desafios, o objetivo deste simpósio é
Joseph Glick - CUNY/EUA
contribuir para a qualidade dos proces-
sos educativos em contextos nos quais os
dispositivos tecnológicos são utilizados
SP LT02 - Simpósio como mediadores para o processo de
ensino-aprendizagem e desenvolvimento
adulto. Apresentamos quatro trabalhos,
SP LT02-1274 - PROCESSOS DE desenvolvidos em distintas Instituições
DESENVOLVIMENTO HUMANO de Ensino Superior, os quais abordam
PROMOVIDOS NO CONTEXTO DA a temática EAD sob diferentes ângulos:
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1. Formação de docentes para atuarem
nessa modalidade de ensino, com ênfase
As Novas Tecnologias da Informação e Co- na análise de como essa formação favo-
municação (NTIC’s) têm sido amplamen- rece os processos de desenvolvimento
te utilizadas em diversos campos sociais profissional e propicia qualificação de
e ocupa lugar de destaque no âmbito da mediações pedagógicas; 2. Significados
Educação a Distância (EAD). Ao adotar as construídos por docentes sobre o uso de
NTIC’s, em especial a internet, a EAD ga- recursos da EAD no ensino presencial, no
nhou maiores proporções e visibilidade sentido de analisar como esses agentes
em diferentes áreas de formação e capa- percebem o potencial das NTIC’s, utiliza-
citação profissional, legitimando-se como das na EAD, para criarem cursos ao estilo
importante contexto de desenvolvimento blended learning; 3. Sobre a função do tu-
humano. A EAD tem possibilidades de tor, apontando algumas incompreensões
renovar e re-construir práticas pedagó- e condições que engendram sua função
gicas tradicionais, transformar a imagem e suas práticas tutorais; e 4. Um estudo
convencional de sala de aula e conferir sobre o desenvolvimento profissional
novos papéis ao professor e ao aluno, na do aluno da licenciatura no contexto da
tentativa de superar a ideia de transmis- EAD, buscando identificar o perfil discen-
são de conteúdo. No entanto, colocam-se te e os significados atribuídos por eles à
como desafios para a EAD, dentre outros: sua formação. Para subsidiar as análises
o desenvolvimento de propostas de cur- empreendidas neste trabalho, adota-
sos que sejam inovadoras, aproveitando- mos a perspectiva histórico-cultural e os
-se criticamente dos recursos oferecidos pressupostos da metodologia qualitativa.
pelas NTIC’s; a incorporação reflexiva dos Concebemos o desenvolvimento humano
elementos da EAD nos cursos da moda- como processo e produto das interações
lidade presencial, ao estilo bledend lear- socialmente estabelecidas ao longo da
ning; a importância de se compreender a vida, a partir dos significados negociados
função dos atores envolvidos na EAD, so- entre os diferentes indivíduos. Os contex-

434
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tos educativos e formativos atuais, como representando o maior grupo. O desen-


é o caso da EAD, são considerados lugares volvimento de cursos para formação de
privilegiados por oferecerem condições professores na modalidade a distância é
para uma intensa troca de significados favorecido pelo cenário contemporâneo,
que podem promover diferentes traje- no qual tem ocorrido um investimento
tórias para o desenvolvimento dos indi- expressivo na formação docente, com vis-
víduos neles inseridos. O uso das NTIC’s tas a atender a demanda de certificação
no âmbito educacional potencializa o en- e qualificação profissional de um grande
contro social e diferentes configurações número de profissionais brasileiros que
de práticas pedagógicas favoráveis ao atuam sem formação adequada (Santa-
desenvolvimento humano. No entanto, a na, 2010). Um investimento motivado,
relação entre NTIC’s – EAD – ensino pre- principalmente, pela exigência da Lei de
sencial, bem como os elementos que os Diretrizes e Bases da Educação Nacio-
compõem deve contemplar posturas teó- nal, n° 9394/1996, de obrigatoriedade
ricas e metodológicas claras que possam de titulação superior para docentes de
romper com o modelo de educação ainda todos os níveis de ensino. Nesse cenário
vigente e garantir efetivamente condições interessa-nos, particularmente, compre-
ao processo de ensino-aprendizagem e ao ender as especificidades da formação do
desenvolvimento humano. professor para atuar na EAD, e para isso
temos desenvolvido estudos sobre tal te-
mática, dentro de um projeto de pesquisa
FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA maior, realizado na Universidade Federal
ATUAR NA EAD: REFLEXÕES SOBRE O de Goiás sobre um curso de licenciatura
DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL vinculado à Universidade Aberta do Bra-
Alba Cristhiane Santana - UFG sil. A UAB foi criada pelo Ministério da
albapsico@gmail.com Educação (MEC) em 2005, configurando-
-se em um programa de Educação a Dis-
A modalidade da Educação a Distância tância. Seu objetivo principal é formar
(EAD), baseada nas Novas Tecnologias professores para atuar na educação bá-
da Informação e Comunicação (NTIC’s), sica e, ao mesmo tempo, contribuir com
particularmente sob o apoio da internet, a expansão e interiorização da oferta de
tem se expandido de modo considerável cursos e programas de Educação Superior
nas últimas décadas, com vistas a atender no país. A estimativa do MEC foi alcançar
às demandas educacionais geradas pelos em 2010 a criação de mil pólos de atendi-
contextos sócio-culturais, políticos e eco- mento da UAB em todo território nacio-
nômicos. Um censo realizado pela Asso- nal e até 2013 atender 800 mil alunos por
ciação Brasileira de Educação a Distância ano (http://portal.mec.gov.br). O cenário
aponta que em 2008 cerca de 2,6 milhões de crescente expansão da EAD, com a
de alunos utilizaram essa modalidade, criação de programas como a UAB, tem
em todos os níveis educacionais (ABED, motivado o desenvolvimento de diferen-
2010). Esse estudo ainda demonstra que tes estudos (Belloni, 2008; Bicalho, 2010;
31,5% dos cursos oferecidos na EAD são Coll et al., 2010; Cruz, 2010; Zuin, 2006),
voltados para a formação de professores, visando compreender as especificidades

435
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do processo de ensino e de aprendizagem realidade educacional, suas possibilida-


nesses novos contextos educativos. O de- des e limites, bem como espaços para
senvolvimento dessa modalidade de ensi- reflexão e ressignificação do processo
no a partir das NTIC’s propicia uma nova educativo. Kenski (2004) afirma que os
cultura. Belloni (2008) e Kenski (2004) professores precisam sentir-se confortá-
assinalam que tais tecnologias são mais veis para atuarem nesse espaço, o que
do que simples suportes pedagógicos ao significa conseguir avaliar criticamente
processo educativo, elas interferem nas as diferentes possibilidades pedagógicas
formas de interação social e de apro- da EAD, integrando os recursos tecnoló-
priação e construção de conhecimento, gicos aos objetivos do processo de ensi-
gerando um novo modelo educacional. no. Nosso estudo tem uma fundamenta-
São construídas novas demandas para o ção teórico-epistemológica que articula a
papel do professor e do aluno, bem como, Psicologia histórico-cultural, numa pers-
novas concepções acerca do processo de pectiva dialógica, com uma abordagem
ensinar e de aprender, a partir das con- teórico-metodológica qualitativa. A partir
figurações específicas dessa modalidade, dos estudos de Bruner (1997) e Vygotsky
destacando o distanciamento espacial en- (2003) concebemos que o processo de
tre professor e aluno, e a simultaneidade desenvolvimento humano se configura
temporal das ações de cada um. Assim, nas relações dialógicas entre os sujeitos e
nesse contexto, os professores precisam os contextos sócio-histórico-culturais, nas
aprender a dominar e a valorizar não só quais ocorrem processos de produção e
um novo instrumento, ou um novo siste- negociação de significados, ao longo de
ma de representação do conhecimento, toda a vida. Dessa forma, vislumbramos
mas uma nova cultura de aprendizagem. o contexto de formação de professores
Os professores precisam estar preparados para atuar na EAD, como um espaço pri-
para lidar com as práticas educativas na vilegiado para o desenvolvimento adulto,
EAD, construídas pela mediação pedagó- considerando que ocorre um intenso pro-
gica, a qual se apresenta como um desafio cesso de significação, o qual pode gerar
para o papel docente nessa modalidade várias possibilidades de trajetórias para o
de ensino. Segundo Coll et al. (2010), o desenvolvimento dos sujeitos. Participam
papel mais importante do professor em da pesquisa quatro professores-forma-
ambientes virtuais, como os da EAD, é dores e quatro tutores a distância de um
o de mediador, visto como alguém que curso de licenciatura inserido no progra-
auxilia a atividade de aprendizagem do ma UAB. A construção das informações
aluno, utilizando-se para isso as NTIC’s. está ocorrendo a partir de entrevistas
A preparação do professor para atuar no qualitativas e observações no ambiente
ambiente virtual implica em uma forma- virtual de aprendizagem. Nosso objetivo
ção que ultrapasse o aspecto técnico de é identificar os significados atribuídos pe-
domínio de ferramentas, deve abranger los professores do curso à formação que
uma nova concepção acerca do processo receberam para atuar nesse contexto for-
de ensino e de aprendizagem. A forma- mativo, com vistas a analisar como essa
ção desse professor precisa oportunizar formação favorece processos de desen-
tempo para familiarização com essa nova volvimento profissional e propicia quali-

436
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ficação de sua mediação pedagógica. Os impulso a partir da década de 1990, oca-


resultados parciais apontam quatro eixos sionaram profundas mudanças em todas
interpretativos, a saber: a) formação ba- as esferas sociais. O domínio e a utilização
seada em cursos ou seminários presen- das Novas Tecnologias da Informação e
ciais, de cunho teórico sobre a EAD; b) Comunicação (NTIC’s), devido a sua pene-
ausência de atividades e experiências prá- trabilidade nas mais variadas esferas da
ticas na formação para atuação na EAD; atividade humana, passa a constituir prá-
c) importância das reuniões periódicas tica cotidiana para a socialização e rela-
entre professores-formadores e tutores, ções de produção e consumo, além de re-
vistas como espaço para reflexão sobre curso para a aquisição e aprofundamento
a prática docente; e d) concepção dos de conhecimentos (Castells, 2000). Entre
professores acerca da EAD: desconfiança outras consequências, observa-se, por um
ou certeza? Acreditamos que a formação lado, um vertiginoso acúmulo de informa-
de professores para atuar na EAD precisa ções em diversos campos do saber (Levy,
contemplar especificidades que garantam 2000; Shirky, 2011) e, por outro lado, a
ao docente condição para perceberem- necessidade de constante formação, atu-
-se como agente, produtor e crítico des- alização de conhecimentos, competên-
sa nova educação mediada pelas NTIC’s. cias e habilidades (Angelim & Rodrigues,
Nessa perspectiva, os programas de EAD 2009). Nesse cenário, a noção de educa-
precisam se comprometer com uma for- ção ao longo da vida vem ganhando força
mação de seus professores que mobilize juntamente com a demanda por maior
processos de desenvolvimento profissio- acesso à educação de nível superior e de
nal, a partir da produção de novos signifi- formação continuada. As NTIC’s começam
cados acerca de seu papel nesse contexto a ser vistas como mediadores do ensino-
educativo, assim como, novas concepções -aprendizagem e também como ferra-
sobre o aluno, os conteúdos, os procedi- menta para ampliar o acesso à educação e
mentos, a avaliação e o processo de ensi- a formação profissional. O campo da Edu-
nar e de aprender. cação a Distância (EAD) se fortalece e vão
crescendo as ofertas de cursos nos mais
Palavras-chave: Formação de professores; diferentes níveis de ensino dentro dessa
EAD; Psicologia Histórico-Cultural. modalidade (Pereira & Moraes, 2009). A
possibilidade de mesclar a EAD e o ensino
presencial tem sido compreendida como
SIGNIFICADOS CONSTRUÍDOS POR uma forma de aproveitar os benefícios
DOCENTES SOBRE O USO DOS de ambas as modalidades, sendo indica-
RECURSOS DA EAD NO ENSINO da como uma das grandes tendências no
PRESENCIAL DE GRADUAÇÃO campo da educação nos próximos anos. O
Anaí Haeser Peña - UnB ensino bimodal, híbrido ou blended lear-
anai.hp@gmail.com ning pressupõe a utilização de princípios
ou o uso das NTIC’s como feito em EAD,
Os avanços tecnológicos no campo da in- juntamente com o ensino presencial (Tori,
formação e comunicação iniciados na dé- 2009). Uma das vantagens mais expressi-
cada de 1960, e que ganharam um grande vas dessa modalidade de ensino seria a

437
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

possibilidade maior de potencialização da da necessidade de educação ao longo da


comunicação e integração espaço-tempo. vida e de possibilitar a formação de pes-
Além disso, há mais opções para oferecer soas capazes de utilizar essas tecnologias
apoio aos estudantes com dificuldades de em sua vida profissional. Nesse sentido,
aprendizagem e atividades complemen- a Coordenação de Aperfeiçoamento de
tares para aumentar a produtividade da- Pessoal de Nível Superior (CAPES) lançou,
queles mais adiantados (Tori, 2009). No em 2010, o Edital no 15 de 2010, o qual
que diz respeito ao fortalecimento das tinha por objetivo incentivar a integração
possibilidades de aprendizagem coope- e a convergência entre as modalidades
rativa e colaborativa (Pontes, 2009, An- de educação presencial e a distância nas
gelim & Rodrigues, 2009), há, igualmen- Instituições Públicas de Ensino Superior
te, estudos que indicam que o senso de (IES), por meio do fomento ao uso das
comunidade entre estudantes de cursos NTIC’s nos cursos de graduação presen-
bimodais é mais forte em comparação ciais. O presente estudo objetivou identi-
àquele de alunos de cursos em modalida- ficar e analisar os significados construídos
de totalmente a distância ou puramente por professores de ensino superior de
presencial (Rovai & Jordan, 2004). Esses uma IFES participante desse edital quan-
exemplos mostram, assim, a possibilida- to ao processo de ensino-aprendizagem
de de atender um escopo mais abrangen- mediado por tecnologias de informação
te de interesses quando se mesclam as e comunicação. A proposta dessa institui-
metodologias de ensino presencial e EAD. ção ao edital foi formada por 27 subpro-
Entretanto, a utilização das NTIC’s na edu- jetos propostos por diferentes unidades
cação, em suas diversas modalidades e acadêmicas e órgãos complementares
níveis, trazem em seu bojo a necessidade dessa instituição, prevendo quatro linhas
de novas práticas educativas (Tori, 2009). de ação: (i) plataforma virtual de aprendi-
Ganham força os discursos que defendem zagem; (ii) oferta de disciplinas com uso
a aproximação entre as práticas educati- das NTIC’s para os cursos de graduação
vas e o universo dos aprendizes, seus in- presenciais; (iii) produção de conteúdos
teresses e necessidades. A formação de educacionais e materiais didáticos; (iv)
professores para atuar nessas diferentes capacitação de recursos humanos. Essa
modalidades educativas tem se apresen- investigação se foca em apenas uma das
tado como um desafio nesse contexto. O linhas de ação de um desses subprojetos,
Poder Público, sensibilizado e impulsio- a qual tinha como um de seus objetivos
nado por esses elementos contextuais, específicos capacitar o corpo docente do
vem adotando políticas para ampliar o departamento para utilização plena os re-
acesso e promover melhorias qualitativas cursos midiáticos da Plataforma Moodle.
à educação, sendo uma das estratégias Participaram da pesquisa 7 professores
adotadas as políticas para a ampliação de ensino superior de um departamento
da EAD e a introdução de seus elementos de uma unidade acadêmica dessa IFES,
no âmbito do ensino presencial. Dessa doravante referidos como docentes e 3
maneira, a EAD associada às NTIC’s tem professores-tutores. Os docentes tiveram
potencial para oferecer maior acesso à acesso a um tipo de capacitação individu-
educação, de favorecer a compreensão alizada, com um professor-tutor especia-

438
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lista no uso e configuração de ambiente A FUNÇÃO DO TUTOR E SUAS PRÁTICAS


virtual de aprendizagem Moodle e gradu- TUTORIAIS EM EAD: ALGUMAS
ado na área do professor em formação. INCOMPREENSÕES
As atividades da capacitação se davam Rute Nogueira de Morais Bicalho - UnB
em torno do planejamento, elaboração, arutebicalho@gmail.com
construção e acompanhamento da ofer-
ta de disciplinas em curso de graduação, Com a expansão dos cursos na modalida-
com o objetivo de criar disciplinas na de de Educação a Distância (EaD), funções
modalidade blended learning. Foram fei- profissionais estão sendo (re)desenhadas
tas entrevistas com os docentes, com os para se adequarem às novas demandas
professores-tutores e etnografia virtual educativas da sociedade atual, como é o
dos ambientes virtuais de aprendizagem caso do tutor. A inserção desse profissional
das disciplinas ofertadas pelos docentes. na EaD, as concepções e suas práticas pe-
As análises, baseadas na metodologia dagógicas ainda são permeadas por mui-
qualitativa (Denzin & Lincoln, 2007) e na tas contradições e incompreensões, o que
abordagem histórico-cultural (Vygotsky, acaba por comprometer a qualidade dos
2003), mostram formas singulares de cursos ofertados nesse contexto. Uma des-
apropriação das NTIC’s e das caracterís- sas incompreensões diz respeito à quan-
ticas da modalidade híbrida de ensino tidade de nomenclaturas oficiais26 que
por parte dos docentes. Tais formas de fazem referência ao tutor: assessor peda-
apropriação se aproximam das concep- gógico (Gutierrez & Prieto, 1994); forma-
ções de ensino-aprendizagem conhecidas dor ou webcoferencista (Valente & Mattar,
e utilizadas por esses docentes em suas 2007; Valente et al., 2003); professor on-
práticas cotidianas, notadamente numa line (Machado & Machado, 2004); educa-
concepção tradicional de educação base- dor a distância (Niskier, 1999), professor/
ada na transmissão de conteúdos e pouca orientador (Lima et al., 2010), orientador
interatividade entre professor-estudante. acadêmico (Pretti, 2000) e instrutor ou
Esses resultados em parte apontam falta facilitador online (Du, Havard & Li, 2005;
de conhecimentos específicos sobre ou- Beuchot & Bullen, 2005; Bolliger & Wasilik,
tras formas de ensinar e aprender pos- 2009; Moore & Kearley, 2008; Dennen &
sibilitadas pelas NTIC’s e estratégias de Wieland, 2007; Dennen, 2005). Essa multi-
resistência diante do imperativo do uso plicidade de termos é um circunscritor im-
dessas tecnologias. Como nos dizem Ma- portante que traduz a ambiguidade e a fal-
turana e Varela (2001), “no âmago das ta de clareza em relação à função do tutor
dificuldades do homem atual, está seu e suas práticas (Bicalho, 2010). Quem é o
tutor afinal? Ele é um docente, informador,
desconhecimento do conhecer. Não é o
avaliador, mensageiro, um recurso, ou um
conhecimento, mas sim o conhecimento
prestador de serviços pedagógicos? (Zuin,
do conhecimento, que cria o comprome-
2006). Certamente, sutilezas do desempe-
timento” (p. 270).
nho da função do tutor engendram-se nas
Palavras-chave: Desenvolvimento docente,
26
EAD, Blended-Learning. Em contrapartida há nomenclaturas informais como,
por exemplo: fantutoche, impostutor (Valente & Mattar,
2007), bedel online.

439
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

propostas metodológicas e na organização visão crítica e global, responsabilidade,


estrutural e profissional adotadas pelas capacidade para lidar com situações novas
diferentes instituições de ensino que ofer- e inesperadas, saber trabalhar em equipe,
tam cursos a distância. No entanto, auto- dominar o conteúdo da(s) disciplina(s); ter
res como Belloni (2008); Machado e Ma- manejo metodológico e didático; habilida-
chado (2004); Valente e Mattar (2007) cha- de para orientar, supervisionar, planejar e
mam a atenção para uma melhor definição avaliar as atividades discentes; motivar e
dos perfis de professor e de tutor em EaD. animar os alunos; e, na opinião de Gonzá-
A inexistência de um modelo que abarque lez (2008), necessita também exercer uma
as diferentes posições ocupadas por eles sedução pedagógica que proporcione aos
“é um fator desestabilizador nas muitas alunos condições de uma aprendizagem
formas de equacionar a EaD” (Saraiva et indagadora, plena e autônoma. Conforme
al., 2006, p. 487). Ressaltamos que as prá- o manual de tutoria da UAB-UnB, o tutor
ticas na modalidade a distância envolvem “é um mediador que problematiza a rea-
compreensões e posturas diferenciadas, lidade, por meio do estabelecimento de
sobretudo quanto à concepção do papel ações interativas dialógicas [...]”, em que o
de tutor (Belloni, 2008) que ainda não tem reconhecimento do tutor como mediador,
uma identidade específica (Sá, 1998). De- resgata o princípio epistêmico da ação do-
finir e compreender o lugar que o tutor cente, compreendendo-o como articula-
deve ocupar nesse contexto é fundamen- dor do processo de formação do aluno. O
tal para o sucesso da EaD. Nesse sentido, tutor, para essa instituição, deve ser “cria-
o objetivo deste ensaio teórico é refletir dor de situações de aprendizagens capazes
sobre as incompreensões e condições do de possibilitar ao aluno montar estratégias
trabalho do tutor, ressaltando o modelo para resolvê-las, “reconstruir conceitos e
de tutoria da UAB em parceria com a UnB. utilizar os processos de estruturas mentais
De acordo com Sá (1998), a figura do tutor complexas” (Brasil, 2009, p. 21). Todavia,
teve origem no século XV permeada por o tutor recebe uma bolsa de trabalho da
um caráter religioso e limites profissionais FNDE27, ao tempo de desenvolvimento da
delimitados: responsabilidade pela orien- ação tutorial, cujo valor atualmente é de
tação de estudantes às condutas de fé e R$ 765,00. Acreditamos que a baixa remu-
de moral. Apenas no século XX, o tutor tor- neração e o caráter incerto da atividade
nou-se figura importante nos programas profissional são circunscritores importan-
de EaD, tendo suas práticas profissionais, tes para o desenvolvimento das práticas
a partir dessa época, um caráter acadê- docentes/tutorias e para sua formação
mico. Apesar dessa mudança histórica, a identitária (Bicalho, 2010). Teixeira Júnior
concepção de tutor parte ainda da premis- (2010), nesse sentido, coloca como condi-
sa de que ele não ensina, apenas orienta, ções ruins para o exercício da tutoria: a so-
dirige e apóia a aprendizagem, remetendo
brecarga e acúmulo de atividades, as difi-
a alguém devidamente responsável pela
culdade na organização do tempo e espaço
tutela e proteção (Machado & Machado,
para executar a atividade tutorial, a falta
2004). Essa figura do tutor, entretanto, não
de diálogo com a equipe docente e dificul-
condiz com a nova demanda social, que co-
bra dele uma série de competências: ade-
quada formação acadêmica; dinamismo, 27
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.

440
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade em manter o ânimo e a participação DESENVOLVIMENTO DISCENTE NA


dos alunos no curso. Ademais, a falta de ga- EAD: UM ESTUDO SOBRE O ALUNO DA
rantias legais e de reconhecimento deses- LICENCIATURA
timula o tutor, fazendo-o permanecer pou- Alessandra Oliveira Machado Vieira - UFG
co tempo na função, acarretando prejuízos avieira@fe.ufg.br
pedagógicos à EaD (Juste, 2011). Estudos
americanos (Bolliger & Wasilik, 2009), afir- Temos evidenciado nas últimas décadas,
mam que os tutores apresentam desgaste um foco especial de atenção e interes-
emocional, altos níveis de despersonaliza- se à modalidade de ensino denominada
ção e baixos níveis de realização pessoal, Educação a Distância (EaD). Baseada nas
enfatizando que a satisfação do tutor é Novas Tecnologias da Informação e Co-
um fato considerável por comprometer a municação (NTIC’s), essa modalidade tem
qualidade de cursos a distância, tal como buscado atender às demandas educacio-
as pesquisas brasileiras indicam (Bicalho, nais geradas pela exigência de certifica-
2010). Valente e Mattar (2007) falam que ção e qualificação profissional do quadro
as condições dadas ao desempenho da docente, com o objetivo de democratizar
função tutorial são indecentes e dramáti- e elevar o padrão de qualidade da edu-
cas, ao passo que o “tutor recebe não ape- cação brasileira (Behar, 2010). A começar
nas um currículo, mas um pacote comple- pelo amplo sentido de definições (Bello-
to pronto [...]”, de todo o funcionamento ni, 2008), sem dúvida a EaD apresenta-se
do curso. Os autores concluem que o tutor, como uma proposta de ensino diferente,
assim, transforma-se “em um ‘impostutor’ visto que não consiste simplesmente em
(inclusive porque tudo lhe é imposto), um adaptar formas tradicionais de ensino às
‘fantutoche’, passivo e algemado, ao qual tecnologias ou vice-versa, mas envolve
não é dada praticamente nenhuma liber- a preocupação com o que Kenski (2010)
dade para atuar no processo de ensino e chamou de nova lógica do ensino, tendo
aprendizagem” (p. 139). Para Zuin (2006) em vista questões estruturais, dentre as
o tutor não deve, apaticamente e sem quais destaca a definição sobre que tipo
questionamentos, absorver o que lhe é de educação se deseja desenvolver e que
imposto. Seu posicionamento crítico guar- tipo de aluno se pretende formar; com
da relações diretas com a qualidade do co- que finalidade e perspectivas; que altera-
nhecimento construído em EaD (Bicalho, ções curriculares e impactos na concreti-
2010; Bicalho et al., 2011).Concluímos que zação do projeto pedagógico são acarreta-
o papel desse profissional e suas práticas das por essas tecnologias e que formação
pedagógicas precisam ser repensadas, sob é necessária aos professores que vão atuar
risco de reproduzirmos concepções tradi- nesse espaço. As questões levantadas por
cionais de ensino em uma modalidade que Kenski e outros pesquisadores (Belloni,
tem grande potencial para transformar, de 2008; Bicalho, 2010; Coll et al., 2010; Cruz,
maneira criativa e inovadora, a educação 2010; Mattar, 2011; Zuin, 2006) sugerem
deste país, favorecendo assim o desenvol- uma diversidade profícua de objetivos de
vimento humano. pesquisa, que abarcam a complexidade
sistêmica dessa modalidade de ensino. Em
Palavras-chave: EaD; Tutor; Práticas Tutoriais. relação ao aluno da EaD, especificamente,

441
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Belloni (2008) aponta que estudos indicam perspectiva dialógica de desenvolvimen-


que muitos estudantes dessa modalidade to, que considera a co-construção de sig-
de ensino tendem a realizar uma aprendi- nificados compartilhados nos específicos
zagem passiva “digerindo pacotes instru- contextos de participação e produção de
cionais e regurgitando os conhecimentos saberes. Nessa perspectiva, o desenvolvi-
assimilados nos momentos de avaliação” mento está intimamente relacionado ao
(p.40). Essa autora ainda assinala que não contexto sociocultural no qual se insere a
se pode generalizar, mas esta concepção pessoa, do qual participa e o qual reorga-
revela significados que são atribuídos à niza continuamente. Sendo os processos
EaD e que podem comprometer seu pro- de significação dos sujeitos impregnados
cesso educativo. Nessa modalidade de de significação cultural, as concepções dos
ensino exige-se do aluno um trabalho au- alunos constituem campos privilegiados
tônomo, ao assumir a responsabilidade de de conhecimento sobre processos educa-
estudar à distância, o aluno se obriga a ter cionais e desenvolvimento humano. São
um ambiente e um tempo para estudar no participantes da pesquisa 35 alunos de
seu próprio ritmo, de acordo com as con- um curso de licenciatura inserido no pro-
dições e capacidades individuais. A EaD grama UAB. Questionários e observações
exige um aluno disciplinado, independen- no ambiente virtual de aprendizagem são
te e autônomo (Coll et al., 2010), mas será os procedimentos utilizados e a partir dos
que é esse o aluno que temos nos nossos quais temos construído as informações,
cursos? Estudos têm sido desenvolvidos apoiando-nos numa análise qualitativa
nessa direção (Belloni, 2008; Bohadana & das mesmas. Nosso objetivo é identificar
Valle, 2009; Coll et al., 2010), com vistas quem são os alunos e quais os significa-
a conhecer o perfil, as competências, os dos atribuídos por eles à sua formação,
objetivos do aluno da EaD. Assim, também tendo assim, como perspectiva, conhecer
temos desenvolvido estudos nesse cená- o que pensam sobre o curso e como tais
rio, abrangendo diferentes eixos investi- concepções favorecem (ou não) sua atu-
gativos, dentro de um projeto de pesquisa ação e compromisso, isto é, os processos
maior, realizado na Universidade Federal de qualificação e desenvolvimento profis-
de Goiás sobre um curso de licenciatura sional. Os resultados preliminares apon-
vinculado à Universidade Aberta do Bra- tam como indicadores (a) a construção de
sil (UAB). Interessa-nos, particularmente uma consciência grupal sobre os limites da
aqui, apresentar um desses eixos, que formação na modalidade à distância, des-
consiste em compreender algumas espe- dobrada em queixas sobre a qualidade do
cificidades que envolvem o processo de material textual didático e o ritmo em que
construção do conhecimento nessa nova são apresentados os conteúdos; (b) dificul-
cultura educacional, em especial, a carac- dade de compreender com autonomia, a
terização dos alunos e as suas concepções linguagem dos textos propostos, eviden-
e objetivos quanto ao curso de licenciatu- ciando a necessária mediação do tutor; (c)
ra. A pesquisa em questão fundamenta-se a importância e demanda do número de
na Psicologia Histórico-Cultural, a partir encontros presenciais; (d) a urgência em
dos estudos de Vygotsky (1994, 2003) e repensar e avaliar a qualidade das (inter)
Bruner (1997, 2001), articulado a uma ações e dos aspectos de intervenção mo-

442
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tivacionais voltados para a produção do sentar modelos de intervenção e, con-


conhecimento no ensino a distância. Co- sequentemente, formação profissional
nhecer as concepções dos alunos sobre mais condizentes com o conhecimento
o curso em desenvolvimento nos ajuda a contemporâneo a respeito do desenvol-
compreender o que esperam dessa expe- vimento humano. Em um país como o
riência e quais são as características dos Brasil, de grande diversidade cultural,
cursos que atendem aos seus objetivos, social, econômica, ambiental, é de funda-
analisando os efeitos desses novos mode- mental importância um olhar diferencia-
los pedagógicos em relação ao desenvolvi- do para a situação de crianças e adoles-
mento de processos de ensino e aprendi- centes. A primeira fala tem o objetivo de
zagem (Behar, 2010). Em consonância com apresentar fatores de risco e de proteção
essa última autora, acreditamos que é ne- para o desenvolvimento da criança e do
cessário realizar pesquisas reflexivas, que adolescente, visando introduzir o tema;
auxiliem na compreensão não apenas das destaca-se a multideterminação desses
possibilidades, mas também dos limites fatores, uma vez que há uma interação
do uso de ambientes virtuais na educação, contínua, ao longo do tempo, entre fato-
contribuindo para a construção e expan- res biológicos e ambientais e que as con-
são da EAD, de forma crítica e dinâmica. dições ambientais têm a possibilidade de
atenuar ou agravar os efeitos de risco ou
Palavras-chave: Desenvolvimento Discente; de proteção no desenvolvimento infantil.
Licenciatura; EaD; Psicologia Histórico- A segunda fala apresenta uma análise de
Cultural. fatores de risco e de proteção, relativos
à violência física intrafamiliar contra a
criança, dentro da perspectiva do Modelo
SP LT06 - Simpósio Bioecológico, identificando necessidades
de pesquisas na área para esclarecer as-
pectos pouco explorados; são enfocados
SP LT06-883 - REFLEXÕES SOBRE fatores relacionados ao contexto e ao
FATORES DE RISCO E PROTEÇÃO PARA tempo, assim como às características da
O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA pessoa; discutem-se, ainda, os proces-
E DO ADOLESCENTE E MODELOS DE sos proximais que permeiam o contexto
INTERVENÇÃO de violência intrafamiliar, abordando sua
Lígia Ebner Melchiori - UNESP/Bauru perpetuação ao longo do curso de vida
lmelch@fc.unesp.br e as características das interações entre
Maria Auxiliadora Dessen - UnB pais e filhos, em famílias com histórico
dessen@unb.br de violência. Na terceira fala discorre-se
Ana Carolina Villares Barral Villas Boas - UnB a respeito da necessidade de se adotar
villares_ana@yahoo.com.br uma fundamentação teórica sistêmica e
modelos de formação profissional que se-
Esta proposta de Simpósio visa: promo- jam compatíveis com a complexidade das
ver reflexões a respeito de fatores de ris- intervenções com famílias em situação de
co e de proteção ao desenvolvimento da risco; inicialmente, discute-se como a te-
criança e do adolescente, além de apre- oria sistêmica da família e o modelo bio-

443
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ecológico de Bronfenbrenner constituem pesquisadores brasileiros e para profissio-


ferramentas apropriadas para pesquisar e nais que atuam diretamente nessa área. A
lidar com a família; defende-se a adoção primeira parte é dedicada a descrever os
de um modelo de formação profissional fatores de risco para o desenvolvimento
compatível com a atuação sistêmica – o e, na segunda, são destacados os fatores
modelo transdisciplinar; conclui-se com de proteção. Os fatores de risco envolvem
algumas reflexões sobre a necessidade os de ordem política, socioeconômica,
de parcerias entre todos os segmentos ambiental, cultural, familiar e genética,
envolvidos com a qualidade de vida e o sendo a combinação de adversidades que
desenvolvimento de famílias em situação influencia, negativamente, diferentes áre-
de risco. as do desenvolvimento. Eles têm ações
diversas sobre o desenvolvimento, uma
FATORES DE RISCO E DE PROTEÇÃO vez que dependem da idade em que aco-
PARA O DESENVOLVIMENTO DA metem o indivíduo, duração, intensidade,
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE quantidade e variedade do agente nocivo
Lígia Ebner Melchiori - UNESP/Bauru e da susceptibilidade genética. Diferentes
lmelch@fc.unesp.br autores têm destacado fatores de risco
gerais que podem afetar o desenvolvi-
Os fatores de risco ao desenvolvimen- mento infantil, que vão além dos fatores
to da criança e do adolescente têm sido genéticos ou biológicos e das condições
estudados, na literatura, em função das de nascimento, como baixo peso ou pre-
condições prejudiciais que podem causar. maturidade. Sameroff, Seifer, Barocas,
No entanto, há necessidade de se dar a Zax e Greenspan (1987), por exemplo,
mesma ênfase aos fatores de proteção, destacaram 10 fatores de risco que afe-
uma vez que eles podem auxiliar na mi- tam o QI de crianças de nível socioeconô-
nimização ou, mesmo, na superação das mico desfavorecido, no entanto, muitos
condições adversas. É necessário destacar deles influenciam crianças de qualquer
que esses fatores são multideterminados classe social: (a) saúde mental materna;
- pois, há uma interação contínua entre (b) ansiedade materna; (c) perspectivas
fatores biológicos e ambientais, ao longo parentais; (d) comportamentos interati-
do tempo - e que as condições ambientais vos maternos; (e) educação materna; (f)
têm a possibilidade de atenuar ou agravar status ocupacional do provedor; (g) status
os efeitos de risco ou de proteção no de- socioeconômico; (h) suporte social fami-
senvolvimento infantil. Atrasos no desen- liar; (i) tamanho da família; e (j) eventos
volvimento são produzidos, então, pela estressantes. Esses autores alertam que,
combinação de fatores de risco genéti- no entanto, poucos riscos são suscetíveis
cos, biológicos, psicológicos e ambientais, a intervenções. O tamanho da família não
envolvendo interações complexas entre tem como diminuir. O nível de escolari-
eles. Esta apresentação tem o objetivo de dade materno, a ocupação do chefe da
destacar relevantes aspectos a respeito família, as perspectivas parentais e os
dos fatores de risco e de proteção no de- aspectos socioeconômicos são aspectos
senvolvimento da criança e do adolescen- que podem ser desenvolvidos em longo
te, visando fornecer subsídios para jovens prazo, apesar de não serem passíveis de

444
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

modificação em programas básicos de de saúde, opções de lazer, centros reli-


intervenção. No entanto, a intervenção giosos) podem minimizar ou neutralizar
psicológica pode ajudar a alterar a forma o impacto dos fatores de risco. É impor-
de se enfrentar os eventos estressantes, tante destacar a necessidade de fortale-
diminuir a ansiedade materna e melho- cimento dos fatores de proteção, em seus
rar a qualidade da interação entre mãe diferentes níveis, o mais cedo possível.
e filhos. A rede de suporte social familiar Em estudo de meta-análise, por exemplo,
também pode ser passível de ampliação, Bakermans-Kranenburg, Van Ijzendoonr
com orientações de como e onde buscar e Juffer (2005) concluíram que as inter-
determinados tipos de ajuda. Em função venções psicológicas para se trabalhar o
da situação aflitiva em que se encontram vínculo de apego entre mãe e filho ocor-
as crianças brasileiras, Della Barba, Mar- rem com excelentes resultados quando
tinez e Carrasco (2003) concluem que as este tem seis meses de idade. Outros
políticas públicas devem procurar facili- tipos de intervenção e de estimulação
tar a integração da mãe no mercado de também apresentam resultados excelen-
trabalho, auxiliá-la na conciliação de res- tes nos primeiros anos de vida da crian-
ponsabilidades familiares e profissionais, ça, em função da plasticidade do cérebro
apoiar crianças e famílias em situação de humano nesta época. No entanto, para
risco, favorecer oportunidades de escola- que realmente ocorra o fortalecimento
rização materna e paterna - uma vez que dos fatores de proteção e supressão ou
a escolaridade pode resultar em crenças minimização dos riscos, há necessidade
mais positivas com relação ao ambiente de se ter uma visão o mais abrangente
familiar, aumentando a provisão de mate- possível dessa multiplicidade de influên-
riais e interações afetivas - e auxiliar na cias a que o ser humano está exposto. A
implantação de ambientes que estimu- atuação da forma mais eficaz possível vai
lem o desenvolvimento global da crian- depender de inúmeros agentes, desde os
ça, como creches e escolas de qualidade, proponentes das políticas públicas, cuja
centros esportivos, entre outros. Outro iniciativa em nosso país está começando
ponto que eles destacam é a veiculação a não depender apenas dos órgãos go-
de informações a respeito do desenvolvi- vernamentais, como a atuação de uma
mento infantil para profissionais da saú- equipe multiprofissional, que trabalhe de
de e para a família. Eles concluem que os forma mais organizada e interdependen-
resultados serão satisfatórios quando a te. Trabalhar junto com a família, visando
intervenção envolver a família, a comu- suas necessidades gerais, é condição bási-
nidade e os serviços públicos, uma vez ca para a promoção do desenvolvimento
que saúde, ambiente e desenvolvimen- da criança e do adolescente, em toda sua
to infantil não são conceitos que podem potencialidade.
caminhar sozinhos. Os recursos pessoais
(ex: autoestima, habilidades cognitivas, Palavras-chave: fatores de proteção e de risco,
capacidade de enfrentamento de situa- crianças, adolescentes
ções adversas), familiares (ex: práticas pa- Contato: Lígia Ebner Melchiori, Unesp/Bauru,
rentais, vínculos de apego estabelecidos) lmelch@fc.unesp.br
e sociais (ex: escola, comunidade, centros

445
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

VIOLÊNCIA FÍSICA CONTRA A CRIANÇA: miliar e, ao tempo, tendo em vista que a


ANÁLISE DE FATORES DE RISCO E noção de cronossistema permite compre-
PROTEÇÃO NA PERSPECTIVA DO ender as transformações nas concepções
MODELO BIOECOLÓGICO sobre a criança, ao longo das gerações. Na
Ana Carolina Villares Barral Villas Boas - UnB segunda parte, é destacado o olhar sobre
villares_ana@yahoo.com.br o indivíduo e características pessoais que
devem ser levadas em conta. Em seguida,
No Brasil, os números da violência física são discutidos os processos proximais que
contra crianças são alarmantes, sobretu- permeiam o contexto de violência intrafa-
do, por se referirem a indivíduos em ten- miliar, abordando sua perpetuação ao lon-
ra idade, que deveriam estar protegidos go do curso de vida e características das
desse tipo de experiência. Ainda que a interações entre pais e filhos, em famílias
família represente o principal ambiente de com histórico de violência. Discutem-se,
socialização da criança, desempenhando por fim, limites e avanços na pesquisa con-
um importante papel no seu processo de temporânea sobre violência física contra a
desenvolvimento, muitas famílias expõem criança e as vantagens da adoção da pers-
crianças e adolescentes a situações de ris- pectiva biecológica para a sua compreen-
co que podem comprometer sua integri- são. Enquanto fatores de risco aumentam
dade física e emocional. A violência física as chances ou estão associados à ocorrên-
intrafamiliar é um fenômeno de complexa cia de um evento indesejado, fatores de
apreensão, determinado por fatores que proteção envolvem recursos do indivíduo
operam em diferentes níveis, consideran- ou da sociedade que minimizam ou neu-
do a interação entre variáveis contextuais tralizam os efeitos do risco. Considerando
e individuais. Sua compreensão, portanto, o atual contexto histórico brasileiro e as
depende de uma perspectiva ampla o su- discussões para o combate à violência, os
ficiente para contemplar aspectos imedia- fatores associados ao macro e ao cronos-
tos e históricos, proximais e distais, envol- sistema são os primeiros a serem aborda-
vendo toda a rede de relações em que a fa- dos. Enquanto a análise sobre o macrossis-
mília se encontra. O modelo Bioecológico tema contribui para o entendimento sobre
proposto por Uri Bronfenbrenner revela- valores e padrões da cultura ou subcultura,
-se capaz de embasar estudos sobre fenô- especialmente, no que diz respeito ao uso
menos dessa natureza, por oferecer uma da punição física como prática educativa, a
ampla visão sobre as variáveis associadas noção de cronossistema permite compre-
ao desenvolvimento humano. Para tanto, ender as mudanças no reconhecimento
esta apresentação tem como objetivo re- da criança como detentora de direitos e
alizar uma análise de fatores de risco e de a construção de prerrogativas legais para
proteção relativos à violência física intrafa- sua proteção. Além do contexto social,
miliar contra a criança, na perspectiva do seja ele imediato e representado pelos
Modelo Bioecológico, com base nos seus valores que permeiam o contexto familiar,
componentes Pessoa-Processo-Contexto- ou distal, como as alterações na visão da
-Tempo. Primeiramente, são enfocados infância, nenhum fenômeno relacionado
aspectos relacionados ao contexto, espe- ao desenvolvimento pode ser compreen-
cialmente, o macro e o microssistema fa- dido sem levar em conta as características

446
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da pessoa. Nesse sentido, os estudos sobre de proteção, evitando que a atenção a um


violência física chamam a atenção tanto único aspecto possa gerar intervenções li-
para características dos pais, como a pre- mitadas e não abrangentes. No que tange
sença de psicopatologias e de uma perso- aos processos proximais, os estudos care-
nalidade hostil, quanto da criança, como o cem de análises mais amplas, que focali-
temperamento difícil. No que diz respeito zem as interações entre os membros fami-
ao processo, elemento central do modelo liares e identifiquem padrões de risco com
bioecológico, estudos sobre as relações o intuito de favorecer relações saudáveis,
mantidas no contexto imediato sinalizam auxiliando no declínio e até abandono de
a importância de identificar característi- práticas que violem os direitos da criança.
cas da interação entre pais e mães com
histórico de violência e seus filhos, o que Palavras-chave: família, fatores de risco e
pode contribuir para o reconhecimento proteção, violência física contra a criança
de padrões de interação considerados de Contato: Ana Carolina Villares Barral Villas
risco. Pesquisadores têm identificado, por Boas, UnB, villares_ana@yahoo.com.br
exemplo, que nessas famílias pais e filhos
interagem menos e, frequentemente, suas
interações têm sido descritas como mais MODELOS SISTÊMICOS: DESAFIOS
negativas, sendo as genitoras mais direti- PARA A ATUAÇÃO COM FAMÍLIAS EM
vas, controladoras e inconsistentes. Ape- SITUAÇÃO DE RISCO
sar desses achados, os fatores relaciona- Maria Auxiliadora Dessen - UnB
dos aos processos proximais têm recebido dessen@unb.br
menor atenção por parte dos pesquisado-
res da área. Embora haja um considerável A promoção do desenvolvimento huma-
número de trabalhos sobre as interações no requer ações complexas, que envol-
entre pais e filhos em situação de violên- vam aspectos biológicos, físicos, sociais e
cia, muitos estudos têm enfocado apenas psicológicos. Nesse processo, as ações da
o comportamento de cada membro fami- saúde e da educação têm contribuições
liar, separadamente, sem levar em conta diretas e fundamentais, no que tange a
a reciprocidade da relação. Considerando assegurar melhores condições de vida,
que o desenvolvimento é um fenômeno permanência e participação da pessoa em
epigenético e probabilístico, sua compre- desenvolvimento no seu contexto social.
ensão depende da análise da interação en- Considerando as diversas frentes de atu-
tre as diversas características do indivíduo ação promovidas pelas áreas da saúde e
e do ambiente. Sendo assim, a adoção da da educação, merecem destaque aquelas
perspectiva bioecológica para a análise da voltadas às famílias em situação de risco,
violência física intrafamiliar parece contri- particularmente, de bebês e crianças que
buir para a compreensão das relações di- necessitam de atenção precoce. A família
nâmicas presentes nesse contexto, eviden- é a principal fonte de contribuição para o
ciando a necessidade de estudos amplos processo de desenvolvimento do ser hu-
e integrados. A intensificação do combate mano, especialmente na infância, quando
à violência contra a criança requer ações a criança se encontra em situação de risco
com foco tanto em fatores de risco como social ou biológico. Estas famílias deman-

447
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dam maior suporte, cuidado, informação, interações familiares têm uma organização
acolhimento e orientação. Neste contexto, dinâmica, na qual as mudanças que ocor-
os programas de atendimento familiar são rem em uma determinada relação afetam
essenciais, tanto para orientar as famílias as demais; (c) a família tende a manter um
no que se referem às tarefas de desenvol- estado de equilíbrio ou homeostase; e (d)
vimento do seu curso de vida quanto para o equilíbrio familiar ocorre através de uma
apoiá-las, fortalecê-las e encorajá-las na constante readaptação ao seu contexto.
busca de soluções para seus problemas. A Para compreendermos a família e suas re-
noção de fortalecimento da família como lações extra-familiares, faz-se necessário
solucionadora de suas próprias dificulda- recorrer a outra ferramenta teórica, mais
des deve ser priorizada no planejamento abrangente e que complementa a Teoria
dos programas e de projetos de pesquisa. Sistêmica da Família: o Modelo Bioecológi-
Para isto, duas condições são necessá- co, proposto por Bronfenbrenner. Este mo-
rias: adotar uma fundamentação teórica delo, bastante divulgado nas últimas três
sistêmica e modelos de formação profis- décadas, amplia o escopo de análise e per-
sional que sejam compatíveis à complexi- mite entender o sistema familiar de forma
dade das intervenções com as pessoas e integrada e global, levando em conside-
as famílias em situação de risco. Assim, a ração a pessoa, os processos proximais,
primeira parte desta apresentação é de- os contextos ecológicos e o tempo. Esta
dicada a discutir como a teoria sistêmi- complexidade sistêmica demanda uma
ca da família e o modelo bioecológico de inovação na formação atual de uma equi-
Bronfenbrenner constituem ferramentas pe multidisciplinar. Assim, apresentamos
apropriadas para pesquisar e lidar com a uma das alternativas de formação de pro-
família. Na segunda parte, defendemos a fissionais que nos parece apropriada: os
importância de se adotar um modelo de Modelos Transdisciplinares. A intervenção
formação profissional compatível com a transdisciplinar é definida como os papéis
necessidade de uma atuação sistêmica – o compartilhados entre os limites ou frontei-
modelo transdisciplinar. A terceira e última ras das disciplinas, de modo a otimizar a
parte é dedicada a apresentar algumas re- comunicação, a interação e a cooperação
flexões sobre a necessidade de parcerias entre os membros da equipe. Portanto, os
entre todos os segmentos envolvidos com modelos transdisciplinares têm como ob-
a qualidade de vida e o desenvolvimento jetivo proporcionar serviços mais integra-
de famílias em situação de risco. Para es- dos, coordenados e centrados na família,
tudar a família, frente às mudanças nas reduzindo os problemas de comunicação e
sociedades, é preciso compreender as potencializando a coordenação dos servi-
transformações ocorridas dentro deste mi- ços. A elaboração de programas, baseada
crossistema e, deste, em relação a outros única e exclusivamente na experiência do
contextos extrafamiliares. Quatro princí- próprio profissional que executa a inter-
pios devem ser considerados em um pla- venção e limitada à sua necessidade de
nejamento de pesquisa sob a perspectiva trabalho com a família, não se mostra mais
do desenvolvimento familiar: (a) a família adequada à complexidade de um paradig-
é caracterizada por uma estrutura específi- ma sistêmico. Um paradigma sistêmico
ca de relações entre seus membros; (b) as requer a colaboração de profissionais de

448
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

diferentes áreas envolvendo, pelo menos, CO 15 - LT02


pesquisadores e profissionais da psicologia
do desenvolvimento infantil e familiar, da
Leitura e Escrita
educação, do serviço social, direito e da
área de saúde, em geral. Assim, dada a
LT02-739 - METACOGNIÇÃO E
complexidade e a natureza transdisciplinar
METALINGUAGEM: ALIADOS NA
das questões de desenvolvimento huma-
AQUISIÇÃO DA LEITURA E ESCRITA
no, relacionadas à pessoa e suas famílias
em situação de risco, a implementação de Renata Nóbrega de Lucena - UFPE
qualquer projeto de pesquisa ou programa renata.nobrega@gmail.com
de atuação requer que a a qualidade de Alena Nobre - UFPE
vida e dos serviços ocupem um lugar de alenacabral@gmail.com
destaque na política social, em programas Lysia Basílio - UFPE
de habilitação e reabilitação e na pesqui- lysiabasilio@yahoo.com.br
sa científica. Somente com a colaboração
de uma equipe multidisciplinar podere- A relação entre linguagem e cognição é
mos responder as questões centrais sobre amplamente discutida na literatura psico-
crianças e adolescentes, e suas famílias, lógica. Diversos são os posicionamentos
em situação de risco; tais questões são, no sobre essa relação: alguns enxergam uma
mínimo, interdisciplinares e transdiscipli- preponderância da cognição sobre a lin-
nares. Portanto, é essencial que se forne- guagem (Correa, 2004; Gombert, 2003);
çam subsídios empíricos para a formulação outros salientam que cognição e linguagem
de políticas públicas das áreas de saúde e não se interrelacionam (Gleitman, 1972
educação e, também, que a produção do apud Gombert, 1992); e há ainda os que
conhecimento seja extensiva à melhoria defendam uma interdependência entre
da qualidade dos serviços prestados por elas (Vygotsky, 1998; Figueira, 20 03).Nes-
centros de desenvolvimento infantil e ins- te último posicionamento, notadamente
tituições de reabilitação, bem como por vygotskyano, linguagem e cognição se afe-
escolas infantis. Acreditamos que uma tam mutuamente. Para o autor, é inegável
nova postura teórico-metodológica pos- que a linguagem desempenha um papel im-
sibilitará um novo olhar sobre a comple- portante na regulação do comportamento
xidade do desenvolvimento de crianças e e, simultaneamente, esta regulação é fruto
adolescentes e suas famílias em situação do desenvolvimento das funções mentais
de risco. Isto requer uma equipe de pro- superiores (Fernandes e Magalhães, 2003).
fissionais habilitados para trabalharem Tomando esta perspectiva sociocultural de
sistemicamente com essas famílias, o que forma axiomática, uma reflexão acerca da
demanda novas necessidades de formação metacognição e metalinguagem e sua in-
destes profissionais. terrelação precisam ser igualmente discu-
tidos, destacando ainda sua repercussão
Palavras-chave: família, situação de risco, sobre a aquisição da leitura e da escrita.
formação profissional Segundo Flavell (1974), a metacognição
Contato: Maria Auxiliadora Dessen, refere-se ao conhecimento do próprio co-
Universidade de Brasília-UnB, dessen@unb.br nhecimento, além do controle e da autorre-

449
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gulação dos processos cognitivos. É possível objeto de conhecimento, enfim, imporá


afirmar também que a metacognição está novas demandas à criança, por exemplo:
relacionada com a avaliação, o controle e o constante apelo didático para se tomar
a regulação de quaisquer tarefas e estraté- a linguagem como objeto do aprender re-
gias cognitivas já evidenciadas na literatura quererá o uso em maior ou menor grau de
enquanto habilidades metacognitivas (me- habilidades metalinguísticas. Contudo, é
tamemória, meta-atenção, meta-aprendi- importante lembrar ainda que as habilida-
zagem, meta-cognição social, metalingua- des metalinguísticas não podem ser vistas
gem, etc.). O conceito de metalinguagem de forma isolada. Acredita-se que o uso das
pode ser definido a partir de duas pers- estratégias metacognitivas nas atividades
pectivas: linguística e psicolinguística. Na de leitura e escrita podem tornar o leitor
perspectiva linguística, a metalinguagem é mais consciente metalinguisticamente das
vista como autorreferenciação da língua. suas produções e compreensões. Vejamos
Neste sentido, ela poderia ser encontrada breves exemplos a seguir. Para realizar uma
ao examinarmos produções verbais e en- tarefa de manipulação de sons que envolva
contrarmos características de que a lingua- produção de um verso rimado, por exem-
gem foi usada para referir-se a si própria. A plo, o sujeito precisa fazer uso de estraté-
perspectiva psicolinguística, por seu turno, gias que facilitem a realização daquela ativi-
assume uma análise da atividade cogniti- dade linguística. O sujeito precisa enumerar
va inexistente na perspectiva linguística. palavras que terminam com o mesmo som,
Nesta perspectiva, Pratt e Grieve (1984) mas que guardem o sentido com o verso
definem a metalinguagem (melhor tradu- anterior; pode optar por utilizar verbos (e
zida como consciência metalinguística) en- não substantivos) com terminações pareci-
quanto uma habilidade para refletir sobre das em versos alternados, a fim de facilitar
as propriedades da linguagem, tratando-a a rima, etc. Esse seria um exemplo de uma
como objeto de atenção deliberada pelo atividade metacognitiva, sendo suporte
sujeito. Gombert (1992) ratifica ainda que para uma atividade metalinguística, uma
saber sobre a linguagem é uma habilidade vez que elas se referem à realização da ta-
preliminar, enquanto que a atividade meta- refa e não aos sons relativos à mesma. Se
linguística refere-se à capacidade de saber pensarmos também no desenvolvimento
analisar aquilo que já se conhece. Diante da escrita de maneira mais ampla, vemos
deste panorama, Correa (2004, p.74) afir- que para aprender a escrever de forma or-
ma que “[...] não resta dúvida que, ao longo tograficamente correta é preciso mais do
do desenvolvimento, ocorre uma mudança que a consciência metalinguística fonológi-
significativa na maneira como conceitua- ca ou sintática. De acordo com Dias e Ávila
lizamos e fazemos uso da linguagem. Ini- (2008), o aprendizado da escrita ortográfica
cialmente utilizada como instrumento de envolve processos metacognitivos, de aná-
comunicação social que permite a crian- lise dos fatos da grafia (metagráfica), que a
ça se expressar e interagir socialmente, a criança faz até dominar o uso das regras.
linguagem torna-se, gradativamente, um Essas competências conferem ao aprendiz
objeto de conhecimento, devido aos efei- a capacidade de explicar o porquê da for-
tos da escolarização sobre o aprendizado ma de escrever uma ou outra palavra, e não
da língua escrita”. Tomar a língua como apoiando sua ação somente no domínio das

450
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

bases fonológicas ou regras ortográficas. significar ampliação e reativação da consci-


Outro exemplo refere-se à leitura. A forma- ência metalinguística para avaliar se as es-
ção de um leitor não resume-se à decodifi- tratégias trouxeram ou não a compreensão
cação de sons. É necessário que se faça uso ou produção esperada pelo sujeito. Enfim,
de habilidades metalinguísticas de manipu- sugeriu-se neste ensaio pensar a relação
lação sonora para ler adequadamente pois, entre metacognição e metalinguagem de
para ler um texto, manipular sons não é su- forma cíclica, havendo uma relação mútua
ficiente. É preciso, deliberadamente, pen- de interdependência e beneficio. Propor
sar sobre o sentido daqueles sons traduzi- atividades nas quais a criança é levada a
dos em palavras, num todo ainda mais sig- fazer uso das duas habilidades pode ser
nificativo: o texto. Ou seja, a consciência fo- significativo para apropriação e desenvolvi-
nológica pode ser suficiente para ler frases, mento linguístico da mesma.
mas não necessariamente para produzir
sentido sobre ela. É neste momento, então, Palavras-chave: Alfabetização; Metacognição;
que a colaboração das estratégias cogniti- Metalinguagem.
vas e metacognitivas podem ser eficientes Contato: Renata Nóbrega de Lucena (renata.
para o sucesso da atividade. Numa situação nobrega@gmail.com)
como esta, a monitoração de pausas para
armazenamento e compreensão da infor-
mação e o uso consciente desta estratégia LT02-741 - A REVISÃO DE TEXTOS
pode ajudar o leitor em formação. Nestas ESCRITOS POR CRIANÇAS: UMA ANÁLISE
condições, entende-se que a literatura con- DAS PESQUISAS NA ÁREA
firma a necessidade do desenvolvimento Renata Nóbrega de Lucena - UFPE
da consciência metalinguística no processo renata.nobrega@gmail.com
de aquisição da leitura e escrita. Entretan- Alina Galvão Spinillo - UFPE
to, nem sempre menciona-se como meta- alinaspinillo@hotmail.com
linguagem e metacognição podem colabo- Lysia Basílio - UFPE
rar entre si, favorecendo as descobertas lysiabasilio@yahoo.com.br
sobre a representação e o uso do sistema Financiamento: CNPq
de escrita. Sabe-se que delimitar as bordas
de afetação de linguagem, cognição, meta- Escrever textos é uma habilidade que en-
linguagem e metacognição entre si é algo volve diferentes etapas: planejamento,
muito difícil. Mas independentemente dis- textualizacão e revisão. O planejamento
so, concebê-las não enquanto “entidades” ocorre em nível pré-linguístico, consistindo
diferentes, mas complementares, pode ser na organização e definição de objetivos da
algo muito interessante. A consciência me- escrita, na seleção e avaliação das ideias
talinguística, por exemplo, aponta dificulda- a serem inseridas no texto. A textualiza-
des em determinadas questões linguísticas ção ocorre em nível linguístico, traduzindo
que, por conseguinte, indica a necessidade ideias em instâncias linguísticas que aten-
de adoção de estratégias adequadas para dam as regras ortográficas, sintáticas e gra-
realização da atividade linguística proposta. maticais de uma língua. A revisão consiste
Assim, a utilização destas estratégias favo- em se colocar no lugar de leitor e avaliar a
receria a realização da tarefa, o que poderia necessidade de alterar o texto, seja duran-

451
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

te a textualização quando o texto ainda é mostram que a capacidade de identificar e


emergente, ou na fase de edição, após a corrigir erros varia em função do domínio
escrita do texto. O processo de revisão, que o escritor tem da escrita. Os dados evi-
então, resulta do confronto entre o texto denciam que quando se é inexperiente, as
pretendido e o instanciado (aquele efetiva- alterações de revisão costumam ser poucas
mente escrito de forma parcial ou total) so- e em relação a aspectos superficiais do tex-
bre o qual alterações podem ser realizadas. to (sintaxe e ortografia). Quando o escritor
Essas alterações podem ser de forma e de é mais competente, a revisão torna-se mais
conteúdo, assim como podem ser mínimas complexa, ocorrendo em maior frequência
ou substanciais. No âmbito da Psicologia, e em relação a aspectos estruturais do tex-
diferentes aspectos relativos à revisão tex- to. Além disso, todos os tipos de alterações
tual têm sido investigados: as estratégias de (adição, retirada, substituição e desloca-
revisão adotadas pelos escritores ao reali- mento) tendem a ser realizados por este
zarem alterações sobre seus textos, a com- escritor, o que não se observa em relação
petência do escritor, sua familiaridade com a escritores iniciantes que utilizam poucas
o texto revisado, o papel do interlocutor na ações de revisão. Estudos de intervenção e
escrita do texto e as diferentes situações de longitudinais confirmam esses dados, des-
revisão. O objetivo deste trabalho é apre- tacando que instruções específicas podem
sentar e discutir esses estudos e suas prin- potencializar o desenvolvimento da capaci-
cipais contribuições, procurando mapear a dade de escrever e de revisar. Sobre familia-
literatura mais recente e oferecer aos inte- ridade com o texto revisado, estudos apon-
ressados informações acerca deste campo tam que é mais fácil identificar os erros
de investigação, bem como tecer consi- presentes em textos não-familiares do que
derações acerca de possíveis implicações os erros presentes em textos familiares.
educacionais para o ensino da escrita de Isso foi observado tanto com crianças como
textos. Há autores que investigam as estra- com indivíduos graduados. Pesquisas sobre
tégias de revisão adotadas pelos indivíduos, este tema geralmente consistem em solici-
agrupando-as em edição e reescrita. A edi- tar que o revisor identifique erros e os corri-
ção refere-se à correção de erros e altera- ja em textos familiares (seu próprio texto) e
ções com vistas a melhorar a adequação do em textos não familiares (escritos por outra
texto sem que seja necessário alterar seu pessoa). Por exemplo, estudos realizados
significado e estrutura geral. A reescrita im- com estudantes universitários mostraram
plica em transformações no conteúdo (in- que ao identificar e corrigir erros em tex-
serção e retirada de segmentos), alterações tos com níveis de familiaridade distintos,
na organização do texto (deslocamento de a familiaridade do revisor com sua própria
segmentos que alteram a sequência) e mo- escrita pode prejudicar a detecção de erros,
dificações do significado de algum segmen- pois aumenta a previsibilidade do texto que
to (substituição). Essas duas estratégias não está sendo revisado e, portanto, a probabi-
são excludentes, podendo ser combinadas lidade de não perceber os erros. Por outro
de modo que a revisão inclua tanto a cor- lado, a não familiaridade poderia tornar os
reção de erros como a transformação do erros mais salientes, aumentando assim o
texto. Estudos acerca da relação entre a número de detecções e correções. Outras
competência do escritor e a revisão textual investigações examinam o papel do interlo-

452
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cutor sobre as alterações feitas pelas crian- dos na escrita de textos, de maneira geral,
ças ao revisarem seus textos, examinando e na revisão textual, em particular. Assim,
o papel desempenhado pelo adulto letrado do ponto de vista psicológico, compreender
com o qual a criança interage e que contri- o processo de escrita é essencial para de-
bui com o seu processo de constituição da senvolver habilidades linguísticas, tornan-
representação escrita. Pesquisas desta na- do o indivíduo competente em sua língua
tureza muitas vezes são estudos longitudi- materna. A partir de tal reflexão é possível
nais e estudos de caso. Segundo os dados gerar ainda alternativas educacionais relati-
gerados por essas pesquisas, durante a es- vas ao planejamento de situações em que a
crita, o escritor se coloca no lugar de leitor escrita passa a ser um objeto do ensino pas-
de seu próprio texto, marcando a existência sível de tratamento didático, sem perder de
de um leitor, ou seja, de um destinatário; e vista sua natureza psicológica (aquisição e
que o produtor do texto alterna os papéis desenvolvimento).
de escritor e de leitor. A presença de um in-
terlocutor internalizado, um leitor ao qual Palavras-chave: revisão textual;
o texto se dirige, tende a ser mais saliente crianças; psicologia.
com o aumento da idade e da escolaridade Contato: Renata Nóbrega de Lucena,
(através do domínio da escrita). Um grande renata.nobrega@gmail.com.
número de investigações tem examinado
ainda as diferentes situações de revisão e
interação entre revisores/escritores. Há in- LT02-842 - O CONHECIMENTO DE
vestigações envolvendo diversas situações ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO
de revisão: individual, em dupla e coletiva- FUNDAMENTAL SOBRE OS PORTADORES
mente. De maneira geral, observa-se que DE TEXTO
interações coletivas influenciam a maneira Kaline Jurema Jambeiro Rocha - UNIVASF
dos alunos revisarem. Um dos principais rocha.kaline@yahoo.com
resultados dos estudos em que se compa- Maria Tarciana de Almeida Barros - UNIVASF
ram diferentes situações de revisão é que mariatarciana@yahoo.com.br
a atividade de revisão conjunta provoca
um grande número de alterações sobre o Os estudos sobre Letramento no Brasil são
texto, havendo diferentes categorias de co- recentes, datando de duas ou três décadas
-elaboração dos membros: concordância e seguindo as preocupações com grupos
e discordância quanto a alguma alteração sociais marginalizados que não dominam
proposta e co-construção de maneira que a escrita. Por seu próprio estado de cons-
as alterações se articulavam e se comple- trução, é um conceito que enfrenta dificul-
mentavam. Os dados mostraram que mui- dades em sua definição. De acordo com
tas das ações de revisão ocorriam ao nível Kleiman (1995), tal conceito começou a ser
do planejamento da escrita e que tais alte- utilizado por pesquisadores com o objeti-
rações, no entanto, não se traduziam efeti- vo de diferenciar estudos sobre o impacto
vamente em alterações feitas sobre o texto social da escrita dos estudos em alfabeti-
em construção. Mapear, apresentar e dis- zação, que se ligavam quase que esponta-
cutir esses estudos permitem compreender neamente à escolarização e ao desenvolvi-
os diferentes processos cognitivos envolvi- mento de competências individuais. Diante

453
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dessa preocupação com o impacto social Gostaria que você me desse o portador X;
da escrita e das práticas sociais em que (2) Como você sabe que este é o portador
ela é central, os estudos em Letramento X?; (3) O que você acha que tem escrito no
desligam-se do individual e centram-se portador X? e (4). Pra que a gente usa o
no social, investigando não apenas quem portador X?. Com isso, obteve-se 2800 res-
é alfabetizado, mas todos os sujeitos que postas para o grupo total de participantes.
de certa forma se engajam em atividades Assim, focalizou-se o conhecimento dos
de escrita, mesmo que dominem ou não as alunos sobre a identificação do portador,
habilidades de leitura e escrita. O conceito suas características, seu conteúdo, usos e
de Letramento, portanto, focaliza os aspec- funções. Inicialmente, o grupo de pesquisa
tos sócio-históricos que são vistos como estudou a bibliografia referente à temática
intrínsecos à aquisição da escrita. Ao abor- da pesquisa. A seguir, o projeto foi subme-
dar-se a compreensão da criança sobre a tido ao Comitê de Ética em Pesquisa com
funcionalidade da língua escrita, é ressal- Seres Humanos. Sendo assinado o TCLE,
tada a importância do texto enquanto uni- realizaram-se entrevistas com os alunos
dade mínima de sentido lingüístico. O uso participantes. A análise dos resultados foi
da linguagem escrita em sociedade se faz realizada por meio de categorizações das
prioritariamente pelo texto. Dessa forma, repostas em níveis hierárquicos, os quais
foi investigado o nível de Letramento dos foram posteriormente avaliados estatisti-
alunos em relação aos portadores de texto camente (análise de variância). As análises
– objetos para serem lidos ou objetos que foram feitas com base em estudo de Mo-
carreguem um texto impresso (jornal, re- reira (1992). Quanto à identificação dos
ceita de remédio etc.) (Moreira, 1992). O portadores de texto, notou-se uma maior
conhecimento sobre portadores textuais freqüência de respostas concentradas no
será aqui tomado como um indicador de Nível III (47,4%), p<0,001, ou seja, a maior
Letramento. O presente estudo nasceu da parte do alunado em questão consegue
preocupação crescente com a qualidade identificar corretamente os portadores,
do ensino da linguagem escrita no que se tendo como critérios as características ine-
refere ao fenômeno do Letramento. Diante rentes aos mesmos. Já quanto ao conteú-
desse cenário, objetivou-se identificar o ní- do dos portadores, notou-se que a maioria
vel de letramento presente em estudantes dos participantes encontra-se no Nível I
do primeiro ano do ensino fundamental de (50,9 %), p<0,001, ou seja, os alunos erram
escolas públicas do Vale do São Francisco. ou nada dizem em relação às previsões
Participaram do estudo 50 crianças de bai- quanto ao conteúdo dos portadores de
xa renda, de 6 a 7 anos, todas alunas do texto apresentados. Quanto à função do
primeiro ano do Ensino Fundamental I de portador, pode-se dizer que a maioria dos
Escolas Públicas Municipais da região do participantes encontra-se no Nível II (58,3
Vale do São Francisco. Foram aplicadas ta- %), p<0,001, ou seja, as crianças atribuem
refas, em entrevistas individuais, que ava- função ao portador levando em considera-
liaram o conhecimento sobre portadores ção situações particulares de contatos com
de textos dos alunos. Eram apresentados o objeto ou considerando que a função dos
14 portadores de texto separadamente, portadores possui um fim em si mesma,
cada um gerando quatro perguntas: (1) mas não identificam uma função comuni-

454
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cativo social dos mesmos. Os dados trazi- Já há algum tempo as discussões sobre alfa-
dos revelaram que apesar dos estudantes betização ocupam um significativo espaço
investigados conseguirem fazer a identifi- no meio educacional. Este fato provavel-
cação dos portadores de textos, mostraram mente deve-se à dificuldade que ainda en-
ainda não ter desenvolvido conhecimentos frentamos em alfabetizar os nossos alunos,
sobre a função comunicativo-social da es- o que se torna um grande desafio para to-
crita, assim como sobre o conteúdo que dos os que lidam com este tema. Se antes
os portadores possuem. Portanto, pode-se nos preocupávamos com a grande quanti-
questionar: qual o sentido que tais crian- dade de alunos fora da escola, hoje vivemos
ças estão produzindo sobre portadores de o que alguns pesquisadores têm chamado
texto? Os dados apontam que os mesmos de “exclusão de dentro das escolas”, fenô-
consistem em objetos extrínsecos, porém meno que caracterizaria a incapacidade
não são utilizados de fato como objetos das escolas em alfabetizar uma boa parte
comunicativos no cotidiano das crianças. dos alunos que a procuram. Reconhece-
Sendo assim, destaca-se a importância de mos que, em grande parte, a melhoria da
tornar a experiência com portadores de alfabetização dos alunos depende de polí-
textos mais significativa para as crianças, ticas públicas que efetivem investimentos
o que pode ser realizado em várias agen- nas escolas e na formação de seus profis-
cias de Letramento, inclusive na escola, sionais. Mas sabemos também que muito
considerada como uma das agências de vem sendo realizado por professoras com-
letramento. As dimensões da escrita ultra- prometidas com a sua função de ensinar.
passam as barreiras da relação grafofônica, Concordamos com Bressoux (2003) quando
sendo preciso pensar em outras dimen- afirma que se há professores que elevam
seus alunos a maior nível de sucesso do
sões tais como: a compreensão de textos,
que outros, investigá-los e compartilhar as
as habilidades cognitivas e metacognitivas
suas práticas seria uma possibilidade de
e os conhecimentos sobre textos envolvi-
melhorar o sucesso de muitos alunos, em
dos neste processo, propondo novas estra-
outras escolas. Trabalhamos, desse modo,
tégias de ensino-aprendizagem.
com o conceito de professora-referência28.
Esta seria uma professora reconhecida na
Palavras-chave: alfabetização; letramento;
comunidade escolar por sua capacidade
portadores de textos .
em alfabetizar os seus alunos. Dominaria
Contato: Kaline Jurema Jambeiro Rocha, a metodologia de alfabetização com a qual
UNIVASF, rocha.kaline@yahoo.com se propunha a trabalhar, teria uma boa re-
lação com os seus alunos, conhecendo-os
e respeitando-os, reconhecendo ainda as
LT02-936 - AS PRÁTICAS COTIDIANAS
suas necessidades de aprendizagem. Se-
DE ALFABETIZAÇÃO: O QUE FAZEM AS
ria, enfim, uma professora comprometida
PROFESSORAS-REFERÊNCIA EM DUQUE
com a aprendizagem do código escrito dos
DE CAXIAS?
seus alunos e eficiente na tarefa. Além de
Janete Teixeira de Lyra - PUC/Rio
janetelyra@ig.com.br 28
A escolha do gênero feminino deve-se à constatação de
Zena Eisenberg - PUC/Rio que os professores que alfabetizam são, em sua maioria,
zwe@puc-rio.br mulheres.

455
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

componentes importantes à sala de aula, sujeito com as práticas sociais de letramen-


como gestão do tempo e conhecimento do to, que se iniciam muito antes de as crian-
que os alunos sabem, as práticas de ensino ças entrarem para a escola. Entretanto, a
possuem um grande poder de influência no autor alerta para que não descuidemos do
sucesso escolar dos alunos. Mas, existem ensino sistemático da relação letra-som e
de fato práticas que melhor alfabetizam? o ensino da notação alfabética. Segue daí
Se existem, quais são? Nos últimos anos, nossa pergunta de pesquisa: e as professo-
pesquisas têm nos permitido acumular ras-referência? Como conjugam as práticas
um conjunto de conhecimentos que nos de alfabetização e as de letramento? Propo-
informam sobre o que vem a se configurar mos que investigar as práticas do cotidiano
como boas práticas de ensino. Em se tra- de tais professoras pode nos dar respostas
tando de alfabetização, os estudos sobre a sobre como organizam o ensino para que
psicogênese da língua escrita e os do cam- seus alunos desenvolvam as habilidades de
po do letramento trouxeram importantes leitura e escrita. Como procedimento me-
contribuições para a área (Ferreiro & Tebe- todológico, pretendemos utilizar a obser-
rosky,1889; Goulart 2006 & Soares, 2004, vação sistemática em sala ao longo de um
2008). Desde a circulação, em meados dos ano. Discutiremos aqui os resultados de um
anos 80, de estudos que nos informavam estudo preliminar com cinco orientadoras
sobre as diferentes hipóteses que as crian- pedagógicas do município de Duque de Ca-
ças constroem sobre a escrita, (Ferreiro & xias. Entregamos um questionário para elas
Teberosky, 1889) passamos a compreender completarem no qual pedimos para identi-
que a aprendizagem do sistema alfabéti- ficarem professoras-referência em alfabeti-
co é de natureza conceitual, o que a torna zação na sua escola e relacionarem carac-
muito mais complexa para o alfabetizando. terísticas que julgam relevantes para sua
Ao contrário do que se pensava, a criança constituição como referência. Perguntamos
desde cedo elabora ideias sobre o que a a elas: “Que práticas da rotina de professo-
escrita nota. A compreensão dessas ideias ras alfabetizadoras você considera que con-
das crianças sobre a língua escrita muda tribuem para a alfabetização dos alunos?”.
radicalmente a postura do professor frente Os resultados preliminares indicam que
às suas tentativas de produção. A criança algumas práticas são consideradas mais im-
passa a ser considerada um sujeito ativo portantes que outras. As que se destacaram
e, o que antes era erro de escrita, passa a em relação ao letramento foram: a leitura
fazer parte do processo de desenvolvimen- diária de diferentes gêneros, os comentá-
to individual. Nas últimas duas décadas, os rios sobre essas leituras, as atividades de
estudos sobre letramento têm contribuído produção coletiva de textos, recontos, em-
para pensarmos práticas alfabetizadoras préstimos de livros e propostas para que os
significativas que promovam a inserção do alunos leiam, mesmo que não saibam ler.
sujeito no mundo da leitura e escrita. Muito Em relação ao ensino da notação alfabéti-
além de considerar a alfabetização como a ca, vimos um número menor de citações
simples aprendizagem da correspondência e de atividades: escrita com letras móveis,
fonográfica propõe-se que esta aprendiza- atividades com nomes dos alunos, bingo de
gem ocorra dentro de uma prática ampla letras, atividades diagnósticas de escritas.
de leitura e escrita. Para Morais (2006a), a Percebemos uma prevalência de atividades
alfabetização deve ocorrer na interação do de letramento em detrimento das de alfa-

456
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

betização, o que corrobora as críticas que Existem relatos de crianças que nas fases
Soares (2004) faz ao ensino da escrita nos iniciais da escrita utilizam estratégias refe-
últimos anos, fenômeno chamado por ela renciais ao invés de estratégias fonológicas
de “desinvenção da alfabetização”. Entre- (Ferreiro & Teberosky, 1982). Por exemplo,
tanto, as professoras foram escolhidas jus- crianças utilizam mais letras para escrever a
tamente por seus resultados satisfatórios. palavra ‘urso’ do que para escrever a pala-
Além disto, as orientadoras pedagógicas vra ‘mosquito’ porque elas acreditam que
compreendem que outros fatores, além do o número de letras deve refletir o tamanho
conhecimento técnico do professor contri- do objeto ao invés da duração da pronúncia
buem para a alfabetização dos alunos, sen- da palavra. Essas estratégias são algumas
do esses: o comprometimento profissional, vezes chamadas de estratégias referenciais
o respeito aos alunos, a abertura a novas ou estratégias semanticas. No entanto, a
aprendizagens, a afetividade e a preocupa- evidência para essas estratégias referen-
ção com a aprendizagem dos alunos. Em re- ciais é baseada em grande parte apenas
lação a estes aspectos acreditamos que se em relatos e essa estratégia ainda não foi
faz necessária uma investigação mais apro- rigorosamente testada. O presente estudo
fundada, no sentido de compreender como investiga o uso destas estratégias nas
se dão as múltiplas relações presentes no primeiras escritas das crianças. Estudamos
dia-a-dia. “É necessário que a sala de aula 106 crianças americanas de escolas particu-
como objeto de pesquisa seja revelada na lares que tinham o inglês como primeira lín-
sua cotidianidade, na interação professor- gua (idade média de 4 anos e 7 meses). As
aluno para que a “caixa-preta” seja aberta” crianças participaram de tarefas individuais
(Bressoux, 2003, p. 48). No momento es- de leitura, conhecimento dos nomes e sons
tamos organizando um protocolo de ob- das letras e de uma tarefa de leitura. Utili-
servação, com base no conjunto proposto zando um quadro magnético e letras mag-
por Albuquerque, Morais e Ferreira (2008). néticas, as crianças escreveram 24 palavras
Esse conjunto está organizado em catego- com comprimentos diferentes que repre-
rias e estas divididas em subcategorias re- sentavam pequenos objetos (por exem-
lacionadas às atividades de alfabetização plo, bug ´mosca`, mosquito ´mosquito´) ou
desenvolvidas pelas professoras. Em nossa grandes objetos (por exemplo, bear ´urso`,
re-elaboração buscaremos identificar quais dinosaur ´dinossauro`). Nós investigamos
atividades são privilegiadas pelas professo- se as crianças que ainda não eram fonoló-
ras-referência e com que frequência apare- gicas escreveriam as palavras que denotam
cem na rotina das mesmas. objetos maiores com mais letras, ignorando
o comprimento das palavras, e se as crian-
ças fonológicas demonstrariam escritas
LT02-1001 - ESTRATÉGIAS INICIAIS DE seguindo o padrão oposto. Utilizamos um
ESCRITA programa chamado AMPR (Treiman & Kes-
Tatiana Cury Pollo - UFSJ sler, 2004), que avalia as escritas de crian-
tpollo@gmail.com ças nas fases iniciais de escrita, bem como
Rebecca Treiman - WUSTL técnicas de Monte Carlo, para identificar
rtreiman@wustl.edu subgrupos que faziam uso significativo de
Financiamento: NIH letras que eram fonologicamente apropria-

457
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

das ou que não utilizavam letras fonologi- não encontramos nenhuma evidência para
camente apropriadas em suas escritas (56 estratégias de escrita referenciais, mesmo
crianças). Esse último grupo é o grupo de no grupo de crianças que ainda não haviam
interesse nesse trabalho. Como esperado, aprendido a utilizar letras para representar
as crianças que utilizam fonologia em suas sons. A estratégia referencial descrita por
escritas utilizaram mais letras para palavras outros pesquisadores pode não ser repre-
mais longas (p < .001), enquanto o grupo sentativa da forma como a maioria das
que não era fonológico não utilizou (p = crianças não fonológicas escrevem em ex-
.808). No entanto, ao contrário do que se- perimentos controlados.
ria esperado se as crianças utilizassesm es-
tratégias referenciais, nenhum dos grupos Palavras-chave: Alfabetização; escrita;
consistentemente utilizou mais letras para estratégias referenciais.
objetos maiores (p = .237; grupo não fono- Contato: Tatiana Cury Pollo, UFSJ,
lógico). Em um segundo estudo, 35 crianças tpollo@gmail.com
americanas de escolas particulares (idade
média de 4 anos, 3 meses) escreveram pala-
vras a mão livre. Palavras que representam LT02-1023 - A UTILIZAÇÃO DA ZONA
objetos pequenos e objetos grandes foram DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL NA
escritas em pares para fazer o contraste de AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM ESCRITA
tamanho mais saliente. As palavras que re- Natalia Duarte - EAPE/SEDF/GDF
presentavam objetos pequenos ou grandes nataliasduarte@gmail.com
eram escritas lado a lado (por exemplo,
“Nós agora vamos falar de coisas do ocea- O presente trabalho destaca o desafio de
no. Nós vamos escrever duas coisas. Escre- assegurar o direito social de aprender a to-
va fish ‘peixe’ aqui. (Esperar a criança termi- dos os alunos e expõe indicadores das difi-
nar). Agora escreva ship ‘navio’ aqui deste culdades na aquisição da linguagem escrita,
lado”. Nem as 18 crianças que ainda não especialmente dos grupos mais vulneráveis
utilizavam fonologia em suas escritas pro- da população. Apresenta referencial teó-
duziram escritas maiores para palavras que rico que analisa as dificuldades da escola
representam objetos maiores. No entando, em socializar a aquisição da língua escrita,
quando pedimos que as crianças fizessem a em especial Mortatti (2006), Soares (2004)
mesma tarefa mas que, ao invés de escre- e Grossi (1995). Registra a presença dessa
ver, elas desenhassem os referentes, elas dificuldade nos últimos 100 anos e apre-
produziram figuras maiores para palavras senta a operacionalização do conceito de
que representavam objetos maiores. Isso Zona de Desenvolvimento Proximal – ZDP
demonstra que as crianças conseguiam sim no trabalho pedagógico para aquisição da
entender as diferenças de tamanho dos linguagem escrita. Destaca a ZDP como
objetos, mas escolheram não as represen- conceito Vygotskiano, apresentado em
tar em suas escritas. Ao final desse estudo Pensamento e Linguagem como aquilo que
nós entrevistamos as crianças e analisamos “a criança é capaz de fazer hoje em coo-
qualitativamente suas respostas e também peração” (Vygotsky, 1993, p.89). Destaca
não obtivemos nenhuma indicação de pos- a ZDP como uma janela para a aprendiza-
síveis estratégias referenciais. Para concluir, gem (FINO, 2001) a ser utilizada na escola e

458
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

na organização do trabalho pedagógico do gundo Vergnaud (2004), as conseqüências


professor: o bom ensino “caminha à frente práticas do conceito de ZDP são muito im-
do desenvolvimento, servindo-lhe de guia; portantes. “De uma maneira próxima, nas
deve voltar-se não tanto às funções já ma- escolas comuns, o ensino orientado para
duras, mas principalmente para as funções um estádio já adquirido pela criança não é
em amadurecimento” Vygotsky, 1993, p. muito produtivo” (idem, 2004, p. 31). O en-
89). Apresenta a psicogênese da lecto-es- sino convencional volta-se para aquilo que
crita (Ferreiro & Teberosky, 1991) como o a criança já consegue fazer ao invés de se
reconhecimento e sistematização das hipó- voltar para aquilo que ainda não sabe e por
teses que os alfabetizandos constroem no isso pode vir a saber (PAIN, 1999). A possi-
percurso da aprendizagem da leitura e da bilidade, maior ou menor, que uma criança
escrita e como esse construto teórico pos- tem de passar do que ela sabe fazer sozinha
sibilita a operacionalização da ZDP. Destaca ao que ela sabe fazer com a colaboração de
como a psicogênese da lecto-escrita repre- alguém é “precisamente o sintoma mais
senta a caminhada no processo de aquisi- notável que caracteriza a dinâmica do seu
ção da escrita explicando os esquemas de desenvolvimento e o êxito de sua ativida-
pensamento e performances dos níveis de intelectual. Coincide inteiramente com
Pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e a sua Zona de Desenvolvimento Proximal”
Ortográfico. Apresenta a Psicogênese for- (Vygotsky citado em Vergnaud, 2004, p. 36).
mulada por Grossi (1995) destacando a Para apurar as aprendizagens dos alunos e
procedência do desmembramento do nível alcançar precisão didática nas atividades
PS em PS1 e PS2; a extinção do nível silábi- planejadas, o artigo apresenta explicação
co-alfabético e o desmembramento do ní- de Vygotsky (1993) que permite entender
vel ortográfico em níveis Alfabetizado1, 2 e que aquilo que a criança pode fazer hoje
3. Apresenta a fundamentação teórica para com a ajuda de um mediador, poderá exe-
a aproximação do conceito de psicogênese cutar sozinha amanhã. A partir daí, apre-
piagetiano (PIAGET, 1972) e ZDP vygotskia- senta evidências e estratégias do ensino
no empregando Vergnaud (2003) para vali- que deixam de focar o que o aluno já sabe
dar o emprego conjunto desses dois teóri- para focar aquilo que ele ainda não sabe
cos ressaltando que “há algumas idéias que e por isso pode vir a saber - se provocado
podemos tomar de Piaget e de Vygotsky, na para isso. Destaca que na alfabetização a
sua convergência e na sua complementari- Zona Real é a forma como o aluno escreve
dade” (Vergnaud, 2003, p. 24). Segue apre- espontaneamente, Zona Potencial é aquilo
sentando a utilização pedagógica da ZDP na que espera-se que o aluno aprenda e a ZDP
aquisição da linguagem escrita a partir da é a escrita que o aluno consegue fazer com
idéia de esquema de pensamento, desta- a ajuda de um colega, de um jogo, de um
cando a contribuição da análise de Vygotsky cartão ou mesmo da professora. Assim, o
(1993): a escola tradicional não ensinava trabalho finaliza-se com a apresentação do
“na medida em que se oferecia à criança quadro abaixo, a partir de Duarte (2007),
problemas que ela conseguia resolver sozi- onde se explicita a Zona Real do aluno, rela-
nha, o método foi incapaz de utilizar a ZDP cionando-a com os níveis psicogenéticos e
e dirigir a criança para aquilo que ainda não a ZDP, caracterizando-a como o nível psico-
era capaz de fazer” (1993, p. 90). Ainda se- genético subseqüente.

459
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ZONA REAL ZONA DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL


Nível
(como o aluno escreve espontaneamente) (o que deve ser trabalhado com o aluno)

Escreve desenhando. Escrever com símbolos. Perceber as


PS1 letras. Relacionar a escrita à fala. Produzir
frases e textos.

Escreve com símbolos, mas sem Vincular a escrita à fala. Estabelecer


PS2 relacionar a escrita à fala. a relação letra/som. Produzir frases e
textos.

Quebrar a unidade sonora da sílaba,


Escreve uma letra para cada sílaba.
desdobrando-a nos fonemas das letras.
S Fortalecer a relação letra/som. Propiciar
a leitura de palavras (dissílabas simples) e
pequenas frases. Produzir frases e textos.

“Engole” letras. Não tem estabilidade na Perceber a sílaba como consoante/vogal.


representação da sílaba. Propiciar a leitura de palavras (dissílabas
A
simples) e pequenas frases. Produzir
frases e textos.

Representa a sílaba rigidamente por Flexibilizar a sílaba (como consoante/


consoante/vogal. Não segmenta vogal; consoante/ consoante/vogal;
Alf1 corretamente as palavras em uma frase. vogal/ consoante). Segmentar palavras.
Propiciar a leitura de palavras, frases e
pequenos textos. Produzir frases e textos.

Escreve a palavra e não mais a sílaba. Quebrar a relação biunívoca letra/som.


Consegue vincular um som para cada Apresentar formalmente os dígrafos e
Alf2 letra (em uma relação biunívoca). Já as nasalizações. Operar com os sinais de
apresenta segmentação e início de pontuação.
pontuação.

Escreve frases e textos. Flexibiliza a Destacar as consoantes mudas. Estruturar


relação biunívoca letra/som. Já apresenta as idéias de um texto expressas em
paragrafação e pontuação. parágrafos (início, meio e fim) analisar
Alf3
as idéias do texto (uma idéia vinculada a
outra... com conclusão coerente). Operar
a lógica da pontuação.

460
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-1187 - SEMELHANÇAS E em programas de alfabetização tardia na


DIFERENÇAS NA AQUISIÇÃO DA LEITURA cidade de Belo Horizonte, MG. O estudo
E DA ESCRITA POR CRIANÇAS E JOVENS E também incluiu 61 crianças (39 meninas
ADULTOS e 22 meninos) com desenvolvimento tí-
Marcela Fulanete Corrêa - UNIVASF pico, individualmente emparelhadas aos
mfulanete@gmail.com adultos em função da habilidade de leitu-
Cláudia Cardoso-Martins - UFMG ra de palavras. Sua idade variava entre 6 e
cardosomartins.c@gmail.com 9 anos e todas estavam matriculadas em
classes do 2ª, 3ª e 4ª anos do ensino fun-
Financiamento: CAPES, CNPq, FAPEMIG
damental de uma escola pública localiza-
da na mesma cidade dos adultos. Os par-
O objetivo do presente estudo consistiu
ticipantes foram submetidos a tarefas que
em investigar o processamento fonológico
avaliavam habilidades acadêmicas e de
de jovens e adultos pouco escolarizados
em comparação com o processamento processamento fonológico. As habilidades
fonológico de crianças com a mesma ha- acadêmicas foram mensuradas através
bilidade de leitura. Estudos realizados nos dos subtestes de leitura, escrita e mate-
Estados Unidos e na Espanha sugerem mática do Teste de Desempenho Escolar
que jovens e adultos pouco escolarizados (TDE, Stein, 1994). Tarefas de consciência
apresentam déficits fonológicos, em com- fonológica, memória verbal de trabalho e
paração a crianças com desenvolvimento nomeação seriada rápida foram utilizadas
típico emparelhadas aos adultos em fun- para aferir o processamento fonológico. A
ção da habilidade de leitura. Por exemplo, consciência fonológica foi avaliada através
os jovens e adultos que participaram dos de tarefas de detecção de rima e fonema.
estudos de Read e Ruyter (1985), Green- Nessas tarefas, os participantes eram soli-
berg, Ehri e Perin (1997), Thompkins e citados a indicar, entre três palavras enun-
Binder (2003) e Jiménez e Venegas (2004) ciadas pelo examinador, as duas que rima-
apresentaram um desempenho signifi- vam ou que começavam com o mesmo
cativamente inferior ao das crianças em som. Os subtestes de repetição de dígitos
tarefas que avaliavam a consciência fono- (ordem direta e ordem inversa) das esca-
lógica, especificamente, a habilidade de las de inteligência Weschler para crianças
segmentar e subtrair os sons da fala. Não e adultos foram utilizados para avaliar a
é certo, contudo, que esses resultados memória fonológica e o executivo central,
possam ser generalizados para jovens e respectivamente. Finalmente, a tarefa de
adultos brasileiros com pouca escolariza- Denckla e Rudel (1976) foi utilizada para
ção. Como Oliveira (1999) destaca, o bai- mensurar a habilidade de recuperar códi-
xo nível de escolarização de grande parte gos fonológicos na memória de trabalho.
da população jovem e adulta brasileira é, Nesta tarefa, os participantes eram solici-
em geral, resultado de condições econô- tados a nomear tão rápido e corretamen-
micas e sociais adversas e não de dificul- te, quanto possível, séries de estímulos
dades de aprendizagem. Participaram do visuais familiares, especificamente, cores,
presente estudo 61 jovens e adultos (49 objetos, números e letras. Ao contrário
mulheres e 12 homens) com idade entre do que tem sido apontado na literatu-
16 e 80 anos. Todos estavam matriculados ra, nenhuma diferença entre os adultos

461
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e as crianças foi encontrada nas tarefas dos adultos inscritos nesses programas
de consciência fonológica. Além disso, os possa impor alguma restrição à sua alfa-
adultos apresentaram um desempenho betização. Por exemplo, não encontramos
relativamente melhor do que as crianças uma relação entre a idade cronológica, as
nas medidas de nomeação seriada rápida, habilidades acadêmicas e as habilidades
embora apenas as diferenças envolvendo de processamento fonológico dos jovens
as medidas de nomeação de objetos e dí- e adultos que participaram deste estudo.
gitos tenham atingido significância estatís- Nossos resultados sugerem, portanto, que
tica. Os dois grupos tampouco diferiram o fracasso de programas de alfabetização
entre si na tarefa de repetição de dígitos tardia está provavelmente relacionado a
na ordem direta. No subteste de escrita do variáveis exógenas aos participantes. Es-
TDE e na tarefa de repetição de dígitos na tudos adicionais são necessários para es-
ordem inversa, as crianças se sobressaíram clarecer a natureza dessas variáveis.
aos adultos, ao passo que no subteste de
matemática os adultos apresentaram um Palavras-chave: Alfabetização de adultos;
desempenho significativamente superior crianças; processamento fonológico.
ao das crianças. Há evidência de que pro- Contato: Marcela Fulanete Corrêa, UNIVASF,
gramas de alfabetização tardia raramente mfulanete@gmail.com
são bem sucedidos (Abadzi, 1995; Di Pier-
ro, 2010). Semelhantemente ao que tem
sido relatado na literatura especializada, CO 49 - LT03
os jovens e adultos que participaram do
presente estudo apresentaram pouco pro- Valores
gresso ao longo do programa de alfabeti-
zação. Dos 61 jovens e adultos avaliados
no início do estudo, 33 foram novamente LT03-1277 - COMO AS MÃES DIZEM
submetidos às tarefas de leitura e escrita CONVERSAR COM SEUS FILHOS SOBRE
do TDE no final do programa. Compara- SENTIMENTOS EMPÁTICOS
ções entre o seu desempenho no início Natália Lins Pequeno - UFPB
e no final do ano revelaram um aumento natalia_lins@hotmail.com
significativo, porém muito pequeno, no Cleonice Camino - UFPB
número de palavras lidas corretamente cleocamino@yahoo.com.br
[M=44,79; DP=19,56 para a primeira oca- Pablo Queiroz - UFPB
sião, M=48,21; DP=18,01 para a segunda pablooliver5@gmail.com
ocasião, t(32)=-2,96, p=0,006]. Além dis- Julian Bruno Santos - UFPB
so, nenhum progresso foi encontrado na ledjulian@hotmail.com
tarefa de escrita. A julgar pelos nossos re- Lívia Braga - UFPB
sultados, é pouco provável que o fracasso liviabsc@hotmail.com
de programas de alfabetização tardia no
Brasil possa ser atribuído a dificuldades A empatia é uma das habilidades mais
fonológicas apresentadas pelos seus par- valorizadas por todas as pessoas que cul-
ticipantes. Tampouco encontramos qual- tivam valores humanitários, sendo impor-
quer evidência de que a idade avançada tante para o desenvolvimento do julga-

462
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mento moral e para o engajamento em gravadas com autorização das participan-


comportamentos pró-sociais (Hoffman, tes e foram transcritas. Em seguida, foram
1975a, 1978, 1990, 2003). A empatia, categorizadas utilizando-se a Análise de
em um nível mais desenvolvido, segundo Conteúdo Semântico (Bardin, 1977). Após
Hoffman (1975a, 2003), é compreendida esta análise, os dados foram submetidos
como uma resposta afetiva voltada mais a uma análise das freqüências por meio
para a situação de outra pessoa do que do Qui-quadrado. Em relação aos resul-
para a própria. Considera-se que os pro- tados, foi possível organizar as respostas
cedimentos que os pais adotam na educa- em duas grandes categorias: recomenda-
ção são cruciais para que os sentimentos ção – respostas nas quais as mães diziam
empáticos dos filhos sejam fortalecidos ter mencionado ao filho como deveria se
ou enfraquecidos (Hofmman & Saltzstein, comportar ao se deparar com umas das
1967; Hoffman, 1975b). No momento em situações envolvendo vítima e/ou agres-
que os pais verbalizam sentimentos e ex- sor – e explicação – respostas nas quais
plicam a situação da vítima chamando a as mães diziam explicar a situação, dar
atenção para o seu sofrimento, eles esti- exemplos, etc, sem mencionar diretamen-
mulam a tendência empática da criança, te como o filho deveria se comportar. O
fazendo com que a experiência da criança teste estatístico para duas amostras inde-
de angústia empática – não há motivação pendentes identificou diferença significa-
necessária para procurar amenizar o senti- tiva entre as freqüências de respostas em
mento da vítima por meio de ajuda – tran- relação às situações em função das duas
site para a angústia simpática – sofrimen- formas de verbalização (X2(3)=38,171
to que estimula uma forma de motivação p≤0,05). As situações que se destacaram
para buscar a resolução de conflitos (Ho- foram Pessoa em sofrimento, com uma
ffman, 2003). Quando os pais assumem freqüência elevada de recomendações, e
esta postura disciplinar, estão utilizando a Pessoa passando por sofrimento não me-
técnica indutiva. Diante da compreensão recido, com uma freqüência elevada de
da importância da habilidade empática explicações. A fim de compreender quais
e do papel dos pais para o seu fortaleci- as recomendações que as mães diziam
mento, o presente estudo teve como ob- verbalizar aos seus filhos, foi necessário
jetivo verificar como as mães dizem con- realizar uma análise mais aprofundada,
versar com seus filhos a respeito dos seus construindo, assim, subcategorias em re-
sentimentos empáticos. Participaram da lação a cada situação. Em todas as situa-
pesquisa 100 mães de crianças e adoles- ções estudadas, as subcategorias de di-
centes, da cidade de João Pessoa-PB. As ferenciaram significativamente (p<0,05).
participantes responderam um roteiro de A seguir serão apresentadas as subcate-
entrevista, onde puderam falar a respeito gorias que obtiveram maiores freqüên-
do que verbalizavam aos seus filhos em re- cias. Em relação à situação que envolvia
lação a diferentes situações presenciadas: uma pessoa em sofrimento, destacou-se
uma pessoa em sofrimento, uma pessoa Ajudar o próximo/Solidariedade (30,00%
agredindo outra, uma pessoa necessitada das respostas). Na situação que envolvia
e uma pessoa passando por um sofrimen- uma agressão, destacou-se Não maltratar
to não merecido. As entrevistas foram (34,31% das respostas). No que se refere

463
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

à situação que envolvia uma pessoa ne- sofrimentos nelas e principalmente neles
cessitada, destacou-se Ajudar o próximo/ próprios. É difícil compreender como este
Solidariedade (54,21% das respostas). Na último tipo recomendação promoveria
última situação estudada, pessoa pas- uma transformação de afetos – da angús-
sando por um sofrimento não merecido, tia empática para angústia simpática – e,
destacaram-se Ser generoso e Não fazer não acorrendo esta transformação, o indi-
nada errado (21,84% e 20,69% das res- víduo não desenvolveria a sua capacidade
postas, respectivamente). O fato das mães empática. Salienta-se que, segundo Hoff-
terem utilizado mais recomendações man (1975a,1982,1990), sem essa transi-
do que explicações mostra que elas não ção não haveria a possibilidade do desen-
deixaram claro para os seus filho porque volvimento de motivações altruístas.
determinados sentimentos podem ser ex-
perimentados e, neste sentido, não contri-
buem como deveriam para o processo de LT03-1416 - ENSINO DO TEMA
internalização moral. O fato do número de TRANSVERSAL ÉTICA NO ENSINO MÉDIO
explicações ter ultrapassado o das reco-
Nelson Pedro-Silva - UNESP
mendações na situação que envolvia uma
nelsonp1@terra.com.br
pessoa passando por um sofrimento não
Camila Mendes Prado - UNESP
merecido pode ter ocorrido porque essa
camilamprado@hotmail.com
situação suscita muitos sentimentos no
Camila Rippi Moreno - UNESP
observador e maiores descentrações cog-
cah.moreno@gmail.com
nitivas (Hoffman,1990,2003). As recomen-
Fernanda Estevaletto Macedo - UNESP
dações das mães para motivarem os filhos
fernanda.estevaletto@hotmail.com
a ajudar o próximo e a ser solidários com
a vítima demonstraram uma mobilização Financiamento: UNESP
afetiva das participantes para indicar aos
filhos como estes devem aliviar os senti- Nas últimas décadas, aumentou as quei-
mentos experimentados. A fala das mães xas dos docentes no tocante à violência
para os filhos não maltratarem o outro ao escolar. Ao pesquisar 13 mil alunos de
se referirem a uma situação de uma pes- escolas públicas brasileiras, por exemplo,
soa agredindo outra aparentemente de- Abramovay e colaboradores (2006) verifi-
monstra uma preocupação com o outro, caram que cerca de 50% dos docentes já
mas, considera-se que nesta verbalização tinham sido vítimas de violência discente.
há também uma preocupação nas conse- Em outra pesquisa, estudiosos concluíram
qüências em que um ato agressivo pode que 40% dos docentes consideraram as
trazer aos filhos das participantes. Julga- gangues de jovens e as drogas os maiores
-se que a recomendação dada pelas mães problemas escolares; 50% dos alunos têm
aos filhos para serem generosos ao verem o aprendizado prejudicado pela violência
uma pessoa passando por sofrimento escolar e metade dos professores pau-
não merecido incentivaria a expressão da listanos já relatou ameaças de agressão.
angústia, mas a segunda recomendação Para Fante (2005, p.9-10), a violência es-
dada para não fazerem nada errado pre- colar refere-se a “um conjunto de atitu-
veniria o filho para que este não causasse des agressivas, intencionais e repetitivas

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que ocorrem sem motivação evidente alunos e sua influência na violência esco-
[...], adotado por um ou mais indivíduos lar; pouca importância é dada à discussão
contra outro(s), causando dor, angústia e da moral brasileira e o trabalho sobre a
sofrimento”. Produziu, na maioria de suas ética é considerado “deficiente”. O obje-
vítimas, estresse, depressão, baixa auto- tivo principal da pesquisa foi desenvolver
estima, reduzida capacidade de autoafir- procedimentos para o ensino da ética.
mação e de autoexpressão, prejudicando Secundários: discutir, tendo como pers-
o processo de ensino-aprendizagem e de pectiva a psicologia moral e ética, temas
socialização. Para Pedro-Silva (2011), tal relacionados ao interesse dos adolescen-
fenômeno é produto de personalidades tes; oferecer espaço de escuta analítica
imaturas (elas só pensam em si mesmas (Kupfer, 2004); contribuir para a reflexão
e buscam a satisfação imediata), passando sobre a moral vigente; auxiliar no desen-
as diferenças a serem vistas como obje- volvimento ético; contribuir para a melho-
tos a serem destruídos. Há outras causas ria do aprendizado escolar e incentivar os
e explicações para o bullying. Entre eles: membros da escola à concretização dos
divulgação distorcida do saber psicológi- valores básicos previstos na Lei. Participa-
co; valorização de uma sociedade centra- ram da pesquisa 26 alunos do Ensino Mé-
da nos desejos infanto-juvenis (La Taille, dio entre 15 e 17 anos, ambos os sexos,
1998a); situação política e econômica do nível sócio-econômico D, matriculados
país (Costa, 1989; Silva, 2004); o fato de a numa escola pública paulistana. Foram
escola não ser mais vista como templo do realizadas 20 oficinas, realizadas sema-
saber (Bruckner, 1997); desvalorização do nalmente (duração de 50’), com dois exe-
conhecimento (La Taille, 2006); ausência cutores e oito alunos. Nestas, abordamos
da vergonha por apresentar condutas inci- vários temas (diversidade, escola, grupos
vilizadas (La Taille, 1996) e dificuldade dos urbanos, beleza, preconceito, sexualidade
docentes em lidarem com as novas políti- e bullying). Tais assuntos foram propostos
cas educacionais. Não se pode desprezar pelo pesquisador e/ou pelos próprios su-
que os alunos estão agindo segundo for- jeitos. Levantamos os temas de interesse
mas de glória (beleza, status social e finan- dos sujeitos e as representações acerca de
ceiro), são consumistas, individualistas e tais assuntos; depois, estabelecemos vín-
hedonistas (La Taille, 2009). Há também culo e apresentamos conteúdo sistemati-
os estudos de Costa (1988, 1989, 1999). zado com o fim de informá-los e, principal-
Estes apontam que, diante da impotência mente, de que tais saberes funcionassem
e a impossibilidade de mudança do mo- como elementos “disparadores” de novas
delo social instituído, além de serem mal- discussões. Exemplo: a “normalidade” era
-socializados e frágeis psiquicamente, os citada e compreendida como sinônimo
jovens ativam mecanismos narcisistas, a de “natural”. Buscamos demonstrar, pelo
ponto de desconsiderarem valores morais conceito de curva normal (Estatística), que
e a serem descrentes quanto à lei na solu- a normalidade é uma construção (propor-
ção de conflitos. Em síntese: não há con- ção matemática). Portanto, o normal esta-
senso sobre os motivos que estimulam a belecido hoje pode ter sido compreendido
produção de tais fatos; há a ausência de e/ou pode vir a sê-lo em outras ocasiões
estudos científicos sobre os valores dos como anormal. Obtidas as informações,

465
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

as categorizamos, tendo por parâmetro os to estado persecutório (eles acreditavam


objetivos do estudo, a teoria psicológica que as pessoas os viam como diferentes).
das virtudes (Piaget, 1932/1994; La Taille, Nesse sentido, as intervenções exerceram
2002, 2006, 2009; Pedro-Silva, 2006). Com papel terapêutico; Relação com a esco-
isso, analisamos as concepções dos sujei- la: Um dos sujeitos afirmou que, devido
tos sobre as temáticas trabalhadas e os às oficinas, aproximou-se daqueles com
agrupamos em cinco categorias: bullying; os quais tinha diferenças, aprendendo
orientação sexual, padrões de beleza; aná- a respeitá-los. Afinal, as pessoas não se
lise da escola e das oficinas. Bullying: Con- resumem a certos caracteres, como a
sideraram uma prática condenável e dano- vestimenta. Informou-nos, ainda, que ele
sa. Eles, inclusive, deram subsídios à ideia superou certo quadro de xenofobia. Para
de que quem já fora objeto do bullying ele, não é necessário fazer tempestade só
sabe dos seus efeitos negativos; logo, to- porque o outro não pensa e age de manei-
dos deveriam colocar-se no lugar das ví- ra igual. Ao ampliar as diferenças, ampliou
timas. Além disso, manifestaram que as seu ciclo de convivência. Outro aspecto foi
oficinas foram importantes para que tra- o fato de eles terem começado a apreciar
balhassem seus preconceitos, assim como valores morais e éticos; evidentemente,
o fato de mostrarem-se incomodados com sem desconsiderar os ligados à glória.
os juízos alheios; Orientação sexual: Jul- Informamos que os valores são fortes de-
garam que a homossexualidade deve ser terminantes das condutas morais, pois o
respeitada. Porém, avaliamos que eles homem faz uma leitura valorativa de si. Tal
consideraram esse “respeito” como obri- valor pode ser moral, ético ou não-moral
gação (dever). Depreendemos, ainda, que (La Taille, 1998b; 2000). Caso os valores
os docentes podem não estar trabalhando morais/éticos sejam centrais, a pessoa
o tema, ou o fazendo de modo ineficaz, a poderá sentir vergonha ou indignidade
ponto de os alunos a transformarem em se cometer ato desonesto, se os da glória
conhecimento; Padrões de beleza: Rea- ocupar esse lugar, esses sentimentos apa-
valiaram sua visão acerca da beleza, além reçam quando não se possuir a beleza de-
de a terem relativizado. Eles basearam- sejada; Avaliação das oficinas: os alunos
-se na ética da reciprocidade, isto é, não fizeram críticas à metodologia, ao dizer
se deve falar nada a respeito da beleza que explicávamos de uma maneira que
pelo motivo de o outro poder fazer uso de eles compreendiam o conteúdo, não os
expediente igual. Vê-se, que, para eles, a deixando desmotivados para o aprendiza-
reciprocidade é defesa (e não sentimen- do. Além disso, as oficinas lhes possibilita-
to de respeito à diversidade). As oficinas ram a reflexão sobre assuntos distantes da
foram válidas, ainda, para a elevação da sua vivência, até então tidos como verda-
autoestima. Apesar disso, eles indicaram des. Em relação aos docentes, tais oficinas
certo conformismo, isto é, uma forma en- auxiliaram os sujeitos a se colocarem no
contrada de lidar com a representação de lugar deles, apesar de ainda terem referi-
si como pessoas esteticamente feias ou di- do reciprocidade como obrigação (dever).
ferentes e, como decorrência, aceitarem- As oficinas contribuíram para a construção
-se e relacionarem-se positivamente com de meios para o ensino da ética no Ensino
tal estado. Reafirmaram, além disso, cer- Médio; possibilitaram a discussão de te-

466
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mas atinentes aos interesses dos alunos, abstração e descentração, totalizando seis
tendo como parâmetro a perspectiva da estágios). Para esses autores, o princípio
psicologia das virtudes e os conteúdos da justiça é o fundamento do juízo moral.
curriculares; funcionaram como espaço Neste ponto, Carol Gilligan (1982) discor-
de escuta analítica; auxiliaram na melho- da, defendendo haver duas orientações
ria das relações escolares e contribuiram para tratar os assuntos morais: a masculi-
para o desenvolvimento da noção de soli- na, centrada nas ideias de justiça, direitos
dariedade e de respeito às diferenças. e deveres (“ética da justiça”); e a femini-
na, centrada nas responsabilidades e cui-
Palavras-chave: ensino médio, psicologia das dados aos outros (“ética do cuidado”). As
virtudes, ética. teorias de Piaget e Kohlberg conduzem à
Contato: Nelson Pedro-Silva, UNESP, ideia de que todas as virtudes estão liga-
nelsonp1@terra.com.br das à justiça. Esta seria, para os filósofos
e estudiosos da moral, a mais importante
das virtudes, e a única necessária. Con-
LT01-699 - VALORES RELIGIOSOS OU tudo, Lima (2000) aponta que, na forma-
VALORES MORAIS: UM ESTUDO SOBRE ção do senso de justiça, estão presentes
A VIRTUDE DA GENEROSIDADE À LUZ DE outras virtudes, inclusive a generosidade.
INTERPRETAÇÕES DE HISTÓRIAS Spinoza, segundo Comte-Sponville (1998),
define a generosidade como dar algo que
Sarah Izbicki - IPUSP faltará para quem está dando, não sendo
sarahizbicki@yahoo.com.br) a atribuição ao outro o que é seu direito
Maria Thereza Costa Coelho de Souza - PUSP (como o faz a justiça). Para Comte-Sponvil-
mtdesouza@usp.br) le (1999), a justiça seria mais racional e a
Financiamento: FAPESP generosidade, mais afetiva. Para Gilligan, a
generosidade é um importante elemento
Os escritos de Piaget sobre a construção para a “ética do cuidado”: cuidar do outro
e a qualidade das crenças infantis, as ca- nos convocaria a dar mais do que lhe é de
racterísticas da evolução cognitiva e a cor- direito, portanto, a sermos generosos. Se-
respondência entre aspectos cognitivos e gundo Vázquez (1998), a religião se carac-
afetivos do desenvolvimento, bem como a teriza pelo sentimento de dependência do
entrevista clínica, por ele proposta (Piaget, homem a Deus e pela garantia de salvação
1926), inspiram pesquisas que fazem uso dos males terrenos, entendendo-se Deus
de contos de fada como instrumento para como verdadeiro sujeito e negando-se a
estudar o desenvolvimento infantil. Para autonomia do homem. Vázquez (1998)
compreender as representações infantis defende que se confirma historicamente
da generosidade em sua relação com os que a religião inclui certa moral, pois uma
aspectos morais, deve-se considerar te- moral de inspiração religiosa sempre exis-
orizações de Piaget (1932) sobre a mora- tiu, com a ressalva de que a moral cristã
lidade (passagem da heteronomia para a estava a serviço dos interesses da classe
autonomia) e Kohlberg (1981) (passagem social dominante. Porém, a moral não se-
de estágios mais concretos e egocêntri- ria originada a partir da religião, mesmo
cos, para níveis de maior complexidade, porque é anterior a ela.

467
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Fowler (1992) foi um dos autores que es- as relacionadas com a ideia da recompen-
tudou o desenvolvimento das valorizações sa (apresentadas somente por meninas)
religiosas e crenças, estabelecendo, para apresentam maior ligação com a questão
cada intervalo de idade – considerando da justiça. Quanto à coerência interna, as
as características do pensamento e os meninas tenderam a dar mais respostas
processos imaginativos correspondentes coerentes (julgam boa a atitude generosa
-, aquilo que denomina “estágios da fé” da personagem e afirmam que fariam o
(fé intuitivo-projetiva, fé mítico-literal, fé mesmo) e, os meninos, a dar mais respos-
sintético-convencional, fé individuativo- tas incoerentes (julgam boa, mas negam
-reflexiva, fé conjuntiva e, por fim, fé uni- que fariam o mesmo). Possivelmente, os
versalizante). meninos mostram que não fariam o mes-
mo, por não apresentarem necessidade
No contexto da literatura apresentada,
buscou-se investigar relações entre va- de preservar relacionamentos – o que
lores religiosos e morais. Como segundo ocorreria caso agissem generosamente -,
objetivo, foi realizada uma comparação confirmando a ideia de Gilligan de que a
entre os dois sexos, com relação à concep- masculinidade se caracteriza pela separa-
ção de generosidade. Para isso, participa- ção e a feminilidade, pelo apego. Quanto
ram da pesquisa 17 meninas e 13 meninos às relações entre valores religiosos e mo-
de uma escola pública, com idades entre rais, mais crianças defenderam a genero-
oito e 11 anos. Utilizou-se o método clíni- sidade por ser boa para os outros e apre-
co piagetiano para estudar as representa- sentaram respostas com religião explícita,
ções relacionadas à generosidade da per- seguidas das que defenderam a genero-
sonagem do conto “As moedas-estrela”, sidade do mesmo modo e apresentaram
dos Irmãos Grimm, segundo um protocolo respostas com ideia de religião implícita
previamente elaborado, a partir do qual, e das que não souberam justificar porque
conforme o participante respondia, novas a generosidade foi boa e apresentaram
perguntas eram feitas, com o intuito de respostas com ideia de religião explícita.
esclarecer pontos obscuros e acompanhar Como as crianças que trouxeram respos-
seu pensamento. As respostas obtidas fo- tas classificadas como “religião implícita”
ram agrupadas de acordo com as seme- apresentaram valores religiosos mais con-
lhanças dos argumentos, por questão do solidados, seria esperado que mais crian-
protocolo, sexo e idade do participante. ças que defenderam a generosidade por
Os dados foram submetidos a uma análise ser boa para os outros apresentassem res-
estatística. Com relação às diferenças en- postas com ideia de religião implícita, pois
contradas entre os sexos quanto à razão a ideia do “fazer o bem” seria um dos va-
pela qual a atitude generosa da perso- lores implícitos nos conteúdos religiosos
nagem foi vista como positiva, houve, na transmitidos diretamente ao indivíduo.
amostra estudada, uma tendência à in- Entretanto, a referência direta do conto
versão das características salientadas por à generosidade da personagem e à figura
Gilligan, pois as respostas relacionadas de Deus pode ter contribuído para as res-
com a ideia do fazer o bem (apresenta- postas mais frequentes. Com referência
das, na amostra, mais por meninos do que ao cruzamento dos dados relativos aos as-
meninas) se referem mais ao cuidado, e pectos religiosos e à coerência interna, a

468
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

frequência maior de crianças com respos- com transformações das estruturas de ra-
tas classificadas como incoerentes e com ciocínios que implicam em uma constru-
religião explícita que a de crianças classifi- ção progressiva. Existem cinco estágios
cadas do mesmo modo em relação aos as- do julgamento religioso, que podem ser
pectos morais, mas com religião implícita, divididos em três níveis de pensamento re-
mostrou o quanto os valores religiosos das ligioso, no qual os dois primeiros estágios
crianças com respostas “explícitas” ainda podem ser considerados elementares, o
não são totalmente consolidados por elas, terceiro estágio intermediário e os dois úl-
enquanto que essa consolidação ocorreu timos estágios avançados. As pessoas que
com maior intensidade nas entrevistadas se encontram no primeiro estágio consi-
que trouxeram respostas “implícitas”. A deram que Deus interfere diretamente na
consolidação do valor religioso, que per- vida das pessoas e no mundo. No segundo
mite com que a criança compreenda seus estágio existe uma reciprocidade entre os
valores implícitos, tornaria o indivíduo seres humanos e Deus, na qual as ações
apto a julgar como positiva a ação da per- humanas podem interferir nos desígnios
sonagem e, também, assumir para si sua divinos. O terceiro estágio é a autonomia
atitude. Os dados parecem corroborar a entre os seres humanos e Deus, é a sepa-
relação positiva existente entre os aspec- ração entre as duas esferas. O quarto es-
tos morais e os aspectos religiosos, refe- tágio é um retorno do divino no mundo e
rentes a valores consolidados da religião. na vida das pessoas, existe uma liberdade
de ação concedida por Deus. No quinto e
Palavras-chave: valores religiosos, valores último estágio existe uma total união entre
morais, interpretações de histórias. Deus e os seres humanos. Para investigar
Contato: Sarah Izbicki, Instituto de Psicologia o julgamento religioso, Oser e Gmunder
da USP, sarahizbicki@yahoo.com.br elaboraram uma entrevista semiestrutu-
rada, contendo dilemas hipotéticos, que
foi traduzida e adaptada para a língua
LT01-966 – VALIDAÇÃO DA ESCALA DO portuguesa pela primeira autora deste tra-
JULGAMENTO RELIGIOSO balho. Essa entrevista é extensa e requer
Aurora Camboim - UFPB bastante tempo e atenção dos entrevista-
auroraclal@yahoo.com.br dos. Para facilitar a aplicação e correção
Cleonice Camino - UFPB na investigação do julgamento religioso,
cleocamino@yahoo.com.br acreditou-se ser conveniente, a partir des-
Financiamento: CAPES sa entrevista e das respostas a ela, cons-
truir uma escala com um formato de teste
O Julgamento religioso é definido por Oser objetivo. A construção e validação da Es-
e Gmünder (1991) como a maneira pela cala do Julgamento Religioso (EJR) cons-
qual as pessoas justificam seu relacio- tituem o objetivo da presente pesquisa.
namento com Deus, principalmente, em Essa pesquisa foi realizada em duas fases.
situações difíceis da vida. Esses autores A primeira teve como objetivo a constru-
elaboraram uma sequência de estágios ção e validação de conteúdo da EJR e a se-
referentes à evolução desse tipo de pen- gunda teve como objetivo a validação de
samento, que ocorre de forma organizada construto, para verificar os coeficientes de

469
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fidedignidade e a consistência interna dos de forma coletiva em sala de aula. Os estu-


itens. A construção da EJR foi baseada nos dantes levaram em média 40 minutos para
estágios do julgamento religioso descritos responder. Para verificar se os itens da es-
por Oser e Gmünder (1991), nos dilemas cala correspondem aos estágios do julga-
hipotéticos da entrevista semiestruturada mento religioso, foi feita uma Análise Fato-
desses autores e nas respostas dos parti- rial confirmatória, inicialmente com cinco
cipantes que responderam a essa entre- fatores, como prevê a teoria. Utilizou-se o
vista no trabalho dissertativo da autora método dos componentes principais com
desse trabalho (Camboim, 2009). A escala rotação Varimax que revelou a adequação
é composta por um dilema, que diz respei- da amostra (KMO = 0,85) e que a correla-
to a uma promessa feita a Deus num mo- ção entre os itens são suficientes para rea-
mento de dificuldade. Inicialmente, foram lização da análise (teste de esfericidade de
elaborados 40 itens referentes ao dilema, Bartlett [А² (190) = 1425,556, p < 0,001]). A
sendo dez itens para cada um dos cinco es- análise inicial mostrou que quatro dos cin-
tágios do julgamento religioso. Após cada co componentes obedeceram ao critério
item, deve-se indicar o grau de importân- de Kaiser de autovalor (eigenvalue) maior
cia para cada afirmação que acompanha que 1 e explicaram 54,2% da variância. To-
o dilema numa escala tipo likert de cinco mando-se como referência os estágios do
pontos. Por fim, deve-se escolher dentre julgamento religioso, verificou-se que a or-
todas as afirmações, as quatro que são ganização dos itens nos fatores mostrou-se
consideradas mais importantes, de forma inadequada e desequilibrada. Optou-se,
hierárquica. Depois de elaborados os itens, portanto, por reter a estrutura fatorial em
foi realizada uma análise de juízes através três componentes. Assumiu-se que cada
da discussão com um grupo de pessoas, item deveria apresentar saturação mínima
com prévio conhecimento dos estágios, de |0,47|, assim como excluir os itens que
que verificou a dificuldade e adequação saturavam em mais de um componente.
dos itens. Em seguida, houve a adminis- Seguindo esses critérios, dois itens foram
tração do instrumento em 40 adolescentes excluídos. Os três componentes obtiveram
de uma escola pública, do sexo masculino um Alfa de Cronbach médio de 0,75. O pri-
e do sexo feminino, com idades de 12 a 16 meiro componente incluiu todos os itens
anos. Após responderem ao instrumen- que caracterizavam os estágios 1 e 2 (Nível
to foram discutidas com os estudantes as I), tendo um valor próprio de 5,09, e expli-
dúvidas e dificuldades que os itens susci- cando 25,4% da variância e com consistên-
taram. Com os dados obtidos foi realiza- cia interna (Alfa de Cronbach) de 0,87. O
da uma análise semântica, na qual alguns segundo componente incluiu os estágios 4
itens foram retirados e outros reformula- e 5 (Nível III), tendo um valor próprio de
dos, o que levou a uma segunda versão do 2,93, explicando 14,63% da variância e
instrumento com 20 itens, sendo quatro com consistência interna de 0,72. O tercei-
itens para cada estágio. A segunda fase ro componente incluiu o estágio 3 (Nível
deste trabalho contou com a participação II), tendo um valor próprio de 1,71, expli-
de 114 adolescentes de escolas públicas e cando 8,55% da variância e com consistên-
privadas e 130 jovens adultos de universi- cia interna de 0,65. Com esses resultados,
dades públicas federais. A EJR foi aplicada pode-se verificar que a escala apresentou

470
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

parâmetros psicométricos adequados, A Empatia é definida por autores da abor-


podendo ser um instrumento válido para dagem Cognitivo-Desenvolvimentista
identificar três componentes claramente como um construto multidimensional,
discerníveis em relação aos três níveis de formado por fatores cognitivos, afetivos
julgamento religioso. Com relação à con- e sociais. Autores como Hoffman (1987)
sistência interna, um Alfa de Cronbach mé- e Davis (1983) corroboram essa definição,
dio de 0,75 pode ser classificada como ten- afirmando que a empatia se desenvolve
do uma confiabilidade apropriada, mesmo paralelamente à maturação do individuo.
que um dos fatores tenha apresentado um Para Hoffman (1987), a Empatia deve ser
alfa de 0,65, pois pode ser justificado pelo compreendida como uma reação afeti-
número reduzido de itens. Com esses re- va mais adequada ao contexto de outra
sultados, pode-se constatar uma diferença pessoa do que ao contexto do próprio ob-
na maneira de pensar dos participantes servador, sendo, portanto, uma resposta
brasileiros em relação aos europeus en- vicária às representações mentais que se
trevistados por Oser e Gmunder. Porém, tem dos sentimentos dos outros. O pre-
essa diferença pode ser explicada pelo fato sente estudo teve como objetivo realizar
dos dados representados nessa pesquisa um levantamento dos sentimentos empá-
terem sido colhidos por uma amostra de ticos vivenciados por crianças, adolescen-
conveniência que talvez não represente a tes e adultos diante de notícias da TV. A
população brasileira. Ressalta-se, portan- amostra foi composta por 254 sujeitos do
to, a necessidade de novos estudos em sexo masculino (n=107) e do sexo femi-
diferentes contextos. nino (n=147), com idades variando entre
10 e 29 anos, estudantes de escolas pú-
Palavras-chave: Validação de instrumento, blicas (n=69), escolas particulares (n=35)
Julgamento Religioso, Estudantes. e de uma universidade pública (n=150)
Contato: Aurora Camboim Lopes de Andrade das cidades de Petrolina-PE e Juazeiro-BA.
Lula (UFPB - auroraclal@yahoo.com.br) Os instrumentos utilizados foram quatro
reportagens, exibidas por telejornais da
TV aberta brasileira, retirados de um por-
LT01 – 978 – AVALIAÇÃO DE tal de vídeos da Internet (YouTube). Estes
SENTIMENTOS EMPÁTICOS EM vídeos serviram como situações-estímulo
CRIANÇAS, ADOLESCENTES E ADULTOS para perguntas disparadoras da temática
Leonardo Rodrigues Sampaio - UNIVASF empatia, a partir das seguintes situações:
leorsampaio@yahoo.com.br o primeiro vídeo retratava a história de
Maria Aline Rodrigues de Moura - UNIVASF uma babá que agredia uma criança com
aline_rm@hotmail.com síndrome de Down; o segundo relatava
Pâmela Rocha Bagano Guimarães - UNIVASF a história de uma mãe que esqueceu um
pamisbagano@hotmail.com bebê no carro e este acabou morrendo
Laila Barbosa de Santana - UNIVASF por causa do calor; o terceiro fazia uma
lailablue@hotmail.com comparação entre os gastos públicos com
Cleonice Pereira dos Santos Camino - UFPB políticos no Brasil e em países desenvol-
cleocamino@yahoo.com.br vidos; e o último contava a história de
Financiamento: FACEPE, FAPESB e CNPq um ex-morador de rua que conseguiu ser

471
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aprovado em concursos públicos. Para a raiva (agressividade contra a babá), tris-


coleta de dados foi utilizada um roteiro teza (pelo sofrimento causado à criança),
de entrevista semiestruturado que busca- compaixão (com o sofrimento da criança
va identificar os tipos de emoções/senti- e de seus pais), injustiça (pela condição
mentos desencadeados pelas reportagens de fragilidade da criança), angústia (pelo
nos participantes, uma escala gráfica do sofrimento do infante), culpa (ao se colo-
tipo Likert para avaliar a intensidade dos carem no lugar dos pais por terem contra-
sentimentos empáticos e um questionário tado a babá) e desprezo (pelas ações da
sócio-demográfico. A análise de dados foi babá). Em relação ao vídeo do ex-morador
realizada usando técnicas qualitativas e de rua, os participantes relataram seis ti-
quantitativas. No que concerne a análise pos de respostas empáticas: alegria (pela
qualitativa, os relatos dos participantes atual situação de vida do protagonista),
foram transcritos e, com base na teoria de tristeza (pelo sofrimento do ex-morador,
Hoffman (1987; 1989; 1991), foi feita uma quando este ainda residia nas ruas), com-
categorização das respostas, através do paixão (pela condição de miséria anterior
método dos juízes, buscando-se avaliar os do personagem), orgulho (pelo esforço do
tipos de sentimentos empáticos vivencia- ex-morador), injustiça (pela discrepante
dos pelos participantes da pesquisa. distribuição de renda no país) e angústia
(pela situação anterior do ex-morador).
Em relação aos dados quantitativos, fo- No vídeo da mãe que esqueceu seu bebê
ram realizadas Análises de Variância Mul- dentro de um carro, as respostas obtidas
tivariada, para comparar as intensidades foram organizadas em seis categorias: tris-
dos sentimentos relatados, em função das teza (pelo óbito da criança e/ou pelo sofri-
principais variáveis independentes. Além mento da mãe), compaixão (pelo bebê e
disso, foi utilizado o Teste do Qui-quadra- pelos seus pais), angústia (pelo sofrimen-
do para comparar a frequência de evoca- to do bebê e dos seus pais) e culpa (ao se
ção das respostas em cada categoria, em colocar no lugar da mãe como responsável
função do sexo, idade, curso e tipo de es- pelo fato). Em relação ao vídeo dos polí-
cola dos participantes. Nos resultados ob- ticos brasileiros, as respostas foram clas-
servou-se que 54 tipos diferentes de res- sificadas nas seguintes categorias: raiva
postas relacionadas a emoções (ex: nojo, (pelos gastos exorbitantes dos políticos
raiva, alegria, tristeza, etc.), sentimentos brasileiros), tristeza (por ser uma situação
(ex: compaixão, angústia, etc.) e outros constante no país), injustiça (ao comparar
(ex: graça, fé, impotência, etc.) foram re- a realidade brasileira com a de outros pa-
latados pelos participantes, quando estes íses desenvolvidos), culpa (por não fazer
eram questionados sobre o quê sentiram nada para mudar esta situação), angústia
após assistirem os vídeos. Foram conside- (diante da constatação desta realidade)
radas como respostas empáticas aquelas e vergonha (dos políticos e da população
relacionadas a emoções e sentimentos brasileira). No tocante à influência do
que seriam mais adequadas aos protago- sexo, não houve diferenças significativas
nistas dos vídeos do que aos participantes. na frequência com que os participantes
No vídeo da babá observaram-se oito ti- relataram os diferentes sentimentos em-
pos diferentes de sentimentos empáticos: páticos. Entretanto, as análises de vari-

472
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ância indicaram que: no vídeo do carro DIA 14/11 - Segunda-feira


a intensidade da Tristeza foi significativa-
mente superior entre os participantes do
sexo feminino (X = 4,12; d.p. = ,89) em 8h30-10h
relação à intensidade dos participantes
do sexo masculino (X = 3,74; d.p. =1 ,02);
no vídeo do ex-morador, a intensidade na
CONFERÊNCIA
média da alegria foi diferente entre crian-
ças (X = 4,27; d.p. = 0,78), adolescentes (
X = 3,77; d.p. = 1,04) e adultos (X = 4,03;
– CREATIVIDAD Y DESARROLLO DE
d.p. = 0,74): O post hoc Test de Tukey indi-
TALENTOS HACIA LA TRANSFORMACIÓN
cou que a diferença foi significativa ape-
SOCIAL
nas entre as crianças e os adolescentes (p
= ,001). Em relação à variável faixa etária, Sheyla Blumen - PUC/Perú
a ANOVA apontou que no vídeo dos po-
líticos houve uma influência significativa Se reflexiona acerca de la importancia de
sobre os sentimentos de Raiva, Tristeza la creatividad como expresión de salud
e Injustiça, no sentido de que os adultos en el desarrollo humano y su desarrollo
relataram sentir estes sentimentos mais en entornos de diversidad etnolingüística
intensamente que as crianças. Esses re- para la transformación social, a partir de
sultados sugerem que os tipos de pistas datos empíricos. Asimismo, se analiza la
situacionais acessíveis e o desenvolvimen- construcción social del concepto talento
to psicossocial podem exercer influência en Perú, Chile y Colombia considerando
significativa sobre os sentimentos empá- la influencia de la psicología positiva en su
ticos vivenciados por crianças, adultos e concepción actual, así como la necesidad
adolescentes. Além disso, emoções que de fomentar su desarrollo desde el esfuer-
fazem parte do dia-a-dia dos participantes zo individual y grupal hacia la mejora del
foram mais facilmente identificadas e que bien común. Posteriormente, se discute
suas perspectivas críticas diante de deter- la relación de los conceptos creatividad y
minados fenômenos também exerceram talento, considerando estudios empíricos
influencia sobre suas respostas. y el análisis de un caso, con el fin de com-
prender las contribuciones particulares de
Assim, os resultados corroboram a teoria
aquellas personas que utilizaron su talen-
de Hoffman no que tange à empatia como
to para hacer de éste, un mundo mejor
algo essencial para a vida em sociedade,
para vivir, enfatizando el importante rol
uma vez que é através dela que as pessoas
que juegan las oportunidades y servicios
acessam as experiências internas dos ou-
complementarios a los que están expues-
tros e, a partir disso, modificam seu pró-
tos las y los jóvenes potencialmente ta-
prio comportamento.
lentosos. Asimismo, se proponen diversas
estrategias de aceleración pedagógica en
el entorno escolar y universitario, para
apoyar el desarrollo del talento en niñas,
niños y jóvenes, tomando consciencia de

473
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nuestra responsabilidad en la formación de los organizadores de este Congreso de


intelectual, ética y moral de las y los líderes pensar una Psicología del Desarrollo para
del futuro. Finalmente, se subraya la nece- Transformar América Latina. El texto La
sidad de mejorar la comprensión de las y Hollywodización de la Psicología del Desar-
los profesionales de la salud y educado- rollo (Valsiner, 2004) constituye una fuer-
res acerca de las y los jóvenes talentosos, te crítica a una concepción del desarrollo
tomando en consideración la diversidad basada en la edad como referencia para
etnolingüística característica del contexto conceptualizar los cambios, así como una
en que crecen y se desarrollan, asumien- critica a esa tendencia a realizar compara-
do que la gran mayoría se encuentra en ciones entre grupos de edades, para dar
espacios de pobreza, carentes de oportu- cuenta de lo que sería el desarrollo “Las
nidades para desarrollar sus capacidades. teorías que se hacen pasar por evolutivas
Se recomienda el planteamiento de line- solo son un compendio de afirmaciones
amientos formales de fomento al talento no evolutivas, adornadas de tal manera
en sus diferentes manifestaciones, con el que, efectivamente, parecen depender del
compromiso de los diferentes agentes de concepto de desarrollo”. Esa crítica que
la sociedad civil y del estado, así como de se oye de más en más, y que es común a
las universidades y empresas, con el fin de muchos otros investigadores (van Geert,
asegurarles un espacio comunitario, social 2003; Rose & Fischer, 2009; Kagan, 2008;
y laboral, evitando la fuga de talentos y Spencer & Perone, 2008), es entonces
apoyando su desarrollo para la transfor- la plataforma sobre la cual se construye
mación social. buena parte de la argumentación de esta
charla. Complementariamente para la otra
Palabras-clave: creatividad, talento, bienestar parte la invitación sobre el papel de Amé-
social, diversidad etnolingüística, aceleración rica Latina en los estudios del desarrollo,
también tiene en las palabras de Valsiner,
un excelente complemento. En su discurso
CONFERÊNCIA de aceptación al Doctorado Honoris Causa
que concedió la Universidad del Valle en
Octubre del 2010, Valsiner plantea que la
LA HOLLYWODIZACIÓN DE LA investigación psicológica realizada en paí-
PSICOLOGÍA DEL DESARROLLO, FRENTE ses como Brasil, Chile y Argentina y en Co-
A LAS PROPUESTAS DE UNA PSICOLOGÍA lombia, constituye una de las alternativas
AÚN MUY SILENCIOSA: EL PAPEL DEL más audaces y rigurosas de la psicología
SUBCONTINENTE LATINOAMERICANO EN actual. Por una parte la investigación en es-
LA INVESTIGACIÓN PSICOLÓGICA tos países acepta sin prejuicios lo que po-
Rebeca Puche Navarro - Universidad del Valle- dría ser “la primacía cualitativa en la cons-
Cali Colombia trucción de los métodos en la psicología”
(Valsiner, 2010, p 52), pero por otra parte
Como deriva del título de esta charla, las también se explora “el uso de matemáticas
reflexiones de Jaan Valsiner, a quienes sofisticadas” (Valsiner, 2010, p 52) como
ustedes conocen bien aquí en Brasil, son las provenientes de los sistemas dinámi-
la base que para responder a la solicitud cos. Dicho de manera breve, alguna inves-

474
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tigación realizada por una cierta vanguar- temas dinámicos no lineales), y que han
dia en Latinoamérica, entiende y asimila permitido abordar los naturaleza cam-
más rápidamente los rápidos cambios que biante de itinerarios y los patrones subya-
la psicología del desarrollo requiere, aun- centes a dichos itinerarios. Una de esas
que lo hace aún de manera bastante silen- técnicas, es la de series temporales de los
ciosa. Esta charla pretende recuperar esos mínimos y máximos (van Dick & van Geert,
planteamientos a la luz de algunos núcleos 2002). Ella gráfica la trayectoria de los de-
conceptuales del desarrollo, y analizar su sempeños de un sujeto, y de esta manera
relación con los abordajes metodológicos. visualiza el tiempo serial a partir de curvas
Desde la revisión de algunas herramien- de los itinerarios del sujeto. La condición
tas metodológicas se podrá mostrar que para su aplicación es un número amplio
la no linealidad del desarrollo de la men- de observaciones sucesivas en situaciones
te resulta ineludible, por ejemplos y por idénticas, establecidas dentro de un lapso
lo tanto esa vieja premisa según la cual, determinado de tiempo. El equipo de van
el desarrollo depende de la manera cómo Geert ha introducido éstas técnicas de se-
lo abordemos sigue presente en la agen- ries temporales en estudios longitudinales
da de trabajo. En primer lugar, se toman (van Dijk & Van Geert, 2007). A partir de
versiones de los métodos microgenéticos esos trabajos, otros estudios usan esas téc-
exitosos que han producido un amplio nú- nicas en períodos más cortos y más centra-
mero de estudios y que provienen muchas dos en funcionamientos a lo largo de tres o
veces de autores con linajes muy diferen- cuatro meses con dos intervenciones men-
ciados (Flynn & Siegler, 2007; Miller & Coy- suales y con cuatro observaciones por re-
le, 1999; Siegler, 2004, 2002; Adolph, Ro- gistro (Guerrero & Puche-Navarro, 2009).
binson, Young, & Gil Alvarez, 2008; Lavelli, En tercer lugar se toma técnicas como el
Pantoja, Hsu, Messinger & Fogel, 2005; state space grid (Hollenstein, & Lewis,
Puche Navarro & Ossa, 2006). Se trata de 2006; Hollenstein, & Lewis, 2009; Lewis,
mostrar como el método micrognenético 2004; 2006). Con esta técnica se trata de
esta unido conceptualmente al cambio y a “rastrear las trayectorias de emergencia
la variabilidad. Definido como la capacidad de patrones de los fenómenos en estu-
abordar minuciosamente la manera como dio (personalidad, emociones, interacción
se manifiesta el cambio cognitivo en una madre-niño) para mostrar las transiciones
secuencia de conductas, el método micro- en los desempeños a través del tiempo
genético implica registrar un gran número (Lewis, Lamey & Douglas, 1999; Lewis,
de conductas en una secuencia corta de 2000a; Lamey, Hollenstein, Lewis & Granic,
tiempo. Se trata de cubrir el mayor núme- 2004; Hollenstein & Lewis 2006)” (De la
ro de acciones que tienen lugar antes, en Rosa, Rodriguez & Ossa. 2009 p.33-34). A
y después de que ocurre el cambio. Si se partir del espacio de estado y atractor, dos
acepta que “la esencia del desarrollo es el principios de los sistemas dinámicos, se
cambio” (Siegler & Crowley, 1991 p. 606), identifican muchos de los posibles estados
entonces la pertinencia de esta técnica de un sistema en momentos específicos.
resulta definitiva. En segundo término se La otra cosa es trata de encontrar que las
revisan otros métodos de naturaleza más tendencias de esas trayectorias correspon-
matemática provenientes de los SDNL (sis- den a un atractor. En la conclusión se hace

475
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

un balance de la claridad entre la interde- crianças em creche”, defendida no Insti-


pendencia entre la concepción del desar- tuto de Psicologia da USP, sob orientação
rollo y los métodos. Se enfatiza como los do prof. Lino de Macedo, em fevereiro do
métodos microgenéticos como las técnicas corrente ano. O objetivo da Tese foi de
de series temporales recuperan el flujo di- investigar a Exploração Lúdica e Afetivi-
námico que es la característica que define dade, em criança de zero a dois anos de
el desarrollo como proceso. Ese tipo de idade, atendida em berçários de creche.
abordaje contrasta con el abordaje trans- Para tanto, utilizaram-se as concepções
versal que se limita a establecer, en el me- teóricas de Jean Piaget que possibilitaram
jor de los casos, un solo registro en un mo- compreender tanto a Exploração Lúdica
mento determinado, es decir “fotografías” - na discussão dos conceitos de Repeti-
del desarrollo. Ese abordaje transversal ção, Prazer Funcional, Jogos de Exercício
responde a una concepción que concibe e Reação Circular Terciária -, quanto o
el desarrollo como etapas, como momen- Desenvolvimento Afetivo - através dos
tos fijos en la adquisición de habilidades y conceitos de Afetos Perceptivos e Afetos
que en consecuencia termina siendo una Intencionais. Este foi um Estudo de Caso
concepción estática. En resumen se trata desenvolvido através do Método Clínico
de analizar aquello que permite a los paí- de Piaget e da Microgenética. Foram re-
ses llamados de la periferia y del papel del alizadas 10 observações com registros fíl-
subcontinente latinoamericano jugar un micos, em um total de 44 crianças peque-
papel, y contribuir a identificar como ha- nas, presentes nos berçários de duas cre-
cerlo de la mejor manera. ches comunitárias e conveniadas com a
Rede Municipal de Belo Horizonte, a par-
Palabras-claves: Desarrollo, microgenético, tir da apresentação de um kit de objetos/
metodos de mínimos y máximos, método de brinquedos. Desse processo resultaram 5
state space gris. filmes sobre as ações afetivas manifesta-
das pelas crianças pequenas: o primeiro
foi elaborado com o foco nas ações das
CO 12 - LT01 crianças, no ambiente de berçário sem
o kit de objetos/brinquedos. O segundo
Estudos piagetianos contempla as ações das crianças, no am-
biente de berçário, com a introdução do
kit de objetos /brinquedos. O terceiro,
LT01-929 – A CRIANÇA PEQUENA, O
quarto e quinto filmes focam a trajetó-
BRINCAR E AFETIVIDADE.
ria individual de três crianças, de idades
Paula de Souza Birchal - PUC/Minas diferentes. Os cinco filmes possibilitaram
pbirchal@pucminas.br perceber as ações das crianças pequenas
Lino de Macedo - USP com e sem o kit de objetos/brinquedos,
limacedo@uol.com.br suas relações - entre si, com os objetos/
brinquedos e com as professoras - além
A proposta dessa comunicação oral é de da comparação entre os períodos de Ex-
apresentar um recorte da Tese de Douto- ploração Lúdica e de não exploração. A
rado: “Exploração lúdica e afetividade de pesquisa confirmou a hipótese de que a

476
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

introdução do kit de objetos/brinquedos filme foi elaborado a partir das ações das
promove a Exploração Lúdica e esta se crianças, no ambiente de berçário, com a
constitui em um recurso fundamental de introdução do kit de objetos /brinquedos.
manifestação e desenvolvimento da Afe- Este filme mostra as ações de Exploração
tividade das crianças pequenas. A partir Lúdica e manifestações afetivas das crian-
desta breve apresentação da Tese preten- ças quando lhes foram oferecidos os kit’s
de-se, nessa comunicação oral, apresen- de objetos/brinquedos, compostos de
tar os dois primeiros filmes que mostram bolas, livros, chocalhos, caixas de formas,
as ações das crianças sem e com o Kit de jogo de empilhe, mordedores. A maioria
objetos/brinquedos e os resultados ob- das cenas evidencia crianças explorando
tidos em cada um deles, como também os objetos/brinquedo, primeiramente,
uma análise comparativa das ações das através do olhar, quando os identificam
crianças nessas duas situações. No pri- e os escolhem. Em seguida observam-se
meiro filme, que mostra o que as crianças a intensificação das ações e as manifes-
fazem no ambiente de berçário quando tações afetivas das formas mais distintas:
não estão com os objetos/brinquedos, pegar, morder, chupar, arrancar, dispu-
definidas a partir das ações: mostrar os tar, jogar, balançar, sorrir, apertar, segu-
cuidados básicos das professoras com as rar, agarrar, encaixar, assentar, encontrar
crianças e cenas que retratam a existência orifícios, empilhar, manipular livremen-
de brinquedos nos berçários das creches, te, solicitar ajuda, interagir com o outro,
compatíveis com o desenvolvimento das chorar, balbuciar, falar, irritar-se, criar
crianças, mas que permanecem sem uso, histórias, derrubar, imitar. Não há cenas
seja porque as professoras não os dispo- de crianças isoladas sem exploração dos
nibilizam para as crianças (visível no fato objetos/brinquedos e em todas as cenas
de alguns estarem ainda dentro das em- a Exploração Lúdica está presente nas
balagens, e no caso dos triciclos as rodas ações das crianças, assim como a Afetivi-
lisas e brilhantes demonstram não uso) dade também pode ser observada tanto
seja porque estão guardados em lugares nas formas de Afetos Perceptivos quan-
altos, inacessíveis às crianças. Observa-se to Intencional. Os dados apontam que,
neste filme que a maioria das cenas re- na ausência do kit, em apenas 59% das
trata crianças dispersas pela sala, ou sozi- cenas há Afeto Perceptivo contra 100%
nhas em algum canto, ou em seus berços, com a presença dele. No caso do Afeto
acordadas. Enquanto algumas crianças Intencional a ausência do kit torna-o pre-
exploram objetos do berçário que as colo- sente apenas em 21% das cenas contra
cam em situação de risco, como cadeira, 81% quando de sua presença. Pode-se
porta, portão, saco plástico e até mesmo perceber que há um ganho qualitativo
balões, outras carregam de um lado para no desenvolvimento da afetividade com
outro, bolas, chocalho de garrafa pet e bo- a presença do kit, uma vez que as mani-
neca. Algumas exploram o próprio corpo, festações afetivas das crianças são mais
interagem entre si e com as professoras. intencionais que perceptivas. É impor-
Poucas estão sorrindo e alegres. Dormem, tante ressaltar que no filme com o Kit de
choram e recebem os cuidados básicos objetos/brinquedos, nas primeiras cenas,
(banho, alimentação, higiene). O segundo as crianças emitem poucos sons, durante

477
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sua exploração. Já do meio para o fim do moral. O campo de pesquisa com jogos
filme, pode-se observar um aumento na comporta, atualmente, temas partidários
variedade de sons emitidos pelas crian- da Antropologia, Filosofia, Sociologia e, é
ças, assim como também produzidos claro, também da Psicologia. Com relação
pelos próprios brinquedos, enquanto as a esta última, vemos importantes con-
crianças os exploram. Outro aspecto a ser tribuições do uso do jogo para o estudo
ressaltado é quanto à frequência dos kit’s de aspectos cognitivos, afetivos, sociais,
no ambiente dos berçários. Isto é, com morais, simbólicos, comportamentais,
frequência maior dos objetos/brinquedos entre outros. Neste contexto, o jogo é
dos kit’s as crianças se interagiam mais geralmente estudado em termos de suas
umas com as outras e com as professoras. influências ou contribuições para diversos
A frequência também mostrou que nas fenômenos, como, por exemplo, a repre-
últimas cenas as crianças disputavam me- sentação mental, a linguagem, a aprendi-
nos os objetos/brinquedos e brincavam zagem, sem contar a vasta gama de no-
mais próximas umas das outras. Diante ções e conceitos aos quais são, geralmen-
do exposto pode-se concluir que a Explo- te, associados. A moralidade, assim como
ração lúdica se coloca como elemento in- o jogo, vem sendo historicamente estuda-
termediário, primordial e fundante, pois da como aspecto inerente à humanidade
com ela a criança se estrutura, edifica-se e é também alvo do interesse de ciências
na sua condição de sujeito e protagonista diversas. Assim, enquanto algumas cor-
do seu desenvolvimento, não apenas in- rentes filosóficas buscam teorizar sobre
telectual, mas afetivo. os valores e princípios morais universais,
os sociólogos, geralmente, enfatizam o
Palavras-chave: afetividade; brincar; criança pensamento moral em caráter coletivo,
pequena. ficando a cargo de algumas vertentes da
Contato: Paula de Souza Birchal - Pontifícia Psicologia uma preocupação maior em re-
Universidade Católica de Minas Gerais; lação ao desenvolvimento da consciência
pbirchal@pucminas.br moral individual. Neste grupo, daremos
destaque a Epistemologia Genética de
Jean Piaget, na qual é possível encon-
LT01-1288 – A REGRA EM JOGO: trar importantes teorizações a respeito
ESTUDANDO AS CONCEPÇÕES INFANTIS do jogo e da moralidade, que nortearão
SOBRE A REGRA DO JOGO E A REGRA o presente trabalho.Acreditando que a
MORAL essência da moral deva ser estudada a
Ana Paula Sthel Caiado - USP partir do respeito que os indivíduos ad-
apcaiado@usp.br quirem pelas regras, e que o jogo possui a
Maria Thereza Costa Coelho de Souza - USP peculiaridade de reunir regras estabeleci-
mtdesouza@usp.br das nas relações entre crianças exclusiva-
Financiamento: FAPESP mente, Piaget (1932/1994) buscou inves-
tigar as afirmações e ideias destas sobre
Trata-se de um estudo sobre os julgamen- as regras do jogo de bolinha de gude,
tos emitidos por crianças a respeito das analisando não só como elas as pratica-
regras em contexto de jogo e contexto vam como também suas considerações a

478
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

respeito de sua origem e obrigatorieda- que lhe cabe nesta proposta, o presente
de, ao que denominou consciência das trabalho reúne os resultados referentes à
regras. Com essa pesquisa, demonstrou realização de entrevistas, utilizando-se o
como o jogo muscular e egocêntrico tor- método clínico piagetiano, com 08 crian-
na-se social, defendendo-o como espaço ças, entre 07 e 09 anos, nas quais foram
de discussão e reciprocidade, no qual os investigadas suas concepções relativas
indivíduos, considerando-se como iguais, aosquatro aspectos da moralidade supra-
poderão controlar-se mutuamente e atin- citados. A entrevista consistiu em quatro
gir, assim, o estado cooperativo, condição pares de historias-dilemas nas quais eram
primeira para o desenvolvimento do juízo contrapostas situações de jogo com situ-
moral autônomo. Desta maneira, julga- ações do cotidiano envolvendo preceitos
-se pertinente ressaltar o enfoque dado morais. Esta foi gravada e posteriormen-
ao jogo de regras como espaço de trocas te transcrita pela própria pesquisadora.
interindividuais igualitárias e estas como Foram definidos critérios de análise de
importantes ao desenvolvimento moral, forma a avaliar se as respostas emitidas
sendo a regra um importante ponto de pelas crianças tendiam mais para a auto-
intersecção entre tais aspectos. Concebi- nomia, para a heteronomia, se denota-
da por Piaget (1932/1994) como fator es- vam certa transição ou ainda se apresen-
sencial da moralidade e estudada por ele tavam contradição. Foi também analisado
como uma das estruturas do jogo – em se era mantida coerência de respostas
conjunto com o exercício e o símbolo – a entre a situação de jogo e a situação co-
regra funciona como regulador das trocas tidiana descritas nas estórias-dilema. A
sociais, determinando (ou restabelecen- este respeito cabe uma breve referência
do) seu equilíbrio, encontra-se nela um à forma como o desenvolvimento moral
sentido de obrigatoriedade que denota é tratado na abordagem piagetiana. Nela
a existência de relações sociais (Piaget, são concebidas duas formas possíveis de
1965/1973).As considerações teóricas legitimação das regras e valores morais,
apresentadas, resumidamente até então, uma a partir da referência a figuras de
embasam este trabalho, que teve como autoridade constituindo-se, portanto he-
objetivo avaliar os juízos dos sujeitos com terônoma, e outra baseada na autonomia
relação às regras do jogo e regras morais, da consciência, na qual o sujeito conse-
tomando como referência as noções de gue prescindir de interferências externas.
justiça (distributiva ou retributiva), de de- Sendo a primeira geralmente, prevalente
ver (igualdade ou autoridade), de sanção até os sete anos, momento em que ocor-
(expiatória ou recíproca) e de responsabi- re o deslocamento da postura egocêntri-
lidade (objetiva ou subjetiva). Tal propó- ca para a capacidade de coordenar dife-
sito é parte de um espectro mais amplo rentes pontos de vista, condição inerente
que busca analisar, por meio do jogo de ao exercício cooperativo e à construção
regras, diferentes maneiras das crianças de juízos morais mais autônomos. Os
praticarem, assimilarem e respeitarem a resultados demonstram conformidade
regra, buscando com isso abordar aspec- com a teoria no que diz respeito aos ju-
tos do desenvolvimento moral infantil, ízos morais emitidos, ficando as crianças
segundo a teoria piagetiana. Para a parte mais novas responsáveis, em sua maioria,

479
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

por aqueles que denotavam concepções vídeo é uma produção da Casa Redonda
heterônomas. Quanto às comparações Centro de Estudos, instituição localizada
entre as situações de jogo e situações em São Paulo, que atende a crianças en-
cotidianas, verificou-se uma supremacia tre dois anos e meio e sete anos. O vídeo
das segundas em relação às primeiras, ou é composto por cenas em que as crianças,
seja, houve diferenças no julgamento de ao longo das diferentes estações do ano
grande parte das crianças, no sentido de e quase sempre ao ar livre, brincam com
tomarem as situações cotidianas que en- os quatro elementos da natureza: terra,
volviam preceitos morais como mais im- água, fogo e ar (Cruz, 2005). Estimulados
portantes ou os erros delas decorrentes a falar sobre o vídeo, os alunos reconhe-
como mais graves quando comparadas às ceram o ambiente retratado como um
situações de jogo. Uma possível ponde- espaço de aprendizagem, propiciador de
ração a este respeito pode ser levantada contato com a natureza e em que, sem a
tomando em conta que as situações coti- intervenção direta de adultos, as crianças
dianas descreviam vez ou outra, a parti- podem explorar livremente os recursos
cipação de um adulto. Desta forma, são que encontram. Segundo eles, Piaget con-
evidenciados alguns fatores presentes sideraria esse espaço “ideal”, já que nele
nas concepções infantis sobre a regra em as crianças dispõem de liberdade para
diferentes contextos, assim como suas agir e é pela ação que a criança organiza
nuances e transformações. seus pensamentos. Alguns alunos identi-
ficaram as ações realizadas pelas crianças
Palavras-chave: jogos de regras; do vídeo como possibilidade de constru-
desenvolvimento moral infantil; ção de novos esquemas e de experiência
epistemologia genética. de reflexão sobre temas abstratos, como
“Deus” e “criação do mundo”. As crianças
visualizadas, segundo os alunos, vivem o
LT01-1310 – A INFLUÊNCIA DA TEORIA estágio pré-operatório, apresentam pen-
PIAGETIANA SOBRE A PERCEPÇÃO DE samento animista e linguagem marcada
ESTUDANTES DO SEGUNDO SEMESTRE por monólogos coletivos. De fato, Piaget
DO CURSO DE PSICOLOGIA A RESPEITO (2006) identifica o estágio pré-operatório,
DO BRINCAR INFANTIL que localiza-se aproximadamente entre o
Juliana Lima de Araújo - UNIFOR terceiro e o oitavo ano de vida, como um
ju_lima_araujo@yahoo.com.br momento de grande evolução, quando a
Cristiane Amorim Martins - UNIFOR linguagem, recém adquirida, expande as
crisamorim@unifor.br possibilidades de socialização e, em uma
forma ainda egocêntrica, favorece a in-
Este trabalho relata a experiência de moni- teriorização da ação e o surgimento do
toria em que se investigou a percepção de pensamento intuitivo. No vídeo vemos
alunos do segundo semestre do curso de crianças em volta da fogueira, controlan-
psicologia a respeito do brincar infantil. A do as chamas ao movimentar o vento,
experiência relatada consiste na exibição manuseando velas, cozinhando em um
do vídeo “Brincando com os Elementos” e fogão improvisado que uma delas chama
posterior discussão sobre o mesmo. Este de “caldeirão de bruxa” (é importante

480
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ressaltar que todas essas atividades são relativos às capacidades básicas de ler e
supervisionadas por um adulto e que a contar é hoje o principal meio de medir
criança só realiza aquilo que pode e con- a eficácia do ensino escolar. Certamente
segue). Lima (2003) nos fala da “idade do as crianças devem ser capazes de ler, es-
fogo”, comum ao período pré-operatório, crever e contar, mas a maioria das escolas
em que as crianças sentem-se especial- parece deixar em segundo plano o desen-
mente motivadas em explorar o fogo volvimento da sua autonomia intelectual
(com frequência envolvem-se longamen- e moral e a construção de conhecimentos
te em jogar objetos numa fogueira). O relacionados à questões cotidianas. Os
vídeo também nos mostra jogos simbó- estudos de Piaget trazem grande contri-
licos, os chamados faz-de-conta, em que buição à educação. Embora ele não tenha
as crianças agem através de um “como proposto uma metodologia de ensino,
se”. Este “como se” se caracteriza como sua teoria nos exige uma quebra de para-
símbolo lúdico: as crianças, por exemplo, digma na idéia tradicionalmente atribuída
brincam imitando barulhos de carros, api- de como o conhecimento é apreendido.
tos de trem, tiros, e, nesse contexto de É a partir de sua teoria sobre o desenvol-
fantasia, exercitam um pensamento mais vimento da cognição e da aquisição de
flexível do que aquele presente nas situa- conhecimento, que muitas intervenções
ções cotidianas. Essa experiência propicia são realizadas por psicólogos e pedago-
o desenvolvimento da competência para gos. Partindo da idéia de que toda pro-
pensar sobre coisas irreais (Bomtempo, posta educacional deve, inicialmente, se
2000). perguntar que tipo de homem se quer
Discutindo as brincadeiras mostradas no formar, a grande questão a se pensar, em
vídeo, questionamos, junto aos alunos, se uma educação influenciada pela teoria
as escolas costumam dar espaço à ação piagetiana, é como promover o desenvol-
espontânea da criança. Alguns menciona- vimento da autonomia intelectual e moral
ram o fato de muitas escolas, atualmente, das crianças. Deve haver uma mudança
permitirem às crianças a experimentação de paradigma à medida que se considera
através de “feiras de ciências” e uso de o conhecimento construído pelo aluno ao
laboratórios, mas consideraram raras as invés de transmitido pelo professor. Este
práticas pedagógicas que valorizam, real- deixa de ser entendido como o possuidor
mente, a brincadeira livre. Piaget (1990) do saber, passando a ser visto como aque-
ressalta o quanto o brincar é importante le que estimula o processo de aprendiza-
para o desenvolvimento infantil, já que, gem do aluno. É importante que na for-
dispondo de um pensamento marcada- mação do psicólogo, desde os primeiros
mente concreto, é através das suas ações semestres da graduação, se reflita sobre
que a criança pequena elabora uma com- as contribuições da psicologia na supe-
preensão sobre a realidade e também ex- ração dos desafios vividos no campo da
pressa suas idéias. Tem-se alcançado mui- educação.
tos progressos teóricos no campo da edu-
cação, mas infelizmente a prática não tem Palavras-chave: teoria piagetiana, brincadeira,
conseguido acompanhar esses avanços. educação.
O desempenho em testes padronizados

481
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-1451 – O ESTADO DA ARTE DAS em anais de congressos e de seminários.


PROVAS OPERATÓRIAS PIAGETIANAS NO Também são reconhecidas por utilizarem
BRASIL uma metodologia de caráter inventarian-
Daiana Stursa - UFES te e descritivo da produção acadêmica e
daianastursa@yahoo.com.br. científica sobre o tema que busca inves-
Bárbara Subtil de Paula - UFES tigar, à luz de categorias e facetas que se
Sâmia Gabler da Eira - UFES caracterizam, enquanto tais, em cada tra-
Tamires da Silva Mascarenhas Pinho - UFES balho e no conjunto deles, sob os quais o
Savio Silveira de Queiroz - UFES fenômeno passa a ser analisado. O objeti-
vo desta pesquisa é o de investigar a pro-
O conjunto das provas operatórias piage- dução brasileira nos últimos 10 anos acer-
tianas foi concebido inicialmente como ca do uso das provas operatórias como ins-
metodologia destinada à investigação de trumentos ou como objeto de reflexão em
parâmetros de observação do processo pesquisas de caráter científico. Para isso,
de construção do conhecimento, visando realizaremos análise quantitativa e quali-
a descrição de um sujeito epistemológico. tativa de dissertações, livros, teses e arti-
Desde então, as provas operatórias são uti- gos publicados sobre o tema geral: “pro-
lizadas para múltiplos fins investigativos. vas operatórias piagetianas”, empregando
Contudo, aparentemente, não sofreram os seguintes critérios para essa análise: 1)
modificações relevantes em sua forma de a quantidade da produção; 2) definições
aplicação ou parametrização, dificultando empregadas; 3) referenciais teóricos ado-
novas abordagens sobre o sujeito psicoló- tados e presença de pesquisa empírica;
gico acerca de como construiu seu próprio 4) adoção, ou não, de postura crítica em
conhecimento. Proceder desta maneira relação avaliação clínica ou pedagógica;
é permitir o restabelecimento constante 5) presença de propostas de intervenções
dos parâmetros do sujeito epistemológi- pedagógicas ou clínicas; e 6) discussão
co, contribuindo para o exame dos relatos epistemológica ou filosófica sobre o tema
de pesquisas e reflexões em geral à luz do específico da publicação. Os dados (em
crivo da Epistemologia Genética e da Epis- fase final de organização e análise) foram
temologia científica em geral. Nesse senti- obtidos por meios digitais ou impressos,
do, pesquisas que recebem denominação centralizados em banco de dados único, e
de “estado da arte” ou “estado do conhe- criticados em reuniões periódicas que cor-
cimento” podem ser definidas como de rigem eventuais falhas em nossos procedi-
caráter bibliográfico, trazendo em comum mentos de pesquisas. Espera-se que esta
o desafio de mapear e de discutir a produ- pesquisa forneça avanço teórico e meto-
ção acadêmica em diferentes campos do dológico a respeito das provas operatórias
conhecimento, a fim de responder sobre bem como, subsídios para a produção de
quais aspectos e dimensões vêm sendo material didático voltado para a instru-
destacados e privilegiados em diferentes mentação clínica e pedagógica.
épocas e lugares; de que formas e em que
condições têm sido produzidas disserta- Palavras-chave: Provas Operatórias
ções de mestrado, teses de doutorado, pu- Piagetianas; Estado da Arte; Epistemologia
blicações em periódicos e comunicações Genética.

482
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 13 - LT01 grama estruturado de intervenção no qual


os procedimentos de estimulação visavam
Saúde atingir os seguintes objetivos específicos:
andar sozinha pela sala de aula; pular (os
LT01-725 - ESTIMULAÇÃO DO dois pés devem sair do chão); chutar (o
DESENVOLVIMENTO MOTOR DE UMA pé direito ou esquerdo deve sair do chão
CRIANÇA CEGA quando a bola for tocada); correr (em um
instante, no local, ambos os pés devem
Maria Luiza Pontes de França Freitas - UFSCar
estar fora do chão ao mesmo tempo);
mluizapf@yahoo.com.br
locomover-se em velocípede; realizar o
Maria Stella Coutinho de Alcântara Gil -
movimento manual de penta digital; ma-
UFSCar
nusear massa de modelar. O programa de
stellagil@uol.com.br
intervenção foi elaborado com base na
Financiamento: CAPES avaliação inicial do repertório de compor-
tamentos da criança participante desse
O grau da deficiência visual tem diferentes estudo que foi um menino cego (retino-
efeitos no desenvolvimento de habilida- patia da prematuridade) de cinco anos de
des motoras e pode afetar, por exemplo, a idade com acentuado atraso de desenvol-
aquisição da percepção espacial e de dis- vimento que frequentava a sala regular do
tância necessárias para o desenvolvimen- maternal de uma escola pública localizada
to dessas habilidades (Rodrigues, 2002). em uma cidade do interior de São Paulo.
De acordo com Warren (1994), o desen- Para obter o repertório de comportamen-
volvimento motor mais lento em algumas tos da criança cega antes das intervenções
crianças cegas pode ser devido à restrição foi realizado um pré-teste que consistiu na
de oportunidades muitas vezes agravada aplicação do Inventário Portage Operacio-
pela superproteção dos pais. A oportuni- nalizado (WILLIAMS; AIELLO, 2001) que
dade ou possibilidade de deslocamento fornece a avaliação das seguintes áreas
e mobilidade é o fator mais importante de desenvolvimento: socialização, lingua-
na determinação das capacidades moto- gem, autocuidados, cognição e desenvol-
ras de crianças com deficiência visual e vimento motor. Esse instrumento foi uti-
a restrição de oportunidades pode gerar lizado em forma de entrevista com a mãe
atrasos de desenvolvimento da locomo- e a professora (informantes na pesquisa)
ção. Por esse motivo é importante que a da criança cega antes da intervenção. O
criança adquira as habilidades de locomo- item era lido e depois a mãe ou professora
ção, exploração e manipulação tátil, para informava se a criança realizava ou não o
poder interagir efetivamente com o mun- comportamento específico do item lido.
do físico (Warren, 1994). Diante disso, o Além das informações coletadas por meio
objetivo geral desse trabalho foi avaliar o do Inventário Portage Operacionalizado
efeito de procedimentos de intervenção, (IPO), foram realizados registros manuais
em ambiente escolar, no desenvolvimen- e em vídeo de sessões de brincadeira li-
to motor de uma criança cega com atraso vre na escola para obter informações do
de desenvolvimento. Para alcançar esse repertório de entrada da criança. Com
objetivo foi necessário elaborar um pro- base nesses registros e entrevistas iniciais

483
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foi possível verificar os comportamentos perspectiva da mãe, outros pela perspec-


que necessitavam de estimulação e os tiva da professora e um número menor
que precisavam ser incluídos no reper- foi incluído com base na perspectiva das
tório da criança. Após a coleta descrita, duas. O maior número de desempenhos
deu-se início a segunda fase do estudo motores foi incluído pela perspectiva da
na qual foram realizadas intervenções por professora (20) em comparação com os
meio de propostas de atividades indivi- inseridos na perspectiva da mãe (9). É pro-
duais e de brincadeiras semiestruturadas vável que isso tenha acontecido pelo fato
para estimular o desenvolvimento motor da intervenção ter sido realizada no am-
da criança cega. Essas atividades foram biente escolar. Com base nos resultados
registradas em vídeo e manualmente. Fi- pode-se afirmar que a partir das experi-
nalizadas as intervenções foi realizado um ências motoras, proporcionadas através
pós-teste que consistiu na reaplicação do das brincadeiras, foi possível estimular o
IPO por meio de entrevista para a mãe e desenvolvimento motor da criança cega,
para a professora com o intuito de avaliar bem como a construção da noção de es-
novamente o nível de desenvolvimento paço tão importante para a capacidade de
motor da criança (pós-intervenção). Para se deslocar no ambiente escolar. À medi-
avaliação dos resultados obtidos por meio da que a criança adquiria novos desempe-
do IPO foi realizado o cálculo da reta de re- nhos motores estimulados com atividades
gressão do desenvolvimento motor. Esse individuais era facilitada sua participação
cálculo apresentou os totais de compor- nas brincadeiras em grupo realizadas em
tamentos estimados pelo inventário por sala de aula. Diante das alterações veri-
faixa-etária e onde a criança avaliada se ficadas na comparação do repertório an-
localizava na reta. Depois disso, o pré-tes- terior da criança com os desempenhos
te foi comparado com o pós-teste (IPO) e adquiridos posteriormente, pode-se des-
os desempenhos incluídos no repertório tacar que a intervenção realizada nessa
da criança consistiram naqueles que não área específica de desenvolvimento foi
haviam sido considerados como parte do efetiva. Atualmente, se reconhece que as
repertório dessa criança nem pela mãe crianças cegas que não recebem estimula-
nem pela professora antes da intervenção ção especializada no primeiro ano de vida
e depois foram acrescentados pelas duas apresentam atraso no desenvolvimento,
ao repertório após a intervenção. Com por esse motivo necessitam de uma maior
base nessa comparação e nos registros estimulação para que desenvolvam suas
manuais e em vídeo foi possível verificar potencialidades. Faltou à criança partici-
que após a intervenção foram alcançados pante do estudo a devida estimulação nos
os sete objetivos específicos desse estudo. seus primeiros anos, conforme relato da
Os objetivos correr e locomover-se com mãe e da professora. Entretanto, a criança
velocípede foram alcançados pela crian- demonstrou ter capacidade para adquirir,
ça apenas com auxílio de outra pessoa. com o auxílio de estimulação especializa-
Outros desempenhos motores existen- da, vários comportamentos e desenvol-
tes no IPO foram incluídos no repertório ver suas potencialidades. Com apenas 18
da criança após intervenção. Alguns de- sessões, foram obtidas modificações sig-
sempenhos foram incluídos apenas pela nificativas no comportamento da criança

484
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cega. Diante disso, pode-se afirmar que a sexuais e relacionais da constituição do


estimulação realizada de forma adequada aparelho psíquico. O conhecimento sobre
pode contribuir para a criança cega, com a origem dos bebês manifesta uma pro-
deficiências adicionais ou não, adquirir gressão genética baseada nas “formas”
senso de equilíbrio, autoconfiança e in- gerais do desenvolvimento das estruturas
dependência, tão importantes para seu do pensamento postuladas por Piaget.
desempenho geral no ambiente escolar. Na obra freudiana, as teorias sexuais in-
Esse estudo, portanto, fornece estratégias fantis (falocêntrica, sádica do coito e clo-
para promover o desenvolvimento motor acal) são destacadas como os primórdios
de crianças cegas, contribuindo de modo do vínculo da criança com o saber e seu
significativo para futuras intervenções. desenvolvimento psicossexual modelará
as características dessas construções. A
Palavras-chave: desenvolvimento motor, escolha das contribuições de ambos os
criança cega, intervenção. autores se justifica em suas concepções
Contato: Maria Luiza Pontes de França Freitas de desenvolvimento, que permitem en-
- Universidade Federal de São Carlos tender a constituição subjetiva e mental
mluizapf@yahoo.com.br da criança a partir de um processo mul-
tideterminado. Este trabalho se baseia na
hipótese de que os processos estruturais
LT01-796 - A CONSTRUÇÃO DO do desenvolvimento cognitivo da criança
CONHECIMENTO SOBRE O NASCIMENTO: se desenvolvem de maneira correlativa e
CONSIDERAÇÕES A PARTIR DO DIÁLOGO convergente aos aspectos psicodinâmicos
ENTRE AS TEORIAS PIAGETIANA E do pensamento e aos conflitos psíquicos
FREUDIANA e fantasias universais em relação à sexu-
Mariana Inés Garbarino - IP/USP alidade. Para isso, articula a contribuição
marianagarbarino@usp.br da psicogênese de Piaget e da psicanálise
Maria Thereza Costa Coelho de Souza - IP/USP por considerar que ambas se distanciam
mtdesouza@usp.br. dos dualismos corpo-mente e afetividade-
Financiamento: CNPq -inteligência que levam a reducionismos
na interpretação dos processos cognitivos
A análise da construção dos conhecimen- e afetivos do desenvolvimento humano.
tos das crianças sobre o nascimento e a Os dois corpos teóricos admitem refletir
fecundação exige ferramentas conceitu- acerca dos limites do fator social, e espe-
ais que abordem diferentes aspectos do cialmente da educação, diante do pensa-
desenvolvimento. O presente trabalho se mento egocêntrico/pré-operatório e do
situa na linha do estudo da inteligência e caráter universal das teorias sexuais infan-
da afetividade e se fundamenta nas con- tis. Para ambos os autores, a tenacidade
tribuições da psicogênese e da psicanálise das convicções das crianças persiste ape-
por considerá-las as mais adequadas para sar da observação de fatos contraditórios
tratar a questão. A primeira fundamenta a sua crença e da influência dos discursos
sua teoria nos fatores cognitivos e afeti- dos adultos. A relevância do problema
vos implicados na construção do conhe- da origem dos bebês na perspectiva pia-
cimento. A segunda, nos aspectos psicos- getiana se sustenta na afirmação de que

485
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a curiosidade relativa ao nascimento é o Partindo do método clínico piagetiano


que está no ponto de partida das pergun- foram realizadas 60 entrevistas individu-
tas sobre a origem das coisas de maneira ais e semiestruturadas, com crianças de 4
geral e, portanto, do artificialismo. Outra e 8 anos de escolas de Campinas/SP. Os
importante fonte de artificialismo, segun- níveis das respostas foram estabelecidos
do Piaget, é o singular sentimento filial com base nos sucessivos períodos do ar-
das crianças pequenas. Aproximadamen- tificialismo e animismo propostos por
te aos 6/7 anos começa uma crise intelec- Piaget nas suas pesquisas, além de consi-
tual e moral da onisciência e onipresença derar o nível de descentração das respos-
dos pais que coincide com uma crise do tas (por oposição às mais egocêntricas).
artificialismo mitológico e o início da ten- Foram organizadas a partir de três blocos
dência ao artificialismo técnico. O vínculo temáticos: Nascimento e origem do bebê
da criança com os pais também foi espe- (fecundação e saída da barriga); Vida in-
cialmente destacado por Freud para expli- trauterina (alimentação e crescimento
car o complexo de Édipo, sua dissolução e do bebê) e Diferença entre os sexos. Os
o ingresso ao período de latência. Nesse dados coletados mostram recorrência de
período, a tentativa de decifrar os enig- certas respostas e corroboram tendências
mas do sexo ativa traços inconscientes do do pensamento simbólico (como sincre-
primeiro período e assim as novas desco- tismo e admissão da contradição) espe-
bertas se misturam com idéias falsas e re- cialmente nas crianças mais novas. Tam-
síduos das teorias sexuais infantis de fases bém foi verificada a tendência narcisista
anteriores. A respeito do nascimento, Pia- intelectual que funciona, segundo Piaget,
get (1926) considera que em um primeiro como a única prova possível da qual a ló-
momento a criança do período pré-ope- gica infantil se serve durante muito tem-
ratório sustenta a pré-existência do bebê po. Acerca do nascimento, observaram-se
e as perguntas surgem em referência a três níveis de respostas. No primeiro, as
onde estava antes de nascer. Logo, se per- crianças afirmam que o bebê sai da bar-
guntará acerca do como da formação dos riga, mas sem especificações de como se
bebês e o papel dos pais. Nas primeiras tira. Um segundo grupo de respostas in-
perguntas, que supõem a pré-existência clui processos como a ação do médico.
(estágio de pré-artificialismo), há ligação Um terceiro grupo menciona o nascimen-
pais-criança no sentido de que a vinda do to pela barriga ou por outro lugar. A res-
bebê é considerada querida e determina- peito da fecundação foram estabelecidos
da pelos pais, mas sem que seja feita a três níveis de crenças: Mágicas com pre-
pergunta sobre como o bebê pode vir à existência, Mistas com fecundação mági-
existência. Diante do exposto, o presente ca e Realistas deformadas. As respostas
trabalho visa apresentar um recorte da variam entre idéias de preexistência do
pesquisa que está sendo realizada a partir bebê na barriga, de alimentação materna
da seguinte pergunta: como se constroem fecundante e da participação de uma se-
as crenças sobre a origem dos bebês nas mente de origem ambígua, oferecida pelo
crianças de 4 a 8 anos e qual é a sua pro- pai ou pelo “papai do céu” e que a mãe
gressão genética em relação ao desenvol- ingere. Em linhas gerais, nas respostas das
vimento da inteligência e da afetividade? crianças mais novas, para ter um bebê

486
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pode ser suficiente desejá-lo ou pedir a de que as funções vitais findam com a
Deus e a função do pai aparece restringida morte e a universalidade, significa dizer
aos cuidados da mãe e do bebê. A respei- que a morte serve para todos e que uma
to do nascimento, a crença predominante hora ou outra irá ocorrer (Torres, 1999).
é a do médico que corta a barriga e tira o Determinado esse conceitos, é possível
bebê, omitindo o nascimento pela vagina. compreender o fato de que informar à
Com os resultados da pesquisa espera-se criança que algum ente querido faleceu
aprofundar a compreensão sobre a cons- não é uma tarefa nada fácil. O adulto
trução do conhecimento das crianças so- tende a adiar esse momento por algum
bre a fecundação e o nascimento, e avaliar tempo, acreditando que desta forma es-
a pertinência do diálogo entre conceitos tará protegendo-a da dor do luto e ameni-
piagetianos e freudianos para estudar as zando seu sofrimento, além de que, falar
particularidades afetivas e cognitivas do sobre isso fará com que apareçam senti-
desenvolvimento infantil. mentos difíceis de lidar e que confirmam
a realidade vivida (Bolwby, 1985; Kovács,
Palavras-chave: nascimento e fecundação; 1999). São várias as explicações que pos-
psicogênese piagetiana; psicanálise. sivelmente são dadas aos pequenos: “a
Contato: Mariana Inés Garbarino (IP/USP) de que o pai ou a mãe foi viajar, ou talvez
marianagarbarino@usp.br que foi transferido para outro hospital”
(Bolwby, 1985, p. 283); a de que o ente
querido foi levado para o céu, o que leva o
LT01 – 1025 – LUTO NA INFÂNCIA: UMA menor a ficar confuso, achando que o céu
VISÃO DA EQUIPE DE ENFERMAGEM é apenas um lugar distante e que a vol-
Camilla Ramos Medalane Cravinho - UVV ta irá acontecer mais cedo ou mais tarde.
camillamedalane@yahoo.com.br Também há algumas explicações relacio-
Claudia Patrocinio Pedroza Canal - UVV nadas a pessoas mais velhas, como, dizer
claudia.canal@uvv.br que estas foram dormir; porém, a criança
não entende de forma conotativa e acaba
Compreender a maneira como a crian- acreditando que o simples fato de ador-
ça hospitalizada vivencia o luto de outra mecer pode ser algo arriscado (Bolwby,
criança no hospital é de grande relevân- 1985). Segundo Brazelton (1994), é im-
cia, pois a partir disso é possível descobrir portante que os pais compartilhem seus
estratégias que fundamentem o programa sentimentos relacionados ao luto com
de intervenção do profissional da psicolo- os filhos. Apesar destes terem uma ideia
gia. Para entender como a criança desen- primitiva da morte, são capazes de iden-
volve o conceito de morte, foram identi- tificar os sentimentos de tristeza a partir
ficados três componentes fundamentais das expressões faciais (Harris, 1996). En-
que a caracterizam: irreversibilidade, não tão, com a transmissão do sofrimento do
funcionalidade e universalidade. Sendo adulto, a própria criança também será ca-
que a irreversibilidade refere-se ao fato paz de dividir suas emoções e se sentirá
de que algo com vida, se morrer não há mais segura e aliviada em relação a essa
a possibilidade voltar a viver; a não fun- questão que é inerente à vida (Brazel-
cionalidade diz respeito à compreensão ton, 1994; Kovács, 1999). Bolwby (1982)

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

afirma também que, assim como para os esclarecido. A identidade dos participan-
adultos, as crianças necessitam do supor- tes será mantida em sigilo e a divulgação
te de alguém próximo para superar uma dos dados será feita somente por meio
perda. Dessa forma, será capaz de se reor- de nomes fictícios. Os participantes tam-
ganizar internamente e conseguirá aceitar bém poderão retirar seu consentimento
a morte como algo permanente, universal para participação na pesquisa a qualquer
e irreversível. Além do que foi citado, pes- momento de realização da mesma, sem
quisas realizadas por Almeida (2005), re- prejuízo para os mesmo. A entrevista não
velam que o brincar terapêutico também será realizada com as crianças devido à
pode ser uma forma de enfrentar a morte questão ética, prevista nessa mesma re-
e o luto, pois através dele a criança é ca- solução, de que o risco de prejuízo para
paz de representar simbolicamente essa a criança de falar sobre conteúdos rela-
situação dolorosa. Sendo assim, sabendo- tivos ao luto estando numa situação de
-se da dificuldade de se perder um ente hospitalização poder ser maior do que os
querido, a pesquisa tem como objetivo benefícios previstos para o campo cientí-
identificar o enfrentamento da morte por fico. Finalmente, em relação aos resulta-
crianças hospitalizadas, a partir da visão dos, pretende-se identificar, por meio da
da equipe de enfermagem de um hospi- equipe da enfermagem, a maneira como
tal da rede pública da Grande Vitória/ES. as crianças vivenciam o luto. Dessa forma
A pesquisa contará com 10 profissionais será possível descobrir estratégias que
da equipe de enfermagem (enfermeiros, fundamentem o programa de intervenção
auxiliares e técnicos de enfermagem), de do profissional da psicologia e obter res-
ambos os sexos. Será realizada uma en- postas que agreguem conhecimento para
trevista com duração aproximada de 20 a área científica.
minutos. Para ser incluído na pesquisa, o
participante terá que ter vivenciado algu- Palavras- chave: criança hospitalizada, equipe
ma situação de morte na pediatria. Esta de enfermagem, luto.
pesquisa será do tipo descritiva, pois visa Contato : Camilla Ramos Medalane Cravinho -
a descrever a visão dos profissionais da Centro Universitário Vila Velha
enfermagem sobre a vivência de luto por camillamedalane@yahoo.com.br
crianças hospitalizadas. Os dados coleta-
dos ao longo do estágio serão analisados
de modo qualitativo. As categorias serão LT01-1066 – ABORDAGEM CENTRADA
criadas após a realização das entrevistas, NA PESSOA: PROMOÇÃO AO
das transcrições e da leitura das mesmas, DESENVOLVIMENTO
a fim de retratarem com fidedignidade os Lydia Maria Sena e Santos
conteúdos das entrevistas. Essa pesquisa Daniela Ribeiro Barros
atenderá à resolução 196 de 1996, do Con- José Andrade Costa Silva - UEPB
selho Nacional de Saúde sobre as normas www.uepb.edu.br
éticas para pesquisa com seres humanos.
Assim, participarão da pesquisa aqueles Este trabalho objetiva apresentar o estu-
profissionais que concordarem após lei- do de um caso clínico embasado na Abor-
tura do termo de consentimento livre e dagem Centrada na Pessoa e no método

488
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da ludoterapia não-diretiva, visando favo- necessitava trabalhar a autonomia, con-


recer o desenvolvimento da criança como centração, entendimento dos processos
um todo. Nessa perspectiva, foram traba- relativos ao conhecimento da realidade
lhados, através da brincadeira, os senti- e seus sentimentos envolvidos na dificul-
mentos relativos à experiência imediata dade de aprendizagem. Nesse momento
da criança, com a utilização das atitudes houve o encaminhamento e passei a me
facilitadoras e respostas-reflexo propos- inteirar do processo terapêutico de João.
tas por Carl Rogers. O presente trabalho A sessão de repasse foi marcada onde foi
trata-se de um estudo de caso, com base produzida uma pipa como objeto de re-
no método fenomenológico, do tipo des- cordação entre cliente e terapeuta. Luisa
critivo. Participou do presente estudo um procurou nos deixar à vontade; e foi no
menino de 5 anos de idade, cursando o clima de aceitação, numa atmosfera tera-
1º ano do Ensino Fundamental, numa es- pêutica que fui introduzida no seu proces-
cola da cidade de Campina Grande-PB. As so psicoterápico. Através da observação
intervenções ocorreram na Clínica de Psi- sistemática, percebi em João dificuldade
cologia da Universidade Estadual da Pa- na estruturação espacial e ordenação de
raíba. Os procedimentos para análise dos sequências, ansiedade frente à realização
dados foram: transcrição dos atendimen- de atividades, dificuldade psicomotora,
tos, releitura das transcrições e triagem numérica e na linguagem, e principal-
dos eventos mais significativos durante os mente, insegurança e dependência. Em
atendimentos. O caso em questão trata- seguida foi realizada a entrevista psicoló-
-se de João (nome fictício), um garoto gica com os pais do menino com o objeti-
que foi atendido no Serviço de Triagem vo da “clarificação da queixa inicial, a sua
da Clínica de Psicologia da UEPB, encami- contextualização, favorecendo o conheci-
nhado pela Assistente Social do Centro de mento das condições familiares e sociais,
Saúde Municipal, por ser filho adotivo e os vínculos estabelecidos e os papéis de-
sua mãe apresentar dificuldades para tal sempenhados” (Camon et al, 2004, p.11).
revelação. Também foi encaminhado pela Nesta, os pais relataram a persistência
Professora e pela Coordenadora Pedagó- da dificuldade na aprendizagem, falta de
gica da escola onde estuda, por apresen- atenção, insegurança, medo de ficar so-
tar comportamentos agressivos, falta de zinho e dependência como pressupostos
limites, dificuldade na socialização e na para continuar o processo. Nas sessões
linguagem e medos. Inicialmente João subsequentes, buscou-se estabelecer
foi atendido durante 7 meses por Luiza uma análise situacional ou avaliação psi-
(nome fictício), uma estagiária daquele cológica pautada na observação, entrevis-
setor. Já na anamnese realizada por ela tas e uma visita à escola. Considerando a
surgiu outra queixa: ansiedade diante análise situacional nas sessões realizadas
das atividades que necessitava realizar. no final do ano, além de suas dificuldades
Durante o acompanhamento psicoterá- apresentadas, percebeu-se a consistência
pico por Luiza, João apresentou várias do vínculo terapêutico, e com ele, João
conquistas, como a extinção do compor- pôde expor seus sentimentos, medos,
tamento agressivo. Com término do está- angústias e assim, revelar seu verdadeiro
gio de Luiza, esta verificou que João ainda “eu” através dos brinquedos e das brinca-

489
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

deiras. Durante essas sessões uma frase ler. Segundo a professora, João não con-
permeou os atendimentos: “É muito difí- segue ler, interpretar e expor sua opinião,
cil”, principalmente quando as brincadei- embora tenha uma ótima participação
ras lhe exigiam concentração e habilida- nas atividades lúdicas. Acrescentaram
des específicas, assim como o medo de que todas as suas atividades eram reali-
ficar sozinho. Para finalizar o ano e iniciar zadas sob sua mediação ou de um colega,
o recesso na universidade, foi necessária e que se perdia na ordem do alfabeto e
uma nova sessão com os pais. Nesta, fala- dos números. Durante as sessões seguin-
ram dos avanços no desenvolvimento de tes João conseguiu desenvolver habilida-
João: na aprendizagem, passou de ano e já des na escrita, conhecimento em relação
conseguia escrever e, na interação social, aos números, dinheiro, valores, somas e
já que conseguia participar da roda de respeito às regras dos jogos e demais re-
conversa na escola e aceitava bem a mu- gras, autonomia, segurança na escrita e
dança de psicoterapeuta. Dessa forma, foi ordenação numérica, segurança na late-
acordado para o ano seguinte, com o iní- ralidade da escrita, clareza dos seus sen-
cio das atividades da Clínica de Psicologia timentos e indícios para alta. Nas sessões
da UEPB, um novo contato para conhecer de preparação para alta, o mesmo pôde
os interesses na continuação dos atendi- resgatar momentos importantes, como a
mentos psicoterápicos. Com a retomada pipa que confeccionara com Luiza e nossa
das atividades da clínica no início do ano, primeira sessão juntos, bem como nossos
firmou-se novamente o contrato terapêu- jogos de futebol. Vale salientar que João
tico objetivando trabalhar os sentimentos recebeu calmo e tranquilo a notícia da
de João envolvidos em suas dificuldades alta, embora expressasse preocupação
de aprendizagem, atenção, insegurança, por não compreender o real espaço de
dependência, e como lidar com as separa- tempo das sessões quinzenais. Durante
ções e mudanças afetivas. Nos primeiros estas, João tomou consciência de que iría-
contatos, percebeu-se uma notável evo- mos terminar; continuou o seu progresso,
lução em João. Quanto às mudanças, não não regrediu, pelo contrário, começou a
expressou insatisfação na troca de sala expressar seus sentimentos com clareza,
de atendimento; apresentou paciência, expor suas idéias e lembrar fatos passa-
concentração e persistência; no entan- dos. Hoje João continua com dificuldades
to, continuou manipulando as regras dos na aprendizagem, no entanto, todas as
jogos em seu favor. Com a continuação outras queixas que o fizeram procurar o
do processo, João passou a respeitar as processo psicoterápico cessaram. Portan-
regras estabelecidas e delimitar o espa- to, é com sentimento de muita satisfação
ço, bem como criar suas próprias regras. que este caso é concluído, tomando como
Também se pôde perceber sua dificulda- avaliação as visíveis mudanças de João.
de numérica, por meio da qual houve a
autorização de João para que se visitasse Palavras-chave: Psicoterapia Infantil;
sua escola. Na escola tanto a professo- Abordagem Centrada na Pessoa, Dificuldade
ra como a coordenadora pedagógica de de aprendizagem.
João relataram que o percebiam inquieto,
disperso e angustiado por não conseguir

490
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-1069 - HIV/AIDS NA IDADE como objetivo conhecer e analisar aspec-


MADURA: UM ESTUDO SOBRE AS tos do relacionamento conjugal e familiar
REPERCUSSÕES NO CASAL E NA FAMÍLIA de um casal heterossexual infectado pelo
Renata Maêve Faleiros - UCB vírus HIV, bem como o impacto e as mu-
Maria Alexina Ribeiro - UCB danças causadas pela doença no sistema
Luciene Pires de Araújo Lins - UCB conjugal e familiar. Trata-se de uma dis-
renatamaeve@terra.com.br sertação de mestrado da primeira autora
orientada pela segunda. Devido ao seu
A aids (acquired immune deficiencccccy caráter complexo e subjetivo, o estudo
syndrome) ou síndrome da imunodefi- aqui proposto privilegiou o método da
ciência adquirida é uma das epidemias pesquisa qualitativa, que permite focar o
mais complexas e desafiadoras já enfren- específico e trabalhar com o universo dos
tadas pela humanidade. Uma doença de significados e crenças, compreendendo
dimensões alarmantes, transmitida prin- as relações estabelecidas entre os sujei-
cipalmente pela via sexual, que traz à tos. A pesquisa foi realizada por meio de
tona questões complexas e desafiadoras estudo de caso com um casal heterosse-
como o comportamento sexual e de pre- xual casado há 27 anos, com dois filhos
venção às doenças sexualmente trans- adolescentes. O marido tem 61 anos e a
missíveis, crenças e mitos relacionados à esposa 42. Ambos foram diagnosticados
enfermidade, morte, preconceito, papéis há dez anos como portadores do vírus
e infidelidade. No Brasil, de 1980 a 2008 HIV. O casal participa do Programa Esta-
foram notificados 506.499 casos de aids. dual de DSTAIDS da Secretaria Estadual
Nosso país tem uma epidemia concentra- de Saúde de Goiás. O casal foi convidado
da, com taxa de prevalência de infecção a participar da pesquisa por meio da co-
pelo HIV de 0,6% na população de 15 a ordenadora do programa e, após ser in-
49 anos e de 19,5 casos de aids a cada formado sobre os procedimentos do es-
100 mil habitantes. Inicialmente conside- tudo, assinou o Termo de consentimento
rada como uma praga que abatia somen- Livre e Esclarecido. O projeto foi subme-
te identidades marginais, a aids passa a tido e aprovado pelo Comitê de Ética em
ser percebida como enfermidade que Pesquisa da Universidade Católica de
ameaça a todos e não somente grupos Brasília - UCB. Foram realizados cinco en-
específicos. Pesquisas recentes apontam contros com o casal com duração de duas
para significativo aumento de pessoas in- horas cada, na clínica de psicologia onde
fectadas pelo HIV/AIDS com mais de 50 a primeira autora trabalha. Os instru-
anos de idade e em relacionamento es- mentos utilizados para coleta de dados
tável, denunciando baixos índices do uso foram: roteiro de entrevista semiestrutu-
de preservativo por essa população. Con- rado, genograma, roteiro para a técnica
siderando a família como a base da cons- da colagem, roteiro para a construção da
tituição do sujeito e de seus padrões rela- linha da vida do casal e o roteiro para en-
cionais, construídos ao longo do ciclo de trevista do ciclo de vida familiar, sendo a
vida familiar e essenciais na forma como abordagem sistêmica a base para análise
o indivíduo lida e enfrenta as vivências e interpretação dos dados. Para análise
ao longo da vida, o presente estudo teve dos dados utilizamos a perspectiva inter-

491
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pretativa e construtivista que pressupõe redes de relacionamentos, promovendo


o conhecimento enquanto uma produção mudanças e transformações na sua vida
e não uma assimilação linear da realida- e de sua família. Como sugestões para
de. Trabalhamos com eixos de análise e pesquisas futuras, consideram-se impor-
indicadores, a partir dos quais seis zonas tantes estudos sobre educação sexual e
de sentidos foram construídas. Os dados questões de gênero e papéis relaciona-
mostraram o impacto da descoberta da dos com a negociação de sexo seguro.
doença gera sofrimento e angustia por
levantar questões acerca das circunstân- Palavras-chave: HIV/AIDS; casal
cias da infecção pelo vírus HIV, medo da heterossexual; ciclo de vida familiar.
morte, do preconceito, do tratamento Contato: Renata Maêve Faleiros -
e do estigma da aids. Verificou-se tam- Universidade Católica de Brasília - UCB
bém a importância do apoio da família renatamaeve@terra.com.br
no enfrentamento, como facilitador de
resiliência diante da doença e seus mais
complexos significados, proporcionando LT01 – 1194 – A EXPRESSÃO GRÁFICA
maior adaptação às mudanças. Em re- DA CRIANÇA COMO POSSIBILIDADE DE
lação às mudanças na relação conjugal, PERCEPÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
observamos uma reorganização do siste- MOTOR: UMA PROPOSTA
ma familiar em busca de equilíbrio. Com Ilton de Jesus Viana - UEPA
o aparecimento da doença o casal estu- iltonjv@yahoo.com.br
dado se aproximou mais, aumentando
o companheirismo e o respeito entre os Diante da necessidade de possibilitar que
cônjuges, por meio do desempenho de a aprendizagem esteja sempre acessível
novos papéis dentro da relação. A análi- à criança, faz-se necessário a elabora-
se demonstrou que a aids é uma doença ção de estratégias que possam prevenir
estigmatizante, permeada por crenças e e/ou identificar questões que interfiram
preconceitos que dificultam a sua pre- no processo ensino/aprendizagem. Um
venção e tratamento, tornando-se funda- aspecto que atua diretamente neste pro-
mental a atuação sobre essas crenças a cesso é a evolução da motricidade, por-
fim de promover o sexo seguro, o uso de que ela é uma base fundamental para
preservativo e a prevenção. A pesquisa outras aquisições do ser humano, como
confirma que não existem os grupos de a aprendizagem. A esse respeito, Silva
risco e que a população estudada está et al. (2011) ressalta que o desenvolvi-
vulnerável à doença por questões cultu- mento motor está inter-relacionado com
rais e de gênero relacionadas com a ne- a evolução fisiológica, as condições do
gociação do uso de preservativo por ca- ambiente e as necessidades das tarefas,
sais em relacionamento estável. Os dados que se bem interligadas podem propor-
do estudo demonstraram e confirmaram cionar ao indivíduo novas conquistas. No
a complexidade das relações onde estão entanto, caso ocorra alguma interrup-
presentes o HIV e a aids. Esta é uma do- ção neste processo, especialmente para
ença que envolve o indivíduo física, psí- aqueles que possuem algum déficit ou
quica e emocionalmente, afetando suas transtorno, faz-se necessário a detecção

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

o quanto antes para que se possa inter- aspectos será percebida de acordo com
vir evitando prejuízos futuros (Brêtas et o tipo de desenho ou do comando que é
al., 2005; Mora, 2007; Rosa et al., 2008; dado para executá-lo. No tônus muscu-
Silva, et al., 2011). Neste sentido, o estu- lar se verifica as variações hipertônicas
do do grafismo (desenho e escrita) infan- e hipotônicas, quando o desenho apre-
til surge como uma ferramenta passível senta traços muito grossos quase rasgan-
para este fim, pois sua observação não do o papel observa-se a ocorrência de
exige grandes habilidades do observa- hipertonia (Oliveira, 2008), já quando o
dor e é possível que se faça a detecção grafismo apresenta riscos claro demais,
do indício de atraso no desenvolvimento quase apagados pode ser sinal de hipoto-
motor. Como a evolução motora segue nia (Mora, 2007). A coordenação motora
uma maturação coordenada, também o ampla é necessária para ter uma postura
desenvolvimento da expressão gráfica na corporal adequada diante dos elementos
criança acontece em estágios sucessivos, usados no ato de desenhar. Já a coorde-
o que reflete o grau de seu amadureci- nação motora fina é necessária para se-
mento nervoso (Sistema Nervoso) e mo- gurar o lápis e manuseá-lo corretamente
tor (Mora, 2007). A escolha pelo desenho e quando ao desenhar um círculo e se fi-
se faz pela sua facilidade na execução por zer outro menor dentro dele e um pingo
parte da criança. E pelas inúmeras possi- dentro do segundo círculo (uma cabaça
bilidades que ele representa, porque há com os olhos, por exemplo), aqui tam-
quem considere o ato de desenhar como bém é fundamental a presença de um
processo no qual se expressa experiên- adequando desenvolvimento óculo-mo-
cias vividas, organiza informações e reve- tor. Outros aspectos da evolução psico-
la o aprendizado (Goldberg; Yunes; Frei- motora podem ser evidenciados na análi-
tas, 2005), ou o desenho como forma de se do desenho infantil, como o esquema
representação do espaço (Padilha, 1990), corporal, a lateralização, a senso-per-
o desenho como expressão da linguagem cepção e a percepção espaço-temporal
simbólica (Hammer, 1981; Di Leo, 1985), (Viana, 2011). No entanto, estas evidên-
o desenhar como mediador e facilita- cias têm sido observadas empiricamen-
dor de interações sociais (Dias; Almeida, te, sem rigor científico, o que necessita
2009), ainda o desenho como expressão de estudos que comprovem ou refutem
de sentimento e promotor da comunica- esta hipótese. Como foi referido acima,
ção terapeuta-cliente (Silva, 2010), ape- paralelamente ao desenvolvimento mo-
nas para citar alguns. Além disso, é pos- tor, a expressão gráfica no infante deve
sível, a partir do grafismo infantil, avaliar evoluir continuamente, assim os traços e
e/ou perceber o desenvolvimento de cer- rabiscos dos primeiros anos vão se apri-
tos aspectos da motricidade da criança. morando para circunferências, bolinhas e
Os elementos da evolução motora que até o desenho perfeito da figura humana
a expressão gráfica do infante relaciona- (Oliveira, 2008). Assim, em torno dos três
-se diretamente são: o tônus muscular, anos a criança pode combinar formas re-
coordenação motora ampla e fina e co- tas e circulares, passa a relacionar suas
ordenação óculo-motor (Palácios et al., produções com objetos e pessoas (Pa-
2004; Mora, 2007). A observação destes lácios et al., 2004). Por volta dos quatro

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

anos faz figuras geométricas fechadas, algo simples. E uma vez que ele é funda-
pode deixar de desenhar ações pre- mental para desencadear uma série de
sentes e passar a registras situações de aquisições no sujeito humano como, por
motivação afetiva, aqui a figura humana exemplo, a linguagem e a escrita que são
ainda apresenta grandes desproporções fundamentais para a pessoa entrar em
(Mora, 2007). Aos cinco anos surgem os contato com o mundo exterior e assim
primeiros desenhos de pessoas com ob- adquirir os resultados conquistados pela
jetos nas mãos e a ideia de movimento cultura humana. Com isso, a pessoa pode
é representado nas gravuras. Já por volta tornar-se conhecedora e modificadora da
dos seis anos as ilustrações representam realidade que a cerca. No processo edu-
mais claramente a realidade, a noção de cacional, faz-se necessário que todo edu-
chão e céu está presente, o desenho da cando tenha acesso aos conhecimentos
figura humana dever ser o mais perfeito e produzidos, mas o bloqueio ou retardo
completo (para crianças com motricidade na evolução motor pode interferir nesta
e inteligência normal) possível (Palácios aquisição. Por isso, análise do desenho
et al., 2004; Mora, 2007) o que demons- infantil é uma possibilidade de verifica-
tra o adequado desenvolvimento motor. ção do estágio da motricidade da criança,
Do ponto de vista das funções motoras a permitindo que se intervenha em tem-
partir dos seis/sete anos a pessoa já deve po hábil evitando prejuízos futuros na
ter adquirido as habilidades necessárias aprendizagem. Como isso, o profissional
para possibilitar as demais aquisições poderá estabelecer um plano de inter-
advindas com a aprendizagem (escolar venção junto ao infante a fim de superar
ou não) e das demais interações sociais a dificuldade encontrada, ou deverá en-
que o meio em que vive a proporcionar. caminhá-lo para profissionais que atuem
A evolução do grafismo infantil refere-se na reabilitação destes aspectos.
à elaboração dos desenhos e o desenvol-
vimento da escrita manual. A este respei- Palavras-chave: Grafismo infantil.
to Condemarín e Chadwick (1990 apud Desenvolvimento motor. Avaliação motora.
Palácios et al., 2004) dividem a aquisição
da escrita em três fases: pré-caligráfica,
caligráfica e pós-caligráfica. A fase pré-ca- LT01-1479 - ACOMPANHAMENTO
ligráfica situa-se entre dois e cinco anos PSICOLÓGICO AO PORTADOR DE
aproximadamente e caracteriza-se pelo MUCOPOLISSACARIDOSE
início dos primeiros rabiscos até a elabo- Petruska Oliveira Baptista - UFPA
ração das primeiras letras. Na caligráfica petruska@ufpa.br
que ocorre depois dos cinco anos há o Ana Paula de Andrade Rodrigues
desenvolvimento propriamente dito da
escrita, ela vai até por volta de doze anos. A Mucopolissacaridose (MPS) é uma do-
E na fase pós-caligráfica a pessoas irá es- ença genética rara com manifestações
colher que tipo de letra usará, comple- patológicas progressivas na maioria dos
tando, assim o desenvolvimento do seu sistemas de órgãos. A complexidade das
grafismo. O desenvolvimento psicomotor características clínicas associadas a MPS
é um processo complexo, embora pareça dificulta aos profissionais da saúde uma

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

intervenção preventiva que possibilite indivíduos quanto para seus familiares,


controlar os rumos clínicos que a doen- que acabam por desenvolver doenças
ça possa seguir. Este trabalho teve como psicológicas. Uma avaliação cognitiva
principal objetivo organizar uma linha se faz necessária, por que como a MPS
de cuidados referentes ao acompanha- é uma doença sistêmica, conseqüente-
mento psicológico do paciente portador mente atinge as habilidades sensoriais,
de mucopolissacaridose. Foram inscritos e por conseqüência a cognição e a habi-
dez pacientes no programa, sendo que lidade de aprendizado escolar. Por essas
destes apenas cinco compareceram de razões fica claro que é necessário fazer
forma assídua aos atendimentos psico- avaliação e acompanhamento psicológi-
terápicos. Como recursos de avaliação co com estes pacientes. Em suma, este
foram utilizados Anamnese Psicológica, projeto consiste em organizar uma linha
Inventário CBCL, Questionário de Quali- de cuidados referentes ao acompanha-
dade de Vida e Teste SON. Mucopolissa- mento psicológico do paciente portador
caridose (MPS) é uma doença metabólica de mucopolissacaridose. Foram inscritos
hereditária na qual há falta ou diminui- no Programa Caminhar um total de dez
ção de algumas enzimas que atuam nos pacientes, sendo cinco do sexo masculi-
lisossomos da estrutura celular, as quais no e cinco do sexo feminino. O Ambula-
digerem os glicosaminoglicanos (GAG). tório Cirúrgico onde ocorriam as infusões
Em razão deste erro metabólico a MPS era composto de dois ambulatórios, um
faz parte de um grupo de doença chama- feminino e um masculino. O HUBFS dis-
do de Doença de Depósito Lisossômico. põe de duas salas para as atividades do
(Pinheiro, 2010). A MPS é uma doença Serviço de Psicologia, devidamente equi-
genética rara com manifestações pato- padas com o material necessário para a
lógicas progressivas na maioria dos sis- realização de psicodiagnóstico e de regis-
temas de órgãos. Os sintomas da MPS tro dos atendimentos. Anamnese psico-
variam de acordo com a idade do pacien- lógica: Entrevista semiestruturada, com
te, com o tipo de mucopolissacaridose e o objetivo de colher informações sobre
com a gravidade da doença de cada pa- o paciente. Inventário CBCL e ABCL (Child
ciente. O tratamento da mucopolissaca- Behavior Checklist & Adult Behavior Che-
ridose envolve uma equipe com diversos cklist): Inventário de Comportamentos
profissionais, entre eles estão: médico da Infância, Adolescência e Idade Adulta.
geneticista, pediatra, pneumologista, Questionário que avalia a competência
otorrinolaringologista, oftalmologista, social e problemas de comportamento
ortopedista e neurologista, fisioterapeu- de indivíduos. Questionário de Qualida-
ta, dentista, fonoaudiólogo e psicólogo. A de de Vida: avalia a saúde e o bem-estar
complexidade das características clínicas da criança segundo o relato dos pais e/
associadas a MPS dificulta aos profissio- ou responsáveis. Teste SON-R 2 ½-7
nais da saúde uma intervenção preven- (Snijders-Oomen Niet Verbale Intelligen-
tiva que possibilite controlar os rumos tietest): Teste não-verbal de inteligência
clínicos que a doença possa seguir. Esta que consiste em um conjunto de 4 sub-
insegurança frente ao enfrentamento da -testes (mosaicos, categorias, situações e
doença gera dificuldades tanto para os padrões), os quais são combinados para

495
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

formar um escore de inteligência que re- Pessoal estavam na gama normais. Estes
presenta a habilidade do paciente relati- resultados foram confirmados pelas per-
vo à sua idade. Atividades desenvolvidas: cepções de suas responsáveis e profes-
Análise de prontuários e levantamento sores. A partir do mencionado podemos
de dados de identificação para estabe- dizer que a melhora da qualidade de vida
lecer contato com os responsáveis; Pri- dos pacientes após as sessões de repo-
meiro contato com os responsáveis para sição enzimática e do acompanhamento
esclarecem os objetivos do acompanha- especializado é significativa. Quanto às
mento e quais os procedimentos que avaliações das Competências Sociais e os
serão adotados; Aplicação da anamnese Problemas de Comportamento, os resul-
psicológica; Aplicação do Questionário tados variaram em razão das vivencia que
de Qualidade de Vida; Aplicação do teste cada individuo, pois esta está intrinseca-
SON; Aplicação do CBCL; Elaboração do mente relacionada com as habilidades
laudo; Apresentação de relatório psico- sociais. E, que, apesar do auxílio físico e
lógico à Equipe multidisciplinar. Entrevis- psicológico que o acompanhamento no
ta devolutiva do diagnóstico e possíveis hospital proporciona as dificuldades so-
encaminhamentos à família. Dos 10 pa- ciais, comportamentais e escolares ain-
cientes inscritos, apenas quatro compa- da se encontram presentes, por serem
receram desde o início ao acompanha- uma constante na vida destes pacientes
mento psicológico. O teste SON foi apli- desde o momento da descoberta desta
cado em quatro, sendo duas meninas e doença em suas vidas. Isto se dá por ser
dois meninos. Os resultados da avaliação uma doença sistêmica e atingir todos os
apontaram diferentes graus de Déficit sentidos. Por ser uma doença sistêmica
Cognitivo, ambas as meninas apontaram que altera diversas capacidades, acredi-
grau médio, um dos meninos teve como tamos que esta característica altera os re-
resultado grau abaixo da média, e o últi- sultados apontado para alguns pacientes
mo Dificuldades no Aprendizado. Foram Déficit Cognitivo, pois não visualizamos
aplicados os Questionários de Qualidade dificuldade elaborativa ou ideativa. Os
de Vida em cinco pacientes, duas meni- assuntos relacionados aos atendimentos
nas e três meninos. O resultado para os a pacientes com MPS exige amplo co-
quatro pacientes apontou uma melhora nhecimento de diversos aspectos sobre
na qualidade de vida, ou seja, melhora a psique do paciente, e devem guardar
na saúde e no bem-estar. Foi aplicado o relações específicas com os níveis de de-
CBCL em três pacientes, sendo duas me- senvolvimento e com os sintomas apre-
ninas e um menino, as avaliações para o sentados por cada paciente, respeitando
paciente do sexo masculino nas escalas a premissa da diversidade, da idiossincra-
de Competência Social, Interação Social, sia e individualidade.
Amizades e Família resultou na escala
normal para os responsáveis, enquanto Palavras-chave: mucopolissacaridose;
que na autoavaliação resultou na escala psicopediatria; neurogenética.
limítrofe. Para ambas as meninas, a con-
tagem de Competência Social Interação
Social, Amizades, Família e Adaptação

496
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-910 - MÃES DE CRIANÇAS COM tendo entre 10 a 20% da população mun-


DERMATITE ATÓPICA: ASPECTOS dial. Essa dermatose se caracteriza por le-
PSICOSSOCIAIS sões avermelhadas e prurido (Alvarenga
Tatiana Helena José Facchin - PUCRS & Caldeira, 2009; Ricci, Dondi & Patrizi,
tatyhelena@yahoo.com.br 2009; Myssior, Fontes, Ferreira & Mar-
Helena Diefenthaeler Christ - PUCRS ques, 2008). Embora sua etiopatogenia
helenachrist@hotmail.com não esteja completamente esclarecida,
Deise Fonseca Fernandes - PUCRS esta doença pode ser considerada psicos-
deise.ff@hotmail.com somática por estarem envolvidas ques-
Bruna Ferreira Fernandes - PUCRS tões emocionais, além das físicas, modifi-
brufernandes1@hotmail.com cando, inclusive, a estrutura familiar, pois
Gabriel José Chittó Gauer - PUCRS a família passa a viver em torno desta
ggauer@pq.cnpq.br doença, e, consequentemente, evita situ-
ações que possam desencadear as crises,
Financiamento: CNPq, CAPES, Pró-bolsa tais como mudanças climáticas, ingestão
de alimentos, exposição a alérgenos e
A pele é o maior órgão do corpo humano, situações emocionais (Ferreira, Müller &
tendo como funções o toque, o contato, a Jorge, 2006; Alvarenga & Caldeira, 2009).
respiração, a proteção, entre outros. Além A DA pode ser considerada uma derma-
disso, a pele pode ser considerada o espe- tose social e psicologicamente relevante,
lho das emoções, pois possui uma estrei- pois além de acometer o próprio pacien-
ta ligação com o Sistema Nervoso Central, te, todo o ambiente familiar e profissio-
como, por exemplo, o rubor quando a nal é afetado. É relatado, também, um
pessoa sente vergonha, assim a manifes- impacto financeiro, social e emocional na
tação de conflitos pode vir a aparecer por família do acometido por esta doença de
meio de alguma dermatose (Dethlefsen & pele. Além disso, esta sobrecarga gerada
Dahlke, 2007). Alguns autores (Thomaz, pelos cuidados das crianças com DA gera
Lima, Tavares & Oliveira, 2005; Jorge, conflitos entre o casal e entre os irmãos
Müller, Ferreira & Cassal, 2004; Montagu, saudáveis, alterando a estrutura familiar
1988) afirmam que é possível encontrar (Alvarenga & Caldeira, 2009; Ferreira et
conexões entre as relações iniciais mãe- al., 2006). A abordagem privilegiada nes-
-bebê e a pele, uma vez que os primeiros te trabalho é a psicossomática, na qual a
modelos de vinculação com o mundo ex- “criança para se fazer ouvir, revela simul-
terno começam a ser impressos no corpo, taneamente grande parte dos seus impas-
e a partir disso, no psiquismo da criança. ses de suas formas psíquica e somática”
Desta forma, as dificuldades experiencia- (Myssior et al., 2008). Desta forma, pode-
das pela díade podem ter diferentes vias -se considerar que o sintoma comunica
de manifestação, sendo a doença de pele algo em nível corporal, que acaba infor-
uma delas. Ao contrário da grande maio- mando a família, e adquire um simbolis-
ria dos problemas de pele que, geralmen- mo por estar inserido em uma seqüência
te, têm início na segunda década de vida, de troca de afetos. Os pais utilizam os
a Dermatite Atópica (DA), ou eczema, é sintomas do filho como “elo comunicati-
bastante encontrada na infância, acome- vo de forma rígida”, isto é, o filho sinto-

497
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mático é o canal de comunicação entre o são advindos da relação mãe-bebê, como


casal, pois estes não conseguem definir forma patológica decorrente das relações
sua relação adequadamente. O sintoma objetais. Pode-se dizer que a criança fica
também exerce a função de proteção ao contaminada pelo clima afetivo materno,
sistema familiar, desviando o olhar dos e, quando a mãe depressiva se afasta, a
conflitos existentes para o sintoma em si criança fica impossibilitada de completar
(Ferreira et al., 2006). O estado emocio- a fusão, necessária nesta etapa do ciclo
nal da mãe é primordial para a presença vital e, se estiver no período de forma-
ou ausência de saúde, especialmente ção do psiquismo, estes distúrbios dei-
quando se trata da fase mais precoce da xam cicatrizes tanto na estrutura quanto
criança (Araújo, 2003). McDougall (2000) no funcionamento do aparelho psíquico
ratifica isso, ao afirmar que a mãe pode (Pio, 2007). Assim, este estudo visa inves-
ser incapaz de atender às necessidades tigar os aspectos psicossociais de mães
de seu filho por questões internas (dela) de crianças com Dermatite Atópica, bem
ou por fatores ambientais. Assim, a crian- como a relação mãe-filho(a). A amostra
ça sente-se permanentemente frustrada será composta por 6 mães com idade
e com fúria impotente, de forma a criar entre 18 a 60 anos, com escolaridade mí-
recursos de proteção para crises afetivas nima de 5ª série do ensino fundamental,
e para o esgotamento advindo disso. Esta com filhos portadores de DA entre 6 anos
defesa diz mais respeito ao fenômeno a 9 anos 11 meses e 29 dias. O local será
psicossomático do que à psicose, e assim, o Ambulatório de Dermatologia Sanitária
toda a agressão que não é direcionada à de Porto Alegre e Ambulatório de Derma-
figura materna volta como autoagressivi- tologia do Centro Clínico Santa Marta. O
dade inconsciente no sujeito que adoece. delineamento é qualitativo, descritivo e
Mello, Maia e Silva (2009) acreditam que exploratório, sendo utilizados um ques-
as dificuldades da mãe no cuidado com o tionário de dados sócio-demográficos e
bebê, como não conseguir se aproximar da situação clínica da criança, entrevista
dele, nem segurá-lo, causam neste uma semiestruturada e análise do prontuário
sensação de desconforto, na qual há um clínico da criança. As entrevistas serão
sentimento de falta de proteção corpo- gravadas e os dados obtidos por meio
ral. As relações iniciais entre a mãe e seu das gravações de áudio serão transcritos
bebê têm grande importância para o de- e analisados de acordo com o método
senvolvimento emocional deste, visto que de análise de conteúdo de Bardin (1977).
a partir da atitude emocional da genitora Este estudo está aprovado pelo Comitê
e de seu afeto, ela orienta a criança, cujo de Ética em Pesquisa da PUCRS sob o nú-
aparelho perceptivo e discriminação sen- mero CEP 11/05428. Neste momento, as
sorial se encontra imaturo. Não obstante, participantes estão sendo recrutadas nos
a formação das primeiras relações entre serviços. As entrevistas ocorrerão no mês
esta dupla serve como modelo para as fu- de julho do presente ano. Desta forma, os
turas relações sociais do infante (Thomaz, resultados são esperados até o mês de se-
Lima, Tavares & Oliveira, 2005). Muitos tembro de 2011. Este estudo encontra-se
sintomas físicos infantis, tais como cólica, em andamento, e, portanto, não há con-
eczema, manipulação fecal, entre outros, clusões até o presente momento.

498
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: dermatite atópica, mães, ralidade de trajetórias, a não normatização


aspectos psicossociais e a influência dos contextos sócio-político-
Contato: Tatiana Helena José Facchin, PUCRS, -culturais na constituição de um sujeito
tatyhelena@yahoo.com.br que é ativo em seu processo de estar no
mundo, entende-se que a condição de ser
um adulto com deficiência, com a comple-
CO 09 - LT01 xidade que tal rotulação acarreta, é campo
fértil para análise. Assim, revisa-se a lite-
Deficiência e vida adulta
ratura na Psicologia e disciplinas afins em
que adultos com deficiência são incluídos
nos delineamentos de pesquisa e analisa-
LT01-750 - ADULTOS COM DEFICIÊNCIA
-se a presença de temas transversais como
NA PSICOLOGIA: DESAFIOS PARA
exclusão social, pobreza e violência. Rea-
UMA INVESTIGAÇÃO PSICOLÓGICA
lizou-se revisão exploratória de literatura
POLITICAMENTE CONSCIENTE
com base em artigos disponíveis no portal
Aline Wanderer - UnB SciELO (www.scielo.br), a partir de combi-
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB nações dos descritores psicologia, desen-
www.unb.br volvimento, adulto, deficiência, social e
violência. Algumas publicações internacio-
Este trabalho objetiva investigar como os nais foram incluídas para fins de discussão
adultos com deficiência vêm sendo abor- com a literatura nacional. Foram localiza-
dados pela Psicologia do Desenvolvimento dos diversos estudos, na Psicologia e em
Adulto. Parte de uma análise acerca das áreas correlatas, envolvendo questões vin-
concepções de desenvolvimento humano culadas à experiência de adultos com defi-
que embasam a área e considera algumas ciência. Uma grande categoria identificada
de suas principais linhas de pesquisa. Du- refere-se a publicações relacionadas à saú-
rante o século XX, ocorreram importantes de em temas como reabilitação, qualidade
mudanças na compreensão da psicologia de vida, programas de orientação acerca
sobre o desenvolvimento humano, que de questões como a sexualidade, atuação
passou a ser entendido, genericamente, dos profissionais que intervêm na área da
como transformação ou mudanças em ní- saúde de pessoas com deficiência. A maio-
vel de funcionamento e comportamento, ria dessas investigações preocupava-se
que ocorrem durante todo o ciclo de vida com a identificação de aspectos psicológi-
e percorrem múltiplos caminhos que se cos e repercussões sociais para os indivídu-
diversificam com o avanço da idade e mar- os diante de adoecimento que implica em
cam trajetórias singulares. As teorizações uma condição de perda. Essa perda, relati-
têm dado progressivo valor à noção dos va a alguma funcionalidade anterior do or-
indivíduos como produtos e produtores ganismo, é tomada como eixo central dos
de seu desenvolvimento, exercendo papel questionamentos de pesquisa, buscando-
ativo e intencional. Considerando-se as -se compreender como se pode auxiliar o
contribuições teóricas acerca do desenvol- indivíduo a superá-la, por meio de inter-
vimento adulto provenientes de uma am- venções multidisciplinares que minorem a
pliação desse conceito, que valoriza a plu- desvantagem resultante da nova condição

499
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

orgânica. Temas entendidos como mar- de condições macroestruturais comple-


cadores importantes da vida adulta são xas que envolvem processos de exclusão
considerados em outras áreas, como a pa- social, pobreza, violência, preconceito e
rentalidade, o trabalho e a sexualidade. As estigma. Diante disso, entende-se ser de-
investigações com adultos com deficiência safio da Psicologia do desenvolvimento
intelectual merecem atenção especial, adulto ter algo a dizer, politicamente, com
porque o estigma vinculado à deficiência suas contribuições teóricas, no sentido de
intelectual parece perpassar escolhas teó- auxiliar na fomentação de uma sociedade
rico-metodológicas de pesquisadores com inclusiva, com garantia de direitos de vida
esses sujeitos de forma mais contundente, digna a todos. Nesse sentido, importa re-
inaugurando importantes desafios para a conhecer que toda escolha teórico-meto-
investigação psicológica. De modo geral, dológica é marcada por concepções ideo-
o maior desses desafios é elaborar meto- lógicas e políticas e que a consciência des-
dologias que confiram, verdadeiramente, se fato pode permitir delineamentos de
o status de adultos aos sujeitos com de- pesquisa e elaborações teóricas que não
ficiência intelectual. Projetá-las envolve contribuam para a manutenção do status-
questões como: onde encontrar os parti- -quo sendo, elas mesmas, potencialmente
cipantes da pesquisa (escolas especiais e impulsionadoras de desenvolvimento (em-
contextos familiares versus outros setores poderadoras) dos indivíduos. Nos estudos
da sociedade); a quem solicitar a autori- que focalizam a saúde, a qualidade de vida
zação para a participação desses adultos e a reabilitação, a visão que predomina nas
nas pesquisas empíricas (aos cuidadores escolhas teórico-metodológicas ainda é a
exclusivamente ou aos sujeitos que serão de um desenvolvimento padrão esperado
parceiros na construção do conhecimen- que serve de parâmetro de comparação
to); que instrumentos utilizar para a inte- para compreender aqueles que fogem a
ração com esses adultos, notadamente ele e, por isso, carregam um pressuposto
quando os processos comunicacionais se- de desvantagem. Constitui desafio ideali-
jam qualitativamente diferenciados; como zar metodologias que abordem a reabilita-
conduzir análises que confiram papel ativo ção numa perspectiva de desenvolvimento
aos adultos com deficiência intelectual em por todo ciclo de vida, não linear e aberto
seu desenvolvimento. A literatura analisa- a possibilidades diversas. Nessa perspecti-
da demonstrou que ainda é tímido o tema va, importaria compreender a deficiência
de desenvolver-se adulto com deficiência não como interrupção de um processo de
na Psicologia do Desenvolvimento Adul- desenvolvimento normal, mas como inter-
to. A quantidade de trabalhos relativos ao corrência cabível na vida de qualquer ser
campo da saúde, principalmente voltadas humano e que compõe o processo, sem
à reabilitação é expressiva, embora alguns necessariamente representar prejuízo.
estudos na psicologia voltem-se a aspec- Nos estudos com adultos com deficiência
tos culturalmente considerados como im- intelectual, as desvantagens no processo
portantes marcadores da vida adulta. Con- de pesquisa são evidentes, percebendo-se
tudo, é marcante em todas as produções que em trabalhos com adultos sem com-
o reconhecimento de que constituir-se prometimento cognitivo, há maior tendên-
adulto com deficiência implica o manejo cia em se considerar a deficiência como

500
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aspecto que compõe o desenvolvimento ratura, uma reflexão acerca do ambiente


em vez de limitá-lo. Os estudos que privile- ocupacional como contexto de desenvol-
giam enfoques qualitativos, com ênfase na vimento para as pessoas com deficiência
narrativa e na construção sócio-histórica intelectual (DI). O desenvolvimento das
da identidade, parecem promissores em pessoas com DI é caracterizado por limi-
um campo ainda tão marcado pela incons- tações no funcionamento intelectual e no
ciência das ideologias perpetuadoras das comportamento adaptativo em habilida-
assimetrias de poder. Conclui-se refletindo des conceituais, sociais e prática. Pode-se
criticamente sobre a importância de uma considerar que as pessoas com DI apresen-
produção acadêmica politicamente cons- tam baixo nível intelectual que dificulta a
ciente, em que pesquisadores reconhe- aprendizagem e, consequentemente, a re-
çam os pressupostos ideológico-políticos alização das atividades de vida diária, den-
que embasam suas escolhas teórico-meto- tre outras habilidades. O desenvolvimento
dológicas para se alinharem com um com- humano, segundo Bronfenbrenner (1996),
promisso ético que vise mudanças sociais é regido pelas interações da pessoa com
tendentes à efetiva inclusão das pessoas os contextos de desenvolvimento. Dentre
com deficiência. estes contextos, o ambiente de trabalho,
para as pessoas adultas com DI, pode ser
Palavras-chave: adultos com deficiência; considerado de grande importância para
psicologia do desenvolvimento adulto; construção da identidade, desenvolvi-
inclusão social. mento social e emocional (Amaral, 1994;
Contato: Regina Lúcia Sucupira Pedroza – Araújo, Escobal & Goyos, 2006; Escobal,
Universidade de Brasília (UnB). Araújo & Goyos, 2005). Os processos de
rpedroza@unb.br capacitação profissional e de inserção no
mercado de trabalho podem ser conside-
rados como meios importantes de aquisi-
LT01-777 – O TRABALHO COMO ção de habilidades para as pessoas com DI,
CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO visando à inclusão efetiva destas no meio
PARA AS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA ocupacional, ou seja, trata-se de processos
INTELECTUAL que têm implicações no funcionamento do
Adelaine Vianna Furtado - UFJF sujeito, bem como na interação da pessoa
ane_vf@yahoo.com com o ambiente. A formação profissional
Nara Liana Pereira-Silva - UFJF dirigida às pessoas com DI, no Brasil, vem
naraliana.silva@ufjf.edu.br sendo ofertada pelos Centros de Educação
Especial, principalmente, através de ofici-
As leis que regem o contexto de desenvol- nas que visam desenvolver competências
vimento das pessoas com deficiência são voltadas para o trabalho. Entretanto, ve-
iguais às que regem o desenvolvimento rifica-se que o mercado competitivo tem
das pessoas sem deficiências, porém, o demandas que as instituições profissiona-
desenvolvimento quando é comprometido lizantes nem sempre conseguem suprir. O
por alguma deficiência ocorre de manei- treinamento para o trabalho, geralmente,
ra diferenciada. O presente trabalho visa é dirigido para atividades ocupacionais
apresentar, por meio dos dados da lite- gerais, tais como jardinagem, artesanato,

501
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dentre outras, as quais oferecem poucas necessárias como competências para in-
vagas de empregos. É fundamental que serção e manutenção das pessoas com DI
ocorra o ajustamento ao trabalho com a no trabalho, visto que esse tipo de compe-
criação de oportunidades para as pesso- tência é de suma importância para o ade-
as com DI desenvolverem e mostrarem quado ‘funcionamento’ do indivíduo não
suas competências dentro de uma ótica somente no local de trabalho, mas tam-
de mercado mais real. Não basta, apenas, bém na comunidade, na família, dentre
treinar algumas habilidades básicas para outros sistemas sociais (Tanaka & Manzini,
que ocorra a efetiva inclusão das pessoas 2005). Considerando o papel do contexto
com DI no trabalho. Por outro lado, não do trabalho para a promoção ou não do
é necessária somente a preparação da desenvolvimento do indivíduo, bem como
pessoa com DI (escolaridade, qualificação da escassez de estudos com a população
profissional etc.), mas também é preciso brasileira é que se faz necessária a imple-
que as empresas tenham condições físi- mentação de estudos que visem uma re-
cas e sociais para promoverem a inclusão, flexão do processo de inclusão, de forma,
além do apoio para efetivar a acessibili- a contribuir para a geração de dados que
dade e estreitar os vínculos entre as insti- possam subsidiar políticas de atenção às
tuições profissionalizantes e as empresas. pessoas com deficiências em nosso país.
Independentemente da maneira com que
ocorre a inclusão no trabalho, este tema Palavras-chave: deficiência intelectual;
vem se tornando cada vez mais relevante inclusão no trabalho; desenvolvimento
por sua importância na perspectiva do de- humano.
senvolvimento dessas pessoas, podendo Contato: Adelaine Vianna Furtado.
subsidiar dados empíricos que fomentem Universidade Federal de Juiz de Fora.
programas de preparação do jovem com ane_vf@yahoo.com.br
DI ao mercado de trabalho. A produção
científica nesta área ainda é escassa, prin-
cipalmente, no Brasil. É preciso envidar LT01-1261 – DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
esforços no sentido de planejar estudos NA VIDA ADULTA: PRODUÇÃO CIENTÍFICA
que busquem um melhor entendimento NACIONAL
do processo de inclusão, bem como do im- Sueli de Souza Dias - UnB/SEEDF
pacto desse processo no desenvolvimento suelidiass@gmail.com
das pessoas com DI. Não há dúvidas quan- Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB
to à importância da inclusão no trabalho, mcsloliveira@gmail.com
destacando esta como via de inserção das
pessoas com deficiências nas relações de Transição para a vida adulta é uma circuns-
produção e consumo, portanto, de inclu- tância significativa para o desenvolvimen-
são social também. Além disso, trata-se to do ser humano, pois um conjunto de
da continuidade do atendimento educa- mudanças se processa, tendo o indivíduo
cional, podendo proporcionar aquisição que se reorganizar tanto do ponto de vista
de boa conduta e reconhecimento pessoal da própria subjetividade, quanto no rela-
e profissional. Dessa forma as habilidades cionamento com o seu mundo circundan-
sociais vêm sendo consideradas as mais te. Trata-se de um momento de escolhas

502
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e emergência de novas responsabilidades, demonstrar as atuais pesquisas realizadas


que possibilitam ampliação do contexto na área e as lacunas a serem preenchidas.
imediato através de inserção social na vida Levantamento bibliográfico geral dos ar-
laboral e ressignificação da vida acadêmi- tigos sobre deficiência intelectual no por-
ca, familiar e comunitária. Estudos sobre tal Periódicos CAPES (Brasil, 2011), sem
transição para a vida adulta e desenvol- delimitação de datas, nas bases de dados
vimento adulto ganharam destaque nas Scientific Electronic Library Online – Brasil
últimas décadas, sobressaindo-se o inte- (SciELO- Brasil) e Peródicos Eletrônicos em
resse sobre competências profissionais e Psicologia (PePSIC). Observou-se, inicial-
aspectos cognitivos. Duas grandes linhas mente, o período das publicações, direcio-
de pesquisa se destacam: (a) a perspecti- namentos e temas abordados. O procedi-
va life span, discutindo mudanças ao longo mento seguinte foi a seleção e análise das
da vida (Baltes, 1987, Baltes, Staudinger & produções específicas sobre pessoas com
Lindenberger, 1999) e (b) estudos sobre deficiência intelectual na idade adulta. O
self, processos de significação e narrativas, acesso às produções se deu a partir dos
com investigações envolvendo teorias do descritores: deficiência; deficiência inte-
desenvolvimento e teorias psicoterápi- lectual; deficiência mental. O resultado foi
cas (Brockmeier, 2009; D’alte, Petracchi, insatisfatório para as seguintes variações
Ferreira, Cunha & Salgado, 2007; Davies nos descritores: deficiência e vida adulta;
& Harré, 1990; Hermans & Hermans- desenvolvimento adulto; adultez e defici-
-Jansen, 2003). No caso de pessoas com ência. Foram encontrados 76 artigos publi-
deficiência, o processo de transição para cados no período de 1996 a 2010, descon-
a vida adulta está ligado diretamente às siderando aqueles que se repetiram nas
concepções sociais sobre esta condição. duas bases. Observaram-se grandes eixos
Historicamente, pessoas com deficiência, nas publicações: questões conceituais e
quando não exterminadas, foram trata- concepções sobre a deficiência intelectual;
das de forma segregada ou submetidas levantamentos de produções sobre defici-
à infantilização permanente (Dias, 2004; ência intelectual; prevenção de deficiência
Glat, 1989; Meletti, 2008), impedindo a in- intelectual; infância; adolescência; vida
serção social de forma plena e autônoma. adulta; curso de vida. Diferentes temas
A inclusão de pessoas com deficiência faz perpassaram os citados eixos: inclusão;
parte da história recente no mundo oci- interações sociais; habilidades cognitivas;
dental, sendo a deficiência intelectual a práticas educativas; trabalho; saúde; se-
condição que mais tardiamente se coloca xualidade; família. Houve variação signi-
no contexto de inserção social (Barbosa & ficativa nos números de publicações. Não
Moreira, 2009). Este trabalho é parte da foram encontradas publicações no ano de
revisão bibliográfica da tese de doutora- 1998, contrapondo-se ao salto quantitati-
do, em andamento, da primeira autora. O vo em 2006. Totalizaram 26 artigos publi-
propósito do presente estudo foi discutir a cados entre 2000 e 2010. Quanto ao tipo
produção apresentada em periódicos cien- de periódico: três publicações em periódi-
tíficos brasileiros, sobre emergência da cos especializados em educação especial;
adultez e desenvolvimento adulto de pes- duas em educação geral; duas em psica-
soas com deficiência intelectual, buscando nálise; duas em administração; uma em

503
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

psiquiatria; uma em periódico abrangendo liados os programas de acompanhamento


educação e psicologia; 15 em periódicos e promoção educacional dessas pessoas?
de psicologia de diferentes abordagens. Quais os mecanismos sociais existentes
Há um quantitativo menor de publicações para motivar a inserção das pessoas com
com temas como educação, sexualidade deficiência intelectual nas diversas esferas
e qualidade de vida, se comparado com a da sociedade? E quanto ao campo afetivo/
ênfase no tema do trabalho. As áreas de sexual, existem serviços educação sexual
concentração e os temas das publicações que possibilitem ao jovem e ao adulto com
dão indicativo de interesse científico em deficiência intelectual uma reflexão crítica
aspectos importantes ao desenvolvimen- acerca de seu próprio desenvolvimento se-
to na vida adulta: conclusão dos estudos, xual, possibilidade de união estável ou de-
trabalho e desenvolvimento psicológico sempenho da paternidade ou maternida-
(autonomia, habilidades sociais, afetivida- de responsável? Tais questões perpassam
de, dentre outros). O crescimento de pu- a discussão sobre o desenvolvimento do
blicações sobre a fase adulta de pessoas pensamento pós-formal, característica do
com deficiência intelectual pode estar re- pensamento do adulto (Marchand, 2002;
lacionado às novas concepções de mundo Sinnott & Johnson, 1997), destacando-se a
e de ser humano, assim como a evolução necessidade de se pesquisar metodologias
médica e tecnológica que têm propiciado adequadas para a compreensão desse pro-
longevidade às pessoas com deficiência. cesso em relação às pessoas com deficiên-
Da mesma forma, discussões sobre inclu- cia intelectual.
são têm dado visibilidade a situações antes
ignoradas ou consideradas não relevantes Palavras-chave: desenvolvimento adulto; defi-
do ponto de vista da investigação científica. ciência intelectual; produção científica.
O quantitativo de artigos sobre vida adulta
ficou muito próximo do número de artigos
produzidos sobre infância e adolescência LT01-1227 - DEPRESSÃO NA MATURIDA-
juntos, destacando-se o número restrito DE: UM ESTUDO COM MULHERES NO
de artigos acerca deste último, destoando INTERIOR DO RIO GRANDE DO SUL
do que se observa em relação aos adoles-
Jeane Lessinger Borges - ETREM
centes sem deficiência. Os temas discu-
jeanepsico@yahoo.com.br
tidos nos artigos contemplam, em certa
Zuleica Strohschon - SETREM
medida, as preocupações inerentes à vida
zuleica.psico@yahoo.com.br
adulta (Arnet, 2001). Entretanto, o quanti-
Diana Kettner - SETREM
tativo de pesquisas é ainda restrito diante
dyana-tm@hotmail.com
da diversidade de aspectos que envolvem
cada um dos temas, observando-se a ne- Financiamento: Faculdade Três de Maio/SETREM
cessidade de realização e divulgação de
mais pesquisas com diferentes aborda- A Depressão Maior (DM) caracteriza-se
gens. Como garantir que o fim da escolari- pela presença de humor depressivo por
zação possa ter um significado de inclusão duas semanas com anormalidades das
social para as pessoas com deficiência in- funções neurovegetativas (apetite, peso,
telectual? De que forma estão sendo ava- sono), da atividade psicomotora (perda

504
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de energia, de interesse, agitação mo- conjugais, dilemas da maternidade, passi-


tora ou retardo), da cognição (memória, vidade e submissão, violência perpretada
tomada de decisão, culpa, inutilidade, pelo companheiro íntimo e sentimentos
falta de esperança), bem como ansiedade de culpa e de fracasso (Carvalho & Coe-
e ideias suicidas (Bauer et al., 2009). De lho, 2002). O presente estudo refere-se
acordo com estes autores, a DM é o qua- aos resultados de uma pesquisa realizada
dro psicopatológico mais estudado entre no município de Três de Maio/RS, junto
os transtornos de depressivos unipola- a uma amostra de usuários de unidade
res e está associada à alta mortalidade e de Estratégica de Saúde da Família (ESF).
morbidade. Além disso, uma associação Este município se localiza na região no-
entre as variáveis sexo feminino, episó- roeste do Rio Grande do Sul, próximo a
dio prévio e histórico familiar positivo fronteira com a Argentina. A incidência de
aumentam o risco para a DM. A depres- suicídio nesta cidade é significativamente
são é um dos transtornos mentais mais mais alta do que a média do Estado do
observados em usuários de atendimento RS (média de 10,2/100.000) (Roos, Fao-
público de saúde e/ou saúde mental (He- ro, Osmari & Kettner, 2009). As taxas de
gadoren et al., 2009). Sua prevalência na suicídio no RS estão entre as mais do Bra-
população adulta, varia entre 15 a 20%, sil. Além disso, o sentimento de desespe-
em que estima-se que pelo menos 12% rança é um dos mais associados aos atos
das pessoas experimentam depressão suicidas (Dutra, 2010). Considerando es-
grave ao longo da vida (Fenell, 1997). tes aspectos, o presente trabalho aborda
Uma maior incidência de depressão em os resultados de dois estudos realizados
mulheres também foi observada entre na referida amostra. O Estudo I avaliou a
usuários de unidades primárias de saúde presença de sintomas de estresse, de de-
de Porto Alegre/RS (Fleck et al., 2002). pressão e de desesperança entre usuários
Neste estudo, a média de sintomas de- atendidos numa ESF, identificando pesso-
pressivos nas mulheres foi mais alta do as com elevados sintomas de depressão e
que entre os homens. Embora não haja desesperança. Foram aplicados um ques-
uma idade de início para a DM, uma vez tionário sóciodemográfico; o Inventário
que está presente em todas as etapas do Beck de Depressão (BDI), para avaliar sin-
desenvolvimento humano (Bauer et al., tomas de depressão; a Escala de Deses-
2009), estudos têm apontado uma maior perança de Beck (BHS), para avaliar sinto-
prevalência de DM na maturidade (Car- mas de desesperança; e o Inventário de
valho & Coelho, 2002; Fleck et al., 2002). Sintomas de Estresse para Adultos (ISSL),
A depressão em mulheres na faixa etária para avaliar sintomas referentes a fases
entre 40 a 60 anos vem sendo associada de estresse. Os participantes assinaram
as alterações hormonais (Polisseni et al., Termo de Consentimento Livre e Escla-
2009) e à autoimagem feminina e sua re- recido. Os dados foram analisados atra-
lação com a menopausa. Além disso, sin- vés de cálculo estatístico descritivo, fre-
tomas de depressão em mulheres madu- qüência simples e correlação de Sperman
ras, que estejam vivenciando o ciclo vital (SPSS versão 13.0). Foram entrevistados
do adulto maduro, foram associados com 100 usuários de uma unidade de ESF, de
perdas e privações na infância, conflitos ambos os sexos (17% masculino e 83%

505
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

feminino), com idade entre 20 a 80 anos violência psicológica e física perpretada


(M=60 anos; D.P.= 11,87). Nesta amostra, pelo marido e desastres naturais, foram
14.8% dos usuários têm diabetes associa- associados a um alto impacto emocional
da à hipertensão. Os resultados indicaram na vida destas mulheres, incluindo os
que, na amostra geral, a média no escore sentimentos de depressão; e “Depressão,
do BDI foi de 11,23 (D.P.=9,65), bem como feminino e visão de si”, a qual inclui os re-
que 13% dos participantes apresentam latos das mulheres sobre seu self, sendo
sintomas moderados a grave de depres- que a maioria destas faz uma associação
são, sendo que este dado foi associado ao entre a sua imagem e a depressão. As par-
gênero feminino. Não foi encontrada uma ticipantes se descrevem como “sendo a
diferença entre os gêneros quando avalia- própria depressão”, com sentimentos de
da apenas a média de escore no BDI, em- inutilidade, fracasso e culpa. Desta forma,
bora as mulheres apresentassem escore os resultados apontam características de
médio superior (M=11,54; D.P.=10,35) mulheres que se encontram na passagem
quando comparado ao dos homens (M= da etapa do adulto maduro para a velhi-
9,71; D.P.=4,92).Em relação à desesperan- ce, com um quadro crônico de depressão,
ça, observou-se que a média no BHS foi iniciado ainda na etapa do adulto jovem.
de 5,19 (D.P.=3,54) e, ainda, que 15% dos Ressalta-se a necessidade de um olhar so-
entrevistados apresentam sintomas de bre as relações entre depressão e gênero
desesperança de intensidade moderada. feminino, buscando avaliar possíveis con-
Não foi observada a presença de sinto- vergências teóricas sobre estas variáveis.
mas significativos de estresse (M=10,14; Além disso, discute-se a importância do
D.P.=9,25), apesar de ser identificada uma acesso ao atendimento psicológico em
correlação positiva entre o escore do BDI ESFs, a fim de minimizar a cronificação e
e do ISSL (r=.76). A partir deste estudo o risco de suicídio em usuários com sin-
verificou-se que, respectivamente, entre tomas moderados a grave de depressão.
13% e 15% dos entrevistados apresenta- Por fim, torna-se importante avaliar a pre-
ram escores altos de depressão e deses- sença de sintomas de risco e de proteção
perança. O Estudo II se refere a uma pes- à depressão maior, bem como investigar
quisa qualitativa, envolvendo o Estudo de a presença de comorbidade psiquiátrica.
Casos Múltiplos (Yin, 2004), em que parti-
ciparam três mulheres, com idades entre Palavras-chave: Depressão, gênero feminino,
53 a 62 anos, que apresentavam sintomas adulto maduro.
moderados de depressão (Estudo I) e que Contato: Jeane Lessinger Borges, Docente do
tinham histórico de depressão crônica e Curso de Psicologia da SETREM,
com uma tentativa de suicídio. A partir jeanepsico@yahoo.com.br.
de fragmentos de relatos das participan-
tes, ao longo de sessões de psicoterapia,
foram construídas duas categorias: “De-
pressão, feminino e eventos de vida nega-
tivos”, a qual aponta que a exposição a vá-
rios eventos estressores ao longo da vida,
incluindo violência na família de origem,

506
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 28 - LT04 com os outros (Bakhtin, 2006a, 2006b;


Hermans, 1996, 1999, 2001). Apresenta-
Docência mos uma análise de posicionamentos de
uma professora a partir da matriz concei-
tual do self dialógico. Nessa perspectiva
LT04-818 - UM ESTUDO
o self é visto como uma multiplicidade
SEMIÓTICO E DIALÓGICO SOBRE O
dinâmica de posições relativamente au-
DESENVOLVIMENTO DOCENTE A PARTIR
tônomas que se movem em um espaço
DA ANÁLISE DE POSICIONAMENTOS
imaginário, de acordo com as mudanças
Alba Cristhiane Santana - UFG da situação e do tempo (Hermans, 1996,
albapsico@gmail.com 2001). Os posicionamentos referem-se às
Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB posições que a pessoa assume em rela-
claudia@unb.br ção a si própria e a algo ou alguém, nos
diálogos internos e externos realizados
Este estudo faz parte de uma pesquisa em determinados contextos espaciais e
de doutorado que investigou o desenvol- temporais (Hermans, 2001; Salgado &
vimento de professores no contexto de Hermans, 2005). A posição é um constru-
um programa alternativo de licenciatura, to teórico que representa um conjunto
tomando por indicadores de desenvolvi- complexo de significados e de ações ado-
mento os processos de significação e as tadas pela pessoa na sua relação consigo
mudanças de posicionamentos pessoais a mesma, com o outro e com o mundo,
partir da formação superior. Nosso obje- assim como as interpretações que ela
tivo nesta apresentação é discorrer sobre faz em relação à realidade. Em relação
um estudo de caso (desenvolvido na pes- ao self, é possível pensar que no espaço
quisa maior) acerca do desenvolvimento dialógico a pessoa pode mover-se de uma
e de mudanças de posicionamentos de posição a outra e de um tempo a outro,
uma professora em relação a si mesma e quer dizer, pode circular entre o passado,
à sua trajetória profissional, mediada pelo o presente e o futuro, por meio de narra-
curso superior. Interessa também discutir tivas que carregam lembranças e projeto
sobre as percepções da professora acerca de vida, por exemplo. O termo posiciona-
do seu processo formativo como espaço mento representa a ideia do movimento
de mediação para seu desenvolvimento dinâmico e constante do Eu entre as dife-
profissional. Partimos de uma base que rentes posições que constituem o espaço
associa dois eixos teórico-epistemoló- dialógico, e refere-se a uma ferramenta
gicos, uma perspectiva semiótica do de- conceitual que favorece a compreensão
senvolvimento humano, vista como um tanto da dinâmica interna, como dos pro-
estudo dos significados e dos processos cessos de interação social que levam à
de significação (Bruner, 1997, 1998; Val- construção de significados sobre si e so-
siner, 1989, 2007; Vygotsky, 1934/2000, bre o mundo (Oliveira, Guanaes & Costa,
2003), e uma perspectiva dialógica da 2004). Assim, a noção de posição e de
constituição do self, a qual dá relevância posicionamento é semiótica e dialógica,
às relações dialógicas que são estabele- envolve os processos de significação e as
cidas entre os sujeitos consigo mesmo e relações dialógicas estabelecidas entre os

507
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sujeitos (Salgado & Cunha, no prelo), os em que a professora fala de si e de sua


quais participam da configuração do de- prática profissional usando uma posição
senvolvimento humano. A análise de po- autoral e reflexiva, especificamente usan-
sicionamentos da professora foi realizada do o pronome “eu” e os correspondentes
a partir de uma entrevista mediada por me/mim, meu/minha. Na narrativa da
videogravação. O procedimento foi dividi- professora foram identificadas seis posi-
do em duas etapas: a primeira orientada ções em relação à sua prática pedagógi-
por um roteiro semiestruturado, com ob- ca, as quais se destacaram devido à sua
jetivo de provocar questões sobre a tra- regularidade e aos conteúdos expressos.
jetória pessoal da professora na docência Observamos uma relação de dependên-
e sobre suas experiências na licenciatura; cia entre os posicionamentos e de domí-
a segunda etapa foi mediada pela video- nio do espaço dialógico, situação em que
gravação de episódios retratando situa- ocorre um enfraquecimento da possibili-
ções concretas de sua prática docente. A dade de emergência de outras posições,
entrevista foi analisada por meio de um dificultando o surgimento da inovação e
roteiro de análise de posicionamentos, o de processos de desenvolvimento (Her-
qual foi construído apoiado na teoria do mans, 1999; Valsiner, 2002). Quer dizer,
self dialógico e no manual de posiciona- emergem posições que não se confron-
mentos elaborado por Salgado e Cunha tam a ponto de dominar o espaço e nem
(no prelo). O roteiro contemplou os se- criam estados de tensão que possibilitem
guintes passos: a) construção de catego- processos de mudança. Os significados de
rias de análise dos posicionamentos; b) cada posição são construídos a partir das
identificação de unidades de significação relações dialógicas e conforme as caracte-
(Vygotsky, 1934/2000); c) microanálise de rísticas dos contextos sócio-culturais e re-
cada unidade (Cunha, Salgado, Santos & lacionais. Esse processo é caracterizado,
Marques, 2009; Salgado & Cunha, no pre- segundo Salgado e Hermans (2005), por
lo); d) análise das formas de relação dialó- um interjogo contínuo do sujeito consigo
gica entre os posicionamentos (Hermans, próprio e com o outro, onde significados
2001b; Valsiner, 2002); e) elaboração de são negociados e trocados, promoven-
um diagrama para representar tais formas do um movimento de posicionamentos
e a organização hierárquica entre as posi- e reposicionamento. Em tal movimento,
ções (Salgado & Cunha, no prelo; Valsiner, conforme Hermans (1996, 1999) podem
2002). Uma das categorias de análise dos ocorrer confrontos que resultam em ins-
posicionamentos foi: os Posicionamentos tabilidade e estados de tensão, gerando
autorreflexivos assumidos pela profes- processos autoreflexivos e favorecendo o
sora em relação à sua prática docente. A surgimento de novas posições. No estu-
análise de tais posições propiciou indica- do de caso apresentado notamos que os
dores sobre a percepção da professora posicionamentos construídos pela profes-
acerca da influência do processo forma- sora ao longo da entrevista fundam uma
tivo vivenciado na licenciatura em sua relação de dependência, tal como descri-
ação docente e em seu desenvolvimento ta por Valsiner (2002), onde um fortalece
profissional. Tais posicionamentos foram o outro e assim, se mantém um estado de
observados em momentos da entrevista estabilidade e não se cria espaço para o

508
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

desenvolvimento de mudanças. Por outro to facilitador dos processos de ensino e


lado, também é interessante sublinhar aprendizagem, uma vez que a criança pe-
que o último posicionamento assumido quena utiliza-se da fantasia/imaginação
pela professora (Eu como professora que para compreender o complexo mundo a
espera mais de sua prática) se mostra fér- sua volta, devendo o educador ter cons-
til para a produção de novos significados ciência de que, em sua prática educativa,
sobre a percepção de si em relação à do- o brincar é uma das atividades essenciais
cência, uma vez que se expressa por uma para o desenvolvimento da identidade e
voz reflexiva que questiona a possibilida- da autonomia. O posicionamento desses
de de desenvolver práticas pedagógicas autores vem de encontro à série de do-
alternativas. cumentos que integra os Parâmetros Cur-
riculares Nacionais, elaborado pelo MEC,
Palavras-chave: análise de posicionamentos; ao explicitar a necessária realização de
desenvolvimento docente; self dialógico. programas que contribuam para a qualifi-
cação destes profissionais, conhecendo e
reconhecendo as características da infân-
LT04-822 - A FORMAÇÃO DO EDUCADOR cia, assumindo uma postura crítica fren-
INFANTIL EM CONTEXTOS LÚDICOS DE te às teorias que embasam sua atuação,
DESENVOLVIMENTO revendo e atualizando suas práticas, e
Valéria Queiroz Furtado - UEL criando novas estratégias educativas que
valeriauel@uel.br atendam os objetivos da educação infantil
Marilícia Witzler Antunes Palmieri - UEL (Brasil, 1998). A atividade lúdica enquan-
marilicia@uel.br to uma ação mediada pelo contexto so-
ciocultural é um recurso educativo funda-
Financiamento: Fundação Araucária – Apoio
mental para o pleno desenvolvimento da
ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico
criança, pois circunscreve a própria noção
do Paraná.
de infância. Enquanto se diverte, sozinha
ou em pares, a criança vivencia o lúdico,
A discussão sobre a formação do edu-
descobre-se a si mesma, apreende a rea-
cador infantil em contextos lúdicos1 de
lidade, tornando-se capaz de desenvolver
desenvolvimento tem sido uma preocu-
seu potencial criativo (Siaulys, 2005 cita-
pação atual que impulsiona um grande
do em Queiroz, Maciel & Branco, 2006).
volume de estudos e produções teóricas
De acordo com o Referencial Curricular
(Almeida, 1998; Araújo, 1992; Borba,
Nacional para a Educação infantil (Brasil,
2006; Kamii, 2001; Kishimoto, 1998; Quei-
1998, p. 27), “os jogos e as brincadeiras
roz, Maciel & Branco, 2006). Tais estudos
devem ser parte integrante do projeto pe-
enfatizam o lúdico como um instrumen-
dagógico, pois propiciam a ampliação dos
conhecimentos infantis por representa-
1
No presente trabalho, embora a distinção entre as termi- rem um desafio e provocam o pensamen-
nologias ‘jogo’, ‘brinquedo’, ‘brincadeira’ e a caracteriza-
ção de ‘brincar’, ‘lúdico’ e ‘ludicidade’ tenham um espaço
to reflexivo da criança”. As crianças estão
próprio para serem explicitadas, o uso que fazemos deles na escola para aprender, no entanto, nos
não se limita a tais parâmetros; assim, ‘brincadeira’ ou parece um paradoxo que nem todo traba-
‘jogo’ podem, igualmente, expressar as idéias genéricas de
atividade lúdica ou brincar, sem perda de inteligibilidade. lho escolar produza aprendizagem e, ao

509
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mesmo tempo, “é surpreendente como ção continuada em educação lúdica, a 15


as crianças aprendem enquanto brincam” (quinze) educadoras infantis, provenien-
(Kamii, 2001, p. 171). Para que uma ativi- tes de duas instituições filantrópicas per-
dade possa ser caracterizada como lúdica tencentes à Rede de Ensino de Londrina-
é importante que promova à criança em -PR. O objetivo é oferecer formação teó-
desenvolvimento capacidade de tomar rica e fomentar discussões práticas, a fim
decisões, fazer escolhas, descobertas, de contribuir à conscientização profissio-
perguntas e encontrar soluções (Borba, nal sobre a importância das atividades lú-
2006), definir valores, formar juízos, tor- dicas no favorecimento da aprendizagem
nando a linguagem mais rica por meio da social. O programa incluiu as seguintes
aquisição de novas formas de expressão. etapas: 1ª) Entrevista (inicial) com as edu-
O brincar é, assim, um espaço de desen- cadoras para conhecer suas concepções
volvimento da linguagem, da cognição, sobre ludicidade, e as formas nas quais in-
dos valores e da sociabilidade, pois atra- serem o lúdico no trabalho educativo di-
vés da brincadeira, a criança se apropria ário junto às crianças (roteiro semiestru-
dos conteúdos sócio-culturais disponíveis, turado, gravação em áudio). Uma segun-
tornando-os seus, através de construções da entrevista está sendo conduzida para
específicas (Borba, 2005; Porto, 2002). avaliar o conhecimento gerado durante
Para tanto o educador infantil deve assu- o processo formativo; 2ª) Elaboração de
mir uma postura crítica frente às teorias portifólios para registrar o processo for-
que embasam sua atuação, rever e atua- mativo de cada educadora e auxiliá-la nas
lizar seu fazer e criar estratégias de ação, reflexões sobre o seu próprio processo
as quais o levem a compreender conflitos (etapa em construção); 3ª) Cursos para
e dificuldades postas no seu dia-a-dia es- abordar o aporte teórico-metodológico
colar. Desse prisma, parece inconcebível acerca do papel do lúdico na educação
que as atividades lúdicas não estejam infantil, utilizando perspectivas teóricas
acentuadamente presentes no trabalho defendidas por autores como Piaget e
com a criança pré-escolar. No entanto, a Vygotsky para abordar a proposta teóri-
realidade da maioria de nossas institui- ca do sociocultural construtivismo (Jaan
ções infantis diverge dessa constatação, Valsiner e colaboradores); 4ª) Oficinas de
quando a ‘hora do brincar’ constitui-se jogos (simbólico, regras e jogos coopera-
pelo enquadre espontaneísta. Concomi- tivos) e confecção de jogos educativos de
tantemente é necessário buscar soluções materiais recicláveis. Esta etapa envolveu
educativas para a superação, de um lado, planejamento dos jogos pelas educado-
da manutenção de modelos tradicionais ras, a promoção dos jogos planejados jun-
de educação, pautados na transmissão de to às crianças (gravação em vídeo; análise
conteúdos e no caráter passivo do edu- microgenética, em curso) e uma sessão
cando e, de outro, implementar projetos devolutiva parcial às educadoras sobre os
educativos que enriqueçam as discussões resultados e avaliação dessa etapa. Para
pedagógicas no interior das instituições a realização dos cursos e das oficinas ela-
(Kramer, 2002). É dentro deste contexto boramos apostilas como recurso didático.
que discorremos a forma com que vimos Nas primeiras entrevistas, questionamos
desenvolvendo um programa de forma- a amplitude do conhecimento teórico das

510
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

educadoras em que se respaldam suas LT04-928 - A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA


práticas educativas e problematizamos COMO PROPOSTA DE APROXIMAÇÃO
se estão conscientes da natureza das ati- ENTRE A PSICOLOGIA E A FORMAÇÃO
vidades lúdicas que estão promovendo CONTINUADA DE PROFESSORES.
às crianças. Ao invés de conceberem o Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB
lúdico como promotor de aprendizado, rmirian@unb.br
mostrando experiência prática e reflexões
pedagógicas acerca do brincar, terminam Esse trabalho tem por objetivo apresentar
por fortalecer concepções de que al- uma alternativa de formação continuada
guns jogos e brincadeiras não favorecem de professores, desenvolvida pelo Labo-
aprendizagem. Por outro lado, cursos e ratório de Microgêneses das Interações
oficinas ofereceram-lhes ampla gama de Sociais, do Instituto de Psicologia da UnB,
informações e questionamentos relativos por meio do curso de extensão ‘A Psicolo-
às concepções sobre o brincar como uma gia e a Formação Continuada de Professo-
atividade de construção de cultura basea- res’. O curso visa atender professores da
do nas interações entre as crianças e que Educação Básica do DF, na construção de
envolve aprendizagem, sendo uma for- competências relacionadas à Psicologia
ma de internalizar e recriar a experiência do Desenvolvimento e da Aprendizagem
sócio-cultural dos adultos. Valorizaram e à relação Psicologia e Educação. Trata-se
vivências lúdicas cooperativas, conside- de um curso presencial de 60 horas e que
rando-as valiosas para favorecer o desen- se desenvolve, anualmente, tendo como
volvimento da autonomia e da solidarie- princípio básico a formação do professor
dade, muito embora desconhecessem as pesquisador, na perspectiva da ação-re-
formas pelas qual este tipo de vivência flexão-ação, discutida por Nóvoa e Schön.
pode ser promovido. Acreditamos que as O curso se propõe a contribuir para o pro-
ações até aqui empreendidas têm contri- cesso de construção de duas competências
buído para o planejamento, desenvolvi- essenciais ao professor: (a) conhecer algu-
mento e avaliação das práticas educativas mas teorias do desenvolvimento humano,
no tocante ao lúdico como um instrumen- a fim de instrumentalizar-se para análise
to facilitador de aprendizagem social, das questões teórico-práticas recorrentes
podendo utilizá-lo como instrumento de na educação; e (b) refletir sobre a relação
trabalho cotidiano. O tema da ludicidade entre desenvolvimento e aprendizagem,
atrelado à formação de educadores infan- de forma que se possibilite uma discussão
tis, constitui-se em um desafio teórico e crítica de questões e problemas referen-
prático, capaz de gerar novas reflexões, tes à prática pedagógica. Nesse sentido, o
análises e discussões sobre concepções e curso se utiliza da pesquisação, de maneira
práticas sócio-culturais que venham a se- que o professor possa rejuntar a teoria e a
dimentar ações educativas enriquecedo- prática, a ação e a reflexão, a formação da
res de discussões pedagógicas no interior consciência e a realidade material e cultu-
das instituições. ral. A Psicologia, nesse processo, contribui
para o desenvolvimento de conhecimentos
Palavras-chave: Ludicidade; Formação de e habilidades, além de competências, ati-
Educadores; Educação Infantil. tudes e valores, que possibilitem ao pro-

511
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fessor em formação ir construindo seus de Vygotsky. Segundo a autora, a análise


saberes-fazeres docentes a partir das ne- dessas questões, a partir de diferentes
cessidades e desafios que o ensino, como concepções, contribuiu para a compreen-
prática social, lhes coloca no cotidiano. A são de que a atividade pedagógica exige,
partir desse ponto de vista, a Psicologia do professor, o alinhamento de princípios
deixa de ser vista como um conjunto de co- científicos que viabilizarão o alcance das
nhecimentos teóricos a serem aplicados na metas pedagógicas que se propõem.
prática pedagógica e se reconhece como
um conjunto de referenciais que, ao lado
de outras áreas do conhecimento, pode JOGOS E BRINCADEIRAS NA EDUCAÇÃO
subsidiar a prática, contribuindo no sentido
de melhor compreender e atuar na compli- O estudo teve por objetivo conhecer como
cada dinâmica que se desenrola dentro da os professores da Escola Parque 210/211
escola. Nesse trabalho, especificamente, Norte trabalham com os jogos e as brin-
sintetizamos os trabalhos co-construídos cadeiras, na organização do trabalho pe-
por alunos de algumas das turmas do cur- dagógico de sua sala de aula. Por meio
so, entre eles: O Ensino de Contabilidade; dessa informação, a escola pôde refletir
Jogos e Brincadeiras na Educação; Coorde- sobre outras possibilidades do uso de jo-
nação Pedagógica e Formação Continuada; gos e brincadeiras, de maneira a contri-
Desenho e Desenvolvimento. buir para o desenvolvimento dos alunos. A
metodologia envolveu a utilização de dois
instrumentos fundamentais: o questioná-
O ENSINO DE CONTABILIDADE rio e a discussão comentada de cada um
deles com os sujeitos da pesquisa. Quatro
Nesse estudo, a autora, professora de Con- professoras participaram do estudo. Os
tabilidade num curso de Administração resultados foram apresentados a partir de
em nível superior, tinha como objetivo duas categorias de análise: A vivência de
construir conhecimentos que pudessem situações internas manifestadas pelo ima-
facilitar a ação pedagógica do professor ginário; e Ampliação do desenvolvimento
de contabilidade e indicar caminhos para cognitivo e psicomotor. No que se refere
mostrar, aos alunos de Administração, as à primeira categoria, a autora, embasada
contribuições da Contabilidade para o al- nos trabalhos de Hernandez (1998), afirma
cance de seus objetivos profissionais. Para que no momento em que a criança partici-
pensar o ensino de Contabilidade, a autora pa de imitações, jogos e desenhos, ela se
refletiu a respeito de alguns dos conceitos transporta do mundo real ao imaginário,
que perpassam a atividade pedagógica onde é capaz de produzir uma linguagem
do professor, entre eles: currículo, ensi- mais significativa. Nessa relação de maior
no, aprendizagem, avaliação e motivação. espontaneidade, ela é capaz de aumentar
Tais discussões foram organizadas a partir seu entendimento, solucionar questões
de diferentes concepções de desenvolvi- ou apontar o caminho para ajudas. Nesses
mento, a saber: o behaviorismo de Skin- momentos, a criança tira o peso de quem
ner, o humanismo de Rogers, o construti- ela realmente é e interpreta um papel que
vismo de Piaget e o sócio-construtivismo lhe dá liberdade de jogar, arriscar e ampliar

512
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

seu comportamento habitual. Em relação prática pedagógica, de formação e de cons-


à segunda categoria, a autora utiliza os trução do projeto político-pedagógico, por
fundamentos de Vygotsky para afirmar meio de uma reflexão permanente, num
que os jogos e as brincadeiras podem re- clima psicológico favorável à participação
presentar uma excelente ferramenta pro- e a tomada de decisões, para o desenvol-
motora de desenvolvimento, uma vez que vimento de uma educação de qualidade
podem atuar como recursos que propiciam para todos. A formação do professor – que
diferentes relações interpessoais entre os se dá na instituição educativa, partindo de
vários sujeitos envolvidos na atividade e, situações problemáticas do contexto esco-
nesse sentido, poderá servir como impul- lar, com a concepção de professor como
sionadores dos níveis reais de desenvolvi- agente social, isto é, capaz de planejar, ge-
mento de cada um deles. rir o ensino-aprendizagem, além de inter-
vir nas questões sociais e profissionais que
influenciam a sua prática, coerente com
COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA E a visão de educação como prática social,
FORMAÇÃO CONTINUADA comprometida com o desenvolvimento de
uma educação de qualidade para todos.
O estudo teve por objetivo refletir sobre
as possibilidades e os limites da coordena- Palavras-chave: Psicologia e formação
ção pedagógica, como espaço de formação continuada de professores, desenvolvimento e
docente e de aperfeiçoamento da prática aprendizagem, pesquisa e formação docente.
pedagógica na Escola. Os instrumentos Contato: Mírian Barbosa Tavares Raposo, UnB,
empregados foram questionários para a rmirian@unb.br
caracterização dos interlocutores e entre-
vistas semiestruturadas. Os depoimentos
dos professores expressam uma perspecti- LT04-1188 - A CONSTITUIÇÃO DO
va de coordenação pedagógica como espa- COORDENADOR PEDAGÓGICO NAS
ço de: integração, reflexão sobre a prática, RELAÇÕES SOCIAIS: CONTRIBUIÇÕES DE
troca de experiências e conhecimentos, HENRI WALLON E CLAUDE DUBAR
formação continuada, elaboração do pro- Laurinda Ramalho de Almeida - PUC/SP
jeto político-pedagógico e desenvolvimen- laurinda@pucsp.br
to de relações interpessoais. Destacam, Andrea Jamil Paiva Mollica - PUC/SP
ainda, a importância do caráter coletivo do ajmollica@uol.com.br
trabalho de coordenação pedagógica e a Lilian Corrêia Pessôa - PUC/SP
dificuldade para a estruturação desse tra- lilipessoa@hotmail.com
balho. Três categorias de análise responde-
ram aos objetivos do estudo: A prática pe- O texto refere-se a um dos eixos de pes-
dagógica - entendida como práxis, ou seja, quisa em andamento sobre o desenvolvi-
um processo complexo e dinâmico em que mento da identidade do coordenador pe-
teoria e prática estão unidas, por meio de dagógico. A escolha deste profissional para
ação e reflexão permanente. A coordena- investigação decorre do fato de acreditar-
ção pedagógica - compreendida como um mos na importância de sua atuação para
espaço coletivo de aperfeiçoamento da uma escola de qualidade. Entendemos que

513
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

compete a este ator as funções de articula- na teoria walloniana contribui para a am-
dor, formador e transformador no cenário pliação do entendimento sobre o processo
da unidade escolar. Como articulador, ofe- de constituição do coordenador pedagógi-
recendo condições aos professores para co. Assim, pessoa é o conceito empregado
que trabalhem coletivamente suas pro- por Wallon (2007) para definir e nomear o
postas curriculares; como formador, ofere- domínio ou conjunto funcional resultante
cendo condições aos professores para que de outros três: afetividade, ato motor e
se aprofundem em suas áreas específicas e conhecimento. A integração das funções
para que transformem seu conhecimento dos domínios funcionais não é estática, é
em ensino de qualidade; como transfor- mutante, a partir de oposições, conflitos,
mador, propiciando condições para que forças convergentes e divergentes nas re-
o professor seja reflexivo e crítico em sua lações com o meio social, pois pessoa é a
prática (Almeida & Placco, 2009). Sem des- síntese entre um organismo com potencial
considerar as demais vias que promovem genético para se tornar um representante
o desenvolvimento dos conhecimentos típico da espécie e o meio, predominan-
pedagógicos, curriculares e também das temente social. A integração das funções
habilidades de relacionamento interpes- desses domínios pode levar a configura-
soal, vamos nos deter nas situações de ções diferenciadas, variáveis de indivíduo
trabalho, por concordar com Dubar (1997, para indivíduo, conferindo, portanto, sin-
p.48) que o “trabalho está no processo de gularidade e caracterizando uma forma de
construção, destruição e reconstrução das ser e estar no mundo. Entretanto, de um
formas identitárias...”. Esse mesmo autor modo geral, é a afetividade que dá direção
(Dubar, 2005) lembra que há um jogo de às ações, orienta as escolhas, com base
forças constante entre atos de atribuição nos desejos da pessoa, nos significados e
e atos e sentimentos de pertença. No caso sentidos atribuídos às suas experiências
do coordenador pedagógico, os atos de anteriores, em suas necessidades fisioló-
atribuição chegam da estrutura oficial (o gicas e sócio-afetivas. Esses significados
que vem do instituído, do Sistema) e da e sentidos são constituídos no meio so-
estrutura funcional da escola (a tradução cial, portanto, na relação eu-outro. Zazzo
do instituído e as exigências da escola para (1978) observa que em Wallon pode-se
o trabalho de coordenação). Já os atos e apreender três tipos de Outro: o outro, os
sentimentos de pertença referem-se ao outros e o outro íntimo. Outro refere-se
que o coordenador aceita desses dois con- a um conceito geral; os outros referem-
textos, e o que acrescenta a eles, definin- -se àqueles com os quais o indivíduo se
do seu papel profissional, numa constante relaciona concretamente; o outro íntimo,
tensão eu-outro. Ao abordar a questão também chamado de socius (conceito
da identidade, Wallon (1975) a denomina emprestado de Pierre Janet) é o parceiro
como personalidade e a descreve como permanente na vida psíquica do indivíduo,
uma percepção e si mesmo adquirida por decorrente da articulação de elementos
afirmação constante de autonomia em re- antigos e novos da experiência do indiví-
lação aos demais, construída nos proces- duo, em suas relações com os diferentes
sos de identificação e diferenciação com o meios sociais. Para a produção de informa-
outro. A compreensão do conceito pessoa ções foram empregados questionários e

514
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

entrevistas biográfico-narrativas com coor- papel exercido pelo Outro Íntimo. A valori-
denadoras atuando em duas Diretorias Re- zação que todos os coordenadores dão às
gionais de Ensino do Estado de São Paulo, relações interpessoais, seja nos momen-
uma na capital, outra no interior. Nesta co- tos de início da função (apoio, aceitação),
municação serão discutidos os resultados seja nos momentos formativos (aceitação,
de uma das Diretorias Regionais. O que é rejeição de propostas) é outro indicativo
recorrente no cotidiano dos coordenado- de forte influência das relações eu-outro.
res é a resposta aos atos de atribuição do Alguns coordenadores referem-se ao pa-
sistema e da organização da escola: mul- pel das políticas públicas, acentuando que
tiplicidade de tarefas: materialidade bem o coordenador precisa ver sentido nelas,
explicitada por uma mesa “cheia de coisas: para trabalhar de forma competente. Esse
rádios, revistas, livros perdidos, bilhetes de sentido foi sendo constituído por eles nas
professores, cadernos, os próprios papéis, e pelas relações sociais de sua trajetória. A
cadernos, atas...”; atendimento a situa- função formativa é recorrente, como ato/
ções imprevistas, que impedem a execu- sentimento de pertença. Afirma um coor-
ção do planejamento feito; tempo escasso denador: “Nós, coordenadores antigos, tí-
para dar conta de tantas atribuições: “a nhamos uma função que nos honrava: de-
mesa cheia de coisas migra para a casa, e o senvolver um projeto, articular o coletivo,
trabalho continua...”; atendimento a pais, formar o professor.”
professores, alunos, pessoas que procu-
ram informações; elaboração da agenda e Palavras-chave: coordenador pedagógico,
execução de Horas de Trabalho Pedagógi- identidade, relações sociais.
co Coletivo; resolver conflitos: de profes- Contato: Laurinda Ramalho de Almeida, PUC-
sores, pais, alunos. Esta situação provoca SP, laurinda@pucsp.br
manifestações de mal-estar nos coordena-
dores ao final do período de trabalho: ex-
tremados, cansados, com sensação de “fiz LT04-1327 - BUSCANDO COMPREENDER
tanto, e não fiz nada”. As atividades são A RELAÇÃO TUTOR E CURSISTA EM
feitas porque os outros exigem dele uma UM AMBIENTE VIRTUAL DE ENSINO A
atuação desse tipo. Algumas dessas ativi- DISTÂNCIA
dades, no entanto, caracterizam-se como Daniel Röhe Salomon da Rosa Rodrigues -
suas (sentimento de pertença), principal- UnB
mente a elaboração de agenda de traba- rohe.daniel.1986@gmail.com
lho e planejamento e execução de horas Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB
de trabalho coletivo. Os atos de pertença Maria Fátima Olivier Sudbrack - UnB
são, também, decorrentes das relações Financiamento: PRONASCI
eu-outro, principalmente com pares (coor-
denadores de outras escolas), com profes- A educação possui a função de habilitar in-
sores, gestores, comunidade escolar que divíduos para o manejo do conhecimento.
lhes solicitam atendimento às suas neces- Paulo Freire propõe a reflexão no sentido
sidades. Ao aceitar/recusar as atribuições do reconhecimento de objetos: o si-mes-
que lhes são dadas, entra, na tomada de mo, o outro e os conteúdos disciplinares.
decisão para este ou aquele caminho, o Ele incentiva ainda o exercício de criativi-

515
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade que vai além do simples reconhecer, o acréscimo de 60 horas aula pela neces-
mas que alcança a reflexão epistemológica sidade de integrar teoria e prática. A meta
do conteúdo. Educar então não significa fundamental é, pois, a socialização e im-
impor um conhecimento ao outro, mas plementação dos projetos elaborados nos
sim propor a reflexão sobre o conheci- módulos anteriores. Assim, esse módulo
mento que se almeja partilhar. É preciso estimulou a equipe da coordenação do
reconhecer o mecanismo fundamental na curso a refletir e a criar espaços para aten-
aprendizagem, destarte é necessário que der aos desafios apresentados pelos cur-
o sujeito que está aprendendo enxergue sistas. Nesse curso ocorre uma relação en-
a si mesmo. Ensinar é então a criação de tre conteudistas, supervisores de tutores,
possibilidades para a autocondução e a tutores e cursistas no sentido de garantir a
produção de diálogos que promovam a eficácia do curso. Os conteudistas além de
construção do conhecimento. O ensino a elaborarem o conteúdo participam da for-
distância é uma modalidade educacional mação dos tutores e seus supervisores. Os
que será utilizada como principal forma tutores, por serem aqueles que estão em
de ensino no futuro, pois possibilita que contato direto com os cursistas, são os res-
grandes populações tenham acesso à ponsáveis pela construção do conhecimen-
educação escolar. Isto porque proporcio- to e ações deles. Por isso faz-se necessário
na flexibilização de espaço e tempo para uma reflexão sobre a formação daqueles
os estudos. Pesquisas apontam relatos de para que atuem de forma dialógica privile-
estudantes indicando uma preferência por giando os aspectos da aprendizagem como
esse tipo de ensino porque adquirem mais um todo e não apenas as práticas tecno-
informações. O Curso de Prevenção ao Uso cráticas das ferramentas contemporâneas.
de Drogas é uma parceria entre o Progra- Deve-se garantir que os tutores favoreçam
ma de Estudos e Atenção às Dependências o potencial criativo dos educadores para
Químicas do Departamento de Psicologia que atuem na área de prevenção e saúde
Clínica do Instituto de Psicologia da Uni- pública. Este trabalho tem como objetivo
versidade de Brasília (PRODEQUI/PCL/IP/ geral refletir sobre a formação do tutor em
UnB) - em articulação com a Secretaria Na- ensino a distância e especificamente inda-
cional de Políticas sobre Drogas (SENAD) e gar sobre o papel de supervisão dos tuto-
MEC. Este é um curso à distância voltado res analisando a interação tutor-cursista
para formação de educadores de escolas no ensino a distância. Os participantes da
públicas e tem como objetivo habilitá-los pesquisa foram 45 Tutores de 45 turmas
a atuar na área da prevenção ao uso de do Módulo V e um supervisor de conteú-
drogas de forma integrada às atividades de do. Foi analisada a relação entre esses tu-
ensino em sala de aula. O curso é compos- tores e os cursistas na plataforma moodle.
to de quatro módulos de conteúdos que Os materiais de análise foram: relatórios
envolvem as temáticas sobre adolescente, padronizados para análise com ALCESTE
família, conceitos e informações básicas a partir de um banco de dados contendo
sobre drogas, a prevenção e estratégias de os fóruns de socialização de 50% do total
prevenção na escola. Na edição 2010-2011 de turmas do Módulo V; análise de conte-
do curso, foi acrescentado o Módulo V que údo das falas dos tutores em supervisão.
consiste na ampliação do curso mediante No primeiro material de análise foram

516
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

identificados como variáveis “T_1” para do projeto. Na Classe 5 encontramos os


tutor e “T_2” para cursista. Com a análi- cursistas discutindo o conteúdo do curso e
se ALCESTE estudamos a relação entre os há uma fala de tutor orientando para a dis-
participantes. O relatório ALCESTE gerou cussão epistemológica. Assim percebemos
cinco classes. Na Classe 1 predominam fa- uma prevalência das práticas tecnocráti-
las de cursistas. Na 2, falas de tutores com cas apesar de ocorrem também reflexões
duas de cursistas com qui-quadrado maior epistemológicas. Nota-se uma preocupa-
que 32. Na 3 predominam falas de tutores. ção com o lado executivo em contraste
No entanto, há duas falas de cursistas que com uma preocupação na construção do
tem o maior qui-quadrado nesta classe. conhecimento. Acreditamos que o tutor
Na 4, predominam falas de tutores. Na 5 deva atuar na formação de um cursista que
sobressaem falas de tutores observando- irá aprender sob a égide de uma aventura
-se a presença de uma fala de cursista. No criadora. É Paulo Freire que aponta para
fórum de socialização foi possível identifi- um aprendizado que implica em “construir,
car os eixos de sentido, o tecnocrático e o reconstruir, constatar para mudar”, o que
que concerne o conteúdo programático. cria a demanda de riscos e pela aventura
Como exemplo o enunciado que denuncia do espírito.
o primeiro eixo temos: “(...) para postar o
projeto nesse fórum vocês precisam seguir Palavras-chave: ensino a distância, tutor,
os seguintes passos: entre no fórum, leia prevenção de drogas.
a mensagem de seu colega e clique em
responder, em seguida escreva uma men-
sagem na janelinha aberta para tal fim e LT04-1342 - UMA REFLEXÃO SOBRE
ANEXE o projeto pelo espaço que apare- A RELAÇÃO PROFESSOR E ALUNO: O
ce embaixo do local onde você escreve a SUBJETIVO FRENTE À COMPLEXIDADE DE
mensagem (...)”. Por outro lado podemos ENSINAR E APRENDER
identificar enunciados voltados para outra Silvia Souza de Miranda Rodrigues - UnB
postura: “A socialização é um momento ssylvyar2@yahoo.com.br
privilegiado para incluir novas contribui-
ções decorrentes dos encontros realizados Trata-se de uma reflexão sobre a pro-
na escola e nos fóruns. Além da socializa- blemática da relação professor e aluno
ção na sua escola, vocês terão acesso a com ênfase na complexidade de ensinar
projetos elaborados por outros cursistas, e aprender. Baseado em alguns autores
em outras realidades, e poderão intera- preocupados com a educação, ressalto a
gir com eles.” A partir de uma leitura do questão polêmica de conhecer a si mes-
relatório gerado pelo ALCESTE podemos mo para então conhecer o outro com fins
perceber o desenrolar da relação tutor- a facilitar o encontro de entendimento e
-cursista no Módulo V. Na Classe 2 encon- compreensão durante o processo ensino
tramos 13 falas de tutores orientando para e aprendizagem. É no espaço escolar que
procedimentos mecânicos na plataforma o eu-professor (Blanchard-Laville, 2005)
enquanto há 6 falas que incentivam para a se confunde com um super-herói na ten-
discussões epistemológicas. Encontramos tativa de cumprir com suas obrigações de
também duas falas sobre prazo de envio forma exemplar, dentro dos parâmetros

517
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de exigências que fazem a instituição, os sociação de idéias realize a transição entre


alunos, os pais e comunidade, esquecen- duas formas de realidade psíquica e uma
do-se, porém, que antes de ser professor que exista a ameaça de transformação,
é um ser humano, com identidade e sub- produz-se uma resistência movida pelo
jetividade própria e que nem ele e nem medo do doloroso sofrimento associado
o aluno mudam de personalidade para (Blanchard-Laville,2005). Uma coisa é o
enfrentar uma sala de aula. Portanto, o professor ir para sala de aula expor me-
essencial a considerar no espaço escolar é canicamente sua aula, e outra, é expor a
a relação de parceria e cumplicidade que mesma aula utilizando-se de linguagem
ambos estabelecerão no decorrer do pro- apropriada, de empatia, deixando fluir o
cesso de aprendizagem, sem esquecerem- diálogo de forma a transformar os conte-
-se de si mesmo e cientes que ambos têm údos em algo significativo. Obviamente, o
suas próprias dificuldades, sua história de professor traz consigo sua bagagem histó-
vida, cada qual a seu modo. O objetivo do rica, suas próprias dificuldades psíquicas e
trabalho foi refletir sobre a importância não será fácil transpor essas barreiras. Não
da subjetividade na relação professor e se espera que o professor salve a educa-
aluno. Esta reflexão ocorreu no contexto ção sem antes entender-se, falar consigo
escolar através da observação em conso- mesmo, observar e analisar sua prática
nância com os professores regentes. Muito pedagógica, olhar prioritariamente sua re-
há que se analisar numa relação professor lação com o aluno, pois minha observação
e aluno onde, segundo a concepção do não se resume no conteúdo ministrado e
sistema educacional, o essencial dessa re- nem nas estratégias utilizadas no contexto
lação é o sucesso no ensinar e aprender escolar, mas a complexidade da relação do
de forma numérica e quantitativa. Sem, eu-professor com o eu-aluno (Blanchard-
portanto, uma preocupação de em que -Laville(2005). Num documentário sobre
moldes a relação é estabelecida e por que a educação, Leandro de Lajonquiere pro-
motivos se torna exaustivo e desanimador voca reflexões sobre a prática pedagógica
o exercício dessa profissão. As queixas são afirmando que “o ser humano não repete
freqüentes em relação aos alunos que não uma mensagem”, o que significa que os
trazem mais consigo o desejo em aprender alunos não são meros especuladores ou
dificultando a mediação de conteúdos e receptores de conhecimentos, são pessoas
o cumprimento do currículo educacional que levam consigo a cultura do contexto
em tempo hábil. Esquecemos, porém, que em que vivem e cada qual interpreta e aco-
tanto o professor como o aluno são muni- moda os conhecimentos sob uma ótica. A
dos de particularidades que requerem pri- palavra, como esclarece o referido autor, é
meiramente conhecimento de si mesmos, uma ferramenta indissociável da educação
numa quebra de paradigmas onde tradicio- que o professor poderá fazer uso para se
nalmente o ensinar se resumia em cuspe e aproximar e estreitar uma relação de cum-
giz. O aprender a lidar requer mudança de plicidade com seus alunos. O importante
postura, de pensamento, de atitudes, pois nesta fala é como está sendo endereça-
complexidade dentre outros significativos da, qual a clareza e autoridade com a qual
reporta-se a tecer juntos, numa cumplici- está sendo dirigida, pois através da palavra
dade de estar junto e uma vez que a as- transparente o professor guia os alunos

518
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para novos horizontes. Não há receita para como o desenvolvimento da subjetividade


a educação sem a existência da palavra e evitando, talvez, o prolongamento de frus-
não haverá ensino e aprendizagem sem a trações, angústias e sofrimentos. “Ensinar,
presença da subjetividade. O sofrimento nesta proposição, significa mais do que se
exteriorizado nas queixas do professor em preocupar com estratégias e métodos de
relação aos entraves pedagógicos e dificul- ensino em si, mas implica, sobretudo, re-
dades de aprendizagem dos alunos deve- conhecer a importância de conhecer o fio
riam ser entendidos pelo Sistema Educa- da história constitutiva da configuração
cional como o primeiro pedido de socorro subjetiva dos sujeitos da aprendizagem,
e numa análise minuciosa procurar desve- procurando compreender a forma como
lar as causas que impactam o desenvolvi- se imbricam nela o afeto e a cognição...”
mento dos saberes, com fins a redimensio- (Tacca, apud Maluf, 2006).
nar o fazer pedagógico, propiciando meios
para a autorreflexão do professor, o olhar
para si mesmo como um espelho que re- LT04-1364 - CENÁRIO EDUCACIONAL:
flete as aparências. Porém, o olhar do pro- UM OLHAR SOBRE O PROFESSOR E A
fessor para ele mesmo deverá ir além da RELAÇÃO COM O SABER
aparência física, ou seja, buscar conhecer a Natália Queiroz de Oliveira Souto - UnB
sua subjetividade numa ação psicanalítica, nathqueiroz@yahoo.com.br
lembrando-se que tanto ele como o aluno
têm suas razões para ensinar e aprender. Este ensaio pretende abordar, a dimensão
Nesse encontro consigo mesmo o profes- da relação com o saber estabelecida pelo
sor poderá refazer seus objetivos e ideais professor enquanto sujeito da cena edu-
quanto aos resultados do processo de cativa e suas possíveis ressonâncias para
aprendizagem, reconsiderando que ambos o processo de ensino e aprendizagem. A
têm limitações que precisam superar jun- abordagem sustenta-se no arcabouço te-
tos – é o eu-professor com o eu-aluno num órico discutido em Charlot (2000, 2005);
movimento de compreensão e respeito à Blanchard-Laville (2001) e Tanis (1995). O
integridade de cada um, uma vez que nem cenário educacional tem alguns de seus
o professor e o aluno vão para sala de aula elementos previamente definidos pelos
sem serem o que são. Entretanto, espera- saberes que se pretendem transmitir num
-se que diante desse encontro, rompam-se processo contínuo de construção de sen-
paradigmas quanto à educação tradicio- tidos e de significação dos fazeres, num
nal avançando para uma abordagem mais mundo social. Os outros elementos vão
transdisciplinar considerando a relevância se constituir no encontro, forjados no ca-
do saber ser. A forma como se conecta os lor da relação, na consolidação dos víncu-
vínculos relacionais entre professor e aluno los que vão se formando e se atualizando
transcendem o fazer pedagógico, influen- constantemente, na dinâmica estabele-
ciando o aluno em sua vida fora dos muros cida dentro dos espaços educativos. Para
da escola. Portanto, a qualidade da comu- Charlot (2000, p.63) “o saber é construído
nicação, a relação de confiança estabeleci- em uma história coletiva que é a da men-
da em sala de aula favorecerá o sucesso do te humana e a das atividades do homem
processo de ensino e aprendizagem, assim e está submetido a processos coletivos da

519
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

validação, capitalização e transmissão”. A negativa” conforme Charlot (2005, p.21)


reflexão a que se destina o texto se cons- das problemáticas educacionais. A abor-
trói partindo da caracterização do saber dagem refere-se à problematização da re-
como patrimônio humano, do qual o ser lação com o saber estabelecida pelo pro-
humano se apropria no mesmo processo fessor ao longo de sua trajetória, de sua
em que se constitui como sujeito de sua história e constituição enquanto sujeito de
história. A discussão avança no sentido saber. “Não há sujeito de saber e não há
de refletir sobre a centralidade da relação saber senão em uma certa relação com o
com o saber, da apropriação do saber na mundo, que vem a ser, ao mesmo tempo e
constituição do indivíduo em ser humano. por isso mesmo, uma relação com o saber”
A conceituação de infantil em Tanis é im- (Charlot, 2000, P.63). O olhar sobre a rela-
portante no âmbito desta discussão como ção com o saber com o foco no professor,
o “núcleo ordenador dos possíveis, como se justifica na crescente responsabilização
determinante das potencialidades singu- dos alunos, que tem influenciado inclusive
lares do sujeito” (Tanis, 1995, p.91). Este no crescimento de diagnósticos médicos,
núcleo constitui uma dimensão estrutural neurológicos, psiquiátricos e psicoterápi-
do sujeito, por guardar as interpretações cos como justificativa do não desenvolvi-
do que fora vivido no início da sua cons- mento intelectual, emocional e social de
tituição, primeiras relações estabelecidas alunos em geral, uma leitura unilateral e
ou propiciadas. Esta perspectiva implica reducionista do processo. No contexto his-
analisar o próprio sujeito que se consti- tórico-cultural ocidental e nessa organiza-
tui enquanto constrói sua relação com o ção social, parte considerável dessas expe-
mundo, além de perceber a forma como rimentações rumo à apropriação do saber
este sujeito interpreta e atribui sentido às acontece num ambiente específico: a esco-
suas posições e aos papéis que desempe- la. Ela é o lócus de sistematização do saber
nha, no caso, o professor. Implica também por excelência. Um lugar que se propõe a
conhecer e analisar a relação com o saber tratar das relações com o saber a priori. O
estabelecida pelo professor como conside- professor imprime sua marca, a marca de
rada em Blanchard-Laville, na sua própria sua relação com o saber, na relação com
constituição como sujeito, com a posterior o saber que cada um dos alunos estabe-
dimensão da responsabilidade profissional lece particularmente. “A interação destes
de ter o saber como objeto de trabalho do psiquismos cria uma atmosfera que qua-
qual é mediador, nos contextos educacio- lifico como transferencial (...) permeados
nais que pertencem a um contexto outro, pelos afetos que circulam neste espaço.
de práticas e demandas sociais. A relação (Blanchard-Laville, (2005). Nesta demanda
com o saber, em seu desdobramento no de ensinar, serão mobilizados os modelos,
processo de ensino e aprendizagem, é das as referências deste professor. Este é um
problemáticas que assumem a centralida- momento em que toda a dinâmica fantas-
de no cotidiano escolar. Nesta oportuni- mática do educador vem à tona, permeia a
dade a abordagem a que se propõe esta malha da configuração pedagógica, articu-
reflexão não se refere às faltas, carências lando sua mobilização com seus desejos,
já muito discutidas e de diversas ordens – inclusive inconscientes, na forma como
social, cultural, econômica; uma “leitura se relaciona com o conteúdo que ensina.

520
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Os processos subjetivos, embora muitas esta aproximação com a temática, objetiva


vezes desconsiderados, se inscrevem in- lançar luz sobre aspectos da relação com
cessantemente nas relações estabelecidas o saber, dignos de uma atenção mais deti-
pelo professor, imprimindo suas marcas e da por passarem muitas vezes, por muitos
fazendo transparecer em lados opostos, anos de carreira, de forma irrefletida, sem
a síntese entre vontades “conscientes” e o intuito de esgotá-los ou de discorrer so-
resistências, muitas destas no nível incons- bre todas as suas nuances.
ciente, não encontram explicações nos
princípios da realidade consciente, e que Palavras-chave: educação, saber, sociedade
geram sem dúvidas sofrimento psíquico Contato: Natália Queiroz de Oliveira Souto,
ao profissional, adoecimento emocional e Universidade de Brasília, nathqueiroz@yahoo.
físico, revelados numa vivência e atuação com.br, nathqueiroz@unb.br
docente sem significação pessoal. Torna-se
primordial para o professor evocar as mar-
cas que reuniu em seu psiquismo no que LT01-1070 - A MEDIAÇÃO DE
diz respeito a sua relação com o saber, des- SIGNIFICADOS NA AULA DE
de as primeiras interdições por parte dos, MATEMÁTICA: VALORIZAÇÀO,
sujeitos que o impulsionaram rumo ao sa- DESQUALIFICAÇÃO E PAPÉIS DE GÊNERO
ber com seus desejos, tanto dos saberes Otávio Henrique Braz de Oliveira - SEEDF
que adquiriram expressões verbais quanto ohbo-df@hotmail.com
daqueles cuja comunicação o inconsciente Maria Helena Fávero - COGITO/UnB
se encarregou de expressar como sujeito faveromh@unb.br)
de incompletude – da falta que funda o de-
sejo. O contexto social no qual o professor
atua promove uma alienação do professor Conforme sabemos, a instituição esco-
enquanto sujeito, no que se refere à sua lar media significados partilhados social-
interioridade psíquica e seus processos mente acerca da relação entre as áreas
subjetivos. “Os professores devem passar do conhecimento e gênero (Fávero, 1994;
imediatamente por uma reaprendizagem Fávero, 2009 b). Como as questões de gê-
da escuta de si mesmos, pois não pode- nero delimitam os papéis considerados
mos deixar fora de sala de aula tudo aqui- adequados a homens e mulheres, na es-
lo que somos, tudo aquilo que sentimos” cola essa constatação não é diferente: nos
(Blanchard-Laville, 2005, p. 134). A dinâmi- meios escolares, são partilhados signifi-
ca reflexiva que leva à compreensão da re- cados que associam as disciplinas ligadas
lação com o saber por parte do professor, às áreas das ciências exatas como mais
se encaminha num movimento em busca apropriadas ao gênero masculino (Fáve-
da elucidação da função dos saberes, da ro, 2010). Assim, na escola, acredita-se
significação que estes adquirem na vida do que as alunas apresentam dificuldades em
sujeito, em seu devir... Saber sobre os sa- aprender tais conhecimentos, considera-
beres que os saberes suscitam e também dos racionais e objetivos, portanto, tidos
dos saberes que estes suplantam, pode sócio-culturalmente como masculinos.
desvelar, importantes rumos na formação Conforme indicam as pesquisas de Fávero
reflexiva do docente. Cumpre registrar que (2010), as alunas aprendem que as áreas

521
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ligadas à ciência e tecnologia não são ade- nas, como, por exemplo, passar a mão na
quadas ao seu gênero e a matemática é a cabeça delas durante alguma dificuldade
porta de entrada para o ingresso nessas encontrada nas atividades de matemática,
carreiras. Para o entendimento mais am- demonstrando mais paciência - repetindo
plo dessas questões, este trabalho analisa várias vezes as instruções, por exemplo -
a maneira como o conhecimento mate- ao explicar-lhes o conteúdo; em ocasiões
mático é mediado em sala de aula, ten- como essas as alunas, nessas aulas, eram
do como fundamento teórico-conceitual desqualificadas, como se elas não pudes-
e metodológico a abordagem de Fávero sem aprender satisfatoriamente, sendo
(2009b; 2010a) que propõe a articulação suas dificuldades tidas como naturais e,
entre a Psicologia do Desenvolvimento e a portanto, esperadas para seu gênero. Es-
Psicologia do Gênero. Assim, procedemos sas atitudes do professor revelam que as
a coleta de dados em aulas de matemática expectativas docentes em relação à apren-
de duas salas do 3º ano do Ensino Médio dizagem das alunas acerca dos conceitos e
de uma escola da Rede Pública de Ensino das regras matemáticas são menores do
do DF, uma ministrada por uma professora que os resultados esperados das alunas.
de matemática e outra por um professor Numa dessas situações, por exemplo, o
de matemática, ambos licenciados nessa professor disse que iria “utilizar o giz ro-
disciplina, ambos numa faixa etária de 35 sinha em homenagem às meninas”, numa
anos. As salas tinham em média 35 alunos clara referência à dicotomia presente na
cada, com alunos entre 17 e 19 anos. Com escola entre a feminilidade das meninas
a anuência dos professores e da direção da (associada à delicadeza da cor escolhida) e
escola, registramos em vídeo três aulas em a rigidez e objetividade do conhecimento
cada turma, sendo 30 minutos em média, matemático. Concluímos, como já assina-
com o intervalo de três dias entre cada lado por Fávero (2010 a), que as meninas
registro. As transcrições dos vídeos foram são distanciadas da matemática ao longo
submetidas à proposta de Fávero (2005), a de sua vida escolar. Tais atitudes, ao lon-
qual toma os atos da fala como unidades go do ciclo escolar, também as distanciam
de análise. Os resultados apontam que: a das carreiras científico-tecnológicas que,
mediação dos professores associa a mate- como sabemos, têm a matemática como
mática à objetividade científica e à racio- filtro de acesso e permanência. Tais dados
nalidade; as regras sobre as operações são podem explicar porque ainda hoje as alu-
transmitidas no lugar de conceitos mate- nas são distanciadas dessas carreiras, as
máticos; os alunos são mais solicitados a quais gozam de alto prestígio social (Fer-
participar durante as aulas, perguntando nandes & Healy, 2007). Nossos estudos
e procurando soluções para problemas, continuam dentro dessa linha para apro-
enquanto as vozes das alunas são menos fundar dados tais como o fato de que as
ouvidas durante as participações nas aulas dificuldades das alunas, nas mediações
de matemática. Evidenciou-se: a diferença observadas, são desqualificadas em várias
de comportamento entre professores e situações, quando, por exemplo, o profes-
alunos e professores e alunas; no segundo sor diz que “não estão aprendendo ma-
caso, os professores tendem a demonstrar temática porque estão preocupadas com
comportamento complacente com as alu- flerte com os meninos”.

522
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: Gênero, mediação de sem suas próprias idéias e valores. Assim,


conhecimento, aprendizagem de matemática. podemos afirmar que nas interações coti-
Contato: Prof. Otávio Henrique Braz de dianas os professores e alunos vão cons-
Oliveira - Secretaria de Estado de Educação do truindo e produzindo representações so-
Distrito Federal. Endereço eletrônico: ohbo- bre o mundo, sobre o fazer pedagógico, as
df@hotmail.com quais são compartilhadas com seus pares
e contribuem para a constituição de sua
identidade. Esta pesquisa teve como prin-
CO 29 - LT04 cipal objetivo conhecer como professores
e alunos representam a questão do insu-
Dificuldades de Aprendizagem cesso escolar e a não aprendizagem. A co-
leta de dados foi organizada por meio de
uma entrevista semi estruturada conten-
LT04-747 - CRIANÇAS QUE NÃO do quinze questões abertas. Participaram
APRENDEM: REPRESENTAÇÕES DE deste estudo vinte professores e quarenta
PROFESSORES E ALUNOS alunos (20 com adequado desempenho
Andreia Osti - FAV acadêmico e 20 com desempenho insatis-
andreia.osti@gmail.com fatório) do 5º ano do Ensino Fundamental
Rosely Palermo Brenelli - Unicamp da rede municipal de uma cidade da região
roselypb@unicamp.br Metropolitana de Campinas. Foram sele-
cionados dois alunos de um mesmo pro-
A escola constitui uma das mais importan- fessor, um apontado por ele – professor,
tes fontes de socialização, sendo assim, como tendo adequado desempenho aca-
não há como desconsiderar que nesse dêmico e outro com desempenho abaixo
contexto inevitavelmente ocorrem múl- do esperado. Não foi verificado se o aluno
tiplos relacionamentos entre alunos e com baixo desempenho apresenta alguma
professores. Segundo Visca (2002) o re- dificuldade de aprendizagem, nos base-
lacionamento entre docente e estudante amos apenas na opinião do professor so-
ocorre de maneira tão intensa que ambos bre seus alunos. As comparações entre as
formam um par educativo e devem ser respostas dos alunos e professores foram
considerados como uma unidade. Nes- realizadas através do teste Qui-Quadrado
se sentido, podemos afirmar que a cons- e do teste exato de Fisher. O nível de con-
trução do indivíduo está completamente fiança utilizado nas análises comparativas
imbricada ao ambiente no qual ela se de- foi de 95% e o software estatístico empre-
senvolve. Falar sobre a aprendizagem de gado foi o XLSTAT 2009. As representações
alunos implica perceber o ambiente e as dos alunos e professores sobre as crianças
relações que o circundam, o amparam e que não aprendem se aproximam. Para
falam sobre ele mesmo. Moscovici (1978), o professor não se aprende por possíveis
afirma que quando uma pessoa está reu- transtornos específicos de aprendizagem,
nida e formando um grupo, ela passa a tendo como causa a imaturidade, proble-
sentir e a pensar de maneira diferente de mas psicológicos e sociais. Ele caracteriza
quando está sozinha, isso porque as trocas esse aluno como desinteressado (35%),
contribuem para que os indivíduos repen- sem apoio familiar (40%) e com algum tipo

523
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de deficiência ou transtorno (25%). Os alu- Baseiam suas respostas na percepção de


nos atribuem a não aprendizagem a fato- que não se aprende ao se ter uma doença
res internos, como sua falta de capacidade (75%), por não fazer a lição (5%) ou por-
para entender os conteúdos e o não cum- que a disciplina estudada é difícil (20%).
primento dos deveres escolares. No en- Acreditamos ser a aprendizagem, até certo
tanto arriscamos afirmar que, apesar das ponto, condicionada tanto pelas possibili-
representações coincidirem, elas diver- dades e capacidades do aluno (nível cog-
gem quanto ao significado da palavra. En- nitivo e conhecimentos prévios) quanto
quanto as crianças dizem que o aluno não pela interação vivenciada em sala de aula
aprende porque não domina a matéria, o com seus pares. É interessante observar
professor pontua essa não aprendizagem na fala dos professores que os alunos com
como falta de interesse, como se a moti- baixo desempenho são considerados de-
vação e a atenção dependessem somente sinteressados, mas o docente parece não
do aluno. Analisando mais detalhadamen- ter consciência que esse desinteresse, em
te as representações dos alunos, 5% dos certa medida, pode ser decorrente de sua
com desempenho insatisfatório e 90% dos própria didática e do modo de se relacio-
com bom desempenho apontam o fator nar com o estudante. É interessante notar
não estudar e não fazer a lição como uma que apesar das crianças compartilharem
variável que contribui para o insucesso da um mesmo ambiente, as representações
aprendizagem. Os demais, 10% dos alunos se diferenciam. Isso se justifica pelo fato
com bom desempenho e 75% dos com de cada aluno vivenciar as relações com
baixo desempenho, consideram que uma seu professor e com o ambiente de sala de
pessoa pode não aprender porque tem um aula, segundo suas possibilidades. Quere-
problema, ou uma doença. Aqui podemos mos com isso dizer que, embora a análise
perceber a questão da medicalização da comparativa dos grupos nos forneça da-
aprendizagem, uma visão mais biológica, dos interessantes não podemos esquecer
ou seja, quem tem uma deficiência ou um do sujeito psicológico, individual. Cada
problema de saúde pode não aprender aluno e cada professor participante desta
em conseqüência dessa condição. Para pesquisa construiu suas representações a
explicar o porquê um aluno não apren- partir da interação com o meio o que im-
de, as professoras usaram expressões plica em considerar também sua história
como imaturidade, falta de estimulação, pessoal. Nesse sentido, acreditamos que
alteração orgânica, enquanto as crianças tanto professores quanto alunos adotam
usaram o termo doença. Nesse ponto as uma concepção de ensino e aprendiza-
dificuldades são vistas como indicador de gem, mesmo de forma inconsciente, e essa
algo errado, sintomático, assemelhando- representação vai determinar sua com-
-se à visão de doença. Comparando mais preensão sobre as causas e conseqüên-
especificamente os argumentos dos dois cias do não aprender. De maneira geral,
grupos de alunos, os com desempenho constatou-se a visão de que a criança não
insatisfatório apontam mais causas para a aprende devido a alguma circunstância ou
não aprendizagem. Talvez esse grupo con- motivo que se encontra dentro ou ligada
siga ter uma visão mais geral sobre essa a ela, sendo descartados outros fatores
problemática por serem integrantes dela. tais como a metodologia empregada e a

524
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

maneira pela qual o conteúdo é enfocado. como o diagnóstico de TDAH tem sido fei-
Não aparece a possibilidade de questiona- to no Sistema de Saúde Pública no Brasil.
mento frente ao método de ensino ado- Verificamos que há um grande número de
tado, as estratégias utilizadas nem se isso crianças sendo diagnosticadas como TDAH
poderia interferir no desempenho acadê- por médicos do setor de Saúde Pública,
mico dos alunos. Nesse sentido, a aprendi- mas que, de fato, não apresentam esse
zagem parece ser um processo individual e transtorno, quando avaliadas segundo os
não social. Nossos dados também revelam critérios do DSM-IV. A pesquisa nos per-
uma visão tradicional de ensino, em que a mitiu identificar três pontos básicos envol-
aprendizagem é concebida como um refle- vendo a criança diagnosticada como TDAH
xo da conduta do aluno e de sua família, pelo Sistema de Saúde Pública de Divinó-
desconsiderando o papel do professor e a polis, o qual reflete o que acontece em ou-
influência de sua prática para o desenvol- tros locais no Brasil (Gomes & cols, 2007).
vimento do estudante. O primeiro ponto refere-se à forma como
o diagnóstico tem sido realizado na Saúde
Palavras-chave: representações, Pública de Divinópolis, segundo ponto, a
aprendizagem, desempenho acadêmico. importância das narrativas das mães e es-
colas sobre a criança para que o profissio-
nal da área de saúde estabeleça o diagnós-
LT04-837 - O DIAGNÓSTICO DA CRIANÇA tico de TDAH e terceiro, a inadequação da
COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE medicação fornecida a essa criança, diag-
ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE NA SAÚDE nosticada de forma inadequada. A partir
PÚBLICA dos resultados aqui encontrados, mesmo
Cláudia Lúcia Carazza - Bolsista PAEx/UEMG que parciais hipotetizamos que a criança
(FUNEDI/UEMG) usuária do Sistema de Saúde Pública de
Lúcia Maria Silva Arruda - FUNEDI/UEM Divinópolis recebe o diagnóstico médico
Marcos Paulo Alves de Oliveira - Bolsista de TDAH a partir das narrativas que a mãe
PAPq/UEMG (FUNEDI/UEMG) ou o cuidador dessa criança fornece sobre
Marilene Tavares Cortez - FUNEDI/UEMG/ ela. O principal objetivo dessa pesquisa foi
UFMG refazer o diagnóstico de TDAH recebido
por muitas crianças, já que observávamos
A pesquisa aqui relatada reavaliou o diag- que havia um número excessivo de crian-
nóstico de Transtorno de Déficit de Aten- ças com esse diagnóstico, crianças com as
ção e Hiperatividade (TDAH) dado às crian- quais tínhamos contato. Sabíamos que se-
ças usuárias do Sistema de Saúde Pública guindo as indicações das pesquisas sobre
da cidade de Divinópolis (MG). A meto- o TDAH e a indicação do DSM-IV sobre o
dologia de pesquisa envolveu analisar as número de crianças TDAH, em idade esco-
fichas das crianças com o diagnóstico ou lar, deve ficar entre 3 a 7%. O número de
indicação de TDAH de alguns Centros de crianças com diagnóstico de TDAH vincula-
Saúde de Divinópolis e refazer o diagnós- das ao nosso trabalho ultrapassava muito
tico. Os dados e resultados aqui descritos essa estatística. Em um primeiro momento
e analisados, mesmo sendo parciais, são da pesquisa foi realizado um levantamento
extremamente relevantes para se pensar de dados das crianças TDAH usuárias da

525
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rede de Saúde Pública de Divinópolis. Esse se sabe “nenhum exame laboratorial ou


levantamento se deu através das seguintes avaliação neurológica ou da atenção foi es-
etapas: Primeira: Elaboração da ficha para tabelecido como diagnóstico na avaliação
coleta de dados pela equipe pesquisado- clínica do TDAH” (DSM-IV, 2003, p. 115).
ra. Estabelecimento de parcerias com a Outro dado a ser obtido pela pesquisa é
prefeitura da cidade de Divinópolis, para que há um número significativo de crian-
que a pesquisa pudesse ser efetivada. Co- ças que estão sendo medicadas pelos pais
leta de dados das fichas de crianças e ado- e pelos profissionais da área de saúde sem
lescentes de 3 a 17 anos, em Centros de necessidade, pois elas não se enquadram
Saúde de Divinópolis. O numero de fichas nos critérios definidores do TDAH. Polan-
pesquisadas em três Centros de Saúde czyk, Arruda e Bigal apresentaram dados
com o TDAH, perfazem um total de 325 fi- de pesquisas similares no 3º Congresso
chas, sendo 120 fichas de crianças. Dessas Internacional de TDAH, na Alemanha, em
120 fichas de crianças, 57 fichas referem- fins de maio de 2011. É necessário discutir
-se à crianças que tinham algum indicador de forma séria e permanente pela comu-
de TDAH, dessas 57 crianças, 31 tinham nidade, pais, professores/as e profissionais
recebido o diagnóstico, médico, de TDAH. da área de saúde, uma vez que se sabe
O nosso trabalho de pesquisa de reava- que os psicoestimulantes, como o metilfe-
liação diagnóstica levou em consideração nidato, causam danos no sistema nervoso
22 crianças que receberam o diagnóstico dos indivíduos jovens (Gomes, 2006, p. 51,
médico inicial de TDAH. Não foi possível 56). A análise dos dados obtidos até o pre-
contatar as 31 crianças, apenas 22 foram sente momento possibilita uma conclusão
localizadas. Esse segundo diagnóstico foi parcial de que, atualmente, o diagnóstico
realizado através de anamnese junto às de TDAH é estabelecido, primordialmente,
mães e/ou responsáveis, bem como atra- por neurologistas, em alguns casos após
vés de atendimentos individuais das crian- haverem sido realizados exames neuroló-
ças, e, ainda, foram realizadas entrevistas gicos. No entanto, os critérios diagnósticos
com professoras. Ou seja, esse segundo devem ser estabelecidos a partir do exame
diagnóstico foi estabelecido a partir do clínico (cf. DSM-IV). Conforme destacado,
exame clínico, com base nos critérios diag- a partir dos dados obtidos por essa pes-
nósticos estabelecidos DSM-IV. Através da quisa, pode-se estabelecer, ainda, que um
prefeitura do diagnóstico das 22 crianças número significativo de crianças faz uso da
que tinham recebido o diagnóstico médi- medicação indicada para o tratamento do
co de TDAH por esse grupo de pesquisa, TDAH sem, contudo, apresentar tal “dis-
constatou-se que apenas 2 crianças de função”. Diante deste quadro, rapidamen-
fato apresentavam os sintomas de TDAH te traçado, percebe-se a necessidade de
listados no DSM-IV. Em 84% dos casos das ampliar a compreensão que se tem sobre o
crianças diagnosticas no Sistema de Saú- TDAH, inclusive pelos profissionais da área
de Publica foi realizado por neurologistas. médica e/ou se de saúde mental. Assim,
Identificamos que muitas crianças pesqui- é crucial que os responsáveis pela saúde
sadas foram submetidas ao eletroencefa- da criança, sejam os pais, os profissionais
lograma (EEG) e depois receberam o diag- da área da saúde e os/as professores/as,
nóstico médico de TDAH. Contudo, como mobilizem-se para que: Reavaliem a bana-

526
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lização que vem ocorrendo em relação ao cio do estudo, os sujeitos pouco se relacio-
diagnóstico do TDAH. Hiperatividade não navam entre si e, com o decorrer das ses-
é o TDAH. Ampliar a consciência sobre o sões, a interação foi favorecida pela maior
uso de psicoestimulantes, como o metilfe- freqüência de brincadeiras de faz-de-con-
nidato, que pode causar dano nos sistema ta. As autoras concluíram destacando a
nervoso das crianças. Ter consciência dos importância do brincar para melhorar re-
reais critérios usados para se fazer um lações sociais e promover desenvolvimen-
diagnóstico correto do TDAH. Encontrar to. O brincar também pode ser utilizado
formas alternativas de tratamento para es- para identificar habilidades em crianças
sas crianças. A Terapia Cognitiva (TC), por que apresentam alterações no seu de-
exemplo, tem propostas diferentes para senvolvimento. Esse uso é enfatizado na
abordar essa criança. Isto é, ela pretende proposta de grupo para intervenção fono-
trabalhar precisamente aspectos o proces- audiológica descrito por Laplane, Batista e
samento cognitivo da criança que, efetiva- Botega (2007), em que crianças com quei-
mente, apresente o TDAH. xas de atraso de linguagem podem mos-
trar competências através da observação
Palavras-chave: TDAH; Discussão diagnóstica; de situações que se caracterizem como as
DSM-IV. mais naturais possíveis como, por exem-
plo, o brincar. Diante da perspectiva do
brincar como contexto passível de iden-
LT04-984 - O MANUSEIO DE tificação de competências, o objetivo do
OBJETOS COMO INDICADOR DE presente projeto foi o de descrever situa-
DESENVOLVIMENTO EM CRIANÇAS ções de brincadeiras, nas quais ocorresse
COM ALTERAÇÕES DE LINGUAGEM E DE o uso de objetos por crianças com alte-
DESENVOLVIMENTO rações no desenvolvimento e linguagem,
Amanda Brait Zerbeto - UNICAMP e assim, evidenciar as competências que
amandabrait@gmail.com elas apresentam. Em relação à metodolo-
Cecília Guarnieri Batista - UNICAMP gia, trata-se de uma pesquisa qualitativa
cecigb@gmail.com observacional. Os participantes da pesqui-
Financiamento: CNPq sa foram quatro crianças com idades entre
2 e 5 anos, com queixas de alterações de
Crianças com alterações de linguagem e linguagem e no desenvolvimento global.
no desenvolvimento global são, frequen- Foram observados em contexto de um
temente, descritas por suas incapacidades grupo de Avaliação de Linguagem, super-
e limitações, mais do que por suas habi- visionado por Fonoaudióloga, Psicóloga
lidades, muitas vezes, de difícil identifica- e Pedagoga. O projeto foi aprovado pelo
ção. O brincar influi no desenvolvimento Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição
infantil, contribuindo para o desenvolvi- em que foi realizado. Os pais assinaram o
mento social, cognitivo, linguístico e mo- Termo de Consentimento Livre e Esclareci-
tor (Vygotsky, 1998). Pinto e Góes (2006) do e os nomes das crianças, quando cita-
estudaram o brincar de faz-de-conta em dos no estudo, foram substituídos por no-
crianças com diagnóstico de deficiência mes fictícios. Doze sessões foram video-
mental, entre 4 e 6 anos de idade. No iní- gravadas, com duração de uma hora cada,

527
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sendo transcritos e analisados 12 episó- (segurando-o pela traseira). Análise: (a)


dios relativos às 4 crianças. Os episódios competências sociais: nesse episódio, não
significativos (Carvalho & Pedrosa, 2002) houve intervenção direta do estagiário e,
foram identificados e a análise, realizada mesmo assim, Mila manuseou o objeto da
tendo como base a abordagem microge- forma socialmente aceita; quando o car-
nética (Góes, 2000). A análise foi centrada rinho caiu de lado, Mila o virou diversas
na busca de competências, com foco nos vezes, até que este ficou na posição con-
aspectos sociais, cognitivos e lingüísticos. vencional, com as rodas sob o chão; (b)
Como parte dos resultados, a análise de competências cognitivas: Mila pareceu
um episódio relativo à criança Mila (3 estar “concentrada” na tarefa de colocar o
anos e 4 meses) será apresentada, para carrinho na posição convencionada, com
ilustrar as análises realizadas: Queixa/ as rodas no chão; fez tentativas seguidas
diagnósticos: “Atraso no desenvolvimen- de posicionar o carro, com movimentos
to da linguagem e no desenvolvimento de virá-lo em seu eixo central; deslizar o
neuropsicomotor” (dado do prontuário). carro pelo chão de forma simples, pareceu
Nasceu prematura e era pequena para a próximo ao uso canônico, sem colocar o
idade gestacional. Observações no grupo: objeto na boca; (c) competências lingüís-
Durante os grupos, andou pela sala sem ticas: Mila não falou no episódio relata-
se fixar em atividades e freqüentemente do; demonstrou atenção na atividade, ao
levou objetos à boca. Fez contato de olho olhar o movimento do carro sendo virado,
com os estagiários e apresentou sorrisos e em relação ao trajeto feito quando este
espontâneos. Quando chamada pelo ape- foi empurrado. Em outros momentos da
lido, olhou na direção de quem a chamou. sessão, olhou para os estagiários enquan-
Vocalizou “aaa” e “ooo”, algumas vezes, to estes falavam, sorrindo para eles. Nas
em contexto de comunicação, ocupando crianças com alterações de linguagem e
seu turno de conversação. Episódio 1: (1) desenvolvimento, pode-se notar que atra-
Mila está ajoelhada no chão, com um car- vés do manuseio de objetos foi possível
rinho de plástico (ambulância) na mão. (2) identificar competências sociais, cogni-
Mila deixa o carrinho cair no chão e o ob- tivas e lingüísticas (Silva e Batista, 2007).
jeto cai virado de lado. (3) Mila olha para As crianças observadas, na maior parte
o carrinho e começa a virá-lo em diversas das sessões, fizeram o manuseio não con-
posições (de cabeça para baixo, de lado, vencional do objeto (Rodriguez & Moro,
de trás), até deixar o carrinho na posição 1999). Entretanto, na análise minuciosa
convencional (com as rodas no chão). (4) de sessões consecutivas, foram encontra-
Mila coloca as mãos na lateral do carri- dos episódios em que as mesmas crian-
nho e o empurra. O carrinho é deslocado ças manusearam os brinquedos de forma
para longe de Mila, e se move lateralmen- mais próxima à socialmente preconizada.
te (nessa posição, as rodas deslizam no Nas brincadeiras em que foram simuladas
chão). (5) Mila acompanha com o olhar situações do cotidiano (como alimenta-
o movimento do carrinho. (6) Mila pega ção, meios de transporte, brincadeiras
o carrinho pela parte de trás e o arrasta tradicionais, cuidar do bebê), a interação
para mais próximo de seu corpo. (7) Mila da criança com o estagiário mostrou-se
desliza o carrinho para frente e para trás mais efetiva e semelhante ao encontra-

528
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do socialmente. As crianças sustentaram dissociado do contexto social, histórico


uma atenção voltada tanto para os obje- e cultural: é sempre decorrente da rela-
tos como para os estagiários (interação tri- ção dialógica do sujeito com o meio e,
ádica). As simulações do cotidiano foram como afirma Kelman (2010), pressupõe
especialmente relevantes porque muitas interações que acontecem em ambientes
das crianças não tinham familiaridade ou social e culturalmente estruturados, que
interesse por outro tipo de brinquedo. A promovem mudanças ao longo do tempo,
observação do manuseio de objetos pe- implicando em transformações. Partindo
las crianças com queixas de alterações na dessa concepção, o trabalho com forma-
linguagem e desenvolvimento permitiu ção de professores na Secretaria de Edu-
a identificação de competências sociais, cação do Distrito Federal remete a análise
cognitivas e lingüísticas. O manuseio ocor- de questões que interferem no desen-
reu, na maior parte das ocasiões, de forma volvimento profissional dos docentes e,
não-convencional, porém, a partir da par- por conseguinte, no desenvolvimento
ticipação do estagiário na brincadeira e da dos estudantes. Com relação à formação
significação do contexto por meio da fala, dos professores que trabalham com estu-
o manuseio mostrou-se mais próximo do dantes com Transtorno Global do Desen-
socialmente estabelecido. A observação volvimento (TGD) torna-se pertinente a
sistemática das interações, por várias ses- análise das expectativas que professores
sões, permitiu caracterizar o processo de e família tem sobre o atendimento para
desenvolvimento da criança, com foco no orientação do trabalho na formação. O
potencial. desenvolvimento profissional de profes-
sores, historicamente, não traz, em sua
Palavras-chave: alteração no formação inicial, um trabalho direcionado
desenvolvimento, manuseio se objetos, de modo objetivo para o atendimento ao
competências aluno com TGD, deficiência, ou altas habi-
Contato: Cecilia Guarnieri Batista, lidades/superdotação. Formações especí-
Universidade Estadual de Campinas, ficas, hoje, são determinadas por lei, ou
cecigb@gmail.com são feitas à parte em cursos complemen-
tares. Atualmente nos encontramos no
curso efervescente da inclusão escolar e
LT04-1026 - IMPLICAÇÃO DAS com muitos profissionais sentindo-se des-
EXPECTATIVAS DE PROFESSORES E preparados para o trabalho com o público
FAMÍLIA NO DESENVOLVIMENTO DO da Educação Especial. Fator que diminui
ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO ou exacerba as expectativas durante o
DESENVOLVIMENTO - TGD atendimento ao estudante, prejudicando
Virgínia Silva - SEDF/EAPE o curso do seu desenvolvimento e tam-
virgínia_s@globo.com bém do desenvolvimento profissional do
Maria da Conceição Nunes - SEDF/EAPE docente. O conhecimento das expectati-
conceicaonunes@yahoo.com.br vas interfere diretamente na construção
de objetivos e estabelecimento de meto-
Segundo a perspectiva histórico-cultural dologias de trabalho. O professor, como
o desenvolvimento humano não ocorre sujeito cultural, propõe um arranjo me-

529
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

todológico para mediar a aprendizagem mento aprofundado dos estudantes, das


e o desenvolvimento dos estudantes. Tal expectativas da família e da escola com
arranjo deve ser organizado e construí- relação ao seu desenvolvimento e da pre-
do com base nas expectativas da família sença da formadora no momento de defi-
e da escola. Essa ação se justifica porque nição e escolha de estratégias de ensino
a pessoa com diagnóstico de TGD possui e critérios de avaliação do planejamento.
características que, sem a precisão do Definiram-se encontros quinzenais para
planejamento, presença e colaboração discutir os planejamentos, totalizando 14
de um sujeito mais experiente na reali- sessões de discussão, com cerca de 3h de
zação de atividades, podem impedir um duração cada. Inicialmente, foi utilizado,
ritmo adequado ao seu desenvolvimen- para a apresentação de cada estudan-
to. O desenvolvimento das pessoas com te, um dossiê com perguntas específicas
TGD está ligado ao que o meio lhes ofe- elaborado para que a descrição fosse ob-
rece como propulsores de habilidades e jetiva e abrangesse aspectos globais de
conhecimentos úteis, necessários e indis- análise da pessoa com TGD. Os objetivos
pensáveis para a vida autônoma. Para es- são discutidos e produzidos em grupo
tabelecer esses propulsores, professores nas turmas de formação. Posteriormen-
e família devem trabalhar em conjunto e te, estratégias serão traçadas para cada
partir do que os estudantes conseguem objetivo estabelecido enfatizando a im-
demonstrar saber e/ou fazer bem. Este portância do atendimento às expectativas
aspecto será o ponto motivador para os analisadas e do registro das ações para o
estudantes recepcionarem o trabalho acompanhamento pontual do desenvolvi-
e poderem, por meio dessa mediação, mento do estudante e do profissional que
desenvolverem-se de forma mais autôno- está em formação. Dados preliminares
ma possível. Estudos indicam que as con- deste estudo indicam que as expectati-
cepções dos professores norteiam seus vas relatadas por professores e famílias
trabalhos e modificam o meio no qual se relacionam-se as categorias linguagem,
estabelece o ambiente de aprendizagem escolarização, comportamento, socializa-
dos estudantes. O professor, ao levar em ção/interação e autonomia. A categoriza-
conta a expectativa que ele próprio e a ção facilita a orientação, no trabalho de
família possuem para determinado estu- formação, para o estabelecimento de um
dante, está imprimindo em sua prática ambiente que seja estruturado e provo-
suas concepções de mundo e de desen- que interações causadoras de desenvol-
volvimento. Tais concepções interferem vimento humano. Os procedimentos es-
de modo significativo no estabelecimento colhidos neste estudo desenvolvem-se na
de ações que promovam ensino e apren- direção da compreensão, pelos sujeitos
dizagem dos estudantes. A pesquisa ora envolvidos, da importância que as expec-
apresentada propõe o acompanhamento tativas possuem no desenvolvimento dos
individual do planejamento de sessenta e contextos interacionais. Para isso, conhe-
dois professores, em formação continua- cer o aluno nos leva a estabelecer expec-
da, que atendem estudantes com TGD na tativas adequadas e possíveis e planejar
rede pública. O acompanhamento acon- estratégias que sejam funcionais dentro
tece a partir da identificação e conheci- dos variados contextos. O aluno com TGD

530
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

precisa aprender a viver nesses contextos LT04-1037 - AS EXPERIÊNCIAS


de forma autônoma, o que muitas vezes ESCOLARES DE PESSOAS COM
é um ponto impeditivo do seu estar mais NECESSIDADES EDUCACIONAIS
independente no mundo. O exercício de ESPECIAIS: OLHARES SOBRE AS PRÁTICAS
olhar para esse sujeito, objetivando o seu DE EXCLUSÃO E BULLYING
desenvolvimento, provoca no educador Laís Pinheiro de Menezes - UnB
outro exercício: o de pesquisar, estudar, lais.pinheiro.menezes@hotmail.com
registrar e analisar suas ações práticas e Sandra Ferraz de C. D. Freire - UnB
seus resultados. Tais exercícios promovem sandra.ferraz@gmail.com
o desenvolvimento profissional quando
realizado em um contexto dialógico que O presente trabalho tem por objetivo
permite a ida e a vinda das ações inter- analisar o sentido das práticas discrimi-
ventivas, o diálogo do, então profissional natórias vivenciadas por sujeitos com
pesquisador, com a realidade pesquisada necessidades educacionais especiais na
e com o sujeito objeto de sua pesquisa. escola com o intuito de verificar a possí-
O fomento pela análise dessa realidade vel caracterização dessas práticas como
permite que se desenvolvam estratégias violência escolar, ou bullying. Apesar da
de aprimoramento. Estratégias que a for- grande repercussão que a violência esco-
mação auxilia a desenvolver ou mesmo lar, bullying, tem tido na mídia, na política
fortalecer ao destacar, por meio do diálo- e na produção de pesquisas e trabalhos
go e estudo aprofundado, a importância acadêmicos de diversas áreas do conheci-
da precisão na sua definição. Portanto, mento, pouco têm se falado do fenômeno
identificar e compreender as expectativas com pessoas com necessidades educa-
que, socialmente, são construídas para o cionais especiais. No caso da experiência
trabalho escolar no atendimento ao aluno escolar dessas pessoas, muito tem se es-
com TGD deve tornar-se parte constituti- tudado sobre as especificidades das con-
va e de tradição nos cursos de formação dições biológicas, cognitivas e questões
e de desenvolvimento profissional de do- referentes à aprendizagem. Mas, poucos
centes da escola pública. Espera-se que, trabalhos se preocupam em estudar as
ao finalizarem este curso de formação, questões referentes aos processos do de-
os profissionais compreendam: a) a im- senvolvimento subjetivo marcadas pelas
portância das expectativas da escola e da experiências interpessoais vivenciadas em
família para o desenvolvimento da pessoa função do trabalho escolar. As políticas de
com TGD e b) a relação de tais expecta- inclusão se preocupam com a colocação
tivas para o desenvolvimento docente e dessas crianças na escola, mas tais medi-
discente, em permanente construção. das não são suficientes para que se garan-
ta a inclusão. E o que se observa no dia
Palavras-chave: Desenvolvimento, a dia de escolas inclusivas é uma relação
Expectativa, Formação ainda excludente com essas pessoas. O
Contato: Virgínia Silva, SE-DF/ EAPE, Brasil demorou em expressar seu interes-
virginia_s@globo.com se por “cuidar” dos “deficientes” por meio
de políticas e ações concretas. Internacio-
nalmente, Maria Montessori (1870-1956)

531
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e médicos como Jean Marc Itard (1774- simbólica, contra pessoas com necessida-
1838) e Edward Seguin (1812-1880) já atri- des educacionais especiais. O simples fato
buíam uma importância ao estudo do de- de apenas colocar as crianças com neces-
senvolvimento físico e intelectual dessas sidades educacionais especiais em classes
pessoas. Preocupados com o “desenvolvi- regulares não é suficiente para que haja
mento atípico” buscavam conhecer carac- uma inclusão. Vasta literatura aponta para
terísticas especiais e desenvolver métodos a inadequada formação dos professores
de treinamento para estimular o aprendi- para lidar com o processo de inclusão.
zado dessas crianças, que naquela época Entretanto, poucos estudos considerem
eram rotuladas como idiotas, débeis e as perspectivas dos sujeitos em processo
outros pejorativos. Na evolução da histó- de inclusão. Acreditamos que tais estudos
ria da educação especial no Brasil, merece possam ser reveladores dos mecanismos
destaque a primeira inciativa do governo de exclusão, discriminação e violência vi-
Imperial na criação de institutos como: venciadas por pessoas com necessidades
“Instituto dos Meninos Cegos” (hoje “Ins- educacionais especiais e da posição des-
tituto Benjamin Constant”) em 1854, e do sas experiências na construção da subje-
“Instituto dos Surdos-Mudos” (hoje, “Ins- tividade. Práticas discriminatórias, de ex-
tituto Nacional de Educação de Surdos – clusão e até mesmo de violência ocorrem
INES”) em 1857, ambos na cidade do Rio desde os primórdios da escola. Atualmen-
de Janeiro. Mesmo com rápido avanço no te é conhecido pelo termo inglês bullying,
exterior no início do século XX, o Brasil só que designa comportamentos agressivos,
deu outro passo significativo a partir dos anti-sociais e violentos tanto em âmbito
anos 50. Entretanto, a Educação Especial educacional quanto fora dele. Porém, o
da época se dedicava apenas à pesquisa fenômeno tem chamado mais atenção
acadêmica e a pouquíssimos atendimen- no ambiente escolar pelos prejuízos que
tos educacionais. A criação de escolas de acarreta na vida das pessoas envolvidas.
ensino especial ocorreu gradativamente No Brasil cerca de 1/3 dos estudantes se
ao longo da década de 1960. Em 1969 já consideram vítimas de bullying. Brasília é
havia mais de 800 estabelecimentos de considerada a capital brasileira com maior
ensino especial para deficientes mentais, incidência de bullying: 35,6% dos estudan-
cerca de quatro vezes mais que em 1960. tes (IBGE, 2009). Não há dados estatísticos
Depois, somente a partir da reabertura relacionando pessoas com necessidades
política, com a Constituição de 1988, a especiais. No meio acadêmico, o tema
Educação Especial começa a ganhar espa- também tem preocupado pesquisadores
ço nos documentos oficiais. Em dezembro de várias áreas. Em um levantamento no
de 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Edu- indexador de periódicos científicos Scie-
cação Nacional 9.394/96, define Educação lo, usando como palavra-chave bullying,
Especial e adota medidas para o devido foi possível encontrar 54 artigos sendo
exercício no Brasil, preferencialmente nas que o primeiro aparece no ano de 2001.
escolas públicas por meio da política de Após essa data o próximo trabalho data de
inclusão. Mesmo com esse novo modelo, 2005, mas é em 2008 que há um intenso
ainda persistem práticas de exclusão, dis- aumento de estudos e trabalhos publica-
criminação e até violência, principalmente dos nos periódicos indexados pelo termo.

532
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Não foi encontrado nenhum trabalho que lência se dá apenas de forma indireta na
relacionasse bullying e estudantes com narrativa em função de práticas veladas
necessidades educacionais especiais, ou de exclusão. As práticas escolares canali-
termos similares. Por isso, esta pesquisa zam a cultura de violência que assola a so-
procurou o sentido das práticas discri- ciedade atual e marcam mais intensamen-
minatórias vivenciadas por alunos com te as vidas das pessoas mais vulneráveis.
necessidades educacionais especiais nas Como menciona Charlot (2005), a escola
escolas, com o intuito de verificar a pos- não pode fugir negando a existência da
sível caracterização dessas práticas como violência, pelo contrário, é seu papel re-
bullying. A pesquisa empírica, de caráter fletir e lutar pela cultura de paz.
qualitativo, desenvolveu uma metodolo-
gia interpretativa das narrativas dos su- Palavras-chave: Práticas de exclusão, Bullying,
jeitos. Utilizou questionários dialogados Necessidades educacionais especiais
com questões abertas com quatro mães/ Contato: Laís Pinheiro de Menezes, UnB,
pais de crianças com necessidades espe- lais.pinheiro.menezes@hotmail.com
ciais que estudam em escolas regulares e
fazem complementação em uma escola
especial e entrevistas narrativas individu- LT04-1050 - DESENVOLVIMENTO
ais com quatro pessoas com necessida- COGNITIVO E CO-COGNITIVO DE
des especiais de 11, 14, 19 e 35 anos de INDIVÍDUOS SUPERDOTADOS
idade, alguns também estudantes de es- Fernanda do Carmo Gonçalves - UnB
colas regulares, que frequentam a escola fernandajfmg@yahoo.com.br
especial. Foi realizada no contexto de um
centro de ensino especial da rede pública O interesse por indivíduos superdotados
de educação do Distrito Federal. A partir vem crescendo nas últimas décadas. Di-
da análise dos discursos e narrativas, pro- versos países têm, inclusive, investido em
curou-se identificar e caracterizar práticas programas para superdotados por reco-
potencialmente ou evidentemente dis- nhecerem as vantagens sociais, científicas
criminatórias nas experiências escolares e econômicas relacionadas ao desenvol-
de tais sujeitos e sua possível caracteri- vimento do potencial desses indivíduos.
zação como bullying. As categorias foram Em paralelo, nas últimas três décadas, os
construídas com base nos significados e especialistas em superdotação têm res-
sentidos dessas experiências preconcei- saltado a importância de se compreender
tuosas para os próprios sujeitos. Foi pos- esse fenômeno de maneira complexa e
sível estabelecer relações entre o sentido multidimensional, conhecendo as caracte-
das vivências discriminatórias na escola, o rísticas dos indivíduos superdotados para
desenvolvimento de concepções de si e o que eles possam ser efetivamente identifi-
desenvolvimento escolar de pessoas com cados e receber um atendimento adequa-
necessidades educacionais especiais. Os do de acordo com suas potencialidades e
resultados sugerem que todos os sujeitos necessidades. Dessa forma, os programas
e suas famílias são marcados pela exclu- para superdotados não devem focar-se
são e desigualdade social na escola e na apenas nos aspectos cognitivos (como
família. Porém, o reconhecimento da vio- criatividade e inteligência), mas também

533
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nos aspectos afetivos e sociais, por exem- estimulem os indivíduos superdotados a


plo. Renzulli, um dos mais renomados es- utilizarem seus potenciais em prol da so-
tudiosos na área, propôs em seu modelo a ciedade. Houve um grande avanço no pro-
caracterização da superdotação por meio grama para superdotados no desenvolvi-
de três anéis (Modelo dos Três Aneís) que mento dos fatores cognitivos, que trazem
interagem: habilidade acima da média, impacto no capital intelectual e econômi-
envolvimento com a tarefa e criatividade. co, mas os fatores co-cognitivos merecem
Na representação gráfica desse modelo, ser melhor refletidos e desenvolvidos pois
Renzulli apresenta essas três característi- esses estimulam o capital social. Observa-
cas contextualizadas em um fundo que re- -se ainda que os capitais intelectual e fi-
presenta os fatores personológicos e am- nanceiro tem sido o foco principal dos
bientais que são necessários para a emer- países para o seu desenvolvimento, o ca-
gência e o desenvolvimento dos três anéis. pital social ainda precisa ser estimulado.
Segundo Renzulli esses fatores estão inter- Embora não haja uma definição clara des-
-relacionados e seriam: (a) otimismo, que se termo, considerado intangível, o capital
diz respeito à esperança e aos sentimen- social é compreendido como importante
tos positivos decorrentes da dedicação a e determinante na qualidade de vida de
uma tarefa; (b) coragem, que se refere à pessoas e nas relações sociais diárias. Ren-
independência psicológica e intelectual e zulli indica que o capital social beneficia a
à coragem para correr riscos; (c) romance sociedade como um todo, pois promove a
em um tópico ou disciplina, representado criação de valores, normas e redes de con-
pela paixão por uma determinada área de fiança social que facilitam a coordenação
interesse; (d) sensibilidade às inquietações e cooperação voltada para bem coletivo. A
humanas, que diz respeito à empatia e ao promoção desses fatores devem ocorrem
altruísmo e são impulsos para a motivação em uma bordagem sistemática por meio
do estudo e para o desejo de compreen- de análise de capacidades individuais,
der o ser humano e o mundo; (e) energia interesses e estilos de aprendizagem do
física e mental, expressa pela curiosidade indivíduo superdotado, proporcionando-
e pelo investimento em um determinado -lhes oportunidades, recursos e incentivo
objetivo; e (f) senso de destino, caracteri- de investigação ou criação de experiências
zado pela necessidade de promover mu- dentro de suas áreas de interesse esco-
danças e buscar seus objetivos. Esses seis lhida. Todo o aprendizado e crescimento
componentes são chamados por Renzulli pessoal resultante dessas experiências,
de fatores co-cognitivos, pois interagem tanto cognitivos como co-cognitivos, to-
com os fatores cognitivos (fatores asso- mam lugar no contexto onde convivem.
ciados ao sucesso escolar e a habilidades Dessa maneira, faz-se pertinente refletir a
humanas). O autor expandiu a concepção importância do desenvolvimento dos fato-
de superdotação com os fatores co-cog- res cognitivos e co-cognitivos dos indivídu-
nitivos, pois considera que as caracterís- os superdotados, bem como os contextos
ticas dos indivíduos superdotados não se da família, da escola e dos programas para
restringem apenas a fatores cognitivos. superdotados no estímulo desses fatores
Além disso, Renzulli busca compreender, para a promoção de saúde desses indiví-
por meio desses fatores, condições que duos e do capital social.

534
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: Superdotação, Educação, ma de ensino a uma proposta que esclare-


Desenvolvimento cesse e direcionasse as diretrizes de traba-
Contato: Fernanda do Carmo Gonçalves, UnB, lho dos Grupos de Apoio. A Psicopedago-
fernandajfmg@yahoo.com.br gia institucional tem como objeto de estu-
do a instituição, enquanto espaço físico e
psíquico referente à aprendizagem, sendo
LT04-1196 - AS DIFICULDADES DE avaliadas todas as atividades realizadas no
APRENDIZAGEM E O TRABALHO contexto escolar que interfiram na apren-
PSICOPEDAGÓGICO NOS GRUPOS DE dizagem. O papel da Psicopedagogia insti-
APOIO tucional é estudar as modalidades de ensi-
Simone Cassiani - UNICAMP no-aprendizagem desencadeadas e/ou
simonecassiani@uol.com.br possibilitadas pela instituição escolar. As-
Rosely Palermo Brenelli - UNICAMP sim, o psicopedagogo atuará juntamente
com todos os profissionais que cuidam da
Os grupos de apoio têm como objetivo ga- escola, promovendo a articulação entre
rantir a todos os alunos oportunidades de eles, os alunos e suas respectivas famílias.
aprendizagem, tendo como princípio bási- Ele orientará a ação do professor num ní-
co o respeito à diversidade de característi- vel preventivo e não somente remediador.
cas, de necessidades e de ritmo de apren- (Saravali, 2005; Bossa, 2007). Nessa dire-
dizagem de cada um dos discentes. Esse ção, o trabalho psicopedagógico pode e
estudo de reforço se caracteriza por ativi- deve ser pensado a partir da instituição
dades específicas para a superação das escolar, a qual cumpre uma importante
dificuldades encontradas e para a consoli- função social – de socializar os conheci-
dação de aprendizagem efetiva e bem su- mentos disponíveis, promover o desenvol-
cedida a todos os alunos. Previsto na legis- vimento cognitivo e a construção de re-
lação, de acordo com a Lei de Diretrizes e gras de conduta, de acordo com um proje-
Bases da Educação Nacional 9394/96, to social mais amplo. Pensar a escola à luz
cabe aos municípios baixar normas com- da Psicopedagogia significa analisar um
plementares para o seu sistema de ensino processo que inclui questões metodológi-
(artigo 11, inciso III) e prover meios para a cas, relacionais e socioculturais, engloban-
recuperação dos alunos de menor rendi- do o ponto de vista de quem ensina e de
mento (artigo 13, inciso V). Podemos res- quem aprende, abrangendo, conforme já
saltar que as políticas públicas para as difi- dissemos, a participação da família e da
culdades de aprendizagem não são recen- sociedade (Bossa, 2007). Assim, a Psicope-
tes no âmbito educacional. No entanto, dagogia institucional tem papel importan-
mais do que tê-la, é preciso implementá-la te, mesmo que seus resultados não sejam
de maneira clara e objetiva. O presente imediatos, pois é necessário diagnosticar,
trabalho tem como objetivo descrever a investigar e trabalhar com diferentes fato-
atuação psicopedagógica institucional em res que interferem na aprendizagem, tor-
Grupos de Apoio para os alunos com difi- nando-a mais significativa, agindo de for-
culdade de aprendizagem numa Rede Mu- ma particular com cada aluno. O termo
nicipal de Ensino do Interior do Estado de dificuldade de aprendizagem tem sido fre-
São Paulo, que procurou adequar o siste- qüentemente utilizado por professores e

535
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

por equipes escolares para caracterizar a va-se que na situação de aprendizagem,


não aprendizagem ou o fracasso escolar há a intervenção de uma série de fatores
de crianças e de adolescentes. Tem sido de forma interativa, cuja confluência espe-
estudado pelos mais diversos profissionais cífica determina o rendimento daquele
preocupados com a escola, na busca de que aprende. Os autores destacam que os
uma identificação dos fatores que interfe- problemas de atenção e memória se de-
rem diretamente no sucesso escolar, a fim vem a uma falta de conscientização em
de melhorar o ensino no país. Sisto (2001, relação às exigências da tarefa, às estraté-
p. 33) diz que “(...) poder-se-ia definir que gias que devem ser colocadas em prática
o termo de dificuldades de aprendizagem para resolvê-la e não tanto a um problema
engloba um grupo heterogêneo de trans- de ausência das estratégias concretas. De
tornos, manifestando-se por meio de atra- acordo com Macedo (2005), o modo usual
sos ou dificuldades em leitura, escrita, so- de ver a dificuldade de aprendizagem é no
letração e cálculo, em pessoas com inteli- sentido de queixa, de defasagem ou de la-
gência normal ou superior e sem deficiên- cunas que se não forem superadas, impli-
cias visuais, auditivas, motoras ou desvan- carão prejuízos para a criança que tem tais
tagens culturais. Geralmente não ocorre dificuldades. Dificuldades de aprendiza-
em todas essas áreas de uma só vez e gem, às vezes, significa tristeza, desespe-
pode estar relacionada a problemas de co- rança dos pais que gostariam que seus fi-
municação, atenção, raciocínio, coordena- lhos tivessem um ritmo comparável ao da
ção, adaptação social e problemas emo- média da classe ou às suas próprias refe-
cionais”. As dificuldades de aprendizagem rências. Ou seja, dificuldade remete-nos a
podem se manifestar em qualquer época um critério externo, conhecido e desejável
da vida das pessoas, em qualquer mo- para um outro. Para esse autor, dificulda-
mento do processo ensino-aprendizagem. de, na perspectiva do profissional, signifi-
Como destaca Citoler (2000), não são per- ca receber uma queixa, seja no contexto
manentes, compreendendo-as como uma clínico ou no de sala de aula. Significa do-
situação transitória com possibilidades de minar procedimentos de escuta que per-
melhoras. Essas dificuldades, para Martin mitam compreender o sentido dessa difi-
e Marchesi (1995), implicariam qualquer culdade. Há necessidade de precisar a co-
dificuldade observável, vivenciada pelo locação do problema. Significa usar proce-
aluno para acompanhar o ritmo de apren- dimentos de intervenção terapêuticos ou
dizagem de seus colegas da mesma idade, pedagógicos. É todo um universo diferen-
sem contar o fator determinante da defa- te daquele dos adultos, por exemplo, da
sagem. Assim, é uma população de grande mãe e do pai. Dificuldade, para eles, signi-
heterogeneidade, não sendo fácil encon- fica outras coisas: gastar dinheiro com o
trar critérios que a delimitem com maior psicopedagogo, uma certa desesperança,
precisão. Durante muitos anos os atrasos uma certa preocupação. Enfim, o universo
ou problemas foram definidos pela defici- de discurso e inquietações que a dificulda-
ência em uma determinada habilidade de de aprendizagem traz para os pais. Por-
tais como: inteligência, raciocínio, lingua- tanto, na categoria dificuldade de aprendi-
gem, percepção visual, codificação fonoló- zagem encontram-se alunos com proble-
gica ou na memória, dentre outros. Obser- mas situacionais de aprendizagem (com-

536
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

prometimento em algumas circunstâncias gogo, os educadores e os especialistas que


e não em outras), de comportamento, compõem as unidades escolares da rede
emocionais, de comunicação (distúrbios municipal de ensino. Ressalta, além disso,
da fala e da linguagem), físicos, de visão e que a atuação do psicopedagogo tem um
de audição, e, por fim, problemas múlti- caráter de atendimento escolar e não clí-
plos (presença simultânea de mais de um nico, e que o acompanhamento e inter-
dos problemas anteriormente menciona- venções psicopedagógicas se destinam
dos). Isso nos mostra a abrangência das exclusivamente aos alunos que participam
dificuldades de aprendizagem e as suas da recuperação nas classes de apoio, sem
peculiaridades para o diagnóstico, para a influenciar de modo prescritivo o trabalho
intervenção ou o tratamento. O município desenvolvido nas respectivas classes des-
que foi alvo da presente investigação or- ses alunos. O psicopedagogo não tem uma
ganizou diretrizes de trabalho para os gru- relação direta com o aluno, salvo em situ-
pos de apoio atendendo às exigências pro- ações que necessitem de uma avaliação
postas pelas normas anteriormente des- específica deste profissional. O trabalho
critas. Para tal, a Secretaria Municipal de favorece o aluno, mas a atuação psicope-
Educação elaborou a Resolução nº 003/04, dagógica é com o professor. É o professor
que dispõe sobre os procedimentos para que receberá as orientações pontuais e as
apresentação de um projeto voltado para sugestões de trabalho com os alunos que
o trabalho de acompanhamento psicope- apresentam dificuldades de aprendiza-
dagógico em classes de apoio, consideran- gem. No entanto, nem sempre o professor
do: “ a necessidade da construção e de- cumpre as orientações recebidas, o que
senvolvimento de um projeto claro e coe- pode comprometer o trabalho e a apren-
so para as classes de apoio, com o intuito dizagem dos alunos. Vale ressaltar que há
de contribuir para a minimização dos pro- um psicopedagogo na rede, atendendo as
blemas de dificuldades de aprendizagem oito escolas de Ensino Fundamental. O en-
apresentados por crianças das séries ini- caminhamento ao Grupo de Apoio é reali-
ciais do Ensino Fundamental; a necessida- zado pela professora da sala regular, que
de de acompanhamento e orientação es- detecta as dificuldades dos alunos com
pecífica aos professores que atuam nessas relação aos conteúdos trabalhados na sé-
classes; e, o bom andamento das unida- rie e ou defasagens anteriores, descreven-
des escolares, a democratização de infor- do-as em fichas próprias para direcionar o
mações, a transparência das ações e a uni- trabalho do professor do grupo de apoio.
formização dos procedimentos para a O encaminhamento pode ser efetuado
apresentação de projetos” (2004, p. 1). A para compensar ausências dos alunos que
partir dessas considerações, a Secretaria têm menos de 75% de freqüência às aulas
de Educação do município estudado de- regulares, para reforço aos que não estão
senvolve um projeto sob a orientação de acompanhando o desenvolvimento da
um psicopedagogo em parceria com a di- turma, mas que não apresentam rendi-
reção e coordenação pedagógica das es- mento insatisfatório, e para recuperação
colas e dos grupos de apoio. Essa proposta paralela aos que não acompanham o con-
põe em evidência o compromisso de um teúdo da série, apresentando dificuldades
trabalho cooperativo entre o psicopeda- de aprendizagem e que têm rendimento

537
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

insatisfatório, ou seja, notas abaixo da mé- copedagógicas, visando à melhoria da


dia. O professor da sala de apoio, diante qualidade do trabalho e aprendizagem
do encaminhamento recebido, analisa e dos alunos.
direciona suas aulas preparando ativida-
des interventivas que possam contribuir Palavras-chave: dificuldades de aprendizagem,
para a superação das dificuldades do alu- grupo de apoio, psicopedagogia.
no. Em casos especiais, os alunos são ava-
liados também pela psicopedagoga que
realiza uma avaliação psicomotora e cog- LT01-1070 - A MEDIAÇÃO DE
nitiva, contribuindo para um diagnóstico SIGNIFICADOS NA AULA DE
mais preciso, incentivando o professor da MATEMÁTICA: VALORIZAÇÀO,
sala de apoio a buscar outras direções DESQUALIFICAÇÃO E PAPÉIS DE GÊNERO
para o processo de intervenção. O psico- Otávio Henrique Braz de Oliveira - SEEDF
pedagogo propõe também orientação ao ohbo-df@hotmail.com
professor da sala regular e de Educação Maria Helena Fávero - COGITO/UnB
Física. Os professores que atuam na sala faveromh@unb.br
de apoio participam de reuniões de capa-
citação com a psicopedagoga, quinzenal- Conforme sabemos, a instituição esco-
mente, em que são discutidas teorias e lar media significados partilhados social-
práticas pedagógicas a fim de proporcio- mente acerca da relação entre as áreas
nar melhores subsídios ao trabalho de in- do conhecimento e gênero (Fávero, 1994;
tervenção. O projeto da atuação psicope- Fávero, 2009 b). Como as questões de gê-
dagógica teve início em 2004 e voltou-se nero delimitam os papéis considerados
ao conhecimento das atividades do grupo adequados a homens e mulheres, na es-
de apoio para organização e acompanha- cola essa constatação não é diferente: nos
mento do trabalho pedagógico e dos do- meios escolares, são partilhados signifi-
cumentos administrativos e orientação cados que associam as disciplinas ligadas
aos docentes e pais de alunos. Nos anos às áreas das ciências exatas como mais
seguintes, essas ações foram ampliadas e apropriadas ao gênero masculino (Fávero,
modificaram-se procedimentos adminis- 2010). Assim, na escola, acredita-se que
trativos e pedagógicos. Houve uma orga- as alunas apresentam dificuldades em
nização dos alunos por dificuldades próxi- aprender tais conhecimentos, considera-
mas, nos grupos de apoio, e um trabalho dos racionais e objetivos, portanto, tidos
voltado à motivação tanto para os alunos sócio-culturalmente como masculinos.
da sala regular como para os do próprio Conforme indicam as pesquisas de Fávero
grupo. Foram realizadas avaliações psico- (2010), as alunas aprendem que as áreas
pedagógicas que envolvem o conhecimen- ligadas à ciência e tecnologia não são ade-
to lógico-matemático, a psicomotricidade quadas ao seu gênero e a matemática é a
e as habilidades de leitura e escrita. Con- porta de entrada para o ingresso nessas
forme o desempenho dos alunos, é pro- carreiras. Para o entendimento mais am-
posta uma anamnese com os pais a fim de plo dessas questões, este trabalho analisa
levantar outras informações importantes a maneira como o conhecimento mate-
para o planejamento das intervenções psi- mático é mediado em sala de aula, ten-

538
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do como fundamento teórico-conceitual desqualificadas, como se elas não pudes-


e metodológico a abordagem de Fávero sem aprender satisfatoriamente, sendo
(2009b; 2010a) que propõe a articulação suas dificuldades tidas como naturais e,
entre a Psicologia do Desenvolvimento e a portanto, esperadas para seu gênero. Es-
Psicologia do Gênero. Assim, procedemos sas atitudes do professor revelam que as
a coleta de dados em aulas de matemática expectativas docentes em relação à apren-
de duas salas do 3º ano do Ensino Médio dizagem das alunas acerca dos conceitos e
de uma escola da Rede Pública de Ensino das regras matemáticas são menores do
do DF, uma ministrada por uma professora que os resultados esperados das alunas.
de matemática e outra por um professor Numa dessas situações, por exemplo, o
de matemática, ambos licenciados nessa professor disse que iria “utilizar o giz ro-
disciplina, ambos numa faixa etária de 35 sinha em homenagem às meninas”, numa
anos. As salas tinham em média 35 alunos clara referência à dicotomia presente na
cada, com alunos entre 17 e 19 anos. Com escola entre a feminilidade das meninas
a anuência dos professores e da direção (associada à delicadeza da cor escolhida) e
da escola, registramos em vídeo três aulas a rigidez e objetividade do conhecimento
em cada turma, sendo 30 minutos em mé- matemático. Concluímos, como já assina-
dia, com o intervalo de três dias entre cada lado por Fávero (2010 a), que as meninas
registro. As transcrições dos vídeos foram são distanciadas da matemática ao longo
submetidas à proposta de Fávero (2005), a de sua vida escolar. Tais atitudes, ao lon-
qual toma os atos da fala como unidades go do ciclo escolar, também as distanciam
de análise. Os resultados apontam que: a das carreiras científico-tecnológicas que,
mediação dos professores associa a mate- como sabemos, têm a matemática como
mática à objetividade científica e à racio- filtro de acesso e permanência. Tais dados
nalidade; as regras sobre as operações são podem explicar porque ainda hoje as alu-
transmitidas no lugar de conceitos mate- nas são distanciadas dessas carreiras, as
máticos; os alunos são mais solicitados a quais gozam de alto prestígio social (Fer-
participar durante as aulas, perguntando nandes & Healy, 2007). Nossos estudos
e procurando soluções para problemas, continuam dentro dessa linha para apro-
enquanto as vozes das alunas são menos fundar dados tais como o fato de que as
ouvidas durante as participações nas aulas dificuldades das alunas, nas mediações
de matemática. Evidenciou-se: a diferença observadas, são desqualificadas em várias
de comportamento entre professores e situações, quando, por exemplo, o profes-
alunos e professores e alunas; no segundo sor diz que “não estão aprendendo ma-
caso, os professores tendem a demonstrar temática porque estão preocupadas com
comportamento complacente com as alu- flerte com os meninos”.
nas, como, por exemplo, passar a mão na
cabeça delas durante alguma dificuldade Palavras-chave: Gênero, mediação de
encontrada nas atividades de matemática, conhecimento, aprendizagem de matemática.
demonstrando mais paciência - repetindo Contato: Prof. Otávio Henrique Braz de
várias vezes as instruções, por exemplo - Oliveira - Secretaria de Estado de Educação do
ao explicar-lhes o conteúdo; em ocasiões Distrito Federal. Endereço eletrônico:
como essas as alunas, nessas aulas, eram ohbo-df@hotmail.com

539
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 23 - LT04 2002, 2008; Gonçalves, 1990, 1996). O nú-


mero reduzido de estudos sobre este tema
Infância 1 pode dever-se aos desafios metodológicos
envolvidos em pesquisas realizadas com
LT04-700 - A ESCOLA DE EDUCAÇÃO crianças pequenas. Embora o brincar seja,
INFANTIL NA PERSPECTIVA DAS atualmente, reconhecido como um lugar
CRIANÇAS: UMA ANÁLISE DE EPISÓDIOS “ecologicamente relevante” para o estu-
OCORRIDOS NO CONTEXTO DO BRINCAR do sobre a criança (Pedrosa, 2005), ainda
são poucas as pesquisas que empregam
Fernanda Martins Marques - UFRGS
esse recurso ao investigar as concepções
fernanda_mm@ig.com.br
das crianças sobre a escola (Gonçalves,
Tania Mara Sperb - UFRGS
1990; Morassutti, 2005; Sager, 2002). Em
sperbt@terra.com.br
decorrência, o objetivo deste estudo foi
Júlia Pinto Soares - UFRGS
compreender as concepções das crianças
jps.psico@gmail.com
participantes acerca da escola de edu-
Financiamento: CNPq cação infantil, através da análise de epi-
sódios ocorridos no contexto do brincar.
É cada vez mais comum que crianças bra- Participaram do estudo 5 díades de crian-
sileiras passem parte considerável do seu ças de 5 anos de idade, das quais 3 eram
tempo no ambiente de creches e pré- compostas por meninos e 2 por meninas.
-escolas. É crescente, também, o número As crianças frequentavam uma pré-escola
dessas instituições e a quantidade de pro- que atende aos filhos e dependentes le-
fissionais que se dedicam a essa etapa da gais dos funcionários de uma instituição
educação. Isto se deve, entre outros fato- pública. Foi realizado um estudo observa-
res, ao reconhecimento de que o acesso a cional de tipo focal, com a pesquisadora
uma educação de qualidade nos primeiros ocupando a posição de observadora na
anos de vida auxilia o desenvolvimento in- qualidade de participante (Gold, 1958 in
fantil. Ainda que as crianças façam parte Flick, 2007). Cenas e instruções previa-
da escola e esta se destine principalmente mente organizadas em três sessões de
a elas, a maior parte das ideias e diretrizes brincar objetivaram eliciar episódios que
acerca dessa instituição é uma constru- permitissem acessar as concepções das
ção dos adultos, que se dá sem o envol- crianças sobre a pré-escola. Os dados fo-
vimento das crianças. Estudos sobre as ram coletados na própria escola e as três
concepções das crianças acerca da escola sessões de brincar foram filmadas. A partir
de educação infantil também são raros. As dos vídeos das sessões de brincar, dois ob-
pesquisas realizadas têm mostrado o des- servadores identificaram, separadamente,
taque que as crianças conferem ao brin- os episódios em que se evidenciavam as
car, à alimentação, às regras e à disciplina concepções das crianças sobre a escola
da escola (Cruz, 2002, 2008; Einarsdóttir, (Pedrosa e Carvalho, 2005). Em cada epi-
2008; Sager, 2002; Silveira, 2005). Além sódio foram transcritas as sequências de
disso, os professores costumam apare- ações, uso de objetos e verbalizações das
cer como os principais articuladores des- crianças e da pesquisadora. Os episódios
sa função disciplinadora da escola (Cruz, foram analisados pelo método da Análise

540
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de Conteúdo (Bardin, 1977/2008; Laville frequente, e indica uma representação do


& Dionne, 2007). Os resultados mostra- professor como aquele que oferece su-
ram que as cinco grandes categorias mais porte direto às necessidades da criança na
frequentes nas concepções das crianças escola, seja no confronto com colegas ou
sobre a pré-escola foram: Brincar, Ativida- diante de desafios como machucar-se ou
des, Espaço Físico, Professores e Regras. usar um brinquedo. Outras subcategorias
Em cada uma delas, foram identificadas identificadas em relação aos professores
subcategorias que especificam o conte- foram: Diferenciado do lugar das crianças,
údo trazido pelas crianças. A categoria Disciplinador e Doente. As crianças tam-
Brincar foi a mais frequente, o que suge- bém representaram a escola como um lu-
re que, para essas crianças, a pré-escola gar em que existem determinadas regras
é, principalmente, um lugar para brincar. a serem cumpridas. A subcategoria mais
Dentre as subcategorias identificadas den- frequente foi Uso do espaço e dos mate-
tro da categoria Brincar, a mais frequente riais, que se refere a normas como ter que
foi Brincadeiras de pátio, que inclui brin- arrumar a sala, guardar os brinquedos,
car em equipamentos como escorregador colocar as cadeiras no lugar, etc. As crian-
e balanço, brincar com bola, balde, rolar ças também mencionaram outros tipos de
pneu, jogar futebol, etc.. Em seguida apa- regras, especificadas nas subcategorias
rece a subcategoria Brincadeiras de sala, Segurança, Comportamento e Higiene.
que se refere a jogos (memória, damas, Alguns resultados encontrados nesta pes-
bingo), brincar com fantasias, colar figu- quisa corroboram os achados de outros
rinha, etc. Já a categoria Atividades, se- estudos, tanto nacionais quanto interna-
gunda mais frequente, mostra que para as cionais, como no que diz respeito à impor-
crianças a escola é um lugar em que são tância conferida pelas crianças ao brincar
desenvolvidas certas atividades típicas. (Cruz, 2002, 2008; Einarsdóttir, 2008; Sa-
As atividades mais frequentemente iden- ger, 2002; Silveira, 2005), à alimentação
tificadas foram Alimentação e Acadêmi- (Cruz, 2008; Gonçalves, 1990), ao espaço
cas, seguidas por Contação de histórias/ físico do pátio (Einarsdóttir, 2008; Sager,
rodinha e Enfermagem. Educação Física, 2002) e às regras da escola (Cruz, 2002,
Dormir/descansar, Passeio e Vídeo foram 2008; Gonçalves, 1990, 1996).
atividades menos frequentes. Na catego-
A cultura em que os participantes vivem
ria Espaço Físico observou-se o predomí-
também está relacionada a suas concep-
nio das referências ao pátio, seguido pela
ções sobre a pré-escola. Alguns aspectos
sala, espaço externo à escola, berçário,
mencionados e encenados pelas crianças
biblioteca, reunião e vídeo.
são coerentes com a legislação brasileira
Já na categoria Professores, as crianças na área da educação infantil (Brasil, 1998,
identificaram o educador predominan- 1999, 2009) e com a proposta pedagógica
temente como Determinador. Esta sub- da instituição em que foi realizado o es-
categoria aplica-se a episódios em que o tudo. Destacam-se, nesse sentido, suas
professor aparece anunciando rotinas, de- referências ao brincar, a atividades envol-
terminando o início e o final das ativida- vendo tanto aspectos assistenciais quanto
des, dizendo o que fazer. O papel do pro- educacionais e à diversidade de espaços
fessor como Mediador foi o segundo mais físicos. Ao mesmo tempo, outros achados

541
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

diferem do que consta na legislação e no mal/anormal, verdadeiro/falso, natural/


próprio projeto pedagógico da escola: as antinatural. As manifestações de poder
referências às regras e o predomínio do na escola são exercidas em formas pe-
papel do professor como Determinador. culiares de controle de gestos, atitudes,
Tais resultados indicam a importância de comportamentos, hábitos e discursos. Os
se pensar que espaços e oportunidades educadores aparecem como responsáveis
para brincar estão sendo disponibilizados pela mudança ou pela reprodução, pois
nas escolas de educação infantil. Também ensinam para as crianças como as iden-
mostram que a pergunta inicial deste es- tidades e saberes são representados. A
tudo pode ser relançada: as crianças vêm criança é uma instituição social de apa-
sendo escutadas nas instituições que fre- rição recente ligada a práticas familiares,
quentam? modos de educação e classes sociais e, tal
como a percebemos hoje, é sujeito ativo
Palavras-chave: Concepções de crianças; na sociedade. Presente nas relações hu-
educação infantil; brincar manas, a sexualidade é uma construção
social relacionada ao poder e à regulação,
ainda hoje, polêmica na escola pela multi-
LT04-733 - O QUE SABEM E PENSAM OS plicidade de visões, crenças, tabus, inter-
EDUCADORES SOBRE A SEXUALIDADE ditos e valores dos que nela convivem. As
INFANTIL inclinações sexuais das crianças provêm
Schindhelm, Virginia Georg - UFF/CNPq da curiosidade em explorar e conhecer
psicovir@terra.com.br aquilo que, comumente, é velado e não
de um desejo de prazer sensual. Os pe-
A pesquisa, em andamento, prioriza os quenos constroem suas representações
educadores e busca conhecer suas expe- sobre sexualidade na relação individual
riências e práticas sobre a sexualidade vi- e social com seus pares, seus familiares e
venciada pelas crianças, testemunhando com os educadores da creche durante os
com eles as concepções, valores, atitudes primeiros anos da vida escolar. Trabalhar
e saberes, acerca do gênero e da sexua- com a sexualidade na educação infantil
lidade infantil, com foco na melhoria da tem sido um desafio transformador da
interação educador-criança exercitada no prática educativa cotidiana na Creche da
dia-a-dia escolar. A escola para pequenos Universidade Federal Fluminense – Cre-
é uma instituição, criada pela sociedade che UFF, em Niterói, no Rio de Janeiro.
e nela inserida como uma maquinaria da Inserimo-nos no cotidiano da Creche UFF,
infância que recebe influências e impac- com vistas a: (a) investigar como os edu-
tos da comunidade e se vê atravessada cadores infantis lidam com as formas de
pelas correntes de pensamento, movi- manifestação da sexualidade das crianças
mentos sociais e tensões que perpassam na vivência escolar; (b) conhecer o que
pela sociedade onde se insere. Como sabem os educadores sobre os temas gê-
um subgrupo social, a escola enquadra nero e sexualidade, de forma a fornecer-
e normaliza os alunos dentro de padrões -lhes condições para um diálogo aberto
sociais, reproduzindo dicotomias e políti- com as crianças sobre estas questões; (c)
cas da verdade entre certo/ errado, nor- identificar as relações entre sexualidade

542
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e vida como indicativos de melhoria das educativa cotidiana, na medida em que,


condições de cidadania das crianças e dos muitas vezes, os educadores defrontam-se
educadores; (d) entender de que forma a com situações inesperadas, oriundas das
educação para a sexualidade desde a edu- crianças imbuídas por uma vontade de sa-
cação infantil pode contribuir para a me- ber, que os levam a decisões num terreno
lhoria das práticas educativas e mudanças de grande complexidade, incerteza, singu-
no ethos escolar. O trabalho investigativo laridade e de conflito de valores relativos
tem entrelaçado dados constitutivos de: ao sexual. Estas manifestações relativas à
(a) pesquisa qualitativa com observação sexualidade promovem, nos educadores,
participante; (b) coleta de informações, sentimentos de desconhecimento e impo-
registro de observações livres e narrati- tência no confronto e questionamento so-
vas das crianças e da equipe pedagógica; bre essas vivências. É comum presenciar-
(c) discussões e troca de conhecimentos mos, na escola, manifestações peculiares
na formação continuada dos educadores; de histórias e vivências de meninos e
(d) análise de material bibliográfico prio- meninas construídas e determinadas pela
rizando as teses de Foucault, Louro, Vas- cultura no qual são criadas. Os pequenos
concellos, Kramer, Varela e Alvarez-Uria, distinguem-se uns dos outros nos espa-
Castejón, Constantine, Martinson e ou- ços, nas formas de socialização, no tempo
tros estudiosos da infância, do poder na de escolarização, nos trabalhos, nos tipos
escola e da sexualidade. Muito falada, po- de brincadeiras, nos gostos, nas vestimen-
rém pouco explicada, a sexualidade é uma tas, enfim, nos modos de ser e estar no
invenção social constituída historicamen- mundo. Pela imitação e identificação as
te por inúmeros discursos, que a regulam, crianças introjetam significados e exerci-
a normatizam e que instauram saberes e tam fazeres estabelecidos pela sociedade
produzem verdades sobre o sexo. Vincula- como eminentemente feminino ou mas-
-se ao erotismo e à reprodução, tem um culino. Apesar dos temas sexualidade e
caráter dinâmico e mutável por ser ex- gênero ainda serem pouco discutidos na
perimentada e também expressa pelos área da educação infantil, é na primeira
pensamentos, fantasias, desejos, crenças, infância que as crianças começam a for-
atitudes, valores e relacionamentos. O mar as suas idéias sobre sexo, gênero e
educador, em conformidade com a ciên- sexualidade com base no que observam e
cia sexual foucaultiana, é levado a pensar vivenciam na interação familiar, com seus
na sexualidade como algo que está dentro pares e com os educadores. O educador é
de cada um, como algo que faz parte do uma presença política na escola, que não
corpo biológico. A sexualidade, no entan- passa despercebido, na medida em que é
to, diz respeito à convivência social e às uma figura central e importante nos ques-
relações, pois manifesta-se por meio de tionamentos das crianças. As inferências,
palavras, gestos e também pelas idéias ainda que provisórias, alicerçam situa-
compartilhadas com os outros. Apesar de ções que emergiram do cotidiano e: (1)
ser um dispositivo fundamental aos pro- desvelam ocultamentos e silenciamentos
cessos de subjetivação, ainda hoje, esta dos educadores acerca da temática; (2)
temática recebe pouca importância e pro- expõem experiências problemáticas que
voca desafios transformadores da prática os levam ao enfrentamento de situações

543
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

inusitadas, relativas à sexualidade das de desde o seu nascimento. O desenvol-


crianças; (3) evidenciam falas dos educa- vimento cognitivo, social e emocional da
dores que carregam em si marcas de an- criança se estabelece a partir da sua inte-
gústias e constrangimentos sobre o sexu- ração com o mundo que a cerca e os olha-
al; (4) revelam que o conhecimento sobre res que lança sobre este mundo. O ingres-
a sexualidade infantil ainda permanece so da criança à escola infantil marca uma
uma verdadeira terra incógnita, proibi- fase de novas descobertas e aprendizados
da e assustadora para a equipe pedagó- que serão construídos. Quando a criança
gica. A investigação de doutoramento pequena chega à escola infantil, traz con-
tem produzido movimentos instituintes, sigo um conjunto de características que
ainda que singelos, no cotidiano escolar, se expressam, sobremaneira, no campo
na medida em que recolhe fragmentos e educacional, ou seja, traz para escola as-
promove oportunidades para o intercâm- pectos emocionais próprios, apresentam
bio de experiências e saberes geradores comportamentos, valores, interesses e
de novos conhecimentos, informações dificuldades, aprendizados e cultura de-
e reflexões entrelaçados pelas vivências correntes de sua vivência social e fami-
cotidianas, capazes de promover nos edu- liar. Etendemos que a Educação Infantil é
cadores alternativas para re-significarem uma etapa de fundamental importância
as suas concepções acerca da sexualidade para o desenvolvimento pleno da crian-
infantil. ça. Educação infantil aqui definida como
um conjunto de ações que envolvem as
Palavras-chave: educadores, sexualidade dimensões integradas e indissociáveis do
infantil, poder na escola cuidado e da educação, que, de forma
sistemática e intencional, propiciam uma
visão ampla que compreende o desenvol-
LT04-756 - O QUE PENSA A CRIANÇA vimento da criança nos seus múltiplos as-
PEQUENA SOBRE A ESCOLA INFANTIL pectos. Estas colocações sobre o tema em
Andréia Dutra Escarião - UFPB questão justificam a pertinência dos estu-
Adelaide Alves Dias - UFPB dos sobre a criança e o seu olhar sobre a
aescariao@gmail.com escola infantil, revisitado na concepção de
algo que vai além de saberes que se colo-
O interesse em aprofundar os estudos so- cam como processo de formação para o
bre a criança pequena, e seu olhar sobre a exercício da cidadania plena. Identificar o
escola infantil se deu a partir da importân- que pensa a criança sobre a escola infan-
cia de focalizar a infância como um estudo til; Relacionar as necessidades e expecta-
específico, detalhado e crítico. Os nossos tivas da criança com as propostas voltadas
estudos foram pautados em autores que para Educação Infantil; Analisar os dados
se propuseram a escrever sobre a crian- referentes às necessidades e expectativas
ça pequena, como Ariès (2006), Kramer das crianças com relação à escola infantil,
(2007), Cohn (2005), Del Priore (2007), com o propósito de melhoria da qualida-
Kuhlmann (2007), entre outros, assim de de ensino. A escola escolhida para a re-
como, a legislação referente à educação alização da pesquisa foi a Escola da Crian-
infantil. Entendemos que a criança apren- ça (nome fantasia). A escola faz parte da

544
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rede particular de ensino da cidade de forma, o seu desenvolvimento aconteça


João Pessoa – Paraíba. Escolhemos uma de forma plena, estimulando a sua cria-
sala com 8 crianças, todas com 5 anos de tividade, o contato social com as outras
idade. Com o objetivo central de identifi- crianças e com os adultos, promovendo
car o que pensa a criança pequena sobre o aprendizado de novos conhecimentos,
a escola infantil, realizamos uma pesquisa assim como, estabelecendo um ambiente
do tipo qualitativa. Para tanto, utilizamos em que se sinta confiante e segura. A par-
a observação participante como forma tir da fala das crianças, percebemos que a
de iniciar a nossa investigação científica. brincadeira assume papel de grande rele-
Como o nosso objetivo se pautou na in- vância na escola infantil, e que as crianças
tenção de perceber o que pensa a criança se referem ao brincar como aquilo que
pequena sobre a escola infantil, defini- mais gostam de fazer. Vygotsky (1998)
mos o estudo de caso como sendo a me- afirma que o brinquedo é uma fonte es-
lhor abordagem metodológica. Pautados sencial de promoção do desenvolvimento
no conceito de que a criança é sujeito infantil, na medida em que a criança assu-
ativo na construção das relações sociais, me papéis, jogos de “faz-de-conta”, repre-
voltamo-nos para a importância de ouvir sentando simbolicamente alguma situa-
a sua voz, como expressão do seu pensar ção ou sentimento. Outro aspecto expos-
à respeito da escola infantil. Respaldamo- to, por meio dos resultados obtidos, são
-nos na interpretação do desenho da es- os vínculos construídos pelas crianças. A
cola feito pela própria criança, seguida de pesquisa aponta para a predominância da
entrevista semiestruturada, partindo do criança interagir mais comumente com
desenho. Para a realização da coleta de outra criança, a medida que elas brincam,
dados foram utilizamos desenhos como trocam experiências, constroem e re-
forma de expressão da criança, brincadei- constroem o seu ambiente. Os resultados
ras interativas e o registro das falas das também mostraram a importância da for-
crianças através de gravação. Utilizamos mação do professor da educação infantil.
um questionário com os pais ou responsá- Podemos ressaltar que, de acordo com as
veis pela criança, com o objetivo de com- observações realizadas na escola, os de-
preender os motivos pelos quais houve a senhos das crianças e as suas falas sobre a
escolha da escola infantil referida. Como escola infantil, assim como os questioná-
recurso auxiliar foi utilizado o diário de rios aplicados com as mães ou responsá-
campo, para registrar possíveis fatos, situ- veis, entendemos o quanto é necessário
ações e/ou falas observadas no cotidiano continuar a luta por uma escola de quali-
do trabalho. Quando pedimos à criança dade, que venha atender às necessidades
para desenhar a sua escola, entendemos da criança pequena. Estas necessidades
que a representação expressada através estão expressas na nossa pesquisa atra-
do desenho foi construída a partir da sua vés do que pensa a criança sobre a escola
experiência vivenciada neste ambiente. infantil: um espaço de aprendizado lúdico,
Sendo assim, a partir dos desenhos e das um espaço onde o brincar seja valorizado
falas das crianças observamos como é im- e permitido; onde as relações se cons-
portante perceber as suas necessidades troem através dos vínculos estabelecidos
neste ambiente infantil, para que, desta com as outras crianças e com os adultos;

545
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

um espaço de crescimento. Concluímos, no país. Afinadas com os documentos ofi-


destacando a necessidade de pensarmos ciais (BRASIL, 2002; 2009), Silva e Pasuch
esta escola infantil a partir das necessida- (2010) afirmam que a educação infantil
des das crianças, aliada ao planejamento no/do campo deve ser, portanto, constru-
pedagógico, e à constante discussão sobre ída a partir dos modos próprios de vida,
as políticas públicas que visam atender valorizando e reconhecendo as práticas
às necessidades da criança, promovendo culturais locais e as necessidades de fle-
desta forma o seu desenvolvimento pleno xibilização de calendário, rotina e ativida-
e, consequentemente, uma educação in- des. Segundo Araújo (2010), muitos pro-
fantil de qualidade. Ratificamos a impor- fissionais da educação cultivam modelos
tância do estudo sobre a criança pequena, de educação tradicionais, que têm como
entendendo esta criança como um ser so- base a hierarquização Estado-município-
cial, atuante, construtora de cultura, com -professores-alunos. Além disso, quando
características próprias, reconhecendo-a se trata de um contexto diferente como
como sujeito ativo no processo de desen- o campo, apóiam-se em modelos urbano-
volvimento e na construção das relações cêntricos nos quais impera a concepção
sociais que estabelece com os outros, e na de rural como centro agroindustrial, difi-
percepção do mundo que a cerca. cultando possibilidades de atuação junto
à comunidade. A partir do pressuposto
Palavras-chave: Criança. Infância. Escola teórico histórico-cultural, segundo o qual
infantil. os processos de aprendizagem são media-
dos semioticamente pelo outro (Vygotsky,
1998) e situados em contextos históricos,
LT04-797 - EQUIPE ESCOLAR EM políticos e culturais, os profissionais da
ASSENTAMENTO RURAL: SIGNIFICAÇÕES educação do campo são compreendidos
SOBRE EDUCAÇÃO INFANTIL E CRIANÇA aqui como agentes potencializadores des-
DO CAMPO sa mediação simbólica criança-mundo.
Assim, a equipe escolar constitui-se como
Juliana Bezzon da Silva - FFCLRP/USP
significativamente importante na constru-
julianabezzon@gmail.com ção de espaços e atividades que permitam
Ana Paula Soares da Silva - FFCLR/USP às crianças ampliar as potencialidades de
apsoares.silva@gmail.com seu desenvolvimento. Para as crianças
Financiamento: FAPESP do campo, a escola pode se configurar
por diversos matizes, desde um espaço
Introdução - A educação infantil no/do de descobertas sobre seu próprio mun-
campo começa a ser objeto de discus- do atreladas ao conhecimento produzido
são nacional a partir de políticas públicas pela humanidade e sua comunidade até
recentes empreendidas principalmente como um lugar externo à realidade rural,
pela Coordenadoria de Educação Infantil negando-a enquanto espaço de vida. A
da Secretaria de Educação Básica – CO- atuação da equipe escolar nos contextos
EDI/SEB/MEC em articulação e diálogo rurais, a partir dessa problemática, deve
com os acúmulos dos movimentos sociais ser analisada na perspectiva de compre-
e sindicais que atuam na questão agrária ender quem são esses sujeitos e quais

546
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

possibilidades de sua atuação para o fa- Wallon, propondo uma abordagem semi-
vorecimento da aprendizagem infantil em ótica e considerando a complexidade do
sincronia com a comunidade, visando seu desenvolvimento humano. Assim, foram
fortalecimento. Nesse campo de investi- construídas categorias de significações
gação, o objetivo do presente trabalho é que permitiram a compreensão dos sabe-
tentar compreender as significações da res que constituíam as práticas educativas
equipe escolar de um assentamento ru- das participantes e que compunham a or-
ral sobre a criança pré-escolar assentada ganização e o cotidiano escolar. As profes-
e a educação infantil do campo. Trata-se soras entrevistadas, ambas de uma cidade
de uma análise inserida no contexto da vizinha tida como referência por ser maior
pesquisa de mestrado Educação infantil e sede da diretoria regional de ensino, ha-
no campo: significações de professores, viam iniciado seu trabalho na escola seis
pais e crianças da pré-escola, cujo obje- meses antes da realização das entrevis-
tivo geral é investigar as significações de tas. A diretora, também coordenadora
educação infantil no/do campo presentes pedagógica, é moradora da região urbana
nas práticas sociais de famílias, crianças do município do assentamento, com po-
de cinco anos, comunidade, professores e pulação estimada em 5.000 habitantes e
demais profissionais da educação em dois localizada a 14 km do assentamento. Por
assentamentos rurais. Método - A pes- fim, a monitora do ônibus é assentada há
quisa como um todo envolve a vivência cinco anos, possui dois filhos matricula-
pelo período de um mês continuamente dos na escola, sendo um na pré-escola.
no cotidiano das instituições escolares Considerações - A partir das entrevistas,
em duas comunidades rurais e entrevistas foi possível analisar algumas divergências
semiestruturadas com os principais ato- e/ou convergências entre os discursos das
res sociais envolvidos. Para este trabalho, participantes. Os discursos das professo-
foram analisadas as entrevistas com as ras/diretora divergiram destacadamente
profissionais da educação que trabalham do apresentado pela monitora do ônibus
diretamente com a pré-escola da esco- em relação à visão de criança assentada
la municipal de um assentamento rural no que tange às possibilidades de viven-
do interior do estado de São Paulo, que ciar brincadeiras e experiências de apren-
possui turmas de pré-escola e das séries dizagem no contexto rural. Na visão das
iniciais do ensino fundamental. As profis- professoras/diretora, as crianças assen-
sionais que participaram das entrevistas tadas são “carentes” e possuem poucos
foram: a diretora/coordenadora, a moni- estímulos para aprendizagem e desenvol-
tora do ônibus, a professora da pré-escola vimento. Por outro lado, a monitora entra
e a professora de educação física, que em consonância com as demais quando
ministrava aulas para eles diariamente. se trata dos modos de lidar e interpretar
As entrevistas foram trabalhadas a partir os problemas de comportamento, sempre
da perspectiva teórico-metodológica da solucionados pelo uso de ameaças de re-
Rede de Significações (RedSig) (Rossetti- preensão dos familiares/responsáveis e
-Ferreira; Amorim; Silva; Carvalho, 2004), raramente relacionados às interações com
cujas concepções baseiam-se no mate- a equipe ou à organização da rotina/am-
rialismo histórico-dialético de Vygotsky e biente. Outros aspectos que compuseram

547
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a interpretação dos discursos das profes- LT04-899 - CRENÇA E PRÁTICA DE


soras/diretora foram significações sobre PROFESSORES SOBRE A RELAÇÃO
as crianças como “briguentas”, tanto no CRECHE-FAMÍLIA
sentido de mau comportamento como de Celi Costa Silva Bahia - UFPA
luta pelos direitos. Esse duplo sentido foi celibahia@yahoo.com.br
demonstrado como intrinsecamente rela- Celina Maria Colino Magalhães - UFPA
cionado e complicador do trabalho peda- celina.magalhaes@pesquisador.cnpq.br
gógico que a equipe tentava desenvolver. Fernando Augusto Ramos Pontes - UFPA
Percebeu-se um desconhecimento com fernando.pontes@pesquisador.cnpq.br
relação aos materiais publicados pelo
governo sobre educação do campo. Tais Diante da importância da cultura para a
materiais não têm sido valorizados na re- compreensão do desenvolvimento hu-
gião em que se encontra a escola, sendo mano, a literatura indica diversas razões
tanto uma dificuldade da própria equipe para se investigar a psicologia dos cui-
em buscá-los independentemente, como dadores. Como um elemento dessa psi-
também uma falta de articulação entre os cologia, as crenças influenciam, ainda
poderes públicos local, estadual e nacio- que parcialmente, na maneira como as
nal para viabilização desses materiais na pessoas se comportam. Assim, o com-
formação continuada da equipe. A escola portamento dos cuidadores não consiste
do assentamento investigada é vinculada de uma série de respostas acidentais à
a uma escola da cidade do município ao criança; os adultos têm noções ou ideias
qual pertence o assentamento. Esse fato a respeito de como tratá-las, isto é, suas
demonstrou ser um elemento dificultoso práticas na relação com as crianças estão
na realização de propostas pedagógicas sustentadas no que acreditam ser bom ou
específicas para a educação no campo. ruim, naquilo que eles valorizam ou des-
Evidenciou-se essa questão na conver- valorizam (Miller, 1988). Contudo, Good-
sa com as professoras/diretora sobre o now (1988) argumenta que o número de
projeto político pedagógico da escola, pesquisas relacionando crenças e práti-
submetido às determinações da escola cas ainda é limitado. Essa autora também
urbana. Pode-se dizer que, no contexto chama atenção para o risco de resultados
investigado, a educação infantil do campo ambíguos, por se tratar de respostas dos
é submetida a uma proposta pedagógica adultos sobre suas ações, ou seja, ela
tradicional, autoritária, que não agrega considera que alguns estudos que esta-
novos conhecimentos inclusive legitima- belecem essa relação investigam crenças
dos pelo poder público, o que prejudica a sobre práticas como se estivessem inves-
construção de projetos originais e autên- tigando as práticas. Por isso, estabelecer
ticos que visam estimular e enriquecer as conexão entre crença e prática exige cui-
possibilidades de desenvolvimento infan- dados, pois, nem sempre existe uma re-
til nos e para os contextos rurais específi- lação direta, uma vez que outros fatores
cos onde ele ocorre. interferem nas ações dos adultos. Estu-
dos também têm apontado que quando
Palavras-chave: educação infantil, a família compartilha a educação e socia-
assentamento, pré-escolar. lização da criança com a creche, esta atua

548
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

apoiando as famílias na criação dos seus da na atividade de recepção/despedida,


filhos e a criança passa a viver com seus pois, foi possível visualizar que tanto as
pares e com adultos em um novo contex- professoras quanto as mães buscam a re-
to, com regras e normas próprias. Neste, lação, desde que sejam estas as pessoas
as relações são centrais, desde aquelas que deixam ou buscam a criança. Quanto
diretas com as crianças, até as relações ao conteúdo da relação, as professoras
com os familiares e com a comunidade; afirmam que buscam a relação para so-
assim, a relação entre estas instituições lucionar problemas de saúde e compor-
não pode ser uma opção que poderá ou tamento da criança, para partilhar res-
não existir, ela é imprescindível. Uma das ponsabilidades com a família e para levar
possibilidades de análise da relação entre informação sobre a criança e seu desen-
crença e prática é quando os subsistemas volvimento. Essas ideias indicam a supe-
envolvidos entram em contato; entende- ração da compreensão de que a busca de
-se que a atividade de recepção/despedi- contato com a família é apenas para so-
da é um bom momento para analisar a re- lucionar problemas imediatos. Contudo,
lação entre crença e prática sobre a rela- observou-se que, na atividade de recep-
ção creche-família. O estudo foi realizado ção/despedida, os contatos são breves,
com o objetivo de localizar convergências pautados na solução de problemas ime-
e divergências entre crenças e práticas diatos e não fazem parte do planejamen-
de professoras de creche sobre a rela- to das professoras. No que dizem res-
ção creche-família. Fizeram parte deste peito à forma, as professoras afirmaram
estudo 16 professoras que trabalhavam promover a relação por meio de eventos
com crianças na faixa etária de zero a três (reuniões e festas) e da atenção e diálogo
anos, em uma creche pública da periferia destinado aos pais durante a recepção/
de Belém, bem como as crianças que fre- despedida, entretanto, na atividade de
quentavam as turmas de maternal e seus recepção/despedida observou-se que os
familiares. Para coleta de dados, utilizou- encontros são breves e pautados na so-
-se a observação e o grupo focal; neste, lução de problemas; esta atividade tem
abordou-se os seguintes eixos: (a) os ato- o caráter, apenas, de receber e entregar
res da relação creche-família, (b) como e não representa uma oportunidade de
ocorria essa relação e (c) as principais di- aproximação entre as instituições. As-
ficuldades enfrentadas para promovê-la. sim, a relação é quase inexistente. Desse
Os dados observacionais foram analisa- modo, é possível perceber a existência
dos tendo por referência os estudos reali- de convergências e divergências entre as
zados por Bondioli (2004) e Nigito (2004). crenças e as práticas das professoras, o
Já os dados do grupo focal, depois de que significa que nem sempre suas cren-
transcritos, foram analisados tendo por ças são coerentes com suas ações. Con-
base as orientações propostas pela aná- cordamos com Goodnow (1988, 1996),
lise de conteúdo. Os principais resultados quando argumenta em favor do cuidado
revelam que, em se tratando da iniciativa em estabelecer correspondência entre
para a busca da relação, as verbalizações crença e prática, pois, nem sempre existe
das professoras indicam que as relações uma relação direta, uma vez que outros
são bidirecionais. Essa crença foi observa- fatores interferem nas ações dos adultos.

549
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Neste estudo, especificamente, a visão LT04-1514 - REPRESENTAÇÃO DO


negativa que as professoras têm sobre GÊNERO NOS CLÁSSICOS INFANTIS
as famílias parece estar influenciando Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB
na maneira como as duas instituições eugenia_gba@hotmail.com
se relacionam, pois, ainda que os fami- Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB
liares ofereçam informações sobre seus patynfonseca@hotmail.com
filhos, poucas oportunidades são ofe- Jaciara de Lira Almeida Dantas - UFPB
recidas para que eles expressarem seus jaciaraadantas @hotmail.com
desejos, medos, dúvidas, inseguranças, Vivian Kelle Lau Alves - UFPB
etc., enquanto ficam, apenas, receben- vivian.e@gmail.com @hotmail.com
do informações da creche. Infere-se que Walkyria dos Santos Farias Machado - UFPB
a continuidade/ complementaridade do psi_walkyriafarias@hotmail.com
processo educativo da criança, ocorrido Jessyka Natalya de Sousa Cavalcanti
nas duas instituições, fica prejudicada e, jessyka_natalia@hotmail.com
consequentemente, a função educativa
da creche, que tem por objetivo o desen- A infância é uma fase do desenvolvimen-
volvimento integral da criança, também. to repleta de descobertas e aprendiza-
Esses resultados nos fazem pensar que os gens. Nela, as crianças observam, imitam
cursos de formação de professores preci- e aprendem comportamentos e atitudes
sam discutir as crenças desses profissio- apresentados pelos adultos que fazem
nais a respeito não só do desenvolvimen- parte de sua vida. Progressivamente, vão
to da criança, mas, também, das famílias formando seus papéis sociais, os quais são
e, ainda, como sugere Tancredi e Reali construídos a partir dos valores transmiti-
(2001), “conhecer como elas se constro- dos pelos pais e pelas atividades desenvol-
em, para que as imagens das famílias das vidas no contexto escolar, que estimulam
crianças sejam (re)construídas de forma e enfatizam determinados estereótipos de
mais realista e menos preconceituosa” masculinidade ou feminilidade, a exemplo
(p.15). Para além de conhecer os pais, é das estórias infantis. A literatura infantil
importante as professoras saberem como é uma das grandes responsáveis pelo de-
se comunicar com as famílias, pois, a co- senvolvimento da imaginação, da criativi-
municação é o princípio que rege a rela- dade, da linguagem, da socialização e da
ção e assegura às crianças a continuidade identidade de gênero. Os livros auxiliam
e o enriquecimento de suas experiências. na aprendizagem de conteúdos, na forma-
ção de hábitos de higiene e de convivência,
Palavras-chave: crença, prática, relação na aquisição de princípios religiosos, mo-
creche-família rais, éticos transmitidos através de textos
Contato: Celi Costa Silva Bahia, UFPA, e ilustrações que, por sua vez, expressam
celibahia@yahoo.com.br conotações femininas e masculinas. Tra-
dicionalmente, os homens são represen-
tados como fortes, agressivos, violentos,
inteligentes e competentes, enquanto as
mulheres são apresentadas como meigas,
simpáticas, amorosas, frágeis e emocional-

550
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mente dependentes dos homens. Neste Os resultados mostraram que dos 67


contexto, a família e a instituição escolar personagens identificados nas estórias,
têm reproduzido os discursos e as imagens 55,2% eram do sexo masculino e 44,8% fe-
retratados nestes livros, estimulando atitu- minino. Identificou-se ainda que do total
des sexistas, de discriminação e de exclu- dos personagens, 36 eram protagonistas,
são. Os clássicos infantis, estórias mundial- sendo 61,1% do sexo masculino e 38,9%
mente conhecidas e passadas às gerações do sexo feminino. Com relação à figura
através de livros e de filmes, continuam masculina, foram identificadas 277 carac-
encantando e moldando o pensamento e terísticas, sendo 25% físicas (cor branca,
o comportamento de um povo em um de- alto, forte, cabelos lisos e escuros, olhos
terminando momento histórico. Nos dias claros e magros), 20,9% socioeconômi-
atuais, ainda se vê jovens falando que es- cas (rico, simpático, gentil e solidário),
tão à procura de um “príncipe encantado”, 16,2% características psicológicas (bon-
ou seja, de um rapaz bonito, forte, rico e doso, corajoso, alegre e amável) e 15,8%
inteligente que, juntamente com ela, serão cognitivas (inteligente e esperto). Quanto
“felizes para sempre”. Todavia, não se tem à figura feminina foram observadas 174
realizado uma análise crítica acerca das características, sendo 58% físicas (cor
mensagens sexistas transmitidas através branca, loira, magra, cabelos lisos e escu-
dos textos e das imagens desses clássicos. ros, olhos claros e escuros), 13% socioe-
Sendo assim, há necessidade de se discu- conômicas (rica, simpática, e solidaria) e
tir na sociedade, especialmente na esco- 29% características psicológicas (ingênua,
la, as desigualdades de gênero propostas meiga, submissa, honesta e bondosa).
por esta literatura que reforçam práticas Conclui-se que as estórias infantis repre-
sociais e pedagógicas preconceituosas. sentam, predominantemente, figuras
Diante do exposto, este trabalho tem por do gênero masculino, sobretudo, prota-
objetivo verificar como as estórias infantis, gonistas. Esta constatação vem mostrar
especialmente os textos e as imagens, re- uma relação desigual, onde o homem é
presentam os papéis de gênero. representado com mais importância e su-
Para sua realização, foram selecionadas, perioridade do que a mulher, próprio de
por indicação de cinco professores da uma sociedade androcêntrica, onde as
educação infantil, 11 estórias infantis, são normas e os valores são definidos a partir
elas: A Bela Adormecida, A Bela e a Fera, dos princípios masculinos. Especificando
A pequena Sereia, A Princesa e o Sapo, os dados, constatamos que a figura mas-
Aladim, Branca de Neve e os Sete Anões, culina é apresentada nas estórias, na sua
Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, João e grande maioria, como um homem bonito,
o Pé de Feijão, Peter Pan e Rapunzel. Estas rico, corajoso e inteligente, atributos ab-
foram submetidas a uma análise qualitati- sorvidos pelo público feminino e fonte de
va por três juízes, onde se buscava avaliar desejo na adolescência e na vida adulta.
a representação do gênero a partir dos se- No caso do modelo feminino transmitido
guintes aspectos: personagem escolhida nestas estórias, observa-se o de uma mu-
como protagonista, características físicas, lher bonita, ingênua e submissa, aspectos
sociais, econômicas e emocionais dos per- tão enfatizados na sociedade patriarcal e,
sonagens. ainda, exigidos, por alguns homens, no

551
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

atual contexto social. As estórias ainda LT04-1519 - O CUIDAR NOS PEDE


revelam uma ênfase nas características MAESTRIA: REFLEXÕES SOBRE O
físicas dos personagens, principalmente TRABALHO DO PROFESSOR NO CAMPO
na mulher, figuras belas, magras, brancas DA PRIMEIRA INFÂNCIA
e com cabelos lisos, definindo um padrão Maria Vitória Campos Mamede Maia - UFRJ
de beleza. Com isto, as estórias estimulam mariavitoriamaia@gmail.br
a preocupação com a beleza e o corpo a Isadora Garcia - UFRJ
ponto de abalar o autoconceito e a au- Shelle Cristine Goldemberg de Araújo - UFRJ
toestima das jovens que não conseguem
alcançar este padrão. Nesta perspectiva, Cuidar de crianças na primeira infância
por definir previamente um padrão de be- nos coloca questões diante do fato de es-
leza, a sociedade exclui o diferente (ex. a tas nos solicitarem, mais do que crianças
criança de cor escura, cabelos cacheados, maiores, cuidado: como não assumirmos
gorda, deficiente intelectualmente), o que transferencialmente o lugar materno ou
precisa ser combatido nas escolas. Frente paterno|? Como não nos penalizarmos
ao exposto, pensa-se sobre a representa- pelo que vemos, sem proferirmos julga-
ção que as crianças da educação infantil mentos de valor? De que lugar falamos e
estão formando a partir destas estórias, que lugar ocupamos quando trabalhamos
que são contadas e lidas, na maioria das com a primeira infância ? O cuidar nos
vezes, sem uma reflexão sobre os papeis pede maestria. Quando lidamos a pri-
sociais de gênero. Assim, é fundamental meira infância, igualmente lidamos com
que o professor e os pais/responsáveis to- suas famílias e estas possuem uma forma
mem consciência desta discussão uma vez peculiar e única de funcionamento. Pre-
que tanto a escola como a família são os cisamos, como profissionais, sermos ma-
dois contextos de socialização responsá- estros de uma orquestra que possui sons
veis pela formação inicial da criança, que próprios e tons próprios. Dentro desse
está aprendendo sobre a diferenciação contexto qual seria a função do educador
de gênero, ou seja, o que é ser homem no espaço da educação infantil? Será que
ou mulher na sociedade. A escola, em essas pessoas têm noção plena do impac-
particular, apresenta-se como um meio to que causam no desenvolvimento da
de grande importância na construção da criança desta faixa etária? Como lidar com
identidade na vida dos indivíduos, pois essas crianças se elas nos mobilizam exa-
é neste contexto que as crianças passar tamente a parte que muitas vezes esque-
grande parte do seu tempo e aprendem a cemos como era quando fôramos peque-
ser e a conviver. nos? Se retomarmos o histórico de como
a educação infantil passou a fazer parte da
Palavras-chave: Gênero; Estórias Infantis; Educação veremos que antes de a infância
Educação Infantil. habitar o espaço educacional ela era des-
Contato: Patrícia Nunes da Fonseca, UFPB, tinada e cuidada por profissionais sociais.
patynfonseca@hotmail.com Depois que o cuidar ganha outros sentidos
para além de manter vivo aquele ser pe-
queno e passa a escola a ser o palco deste
trabalho. Perguntamo-nos se os profissio-

552
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nais que são deslocados da sala de aula da de cuidado que respeitem e favoreçam as
alfabetização para tomar conta das crian- condições de subjetivação e acolhimento
ças entendem a importância de seu papel ao pais e aos bebês, e que contemplem
ou sabem o que fazer? Hoje já temos uma uma formação mais singularizada dos
cultura da educação infantil, mas o cuidar profissionais que se dedicam à primeira
que essa faixa etária nos pede é um cuidar infância”(Zornic, 2010, p. 4) e igualmen-
diferente, um cuidar de sustentação e con- te de sua valorização pelo trabalho exer-
tinência para além do trabalho pedagógi- cido, o que não acontece na maioria das
co que lhes é solicitado. Um bebê e uma vezes. Segundo ainda a mesma autora, na
criança muito pequena só pode se cons- pesquisa realizada pela mesma, foi cons-
tituir e construir para si uma história nar- tatado que “muitas vezes os profissionais
rativa se houver, com ela, nesse percurso, da primeira infância não conseguem reco-
um adulto que exerça a função de nomear nhecer a dimensão fundamental e criativa
o mundo, identificá-lo e interpretá-lo des- de seu trabalho, sobrecarregados por uma
de as funções corporais até o mundo das rotina repetitiva e sem uma interlocução
coisas que rodeiam essa criança e os sen- que lhes permita dar sentido e amarração
timentos que emergem em determinadas simbólica a seu ato.” (Zornic, 2010, p. 13).
situações. Há regras que ainda precisam Neste trabalho discutiremos qual a impor-
ser aprendidas e estas só assim serão se tância da formação de profissionais nesta
houver alguém que exerça essa função. O área da primeira infância, levando-se em
que é pedido aos professores, mais do que consideração os conceitos de Winnicott
uma demanda pedagógica, é sustentação de holding, handling e apresentação do
e continência (Winnicott, 2000). Como mundo como sendo as principais tarefas
articular o que se pede como trabalho a maternas e o olhar diferenciado que um
ser feito dentro de uma faixa etária e a professor precisa desenvolver para intervir
questão primordial, ao nosso ver, de cons- sem interferir em um processo de desen-
tituição de um sujeito psíquico, qual seja, volvimento que já está lá, só que às vezes
sustentar e conter no tempo e no espaço de forma ainda insipiente. Neste âmbito,
uma criança pequena nas suas angustias para ampliar a discussão que este trabalho
e desejos? Relata-nos Zornic (2010) que pretende trazer, relataremos como uma
em um estudo feito pela Fundação Carlos situação de substituição de professor no
Chagas, em parceria com o Ministério da final de ano, devido à demissão da profes-
Educação e o BID, que 49,5% das creches sora regente, pode gerar a construção de
no Brasil tem qualidade inadequada, com um trabalho entre as crianças de 3-4 anos,
nota entre 1 e 3 numa escala que vai até do Maternal II, em um colégio Municipal
10. A pesquisa foi realizada em 147 insti- do Rio de Janeiro, e a professora novata,
tuições municipais, mas também incluiu levando a uma transformação da relação
escolas conveniadas e particulares. Os professor-aluno e novos aprendizados. A
resultados enfatizaram a necessidade de técnica por ela utilizada foi desenvolvida
melhorar a formação dos profissionais no âmbito do grupo de pesquisa Criar e
que cuidam desta faixa etária” (Zornic, brincar: o lúdico na escola, coordenado
2010, p. 4). Segundo a autora, esta e ou- pela Profa. Dr. Maria Vitoria Maia (UFRJ).
tras pesquisas marcam a “falta de práticas Os impasses que as crianças de 3-4 anos

553
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

trouxeram para a pesquisadora-professo- tem sido ofertado e efetuado com equi-


ra levaram-na a, mais do que cumprir os dade. Diferenças etárias, étnico-raciais,
pontos pedagógicos estabelecidos para de classe e territoriais são evidenciadas
esta turma, trabalhar com elas contenção, nos índices nacionais sobre a cobertura
limite e sustentação no tempo e no espaço do atendimento. Dados sobre as condi-
e, assim, poder reconstruir o vinculo com ções estruturais dos estabelecimentos
a aprendizagem que fora quebrado frente educacionais e sobre os profissionais da
à saída da professora conhecida por eles. educação infantil demonstram ainda que
a qualidade é bastante diferenciada, a
Palavras-chave: Primeira Infância; Formação depender da população atendida. Es-
de Professores; Pratica Pedagógica. ses fatores afetam a plena cidadania das
crianças de 0 a 6 anos de idade e, como
queremos discutir nessa mesa, de modo
particular afetam os bebês e as crianças
de até 3 anos de idade. Representam di-
DIA 14/11 - Segunda-feira ficuldades e desafios que necessitam ser
vencidos no processo de construção da
10h30-12h sociedade democrática, estipulado pela
Constituição Federal de 1988, e na conso-
lidação de um Estado de Direito. A invisi-
bilidade dos bebês nas políticas públicas
MR LT04 - Mesa Redonda e, por que não dizer, também em parte na
Convidada ciência, é ingrediente adicional nesse pro-
cesso. A mesa pretende aprofundar essas
questões, explicitando e esmiuçando as
MR LT04-1331 - A CIDADANIA DOS BEBÊS desigualdades no direito à educação in-
BRASILEIROS EM DEBATE: DESAFIOS fantil vividas e vivenciadas pelos bebês
PARA A CONSOLIDAÇÃO DO DIREITO À e crianças de até 3 aos de idade. Aspec-
EDUCAÇÃO INFANTIL tos do desenvolvimento infantil, parti-
Fúlvia Rosemberg - FCC/PUC-SP cularmente das condições ofertadas às
frosemberg@fcc.org.br crianças pequenas, serão abordados na
relação complexa que esse possui com a
A educação infantil brasileira tem passado política pública, com determinações eco-
por profundas mudanças ao longo das úl- nômicas e culturais. A professora Fúlvia
timas décadas. Os sistemas de ensino têm Rosemberg, que vem problematizando
sido provocados por legislações e regula- há algum tempo o lugar do bebê nas po-
mentações, criadas pelos governos e con- líticas públicas, abordará os discursos do
selhos de educação a partir da construção bebê e da creche a partir do trabalho de
de conhecimentos e da pressão do movi- investigação empreendido por seu grupo
mento social, para atuarem em direção a de pesquisa Núcleo de Estudos de Gêne-
um atendimento que assegure os direitos ro, Raça e Idade (NEGRI) da PUC-SP. Ana
das crianças ao acesso à educação infantil Maria Mello, por sua vez, discutirá aspec-
com qualidade. Esse direito, contudo, não tos relacionados à relação entre política

554
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pública, direitos trabalhistas e questões ficit apenas superado pelas pessoas de 25


econômicas, abordando particularmen- anos e mais, idade prevista para o término
te o benefício do auxílio-creche e seus do ensino superior (IPEA, 2008). Além de
impactos na qualidade diferenciada de a oferta de vagas ser insuficiente e iníqua,
atendimento ofertado às crianças peque- sua qualidade é precária: a situação das
nas. Ana Paula Soares da Silva, a partir creches é pior que a das pré-escolas; a
das reflexões derivadas das investigações situação das creches comunitárias é pior
de seu grupo de pesquisa Subjetividade, que a das demais; a formação dos pro-
Educação e Infância nos Territórios Rurais fessores dá pouca atenção ao desenvol-
e da Reforma Agrária (SEITERRA), vincula- vimento infantil na faixa de 0 a 3 anos e
do ao CINDEDI, explorará a particularida- oferece poucas oportunidades de estágio
de relativa aos desafios para a efetivação em creche; as atividades com as crianças
do direito à educação infantil dos bebês e são rígidas, pouco diversificadas. Enten-
crianças de até 3 anos de idade do campo. demos que nossa dificuldade de que a
creche seja definitivamente incorporada
à agenda de políticas educacionais decore
DISCURSOS SOBRE BEBÊ E A CRECHE de vários fatores. Falta-nos mais clareza
Fúlvia Rosemberg - FCC/PUC-SP sobre o estatuto da pequena infância na
frosemberg@fcc.org.br sociedade brasileira quando a considera-
mos apenas como uma etapa preparatória
A apresentação pretende trazer reflexões para a verdadeira vida, que se inicia com
derivadas das várias pesquisas desenvol- o ensino fundamental, com as verdadei-
vidas na trajetória de investigação do Nú- ras aprendizagens, da leitura, da escrita,
cleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade dos cálculos. Por esta falta de clareza, te-
(NEGRI) da PUC-SP. O NEGRI, nos últimos mos caído nas armadilhas: a escolarização
anos, vem desenvolvendo uma linha de precoce, que transforma a pré-escola em
pesquisas denominada Discursos sobre o vestíbulo, fase preparatória para o ensino
bebê, sua educação e cuidado, com espe- fundamental e daí sua valorização; a re-
cial atenção à creche. A linha de pesqui- dução progressiva da idade para ingresso
sa parte de uma reflexão sobre o espaço no ensino fundamental e para o início da
auferido ao bebê nas políticas educacio- escolaridade obrigatória; a “assistenciali-
nais. Se pais e mães brasileiros amamos zação” da creche, especialmente do aten-
nossos filhos, enquanto cidadãos adultos dimento à criança pobre de 0 a 3 anos, isto
nem sempre reconhecemos a criança pe- é, direcionar os recursos da creche para a
quena como cidadã, pois apreende-se um salvação da criança brasileira. Portanto,
descompromisso histórico quando suas observamos que a EI não tem escapado
necessidades e seus direitos são trazidos à lógica de produção e reprodução da
para o espaço público. A insuficiência de pobreza via políticas públicas. Por isto, é
recursos disponibilizados para a EI pode necessário lutar por mudanças estruturais
explicar, em parte, o quadro de insuficiên- para que os recursos alocados às políticas
cias que vem sendo apontado: as crianças públicas para o bebê, não sejam reduzi-
de 0 a 3 anos são as pessoas que menos dos. Mas para isto, é necessário, também,
frequentam instituições educacionais, dé- atuar no plano simbólico, em políticas e

555
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

práticas de reconhecimento da alteridade de classe. Uma dessas políticas de finan-


dos bebês. Para tanto, é necessário trazer ciamento, justificadas para atender mais
a criança pequena e sua família, suas ne- rapidamente um maior número de crian-
cessidades e seus direitos para o espaço ças, consiste no auxílio-creche, oferecido
público, fortalecendo sua visibilidade e o a trabalhadoras e trabalhadores. O auxí-
poder de negociação na arena de debates lio-creche, como benefício pecuniário,
sobre prioridades em políticas públicas. precisa ser compreendido a partir da aná-
Enquanto pesquisadores, cabe-nos “dese- lise dos limites de organização do Estado
videnciar” processos de naturalização de enquanto promotor de políticas sociais
opções históricas que são construções so- no âmbito de uma sociedade capitalista.
ciais. Daí a linha de pesquisa do NEGRI que Ele se fortalece no com forte influência
vem analisando discursos de atores sociais de recomendações de agências multilate-
sobre o bebê, sua educação e cuidado. rais, no bojo das reformas do Estado que
precisam assim ser consideradas como
Palavras-chave: bebê; educação infantil; determinadas por crises estruturais. Nes-
políticas públicas se cenário, rico em concepções e orien-
Contato: Fúlvia Rosemberg, FCC/PUC-SP, tações neoliberais, as conquistas dos tra-
frosemberg@fcc.org.br balhadores, os acordos e convenções co-
letivas, quando relacionados à educação
e cuidado dos filhos dos trabalhadores,
A POLÍTICA DO AUXÍLIO-CRECHE: facilmente derivam para financiamentos
IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO E O e programas ditos alternativos, o que se
CUIDADO INFANTIL convencionou denominar atendimento
Ana Maria Mello - USP à infância incompleto. Esses programas
melloa@uol.com.br expressam contradições sociais e resul-
tam em reformas restritivas de direitos
A apresentação procurará explorar as das crianças bem pequenas. Assim, ape-
implicações da política do auxílio-creche sar da grande ampliação do atendimento
para a educação infantil e para as crian- a partir dos anos 1980, persistiu no país
ças bem pequenas. Ao longo da história, a oferta de padrões distintos conforme
a escola da elite não é a mesma que a do o perfil social dos usuários. Às reflexões
trabalhador. Nos últimos anos, desenvol- teóricas e políticas sobre esse benefício,
veram-se inúmeros arranjos familiares e serão acrescentados exemplos concre-
formas de organizar o dia a dia da crian- tos como o caso do auxílio-creche, con-
ça pequena. Diferentes formas e arranjos quistado pelos servidores com filhos de
educacionais retratam e exprimem essa menos de sete anos de idade e que não
diferença, que reproduz a desigualdade freqüentam as creches da Universidade
entre as classes. A análise de expansão de São Paulo – USP. Depoimentos de sin-
de vagas e das políticas de financiamen- dicalistas, de equipe de direção do serviço
to da educação infantil no país evidencia social da Universidade e de creches, as-
que elas se reproduzem menos na lógica sim como de pais e familiares, dão vida
da superação e mais na da reprodução e às relações entre o auxílio e o cotidiano
manutenção das desigualdades sociais e desses atores que assumem diferentes

556
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

papéis na educação das crianças peque- BEBÊS DO CAMPO: UM CASO


nas. Dados de pesquisa sobre oferta nas PARTICULAR DE DESILGUALDADE
creches ao longo do tempo oferecem NO ATENDIMENTO DO DIREITO À
indicadores do movimento de influên- EDUCAÇÃO INFANTIL
cia do auxílio-creche na demanda pelo Ana Paula Soares da Silva - CINDEDI/FFCLRP-
atendimento à criança pequena. A fim de USP
complementar a renda familiar, o auxílio apsoares.silva@gmail.com
se torna muitas vezes mais atraente do
Financiamento: FAPESP
que um atendimento à criança em insti-
tuição de qualidade, oferecendo à família A educação infantil brasileira vem se con-
possibilidades de deslocar o recurso para solidando como uma área própria, com
outras despesas ou para o pagamento de saberes específicos, no diálogo e na arti-
atendimento em instituições precárias. culação com os outros níveis da educação.
Esse quadro reforça situações de desi- Do ponto de vista da construção do conhe-
gualdade no atendimento ao direito da cimento, nas últimas décadas, são grandes
criança pequena à educação infantil, uma os avanços realizados pelos pesquisadores
vez que incide principalmente sobre as fa- e universidades do país. Questões relati-
mílias de menor renda. Aponta-se dessa vas à organização do trabalho pedagógico,
forma para o risco de que o auxílio-creche à formação de professores, à relação famí-
determine que sejam oferecidas diferen- lia e instituição, à importância do brincar
tes qualidades de cuidado infantil, tendo como eixo da proposta pedagógica, às po-
ainda como conseqüência a restrição do líticas de educação infantil são exemplos
investimento público em instituições e de temas bastante pesquisados e para
sistemas de qualidade e a ampliação dos os quais a produção nacional já pode ser
modelos alternativos de educação e cui- considerada com relativo acúmulo. Ques-
dado infantil. Afirma-se a ideia de que tões mais recentes, como o currículo, vêm
programas como o auxílio-creche para a ganhando também espaço no debate na-
infância desresponsabilizam o Estado e cional. Da perspectiva da legislação e da
acentuam as diferenças sociais, pois pro- política, também os avanços são visíveis
movem a expansão do atendimento das principalmente após a LDB de 1996, que
crianças de camadas pobres sem a qua- estabeleceu os marcos para a integração
lidade preconizada pela legislação, pelas das creches e pré-escolas ao sistema de
pesquisas referentes à infância pequena ensino. Na medida dos avanços do conhe-
e pelos princípios e critérios de qualidade cimento e da produção de marcos legais,
defendidos pelos movimentos sociais. e concomitantemente a eles, temos ob-
servado a modificação nas concepções de
Palavras-chave: educação infantil, creche, infância, assim como a inclusão das crian-
auxílio-creche ças no movimento histórico de conquista
Contato: Ana Maria Mello, USP, dos direitos humanos, incluindo a educa-
melloa@uol.com.br ção infantil. É nesse contexto que a edu-
cação infantil, embora tenha sua origem
intrinsecamente vinculada ao processo de
industrialização, urbanização e migração

557
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

das populações do campo para a cidade, direito à creche e que povos do campo ne-
expande-se como direito a todas as crian- cessitam do atendimento a seus filhos em
ças, não mais apenas um direito social dos creche são ainda questões não pautadas
filhos de trabalhadores rurais e urbanos. pelo país em sua agenda política e cien-
Esses avanços, sejam eles do ponto da tífica. Quando pautadas, são atravessadas
vista da ciência, da política ou da cultura, pelos discursos e práticas historicamente
não possuem, contudo, uma distribuição construídos que apelam para programas
democrática e igualitária no país. O aces- não formais, alternativos e de baixo cus-
so e a qualidade dos serviços oferecidos to para a população pobre do campo que,
às crianças de 0 a 6 anos são atravessa- como apontam vários estudos em educa-
dos por desigualdades etárias, étnicas, ção, recebe as “sobras” da cidade e é sub-
de classe e regionais. No que se refere à metida a políticas que desconsideram e
questão territorial, a desigualdade entre o desvalorizam a cultura, os modos de vida
oferecimento da educação infantil urbana e os saberes desses povos. Se essas ques-
e do campo é particularmente preocupan- tões são desafiadoras para as ciências de
te, uma vez que no campo concentram-se modo geral, são de modo peculiar para
os maiores indicadores de pobreza. Num a psicologia, dado o impacto na constru-
processo de múltiplas desigualdades, as ção das subjetividades desses povos e de
populações do campo sofrem com a au- suas crianças. Na apresentação, pretende-
sência de políticas públicas. Se assumir- -se explorar esses aspectos, a partir de
mos, com demais autores, que as crianças reflexões provenientes de pesquisas do
são o grupo geracional mais afetado pelas grupo Subjetividade, Educação e Infân-
desigualdades sociais e pelas políticas pú- cia nos Territórios Rurais e da Reforma
blicas e que, quanto menores as crianças Agrária (SEITERRA), vinculado ao Centro
mais invisíveis são do ponto de vista do co- de Investigações sobre Desenvolvimento
nhecimento e das políticas, podemos dizer Humano e Educação Infantil (CINDEDI/
que as crianças do campo de a 0 a 3 anos FFCLRP-USP). Derivam também da vivên-
de idade situam-se na ponta mais extrema cia recente desse grupo na consultoria a
desse processo. Os indicadores nacionais iniciativas, do governo federal, de cria-
evidenciam a desigualdade de acesso no ção de um diálogo entre duas áreas cujos
caso do segmento de 0 a 3 anos de idade. avanços vêm se dando pela pressão dos
Enquanto que na população infantil urba- movimentos sociais: a educação infantil
na a taxa de frequencia à creche, de acor- e a educação do campo. Afirma-se que
do com a PNAD 2008, era de 20,52%, nos será necessária uma síntese dos acúmulos
territórios rurais era de 6,83%. Os desafios construídos por essas duas áreas a fim de
para a implantação do direito à educação superar concepções de campo sem crian-
infantil no campo são enormes, dada a ça e concepções de criança hegemoniza-
quase inexistência de investigações sobre das por um ideário urbano.
a população do campo, em especial sobre Defende-se que o grande desafio na ga-
o momento em que o ciclo familiar conta rantia do direito à educação infantil dos
com a presença de crianças bem peque- bebês do campo é harmonizar os princí-
nas. Como vivem os bebês do campo, que pios e as formas do atendimento. Se os
povos do campo querem e reivindicam o princípios são os mesmos a todas as crian-

558
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ças, como meio de garantir atendimento se considerando a população infantil en-


com qualidade e equidade, as formas de quanto sujeito de pesquisa, o primeiro
implantação necessitam de adequação trabalho discute as especificidades éticas
à realidade e à dinâmica da vida dos po- e metodológicas do trabalho de investiga-
vos do campo. Enfrentar esta questão no ção com crianças. A condição da criança
âmbito do sistema de educação formal é enquanto sujeito de direitos faz com que
questão necessária, urgente e estratégi- a escuta da criança e os cuidados especiais
ca para colaborar na construção da iden- necessários nessa condição ganhem no-
tidade da educação infantil do campo e vos contornos. As concepções de Infância
para evitar que políticas de flexibilização – Criança presentes nas produções acadê-
produzam, na educação infantil do cam- micas em Psicologia e Educação, no Brasil,
po, processos de exclusão já bastante co- após a promulgação do Estatuto da Crian-
nhecidos na educação infantil ofertada às ça e do Adolescente, é objeto de investiga-
crianças dos territórios urbanos. ção do segundo trabalho. O autor analisou
teses e dissertações, livros, capítulos de li-
Palavras-chave: bebês, rural, educação infantil vros e artigos em periódicos, produzidos
Contato: Ana Paula Soares da Silva, CINDEDI/ por participantes de grupos de pesquisa
FFCLRP-USP, apsoares.silva@gmail.com relacionados à infância, cadastrados no
CNPq. Segundo o autor, no Brasil, foram
os marcos legais/institucionais que norte-
MR LT01 aram as concepções de infância e de crian-
ça no Brasil, a partir da segunda metade
Mesa Redonda Convidada
do século XX, “e resultaram na afirmação
de uma identidade marcada pelos discur-
MR LT01-1223 QUE INFÂNCIA(S)? QUE sos psicológico e sociológico nos quais as
CRIANÇA(S) tensões, o sujeito e a subjetividade estive-
ram, por vezes, também subsumidas”. O
Rosângela Francischini - UFRN
terceiro trabalho busca, na produção de
rfranci@uol.com.br
duas composições de autores brasileiros,
Romilson Martins Siqueira - PUC/Goiás
uma de Chico Buarque, a outra de Lenine
romilson@pucgoias.edu.br
e Paulinho Moska, a identificação do re-
Silvia Helena Vieira Cruz - UFC
trato da infância presente na letra, com a
silviavc@uol.com.br
Doutrina da “situação irregular”, que vi-
Financiamento: CAPES gorou, no Brasil, desde a segunda década
do século XX até a adoção da Doutrina da
O objetivo desta Mesa é apresentar e dis- Proteção Integral. As duas composições
cutir sobre os conceitos Infância – Crian- retratam uma infância em situação de rua,
ça, considerando os espaços que esses cujas condições e ações, reveladas pelos
conceitos vêm comparecendo nas produ- compositores, comparecem nos descrito-
ções acadêmicas, principalmente a partir res dessa população, na referida doutrina.
da década de 80. Os significados e senti- O caráter de crítica social e de não resig-
dos atribuídos a esses conceitos resultam nação frente a essa condição é igualmente
em ações/intervenções específicas. Em apontado.

559
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

OBSERVAÇÕES ACERCA DA ÉTICA NA tos da Criança de que elas têm o direito


ESCUTA DE CRIANÇAS de exprimir livremente as suas opiniões
Silvia Helena Vieira Cruz - UFC sobre questões que as afetam e de ver es-
silviavc@uol.com.br sas opiniões tomadas em consideração.
Portanto, ser ouvida acerca de temas que
Nos últimos anos tem havido relativo in- lhes dizem respeito não é uma concessão
cremento na produção científica que que fazemos às crianças, mas um direito
toma as crianças como sujeitos ou atores delas. Entre as justificativas apontadas
sociais e têm como objetivo conhecer o para que as crianças sejam envolvidas nas
que elas pensam e sentem sobre temas discussões dos adultos sobre como me-
que lhes dizem respeito. Nestes trabalhos lhorar as suas vidas está a constatação de
consideram o fato de que as crianças vi- que assegurar que aqueles que direta-
vem as suas diferentes infâncias imersas mente vivenciam a situação focada te-
em práticas sociais, das quais participam nham as suas vozes ouvidas aumenta a
e através das quais, de diferentes manei- possibilidade de que as decisões sejam
ras e posições, vão se apropriando de relevantes e apropriadas (Save the Chil-
idéias, crenças, habilidades, desejos, ne- dren, 2003). A compreensão de que o co-
cessidades... Já começa e ser comum a nhecimento da perspectiva das crianças
referência a essa apropriação como sen- traz ganhos aos adultos é inovadora, pois
do uma reprodução interpretativa (Corsa- se coloca na contramão do desdém domi-
ro, 2001), uma vez que ela não se dá de nante acerca da opinião das crianças na
maneira passiva, mas há um papel ativo nossa sociedade. O pediatra e pedagogo
dos sujeitos. Passa a ser evidenciado, por- polonês Janusz Korczac (1986, p.71), em
tanto, que as crianças possuem uma ma- meados da década de 20, já alertava que
neira própria de perceber e sentir as suas os políticos e legisladores deliberam e de-
diversas experiências. Tais trabalhos par- cidem sobre o destino das crianças, “mas
tem da crença de que entre as várias com- a ninguém ocorreria perguntar à própria
petências das crianças está a possibilida- criança o que ela acha, se está de acordo.
de de perceber aspectos da sua realidade, Afinal, o que ela teria a dizer?” Vale desta-
discriminar e expressar os seus sentimen- car, portanto, que as crianças passam a
tos e opiniões sobre eles. Por isso, aos ser vistas, ao mesmo tempo, tanto como
poucos os pesquisadores têm abandona- indivíduos que precisam ser protegidos,
do a prática comum de recorrer aos adul- em decorrência da sua vulnerabilidade (o
tos com os quais as crianças têm mais que já estava presente na “Declaração
contato para obter informações sobre dos Direitos das Crianças”, de 1959), mas
elas e passam a interrogá-las diretamente também como sujeitos potentes devido a
(CRUZ, 2008). Soma-se a essa percepção suas competências e sujeitos com direitos
da criança como competente para falar o assegurados, inclusive o direito à partici-
reconhecimento de que ela deve ser ouvi- pação. Na atualidade, vários autores têm
da. De fato, na definição contemporânea destacado que as crianças podem acres-
dos direitos fundamentais das crianças centar informações novas e importantes,
está incluído o direito assegurado pela que ampliam o nosso conhecimento so-
Convenção Internacional sobre os Direi- bre a realidade. Novaes (2000), por exem-

560
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

plo, diz que “a infância, em sua aparente ela usualmente precisa submeter-se a ele.
fragilidade, pode revelar ao adulto verda- No caso das pesquisas realizadas com
des que ele não consegue mais ouvir ou crianças pertencentes às camadas mais
enxergar”. Trata-se, portanto de reconhe- empobrecidas da população (o que tem
cer uma contribuição insubstituível, já sido bastante comum), soma-se a assime-
que, como reforça Rocha (2008), a escuta tria de poder derivada do pouco prestígio
das crianças torna possível conhecer e dos pobres ante as camadas dominantes.
confrontar um ponto de vista diferente Em muitos casos, são agregadas ainda as
daquele que nós seríamos capazes de ver desigualdades de poder originadas na
e analisar no âmbito do mundo social de raça e no gênero das crianças envolvidas
pertença dos adultos. No Brasil, esse mo- na situação de pesquisa. Alguns cuidados
vimento iniciou-se lentamente, sendo di- adicionais, portanto, precisam ser toma-
fícil identificar pesquisas focadas na escu- dos ao se realizar a escuta de crianças,
ta da criança antes dos anos 90. É a partir dando especial atenção à questão ética. É
de então que alguns trabalhos principia- necessário, por exemplo, tratar com rigor
ram a busca por conhecer a criança con- o consentimento e a manutenção da par-
creta, contextualizada social e cultural- ticipação das crianças: após obter a auto-
mente (Rocha, 1999). Nos últimos anos rização dos seus responsáveis, agir de
tem crescido a produção de estudos que modo que elas não se sintam constrangi-
ampliam e aprimoram o nosso conheci- das a participar da pesquisa, deixando
mento acerca do ponto de vista da crian- bastante clara a possibilidade de elas
ça, não apenas nas áreas da educação e aceitarem ou não o convite que lhes é fei-
da psicologia, mas também na da saúde e to. Ao mesmo tempo, o pesquisador deve
outras têm sido buscadas formas de apre- ficar muito atento para perceber se as
ender o ponto de vista das crianças. Para crianças estão confortáveis e interessadas
tanto, além de recorrerem às estratégias nessa participação ao longo de todo o
tradicionalmente disponíveis, vários pes- processo da pesquisa, mesmo que a de-
quisadores têm procurado novas formas sistência de alguém não seja conveniente
de explorar as diferentes linguagens da para os seus objetivos (vale lembrar que o
criança. Buscam criar recursos metodoló- interesse para a realização da pesquisa
gicos diferentes, como entrevistas de não parte da criança e, ao contrário do
crianças em pequenos grupos; criação de pesquisador, para ela é uma proposta
histórias acerca de desenhos feitos por nova e nem sempre muito clara). Uma das
elas; complementação de pequenas his- formas de diminuir os possíveis constran-
tórias relativas ao tema enfocado; realiza- gimentos decorrentes das desigualdades
ção de jogos simbólicos; utilização de ví- entre pesquisador e crianças tem sido a
deos e fotografias feitas pelas crianças realização de atividades em grupos, pois,
etc. É preciso considerar, no entanto, que estando entre os seus pares, a criança
nesse tipo de pesquisa é estabelecida possivelmente se sente mais à vontade e
uma relação entre sujeitos com posição mais fortalecida frente ao adulto (Andra-
desigual na nossa sociedade: enquanto de, 2007; Cruz, 2002, 2004 e 2007; Cam-
ao adulto é conferido o poder de realizar pos e Cruz, 2006; Martins, 2009;
ações que afetam diretamente a criança, Schramm, 2009, Souza, 2006). Além de

561
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

considerar aspectos éticos relativos ao in- das, como a realização de vários grupos
gresso da criança na situação de pesquisa de crianças, a fim de dificultar a identifi-
e ao seu bem estar durante a sua partici- cação da autoria das opiniões e sentimen-
pação no processo, é preciso também tos apresentados. Concluímos, portanto,
atentar para as conseqüências decorren- que seria melhor, no sentido de proteger
tes da expressão das suas percepções, as crianças, que elas não participassem
opiniões, sentimentos etc. Isto porque, dessa consulta, apesar do processo ficar
dependendo do uso que se faz delas e das empobrecido por essa ausência. Nos últi-
reações dos adultos, as crianças podem mos anos, a área da Psicologia tem sido
vir a ser penalizadas. Recentemente, por demandada a pensar acerca do papel do
ocasião do projeto Indicadores da Quali- psicólogo na escuta de crianças suposta-
dade na Educação Infantil, tivemos uma mente vítimas de violência. A partir de
experiência muito marcante nesse senti- consulta recebida sobre o procedimento
do. Esse projeto, realizado sob a coorde- denominado Depoimento sem Dano, o
nação da Ação Educativa, tinha como ob- Conselho Federal de Psicologia tem pro-
jetivo a avaliação conjunta de todos os movido o debate e tomado posição acer-
segmentos que integram a instituição de ca de várias questões éticas envolvidas
Educação Infantil acerca do trabalho que nessa escuta, tanto relativas ao papel do
está sendo realizado. Assim, foi elaborado psicólogo como às possíveis consequên-
um instrumento para a escuta das crian- cias para as crianças e adolescentes (da-
ças, utilizado de forma experimental em nos, sofrimento, revitimação) (CFP, 2009).
quatro instituições que partilharam da Escutar as crianças, portanto, é decorren-
aplicação piloto na cidade de Fortaleza. te não só do desejo de aprofundar certos
Participaram desse processo meninos e conhecimentos, mas também de uma
meninas de 4 a 5 anos que freqüentam postura política de insatisfação diante das
uma creche municipal e outra convenia- condições em que vivem a sua infância. O
da, uma instituição filantrópica e uma es- maior conhecimento das perspectivas das
cola particular. Em cada uma dessas insti- crianças sobre aspectos de suas experiên-
tuições foi ouvido um grupo de crianças. cias realmente tem permitido ampliar o
Elas trouxeram informações muito impor- conhecimento acumulado sobre as pró-
tantes sobre o seu quotidiano nessas ins- prias crianças e sobre temas a elas rela-
tituições, mas várias dessas informações cionados, fornecendo elementos para
eram contraditória com as fornecidas pe- melhor fundamentar ações a seu favor.
los adultos e algumas desvelavam práti- Mas o empenho em escutar as crianças
cas totalmente inadequadas. Nessa expe- precisa ser orientado também pelo maior
riência, concluímos que, apesar de ser cuidado com esses sujeitos, devido a sua
muito importante para o sucesso dessa maior vulnerabilidade e respeito que lhe
iniciativa que as crianças fossem ouvidas, é devido.
seria preciso preservá-la de possíveis re-
taliações provocadas pela exposição do Palavras-chave: pesquisa com crianças,
que pensam e sentem sobre a sua experi- ética em pesquisas com crianças, escuta de
ência educativa. Para minimizar esse ris- crianças.
co, seria necessário uma série de medi-

562
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ENTRE CRIVOS EPISTEMOLÓGICOS E históricas. Nos seus sentidos e significa-


MODOS DE APREENSÃO: QUEM NOMEIA dos, são sínteses produzidas por objeti-
A INFÂNCIA E A CRIANÇA? vações humanas em condições históricas
Romilson Martins Siqueira - PUC/Goiás determinadas e, enquanto tal, revelam ou
romilson@pucgoias.edu.br velam intencionalidades, direções, proje-
Financiamento: CAPES tos.” (p. 201) Neste caso, a elucidação dos
sentidos e significados de uma nomeação
O presente trabalho tem como objeto nos remetem à “percepção de que as pa-
o estudo as concepções de infância e de lavras podem se referir a várias coisas e a
criança no campo da educação e da psi- nenhuma ao mesmo tempo.” (Resende,
cologia. Estudar uma concepção significa 2001, p. 533). A exemplo disso, pode-se
estudar “aquilo que a coisa expressa ser, perceber como muitos estudos justapõem
mas não é”. Dito de outro modo, uma con- as concepções de criança e de infância
cepção é elaborada no plano das idéias, como intercambiáveis. Para muitos auto-
fato que pode ocultar o seu sentido e sua res, falar da infância é falar da criança e
razão. A concepção expressa o que é pen- vice-versa, como se, ao fim, falassem de
sado, perspectivado, elaborado e dito so- tudo. Contrária a essa perspectiva está a
bre. No caso, é uma forma de como a so- afirmação de que criança e infância são
ciedade representa a infância e a criança. interdependentes, já que não é possível
Uma coisa é falar sobre as “concepções de deixar de apreender na criança a infância,
infância e de criança”, outra coisa é falar muito menos de reconhecer que na infân-
da “infância e da criança” em si, portan- cia há uma expressão da criança, mas as
to, em sua concretude. Claro que essas duas categorias, se se aproximam e se afir-
dimensões: o real e o racional, o conceito mam, também se afastam e se negam e
e a realidade, o lógico e o histórico estão não são as mesmas. Ambas se constituem
referidas reciprocamente. Mas é certo como categorias históricas e sociais, mas
também que não há uma correspondên- a criança revela o indivíduo e a infância
cia empírica imediata, ao menos do ponto revela o tempo social e histórico em que
de vista de uma epistemologia dialética, esse indivíduo se constitui e constrói a sua
entre o conceito e a realidade que ele no- história. Enquanto síntese deste trabalho
meia. De início, portanto, já se coloca uma pôde-se apreender movimentos de nega-
problemática importante no contexto des- ção e de reafirmação da criança e do seu
te estudo. Se o tempo e o cenário em que tempo da vida. Se num tempo a expressão
se vive hoje são marcados pelos processos infante circunscreveu o silêncio e a abstra-
de (des)razão, quais são as possibilidades ção da infância e da criança, por outro, e
de se pensar a infância e a criança con- atualmente, um determinado tipo de dis-
temporâneas partindo de outra lógica? curso sobre o protagonismo tem afirma-
Não haveria outro espaço e sentido senão do o direito, a voz e a ação dos sujeitos
aqueles marcados pela crítica, pela auto- da infância. Todavia, esse processo não se
nomia e pela razão. Mas porque partir dos deu deslocado da História e das contradi-
estudos sobre as concepções de infância ções sociais. A idéia central que norteia
e criança? Segundo Miranda e Resende este trabalho parte da compreensão de
(2009), “palavras são realidades lógicas e que as concepções de infância e de crian-

563
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ça no Brasil, constituídas particularmente particularmente, tem informado modos


a partir da segunda metade do século XX, de compreensão da criança e da infância
foram crivadas predominantemente pelos em seus processos correlatos: subjeti-
marcos legais/institucionais e resultaram vidade, educação, sociabilidade, dentre
na afirmação de uma identidade marcada outros. Ademais, tem sido convocada es-
pelos discursos psicológico e sociológico pecialmente quando a segunda toma os
nos quais as tensões, o sujeito e a subje- fenômenos educacionais como objetos de
tividade estiveram, por vezes, também análise e a primeira se apropria da ciência
subsumidas. A defesa dessa idéia guarda psicológica para empreender e respaldar
sua afirmação na análise que foi realizada os processos educativos no campo das te-
no doutoramento em educação, a partir orias, das políticas e das práticas. Os resul-
do estudo de 151 trabalhos, sendo estes tados deste estudo indicaram que, a partir
27 livros, 70 capítulos de livros e 54 arti- da segunda metade do século XX, aquilo
gos, objetos da produção científica de 10 que constituiu a história da infância e da
grupos de pesquisa cadastrados no CNPq, criança brasileira, e consequentemente a
o que representa parte substantiva da formulação de suas concepções, foi sinte-
pesquisa sobre a infância e a criança em tizado e recortado, predominantemente
quase todas as regiões brasileiras. Nesse pelo recorte do aparato jurídico-legal. Ou
conjunto, foram analisados os trabalhos seja, a nomeação da infância e da criança
de 05 grupos na psicologia e 05 na educa- foi afirmada por uma certa “força da lei”
ção, sendo os mesmos representativos de como determinante destas concepções.
06 IES públicas federais, 03 privadas e 01 Da concepção de menor à concepção de
estadual. Vale aqui a ressalva de que este sujeito de direito as crianças foram en-
trabalho não se propôs a avaliar esta pro- quadradas no imperativo da lei. Da mes-
dução científica, mas tomá-la como ponto ma forma, uma certa noção de “infância
de partida para a compreensão daquilo como construção social ou histórica/cultu-
que vem sendo formulado em torno das ral” foi propagada sem considerar a ten-
concepções de infância e de criança. Mas são dialética que perpassa temas como
porque tomar os campos da educação e classe, desenvolvimento natural-social e a
da psicologia? Porque objetivou-se com- infância como tempo da vida. Desse pro-
preender como se tensionam os campos cesso investigativo é possível indicar as
teóricos que advogam a autoridade de tendências predominantes como a ausên-
postular o que se compreende por criança cia do tema da subjetividade, a presença
e infância, ao mesmo tempo em que per- de riscos que envolvem reducionismos, a
mitiu interrogar sobre o que vem sendo presença do recorte da identidade pelo
produzido sobre criança e infância no Bra- Direito, a presença de uma epifania da
sil. Neste caso, a relação entre Educação- criança na exacerbação do protagonismo
-Psicologia tem historicamente marcado infantil, a ausência da tensão entre natu-
presença no campo da produção intelec- ral-biológico e social-histórico e ausência
tual sobre a infância e a criança, ora em do debate sobre o desenvolvimento da
movimentos de confluências, ora de em- criança. Portanto, considera-se que, sem a
bates epistêmicos. Também tem orienta- apreensão daquilo que se entende por in-
do muitas das produções sobre o tema e, fância e criança no campo da relação entre

564
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lógico-histórico e das condições concretas Como afirma Moraes (2002), a música, so-
e objetivas que produzem os padrões de bretudo a popular, pode ser compreendi-
sociabilidade, a infância, a criança e a sub- da como parte de uma trama povoada por
jetividade continuam abstratas. contradições e tensões em que os sujeitos
sociais (re) constroem partes da realida-
Palavras-chave: infância; criança; “menor”. de social e cultural, por meio dos sons.
Nessa perspectiva, a produção artística,
especialmente a musical, tem represen-
DA CONDIÇÃO DE ‘MENOR’ EM tado, a partir da década de 70, material
‘SITUAÇÃO IRREGULAR’: RETRATOS DE documental de interesse em pesquisas de
INFÂNCIAS NA MPB enfoque histórico, antropológico, semio-
Rosângela Francischini - UFRN lógico, sociológico e literário, para citar os
rfranci/@uol.com.br mais representativos. As formas através
Narjara Medeiros de Macêdo das quais a música foi se expandindo na
narjaramaceo@yahoo.com.br sociedade, enquanto veículo de informa-
ção ou de massificação, ganha contornos
Pensar a produção artística implica, neces- diferenciados, decorrentes dos momentos
sariamente, a consideração do contexto históricos no desenvolvimento das socie-
social e histórico em que esta foi elabora- dades. Assim, além de podermos observar
da. As manifestações artísticas sempre es- manifestações específicas predominantes
tiveram associadas às tradições e culturas em determinadas épocas, convivem, em
de cada época, tendo, portanto determi- um mesmo momento histórico, diferen-
nadas funções e atribuições relacionadas tes possibilidades de expressão musical e
à estrutura social, em um determinado ideológica. Isso porque, seguindo Bakhtin
momento. Segundo Stalschimidt (1999), (1979), enquanto manifestação simbólica
em diferentes culturas ao longo da histó- a música é perpassada pelo diálogo entre
ria da humanidade, podem ser encontra- diversas vozes culturais, caracterizado ora
das manifestações artísticas que expres- por oposição/confronto, ora por comple-
sam, de algum modo, as características da mentaridade ou ainda por concordância.
sociedade em que foram produzidas, bem Desta forma, a música pode carregar ma-
como as formas de relações entre seus nifestações da cultura dominante, erudi-
membros. A música, por exemplo, pode ta/formal, bem como da cultura popular
ser encontrada em diferentes contextos em suas formas folclóricas, urbanas e/ou
sócio-históricos, com funções bem dis- massificadas. Essas possibilidades que a
tintas, tais como em rituais religiosos, na música nos apresenta, de trazer conteú-
educação/formação dos indivíduos, como dos do contexto de sua produção, podem
procedimento terapêutico, na crítica ou ser observadas também nas letras de can-
manutenção de padrões estabelecidos, ções brasileiras cujo tema é a infância. As-
dentre outros. Deste modo, as canções e sim como a música, a infância é uma cons-
músicas podem esclarecer certos aspec- trução social. A partir das observações aci-
tos da história e da cultura, que nem sem- ma, estabelecemos, como objetivo deste
pre se apresentam de maneira explícita ou trabalho, apresentar e discutir a concep-
acessível por meio de outras linguagens. ção de infância que norteou o Código de

565
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Menores de 1979, qual seja, sujeito “em tivos, que aqui são apenas sinalizados: a.)
condição irregular”, retratada em duas a condição do protagonista; b.) o teor do
composições musicais brasileiras, partin- discurso sobre o protagonista; c.) quem
do do pressuposto de que a construção, “fala” desse protagonista. O discurso na
a profusão e significação de elementos composição Pivete pode ser entendido
culturais e formas simbólicas comparti- como uma narrativa do cotidiano de um
lhados em uma dada sociedade, em de- sujeito em situação de rua, no Rio, em
terminado momento histórico, refletem atividades de trabalho: vendedor no se-
e refratam as condições dessa sociedade. máforo, flanelinha; em atividade ilegal:
No Brasil, teóricos que se ocupam da dis- “aponta o canivete”, “arromba uma por-
cussão sobre as políticas de atendimento ta Faz ligação direta”; “agita numa boca,
à Infância (Pilotti & Rizzini, 1995, Rizzini, descola uma mutuca”, e perambulando
1997, 1998; Kramer, 2001; Faleiros, 1995; e mendigando: “zanza na sarjeta, fatura
Neves, 1999) vêm apontando que a con- uma besteira”. Assim, o protagonista é o
cepção de infância que orienta essas po- retrato do sujeito em ‘situação irregular’.
líticas passa por um percurso inaugurado No entanto, considerando o autor da com-
pela Doutrina do Direito do Menor (em posição, Chico Buarque, cujas canções
oposição à criança), substituída posterior- são marcadas pela oposição ao regime
mente, pela Doutrina da ‘Situação Irre- autoritário, Pivete é mais um registro da-
gular’ que, decorrente de ampla mobili- quilo que contraria o discurso dominante,
zação popular, foi abandonada e em seu na época, sobre crianças e adolescentes.
lugar adotou-se, com o Estatuto da Crian- Nas palavras de Meneses, Chico “privile-
ça e do Adolescente (Lei 8.690, 1990), a gia o marginal como protagonista, pondo
Doutrina da Proteção Integral. Não é ob- a nu, assim, a negatividade da sociedade.
jetivo, neste trabalho, aprofundarmo-nos Desde o primeiro disco (...) os despossuí-
na discussão a respeito dessas doutrinas. dos têm voz e vez. Malandros, sambistas,
Nossa intenção, ao chamá-las ao cenário, pedreiros, pivetes, prostitutas, pequenos
sinaliza para uma direção/proposta de funcionários, sem terra, mulheres aban-
análise das letras das músicas, que, de al- donadas”. (Meneses, 2003: 58). Sobre Re-
guma forma, trazem o protagonista “Me- lampiano o personagem central, Neném,
nor em situação irregular”. Essa catego- é retratado na condição de trabalho nas
ria, presente no imaginário da população ruas e pelo contexto de moradia em um
por um longo período de nossa história, barraco junto à mãe, aos irmãos e de um
persiste no sentido de que configura uma “pai de agora”. Assim, igualmente, crian-
concepção de infância “delinqüente”, ça em ‘situação irregular’. A descrição
“abandonada”, que vive nas ruas e/ou em das atividades de Neném não pode ser
ambientes familiares “desestruturados”, localizada em um narrador determinado,
na mendicância, e/ou praticando atos in- ao contrário do que ocorre com Pivete.
fracionais. Foram selecionadas as músicas O refrão da canção evidencia a presença
Pivete, de Chico Buarque e Francis Hime da mãe: “Tá relapiano, cadê Neném?”, e
(1978) e Relampiano, de Paulinho Moska uma resposta, que não se sabe por quem
e Lenine (1997). A análise das letras obe- é emitida: “Tá vendendo drops ...” Os de-
deceu aos seguintes elementos constitu- mais segmentos demonstram uma des-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

crição, em terceira pessoa, em podemos cial, especificamente, responsabilidade


identificar a expressão do sofrimento que relacional, posicionamento, postura de
comparece no relato da situação de vida, não saber, relacionamento colaborativo,
de família e da condição de pobreza do conversas dialógicas e suplementação.
Neném. A aparente resignação frente a Pretende-se articular a utilização desse
essa condição, presente em “tudo é tão repertório conceitual no processo de pes-
normal, tudo tal e qual” marca o não dis- quisar a infância, explicitando os desafios
tanciamento dos autores da música em e as interessantes descobertas quando
relação à condição do Neném. dessa aproximação. A segunda apre-
sentação abordará a utilização do diário
de campo como uma ferramenta útil no
MR LT04 - Mesa Redonda processo de constituição do pesquisador
da infância. Tal ferramenta é compreen-
Convidada dida por nós como um espaço possível
de experimentação, na medida em que
ao descrever determinadas experiências,
MR LT04-1407 - CONSTRUCIONISMO
utilizando-se de um repertório linguístico
SOCIAL: DESCOBRINDO CRIANÇAS QUE
e uma forma específica de escrita, con-
FORMAM PESQUISADORES
tribuímos para a construção de infâncias
Paula Cristina Medeiros Rezende - UFU específicas. A partir da análise dos diários
lalamedeiros@netsite.com.br de campo pretendemos refletir sobre o
Marcella Oliveira Araújo - USP processo de formação do pesquisador
moa.psic@gmail.com da infância, explicitando a trajetória de
Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo Ferreira - USP aprendizagem que se configura enquanto
melolud@yahoo.com.br entrevistamos as crianças. Em seguida, a
terceira fala apresentará uma pesquisa
Esta mesa pretende refletir, a partir das empírica realizada com crianças de idade
contribuições do construcionismo social, entre quatro e sete anos, como forma de
sobre a pesquisa com crianças e a cons- refletir sobre a utilização da entrevista e
tituição do pesquisador da infância. Esta do diário de campo como ferramentas
reflexão apresenta-se profícua quando metodológicas para o pesquisador da in-
nos posicionamos como pesquisadores- fância, bem como os desdobramentos e
-adultos interessados em investigar a in- possibilidades destes recursos; tendo o
fância por ela mesma. Esta empreitada construcionismo social como embasa-
não nos permite pensar em uma criança mento teórico para a construção da pes-
como um ser universal, isolado e imper- quisa e a análise dos dados. Destaca-se, a
meável às categorias culturais e sociais, partir do estudo apresentado, o instigan-
mas sim nos convidam à interlocução te exercício de conversar com as crianças,
com sujeitos ativos, produtores de cul- em um formato inusitado de aproximação
tura que emergem em um movimento e pesquisa com os pequenos; e a explo-
ativo de negociação social. A primeira ração de novos caminhos metodológicos
fala versará sobre a apresentação de al- e perspectivas teóricas realizadas pelos
guns conceitos do construcionismo so- pesquisadores.

567
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CONSTRUCIONISMO SOCIAL: conversas dialógicas e suplementação, e


APROXIMAÇÕES NO CAMPO DA articulá-los ao processo de pesquisar a in-
INFÂNCIA fância. Utilizar esse repertório conceitual
Paula Cristina Medeiros Rezende - UFU que sustenta e inspira a atuação de pes-
lalamedeiros@netsite.com.br quisadores construcionistas pode se con-
figurar em um desafio para aqueles que
O construcionismo social, como um refe- estão introduzindo este conhecimento
rencial teórico-metodológico disponível no campo da educação, especialmente a
socialmente, compreende o conhecimen- que se encarrega das questões da infân-
to como uma função da interpretação so- cia. Neste processo emergem inquietan-
cial de uma comunidade linguística, atri- tes indagações: Como ser um pesquisador
buindo destaque aos sentidos construídos da infância coerente com os pressupostos
pelas pessoas enquanto interagem. Esta teóricos do construcionismo social? Como
perspectiva teórica valida o discurso só- colaborar na transformação social da nar-
cio-historicamente construído, na medida rativa sobre a infância? O que poderia ser
em que questiona a ciência como proprie- útil nesse processo? Como se constroem
dade do indivíduo e produtora de verda- perguntas que acionam, no encontro com
des universais e objetivas. Atualmente, o as crianças, recursos para compreender e
construcionismo social tem avançado no constituir a infância que queremos? A par-
campo da psicoterapia, ampliando novas tir do movimento que tais questões ge-
possibilidades de ação do terapeuta e o ram, propomos uma análise que foca a re-
processo terapêutico. Apoiado em suas levância de se utilizar tais conceitos como
contribuições o terapeuta construcionis- ferramentas conversacionais na ação
ta tem como foco a potencialidade do do pesquisador que entrevista crianças.
significado, a co-construção do processo Como instrumento de pesquisa a entrevis-
terapêutico, a ênfase no relacionamento, ta apresenta-se como extremamente in-
a polivocalidade, a ação e as potenciali- teressante quando objetiva, em primeira
dades dos clientes superando a noção de instância, identificar práticas interpretati-
problema como algo existente para além vas. Ao estar com as crianças, acreditamos
das formas de descrevê-lo. Esse conjun- que as interrogações são alternativas que
to de ideias conceituais, que sustentam abrem caminho para entender as rela-
e inspiram a atuação de terapeutas cons- ções, situando-as histórica e culturalmen-
trucionistas, quando transportados para te; convivendo com a surpresa, na qual
o campo da educação tem nos ajudado não se tem uma receita pré-determinada
a ampliar a compreensão sobre a cons- e uma verdade absoluta que guie o pes-
tituição da infância e, por conseguinte a quisador, mas sim uma abertura para o
criar novas possibilidades de se conduzir desconhecido no qual o pesquisador re-
pesquisas nesta arena de conhecimento. flete sobre o óbvio e entende o ‘pesquisa-
Para este trabalho pretendo dar visibilida- do’ por ele mesmo, não por uma verdade
de a alguns conceitos do construcionismo histórica e exata. Destaca-se, deste modo,
social, especificamente, responsabilidade que o posicionamento de ouvir a criança
relacional, posicionamento, postura de e construir uma relação que a possibilite
não saber, relacionamento colaborativo, ser interlocutora, explorando suas narra-

568
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tivas são movimentos interessantes que útil no processo de constituição do pes-


nos ajudam a problematizar os diferentes quisador da infância. Quando construímos
modos de lidar com crianças. Deste modo, um texto consideramos regras linguísticas
a perspectiva teórica do construcionismo e escolhemos palavras e pontuações que
social, ao distanciar-se da coleta e quanti- serão utilizadas, tecendo, assim, uma nar-
ficação dos dados, permite compreender rativa sobre o ser e estar pesquisador. À
os discursos a partir do lugar onde são priori esse registro carece de interpreta-
produzidos, procurando revelar o proces- ção que será articulada com a participação
so, o movimento e o sentido. A aproxima- de um interlocutor que trará ao diálogo
ção da teoria do construcionismo social ao aspectos históricos, culturais e relacionais,
território da educação infantil tem gerado anteriores ao momento da leitura; e que
otimismo em relação às produções futu- também participará da negociação de um
ras neste campo de conhecimento. significado e não de outro. Deste modo, o
texto escrito é um conteúdo linguístico a
Contato: Paula Cristina Medeiros Rezende, ser complementado e significado no mo-
Universidade Federal de Uberlândia – Instituto mento da leitura. O registro de estar, con-
de Psicologia, lalamedeiros@netsite.com.br versar, brincar, pesquisar com crianças vai
além de uma simples descrição que tem
a infância como objeto de estudo, tema
DIÁRIO DE CAMPO: QUE INFÂNCIAS, ou assunto discutido. Ao registrar, docu-
CRIANÇAS E PESQUISADORES mentamos a criação de uma infância es-
ESCREVEMOS? pecífica que se faz surgir a partir da mão
Marcella Oliveira Araújo - USP do pesquisador que atua ativamente no
moa.psic@gmail.com processo de escolha sobre como dar visi-
bilidade as experiências de pesquisar com
O construcionismo social, enquanto uma crianças. Dessa forma, não só se tornam
perspectiva teórica e metodológica, res- visíveis a constituição das infâncias e suas
salta que as descrições do mundo são re- crianças, como também a constituição do
sultado dos significados construídos em pesquisador que se dispõe a desenvolver
relacionamentos. Ao descrever o mundo, uma postura de não-saber, a fim de pro-
sentidos e significados são produzidos e mover o diálogo e sustentar uma inves-
negociados dialógica e relacionalmente. tigação compartilhada. Neste processo,
A linguagem, dessa forma, é considerada onde pesquisadores e crianças investigam
em seus aspectos performáticos como a partir de suas curiosidades, há que se in-
ação no mundo, ou seja, uma construção dagar sobre: as palavras que escolhemos
ativa no mundo. Se ao falarmos marcamos para registrar nossas experiências em pes-
posicionamentos e sustentamos alguns quisa com crianças; os recortes que elege-
sentidos, na escrita isso não é diferente. mos dar visibilidade e como temos olhado
Nesse sentido, esta apresentação busca para o diário de campo enquanto uma
dar visibilidade à utilização do diário de ferramenta de pesquisa com crianças. O
campo, entendido como registros escri- construcionismo social nos convida a dar
tos construídos a partir da experiência de visibilidade ao diário de campo enquanto
pesquisar crianças, como uma ferramenta um espaço possível de experimentação,

569
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

na medida em que ao descrever determi- sível brincar de perguntar e responder di-


nadas situações, utilizando-se de um re- versas questões que foram constituindo a
pertório linguístico e uma forma específi- conversa entre pesquisadoras e crianças.
ca de escrita, decorrem desse processo di- A priori, este modo de aproximação apre-
ferentes ações e construções das infâncias sentou-se como inusitado, visto que o es-
e suas crianças em situação de pesquisa. paço físico nos impunha certa imprevisibi-
lidade e a falta de um roteiro pré-definido
Contato: Marcella Oliveira Araújo, a ser seguido também nos colocava diante
Universidade de São Paulo – Ribeirão Preto-SP da experimentação da espontaneidade e
moa.psic@gmail.com criatividade. No entanto, ao experimen-
tarmos o exercício proposto, percebemos
o quanto a entrevista pode ser um recurso
JOGANDO CONVERSA (SÉRIA) FORA: rico para compartilhar o espaço da infância
PESQUISANDO COM CRIANÇAS e aproximar-se das crianças. Elas, curiosas
Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo Ferreira - e “perguntadeiras”, não só responderam
USP às nossas curiosidades e perguntas como
melolud@yahoo.com.br também quiseram fazer perguntas e cons-
truir conosco a brincadeira de perguntar.
Considerando as contribuições do cons- Juntamente com a entrevista, propomos
trucionismo social para a pesquisa com como recurso metodológico o diário de
crianças, e buscando discutir sobre a en- campo realizado imediatamente após
trevista e o diário de campo como fer- cada entrevista. Essa ferramenta foi como
ramentas interessantes nesta área, pro- um fio condutor da pesquisa, estando pre-
põem-se a apresentação de uma pesquisa sente desde a primeira entrevista até a
empírica com crianças, em que estes re- análise dos dados. Na escrita do diário se
cursos foram utilizados na metodologia e concretizava os sentidos e os significados
o construcionismo social como referencial construídos pelas pesquisadoras durante
teórico. O objetivo da pesquisa foi analisar as entrevistas, como: as dificuldades de
os sentidos construídos e negociados por aproximar das crianças, as inquietações
crianças e pesquisadoras a partir de de- de como propor uma brincadeira de con-
terminados posicionamentos assumidos versar, o próprio jeito de falar e conduzir a
enquanto conversavam durante um exer- conversa, bem como as dúvidas, os emba-
cício denominado “jogando conversa (sé- raços, as surpresas e as conquistas duran-
ria) fora”, uma brincadeira de perguntas e te o processo. Foi assim que cada diário de
respostas em formato de entrevista, que campo gestava a próxima entrevista que
foram gravadas em áudio e em seguida estava por vir, possibilitando-nos sentir-
transcritas. O estudo foi desenvolvido em mos confortáveis e confiantes com o exer-
praças públicas, com quatro participantes, cício, e até modificarmos alguns aspectos,
sendo três meninos e uma menina, com como a aproximação das crianças, o jeito
idade variando entre quatro e sete anos. de conversar e perguntar, os tipos de per-
Desta forma, utilizou-se de uma entrevista guntas, e diversos outros detalhes e nu-
com nova roupagem, ou seja, uma entre- ances deste desafio de pesquisar (e con-
vista-brincadeira, a partir da qual foi pos- versar) com crianças. Neste processo, o

570
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

construcionismo social foi utilizado como cado investigar esses temas. Nesta mesa
referencial teórico-metodológico, princi- serão apresentados quatro trabalhos que
palmente para a análise das entrevistas, a envolvem a vulnerabilidade da infância,
qual compreendeu quatro temas que nos adolescência e vida adulta. No primeiro
possibilitaram discutir algumas situações trabalho, as autoras investigam efeitos
de interação que elegemos interessantes, psíquicos de traumatismos precoces pro-
a saber: 1) Descobrindo crianças “pergun- duzidos pelo abuso sexual em crianças.
tadeiras”; 2) “Pergunta é pra conversar”: Considera-se que em função desse estágio
discutindo uma ferramenta de pesquisa de desenvolvimento esses traumatismos
com crianças; 3) Negociação de sentidos; tendem a produzir danos psíquicos que
e 4) Pesquisador em formação. Destaca- afetam o pensar, a capacidade de simboli-
mos deste trabalho que o enquadramento zar, o ajustamento no mundo e produzem
relacional específico utilizado no estudo frequentes danos na aprendizagem. As
possibilitou reconhecer a potencialidade consequências do abuso são múltiplas e
das descobertas durante a conversa com o método de Rorschach é um instrumento
as crianças e, ainda, permitiu refletir sobre poderoso nessa investigação. O segundo
como colaboramos, como pesquisadores- trabalho continua abordando o tema do
-adultos, com o processo de constituição abuso sexual na perspectiva de crianças
da infância e da pesquisa com crianças a e adultos. Neste trabalho a autora apon-
partir da construção e combinação de re- ta que o Rorschach tem sido considerado
cursos metodológicos, aliados à explora- um instrumento ideal para desencadear
ção de novas perspectivas teóricas. memórias e sentimentos relacionados às
vivências traumáticas. O processo de sub-
Contato: Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo missão ao teste pode ser muito semelhan-
Ferreira, Universidade de São Paulo – Ribeirão te à revivência da situação dramática em
Preto-SP, melolud@yahoo.com.br pesadelo. Além disso, o teste pode forne-
cer, de modo indireto, informações essen-
ciais de personalidade que os inquiridos
MR LT01 - Mesa Redonda não reconhecem plenamente em si ou
hesitam em admitir quando questionados
Convidada
sobre eles diretamente por meio de ins-
trumentos de autorrelato. De outra parte,
no trabalho seguinte, investiga-se a pers-
MR LT01-1053 - VIOLÊNCIAS,
pectiva do abusador adolescente, consi-
TRAUMATISMOS E VULNERABILIDADES
dera-se que essa fase do desenvolvimento
NO CICLO VITAL: ESTUDOS COM O
é um momento de intensa instabilidade
MÉTODO DE RORSCHACH
produzidas pelas mudanças corporais e
psicológicas que colocam em perspectiva
Temas como abuso, violência e suicídio uma reorganização da identidade corpo-
são signos do mal-estar da atualidade e ral e psicológica da infância. Enfatiza-se
revelam estados de vulnerabilidade do hu- os aspectos traumáticos deste período,
mano ao longo do seu ciclo vital. Pesqui- destacando-se as transformações violen-
sas com o Método de Rosrchach tem bus- tas decorrentes da genitalização do corpo

571
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e do psiquismo, considerando que em cer- afetam as pessoas, podem tornar-se uma


tos adolescentes há um trabalho psíquico sobrecarga para o individuo. Isso quer
que eles não suportam ou não conseguem dizer que pode atingir certos indivíduos
realizar dificultando a transformação na mais intensamente do que outros devido
corrente libidinal. Considera-se que o agir às circunstancias, ao período do desenvol-
é, muitas vezes, uma forma de lidar com a vimento, e/ou a multiplicidade formas sob
angústia e que pode revelar a fragilidade as quais elas ocorrem. Assim sendo, cer-
da capacidade de mentalização deste gru- tas variáveis que influenciam na resposta
po. O método de Rorschach permite inves- ao trauma residem no estressor externo.
tigar o funcionamento psíquico e psicodi- Isso inclui a magnitude e a severidade do
nâmico e pode favorecer a construções trauma bem como seu fator de imprevisi-
de estratégias terapêuticas nesta clínica bilidade e duração. Um trauma repetitivo
de tão difícil intervenção. O ultimo traba- e altamente violento tem mais efeitos psi-
lho, apresenta reflexões sobre a violência cológicos severos do que incidentes rela-
dirigida contra si, investigando o tema tivamente não violentos e únicos. Outras
do suicídio, e os problemas importantes variáveis moderadoras residem no sujeito,
associados a dificuldades psicológicas e por exemplo, indivíduos com vivências
ao sofrimento psíquico grave que podem traumáticas anteriores não elaboradas
ter criado situação favorável às tentativas tendem a responder de forma mais mal-
de suicídio. São desenvolvidas considera- -adaptativa a uma nova situação traumá-
ções preliminares sobre o risco de suicídio tica, assim como os que possuem história
apontando como o método de Rorschach de desordem psicológica estão mais pre-
é um instrumento adequado para investi- dispostos a resposta patológica ao trau-
gações psicológicas neste contexto, além ma. Aliado a isso, o estágio de desenvolvi-
de oferece informações clínicas que me- mento da vítima na ocorrência do trauma
lhor qualificam o psicodiagnóstico e as é uma variável moderadora interna pode-
recomendações terapêuticas possíveis na rosa. A pesquisa sobre o trauma repetitivo
intervenção em crise com pacientes que em crianças indica que tais experiências
são acometidos desse risco. estão propensas a ter um efeito pervasi-
vo no desenvolvimento da personalidade.
Outras variáveis moderadoras refletem a
O RORSCHACH DE CRIANÇAS VÍTIMAS DE interação entre o indivíduo e o contexto
ABUSO SEXUAL E PERDAS PRECOCES da vitimização. Se, por uma lado, uma si-
Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS tuação traumática causada por uma outra
silvanalba@upf.br pessoa tende a levar a uma reação psicoló-
Anna Elisa Villemor Amaral - USF/SP gica mais séria do que a experiência de um
anna.villemor@saofrancisco.edu.br trauma impessoal, como um desastre na-
tural, por outro, no trauma do incesto, os
A perda é um evento comumente pre- laços de proximidade entre o perpetrador
sente na vida das pessoas e pode ser um e a vítima tornam mais propensos o de-
catalisador promotor de crescimento. En- senvolvimento do Transtorno de Estresse
tretanto, considerando que as perdas dife- Pós-Traumático TEPT com profundo dano
rem em sua natureza e na amplitude que ao ego. Talvez, esse seja um dos aspectos

572
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mais dolorosos da experiência traumáti- o sujeito vivenciou suas experiências de


ca, a perda de um sentido de si mesmo. A vida, como elas estão representadas em
ocorrência de eventos traumáticos em pe- seu psiquismo e como passaram a consti-
ríodos que antecedem o desenvolvimento tuir o seu mundo interno. Nessa perspec-
da habilidade da criança em diferenciar o tiva, o presente estudo teve por objetivo
que é real e o que é fantasia, em que o analisar qualitativamente as respostas de
pensamento concreto predomina, faz com m, indicador de vitimização e trauma, e
que seus mais assustadores pensamentos contribuir com a validade do Rorschach
pareçam realidade. Como consequência, nesse contexto. Foram analisados 16 pro-
a capacidade de pensar, de investigar e tocolos do Rorschach no Sistema Compre-
de simbolizar torna-se precária e a com- ensivo de crianças, entre 10 e 14 anos de
preensão e o ajustamento ao mundo pre- idade, 11 meninas e cinco meninos, com
judicados. São frequentes os danos no nível socioeconômico e escolaridade bai-
desenvolvimento do pensamento e na xos, vítimas de abuso sexual intrafamiliar
aprendizagem, que, nesse contexto estão documentado, contendo respostas de m.
relacionados a uma inibição sintomática, Entre as verbalizações das 23 respostas
utilizada como tentativa de remover uma emitas pelas crianças, destacam-se: “ta
situação de perigo geradora de ansieda- caindo uns pinguinhos de sangue”, “escor-
de para o ego, que é conhecer a própria rendo sangue”, “ninho...ta se quebrando,
história. As consequências traumáticas do se desfazendo”, “muito sangue caindo
abuso sexual são múltiplas e necessitam, nas pessoas”, “duas nuvens pretas se en-
além de procedimentos de observação e contrando”, “um navio negro vindo, “o
de entrevistas, de instrumentos eficien- fígado de uma pessoa sangrando porque
tes e hábeis para responder a avaliação ta tipo uma cor mais escura e uma mais
deste construto. Entre eles, os pesquisa- clara”. Observa-se que as respostas de m
dores destacam o Método de Rorschach associadas a conteúdos de sangue e a con-
como mais amplamente usado, aceito teúdos sexuais simbólicos podem denotar
e indicado para essa finalidade. Os pri- um ego frágil, ameaçado pela invasão de
meiros estudos com o uso do Rorschach forças alheias ao seu controle. Já a asso-
nesse contexto foram desenvolvidos com ciação de m à cor acromática e ao sombre-
sobreviventes de guerra e constataram o ado difuso, podem representar a vivência
aumento no movimento inanimado m. O de sentimentos persecutórios à vitimiza-
mestá relacionado, portanto, com forças ção, a ansiedade invasora, alheia ao seu
ou impulsos fora do controle do sujeito, controle, podendo ser percebida como
como também com pensamentos e impul- fruto do destino, de sua história pesso-
sos inadequadamente integrados em sua al. Verifica-se ainda, que as respostas de
estrutura cognitiva. São forças que podem m partem de uma sensação cinestésica
provir tanto do interior, como os impulsos presente, como algo que está sendo vi-
que ameaçam a autoimagem ou o sistema venciado, o que pode igualmente denotar
de valores ,quanto do o exterior, como uma relação mais direta com o processo
forças ambientais, incontroláveis e frus- da experiência traumática. Em conclusão,
trantes. Um dos aspectos centrais das res- os resultados deste estudo contribuíram
postas de m é revelar o significado a como para asseverar a validade do Rorschach,

573
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e ratificaram que as respostas de m são de culpa, de medo, de agressões físicas e


sugestivas da presença de sentimentos morais que são projetadas nas manchas
de desamparo e impotência, associados como respostas. Além disso, o teste pode
a circunstâncias que fogem ao controle e fornecer, de modo indireto, informações
que, portanto, constituem um alarme, um essenciais de personalidade que os inqui-
indicativo de conflito e tensão, comum em ridos não reconhecem plenamente em si
processos de vitimização e trauma, confir- ou hesitam em admitir quando questio-
mando as expectativas do estudo. nados sobre eles diretamente por meio
de instrumentos de autorrelato. Justa-
Palavras-chave: Rorschach no Sistema mente por ter essa característica, esse
Compreensivo; abuso sexual infantil; método pode ser considerado um instru-
evidências de validade. mento ideal para o estudo de situações
Contato: Silvana Alba Scortegagna, traumáticas. Dessa forma, o objetivo do
Universidade de Passo Fundo – UPF/RS presente estudo consiste em descrever
silvanalba@upf.br a experiência psicológica de trauma, por
A AVALIAÇÃO DE TRAUMAS POR meio do método de Rorschach, de uma
ESPANCAMENTO E ABUSO SEXUAL EM mãe e de sua filha que eram fisicamente
CRIANÇA E ADULTO abusadas. A senhora Vilma e a filha Aline,
Ana Cristina Resende - PUC/Goiás respectivamente 39 e 11 anos de idade,
anacristinaresende@hotmail.com eram espancadas e abusadas sexualmen-
te pelo marido de Vilma, que também era
Sobre o espancamento e o abuso sexual, o padrasto de sua filha. A senhora Vilma
neste estudo definido como constrangi- resolveu dar queixa na delegacia da mu-
mento à conjunção carnal mediante vio- lher quando descobriu que sua filha tam-
lência ou grave ameaça, pode-se dizer bém era abusada sexualmente pelo seu
que se trata de duas experiências com marido há mais ou menos três anos. É
um grande potencial de desenvolver um importante dizer que a Sra. Vilma sofreu
Transtorno de Estresse Pós-Traumático um violento abuso sexual na sua infân-
(TEPT). Quanto mais cruel é a violência cia, que sua mãe a criou sozinha porque
sofrida, mais grave tende a ser o efeito o seu pai bebia muito e quando voltava
psicológico. Quanto mais a pessoa é ame- para casa batia nas duas. Mãe e filha
açada, maior pode ser medo que ela sente foram esclarecidas a respeito do proces-
e provavelmente maior será o trauma psi- so de avaliação e concordaram com a
cológico também. O Rorschach tem sido participação em estudos que abordam o
considerado um instrumento ideal para drama de pessoas que sofreram agres-
desencadear memórias e sentimentos sões físicas e psicológicas. Ambas foram
relacionados às vivências traumáticas. O avaliadas por meio de entrevistas e por
processo de submissão ao teste pode ser meio do Método de Rorschach. Quanto
muito semelhante à revivência da situa- aos resultados das avaliações, observou-
ção dramática em pesadelo. Seus estímu- -se que as respostas aos cartões I, II e III
los pouco definidos, ou vagos, com suas da Sra. Vilma e de Aline foram as que me-
cores acromáticas e vibrantes, evocam lhor ilustraram o profundo desespero de
imagens distintas de situações de perdas, mãe e filha. O conteúdo de suas respostas

574
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

revelam a percepção única da realidade, ADOLESCENTES OFENSORES SEXUAIS:


a história do abuso, o senso do dano que AVALIAÇÂO PSICODINÂMICA COM O
sofreram e as emoções dolorosas de cada MÈTODO DE RORSCHACH
uma delas. Além disso, as duas revelaram Deise Matos do Amparo - UnB
Índices de Depressão positivos (DEPI 7 e deiseamparo@unb.br
6) e vários indícios de Transtornos de Es- Márcia Pereira dos Santos - SCA/DF
tresse Pós-Traumático no Rorschach tais osemes@bol.com.br
como a re-vivência de eventos perturba- Lana Wolf - UnB
dores, esforços para evitar as emoções e lanawolff@gmail.com
situações que podem precipitar ou agra-
Financiamento: CNPq
var a aflição psicológica e um estado de
hipervigilância mental e física. Destaca-se
A adolescência é um período do ciclo vi-
que no Rorschach é possível definir dois
tal caracterizado por mudanças corporais
estilos diferentes de responder aos even-
e psicológicas intensas que colocam em
tos pós traumáticos: uma fase em que há
perspectiva uma reorganização da iden-
uma constrição afetiva e cognitiva, onde a
tidade corporal e psicológica da infância.
pessoa luta contra imagens e pensamen-
Enfatiza-se os aspectos traumáticos deste
tos traumáticos e demonstra um estilo de
período, destacando-se as transforma-
resposta mais evitativo; uma fase em que
ções violentas decorrentes da genitaliza-
a pessoa revela um perfil de respostas tí-
ção do corpo e do psiquismo. Neste sen-
picos transtornos psicóticos. Nestes dois
tido, por um lado, podemos compreender
estudos de caso, mãe e filha claramente
a violência agida do adolescente, essen-
evidenciaram um profundo distúrbio do
cialmente, como um dado pubertário,
pensamento e dos afetos e um número
pelo choque corporal, psíquico e social
grande de conteúdo relacionados ao trau-
que se produz nesse período. Por outro,
ma que vivenciaram por alguns anos con-
podemos investigar se em certos adoles-
secutivos. Os achados dessa investigação
centes há um trabalho psíquico que eles
sustentam estudos anteriores que descre-
não suportam ou não conseguem realizar
vem a personalidade de pessoas espanca-
que dificulta a transformação na corrente
das e abusadas sexualmente. O Método
libidinal. Nesse caso, trata-se de analisar
de Rorschach, por sua vez, revelou-se
a dimensão do agir a partir de uma hipó-
bastante sensível às perturbações trau-
tese metapsicológica, referimos ao aspec-
máticas; seus estímulos ambíguos de fato
to dinâmico do funcionamento psíquicos,
desvelaram muitas imagens traumáticas e
abordando, particularmente, a dimensão
seus índices foram compatíveis com índi-
narcísica, os recursos simbólicos e a capa-
ces que refletem resultados encontrados
cidade de estabelecer a prova de realida-
em grupos de pessoas vitimizadas.
de. No caso dos adolescentes ofensores
sexuais é importante distinguir a violência
Palavras-chave: Rorschach no Sistema
agida das condutas delituosas, da violên-
Compreensivo; abuso sexual; TEPT.
cia interna, de essência pubertária, que
Contato: Ana Cristina Resende - Pontifícia
envolve as transformações corporais e
Universidade Católica de Goiás
que às vezes são vividos como verdadei-
anacristinaresende@hotmail.com

575
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ros traumatismos. Ao falar sobre esses registro objetal agressivo, rebaixamen-


adolescentes, pode-se, também, ressaltar to da relação com a realidade, clivagem
as dificuldades inerentes ao desenvolvi- como defesa. Ressalta-se a singularidade
mento emocional da criança e considerar dos casos individuais, a fragilidade nar-
que quando a vida familiar não oferece císica e os parcos recursos simbólicos e
uma referência segura essa torna-se an- de mentalização desses adolescentes.
gustiada e recorre à sociedade em busca Por outro lado, é importante reafirmar
de uma estabilidade externa que lhe per- que a clínica da adolescência coloca em
mita transpor os estágios essenciais de questão a estabilidade do quadro e os as-
seu crescimento emocional. Estudos com pectos psicopatológicos, bem como, per-
método de Rorschach, na abordagem mite uma constante reflexão sobre a in-
francesa, indicam como a passagem ao tervenção e o diagnóstico, em função da
ato pode ser uma forma de defesa con- suscetibilidade de remanejamento deste
tra a angústia. De modo geral, a literatura período. Particularmente em relação aos
aponta que esses adolescentes apresen- adolescentes deste estudo, é importante
tam protocolos do método de Rorschach, reforçar a necessidade de intervenções
com instabilidades narcísicas, dificuldade adequadas à especificidade do desenvol-
de elaboração de laços objetais, identifi- vimento e funcionamento psicodinâmico,
cações marcadas por recusa da diferen- bem como, considerar as repercussões
ciação de sexos e banalização das repre- subjetivas da violência, vivida e atuada,
sentações humanas. O propósito deste no que se refere aos determinantes psí-
trabalho é explicitar alguns aspectos re- quicos e de saúde mental. A atuação psi-
lativos ao funcionamento psíquico, ava- cológica particularizada, no contexto da
liar a psicodinâmica e realizar o diagnós- prática jurídica do psicólogo é incipiente e
tico clínico de quatro adolescentes que o sistema de atendimento ao adolescente
cometeram abuso sexual. Pretende-se em conflito com a lei, realizado pelas ins-
levantar considerações sobre o funciona- tâncias oficiais, de forma predominante,
mento psíquico, desses adolescentes por propõe intervenções de caráter psicosso-
meio dos seguintes eixos de análise: or- cial ou punitiva nas quais, não necessa-
ganização do ego; defesas, incidência do riamente está envolvido, o trabalho com
narcisismo, relação com a realidade, ca- dimensões subjetivas e clínicas que são
pacidade de construção simbólica e ela- fundamentais com esta população.
boração de conflito. Para tanto, apoiou-se
em entrevistas clínicas e no Rorschach, Palavras-chave: Rorschach , Sistema Frances,
abordagem francesa. Os protocolos não ofensores sexuais, Psicodinâmica.
apontam para um perfil único de funcio- Contato: Deise Matos do Amparo -
namento psíquico, muito embora, sejam Universidade de Brasília – UnB
encontrados dois estilos predominantes: (deiseamparo@unb.br)
1. defensivo e inibido, com recursos sim-
bólicos precários, restrição da capacidade
identificatória e relacional, organização
narcísica frágil; 2. abordagem formal re-
baixada, angústia depressiva subjacente,

576
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES juízo mediacional (indicadores de quali-


SOBRE O RISCO DE SUICÍDIO PELO dade formal, incluindo XA%, WDA%, X+%,
MÉTODO DE RORSCHACH NO SISTEMA Xu%, X-%, baixa produtividade [R], poucas
COMPREENSIVO respostas populares [P] e o indicador PTI
Marcelo Tavares - UnB positivo). Um quarto dos sujeitos apresen-
marsatavares@gmail.com tou número de respostas menor que 17,
Liliane Domingos Martins - UF/Goiás conforme índice da S-COM. Observamos
Samita Batista Vaz - UnB deficiência de adequação perceptiva em
geral (XA%) e deficiência de adequação
Apresentaremos considerações sobre o perceptiva em situações óbvias ou co-
risco de suicídio pelo Método de Rors- muns (WDA%), o que sugere ajuste menos
chach no Sistema Compreensivo (MRSC). eficiente ou menos adaptado à realidade.
A maioria dos sujeitos desse estudo são Cerca de um quarto da amostra apresenta
adultos jovens do sexo feminino com ten- PTI positivo, o que aponta para um funcio-
tativa de suicídio (TS). Conforme a litera- namento psicológico bastante primitivo e
tura, as mulheres fazem mais tentativas maior suscetibilidade a rupturas no conta-
de menor letalidade e são mais propensas to com a realidade. Respostas populares,
a buscar ajuda; os homens, ao contrário, uma das variáveis críticas no estudo do
mascaram suas vivências depressivas, fa- suicídio, são menos frequentes e indicam
zem tentativas mais letais mais frequen- uma capacidade reduzida de reconhecer e
temente que as mulheres e, menos fre- responder às demandas e valores sociais
quentemente que elas procuram ajuda mais óbvios, podendo precipitar conflitos
psicológica. Homens, portando, têm me- com o ambiente. Todos esses dados mos-
nor probabilidade de serem incluídos em tram uma maior tendência nessa amostra
estudos desse tipo. A maioria dos sujeitos para utilizarem uma lógica mais pessoal e
possui pelo menos o primeiro grau com- subjetiva de abordagem da realidade, sen-
pleto, é casada ou vive com companheiro. do que muitas vezes esse contato vai ser
Apenas cerca de um quarto encontra-se pautado por grande distorção. Quanto aos
situação regular de trabalho; mais da me- tipos de vivência, uma minoria apresenta-
tade encontra-se desempregada ou em li- va estilo extratensivo ou introversivo ade-
cença por motivo de saúde. A maioria tem quado. O restante se distribuíu entre os
história de internação psiquiátrica. Perdas estilos ambigual, rígido (extratensivo ou
recentes são relatadas por dois terços dos introversivo), indefinido ou evitativo. Um
sujeitos. Experiências adversas ou trau- quarto da amostra apresenta elevações
máticas são relatadas por quase todos, in- em lambda, cuja média é superior à brasi-
cluindo violência, abuso emocional, físico leira. A qualidade dos controles é precária
e sexual. Não encontramos um padrão típi- na maioria dos casos, mesmo quando o
co no MRSC associado à TS. Porém, detec- tipo de vivência parecia adequado: tam-
tamos problemas importantes associados bém nestes protocolos verificamos distor-
a dificuldades psicológicas e a sofrimento ção da forma em respostas de movimento
psíquico grave que podem ter criado situ- humano ou de cor, ou ainda com respos-
ação favorável à TS. Cerca de três quartos tas de cor pura, sugerindo prejuízos no
da amostra apresenta algum tipo de pre- uso desses recursos. Há elevação na carga

577
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de estressores que incidem sobre a expe- com tendências ao uso da intelectualiza-


riência (es – estimulação experimentada ção e do abuso da fantasia como estraté-
ou sofrida). Um terço da amostra apresen- gias defensivas para lidar com o impacto
ta estilos hipoincorporadores (Zd<-3,5) ou de certas emoções e com situações de
hiperincorporadores (Zd>+3,5), denotan- sobrecarga. Tais estratégias se destacam
do prejuízo na eficiência do processamen- como recursos frágeis que aumentam os
to do estímulo, ou por uma abordagem riscos de controle inadequado do estres-
descuidada ou por um modo excessivo de se. Além disso, estes sujeitos estão mais
incorporação de elementos da realidade. propensos a sentimentos de pessimismo
A experiência dos afetos também apre- que influenciam boa parte do seu funcio-
senta dificuldades significativas. Quase a namento usual, impregnando seus planos
metade apresentou-se mais suscetível a e a concepção que possuem acerca de si.
experiências afetivas negativas, como de- Mais do que isso, expressivas distorções
pressão, alterações do humor, tensão, an- na percepção interagem e prejudicam a
siedade e desorganização emocional (DEPI clareza do pensamento, tornando-o me-
positivo). A modulação afetiva da maioria nos eficiente, prático ou ajustado. Em sín-
privilegia de modo exagerado a expressivi- tese, todas essas dificuldades no estilo de
dade e impulsividade (CF+C>FC), demons- enfrentamento (tipos de vivência rígido,
trando maior intensidade na descarga de ambigual, indefinido ou evitativo), dificul-
seus sentimentos e escasso controle sobre dades de mediação (elevação do índice
estes (Cpura). Por outro lado, a constrição FQ-) e dificuldades no gerenciamento do
afetiva (SumC’>WSumC) ou o controle rí- afeto (sentimentos disfóricos; constrição
gido da afetividade (FC>2[CF+C]) aparece afetiva ou impulsividade) comprometem
em cerca de um quarto dos sujeitos, su- ainda outras áreas de organização psíqui-
gerindo limitada capacidade para dar li- ca, alcançam outras variáveis e terão in-
vre vazão às emoções, o que resulta em fluência negativa sobre a autopercepção,
estados irritativos e desconfortáveis. Em a organização da capacidade de controle
alguns casos essa constrição afetiva é se- do estresse e o ajustamento nos relacio-
vera (WsumC=0), com estrangulamento namentos interpessoais. A variável EA e os
afetivo e muito dispêndio de energia para recursos a ela associados podem ser mais
reter o fluxo emocional espontâneo. Cerca uma vez questionados, visto que várias
de um quarto apresentou uma séria ina- respostas destas pessoas são formadas
bilidade relacional que interfere sobre o por um comprometimento da qualidade
ajustamento funcional (CDI positivo). Há da forma e da expressão de afetos que
elevada incidência de respostas mórbi- conduz a prejuízos na estruturação das
das, um importante destaque da S-CON, capacidades de que o sujeito dispõe para
indicando presença de componentes dis- se manter equilibrado, tomar decisões co-
fóricos e depreciativos que caracterizam erentes e alcançar soluções práticas e re-
as impressões sobre o meio e os eventos, alísticas para seus problemas, implicando
sobre si e as demais pessoas. A análise assim, em complicações no manejo das
geral do agrupamento referente à ide- vivências de sobrecarga. Serão também
ação mostra uma maior suscetibilidade traçadas considerações acerca de dificul-
a um funcionamento rígido e inflexível, dades culturais e metodológicas para va-

578
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lidação de um índice de suicídio no Brasil. Como ato comunicativo uma enunciação


Ainda assim o MRSC oferece informações muda, uma vez que sua posição e função
clínicas que melhor qualificam o psico- nas cadeias comunicativas mudam, sendo
diagnóstico e as recomendações terapêu- moldada por elementos outros que ape-
ticas possíveis na intervenção em crise sar de se relacionarem com os constituin-
com pacientes em risco de suicídio. tes lingUísticos - pois os utilizam como
um meio - são considerados, também,
Palavras-chave: Rorschach, Sistema aspectos dialógicos e, portanto, extralin-
compreensivo, suicídio, Intervenção em crise. guísticos (elementos que reverberam a
Contato: Marcelo Tavares - Universidade de partir do encontro polifônico das vozes),
Brasília (marsatavares@gmail.com) que se constituem socialmente e pesso-
almente, nas cadeias semânticas e semi-
óticas. Nesta sessão vamos enfocar expe-
MR LT02 - Mesa Redonda riências em esferas comuns, mediadas por
ferramentas culturais físicas e simbólicas
Convidada diferenciadas que impactam nas formas
de os interlocutores interpretarem e atu-
arem no mundo, desencadeando proces-
MR LT02-1390 - ESTUDOS SOBRE sos de transição com novas apropriações
CONSTRUÇÃO DE SI: NARRATIVAS E de fazeres e significados, direcionando
IDENTIDADE os processos de convencionalização que
ocorrem no jogo polifônico entre histó-
Nesta sessão propomos discutir a constru- ria pessoal e coletiva. A identidade, como
ção dos significados de si em estudos que uma referência de si mesmo no mundo
visam compreender os processos de iden- cultural, implica nos posicionamentos do
tificação mediados por narrativas. Tendo self dos interlocutores em uma narrativa.
em vista a perspectiva da Psicologia Cultu- Neste sentido, o uso inicial de ferramenta,
ral em sua vertente dialogista, a experiên- técnica, costume até certo momento des-
cia é construída numa ininterrupta cadeia conhecidos que passam a ser utilizados
de atos comunicativos, na transitividade em novas práticas culturais desencadeia o
em que significados construídos histori- processo de convencionalziação, cabendo
camente, coletiva e individualmente, e é ao pesquisador buscar compreender as
atualizada na interação que se concretiza. dinâmicas que ocorrem e identificar quais
Cada experiência está sempre direcionada formas sofrem mudanças, quais perma-
para dois pólos: o do seu sentido e o do necem, antes que o processo se estabili-
ser. Então, cada experiência comunicati- ze. Iniciamos com uma reflexão histórica
va leva o indivíduo a construir atos que sobre o conceito de memória histórica e
envolvem toda a sua vida: experiência de história de vida destacando aspectos
pessoal, coletiva, de situações similares, relevantes que distinguem a memória da
de conhecimento dos diferentes interlo- recordação, e abordando os pontos de
cutores e de conhecimento/julgamento referências como componentes para a
sobre como se está sendo posicionado e construção narrativa de si para propor um
se posiciona a cada um dos interlocutores. estudo da narrativa de três gerações de fa-

579
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mílias cujos membros da primeira geração leitura de um dos pioneiros desse estudo:
foram torturados durante o período de Di- Bartlett. A compreensão sobre o estudo
tadura brasileira. A narrativa de história de da memória na ciência do desenvolvimen-
vida é aqui interpretada como instrumen- to induz, no entanto, à necessidade de
to de recordação desde o que é relevante recuperação de sua história nessa disci-
no presente e na construção de futuro, plina. No século XIX, Ribot desenvolveu
sendo, portanto situada e mediada his- um estudo sobre memória humana. Sob
tórica e culturalmente. Em seguida, apre- a perspectiva organicista, diferenciando
sentaremos estudo em que se utilizam as recordação e memória; a recordação é um
narrativas para se entender o impacto de mecanismo de resgate de eventos passa-
ferramentas mediacionais na emergência dos, sendo um aspecto complementar da
da identidade profissional docente de es- memória. Essa distinção ocorre pelo fato
tudantes de um curso de Licenciatura em de a memória não conter aspectos subje-
Letras a distância. Em um terceiro estudo, tivos de funcionamento, mas biológicos,
enfocamos os reposicionamentos de pro- enquanto a recordação compõe o ato
fessores do ensino superior quando tran- de recuperar eventos do passado. Nesse
sitam do ensino presencial para a EaD. primeiro estudo as memórias autobiográ-
ficas são nomeadas como “pontos de re-
ferência” que são manifestados pelas nar-
A MEMÓRIA AUTOBIOGRÁFICA NA rativas e vivências da pessoa. Esses pontos
CIÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO: de referência de memória são estabeleci-
ASPECTOS TEÓRICO-HISTÓRICOS dos por três fatores que atuam isolada- ou
André de Carvalho-Barreto - UnB, dinamicamente: interesse da pessoa, con-
andrecarvalhobarreto@yahoo.com.br senso de um grupo no qual a pessoa inte-
Silviane Bonaccorsi Barbato - UnB gra ou pelo interesse da sociedade. Esse
silviane@gmail.com ponto de referência é compreendido ain-
da como eventos e estados de consciên-
Financiamento: CAPES
cia que se posicionam ao longo do tempo
vivido da pessoa. A memória autobiográ-
Nessa sessão pretendo discutir o conceito
de memória autobiográfica no contexto fica Ribot faz uso dos seus pontos de re-
da ciência do desenvolvimento, partindo ferência para resgate de eventos vividos,
do aspecto histórico. Por memória auto- estando esses inseridos dentro tempo,
biográfica compreende-se a história de mas não muito bem organizados crono-
vida, que a pessoa constitui ao longo do logicamente pela memória. A linguagem,
tempo, promovida pelos processos de in- nesse contexto, apesar de percebida de
teração da pessoa em desenvolvimento forma orgânica, é entendida como a for-
com as outras pessoas, objetos e símbolos ma interna que a pessoa utiliza para atri-
existentes em seu contexto. A linguagem é buir significados às suas memórias, sendo
a mediadora na interação e desencadeia a ela igualmente uma forma de acesso às
construção de significados. Na última dé- memórias, recuperando-as e oferecendo
cada, a ciência do desenvolvimento huma- significados. No mesmo período Galton
no do Brasil tem retomado seus estudos evidencia a relevância da linguagem como
sobre a memória autobiográfica pela re- forma de acesso para a memória autobio-

580
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gráfica. Utilizando um método nomeado sas do esquecimento. Numa perspectiva


por ele como técnica da palavra-chave, cognitiva, Barlett é o primeiro a ressaltar a
asseverava que uma palavra ou um obje- memória autobiográfica como reguladora
to podem ser promotores de elucidação das formas de resolução de problemas, de
de memórias autobiográficas, sendo as regulação das emoções, do planejamento
principais memórias resgatadas as da in- futuro e das interações sociais. Seus estu-
fância e vida adulta da pessoa. Assim, para dos foram base para diversos modelos te-
esse autor, a memória autobiográfica seria óricos que desenvolveram os conceitos de
uma forma de recordação do self. Por sua esquemas, sistemas de memória e self e,
vez, psicólogo experimental Ebbinghaus atualmente, para a psicologia cultural. As
publica na Alemanha o volume Über das memórias são reconstruções do passado
Gedächtnis no qual, por métodos que perante as necessidades do presente, sen-
envolvem estímulos, tenta quantificar a do necessárias operações de esquemati-
memória. Para esse autor, um conjunto zação para sustentar a reconstrução desse
de silabas lidas em frases longas e, depois, passado na atualidade. Em Remembering,
repetidas de forma desconexa, diversas Bartlett introduz nos estudos da memó-
vezes, poderia fomentar a memória. As- ria autobiográfica um dos pressupostos
sim, a memória autobiográfica é originada mais relevantes para sua compreensão:
por estímulos que são reunidas ao longo o da convencionalização social, que con-
da vida. Ainda no fim do século XIX, Freud, sidera que o macrossistema cultural, ou
com seus estudos psicossexuais que se os elementos que dele fazem parte, são
estendem durante o século seguinte, ins- possíveis de serem modificados na sua
taura a memória autobiográfica na origem passagem de um grupo para outro. Esses
e no tratamento das neuroses. Em suma, elementos vão, gradualmente, assumindo
as neuroses seriam determinadas pelas uma forma distinta, estável e aceita pelo
experiências ocorridas, especialmente, grupo receptor. Assim, as memórias, além
na infância da pessoa. Seus estudos sus- de não serem entidades estáticas e fixas,
tentavam a ocorrência do impedimento modificam-se pelos interesses do grupo
de recordar memórias dos primeiros anos receptor. A investigação de Bartlett focou
como mecanismo de recalque da sexua- na compreensão dos processos de re-
lidade infantil. Antes da primeira metade construção, recordação e codificação dos
do século XX, as investigações sobre me- eventos outrora vividos, em vez da repre-
mória autobiográfica não eram sistêmicas, sentação fatídica de fatos, como outros te-
sendo associadas a conceitos de memória óricos da memória autobiográfica promo-
neurológica e patologia, como também vem. Atualmente, seus estudos estão sen-
a métodos de anamnese. As principais do utilizados como base de uma série de
correntes de fundamentação das investi- estudos sobre posicionamento-eu a partir
gações desse período eram a galtoniana, de eventos de histórias de vida narrados
a freudiana e a experimental. As três, inter- e intrageracionalmente, por diferen-
contudo, apresentavam uma perspectiva tes pessoas segundo suas experiências co-
limitada da memória autobiográfica por muns. Seguindo essa linha, esse trabalho
centrarem seus estudos na capacidade de pretende também apresentar uma inves-
reconhecimento da memória e nas cau- tigação em produção que estuda o proces-

581
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

so de convencionalização sobre a ditadura fóruns e atividades individuais presentes


militar (1964-1985), segundo narrativas em plataformas como a moodle. No estu-
de torturados nesse regime, seus filhos e do, consideramos o espaço de educação a
netos na perspectiva da ciência do desen- distância como um micromundo, onde os
volvimento. estudantes em atividades e ações conjun-
tas com os tutores e professores atualizam
Palavras-chave: Narrativas Autobiográficas; e constroem conhecimentos teórico-práti-
Memória Social; Convencionalização. cos sobre a área de atuação e significados
sobre o ser professor de forma situada
e contextualizada. Para entendermos a
A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE construção da identidade docente acredi-
PROFISSIONAL: UM ESTUDO SOBRE AS tamos ser importante recorrermos a suas
NARRATIVAS DE ALUNOS DO ENSINO A narrativas sobre os significados e o papel
DISTÂNCIA de ser professor e sua prática diária. O dis-
Ana Paula Carlucci - UnB curso produzido por elas nas trocas inter-
apcarlucci@gmail.com subjetivas propiciadas pelos fóruns de dis-
Silviane Bonaccorsi Barbato - UnB cussão, por exemplo, revela os significados
barbato.silviane@gmail.com sociais que medeiam as construções das
Financiamento: CAPES suas representações e relações na produ-
ção de sentidos pessoais. Para nós, a nar-
Nesta sessão, discutiremos a construção rativa é vista como um instrumento que
da identidade docente de estudantes- medeia o mundo canônico da cultura e o
-professores que participaram de um es- mundo idiossincrásico dos desejos, cren-
tudo exploratório realizado no curso de ças e valores das pessoas, sendo utilizada
Licenciatura em Letras a distância, no qual neste trabalho como um instrumento cul-
enfocamos a emergência da identidade tural que organiza os eventos vividos. Na
docente de estudantes-professores do tensão entre esses novos significados e os
curso de Licenciatura em Letras a distân- antigos sobre a área de atuação, os estu-
cia. Objetivamos no estudo exploratório dantes estão ativamente em um processo
analisar nas narrativas os significados que dialético de identificar-se e diferenciar-se
estão mediando e gerando a construção com as outras pessoas, construindo signi-
da identidade docente dos estudantes ficados e raciocínios que, por sua vez, irão
do curso de extensão Identidade Docen- mediar e gerar a construção de posiciona-
te na Educação a Distância do curso de mentos sobre o ser professor. Entende-
Licenciatura em Letras. Entendemos que mos posicionamentos como um processo
a constituição desta identidade profissio- de discurso no qual o self (si-mesmo) é
nal é gerada nas experiências em espaços concretizado na relação dialógica e o si-
comuns e individuais mediadas pelos dife- -mesmo é construído na relação dialética
rentes instrumentos e recursos de ensino- entre os aspectos coletivos e pessoais no
-aprendizagem que incluem, no caso da momento da interlocução, em um ativo
EaD recursos tecnológicos, nas interações processo de construção de sua agenciali-
de estudantes, tutores e professor nos ao dade. A agencialidade, entendida como a
concretizarem atividades coletivas como habilidade de atuar reflexivamente sobre

582
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

o mundo, é um fenômeno situado e con- enunciações como unidade de análise. Os


textualizado que está sob o domínio de es- resultados indicaram que ser professor
tados intencionais como crenças, desejos está sendo mediado pelos seguintes signi-
e emoções. Nessa relação, a construção da ficados: ser professor = “vocação”, “dom”,
identidade docente está sendo impactada “dedicação”, “cuidadoso” e “amoroso”,
pelos aspectos ideológicos, isto é, dos sig- “não precisa se aperfeiçoar, pois já nas-
nificados sociais expressos em discursos ceu assim”, “está no sangue”, “sonhador”;
hegemônicos pelos interesses concretos, estar na profissão – “bico”, “necessidade
definidos historicamente na contradição financeira”, “comprometimento baixo”; e
de classe e pelos aspectos emocionais, re- escolher a profissão – “procura se especia-
sultante de um processo conhecido como lizar”, “busca novos modelos de ensino”,
internalização. Para nós, a internalização é “trabalha melhor a cada momento”, “bus-
o processo pelo qual os significados cris- ca ser um professor melhor”. Os resulta-
talizados no contexto sociocultural e de- dos sugeriram também que a construção
senvolvidos historicamente pela pessoa da identidade docente foi impactada pelas
são transformados em significados pes- experiências e trocas do próprio contexto
soais que irão mediar, regular e impactar de educação a distância, a partir dos se-
o desenvolvimento dos significados sobre guintes resultados: retorno a educação;
o ser professor, possibilitando o estu- facilita e agiliza a vida pessoal e profissio-
dante tornar-se um professor individual nal; e lazer. Concluímos que a constituição
num coletivo. Para a realização do estudo dos significados sobre o ser professor foi
exploratório, participaram cinco alunos impactada pelas experiências e atividades
(Andreia, Gilberto, Carolina, Fernanda e realizadas no contexto de educação a dis-
Carla), todos cursando o terceiro semes- tância prática de sala de aula. Essas ativi-
tre do curso de Licenciatura em Letras. dades e experiências permitiram que os
Como procedimentos para a construção estudantes ao se posicionarem como do-
das informações, criamos o curso de ex- centes, refletissem sobre suas vidas, sobre
tensão intitulado Identidade Docente na si, suas escolhas profissionais e sobre o ser
Educação a Distância que durou oito (08) professor, ao mesmo tempo que permitiu
semanas, nas quais os estudantes tiveram que eles se identificassem com as outras
que realizar (a) atividades coletivas, como pessoas (professores, colegas de trabalho
fórum de discussão, sala do café, e (b) e da universidade, pais, amigos, maridos
atividades individuais, como história de e esposas) e com o e com os lugares nos
vida, mapa de vida, painel sobre as gen- quais participavam (emprego, escolas em
tes dentro de mim, a escolha profissional, que trabalham), se situando na narrativa,
rapidinhas, minhas perspectivas futuras e construindo e atualizando os valores, as
e, por último, memorial autobiográfico. crenças, as idéias e as práticas que foram
Para análise das informações, utilizamos produzidas no decorrer de suas histórias
a análise dialógica temática aplicada à de vida, de sua família e da comunida-
Psicologia, onde as narrativas construí- de. Posto que nesse espaço da educação
das nas atividades (a) e (b) foram lidas e a distância, os estudantes puderam se
relidas várias vezes para a construção de posicionar e atuar de diferentes papéis
um referencial de codificação, tendo as (eu-professor no presente; eu-professor

583
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no passado, eu-professor no futuro, eu- sita estar incluído na relação com ele, ain-
-estudante). A partir disso, eles foram se da que seja uma relação não presencial.
identificando e diferenciando com as ou- É na relação com o aluno que o professor
tras pessoas e construindo os significados consegue se perceber em sua atividade,
que mediaram suas identidades e seus regulando suas ações e, consequente-
posicionamentos sobre o ser jovem, estu- mente, orientando e negociando seus
dante e trabalhador. Neste interjogo entre significados nas trocas intersubjetivas. Em
passado, presente e futuro, a construção relação ao ser professor, vários elementos
da identidade docente foi marcada pelos participam desta construção da experiên-
embates críticos, a negociação e a trans- cia em salas de aula presencial ou virtual:
formação entre o passado (eu – professor o tipo de atividade desenvolvida, a relação
iniciante), o presente (eu – professor atu- professor-aluno, a didática e a metodolo-
al, eu - estudante) e o futuro (eu – profes- gia e outros mediadores utilizados. O pro-
sor melhor, eu - mais preparado, eu - mais fessor é a partir de seus alunos, e, é como
qualificado para o trabalho). é por suas relações específicas com as
ideologias vivenciadas e pelas tensões no
Palavras-chave: Jovem; Narrativa; impacto destas interações. Nesta relação
Posicionamentos. está envolvida a atividade de “dar aulas’,
que se caracteriza, no ensino presencial,
como o momento privilegiado do encon-
CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA EM tro com o aluno. Quando transitamos nos
DOCENTES: DO PRESENCIAL À EAD diversos níveis do ser professor através do
Fabrícia Teixeira Borges - UNIT processo de escolarização, percebemos
fabricia.borges@gmail.com alguns significados que participam espe-
cificamente, de cada fase, e das constru-
Neste trabalho, discuto os processos iden- ções identitárias de docentes. No ensino
titários de professores do ensino superior superior, por exemplo, novos significados
e as mudanças percebidas quando transi- são negociados na relação professor – alu-
tam entre o ensino presencial e a atuação no. Inicialmente, há uma tensão na nego-
na educação à distância. Entendemos que ciação destes novos significados, pois os
a construção da identidade é dinâmica e posicionamentos vivenciados entre um
constante, envolvendo os posicionamen- e outro começam a diferir do professor
tos de si na relação com os grupos a que de ensino médio. A perspectiva de uma
pertencemos e as atividades que desen- maior autonomia do aluno e do professor
volvemos. Portanto, a identidade refere-se gera um reposicionamento nesta intera-
a um pertencimento e a uma organização ção. Em alguns momentos o impacto da
de si como forma de se construir a partir entrada na universidade para os jovens,
das relações dialógicas. A inclusão em um vem principalmente, por um contexto que
grupo determinado, como o de professo- novas ideologias são apresentadas como
res, implica no distanciamento de outros, forma de inseri-los em um novo posicio-
como o de alunos. Embora percebamos namento de ser alunos. Então a partir de
um movimento dialógico, em que o pro- um estudo com professores que atuavam
fessor, para se diferenciar do aluno, neces- tanto no ensino presencial como na EaD

584
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foi observado que a mediação pela tecno- de construção de novos significados que
logia impactava diretamente sua constru- estão em evidência nas entrevistas e que
ção identitária por alguns motivos: 1) pela nos propiciaram definir como marcadores
“ausência” do contato direto com o aluno, do processo identitário do professor de
modificando a relação professor-aluno e ead, as tensões vivenciadas entre o ser-
o processo de comunicação, 2) pela ênfa- -professor-presencial e o ser-professor-
se em outras atividades que não o de dar -ead. Na tentativa de definir quais as di-
aulas para identificá-lo como professor ferenças entre o atuar presencialmente e
(função administrativa e função técnica), na EaD, foi possível perceber a dinâmica
3) por uma mediação hipermidiática na identitária entre uma e outra forma de ser
construção do conhecimento, 4) por um professor. O que parece ser importante no
vivência da temporalidade diferenciada professor de EaD é considerar os aspectos
do ensino presencial. Utilizamos as narra- do ser professor, como: a relação com os
tivas de história de vida com professores alunos, a didática e os outros processos
por entendermos que as histórias de suas da construção de sua identidade a partir
vidas profissionais desencadeiam nego- de mediadores tecnológicos. O professor
ciações de significados entre as diversas presencial estabelece a relação com o
vozes presentes, como o eu-professor- aluno em um tempo e um espaço defi-
-presencial e o eu-professor-ead, propi- nido, enquanto o de ead, vivencia nesta
ciando uma reflexão sobre sua construção relação outras formas de temporalidade
identitária em uma e outra atividade. Ao e de encontro, que na maioria das vezes
contarem sobre suas carreiras docentes, são mediados pela tecnologia. Participar
na presença do outro-pesquisador, há do desenvolvimento tecnológico e ser im-
uma reorganização e a consciência de si pactado por ele, não é exclusivo da educa-
propiciadas por estas reflexões. Percebe- ção, mas implica em um processo cultural
mos a repetição dos significados, como que temos sentido em vários níveis e ati-
vozes que circulam nos textos e nas for- vidades, principalmente o das interações.
mações de professores para a Ead, como: Assim, entendemos que a tecnologia im-
“temos que planejar mais na ead que no pacta consideravelmente no desenvolvi-
presencial”, “temos que ter domínio das mento psicológico humano, influenciando
tecnologias”. Mas é quando estas vozes diretamente nas formas de ser e agir. Por-
nos remetem às dificuldade do ser pro- tanto, o ser-professor - EaD traz reflexões
fessor de ead, como: “nós não temos con- de nossa própria vivencia histórica con-
tato com o aluno”, “as relações com os temporânea e de constituição identitária
alunos são diferentes, são mais afetivas”, globalizada, mediada pelas tecnologias
“no presencial dá para improvisar, na ead e pelo advento da internet, onde namo-
não” ou “no EAD a gente tem que ter uma ramos pela internet, temos amigos pelo
visão diferente, tem que ter uma paciência MSN, mas não deixamos de vivenciar os
maior, tem que ter uma qualificação tam- afetos e os processos dialógicos que en-
bém muito maior do profissional para com volvem todas a relações humanas.
o aluno”; que percebemos o momento de
reposicionamento do professor. Nestas Palavras-chave: Identidade; Professor; EaD.
falas, podemos apreender o movimento

585
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

MR LT04 - Mesa Redonda a respeito de algo. Neste contexto tem-


-se a criação da realidade em que grupos
Convidada e indivíduos controlam-se e criam tanto
seus laços de solidariedade, como suas
MR LT04-1476 - PERSPECTIVAS DO diferenças. Ressaltam-se os aportes teó-
DESENVOLVIMENTO HUMANO EM ricos metodológicos das representações
ESPAÇOS ESCOLARES E NÃO ESCOLARES sociais na segunda pesquisa que aborda a
percepção dos adultos sobre a escola. Fo-
Teresa Cristina Siqueira Cerqueira - UnB caliza a fase adulta em seus aspectos do
teresacristina@unb.br desenvolvimento social, e nas influências
André Felipe Costa Santos -UnB que a escola apresenta sobre as escolhas
andrefelipecostasantos@gmail.com realizadas no período da fase adulta. Nes-
Jaqueline Kelly Lourenço -UnB te sentido, a escola simboliza um espaço
jaquelinek@gmail.com fundamental que proporciona o direcio-
namento destas escolhas. Os resultados
O objetivo da mesa é discutir as idéias e apontam para uma representação sobre
socializar conhecimentos resultantes de a escola como espaço de socialização,
pesquisas, relato de experiência e ensaio além de primar pelo conhecimento for-
teórico dos investigadores do Gruppe – mal e acadêmico. O relato de experiên-
Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicolo- cia sobre as representações sociais dos
gia e Educação que, de diferentes formas professores em relação aos adolescentes
e matizes, abordam a questão da postura em conflito com a lei aborda as concep-
transversal das perspectivas do desenvol- ções de liberdade assistida como uma das
vimento humano em espaços escolares e medidas sócioeducativas que estão pre-
não escolares. Evidenciam-se os aspectos vistas no ECA- Estatuto da Criança e do
das representações sociais das crianças no Adolescente. A medida sócioeducativa é
ensino fundamental sobre a escola opor- aplicada em meio aberto aos adolescen-
tunizando condições para refletir sobre as tes que cometeram algum ato infracio-
percepções sobre a escola pelos próprios nal leve. A inclusão dos adolescentes no
estudantes. A proposta da pesquisa bus- contexto escolar é muito difícil uma vez
ca perceber a escola como espaço de de- que são estigmatizados como infratores.
senvolvimento que privilegia a formação A medida sócioeducativa consegue, por
integral do sujeito enquanto propiciado- força da lei, matriculá-los, porém, a per-
ra de transformações e formação. Busca manência deles na escola, por vezes, não
também preparar o aluno para um exer- é assegurada por questões de preconcei-
cício criativo e de qualidade, considera o to, estigmatizações e falta de aceitação
desenvolvimento humano em suas fases por parte dos atores educacionais e dos
como importante fator para aquisição de próprios alunos em liberdade assistida.
conhecimento e das competências relati- Neste sentido verificar as representações
va à concretização de valores, como éti- sociais dos professores sobre estes alunos
ca e condutas. As representações sociais adolescentes pode ajudar na melhoria da
constituem um corpo teórico que nos qualidade do ensino e buscar alternati-
auxilia na compreensão das percepções vas para a permanência deles na escola.

586
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

O último trabalho apresentado, o ensaio, cebem alimentação adequada e cuidados


enfoca as concepções de educação indí- médicos podem estar em risco para o de-
gena e educação escolar nas sociedades senvolvimento de crescimento retardado
indígenas e propõe-se a contribuir com as ou atrasado. Por exemplo, crianças que
discussões para construção da interdisci- vivem em países onde a desnutrição não
plinaridade necessária que ultrapasse as é um problema tendem a ser mais altos
fronteiras dos diversos domínios das ciên- do que as crianças que vivem em países
cias sociais. onde a desnutrição é um problema. As
mudanças físicas, desenvolvimento do
cérebro e sistema nervoso, coordenação
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DAS motora grossa e fina, e problemas de
CRIANÇAS DO ENSINO FUNDAMENTAL saúde são aspectos importantes do de-
SOBRE A ESCOLA senvolvimento físico durante a infância
Teresa Cristina Siqueira Cerqueira - UnB meio como em anteriores fases de desen-
teresacristina@unb.br volvimento. Nesta pesquisa o referencial
teórico e metodológico utilizado será o
Um dos objetivos da escola é proporcio- das representações sociais. A teoria das
nar aos estudantes que nelas estão inseri- representações sociais foi apresentada
dos a oportunidade de aprender uns com por Serge Moscovici em 1961. Moscovici
os outros, sem distinção de sexo, etnia, (2001) entende as representações como
ou classe social. Porém, para que isto se “um conjunto de conceitos, proposições
torne realidade é importante que a escola e explicações originado na vida cotidiana
esteja preparada para lidar com as diver- no curso de comunicações interpessoais”.
sas necessidades de seus alunos, estando (P.59). Elas são equivalentes aos mitos
ciente de que precisa conhecê-las e con- e sistemas de crenças das sociedades
siderá-las em suas estratégias de ensino, tradicionais, podem também ser vistas
respeitando e assegurando desta forma, como a versão contemporânea do senso
uma educação de qualidade. O desenvol- comum. As representações sociais são
vimento físico no meio da infância é ca- como um saber prático que visa respon-
racterizado por variações consideráveis der questões que surgem na comunica-
nos padrões de crescimento. Estas varia- ção e no relacionamento interpessoal. A
ções podem ser devidas a sexo, origem representação é assim entendida como
étnica, genética, hormônios, nutrição, “construção de um objeto e expressão
meio ambiente, doenças ou. Embora as de um sujeito” (Vala, 1993 p.354) tendo
crianças desta faixa-etária sigam os mes- uma forte ressonância social, pois se tra-
mos padrões de desenvolvimento, eles ta de “uma modalidade de conhecimento
não necessariamente maduros na mesma socialmente elaborada e partilhada, com
taxa. A maioria das meninas experimen- um objetivo prático, contribuindo para a
tam um surto de crescimento pré-adoles- construção de uma realidade comum a
centes em torno de 9 ou 10 anos, enquan- um conjunto social”. (Jodelet, 1989 p.36).
to a maioria dos meninos experimentam Moscovici, que começou por analisar na
o estirão de crescimento mesmo em tor- França as representações de determina-
no de 11 ou 12 anos. Crianças que não re- dos grupos sociais relativamente à teoria

587
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

psicanalítica, acaba por concluir que as dados coletados, os mesmos foram anali-
representações sociais não se alimen- sados por meio do software desenvolvido
tam apenas das teorias científicas, mas por Vergès, denominado EVOC (Ensemble
também “(...) dos grandes eixos culturais, de programmes permettant l’analyse des
das ideologias formalizadas, das experi- evocations) – versão 2003, que permite
ências e das comunicações cotidianas” a organização das evocações produzidas
(Vala, 1993 p.353). Estudos mostram que de acordo com as suas freqüências e com
as representações sociais não são a mera a ordem de evocação ou, como se adota
reprodução mental da realidade exterior no presente estudo, de importância, pos-
ao sujeito, mas elas passam a impregnar a sibilitada pela hierarquização dos termos
realidade adquirindo foros de consistên- enunciados pelos sujeitos. É um instru-
cia ontológica, orientando as cognições e mento facilitador para a análise da estru-
comportamentos dos indivíduos. (Abric, tura e organização de uma representação
Faucheux & Moscovici,1967). Nas pala- social. O instrumento contém ainda as se-
vras de Vala, (1986) “(...) as representa- guintes informações: dados de identifica-
ções são sociais, não pela sua extensão, ção: sexo, série e idade. Os participantes
mas porque emergem num dado contex- da pesquisa foram 112 alunos, sendo 54
to social; porque são elaboradas a partir do gênero feminino e 58 do gênero mas-
de quadros de apreensão que fornecem culino. 51 alunos cursam o 4º ano e 61
os valores, as ideologias e os sistemas de alunos o 5º ano do ensino fundamental. A
categorização social partilhados pelos di- idade variou entre a mínima de 9 e a má-
ferentes grupos sociais” (p.20). O papel xima de 14 anos de idade. Todos estudam
da escola está além do âmbito formal, é em escolas da rede pública de ensino do
imprescindível que a escola esteja aten- Governo do Distrito Federal. Os resulta-
ta e busque estratégias adequadas para dos apontam que a representação social
trabalhar com os alunos de forma global, mais evocada pelos alunos do 4º e 5º ano
proporcionando ambiente acolhedor e lú- foi que a escola é boa (evocada 58 vezes e
dico, além da própria aprendizagem. Des- com freqüência de 2,27%), em seguida foi
ta forma, este projeto de pesquisa teve a palavra importante com 31 evocações e
como objetivo analisar as representações com freqüência de 2,21 e por último lugar
sociais dos alunos do 4º e 5º ano do Ensi- de aprendizagem, com 28 evocações e
no Fundamental sobre a escola e sugerir freqüência de 2,125. Tais representações
reflexões sobre os aspectos pedagógicos devem primar por trabalhar a criatividade
e metodológicos proporcionados na esco- e ampliar o nível de satisfação dos alunos
la. A principal fonte de dados da pesquisa e que os ajudem a reconhecer, cada vez
foi um instrumento de evocação livre com mais, a escola como um espaço de apren-
seis respostas, que foi aplicado aos alunos dizagem e de lazer. A inserção prazerosa
do ensino fundamental do 4º e 5º ano da do aluno na escola certamente é uma ex-
rede pública de ensino do Distrito fede- periência positiva em sua trajetória esco-
ral. O instrumento de evocação possui lar estendendo-se até a vida adulta. Pode-
uma única pergunta: Para você a Escola -se concluir com essas análises que os alu-
é.... O aluno deve colocar seis frases ou nos do 4º e 5º anos do ensino fundamen-
palavras que remetam à escola. Após os tal possuem uma representação da escola

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como boa e a percebem como importante mos seres sociais, muito antes mesmo do
local de aprendizagem para o desenvolvi- nosso nascimento. Logo após o nosso nas-
mento da pessoa como um todo. cimento e durante todo o transcorrer da
nossa vida há um desenvolvimento social
Palavras-chave: Representações Sociais, como aborda Zimbardo (2005). A vida a
Escola, Crianças dois e o relacionamento matrimonial por
Contato: Teresa Cristina Siqueira Cerqueira, serem construções sociais são carregados
UnB, teresacristina@unb.br de representações que trazemos e desen-
volvemos ao longo da nossa história de
vida. A segunda característica marcante
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE SUJEITOS da fase adulta é a relação de trabalho e
NA FASE ADULTA SOBRE A ESCOLA profissionalização. Rodrigues (2003) ex-
André Felipe Costa Santos -UnB plana que a escolha profissional é marca-
andrefelipecostasantos@gmail.com da por dois enfoques: satisfação e prazer
Profa. Dra.Teresa Cristina Siqueira Cerqueira -UnB por meio de ganhar a vida. Tais enfoques
teresacristina@unb.br então abalizados e influenciados pelo
meio social no qual aquele sujeito está
A Psicologia do Desenvolvimento Humano inserido. Tendo em vista estas duas carac-
tem por seu objetivo o estudo sobre a evo- terísticas basilares da vida adulta, vida a
lução da capacidade percentual e motora, dois e trabalho, constata-se o forte eixo
das funções intelectuais, da sociabilidade que o aspecto social tem na relação dos
e da afetividade do ser humano (Oliveira, indivíduos e da construção do ser. Dentro
1994). Apoiado nesta premissa e embasa- desse cenário verificamos o quanto algu-
do na relevante contribuição que estudos mas instituições como: Família; Escola;
em psicologia do desenvolvimento huma- Religião; são fundamentais e relevantes
no pode oferecer para melhor compreen- na formação do sujeito e no desenvolvi-
dermos o espaço educacional, constitui o mento social, uma vez que estas institui-
objetivo desta pesquisa apresentar dados ções exercem forte influência na constru-
e contribuições sobre as representações ção e concepção das representações dos
sociais de sujeitos da fase adulta sobre sujeitos. Tendo em vista a força destas ins-
a escola. Rodrigues (2003) aponta que o tituições, destacamos o ambiente escolar
grande marco e característica fundamen- como um das principais entidades gerado-
tal da etapa adulta são: vida a dois e o ras de representações. Segundo Mazzotti
trabalho. Com respaldo nestas conside- (2008) o ambiente escolar exerce função
rações é que me proponho explicitar de primordial na internalização de represen-
forma breve essas duas características tações sociais nos indivíduos, por meio
fundamentais da fase adulta. Pautando, das praticas sociais estabelecidas durante
todavia, no aspecto social. É mui- a formação e o processo de aprendizado.
to recorrente encontrarmos na literatura Mediante a isto a Escola é uma instituição
acadêmica, que aborde a psicologia do de grande valia de estudo, uma vez que
desenvolvimento humano, que a principal esta gera algumas representações sociais
característica da fase adulta seja a vida a que influenciam grande parte da vida do
dois, ou intimidade. Para Lane (1994) so- ser. Em função da importância do desen-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

volvimento social dos sujeitos e das suas se adotou como instrumento de coleta o
representações sociais, em todas as eta- questionário. O questionário aplicado aos
pas do desenvolvimento humano, desde Adultos possuía uma única pergunta: Para
a sua infância até a sua velhice. Trazemos você a Escola é....; Os adultos deveriam co-
para a discussão deste trabalho conceitu- locar seis frases ou palavras que deveriam
ações da Psicologia Social, com o intuito remeter à escola e depois hierarquizá-las
de melhor auxiliar na nossa compreensão pelo grau de importância as evocações.
sobre a fase adulta e mais especificamen- Demais disso, os adultos deveriam pre-
te da relação adulto/ escola. Partindo da encher itens relacionados à identificação
linha materialista- histórica da Psicologia (informações sobre idade, sexo, formação
Social trazemos à baila a Teoria das Re- acadêmica). Depois de coletados os dados
presentações Sociais, desenvolvida por dos pais, utilizamos o software desenvolvi-
Serge Moscovici em 1961, que conforme do por Vergès, denominado EVOC (Ensem-
Almeida (2003) tem oferecido um impor- ble de programmes permettant l’analyse
tante aporte teórico aos pesquisadores des evocations) – versão 2003, que possi-
que buscam compreender os significados, bilita a ordem de evocação e a freqüência
e os processos neles imbricados, criados das respostas suscitadas. Os procedimen-
pelos homens para explicar o mundo e tos para realização deste estudo foi pau-
sua inserção dentro dele. Para Jodelet as tado na aplicação de 10 questionários,
representações sociais são “uma forma de no transcorrer do segundo semestre de
conhecimento, socialmente elaborada e 2010, por cada um dos dois pesquisado-
partilhada, que tem um objetivo prático e res envolvidos. O passo seguinte foi, a efe-
concorre para a construção de uma reali- tivação da introdução dos dados colhidos
dade comum a um conjunto social” (Jode- pelos questionários no software EVOC,
let, 1989). É nesse cenário que esta pes- que permitiu a organização das evocações
quisa analisa como sujeitos na fase adulta produzidas de acordo com as suas frequ-
percebem o ambiente escolar. Outro re- ências e ordem. Para os sujeitos na fase
levante objetivo deste trabalho é inferir, adulta, obtemos 20 representações da
de acordo com as representações sócias escola. A representação mais evocada foi:
evocadas pelo grupo pesquisado, melho- socialização com 4 evocações; Aprender,
rias no espaço escolar. A matriz epistemo- Troca de Experiências,Conhecimento e
lógica escolhida para realização desta pes- Formação, aparecem com 3 cada; Respei-
quisa foi a pesquisa qualitativa que segun- to e Fazer Amigos com 2 cada. Para uma
do Gonsalves (2007), tem como baliza as melhor conceituação e visualização cate-
preocupações com a compreensão, com a gorizamos as representações em três zo-
interpretação do fenômeno, considerando nas de frequências: A maior categoria, So-
o significado que se dá a sua prática. Os cial, integrando pelas palavras Fazer ami-
participantes deste estudo foram dez (10) gos, Troca de experiências, Socialização
sujeitos na fase adulta no Distrito Federal, e Respeito, compondo 55%; a categoria
Brasília. Os participantes eram 6 do gêne- Cognitiva, composto por Aprender e Co-
ro feminino e 4 do gênero masculino, sen- nhecimento, satisfazendo 30%; A menor
do que se encontravam na faixa etária de zona chamada Cognitivo/Social é formada
26 a 36 anos. Para a obtenção dos dados, unicamente pela representação Forma-

590
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ção, correspondendo 15%. Mediante es- que o adolescente cumpra a medida de


tes dados constatamos, que os sujeitos na L.A. é a que ele esteja devidamente ma-
fase adulta enxergam a escola como um triculado e que tenha frequência e apro-
importante espaço de socialização, fazen- veitamento escolar. Como pedagoga da
do nos perceber o quanto o ambiente es- liberdade assistida, sou responsável pela
colar é grande contribuído, não somente inclusão e acompanhamento escolar dos
da formação acadêmica, mas também do adolescentes. Tenho percebido que, ape-
desenvolvimento social desses atores. Ou- sar da escolarização ser uma das partes
tra relevante verificação que obtivemos é mais importantes para a eficácia da me-
que tais representações sociais marcam dida sócioeducativa, ela dificilmente é
como neste inicio de século XXI os adultos posta efetivamente em prática. A inclusão
enxergam a escola. dos adolescentes que carregam o estigma
de terem sido autores de atos infracionais
Palavras-chave: Adulto, Representações no contexto escolar é, por vez, muito di-
Sociais, Socialização fícil. Conseguimos promover a matrícula
Contato: André Felipe Costa Santos, UnB, deles, no entanto, na maioria dos casos,
andrefelipecostasantos@gmail.com não conseguimos manter sua frequência
e aproveitamento escolar, que são de ex-
trema importância para a sua ressociali-
AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS zação. Acredito que um dos fatores que
PROFESSORES EM RELAÇÃO AOS deve ser analisado, quando avaliamos o
ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI porquê da não adesão desses adolescen-
Jaqueline Kelly Lourenço -UnB tes à escolarização, é o da possível falta
jaquelinek@gmail.com de aceitação da qual são vítimas. Enquan-
Profa. Dra Teresa Cristina Cerqueira Sirqueira -UnB to executora da medida sócioeducativa
teresacristina@unb.br de liberdade assistida tenho ouvido cons-
tantemente discursos contrários à perma-
O presente trabalho apresenta a concep- nência desses alunos no contexto escolar,
ção de liberdade assistida (L.A.) como sob a alegação de que eles representam
uma das medidas sócioeducativas que es- um risco para o restante da comunidade
tão prevista no Estatuto da Criança e do escolar. O trabalho sócioeducativo tem
Adolescente-ECA, ela é aplicada em meio como pilares de sustentação legislações
aberto, aos adolescentes que cometeram como o Estatuto da Criança e do Adoles-
algum ato infracional que pode ser con- cente, o Sistema Nacional de Atendimen-
siderado com menos grave. Ela tem por to Sócioeducativo - SINASE, bem como
objetivo acompanhar os adolescentes em outras legislações ligadas aos direitos hu-
seu contexto social, possibilitando uma manos e defesa dos direitos das crianças
maior inserção deles na sociedade. No e adolescente como a Declaração Univer-
Distrito Federal, até o ano de 2010, esta sal dos Direitos Humanos. Pensadores
medida era aplicada pela Secretaria de como Costa (2001, 2006) Volpi (1999) de-
Justiça, no entanto, atualmente a com- fendem tais legislações, pois elas tratam
petência é da Secretária da Criança e do a criança e o adolescente como seres do-
Adolescente. Uma das condições para tados de direitos e que se encontram em

591
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fase peculiar de desenvolvimento, e por pesquisar as representações sociais dos


tal motivo merecem tratamento diferen- professores em relação ao adolescente
ciado (Estatuto da Criança e do Adoles- em conflito com a lei pode auxiliar na per-
cente, 2005). As legislações que garantem cepção das significações sociais que estes
ou regulamentam os direitos da criança e atores têm em relação ao tema. Este tipo
do adolescente, não trabalham na pers- de estudo se faz ainda mais importante,
pectiva da punição e da retribuição e sim pois a escola tem o papel de auxiliar este
na da responsabilização e inclusão, pois jovem em sua (re)inserção social, ajudan-
estão embasadas em referenciais teóricos do-o a assimilar as regras sociais, valorizar
pautados pelos direitos humanos. Pode- e respeitar os outros cidadãos, tornando-
mos citar a Pedagogia, que por meio do -os, assim, pessoas éticas e capazes de
pensamento freiriano tem sido um dos uma vinculação social não só efetiva,
pilares teóricos de sustentação do atendi- como ativa. O papel da escola em relação
mento sócieducativo. Há, ainda, o estudo a estes jovens não é diferente do seu pa-
das Representações Sociais, que por meio pel em relação aos demais jovens que ela
de pesquisas relacionadas às crenças, à atende. No entanto, devido à trajetória de
comunicação e ao imaginário social acer- vida deles, as representações da escola
ca do tema, têm proporcionado possibi- em relação a eles podem ser diferencia-
lidades diferenciadas de entendimento das. A teoria das Representações Sociais
da questão da violência que os adoles- é um campo de estudos relativamente
centes são causadores, e que, por vezes, jovem e que tem tido ampla inserção em
também são vítimas. No presente estudo vários países, bem como, uma aceitação
tentaremos relacionar estes dois campos de seus estudos por diversas áreas do co-
de conhecimento, no intuito de investigar nhecimento (Jodelet, 2001). O pensamen-
as representações sociais em relação ao to ligado às representações sociais que
tema, bem como, por meio dessa inves- será adotado na presente pesquisa será o
tigação, possibilitar trabalhos educativos de autores como Moscovici (2009) e Jo-
diferenciados com estes adolescentes. delet (2005, 2001), utilizar-se-á também
A violência é um dos problemas sociais os pensamentos de outros pesquisadores
mais debatidos na atualidade, o seu en- do campo das representações sociais. Tra-
frentamento é de suma importância para remos, ainda, o pensamento de Foucault
a garantia do bem estar social. Almeida (2009), Costa(2006), Freire(1996), Arendt
(2006) afirma que quando vemos a vio- (2010), entre outros, para entender me-
lência e a exclusão social como fenôme- lhor a dinâmica do pensamento social
nos culturais, por conseqüência, os con- corrente em relação aos adolescentes em
cebemos como objeto social que suscita conflito com a lei, e tentar compreender
representações sociais, e que, portanto, em que medida os processos educativos
podem ser estudados à luz da Teoria das e socieducativos podem contribuir para a
Representações Sociais. Gilly (2001) lem- mudança de atitude dos adolescentes em
bra que as representações sociais que relação à sociedade e da sociedade em
perpassam o ambiente escolar, trazem relação aos adolescentes. No estudo das
consigo significações sociais que influen- representações sociais o instrumento de
ciam o processo educativo. Sendo assim, evocação (EVOC) sinaliza a compreensão

592
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de como o fenômeno violência tem afe- ultrapasse as fronteiras dos diversos do-
tado o pensamento e o comportamento mínios das Ciências Sociais. O tema tem
de um povo. Entender o que os grupos de sido estudado por antropólogos, mas
professores pensam a respeito dos ado- pouco contemplado por estudos peda-
lescentes que já praticaram ou praticam gógicos e psicológicos na abordagem dos
atos infracionais, pode representar um estudos sócios-culturais. A aproximação
passo no sentido de superar possíveis dos psicólogos à questão indígena ocor-
problemas de relacionamento, visando à re nesta década. Atualmente, há uma
efetiva inclusão destes adolescentes na inserção dos psicólogos junto às aldeias
escola. Sendo assim, percebe-se a im- especialmente na área da saúde e uma
portância do estudo das representações maior adesão de psicólogos sociais nas
social em relação à questão da violência. discussões da temática indígena. O tem-
Fica clara a necessidade do aprofunda- po indígena para um ser humano desen-
mento do tema, especialmente quando, volver-se imita a natureza, cada pessoa,
por meio de pesquisas científicas (Me- tem seu próprio ritmo de aprendizagem,
nim, 2005; Santos; Aléssio, 2006; Espín- o que proporciona a educação é a cultura,
dula; Santos, 2004), percebemos que as a corporalidade, o próprio ciclo de vida
representações sociais de determinados do indivíduo, apoiando-se na cosmologia,
grupos em relação ao fenômeno da vio- nas tradições e no modo de vida da sua
lência, têm contribuído para perpetuar comunidade. “A família e a comunidade
visões preconceituosas e distorcidas. (ou povo) são os responsáveis pela educa-
Diante disso, verifica-se nos estudos das ção dos filhos. É na família que se aprende
representações sociais, um caminho vi- a viver bem: ser um bom caçador, um bom
ável para entender a visão da sociedade pescador, um bom marido, uma boa espo-
em relação ao fenômeno estudado. sa, um bom filho, um membro solidário
e hospitaleiro da comunidade; aprende-
Palavras-chave: Representações sociais; -se a fazer roça, a plantar, fazer farinha;
Adolescente em conflitos com a lei; Escola. aprende-se a fazer cestarias; aprende-se
Contato: Jaqueline Kelly Lourenço, UnB, a cuidar da saúde, benzer, curar doenças,
jaquelinek@gmail.com conhecer plantas medicinais; aprende-se
a geografia das matas, dos rios, das ser-
ras; a matemática e a geometria para fa-
ESCOLA DIFERENCIADA INDÍGENA: zer canoas, remos, roças, cacuri, etc; não
ESPAÇO ABERTO DE PRÁTICAS existe sistema de reprovação ou seleção;
EDUCACIONAIS CULTURAIS os conhecimentos específicos (como o dos
Ana América Magalhães Avila Paz -UnB pajés) estão a serviço e ao alcance de to-
anapaz.uab@gmail.com dos; aprende-se a viver e combater qual-
quer mal social, para que não tenha na
Este ensaio enfoca as concepções de edu- comunidade crianças órfãs e abandona-
cação indígena e educação escolar nas das, pessoas passando fome, mendigos,
sociedades indígenas e propõe-se a con- velhos esquecidos, roubos, violência, etc.
tribuir com as discussões para construção Todos são professores e alunos ao mesmo
da interdisciplinaridade necessária que tempo”(Gersem Luciano-Baniwa). Os mo-

593
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mentos coletivos importantes tais como: lar indígena foi atribuída às Assembléias
a recepção do nome, a “iniciação”, o nas- Provinciais promovida cumulativamente
cimento do primeiro filho, a morte de um com as Assembléias e os Governos Ge-
parente ou de um membro da comunida- rais. Até os anos 70, predominou o discur-
de são marcados por ações ritualísticas so integracionista que segundo Grupioni
e pedagógicas, das quais a comunidade (2008, p.36), evidencia a atuação hege-
participa ativamente, a subjetividade se mônica do órgão indigenista na oferta de
expressa de forma individual e ao mes- processos escolares aos grupos indígenas,
mo tempo é social. A educação indígena, ancorado numa legislação que apontava
em sua alteridade possibilitou estraté- para a integração dos índios à comunhão
gias para continuar sendo eles próprios, nacional “como caminho inexorável de
conforme é explicitado por Meliá (1999): seu desenvolvimento”. Entre os anos 80
“Os povos indígenas sustentaram sua al- e 90 começaram as discussões interdis-
teridade graças a estratégias próprias, ciplinares sobre a educação diferenciada
das quais uma foi precisamente a ação indígena, (Grupione, 2006). A perspectiva
pedagógica. Em outros termos, continua integracionista dos programas de educa-
havendo nesses povos uma educação in- ção e o acesso à escola, precisavam ser
dígena que permite que o modo de ser superadas pelo conceito de direito, garan-
e a cultura venham a se reproduzir nas tido pela Constituição Federal de 1988,
novas gerações, mas também que essas que recomenda o respeito às línguas, a
sociedades encarem com relativo sucesso formação de índios para a docência na
situações novas”. A escola enquanto insti- escola indígena e o reconhecimento dos
tuição foi historicamente imposta aos in- direitos culturais dos grupos indígenas.
dígenas pelos jesuítas, por volta de 1549, Nesse sentido a escola necessária aos po-
com o objetivo de domesticá-los e cate- vos indígenas é multilíngüe, fortalecedora
quizá-los, serviu desde o início para vestir da identidade, do sentimento de perten-
suas vergonhas, adestrar-lhes e reprimir- cimento étnico, exigindo do Estado uma
-lhes duramente os comportamentos postura ativa na construção de políticas
considerados inadequados. Impôs-lhes a para que os povos indígenas possam usu-
proibição e a vergonha de falar suas lín- fruir deste direito. “A escola não é o único
guas, de cultuar seus ritos de aprender lugar de aprendizado. Ela é uma maneira
com suas memórias. Este tipo de escola de organizar alguns tipos de conhecimen-
foi seguida por outras ordens religiosas: to para ensinar às pessoas que precisam,
salesianos, capuchinhos e outros missio- através de uma pessoa, que é o professor.
nários. Entre os séculos XVI a XVIII o papel Escola não é o prédio construído ou as
da escola era indissociável do projeto de carteiras dos alunos. São os conhecimen-
catequese, crianças indígenas foram reti- tos, os saberes. Também a comunidade
radas de suas famílias e levadas para inter- possui sua sabedoria para ser comunica-
natos missionários. No Império, o Estado da, transmitida e distribuída” (Gersem
laico preocupou-se com a domesticação Baniwa). As práticas educativas emergem
indígena, criando escolas que visavam de uma racionalidade que foi negada aos
a assimilação à “civilização”. Em 1834, a indígenas (Meliá, 1999). As pedagogias
competência da oferta da educação esco- indígenas são fundamentais na formação

594
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

das novas gerações e na transmissão de problemático índice de Desenvolvimento


saberes, valores e tradições, fortalecendo Infantil (Pochmann. 2003). Tais dados re-
as identidades étnicas, articulados com velam, apenas, uma parte da realidade
outras demandas sociais, como saúde, re- do sertão da Bahia, pois, pesquisas mais
cuperação e gestão ambiental para seus detalhadas sobre as condições de vida de
projetos de futuro. Trata-se de uma esco- sua população demonstram que a aridez
la aberta, para os tempos e movimentos da região não se restringe a uma questão
da corporalidade indígena, da vida coti- climática. É evidente a carência de recur-
diana comunitária, aberta a todos. Escola sos culturais, educacionais e econômicos.
sem muros, escola cheia de vida, prenhe A situação generalizada de vulnerabilida-
de natureza. de social destes municípios interfere na
dinâmica familiar e priva os indivíduos
Palavras-chave: Educação indígena, Educação de direitos fundamentais, assegurados
escolar, Práticas educacionais pelo Estatuto da Criança e Adolescente
Contato: Ana América Magalhães Ávila Paz, (ECA,2002). Entre os exemplos que po-
Faculdade CECAP, anapaz.uab@gmail.com dem ser citados para ilustrar essa realida-
de, pode-se encontrar o trabalho de crian-
ças e de adolescentes no sisal, temática a
MR LT06 - Mesa Redonda ser contemplada na presente pesquisa. O
trabalho no sisal é de alto risco; não raro,
Convidada vêem-se indivíduos com algum tipo de
deficiência física, decorrente do trabalho
nos motores. É, ainda, um ofício extre-
MR LT06-1504 - CRIANÇAS DO SISAL: mamente cansativo e desgastante, ainda
UM ESTUDO EXPLORATÓRIO SOBRE AS mais, considerando-se que é praticado no
CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE RISCO E sol do sertão baiano, sem qualquer tipo de
VULNERABILIDADE SOCIAL proteção. É, também, completamente ir-
Mariana Leonesy da S. Barreto - UFBA regular: o trabalhador não possui nenhum
maribarreto@gmail.com dos direitos assegurados pela C.L.T. e, se
Larisse de Oliveira Seixas - UNEB tal realidade impera entre adultos, a situa-
larisseseixas@gmail.com ção é ainda mais difícil quanto às crianças
Luciana da Silveira Barreto - UFBA e adolescentes que desenvolvem traba-
lsbarreto@gmail.com lhos com o cultivo e a extração do sisal.
É nesse sentido que o presente trabalho
O presente resumo trata do trabalho no tem o objetivo de analisar a infância nesse
sisal, feito por crianças de baixo status so- contexto específico. Há poucas pesquisas
cial e econômico, residentes no semiárido que retratam a infância de crianças que
baiano, nas regiões sisaleiras de São Do- trabalham com o sisal; justamente por
mingos e Santa Luz. Esses munícipios es- isso, entender tal realidade é importante
tão localizados no nordeste da Bahia, mais para contribuir com o desenvolvimento e
especificamente, em uma região conheci- aprimoramento de políticas públicas que
da como polígono das secas. Há, nestas ci- melhorem a qualidade de vida das crian-
dades, alto Índice de Exclusão Social e um ças do semiárido baiano. Tendo em vista

595
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

essas questões, o trabalho busca analisar também, que o sol é muito forte e, por
a realidade de crianças e adolescentes em isso, sentem muita dor de cabeça, sinto-
situação de risco social e econômico, que ma possivelmente agravado em decor-
trabalham com o motor do sisal. Para isso, rência da desidratação e da desnutrição.
adotou-se como referencial teórico uma Ao serem perguntados sobre o que mais
abordagem a sociologia da infância (ARI- gostavam no trabalho, eles indicaram que
ÉS, 1981) e a teoria das representações gostavam de voltar montados nos jegues,
sociais (Moscovici, 1978), a fim de se en- após as plantas terem sido descarregadas.
tender a diversidade e as permanências Eles afirmam, ainda, que gostam de poder
culturais, bem como, as contradições ine- ajudar os seus pais, pois, quando toda a
rentes à realidade das crianças que traba- família trabalha, eles conseguem uma
lham com o motor do sisal (Spink, 1993). maior margem de lucro; isso significa 90
Como método da pesquisa, foi realizado a 100 reais por mês. Nesse sentido, há o
um estudo descritivo exploratório, por incentivo dos pais, aos seus filhos, para
meio do qual foram entrevistados cinco que as crianças ajudem no trabalho com
participantes, com idades entre 9 a 15 o sisal. Para os pais, é um absurdo que os
anos. Os dados também foram coletados seus filhos não possam exercer essa tare-
por meio de pesquisa participante. Como fa, pois, a bolsa família ainda é insuficiente
instrumentos de coleta de dados, foram e, desde crianças, eles trabalharam com o
realizadas entrevistas semiestruturadas, sisal e afirmam: Os meus pais trabalharam
posteriormente, submetidas a análise de desde pequenos, eu também trabalhei,
conteúdo. Os dados levantados durante por que os meus filhos não podem tra-
a pesquisa apontam para o fato de que, balhar? Nesse sentido, é possível afirmar
mesmo com a cobertura dos variados que o trabalho no sisal faz parte da cultura
programas assistenciais do Ministério do da região; é um conhecimento transmiti-
Desenvolvimento Social (MDS) - tais como do de geração em geração e, infelizmente,
PETI (Programa de Erradicação do Traba- de difícil mudança. As precárias condi-
lho Infantil), Bolsa Família e CRAS (Centro ções são reverberadas no dia-a-dia dessas
de Referência em Assistência Social) - a crianças, que sofrem com a insuficiência
questão do trabalho infantil ainda se apre- alimentar, o excesso de atividade física e
senta como uma contingência inerente à acabam por faltar às aulas. Como conse-
realidade dos recortes territoriais dessa quência, constantemente, as essas crian-
pesquisa. Como reflexo dessa realidade, é ças trocam as fardas escolares pelo motor
possível identificar crianças que continu- do sisal. Desde cedo, elas se expõem a si-
am trabalhando com o sisal – pelo menos tuações de risco, mas, apesar da situação
uma vez por semana – ainda que recebam adversa que vivenciam, ainda possuem
incentivos governamentais. Para essas sonhos. Ao serem perguntadas sobre a es-
crianças, o trabalho no sisal é considerado cola e a necessidade de estudar, elas indi-
como uma atividade cansativa, perigosa e cam a importância do estudo, cultivam os
sofrida. Elas indicam que a principal difi- sonhos de ser policial militar, advogado,
culdade do trabalho é cortar o sisal, pois, professor e médico. Entretanto, ainda há
constantemente, eles se furam ao exercer aqueles que afirmam: Estudar para quê?
a tarefa. A maioria dos meninos indica, Eu sempre viverei pela roça, mesmo. Tal

596
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

realidade demonstra a falta de perspecti- contribuições para diferentes práticas


va de vida de alguns dos jovens, que pro- psicológicas e em especial para o campo
jetam o seu futuro a partir da realidade da avaliação psicológica infantil. Apesar
presente, sem analisar a possibilidade da da dificuldade de se definir a psicologia
alteração de um ciclo de vida. Acredita-se do desenvolvimento, em virtude de seu
que esse trabalho pode contribuir para vasto campo de estudo, alguns autores
um melhor entendimento da realidade afirmam que, de modo geral, trata-se da
de crianças e adolescentes que trabalham área da psicologia que estuda as mudan-
com o motor do sisal. Para pesquisas fu- ças que ocorrem no ser humano ao longo
turas, sugere-se a necessidade de realizar do ciclo vital. Tal definição levanta ques-
estudos transversais, com indivíduos de tões sobre o que muda e o que perma-
diferentes idades, que trabalharam ou nece constante ao longo da vida e sobre
ainda trabalham no motor do sisal, a fim como ocorrem tais mudanças. Diante de
de se entender melhor a cultura local. Há, tais questionamentos, permanecem anti-
ainda, a necessidade de aprimorar a efe- gas – e, por vezes, apenas aparentes – di-
tivação das políticas públicas, elaboradas cotomias tais como: a natureza universal
com o objetivo de melhorar as condições e previsível do desenvolvimento versus a
sociais, econômicas, educacionais e cultu- particularidade da experiência individual
rais das crianças e dos adolescentes que contextualizada, mudanças quantitativas
vivenciam na região. versus mudanças qualitativas ou a tão
conhecida problematização “natureza
Palavras-chave: crianças, situação de risco, versus ambiente”. Diferentes teorias as-
vulnerabilidade social sumem posicionamentos distintos em re-
Contato: Mariana Leonesy da S. Barreto, lação a essas questões, bem como enfa-
UFBA, maribarreto@gmail.com tizam diferentes dimensões do desenvol-
vimento. As mudanças desenvolvimentais
envolvem aspectos biológicos, cognitivos,
MR LT01 - Mesa Redonda afetivos e sociais, tornando seu estudo
um campo efetivamente interdisciplinar,
Convidada com aproximações em diferentes graus
com outras áreas de conhecimento tais
como a biologia, educação, medicina,
MR LT01 1491 POSSÍVEIS entre outras. Além disso, inevitavelmen-
CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA DO te, a psicologia do desenvolvimento faz
DESENVOLVIMENTO EM DIVERSOS interface com outros ramos da psicologia
CONTEXTOS DE AVALIAÇÃO e não apenas no que diz respeito a aspec-
PSICOLÓGICA INFANTIL tos teórico-metodológicos, mas também
Clara Maria M. Santos - UFRN a práticas psicológicas como, por exem-
clarasantos@yahoo.com plo, a avaliação psicológica infantil, foco
da presente atividade. A motivação para
A presente atividade tem como objetivo a organização desta mesa-redonda surgiu
apontar como conhecimentos associados da observação de que a desconsideração
à psicologia do desenvolvimento trazem de conhecimentos básicos sobre caracte-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rísticas do desenvolvimento infantil pode ciais. Todas as apresentações usarão como


levar a compreensões equivocadas de ilustrações estudos de caso, evidenciando
comportamentos e expressões de pensa- assim não apenas uma articulação entre o
mentos e sentimentos de crianças, resul- estudo do desenvolvimento humano e ou-
tando em intervenções menos eficazes. tras áreas da psicologia, mas também uma
Obviamente, essas afirmações apontam estreita interação entre teorias e práticas
para perspectiva de desenvolvimento de psicológicas.
natureza em parte previsível, ao mesmo
tempo reconhecendo que ocorre sempre Palavras-chave: Psicologia do
em contextos relacionais e sócio-histó- desenvolvimento, avaliação psicológica,
ricos, possibilitando o aparecimento do práticas psicológicas
imprevisível e das diferenças individuais.
Quatro trabalhos compõem esta mesa-re-
donda. O primeiro introduz o tema tratado CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA
nesta atividade, apresentando ilustrações DO DESENVOLVIMENTO PARA A
de comportamentos típicos de crianças COMPREENSÃO DE EXPRESSÕES
em diferentes etapas de desenvolvimen- INFANTIS EM DIFERENTES CONTEXTOS
tos, comportamentos esses muitas vezes DE PRÁTICAS PSICOLÓGICAS.
mal-compreendidos por desconhecimento Clara Maria M. Santos - UFRN
de aspectos desenvolvimentais. Os outros clarasantos@yahoo.com
três trabalhos apresentam aplicações da
avaliação psicológica infantil em diversos
contextos, a partir de diferentes referen- O objetivo deste trabalho é demonstrar
ciais teórico-metodológicos estabelecen- como conhecimentos relativos à psicolo-
do relações com diferentes aspectos do gia do desenvolvimento contribuem para
desenvolvimento. O primeiro trabalho dis- uma melhor compreensão de expressões
cute as contribuições dos princípios teóri- e comportamentos infantis. É consenso
co-metodológicos da psicologia histórico- que a criança difere do adulto. É igual-
-cultural na avaliação do desenvolvimento mente notório que crianças diferem entre
neuropiscológico. Uma segunda reflexão é si. Essas diferenças podem ser atribuídas
trazida com foco em aspectos do desenvol- a fatores que ora tendem para aspectos
vimento cognitivo inicial, problematizando biológicos, ora para aspectos sócio-cultu-
os alcances e limites do referencial teórico rais. Observa-se também que crianças de
da epistemologia genética, do método clí- uma mesma faixa etária assemelham-se
nico piagetiano e do Protocolo para Obser- em vários aspectos. Tais semelhanças po-
vação do Desenvolvimento Cognitivo e de dem, por vezes, tornar um menino hipo-
Linguagem Expressiva (PODCLE). Por fim, tético do sertão nordestino mais parecido
no último trabalho, discute-se a inserção com um garoto sueco da mesma idade,
do psicólogo no campo jurídico, notada- do que com seu irmão adolescente (Cole
mente no âmbito de questões que envol- & Cole, 2004). Esta afirmação implica as-
vem a infância, a partir da perspectiva fe- sumir que pelo menos alguns aspectos do
nomenológico-existencial para a avaliação desenvolvimento humano são previsíveis
psicológica de crianças em processos judi- e universais. Ao mesmo tempo, pode-

598
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ríamos ainda supor que aquele mesmo ceitos relevantes como os de períodos
menino sertanejo poderia diferir bastan- críticos/sensíveis do desenvolvimento e
te de seu irmão gêmeo que, porventura, o de janelas de oportunidade. O estudo
houvesse sido adotado por uma família dos casos das crianças-lobo, perdidas ou
na “cidade grande” e vivido em contex- abandonadas ainda na primeira infância
tos diferentes dos de seu irmão sertane- em florestas, ilustra de forma dramática a
jo. Assume-se, portanto, que o indivíduo importância da compreensão desses pro-
desenvolve-se sempre em contextos que cessos de desenvolvimento (Banks-Leite
o influencia e o constitui enquanto sujei- & Galvão, 2000). Outro processo central
to. Assim, no desenvolvimento humano no neurodesenvolvimento é a sinaptogê-
há espaço para o “previsível” e universal, nese. Em determinados períodos críticos
bem como para o “imprevisível” e para há uma superprodução de sinapses em
diferenças individuais (Tourinho & Neno, áreas específicas do córtex cerebral (Mu-
2006). O desenvolvimento humano en- zskat, 2006). Entretanto, se não há uma
volve dimensões biológicas, cognitivas, estimulação ambiental, esses momento
afetivas e sociais. Essas dimensões inte- ótimos para a produção de sinapses nes-
gram-se e se influenciam mutuamente, tas áreas corticais específicas são perdi-
sem limites claros entre elas. Mudanças dos, e o desenvolvimento das habilidades
ocorrem ao longo da vida em todas as cognitivas associadas a estas áreas será
dimensões do desenvolvimento, sendo alterado (Miranda & Muszkat, 2004). Esta
observadas mais marcadamente no que afirmação aponta para o fato de que o
Biaggio (1978) denomina de períodos de desenvolvimento do sistema nervoso não
transição rápida, ou seja, a infância, ado- é apenas resultado de etapas pré-estabe-
lescência e envelhecimento (Mota, 2005). lecidas, mas é também mediado, entre
Em se tratando especificamente da infân- outras coisas, pelos processos de apren-
cia, chama-se à atenção neste trabalho dizagem e de memória. Do ponto de vista
para o fato de que a não observância de neuropsicológico, a aprendizagem depen-
características típicas de crianças em di- de da quantidade de sinapses realizadas -
ferentes fases e contextos de desenvol- e não da quantidade de neurônios. É fun-
vimento pode levar a equívocos na com- damental, portanto, que os neurônios es-
preensão do comportamento infantil com tabeleçam conexões entre si, construindo
conseqüências para práticas profissionais redes neurais que possibilitam o aprendi-
voltadas para a infância. Considerando o zado. Por outro lado, as sinapses forma-
desenvolvimento inicial pode-se afirmar das são respostas a demandas da cultura,
que as potencialidades e limitações de- contextualizadas social e historicamente.
monstradas no comportamento infantil Obviamente, esses conhecimentos sobre
são consequências diretas dos diferentes o desenvolvimento neuropsicológico é de
ritmos de crescimento neuronal, mieli- fundamental importância para a atuação
nização e maturação seqüencial de regi- psicológica em áreas como a avaliação e
ões cerebrais distintas (Pappalia, Olds & reabilitação neuropsicológica. Partindo-
Feldman, 2009). Nesse sentido, a psico- -se do desenvolvimento neuropsicológi-
logia do desenvolvimento se aproxima co, um surto de sinapses entre os cinco
da neuropsicologia e compartilham con- e sete anos de idade está associado com

599
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mudanças radicais na forma de pensar (de conceitos é equivocado interpretar como


sentir e de se comportar) das crianças, re- “preconceito” o fato de uma criança acre-
ferido na teoria piagetiana como uma ditar que ser negro é ser portador de ne-
mudança de estágio de desenvolvimen- cessidades especiais porque o único cole-
to. Independentemente da perspectiva guinha negro na escola tem síndrome de
teórica adotada, é consenso que nesta Down. Ainda sobre questões morais e de
etapa da infância ocorrem mudanças que desenvolvimento psicossocial, psicotera-
tornam a criança cada vez mais parecida peutas ficam intrigados quando crianças
com o adulto. Neste trabalho, focalizamos em atendimento na abordagem humanis-
principalmente a fase de desenvolvimen- ta-existencial continuam requerendo do
to que antecede tais mudanças e tenta- terapeuta manifestações de aprovação a
mos demonstrar como o conhecimento despeito da atitude de aceitação incondi-
de características do desenvolvimento de cional do profissional (Morais, 2011). Esse
crianças pré-escolares (pré-operacionais) comportamento não os surpreenderia
contribui para um melhor entendimento tanto se considerassem aspectos típicos
da visão de mundo e de comportamentos do desenvolvimento do raciocínio moral.
típicos de crianças dessa faixa etária. Para Sem perder de vista as semelhanças en-
tanto, utilizamos exemplos baseados em tre crianças em uma mesma etapa de de-
situações reais. Um dos fatores que con- senvolvimento, é fundamental considerar
tribuem para a dificuldade de compreen- também as influências sócio-culturais que
são das crianças pré-escolares é o fato podem estar por trás do que as genera-
de que, apesar de já terem desenvolvido lizações teóricas, muito embora necessá-
habilidades lingüísticas que possibilitam rias, deixam escapar. Respostas peculiares
uma comunicação verbal relativamente dadas por crianças de diferentes regiões
satisfatória, ainda há muito a se desen- do Brasil a testes padronizados como o
volver com relação à formação de concei- WISC apontam para a necessidade desta
tos. Esses são construídos frequentemen- consideração. Acreditamos que interven-
te baseados em experiências pessoais e ções profissionais mais eficazes devem
não através do exame das características acontecer, na medida em que psicólogos
essenciais que identificam uma classe de que trabalham a serviço da infância bus-
objetos. Desse modo, ao se referir ao psi- quem na psicologia do desenvolvimento
coterapeuta como médico, a criança não subsídios teóricos e metodológicos para
está necessariamente associando a psico- sua prática profissional.
terapia ao modelo médico (Morais, 2011),
mas possivelmente tentando transformar Palavras-chave: psicologia do
o desconhecido e em algo familiar. Conhe- desenvolvimento, formação de conceitos,
cendo-se um pouco mais o processo de desenvolvimento, avaliação psicológica
formação de conceitos, entende-se tam-
bém porque crianças pequenas confun-
dem “direitos” e “deveres” (Patino, 2010),
incluindo esses conceitos em uma cate-
goria maior de “coisas que se tem que...”.
Ainda associado ao desenvolvimento de

600
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DE -se a metodologia proposta por Luria. As


CRIANÇAS COM LESÕES CEREBRAIS crianças em questão foram acompanhadas
ADQUIRIDAS: CONTRIBUIÇÕES DA no Centro de Saúde Anita Garibaldi, vin-
PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL culado ao Instituto Internacional de Neu-
Izabel Hazin - LAPEN/UFRN rociências de Natal Edmond e Lily Safra
izabel.hazin@gmail.com (IINELS). A abordagem genética do desen-
Juliana Medeiros Freire da Costa Mafra - IINELS volvimento avançada pela psicologia histó-
j_lianafreire@hotmail.com rico-cultural pode ser compreendida a par-
tir do exame de quatro premissas que sub-
O desenvolvimento da criança é um pro- jazem a toda sua produção (Eilam, 2003).
cesso complexo, contínuo e contextualiza- A primeira premissa aponta para a necessi-
do, envolvendo mudanças psicológicas e dade da utilização de método genético nas
físicas, que necessariamente precisam ser investigações acerca do desenvolvimento.
compreendidas no interior de práticas cul- O programa de pesquisa instaurado pela
turais (Hazin, 2006). Entretanto, não é pos- psicologia histórico-cultural fornece uma
sível pesquisar e construir conhecimento explicação genético-desenvolvimental do
contemplando simultaneamente todos funcionamento mental, ressaltando a im-
estes aspectos, o que constitui um desafio portância dos aspectos sócio-culturais na
para a psicologia, que pode por um lado constituição do funcionamento cognitivo
ser aprisionada numa perspectiva redu- superior. A segunda destas premissas de-
cionista, na qual um único elemento expli- fende que as funções psicológicas supe-
caria o desenvolvimento humano ou, por riores têm um suporte biológico, baseado
outro lado, resvalar para o ecletismo, no na atividade cerebral enquanto sistema
qual a consideração de uma vasta gama de aberto e plástico. Tal concepção antecipa
aspectos é igualmente contraproducente, a terceira premissa, a saber, o argumento
já que se torna impossível a compreensão que o funcionamento psicológico comple-
da participação específica de determinado xo está fundamentado nas relações sociais
domínio no curso do desenvolvimento. estabelecidas entre o sujeito e o mundo,
Isto posto, a presente proposta tem como imersos numa dimensão histórica e cultu-
objetivo central discutir acerca da contri- ral. Por fim, a quarta idéia de base, rela-
buição e pertinência de aplicação dos prin- cionada ao aspecto instrumental da psi-
cípios teórico-metodológicos da psicologia cologia histórico-cultural, argumenta que
histórico-cultural na avaliação do desenvol- as relações estabelecidas entre indivíduo
vimento infantil, notadamente em termos e mundo não são diretas, mas requerem
de aspectos inerentes ao desenvolvimento que a ação do primeiro sobre/com o se-
neuropsicológico. Para tanto, apresentará gundo, seja mediada por instrumentos
os conceitos teóricos centrais propostos ou signos, particularmente a linguagem
por tal projeto científico, o modelo de ava- verbal (Vygotsky, 1991; Vygotsky & Luria,
liação neuropsicológica decorrente de tais 1996; Hazin & Meira, 2004). A análise des-
conceitos e, por fim, discutirá acerca de tas quatro premissas permite afirmar que
conjunto de dados oriundos da avaliação a compreensão do desenvolvimento hu-
neuropsicológica de crianças com lesões mano para a perspectiva histórico-cultural
cerebrais inatas ou adquiridas utilizando- exige a consideração conjunta de níveis

601
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

distintos de análise. O nível histórico, ou cesso a um resultado final constante (inva-


da sociogênese, refere-se às aquisições so- riável); a composição complexa do sistema
ciais, históricas, culturais da humanidade, funcional sempre terá impulsos aferentes
da comunidade e do momento histórico e eferentes, ou seja, informações são re-
no qual se desvela a ação humana. O nível cebidas e respostas, de naturezas diversas,
evolutivo, ou da filogênese, diz respeito são fornecidas pelo sujeito; e o sistema
ao desenvolvimento das espécies e as es- funcional não possui uma localização cor-
pecificidades de cada uma destas. O nível tical exata, ou seja, não está confinado a
individual, ou ontogênese, refere-se ao áreas cerebrais determinadas, embora se
desenvolvimento cognitivo e sócio-afetivo possa falar de áreas corticais importantes
dos sujeitos, ou seja, a passagem da infân- para cada um dos sistemas. Nessa direção,
cia para a idade adulta e as mudanças na a proposta de Luria acerca do princípio
estrutura e nas funções mentais que ocor- de organização extracortical das funções
rem ao longo deste processo. Por fim, no mentais inaugura uma concepção de ciên-
nivel da microgênese considera-se cada cia em consonância simultânea com a tra-
fenômeno psicológico como detentor de dição neurofisiológica e com a perspectiva
trajetória própria. Utiliza-se aqui a palavra humanista. Simultaneamente, apresenta
Micro, não como para se referir a algo ne- reformulação do conflito, inerente à psi-
cessariamente pequeno, mas, sobretudo, cologia, entre as abordagens nomotética
para remeter a um nível de análise que e idiográfica, o que resultou no desenvol-
se orienta para a apreensão de minúcias vimento de concepção peculiar do fenô-
na transfomação de processos e ações do meno neuropsicológico, e consequente-
sujeito (Vygotsky & Luria, 1996). Apesar mente, na proposição de avaliação de tal
de o presente trabalho admitir que haja fenômeno igualmente inovadora.
inter-relações entre os diferentes níveis A metodologia proposta por Luria pres-
de desenvolvimento propostos pela teo- supõe a análise qualitativa do sintoma in-
ria histórico-cultural, este irá centrar-se no vestigado, o que provoca duas implicações
domínio da ontogênese, examinando, em centrais, a saber, a flexibilização da avalia-
especial, o curso da dissolução das funções ção neuropsicológica, o que possibilita sua
psicológicas superiores nos quadros de le- adaptação a cada paciente e; a necessi-
sões e/ou disfunções cerebrais, inatas ou dade, por parte do examinador, de vasto
adquiridas. Podemos resumir as propos- conhecimento acerca da organização ce-
tas neuropsicológicas de Luria afirmando, rebral e da atividade cognitiva subjacente,
portanto, que o cérebro é formado por sis- de forma a orientar o processo avaliativo
temas funcionais, caracterizados não ape- (GlozmaN, 2007). Para Luria, a habilidade
nas por sua complexidade estrutural, mas clínica e a avaliação das síndromes não po-
essencialmente pela mobilidade de suas deriam ser substituídas por testes padro-
partes constituintes (Luria,1981). Para Lu- nizados e normatizados para a população
ria, as características básicas de um siste- dita normal. A necessidade de adaptação
ma funcional consistem em que: diante da para a criança desta metodologia nos le-
presença de uma tarefa constante (invari- vou à construção de protocolo de avalia-
ável), mecanismos diferentes podem ser ção neuropsicológica qualitativa, desen-
acessados (variabilidade), levando o pro- volvido com o objetivo de fornecer subsí-

602
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dios à estruturação de plano de reabilita- a avaliação do desenvolvimento infantil.


ção, partindo da identificação de funções Tomaremos por base: 1. a aplicação das
cognitivas preservadas e comprometidas. tarefas clínicas piagetianas, 2. o Protoco-
Para tanto, cada tarefa avaliativa proposta lo para Observação do Desenvolvimen-
foi desenvolvida a partir de teoria compre- to Cognitivo e de Linguagem Expressiva
ensiva do funcionamento e organização (PODCLE) - instrumento desenvolvido a
do sistema nervoso humano. A aplicação partir dos constructos piagetianos – e 3.
de tal instrumento junto a crianças com A Bayley-III (Scales of infant and toddler
lesões cerebrais vem contribuindo para development) – instrumento desenvol-
maior compreensão acerca de formas qua- vido de modo compatível com a aborda-
litativamente atípicas de desenvolvimen- gem sócio-histórica. Para Piaget, a avalia-
to e aprendizagem, ilustrando o quanto a ção deveria centrar-se essencialmente na
combinação de abordagens quantitativo- compreensão do “como” a criança pensa,
-descritivas e clínico-qualitativa é funda- analisa situações, resolve problemas e
mental para a compreensão do funciona- responde às colocações do examinador.
mento neuropsicológico das crianças. Nesse sentido, as situações de avaliação
não são totalmente padronizadas, pois
Palavras-chave: avaliação psicológica, cabe ao profissional que avalia buscar
avaliação neuropsicológica, psicologia confirmar suas inferências acerca do ra-
histórico-cultural. ciocínio da criança ao longo do processo
avaliativo. Como a ênfase do método clíni-
co piagetiano recai mais sobre o processo
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA DA do que sobre a resposta como produto,
CRIANÇA: ALCANCES E LIMITES o foco não está sobre respostas certas
DA EPISTEMOLOGIA-GENÉTICA ou erradas, mas sobre o esforço de com-
E CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE preensão da lógica inerente às respostas
INTERACIONAL E VIDEOGRÁFICA fornecidas pela criança. Porém, apesar da
Pompéia Villachan-Lyra - UFPE flexibilidade própria do método clínico, a
lyrapomp@gmail.com avaliação é orientada pela proposição dos
Eliana Almeida - FACHO estágios de desenvolvimento da inteligên-
eligsa.almeida@gmail.com cia preconizados por Piaget. Adotando
essa perspectiva, o PODCLE representa
Esse estudo visa contribuir para a reflexão um esforço na direção de sistematização
acerca da avaliação neuropsicológica de da observação do desenvolvimento cogni-
crianças em estágios iniciais do desenvol- tivo e da linguagem expressiva nas fases
vimento a partir do referencial piagetia- iniciais do desenvolvimento, correspon-
no. Busca também destacar a relevante dendo, portanto, aos estágios sensório-
contribuição que a análise interacional e -motor e pré-operatório. A utilização do
videográfica pode trazer para a avaliação PODCLE e das tarefas clínicas piagetianas
psicológica nesses estágios do desenvolvi- tem possibilitado a realização de uma
mento. Discutiremos alguns aspectos re- avaliação do desenvolvimento cognitivo
lacionados aos alcances e limites teórico- inicial de crianças pequenas, em situação
-metodológicos destas perspectivas para de desenvolvimento normal e patológico.

603
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

No entanto, o uso desses instrumentos acontecendo até o momento da avaliação.


favorece, sobretudo, a avaliação da inte- Considerando esse quadro clínico, bem
ligência, tal como preconizado por Piaget. como o fato de ser essa uma criança que
Considerando a importância de uma com- demanda especial atenção por se comuni-
preensão mais ampla do funcionamento car de forma muito peculiar, sem que pos-
cognitivo e psicológico da criança, esse samos contar com o recurso da linguagem
instrumento apresenta importantes limi- verbal, foi feita a opção pelo uso da vide-
tações. Nesse sentido, sugerimos o uso ografia. Assim, todo o procedimento de
da escala BAYLEY-III como importante es- avaliação dessa criança foi realizado em
tratégia complementar à avaliação, que ambiente domiciliar e com uso da técnica
favorecerá uma compreensão mais am- da videografia e da análise interacional. A
pla do funcionamento cognitivo e sócio- videografia oportuniza um tipo de registro
-afetivo da criança. A BAYLEY-III constitui- permanente, que permite resgatar a com-
-se como um instrumento de avaliação de plexidade e a densidade das ações e inte-
nível de desenvolvimento, com ênfase na rações humanas, favorecendo uma maior
avaliação das seguintes áreas: cognição, compreensão do fenômeno investigado.
linguagem (receptiva e expressiva), de- Em função disso, os registros podem ser
senvolvimento motor (grosso e fino), de- analisados diversas vezes, de diferentes
senvolvimento sócio-afetivo e comporta- maneiras e de modo extremamente minu-
mento adaptativo. Dessa forma, além da cioso. Assim, é possível capturar peque-
avaliação cognitiva, essa escala favorece nos, mas importantes, detalhes das ações
também a compreensão do funcionamen- e interações envolvidos nas situações de
to psicológico infantil considerando aspec- comunicação, de manuseio de artefatos
tos do seu desenvolvimento sócio-afetivo, culturais e de competências, de um modo
bem como destaca aspectos ecológicos, geral. A análise interacional, por sua vez,
da rotina da criança e de sua família. Fa- tem como principal objetivo investigar
zendo uso desses instrumentos, traremos empiricamente as atividades dos seres
para discussão dados da avaliação de uma humanos entre si e em suas relações com
criança com alterações neurodesenvol- os artefatos culturais e com o ambiente.
vimentais. Trata-se de uma criança de 4 Fundamenta-se, principalmente, na etno-
anos, nascida no dia 01/08/2006, fruto de metodologia e na análise da conversação
um processo de fertilização in vitro (FIV), e destaca a contribuição da investiga-
do qual nasceram 4 crianças – 3 meninas ção qualitativa das atividades cotidianas.
e 1 menino. Em função da prematuridade Como resultado dessa avaliação neurop-
e de um quadro clínico bastante comple- sicológica e do uso dos recursos descritos
xo – que inclui um quadro de quilotórax, acima, apesar das dificuldades inerentes à
grave infecção, inúmeras paradas cario- faixa etária e à especificidade do quadro
-respiratórias e dieta pobre em lipídios clínico, foi possível construir uma compre-
– essa criança permaneceu internada em ensão a respeito do perfil neuropsicológi-
UTI pediátrica durante os 2 primeiros anos co da criança em análise.
de sua vida. Após esse período, sai do
hospital alimentando-se por sonda e de- Palavras-chave: avaliação psicológica;
pendendo do respirador, o que continuou método-clínico piagetiano; PODCLE; BAYLEY

604
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA DE CRIANÇAS ferentes às Varas da Infância e Juventude e


NO CONTEXTO JURÍDICO: Varas de Família. Os processos que envol-
CONTRIBUIÇÕES TEÓRICO- vem crianças constituem-se num grande
METODOLÓGICAS desafio no tocante à articulação entre o
Direito e a Psicologia. Partindo de campos
Symone Fernandes de Melo - UFRN
epistemológicos distintos, profissionais
symonemelo@uol.com.br
destas áreas lançam-se ao desafio de inter-
Ana Andrea Barvosa Maux - TJ/RN/FACEX
amaux@bol.com.br vir em casos nos quais aspectos jurídicos e
afetivo-emocionais se relacionam de forma
O objetivo deste trabalho é problematizar complexa. O trabalho, em tais casos, de-
a inserção do psicólogo no campo jurídi- monstra que, se a decisão judicial não vier
co, notadamente no âmbito da avaliação acompanhada de um movimento de com-
psicológica em processos que envolvem preensão, por parte dos envolvidos, das
crianças. Discute-se a complexidade do questões implícitas na demanda jurídica,
processo avaliativo neste campo e a rele- novos processos são originados, numa se-
vância dos aportes teórico-metodológicos quência interminável de litígios que provo-
que fundamentam a prática profissional. cam sofrimento às partes e, especialmen-
Ressaltam-se, a partir de experiência na te, por sua condição de vulnerabilidade, à
área, as contribuições da perspectiva Feno- criança. Tem-se, assim, adoções malsucedi-
menológico-Existencial e da Psicologia do das, mudanças recorrentes do sistema de
Desenvolvimento em tal contexto. A pro- guarda e visitação, falsas acusações de abu-
mulgação em 1990, do Estatuto da Criança so sexual como exemplos emblemáticos da
e do Adolescente (ECA), inspirado na Dou- complexidade que envolve este campo. A
trina da Proteção Integral exigiu do psicó- despeito da ilusória resolutividade jurídica,
logo o redimensionamento de sua atuação são muitos os processos em que todos per-
em processos judiciais em que a criança dem: a criança, os responsáveis e a própria
toma parte. A partir de então, torna-se cla- justiça. Verifica-se a necessidade de alte-
ro não se tratar apenas de diagnosticar, elu- rações no modelo tradicional/clássico de
cidar, mas especialmente de preocupar-se avaliação psicológica, de modo a adaptá-
em possibilitar um desenvolvimento ade- -lo a um contexto marcado por demandas
quado e garantir os direitos fundamentais não explícitas e, muitas vezes, por intensos
do infante (Brito, 1999). Segundo Costa e conflitos entre os atores envolvidos nos
Cruz (2005), “fenômenos e processos psi- processos. Sugere-se a perspectiva feno-
cológicos estão presentes nas organizações menológico-existencial como fundamento
de justiça, mobilizando aspectos desen- teórico-metodológico para a realização de
cadeantes dos processos judiciais que ali avaliação psicológica no campo jurídico. A
tramitam” (p. 19). As questões humanas fenomenologia hermenêutica heideggeria-
tratadas no âmbito do Direito e do judiciá- na, especialmente, concebendo o homem
rio não são meramente burocráticas e pro- como ser-no-mundo, constituído pelo cui-
cessuais, mas extremamente complexas, dado, livre e responsável por suas escolhas,
revelando situações delicadas, difíceis e oferece subsídios importantes à atuação
dolorosas (Altoé, 2001). Tais assertivas são no contexto em foco. Evidencia-se, ainda,
especialmente evidentes nos processos re- a necessidade de considerar nas avaliações

605
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

periciais aspectos do desenvolvimento in- rias singulares. Especificamente no campo


fantil. A compreensão da expressão infantil jurídico, ressalta-se a necessidade de res-
requer um conhecimento amplo do desen- tituir ao sujeito o poder de condução de
volvimento cognitivo, afetivo-emocional sua vida. No tocante aos procedimentos/
e social da criança. O processo avaliativo instrumentos utilizados no psicodiagnósti-
infantil deverá ter sempre como referência co fenomenológico-existencial, prioriza-se
as possibilidades desenvolvimentais re- a entrevista (aberta ou semiestruturada).
ferentes a cada etapa de vida. Do contrá- Considerando-se o discurso como originá-
rio, corre-se o risco de cometer equívocos rio da disposição afetiva e da compreen-
que irão ter desdobramentos importantes, são, concebe-se que a compreensibilidade
inclusive no tocante a decisões judiciais. do ser-no-mundo se pronuncia como dis-
Entende-se que, no que tange a questões curso (Heidegger, 1927/2005). Ressalta-se,
que envolvem infância e justiça, o modelo portanto, a necessidade de ouvir todos os
tradicional de avaliação psicológica mostra- envolvidos no processo. Em consonância
-se contraproducente. Destaca-se a neces- com as mudanças verificadas na noção de
sidade de uma apropriação reflexiva da infância, a narrativa da criança é valoriza-
demanda por parte dos litigantes, o que da, lançando-se mão, algumas vezes, de
exige o destecer de uma trama de significa- recursos expressivos como o brinquedo e
dos, que estão na origem dos conflitos que o desenho, formas privilegiadas de acesso
resultam na demanda judicial. A dicotomia à subjetividade infantil. Os testes, especial-
inocente versus culpado deve ser proble- mente os projetivos, são também utiliza-
matizada e revista, tendo-se sempre como dos em alguns casos, como mediadores de
norte o melhor interesse da criança. Para expressão. A interpretação da expressão da
além da instrução de processos e elucida- criança deve sempre considerar a etapa do
ção de dúvidas, propõe-se um investimen- desenvolvimento em que esta se encontra.
to da instituição judiciária na promoção Conclui-se que a proposição de empreen-
da saúde mental daqueles que buscam tal der no campo jurídico uma avalição pau-
instância para resolução de seus conflitos. tada em contribuições da Fenomenologia
É importante rever antigas concepções e e do Existencialismo revela-se delicada. As
abandonar a ideia de que a avaliação não instituições judiciais caracterizam-se sobre-
tem objetivos terapêuticos. Não há como maneira pela hierarquia de poder, objeti-
dissociar avaliação e intervenção. Na ava- vidade, neutralidade e normatividade; os
liação psicológica pautada em pressupos- prazos para consecução de avaliações são
tos da fenomenologia existencial, há uma exíguos e a interdisciplinaridade é ainda
horizontalização no tocante à relação de um desafio. Dentre os obstáculos enfren-
poder, buscando-se um engajamento ativo tados pelo psicólogo na transposição de tal
das partes envolvidas na compreensão e referencial ao campo jurídico, evidencia-se
resolução da problemática em tela. O pro- o descompasso entre o tempo jurídico e o
fissional atua no sentido de facilitar a atri- psicológico e a adoção de uma concepção
buição de novos significados ao vivido. Para de verdade distinta daquela que predomi-
Altoé (2001), é papel do psicólogo auxiliar na na organização judiciária. A despeito
as partes na procura por respostas pró- disto a Psicologia e o Direito, no dizer de
prias, dentro de suas possibilidades e histó- Trindade (2010), são “dois mundos conde-

606
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nados a entender-se”, quiçá, assim, possa- a partir da brincadeira de faz de conta (2)
mos ter processos judiciais em que todas reflexões sobre as potencialidades que se
as partes “ganhem”, a criança, os responsá- fazem e/ou podem se fazer presentes nas
veis e a instituição jurídica. práticas de cuidado e educação das crian-
ças pequenas na creche, no que se refere
Palavras-chave: avaliação psicológica; à emergência de um paradigma crítico-
psicologia jurídica, desenvolvimento. -emancipatório, com enfoque nas práticas
da autonomia (3) o lugar do choro no coti-
diano da creche.
SP LT04 - Simpósio
O MOVIMENTO DO SIGNIFICADO DO
SP LT04-1354 – PESQUISAS SOBRE BRINCAR NO GP LEFOPI
CRIANÇAS E INFÂNCIAS: DIÁLOGOS EM
Ilka Schapper - UFJF
CONSTRUÇÃO
ilkaschapper@gmail.com
Ilka Schapper - UFJF Víviam Carvalho de Araújo - UFJF
ilkaschapper@gmail.com viviamc@powermail.com.br
Michelle Duarte Rios Cardoso - BIC/UFJF
Este simpósio apresenta trabalhos de pes- dudabcc@yahoo.com.br
quisas desenvolvidas no Grupo de Pes- Patrícia Maria Reis Cestaro - UFJF
quisa Linguagem, Educação, Formação de patrícia.cestaro@oi.com.br
Professores e Infância (LEFoPI) em inter- Hilda Micarello - UFJF
locução com outro Grupo de pesquisa: o micarelo@powerline.com.br
Núcleo de Estudos da Infância: Pesquisa Mislene Carvalhais do Nascimento - UFJF
e Extensão (NEIPE/PROPED/UERJ). Tais mislenenasci@yahoo.com.br
trabalhos vêm se constituindo em torno Alexsandra Zanetti - UERJ
da temática da infância e da formação alexzanetti13@yahoo.com.br
docente que se apresenta como uma das
grandes demandas interpostas para a O presente trabalho tem por objetivo com-
educação pública nacional: a formação de preender como, no grupo de pesquisa LE-
profissionais para atuar no segmento da FoPI (Linguagem, Educação, Formação de
educação infantil.A metodologia utilizada Professores e Infância), processa o com-
consiste em sessões reflexivas, que está partilhamento de sentidos e significados
alicerçada na pesquisa crítico-colaborativa entre os participantes do grupo sobre o
como espaço de formação. Esta perspecti- desenvolvimento da imaginação, a partir
va tem por base o materialismo-histórico- da brincadeira de faz de conta. Para isso,
-dialético e as ações como práxis. A partir a discussão se centra em dois pontos: o
dessa concepção teórica e metodológica corpus teórico do grupo de pesquisa e a
optamos, então, nesse simpósio por apre- análise de um excerto, no interior de uma
sentar os seguintes temas: (1) sentidos e sessão reflexiva. A criança e suas infâncias
significados compartilhados entre os par- se transformaram em temas que, a partir
ticipantes do grupo de pesquisa LEFoPI das últimas décadas, passaram a represen-
sobre o desenvolvimento da imaginação, tar um dos grandes eixos de preocupação

607
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no cenário acadêmico, nas instituições de trução”, no período de 2006-2007, buscan-


educação infantil e, também, nas políticas do compreender como foram negociados
públicas. Mas o campo da imaginação e seu os sentidos e construídos os significados
desenvolvimento na infância, tendo como sobre o brincar entre os participantes do
eixo a brincadeira de faz de conta, têm Grupo de Pesquisa LEFoPI. Focaremos a
ainda sido pouco discutidos no panorama discussão sobre a brincadeira de faz de
educacional brasileiro. A discussão sobre conta e a imaginação, a partir da perspecti-
o desenvolvimento da imaginação infantil, va histórico-cultural. Para delinearmos me-
sob a égide da brincadeira de faz de con- lhor os estudos do grupo de pesquisa LE-
ta, pode configurar um espaço de discus- FoPI sobre o tema, discorreremos sobre as
são muito interessante, tanto do ponto de relações teóricas que o grupo teceu entre a
vista teórico quanto do ponto de vista da importância do desenvolvimento da imagi-
prática pedagógica. Em especial, no que nação no contexto da brincadeira de faz de
se refere à possibilidade de estudo sobre conta. Vigotski (1991) estudou a brincadei-
suas relações com o desenvolvimento da ra de faz de conta e a sua importância para
criança, no interior dos processos de socia- o desenvolvimento infantil, tendo como re-
lização, de (re) construção do real e de in- ferência os elementos culturais. Ao abordar
ternalização de modos, valores e costumes essa questão, aponta que a criança desen-
da produção cultural. Assim, este trabalho volve-se essencialmente através da ativida-
transitará no interregno de confluências de de brincadeira, considerando essa ativi-
entre o desenvolvimento da imaginação e dade como um fator imprescindível para o
a brincadeira de faz de conta. Trataremos, desenvolvimento dos pequenos. Postulou,
em um primeiro momento, das discussões ainda, que as transformações internas no
teóricas do grupo de pesquisa Linguagem, desenvolvimento da criança como o sim-
Educação, Formação de Professores e In- bolismo, a capacidade de representar, imi-
fância (LEFoPI) da Faculdade de Educação, tar e abstrair surgem a partir de situações
da Universidade Federal de Juiz de Fora lúdicas. Esse formato que a criança atribui
sobre: (1) a relevância da imaginação no aos objetos representados tem implicações
contexto da brincadeira de faz de conta, importantes em seu desenvolvimento, em
contribuindo para o processo de criação e especial para a (re) construção de sentidos
desenvolvimento infantil; (2) a Zona Proxi- e significados sobre o mundo material em
mal de Desenvolvimento (ZPD) como espa- que vive. Ao montar suas brincadeiras de
ço de conflitos e tensões e (3) e o compar- faz de conta, retira os elementos das suas
tilhamento de sentidos significados sobre o experiências de vida, do contexto histórico-
brincar. Para isso, trazemos algumas das re- -cultural em que está inserida, formulação
flexões teóricas tecidas pelos participantes que traz elementos novos, que não esta-
do grupo de pesquisa, a partir da perspecti- vam postos nas experiências passadas. A
va histórico-cultural, fundada nas constru- criação de novas imagens, no interior das
ções teóricas de Vigotski e Bakhtin. Depois, imagens e vivências passadas, são ele-
analisamos um excerto de uma das sessões mentos importantes para que ela possa
reflexivas da pesquisa intitulada “A vertica- inaugurar novas maneiras de compreen-
lização e a horizontalização do espaço da der e (re) inventar a realidade que a cerca,
sala de educação infantil: saberes em cons- configurando-se, também, como a base da

608
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

atividade criadora do homem. Nossa tese, de pesquisa EFoPI, reforçamos a ideia de


materializada nas discussões do grupo e que se faz importante a reflexão sobre a
respaldada na perspectiva vigostikiana, é prática e a prática da reflexão, em um mo-
que a imaginação se constitui como um so- vimento circunscrito ao contexto histórico
matório de duas imagens (a pregressa e a cultural de cada participante do grupo. As-
atual), somatório que possibilita a criação sim, as pesquisas do grupo estão fundadas
de uma nova imagem totalmente distinta em uma interlocução que busca a supera-
em cada mente humana. Numa equação ção do já rotinizado, tanto no campo da
simples, diríamos que a cena da imagina- investigação científica quanto no universo
ção se estrutura com a combinação de dois das práticas cotidianas das creches e pré-
elementos que, resultando num terceiro, -escolas.
constitui-se como algo totalmente novo.
O primeiro elemento seria configurado por Palavras-chave: sentido, significado, brincadeira
estilhaços e fragmentos da memória que
se materializam na imitação, o segundo se-
ria a vivência do sujeito no momento em AS PRÁTICAS DE CUIDADO E
que decide reconstruir essa imagem e a EDUCAÇÃO NA CRECHE: AUTONOMIA,
combinação desses dois pontos gera uma EMANCIPAÇÃO, POSSIBILIDADES...
nova imagem criada pelo humano. A ima- Lílian Marta Dalamura Gomes - UFJF,
ginação, conforme a perspectiva histórico- liliandalamura@hotmail.com
-cultural, não repete em formas e combi- Alice de Paula Macário - UFJF,
nações iguais impressões acumuladas, alice_macario14@yahoo.com.br
isoladas, mas (re) constrói, (re) cria o novo Denise Rangel Miranda de Oliveira - UFJF,
a partir das impressões anteriormente in- denisermoliveira@ig.com.br
ternalizadas. Embora a imaginação criado- Luciana da Silva de Oliveira - UFJF,
ra não seja sinônimo de memória, nela se isoliveiry@yahoo.com.br
apoia, já que as novas imagens só surgem Aretusa Santos - UFJF,
a partir das reminiscências. É interessante aretusasantos@uab.ufjf.br
notar como as questões teóricas discutidas Vanessa Almeida Stigert - PROEXC/UFJF,
no grupo atravessam as intervenções dos vanessa_stiigert@hotmail.com
pesquisadores no excerto que foi analisado
e, também, como as reflexões das educa- Este resumo apresenta reflexões sobre as
doras estão prenhas das suas experiências potencialidades que se fazem e/ou podem
vivenciadas no cotidiano das creches. Esse se fazer presentes nas práticas de cuida-
interregno de confluências entre pesquisa- do e educação das crianças pequenas na
dores e os participantes da pesquisa pos- creche, no que se refere à emergência de
sibilita, no interior dos enunciados produ- um paradigma crítico-emancipatório, com
zidos, o compartilhamento de sentidos e enfoque, neste texto, às práticas da auto-
significados construídos em interlocuções nomia. É parte de algumas das reflexões
anteriores. Acreditamos que este possa construídas no interior do Grupo de Pes-
ser um dos caminhos para diminuir o fos- quisa LEFoPI – Linguagem, Educação, For-
so entre a teoria e a prática, manifesto na mação de Professores e Infância (UFJF), que
dissociação entre o pensar/fazer. No grupo tem como pressuposto teórico a pesquisa

609
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

critíco-colaborativa, mantendo interlocu- Vigotski (2004) o educador só será capaz de


ção com o grupo de Pesquisa LACE – Lin- provocar transformações, ou novas intera-
guagem em Atividade no Contexto Escolar ções, por meio de sua própria experiência.
(PUC/SP), e, com as coordenadoras de 23 Percebemos que as concepções de infância
creches públicas de Juiz de Fora/MG. Para e criança atravessam as formas pelas quais
Santos (2010, p. 27), essa perspectiva, as ações de cuidado e educação são pla-
busca no espaço de pesquisa, “propiciar nejadas. Se a criança é vista como cidadã
elementos em que os participantes pos- futura, raramente será ouvida e atendi-
sam ter uma compreensão crítica de que da em suas singularidades. No entanto, o
tanto as circunstâncias fazem os homens reconhecimento de sua cidadania sócio-
como os homens fazem as circunstâncias”. -histórico-cultural, as diferentes especifici-
A autora (idem, p.28) acrescenta ainda que dades caracterizadas nos modos de ser, se
“A preocupação é entender a atividade de relacionar, e produzir culturas entre pares
pesquisa e de extensão em um movimen- e diferentes gerações (Sarmento, 2007),
to que possibilita a transformação da rea- exigem a consideração de que existe uma
lidade social dos sujeitos envolvidos nos dimensão política nos próprios e diferen-
processos de pesquisa”. As dimensões que tes modos de ser criança. Assim como há
envolvem o cuidar e o educar são atraves- política nos próprios e diferentes modos de
sadas por complexas redes de valores, mo- estruturar as relações de cuidado e educa-
dos de ver e se posicionar perante os ou- ção. Diferentes modos de cuidar e educar
tros, à igualdade e à diferença, assim como estão necessariamente atrelados à diferen-
às expectativas que geramos com relação tes modos e possibilidades emancipatórias
às diferentes subjetividades e aos diferen- de construção da autonomia. Há práticas
tes grupos sociais dos quais cada criança voltadas ao exercício da autonomia no âm-
ou determinado grupo de criança faz parte. bito do educar para o autocuidado que se
Como nos questiona Gentili (2001, p.69) diferem daquelas voltadas para o exercício
atuamos sobre qual educação, para qual da autonomia no âmbito político e econô-
cidadania? Nessa direção, diversas ques- mico, ou no âmbito do que Vigotski (2004)
tões são importantes para a construção de chama de autogestão. A necessidade de
uma pedagogia crítica (Contreras, 2002; educar para a autonomia é uma discussão
Freire, 1994; Giroux, 1997; Vygotsky, 2004) consensual no que se refere às reflexões
de cuidado e educação da criança peque- sobre a educação para a primeira infância.
na, envolvendo análise e reconhecimento Há um consenso de que a criança precisa
das concepções e dimensões culturais, aprender a se cuidar, a controlar os esfinc-
políticas e sociais que interferem e dialo- teres, a alimentar-se sem sujar a roupa, a
gam nos nossos modos de posicionamento utilizar o banheiro sozinha, a guardar os
perante cada criança. “Para os professores brinquedos, entre outras. No entanto,
isso significa examinar seu próprio capital quando pensamos no exercício da autono-
cultural e examinar o modo no qual este mia com relação ao educar para a emanci-
beneficia ou prejudica os estudantes. (...) pação política ou às práticas de autogestão
construindo-se um modo crítico de ensino (Vigostski, idem), chama-nos a atenção a
que empregue, e não exclua, a história e busca daquelas práticas que rompem com
prática crítica.” (Giroux, 1997, p. 39). Para o campo de segurança e certeza, perante

610
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a costumeira centralidade do adulto na to- amplos que também precisam ser trans-
mada de decisões, seja impedindo ou limi- formados. Assim, o desafio é: romper com
tando as possibilidades da criança escolher culturas historicamente instituídas, na bus-
o que realizar, para onde ir, o que vestir, ca por uma transformação que promova a
seja na definição das rotinas, na tessitura emancipação. Para isso a reflexão embasa
de argumentos e resolução de conflitos. todas as partes integrantes do processo
As dificuldades vivenciadas no exercício da crítico-colaborativo - todos os integrantes,
autonomia, tanto no espaço micro das ins- sobretudo e principalmente os pesquisado-
tituições de educação das crianças peque- res, exigindo revisão de caminhos, abertu-
nas, quanto no espaço macro das relações ra ao novo, construção de outras travessias
sociais, da qual ambas se completam, se embasadas pela solidariedade e coletivida-
intercambiam e se atravessam, reforçam de entre sujeitos, instituições e as subjetivi-
a importância de redes de colaboração dades que os atravessam.
crítica para a construção de práticas eman-
cipatórias. Corroboramos com Contreras Palavras-chave: creche, crianças, autonomia
(2002, p. 212), de que a autonomia não é
uma condição possuída a priori, mas sim
uma condição circunstancial que “tem a PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA-
ver com a forma pela qual se estabelecem CULTURAL: WALLON E O CHORO DE
as relações profissionais, tanto no âmbito CRIANÇAS NO CONTEXTO DA CRECHE
da sala de aula como em outros campos Núbia Santos - UERJ/FAPERJ
de relação e intervenção.” As creches, en- nubiapsi@ig.com.br
quanto lugar oficialmente designado para Maritza Dessupoio de Abreu - UFJF
as práticas de cuidado e educação das maritzaabreu@gmail.com
crianças pequenas, também se constituem Marília Dejanira B. Almeida - PIBIC/CNPq/UFJF
em locais econômicos, culturais e sociais, mariliaberberick@yahoo.com.br
cujas relações de poder e controle se atra-
vessam. Nesse sentido, existem interesses Neste trabalho apresentaremos parte de
políticos e ideológicos que influem na es- uma pesquisa mais ampla em andamento
truturação e natureza dos discursos nela no Programa de Pós-Graduação em Educa-
construídos (Giroux,1997), evidenciando ção da Universidade do Estado do Rio de
que não há neutralidade nas relações. Todo Janeiro – PROPED/UERJ juntamente com
relacionamento humano acontece entre o grupo de pesquisa Linguagem, Educa-
sujeitos que possuem ideologias, desejos, ção, Formação de Professores e Infância
afetos e interesses. Cuidado e educação – LEFoPI da Universidade Federal de Juiz
são, sobretudo, modos de relacionamento Fora/MG. A inquietação tem nos movido a
entre diferentes sujeitos, diferentes idades compreender os sentidos e os significados
e múltiplas especificidades. Para Contreras que o pensar sobre as atividades educati-
(2002, p.186), a emancipação não se tra- vas têm para o desenvolvimento infantil e
ta de uma conquista ou direito individual, para a (re)construção das ações desenvol-
mas, sobretudo, uma construção de inter- vidas em vinte e três creches públicas do
conexões com contextos locais, específi- referido município. Isto torna-se relevan-
cos, imediatos e os contextos sociais mais te porque na sociedade contemporânea

611
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

porque o lugar da creche vem sendo sig- supor a relevância do tema para o cotidia-
nificado a partir de outros elementos que no da creche e das relações nela estabeleci-
divergem daquele significado em tempos das. Para Wallon, há diferenças conceituais
passados, qual seja: apenas um mal neces- entre emoção e afetividade. As emoções,
sário. A metodologia utilizada para alcan- os sentimentos e os desejos são manifes-
çar o objetivo deste trabalho consiste em tações da vida afetiva. A afetividade é um
sessões reflexivas, que está alicerçada na conceito mais abrangente no qual se in-
pesquisa crítico-colaborativa como espa- serem várias manifestações. As emoções
ço de formação. Esta perspectiva tem por são constituídas de características mais
base o materialismo-histórico-dialético e específicas que as diferenciam das demais
as ações como práxis. Isso nos leva a crer manifestações afetivas. Sendo uma ativida-
que a pesquisa é uma atividade coletiva e de social, provoca, por exemplo, algumas
que os envolvidos no processo são colabo- alterações orgânicas, como aceleração dos
radores críticos. As sessões foram filmadas, batimentos cardíacos, alterações no ritmo
transcritas e estão sendo analisadas. Esco- da respiração, secura na boca, dificuldades
lhemos dialogar com Wallon, interlocutor na digestão, além de alterações expressi-
inscrito na perspectiva sócio-histórico- vas, como mudança na expressão facial,
-cultural para auxiliar na discussão sobre na postura e nas gesticulações. Nisso se
as concepções de choro e desenvolvimen- diferencia o sentimento, que não obriga-
to infantil. Lidar com o choro das crianças toriamente resulta em alterações visíveis.
evoca a concepção de infância, educação Neste sentido, que lugar ocupa na creche?
e aprendizagem que se revelam nas ações Existe possibilidade de sua expressão como
dos profissionais no cotidiano nas creches. linguagem? Como é considerado e como li-
Pressupomos, então, que o choro faz parte damos com ele? Que concepções ele pode
daquilo que convencionamos chamar de revelar nesse contexto? Estas perguntas
rotina e que deve ser problematizado para são fundamentais porque entendemos
além do momento de inserção das crianças que a formação dos profissionais da creche
pequenas nas instituições que as recebem. deve contemplar não somente os saberes
Para Wallon (2007), é no movimento do produzidos e sistematizados pela acade-
outro que a criança, ainda sem condições mia, mas também o permanente diálogo
da consciência de si e de efetuar algo por si, com outros espaços, entre eles, o contexto
que o outro, por sua ação, desencadeará a das próprias creches. As primeiras análises
ação dela. Se a emoção tem como possibili- revelaram a importância de pensar a prá-
dade a ativação do outro no processo de in- tica a partir de referenciais teóricos. Nos-
teração humana, não é difícil supor a rele- sa tentativa no movimento das sessões
vância do tema para o cotidiano da creche reflexivas foi desdobrar os nossos olhares
e das relações nela estabelecidas. É no mo- porque somente assim é possível “que se
vimento do outro que a criança, ainda sem veja do sujeito algo que o próprio sujeito
condições da consciência de si e de efetuar nunca pode ver” (Amorim, 2004, p. 14).
algo por si, que o outro, por sua ação, de- Neste processo de construir conhecimento,
sencadeará a ação dela. Se a emoção tem que é dialético, os participantes se revezam
como possibilidade a ativação do outro no nos posicionamentos ora de ouvinte ora de
processo de interação humana, não é difícil locutor, num fluxo dialógico da linguagem.

612
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Nesse movimento dialético entre ouvinte/ rante e depois do processo formal, como
locutor que o enunciado, no contexto de espaços de reflexão sobre o próprio traba-
produção da investigação, ganha novas lho, em seu próprio contexto. Mudamos o
formas de expressão e novas construções olhar para as crianças e para as políticas
coletivas. A descrição das sessões reflexivas públicas que incidem sobre elas porque o
demonstra o embate, o encontro e o de- conceito de infância passou por inúmeras
sencontro desta maneira de fazer pesquisa. transformações através da história. No en-
O conflito teoria-empiria permeia o diálogo tanto, precisamos educar o nosso olhar. É
entre pesquisadoras e coordenadoras/dire- necessário pensar no espaço da creche
toras. Isso porque está arraigada em nós a como lugar social que ganha visibilidade e
histórica cisão entre os dois campos e por- interesse, como espaço de investigação, na
que a representação do conhecimento aca- mesma medida em que reconhecemos que
dêmico e do conhecimento da experiência a criança exercita sua aparência e sua pre-
se manifesta continuamente nas sessões sença no tecido social.
reflexivas. A questão do olhar do outro foi
uma expressão recorrente, utilizada pelas Palavras-chave: choro, creche, sentido/
coordenadoras/diretoras. Na trama das in- significado
terações o olhar do outro é em parte o nos-
so olhar em um jogo que reflete e refrata.
O olhar do outro representa não somente CO 30 - LT4
a comunidade do entorno da creche, mas
dos pesquisadores, que, de tão fora que se Saúde
encontram, desconhecem também a mate-
rialidade das ações que tentam conhecer.
Como dizer para as coordenadoras que o LT04-838 – COMPETÊNCIA CULTURAL E
choro, a agressividade ou outras expres- EDUCAÇÃO EM SAÚDE: CONTRIBUIÇÕES
sões da criança estão inseridos em um con- PARA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL E
texto e que, mais interessante que focalizar ASSISTÊNCIA QUALIFICADA
a reação da criança é ler o entorno no qual Clarissa Vaz Dias - UnB
estas manifestações se expressam? Esta é a vazdias@gmail.com
inversão do olhar e o redirecionamento ne- Elizabeth Queiroz - UnB
cessário que pode produzir mudanças nas bethqueiroz@unb.br
ações com as crianças. Não há, portanto,
possibilidade de mudanças em nossas prá- Entende-se a cultura a partir de uma na-
ticas se não compreendemos os mecanis- tureza dinâmica e processual, dentro
mos/estratégias que utilizamos nas ações de sistemas psicológicos inter e intra-
diárias, dentro de um contexto específico. pessoais, considerando os sentimentos,
A opção por este modelo de investigação pensamentos e ações, e as condutas de
deve-se à premissa de que a formação uma pessoa com relação a seu meio. O
profissional não pode mais se reduzir aos desenvolvimento humano se dá através
espaços formais e escolarizados, organiza- da negociação entre a percepção e ação
dos com esse fim. Ela precisa ser concebida que unem o ator e o contexto, e as suges-
como algo que pode acontecer antes, du- tões para os sentimentos, pensamentos e

613
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

comportamentos que proliferam através uma das estratégias mais atuais que pode
da comunicação. A comunicação implica auxiliar na abordagem dos conceitos que
o compartilhamento de significado entre permeiam o processo saúde-doença e na
aqueles que se comunicam. Comunicação redução das disparidades em saúde. É um
em saúde é uma abordagem multifaceta- modelo com indicadores para o processo
da e multidisciplinar para atingir diferen- da comunicação profissional de saúde-
tes audiências que compartilham informa- -paciente que possibilita a quem trabalha
ções relacionadas à saúde, com o objetivo em saúde intervir, exercitando o conheci-
de influenciar, engajar e apoiar indivíduos, mento e buscando o diálogo interdiscipli-
comunidades, profissionais de saúde, gru- nar, para melhorar a qualidade da atenção
pos especiais, formadores de políticas pú- integral à saúde, refletindo a jornada do
blicas e o público, para instigar, introduzir, ciclo de vida. Nesse sentido, o presente
adotar, ou sustentar um comportamento, ensaio objetivou apontar a necessidade
prática, ou política que finalmente melho- de inclusão do tema competência cultural
re os resultados em saúde, sendo a edu- nas políticas públicas de educação em saú-
cação em saúde, uma das principais vias de, para o treinamento em comunicação
de acesso para a comunicação em saúde. em saúde, visando a relação profissional
A educação em saúde é um campo multi- de saúde-paciente, de forma a favorecer a
facetado, convergindo temáticas tanto da atuação norteada pelo modelo biopsicos-
educação, quanto da saúde, e abrangendo social, em equipes comprometidas com o
todo o curso de vida da diversidade popu- reconhecimento da diversidade popula-
lacional e cultural. A Organização Mundial cional e as atuais disparidades em assis-
da Saúde agrega às dimensões da promo- tência à saúde. Para tanto, realizou-se um
ção da saúde a inclusão de fatores sociais levantamento do que tem sido utilizado
que afetam a saúde, abordando caminhos pelas estratégias de educação em saúde,
pelos quais diferentes estados de saúde e fazendo uso da competência cultural para
bem-estar são construídos socialmente. a formação profissional e implementação
Por sua vez, a educação em saúde inclui de treinamentos de competência cultural
políticas públicas que orientem ações vol- com profissionais de saúde já inseridos
tadas para a formação de profissionais de nos serviços de saúde, através de uma
saúde. A competência cultural tem sido revisão da literatura, utilizando o descri-
apontada pela literatura como um conjun- tor competência cultural, indexado pelos
to de habilidades essenciais para a efetiva Descritores em Ciências da Saúde (DeCS)
promoção da saúde e educação em saúde da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), des-
em locais onde há diversidade populacio- de 1989, ano em que o termo competên-
nal. Ela é delineada a partir de uma base cia cultural, foi definido, especificamente
de conhecimentos de diversas disciplinas, em saúde, como um conjunto de com-
numa tentativa de estabelecer uma orien- portamentos, atitudes e políticas que se
tação teórica para traduzir as variáveis unem em um sistema, agência ou entre
sócio-demográficas de um dado grupo, profissionais que possibilitam ao sistema,
assim como perceber o que é específico agência ou profissionais a efetivamente
e relevante em cada etapa do desenvol- trabalharem juntos em contextos onde as
vimento humano. Competência cultural é culturas se cruzam. As práticas sociais, in-

614
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cluindo as ações com relação ao estado de LT04-840 – A EDUCAÇÃO DE


saúde são manifestações de crenças cul- PROFISSIONAIS DE SAÚDE COMO
turais e experiências de vida individual. Os PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO
achados apontam que é necessário consi- HUMANO
derar o contexto cultural onde os progra- Ana Maria Orofino Teles - FE/UnB
mas de educação em saúde e promoção anaorofino@gmail.com
da saúde são prestados, contemplando a
importância de fatores psicossociais não O desenvolvimento humano é um pro-
somente com relação a comportamentos cesso permanente, que acontece desde
de saúde, mas também as atitudes diante a fecundação do óvulo até a morte. Não
do processo de saúde e adoecimento, as-
existem momentos estáticos na vida de
sim como o impacto que a cultura, as co-
uma pessoa e, dentro de uma perspectiva
ortes e o gênero exercem sobre as ações
de entendimento subjetivo, não é inte-
das pessoas ao longo de todo o curso de
ressante pensar que o ser humano é um
suas vidas. Quando as diferenças multi-
bloco estruturado que não se modifica no
culturais são ignoradas, existe um vão no
constante devir de sua vida. Estamos sem-
processo de educação em saúde. Nesta
pre encontrando surpresas que nos mo-
reflexão, uma questão central é que aque-
les que fornecem produtos, serviços ou bilizam e nos fazem produzir novos senti-
educação em saúde, efetivamente pre- dos subjetivos (González Rey, 2002, 2004,
cisam se adequar para conversar e asse- 2005b) que instigam nossa configuração
melhar-se com quem recebe a educação, subjetiva (Idem.) e que nos transformam
e entende-se que a competência cultural permanentemente. Nosso foco, dentro
pode servir como uma estratégia para desse entendimento, tem sido o desen-
traduzir estas necessidades. A partir de volvimento dos profissionais de saúde
uma perspectiva universal, as dimensões através de sua formação, trabalhando em
da competência cultural vão bem além seu despertar como sujeito da saúde, para
de uma lista de elementos que auxiliam o que assim eles possam vir a ser pessoas
sistema de saúde. A competência cultural comprometidas com o de despertar do
representa um arcabouço organizacional, sujeito da saúde de seus próprios pacien-
estrutural e clínico que envolve e requer tes. Criamos uma categoria de pesquisa
uma compreensão da importância de in- que chamamos de “pedagogia do si mes-
fluências sociais e culturais como marca- mo” para levar em frente esse processo
dores básicos que delineiam o ciclo de de investigação sobre um modelo peda-
vida, os comportamentos e as crenças em gógico que coloque o sujeito no centro
saúde e a integração da interação destes do processo de ensino e aprendizagem. A
fatores, por aqueles responsáveis por pro- ideia é de uma pedagogia que possibilite
por, moldar e educar em saúde. que a pessoa perceba que os assuntos de
caráter humano que estuda também di-
Palavras-chave: competência cultural; zem respeito a si mesma. Dessa forma, o
educação em saúde; formação profissional conhecimento se converte em algo a ser
vivenciado e não somente teorizado, algo
a ser produzido e não somente interioriza-
do. Nossos primeiros resultados derivam

615
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da análise de um curso feito sobre essas quem prova o sabor do saber, sabe. É nes-
bases pedagógicas e indicaram que o pro- se sentido que buscamos uma estratégia
cesso de ensino/aprendizagem que não de educação para a saúde, onde o apren-
fornece fórmulas como receitas mágicas diz entra no centro do processo como su-
e, ao contrário disso, instiga e inquieta a jeito, onde o instrutor é um coordenador
pessoa permanentemente a refletir sobre e facilitador e não o detentor do saber. O
si mesma, acarreta numa produção de conhecimento é construído coletivamen-
sentidos subjetivos altamente mobiliza- te e as pessoas passam a ser responsáveis
dores de reconfigurações que agem sobre por si e também por seu aprendizado. Daí
o concreto da vida, gerando mudanças o sentido da “pedagogia do si mesmo” e
qualitativas, levando esse profissional a de uma formação como desenvolvimen-
refletir sobre sua prática clínica. Ele muda to humano. Nossa perspectiva teórica é
seu relacionamento com seu paciente, a da teoria da subjetividade de González
saindo da postura do “todo-poderoso que Rey (2002, 2004, 2005a, 2005b, 2007a,
sabe o segredo da cura”, tornando-se um 2007b), que nos fornece um entendimen-
parceiro e um construtor de diálogos clí- to histórico-cultural e uma abordagem do
nicos que conduzem o paciente a refletir ser humano em complexidade, abrindo o
também sobre si mesmo, suas rotinas e foco para uma grande angular que mira o
seu modo de vida, gerando assim mudan- indivíduo, seus processos subjetivos indi-
ças qualitativas concretas que repercutem viduais e sociais, sua história de vida, seu
nas esferas sociais, psicológicas e também momento concreto atual, sua integridade
biológicas. (Teles, 2010). Estamos numa simbólico-emocional, sua imersão dentro
fase de construção de oficinas para re- de um corpo biológico, as tensões entre
plicarmos o modelo avaliado. O primeiro o que vive como pessoa e o que o mun-
passo foi feito com profissionais de saúde do externo lhe suscita, suas contradições,
já graduados e o segundo passo investiga- etc. O nosso referencial sobre a subjetivi-
tivo será feito com estudantes das áreas dade tem pontos de encontros e possibi-
de saúde. Queremos avaliar como o con- lidades de extensão com o trabalho Edgar
ceito de saúde é transmitido nessas facul- Morin (s/d, 1996, 2000, 2008), principal-
dades, fazendo um confronto com essas mente na sistematização que faz acerca
oficinas. A hipótese é de que o modelo de da complexidade, assim como na discus-
formação é basicamente cognitivo, des- são que apresenta ao contrapor o ensino
considerando, assim, um entendimento de cabeça bem cheia ao de cabeça bem
de aprendizagem como um processo sub- feita. Em nossa perspectiva de trabalho
jetivo de desenvolvimento e transforma- buscamos “fazer” as cabeças, mais do que
ção humana. Para o direcionamento des- “enchê-las”, e isso se dá no sentido de le-
sas oficinas estamos usando a metáfora var o sujeito à reflexão, ao encontro consi-
do saber como um sabor que se prova Pre- go mesmo e, a partir daí, transformar-se.
tendemos romper com a idéia do aprovar Um processo dinâmico e permanente de
como forma de garantir que o estudante inquietação, que leve a pessoa a encon-
adquiriu o saber. A-provar seria a negação trar alternativas frente ao status quo
do provar. Em nossas oficinas estamos massificante e veiculador de ideologias
buscando o provar para conhecer, pois apaziguantes que servem aos modelos

616
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de dominação e sujeição, despertando o LT04-982 – EDUCAÇÃO E JUVENTUDES:


sujeito da ação. Quem inspira nosso pen- A ESCOLA COMO ESPAÇO PARA
sar pedagógico é Paulo Freire (1965/2003, CONSTRUÇÃO DE PROJETOS DE VIDA E
1983) com sua proposta de círculos de PROMOÇÃO DE SAÚDE
cultura. Como estamos trabalhando outro Verônica Salgueiro do Nascimento - UFC
tipo de alfabetização, que não o letramen- vesalgueiro@gmail.com
to de adultos, construímos um modelo de
círculos de ensino/aprendizagem, onde a Assinalando a significativa transforma-
alfabetização que está em jogo é a saú- ção que os jovens têm passado, Peralva
de de cada um que está em vias de se (1997) afirma que o jovem migra de um
formar como profissional desse campo. pólo onde era percebido como promes-
Buscamos o despertar para a saúde em sa de futuro, para outro lugar, passando
contraponto a uma formação que se cen- a ser visto como modelo cultural do pre-
tra na doença. Nessa estratégia de “alfa- sente. Ainda de acordo com essa auto-
betização para a saúde” lançamos mão de ra, “interrogar essas categorias permite
categorias que denominamos de funções não somente uma melhor compreensão
de vida e funções sociais. Trabalhamos a do universo de referências de um grupo
conscientização das funções vitais, tais etário particular, mas também da nova
como respiração, alimentação, sexuali- sociedade transformada pela mutação”
dade, motricidade, sono, assim como as (Peralva, 1997, p. 23). Entendemos como
funções sociais básicas, como família, tra- necessário orientar qualquer que seja a
balho, lazer, religiosidade, comunicação, proposta de trabalho com os jovens, com
propriedade, segurança, entre outras, que a clara intenção de contrapor-se a per-
são apresentadas como uma dinâmica ci- cepção de que o jovem é “rebelde sem
bernética de retroalimentação e também causa”, situação enfatizada pelo senso co-
de conscientização da pessoa sobre os sis- mum. Basearemos nossas ações no inte-
temas que vive e que cria como ser vivo resse em descobrir o que os jovens têm a
autopoiético. O desafio de questionar os falar, colaborando com a confirmação da
modelos educativos vigentes e construir condição de sujeitos concretos e capazes.
uma pedagogia para a emergência do su- Numericamente, os jovens compõem um
jeito é grande, mas instiga a pensar novas grupo significativo de nossa população.
propostas que possam ser utilizadas pelas No entanto, para além do aspecto quan-
faculdades que formam profissionais para titativo, tal grupo vem despertando inte-
a saúde, seja a medicina, a odontologia, resse nos pesquisadores, também, por ser
a fisioterapia e, inclusive, a psicologia. O considerado como um grupo vulnerável
convite é para romper com o modelo que em várias dimensões, estando presente
valoriza o dano em detrimento do ser sau- com destaque nas estatísticas de violên-
dável e em harmonia, pois acreditamos cia, desemprego, gravidez não-desejada,
que saúde não é sinônimo linear de au- falta de acesso a uma escola de qualida-
sência de sintomas. de e carências de bens culturais, lazer e
esporte. Esse quadro revela-se como pre-
Palavras-chave: educação, saúde, sujeito. ocupante, na medida em que os jovens
passam a ser referência para ênfases em

617
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dimensões problemáticas e não são ex- que estimulam a competitividade. Ao


plorados aspectos como o da criativida- aprender a trabalhar em grupo, o edu-
de e disponibilidade para a participação cando vivencia uma situação de aprendi-
social, elementos a serem mais trabalha- zagem colaborativa baseada em relações
dos com os jovens. O presente trabalho de cooperação e solidariedade. A ênfase
é fruto das atividades do Projeto de ex- da vivência desses valores com os jovens
tensão do curso de Psicologia em Sobral: faz com que os sujeitos possam se tornar
“Juventudes e escola, diálogos em tela”. A cada vez mais capazes para o exercício de-
partir de um detalhado mapeamento de mocrático e se tornem mais comprome-
informações sobre o contexto de uma es- tidos com a promoção do bem comum.
cola pública de Ensino Médio em Sobral, Acompanhando a prática docente que
região Norte do Ceará, realizado durante atribui tal relevância ao trabalho em gru-
o primeiro semestre de 2011 utilizando, po, lembro-me da contribuição de Jares
como instrumento de pesquisa, entrevis- (2007), quando este coloca que a escola,
tas com gestores, docentes e discentes. sobretudo, deve ser entendida como um
Os resultados iniciais apontaram que a espaço de convivência entre as pessoas
temática de projeto de vida traduz algo em desenvolvimento, pessoas que devem
indicado a ser trabalhado, na ótica de ser estimuladas a construir sentidos sobre
uma pesquisa participante. Essa ampla os conhecimentos já sistematizados e so-
temática contempla, também, atividades bre a relação destes com a vida, nas ins-
que dizem respeito à orientação profis- tâncias do individual e do coletivo. Por úl-
sional. De acordo com a segunda fase da timo, a contribuição da Psicologia para o
pesquisa pretende-se, ainda, desenvolver cenário escolar atual faz-se cada vez mais
ações embasadas pelo posicionamento necessária. Por essa razão, entendemos
teórico da Psicologia Sócio-histórica (Bok; que a formação do estudante de Psicolo-
Gonçalves & Furtado, 2001). Esse olhar gia deve oferecer espaços de prática que
compreende a prática da orientação pro- enfoque, também, o espaço da escola.
fissional como promotora de saúde. Ob-
jetivamos, nessa segunda fase, facilitar a Palavras-chave: Juventude; Escola; Projeto
expressão da fala dos jovens, na escola, de vida.
através da criação de espaços criativos e Contato: Verônica Salgueiro do Nascimento,
dialógicos, a respeito de práticas coletivas Universidade Federal do Ceará – Campus de
de construção de um projeto de vida. A Sobral, vesalgueiro@gmail.com
opção metodológica será por um padrão
qualitativo, que privilegia a participação
dos sujeitos envolvidos. O trabalho em
grupo será uma constante e as rodas de
conversas nortearão nossas atividades.
Da experiência do trabalho em grupo, po-
demos ressaltar a grandeza desta apren-
dizagem, principalmente, por representar
uma oposição concreta ao modelo tradi-
cional de educação, pautado em relações

618
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1268 – O ADOLESCER EM FOCO: tribuído para que práticas sociais também


AÇÕES INTERDISCIPLINARES DE se beneficiem, tornando-se mais próximas
PROMOÇÃO DE SAÚDE das diferentes realidades. Dentre estas prá-
Eliane Gonçalves Cordeiro - UNIUBE ticas destacam-se as relativas ao cuidado
eliane.cordeiro@uniube.br junto aos diferentes ciclos de vida, que his-
Luciana S. P. Menezes - UNIUBE toricamente tem sido objeto das políticas
lucianamenezespediatria@bol.com.br públicas que reconhecem o caráter multi-
Marcelo Meirelles - UNIUBE dimensional do desenvolvimento humano
dr.marcelomeirelles@yahoo.com.br propondo programas e ações interdiscipli-
Nathália B. S. Corrêa - UNIUBE nares para a efetivação da assistência e do
ricotinha17@hotmail.com.br cuidado. Dentre os ciclos de vida, a adoles-
Lilia C. Laurentino - UNIUBE cência tem sido foco, nos últimos tempos,
liliacristin@hotmail.com de propostas de educação e promoção de
Lorrayne F. Silva - UNIUBE saúde e de prevenção de danos. Porém,
Vilma M. A. Nunes Filha - UNIUBE no que diz respeito à Saúde, o adolescente
vilminhamarj@hotmail.com.br tem sido um grande ausente, por conta da
Thalita A. Queiroz - UNIUBE ausência de ações que atendam suas ne-
thalita.allstar@gmail.com cessidades e que estejam em sintonia com
sua realidade sócio-cultural. Os serviços
A discussão sobre o desenvolvimento públicos de Atenção Primária à Saúde, por
humano tem sido uma das mais transfor- exemplo, não tinham claro a quem perten-
madoras dos conceitos defendidos por cia o cuidado dos adolescentes, nem pedia-
educadores, teóricos e cientistas das mais tra, nem clínico. Não é por acaso que atu-
diferentes áreas do conhecimento, como a almente há uma especialidade, a hebiatria,
antropologia, sociologia, psicologia, medi- que inclui na formação do médico conheci-
cina, entre outras . Cada vez mais a visão mentos sobre o crescimento e o desenvol-
naturalizante do desenvolvimento humano vimento do adolescente. Esse campo, rela-
dá lugar para uma compreensão ampliada, tivamente novo e pouco conhecido fora do
que aborda o tema como um fenômeno circuito da Saúde, tem aberto espaço para
intercortado pela dimensão sócio-cultural, o surgimento de trabalhos interdisciplina-
situado historicamente, o que colocou em res de acolhimento e cuidado com ações
cheque a instituição das fases de cresci- de promoção de saúde, como é o caso do
mento e desenvolvimento como processo objeto deste resumo. O presente trabalho
linear e universal. Por essa razão, a cons- trata das atividades de promoção de saúde
trução de conhecimentos sobre o desen- realizadas junto a adolescentes, entre 11 e
volvimento humano e seus ciclos tem 14 anos, na Unidade de Atenção Básica à
requisitado a contribuição de diferentes Saúde do Município de Uberaba, MG, de-
áreas do saber, o que torna necessária a nominada George Chirré Jardim, localizada
interdisciplinaridade na sua compreensão no bairro Alfredo Freire I, II e II mantida em
e nas diversificadas práticas profissionais parceria pela Universidade de Uberaba –
que o tem enquanto objeto de trabalho, UNIUBE – e Secretaria Municipal da Saúde
ainda que resguarde suas especificidades. – SMS. Formado a partir da clínica de he-
Essas transformações conceituais têm con- biatria da referida unidade, há 18 meses,

619
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

o grupo inclui adolescentes de ambos os que participam os coordenadores e estagi-


sexos, moradores na comunidade da área ários. Nessa ocasião são decididas as estra-
de abrangência da unidade de saúde. Tem tégias e técnicas para o desenvolvimento
por objetivos: propiciar espaço de orienta- dos temas. Essa proximidade e articulação
ção interdisciplinar a adolescentes; favore- de saberes e fazeres de diferentes áreas
cer a compreensão das demandas desse tem consolidado a importância do trabalho
ciclo de vida e como elas são constituídas; interdisciplinar e propiciado o exercício do
contribuir para a formação profissional de reconhecimento da complementariedade
acadêmicos dos cursos de Medicina, Psico- dos conhecimentos e práticas para um tra-
logia e Educação Física, numa perspectiva balho que fomenta a integralidade da aten-
interdisciplinar e fortalecedora das políti- ção. Em vários momentos foi necessária
cas públicas de saúde do SUS. O grupo, de a flexibilidade e quebra de conceitos pré-
natureza aberta, sob a coordenação da mé- -estabelecidos, concebidos em outros con-
dica hebiatra da unidade e co-coordenação textos vividos pelos acadêmicos, uma vez
do médico pediatra-hebiatra preceptor, é que o grupo de adolescentes está inserido
conduzido por estagiários dos três cursos em uma realidade muito diferente da reali-
acima. Conta ainda com sistema de super- dade da maioria dos estagiários. Em várias
visão realizada por professores dos res- ocasiões, tem sido possível conferir uma
pectivos cursos para a o aperfeiçoamento certa distância entre o perfil desses ado-
técnico específico e suas interfaces com a lescentes, concretos, enredados em suas
construção da interdisciplinaridade. São re- histórias de vida, com seus valores e jeito
alizados encontros semanais com duração de estar no mundo, e os conceitos estuda-
de duas horas, ocasião em que são aborda- dos no conforto da sala de aula, obrigando
dos os temas escolhidos pelos integrantes, o exercício da reflexão e da crítica para bus-
de forma participativa e por meio de meto- car diferentes formas de trabalho, de técni-
dologia e técnicas da Dinâmica de Grupo, cas mais próximas da realidade daquela co-
de expressão, dramatização, entre outras. munidade. Essa atividade tem demonstra-
Os temas centrais escolhidos referem-se à do sua pertinência, pelo aumento gradual
sexualidade, uso de drogas lícitas e ilícitas, de adolescentes que acessam ao grupo e
relacionamento amoroso, projeto de vida. pela sua permanência ao longo do tempo;
Os estagiários participam de forma ativa e pela atualização das orientações em con-
de acordo com o plano de estágio traçado sonância com os temas; pela participação
pelo Projeto Pedagógico de cada curso no significativa nas escolhas dos temas e nos
que se refere ao tipo de vínculo do aluno encontros; pelo compromisso dos estagiá-
com a atividade. Os alunos do curso de Psi- rios no planejamento e realização das ati-
cologia permanecem três semestres letivos vidades. Os encontros têm propiciado para
na atividade o que favorece a vinculação os adolescentes o surgimento de reflexão
estreita com a proposta e seus atores. Os e de possibilidades de ressignificação de
alunos do curso de Educação Física perma- questões próprias desse ciclo de vida. Nas
necem um semestre e os alunos do curso discussões sobre projetos de vida, por
de Medicina participam dois meses em exemplo, têm sido expressas visões interes-
sistema de rodízio. O planejamento dos en- santes, como no caso das meninas, o fato
contros acontece em reunião semanal, em de valorizarem o trabalho, a autonomia,

620
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

enquanto os meninos demonstram desejar no desconhecimento e na desvalorização


a formação de família. Para os estagiários deste profissional por parte das políticas
tem sido fonte de formação e integração publicas do Estado e de suas instituições,
de conteúdos teóricos com a prática super- bem como na repressão de mercado que
visionada. Este trabalho já conquistou seu enfrenta este profissional por um hege-
espaço na prestação de serviços da referida monismo médico que, histórica e tradi-
unidade de saúde e no cotidiano dos ado- cionalmente, se encontra instalado sobre
lescentes participantes. ditas políticas e instituições. No Brasil a
saúde avança lentamente num processo
Palavras-chave: adolescência, hebiatria, social de quebra paradigmática desde a
promoção de saúde, interdisciplinaridade. concepção do SUS, alcançando, atualmen-
Contato: Eliane Gonçalves Cordeiro, UNIUBE, te, sua máxima expressão com a recente
eliane.cordeiro@uniube.br constituição do pacto pela saúde (P.SUS
Nº 399/2006), e a instauração dos Núcleos
de Apoio de Saúde Familiar (NASF), que se
LT04-1392 – A FISIOTERAPIA À LUZ DAS manifestam cada vez mais neste cenário.
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA SAÚDE NO Neste processo social é que se enfrentam
BRASIL duas forças antagônicas. Por um lado, a
Ricardo Alain Leyva-Nápoles - UnB forte tendência positivista de uma cultura
confie.fisio@gmail.com de saúde marcada por visão restrita ao pla-
Sílvia Ester Orrú - UnB, no biológico, que trata a patologia e não o
seorru@hotmail.com individuo, junto a uma cultura social que
apela pelo “curativo” e procura atendi-
A Fisioterapia é uma profissão de nível mento quando a doença já esta instalada.
superior, reconhecidamente autônoma e E por outro, os princípios e diretrizes do
regulamentada pelo Decreto-Lei n°938/69 SUS na busca de uma assistência à saúde
e Lei Federal n°6.316/75. No marco da saú- mais justa, e a conscientização da socie-
de publica sua atuação abrange promoção, dade sobre a importância da prevenção
prevenção, tratamento e recuperação e a busca de qualidade de vida. Embora
de doenças de características cinésico- os Programas de Prevenção de Saúde Fa-
-funcionais que provocam impacto psico- miliar (PSF) agreguem para a promoção e
fisiológico na saúde individual ou coletiva, prevenção na assistência de saúde que se
na área clínica quanto empresarial e/ou pretende alcançar, o SUS enfrenta desafios
à saúde do trabalhador, visando garantir no rompimento de modelos enrijecidos
melhor qualidade de vida aos cidadãos. que precisam, além da legislação especí-
Tal qual o Sistema Único de Saúde (SUS), fica, a conscientização da sociedade e de
a Fisioterapia, que é uma categoria cien- suas instituições. Destacamos que as Uni-
tífica nova, conta com quarenta anos de dades Básicas de Saúde (UBS) de atenção
existência no cenário da saúde brasileira. primaria representam a porta de entrada
Apesar de sua importância como protago- ideal da população aos serviços de saúde
nista desse contexto, atualmente, viven- e que a função fundamental do PSF é a
cia uma crise sócio-cultural, caracterizada estruturação da demanda populacional.
pela soma de fatores complexos expressos Porém, a atuação das unidades deve ser

621
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ampliada para outras especialidades, além mos terapêuticos próprios, sistematizados


de médicos, enfermeiros e agentes comu- pelos estudos biológicos, morfológicos,
nitários, possibilitando atendimento de fisiológicos, patológicos, bioquímicos, bio-
qualidade às demandas da comunidade. físicos, biomecânicos, cinésicos, sinérgico-
Esta análise do panorama atual sócio-cul- -funcionais, e cinésico-patológicos de ór-
tural da Fisioterapia e da saúde brasileira gãos e sistemas do corpo, e das disciplinas
nos leva a Moscovici (2007), autor marxis- comportamentais e sociais. Portanto, res-
ta, e seu estudo sobre as representações saltamos que a Fisioterapia não se restrin-
sociais. Esta teoria tem como uma de suas ge à realização de simples procedimentos
finalidades tornar familiar algo não-fami- mecânicos de reabilitação como se tem
liar, ou seja, tornar compreensível uma preconizado, equivocadamente, pela cul-
nova alternativa, categoria e a nomeação tura e seus meios de difusão massiva, mas
de novos acontecimentos e idéias, a partir é uma ciência complexa que exerce papel
de princípios pré-existentes e internaliza- preponderante no novo contexto que a
dos pelo individuo e pela própria socie- saúde vivencia, estendendo seus serviços
dade. A implantação do PSF evidencia a assistenciais e atuação pela promoção,
necessidade e importância da inserção do educação, prevenção e tratamento das di-
fisioterapeuta na equipe multidisciplinar, versas faixas etárias, ou seja, fazendo um
visando os objetivos da promoção, pre- percurso entre as diferentes instâncias de
venção à saúde e melhoria da qualidade atenção primária, secundária e terciária do
de vida da população. As atribuições do fi- SUS. O principio da fisiologia humana não
sioterapeuta no PSF e na atenção primária é a estática, mas o movimento. A fisiolo-
estão voltadas para a educação, prevenção gia é complexa e dinâmica, assim como os
e assistência coletiva e individual, traba- próprios processos e fenômenos sociais, e
lhando em colaboração com uma equipe a Fisioterapia segue este principio em sua
interdisciplinar. Logo, chamamos à aten- concepção, pois, é a ciência que estuda
ção para a mediação fisioterapêutica na a cinesiologia funcional, a maneira pela
saúde coletiva e individual, que representa qual o cérebro e a mente reconhecem e
uma função fundamental na formação dos utilizam o corpo como instrumento de in-
significados e conceitos que a sociedade teração com o mundo, permitindo ao indi-
desenvolve, partindo da propiciação do víduo maior compreensão de si mesmo e
encontro/confronto da sua prática, com de seu entorno. Segundo Le Boulch (1987),
as experiências diárias do usuário destes o corpo não se reduz ao mero conjunto de
serviços e com a própria concepção que o músculos e ossos, mas à expressão da cul-
SUS defende como ideal de saúde. Segun- tura de um povo ou de determinado grupo
do a regulamentação do COFFITO (1969), social. Portanto, quando profissionais da
que rege e legitima a Fisioterapia, esta é saúde tratam o indivíduo, atuam sobre a
uma ciência da saúde que estuda, previne manifestação da própria sociedade. Por
e trata dos distúrbios cinéticos funcionais conseguinte, concebemos a Fisioterapia
intercorrentes em órgãos e sistemas do em interação com uma equipe multipro-
corpo humano, gerados por alterações fissional e de forma interdisciplinar, como
genéticas, traumas e doenças adquiridas. importante canal de atuação à disposição
Fundamentando suas ações em mecanis- dos programas e unidades de Saúde da

622
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Família. Pois este profissional é um agente construto do coping. Esta permite sistema-
multiplicador de saúde, indispensável para tizar o processo de enfrentamento, com
alcançar o objetivo do desenvolvimento base em 13 categorias: solução do proble-
de uma abordagem qualitativa que conhe- ma, busca por suporte, esquiva, distração,
ça aspectos particulares e trabalhe com o reestruturação cognitiva, ruminação, de-
universo de significados, valores e atitudes samparo, afastamento social, regulação da
desenvolvidos nas relações da sociedade emoção, busca por informação, negação,
e no contexto em que estas ocorrem. Por- oposição e delegação. Nessa perspectiva
tanto, a valorização do fisioterapeuta nas desenvolvimentista, o coping passa a ter
políticas públicas de saúde e a sua inclusão um papel central e diferenciado, passando
social, principalmente no que diz respeito a entender os processos emocionais, com-
ao PSF, trará importante contribuição para portamentais, motivacionais, cognitivos e
a eficácia e a resolução dos problemas de sociais; mostrando como esses múltiplos
saúde que o SUS enfrenta na atenção pri- subsistemas regulatórios funcionam jun-
mária, contribuindo para a formação de tos para enfrentar o estresse. Motta (2007)
uma equipe qualificada e apta para pro- adaptou essas categorias para analisar as
mover e prevenir a saúde da população. estratégias de enfrentamento (EE) da hos-
pitalização em crianças com câncer; sendo
Palavras-chave: Fisioterapia, SUS, também utilizadas por Moraes e Enumo
representações sociais. (2008) para crianças hospitalizadas com
Contato: Ricardo Alain Leyva Nápoles, doenças diversas. Essa análise considera
Universidade de Brasília, confie.fisio@gmail.com que a criança usa EE acessando seus recur-
sos cognitivos, ambientais, afetivos, emo-
cionais e sociais. Além de estar afastada
LT04-1446 – O ENFRENTAMENTO DA de sua família, sua casa e seus amigos, a
HOSPITALIZAÇÃO EM CRIANÇAS COM criança deixa de freqüentar a escola, por
CÂNCER, NA CLASSE HOSPITALAR conta da longa internação e do tratamen-
Paula Coimbra da Costa Pereira Hostert - UFES to, podendo ter atraso escolar e prejuízo
paulahostert@gmail.com no desempenho acadêmico. Contudo, a
Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES criança hospitalizada possui o direito legal
soniaenumo@terra.com.br de acompanhar seus estudos e não perder
Alessandra Brunoro Motta - UFES o ano letivo, conseguindo assim continuar
alessandrabmotta@yahoo.com.br no processo escolar. Assim, a educação
Financiamento: CNPq; CAPES especial em enfermarias pediátricas tem
o objetivo de prevenir o fracasso escolar,
O estudo do enfrentamento é fundamen- bem como atender às necessidades peda-
tal para compreender como o estresse afe- gógico-educacionais do desenvolvimento
ta a vida das pessoas, especialmente o de- infantil (Fonseca, 2003; Sandroni, 2008).
senvolvimento de crianças e adolescentes, Além do aprendizado, a classe hospitalar
Skinner e colaboradores (Skinner et al., (CH) contribui na evolução do quadro clí-
2003; Skinner & Zimmer-Gembeck, 2007) nico da criança, sendo uma das formas de
propuseram, a partir da revisão de 100 humanização da hospitalização, que acele-
estudos, uma concepção hierárquica do ra a melhora do paciente e contribui para

623
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

o seu bem-estar (Almeida & Albinati, 2009; paro (0,55%), seguida pela reestruturação
Sandroni, 2008). O objetivo deste estudo cognitiva (2,22%). As estratégias de afas-
foi analisar as estratégias de enfrentamen- tamento social, oposição e delegação não
to das crianças com câncer para lidar com foram escolhidas pelas crianças. Estudar as
a hospitalização e o tratamento da doen- EE de crianças com câncer torna possível
ça, considerando o diferencial da criança saber quais os fatores que causam prejuízo
frequentar a CH como possível mediador no contexto hospitalar e se o fato de ser
do coping da hospitalização. Participaram atendida por professores da CH e dar con-
do estudo 18 crianças (14 meninos e 4 me- tinuidade aos estudos no hospital ajuda a
ninas), com idade entre 6 e 12 anos (mé- minimizar esse sofrimento. Com essa pers-
dia: 9,4 anos), diagnosticadas com câncer, pectiva, este estudo identificou, usando o
internadas por 47 dias, em média, para AEHcomp comportamentos e estratégias
tratamento no Serviço de Oncologia, e ins- de coping como diretamente ligados ao
critas na classe hospitalar de um hospital enfrentamento das situações estressantes
infantil público em Vitória, ES. Para iden- no hospital, sendo os principais compor-
tificar as EE foi utilizado o Instrumento In- tamentos: brincar, conversar, assistir TV,
formatizado de Avaliação do Enfrentamen- tomar remédio, estudar e sentir raiva. Os
to da Hospitalização - AEHcomp (Motta & cinco primeiros comportamentos ou ins-
Enumo, 2004; 2010), composto por um tâncias de coping podem ser entendidos
software com 20 cenas sobre situações co- como favoráveis ao processo de adaptação
tidianas no ambiente hospitalar, para iden- ao contexto hospitalar. Esses resultados
tificar o que as crianças fazem, pensam e corroboram com dados de outros estudos
sentem sobre a sua condição de hospita- realizados com crianças hospitalizadas: por
lização (comportamentos ou instâncias de doenças diversas, Moraes e Enumo (2008)
coping), permitindo analisar suas estraté- e por Motta e Enumo (2010) com crian-
gias de enfrentamento a partir das justifi- ças hospitalizadas com câncer; sendo os
cativas dadas às escolhas da cenas. Quanto comportamentos mais escolhidos: tomar
aos resultados, as informações coletadas remédio, conversar, rezar, chorar e ficar
na avaliação foram analisadas quantitati- triste. Diante disso, entende-se que o com-
va e qualitativamente, de acordo com as portamento de conversar sugere a busca
normas do AEHcomp, sendo que os com- de apoio; e o comportamento de tomar
portamentos brincar, conversar, assistir remédio demonstra a colaboração direta
TV, tomar remédio, estudar e sentir raiva da criança para ser curada e voltar ao seu
foram escolhidas por todas as crianças, ambiente familiar. Entre as famílias de co-
e apenas uma não escolheu a cena fazer ping ou EE mais frequentes nesta amostra,
chantagem. As cenas menos escolhidas fo- estão a distração e a ruminação, seguidas
ram: pensar em fugir (3) e sentir culpa (5). das estratégias de solução de problemas e
A partir da classificação de Motta (2007), busca de suporte. Esses resultados apoiam
a estratégia de enfrentamento mais iden- os dados das pesquisas referidas anterior-
tificada foi a distração (27,77%), seguido mente, pois encontraram a ruminação e
pela ruminação (24,44%) e solução de pro- distração como as principais estratégias
blemas (10,55%). A família ou estratégia de crianças hospitalizadas. A estratégia
de coping menos identificada foi o desam- ruminação indica necessidade de atendi-

624
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mento psicológico e assistência social para estressores, tais como o afastamento fa-
criança neste ambiente, favorecendo seu miliar, o contato com pessoas estranhas,
processo adaptativo e seu enfrentamento a restrição de atividades lúdicas, o aban-
dessa situação adversa. Como os resulta- dono da escola e a submissão a proce-
dos do AEHcomp mostraram que todas dimentos médicos invasivos (Ferreira,
as crianças escolheram comportamentos 2006). Para lidar com essa situação, estra-
favoráveis ao processo de hospitalização tégias de enfrentamento que minimizem
(brincar, conversar, assistir TV, tomar re- os prejuízos ao seu desenvolvimento são
médio e estudar), isto sugere uma possível necessárias. Dentro dessa perspectiva, o
relação favorável ao fato de freqüentar a brincar tem sido inserido no hospital, por
CH, auxiliando as crianças a utilizar essas meio do trabalho de recreadores e como
estratégias durante situações estressan- recurso para a intervenção psicológica
tes. Os estudos da área têm mostrado que junto à criança (Moraes & Enumo, 2009;
a classe hospitalar favorece uma melhora Motta & Enumo, 2010). O brincar pode
mais rápida no quadro clínico do paciente, ter efeitos positivos para crianças que
o que pode-se observar pela estratégia de vivenciam situações de estresse, medo e
coping mais identificada - a distração (San- ansiedade associadas a doenças (Motta
droni, 2008; Almeida & Albinati, 2009). & Enumo, 2004, 2010; Brown, 2001; Mi-
tre, 2004). Assim, estudos sugerem que
Palavras-chave: Estratégias de Enfrentamento; os brinquedos no hospital representem
Hospitalização Infantil; Classe Hospitalar. a vida cotidiana, tais como brinquedos
Contato: Paula Coimbra da Costa Pereira para dramatização, para construção, para
Hostert, UFES, paulahostert@gmail.com expressão artística e jogos, desde que se-
jam seguros, acessíveis e funcionais. Des-
tacam ainda o uso do videogame, por sua
LT04-1447 – O BRINCAR NO HOSPITAL E característica de incentivar a participa-
PROBLEMAS COMPORTAMENTAIS EM ção da criança, evitando seu isolamento
CRIANÇAS COM CÂNCER, NA CLASSE e favorecendo a sensação de realização
HOSPITALAR (Motta & Enumo, 2004; Mitre & Gomes,
Paula Coimbra da Costa Pereira Hostert - UFES 2004). Através da promoção do brincar
paulahostert@gmail.com no espaço hospitalar é possível modificar
Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES e melhorar o modelo tradicional de in-
soniaenumo@terra.com.br tervenção e o cuidado (Mitre & Gomes,
Alessandra Brunoro Motta - UFES 2004). Procurando verificar se o interes-
alessandrabmotta@yahoo.com.br se da criança em brincar no hospital te-
Financiamento: CNPq; CAPES ria relações com possíveis problemas de
comportamento e emocionais, este estu-
A criança com câncer é exposta a hos- do identificou as preferências lúdicas de
pitalizações prolongadas e frequentes, crianças com câncer, freqüentando uma
cujos motivos variam entre o diagnóstico classe hospitalar, e os problemas de com-
inicial, a medicação e a necessidade de portamento infantis relatados pelos cui-
tratar uma recidiva da doença. Uma vez dadores. Foram utilizados o Instrumento
hospitalizada, ela se depara com diversos Computadorizado de Avaliação do Brincar

625
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no Hospital (ABHcomp) (Motta & Enumo, não precisam de recursos ou espaço, tais
2010) – composto por um software com como assistir TV, desenhar, ouvir histórias
20 cenas de brinquedos e brincadeiras, e conversar. Já as brincadeiras menos es-
que identifica o que as crianças fazem, colhidas - brincar de fantoche, jogar bola,
pensam e sentem sobre o brincar no hos- brincar de médico e jogar boliche - são
pital, permitindo avaliar suas brincadeiras atividades difíceis de serem realizadas no
preferidas e mais realizadas no ambien- hospital. Além disso, realizar atividades
te hospitalar. Já o perfil comportamental físicas e emitir sons foi considerado por
dessas crianças foi avaliado por meio da dez crianças como impróprio para o am-
Escala Comportamental Infantil A2 de biente hospitalar, revelando a importân-
Rutter (ECI) (Graminha, 1994) – utilizada cia da implementação de políticas e ações
para a avaliação de problemas compor- que promovam o brincar neste contexto.
tamentais e emocionais das crianças. Esses dados vão de encontro aos achados
Contém 36 itens distribuídos em três tó- de estudos anteriores (Motta & Enumo,
picos: problemas de saúde (oito), hábitos 2010; Pedro et al., 2007; Furtado, 1999),
(sete) e comportamento (21). Através do pois, apesar das restrições físicas impos-
comportamento infantil, a escala identi- tas pela doença e independente da idade,
fica casos que necessitam de ajuda psi- as crianças continuam interessadas em
cológica. Classificando essas atividades brincadeiras no ambiente hospitalar. Já a
em cinco tipos de brincadeiras de acordo ECI mostrou que 11 crianças (61,1%) fo-
com Garon (1996), tem-se a seguinte hie- ram classificadas como “clínicas”; indican-
rarquia de respostas: 1) atividades recre- do a necessidade de atendimento psico-
ativas diversas (assistir TV, ler gibi, ouvir lógico. Na subescala Saúde, os itens com
histórias, cantar e dançar): 63 (33,7%); maior frequência de respostas foram:
2) jogos simbólicos (fantoches, palhaço, dor de cabeça (30,6%), dor no estômago
desenhar e médico): 39 (20,9%); 3) jogos (20,4%) e mau humor (16,3%). Já na su-
de regras (baralho, minigame, dominó e bescala Hábitos, os comportamentos que
bingo): 39 (20,9%); 4) jogos de acoplagem apresentaram respostas mais frequentes
(montagem, modelagem, recorte/cola- foram: medo (37,2%), dificuldade de ali-
gem e quebra-cabeça) (26 = 13,9%); e 5) mentação (27,9%) e dificuldade de sono
jogos de exercício (jogar bola, tocar ins- (23,3%). Na subescala Problemas de
trumentos, boliche e jogar pedrinhas): 20 comportamento, os itens mais indicados
(10,7%). As preferências lúdicas apresen- foram: medo de situações novas (8,8%);
tadas por essas crianças corroboram com estar muito preocupada e insegura e ser
dados de outros estudos. (Motta & Enu- desobediente (7,2%), além de ser impa-
mo, 2004, 2010; Furtado, 1999) As brinca- ciente e ser “agarrada” à mãe (6,8%). Os
deiras mais escolhidas no ABHcomp - as- resultados sobre problemas emocionais e
sistir TV (88,9%), desenhar (77,8%), ouvir comportamentais identificados pela ECI
histórias (72,2%) e tocar instrumentos devem ser considerados pelos serviços de
(72,2%) - foram aquelas disponibilizadas atendimento psicológico do hospital. Es-
no ambiente hospitalar, levados pelos vo- ses problemas podem estar associados ao
luntários ou pelos professores da CH. Em impacto hospitalar no desenvolvimento
geral, estas são também atividades que de crianças com câncer; pois a maior fre-

626
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

quência de comportamentos apresenta- CO 33 - LT4


dos indica sofrimento emocional e afetivo
possivelmente decorrente da hospitaliza-
Psicologia Escolar
ção. As dores de cabeça e de estômago e
as dificuldades de alimentação e de sono,
LT04-755 – INTERVENÇÃO
que podem decorrer dos efeitos colaterais
PSICOPEDAGÓGICA INSTITUCIONAL
da medicação, indicam comportamentos
EM ESCOLAS PÚBLICAS MUNICIPAIS DE
provavelmente são relacionados às con-
VALINHOS
sequências do tratamento do câncer. Da
mesma forma, os sentimentos de medo, Andreia Osti - PMV
preocupação, insegurança e impaciência andreia.osti@gmail.com
são indicativos do sofrimento emocional Cristina Andrade Ferreira Silveira - PMV
e afetivo decorrentes da hospitalização. pedcafs@gmail.com
Comportamentos, como mau humor, de-
sobediência e apego à mãe sugerem que Ao analisar e verificar um número cada
o desenvolvimento social e emocional da vez maior de crianças com queixa de di-
criança também está sofrendo impactos ficuldades para aprender, a Secretaria
da hospitalização. Concluindo, os dados de Educação do Município de Valinhos/
mostraram que o brincar no hospital SP criou em 2004, o Programa de Aten-
pode ser uma estratégia de enfrenta- dimento Psicopedagógico – PAP. O qua-
mento da hospitalização a ser estimulada dro educacional contemporâneo permite
institucionalmente, amenizando as di- constatar um crescente número de alunos
ficuldades que a doença traz à criança e que são encaminhados pelas escolas para
à sua família. Complementarmente, este avaliação especializada por não estarem
estudo mostra a relevância da avaliação acompanhando o conteúdo escolar. Essa
de problemas emocionais e comporta- realidade é percebida através dos dados
mentais de crianças hospitalizadas, pro- fornecidos por autores como Fernandez
blemas estes possivelmente decorrentes (1991), Ciasca e Rossini (2000), Polity
do tratamento, sugerindo assim como o (2002), Osti, Júlio e cols (2005), Ciasca
estudo de Parcinello e Felin (2008) que o (2006). A criação do Programa em 2004
brincar pode ajudar nesse sentido, pois visou transformar essa realidade ao aten-
através da brincadeira, a criança deixa de der os alunos encaminhados pelas esco-
ser objeto de cuidados e passa a ser sujei- las da rede por apresentarem algum tipo
to da ação, permitindo que ela se adapte de dificuldade na aprendizagem e neces-
e elabore melhor o processo de hospitali- sitarem de atendimento especializado. As
zação, contribuindo assim para adesão ao dificuldades de aprendizagem abrangem
tratamento e para a evolução do mesmo. vários fatores, uma vez que envolvem a
complexidade do ser humano (Sanchez,
Palavras-chave: Brincar; Hospitalização 2004; Cruz, 1999; Sisto e Martinelli, 2006),
Infantil; Câncer Infantil. podendo ser decorrentes de um proble-
Contato: Paula Coimbra da Costa Pereira ma fisiológico, um estresse grande vivido
Hostert, UFES, paulahostert@gmail.com pela criança, problemas com alcoolismo
ou drogas, separação dos pais, doenças,

627
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

falta de alimentação, falta de material e mente o Programa foi estruturado em


estímulos, baixa auto estima, problemas três fases. Na primeira foram resgatados
patológicos como a TDAH (transtorno os fundamentos da psicopedagogia por
de déficit de atenção/ hiperatividade), meio do estudo de textos e de grupos de
dislexias, psicopatias, alterações no de- discussão, o que contribuiu para o melhor
senvolvimento cerebral, desequilíbrios entendimento das técnicas e conceitos,
químicos, hereditariedade, problemas auxiliando a equipe no seu desempenho
no ambiente doméstico e/ou escolar. profissional. Durante a segunda fase os
Com base nessa assertiva, o Programa de profissionais atuaram na remediação das
Atendimento Psicopedagógico parte do queixas apresentadas pelas escolas, re-
pressuposto de que as dificuldades dos alizando ações para atender as diversas
alunos podem ser superadas desde que demandas envolvendo a aprendizagem
o mesmo receba atendimento especiali- e desenvolvendo ações compartilhadas.
zado direcionado às suas reais necessida- A terceira contemplou a retomada do
des, tendo por objetivo o seu progresso projeto para revisão dos casos atendidos
acadêmico. Acredita-se que o trabalho de anteriormente e estruturação de novos
prevenção, associado ao de tratamento casos. Para a efetivação do Programa a
das dificuldades, problemas e distúrbios Secretaria de Educação viabilizou a atu-
de aprendizagem possui um caráter fun- ação de profissionais da Rede de Ensino
damental para garantir a permanência e Municipal que atuavam como professo-
passagem, com sucesso, destas crianças e ras, com Especialização Lato Sensu em
adolescentes pela escola. Desta forma a Psicopedagogia, para atuarem como psi-
Secretaria de Educação do Município de copedagogas. Nesse sentido, a Lei Mu-
Valinhos procurou oferecer ações preven- nicipal 4.372/2008, Artigo 39 parágrafo
tivas e remediativas que possibilitassem III permite aos professores atuarem em
condições para o atendimento psicope- projetos educacionais, justificando então
dagógico aos alunos da Rede Pública Mu- seu afastamento da sala de aula. Conside-
nicipal. Esse trabalho tem a finalidade de rando que cabe à escola garantir a todos
avaliar, atender e intervir junto a alunos os seus alunos oportunidades de apren-
que não estivessem acompanhando o dizagem que possam promover continua-
conteúdo escolar, além de orientar dire- mente avanços escolares, em observância
tores, coordenadores pedagógicos e pro- aos princípios e diretrizes estabelecidos
fessores em como atuar com os estudan- na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
tes que apresentassem queixas escolares. Nacional (LDB 9.394/96) e no Regimento
O Programa tem como diferencial incenti- Comum das Escolas de Educação Funda-
var a participação, fortalecer a formação mental do Município é que esse progra-
e a interação, buscando o aprimoramento ma foi elaborado, dando ênfase à neces-
dos professores desta rede de ensino que sidade da mudança do olhar no campo
possuem especialização em psicopeda- educacional em relação ao atendimento
gogia para atuarem como psicopedago- de crianças do ensino fundamental. Para
gos, visando melhor atender aos alunos acompanhar e compreender o processo
do ensino fundamental que apresentam cognitivo do aprendiz, o Programa de-
dificuldades de aprendizagem. Inicial- senvolvido estruturou-se em três etapas.

628
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Num primeiro momento a escola envia ao grama e até maio de 2011, foram realiza-
Departamento Técnico Pedagógico uma dos 226 atendimentos.
ficha de encaminhamento preenchida
pelo professor da sala relatando a queixa Palavras-chave: atendimento psicopedagógico,
em relação ao seu aluno. Essa ficha é ana- ensino público, educação básica.
lisada e os alunos encaminhados passam
por uma triagem. Após essa triagem, são
realizadas avaliações para o diagnóstico, LT04-876 – PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO:
sendo confirmadas as hipóteses pode ser UMA APROXIMAÇÃO POSSÍVEL PARA A
indicado um acompanhamento específico CONSTITUIÇÃO DE SUJEITOS
pela equipe ou por outros profissionais. Anamaria Silva Neves - UFU
Por fim, a intervenção ocorre por meio de anamaria@umuarama.ufu.br
sessões com 50 minutos de duração, re- Lorena Candelori Vidal - UFU
alizadas semanal ou quinzenalmente nas lorenacvidal@gmail.com
Unidades Escolares onde o aluno recebe Taísa Resende Sousa - UFU
atendimento individual. Para isso são uti- taisa.r.s@hotmail.com
lizados como instrumentos jogos e ativi- Financiamento: FAPEMIG
dades diversas que visam melhorar as di-
ficuldades específicas da criança, tornan- O presente trabalho tem como objetivo
do assim a aprendizagem dos conteúdos central a discussão teórica que sustenta
escolares mais concreta, lúdica e pontual. a díade Psicanálise e Educação, como ar-
Em reuniões semanais o grupo troca ex- gumentação possível sobre as estruturas
periências e discute sobre os atendimen- afetivas e o desenvolvimento do sujei-
tos realizados, com objetivo de esclare- to. Trata-se do recorte de uma pesquisa
cer os casos e diversificar as estratégias, financiada pela Fapemig, cujo objetivo
promovendo modificações na dinâmica e geral é compreender as representações
manejo instrumental (preparação de ma- tecidas por educadoras da educação in-
teriais e atividades) utilizados nos atendi- fantil sobre a violência sexual incestuosa,
mentos. Os avanços observados nas crian- com especial interesse sobre os sentimen-
ças são apresentados aos coordenadores tos emergidos e as iniciativas assumidas
das escolas e professores em devolutiva diante da suspeita da violência vivencia-
trimestral. Este trabalho tem contribuído da pelos alunos. A eclosão da Segunda
para a melhora do desempenho acadêmi- Guerra Mundial (1939-1945) propagou e
co dos alunos atendidos, o que reforça a difundiu a Psicanálise pelo mundo. A te-
importância da ampliação e continuidade oria freudiana foi sendo conhecida por di-
do Programa. Entre 2006 e 2009, 460 alu- versas pessoas, de diferentes segmentos,
nos foram atendidos, desses, 75% foram e os seus conceitos sendo apropriados em
dispensados do atendimento por apre- cenários ampliados. Para se pensar a Psi-
sentarem progresso em seu desempenho canálise, é fundamental que se retome as
acadêmico e por terem condições, após suas origens: Freud, o pai da Psicanálise,
as intervenções, de acompanhar os con- que se dedicou aos estudos dos sentidos
teúdos trabalhados em sala de aula. Em ocultos dos fenômenos, eclodindo na sus-
2010, 178 crianças participaram do Pro- tentação fundamental do inconsciente e

629
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sua dinâmica. No decorrer de sua obra, Psicanálise e Educação. Contudo, afirma


Freud alicerçou uma possível aproxima- que a tarefa primeira da educação é pos-
ção entre Psicanálise e Educação - mesmo sibilitar que a criança aprenda a controlar
não tendo desenvolvido, extensivamente, seus instintos, devendo “inibir, proibir e
uma explanação sobre o tema - e ofere- suprimir, e isto ela procurou fazer em to-
ceu alguns elementos muito importan- dos os períodos da história” (p.182). Po-
tes. Em seu texto, O interesse Científico rém, a educação deveria “atingir o máxi-
da Psicanálise (1913), Freud afirma que mo, com o mínimo de dano. Será, portan-
“a psicanálise trouxe à luz os desejos, as to, uma questão de decidir quanto proibir,
estruturas de pensamento e os processos em que hora e por que meios” (p.182).
de desenvolvimento da infância” (p.224). Freud pensou a relação entre Psicanálise
Pensando as crianças de maneira diferen- e Educação, sob a perspectiva do que a
te, considerando suas disposições para Psicanálise poderia influenciar ou ser apli-
perversões, a curiosidade sexual, o com- cada à educação. Entretanto, seus estudos
plexo de Édipo, o erotismo anal, o amor foram de inegável importância. Almeida
a si próprio (ou “o narcisismo”), entre (2001) afirma que as descobertas da Psi-
outros, Freud inaugurou uma nova forma canálise, em relação à questão do incons-
de se entender a infância. Na Conferência ciente, permitiram pensar o sujeito sob
XIII: Aspectos arcaicos e Infantilismo dos uma perspectiva diferente das de outras
sonhos (1916), Freud aponta que nenhu- ciências sociais e humanas, considerando-
ma barreira existe desde o início da vida -o como o sujeito da cultura ou o sujeito
dos indivíduos. Tais censuras vão sendo social; pensando-o como sujeito do de-
gradualmente estabelecidas, durante o sejo, sujeito do inconsciente, sujeito da
processo de desenvolvimento e educação. falta. Zibetti (2004) afirma que as crianças
“Todas as manifestações sexuais de uma possuem o desejo de saber, que “tem sua
criança são prontamente, energicamen- origem na investigação sexual que precisa
te suprimidas pela educação” (p.251). ser inconscientemente reprimida e que,
Em Algumas reflexões sobre a Psicologia portanto, é deslocada de objetos sexu-
Escolar (1914), Freud narra sobre o seu ais para objetos não-sexuais” (p.224). As
percurso escolar e expressa uma gratidão crianças vão investigando, perguntando,
aos seus educadores, apontando que, na indagando, em busca de um domínio do
fase escolar, os professores se tornam pais saber; estimuladas pela força pulsional. E,
substitutos. As crianças transferem, para na busca de uma resposta, conjetura-se
estas figuras, sentimentos que remetem à que há um outro, que colocado na posi-
imago parental e à infância; e, depois, co- ção de educador, recebe importância es-
meçam a tratá-los como tratavam os pais, pecial. A autora afirma que os educadores
confrontando o que já adquirira com am- exercem forte influência sobre os alunos,
bivalência. “Estávamos, desde o princípio, “oriunda da transferência de sentimen-
igualmente inclinados a amá-los e a odiá- tos que a criança dirigia ao pai” (p.224).
-los, a criticá-los e a respeitá-los” (p.286). Para a Psicanálise, só é possível se pensar
Na Conferência XXXIV: Explicações, Aplica- a constituição de um sujeito, a partir do
ções e Orientações (1933), Freud lamenta olhar, do investimento, de um mínimo de
por não ter contribuído muito para o tema gozo necessário do Outro. Segundo Laznik

630
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(2010), a constituição do sujeito é possível, um sujeito, abandona técnicas de adestra-


apenas, no campo do Outro; apontando “o mento e adaptação” (p.19). É importante o
gozo do Outro como um elemento consti- refinamento da escuta junto a esses sujei-
tutivo do aparelho psíquico” (p.143). As- tos, assim como uma aproximação genuí-
sim, é fundamental esse investimento do na entre Psicanálise e Educação. A escola,
Outro para que o indivíduo possa emergir neste sentido, pode configurar um lócus
como sujeito. Neves (2009) aponta que a que, para além da transmissão de conhe-
família “é um grupo primordial no âmbito cimentos, corrobore para a construção de
do desenvolvimento de sujeitos psíquicos novos espaços afetivos, com as (re)edições
singulares” (p. 34). E, enquanto instituição das relações vinculativas e com a constitui-
primária, ela é um espaço fundamental ao ção novos sujeitos.
desenvolvimento de seus membros. Ini-
cialmente, as redes vinculativas são viven- Palavras-chave: Psicanálise, Educação, sujeito
ciadas nessas relações familiares e podem Contato: Taísa Resende Sousa, UFU
ser, posteriormente, reeditadas nos outros taisa.r.s@hotmail.com
espaços afetivos, que poderão ser expe-
rienciados pelos sujeitos. Assim, a escola
poderá emergir como instituição secundá- LT04-1049 – VALIDADE DO ZULLIGER
ria fundamental, podendo contribuir para NA AVALIAÇÃO DA COMPETÊNCIA
a constituição desses sujeitos, singulares e INTERPESSOAL
únicos; e para a construção de novos es- Jucelaine Bier Di Domenico Grazziotin -
paços afetivos. A escola pode representar Comercial Di Domênico Ltda.,
uma instituição de amparo, de referência jucelainegraz@terra.com.br
à família, com algumas funções específicas Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS
na mediação e produção desses outros es- silvanalba@upf.br
paços afetivos. Soares (2004) afirma que,
considerando a escola como um espaço A avaliação psicológica é uma prática fre-
de escuta desses sujeitos implicados no quente no contexto organizacional, pois
contexto educacional, pode-se pensá-la possibilita melhor compreensão das habi-
como um lugar de prevenção, uma vez que lidades do indivíduo, do seu funcionamen-
a educação “é uma forma de discurso so- to psicológico e, ainda, dos aspectos predi-
cial e através dele podemos escutar como tivos do desenvolvimento de seu compor-
o sujeito contemporâneo vai orientando tamento. Atualmente, as habilidades de
seu desejo” (p.206). E, assim, pode-se competência interpessoal nesse âmbito,
pensar uma aproximação entre a Psica- passaram a ser um requisito imprescindí-
nálise e a Educação; e como a Psicanálise vel em todos os níveis ocupacionais, desde
poderá colaborar, de alguma forma, neste aquele que atende à comunidade externa
processo. Kupfer (apud Santos, 2002) afir- à empresa como aos clientes e ao público
ma que a Educação pode contribuir para em geral, até aqueles que convivem diaria-
a constituição do sujeito singular e único, mente com o público interno, no mesmo
não importando qual papel social que o setor e intersetores. Assim, a competência
mesmo ocupa. A autora (1995) afirma que interpessoal é a habilidade de lidar eficaz-
“quando um educador opera a serviço de mente com as relações interpessoais, de

631
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lidar com outras pessoas de forma ade- (movimento cooperativo) que, por hipóte-
quada às necessidades de cada uma e às se, estariam correlacionadas com os fato-
exigências da situação. Perceber de forma res de Habilidade IHS: F1) autoafirmação
acurada uma situação e suas variáveis per- e enfrentamento com risco; F2) autoafir-
mite que o sujeito desempenhe melhor o mação na expressão de afeto positivo; F3)
seu trabalho, tanto na dimensão técnica conversação e desenvoltura social; F4) au-
requerida pela natureza dessa atividade toexposição a desconhecidos e situações
quanto na de ser capaz de se posicionar novas; F5) autocontrole da agressividade
de forma habilidosa na rede de relações em situações aversivas. Participaram deze-
interpessoais, interna e externa, no local nove sujeitos, entre 18 e 43 anos de idade,
de trabalho. A competência interpessoal média 27,5 anos (DP=8,83), dez (53%) do
é revelada nas relações estabelecidas en- gênero feminino e nove (47%) do gênero
tre indivíduo-indivíduo e indivíduo-grupo, masculino, quinze (78,94%) com ensino
englobando assim atitudes individuais e médio completo e quatro (21,05%) ensino
coletivas, sendo estas jamais indissociá- médio incompleto. Todos exerciam ativi-
veis. Desse modo, para avaliar o desen- dades de atendimento direto ao cliente
volvimento e a aquisição da competência em uma loja de uma rede de supermer-
interpessoal é necessário a utilização de cados. Destes, sete (36,84%) na função
instrumentos válidos, que reúnam um de operadores e frente de caixa; sete
conjunto de evidências que assegurem a (36,84%) como atendentes de perecíveis
sua relevância, a sua utilidade nos usos e cinco (26,31%) no cargo de atendentes
propostos e nas interpretações geradas. de loja. Os participantes responderam ao
É nesse contexto, que o teste Zulliger no ZSC seguido pelo IHS, de forma individual
Sistema Compreensivo ZSC se insere, es- em uma única sessão. Nos resultados, em
pecialmente por integrar diversos aspec- relação ao ZSC, apenas as variáveis SumT e
tos da personalidade, com base tanto nos Isolamento oscilaram entre os parâmetros
preceitos da psicometria, como nos da normativos. Também os fatores do IHS,
projeção e por possibilitar uma investiga- mantiveram-se nos índices normativos.
ção mais completa do universo psíquico Os resultados, além disso, demonstraram
do examinando, tão solicitada no campo que os indicadores GHR, GPHR, pure H,
empresarial. Assim sendo, o objetivo des- Sum H, que informam sobre o bom re-
te estudo foi verificar as evidências de vali- lacionamento e percepção interpessoal
dade do Zulliger no Sistema Compreensivo adequada, correlacionaram-se positiva e
ZSC, focalizando a variável relacionamen- significativamente com fatores GIHS, F3 e
to, a saber: SumT (sombreado textura); Fd F1 do IHS. A variável COP, apesar de não
(comida ou ação de comer); H (humano ter apresentado índices significativos de
inteiro), Hd (detalhe humano),(H) (para- correlação com o IHS, apontou aspectos
-humano inteiro), (Hd) (detalhe para-hu- positivos qualitativamente, manteve-se na
mano); GHR (boa representação humana) média normativa e em comparação à AG,
e PHR (representação humana pobre); a mostrou-se superior. As variáveis AG, PHR,
(movimento ativo) e p (movimento passi- SumT, que podem informar sobre o rela-
vo); (isolamento); PER (resposta persona- cionamento e a percepção interpessoal
lizada); AG (movimento agressivo); COP prejudicados, correlacionaram-se negativa

632
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e significativamente com os fatores GIHS são “paixão de formar” para caracterizar a


e F5 do IHS. Portanto, sendo a idéia prin- prática daqueles professores que se dedi-
cipal desse estudo, verificar as evidências cam com entusiasmo, que se identificaram
de validade do ZSC em correlação com os com a profissão e são bem-sucedidos na
fatores do IHS, que teoricamente avaliam transmissão de conhecimento, o presente
construtos similares, relacionamento e trabalho buscou olhar mais de perto para
habilidade social, a correspondência dos os psicólogos que escolheram se inserir
resultados obtidos entre os instrumentos, no ambiente escolar, que seguem nesta
forneceu uma importante contribuição área e que são reconhecidos como bem-
para a sua legitimidade. Por fim, mesmo -sucedidos em suas práticas, ou seja, con-
sendo um estudo de caráter preliminar, os forme a autora, que sejam profissionais
resultados contribuíram para afirmar a va- “apaixonados” pelo que fazem. Portanto,
lidade do Zulliger na avaliação psicológica o problema central da pesquisa que re-
da competência interpessoal no contexto sultou no Trabalho de Conclusão de Curso
organizacional. da autora, pode ser traduzido na seguinte
pergunta: como se constitui a paixão pelo
Palavras-chave: Competência Interpessoal, exercício da Psicologia no ambiente esco-
Zulliger no Sistema Compreensivo, Evidência lar? Para respondê-la foram realizadas en-
de validade trevistas com cinco psicólogas que foram
Contato: Jucelaine Bier Di Domenico tratadas por análise de conteúdo por ca-
Grazziotin, Comercial Di Domênico Ltda., tegorização. Para discutir a questão teori-
jucelainegraz@terra.com.br camente, foi levantado um breve histórico
da atuação do psicólogo na área escolar,
assim como as questões que levam a uma
LT04-1397 – A PAIXÃO PELO EXERCÍCIO escolha profissional, a partir de Bohosla-
DA PSICOLOGIA NO AMBIENTE ESCOLAR visky (1977). Também foram trabalhadas
Letícia Wilke Franco - UNISINOS/UFRGS considerações sobre o conceito de paixão,
leticiawfranco@gmail.com buscando na psicanálise um suporte teóri-
Márcia E. Wilke Franco - CESUCA co para seu entendimento. Em seguida, a
partir de articulações teórico/práticas com
O campo de trabalho do psicólogo é bas- as falas das entrevistadas, pode-se chegar
tante abrangente e diversificado. Encon- a algumas formulações finais sobre o que
tramos possibilidades da sua intervenção leva essas profissionais a se “apaixona-
na área jurídica, do esporte, do trânsito, rem” pelo trabalho no campo da educa-
da clínica, hospitalar, empresarial, esco- ção, mais especificamente dentro da esco-
lar, entre outras. Cada área tem as suas la. Partindo de uma análise inicial das falas
demandas e práticas, específicas ou não, das psicólogas entrevistadas foram criadas
e cada profissional procura atuar na área quatro categorias a fim de orientar a aná-
que condiz com a sua afinidade, formação lise e discussão dos achados. As categorias
ou mesmo oportunidade. Inspirando-se foram formadas a partir da importância
em Maria Cecília Pereira da Silva, a qual, teórica da questão em análise e da recor-
no seu livro “A paixão de formar: da psica- rência nas respostas das entrevistadas. A
nálise à educação” (1994), utiliza a expres- primeira categoria foi intitulada HISTÓRIA

633
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

DE VIDA, onde apareceu que a identifica- e permanência na Psicologia Escolar, elas


ção com figuras da infância é de grande va- trouxeram questões sobre o trabalho ser
lor teórico para entender a paixão no exer- gratificante, prazeroso, envolvente, ser
cício profissional. A história de vida como uma realização. Também apareceram ex-
um ponto determinante para uma escolha pressões como acreditar no trabalho nes-
e inserção nesse campo de trabalho apa- te campo, ter um retorno, ver resultados
receu em duas entrevistadas. Quando se e poder fazer a diferença. Além disso, foi
remete à escolha de algo, as MOTIVAÇÕES trazido por mais de uma entrevistada “as
INCONSCIENTES estão presentes, portanto possibilidades de trabalhar com muitas
esta é a segunda categoria. É neste cam- frentes da psicologia” (sic). Através das fa-
po (do inconsciente) que se encontram las das psicólogas entrevistadas consegue-
as identificações, tratadas também na -se vislumbrar parte do que elas entendem
categoria anterior já que a identificação por Psicologia Escolar. Este trabalho não se
com outro é o que faz a história de vida propôs a investigar essa questão, porém
ser determinante para algumas entrevista- é interessante evidenciar um ponto que
das. Também apareceu a transferência da todas as cinco entrevistadas trouxeram:
paixão pela área através de um supervisor a prevenção como talvez sendo a grande
local de estágio. Essa transferência pode possibilidade de suas práticas. Esta pes-
ser entendida como uma transferência de quisa suscitou alguns temas pertinentes
aprendizagem positiva, onde os processos a outros estudos. Um dos pontos interes-
de aprendizagem adicionaram algo à sua santes é o que diz respeito à organização
prática (Laplanche; Pontalis, 1967). Na ter- curricular da graduação em Psicologia. O
ceira categoria, FORMAÇÃO ACADÊMICA, ensino das diversas disciplinas do curso é,
apareceu mais especificamente os Está- em sua maioria, ministrado por professo-
gios em Psicologia Escolar como de grande res que atuam ou que tem uma passagem
importância. Todas identificaram a partir significativa na área correspondente. Pen-
de seus estágios o interesse em continuar sando na transferência de aprendizagem
na área e mais que isso: o surgimento da colocada anteriormente, o ideal é ter au-
paixão por este lugar. A CONFORMAÇÃO las de Psicologia Escolar com um professor
DA PAIXÃO é a quarta categoria discutida. que, além de ter estudo nessa área, atue
Com a análise desta categoria podemos vi- na escola. Às vezes falta na graduação esse
sualizar o “processo de apaixonamento” e docente que esteja engajado nesta área
o desejo e a necessidade como questões ou ainda que transfira o conhecimento e
importantes para essa conformação e toda a gama de sentimentos e realidades
confirmação da existência da paixão. Por que perpassam sua prática. Não pode ficar
fim fala-se do exercício “viciante” da Psi- de fora dessa discussão a importância da
cologia dentro da escola. A conformação inserção do psicólogo no sistema público
da paixão traz mais um ponto interessante de educação. Nesse trabalho foram entre-
a ser refletido: as psicólogas entrevistadas vistadas somente profissionais do sistema
são conscientes da paixão que possuem privado. Mas será que não existem psicó-
pelo exercício da Psicologia no ambiente logos apaixonados na educação pública?
escolar. Quando perguntado como as en- Com certeza existe, porém se torna com-
trevistadas definem o seu apaixonamento plicado até mesmo localizá-los, já que as

634
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

suas práticas às vezes ficam vinculadas às ção de significados acerca de si próprios,


Secretarias de Educação e Saúde dos mu- do outro e da realidade. De acordo com
nicípios, onde os psicólogos prestam ser- Vygotsky (2000), nos constituímos atra-
viços às escolas. Também ocorrem os cha- vés dos outros, os fenômenos psíquicos
mados “desvios de função”, o que acontece especificamente humanos são oriundos
muito dentro da educação pública brasilei- da mediação entre a história social e a ex-
ra. Pensando na realidade brasileira, se faz periência individual e concreta dos sujei-
necessária a inserção deste profissional tos, realizada por meio de relações sociais
dentro do contexto da comunidade onde a partilhadas. No contexto acadêmico, no
escola se encontra, inclusive na produção entanto, tradicionalmente trabalha-se a
de conhecimento desta área. Assim esse partir de concepções de educação que vi-
conhecimento conseguirá ser utilizado a sam a transmissão de conteúdos, a indivi-
fim de pensar práticas no contexto social dualização no processo de aprendizagem,
e cultural em que se encontra a maior par- a padronização e a localização no indiví-
te da população brasileira, principalmente duo das responsabilidades pelo sucesso
quando se tem a grande possibilidade de ou fracasso acadêmico (Kuenzer, 2000).
trabalhar em termos de prevenção, como Tais concepções geram problemáticas que
trouxeram as entrevistadas. muitas vezes dificultam o pleno desenvol-
vimento dos sujeitos. Estudos apontam
Palavras-chave: Psicologia Escolar, escolha que ao ingressar neste contexto, os alunos
profissional, ambiente escolar. enfrentam diversas dificuldades relaciona-
Contato: Letícia Wilke Franco, UNISINOS/ das à dinâmica do processo educativo, as
UFRGS, leticiawfranco@gmail.com quais geram reprovação, evasão e desmo-
tivação em relação à formação acadêmica
(Ferreira, Almeida & Soares, 2001; Serpa &
LT04-1459 – DESENVOLVIMENTO Santos, 2001; Witter, 2002). Cunha e Car-
HUMANO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: rilho (2005) afirmam que de maneira ge-
CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA ral, os alunos ao ingressarem na Educação
ESCOLAR Superior levam com eles uma expectativa
Alciane Barbosa Macedo Pereira - UEG/UnB positiva em relação a sua futura experiên-
barbosaalciane@gmail.com cia acadêmica. A discordância entre tais
Alba Cristhiane Santana - UFG expectativas e o que a universidade pode
albapsico@gmail.com oferecer efetivamente, gera uma fonte de
dificuldade que se reflete na satisfação e
A Educação Superior é um cenário privi- no sucesso acadêmico. Considerando esse
legiado para o desenvolvimento humano cenário, o trabalho realizado a partir de
devido as inúmeras possibilidades de inte- um curso de especialização em Psicologia
ração social nesse espaço, conforme Ma- teve como objetivo investigar as dificulda-
rinho-Araujo (2009). A partir da Psicologia des encontradas por alunos ingressantes
Histórico-Cultural pode-se afirmar que o de um curso de licenciatura na área de
desenvolvimento humano é um proces- exatas de uma Instituição de Educação
so que envolve a interação humana, em Superior (IES) pública em Goiânia, visando
seus processos de produção e negocia- contribuir com discussões sobre a criação

635
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de estratégias pedagógicas para minimizar prometem os processos de aprendizagem


essa situação. Também foram investigadas e de desenvolvimento, pois podem gerar
as possibilidades de atuação do psicólogo nos discentes: a manutenção das fragilida-
escolar na inserção acadêmica, com foco des apresentadas no Ensino Médio; falta
no desenvolvimento dos discentes, pro- de crença na própria capacidade de apren-
movendo reflexões acerca das suas con- der; diminuição do empenho nos estudos;
tribuições na Educação Superior. O estudo dúvidas em relação ao curso escolhido,
fundamentou-se em uma Epistemologia dentre outras questões. Outro tema foram
Qualitativa (Gonzaléz Rey, 2005), na qual o os significados que os docentes apresen-
centro da pesquisa é o diálogo entre o pes- taram acerca do desempenho dos discen-
quisador e os sujeitos pesquisados. Outra tes: pouca dedicação aos estudos; defici-
fundamentação importante foi a Psicologia ência de conteúdos básicos; ausência de
Histórico-Cultural (Bruner, 1997; Vygotsky, comportamento pró-ativo. Somado a isso,
2003) e uma visão crítica da Psicologia Es- as dificuldades percebidas nos docentes
colar (Marinho-Araujo & Almeida, 2005; frente aos discentes foram: pouca habili-
Mitjáns Martinez, 2006). Participaram do dade em desenvolver estratégias especí-
trabalho 37 alunos de duas turmas do pri- ficas para lidar com alunos com dificulda-
meiro período de um curso de licenciatura de; pouco investimento na relação com o
da área de exatas; dois docentes e o coor- aluno; pouca disponibilidade afetiva e de
denador desse curso. Utilizou-se um ques- tempo para auxiliar os alunos com dificul-
tionário com questões abertas e fechadas, dade. Como pode ser percebido não há a
aplicado aos discentes em sala de aula. Fo- discussão sobre o tipo de aluno que o En-
ram realizadas entrevistas semiestrutura- sino Médio está formando, e as possíveis
das com os docentes e o coordenador do consequências para a Educação Superior.
curso, no contexto da IES. Os procedimen- A construção dos significados atribuídos
tos de análise dos resultados abrangeram: por docentes e discentes sinalizam que as
análise estatística simples das questões dificuldades de ambos são semelhantes,
fechadas do questionário; e análise de uma vez que envolvem problemas em re-
significados das questões abertas e das lação às deficiências de conteúdo básico,
entrevistas. A construção das informações falta de conhecimento acerca de métodos
possibilitou a elaboração de temas espe- de estudo e distanciamento na relação
cíficos relativos ao objeto de estudo e aos professor-aluno. As possíveis contribui-
objetivos da referida pesquisa. A primeira ções da Psicologia nesse contexto, visan-
temática está relacionada aos significados do atender um processo formativo que
que os discentes apresentaram acerca do efetivamente contribua com o desenvol-
contexto da Educação Superior, a saber: vimento dos sujeitos teriam que partir de
disciplinas de difícil entendimento, devido procedimentos que evidenciem os fatores
a insuficiência de conteúdos básicos; rela- que dificultam a ação dos discentes e dos
ção distante com os professores, com au- docentes. E, por outro lado, pode-se pen-
sência de apoio em relação às dificuldades sar na ação do Psicólogo Escolar criando
encontradas; sensação de estar sozinho espaços de reflexão e discussão entre do-
no processo de aprendizagem. As conse- centes e discentes, em busca de superação
quências diante dessa problemática com- das dificuldades vivenciadas nesse espaço.

636
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Assim, o Psicólogo Escolar, conforme Mi- LT04-1484 – CONTRIBUIÇÃO DO


tjáns Martinez (2009) tem como objetivo PLANTÃO PSICOLÓGICO NO PROCESSO
contribuir para a otimização dos processos IDENTITÁRIO E NA ELABORAÇÃO
educativos e seu locus de atuação é cons- DOS CONFLITOS VIVIDOS PELOS
tituído pelas diferentes instâncias do sis- ADOLESCENTES
tema educativo. Assim, foi evidenciada a André Rezende Morais - UFSJ
necessidade de um trabalho coletivo e in- andre_rmorais@hotmail.com
terdisciplinar para superar as dificuldades Dener Luiz da Silva - DPSIC/UFSJ
dos alunos e educadores, visando aperfei- densilva@ufsj.edu.br
çoar o processo educativo desenvolvido
na Educação Superior. Esse trabalho com O objetivo deste trabalho é apresentar
a coletividade é fundamental na ação do uma experiência de Plantão Psicológico
psicólogo escolar na instituição, conforme (PP) iniciada durante o segundo semes-
Tanamachi e Meira (2003), pois viabiliza ao tre de 2010 em uma escola pública, com
profissional colocar-se como um mediador aproximadamente 1500 alunos, em uma
que pode contribuir, nas questões que lhe cidade de médio porte do interior de Mi-
são particulares, para a criação de espaços nas Gerais. Busca-se articular as ativida-
de discussão e de resgate da capacidade des e decorrências do PP com elementos
de pensamento crítico, o que pode colocar do processo de formação identitária dos
todos os segmentos da instituição educati- adolescentes, público-alvo do serviço. O
va no lugar de sujeitos ativos. As informa- PP na escola pode ser inicialmente defi-
ções construídas indicam a necessidade nido como um espaço de escuta psico-
de intervenção para auxiliar na inserção lógica oferecido aos alunos. Respaldado
acadêmica dos alunos e contribuir com na abordagem Humanista de Carl Rogers
o processo de desenvolvimento humano (1902-1987), e em seu famoso tripé Em-
nesse contexto. Além disso, o psicólogo patia, Congruência e Aceitação Incondi-
escolar pode contribuir com um trabalho cional, os estagiários de Psicologia bus-
coletivo com os demais profissionais, por cam atender às questões emergenciais
meio de um diagnóstico institucional e trazidas pelos alunos e auxiliá-los em sua
de práticas que favoreçam a elaboração elaboração. Visto que a adolescência é
de estratégias pedagógicas que levem à considerada um período de mudanças,
superação das dificuldades dos alunos no caracterizado pela vivência de inúmeros
início de sua formação acadêmica e assim, conflitos e por um momento importante
auxiliem na sua aprendizagem e no seu na formação da identidade (Aberastury,
desenvolvimento. 1981; Erikson 1972), o PP se apresenta
como instrumento que auxilia o adoles-
Palavras-chave: Educação Superior; cente a tomar consciência dos elementos
Desenvolvimento dos Discentes; Psicologia cognitivos e emocionais envolvidos nas
Escolar. vivências de seus conflitos, o que pode
Contato: Alciane Barbosa Macedo Pereira, trazer benefícios para uma retomada de
UEG/UnB, alcianebarbosa@gmail.com uma postura em direção à saúde psico-
lógica. Até o momento, foram atendidos
vinte casos. Destes, sete referem-se a uma

637
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sessão e treze a mais de uma (entre duas familiares e sociais fossem modificadas.
e três sessões). A idade média é de quinze Partindo desta ideia, o Plantão atua, ofe-
anos; aproximadamente, 78% dos atendi- recendo um espaço onde o adolescente
dos são do sexo feminino e os problemas possa falar o que realmente sente e ter
mais citados são: busca de reconhecimen- liberdade de ser o que realmente se é e
to, dificuldade na escola, dificuldade em não o que a sociedade exige. Analisando
escolhas/decisão, elaboração de perdas, as demandas apresentas durante os aten-
falta de correspondência nos relaciona- dimentos e aquelas do período da ado-
mentos amorosos, incômodo com a ma- lescência, o PP se apresenta como lugar
neira de ser e reagir às situações, insatis- onde o jovem pode vivenciar com mais
fação com as atribuições e contingências liberdade suas experiências. Durante o
e insatisfação no relacionamento com a atendimento, o plantonista procura pro-
família. Para relatar a dinâmica básica dos porcionar um clima de aceitação em um
atendimentos foram utilizadas as descri- momento de reflexão, fazendo com que
ções feitas por Mahfoud (1999), que reali- o adolescente entre em contato consigo
zou uma pesquisa para identificar as fases mesmo, pense de forma mais clara sobre
do processo de atendimento no PP. Geral- a questão trazida, que entenda melhor o
mente, um atendimento acontecia com o seu problema, se posicionando em rela-
adolescente apresentando a questão (AQ) ção a ele (Mahfoud, 1999). Cabe ressaltar,
e explorando-a (ExQ). Em alguns casos o diante do que foi exposto, que para que
aluno apresentava várias questões (AV) o PP contribua de fato para o desenvol-
e no decorrer do processo se fixava em vimento do adolescente ele deve ser im-
apenas uma. Havia outros casos em que plantado juntamente com outras práticas
o jovem, depois de apresentar e explorar psicológicas e não de forma isolada na
uma questão apresentava outra nova (OQ escola (Tassinari, 1999), bem como uma
– outra questão). Além dessas, outras ex- divulgação para alunos e educadores in-
pressões foram utilizadas para descrever formando sobre importância da interven-
as fases do processo: PI – pede informa- ção. Estas ações contribuem para a entra-
ção, RA – reafirma atitude, RQR – relata da do plantonista de forma mais efetiva
como a questão se resolveu, RCA – relata e ativa no contexto da escola. Para mos-
como agiu, PR – propõe-se a refletir e AP trar como o PP pode auxiliar na tomada
– apresenta possibilidades. No encerra- de consciência e na decisão pela saúde,
mento do processo foram percebidas três passaremos a um exemplo de atendimen-
fases que correspondiam ao desfecho to: L.M.S. tem 15 anos, sexo feminino e
diante do que fora apresentado durante está no 9º ano. No seu primeiro encontro
todo o processo: mudança de perspectiva ela relatou estar apaixonada por garoto.
(MP); assumir nova atitude (ANA); decidir Diante desta paixão, ela se queixou que
agir (DA). Segundo Aberastury (1981), o não parava de pensar nesta pessoa, sen-
sofrimento, a contradição, a confusão, os do assim não se alimentava bem e estava
transtornos, durante a adolescência são mal nas atividades escolares. Além disso,
inevitáveis. Ela ressalta que estes podem ela se mostrava muito ansiosa e indecisa
ser transitórios, elaboráveis e que a dor frente a tal situação. Diante desse relato,
poderia ser amenizada se as estruturas o plantonista procurou ajudá-la a refletir

638
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sobre as atitudes tomadas com relação ao LT04-1500 – ONGs, PSICOLOGIA ESCOLAR


que sentia pelo rapaz, questionando se o E COMPROMISSO SOCIAL: DESAFIOS E
que ela havia feito estava sendo saudá- POSSIBILIDADES
vel para ela e se agindo como agia esta- Pollianna Galvão Soares - UnB
va conseguindo o que queria, que era ser polliannagalvao@yahoo.com.br
correspondida afetivamente pelo preten- Claisy Maria Marinho Araújo - UnB
dente. Neste momento ela deu uma pau- claisy@unb.br
sa e disse que aquilo não estava fazendo Financiamento: CNPq
bem para ela. O plantonista pergunta o
que ela pretendia fazer. Ela responde que A partir da globalização e da pós-mo-
gostaria de conversar com o rapaz e dizer dernidade, a sociedade hodierna tem
tudo o que sente por ele, mas não con- fomentado o surgimento de distintas ins-
seguiria já que se considera ansiosa. No tituições pelas quais o homem organiza
primeiro encontro foi trabalhado este de- sua vida em coletividade ante as deman-
sejo de conversar com o rapaz. Ao final, das contemporâneas. O panorama das
ela disse que iria tomar iniciativa para organizações sociais, especialmente no
falar com ele, pois percebeu os prejuí- cenário brasileiro, vem configurando con-
zos que esta relação estava causando. textos emergentes férteis à ações volta-
No segundo encontro L.M.S. relatou que das para o apaziguamento do quadro de
conseguiu conversar com o garoto e disse exclusão social. Dentre esses contextos,
que se saiu bem. Durante a conversa ela as instituições educativas não formais
disse que procurou ficar tranquila, não de terceiro setor vêm trazendo peculia-
sofreu por antecipação e não fantasiou a ridades às suas organizações e atividades
situação. Diante do sucesso da conversa, pedagógicas (Gohn, 2009).O surgimento
afirmou estar mais tranquila e feliz, está dos espaços educativos não formais tem
pensando mais em si, em suas atitudes se elevando em função, principalmente,
e naquilo que ela realmente quer. Desta do aumento dos problemas sociais para
forma, evidenciamos o papel que o PP as- os quais o Estado não tem cumprido de-
sume diante da realidade vivenciada por vidamente seu dever em “construir uma
adolescentes de escolas públicas: contri- sociedade livre, justa e solidária; garantir
buir para promoção da saúde destes ado- o desenvolvimento nacional; erradicar a
lescentes, uma vez que, apesar de não ser pobreza e a marginalização e reduzir as
tão diferente dos demais adolescentes, desigualdades sociais e regionais” (Cons-
estes possuem certas particularidades: tituição Federal, 1988, Art. 3) e nem em
nível sócio econômico baixo, baixa escola- garantir a educação como “direito de
rização dos pais, oportunidades restritas todos e dever do Estado (...) visando ao
de lazer e emprego. pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e
Palavras-chave: Adolescência, Plantão sua qualificação para o trabalho” (Cons-
Psicológico, Humanismo. tituição Federal, 1988, Art. 205). Nessa
Contato: André Rezende Morais, UFSJ, andre_ direção, as organizações da sociedade
rmorais@hotmail.com civil (OSC’s) têm se expandido entre os
setores públicos e privado nas últimas

639
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

décadas como novo arranjo social que camente as implicações políticas e éticas
viabiliza legitimamente a aproximação para que suas ações sejam intencional-
entre os cidadãos e a esfera pública em mente direcionadas se aos interesses
prol da garantia do atendimento aos di- e necessidades da coletividade (Guzzo,
reitos sociais básicos (Gohn, 2009, 2010; 2003, 2005). Se as ONGs educativas nas-
Montaño, 2002; Souza, 2009). São diver- cem e se desenvolvem no sistema social
sas as designações institucionais dessa capitalista, é necessário que essas insti-
esfera social: associações, fundações, tuições se posicionem e se assumam poli-
cooperativas e outras do terceiro setor, ticamente ante às questões sociais em fa-
sendo culturalmente reconhecidas como vor de uma conscientização do grupo so-
organizações não governamentais (ONGs) cial (Souza, 2009). Nesse sentido, há de se
e definidas como agências colaboradoras ter o cuidado de que as ONGs educativas
para a avaliação das demandas sociais e podem estar a serviço de privilégios elitis-
mobilização dos sujeitos locais para a luta tas, uma vez que elas não criticam, mas se
e garantia dos direitos civis (Gohn, 2010, aliam a proposições políticas e filosóficas
Souza, 2009). Apesar de se reconhecer o dominantes. Assim, os investimentos em-
crescimento das ONGs educativas relacio- preendidos nessas instituições corre o ris-
nado à mobilização pela democratização co de não transformar, mas, ao contrário,
da educação, paralelamente, muitas críti- perpetuar as relações de poder e incenti-
cas têm sido engendradas a partir de uma var um papel eminentemente burocrático
reflexão crítica acerca do seu papel, fun- e administrativo para angariação de ver-
ção e relevância social que podem, ainda, bas. Em um cenário de práticas educati-
ocultar a predominância de uma ideolo- vas formais e não formais amplo como o
gia burguesa e elitista própria do sistema Brasil, as organizações não governamen-
econômico capitalista (Aoyama, 2005; tais (ONGs) tem ganhado atenção da Psi-
Deluiz, Gonzalez & Pinheiro, 2003). Ge- cologia Escolar por realizarem atividades
ralmente, essas críticas são endereçadas pedagógicas que visam, em princípio, ao
à forma assistencialista com as quais as desenvolvimento humano (Soares, 2008;
ONGs desenvolvem suas atividades e que Soares & Marinho-Araújo, 2010; Souza,
corroboram com uma espécie de disfarce 2009). A conjuntura da educação brasi-
político-ideológico acerca dos problemas leira contemporânea, bem como seus
sociais sob a égide do compromisso com diversos desmembramentos institucio-
a transformação social. Uma vez que o nais, têm oportunizado novas reflexões
Estado não cumpre e nem garante ade- sobre o trabalho do psicólogo escolar e
quadamente os direitos sociais, tal como o seu compromisso político e ético com
preconiza legalmente, distribui seu poder a educação. Se a intenção é propiciar a
para amenizar o impacto de políticas vol- transformação social por meio das ONGs,
tadas para um suposto ajuste econômico a Psicologia Escolar deve comprometer-se
que atingem a população mais empobre- com o desvelamento dos aspectos ideo-
cida. Para se desenvolver ações voltadas lógicos e filosóficos presentes nos diver-
em prol da reversibilidade do quadro de sos aspectos institucionais (Guzzo, 2003;
injustiça social, é necessário que os ato- Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Nas
res dessas instituições reconheçam criti- últimas décadas, a Psicologia Escolar tem

640
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

revisto os paradigmas que subsidiam os ministas de desenvolvimento humano;


modelos e campos de atuação, sendo re- práticas domesticadoras e autoritárias de
conhecida como área de intervenção pro- ensino e de aprendizagem; processos de
fissional, pesquisa e produção de conhe- exclusão, marginalização e discriminação
cimento que compromete-se com ques- camuflados em processos avaliativos ou
tões relacionadas ao desenvolvimento em procedimentos pedagógicos pouco
humano em diversos contextos e modali- críticos e autônomos em sua intenciona-
dades de ensino (Marinho-Araújo, 2009). lidade (Caro & Guzzo, 2004; Guzzo, 2001,
Embora tradicionalmente vinculada à es- 2003, 2005; Marinho-Araújo & Almeida,
cola, essa área tem se expandido a outros 2005).
cenários devido ao reconhecimento de
que as possibilidades de desenvolvimen- Palavras-chave: Psicologia Escolar; ONG;
to estendem-se a diferentes instituições Desenvolvimento Humano.
investidas da função educativa, como as
ONGs (Correia & Campos, 2004; Cruces,
2003, 2005; Marinho-Araújo, 2009; Ma- CO 14 - LT01
rinho-Araújo & Almeida, 2005; Vectore,
2005). A recente conjuntura educacional, Estado da arte da pesquisa
que dá abertura aos espaços educativos
não formais de terceiro setor, convida (e
instiga) um comparecimento do psicó- LT01-827 - PESQUISA COM CRIANÇAS
logo escolar com um perfil eticamente NA AMÉRICA LATINA: CONSIDERAÇÕES
comprometido com a transformação da ÉTICAS E EPISTEMOLÓGICAS
realidade em prol do estabelecimento Nicole Bacellar Zaneti - UnB
de ações e mediações para o desenvolvi- nikazaneti@hotmail.com
mento da cidadania (Guzzo, 2003, 2005). Lúcia Helena Cavasin Zabotto Pulino - UnB
Uma atuação política, ética e socialmente luciahelena.pulino@gmail.com
voltada para provocar incômodos, des- Financiamento: CAPES
velar ideologias dominantes, desestabi-
lizar formas de relações de poder, se faz No seu curso de vida, e até mesmo desde
necessária e pertinente ao perfil do psi- sua concepção, a criança vive imersa em
cólogo escolar, a partir da clareza sobre diversos contextos, tornando-se membro
o panorama histórico e atual do sistema de uma cultura, no seio de uma família,
educacional e suas complexas dimensões. de comunidades e da sociedade, desen-
Defende-se que seja papel do psicólogo volvendo a linguagem, construindo con-
escolar contribuir para a transformação cepções, valores e crenças, típicos dessa
das condições ideológicas e práticas de cultura. Porém, a criança tem sido vista,
opressão que advém de um quadro social em muitas instâncias, como alguém que
de injustiças que viabilizam e mantêm as não é capaz de fazer escolhas, que é infe-
estruturas das relações desiguais entre rior ao adulto, um ser passivo e totalmen-
os homens. Tal conscientização, mediada te dependente dos outros. A concepção
pelo psicólogo escolar, poderá evidenciar, da criança como um ser inferior existe
criticar e denunciar concepções deter- desde Platão (Kohan, 2005). A sociedade

641
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tradicional reduzia a duração da infância Andrade (1998) salienta que a criança não
a seu período mais frágil; a partir do mo- deve ser subestimada, infantilizada, nem
mento em que a criança conseguia algum vista como um objeto. Ela não deve ser
desembaraço físico ela já era agregada vista como alguém que ainda não é um
aos adultos, não passando pelo período adulto, mas como alguém que constitui
da juventude. Não havia uma preocu- e é constituído, construindo, de forma
pação em controlar a transmissão dos dialética, sua subjetividade. É necessário
conhecimentos e de valores para a crian- reconhecer e valorizar a criatividade e as
ça, ela os aprendia quando auxiliava os potencialidades da criança, estimulan-
adultos a fazer as coisas. A criança vivia do sua participação, enxergando-a como
em um anonimato, e quando morria, as um sujeito que possui direitos e deveres.
pessoas não deveriam dar muita impor- A criança não é incompleta, um vir-a-ser
tância, pois ela logo seria substituída por que apenas se constituirá no futuro. Além
outra (Ariès, 2006). Esta concepção que de estar num processo de desenvolvimen-
diminui a capacidade da criança continua to em direção à idade adulta, ela é; existe,
existindo em muitas esferas da sociedade em sua totalidade, em sua singularidade,
contemporânea, o que se constata em no tempo presente. A criança traz o novo,
instituições como a escola, e até mesmo pode surpreender, transgredir e modifi-
em algumas teorias e práticas psicológi- car o mundo, não apenas sendo modifi-
cas, que tomam a criança como um ser cada por ele. Ela participa da construção
incompleto, desconsiderando sua manei- da cultura, da história e da sociedade
ra de pensar e usar a linguagem, na me- em que vive, transformando-as (Andra-
dida em que a comparam com as formas de, 1998; Pulino, 2001; Vigotski, 2007).
adultas de pensar, sentir e agir. A criança Assim, a criança, desde pequena, já está
é concebida por essas esferas como um imersa em um contexto, em uma determi-
ainda não, uma extensão de seus pais, nada cultura, no seio de uma família, de
um ser inacabado, não evoluído, que comunidades e da sociedade, desenvolve
somente será alguém quando se tor- a linguagem, constrói concepções, ações,
nar adulto (Andrade, 1998). As crianças, atitudes, valores e crenças, típicos dessa
muitas vezes, são invisíveis para algumas cultura. Porém, ela não internaliza pas-
sociedades, que possuem práticas e con- sivamente esses conceitos, mas negocia
cepções de infância que não valorizam e seus significados, atuando e co-construin-
não respeitam os direitos das crianças vi- do essas concepções (Vigotski, 2007). As
verem sua infância. É importante que se constantes transformações culturais têm
compreenda o mundo das crianças e elas ocorrido na atualidade por diversos fato-
mesmas através de seus próprios olha- res, como o surgimento da televisão, da
res. O mundo das crianças atualmente é internet, do telefone, o que possibilitou
bastante heterogêneo, elas têm contato maior velocidade de comunicação entre
com diversas realidades, com as quais diversas culturas mundiais. A frequente
interagem e aprendem valores e diversas imigração em todo o mundo e o casamen-
práticas culturais e sociais, ressignifican- to entre indivíduos de nacionalidades e
do-os e internalizando-os de forma sin- raças diferentes também contribui para
gular (Vasconcellos, 2007). Dessa forma, essas mudanças e para a convivência com

642
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

diversas culturas e valores (Rogoff, 2005). diversos procedimentos metodológicos,


Esta convivência muitas vezes pode ser a fim de ampliar as ferramentas para a
difícil e desafiadora para a criança, prin- compreensão do universo de cada crian-
cipalmente quando os hábitos diferentes ça, e das diferenças e semelhanças entre
entram em conflito, mas também pode elas e os adultos. Também é essencial
ser vivida de forma criativa, através de permitir à criança participar das decisões
combinações e negociações pessoais e sobre quais procedimentos elas querem
coletivas. Dessa forma, é de extrema im- utilizar para comunicar suas experiên-
portância a realização de pesquisas com cias para outras pessoas (Rocha, 2008).
crianças. A criança tem estado presente A pesquisa com crianças tanto possibilita
nas pesquisas científicas há muito tempo, a abertura de Zonas de Desenvolvimento
sendo estudada como objeto a ser des- Proximal para as crianças se colocarem
crito, medido, analisado. O que é preciso em posição de serem ouvidas, de coloca-
ser discutido e modificado é a forma que rem suas concepções, como a abertura de
a criança tem sido estudada na comuni- uma Zona de Desenvolvimento Proximal
dade científica. Pesquisas que deem voz para os pesquisadores, considerarem a
a crianças, de modo a não só possibilitar criança como colaboradora da pesquisa,
o conhecimento da maneira como elas e, mesmo, para considerarem a própria
lidam com os ensinamentos, regras, cren- pesquisa como um processo de constru-
ças que os adultos lhe apresentam, mas ção de conhecimento que se abre para o
também para permitir repensar as formas novo, para incluir novos seres, em início
como os adultos estão se relacionando de socialização, em nossa tarefa de com-
com elas são necessárias (Campos, 2008). preender o mundo e as pessoas em vários
É preciso compreender a singularidade de momentos da vida. Em termos de Améri-
cada criança, que cada resposta da crian- ca Latina, isso pode sugerir que crianças
ça está relacionada ao ambiente em que de diferentes países e culturas possam
elas vivem. É interessante observar que a ser ouvidas, e a Psicologia do Desenvol-
mesma criança age de forma diferente de vimento possa se abrir para um diálogo
acordo com o ambiente, como a família, a profícuo que permitirá aos países se re-
escola, as brincadeiras na rua e, por isso, conhecerem no que tem de semelhante e
buscar ouvi-las nesses diferentes contex- diferente em relação ao acolhimento e à
tos (Campos, 2008). As crianças precisam educação de crianças.
ser ouvidas no plural, através da valoriza-
ção das diferenças, da multiplicidade de Palavras-chave: crianças, pesquisa, América
vivências da infância e da heterogenei- Latina.
dade dos contextos em que as crianças Contato: Nicole Bacellar Zaneti (UnB)
vivem. A entrevista com uma criança de nikazaneti@hotmail.com
um determinado país pode ser totalmen-
te diferente de uma com uma criança de
outro país. A classe social, a cultura, a so-
ciedade em que ela vive podem constituir
indicadores empíricos muito diferentes. É
interessante, também, o cruzamento de

643
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-1367 - PSICOLOGIA DO Infantil da Universidade de São Paulo –


DESENVOLVIMENTO NA AMÉRICA USP. Embora percebamos que o número
LATINA: UM GRUPO DE PESQUISA DE de produções da líder do grupo da USP,
SÃO PAULO SE REVELA PIONEIRO NESTA professora Maria Clotilde Rossetti-Ferrei-
ÁREA DO CONHECIMENTO ra, tenha diminuído gradativamente nos
Fabiana Luzia de Rezende último cinco anos, pois está aposentada
Franciene Soares Barbosa de Andrade compulsoriamente desde 2006. Optamos
por um levantamento mais aprofundado
Este trabalho consiste em um mapea- sobre os históricos, projetos e produções
mento da produção intelectual brasileira de seu grupo de pesquisa porque verifi-
na área de psicologia do desenvolvimen- camos ser um grupo bastante significa-
to humano da região Sudeste, mais espe- tivo e pioneiro para a área da psicologia
cificamente dos Estados de São Paulo e do desenvolvimento humano no Brasil. O
Espírito Santo. Ele está sendo desenvol- grupo da USP – SP, denominado Centro
vido como um dos requisitos avaliativos de Investigações sobre Desenvolvimento
da disciplina Seminário de Pesquisa em Humano e Educação Infantil (CINDEDI) é
Desenvolvimento Humano, tendo como constituído por dez pesquisadores, são
professora supervisora a Doutora Ma- eles: Ana Maria Almeida Carvalho, Maria
ria Cláudia Santos Lopes de Oliveira. O Isabel Patrício de Carvalho Pedrosa, Ana
objetivo é identificar e analisar a produ- Paula Soares da Silva, Regina Helena Lima
ção acadêmica de um grupo de pesquisa Caldana, Katia de Souza Amorim, Reinal-
brasileiro com produção consistente e do Furlan, Mara Ignez Campos de Carva-
relevante no cenário nacional e/ou inter- lho, Sueli Cristina de Pauli Teixeira, Maria
nacional. Para levantamento dos grupos Clotilde Therezinha Rossetti Ferreira e Zil-
realizamos, em um primeiro momento, ma de Moraes Ramos de Oliveira. Os de-
uma busca dos grupos de pesquisa de São mais que participam do grupo são: vinte
Paulo e Espírito Santo voltados para área e oito estudantes e dois técnicos. Quan-
do desenvolvimento humano presentes to à trajetória, o grupo surgiu em 1988,
em anais, congressos, reuniões, simpó- pertence a Faculdade de Filosofia Ciên-
sios de psicologia. Então, consultamos cias e Letras de Ribeirão Preto do Depar-
os diretórios dos grupos de pesquisa no tamento de Psicologia e Educação, sen-
Brasil no site da ANPEPP. Por meio dessa do certificado pela Universidade de São
busca identificamos diversos grupos e ve- Paulo – USP. Atualmente é liderado por
rificamos quais tinham maior visibilidade Maria Clotilde Therezinha Rossetti Fer-
nos congressos dos últimos cinco anos reira e Mara Ignez Campos de Carvalho e
e apresentavam produção relevante na tem como área predominante as Ciências
área de desenvolvimento humano. Des- humanas e a Psicologia. Apresenta treze
te modo, selecionamos a princípio dois linhas de pesquisa, como: Inclusão social
grupos: o grupo Processos de Desenvol- de pessoas portadoras de necessidades
vimento e de Aprendizagem da Universi- especiais, Interação criança-criança, A
dade Federal do Espírito Santo – UFES e construção do sujeito e da intersubjetivi-
o grupo Centro de Investigação Sobre o dade, A Educação infantil a partir da Rede
Desenvolvimento Humano e Educação de Significações, Construção das Relações

644
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

afetivas e apego, Diferentes aspectos do Universidade de São Paulo. Em sua rede


processo de adoção, Infância e família: de colaboradores podemos citar os auto-
ideário e práticas em diferentes contex- res|: Amorim KS; Anjos AM; Carvalho MI;
tos, Narrativa, self e descrições de si na Costa NR; Ferreira MC; Mariano FN; Oli-
perspectiva de rede de significações, Or- veira ZM; Ramon FM; Roriz TM; Serrano
ganização espacial e educação infantil co- SA; Teixeira SC e Yazlle CH. Ela apresenta
letiva, Processos dialógicos e indissociabi- linhas de pesquisa voltada para Processos
lidade de corpo-mente-cultura, Produção de adoção, guarda e tutela e abrigamento
de material didático-científico, Questões e Processos de Desenvolvimento da crian-
conceituais e metodológicas, Significado ça pequena em creches e pré-escolas. A
de sentido e significação/Figuras do si outra líder do grupo de pesquisa, Mara
mesmo ou noções de subjetividade. Esse Ignez Campos de Carvalho, possui gradu-
grupo tem repercussão nacional e inter- ação em Psicologia pela Universidade de
nacional, por meio das suas pesquisas São Paulo (1970), mestrado em Psicologia
sobre interação, adaptação e arranjo es- (Psicologia Experimental) pela Universi-
pacial em creche e pré-escola e produção dade de São Paulo (1979), doutorado em
de material didático destinado à forma- Psicologia (Psicologia Experimental) pela
ção de professores. Além da expansão de Universidade de São Paulo (1990) e pós-
suas temáticas, está desenvolvendo uma -doutorado pela Rutgers - The State Uni-
nova perspectiva teórico-metodológica versity of New Jersey (1992). Atualmente
chamada Rede de Significações que é “ca- é professora doutora da Universidade de
paz de considerar, no processo de investi- São Paulo. Tem experiência na área de
gação ou na intervenção, a complexidade Educação com ênfase em Educação Psico-
do processo de desenvolvimento”. Ulti- logia Ambiental, atuando principalmente
mamente a linha de pesquisa do grupo nos seguintes temas: arranjo, crianças
está voltada para estudos de processos 2-3 anos, atividades livres. Sua rede de
ligados a Adoção, que contribuiu para a colaboradores apresenta autores, como:
realização e produção de material didá- Carvalho MI; Ferreira MC; Meneghini R;
tico voltado para o tema “REDE DE PRO- Mingorance RC e Souza TN. Além das in-
TEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA, FAMILIA E formações aqui citadas, este trabalho de
ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO DE RISCO” mapeamento constará de uma análise crí-
e auxílio de “diretrizes e práticas para o tica acerca da trajetória das líderes e seus
campo e formação de políticas públicas colaboradores, de suas produções inte-
neste contexto”. A líder Maria Clotilde lectuais, verificando seus pontos fortes,
Therezinha Rossetti Ferreira é Licenciada opacidades e perspectivas para futuros
em Filosofia pela PUC-SP, Especialista em trabalhos.
Psicologia Clínica pelo Sedes Sapientiae-
-SP, Doutora em Psicologia pela University Palavras-chave: produção acadêmica;
of London, com Pós Doutorado no Institu- psicologia do desaenvolviemento; questões
te of Child Health, Londres e no Labora- conceituais e metodológicas.
toire de Psycho-Biologie de l Enfant, Paris.
Professora Titular da Faculdade de Filoso-
fia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da

645
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-1455 - ALBERTO MERANI E OS primeiro tema de sua obra marca abertu-


ESTUDOS DE PSICOLOGIA INFANTIL- UM ra de um projeto que vai perdurar duran-
RESGATE DA CONTRIBUIÇAO LATINA te toda a sua vida: a psicologia infantil e
AMERICANA PARA A PSICOLOGIA DO psicologia genética. Contextualizando os
DESENVOLVIMENTO principais estudiosos sobre o desenvol-
Luciane Alves de Oliveira - UFC/Sobral vimento infantil, visualizamos algumas
luaoliveira2307@yahoo.com.br diferenças de conceitos e fundamentos.
Franci Iria Servolo Sabóia - UFC/Sobral Para Piaget a psicologia genética e a psi-
irya.saboia@hotmail.com cologia infantil se distinguem da seguinte
Hanna Graziely Rêgo Castro - UFC/Sobral maneira: a psicologia genética é o estudo
hanna_graziely@hotmail.com da psicologia geral que abrange a forma-
Isadorah Dantas Cavalcante Martins - UFC/ ção dos processos mentais, enquanto a
Sobral psicologia infantil é um instrumento da
Maria Júlia Melo Farias - UFC/Sobral psicologia genética. Para Wallon, a psi-
majumelo_3@hotmail.com cologia genética estuda o psiquismo em
Thamila Cristina dos Santos da Silva - UFC/ sua formação e transformações em três
Sobral níveis: o nível do mundo, da espécie e do
thamila_silva@hotmail.com individuo. Portanto, a psicologia infantil é
apenas um dos métodos. Merani, seguin-
Vida e obra - Alberto Merani nasceu em do Wallon, organiza a psicologia genética
1918 na Argentina. Estudou em vários pa- como uma psicologia comparada. Opõe-
íses, discípulo de Wallon na França e de -se assim a psicologia geral da psicologia
Nicolás Pende na Itália. Estabeleceu-se genética, que tem o objetivo de explicar
em Caracas, trabalhando Universidade a função mental pela a história do desen-
dos Andes e posteriormente na Univer- volvimento através das idades. As etapas
sidade Central de Venezuela. Morreu em do homem são estudadas em três pontos
20/08/1984 em Caracas. Em meados do de vistas: a infância sobre a óptica da psi-
século XX, se converteu em um dos mais cologia infantil; a infância, a puberdade
importantes psicólogos da América Lati- e adolescência pela psicologia da idade
na; produziu em torno de 40 livros e os evolutiva; o processo completo, isto é,
temas principais que trabalha são: psi- infância, puberdade, adolescência, juven-
cologia infantil, evolutiva, genética, psi- tude, maturidade e velhice pela visão da
cogênese, epistemologia da psicologia psicologia genética. No pensamento de
e educação, psicopatologia, historia da Merani aparece à necessidade de proble-
psicologia e da educação. Embora com matizar, acerca das relações entre a psico-
vasta obra é difícil o seu acesso no Brasil. logia, ciência e a filosofia, e os problemas
Merani engaja-se no campo da psicologia relacionados com estas, como a classifi-
em 1941 com um ensaio sobre a psicogê- cação do método materialista dialético,
nese do sentimento maternal, e dez anos a unidade do objetivo e do subjetivo. Um
depois publica seu primeiro trabalho de ponto de partida ou um ponto de chega-
psicologia infantil. Em 1961, convidou da? “Somos conscientes de que o único
Wallon a escrever o prefácio para seu li- grupo de indivíduos caracterizados como
vro “introdução a psicologia infantil”. O homo sapiens é aquele que, mediante a

646
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

práxis, deu origem ao acervo histórico- seus estudos, apoiando-se nos mesmos
-cultural humano. Como seres animais, parâmetros, fazendo as mesmas consi-
estamos apoiados no biológico; como in- derações para crianças que são estuda-
divíduo dotados de pensamento, no psi- das em diferentes contextos sociais. Por
cológico; e como homens, isto é, seres ca- causa dessas generalizações, afirma que a
pazes de assimilar e de converter os pro- separação da teoria e da prática sobressai
dutos da atividade interpessoal, no social. a cada instante, pois «a criança é objeto,
Seja qual for a importância que se queira e as hipóteses mais em voga são subjeti-
conceder a cada um destes elementos, vas; as interpretações forçam muitas ve-
nas sucessivas fases que desembocaram zes o sujeito que estuda a entrar no âma-
no estado atual da humanidade, resulta go da teoria e, por conseguinte, não é a
inegável que o indivíduo contemporâneo criança fenômeno natural a ser estudado,
representa o equilíbrio harmônico destes mas a criança fenômeno interpretativo.
três elementos.” (Merani, 1972, p.68) To- É relevante considerar o quanto enfatiza
mando por base as ideias de Merani fica a idéia de desenvolvimento dialético, es-
evidente que o desenvolvimento humano tando sempre presente a ideia de devir,
reflete continuamente a associação, a in- processo inacabado que a todo instante
teração, a influência de diferentes fatores, pode estar sofrendo alterações. Sabe-
sendo, portanto, um produto tanto do -se que não se herdam idéias, talentos
biológico quanto do meio social. Quando particulares, gostos, sentimentos como
afirma Merani, a “essência” do homem, virtuosidades abstratas, mas possibilida-
ou, em outros termos, suas funções psí- des materiais para o desenvolvimento
quicas, repousa sob o conjunto das rela- das mesmas em função das interações
ções sociais. Entendemos que não temos indivíduo-meio. Não se herda a rigor uma
como obter a compreensão desse proces- entidade formal, mas possibilidades para
so por isolamento, querendo entender as o desenvolvimento da mesma. Com este
singularidades, pois para Merani o que trabalho propomos resgatar os estudos
existe de mais íntimo e peculiar ao indi- desse clássico autor de desenvolvimento
víduo pode ser superado, descamuflado, na America Latina. (Re)conhecer sua pro-
quando considerarmos o meio social que posta teórica metodológica para o desen-
o envolve. A interpretação mais evidente volvimento infantil e entrelaçarmos a pro-
é que ele coloca a sociedade na condi- posta do autor com o que estudamos nas
ção de um fenômeno que tanto contribui disciplinas de desenvolvimento humano
para o surgimento das significações que na universidade. Divulgar e possibilitar
emergem a partir das funções de origem que outros possam conhecê-lo e com-
genéticas que são inatas aos indivíduos, preender a importância de seus estudos.
porém essas funções só passam a desen- Constatamos a importância do discurso
volverem-se quando estimuladas pelos feito por Merani sobre desenvolvimento
fatores presentes na sociedade. É, mister, em caráter dialético. Ele faz críticas e con-
portanto que haja a integração entre o siderações importantíssimas a autores
critério genético e o social. A partir des- de desenvolvimento que se ausentam de
sas considerações, Merani faz uma crítica fazer considerações acerca de pequenas
muito sutil aos autores que generalizam interconecções que englobam todas as

647
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

singulares do desenvolvimento infantil. os pesquisadores da região em questão


Transmite uma concepção de desenvol- presentes nas comissões dos seguintes
vimento em movimento, mostra que este congressos: Congresso Brasileiro de Psi-
está em constante construção, é influen- cologia do Desenvolvimento - CBPD (São
ciado por fatores internos e externos, Paulo, 2005 - Vitória, 2007 - Rio de Janei-
destacando, assim, a grande abordagem ro, 2009), Reunião Anual da Sociedade
que considera sobre as influências bioló- Brasileira de Psicologia – SBP (Curitiba,
gicas, genéticas ou somáticas no desen- 2010), Congresso Norte-Nordeste de Psi-
volvimento. cologia - CONPSI (Maceió, 2007; Belém,
2009; Salvador, 2011), Simpósio Científi-
Palavras-chave: Merani; Desenvolvimento co da Associação Nacional de Pesquisa e
Infantil; Devir Pós-Graduação em Psicologia - ANPEPP
(XI Simpósio, 2006). Posteriormente, fo-
ram analisados os grupos de pesquisa dis-
LT01-1498 - PSICOLOGIA DO ponibilizados pela ANPEPP. Depois desse
DESENVOLVIMENTO NA AMÉRICA primeiro procedimento, estabeleceu-se
LATINA: BRASIL RIO DE JANEIRO E como critério para aprofundar a análise,
MINAS GERAIS a área predominante escolhida sendo a
Marina Teixeira Mendes de Souza Costa - psicologia. Neste recorte, foram encon-
UNB trados oitenta e seis grupos de pesquisa,
mtmscosta@hotmail.com sendo cinquenta e dois pertencentes à
Telma Regina Lago Costa - UNB psicologia. Cabe ressaltar que desses gru-
telmalagocosta@gmail.com pos, oito pertencem a Minas Gerais e dez
ao Rio de Janeiro. Estes foram estudados
O presente trabalho foi desenvolvido na com maior profundidade, no que tange
disciplina Seminário de Pesquisa em De- às produções anuais na temática do de-
senvolvimento Humano, ministrada pela senvolvimento. Outro fator para a escolha
professora Maria Cláudia Oliveira no pro- do grupo foi à observação daqueles que
grama de Pós-Graduação em Processos se encontravam presentes nos congres-
de Desenvolvimento Humano e Saúde da sos analisados. A pesquisa se caracteriza
Universidade de Brasília. O estudo teve por ainda estar em andamento, tendo, a
como objetivo realizar um levantamen- priori, como grupo escolhido por maior
to sobre como estão se circunscrevendo produção bibliográfica: Interação Social
as pesquisas em psicologia do desenvol- e Desenvolvimento, liderado por Maria
vimento humano no Brasil e na América Seidl-de-Moura e Deise Maria Leal Fer-
Latina de forma geral, e a escolha de um nandes Mendes, da Universidade do Es-
grupo de pesquisa em evidência. Neste tado de Rio de Janeiro (UERJ), o que não
levantamento, foram analisados dois es- descarta uma possível mudança caso no
tados da região sudeste brasileira: Rio de decorrer da pesquisa se encontrem novas
Janeiro e Minas Gerais. A princípio, toda informações.
a região sudeste foi mapeada por meio
dos anais em psicologia. A partir de en- Palavras-chave: desenvolvimento, grupos de
tão, foram anotados os nomes de todos pesquisa e levantamento.

648
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-719 - A PSICOLOGIA DO trabalhos realizados priorizam contribui-


DESENVOLVIMENTO BRASILEIRA. ções teóricas e práticas que levem em con-
ARGUMENTOS PARA SUA (RE) ta a desigualdade social? Ora, sendo fiel às
CONSTRUÇÃO mais recente elaborações em psicologia do
Letícia Silveira Vasconcelos - UFBA desenvolvimento, que entendem o meio
Lélia Santiago Custódio da Silva - UFBA como parte essencial desse processo, não
Sônia Maria Rocha Sampaio - UFBA seria incoerente pensar que o desenvol-
Sueli Barros da Ressurreição - UNEB vimento de um campo de estudo esteja
também ele inextricavelmente atado ao
A psicologia, historicamente vinculada ao seu contexto histórico e cultural. O que,
paradigma positivista, carregou no seu de fato, não é uma ideia nova no estudo
processo de construção de saber a con- da construção do pensamento científico.
cepção de ser humano naturalista e uni- No entanto, desde onde se situam as auto-
versalista, adotando posições e práticas in- ras, cada uma com uma trajetória diversa
dividualistas e distantes da realidade social na psicologia do desenvolvimento, a per-
dos sujeitos que pretendeu estudar. Uma cepção que se tem é a de que as teorias
vez importada para os países latinos ame- vêm sendo mais comumente importadas e
ricanos, dentre os quais, o Brasil, orientou- aplicadas sem as tintas e temperos locais,
-se pelo pensamento colonialista (Bock, seguindo uma moda mais colonial e de
2003) concebendo a sociedade como algo aculturação. Tendo em vista este contex-
externo ao sujeito, negando seus vínculos, to, o presente ensaio tem como objetivo
historicidade e contextos culturais espe- discutir a prática de apropriação acrítica e
cíficos. Aos 49 anos de institucionalização a-histórica de teorias do desenvolvimento,
desta ciência no país, convive-se com um sem a necessária adaptação teórica e me-
anseio pela afirmação de sua identidade e todológica à realidade brasileira. Este tra-
seu compromisso com as questões sociais balho parte do pressuposto de que todo
(Bock, 2003). Nesta mesma perspectiva, posicionamento teórico e metodológico é
o neurocientista Nicolelis (2010), em seu também um posicionamento ético e políti-
Manifesto da Ciência Tropical, sinaliza a co. Encontra sustentação nos pesquisado-
necessidade de construção de um novo res que advogam o tema do compromisso
paradigma científico que democratize as social da psicologia e denuncia a condição
práticas de pesquisa e auxilie a transfor- de colonização e subserviência aos países
mação social e econômica do Brasil. Diante desenvolvidos, presente também no âm-
deste quadro mais geral da ciência psicoló- bito científico. O estudo aqui proposto se
gica, propõe-se discutir o tema a partir do constitui por uma revisão teórica da lite-
campo da psicologia do desenvolvimento. ratura e um esforço empírico de ilustração
Algumas perguntas são identificadas como das idéias expressas. Inicialmente, busca-
pontos de partida para o presente ensaio: -se uma compreensão sobre o saber dos
O saber e a prática da psicologia do desen- psicólogos ilustrando suas origens episte-
volvimento brasileira estão comprometi- mológicas dicotômicas e sua relação com
dos com a melhora da qualidade de vida o surgimento das noções de subjetividade,
de seus cidadãos? As pesquisas contem- infância, juventude e velhice, e inserida
plam temas de relevância nacional? Os na sociedade contemporânea. Para tanto,

649
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

recorre-se a autores que propõem uma plural, indivisível e, eventualmente, ambí-


forma alternativa de pensar a história da guo. Há necessidade de diálogos com ou-
psicologia, privilegiando versões menos tras áreas do conhecimento humano para
descritivas e romantizadas e mais interes- que se possam superar dicotomias, muitas
sadas em entender as consequências do vezes artificiais, da psicologia em campos
saber e fazer psicológico em cada época distintos e distanciadas das questões da
e lugar (Bock, 2003; Foucault, 1987 a e vida contemporânea. Além disso, consi-
b, Prado Filho, 2005; Martín-Baró, 1996; dera-se urgente a superação da fragmen-
Bock & Gonçalves, 2009; Massimi, 2006). tação interna ao próprio saber psicológico,
Em seguida, trata-se da história da psico- que foi se dividindo em áreas especializa-
logia do desenvolvimento no Brasil e uma das de atuação e pesquisa, sem interlocu-
compreensão de suas raízes históricas ção entre esses campos. Estes são algumas
(Mota, 2005). Como uma tentativa de ve- posturas que possibilitam uma melhor
rificar as ideias expostas, é apresentado os compreensão do desenvolvimento huma-
dados construídos a partir de um estudo no e a construção de uma psicologia do
empírico da análise dos programas de gra- desenvolvimento que represente o Brasil e
duação de psicologia das Instituições de responda às necessidades dos brasileiros.
Ensino Superior públicas, que ministram
disciplinas nomeadas de Psicologia do Palavras-chave: psicologia do
Desenvolvimento. Para análise, buscou- desenvolvimento, compromisso social, cultura
-se identificar, através das referências bi- brasileira
bliográficas das ementas das disciplinas, a Contato: Letícia Silveira Vasconcelos, UFBA,
presença de autores e estudos nacionais leticiasvasconcelos@gmail.com
e latinos americanos. Os dados mostra-
ram que as ementas das disciplinas ainda
têm um foco no desenvolvimento a partir PO-LT05
da concepção cronológica de fase e uma
grande influência das teorias tradicionais
do desenvolvimento, que vigoraram no LT05-694 - A SOCIALIZAÇÃO DE GÊNERO
século passado. Em grande parte dos pro- NAS FAMÍLIAS DE ADOLESCENTES
gramas consultados, não foram verificadas HOMENS ALUNOS DE UMA ESCOLA
citações de referências teóricas brasileiras PARTICULAR DE PORTO ALEGRE
e latino-americanas, que discutam a con-
Gabriela Sagebin Bordini - UFRGS
cepção da infância, juventude e velhice a
gsagebin@hotmail.com
partir de um ângulo local. Sendo assim,
Tania Mara Sperb - UFRGS
conclui-se que para desenvolver uma re-
sperbt@terra.com.br
construção crítica dos saberes psicológicos
no estudo do desenvolvimento humano, a Financiamento: CNPq
historicidade e a complexidade tornam-se
categorias fundamentais, pois identificam Os significados atribuídos ao masculino e
cada fenômeno na sua relação com a pro- ao feminino são culturalmente construí-
dução humana histórica e compreendem dos e transmitidos socialmente através da
a realidade em seu caráter contraditório, interação (Diamond, 2002; Louro, 2004).

650
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Pinheiro (2001) nomeia socialização de 41 adolescentes, estudantes de uma escola


gênero o processo de incorporação pelos estadual e de uma escola particular de Por-
indivíduos das normas, dos papéis, dos va- to Alegre, divididos em 2 grupos de ado-
lores socioculturais que determinam o que lescentes homens, 2 de adolescentes mu-
é ser homem e o que é ser mulher. Como as lheres e 2 mistos. Os grupos tiveram lugar
categorias de gênero são construídas pelas na sala de informática das escolas em que
pessoas nas suas interações, ocorre uma eles estudavam e foram moderados pela
constante reconstrução das mesmas. Em pesquisadora. Esta e todos os adolescentes
decorrência disso, considera-se que a pró- tinham um computador à sua disposição,
pria socialização de gênero é um processo conectado ao MSN. A discussão era realiza-
permanente. Segundo Traverso-Yépez e da por escrito e iniciava com a questão de
Pinheiro (2005), essa socialização se inten- abertura proposta pela moderadora: “Con-
sifica nos espaços de convivência cotidia- tem histórias que vocês acham que mos-
na – a família, por exemplo – nos quais se tram bem o que é ser homem ou o que é ser
reproduzem os papéis de gênero vigentes mulher hoje.”. As narrativas obtidas foram
no contexto dos indivíduos e também as submetidas à Análise de Conteúdo (Bardin,
contradições existentes em tal contexto, 2008). Foram identificados 4 temas entre
possibilitando rupturas em relação ao ins- as narrativas dos adolescentes, sendo Se-
tituído. Oliveira (2007) destacou o papel xualidade o tema que contou com o maior
fundamental da família enquanto agente número de produções. Resultados: No pre-
de socialização para os jovens, constituindo sente trabalho, são apresentados somente
o fundamento das suas trajetórias sociais. os resultados do grupo focal realizado com
Em sua pesquisa, com camadas populares 7 adolescentes homens da escola particu-
no município de São Paulo, identificou uma lar. Tal recorte decorre da presença maciça,
socialização familiar diferenciada para me- nesse grupo, de narrativas que tratavam
ninos e meninas, em termos de atividades da socialização de gênero nas famílias com
permitidas e estimuladas pela família. Ain- filhos adolescentes. Das 13 narrativas ela-
da assim, a autora assinala que a identifica- boradas nesse grupo, 10 referiam-se ao
ção dos jovens com os modelos familiares tema Sexualidade e foram classificadas nas
de gênero não ocorria de forma passiva e seguintes categorias: Hipossexualização
automática, sendo um processo de reitera- da mulher (07 narrativas), Hipersexualiza-
ção, tensão e questionamento em relação çao do homem (02), e Homossexualidade
a tais modelos. Objetivo: O objetivo deste (01). As outras 3 narrativas não continham
trabalho é analisar a socialização de gênero referências à socialização de gênero e não
nas famílias de um grupo de adolescentes são, portanto, apresentadas aqui. A cate-
homens alunos de uma escola de Porto goria Hipossexualização da mulher englo-
Alegre (RS). Metodologia: Será apresen- bou narrativas que associavam ser mulher
tado um recorte de um estudo realizado com ser heterossexual e pouco sexualizada.
acerca das concepções dos adolescentes Nessas narrativas apareceram a censura e
sobre o que é ser homem e o que é ser mu- a repressão por parte do pai e da mãe da
lher atualmente. Neste, foram realizados 6 adolescente mulher quando esta expressa
grupos focais online síncronos, através do sua sexualidade. Segundo os membros do
programa de bate-papo MSN. Participaram grupo focal, diante da sexualidade da filha

651
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mulher, o pai fica brabo e a mãe assustada, cente a apresentar características femini-
irritada, nervosa e preocupada. Somente nas e a parecer homossexual. Em resumo,
uma dessas narrativas sugere que, frente as narrativas mostraram que a socialização
à notícia da perda da virgindade da filha, de gênero na família contribui para a ma-
a mãe a apoia, conversando com ela e de- nutenção da articulação histórica entre
monstrando interesse pelo relato da situa- masculinidade e sexualidade heterossexu-
ção. A categoria Hipersexualização do ho- al (Louro, s/d; Seffner, 2004). No entanto,
mem reuniu as narrativas que associavam ainda que a análise de conteúdo não tenha
ser homem com ter uma heterossexualida- sido capaz de detectar os questionamentos
de exacerbada. Essas narrativas abordaram dos adolescentes, esses padrões de femini-
a aceitação e até o estímulo à sexualidade lidade e de masculinidade foram também
do adolescente homem por parte do seu relativizados e postos à prova durante a
pai e da sua mãe. Nas situações relatadas construção das narrativas. A linguagem
no grupo focal, a vida sexual ativa do fi- confirmou-se como um instrumento por
lho é aceita pela mãe e motivo de orgulho meio do qual se pode oferecer resistência
para o pai. A categoria Homossexualidade às construções estabelecidas e fixadas (Bu-
incluiu uma narrativa em que se explicava tler, 1999), abrindo-se espaço para novos
por que um adolescente da escola tinha sentidos. Ressalta-se, assim, a importância
aparência de homossexual, graças às suas de análises narrativas que contemplem os
características consideradas femininas. Es- movimentos realizados pelos indivíduos no
sas características foram atribuídas à sua processo de construção de sentidos.
pouca convivência com o pai concomitan-
te à sua criação por mulheres. Conclusão: Palavras-chave: família, socialização de
Tais narrativas foram ao encontro da afir- gênero, adolescência
mação de Oliveira (2007) acerca do papel Contato: Gabriela Sagebin Bordini, UFRGS,
fundamental da família como agente de charlestonbordini@yahoo.com.br
socialização de gênero para os jovens. As
reações dos familiares à expressão da sexu-
alidade feminina parecem promover uma LT05-718 - EXPERIÊNCIA PATERNA
socialização de gênero padronizada para EM FAMÍLIAS NUCLEARES E O
as adolescentes, fixando características e DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL DA
atitudes que associam a mulher a um ser FILHA
heterossexual, pouco sexualizado e passi- Andressa Pin Scaglia - FFCLRP/USP,
vo. A família também se sobressaiu como andressascaglia@yahoo.com.br
agente de socialização de gênero para os Fernanda K. T. Mishima - FFCLRP/USP
adolescentes homens, promovendo uma fktmishima@srv1.ffclrp.usp.br
socialização de gênero padronizada, fixan- Valéria Barbieri - FFCLRP-USP,
do características e atitudes que associam valeriab@ffclrp.usp.br
o homem à heterossexualidade ativa. Essa Financiamento: FAPESP
socialização pareceu ser tomada de modo
fatalista pelos próprios participantes da A família ocupa um papel de grande im-
pesquisa, que consideraram que a criação portância no desenvolvimento emocional
oferecida pelos pais pode levar um adoles- da criança, é responsável por fornecer

652
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

condições de sobrevivência, por transmitir tência com falta de delimitações internas


normas, valores pessoais, culturais, emo- que se refletem no mundo externo. Du-
cionais e pelo suprimento das necessida- rante a entrevista, três crianças passaram
des afetivas (Ferrari & Kaloustian, 2002). próximas à sala. Vendo-as, a participante
Apesar do grande destaque dado ao papel começou a chamá-las e a provocá-las: “pe-
materno, o pai também desempenha uma quenininhos”; “Oi pequenininho, cara de
função de grande relevância no desenvol- boboca”. Ela se mostrou desinteressada
vimento físico e emocional de seus filhos em contar histórias sobre as pranchas; a
(Winnicott, 1975). Porém, na sociedade todo momento, pedia para que a pesqui-
contemporânea se vê uma diversifica- sadora fosse com ela até sua sala e, em
ção do comportamento paterno (Thorne, um momento diz “eu estou brava, vamos
1992; Romanelli, 2003; Marri & Wajnman, logo!”. Ao chegar em sua sala, ela abre a
2007), assinalando, assim, um processo porta de maneira brusca e diz gritando
de redefinição ou mesmo indefinição de que viu um Leão sentado em uma cadei-
seu papel. Desta maneira, o objetivo do ra. Antes disso, entra em uma sala que não
presente trabalho é compreender o modo é a sua e tem a mesma atitude. O pai da
como pais de crianças do sexo feminino, primeira díade tem 32 anos, é vendedor.
inseridos na configuração familiar nuclear, Inicia a entrevista de uma maneira mais
experimentam a função paterna, associan- formal e intelectualizada, postura que
do suas vivências ao desenvolvimento do se dissolve ao longo do encontro. Inicia
Self de suas filhas, no sentido definido por se descrevendo como um pai autoritário
Winnicott (1960/1990). Serão apresenta- que exerce poder e domínio: “Sou a refe-
dos os casos de duas díades, pai-filha, bra- rência da criança, sou eu quem mando,
sileiras, de nível socioeconômico médio. quem sabe o que é certo, basta um olhar”.
Foi realizado um encontro com cada pai e Porém, no decorrer da entrevista relata
com cada criança separadamente, utilizan- vivências que revelam uma ausência de
do em ambos 5 cartões de um teste psico- autoridade diante da filha que consegue
lógico projetivo (CAT-A) como instrumen- manipulá-lo e dominá-lo, a única maneira
tos mediadores da comunicação. Trata-se de controle, de imposição de limites, se dá
de uma pesquisa qualitativa em que foi de forma distorcida através do uso da ma-
empregado o método Psicanalítico Win- nipulação: “ela não gosta de colocar cinto
nicottiano, a estratégia metodológica uti- de segurança, então temos que falar que a
lizada foi a de “Narrativas Psicanalíticas”, polícia vai pegá-la para ela colocar”. Afirma
como meio de propiciar o surgimento de que a chantagem é uma maneira mais van-
novos pensamentos e interrogações, par- tajosa e fácil de educá-la, “assim ela esque-
tindo de uma participação ativa do pesqui- ce o que quer e faz o que eu quero”. Além
sador (Aiello-Vaisberg & Machado, 2005). disso, quando impõe a autoridade o faz de
A criança da primeira díade tem quatro maneira inconsistente “quando sou bravo
anos, a entrevista ocorreu em sua escola. com ela bate o maior arrependimento, daí
Mostra-se bastante dominadora, inicial- eu pego ela no colo, peço desculpas, digo
mente afirma que sabe que verá algumas que não vou fazer mais; ela geralmente me
figuras e não vai contar como soube. Ela manda sair de perto”. Afirma ser um gran-
parece experimentar o processo de onipo- de protetor da criança e parece exercer tal

653
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cuidado como uma maneira de poupá-la na família: “eu tenho a minha poltrona do
de frustrações: “Mesmo quando a pes- papai na sala, mas não é cativa minha não,
soa está certa eu não gosto que chamem todo mundo senta” e sentir-se em dívida
atenção da minha filha”. A criança parece em a esposa: “tenho muita gratidão pela
representar um objeto narcísico, e há um minha esposa”. Nos casos apresentados
grande medo da perda do amor. Na segun- os pais parecem vivenciar a paternidade
da díade, a criança, também de 04 anos, de maneira confusa e ambivalente, e os
apresenta-se de maneira bastante tímida e significados que atribuem à paternida-
retraída, fala pouco. A mãe aparece como de parecem refletir no desenvolvimento
uma figura de autoridade proibitiva, cas- de suas filhas. No primeiro caso, a garota
tradora: “eu queria um cachorrinho, mas mostra-se voraz e dominadora, parece que
minha mãe não deixa... não deixa eu fa- a experiência de onipotência sugere um
zer piquenique”. O seu vínculo mais forte processo deficiente de desilusão, quadro
é com o pai: “faço muitas coisas com meu este que vai ao encontro com a entrevista
pai”, mas ela parece senti-lo como alguém do pai que parece ser dominado pela filha,
que a impulsiona ora para o refúgio, ora a apresenta dificuldade para impor a autori-
autonomia: “meu pai segura atrás da mi- dade. No segundo, a garota se mostra inse-
nha bicicleta, mas tem hora que ele solta”. gura, sugere-se um ambiente com falta de
Assim, parece que os pais não são capazes holding suficiente; entrevista que também
de dar holding suficiente, de maneira que corresponde com a do pai que se mostra
a menina não se sinta segura e protegida. confuso em seu papel devido às diversas
Mostra-se frágil diante do mundo. O pai demandas e acaba por ao possibilitar uma
tem 41 anos, inicia o encontro afirmando provisão insatisfatória para a criança.
que é muito prazerosa a experiência de ser
pai, mas, em seguida, aponta dificuldades Palavras-chave: paternidade,
com a filha “ela é muito insegura, muito desenvolvimento emocional, Winnicott
tímida, alguns aspectos me preocupam Contato: Andressa Pin Scaglia, FFCLRP-USP,
nela, como o contato com outras crian- andressascaglia@yahoo.com.br
ças”, mas na seqüência atribui que todos
os problemas com a filha são, na verdade,
problemáticas da esposa: “o pediatra disse LT05-721 - PSICODINAMISMO FAMILIAR
que não deveria levar a garota em um psi- E PATOLOGIA INFANTIL
cólogo, mas minha mulher procurar um”. Andressa Pin Scaglia - FFCLRP/USP
A esposa parece impedir que o pai tenha andressascaglia@yahoo.com.br
acesso à filha, e ela é citada na maior parte Fernanda K. T. Mishima - FFCLRP/USP
da entrevista, tirando, assim, o espaço da fktmishima@ffclrp.usp.br
garota. O pai se mostrou ambivalente dian- Valéria Barbieri - FFCLRP/USP
te de seu papel e seus valores, fica dividido valeriab@ffclrp.usp.br
entre uma imagem ideal de pai e a que a
esposa exige: “às vezes eu preciso sair da A compreensão da patologia infantil en-
minha cama para dar lugar para ela para volve diversos aspectos, em especial, a
elas dormirem confortáveis, eu acho isso dinâmica familiar em que a criança vive.
horrível”. Parece não encontrar seu espaço A qualidade do ambiente oferecido pelas

654
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

figuras parentais é de suma relevância fora, permanecendo pouco tempo com os


para o desenvolvimento emocional do filhos. A mãe relatou que a gestação foi
indivíduo (Winnicott, 1958/2000), assim, conturbada, por discutir muito com seu
é capaz de influenciar o aparecimento de marido nesta época. Ela não amamentou
determinadas doenças e seu tratamen- a criança no peito, porque não tinha lei-
to. Uma das patologias mais difundidas te, o pai complementou que foi ele quem
no momento atual refere-se à obesidade amamentou o filho, dando-lhe mamadei-
infantil, um grave problema de saúde pú- ra. Os pais reclamaram do temperamento
blica, que atinge de 30 a 45 milhões de de Felipe, dizendo que ele era explosivo,
crianças no mundo todo (Fisberg, Cintra & exigente e inconstante (“ora água, ora vi-
Oliveira, 2005). No Brasil, este índice é de nho” – fala do pai). A mãe parece exer-
aproximadamente 13% (Fisberg, 2005), cer o papel materno não apenas com os
sugerindo necessidade de cuidado e com- filhos, mas com o marido também; ela
preensão da doença, para que haja trata- demonstrou autoridade, dominância e
mento mais efetivo. Contudo, apesar da controle, com receio de cometer erros e
abrangência desta epidemia, na literatura ser julgada (culpou a sogra e a babá pelo
científica destaca-se a vertente biológica excesso de peso de Felipe). O pai parece
e social da obesidade, em detrimento do não ter muito espaço para expressar suas
aspecto emocional envolvido na doença. opiniões, busca a aprovação da mulher e
Em vista de tais considerações, este tra- se retrai para dar lugar à figura materna.
balho tem por objetivo compreender a O funcionamento psicodinâmico de Fe-
dinâmica psíquica de uma criança obesa e lipe e seus pais são semelhantes no que
de seus pais, no intuito de se pensar acer- se refere à carência de uma figura capaz
ca do psicodinamismo familiar na susten- de suprir a dependência para, assim,
tação desta patologia. Para tanto, será proporcionar a autonomia e expressão
apresentado um estudo de caso de um de um estilo pessoal de ser. Houve sinais
menino, Felipe, de 09 anos, sua mãe, de da vivência de um ambiente que não foi
46 anos e seu pai, de 36 anos. As sessões suficientemente bom, incapaz de prover
realizadas foram individuais, usando-se e sustentar emocionalmente. A deficiên-
entrevista semiestruturada, aplicação do cia afetiva faz com que eles recorram à
Desenho da Figura Humana (DFH) e do racionalidade, valorização do intelectual
Teste de Apercepção Temática, nas formas e concretude. Os pais oferecem para Fe-
adulto e criança (forma animal – CAT-A). lipe o cuidado material em detrimento do
Os dados advindos destas técnicas foram afetivo, valorizando seu desenvolvimento
interpretados segundo método da livre intelectual no lugar do emocional. Houve
inspeção de Trinca (1984), de acordo com sinais de dificuldade de integração do afe-
referencial psicanalítico winnicottiano. to e razão, com prejuízos à capacidade de
Felipe, 9 anos, apresentava como princi- expressão da criatividade e espontanei-
pal queixa a obesidade e a dificuldade em dade. Os três fazem uso do funcionamen-
perder peso, sentindo-se desanimado a to falso self como forma de se adaptar ao
cada tentativa e insucesso do tratamento ambiente externo, mas que acaba por ge-
para emagrecer. Tem um irmão mais ve- rar sentimento de vazio, inutilidade e futi-
lho, de 12 anos; ambos os pais trabalham lidade, como se não houvesse um espaço

655
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para eles na realidade compartilhada. Os relaciona com o objeto externo, em espe-


pais apresentaram conflito em relação à cial, o alimento, e o uso que é feito deste
sexualidade, permanecendo em um vín- objeto. Deve-se ressaltar a raridade de
culo de dependência mãe-filho, como estudos que abarcam o ambiente familiar
forma de suprir as necessidades que não na patologia infantil, dando destaque ao
foram satisfeitas pelos próprios pais. Com fato de que, ao compreender o psicodina-
isso, houve comprometimento na rela- mismo familiar que envolve a obesidade,
ção atual com o filho, sugerindo que eles seu tratamento pode ser mais efetivo,
se identificaram com as próprias figuras pois, assim, pode-se trabalhar com o sen-
parentais, repetindo a mesma dinâmica: tido que a patologia tem para a família e
oferta do material em detrimento do afe- o uso do alimento para a vida da criança.
tivo. Assim, a criança passa a buscar algo Além disso, ao envolver toda a família,
concreto como solução para a ansiedade esta se responsabiliza pelo cuidado e é
gerada pela falta de afeto, recorrendo capaz de auxiliar a criança, para que não
à ingestão excessiva de alimento. Esta haja tanto sofrimento com o insucesso de
busca não abranda a ansiedade e não outros tratamentos realizados.
satisfaz, gerando sentimento de solidão.
Este sentimento também apareceu na Palavras-chave: criança, obesidade, família
dinâmica dos pais, que buscam amenizá- Contato: Andressa Pin Scaglia, FFCLRP-USP,
-lo mostrando-se ideais e corretos, como andressascaglia@yahoo.com.br
figuras que devem ser muito idealizadas
e perfeitas, o que aumenta a exigência
consigo próprios e com os filhos. Dessa LT05-823 - SERVIÇOS DE ATENÇÃO
maneira, exigem que Felipe seja respon- A FAMÍLIAS DE CRIANÇAS COM
sável e independente, mas sem terem DEFICIÊNCIA: A PERSPECTIVA DE
oferecido a sustentação emocional su- FAMILIARES E PROFISSIONAIS
ficiente para se chegar a essa capacida- Simone Cerqueira-Silva - IESB
de. Ao colocar o outro como inatingível simone.cerqueira@iesb.br
e perfeito, distanciam-no da realidade, Maria Auxiliadora Dessen - UnB
intensificando o sentimento de solidão e dessen@unb.br
de não pertencimento familiar, como se Financiamento: CAPES
não houvesse um lugar próprio para eles.
Felipe demonstrou prejuízo na expressão O suporte familiar e as competências de
do gesto espontâneo, permanecendo cada membro da família são importantes
preso na concretude e no sentido que o recursos que influenciam o modo como a
alimento tem: amenizar a ansiedade ad- criança lida com a sua deficiência, tendo
vinda da lacuna afetiva. Pensando em tais um impacto significativo sobre o seu ajus-
considerações, é possível assinalar que as tamento. Independente da condição so-
características dos membros familiares cial, econômica e do nível educacional da
estão inter-relacionadas, fazendo sentido família, são os genitores que transmitem
se compreendidas no todo. A dinâmica valores, crenças e práticas que são inte-
psíquica apresentada pelos pais e pela riorizados pelos filhos, atuando como um
criança influencia a maneira como esta se elo que intermedeia e integra o indivíduo

656
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e a cultura. Considerando que a família é a mães, 12 pais, 10 irmãos e 16 crianças) e


base para a promoção do desenvolvimen- 26 profissionais (16 especialistas de equi-
to das crianças, as famílias com crianças pes técnicas, 5 coordenadores de equipes
que apresentam algum tipo de deficiência técnicas e 5 diretores de instituições de
requerem uma atenção especial, na medi- atendimento às crianças com deficiên-
da em apresentam necessidades diferen- cia), de duas localidades brasileiras: uma
tes e especiais. Para alcançar níveis satis- capital (Distrito Federal) e uma cidade do
fatórios de adaptação à situação da defici- interior do Estado de São Paulo. Dessas
ência, estas famílias demandam maior su- famílias, 7 tinham filhos entre 4 e 6 anos
porte, cuidado, informação e acolhimen- de idade, com diferentes deficiências:
to, sobretudo no que tange às tarefas de auditiva (n=3), múltipla (n=2), intelectual
desenvolvimento familiar. A literatura tem (n=1) e física (n=1); e 9 tinham filhos com
mostrado que um dos fatores de proteção idades acima de 6 anos, com diferentes
para as famílias que têm crianças com de- deficiências: auditiva (n=1), intelectual
ficiência é a composição e a qualidade da (n=3), física (n=3) e visual (n=2). Para a co-
rede social de apoio. Neste contexto, os leta de dados foram realizadas entrevistas
programas de intervenção familiar consti- semiestruturadas (individuais) com todos
tuem fonte poderosa de apoio às famílias, os participantes e seu roteiro incluía ques-
sobretudo quando eles são fundamenta- tões relativas à caracterização, avaliação
dos no modelo centrado nas famílias. Sob e experiências com os serviços e atendi-
essa perspectiva, as famílias deixam de ser mentos familiares. A análise qualitativa
vistas como passivas e dependentes das das entrevistas foi realizada com base em
orientações profissionais para serem con- um sistema de categorias desenvolvido de
sideradas ativas. Seus conhecimentos e acordo com os procedimentos propostos
habilidades são realçados em uma relação para gerar sistemas integrados de cate-
de parceria e não mais de dependência, gorias, possibilitando a quantificação das
na qual são desenvolvidos lideranças e ci- categorias. Os resultados mostraram que
dadãos críticos. Apesar de haver reconhe- os atendimentos oferecidos às famílias
cimento, na literatura, da importância da eram, na sua grande maioria, esporádicos
família para os programas de intervenção, e informais (orientações sem uma regu-
a sua participação no âmbito dos atendi- laridade para acontecer), principalmente
mentos e das políticas públicas tem sido individuais (basicamente psicoterapia de
limitada. O primeiro passo para a adoção apoio) ou em grupo (restritos às reuniões
bem sucedida de modelos centrados na de pais). Já os serviços oferecidos refe-
familia é a identificação, descrição e ava- riam-se às atividades educativas e profis-
liação dos atuais serviços e atendimentos sionais (n=30), às confraternizações (n=9)
às crianças com deficiência e suas famílias. e às atividades físicas (n=7). As avaliações
Assim, este estudo investigou os serviços dos profissionais e dos familiares apon-
oferecidos e os atendimentos dirigidos às taram alguns aspectos positivos como as
famílias, na perspectiva de crianças com orientações/informações sobre as rela-
deficiência, de suas famílias e dos profis- ções parentais, a deficiência e o desenvol-
sionais de instituições de atendimento. vimento da criança (n=22), bem como o
Participaram da pesquisa 16 famílias (16 apoio emocional (n=11), e a troca de expe-

657
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

riências (n=9). Quanto aos aspectos nega- LT05-843 - FAMÍLIA E DEFICIÊNCIA


tivos, os especialistas das equipes técnicas INTELECTUAL: PESQUISAS SOBRE
disseram, principalmente, que os serviços ESTRESSE, ESTRATÉGIAS DE
e atendimentos familiares não eram prio- ENFRENTAMENTO E APOIO SOCIAL
ritários no cronograma de trabalho das Larissa Dias de Oliveira - UFJF
instituições (n=3), e as famílias avaliaram larissa.dias83@yahoo.com.br
que eles eram insuficientes (n=10), pois as Nara Liana Pereira-Silva - UFJF
mães ficavam ociosas e não eram atendi- naraliana.silva@ufjf.edu.br
das em suas necessidades (n=3). As famí-
lias desejavam que os diferentes tipos de A família constitui o primeiro universo de
intervenções já oferecidos pelas institui- relações da criança, podendo proporcio-
ções fossem sistematizados/regulares, em nar-lhe um ambiente que promova ou não
horários flexíveis, com melhores profissio- um desenvolvimento adequado e saudá-
nais, e que envolvessem, inclusive, pais e vel. De acordo com a visão sistêmica, o
irmãos da criança. As crianças, por sua vez, nascimento de uma criança com deficiên-
manifestaram o desejo de que seus pais cia é uma experiência única para o grupo
pudessem participar mais dos seus aten- familiar, trazendo implicações para o de-
dimentos. Os resultados indicaram que, senvolvimento do grupo, bem como para
mesmo sendo diversificados, os serviços e cada um de seus membros individualmen-
atendimentos familiares ainda eram cen- te. Trata-se de uma experiência inespera-
trados na promoção do desenvolvimento da que acarreta mudanças na dinâmica
da criança e não da família. Portanto, os e funcionamento familiar, o que já vem
serviços e atendimentos oferecidos às fa- sendo mostrado pela literatura. As expec-
mílias NE ainda estão embasados muito tativas dos genitores, também, podem ser
mais em um modelo centrado nos profis- afetadas pelo nascimento de um filho com
sionais do que em um modelo centrado deficiência, tendo implicações no modo
na família. Apesar das contribuições que como estes vão lidar com as demandas de
essas intervenções têm tido para os fami- criação do filho. A importância do tipo de
liares, nota-se que o desconhecimento da relação estabelecida entre a criança com
literatura que subsidia esses trabalhos in- deficiência intelectual (DI) e os membros
cide em prejuízos para as instituições, os familiares tem sido tema bastante ressal-
familiares e suas crianças. Considerando tado pela literatura. Entretanto, há um
as lacunas identificadas faz-se necessá- foco mais frequente sobre as interações e
rio envidar esforços para a melhoria da relações mãe-bebê/criança com DI em de-
qualidade das intervenções familiares, de trimento das relações com adolescentes e
modo que programas centrados nas famí- adultos e daqueles entre estes membros
lias possam ser, de fato, implementados e o pai e o irmão. Observa-se, atualmen-
na realidade brasileira. te, um aumento de estudos com estes
membros, especialmente no contexto
Palavras-chave: família, crianças com brasileiro nos últimos anos. Dada à impor-
deficiência, intervenção familiar tância da família para o desenvolvimento
Contato: Simone Cerqueira da Silva, IESB, do indivíduo com deficiência intelectual,
simone.cerqueira@iesb.br o presente trabalho tem o objetivo de

658
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

proporcionar uma reflexão a respeito das adaptativas, incluindo sentimentos de cul-


implicações do estresse em famílias de pa, hostilidade, agressão e evitação. Con-
pessoas com deficiência intelectual fo- tudo, o suporte social pode ser uma des-
calizando: as estratégias utilizadas pelos sas estratégias que auxiliam na adaptação
genitores e o tipo e qualidade do apoio às circunstâncias estressantes. A rede de
social recebido. O estresse parental é um apoio e os serviços disponibilizados para
dos acometimentos psicológicos mais tratamento e acompanhamento de pes-
frequentemente descritos pela literatu- soas com deficiência parecem favorecer
ra como tendo implicações importantes a adaptação da família, a qual necessita
para as interações e relações familiares ser atendida com recursos e profissionais
e, consequentemente, para o desenvol- adequados. Estudos apontam que essas
vimento dos membros familiares. A lite- famílias possuem um menor número de
ratura aponta para o fato de os genitores pessoas suportivas, existindo uma relação
de crianças com DI apresentarem níveis negativa entre estresse e suporte social,
mais altos de estresse quando compara- isto é, quanto maior se apresenta o nível
dos com o grupo de genitores de crian- de estresse, menor é o número de pesso-
ças sem deficiências. Entretanto pouco se as suportivas na rede social das famílias. O
conhece do estresse parental em famílias estresse, as estratégias de enfrentamento
de adolescentes com DI. Estudos indicam e a rede social de apoio são variáveis que
que o estresse materno tende a aumentar estão inter-relacionadas e, devido a isso,
ao longo do tempo, enquanto o estresse há necessidade de se ampliar os estudos
paterno permanece estável. Outras inves- para que se possa aprofundar o conheci-
tigações apontam que o estresse materno mento sobre o funcionamento de famílias
e paterno apresentaram relação positiva, com pessoas com deficiência intelectual,
ou seja, quanto maior o estresse do pai utilizando uma metodologia adequada
maior o estresse da mãe. Parece, portan- que possa captar a complexidade do fe-
to, não haver tanto consenso na literatura, nômeno. É importante que as pesquisas
indicando a necessidade de mais estudos envolvam outros membros do sistema
nessa área. Não há dúvidas, portanto, que familiar, como os pais, já que homens e
os genitores de pessoas com deficiências mulheres reagem de maneiras diferentes
representam uma população que tende ao estresse, além dos níveis de estresse
a manifestar mais sintomas de estresse paterno e materno estar associado a fa-
e, por isso, necessitam de mais atenção tores diferentes relacionados aos filhos.
dos profissionais de saúde, sobretudo dos A escassez de estudos com a população
psicólogos, para que possam desenvolver adolescente e adulta, sobretudo com sín-
estratégias de enfrentamento adequadas. drome de Down, especificamente, no Bra-
O que os estudos vêm mostrando sobre as sil, é outra dificuldade encontrada. Não há
estratégias utilizadas pelos genitores para como negar os efeitos de se ter um ado-
o enfrentamento de situações estressan- lescente com DI na família e os desafios
tes, nessas famílias? A literatura apresenta a que esta enfrenta (Bastos & Deslandes,
um quadro não muito animador das estra- 2008, 2009; Cunningham, 1996; Douma,
tégias de enfrentamento dessas famílias, Dekker & Koot, 2006). Quais são as tarefas
o qual é caracterizado por estratégias mal de desenvolvimento típicas dessa fase do

659
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ciclo vital, para essas famílias? Ao longo cialmente quando há uma alteração de po-
do tempo, o estresse tende a aumentar? líticas educacionais, como a implementa-
Quais os níveis de estresse de pais e mães ção do ensino fundamental de nove anos.
durante os anos de adolescência dos fi- Essa ampliação prevê a entrada das crian-
lhos com DI? As estratégias de enfrenta- ças com seis anos no primeiro ano desse
mento são diferentes para pais e mães de nível de ensino, o qual passa a ter duração
adolescentes? Quais são as características de nove anos. Com essa ampliação novas
da rede social de apoio dessas famílias configurações passam a existir, mudanças
com adolescentes? Essas são algumas das de práticas pedagógicas, de tempos, es-
lacunas que podem ser discutidas e apro- paços e de relações interpessoais. Para a
fundadas em planejamentos de pesquisa, realização dessa pesquisa adotou-se como
contribuindo para a geração de dados em- respaldo teórico-metodológico a pers-
píricos que subsidiem o planejamento de pectiva bioecológica de Bronfenbrenner
programas dirigidos a essas famílias. (1997, 1999), a qual possibilita a realização
de estudos que visam analisar fenômenos
Palavras-chave: estresse, deficiência do desenvolvimento humano em sua com-
intelectual, família plexidade analisando as trajetórias indivi-
Contato: Larissa Dias de Oliveira, UFJF, larissa. duais, mas sem deixar de compreender
dias83@yahoo.com.br os contextos macros onde os indivíduos
estão inseridos. O desenvolvimento, nessa
perspectiva, é concebido como o produ-
LT05-852 - CONTINUIDADES E tor e o produto dos processos de intera-
DESCONTINUIDADES NAS RELAÇÕES ção - que devem ser recíprocos - entre o
FAMÍLIA-ESCOLA NA TRANSIÇÃO ser humano biopsicologicamente ativo e
DA EDUCAÇÃO INFANTIL PARA O os múltiplos contextos, sendo necessário
ENSINO FUNDAMENTAL: CONCEPÇÕES que esse desenvolvimento ocorra através
DOCENTES do tempo. Destaca-se para esse estudo, a
Keila Hellen Barbato Marcondes - UNESP afirmação que Bronfenbrenner (1997) faz
keilamarcondes@yahoo.com.br sobre a importância do estabelecimento
Silvia Regina Ricco Lucato Sigolo - UNESP de comunicação entre os contextos em
sigolo@yahoo.com.br que o indivíduo em desenvolvimento é ati-
Financiamento: CNPq vo, destacando a importância dos sujeitos
(responsáveis e docentes) se envolverem
O presente estudo é parte integrante da em ambos os contextos, desenvolvendo
tese de doutoramento denominado “Tran- a confiança mútua e o consenso de ob-
sição da educação infantil para o ensino jetivos. O que esta afirmação salienta é
fundamental de nove anos: trajetórias de a importância da interação entre família-
escolarização”. A transição entre esse dois -escola, que se apresenta como um fator
níveis de ensino mostra-se um momento positivo para o desenvolvimento infantil.
de grande importância na trajetória de es- Diante desse cenário, o presente estudo
colarização das crianças, por se tratar de tem como objetivo analisar as continui-
uma situação na qual podem ocorrer con- dades e descontinuidades das relações
tinuidades e/ou descontinuidades, espe- estabelecidas entre a escola e a família

660
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

em uma situação de transição da educa- momento de entrada e saída das crianças.


ção infantil para o ensino fundamental. Estes entram na instituição para buscar as
A pesquisa ocorre em uma cidade do in- crianças, momento em que há troca de
terior de São Paulo, tendo como sujeitos informações sobre os acontecimentos do
quatro professoras das últimas etapas da dia. Já no ensino fundamental, nesses mo-
educação infantil de duas escolas e seis mentos, os responsáveis são impedidos de
docentes dos primeiros anos do ensino entrarem na escola, aguardando as crian-
fundamental de outras duas escolas. A co- ças do lado de fora. Alguns responsáveis,
leta de dados foi realizada por meio de en- quando necessitam com urgência conver-
trevistas semiestruturadas, observações sar com a docente adentram o ambiente,
das reuniões de pais e situações cotidia- mas não é uma prática comum. As reuni-
nas de contato entre famílias e docentes. ões entre pais e mestres se constituem em
Com as professoras da educação infantil a uma das principais formas de comunica-
coleta foi realizada em 2009 e com as pro- ção entre os dois ambientes, não havendo
fessoras do ensino fundamental no ano de muitas diferenças entre os dois níveis de
2010. Para a análise de dados, foram rea- ensino no que se refere à dinâmica da re-
lizadas leituras das transcrições das entre- alização desses encontros. Centram-se em
vistas e das notas de diário de campo, em informes relacionados ao comportamento
seguida o levantamento dos temas abor- das crianças, seu desempenho acadêmico
dados pelas docentes, finalizando com e o pedido de auxílio para a instituição. Em
a redação das análises (BIASOLI-ALVES, relação ao envolvimento dos responsáveis
1998; BOGDAN; BIKLEN, 1991). Os dados com a escolarização da criança, destaca-
preliminares foram divididos em quatro remos nesse momento, somente a parti-
categorias definidas como: Comunicação cipação dos responsáveis nas festividades
na educação infantil, Envolvimento fami- promovidas pela escola. Há uma participa-
liar na educação infantil, Comunicação no ção maior dos responsáveis na educação
ensino fundamental e envolvimento fami- infantil, uma vez que a instituição sempre
liar no ensino fundamental. As categorias estende o convite aos pais, diferentemen-
foram construídas baseadas nos estudos te do ensino fundamental, que raramen-
de Bhering e Siraj-Blachtford (1999), Bhe- te convida os responsáveis. As docentes
ring e De Nez (2002) e Bhering (2003). Os da educação infantil destacam em seus
dados advindos da educação infantil e do depoimentos que a escola está sempre à
ensino fundamental foram triangulados, disposição da comunidade, seja para par-
ou seja, buscaram-se as continuidades e ticiparem das festividades ou para con-
descontinuidades referentes às catego- versarem sobre a evolução das crianças,
rias desenvolvidas. A análise inicial per- já as professoras do ensino fundamental
mite-nos somente apresentar resultados afirmam que mantêm o contato com os
preliminares da pesquisa. Em relação à responsáveis, já que acham essa inter-
comunicação, pode-se afirmar que há di- conexão essencial, mas que essa relação
ferenças nas formas destas ocorrerem nas deve ser controlada e somente realizada
duas instituições educacionais. Nas insti- em horários especificados pela escola. O
tuições de educação infantil, os contatos que se pode concluir é que há diferenças
dos responsáveis ocorrem diariamente no entre as relações entre família e escola em

661
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cada um dos níveis de ensino pesquisados, A Dermatite Atópica (DA) ou eczema é


mostrando uma descontinuidade dessas uma doença de pele que acomete entre
relações. Tendo em vista que a passagem 10 a 20% da população mundial, sendo
da educação infantil para o ensino funda- mais prevalente em crianças. Esta derma-
mental é uma transição ecológica, a qual é tose se caracteriza pela presença de epi-
definida por Bronfenbrenner (1997) como sódios cíclicos de prurido, com alterações
sendo a alteração da posição da pessoa imunológicas cutâneas que causam infla-
em desenvolvimento, resultando em mu- mação. Ocorre com mais freqüência em
dança de papel, ambiente ou ambos, tal famílias em que há rinite alérgica, asma
descontinuidade mostra-se preocupante. e alergia alimentar, e em países indus-
De acordo com o autor, para que a transi- trializados (Alvarenga & Caldeira, 2009;
ção seja efetiva para a criança em desen- Ricci et al., 2009; Myssior et al., 2008).
volvimento, é importante que haja apoio Quando um membro do sistema familiar
e participação de pessoas significativas está acometido por DA é comum que esta
neste processo, o que não foi constatado. instituição passe por uma reorganização,
Assim, há que se refletir sobre as possíveis especialmente por se tratar de uma do-
estratégias a serem adotadas, buscando ença crônica cuja etiopatogenia não é
estabelecer uma continuidade entre as conhecida, mas entende-se que alguns
formas da família e escola se relacionar, fatores, tais como mudanças climáticas,
estabelecendo assim uma interconexão alimentação e situações emocionais po-
que seja benéfica para o desenvolvimento dem desencadear novas crises que ten-
das crianças. tam ser evitadas pela família (Ferreira, et
al., 2006). Os cuidadores de crianças com
Palavras-chave: transição escolar, perspectiva alguma enfermidade são expostos a uma
Bioecológica, relação família-escola grande quantidade de eventos estresso-
Contato: Keila Hellen Barbato Marcondes, res. O impacto da doença pode alterar re-
UNESP, keilamarcondes@yahoo.com.br lações conjugais, reduzir a capacidade de
os pais manterem um adequado suporte
social à criança e aos demais membros da
LT05-916 - APEGO E SUPORTE SOCIAL família (Kohlsdorf & Costa Júnior, 2008).
PERCEBIDOS POR MÃES DE CRIANÇAS O apoio social serve como moderador
COM DERMATITE ATÓPICA da relação entre problemas de compor-
Tatiana Helena José Facchin - PUCRS tamento e o estresse parental. Não obs-
tatyhelena@yahoo.com.br) tante, observa-se que quanto maior é o
Helena Diefenthaeler Christ - PUCRS apoio social percebido, menor é o estres-
helenachrist@hotmail.com) se relacionado a sobrecarga emocional
Bruna Ferreira - PUCRS pelas mães. Também constatou-se que os
brufernandes1@hotmail.com) cuidados da mãe consigo, a autoconfian-
Deise Fonseca Fernandes - PUCRS ça, a busca de lazer e realização pessoal
deise.ff@hotmail.com) atenuam o estresse materno relacionado
Gabriel José Chittó Gauer - PUCRS a doença do filho (Bellé et al., 2009), pro-
ggauer@pq.cnpq.br) piciando uma melhor qualidade de vida.
Financiamento: CNPq, CAPES e Pró-bolsa A existência ou não de suporte social

662
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

está diretamente relacionado a presen- pensão de os seres humanos construírem


ça ou ausência de diversas doenças. O “fortes vínculos afetivos com outros e de
prognóstico de quem está doente é me- explicarem as diferentes formas de cons-
lhor quanto maior for seu suporte social. ternação emocional que ocorrem quan-
Assim, pode-se conceber o suporte social do da separação ou perda involuntárias
como um fator protetor à saúde. Outro do outro, é construído a partir do proces-
ponto importante a ser destacado é a re- so de interação entre o bebê e o círculo
lação entre suporte social e níveis de es- maternante” (Piccinini, et al, 2001). Do
tresse, na qual este também atua como ponto de vista evolucionista, o sistema
fator protetivo nas situações estressoras de apego aumenta as chances de sobre-
“quando as medidas de suporte estão vivência do bebê por permitir ao cérebro
relacionadas com a disponibilidade per- imaturo da criança a utilização do funcio-
cebida de recursos interpessoais que res- namento maduro de seus pais, a fim de
pondem às necessidades presentes nos atender suas necessidades vitais. O vín-
eventos estressantes” (Matsukura, et al., culo materno adequado é crucial para o
2002). As configurações familiares que, surgimento do apego seguro, o qual ne-
além da mãe, contam com a presença cessitará da retro-alimentação do com-
e auxílio de outros adultos favorecem a portamento do bebê (Motta et al., 2005;
maternidade e o desenvolvimento infan- Pio, 2007). Filhos de mães mais sensíveis
til, especialmente quando o pai é a figura e responsivas tendem a ter um apego
presente, pois este também compartilha seguro, caracterizado pela confiança na
com a esposa a responsabilidade da cria- disponibilidade emocional e responsivi-
ção, incluindo êxitos e fracassos. Estudos dade materna, bem como na promoção
realizados constataram a existência de de uma orientação positiva e confiante
uma relação positiva entre a presença do da criança em relação à mãe, ao mundo
pai e o cuidado maior da mãe pelo filho, e a si mesma. Entretanto, quando o bebê
favorecendo o desenvolvimento infantil recebe cuidados com pouca sensibilida-
saudável (Piccinini et al., 2007; Motta et de e baixa responsividade materna, ele
al., 2005). Outro fator relevante para o de- tende a desenvolver um apego inseguro,
senvolvimento adequado da criança diz o qual representa uma falta de confian-
respeito ao apego. Para Montagu (1988) ça na disponibilidade emocional da mãe
o contato físico é fundamental para o e acarreta em uma atitude negativa e
crescimento do bebê, evidenciando a re- pouco confiante em relação à genitora,
lação entre pele e apego. Anzieu (1989) ao mundo e a si mesmo (Piccinini et al.,
afirma que a pele e o toque são bastan- 2007; Motta et al, 2005). Percebe-se a
te importantes para o desenvolvimento importância do apego e do suporte social
do aparelho psíquico do infante. Assim, como fatores protetivos à saúde tanto
Piccinini et al. (2007) referem sobre a im- da mãe quanto da criança. Desta forma,
portância de que os pais respondam com este trabalho se propõe a avaliar o apego
afeto e sensibilidade ao comportamento e o suporte social percebido por mães de
do filho, a fim de favorecer a formação crianças com DA. Método. Amostra: Será
do apego e seu desenvolvimento sócio- composta por 6 mães com idade entre
-emocional. O apego representa a pro- 18 a 60 anos, com escolaridade mínima

663
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de 5ª série do ensino fundamental, com LT05-942 - O IMPACTO DO CUIDADO


filhos portadores de DA entre 6 anos a 9 PARA FAMILIARES DE IDOSOS COM
anos 11 meses e 29 dias. Local: Ambula- DOENÇA DE ALZHEIMER: AVALIAÇÃO
tório de Dermatologia Sanitária de Porto DA SOBRECARGA, QUALIDADE DE VIDA,
Alegre e Ambulatório de Dermatologia DEPRESSÃO E ANSIEDADE VERSUS A
do Centro Clínico Santa Marta. Delinea- CAPACIDADE FUNCIONAL DO IDOSO
mento: Qualitativo, descritivo e explora- Sara Salsa Papaleo - UFRN
tório. Instrumentos: Questionário de da- sara_papaleo@hotmail.com
dos sócio-demográficos, Questionário de Luana Cristina Andrade - UFRN
Suporte Social (SSQ) (Matsukura, et al., luana.cris@globo.com
2002) e Escala de Apego Adulto de Collins Beatriz Mosca Rivera - UFRN
(EAA) (Silva, 2008). Procedimentos: Após biarivera@hotmail.com
leitura e assinatura do Termo de Con- Caroline Araújo Lemos-Ferreira - UFRN
sentimento Livre e Esclarecido (TCLE), a k_rollemos@hotmail.com
pesquisadora aplicará individualmente Eulália Maria Maia - UFRN
os instrumentos supracitados. Os dados eulália.maia@yahoo.com.br
serão digitados no Programa SPSS 17.0
e será realizada uma análise descritiva Atualmente, são conhecidos vários tipos
na qual serão avaliadas as freqüências, de demências, dando-se destaque para
médias e desvios padrões das variáveis a Doença de Alzheimer (DA) visto que
em estudo através do Qui-quadrado e representa entre 60% e 70% do total de
correlação de Spearman. Outros testes demências. Trata-se de uma doença neu-
paramétricos e não paramétricos serão rodegenerativa progressiva e irreversível,
utilizados conforme a situação a ser ana- heterogênea nos seus aspectos etiológi-
lisada. Procedimentos éticos: Este estudo cos, clínico e neuropatológico, e se carac-
está aprovado pelo Comitê de Ética em teriza por um declínio funcional progres-
Pesquisa da PUCRS sob o número CEP sivo e perda da autonomia, ocasionando
11/05428. Resultados: Neste momento a necessidade de constantes e complexos
as participantes estão sendo recrutadas cuidados, o que impõe tanto um desgaste
nos serviços. As entrevistas ocorrerão para o próprio paciente quanto sobrecar-
no mês de julho do presente ano. Desta ga e estresse aos familiares e/ou cuida-
forma, os resultados são esperados até dores. Tais cuidados exigem dedicação,
o mês de setembro de 2011. Conclusão: às vezes, total do cuidador, conduzindo a
Este estudo encontra-se em andamento, uma sobrecarga emocional, que somada
portanto, não há conclusões até o pre- aos sintomas neuropsiquiátricos, é fonte
sente momento. de estresse e prejuízos na saúde e na qua-
lidade de vida do cuidador, comprometen-
Palavras-chave: Apego; Suporte Social; Mães. do sobremaneira sua integridade física,
Contato: Tatiana Helena José Facchin – mental e social, sendo fontes de sofrimen-
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande to e de morbidade. Especialmente quan-
do Sul (PUCRS). tatyhelena@yahoo.com.br. do esse cuidador é o(a) companheiro(a)
do idoso, ou seja, também um idoso, mais
vulnerável às doenças crônicas decorren-

664
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tes do estresse e da sobrecarga. A Políti- sócio-demográficas, as Escalas de Katz,


ca Nacional da Saúde do Idoso define o de Lawton e de Qualidade de Vida; o ins-
termo cuidador como a pessoa, podendo trumento de Avaliação da Sobrecarga dos
ser membro familiar ou não, que, com ou Cuidadores; o Inventário de Depressão de
sem remuneração, cuida do idoso doente Beck e o Inventário de Ansiedade de Beck.
ou dependente no exercício das suas ativi- No período de maio a julho de 2009 foi
dades diárias, tais como alimentação, hi- realizado um estudo-piloto com 7 cuida-
giene pessoal, medicação de rotina, acom- dores de idosos atendidos no CEASI, com
panhamento aos serviços de saúde ou ou- o objetivo de verificar a aplicabilidade dos
tros serviços requeridos no cotidiano. No instrumentos. Em seguida iniciou-se a
entanto, os estudos revelam que 80% dos coleta de dados propriamente dita, pros-
cuidadores de idosos são membros da fa- seguindo de Agosto de 2009 à Janeiro de
mília do paciente, tendo em vista o valor 2010. Os dados obtidos foram organizados
cultural de cuidado e proteção atribuído com auxílio do Programa Microsoft Excel e
à família. Portanto, a sociedade, historica- processados através do programa SPSS for
mente, responsabiliza a família pelos cui- Windows, versão 10.0. Os dados do pre-
dados prestados ao idoso, mas, atualmen- sente estudo corroboram com grande par-
te, não a instrumentaliza adequadamente te dos estudos encontrados na literatura
para realizar tal cuidado. A atenção ao cui- a respeito das características sócio-de-
dador familiar do idoso com DA tem sido mográficas do cuidador familiar do idoso
cada vez mais reconhecida como forma de com Alzheimer, visto que apontam que o
promoção da saúde do idoso e prevenção cuidado é realizado, predominantemente,
de agravos e da manutenção da saúde do pelas mulheres, esposas e filhas do pacien-
cuidador. Neste sentido, este estudo teve te, com idade média entre 50 e 65 anos.
como objetivo geral caracterizar os cuida- Com relação às implicações do cuidado,
dores de idosos com Doença de Alzheimer o nível de dependência do paciente, ou
(DA) atendidos no Centro Especializado na seja, as dificuldades em realizar as AVDs,
Atenção à Saúde do Idoso (CEASI), no mu- mostraram-se importantes na avaliação
nicípio de Natal/RN; além dos objetivos do impacto no cuidador, pois na medida
específicos de: Avaliar a capacidade fun- em que a doença evolui e a necessidade
cional destes idosos com DA; avaliar a so- de cuidados aumenta, ocorre também o
brecarga e a qualidade de vida dos cuida- aumento da sobrecarga para o cuidador, e
dores destes idosos; avaliar ainda os níveis conseqüentemente aumenta a percepção
de depressão e ansiedade nesses cuidado- das dificuldades encontradas. O cuidar en-
res. Participaram do estudo 31 cuidadores volve a necessidade de abdicar de muitos
familiares de idosos com DA, voluntários, pontos em sua vida em prol do outro - fato
de ambos os sexos, triados dentre outras que pode levar também a um risco subs-
modalidade de cuidadores como os “cui- tancial de adoecimento pessoal e familiar.
dadores remunerados” ou “cuidadores No presente estudo, os cuidadores apre-
secundários”. Foi utilizada a técnica da sentaram elevados índices de depressão e
entrevista estruturada em situação indivi- ansiedade, relacionados a uma moderada
dual, aplicando-se além de um questioná- sobrecarga para esse cuidador. Observou-
rio semiestruturado, contendo questões -se baixo índice de qualidade de vida entre

665
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os cônjuges e entre os indivíduos com o família a função de cuidar necessita de


nível superior completo, assim como alto clareza sobre a estrutura familiar, o tipo
índice de depressão entre esses últimos, de cuidado a ser executado, o tempo ne-
os cuidadores viúvos e idosos (acima de cessário, as características da doença e o
60 anos). O maior índice de sobrecarga do acompanhamento profissional, o que ra-
cuidado, no entanto, foi dos cuidadores tifica a necessidade de pesquisas que ob-
que são filhos dos idosos. É importante jetivem levantar as características desses
salientar que para além dessas caracterís- cuidadores de modo a subsidiar a elabora-
ticas, muitas outras variáveis situacionais ção de políticas públicas de saúde.
podem influenciar nesses índices, trata-
-se de indicativos gerais. Não obstante, Palavras-chave: cuidadores, demência de
os estudos indicam possibilidades para a Alzheimer, sobrecarga do cuidado
minimização do impacto do cuidado para Contato: Sara Salsa Papaleo, UFRN,
o cuidador, como o suporte social, o enga- sara_papaleo@hotmail.com
jamento em atividades da comunidade e
participação em grupos de apoio, ou ou-
tras variações como terapia familiar, tera- LT05-953 - O EFEITO DE INTERVENÇÃO
pia individual, ou intervenções psicoedu- EM PLANEJAMENTO FAMILIAR NA
cacionais que possam ajudar ao cuidador PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO
no enfrentamento nessa situação de crise. NAS RELAÇÕES AFETIVAS
Para tal, é necessário que os profissionais Marianna Santos Rodrigues - UFRB/CCS
de saúde estejam aptos a prover suporte marianna-sr@hotmail.com
adequado a esses cuidadores, planejando Patrícia Martins de Freitas - UFRB/CCS
junto a eles intervenções para melhorar a pmfrei@gmail.com
qualidade de assistência aos envolvidos Financiamento: FAPESB
na tarefa, com o objetivo de minimizar
problemas tanto para pacientes, quanto O sistema familiar, definido como um gru-
para cuidadores, visando à promoção da po de pessoas que compartilham o seu
saúde e bem-estar para ambos. Percebe- dia-a-dia, desempenha uma importante
-se a crescente necessidade de investi- função no desenvolvimento e na promo-
mentos em políticas públicas para cons- ção da qualidade de vida e do bem-estar
truir e manter redes de suporte a idosos e de seus membros. Para estudar a família
a cuidadores, de modo manter o idoso em na contemporaneidade é preciso atentar
seu ambiente domiciliar, oferecendo um para a estrutura familiar, a qual está inti-
suporte à família e especialmente aos cui- mamente vinculada com o momento his-
dadores. Uma vez estabelecida essa rede tórico que atravessa a sociedade da qual
de atenção ao cuidador do idoso com DA, ela faz parte, visto que, um conjunto de
oferecendo apoio institucional, material variáveis sociais, econômicas, históricas e
e emocional, eles poderão exercer o cui- culturais vem a moldar e a influenciar na
dado e permanecer inseridos socialmente conjectura da construção familiar atual.
sem imobilizar-se pela sobrecarga, oriun- Considerando o desenvolvimento como
da da exigente atenção ao doente depen- período de transições em que em todas
dente. Vale salientar ainda que delegar à as fases do ciclo de vida ocorrem mudan-

666
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ças que vem a influenciar novas fases da inicialmente da aplicação dos instrumen-
vida de um individuo, e por sua vez, em tos de avaliação, em seguida, intervenção
toda a família. Os modelos de planeja- com orientações sócio-educativa e, por
mento familiar típicos deixam de conside- fim, a re-avaliação com os mesmos ins-
rar os efeitos significativos da etnicidade, trumentos iniciais. Todo processo foi re-
da religião, das classes sociais, em todos alizado nas escolas, em 12 encontros de
os aspectos de quando e de que manei- 60 minutos. As sessões abordaram temas
ra uma família faz suas transições de uma como: educação, saúde, orçamento do-
fase para outra. O planejamento familiar méstico, sexualidade, relações afetivas,
realizado pelo programa de saúde pública lazer, habitação. Os participantes foram
é voltado para a questão do controle da orientados para a análise dos problemas,
natalidade, a redução do aborto, a saú- das potencialidades e das conseqüências
de da mulher, a redução da pobreza etc, definindo as possíveis soluções. O produto
não realizando avaliações das potenciali- de cada etapa é o planejamento familiar
dades e dos recursos do núcleo familiar. que responde aos diferentes problemas
Entretanto, o planejamento familiar, na presentes no sistema. A análise dos dados
perspectiva do desenvolvimento, acres- de avaliação (teste e re-teste) foi realizada
centa variáveis organizadoras do sistema, através do programa estatístico Statistical
permitindo um planejamento baseado na Package for the Social Sciences (SPSS). Os
sustentabilidade e no ciclo de vida da fa- instrumentos utilizados foram o Familio-
mília. O objetivo deste estudo é avaliar, na grama e o Inventário do Clima Familiar
perspetiva do desenvolvimento, o efeito – ICF. O Familiograma é um instrumento
da intervenção em planejamento familiar desenvolvido para avaliar a percepção da
realizado com adolescentes sobre o clima afetividade e o conflito familiar nas díades
familiar: relações de conflito e afetividade familiares, a partir de 22 adjetivos, confi-
de suas famílias, comparando os resulta- gurado com a escala Lickert. O Inventário
dos de teste e re-teste. Esse estudo teve de Clima Familiar é um instrumento que
como base o Projeto de Planejamento Fa- avalia a percepção do clima familiar e as
miliar na Perspectiva do Desenvolvimento, dinâmicas existentes nos relacionamentos
desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Saú- intra e extrafamiliares. Essa avaliação é re-
de, Educação e Desenvolvimento - SAED, alizada através de quatro fatores diferen-
da Universidade Federal do Recôncavo tes: apoio, coesão, conflito e hierarquia,
da Bahia. A metodologia do estudo é de contendo um total de 32 itens. Os resulta-
caráter quase experimental. A coleta de dos sócio-demográficos apresentam 150
dados foi realizada com 150 adolescentes, adolescentes entre 12 e 19 anos (M=16,03
entre 12 e 19 anos, estudantes de escolas e DP = 2,03). A maioria dos participantes
públicas. Os adolescentes foram convida- era do sexo feminino (73,4%). A distribui-
dos através do contato com as instituições ção da escolaridade mostra maior concen-
de ensino. A realização da pesquisa ocor- tração para o ensino fundamental incom-
reu mediante a assinatura do termo de pleto (43,4%) e ensino médio incompleto
consentimento livre e esclarecido (TCLE) (46,5%). Os dados sobre estado civil de-
pelos responsáveis dos participantes. O monstram que a maioria dos adolescen-
procedimento do projeto foi constituído tes é solteira (81,6%); 10,7% são casados;

667
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

5,6% vivem juntos e 1,0% são divorcia- entende-se o desenvolvimento saudável


dos. No pré-teste, o ICF apresentou o fa- associado ao alto nível de coesão, mas
tor coesão familiar (M= 17,25 e DP=5,27) não ao alto nível de hierarquia. O plane-
maior que o fator de conflitos (M=10,82 e jamento realizado por cada adolescente
DP=5,48); os fatores hierarquia (M=11,67 foi útil no sentido de demonstrar todos os
e DP=4,68) e apoio (M=16.27 e DP=4,81) elementos que precisam ser considerados
estão estatisticamente semelhantes. Com para o desenvolvimento familiar, abor-
base no Familiograma, as famílias foram dando conjuntamente questões sobre a
classificadas com alta afetividade e baixo sexualidade. O aumento significativo dos
conflito. Apresentou-se maior afetividade escores de afetividade (Familiograma) foi
na relação díade mãe/filho (M=41,05 e outro resultado encontrado a partir da
DP=10,55) e maior conflito na relação fi- comparação entre o pré-teste e pós-teste.
lho com outro individuo, em geral irmão Os resultados demonstram que o progra-
(M=21,38 e DP=9,44) e na relação filho/ ma de planejamento familiar na perspec-
pai (M=20,30 e DP=9,09). No pós-teste, ao tiva do desenvolvimento contribui com o
fazer uma comparção com o pré-teste, o bem estar de adolescentes, melhorando
resultado do Familiograma descreve alta de forma significativa a afetividade entre
afetividade e baixo conflito, com uma dife- os mesmos e suas respectivas famílias.
rença estatística significativa no aumento
do nível de afetividade na díade filho/mãe Palavras-chave: planejamento familiar,
(M=42,68 DP=10,38 p=0,05) e na dídade conflito, afetividade
filho/pai (M=37,43 DP=12,64 p=0,05). Contato: Marianna Santos Rodrigues, UFRB,
Quanto à relação de conflitos, houve um marianna-sr@hotmail.com
aumento não significativo estatísticamen-
te nas relações de conflitos na díade filho/
outro indivíduo, em geral irmãos, e na dí- LT05-962 - A INTERPRETAÇÃO
ade filho/pai. Quanto à comparação entre TRANSGERACIONALIDADE EM
os escores médios no pré e pós-teste do PSICOTERAPIA PAIS-BEBÊ: RELATO DE
Inventário de Clima Familiar e seus res- DOIS CASOS CLÍNICOS
pectivos fatores: Conflito (M=10 DP=5,03 Evanisa Helena de Maio Brum - UFRGS/CESUCA
p=0,39); Hierarquia (M=10,67 DP=3,84 evanisa.brum@gmail.com
p=0,74); Apoio (M=16,27 DP=3,84 p=1,0); Aline Grill Gomes - UFRGS
Coesão (M=18,05 DP=5,07 p=0,25), os Cesar Augusto Piccinini - UFRGS
resultados não apresentaram diferenças
estatisticamente significativas. Os fato- As intervenções utilizadas em psicotera-
res coesão e hierarquia são fatores fortes pia visam provocar mudanças específicas
para compreensão do clima familiar que ou gerais em alguns aspectos da dinâmi-
se contrapõe, mas não estão dissociados: ca psíquica e/ou comportamental do pa-
a coesão representa o vínculo emocio- ciente, podendo ser reveladas ao longo do
nal entre os membros da família, o que processo psicoterápico através de insights
evidencia um fator positivo nas relações (Zimerman, 2001). O termo insight, con-
familiares. Por sua vez, a hierarquia está forme o autor, é a compreensão pelo pa-
associada à autoridade. Desta forma, ciente de fatos dinâmicos que contribuem

668
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para a resolução de conflitos inconscien- e a díade mãe-bebê e/ou tríade mãe/pai-


tes (Zimerman, 2001) e pode ser classifi- -bebê, bem como entre a própria díade
cado em: insight cognitivo, insight afetivo, mãe-bebê, ou mesmo entre o casal, du-
insight pragmático. Na Psicoterapia Pais- rante as sessões psicoterápicas, com base
-Bebê (PPB) especificamente, um tipo de no referencial psicanalítico (Gomes, 2007).
intervenção que tem sido bastante desta- A expectativa inicial era de que a interpre-
cada na literatura é a Interpretação Trans- tação transgeracional apesar de importan-
geracional (IT). Esta objetiva buscar conec- te seria pouco presente, pois há registro
tar os acontecimentos do “aqui-e-agora” na literatura sobre psicoterapia pais-bebê
da sessão com o passado conflitivo dos que a referência ao passado da mãe é
pais (Barrows, 2003; Fraiberg et. al., 1994; menos utilizada nesta técnica do que em
Lebovici, 1993), para assim favorecer mais psicoterapia psicanalítica (Cramer, 1999).
qualidade na relação dos pais com o bebê. Esperava-se também que esta intervenção
O presente estudo buscou verificar a asso- apresentasse bastante associação com
ciação das interpretações transgeracionais insights, pois a interpretação objetiva o
com o surgimento dos insights, no atendi- insight (Zimerman, 2001), seja ela relati-
mento em psicoterapia pais-bebê de duas va a conteúdos transgeracionais ou não.
famílias. Foi utilizado um delineamento de A primeira expectativa recebeu apoio da
estudo de caso coletivo (Stake, 1994) para análise das duas famílias, cujos resultados
se investigar o processo psicoterápico das mostraram que as interpretações transge-
duas famílias atendidas em psicoterapia racionais estiveram pouco presentes. Já
pais-bebê. As sessões de psicoterapia quanto aos insights associados a este tipo
foram gravadas em áudio e vídeo e pos- de interpretação, estes ocorreram pre-
teriormente transcritas para análise. As ponderantemente na Família 1. Já na Fa-
famílias selecionadas faziam parte de um mília 2 encontramos poucas intervenções
projeto maior intitulado “O impacto da desta categoria e nenhuma delas apre-
psicoterapia para a depressão materna e sentou associação com insights, na Famí-
para a interação pais-bebê: Estudo longi- lia 1 esta intervenção foi mais presente e
tudinal do nascimento ao segundo ano de pareceu ter sido mais importante por ter
vida do bebê - PSICDEMA” (Piccinini et al., apresentado associação com insights, in-
2003), que acompanhou 19 famílias cujas clusive do tipo pragmático. Os resultados
mães apresentavam depressão pós-parto. revelaram que as diferenças em relação
A análise dos dados foi realizada separada- aos insights encontrados nas duas famílias
mente, para cada uma das famílias atendi- apresentam relação com o funcionamen-
das em Psicoterapia Pais-Bebê (PPB). Para to dinâmico de cada mãe. A mãe da Fa-
tanto, foram examinadas as transcrições mília 1 apresentou mais associações com
e o próprio vídeo de todas as sessões de insights do que a da Família 2. Podemos
psicoterapia, buscando-se investigar tanto pensar que esta mãe apresentou poucos
as interpretações transgeracionais como insights devido a sua dificuldade de sim-
os insights dos participantes associados à bolização, principalmente por apresentar
elas. Para fins de análise se investigou os alguns traços de personalidade obsessiva,
conteúdos manifestos e latentes das ver- bem como por ter sido possível observar
balizações e interações entre a terapeuta que ela respondeu de forma concreta a

669
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

muitas intervenções. A literatura destaca le sobre sua parceira. Segundo a Organi-


que pacientes com transtorno obsessivo zação Mundial da Saúde, uma em cada
compulsivo apresentam pouca freqüência seis mulheres no mundo sofre violência
de insights em tratamentos de base psico- doméstica, sendo que em 60% dos casos,
dinâmica (Fontenelle et al., 2010). a violência foi perpetrada por marido ou
companheiro (OMS, 2005). A violência
Contato: Evanisa Helena Maio de Brum, provoca uma situação de intenso estres-
UFRGS/CESUCA, evanisa.brum@gmail.com se na família, que comumente resulta em
marcas físicas e psicológicas. Quando a
violência ocorre entre o casal o assunto
LT05-1022 - DE MÃE PARA FILHA: A torna-se ainda mais complicado, devido
TRANSGERACIONALIDADE DA VIOLÊNCIA aos efeitos que frequentemente se esten-
DOMÉSTICA CONJUGAL dem em forma de transgeracionalidade
Lila Maria Gadoni-Costa - UFRGS (Takano, 2006). Na literatura especializada
lilamariacosta@gmail.com diferentes termos podem ser encontrados
Débora Dalbosco Dell’Aglio - UFRGS para descrever esse processo de trans-
debora.dellaglio@ufrgs.br missão dos legados familiares entre as
gerações. Entre eles, destacam-se “trans-
A violência contra a mulher é um fenôme- geracionalidade”, “intergeracionalidade
no que perpassa todas as classes sociais e ”e “multigeracionalidade” (Falcke & Wag-
independe de idade ou escolaridade. Por ner, 2005). Neste trabalho será utilizado o
tratar-se de uma questão multifacetada termo transgeracionalidade para descre-
e de alta prevalência, pesquisadores de ver a transmissão do legado da violência
diversas áreas têm se ocupado dessa te- doméstica de uma geração para outra.
mática (Grossi & Aguinsky, 2001). Entre as Os crimes praticados em família não têm
formas de violência sofridas pela mulher, testemunhas e são encobertos pelo silên-
destaca-se a violência que ocorre no âm- cio das próprias vítimas (Ribeiro, Ferriani
bito privado e é perpetrada por parceiro & Reis, 2004). Quando uma criança rece-
íntimo, também denominada violência be punição física, passa a perceber a si
doméstica ou violência conjugal. Confor- mesma como merecedora desse castigo,
me Calvete, Corral e Estévez (2008), esta acreditando que fez algo errado. Ao lon-
forma de violência constitui-se em um es- go do tempo essa crença é internalizada e
tressor severo, que afeta negativamente poderá se repetir na geração seguinte. A
criança exposta à violência tenderá a ter
a saúde mental da vítima. No Brasil, exis-
problemas relacionados à agressão em
te uma lei contra a violência doméstica,
suas relações futuras (Carrasco, 2003). O
conhecida como Lei Maria da Penha (Lei
ciclo da violência, segundo Muskat (2002)
11.340/2006), que orienta as práticas de
começa quando as crianças sofrem negli-
atendimento multidisciplinar, tanto nas
gência ou abuso em suas casas e quando
delegacias especializadas como nos ser-
aprendem, a partir da relação agressiva da
viços de saúde. Na violência conjugal, o
díade parental, que é através da violência
agressor, que em geral é o homem, busca
que se resolvem os conflitos. A exposição
maneiras diversas para exercer o contro-
das crianças à violência intrafamiliar pro-

670
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

duz reverberações e contribui para o esta- a discussão: transgeracionalidade e estra-


belecimento do ciclo da violência transge- tégias de enfrentamento. A compreensão
racional (Algeri & Souza, 2006; Carrasco, dos resultados considerou como base teó-
2003; Muskat, 2002). Para investigar esse rica os estudos sobre processos de stress
fenômeno, foi realizado um estudo quali- e coping, a partir do modelo de Lazarus
tativo, de cunho exploratório, a partir da e Folkman (1984), pesquisas atuais que
metodologia de estudos de caso proposta consideram o enfrentamento como um
por Yin (2005). Foram estudados os casos processo complexo e dinâmico e a teoria
de duas mulheres vítimas de violência sistêmica. Os dois casos investigados se
conjugal que procuraram uma delegacia configuram como de extrema violência
especializada para registro de ocorrência. conjugal no âmbito doméstico, em que
Como critérios de inclusão foram consi- tanto a violência física como a psicológi-
derados: presença de histórico de violên- ca se fez presente nas famílias de origem
cia perpetrada por parceiro, anterior ou e nas famílias atuais, caracterizando a
atual, com convívio pelo período mínimo transgeracionalidade. As duas mulheres
de um ano; e estar em atendimento psi- entrevistadas tiveram um relacionamento
cológico por pelo menos há dois meses difícil com a figura paterna, descrita como
com um estagiário ou profissional na de- pouco afetiva, rígida, agressiva e autoritá-
legacia onde os dados foram coletados. ria. Os pais de ambas eram alcoólatras e
A coleta ocorreu em um encontro com a situação financeira era precária. Apesar
cada participante, através de entrevista do uso de álcool não ser um fator causal
semiestruturada individual, com duração da violência doméstica, pode ser relacio-
de uma hora e meia, aproximadamente. nado de forma significativa ao fenômeno,
As entrevistas foram realizadas na pró- visto que o alcoolismo severo aumenta o
pria delegacia, após assinatura do Termo risco de vitimização de mulheres e seus
de Consentimento Livre e Esclarecido, e filhos nos relacionamentos com parceiros
foram gravadas para posterior transcrição íntimos. As participantes do estudo pre-
e análise de conteúdo. As entrevistas ti- senciavam agressões por parte dos pais,
nham por objetivo investigar a percepção contra suas mães, que suportavam cala-
das mulheres vítimas quanto à violência das, como se o comportamento dos ho-
sofrida, as estratégias de enfrentamento mens fosse algo “natural”. De acordo com
e a transgeracionalidade do fenômeno. Carrasco (2003), a partir do momento em
As unidades de análise foram definidas a que se estabelece a crença, entre mães
posteriori, a partir da análise qualitativa e filhas, de que o homem pode agredir,
das respostas das participantes, efetuan- instala-se a hierarquia. O homem fica com
do-se recortes dos conteúdos das falas, o papel de dominador e a mulher com o
tais como palavras, expressões ou frases papel de submissa, proporcionando a par-
que se referiam a temas específicos e que tir daí, um total desequilíbrio nas relações.
foram apreciados com o objetivo de es- Estas mulheres suportaram as agressões
clarecer as semelhanças e as diferenças durante muito tempo sem partilhar com
entre os casos (Laville & Dionne, 1999; outras pessoas. A identificação do ciclo
Yin, 2005). A partir disso, foram definidas que se estabelece nas famílias que vivem
duas unidades de análise para direcionar em situação de violência é determinante

671
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para que essa experiência não se repita é de extrema importância e deve ser cui-
geração após geração. São necessários es- dado com delicadeza pela díade parental
forços nos diferentes âmbitos da socieda- no momento em que se organizam os ar-
de no sentido de romper este ciclo, bem ranjos a partir da definição da modalidade
como para auxiliar as mulheres a compre- de guarda. No Brasil, via de regra, adota-
ender a dimensão do mesmo. -se o sistema de guarda única, concedida à
mãe, enquanto o pai fica com o direito de
Palavras-chave: violência doméstica, visita, geralmente em finais de semanas
transgeracionalidade, enfrentamento alternados. Essa situação favorece o afas-
Contato: Lila Maria Gadoni-Costa, UFRGS, tamento gradativo do pai na relação com
lilamariacosta@gmail.com os filhos, com grandes desvantagens para
ambos, principalmente, para os filhos. A
presença do pai, tanto quanto a presença
LT05-1033 - A VIDA EM FAMÍLIA DEPOIS da mãe, tem sido apontada pela literatu-
DO DIVÓRCIO: A PERSPECTIVA DOS ra especializada como fundamental para
FILHOS ADOLESCENTES E ADULTOS a formação da criança e do adolescente
JOVENS (Brito, 2008; Cano et al., 2009; Grzybo-
Lila Maria Gadoni-Costa - UFRGS wski, 2011). A partir da ruptura da conju-
lilamariacosta@gmail.com galidade, a guarda poderá ser definida em
Bruno Moraes da Silva - UFCSPA diferentes modalidades, visando sempre o
brunoms88@gmail.com melhor interesse da prole. A complexida-
Adriana Wagner - UFRGS de dessa tarefa impõe reflexões, visto que
adrianawagner.ufrgs@hotmail.com a literatura especializada considera que
o divórcio é o maior rompimento e tam-
O sistema familiar vem passando por diver- bém o maior promotor de mudanças no
sas transformações nas últimas décadas. processo de ciclo familiar, para todos os
Um dos fatores que contribui para essas membros da família (Alexandre & Vieira,
transformações é o número de divórcios, 2009; Cerveny, 2004; Schabbel, 2005). O
que cresceu 52% nos últimos dez anos no lugar dos filhos, segundo Alexandre e Viei-
Brasil. A partir da separação, a família pre- ra (2009), precisa ser assegurado após o
cisa se adaptar a diversas mudanças: nova fim da conjugalidade, pois a díade paren-
rotina dos filhos, padrão econômico, ma- tal continua a existir independente da se-
nutenção dos laços parentais e adaptação paração. Esses autores salientam que uma
do sistema familiar à nova configuração separação envolve conflitos no relaciona-
que se estabelece. Esse momento é reves- mento familiar e ressalta a importância e
tido de complexidade e consiste em um necessidade de que o casal parental seja
importante desafio para o ex-casal (Carter mantido, bem como a coparentalidade,
& MacGoldrick, 2001). A partir da separa- para que pais e mães possam estabelecer
ção, o estabelecimento da rotina de visi- limites e oferecer aos filhos um ambiente
tas pelo pai ou mãe não-residente pode afetivo e seguro, a fim de garantir-lhes um
gerar nos filhos a sensação de que não desenvolvimento saudável. A coparentali-
pertencem a, pelo menos, um dos lados dade é a relação que se estabelece quan-
de sua família (Travis, 2003). Tal aspecto do duas pessoas assumem, em conjunto, a

672
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

responsabilidade e os cuidados rotineiros tros. Trata-se de uma pesquisa qualitativa


por uma criança ou adolescente, visando de cunho exploratório, com participação
seu bem estar. Essa inter-relação entre o de trinta adolescentes e jovens adultos
casal coparental inclui valores e expectati- com faixa etária entre 18 e 23 anos, mo-
vas quanto ao desenvolvimento dos filhos mento em que já se pode ter uma maior
e independente da configuração familiar, compreensão das consequências da sepa-
da condição civil ou orientação sexual dos ração. Os participantes foram seleciona-
pais (Feinberg, 2002; Margolin, Gordis & dos por conveniência utilizando a técnica
John, 2001; Van Egeren & Hawkins, 2004). de composição amostral “bola de neve”
A separação conjugal tem significados di- (snow ball sampling), que consiste em lo-
ferentes para pais e filhos. Pode ser con- calizar pessoas mediante indicação de co-
siderada pelo adulto como um recomeço, nhecidos, que indicam outras pessoas que
uma nova chance de ser feliz. Por outro se ajustam aos critérios. Os dados foram
lado, as crianças e adolescentes tendem a coletados através da aplicação de ques-
preferir que os pais permaneçam juntos, tionário construído a partir de revisão da
mesmo depois que a separação acontece literatura que investigava os seguintes te-
(Azambuja, Larratéa, & Filipouski, 2010). É mas: relações familiares, coparentalidade,
comum que os filhos experimentem, logo divórcio e guarda de filhos. Foi realizada
após a ruptura, sentimentos de abando- análise de conteúdo, considerando-se os
no. Trata-se de uma etapa difícil, caben- blocos temáticos definidos a priori. As
do aos pais procurar conduzir o processo reações e sentimentos relatados pelos
de separação da maneira mais tranquila participantes por ocasião da separação
possível. As mudanças e os ajustamentos de seus pais variaram entre tristeza, raiva,
necessários na vida dos filhos após a sepa- abalo pela quebra de rotina, inseguran-
ração dos pais tendem a ter uma melhor ça, desamparo e abandono. Atualmente,
adaptação quando o vínculo com ambos os principais sentimentos referem-se à
os genitores é preservado e quando as in- compreensão e saudade. A maioria dos
formações e esclarecimentos sobre como entrevistados não relatou alteração no
será suas vidas são compartilhadas. Sendo desempenho escolar e nem alteração de
assim, a opção pela guarda adotada pela rotina. As principais mudanças são hoje
família e a forma como é administrada percebidas como consequências naturais
passa a ter um papel fundamental nesse da etapa de desenvolvimento em que se
processo. O objetivo deste trabalho é in- encontram. Os resultados revelam que in-
vestigar as transições familiares relacio- dependente da modalidade de guarda es-
nadas ao divórcio sob a perspectiva dos tabelecida judicialmente, a qualidade da
filhos, enfocando o tipo de guarda e as relação entre pais e filhos está mais rela-
principais reverberações entre os subsis- cionada ao efetivo desempenho do papel
temas filial e parental. Foram investigados parental.
aspectos referentes ao relacionamento,
aos sentimentos e reações dos filhos na Palavras-chave: divórcio, guarda de filhos,
ocasião da separação, mudanças na roti- coparentalidade
na e a satisfação quanto à frequência com Contato: Lila Maria Gadoni-Costa, UFRGS,
que convivem com os genitores, entre ou- lilamariacosta@gmail.com

673
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-1238 - O CORPO E SUAS o material das sessões semanais de dura-


DIMENSÕES: UM ESTUDO ETNOGRÁFICO ção de 50 minutos, que eram transcritas
DE UMA JOVEM ANORÉXICA literalmente após atendimento. Além dis-
Roxane Mangueira Sales - UNIFOR so, solicitou-se a paciente um “diário de
roxane_mangueira@hotmail.com comunicação”, no qual eram relatados os
Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC sentimentos vividos durante a semana. A
naradiogo@hotmail.com análise dos dados da descrição das ses-
Márcio Silva Gondim - FANOR sões (24 sessões ao todo) ocorreu através
mgondim@fanor.edu.br da análise de conteúdo temática de Bar-
din. Este método “consiste em descobrir
A Anorexia Nervosa, segundo diagnósti- os núcleos de sentido que compõem a co-
co do DSM-IV é um transtorno alimentar municação e cuja presença, ou freqüên-
caracterizado por importante perda de cia de aparição podem significar alguma
peso, amenorréia, recusa de ingerir ali- coisa para o objetivo analítico escolhido”
mentos, perturbação no modo de viven- (Bardin, 1979). A apresentação dos resul-
tados foi organizada segundo categorias
ciar a forma do corpo. Trata-se de um gra-
de modo a descrever para o leitor o re-
ve distúrbio de imagem corporal. O diag-
lacionamento familiar vivenciado entre
nóstico ocorre predominantemente em
mãe filha través de narrativas. O sigilo e
mulheres e apresenta uma elevadíssima
o anonimato da paciente foram garanti-
taxa de mortalidade, configurando-se em
dos. Assim, o nome citado é fictício. Foi
um grave problema de saúde pública. O
assinado o Termo de Consentimento Livre
objetivo deste estudo é desnudar a narra-
e Esclarecido, de acordo com Resolução
tiva e compreender que tipos de conflitos
nº. 196/96 do CNS/Ministério da Saúde,
estão envolvidos no processo de constru-
Brasil. Resultado e Discussão: Ana, uma
ção da subjetividade da anoréxica. Meto-
jovem de 26 anos, natural de Fortaleza.
dologia. Estudo de caso de uma paciente
É a filha caçula e tem um irmão de 31
com quadro de anorexia nervosa, de 26
anos. Fala baixa, pausada, quase inau-
anos, em psicoterapia. Para realização
dível. Traços delicados. Vive com a mãe
deste trabalho foi utilizada a epistemolo- e perdeu o pai há um ano e seis meses.
gia qualitativa e o método etnográfico. A Residiu durante 3 anos e meio em Curiti-
etnografia é definida como um processo ba, onde cursava jornalismo. Pouco após
sistemático de observar, detalhar, descre- a morte do pai, teve a sua segunda crise
ver, documentar e analisar o estilo de vida de anorexia, chegando a apresentar IMC
ou padrões específicos de uma cultura ou 18. Foi quando retornou a conviver com
sujeito, para aprender o seu modo de vi- a mãe. Recusava-se a comer, fazia uso de
ver em seu ambiente natural. O pesquisa- laxantes, além de apresentar distúrbio de
dor mantém um intenso envolvimento in- imagem corporal grave, consoante o ins-
tersubjetivo com as pessoas pesquisadas. trumental de avaliação de imagem corpo-
Trata-se de um processo de relação inter- ral BSQ (Body Shape Questionnaire) utili-
pessoal onde ocorre o encontro entre a zado. O BSQ mede as preocupações com
subjetividade do pesquisador e a do cola- a forma do corpo, autodepreciação, em
borador. Para coleta de dados, utilizou-se razão da aparência física e da sensação de

674
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

estar “gorda”. A sua primeira crise anoré- A rigidez e o controle presentes na per-
xica ocorreu aos 15 anos, juntamente com sonalidade da anoréxica encontram-se na
um grave episódio depressivo. Chegou a fala e nos escritos da paciente. Segundo
ser internada e pesar 46 kilos. A paciente as narrativas de Ana, podemos descrever
iniciou então acompanhamento psiqui- três categorias: “Mãe: uma fonte de afe-
átrico. Apresentava também episódios tos e conflitos”, “o espelho da mãe rígida”,
de compras compulsivas. Preocupação “a negação do corpo de mulher e do fe-
excessiva com a imagem, e compulsão minino”. Consoante Ana, seus remédios,
por cosméticos e produtos de beleza que atitudes, sentimentos eram controlados,
comprava, mas não usava. A observação assim como sua comida, as amizades,
da dinâmica mãe e filha ocorreu desde a notas, horários e até mesmo o que de-
primeira sessão. Desvelou-se um compor- veria vestir. Os sentimentos da paciente
tamento simbiótico da díade mãe-filha e em relação à mãe oscilavam entre raiva,
um sentimento, por parte da paciente, de sensação de dependência, zelo e fragili-
ser controlada, de impotência diante até dade. “Minha mãe não gosta de mulher,
da própria fala. A mãe entra no consultó- ela controla as minhas roupas... (...) diz:
rio “arrastando” a filha. Fala por ela, que mulher não presta. Minhas roupas são
permanece inexpressiva. Peço-lhe para feias, meus desenhos de vestidos são
permanecer a sós com a paciente. Ao fi- horrorosos. Até meu celular ela xereta...”.
nalizar o atendimento, novamente a mãe Oscila e diz “Ela é frágil. Sozinha, perdeu
adentra o consultório. Acusa a filha, cha- meu pai e só tem a mim. Ela quer que
mando-a de mentirosa, afirmando que eu seja a menina que ela quis ser e não
lhe rouba dinheiro para comprar de forma podia. Passou a vida castelos de areia.”
desmedida e que ela está sem estudar e Ressalta: “Adoro desenhar vestidos, mas
trabalhar. Além desse comportamento, si- eles são caros, impossíveis de usar e de
tuações como ligar minutos antecedentes cair bem no meu corpo”. Para Gabbbard
ao horário da sessão para confirmar se a (1992) é como se o corpo não fizesse par-
paciente estava lá e tentar obter informa- te do self de anoréxicas, mas pertencesse
ções da filha com a terapeuta desvelava aos seus pais, de modo que há uma falha
uma situação de controle excessivo. Iden- em reconhecerem uma individualidade
tificam-se fatores familiares, psicológicos própria. Conclusões: As narrativas desve-
e socioculturais que interagem entre si lam que a internalização da mãe negati-
de forma complexa de modo a predispor, va levou Ana a desenvolver um medo de
a precipitar e/ou a manter o transtorno. assumir seu corpo de mulher adulta. O
Ana afirmou, em diversos momentos da excesso de controle é internalizado pela
terapia: “Passei a vida tentando ser uma paciente, que manifesta crises sempre
boa filha, uma boa namorada, só queria que se sentia cobrada ou em situações de
amor e aceitação...”. Destaca-se a nega- dependência.
ção inconsciente da figura feminina adul-
ta e o temor da anoréxica de assumir pa- Palavras-chave: anorexia, construção
péis concernentes a esta, como não apre- subjetiva, etnografia
sentar contornos arredondas do corpo, Contato: Nara Maria Forte Diogo Rocha, UFC,
permanecendo como um ser assexuado. naradiogo@hotmail.com

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-1299 - A HOMOAFETIVIDADE E AS graduação de Psicologia de uma institui-


NOVAS CONFIGURAÇÕES FAMILIARES ção de ensino da região metropolitana
Felipe Pereira de Assis - CFI de Porto Alegre. Foi aplicado uma escala
titiassis@gmail.com likert de 4 pontos (Concordo Totalmen-
Alessandra de Almeida Rodrigues te, Concordo, Discordo e Discordo Total-
Andressa Brogni mente) contendo 42 perguntas fechadas.
Cassia Souza Para melhor exposição dos resultados,
Evanisa Helena Maio de Brum foram consideradas apenas as alternati-
Karen Simone Lenz Fortes vas Concordo (contemplando Concordo
Karine da Silva Moraes Martins Totalmente) e Discordo (contemplando
Paula Grazziotin Silveira Rava Discordo Totalmente). Para os resultados,
foram destacadas as questões que apre-
Nas últimas décadas temos presenciado sentaram maior relevância para discus-
a modernização, e este conceito não está são sobre o tema abordado. Em relação
relacionado somente com a tecnologia, a caracterização da amostra encontramos
mas também com os padrões da socie- que a idade mínima foi de 17 anos, com
dade. A vida adulta é uma fase marcada a média de 27,5 anos e idade máxima de
por várias transições e transformações. 54 anos. Em relação ao gênero encontra-
Surgem os papéis a serem definidos de mos que 20,5% da amostra era do sexo
estrutura e estabilidade. A relação esta- masculino, representando 30 sujeitos; e
belecida entre pessoas do mesmo sexo 79,5% era do sexo feminino, representan-
é definida como homoafetiva. Relação do 116 sujeitos. Quanto ao estado civil
esta que tem causado polêmica, devido 57,5% eram solteiros, representando 84
à questão jurídica. A justiça brasileira já sujeitos; 30% casados, representando 44
tem reconhecida a união de pessoas do sujeitos; 1,5% divorciados, representan-
mesmo sexo, garantindo os direitos de do 2 sujeitos e, por fim, 11% viviam em
família nestes casos. No que se refere à União estável, representando 16 sujeitos.
adoção existe divergência de opiniões en- O questionário aplicado visa estabelecer
tre os juristas brasileiros, apesar de já se as diferenças de opiniões entre os gêne-
ter jurisprudência aceitando a adoção por ros, idades e estados civis. Na questão “O
casais homossexuais. As opiniões têm se casamento faz parte do ciclo da vida”. Os
dividido, levantando questões como uma resultados demonstraram que mulheres:
possível educação desviante, moral, ética 104 (90%) Concordam; 12 (10%) Discor-
e social. Apresentaremos neste trabalho dam; homens: 24 (80%) Concordam; 6
uma pesquisa qualitativa que objetivou (20%) discordam. Nota-se que a pesqui-
analisar a opinião pública face à confi- sa constatou uma diferença de 10 pontos
guração da família pós-moderna, para percentuais entre a opinião das mulheres
fins deste trabalho consideramos família e dos homens em relação ao matrimônio.
pós-moderna aquelas compostas por ca- Esta questão é importante, visto que é
sais homoafetivos e crianças adotadas. a primeira do questionário e indaga aos
A amostra foi realizada por conveniência participantes suas concepções sobre a
e composta por 146 alunos do curso de aquisição matrimonial em um aspecto ge-
ral. Outra pergunta feita, também com um

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sentido geral, para observarmos a opinião uma família constituída por casais homo-
dos participantes, enunciava que “Rela- afetivos e crianças adotadas, surge uma
cionar-se com a pessoa que ama faz parte variação considerável na faixa etária dos
da vida”. Nesta questão observamos una- 21 aos 30 anos. Nesta população espe-
nimidade entre os participantes. A partir cífica, 20% a mais responderam que não
deste momento, começamos a analisar as concordam com esta nova concepção de
respostas dadas às questões diretamente família, enquanto a faixa etária acima de
relacionadas à união por pares homoa- 41 anos foi unânime, concordando com a
fetivos e a configuração da nova família. possibilidade desta configuração familiar.
A questão apresentada era: “A ideia de Através deste questionário e da análise de
uma relação entre dois homens ou duas dados, constatou-se que, mesmo as pes-
mulheres me incomoda”, além dos resul- soas concordando com a ideia de relacio-
tados mostrarem que, apesar da maioria namentos, de afetos, de família, dentro
ser favorável ao casamento e de a unani- de um contexto geral, ainda existe certo
midade concordar com o relacionamen- preconceito, face aos relacionamentos
to entre pessoas que se amam, 26% dos homoafetivos e a adoção de crianças por
entrevistados afirmaram que se sentem homossexuais. O último gráfico demons-
incomodados com a ideia de uma relação tra uma significativa diferença entre as
entre pessoas do mesmo sexo. Destes, opiniões na faixa de 21 a 30 anos. Talvez
21% são mulheres e 31% são homens. A tal resultado esteja relacionado ao fato
pesquisa também buscou coletar dados das pessoas, nesta fase da vida, estarem
nos diferentes estados civis, abrangendo iniciando seus relacionamentos mais
solteiros, casados, uniões estáveis e divor- duradouros e vislumbrando a formação
ciados. Pretendíamos também verificar o de uma família dentro dos padrões con-
grau de tolerância das pessoas frente ao siderados “normais” para a sociedade.
relacionamento homoafetivo afirman- Também deve ser considerado o fato de
do: “A qualidade do amor entre pessoas que as pessoas, nesta faixa etária (princi-
do mesmo sexo é igual à de pessoas de palmente as mulheres), encontrarem-se
sexo diferente”. O resultado demonstrou no ápice do seu período de fertilidade e
que as pessoas casadas apresentam 7% procriação, tentando inconscientemente
mais tolerância ao relacionamento homo- refutar a possibilidade da adoção. O tema
afetivo do que as pessoas solteiras. Isso escolhido aborda dois assuntos conside-
nos chamou a atenção para analisarmos rados polêmicos pela sociedade: o pri-
as opiniões, considerando agora as dife- meiro é sobre a sexualidade, homossexu-
renças etárias. Na questão “Uma família alidade e relacionamentos homoafetivos;
pode ser composta por um casal homo- o segundo agrega a adoção, que também
afetivo e crianças adotadas” dividimos as é um assunto bastante complexo.
respostas em dois grupos: o primeiro com
pessoas menores ou iguais a 28 anos e Palavras-chave: família, homoafetivo, adoção
segundo grupo acima dos 29 anos. O que Contato: Felipe Assis, Cesuca Faculdade Inedi,
podemos perceber nos resultados obti- titiassis@gmail.com
dos é que, apesar da maioria (55%) das
pessoas concordarem com a formação de

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT05-1301 - PERCEPÇÃO E IMPACTO dor ou de uma cuidadora que as ofereça


NA FAMÍLIA DA RECEPÇÃO DO estímulos, atenção, carinho, compreen-
DIAGNÓSTICO DE SINDROME DE DOWN são e proteção. Especificamente no que
EM RECÉM-NASCIDOS diz respeito à recepção do diagnóstico de
Marta Lindalva da Silva - IESB deficiência em um recém-nascido em uma
martinha@gmail.com família pode gerar situações complexas,
Denise Farias da Silva - IESB muitas vezes resultantes da falta de pre-
denise.farias.silva@gmail.com paro e informação adequada, bem como
Rosângela Valentim Pereira - IESB de uma rede de apoio que auxilie a lidar
rosangela.valentim.pereira@gmail.com com os sentimentos experienciados nesse
Ana Beatriz Sousa de Menezes - IESB momento. A Síndrome de Down, um dis-
anab@geap.com.br túrbio genético também chamado de Tris-
Alayr Rodrigues Barros - IESB somia do Cromossoma 21, por ser resulta-
alayr.barros@gmail.com do da existência de um cromossomo 21 a
Jucinara Santos Ribeiro - IESB mais, é conhecida como uma das causas
jucysribeiro@hotmail.com mais comuns de deficiência mental, além
Anaí Haeser Peña - IESB/UnB, de afetar outros sistemas do corpo provo-
anai.hp@gmail.com cando mal formações de alguns órgãos. É
Gilvan Gomes da Silva - IESB um dos distúrbios genéticos mais comuns
lammarca@gmail.com entre recém nascidos vivos. Atualmente
o diagnóstico dessa síndrome é possível
A família pode ser definida como um con- ainda no período gestacional, e mesmo
junto organizado de pessoas que se rela- após o nascimento sua identificação é re-
cionam e interagem, sendo que cada um lativamente simples, especialmente devi-
de seus membros tem um papel especí- do a características fenotípicas peculiares
fico. Influenciam nessas definições tanto aos portadores dessa síndrome. Contudo,
questões culturais como as necessidades as pessoas ouvem falar pouco sobre a
individuais e do grupo no qual se inserem. síndrome e diante de um caso na famí-
Alterações ou mudanças que afetem um lia sentem-se desamparadas e inseguras.
dos membros podem repercutir nos de- Embora os pais muitas vezes conheçam
mais, inclusive causando um estado de a possibilidade de seu bebê nascer com
crise que desorganiza a estrutura familiar. uma má formação, o filho esperado e ima-
Esses efeitos de alterações ou mudanças ginado é sempre saudável e lindo. Quan-
sobre a estrutura familiar variam bastan- do o bebê esperado ou nascido difere
te, e dependem do membro acometido, daquele imaginado, haverá um período
do tempo de permanência do agravo e, de luto, no qual as respostas de negação
ainda, de sua gravidade. Especificamente ou aceitação refletir-se-ão no vínculo es-
no caso de uma doença crônico-degene- tabelecido entre pais e bebê. A possível
rativa, em especial a de um bebê, exige predominância de sentimentos negativos
da família maior tempo e dedicação para expressos por mães de crianças com esta
o cuidado. Por ainda encontrar-se em síndrome sobre seus filhos pode acarrer-
fase de crescimento e desenvolvimento, o tar sentimentos ambivalentes e compor-
bebê e a criança dependem de um cuida- tamentos de superproteção (Sigaud &

678
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Reis, 1999), bem como a formação de me- descritiva, de natureza qualitativa, que
canismos de defesa, tais como a negação, busca analisar a percepção e o impacto
relatadas por Brunhara e Petean (1999) na família da recepção do diagnóstico de
como um dos mecanismos mais freqüen- síndrome de Down em recém-nascidos,
tes, provavelmente como meio de dimi- com vistas a identificar elementos para a
nuir ou encobrir a problemática do filho, construção de um serviço de apoio a famí-
para ganhar tempo para a elaboração do lias com crianças portadoras de Síndrome
choque inicial. O papel dos profissionais de Down. No estudo piloto foram reali-
de saúde, tanto no momento de atendi- zadas entrevistas semiestruturadas com
mento pré-natal em geral, como meio de pais de crianças portadoras de Síndrome
informação e conscientização, assim como de Down, baseadas em um roteiro dividi-
na ocasião do diagnóstico e informação à do em duas partes: a primeira dedicada
família, é de extrema importância. A es- à caracterização da família, e a segunda
ses profissionais cabe maior empenho no relacionada às experiências vividas por
sentido de envolver e, ao mesmo tempo, ocasião da recepção do diagnóstico de
voltar suas ações para a unidade familiar, Síndrome de Down. As análises apontam
tendo como objetivo apoiá-la, fortalecê-la para a importância da presença de um
e instrumentalizá-la ao desempenho efi- psicólogo no momento da transmissão do
caz de suas funções junto a todos os seus diagnóstico, bem como da necessidade de
membros e, de maneira particular, junto informação sobre a Síndrome. Quase to-
àqueles dependentes de cuidados. Muitas dos os casais entrevistados indicaram ter
vezes o diagnóstico da Síndrome de Down recebido a notícia entre dois dias após o
não é realizado de maneira adequada, nascimento, e apenas um recebeu esse
acarretando maior sofrimento e, como comunicado no segundo mês de gestação,
consequência, trazendo mais dificuldades sendo os profissionais responsáveis por
para a aceitação do bebê e o estabeleci- essa tarefa o obstetra, no último caso, o
mento de um vínculo adequado entre pais pediatra e o médico da UTI neonatal. O
e recém-nascido. A maneira profissional e diagnóstico, em todos os casos, foi trans-
objetiva da comunicação feita comumen- mitido de forma direta e brusca, sem pre-
te por médicos pode causar indignação parações ou cuidados especiais, inclusive
aos pais. Justamente por esse motivo é aquele de oferecer esclarecimentos sobre
importante que o bebê seja apresentado esse distúrbio e os cuidados ou rede de
à família de tal maneira que seus atribu- apoio disponível. As reações relatadas en-
tos e aspectos normais sejam ressaltados. volvem o susto, desespero, choro compul-
Também é de suma importância conside- sivo, bem como a percepção de recebe-
rar o período de desorganização que os rem informações desencontradas e falta
pais experimentam durante os estágios de de apoio. Os entrevistados relataram sen-
choque e negação, de tal forma que infor- tir-se despreparados para a recepção da
mações sobre as condições e a evolução notícia. Também foi relatada a existência
da criança terão que ser repetidas várias de conflitos familiares disparados a partir
vezes. O presente trabalho apresenta in- da notícia, os quais foram solucionados
formações construídas a partir de um es- internamente, sem interferência ou apoio
tudo piloto, que é parte de uma pesquisa de profissionais.

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: síndrome de Down, família, to. Metodologia. A investigação abrangeu


apoio psicológico a produção científica dos últimos dez anos
Contato: Marta Lindalva da Silva, IESB, sobre o tema da satisfação conjugal asso-
martinha@gmail.com ciado à coabitação/união estável acessada
através da base de dados “Web of Scien-
ce”. No total, foram identificados 102 arti-
LT05-1370 - O EFEITO DA COABITAÇÃO gos entre janeiro de 1999 e maio de 2008,
NA SATISFAÇÃO CONJUGAL sendo quatro excluídos devido ao idioma.
Caroline Rubin Rossato Pereira - UFSM/ Dos 98 artigos analisados, 37 (41,3%),
ULBRA apresentaram resultados referentes ao
carolinerrp@gmail.com “status” conjugal e foram submetidos a
Lina Wainberg - UFRGS uma análise de conteúdo. Discussão de
linawainberg@hotmail.com resultados. (a) Satisfação conjugal: De um
Cláudio Simon Hutz - UFRGS modo geral, foram apontados menores ní-
claudio_hutz@terra.com.br veis de satisfação conjugal em pessoas co-
Rita de Cássia Sobreira Lopes - UFRGS abitantes quando comparadas às casadas
sobreiralopes@portoweb.com.br (Hansen & Shapiro, 2007; Lee, Miles & Hol-
ditch-Davis, 2006; Stanley, Whitton & Ma-
A possibilidade da coabitação tornou-se rkman, 2004; Xu, Hudspeth & Bartkowski,
mais freqüente nas últimas décadas no 2006). Considerando-se as especificidades
mundo ocidental e trouxe consigo uma sé- das configurações do arranjo conjugal,
rie de questionamentos sobre a dinâmica os coabitantes de longa duração (“status
estabelecida entre os casais nestas uni- quo”) foram apontados como significativa-
ões quando comparados a casais vivendo mente menos satisfeitos com o relaciona-
em casamentos legalizados. Considera-se mento que os outros quatro tipos de casais
como satisfação conjugal a avaliação sub- comparados (casados, casados com coa-
jetiva da experiência pessoal no relaciona- bitação pré-nupcial, recasados e recasa-
mento (Wachelkel, Andrade, Cruz, Faggiani dos com coabitação pré-nupcial) (Skinner,
& Natividade, 2004). A este respeito, al- Bahr, Crane & Call, 2002). Mesmo quando
guns estudos sugerem que o “status” con- se deu na forma de coabitação pré-nupcial,
jugal e os novos arranjos de uniões entre houve um efeito negativo sobre a satisfa-
os casais podem influenciar na variação ção conjugal após o casamento (Stanley et
dos índices desta satisfação (Amato, John- al., 2004) ou recasamento (Xu et al., 2006).
son, Booth & Rogers, 2003; Evans & Kelley, (b) Fatores associados à satisfação conju-
2004; Wydick, 2007). Objetivo. O presente gal (b1) Comprometimento: Embora um
artigo buscou conhecer a literatura produ- estudo tenha referido não haver diferença
zida sobre a temática da satisfação conju- estatística entre coabitantes e casados no
gal entre casais coabitantes na última dé- comprometimento com o relacionamento
cada. De modo específico, o estudo visou (Garcia & Markey, 2007), a literatura apon-
a investigar os principais achados e as prin- tou que coabitantes possuíam menor com-
cipais diferenças apontadas pela literatura prometimento do que casados (Stafford,
entre casais coabitantes e aqueles que ofi- Kline & Rankin, 2004; Stanley et al., 2004)
cializaram sua união através do casamen- e que casados que coabitaram antes do ca-

680
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

samento tiveram menos comprometimen- dos. Com relação à religiosidade, enquanto


to interpessoal com o parceiro que casados que Wolfinger e Wilcox (2008) referiram
sem coabitação pré-marital (Stanley et al., não haver diferença quanto ao “status”
2004). (b2) Conflito e agressão: Alguns es- conjugal, Stanley et al. (2004) relataram
tudos indicaram que os coabitantes apre- maior religiosidade entre os casados do
sentaram maior freqüência de conflito do que entre coabitantes. Pessoas coabitantes
que casados (Risch, Riley & Lawler, 2003; também apresentaram valores menos con-
Stafford et al., 2004), o que desencadea- vencionais associados a maiores índices de
ria níveis mais elevados de agressão entre inserção da mulher no mercado de traba-
estes casais (Stafford et al., 2004). Contu- lho (Wydick, 2007) e menor discrepância
do, algumas pesquisas não encontraram entre os cônjuges no número de parceiros
diferenças significativas no que se refere à sexuais prévios ao relacionamento (Garcia
freqüência de conflito ou desentendimen- & Markey, 2007). Neste mesmo sentido,
tos (Boesch, Cerqueira, Safer & Wright, Kaufman (2000) indicou que homens sol-
2007; Kluwer & Johnson, 2007) e, tampou- teiros que possuíam atitudes mais iguali-
co, quanto à agressão (Marshall, Weston tárias tinham duas vezes mais chances de
& Honeycutt, 2000) entre os grupos por coabitar do que homens tradicionais (19%
“status” de relacionamento. (b3) Individu- versus 9%). Em contrapartida, um estudo
alidade: Os resultados analisados demons- indicou não haver diferenças de valores
traram que os coabitantes possuíam maio- convencionais entre casados e coabitan-
res índices de individualidade, mantendo tes (Treas & Giesen, 2000). (b5) Separação
mais vínculos não compartilhados e menos conjugal: As pesquisas demonstraram que
contatos sociais comuns ao casal (Kalmijn coabitantes possuem uma tendência mais
& Bernasco, 2001). Nesta perspectiva, Kur- elevada a terminar a união do que casados,
dek (2006) encontrou que os coabitantes chegando a índices maiores que o dobro
possuíam mais contato com amigos do (Amato et al., 2003; Hohmann-Marriott,
que com membros da família e sentiam-se 2006; Kurdek, 2006; Shortt, Capaldi, Kim
menos aceitos pelos pais do companheiro & Owen, 2006). A partir destes resultados,
do que casados com filhos. No entanto, al- pode-se indicar que, somado a caracterís-
guns estudos não encontraram diferenças ticas de personalidade dos indivíduos que
significativas entre coabitantes e casados ingressam em uma coabitação, foram iden-
nos seguintes aspectos: dependência e tificados índices mais elevados de conflito
companheirismo (Stafford et al., 2004); entre coabitantes, o que estaria associado
equilíbrio emprego-família, equilíbrio tem- a menores índices de satisfação conjugal.
po do casal - tempo da família, relaciona- Além disso, a satisfação conjugal estaria
mento com as famílias de origem (Risch vinculada à menor segurança e o menor
et al., 2003); apoio social (Van Willigen & senso de indissolubilidade experienciada
Drentea, 2001); interdependência para o nas relações de coabitação. Neste panora-
planejamento da aposentadoria (Mock & ma, estes casais estariam mais propensos
Cornelius, 2007). (b4) Valores morais: Os a uma separação conjugal do que pessoas
resultados analisados indicaram uma ten- casadas formalmente. Destaca-se ainda
dência dos coabitantes apresentarem valo- que o apoio social e institucional para o
res menos conservadores do que os casa- casamento formal constitui-se em parte

681
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

importante para torná-lo mais satisfatório. res e o irmão e busca da atenção dos pro-
Assim, a coabitação refere-se a uma possi- genitores para si (Hill & Davis, 2000; Miller,
bilidade ainda em construção, na qual os Volling & McElwain, 2000). Assim como o
casais que optam por esta forma de convi- ciúme em adultos, as crianças enciumadas
vência parecem enfrentar desafios maiores agem, pensam e sentem de variadas for-
do que aqueles casados formalmente. Isto mas que não são necessariamente agres-
é, além de vivenciarem os questionamen- sivas ou abertamente competitivas (White
tos pessoais rotineiros da construção da & Mullen, 1989). Além disso, considera-se
vida conjugal, ainda precisam, algumas ve- haver ainda uma falta de clareza na litera-
zes, enfrentar a falta de credibilidade com tura científica acerca dos conceitos refe-
que a sociedade percebe a coabitação. rentes a esta temática. Objetivo. O presen-
te estudo teve como objetivo investigar, a
Palavras-chave: coabitação, satisfação partir da perspectiva dos progenitores, as
conjugal, status conjugal manifestações do ciúme de primogênitos
Contato: Caroline Rubin Rossato Pereira, pré-escolares com seus irmãos menores
UFSM/ULBRA, carolinerrp@gmail.com nos anos iniciais da relação fraterna. Me-
todologia. Participaram do estudo quatro
casais de progenitores de famílias com
LT05-1371 - INDICADORES DE CIÚMES DE dois filhos residentes na cidade de Porto
PRIMOGÊNITOS PRÉ-ESCOLARES Alegre (RS). O filho primogênito possuía
COM OS IRMÃOS MENORES idade pré-escolar e a mãe estava grávida
Caroline Rubin Rossato Pereira - UFSM/ do segundo filho no momento da primeira
ULBRA etapa de coleta de dados. Através de um
carolinerrp@gmail.com estudo de caso coletivo (Stake, 1994), os
Rita de Cássia Sobreira Lopes - UFRGS progenitores responderam separadamen-
sobreiralopes@portoweb.com.br te a entrevistas semidirigidas em quatro
momentos de coleta de dados (3º. trimes-
Com a chegada do segundo filho à família, tre de gestação, aos 6, 12 e 24 meses de
surge um novo desafio ao primogênito, o vida do segundo filho). Os dados foram
de dividir e compartilhar com o irmão o examinados através da análise de conteú-
espaço físico da casa, suas posses, brin- do qualitativa (Bardin, 1977; Laville & Dio-
quedos e, mais do que isto, a atenção, a nne, 1999). Discussão de resultados. Ao
admiração e o afeto dos progenitores. Nes- analisar conjuntamente o ciúme do primo-
te contexto, o ciúme poderia ser pensado gênito em relação aos progenitores com o
como uma experiência normal e talvez di- irmão nos quatro casos investigados, cinco
ária para estas crianças. Diferentemente formas básicas de manifestações de ciúme
das emoções básicas de raiva, tristeza e emergiram, sendo consideradas como in-
alegria, o ciúme refere-se a uma emoção dicadores de ciúme: 1) busca da atenção/
social complexa. Os indivíduos em situação afeto dos progenitores; 2) sentimento de
de ciúme expressam uma gama de emo- perda do amor dos progenitores; 3) de-
ções incluindo raiva, ansiedade e tristeza, sejo de estar no lugar do bebê; 4) expres-
as quais podem estar associadas a com- sões de agressividade; 5) expressões de
portamentos de conflito com os progenito- tristeza/desconforto. Segundo a literatura,

682
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

considera-se como indicadores de ciúme os primogênitos apresentariam uma busca


os comportamentos do primogênito que por resgatar a relação desfrutada até en-
visam a distrair o progenitor ou o irmão, tão. Percebe-se, com isso, a relevância des-
interrompendo a interação deles e reto- te fenômeno entre as crianças pré-escola-
mando para si a atenção parental (Masciu- res que vivenciam a chegada de um irmão.
ch & Kienapple, 1993; Miller et al., 2000; A importância do ciúme expresso neste
Volling, McElwain & Miller, 2002). Mais es- momento de vida das crianças justifica-se
pecificamente, o ciúme tem sido conside- uma vez que a ameaça ao relacionamento
rado basicamente através de dois compor- parental equivale ao risco de perda de uma
tamentos - agressões ou comportamentos relação de apego (Bowlby, 1973/2004a).
de distração aos progenitores ou aos ir- Segundo Weiss (1991), três características
mãos – e três expressões emocionais bá- fundamentais diferenciam o apego de ou-
sicas - raiva, tristeza e ansiedade (Miller et tras formas de vínculos afetivos: a busca
al., 2000; Volling et al., 2002). Frente a este de proximidade; a presença da figura de
panorama, com base no presente estudo, apego proporciona segurança para a crian-
além de considerar os comportamentos de ça, possibilitando que explore o ambiente;
distração e as expressões de agressividade o medo da falta de acessibilidade da figura
e de tristeza do primogênito, propõe-se a de apego causa protesto e ativa tentativas
ampliação do conceito de ciúme, a fim de para se evitar a separação. Os indicadores
incluir também a expressão de temores, de ciúme encontrados no presente estudo
desejos e inseguranças das crianças, consi- estão de acordo com esta definição, uma
derados como emoções e cognições com- vez que podem ser considerados como
plexas. Com isso, corrobora-se a ideia de formas de reaver a relação desfrutada com
que o ciúme refere-se a um complexo de os progenitores até o momento. Pode-se
emoções, comportamentos e pensamen- considerar que tais manifestações (busca
tos (White & Mulen, 1989), devendo ser da atenção/afeto dos progenitores, desejo
considerado mais como uma experiência de estar no lugar do bebê, expressões de
emocional complexa do que como uma agressividade, expressões de tristeza/ des-
emoção em si ou uma expressão compor- conforto) corresponderiam a comporta-
tamental (Volling et al., 2002). Deste modo, mentos de apego, enquanto que o terceiro
apenas podemos acessar os indicadores indicador de ciúme, a saber, o sentimento
do ciúme, e não o ciúme em si. A partir dos de perda do amor dos progenitores, seria
relatos de ciúmes, percebeu-se, através do um fator desencadeante destas manifes-
sentimento de perda do amor dos proge- tações. Assim, os indicadores de ciúme
nitores, que a redução do envolvimento poderiam ser pensados como formas de
parental fora sentida pelos primogênitos manter a relação especial usufruída até
como relacionada ao risco de perda da re- determinado momento com os progenito-
lação parental como um todo e da perda res, sem serem considerados como inade-
de seu lugar de filho e de depositário do quados ou indesejados. Segundo Bowlby
amor parental na família. Neste contexto, (1973/2004b), o comportamento de ape-
a fim de evitar tal perda, e já percebendo go teria uma função vital, sendo um grave
perder parte do envolvimento dos proge- equívoco supor que indique patologia ou
nitores consigo com a chegada do irmão, regressão a comportamentos imaturos.

683
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Ao abordar especificamente a temática infância, segunda infância, terceira infân-


do ciúme fraterno, baseada nas contribui- cia, adolescência, início da vida adulta,
ções da Teoria do Apego, Neubauer (1982) vida adulta intermediária e vida adulta
havia enfatizado, já na década de 80, a tardia. A primeira infância é caracterizada
importância de que os comportamentos do nascimento até os três anos, é mar-
de ciúme fossem compreendidos como cado pelo acelerado crescimento físico e
parte da intensificação do apego, e não motor, e a compreensão e linguagem se
necessariamente uma regressão a etapas desenvolvem rapidamente. A segunda
anteriores do desenvolvimento psicosse- infância ocorre de três a seis anos, é um
xual. Como contribuição, os resultados período que possibilita o aprimoramento
encontrados poderão servir como fonte de das habilidades motoras finas e amplas,
hipóteses a serem investigadas em futuras o pensamento apresenta-se egocêntrico,
pesquisas. Através da proposta dos indica- as emoções e o autoconceito tornam-se
dores de ciúme, estes resultados poderão mais complexos, a independência evolui
apoiar estudos quantitativos em grandes e desenvolve-se a identidade de gêne-
amostras, a fim de ampliar o entendimen- ro. A terceira infância caracteriza-se pela
to deste fenômeno. ampliação da força física e as habilidades
atléticas, o egocentrismo diminui, é mar-
Palavras-chave: ciúme, irmãos, indicadores cada por um pensamento lógico, desde
Contato: Caroline Rubin Rossato Pereira, que o mesmo seja de forma concreta, as
UFSM/ULBRA, carolinerrp@gmail.com amizades exercem uma maior importân-
cia. A adolescência por sua vez vai dos
11 anos a aproximadamente 20 anos e é
LT05-1515 - O DESENVOLVIMENTO fundamentada pela maturidade reprodu-
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NA tiva, o pensamento abstrato vem à tona,
PERCEPÇÃO DAS MÃES no entanto o pensamento imaturo é per-
Jaciara de Lira Almeida Dantas - UFPB sistente em algumas momentos, a edu-
jaciaraadantas@hotmail.com cação está direcionada para a preparação
Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB profissional, há uma incessante busca pela
patynfonseca@hotmail.com identidade, principalmente a sexual, e um
Samara Pereira Cabral - UFPB amadurecimento no relacionamento com
samarapc@hotmal.com os pais. Todavia, frente à sociedade global
Lubiana de Souza dos Santos - UFPB e tecnologia, muitos pais comentam sobre
lubianasouza@hotmail.com o desenvolvimento de seus filhos, ale-
Jessyka Natalya de Sousa Cavalcanti - UFPB gando que muitos deles são precoces em
jessyka_natalia@hotmail.com algumas atitudes e comportamentos, es-
pecialmente no que se refere ao desenvol-
O desenvolvimento humano é peculiar e vimento cognitivo. Também afirmam que
individual, tem sua gênese na concepção os filhos são precoces para as questões
e seu fim com a morte. Segundo Papalia, sexuais, principalmente em virtude da
Olds e Feldman (2009), o desenvolvimen- exposição da mídia de filmes, comerciais,
to do ser humano ocorre em oito perío- novelas e músicas que estimulam a área
dos, são eles: período pré-natal, primeira sexual. Frente a estas questões, buscou-

684
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-se, através deste trabalho, identificar a sapatos e maquiagem da mãe); na lingua-


percepção das mães acerca do comporta- gem (já têm o maior acervo de palavras e
mento das crianças e a fase do desenvolvi- já sabem nomear alguns objetos); na área
mento em que ele deveria ou é apresenta- moral (pedem desculpas e são exigentes),
do. Participaram do estudo 48 mães com na social (tem a percepção de si mesmo
idade média de 35 anos (DP = 10,7), sendo e sabem o que querem; brincam com os
68,8% casadas, 43% com ensino superior colegas, são espontâneos e desinibidos).
e 39,5% tinham até dois filhos. A maioria Para a terceira infância, que compreen-
(31,9%) apresentava uma renda familiar dem de 6 a 12 anos, as mães mostraram
entre R$ 546,00 a R$ 1.635,00. A amostra que as crianças apresentam na área física
foi por conveniência, não probabilística. O (não gostam de tomar banho, usam talhe-
único critério de inclusão era ela ter filho res com facilidades e são independentes);
independente da idade da criança e do na psicossexual (já tem conhecimento so-
estado civil em que a mãe se encontra- bre namoro, sexo e romance); na lingua-
va no momento. Elas responderam a um gem (são comunicativas e falam muito);
questionário em que se perguntava sobre na emocional (são egoístas, rebeldes, tí-
o comportamento da criança (na área físi- midas, preocupadas), na área social (fa-
ca, cognitiva, lingüística, emocional, social, zem amizades, são extrovertidas e desen-
moral) e a fase do desenvolvimento (1ª, volvem o companheirismo), na cognitiva
2ª, 3ª infâncias e adolescência) correspon- (gostam de brincar, imitam, são curiosas,
dente. Foi feito uma análise qualitativa. Os vaidosas, conseguem fazer duas coisas
resultados revelaram que as mães apon- ao mesmo tempo, gostam de desenhar);
taram para primeira infância (0-3 anos) os na área moral (gostam de dar opiniões e
seguintes comportamentos: na área física algumas vezes apresentam-se atitudes
(engatinhar, andar, descer escada, pular e de desrespeito). No que se refere a ado-
dançar); na cognitiva (inteligência, curio- lescência, as mães apresentaram como
sidade, compreensão e egocentrismo); características da área física (altos, fortes
lingüística (início da pronúncia das pala- e gostam muito de esportes), na cognitiva
vras); na área emocional (desobedientes, (são inteligentes e tem grande interesse
birrentas, porém gostam de receber cari- pelas tecnologias); na social (apresentam-
nho); na social (relacionam-se bem com -se como solitários), na área psicossexual
a família e estão prontas para novas des- (tem grande interesse com assuntos rela-
cobertas, são independentes, atrevidas); cionados ao namoro e sexo); na emocional
moral (já sabem o que é certo e errado). (são desobedientes, donos de si e muitas
Com relação à segunda infância (3-6 anos), vezes rebeldes). Conclui-se que, de forma
as mães indicaram com relação à área fí- geral, as mães apresentaram uma percep-
sica (possui coordenação para comerem ção condizente com a literatura, especial-
sozinhas); emocionais (são agressivas); mente no que diz respeito à faixa etária e
cognitiva (são esclarecidas, sabem manu- o comportamento correspondente. Não
sear computadores, inventam estórias, é de surpreender o resultado, quando se
imitam, são criativas, egocêntricas, brin- leva em consideração que a mãe é a pes-
cam de faz de conta e aprendem facilmen- soa mais próxima da criança e dedica aten-
te); psicossexual (gostam de usar roupas, ção ao desenvolvimento desta, a ponto de

685
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

buscar ajuda profissional quando constata A chegada da Psicologia no país se deu


algum atraso no desenvolvimento. Aspec- na passagem dos séculos XIX-XX, acom-
to que não se observa na maioria dos pais, panhada por estudos desenvolvidos prin-
o que seria interessante desenvolver um cipalmente nas áreas da Medicina e da
novo estudo, só que tendo os pais como Pedagogia (Marinho-Araujo & Almeida,
os respondentes. 2005; Maluf & Cruces, 2008). Mais espe-
cificamente, foi na década de 60 que a
Palavras-chave: gênero, estórias infantis, área adquiriu o reconhecimento profis-
educação infantil sional, por meio da Lei 4.119, de 1962,
Contato: Jaciara de Lira Almeida Dantas, pela qual se instituiu o ensino superior
UFPB, jaciaraadantas@hotmail.com da Psicologia e a regulamentação da pro-
fissão de psicólogo (Marinho-Araujo &
Almeida, 2005, Massimi, 1990). Embora
a área começasse a ser consolidada, no
cenário nacional, na década de 60, a Psi-
DIA 14/11 - Segunda-feira cologia no estado do Maranhão surgiu
com considerável atraso em comparação
14h-15h30 às demais regiões do país. Os caminhos
percorridos por essa área no país não se
diferiram, em essência, dos de sua inser-
ção na região maranhense. A chegada
CONFERÊNCIA: dos profissionais da Psicologia no Mara-
nhão ocorreu entre as décadas de 70 e
80. Desde então, diversas áreas dessa ci-
EL GIRO LINGÜÍSTICO Y EL GIRO CORPORAL
ência têm se desenvolvido no estado em
EN LA PSICOLOGÍA DEL DESARROLLO
função dos grupos de professores, pro-
Silvia Español - UBA fissionais e pesquisadores que migraram
de outras regiões (Araújo, 2005; Carvalho
& Marinho-Araujo, 2009). Ao se propor,
MR LT04 - Mesa Redonda por meio desse trabalho, discutir sobre o
desenvolvimento da Psicologia Escolar no
Convidada Maranhão, numa perspectiva histórica e
contemporânea, é necessário considerar
os múltiplos aspectos que passam por
MR LT04-1276 - PSICOLOGIA ESCOLAR uma análise da realidade maranhense de
NO MARANHÃO: HISTÓRIA, FORMAÇÃO maneira ampla, crítica e contextualizada
E ATUAÇÃO às características políticas, sociais e eco-
Januária Aires - UFMA, nômicas do estado (Carvalho, 2007; So-
cefape2001@yahoo.com.br ares, 2008). Assim, pretende-se debater,
Pollianna Galvão Soares - UnB, na primeira temática, sobre o histórico da
polliannagalvao@yahoo.com.br Psicologia Escolar no Maranhão, a partir
Tatiana Oliveira de Carvalho - IG/MA, do levantamento de informações sobre
tatiana@institutogeist.com.br o processo inserção dessa área no esta-

686
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do. Seguidamente, pretende-se trazer o tudos, pesquisas e intervenções psicológi-


tema da formação no atual cenário da cas comprometam-se com a transforma-
Psicologia Escolar no Maranhão, tendo ção dessa realidade. Trata-se do estado
como aporte as transformações ocorri- que possui a menor média de escolarida-
das nas últimas décadas nos contextos de, com uma taxa de analfabetismo que
das Instituições de Ensino Superior. Por atinge 22% da população com mais de 10
fim, debater-se-á acerca das tendências anos de idade. A parcela empobrecida do
atuais no âmbito da atuação do psicólogo povo, que corresponde à grande maioria
escolar no estado, a partir de um relato dos maranhenses, tem seu percurso de
de experiência em Psicologia Escolar em educação formal trilhado no ensino públi-
um contexto educativo ludovicense. Res- co. A Psicologia Escolar maranhense vem
salta-se a importância da Psicologia Esco- reconhecendo que tem contribuições im-
lar do Maranhão para integrar-se junto portantes a oferecer em relação às neces-
ao debate nacional, especialmente sobre sárias transformações sociais no estado. A
propostas de reestruturação da formação chegada da Psicologia ao Maranhão ocor-
nessa área no estado. Essa formação deve reu pelas mesmas vias que marcaram sua
privilegiar recursos pelos quais se possam chegada a outras regiões do Brasil, apesar
desenvolver profissionais seguros da es- de bem tardiamente em comparação a
pecificidade da sua atuação e conscientes essas. O estudo dos fenômenos psicoló-
de seu compromisso social com a região gicos esteve por muito tempo atrelado
(Soares, 2008). Considera-se que o Mara- às áreas médica e educacional. Enquanto
nhão necessita da contribuição de psicó- profissão, a conquista de seu espaço se
logos escolares que, seguros de seu papel deu de forma lenta. Na capital, São Luís,
e intencionalidade, construam uma iden- onde surgiram os primeiros psicólogos
tidade profissional comprometida com no estado, até a década de 70 inexistiam
as transformações sociais do contexto serviços profissionais de Psicologia, con-
local, o que começa a se efetivar através forme afirma Araújo (2005a). Foi naquela
do aprimoramento da formação na área década que se iniciou uma atuação ainda
e da clareza e segurança em sua atuação restrita, com a chegada de profissionais
profissional (Carvalho & Marinho-Araujo, formados em outros estados. A maioria
2009). dos psicólogos recém-chegados atuou na
área da Psicologia Organizacional, na qual
havia maior demanda. Alguns atuaram na
HISTÓRICO DA PSICOLOGIA ESCOLAR NO área clínica e raramente se encontravam
MARANHÃO psicólogos nas escolas. Quando isso acon-
Tatiana Oliveira de Carvalho - IG/MA tecia, essa atuação se restringia à aplica-
tatiana@institutogeist.com.br ção de testes vocacionais. Na década de
80, enquanto a Psicologia brasileira vivia
No Maranhão, estado nordestino com um um momento de intensas e significativas
desenvolvimento ainda restrito na área ressignificações, nem sequer havia essa
da Educação, a situação precária em que formação no Maranhão, e sim, um des-
vive grande parte de sua população vem conhecimento generalizado acerca da
se constituindo em um apelo para que es- atuação desse profissional. Mesmo com

687
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a chegada de psicólogos no estado, era demandado o serviço de Psicologia Es-


comum que as pessoas procurassem, em colar, ainda que esse crescimento seja
detrimento desses, o Padre João Mohana, lento. A título de exemplo, tem-se que a
para tratarem de assuntos de ordem psi- Prefeitura de São Luís, em fevereiro de
cológica, sem diferenciarem atendimento 2008, realizou concurso público para a
psicológico e religioso. Araújo (2005b) Secretaria Municipal de Educação abrin-
relata que esse padre, estudioso da ci- do quatro vagas para psicólogo, sendo
ência psicológica, recebia grande reco- duas delas para psicólogo especialista
nhecimento por parte da população, por em Psicopedagogia. Na rede estadual de
seu trabalho pautado em uma “psicologia ensino, há psicólogos escolares atuando
iluminada pela fé” (p. 148). Com o passar na área da Educação Especial. Nas esco-
dos anos, a necessidade do trabalho do las privadas, é mais comum a presença
psicólogo no Maranhão foi lentamente se do psicólogo apenas como consultor, ou
estabelecendo. Na década de 90, surgi- desenvolvendo atividades pontuais, sem
ram cursos de graduação em Psicologia no um vínculo com a instituição. As recen-
estado, em São Luís. Ainda hoje, porém, tes melhorias da formação em Psicologia
pouco desenvolvem atividades de pesqui- Escolar no Maranhão têm se mostrado
sa e extensão universitária. Também são como caminho promissor para uma maior
raras as oportunidades de pós-graduação, consolidação da área no estado, tanto
e em Psicologia Escolar, elas inexistem. no sentido de uma maior abertura para
Observa-se, por outro lado, que a deman- inserção desse profissional na educação,
da por serviços psicológicos é crescente, como, também, para o desenvolvimento
assim como cresce a quantidade de pro- de ações profissionais pautadas no com-
fissionais no estado. Até junho de 2011, prometimento com as necessárias trans-
o Conselho Regional de Psicologia – 11ª formações do cenário educacional mara-
Região2 havia registrado 1.195 psicólogos nhense. Compreende-se, porém, que a
no estado. A profissão de psicólogo vem construção de uma Psicologia Escolar crí-
se consolidando no Maranhão, enquanto tica, comprometida e transformadora no
a Psicologia Escolar brasileira vive um pe- Maranhão não depende exclusivamente
ríodo de transição, marcado por uma ten- das instituições formadoras. Percebe-se
dência a superar os padrões tradicionais a ressonância de fatores sócio-econômi-
de formação e atuação na área (Carvalho, cos e políticos no contexto maranhense
2007; Carvalho & Marinho-Araujo, 2009). funcionando como entraves ao ingresso
Vê-se, dessa forma, que os incrementos e permanência dos psicólogos escolares
que vêm sendo realizados na Psicologia no mercado de trabalho. Soma-se a isso o
Escolar maranhense já trazem a marca pouco conhecimento da sociedade acerca
das mudanças paradigmáticas testemu- de seu papel profissional. Paralelamente
nhadas em âmbito nacional. As institui- ao já apontado, são necessárias ações de
ções educacionais privadas, públicas e maior amplitude, que envolvam a elabo-
do terceiro setor, têm crescentemente ração de políticas públicas que prevejam
a participação do psicólogo no cenário
2 educacional, o aumento das verbas desti-
O CRP 11, cuja sede fica em Fortaleza-CE, abrange os esta-
dos Ceará, Piauí e Maranhão. nadas à educação, bem como uma maior

688
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

divulgação do trabalho da Psicologia Es- TENDÊNCIAS ATUAIS NA FORMAÇÃO EM


colar junto aos maranhenses. Isso requer PSICOLOGIA ESCOLAR NO MARANHÃO
a mobilização da categoria profissional de Januária Silva Aires - UFMA
psicólogos junto aos legisladores e ges- cefape2001@yahoo.com.br
tores da educação no Maranhão, sendo
necessária sua inserção nos espaços deli- A década de 80 demarca um momento
berativos. Estes foram alguns dos pontos importante na história da Psicologia no
que passaram a ser sistematicamente dis- Brasil. Esse período foi caracterizado pelo
cutidos pela categoria no estado, a partir rompimento da tradição individualista,
de 2008, ano temático da Educação no naturalizante, patologizante das questões
Sistema Conselhos de Psicologia. Neste sociais que dominava a Psicologia desde
ano, foi criada a Comissão de Psicologia sua regulamentação enquanto profissão.
Escolar/Educacional da Seção Maranhão No entanto, essa ruptura desencadea-
do Conselho Regional de Psicologia – 11ª da ao longo das décadas de 80 e 90 não
região. Essa Comissão organizou, no mes- foi suficiente para vencer a visão liberal,
mo ano, o II Fórum de Psicologia do Ma- positivista e idealista de um homem iso-
ranhão, que teve como tema “A Psicologia lado da sociedade, tendências essas que
na construção da educação para todos”, influenciaram, sobremaneira, a formação
e o “I Encontro Maranhense de Psicologia em Psicologia nos cursos de graduação
Escolar”, com participação de conferen- (Bock 1999; Marinho-Araujo & Almeida,
cistas de renome no cenário nacional. Em 2005; Meira 2000). Paralelamente a essa
2009 e 2011, respectivamente, foram rea- transição, a Psicologia Escolar brasileira
lizados o I e o II Encontro “A Psicologia na também começou buscar recursos para
construção da educação inclusiva”, dando atender esse novo momento histórico
continuidade à discussão acerca da práti- pelo qual Psicologia passava, a partir dos
ca profissional e científica do psicólogo no quais se passou a desenvolver uma crítica
campo educacional, buscando a supera- interna à sua prática. As transições de pa-
ção de uma atuação estigmatizadora e ex- radigmas, as mudanças teórico-metodo-
cludente e oportunizando que psicólogos, lógicas ancoradas à necessidade de uma
estudantes, docentes e pesquisadores re- Psicologia comprometida com as mu-
fletissem acerca da configuração da Psico- danças sociais, dentre outros aspectos,
logia Escolar no cenário maranhense. Ob- nos remete à reflexão sobre a formação
serva-se que, atualmente, têm surgido re- do profissional de Psicologia como pers-
levantes iniciativas que demonstram que pectiva de alcançar essa nova demanda.
o psicólogo escolar tem buscado atuar Embora a área começasse a ser consoli-
em consonância ao que Martínez (2009) dada, no cenário nacional, na década de
define como formas emergentes de atu- 60, a Psicologia no estado do Maranhão
ação, desenvolvendo ações cada vez mais não seguiu o mesmo curso de desenvol-
abrangentes, com o propósito de contri- vimento da Psicologia no Brasil, especial-
buir à otimização do processo educativo. mente no que toca à formação da área
(Araújo, 2005a; 2005b; Carvalho & Mari-
Palavras-chave: Psicologia Escolar, história, nho-Araujo, 2009). Foi apenas a partir da
Maranhão. década de 90 que a formação em Psico-

689
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

logia começa a se concretizar no estado. com experiência em Psicologia Escolar.


No início dos anos 90, se inaugurou o pri- Esse momento inaugurou uma nova fase
meiro curso de Psicologia na Universida- na formação discente: o contato com no-
de Federal do Maranhão (UFMA). No final vas abordagens em Psicologia Escolar, o
dessa mesma década, surgiu o segundo maior número de vagas oferecidas para
curso de graduação, partindo, dessa vez, o estágio na área, professores responsá-
da iniciativa privada por meio do Centro veis pelas disciplinas afins com experiên-
Universitário do Maranhão (UNICEUMA). cia em pesquisa e atuação em Psicologia
Mais recentemente, emergiu o terceiro Escolar, entre outros aspectos. Ainda em
curso de Psicologia na Faculdade Pitágo- 2006, o estágio começou a ser ofereci-
ras, também uma instituição de natureza do na abordagem comportamental e na
privada. Nessa apresentação, será des- abordagem histórico-cultural. Com base
tacada a formação em Psicologia Escolar nessa última perspectiva da Psicologia,
da UFMA. O estágio em Psicologia Esco- o estágio se configurou em duas moda-
lar nessa instituição só foi iniciado em lidades de orientação e supervisão: uma
1997, mesma época em que o curso de voltada para uma Psicologia Escolar insti-
Psicologia da Universidade formava a sua tucional, de caráter preventivo e relacio-
primeira turma. Isso significa que o início nal (Marinho-Araujo & Almeida, 2005), e
da fundação da Psicologia no contexto da a outra voltada para avaliação e interven-
UFMA, não se privilegiava a formação na ção nas queixas escolares, conforme pro-
área da Psicologia Escolar, quadro insti- posição teórico-metodológica de Neves
tucional não muito diferente das demais & Almeida (2003). Essas perspectivas de
Instituições de Ensino Superior do país atuação superam a atuação centrada no
(Marinho-Araujo, 2007). Entre o período aluno e envolve toda a instituição esco-
de 1997 a 2006, apenas uma professora lar, numa perspectiva dinâmica, sistêmica
com experiência em Psicologia Escolar e processual de intervenção e mediação
fazia parte do quadro docente da institui- psicológica no contexto educativo, abor-
ção. Dessa forma, não havia a possibili- dagens significativas no cenário nacional
dade de atender, de forma satisfatória, a e de grande relevância para a formação
demanda de estágio e nem as disciplinas do psicólogo escolar no Maranhão. Cabe
relacionadas à área para uma formação ainda enfatizar acerca da diversidade dos
crítica e segura do psicólogo escolar. As campos para os quais os estagiários em
disciplinas eram ministradas por profes- Psicologia Escolar são orientados e que
sores que precisavam preencher suas permitem ampliar sua experiência na
cargas-horárias, provocando, assim, uma área. Além da escola, tem-se orientado
lacuna na formação discente devido à fal- estágio em instituições de acolhimen-
ta de preparo dos docentes, uma vez que to para crianças em situação de risco e
a disciplina não era de domínio teórico, vulnerabilidade social, ONGs, creches-
metodológico e prático do agente media- -escola, entre outros, instituições geral-
dor dessa formação. A partir do concur- mente voltadas para o atendimento da
so realizado em 2006, o Departamento população desfavorecida socioeconomi-
de Psicologia da UFMA aumentou para camente de São Luís. A recente configu-
quatro o número de professores efetivos ração institucional do curso de Psicologia

690
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da UFMA tem possibilitado, como desdo- ATUAÇÃO DA PSICOLOGIA ESCOLAR


bramento dessas mudanças, um aumen- NO MARANHÃO: COMPROMISSO
to significativo de trabalhos de conclusão COM A TRANSFORMAÇÃO SOCIAL DA
de curso voltados para o mapeamento da REALIDADE LOCAL
realidade socioeducacional maranhen- Pollianna Galvão Soares - UnB
se, visando explorar as possibilidades polliannagalvao@yahoo.com.br
intervenção do psicólogo escolar nos
contextos educacionais. No âmbito da A realidade socioeducativa do estado do
formação em Psicologia Escolar na insti- Maranhão requer especial atenção de pro-
tuição, tem-se privilegiado estratégias de fissionais e pesquisadores envolvidos nos
mediação visando o desenvolvimento de diversos contextos educativos, em função
competências no graduando para a cons- de um panorama econômico e político
trução de uma postura profissional ética desfavorável ao desenvolvimento dos seus
e comprometida com a realidade social cidadãos. De acordo com o IBGE, entre os
do estado do Maranhão. Apesar desses anos 1999-2002, o Maranhão liderava a lis-
avanços iniciais, ainda se faz necessário tagem dos estados mais pobres do país. Na
criar outras possibilidades de formação, amostragem dos 100 municípios de piores
inicial e continuada, na área da Psicologia índices do PIB, 83 eram do interior mara-
Escolar, tais como cursos de pós-gradua- nhense. O IDH (Índice de Desenvolvimen-
ção latu sensu e stricto sensu, projetos de to Humano) do estado encontrava-se com
pesquisa e extensão, estratégias políticas o índice de 0,673 no ano de 2001, o pior
para incentivar interlocução com outras do país. O Maranhão também é o estado
instituições de ensino em Psicologia do que detém uma das maiores taxas de anal-
estado, bem como para estreitar debates fabetismo entre as demais unidades da
entre profissionais e pesquisadores do federação. Diante de um panorama socio-
Maranhão e de outros estados brasilei- econômico desfavorável a uma educação
ros, políticas públicas de ampliação dos de qualidade pública, o psicólogo escolar
espaços de atuação do psicólogo escolar, maranhense, não diferentemente dos que
entre outros desafios. (Carvalho, 2007; atuam nas demais regiões do país, tem se
Carvalho & Marinho-Araujo, 2009; Soa- defrontado cada vez mais com espaços
res, 2008). A reflexão crítica em prol da diferenciados de práticas educativas vin-
transformação de estruturas de curricu- culadas a organizações civis (ONGs) (Caro
lares desatualizadas e cristalizadas que & Guzzo, 2004; Gohn, 2009, 2010; Soares
marcaram história da formação da Psico- & Marinho-Araujo, 2010; Souza, 2009). A
logia no estado do Maranhão é o convite atual conjuntura da educação brasileira,
final deste trabalho. que alavanca ações socioeducativas civis
em prol da garantia dos direitos constitu-
Palavras-chave: Psicologia Escolar, formação, cionais, tem oportunizado novas reflexões
UFMA. sobre o trabalho do psicólogo escolar e o
seu compromisso com a educação no Bra-
sil. Quando é requerido o compromisso
social da Psicologia Escolar, reivindica-se,
necessariamente, uma implicação prática

691
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

voltada para os interesses e necessidades to de Avaliação e Intervenção das Queixas


da coletividade (Guzzo, 2003, 2005). Como Escolares), proposto por Neves & Almeida
a Psicologia Escolar historicamente esteve (2003). Para esse acompanhamento, ain-
comprometida com interesses sociais de da eram realizados observação em sala de
uma minoria da população (Guzzo, 2003, aula, visitas domiciliares e estudos de caso
2005; Patto, 1999; Marinho-Araujo & Al- com as educadoras, a fim de melhor com-
meida, 2005), é necessário que se questio- preender os aspectos relacionados ao pro-
ne de qual compromisso social se discursa cesso de aprendizagem e desenvolvimento
e se pratica nos mais distintos contextos do aluno encaminhado. Os trabalhos com
revestidos da função educativa. Se a in- grupos referiam-se a intervenções junto
tenção é propiciar a transformação social aos adolescentes com temáticas específi-
por meio da ação profissional, a Psicolo- cas, como adolescência, cidadania, sexuali-
gia Escolar deve comprometer-se com o dade, drogas, relações interpessoais, entre
desvelamento dos aspectos ideológicos e outras. Realizavam-se, ainda como traba-
filosóficos presentes nos diversos aspec- lho grupal, encontros com as crianças com
tos institucionais pelos quais se mantêm temáticas definidas e desenvolvidas com
as desigualdades sociais (Guzzo, 2003; as educadoras. Efetivavam-se, também,
Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Partin- reuniões mensais com os pais em cada
do de uma perspectiva preventiva, crítica unidade da instituição, durante as quais o
e contextual (Marinho-Araujo & Almeida, psicólogo ministrava oficinas e palestras de
2005), será apresentada uma experiência acordo com as demandas analisadas pela
de uma equipe de psicólogos escolares em equipe de Psicologia Escolar, educadoras
uma ONG educativa beneficente de São e pais. O terceiro eixo do trabalho realiza-
Luís, capital maranhense. Essa instituição do era a assessoria ao trabalho educativo,
é uma entidade filantrópica mantida por a qual era desenvolvida por meio de duas
uma associação religiosa há cerca de 20 estratégias de mediação: elaboração de
anos, pela qual se provê acompanhamen- espaços escuta psicológica e formação as-
to da aprendizagem e desenvolvimento de sistida às educadoras, em consonância à
cerca de 300 crianças e adolescentes de proposição de atuação em Psicologia Esco-
baixa renda, no horário oposto ao que fre- lar de Marinho-Araujo & Almeida (2005). A
quentam a escola. O relato dessa experi- primeira estratégia era realizada por meio
ência refere-se ao período de 2002 a 2005, de situações espontâneas e estruturadas,
durante o qual esteve em vigência a atua- pelas quais se intencionava compreender
ção dessa equipe de psicólogos escolares. e intervir nos aspectos intersubjetivos
Esse trabalho foi desenvolvido por três construídos nas relações sociais. A escuta
profissionais, cujas intervenções eram re- clínica (Kupfer, 2004) nos permitia realizar
alizadas por meio de estratégias coletivas uma leitura institucional crítica e reflexiva
e individuais. No que se refere ao acompa- das “vozes institucionais” que se manifes-
nhamento ao processo de ensino-aprendi- tavam pelas ações e discursos desenvolvi-
zagem, investigavam-se os casos de queixa dos pelos seus atores. A partir dessa aná-
escolar encaminhados ao serviço de Psi- lise, se planejavam mediações individuais
cologia Escolar da instituição, partindo do e coletivas que implicassem em processos
modelo de avaliação PAIQUE (Procedimen- de conscientização do educador sobre o

692
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

seu papel, responsabilidade e função no tivo não formal. É oportuno refletir, qual
desenvolvimento dos seus alunos de ma- seja a sua ação, que há de se ter devido
neira intencional e crítica (Marinho-Arau- cuidado com mediações profissionais de
jo, 2005; Guzzo, 2003, 2005). A segunda maneira acrítica, apolítica e descontextu-
ação era concretizada através da formação alizada do panorama histórico e sociocul-
assistida às educadoras. As ações de for- tural do qual as instituições educativas de
mação eram feitas mensalmente com as terceiro setor nascem e se desenvolvem.
educadoras sociais das unidades da ONG e
a coordenadora pedagógica. Planejava-se, Palavras-chave: Psicologia Escolar, atuação, ONG.
por meio dessa ação, o desenvolvimento
de competências teóricas, conceituais e
metodológicas das profissionais, especial- SP LT04 - Simpósio
mente pela mediação de discussões da
psicologia do desenvolvimento e suas im-
plicações pedagógicas, relacionando às di- SP LT04-1383 - A CONSTRUÇÃO DO
ficuldades educacionais que encontravam CONHECIMENTO NA PRIMEIRA
no dia a dia. Posteriormente, realizava-se INFANCIA EM DIFERENTES CONTEXTOS
um acompanhamento das educadoras DE DESENVOLVIMENTO
no seu exercício profissional, provocando Silviane Barbato - IP/UnB
continuamente reflexão sobre, na e para barbato.silviane@gmail.com
a ação do educar, em consonância à pro-
posição teórica da epistemologia da ação Nesta sessão apresentaremos e discutire-
(Araujo, 2003; Plantamura, 2003). Duas mos a utilização de diferentes ferramentas
pesquisas acadêmicas em Psicologia Esco- mediacionais físicas e simbólicas na cons-
lar foram desenvolvidas pelas psicólogas trução de conhecimento da criança pe-
da ONG na própria instituição. A primeira, quena em interação com um adulto e/ou
intitulada Atuação em psicologia escolar: o seus pares. Enquanto grupo, nos interessa
desenvolvimento de competências para a entender como a criança constrói conheci-
mediação da escolha profissional em São mento e significados em contextos de prá-
Luís-MA (Carvalho, 2007), investigou o ticas e interlocuções formais e informais
desenvolvimento de competências de psi- no cotidiano da família e da escola quando
cólogos escolares para a mediação da es- ela passa a frenquentá-la. A fim de alcan-
colha profissional do grupo de educandos çarmos nosso objetivo geral, enfocaremos
adolescentes da ONG. A segunda pesquisa diferentes momentos do desenvolvimento
desenvolvida foi Psicologia escolar e o de- na primeira infância, considerando o seu
senvolvimento adulto: um estudo sobre o desenvolvimento simbólico mediado na fa-
perfil de educadoras sociais em uma ONG mília, na educação infantil e nos primeiros
de São Luís/MA (Soares, 2008), pela qual anos do ensino fundamental, entenden-
se investigou o perfil de educadoras sociais do que estamos diante de dois períodos
da instituição, visando conhecer as possibi- de transição que implicam em diferentes
lidades de mediação da Psicologia Escolar configurações das redes interacionais nas
para o desenvolvimento de competências diferentes atividades das quais a criança
profissionais próprias ao trabalho educa- participa: da construção de conhecimento

693
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

com o cuidador na família para a educa- conhecimento na intersubjetividade com


ção infantil e da educação infantil para o a utilização de repetição cantada, repeti-
Ensino Fundamental. Para tanto, inicia- ção exaustiva de palavras, de conjuntos de
mos com a análise de dados de desenvol- fonemas e fonemas isolados, relacionados
vimento semiótico na emergência do ins- à situação de ensino construída em sala
trumento na relação criança-cuidador em com a professora e utilizados pela criança
que se busca compreender as complexas para avançar no conhecimento da leitura
organizações de signos, ações, afetos e in- e da escrita essenciais para os processos
tenções tecidas em situação de resolução de letramento.
de problemas. Em seguida, abordamos a
participação de crianças em pesquisa na Palavras-chave: mediação, construção do
transição da educação infantil para o en- conhecimento, transições.
sino fundamental, cujas dinâmicas são
pouco conhecidas quando se considera o
sistema educacional brasileiro e a inclusão DESENVOLVIMENTO E SEMIOSIS: A
recente de crianças de seis anos no pri- EMERGÊNCIA DO INSTRUMENTO NA
meiro ano do EF e envolve fatores como: RELAÇÃO CRIANÇA-CUIDADOR
cuidado e educação da criança pequena, Francisco José Rengifo Herrera - UI/UnB
família e professores dos dois níveis de en- frengifoherrera@gmail.com
sino. O terceiro trabalho também conside-
ra essa transição, no entanto, enfocando Os aspectos culturais e semióticos como
a mediação da música no desenvolvimen- base da explicação das mudanças cogniti-
to da consciência fonológica em que são vas, afetivas e relacionais dos indivíduos.
construídas suposições sobre a relação Especialmente os trabalhos de Valsiner
entre desenvolvimento do ouvido musical (2007) os quais enfatizam a separação in-
e a habilidade de ouvir fonemas no ensi- clusiva e a canalização cultural do sujeito,
no-aprendizagem da leitura e da escrita, assim como a construção de sistemas de
considerando-se a recente introdução da significação no sujeito. Nesse sentido a
educação musical nas escolas brasileiras. construção de sistemas relacionais entre
No quarto momento, avançamos em dire- o cuidador e a criança constitui-se num
ção a discussão da mediação dos modos cenário privilegiado para compreender o
comunicativos visuais, orais e escritos desenvolvimento de sistemas semióticos
nesta transição, enfocando a mediação do que permitem “desfiar” as complexas or-
desenho na aprendizagem de linguagem ganizações de signos, ações, afetos e in-
gráfica na construção inicial dos conceitos tenções tecidas entre crianças e adultos. A
de espaço e do sistema de símbolos que construção de ferramentas é uma das ca-
envolve construção do conceito de pro- racterísticas que tem sido continuamente
porção e o uso de signos ordenados e téc- sublinhada como exemplo da capacidade e
nicas de projeção necessários para a lei- flexibilidade do sistema psicológico da es-
tura de linguagem gráfica e representação pécie humana. No entanto, a abordagem
do espaço geográfico. Finalizamos nosso tradicional na psicologia do desenvolvi-
simpósio com a discussão de dados de fala mento está enfocada tem sido focada na
egocêntrica mediando a construção de compreensão de sistemas cognitivos indi-

694
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

viduais, deixando de lado as construções criação de camadas semióticas nas crian-


feitas mediante os sistemas culturais de ças, o papel dos cuidadores no desenvol-
canalização, o papel dos Promoter Signs e vimento de ferramentas semióticas e na
a transformação dos signos como base as construção e reelaboração das ações das
posteriores mudanças da ação. A organiza- díades e na apropriação das crianças nos
ção de “camadas semióticas” nas crianças usos dos objetos. Finalmente, se pode
depende das formas semióticas e dos re- concluir que nos processos de desenvolvi-
cursos sígnicos oferecidos pelos cuidado- mento participam de maneira importante
res. No caso da presente pesquisa, o traba- a semiosis, os usos convencionais e simbó-
lho consiste em replicar o uso da situação licos e a canalização dos usos dos objetos,
criada pelo Mounoud (1970). Os dados fo- mas se deve sublinhar o papel do cuidador
ram coletados com crianças de 3,3 até 3,10 no desenvolvimento psicológico da crian-
meses de idade. Nesta apresentação serão ça. Compreender os usos dos objetos à luz
usados os dados de uma criança e o seu dos processos de construção de semiosis e
cuidador só, neste caso Santiago de 3.5 significação são um dos principais aportes
meses. A tarefa consistiu em utilizar, num da pesquisa.
primeiro momento, o conjunto de ganchos
de metal com o objetivo de pegar um cubo Palavras-chave: semiose, díade criança-
de madeira de 3 cm que tem um gancho cuidador, mediação.
aberto inserido. Depois, num segundo mo-
mento, precisava-se do uso de placas finas
de madeira com o mesmo objetivo. O cubo PARTICIPAÇÃO DE CRIANÇAS EM
de madeira se encontra no interior de um PESQUISAS DURANTE A EDUCAÇÃO
frasco de 20 cm de cumprimento e 10 cm INFANTIL E O INÍCIO DO ENSINO
de diâmetro. Porém, fizemos algumas mu- FUNDAMENTAL
danças nas características metodológicas Patrícia C. Campos-Ramos - UnB
da situação original, no caso da pesquisa pcamposramos@uol.com.br
apresentada as mudanças têm relação Silviane B. Barbato - UnB
com a participação explícita do cuidador barbato.silviane@gmail.com
como parte do processo de resolução do
problema. As situações foram filmadas Ao relacionarmos processos de desenvol-
durante 15 min. e depois foram analisa- vimento humano e educação, notamos
das através da construção de categorias a existência de diálogos entre crianças,
e a utilização da análise microgenética. adultos de variados contextos e o conhe-
Os resultados indicam que a díade cons- cimento. Eles são oportunizados, nas so-
truiu uma serie de signos recorrentes que ciedades letradas contemporâneas, pri-
deixam em evidência a complexa relação meiramente pela família e a escola, com
semiótica que exige a criação de signos e implicações para o desenvolvimento e
o papel dos ícones, índices e símbolos na mediação na aprendizagem da criança, via
facilitação dessa construção por parte das diferentes atividades. Nestes contextos,
crianças, assim como também as ações e as crianças compreendem, interpretam e
as categorias construídas e identificadas atuam; porém, ainda são pouco incluídas
permitem compreender os processos de como informantes nas pesquisas e muitos

695
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

estudos que as investigam focalizam, ape- escreveram compreensivamente a respei-


nas, as opiniões dos adultos, revelando a to de si, da família e da escola. Também,
prevalência de uma visão adultocêntrica em estudo a respeito de sua compreensão
da infância. Por isso consideramos, em de família4, no qual crianças ainda meno-
nossas pesquisas, de fundamental impor- res responderam entrevistas semiestrutu-
tância investigar a compreensão e a ex- radas, com auxílio de cenário e histórias
pressão que a criança tem seu desenvolvi- para completar, referindo-se a composi-
mento e aprendizagem. Algumas técnicas ção familiar, coabitação e cumprimento de
mostram-se mais apropriadas a estas funções, com definições mais abstratas e
explorações, como as narrativas associa- complexas conforme o aumento da idade
das a histórias com bonecos/fantoches; dos participantes, que tinham entre três
figuras representando conceitos; e, entre e cinco anos. Ainda, em estudos sobre a
outras, os desenhos, ainda que criticados inclusão escolar de crianças com neces-
pela possibilidade de ambigüidades de in- sidades educacionais especiais5 com ou
terpretação, pois, propiciam descobertas sem diagnóstico, na escola ou em outros
interessantes e são utilizados na prática contextos inclusivos; educadores especia-
clínica com crianças desde início/meados listas são orientados por nós a incluírem a
do século XX, de modo livre ou com temas opinião das crianças nas entrevistas - com
como, por exemplo, o desenho de família. auxílio de fantoches, desenhos, livros in-
Estas atividades estão entre as preferên- fantis, etc. - a respeito do entendimen-
cias das crianças, dando indicadores simi- to e opiniões que elas constroem sobre
lares aos dos adultos nos diálogos; por- deficiências, diversidade e inclusão. No
tanto, podem complementar a entrevista momento, dando continuidade aos estu-
com crianças, visando captar mais ampla- dos com crianças, buscamos melhor com-
mente suas concepções e torná-la mais lú- preender seu ingresso, aos seis anos, no
dica e atrativa. Como em todas as técnicas Ensino Fundamental6 e as possíveis conse-
de pesquisa, deve haver alguns cuidados qüências para: (a) os profissionais da edu-
ao adotá-las, como o preparo do pesqui- cação, que recebem novas crianças a cada
sador para saber ouvir e interpretar o que ano e enfrentam constantes mudanças
dizem as crianças. Sua participação vem nas diretrizes de trabalho; (b) as famílias,
sendo considerada em nossos estudos, que necessitam se adaptar à nova rotina;
por exemplo, a respeito das representa- e, principalmente, (c) as crianças. A tran-
ções de família, relacionadas à (dificulda-
de de) aprendizagem3; participaram do re-
ferido estudo crianças de sete a dez anos, 4
Trabalho desenvolvido no grupo de pesquisa em que par-
com e sem dificuldades de aprendizagem, ticipou a primeira autora durante o mestrado, orientada
pela Profa. Dra. Maria Auxiliadora Dessen, na perspectiva
cursando do segundo ao quinto ano do do desenvolvimento familiar.
Ensino Fundamental; elas desenharam e 5
Trabalhos desenvolvidos por alunos de especialização em
Desenvolvimento Humano, Educação e Inclusão Escolar,
orientados pela primeira autora.
6
Projeto de pesquisa das autoras, em grupo de pesquisa
3
Trabalho desenvolvido durante o curso de especialização que trabalha com a perspectiva sociocultural de desen-
em Psicopedagogia pela primeira autora, orientada pela volvimento, com foco na entrada da criança brasileira de
Profa. Ms. Anete Maria Busin Fernandes, na perspectiva seis anos no Ensino Fundamental, a alfabetização e o le-
do atendimento clínico. tramento.

696
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sição para o Ensino Fundamental aos seis maior abrangência possível de suas opini-
anos (por vezes incompletos) constitui-se, ões. Tais entrevistas são submetidas à gra-
no Brasil, mudança recente, com efeitos vação, transcrição na íntegra e análise por
ainda relativamente desconhecidos e que, episódios, com prevalência de aspectos
possivelmente, envolvem fatores como qualitativos. Esperamos, com isto, colabo-
o cuidado e a educação da criança, pela rar com a compreensão teórica do tema
família, e o processo de sua escolarização e estimular reflexões sobre a construção
até o momento. As maneiras como a es- de políticas públicas, projetos político-
cola, a família e a criança lidam com es- -pedagógicos escolares e objetivos para o
tas mudanças poderão propiciar ou inibir ensino-aprendizado de crianças da Educa-
avanços no desenvolvimento global e, em ção Infantil e do Ensino Fundamental.
especial, da aprendizagem, como da lei-
tura e escrita. Temos como objetivo geral Palavras-chave: pesquisas com crianças;
a compreensão da transição da Educação Educação Infantil; Ensino Fundamental.
Infantil para o Ensino Fundamental, além
das possíveis conseqüências desta inser-
ção e os prováveis reflexos na alfabetiza- A MÚSICA COMO MEDIADORA DO
ção e no letramento das crianças, conside- DESENVOLVIMENTO DA CONSCIÊNCIA
rando a realidade de diferentes contextos FONOLÓGICA
de seu desenvolvimento. Sob a visão do Júlia Escalda Mendonça - UnB
desenvolvimento humano, consideramos juescalda@yahoo.com.br
importante construir informações sob Silviane Barbato - UnB
uma perspectiva longitudinal, para me- barbato.silviane@gmail.com
lhor compreensão de todo o processo e,
em particular, da transição de uma para O desenvolvimento da linguagem escri-
outra etapa da educação. Baseando-nos ta relaciona-se a um complexo sistema
na metodologia qualitativa, elaboramos de habilidades e de conhecimentos. Para
roteiros de entrevistas semiestruturadas aprender a ler e escrever as crianças de-
e de observação do quotidiano, a partir vem inicialmente entender que existe uma
de indicadores da literatura; neles, são correspondência entre a linguagem oral e
explorados aspectos da aprendizagem, os símbolos gráficos usados na escrita. Elas
situações do passado, do presente e das precisam estabelecer relações entre os
perspectivas de futuro dos participantes sons da língua e as letras, ou seja, precisam
de ambos os contextos envolvidos (escola identificar e reconhecer que os sons po-
e família), a respeito de papéis e funções dem corresponder a letras sozinhas ou em
de cada um na escolarização, bem como combinações. Esse processo é chamado
de suas possíveis relações. A entrevista de correspondência grafema-fonema e é
com crianças partiu de um roteiro ade- essencialmente um procedimento de aná-
quado ao momento de desenvolvimento, lise. A descoberta dos sons da língua, os
com base em técnicas e instrumentos já fonemas, está relacionada à competência
citados e utilizados em nossas pesquisas metalinguística denominada consciência
com crianças, tendo em vista um melhor fonológica, que se refere às habilidades de
aproveitamento da sua participação e manipular e refletir sobre os sons da fala.

697
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

As habilidades de consciência fonológica forma, a habilidade de “ouvir os fonemas”


envolvem diversos níveis de processamen- torna-se ainda mais essencial no processo
to e operações, tais como a segmentação, de desenvolvimento da leitura e da escrita.
síntese, exclusão, substituição e trans- Recentemente, observou-se um crescente
posição que podem ocorrer no nível das interesse pelo estudo do desenvolvimento
sentenças, palavras, sílabas e fonemas. O da leitura e escrita em relação à aprendi-
desenvolvimento da habilidade de analisar zagem e experiência musical. Parte desses
os sons da fala e a consequente aprendiza- estudos demonstra relações significantes
gem das correspondências grafema-fone- entre habilidades musicais, consciência
ma, necessárias a aprendizagem da leitura fonológica, consciência fonêmica e desen-
e da escrita, têm relação com o processo volvimento de leitura em crianças de pa-
de consciência fonêmica que corresponde íses e línguas diferentes. Alguns autores
à consciência fonológica no nível do fone- sugerem a inclusão de aulas de música no
ma. A relação entre a consciência fonêmica currículo escolar a fim de colaborar com o
e a aquisição de leitura e escrita é recípro- desenvolvimento de consciência fonoló-
ca. À medida que as crianças desenvolvem gica e contribuir em atividades de leitura
habilidades de consciência fonológica, a e escrita. Dessa forma, surgiu o interesse
aprendizagem da leitura e escrita é facili- em dar início às investigações entre as
tada e o desenvolvimento da consciência relações entre a consciência fonológica e
fonêmica acontece. Um relevante núme- a experiência musical em crianças brasi-
ro de estudos tem demonstrado que as leiras. Muito desse interesse foi pautado
habilidades de consciência fonológica são na questão do “ouvir” que, por meio da
adquiridas no sentido de segmentos maio- “apreciação musical”, é uma das modalida-
res (sentenças e palavras) para segmentos des que possibilita o envolvimento direto
menores (sílabas e fonemas) e que tanto e participativo com a música. Foi realizado
a idade como a escolaridade influenciam então um estudo inicial com objetivo de
no seu curso de desenvolvimento. Existem comparar o desempenho de crianças de
diferentes níveis de consciência fonológi- cinco anos com e sem experiência musi-
ca, alguns são independentes da educação cal formal, caracterizada pela participação
escolar e outros só surgem com o início sistemática em aulas de musicalização in-
da escolarização. O desenvolvimento da fantil, em tarefas de consciência fonoló-
consciência fonêmica parece estar direta- gica. Nesse estudo, optou-se por estudar
mente relacionado ao aprendizado formal crianças de cinco anos pelo fato de essas
dos sistemas alfabéticos de leitura e escri- crianças possuírem idade anterior ao início
ta. Estudos com adultos não-alfabetizados formal da alfabetização no contexto esco-
mostraram que eles não possuíam as ha- lar, ou seja, ainda que elas estejam expos-
bilidades de realizar manipulações fonê- tas diariamente à linguagem escrita (em
micas, ou seja, não tinham desenvolvido a casa, na rua, etc) esse tipo de exposição
consciência fonêmica. Nesse processo de seria não-sistemático em contraposição à
aprendizagem uma dificuldade adicional exposição sistemática às aulas de música.
é ainda imposta às crianças: a fala não é Participaram do estudo 56 crianças que
composta de segmentos isolados, nós fa- foram distribuídas em dois grupos: grupo
lamos de forma encadeada e rápida. Dessa estudo (n=26) e grupo controle (n=30). Foi

698
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

utilizado o Teste de Consciência Fonológi- sua importância comunicativa. Tomando


ca como instrumento de coleta de dados, a perspectiva de que a aprendizagem é
composto pelas tarefas de síntese silábi- um processo de mudança a partir de ex-
ca; síntese fonêmica; reconhecimento de periências, construído nas interações e
rimas; segmentação fonêmica e exclusão nos processos de mediação, a experiência
fonêmica. Os dados foram analisados es- musical pode também oferecer interações
tatisticamente e observou-se diferença significativas na cultura e favorecer novas
significante entre os resultados obtidos formas de aprendizagem da leitura e da es-
nas tarefas de reconhecimento de rimas, crita em diversos contextos para além dos
síntese e exclusão fonêmica. A análise de- escolares.
monstrou que a diferença observada entre
esses grupos de crianças associou-se com Palavras-chave: música, consciência
significância estatística à sua experiência fonológica, linguagem escrita.
musical, ou seja, crianças com experiência
musical apresentaram chances maiores de
obter melhores resultados nas habilidades GEOGRAFIA, PERCEPÇÃO ESPACIAL E
de consciência fonológica em que foram LINGUAGEM GRÁFICA: UMA RELAÇÃO
avaliadas quando comparadas às crianças APLICADA AO ENSINO NOS ANOS
sem experiência musical formal. A experi- INICIAIS
ência musical foi o fator que determinou Cristina Maria Costa Leite - UnB
as diferenças observadas em relação às criscostaleite@gmail.com
habilidades de consciência fonológica dos
grupos de crianças de cinco anos e espera- A reflexão sobre as práticas pedagógicas
-se que, posteriormente, a aprendizagem e relacionadas ao ensino de geografia nos
desenvolvimento de leitura e escrita nesse anos iniciais de escolarização é recente.
grupo de crianças também sejam facilita- Decorrente da evolução da própria ciência
dos. Assumimos esse estudo como ponto geográfica, que a partir de 1970 reorienta
de partida para investigações mais apro- suas análises para outras fundamentações
fundadas sobre o tema. Dada sua impor- filosóficas que não o positivismo, as pes-
tância e, particularmente após a inclusão quisas nessa área do conhecimento reper-
das crianças de seis anos no ensino funda- cutiram diretamente nas orientações de
mental, vimos a oportunidade de investi- cunho pedagógico, aos terceiro e quarto
gar tais relações de desenvolvimento em ciclos do Ensino Fundamental e Ensino
crianças já em processo formal de aprendi- Médio. Desse modo, pode-se afirmar que
zagem da leitura e da escrita, no contexto houve uma primazia dessas etapas da es-
escolar onde essa atividade é primordial- colarização, em detrimento das demais:
mente sistemática. Partindo dos processos primeiro e segundo ciclos do Ensino Fun-
de decodificação, de consciência fonológi- damental e da Educação Infantil. Tal lacu-
ca e consciência fonêmica, o objetivo de na começou a ser percebida no curso dos
nossos estudos atuais é ampliar o entendi- anos 90, principalmente em decorrência
mento das relações entre experiência mu- do aprofundamento das discussões relati-
sical, consciência fonológica e linguagem vas aos sujeitos de aprendizagem, no con-
escrita para suas funções e usos sociais e texto do fazer pedagógico em Geografia. A

699
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

partir daí, iniciou-se um novo momento de copiar, colorir, nomear, memorizar suas
investigação sobre o ensino de Geografia, informações, tão somente. Nesse senti-
pautado pela identificação e compreensão do, a construção dos conhecimentos para
do papel dessa área do conhecimento na a leitura de mapas e a representação do
formação integral da criança. Os resulta- espaço geográfico assenta-se na premissa
dos, ainda em franco processo de desen- de que a linguagem gráfica corresponde a
volvimento, permitiram aportes teóricos um sistema de símbolos que envolve pro-
específicos aos anos iniciais de escolari- porção, uso de signos ordenados e técni-
zação. Nesse contexto, destacam-se os cas de projeção, além do atendimento a
processos de estudo da linguagem gráfica, algumas necessidades cotidianas, como
compreendida como uma espécie de “al- por exemplo o acesso a determinados lo-
fabetização cartográfica”, fundamental à cais ou os limites de uma determinada
compreensão e representação de mundo, área. A geografia escolar demanda uma
o qual se modifica em consonância com os abordagem relacional, a articulação de
próprios processos de desenvolvimento distintas noções de tempo, espaço, fenô-
da criança e as condições culturais onde menos culturais, sociais, naturais de cada
está inserida. A linguagem gráfica, expres- paisagem, entre outros, para fazer cum-
sa na Geografia por meio da cartografia, prir seu objetivo: “estudar as relações en-
assume importante papel no processo de tre o processo histórico na formação das
desenvolvimento infantil, notadamente sociedades humanas e o funcionamento
nos anos iniciais de escolarização, quando da natureza por meio da leitura do lugar,
as referências de si, do outro e do mundo do território, a partir da paisagem“ (MEC,
estão sendo construídas. Desse modo, seu 1997). Tal intento é complexo e evidencia
domínio possibilita o desenvolvimento das um problema efetivo e real: até que ponto
competências necessárias à compreensão as crianças que estão em pleno processo
do processo de produção do espaço. Isso de desenvolvimento e, por conseguinte,
evidencia a necessidade de se trabalhar habilitando paulatina e progressivamente
na perspectiva de desenvolver as habilida- sua capacidade de compreensão do espa-
des que permitam compreender o espaço ço, dispõem de condições para realizar os
geográfico na lógica de sua produção. Tal objetivos da Geografia? Assim, para o tra-
compreensão se manifesta pela possibili- balho em Geografia, há a necessidade de
dade de sintetizar informações, expressar se compreender o processo de desenvolvi-
conhecimentos sobre uma dada realida- mento da percepção espacial na criança, a
de, estudar situações (analisar, comparar, fim de identificar como se desenvolve sua
correlacionar, concluir), que demonstrem capacidade de perceber o espaço, como é
a produção do espaço na perspectiva de essa percepção e como ela é representada.
sua organização. Tal dimensão é complexa, Almeida e Pasini (1991) identificam que os
não somente por envolver novas formas conteúdos de Geografia nos anos iniciais
de entendimento sobre o papel dessa lin- de escolarização orientam-se às noções
guagem no contexto da geografia escolar, de localização, orientação e representa-
como também inovadora, por represen- ção do espaço. Nesse sentido, para essas
tar a possibilidade de superação das for- autoras, a criança desenvolve a percepção
mas tradicionais de trabalho com mapas: do espaço em três momentos sucessivos e

700
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

subseqüentes, denominados vivido, perce- conteúdos, por exemplo, e à maneira de


bido e concebido. No primeiro a referência abordá-los. Assim, pode-se afirmar que na
de mundo é literalmente experimentada, área de geografia o desenho constitui-se
sendo o tato o sentido mais marcante: a um condicionante à alfabetização carto-
existência é algo concreto, que possa ser gráfica, na medida em que permite: a ela-
visto e tocado. Os referenciais de loca- boração de uma síntese espacial, por meio
lização, orientação e representação são da escolha daqueles elementos que carac-
estabelecidos a partir do próprio corpo. terizam, efetivamente, um determinado
Daí a afirmação de egocentrismo. Nessa espaço (quadro negro, carteiras e mesa da
ocasião desenvolvem-se as relações espa- professora para representar a sala de aula,
ciais mais elementares de especificação por exemplo); a codificação da realidade
do lugar: as relações espaciais topológicas representada, por meio de determinados
elementares (dentro/fora, em cima/ em- símbolos (o desenho em si), condição para
baixo, perto/longe, grande/pequeno etc). o processo de decodificação, exercício in-
O segundo momento é caracterizado pelo trínseco à leitura de mapas; significação e
processo de descentralização, superação sistematização de conteúdos estudados;
do egocentrismo, quando os referenciais identificação das relações espaciais apre-
de localização, orientação e representa- endidas pela criança e, por conseguinte, o
ção são estabelecidos, não mais a partir dimensionamento dos trabalhos relativos
do próprio corpo, mas sim a partir do que ao espaço geográfico.
é visto. Em decorrência disso, realizam-se
as relações espaciais de ordem, sucessão, Palavras-chave: conceito de espaço,
envolvimento, continuidade. Por fim, num proporção, seqüencia lógica, mediação do
terceiro momento, ocorre a superação desenho.
total da necessidade de localizar, orientar
e representar por meio de algo visto ou A MEDIAÇÃO DA FALA EGOCÊNTRICA DA
experimentado. Aqui ocorre o raciocínio CRIANÇA DE SEIS ANOS NA CONSTRUÇÃO
abstrato, onde as funções de localização, COLETIVA DA ESCRITA
orientação e representação são estabeleci- Maria Fernanda Farah Cavaton - UnB
das por um exercício mental, por meio das fernandacavaton@uol.com.br
relações espaciais projetivas e euclidianas.
Tais considerações expressam uma inegá- Neste trabalho, apresentamos e analisa-
vel cautela ao exigir uma compreensão e mos os dados sobre os usos e as funções da
explicação de mundo por crianças, como fala egocêntrica de quatro crianças de seis
objetiva a Geografia escolar. Nesse sentido, anos em suas produções gráficas livres: o
a aprendizagem da linguagem gráfica, que desenho e as escritas iniciais, no contexto
pode ser iniciada a partir de desenhos de escolar. Escolhemos esta faixa etária, por-
situações cotidianas, apresenta-se como que a criança está ingressando no primei-
uma possibilidade de organização pela ro ano do ensino fundamental e sua fala
criança, para a leitura de mundo exigida egocêntrica tem a função mediadora para
pela geografia. Além disso, permite iden- a construção da sistematização da escrita
tificar o modo pelo qual as crianças perce- que é fator determinante de seu desen-
bem o espaço, fundamental à seleção de volvimento cultural (Luria, 1992; Vigotski,

701
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

1994). Nesse momento de construção da tudos contemporâneos (Berk, 1994, 2006;


linguagem escrita da criança pequena, há Berk & Spuhl, 1995; Montero, Dios & Huer-
também a mediação do desenho, enquan- tas, 2001; Winsler, Diaz & Montero, 1997;
to modo comunicativo utilizado na escola. Ramírez, 1991; Winsler & Naglieri, 2003)
Partimos do pressuposto que o processo que sugerem as funções vigotskianas da
de desenvolvimento cultural da criança se fala egocêntrica nas crianças que falam
relaciona à aprendizagem do uso dos sis- para si mesmas na realização de atividades
temas simbólicos como ferramentas cul- cotidianas e escolares. Com o objetivo de
turais, entre eles, a linguagem, a escrita analisar os usos e as funções da fala ego-
e as imagens. Esse processo avança à me- cêntrica nas produções gráficas livres – o
dida que a criança pequena participa de desenho e as escritas iniciais – gravamos
interações e vai compreendendo o uso e em áudio e vídeo quatro sessões de ses-
as funções dos mediadores instrumentais senta minutos no contexto da sala de aula
e simbólicos, atribuindo-lhes novas fun- do BIA I, focando em quatro crianças de
ções como meio de atingir seus objetivos. seis anos: Clara, Daniel, Felipe e Renato em
O estudo aqui apresentado faz parte de quatro tipos de atividades de letramento,
uma pesquisa guarda-chuva com crianças sendo três de reconto de história infantil
de seis anos em sala de aula do 1º ano do e uma de escrita livre propostas pela pro-
ensino fundamental numa escola pública fessora. Utilizamos a abordagem da meto-
de Distrito Federal, denominado de Bloco dologia qualitativa (Creswell, 1998; Mey,
Inicial de Alfabetização (BIA 1), na qual es- 2000) por nos propiciar estudar processos
tudamos as mediações da fala, do desenho educativos considerando a psicologia do
e da escrita inicial na construção de conhe- desenvolvimento da pessoa em sua sin-
cimento nas interações criança/criança e gularidade, para tal, utilizamos o episódio
criança/professora (Cavaton, 2010). Este como unidade de análise (Lacasa, 2001; Le-
trabalho foi desenvolvido na perspectiva mke, 1990; Linell, 1998; Wells, 2005; Wers-
da psicologia sociocultural (Wertsch, 1998) ch & Sammarco, 1985). Para analisar as fa-
na qual o desenvolvimento é construído las egocêntricas aplicamos três categorias
dialogicamente durante atividades de en- descritas por Montero e cols. (2001) e cria-
sinar e aprender (Alexander, 2003, 2005; mos uma quarta categoria para a situação
Pontecorvo, Ajello & Zucchermaglio 2005) específica encontrada em nossa pesquisa:
em processos de letramento multimodal 1. Fala Egocêntrica Irrelevante: a criança
(Descardeci, 2002; Dyson, 2008; Kendrick fala consigo mesma não estabelecendo
& Mckay, 2004). Isto é, novas perspectivas relação com a atividade que está desem-
de alfabetização e letramento de crianças penhando; 2. Fala Egocêntrica Externali-
impulsionadas pelo desenvolvimento da zada e Relevante: inclui comentários para
tecnologia da comunicação online, o que guiar, regular e organizar a própria tarefa;
torna conhecer a correspondência fone- 3. Manifestações Externalizadas de Fala
ma/grafema insuficiente, é preciso tam- Interna: relevantes para a tarefa, incluem
bém acompanhar os sons e a leitura das murmúrios e movimentos de lábios quase
imagens utilizadas em novas formas de imperceptíveis; 4. Fala Egocêntrica Gera-
comunicação. Como nosso estudo analisa dora de Fala Comunicativa: quando a fala
as falas egocêntricas, buscamos vários es- da criança para si mesma desencadeia in-

702
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

terações continuadas por qualquer um dos ção “coletivizada”: Daniel, Felipe e Rena-
interlocutores. Os resultados indicaram o to, sentados à mesma mesa, quando um
uso da fala egocêntrica com a função or- deles fez a relação fonema/grafema usan-
ganizadora do desenho, a criança anuncia- do a fala egocêntrica, os demais também
va o que ia desenhar, contava a narrativa passaram a fazer essa relação, soletrando
da história, os personagens; na escrita, o conjuntamente; f) comentário de concor-
uso com a função de soletração da rela- dância ou discordância: As falas egocêntri-
ção fonema/grafema, a fim de descobrir cas do Felipe geraram sucessivas Zonas de
qual letra empregar na palavra que estava Desenvolvimento Proximal (ZDP) (Vigotski,
escrevendo. Encontramos o uso das falas 1998) pelas falas de apoio da professora ao
egocêntricas com as seguintes funções ge- complexo processo de soletração da rela-
radoras de construção de conhecimento ção fonema/grafema, seguindo a seguinte
na intersubjetividade: a) comentário de dinâmica: ele inicia pronunciando uma pa-
outro social: a fala egocêntrica do falante, lavra; a professora repete; ele pede confir-
gerando questões no interlocutor ouvinte, mação da letra que descobrira; a professo-
que pede esclarecimento ao falante. Feli- ra confirma e o incentiva ir adiante.
pe narrou sua história, em que, a cada ele-
mento inusitado que apresentou falando, Palavras-chave: fala egocêntrica, escrita,
o colega quis ver e saber do que se tratava; desenho infantil.
b) comentário do próprio falante dirigido
a outros sociais: a fala egocêntrica do fa-
lante como geradora da fala comunicativa. SP LT01 - Simpósio
Clara anunciou para si que ia desenhar o
castelo e o cabelo da princesa, serviu de
interlocutor para chamar o coletivo, as SP LT01-959 – COMPLEXIDADE,
outras meninas desenharam também o DESENVOLVIMENTO E CULTURA:
castelo e a princesa; c) falas egocêntricas DESAFIOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS.
em outros sociais: as falas egocêntricas de
Angela Branco - UnB
um falante, gerando várias falas egocêntri-
ambranco@terra.com.br
cas de falantes diferentes, levando a uma
Ana Cecília Bastos - UFBA
adição coletiva de conhecimento. Renato
anaceciliabastos@gmail.com
e seus colegas da mesa, um dos meninos
Maria C.D.P. Lyra - UFPE
começou a nomear seus desenhos perti-
marialyra2007@gmail.com
nentes à história e gerou a nomeação de
outros elementos pelos demais meninos, Financiamento: CNPq
ampliando cada vez mais as falas; d) co-
mentário de avaliação: a fala egocêntrica O conceito de complexidade aplicado ao
gerando avaliação, quando algum interlo- fenômeno psicológico assume diferentes
cutor ouvinte identifica um fato errôneo. dimensões que estão interligadas. Dois as-
Quando Renato e os meninos começaram pectos são, particularmente, relevantes.
a dizer elementos errados da história, ge- Um primeiro diz respeito à multicausali-
rou a avaliação e correção do erro pelos dade que constrói uma causalidade sistê-
outros.; e) falas egocêntricas de soletra- mica, inerente ao sistema aberto que ca-

703
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

racteriza o fenômeno psicológico. Outro, entretanto, não tem sido suficientemente


se aplica à inclusão de um tempo irrever- discutida e esta discussão é absolutamen-
sível como constitutivo deste fenômeno. te necessária diante da tarefa de constru-
Neste simpósio as três apresentações vão ção de conhecimentos científicos sobre
tratar dos desafios enfrentados ao ado- o desenvolvimento humano ao longo do
tar propostas metodológicas condizentes ciclo vital. A perspectiva epistemológica
com a complexidade requerida para o realista, de inspiração positivista, postula
estudo do desenvolvimento e da cultura. a existência de uma realidade que se re-
A Profa, Ângela Branco inicia destacando vela por métodos rigorosos, atemporais e
as exigências e desafios para o estudo independentes do pesquisador. Os dados
do desenvolvimento inserido na cultura seriam essencialmente objetivos e, por-
como fenômeno complexo e multicau- tanto, válidos, confiáveis, e independen-
sal; A Profa. Ana Cecília Bastos examina tes do olhar daquele que pesquisa. É ne-
o modelo de trajetórias de equifinalidade cessário, porém, que sejamos conscientes
(TEM) -- proposto por Sato, Valsiner e co- de que os dados são construídos através
laboradores -- para o estudo de narrativas da derivação de conhecimentos selecio-
autobiográficas de mulheres sobre o tema nados e generalizados dos fenômenos ob-
da transição para a maternidade; Final- servados, de acordo com os pressupostos
mente, as Profa Maria Lyra e Letícia Scorsi teóricos dos pesquisadores. Isto porque a
apresentam a aplicação do modelo de tra- qualidade complexa dos processos estu-
jetórias de equifinalidade (TEM) aplicado dados pela psicologia do desenvolvimento
ao estudo das transformações da fala da exige a consideração da multicausalidade
mãe enquanto significam a diferenciação dos fenômenos, superando a adoção de
das posições dos parceiros -- mãe e bebê paradigmas simplistas onde variáveis são
- no diálogo que ocorre nos primeiros me- artificialmente isoladas e analisadas com
ses de vida do bebê. base em referencial mecanicista inspirado
em uma lógica formal que não pode dar
conta do estudo de processos que atuam
MULTICAUSALIDADE E COMPLEXIDADE em sistemas superpostos e interdepen-
NA PERSPECTIVA SOCIOCULTURAL dentes. Impõe-se, assim, uma mudança
CONSTRUTIVISTA paradigmática com o objetivo de produ-
Angela Branco - Unb zir conhecimentos científicos, isto é, coe-
ambranco@terra.com.br rentes, consistentes e sistemáticos sobre
Financiamento: CNPq uma realidade dinâmica, organizada de
forma sistêmica e complexa, constituí-
A história da psicologia do desenvolvi- da de processos e não mais de produtos
mento como disciplina científica revela- do desenvolvimento humano. Estou aqui
-nos múltiplas tendências e uma imensa me referindo à multiplicidade de fatores
variedade de trajetórias teórico-meto- causais que englobam as dimensões da
dológicas no sentido de promover a pro- filogênese, da história cultural da socie-
dução do conhecimento. A questão epis- dade e dos grupos nos quais o sujeito se
temológica que se encontra na base de insere, da ontogênese, e dos contextos
todo e qualquer processo de investigação, concretos de relações e interações sociais

704
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da pessoa em desenvolvimento, que por por características e eventos que assu-


sua vez, é também capaz de intenciona- mem significados particulares, específi-
lidade e reflexão em nível inter e intra- cos, em função da experiência histórico-
-subjetivo. Considero que a perspectiva -cultural do grupo. Desta forma, teorias e
sistêmica desenvolvimental proposta por métodos deverão contemplar a natureza
Lerner e Ford (1992) permite a considera- dinâmica e de multicausalidade do desen-
ção dialética entre o papel preponderante volvimento, devendo ser sensíveis às es-
da cultura e a construtividade do sujeito, pecificidades do fenômeno em cada con-
definido como um sistema de self dialó- texto que este se apresente, mas sempre
gico em constante interação e desenvol- em busca de tendências e regularidades
vimento. A constatação da complexidade, de caráter mais geral. O maior problema
entretanto, não inviabiliza, a construção das pesquisas acerca do desenvolvimento
rigorosa e científica de conhecimentos. O humano é a existência de uma preocupa-
que nos é exigido é realizar recortes cui- ção excessiva na obtenção de dados que
dadosos e adotar metodologias coeren- possam ser quantificados (tendo em vista
tes com nossa orientação teórico-episte- uma análise dita “científica” do ponto de
mológica e com os objetivos precisos da vista tradicional positivista), o que impe-
pesquisa a ser realizada. Iniciamos nossa de que o fenômeno seja analisado em sua
apresentação discutindo com detalhe a plenitude. Assim, a investigação de cada
própria definição de desenvolvimento questão representa um desafio a exigir
humano apresentada por Ford e Lerner a criatividade do pesquisador no sentido
(1992): “O desenvolvimento humano in- de construir uma metodologia adequada
dividual envolve processos de incremen- aos objetivos do projeto, que seja sufi-
to e transformação que, através do flu- cientemente clara e precisa e, ao mesmo
xo de interações entre as características tempo, flexível e capaz de adaptar-se a
atuais da pessoa e os contextos em que cada etapa do processo de investigação.
está inserida, produz uma sucessão de Desde que apropriados, métodos quanti-
mudanças relativamente duradouras que tativos podem também serem utilizados,
elaboram ou aumentam a diversidade das apesar de que a metodologia qualitativa
características estruturais e funcionais da encontra-se muito mais adequada para o
pessoa e os padrões de suas interações estudo de processos e não de produtos.
com o ambiente, ao mesmo tempo em Com isto, superamos a desgastada dico-
que mantém a organização coerente e a tomia entre quantitativo e qualitativo, e
unidade estrutural-funcional da pessoa partimos para estabelecer recortes entre
como um todo.” (p. 49). Desta definição, a multiplicidade de fatores causais que
depreende-se como característica princi- atuam sobre o fenômeno. Uma dificulda-
pal do desenvolvimento a noção de pro- de importante das pesquisas tradicionais
cesso, de dinâmica e transformação de é a exclusão da cultura (Bronfenbrenner,
um sistema aberto (organismo) em con- 1989; Cole, 1992; Schweder & Much,
tínua interação com o contexto em que 1987), ou sua consideração apenas como
se insere. No caso do ser humano, este variável (o que ocorre no caso da abor-
contexto é eminentemente histórico-so- dagem transcultural, muito distinta da
ciocultural, isto é, um contexto composto psicologia cultural). Em sua busca por leis

705
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

universais, as pesquisas tentam eliminar MODELOS COMPLEXOS NO


a dimensão da cultura e da subjetividade, DESENVOLVIMENTO: O MODELO DE
e com isso os processos de significação de EQUIFINALIDADE DE TRAJETÓRIAS
características, eventos e experiências, (TEM) E A ANÁLISE DE NARRATIVAS
tão distintos em diferentes contextos AUTOBIOGRÁFICAS
histórico-culturais, deixam de ser anali- Ana Cecília Bastos - UFBA,
sados. Muitos autores vêm criticando as anaceciliabastos@gmail.com
“leis universalmente válidas”, mas que se Financiamento: CNPq
aplicam apenas a um indivíduo “médio”
(e.g. Gigerenzer, 1991; Magnusson, 1996). A construção do self pode ser concebida
Tais “indivíduos médios” não existem, e como arte narrativa, processando-se en-
isto implica na necessidade de se reali- tre os mundos pessoais interno e externo.
zar estudos cuidadosos que se refiram a Apreciar este processo em sua complexi-
sujeitos concretos. E é assim que uma ci- dade exige que se tenha como horizonte
ência idiográfica pode melhor contemplar a incomensurável diversidade e variabili-
a complexidade derivada dos múltiplos dade da experiência humana em contexto
fatores interdependentes que atuam so- cultural, aberta a abundantes possibilida-
bre o fenômeno, gerando conhecimentos des de significação, assim como seu po-
que podem vir a orientar novas pesquisas tencial inovador. Seu caráter desenvolvi-
visando a construção de generalizações e mental implica uma tensão dinâmica entre
o desenvolvimento de novos avanços teó- domínios literais e imaginados, a qual tem
ricos. No Laboratório de Microgênese das sido denominada como poetic motion. A
Interações Sociais (LABMIS) do Instituto novidade psicológica emerge justamente
de Psicologia da Universidade de Brasí- de relações entre domínios polarizados
lia, temos desenvolvido projetos a partir entre literal-imaginado e entre passado-
da perspectiva microgenética. Mas temos -presente-futuro. Narrativas autobiográ-
plena consciência de que mesmo que te- ficas podem ser consideradas um desses
nhamos de recortar o nível em que o fe- domínios quando, por exemplo, se focali-
nômeno é estudado, jamais poderemos za agentividade (agency) como trama que
perder de vista os demais níveis em que autoriza ou induz a pessoa a se engajar em
estes se situam, isto é, filogenético, histó- algo não necessariamente formulado em
rico-cultural, ontogenético e prospectivo. dado momento presente. Esta apresenta-
Este último nível ou dimensão vem sendo ção parte das narrativas de seis mulheres
cada vez mais explorado, analisado e dis- de uma mesma família, de idade variando
cutido na psicologia do desenvolvimento, entre 60 e 84 anos, e de suas filhas (ida-
visto que a capacidade humana de ante- de entre 40 e 60 anos), sobre a transição
cipação de probabilidades de futuro tem para a maternidade (tomando gravidez e
importante influência sobre as ações pre- parto como marcadores). A maternidade,
sentes da pessoa. entendida como transição, é um processo
que requer a reconciliação de experiências
Palavras-chave: complexidade, passadas, presentes e futuras, de forma a
multicausalidade, perspectiva sociocultural dar nexo aos diversos acontecimentos que
construtivista. a caracterizam e integrá-los ao curso de

706
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

vida da mulher, em particular, e da família, pode ser estimada, para uma determinada
em geral. Nesse sentido, é consenso entre destinação na vida (o ponto de equifinali-
os autores que trabalham com a aborda- dade). Nesse sentido, envolve a tendência
gem narrativa a idéia de que é o próprio de persistir em determinados padrões no
ato de narrar que dá coesão à diversidade curso de vida. Os autores sugerem a metá-
de nossas experiências, promovendo a co- fora de “canal” para melhor abordar a no-
nexão entre eventos passados, presentes ção de trajetória: o canal pode modificar
e futuros. É, então, através da constante seu curso eventualmente e, no entanto,
atividade de construção e reconstrução continua representando uma trilha con-
de narrativas, do relato de histórias, que creta. O modelo TEM oferece uma opor-
as pessoas dão unidade e coerência aos tunidade de explorar a complexidade da
eventos da própria vida. Discute-se a pos- história de vida, assumindo efetivamen-
sibilidade de aplicação do Modelo de Equi- te que as vidas humanas se desdobram
finalidade de Trajetórias (TEM), elaborado no tempo irreversível, de um ponto co-
por Sato e Valsiner, à análise de narrati- nhecido em direção ao desconhecido. O
vas autobiográficas de mulheres sobre a modelo inclui os modos de adaptação da
transição para a maternidade. O modelo pessoa enquanto agente, as histórias de
TEM é apropriado para análises de narra- vida integrativas da pessoa enquanto au-
tivas, na medida em que permite articular tora, situados, ambos, de forma complexa
orientação e direcionamento social à sín- e diferenciada, no contexto sociocultural.
tese pessoal, favorecendo a identificação Aqui, são também consideradas as traje-
de padrões singulares frente a contextos tórias potenciais ou não realizadas, tanto
que representam diferentes estruturas de no passado quanto no possível futuro; tais
oportunidade. É proposto por seus auto- dimensões são relevantes e presentes na
res como um novo dispositivo metodo- construção pessoal de vidas individuais.
lógicos, baseado numa visão sistêmica e A noção de eqüifinalidade, oriunda da te-
capaz de considerar seriamente a noção oria dos sistemas, refere-se ao princípio
da irreversibilidade do tempo. Assim, é de que, em sistemas abertos, um estado
consistente com a perspectiva do curso final pode ser alcançado através de mui-
de vida, a qual enfatiza o papel da agen- tos meios ou caminhos potenciais; é esta
tividade humana através de transições noção que, de certa forma, articula as di-
desenvolvimentais, devidamente contex- ferentes trajetórias e imprime à vida uma
tualizadas no lugar e no tempo histórico infinita riqueza. Finalmente, pretende-se
e através dos processos de formação e evidenciar que o modelo TEM é adequa-
dissolução de vidas interligadas. Porém, do a uma concepção do desenvolvimento
o modelo TEM vai além da identificação hierarquicamente organizado, abrangen-
de padrões: pretende alcançar a dinâmica do processos que se dão nos níveis macro-
desse movimento da pessoa em direção genético, mesogenético e microgenético,
ao futuro. Pode-se considerar que, nesse permitindo o que os autores denominam
aspecto, converge com a noção de poetic de “manutenção ontogenética’, a qual é
motion. Aqui, trajetória é entendida como semioticamente regulada por signos pro-
o componente estável de uma particular motores derivados dos níveis anteriores.
direção, cuja probabilidade de ocorrência

707
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: narrativas autobiográficas; sultantes na história de desenvolvimento


construção do selF; modelo de equifinalidade da fala da mãe em duas díades mãe-bebê,
de trajetórias (TEM.) ao longo dos oito primeiros meses de vida
do bebê. Os resultados encontrados su-
gerem a existência de um movimento em
TRAJETÓRIAS DE DESENVOLVIMENTO DA espiral que pode ser descrito como “co-
FALA DA MÃE nhecimento-distanciamento-elaboração”
Maria C.D.P. Lyra - UFPE em relação a dois tipos de conteúdos de-
marialyra2007@gmail.com preendidos das manifestações/ações do
Financiamento: CNPq bebê: os estados involuntários do bebê
e as ações do bebê que operam sobre o
Esta apresentação discute as transforma- mundo exterior. É nossa compreensão que
ções da fala da mãe enquanto ela significa este movimento em espiral representa um
as posições dos parceiros no diálogo mãe- padrão desenvolvimentista que é projeta-
-bebê. A perspectiva teórica adotada está do como possibilidades futuras aplicado,
respaldada no dialogismo bakhtiniano fo- então, a novas manifestações/ações do
calizando o movimento constante entre o bebê. Assim, o padrão encontrado guia as
eu e o alter nas trocas que ocorrem no diá- possibilidades de novas trajetórias a serem
logo. Concebemos, assim, que a emergên- vividas no futuro. O modelo de trajetórias
cia do self dialógico no início da vida requer de equifinalidade (TEM, proposto e desen-
um movimento de identificação e de dife- volvido por Sato, Valsiner e colaboradores)
renciação dos parceiros no diálogo, parti- se propõe a integrar tanto o domínio do
cularmente significado pela mãe nas rela- real-imaginado como aquele do passado-
ções que se estabelecem e se desenvolvem -presente-futuro, coexistindo em dado
com seu bebê. Trata-se de uma análise da momento do tempo. Na análise efetuada
fala da mãe que ocorre na relação mãe-be- separamos três tipos de significado da fala
bê, ao longo dos primeiros meses de vida da mãe que correspondem ao movimento
do bebê. Postulamos, desta forma, que a de identificação e de diferenciação dela
diferenciação das posições dos parceiros em relação ao parceiro bebê: (a) a neces-
mãe e bebê pode ser investigada a partir sidade de penetrar o mundo do bebê para
do significado assumido pela fala da mãe compreendê-lo; (b) a necessidade da mãe
ao adotar posições no diálogo. Partindo da de se distanciar do bebê e se diferenciar
análise histórica dessas posições compu- como parceira e (c) a necessidade de se ver
semos uma amostra historicamente estru- (ela mesma) pelos “olhos do bebê”. Estes
turada (HSS). Consideramos a abreviação três tipos de significação correspondem
das trocas mãe-bebê como o estado do ao movimento necessário à constituição
sistema de trocas a atingir (ponto de equi- de um agente na e das trocas dialógicas.
finalidade - EFP) porque sugerimos que, Faremos referência em especial ao que Gil-
segundo Lyra e colaboradores, ela repre- lespie chama de perspectivas na primeira e
senta os primeiros indícios da emergência terceira pessoa necessárias à agentividade
do bebê como parceiro dialógico. Foram no diálogo. Discutiremos, nesta apresen-
identificados os pontos de passagem obri- tação, como o imaginado se torna real na
gatória (OPPs) e traçadas as trajetórias re- perspectiva da mãe, a partir da microaná-

708
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lise das trocas com seu bebê. Discutire- entanto, nota-se certa carência de estudos
mos também a possibilidade de que, em que investiguem os processos educativos
se tratando de um sistema extremamen- estabelecidos a distância, na tentativa de
te fluído como aquele que investigamos, compreender como ocorre o funciona-
as trocas mãe-bebê, novos desafios se mento cognitivo nesse contexto e quais os
colocam ao analisar as trajetórias de de- elementos que o influenciam. A proposta
senvolvimento, no presente caso aquelas deste simpósio é analisar as interações
assumidas pelo desenvolvimento da fala sociais em EaD a partir de três estudos,
da mãe. Por exemplo, trajetórias que pa- desenvolvidos em diferentes Instituições
recem persistir sem bifurcações que, mais de Ensino Superior: 1) Um resumo teórico
adiante, desaparecem, coexistem com ou- que aborda a interface linguagem, cogni-
tras que, claramente, sofrem bifurcações. ção e emoção como elementos essenciais
Poderiam as primeiras ser interpretadas para o estabelecimento das trocas sociais
como resultantes da manutenção de sig- em EaD; 2) A apresentação do termo in-
nificados necessários ao próprio sistema tercognição como um conceito que va-
em estudo? Esta interpretação é coeren- loriza a mediação semiótica presente no
te com o modelo de trajetórias de equi- intercâmbio das mensagens em fóruns de
finalidade (TEM). Discutiremos, assim, as discussão para a construção dialógica do
contribuições e desafios enfrentados ao conhecimento; e 3) O desenvolvimento
aplicar este modelo para o estudo da mi- do pensamento crítico empreendido por
crogênese das trocas mãe-bebê. interlocutores concretos em fóruns de dis-
cussão, buscando evidenciar os fenôme-
Palavras-chave: self dialógico; fala da mãe; nos subjetivos e interativos presentes nas
modelo de trajetórias de equifinalidade (TEM) práticas interativas. Os estudos apresenta-
dos compartilham da metodologia qualita-
tiva e de uma visão de construção de co-
SP LT02 - Simpósio nhecimento forjada a partir de interações
sócio-afetivas e historicamente contextua-
lizadas, onde as pessoas são parceiras de
SP LT02-1298 -INTERAÇÕES SOCIAIS E comunicação, co-autoras e responsáveis
PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO NO pela a qualidade dos processos educativos
CONTEXTO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA que engendram. À medida que ocorre um
comprometimento entre os interlocuto-
res, uma parceria, voltada ao intercâmbio
A Educação a Distância (EaD) é uma mo- das ideias e ao reconhecimento e legitima-
dalidade de ensino em expansão que vem ção do outro enquanto importante media-
consolidando-se como “importante fer- dor para a sua própria aprendizagem, os
ramenta de inclusão social e de melhoria processos educativos no campo da EaD se
da qualidade da educação”, especialmente qualificam mais intensivamente. Portanto,
no âmbito do ensino superior brasileiro as análises realizadas ao longo deste sim-
(ABED, 2011, p. 41). Em função disso, di- pósio enfatizam a indissociável relação en-
versos campos teóricos e metodológicos tre intersubjetividade, cognição, emoção e
têm se interessado pela temática EaD. No práticas argumentativas para a qualidade

709
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

das trocas interativas e a construção do ou mais atores em que ocorre intersubjeti-


conhecimento. Torna-se possível, a partir vidade” (p. 38). Bicalho (2010) trabalhando
da análise dessa relação, o entendimen- esse tema em fóruns de discussão online
to do papel social e as consequências das comenta a importância da relação dialó-
ações de todos os interlocutores sobre o gica, das argumentações, da retórica, dos
processo de ensino-aprendizagem uns dos turnos de comunicação, da constituição
outros, além de possibilitar a criação de discursiva entre os sujeitos, do enunciado,
estratégias que vise maior participação e entre outros, na construção intersubjetiva
melhores níveis de qualidade do conteúdo de conhecimentos. Assim, linguagem, cog-
postado pelos interlocutores nos fóruns de nição e interação são importantes fatores
discussão. Outrossim, as análises ilustram interligados na Educação a Distância, e po-
a fertilidade do diálogo entre EaD e a área dem ser analisados no âmbito da intersub-
da Psicologia, em que é desejável uma jetividade e do registro simbólico. Neste
maior adesão por parte dos psicólogos, trabalho, desenvolveremos uma análise
no sentido de contribuir para o desenvol- teórica dessas questões, mas, incluindo
vimento de métodos e intervenções que a dimensão emocional como outro fator
ressignifiquem as práticas educativas no igualmente importante no estudo da cons-
âmbito da EaD e que sejam favoráveis ao trução intersubjetiva de conhecimento em
desenvolvimento humano. ambientes virtuais de aprendizagem. Nes-
ses ambientes, a inter-relação entre lingua-
Palavras-chave: Cognição; Desenvolvimento gem e emoção, no contexto da intersubje-
humano; EaD. tividade, pode ser mais bem observada em
situações de aprendizagem cooperativa ou
colaborativa. Essas estratégias consistem
LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NA em fazer circular o conhecimento entre os
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA participantes de um curso de modo que,
Ruben de Oliveira Nascimento - UFU num contexto de troca tanto de crenças e
rubenufu@gmail.com opiniões quanto de conceitos, uma apren-
dizagem de qualidade aconteça, e o aluno
A relação entre Linguagem e Cognição é experimente desenvolvimento no curso.
um tema complexo, porém, fundamental Bicalho (2010), explica que “quanto mais
quando se pensa no processo educacional os indivíduos se expressam, aumentam-se
e no desenvolvimento dos sujeitos nele as oportunidades de trocas de significados
envolvidos. Na Educação a Distância (EAD), entre eles, e o peso argumentativo de seus
essa relação é vital. Nesse tipo de educa- enunciados ganha força, desenvolvendo,
ção os sujeitos estão física, espacial e tem- dessa forma, uma intensa realidade in-
poralmente distantes, dependendo assim tersubjetiva” (p. 24). Nesse caso, é impor-
de meios e tecnologias de informação e tante um investimento em dispositivos
comunicação para diminuir distâncias e comunicacionais que estimulem pedago-
promover contatos, o que implica na valo- gicamente a participação e a cooperação
rização da interação. De acordo com Dias dos sujeitos no tratamento de conteúdos.
e Leite (2010), na Educação a Distância, “a Como aponta Morato (2002), com base em
interação é uma ação recíproca entre dois Vigotski, “não há possibilidades de conte-

710
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

údos cognitivos integrais ou domínios do a um patamar meramente intelectual” (p.


pensamento fora da linguagem, nem pos- 80), envolvendo sujeitos únicos, com expe-
sibilidades integrais de linguagem fora dos riências próprias em relação ao mundo e
processos interativos humanos” (Morato, a outras pessoas. Segundo Oliveira (1992),
2002, p. 18). No entanto, Bicalho (2010), para Vygotsky, o significado da palavra (or-
também numa perspectiva histórico-cultu- ganização conceitual) pertence ao cogniti-
ral, assinala que o processo de construção vo, e o sentido da palavra (o que ela signi-
intersubjetiva de conhecimento na Educa- fica para cada indivíduo em particular), de-
ção a Distância não é linear, mas dialética, pende do contexto de uso e das vivências
baseada nas diferenças entre os sujeitos e afetivas dos sujeitos, mostrando como se
entre os argumentos produzidos, de modo dão as relações entre linguagem, cognição
que as significações precisam ser negocia- e afeto. Defendemos que essa relação en-
das. Nesse sentido, não é possível despre- tre significado e sentido, influencia a inter-
zar questões afetivas que surgem tanto no pretação e a resposta afetiva dos sujeitos
embate de ideias quanto nas formas, cri- em interação, num ambiente virtual em
térios e expectativas de participação e de que o discurso escrito predomina. Para-
interação com o outro. Assim, linguagem, lelo a isso, na Educação a Distância, Serra
cognição e emoção estão interligadas na (2005) mostra que indícios de intenções
interação. Papalia e Olds (2000, p. 154) co- e estados afetivos trocados no ambiente
mentam que, no desenvolvimento huma- virtual, podem ser percebidos no uso de
no, as pessoas diferem com relação a uma emoticons, de formas linguísticas que su-
determinada emoção, na reação ao tipo gerem emoções e sentimentos, etc. Essas
de situação que as produzem, e até mes- questões são próprias do desenvolvimento
mo no modo de agir em consequência; humano. Vygotsky (2003), em seus estu-
sendo essas questões ligadas às percep- dos sobre desenvolvimento, comenta que
ções cognitivas de acontecimentos e pes- as emoções não devem ser “consideradas
soas. Mesmo num contexto virtual em que de modo isolado, separadas do conjunto
predomina o discurso escrito e eletrônico global, de todo o resto da vida psíquica do
(Souza, 2002), no qual índices de comuni- homem” (Vygotsky, 2003, p. 86). Vygotsky
cação normalmente encontrados na inte- (2003) sustenta que todas as emoções, to-
ração face a face (gestos, olhares, postura das as sensações emocionais, estão “dire-
corporal, etc., que auxiliam na transmissão tamente entrelaçadas em nossos proces-
de intenções e afetos) não estão visual ou sos de pensamento e que são parte inalie-
diretamente presentes, o registro simbóli- nável do processo integral dos raciocínios”
co permite a expressão de intenções e rea- (p. 85). Nesse sentido, Vygotsky concebe as
ções afetivas, passíveis de serem observa- emoções ligadas ao processo intelectual, à
das nas interações em fóruns de discussão, conscientização das situações que nos cer-
tutorias, e-mail, etc., no modo como as cam e ao nosso comportamento. Vygotsky
relações são construídas. Na abordagem (1991) defende a noção de que “no senti-
vigotskiana, Oliveira (1992) mostra que as mos simplesmente: el sentimiento lo per-
relações interpessoais (intersubjetivas) são cibimos en forma de celos, cólera, ultraje,
vistas como “densas, mediadas simbolica- ofensa. Si decimos que despreciamos a al-
mente, e não trocas mecânicas limitadas guien, el hecho de nombrar los sentimien-

711
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tos hace que éstos varíen, ya que guardan intercognição é entendida como fenôme-
cierta relación com nuestros pensamien- no da interação socialmente estabelecida
tos” (p. 86-87). Bauman (2003) comenta entre interlocutores concretos e que reve-
que “as palavras têm significado: algumas la a interdependência mútua e constante
delas, porém, guardam sensações [...] Os entre eles para a construção dialógica do
significados e sensações que as palavras conhecimento. É um conceito ainda em
carregam não são, é claro, independen- construção, tendo se desdobrado do estu-
tes” (p. 7). Essas concepções fortalecem do empírico de Bicalho (2010) que reali-
a afirmação de Berger e Luckmann (2004) zou análises do conteúdo de mensagens
de que a intersubjetividade inclui índices postadas em fóruns de discussão de uma
de comunicação que se valem do caráter disciplina ofertada, totalmente a distân-
transcendente da linguagem, permitindo a cia, pela Universidade Aberta do Brasil
expressão de intenções e expectativas, in- (UAB) em parceria com a Universidade de
dependente da presença física dos sujeitos Brasília (UnB). A compreensão que temos
em interação. Com base na discussão que da intercognição encontra lastro em uma
levantamos, consideramos necessário na abordagem construtivista, cuja matriz
Educação a Distância, examinar como os provém da tradição piagetiana, conside-
fatores que abordamos se entrelaçam em rando a ênfase dada ao papel ativo do
momentos de intersubjetividade, e como sujeito da aprendizagem; da perspectiva
podem facilitar ou dificultar um ambiente sócio-cultural de Vigotski (2001, 2007),
de cooperação na construção de conheci- ressaltando a noção de zona de desenvol-
mentos. Concluímos que é importante não vimento proximo; da abordagem dialógica
dissociar linguagem, cognição e emoção de Bakhtin (1988, 1997); e interlocutores
no estudo da construção intersubjetiva de (Bruner, 2001; Ligorio et al., 2005; Pon-
conhecimento na Educação a Distância e tecorvo et al., 2005; Rommetveit, Blakar,
na análise dos processos de interação em 1979), sobre a importância dos proces-
ambientes virtuais de aprendizagem. sos interativos para a construção do co-
nhecimento. Partimos do pressuposto
Palavras-chave: Cognição; Emoção; Linguagem. que “o pensamento, o conhecimento e
o raciocínio são também, e prioritaria-
mente, atividades sociais” (Pontecorvo et
INTERCOGNIÇÃO: PARA UMA al., 2005, p. 46). O plano cognitivo, nesse
CONSTRUÇÃO DIALÓGICA DO sentido, é concebido na esfera do social,
CONHECIMENTO NO CONTEXTO DA no qual a interação é responsável por de-
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA sencadear os processos constitutivos do
conhecimento. Produzir conhecimento é
Rute Nogueira de Morais Bicalho - UnB
interpretar a realidade e a si mesmo, em
arutebicalho@gmail.com
um processo dialético bastante complexo,
permeado de contradições e mediações
Neste trabalho pretendemos apresentar
o conceito de intercognição para compre- várias (Linell, 2000). Defendemos que a
endermos a construção coletiva e dialó- cognição deve ser analisada no contexto
gica do conhecimento empreendida no da socialização e dos processos comuni-
contexto da Educação a Distância (EAD). A cativos. Notadamente, os estudos sobre

712
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cognição têm sido realizados em contex- participação e escuta ativa na dinâmica


tos de interações verbais do tipo face a conversacional constantemente reestru-
face (Bourdais, 2002; Sigel, 2002). Nossa turada em função da resposta de cada
proposta é analisar as interações empre- um. Para se chegar a noção de intercogni-
endidas a distância. Acreditamos que a ção foram realizadas análises sistemáticas
intercognição converte-se em principal em fóruns de discussão de uma disciplina,
instrumento de aprendizagem, quando da área da Psicologia ofertada pela UAB-
envolve trocas ativas entre interlocuto- -UnB (totalizando 16 fóruns e 1.097 men-
res concretos, neste caso, professores- sagens postadas). Todas as mensagens
-tutores e cursistas, permitindo desenvol- foram repetidamente lidas, buscando-se,
ver o que Pontecorvo et al. (2005, p.69) conforme os pressupostos da Análise da
chamou de “pensamento coletivo”, para Conversação, formar cadeias enunciativas
referir-se àquele pensamento que: “passa que teve por critério o movimento dos
de um para o outro, como se não tratas- interlocutores em complementarem uns
se mais de indivíduos diferentes, mas de aos outros, intencionalmente, para o de-
um único sujeito que fala com mais ‘vo- senvolvimento do conteúdo trabalho nos
zes’ (como poderíamos dizer seguindo fóruns. A partir da análise dessas cadeias,
Bakthtin, 1981)”. A intercognição emerge evidenciamos que a intercognição foi im-
a partir de uma base temporária de do- plementada quando, entre outros: (a) As
mínio conjuntamente compartilhamento mediações pedagógicas foram rápidas,
entre os interlocutores para as negocia- eficientes e constantes, com o objetivo
ções semióticas em que a dimensão afe- de ajudar os cursistas a concretizarem os
tiva é subjacente (Valsiner, 1998). Em ou- conteúdos trabalhos no texto didático,
tros termos, ela é empreendida à medida favorecendo as discussões e o aprofunda-
que os interlocutores desenvolvem um mento em relação ao assunto em foco; (b)
fio condutor de natureza simbólica que O conteúdo das mensagens foi pertinente
avança junto com a comunicação, caracte- aos objetivos pedagógicos do fórum e à
rizado pelo acréscimo de conteúdos perti- formação de novas zonas de desenvolvi-
nentes e novas perspectivas que levam à mento proximo. Os interlocutores busca-
reconstrução do objeto do conhecimento, ram agregar novos elementos ao debate,
em uma relação de contínua co-autoria integrando-os ao fluxo da comunicação
(Ligorio et al., 2005; Pontecorvo et al., e evitando repetições acríticas aos enun-
2005). Nessa perspectiva, o papel do ou- ciados. E ainda quando intervieram, so-
tro é essencial não apenas como fonte de bretudo, nos momentos de dificuldades
informação, mas como parceiro no pró- dos colegas, conferindo valor epistêmico
prio processo de estruturação e transfor- aos enunciados e aos termos utilizados,
mação da aprendizagem, considerando-se passando do senso comum para o gênero
que o conhecimento não está localizado discursivo acadêmico, e conteúdos cienti-
em um ou outro interlocutor, mas na in- ficamente embasados; (c) As intervenções
teração que eles estabelecem intencional demonstraram, além de cuidado, afeto e
e colaborativamente. Para tanto, é indis- zelo com os enunciados alheios, compro-
pensável uma imersão dos interlocutores metimento em prover suporte emocional
no fluxo da comunicação, logrando uma e pedagógico ao grupo, favorecendo as

713
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

exteriorizações de demandas pedagó- -se da estimativa realizada pelo francês


gicas e didáticas de interlocutores mais Jacques Vallée, Wickert (1999, citado em
tímidos ou academicamente menos com- Jacobini s/d) afirma que o conhecimen-
petentes, no contexto do fórum; (d) Os to dobra a cada 18 meses. Dentro desse
interlocutores se envolviam na discussão contexto, o problema já não é, na maioria
em um movimento de ir e vir, sinalizando das áreas de conhecimento, a escassez de
que o fórum não é apenas um repositório informações, mas justamente o contrário,
de mensagens de cunho avaliativo, mas o excesso. Tal condição tem repercussões
um lugar privilegiado de aprendizagem. diretas sobre o desenvolvimento huma-
O conceito de intercognição mostrou-se no, sobretudo nos aspectos cognitivos.
fértil ao indicar a escuta ativa, o envolvi- Segundo Terneiro-Vieira (1997, p. 9), “a
mento mútuo e o foco no processo cog- superabundância de conhecimentos, o
nitivo dos interlocutores, que constroem, crescimento da complexidade e o ritmo da
situadamente, um pensamento global, mudança impendem o domínio de todo o
coletivo e socializado, o qual tem como conhecimento necessário para dar respos-
processo e produto a dinâmica conversa- tas às exigências sociais e econômicas”. As-
cional. Acreditamos que nossas análises sim, qualquer cidadão necessita estar apto
podem orientar a promoção e a avaliação para lidar com informações, compreendê-
de interações voltadas à construção do -las, selecioná-las e, sobretudo, avaliá-las.
conhecimento e prover subsídios para a É preciso saber discernir as informações
formação de professores-tutores. Entre- válidas, confiáveis e verdadeiras daquelas
tanto, compreendemos que a noção de inconsistentes, imprecisas e falsas. Para
intercognição necessita continuar sendo isso é convocado o pensamento crítico,
elaborada, por meio de investigação que cujo conceito refere-se à habilidade cogni-
envolva outros segmentos da EAD e dis- tiva de decidir racionalmente sobre quais
tintas dinâmicas de construção de conhe- ideias, informações ou argumentos devam
cimento, como, por exemplo, os contextos ser admitidos, rejeitados ou não julgáveis.
educativos convencionais. Johnson (citado em Boisvert, 2004, p. 31),
a partir da análise crítica dos conceitos
Palavras-chave: Intercognição; EaD; Fórum de de 5 autores de referência no tema, iden-
Discussão. tificou 3 pontos de convergência sobre a
constituição do pensamento crítico: 1.
Envolve múltiplas habilidades cognitivas;
O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO 2. Envolve informações e conhecimentos
CRÍTICO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: e; 3. Envolve uma dimensão afetiva. Com
FATORES SUBJETIVOS E INTERATIVOS base nestes três elementos constituintes
Laênio Loche - Uniamérica surgiu o interesse em saber, no processo
loche@livrepensamento.com.br de ensino-aprendizagem desta competên-
cia, quais fatores influenciam o exercício
O momento histórico atual é considerado pleno do pensamento crítico. O presente
a Era da Informação, cujo um dos indícios trabalho buscou descrever os fenômenos
é o crescimento exponencial e vertiginoso subjetivos e interativos no desenvolvi-
do conhecimento humano. Ao apropriar- mento do pensamento crítico manifes-

714
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tados nas práticas interativas em fóruns possibilidade de revelar fatores influen-


de discussão no contexto da Educação a ciadores do pensamento crítico de alunos,
Distância. A competência do pensamento contribuindo assim para a elaboração de
crítico, alçada ao status de objetivo edu- estratégias de aprimoramento através de
cacional, pode ser alcançada através de didáticas mais adequadas e efetivas. Cum-
diferentes estratégias de ensino-aprendi- pre lembrar que a investigação foi de na-
zagem, como o estímulo a autorreflexão e tureza descritiva e exploratória devido aos
a análise crítica de um livro, filme ou qual- estudos relacionados ao pensamento crí-
quer outra obra. Devido à multiplicidade tico no ensino a distância ainda serem in-
de possibilidades didáticas a delimitação cipientes. Os sujeitos selecionados foram
da pesquisa considerou os seguintes crité- alunos de uma turma do curso Didática do
rios: 1. Interação – dentre tais caminhos, Pensamento Crítico 2 – Habilidades Espe-
se destacam as metodologias interativas cíficas, ocorrida no primeiro semestre de
e colaborativas, pois a interação com ou- 2011, cujo perfil era de professores uni-
tro permite comparar e avaliar a própria versitários (mestres, doutores), treinado-
forma de pensar; 2. Debate – segundo res organizacionais, pedagogos, psicólo-
Walton (2006, p. 12), do ponto de vista da gos e outros profissionais envolvidos com
argumentação crítica, o diálogo crítico é a educação de maneira geral, perfazendo
o mais significativo, pois “representa um um total de 19 participantes. Para analisar
modelo ideal, ou normativo, de bom diá- as práticas interativas, foram utilizados os
logo porque tem regras normativas que, pressupostos da Análise de Conteúdo apli-
tomadas em conjunto, estabelecem um cada às mensagens postadas nos fóruns
padrão que define como deve ser um bom de discussão. A seguir, são apresentados
diálogo persuasivo”. Optou-se pelo deba- alguns dos resultados encontrados: I. Fe-
te; 3. EaD – face à presença cada vez maior nômenos cognitivos: 1. Preconceitos – a
da EsD nos processos educativos em nível manifestação de preconceitos a partir da
mundial, impulsionada pela internet, op- assunção de suposições arbitrárias, sem
tou-se por essa modalidade; 4. Fóruns – fundamentos; 2. Distorções cognitivas –
segundo Bicalho (2010, p. 45), o fórum de erros sobre os posicionamentos alheios,
discussão é um contexto propenso à cons- afirmando que a posição do colega era
trução intersubjetiva do conhecimento. uma quando ele disse o contrário; 3. Resis-
Por ser uma atividade de comunicação as- tência – recusa declarada de analisar argu-
síncrona, permitindo uma interatividade mentos por serem contrários às próprias
intensa ao tempo de cada um, os fóruns opiniões; 4. Procedimentais – falhas pro-
permitem aos envolvidos na comunicação cedimentais no exercício das 3 habilida-
um nível de reflexão maior. Diante desta des de argumentar, análise argumentativa
delimitação a presente pesquisa visou res- e avaliação argumentativa. II. Fenômenos
ponder o seguinte problema: quais fatores afetivos: 1. Surpresa – algumas pessoas
de ordem subjetiva e interativa, presentes manifestaram certa surpresa diante de
nas práticas interativas estabelecidas a uma questão inusitada para a maioria,
distância, influenciam o desenvolvimento pois fugia dos problemas comuns do co-
do pensamento crítico em fóruns de dis- tidiano; 2. Titubeio – dado o caráter inco-
cussão? A pesquisa é relevante devido à mum de determinado problema discutido

715
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e por ele envolver valores, de início algu- SP LT02 - Simpósio


mas participantes ficaram hesitantes em
definir uma posição, algo natural, inferido
a partir de respostas um pouco ambíguas; SP LT02-1442 - AVALIAÇÃO COGNITIVA
3. Entusiasmo – momentos de entusiasmo DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA E
inferidos a partir da frequência, tempo de EM RISCO PARA PROBLEMAS NO
resposta e argumentos fundamentados a DESENVOLVIMENTO
partir de pesquisas em referências exter- Grace Rangel Felizardo - UFES
nas; 4. Frustração – chegou o ponto em gracerangelf@gmail.com
que os argumentos começaram a se esgo- Jucineide Della Valentina de Oliveira - FPL
tar, fato identificável quando começaram jucineidedella@yahoo.com.br
a se repetir em diversas mensagens, além Kely Maria Pereira de Paula - UFES
da manifestação da dúvida de se chegar a kelydepaula@yahoo.com.br
um consenso; 5. Reanimação – diante de Kelly Ambrósio Silveira - UFES
uma queda no ritmo da discussão alguns kellysilveira.psicologia@gmail.com
tomaram a iniciativa e convocaram o gru- Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES
po para focar em um posicionamento; 6. soniaenumo@gmail.com
Exacerbação – ao longo de certo debate a
exacerbação de emoções identificadas na A proposta desse simpósio intitulado “Ava-
progressão da posição moderada para a liação cognitiva de crianças com deficiên-
extremada. III. Fenômenos Grupais: 1. Pa- cia e em risco para problemas no desen-
péis – a assunção de papéis dentro do gru- volvimento” tem como objetivo principal
po, onde foi possível observar quem assu- discutir procedimentos de avaliação da di-
miu o papel de motivador, estimulando mensão cognitiva em crianças vulneráveis,
o colega, e também o de líder propondo dada a influência de fatores de risco bioló-
formas de trabalhar ao grupo; 2. Conflitos gico ou psicossociais. Nessa perspectiva, a
– alguns participantes sentiram-se leve- Psicologia Pediátrica tem contribuído para
mente desrespeitados a partir da forma a compreensão e estimulação dos proces-
de refutação e cobrança efetivadas pelos sos de saúde no desenvolvimento da crian-
colegas. A partir dos achados, hipóteses ça e do adolescente, e de suas famílias. Os
podem ser elaboradas servindo de norte- estudos da área procuram identificar e de-
adoras de futuros estudos sobre quais são finir as principais adversidades que com-
os fatores etiológicos destes fenômenos, prometem a saúde, subsidiando interven-
quais métodos didáticos melhor desenvol- ções e programas de prevenção para esta
vem o pensamento crítico, dentre outros. população. Em interface com a Psicologia
Conforme os resultados obtidos, a pesqui- Pediátrica, a Psicopatologia do Desenvol-
sa demonstrou que os fóruns de discussão vimento afirma que, ao longo do curso de
oferecem oportunidades profícuas para o vida, as crianças estão sujeitas à ação de
exercício do pensamento crítico e do de- diferentes riscos ou adversidades que po-
senvolvimento humano. dem incidir sobre o processo de aquisição
de habilidades. Por outro lado, considera
Palavras-chave: Pensamento crítico; EaD; que a ação de mecanismos de proteção ex-
fóruns de discussão. trínsecos à criança poderá facilitar a ado-

716
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ção de processos adaptativos bem-suce- do potencial cognitivo de crianças com


didos e de resiliência. Entende-se, a partir deficiência na perspectiva assistida” visou
da literatura, que condições específicas ao verificar se a avaliação assistida informati-
nascimento, dentre elas a prematuridade zada se apresenta como uma modalidade
e o baixo peso, doenças crônicas e defici- de diagnóstico mais prescritivo do desen-
ências estão associadas a dificuldades em volvimento cognitivo, quando comparada
áreas específicas da agenda desenvolvi- à avaliação psicométrica em crianças com
mental. Uma das áreas consideradas é a deficiência. E o último trabalho, “Avaliação
cognição. Assim, o uso de instrumentos de do desempenho cognitivo de crianças com
vigilância do desenvolvimento e de recur- Anemia Falciforme em prova assistida”,
sos avaliativos diferenciados, como a Ava- teve por objetivo avaliar indicadores de
liação Assistida (Dynamic Assessment), são desempenho cognitivo em crianças com
importantes, de um lado, para a prevenção anemia falciforme durante a realização de
de problemas e estimulação precoce, e de prova assistida.
outro, para a maior compreensão das es-
tratégias de pensamento utilizadas na re-
solução de tarefas, sinalizando potencial AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
cognitivo e indicadores para intervenção. COGNITIVO E DE FATORES
Este simpósio apresentará três pesquisas BIOPSICOSSOCIAIS EM CRIANÇAS
que tiveram como participantes crianças NASCIDAS PREMATURAS E COM BAIXO
que apresentam os seguintes riscos para PESO
problemas no desenvolvimento: prema- Kelly Ambrósio Silveira - UFES
turidade e baixo peso, anemia falciforme kellysilveira.psicologia@gmail.com
e deficiência. A relevância dessa temática Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES
está na necessidade de se discutir os avan- soniaenumo@gmail.com
ços teórico-metodológicos do campo da Kely Maria Pereira de Paula - UFES
Avaliação Psicológica e suas implicações Kelympp@terra.com.br
para a prática profissional, principalmente Financiamento: CNPq
no que diz respeito a adoção de estratégias
de avaliação mais eficazes que promovam A Psicopatologia do Desenvolvimento
intervenções assertivas na promoção da tem indicado a importância da investiga-
saúde e na inclusão educacional/social. ção de fatores biopsicossociais presentes
As pesquisas foram desenvolvidas no Pro- na trajetória de desenvolvimento infantil
grama de Pós-graduação em Psicologia para a compreensão de habilidades cog-
da UFES. A primeira pesquisa, “Avaliação nitivas, linguísticas, motoras e comporta-
do desenvolvimento cognitivo e de fato- mentais (Rutter, 2000; Rutter, & Sroufe,
res biopsicossociais em crianças nascidas 2000). Nesse contexto, a prematuridade,
prematuras e com baixo peso”, utilizando entendida como nascimento anterior a 37
a escala Bayley, avaliou o desenvolvimento semanas de gestação, e o baixo peso, in-
cognitivo de crianças nascidas prematuras ferior a 2.500g, têm sido apontados como
e com baixo peso, que ficaram internadas importantes fatores que podem conferir
em uma UTIN de hospital público da Gran- maior vulnerabilidade ao recém-nascido
de Vitória. O segundo estudo, “Avaliação (Halpern et al., 2002), sendo os processos

717
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

avaliativos e as atividades de estimulação dio ao nascer foi de 1.646g e a idade ges-


precoce temas recorrentes na atuação em tacional média em torno de 32,6 semanas.
Psicologia Pediátrica (Barros, 2003). Sabe- O tempo médio de internação na UTIN foi
-se que o nascimento prematuro (PT) e o 25,9 dias (DP= 19). A maioria das crianças
baixo peso (BP) podem estar ligados a in- (90%) apresentou problemas respiratórios
dicadores de problemas cognitivos, desde ao nascer, sendo a Doença da Membrana
a primeira infância até os anos escolares, Hialina a disfunção mais frequente, repre-
comprometendo processos autorregula- sentando 50% dos problemas respirató-
tórios e de aprendizagem (Bordin, Linha- rios. A partir do questionário sobre riscos
res & Jorge, 2001; Briscoe, Gathercole psicossociais, observou-se que a maioria
& Marlow, 2001; Dezoete, Macarthur & das crianças (47,5%) apresentava baixo
Tuck, 2003). Dessa forma, faz-se neces- risco, 40% apresentou risco psicossocial
sário investigar indicadores cognitivos e moderado e 12,5% da amostra apresen-
intervir precocemente junto a essa popu- tou risco psicossocial severo. Houve maior
lação, atuando de forma preventiva, tendo média na pontuação de variáveis relacio-
em vista que o sistema neurológico ainda nadas a problemas conjugais, seguidas da
está em amplo processo de maturação du- maternidade/paternidade precoces, ha-
rante os primeiros anos de vida (Antunha, bitação superlotada e do baixo nível edu-
1994). Este estudo teve por objetivo ava- cacional dos pais. Verificou-se que o G4
liar o desenvolvimento cognitivo de crian- acumulou maior quantidade de variáveis
ças nascidas prematuras e com baixo peso, de risco biológico e psicossocial. Houve
em um hospital público da Grande Vitória/ baixo desempenho cognitivo em 50% das
ES, com idade entre 12 e 36 meses (mé- crianças, sendo que 45% foram conside-
dia= 23,6 meses, DP= 7,6). Participaram radas Emergentes, com risco médio de ter
40 crianças, 24 meninas e 16 meninos, e algum comprometimento no desenvolvi-
suas mães, organizados em 4 grupos: G1 mento cognitivo, e 5% foram consideradas
com 10 crianças entre 12 e 18 meses; G2 Em Risco, com alta probabilidade de apre-
com 10 crianças entre 18 e 24 meses; G3 sentar algum atraso. Houve, em média,
com 10 crianças entre 24 e 30 meses; e 67,1% de acerto aos itens da escala, com
G4 com 10 crianças entre 30 e 36 meses. progressão da pontuação média e percen-
A avaliação do desenvolvimento foi efetu- tual de acerto do G1 ao G4. A quantidade
ada a partir da Bayley Scales for Infant and de crianças classificadas como Competen-
Toodler Development (BSID- III)- versão de tes aumentou com o passar da idade, com
triagem (screening), Escala Cognitiva, que maior concentração dessa classificação
fornece os indicadores Em Risco, Emergen- no G4. Foi realizada, também, uma Análi-
te e Competente para os resultados obti- se de Variância para o resultado bruto da
dos (Bayley, 2006). A partir do contato com BSID-III, objetivando identificar diferenças
as mães, foi realizada uma entrevista para significativas entre os resultados dos dife-
a verificação de dados demográficos e de rentes grupos. Observou-se que, em re-
nascimento, sendo preenchido também lação aos escores brutos, de modo geral,
o Índice de Riscos Psicossociais de Rutter. houve diferença significativa entre os gru-
Dados dos prontuários médicos foram pos de idade. Isso sugere que as crianças,
consultados. Verificou-se que o peso mé- ainda que sujeitas aos efeitos de variáveis

718
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

biopsicossociais, podem aumentar o de- por inúmeras condições orgânicas, psicoló-


sempenho em atividades cognitivas com o gicas, sociais e econômicas que se somam
passar da idade. Analisando a significância em seus efeitos negativos, ou que, contra-
dos escores entre os grupos, foi possível riamente, adquirem o poder de proteger a
observar que não houve diferença signifi- criança contra atrasos no desenvolvimen-
cativa entre G3 e G4 para a escala cogni- to. É possível que processos de resiliência
tiva. O desempenho cognitivo apresentou estejam atuando nos casos em que há
correlação significativa positiva com as va- diminuição do efeito da ação de variáveis
riáveis: peso ao nascer, idade gestacional, biopsicossociais comprovadamente per-
frequência na creche e escolaridade pater- turbadoras para o desenvolvimento infan-
na; e correlação negativa com hemorragia til. Sendo assim, é de extrema importância
intracraniana. Não foi identificada associa- a prática da intervenção precoce, a partir
ção significativa entre indicadores de risco de grupos de orientação com os pais, e de
psicossocial e indicadores de risco para estimulação especializada e individualiza-
atraso cognitivo (Qui-quadrado, teste V da para os casos de maior vulnerabilidade
de Cramer). Os resultados obtidos permi- a diferentes fatores de risco.
tem observar que o desempenho bruto e
a classificação tenderam à progressão, res- Palavras-chave: Prematuridade e baixo peso;
saltando a hipótese de que, a longo prazo, 2) Desenvolvimento cognitivo; 3) Avaliação do
algumas dificuldades no desenvolvimento desenvolvimento.
infantil podem diminuir a partir do enfra- Contato: Kelly Ambrosio Silveira. Mestre e
quecimento do efeito de algumas variáveis Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação
relacionadas ao nascimento. As análises em Psicologia/UFES.
provenientes do teste de Qui-Quadrado Kellysilveira.psicologia@gmail.com
reforçaram a noção de que não é possível
generalizar a possibilidade de interferência
negativa de riscos relacionados a atrasos AVALIAÇÃO DO POTENCIAL COGNITIVO
no desenvolvimento. Os dados confirmam DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA NA
os resultados indicados na literatura no PERSPECTIVA ASSISTIDA
que tange ao contingente de crianças com Jucineide Della Valentina de Oliveira - FPL
problemas cognitivos em PT/BP, indicando jucineidedella@yahoo.com.br
a necessidade de programas de estimula- Kely Maria Pereira de Paula - UFES
ção precoce, e estudos sobre a correlação kelydepaula@yahoo.com.br
entre fatores biopsicossociais e indicado- Financiamento: FAPES (bolsa de mestrado) e
res de desenvolvimento cognitivo. Quan- FACITEC (bolsa de iniciação científica)
do o foco de análise é o desenvolvimento
infantil torna-se difícil afirmar relações de Vislumbrar as práticas de avaliação psico-
causa-efeito, em que uma variável inde- lógica numa perspectiva de acessibilidade,
pendente de interesse produz um efeito potencialidade e modificabilidade cogniti-
em outra variável dependente. Ao longo va, principalmente, em crianças com defi-
da trajetória de desenvolvimento, os pro- ciência, é um grande desafio. Sabe-se que a
cessos maturacionais e a própria interação identificação e a avaliação de crianças com
do indivíduo com o mundo são permeados deficiência configuram-se como etapas de

719
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

um processo importante para subsidiar es- cesso intelectual e avaliar os resultados


tratégias psicoeducacionais voltadas para provenientes dessa regulação, desenvol-
a promoção do potencial de aprendiza- vendo, por sua vez, habilidades metacogni-
gem. Historicamente, entretanto, práticas tivas5. Assim como a avaliação assistida, a
de avaliação com enfoque estritamente informatização de testes psicológicos per-
comparativo com grupos normativos in- mite uma maior acessibilidade para crian-
crementou a produção de estigmas em ças com problemas no desenvolvimento.
crianças com deficiência, gerando ações Em ambos os casos, considera-se que os
de segregação e preconceito. Em contra- instrumentos utilizados sejam adequados
partida, medidas que consideram a varia- às necessidades dos sujeitos, tendo como
ção intragrupo e aquelas que destacam foco suas potencialidades. Partindo destes
muito mais o processo de aprendizagem princípios, este trabalho teve por objetivo
e as ferramentas metacognitivas do que verificar se a avaliação assistida informati-
os conteúdos aprendidos trouxeram dife- zada se apresenta como uma modalidade
rentes perspectivas ao campo da avaliação de diagnóstico mais prescritivo do desen-
de pessoas com deficiência. Essa nova mo- volvimento cognitivo, quando comparada
dalidade, denominada Avaliação Assistida à avaliação psicométrica, na aplicação em
(Dynamic Assessment), abre um horizonte crianças com deficiência. Participaram da
de possibilidades que colaboram na orga- pesquisa 11 crianças, que frequentavam
nização de propostas de intervenção mais uma instituição de atendimento clínico
dirigidas às potencialidades do ser huma- especializado, na Grande Vitória (ES). O
no, o que, em tempo, pode auxiliar no pro- grupo foi composto por 7 meninos e 4
cesso de inclusão social e educacional de meninas, com idades entre 5 anos e 2 me-
crianças com déficits no desenvolvimento. ses a 9 anos e 11meses, com deficiências
A Experiência de Aprendizagem Mediada e déficits que variavam de moderado a
e a Teoria da Modificabilidade Cognitiva severo nas habilidades sociais, de lingua-
Estrutural, conceitos desenvolvidos pelo gem, comunicação, coordenação moto-
psicólogo israelense Reuven Feuerstein, ra e cognição, decorrentes de diferentes
norteiam essa abordagem de avaliação, e etiologias, entre elas Síndrome de Down
resultam na organização de ambientes es- (n=4), Retardo Mental (n=3), Síndrome de
pecíficos de aprendizagem que auxiliam na Asperger (n=2) e Paralisia Cerebral (n=2).
promoção do desenvolvimento cognitivo1, Na avaliação psicométrica foram utilizados
2
. Nesse contexto, a avaliação assistida é a Escala de Maturidade Mental Colúmbia
uma metodologia que atende às diferen- computadorizada (Colúmbiacomp) e o Tes-
ças individuais3 e que também permite te de Vocabulário por Imagens Peabody
às crianças utilizarem diferentes recursos (TVIPcomp). Na avaliação assistida infor-
cognitivos no processo de aprendizagem4. matizada foram aplicadas três provas vol-
Quando a criança recebe uma intervenção tadas para as habilidades de classificação
individualizada, com o objetivo de otimizar e raciocínio analógico: Exclusão de Objetos
sua capacidade de processar informações, (PEFGcomp), Exclusão de Figuras Geomé-
cria-se uma situação favorável para a mo- tricas (PEFGcomp) e Jogo de Analogia de
dificabilidade cognitiva3 , proporcionando Figuras (JAFcomp), no ambiente informa-
a capacidade de planejar, controlar o pro- tizado SINDAPSI, software desenvolvido

720
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

especificamente para este estudo. Proto- exemplo). No que se refere aos indicado-
colos de registro de fatores afetivo-moti- res afetivo-motivacionais, em todas as
vacionais e de operações cognitivas foram provas a proporção de fatores facilitadores
utilizados durante as tarefas assistidas. Por ficou acima de 90%. A despeito das dificul-
fim, na avaliação do comportamento, o dades cognitivas, o grupo apresentou com-
Child Behavior Checklist (CBCL) foi respon- portamento acessíveis à mediação do exa-
dido pelas mães. Os dados foram subme- minador e facilitadores à tarefa, tais como
tidos à análise estatística descritiva para prazer na atividade, níveis adequados de
verificar o desempenho das crianças nas tolerância à frustração, além de vitalidade
duas formas de avaliação informatizada e sentido de alerta. Os dados do compor-
(psicométrica e assistida). O desempenho tamento da criança avaliados pela mãe
do grupo nos testes psicométricos apre- indicou, por meio do CBCL, que a maioria
sentou classificações inferiores. No TVIP- (n= 7) foi classificada no perfil “clínico” na
comp, que analisa o vocabulário receptivo, “Escala de Problemas Totais”, o mesmo na
7 crianças obtiveram índice “abaixo da subescala de “Distúrbios Internalizantes”;
média”. Na avaliação do raciocínio geral, já para os “Distúrbios Externalizantes”, só
medido pelo Comlúmbiacomp, 55% (n=6) 1 criança se enquadrou no perfil “clínico”.
da amostra foi classificada com desempe- Contudo, problemas comportamentais si-
nho “médio inferior”. Na modalidade as- nalizados pelo CBCL não se apresentaram
sistida, quanto ao desempenho nas provas como dificultadores à realização dos testes
informatizadas, a maior parte das crianças na condição de avaliação estruturada. Na
(n=6) alcançou o perfil classificado como análise geral, o grupo apresentou níveis
“alto-escore” na PEFGcomp, enquanto que de dificuldade na realização dos testes in-
na PEOcomp, 7 crianças foram referidas formatizados assistidos, que variaram em
como “não-mantenedoras”. No JAFcomp a função da prova (maior ou menor com-
maioria (n=6) conseguiu se beneficiar dos plexidade). Contudo, quando incluímos na
níveis de ajuda fornecidos pela mediado- análise do desempenho, outros indicado-
ra na fase de assistência, melhorando ou res (como os afetivos e comportamentais),
mantendo seu desempenho, numa pro- além do perfil cognitivo, o resultado se
porção de 50% de acertos na manutenção apresenta melhor, evidenciando que o gru-
(classificações “ganhador” e “ganhador de- po se beneficiou da mediação implemen-
pendente de assistência”). A relação entre tada na fase de assistência para melhorar
os indicadores cognitivos e o desempenho as habilidades dirigidas à resolução de
nas provas assistidas ficou bem estabele- tarefas. Além disso, a apresentação infor-
cida. Quanto maior o índice de operações matizada dos testes se configurou em fator
cognitivas facilitadoras à execução da tare- motivador que contribuiu para a realização
fa, melhor o desempenho (por exemplo, e persistência na situação de avaliação. Os
perfil “alto-escore” ou “ganhador” na PE- resultados desta pesquisa poderão auxiliar
FGcomp). Assim, em relação equivalente, na elaboração de estratégias no campo da
o JAFcomp, tarefa de maior complexidade, Psicologia, fomentando uma avaliação que
apresentou maior índice de operações valorize mais as potencialidades do que as
cognitivas não-facilitadoras (percepção limitações impostas pela condição de de-
episódica e conduta não-comparativa, por ficiência, também destacando a influência

721
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de processos afetivos na expressão das ha- sa, 2002). Por ser uma doença crônica, a
bilidades cognitivas. mesma constitui um risco para o funciona-
mento da criança, pois impõe uma rotina
Palavras-chave: Avaliação Assistida; Avaliação de consultas médicas, internações hospita-
psicológica computadorizada; Crianças com lares, baixa frequência escolar, agravamen-
deficiência. to da condição física, além de problemas
Contato: Jucineide Della Valentina de psicológicos e comportamentais (Castro &
Oliveira - Faculdade Pitágoras de Linhares, Piccinini, 2002). A AF é vista como um sério
jucineidedella@yahoo.com.br risco para o desempenho cognitivo e para
a aprendizagem (Bonner, Gustafson, Schu-
macher & Thompson, 1999) devido a
AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO maior suscetibilidade a acidentes vascula-
COGNITIVO DE CRIANÇAS COM ANEMIA res e outras alterações neuronais, princi-
FALCIFORME EM PROVA ASSISTIDA palmente em crianças. Considerando que
Grace Rangel Felizardo - UFES há poucos estudos no campo da Psicologia
gracerangelf@gmail.com que avaliam o impacto da doença falcifor-
Kely Maria Pereira de Paula - UFES me nas funções cognitivas, novas investi-
kelydepaula@yahoo.com.br gações e mais detalhadas são necessárias,
Financiamento: CAPES dada a multiplicidade de fatores que po-
dem afetar o desempenho em situações
A doença crônica apresenta um forte im- de aprendizagem. Este trabalho considera
pacto sobre a capacidade funcional do su- que a proposta da Avaliação Assistida (Dy-
jeito, pois altera de forma significativa a namic Assessment) poderá ser útil na iden-
forma como o sujeito se relaciona no dia a tificação do potencial cognitivo de crianças
dia. Mesmo com o avanço nos tratamen- com anemia falciforme. Na literatura, a
tos, em muitos casos, essas doenças não avaliação cognitiva dessa população foi,
podem ser curadas, trazendo para o indivi- sobretudo realizada mediante uma abor-
duo várias e extensivas hospitalizações, dagem psicométrica (BROWN et al, 1993),
dor aguda e/ou contínua e prejuízos cogni- destacando o desempenho inferior do gru-
tivos, além do comprometimento sócio po com doença falciforme em relação à
emocional (Dias, Baptista & Baptista, população normal. Assim, com base nes-
2003). Nesse grupo, podemos citar a Ane- ses dados, optou-se por utilizar a Avaliação
mia Falciforme – AF que chega a afetar de Assistida, visto que esta se fundamenta,
6 a 10% da população afrodescendente teórica e metodologicamente, em uma vi-
brasileira. A doença é definida por uma são mais otimista acerca do desenvolvi-
mutação genética que compromete as mento humano e dos processos de apren-
funções das hemácias, responsáveis por dizagem em situação de adversidade (Feu-
distribuir o oxigênio às demais células do erstein, Rand, Jensen, Kaniel & Tzuriel,
corpo. Tal mutação leva ao encurtamento 1987), considerando os indivíduos que
da vida média dessas células, causando, apresentam uma sobreposição de riscos,
então, a anemia hemolítica, a oclusão dos como os de natureza biológica e psicosso-
vasos e infartos teciduais, resultando em cial, além de integrar à análise de variáveis
lesões e crises dolorosas constantes (Anvi- não estritamente intelectuais (Tzuriel,

722
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

2001). A Avaliação Assistida vai além da ção – MAN e Transferência – TRF). Consi-
medição do conhecimento atual da crian- dera-se a fase SAJ como linha de base, sen-
ça, buscando compreender como a mesma do a ASS a única fase com ajuda do media-
percebe, identifica e analisa os estímulos dor. Após, suspende-se qualquer procedi-
apresentados numa situação de resolução mento de auxílio e verifica-se se a criança
de problemas. Nesse processo de avalia- melhorou seu desempenho nas etapas
ção se configura uma situação de aprendi- subsequentes da avaliação, a saber, MAN e
zagem em que o examinador, através do TRA. No procedimento assistido avaliam-
fornecimento de pistas procura oferecer -se, além do perfil de desempenho, as ope-
um suporte instrucional, o qual se ajusta rações cognitivas e o comportamento du-
ao desempenho da criança. Ao final da rante a realização da prova. Participaram
prova, além de identificar como a criança do estudo 11 crianças com idade entre 8 e
realiza a tarefa, e quais são as melhores e 10 anos, que realizavam tratamento no
mais adequadas estratégias de mediação e ambulatório de pediatria de um hospital
a sensibilidade da mesma às instruções público de Vitória, ES. Em relação à avalia-
oferecidas. Assim, o objetivo principal não ção psicométrica realizada com o Raven
é avaliar o desempenho e sim avaliar a mu- 80% da amostra foi classificada como ten-
dança do padrão de desempenho, a partir do nível intelectual médio. Quanto aos in-
da assistência do mediador, a fim de reve- dicadores de desempenho na resolução de
lar o potencial de aprendizagem, permitin- problemas os resultados mostraram que
do a construção de estratégias mais ade- houve um aumento do numero de pergun-
quadas para cada aprendiz. O presente es- tas relevantes e acertos nas fases ASS,
tudo teve como objetivo avaliar os indica- MAN e TRF quando comparada à SAJ. So-
dores de potencial cognitivo em crianças bre os perfis de desempenho verificou-se
portadoras da anemia falciforme, utilizan- que 27% da amostra foi classificada como
do o procedimento combinado de avalia- alto escore (não requer nenhum tipo de
ção psicométrica e avaliação assistida. Uti- assistência para realizar a prova) e 64%
lizou-se como instrumentos de avaliação como ganhador mantenedor; apenas uma
as Matrizes Progressivas Coloridas de Ra- criança foi classificada como ganhador de-
ven – Escala especial (Angelini, Alves, Cus- pendente de assistência, indicando que a
tódio, Duarte & Duarte 1999), a prova as- maioria da amostra obteve melhora na
sistida Jogo de Perguntas de Busca com Fi- fase de assistência e manteve o bom de-
guras Diversas - PBFD (Gera & Linhares, sempenho na fase de manutenção. No que
1998), na versão computadorizada (Olivei- se refere a transferência da aprendizagem
ra, 2009), além de protocolos específicos 100% da amostra recebeu classificação de
para avaliação de operações cognitivas e transferidor, o que demonstra alto índice
comportamentos envolvidos na resolução de perguntas relevantes e de acertos nessa
da tarefa. Anamnese realizada com as fase. Houve também um aumento das
mães e análise de prontuários médicos operações cognitivas positivas durante as
completaram o procedimento. Em um mo- fases ASS, MAN e TRF se comparadas com
delo estruturado para o contexto de pes- a fase SAJ (sem ajuda). Os comportamen-
quisa, o PBFD apresenta quatro fases (Sem tos positivos ocorreram numa média de
ajuda – SAJ, Assistência – ASS, Manuten- 89% entre as quatro fases. Apesar de a lite-

723
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ratura apontar que as crianças portadoras tras especialidades, participação em grupo


de anemia falciforme tendem a apresentar de apoio à família do portador de anemia
um baixo desempenho cognitivo, os resul- falciforme, elevado envolvimento dos pais
tados indicaram uma situação inversa no conhecimento e manejo da doença, o
onde este grupo, de uma maneira geral, uso de medição específica para dor (hidro-
apresentou um bom desempenho, tanto xiuréia) levando a menor número de crises
na avaliação psicométrica quanto na assis- álgicas seguidas de internação prolongada
tida. Na avaliação assistida, mesmo a e maior frequência escolar. Esses fatores
criança que apresentou um desempenho podem se constituir em mecanismos de
inferior nas primeiras fases, conseguiu ge- proteção que incidem sobre a criança, mi-
neralizar a aprendizagem e ter um bom nimizando os efeitos deletérios de fatores
desempenho (maior número de perguntas biológicos, como a doença crônica e a dor
relevantes e acertos) na fase de transfe- recorrente. São necessários novos estudos
rência. Ainda, a avaliação assistida permi- no país com amostra mais ampla que con-
tiu discriminar o quanto esse grupo se be- siderem o interjogo entre diferentes variá-
neficiou dos níveis de assistência, pois, veis e sua influência no desempenho cog-
apesar de ter um desempenho médio me- nitivo de crianças e jovens com anemia
lhor, se comparado aos resultados de ou- falciforme.
tros grupos com anemia falciforme, em
baterias psicométricas, descritos na litera- Palavras-chave: Avaliação assistida; Avaliação
tura, a competência na tarefa de “pergun- psicológica; Anemia Falciforme; Doença
ta de busca com restrição de alternativas”, Crônica.
que envolve, por exemplo, outras habilida- Contato: Grace Rangel Felizardo – Mestranda
des cognitivas, como as de análise e classi- do Programa de Pós-Graduação em Psicologia/
ficação de estímulos, se tornou mais efeti- UFES - gracerangelf@gmail.com
va ao longo da prova. Esses resultados po-
dem estar relacionados ao método de
avaliação mais compreensivo na organiza- SP LT05 - Simpósio
ção de uma situação de aprendizagem, de-
monstrando que essas crianças foram sen-
síveis à mediação oferecida. É possível que SP LT05-826 - CONTRIBUIÇÕES DA
o desempenho cognitivo do grupo tenha FAMÍLIA PARA O DESENVOLVIMENTO DA
sido influenciado por outros fatores, tais PESSOA COM DEFICIÊNCIA
como as variáveis clínicas, afetivas e so-
Maria Auxiliadora Dessen - UnB
ciais. Embora não seja possível medir pre-
dessen@unb.br
cisamente a direção de tais variáveis, dado
o delineamento do estudo, entre os fato-
Estudar o desenvolvimento do indivíduo
res que podem ter contribuído para o de-
requer, sobretudo, compreender os pro-
sempenho nos testes e sensibilidade à ins-
cessos de comunicação existentes dentro
trução, destacam-se: o diagnóstico defini-
da família e suas inter-relações com os
do até o primeiro ano de vida, o atendi-
demais contextos em que ela se insere.
mento pela mesma equipe médica há vá-
Tanto a criança como os seus genitores e
rios anos, com acesso mais facilitado a ou-

724
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

irmãos são participantes ativos nas rela- analisa as contribuições da família nos
ções familiares, influenciando uns aos ou- atendimentos da pessoa com deficiência,
tros, direta e indiretamente. Dependendo na perspectiva de profissionais, de pro-
do modo como a família se estrutura e fessores de escolas regulares, da família
se relaciona, ela pode favorecer ou difi- (pai, mãe e irmãos) e da própria pessoa
cultar os processos de desenvolvimento com deficiência. Apesar de haver consen-
humano. Considerando que a família está so sobre a importância da parceria entre
em constante processo de adaptação e profissionais e família, os dados sugerem
readaptação em função da ocorrência que a família não participa ativamente
de eventos normativos e não normativos dos serviços e atendimentos oferecidos
próprios de seu desenvolvimento, conhe- pelas instituições, seja porque ela mesma
cer estes processos, sobretudo, quando não se inclui, seja porque são excluídas
um de seus membros apresenta algum pelos profissionais, pois ambos mostram
tipo de deficiência, torna-se prioritário. despreparos para atuarem de acordo com
Assim, este simpósio tem por finalidade modelos de intervenção centrados na fa-
discutir as contribuições de diferentes mília. A última apresentação, baseada na
membros da família (mãe, pai, irmãos) premissa de que o cuidado de pessoas
para o desenvolvimento de pessoas com com deficiência intelectual não se esgo-
deficiência, com ênfase no papel do pai. ta para os familiares ao longo do curso
A primeira apresentação compara várias de vida destes indivíduos, visa discutir as
dimensões das relações entre famílias possibilidades de desenvolvimento das
de crianças pré-escolares com e sem de- pessoas com deficiência ao se tornarem
ficiência, com destaque para as relações adultos em nosso contexto sociocultural.
conjugais, parentais e fraternas, demons- Assim, são apresentados os principais re-
trando que o pai é mais participativo nas sultados de estudos empíricos a respeito
famílias de crianças com síndrome de das trajetórias escolares e perspectivas
Down que nas famílias de crianças com de futuro de jovens / adultos com defici-
desenvolvimento típico. Dando continui- ência e das contribuições dos familiares
dade, a segunda apresentação enfoca as para a configuração de um quadro com-
principais descobertas dos estudos em- preensivo das condições educacionais e
píricos a respeito das contribuições do sociais destas pessoas. Ao final das apre-
pai da pessoa deficiente, ilustrando com sentações, serão discutidas questões re-
dados de uma pesquisa sobre os efei- lativas ao funcionamento familiar, tendo
tos de uma intervenção domiciliar com como pressuposto básico que a presença
envolvimento paterno em famílias de de uma pessoa com deficiência não re-
crianças com síndrome de Down. Den- presenta, necessariamente, um evento
tre os principais resultados encontrados, adverso, desde que haja qualidade nas
merece destaque o fato de que, embo- relações familiares e uma eficiente rede
ra a maioria dos pais tivesse o papel de social de apoio.
provedor principal, eles estavam bastante
envolvidos com seus filhos, colaborando
de forma eficiente com o desenvolvimen-
to das crianças. A terceira apresentação

725
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

RELAÇÕES CONJUGAIS, PARENTAIS E DI, independentemente das idades das


FRATERNAS EM FAMÍLIAS COM FILHOS crianças (6, 7 e 8 anos). Isto significa que à
COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL medida que a criança se desenvolve, não
Nara Liana Pereira-Silva - UFJF demanda, necessariamente, mais estres-
naraliana.silva@ufjf.edu.br sores à unidade conjugal. Quanto às rela-
Maria Auxiliadora Dessen - UnB ções parentais em famílias com pessoas
dessen@unb.br com DI, a literatura tem priorizado os es-
tudos sobre interações mãe-bebê e crian-
Os relacionamentos familiares são consti- ças pequenas, em detrimento daquelas
tuídos por um sistema de trocas interati- com adolescentes e adultos. No entanto,
vas que incluem díades, tríades, tétrades as últimas décadas têm registrado um
e outras constelações, que integram os aumento crescente de interesse pela in-
diferentes subsistemas (conjugal, paren- vestigação de interações pai-criança com
tal, fraternal) que se influenciam mútua DI e de interações entre irmãos, em día-
e multidirecionalmente. Dentre as influ- des em que um dos irmãos apresenta DI.
ências marcantes no desenvolvimento in- A relação entre irmãos é vista como um
fantil, merece destaque aquelas oriundas aspecto essencial do desenvolvimento
das relações dos genitores enquanto ca- humano, ao longo do curso de vida, uma
sal, que interferem diretamente nas suas vez que se trata da relação potencialmen-
relações com os filhos, ao desempenha- te mais duradoura dentro da família. A
rem as tarefas de pai e mãe. As relações convivência com os irmãos facilita a aqui-
parentais, por sua vez, influenciam dire- sição e o desenvolvimento de diversas
tamente o desenvolvimento da criança. habilidades, dentre as quais as sociais e
Em se tratando das relações conjugais em as de solução de problemas. Além disso,
famílias com filhos com deficiência inte- os irmãos passam a constituir uma fonte
lectual (DI), os resultados da literatura, importante de apoio da rede social da fa-
embora ainda não conclusivos, apontam mília, sobretudo quando há pessoas com
que a insatisfação e o estresse marital po- deficiência intelectual, que requerem cui-
dem estar associados aos problemas de dados extras. Assim, dada a importância
comportamento que a criança apresenta, das relações familiares para o desenvolvi-
às maiores demandas de cuidado com as mento de seus membros, e tendo como
necessidades da criança, às interações premissa básica que as famílias com filhos
maritais negativas, bem como à ocor- com necessidades especiais não têm um
rência de trocas aversivas com a criança. funcionamento patológico, mas apenas
Este quadro pode ser amenizado quando enfrentam desafios diferentes daqueles
os maridos empregam mais estratégias enfrentados pelas famílias com filhos sem
de enfrentamento de problemas, possi- deficiência, o objetivo desta apresenta-
bilitando que suas esposas percebam a ção é discutir os principais resultados de
relação do casal de modo mais ajustado. dois estudos empíricos a respeito das re-
No entanto, há estudos que mostram que lações conjugais, parentais e fraternas em
nem a qualidade da relação marital nem o famílias com crianças com DI. O primeiro,
apoio conjugal diferem significativamen- com o objetivo de descrever as relações
te entre famílias de crianças com e sem parentais e as fraternas nestas famílias,

726
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foi realizado com 10 famílias residentes com o diagnóstico de deficiência intelec-


em Brasília, das quais 5 tinham um filho tual, tendo a maioria síndrome de Down
com síndrome de Down (SD) e 5 tinham fi- (n=15). Um dos objetivos deste estudo foi
lhos com desenvolvimento típico. A cole- verificar o índice de ajustamento diádico
ta de dados foi efetuada na residência das medido por meio da Escala de Ajustamen-
famílias, durante dois anos, com visitas to Diádico de Spanier. A média de pontos
semestrais. As relações parentais e frater- atingidos pela maioria de pais (M=106) e
nas foram investigadas por meio de ob- mães (M=107) foi maior que 101, indican-
servação direta do comportamento, usan- do que estes casais estão ajustados em
do os recursos da tecnologia de vídeo. As seu relacionamento conjugal. A minoria
observações tiveram duração de, aproxi- dos participantes (pais - n=8; mães - n=7)
madamente, 10 minutos cada, nas situa- encontra-se em dificuldade/desajusta-
ções de atividades livres em que a criança mento no relacionamento conjugal. Es-
(C) encontrava-se com um dos genitores ses resultados indicam, ainda, que pais e
(C-M, C-P), com ambos (C-M-P), com os mães não diferiram em sua percepção de
genitores e o irmão (C-M-P-I) ou somen- ajustamento, bem como de felicidade no
te com o irmão (C-I). As interações fami- casamento, apresentando uma variação
liares caracterizaram-se pela ‘Sincronia’, entre ‘feliz’ e ‘muito feliz’. Os resultados
‘Supervisão’, ‘Amistosidade’ e ‘Liderança’. de ambas as pesquisas confirmam o pres-
Esse mesmo padrão foi encontrado em suposto inicial de que estas famílias têm
díades, tríades e tétrades, em ambos os uma dinâmica similar à de famílias com
tipos de família, tanto nas relações paren- filhos sem deficiências e sugerem que é
tais quanto nas relações entre os irmãos. preciso envidar esforços para ampliar o
As atividades foram desenvolvidas, ge- escopo da pesquisa sobre a família, in-
ralmente, em ‘Grupo’, havendo predomi- cluindo resultados positivos para as famí-
nância da participação ‘Conjunta’, com a lias com filhos com deficiências, levando
mãe sendo a maior responsável pela ‘Su- em consideração a natureza sistêmica da
pervisão’ e ‘Liderança’ nas interações, em família e, consequentemente, as influên-
ambos os tipos de famílias. Mães e pais, cias mútuas entre os diferentes subsiste-
em famílias de crianças com síndrome de mas. Destaca-se a importância da elabo-
Down, iniciaram igualmente as interações ração de programas de educação familiar
com sua criança, enquanto em famílias de voltados para as famílias com necessida-
crianças com desenvolvimento típico, a des especiais, com ênfase na dinâmica de
responsabilidade maior foi da mãe. O pai suas relações familiares.
mostrou-se mais participativo nas famílias
de crianças com síndrome de Down que Palavras-chave: relações maritais, relações
nas famílias de crianças com desenvolvi- parentais, relações fraternas, deficiência
mento típico. Alguns padrões de comuni- intelectual
cação familiar apresentaram continuida- Contato: Nara Liana Pereira-Silva, UFJF,
des e outros apresentaram descontinui- naraliana.silva@ufjf.edu.br
dades ao longo do tempo. O outro estudo
contou com a participação de 21 pais e 21
mães de crianças de 1 a 13 anos de idade

727
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CONTRIBUIÇÕES ALÉM DA MÃE: O um aumento de conhecimentos sobre a


IRMÃO E O PAI DA PESSOA COM deficiência do irmão e aspectos relacio-
DEFICIÊNCIA nados; variabilidade em relação aos níveis
Nancy Capretz Batista da Silva - UFSCar de interação com os irmãos e aos tipos de
nancycbs@gmail.com comportamentos dirigidos a eles e, tam-
Ana Lúcia Rossito Aiello - UFSCar bém, quanto às estratégias utilizadas para
ana.aiello@terra.com.br enfrentar situações difíceis relacionadas
Financiamento: CAPES ao irmão. Já em relação ao papel do pai,
sua importância no desenvolvimento dos
O desenvolvimento humano depende, filhos é reconhecida na literatura, mes-
sobretudo, da família na qual o indivíduo mo que muitas vezes seu papel prepon-
se insere. Quando uma das crianças da fa- derante seja o de provedor. Assim, o pai
mília tem uma deficiência, a necessidade positivamente envolvido contribui com
de que aquela família seja uma estrutura o desenvolvimento psicoafetivo e com a
social efetiva se torna ainda mais impor- construção da personalidade dos filhos,
tante. O universo familiar das crianças vai constituindo a sua primeira autoridade
muito além da interação mãe–criança, social; com o desenvolvimento intelectu-
díade tradicionalmente mais contempla- al, social e emocional das crianças; com
da nos estudos sobre desenvolvimento, a competência cognitiva, a empatia, o
dado que envolve o pai, irmãos, avós e foco de controle interno e a formação de
outros agentes sociais. Com base nessa uma menor crença sexualmente estere-
concepção sistêmica de família, consi- otipada; contra desajustes psicológicos
dera-se que qualquer fato ou aconteci- e estresse; e tem filhos mais engajados
mento que afete um membro da família socialmente, obedientes e com relação
atingirá, consequentemente, o sistema harmoniosa com o mesmo. Portanto,
como um todo. A relação entre irmãos e uma variedade de fatores influencia no
irmãs, por exemplo, é o mais rico e dura- envolvimento paterno, dentre os quais:
douro dos relacionamentos familiares, a qualidade da interação com a parcei-
tanto na infância como na idade adulta. ra, a relação com o próprio pai, a família
Os irmãos modelam ativamente as vidas estendida e os suportes sociais, caracte-
uns dos outros e preparam uns aos ou- rísticas da criança (idade, gênero, status
tros para as experiências que terão com de desenvolvimento, saúde e personali-
pares e adultos. Sabe-se que os irmãos de dade); fatores sociodemográficos do pai
pessoas com necessidades educacionais (idade, nível educacional, renda, status
especiais frequentemente passam pelas conjugal, status empregatício, identidade
mesmas experiências que os pais, como cultural e religiosidade); fatores pessoais
medo, raiva, culpa, etc., o que se justifi- do pai (funcionalidade, preparo para a
ca, uma vez que as reações dos pais in- paternidade, estilo parental, motivação,
fluenciam aquelas dos filhos. A literatura personalidade, habilidades, visão do pa-
ressalta a importância de se realizar in- pel paterno, experiência cultural e identi-
tervenções em grupos com os irmãos de dade paterna); demandas de papéis com-
crianças com deficiência, uma vez que há plementares ou concorrentes (família,
trabalho e comunidade) e; envolvimento

728
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

paterno (frequência, variedade de com- culinos, mas, estresse geral para todas
portamentos, qualidade das interações as mães. Após a intervenção domiciliar
e significado do envolvimento). Assim, o da pesquisadora, as atividades de treino
objetivo desta apresentação é discutir as realizado pelo pai, baseadas no Porta-
principais descobertas dos estudos empí- ge, desenvolveram novos repertórios na
ricos à respeito das contribuições do pai criança, comportamentos positivos nas
da pessoa deficiente, ilustrando com os interações foram mais frequentes e hou-
dados de uma pesquisa sobre os efeitos ve diminuição dos índices indicativos de
de uma intervenção domiciliar com envol- estresse nas mães. Embora a maioria dos
vimento paterno em famílias de crianças pais tivesse o papel de provedor principal,
com síndrome de Down. Cinco famílias conforme a literatura indica, estavam en-
de duas cidades do interior do Estado volvidos com seus filhos, colaborando de
de São Paulo participaram do estudo. As forma eficiente com o desenvolvimento
crianças, com idade entre um e dois anos, das crianças e absorvendo as dicas para
foram avaliadas com o Inventário Porta- uma melhor interação familiar, o que
ge Operacionalizado, sendo constatado pareceu contribuir para a diminuição do
atraso no desenvolvimento de todas elas. estresse nas mães. Assim, a intervenção
Elas foram filmadas, ao longo do estudo, indicou realizações nos fatores pessoais
brincando com seus genitores e essas in- do pai, que influenciam envolvimento pa-
terações foram analisadas por meio de terno, e no envolvimento em si, aumen-
três protocolos diferentes: o Protocolo tando sua frequência, ampliando a varie-
de Categorias de Análise das Filmagens dade de comportamentos, melhorando a
de Interação, o Sistema Definitivo de Ca- qualidade das interações e resignificando
tegorias Observacionais e o Protocolo de a importância do envolvimento. Concluin-
Avaliação da Interação Diádica/Triádico. do, programas de intervenção precoce
Além disso, foram utilizados o roteiro de deveriam abandonar o modelo centrado
Entrevista de Caracterização do Papel do na criança para adotar um modelo centra-
Pai Brasileiro na Educação da Criança com do na família, envolvendo também o pai
Deficiência Mental para avaliar o envolvi- e o(s) irmão(s). Futuras pesquisas devem
mento paterno; o QRS-F e o ISSL para me- avaliar formas de incluir os irmãos nas in-
dir o estresse dos genitores; e outras me- tervenções e os resultados advindos da
didas como depressão, funcionamento intervenção com a família toda.
familiar, nível de enfrentamento, supor-
te social, satisfação parental, satisfação Palavras-chave: pessoa com deficiência,
marital e empoderamento, os quais não irmão, envolvimento do pai
sofreram alterações durante o estudo. Contato: Nancy Capretz Batista da Silva,
Foram observadas interações familiares UFSCar, nancycbs@gmail.com
satisfatórias, porém, diferentes em alguns
aspectos entre pais e mães e nas díades e
tríades; envolvimento paterno em diver-
sos aspectos; baixos níveis de estresse em
relação à presença da criança; ausência
de estresse geral entre os genitores mas-

729
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

A PARTICIPAÇÃO E O ENVOLVIMENTO a evolução de sua participação em progra-


DAS FAMÍLIAS NOS ATENDIMENTOS DA mas de intervenção familiar e os resultados
CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA de uma pesquisa nacional sobre o tipo de
Simone Cerqueira-Silva - IESB participação e envolvimento da família em
simone.cerqueira@iesb.br diferentes instituições de atendimento e
Maria Auxiliadora Dessen - UnB nas escolas. A participação de mães e pais
dessen@unb.br em programas de intervenção familiar é
Financiamento: CAPES considerada importante para o desenvolvi-
mento das crianças desde as décadas de 30
Para que a família possa desenvolver pa- e 40 do século XX, quando os programas de
drões de comunicação que favoreçam o intervenção familiar começaram a prolife-
seu desenvolvimento e o de suas crianças rar nos Estados Unidos. Desde essa época,
com deficiência, ela precisa dispor de re- novas perspectivas nos atendimentos fami-
cursos e suportes que a ajudem a superar liares têm sido vislumbradas, embora não
as adversidades próprias de sua trajetória necessariamente em todos os contextos e
de desenvolvimento. A presença de um áreas de aplicação. A partir de 1950, tanto
familiar com deficiência não representa, nos Estados Unidos como no Brasil, surgi-
necessariamente, um evento adverso para ram os modelos remediativos de atendi-
o grupo familiar, desde que haja qualidade mento (prevenção), enfatizando a maneira
nas relações e uma eficiente rede social de compreender o homem em seu caráter
de apoio. As famílias necessitam desse histórico e social. Acompanhando a mesma
tipo de apoio para que possam desenvol- evolução das estratégias de prevenção e
ver a autoconfiança, a capacidade crítica intervenção na saúde, os programas vol-
e a autonomia no gerenciamento de suas tados para as famílias vêm lenta e progres-
próprias vidas. Para isso, é importante que sivamente ampliando o foco de trabalho.
participem de programas de intervenção A visão predominante da mãe como um
familiar que as empoderem na direção de agente passivo e receptivo de orientação e
uma maior conscientização de seus direitos informação, característica do modelo cen-
e de um maior envolvimento e participação trado nos profissionais, vem sendo subs-
nos atendimentos, de modo que possam tituída por um enfoque que a considera
enfrentar as dificuldades advindas com as ativa e participativa - modelo centrado na
necessidades especiais de suas crianças. família. Este paradigma de trabalho com
Dada as contribuições da família para o de- as famílias surgiu como uma alternativa
senvolvimento da criança, tanto no espaço promissora na área de intervenção preco-
familiar quanto em instituições de atendi- ce nos Estados Unidos e difere do trabalho
mento à criança e nas escolas, é cada vez tradicional, uma vez que cria oportunida-
mais crescente o interesse em se promover des para os familiares exercerem suas ca-
a sua participação em programas de inter- pacidades e desenvolverem novas compe-
venção familiar. Assim, o objetivo desta tências. Os profissionais são vistos como
apresentação é discutir a participação e o agentes que ajudam as famílias, mas que
envolvimento das famílias nos atendimen- não agem por elas, enquanto as famílias
tos da criança com deficiência, apresentan- deixam de ser vistas como passivas e de-
do, inicialmente, um breve histórico sobre pendentes das orientações profissionais

730
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para serem consideradas ativas e partici- que este comportamento dos pais sem-
pativas. Estudos internacionais sugerem pre ocorre, e apenas 5% dos professores
que os atendimentos familiares deveriam informaram que as famílias têm sempre
ser embasados, especialmente, no modelo esse comportamento. Portanto, os dados
centrado na família. O Programa de Edu- sugerem que apesar de a maioria das fa-
cação Familiar na Infância Precoce (Early milias procurarem por informações sobre o
Childhood Family Education), por exem- atendimento, isto não significa uma parti-
plo, fundamentado na Teoria Sistêmica e cipação efetiva da família. A sua passivida-
no trabalho desenvolvido no Centro para a de pode ser decorrente da própria falta de
Democracia e Cidadania (Center for Demo- recursos pessoais para o enfrentamento da
cracy and Citizenship) da Universidade de deficiência, indicando a necessidade de um
Minnesota (USA), é considerado um mode- programa eficaz que a capacite a lidar com
lo alternativo de atendimento às famílias. a própria deficiência e suas implicações.
Ele prioriza o desenvolvimento de lideran- Além disso, essa passividade pode estar
ças, de auto-organização e a participação associada aos próprios valores arraigados
ativa de todos os envolvidos. Por outro na cultura, cuja conformidade e autoridade
lado, no âmbito nacional, alguns estudos externa são mais valorizadas do que a pró-
revelam que a implementação desse tipo pria autonomia, o autocontrole e a respon-
de trabalho ainda é muito deficitário, em sabilidade. Esta passividade das famílias,
nossa realidade, pois os familiares ainda se aliada ao despreparo dos profissionais para
colocam em posição inferior, desconhecen- trabalhar com a família, constitui um fator
do a importância de se emanciparem e de- dificultador para os serviços e atendimen-
senvolverem uma relação mais igualitária. tos. O fato de não haver indicação de de-
Para ilustrar essa realidade, apresentamos mandas espontâneas das famílias para os
os dados de um estudo envolvendo dife- profissionais e, por outro lado, os próprios
rentes instituições de atendimento e esco- profissionais não terem o feedback da qua-
las, em que ficou constatado que a maioria lidade dos seus serviços por parte das famí-
(81%) das 16 famílias participantes avaliou lias, dificulta ainda mais a mudança de mo-
que sempre colabora com os atendimentos delos de atendimento centrados nos profis-
da criança, e que 47% dos profissionais da sionais para aqueles centrados na família.
equipe técnica avaliaram que os pais sem- Este quadro denota que é preciso investir
pre colaboram. Além disso, para 70% das na mudança de concepções e valores de
famílias, elas sempre procuram pelos pro- ambos os lados – profissionais e famílias,
fissionais para se informarem a respeito em primeiro lugar, para, em seguida, ado-
dos atendimentos da criança, mas somen- tar estratégias que sejam coerentes com o
te 32% dos profissionais das instituições modelo centrado na família, apontado pela
(equipe técnica e coordenadores) e 10% literatura como sendo o mais eficaz.
dos professores das escolas, relataram que
elas sempre procuram pelos profissionais. Palavras-chave: família, necessidades
Quando o assunto é pedir informações, fa- especiais, parceria família-instituição de
zer críticas e dar sugestões, 25% das famí- atendimento-escola
lias disseram que sempre fazem isto, 25% Contato: Simone Cerqueira da Silva, IESB,
dos profissionais das instituições avaliaram simone.cerqueira@iesb.br

731
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

TRAJETÓRIAS ESCOLARES E comum, defendendo a tese de que estes


EXPECTATIVAS DE FUTURO: A teriam muito a se beneficiar deste proces-
PERSPECTIVA DE JOVENS /ADULTOS COM so. Embora haja uma tendência crescente
DEFICIÊNCIA E DE SEUS FAMILIARES. de ingresso de jovens e adultos com de-
Silvia Regina Ricco Lucato Sigolo - UNESP ficiência nos programas de educação de
sigolo@fclar.unesp.br jovens e adultos, ainda são raras as pes-
Giorgia Caroline Tomaino - UNESP quisas que investigam os contextos de de-
senvolvimento para esta população. Estes
Esta apresentação visa discutir as possibi- alunos estão vivenciando dupla situação
lidades de desenvolvimento das pessoas de exclusão, a de ser um aluno com defi-
com deficiência ao se tornarem adultos ciência no ensino regular e a de pertencer
em nosso contexto sociocultural. Pesqui- ao segundo segmento da EJA, revelando
sas com esta população que enfocam os as faces de uma inclusão perversa. Alguns
cenários de suas atividades e relações, in- estudos apontam como obstáculos a au-
cluindo as relações com o trabalho, a vida sência de informação sobre o processo
afetiva, os diferentes espaços de ativida- de inclusão, diferenças na estrutura e
des e as experiências escolares, apontam organização das escolas e na formação
para um contexto extremamente restrito. profissional distinta dada pela escola es-
Este contexto é permeado pela condu- pecializada e a regular. Baseados nestas
ção de suas famílias e das instituições reflexões, o objetivo desta apresentação
das quais fazem parte, sugerindo que as é discutir os principais resultados dos es-
oportunidades de relações autônomas, tudos empíricos a respeito das trajetórias
além de escassas, parecem determinar escolares e perspectivas de futuro de jo-
um não reconhecimento dos direitos de vens / adultos com deficiência a partir de
participação ampla das pessoas com de- sua própria percepção e as contribuições
ficiência intelectual no mundo adulto, dos familiares para a configuração de um
incluídas as condições cruciais para a ma- quadro compreensivo das condições edu-
turidade, tais como relações afetivas, es- cacionais e sociais destas pessoas. Ênfa-
colarização e trabalho. Dadas estas con- se será dada ao estudo dos processos de
dições, pode-se afirmar que o cuidado de transição de jovens/ adultos com defici-
pessoas com deficiência intelectual não ência intelectual entre contextos escola-
se esgota para os familiares destes indiví- res especializados e regulares, na pers-
duos e que o conhecimento de suas con- pectiva destes jovens e de seus familia-
cepções e estilos de vida poderiam deli- res. Tal estudo revela que o ambiente das
near mais claramente os mecanismos de instituições, de acordo com as relações
ligação destes cuidadores com os serviços estabelecidas e a rotina das atividades,
disponíveis para seus filhos e parentes, oferecia maiores oportunidades de socia-
com base na percepção de necessidades lização, enquanto que as escolas regula-
destas famílias. Por outro lado, no âmbito res trabalhavam preferencialmente com a
educacional, no bojo das propostas inclu- transmissão de conteúdos escolares, não
sivas tem se estimulado, desde o inicio proporcionando espaços adequados para
da década passada, a inserção deste gru- a ampliação da rede de relações até então
po de pessoas no processo de educação construída. Os modelos de organização e
estrutura da escola atual não permitiam
732
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

melhores oportunidades de aprendiza- condições de aprendizagem, uma vez que


gem e desenvolvimento para estes alu- estes alunos não apresentavam desenvol-
nos, uma vez que os conteúdos eram vimento compatível com a faixa etária. Os
apresentados de forma fragmentada em dados apresentados embasam uma dis-
função do tempo limitado das aulas, au- cussão sobre a necessidade de conceber
sência de oportunidades de adaptação à a pessoa com deficiência enquanto um
nova realidade escolar, ou mesmo, de uti- ser humano com vida social, afetiva, aca-
lização de recursos especializados. A tran- dêmica e de trabalho. Isto significa pensar
sição para o contexto escolar foi avaliada nestes jovens e adultos com deficiência
positivamente como princípio, contudo como pessoas que estão em desenvolvi-
apresentaram criticas sobre a sua estru- mento e cujas perspectivas e expectativas
tura, o distanciamento entre professor e podem se alterar para além das possibi-
aluno e as dificuldades de relacionamen- lidades apreendidas durante a infância.
to entre os alunos em função da hetero- As trajetórias escolares embora apresen-
geneidade da turma. No contexto escolar tadas como singulares, são coincidentes
atual, para alguns jovens, a convivência nas condições de extrema precariedade,
com um grupo heterogêneo significou nas reiteradas submissões a rótulos de
estabelecer projetos como a continuida- incapazes e à conformidade com o fracas-
de aos estudos, ser inserido no mercado so imposto por situações excludentes. Há
de trabalho ou mesmo constituir famí- necessidade, portanto, (a) de se pensar
lia. Para outros, as interações entre os em um processo de transição que procure
colegas significou ainda que, de maneira efetivamente estabelecer as conexões en-
dissimulada, situações de discriminação. tre ambos os contextos; (b) há premência
Com a freqüência no ensino comum, as de pesquisas que conheçam a realidade
perspectivas de futuro se ampliaram para de jovens e adultos nestas condições e de
alguns, que vislumbravam estudar para se suas famílias, que identifiquem as reais
engajar em empregos melhores do que o necessidades para a formulação de servi-
de atividades manuais. No entanto, estas ços adequados; (c) repensar os suportes e
expectativas parecem não estar pauta- apoios para a garantia de que o processo
das nas condições reais de progressos na de inclusão escolar e social seja concreti-
aprendizagem escolar e as dificuldades zado, possibilitando estratégias apropria-
no processo de escolarização são visíveis, das de transição de um contexto para o
além do fato de que o processo de tran- outro, incluindo as famílias em programas
sição trouxe situações novas e de difícil de assistência.
adaptação. Para os familiares, a transição
significou a perda de alguns benefícios, Palavras-chave: jovens/adultos com
como acesso facilitado aos profissionais deficiência, famílias, desenvolvimento
da saúde, a oportunidade de ser inseri- humano
do no mercado de trabalho; para alguns Contato: Silvia Regina Ricco Lucato Sigolo,
deles, a escola regular deveria oferecer as UNESP, sigolo@fclar.unesp.br
mesmas atividades e oportunidades que
anteriormente os alunos recebiam nas
instituições, e ainda propiciar melhores

733
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

SP LT05 - Simpósio condição da DPP, propicia reflexões teóri-


cas e metodológicas sobre estas questões
e congrega pesquisadores de diferentes
SP LT05-841 - CONTEXTO SÓCIO-AFETIVO formações e inserções institucionais em
DA FAMÍLIA E O DESENVOLVIMENTO torno de um projeto temático, voltado
DA CRIANÇA À LUZ DA CONDIÇÃO DA para população atendida pelo sistema
DEPRESSÃO PÓS PARTO (DPP) público de saúde. Reúne pesquisas sobre
a ontogênese de aspectos essenciais do
Júlia Scarano de Mendonça - IPUSP
desenvolvimento humano, representati-
julia.m@itelefonica.com.br
vos da integração de processos afetivos
Financiamento: FAPESP e cognitivos. Dois dos trabalhos referem-
-se ao desenvolvimento do apego. Um
Há um reconhecimento crescente da com- deles analisa a constelação familiar em
plexidade dos processos de desenvolvi- geral, valendo-se da experiência em um
mento, condizentes com uma abordagem centro canadense voltado para este tipo
sistêmica: tanto a comprovação de dados de análise (Mendonça & Cossette): vale
esperados como a constatação de resulta- destacar que análises separadas dos pais
dos paradoxais exigem, dada a natureza e das mães produziram resultados contra-
do fenômeno, constantes aprimoramen- ditórios, com dados significativos apenas
tos conceituais e metodológicos. Estamos no caso da análise conjunta de perfis de
às voltas com os desafios atuais da Psico- apego considerando-se ambos os pais. Na
logia: integrar níveis de análise via pesqui- outra pesquisa, analisou-se o desenvolvi-
sa interdisciplinar e formação de redes; mento da vinculação afetiva na criança em
integrar conhecimentos através de meta- condição de DPP (Vicente & Bussab). Não
nálises e revisões sistemáticas, abarcando foram constatadas diferenças em estilo
resultados aparentemente incongruentes; de apego nos grupos com DPP, mas apa-
compreender a ação de fatores dentro de receram efeitos em padrões associados à
uma abordagem sistêmica; desenvolver segurança do vínculo, como os de ansie-
métodos de coleta e de análise que pro- dade, exploração e brincadeira, demons-
piciem estes objetivos; realizar pesquisa trando complexidade e conjugação de fa-
teoricamente relevante num contexto de tores familiares e sociais, e a ligação deste
saúde pública. Convergindo de diferen- desenvolvimento afetivo com aspectos
tes pontos de partida, têm sido elabora- cognitivos de exploração do ambiente. O
das propostas de integração dos vários terceiro trabalho (Prado & Bussab) inves-
aspectos do desenvolvimento, com reco- tigou aspectos específicos do desenvolvi-
nhecimento da inter-determinação entre mento cognitivo, ligados à compreensão
aspectos emocionais, afetivos e cognitivos de intencionalidade, que têm merecido
e entre os níveis psicobiológicos (como atenção especial na literatura. Esta com-
em Rossetti-Ferreira, Amorim & Carvalho, preensão mostrou-se afetada pela DPP
2004; e em Seidl de Moura, 2004). A pro- quanto à adesão geral à tarefa e a aspec-
posição do presente simpósio em torno tos específicos, além de mostrar interação
do tema do contexto sócio-afetivo fami- interessante com o gênero da criança. Por
liar e do desenvolvimento infantil, à luz da fim, a investigação ampla do desenvolvi-

734
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mento de aspectos neuropsicomotores bebê e a formação do vínculo afetivo tem


feita no terceiro trabalho (Morais, Lucci sido realizadas. Apesar disso, apenas re-
& Otta) mostrou resultados indicativos de centemente tem havido uma ampliação
que variações na gravidade, cronicidade de enfoque para incluir características do
e ocasião da DPP, assim como diversos contexto de criação. O presente trabalho
fatores de risco potencializadores, como tem como objetivo investigar o impacto da
adversidade familiar, falta de apoio social harmonia familiar, por meio da análise da
e estresse financeiro, contribuem para ge- sincronia interacional entre os membros
rar diferentes consequências no desenvol- da família, na representação dos pais so-
vimento das crianças. A composição dos bre a relação de apego com os seus filhos.
diferentes resultados em função da DPP Essa pesquisa é parte do doutorado do
aponta, por um lado, fatores de proteção primeiro autor, realizado no Laboratoi-
e de compensação associados, mas tam- re d’Ethologie Humaine, na Université du
bém indica aspectos peculiares que mere- Québéc à Montréal, Canadá, dirigido pelo
cem ser alvo de entendimento e de aplica- Dr. F. F. Strayer. Baseado em uma perspecti-
ção a políticas de intervenção e suporte. va sistêmica do desenvolvimento humano,
o presente trabalho enfatiza a relevância
do contexto sócio afetivo da família para
REPRESENTAÇÃO MATERNA E PATERNA a percepção dos pais da relação do apego
DA RELAÇÃO DE APEGO MÃE-CRIANÇA com os seus filhos. A inclusão desse tra-
E PAI-CRIANÇA: RELAÇÃO COM A balho nesse simpósio com ênfase na com-
HARMONIA FAMILIAR preensão dos efeitos da DPP no desenvol-
Júlia Scarano de Mendonça - IPUSP vimento da criança justifica-se por ilustrar
julia.m@itelefonica.com.br o impacto do contexto familiar nas traje-
Louise Cossette - UQAM tórias de desenvolvimento. Trinta famílias
cossettelouise@hotmail.com franco-canadense da classe média (mãe,
pai e criança). A idade média das crianças
A presente pesquisa enquadra-se no refe- foi de 25 meses (DP=3.3). A qualidade da
rencial teórico da teoria do apego (Bowl- relação do apego foi avaliada por meio da
by, 1969; Ainsworth, 1973) e na abordagem tradução francesa do questionário Q.sort
sistêmica do desenvolvimento humano (Waters & Deane, 1985). A sincronia inte-
(Bronfenbrenner, 1969; Belsky, 1999, racional foi avaliada a partir da observação
2006) e da família (McHale, 1995; Fivaz- da interação da criança com os seus pais
-Depeursinge, 1999), a qual considera a em dois momentos: diádico (mãe-criança
influência do contexto social e cultural no e pai-criança) e triádico (mãe-pai e crian-
qual a criança está inserida para o seu de- ça). Os pais responderam ao Q.sort em
senvolvimento, assim como as influências visitas domiciliares. Para a avaliação da
recíprocas de todos os elementos perten- sincronia interacional, a família participou
centes aos múltiplos contextos sociais do de sessões de observação no laboratório.
indivíduo. A teoria do apego tem sido am- Oito minutos de interação foram codi-
plamente investigada: inúmeras pesquisas ficadas em cada uma das situações por
sobre as relações entre a sensibilidade observadores treinados (Kappa=80%) a
materna refletida nas interações com o partir do procedimento “time-sampling”.

735
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Os observadores deveriam anotar, numa as crianças que apresentam um apego se-


escala de 1 a 4, a maior ou menor sincro- guro com um dos seus pais e inseguro com
nia interacional para cada uma das cate- o outro demonstram maior sincronia inte-
gorias: distância física, orientação visual e racional com a mãe do que com o pai nes-
corporal e nível de envolvimento diádico. sas mesmas variáveis: orientação visual
A média de cada uma das categorias foi (interação apego mãe-criança x apego pai-
considerada para a análise. Os dados do -criança x interação pais, F(1, 25) = 6.45,
Q.sort foram analisados segundo um pro- p=0.019) e envolvimento diádico (intera-
cedimento desenvolvido por Strayer et al. ção apego mãe-criança x apego pai-criança
(1995). Os itens do Q.sort foram agrupa- x interação pais, F(1, 25) = 5.57, p=0.026).
dos nas sete escalas sugeridas por Strayer. Conforme esperado, observou-se relação
Análises de Cronbach alphas foram reali- entre a harmonia familiar e a representa-
zadas para verificar a consistência interna ção dos pais da relação de apego com os
de para cada uma das escalas. Seis escalas seus filhos. Em análise anterior dos dados
foram mantidas com níveis acima de.50, sobre a sincronia interacional, Mendonça
considerados aceitáveis segundo a lite- et al. (2011) demonstraram que quando
ratura. Análises clusters foram realizadas a criança, a mãe e o pai interagem entre
nas escalas das mães e dos pais separada- si, as díades mãe-criança tendem a formar
mente com o objetivo de identificar perfis uma “unidade principal” da interação so-
de apego. Quatro perfis de apego foram cial enquanto os pais mantém-se distantes
obtidos tanto para as mães como para os delas. Uma explicação possível é que a si-
pais: inseguro-asocial, inseguro-depen- tuação triádica reforce os papéis parentais
dente, seguro e seguro-autônomo. Análi- tradicionais: as mães como principais cui-
ses da variância não indicaram nenhuma dadoras enquanto os pais desempenham
associação entre os padrões de sincronia um papel secundário. O que a presente
interacional segundo o perfil de apego pesquisa mostra, especificamente, é que
mãe-criança e pai-criança. Quatro grupos esse padrão interacional é diferente, com
foram criados juntando as classificações o pai integrado a essa “unidade principal”,
dos perfis de apego das mães e dos pais: quando ambos os pais têm a mesma per-
seguro com mãe e pai, seguro com mãe cepção da relação do apego com a criança,
e inseguro com pai, inseguro com mãe e seja ela positiva ou negativa. Nesses casos,
seguro com pai e inseguro com mãe e pai. observa-se maior harmonia na interação
Quando levamos em consideração a quali- social da família. Esses resultados curiosos
dade do apego da criança com a sua mãe reforçam a relevância da relação marido-
e o seu pai conjuntamente, diferenças -mulher para a qualidade da vida familiar
significativas apareceram nas análises. Na (Phares, Duhig & Watkins, 2002) e a impor-
situação triádica, as crianças que têm um tância de pensar a formação dos laços afe-
apego seguro ou inseguro com a sua mãe tivos da criança como uma rede complexa
e com o seu pai diferenciam-se das outras: de influências mútuas entre os membros
elas apresentam um nível de sincronia in- da família, em consonância com as teorias
teracional parecido e positivo com a mãe sistêmicas (Stafford & Bayer, 1993; Gol-
e com o pai nas categorias envolvimento dbeter, 2005; Minuchin, 1985). Segundo
diádico e orientação visual, enquanto que Byng-Hall (1999), sucessor de Bowlby na

736
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

clínica Tavistock, em Londres, é a família e deprimido, labilidade emocional, senti-


não uma única figura de apego que dá a mentos de incompetência para lidar com a
criança um sentimento de segurança sufi- criança, distúrbio do sono, perda de prazer
ciente que lhe permite explorar o mundo e ideação suicida, o que por sua vez pode
e desenvolver-se. Da mesma forma, ou- acarretar prejuízos para o bebê, associa-
tros trabalhos inspirados na abordagem dos a atrasos no desenvolvimento físico e
sistêmica, salientam a importância de se cognitivo (Patel, Souza & Rodrigues, 2003).
considerar a influência de outras variá- Este estudo objetivou avaliar estilos de
veis no desenvolvimento das relações de apego em bebês de mães com e sem in-
apego pais-criança, tais como: qualidade dicativos de DPP, de modo a aprofundar
da relação conjugal, apoio social, práticas a compreensão sobre o desenvolvimento
parentais etc (Belsky, 1999, 2006; Martin, afetivo e a sua influência no desenvolvi-
2001; Mendonça et al., 2008) reforçando mento geral da criança. Este estudo esteve
a idéia da multideterminação na formação associado ao projeto temático “Depressão
dos vínculos afetivos. pós-parto como fator de risco no desen-
volvimento: estudo interdisciplinar dos
Palavras-chave: apego, família, interação mãe- fatores envolvidos na gênese do quadro e
pai-criança em suas conseqüências”, no qual mães e
Contato: Júlia Scarano de Mendonça, IPUSP, bebês atendidos pelo sistema público de
julia.m@itelefonica.com.br saúde foram acompanhados longitudinal-
mente, desde a gestação até o 3º ano da
criança. Metodologia. O estilo de apego
ESTILO DE APEGO E DEPRESSÃO PÓS- da criança foi avaliado através dos proce-
PARTO dimentos da “Situação Estranha”, segundo
Carla Cristine Vicente - UFRRJ protocolo desenvolvido por Ainsworth,
carlavicent@gmail.com Blehar, Waters e Wall (1978) e Main e So-
Vera Silvia Raad Bussab - IPUSP lomon (1990). Uma equipe de 04 pessoas
vsbussab@gmail.com treinadas participou das filmagens, feitas
quando os bebês foram completando 12
O estilo de apego que a criança constrói a meses. Todas as díades foram recebidas
partir das diferentes interações que parti- pela pesquisadora e instruídas para par-
cipa se refere a estratégias ontogenéticas ticipar dos oito episódios (duração de 21
de desenvolvimento social. O apego se minutos), nos quais ocorre uma seqüência
relaciona ao sentimento de segurança e de interações entre o bebê, a mãe e uma
proximidade do bebê em relação a suas pessoa desconhecida do bebê, envolvendo
figuras significativas, o que integrará todo separações e reuniões mãe-bebê. Foram
o seu desenvolvimento global e construi- analisadas 85 díades, que foram divididas
rá um modelo de funcionamento inter- em dois grupos: experimental (com indica-
no para seus relacionamentos futuros tivos de DPP) e controle (sem DPP), Escala
(Bolwby, 1990). A Depressão Pós-Parto de Depressão Pós-Parto de Edimburgh –
(DPP) é um distúrbio com sérias implica- EDPE (Cox, Holden & Sagovsky, 1987). A
ções potenciais para a mãe, por propiciar classificação do padrão de apego foi feita
a emergência de sintomas como humor conforme o protocolo de Ainsworth et al.

737
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(1978), que considera quatro dimensões: 0,01). As análises do protocolo adicional


Procura de proximidade; Manutenção de mostraram peculiaridades significativas
contato; Evitação de proximidade, e Resis- nas crianças do grupo DPP: menos des-
tência ao contato e conforto, avaliadas via locamento exploratório (X²(1)= 4,307,
atribuição de valores de 1 a 7 pontos, de- p=0,038), menos manipulação de brinque-
talhadamente definidos. A classificação foi do (X²(1)=5,434, p=0,02), menos iniciati-
realizada separadamente por duas obser- va na manipulação de brinquedos (X²(2)=
vadoras cegas para o índice de DPP da mãe. 5,939, p=0,005), mais comportamentos
A confiabilidade das observações medida ansiosos nos dois episódios de separação
pelo índice Kappa de Cohen apontou con- (X²(1)=4,400, p=0,036; e (X²(1)=3,398,
cordância de 0,833, valor confiável para p=0,028), e menos retomada de explo-
avaliações. Dadas as reconhecidas ligações ração nos retornos da mãe (X²(1)=3,896,
entre os estilos de apego e a regulação da p=0,040; e X²(1)=3,922 p=0,038). Não hou-
segurança afetiva com autonomia, explo- ve predominância de estilos de apego inse-
ração e brincadeira (como Grossmann et guros no grupo com DPP, conforme espe-
al., 1999), foi desenvolvido um protocolo rada pelos indicadores da literatura sobre
adicional de observação, para avaliar pa- o desenvolvimento de vinculação afetiva.
drões de exploração do ambiente, de brin- Entretanto, foram constatadas ligações
cadeira, e sinais de ansiedade, como mo- significativas da DPP com as dimensões de
vimentos repetitivos, desconcerto emocio- comportamento resistente e de busca de
nal e cessação de atividade e de interação contato, compatíveis com aspectos de in-
com a pessoa estranha, nas episódios de segurança neste grupo. Padrões de explo-
separação e retorno da mãe. Resultados. ração do ambiente, de brincadeira e de an-
Segundo os critérios do instrumento da Si- siedade nas crianças, também apareceram
tuação Estranha, predominou a classifica- prejudicados no grupo DPP. Nos episódios
ção de apego seguro (82%), para o grupo de separação da mãe, as crianças do gru-
como um todo (inseguros evitadores 11% po controle agiram com mais segurança,
e resistentes 7%). O mesmo perfil de distri- como se esperassem pelo retorno breve de
buição de estilos foi verificado no subgru- suas mães. Na comparação com os dados
po com DPP, com predominância de apego observacionais, a classificação de seguran-
seguro em 87% dos casos. Dos bebês (27) ça dos bebês esteve diretamente associa-
de mães que tinham indicativos de DPP, da à desenvoltura, iniciativa, manutenção
apenas 4 foram classificados como insegu- e retornos à exploração ambiental e dos
ros, contrariando as expectativas. Apesar brinquedos, quanto às oportunidades de
de não se refletirem na classificação final interação com a figura materna. De acordo
do estilo de apego, verificaram-se relações com a ênfase atual nos comportamentos
entre DPP e dimensões do protocolo da Si- dos bebês no retorno da mãe (Waters et
tuação Estranha, por análise de regressão al., 2000), como base para a compreensão
múltipla (método stepwise), que indicou da natureza do vínculo, o presente estudo
duas destas dimensões como preditivas da indicou efeitos relevantes: bebês do gru-
DPP materna: mais comportamentos resis- po controle, mesmo após a angústia pela
tente (B= 1,76; t= 2,66; sig=0,01); menos separação, demonstraram apoiar-se mais
busca de contato (B= -3,40; 7= 2,61; sig= na mãe como base segurança para explo-

738
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ração ambiental. Como os bebês de mães A presente pesquisa constitui um re-


com indicativo de DPP, de modo geral, não corte transversal do projeto Depressão
retomaram as atividades após a separação pós-parto como um fator de risco para
da mãe, podemos presumir uma angústia o desenvolvimento do bebê: estudo in-
maior ou falta de habilidade da mãe para terdisciplinar dos fatores envolvidos na
restabelecer a confiança de seus bebês, o gênese do quadro e em suas conseqüên-
que é compreensível na situação em que cias, (Temático FAPESP, N° 06/59192), que
se encontram. O conjunto de resultados acompanha díades mãe-bebê, do sistema
aponta a importância de questões meto- público de saúde, a partir da gestação.
dológicas, ligadas a um cenário de comple- Tem como objetivo avaliar o desempenho
xidade de determinações, bem como à ne- das crianças, aos três anos, em Testes de
cessidade de consideração de ajustamento Compreensão de Intencionalidade e de
dos instrumentos de avaliação do apego. Direção do Olhar, comparando os grupos
Reitera também efeitos da DPP no desen- com e sem indicativos de DPP, avaliada
volvimento dos padrões ligados à vincula- aos quatro meses, pela Escala de Depres-
ção afetiva e a relevância de estudos de são Pós-parto de Edinburgh, (Cox, Holden
acompanhamento para a compreensão do & Sagovsky, 1987; validada por Santos,
quadro e para a promoção de programas Martins & Pasquali, 1999). A aquisição de
de intervenção. compreensão de intencionalidade é um
marco no desenvolvimento infantil (Fein-
Palavras-chave: classificação de apego, field, Lee, Flavell, Greene & Flavell, 1999)
depressão pós-parto, desenvolvimento e está ligada ao desenvolvimento da ca-
cognitivo e afetivo pacidade cognitiva de “Teoria da Mente”,
Contato: Carla Cristine Vicente, UFRRJ, ou seja, capacidade de reconhecer e in-
carlavicent@gmail.com ferir sobre a perspectiva mental do ou-
tro, e de representar os estados mentais
próprios e da outra pessoa, em termos de
EFEITOS DO CONTEXTO SÓCIO-AFETIVO pensamentos, crenças e intenções (Cahill,
DE CRIAÇÃO E DA DEPRESSÃO PÓS- Deater-Deckard & Pike, 2007): levar em
PARTO NO DESENVOLVIMENTO DA consideração os próprios estados mentais
COMPREENSÃO DE INTENCIONALIDADE e os dos outros, de modo a compreender
E DIREÇÃO DO OLHAR DE CRIANÇAS DE e prever comportamentos são condições
TRÊS ANOS básicas na interação social (Jou & Sperb,
Alessandra Bonassoli Prado - IPUSP 1999). Acumulam-se evidências de que a
sanaprado@hotmail.com adaptação social e a teoria da mente de
Indira Yasmini França - IPUSP crianças dependem do contexto sócio-
indirayfranca@gmail.com -emocional de criação (Cahill et al., 2007),
Daniela Bulow - IPUSP o que confere especial importância para
dmbulow@gmail.com a investigação desta ontogênese no con-
Vera Sílvia Raad Bussab - IPUSP texto da DPP. O objetivo do presente tra-
vsbussab@gmail.com balho é verificar a influência de variáveis
Briseida Dôgo Resende - IPUSP do contexto sócio-afetivo, em especial da
briseida@uol.com.br DPP, no desempenho de crianças em tes-

739
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tes de compreensão de direção do olhar aplicado completamente em 51 crianças,


e de intencionalidade. Método. Partici- interrompido em 13 casos devida a não
pantes: Foram analisadas 71 díades mãe- colaboração/interação durante o teste e
-criança que chegaram ao terceiro ano. As aplicado parcialmente em 7, pois a crian-
mães têm em média 24 anos (± 6, 049) ça não compreendeu o teste, errando a
e escolaridade predominante de ensino maioria dos questionamentos. A falta de
médio (incompleto ou completo=68,6%). adesão inicial relacionou-se à DPP: nas
28% das mães (N=25) apresentaram indi- crianças em que a aplicação do teste teve
cativos de DPP quatro meses após o par- que ser interrompida, por falta de coo-
to. Os testes foram aplicados aos 3 anos peração e interação com a pesquisadora,
(X²=3,15±0,13), em 45 meninas e 26 me- o escore de DPP foi em média significa-
ninos. Procedimento: Teste 1- Compreen- tivamente mais alto do que nos demais
são de intencionalidade: Foi desenvolvido grupos (F2,68=3,006, p<0,05). No teste de
com base no estudo de Feinfield, Lee, Fla- Compreensão de Direção do Olhar não
vell, Green e Flavell (1999) para verificar foi verificado tal efeito. Constatou-se,
quando as crianças começam a compre- porém, adesão ainda menor das crianças
ender a intenção das pessoas como esta- de modo geral: apenas 30 completaram o
do mental representacional e comporta- teste e em 28 casos este foi interrompido.
mento direcionado a metas. Para tal, são Não foi identificada diferença significativa
usadas figuras, em cenários e estórias, entre os grupos com e sem DPP quanto
que mostram um personagem no pro- à porcentagem de acerto, embora esta
cesso de busca de um objeto (A) em um fosse mais alta para o grupo sem DPP no
local previsto e, em seguida, a descoberta teste compreensão de intencionalidade
inesperada de um objeto diferente, mais (Sem=37,0% e Com=35%) e no teste de
desejável (B) em seu lugar. O protocolo Direção do Olhar (Sem=41% e Com=31%).
avalia todas as etapas de aplicação do Avaliando aspectos particulares de cada
teste quando à compreensão, memória, teste, foi identificada tendência de as
intenção da ação e pensamento subjacen- crianças do grupo Sem DPP apresentarem
te à ação. O escore pode variar de 0 a 8. significativamente mais acerto na tarefa
Teste 2-Compreensão de direção do olhar: “apontando para” (t=1,737, p=0,08). Veri-
Baseado no estudo de Doherty e Ander- ficou-se diferença significativa entre me-
son (2000), para avaliar a habilidade para ninas e meninos no teste direção do olhar
compreender e fazer julgamentos sobre (t=-2,208, p=0,031), e uma tendência no
“direção do olhar” ou “olhar fixamente” teste de compreensão de intencionalida-
(gaze) e o “apontar”, por meio de três de (t=-1,775, p=0,08), com desempenho
tarefas em que a criança deveria identi- superior das meninas. Houve correlação
ficar: qual das figuras está “olhando para significativa no desempenho entre os dois
ela (você)?”; o personagem (José) está testes (r=0,469; p=0,000), ou seja, a crian-
“olhando para onde?”, e está “apontando ça que teve um bom desempenho em um
para onde?”, associadas a perguntas so- dos testes manteve-o no outro. A depres-
bre o que o personagem quer. O escore são pós-parto afetou mais a adesão geral
pode variar de 0 a 14. Resultados. O teste ao teste de intencionalidade, do que o de-
de Compreensão de Intencionalidade foi sempenho final das crianças. Entretanto,

740
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

constatou-se melhor desempenho em as- TIMING DA DEPRESSÃO


pectos específicos das tarefas nos grupos MATERNA E DESENVOLVIMENTO
sem DPP, além de uma tendência geral NEUROPSICOMOTOR DO BEBÊ AOS 12
de superioridade. Apesar de a correlação MESES DE VIDA.
dos resultados dos dois testes apontarem Maria de Lima Salum e Morais - IS/SESSP
para uma capacidade subjacente comum, salum@isaude.sp.gov.br
alguns aspectos dos resultados também Tânia Kiehl Lucci - IPUSP
mostram peculiaridades dos testes quan- tanialucci@usp.br
to à adesão e ou à dificuldade relativa, Emma Otta - IPUSP
que merecem ser mais bem discutidas e emmaotta@usp.br
avaliadas. O desempenho diferenciado Vinicius Frayze David - IPUSP
das meninas em ambos os testes condiz viniciusfdavid@gmail.com
com dados da literatura quanto ao ritmo Luiz Santos Silva - IPUSP
de desenvolvimento da “teoria da mente” luizsilvadossantos@usp.br
em função do sexo (Baron-Cohen, 2004).
Ainda assim, possíveis interações entre Investigações da influência da depressão
o sexo da criança e o efeito da DPP de- pós-parto (DPP) sobre o desenvolvimento
verão ser mais bem investigadas com o e o comportamento de bebês apresentam
aumento da amostra, pois há indicadores dados contraditórios, sugestivos da com-
de os meninos poderem ser mais afeta- plexidade dos fatores envolvidos. Alguns
dos (Tronick & Weinberg, 1997). Mere- autores encontraram efeitos negativos,
ce ainda destaque e aprofundamento a principalmente sobre as interações face-
compreensão do duplo efeito da DPP so- -a-face. Schwengber e Piccinini (2003) e
bre a disposição geral para a interação e/ Frizzo e Piccinini (2005), por exemplo, re-
ou sobre o desenvolvimento cognitivo da lataram que mães deprimidas apresenta-
criança refletido na dificuldade da tarefa. vam menos interações com seus bebês,
O conjunto de resultados é compatível mais expressões negativas e menor espon-
com a hipótese de efeito das condições taneidade. Por sua vez, os bebês de mães
sócio-afetivas de criação, via presença da deprimidas mostravam menos afeto posi-
DPP, no desenvolvimento de capacidades tivo e expressões de interesse, bem como
cognitivas básicas das crianças e indica a menor nível de atividade e vocalização.
importância de estudos longitudinais na Entretanto, os resultados de algumas pes-
população em geral e nas amostras de quisas demonstram que diversos fatores
risco em particular, para a promoção de podem compensar os efeitos da depres-
condições de prevenção e de intervenção. são no comportamento parental. Boyd et
al. (2006), estudando um grupo de mães
Palavras-chave: desenvolvimento cognitivo, afro-americanas e hispânicas, não encon-
compreensão de intencionalidade, depressão traram diferenças significativas entre indi-
pós-parto cadores de interação materna em função
Contato: Alessandra Bonassoli Prado, IPUSP, da depressão. Fonseca et al. (2010), em
sanaprado@hotmail.com pesquisa com as mesmas participantes do
presente trabalho, não constataram efeito
significativo da depressão puerperal sobre

741
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a interação das díades mães-bebês. Den- neuropsicomotor (DNPM) do bebê aos 12


tre os fatores que podem ser responsáveis meses de vida. Para tanto, as mães foram
por diferentes achados sobre a influência avaliadas quanto à depressão no 3o. e no
da depressão sobre o desenvolvimento 8º. mês do bebê. A associação de sua con-
dos filhos, encontram-se, por parte da dição (deprimida aos três ou oito meses)
mãe: o apoio que recebe de seu compa- a itens do desenvolvimento do bebê foi
nheiro, familiares e amigos, sua capacida- testada através de qui-quadrado. Setenta
de de tamponar os sintomas da depressão e oito díades mães-bebês de 12 meses de
na relação com o bebê, o período, a du- idade, moradoras de bairros periféricos da
ração e o nível de gravidade da depressão Zona Oeste da cidade de São Paulo, sendo
(CPS, 2004), e, por parte do bebê, fatores 25% avaliadas como portadoras de DPP no
como temperamento, resiliência, tempo 3º. mês pós-parto. No 8º. mês foram ava-
que passa com a mãe, entre outros. Para liadas 70 das 78 mães, sendo 23% consi-
avaliar o desenvolvimento das crianças deradas deprimidas. Foi utilizada a Escala
neste estudo, partimos de critérios esta- de Depressão Pós-Parto de Edimburgo
belecidos por Knobloch e Passamanick (EDPE) (Santos, Martins & Pasquali, 1999):
(1990), pelo teste Denver II (Frankenburg, mães com escores de 12 pontos ou mais
1990) e pela escala M-Chat (Robins, Fein, foram consideradas deprimidas. Para a
Barton & Green, 2001). Tanto Knobloch avaliação do desenvolvimento dos bebês
e Passamanick (1990) – que propuseram adaptamos um instrumento de rápida e
uma forma de avaliação do desenvolvi- simples aplicação baseado em marcos se-
mento de quatro semanas a 36 meses de lecionados dentre os indicadores apresen-
vida seguindo Gesell – quanto o teste Den- tados por Knobloch e Passamanick (1990),
ver II, aplicável dos 15 dias aos seis anos de Frankenburg (1990) e Robins et al. (2001).
idade, exploram mais os aspectos motor, Resultados. Relação entre DNPM aos 12
pessoal-social e de linguagem. A escala M- meses e DPP medida no 3º. mês pós-par-
-Chat, formulada por Robins et al. (2001) to. Encontraram-se diferenças estatistica-
para o diagnóstico de autismo, propõe mente significativas entre filhos de mães
itens especialmente voltados para avaliar com e sem DPP, no 3º. mês após o parto,
o desenvolvimento da capacidade de in- nos quesitos: juntar sílabas (А2 = 3,800; p =
teração social da criança. A subdivisão do 0,05) e bater dois cubos seguros nas mãos
desenvolvimento em domínios, a qual foi (А2 = 5,336; p <0,05) e diferenças margi-
empregada no presente estudo com base nalmente significativas em imitar sons de
nas escalas citadas, ajuda-nos a compre- palavras (А2 = 2,980; p <0,10) e começar a
ender melhor em que áreas e de que ma- andar apoiado pelo adulto (А2 = 2,919; p
neira o comportamento da criança pode <0,10). Surpreendentemente, nos três pri-
ser afetado pela depressão da mãe. Bus- meiros quesitos, o desempenho de filhos
cando contribuir para a compreensão da de mães com DPP foi superior. Apenas em
influência da duração e momento da de- começar a andar apoiado pelo adulto, fi-
pressão materna sobre o comportamento lhos de mães não deprimidas tenderam a
do bebê, objetivamos, no presente estu- sair-se melhor do que bebês de mães com
do, comparar o efeito do momento da de- DPP. Relação entre DNPM aos 12 meses e
pressão materna sobre o desenvolvimento DPP medida no 8º. mês do bebê. A rela-

742
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ção entre quesitos de desenvolvimento e respeito do impacto da depressão mater-


a DPP medida no 8º. mês mostrou resulta- na no desenvolvimento infantil.
dos bastante diferentes. Houve diferenças
significativas favorecendo filhos de mães Palavras-chave: depressão materna, timing da
não deprimidas nos seguintes itens: supor- depressão, desenvolvimento infantil
ta bem breves ausências da mãe e reage Contato: Maria de Lima Salum e Morais,
a prolongadas (А2 = 5,479; p <0,05); olha Instituto de Saúde da Secretaria de Estado da
com curiosidade o que interessa à mãe (А2 Saúde de São Paulo, salum@isaude.sp.gov.br
= 4,900; p <0,05); faz gestos comunicati-
vos (А2 = 6,542; p <0,05); começa a andar
apoiado pelo adulto (А2 = 7,312; p <0,01); CO 25 - LT04
sobe degraus engatinhando (А2 = 8,453; p
<0,01). Apenas em um quesito detectou- Cuidado e relação mãe-bebê
-se tendência a superioridade de filhos de
mães deprimidas: imitar sons de palavras
(А2 = 2,676; p<0,10). O pior desempenho LT04-736 - RELAÇÃO ENTRE DEPRESSÃO
de filhos de mães deprimidas, conforme PÓS-PARTO, CRENÇAS E PRÁTICAS
depressão medida no 8º. mês em com- MATERNAS EM UMA AMOSTRA
paração com o 3º. mês, em diversos itens PAULISTANA DE RISCO
do desenvolvimento avaliados aos doze Renata Pereira Defelipe - USP
meses, leva-nos a concluir que é possível redefelipe@gmail.com, CAPES
que quanto maior a duração e/ou mais re- Vera Silvia Raad Bussab - USP
cente é o período da depressão, maiores vsbussab@gmail.com, CNPq; FAPESP
são os impactos negativos sobre o desen-
volvimento do bebê. Tais dados estão de O presente trabalho insere-se na pesquisa
acordo com os estudos de Brennan et al. longitudinal “Depressão pós-parto (DPP)
(2000), McLearn et al. (2006), Deave et al. como um fator de risco para o desenvol-
(2008), entre outros. Os primeiros autores vimento do bebê: estudo interdisciplinar
encontraram que relatos recentes de sin- dos fatores envolvidos na gênese do qua-
tomas depressivos da mãe estavam asso- dro e em suas conseqüências” (FAPESP
ciados a taxas mais altas de problemas de No. 06/59192), que acompanha díades
comportamento das crianças; os segundos mãe-bebê da gestação ao terceiro ano da
verificaram que os sintomas de depressão criança. Pesquisa anterior (Defelipe, 2009)
materna recentes tinham relações mais mostrou efeitos de interação entre fato-
fortes com atitudes parentais inadequadas res sócio-culturais e DPP, apontando para
do que sintomas depressivos anteriores. a necessidade de se considerar variáveis
Os terceiros constataram que é a depres- do contexto sócio-cultural materno (am-
são persistente que está associada a atra- biente sócio-físico e sistemas de criação)
sos de desenvolvimento. Os resultados para a promoção de diferentes trajetórias
deste trabalho mostram que o momento ontogenéticas infantis. O presente estudo
em que a mãe está deprimida - variável re- visou avaliar relações da DPP com variá-
legada em alguns estudos – é um aspecto veis bio-culturais (crenças, metas e práti-
importante a se considerar em pesquisas a cas de criação) e ecológicas (nível sócio-

743
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-econômico e escolaridade) maternas. como co-agente, capaz de obedecer a


Estudos interculturais de Keller e colabo- normas e priorizar a harmonia social. A
radores (2006) identificaram seis sistemas interdependência é passada de pais a fi-
de cuidados parentais universais: cuidado lhos e é crucial para sobrevivência. É iden-
primário; contato corporal; estimulação tificado em famílias estendidas, típicas de
corporal; estimulação via objeto; face-a- zonas rurais ou tribais que sobrevivem da
-face; e envelope narrativo. Apesar de uni- agricultura ou da caça-coleta. O modelo
versais, estes sistemas variam dependen- autônomo-relacional tem características
do do contexto eco-sócio-cultural em que dos modelos anteriores, concebendo o in-
estão inseridos. Além destes sistemas de divíduo como independente e co-agente.
cuidados parentais, os sistemas de cren- É constatado em famílias de classe média
ças e de práticas parentais são também de zonas urbanas com uma herança cul-
responsáveis por promover, juntamente tural inter-relacional (Keller & cols., 2006).
com o contexto, diferentes experiências Em suma, enquanto as crenças influen-
de socialização ao indivíduo. Apesar da ciam as práticas parentais e vice-versa,
variação intercultural, membros de uma ambas auxiliam a esculpir diferentes tra-
mesma sociedade podem ser vistos como jetórias de desenvolvimento infantil. Além
co-autores de uma realidade parental delas, outros fatores, como a DPP, podem
compartilhada (Harwood, Schoelmerich & influenciar nas práticas parentais, e, con-
Schulze, 2000). Foram identificadas duas duzir a trajetórias ontogenéticas particu-
orientações ou modelos sócio-culturais lares. Caracterizar as crenças e práticas
básicos associados a diferentes metas parentais da amostra e contribuir para o
de desenvolvimento infantil e diferentes entendimento das relações entre crenças,
práticas de cuidados: 1. Autonomia ou práticas parentais e DPP. Participaram 83
independência; e 2. Relação ou interde- mães do Distrito Butantã (São Paulo) com
pendência (Keller & cols. 2003). Mais re- média de 25 anos (m = 24,8 ± 6,02) atendi-
centemente, foi identificada uma terceira das pelo sistema público de saúde. Foram
expressão destas orientações, entendida aplicados: 1) Questionário sociodemográ-
como uma conjugação das anteriores e fico aos 36 meses pós-parto; 2) Escala de
chamada de modelo autônomo-relacional Depressão Pós-parto de Edinburgh (San-
(Kagitçibasi, 2005; Keller & cols. 2006). tos, Martins & Pasquali, 1999) aos 3, 8 e
Cada um destes modelos está associado 36 meses; 3) Escalas de Metas de Sociali-
a diferentes estilos parentais que, por sua zação e de Crenças sobre Práticas Paren-
vez, costumam refletir o modus operandi tais (Keller et al., 2006) e a Escala de Ati-
de diferentes sociedades. No modelo au- vidades Parentais Realizadas (Martins et
tônomo, o indivíduo é percebido como al., 2010) aos 36 meses. As participantes
um elo separado e independente. A edu- atingiram médias significativamente mais
cação é voltada para a singularidade e elevadas para metas relacionais (m = 18,5)
para o autoaprimoramento. Este modelo do que para autônomas (m = 16,7) (t82 =
é composto por famílias nucleares ur- -4,619, p<0,001) e médias significativa-
banas de classe média, encontradas em mente mais elevadas para práticas autô-
sociedades industrializadas ocidentais. O nomas (m = 17,7) do que para relacionais
modelo relacional concebe o indivíduo (m = 16,4) (t test: t81 = 2,086, p=0,040).

744
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Constataram-se índices elevados para prá- mais por terem menor escolaridade, fato
ticas de estimulação (m = 40,3) e baixos que poderia indicar maiores dificuldades
para as de cuidados primários (m = 16,8). sócio-econômicas. Para enfrentar tais difi-
Uma ANOVA mostrou diferenças significa- culdades, estas mães mesclariam elemen-
tivas dos diferentes grupos de DPP (sem- tos relacionais idealizados e autônomos
pre deprimida; pelo menos uma vez depri- realizados a fim de se “ajustar” ao cenário
mida; nunca deprimida) sobre a escolari- de risco em que vivem. Os resultados além
dade materna (F(2,77) = 7,693, p<0,001) e de sugerir relação entre a DPP e o modelo
sobre os escores de estimulação (F(2, 80) cultural autônomo-relacional, justificam
= 6,983, p=0,002). Mães sempre deprimi- a importância da análise sistêmica de fa-
das: 1) estudavam, em média, menos (m = tores bio-culturais (crenças e práticas),
5,83) que as demais (mpelo menos uma vez = 9,42; ecológicos (escolaridade e renda) e psico-
mnunca deprimidas = 9,97); e 2) estimulavam, em lógicos (DPP) para uma compreensão mais
média, menos seus filhos (m = 35) que global das diferentes trajetórias de desen-
as demais (mpelo menos uma vez = 40,5; mnunca volvimento infantil.
deprimidas =
41,36). Uma ANOVA subseqüente
encontrou diferenças significativas entre Palavras-chave: depressão pós-parto; metas e
os grupos de DPP e itens de práticas ide- práticas; ambiente de risco.
alizadas e realizadas: sempre deprimidas
tiveram média maior do que as demais
em “Não é necessário atender imediata- LT04-782 - A INFLUÊNCIA DO TIPO DE
mente o bebê que chora” (prática ideali- ALIMENTAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO
zada autônoma) (F(2) = 3,298, p=0,042) e DE BEBÊS DE TRÊS MESES DE IDADE
“Dormir junto na cama” (prática realizada Jussara do Amaral Leopaci - UNESP/Bauru
relacional) (F(2) = 4,688, p=0,012); e tive- jussara_leopaci@yahoo.com.br
ram médias menores para “Conversar” Renata Ajub Tirelli - UNESP/Bauru
(F(2) = 5,081, p=0,008) e “Explicar coisas” renata_ajub@hotmail.com
(ambas práticas realizadas autônomas) Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues –
(F(2) = 3,762, p=0,027). Mães valorizaram UNESP/Bauru
mais metas relacionais, idealizaram e re- olgarolim@uol.com.br
alizaram mais práticas autônomas. Esta
conjugação pode caracterizar um cená- O desenvolvimento no primeiro ano de
rio autônomo-relacional para a presente vida é um complexo processo afetado por
amostra. Porém, a discrepância observada múltiplos fatores, como os socioeconômi-
entre crenças e práticas pode sugerir certo cos, condições de saúde ao nascer e tipo
conflito. Conflito este que pode se agravar de alimentação oferecida. A recomen-
em ambientes de risco, caracterizados por dação da OMS é de que os bebês até os
alta prevalência de DPP (sempre deprimi- seis meses de idade sejam alimentados
das = 9,2%; pelo menos uma vez deprimi- somente com leite materno, a não ser em
da no puerpério = 44,8%), baixa escolari- casos de orientação médica. O leite ma-
dade, conflitos familiares e conjugais, falta terno contém todas as proteínas, açúcar,
de apoio social (Silva, 2008). Mães com gordura, vitaminas e água que o bebê ne-
DPP mais crônica destacaram-se das de- cessita. Além disso, contém determinados

745
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

elementos que o leite em pó não incorpo- do desenvolvimento de bebês de risco:


ra, tais como anticorpos e glóbulos bran- avaliação e orientação aos pais”, realizado
cos. É por isso que o leite materno protege no campus da UNESP de Bauru. As condi-
o bebê de doenças e infecções (World He- ções de aleitamento foram classificadas
alth Organization, 2000; 2001). Venâncio como natural (exclusivamente no seio),
e Monteiro (1998) observaram, na década misto (leite do seio juntamente com arti-
passada, um aumento na freqüência e du- ficial) ou artificial (exclusivamente leite in-
ração da amamentação no Brasil (de 2,5 dustrializado). Os dados foram coletados
para 5,5 meses) em todos os estratos da dos protocolos do projeto de extensão,
população. Porém, estudos atuais apon- tendo suas mães no papel de informantes.
tam para a diminuição do índice ao longo Os dados sobre desenvolvimento foram
dos meses, sendo que apenas 3% mantém coletados a partir do Inventário Portage
essa prática até os seis meses de idade e Operacionalizado, utilizado na avaliação
70% introduzem o leite industrializado an- mensal dos bebês. Utilizou-se o teste t de
tes do sexto mês (Bernardi; Jordao; Barros Student para análise dos dados estatís-
Filho, 2009; Almeida; Novak, 2004). Barros ticos. Os resultados apontaram para me-
e cols. (2008) afirmam que a alimentação lhor desempenho dos bebês aleitados ex-
oferecida ao bebê exerce papel funda- clusivamente no seio na maioria das áreas
mental no que diz respeito tanto ao seu observadas. Os resultados indicaram que
desenvolvimento físico, quanto cogniti- o desenvolvimento de bebês submetidos
vo e emocional. A interação mãe-bebê é ao aleitamento natural aos três meses de
importante não só na promoção da saúde idade, quando comparados com o desen-
física, mas também na criação das condi- volvimento de bebês com alimentação
ções necessárias para que a criança, ao mista, foi significativamente superior em
sentir-se amada, desenvolva, ao máximo, quatro das cinco áreas avaliadas (Desen-
o seu potencial psicomotor e social (Al- volvimento Motor t=1, 61, p=0,05; Cog-
faya; Schermann, 2005). Todavia, a iden- nição t=3, 19, p=0,001; Socialização t=1,
tificação precisa do desenvolvimento in- 73, p=0,043; Linguagem t=1, 86, p=0,03).
fantil depende de instrumentos confiáveis Comparando o desenvolvimento de bebês
que fornecerão resultados para subsidiar com aleitamento natural e de alimentação
procedimentos pontuais de intervenção. artificial observou-se que os primeiros fo-
Vieira, Ribeiro e Formiga, (2009) em uma ram significativamente melhores em três
revisão de literatura sobre instrumentos das áreas avaliadas (Desenvolvimento
de avaliação do desenvolvimento de crian- Motor t=3, 34, p=0,0006; Cognição t=2,
ças de zero a dois anos de idade, identifi- 05, p=0,021; Socialização t=2, 32, p=0,01).
caram 15 instrumentos e, entre eles, cita Comparando os bebês com alimentação
o Inventário Portage Operacionalizado. mista e artificial observou-se que os pri-
Avaliar o desenvolvimento de bebês de meiros superaram os segundos somen-
três meses de idade considerando o tipo te em Desenvolvimento Motor (t=1, 69,
de alimentação oferecida. Participaram da p=0,04), sendo que em Linguagem, Socia-
pesquisa 150 (cento e cinquenta) díades lização e Cognição não houve diferenças
mães-bebês de três meses, do projeto de significativas. Todavia, os bebês alimenta-
extensão universitária “Acompanhamento dos artificialmente superaram, na área de

746
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Autocuidado os bebês com aleitamento Palavras-chave: desenvolvimento infantil;


natural (t=4, 21, p<0,0001) e mista (t=-2, tipos de aleitamento; Inventário Portage
35, p=0,01). Para a amostra estudada os Operacionalizado.
resultados obtidos indicam que o alei-
tamento natural favoreceu o desenvol-
vimento de bebês em sete das dez com- LT04-783 - A IDADE DA MÃE E O
parações realizadas, principalmente nas DESENVOLVIMENTO DE BEBÊS NO SEXTO
áreas de Desenvolvimento Motor, Cogni- MÊS DE VIDA
ção e Socialização, presentes nas análises Renata Ajub Tirelli - UNESP/Bauru
conduzidas com os dois grupos (mista e renata_ajub@hotmail.com - Apoio Fapesp
artificial). Os dados obtidos em Autocui- Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues -
dado, área que avalia a independência UNESP/Bauru
do bebê, pode se dever ao fato de que a olgarolim@fc.unesp.br
alimentação artificial aumenta a probabi-
lidade de exposição a variados cuidado- Pesquisas têm investigado a relação entre
res e contextos, o que colaboraria para o a idade da mãe e seu impacto durante a
resultado encontrado. Pesquisa realizada gravidez e no desenvolvimento da crian-
por Mansur e Neto (2006) confirma os re- ça, com ênfase nos filhos de mães adoles-
sultados encontrados. Os autores analisa- centes (Konje & cols. 2002; Vieira & cols.
ram o desenvolvimento neuropsicomotor 2007). De acordo com o Estatuto da Crian-
de lactentes com desnutrição leve através ça e do Adolescente, é considerado ado-
da Escala de Desenvolvimento Psicomo- lescente o indivíduo entre 12 e 18 anos de
tor da Primeira Infância. Seus resultados idade. A gravidez na adolescência ocorre,
apontaram para as médias de desenvolvi- principalmente, devido a: falta de acesso
mento da coordenação óculo-motriz e de a métodos contraceptivos e/ou ignorância
sociabilidade significativamente abaixo da e ineficiente utilização dos mesmos; pouca
média cronológica esperada para a amos- compreensão sobre sexualidade e sobre o
tra. Outros estudos também confirmam a próprio corpo; alternativa para sair de casa
influência positiva do aleitamento mater- ou da escola; tentativa de manter um re-
no no desenvolvimento de lactentes, nos lacionamento; sanar a carência afetiva e o
quais os resultados apontam que crianças desejo de ser mãe (Araújo, 1996; Gaude-
aleitadas naturalmente tinham escores rer, 1996). Outros estudos salientam que
de desenvolvimento cognitivo significati- a pouca escolaridade, desenvolvimento
vamente maiores do que os das crianças puberal mais precoce, pobreza e difícil
alimentadas artificialmente (Anderson & acesso aos serviços de saúde, também
cols, 1996; Rao, 2002). Os dados apontam têm contribuído para que a gravidez e os
para a importância da alimentação natu- partos de adolescentes aumentassem nos
ral no desenvolvimento de bebês aos três últimos 20 anos (Colucci, 2003; Konje &
meses de idade. Todavia, é importante cols. 2002; Corrêa, 2003; Costa, 2001). To-
estudos com populações maiores e outras davia, a gravidez na adolescência pode ser
faixas etárias para analisar os efeitos do vivida de múltiplas formas e os contextos
aleitamento materno, comprovando seus sociais definem inúmeras possibilidades
benefícios em idades posteriores. e significações diferentes entre os jovens

747
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de distintas classes sociais (Aquino & cols. crianças até seis anos de idade, previstos
2003). Não há, também, consenso na lite- para faixas etárias anuais. É composto por
ratura sobre os mecanismos pelo qual a 580 comportamentos divididos nas cinco
idade da mãe opera durante a gestação e, áreas de desenvolvimento (Linguagem,
ainda, que determinam os cuidados poste- Autocuidados, Cognição, Socialização e
riores com o bebê. Pesquisadores defen- Desenvolvimento – Motor) além do proto-
dem que mães jovens não estariam fisiolo- colo de Estimulação Infantil, composto por
gicamente prontas para uma gravidez em 45 comportamentos previstos para ava-
termos de peso, altura e desenvolvimento liação do comportamento de bebês até 4
do aparelho reprodutivo, enquanto outros meses de idade. Para o presente estudo os
focam mais sobre as condições socioeco- itens do protocolo de Estimulação Infantil
nômicas destas mães como fator de risco foram distribuídos nas áreas previstas no
que superaria o efeito da idade (Siqueira; IPO, resultando em 154 itens para avalia-
Tanaka, 1986; Vieira & cols, 2007; Gallo; ção de bebês no primeiro ano de vida. O
Leone; Amigo, 2009). Outros estudos pro- desenvolvimento das crianças de cada um
curam analisar as competências desta mãe dos grupos foi avaliado em cada uma das
nos cuidados e estimulação do desenvol- áreas de desenvolvimento e comparados
vimento do bebê (Bigras; Paquete; 2007). utilizando-se o teste estatístico t de Stu-
Apesar de a adolescente ser considerada dent. Não foram encontradas diferenças
freqüentemente incapaz de cuidar de significativas nas áreas de Linguagem (t=
uma criança, há controvérsias quanto ao 1,07; p =0,14), Socialização (t = 0,61; p =
resultado final do seu desempenho e as 0,27) e Desenvolvimento Motor (t = 0,60;
conseqüências para o seu filho (Carruth; p = 0,27). Já nas áreas de Autocuidados, os
neviling; Skinner, 1997). Estas indagações bebês do Grupo 1 apresentaram melhor
motivaram a elaboração do presente tra- desempenho (t = 2,22; p = 0,01) e na área
balho. Comparar o desenvolvimento de 31 de Cognição, foram os bebês do Grupo 2
bebês, filhos de mães até 18 anos de ida- (t = 1,81; p = 0,03) que apresentaram de-
de (Grupo 1) com o desenvolvimento de sempenho superior. Uma hipótese para o
46 bebês filhos de mães com idade entre melhor desempenho do Grupo 1 na área
19 a 24 anos (Grupo 2), no sexto mês de de Autocuidados pode estar relacionada
vida. As mães dos bebês nascidos de janei- ao fato de que estes bebês podem ter sido
ro de 2010, que não possuíam nenhuma expostos a diferentes situações de alimen-
condição de risco, identificados em uma tação e cuidados por cuidadores variados
maternidade e no Banco de Leite Huma- o que resultou na necessidade de adapta-
no, de uma cidade do interior paulista, ção a outras situações de independência
em parceria com o projeto de extensão da mãe. Coslovsky e Geller (1996) suge-
“Acompanhamento do desenvolvimento rem que a gravidez na adolescência tem
de bebês no primeiro ano de vida”, foram um grande impacto na vida da família de
convidadas a participar da pesquisa. O de- origem da jovem mãe podendo resultar
senvolvimento dos bebês foi acompanha- em múltiplos cuidadores do bebê. Silva
do utilizando o Inventário Portage Opera- e Salomão (2003) também alertam para
cionalizado (IPO) (Williams; Aiello, 2001) o o fato de que o exercício da maternida-
qual objetiva avaliar o desenvolvimento de de irá requerer reajustes e até mudanças

748
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de papéis desempenhados no meio sócio LT04-917 - QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL


– familiar da jovem mãe que, precisando NO ATENDIMENTO ESCOLAR DA
continuar seus estudos ou ir para o mer- CRIANÇA DE 0 A 3 ANOS: REFLEXÕES
cado de trabalho, deixam seus bebês aos SOBRE O PAPEL DOS EDUCADORES
cuidados de outros familiares/cuidado- INFANTIS NO DESENVOLVIMENTO
res. Quanto ao melhor desempenho na DOS BEBÊS
área de Cognição pelo Grupo 2, fatores Bárbara Couto Preisser Marçal - PUC/Minas
como organização do ambiente, expec- barbaracpmarcal@gmail.com
tativas e práticas parentais, experiências
com materiais para estimulação cognitiva Segundo o Ministério da Educação, atual-
e variação da estimulação diária estariam mente, apenas 18% das crianças brasilei-
mais presentes em mães mais velhas que ras de zero a três anos são atendidas em
proporcionariam um desenvolvimento in- creches (IBGE/PNAD, 2009). A demanda
fantil adequado (Bradley; Corwyn, 2002). por vagas na Educação Infantil é crescente
Andrade e cols (2005), em um estudo ana- e, cada vez mais, tem sido evidenciada a
lisando estimulação ambiental e cognição, necessidade de se desenvolverem políti-
apontaram que mães orientadas a esti- cas públicas para atender a essas crianças
mularem seus bebês por meio de uma va- e suas famílias. Porém, além da ampliação
riedade de experiências perceptivas com da oferta de vagas, deve-se visar à quali-
pessoas, objetos e símbolos, contribuem ficação, viabilizando a garantia das especi-
significativamente para o desenvolvimen- ficidades necessárias para o atendimento
to cognitivo das crianças, observando-se, à criança pequena. Nesse contexto, o Nú-
ainda, conseqüências positivas em longo cleo Educativo da Pró-reitoria de Extensão
prazo. Entretanto, são necessários estu- da PUC Minas desenvolveu, ao longo dos
dos que investiguem o impacto do grau últimos anos, ações extensionistas cola-
de instrução das mães mais velhas, o que borativas com creches e pré-escolas do
pode, também, providenciar ambientes sistema de ensino de Belo Horizonte, con-
mais estimuladores para seus filhos, assim tribuindo para a qualificação no atendi-
como o papel do tipo de família da mãe mento à criança até os 6 anos de idade. As
adolescente para referendar os resultados experiências e reflexões relatadas no pre-
obtidos. Concluindo, o presente estudo, sente trabalho foram vivenciadas ao longo
parece apontar para a influência da idade do ano de 2010, em um estabelecimento
materna em alguns aspectos do desenvol- educacional comunitário localizado em um
vimento infantil em especial autocuidado aglomerado da regional Centro-Sul de Belo
e cognição, reconhecendo, todavia a im- Horizonte, através da ação de Qualificação
portância de ampliação de estudos des- Profissional no Atendimento à Criança de
te tipo para a análise de outras variáveis Zero a Três Anos, integrante do Programa
associadas como escolaridade materna e Interdisciplinar de Política e Atendimen-
tipo de família. to Educacional. A ação em questão teve
como foco a melhoria da qualidade dos
Palavras-chave: Idade Materna; afetos entre crianças e adultos no contex-
Desenvolvimento Infantil; Inventário Portage to escolar, e contou com a participação de
Operacionalizado duas alunas do curso de Psicologia e uma

749
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aluna do curso de Pedagogia, orientadas crianças de outras faixas etárias e as de-


semanalmente por uma professora do mais extensionistas envolvidas. Os relatos
curso de Psicologia. Foram realizadas vi- das reuniões com a coordenadora pedagó-
sitas semanais à escola, para a realização gica também foram utilizados, pois, permi-
de atividades lúdicas com as crianças e tiram a observação de momentos de pla-
professoras, além de reuniões de reflexão nejamento e reflexão das atividades execu-
e planejamento pedagógico com a coorde- tadas com crianças e professoras. Algumas
nadora pedagógica. As práticas foram nor- dessas reuniões contaram com a presença
teadas pelas interações entre as próprias das professoras, o que proporcionou uma
crianças e delas com os educadores, por aproximação das concepções das mesmas
meio de brincadeiras e vivências que pro- em relação à sua atuação. Outro ponto im-
porcionavam o desenvolvimento integral portante para a escolha da análise das ati-
da criança, nos aspectos físico, psicológi- vidades realizadas com a turma do Mater-
co, intelectual e social, em complemento nal I é o fato de que o atendimento à faixa
às relações com a família e a comunidade. creche – 0 a 3 anos – tem se apresentado
As intervenções também buscaram esti- como um desafio para as profissionais,
mular o planejamento e a reflexão sobre por estas não conhecerem bem as ações
as ações pedagógicas desenvolvidas pela pedagógicas voltadas para a referida faixa,
escola, para que sempre tivessem como pautando sua atuação, majoritariamente,
foco principal as necessidades e demandas no campo dos cuidados aos bebês. Além
apresentadas pelas crianças e se valessem dos relatórios escritos, foram analisadas as
do lúdico como princípio norteador da fotos de algumas atividades desenvolvidas
prática educativa cotidiana. A avaliação com as crianças, também, com foco prin-
dos resultados da ação de qualificação de- cipal na turma de Maternal I. A partir do
senvolvida foi realizada a partir de estudo estudo bibliográfico de autores do campo
bibliográfico e pesquisa documental. Para da Psicossociologia, fez-se uma releitura
a pesquisa documental, foram utilizadas da experiência extensionista e análise das
as informações contidas nos relatórios es- contribuições da intervenção psicossocial
critos pela autora da pesquisa, durante o para a qualificação profissional do aten-
desenvolvimento da ação extensionista de dimento educacional de crianças de 1 a
Qualificação Profissional no Atendimento 2 anos. Buscou-se traçar, também, possí-
à Criança de Zero a Três Anos, a respeito veis estratégias de formação continuada
das experiências vivenciadas ao longo do para professores da Educação Infantil, a
ano de 2010. Foram analisados os relatos partir dos conceitos estudados. A pesqui-
das reuniões de planejamento pedagógico sa também teve como referência a legis-
e das tardes lúdicas realizadas com a tur- lação brasileira relacionada à esta etapa
ma do Maternal I, composta de crianças da educação, principalmente, no que se
de 1 a 2 anos de idade e uma profissional. refere às políticas de formação inicial e
A escolha desta turma se deu pelo fato de continuada, além de outras publicações
ter sido acompanhada pela autora da pes- dos órgãos públicos federais, estaduais e
quisa durante todo o ano, sendo que, em municipais, também, neste campo. Auto-
apenas alguns momentos, as atividades res dos campos da Educação Infantil e da
tenham sido realizadas juntamente com Psicologia do Desenvolvimento também

750
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foram utilizados para acrescentar a discus- O sistema econômico da sociedade urbana


são que vem sendo realizada nos últimos ocidental, no qual a mulher tem estado in-
anos, a respeito das políticas e práticas de serida cada vez mais em trabalhos remune-
atendimento às crianças e seus reflexos no rados, exige mudanças nos papeis sociais e
desenvolvimento dos bebês. Foi possível têm levando o pai a ganhar espaço em re-
observar que os educadores da Educação lação à promoção do desenvolvimento de
Infantil, muitas vezes, não conseguem re- seus filhos. O presente trabalho integra a
conhecer as potencialidades das crianças e tese de doutoramento da primeira autora
adaptar os conhecimentos teóricos à prá- e pretendeu dar continuidade às investiga-
tica profissional, construindo seu próprio ções sobre o papel paterno no desenvolvi-
saber a partir de suas vivências. Promover mento da criança, buscando compreender
a apropriação da teoria, proporcionando a paternidade através da abordagem so-
uma visão ampla em relação ao repertó- ciocultural. Este estudo parte do pressu-
rio de recursos, à flexibilização dos espa- posto de que o desenvolvimento humano
ços, à disponibilidade dos materiais, bem em todos os seus aspectos depende de um
como sensibilidade para interagir com as “outro social”, que a família é o primeiro
crianças e perceber suas necessidades e ambiente socializador da criança, e suas
demandas contribuiu, significativamente, práticas são essenciais para que a criança
para a melhoria do atendimento ofereci- se desenvolva. Seu objetivo principal foi
do. As ações lúdicas propostas proporcio- investigar o estilo paterno dos participan-
naram maior interação entre as crianças e tes e mapear a forma de envolvimento dos
professoras da instituição, favorecendo o pais com seus filhos. Participaram deste
desenvolvimento integral das crianças e o estudo um grupo de pais da cidade do Rio
aprimoramento profissional das docentes. de Janeiro com filhos primogênitos de trin-
Observou-se, ainda, maior comprometi- ta e seis meses. As famílias eram de nível
mento das professoras com as atividades socioeconômico médio e os pais moravam
planejadas e executadas, a partir do mo- junto com seus filhos. Os pais foram en-
mento em que o planejamento pedagó- trevistados e responderam um inventário
gico englobou as concepções de educar e de dados socioeconômicos. As entrevistas
cuidar, de forma indissociada. foram gravadas, transcritas e os conteúdos
das falas dos pais foram analisados qua-
Palavras-chave: desenvolvimento infantil, litativamente. As entrevistas realizadas
qualificação profissional, creche com os pais tiveram por objetivos coletar
Contato: Bárbara Couto Preisser Marçal, PUC informações sobre a compreensão da pa-
Minas, barbaracpmarcal@gmail.com ternidade; as mudanças ocorridas após a
paternidade; os conhecimentos necessá-
rios para cuidar e educar os filhos; as ex-
LT04-1047 - ENVOLVIMENTO PATERNO pectativas de futuro em relação ao filho; a
NOS ANOS INICIAIS DE VIDA DOS FILHOS participação paterna nos cuidados com os
Karla da Costa Seabr - UERJ filhos; a divisão dos cuidados e dos traba-
seabrakc@uol.com.br lhos domésticos entre o pai e mãe; o seu
Maria Lucia Seidl de Moura - UERJ estilo paterno e o modelo de estilo pater-
mlseidl@gmail.com no da família de origem; satisfações e insa-

751
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tisfações em relação aos cuidados com o filhos, mas o acompanhamento diário ten-
filho e a participação paterna na escola. O de a ser considerado atribuição feminina.
inventário de dados socioeconômicos teve O resultado das entrevistas indica que os
por objetivo obter informações sobre as pais ainda apresentam características da
condições socioeconômicas da família. Os “paternidade tradicional”, tais como: pre-
resultados apontam que a maioria dos pais ferir se envolver em atividades lúdicas; não
percebe diferença na participação paterna apreciar as tarefas de cuidado; e não parti-
ao longo do desenvolvimento, quanto me- cipar de reuniões escolares. Mas, também
nor a idade menor a participação paterna. apresentam características da “paternida-
Piccinini e colaboradores (2004) discutem de não tradicional”: não gostar de impor
que o envolvimento paterno nos primeiros regras e limites; compartilhar tarefas; e
meses de vida do bebê tende a ser menor participar da vida escolar, predominado a
nas famílias que as mulheres resistem a “paternidade com manifestações de mu-
essa participação, excluindo os pais dos dança”, apresentando características da
cuidados básicos com o bebê. As ativida- paternidade tradicional e da paternidade
des que mais dão prazer aos pais em re- não tradicional.
lação aos filhos são as atividades lúdicas,
como afirma Jablonski (1999), os pais cos- Palavras-chave: Paternidade, Participação
tumam interagir mais com os filhos nos paterna, Envolvimento paterno
momentos de jogos e humor, e Roberts Contato: Karla da Costa Seabra, UERJ,
(1996) que afirma que a participação dos seabrakc@uol.com.br
pais ocorre nas horas de lazer enquanto as
mães se encarregam das tarefas rotineiras
e cotidianas. Os momentos de imposição LT04-1250 - ESPAÇOS DE CRIANÇAS,
de limites e regras são considerados pelos LUGARES DE INFÂNCIAS: UM OLHAR
pais os menos prazerosos. Este é um dos SOBRE CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DE
pontos que, segundo a classificação de EDUCADORES INFANTIS
Muzio (1998), os pais deste estudo mais Claudia da C. G. Santana - ISE TRÊS RIOS/
se distanciam da paternidade tradicio- FAETEC
nal, na qual uma característica marcante ccgsantana@yahoo.com.br
seria exatamente o fato do pai exercer o Lílian A. dos R. Ernesto - ISE TRÊS RIOS/FAETEC
“poder” dentro da família. Quanto à par- liliernesto@msn.com
ticipação na vida escolar do filho, os pais Peterson P. S. de Almeida - ISE TRÊS RIOS/
se consideram participativos dentro das FAETEC
possibilidades dos horários de trabalho e Peterson.psa@hotmail.com
evidenciam um desejo de maior participa- Elder dos Santos Azevedo - UFF
ção. Os pais atribuem pouca participação eldersouza_rj@yahoo.com.br
em reuniões solicitadas pela escola. Os re- Luther King A. Santana - USS
sultados encontrados em relação à partici- lutherk@yahoo.com.br
pação paterna na escola estão de acordo
com os encontrados por Wagner e colabo- Um pensamento que toma o homem
radores (2005), os pais tendem a investir e como um ser abstrato existe apenas no
incentivar os compromissos escolares dos “mundo das idéias”. O homem concreto

752
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tem como referência seu nicho, ou seja, zação que, numa abordagem semiótica,
ele ocupa espaços, os transforma em lu- funcionam tanto como signos quanto
gar, tem uma história, cultura, relaciona- como instrumentos. Na intenção de refle-
-se com pessoas e assume determinados tir sobre as questões até aqui abordadas,
papéis nos grupos sociais dos quais par- o Grupo de Estudo e Pesquisa da Infân-
ticipa. Assim são os espaços destinados cia (GEPINFÂNCIA) do Instituto Superior
a infância: estão definidos culturalmente de Educação de Três Rios busca compre-
e têm seus significados percebidos e/ou ender como a construção de um espaço
modificados pelos sujeitos nele presentes. físico para a criança pequena é utilizado
Os espaços socialmente construídos para e simbolizado por educadores infantis e
as crianças influenciam e afetam o com- crianças. Nossa pesquisa (em andamento)
portamento e desenvolvimento das mes- se desenvolve numa Escola Municipal de
mas num processo de interdependência e Educação Infantil em Três Rios que neste
afetações complexas. Em outras palavras, ano completa 50 anos. Considerada por
como nos diz Lopez e Vasconcellos (2006, muitos como uma escola modelo em edu-
p. 121), “a noção espacial, como parte in- cação infantil, não só pela sua localização,
tegrante dos sujeitos, é uma noção social, mas sobretudo, pela sua arquitetura pro-
é uma construção simbólica, constituída a jetada com amplos espaços de movimen-
partir do contexto cultural no qual se está to e uma área externa repleta de árvores e
inserido”. Nesta perspectiva, Vygotsky brinquedos próprios para esta faixa etária,
(1998) nos auxilia na compreensão da re- nosso objetivo é refletir sobre as concep-
lação do sujeito com o meio social e físico ções e práticas desses educadores neste
em que vive. Para ele, o desenvolvimen- espaço educacional. A pesquisa tem sido
to humano é entendido como a interna- desenvolvida dentro de uma abordagem
lização de processos interpsicológicos, ou qualitativa, com observações semanais
seja, o que é apreendido pelos sujeitos em diário de campo, fotografias e entre-
nas interações que estabelece com seus vistas semiestruturadas com os educado-
outros sociais e com o espaço planejado res do turno da manhã da referida escola.
por eles. O ser humano desenvolve-se pri- Como elemento concreto através do qual
meiramente por meio de uma inteligência a criança experimenta suas primeiras sen-
prática, elementar que, num processo de sações, queremos analisar como este es-
internalização transforma-se quantitativa paço é qualificado significativamente por
e qualitativamente em funções mais ela- esses educadores na sua prática cotidia-
boradas, superiores, presentes somente na com suas crianças. Entendemos como
no Homem. Esse processo de desenvolvi- Tuan (1980), Lima (1989), Lopes (1999)
mento é mediado socialmente por outros e Santana (2000, p. 19) que “um mesmo
homens no contato com instrumentos espaço pode constituir ambientes diferen-
e signos culturais. Apesar de sua ênfa- tes da mesma forma que ambientes se-
se na intersubjetividade, a perspectiva melhantes não correspondem a espaços
vygotskyana, aponta para a materialidade iguais, visto que concretamente os espa-
da cultura, o que implica entender tam- ços físicos estão prenhes de valores, cren-
bém os elementos físicos de um espaço, ças e significados que afetam sua natureza
sua composição, organização e simboli- e qualidade”. Nesse sentido, o espaço de

753
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

educação de crianças pequenas não é um predominam famílias nucleares e as dis-


cenário onde ocorre a atividade educati- tâncias físicas entre familiares tendem a
va, mas é parte integrante de sua própria ser maiores, reduzindo a disponibilidade
natureza. Nas palavras de Lima (1989, p. de familiares para o compartilhamento
5), “o espaço físico isolado do ambiente só do cuidado, este ocorre principalmente
existe na cabeça dos adultos para medi- com auxiliares domésticas e com cuidado
-lo, para vendê-lo, para guardá-lo. Para a institucional. Este estudo consiste de um
criança existe o espaço-alegria, o espaço- recorte realizado a partir de um trabalho
-proteção, o espaço-medo, o espaço-mis- sobre cuidado de crianças em diferentes
tério, o espaço-descoberta, enfim, os es- níveis socioeconômicos, aspectos de gê-
paços da liberdade ou da opressão”. nero e geração. Neste trabalho, analisa-
mos o lugar do cuidado institucional na
Palavras-chave: infância, lugar, educação rede de cuidadores de crianças pequenas
Contato: Claudia da Costa Guimarães Santana. em uma amostra de 150 famílias de Nível
Instituto Superior de Educação de Três Rios/ Socioeconômico (NSE) médio-alto e baixo,
FAETEC, ccgsantana@yahoo.com.br residentes em Salvador, a partir de infor-
mações oferecidas por pais e mães em en-
trevistas estruturadas. Encontramos uma
LT04-1391 - LUGAR DO CUIDADO incidência bastante reduzida de cuidado
INSTITUCIONAL NA REDE DE institucional (14%), maior no NSE médio-
CUIDADORES ENVOLVIDOS NO -alto quando se tratava de freqüência em
CUIDADO COTIDIANO DE CRIANÇAS tempo parcial, enquanto no NSE baixo
PEQUENAS ocorreram os poucos casos de freqüência
Ana Maria de Almeida Carvalho - USP em tempo integral. Estas famílias perten-
amacarva@uol.com.br cem tanto ao nível sócio econômico bai-
Anamélia Lins e Silva Franco - UFBA xo como ao médio-alto, aquelas do nível
anameliafranco@uol.com.br sócio-econômico baixo de modo previsível
Lívia da Costa Fialho - UCSAL residem em bairros periféricos e as de ní-
livia.fialho@yahoo.com.br vel socioeconômico médio-alto em bairros
centrais. Com relação a faixa-etária dos
As transformações da família, em especial pais observamos que as famílias de nível
as decorrentes do ingresso crescente de socioeconômico alto recorrem a creches
mulheres no mercado de trabalho, intro- há mais tempo já que o grupo é composto
duziram novos desafios para o comparti- de pais de todas as faixas etárias e o gru-
lhamento do cuidado de crianças peque- po de nível sócio-econômico baixo na sua
nas. A literatura evidencia que o cuidado maioria encontra-se na faixa etária pro-
parental humano sempre envolve algum dutiva entre 30 e 44 anos. Para explorar
grau de compartilhamento, mais tipica- possíveis fatores relacionados ao recurso
mente entre a mãe e outras mulheres dis- à creche, examinamos algumas relações:
poníveis, familiares (avós, tias, irmãs) ou nível socioeconômico e horas de trabalho
não (vizinhas, amigas, babás). Poortinga da mãe – esta relação possibilita afirmar
& Georgas (2006) apontam que nas so- que as mães do nível socioeconômico mé-
ciedades urbanas contemporâneas, onde dio-alto têm na sua maioria atividade pro-

754
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fissional formal com carga-horária de pelo DIA 14/11 - Segunda-feira


menos 40 horas chegando até 80 horas.
As mães do grupo sócio-econômico baixo,
várias não são “donas de casa” e aquelas 16h-18h
que exercem atividade laboral formal têm
uma carga-horária mais variada entre 15
até 72 horas semanais, estes dados possi-
bilitam considerar que o motivo das famí-
MR LT01
lias de nível médio-alto optarem por cui- Mesa Redonda
dados institucionais para seus filhos está
relacionado às rotinas de trabalho dos
pais o que não necessariamente segue o MR LT01-757 -O DESENVOLVIMENTO
mesmo padrão para as famílias de nível DA SUBJETIVIDADE: UMA DISCUSSÃO
socioeconômico baixo e médio. Outra re- NECESSÁRIA
lação construída foi a condição socioeco- Albertina Mitjáns Martínez - UnB
nômica e a presença de avós morando na Maristela Rossato - UnB
mesma cidade: os dados demonstram que Geandra Cláudia Silva Santos - UECE
todas as famílias de nível socioeconômico Luciana Soares Muniz - UFU/Eseba
baixo tem familiares morando na mesma Fernando Luis González Rey - UniCEUB/UnB
cidade o que não acontece com as famílias
de nível sócio econômico médio-alto que Durante muitos anos a Psicologia abor-
pelo menos a metade não tem nenhum dou os problemas do desenvolvimento a
familiar de geração anterior morando em partir de dois eixos dominantes e inter-
Salvador. Finalmente, de forma a abrir -relacionados: o desenvolvimento de
novas possibilidades de interpretação, os processos específicos (desenvolvimento
dados quantitativos foram complemen- psicomotor, desenvolvimento cognitivo,
tados com entrevistas em profundidade desenvolvimento moral etc.) em corres-
a respeito de atitudes em relação ao cui- pondência com a forma fragmentada de
dado institucional com duas mães de NSE se estudar o psicológico e o desenvolvi-
médio-alto e duas de NSE baixo, sendo, mento concebido como transito entre
em cada caso, uma mãe que recorre ao fases ou etapas influído pela concepção
cuidado institucional e uma que não o uti- universalista e intrapsíquica, dominante
liza. Os resultados sugerem que o recur- de psique. O estudo do desenvolvimen-
so ao cuidado institucional para crianças to do psicológico como sistema comple-
pequenas é modulado por um conjunto xo não tem tido destaque na Psicologia,
complexo de fatores que também podem mesmo considerando as diferentes for-
ser analisados com utilização do conceito mas em que tem sido tratado o desen-
de rede. volvimento da personalidade. Avançar
na compreensão do psicológico como
Palavras-chave: cuidado parental, cuidado sistema e consequentemente da consti-
institucional, rede de cuidadores tuição e desenvolvimento de tal sistema
Contato: Anamélia Lins, UFBA, constitui um desafio que temos assumido
anameliafranco@uol.com.br a partir da Teoria da Subjetividade elabo-

755
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rada por González Rey. O autor concebe niz, ainda em andamento, que investiga
a subjetividade como uma forma comple- a influência da aprendizagem criativa da
xa de organização do psicológico onde se leitura e da escrita no desenvolvimento
integram, formando novas unidades, os da subjetividade em alunos das primeiras
processos simbólicos e emocionais que séries de ensino fundamental. Também
tipificam as formas complexas do funcio- contribui para a discussão em foco o inte-
namento do homem inserido na cultura. ressante trabalho elaborado por González
As categorias sujeito, sentidos subjetivos Rey sobre as implicações de considerar a
e configurações subjetivas contribuem ação como configuração subjetiva para
para dar conta do caráter contraditório, a compreensão do desenvolvimento da
dinâmico e processual da subjetividade, subjetividade. As construções elaboradas
a que se constitui e se desenvolve a par- a partir das pesquisas realizadas, assim
tir da inserção do individuo em múltiplos como os avanços na teorização sobre o
contextos culturais e sócio-relacionais. desenvolvimento da subjetividade permi-
Porém, como “os outros” participam do tirão discutir, analisar e exemplificar três
desenvolvimento da subjetividade? Quais questões chaves neste campo de estudos:
os “mecanismos” pelos quais o próprio in- (1) As diferenças entre mudança e desen-
divíduo participa de seu desenvolvimen- volvimento da subjetividade; (2) Os senti-
to? Como o subjetivamente constituído dos subjetivos produzidos pelo indivíduo
intervém no desenvolvimento de novos nas suas ações e nas suas relações com
processos subjetivos? Como a subjetivi- os outros como fontes do desenvolvimen-
dade social participa da constituição das to da subjetividade e (3) As condições e
subjetividades individuais? Tentar avan- os mecanismos pelos quais os sentidos
çar na elaboração de respostas para estas subjetivos mobilizam o aparecimento de
perguntas a partir das ideias elaboradas novas configurações subjetivas. Conside-
por González Rey acerca da subjetividade ramos ser esta uma discussão necessária
e seu desenvolvimento tem gerado dife- não apenas pela sua significação para o
rentes pesquisas algumas das quais dão delineamento de novas pesquisas, mas,
suporte à Mesa proposta. Seu objetivo essencialmente, pela nossa convicção de
central é discutir o tema do desenvolvi- que avançar na compreensão dos meca-
mento da subjetividade tendo em conta, nismos do desenvolvimento da subjetivi-
essencialmente, as reflexões elaboradas dade pode favorecer o delineamento de
a partir de três pesquisas com olhares di- estratégias educativas potencialmente
ferentes: (a) a pesquisa desenvolvida por mais efetivas.
Rossato, com alunos de séries iniciais de
ensino fundamental que investigou o mo- Palavras-chave: desenvolvimento subjetivo,
vimento da subjetividade no processo de sentidos subjetivos, sujeito.
superação das dificuldades de aprendiza- Contato: Albertina Mitjáns Martínez. UnB/FE;
gem escolar; (b) a pesquisa realizada por amitjans@terra.com.br
Santos, que objetivou compreender como
o trabalho com alunos que têm desenvol-
vimento atípico impacta a subjetividade
dos professores e (c) a pesquisa de Mu-

756
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

MUDANÇA E DESENVOLVIMENTO DA social; (3) possibilidades de reconfigura-


SUBJETIVIDADE: UM ESTUDO A PARTIR ção subjetiva e mudanças nos núcleos das
DA SUPERAÇÃO DAS DIFICULDADES DE configurações subjetivas diante de novos
APRENDIZAGEM ESCOLAR sentidos subjetivos; (4) produção contínua
Maristela Rossato - UnB/IP de novos sentidos subjetivos capazes de
stelarossato@hotmail.com entrar no sistema de configurações subje-
Albertina Mitjáns Martínez - UnB/FE tivas. Na busca de inteligibilidade sobre o
amitjans@terra.com.br desenvolvimento da subjetividade, faz-se
necessário diferenciá-lo da compreensão
Compreender as fronteiras entre mudan- de mudança adotada na pesquisa. O con-
ça e desenvolvimento da subjetividade ceito de mudança presente na Teoria da
requer um olhar sensível do pesquisa- Subjetividade de González Rey encontra
dor amparado por um rigor teórico que ancoragem na conceituação de circuito
lhe possibilite produzir inteligibilidade tetralógico proposta por Morin (2003) –
em meio à complexidade humana e seus ordem-desordem-interação-organização
processos evolutivos. As discussões apre- – estabelecendo, com isso, uma dinâmica
sentadas a seguir são decorrentes de mutacional de impactos no sistema, mes-
uma pesquisa realizada com estudantes mo que sejam de superfície. O desenvol-
das séries iniciais do ensino fundamental vimento de um sistema ocorre por forças
que objetivou investigar o movimento da que incluem o funcionamento do pró-
subjetividade no processo de superação prio sistema (Gonzalez Rey, 1995, Morin,
das dificuldades de aprendizagem esco- 2003). Considera-se que, no funcionamen-
lar (Rossato, 2009). Dessa pesquisa, serão to, o foco da análise é a organização do sis-
apresentadas as reflexões e produções tema e, quanto maior sua complexidade,
da primeira autora sobre como a subjeti- mais ordem e desordem tendem a estar
vidade se movimenta, distinguindo mu- intimamente ligadas; no caso de desenvol-
dança e desenvolvimento, identificadas vimento, o foco da análise é a complexi-
em diferentes zonas da vida dos sujeitos dade do processo de mudança desse sis-
e presentes na complexidade da dinâmica tema. Os casos analisados permitiram-nos
escolar. A Teoria da Subjetividade de Gon- compreender com maior inteligibilidade a
zález Rey (1995, 2003a, 2003b) foi usada integração do sujeito, da personalidade e
como base teórica para discussão por ser, da subjetividade social no desenvolvimen-
em essência, uma teoria que busca com- to da subjetividade, conforme González
preender a subjetividade reconhecendo o Rey (1995, 2003a, 2004, 2008) já havia
valor da história e da cultura, o que pos- anunciado teoricamente. Em dois parti-
sibilita olhar o estudante e seus proces- cipantes da pesquisa, João e Fernanda, o
sos singulares. Mais especificamente, a movimento da subjetividade, pela com-
teoria citada permitiu: (1) compreensão plexidade envolvida nas mudanças subje-
da subjetividade como sistema complexo, tivas e pela relativa estabilidade adquirida
dinâmico e em permanente mobilidade; na organização do sistema, possibilitou
(2) concepção do sujeito constituído na o desenvolvimento da subjetividade ne-
inter-relação tensa e contraditória entre a cessário à superação das dificuldades de
subjetividade individual e a subjetividade aprendizagem. Portanto, com Fernanda

757
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e João podemos afirmar que a superação dução de sentidos subjetivos mobilizado-


das dificuldades de aprendizagem decor- res, numa relação dialógica (González Rey,
rentes do desenvolvimento da subjetivi- 2004). Nos três casos analisados, o outro,
dade envolveu uma reorganização estável em circunstâncias distintas, gerou emocio-
da personalidade e das qualidades do su- nalidades que possibilitaram a produção
jeito, assumindo novos níveis qualitativos de sentidos subjetivos mobilizadores dos
de organização subjetiva. No caso de Da- sujeitos. A condição do sujeito é marcada
niel, o movimento da subjetividade não pela mobilidade ao longo de toda a vida
chegou a gerar mudanças complexas que em formas e níveis particulares de organi-
ganhassem estabilidade durante o perí- zação da subjetividade. O pensamento, a
odo investigado, uma vez que, quando a reflexão e as decisões tomadas pelo indi-
emocionalidade produtora dos sentidos viduo singular legitimam sua condição de
subjetivos se rompeu, houve também sujeito e possibilitam que entre na dinâ-
uma involução na qualidade que acredi- mica complexa da vida social e seja capaz
távamos ter alcançado em sua aprendi- de gerar espaços próprios de subjetivação
zagem. O caso de Daniel mostra-nos que, (González Rey, 2005, 2006, 2007).
no momento em que a emocionalidade
geradora de uma mudança se interrom- Em segundo lugar, discutiu-se o desen-
pe, pode haver involução nos níveis de volvimento da subjetividade na mudança
organização subjetiva que se anunciavam da personalidade gerada pelas reconfi-
até então, demonstrando que os sentidos gurações subjetivas e produção de no-
subjetivos precisam de certo tempo, esta- vos sentidos subjetivos. À personalidade
bilidade e intensidade para se integrarem como sistema subjetivo auto-organizador
às configurações subjetivas e provocarem da experiência do sujeito, constituída em
mudanças mais complexas. Em termos sua história, se lhe atribui um caráter tem-
de desenvolvimento da subjetividade, a poral e com mobilidade (González Rey,
análise das informações produzidas na 1995), e somente com essa compreensão
pesquisa abriu dois caminhos de análise de personalidade pode-se efetivamen-
baseados no momento empírico: em pri- te pensar o sujeito em permanente pro-
meiro lugar, o desenvolvimento da subje- cesso de mudança, sem ter que carregar
tividade na constituição do sujeito produ- para toda vida os rótulos sociais criados
zida no confronto com o outro. No caso em função das condições vividas em de-
de João, esse outro foi representado pela terminadas circunstâncias de sua história.
professora Ana e pela Mãe; nos casos de As experiências vividas pelo sujeito pro-
Fernanda e Daniel, o outro foi represen- duzem uma variedade de sentidos sub-
tado pela professora Rosane. A produção jetivos que alimentam e desenvolvem as
dos sentidos subjetivos específicos segue configurações subjetivas, as quais, mesmo
desdobramentos e entrelaçamentos que diante dessa mobilidade, mantêm núcleos
nunca são universais, mas que posicionam estáveis de produção subjetiva. Os núcle-
a pessoa como sujeito de seu próprio de- os, organizados pelos sentidos subjetivos
senvolvimento e, nesse sentido, o outro dominantes, dão integridade à configu-
tem importância para o desenvolvimento ração, o que nos leva a entender que um
quando se converte em uma fonte de pro- novo sentido subjetivo, que assuma papel

758
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dominante, pode mobilizar mudanças no parados profissional e emocionalmente.


núcleo de uma configuração. Vale lembrar A problemática da oferta de educação
que a configuração subjetiva caracteriza- escolar para esses alunos encerra desa-
-se pela possibilidade de integrar elemen- fios de natureza organizacional, política,
tos dinâmicos e contraditórios, os quais pedagógica, cultural e subjetiva (Gomes;
podem converter-se em sentidos subje- González Rey, 2007; Mitjáns Martínez,
tivos dominantes. (González Rey, 2003a). 2005, 2006; Tunes; Bartholo, 2006) a
Diante do exposto, definimos o desenvol- todos os atores dos sistemas de ensino,
vimento da subjetividade como mudanças sobretudo, aos professores, que cada vez
subjetivas que impactam e que ganham mais estarão assumindo responsabilida-
certa estabilidade, capazes de desencade- des político-pedagógicas em um cenário
ar outras mudanças, gerando novos níveis profundamente contraditório, tornando-
qualitativos de organização subjetiva. A -se um contexto propício para reflexões
análise do desenvolvimento da subjetivi- relacionadas às implicações dessa expe-
dade requer adentrar no movimento con- riência, na subjetividade individual dos
tínuo de produção de sentidos subjetivos professores. Ao problematizarmos a situ-
identificando os impactos, as rupturas e as ação de inclusão escolar vigente na esco-
construções que são capazes de desenca- la, objetivamos compreender como o im-
dear no sujeito. pacto do trabalho com os alunos que têm
desenvolvimento atípico gerou mudanças
Palavras-chave: desenvolvimento da na subjetividade dos professores envol-
subjetividade; dificuldades de aprendizagem; vidos. Optamos pela Epistemologia Qua-
sujeito. litativa de González Rey (2002, 2005a)
Contato: Maristela Rossato; UnB/IP; para ancorar as construções teórico-me-
stelarossato@hotmail.com todológicas. A pesquisa foi organizada por
meio do estudo de três casos, contando
com a participação de três professores do
MUDANÇAS NA SUBJETIVIDADE DOS Ensino Fundamental, iniciantes no traba-
PROFESSORES: CONSTRUÇÕES A PARTIR lho com alunos que têm desenvolvimento
DA EXPERIÊNCIA COM ALUNOS QUE TÊM atípico. Nossas construções fundamen-
DESENVOLVIMENTO ATÍPICO taram-se na Teoria da Subjetividade de
Geandra Cláudia Silva Santos - UECE González Rey (1995, 2003, 2004a, 2004b,
geandracss@yahoo.com.br 2007), articulada as contribuições da Te-
Albertina Mitjáns Martínez - UnB/FE oria da Complexidade de Morin (2003) e
amitjans@terra.com.br de Neubern (2004). A mudança na subje-
tividade individual não é uma produção
A experiência com os alunos que têm de- final e isolada, fruto da construção de
senvolvimento atípico vem gerando, em uma resposta imediata, linear e específi-
parte significativa dos educadores bra- ca aos apelos externos participantes das
sileiros, manifestações de insegurança, relações e experiências vivenciadas pe-
angústia, impotência e resistência (Tes- los sujeitos, mas inscreve-se no processo
saro, 2004; Domingues; Cavalli, 2006; de produção de sentidos subjetivos em
MUNHOS, 2009), por sentirem-se despre- desenvolvimento, na subjetividade indi-

759
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

vidual do sujeito implicado, bem como e na representação sobre as alternativas


da subjetividade social do espaço, no de intervenção educativa direcionada
qual ele se realiza (González Rey, 2007). aos alunos com desenvolvimento atípi-
A mudança origina-se dos impactos gera- co. Essa produção articulou-se, dialetica-
dos pelas relações com outros sistemas mente, com o aprofundamento do status
subjetivos individuais e sociais e pelas conflituoso da configuração subjetiva da
experiências vivenciadas em diferentes sua condição de professor e das relações
contextos. Os impactos, por sua vez, mo- estabelecidas na escola, criando contra-
bilizam confrontos e instabilidades, na dições que causaram danos, interrom-
constituição subjetiva do sujeito, pelas pendo a produção subjetiva em curso. Os
tensões e contradições que são capazes novos elementos subjetivos, integrados
de produzir. Nos estudos de caso realiza- na configuração subjetiva da condição de
dos identificamos impactos que geraram professor não geraram repertórios de ex-
mudanças qualitativamente diferentes na pressão subjetiva duradoura e consisten-
subjetividade individual de cada profes- te emocionalmente, apesar das expres-
sor. A mudança significativa, no caso da sões pertinentes à condição de sujeito
professora Bárbara, consistiu no fortale- de Teo, interrompendo a reorganização e
cimento da sua condição de sujeito, per- ruptura de sentidos subjetivos dominan-
mitindo o enfrentamento ativo, interativo tes na configuração em tela. A mudança
e criativo das próprias limitações e das não-significativa, no caso da professora
adversidades do cenário organizacional, Amália, incidiu na emergência de relativo
bem como em mudanças importantes na interesse pela tarefa de ensinar os alunos
configuração subjetiva da profissão do- com desenvolvimento atípico, na negação
cente, oriundas da constituição de novos da condição de sujeito e no agravamento
sentidos subjetivos que resultou no posi- da insatisfação com o magistério, pois a
cionamento ético-profissional favorável experiência com esses alunos mostrou-
ao trabalho com alunos que têm desen- -se problemática, intensificando as difi-
volvimento atípico e em desvantagem culdades da sua prática educativa. Essa
pedagógica. Essa mudança constituiu-se movimentação foi coerente com os arran-
numa movimentação expressiva e com jos subjetivos existentes na configuração
certa estabilidade, que se manifestou em subjetiva implicada, expressa por um pro-
elementos centrais de uma configuração cesso de consolidação dos sentidos subje-
subjetiva específica, por meio da altera- tivos dominantes, que gerou novo reper-
ção e emergência de sentidos subjetivos, tório emocional, contudo, não produziu
responsáveis pela reorganização da confi- uma organização subjetiva alternativa.
guração subjetiva, implicada na mudança. As mudanças configuraram-se a partir de
A mudança pouco significativa, no caso uma tessitura de implicações geradas a
do professor Teo, consistiu na emergên- partir dos seguintes aspectos: a relação
cia de sentido subjetivo voltado à relação estabelecida com os alunos; a organiza-
com os alunos, promovendo aproxima- ção subjetiva, incluindo o envolvimento
ção, afetuosidade e interesse pelo proces- emocional com a docência; a expressão
so de aprendizagem destes; mudanças na da condição de sujeito. A inserção de alu-
representação relacionada à deficiência nos com desenvolvimento atípico no uni-

760
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

verso da escola, não promove, por si só, mudança tornou-se mais intensa, quando
impactos diferenciados, na subjetividade as relações entre os envolvidos expressa-
individual do professor. O que desenca- ram-se com riqueza subjetiva.
deia impactos na subjetividade, capazes
de inscrever o outro em uma condição Palavras-chave: subjetividade do professor;
significativa, depende da qualidade de mudanças; alunos com desenvolvimento
sentidos subjetivos produzidos na relação atípico.
que se constituiu mutuamente (González Contato: Geandra Cláudia Silva Santos; UECE;
Rey, 2004b). Existem processos organiza- geandracss@yahoo.com.br
tivos da subjetividade, com capacidade
generativa e outros que congregam pelo
menos, em situações específicas, como A CRIATIVIDADE NA APRENDIZAGEM DA
a estudada, qualidades não-generativas, LEITURA E ESCRITA E SEUS IMPACTOS NO
interrompendo ou impedindo o fluxo de DESENVOLVIMENTO INFANTIL
novas produções subjetivas (González Luciana Soares Muniz - UFU/Eseba
Rey, 1995, 2004a, 2007). Os vínculos emo- lucianasoares.muniz@gmail.com
cionais do professor com a atividade pro- Albertina Mitjáns Martínez - UnB/FE
fissional atuam como recursos subjetivos amitjans@terra.com.br
relevantes às mudanças, na subjetividade
individual dos professores. Na produção O presente trabalho permeia uma pesqui-
subjetiva em que houve sensível expres- sa em andamento vinculada ao Programa
são da condição de sujeito, no processo de Doutorado da Faculdade de Educação
de subjetivação da experiência com as da Universidade de Brasília. Partimos do
alunas que têm desenvolvimento atípico, pressuposto de que a escola e a sala de
mais a mudança tornou-se significativa. aula são espaços singulares de aprendi-
O movimento tenso e contraditório da zagem e desenvolvimento, e convidam a
relação estabelecida entre a realidade e várias reflexões (Muniz, 2006). Tendo em
a condição pessoal do sujeito requer con- vista que a função que move a escola é o
gruência (González Rey, 2005b, 2004a), próprio processo de ensinar e aprender
para que essa condição expresse-se e torna-se fundamental, no contexto atu-
aprimore-se. Assim, compreendemos al da sociedade que demanda cada vez
que as mudanças na subjetividade dos mais uma postura criativa das pessoas
professores concentraram-se em configu- frente aos desafios e à complexidade do
rações subjetivas associadas à atividade cenário mundial, a expressão criativa dos
em foco; a produção de novos sentidos sujeitos envolvidos nesse processo. Mes-
subjetivos firmou-se como marco central mo convalidando a relevância da criativi-
das mudanças; os descompassos entre a dade na educação, as práticas e os sabe-
condição de sujeito e a organização sub- res organizados no cotidiano escolar nem
jetiva favorecem danos na produção de sempre contribuem para a formação de
novos sentidos subjetivos; a organização sujeitos criativos. As salas de aula consti-
subjetiva produzida com as mudanças so- tuem espaços em que o professor ainda
freu implicações relevantes da integração é o único detentor do conhecimento e ao
entre processualidade e temporalidade; a aluno cabe a tarefa de ouvir e observar

761
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para reproduzir tal qual lhe foi ensinado, que são mobilizados na aprendizagem
caracterizando uma aprendizagem pas- criativa da leitura e da escrita, a partir do
sivo-reprodutiva (González Rey, 2003b, sistema atividade-comunicação que en-
2006). Entender como o sujeito pode volve o cotidiano da criança, seja no âm-
aprender criativamente e se desenvolver bito da escola, família ou outros contex-
como sujeito criativo no contexto educa- tos sócio relacionais nos quais a criança
cional é essencial. Acreditamos que as participa. Desta forma, partimos de uma
características subjetivas que participam concepção de personalidade como uma
da expressão criativa do sujeito são cons- configuração de configurações subjetivas
tituídas no decorrer da sua história de (González Rey, 1997) que possui um ca-
vida e a partir dos diferentes contextos ráter dinâmico, flexível e singular. Nessa
sociais de que o sujeito participa. Num concepção a categoria sujeito, constitui
movimento dialético, a história individual uma categoria fundamental para nossos
e os momentos que vivenciam os sujeitos estudos, uma vez que expressa o cará-
concretos nos trazem a possibilidade de ter ativo, intencional e transformador da
analisar a leitura e a escrita em contexto, pessoa, na confluência das configurações
como um processo singular dos sujeitos subjetivas constituídas em sua história de
envolvidos. Apreendemos como Gonzá- vida e dos sentidos subjetivos que produz
lez Rey (1995, 2003, 2007) que o desen- nos contextos sociais onde desenvolve
volvimento da subjetividade consiste em sua ação. Diante dessas reflexões, enfa-
um processo que ocorre vinculado aos tizamos que o objetivo principal desta
sentidos subjetivos que o sujeito produz. pesquisa consiste em compreender os
Como um movimento singular, o desen- processos subjetivos que se expressam
volvimento da subjetividade ocorre na na criatividade na aprendizagem da lei-
confluência da subjetividade individual tura e da escrita e os impactos desta no
e da subjetividade social. Nessa aborda- desenvolvimento infantil. Buscamos as
gem, procuramos analisar o impacto da contribuições da perspectiva histórico-
criatividade no desenvolvimento a partir -cultural, dentro dela, a linha teórica que
das complexas relações sujeito-contexto, tem elaborado o tema da Subjetividade
em que o sujeito é ativo e atua conforme desenvolvida por González Rey (1995,
os recursos subjetivos de que dispõe no 2003, 2005a), e da Criatividade, proposta
momento da ação, bem como da repre- por Mitjáns Martínez (1995, 1997, 2002,
sentação que concretiza em decorrência 2004, 2008, 2009a). Como metodologia
da situação vivida. Enfatizamos a falta utilizada, ressaltamos a opção pelos es-
de pesquisas que revelem a expressão tudos de caso a partir da Epistemologia
criativa da criança no processo de aqui- Qualitativa (González Rey, 2002, 2005b,
sição da leitura e da escrita, processo 2009), concepção epistemológica que
essencial para todo o desenvolvimento tem se mostrado promissória para a pro-
educacional posterior, e os impactos des- dução de conhecimentos sobre proces-
sa aprendizagem no desenvolvimento sos humanos complexos como a apren-
integral dela. Consideramos como funda- dizagem criativa e o desenvolvimento da
mental para a investigação aqui exposta, subjetividade (Mitjáns Martínez, 2008).
compreender os recursos personológicos Por meio da pesquisa qualitativa orien-

762
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tada nessa concepção epistemológica, próprio sujeito, como o que temos come-
o pesquisador demonstra abertura e çado realizar. Portanto, o produzido até
sensibilidade à imprevisibilidade da pes- o presente momento permite hipotetizar
quisa e assume sua responsabilidade e que as emoções envolvidas no momento
criatividade individual em um processo da aprendizagem, adquirem importância
interpretativo – construtivo de produção essencial para a compreensão do desen-
de conhecimento. Os sujeitos da pesqui- volvimento subjetivo da criança, o qual
sa são alunos em fase de aprendizagem é concretizado em meio aos sentidos
da leitura e da escrita que demonstram subjetivos diversos produzidos no pro-
indicadores de criatividade nesse pro- cesso de aprender criativamente. Nessa
cesso. Para contribuir, numa perspectiva reflexão, ressaltamos a sala de aula como
da pesquisa qualitativa, com a expressão espaço dialógico e que a aprendizagem
dos sujeitos, contamos com a utilização constitui-se como propulsora da ativi-
de instrumentos abertos e semiabertos, dade criadora e do desenvolvimento do
com o intuito de compreender os senti- aluno. Estudar a forma em que a apren-
dos subjetivos e as configurações subjeti- dizagem criativa da leitura e da escrita
vas implicados na aprendizagem criativa impacta o desenvolvimento ulterior da
dos alunos. Igualmente com instrumen- criança torna-se promissor no sentido de
tos deste tipo, junto a entrevistas a pais e contribuir para melhor fundamentar pos-
professores acompanhamos os possíveis síveis mudanças nas formas dominantes
impactos que a aprendizagem da leitu- em que o ensino da leitura e da escrita
ra e da escrita tem em outras áreas do tem se desenvolvido nas nossas salas de
desenvolvimento das crianças. O estudo aula, vinculado a uma aprendizagem pas-
aqui delineado apreende a prática edu- sivo-reprodutiva.
cativa como cenário de investigação e de
produção teórica. A pesquisa encontra-se Palavras-chave: desenvolvimento infantil;
em andamento e aponta como resulta- criatividade; aprendizagem.
dos iniciais a necessidade de construções Contato: Luciana Soares Muniz; UFU;
teóricas sobre como se expressa a criati- lucianasoares.muniz@gmail.com
vidade na aprendizagem da leitura e da
escrita e suas influências no desenvolvi-
mento infantil, especialmente em outros A AÇÃO COMO CONFIGURAÇÃO
aspectos da subjetividade. A revisão bi- SUBJETIVA: IMPLICAÇÕES PARA O
bliográfica do tema, realizada até o pre- DESENVOLVIMENTO DA SUBJETIVIDADE
sente instante, referente aos impactos Fernando Luis González Rey - UniCEUB/UnB
da aprendizagem criativa no desenvolvi- gonzalez_rey49@hotmail.com
mento da criança, revela a ausência de
pesquisas dessa natureza e se constata Historicamente o termo comportamento
estudos que partem do que é exterior ficou associado ao Behaviorismo, assim
ao sujeito, como métodos, recursos ma- como o inconsciente à Psicanálise, o que
teriais, estudos do professor, revelando tem levado a sua desconsideração como
a urgência de pesquisas que considerem categoria psicológica por matrizes teóri-
o desenvolvimento a partir da ação do cas diferentes daquelas em que esse ter-

763
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mo se institucionalizou na psicologia. Nas essa perspectiva o desenvolvimento ti-


tendências dos pensamentos que se in- nha como seu conceito central o de “ati-
tegram naquilo que hoje se define como vidade reitora”, estabelecendo-se uma
“teorias culturais”, têm sido preferivel- relação direta entre um tipo de atividade
mente usados, de uma forma geral, os e as características mais gerais de cada
conceitos de ação e atividade. O conceito momento concreto do desenvolvimento
de ação, diferentemente do comporta- psíquico. Os temas da emoção, da subje-
mento, sinaliza o caráter ativo do sujeito tividade, assim como a personalidade e
através do exercício de recursos simbó- a motivação, ocuparam um lugar total-
licos de caráter cultural, ainda que com mente secundário nesse marco teórico
frequência se identifiquem ação e ato. O e, consequentemente, não apareceram
conceito de ação, assim como o de ativi- como aspectos centrais para uma teoria
dade, enfatiza um psiquismo humano em do desenvolvimento humano dentro des-
processo, de natureza cultural, destacan- sa perspectiva, apesar dos importantes
do o processual desse psiquismo. Porém, antecedentes que existiram na obra de
nessa mesma tradição, que no Ocidente Vygotsky orientados a representar a uni-
se circunscreve dentro das famílias de dade do cognitivo e do afetivo no desen-
psicologias culturais ou socioculturais, volvimento humano. O conceito de “pe-
a definição cultural histórica da psique rezhivanie”, que pode ser traduzido como
que caracterizou a obra de Vygotsky, o vivência, mas que, como categoria, era
que apareceu como um princípio geral algo mais abrangente em sua definição,
da Psicologia Soviética tem sido mistura- foi compreendido por Vygotsky como
da com uma definição concreta de ativi- aquela unidade psicológica que integrava
dade; aquela claramente definida por A. cognição e afeto e que permitia explicar,
N. Leontiev na Teoria da Atividade como desde o sujeito, a relevância de uma in-
atividade com objetos. Como resultado fluência externa para o desenvolvimento
dessa integração acrítica das teorias de da personalidade. Esse conceito desen-
Vygotsky e Leontiev apareceu a CHAT volvido por Vygotsky no último momento
(Cultural Historical Activity Theory), mo- de sua obra voltava a trazer a personali-
vimento que hegemonizou as interpre- dade como um conceito importante para
tações desses dois autores no Ocidente. o desenvolvimento humano. No presente
Desde esse marco os conceitos de ação trabalho iremos discutir o lugar central
e de atividade foram usados em uma da ação numa concepção cultural históri-
perspectiva orientada à compreensão ca do desenvolvimento da subjetividade,
das funções psíquicas como resultado que recupera e integra em novas defini-
direto da atividade humana, afirmando- ções teóricas os temas da personalidade,
-se esse foco num paradigma teórico que da motivação e do sujeito do desenvolvi-
enfatizou a unidade teórica da ativida- mento, onde a ação aparece como con-
de, da interiorização, da mediação e da figuração subjetiva em processo e não
função psíquica, onde o sujeito, a perso- apenas como a expressão de recursos
nalidade e a unidade do cognitivo e do simbólicos numa atividade externa que
afetivo, temas importantes na trajetória passa a ser interna através da interiori-
cultural histórica, foram omitidos. Desde zação. O epicentro do desenvolvimento é

764
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

deslocado da atividade e colocado na ca- configurando subjetivamente em formas


pacidade subjetiva geradora de um sujei- que escapam tanto à intencionalidade,
to, conceito que é central para a produ- quanto à capacidade de significação do
ção subjetiva que acontece na ação. Os sujeito. Essas poderosas forças simbóli-
diferentes atos da pessoa representam co-emocionais se organizam em configu-
momentos particulares de configurações rações que estão permanentemente en-
subjetivas que fazem da ação um espaço volvidas nos cursos de vida do sujeito. A
de intensa produção subjetiva. O curso ideia de configuração subjetiva é respon-
da ação não é operacional cognitivo, mas sável pela presença permanente do his-
um processo emocional intenso em que tórico no atual, e do contexto no pesso-
as emoções resultam inseparáveis de to- al. O desenvolvimento da subjetividade
das as operações da ação. A ação repre- acontece pelos processos envolvidos em
senta sempre uma configuração na qual configurações subjetivas que se tornam
personalidade, contexto e produções do centrais no presente da vida do sujeito.
sujeito se integram em uma configuração Os sentidos subjetivos múltiplos, que se
subjetiva específica, responsável pelas organizam e se geram permanentemen-
produções subjetivas que acontecem e te nas configurações subjetivas, estão
se desdobram como resultado da ação. associados a processos simultâneos e
As duas categorias que temos desenvol- diversos que ganham vida nas diferentes
vido para esta representação da subje- experiências humanas implicadas com
tividade que se desenvolve no curso da essas configurações subjetivas. São os
ação, sem se diluir nela, nem nas práticas novos níveis de desenvolvimento desses
discursivas ou nos atos como processos processos e da pessoa, que estão presen-
da ação, são as de sentido subjetivo e tes de forma permanente na processua-
configuração subjetiva. Diferentemente lidade dessa experiência através de sua
da ênfase da psicologia cultural-histórica reflexividade, suas decisões e conflitos
na unidade do cognitivo e do afetivo, a que, em seu conjunto, representam es-
nossa ênfase é na unidade do simbólico- sas mudanças qualitativas na história da
-emocional, unidade essa que representa pessoa e que podem ser definidas como
uma produção subjetiva permanente da desenvolvimento da subjetividade.
experiência humana, que tem lugar nos
contextos da ação e de todas as outras Palavras-chave: configuração subjetiva;
formas de expressão do sujeito, incluin- desenvolvimento subjetivo; ação.
do a produção imaginária e reflexiva de Contato: Fernando Luis González Rey;
seus espaços íntimo-pessoais. Nos senti- UniCEUB/UnB; gonzalez_rey49@hotmail.com
dos subjetivos o simbólico e o emocional
se implicam de forma recíproca, mas sem
relações de determinação. As emoções
têm uma capacidade geradora que se
desdobra em múltiplas formas no curso
do tempo e sobre as quais se desenvol-
vem formas simbólicas múltiplas que es-
capam da ordem da racionalidade, se re-

765
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

MR LT04 - Mesa Redonda entre as disciplinas tanto no contexto bra-


sileiro, como internacional, sendo eviden-
Convidada tes as contribuições dos dois campos de
conhecimento para o estudo dos mundos
sociais das crianças. A articulação e o diá-
MR LT04-1325 - O LUGAR DA CRIANÇA
logo não implicam em um apagamento das
NA PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
diferenças existentes, mas a necessidade
E NA SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA:
do estabelecimento de novos diálogos e
PROXIMIDADES E DIFERENÇAS
novas propostas de pesquisa e intervenção
Juliana Prates Santana - UFBA com as crianças. Dessa forma, observa-se
julianapsantana@gmail.com que uma tentativa de abandonar a pers-
Maria Letícia B. P. Nascimento - FEUSP pectiva adultocêntrica nas investigações
letician@usp.br com crianças, considerando as suas vozes
Lirene Finkler - UFRGS/FASC e culturas como elementos cruciais para
lirenefinkler@yahoo.com.br a compreensão dos seus modos de vida e
Vera M. R. de Vasconcellos - FE/UERJ mundos sociais. O trabalho de Maria Letí-
Vasconcellos.Vera@gmail.com cia Nascimento versa sobre os contributos
teóricos iniciais da Sociologia da Infância e
A presente Mesa tem por objetivo cons- sua influência nas pesquisas com e sobre
truir um diálogo entre a Psicologia do De- as crianças. Lirene Finkler discute a par-
senvolvimento e a Sociologia da Infância ticipação social infanto-juvenil no Brasil,
a partir de contribuições teóricas e empí- tomando como base as práticas nas Con-
ricas realizadas à luz destes dois campos ferências Nacionais e Municipais dos Di-
de conhecimento. Inicialmente, a Sociolo- reitos da Criança e do Adolescente. Juliana
gia da Infância surge em contraposição a Santana discute, a partir de uma pesquisa
uma perspectiva de desenvolvimento que empírica, as principais contribuições da
via na criança apenas um vir a ser, um pro- Sociologia da Infancia e da Psicologia do
jeto de futuro em construção, ao mesmo Desenvolvimento para a investigação e
tempo em que se opõe a uma perspectiva intervenção com crianças em situação de
sociológica que limitava a criança ao papel rua. Por fim, Vera Vasconcellos objetiva
de alvo dos processos de socialização. Es- compreender, por sua vez, como os con-
sas idéias iniciais colocavam a Sociologia ceitos de infância e criança vêm mudando
da Infância como antagônica à Psicologia na Psicologia e influenciando a Educação,
do Desenvolvimento, particularmente, e como tais mudanças têm marcado os te-
aquela que não considerava os aspectos mas em estudo e as práticas, tanto de pes-
históricos e sócio-culturais que influen- quisa quanto de ensino, além da atuação
ciam o desenvolvimento, tomando a infân- profissional dos psicólogos e educadores.
cia como fenômeno natural. No entanto, Pretende-se a partir das discussões imple-
tais críticas também surgiram no interior mentadas nesta Mesa aprofundar as inter-
da própria Psicologia do Desenvolvimento, conexões da Psicologia do Desenvolvimen-
produzindo importantes reformulações e to e da Sociologia da Infância, evidencian-
novas proposições teóricas. Nesse sentido, do as suas potencialidades e as principais
observa-se atualmente um maior diálogo tensões existentes.

766
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A historicamente datadas, elas não excluem


SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA COMO ÁREA uma a outra, mas, ao contrário, muitas
DE ESTUDO DAS CRIANÇAS vezes se mesclam entre si e justificam
Maria Letícia B. P. Nascimento - FEUSP algumas das práticas sociais dos adultos
letician@usp.br até nossos dias. Os sociólogos apresen-
tam também as imagens sociológicas da
Em 1998, os sociólogos britânicos James, infância, organizadas em quatro aborda-
Jenks e Prout apresentaram um levan- gens: a infância construída socialmente,
tamento das representações sociais da que se opõe à visão positivista e à crença
infância elaboradas por diferentes pen- em significados pré-estabelecidos, isto é,
sadores. Nesse inventário, denominam sendo uma construção social, depende
imagens pré-sociológicas aquelas que dos contextos social, político, histórico
correspondem a construções históricas – e moral, o que revela que os grupos de
e simbólicas – de tipos ideais de criança: crianças que compõem a infância são va-
a criança má, a inocente, a imanente, a riáveis; a tribal, que estuda as relações
naturalmente desenvolvida e a incons- sociais das crianças entre pares e as in-
ciente, concepções construídas entre os terações destes grupos de pares com os
séculos XIX e XX. O que há de comum adultos próximos; a infância como grupo
nessas representações? Marcadamente minoritário, que focaliza as relações de
o reconhecimento que crianças e adultos poder entre adultos e crianças; e a infân-
são diferentes. Indo mais além, as con- cia como estrutura social, que pesquisa a
cepções hierarquizam as relações sociais infância na estrutura social, com ênfase
entre a infância e o mundo adulto, enfa- na interdependência entre as gerações.
tizando a subordinação da infância, com- Parece interessante pensar que as qua-
preendida como “tempo de passagem”, tro abordagens sociológicas trazem em
aos adultos. Além disso, a negatividade comum um novo paradigma da infância,
atribuída às características infantis e à que deixa de ser vista como um tempo de
fragilidade física e moral reconhecida nas passagem para constituir-se como uma
crianças vão produzir práticas sociais de categoria na estrutura social. De acordo
confinamento e proteção. Acrescente-se com os pesquisadores Dahlberg, Moss e
que foi sendo constituída uma imagem de Pence (2003), significa que a infância dei-
criança com características universais, ou xa de ser vista como estágio preparatório
seja, “o status da infância tem suas fron- para ser entendida como um componente
teiras mantidas pela cristalização das con- da estrutura da sociedade, “importante
venções e discursos presentes nas formas em seu próprio direito como um estágio
institucionais que com ela lidam, como as no curso da vida, nem mais nem me-
famílias, creches, escolas e consultórios/ nos importante do que outros estágios”
clínicas, todas essas, agências designadas (p.70). Importante notar que a perspec-
e estabelecidas para processar a infância tiva estrutural da infância, defendida por
como uma entidade uniforme.” (JENKS, Qvortrup (1993, 1995, 1999, 2002, 2005,
2002, p.5) Embora as concepções apre- 2009, 2010) fundamenta-se em três as-
sentadas tenham sido originadas em di- serções principais: (1) a infância não é
ferentes autores, e sejam interpretações exatamente uma fase da vida, mas uma

767
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

categoria na estrutura social que manifes- ta ainda que “o nível de análise para o
ta variações históricas e interculturais; (2) estudo da infância e das transições nas
alterações na sociedade afetam as crian- vidas das crianças devem ser sempre co-
ças tanto quanto os adultos; (3) as crian- letivas, o indivíduo em interação com os
ças contribuem ativamente na sociedade, outros, num contexto cultural” (p.1). Nes-
embora a natureza de sua contribuição sa linha, Corsaro propõe o conceito de
seja diferente em distintas culturas. A culturas infantis, “um arranjo estável de
passagem de um tipo de abordagem, que atividades ou rotinas, artefatos, valores
focalizava a criança, para outro, que vai e interesses que as crianças produzem e
estudar a infância e as crianças como uma compartilham em interação com os pa-
categoria social, vai modificar as práticas res” (1997). Essas culturas influenciam
sociais e as relações intergeracionais. Na e são influenciadas pelo mundo cultural
primeira, as crianças, avaliadas por sua adulto. A tese permite uma modificação
imaturidade física e mental, são, sobretu- no olhar para suas atividades cotidianas
do, controladas tanto nas famílias quanto das crianças, ou seja, ao invés da fragili-
nas escolas e creches, tendo reduzidas dade, da incompetência, da negatividade
suas possibilidades de utilizar as próprias naturalmente atribuída aos pequenos, é
capacidades e de opinar sobre suas vidas. possível formular outras hipóteses, a par-
Nesse caso, as instituições dão voz prin- tir de suas ações concretas e simbólicas
cipalmente aos adultos que delas partici- e, mais do que isso, modificar as práticas
pam, contrariando o princípio que susten- sociais. Moss (2001) afirma que “se esco-
ta que crianças e adultos têm o direito de lhemos entender as crianças como atores
serem ouvidos individual e coletivamente sociais, como especialistas em suas pró-
sobre as questões que os afetam e têm o prias vidas, então os trabalhos futuros
direito de terem suas inquietações leva- precisam tornar suas vidas visíveis por
das a sério pela sociedade (Moss e Petrie, meio da escuta das crianças pequenas:
2004). Na segunda, são coconstrutoras elas precisam participar desses estudos.
da sociedade, conforme a quinta tese Tendo feito, eu mesmo, trabalho na área,
de Qvortrup (2011), são agentes sociais. reconheço que participação e escuta são
A agência é o compromisso construído conceitos muito complexos e problemáti-
temporalmente por atores de diferentes cos. Entretanto, há maneiras pelas quais
contextos estruturais – os quais, através podemos chegar a alguma compreensão
da interação de hábito, imaginação e jul- sobre as experiências da pequena infân-
gamento, reproduzem e transformam as cia nas instituições de educação infantil –
estruturas em respostas interativas aos elas vivem suas vidas”. (2001, p.4). Não se
problemas postos por situações históricas trata somente de uma contraposição ao
em mudança (EMIRBAYER e MISHE, 1988, adultocentrismo, desenvolvido ao longo
p.970). Corsaro (2005/2007) destaca que dos séculos, e de visibilização das crian-
a utilização desse conceito em casos con- ças, mas de reconhecimento da interde-
cretos permite romper com abordagens pendência entre gerações.
individualísticas: “a natureza relacional e
coletiva da agência, tende a suplantar o Palavras-chave: infância, sociologia da
foco no ator individual” (p.3). Argumen- infância, relações intergeracionais

768
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

PARTICIPAÇÃO INFANTO-JUVENIL cial teórico da Sociologia da Infância e da


NAS CONFERÊNCIAS DE DIREITOS Psicologia do Desenvolvimento, tomando
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE como campo empírico de análise as prá-
NO BRASIL: REFLEXÕES A PARTIR ticas nas Conferências Nacionais e Locais
DA SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA E DA dos Direitos da Criança e do Adolescente.
PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO A partir das legislações CDC (ONU, 1989)
Lirene Finkler - UFRGS/FASC, e ECA (Brasil, 1990) a questão deixa de ser
lirenefinkler@yahoo.com.br se as crianças devem participar, e passa
Ana Paula Lazaretti Souza - UFRS a ser o como e a finalidade dessa parti-
anapaula.lazzaretti@gmail.com cipação (Hinton, 2008). Assim como no
Débora Dalbosco Dell’Aglio - UFRGS artigo de Souza, Finkler, Dell’Aglio e Kol-
dalbosco@cpovo.net ler (2010) a questão geradora é o quanto
Sílvia Helena Koller - UFRGS as conferências são espaço que expressa
silvia.koller@gmail.com avanço nas condições de participação in-
fanto-juvenil no Brasil. Nesta mesa, a dis-
No decorrer dos últimos séculos, a cons- cussão será ampliada para a participação
trução da infância implicou a sucessiva em nível local e municipal, a partir da ex-
exclusão das crianças das esferas do tra- periência das pré-conferências de Porto
balho, do convívio social com adultos fora Alegre/RS no ano de 2011. Considera-se
do círculo familiar e, portanto, da par- essa reflexão pertinente, tendo em vista
ticipação na vida comunitária e política que o direito de participação está pre-
(Sarmento, Fernandes, & Tomás, 2007). sente nas legislações sendo, entretanto,
Cada vez mais heterogênea, a infância e menos enfatizado e colocado em prática
os modos de ser criança tornam-se mais do que os direitos de proteção e provisão
plurais, com novos papéis e estatutos so- (Hinton, 2008; Murray & Hallet, 2000). A
ciais, os quais vem sendo estudados tanto participação corresponde ao direito da
pela Sociologia da Infância quanto pela criança ser ativa nas tomadas de decisão
Psicologia do Desenvolvimento, em suas que afetam sua vida (Verhellen, 2000), e
diversas concepções teóricas. Ao contrá- é um tema amplamente problematizado
rio do que se poderia esperar, há cada vez pela Sociologia da Infância e de interes-
menos autonomia e maior controle, res- se para a Psicologia do Desenvolvimento.
tringindo às crianças o exercício da par- Ainda que a literatura aponte o cresci-
ticipação social. Afirma-se a cidadania da mento global nas atividades de partici-
infância, e ao mesmo tempo intensifica- pação infanto-juvenil, e um significativo
-se seu controle simbólico, no sentido de ambiente político para sustentação de
limitar seus espaços de atuação e influ- tais espaços (Hinton, 2008), as crianças
ência sobre seu contexto social e as deci- permanecem sendo o único grupo social
sões que influenciam suas próprias vidas verdadeiramente excluído de direitos po-
(Bühler-Niederberger, 2010b; Reynaert, líticos expressos (Bühler-Niederberger,
Bouverne-de-Bie & Vandevelde, 2009; 2010a). A concretização de tal direito re-
Sarmento, 2004). A presente proposta produz um desafio compartilhado entre
tem como objetivo discutir a participação as diversas sociedades: a efetivação de
social infanto-juvenil, a partir do referen- formas de participação democrática de

769
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

todos os seus membros. Ainda que exis- para uma mudança sistêmica nos modos
ta um conjunto de experiências, iniciati- de participação (Hinton, 2008). As regras
vas e lutas “por/com/das crianças”, o que fixas e procedimentos que reforçam as re-
contribui para a progressiva inclusão das lações de poder a partir dos adultos, com-
crianças na agenda sociopolítica mun- petem com um modo mais fluido e lúdico
dial, sua efetiva participação como pro- que caracteriza a infância. Por outro lado,
tagonistas acontece ainda a passos lentos essas prerrogativas de participação num
(Sarmento et al., 2007). Para responder a âmbito de conferência implicam em certo
questão proposta, inicialmente, serão ex- treinamento anterior em modalidades de
postos importantes conceitos da Sociolo- participação nos demais espaços de con-
gia da Infância relacionados ao direito de vívio da criança e adolescente ao longo do
participação, e definidos os conceitos e seu desenvolvimento/socialização (Rogo-
práticas de participação e protagonismo, ff, 2005). Entende-se que o direito à parti-
conforme problematizados pelo referen- cipação deve ser estimulado o ano inteiro
cial da Psicologia do Desenvolvimento. O nos diversos microssistemas nos quais
referencial da teoria Bioecológica do De- crianças e adolescentes se desenvolvem –
senvolvimento Humano (Bronfrenbren- família, escola, comunidade. As pré-con-
ner, 2005) é tomado como parâmetro ferências proporcionam justamente ex-
para o olhar sobre os contextos de partici- periências de participação em ambientes
pação infanto-juvenil. Após um breve his- comunitários conhecidos das crianças e
tórico acerca das Conferências Nacionais adolescentes, mas que constituem-se em
dos Direitos da Criança e do Adolescente contextos mais amplos. São necessários
no Brasil, será discutida a participação de procedimentos flexíveis para possibilitar
crianças e adolescentes nas conferências a escuta da opinião das crianças e adoles-
nacionais e municipais. Tal discussão será centes, assim como proporcionar contro-
subsidiada a) pela consulta e análise de le pelas crianças quanto ao destino dado
documentos – programas e anais das con- às suas propostas e reivindicações. Essas
ferências disponíveis em sites do Governo estratégias não devem simplesmente re-
Federal Brasileiro e registros das confe- plicar as instituições adultas de participa-
rências municipais de Porto Alegre, e b) ção política, como os parlamentos locais
pelo acompanhamento direto do proces- ou as comissões consultivas, “mas desco-
so de participação nas pré-conferências brir, através do recurso à imaginação in-
e conferência municipal no ano de 2011. terventora, modalidades de participação
Entre os resultados encontrados no estu- compatíveis com as culturas infantis, for-
do de Souza et al. (2010), o espaço das mas de comunicação atentas aos modos
conferências nacionais parece ser visto de expressão das crianças” (Sarmento et
como do outro, o saber sobre os conteú- al., 2007, p. 196). Faz-se necessária a utili-
dos em discussão parece estar com a ge- zação do lúdico, dos desenhos, de formas
ração dos adultos, que as expressa a seu alternativas de diálogo com o poder cons-
próprio modo e linguagem. A existência tituído, que deve, por sua vez, estar pron-
de uma linguagem dominante, adulta, to a receber e interpretar formas alterna-
que predomina nos espaços de decisões tivas de participação. Isso é relevante tan-
políticas, é apontada como uma barreira to nos níveis de reivindicação das crianças

770
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e adolescentes, quanto numa perspectiva volvimento. Esta perspectiva foi bastante


de acompanhamento e monitoramento criticada, sendo que muitos estudos fo-
das ações políticas implantadas. O con- ram realizados no sentido de compreen-
junto das discussões a serem apresenta- der a rua como um contexto que promove
das neste trabalho aponta que a constru- desenvolvimento, sendo que as crianças
ção de relações democráticas nos espaços ali inseridas possuíam muitas caracterís-
de vida das crianças pode contribuir para ticas comuns a todas as outras crianças,
a transformação não apenas dos sujeitos/ como por exemplo, o fato de brincarem,
atores/crianças no seu momento de vida de terem um desenvolvimento moral ou
presente, mas também para a emancipa- mesmo expectativas de futuro. No entan-
ção social e transformação da sociedade. to, muitos estudos acabaram por roman-
tizar a vida nas ruas, desconsiderando os
Palavras-chave: participação; sociologia da constrangimentos e perigos presentes
infância; psicologia do desenvolvimento. neste espaço, e os fatores sociais, histó-
Contato: Lirene Finkler, UFRGS/FASC, ricos e econômicos que influenciam esta
lirenefinkler@yahoo.com.br condição. A compreensão da realidade
das crianças em situação de rua exige a
superação dessas perspectivas antagô-
AS CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE RUA: nicas, que ora demonizam ora romanti-
DIÁLOGOS ENTRE PSICOLOGIA DO zam a realidade dessas crianças. Tal su-
DESENVOLVIMENTO E SOCIOLOGIA DA peração é facilitada no diálogo estreito
INFÂNCIA entre a Psicologia do Desenvolvimento e
Juliana Prates Santana - IP/UFBA a Sociologia da Infância, na medida em
julianapsantana@gmail.com que ambas fornecem elementos que au-
xiliam na compreensão da realidade des-
O presente trabalho pretende discutir a tas crianças, ao mesmo tempo, que pro-
importância de um diálogo freqüente e vê subsídios para uma intervenção mais
próximo entre a Psicologia do Desenvolvi- qualificada. Para ilustrar esta questão,
mento e a Sociologia da Infância na com- será descrita uma investigação participa-
preensão do fenômeno das crianças em tiva realizada com crianças em situação
situação de rua. O interesse social e cien- de rua inseridas em uma instituição de
tífico sobre esta tema teve o seu apogeu atendimento na cidade de Salvador. Esta
no final dos anos oitenta, havendo mais investigação teve por objetivos investigar
de duas décadas de pesquisas, que bus- a trajetória de vida e o cotidiano institu-
cavam entre outras questões, caracterizar cional das crianças, assim como as suas
essas crianças, suas famílias e principais produções culturais (Santana, 2008). Ao
atividades desenvolvidas na rua (Rizzini & assumir as crianças enquanto atores so-
Butler, 2003). Inicialmente eram estudos ciais competentes e produtores culturais,
que, no âmbito da Psicologia do Desen- esta pesquisa explicita elementos que pa-
volvimento e de outras disciplinas, bus- recem ser importantes na convergência
cavam assinalar os déficts destas crianças entre a Psicologia do Desenvolvimento e
quando comparadas com aquelas que vi- a Sociologia da Infância. Um deles refere-
viam em um contexto “normal” de desen- -se à necessidade das pesquisas privile-

771
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

giarem a escuta das vozes das crianças, já necessidade de estudos interdisciplinares


que como afirma Vasconcellos (2007, p. para a compreensão das infâncias e das
10), “as crianças são, sim, sujeitos plenos crianças para além das dicotomias, an-
de direito e informantes competentes de teriormente identificadas pelos teóricos
suas histórias singulares, que com espe- como sendo estruturadoras do campo
cificidades próprias expressam variadas da Sociologia da Infância. Para o autor, a
dimensões culturais, presentes em toda dicotomia entre Psicologia e Sociologia
ação/atividade humana”. Privilegiar as vo- são emblemáticas do embate entre as
zes das crianças, especificamente aquelas concepções de crianças como indivíduos
em situação de risco ou vulnerabilidade, e crianças como produção social. De acor-
como é o caso das crianças em situação do com Prout são particularmente úteis
de rua, implica em alguns desafios éticos diálogos que explicitem as similaridades e
e metodológicos, sendo que as metodolo- as diferenças desses campos, visando ao
gias participativas parecem ser uma valio- desenvolvimento de novas abordagens e
sa contribuição no processo de visibiliza- perspectivas teóricas-analíticas. De acor-
ção das vozes dessas crianças (Santana & do com Sarmento (2007), a interdiscipli-
Fernandes, 2011). Além disso, a pesquisa naridade deve ser baseada em afinidade
com crianças em situação de rua exige eletivas, sendo importante recorrer ao
do pesquisador uma postura de reflexi- conhecimento produzido por outras áreas
vidade constante já que se trata de uma de saber, sem que isso implique a nega-
dupla alteridade (Marchi, 2007), uma vez ção das tensões e contradições. Cabe des-
que as crianças em situação de rua não tacar que a pesquisa e a intervenção com
são adultos, mas também não são crian- as crianças em situação de rua se bene-
ças como as outras crianças. Outro ele- ficiam do diálogo cada vez mais próximo
mento que tem aproximado as duas áreas entre os campos de conhecimento da Psi-
de conhecimento é a investigação sobre cologia do Desenvolvimento e a Sociolo-
as produções culturais das crianças ou as gia da Infância, sendo este aspecto crucial
chamadas culturas de pares. De fato, este quando se tem em mente uma produção
parece ser um tópico de bastante con- científica implicada com as necessidades
fluência no contexto brasileiro, tanto em e demandas sociais. Dar visibilidade e voz
termos teóricos, como metodológicos, às crianças em situação de rua significa
sendo o conceito de reprodução interpre- não apenas um avanço do conhecimento
tativa o principal elo de ligação (Müller & científico, mas um compromisso efetivo
Carvalho, 2009). Por fim, um elemento com a alteração das condições de vida
crucial na área dos estudos sociais da in- destas crianças.
fância parece ser a interdisciplinaridade,
também explicitada na pesquisa e de- Palavras-chave: crianças em situação de rua,
fendida por vários pesquisadores como Psicologia do Desenvolvimento, Sociologia da
crucial no desenvolvimento da pesquisa Infância
sobre a infância e crianças (Prout, 2005; Contato: Juliana Prates Santana, IP/UFBA,
Carvalho, Müller & Sampaio, 2009). Não julianapsantana@gmail.com
se trata de uma tarefa simples, mas in-
dispensável. Prout (2005) argumenta a

772
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

PSICOLOGIA DA CRIANÇA E SOCIOLOGIA geracional construída social e historica-


DA INFÂNCIA: PARADIGMAS RIVAIS OU mente e das crianças como atores e au-
COMPLEMENTARES? tores sociais. Esta outra abordagem das
Vera M. R. de Vasconcellos - FE/UERJ ciências sociais e humanas tem produzido
vasconcellos.vera@gmail.com discursos que colocam a Educação como
propriedade intrínseca e constitutiva do
Neste trabalho pretendemos estabelecer “ser criança”. Assim procedendo, chama
um diálogo entre os princípios da Psico- a atenção para se pensar a criança não
logia do Desenvolvimento, que estudam só enquanto aluno (a) da escola, mas sim
a infância e as crianças, privilegiando a como participante de outros lugares da
matriz sócio-histórica e cultural do de- vida social e de outros espaços socioedu-
senvolvimento humano e a Sociologia da cativos. A Sociologia da Infância aparece
infância, a partier dos princípios traçados na contramão de uma Sociologia da Edu-
nos trabalhos mais contemporâneos da cação ou da Família, que sempre teve por
área (Sarmento &Gouvêa, 2008; Rocha & tradição observar as crianças no papel de
Ferreira, 2011). Iniciamos, por apresentar aluno ou de filho. Nos aproximamos de
a Psicologia do Desenvolvimento como uma releitura crítica feita pela Sociologia
uma área do conhecimento das ciências da Infância que toma o campo da infância
sociais e humanas que se constituiu, his- interpretando as crianças como sujeitos
toricamente, em diálogo com a Infância. em condição de desenhar e interpretar
Com ela fala-se de gêneses da origem, do as suas próprias vidas. Vendo as crianças
início da infância da Psicologia da Infância como portas de entrada fundamentais na
(Kohan, 2003). E pergunta-se: o que fez a reflexão da realidade social contemporâ-
Psicologia com o conhecimento acumula- nea (Sarmento, 2005; 2006). Tal propósi-
do de tanto estudar a criança? o que fez to traduz-se numa perspectiva distinta de
a Psicologia com as imagens de infância análise da Educação, da escola ou outros
e criança que construiu ao longo de todo contextos socioeducativos, privilegiando,
o século XX – Século da Criança? a quem no plano teórico, a análise da situação so-
a Psicologia serve/serviu quando fala de cial das crianças como atores e autores de
Infância? E em que momento a Psicolo- seu próprio desenvolvimento. No plano
gia deixa de falar das/sobre as crianças e metodológico, busca-se ouvir as crianças
começa a falar com as crianças? (Vascon- reconhecendo-se os sentidos e significa-
cellos, 2008). Com estas questões temos dos por elas construídas do ser criança e
por objetivo compreender como os con- ter direito à infância. Entende-se que em
ceitos de infância e criança vêm mudando ambos os campos teóricos, o foco incide
na Psicologia e influenciando a Educação, prioritariamente na análise da interação
e como tais mudanças têm marcado os te- de crianças versus o dispositivo institucio-
mas em estudo e as práticas, tanto de pes- nal, na aprendizagem versus o ensino e na
quisa quanto de ensino, além da atuação criança como ator/autor e sujeito social
profissional dos psicólogos e educadores. versus o estatuto e papéis sociais por elas
Num segundo momento, compreende- assumidos (Ferreira, 2008). Produzida na
mos a Sociologia da Infância, constituída visibilidade e reconhecimento epistemo-
na dupla visão de infância como categoria lógicos das crianças e seus modos de vida,

773
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a compreensão sociológica e psicológica nas práticas educiacionais, nas premissas


que a Sociologia da Infância e a Psicologia institucionais, alterando interesses cultu-
da Criança inscrevem-se no duplo movi- rais, sociopolíticos e econômicos a’i exis-
mento de deslocamento do olhar analítico tentes (Vasconcellos, 2006). Mais que pa-
e de exploração do objeto que reconfigura radigmas rivais, que competem entre si,
as tendências da Sociologia e da Psicologia a Sociologia da Infância e a Psicologia do
da Educação contemporâneas, colocando Desenvolvimento, que estuda a criança,
agora ambas as ciências “do mesmo lado colaboram com a Educação no momento
da balança”. Busca-se com isso a produ- em que suas reflexões expandem e apon-
ção de estímulos para o investimento e tam espaços de diálogo que ampliam o
ampliação dos estudos da infância, pela conhecimento sobre/da Infância. Temos
prática da interdisciplinaridade. Neste por compromisso comum situar a Infân-
sentido, a presente comunicação apoia-se cia no centro das reflexões das Ciências
nos dados de levantamento bibliográfico do Homem (Vasconcellos, 2008). Este de-
obtidos na interlocução de dois projetos safio conceitual é um empreendimento
de investigação, financiados pela FAPERJ, ético e político, que atravessa as práticas
intitulados: Creche: Contexto de Desen- educacionais influenciadas pelas dife-
volvimento e Formação de Subjetividade rentes concepções teóricas encontradas
(E-26/110.234/2007) vigência 2007008 no levantamento bibliográfico realizado.
e Agente Auxiliar de Creche: educadores Acreditamos que é o desafio de impedir
da infância carioca (E-26/102.961 /2008), toda e qualquer simplificação e redução
com vigência 2009-011. Em nossas buscas na forma de se pensar o ser humano e
verificamos que a Infância está no centro a(s) ciência(s) a ele dedicadas, que têm
do pensamento da Psicologia há mais de inspirado nossas reflexões e pesquisas
um século. Muitos foram os caminhos com e sobre as crianças. Simultaneamen-
e, portanto, também os descaminhos e te, as discussões teóricas das Ciências
erros cometidos nessa trajetória, o que Humanas atravessam as práticas sociais
expõe a Psicologia da Infância, mais que influenciadas pelas perspectivas éticas e
qualquer outra ciência, às críticas de suas políticas das diferentes concepções teó-
jovens parceiras, dentre elas a Sociologia ricas de desenvolvimento humano. Por-
da Infância, na (re)descoberta da Infância. tanto, enquanto estudiosos da Infância
Verificamos também que ainda há muito precisamos construir novos patamares
a fazer para compreender e criar formas complementares de compreensão, pois
de entender e interpretar o ser humano quando os paradigmas disputam entre si
histórico, e dentre eles estão as crian- a hegemonia do conhecimento das pecu-
ças. Precisamos melhor descrever seu liaridades da Infância, são as crianças que
processo de desenvolvimento, e de estar perdem e com elas perdemos todos nós
no mundo, ao mesmo tempo analisar, de como sociedade.
forma crítica, as ciências a ele dedicadas.
Entendemos que os conceitos que vão Contato: Vera M. R. de Vasconcellos, FE/UERJ,
sendo reconstruídos no interior das te- vasconcellos.vera@gmail.com
orias, sejam elas da Psicologia ou da So-
ciologia, passam a interferir diretamente

774
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

MR LT05 na construção da política de saúde. Nesse


sentido, a psicologia do desenvolvimento
Mesa Redonda humano aborda parâmetros semelhantes.
Uma de suas dimensões, a sócio-histórica,
sociogenética (Vygotsky, 1984) está con-
MR LT05-1499 - FAMÍLIA:
templada pelo construto sociocultural,
DESENVOLVIMENTO E PROMOÇÃO DA
que por sua vez, se refere a relevância do
SAÚDE
sujeito ativo, co-construtivo e participante
Júlio César dos Santos - UFRB de seu próprio desenvolvimento (Valsiner
economiadasaude@ufrb.edu.br 2007). Nesse aspecto, o desenvolvimento
Silvia Renata Lordello - NASAD será facilitado pela família, como unidade
srlordello@terra.com.br microssistêmica dos primeiros cuidados
Etiene Oliveira Silva Macedo - UnB em saúde como também contribuidora
etienemacedo@gmail.com para o desenvolvimento humano. Estes
três entes: a visão ampla da saúde, a psico-
Esta mesa será composta por três pesqui- logia do desenvolvimento e sua dimensão
sadores de instituições diferentes. O foco cultural contribuem para os estudos em
central dos estudos realizados tem proxi- desenvolvimento familiar. Para debater
midade com a temática da família e inter- investigações próximas a esse conceito um
faces no desenvolvimento e na saúde. Esta dos autores discutirá que o investimento
última tem conceitos que historicamente na gravidez representa uma grande con-
foram se formando. Para a Organização tribuição à promoção de saúde, pois an-
Mundial de Saúde – OMS (1948) a saúde tecipa conteúdos e atitudes que preparam
é um completo bem estar físico, mental os pais para o exercício da parentalidade
e social. Esse conceito carrega um anseio saudável, tão desejável e necessária à che-
político dos movimentos sociais do pós- gada dos filhos. O outro autor tem uma
-guerra. Uma das críticas a esse conceito proposta: pensar a promoção da saúde em
era que se constituía um desafio aos policy estreita interdependência com os fatores
markers da saúde. Em decorrência da pri- psicossocioambientais e a psicologia na
meira objeção, surge o conceito de Chris- interface com a atenção integral à saúde
topher Boorse (1977): saúde é ausência de dos adolescentes, entendendo que uma
doença. Mas como a saúde era a contra- permanente reflexão fomenta na prática, a
partida da doença o objetivo dos líderes possibilidade, aos adolescentes, da vivên-
de saúde era somente diminuir os males cia sócio-afetiva e o acesso a variados tipos
da região sob sua direção. A resposta foi de expressões e autodescoberta de habi-
A Conferência de Alma-Atá, que ampliou lidades, potencialidades e limitações. Já o
o conceito da saúde para a esfera política último autor propõe que o programa de
e social. Em seu relatório final destaca os planejamento familiar segundo a perspec-
cuidados primários de saúde, nos seguin- tiva do desenvolvimento pode ser um mé-
tes parâmetros: educação em saúde, nutri- todo mais adequado para atingir as metas
ção adequada, saneamento básico, cuida- do governo em relação ao planejamento
dos materno-infantis, planejamento fami- familiar e as melhorias sociais. O modelo
liar, além da participação da comunidade investigado em sua pesquisa com grupos

775
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de adolescentes foi satisfatório conside- abaixo da linha da pobreza; b) grupo de


rando o custo-efetividade. Esse procedi- famílias cujos adolescentes estavam nas
mento é favorável para implantação do escolas públicas c) grupo de famílias que
programa como política pública, pois atin- utilizaram o salário maternidade. O nú-
ge um maior número de pessoas com um mero de famílias participantes por grupo
efeito desejável, reduzindo custos. foi definido a partir dos alunos - adoles-
centes de escolas públicas estaduais que
consentiram na participação da pesquisas.
O DESENVOLVIMENTO FAMILIAR: UMA Para garantir um poder estatístico de 80%
VISÃO DOS ADOLESCENTES a amostra foi de 150 famílias em média di-
Júlio César dos Santos - UFRB vididas nos grupos. O estudo foi iniciado
economiadasaude@ufrb.edu.br com a realização de um estudo piloto. A
Financiamento: CAPES avaliação do sistema familiar foi realizada
por um questionário com itens demográfi-
Os serviços de planejamento familiar tra- cos e econômicos da população envolvida.
dicionais atuam em função da vida repro- Dados primários: a avaliação do sistema
dutiva com responsabilidade exclusiva- familiar foi realizada por um questioná-
mente feminina e prioridade social. As op- rio com questões demográficas e sócio-
ções contraceptivas mais utilizadas pelas -econômicas da população como idade
mulheres são sugeridas pelos serviços de reprodutiva, número de filhos, urbano/
saúde e requerem desenvolvimento tec- rural. Os instrumentos de pesquisa foi in-
nológico e monitoramento médico. Além ventário do clima familiar (ICF – Teodoro,
das falhas dos atuais modelos de planeja- 2008). Para a intervenção foi desenvolvido
mento familiar, a presença dos benefícios um programa baseado na terapia familiar
sociais durante a gestação tem sido favo- consistindo de orientações sócio-educati-
rável ao aumento do número de adoles- vas seguida de tarefas para que os parti-
centes grávidas, provocando problemas cipantes percebam o efeito da mudança.
educacionais como a evasão e um ônus Através de sessões realizadas com a famí-
excessivo para o sistema previdenciário. O lia serão focalizados os seguintes temas:
salário-maternidade é o segundo benefí- educação, lazer, habitação, relação fami-
cio mais pago no Recôncavo da Bahia. Por- liar, valores, orçamento doméstico, saúde,
tanto o objetivo geral deste estudo é ela- sexualidade e afetividade. Este momento
borar um modelo de avaliação e interven- é de discussões com o grupo familiar nas
ção fundamentadas no desenvolvimento conclusões em que chegaram cada mem-
familiar para famílias de baixa renda de bro da família sobre as situações de con-
Santo Antônio de Jesus - BA, com impac- flito, os fatores externos e internos que
tos positivos na educação básica dividida interferem no seu desenvolvimento e na
entre a família e a escola. Os participan- unidade familiar. Diante disto, será reali-
tes do estudo foram adolescentes e suas zada dinâmica de grupo que promovam a
famílias de baixa renda de Santo Antônio conscientização sobre os processos espe-
de Jesus-BA, divididas em três grupos: a) cíficos e amplos abordados nestas ações.
grupo de famílias que utilizam os progra- As sessões de orientação social educativa
mas sociais do governo federal e estavam tiveram duração de 60 minutos. A análise

776
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos dados foi dividida em três etapas: es- diversas questões do desenvolvimento
tudo de caso; efeito da intervenção intra- familiar tais como: afetividade; conflito;
-grupo e inter-grupo. Entre as questões de comunicação; orçamento doméstico; mo-
pesquisa estão: O planejamento familiar é radia; segurança; sexualidade; educação
uma política de saúde que não atinge as e saúde. Através do programa espera-se
populações da baixa renda? Nestes des- mudanças nas relações familiares e que
níveis educacionais o que ocorre com o o desenvolvimento da família seja plane-
processo cultural? Desta forma, num am- jado. Os resultados demonstram inicial-
biente onde o relacionamento entre os mente que as relações afetivas podem ser
membros se dá de forma harmoniosa é definidas como fatores de proteção para
possível que adolescentes o tenha como o desenvolvimento dos adolescentes,
o ideal para suportar as transformações evitando ou diminuído o impacto dos di-
que ocorrem neste período de transição versos problemas emocionais que podem
da fase de criança para o início da vida surgir. Os resultados foram mais efetivos
adulta. A qualidade da relação com a fa- na preparação desse adolescentes para
mília tem um impacto importante em a construção de suas famílias. O planeja-
vários aspectos da vida do adolescente mento realizado por cada adolescente foi
como, por exemplo, na formação do au- útil no sentido de demonstrar todos os
toconceito que, segundo Peixoto (2004), é elementos que precisam ser considerados
desenvolvido por influência das avaliações para o desenvolvimento familiar. Os resul-
feitas por diferentes membros da família tados precisam ser analisados a partir das
relacionadas com as representações que limitações do estudo como a dificuldade
os adolescentes fazem de si mesmo. As re- de conciliação do processo de intervenção
lações familiares foram o foco dos proce- com o calendário escolar, o que muitas
dimentos de intervenção. Durante a apli- vezes atrasou a aplicação dos procedi-
cação dos procedimentos de intervenção, mentos. Os resultados demonstram que
realizada prioritáriamente nas escolas, foi o programa de planejamento familiar na
possível perceber a dificuldades que os perspectiva do desenvolvimento contribui
adolescentes tinham de falar sobre os con- com o bem estar de adolescentes, melho-
flitos familiares. A principal preocupação rando de forma significativa a afetividade
era se os pais teriam acesso as informa- entre os mesmos, e suas respectivas famí-
ções coletadas. Essa dificuldade demons- lias. Assim, a intervenção contribuiu para
trou que os problemas familiares eram a redução dos sintomas depressivos e me-
ciclicos e que romper com os mesmos não lhora na saúde percebida dos adolescen-
dependeria apenas das ações da interven- tes. Esse resultado também foi acompa-
ção, mas sim da capacidade de cada estu- nhado por uma melhora significativa nas
dante de aplicar as orientações recebidas. relações familiares. Esses resultados são
O Programa de Planejamento familiar na efetivos e já sugerem que o programa de
Perspectiva do Desenvolvimento tem o planejamento familiar segundo a perspec-
formato de passo a passo, constituído de tiva do desenvolvimento pode ser um mé-
atividades realizadas pelos participantes, todo mais adequado para atingir as metas
sendo os mesmos a gente de sua própria do governo em relação ao planejamento
transformação. Esse modelo aborda as familiar e as melhorias sociais. O modelo

777
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

evidenciou que o trabalho com grupos de marcados. Do ponto de vista jurídico, o


adolescentes foi satisfatório considerando Brasil fez avanços, ao compreender esse
o custo-efetividade. Esse procedimento período como aquele que ocorre dos 12
é favorável para implantação do progra- aos 18 anos e conceber crianças e adoles-
ma como política pública, pois atinge um centes como sujeitos em condição pecu-
maior número de pessoas com um efeito liar de desenvolvimento, por isso, inimpu-
desejável, reduzindo custos. táveis nos âmbitos civil e criminal (Brasil,
1990). Diversas áreas do conhecimento
Palavras-chave: planejamento familiar, procuram então inscrever essa adoles-
afetividade, conflito cência num fenômeno explicável, e vão
Contato: Julio César dos Santos, UFRB, se instituindo assim, a normativa jurídica,
economiadasaude@ufrb.edu.br pedagógica e médica, que visam oferecer
os contornos para esse conceito. Embora
haja uma multiplicidade de olhares, é con-
ADOLESCÊNCIA E PROMOÇÃO DA senso que se trata de um momento dis-
SAÚDE: IMPLICAÇÕES CONCEITUAIS tinto no processo de desenvolvimento hu-
E PRÁTICAS PARA A ATUAÇÃO DA mano, entre a infância e a vida adulta. Fato
PSICOLOGIA é que a temática da adolescência mobiliza
Etiene Oliveira Silva Macedo - UnB as sociedades. Na atualidade, comumente
etienemacedo@gmail.com encontramos definições para os adoles-
Financiamento: CNPq centes como incompreensíveis, inacessí-
veis ou difíceis, presentes no cotidiano,
O conceito de adolescência faz referên- por meio do discurso de pais, profissionais
cia a variados indicadores: faixa etária, da saúde e educação e nos veículos de co-
período da vida, categoria social, que de municação. Para Rios (2002), vigora nos
alguma forma, estão vinculadas aos li- dias atuais o caráter adultocêntrico, que
mites etários, para marcar esse período concebe uma adolescência irresponsável,
transicional entre infância e a maturida- instável, rebelde e imatura. A concepção
de. O clássico, História social da criança de adolescência subjacente a qualquer
e da família (Ariès, 1981), mostra como a serviço oferecido a essa população traz,
adolescência começa a ser privilegiada no pois, implicações para as atividades que
século XVIII quando infância e adolescên- vão ser realizadas. No campo das políti-
cia ainda não eram diferenciadas e, como cas de saúde, por exemplo, a Organização
ganha atenção na sociedade ocidental ca- Pan-americana de Saúde, observa que as
pitalista, durante o século XX. Para a Orga- ações voltadas para os adolescentes limi-
nização Mundial de Saúde, a adolescência tam-se à educação pela informação em
é o período entre os 10 e 19 anos, marca- relação a comportamentos problemáticos
do por mudanças biopsicossociais (WHO, específicos, tardiamente, quando estes já
1975). O enfoque biomédico caracteriza comparecem como uma questão de saú-
esse período como marcado por intensas de pública, evidenciados em dados epide-
mudanças físicas, psicológicas e sociais, miológicos. É o caso das ações que visam à
cujo fio condutor, é a puberdade, que, prevenção de doenças sexualmente trans-
nessa perspectiva tem seu fim e início de- missíveis, uso de drogas e violência. O en-

778
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foque das ações torna-se, deste modo, es- de não só se modifica o comportamento,
tritamente verticalizado e limitado (Burt, como também as próprias forças motrizes
1998). Reconhecendo a diversidade de também são modificadas, a partir de no-
experiências, condições de vida, carac- vos objetos incitadores que são criados
terísticas raciais, étnicas, econômicas e pelo homem. Na adolescência se mani-
culturais, dentre outras, o Ministério da festam as relações entre as necessidades
Saúde adotou a expressão “adolescências biológicas e as constituídas historicamen-
e juventudes”, com o objetivo de compre- te, que, dada à multiplicidade de interes-
ender essa multiplicidade de fatores, num ses que vão se desenvolvendo, cooperam
continuum, que implica em experiências para a ocorrência de profundas mudan-
diferenciadas com significados específi- ças nessas necessidades e aspirações. De
cos (Brasil, 2010, p. 46). Nessa perspecti- acordo com o autor, é nessa fase que vão
va, para além de extirpar os “males” que emergir novas possibilidades, novos obje-
acometem essa população, sugere-se que tos capazes de modificar os interesses e
as ações considerem três dimensões: a incitar novas necessidades, até então des-
macrossocial, relacionada às questões de conhecidas da criança. Sugerindo, então,
classe, desigualdades, gênero e etnia; a pensar os processos de subjetivação na
institucional, que diz respeito aos disposi- adolescência a partir da abordagem his-
tivos de ensino, às relações produtivas e tórico-cultural de Vygotsky e autores con-
de mercado e a biográfica, inscrita na tra- temporâneos (González Rey, 2003; Madu-
jetória pessoal do adolescente. Assim, ao reira & Branco, 2005, dentre outros) na in-
se desenvolver ações voltadas para esses terface com a condição humana, em lugar
sujeitos é necessário colocar em questão da natureza humana, pretende-se discutir
imagens estigmatizadas que atravessam o sobre a inserção da psicologia no âmbito
conceito de adolescência. Compreendê-la do sistema único de saúde, com os servi-
a partir de modelos socialmente desfa- ços oferecidos a essa população. Como as
voráveis, alude a uma forma equivocada ações desenvolvidas por esse profissional
de abordagem, pois reafirma um modelo podem favorecer o desenvolvimento inte-
estereotipado de ser adolescente (Toneli, gral desses sujeitos, conforme preconiza
2004). No estudo em questão, pretende- a normativa constitucional? Para além da
-se propor a concepção de adolescência simples transposição do modelo clínico
como uma categoria situada no contexto, hegemônico da psicoterapia individual,
o que possibilita sua despatologização. A centrada no modelo curativo, problema-
perspectiva da teoria histórico-cultural, tiza-se a necessidade de um reordena-
desenvolvida por Vygotsky (1996) con- mento prático e também paradigmático
cebe esse “momento”, no processo do da Psicologia (Boing, 2009), de modo que
desenvolvimento humano como uma ca- contribua para a transformação social e
tegoria gerada pela interação das pessoas para legitimar a condição de sujeitos em
com o seu meio. Durante a adolescência, desenvolvimento dos adolescentes. A pro-
transformações significativas ocorrem. Ao posta é pensar a promoção da saúde em
longo do desenvolvimento humano as for- estreita interdependência com os fatores
ças motrizes é que vão pôr em movimento psicossocioambientais e a psicologia na
os comportamentos. Em cada nova ida- interface com a atenção integral à saúde

779
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos adolescentes, entendendo que uma gravídico puerperal, que compreende não
permanente reflexão em relação a esses só o pré-natal, mas inclui ainda o parto e
posicionamentos conceituais fomenta na o puerpério, vem se mostrando benéfica,
prática, a possibilidade, aos adolescentes, como processo privilegiado de construção
da vivência sócio-afetiva e o acesso a va- e compreensão do sentido subjetivo da
riados tipos de expressão, autodescoberta maternidade e da complexidade de emo-
e o encontro com suas próprias habilida- ções envolvidas nesta elaboração psíquica.
des, potencialidades e limitações (Traver- Além disso, a natureza profilática da in-
so-Yépez & Pinheiro, 2002). tervenção psicológica junto a este público
tem apresentado uma rica contribuição à
Palavras-chave: adolescência, promoção da prevenção da depressão pós-parto e ou-
saúde, Sistema Único de Saúde tras sintomatologias puerperais que se
Contato: Etiene Oliveira Silva de Macedo, alimentam de sinais ansiógenos, expres-
Secretaria de Estado de Saúde-DF, UnB, sos ao longo da gestação. Uma vez não
etienemacedo@gmail.com tratados, estes sinais podem exacerbar-se
na forma de quadros patológicos. O fato
de a gestação desencadear estados orgâ-
IMPLANTAÇÃO DE PRÉ-NATAL nicos e emocionais intensos faz com que
PSICOLÓGICO NO GRUPO DE este público seja alvo de intervenções de
ADOLESCENTES GRÁVIDAS: UMA diferentes naturezas. Segundo Serruya,
VISÃO INDISSOCIÁVEL ENTRE SAÚDE E Cecatti e Lago (2004), nos serviços públi-
DESENVOLVIMENTO HUMANO cos de saúde, inicialmente o trabalho era
Silvia Renata Lordello - NASAD voltado à gestante com vistas ao cuidado
srlordello@terra.com.br infantil. A saúde da mulher ganhou desta-
que somente em 1983 com a criação do
Numa perspectiva desenvolvimental, o Programa de Assistência Integral à Saúde
investimento na gravidez representa uma da Mulher (PAISM). Em 2000, foi instituído
grande contribuição à promoção de saú- o Programa de Humanização no Pré-natal
de, pois antecipa conteúdos e atitudes e Nascimento (PHPN), que preconizava a
que preparam os pais para o exercício da humanização da assistência obstétrica e
parentalidade saudável, tão desejável e neonatal como condição privilegiada para
necessária à chegada dos filhos. Sendo o adequado acompanhamento do parto e
esta uma transição ecológica das mais puerpério, mas que na visão dos autores,
significativas, a gravidez é um período de permanece um desafio à assistência por
grandes transformações, de mudanças fí- configurar-se ainda em modelos restritivos
sicas e emocionais, de planejamento de medicalizantes e hospitalocêntricos. Há na
vida, ressignificação de papéis e de re- literatura, várias iniciativas em torno de
lacionamentos. As vivências do período atendimento às gestantes (Durães-Pereira,
gravídico podem ocorrer de forma angus- Novo & Armond, 2007; Melleiro & Gualda,
tiante porque não se limitam ao plano 2004; Nagahama & Santiago, 2006; Ser-
orgânico, mas remetem à configuração ruya, Cecatti & Lago, 2004) que enfatizam
subjetiva e à significação da maternidade. avaliações dos programas destinados à
A intervenção psicológica ao longo do ciclo gestantes na saúde pública e em hospitais

780
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

universitários. O que há de comum é a ne- o atendimento a dúvidas específicas pelos


cessidade de escuta e diálogo e o espaço especialistas. O pré-natal psicológico, de
de acolhimento das angústias vivenciadas acordo com Bortoletti (2007), tem como
pelas gestantes, o que muitas vezes não é objetivo a prevenção de transtornos psico-
contemplado nos serviços. De acordo com lógicos, que contemple as angústias perti-
Maldonado (2002), um grupo que atue nentes ao casal grávido que, uma vez ali-
com gestantes deve preconizar a expressão viadas, permitirão a vivência saudável do
de sentimentos positivos e negativos que ciclo gravídico puerperal. Ao contrário do
envolvem a gestação e compartilhar vivên- curso de gestantes, o pré-natal psicológi-
cias comuns em relação à maternidade e co não deve privilegiar somente aspectos
às modificações conseqüentes. Segundo informativos, mas deve incluir ainda um
a autora, é pelo manejo da ambivalência trabalho corporal com vistas a priorizar a
afetiva que se minimizam sentimentos de exteriorização e expressão dos conteúdos
culpa. Ao contrário de ignorá-los, é aco- psíquicos envolvidos, interpretados à luz
lhendo o que há de negativo e hostil que da psicodinâmica do ciclo gravídico puer-
haverá a oportunidade de ressignificá-los, peral. De acordo com a autora, o trabalho
em processo de maternagem sadia, não pressupõe uma personalização e evita a
idealizada, que inclua imperfeições e inse- organização diretiva por conteúdos aprio-
guranças e que permita a construção pro- rísticos ao casal, entretanto é possível o
gressiva de sentimentos, defendendo uma atendimento a grupos, desde que obser-
vinculação afetiva que ocorre por conquis- vadas as indicações de adequação desta
ta e não por instinto. A historicidade das proposta aos participantes em questão.
intervenções psicoprofiláticas com relação O conceito de pré-natal psicológico vem
à gestação sempre estiveram limitadas à sofrendo interferências do contexto sócio-
facilitação do parto, por este demandar -cultural, e em nível de aplicabilidade, re-
tentativas de redução dos sintomas ansió- cebe a contribuição atual dos primeiros
genos envolvidos, como apontam os estu- delineamentos na intervenção psicológica
dos de Maldonado (2002). De acordo com baseada em seus pressupostos. O presen-
Bortoletti (2007), há diferenças entre cur- te trabalho tem por objetivo realizar uma
sos de gestantes oferecidos por psicólogos proposta de intervenção que se baseia
como parte de seus serviços e a psicopro- em pressupostos do pré-natal psicológi-
filaxia denominada como pré-natal psico- co, com vistas a acolher as angústias das
lógico. Para a autora, o curso de gestantes adolescentes gestantes e oportunizar um
difere em objetivo e estrutura, pois traba- espaço de expressão das vivências afetivas
lha com aulas e conteúdos pré-definidos com o bebê, além da inclusão de esclare-
para casais grávidos e gira em torno de cimentos de cunho informacional a respei-
uma proposta informacional com diferen- to do processo gestacional. Voltada para
tes profissionais, cada qual esclarecendo acolher comunidade do entorno do DF, a
sobre sua área. A intenção é que represen- proposta sofreu adaptações com vistas à
te um investimento no período pré-natal exeqüibilidade. Buscando investigar e in-
que instrumentalize teoricamente o casal tervir sobre tais transformações, o traba-
para as vivências futuras de parto, primei- lho consiste de uma pesquisa qualitativa
ros cuidados com o bebê recém-nascido e sobre programa de intervenção elaborado

781
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a partir das necessidades apontadas por MR LT02


adolescentes grávidas de uma comuni-
dade do entorno do DF. O grupo já é ati-
Mesa Redonda
vidade regular do Programa de Atenção
Integral à Saúde do Adolescente (PRAIA)
MR LT02-704 - NARRATIVA,
desta regional e é desenvolvido em uma
DESENVOLVIMENTO E INTERVENÇÃO
Unidade Básica de Saúde. O programa é
coordenado por uma médica ginecolo-
gista que participou junto à psicóloga da Recentemente, os processos através dos
condução dos encontros. Participaram quais as pessoas constroem significados
das sessões uma média de 25 gestantes sobre o mundo em que vivem e sobre si
com idades entre 14 e 18 anos. Foram mesmas têm merecido destaque na pes-
realizados sete encontros, contemplando quisa sobre o desenvolvimento. A visão
temáticas como: desenvolvimento do feto, de desenvolvimento como um processo
dor do parto, comunicação pais e filhos e interativo, mediado pela cultura, contex-
educação. Três encontros foram interdis- to, linguagem e interação social tem sido
ciplinares, contando com profissionais de um enfoque prevalente no atual campo
áreas afins como nutrição, enfermeira e do desenvolvimento cognitivo (Hudson,
dentista. Os companheiros das gestantes Lucariello, Fivush & Bauer, 2004). Nes-
eram solicitados a participar, bem como as ta linha, a linguagem é entendida como
mães ou tias, porém ao longo das sessões, emergindo do progressivo conhecimento
por se tratarem de grupo aberto, houve que a criança tem sobre o mundo que a
uma média de 5 companheiros por encon- cerca e, por sua vez, estas emergentes
tro. Os resultados obtidos demonstraram habilidades linguísticas mudam a forma
que as gestantes, a cada sessão, validavam como elas interagem com os outros. A
a participação nos encontros, relatando linguagem é entendida como um instru-
várias mudanças na relação com o bebê, mento representacional para ambos, a
diminuição de angústias e fortalecimento comunicação com os outros e a organi-
da rede social de apoio. Foram discutidas zação da própria cognição. Dentro deste
a inserção de um trabalho de promoção enfoque, a narrativa ocupa atualmente
de saúde em comunidade, visando a psi- um lugar de destaque uma vez que seria,
coprofilaxia da clientela, bem como a rele- nas palavras de Bruner (2002), uma for-
vância de propostas de intervenção psico- ma não somente de representação, mas
lógica, do ponto de vista social e científico, de constituição da realidade. Definir nar-
favorecendo a vivência saudável da rela- rativa, no entanto, não é uma tarefa fácil,
ção mãe-bebê. uma vez que o termo narrativa carrega
consigo vários significados e é usado de
Palavras-chave: gestação, psicoprofilaxia, modos variados por diferentes discipli-
maternidade nas. Uma das formas de considerá-la é
Contato: Silvia Renata Lordello, Núcleo de como uma ferramenta mediacional que
Atenção Integral à Saúde de Adolescentes - opera entre os indivíduos e grupos e a
Secretaria de Estado da Saúde, UnB, srlordello realidade tendo, como consequência, um
@terra.com.br poderoso impacto no desenvolvimento

782
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cognitivo. Este entendimento de narrati- MICROANÁLISE DE NARRATIVAS


va como mediador para o desenvolvimen- INTERACIONAIS CONSTRUÍDAS POR
to em distintos contextos e situações é o ADOLESCENTES EM AMBIENTE VIRTUAL
adotado nesta mesa redonda. Assim, di- Gabriela Sagebin Bordini - UFRGS
ferentes espaços criados para narrar são charlestonbordini@yahoo.com.br
descritos: no contexto da escola infantil,
Financiamento: CNPq
a mãe e seu filho contam-se mutuamente
uma história e a habilidade narrativa da A linguagem é fundamental tanto na trans-
criança, assim como o estilo materno de missão quanto na construção das catego-
narrar, foram analisados com referência rias de classificação da realidade e das con-
à coerência narrativa de ambos e aos in- cepções culturais. Conforme Bruner (1998,
dicadores do desenvolvimento da teoria não há mundo independente da atividade
da mente; uma oficina do conto foi criada mental humana, da linguagem, pois é atra-
no contexto de uma instituição de acolhi- vés de procedimentos simbólicos que o ser
mento para investigar como a mediação humano constrói a realidade. Isto é, os sig-
do outro social possibilitou o desenvol- nificados não provêm das coisas, mas são
vimento do enredo narrativo, analisado fruto da linguagem, que as classifica (Hall,
através dos aspectos estruturais e conver- 1997). Quando, àquilo que ainda não tinha
sacionais da narrativa, e por meio deste sido categorizado, se atribui um significa-
enredo o acesso às respectivas histórias do baseado em padrões vigentes, não se
de vida; narrativas autobiográficas de pode esquecer que esses padrões foram
pré-adolescentes sobre experiências en- instituídos justamente na linguagem. Evi-
volvendo emoções são analisadas quanto dencia-se, assim, o poder da linguagem,
a sua coerência e relacionadas ao hábito enquanto espaço de construção e de hie-
de conversar sobre emoções com os pais rarquização das realidades. Nesse proces-
no contexto de suas casas. Os efeitos des- so, destaca-se o papel na narrativa, visto
se contexto conversacional nas autobio- que o indivíduo, ao construir histórias e
grafias são discutidos; grupos online sín- ter contato com as histórias dos outros, dá
cronos foram criados no contexto escolar sentido à sua experiência e à sua realidade
para investigar o processo interativo de (Bruner, 1997). Além de uma prática social,
construção de identidades de gênero de o contar histórias é uma atividade organi-
adolescentes. O acesso a estas constru- zadora da vida mental do sujeito, através
ções foi feito através de microanálises das da qual ele conhece a si mesmo (Lopes
narrativas interacionais produzidas pelos de Oliveira, 2006). Dessa forma, observa-
adolescentes. Os exemplos trazidos sobre -se a importância da interação narrativa
os usos da narrativa em vários contextos na construção das identidades. As identi-
e para a investigação de vários aspectos dades de gênero, por exemplo, não estão
da organização do self indicam a impor- contidas nos indivíduos. Estas são produ-
tância da utilização desta ferramenta para zidas e, ao mesmo tempo, reguladas pelo
ampliar as possibilidades de desenvolvi- discurso (Butler, 2003). Ou seja, através da
mento e ao mesmo tempo pensá-la como repetição de normas ou práticas que, em
ferramenta de intervenção. uma dada cultura, são tidas como cons-
tituintes de uma identidade, produz-se

783
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

determinada identidade. Assim, questões em que os personagens das histórias e si-


culturais – normatizantes e reguladoras tuações contadas são colocados pelo gru-
– direcionam o indivíduo a determinadas po; (b) um nível no qual se analisam as po-
identidades. Isso não quer dizer que as sições e os papéis assumidos pelos compo-
pessoas não questionem essas repetições, nentes do grupo – uns em relação aos ou-
oferecendo resistência às construções es- tros – durante as interações; e (c) um nível
tabelecidas e fixadas pela sua própria rei- que aborda as posições dos participantes
teração (Butler, 1999). É esse processo in- frente aos discursos culturais hegemôni-
terativo de construção das identidades de cos e a influência destes na construção das
gênero, com suas repetições, resistências identidades dos membros do grupo. Neste
e ambiguidades, que se procurou abarcar trabalho apresenta-se uma microanálise
na pesquisa aqui descrita. O objetivo do de dois trechos considerados ilustrativos
presente trabalho é apresentar e discutir do processo de construção das identida-
a microanálise de narrativas interacionais, des de gênero dos adolescentes partici-
revelando os benefícios dessa técnica para pantes. Esses trechos de interação foram
o estudo das identidades. Apresenta-se produzidos em dois dos grupos focais on-
um recorte de um estudo realizado acer- line realizados. Os grupos contavam com
ca das concepções dos adolescentes sobre adolescentes de ambos os sexos; sendo
o que é ser homem e o que é ser mulher um composto por alunos da escola públi-
atualmente. Neste, foram realizados 6 gru- ca e outro, da escola privada. As narrativas
pos focais online síncronos, através do pro- contidas nos trechos microanalisados não
grama de bate-papo MSN. Participaram 41 correspondiam à narrativa prototípica, tra-
adolescentes, com idades entre os 14 e os tando-se, algumas vezes, de contações de
15 anos, estudantes de uma escola esta- eventos futuros, presentes, hipotéticos ou
dual e de uma escola particular de Porto compartilhados (Georgakopoulou, 2007).
Alegre (RS), divididos em 2 grupos de ado- Além disso, a linguagem utilizada nesses
lescentes homens, 2 de adolescentes mu- trechos caracterizou-se pela fragmenta-
lheres e 2 mistos. Os grupos tiveram lugar ção e pela pouca elaboração. Tais aspec-
na sala de informática das escolas em que tos podem ser atribuídos ao contexto de
eles estudavam e foram moderados pela realização da coleta de dados. Nos grupos
pesquisadora. Esta e todos os adolescentes focais online síncronos, os participantes fa-
tinham um computador à sua disposição, zem comentários mais curtos e menos ela-
conectado ao MSN. A discussão era realiza- borados, em comparação com os grupos
da por escrito e iniciava com a questão de presenciais (Schneider, Kerwin, Frechtling
abertura proposta pela moderadora: “Con- & Vivari, 2002). Essa técnica de coleta de
tem histórias que vocês acham que mos- dados também pareceu ter influenciado a
tram bem o que é ser homem ou o que é continuidade das narrativas construídas,
ser mulher hoje”. As narrativas produzidas visto que a rapidez da comunicação onli-
mediante a interação entre os adolescen- ne pareceu dificultar a concentração do
tes e a moderadora foram microanalisadas grupo em um único assunto, provocando
(cf. Bamberg, 2002). Tal técnica conta com a fragmentação das interações. Quanto à
três níveis de análise das narrativas: (a) um construção das identidades de gênero dos
nível com foco nas posições e nos papéis adolescentes, a microanálise mostrou uma

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

predominância de concepções tradicio- tas. Sejam contadas, lidas ou ouvidas,


nais sobre o masculino e o feminino, em as histórias podem versar sobre eventos
especial a associação entre ser homem e ocorridos, sobre experiências passadas
ter uma vida heterossexual intensa. No e podem ser ficcionais, como os contos
entanto, essa técnica de análise também de fadas, ou criações da própria criança
revelou questionamentos e relativizações para dar conta de acontecimentos vivi-
desses discursos culturais hegemônicos, já dos. A forma narrativa pode ser conside-
que, m alguns momentos, personagens e rada, portanto, mais do que um meio de
participantes mulheres foram apresenta- comunicação, mas, principalmente, uma
das em papéis de agente e posicionadas forma de compreensão de si mesmo, das
ativamente, enquanto personagens e par- pessoas e do mundo em que se vive. Con-
ticipantes homens foram apresentados em forme Dunn (1991), existe um fascínio
papéis de receptor e posicionados passiva- natural das crianças pelas narrativas, o
mente. A microanálise das narrativas mos- que denota uma prontidão para explorar
trou que os adolescentes não apenas repe- e compreender o mundo social. Este inte-
tiam, mas reelaboravam e construíam di- resse deve ser estimulado e suprido pelos
ferenças não só entre homens e mulheres, adultos que fazem parte de seu mundo.
mas entre as próprias mulheres e entre os Becker (2004) salienta o papel da intera-
próprios homens. Isto é, suas identidades ção no desenvolvimento da linguagem e
de gênero não eram fixas, pois as masculi- o quanto é preponderante para o desen-
nidades não eram produzidas unicamente volvimento da estrutura narrativa. Dentro
em contraposição às feminilidades, mas deste contexto, papel dominante tem sido
em relação com outras masculinidades, o atribuído para a díade mãe-criança. O es-
mesmo tendo ocorrido na produção das tilo narrativo materno é apontado como
feminilidades. Assim, a microanálise per- instrumental no desenvolvimento da ha-
mitiu o acesso aos movimentos que fazem bilidade narrativa da criança, por muitos
parte do processo de construção das iden- pesquisadores da área. Nelson e Fivush
tidades de gênero e evidenciou o papel da (2004), por exemplo, citam que o modo
narrativa interacional para que o indivíduo como as mães estruturam suas histórias
não só apreenda a cultura, mas a construa. com os filhos possui forte relação com a
forma utilizada pelas crianças para elabo-
Palavras-chave: Narrativa; Microanálise; rar suas próprias narrativas. A literatura
Ambiente Virtual. (Oppenheim, Nir, Warren & Emde, 1997;
Fivush, Haden & Reese, 2004) aponta
também que crianças cujas mães contam
AS NARRATIVAS MATERNAS E O histórias com mais referência a estados
DISCURSO NARRATIVO DA CRIANÇA mentais, como sentimentos e emoções,
Greicy Boness de Araujo - CSI tendem a apresentar mais condições de
greboness@hotmail.com reconhecer e identificar os próprios esta-
dos mentais e dos demais, o que auxilia na
O ato de contar histórias está presente elaboração de narrativas mais coerentes.
no mundo infantil em vários momentos A coerência, que se refere à habilidade
do desenvolvimento e de formas distin- de contar uma história organizada e com

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sentido é um importante indicador da referência a estes aspectos ocorre mais


capacidade de considerar o interlocutor. frequentemente durante a leitura de uma
Conforme Bamberg (1997), uma histó- história, do que em outros tipos de intera-
ria competente requer a aprendizagem ção social. Ouvir histórias, portanto, é um
de convenções sociais e a capacidade de importante ato de passagem ao longo do
manter as informações referenciais e con- caminho para a comunidade de mentes,
textuais, monitorando a compreensão do metáfora utilizada por Nelson (2005) para
ouvinte e seu envolvimento através dos explicar o ingresso da criança no mundo
eventos narrados. Para Tomasello (2003), social e cultural. Apesar de muitos estu-
são estas propriedades das histórias que dos estrangeiros indicarem que há fortes
auxiliam o ouvinte a construir, em sua pró- relações entre linguagem materna e dis-
pria mente, uma coerente e interessante curso narrativo infantil, no Brasil, ainda há
estrutura narrativa. Deste modo, a narra- poucas pesquisas na área. Neste estudo,
tiva constitui-se em uma valiosa fonte de comparam-se as narrativas das mães e
investigação, não somente da linguagem das crianças quanto ao nível de coerência
infantil, mas do desenvolvimento social e e de alusão aos estados mentais. Utilizou-
cognitivo. Nelson (2006) destaca o papel -se um delineamento transversal correla-
da narrativa como instrumento de desen- cional para avaliar a associação entre as
volvimento da linguagem e de evolução da variáveis do estudo: narrativas maternas
criança no campo cognitivo e social. Nesta e discurso narrativo da criança. Partici-
direção, Lorusso, Galli, Libera, Gagliardi, param 27 díades mãe-criança, tendo as
Borgatti e Hollebrandse (2007) observam crianças idade entre 4 e 5 anos, de ambos
que a elaboração de narrativas pode pro- os sexos, matriculadas em uma escola pri-
ver valiosas informações sobre a teoria da vada de Porto Alegre. As mães foram con-
mente, já que pressupõe não somente a vidadas a contar aos filhos uma história de
habilidade representação da história, mas um livro de gravuras, fornecido pela pes-
também representação do estado mental quisadora, nas dependências da escola.
do ouvinte. O narrador conta uma his- Após a narrativa da mãe, estas solicitavam
tória coerente para manter a audiência que as crianças narrassem a história para
através da avaliação de informações que a mãe do seu jeito. As narrativas das mães
considera interessantes ao interlocutor. e das crianças foram analisadas quanto a
Pesquisadores (Adrian, Clemente & Villa- indicadores de estados mentais e quanto
nueva, 2007; Bruner 1991; Losh & Capps, aos índices de coerência narrativa. Cons-
2003; Miller, 2006; Nicolopoulou & Rich- tatou-se que avaliar a habilidade narra-
ner, 2007; Slaughter, Peterson & Mackin- tiva infantil é uma forma de acessar seu
tosh, 2007) indicam a potencialidade das desenvolvimento sociocognitivo e tam-
histórias para favorecer conversas sobre bém de estabelecer relações com o estilo
estados mentais e para a consideração de narrativo materno. Resultados prévios do
diferentes pontos de vista, aspectos im- estudo indicaram que as crianças cujas
portantes para o desenvolvimento da ha- mães produziram histórias com maior ní-
bilidade sociocognitiva de compreensão vel de coerência também apresentaram
dos estados mentais e de sua relação com narrativas mais coerentes. Mães que utili-
o comportamento. Eles acreditam que a zam mais referência a estados mentais em

786
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

suas narrativas também contribuem para autobiográfica é o que permite ao indiví-


a elaboração de narrativas mais coerentes duo recriar o passado ao compartilhá-lo
por parte de seus filhos, nas quais existe com os outros, e em decorrência disso,
maior habilidade de levar em conta a pers- emerge um passado individual (Fivush &
pectiva do ouvinte. Quanto mais as mães Nelson, 2004). Um passado passível de
utilizam termos mentais, mais favorecem ser transformado em uma história única
a ampliação do conhecimento, reflexão de vida. Por fim, a relação entre narrativa
e utilização destes pelas crianças, o que autobiográfica e self se revela na coerên-
também contribuiria com sua teoria da cia da narrativa. Coerência da narrativa é
mente. A atividade materna de contação o pivot da integridade da história e na his-
de histórias mostra-se uma ferramenta tória de vida é considerada um marcador
efetiva tanto no desenvolvimento lingüís- para avaliar a integridade do self (Fiese &
tico infantil quanto cognitivo e social. Pratt, 2004). Adolescentes que são capa-
zes de sintetizar diferentes elementos de
Palavras-chave: Contação de Histórias; suas vidas em uma história coerente têm
Coerência Narrativa; Teoria da Mente. um senso mais integrado de self. Coerên-
cia na construção de uma história de vida,
em adultos, está significativamente rela-
ANÁLISE DA COERÊNCIA NAS cionada com medidas psicométricas que
NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS DE indicam bem estar psicológico (Baerguer
PRÉ-ADOLESCENTES & McAdams, 1999). A articulação total de
Lídia Suzana Rocha de Macedo - UFRGS uma história de vida implica, segundo Ha-
lidiasrmacedo@gmail.com bermas e Bluck (2000), em compreender
e utilizar quatro tipos de coerência: tem-
Ao longo de seu desenvolvimento a crian- poral, biográfica, causal e temática. Ao
ça é auxiliada a re-constituir e avaliar suas utilizá-los, a pessoa consegue criar uma
experiências pessoais durante as conver- narrativa integrada sobre o self que trans-
sações com seus pais. A construção de mite a idéia de que ela se constitui como
uma narrativa autobiográfica depende da uma unidade psicossocial com algum pro-
interação de vários desenvolvimentos que pósito na vida (McAdams, 2001). O domí-
se beneficiaram dessas conversações, em nio no uso de todos os tipos de coerência
especial: do desenvolvimento cognitivo, ainda não está consolidado durante a pré-
da memória autobiográfica, da habilidade -adolescência, mas em processo de aquisi-
narrativa e do self. A narrativa autobiográ- ção. Assim, para estudar como se dá esse
fica prescinde do desenvolvimento de dis- processo, Habermas e Paha (2001) identi-
positivos cognitivos, pois o modo narrativo ficaram alguns dispositivos que agregam
é um modo de funcionamento cognitivo coerência às narrativas autobiográficas,
que tem implicações imaginativas no que como: o grau de integração das narrati-
tange às ações e intenções humanas (Bru- vas através do número de associações de
ner, 1997). A aquisição do pensamento causalidade entre as sentenças e a utiliza-
formal constitui-se como pré-requisito bá- ção de diversos tipos de associações de
sico para construção da narrativa autobio- causalidade. Esses tipos são associações
gráfica. Já o desenvolvimento da memória que indicam extensão temporal, relações

787
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

entre personalidade e eventos, compara- qualidade, pelo nível de detalhe e relevân-


ções entre o passado e o presente e o uso cia dos eventos para o self (Baron & Bluck,
de elementos biográficos complexos para 2009). Esse resultado confirma a literatu-
explicar a maneira de experimentar deter- ra, pois o nível de detalhe e a coerência
minada situação. Há poucos dados sobre na narrativa de uma experiência pessoal
o desenvolvimento da narrativa autobio- é resultado das conversações precoces
gráfica na pré-adolescência, tanto em es- mãe-criança, em especial, do estilo mater-
tudos internacionais como no Brasil. O ob- no de relembrar (Cleveland, Reese & Grol-
jetivo desta apresentação é mostrar uma nick, 2007; Fivush, Haden & Reese, 2006;
forma de analisar a coerência nas narra- Peterson & McCabe, 1994; Reese, Haden
tivas autobiográficas de pré-adolescentes, & Fivush, 1993). As relações entre even-
baseada no modelo de Habermas e Paha tos e personalidade foram estabelecidas
(2001). Serão apresentadas narrativas au- apenas nos dois grupos que costumam
tobiográficas de pré-adolescentes 10 a 13 conversar em casa, o que mostra maior
anos, que participaram de uma pesquisa capacidade desses pré-adolescentes para
que investigou os efeitos na narrativa au- refletir sobre a experiência e sobre o self.
tobiográfica da conversação entre o pré- Esse resultado também confirma a litera-
-adolescente e seus pais sobre experiên- tura, pois é no contexto das conversações
cias envolvendo emoções. 25 pré-adoles- precoces em que a mãe relembra em con-
centes constituíram três grupos conforme junto com a criança de suas experiências
seu hábito conversacional: um grupo que que se desenvolve um modelo para ava-
costuma conversar e fala sobre emoções; liar a própria experiência (Fivush, 1991).
um grupo que costuma conversar, mas Os dois grupos que costumam conversar
não fala sobre emoções e um grupo que em casa estabeleceram mais compara-
não costuma conversar em casa. As nar- ções entre o passado e o presente. Esses
rativas dos três grupos foram comparadas resultados mostram que esses pré-ado-
em relação ao uso dos dispositivos que lescentes puderam compreender melhor
agregam coerência. Ao comparar o nú- as experiências vividas, sendo capazes de
mero de associações de causalidade utili- identificar continuidades e descontinuida-
zado nos três grupos, verificou-se que os des em suas linhas de vida. Compreender
pré-adolescentes pertencentes aos dois melhor o próprio self, implica no funcio-
grupos que costumam conversar em casa namento da memória autobiográfica,
utilizaram o dobro de associações do que que define o self no tempo e em relação
o grupo que não tem esse costume. A falta aos outros (Nelson & Fivush, 2004). Já o
de associações de causalidade nas narra- uso de elementos biográficos complexos,
tivas do grupo que não costuma falar em como nas referências ao background bio-
casa resultou em narrativas sem integra- gráfico, ilustrações e generalizações, reve-
ção que lembram uma coleção de eventos lam ainda a agilidade do funcionamento
(Habermas & Paha, 2001). Nos dois gru- da memória autobiográfica. Isso porque,
pos que costumam conversar em casa, o é através da memória autobiográfica,
uso de associações que indicam extensão que a pessoa mantém um senso de con-
temporal resultou em narrativas coeren- tinuidade no tempo (Bauer, 2007; Nelson
tes (Habermas & Bluck, 2000) e com mais & Fivush, 2004). De um modo geral, os

788
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

resultados mostraram que o uso desses exclusivamente das trocas conversacio-


dispositivos permitiu comparar os grupos nais com suporte de um adulto. As nar-
em relação ao desenvolvimento cognitivo rativas pessoais se constituem antes de
(raciocínio autobiográfico e capacidade de tudo num meio para compreender a vida
compreender a experiência), da memória e a nós mesmos porque permitem estabe-
autobiográfica, da habilidade narrativa e lecer um elo entre o passado, o presente
da compreensão sobre o próprio self. e o futuro, ou seja, entre os eventos que
fazem parte da história de vida da crian-
Palavras-chave: Pré-adolescência; Narrativa; ça e de sua família, seus ancestrais. Nesse
Comunicação Familiar. sentido, as histórias que contam sobre nós
e para nós têm um papel importante na
definição de nós mesmos (Fivush, 1991).
ANÁLISE ESTRUTURAL E As crianças aprendem a falar sobre as suas
CONVERSACIONAL DAS NARRATIVAS memórias dos eventos passados de uma
PESSOAIS CONSTRUÍDAS NA HORA DO maneira organizada num contexto colabo-
CONTO rativo de engajamento com seus pais (Ma-
Luciane De Conti - UFPE cedo e Sperb, 2007; Fivush & Haden, 1997;
ludeconti@gmail.com Dunn, 1988). Assim, os adultos próximos
Financiamento: CNPq da criança têm um papel específico a de-
sempenhar em relação ao desenvolvimen-
A perspectiva narrativista em Psicologia to da habilidade da criança em narrar suas
toma a linguagem como aspecto nuclear experiências pessoais. Esta habilidade se
da constituição subjetiva humana à medi- inicia entre 24 e 36 meses, sendo que aos
da que estabelece o elo entre a ordem do 4 anos a criança, em geral, já toma a inicia-
psicológico e a da cultura, por meio dos tiva em narrar as suas experiências pesso-
significados. É pelo trabalho de narração ais sem o questionamento adulto (Peter-
que o sujeito interpreta os fatos vivencia- son e McCabe, 1991; Hudson & Shapiro,
dos, construindo uma significação pessoal 1991; Perroni, 1992). Dos 4 aos 5 anos as
sobre eles (Bruner, 1997). O sentido do crianças evoluem da apresentação de uma
tempo vivido é resultado de uma inter- sequência de eventos temporalmente de-
pretação, nunca um dado imediato. A lin- sorganizadas para uma sequência tempo-
guagem constitui-se, então, em uma fer- ral coerente, porém finalizam suas histó-
ramenta privilegiada de mediação entre rias no ponto culminante, ou como coloca
o sujeito e o seu meio, sendo a interação Todorov (1978/1987), elas encerram suas
social a base desse processo. Esta intera- histórias na problematização do even-
ção é condição inevitável e necessária de to. Então, podemos dizer que para que a
inserção social do indivíduo enquanto par- criança possa significar a sua existência e
ticipante de um processo histórico e cultu- realizar a narração de suas experiências
ral que o produz e é, dialeticamente, por pessoais é necessário que ela tenha um
ele produzido (Colaço, 2004). A habilidade adulto que possibilite a ela o acesso a sua
da criança em narrar suas experiências origem, a sua herança. Ou seja, alguém
pessoais é uma das primeiras modalida- que transmita a ela a história das gerações
des narrativas a se desenvolver e depende que a antecederam bem como nomeie

789
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os eventos que compõem a trajetória de pleto, encerrando a narrativa na situação


seus primeiros anos de vida, antes que problema. Em termos de Todorov (1973),
ela tivesse acesso à linguagem. É o acesso podemos dizer que a organização narrati-
às histórias que contam sobre o seu pas- va constituída pelas crianças nos encon-
sado que parece ser difícil e até mesmo tros dos grupos se circunscreveu predo-
impossível para muitas crianças acolhidas minantemente na apresentação da situ-
em um abrigo o que pode impedi-la de ação inicial (Pn1), de uma outra situação
(re)contar a história de sua vida em uma que vinha perturbar esse estado inicial
narrativa temporalizada. Partimos da idéia (Pn2) permanecendo na terceira proposi-
que os contos infantis podem servir como ção marcada pela situação em estado de
mediadores semióticos na elaboração das desequilíbrio. Este resultado nos indicou
narrativas pessoais para essas crianças que a dificuldade dessas crianças em fina-
cujas interações iniciais com seus fami- lizarem suas narrativas pessoais, embora
liares estão muitas vezes impossibilita- já tivessem idade para isso, poderia estar
das. Assim, a pesquisa desenvolvida teve relacionada ao papel de suporte do outro
como objetivo investigar a construção de mediador (pesquisador ou outra criança)
narrativas pessoais pela criança no ato de na composição narrativa. Isto porque na
narrar sua história de vida em um contex- maioria das vezes esta intervenção não
to de oficina denominada Hora do conto. ocorreu, o que nos indicou a necessidade
Participaram do estudo dez crianças entre de realizarmos a análise da conversação
seis e nove anos, acolhidas em um abri- a fim de melhor compreendermos o pa-
go de Pernambuco e que fizeram parte de pel do outro na manutenção e sustenta-
dois grupos. Utilizamos um delineamento ção da narrativa pessoal nesse contexto.
de estudo de casos múltiplos (Yin, 2001). Em função disso, selecionamos um caso
Os grupos foram compostos por até seis para realizamos um terceiro nível de aná-
crianças, os encontros foram realizados lise, a análise conversacional, a fim de
no abrigo, semanalmente com duração de visualizarmos o papel da interação social
uma hora e meia, por oito meses. Os en- na manutenção ou não dessas narrativas
contros se organizaram de tal forma que pessoais. Esta análise demonstrou que a
um dos responsáveis pelo grupo narrava o mediação do outro social foi essencial na
conto; seguia o espaço para o reconto e o modulação das narrativas pessoais cons-
debate da história narrada, durante o qual truídas pela criança no caso investigado,
as crianças podiam desenhar e/ou brincar. pois a intervenção dos pesquisadores ou
Os episódios foram filmados e posterior- dos pares (outras crianças) na construção
mente transcritos. Para fins de análise dos das narrativas pessoais, quando ocorreu,
dados, inicialmente consideramos dois possibilitou o desenvolvimento do enre-
níveis: 1) Análise da estrutura e 2) Análi- do narrativo. Para fins específicos deste
se da voz narrativa (autor, personagem e trabalho, iremos apresentar as análises
narrador). Analisamos 18 encontros nos estrutural e conversacional realizadas no
quais foram encontradas 93 narrativas: 45 caso selecionado.
pessoais e 48 de fantasia. A análise estru-
tural mostrou que as narrativas pessoais Palavras-chave: Narrativa; Estrutura; Análise
apresentaram um ciclo narrativo incom- conversacional.

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

MR-LT02 INCLUSÃO/FORMAÇÃO DO PROFESSOR


POR MEIO DO OLHAR INVESTIGATIVO
Mesa Redonda SOBRE O COTIDIANO ESCOLAR E A
COCONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO
EM AMBIENTES VIRTUAIS DE
MR LT02-1425 - LEITURA DOS
APRENDIZAGEM
PROFESSORES E PEDAGOGOS EM
PROCESSO DE COCONSTRUÇÃO E Diva Albuquerque Maciel - PGPDS/IP/UnB
DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL EM
CONTEXTOS DE LETRAMENTO E DA EAD, A existência de cursos na modalidade da
PRIVILEGIANDO PRÁTICAS INCLUSIVAS E Educação a Distancia (EAD) data de qua-
INVESTIGATIVAS se um século. Em uma revisão de estudos
em que buscam comparar os resultados
Norma Lucia Neris de Queiroz - FE/UnB
de cursos presenciais e a distancia, Moore
normaluciaq@yahoo.com.br
& Kearsley (2010) citam estudo de Crump
(1928), no qual afirma não ter encontra-
Esta mesa redonda composta por três es-
do diferenças significativas entre resulta-
tudos tem como objetivo discutir a forma-
dos de testes de alunos de uma escola de
ção de professores, incluindo os pedago-
Oklahoma e aqueles que estudaram por
gos nos contextos de aprendizagem pre-
correspondência. Na revisão de Moore &
sencial e a distância, destacando práticas
Kearsley, cuja parte massiva é de estudos
sociais de letramento e inclusivas apoiada
realizados do final da década de 1990 até
na perspectiva teórica da Psicologia Cul-
os três primeiros anos dos anos 2000, pe-
tural, na qual Vigotsky é um dos mais im-
ríodo em que a tecnologia dominante em
portantes representantes. A preocupação
EAD era a ‘teleducação’ (sistemas media-
das pesquisadoras, aqui, foi discutir os
dos por redes de TV), eles consideram ha-
resultados de seus estudos com vistas a
ver evidencia suficiente para afirmar que
identificar possibilidades de ampliá-los
cursos na modalidade EAD podem ser tão
e ao mesmo tempo compartilhar suas
eficazes para a aprendizagem quanto os
análises para perceberem contradições e
presenciais, sendo que, não é a ausencia
limites. A discussão destacou nos três es-
de contato (face a face) ‘em si’ prejudicial
tudos a formação profissional dos sujeitos
a aprendizagem. Grande parte dos estu-
adultos no ensino superior, os desafios e
dos citados, realizados por meio de mé-
possibilidades de formação desses sujei-
todos comparativos e que examinaram
tos, os quais que não teriam chances de
variáveis ligadas a resultados entre essas
realizar o ensino superior, considerando
modalidades de cursos demonstraram que
seus lugares de moradia e suas necessida-
os índices de aprendizagem eram melho-
des de sobrevivência. Sendo assim, a EaD
res na modalidade EAD, ou pelo menos
tem cumprido uma função social impor-
equivalentes aos presenciais. Postas estas
tante, bem como a ênfase nas práticas de
reflexões iniciais, podemos dizer que, no
letramento dos cursos presenciais.
nosso país, ainda se observa um forte pre-
conceito da academia acerca da EAD, espe-
cialmente, no que diz respeito à oferta de
cursos regulares de nível universitário. Ao

791
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mesmo tempo, podemos dizer que, a pre- sar a formação de um professor capaz de
sença cada vez mais marcante das novas atuar nessa nova realidade. Por outro lado,
tecnologias da informação e comunicação o olhar investigativo do professor sobre o
(TIC) tem contribuído para uma revolucio- cotidiano escolar tem sido entendido, por
nária transformação (nem sempre posi- nosso grupo de pesquisa, como condição
tivas, segundo Coll & Monereo, 2010) da necessária a uma formação comprometi-
nossa realidade social e cotidiana, em que, da com práticas pedagógicas inclusivas e
de uma sociedade ainda marcadamente transformadoras. Nessa perspectiva, a pes-
rural, estamos caminhando a passos largos quisa no e do ambiente escolar pode ser
para uma sociedade da informação (SI). vista, ao mesmo tempo, como princípios,
Temos, especialmente na última década, científico e educativo. Hoje, não cabe mais
sido confrontados com ambientes virtuais ao professor apenas reproduzir os conheci-
de aprendizagem (AVA), notadamente a mentos para seus estudantes, mas buscar
plataforma moodle, que têm implicado em a compreensão dos problemas concretos
uma verdadeira revolução de transforma- que se colocam no cotidiano educacional.
ções que carecessem de estudos que nos Coconstruir ferramentas que permitam
permitam dar-lhes sentido e avaliar seu ao professor olhar sua própria prática e
valor e impacto. De uma cultura marcada- investigar as questões reais presentes em
mente oral, estamos sendo lançados a uma seu cotidiano, de forma reflexiva e siste-
cultura digital, produtora e produzida pelos matizada em bases teóricas consistentes,
avanços tecnológicos. Tal revolução nos su- constituiu a base curricular de um curso
portes da informação tem criado novas for- de especialização sobre desenvolvimento
mas de relacionamento e novas formas de humano e inclusão escolar, na modalidade
aprender e produzir conhecimento, assim EAD, oferecido pelo PGPDS – PED/IP - UnB/
como novos agentes educativos. Por ou- UAB. No contexto desse curso, os fóruns de
tro lado, de acordo com a perspectiva te- discussão - salas de conversa entre os alu-
órica da Psicologia Cultural que adotamos nos pós-graduandos (professores de redes
aqui, o desenvolvimento humano é com- públicas, psicólogos e outros profissionais
preendido como um fenômeno complexo da educação) e seus tutores e professores
e dinâmico, no qual o sujeito é tido como supervisores – constituem um meio privi-
participante ativo do seu desenvolvimento, legiado de formação, de coconstrução de
em constante interação com o meio (Bran- conhecimentos e de novos procedimen-
co & Valsiner, 2004). Por outras palavras, tos de ensinar e aprender. O presente es-
compreende-se que o sujeito se constitui tudo teve como objetivo contribuir para a
por meio da interação dialética entre pro- sistematização de princípios pedagógicos
cessos de canalização cultural e da ação do específicos da modalidade EAD e que se-
indivíduo, enquanto sujeito ativo e co-par- jam úteis à Formação de Professores que
ticipante do seu próprio desenvolvimento. possa prover a instituição escolar de meios
Nesse contexto, a presença cada vez mais pedagógicos que atendam à diversidade
frequente de cursos na modalidade EAD dos alunos. Por meio de uma abordagem
por meio de AVA tem nos confrontado interpretativa, característica da perspecti-
com desafios marcantes, especialmente va teórica aqui defendida, foram objeto de
no que se refere a necessidade de repen- análise as discussões estabelecidas nos Fó-

792
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

runs de Discussão no referido curso, tendo alterações em nosso modo de aprender e


sido selecionados para análise 10 tópicos de ensinar na sociedade contemporânea
dos fóruns de discussão, específicos sobre brasileira. Nos anos 1990, a Lei de Dire-
os projetos de pesquisa, que tiveram acima trizes e Bases da Educação Nacional esta-
de 10 intervenções. Dois tipos de catego- beleceu diversas mudanças no contexto
rias de análise foram construídas com base educacional para atender às essas novas
em procedimentos de microanálise das in- exigências. Uma dessas mudanças diz res-
formações observadas e da exegese reali- peito à obrigatoriedade da formação em
zada com base na literatura: (1) categorias nível superior para todos os docentes da
que focalizam a construção colaborativa do educação básica. Essa determinação le-
conhecimento; e (2) categorias que focali- gal gerou novos desafios, possibilidades
zam a reflexão conjunta sobre as situações e modalidades de curso para instituições
de pesquisa realizadas pelos participantes de ensino superior, os quais favoreceram
na sua realidade escolar. Os temas mais a criação de diferentes Programas de Li-
recorrentes observados no estudo dizem cenciaturas com vistas atender aos do-
respeito às referências dos professores à centes da educação básica em exercício,
oportunidade de participarem da própria bem como a formação inicial de jovens
construção do curso por meio da discussão para atuar em áreas de conhecimento
nos fóruns, e a possibilidade de ressignifi- que apresentam lacunas em seus quadros
carem a sua prática pedagógiaca por meio tais como Matemática, Física, Química e
da pesquisa, sendo estes apontados como Biologia. É possível observar que esses
os principais fatores de comprometimento programas procuraram dar uma resposta
com a qualidade do curso. Trazemos para institucional às demandas legais e sociais
debate alguns princípios pedagógicos cons- em relação à formação docente, como
truídos neste exercício de análise que con- uma estratégia que para a melhoria da
sideramos uma contribuição importante educação brasileira. Por outro lado, com-
para o tema da inclusão preendemos que esses programas consti-
tuem-se em espaços de tensões em fun-
Palavras-chave: Inclusão/Formação do ção dos confrontos entre velhos e novos
Professor; Ambiente Virtual de Aprendizagem; significados construídos pelos sujeitos
Microanálise das interações em Fóruns de em relação à prática docente, oriundos
Discussão. de suas trajetórias pessoais, crenças, va-
lores e formação acadêmica propiciada
nestes espaços formativos. Este estudo
É POSSÍVEL A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO tem como objetivo explicitar as configu-
COMO PROFISSIONAL PESQUISADOR: rações do curso de Pedagogia a distância
DESAFIOS E POSSIBILIDADES NO CURSO A oferecido pela Faculdade de Educação -
DISTÂNCIA DA FE-UnB UaB-UnB, bem como compreender, mais
Norma Lucia Neris de Queiroz - FE-UnB especificamente, a formação do futuro
normaluciaq@yahoo.com.br pedagogo como um profissional pesqui-
sador, aquele que desenvolve estratégias
Inovações tecnológicas e mudanças na de reflexão sobre a prática docente, a par-
economia mundial têm exigido profundas tir do componente curricular, denomina-

793
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do Projeto 3 – alfabetização e letramento, vel institucional, a proposta do curso e do


cuja a oferta ocorre no quinto semestre componente curricular e nos níveis inter-
do curso. Nessa perspectiva, percebe- pessoal e pessoal, os dados da entrevista
mos a formação docente dos estudantes semiestruturada com a professora-tutora
como um processo de transformações, e observações das atividades interativas
que abrange continuidades e desconti- e teóricas – projeto de pesquisa constru-
nuidades, e que se configura nas relações ído pelos estudantes e dos registros do
dialógicas entre os sujeitos e os contextos diário de bordo feitos nos encontros pre-
sócio-histórico-culturais, nos quais ocor- senciais. Os resultados evidenciaram as
rem processos de produção e negociação seguintes categorias interpretativas: a) o
de significados, ao longo da formação. A Programa do curso explicita muitas limita-
expectativa na formação em nível supe- ções em relação aos seus desafios e pos-
rior foi vista como um espaço privilegiado sibilidades de atuação; b) a proposta do
de formação de um futuro pedagogo que componente curricular trabalha o contex-
poderia refletir sobre sua prática docente. to de profissional pesquisador articulan-
Ou seja, o pedagogo poderá imprimir nela do teoria e prática em suas comunidades,
melhoria na qualidade da educação para portanto, desafia durante todo o semes-
seus alunos. Os objetivos específicos elei- tre um olhar investigativo. Essa estratégia
tos para esse estudo foram: identificar a no primeiro momento provoca muitos
configuração do curso e do componente conflitos nos estudantes, mas com o pas-
curricular, identificar concepções dos es- sar dos dois primeiros meses observamos
tudantes sobre a pesquisa e o profissional um refazer de suas concepções; c) con-
pesquisador; identificar expectativas dos cepções de ensino previstas no curso vão
participantes sobre o curso e o compo- se deslocando da tendência tradicional
nente curricular investigado; analisar a para uma, considerada mais inovadoras;
interação entre teoria e prática presente d) há um pequeno avanço nas concep-
no discurso dos participantes; analisar ções dos estudantes acerca do pedagogo
os impactos desse componente em sua como um profissional pesquisador, uma
formação docente; analisar os aspectos vez que no início eles sequer pensavam
que os participantes ressignificaram por nessa dimensão profissional; e) a cons-
meio desta formação. Participaram deste trução do conhecimento nas atividades
estudo 29 estudantes de três polos (Alto interativas, especialmente, os fóruns de
Paraíso (Go), Alexania (Go) e Carinhanha discussão ainda carecem de estudos mais
(Ba) e uma professora-tutora. Os instru- aprofundados, pois as participações ficam
mentos de construção de dados foram a restritas a concordâncias e/ou discordân-
análise documental acerca da proposta cias sem reflexões teóricas; ou seja, eles
do componente curricular, observações têm ocupado mais da função de avaliar
sistemáticas das atividades realizadas pe- a participação dos estudantes. Por outro
los estudantes no ambiente virtual e uma lado, favorece as interações dialógicas
entrevista semiestruturada com professo- entre professora-tutora e estudantes e
ra-tutora. Os dados foram analisados em estudantes e estudantes. Nossa argumen-
três níveis: institucional e interpessoal e tação é de que é necessário aprofundar
pessoal. Nesta análise, destacamos no ní- os estudos sobre os fóruns, considerando

794
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que a discussão temática possibilita um MAS AFINAL DE CONTAS, QUEM


encontro de diversas vozes, possibilitan- É A MULHERZINHA? REFLEXÕES
do que as idéias se entrecruzam nas in- SOBRE A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO
terações entre os sujeitos envolvidos no E A SITUAÇÃO SOCIAL DE
processo de ensino aprendizagem. Sendo DESENVOLVIMENTO.
assim, os fóruns podem ser vistos como Mercedes Villa Cupolillo - FP/SG-RJ
uma valiosa estratégia de aprendizagem mercedes.cupolillo@gmail.com
neste curso. No entanto, para que haja a
construção do conhecimento em grupo é Apoiados na perspectiva histórico-cultural,
fundamental que os estudantes comecem podemos dizer que personalidade é in-
a encarar os fóruns como as discussões fluenciada pela história do sujeito e pelas
presenciais em sala de aula e tornem-se interações que se dão nos contextos sócio-
parceiras nesse processo. A partir desta -culturais do indivíduo de uma forma di-
parceria, os estudantes podem entender nâmica. As formas de organização dos ele-
que eles podem contribuir de forma ati- mentos de sentido da personalidade acon-
va e colaborativa com a aprendizagem do tecem em relações de contradição entre as
outro e motiva-lo a investir esforço para forças que a movimentam. Um dos espaços
discutir e aprender com os debates em sociais privilegiados que atua fortemente
questão; f) as atividades que contribuíram na constituição da personalidade em nossa
para os estudantes ampliarem suas con- sociedade é o espaço educacional. A pers-
cepções sobre a formação do profissional pectiva histórico-cultural do desenvolvi-
pesquisador foram as atividades desen- mento humano convida à reflexão sobre a
volvidas nos encontros presenciais e a necessidade de mudanças nos espaços de
elaboração do projeto de pesquisa. Cons- sala de aula do ensino superior com base
tatamos que as relações dialógicas entre em pesquisas recentes (Cupolillo, 2010).
professora-estudantes e estudantes-estu- Apoiados em Vygotsky, dizemos que a zona
dantes instituem um contexto semiótico de desenvolvimento proximal refere-se ao
que circunscreve os sujeitos em processo caminho que o sujeito percorre para de-
de formação profissional, especialmente, senvolver funções que estão em processo
elas podem favorecer o desenvolvimento de amadurecimento e que se tornarão fun-
de futuros pedagogos pesquisadores. É ções consolidadas, estabelecidas no nível
necessário, ainda, investir em estratégias de desenvolvimento real. Ao recorrermos
de discussões mais positivas e recursos à ideia de zona de desenvolvimento proxi-
teórico-metodológicos que permeiam a mal, deparamo-nos com a impossibilidade
prática docente de um modo geral, a qual de pensar o desenvolvimento como uma
exige deles a reflexão acerca dessa prática função puramente cognitiva, já que ela
e das ações da instituição educativa para acontece na relação com o Outro. Ambos
facilitar que estudantes desses cursos promovem, portanto, um clima emocional
compreendam e assuma a postura de um durante esse percurso conjunto. No caso
profissional pesquisador. de nossa sala de aula, podemos dizer que
as situações interativas na escola propor-
Palavras-chave: Curso de Pedagogia; Educação cionam vivências de conflitos, emoções
a Distância; Profissional Pesquisador e construções de significados e sentidos

795
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

entre os participantes envolvidos nas situ- apesar das características em comum que
ações interativas. O espaço subjetivo em os grupos de alunos de cada curso apresen-
que elas se processam é chamado de “situ- tam, a constituição individual de cada um é
ação social do desenvolvimento” e traduz- muito importante na formação dos grupos,
-se como o contexto que envolve o indiví- planejamos nosso trabalho. O presente
duo, permitindo a ele o estabelecimento estudo discute o percurso de uma turma
de uma zona de sentido. Retomando nossa de pedagogia durante as disciplinas minis-
escola, podemos dizer que na sala de aula tradas pela autora. O percurso serviu para
se estabelecem relações entre os alunos, nortear grande parte de nosso trabalho em
entre alunos e professores, entre os coor- sala de aula, após compreendermos que a
denadores e alunos, entre os coordenado- base das necessidades dos alunos era pro-
res e professores, e assim por diante. Essas veniente da leitura e da escrita. Construí-
relações podem produzir espaços de trocas mos estratégias no sentido de promover o
que promovem a aprendizagem e geram aprendizado e desenvolvimento de proces-
desenvolvimento. Muitas das contribuições sos de pensamento complexo, por conside-
sobre a subjetividade nessa perspectiva rarmos a importância desses processos na
vêm de autores como González Rey (2005) formação de professores. O relato foi reti-
e Martinez Mitjáns (2005), na discussão so- rado de trabalho com disciplinas de psico-
bre as concepções de Vygotsky sobre a na- logia de desenvolvimento e aprendizagem,
tureza dos processos de desenvolvimento e acompanhada durante o período de um
aprendizagem. Investigando mais os aspec- ano, disciplinas obrigatórias do primeiro
tos ligados à subjetividade humana, Gonzá- e segundo períodos do curso. Tomamos
lez Rey contribui para a compreensão dessa como base os indicadores anteriores ob-
dinâmica nos processos de desenvolvimen- servados em todos os grupos de alunos do
to. Com base em suas contribuições, pode- mesmo curso de pedagogia, de três anos
mos dizer que o ser humano se desenvolve anteriores: 1-as turmas apresentavam a
processualmente, de maneira gradual e em falta de interesse e motivação para ativida-
constante relação de tensão e conflito entre des que envolviam leitura e escrita, ainda
o sujeito e o mundo: o homem se consti- que possa parecer estranho e incoerente
tui ao mesmo tempo nas relações consigo para um curso de formação de educadores;
mesmo e com o seu meio sociocultural. Es- 2-apresentavam desvalorização da profis-
sas relações não são diretas. São mediadas são em contradição à supervalorização do
por instrumentos concretos e psicológicos, psicólogo; 3-havia de modo geral muita di-
sendo a psique constituída na unidade dia- ficuldade de entrar em contato com o erro.
lética objetividade/subjetividade, em que Após uma conversa informal com a turma
o indivíduo e o social são inseparáveis e o que ingressava havia pouco tempo, no pri-
particular contém em si o universal. As vi- meiro período, chegamos a algumas das
vências na área de educação, sejam elas respostas que nos levaram aos indicadores
em cursos presenciais ou à distância, en- sobre o curso de Pedagogia: 1-“Vim porque
volvem o aprendizado e os processos de não passei em outra. 2- Eu não gosto mui-
desenvolvimento. Baseados no pressupos- to do curso, não quero ser professora, mas
to de que os processos de constituição de só podia fazer esse curso. 3-É mais barato;
subjetividades é multideterminado e que, 4-Detesto ler; 5-Não entendo nada desses

796
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

textos que os professores passam; 6-Eu cesso sistêmico o desenvolvimento huma-


queria psicologia, mas tem que ler muito; no como um processo sistêmico, comple-
7-Psicologia é meu sonho, mas não tem por xo, singular e subjetivo marcado pela im-
aqui.” A partir daí identificamos a necessi- plicação do sujeito em um movimento his-
dade de um trabalho de desenvolvimento tórico e cultural em que em que a saúde, a
de habilidades e competências diversas doença e a educação são partícipes desse
dentre elas:1-o conhecimento sobre o cur- processo e corroboram na configuração
so escolhido e consciência da co-constru- de sua personalidade. Para adentrar esse
ção das habilidades durante o curso; 2-a ca- sistema complexo, alguns diálogos buscam
pacidade de trabalhar cooperativamente; ancorar-se na Teoria da Subjetividade de
3-a valorização do curso e o enfrentamento caráter histórico-cultural de González Rey
em situações que envolvem exposição de (2003) buscando suas categorias para ge-
idéias;4- a compreensão e elaboração das rar inteligibilidade e mergulhar por temas
idéias no processo de leitura e escrita e como: as produções subjetivas em relação
5-o incentivo à pesquisa. Através de ativi- ao desenvolvimento humano, a saúde e a
dades que envolviam leituras individuais e educação e o reconhecimento do sujeito
conjuntas, relatamos uma experiência com como ser histórico, concreto, marcado por
leitura conjunta de um texto científico. Du- uma cultura, sujeito produtor de ideias e
rante o episódio, que exibe o trabalho com alternativas e que, ao produzir e reprodu-
a turma, o nome da autora do texto era zir a realidade social é, ao mesmo tempo,
nomeado pela leitora como “mulherzinha.” produzido por ela no escopo do seu de-
Nossa proposta é, portanto, discutir a ne- senvolvimento. Destarte, embasar-se no
cessidade de formação de na formação de contexto histórico-cultural, ao propor a su-
pedagogos, partindo da compreensão da peração dos reducionismos de concepções
situação social de desenvolvimento como que privilegiam ora a mente e os aspectos
uma das bases para o planejamento das internos (idealismo), ora o comportamento
atividades de sala de aula. externo (empirismo), cria uma nova visão
na psicologia e na educação que possibilita
Palavras-chave: pedagogia; situação social de
pensar o indivíduo em sua integralidade/
desenvolvimento
totalidade, compreendendo-o como arti-
culação dialógica dos aspectos externos
com os internos e considera a relação do
MR LT04 sujeito com a sociedade a qual pertence.
Mesa Redonda Trazemos também sob essa égide e como
tema a uma discussão profícua, a subver-
são como alternativa para a emergência do
MR LT04-1460 - DESENVOLVIMENTO sujeito apontando a influência sobre o de-
HUMANO E SUBJETIVIDADE UM senvolvimento humano, esta abordagem
DIÁLOGO ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO traz em si, tanto uma crítica contundente
ao paradigma dominante que se baseia
O objetivo da mesa é discutir as ideias e em pressupostos universais e naturalistas
socializar conhecimento na perspectiva do e metodologia reducionista e quantitativa,
desenvolvimento humano como um pro- quanto uma nova proposta para compre-

797
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ender o ser humano em sua totalidade. A discussão situada neste trabalho, que
Desta forma, apresentar a subversão como envolve os temas do Desenvolvimento
produção simbólico-emocional que se ma- Humano, da Saúde e da Educação como
nifesta na mudança de posicionamento do produções subjetivas, apóia-se, principal-
sujeito em relação à ordem estabelecida, mente, na Teoria da Subjetividade de ca-
pode viabilizar a expressão de sua singu- ráter histórico-cultural desenvolvida por
laridade e contribuir para o desenvolvi- González Rey (2003). Segundo este autor,
mento enquanto crescimento individual a Subjetividade é caracterizada por uma
a partir da emergência de sentidos frente ruptura com a visão da psique como en-
à nova forma de vivenciar sua realidade. tidade individual e intrapsíquica; uma re-
Outra temática que compõe esta mesa é presentação da psique como um sistema
discutir a tríade equoterapia, educação e complexo, cujas formas de organização
promoção de saúde, instigar essa reflexão não estabelecem relações de causa e efei-
é uma forma de abertura à visibilidade to e a superação de um conjunto de cisões
desse espaço como propício à comunica- que historicamente foram construídas
ção saudável, à emersão do sujeito e ao pelo conhecimento formador na maioria
favorecimento de relações dialógicas que das correntes nas Ciências Sociais, em es-
contribuam e impulsionem os processos pecial na Psicologia, como objetivo/sub-
de aprendizagem e desenvolvimento e à jetivo, afetivo/cognitivo, interno/externo,
promoção de saúde como um processo individual/social. Na tentativa da compre-
complexo, multidimensional, subjetivo, ensão do desenvolvimento humano, vários
contraditório, singular e sistêmico (Rey, autores realizaram estudos com diferentes
2004). A última temática apresentada enfoques, tais como: os aspectos biológi-
aborda um modelo de prevenção da Aids cos, as estruturas cognitivas, o meio social,
pautado na informação, motivação e habi- o campo afetivo, entre outros. Para Piaget
lidades comportamentais. A subjetividade, (1988), o desenvolvimento humano obe-
nesta perspectiva, está necessariamente dece a estágios hierárquicos (sensório-mo-
implicada no que Lévinas chama de “aven- tor - 0 a 2 anos, pré-operatório - 2 a 7 anos,
tura do saber” ou, noutras palavras, impli- operações concretas - 7 a 11 ou 12 anos,
cada numa estrutura gnosiológica, relativo operações formais - 11 ou 12 anos). Já a
aos limites e valores do conhecimento hu- concepção behaviorista de Skinner (2003),
mano, que em última instância, também é elegeu o comportamento como objeto de
ontológica. Para Lévinas, a subjetividade estudo e analisou o desenvolvimento hu-
tem como tarefa ontológica encontrar-se, mano e a aprendizagem como unidades
compreender-se e compreender, estabe- estímulo-resposta, com o objetivo de con-
lecer referências com sentido e significar. trolar e modificar o comportamento. Com
intuito de entender o desenvolvimento
humano sob outro prisma, em que as ra-
O DESENVOLVIMENTO HUMANO, zões lineares e hierárquicas de compreen-
A SAÚDE E A EDUCAÇÃO COMO der o sujeito dessem lugar aos aspectos
PRODUÇÕES SUBJETIVAS relacionais, Vygotsky (1991) assinala que
Helio Ricardo Machado Lopéz - SENAC este é um processo dialético, complexo,
helio.lopez@terra.com.br multifacetado, por desproporções de fun-

798
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ções, conversões qualitativas, combina- tua como máquina, formatada por meca-
ções complexas, processos de evolução e nismos bioquímicos e histológicos, para
involução, interação de fatores externos e outro, que estabelece relações multiarti-
internos e busca constante de adaptação culadas na processualidade assimétrica do
ao meio. Segundo González Rey (2001), o constituir-se. Desta afirmação surgem dois
desenvolvimento humano é um proces- desdobramentos que consideramos sig-
so complexo e não linear, que não pode nificativos. O primeiro é que os aspectos
ser reduzido a um padrão. Desta forma o subjetivos da saúde e da educação e, por
compreende o desenvolvimento humano consequência, o desenvolvimento huma-
como uma produção de sentidos subje- no, não podem ser conceituados como um
tivos que, segundo González Rey (2009), eco da condição objetiva da realidade. Di-
esta categoria permite expressar os pro- ferentemente disto, possibilitam alterna-
cessos de subjetivação que estão além da tivas de enfrentamento ao sujeito a partir
intencionalidade e da consciência do sujei- dos seus recursos subjetivos: viver os pro-
to, e que estão estreitamente associados cessos geradores de saúde não é apenas
ao percurso das emoções que atuam como uma expressão direta entre o sujeito e os
uma o unidade inseparável com os proces- efeitos de suas ações concretas na vida co-
sos simbólicos e emocionais. González Rey tidiana. Por este viés, é caracterizada como
(2005) assevera que é preciso pensar uma produção de sentidos articuladas na trama
construção teórica diferenciada sobre a singularizada da experiência vivida. O se-
saúde e o desenvolvimento humano, im- gundo desdobramento é a possibilidade
plicada em superar sua definição em ter- real da emergência do sujeito, tendo como
mos de normalidade, equilíbrio e ausência base este cenário em que a singularidade
de sintomas e doenças perceptíveis a par- se faz presente, sendo legitimada nas prá-
tir do diagnóstico médico. Para tal, torna- ticas em educação e saúde. O resgate da
-se necessário definir saúde em termos de subjetividade na dimensão educacional,
um sistema vivo, interatuante com as com- como um atributo essencial de sua pró-
plexas formas de vida e espaços sociais pria definição histórica e cultural, permite
que ultrapassem a barreira do fisiológico e o reconhecimento das práticas educativas
expresse a qualidade do desenvolvimento como processos de sentido, promotoras
do sistema, tendo como referência os ele- de uma compreensão significativa no ato
mentos constitutivos de suas produções de aprender. Esta visão desenvolvida por
subjetivas. Conforme Langdon (1995), re- González Rey (2008) esclarece que o ca-
conhecer a subjetividade permite conside- ráter singular da do desenvolvimento hu-
rar a heterogeneidade como partícipe do mano vai nos obrigar a pensar em nossas
processo do desenvolvimento humano. práticas pedagógicas sobre os aspectos
Desta forma, ressalta a relação entre pa- que propiciam o posicionamento do sujei-
dronização-descontinuidade, em que o de- to e sua complexidade na aprendizagem.
senvolvimento humano, saúde e educação A partir desta concepção, o processo do
possuem interrelações: o caráter simbóli- desenvolvimento humano deixa de ser mi-
co da singularidade em relação aos temas metizado e robótico, para envolver-se no
citados, abre outro olhar sobre sua repre- campo das construções dos elementos de
sentação, diferente daquela que o concei- sentido do sujeito, articulado nos diálogos,

799
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nas reflexões e nas contradições, tendo significativamente para o avanço no co-


estes elementos fortes aliados na compo- nhecimento da Psicologia e áreas afins.
sição da tessitura simbólica da aprendiza- González Rey (2004) define o desenvol-
gem. Como teoriza González Rey (2008), vimento como um processo integral do
recuperar o sujeito que aprende e se de- sujeito que influencia simultaneamente
senvolve, implica em integrar a subjetivi- diferentes aspectos da personalidade em
dade como aspecto importante deste pro- configurações subjetivas que acarretam
cesso, pois o sujeito interage em desenvol- no crescimento do indivíduo em diversas
vimento permanente como sistema e não esferas de sua vida. Este crescimento não
só com o intelecto ou com a cognição. Os significa acumulo de informações, mas
sentidos subjetivos na forma em que te- produção de sentidos subjetivos que afe-
mos desenvolvido esta categoria represen- tam sua personalidade como um todo.
tam um sistema simbólico emocional em Neste sentido, torna-se imperioso falar da
constante desenvolvimento, no qual cada categoria Sujeito. Segundo Gonzalez Rey,
um desses aspectos acima citados se evo- o sujeito se forma na atuação consciente
ca de forma recíproca, sem que um seja a e intencional em seus diversos espaços
causa do outro, provocando constantes e de convivência e relacionamento (Rey,
imprevisíveis desdobramentos. Para tal, se 2004a). Está engajado em seu cenário atu-
faz necessário considerar o sujeito e seu al e produz sentidos subjetivos a este re-
desenvolvimento como aspectos subjeti- lacionados, possibilitando sua reconstitui-
vos que possuem uma dimensão central ção e reconfiguração. O sujeito é gerador
nos processos educativos em saúde que, de alternativas frente aos contextos de
por meio dos desdobramentos desta com- tensão, e emerge das rupturas provenien-
plexa relação, tem aberto novas frentes de tes de experiências que se apresentam im-
entendimento na compreensão das práti- positivas. Touraine apresenta interessan-
cas pedagógicas diferenciadas que reco- tes apontamentos sobre este tema. Para
nheçam de vez seu caráter singular. ele, o indivíduo torna-se sujeito quando
se reencontra na vida e desta toma pos-
Palavras-chave: Desenvolvimento Humano; se (2004). Reconhece-se o sujeito em seu
Saúde; Educação. engajamento a serviço de sua própria
imagem, que constitua sua razão de ser,
em seu retorno a si mesmo e àquilo que
SUJEITO, SUBVERSÃO E confere sentido a sua vida, àquilo que cria
DESENVOLVIMENTO HUMANO sua liberdade, sua responsabilidade e sua
Mariana Oliveira Santos - Crea-DF esperança (2007). Neste sentido, o sujeito
mari.oliveirasantos@yahoo.com.br aparece na resistência às forças modela-
doras e alienantes e na diferença. Ele sur-
O entendimento do desenvolvimento hu- ge na vontade e compromisso consigo de
mano como processo singular, complexo, afirmar-se em sua singularidade. Estas de-
histórico, cultural, dinâmico e sistêmico finições não implicam em dizer que o sujei-
conforme apresentado pela Teoria da to é portador de independência absoluta.
Subjetividade de González Rey, entre ou- De acordo com Morin (1999) autonomia
tros autores contemporâneos, contribui e independência não se separam, ao con-

800
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

trário, na medida em que nos tornamos o pensamento dicotômico. Também não


autônomos, ficamos cada vez mais de- representa a passagem de um estado es-
pendentes de inúmeras condições neces- tático para outro, contrário ou diferente,
sárias à emergência da autonomia. Neste uma vez que a constituição do sujeito e da
sentido, apresenta-se a subversão como subjetividade acontece de forma dinâmi-
alternativa para tornar-se sujeito. A sub- ca, processual e sistêmica. Trata-se de um
versão é aqui entendida como a atitude de tema que consolida-se pela atribuição de
subverter uma ordem reinante adotando- sentido, sendo assim, a subversão deve
-se uma posição diferente e muitas vezes ser entendida dentro de um contexto, e na
contrária a anteriormente estabelecida ou referência a um sujeito ou grupo específi-
proposta (Santos, 2008). Representa uma co. A subversão representa uma produção
modificação configuracional que pode se de sentidos que constitui um modus ope-
dar em diferentes níveis, ou seja, pode ter randi diferenciado. González Rey (2005)
seu epicentro no âmbito religioso, cientí- diz que “o sentido subjetivo está na base
fico, político entre outros. Porém, como da subversão de qualquer ordem que se
um verdadeiro terremoto, esta modifica- queira impor ao sujeito e à sociedade des-
ção configuracional pode alcançar as mais de fora” (p. 22). Mas a subversão difere do
longínquas estâncias que se ramificam a sentido subjetivo, pois este não produz,
partir do epicentro e abalar até as estrutu- necessariamente, uma ação contraposta.
ras mais sólidas. Daí abre-se o espaço para O sujeito pode produzir sentidos subje-
o novo. A ordem que se subverte está na tivos em consonância com uma ordem
interface relacional entre a subjetividade estabelecida ou proposta de acordo com
social e a individual, sendo assim, abran- sua configuração subjetiva. Sendo assim,
ge o compartilhamento de significados e a principal relação entre a categoria sen-
o sentido subjetivo do sujeito. O sujeito tido subjetivo e a subversão é que ambos
subversivo enquanto constituinte e cons- representam uma produção simbólico-
tituído da subjetividade social, participa e -emocional que constitui a práxis do su-
compartilha dos elementos subjetivos de jeito. Porém, a diferença entre estas cate-
seu grupo, cultura e sociedade, porém, gorias é que a práxis do sujeito subversivo
em algum momento a práxis deste gru- apresenta-se como dissonante da ordem
po deixa de lhe apresentar sentido e ele estabelecida e da configuração de senti-
busca novas formas de pensar e agir em dos subjetivos vigente na constituição do
que possa encontrar subsídios que sus- sujeito. A subversão é uma produção de
tentem essas novas produções de sentido. sentidos que entra em conflito com aque-
Cabe ressaltar que a noção de subversão les que configuram subjetivamente o su-
apresentada, não agrega nenhum tipo de jeito proporcionando uma reconfiguração
valor em si. Não se trata de uma ideia qua- que vai além dos sentidos produzidos até
lificante, que esteja associada a um valor o momento, que se configura com essas
(a pessoa subversiva é boa ou má), mui- novas produções, e que o faz avançar os
to menos, representa uma válvula entre limites de seu escopo buscando em novos
dois polos: negativo ou positivo, visto que arcabouços aquilo que se lhe apresente
o conceito adotado fundamenta-se na como alternativa diante da instabilidade
perspectiva da complexidade, superando gerada por tal conflito. A partir destas con-

801
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

siderações, propõe-se a subversão como mento propício à comunicação saudável,


uma alternativa para a emergência do su- à emersão do sujeito e ao favorecimento
jeito. A abordagem de Touraine (2007) so- de relações dialógicas que provoquem e
bre sujeito caracteriza o sujeito subversivo impulsionem os processos de aprendiza-
quando o apresenta dotado de rebeldia, gem e desenvolvimento por meio da ação
emergindo na vontade de escapar às for- planejada, personalizada e interventiva
ças, regras e poderes que o impedem de da equipe de atendimento. Igualmente,
exercer a autenticidade. “Não há sujeito esses elementos engendram a promoção
senão rebelde, dividido entre raiva e es- de saúde, não como um estado desen-
perança.” (p. 119). O tema da subversão contrado do sujeito e de seus processos
está diretamente relacionado ao desen- de constantes conflitos e tensões com o
volvimento, uma vez que a produção de meio, mas como um processo complexo,
sentidos subjetivos é central para ambos multidimensional, subjetivo, contraditório,
os processos e a emergência do sujeito singular e sistêmico (Rey, 2004) em que a
tem papel fundamental para o desenvol- educação como prática social e a equote-
vimento humano. rapia enquanto terapia sistêmica estejam
vinculadas à qualidade de vida do sujeito.
Palavras-chave: Sujeito; Subversão; Destarte, marcamos essa conjunção como
Desenvolvimento. um processo de desenvolvimento humano
sistêmico em que a eleição da subjetivida-
de como espaço ontológico diferenciado
EQUOTERAPIA, EDUCAÇÃO E nos permite entender as tramas tecidas
PROMOÇÃO DE SAÚDE na interface da educação com a equotera-
Vanessa Martins Rubim - SEEDF/UnB pia como possibilitadoras da configuração
nessarubim@gmail.com subjetiva de uma personalidade saudável
quando nos propomos a discutir a impli-
Pensar na tríade equoterapia, educação e cação da deficiência nesse espaço. Diante
promoção de saúde, talvez não seja algo disso, a deficiência, como produção social,
tão simples como pareça, principalmente nos impõe desafios, nos convida a refletir
quando buscamos como apoio para essa que se por um lado o defeito cria obstácu-
discussão categorias sistêmicas, comple- los e barreiras, por outro, abre novas zonas
xas e processuais ancoradas na Teoria da de possibilidade, nova organização, novas
Subjetividade de caráter histórico-cultural formações psíquicas. Portanto, quando
desenvolvida por González Rey (2003) e falamos em desenvolvimento sistêmico,
os estudos acerca do Tratado de Defec- frisamos a existência de um sujeito atual,
tologia de Vygotsky (1997). Faz-se mister em constante movimento e processualida-
salientar a princípio que a equoterapia de, implicado pela subjetividade, inserido
enquanto método terapêutico (Ande-Bra- nas dinâmicas sociais em constante tensão
sil,1989) possui ação terapêutica por meio e contraditoriedade com as experiências
do cavalo como possibilitador de novas travadas. O caminho do desenvolvimento
experiências propiciadas pela cinestesia pressupõe a relação indissociável entre
de seus movimentos. O que pode gerar a cognição e afeto e os percursos imprevi-
possibilidade de transformar-se em mo- síveis das propriedades e estruturas dessa

802
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

relação, o que rompe o caráter metafísico trabalho é direcionado. Essa teia dinâmica
e alcança a sua condição histórica, mas o e processual no espaço da equoterapia na
fator imprescindível dessa relação é o ca- articulação com a educação constitui-se
ráter sistêmico, processual e integral de em momentos que expressam a organi-
compreender o sujeito. Portanto, essa trí- zação peculiar do sujeito e de sua perso-
ade nos insere na dinâmica dos processos nalidade o que nos conduz à tentativa de
de aprendizagem e desenvolvimento desa- compreender a organização da psique e
fiadores que se apresentam nesse espaço seu caráter ontológico histórico-cultural
e nos brindam com o caráter criativo, com- fora de uma perspectiva coisificada e ob-
plexo e dialético desse desenvolvimento jetivista como um ente que se revela fora
que não segue as vias diretas, mas ver- do sujeito, mas como um sistema gerador,
dadeiros caminhos criativos e elaborados processual e em constante desenvolvi-
que mobilizam a criança na produção do mento. Vygotsky (1995) pressupõe que o
conhecimento. Investigar como as ações desenvolvimento humano seja um proces-
equoterápicas em consonância com os as- so dialético, dinâmico e interativo em que
pectos educativos se constituem em inter- as diversas funções se metamorfoseiam
venções atentas e criativas que se conec- e tomam novas formas em que as velhas
tam ao sujeito atendido percorrendo o seu não se perdem, mas são constitutivas das
funcionamento psicológico (Tacca, 2008), novas, em que interno e externo são mo-
o seu pensar e a forma como produz sen- mentos interrelacionados de um processo
tidos subjetivos nas sessões, nos levam a e não algo dicotômico que se reflete em
crer que estas corroboram à aprendizagem uma instância que se substancializa, mas
e ao desenvolvimento, impulsionam e mo- que nesse conflito produz complexas es-
bilizam esses processos. São questões que truturas psíquicas capazes de diferentes
nos instigam a entender a unidade indisso- formas de organização e desdobramentos.
ciável entre cognição e afeto e a configu- À guisa dessa premissa, entramos nos pro-
ração da personalidade enquanto sistema cessos de aprendizagem e desenvolvimen-
aberto e dinâmico de autorregulação e to que implicam os sujeitos atendidos pela
regulação do comportamento do sujeito equoterapia e destacamos que a organiza-
nos seus contextos de atuação. Quando ção da ação terapêutica pressupõe a imer-
saímos do entendimento da personalidade são do sujeito no contexto de atendimento
enquanto traços fixos definidores do sujei- (Rey, 2007). Desta forma, o terapeuta é um
to e a entendemos enquanto um sistema provocador, um facilitador da emergência
relativamente estável, trazemos uma di- de sentidos subjetivos, um organizador do
mensão subjetiva que infere que a equo- contexto social de atendimento que esco-
terapia na interface com a educação possa lhe os instrumentos que mediam e mobi-
contribuir para que o sujeito possa operar lizam os motivos e as necessidades desse
com os recursos subjetivos com os quais sujeito que alavancam a aprendizagem e
se constitui para gerar alternativas diante o desenvolvimento por meio da conexão
das situações contraditórias e tensas expe- com o seu funcionamento psicológico pe-
rimentadas convertendo-as em sentimen- culiar. São as zonas de possibilidades de
tos de segurança, confiança e autovalori- desenvolvimento aportadas não em um
zação, ou não, dependendo de como esse sujeito de ausências, mas em um sujei-

803
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

to de possibilidades que possivelmente no mundo, infectando milhares de pes-


conduzirão esse processo terapêutico a soas nos diferentes ciclos da vida. Deste
novas produções de sentidos subjetivos e modo, estratégias de prevenção, tanto in-
configurações subjetivas que corrobora- dividuais quanto coletivas, permanecem
rão à configuração de uma personalidade imprescindíveis para reduzir e controlar
saudável. Nesse sentido, concluímos que as taxas de transmissão, além das estra-
essa tríade alicerçada aos estudos da sub- tégias, há necessidade de pesquisas para
jetividade e pautada nos pressupostos de identificar os fatores psicológicos e situa-
Vygotsky coaduna para a compreensão do cionais que possam levar a uma mudança
desenvolvimento humano como um pro- neste comportamento. Entre as dificulda-
cesso singular e integral do sujeito impli- des de desenvolver e manter um compor-
cado por sua emocionalidade, o que des- tamento preventivo nas pessoas destaca-
mistifica o caráter universal, padronizado e -se a dificuldade, da maioria delas, em ter
mecânico de desenvolvimento. uma noção clara do próprio nível de risco.
Vários vieses psicológicos influem sobre
Palavras-chave: Equoterapia; Educação; esta dificuldade de percepção. Do ponto
Subjetividade. de vista cognitivo há uma tendência ge-
neralizada para a baixa avaliação do risco
acumulado, segundo Linville, Fisher e Fis-
UM MODELO PARA A PREVENÇÃO DA chhoff, estudiosos da década de noventa.
AIDS Outra distorção comum da percepção é a
Teresa Cristina Siqueira Cerqueira - UnB de se acreditar mais seguro que os ami-
teresacristina@unb.br gos e estes mais seguros que os demais.
Este otimismo parece ter origem na per-
As últimas pesquisas epidemiológicas cepção de controle. Segundo Thompson,
têm demonstrado um aumento signifi- Nanni e Levine (1994) o controle pode ser
cativo na taxa dos jovens atingidos pela definido como primário, isto é, a crença
Aids. Neste grupo predominam aqueles de que pode influenciar a realidade, ou
cuja vida sexual é intensa e que nem sem- secundário, obtido por meio da aceitação
pre tomam as precauções necessárias. A da realidade. Fatores motivacionais como
constatação de que, muitas vezes jovens os estereótipos acerca das características
estudantes universitários, com acesso à dos grupos de pessoas atingidas são con-
informação pertinente, assumem riscos siderados como provocando um otimismo
desnecessários, faz com que o estudo dos irrealista, de quem se considera diferente
fatores psicológicos deste comportamen- dos demais. Este tipo de reação foi en-
to tenha-se tornado extremamente rele- corajada muito tempo pela mídia, que já
vante. Pesquisas como a de Dhalia, Bar- deixou de associar a Aids a drogados e ho-
reira e Castilho (2000), e a de Szwarcwald mossexuais. Outro fator motivacional que
e Castilho (1999), têm demonstrado uma leva ao otimismo irracional é o mecanis-
redução na taxa dos jovens atingidos pela mo de negação defensiva, que ajuda a re-
Aids (Síndrome da Deficiência Imunoló- duzir a ansiedade, pela redução na avalia-
gica Adquirida) no Brasil. Atualmente a ção dos riscos. Finalmente todos os tipos
Aids está disseminada em todo o país e de otimismo exagerado têm como base

804
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

uma avaliação comparativa, mostrando D’Amorim (2002, 2004), todas com re-
claramente a força da referência social. sultados positivos e propondo alterações
Pode-se perceber que, se a percepção para a prevenção. Portanto, conclui-se
da própria vulnerabilidade leva, no caso que a prevenção tem estreita relação com
das outras doenças a um comportamen- o comportamento; as intervenções que
to preventivo, a ligação entre estas duas ensinam tais habilidades têm sido efeti-
variáveis não se aplica no caso da Aids. vas na promoção do comportamento de
Os modelos mais conhecidos de compor- evitar riscos.
tamento de saúde foram elaborados para
lidar com doenças não fatais e até, ocasio- Palavras-chave: AIDS; Modelo para
nalmente, reversíveis e no caso da Aids os Prevenção; Motivação.
comportamentos de risco a serem evita-
dos estão, em geral, ligados à vida sexual
o que os torna eminentemente sociais, MR LT07
afetando outras pessoas e dependendo
Mesa Redonda
de sua colaboração. Os autores Fisher e
Fisher (1992), discutem uma conceitu-
ação e um conjunto de operações dela
MR LT07-1492 - DESENVOLVIMENTO
derivada que possa fornecer uma base
HUMANO EM CONTEXTOS INCLUSIVOS
mais sólida às intervenções visando a re-
dução do risco Aids. A informação acerca Celeste Azulay Kelman - FE/PPGE/UFRJ
dos métodos de transmissão da Aids e de
modos específicos de prevenir a infecção Esta Mesa Redonda pretende discutir as
são elementos indispensáveis à obtenção influências das interações sociais sobre a
de um comportamento preventivo. A mo- diversidade humana, focalizando a inclu-
tivação para mudar o comportamento de são de algumas minorias em diferentes
risco é o segundo determinante da dispo- contextos e etapas do desenvolvimento.
sição à prevenção. Finalmente as habili- Será abordada a inclusão na escola, na
dades comportamentais necessárias para sociedade, na família e no trabalho de su-
executar os atos preventivos completam jeitos que apresentam surdez na infância
os três elementos do modelo. O modelo e na vida adulta, sujeitos com deficiência
é chamado pelos autores de (IMB) vindo intelectual e adolescentes em conflito
de: Information – Motivation – Behavior. com a lei. A primeira autora apresenta
(Fisher e Fisher, 1993). A partir do modelo os reflexos do respeito à diferença lin-
geral (IMB) as informações, a motivação güística dos alunos surdos de uma escola
e as habilidades a serem utilizadas serão de ensino fundamental e o impacto que
específicas ao grupo que o pesquisador essa diferença traz no desenvolvimento
visa atingir, seja este de homossexuais, da autoestima, da formação identitária
drogados, donas de casa ou estudantes e do bom desempenho acadêmico. Pro-
universitários. O modelo proposto pelos blematiza o papel dos diferentes partici-
autores já foi amplamente aplicado em di- pantes da escolarização desses alunos,
versos países, em especial no Brasil, como mostrando que a língua de sinais não ga-
mostram as pesquisas desenvolvidas por rante o aprendizado e o desenvolvimento

805
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da autoestima e pertencimento, trazendo locutores; tornaram-se mais ousados em


contribuições para o aperfeiçoamento abordar e manter contato com pessoas
da inclusão escolar. A segunda autora faz estranhas; e passaram a ter maior con-
um histórico epistemológico relativo ao trole sobre as próprias vidas, realizando
desenvolvimento de sujeitos com defici- atividades simples como escolher roupas,
ência intelectual, deslocando o eixo do administrar dinheiro, expor vontades e
enfoque biológico para o caráter multidi- modificar hábitos. A última autora con-
mensional da deficiência intelectual. Le- tribui com proposta interdisciplinar no
vanta um conjunto de questionamentos atendimento à adolescentes em conflito
relativos às formas de inclusão de sujeitos com a lei, revelando a mudança da abor-
com deficiência intelectual, desde o dese- dagem interinstitucional governamental,
nho de atenção ao estudante com neces- que transfere o atendimento da Secre-
sidades educacionais especiais, de uma taria de Justiça para a de Educação. Para
maneira geral, proposto pela Política Na- melhor incluir socialmente esses jovens,
cional de Educação Especial na Perspecti- os profissionais propõem a criação de um
va da Educação Inclusiva do MEC (2008), projeto individualizado para cada adoles-
até o estudante em situação de deficiên- cente, o PIA. Relata o acompanhamento e
cia intelectual, considerando o modelo o destino de nove adolescentes em cum-
de atendimento educacional especializa- primento de medida socioeducativa e em
do- AEE no contraturno e a adoção de um situação de vulnerabilidade social, em um
currículo único para todos os estudantes projeto que agrega a atividade esportiva à
da Educação Básica, com ou sem flexibi- formação profissional, com o objetivo de
lizações. Em seguida, a terceira autora inserção no mercado de trabalho.
analisa a percepção das famílias de adul-
tos surdos que não adquiriram nenhuma
língua e que crescem em ambiente pobre INCLUSÃO E AUTOESTIMA ANDAM
de desafios, com cuidadores que têm JUNTAS? DECORRÊNCIAS DA PEDAGOGIA
baixas expectativas quanto ao seu desen- VISUAL
volvimento. Foram analisadas entrevistas Celeste Azulay Kelman - UFRJ
com familiares de adultos entre 35 e 52 cel.azul@superig.com.br
anos, procurando identificar concepções Financiamento: FAPERJ
a respeito da surdez. Todos os quatro sur-
dos buscaram a escola na idade adulta, na A história escolar dos surdos foi marca-
perspectiva de incluírem-se socialmente. da por movimentos de fracasso escolar
É quase consenso entre os familiares a e evasão, produzindo sentimentos de
descrença de que o surdo possa tomar frustração e baixa-estima. Nas primeiras
conta de si mesmo e encontrar, por es- décadas do século XXI, entretanto, têm
forços próprios, meios de subsistência. A sido observadas no Brasil transformações
conquista da linguagem representou um com a política de inclusão e o reconhe-
marco no desenvolvimento destes adul- cimento da Libras como a língua oficial
tos. Mesmo não sendo fluentes, estes da comunidade surda (Lei 10.436/2002).
alunos passaram a interagir com outras Em decorrência, o governo cria legisla-
pessoas, alargando o universo de inter- ção que passa a garantir aos surdos que

806
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Libras seja a sua língua de instrução (De- onde circulam e são respeitadas ambas as
creto Presidencial 5.626/2005). Espera-se línguas, a portuguesa e a Libras. Mas será
que a escola se adapte às necessidades que os aspectos culturais que envolvem
educacionais desses alunos, mas o que o currículo estão sendo pautados nessa
por vezes ainda se observa é o fenômeno perspectiva? Ou permanecem atendendo
denominado “copismo”, onde os alunos à cultura dominante, logocêntrica? O que
surdos dentro das classes regulares fazem fazer para que a escola apresente indi-
uma cópia mecânica, desprovida de signi- cadores mais eficazes no processo de le-
ficado e que não conduz à aprendizagem. tramento de alunos surdos, promovendo
Também apresentam uma produção tex- não apenas a construção de conhecimen-
tual rudimentar, muitas vezes incompre- tos, mas também sujeitos com autoesti-
ensível, por não dominarem a gramática, ma enaltecida? Como os surdos podem
o léxico e a semântica da língua portu- aprender melhor o português, já que
guesa. Tradicionalmente, dentro do âm- sucesso acadêmico relaciona-se também
bito escolar, as metodologias e práticas com satisfação pessoal? Será que seus
educativas empregadas são apoiadas em professores têm passado por processos
aspectos fonéticos da nossa língua. Em de formação continuada? A língua portu-
decorrência, os alunos surdos do ensino guesa está sendo ensinada como segun-
fundamental vivenciam grandes dificulda- da língua? Pratica-se a pedagogia visual?
des para aquisição da língua portuguesa, Estão presentes os atores necessários ao
o que pode eventualmente ser entendido processo adequado à escolarização do
como incapacidade cognitiva. Por serem surdo, como o intérprete educacional e
filhos de pais ouvintes, são prejudicados o instrutor surdo adulto, por exemplo?
na formação inicial de conceitos e meca- Nesse sentido, buscamos investigar quais
nismos que desenvolvem o pensamento, os aspectos que relacionam sucesso aca-
uma vez que língua e pensamento cami- dêmico com satisfação pessoal em con-
nham juntos, um influenciando o outro. textos de aprendizagem do português
Os problemas relacionados à educação como segunda língua. Com o objetivo de
de alunos surdos vão desde a estrutura verificar qual o impacto que o respeito à
e funcionamento da escola, passando diferença lingüística causa no processo de
pelo acesso ao currículo até as pessoas letramento, na autoestima e na constru-
que respondem diretamente pela inclu- ção identitária de alunos surdos, foi reali-
são escolar no ensino fundamental: seus zada uma intervenção em uma escola da
professores e gestores (Kelman; BRANCO; rede pública municipal, em forma de re-
2003; 2004). Para verificar o estágio atu- forço escolar. Os participantes foram cin-
al de desenvolvimento escolar de alunos co alunos surdos de quarto ano do ensino
surdos na rede pública municipal, procu- fundamental, com idades variando entre
ramos identificar se a escola está se trans- onze e treze anos. Inicialmente foi feita
formando para assumir uma posição de uma reunião com as mães desses alunos,
respeito à construção identitária desses que autorizaram a realização da pesqui-
alunos, tornando-se uma escola “bi-bi”: sa. As estratégias utilizadas foram o ensi-
bicultural, que englobe a cultura ouvin- no de português como segunda língua e
te e a cultura surda, e bilíngue, um local o uso da pedagogia visual (BUZAR, 2008).

807
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

A metodologia utilizada, de cunho quali- metendo o aluno a um estado de terror:


tativo, baseou-se na Semiótica Imagética “Vou te dar mais um chance, se você não
(Santaella; Nöth, 2001) e introduziu aulas acertar, vai ficar sem almoço! Tem que ser
de português fora da sala de aula ao lon- assim. Só funciona por pressão.” Apesar
go de 2011. Foram também entrevistados de alguns entraves, os resultados acadê-
a diretora, a professora da classe regu- micos dos alunos estão comparáveis aos
lar, a intérprete, a professora da sala de das crianças ouvintes, com defasagem
recursos, o instrutor surdo e os próprios ainda em português. Os resultados da
alunos surdos. As aulas foram realizadas turma de quarto ano onde estão inseri-
pela pesquisadora, juntamente com duas dos, nas provas bimestrais padronizadas,
alunas da graduação em Pedagogia, a têm mostrado uma média melhor do que
professora da sala de recursos e a intér- da outra turma de quarto ano da escola.
prete fora da sala de aula. O ambiente uti- Essa intervenção tem resultado em me-
lizado foi a sala de informática da escola, lhor aprendizado e poderá apontar para
para acesso aos computadores, que faci- a adoção da mesma estratégia em outras
litariam o uso de recursos visuais. A dire- escolas onde existam alunos surdos inclu-
tora da escola revelou que esses alunos ídos e em diferentes séries escolares. As
estavam em classe especial (CE) até 2009; modificações estruturais na escola, que
mas, em 2010, pela política de inclusão, reconhece e respeita as características
foram transferidos para classe regular. Ela linguísticas do seu alunado surdo, têm
diz: “Acho uma “bobagem” ter colocado implicado no aumento da autoestima, o
os alunos da CE na classe comum. Era que retroalimenta o processo de escolari-
preferível eles ficarem na salinha deles, zação dos alunos surdos.
que se é pra socializar, eles já estão. Estão
super integrados, se divertem e brincam, Palavras-chave: educação, surdez, pedagogia
só não ouvem. No governo Federal eles visual
não entendem nada de escola.”. A pro-
fessora da sala de recursos acompanha
esses alunos há mais de seis anos e disse EDUCAÇÃO INCLUSIVA E ATENÇÃO
sobre um deles: “No começo, ele belis- AO ESTUDANTE EM SITUAÇÃO DE
cava, chutava e jogava as coisas no chão. DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
Depois que aprendeu Libras, se acalmou. Erenice N. Soares Carvalho - UCB
Hoje esses alunos surdos são melhores erenice@pos.ucb.br
do que muitos alunos ouvintes da classe.”
A professora regente constata a evolução A deficiência intelectual é compreendi-
acadêmica dos mesmos, dizendo: “Eu da e explicada diferentemente, segundo
percebo que os olhinhos deles brilham diversas abordagens teóricas. Historica-
quando compreendem o que estou di- mente, e de modo consensual, apenas a
zendo”, o que é feito pelo trabalho da in- dimensão cognitiva era considerada na
térprete. Houve troca de três intérpretes identificação do fenômeno, caracterizado
durante a realização da pesquisa e nem pelo atraso no desenvolvimento da inte-
sempre estes tiveram uma atuação ade- ligência. Nessa perspectiva, a concepção
quada, deixando de interpretar ou sub- piagetiana, representada pelo estudo

808
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

clássico de Inhelder em 1944 Le diagnostic à sua educação e escolarização. Conver-


du raisonnement chez lês débiles mentaux gente com o modelo social, a American
(NOT, 1975), explica a deficiência intelec- Association on Intelectual and Develop-
tual como uma construção mental inaca- mental Disabilities-AAIDD (2010) vem re-
bada, impossibilitando à pessoa o alcance definindo, desde a década de 90, sua con-
de níveis superiores de conhecimento e cepção de deficiência intelectual, vista
de construção das funções mentais, via- atualmente como: “limitação significativa
bilizados pelo desenvolvimento cognitivo no funcionamento intelectual e no com-
pleno. A limitação intelectual foi reco- portamento adaptativo, como expresso
nhecida, também, por Vigotski (1995), e nas habilidades conceituais, sociais e prá-
entendida como resultado das respostas ticas. A deficiência origina-se antes dos 18
sociais do meio ambiente à condição (de- anos de idade” (AAIDD, 2010, p. 1). Essa
feito) apresentada pela pessoa; caracteri- definição enfatiza a limitação significativa
zou-se a deficiência, portanto, como uma como indicadora de desvantagens para a
condição social e culturalmente provoca- pessoa em situação de deficiência, quanto
da. As visões de deficiência enquanto des- ao seu funcionamento na sociedade. Por
vantagem natural, biológica, provocada sua vez, considera o funcionamento inte-
por lesões ou reações sociais, passaram a lectual como uma das dimensões impor-
coexistir com uma representação alterna- tantes do conceito, mas não a única. Essa
tiva desde os anos 70, na emergência do perspectiva funcionalista defende que os
modelo social de deficiência. O modelo comportamentos funcionais da pessoa
foi um marco teórico da concepção des- levam em conta fatores contextuais, fa-
se fenômeno, descrito não mais em uma tores de natureza pessoal (idade, gênero,
perspectiva personalista, tendo o corpo, raça, história de vida, escolarização, etc.)
o organismo, como centralidade, mas e fatores ambientais (físicos e sociais), de
concebido na interação pessoa-ambiente modo que a deficiência intelectual deixa
(Diniz, 2007). Essa visão colocou a defici- de ser vista como um estado ou condi-
ência como problema social e, não ape- ção da pessoa para ser concebida como
nas, da pessoa e sua representatividade um estado de funcionamento no ambien-
corporal. O modelo social de deficiência te, justificando, a nosso ver, a expressão
tem ganhado reconhecimento e aceita- situação de deficiência. Enfim, a AAIDD
ção em estudos e pesquisas da comuni- defende o caráter multidimensional da
dade científica, em textos governamen- deficiência intelectual, ressaltando a ar-
tais e de organismos internacionais e em ticulação entre habilidades intelectuais
documentos e legislações. Desse modo, e adaptativas, mediadas por sistemas de
passou-se a demandar uma resposta so- apoio, envolvendo cinco dimensões: habi-
cietal à exclusão e ao negligenciamento lidades intelectuais, habilidades adaptati-
dos direitos das pessoas em situação de vas, saúde, participação social e contex-
deficiência, mediante o reconhecimento to. Essa visão coaduna-se com o modelo
da diversidade, da posição de desigualda- bioecológico de Bronfenbrenner (1996, p.
de em que se encontravam, requerendo 14), para quem “o desenvolvimento hu-
a promoção de medidas de superação do mano é um produto da interação entre o
status quo, inclusive no que diz respeito organismo humano em crescimento e seu

809
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

meio ambiente [...]”, relacionando o im- te à aprendizagem e ao desenvolvimento


pacto do ambiente no desenvolvimento e do estudante em situação de deficiência
no funcionamento humano em diferentes intelectual (e outros), sua preparação
níveis sistêmicos. Coaduna-se, ainda, com para o trabalho e exercício da cidadania,
a Classificação Internacional de Funciona- como preconiza a Constituição Federal de
lidade, Incapacidade e Saúde – CIF (OMS, 1988. Como desdobramento, as seguintes
2003), considerando que o funcionamen- questões se impõem: O que caracteriza-
to humano abrange um conjunto de fun- mos como inclusão escolar? Que posição
ções e estruturas do corpo, atividades da social ocupa o estudante em situação de
pessoa e participação social. Desse modo, deficiência intelectual enquanto sujeito
quando são garantidas condições favorá- da inclusão na escola? De que mudanças
veis de apoio, interações sociais positivas estamos falando, para as escolas e os sis-
e acessibilidade à vida comunitária e aos temas educacionais, para tornar efetivo o
bens da cultura, ampliam-se as expectati- processo de inclusão? Qual é o desenho
vas de desenvolvimento da pessoa, bem de atenção ao estudante com necessida-
como os horizontes para sua realização des educacionais especiais proposto pela
pessoal e social. A inclusão educacional Política Nacional de Educação Especial
escolar nessa concepção de deficiência na Perspectiva da Educação Inclusiva do
intelectual abre espaço para uma gama MEC (2008) ao estudante em situação de
de reflexões. Dyson (apud Inclusión In- deficiência intelectual? Consideram-se o
ternacional, 2011) distingue quatro en- modelo de atendimento educacional es-
foques de inclusão escolar baseados em pecializado-AEE no contraturno, segundo
diferentes ênfases: (a) localização física– a caracterização proposta pelo MEC, e a
enfatizando a inserção do estudante na adoção de um currículo único para todos
escola comum/classe comum, fundamen- os estudantes, com flexibilizações? É pos-
tando-se principalmente nos direitos hu- sível uma aula que contemple a diversida-
manos e na igualdade de oportunidade; de de todos os estudantes em sua singula-
(b) acessibilidade– enfatizando a educa- ridade? Que espaço ocupa o “Pluralismo
ção para todos mediante a acessibilidade de ideias e de concepções pedagógicas”
plena e a prática do desenho universal; nas propostas atuais dos sistemas de en-
(c) participação social– destacando a in- sino, como preconiza a Constituição Fede-
tegração social do estudante, mediante ral de 1988? Essas questões constituem
relações/interações sociais e interpesso- pontos indutores de análises que podem
ais e; (d) inclusão social/societal– tendo contribuir para orientar a avaliação da
como ênfase a cidadania plena, defen- efetividade do processo de inclusão quan-
dida e conduzida pela escola como eixo do se pensa a deficiência intelectual e as
detentor do poder e capaz de superar os necessidades educacionais especiais dela
impeditivos da inclusão escolar e social, decorrentes na escolarização de estudan-
atuando como protagonista da transfor- tes da Educação Básica.
mação da sociedade excludente em inclu-
siva. Algumas reflexões nesse sentido re- Palavras-chave: educação inclusiva,
metem, primeiramente, às possibilidades deficiência intelectual, modelo funcional de
efetivas da escolar exercer seu papel fren- deficiência

810
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ADULTOS SURDOS: A FAMÍLIA COMO concebido ao surdo, “seu papel e destino


LUGAR DE DESENVOLVIMENTO como partícipe da vida” (p. 18). Este au-
Linair Moura Barros Martins - SEE/DF tor analisa profundamente a linguagem–
linairmoura@gmail.com ou sua ausência– do ponto de vista do
desenvolvimento das funções psíquicas
A aquisição da primeira língua é um fenô- superiores, argumentando que este não
meno tipicamente integrante da infância; está ligado às condições orgânicas e sim
entretanto, há um grupo de indivíduos, às sociais, uma vez que é do ambiente
os surdos, que enfrentam enormes di- da criança que virão as condições e de-
ficuldades no processo de aquisição de safios que propiciarão o seu desenvolvi-
língua nesta fase. Cerca de 95% dos sur- mento. Estudos indicam que a língua de
dos brasileiros são filhos de pais ouvintes sinais é constituída pelos mesmos parâ-
e, nesta situação, o ambiente lingüístico metros das línguas orais e que ela exerce
doméstico não oferece um input ade- o mesmo papel quanto ao desenvolvi-
quado, uma vez que a língua de sinais, mento das funções vitais da linguagem
que poderia ser aprendida naturalmente (Vigotsky, 1997) e outras competências
(QUADROS, 1997), não é utilizada nem humanas que se baseiam nesta capacida-
conhecida pela família e o desenvolvi- de (Quadros, 1997). Para Bakhtin (1981),
mento da linguagem oral não tem como é pela aquisição de uma língua que se
acontecer em razão da impossibilida- constitui a consciência. A consciência se
de de percepção dos sons pela criança confunde com o processo constitutivo do
com surdez profunda. Sem este acesso, sujeito, porque é a através da língua que
muitas vezes, os surdos chegam à idade se dão a interação com o outro e a apro-
adulta sem aquisição de nenhuma língua. priação de conhecimentos, valores, nor-
Este fato tem como conseqüência o es- mas e conceitos compartilhados que per-
tabelecimento grandes dificuldades que mitem a inserção no grupo social. Consi-
se manifestam na interação social e na derando a relevância que Vigotsky dá ao
sua autonomia, especialmente quando ambiente como promotor de condições
o ambiente em que crescem é pobre em adequadas para que o desenvolvimento
desafios e as pessoas que estão ao seu da pessoa com deficiência se concretize,
redor, principalmente os cuidadores, têm e nessas condições está incluído o status
baixas expectativas quanto ao seu desen- social da deficiência que se revela nas
volvimento. A deficiência cria dificulda- metas estabelecidas socialmente como
des diferentes para o desenvolvimento um ideal para os indivíduos de um deter-
nos planos biológico e cultural. Segundo minado grupo, pode-se antever os resul-
Vigotsky (1997), a surdez gera um efeito tados de um ambiente em que a surdez
primário, de origem biológica, que é sen- é tida como uma característica limitante
tido apenas secundariamente por meio e no qual estejam presentes valores ne-
das ações das pessoas que compõem o gativos em relação às capacidades das
entorno do surdo, no modo como enten- pessoas surdas. No estudo em questão,
dem a deficiência e no status social que o desenvolvimento lingüístico dos alu-
dão a ela. Isto se traduz no lugar social nos tem como característica importante
o início da aquisição da primeira língua

811
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

na idade adulta. Esta realidade marca de lias não demonstraram expectativa quan-
forma significativa este processo por se to a um possível casamento ou trabalho
tratar de pessoas que já estabeleceram da pessoa surda. Uma mãe entende que
sua experiência de vida com a utilização as aproximações de seu filho adulto com
de um sistema gestual, constituído no o sexo oposto são “coisas de criança”. Foi
âmbito doméstico e compartilhado com possível concluir que existe uma respon-
um número muito restrito de interlocu- sabilidade passada de uma geração para
tores. Quatro entrevistas com famílias outra quanto ao cuidado com o surdo. A
de surdos foram analisadas, procurando conquista da língua representou um mar-
identificar suas concepções a respeito co no desenvolvimento destes adultos
da surdez. Os surdos em questão são surdos. Na medida em que aprenderam
quatro adultos com idades que variam a usar uma língua como meio de comuni-
de 35 a 52 e que buscaram a escola na cação, mesmo não sendo fluentes, estes
idade adulta, onde começaram a apren- alunos passaram a interagir com outras
der a língua de sinais. Foram constituídas pessoas, alargando o universo de seus
quatro categorias de análise nas entrevis- interlocutores. Pelos relatos dos familia-
tas: a) a comunicação; b) o status dado res, eles se tornaram mais ousados em
à deficiência; c) a expectativa quanto ao abordar e manter contato com pessoas
futuro; e d) as mudanças resultantes da estranhas e passaram a ter maior contro-
inserção na escola e do o aprendizado da le sobre as próprias vidas, realizando ati-
língua de sinais. Quanto à comunicação, vidades simples como escolher roupas,
as quatro famílias relataram a constru- administrar dinheiro, expor vontades,
ção do sistema gestual na infância para modificar hábitos da vida diária. Ganha-
atender às necessidades básicas. Este sis- ram certa autonomia nas atividades da
tema gestual ainda é utilizado no âmbito vida social. As famílias são muito resilien-
doméstico e a comunicação se restringe tes quanto ao novo meio de comunicação
à indicação de atividades relativas a cui- e não demonstraram interesse com seu
dados pessoais, alimentação, repouso e aprendizado, relatando que os gestos
higiene. Relataram ainda que a comuni- satisfazem as necessidades de comunica-
cação com o surdo é estabelecida, em ge- ção. Percebe-se que, para as famílias, a
ral, com apenas um membro da família, surdez é uma condição limitante se suas
pois nem todos, no âmbito doméstico, expectativas ainda são baixas quanto ao
entendem ou se fazem entender com ele. desenvolvimento do surdo.
Quanto ao status da deficiência, três fa-
mílias consideram que cuidar do familiar Palavras-chave: surdez, língua de sinais,
com deficiência é uma espécie de missão. interação familiar
Há um sentimento de responsabilidade e
não existe a crença de que o surdo possa
tomar conta de si mesmo e encontrar, por
esforços próprios, meios de subsistência.
Dois, dentre os quatros, foram matricu-
lados na escola após as mortes das mães
cuidadoras. Quanto ao futuro, duas famí-

812
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

AS NOVE VELAS: UM OLHAR SOBRE O atividades dos adolescentes no CRIAAD; o


PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE assistente social, pelo acompanhamento
ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO do adolescente na relação com as famí-
DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO lias; o psicólogo, pelo acompanhamento
ESTADO DO RIO DE JANEIRO psicológico do adolescente, voltado para
Mercedes Villa Cupolillo - FAP/São Gonçalo-RJ o aspecto do desenvolvimento. O traba-
mercedes.cupolillo@gmail.com lho do psicólogo possui uma proposta
interdisciplinar e, em nossa experiência,
A ruptura com os velhos costumes da deparamos-nos com situações freqüen-
criança “em situação de risco”, a par- tes de conflitos e troca de papéis entre
tir das conquistas de políticas de direi- os profissionais. Na direção do desenvol-
to na década de 80, transfere o foco do vimento, uma das propostas sinalizadas
assistencialismo para a possibilidade de pelo SINASE é a do projeto individualiza-
promoção do desenvolvimento, sendo do para cada adolescente, o PIA (Monte,
a criança considerada “sujeito de direi- 2011). Com base em uma experiência da
to”. Com base no Estatuto da Criança e autora de seis meses no DEGASE, o tra-
do Adolescente, na Lei 8.0669/90, e em balho em questão pretende discutir os li-
diálogo com o Sistema de Atendimen- mites e possibilidades de implantação do
to Socioeducativo – SINASE –, o DEGASE PIA, a partir de estudos de casos de nove
vem promovendo mudanças a partir de adolescentes em cumprimento de medi-
reformulações sobre as Ações Socioe- da socioeducativa. Durante o percurso,
ducativas. Entre elas, os antigos CRIAMS a autora ficou responsável pelo acompa-
passaram a se constituir como unidades nhamento de um grupo de adolescentes
vinculadas aos Municípios, responsáveis em um projeto que agregava a atividade
pela medida de “liberdade assistida”. Em esportiva à formação profissional, com o
contrapartida, o governo do Estado do objetivo de inserção no mercado de tra-
Rio de Janeiro instituiu o Departamento balho - PROJETO GRAEL. O projeto acon-
de Ações Socioeducativas, desvinculando tece em uma ONG na cidade de Niterói,
o DEGASE da Secretaria de Justiça. Atra- fundada pelos velejadores irmãos Grael,
vés do decreto de nº 18.493/93, ele foi inicialmente com o objetivo de promover
transferido para a Secretaria Estadual de a socialização do esporte da vela. Mais
Educação como órgão estadual respon- tarde, o projeto foi ampliado e, hoje em
sável pela execução das medidas socioe- dia, recebe adolescentes e crianças em
ducativas: “de infrator à adolescente em situação de vulnerabilidade social para
conflito com a lei”. O trabalho passou a cursos profissionalizantes voltados ao
ser realizado por uma equipe de profis- esporte, além da natação para vela e da
sionais previamente capacitados através vela, enquanto atividades esportivas. Os
de um curso com duração de 40 horas, cursos são de mecânica de poupa, mecâ-
ministrado por equipes do DEGASE. Nes- nica a diesel, carpintaria náutica, eletro-
se contexto, o pedagogo é basicamente -eletrônica náutica, fibras e capotaria. Os
responsável pelo acompanhamento do adolescentes ingressam a partir de acordo
processo de escolarização; os agentes estabelecido entre o CRIAAD e o grupo do
educativos, pelo acompanhamento das PROJETO GRAEL. A participação nas ativi-

813
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dades implicava a saída do adolescente quase ninguém aprecia, mas, hoje, tenho
do CRIAAD por uma manhã ou tarde, três certeza de que é um dos requisitos mais
vezes na semana, em um período de qua- importantes para a vida desses adoles-
tro meses consecutivos. Foram nove os centes e tantos mais. Duvidar para com-
adolescentes acompanhados pela autora. preender é importante, mas desacreditar
Dentre eles, apenas um obteve uma colo- remete à condição de eterna impotência
cação significativa no mercado de traba- ou impossibilidade de mudança. Como
lho imediatamente após o curso, optando discute Bauman, é a completa derrota
pelo envolvimento com grupos diferentes em uma sociedade como a nossa, onde
de adolescentes; dois retornaram à es- quase nunca se confia no próximo, mas
cola após um período de cinco anos de na possibilidade de superá-lo. Portanto,
ausência; dois deles obtiveram uma colo- na lógica desses adolescentes, ninguém
cação no mercado de trabalho, optando corre riscos se não for um pouco ingênuo
por um novo curso no projeto; três inter- e abraçar os novos desafios acreditando
romperam o curso após a progressão de que dali sairá algo diferente. Meus veleja-
medida socioeducativa. O relato a seguir dores eram ingênuos também. E foi esse
descreve nosso percurso desde os primei- leme que levou alguns deles até o fim da
ros contatos com adolescentes em confli- jornada. A ausência dele, à deriva do bar-
to com a lei. Adegmar, juiz da infância e co. Após a análise dos casos, observamos
da juventude em uma cidade longe daqui, que alguns fatores foram determinantes
me surpreendia com sua capacidade de para que cada vela pudesse se coloca ao
ver um potencial para a vida fora do cri- vento: a aceitação/credibilidade do ado-
me naquelas crianças e adolescentes, tão lescente pelo grupo de profissionais e
temidos por sua violência. Eu tanto tinha pela família; as formas de vínculo estabe-
admiração por ele quanto curiosidade lecidas com os profissionais e grupos do
em saber como deveria ser amar aque- CRIAAD e do PROJETO GRAEL; as estraté-
las pessoas. Minha convivência com eles gias desenvolvidas pelo adolescente na
me levaria mais tarde a essa compreen- relação com os demais durante o seu per-
são. No CRIAAD, assim que os adolescen- curso no CRIAAD; e, finalmente, “a inge-
tes chegavam à unidade, os recebíamos nuidade”. De vez em quando, acordo de-
através de uma entrevista padronizada. solada com a maré. Lembro-me daqueles
Assustava-me a cada contato com um barquinhos desnorteados. Quando ficam
dos adolescentes. Por incrível que pareça, assim, logo me preocupo, temendo que
não era a condição de ilegalidade que me as velas se deteriorem e já não possam
sensibilizava, mas a condição humana de continuar a velejar. As velas ainda não
cada um deles. Foi assim que o afeto por têm rumos muito claros. Além disso, fre-
eles acabava por se entranhar através de qüentemente não sabem se deixar levar
nossos olhos, ouvidos, pele, quando nos pelos bons ventos, resistindo ao encontro
deparávamos com sorrisos deslocados, de si mesmos.
corpos mal tratados, falas interrompidas,
vidas dissimuladas, esperanças adiadas. Palavras-chave: desenvolvimento, medida
É preciso ser ingênuo para viver. Isso eu socioeducativa, inclusão laboral
aprendi com eles. Ingenuidade é algo que

814
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

SP LT04 - Simpósio de Formosa/ Departamento de Química.


Nele revelam como transpor obstáculos
pedagógicos ao desafiar preconceitos e
SP LT04-1496 - A FORMAÇÃO DOCENTE propor as adaptações metodológicas ne-
DEVE CONSIDERAR A PSICOLOGIA DO cessárias para efetivar a educação inclu-
DESENVOLVIMENTO NA EDUCAÇÃO siva no que tange o desenvolvimento da
INCLUSIVA DO JOVEM AO ADULTO? educação científica, com o caso específi-
Juliana Alves de Araújo Bottechia - UEG/UnU co do ensino de Química para estudantes
- Formosa com deficiência visual. O terceiro trabalho
juliana.bottechia@gmail.com é apresentado por Renato Santos, Ana
Marques, Alexandra Pereira e Vânia Ba-
Houve um tempo que a Psicologia do De- cellar, todos colegas de profissão que atu-
senvolvimento em relação à Educação res- ando na Secretaria de Estado de Educação
tringia, em certa medida, suas ocupações do Distrito Federal estiveram à frente da
ao ensino na infância. No entanto, com experiência de construir o módulo res-
o percurso desenvolvido após a LDB nº. ponsável por relacionar Diversidade, Edu-
9394/1996 passa-se a discutir essa rela- cação e Trabalho nos cursos “Construindo
ção de modo mais ampliado, inclusive no Práticas Educativas na Educação de Jovens
que toca a educação dos jovens aos adul- e Adultos”. Esta contribuição versa sobre
tos. Sendo assim, nesta perspectiva, apre- as pesquisas realizadas por este grupo de
sentamos uma provocação como propos- professores da rede pública de ensino para
ta deste Simpósio “A Formação Docente os professores dessas escolas com foco na
deve Considerar a Psicologia do Desenvol- EJA e, sendo assim, considera a formação
vimento para a Educação Inclusiva do Jo- docente como fundante para que educa-
vem ao Adulto?” com trabalhos de grupos ção e trabalho construam o ser humano
envolvidos com a Educação Básica que, de em meio á diversidade. A quarta pesqui-
alguma forma, procuram se aproximar. O sa apresentada trás os resultados iniciais
primeiro deles, apresentado por Robson de uma pesquisa em andamento realiza-
Camara, Kattia Amin, Andréia Tavares e da pelo Grupo de Pesquisa em Educação
Simão de Miranda sintetiza a experiência Especial (GPEE) frente aos cursos de for-
do Grupo de Estudo e Pesquisa em Edu- mação continuada da SEE-DF/Eape. Neste
cação de Jovens e Adultos (GEPEJA) fren- caso específico, Susana Carvalho e Leda
te aos cursos de formação continuada da Bitencourt representam o grupo e reve-
SEE-DF/EAPE. Nele, analisam o processo lam uma escuta sensível tanto às questões
sócio-histórico de aprendizagem consi- legais quanto às angústias de professores
derando o desenvolvimento proximal na da rede pública para lecionar junto ao pú-
educação de jovens e adultos. O segundo blico da modalidade; em toda sua trans-
apresenta ainda que resumidamente, al- versalidade; sem contar com o suporte do
guns resultados de investigações as quais Atendimento Educacional Especializado e
tive a oportunidade de orientar, realizadas como é fundamental a formação contínua
por Marina Lopes e Igor Menezes. Eles re- na área. Assim, este Simpósio não tem a
presentam a participação da Universidade pretensão de esgotar o tema, mas sim,
Estadual de Goiás/ Unidade Universitária com trabalhos de grupos envolvidos com a

815
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Educação Básica e que, de alguma forma, com formação de professores da rede pú-
procuram aproximar suas visões comple- blica de ensino do Distrito Federal reali-
mentares sobre a formação docente, seja zada durante o desenvolvimento dos cur-
inicial ou continuada. sos “Construindo Práticas Educativas na
Educação de Jovens e Adultos” na Escola
de Aperfeiçoamento dos Profissionais da
A APRENDIZAGEM NA PERSPECTIVA Educação- EAPE. A prática de ensino re-
SÓCIO HISTÓRICA NA EDUCAÇÃO DE quer que tenhamos como pressuposto
JOVENS E ADULTOS uma compreensão clara e segura do que
Robson Santos Camara Silva - SEE-DF/GEPEJA significa a aprendizagem, o que remete
robsoncamara@gmail.com a vários problemas. Pode-se inferir que
Kattia de Jesus Amin Athayde Figueiredo - desde o momento que nascemos estamos
SEE-DF/GEPEJA aprendendo, e continuamos aprendendo
kattia.unb@gmail.com a vida toda. Nestes termos, a questão da
Simão de Miranda - SEE-DF/GEPEJA, aprendizagem toma dimensões mais am-
simaodemiranda@globo.com plas. Observa-se que há uma gradação
Andréia Costa Tavares - SEE-DF/GEPEJA das complexidades dos interesses e pre-
prof.andreiatavares@gmail.com ocupações que tomam corpo ao longo da
vida dos indivíduos. Tais aspectos ocupam
As constantes transformações num mun- o centro do processo de ensino-aprendi-
do em que ciência, tecnologia e outras zagem como elementos fundante no con-
formas de letramentos tomam relevo, a texto na educação contemporânea, o que
educação escolar torna-se um instrumen- pode ser perfeitamente desenvolvido na
to mediador das relações estabelecidas EJA. Diante disso, a aprendizagem assume
entre o homem, enquanto gênero hu- uma dimensão em seu significado maior
mano, e a sociedade. A educação, como que comumente se conhece. O que se
prática social, não está dissociada de ou- aprende não sai do nada, mas é construí-
tras práticas que permeiam igualmente o do no processo histórico constitutivo dos
processo de interação humana e produ- indivíduos em suas diversas interações
zem o conhecimento a partir da mediação societais. O desenvolvimento humano
histórico-social-cultural. A aprendizagem não é um processo eminentemente bio-
na perspectiva do desenvolvimento cog- lógico, mas de ordem social. Tais fatores
nitivo recoloca no centro do conhecimen- preponderam e são históricos, o que re-
to os sujeitos da educação. Autores como mete lançar um olhar sobre o contexto
Vigotsky (1998), Marques (2006), Libâneo de aprendizagem num plano diferente
(1994), entre outros, ajudam a compreen- de como as pessoas aprendem e podem
der melhor o processo de ensino e apon- ser estimuladas a aprender. Assim como
tam caminhos que podem ser apropriados as crianças, os adultos e jovens têm o seu
por professores que atuam na Educação processo eivado dos fatores sócio-históri-
de Jovens e Adultos (EJA). Analisar o pro- cos em seu aspecto cognitivo. Portanto,
cesso sócio-histórico de aprendizagem na pode-se também inferir que os educan-
educação de jovens e adultos. O proces- dos da EJA trazem consigo apreensões da
so metodológico se deu nas experiências sua realidade no seu acervo cognitivo, o

816
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que não pode ser jamais descartado pelo da interação homem-mundo-natureza, a


professor, mas potencializados nos pro- aprendizagem na perspectiva sócio-histó-
cessos escolares de ensino. Parte-se desse rica traz consigo um conteúdo pedagógico
pressuposto no centro da aprendizagem fértil de possibilidades educativas. Nesse
os elementos constitutivos da vida em so- caso, percebe-se que, ao mesmo tempo
ciedade como ao campo o campo educa- em que a educação deriva das relações
tivo. Ao apropriarmos essa visão teórica sociais, da mesma forma, o homem, nas
à EJA, o seguinte exemplo pode ser utili- suas relações com o mundo, manifesta
zado - os jovens e adultos não começam um modo específico de aprendizagem
a estudar aritmética na escola, mas mui- capaz de enfrentar as adversidades que
to antes eles tiveram alguma experiência a vida apresenta. Com efeito, possibilita
com quantidades ou tiveram que lidar a reflexão sobre a importância de consi-
com operações de divisão, adição, sub- derar os fatores sociais nos processos de
tração e determinação de tamanho. Por- ensino. As proposições de como e quais
tanto, eles têm suas próprias estratégias são os mecanismos desencadeadores da
mentais para resoluções aritméticas pré- aprendizagem estão, portanto, imbrica-
-escolares. Este fato revela que não são, das na interação sócio-histórico-cultural
apenas, os fatores internos ou biológicos e, que ao serem visualizados pelo pro-
que determinam os processos cognitivos fessor da EJA deve ser o ponto de partida
dos indivíduos, o que remete a uma maior para o seu fazer pedagógico. Em suma, o
compreensão dos elementos contextuais processo de desenvolvimento cognitivo
e sociais daqueles que são sujeitos da dos educandos baseado nos princípios da
educação. A EJA não pode ser compreen- aprendizagem sócio-histórica é uma va-
dida como se estivéssemos tratando de liosa estratégia didática que o professor
sujeitos como sendo receptáculos vazios poderá lançar mão e construir o seu fazer
e neutros em suas convicções, muito pelo pedagógico. Parte-se do princípio que os
contrário, é constituída de percepções di- educandos não são destituídos de conhe-
versas acerca da realidade existente. Evi- cimentos e saberes, mas possuidores uma
dentemente, também possui limitações histórica cultural própria que deve ser tra-
que são inerentes àqueles que não pos- tada como pressuposto de uma educação
suem o saber oriundo de um mundo em com a emancipação humana. Para isso,
que a escolarização equipa cognitivamen- a zona de desenvolvimento proximal é
te os indivíduos e limita aqueles que não onde o professor deverá atuar no ensino
possuem o saber advindo do processo de da EJA com intuito de verificar a metodo-
escolarização. Segundo Fontana (1997, p. logia utilizada e reavaliar o crescimento
57), o princípio orientador dessa aborda- cognitivo dos educandos na condução do
gem “tudo o que é especificamente hu- trabalho pedagógico.
mano e distingue o homem de outras es-
pécies origina-se de sua vida em socieda- Palavras-chave: Aprendizagem sócio-histórica;
de. Seu modo de perceber, de represen- Desenvolvimento Proximal; Formação de
tar, de explicar e de atuar sobre o meio, Professores da EJA
seus sentimentos em relação ao mundo, Contato: Robson Santos Camara Silva, SEE-DF/
ao outro e a si mesmo”. Sob o princípio GEPEJA, robsoncamara@gmail.com

817
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ENSINO DE QUÍMICA PARA CEGOS É professores não se sente preparados para


POSSÍVEL? trabalharem com os vários tipos de neces-
Juliana Alves de Araújo Bottechia - UEG/UnU sidades, o que acaba tornando o sonho da
- Formosa escola inclusiva um pouco distante. Prin-
juliana.bottechia@gmail.com cipalmente no que diz respeito ao ensino
Marina Alves de Castro Lopes - UEG/ UnU - da Química que, dependente da visão e de
Formosa outras capacidades organolépticas, além
marinaedih@hotmail.com da lógica do raciocínio, é para alunos DV
Igor Ramos Menezes - UEG/ UnU - Formosa e seus professores um grande desafio. Por
igor_menezes14@hotmail.com ser uma ciência dependente da visão e de
outras capacidades organolépticas, o ensi-
A Educação para Todos, enunciada pela no de Química para alunos com DV, princi-
primeira vez na Conferência de Salaman- palmente os alunos cegos que são o foco
ca, em 1994, organizada pela UNESCO, do trabalho, pode ser considerado um
mudou drasticamente a concepção de grande desafio. Pensando nas possíveis
educação para pessoas com necessida- dificuldades encontradas pelo professor
des educativas especiais, surgindo então em sala de aula, buscamos expor técnicas
a Escola Inclusiva. Entretanto, mais do e adaptações que podem ser feitas para
que criar condições para os deficientes, a amenizar a dificuldade da aprendizagem
inclusão é um desafio que implica mudar dos alunos cegos, lembrando que essas
a escola como um todo: no projeto peda- adaptações irão valer tanto para os alu-
gógico, na postura diante dos alunos, na nos cegos quanto para os videntes. Nosso
filosofia educativa. A educação inclusiva trabalho se fundamentou em realizar uma
tem a finalidade de incluir os alunos com ampla pesquisa em documentos como li-
deficiência ou distúrbios de aprendizagem vros, revistas e internet com referência no
na rede regular de ensino. Então, os alu- ensino da Química para alunos cegos do
nos com deficiência visual (DV); sejam ce- ensino médio. Porém, visto que os estu-
gos ou com baixa visão; poderão progredir dos sobre o referente assunto começaram
como os alunos não cegos, os videntes. a surgir há pouco tempo, se mostrou um
Na escola inclusiva, todos buscam atin- tema árido para a obtenção de informa-
gir o mesmo nível de conhecimento sem ções teóricas. Assim, participamos de
que existam preconceitos e para que os oficina, mini curso, no qual conhecemos
obstáculos com os alunos DV sejam su- alguns métodos de adaptação de material
perados, mas, para tanto, os professores para o ensino de DV, visitamos instituições
devem ficar próximos de cada aluno para de ensino que realizassem a atividade de
que cada dificuldade “seja vista” a fim de ensino para alunos DV e investigamos pes-
ser trabalhada para a obtenção de conhe- quisas na área in loco. No decorrer da pes-
cimento. A inclusão “olha” para todos os quisa, a investigação revelou que textos,
alunos, sem preconceito e garante que imagens, gráficos, tabelas e diagramas
os alunos com deficiência frequentem o podem ser adaptados para o Braille com
ensino regular. Sendo assim na inclusão, o auxílio da Sala de Recurso por profissio-
a escola deve acolher todos os alunos e nais especializados. Mas essa transcrição
se adaptar a eles. Contudo, a maioria dos para o Braille terá um número de páginas

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

maior do que a comum visual. Também As atividades experimentais podem ser


existem dispositivos auxiliares como o consideradas como um dos melhores au-
multiplano que desenvolve operações, xílios para facilitar o entendimento do con-
tabuadas, equações, proporção, regra de teúdo por parte dos alunos, incluindo os
três, funções entre outros. Além do multi- alunos cegos. Pensando em incluir os alu-
plano, também existem modelos atômicos nos cegos nas atividades experimentais,
fabricados com bolinhas de isopor texturi- adaptações de experimentos podem ser
zadas, tabela periódica em Braille, tabela realizadas utilizando materiais acessíveis,
periódica em alto relevo, tabela periódica onde a adaptação dos experimentos possi-
com bolinhas de isopor, representação de bilita aos alunos cegos uma maior facilida-
ligação iônica e covalente com bolinhas de de em compreender as reações químicas.
isopor texturizadas com imã para a iônica Porém, é importante que os alunos cegos
e com pino de madeira para a covalente, visitem os laboratórios acompanhados de
ligações entre substâncias escritas em um instrutor antes das aulas para conhece-
Braille na fita Din com canudinhos. rem a disposição das bancadas e dos equi-
pamentos onde o professor deve ensinar
Modelos Atômicos. os principais procedimentos de segurança
para todos os alunos. Com base nos dados
apresentados, conclui-se que houve uma
evolução sensível no tratamento destina-
do às pessoas com deficiência. Ao mesmo
tempo, houve um resgate aos direitos des-
sas pessoas e uma atenção maior foi dada
à Educação Especial, onde o professor tem
o papel mais importante no processo de
ensino aprendizagem; porém; ele precisa
de apoio total do governo como a sua pro-
fissionalização de eficácia que deveria ser
obrigatória em todos os cursos de gradua-
ção a fim de estarem preparados para lidar
com os alunos especiais. As consequências
psicológicas da perda da visão variam de
indivíduo para indivíduo, sendo ela con-
gênita ou adquirida, necessitando assim,
Fonte: Resende Filho e Barreto, 2009. de acompanhamento especializado. Estes
impactos acontecem de acordo com a ida-
Representação do NaCl e HCl. de em que a pessoa adquire a deficiência
visual, o grau da deficiência entre outros
fatores, mas o principal é a personalidade
da pessoa. Além disso, as famílias das pes-
soas que sofrem com este tipo de trauma
também precisam de um acompanhamen-
FONTE: Lourenço, I. M. B., Marzorati, L., 2005. to para aprender a lidar com a situação

819
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sem que tragam mais problemas psicoló- No decurso da história da sociedade hu-
gicos ao afetado. A utilização das técnicas mana a educação e o trabalho têm sido
e adaptações apresentadas no decorrer do atividades fundamentais na afirmação da
trabalho visa uma melhor compreensão condição humana e servido de marco di-
da matéria por parte de todos os alunos. ferenciador dos humanos em relação aos
Adaptações feitas com materiais de baixo demais animais. Embora sejam atividades
custo são estratégias essenciais para tor- humanas de dimensões diferentes, a inter-
nar o ensino de Química um modelo a ser ligação entre ambas está na base da cons-
seguido para construir uma educação de- tituição humana, pois o trabalho no senti-
mocrática e acessível a todos. As iniciativas do ontológico é uma atividade em que o
apresentadas em nosso trabalho mostram ser humano, também um ser da natureza,
aos professores que não é impossível lecio- mobiliza seus recursos corporais para, em
nar Química para alunos cegos, devemos relação social necessária, transformar a
apenas mudar nossos métodos de ensi- natureza e produzir os meios necessários à
no. Em consequência, teremos benefícios sua subsistência. Esses meios necessários
para toda a turma, pois os alunos compre- são materiais e simbólicos. Ao proceder
enderão melhor os conteúdos se forem conscientemente na transformação da na-
apresentados a eles métodos diferentes
tureza, o ser humano também transforma
do que os de costume. Facilitar a vida do
a sua natureza tornando-a cultural. Ele
aluno com deficiência visual é excluí-los,
produz cultura e projeta a sua existência
eles precisam apenas de ferramentas para
através das gerações futuras e, ao longo da
concorrer em condições similares aos alu-
sua existência, vem ampliando progressi-
nos videntes, ao invés de receberem pri-
vamente a produtividade do trabalho. Para
vilégios que acabarão prejudicando o seu
desenvolvimento. tal, recorre à educação para transmitir a
experiência social acumulada e ao fazê-lo
Palavras-chave: Química para Cegos; Escola proporciona o desenvolvimento humano
Inclusiva; Adaptação de Materiais. que, na concepção histórico-cultural de
Contato: Juliana Alves de Araújo Bottechia, desenvolvimento humano, não pode pres-
UEG/ UnU-Formosa, cindir do desenvolvimento da sociedade. O
juliana.bottechia@gmail.com trabalho em tela tem por objetivo apresen-
tar conceitos básicos da diversidade, em
geral, e das diversidades étnico-racial, de
A EDUCAÇÃO E O TRABALHO NA gênero, e da língua utilizados na constru-
CONSTRUÇÃO DA DIVERSIDADE ção de um módulo sobre diversidade, edu-
HUMANA cação e trabalho. Vale salientar que, desde
Renato Ferreira dos Santos - SEE-DF a metade do século XX, ocorre uma série
reneja.12@gmail.com de discussões sobre a dimensão da liberda-
Ana José Marques - SEE-DF de, a essas discussões associa-se a noção
marques.ana67@gmail.com de cidadania, “que implica a conquista de
Vânia Elisabeth Bacelar - SEE-DF um amplo leque de direitos civis, políticos,
vania.elisabeth@yahoo.com.br sociais e, mais recentemente, os direitos
Alexandra Pereira da Silva - SEE-DF culturais” (Silvério, 2006, p. 7). O sentido
alexalina@bol.com.br original da ideia de liberdade transformou-

820
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-se, deixando de ser uma ideia abstrata e relações intersubjetivas e pela linguagem.
vazia, passando a ser um desejo dos indi- O desenvolvimento humano é intersubjeti-
víduos poderem controlar suas autorrea- vo e discursivo. Assim, a educação adquire
lizações. Essa evolução leva os grupos de contornos basilares no desenvolvimento
excluídos a formarem movimentos sociais humano cuja relação com a sociedade hu-
(de mulheres, negros, índios, homossexu- mana do seu tempo é dialética e histórica.
ais), que visam a sua melhor qualidade de Isto é, o ser humano se desenvolve com a
vida: inserção na sociedade, aquisição de sociedade e, esta se desenvolve com o ser
direitos, acesso a bens e serviços. Diante humano. Além disso, a atualidade de uma
dessa realidade, conhecer e reconhecer os sociedade reflete a sua história. Então, o
grupos socialmente excluídos torna-se ne- ser humano constituído também concen-
cessário. Além disso, existe a necessidade tra os conhecimentos e valores de gera-
de identificar os fatores geradores de tais ções anteriores, isto é, a história da própria
exclusões, pois as estratégias de conheci- humanidade. O trabalho assim concebido,
mento geram o entendimento e a possibi- ou seja, no sentido ontológico tem se ca-
lidade de se pensar ações concretas que racterizado enquanto eixo norteador da
impeçam a reprodução da exclusão. No educação desde os primórdios da humani-
que tange ao gênero, pretende-se abordar, dade e tem sido fundante na promoção do
de forma breve, o histórico que demonstra desenvolvimento humano. De acordo com
a construção do processo de dependência a concepção sócio-histórica, é nas relações
em que a mulher foi submetida e de lutas sociais estabelecidas para a produção dos
pelas mudanças, que paulatinamente, vem meios necessários à sua sobrevivência- o
conseguindo alcançar, bem como as trans- trabalho- que os seres humanos se produ-
formações ocorridas na sociedade, no que zem enquanto humanos. Nas relações in-
se refere às escolhas sexuais praticadas tersubjetivas mediadas pela linguagem, os
por homens e mulheres. Quanto à temáti- processos e as funções do seu grupo social
ca étnico-racial, a abordagem será no cam- são internalizados e passam para o con-
po conceitual de raça, etnia, de como se trole do indivíduo quando há a construção
processa o racismo no mundo capitalista das funções psicológicas superiores e o de-
e os estabelecimentos das diferenças en- senvolvimento humano. Nesse momento
tre racismo, preconceito e discriminação. o indivíduo adquire autonomia para trans-
Em relação à diversidade linguística, se- formar os valores e conhecimentos rece-
rão apontados três campos importantes: bidos socialmente. Fica configurado o es-
várias línguas nativas do Brasil; línguas paço educacional, mesmo nos ambientes
estrangeiras incorporadas ao nosso siste- de pouco domínio sobre a natureza das so-
ma escolar e as variantes linguísticas dos ciedades e comunidades comunitárias que
grupos socioculturais. Evidencia-se que o caracterizaram os primórdios da sociedade
público da Educação de Jovens e Adultos humana. Para a concepção sócio-histórica
está inserido em contexto de diversidade o desenvolvimento das funções psicoló-
e que este público busca educação e tra- gicas superiores passa necessariamente
balho. Segundo a concepção histórico- pela mediação do outro e da linguagem. O
-cultural, o ser humano se constitui hu- desenvolvimento humano é intersubjetivo
mano através do outro (pedagógico) nas e discursivo. A conceitualização está en-

821
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tre essas funções psicológicas superiores. O presente texto parte de algumas refle-
No entanto, o contexto social em que os xões originadas de professores que atuam
indivíduos estão inseridos é fundamental nos cursos de formação docente na Esco-
para que esse desenvolvimento aconteça. la de Aperfeiçoamento dos Profissionais
Bakhtin acrescenta que não há locução da Educação – EAPE. Preocupados com
sem interlocução, ou seja, a palavra do lo- as inquietações e relatos dos professores
cutor deve ser dirigida à palavra interna do cursistas envolvidos no processo de inclu-
interlocutor para que haja o diálogo. E o di- são, esses questionam e buscam por meio
álogo entre dois sujeitos, o sujeito apren- de pesquisas respostas que atendam aos
dente/ensinante e o sujeito ensinante/ problemas relacionados à formação dos
aprendente, deve necessariamente ocor- profissionais para escola inclusiva. Uma
rer para que haja ensino aprendizagem e, das questões, diz respeito ao Atendimen-
portanto, desenvolvimento humano. Ter a to Educacional Especializado-AEE, que
compreensão desse processo é essencial fundamenta-se nos marcos legais, políti-
para a formação continuada do profes- cos e pedagógicos que orientam a imple-
sor que trabalha na Educação de Jovens e mentação de sistemas educacionais inclu-
Adultos (EJA). Por isso, no curso de forma- sivos. AEE, pela legislação, é o conjunto
ção docente realizado pela Escola de Aper- de atividades e recursos pedagógicos e de
feiçoamento de Profissionais de Educação acessibilidade, organizados institucional-
(EAPE), abordamos esses fundamentos mente, prestados de forma complemen-
educacionais. Esse trabalho analisa e dis- tar ou suplementar a formação dos alunos
cute o processo de ensino-aprendizagem público alvo da educação especial, matri-
de indivíduos nas escolas de EJA do Dis- culados no ensino regular e deverá ser re-
trito Federal em que indivíduos situados alizado em sala de recurso multifuncional
em contextos de diversidade podem ter ou em centro de atendimento educacio-
acesso a conhecimentos que possam ser nal especializado. A formação de profes-
utilizados para além da escola. sores para atuação no AEE foi formatada
e proposta inicialmente pelo Ministério
Palavras-chave: Diversidade, Trabalho e da Educação, posteriormente foram reali-
Educação de Jovens e Adultos. zados alterações pelo grupo da educação
Contato: Renato Ferreira dos Santos, SEE-DF, especial da EAPE, para que atender as
reneja.12@gmail.com necessidades dos professores envolvidos
com os processos de inclusão dos alunos
com deficiência, os diversos transtornos
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES e altas habilidades do Distrito Federal. A
PARA ATENDIMENTO EDUCACIONAL versão 2011, foi planejada na modalidade
ESPECIALIZADO CONTRIBUI NA semipresencial, com 129 horas de ativi-
PROMOÇÃO DA INCLUSÃO ESCOLAR? dades na plataforma Moodle e 51 horas
Susana Silva Carvalho - SEE-DF/EAPE – GPEE presenciais. E o objetivo, do curso, foi de
susanaxedas@gmail.com conceituar e caracterizar as deficiências,
Leda Regina da Bitencourt Silva - SEE-DF/ o transtorno global do desenvolvimento,
EAPE – GPEE as altas habilidades/superdotação com
ledaregina@yahoo.com.br vistas à elaboração do plano pedagógi-

822
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

co de adequação curricular e o plano de cursistas, por meio de um questionário.


atendimento educacional especializado. (2) Reflexão sobre as lacunas e contribui-
Para tratar do tema do atendimento edu- ções do curso AEE para formação dos pro-
cacional especializado proposto na Polí- fessores das salas de recursos. Portanto, é
tica da Educação Especial na Perspectiva uma pesquisa qualitativa, mas com dados
da Educação Inclusiva faz-se a opção pelo quantitativos. Utilizou-se a metodologia
aporte teórico da teoria histórico-cultural da pesquisa qualitativa desenvolvida por
formulada por Vigotsky associada a ou- Gonzalez-Rey que tem como princípios: o
tros teóricos e pesquisadores que apro- conhecimento é uma produção construti-
fundaram e analisam a realidade social vo-interpretativa; o caráter interativo do
vigente considerando a subjetividade dos processo de produção do conhecimento;
sujeitos. Essa teoria explica que “o desen- a significação da singularidade como ní-
volvimento não se dá em círculo, mas em vel da produção do conhecimento. Nesse
espiral, passando por um ponto a cada momento, temos apenas os resultados da
revolução enquanto avança para um nível primeira fase quantitativa. No questioná-
superior” (Vygotsky, 2007, p.56) e que o rio, respondido, no terceiro encontro pre-
“aprendizado adequadamente organiza- sencial do curso, perguntamos sobre (1)
do resulta em desenvolvimento mental e localização do trabalho docente, (2) atu-
põe em movimento vários processos de ação por níveis e etapas da educação, (3)
desenvolvimento que, de outra forma, os tipos de atendimento, (4) experiência
seriam impossíveis de acontecer”. Dessa (tipo e tempo) e a formação desses cur-
forma, educação inclusiva, temática en- sistas. O questionário foi respondido por
volvida nesse estudo, não pode ser consi- duzentos e seis (206) cursistas, número
derada apenas pela matrícula de pessoas que perfaz 74% dos professores matricu-
em situação de deficiência nas escolas lados no curso. Temos representatividade
regulares. É necessário garantir o atendi- de 25% das escolas do Distrito Federal, e
mento desses estudantes com respeito às 23% das salas de recursos. Desse univer-
suas potencialidades de forma que se de- so, 165 (80%) são (1) professores de sala
senvolvam como cidadãos contemplando de recurso generalistas - que atendem os
suas individualidades. Para conviver com alunos com deficiência intelectual, múl-
e na diferença é necessário oferecer for- tipla e física, com transtorno global do
mação permanente aos professores, prin- desenvolvimento e ainda os transtornos
cipalmente os do atendimento educacio- funcionais; (2) sala de recursos específi-
nal especializado para que o atendimento cos: para deficientes visuais, deficientes
possa funcionar como uma parte eficien- auditivos e ainda aqueles com altas ha-
te da rede apoio, disponível hoje, para os bilidades/superdotação; professores que
professores regentes e estudantes. Dessa atuam em escolas especializadas que fa-
forma, surge a questão: o curso AEE con- zem atendimento complementar aos alu-
tribui para a potencialização da rede de nos incluídos e os intérpretes de libras.
apoio e estruturação dos atendimentos Em relação ao níveis e etapa, foi surpresa
ofertados? Dessa forma, foi elaborada constatar que 42% desses profissionais
uma pesquisa, divida em duas partes: (1) estão trabalhando em escolas de anos
Levantamento do perfil dos professores finais do ensino fundamental e mais 8%

823
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

são originados do ensino médio. O que Palavras-chave: Formação Docente,


totaliza 50% do grupo de professores de Desenvolvimento Humano e Inclusão Escolar.
AEE de área específica, fazendo o curso Contato: Susana Silva Carvalho, SEE-DF / EAPE
em 2011. Na educação infantil (5%) e no – GPEE, susanaxedas@gmail.com
ensino fundamental séries iniciais (42%)
totalizando 47%. A EJA tem apenas 1%
e mais 1% não responderam essa ques- SP LT04 - Simpósio
tão. No universo dos 206 questionários:
50% trabalham nas salas de recursos ge-
neralistas; 6% em salas de recursos para SP LT04-1483 - POLÍTICAS, PRÁTICAS
deficientes auditivos; 1% em salas de PEDAGÓGICAS E PESQUISA NA ESCOLA
recursos de deficientes visuais; 9% em PÚBLICA
salas de recursos de altas habilidades e
superdotação; 4% em atendimento com- Os trabalhos a serem discutidos na pre-
plementar em escolas especializadas; 1% sente proposta enfocam questões relacio-
são intérpretes de Libras e 5% são coor- nadas às dinâmicas de funcionamento nas
denadores, supervisores, diretores ou ou- escolas, aos processos de ensino-aprendi-
tras cargos na escola; 4% trabalham em zagem, à constituição dos sujeitos (profes-
serviço especializado de apoio a aprendi- sores e alunos) e à constituição da memó-
zagem; 1% não respondeu e 9% estão em ria apreendida através das narrativas que
sala de aula regular com aluno incluído. evocam aspectos da história da escola e do
Sobre a experiência, 42% estão desenvol- bairro. O projeto de Adriana L. F. Laplane e
vendo esse trabalho há um a treze meses. colaboradoras discute o efeito de políticas
Somando com aqueles que trabalham 13 e programas nas práticas educacionais e
a 24 meses (19%), podemos constatar enfoca, também as percepções dos pro-
que 61% dos professores têm menos de fessores em relação ao trabalho docente
dois anos de experiência com o AEE. 5% e às possibilidades de atuação pedagógi-
têm 49 a 72 meses, 8% 73 a 120 meses e ca. O grupo liderado por Ana L. B. Smolka,
6% tem mais de dez anos de experiência. por sua vez, aborda uma variedade de te-
Quando perguntamos sobre a formação, mas que envolvem as relações professor-
17% responderam que esse curso era o -aluno, a educação inclusiva, a gestão e
primeiro curso em educação especial, e o trabalho docente, nas suas diferentes
42% só tem cursos de formação continu- dimensões. O estudo de Elizabeth dos S
ada. Enquanto 13% têm pós-graduação Braga enfoca narrativas de experiências e
latu senso (especialização). Esse panora- de histórias de vida, formação e prática à
ma indica um quadro de professores com procura da articulação entre as histórias
pouca experiência e relativa formação. individuais e a história social mais ampla.
O que desafia nossa pesquisa a seguir As três pesquisas compartilham a escola
no sentido de abordar, na segunda fase, como lócus de investigação e intervenção
quais percepções e necessidades esses e uma base teórico-metodológica constru-
profissionais tem para promover uma in- ída a partir da perspectiva histórico-cultu-
clusão qualitativa, propulsora do desen- ral do desenvolvimento humano, inspira-
volvimento desses alunos. da nas ideias de L. S. Vygotsky e de outros

824
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

autores que permitem abordar os temas 2009) e a observação e intervenção no


referidos. As pesquisas, de base qualitati- ambiente escolar, na sala de aula e nas
va, lançam mão de técnicas etnográficas, reuniões da equipe de professoras e ges-
da observação participante, da entrevis- tores. Essas duas frentes se fundem nas
ta, do registro em vídeo, dos dispositivos reflexões que procuram situar as práticas
técnicos de confrontação e confrontação no contexto da política, entender de que
cruzada (Yves Clot), da análise do discur- modo essas duas instâncias (a das políti-
so, dentre outros utilizados para coletar os cas e a das práticas) interagem e quais são
dados, discutir os temas propostos e ana- as consequências dessa interação para o
lisar os dados de diferentes tipos à luz do desenvolvimento dos atores do cenário
referencial teórico implicado na discussão escolar. Do ponto de vista das teorias de
de cada um dos aspectos citados. Os três Desenvolvimento Humano, a perspectiva
trabalhos apresentam um panorama das histórico-cultural (Vygotsky, 1989; 2000)
principais questões de desenvolvimento fornece as referências que permitirão ana-
humano que perpassam a vida das esco- lisar, no contexto das práticas escolares, as
las e a constituição dos sujeitos que par- relações de ensino possíveis no ambiente
ticipam dos processos de escolarização. institucional criado a partir da implemen-
Financiamento: Adriana L. F. Laplane: Pro- tação das políticas educacionais. O foco
grama Escola Pública FAPESP; Ana Luiza B. dessa apresentação estará centrado na
Smolka: Programa Escola Pública FAPESP e análise da política estadual que se propõe
Bolsa Produtividade CNPq; Elizabeth dos a garantir a aprendizagem da leitura e da
Santos Braga: USP. escrita a todos os alunos (Programa Ler e
Escrever) e na análise das práticas peda-
gógicas vinculadas a ela. O Programa (São
POLÍTICAS PÚBLICAS E PRÁTICAS Paulo, 2007) prevê, também, a alocação
PEDAGÓGICAS: O DESENVOLVIMENTO de bolsas (Bolsa Alfabetização) a estudan-
DE PROFESSORES E ALUNOS DE UMA tes dos cursos de Pedagogia que, na quali-
ESCOLA PÚBLICA dade de estagiários atuariam nas salas de
Adriana Lia Friszman de Laplane 1a e 2a série do Ciclo I, sob supervisão do
Financiamento: FAPESP professor da sala e do professor coorde-
nador de estágio no curso. Os alunos das
Este estudo, concebido e implementado séries subsequentes são atendidos por
nos dois últimos anos numa escola pública meio de um projeto específico: o Projeto
estadual da cidade de Campinas, SP, teve Intensivo no Ciclo – PIC. Este conta com
por objetivo compreender o movimento materiais diferenciados e os professores
das práticas pedagógicas e sua relação que atuam nas salas de 3a e 4a série PIC re-
com as políticas educacionais nacionais e cebem formação da Secretaria de Educa-
estaduais. O projeto de pesquisa se des- ção do Estado (SEESP) e participam de um
dobrou em duas frentes principais: o es- número maior de reuniões de HTPC (hora
tudo das políticas, através da análise de de trabalho pedagógico coletivo) que os
documentos e da legislação nacional (Bra- demais professores da escola. Duas das
sil, 1996, 2008) e estadual relevante (São intervenções realizadas no contexto da
Paulo, 1989, 2001, 2003, 2008a, 2008b, pesquisa consistiram na observação e par-

825
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ticipação, por meio de projetos, em duas Constata-se que ela ajuda a derrubar todo
salas de 4a série PIC. A pesquisa acompa- tipo de barreiras à aprendizagem e que
nhou o desenvolvimento dos trabalhos ela pode propiciar o contato com temas,
por meio de registros das observações em técnicas e tecnologias atuais e descortinar
diário de campo e por meio da filmagem e para os alunos novas áreas de interesse.
fotografia das atividades e das produções As competências básicas de leitura, es-
dos alunos. Os resultados da pesquisa crita, ciências e matemática envolvidas
mostram que o agrupamento de alunos nessas atividades se tornam, assim, meios
com vários tipos de dificuldade na sala PIC que os alunos se empenham em dominar
(alunos com deficiências, dificuldades de para atingir os objetivos por eles previstos
aprendizagem, problemas sócio-afetivos e e assumidos (Portela, 2010). Em relação
outros) constitui um desafio quase impos- aos fatores que condicionam o sucesso
sível de ser enfrentado com sucesso pelo escolar, as nossas observações nos levam
professor da sala sozinho. Por outro lado, a afirmar que os modos de organização e
a participação da equipe de pesquisa em distribuição de alunos nas classes consti-
sala de aula, assim como o trabalho inte- tuem, ainda, importantes condicionantes.
grado entre as professoras permitiu obser- Embora seja possível e desejável trabalhar
var que quando a classe se propõe metas com alunos com diferentes características,
de curto, médio e longo prazo e assume alguns tipos de agrupamentos revelam-se
um projeto coletivo e quando o professor pouco eficazes para promover o trabalho
recebe apoio, seja de outros professores escolar e a aprendizagem dos alunos. Na
da escola, seja de outros eventuais partici- sala PIC, o agrupamento obedece ao cri-
pantes do processo escolar, o avanço é sig- tério ‘alunos com dificuldades’. Esse tipo
nificativo. Outro resultado da observação de agrupamento, que lembra a ‘classe
participante permite apontar o trabalho especial’, com o agravante de concentrar
por projetos (Hernández, 1998, 2000; Rei- numa única classe todo tipo de dificulda-
ly e Laplane, 2011) como uma das ferra- des (socioeconômicas, culturais, de com-
mentas capazes de potencializar a apren- portamento, aprendizagem e também
dizagem, já que insere os conteúdos disci- deficiências e necessidades especiais) di-
plinares em um contexto que extrapola a ficulta a troca entre os alunos e a tarefa
tarefa escolar e promove o conhecimento de ensinar da professora. Por isso, a pre-
sobre a vida da família, da comunidade sença da equipe de pesquisa na sala de
e da sociedade. A partir da formulação e aula melhorou as condições de trabalho.
implementação das propostas de inter- Nesse sentido, o trabalho em pequenos
venção nas salas de aula emerge – do ro- grupos coordenados por um adulto profi-
tundo sucesso alcançado na condução das ciente que possa abordar as dificuldades e
atividades – a ideia de que a integração de as necessidades dos alunos de forma pon-
disciplinas e o estabelecimento de parce- tual se apresenta como proposta plausível
rias entre as professoras dinamiza, apoia para melhorar a qualidade do ensino, nas
e promove o trabalho escolar, ampliando turmas em que é preciso dispensar aten-
o significado cultural das atividades. Nes- ção especial a alguns alunos. Finalmente,
se sentido, a disciplina de Artes confirma a reflexão sobre a estrutura escolar e so-
seu potencial como elemento integrador. bre o papel das funções não-docentes na

826
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

escola é também um vetor importante a ensino público. Se as condições concretas,


ser considerado, já que as políticas, proje- nelas incluídas as concepções - de ensino,
tos e programas contam justamente com de linguagem, de desenvolvimento huma-
essa estrutura funcional para a implanta- no, de currículo, etc. - se transformam ao
ção e multiplicação de ações e propostas longo do tempo, como essas condições e
de atuação (São Paulo, 2008). O papel concepções (por exemplo, política de ci-
do coordenador pedagógico é assim re- clos, escola de nove anos, avaliação, pro-
levante para a prática dos professores, e gressão continuada, educação inclusiva,
por isso, apontamos o investimento nesse projeto político-pedagógico, definição e
profissional como fator fundamental para ocupação de cargos...) afetam as formas
articular o trabalho pedagógico na escola. de organização da escola e as práticas na
sala de aula? Ficaram definidos quatro ei-
xos de investigação que se articularam no
DESENVOLVIMENTO HUMANO E desenvolvimento da pesquisa: 1. Estudo
PRÁTICAS CONTEMPORÂNEAS: dos anos iniciais do ensino fundamental,
PESQUISA E ENSINO NO ESPAÇO com foco nas relações professor/aluno/
ESCOLAR conhecimento e nas relações família/es-
Ana Luiza Bustamante Smolka cola; 2. Estudo dos anos finais do ensino
Financiamento: FAPESP/CNPq fundamental, com foco nas experiências
e concepções de cidadania e no discurso
A persistência de problemas que se re- sobre trabalho; 3. Estudo das políticas e
colocam continuamente no interior da práticas de educação inclusiva, com foco
escola nos levou à formalização de um em estudos de caso, na dinâmica em sala
projeto coletivo de pesquisa intitulado de aula, no conceito de compensação; 4.
“Condições de desenvolvimento humano Estudo das formas de gestão e trabalho
e práticas contemporâneas: as relações docente. Ao longo de três anos de traba-
de ensino em foco” (FAPESP, CNPq). Os lho, temos vivido diversas situações – dife-
temas que se configuraram inicialmente rentes modos de participação em sala de
no referido projeto surgiram do que cada aula, reuniões para estudo e discussão de
participante – professores-pesquisadores textos, reuniões para análise conjunta do
na escola, pesquisadores na universida- material empírico, oficinas de textos e de
de - podia enxergar no/do seu cotidiano. imagens, participação em reuniões cientí-
Emergiram das preocupações do dia a dia ficas, etc. - em que temos experienciado
para se transformarem em questões de mudanças de posições e reorientação do
pesquisa, que foram acolhidas, discutidas olhar para a prática de ensino e pesquisa.
e entretecidas no conjunto dos interesses Ler e estudar junto, discutir e problemati-
e propostas. Dois movimentos concomi- zar, estabelecer e compartilhar um univer-
tantes foram importantes: acordar sobre so discursivo, elaborar conceitualmente,
e definir o que se tornaria objeto de inves- tem feito parte desse trabalho. Indagar,
tigação coletiva; e pensar como as preo- discordar, polemizar, contrapor, divergir,
cupações e os projetos individuais pode- flagrar-se na realização do trabalho, apa-
riam contribuir para a proposta coletiva recem como possibilidades de provocar
de investigação, com vistas à melhoria do o desenvolvimento. É necessário provo-

827
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

car o desenvolvimento para ser possível de interposições e múltiplas relações – os


estudá-lo, nos aponta Vygotsky (1997). textos, os autores; os lugares de fala, os
Ancorado teórica e metodologicamente modos de dizer; as vivências; as interpre-
nas contribuições de Vygotsky e Bakhtin, tações; as trocas, as elaborações conjun-
Yves Clot (2010) afirma que “O problema tas, heterogêneas; as contribuições singu-
metodológico consiste então em inven- lares... Possíveis análises dessa dinâmica
tar dispositivos técnicos que permitam nos mostram como os sujeitos em relação
aos sujeitos transformar sua experiência vão se afetando, se inter-constituindo no
vivida de um objeto em objeto de uma trabalho cotidiano. Como se configura a
nova experiência vivida. Isso com a finali- atividade de pesquisa, como se realiza o
dade de estudar a transformação de uma ato de investigar? De quantas formas ele
atividade em outra”. Encontramos nessa pode acontecer? O pesquisador ensina
citação provocações que nos movem no enquanto pesquisa? Pode ensinar? Como
sentido de problematizar nossa própria professores pesquisadores se afetam nas
experiência. Indagamo-nos, por exem- relações de interlocução? Como pode um
plo, se uma reunião de estudo pode ser pesquisador levar o outro/sujeito/pesqui-
um dispositivo técnico que permita aos sado a falar sobre /elaborar suas experi-
sujeitos transformar a experiência vivida, ências, a passar suas ações pelo crivo do
incluindo a experiência do(s) próprio(s) pensamento? A ação passada pelo crivo
pesquisador(es) que é/são levado(s), pela do pensamento se transforma em outra
presença do/relação com o outro, a se ação que é refletida (Vygotsky, 1995). Há,
flagrar(em) também no seu ofício. Nesse portanto, que se aprofundar a discussão
particular, vale considerar que além do sobre a posição do pesquisador, as for-
“outro”, ou com ele, interlocutor, instru- mas de (atu)ação, o campo de investiga-
mentos técnico-semióticos podem contri- ção – pesquisar (n)o campo da educação,
buir na viabilização de mudanças de posi- pesquisar (n)a escola. Aqui entrevemos
ção, propiciando distanciamentos e obje- possibilidades de elaboração teórico-me-
tivações (gravações, vídeos, etc.).Torna-se todológica, com base nos conceitos de gê-
importante, então, discutir o estatuto dos nero de atividade e gênero de discurso. Se
recursos/instrumentos técnico-semióticos considerarmos pesquisar e ensinar como
– o papel do registro escrito, do diário de esferas ou gêneros de atividade, levan-
campo, da leitura do material empírico, tamos a hipótese de um gênero híbrido
dos registros em áudio, dos vídeos, das – pesquisar/ensinar - que se mostra parti-
transcrições; mas também a escuta com/ cularmente profícuo e em evidência nesse
pelo outro, que me dá “acabamento” campo da pedagogia, da educação. Sem
(Bakhtin, 2003). Uma reunião de estudo proclamarmos que seja o único modo de
congrega pessoas que, de diferentes mo- investigar nesse campo, argumentamos
dos, participam de objetivos que se tor- sobre a viabilidade, e mais do que isso, a
nam (ou não) compartilhados na busca de necessidade de compreender (argumen-
conhecimento e compreensão de ideias, tar sobre) essa forma de pesquisar... e de
conceitos, teorias... Seja qual for o supor- mostrar como essa forma está relacionada
te (livro, revista, internet, etc.), as palavras com as características (e os objetivos) do
de outros entram em contato num jogo próprio campo de atuação.

828
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

O TRABALHO COM MEMÓRIAS seus espaços, incluindo as escolas. O tra-


NARRATIVAS: SENTIDOS DA RELAÇÃO balho de pesquisa tem se dado por meio
ESCOLA/COMUNIDADE de observação participante na escola e
Elizabeth dos Santos Braga no bairro, entrevistas a antigos mora-
dores, representantes de associações,
O projeto de pesquisa “Memória, nar- alunos, participação em reuniões ordi-
rativa e a dimensão discursiva da expe- nárias e eventos da escola, em reuniões
riência escolar”, desenvolvido em uma do movimento por melhorias no bairro,
escola municipal de São Paulo, compre- e por meio de conversas com membros
ende uma tentativa de apreender os da equipe escolar. A observação segue
significados partilhados, produzidos nas os princípios da etnografia (Geertz, 1978;
relações sociais que se entrecruzam na Hymes, 1982), e parte dela foi realizada
história da escola e do bairro onde ela como um trabalho de Iniciação Científica
está inserida, nas memórias e narrativas (Faria, 2010). Das conversas e entrevistas,
dos sujeitos que participam de sua dinâ- podemos apreender alguns aspectos que
mica. Articulado ao projeto de pesquisa, caracterizam esta instituição, envolvendo
desenvolvemos um projeto de extensão, tensões e conflitos no cotidiano escolar.
desenvolvido com docentes em jornada A observação da dinâmica do funciona-
de trabalho integral. Assim como o pro- mento da escola foi complementada pela
jeto de pesquisa, este objetiva o trabalho análise do Projeto Político-pedagógico.
com memórias, histórias, narrativas na/ No bairro, esta se deu a partir de visitas
sobre a escola, desta vez tendo como acompanhadas por moradores do bairro,
participantes ativos os professores. En- bem como com professores e gestores. As
volve formação de professores, relações entrevistas têm fornecido indícios sobre
de ensino, relações sociais na escola e a a realidade e a história do bairro e da es-
relação desta com a comunidade na qual cola. Os entrevistados têm falado de suas
está inserida. A escola localizada na pe- trajetórias como alunos ou funcionários,
riferia da Zona Oeste de São Paulo fun- de sua relação com a escola e com pes-
ciona em três turnos e atende a alunos soas que ocuparam esse espaço no pas-
do Ensino Fundamental e EJA. Embora sado. Os trabalhos referentes ao projeto
o bairro conte com infraestrutura básica de extensão concentram-se em torno de
relativa, fruto da mobilização popular a quatro eixos - memória do bairro, memó-
partir dos anos 70, ainda apresenta mui- ria da escola, memória dos sujeitos que
tos problemas sociais, como a ausência ocupam o espaço escolar e história do pa-
de equipamentos culturais e serviços de trono da escola - e envolvem atividades
assistência social. Membros de escolas de reflexão (sobre os temas da memória
e de outros equipamentos públicos lo- e subjetividade), visitas de observação,
cais têm trabalhado ativamente em um elaboração de roteiros, realização de
movimento por melhorias no bairro. Os entrevistas e busca de documentos para
projetos articulados de pesquisa e exten- compor um memorial escolar dinâmico e
são vão ao encontro desse movimento de aberto à comunidade escolar e local. As
preocupação com as condições de vida, entrevistas têm produzido depoimentos
saúde e educação e de revitalização de sobre trajetórias de vida e escolares de

829
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

professores, alunos e outros sujeitos e re- possibilitam pensar no desenvolvimento


latos sobre relações de cooperação e/ou e funcionamento mental especificamen-
conflito na instituição escolar e na histó- te humanos somente no interior de prá-
ria do bairro e da escola. Especificamente ticas, na intrincada rede de relações so-
com relação à construção e manutenção ciais, na cultura, na história, na dinâmica
do memorial, pretendemos estender o do discurso (e.g. Vygotsky, 1996, 2001;
trabalho com os docentes a alunos e à Halbwachs, 1952, 1990; Bartlett, 1977;
comunidade, visando à criação de uma Elias, 1994; Bakhtin, 1992, 1997), e de
cultura de preservação. Este trabalho en- autores que nos levam a refletir sobre a
volve a busca de material - documentos relação entre memória, discurso e experi-
textuais, registro fotográfico, cadernos, li- ência (Middleton e Brown, 2005; Smolka,
vros e outros objetos escolares -, ativida- 2006), olhamos para as narrativas de ex-
des de organização das fontes e oficinas periências, de histórias de vida, formação
para preservação e acondicionamento de e prática, relatos de trajetórias escolares,
documentos, para o que contaremos com destacando três aspectos – reconstrução,
o apoio do Centro de Memória da Educa- memória autobiográfica e estrutura nar-
ção (Faculdade de Educação - USP). A arti- rativa da memória –, considerando a di-
culação entre as atividades de pesquisa e mensão constitutivamente dialógica das
extensão tem proporcionado aprofunda- narrativas. A atenção a narrativas de expe-
mento teórico e metodológico por parte riências escolares faz emergir a “história
dos professores, e as etapas que frequen- não documentada da escola” (Ezpeleta e
temente ficam nas mãos dos pesquisado- Rockwell, 1986), sua dimensão cotidiana,
res responsáveis são compartilhadas com e a apropriação por parte dos seus pro-
membros dos grupos. Conforme aponta- fissionais, alunos e pais, das prescrições
do na avaliação do projeto, as atividades e modo de funcionamento. Por trabalhar
têm contribuído para uma maior integra- com memórias e narrativas de vida princi-
ção com a comunidade, para a constru- palmente por meio de depoimentos orais,
ção de um “outro olhar sobre a escola e a pesquisa considera contribuições da his-
o bairro”, um maior conhecimento das tória oral (Thompson, 2002) e da etnosso-
condições de vida dos alunos e o reco- ciologia (Bertaux, 2010), na articulação de
nhecimento da necessidade de levá-las histórias de sujeitos singulares à dimen-
em consideração ao propor atividades são social mais ampla. Assim, tentamos
pedagógicas. Há também a referência a apreender nos relatos elementos cons-
problemas e dificuldades no percurso. titutivos próprios de uma memória co-
Acreditamos que os projetos contribuam letiva e discursiva (Maingueneau, 1997),
não só para transformações na relação atentando para as condições de produção
escola/comunidade, mas também para e a dimensão histórica das enunciações,
o fortalecimento da identidade da esco- interações, práticas. E indagamos sobre a
la e o repensar de práticas e relações, na possibilidade de se articularem a recons-
medida em que cria espaços de emergên- trução da história da escola e do bairro, a
cia de memórias e narrativas de vida e formação docente e o trabalho pedagógi-
experiências. Tomando como referencial co, na promoção de espaços de diálogo e
teórico elaborações de autores que nos troca de experiências.

830
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 42 - LT07 – Infância, como a diversidade cultural é conduzida


pelas relações de poder constitutivas da
adolescência e diversidade sociedade que concebem a diferença e a
identidade como naturais, cristalizadas e
independentes, perpetuando-se, dessa
LT07-737 - NARRATIVAS DE
forma, a exclusão e a marginalização. Es-
DESENVOLVIMENTO AFETIVO ENTRE
tudos sobre a juventude sul-americana
UNIVERSITÁRIOS DE ORIGEM POPULAR
enfocam a vivência da condição juvenil na
Sueli Barros da Ressurreição - UNEB universidade como desigual e diversa em
suelibarros13@gmail.com função da origem social e da renda fami-
Sonia Maria Sampaio - UFBA liar (Novaes, 2007). No Brasil, as pesquisas
voltadas para as estratégias de perma-
A trajetória dos jovens de origem popular nência de estudantes cotistas no contexto
na Universidade tem sido objeto de pes- universitário apontam para importância
quisas internacionais e nacionais voltadas de analisar a dialética exclusão-inclusão
para compreender as mudanças que ocor- (Nery, 2009; Souza & Souza, 2006; Reis,
rem no meio universitário quando nele 2007; Zago, 2009). Esta dialética mostra-
ingressa um novo tipo de estudante, mais -se como um processo multifacetado, uma
diverso e multifacetado em relação ao configuração de dimensões materiais, po-
perfil do discente oriundo de segmentos líticas, relacionais e subjetivas (Sawaia,
sociais mais favorecidos (Almeida, 2007). 2002). Desse modo, a sociedade que ex-
A partir da adoção das políticas de cotas, a clui, inclui o estudante na Universidade
universidade brasileira possibilitou o aces- através das políticas de cotas, mas a exclu-
so de um contingente expressivo de jovens são não se esgota apenas no acesso, ela
de origem popular. Estas políticas têm sido pode reproduzir-se caso não sejam asse-
alvo de muitos debates públicos e estudos guradas a permanência e a convivência do
em torno da diversidade cultural desses jovem com normas institucionais e com
jovens, considerando nível de renda, ori- a sua própria diversidade cultural. Assim,
gem social, gênero, raça, territorialidade, torna-se relevante estudar a forma como
padrões de preconceitos e discriminação, a diversidade cultural na universidade
como integrantes de sua singularidade e tem influenciado o processo de desenvol-
identidade geracional, política e social. vimento afetivo de jovens de origem po-
Segundo Melero (2001) as políticas edu- pular e como ela vem sendo tratada neste
cativas sobre a cultura da diversidade contexto. O propósito deste artigo é re-
têm sustentado a idéia de integração de fletir sobre alguns elementos identitários
grupos marginalizados às condições im- que se apresentam como organizadores
postas pela cultura hegemônica. Como do desenvolvimento afetivo de jovens de
contraponto, o autor propõe que a cul- origem popular no contexto universitário.
tura da diversidade deve ter um compro- A base teórica deste estudo discorre sobre
misso ético de transformar pensamentos o conceito de juventudes e identidade na
e atitudes relativos a estes grupos, para perspectiva da psicologia sócio-histórica.
evitar a tirania e a normatização. Sobre As juventudes (Abramo, 2005; Dayrell,
este ponto, Silva (2000) denuncia a forma 2002; Groppo, 2010; Pais, 2005) são en-

831
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tendidas na ótica da diversidade, ou seja, curso de vida. No entanto, estas rupturas


compreendidas por meio da contextuali- tornam-se fatos integrantes de uma nova
zação das relações sociais num determi- reconfiguração de sua identidade (do ser
nado tempo e espaço histórico. O concei- jovem de origem popular a ser estudante
to de identidade é entendido como uma universitário cotista). Além disso, constro-
construção sócio-histórica, intersubjetiva em outro sentido subjetivo para seu proje-
e simbólica, inscrevendo-se como repre- to de vida, através da experiência vivida e
sentação, ou seja, como um sistema de de suas reconfigurações (do ser estudante
significação no qual se constitui o Eu. Esta cotista a “ser sujeito” no mundo competi-
representação é inserida num contexto tivo). Apesar das diferenças de condições
de diversidade que lhe permite múltiplas econômicas e culturais com as quais se
identificações e oposições e que fornece deparam para permanecer na universida-
sentido de igualdade, diferença, inclusão de e das discriminações sofridas para al-
e exclusão (Sawaia, 1999; Silva, 2007; Hall, cançar a sua mobilidade social, declaram-
2006). A pesquisa se ancora empirica- -se mais confiantes em sua competência
mente num estudo piloto de abordagem e valor pessoal. Observou-se, ainda, que
qualitativa que recorre à técnica da Entre- os episódios vividos por estes jovens no
vista Episódica (Flick, 2008). Esta técnica, cotidiano possibilitam sua afiliação afetiva
como modalidade da entrevista narrativa, à universidade, não de forma passiva às
permite o acesso a trajetória do sujeito normas institucionais e hegemônicas, mas
a partir de sua fala espontânea e da for- eles transformam-se frente às pressões e
ma como ele organiza, seleciona, detalha dificuldades enfrentadas, elaboram etno-
e reduz os seus episódios biográficos. As métodos (Coulon, 2008) e (re)constroem
entrevistas foram realizadas com dois es- seus referenciais identitários, adquirindo
tudantes cotistas de duas universidades novos contornos e valores. Como afirma
públicas baianas, uma federal e outra es- González Rey (2006), diante das mudanças
tadual, e indagaram sobre a percepção ocorridas na trajetória de vida, a pessoa é
que esses jovens tinham acerca dos víncu- capaz de gerar novos sentidos que levam
los estabelecidos no ambiente acadêmico a configurações subjetivas alternativas,
bem como os episódios que consideraram facilitadoras do desenvolvimento pesso-
marcantes para seu desenvolvimento afe- al. Conclui-se que a universidade, espaço
tivo. Os achados mostram que a vida uni- onde ocorrem importantes transições, é
versitária parece ser mais do que um sim- também palco onde uma nova juventu-
ples cenário onde tramitam os estudantes de enfrenta grandes desafios relativos à
cotistas; ela se constitui palco de mudan- afirmação da diversidade e à exigência de
ça para sua trajetória de vida, trazendo lutar pelo direito à diferença, pela recusa
marcos para o desenvolvimento do seu de uma educação excludente, exercendo
processo identitário. Ao entrar na univer- uma política voltada para a convivência
sidade, estes jovens sofrem uma série de democrática. Á guisa de considerações
rupturas afetivas e culturais como reflexos preliminares, é possível afirmar que a ex-
das relações que estabelecem na ambi- periência dos jovens de origem popular na
ência universitária, provocando tensões universidade revela uma nova identidade
significativas para organização do seu per- de estudante e de cidadão, fenômeno

832
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que precisa ser privilegiado por pesqui- diferenças entre os alunos com necessi-
sas sistemáticas voltadas para a constru- dades educacionais especiais (ANEE): au-
ção de políticas públicas adequadas para ditivo, visual, deficiência intelectual, física
este segmento. Além disso, reitera-se a ou múltipla. Os marcos referenciais para
necessidade de novos estudos na área de a Inclusão Escolar envolvendo educado-
psicologia do desenvolvimento, buscando res, familiares, pessoas com necessidades
o aprofundamento dos aspectos identi- educacionais especiais (PNEE) e, poste-
tários deste grupo de jovens, tais como riormente, a criação do Ensino Especial
organização política, diversidade cultural, definida na Lei de Diretrizes e Bases da
além do reconhecimento social e afetivo. Educação Nacional 9.394/1996, foram
Assim, o tema da juventude no contex- a Conferência Mundial sobre Educação
to da diversidade mostra-se campo fértil para Todos (1990 – Tailândia); a Confe-
de investigação da Psicologia do Desen- rência Mundial sobre Necessidades Edu-
volvimento comprometida com o reco- cacionais Especiais (1994 – Salamanca) e
nhecimento das diferenças e respeito às a Convenção de Guatemala (2001). O fato
identidades, especialmente no contexto da Inclusão Escolar ser discutida, predo-
brasileiro, contribuindo com indicadores minantemente, no contexto da Educação
teóricos para problematização da condi- Especial, acarretou a falsa ideia de que sua
ção juvenil na universidade e para a cons- proposta é para os ANEE’s. Deste modo,
trução de políticas públicas voltadas para o termo Inclusão Escolar passou a ser
este público. compreendido como sinônimo de Ensino
Especial (Carvalho, 2009). No entanto, en-
Palavras-chave: processos identitários, tendemos que incluir pressupõe admitir a
desenvolvimento afetivo, universitários de todos. Questões que merecem destaque
origem popular quando o assunto é Inclusão Escolar in-
Contato: Sueli Barros da Ressurreição, UNEB, cluem: Inclusão Escolar como privilégio
suelibarros13@gmail.com apenas de ANEE’s? Onde ficam outras
expressões de diversidade? Diversidade
pressupõe identidade pessoal: modos de
LT07-761 - A DIVERSIDADE COMO ser, agir; gênero; faixa-etária; classe social
PRESSUPOSTO BÁSICO NOS PROCESSOS e econômica; religião; sexualidade; re-
DE INCLUSÃO ESCOLAR gião; cultura; escolaridade; etnia; alunos
Izete Santos do Nascimento - SEEDF com dificuldade de aprendizagem, entre
izesantos@uol.com.br outros. Diversidade significa que cada in-
Rute Nogueira de Morais Bicalho - UAB divíduo tem o direito de não ser “absor-
arutebicalho@gmail.com vido de modo genérico” (Abramowicz E
Silvério, 2005, p.103). A proposta deste
Diversidade e Inclusão Escolar são temas trabalho é ampliar as discussões sobre o
recorrentes e amplamente discutidos em conceito de Inclusão Escolar para além de
livros, revistas, periódicos e artigos edu- sua associação com os ANEE’s. Seguindo
cativos em geral. A diversidade do público os pressupostos da pesquisa qualitativa,
existente no ambiente escolar tem sido foram realizadas entrevistas semiestrutu-
investigada prioritariamente focando as radas e observações do contexto escolar

833
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de 14 educadores de uma Instituição de cadores se referiram à diversidade aplica-


Ensino regular da Rede Pública do Distri- da tão somente ao ANEE. Afirmaram que
to Federal com o objetivo de compreen- lidam bem com a presença desses alunos,
der a concepção deles sobre o conceito mas, em momentos distintos da entre-
de Inclusão Escolar e sua aplicabilidade vista, as falas indicam o oposto: “existe
face à diversidade existente no contexto resistência mútua por parte de alunos e
educacional. A partir das falas dos parti- professores” (Professor Intérprete). O pa-
cipantes, emergiram quatro categorias de radigma da inclusão não é voltado apenas
análise. Na primeira categoria, conceito para os ANEE’s, mas deve abranger e re-
de Inclusão Escolar, percebemos que os presentar “o resgate histórico do igual di-
participantes mesclam o uso do conceito reito de todos à educação de qualidade”
ora para ANEE, ora para os alunos e suas (Carvalho, 2009, p.27); implica promover
dificuldades em geral, como se pode ob- interações capazes de gerar relações de
servar nas falas a seguir: “processo que reciprocidade. Na terceira categoria, se
possibilite a aprendizagem de todos, sem Inclusão Escolar e Ensino Especial são si-
distinguir ANEE...” (Professor Regente); nônimos, os professores se dividem, mas
“inclusão de indivíduos independente da acabam dizendo sim e citam o Ensino Es-
raça, cor, classe social, tribos, gênero, em pecial para justificar suas respostas. Em
um mesmo espaço físico, o que seria em complemento, na última categoria, In-
tese, a igualdade de todos” (Professor In- clusão Escolar se refere apenas ao aluno
térprete). Ainda nesta categoria, ouvimos especial, boa parte dos participantes re-
frases de que a Inclusão Escolar é: “edu- conhece que a Inclusão Escolar se aplica
cação livre de preconceitos” (Professor a todos os indivíduos envolvidos no con-
Regente); “ANEE’s que saíram de um am- texto educacional: “é uma proposta a ser
biente específico para ele e veio se juntar aplicada à diversidade de uma forma ge-
aos alunos regulares” (Professor Regen- ral” (Professor Regente); “a todos os ne-
te). Assim, torna-se evidente a confusão gros, indígenas, pobre, ricos...” (Professor
que se faz no entendimento e aplicabili- Intérprete). No entanto, quando se junta
dade da Inclusão Escolar. Nesse sentido, os termos Inclusão Escolar e Ensino Espe-
Carvalho (2009, p.26) classifica de ‘desa- cial, percebe-se confusão no entendimen-
visado’ o professor que, indagado sobre to e na aplicação de ambos por parte dos
inclusão, a associa com Ensino Especial educadores, indicando a necessidade de
(modalidade de ensino), isto porque mi- maiores reflexões. As entrevistas mostra-
norias e grupos excluídos necessitam ser ram que a maioria dos educadores encon-
incluídos, indiscriminadamente, nas pro- tra dificuldade para diferenciar Inclusão
postas pedagógicas. Esta autora pondera Escolar e Ensino Especial. Surpreendemo-
serem necessários esclarecimentos sobre -nos ao descobrir que poucos deles con-
o que seja Inclusão Escolar, a fim de redu- cordam que é preciso entender como as
zir tanto a confusão quanto as incertezas diferenças se manifestam para não negli-
sobre o tema envolvendo educadores, fa- genciar a diversidade de atuação nos pro-
mílias, a comunidade e o poder público. cessos de ensino e aprendizagem, assim
Na segunda categoria, a maneira como o como não promover atos de violências
professor lida com a diversidade, os edu- pela não aceitação do outro. Esta pesqui-

834
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sa buscou contribuir para que a educação, 1988; Freitas E Khulman Jr, 2002; Dahl-
de fato, possa garantir a inclusão de to- berg, Moss e Pence, 2003; Priore 1996 e
dos os alunos que adentram os muros das 2000; Vasconcelos e Sarmento, 2007). A
escolas. Na perspectiva inclusiva, a escola sociologia da infância propõe como ob-
precisa de adequações que valorizem o jetos de estudo a criança, compreendida
profissional de educação; formação ade- como ator social, e a infância, como cate-
quada; equilíbrio e aperfeiçoamento das goria social do tipo geracional (Sarmento,
estruturas escolares; promoção da igual- 2008). Avessa à invisibilidade infantil, cí-
dades de oportunidade (Carvalho, 2009). vica ou científica, e à definição de criança
Sobretudo, o cotidiano escolar exige no- centrada na negatividade, propõe estudos
vas posturas educativas e humanitárias, que estejam atentos à complexidade da
capazes de mudar os homens, construir vida concreta. Ariès (1988) inaugurou uma
pontes entre educação escolar e vida em perspectiva da compreensão da infância
sociedade, na formação de indivíduos como categoria socialmente construída,
que, em diálogo com seu semelhante/ assim como estudiosos, tais como Stearns
diferente, encontrem caminhos para uma (2006) e Heywood (2004). No Brasil, pes-
vida melhor a partir do reconhecimento e quisadores (Priore, 1996 e 2000; Freitas,
respeito das diversidades individuais. 2007; Freitas e Khulman Jr., 2002; Rizzini,
2004; Pinheiro, 2006) têm estudado a his-
Palavras-chave: inclusão escolar, ensino tória da infância, deixando clara a sua con-
especial, diversidade dição de exploração, desrespeito e invisi-
Contato: Izete Santos do Nascimento, SEEDF, bilidade. Fazer antropologia, afirma Cohn
izesantos@uol.com.br (2005), “é tentar entender um fenômeno
em seu contexto social e cultural” (p. 9).
Desde a década de 20, antropólogos vêm
LT07-765 - CRIANÇA E INFÂNCIA NO estudando a infância em suas peculiari-
MOVIMENTO DOS TRABALHADORES dades e distintos contextos. Estudos vêm
SEM TERRA: OS SEM TERRINHA NAS tomando a cultura como dado simbólico,
REVISTAS acionado por atores sociais que dão senti-
Ângela de Alencar Araripe Pinheiro - UFC do à sua experiência. Pretende entender o
a3pinheiro@gmail.com lugar da criança e da infância como sistema
Ana Maria Monte Coelho Frota - UFC simbólico. Gomes (2008) re-afirma a ne-
anafrota@ufc.br cessidade de se considerar a criança “em
seus próprios termos” (p. 85), chamando
A partir de estudos feitos por diferentes a atenção para sua especificidade. A filo-
campos de conhecimento, consideramos sofia (Koan, 2004 e 2007; Agamben, 2005)
tese irrefutável a afirmação de que não vem discutindo esse tema: a infância pre-
se pode falar de infância partindo-se de cisa dizer-se, para ser. Com base na neces-
uma perspectiva a-histórica e essencialista sidade da criança se dizer, para ser escu-
(Sarmento e Gouveia,2008). É necessário tada verdadeiramente, construímos este
afirmar que a infância é um tempo de vida, projeto de investigação: Criança e infância
construído a partir das relações com os no Movimento sem Terra, com o objetivo
outros, em contextos particulares (Aries, de conhecer os significados de criança e

835
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de infância, construídos e em circulação, Gonçalves, 2011; Oliveira, 2011). Contudo,


entre integrantes de assentamento MST, não encontramos referências de estudos
no interior do Ceará. O MST surgiu na dé- que tratem especificamente das significa-
cada de 1980, sendo ator coletivo atuante ções atribuídas à infância e ao ser criança
da sociedade civil brasileira contemporâ- em assentamentos e acampamentos. Fi-
nea. Sua visibilidade se associa à capaci- caremos também atentas, durante nossa
dade de reivindicação e conflitos que sua investigação, a como a presença (ou não)
atuação revela. É um movimento massivo do trabalho infantil tem implicações nas
de luta pela terra para quem nela trabalha, significações de infância e do ser criança
reivindicação secular (Gohn (1997). O MST em assentamentos do Ceará. Um recorte
adota como estratégia básica a ocupação neste trabalho diz respeito a concepções
de terras improdutivas para se tornarem de criança/infância que atravessem a es-
assentamentos, com a titularidade da ter- trutura dos textos que compõem revistas
ra para as famílias que a tornam produtiva. produzidas pelo MST, destinadas a serem
São três os momentos centrais da consti- trabalhadas com as crianças. Para o MST,
tuição do MST, segundo Stédile (1997, “desde cedo as crianças aprendem através
apud Souza, 2002): a retomada das lutas da participação na luta, que as coisas não
massivas pela terra; a constituição formal nascem prontas, que o mundo está para
do MST, a partir da realização do Encontro ser feito. Sendo assim, a realidade não é
Nacional dos Sem-Terra; e o investimento algo imutável, mas para transformá-la é
na ocupação das áreas para assentamen- importante tratar a terra como lugar de
tos, que são, ao lado dos acampamentos, morar, de trabalhar, de produzir, de viver,
o universo mais próximo do cotidiano do de morrer e de cultuar os mortos” (Mon-
MST, nos quais vivem, convivem, traba- teiro, 2005, p. 16). Segundo Caldart (2004,
lham, estudam, se organizam. É evidente apud Silva, 2008), o ser sem terrinha apre-
a importância que a educação ocupa para senta uma condição infantil ou jeito de ser
o MST - formal e formação de seus inte- criança peculiar, assim como sua condição
grantes, como caminho fértil para fortale- de estudante. Sua participação se liga à
cer a atuação do Movimento (Souza, 2002; história do MST, dando um matiz diferen-
Gohn, 1997). O olhar que o MST incide em te à sua infância. Nem todas as crianças
direção às crianças traz uma comparação acampadas e/ou assentadas são de fato
plena de sentidos: “Há que se cuidar do sem terrinha, embora tal condição se faça
broto, para que a vida dê frutos” (MST, possível, a partir da formação política. Tal
2011, p. 1). As Jornadas de Crianças sem perspectiva corrobora com afirmação de
Terrinha consolidam tal perspectiva, ini- uma educadora do MST: “a primeira idéia
ciadas em 1994, tendo como lema: “Por que me vem, quando se fala de criança,
Escola, Terra e Dignidade”. O envolvimento é a necessidade de formação política”.
das crianças se dá desde a sua preparação Essa realidade é percebida claramente no
até a sua realização. Relatos dos Encontros conteúdo encontrado em Revistas SEM
de 2010 apontam para sua ocorrência em TERRINHA. A importância da compreen-
14 Estados, com a presença de cerca de 15 são do significado dos símbolos do MST,
mil crianças. Estudos em assentamentos assim como do princípio sagrado que eles
têm investigado o trabalho infantil (Cruz e representam, é muito clara. A história da

836
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

luta, assumida e travada pelos sem terra, do Estado do Espírito Santo, os municípios
também é deixada muito evidente. A or- de São Mateus e Conceição da Barra. De
ganização interna do Movimento é apre- acordo com (Silva, 2005), há no território
sentada, através de texto bem escrito e quilombola do Sapê do Norte, 39 comuni-
adaptado à linguagem infantil. Chama-nos dades, cujo grande desafio atualmente é
a atenção a apresentação que é feita dos ter reconhecidos os seus direitos de pos-
Sem Terrinha, através de características: se e titularidade das terras. Apresentare-
“Mas os Sem Terrinha são muito corajo- mos dados das escolas das comunidades
sos”; “E como Sem Terrinha não tinham quilombolas, articulando reflexões sobre
nada de bobo, gritaram bem alto para os as experiências pedagógicas ali realizadas
soldados: nós não queremos balas, quere- com ideias centrais de Vygotsky (1991),
mos terra para os nossos pais” (Sem Ter- tais como a mediação do outro na cons-
rinha, 2009); “nós sem terrinha fazemos trução de significados que nos permitem
parte desde o início da luta pela terra” pensar o mundo que nos cerca e o papel
(Sem Terrinha, 2010). Fica-nos a pergunta da afetividade e das relações intra e extra-
a ser refletida: como esses conteúdos de -escolares no desenvolvimento do sujeito
significação identitária são (re)construídos que aprende. Do final do século XIX até
pelos próprios sem terrinha? Nossa inves- quase o final da segunda metade do sé-
tigação há de abordá-la, com a profundi- culo XX, os quilombos foram tratados na
dade possível. historiografia e na educação brasileira
como se restringindo aos “redutos de es-
Palavras-chave: criança, MST, infância cravos fugidos” e a experiências do perío-
do escravista. No entanto, por todo o país,
agrupamentos negros rurais suburbanos
LT07-1271 - EDUCAÇÃO ESCOLAR e urbanos se constituíram não somente
QUILOMBOLA: MEMÓRIA E VIVENCIAS como fuga ou resistência direta ao siste-
DE SABERES NAS COMUNIDADES ma vigente, mas como uma “busca espa-
QUILOMBOLAS DO SAPÊ DO NORTE: ES cial” (NASCIMENTO, 1989), na construção
INTERFACES NA ESCOLA de território que é social e histórico, atra-
Olindina Serafim Nascimento - UFES vés da manutenção e reprodução de um
modo de vida culturalmente próprio. Após
O presente trabalho é um recorte de uma mobilizações regionais em que estiveram
pesquisa em andamento no curso de Pós- envolvidos militantes e parlamentares ne-
-Graduação no PPGE-UFES que vem retra- gros e entidades de apoio, a abordagem
tar a necessidade de considerar a memó- do tema assumiu outra direção com a
ria e o saber acumulado dos mais velhos publicação do artigo 216 na Constituição
do território do Sapê do Norte, úteis nos Federal que se refere diretamente aos
conteúdos das escolas nas comunidades quilombos. Nos últimos vinte anos, os ne-
quilombolas, visando criar caminhos me- gros rurais, em todo o território nacional,
todológicos-pedagógicos para o desenvol- organizados em Associações Quilombolas,
vimento do processo educativo. O territó- reivindicam o direito à permanência e ao
rio do Sapê do Norte-ES inclui as comuni- reconhecimento legal da posse das terras
dades quilombolas de toda a região norte ocupadas e cultivadas por eles para mora-

837
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dia e sustento, bem como o seu modo tra- para transformar. É papel da escola, de
dicional de viver, o livre exercício de suas forma democrática e comprometida com
práticas, crenças e valores culturais consi- a promoção do ser humano na sua inte-
derados em sua especificidade. A história gralidade, estimular a formação de valo-
da educação escolar quilombola tem sido res, hábitos e comportamentos que res-
marcada pela instabilidade e pelo descaso. peitem as diferenças e as características
Da conquista da escolaridade à existên- próprias de grupos e minorias (Diretrizes
cia dos estabelecimentos de ensino nas Curriculares/Afro-Brasileiro). O processo
comunidades, passaram-se muitas lutas pedagógico para as comunidades quilom-
travadas com os poderes constituídos res- bolas difere dos demais, em função de es-
ponsáveis pelas políticas publicas. A pre- tar baseado em uma pedagogia vinculada
sença de escolas, muitas vezes, parece ser a um movimento de luta social visando
mais uma concessão governamental do reparações, reconhecimento e valoriza-
que uma obrigação em assegurar direitos ção da identidade, da cultura e da história
(GT Educação quilombola, 2008). Entre as dos negros e negras brasileiros. Nos qui-
reivindicações das Associações Quilombo- lombos, o currículo presente não poderá
las estão o direito à educação e a efetivi- permanecer insensível ao diferente capi-
dade da Lei 10.639/2003 de 09/01/2003, tal cultural de origem familiar e social que
que estabelece as diretrizes e bases da os alunos carregam no seu dia-a-dia para
educação nacional, para incluir no currí- a escola. Para atuar nas escolas das comu-
culo oficial da Rede de Ensino a obriga- nidades de quilombo, é necessário que os
toriedade da temática “História e Cultura professores tenham competência cultural
Afro-Brasileira”. A população quilombola para entender que os alunos são seres so-
busca não apenas o direito ao estudo, mas ciais com uma bagagem peculiar de cren-
lutam também para que suas tradições e ças, significados, valores, atitudes e com-
pertencimento sejam temas constantes portamentos adquiridos em ambientes
no currículo escolar. Atualmente, pela via extra-escolares que devem ser considera-
dos movimentos sociais, temos consegui- dos (Perrenoud, 2000). A etno-conclusão
do avanços em relação à incorporação da do nosso trabalho entende que a garantia
cultura afro-descendente nos currículos legal é um primeiro passo nesse campo de
escolares, mas a diversidade do povo bra- lutas contra a discriminação, mas ainda
sileiro enquanto alvo do processo educa- precisamos efetivar de fato essas discus-
cional ainda permanece como desafio nas sões nos cotidianos escolares. É necessá-
escolas. A educação constitui-se um dos rio um novo olhar, que valoriza o saber
principais mecanismos de transforma- acumulado, a tradição, a experiência vivi-
ção de um povo. De acordo com (Nunes, da e as reflexões feitas por aqueles que de
2006), uma concepção de educação que fato experienciaram o fato de serem ne-
vá ao encontro dos interesses emancipa- gros nessa nação. Entendemos que é fun-
tórios que as comunidades quilombolas damental o amplo acesso dos professores
vêm construindo requer a promoção de e professoras a uma formação específica,
uma leitura de mundo que dê ênfase à sua que empregue materiais e equipamentos
trajetória histórica, como lembrança viva pedagógicos que tratem diretamente das
de que o tempo não esvaece a disposição questões étnicas e raciais; estes são raros.

838
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Essencial também é o acesso dos alunos famílias carentes passam por necessidades
a materiais didáticos elaborados regional- básicas; as crianças permanecem na escola
mente que tragam perspectivas afirmati- em turno integral. Com fundamentação te-
vas para os negros. Nas comunidades qui- órica na Psicologia e na Educação, a investi-
lombolas, o direito a educação deve ser gação busca compreender as diversas pos-
entendido como um processo de desen- sibilidades de viver a infância. Utilizamos
volvimento humano e cultural. Nas esco- como instrumento de pesquisa o desenho
las quilombolas, é necessário fomentar o representando episódios de uma criança e
conhecimento, a valorização e o respeito suas falas sobre um dia livre (Schmid-Kitsi-
à descendência africana, à sua cultura e à kis, 1994). A partir das falas das crianças,
história, construindo sujeitos cidadãos e foram organizadas categorias a posterio-
cidadãs e não apenas meros dominadores ri e sobre estas foi realizada uma análise
de competência e habilidades técnicas. A quantitativa e qualitativa, cruzando a fre-
formação para a cidadania procura liber- quência e porcentagem do aparecimento
tar a população quilombola do processo das categorias a partir do conteúdo reve-
alienante, historicamente constituído, no lado pelas mesmas. O grupo de crianças
qual a formação acadêmica do negro era pesquisado, na faixa etária ente 5 e 6 anos,
limitada, enquanto mão de obra barata, e expressa suas idéias por meio de falas e
não o levava a galgar espaços relacionais desenhos. Os episódios foram desenha-
dos quais fora para eles definidos. dos em seis momentos, desde o acordar
até a hora de dormir, detalhes da forma
Palavras-chave: educação, escolar quilombola, que preenchem seu dia e as brincadeiras
território - Sapê do Norte que vivenciam tornando-se informantes
privilegiados. O pesquisador entrevista
o participante de forma que este relate
LT07-1439 - AS POSSIBILIDADES DE as intenções que teve no seu desenho e,
VIVER INFÂNCIAS SOB O OLHAR E conjuntamente, manifestam sentimentos
DESENHAR DAS CRIANÇAS e emoções ao decodificar seus traços re-
Simone Brehm Wurzel - CESUCA gistrados no papel. Os desenhos e falas re-
simone.wurzel@terra.com.br velam que é pelas interações nos espaços
Márcia Elisabette Wilke Franco - CESUCA da casa, da rua e da escola que elas vivem
Camila Francisco Zanette - CESUCA as suas diferentes atividades, explicitando
Felipe Pereira de Assis - CESUCA distintas possibilidades de infância. Os re-
sultados indicam o quanto as culturas de
Este trabalho é resultado de uma pesqui- infância dependem das interações e dos
sa empírica com contextualização teórica significados dos lugares reconhecidos pe-
das disciplinas do curso de Psicologia da las crianças. A dinâmica das interações em
Faculdade CESUCA – Complexo de Ensino cada um desses espaços é própria. A esco-
Superior de Cachoeirinha/RS, em uma es- la é mais um lugar para crianças viverem
cola pública infantil, região metropolitana suas infâncias. Elas não são passivas nas
da grande Porto alegre. A instituição que situações de entretenimento; elas são ati-
participa da pesquisa atende crianças de vas protagonistas. Elas têm presente que a
classe média baixa, tendo casos em que as não-ludicidade faz parte da vida. O lúdico e

839
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

as formas de viver esse lúdico constituem reconhecê-las como sujeitos de cidadania.


uma das possibilidades das crianças vive- As crianças e suas falas sobre as diversas
rem suas infâncias. Quando a criança está possibilidades de viver a infância hoje, à
com a palavra, ela produz mudanças e se medida que as elas apontam, em um dia
configura como agente histórico e social. livre, atividades que podemos entender
A Psicologia estuda a importância do de- como aquelas que fazem parte do cotidia-
senvolvimento psíquico. As brincadeiras no. Alguns autores chamam-nas de rotina,
são primordiais nesta etapa da vida, na hábito, e que, pela repetição, acabam se
atenção, memória, concentração, compre- tornando comportamentos individuais e
ensão de regras e papéis sociais, autoesti- sociais. Poderíamos entender que as crian-
ma e criatividade. O trabalho desenvolvido ças mostram que não podemos pensar só
na escola reflete junto aos profissionais em coisas lúdicas, mesmo em um dia livre.
a importância que eles exercem junto às Estaríamos, neste caso, negligenciando
crianças nesse processo humano, frente os cuidados, ou tudo aquilo que não é lú-
às suas necessidades e possibilidades de dico, por pensar que o lúdico é a grande
desenvolvimento físico, mental e social e o marca trazida pela criança para a infância?
quanto a escola tem contribuído para esti- Ou deveríamos pensar que no lúdico en-
mular as aprendizagens infantis através do contramos também as questões biológicas
lúdico. A forma que estas crianças se de- do humano? É claro que se faz tudo isso
senvolvem refletirá na aprendizagem. En- também porque as normas sociais nos le-
tendemos que a interação é fundamental vam a fazer, mas as crianças aqui pesqui-
para se constituírem novos olhares sobre sadas parecem indicar algo mais do que
a infância, proporcionando novas formas só os condicionantes sociais. Os entrevis-
de se vivê-la hoje. Podemos entender o tados, através de suas falas, demonstram
espaço da escola como um espaço de tro- o quanto suas formas de brincar estão e
cas, de afetos, de grandes interações e são produzidas pela cultura, pelos meios
que, por abrir essas brechas de convivên- de comunicação e pelas instituições so-
cia, passa a ser um espaço de formação ciais de que fazem parte. Essas questões
de identidades, de diferentes infâncias. As podem ser mais bem entendidas quando
crianças mostram suas compreensões de olhamos para quais os tipos de brincadei-
mundo na contemporaneidade e compre- ras que as meninas e os meninos mais se
endem sua participação neste mundo de apropriam, assim como os espaços mais
uma forma bastante lógica e criativa. Elas utilizados por eles. A pesquisa ainda em
acompanham as transformações históricas execução nos lança questionamentos so-
e sociais e também produzem mudanças, bre as influências externas na organização
configurando-se, assim, como agentes das brincadeiras pelas crianças, influências
ou atores históricos e sociais. As crianças da cultura dos adultos, dos programas de
dispõem de um conhecimento, fazem di- televisão, da internet, da tecnologia na in-
versas relações, são capazes de avaliar e fância, o quanto o mundo que as rodeiam
vivenciar vários papéis e inventam suas es- interferem na construção do lúdico.
tratégias. Transgridem as regras atribuindo
outros significados para suas atividades. Palavras-chave: infância, crianças, educação
Pesquisando com as crianças, precisamos Contato: simone.wurzel@terra.com.br

840
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-851 - REPRESENTAÇÕES SOCIAIS contexto histórico social mais amplo.


SOBRE INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA DOS Sendo assim, é de se supor que o (re) co-
ACADÊMICOS DE LICENCIATURA EM nhecimento das representações sociais
QUÍMICA, FÍSICA E MATEMÁTICA construídas pelos indivíduos pertencen-
Tatiana Comiotto Menestrina tes a um determinado grupo social deve
Bruna Bortolatto Rizzieri passar, necessariamente, pelo conheci-
Jacira E. da C. Tavares mento da história de construção desse
Marcelly Brenzink Mira conceito pela comunidade científica,
uma vez que é a partir daí que os mes-
As representações sociais são uma espé- mos são difundidos e propagados para
cie de pequenas teorias criadas de ma- outras instâncias sociais. Segundo Mos-
neira informal em meio às interações so- covici (1984) representação social é algo
ciais. O homem, ao representar alguma um tanto complexo para ser compreendi-
coisa, tem a tendência de remodelar, do. Isto se deve ao fato de que deste con-
atribuir aos objetos, fatos ou situações, ceito confluem noções de origem socio-
um sentido especial e subjetivo. Neste lógica, como a cultura, a ideologia e no-
sentido, pode-se dizer que o mundo no ções de procedência psicológica, tais
qual as pessoas interagem é construído como a imagem e pensamento. Por este
por estas representações sociais, e o que motivo representação social pode ser
consideram como realidade é algo que chamada de um conceito psicossociológi-
foi reelaborado tanto pelo psiquismo in- co. Este autor considera que as represen-
dividual quanto pelo social. A Teoria das tações sociais constituem uma organiza-
Representações Sociais é, desta forma, ção psicológica, uma forma de conheci-
uma abordagem alternativa para se com- mento específico da sociedade e que não
preender o comportamento cotidiano se reduz a nenhuma outra forma de co-
dos indivíduos e dos grupos sociais. Cada nhecimento. Desta forma, ele diferencia
ser humano, no decorrer de sua vida, vai as representações sociais de outras for-
compondo sua história formando um sis- mas como os mitos, a ideologia, a ciência
tema de pensamento que de um lado di- ou as visões de mundo, embora conside-
fere dos demais e por outro está em con- re que elas compartilham aspectos co-
formidade com o grupo do qual faz parte. muns com cada uma. As representações
Estas considerações sobre as representa- sociais são constituídas, em grande par-
ções sociais permitem compreender que, te, através da cultura acumulada na so-
embora uma representação se construa ciedade ao longo da história. O caldo cul-
em torno de objetos reais ou imaginá- tural circula pela sociedade por meio das
rios, ela não pode ser percebida isolada crenças compartilhadas, dos valores, das
ou distanciada do que se pretende captar referências históricas e culturais que for-
e analisar, bem como do modo de vida mam a memória coletiva e constroem a
concreta dos seres humanos. De acordo identidade da própria sociedade. Estas se
com o exposto, as representações sociais encontram, na maioria das vezes, no con-
não dizem respeito apenas a um fenôme- junto de condições sociais, econômicas e
no do imediato, pelo contrário, estão, so- históricas, bem como no sistema de cren-
bretudo, diretamente relacionadas a um ças e valores existentes na referida socie-

841
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade. Neste trabalho, têm-se como obje- aprendizagem, mas dentro de um com-
tivos: analisar as representações sociais plexo contexto social e institucional”. Não
de infância dos acadêmicos de licenciatu- há uma formação acabada, o professor
ra em química, física e matemática de necessita de uma constante movimenta-
uma instituição pública de Joinville; dis- ção, buscando aperfeiçoar fazeres. Se-
cutir as representações sociais dos aca- gundo Freire (2011, p.1): A responsabili-
dêmicos dos referidos cursos quanto à dade ética, política e profissional do ensi-
adolescência, e relacionar as representa- nante lhe coloca o dever de se preparar,
ções sociais apresentadas pelos acadêmi- de se capacitar, de se formar antes mes-
cos destes cursos de formação de profes- mo de iniciar sua atividade docente. Esta
sores e a educação. A EDUCAÇÃO VOLTA- atividade exige que sua preparação, sua
DA PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES. capacitação, sua formação se tornem
A formação docente tem suas problemá- processos permanentes. Sua experiência
ticas enraizadas na história, partindo daí docente, se bem percebida e bem vivida,
os desafios da contemporaneidade. A vai deixando claro que ela requer uma
exigência ao professor é demasiada, a ele formação permanente do ensinante. For-
são dadas inúmeras responsabilidades. mação que se funda na análise crítica de
Será que a educação oferecida aos pro- sua prática. A prática profissional oportu-
fessores em suas formações é suficiente niza ao docente aprendizado cotidiano,
para eles encararem todas as dificulda- quando tal permite-se invadir e almejar o
des, desafios e principalmente responder curiosear dos alunos. De acordo com
de forma positiva a maioria das exigên- Freire (2011, p.1): Não existe ensinar sem
cias feitas? Não. Para o professor conse- aprender. O aprendizado do ensinante ao
guir administrar as facetas existentes é ensinar não se dá necessariamente atra-
necessário ir além dos muros de uma ins- vés da retificação que o aprendiz lhe faça
tituição. Gradativa e historicamente vem- de erros cometidos. O aprendizado do
-se focalizando a importância na forma- ensinante ao ensinar se verifica a medida
ção de professores, em passos miúdos, que o ensinante, humilde, aberto, se
mas que proporcionam em longo prazo ache permanentemente disponível a re-
grandes mudanças. É ampla a responsa- presentar o pensado, rever-se em suas
bilidade das Universidades e Faculdades posição; em que procura envolver-se
na formação profissional de docentes. A com a curiosidade dos alunos e dos dife-
ela cabe além de simplesmente passar- rentes caminhos e veredas, que ela o faz
-lhes a teoria, instigar, deixar claras as di- percorrer. A educação vem-se transfor-
ficuldades e desafios, sua importância na mando, assim como o modo de formar os
formação de cidadãos, descentralizando profissionais desta área, concomitante-
do sujeito a culpa pelas dificuldades e fo- mente a maneira de aprender e a relação
calizando o contexto social. Segundo Pe- professor-aluno. Por isso é fundamental
nin (2001, p. 9) um dos princípios citados conhecer as representações sociais que
para formação de professores é que ele: os futuros docentes, atuais licenciandos,
“... deve partir da noção de que a docên- possuem a respeito da infância e da ado-
cia não se realiza num quadro abstrato de lescência, objeto de seu trabalho. REPRE-
relações individualizadas de ensino e SENTAÇÃO SOCIAL SOBRE INFÂNCIA. Há

842
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

uma grande diversidade da forma como Tudo é mais disponível, mais liberado,
os professores percebem as crianças e as descartável. As facilidades e soluções que
suas representações sobre a infância, a os jovens encontram para resolver seus
educação infantil e seu próprio trabalho, problemas são muito mais rápidas que há
pois, constroem ao longo de suas histó- algum tempo atrás. A falta de espaço
rias de vida, ideias de como devem ser para o amadurecimento tem preocupado
educadas as crianças. As concepções re- os educadores, inclusive quanto ao com-
lacionadas à infância e compartilhadas portamento dos alunos e suas perspecti-
em uma sociedade determinam as atitu- vas em relação à educação. Muitas vezes
des e práticas educativas e suas intera- os adolescentes sabem tudo do mundo
ções com as crianças. Como afirma Nu- virtual, mas estão com os pés longe do
nes (1994) o conceito de infância varia chão, sonhando com uma realidade que
entre distintas classes e culturas, o que não existe. Por este motivo, conhecer as
gera expectativas e demandas diferentes representações sociais dos futuros pro-
quanto ao processo de desenvolvimento fessores sobre a adolescência é um passo
das crianças, ou seja, motiva a constru- fundamental, pois oportuniza a eles
ção de várias imagens a respeito delas. maior conhecimento da realidade. ME-
Estas imagens são determinantes na prá- TODOLOGIA. Foi aplicado aos alunos da
tica educativa, nos mais diversos contex- disciplina de Psicologia da Educação de
tos sociais. Os professores são adultos uma instituição pública de Joinville um
que já passaram pela infância, e suas vi- questionário com perguntas abertas a
vências marcam profundamente as re- fim de verificar a percepção dos acadêmi-
presentações que constroem sobre as cos quanto à infância e a adolescência.
crianças e suas famílias, influenciando na Os questionários foram aplicados entre
prática educativa. Os educadores defi- os meses de março e abril de 2011. A ta-
nem a criança de forma simbólica e como bulação dos dados foi realizada através
um ser em desenvolvimento, a partir de da técnica da análise de conteúdo pro-
uma idealização que dela fazem, e da posta por Bardin (2002). Esta técnica me-
percepção de suas necessidades. Além todológica consiste em que o pesquisa-
da infância, os licenciados também ne- dor construa conhecimentos através da
cessitam conhecer as características dos análise do discurso e da organização das
adolescentes, pois isso irá demonstrar a palavras utilizadas pelo entrevistado. As
forma como eles irão trabalhar com esta questões apresentadas para os acadêmi-
faixa etária. REPRESENTAÇÃO SOCIAL SO- cos foram: como é a infância e a adoles-
BRE ADOLESCÊNCIA. A adolescência, uma cência hoje; conte uma história da sua
fase em que o jovem não é nem criança infância ou adolescência; o que é ines-
nem adulto, está repleta de confusões. quecível para você nestes dois períodos e
As representações sociais dos adolescen- o que se poderia fazer para mudar a rea-
tes são (re) criadas a todo o momento, lidade atual em relação a infância e a
bem como, na sociedade atual, a adoles- adolescência. RESULTADOS E DISCUS-
cência também foi recriada, seu tempo SÕES. Através de questionário respondi-
se estendeu: começa mais cedo e está do pelos alunos dos cursos de licenciatu-
terminando mais tarde (OLIVIERA, 1997). ra em química, física e matemática, per-

843
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cebe-se que eles veem a infância e a ado- bém sobre a vida em família, mencionan-
lescência nos dias atuais como complica- do a relação com os avós. Afirmam que
das, afirmando que tem uma tendência gostavam de tomar banho de rio e viajar
inclusive da infância ir desaparecendo com os pais. Um deles mencionou que
aos poucos. Mencionaram que não exis- gostava de ver, por horas, a mãe dese-
tem mais crianças como antigamente. A nhando e que deixavam a imaginação
adolescência está se antecipando e as guiar a brincadeira. Outros pontos elen-
crianças param de brincar cada vez mais cados foram: os primeiros contatos com a
cedo. Consideram que os adolescentes vida noturna, o amadurecimento pesso-
vivem em uma sociedade violenta, ex- al, as afinidades, o primeiro namorado,
postos a marginalidade e as drogas. A se- amizades da época e o aprendizado com
xualidade também é vivenciada precoce- os professores, pais e o com experiência
mente. Acreditam que as crianças e ado- de vida deles. O carinho dos pais, que
lescentes estão muito presos a tecnolo- sempre observavam tudo que faziam, em
gia, e deixam de lado brincadeiras que fim todas as descobertas feitas neste pe-
envolvem o grupo. Isso afeta o desenvol- ríodo foram apontados como aspectos
vimento social. Apresentaram como pro- positivos. Arrumar toda a bagunça, cair
blemática a falta de tempo dos pais para de bicicleta, a morte do padrinho na in-
darem atenção aos filhos, o que conduz, fância, o fato de ter passado tanto tempo
segundo eles a insegurança, a falta de ob- sozinho na adolescência, a questão dos
jetivos e limites. Afirmam que os adoles- conflitos no casamento dos pais, as ami-
centes estão cada vez mais sedentários e zades deixadas para trás, as mudanças
que os jovens vão a festas, se drogam, repentinas no corpo, as brigas como os
bebem, sem pensar nas consequências, e pais ou a super proteção por parte deles,
deixam os estudos de lado. Além disso, o jeito antigo deles pensarem, preconcei-
estabelecem uma análise baseada no tuosos em alguns casos, a distância da
contexto em que vivem, algumas preci- mãe que morava em outra cidade e uma
sam trabalhar desde jovens, outros se desilusão amorosa são os pontos negati-
sentem mais solitários. Os acadêmicos vos da fase. Um dos entrevistados disse
relatam sobre travessuras, acontecimen- que não tinha nenhuma história a ser
tos trágicos, contam fatos relacionados contada, pois tinha uma realidade triste
com a vida escolar, sobre a dedicação pa- na adolescência e outro menciona ainda
terna e outros sobre brigas com amigos a questão do bullying sofrido na escola. A
da mesma idade durante estes períodos. pergunta que se referia ao que poderia
Quando questionados sobre os momen- ser mudado em relação a realidade atual
tos inesquecíveis destas fases menciona- na infância e na adolescência, afirmaram
ram como pontos positivos: as férias em que depende como as pessoas agem, dos
casa de parentes, a reunião familiar, o valores que transmitem e ensinam. Tam-
primeiro beijo, andar de bicicleta, as bém disseram que depende do contexto
brincadeiras de boneca e liberdade para onde estão inseridos, que é necessário
brincar nas ruas, ir à escola, mudança de maior imposição de limites, dar mais
cidade e de amigos. Suas únicas respon- atenção as crianças e mostrar que tudo
sabilidades eram estudar. Relatam tam- tem seu tempo para acontecer. É neces-

844
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sária também uma preocupação maior LT05-1363 - AS CRIANÇAS DE 0 A 3 ANOS DO


com a educação dos adolescentes. É im- CAMPO E SUAS FAMÍLIAS: INVESTIGANDO
portante, segundo mencionaram, escu- A PRODUÇÃO ACADÊMICA NACIONAL E
tar mais os jovens, seus problemas, e dar INTERNACIONAL
oportunidades para que possam crescer Marcella Oliveira Araújo - FFCLRP-USP
e progredir. Concordam que seria impor- moa.psic@yahoo.com.br
tante que os pais tivessem consciência de Ana Paula Soares da Silva - FFCLRP-USP
seu papel e não jogassem toda a respon- apsoares.silva@gmail.com
sabilidade em cima dos professores, par- Financiamento: CAPES
ticipando da vida dos filhos. E por último
que as escolas deveriam proporcionar Apesar dos avanços no conhecimento so-
palestras aos pais, com temas ligados a bre a criança de 0 a 3 anos de idade e das
relacionamentos, e também a diferença suas possíveis implicações nas práticas
da educação de uma criança que vive no cotidianas, esses sujeitos, de acordo com
mundo tecnológico e uma de antigamen- a literatura da área, continuam invisíveis
te. CONCLUSÕES. Os acadêmicos dos cur- aos olhos da ciência, das políticas públi-
sos de licenciatura irão ministrar aulas cas e da historiografia da infância. Quan-
para crianças e adolescentes e identificar do se trata das crianças moradoras em
suas representações sociais é primordial territórios rurais, essa (in)visibilidade é
para uma formação profissional sólida e mais intensa. O presente trabalho é parte
voltada para o desenvolvimento de cida- da pesquisa de mestrado que busca com-
dãos conscientes e engajados na luta preender como é o cotidiano das crian-
pela transformação social. Verificou-se ças de 0 a 3 anos de idade, moradoras de
que os alunos separaram em algumas ca- uma comunidade rural e que tem como
tegorias as suas percepções, entre elas objetivos específicos investigar as signifi-
citam-se: comportamento dos jovens, cações da família sobre a criança peque-
questões familiares, educação, aspectos na no contexto do campo, assim como os
sociais, alargamento da adolescência em modos como organiza seu dia-a-dia em
contraponto com a diminuição da infân- relação à educação e ao cuidado desta
cia, as brincadeiras e amizades. Essas re- criança. O recorte para a apresentação é
presentações estão em conformidade a revisão bibliográfica do estudo, realiza-
com as características dessas faixas etá- da com objetivo de analisar a produção
rias descritas na literatura. Um contexto acadêmica nacional e internacional sobre
muito comum na realidade da família as crianças de 0 a 3 anos do campo e suas
atual está na permanência cada vez famílias. Realizou-se um levantamento bi-
maior das crianças nas escolas, da expan- bliográfico de estudos indexados nas ba-
são da mídia e o surgimento das novas ses de dados BVS-PSI, PSYCINFO e FRAN-
configurações da família e da sociedade, CIS, sem restrição de data, utilizando as
tornando cada vez mais tênue a linha que seguintes palavras-chaves e seus cruza-
separa a infância de outros grupos gera- mentos: criança; bebê; recém-nascido e
cionais (adolescência, adulto), levando família e rural. Nas bases internacionais,
alguns a questionar se a infância não está as palavras utilizadas foram: newborn;
em processo de extinção. baby; infant; toddler e family e rural. Os

845
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

critérios de inclusão no levantamento fo- estudos (10%) retratam sobre a capacita-


ram: descrição de práticas diretas estabe- ção de profissionais e a relação médico-
lecidas com as crianças de 0 a 3 anos por -paciente; 11 estudos (8%) abordam os
suas famílias; disponibilidade nos idio- impactos de programas governamentais;
mas inglês, português, espanhol e fran- 8 estudos (6%) apresentam como foco
cês; disponibilidade dos resumos. O ma- a maternidade e/ou paternidade – suas
terial levantado foi tratado a partir da se- práticas, suas relações e seus cuidados;
guinte categorização: 1ª) temática e por 8 estudos (6%) apresentam como temá-
áreas do conhecimento; 2ª) demográfica tica a natalidade; e, por último, 3 estudos
e por locais de realização da pesquisa e (2%) focalizam políticas públicas para as
de publicação; 3ª) teórico-metodológica. áreas rurais. Encontrou-se 41 estudos na
Na base de dados BVS-PSI, o cruzamento área de Psicologia, sendo: 16 artigos so-
entre as palavras bebê ou bebês, família bre maternidade e/ou paternidade: práti-
e rural obteve apenas 1 resultado, sendo cas, relações e cuidados (39%); 8 artigos
que o artigo tem como foco o envolvi- na temática saúde materna e neonatal
mento do pai no cuidado de bebês. Com (19,5%); 8 artigos sobre processos de de-
a palavra criança (s), foram encontrados senvolvimento (19,5%); 6 artigos sobre in-
14 artigos que trabalhavam temáticas teração cuidador-criança (14,6%); e 3 ar-
relativas à saúde e ao estado nutricional tigos sobre organização social e ambiente
do bebê do campo assim como a proje- físico (7,4%). Os 39 estudos restantes se
tos de assistência social e à saúde desti- dividiram nas seguintes áreas do conhe-
nados às famílias cm crianças pequenas. cimento e temáticas: Serviço Social (5 ar-
Nas bases internacionais, o cruzamento tigos sobre natalidade); Antropologia (5
entre as palavras baby or babies, family artigos sobre natalidade e saúde materna
e rural obteve 25 artigos (PSYCINFO) e 2 e neonatal); História (3 artigos sobre pro-
artigos (FRANCIS). O cruzamento entre cessos de desenvolvimento); Agronomia
as palavras newborn or newborns, family (3 artigos sobre políticas públicas para
e rural obteve 9 artigos (PSYCINFO) e 4 áreas rurais); Economia (11 artigos sobre
artigos (FRANCIS). O cruzamento entre as políticas públicas e impactos de progra-
palavras infant or infants, family e rural mas governamentais); e Educação (12
obteve 88 artigos (PSYCINFO) e 45 artigos artigos sobre maternidade, paternidade
(FRANCIS). E, por último, o cruzamento e processos de desenvolvimento). Do to-
toddler or toddlers, family e rural obteve tal de 210 estudos, 182 apresentam da-
12 artigos (PSYCINFO) e 4 artigos (FRAN- dos empíricos que utilizam os seguintes
CIS). Dos 210 estudos encontrados, 130 recursos metodológicos: dados demográ-
estudos (62%) são provenientes da área ficos, entrevista, vídeo gravação, escalas,
da Saúde: 68 estudos (52%) abordam a inventários, questionários, observação
saúde materna, com o foco especialmen- participante, transversal, longitudinal,
te na depressão pós-parto e na violência estudo de caso, prospectivo, testes bio-
doméstica por parceiro íntimo, e saúde lógicos, grupo focal e manchetes. Os 24
neonatal; 19 estudos (14%) se referem à restantes se dividem da seguinte manei-
mortalidade infantil, perinatal, materna ra: 11 teóricos, 5 relatos de experiência,
e fatores de risco de natimortalidade; 13 5 históricos e 3 narrativas. Os locais de

846
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pesquisa foram: Brasil; Estados Unidos; CO 37 - LT05


Índia; Quênia; Canadá; Israel; Egito; Iê-
men; China; Itália; Uganda; Irlanda; Gré-
Adolescência e família
cia; Peru; Bolívia; Indonésia e Líbano. A
partir dos 210 estudos encontrados, fo-
LT05-943 - O ADOLESCENTE E SUA
ram selecionados 109 artigos que faziam
RELAÇÃO FAMILIAR: CONCEPÇÕES DE
referência direta ou indiretamente as
ADOLESCENTES DE ENSINO MÉDIO
práticas entre as crianças e suas famílias
a fim de compreender como a literatura Rafaela Marcolino El Corab Moreira - UnB,
vem abordando as relações entre famí- rafaela.mecm@gmail.com
lia e criança de até 3 anos de idade do Taíse Galdioli Paes - UnB,
campo. A análise mostra algumas lacunas taisegaldioli@gmail.com
entre esses estudos, como a ausência de Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB
investigações longitudinais, realizadas rpedroza@unb.br
no contexto familiar e no dia a dia da
criança do campo. Quando se trata da A adolescência é tida como uma fase na
educação e cuidado da criança de 0 a 3 qual as emoções são vivenciadas de for-
anos do campo, os estudos focalizam as ma intensa, havendo uma busca do ado-
metas e práticas de saúde idealizadas por lescente pela consolidação da sua perso-
profissionais e significam o campo como nalidade (Wallon, 1973). A família tem
um lugar de escassez e privação de aten- um papel fundamental na constituição do
dimento. Outra lacuna é a ausência da indivíduo, na determinação e na organi-
explicitação do povo do campo investi- zação de sua personalidade. Além disso,
gado; quando especificada a população, é utilizada como base para a construção
a cultura da mesma é valorizada dicoto- do comportamento individual através de
micamente, se boa ou não para o seus ações e medidas educativas próprias do
membros. Sendo assim, o levantamento ambiente familiar (Drummond & Drum-
bibliográfico contribui para a discussão mond Filho, 1998). É na família que a
da temática e coloca como desafio a re- pessoa vive a situação inicial de aprendi-
alização de estudos prospectivos sobre a zagem e introjeção de padrões e valores,
criança de 0 a 3 anos, suas famílias e as sendo introduzida gradualmente na vida
comunidades rurais enquanto contextos em sociedade (Biasoli-Alves, 1995, citado
específicos de desenvolvimento. por Biasoli-Alves & Dessen, 2001). Dessa
forma, as experiências do jovem cons-
Palavras-chave: criança, família, territórios truídas no âmbito familiar contribuirão
rurais diretamente na sua formação enquanto
Contato: Marcella Oliveira Araújo, USP, adulto, em sua capacidade de tomar de-
moa.psic@yahoo.com.br cisões, relacionar-se, trabalhar e escolher
um cônjuge (Osório, 1991; Aberastury &
Knobel, 1992). Assim, o objetivo deste
trabalho foi de identificar diferentes opi-
niões de adolescentes acerca do relacio-
namento familiar dos jovens na socieda-

847
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de atual. Para isso foi necessária a deli- filho”, “Família a gente não escolhe. Tem
mitação dessa etapa, diferenciando-a da gente boa e tem gente ruim” e “Às ve-
adulta. O conceito de diferenciação ado- zes tem gente que está muito próxima e
tado foi o proposto por Françoise Dolto acaba virando uma família” reforçam a
(2004), segundo o qual um jovem se tor- idéia da flexibilidade desse conceito. No
na adulto quando consegue se libertar entanto, houve consenso na visão da fa-
da influência e da angústia dos pais, ou mília como um modelo a ser seguido pelo
seja, quando consegue “caminhar com as jovem, fornecendo uma base de valores e
próprias pernas”, ser independente, não orientando suas atitudes. A comunicação
apenas financeiramente, mas emocional- familiar foi vista como algo importante
mente. Por conseqüência não é a idade por todos, mas que ocorre com limitação
que faz da pessoa um adulto, mas sim de assuntos e é colocada como variando
seu grau de autonomia. Para este estudo de acordo com os pais, como podemos
utilizou-se um grupo focal composto por observar nas falas: “É difícil um adoles-
sete estudantes de ensino médio com cente se aproximar da mãe e contar de-
idades entre 15 e 20 anos, sendo quatro terminadas coisas, porque tem vergonha,
do sexo masculino e três do sexo femini- aí conta pros amigos”, “A gente conversa
no. O grupo foi realizado dentro de uma sobre assuntos que passam na televisão
instituição de Ensino Médio da Secreta- (...) mas nunca eu comecei o assunto. Se
ria de Educação do Distrito Federal em eles puxarem o assunto, eu converso” e
Brasília – DF, Plano Piloto, com consen- “Se os pais dão abertura, o adolescente
timento da mesma, sendo a participação vai perguntar qualquer coisa”. De acor-
dos alunos voluntária. Estes debateram do com a literatura há uma maior busca
a respeito de questões previamente ela- de diálogo com a mãe (Carmona, 2000),
boradas pelas pesquisadoras, como o sendo esta considerada uma pessoa mui-
conceito de família, a comunicação e as to coerente e com grande capacidade de
regras familiares e a rebeldia na adoles- entendimento, responsável pelo cuidado
cência. Para o devido registro e análise e pela mediação das relações familiares.
posterior dos dados utilizou-se um gra- Já os participantes chegaram à conclusão
vador com a permissão de todos os su- de que a busca por um membro especí-
jeitos. Após esta etapa foi entregue aos fico da família varia conforme o assunto
participantes uma folha para que escre- e o grau de afinidade. Quando questio-
vessem o que “amam” e o que “odeiam” nados sobre a necessidade de regras, en-
em suas famílias, além de outros assun- tendida por alguns como dar satisfação,
tos que desejassem abordar. A análise foi surgiram respostas como: “Regras vão te
feita de forma qualitativa de acordo com ajudar na sociedade” e “Dar satisfação
as interpretações das pesquisadoras com não é bom, mas é uma coisa necessária
base no referencial teórico. Os resultados que você tem que aprender desde cedo
revelaram que o conceito de família para porque vão te cobrar isso lá fora”. Essas
esses jovens não se restringia ao modelo idéias apóiam a teoria da família como
padrão de família como necessariamente fornecedora de uma base ao indivíduo
boa e composta por pai, mãe e filhos. As no que diz respeito às regras e normas
falas “Pode ser pai com filho, mãe com essenciais para o convívio em sociedade

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(Biasoli-Alves, 2001). Quanto à questão LT05-949 - RELAÇÕES FAMILIARES: O


da rebeldia na adolescência, não houve CLIMA FAMILIAR NA PERCEPÇÃO DE
um consenso de opiniões, enquanto um ADOLESCENTES
afirmou que a família estaria diretamente Marianna Santos Rodrigues - UFRB
relacionada a este fato, outros discorda- marianna-sr@hotmail.com
ram dizendo que dependeria do “gênio” Patrícia Martins de Freitas - UFRB
da pessoa, “a pessoa faz o que quer, ela pmfrei@gmail.com
sabe o que está fazendo”. Outro partici-
pante levantou a idéia de que o jovem A família constitui-se como uma institui-
que não se ocupa com atividades acaba ção fundamental da sociedade, na qual
tornando-se rebelde, no entanto foi co- os seus membros dividem o dia-a-dia
locada também a visão na qual a rebeldia e possuem um relacionamento íntimo
se deve à necessidade de chamar a aten- que promove o seu desenvolvimento.
ção dos pais ou de pertencer a um gru- Na perspectiva sistêmica a família é vis-
po. Dessa forma, podemos ver a rebeldia ta como um sistema complexo compos-
como uma característica não apenas da to por vários subsistemas, por exemplo,
adolescência, mas do ser humano em ge- mãe-filho, pai-filho, mãe-pai, mãe-pai-
ral como parte de um processo de auto- -filho, os quais estabelecem relações úni-
nomia, de construção da personalidade, cas, sendo que cada um destes influencia
assim, como colocado por Paulo Freire e é influenciado pelos outros subsistemas
(2001) não é possível “ser” sem rebeldia. existentes. Para estudar a família na con-
Ao contrário do que apresentaram em temporaneidade é preciso atentar para a
suas relações familiares, todos os parti- estrutura familiar, a qual está intimamen-
cipantes relataram que gostariam de ter te vinculada com o momento histórico
um contato mais próximo com seus filhos que atravessa a sociedade da qual ela faz
e demonstraram a incorporação de valo- parte, visto que, um conjunto de variáveis
res passados por seus pais, como a ne- sociais, econômicas, histórico e cultural,
cessidade de regras e a visão hierárquica vem a moldar e a influenciar na conjectu-
entre pais e filhos. Assim, a despeito das ra da construção familiar atual. As novas
dificuldades enfrentadas, a família conti- configurações reafirmam que o sistema
nua atuando nessa etapa da vida como familiar é dinâmico, sendo marcado tanto
um referencial importante para o adoles- por eventos normativos previsíveis quan-
cente, o que se reflete nas avaliações que to por eventos idiossincráticos os quais
os jovens fizeram sobre o que gostam e causam grande impacto no contexto fa-
o que não gostam em suas famílias, bem miliar. Neste sentido, entende-se que em
como nos planos e escolhas que os mes- todas as fases do ciclo de vida ocorrem
mos apresentaram para o futuro. mudanças os quais vem a marcar as tran-
sições para novas fases da vida de um in-
Palavras-chave: adolescentes, família, dividuo, e por sua vez, em toda a família.
relacionamento Neste estudo foca-se a fase da adolescên-
Contato: Rafaela Marcolino El Corab Moreira, cia. A entrada da adolescência de um dos
UnB, rafaela.mecm@gmail.com membros modifica o relacionamento e o
funcionamento da família como um todo.

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Estudos apontam a adolescência, como através do programa estatístico Statistical


uma fase com tendências para a presen- Package for the Social Sciences (SPSS). Os
ça de uma série de problemas e confli- instrumentos utilizados foram: o Fami-
tos dentro do contexto familiar, além de liograma, e Inventário do Clima Familiar
enfatizar que há um aumento das brigas – ICF. O Familiograma é um instrumento
e disputas entre pais e filhos durante os desenvolvido para avaliar a percepção da
anos da adolescência. O objetivo desse afetividade e o conflito familiar nas día-
estudo foi investigar o perfil das relações des familiares, a partir de 22 adjetivos,
familiares, considerando conflito e afeti- configurado com a escala Lickert. Inven-
vidade, sobre o clima familiar e as dinâ- tário de Clima Familiar é um instrumento
micas existentes nos relacionamentos que avalia a percepção do clima familiar
das díades familiares, a partir da percep- e as dinâmicas existentes nos relaciona-
ção de adolescentes, de escola pública da mentos intra e extra familiar. Essa avalia-
cidade de Santo Antônio de Jesus / BA. ção é realizada através de quatro fatores
Essa pesquisa teve como base o Projeto diferentes: apoio, coesão, conflito e hie-
de Planejamento Familiar na Perspectiva rarquia contendo um total de 32 itens. Os
do Desenvolvimento, desenvolvido pelo resultados sócio-demográficos apresen-
Grupo de Pesquisa Saúde, Educação e tam 203 adolescentes entre 12 e 19 anos
Desenvolvimento - SAED, da Universida- sendo a (M=16,03 e DP = 2,03). A maioria
de Federal do Recôncavo da Bahia. A me- dos participantes era do sexo feminino
todologia do estudo é de caráter quase (73,4%) e (26,6% masculino). A distribui-
experimental. A coleta de dados foi rea- ção da escolaridade mostra maior con-
lizada com 203 adolescentes, entre 12 e centração para o ensino fundamental in-
19 anos, como critério de escolha os par- completo (43,4%) e ensino médio incom-
ticipantes são estudantes de escolas pú- pleto (46,5%). Os dados sobre estado civil
blicas. Os adolescentes foram convidados demonstram que a maioria dos adoles-
através do contato com as instituições de centes, são solteiros, sendo 81,6%; 10,7%
ensino. A realização da pesquisa ocorreu são casados; 5,6% vivem juntos e 1,0%
mediante a assinatura pelos responsáveis são divorciados. O ICF apresentou o fa-
dos participantes, ao termo de consenti- tor coesão familiar (M= 17,25 e DP=5,27)
mento livre e esclarecido (TCLE). O pro- maior que o fator de conflitos (M=10,82 e
cedimento do projeto foi constituído da DP=5,48); os fatores hierarquia (M=11,67
aplicação dos instrumentos de avaliação, e DP=4,68) e apoio (M=16.27 e DP=4,81)
a qual foi realizada nas Escolas, em dois estão estatisticamente semelhantes. O
encontros de 60 minutos. Inicialmen- fator coesão e hierarquia são dois fato-
te, houve a sensibilização à proposta do res fortes para compreensão do clima
projeto aos estudantes a participarem familiar que se contrapõe, mas que não
da pesquisa. Depois foi entregue ao par- estão dissociados: a coesão representa o
ticipante uma ficha cadastro, com dados vinculo emocional entre os membros da
sócio-demográficos e caracterização do família, o que se evidencia um fator posi-
seu núcleo familiar. Em seguida, foram tivo nas relações familiares. Por sua vez,
aplicados os instrumentos de avaliação a hierarquia está associada a autoridade.
familiar. A análise dos dados foi realizada Desta forma, entende-se o desenvolvi-

850
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mento saudável associado ao alto nível LT05-1453 - RELATO DE PESQUISA:


de coesão, mas não se associa de mesma ADOLESCENTES COM TRAÇOS DE
forma ao alto nível de hierarquia. Com DEPRESSÃO E O RELACIONAMENTO
base no Familiograma, as famílias foram FAMILIAR COMO FATOR DE INFLUENCIA
classificada com alta afetividade e baixo Bruna Rafaela Soares de Assis - UFRB/CCS
conflito. Apresenta-se maior afetividade brunassis18@hotmail.com
na relação díade mãe/filho (M=41,05 e Marianna Santos Rodrigues - UFRB/CCS
DP=10,55) e maior conflito na relação fi- marianna-sr@hotmail.com
lho com outro individuo, em geral irmão Patrícia Martins de Freitas - UFRB/CCS
(M=21,38 e DP=9,44) e na relação filho/ pmfrei@hotmail.com
pai (M=20,30 e DP=9,09). Quanto a com- Financiamento: FAPESB
paração de gênero, o perfil de percepção
das relações familiares em ambos ins- Diversos estudos abordam sobre a im-
trumentos não difere significativamen- portância das relações familiares para o
te entre o sexo feminino e masculino. O desenvolvimento de crianças e adolescen-
gênero pode ser compreendido como tes. A qualidade desta relação é benéfica
uma construção social e histórica femi- para tal desenvolvimento; em contraparti-
ninos versus masculinos que se processa da, a instabilidade familiar aumenta os ris-
de maneira diferenciada, dentro de uma cos relacionados a problemas emocionais
mesma sociedade. Tal configuração vem e comportamentais, em crianças e adoles-
a ser reflexo do desenvolvimento e inter- centes, podendo também afetar sua saúde
nalização de papeis e comportamentos física. Assim as falhas no suporte afetivo
sociais desejáveis, e culturalmente re- e na coesão familiar estão habitualmen-
passados em linhas transgeracionais. Em te presentes, podendo estes assumir um
suma, avaliar a percepção de adolescen- caráter influenciador no desenvolvimento
tes e suas famílias a partir do clima fami- de características depressivas em adoles-
liar, afetividade e conflitos traz a possibi- centes. Entretanto, é importante ressaltar
lidade de compreender a qualidade da que o fator relacionamento familiar não
relação com a família e os impactos desta é preponderante no desencadear de tais
em vários aspectos da vida do adolescen- reações, mas existem características ge-
te como, como a formação do autocon- néticas, envolvimento com pares e fatores
ceito. Além de instigar discussões sobre socioeconômicos que também desempe-
temáticas tangentes com o contexto so- nham o mesmo papel no desenvolvimen-
cioeconômico-cultural ao qual a família to humano. O objetivo desta pesquisa foi
pertence, os tipos de vinculação e papéis investigar se adolescentes de quatro esco-
existentes entre os membros da família, las públicas da cidade de Santo Antônio de
a fim de conhecer o desenvolvimento do Jesus/BA apresentam traços de depressão
ciclo familiar. e fazer uma correlação com o relaciona-
mento familiar destes adolescentes. A
Palavras-chave: família, adolescentes, conflito amostra foi composta por 150 adolescen-
e afetividade tes estudantes de quatro escolas públicas,
Contato: Marianna Santos Rodrigues, UFRB, da cidade de Santo Antônio de Jesus/Ba,
marianna-sr@hotmail.com convidados a partir do banco de dados do

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

projeto de Intervenção em Planejamento 11,5% da amostra apresentou resultados


Familiar na Perspectiva do Desenvolvi- acima do ponto de corte. Além disso, foi
mento, sendo 73,4% da amostra do sexo feita uma comparação de gênero para ver
feminino e 26,6% do sexo masculino. Os qual deles se sobressaía com distúrbios
participantes assinaram o Termo de Con- psiquiátricos menores e foi encontrado
sentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A que os meninos se destacavam nesta ca-
média de idade foi de 16,03 anos. Os par- tegoria, assim foi possível identificar que
ticipantes assinaram o Termo de Consen- o sexo masculino se destacou na maioria
timento Livre e Esclarecido (TCLE). Foram dos fatores, sendo que as meninas teve o
utilizados para a avaliação dois instrumen- resultado percentual acima do ponto de
tos validados no Brasil: o Familiograma, corte apenas no fator desejo de morte. A
desenvolvido para avaliar a percepção da literatura vem apontando que a instabili-
afetividade e o conflito familiar nas díades dade familiar aumenta os riscos relacio-
familiares. Torna-se útil na identificação nados a problemas emocionais e compor-
do funcionamento sistêmico da família, tamentais, em crianças e adolescentes,
sendo importante na avaliação de famílias podendo também afetar sua saúde física.
que estão em condições de risco, seja de Contudo, neste estudo foi verificado que
caráter biológico, psicológico ou social; e a maioria dos adolescentes não apresen-
o Questionário de Saúde Geral de Gold- tou indícios de problemas emocionais.
berg- o QSG, que objetiva fornecer uma Bem como os resultados que falam das
perspectiva sobre o estado de saúde men- relações familiares não apresentaram va-
tal dos indivíduos. Além do escore geral, lores acima do ponto de corte, assim não
os resultados do QSG originam 5 escores apresentam valores que confirme o que a
parciais: Fator I - Estresse; Fator II - Desejo literatura estudada traz sobre influencias
de Morte; Fator III - Desconfiança no Pró- de conflitos familiares no desenvolvimen-
prio Desempenho; Fator IV - Distúrbios do to de distúrbios psiquiátricos menores nos
Sono; e Fator V - Distúrbios Psicossomá- adolescentes estudados, uma vez que as
ticos. Para análise dos dados foi utilizado relações conflituosas foram identificadas
o programa Statistical Package for Social com menor média do que as relações de
Sciences, SPSS versão 18. Os resultados afetividade. Desta forma, a média de ado-
foram analisados inicialmente através da lescentes que apresentaram traços carac-
verificação do perfil emocional dos ado- terísticos de depressão acima do ponto de
lescentes e do perfil das relações familia- corte pode ter sofrido influências outras.
res, através dos quais não foram encon- Existem estudos que falam que adolescen-
trados comprometimentos emocionais e tes que apresentam indícios de depressão
nem das relações familiares. Foi feita uma na adolescência estão sujeitos a desen-
análise mais detalhada destes resultados volvê-la de maneira mais severa em situ-
através da interpretação dos fatores sinto- ações da vida adulta. Desta forma, ainda
máticos do QGS: no fator I 5,8% apresen- que os comportamentos dos adolescentes
taram dos adolescentes apresentaram re- possam se confundir com alguns sintomas
sultados acima do ponto de corte; no fator da depressão, é necessário se atentar para
II 11,7% apresentaram tais resultados; no a duração que estes são expressos por tais
fator III 4,8%; no fator IV 8,7%; no fator V indivíduos para que não desenvolvam

852
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

complicações futuras na vida destes. E se can, respaldam a observação de que um


estes sintomas se apresentarem com uma trabalho sistemático com os pais produz
duração de duas semanas e, no mínimo efeitos importantes sobre a criança em
cinco deles persistirem já é sinônimo de análise, constituindo-se como uma estra-
preocupação com tal indivíduo. Assim, tégia fundamental na clínica da infância.
uma vez que o ambiente familiar é defini- Mas e quanto à clínica da adolescência?
do como um dos fatores primordiais que O atendimento aos pais pode ou deve ser
assegura o apoio psicológico e social dos incluído como uma estratégia nesta clíni-
seres humanos, ajudando no enfrenta- ca? Ainda trazidos para o atendimento –
mento do estresse provocado por dificul- tal como as crianças – pelas mãos de um
dades do cotidiano, quando se encontram adulto, não são raros os jovens que de-
em alto nível de conflitos e estresse pode monstram dificuldade em formular uma
dificultar o desenvolvimento emocional demanda própria de análise, que possa se
do adolescente. Desta forma, conclui-se sobrepor à queixa inicial apresentada pelo
que é necessário se atentar para as famí- Outro. Entretanto, no caso dos adolescen-
lias de maneira que seja possível desenvol- tes – diferente das crianças –, o trabalho
ver projetos que desenvolva os aspectos de formular uma demanda própria de
positivos desta e, a partir disso, trabalhar análise é o ponto de partida para que ela
com as crianças e adolescentes que fazem possa transcorrer. Diante da tarefa aban-
parte desse ambiente e necessitam de um donar o lugar de sintoma familiar, para
espaço saudável para desenvolver-se. passar a responder em nome próprio, o
adolescente é convocado a ressignificar
Palavras-chave: desenvolvimento humano, as relações que estabelece com os pais.
relacionamento familiar, traços de depressão Frequentemente, esta tarefa é atravessa-
Contato: Bruna Rafaela Soares de Assis, UFRB/ da por um caráter de forte agressividade,
CCS, brunassis18@hotmail.com como uma espécie de combustível para
uma possível separação. Diferente da pu-
berdade, a adolescência é uma categoria
LT01-1264 - O ATENDIMENTO AOS PAIS exclusiva da cultura moderna, definida
NA CLÍNICA COM ADOLESCENTES como um tempo de travessia da infância
Fernanda Hamann de Oliveira - UFRJ para a idade adulta (Ariès, 1981). Nas so-
ciedades ditas tradicionais, esta traves-
Como nos conta a história da psicanálise, sia é ritualizada pelos chamados ritos de
o caso do pequeno Hans é o único rela- passagem, cuja eficácia simbólica garante
to de um atendimento de Freud a uma a operação de morte da criança para que
criança. A rigor, porém, foi através da in- haja o subsequente nascimento do adul-
terlocução com o pai de Hans que Freud to. Não por acaso, tais ritos envolvem si-
conduziu a análise do menino. Lacan, por tuações extremas como cortes na pele,
sua vez, abordou a patologia da criança a marcas, sangramentos, provações ou lon-
partir da situação da mesma em dois lu- gos períodos de reclusão absoluta. Neste
gares possíveis: no lugar de sintoma do contexto, o lugar social que será desem-
casal parental ou de objeto na fantasia da penhado pela criança ao se converter em
mãe. Ambas as posições, de Freud e de La- adulto – pescador, caçador, etc. – já se

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

encontra pré-definido. Em contrapartida, presentante dos obstáculos deste proces-


nas nossas sociedades modernas, onde o so árduo que ele é obrigado a atravessar. É
individualismo produz um afrouxamento a necessidade de separação dos pais que
dos laços e ritos sociais, a adolescência se leva muitos adolescentes a não suportar a
instala como um vácuo, um limbo, no qual ideia de que eles sejam atendidos por seu
o sujeito não é criança nem adulto, não analista. Nesses casos, a escolha de aten-
está dentro nem fora da família, e o lugar der os pais pode, amiúde, ser sentida pelo
que ele deverá ocupar como adulto está adolescente como uma traição, impondo
em aberto, demandando dele uma série dificuldades significativas ao manejo da
de redefinições sociais, sexuais, familiares transferência. Entretanto, tampouco são
e profissionais (Saggese, 2001). Neste mo- raros aqueles que chegam a endereçar
mento, a família do adolescente “ocupa ao analista um pedido de que receba em
um lugar ambíguo, ora representando ela atendimento um de seus pais, ou ambos.
mesma o indivíduo para o conjunto social, Ademais, casos considerados especial-
ora apresentando-se como o círculo me- mente graves – como a eclosão de trans-
nor do qual o indivíduo deve separar-se” tornos alimentares ou a manifestação de
(Ibid., p. 63). Tal ambiguidade se faz notar um quadro psicótico, o que tantas vezes
nos conflitos do adolescente, que em geral ocorre justamente na adolescência, como
se divide entre o amor e o ódio pelos pais resposta do sujeito para as injunções im-
– ou seja, entre a necessidade de se tor- postas pela tarefa de adolescer – parecem
nar independente deles e o desejo de ser exigir um trabalho junto à família. A cha-
novamente acolhido e cuidado por eles. mada crise da adolescência é passível de
Estes conflitos ganham uma intensidade suscitar situações clínicas que revestem
particularmente exagerada uma vez que, de dificuldades o campo da psicanálise
nesse período que se segue à latência, com adolescentes. O atendimento aos
costuma haver uma revivescência de afe- pais – recorrer ou não a ele, de que modo,
tos envolvidos no complexo de Édipo. Tais em que circunstância, com que frequên-
afetos, outrora vivenciados pelo sujeito cia, etc. –, portanto, se inclui entre essas
criança, revestem-se de novos contornos dificuldades. Estas questões se encontram
quando retornam ao sujeito adolescente, na pauta do Proadolescer – Programa Am-
visto que seu corpo púbere já estaria, ao bulatorial para Adolescentes de Risco –,
menos fisicamente, preparado para rea- que há cerca de vinte anos realiza atendi-
lizar os desejos proibidos de matar o pai mentos ambulatoriais a adolescentes em
e copular com a mãe. Diante deste pano- grave sofrimento psíquico, no Serviço In-
rama, impõe-se ao sujeito a necessidade fanto-Juvenil do Instituto de Psiquiatria da
de remanejar suas identificações infantis, UFRJ. Embora se oriente por pressupostos
o que se torna claro nas escolhas de ado- psicanalíticos, o programa desenvolve um
lescentes pela identificação aos pares – trabalho interdisciplinar, por acreditar
grupos de outros que, como ele, buscam que a complexidade das questões graves
novas formas de ser e estar no mundo –, na adolescência demanda a mobilização
assim como na violência como tantos jo- de uma equipe multiprofissional. Assim,
vens se voltam, nesta fase, contra os pais, psicanalistas, psiquiatras e terapeutas de
a sociedade, o “sistema”, ou qualquer re- família compõem uma mesma equipe,

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

planejando e revendo projetos terapêuti- da própria fase adulta. Além disso, o caso
cos para cada caso atendido, que pode en- ajuda a repensar também a prática clínica,
volver as três vertentes de trabalho – psi- no sentido de estar atrelada a uma busca
canálise, psiquiatria e terapia de família –, por uma cura, possuindo, então, um fim.
ou duas, ou apenas uma delas. No contex- Françoise Dolto (1988) sugere a adoles-
to do Proadolescer, em que grande parte cência como uma fase de mutação, que,
dos casos, por sua gravidade, demanda no entanto, é mais comumente definida
um atendimento aos pais, é possível que por características biológicas ou fisiológi-
este atendimento seja levado a cabo por cas do que pelos aspectos subjetivos. O
uma terapeuta de família, preservando corpo é um sinalizador, contudo, não é
assim a relação entre adolescente e psica- um determinante para que a adolescência
nalista. Há outros casos, também, em que e suas vicissitudes se instalem. Mais ain-
os pais comparecem apenas às consultas da, ela traz a idéia do adolescente como
psiquiátricas, resguardando-se o espaço um ser que não é: não é criança e não é
de análise do adolescente. Por promover adulto. Para resolver esse conflito, o ado-
estratégias integradas de tratamento, o lescente precisa passar por um segundo
programa apresenta uma solução viável Complexo de Édipo (Freud, 1905), no sen-
– e que tem se mostrado eficaz – para as tido de abandonar o amor incestuoso dos
dificuldades impostas ao analista de ado- pais, agora já fisicamente possível, para
lescentes com relação à inclusão de seus procurar um outro objeto de afeto fora
pais no tratamento. da família nuclear. Dolto (1988) pontua
que nos tempos atuais, os jovens passam
Palavras-chave: atendimento aos pais; clínica maior dificuldade para vencer essa etapa,
com adolescentes; proadolescer. devido à falta de ritos de passagem. Estes
funcionam como marcadores temporais e
sociais importantes para o entendimento
LT01-1431 - O DESENVOLVIMENTO NA dos outros em relação a este amadure-
ADOLESCÊNCIA: UM ESTUDO DE CASO cimento. Por conseqüência da visão dos
Laís de Azevedo - UnB outros, o próprio indivíduo, estando ele
laismfc@gmail.com maduro de fato ou não, pode perceber-
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB -se como adulto. Agora é o próprio jovem
rpedroza@unb.br que deve criar sua passagem, o que pode
causar grande sofrimento psíquico. Tanto
Este artigo, utilizando-se de uma situação por não estar correspondendo a um ide-
clínica, pretende discutir o desenvolvi- al da sociedade, quanto por ter que criar
mento da adolescência. Esta fase da vida por si maneiras de se separar dos pais. Ela
sempre foi vista mais como uma prepa- afirma que atualmente a independência
ração para a próxima: a idade adulta. Seu acontece de forma mais concreta pela via
objetivo parece ser formar uma ex-criança econômica, entretanto, a sociedade impe-
em um adulto completo. No entanto, o de que o jovem trabalhe. Seguindo essa
caso clínico a ser descrito traz uma série visão de ruptura, Rivelis de Paz (1978)
de questionamentos relativos a essa vi- comenta que existe um relacionamento
são geral sobre a adolescência e mesmo simbiótico entre adolescente e seus pais,

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sendo então necessária uma dessimbio- de em “mostrar quem ele realmente era”
tização, a fim de fortalecer o ego. Esta para as pessoas e queria ampliar a rede
acontece por meio de uma crise, enten- de amizades. Relatava que quando viajava
dida como a resolução de um conflito. O sozinho se sentia livre e queria se sentir
termo crise sugere instabilidade com ca- assim mais vezes. Além disso, pretendia
ráter negativo, porém nesse caso é vista “diminuir o peso da faculdade em sua
como o início de uma nova etapa. Para ela, vida”, pois seu desempenho acadêmico
é uma crise de elaboração da ruptura do o afetava em outras relações. Sua postu-
vínculo simbiótico e da nova organização ra era sempre reflexiva, porém com uma
do ego perante os pais. Durante essa crise visão majoritariamente racionalizada dos
elaborativa, podem surgir momentos de fatos. J. acredita que as pessoas o julgam
angústia, alterações do esquema corporal, e o odeiam antes mesmo de conhecê-lo,
despersonalização, sintomas fóbicos etc. culminando em uma vontade de agradar a
O termo simbiose alude a uma relação em todos. Revelou que sua mãe foi muito co-
que ambos os participantes se beneficiam brada por sua avó na juventude e para ele,
encaixando-se perfeitamente no perío- ela ainda se sente presa a essa situação.
do da infância. A criança se desenvolve Essa postura não o agrada e faz com que
de um estado de completa dependência ele se compare com ela. J. apresenta ar-
para outro de maior individuação. Este rependimentos sobre situações nas quais
caminhar, contudo não é linear. De acor- provocou sentimentos negativos em ou-
do com Wallon (1981), a adolescência re- tras pessoas. Essas lembranças são sem-
presenta o segundo momento de conflito pre as mesmas, aparecem repentinamen-
eu-outro que culminará na diferenciação te e se repetem com frequência. J. aparen-
do eu. Para todos esses teóricos, a fase da ta estar sempre na defensiva, como se os
adolescência acontece durante o período outros tivessem cobranças e julgamentos
entre doze e dezoito anos. No entanto, sobre ele. Chega a questionar todas suas
podemos refletir sobre essa fase, de for- decisões, supondo que elas foram realiza-
ma a nos questionar a respeito tanto de das por desejo de outros (mãe, pai e irmão
sua consolidação temporal quanto de sua mais velho), visto que não se conhecia e
característica finita. Será apenas uma fase precisava da aprovação deles. Relata uma
de quebra que resultará em um sujeito série de acontecimentos em que sente sua
novo, plenamente diferenciado do outro mãe excessivamente protetora. Isto é algo
ou apenas uma passagem importante na que o incomoda, chegando a afirmar que
vida? Isto é, teria a adolescência, e por sua a odeia por isso. Ao mesmo tempo em
vez, o próprio desenvolvimento, um fim, que sente o ímpeto de se separar da mãe,
um ápice? Foram estas as questões susci- deseja uma volta à sua infância perdida
tadas pelo caso clínico a seguir. J. é um jo- em meio às cobranças dela. Afirma que
vem de 20 anos, estudante de engenharia. “isto não é coisa de mãe”. O fato de ter
Filho de pais separados, mora com a mãe 20 anos faz com que J. se sinta angustia-
e o irmão mais velho, também estudante do por ainda não ter constituído seu ego.
de engenharia. Ele procurou por vontade Ele relata sentir-se velho e diz ter perdido
própria a clínica-escola da Universidade tempo na vida com algo que, para ele, de-
de Brasília com a demanda de dificulda- veria ter acontecido aos 15 anos, ou seja,

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ter se dessimbiotizado. A terapia permite dividualidades; pressupõe intersubjetivi-


a J. fazer uma reflexão sobre si, afirman- dade e historicidade. Piaget (1932/1977)
do que apesar de ter chegado com certos tem sido referência frequente para pes-
objetivos, agora já percebe ter novos. Ele quisadores que estudam a dimensão so-
consegue entender a psicoterapia como cial da operação com regras. Na caracte-
um trabalho que não busca um final, vis- rização de diferentes estágios do conhe-
to que, tal como o desenvolvimento, é um cimento de regras pela criança, ele des-
processo dinâmico, dialético e constante. tacou um momento que denominou de
cooperação nascente, quando as crianças
voltam-se para um controle e construção
CO 18 - LT02 de regras coletivas. Nesse estágio a regra
é considerada como uma lei imposta pelo
Educação sentimento mútuo. Piaget observou tam-
bém que a criança pode perceber que a
regra pode ser alterada de acordo com a
LT02-814 - REGRAS DO JOGO DE FAZ DE vontade dos participantes. Como próxi-
CONTA E DO FUNCUNCIONAMENTO mo estágio, ele caracterizou a codificação
DA ESCOLA: O QUE DIZEM CRIANÇAS das regras e, subjacente à codificação, ele
NA EDUCAÇÃO INFANTIL observou a emergência da consciência
Nadja Maria Vieira - UFAL autônoma relacionada com uma atitude
vieira.ufal@gmail.com de amplo convencimento quanto à ne-
cessidade das regras serem obedecidas.
A forma como os seres humanos lidam De acordo com Piaget (1932/1977) essa
com as regras tem sido alvo da atenção de consciência indiciava a atribuição de valo-
diferentes pesquisadores. Mas são aque- res pelas crianças ás convenções sociais.
les que se envolvem com questões educa- Essa observação levou-o a declarar que a
cionais quem mais tem investigado a rela- base do desenvolvimento da moralidade
ção entre o uso e a compreensão de regras na criança é funcionamento das regras.
e o desenvolvimento infantil. Não é difícil Vigotski (1934/2010) também discutiu
observar as razões porque a compreensão a relação entre a compreensão e uso de
e uso de regras sejam conteúdos neces- regras e o desenvolvimento infantil. Para
sários no contexto dos processos educa- ele toda forma de brincadeira infantil é
cionais. A compreensão e uso das regras regida por regras. Ao invés do enfoque na
envolvem processos cognitivos. Abordar moralidade, ele discutiu a relação entre a
o desenvolvimento cognitivo no contexto imaginação e as regras nas brincadeiras
da sala de aula implica no posicionamen- infantis comentando que não existe brin-
to teórico e metodológico frente à forma quedo sem regras e a situação imaginária
como os alunos constroem, concebem e de qualquer forma de brinquedo já con-
operam com as regras. Em diferentes es- tem regras de comportamento. Por exem-
tudos, pesquisadores têm destacado que plo, a criança imagina-se como a mãe e
subjacente à operação com regras está a sua boneca como uma filha. Dessa for-
natureza social da condição humana. As ma, a criança deve obedecer às regras do
regras pressupõe a comunicação entre in- comportamento maternal. Sempre que

857
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

há uma situação imaginária no brinque- conceituais que traduzam aspectos da di-


do há regras que têm origem na própria mensão intersubjetiva no conceber e lidar
situação imaginária. Vigotski (1934/2010) com regras. Além disso, investe-se com
observou ainda que o mais simples jogo esta análise, na construção de informa-
com regras transforma-se imediatamente ções úteis para revisão e renovação das
numa situação imaginária, pois na medida metodologias voltadas para a educação
em que o jogo regulamenta determinadas infantil. O estudo foi realizado numa ins-
regras, outras possibilidades de ação são tituição de educação infantil que tem sua
eliminadas. Então, nesse raciocínio, toda sede no campus da Universidade Federal
situação imaginária contém regras de uma de Alagoas - UFAL. O Núcleo de Desenvol-
forma oculta; e todo jogo com regras con- vimento Infantil - NDI atende prioritaria-
tém, de forma oculta, uma situação imagi- mente, filhos de funcionários e estudan-
nária. Refletindo-se esse cenário de inves- tes da UFAL. Antes do início do estudo,
tigação voltado para explicações de como pesquisadores visitaram a escola para
crianças concebem e lidam com regras e observar nas salas de aulas e no recreio,
como essa concepção e uso são refletidos quais as brincadeiras mais frequentes.
no funcionamento cognitivo e desenvolvi- Foram observadas que as brincadeiras de
mento de valores sociais, foi realizado um faz de conta foram as mais frequentes.
estudo, pretendendo-se atualizar algumas Depois foi realizado um pré-teste para se-
questões que, sugere-se, continuam ain- lecionar crianças que reconheciam as re-
da pouco exploradas nas pesquisas afins. gras daquelas das brincadeiras. Quarenta
O objetivo do estudo que se apresenta crianças do NDI, divididas em dois grupos
aqui foi analisar as atribuições de sentidos (vinte do maternal e vinte do segundo
para regras do jogo e do funcionamento período) foram selecionadas a partir do
da escola por crianças da educação infan- pré-teste. Em duplas, essas crianças inte-
til. A atualização que se esperou com este ragiram em três diferentes situações de
estudo foi poder desenvolver uma inter- um jogo de faz de conta com a pesquisa-
pretação da compreensão e uso de regras dora. Durante essas situações a pesquisa-
por crianças da educação infantil funda- dora quebrou regras do jogo faz de conta.
mentada em pressupostos da psicologia Nas reações das crianças estudaram-se as
sócio histórica. Considera-se esta pers- suas atribuições de sentidos para as re-
pectiva como atualização, pois, observa- gras do jogo. Para analisar as atribuições
-se que a literatura que discute esse tema de sentidos às regras do funcionamento
tem, com maior frequência, mencionado da escola, realizaram-se rodas de conver-
estágios no desenvolvimento da compre- sas, com as mesmas duplas e com parti-
ensão e uso das regras por crianças. De cipação da pesquisadora. Nessas rodas
forma divergente, nos pressupostos da de conversas a pesquisadora contou uma
psicologia sócio-histórica destacam-se um estória. O enredo dessa estória envolveu
enfoque na variabilidade; nos processos duas personagens ( masculino e feminino)
de mudança. Portanto, propõe-se como que representaram crianças da educação
atualização, uma análise da compreensão infantil quebrando regras de funciona-
e uso de regras numa perspectiva dinâmi- mento da escola. Na estória contou-se
ca, a partir da construção de parâmetros que um aluno se esqueceu de tirar os sa-

858
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

patos ao entrar na sala, quando ele sabia LT02-815 - ENTRE O CONTEXTO


que todos deveriam deixar os sapatos lá VERBAL E O CONTEXTO HISTÓRICO
fora. Foi também contado na estória, que CULTURAL: CONSIDERAÇÕES NA
uma aluna insistia em tomar uma carteira, ANÁLISE DA PRODUÇÃO DE SENTIDOS
onde estava sentada sua colega de turma, DE CRIANÇAS
quando ela sabia que, os lugares foram Nadja Maria Vieira - UFAL
pré-definidos pela professora. Depois de vieira.ufal@gmail.com
contar a estória, a pesquisadora incenti-
vou uma conversa acerca das situações Na contramão da análise da “língua mor-
de quebra de regras de funcionamento ta”, Bakhtin (1997; 1999) observou que
da escola, voltando-se sempre para a sala o entendimento das palavras de quem
de aula real, onde estudavam as crianças fala sempre será passível de muitas in-
que participavam da roda de conversa. O terpretações pelo interlocutor. Mesmo
estudo está em andamento, mas é possí- as interpretações aparentemente seme-
vel tecer algumas considerações acerca lhantes são elaboradas a partir de expe-
de resultados parciais. Na análise das atri- riências diferenciadas. Na caracterização
buições de sentidos das crianças para as da enunciação ele capturou laços de in-
situações de jogo de faz de conta foram terpendência entre diferentes dimensões
levantadas algumas categorias. A partir atuantes nos atos de fala. A produção de
dessas categorias foi interpretado que a sentidos emerge nessas condições; refle-
habilidade para lidar com conceitos é um tindo propriedades do funcionamento
aspecto do desenvolvimento cognitivo contextual (processual) dos atos de fala.
eminentemente envolvido no reconheci- O contexto verbal tem sido tradicional-
mento de regras. Nos dados observou-se mente estudado na linguística clássica
que a imaturidade no lidar com conceitos referenciando a relação entre as frases
relacionados às regras do jogo de faz de e os significados das palavras. Bakhtin
conta traduziu-se nas atitudes de aceita- (1997; 1999) contestou essa concepção
ção e incorporação das posições irregu- declarando que o signo cultural, quando
lares da pesquisadora. Por outro lado, os compreendido e dotado de um sentido
indícios da habilidade em lidar com con- torna-se parte da unidade da consciência
ceitos possibilitou que as crianças expli- verbalmente constituída. Nesse pensa-
cassem a regras em questão e corrigissem mento, a concretização da palavra só é
as posições incorretas da pesquisadora. possível com a inclusão dessa palavra no
Pontuou-se, portanto, o papel da lingua- contexto histórico real de sua realização.
gem no desenvolvimento cognitivo rela- O presente estudo discute possibilidades
cionado com o conhecimento de regras na definição e análise da relação entre
no jogo, explorando-se a função da ati- contexto histórico-cultural e a produção
vidade narrativa. Traduziu-se com dados de sentidos. Busca-se com essa iniciativa
desse estudo, o desenvolvimento infantil refletir acerca das dificuldades metodo-
como expressão da narratividade. lógicas potenciais quando a questão é
delinear a dimensão contextual (proces-
Palavras-chave: Regras; Desenvolvimento sual) na análise da produção de sentidos.
infantil; Narratividade. Apresenta-se, aqui, um estudo que teve

859
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como objetivo, explorar a concepção de ca do contexto histórico-cultural foram


contexto histórico-cultural na análise da (a) A dinâmica de vozes sociais ativadas
produção de sentidos de crianças. Trata- nos atos de fala (Bakhtin, 1999) e (b) A
-se de um estudo de casos. Três crianças relação entre tendências sociais estáveis
entre quatro e cinco anos, matriculadas (significado) e características da apreen-
na educação infantil, três crianças entre são ativa do discurso do outro, manifes-
nove e dez anos matriculadas no ensino tas no uso de linguagem (Brait, 2005).Os
fundamental participaram deste estudo. dados de uma criança da educação infan-
Na coleta de dados, as crianças assistiram til ilustram como se operou com esses
a um filme de curta duração (2min 42s). parâmetros na análise dos casos aqui es-
No filme figuravam imagens de crianças tudados. Nesses dados configuraram-se
reais e desenho animado, acompanha- rabiscos predominantemente circulares,
das por um fundo musical. No filme o coloridos, nomeados pela criança como
tema central foi a importância da água bola, chuveiro, balde, tubarão, abelha.
e a necessidade de preservá-la. Depois Esses elementos estavam presentes no
de assistirem ao filme, solicitaram-se filme de curta duração. A criança no-
às crianças que desenhassem sobre o meou ainda quatro dos rabiscos por ba-
que o filme tratava. Para as crianças do rata. A análise da produção de sentidos
ensino fundamental foi solicitada, além dessa criança a partir desses dados, se
do desenho, uma narrativa escrita, por apoiada na definição de contexto verbal,
compreender-se ser esta também uma pressupõe a justaposição de elementos
atividade potencial de produção de sen- (rabiscos). Nessa justaposição concebeu-
tidos. Posteriormente, solicitou-se às -se uma sintaxe empobrecida pela ausên-
crianças que falassem sobre os desenhos cia de funções coesivas que indicassem
e comentassem, no caso das crianças a formulação de proposições pela crian-
do ensino fundamental, sobre suas nar- ça. Quando analisada na perspectiva do
rativas escritas. Essas situações foram contexto histórico-cultural, destacou-se a
videografadas. Na análise conduziu-se apreensão ativa dos significados apresen-
uma abordagem qualitativa de dados, tados no filme pela criança, refletida no
considerando-se: (a) O diálogo entre teo- seu destaque para “a barata”. Uma ques-
ria e método, aproximando e adequando tão que se colocou foi: Por que “a barata”
a pergunta da investigação aos procedi- foi um elemento tão frequente no de-
mentos para análise (Flick, 2004); (b) O senho (rabiscos) e na fala dessa criança
potencial da videografia para captura da acerca do seu desenho? Vale salientar
dinâmica do fenômeno focalizado (Jor- que a imagem da barata não esteve pre-
dan & Henderson, 1995) e (c) A narrati- sente no filme. Foi interpretado aqui que,
va como expressão do desenvolvimento a barata figurou como sentido da relação
humano e instrumento metodológico entre poluição (lixo) e falta da água, uma
(Bruner, 1987; 1997; Flick, 2007). Con- vez que, no vídeo, constou um momento
frontaram-se duas perspectivas na análi- em que seres no desenho animado mer-
se da produção de sentidos: o contexto gulharam em um rio poluído com obje-
verbal e o contexto histórico-cultural. Os tos e a água despareceu. Na perspectiva
aspectos que nortearam a reflexão acer- do contexto histórico-cultural, a pobreza

860
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sintática (contexto verbal) deu lugar ao ções não estiveram visíveis. Elas foram
sentido proposicional, lixo e poluição possíveis na perspectiva do contexto his-
provocam falta d’agua. Em um segundo tórico-cultural, ao capturar-se na história
caso, uma criança do ensino fundamen- da criança que, a referência incidente à
tal apresentou o seu desenho para a pes- barata promovia o sentido onde a criança
quisadora dizendo que “O cara bebeu a relacionava o lixo à falta d’agua. De forma
metade da água do copo, depois derra- diferente, no segundo caso, observou-se
mou em outro copo a água, a água saiu uma composição, a partir de elementos
voando e disse adeus mundo cruel antes gráficos no desenho e na narrativa es-
de morrer e caiu na pia”. Ao ser solicitado crita. Os elementos mantinham uma re-
pela pesquisadora que falasse um pouco lação ativa uns com os outros. Todavia,
mais devagar, pois ela gostaria de com- a perspectiva do contexto verbal não
preendê-lo melhor, a criança comple- provê explicações sobre a relação que a
mentou “Isso tem a ver que o cara tá des- criança fez entre o “Super Câmera” e as
perdiçando água, ó aqui o copo! É a única questões sobre a preservação da água.
coisa que eu vi que tem a ver... Eu vi que Os sentidos emergentes nessas condi-
simplesmente você pode morrer se des- ções não podem prescindir da história da
perdiçar muita água!”. Um tio da criança criança com os significados em questão.
que ouvia perto introduziu-se no diálogo A partir de dados construídos com dese-
e questionou “Super Câmera é?”, referin- nhos e narrativas de crianças, promoveu-
do-se a um dos super heróis de desenho -se aqui um conjunto de situações onde
animado que a criança conhece, que, en- se configuraram produção de sentidos.
tretanto, não estava presente no filme de A pretensão foi de que essas situações
curta duração. A criança então responde fossem analisadas considerando-se as-
“É, tirei da Super Câmera!”. Informa-se pectos emergentes no uso da linguagem
ainda, que o desenho que propiciou essa contrapondo-se a análise de palavras e
fala, tinha aspectos gráficos definidos, sentenças. Na condução dessa perspecti-
constituindo-se como uma composição va de análise destacou-se como parâme-
pela presença de funções coesivas, refor- tro a configuração do contexto histórico-
çadas na fala da criança sobre o desenho. -cultural, confrontando-se com o contex-
Essa criança compôs uma estória sobre o to verbal. Destacou-se que a análise do
resto da água de um copo que uma pes- contexto histórico-cultural pressupõe a
soa desperdiçou, por não toma-la toda. dinâmica de vozes sociais, aspecto au-
A diversidade, se comparada com o caso sente na análise do contexto verbal. A di-
anterior diz respeito às diferentes formas nâmica das vozes sociais, por sua vez está
de apropriação das vozes sociais. Esgotar refletida na forma de apreensão ativa de
uma análise da diversidade é praticamen- significados no discurso do outro.
te impossível. Características da história
dos autores dos diferentes desenhos Palavras-chave: Produção de sentidos;
leva-os a apropriação das vozes sociais Metodologia; Contexto histórico-cultural;
de forma diversa. No primeiro caso, na Desenvolvimento infantil.
justaposição de rabiscos circulares (pers-
pectiva do contexto verbal) as proposi-

861
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-874 - EQUÍVOCOS Nova trouxe características de uma me-


CONTEMPORÂNEOS NA todologia vivencial, enfatizando no en-
ARTE DE ENSINAR PARA O sino fundamental os “cantinhos na sala
DESENVOLVIMENTO HUMANO de aula”- onde os alunos encontravam
Nyrma Souza Nunes de Azevedo - UFRJ material diversificado para sua consulta e
nsn.azevedo@gmail.com experimentação, como em atividades de
leitura, ciências, jogos matemáticos, arte,
Este trabalho tem como objetivo discutir música e outros, que proporcionavam a
formas de ensinar e aprender a partir dos diversificação nas experiências pedagó-
sentidos expressos por professores e alu- gicas. Era uma pedagogia do fazer e da
nos da rede pública do Rio de Janeiro e a alegria, aplicada nas escolas públicas da
relação com a expectativa social de suces- época. Mas, era uma escola para poucos,
so na sociedade brasileira contemporâ- não atingindo a totalidade da população.
nea. Um dos referenciais da pesquisa foi o Foi ocorrendo, então, a democratização
conhecimento nos legado por Vygotsty de da educação, com a ampliação das redes
que a partir de estruturas básicas neuroló- públicas, porém, sem a correspondência
gicas funcionais seriam as experiências de na qualidade. As políticas públicas ado-
aprendizagem que alavancariam o desen- tadas a partir daí “resolveram” as defici-
volvimento humano. Essas experiências ências na formação educacional da socie-
para o autor são mediadas pelos com- dade brasileira, favorecendo a cisão entre
ponentes dos grupos sociais de entorno os que podem pagar e aqueles que são
do sujeito. Assim, o grupo social ao qual obrigados pelos parcos recursos a submis-
pertencemos em nosso cotidiano, aliado são do oferecido pelo governo. Acirrou-
aos instrumentos mediadores culturais de -se deste modo o afastamento entre as
quem recebemos as influências (inclusive classes sociais e o despreparo das novas
as mídias), promovem em nós as transfor- gerações para lidarem com as diferenças.
mações para o nosso desenvolvimento; Os diplomas começam a ser exigidos no
isto é, para nossas capacidades adapta- mercado de trabalho sem a devida cor-
tivas à realidade da vida. Desta forma, a respondência à competência profissional.
família, a escola, os vizinhos, os cultos re- Hoje, o diploma não corresponde ao va-
ligiosos e outros grupos sociais são funda- lor do conhecimento. O construtivismo
mentais para o desenvolvimento humano. piagetiano faz-se hegemônico a partir
No mundo contemporâneo as informa- da década de 1980 e é entendido como
ções e vivências virtuais também são per- uma esperança de rompimento com a
cebidas, principalmente pelas crianças e mesmice. Isto é, o aluno é que constrói o
jovens, como modelos de aprendizagem. seu conhecimento sendo o professor um
Em relação ao ensino, é interessante re- facilitador e observador deste fenôme-
fletir sobre a formação de educadores no. Porém, aplicado de forma equivocada
efetivada em escolas urbanas nas décadas numa sociedade de experiências culturais
de 1950 e 1960, que serão aqui comen- tão heterogêneas, parece ter criado no
tadas através de depoimentos de profes- imaginário social da docência característi-
soras. Havia exigência nos conhecimentos cas que perduram até hoje, manifestadas
teóricos e na prática, sendo que a Escola na atitude passiva de grande parte dos

862
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

professores em sala de aula. Essas práti- se de conteúdo (Bardin,2008) foi utilizada


cas pedagógicas, aliadas a outros fatores, na interpretação dos dados levantados.
como o desprestígio social da carreira do Verificou-se que os professores tendem
magistério, demonstrado, por exemplo, a confundir o conceito de aprendizagem
nos baixos salários e na péssima formação com a metodologia interativa, como se
profissional, são grandes problemas a se- um clima de participação e diálogo garan-
rem enfrentados no contemporâneo. Por tisse a aprendizagem dos alunos. O inte-
outro lado, a interdependência dos povos, ressante é que professores com mais de
que vem transformando o cenário de po- 60 anos indicaram a forma tradicional de
der e as relações comerciais, vem exigin- ensino como a mais eficiente. Esse dado
do cada vez mais um preparo diferenciado foi encontrado também em 55% dos alu-
e amplo para o mercado de trabalho. Es- nos pesquisados. Sabe-se que há muitos
ses dados aliados à rapidez das transfor- anos a figura do professor que dá aula
mações proporcionadas pelas conquistas expositiva, exige dos alunos tarefas e pro-
tecnológicas e que abalaram as certezas move avaliações vem sendo criticada na
científicas exigem ruptura de paradigmas literatura pedagógica. Parece haver uma
nos objetivos educacionais. É necessário o dicotomia no imaginário social dos profes-
desenvolvimento do humano numa visão sores pesquisados entre ensinar conteúdo
de totalidade que favoreça um pensamen- e interagir com o aluno, como se fossem
to complexo capaz de encontrar soluções coisas conflitantes. Tal fato não é percebi-
para os grandes problemas encontrados do nas respostas de grande parte dos alu-
no mundo contemporâneo; inclusive de nos, quando indicam que aprendem mais
sobrevivência no Planeta. Hoje, o conhe- facilmente com professores que explicam
cimento deve vir aliado à capacidade de a matéria, tiram as dúvidas e exigem dis-
tomar decisões onde um processo criativo ciplina na sala de aula. Deve ser conside-
de pensamento é valorizado. Pode-se pen- rado também como problema, o fato de
sar que a partir dessa demanda são feitas que é a quantificação de diplomas e cer-
as avaliações de aprendizagem escolar em tificados que expressa o sucesso profis-
diferentes níveis nacionais e internacio- sional e social em nossa sociedade. Penso
nais, onde o Brasil aparece de forma la- que o ensino em qualquer nível, deve ter
mentável. A inquietação provocada pelos o objetivo de intervir no desenvolvimento
baixos índices de aprendizagem escolar dos humanos, através do conhecimento e
obtido em todos os níveis avaliados, inspi- de vivências, para que autonomia e criati-
rou a elaboração de uma pesquisa em que vidade sejam consideradas como valores.
se buscou conhecer o sentido de aprendi- Essas competências aliadas ao respeito e
zagem e de como se aprende, tendo como à cooperação em todos os níveis podem
sujeitos 70 professores e 89 alunos da favorecer a eclosão de um novo paradig-
rede pública do Rio de Janeiro. O referen- ma na vida para o futuro.
cial teórico que embasou a pesquisa foi
o estudo do Imaginário Social a partir da Palavras-chave: desenvolvimento humano;
elaboração feita por Castoriadis (1991), ensino; valores.
a teoria do desenvolvimento humano de Contato: Nyrma Souza Nunes de Azevedo,
Wallon (1995) e Vygotsky (1988). A análi- UFRJ, nsn.azevedo@gmail.com.

863
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-920 - EFEITOS DE SIMILARIDADES tigação foi feita através da escolha, na si-


AFETIVAS DE ENUNCIADOS DE tuação-problema apresentada na segun-
PROBLEMAS NA RESOLUÇÃO DE da sessão, ou seja, na situação problema
PROBLEMAS E NA TRANSFERÊNCIA “alvo”, de um dos modos de solução de
ANALÓGICA EM UNIVERSITÁRIOS problema vistos na situação-problema
Simone Cagnin - UERJ apresentada na primeira sessão, ou seja,
scagnin@oi.com.br na situação-problema “fonte”. Em outros
termos, dois modos de solução (serial e
Muitos estudos situados em uma pers- convergente) foram apresentados nas
pectiva cognitivista vêm destacando o histórias dos problemas das primeiras
papel das similaridades de superfície, es- sessões nos dois intervalos de tempo
pecialmente dos conteúdos semânticos pesquisados. Nas segundas sessões, nas
dos enunciados dos problemas, na reso- situações-problema “alvo”, foi pedido
lução de problemas e na transferência aos participantes que solucionassem um
de aprendizagem por analogia, como os problema análogo aos problemas vistos
de Holyoak (2005) Holyoak e colabora- anteriormente. Cabe observar que tanto
dores (1980, 1983, 1987, 1997), Bassok os problemas “fonte” que continham os
(2001, 2003), dentre outros. De modo dois modos de solução quanto o proble-
complementar, outros estudos destacam ma “alvo” que requisitava a aplicação de
a influência do afeto na cognição, espe- um destes dois modos de solução foram
cialmente das emoções e dos estados de todos análogos ao clássico problema da
humor no processamento da informação radiação de Duncker (1945). Participaram
(Bower, 1981, Bower & Forgas, 2001, do estudo 463 estudantes universitários
Curran, 2007). Porém, poucos estudos in- de diferentes cursos das áreas humanas.
vestigam mais diretamente os efeitos das Foram realizados também dois estudos
tonalidades afetivas de enunciados de pilotos com 42 estudantes universitários
histórias de problemas nos processos de com o objetivo de ajustar os instrumen-
resolução de problema e de transferência tos da pesquisa propriamente dita. Os
analógica (Hesse, Kauer & Spies, 1997). instrumentos aplicados foram os proble-
Nesta direção, o principal objetivo des- mas “fonte” e ”alvo” mencionados, ques-
te estudo foi o de investigar a influência tionários que versavam sobre algumas
das similaridades afetivas de enunciados características das histórias dos proble-
de histórias de problemas nos processos mas e sobre a apreciação da tonalidade
de resolução de problemas e de transfe- afetiva das histórias e uma escala de au-
rência de aprendizagem por analogia. De toavaliação do humor. A pesquisa foi sub-
modo mais específico, buscou estudar os metida ao Comitê de Ética em Pesquisas
efeitos da similaridade entre as tonali- Humanas da Universidade de São Paulo
dades afetivas agradáveis/ alegres e de- e obteve parecer favorável para a sua re-
gradáveis/ tristes de enunciados nesses alização. Cerca de 50% da amostra parti-
processos em dois intervalos de tempo cipou dos subgrupos das sessões conse-
distintos: sessões consecutivas e sessões cutivas e os outros 50% dos subgrupos
com intervalo de uma semana. Esta inves- com intervalo de uma semana. O Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido foi

864
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

apresentado a todos os participantes. Os zas com diferentes graus de definição e


resultados encontrados apontam para a com maior dependência ou independên-
existência de efeitos positivos das simi- cia de domínio poderiam sofrer a influên-
laridades afetivas dos enunciados dos cia, não só dos conteúdos semânticos dos
problemas nos dois intervalos de tempo enunciados dos problemas e das histórias
pesquisados, com maior freqüência re- com um todo, mas também das tonalida-
lativa nas sessões consecutivas. Desse des afetivas desses conteúdos. Nossos re-
modo, pode-se concluir que, quando há sultados podem ter particular relevância
mais de uma solução disponível e funcio- para os contextos acadêmico e escolar,
nalmente adequada para um determina- como um todo, na medida em que as situ-
do problema, similaridades de superfície, ações-problema vivenciadas pelos alunos
como as tonalidades afetivas de histórias podem revestir-se de tonalidades afetivas
de problemas, influenciam a preferên- que favorecem certo tipo de transferên-
cia por um modo de solução. Verificou- cia, ainda que os efeitos dessas tonalida-
-se ainda que esse tipo de influência das des não se dêem, normalmente, de modo
similaridades afetivas não depende de consciente e ainda que os mesmos não
uma alteração do estado de humor dos dependam da mediação do humor para
indivíduos, pois a maioria dos participan- ocorrer. Desse modo, mostra-se relevante
tes da pesquisa não apresentou variação a ampliação do conhecimento, por parte
em seu estado de humor após a leitura dos educadores, de que fatores afetivos
das histórias “alvo” de tonalidade triste e de diferentes naturezas, incluindo-se aqui
alegre. A escolha de um modo de solução as tonalidades afetivas de histórias que
para um problema “alvo” mal-definido, revestem problemas, podem ter nítida
semelhante ao problema da radiação de influência na transferência de aprendiza-
Duncker, pode ser vista, então, como so- gem. O papel do afeto na cognição pode-
frendo a influência das similaridades afe- ria ser assim visto como mais abrangen-
tivas de histórias que contém problemas te do que o pressuposto na literatura da
que compartilham uma analogia. Conclui- área, pois mesmo quando os indivíduos
-se que o processo de transferência ana- não se consideram afetados em seu hu-
lógica em resolução de problemas pode mor pela leitura de histórias tristes e ale-
ser influenciado por similaridades de gres, eles demonstram sofrer a influência
superfície, como as tonalidades afetivas das tonalidades afetivas dessas histórias.
de histórias de problemas, tanto a curto-
-prazo, em sessões consecutivas, quanto Palavras-chave: Afetividade; Resolução de
a médio-prazo, em sessões com intervalo Problemas; Transferência Analógica.
de tempo de uma semana, e essa influên-
cia não depende da mediação do humor
dos indivíduos para ocorrer. Podemos su-
por que não só problemas mal-definidos
apresentados em situações experimen-
tais poderiam sofrer a influência das si-
milaridades afetivas dos enunciados, mas
também problemas de diferentes nature-

865
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-1466 - A POSSIBILIDADE DO forma cooperativa e estabelecendo trocas


ESPAÇO INTERATIVO E DE CONSTRUÇÃO nas dimensões cognitivas, afetivas, sociais
COLETIVA POR MEIO DO FÓRUM: A e até mesmo culturais, e revela também, a
EXPERIÊNCIA DOS SEMINÁRIOS DE capacidade de lidar com conflitos e propor
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO sua resolução; (c) uso de instrumentos e
Ana da Costa Polonia - FE/UnB recursos: indica a habilidade em lidar com
polonia@unb.br diferentes linguagens, informações, ma-
teriais digitais e emprego da tecnologia
A formação de professores atualmente é para aprender e ensinar, criar e estabe-
foco de ações e programas ligados às po- lecer elos entre conteúdos, situações e
líticas públicas, vinculados aos projetos, interesses. Estas são imprescindíveis em
à capacitação e à formação que buscam qualquer espaço educativo, e certamente,
a qualidade de ensino e sua democrati- as ferramentas presentes no espaço virtu-
zação. Assim, por meio da tecnologia da al, associadas às ações pedagógicas não
comunicação e da informação, emerge um podem se furtar desta premissa, visando
novo conceito de espaço de aprendizagem incrementar estas macrocompetências.
on line, com características peculiares di- Neste cenário, este estudo se propõe a
recionadas à educação a distância, visan- refletir sobre a exploração pedagógica do
do a democratização e ampliação de opor- fórum, vislumbrando então, a construção
tunidades educacionais, superando as coletiva do conhecimento, paralelamen-
barreiras presenciais e espaciais. O fórum te, identificando as dimensões ligadas à
se constitui em uma ferramenta de natu- interatividade e ao desenvolvimento de
reza assíncrona, na medida em que o alu- competências imprescindíveis ao proces-
no ou o professor-mediador não precisam so de ensino-aprendizagem. Impulsionan-
estar simultaneamente, conectados para do a investigação, dos fóruns, da disciplina
estabelecer um diálogo ou uma conversa- Psicologia da Educação, ofertada ao grupo
ção, diferentemente, do chat ou do skype de professores-mediadores, em nível de
(comunicação síncrona). E por isso, Brito especialização, do estado do Acre. Para
(s/d) destaca que ele apresenta uma fle- proceder as análises dos fóruns se optou
xibilidade, já que a interação ocorre sem pelo emprego do software Nvivo 8 (1999-
a presença imediata do aluno ou grupos 2008), de natureza qualitativa que possibi-
de alunos ou professor-mediador. Rychen lita a criação de categorias, codificações de
e Salganick (2001, 2003 citado em Coll; trechos ou falas, além de organizar dados
Monereo, 2010) afirmam que as compe- de pesquisa que podem ser digitalizados-
tências básicas que todos os sujeitos da entrevistas, fóruns, registros de vídeos e
aprendizagem devem ter, se aglutinam áudio, etc (Saur-Amaral, 2010). Segundo
em três blocos: (a) autonomia: retrata Onrubia, Colomina e Engel (2010) é pre-
a capacidade de elaborar e acionar pro- ciso adotar uma perspectiva de pesquisa
jetos, além de se colocar e ocupar espa- que, vislumbre situações educativas reais
ços de discussão, expondo suas opiniões, e naturais, e ainda, tendo como subsídio a
desejos e interesses; (b) interação: inclui abordagem qualitativa. Não se pode con-
a dinâmica de relacionamento com dife- ceber que os dados apenas identifiquem
rentes pessoas e grupos, contribuindo de o número de mensagens trocadas, pala-

866
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

vras ou frases, como evidência de sucesso dois movimentos, a percepção de si, como
de condições colaborativas, no ambiente agente gestor das ações pedagógicas e
virtual, desconsiderando a qualidade das acompanhamento do fórum, e concomi-
interações e da construção coletiva de co- tantemente, a percepção do outro, no que
nhecimento. A tendência atual é associar se refere à supervisão do fórum, a elabo-
a abordagem qualitativa e a quantitativa, ração das questões e a proposição da ati-
de forma complementar os dados, empre- vidade em si, no papel de aluno. Transver-
gando a análise do conteúdo das comuni- salizando esta discussão, é fundamental,
cações. No que se refere à categoria con- no ambiente on line, o fomento à proati-
ceitos científicos e suas subcategorias, um vidade. Ela pode ser conceituada como a
dos destaques foi a contextualização, indi- capacidade de se antecipar, de prever, de
cando que nas discussões, além da apre- tomar a frente, no que tange a um deter-
sentação do conceito científico estudado, minado objetivo ou mesmo, a uma situ-
tanto os professores quanto as professo- ação. Ela está estreitamente, associada à
ras, se preocupavam em articular a este, autonomia, à curiosidade, à capacidade
reflexões ou experiências vividas na pro- de organização e à de previsão, poten-
fissão, assegurando, assim, a perspectiva cialmente, imbricada com a motivação.
teórico-prática. Esta subcategoria pode re- Por vezes, nas propostas direcionadas às
fletir o papel de professores-mediadores, discussões nos fóruns, nos planejamentos
atuando no curso de graduação, e conco- e na implementação dos conteúdos, há
mitantemente, por sua experiência como uma ‘certa’ negligência quanto o fomento
alunos (as), valorizando esta ação com- à proatividade, compreendida simples-
plementar aos conteúdos. Evitando ado- mente como autonomia, não propiciando
tar apenas o ‘modelo’ de disponibilizar o a tomada de decisão e nem assegurando
conceito no fórum, sem estabelecer rela- o espaço de proposição, por parte dos alu-
ções com a prática e sua realidade, afinal, nos. Retomando a reflexão proposta por
não se concebe o conhecimento como um Delcin (2005 citado em Bear et. al, 2009),
produto oriundo do acúmulo de informa- as novas experiências pedagógicas não
ções. Aliando à compreensão do conceito podem estar alijadas do emprego das tec-
ou pressupostos teóricos apresentados, nologias, porque ambas têm uma influên-
outro recurso identificado foi conectar o cia e podem transformá-las em ambientes
conceito ou conteúdo, a outros autores múltiplos, especialmente, com contornos
anteriormente estudados, possibilitando cooperativos, considerando o pensamen-
realizar aproximações e promovendo um to divergente, e as múltiplas linguagens.
diálogo entre eles, ou identificando dife- Espaços onde imagens, sons, afetos, de-
renças em suas abordagens. Interessante sejos, sonhos, signos e símbolos, além da
ressaltar que os e as participantes tam- perspectiva humanista se encontram para
bém descreviam elementos associados à superar o conteúdo em si, mas para criar
reflexão sobre a experiência da ativida- e ampliar as possibilidades de refazer, ino-
de de seminário, no fórum e, o papel da var e reescrever a história da educação.
discussão, estimulando e incrementando
o processo ensino-aprendizagem. Nesta Palavras-chave: Educação a Distância; Fórum;
situação, pode se observar a presença de Software Nvivo; Formação Continuada.

867
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-1386 - INVESTIGAÇÃO SOBRE A ção são pertinentes à comunidade infantil


INTERAÇÃO, AS FUNÇÕES DE CONTATO E atendida no IPREDE? Quais intervenções
A RESSIGNIFICAÇÃO COMO REFERÊNCIA subjacentes ao campo da Gestalt-terapia
NECESSÁRIA PARA O DESENVOLVIMENTO são adequadas para orientar o desenvolvi-
INFANTIL mento infantil? Como as categorias teóri-
Gabriela da Cunha Gomes - UNIFOR cas erigidas a partir da intervenção psico-
cunhagg@hotmail.com lógica operam com respeito à efetividade
dos processos de ressignificação construí-
A preocupação com o desenvolvimento dos pela criança? . Quanto à metodologia,
infantil nas dimensões psicológica e social a pesquisa foi bibliográfica e de campo, e,
instigou-me sobremodo durante a reali- teve como referencial teórico o método fe-
zação do Estágio Supervisionado em Psi- nomenológico (Aguiar, 2005) adotado pela
cologia Clínica I, no qual a realidade social Gestalt-terapia com crianças. O desenvolvi-
das crianças atendidas no Instituto de Pro- mento Infantil é abordado, de acordo com
moção da Nutrição e do Desenvolvimento os estudos de Philippe Ariès (1975), atra-
Humano (IPREDE) é de expressiva vulne- vés de obra intitulada A História Social da
rabilidade social. Em razão da constante Criança e da Família (1975), em que Ariès
relação da pesquisadora com este proces- percorre a história para pensar a infância
so psicológico, nada mais enriquecedor e como um tempo que foi construído em
construtivo do que estudar o seu campo decorrência de fatores culturais, sociais,
de trabalho como objeto de investigação. emocionais e religiosos, bem como as te-
O presente trabalho objetiva analisar o orias desenvolvimentistas propostas por
desenvolvimento infantil de crianças aten- Piaget (1998) e Vygotski (2001). No que
didas pelo IPREDE a partir das contribui- tange aos aspectos sociais, as políticas de
ções da Gestalt-Terapia. Uma revisão dos amparo à criança, surgem como ferra-
estudos sobre o desenvolvimento infantil mentas indispensáveis à efetivação plena
no âmbito psicológico mostra-nos que dos direitos da criança e do adolescente.
estamos perante um tema complexo com Para a realização da pesquisa de campo,
dimensões que vão além da anteriormente inicialmente, fez-se contato com 30 (trinta)
mencionada. Entretanto, para fins de deli- crianças em atendimento pelo IPREDE. En-
mitação da pesquisa, concebe-se o desen- tretanto, apenas 06 (seis) dessas atendiam
volvimento infantil atrelado a interação, aos critérios da pesquisa. Quais sejam:
imaginação, fantasia, criação e ao brincar crianças com o diagnóstico de desnutrição;
enquanto forma de transformação e ex- com a idade de 03 (três) a 06 (seis) anos e
pressão da realidade. Nesta perspectiva, em atendimento nos grupos Mediação e
pode-se inferir que a criança tem sempre Psicomotricidade. Os procedimentos de
“a possibilidade de criar outros sentidos coleta e registro de dados foram realiza-
para os objetos que têm significados fixa- dos por meio de mapas sinápticos, para
dos pela cultura dominante, assim indo acompanhar o percurso de cada criança no
além do sentido único que as coisas novas decorrer das atividades lúdicas propostas
tendem a possuir” (Sousa, 1994). Nesse pela pesquisadora. Na estrutura dos ma-
sentido, algumas indagações foram reali- pas é possível visualizar as dimensões rela-
zadas, tais como: que técnicas de interven- tivas ao desenvolvimento infantil, a partir

868
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de três níveis de intervenção terapêutica seqüências desta realidade e de suas impli-


baseados no método fenomenológico. cações para o desenvolvimento infantil. O
Todos estes níveis possuem particularida- fato de a pesquisa trazer à tona a necessi-
des, assim, não sendo consideradas etapas dade de um trabalho específico no campo
ou fases que devem seguir uma ordem da Gestalt-terapia, requer que, as institui-
específica. Os dados revelaram que ao se ções de apoio a este segmento concen-
apropriar do ambiente lúdico, as crianças trem seus esforços em ações direcionadas
escolhiam o brinquedo e a brincadeira que à ludicidade como uma ferramenta capaz
gostariam de interagir espontaneamente. de favorecer a interação e ressignificação
Observou-se que os brinquedos que fa- de experiências.
voreciam a expressão corporal como um
todo também eram bastante desejados. Palavras-chave: Desenvolvimento infantil.
O tato e o movimento corporal foram às Gestalt-terapia. Mapas Sinápticos.
funções de contato mais expressivas pela
comunidade infantil pesquisada. Este dado
se confirma quando refletimos a respeito LT02-1502 - ESTRATÉGIAS NO ENSINO
das idéias de Piaget, especialmente na fase DE CONCEITOS TEMPORAIS EM
Simbólico-Intuitiva, em que a criança é ca- LIVROS DIDÁTICOS DO ENSINO
paz de simbolizar o mundo a sua volta. Em FUNDAMENTAL
decorrência da observação atenta do com- Zena Eisenberg - PUC/Rio
portamento das crianças em grupo, e, de zwe@puc-rio.br
suas atividades lúdicas escolhidas, visuali- Jéssica Castro Nogueira - PUC/Rio
zaram-se indícios dos mecanismos de evi- Ana Carolina Vilar da Silva - PUC/Rio
tação de contato denominados: Deflexão e Financiamento: FAPERJ
Projeção. Estes mecanismos representam
a forma que estas crianças encontraram de A apresentação proposta faz parte de um
manifestar seu sofrimento psíquico, de ma- projeto maior em andamento financia-
neira que se evidenciou que as situações do pela Faperj. A pesquisa foi realizada
familiares repercutem de forma direta na em duas escolas municipais de Vassouras
apreensão do mundo por estas. Assim, (chamaremos aqui de Escolas A e B), com
observou-se que tais mecanismos podem os professores e alunos das turmas do 2º
minimizar a expressão dos verdadeiros ao 5º ano. Neste trabalho analisaremos as
sentimentos da criança, mas, que consti- estratégias temporais utilizadas nos livros
tuem uma forma flexível da criança ser no didáticos adotados pela prefeitura de Vas-
mundo. Quanto às considerações finais, souras para as turmas do 2º ao 5º ano do
compreendeu-se que o desenvolvimento Ensino Fundamental. Usamos as ideias de
saudável da criança é de responsabilidade Vygotsky (2000) acerca do desenvolvimen-
não só da família, da escola, das entidades to de conceitos. Para ele, a criança constroi
sociais, mas, também da sociedade como o conhecimento sobre o mundo através de
um todo. Contudo, ainda existem indícios um diálogo entre conceitos científicos e
de violação dos direitos da criança, o que, cotidianos. No primeiro tipo, o aprendiza-
incita a investigação científica por parte do do se dá de forma explícita e consciente,
profissional de Psicologia acerca das con- ou seja, a criança necessita que o adulto ou

869
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

outro ensine esses conceitos. Já no segun- codificada buscando identificar estratégias


do caso, os conceitos são aprendidos no didáticas no ensino dos conteúdos tempo-
dia-a-dia da criança através de mediações rais. Selecionamos para discutir aqui aque-
implícitas. Para que a aprendizagem acon- les que apareceram com maior frequência.
teça, os conceitos devem ser trabalhados São eles: Evento Temporal (ET) - datas co-
dentro da zona de desenvolvimento pro- memorativas ou evento temporal para fa-
ximal da criança, garantindo assim que zer marcações do tempo; Linha do Tempo
ela estabeleça um diálogo entre o conhe- (LT) - quando a página do livro apresentava
cimento novo e os já internalizados, sejam uma imagem ou um gráfico representando
estes conhecimentos científicos ou cotidia- uma linha temporal; Passagem do Tempo
nos. Este processo todo se dá pela media- (PT) - Usado em momentos de comparação
ção da linguagem e dos instrumentos cul- de imagens de objetos ou lugares novos
turais. As educadoras seguem estragégias com antigos; Sequenciamento (SQO) - Atri-
sem uma metodologia específica buído a imagens que passam a concepção
de sequência, seja com ações ou mudan-
As educadoras seguem estragégias sem
ças da imagem; xxx anos atrás (XAA) - re-
uma metodologia específica
ferência a anos passados no formato da
Para esta apresentação buscamos verificar expressão. Este último foi observado ape-
se encontramos também nos livros didá- nas no livro de História, que foi analisado
ticos adotados no Ensino Fundamental o de forma diferente dos outros por tratar
descompasso encontrado entre educado- de eventos no tempo e tornando-se assim
res infantis e o conhecimento temporal redundante tratar de estratégias que fo-
das crianças. Queremos ainda examinar as cassem nesses eventos. Percebemos que,
estratégias temporais que os livros trazem. de forma geral, o código XAA foi o mais
Faremos por fim uma comparação entre as frequente com 105 ocorrências seguidas
estratégias utilizadas nos diferentes anos pelo código SQO com 81 casos e o PT com
do Ensino Fundamental, mais especifica- 75. Já os menos frequentes são os códigos
mente do 2º ao 5º ano. Duas escolas do ET com apenas 38 e LT com 62 marcações,
município de Vassouras participaram da sendo no total 361 marcações em todos os
pesquisa. A Escola A possui um total de livros. Assim, os livros em geral lançam mão
71 alunos e a Escola B possui um total de de falar do passado utilizando marcadores
89 alunos. Analisamos no total dezenove temporais convencionais – como número
livros didáticos pertencentes às seguintes de anos. A análise por ano demonstrou
disciplinas: Geografia, História, Matemáti- que no segundo ano SQO foi o código mais
ca e Ciências. Todos os livros foram doados presente com 16 de 49 marcações (33%)
pela Secretária Municipal de Educação de seguido de PT com 24% das marcações
Vassouras para nossas análises. A análise (12/49); no terceiro ano, há destaque para
dos dados teve como unidade cada página XAA com 46 casos entre 160 (29%), PT com
do livro. Como as duas escolas adotavam 28% (44/160) e SQO com 21% (33/160); no
os mesmos livros (por serem indicados quarto ano XAA tem 51 marcações de 112
pela secretaria e selecionados pela PNLD), (45,5%) sendo mais presente também SQO
não fizemos distinção nas nossas análises com 19% (21/112); no quinto ano o código
entre as mesmas. Cada página dos livros foi mais presente é LT com 22 casos entre 40

870
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(55%) seguido de SQO com 27,5% (11/40). seguintes são mais visuais, desta forma
Com relação à análise por disciplina, os as crianças assimilam melhor o conteúdo.
resultados demonstraram que em mate- As estratégias menos usuais são aquelas
mática os códigos mais utilizados foram que envolvem conhecimentos adquiridos
ET com 26 de 64 ocorrências (41%), LT com formalmente, ou de maneira explícita e
31% (20/64) e SQO com 25% (16/64); em consciente, como aquelas que situam os
História o destaque é o código XAA com eventos em uma data histórica. Notamos
105 marcações de 187 (56%), seguido de que nem sempre a linguagem do livro está
LT com apenas 20% (37/187); em Ciências de acordo com a Zona de Desenvolvimento
o código SQO é o mais usado 37 de 75 mar- Proximal das crianças como, por exemplo,
cações (49%), seguido de PT com 41% dos em História, que necessita de apoio para
casos (31/75); em Geografia, verificamos ensinar os conceitos temporais abstratos
como mais presentes os códigos PT, com pretendidos. Já matérias consideradas
15 casos entre 35 (43%), e SQO com 28,5% mais difíceis, como Matemática, há um su-
(10/35). Podemos notar que a estratégia porte maior das estratégias para exempli-
mais usual é aquela referente aos anos ficar o que pode ser mais complicado para
passados que explicam com exatidão o as crianças.
tempo do evento ocorrido, XAA, mas este
aparece apenas na disciplina de História
com maior frequência no terceiro e quarto LT04-1430 - REPENSANDO O TEMPO:
ano. A segunda estratégia mais frequente ENCONTROS E TRAVESSIAS
está associada à esquematização visual das Anabela Rute Kohlmann Ferrarini - UFMT
mudanças de uma determinada figura ou anabelaferrarini@hotmail.com
em uma ação, SQO, comumente presente Raquel Gonçalves Salgado - UFMT
em matemática, ciências e geografia, além ramidan@terra.com.br
de ter destaque em todos os anos. Já a es-
tratégia PT, que demonstra visualmente O tempo tem sido celebrado em verso e
as mudanças de objetos ou locais é mais prosa há séculos, e também tem desperta-
utilizada nas disciplinas de ciências e geo- do angústias, debates filosóficos e estudos
grafia e no terceiro ano. O código LT, que científicos. Nossas vidas são uma travessia
está relacionado aos conceitos cotidianos no tempo, permeada de instantes e lem-
representando aqueles aprendidos no dia- branças, construídas e reconstruídas na
-a-dia das crianças, aparece em destaque memória, pessoal e coletiva, e atravessa-
nas matérias de matemática e história, das por encontros entre pessoas e gera-
mas apenas no quinto ano. Notamos como ções, entre inexperiências e experiências,
a estratégia ET é pouco utilizada em todos cada vez mais raras, nessa época em que
os anos, seu uso só se torna mais evidente tudo acontece velozmente. Construir co-
na disciplina de Matemática. As estratégias nexões significativas em meio a estímulos
mais usadas nos livros são as que exigem efêmeros requer que tomemos para nós
uma noção prévia de tempo, pois a crian- nosso próprio tempo, que sejamos capazes
ça precisa saber se “100 anos” faz muito de, mesmo imersos nesse mundo de vivên-
ou pouco tempo, assim como saber se 5 cias pontuais e rasas, criar memórias e afe-
anos é muito tempo. As duas estratégias tos. Quintana, com seu olhar poético e su-

871
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

til, exalta o corriqueiro da vida, escrevendo tentava uma ideia objetivista, segundo a
sobre amores, tempo, memória, infância e qual o tempo era propriedade da natureza
velhice. Seus poemas revelam tanto a no- e, portanto, está fora do sujeito e sempre
ção cristã de tempo, linear e determinada existiu. Já Kant, subjetivista, compreendia
pela cronologia nascimento, vida e morte, o tempo como imanente à razão humana.
quanto a filosofia epicurista, que privilegia Na Modernidade, encontramos o antes e
a busca incessante do prazer. Com a ajuda o depois, conceitos que forjam uma noção
desses quintanares, procuramos, neste en- de tempo histórico entendido como pro-
saio, refletir sobre o tempo – sem, no en- cesso, contrária à noção do tempo cristão,
tanto, ousar defini-lo – e suas repercussões retilíneo e irreversível. O homem criou os
na vida e no processo educativo, pondo relógios e os calendários, que cumprem as
em discussão a sua dimensão mensurável mesmas funções dos fenômenos naturais:
e previsível que acaba por se apropriar de orientar a humanidade na sucessão e orde-
nossos encontros com o outro e de nossas nação de processos sociais e físicos, repre-
travessias ao longo da vida. Conjugamos sentando a passagem irreversível do tem-
a sensibilidade do poeta às reflexões de po (Elias, 1998). Enquanto cresce, a crian-
Agamben (2005) sobre khronos e kairos, às ça sofre uma espécie de coerção social,
de Elias (1998) sobre o tempo em sua di- disciplinadora, que lhe ensina os habitus
mensão simbólica e de Lloret (1998), sobre sociais, inserindo-a no processo civilizató-
as idades da vida e como estas atravessam rio e capacitando-a a integrar uma comu-
a constituição de nossa identidade. A con- nidade humana e interpretar os símbolos
cepção greco-romana de tempo como um temporais socialmente usados, guiando-se
continuum lança os fundamentos da noção em função deles. Dentre as instituições
ocidental quanto à incapacidade huma- sociais, a escola está intimamente ligada
na de dominá-lo. É o tempo como eterno à ideia de tempo como processo – e pro-
duelo entre kairos e khronos, entre o tem- gresso-, sendo organizada em função dele:
po existencial e divino, que se apropria do a gestão se preocupa em cumprir a tempo
instante, e o tempo quantificado, humano, as obrigações junto ao Estado. Os profes-
delimitado e delimitador. Kairos nos convi- sores, em vencer os conteúdos. Os alunos
da a viver o prazer, enquanto khronos nos correm rumo a dois destinos possíveis:
obriga a postergá-lo. Quintana (1988) la- aprovação ou reprovação, determinados
menta que não possamos viver sem outra pela aprendizagem ou não-aprendizagem
pretensão que não seja viver: “A vida não no tempo pré-determinado como tempo
dá tempo para a Vida.” Esse pensamento certo de aprender. Assim como apreende-
perdura até o início da era cristã, quando mos o tempo como eventos que ordenam
surge a representação do tempo como nossas vidas, também aprendemos sobre
uma linha reta, com princípio, meio e fim. nossos tempos de vida. Aprendemos que
O Gênese é o marco inicial do universo além de sermos homens ou mulheres,
criado por Deus, enquanto o Apocalipse jovens ou velhos, somos/pertencemos a
é seu destino final e inescapável. Durante uma determinada idade, que não é somen-
muito tempo, as teses de Newton e Kant, te nossa, é também do outro que, assim
fundamentalmente opostas, dominaram como nós, é/pertence a essa mesma idade.
as reflexões sobre o tempo. Newton sus- Ser uma pessoa de 30 ou de 5 anos. Esse

872
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ser de indica que somos todos propriedade tência de saberes que aprendemos sobre o
de alguns anos e que, vamos, ao longo da tempo. Passado, presente e futuro. Infân-
vida, sendo inscritos a grupos determina- cia, idade adulta, velhice. São conceitos e
dos de idade (Lloret, 1998). Porém, assim configurações que permeiam nossas expe-
como existe a normalidade, existe o des- riências humanas, constituídas por instan-
vio. Tornou-se comum encontrarmos pes- tes, memórias e encontros, construídas e
soas que não estão em conformidade com reconstruídas num ciclo sem fim.
seus anos de vida. É possível construir uma
identidade flexível e diversificada, dese- Palavras-chave: Tempo; Idades da Vida;
nhada pelas experiências vividas, pois uma Gerações.
idade não elimina a outra e, sim, a contém Contato: Anabela Rute Kohlmann Ferrarini,
(Lloret, 1998). Sob a perspectiva do desvio UFMT, anabelaferrarini@hotmail.com
à normalidade, é justo pensar que a socie-
dade contemporânea vive um período de
instabilidade quanto a situar as pessoas PO-LT04-B
em determinados grupos etários e papéis
sociais. Infância e idade adulta são tempos
de vida distintos, mas cujas fronteiras se LT04-813 - COMPREENSÃO DO OLHAR
tocam em determinados momentos, quan- SOBRE O BULLYING EM UMA ESCOLA DE
do as experiências da infância no mundo TERESINA-PI.
globalizado e midiático a aproximam do Nara Caroline dos Santos Silva - FACID
que seria próprio da idade adulta. Nosso nara_carolline@hotmail.com
ideário projeta sobre as crianças determi- Ana Lúcia Camargo Queiroga - FACID
nados comportamentos e linguagens que lucqueiroga@yahoo.com.br
entram em confronto com a infância que aí Ana Mary Pereira Nunes - FACID
está, transitando entre o que se espera de anna11024@hotmail.com
um adulto ou de uma criança. Confrontos
intergeracionais sempre existiram, e, na Na atualidade, um dos temas que vem
contemporaneidade, tem se mostrado ain- despertando cada vez mais, o interesse
da mais intensamente, atravessados que de profissionais das áreas de educação e
são pelas mensagens da mídia, pelas tec- saúde, em todo o mundo, é sem dúvida,
nologias e pelo consumo que seduz. A pe- o do bullying escolar. Termo encontrado
dagogia é desafiada a perceber a dinâmica na literatura psicológica anglo-saxônica,
da sociedade onde as imagens da infância que conceitua os comportamentos agres-
se constroem e desconstroem, e, assim, sivos e anti-sociais, em estudos sobre o
reconhecer as experiências formadoras da problema da violência escolar. Esta ação
infância e da adolescência. O tempo nos discriminatória dá-se, sobretudo, na ado-
intriga e confunde. Vivemos nele e ele vive lescência, podendo ser direto ou indireto
em nós. Desde o berço recebemos lições e, ocorrendo-nos mais variados contex-
sobre a passagem do tempo, a organiza- tos, sendo que o mais comum é ser entre
ção social e cultural da vida, a trajetória crianças e jovens em contexto escolar.
humana – individual e coletiva – e sobre Compreender o olhar sobre o bullying em
nossos tempos de vida. Assim, é na coexis- uma escola de Teresina, como ele se ma-

873
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nifesta, de que forma os professores per- temente, a partir desta investigação pode-
cebem e lidam e como os alunos reagem -se formular as hipóteses sobre as causas
ao presenciar o bullying. Uma pesquisa da queixa que lhe foi trazida para, então
de ordem qualitativa, realizada em uma intervir no sentido de melhorar este pro-
escola da rede pública de Teresina. Foram cesso. O diagnóstico psicopedagógico
realizadas entrevistas semiestruturadas a institucional explica Bassedas (1996) bus-
partir de um roteiro com oito perguntas, ca conhecer, olhar e escutar a relação do
onde os sujeitos envolvidos eram doze alu- sujeito com o conhecimento objetivando
nos e três professores. Os dados coletados a melhoria do ensino e da aprendizagem,
nesse estudo foram analisados a partir da ou seja, para ajudar a família, a escola (em
análise de conteúdo e agrupados em ca- todos os níveis – administrativo, docente,
tegorias por similaridades de respostas. A técnico, discente) a cumprir o seu papel,
partir dos resultados obtidos observou-se atuando como um articulador do ensino e
que o bullying está se disseminando entre da aprendizagem. (p.24) Dessa forma, esta
os jovens, principalmente os de idade es- pesquisa foi realizada em uma instituição
colar, gerando violência, exclusão, ocasio- não-governamental, na área da educação,
nando sérios danos psicológicos para as que observou através das atividades pe-
vitimas. Foi verificado que os professores dagógicas desenvolvidas, que um número
não tomam conhecimento da ocorrência significativo de crianças apresenta difi-
do bullying no âmbito escolar. Já os fato- culdades para aprender. Partindo destas
res que levam a ocorrência do bullying, são considerações, este estudo buscou realizar
sentimentos que variam muito, entre eles: o diagnóstico psicopedagógico institucio-
maldade, inveja, exibicionismo, falta de nal para identificar quais as crianças que
formação e violência. apresentam estas dificuldades, bem como,
propiciar uma reflexão sobre possíveis
Palavras-chave: Bullying. Escola. Jovens intervenções que os educadores sociais
poderiam desenvolver junto às crianças.
Participaram da pesquisa 50 crianças que
LT04-846 - DIAGNÓSTICO tem entre 7 à 9 anos, estão na 2ª e 3ª série
PSICOPEDAGÓGICO E POSSÍVEIS do ensino fundamental, freqüentam esco-
INTERVENÇÕES EM INSTITUIÇÕES las públicas de um município do interior do
NÃO-GOVERNAMENTAIS NA ÁREA DA Paraná, e também a instituição no contra-
EDUCAÇÃO -turno. Além disso, participaram 5 educa-
Caroline Andrea Pöttker - UNIPAN dores sociais e 15 pais ou responsáveis.
Caroline_pottker@hotmail.com Também foi necessário realizar uma carac-
terização da Instituição Social, sendo uti-
O diagnóstico psicopedagógico institucio- lizado o Projeto Político Pedagógico. Para
nal é uma forma de investigação que deve a coleta de dados foram realizadas obser-
partir da história da instituição e de suas vações nas salas e no pátio da instituição,
características atuais, reestruturando a bem como aplicado atividades pedagógi-
função desta junto aos envolvidos, identi- cas com as crianças direcionadas a leitura e
ficando os sintomas bloqueadores do pro- escrita. Ainda foram utilizadas entrevistas
cesso ensino-aprendizagem. Conseqüen- semiestruturas, as quais foram aplicadas

874
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aos educadores sociais sobre as crianças delas já havia reprovado na escola. Além
e sobre os aspectos psicopedagógicos da disso, a maioria relatou que a atividade
instituição, aos pais ou responsáveis e as que não gostavam de realizar na escola era
crianças selecionadas. Nas observações escrever texto, pois consideravam muito
pode-se notar a resistência das crianças a difícil. Dessa forma, com o diagnóstico psi-
atividades pedagógicas, as quais eram se- copedagógico institucional, constatou-se
melhantes com as que realizam na escola. que neste momento que estas 15 crianças
Nas entrevistas com os educadores sociais necessitavam de uma complementação do
sobre as crianças pode-se perceber que processo de alfabetização, sendo que em
algumas crianças necessitavam de mais seguida, foi realizada uma reflexão sobre
atenção, e demoravam mais para terminar alfabetização e possíveis intervenções que
as atividades, além de presenciarem estas os educadores sociais poderiam realizar
copiando as atividades do colega. Nas ati- junto à criança. Para Paulo Freire (1991), “a
vidades pedagógicas observou-se que as alfabetização enquanto prática discursiva
maiores dificuldades eram quanto a troca possibilita uma leitura crítica da realidade,
e omissão de letras na escrita das palavras, constitui-se como um importante instru-
e em casos mais extremos a não compre- mento de resgate da cidadania e reforça o
ensão do que a criança havia escrito. Em engajamento do cidadão nos movimentos
relação às entrevistas com os educadores sociais que lutam pela melhoria da quali-
sociais sobre os aspectos psicopedagógi- dade de vida e pela transformação social”
cos na concepção dos educadores sobre (p.68). Enquanto que para Soares (2003) a
dificuldade de aprendizagem, estes as rela- alfabetização requer um novo termo, mais
cionam à dificuldade na família, a condição abrangente ou equivalente, sendo este
social, como ao próprio aluno assim como denominado Letramento. Para ela, alfabe-
a escola também. Quanto ao modelo de tizar e letrar são duas ações distintas, mas
aprendizagem da instituição para os edu- não inseparáveis, ao contrario: o ideal seria
cadores sociais não é esclarecido o refe- alfabetizar letrando, ou seja, ensinar a ler
rencial teórico a seguirem, relatam que o e a escrever no contexto das práticas so-
ensino vai desde aprendizagem de letras e ciais da leitura e da escrita. Para possíveis
números até aprender um ofício, costurar, intervenções educacionais sugere-se: jo-
bordar ou pintar. Assim, foram seleciona- gos, brincadeiras, dinâmicas de motivação,
das 15 crianças e a partir disto, foram cha- para proporcionar as crianças um trabalho
mados os pais e as crianças selecionadas rico e prazeroso na aquisição da escrita e
para entrevistas. Nas entrevistas com os da leitura. Através dos jogos o indivíduo
pais, ficou evidente que todos já haviam pode brincar naturalmente, testar hipóte-
percebido a dificuldade de aprendizagem ses, explorar toda a sua espontaneidade
que seu filho apresentava. Quanto à tare- criativa. O jogo cria uma situação de regras
fa, muitos relataram que ajudam o filho a que proporcionam uma zona de desenvol-
fazer, e quando este tinha dificuldade com vimento proximal no aluno. Assim compor-
algo, muitas vezes chorava, ficava agitado, ta-se de forma mais avançada do que nas
nervoso, demonstrava insegurança, com atividades da vida real e também aprende
medo de errar. Nas entrevistas com as a separar objeto e significado. (Oliveira,
crianças percebeu-se que quase metade 1999). Para Bock (1999) “a preocupação do

875
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ensino tem sido a de criar condições tais, A prática pedagógica é constituída por
que o aluno fique “a fim” de aprender” (p. diferentes fatores, abrangendo: os signi-
121). Diante desse contexto percebe-se ficados e as concepções que os docentes
que a motivação deve ser considerada pe- atribuem ao processo educativo e aos seus
los professores de forma cuidadosa, procu- atores; os saberes teórico-práticos cons-
rando mobilizar as capacidades e potencia- truídos pelos professores no seu processo
lidades dos alunos a este nível. Para a lei- formativo; a metodologia de ensino desen-
tura, os textos selecionados pelo educador volvida pelos docentes; as especificidades
devem estar de acordo com a realidade da mediação pedagógica que os docentes
dos alunos, pois serão de fácil compreen- estabelecem com seus alunos; bem como
são; levar em conta também o nível inte- aspectos relacionados à organização cur-
lectual, os interesses e os gostos. Quanto ricular e aos contextos sócio-culturais nos
aos tipos de leitura, devem ser variados: quais o docente está inserido. Este traba-
parlendas, receitas, notícias de jornais, lho tem como proposta investigar como
listas de mercado, letra de músicas, poe- a prática pedagógica de docentes de um
sias, gibis, revistas, entre outros. Portanto curso de licenciatura favorece a articula-
determinadas dificuldades de leitura e es- ção entre as dimensões da teoria e da prá-
crita apresentadas pelas crianças podem tica na formação de professores e, dessa
ser minimizadas e seu aprendizado pode forma, contribui com o desenvolvimento
ser potencializado, principalmente quan- profissional dos discentes. Este trabalho
do pais e professores se unem neste mes- apoia-se na ideia de que é no diálogo entre
mo objetivo. Um ambiente estimulante e a prática docente e a formação teórica que
encorajador que ofereça oportunidades o professor terá condições de construir
apropriadas á aprendizagem produz crian- uma prática crítica e transformadora, a
ças dispostas a aprender (Smith, 2001). partir de estudos que indicam a relevância
de tal diálogo para qualificação da forma-
Palavras-chave: diagnóstico psicopedagógico; ção docente (Brzezinski, 2008; Freire, 2001;
dificuldade de aprendizagem; intervenção. Freitas, 2002; Pimenta, 2005). A formação
de professores poderá favorecer, de forma
efetiva, processos de qualificação e desen-
LT04-912 - PRÁTICAS PEDAGÓGICAS volvimento profissional dos sujeitos, à me-
DESENVOLVIDAS EM UM CURSO DE dida que conceber a relação constitutiva
LICENCIATURA: CONTRIBUIÇÕES PARA O entre os saberes científicos e os saberes
DESENVOLVIMENTO DOCENTE da experiência. Sabendo que o desenvolvi-
Joana Dark Leite - UFG mento desse diálogo implica na superação
joanadarkl@yahoo.com.br de concepções históricas que dicotomizam
Pedro Henrique Andrade de Faria - UFG teoria e prática nos processos formati-
pedrohandradef@hotmail.com vos, privilegiando uma ou outra dimensão
Alba Cristhiane Santana - UFG (Gamboa, 2003). Nossa fundamentação
albapsico@gmail.com teórica acerca da mediação pedagógica
Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB parte dos estudos de Vygotsky (2003), os
claudia@unb.br quais enfatizam a importância da relação
Financiamento: PROLICEN/UFG dialógica estabelecida entre professores e

876
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

alunos, e o processo de significação viven- posição assumida pelo professor diante do


ciado no contexto educativo. Diante disto, próprio fenômeno educativo. É necessário
a prática pedagógica dos docentes de um ressaltar que, em sua prática pedagógica,
curso de licenciatura pode contribuir (ou os docentes desenvolvem diversos proce-
não) para o alcance da proposta de arti- dimentos para alcançar seus objetivos e
cular teoria e prática, a depender de suas atender as propostas de cada disciplina,
concepções acerca dessa questão, das me- configurando metodologias de ensino es-
todologias de ensino desenvolvidas e das pecíficas a cada contexto. O professor, ao
especificidades de sua mediação pedagógi- utilizar determinados procedimentos de
ca. Assim, a mediação pedagógica é conce- ensino, como uma aula expositiva ou um
bida como um processo de intervenção de fórum de debate, se fundamenta em um
um elemento intermediário na relação en- método que abrange: as suas concepções
tre os sujeitos e o objeto de conhecimento sobre ensino e aprendizagem, os seus ob-
(Barros, 2006). Esse é um conceito funda- jetivos de ensino e as características dos
mental para a compreensão dos processos conteúdos curriculares trabalhados (Gil,
de aprendizagem e de desenvolvimento 2007). Nessa perspectiva, a formação dos
humano, visto que é por meio de um in- professores assume um papel fundamen-
tenso processo de interação com o meio tal na qualificação do processo educativo,
social, através da mediação feita pelo ou- devendo possibilitar análises e reflexões
tro, que os sujeitos se apropriam dos obje- acerca das finalidades da educação e do
tos culturais e se desenvolvem (Vygotsky, papel do professor e do aluno no proces-
2003). As ações do professor e do aluno so de ensinar e de aprender, além da im-
não ocorrem de maneira isolada, mas, se portância de metodologias de ensino que
convergem, com discussões e trocas que alcancem os objetivos planejados. A meta
podem ou não favorecer o desenvolvimen- deste trabalho é compreender como a prá-
to dos sujeitos. É necessário realçar que a tica pedagógica de docentes de um curso
natureza da relação entre professor, aluno de licenciatura articula as dimensões da
e objeto do conhecimento é, também, afe- teoria e da prática na formação de profes-
tiva e está subordinada, qualitativamente, sores, e favorece o desenvolvimento dos
à mediação vivida pelos sujeitos (Falcin, sujeitos. Este estudo faz parte de um pro-
2006). No espaço educativo, o professor jeto de pesquisa maior, vinculado à Uni-
é o responsável pela mediação entre o versidade Federal de Goiás, desenvolvido
aluno e o conhecimento; ele desempe- a partir do desmembramento da pesquisa
nha o papel de organizador e facilitador de doutorado realizada pela coordenadora
do contexto de aprendizagem, para que do projeto de pesquisa (Santana, 2010), a
o aluno conheça e se aproprie do conhe- qual resultou em um significativo banco de
cimento. A metodologia de ensino é um dados que não foi totalmente analisado. O
elemento facilitador do processo ensino- material empírico a ser analisado abrange
-aprendizagem, que pode contribuir para informações coletadas nas observações
o atendimento dos objetivos planejados; é etnográficas de aulas de um curso de li-
uma ferramenta do professor que, segun- cenciatura, as quais foram registradas em
do Libâneo (2002), envolve o método e as diários de campo, visando investigar as ca-
estratégias de ensino, bem como inclui a racterísticas da prática pedagógica dos do-

877
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

centes. Os resultados das análises parciais LT04-914 - TEORIA E PRÁTICA EM


apontam três eixos interpretativos: (a) sig- UM CURSO DE LICENCIATURA:
nificados contraditórios acerca da teoria e ESTUDO SOBRE AS SIGNIFICAÇÕES NA
da prática; (b) ênfase em procedimentos FORMAÇÃO DE PROFESSORES
de cunho teórico; e (c) significados sobre Pedro Henrique Andrade de Faria - UFG
o desenvolvimento dos discentes: falta de pedrohandradef@hotmail.com
confiança? A partir da observação da prá- Joana Dark Leite - UFG
tica pedagógica dos docentes do curso de joanadarkl@yahoo.com.br
licenciatura, analisamos que é favorecida Alba Cristhiane Santana - UFG
a dicotomização entre as dimensões da albapsico@gmail.com
teoria e da prática, situação que, dentre Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB
outras, dificulta a mobilização de proces- claudia@unb.br
sos de desenvolvimento profissional dos Financiamento: PROLICEN/UFG
discentes. Pensamos que a formação do-
cente deve assumir uma visão global de Este trabalho refere-se a uma pesquisa
desenvolvimento profissional e, nesse sen- que está sendo realizada sobre um curso
tido, a prática dos docentes de um curso de licenciatura e tem como proposta o es-
de licenciatura deve ser pautada em con- tudo das significações e das concepções
cepções que privilegiem a qualificação do relacionadas à articulação entre as dimen-
processo formativo. Nessa perspectiva, a sões da teoria e da prática, nesse contexto
produção de novos significados acerca das formativo, e como tal articulação favorece
dimensões da teoria e da prática é questão o processo de desenvolvimento profissio-
fundamental para a superação de concep- nal dos discentes. A proposta de articular
ções que desvinculam tais dimensões e as dimensões da teoria e da prática na
comprometem o processo ensino-apren- formação docente é um tema recorren-
dizagem, nos contextos de formação de te nas discussões nessa área (Brzezinski,
professores. Entendemos que um curso 2008; Canen & Xavier, 2005; Freitas, 2002;
de licenciatura deve contribuir para que os Libâneo, 2001) e a legislação educacional
professores assumam uma posição ativa em vigência define e orienta que essa ar-
na produção de novos significados acerca ticulação deve ser um dos fundamentos
de sua profissão, os quais possam gerar a das licenciaturas. O artigo 61 da LDB/1996
construção de práticas intencionais e crí- enfatiza a necessidade de “associação
ticas que promovam transformações efe- entre teorias e práticas” (Brasil, 1996); e
tivas no contexto educacional, mas, para o artigo 3° das Diretrizes Curriculares Na-
alcançar tais objetivos, é necessário haver cionais para a Formação dos Professores
investimentos no processo formativo de da Educação Básica ressalta a importância
tais profissionais. da “coerência entre a formação oferecida
e a prática esperada do futuro professor”
Palavras-chave: práticas pedagógicas, (Brasil, 2002). Essa não é uma proposta de
formação de professor, desenvolvimento fácil desenvolvimento visto que, historica-
profissional mente, teoria e prática têm sido objeto de
Contato: Joana Dark Leite, UFG diferentes interpretações, resultando na
joanadarkl@yahoo.com.br elaboração de diversas abordagens. Gam-

878
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

boa (2003) apresenta três abordagens 1997). Nesse sentido, pensando na rele-
que conceituam a relação entre teoria vância de estudos que contribuam com a
e prática, de formas distintas: (a) as que compreensão acerca do processo de for-
privilegiam o papel da teoria, podendo ser mação docente, buscamos compreender
classificadas como ideal-racionalistas; (b) as possibilidades de um curso de licen-
por outro lado, as que enfatizam a prática ciatura desenvolver a articulação entre
como critério para validação da teoria, a as dimensões da teoria e da prática, por
partir de uma concepção pragmático-utili- meio da análise das significações e das
tarista; (c) e, também, a abordagem dialé- concepções que orientam as práticas pe-
tica, a qual não considera a relação entre dagógicas. Entendemos que a articulação
teoria e prática em termos de adequação entre os saberes científicos e os saberes
de uma a outra, mas, de complementa- da experiência qualifica a formação dos
ção e de conflito, considerando que “é a professores, e proporciona a mobilização
própria relação entre elas que possibilita de processos de desenvolvimento profis-
sua existência” (p.125). Na perspectiva sional dos discentes, ao gerar reflexões
dialética, a relação entre teoria e prática e ressignificações acerca do processo de
é mais complexa que uma relação de im- ensinar e de aprender. Neste estudo ado-
plicação causal, na qual os saberes cien- tamos uma metodologia qualitativa, que
tíficos mantêm uma relação constitutiva concebe o processo investigativo a partir
com os saberes da experiência. E partindo da indissociação entre a fundamentação
dessa discussão, é relevante desenvolver teórica do estudo e os métodos de cons-
estudos que busquem compreender as trução e análise dos dados (Ludke & An-
concepções assumidas na tarefa de articu- dré, 1986). É um processo de investigação
lar teoria e prática nos cursos de formação que se caracteriza por: (a) ser construtivo-
docente. Acreditamos que os contextos -interpretativo na construção do conhe-
sócio-culturais sejam constituídos por um cimento; (b) contar com um instrumento
conjunto de regras, concepções, crenças visto de forma vinculada aos procedimen-
e valores que orientam a ação humana, tos, cujo papel é o de facilitar a expressão
um sistema semiótico compartilhado por dos participantes, por meio de estratégias
pessoas de um mesmo cenário social e interativas planejadas para o desenvolvi-
histórico (Bruner, 1997). Por isso, adota- mento da pesquisa (González Rey, 2005).
mos o conceito de significação, tal como Nosso estudo está vinculado a um projeto
desenvolvido por Vygotsky (2000) e Bru- de pesquisa maior, desenvolvido na Uni-
ner (1997) e, assim, o significado é visto versidade Federal de Goiás, a partir do
a partir de uma natureza relacional e pro- desmembramento da pesquisa de dou-
duzido nos processos sociais de interação torado realizada pela coordenadora do
humana. Nas relações interpessoais os projeto (Santana, 2010), a qual resultou
sujeitos negociam as interpretações que em um expressivo banco de dados, que
fazem do mundo e de si próprios, ou seja, devido ao grande número de informações
as negociações referem-se ao estabeleci- construídas não foi totalmente explorado.
mento de combinações numa mútua par- O material empírico analisado abrange
tilha de pressupostos e convicções sobre informações coletadas em entrevistas se-
como a realidade é percebida (Bruner, miestruturadas com quatro docentes de

879
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

um curso de pedagogia de uma Institui- pedagógica e que podem ou não favore-


ção de Ensino Superior pública do estado cer o desenvolvimento dos seus alunos.
de Goiás e em uma entrevista em grupo
Palavras-chave: teoria e prática, formação de
com nove discentes do referido curso. Ain-
professor, processos de significação
da é objeto de análise a matriz curricular
Contato: Pedro Henrique Andrade de Faria,
do curso de pedagogia e as ementas das
UFG, pedrohandradef@hotmail.com
disciplinas, visando identificar a forma
como as dimensões da teoria e da prática
são consideradas na organização curricu-
LT04-919 - CAMPO E EDUCAÇÃO
lar do curso. As análises iniciais apontam
INFANTIL: CONCEPÇÕES DE FAMÍLIA
três eixos interpretativos, a saber: (a) o
E CRECHE NA PERSPECTIVA DE UM
dos significados que dicotomizam teoria e
CASAL DE PAIS MORADORES DE UM
prática; (b) o da contradição acerca de as-
ASSENTAMENTO RURAL.
pectos teórico-metodológicos do curso; e
(c) o dos espaços férteis para qualificação Leticia Verardi Madlum - FFCLRP-USP
do processo formativo. Observamos que leticiaverardi@terra.com.br
os significados produzidos no curso acer- Ana Paula Soares da Silva - FFCLRP-USP
ca da teoria e da prática comprometem a apsoares.silva@gmail.com
proposta de articulação de tais dimensões Financiamento: FAPESP
no processo formativo, pois, na medida
em que as pessoas as percebem de for- No Brasil, em meados de 1920, com a ur-
ma desvinculada, a tendência é trabalhá- banização, industrialização e entrada da
-las, também, de forma desvinculada. No mulher no mercado de trabalho, surgem
entanto, também, identificamos espaços práticas coletivas, públicas e instituciona-
de negociação de significados que possi- lizadas de cuidado das crianças pequenas,
bilitam alcançar os objetivos de uma for- com o intuito de assistir aos pais trabalha-
mação que contribua, efetivamente, com dores na educação de seus filhos (Oliveira,
o desenvolvimento docente. Entendemos 2005). Na década de 1990, a Lei n. 9.394,
que a teoria não se configura em uma so- de 20 de dezembro de 1996 – Lei de Dire-
lução, explicação ou diretriz pronta para trizes e Bases da Educação Nacional [LDB]
guiar as situações da prática. A formação – define a inserção das creches e pré-es-
docente pode e deve possibilitar espaços colas no sistema de ensino, atribuindo às
de troca entre as pessoas, onde cada uma instituições de educação infantil, além do
possa relacionar teoria e prática, além de compartilhamento da educação da crian-
produzir conhecimentos teórico-práticos ça com a família, a função de promoção
que favoreçam a ação docente. Ao favore- do desenvolvimento das crianças. Com
cer a ação docente nos cursos de formação esse movimento de mudança no papel da
de professores, criam-se possibilidades de creche, ela distancia-se de uma concep-
mobilizar processos de desenvolvimento ção fundada na educação compensatória
profissional nos discentes. Nesse cenário, e assistencialista, e passa a ser compreen-
é fundamental que os futuros professores dida como lugar de formação das crianças
tenham clareza acerca dos processos que e espaço privilegiado para a promoção
podem ser desencadeados pela mediação da interação entre elas. Com identidade

880
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

própria, a creche complementa a ação da de um contexto histórico-cultural, que de-


família na educação integral da criança. limita possibilidades de interação, favore-
Nesse contexto, embora de origem urba- cendo determinados sentidos e significa-
na, atualmente, as creches e pré-escolas dos. Dessa forma, entende-se o meio tan-
se constituem como um direito social dos to como campo de aplicação de condutas,
trabalhadores, sejam eles urbanos ou ru- quanto condição e recurso de desenvol-
rais e, principalmente, como direito às vimento. O instrumento utilizado para a
crianças, estendendo-se às que vivem nos construção do material empírico foi a en-
territórios rurais. Esse fato requer aten- trevista; a partir dela, foi possível acessar
ção quanto a possíveis especificidades do os recortes que cada pessoa, baseada nas
atendimento para essa população. Desde suas histórias, fez da relação com a família
2002, vêm sendo publicadas regulamenta- e com a creche. A entrevista foi realizada
ções com o intuito de orientar as políticas com um casal de moradores do assenta-
e propostas pedagógicas das instituições mento há sete anos. Ambos trabalham no
educacionais do campo, inclusive, as da lote, sendo que o pai atua como monitor
Educação Infantil. Apesar dos avanços na do ônibus escolar que conduz as crianças
legislação, dados mostram que as crianças do assentamento até as instituições esco-
de 0 a 3 anos de idade não estão sendo lares localizadas na cidade. Eles têm cin-
atendidas ou estão sendo atendidas na ci- co filhos, com idades entre 3 e 20 anos;
dade, e que a taxa de freqüência das crian- quatro deles moram na casa e uma reside
ças de 0 a 3 anos na Educação Infantil é de na cidade. Nenhum dos filhos frequentou
6,83% para as oriundas de área rural; na creche. A entrevista foi realizada na casa
área urbana esse número sobe para 54% da família, localizada em um assentamen-
(PNAD, 2008). Partindo da discrepância to rural no interior de São Paulo. A área
entre o atendimento às crianças urbanas e onde se situa o assentamento foi ocupa-
do campo, faz-se presente a necessidade da em 2003, sendo oficializada pelo Incra
de compreender os fatores que influen- em 2007. O assentamento é vinculado a
ciam nas escolhas das famílias do campo, um movimento social de luta pela terra
que tenham crianças de 0 a 3 anos, pela e é constituído por, aproximadamente,
Educação Infantil. Nesse sentido, o obje- 260 famílias, que utilizam os serviços de
tivo deste trabalho é compreender os pa- educação da área urbana, já que o assen-
péis que são atribuídos à família e à cre- tamento não possui escolas e creches em
che por um dos casais de pais investigados seu território. A partir da entrevista, foram
na pesquisa de iniciação científica: “Famí- selecionados trechos que contribuiriam
lias moradoras em assentamento rural: para a compreensão de como esses pais
significações de creche e escolhas dessa vêem a creche e a família com relação ao
modalidade de educação para seus filhos cuidado e educação de crianças pequenas.
de 0 a 3 anos de idade”. O referencial teó- A principal idéia que aparece é a de que a
rico que norteia o trabalho é a perspectiva inserção da criança na instituição está vin-
da Rede de Significações (RedSig) que, por culada à necessidade da família. A creche
conceber o homem a partir de sua mate- assumiria papel importante no processo
rialidade, compreende que ele se constitui de aprendizagem dos pais no cuidado de
nas e pelas relações estabelecidas dentro seus filhos, particularmente, para aqueles

881
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que apresentam dificuldades. Outra con- criança parece ser um passo importante
cepção presente é a da creche como um nessa rede de significações que delimita e
recurso para aqueles que não têm con- promove condições peculiares de desen-
dições de ficar com seus filhos em casa, volvimento e, também, que ajudariam a
pois, precisam trabalhar fora. A família dar visibilidade às necessidades e deman-
recebe o status de principal responsável das das famílias do campo.
pelo cuidado e a educação da criança de 0
a 3 anos, sendo este modelo considerado Palavras-chave: educação infantil,
o ideal pelos entrevistados. As falas suge- assentamento rural, creche
rem uma visão de instituição que se ba- Contato: Letícia Verardi Madlum, FFCLRP-USP,
seia no direito social do trabalhador, que leticiaverardi@terra.com.br
precisa do emprego e não tem com quem
“deixar” o filho, e no direito da criança no
que concerne ao cuidado desta, para que LT04-922 - BULLYING E SUA
tenha assistência durante a jornada de INTERFERÊNCIA NO PROCESSO
trabalho dos pais. A creche assume, as- EDUCACIONAL
sim, um caráter de compartilhamento so- Tamara Correia Alves Campos - UnB
cial, exercendo a mesma função da família tamara.cac@hotmail.com
quando esta não pode exercê-la. Quando
questionados sobre uma possível escolha O bullying é definido como uma agressão
pela creche caso ela existisse no próprio física ou psicológica, intencional e repetiti-
assentamento, o casal modifica seu dis- va que acontece, principalmente, no am-
curso sobre essa instituição no diálogo biente escolar. Essa agressão é perpetuada
com uma creche imaginária que atenda por pessoas que impõem um nível de po-
as necessidades das famílias do campo. der maior do que o do agredido e, muitas
Naquela concepção de creche, está au- vezes, o bullyng é confundido como uma
sente a complementariedade pedagógica brincadeira inocente. Verificam-se casos
e educativa, o que tem efeito nos sentidos de bullying em indivíduos que fogem de
sobre a própria identidade da creche en- padrões ditados pela sociedade. O proble-
quanto instituição educacional legítima, ma que se confere desse ato violento é a
que promova contextos de interação e de- questão da estigmatização do acometido
senvolvimento distintos do núcleo fami- que, muitas vezes, se sente impossibilita-
liar e que se constitua, portanto, como um do de reagir às provocações e de superá-
direito da criança. Nessa concepção, está -las, tornando o ambiente escolar ameaça-
presente o direito a uma especificidade no dor, ambiente esse responsável em formar
cuidado e na educação da criança dos ter- indivíduos aptos a se comportarem no
ritórios rurais. Esses sentidos sobre a cre- meio social. Entretanto essa situação não
che e a família falam sobre as expectati- é muito dimensionada, já que o objetivo
vas de aprendizagens e desenvolvimentos primordial é passar o conteúdo escolar
desse casal, construídas na relação entre sem se preocupar com as relações inter-
suas histórias e experiências, suas condi- pessoais; porém, o desempenho positivo
ções atuais concretas e na cultura de seus dos alunos só se torna possível quando
grupos. Compreender como concebem a há o mínimo de aparato. Visto a magni-

882
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tude dessa problemática, decidiu-se de- mais comuns, levando-se em consideração


senvolver o trabalho com escolares, pais as respostas dos discentes que já sofreram
e professores, aplicando-se questionários bullying, foram: raiva, desejo de vingança
para visualizar e relacionar à problemáti- e tristeza, tendo percentuais de 50,79%,
ca. Tem-se como objetivo abrangente do 34,92%, 34,92%, respectivamente. As res-
estudo identificar o conhecimento de pra- postas daqueles que afirmaram que não
ticantes e/ou agredidos sobre o bullying, sofreram bullying ficaram concentradas
além de evidenciar pais e professores, a nos sentimentos de brincadeira, obtendo
fim de dimensionar a situação. Esse tra- percentagens de 48,78%. Os sentimen-
balho foi desenvolvido em duas escolas tos citados pelos alunos que já sofreram
de Brasília-DF – uma de iniciativa pública bullying são muito preocupantes, pois, po-
e outra privada, pois se conjecturou que dem desencadear comportamentos extre-
a prática do bullying independe da classe mos, como homicídios e suicídios. Ficou
social – de junho de 2010 até o início de nítido, também, que os que não tiveram
agosto do mesmo ano, com intuito de co- experiência com esse ato, não têm consci-
nhecer a realidade atual das duas escolas. ência da gravidade e da amplitude do pro-
O estudo foi baseado na abordagem quan- blema. Essa afirmativa se confirma pelo
ti-qualitativa. Nas escolas, foram anexados fato de que, entre os alunos praticantes,
cartazes e distribuídos folders de caráter 47% afirmaram sentir satisfação ao prati-
informativo, para pais, definindo o que é car e não dimensionarem o que a pessoa
bullying, as formas de ocorrência da prá- agredida poderia sentir. Relacionaram-se,
tica do ato e as possíveis conseqüências também, 49,2 alunos que já sofreram e
e intervenções. Foram aplicados questio- praticaram bullyng, simultaneamente, po-
nários para alunos com idades de 10 a 15 dendo ser hipotetizado como um ato de
anos, pais e professores, além de realizada vingança, enquanto 75,6% dos que não so-
uma roda de conversa com os docentes, freram afirmaram não ter praticado. Ana-
a fim de planejar ações educativas. Res- lisando mais profundamente os dados, o
ponderam aos questionários 104 alunos, bullying se mostrou um ciclo vicioso, em
20 professores e 20 pais. Como parte dos que aqueles que já sofreram sentem ne-
resultados verificou-se que, realmente, cessidade de revidar o comportamento,
em escolas públicas e privadas, a prática enquanto aqueles que não passaram por
de bullying independe da classe social, já essa situação não sentem necessidade de
que 59,61% e 61,53%, respectivamente, continuar o ciclo. A pesquisa não se res-
afirmaram terem sido alvo da prática de tringiu a alunos, pois, a formação e capa-
bullying. A partir desse percentual eleva- cidade de interação sócio-cultural sofrem
do, considerou-se a necessidade de anali- forte influência do ambiente em que se
sar a seguinte pergunta: “Se você já sofreu vive e dos grupos formadores de opiniões,
ou não bullying, o que sentiu ou sentiria?” nesse caso, principalmente, pais e profes-
As alternativas eram: raiva, desejo de vin- sores. Com relação ao questionário que
gança, não sentiu nada, tristeza, simples- abarcou, no total, 20 professores das duas
mente uma brincadeira, se isolou/isolaria, instituições, verificou-se que todos tinham
sendo frisado que os aluno poderiam mar- ciência do conceito de bullying e 90% de-
car mais de uma opção. Os sentimentos les já presenciaram esse tipo de agressão.

883
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Entretanto, 65% tinham consciência que o mento superficial ou, até mesmo, a falta
problema necessita de ações educativas e dele. Entretanto uma diminuição significa-
25% achavam que é normal no cotidiano tiva disto pode ser possível com a realiza-
escolar. Muitos deles relataram que fal- ção de ações educativas, incluindo dinâmi-
tam projetos que os motivem e orientem cas, a fim de interagir pais, professores e
de forma correta, dificultando muito sua alunos para o alcance de uma verdadeira
atuação. A realidade se restringe a seguir educação de qualidade, por conseguinte,
o calendário programático e realizar com uma melhor inserção social.
êxito a aprendizagem dos alunos, ou seja,
se importam muito mais com o conheci- Palavras-chave: bullying, alunos, inserção
mento formal, não refletindo que apenas social
o conhecimento acadêmico não tem ser- Contato: Tamara Correia Alves Campos, UnB,
ventia se o aluno não conseguir aplicá-lo tamara.cac@hotmail.com
socialmente. O caso de bullying não tem
que ser visto como algo isolado, que não
vá repercutir futuramente, pois, ele é ca- LT04-1014 - A IMPORTÂNCIA DA
paz de desenvolver e agravar transtornos. EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NO
Então a figura do professor não se restrin- DESENVOLVIMENTO DO JOVEM
ge em compartilhar conhecimentos; ela PROFISSIONAL: UMA EXPERIÊNCIA
vai muito além, pois, ele precisa ser como JUNTO A PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO
psicólogo, conciliador e pai dos horários INFANTIL
letivos. Por isso, nesse projeto, também Fernanda Pavão Corrêa - UFTM
foram considerados os professores, atra- fernandinha_pavao@hotmail.com
vés uma de roda de conversa, para com- Caroline M. P. Alves - UFTM
preenderem mais claramente causas e carolmartins4@gmail.com
conseqüência, de problemas imediatos Letícia B. Elias - UFTM
até traumas futuros. Com relação aos le_billiejoe@hotmail.com
questionários aplicados com os pais, foi Nayara Fileni Prodócimo - UFTM
possível inferir que a maioria (70%) não nah_prodocimo@hotmail.com
sabia o que era bullying; mesmo depois Conceição Aparecida Serralha - UFTM
do esclarecimento, grande parte afirmou serralhac@hotmail.com
que seus filhos não eram vítimas dessa Jéssica Bezerra Soares - UFTM, MEC/SESu/DIFES
agressão, sendo que, em média, 61% dos jessicabsoares@hotmail.com
alunos afirmaram terem sofrido, ou seja,
isso mostra que não há uma relação efe- A extensão universitária tem se apresenta-
tiva de cuidado. Por isso foi desenvolvido do como uma possibilidade de constituição
um folheto que informava, aos pais, sobre profissional e cidadã, ao conectar a univer-
o que é bullying, como é praticado, suas sidade com as necessidades da população
consequências e soluções. Obtiveram-se (Ribeiro, 2009). Uma das características da
resultados que confirmam que a prática extensão é o fato de proporcionar uma du-
de bullying é algo que já faz parte do co- pla formação, ou seja, além da formação
tidiano escolar e, diversas vezes, o proble- dos membros da comunidade a quem se
ma não é dimensionado por um conheci- dirige o trabalho do projeto, há também a

884
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

formação dos próprios extensionistas (Ar- Esses relatos foram lidos inicialmente em
royo & Rocha, 2010). Além disso, a exten- profundidade, levantando-se as principais
são possibilita a troca de conhecimentos percepções e reflexões realizadas. Nessa
entre a comunidade acadêmica e a popu- análise, ficou clara a percepção dos exten-
lação, e também a divulgação dos conhe- sionistas da importância do conhecimento
cimentos obtidos durante a execução do da demanda de cada instituição, buscando
projeto em eventos científicos (Fernandes; respostas de acordo com as necessida-
Alves & Nitschke, 2008; Ponte; Torres; Ma- des demonstradas: “Com o projeto pude
chado & Manfrói, 2009). Os jovens adul- perceber a importância de se conhecer
tos, ao ingressarem na universidade, cada a comunidade com a qual se trabalha, o
vez mais se vêem diante da necessidade que fica provado pelo fato de que nas ins-
de integrar e discutir conteúdos teóricos tituições surgiram diferentes queixas, que
a partir de práticas reais ou simulações da acabavam orientando os encontros para
vida profissional, visando o “aprender a fa- rumos distintos...” (Graduanda A). No iní-
zer”, não aceitando passivamente a teoria cio, foram destacadas algumas dificulda-
que lhes é apresentada. Esse contexto tem des, como ansiedade e insegurança de se
promovido uma formação crítica, reflexiva perder ou não saber o que falar diante de
e atenta para as necessidades sociais. Esta alguma situação. Contudo, de acordo com
última diz respeito não somente ao profis- o relato dos estudantes, à medida que
sional, mas também ao desenvolvimento eles passaram a lidar diretamente com as
do aluno como pessoa, como cidadão, ou professoras e educadoras das instituições,
seja, uma formação mais ampla. O presen- tiveram de se adaptar a situações inespe-
te trabalho tem como objetivo destacar as radas. Durante o projeto realizado, foi pos-
percepções e reflexões de graduandos em sível observar certas aquisições importan-
Psicologia de uma universidade pública tes para a constituição das competências
da região do Triângulo Mineiro (MG) en- dos discentes envolvidos: (a) habilidade
volvidos diretamente na execução de um da utilização dos conhecimentos ante-
projeto de extensão com educadores, so- riormente adquiridos para a realização
bre a importância dessa experiência para das atividades; (b) adaptação na maneira
o desenvolvimento profissional e pessoal de agir dos integrantes da extensão, de
destes. O projeto, executado por esses acordo com a realidade específica de cada
graduandos – discentes do terceiro ao instituição; (c) capacidade de socializar-
quinto período – e uma docente do cur- -se, desenvolvida ao longo dos encontros,
so de Psicologia, discutiu a temática da no contato com os educadores e também
agressividade na primeira e na segunda entre o próprio grupo de alunos durante
infância com grupos de profissionais da o desenvolvimento das atividades propos-
educação infantil. Para alcançar o objetivo tas; (d) capacidade de enfrentar situações
proposto neste estudo, foram analisados não programadas. Esse enfrentamento de
qualitativamente os pareceres individuais situações reais foi de grande importância
(relatos) dos extensionistas, registrados para o amadurecimento dos estudantes
de forma escrita e obtidos após o térmi- como pessoas e também como profissio-
no da execução do projeto, durante dis- nais, desenvolvendo, assim, a capacida-
cussões realizadas entre os participantes. de de pensar, de interagir com a realida-

885
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de e de serem críticos. Segundo Gondim LT04-1017 - DIALOGANDO COM


(2002), esta maturidade é necessária e de EDUCADORES SOBRE AGRESSIVIDADE
extrema importância para agir em situa- VISANDO AO DESENVOLVIMENTO
ções de imprevisibilidade. (Alves, Serralha, DA CRIANÇA E A PREVENÇÃO DA
Scorsolini-Comin, Corrêa, Soares & Miare- VIOLÊNCIA.
li, no prelo). Nos encontros os alunos pas- Nayara Fileni Prodócimo - UFTM
savam as informações que possuíam e as nah_prodocimo@hotmail.com
discutiam, associando-as com a realidade Carolina Martins Pereira Alves - UFTM
trazida pelos educadores, o que pôde le- carolmartins4@gmail.com
var estes últimos a refletir e repensar sua Fernanda Pavão Corrêa - UFTM
prática profissional, evidenciando, para os fernandinha_pavao@hotmail.com
extensionistas, a importância de sua atu- Letícia Bianquini Elias - UFTM
ação na possível mudança de visão dos le_billiejoe@hotmail.com
educadores. A realização do projeto con- Jéssica Bezerra Soares - UFTM, MEC/SESu/
tribuiu também para o conhecimento e o DIFES
desenvolvimento da prática com grupos. jessicabsoares@hotmail.com
Desse modo, a execução do projeto possi- Conceição Aparecida Serralha - UFTM
bilitou reflexões acerca tanto do processo serralhac@hotmail.com
de desenvolvimento pessoal dos extensio-
nistas, como dos desafios profissionais en- De acordo com a teoria psicanalítica win-
frentados na prática com os professores e nicottiana do amadurecimento humano
educadores das comunidades atendidas. A (Winnicott, 1988/1990), compreende-se
prática possibilitou uma troca recíproca de a agressividade como pertencente à na-
saberes entre os extensionistas e a comu- tureza humana, sendo passível de sofrer
nidade, além de lhes oferecer oportuni- influências do ambiente para o grau e o
dade de se colocarem e mostrarem o seu modo como se manifesta. Sendo assim,
ponto de vista ao aplicar as teorias no seu há a possibilidade de a agressividade in-
dia-a-dia, sendo o grupo um espaço privi- tensificar-se de forma negativa, causando
legiado para a instilação desses aspectos. prejuízos na vida do indivíduo e em suas
É possível afirmar, assim, que a experiên- relações sociais, caso as interações com o
cia de extensão possibilitou o aprimora- ambiente não atendam às suas necessida-
mento da formação profissional, de forma des (Winnicott, 1987/1999). Essas intera-
a melhor capacitá-los para a execução de ções, principalmente no início da vida, se
seu trabalho. Possibilitou, também, que os dão de forma prioritária com a figura ma-
alunos se sentissem responsáveis por pro- terna, que não precisa ser necessariamen-
moverem uma transformação na comuni- te a mãe biológica, mas qualquer pessoa
dade, o que os deixou mais seguros de sua sensível que se disponha a cuidar do bebê.
identidade de futuros psicólogos. Nos vários contextos atuais, são encontra-
das diferentes formas de organização fa-
Palavras-chave: Extensão universitária, miliar e de ampliação no fornecimento de
Psicologia, Narrativas cuidados, sendo o papel materno muitas
Contato: Fernanda Pavão Corrêa, UFTM, vezes complementado por outras figuras,
fernandinha_pavao@hotmail.com como, por exemplo, professores e educa-

886
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dores, no cuidado a crianças de até seis so de Psicologia, que inicialmente elabo-


anos de idade. Este trabalho pretende rou três palestras sobre os temas: “O que
relatar e analisar qualitativamente os re- é agressividade”, “Origens da Agressivida-
sultados finais da execução de um proje- de” e “Lidando com a Agressividade”; as
to de extensão, que foi construído ao se palestras foram ministradas, nos CEMEIs,
levar em conta essas características rela- em três encontros de duração aproxima-
cionadas à agressividade e a importância da de duas horas, ao final do turno de
da participação dos professores e edu- trabalho dos profissionais da instituição,
cadores no desenvolvimento global das em período pré-agendado e destinado à
crianças. O projeto teve como propósito educação continuada destes; houve pro-
auxiliar esses profissionais a compreende- jeção de slides e filmes, realização de di-
rem melhor a agressividade no ser huma- nâmicas e concessão de tempo para dis-
no, seus diferentes tipos de manifestação cussões e trocas de experiências entre os
e motivações, suas bases e contextos de participantes. Ao final, foi contabilizada
ocorrência, bem como de discutir sobre in- a participação de 185 pessoas. Embora a
tervenções mais adequadas por parte dos participação dos profissionais em todas
educadores, de acordo com as competên- as instituições tenha superado a marca
cias profissionais de cada um, no cuidado de 80 % de seus membros, puderam ser
e prevenção de problemas relacionados constatados a dificuldade e o esforço de
à agressividade, evitando o agravamento todos para manterem-se participativos
de situações conflituosas. As discussões e atentos, após um dia inteiro de traba-
visaram ainda orientar possíveis encami- lho. Contudo, o período para a execução
nhamentos a outros serviços, em casos foi escolhido pelas próprias diretoras das
de agressividade mais elevada na criança instituições, que alegaram ter experiência
e, de forma geral, possibilitar a melhora suficiente para saber que a adesão seria
das relações interpessoais, a promoção da mínima caso os encontros fossem marca-
saúde física e psíquica da comunidade e a dos em horários em que os profissionais já
prevenção da violência, criando condições estivessem desligados e afastados de suas
favoráveis para o desenvolvimento saudá- atividades na instituição. Apesar dessas
vel da criança. Além disso, pretendeu-se dificuldades iniciais, pôde ser percebido o
que os discentes pudessem estabelecer crescente envolvimento de todos os par-
contato com os problemas da comunida- ticipantes nos diálogos, a partir da base
de e fazer atuações significativas nesta. A teórica – winnicottiana – muito pertinente
análise dos resultados do projeto abrange às experiências vividas em seu cotidiano
a execução deste em oito Centros Munici- familiar e escolar. Foi possível perceber
pais de Educação Infantil (CEMEIs) e uma que a sensibilização dos educadores em
creche filantrópica do município de Ube- relação aos temas levantados levou-os a
raba, que têm sob seus cuidados crianças reconhecer sua própria importância no
entre 0 e 6 anos de idade. Para compre- que tange ao cuidado das crianças sobe
ensão da análise realizada é importante sua responsabilidade durante o período
relatar os componentes metodológicos do escolar, podendo intervir com mais con-
projeto: a equipe executora foi composta fiança em situações de agressividade, que
por sete discentes e uma docente do Cur- antes não eram capazes de lidar. “Pude

887
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

compreender melhor sobre o comporta- ção também pessoal que os tornem mais
mento humano na infância, o que mu- preparados para atuar como profissionais
dou a minha maneira de lidar com meus no futuro (Alves, Serralha, Scorsoloni-Co-
alunos em sala de aula. Porque vejo que min, Pavão, Soares & Miareli, no prelo).
o professor tem uma tendência em punir Assim, a experiência de extensão permite
o aluno agressivo sendo também agres- que os discentes, desde os períodos ini-
sivo com ele. Contudo, tendo em vista os ciais da graduação, se habilitem a atuar
conhecimentos adquiridos neste módulo diante de uma comunidade marcada por
percebi as causas da agressividade e cami- singularidades e ao mesmo tempo por
nhos para melhor trabalhá-la.” (Professo- problemas comuns à sociedade como
ra participante). Os diálogos permitiram o um todo. Na execução deste projeto, em
compartilhamento de dúvidas e angústias particular, tanto os educadores das insti-
que muitas vezes impedem uma compre- tuições atendidas quanto os futuros pro-
ensão mais objetiva das origens dos com- fissionais de Psicologia puderam discutir
portamentos agressivos da criança. Além sobre os aspectos da agressividade que
disso, a sensibilização demonstrada pelos dificultam o desenvolvimento da criança
profissionais foi importante, pois são eles e pensar meios de facilitarem esse desen-
que possibilitarão a repercussão do proje- volvimento, levando em conta a diversida-
to na comunidade, por meio de práticas e de cultural.
intervenções diferenciadas com os alunos
e seus familiares. A teoria winnicottiana Palavras-chave: Agressividade,
forneceu uma visão mais profunda acer- Desenvolvimento da criança, Escola.
ca dos problemas cotidianos enfrentados Contato: Nayara Fileni Prodócimo, UFTM,
na escola, dos afetos interpessoais, o que nah_prodocimo@hotmail.com
os instigou a buscarem novas formas de
exercício de seus papéis tanto profissio-
nais quanto familiares. Quanto aos dis- LT04-1065 - OUTRAS QUESTÕES QUE
centes que participaram do projeto, estes PODERÍAMOS SABER SOBRE CLASSE
puderam aumentar seus conhecimentos HOSPITALAR
sobre o tema da agressividade, sobre as Kathelem de oliveira dos Santos França - UnB
diferenças culturais e sociais na comuni- kathelemf@yahoo.com.br
dade e também integrar e discutir os con- Patrícia C. Campos-Ramos - UnB
teúdos teóricos a partir de práticas reais
e simulações da vida profissional, visando Fazem parte de nossas rotinas diárias, as-
à complementação entre teoria e prática pectos físicos, sociais e afetivos. Quando
(Lima, 2005). Desse modo, os graduandos estas rotinas são quebradas, levando-se
desenvolveram sua capacidade de identi- em consideração a hospitalização, princi-
ficar problemas, discuti-los e até apresen- palmente, durante a infância, gera-se uma
tar propostas para a resolução destes. A ruptura inesperada de vínculos sociais e
extensão, de modo geral, proporciona aos afetivos. Juntamente, o fator doença traz,
estudantes uma formação diferenciada, consigo, procedimentos que invadem o
complementando seu desenvolvimento espaço social, conduzindo o paciente à
acadêmico e proporcionando uma forma- sensação de insegurança e isolamento.

888
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Tais questões podem, ainda, contribuir evidencia a importância da busca pela dis-
para um não ajustamento da criança ao cussão sobre a continuidade do processo
ambiente escolar. A hospitalização de de escolarização da criança hospitalizada,
crianças em processo de escolarização e bem como a oferta de outras atividades,
a atuação do pedagogo no ambiente hos- procedimentos e estratégias curriculares
pitalar são temas que tomam proporções e/ou extracurriculares mais apropriadas
significativas na literatura, por tratarem às necessidades da criança hospitalizada.
de uma temática discutida no âmbito da A releitura foi realizada sob uma ótica
inclusão escolar. Percebe-se, no entanto, a qualitativa, com vistas à observação de in-
necessidade de maior divulgação de estu- formações ilustradas por meio de quadros
dos relacionados à permanência da crian- descritivos e históricos de casos específi-
ça no ambiente hospitalar, bem como sua cos. Como parte importante da metodo-
ruptura no processo escolar, que são de logia adotada neste estudo, foi focalizada
suma importância, pois, almejam propor- a observação de crianças hospitalizadas
cionar uma adequada inclusão educacio- que, no momento da construção das in-
nal de crianças e adolescentes hospitali- formações, estavam em idade escolar e
zados. Considerando a dialógica saúde/ com processo de escolarização interrom-
educação e os desafios de interação des- pido devido à hospitalização. Participaram
tas áreas, o presente estudo parte do in- do estudo crianças oriundas de escolas da
teresse pelo tema classe hospitalar, tendo rede de ensino público ou particular do
por base a percepção de crianças hospita- Distrito Federal e de cidades do Entorno.
lizadas e de seus cuidadores, em relação à No momento da pesquisa foi solicitada a
intervenção do pedagogo neste ambiente, colaboração de cuidadores responsáveis
prioritariamente marcado pela presença por estas crianças e das próprias crianças.
de profissionais de saúde. Neste sentido, Nos resultados foi possível perceber que
a presente pesquisa teve por objetivo ge- o trabalho realizado em classe hospitalar
ral identificar efeitos da hospitalização na implica o favorecimento da criação e ou
vida escolar das crianças, da perspectiva fortalecimento de laços afetivos entre a
dos seus cuidadores e da própria crian- criança e seu cuidador. Nos relatos dos
ça, e por objetivos específicos: conhecer cuidadores foram observados sentimen-
percepções dos cuidadores e das próprias tos em relação às situações vivenciadas no
crianças, a respeito da dialógica educação período de hospitalização da criança e que
e saúde e como a educação tem se prepa- neste momento, a criança e seu cuidador
rado para atender a criança em momentos necessitam de um espaço de escuta que
de hospitalização. O estudo foi realizado a valorize o resgate da própria história, pois,
partir da reavaliação e releitura de infor- no ambiente hospitalar, na maior parte
mações obtidas para um trabalho de es- do tempo, não é possível se preservar a
tágio realizado no ano de 2003, como exi- intimidade familiar. Foi possível perceber,
gência parcial para conclusão do curso de também, o papel inclusivo de atuação do
Pedagogia na habilitação Ensino Especial. pedagogo frente a uma adequada escuta
Tendo, no momento do presente estudo, pedagógica à criança hospitalizada, facili-
foco de análise na inclusão e na atuação do tando que a criança esteja ciente e com-
pedagogo no ambiente hospitalar, pois, se preensiva do que acontece no hospital.

889
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Portanto, o pedagogo deve ter, em sua criança hospitalizada, proporciona o pro-


atuação, a preocupação de proporcio- cesso inclusivo, e conduz a uma percepção
nar o resgate da identidade da criança e de que ainda existe um longo caminho a
de seus cuidadores. Outro aspecto a ser ser percorrido até a efetiva e adequada
considerado diz respeito à construção de inclusão escolar da criança hospitalizada
meios que favoreçam a criança a aquisi- sendo, também, preciso alcançar objeti-
ção da segurança e confiança em relação vos de sensibilização neste ambiente, que
à equipe hospitalar, uma vez que foi possí- vão além da alfabetização. Atualmente
vel perceber a valorização dos cuidadores percebe-se a necessidade da ampliação
em relação ao serviço prestado na classe do atendimento escolar no ambiente hos-
hospitalar. A ruptura do processo esco- pitalar, por meio do caráter pedagógico
lar torna-se significativo para a criança e e a prática de uma escuta sensível. Com
seus cuidadores, pois, de modo geral, a este estudo pretendemos contribuir para
permanência da criança na escola é mar- a reflexão acerca de práticas inclusivas no
cada por um período de descobertas, re- ambiente hospitalar, visando à abertura
descobertas, significação e re-significação de novos leques.
de conceitos e a ocorrência da hospitali-
zação na idade escolar ocasiona um brus- Palavras-chave: Classe hospitalar, crianças
co rompimento do processo da própria hospitalizadas, cuidadores
construção da infância. Desta forma faz-se
necessário o atendimento na modalidade
classe hospitalar, por se tratar de um mo- LT04-1211 - A PARTICIPAÇÃO DAS
FAMÍLIAS NO PROCESSO DE INCLUSÃO
mento particular de vida da criança e de
EDUCACIONAL DE ALUNOS NEE SEM
seus cuidadores, pois, os mesmos passam
DIAGNÓSTICO
a vivenciar a exclusão de diversos contex-
tos sociais. Sendo assim o hospital pode Tânia de Sousa Lima - UAB/UnB
ser considerado um novo lócus de aten- tanialli@yahoo.com.br
dimento educacional, que deve priorizar Patrícia Cristina Campos Ramos - UnB
a inclusão. Em geral, a hospitalização im- pcamposramos@uol.com.br
põe limites à socialização e às interações Peterson Trindade dos Santos - SEE/DF – UCB
da criança, impondo o seu afastamento da petersonbsb@ig.com.br
escola, dos amigos, da rua e de casa, além Financiamento: CNPq
de regras sobre o corpo, a saúde, o tempo
e o espaço. A hospitalização na infância Escola e família são contextos interrela-
representa, na maior parte das vezes, o cionados, agindo como propulsores ou
impedimento total ou parcial das opor- inibidores do desenvolvimento infantil.
tunidades de ser uma criança. Tais impe- Nos últimos anos, ações de educadores
dimentos ocorrem devido às restrições e familiares promovem a inclusão escolar
ambientais ou, mesmo, pelas condições de pessoas com necessidades educacio-
adversas como uma inabilidade para usar nais especiais (NEE), visando resgatar o
efetivamente o próprio corpo, interagir respeito e a dignidade, e possibilitando o
com pessoas e solucionar problemas. A desenvolvimento e o acesso a recursos so-
classe hospitalar, ao prestar assistência à ciais. Na literatura, modelos como o bio-

890
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

médico e o social explicam as deficiências do estudo membros do corpo discente, do


e orientam, diferenciadamente, a partici- corpo docente e da família do educando
pação da família no processo de inclusão (no caso em questão, a mãe e a avó) liga-
escolar de crianças com NEE. Neste senti- dos a uma instituição educacional pública
do, o estabelecimento de um diagnóstico do Recanto das Emas, Distrito Federal,
tende a conduzir a uma organização de além de uma médica pediatra, que assi-
atendimento e estruturação de apoio es- naram um Termo de Consentimento Livre
pecíficos, visando suprir as necessidades e e Esclarecido concordando com a partici-
desenvolver estratégias eficazes. Porém, é pação. A construção de informações teve
visível a demanda de alunos sem diagnós- como instrumento entrevistas semiestru-
tico, à margem de estratégias educativas turadas, a partir de um roteiro elaborado
potencializadoras de desenvolvimento, para este estudo, e que foram gravadas
por falta de respaldo de um laudo médico, em áudio e transcritas na íntegra. A forma
além de outros inúmeros fatores. Dentro de categorização foi construída a partir do
dessa perspectiva, se faz importante o tra- referencial utilizado em estudos da área,
balho de uma equipe composta por profis- envolvendo a participação ativa das crian-
sionais de diversas áreas, com um objetivo ças, de seus familiares e educadores; as
comum - no caso, a educação inclusiva - categorias foram agrupadas por temas. Os
partindo das especificidades de cada área resultados obtidos com as entrevistas con-
e trazendo contribuições coletivas frente duziram a diferentes categorias em cada
às reais necessidades de cada educando. grupo de participantes: (a) as respostas
O presente estudo tem por objetivo prin- da mãe e da avó possibilitaram o levanta-
cipal valorizar a participação da família na mento de quatro categorias: Processo de
potencialização do desenvolvimento dos diagnóstico na vida familiar, com concep-
educandos e, especialmente, no processo ções divergentes sobre o diagnóstico da
de inclusão de alunos NEE sem diagnós- criança; Aprendizagem e diagnóstico, em
tico; além disto, buscamos destacar a im- que a escola regular foi vista como o me-
portância da relação família e escola; con- lhor ambiente de aprendizagem, ao pro-
tribuir para a atuação das equipes multi/ porcionar convivência com todas as crian-
inter/ transdisciplinares e propor meios ças; Relação família-escola no processo de
que facilitem a inclusão destes alunos. A diagnóstico, em que a família, por vezes,
opção metodológica adotada é a pesquisa transfere sua função para terceiros ou
qualitativa que está inserida, atualmen- para a escola e Expectativas dos familiares
te, em um campo transdisciplinar e sob para com o educando, em que a família foi
diferentes paradigmas de análise. Nestas concebida como aquela que apresenta um
pesquisas é importante obter informa- conflito de interesses e poucos momen-
ções de variadas fontes, como entrevistar tos de lazer; (b) as respostas do orienta-
professores, familiares e profissionais de dor educacional e da professora regente
outras áreas que lidem diretamente com possibilitaram o levantamento de duas
a questão em foco, para conhecer mais categorias: Critérios para o atendimento
amplamente o histórico de vida do aluno, especializado, em que foi constatada a
a fim de traçar estratégias conjuntas de existência de uma equipe constituída por
estimulação família-escola. Participaram um orientador (responsável por questões

891
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

comportamentais dos educandos), uma desenvolvimento e o diagnóstico do edu-


pedagoga e uma psicóloga (responsáveis cando e, também, que uma abordagem
por questões de aprendizagem e diagnós- transdisciplinar seria a melhor forma de
tico de deficiência intelectual) e A relação organização da equipe dos profissionais
família-escola, que na opinião dos partici- que lidam com crianças sem diagnóstico,
pantes deveria ser mais próxima e o pro- para que haja uma melhor compreensão
cesso de diagnóstico seria mais célere se de suas condições e potencialidades. A
a participação fosse mais efetiva; (c) a en- multiplicidade de profissionais e divisão
trevista realizada com a pediatra conduziu de saberes não pode conduzir ao retalha-
a três categorias: Diagnóstico e a inclusão: mento da criança, ou à segmentação de
quanto mais cedo definido o diagnóstico, suas necessidades, como parece ocorrer
maior a possibilidade de reversibilidade; no caso do educando em estudo. A es-
porém, existe alta demanda e poucos pro- cola - espaço privilegiado para reflexões,
fissionais na rede pública, relação médico- aprendizagens e mudanças de posturas -
-família: adequação da linguagem médica deve lidar com as diferenças e a diversi-
vista como fundamental na comunicação dade de características de cada sujeito e
com as famílias durante o diagnóstico, e de suas famílias. Por isso, é fundamental a
relação médico-escola: deve haver maior existência de equipes transdisciplinares e
interação entre profissionais; (d) as res- a participação ativa das famílias. A relação
postas da criança, mais do que dos outros família-escola possibilita o delineamento
participantes anteriores, possibilitaram o de intervenções que favoreçam mais am-
levantamento de seis categorias, sendo plamente o desenvolvimento humano.
quatro referentes às suas concepções de
família e duas sobre escola e inclusão: Palavras-chave: Família, Escola, Diagnóstico
Composição familiar, coabitação, senti- Contato: Tânia de Sousa Lima, UnB/UAB,
mentos, função socializadora e sobre a tanialli@yahoo.com.br
escola e a inclusão. Em síntese, a criança
considera o modelo tradicional de família,
ao citar pai, mãe e filhos em sua compo- LT04-1243 - FATORES QUE DIFICULTAM A
sição, apesar de não ser esta a configura- PERDA DE PESO – ESTUDO DE CASOS DE
ção de sua própria família; também cita as MULHERES OBESAS DE GRAU I E II
relações biológicas e as não biológicas; o Ana Paula da Silva Vasques Oliveira - UCB
pai não é citado pela criança participante psi.paula.vasques@hotmail.com
como pessoa da família, por habitar em Maria Alexina Ribeiro - UCB
outra residência; o amor é compartilhado alexina@solar.com.br
com a mãe, que é chamada pela criança Marília Marques da Silva - UCB
por seu nome próprio; deduz-se que a marilia@ucb.br
televisão é quase a única fonte de lazer;
demonstra gostar da escola e reconhecer Como uma vertente do projeto “Cons-
a autoridade da professora, mas, demons- trução de metodologia de atendimento
tra não gostar da agressividade de alguns psicossocial a crianças e adolescentes
colegas para com ele. Observamos que a com transtornos alimentares e obesida-
família exerce influências decisivas para o de e suas famílias” a pesquisa “Fatores

892
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que dificultam a perda de peso – estudo as mulheres em nossa sociedade, o que


de casos de mulheres obesas de grau I faz com que estas evitem o estilo de vida
e II”, objetiva contribuir para que ocorra sedentário e tenham mais probabilidade
um avanço em termos científicos e téc- se comparadas aos homens de fazer uma
nicos, uma vez que este tema tem sido dieta durante sua vida. Existe maior pos-
muito discutido, mas poucas propostas sibilidade de homens abaixo do peso, re-
são implementadas e avaliadas. O Cen- ceber diagnóstico de depressão clinica do
tro de Formação em Psicologia Aplicada, que os homens obesos, o que aponta que
do curso de graduação em Psicologia da o sofrimento de um obeso masculino não
Universidade Católica de Brasília, recebe é tão intenso quanto ao feminino, devido
semestralmente um número significativo a isto a pesquisa envolve apenas mulhe-
de encaminhamentos de indivíduos com res, pois apesar do obeso independente
transtornos alimentares e obesidade. De- do sexo ser discriminado pela sociedade
vido a esta demanda faz-se necessário um e sofrer vários tipos de preconceitos, são
programa regular e eficaz de atendimento as mulheres na maior parte das vezes que
a essa clientela. O projeto “Construção de carregam o sentimento de não serem vis-
metodologia de atendimento psicossocial tas. Existe não apenas um ideal de corpo,
a crianças e adolescentes com transtornos mas um ideal de vida no qual só se pode
alimentares e obesidade e suas famílias” ser feliz sendo magro. A obesidade pode
visa uma construção de uma metodologia ser vista como um escudo que protege o
que trabalhe tanto os aspectos intrapsí- indivíduo, para que ele não entre em con-
quicos como familiares e sociais, dando tato com a sua dor verdadeira. É um fato
às crianças e adolescentes com essa pro- complexo, que envolve diversos fatores
blemática e suas famílias um atendimento biológicos, sociais, familiares e emocio-
mais eficaz. Torna-se necessário estudar nais que interagem entre si. A pesquisa
questões relacionadas à obesidade pelo “Fatores que dificultam a perda de peso
fato de sua prevalência vir aumentando – estudo de casos de mulheres obesas
na maioria dos países, a ponto de ser con- de grau I e II” está em andamento desde
siderada ultimamente, uma epidemia de Fevereiro de 2011. Tem como objetivo in-
grandes proporções. A obesidade pode vestigar os fatores que dificultam o ema-
levar a morte do corpo físico devido a grecimento em mulheres obesas de grau
diversas doenças que pode vir a causar, I e II que querem emagrecer; identificar a
porém, uma grande quantidade de peso existência de ganhos que contribuem para
pode “matar” subjetivamente o indiví- que mulheres obesas em sofrimento em
duo também. Mata sua vontade de sair, relação ao próprio corpo permaneçam
de se relacionar com outras pessoas, de obesas; verificar quais fatores genéticos,
fazer sexo, dançar, de viver enfim. Assim, emocionais, sociais e familiares pode difi-
a obesidade pode causar várias feridas cultar a perda de peso; verificar o quanto
emocionais e comprometimentos funcio- a família interfere na adesão ao tratamen-
nais, principalmente em adultas jovens to e investigar se existe alguma resistência
que vivem em uma cultura onde a ma- em relação ao emagrecimento, como uma
greza é vista como sinônimo de beleza. A forma de afirmar a identidade. Enfim, o
magreza tende a ser mais valorizada entre estudo pretende investigar a interferência

893
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da obesidade em dimensões do desenvol- LT04 -1246 - PROMOÇÃO DO


vimento humano. Os resultados obtidos AUTOCONCEITO: PESQUISA-
com esta pesquisa podem ajudar a apri- INTERVENÇÃO NO ENSINO
morar os serviços de atendimento de saú- FUNDAMENTAL
de à comunidade que apresenta quadro Bianca Cristine Gomide Costa - UFJF
de obesidade. A pesquisa tem um enfo- biacgc@gmail.com
que qualitativo e envolve cinco mulheres Marisa Cosenza Rodrigues - UFJF
residentes em Brasília, com faixa etária rodriguesma@terra.com.br
entre 23 a 35 anos de idade, com obesida-
de de grau I e II, que já tentaram emagre- O ambiente escolar possui papel funda-
cer e por diversos fatores não obtiveram mental no desenvolvimento humano.
sucesso na perca do peso ou na manuten- De acordo com os parâmetros curricu-
ção deste e que nunca realizaram alguma lares nacionais para a Educação Infantil
cirurgia estética. O delineamento de pes- (Brasil, 1998), a finalidade da educação
quisa escolhido devido à complexidade do é o desenvolvimento integral da criança.
problema foi o estudo de caso, onde se es- Nesse sentido, cabe à escola não apenas
tudou os fenômenos individuais para um o desenvolvimento acadêmico do aluno,
entendimento do fenômeno mais amplo. mas também a promoção de sua saú-
Os instrumentos utilizados para a análise de física, emocional, social e psicológi-
dos dados foram uma entrevista semies- ca. Um importante fator nesse aspecto,
truturada, a escala de figuras de Stunkard considerado relevante à trajetória de um
e o questionário dos três fatores alimen- desenvolvimento saudável é a visão que
tares. A limitação da pesquisa se dá pelo o indivíduo tem de si mesmo e de suas
fato de serem entrevistadas apenas cinco possibilidades, ou seja, o seu autocon-
mulheres que residem no Distrito Federal, ceito. Este constructo tem sido conside-
restringindo-se assim a generalização dos rado um importante fator de proteção
resultados. Os dados parciais da pesquisa intrínseco à criança (Maia e Williams,
estão em consonância com os resultados 2005), sendo defendida a importância
dos trabalhos constantes do levantamen- de sua estimulação em contextos educa-
to bibliográfico sobre o tema, ou seja, fa- tivos (Muller, 2006; Sanchez e Escribano,
tores biológicos, sociais, familiares e emo- 1999). Alguns estudos têm demonstrado
cionais estão na base do surgimento e da uma associação positiva entre o autocon-
manutenção da obesidade em mulheres ceito e o desempenho escolar (Vertelo,
jovens e precisam ser levados em consi- 2007, Ferreira, 2010). No entanto, são
deração quando se pensa em um acompa- escassos na literatura nacional estudos
nhamento adequado feito pelos profissio- que objetivam promover o seu desen-
nais de saúde. volvimento nas instituições escolares.
Nessa perspectiva, insere-se a presente
Palavras-chave: obesidade feminina, família, pesquisa-intervenção, parte integrante
aspectos psicossociais. de um estudo mais amplo, cujo objetivo
Contato: Ana Paula da Silva Vasques Oliveira, foi avaliar o impacto de um programa de
Universidade Católica de Brasília (UCB), psi. intervenção voltado para a estimulação
paula.vasques@hotmail.com do autoconceito no contexto escolar. Par-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ticiparam do estudo 31 alunos do primei- foram realizados na própria sala de aula


ro ano do ensino fundamental de uma com duração média de 50min cada, apli-
escola pública da cidade de Juiz de Fora cados ao longo de 4 semanas. Após o tér-
(MG). A amostra foi composta por 15 me- mino da intervenção realizou-se a pós-
ninas (48,4%) e 16 meninos (51,6%), com -avaliação com os dois grupos de alunos,
média de idade de 6 anos. Após crivo do observando-se que houve a perda de um
comitê de ética da Universidade Federal participante do grupo controle que, por
de Juiz de Fora, realizou-se um sorteio faltas sistemáticas, não respondeu ao
das turmas de primeiro ano para a de- pós-teste. Ressalta-se que, para atender
limitação de um grupo de comparação aos critérios éticos, o mesmo programa
(composto por 14 crianças) e do grupo de intervenção foi realizado posterior-
intervenção (17 crianças). Os dois grupos mente com o grupo de comparação. A
foram pré-avaliados mediante a utiliza- fim de se efetuar comparações entre as
ção da Escala de Percepção do Autocon- pontuações das crianças antes e após a
ceito Infantil – PAI (Sanchez e Escribano, aplicação do programa de intervenção foi
1999), composta por 34 itens que ava- empregada na análise estatística a pro-
liam o autoconceito de crianças de idade va de Wilcoxon, o nível de significância
pré-escolar e do ciclo inicial. A escala, em adotado foi de p<0,05.A média da pon-
sua forma de aplicação individual, possui tuação do grupo comparação na primei-
quatro possibilidades de resposta, cada ra aplicação foi de 104,14 (dp=12,83) e
uma correspondente a um valor (de 1 na segunda avaliação 109,3 (dp= 11,75),
a 4). A soma da pontuação em todos os não se obtendo significância estatística
itens fornece o escore do autoconceito (p=0,059). Quanto ao grupo interven-
da criança. Uma maior pontuação indica ção obteve-se, na fase de pré-avaliação,
um autoconceito mais positivo, enquan- a média de 109,52 (dp=9,99) e na fase
to uma pontuação mais baixa indica um posterior à implementação do progra-
autoconceito mais negativo. Em segui- ma, a média de 115,23 (dp=9,39), sendo
mento, implementou-se o programa para tal diferença significativa ( p=0,017). Ou
a estimulação do autoconceito no grupo seja, comparativamente, houve um incre-
intervenção, tendo como base as propo- mento de componentes relacionados ao
sições teórico-práticas de Muller (2006) e autoconceito na fase de pós-avaliação do
Sanchez e Escribano (1999). O programa programa, sugerindo que a intervenção
foi aplicado em 10 encontros envolvendo implementada teve um impacto positivo
temáticas focalizadas no desenvolvimen- sobre o autoconceito do grupo de crian-
to do autoconceito positivo, a saber: coo- ças. O resultado converge com os dados
peração, reconhecimento das diferenças obtidos por Gonçalves e Murta (2008),
entre as pessoas, autoconhecimento, que também evidenciaram um efeito fa-
reconhecimento de características positi- vorável de um programa de treinamento
vas em si, reconhecimento e comunica- de Habilidades Sociais, focalizando, de
ção de características positivas no outro, maneira indireta, o autoconceito infantil.
expressão de afeto positivo, persistência, A escassez de pesquisas com intervenção
identificação de sentimentos, amizade e focalizando o autoconceito no contexto
reconhecimento próprio. Os encontros nacional limita a comparação dos dados

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aqui obtidos e aponta para a necessida- foi tão desejado, satisfaça suas necessi-
de de mais estudos acerca da avaliação dades, promova mudanças pessoais e o
de programas de intervenção para esti- transforme em um profissional capacita-
mulação do autoconceito no contexto do (Almeida & Soares, 2003). No entanto,
educativo. O resultado positivo obtido a entrada no ensino superior não corres-
no presente trabalho justifica a realiza- ponde apenas em realizar os sonhos e de-
ção de novos estudos para a aplicação sejos pessoais, familiares e sociais, mas
do programa em outros grupos. É válido também requer do estudante coeficien-
destacar que o baixo número de sujeitos tes de resiliência capazes de possibilitar
dessa pesquisa dificulta a generalização ao estudante mediar os estados da subje-
dos dados a outros contextos, sugerindo- tividade com as expectativas e situações
-se a ampliação da amostra em interven- cotidianas, uma vez que, este período de
ções futuras. estudo é permeado de incertezas e dúvi-
das, podendo vir a desencadear quadros
Palavras-chave: autoconceito, ensino de sofrimento psíquico como ansiedade,
fundamental, promoção compulsão, fobias, estados depressivos,
Contato: Bianca Cristine Gomide Costa, ao mesmo tempo em que se busca pela
Universidade Federal de Juiz de Fora, bolsista ascensão profissional, sendo o último
do Programa de Educação Tutorial PET- fator o mais verbalizado entre os gradu-
Psicologia/MEC-SESu, biacgc@gmail.com andos. Marinho-Araújo (2009) salienta
que o ensino superior não está atrelado
apenas a ascensão social, mas vincula-
LT04-1259 - VIVÊNCIA ACADÊMICA: -se ao processo do desenvolvimento hu-
SIGNIFICADOS E MOTIVAÇÕES mano adulto, em uma dimensão crítica
Elen Alves Santos - Projeção e complexa. A motivação e o significado
elenpsi@gmail.com da vivência acadêmica que trazem os es-
Elaine Ribeiro Santos - Projeção tudantes calouros em seu primeiro ano
elaine.santos@projecao.br no ensino superior estão estritamente
Danielle Sousa Silva - Projeção relacionadas ao desenvolvimento do ci-
dssfatima@gmail.com clo vital particular de cada indivíduo. A
depender da fase do desenvolvimento
O ingresso no ensino superior é permeado em que se encontra o sujeito, percebe-se
por diferentes significados e motivações. uma dissonância entre o ideal construído
Jovens e adultos, seja qual for a idade, sobre o que é a vivência acadêmica no
apresentam razões diversas na escolha ensino superior e as relações psicosso-
do curso, como a busca pela identificação ciais; com a vivência real e concreta das
pessoal, a correspondência de expectati- relações que se estabelecem neste con-
vas pessoais e dos familiares, assim como texto. A distância entre o ideal e o real é
o desejo pelo retorno dos aspectos finan- visto como uma luta interna que impeli
ceiro e temporal que foi empregado du- o sujeito a questionar-se sobre a escolha
rante o processo acadêmico. O ingresso do curso e da faculdade, desencadeando
é marcado pela euforia e idealização de outras indagações que visam não apenas
que o novo ambiente educacional, que o ressignificar da escolha profissional,

896
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mas também, de conhecer a si próprio. sucesso e ascensão profissional no futu-


Reportando a psicologia sócio-histórica ro. Esta temática deve compor as discus-
percebe-se que os fatores impostos no sões que permeiam o contexto do ensino
âmbito social e cultural compreendem superior, independente de ser uma insti-
um aspecto de relevante valor no mo- tuição privada ou pública, uma vez que,
mento da escolha profissional. Contudo, há uma gama de recursos sendo empre-
a escolha restrita aos aspectos sociais e endidos para atender as demandas e ne-
culturais acomete várias intercorrências cessidades do público acadêmico, que
no processo de escolarização no ensino muitas vezes não estão conscientes de
superior que contemplam desde dificul- seu papel pessoal e social. É preciso man-
dades de aprendizagem, de relações in- ter uma discussão contínua referente às
terpessoais, processos de somatização, experiências acadêmicas, principalmen-
além do possível desenvolvimento de te, pelo fato que os sujeitos acadêmicos,
transtornos de ansiedade e depressão em geral, estão na fase desenvolvimen-
tendo em vista, a obrigatoriedade que o tal adulta, necessitando de ressignificar
sujeito impõe a si próprio de realizar um de maneira sucessiva as suas vivências
curso, não por vontade e identificação, pessoais que se interpõem as vivências
mas para atingir um ideal social e cultu- acadêmicas/profissional. Deste modo,
ral. Desta forma, justifica-se a necessida- uma intervenção psicológica crítica faz-se
de de um serviço de apoio ao estudante necessário, no decorrer dos anos escola-
no âmbito das instituições de ensino su- res anteriores a graduação, para que faça
perior, a fim de, atuar em uma perspecti- despertar no sujeito uma maturidade e a
va preventiva, dando subsídio aos estu- consciência de si próprio, para lidar com
dantes a ressignificar as suas decisões e o enfrentamento dos aspectos pessoais
escolhas profissionais, bem como o res- e sociais que se unem ao processo de
significar do desenvolvimento pessoal da escolha profissional, vindo a possibilitar
carreira profissional, conforme as vivên- experiências pessoais e sociais favoráveis
cias e expectativas intrínsecas e extrínse- às habilidades e competências do sujeito.
cas. A experiência prática em um núcleo Nesse sentido, Sampaio (2009) ressalta
de apoio psicopedagógico aos estudan- que é imprescindível a atuação de psicó-
tes do ensino superior interage na busca logos no ensino superior para clarificar as
pela compreensão dos aspectos sociais e experiências e as dificuldades acadêmi-
subjetivos que contemplam os estudan- cas existentes no âmbito estudantil, além
tes, sendo um ambiente de identificação de agregar enriquecimento ao ambiente
dos conflitos pessoais vivenciados pelos universitário.
acadêmicos que tangenciam o processo
de ensino e aprendizagem. Neste servi- Palavras-chave: significados, profissional,
ço é possível verificar que a experiência ensino superior.
de ser universitário apresenta-se cada Contato: Elen Alves dos Santos, Núcleo de
vez mais introduzida em um processo de Atenção Psicopedagógica ao Estudante –
falta de organização social a nível macro, NAPEs. Faculdade Projeção,
no sentido de direcionar o sujeito a uma elenpsi@gmail.com
realização pessoal com possibilidades de

897
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1273 - O(A) CUIDADOR(A) DO por que se inicia este processo (Bertolucci,


PACIENTE COM ALZHEIMER 1996). No início da doença, esta perda das
Evanisa Helena de Maio Brum - CESUCA/ células cerebrais não acontece de forma
Faculdade Inedi homogênea, ocorrendo, principalmente,
Paula Grazziotin Silveira Rava - CESUCA/ nas áreas responsáveis pela memória e
Faculdade Inedi funções executivas. Segundo Izquierdo
Aline Fontes de Freitas - CESUCA/Faculdade (2006) esta doença envolve um fator ge-
Inedi nético, portanto, quem tem um familiar
Amanda Passarela Ferreira - CESUCA/ próximo, como pai ou mãe com a doença,
Faculdade Inedi tem maior chance de desenvolvê-la, mas
Carina Renata Pellisoli - CESUCA/Faculdade também deve haver outros fatores, como
Inedi o ambiental, porque mesmo em gêmeos
Kelly Ribeiro Aguiar - CESUCA/Faculdade Inedi idênticos um pode desenvolver a doença e
Nádia Maria Viana Vazata - CESUCA/ o outro não. O fato é que as pessoas porta-
Faculdade Inedi doras de Alzheimer podem ter problemas
de memória, perdas de habilidades moto-
A Doença de Alzheimer (DA) é a forma ras, problemas de comportamento e con-
mais comum de demência. Segundo Frei- fusão mental. Izquierdo (2006) refere que
tas et al (2006) a DA foi descrita primei- existem três fases na evolução da doença:
ramente em 1906 pelo neuropatologista a fase inicial caracteriza-se por distração,
alemão Alois Alzheimer recebendo essa dificuldades de lembrar-se de nomes e/ou
denominação em 1910 por Kraepelin. Isto para aprender novas informações; deso-
significa que toda vez que vemos uma pes- rientação em ambientes familiares e redu-
soa “esclerosada” existe uma chance, em ção das atividades sociais dentro e fora de
duas, de apresentar a doença (Bertolucci, casa. Na fase intermediária ocorre a perda
1996). Não há ainda um teste específico marcante da memória e da atividade cog-
para estabelecer de modo inquestionável nitiva, além da deterioração das atividades
a doença. A comprovação do diagnósti- verbais, diminuição do conteúdo e da va-
co só é feita através de exame patológi- riação da fala. Frequentemente o paciente
co (biopsia de tecido cerebral) realizado apresenta, nesse estágio mais alterações
após a morte. Assim, o diagnóstico é feito de comportamento, como exemplo tem-
excluindo-se outras patologias que podem -se: frustração, impaciência, inquietação,
evoluir também com quadros demenciais. agressão verbal e física. Na fase avançada,
Ela se caracteriza pela perda da memória e a fala pode tornar-se monossilábica e até
pela formação de placas amilóides e ema- desaparecer. Podem estar presentes delí-
ranhados neurofibrilares no cérebro, par- rios, transtornos emocionais e de compor-
ticularmente no córtex cerebral e no hipo- tamento, perda do controle da bexiga e do
campo, levando a perda neural progressi- intestino, tendência a ficar mais no leito,
va (Tavares, 1985). Sabe-se que os neurô- enrijecimento das articulações, dificulda-
nios morrem pelo acúmulo de proteínas de para engolir alimentos, evoluindo para
em formas que não são normalmente en- morte. A evolução da doença comprome-
contradas no cérebro, tanto dentro como te três áreas: a cognição, as atividades do
fora dos mesmos, mas ainda não se sabe dia-a-dia e o comportamento, deixando

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a pessoa cada vez mais dependente dos pelo fato de não ser parente conseguia
familiares e cuidadores. Nesse momento tempo para desenvolver suas atividades,
precisa de ajuda para se locomover, tem principalmente quando a doença ainda se
dificuldade para se comunicar e passa encontrava numa fase intermediária. Ela
a necessitar de supervisão integral para se abalava muito, emocionalmente, pelas
suas atividades comuns de vida diária, dificuldades dos pacientes e pelo descaso
até mesmo as mais elementares, como de familiares que continuavam suas roti-
alimentar-se ou vestir-se, precisando nas normalmente, limitando-se apenas a
de acompanhamento, progressivamen- visitá-los. Também relatou que muitas ve-
te intenso, causando desgaste em seus zes tinha o sono interrompido como, por
cuidadores. Borges (2010) previne que a exemplo, pelo fato de uma das pacientes
doença de Alzheimer não afeta apenas o levantar de madrugada e começar a fazer
paciente, mas também as pessoas que o almoço e esperar os filhos como se fosse
cercam. A família deve preparar-se para meio dia ou acompanhá-la quando saía à
uma sobrecarga tanto em termos emocio- rua, pois aconteceu de a paciente sair e se
nais, pois a evolução da doença acarreta perder, só voltando com ajuda de um co-
em idas frequentes a médicos, limpeza nhecido. Sofria quando a doença chegava
do ambiente, horários de remédios, troca numa fase mais adiantada e os pacientes
de fraldas, roupas de cama e pessoal do necessitavam ir para clínicas e, principal-
paciente e também financeiros através da mente, quando, pela convivência que tive-
compra de medicamentos, produtos de ra, percebia a proximidade da morte. Es-
higiene e limpeza pessoal e pagamento tas questões instigam a continuidade dos
de cuidadores ou clínicas. Este trabalho estudos sobre o desgaste dos cuidadores
objetivou investigar as dificuldades, sofri- de doentes com Alzheimer. Como se tem
mentos e privações enfrentadas pelos cui- ainda um tratamento curativo, nem vaci-
dadores de pacientes com Alzheimer, bem nas ou qualquer outro tipo de terapêutica
como apontar possíveis alternativas para preventiva, o que se pode fazer é utilizar
abrandar estas dificuldades. Muitas vezes, medicamentos que amenizem os sinto-
o cuidador não dispõe de tempo para si mas, o que auxilia o doente e facilita a
próprio, não recebe ajuda de familiares, vida do cuidador. É importante o apoio da
não dispõe de tempo para atividades de família ao doente e ao cuidador, ajudando
lazer, sente-se frustrado, triste, culpado, em outras tarefas como compras, limpeza,
entra em conflito com o paciente, não idas ao médico, bem como ouvir o cuida-
dorme bem, não se alimenta adequada- dor para que não se sinta sozinho. Seria
mente, então começa a apresentar pro- recomendado que eles tivessem acesso
blemas de saúde. Realizou-se um estudo às orientações e dicas de como cuidar do
de caso único, com análise de conteúdo idoso com Alzheimer e também de como
qualitativa. Participou deste estudo uma se cuidar. Para que o cuidador facilite sua
mulher de 50 anos de idade, que respon- tarefa é importante não tratar o idoso
deu a uma entrevista semi estruturada, como doente, mas manter uma rotina di-
contendo 14 questões. Os resultados re- ária, organizar a casa de maneira simples
velaram que a participante já cuidou de e segura, procurar manter o bom humor.
três pacientes com esta doença e que Isto ajuda a diminuir o estresse, organizar

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

horários de medicação e alimentação. As- este processo, o período de desenvolvi-


sim, o trabalho seria menos áspero e mais mento conhecido como adolescência, no
fácil de suportar (Borges, 2010). Este tem qual o jovem se vê envolto por diversas
sido o papel do grupo de suporte ou de transformações não só físicas, mas tam-
autoajuda da ABRAZ (Associação Brasilei- bém psicológicas. Encontra-se inserido
ra de Alzheimer, que existe para servir de numa fase transitória entre a infância e a
cooperação no trabalho dos cuidadores/ maturidade, vendo-se obrigado a tomar
familiares). diversas decisões e assumir responsabi-
lidades anteriormente inexistentes. Para
Palavras-chave: Alzheimer, cuidador, demência. muitos jovens, na sua decisão de escolha
Contato: Paula Grazziotin Silveira Rava, profissional, cabe ser acolhido ou não,
CESUCA/ Faculdade Inedi, pelo seu grupo, sua família, pois muitas
paulagraz@yahoo.com vezes são ridicularizados, desacreditados
de suas competências. Além disso, há o
fator da discriminação socioeconômica.
LT04-1282 - UM ESTUDO SOBRE A Segundo relata Costa (2007) a escola é
ESCOLHA PROFISSIONAL ENTRE um agente importante na escolha profis-
ESTUDANTES DO SISTEMA DE ENSINO sional, pois ela atua como uma janela pela
PÚBLICO E PRIVADO qual os adolescentes vislumbram o futuro,
Liliane Ferreira Neves Inglez de Souza - UNIP mas quando se trata do adolescente de
lfneves@terra.com.br baixa renda, a escola se torna excluden-
André Bethiol Victoria - UNIP te. Para Bock (1995; 2006) na perspectiva
andre_victoria@hotmail.com da teoria liberal as diferenças existentes
Andreia Ap. Alves Feitoza da Costa - UNIP não são vistas como conseqüência da es-
andréia.fcosta@yahoo.com.br trutura social, mas sim como resultado
Audrey Vanessa Barbosa - UNIP das diferenças dos indivíduos: aquele que
audreyvanessa@hotmail.com “não se deu bem na vida” foi porque não
Fabiana de Souza - UNIP se esforçou o suficiente (por exemplo,
fazinhasz@gmail.com devido à evasão ou repetência escolar).
Então, deve conformar-se com a sua situ-
O processo de escolha profissional é afe- ação, uma vez que teve nas mãos todas
tado por modificações observáveis que as oportunidades e não soube aproveitá-
estão ocorrendo, como: introdução de no- -las de forma eficiente. A partir do quadro
vas tecnologias, flexibilidade de produção, apresentado, propôs-se o presente estudo
expansão de emprego etc. (Silva & Jacque- que teve como objetivo investigar alguns
min, 2001). Alguns jovens levam em con- fatores que possivelmente interferem na
sideração ao fazer a escolha profissional escolha profissional de adolescentes, es-
o “desejo de independência”, a “vontade tudantes do sistema de ensino público e
de sair de casa”, o “consultório existente privado, das cidades de Piracicaba e Santa
do pai”, a “importância atribuída pelos Bárbara D’Oeste, SP, tendo como base te-
pais para se cursar um nível superior”, o órica a perspectiva sócio-histórica. Tratou-
“incentivo da família na realização do so- -se de uma pesquisa qualitativa, de cará-
nho”, etc. (Santos, 2005). Coincide com ter exploratório-descritivo, cuja amostra

900
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foi composta por 15 participantes: ado- pública um fator de gosto pela profissão,
lescentes com idades entre 17 e 18 anos, enquanto que para a maioria os alunos
estudantes do terceiro ano do ensino mé- da escola particular a escolha profissio-
dio, sendo 8 alunos de uma escola pública nal teve como fator decisivo a família,
e 7 alunos de uma escola particular. Para amigos e pares. Observa-se através disto
a coleta dos dados utilizou-se um roteiro ainda que a família influencia, ainda que
de entrevista semi estruturada, constituí- indiretamente, na escolha profissional. A
do de 12 perguntas. A partir das respostas família por ter uma função socializado-
às questões da entrevista, foram identi- ra esteve sempre incluída no meio social
ficadas categorias de análise. Os resulta- do adolescente, opinando sobre o que é
dos apontaram que a maioria dos alunos desejável ele realizar como profissão e se
provenientes da escola pública pleitearia preocupando com um futuro bem-sucedi-
vagas em instituições de ensino superior do e remunerado adequadamente (COR-
particulares, colocando inclusive como DEIRO, 2007). Acredita-se que a família
fator de exclusão, instituições mais distan- constitua uma das principais influencias
tes do local onde moram, dando preferên- nesta escolha, embora vários adolescen-
cia a cursos existentes na mesma cidade tes tenham afirmado que não se sentem
ou em cidades vizinhas. As justificativas influenciados. Além disso, outro fator que
apresentadas pelos participantes foram se destacou foi que os entrevistados, em
no sentido de que os mesmos teriam que sua maioria, não se mostraram cientes
trabalhar para custear o curso. O oposto da multiplicidade de fatores que interfe-
ocorreu com alunos da escola particular, rem na realização desta escolha, sejam
que em geral relataram que pleiteariam estas familiares, escolares, econômicas
vagas, em sua maioria, em instituições ou mesmo sociais. Deve-se ressaltar que,
de ensino superior de origem pública, por apresentar uma metodologia qualiti-
as quais consideram ter mais qualidade, tativa, o presente estudo contou com um
além de mostrarem uma preferência por número restrito de sujeitos, portanto os
instituições mais distantes, realizando o resultados não podem ser generalizados a
ideal de “morar sozinho” e ter “indepen- outras amostras. No entanto, é relevante
dência”, apesar de serem custeados pelos notar que os dados desta pesquisa confir-
pais. Outro dado obtido que merece ser mam alguns aspectos já apontados pela
ressaltado, é que os estudantes da escola literatura. Por exemplo, como afirmaram
pública, em sua maioria, levaram em con- Gonçalves e Coimbra (2007), jovens pro-
sideração o interesse e gosto pessoal para venientes de um contexto sociocultural
fazer sua escolha profissional. Já os alunos privilegiado obtêm melhores possibilida-
da escola particular, aparentaram consi- des de acesso às formações profissionais,
derar este como um dos fatores menos ao passo que adolescentes de níveis socio-
relevantes para a realização de tal esco- culturais e econômicos médio e baixo ten-
lha. Não raro, os estudantes da instituição dem a reduzir suas expectativas referente
particular demonstraram preferência por ao seu projeto de vida. Diante do estudo
profissões já existentes na própria família. realizado, acredita-se que o papel do psi-
Sendo assim, a escolha profissional passa cólogo, quando procurado pelo adoles-
a ser para a maioria dos alunos da escola cente, seja dentro ou fora da escola, para

901
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

orientá-lo quanto à escolha profissional, aprendizagem musical, pois será a partir


deve ser ajudá-lo a conhecer os possíveis de suas concepções sobre essa questão
fatores que podem influenciar sua esco- que serão propostas e aplicadas suas prá-
lha, estando o mais consciente possível ao ticas e métodos de ensino dentro de sala.
tomar sua decisão. Dessa maneira, o presente trabalho bus-
ca compreender como se dá a construção
Palavras -chave: escolha profissional, do conhecimento sobre talento musical
adolescência, perspectiva sócio-histórica. em um grupo de professores de música,
Contato: Liliane Ferreira Neves Inglez de buscando analisar quais as concepções
Souza, Universidade Paulista (campus de música que esses sujeitos construíram
Limeira), lfneves@terra.com.br ao longo dos anos. Este estudo investi-
gou especificamente o que os professores
pensam acerca do processo de ensino/
LT04-1381 - O QUE PENSAM aprendizagem musical, como concebem o
PROFESSORES DE MÚSICA ACERCA DO seu próprio papel nesse processo e tam-
TALENTO MUSICAL bém as suas concepções sobre o talento
Mariella Dalvi Rampinelli - UFES musical. Participaram deste estudo oito
marielladalvi@yahoo.com.br professores de música, sendo seis do sexo
Célia Regina Rangel Nascimento - UFES masculino e dois do sexo feminino. Foi
celiarrn@gmail.com utilizada uma entrevista semiestruturada
Claudia Broetto Rossetti - UFES contendo questões que investigaram, ini-
cbroetto.ufes@gmail.com cialmente, o lugar que a música ocupa na
vida dos participantes, isto é, como se deu
A partir do mês de agosto de 2011 o en- a escolha da profissão e qual a percepção
sino de música se tornará obrigatório nas da palavra “música” para cada um deles.
escolas públicas e particulares do Brasil e Após essa abordagem inicial, foram pro-
é urgente buscar as melhores maneiras postas questões relacionadas ao proces-
de operacionalizar a implementação des- so de ensino/aprendizagem musical e às
se novo componente curricular. De fato, representações sobre o talento/dom mu-
é a partir do surgimento da Lei 11.769, sical. Os dados foram coletados nas pró-
que inclui o ensino da música no currí- prias instituições nas quais os professores
culo escolar, que estudos na área pas- ministram aulas de música. Foram elabo-
saram a ganhar relevância. Entende-se radas categorias temáticas de acordo com
que, primeiramente, é necessário que o as respostas dos oito professores às ques-
aluno demonstre interesse em aprender tões da entrevista. As respostas dos parti-
música, assim como ocorre em todas as cipantes a uma mesma questão foram se-
outras disciplinas. Dessa maneira, parte- paradas considerando-se o seu significado
-se da premissa de que a aprendizagem e as categorias temáticas previamente
musical, como ocorre com todos os outros organizadas. Portanto, para cada questão
tipos de conhecimento, é construída na podia haver respostas múltiplas. Ao se-
interação entre sujeito e objeto. Assim, rem questionados sobre o significado da
entende-se que é de grande importância a palavra “música”, metade dos professores
participação do professor no processo de disse que a percebem como uma forma de

902
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

prazer, de descanso, de diversão, além de Segundo três professores, o talento é algo


entendê-la como expressão das emoções que vai surgir com o tempo e que pode ser
e como forma de transcendência. Em rela- desenvolvido. Com efeito, os professores
ção à escolha da profissão, a maioria dos constroem suas concepções e, em função
professores afirmou que a escolha se deu delas, executam suas práticas e as impõem
principalmente pela necessidade financei- aos alunos. Isso é claramente apresentado
ra. No levantamento sobre os fatores que nos resultados dessa pesquisa. Com isso,
influenciam na aprendizagem musical, a torna-se essencial que o professor, além
categoria “talento natural” apresentou os de construir conhecimentos acerca de sua
resultados mais destacados: uma parte prática pedagógica, tenha a oportunidade
significativa dos professores entrevista- de repensá-la sempre, adaptando-a para o
dos, disseram que alguns alunos já levam contexto de seus alunos. Em nossa pesqui-
consigo algo de natural, algo de inato, que sa, foram identificadas as percepções de
pode ou não facilitar o processo de ensi- “talento musical” que nos levaram a dois
no/aprendizagem. Contudo, o esforço e campos: o campo do inato e o campo do
a dedicação também representam uma social (aprendido). Em suas falas, os pro-
categoria que aparece nas respostas da fessores definem a música como algo que
maioria dos professores quando afirmam provoca emoção, como algo que envolve
que se não houver esforço do próprio a dedicação, como uma forma de lingua-
aluno e certa dedicação por parte dele, a gem, ou até mesmo algo que está direta-
aprendizagem musical vai demorar mais mente ligado a elementos musicais, como
ou pode não acontecer. Gostar e ter vonta- o violão, por exemplo. De acordo com
de de aprender foi outra categoria na qual os resultados, os professores parecem
os professores enfatizam a importância de acreditar que o desenvolvimento musical
o aluno gostar do que faz e ter interesse envolve a existência de um componente
em aprender sempre mais. A influência do hereditário e que, portanto os alunos já
ambiente apareceu como um dos fatores possuem algumas habilidades musicais
que influenciam na aprendizagem nas res- inatas. No entanto, as respostas apontam
postas de três professores. Apenas dois também que, segundo as concepções dos
professores consideraram a educação ou professores, o que é inato não determina,
os métodos de aprendizagem como fator mas apenas facilita o processo de aprendi-
que influencia de maneira decisiva o de- zagem musical. Além disso, para a apren-
senvolvimento musical. Sobre o papel do dizagem em música ser significativa e para
professor no processo de aprendizagem que o interesse em buscar além do que
musical, as respostas foram muito próxi- está sendo ensinado em sala de aula apa-
mas. Seis professores responderam que reça, o aluno precisa vivenciar a realidade
o papel do professor não é só o de trans- musical, segundo o discurso dos professo-
mitir informações, mas de estimular o res. Com isso, os alunos se empenhariam
aprendizado, de motivar o aluno. A respei- em buscar sempre mais, tirando dúvidas
to do significado que os professores dão que vêm diretamente de sua prática fora
ao talento/dom musical, seis professores de sala. Ao investigar o que professores
afirmam que o interesse e a facilidade são de música pensam sobre o talento/dom
características inatas de algumas pessoas. musical e o processo de ensino/aprendi-

903
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

zagem musical, julgamos ter sido possível pares de sala de aula durante a formação
aprofundar o conhecimento e a compre- universitária. Nossa pesquisa teve como
ensão de alguns elementos envolvidos na objetivos específicos (i) verificar que tipos
problemática da implementação do ensi- de sentimentos os alunos manifestam na
no de música como obrigatório nas esco- construção do desenvolvimento humano
las brasileiras, bem como a sinalização de a respeito de suas relações afetivas entre
alguns entraves para que o referido pro- discentes; (ii) analisar a percepção do dis-
cesso de fato possa ocorrer. Como pesqui- cente de pedagogia a respeito de como
sa sobre a educação musical escolar, es- as dificuldades vinculadas às relações so-
pera-se poder contribuir para a ampliação ciais no contexto educacional podem in-
dos conhecimentos disponíveis na área, terferir na aprendizagem. Sabe-se que no
visando, em última instância, uma melhor processo de assimilação da aprendizagem
compreensão dos processos de ensino/ o indivíduo participa de maneira ativa no
aprendizagem envolvidos na construção desenvolvimento do conhecimento, assim
do conhecimento musical. como na aprendizagem cooperativa um
grupo de alunos fazem essa construção de
Palavras-chave: ensino/aprendizagem, forma coletiva, constante e ininterrupta
professores, talento musical no desenvolver ou resolver alguma tare-
Contato: Claudia Broetto Rossetti, fa. Freire (1996) fez uma indagação do por
Universidade Federal do Espírito Santo, que não estabelecer uma relação entre
cbroetto.ufes@gmail.com os saberes curriculares fundamentais e as
experiências que eles levam como indiví-
duos. Por isso é importante essa parceria
LT04-1406 - AS RELAÇÕES AFETIVAS entre docente e discente. Ao chegar numa
ENTRE DISCENTES DA PEDAGOGIA sala de aula, todo educador faz as seguin-
E SUAS INFLUÊNCIAS NA CONSTRUÇÃO tes indagações: O que vai ensinar? Para
DO DESENVOLVIMENTO HUMANO que ensinar? Como vai ensinar? O que
Fabianna Antunes Gadelha - Anhanguera também chega como desafio para o edu-
fabianna.gadelha2@gmail.com cador é estar preparado para as possíveis
Luciana Câmara Fernandes Bareicha - dificuldades de relacionamento entre os
Anhanguera alunos. Sabe-se que cada indivíduo carre-
luciana.bareicha@gmail.com ga consigo uma identidade própria que, ao
entrar em contato com outras identidades
A presente pesquisa teve como propósito pode ocorrer harmonia assim como con-
investigar a respeito da influência da afe- flitos e divergências. Ao nascer, a criança
tividade para o desenvolvimento psico- tem seu primeiro contato com o mundo
lógico e como contribuinte na formação denominado “matriz de identidade” onde
educacional na medida em que se consti- para Moreno (2009, p. 114) “proporciona
tui como componente das relações entre ao bebê humano segurança, orientação e
os discentes do curso de pedagogia. Foi guia”. Sendo assim ela proporciona à crian-
verificado como os alunos da pedagogia ça um amparo quanto à suas necessidades
percebem os tipos de afetividades nega- de ordem fisiológicas, afetivas e relacio-
tivas e positivas estabelecidas entre seus nais. A matriz de identidade é composta

904
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pela mãe, pai, irmãos, tios, avós e etc. Nes- jeito ao se sentir motivado a realizar uma
sa matriz de identidade, que para More- tarefa, este poderá se apropriar de suas
no (2009, p. 114) é caracterizado como a aptidões, habilidades e capacidades que
“placenta social”, a criança vai percebendo desenvolve ao longo do tempo. O fato do
a sua semelhança com as pessoas que es- discente se colocar no lugar do seu colega,
tão ao seu redor. Com o passar do tempo, mesmo que mentalmente, dá ao indivíduo
a criança é inserida numa etapa que surge a capacidade de segundo Vygotsky (apud
após o ambiente familial, o ambiente es- Carrara, 2004) ter a compreensão dos pa-
colar. Nesse novo ambiente, a criança vai péis das relações sociais que na qual tes-
adquirindo uma relação que à princípio é temunha. Percebeu-se através da pesquisa
harmoniosa, mas com o passar do tem- que o indivíduo no processo de aquisição
po a relação pode acarretar em conflitos. de conhecimento tem a possibilidade de
Pode também ocorrer problemas à níveis mudança interior e de comportamento ao
didáticos ou relacional onde será preciso interagir e construir trocas afetivas com o
um profissional para auxiliá-los. Entra em outro da sua geração e na convivência com
ação o próprio educador como profissio- o mundo. Desenvolvemos uma pesquisa
nal de formação superior com capacidade, do tipo qualitativa onde foi utilizado como
espera-se, para auxiliar nos desgastes dos instrumento de coleta de dados um grupo
vínculos constituídos no processo educa- focal composto por 16 alunos da Pedago-
cional e que afeta também o desenvol- gia da Faculdade Anhanguera de Brasília,
vimento dos sujeitos envolvidos. Nesse com alunos do 1º ao 6º semestres da res-
processo de conflitos durante o período pectiva formação. A partir de interações
de aprendizagem os alunos considerados grupais apresentamos o tema a respeito
colegas de sala de aula atuam como faci- da importância das relações afetivas entre
litadores ou opositores para facilitar ou alunos para conhecermos esse aspecto no
dificultar as superações nas dificuldades desenvolvimento emocional e educacional
de relacionamentos durante a formação dos pesquisados. Como conclusões, cons-
educacional. Para Vygotsky (apud Carrara, tatamos que nesta construção coletiva a
2004) o termo atividade não é qualquer aprendizagem ocorre numa ação conjunta
coisa feita e sim algo que tem um significa- entre o colega mais experiente e aquele
do para quem dela usufrui. Com isso uma que aprende, sendo assim, o processo é
tarefa, por exemplo, possui um objetivo e ativo por parte de quem aprende e com
um motivo onde um representa a meta a o tempo acaba adquirindo personalidade
ser alcançada e o outro, respectivamente, consciência e inteligência. A formação aca-
é a necessidade que a pessoa sente no agir. dêmica influencia significativamente a vida
Vygotsky (apud Carrara, 2004) enfatiza que dos alunos e professores nas suas constru-
há um sentido quando existe relação en- ções de capacidades cognitivas, sociais e
tre objetivo e motivo. Sendo assim, no que habilidades específicas para a profissão.
concerne ao motivo a pessoa atua porque Nesse sentido, destacamos as ideias do
há um interesse, uma necessidade ou mo- sujeito 2 que expressa suas conclusões da
tivação pelo resultado para atingir o obje- seguinte maneira: “Estou saindo outra pes-
tivo, por isso a atividade ou tarefa têm um soa com uma outra visão muito mais am-
sentido para o sujeito. Dessa forma, o su- pliada do que eu tinha à anos atrás como

905
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

eu já relatei”. Verificou-se que no decorrer Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e


do curso o aluno conclui a sua formação localizado em Ribeirão Preto, interior do
com uma percepção diferente a respeito Estado de São Paulo. A Ciranda Infantil
do seu desenvolvimento como um todo se materializa enquanto um espaço/tem-
e em relação às características subjetivas po de educação não formal e é fruto da
de quando entrou no curso universitário Pedagogia do MST, funcionando tanto em
ao adquirir características provenientes de espaços permanentes nas escolas do mo-
sua interação com o outro, seja entre as vimento, acampamentos, assentamento
trocas afetivas com seus coadjuvantes de e centros de formação, como também a
sala de aula, seja com as relações de afe- Ciranda funciona de forma itinerante em
to estabelecidas com os seus professores. marchas, encontros e viagens de luta do
Consideramos importante ressaltar que o movimento. As Cirandas se constituem
desenvolvimento emocional e cognitivo enquanto um espaço para as crianças
dos alunos foi favorecido pela influência Sem Terrinha construírem sua identidade
das relações afetivas estabelecidas duran- nas e pelas interações com seus pares de
te o curso com os seus pares de sala de faixas etárias diferenciadas, com a comu-
aula. Constatamos que as relações sociais nidade e com o movimento. Ela é assim
que se estabelecem no contexto de apren- também um espaço de luta das crianças
dizagem mobilizam o desenvolvimento das pela reforma agrária, por seus direitos
construções coletivas e articulam resolu- e pela escola do campo. No caso do as-
ções singulares significativas para todos os sentamento Mário Lago, que conta com
envolvidos. aproximadamente 260 famílias, a Ciranda
nasceu da vontade e engajamento da pró-
Palavras-chave: afetividade, aluno, relações- pria comunidade quando ainda a mesma
sociais estava em fase de acampamento. Atual-
mente, a Ciranda ocorre em encontros
semanais, aos finais de semana, com ati-
LT04-1421 - CIRANDA INFANTIL DO MST: vidades planejadas e recebe em torno de
DESENVOLVENDO ATIVIDADES COM 30 crianças de variadas faixas etárias. Os
EDUCADORES POPULARES E CRIANÇAS educadores populares são denominados
DO ASSENTAMENTO MÁRIO LAGO DE pelo movimento social de cirandeiros. O
RIBEIRÃO PRETO/SP trabalho junto a esse grupo social é de-
T. V. Araujo - USP senvolvido desde 2007 por meio de uma
thaisevieira@gmail.com disciplina estágio oferecida aos alunos dos
J. B. da Silva - USP dois últimos anos do curso de Psicologia
A. P. S da Silva - USP da Faculdade de Filosofia, Ciências e Le-
Financiamento: FAPESP; USP tras de Ribeirão Preto – Universidade de
São Paulo. No ano de 2010, a intervenção
O presente trabalho tem como objetivo se tornou interdisciplinar, recebendo tam-
relatar uma experiência de ensino e ex- bém alunos do curso de Pedagogia. A base
tensão realizada junto à Ciranda Infantil teórico-metodológica de desenvolvimen-
Rumo à Liberdade do assentamento Má- to humano que fundamenta as atividades
rio Lago, vinculado ao Movimento dos é a teoria histórico-cultural articulada com

906
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

conceitos da perspectiva da Rede de Sig- de práticas que considerem seu direito de


nificações. A intervenção inspira-se ainda participação na vida social e nos processos
em princípios da Psicologia Social Comuni- de decisão em questões que afetam suas
tária. Sob orientação da docente e de uma vidas. Busca assim promover práticas que
monitora da pós-graduação, a equipe atua apontam para novas sociabilidades e que
em duas frentes por meio do desenvol- rompam os processos de dominação etá-
vimento de: grupos formativos junto aos ria, promovendo assim espaços de ativida-
educadores populares do Setor de Educa- des onde as crianças de diferentes idades
ção do assentamento; atividades lúdicas possam estar junto a sua comunidade.
com as crianças da comunidade no espaço Dentre as novas sociabilidades desejadas
da Ciranda. Essas duas frentes de atuação pelo movimento social, são incluídas de-
do grupo têm como ponto de chegada e mandas de desenvolvimento de projetos
de partida a criança, já que o trabalho com junto às crianças para a promoção da rela-
os educadores populares tem como princi- ção com o ambiente natural. O modelo de
pais objetivos a formação para a constru- assentamento baseado no sistema agro-
ção da identidade de cirandeiro e para a florestal, escolhido pela comunidade para
construção da autonomia da comunidade ser implantado no assentamento, compõe
no trabalho intencionalmente planejado assim parte das temáticas abordadas com
para ser desenvolvido com as crianças do as crianças. A construção da autonomia
assentamento. Tendo como um dos princí- dos educadores que trabalham com as
pios a promoção do desenvolvimento tan- demandas da infância do assentamento
to da criança como do adulto, múltiplas é extremamente relevante no trabalho de
linguagens são exploradas nas atividades intervenção desse projeto, assim como a
formativas e nas atividades lúdicas. Orien- instrumentalização da própria comunida-
tados por uma concepção que vê como de para atuar frente às demandas e pro-
inseparável a teoria e a prática, elementos blemas que ocorram em seu espaço de
para as atividades emergem da observa- vivência e no espaço social mais amplo.
ção das ações e da escuta das deman- Os encontros com os educadores e com
das dos cirandeiros. Essa escuta orienta as crianças não se restringem apenas aos
a construção e confecção de diferentes momentos de realização de uma ativida-
materiais que atuam como mediadores de, uma vez que há acompanhamento de
auxiliares nesse processo, buscando am- atividades fora do assentamento, como
pliar os repertórios de brincadeiras, prá- por exemplo, atividades nas escolas em
ticas, organização de espaços e tempos, que as crianças estudam, no trajeto do
recursos e interações dos cirandeiros com ônibus escolar e em reuniões do setor
as crianças. Além disso, as atividades que de educação onde atuam também os ci-
são realizadas na Ciranda partem de uma randeiros. Com esse acompanhamento, o
posição ético-política que busca garantir grupo pode compreender mais apurada-
o direito das crianças de viverem suas in- mente os saberes e a cultura local, suas
fâncias, de construírem suas identidades dificuldades, problemas, potencialidades
e de se apropriarem dos espaços em que e especificidades individuais e coletivas.
vivem por meio da brincadeira, da intera- O trabalho realizado junto à comunida-
ção com crianças de diferentes idades e de assentada, construído a partir desses

907
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

princípios, gera a construção das inter- timento de prazer pela descoberta, em


venções de forma coletiva e contextuali- ser persistente e em superar obstáculos,
zada e de acordo com as demandas das assim alcançando um ótimo rendimento
crianças e dos cirandeiros, objetivando escolar, interação e companheirismo, em
principalmente a melhoria e promoção do que o aprendizado fluirá com maior faci-
desenvolvimento de adultos e crianças en- lidade. Maia (2005) corrobora à discussão
volvidos no projeto. O trabalho contínuo afirmando que a autoestima da criança
realizado diretamente com as crianças e é essencial para o seu desenvolvimento
educadores do movimento na Ciranda In- educacional. A partir desse entendimen-
fantil vem permitindo ao acompanhamen- to, acredita-se que a escola deve propiciar
to do desenvolvimento dos cirandeiros e condições adequadas para o bem estar
das crianças, assim como dos estagiários comum e para uma aprendizagem eficaz.
e profissionais envolvidos no projeto. Essa Nesse contexto, o professor se torna um
intervenção tem se mostrado formativa referencial que poderá contribuir de for-
para o trabalho do psicólogo do desen- ma positiva ao estimular adequadamen-
volvimento em educação não formal, em te a autoestima da criança no cotidiano
contextos rurais e, principalmente, em escolar. De acordo com Melo (2004), o
situações que desafiam modelos de atua- aluno que tem suas características valori-
ção pautados em recortes geracionais. zadas pelo professor tende a desenvolvê-
-las cada vez mais, enquanto aquele que
Palavras-chave: Infância; Formação de se sente rejeitado tende a se afastar-se,
Educadores; Assentamento Rural. acabando por ver as expectativas nega-
tivas do professor confirmadas. Gadotti
(1999) acrescenta afirmando que o edu-
LT04-1465 - A INFLUÊNCIA DA cador deve promover o diálogo, não se
AUTOESTIMA NO PROCESSO DE colocando na posição de detentor do sa-
APRENDIZAGEM ber, mas sim, se colocado na posição de
Juliana Nunes da Silva - FACITEC quem não sabe de tudo, reconhecendo
jully-gospel@hotmail.com que mesmo um indivíduo que não sabe ler
Helen Tatiana dos Santos Lima - FACITEC/ nem escrever possui o conhecimento mais
SEEDF importante: o da vida. Por outro lado, o
helen.tatiana@hotmail.com professor, por ser reconhecido como um
exemplo de ideal de comportamento, se
A autoestima é um aspecto participante e torna um uma figura de reflexo na forma-
importante no processo de aprendizagem. ção da identidade da criança. Por isso, é
Pode-se notar que a maioria das crianças importante que o docente esteja sempre
com problemas de interação e dificuldade se autoavaliando para que sua postura
na sala de aula passaram ou passam por seja vista e observada pelos alunos de for-
problemas em sua comunidade, em sua ma positiva. Por fim, Brigs (1990) aponta
família ou na própria escola, causando a que, neste espaço relacional, a criança
dificuldades em se manter bem e ter uma deve ser tratada com respeito e se sentir
autoimagem positiva. Acredita-se que livre para expressar sua ideias, sem medo
a autoestima favorece à criança o sen- de ser censurada. Isso porque entende-se

908
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que uma criança que é alimentada afeti- pel da escola, elas apontam que as ações
vamente e recebe incentivo do seu edu- da instituição devem contemplar ativida-
cador, tende a explorar com expectativas des diversas que tratem de temas como a
positivas o seu percurso escolar, assim motivação e o respeito e que envolvam,
podendo adquirir novos conhecimentos. também, a família. Além disso, elas con-
Desta maneira, o aprender se torna mais sideram que a criação do espaço dialógico
interessante e o aluno se sente confian- é um importante recurso para favorecer a
te e competente pelas atitudes tomadas autoestima. Entretanto as respostas indi-
em sala de aula. Partindo desses pres- cam que são poucas as ações desenvolvi-
supostos, propôs-se uma pesquisa cujo das no cotidiano escolar voltadas para o
objetivo foi saber se, de fato, a autoesti- trabalho da autoestima, dentre as quais
ma influencia sobre a interação social do se pode citar o desenvolvimento dos pro-
aluno e sobre seu rendimento escolar. O jetos específicos sobre o tema e as apre-
direcionamento do trabalho se firmou sentações coletivas, que visam favorecer
por meio de uma abordagem qualitati- o reconhecimento e a valoração social do
va. Foram realizadas entrevistas com três aluno. Em seu planejamento individual,
docentes que atuam nos anos iniciais do as docentes relatam que contemplam o
Ensino Fundamental de uma escola públi- tema em suas aulas por meio da criação
ca do DF. Todas as participantes eram do do espaço dialógico e da relação afetiva,
sexo feminino e graduadas em Pedagogia. além do desenvolvimento de atividades
Os resultados mostraram que a influência reflexivas. Isso porque elas acreditam que
da autoestima é marcante no processo de a interação entre professor e aluno é um
aprendizagem. Com base nas respostas elo relacional fundamental para a autoes-
apresentadas, os professores consideram tima, de modo que a postura do profes-
que crianças com a autoestima elevada sor para com o aluno pode fazer com que
desenvolvem uma boa abstração do con- este acredite mais em seus potenciais.
teúdo, se sentem confiantes para realizar Nesse sentido, o trabalho permitiu con-
qualquer atividade ou desafio proposto e cluir que todas as docentes acreditam na
se apresentam mais participantes. Contra- relação professor-aluno como elemento
riamente, aquela com uma baixa autoes- fundamental para o desenvolvimento da
tima evita a interação social e apresenta autoestima. No entanto, embora os profis-
dificuldade em se expressar e manter con- sionais da educação considerem a impor-
tato social. As docentes acreditam que as tância da autoestima no sucesso dos pro-
condições que favorecem a autoestima no cessos de aprendizagem, ainda existe uma
contexto escolar estão basicamente orien- prática incipiente sobre a valorização des-
tadas por suas ações, que devem estar tes processos no espaço escolar, o que se
voltadas ao oferecimento de elogios para distancia, portanto, de uma proposta ideal
motivação aos alunos, para a criação de de ação considerada por elas mesmas.
uma relação afetiva com o aluno e para o
desenvolvimento de uma metodologia de Palavras-chave: Autoestima; Criança;
ensino adequada para o desenvolvimento Aprendizagem.
da autoestima, ou seja, que valorize as ca- Contato: Helen Tatiana dos Santos-Lima;
pacidades do aprendiz. No tocante ao pa- FACITEC/ SEEDF; helen.tatiana@hotmail.com

909
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-1488 - ANOFTALMIA UNILATERAL ensino fundamental de escola privada do


NA INFÂNCIA: IMPLICAÇÕES Distrito Federal. Desde os nove meses de
DA PROTETIZAÇÃO PARA O idade foi verificado um déficit na visão e
DESENVOLVIMENTO o desvio do olho direito. A mãe procurou
Douglas Rangel Goulart - UnB um serviço privado, e a criança ficou um
douglasrgoulart@gmail.com período em avaliação, incluindo ecogra-
Elizabeth Queiroz - UnB fia. Com um ano e 11 meses a criança
bethqueiroz@unb.br foi atendida pelo Hospital Universitário
de Brasília, com relato da mãe de que o
Desde o final da década de 1960 hou- olho direito não acompanhava objetos e
ve um crescente aumento no interesse luz. Após tomografia computadorizada
mundial pela reabilitação como campo foi formulada a hipótese diagnóstica de
de atividade da psicologia e importan- retinoblastoma. A mãe foi encaminhada
tes contribuições dos especialistas em para um serviço de referência em cirur-
desenvolvimento têm colaborado para gia oncológica, e através da Secretaria de
aplicações nas práticas clínicas e cientí- Saúde do Distrito Federal marcou uma
fica. As questões pertinentes ao desen- avaliação no Hospital AC Camargo – São
volvimento típico bem como as influ- Paulo. A cirurgia para remoção do glo-
ências genéticas, médicas, ambientais, bo ocular foi realizada em abril de 2007
comportamentais e socioculturais sobre e a paciente retornou para Brasília para
como uma criança irá se desenvolver têm acompanhamento oftalmológico no HUB.
permitido compreender as inter-relações Foi encaminhada para confecção de pró-
entre diagnósticos específicos e as dife- tese ocular externa 30 dias após a cirur-
renças inter e intra-individuais no lidar gia. Esta é uma modalidade de prótese
com prognóstico. Deriva-se daí a noção maxilofacial, que tem o objetivo de recu-
de que alterações no processo de desen- perar a estética facial, prevenir o colapso
volvimento se devem principalmente aos e a deformidade palpebral, restaurar a
fenômenos psicossociais relacionados à direção da secreção lacrimal e proteger
questão da deficiência, importantes de a cavidade anoftálmica contra agressões
serem discutidos tanto com o paciente de elementos externos. A prótese atua
quanto com sua família e equipe de saú- como elemento estimulador do desen-
de. O presente estudo de caso ilustra a volvimento da órbita durante o período
aplicação desses princípios e importância de crescimento para os indivíduos que
dos cuidados personalizados dedicados perderam parte ou todo globo ocular. No
a uma criança submetida à enucleação caso apresentado a primeira prótese foi
do globo ocular direito, devido a um adaptada em junho de 2007 e a atual em
retinoblastoma, associada à reparação maio de 2011. Neste período, oito próte-
protética imediata e acompanhamento ses foram confeccionadas de forma a ga-
sistemático ao longo de seu desenvol- rantir os objetivos acima descritos, o que
vimento. Trata-se de uma menina, hoje equivale a mais de uma por ano, respei-
com seis anos de idade, filha do meio de tando o desenvolvimento físico particular
uma prole de três irmãos, estudante do de sua idade. A possibilidade de reparo
protético foi informada pelo médico pou-

910
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cos dias antes da cirurgia. A mãe relatou pai o que reforça a importância do apoio
ter uma perspectiva negativa quanto à social. A doença da filha afetou a religio-
utilização de uma prótese ocular, porém sidade materna, que passou a acreditar
a adaptação à primeira prótese com dois mais em Deus. Um ponto importante a
anos e quatro meses foi considerada ser destacado neste caso é a noção pro-
boa, caracterizando o auxílio como uma cessual de adaptação. Indivíduos que são
estratégia compensatória, capaz de tirar expostos a situações estressantes apre-
o foco da deficiência. Nessa condição, o sentam reações emocionais que não ne-
desenvolvimento da criança pode seguir cessariamente evoluem para problemas
um curso guiado por suas possibilidades emocionais, compreendidos aqui como
e não pela falta. Em função da idade do patológicos. Além disso, através de uma
diagnóstico, atenção primeira foi dada à rede de apoio, que inclui os profissionais,
mãe no processo de lidar com a prótese e podem ter a oportunidade de identifi-
assimilar a perda do olho. A criança sem- car estratégias de enfrentamento mais
pre apresentou desenvolvimento físico, eficazes para lidar com aquela situação
cognitivo e emocional compatíveis com específica uma vez. O profissional pode
sua idade. Não foram relatadas altera- efetivamente contribuir com o bem estar
ções na alimentação durante a primeira do paciente através de diferentes formas
infância. Apresentou somente doenças de apoio: emocional (sendo empático às
comuns à faixa etária. Não ocorreu dé- percepções do paciente); concreto (aju-
ficit no desenvolvimento motor e da lin- dando-o a superar limitações através do
guagem, quanto aos quesitos de firmar desenvolvimento de habilidades especí-
a cabeça, sentar com apoio, sentar sem ficas ou fornecimento de recursos com-
apoio, engatinhar, desenvolver o movi- pensatórios) e informativo (orientando-o
mento de pinça, andar, balbuciar, falar, sobre sua patologia, prognóstico e possi-
primeiras palavras, primeiras frases, ca- bilidades). Em outras palavras, o profis-
pacidade motora e linguagem atual. A sional pode ser importante modelo de
mãe considera o desenvolvimento da enfrentamento para o paciente e família,
filha semelhante ao dos irmãos, haven- colaborando para sua real reabilitação,
do inclusive boa interação entre eles. A reforçando a necessidade de acesso a
menina frequenta a escola desde os três serviços de saúde e viabilizando condi-
anos, com comportamento colaborador ções de pleno desenvolvimento.
e entusiasmo. A perda ocular e o fato
de usar prótese não são associados à Palavras-chave: Anoftalmia; Reabilitação;
mudança na rotina de vida e no relacio- Prótese Ocular.
namento interpessoal. Os sentimentos Contato: Douglas Rangel Goulart, UnB,
maternos relacionados ao momento do douglasrgoulart@gmail.com
diagnóstico foram tristeza, inseguran-
ça e medo e já não estão presentes no
momento atual. A mãe relata não ter
recebido atendimento psicológico em
qualquer momento do processo de per-
da e reabilitação, o suporte foi dado pelo

911
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

DIA 14/11 - Segunda-feira Distrito Federal especialmente nos últi-


mos quinze anos e a representatividade
da presença dos psicólogos escolares nas
18h-20h instituições educacionais, notadamente
as que compõem o sistema público de
ensino, contribuem para qualificar o Dis-
CONFERÊNCIA trito Federal como um cenário privilegia-
do para a atuação, ensino, pesquisa e in-
tervenção em Psicologia Escolar. A Psico-
LA AUTOBIOGRAFÍA EN CUANTO OPCIÓN logia Escolar vem apresentando no Brasil,
INVESTIGATIVA PARA INDAGAR LA especialmente nas últimas três décadas,
SUBJETIVIDAD POLÍTICA reflexões teóricas, pesquisas e alternati-
Alvaro Díaz Gómez - UTP/Colombia vas de intervenção profissional como re-
sultado de maior criticidade à formação
e à atuação superando, assim, atuações
CONFERÊNCIA tradicionais que pouco consideravam as
questões sociais. Discussões contempo-
râneas na área apontam para a consoli-
PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO dação da atuação profissional orientada
E SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA: pela adoção de práticas inovadoras de
APROXIMAÇÕES E CONTRADIÇÕES ESTAS intervenção e pela incorporação de es-
PERSPECTIVAS tratégias diferenciadas de ação, visando
favorecer a disseminação e implantação
Vera Vasconcellos - UERJ
de uma cultura de sucesso escolar. As exi-
gências da realidade educativa, das de-
mandas de educadores e demais atores
MR LT04 de contextos educacionais, formais ou
Mesa Redonda não, conferem às práticas profissionais
de psicólogos escolares desafios que se
configuram a partir de urgências, indeter-
MR LT04-1263 - A ATUAÇÃO DA minações, novidades, exigindo compe-
PSICOLOGIA ESCOLAR NA EDUCAÇÃO tências teórico-metodológicas fortemen-
PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL te embasadas e um trânsito ágil do pro-
Marisa Maria Brito da Justa Neves - UnB fissional em uma práxis contextualizada
marisa.brito.neves@uol.com.br e referendada em pesquisas e teorias. A
realidade para a qual o psicólogo escolar
A trajetória da Psicologia Escolar no Dis- deve ser preparado é aquela na qual as
trito Federal evidencia nuances, avanços certezas são limitadas, as necessidades
e desdobramentos singulares, produzi- dinâmicas, os cenários constantemente
dos e consolidados por meio de um con- reconstruídos e que vão além da situação
tinuado processo de atuação, pesquisa e ou ambiente imediato no qual o sujeito
intervenção. A expressividade das produ- está inserido, considerando a influência
ções e estudos na área, intensificados no de contextos mais amplos, formais ou

912
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

informais. O reconhecimento do desen- ficuldade em delinear um perfil de atua-


volvimento humano como um processo ção profissional, bem como de articular a
histórico, amalgamado pelas influências prática à teoria, são questões amplamen-
sócio-culturais dos contextos e das rela- te discutidas pelos pesquisadores dessa
ções partilhados, favorece a atuação dos área, assim como a falta de clareza sobre
diversos profissionais ligados à educação, a abrangência das funções possíveis a se-
dentre eles, os psicólogos escolares, de rem desenvolvidas na escola pelos psicó-
modo a permitir-lhes a autoria de mu- logos que nela atuam (Neves, 2009). No
danças e quebras de paradigmas tradicio- entanto, é inegável que a produção teóri-
nais sobre o estudo do desenvolvimento ca nesse campo do conhecimento tem se
e as formas de ensinar e aprender. Cons- consolidado nos últimos anos, onde as pu-
titui-se um compromisso ético dos profis- blicações sistemáticas do Grupo de Traba-
sionais que atuam nos contextos educa- lho em Psicologia Escolar/Educacional da
cionais o planejamento de possibilidades ANPEPP (Almeida, 2003; Campos, 2007;
de trabalho que considerem o desen- Del Prette, 2001; Guzzo, 2002; Marinho-
volvimento histórico presente nos con- -Araújo, 2009; Mitjáns Martinez, 2005;
textos educativos, entendendo-os como Wechsler, 1996) se constituem numa pro-
projetores da ampla e complexa trama va inequívoca dessa realidade. No Distrito
social, na qual não deixa de comparecer Federal, uma parceria entre o Instituto de
o modo singular e único dos sujeitos que Psicologia da Universidade de Brasília e
dela participam e fazem sua história. No a Secretaria de Estado de Educação vem
Distrito Federal, psicólogos escolares tra- ocorrendo desde 1995, por meio do Pro-
balhando há mais de 40 anos na Secre- jeto de Extensão – Integração Universi-
taria de Educação, consolidam ações de dade / Psicologia Escolar- e, as atividades
resistência e renovação de concepções, desenvolvidas no projeto, têm possibilita-
teorias, prática profissional, alicerçadas do um contínuo fluxo de trocas entre os
em pesquisas e inovações interventivas. conhecimentos produzidos e discutidos
A ampliação da área, a busca constante na academia e a prática dos psicólogos es-
de reflexões e de aperfeiçoamento, o de- colares. Assim, a atuação dos psicólogos
senvolvimento de competências cada vez escolares no ensino público do Distrito
mais compatíveis às especificidades do Federal tem se pautado tanto na necessi-
trabalho da psicologia escolar serão dis- dade de acompanhar a produção na área,
cutidas na Mesa proposta. como também, as demandas advindas
das escolas de uma forma ética e social-
mente comprometida. Este trabalho obje-
ENSINO PÚBLICO DO DISTRITO tiva apresentar e discutir as práticas pro-
FEDERAL: A ATUAÇÃO DOS PSICÓLOGOS fissionais desenvolvidas cotidianamente
ESCOLARES pelos psicólogos escolares que atuam na
Marisa Maria Brito da Justa Neves - UnB Rede Pública de Ensino do Distrito Fede-
marisa.brito.neves@uol.com.br ral. Fizeram parte do estudo 66 psicólogos
escolares que atuavam nas escolas públi-
A necessidade de definir a atuação dos cas do Distrito Federal e que participaram
psicólogos nos contextos escolares e a di- de um programa de formação continuada

913
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

promovido, no ano de 2009, pelo Labora- cólogos escolares da SEDF possibilitam o


tório de Psicologia Escolar do Instituto de desenvolvimento de ações voltadas para
Psicologia da Universidade de Brasília, em a compreensão do sistema educacional e
parceria com a Secretaria de Estado de conduzem a Psicologia Escolar na direção
Educação do Distrito Federal (SEDF). Esse da promoção do desenvolvimento huma-
programa tinha dois objetivos principais: no, com foco no sucesso e nas potencia-
o primeiro, promover formação de todos lidades dos sujeitos para transformar-se a
os psicólogos escolares da rede pública e, si mesmos e aos seus contextos. As ativi-
o segundo, promover uma ampla discus- dades tradicionais, principalmente as que
são com esses profissionais com vistas a se centram nos alunos, permanecem com
subsidiar a elaboração de um documen- uma das múltiplas possibilidades de atua-
to norteador do trabalho do Serviço Es- ção desses profissionais e não mais como
pecializado de Apoio à Aprendizagem da a atividade central de suas intervenções.
SEDF. O estudo ora apresentado teve seus Ressalte-se, também, que esse programa
dados sistematizados a partir das respos- de formação continuada possibilitou que
tas dos psicólogos escolares a um ques- todos os envolvidos pudessem discutir e
tionário respondido no penúltimo dia do contribuir para a elaboração da “Orienta-
programa de formação e versa sobre as ção Pedagógica”, documento norteador
práticas cotidianas desenvolvidas por es- das ações dos psicólogos escolares da Se-
ses profissionais numa semana típica de cretaria de Educação do Distrito Federal.
trabalho. Os resultados apontaram como
atividades típicas desenvolvidas pelos Palavras-chave: Psicologia escolar, práticas
psicólogos escolares da SEDF: entrevistas profissionais, formação continuada.
com professores e pais; escuta aos pro-
fessores e aos pais; acompanhamento
de alunos; levantamento de dados para FORMAÇÃO CONTINUADA EM
elaboração do mapeamento institucional; PSICOLOGIA ESCOLAR: PARA
encontros com os gestores e coordena- ALÉM DA CONQUISTA, A POLÍTICA
dores; visitas a outras instituições par- REGULAMENTADA
ceiras; orientações aos professores; es- Claisy Maria Marinho Araújo - UnB
tudos teóricos; atendimento aos alunos; claisy@unb.br
avaliação psicológica; estudos de casos e
participação nas coordenações coletivas A forte vinculação que a Psicologia Esco-
das escolas. A partir desses resultados, lar vem apresentando entre as pesquisas
pode-se afirmar que os psicólogos escola- e os diversificados processos de inter-
res da SEDF incorporaram às suas rotinas venção conferem à área uma ampliação
cotidianas atividades institucionais ende- de sua atuação para contextos, espaços,
reçadas a toda comunidade escolar e que sujeitos, comunidades e políticas, con-
suas ações estão disseminadas nos diver- tribuindo com análises críticas, atuali-
sos espaços escolares, configurando-se, zação, revisão e inovação de práticas e
assim, numa atuação coadunada com as perfis profissionais formados na interface
pesquisas atuais. Depreende-se, também, da Psicologia e da Educação (Marinho-
que as atividades desenvolvidas pelos psi- -Araújo, 2005). A realidade social do país

914
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

instala o compromisso com o aperfeiço- do processo de ensino-aprendizagem. O


amento constante, apropriação e atuali- trabalho discutido nessa Mesa apresenta
zação crítica da base teórico-conceitual, ações desse projeto. Espera-se desenca-
constante reflexão acerca da prática real, dear discussões acerca da consolidação
ressignificada pelos inúmeros sentidos de redes nacionais que gerem políticas
da experiência. O perfil do psicólogo es- educacionais favoráveis à formação e
colar, nessa perspectiva, configura-se de atuação de psicólogos escolares compe-
forma complexa, caracterizado por obje- tentes e comprometidos eticamente com
tivos desenvolvidos na formação (inicial e uma educação de qualidade para todos e
continuada), na demarcação do campo de com todos.
atuação e no domínio de competências e
conhecimentos expressos na intervenção Palavras-chave: Psicologia Escolar, políticas
profissional (Araújo, 2003). Ao longo de públicas, atuação institucional
mais de 40 anos de história, psicólogos
que atuam na Psicologia Escolar da Secre-
taria de Estado da Educação do Distrito FORMAÇÃO CONTINUADA
Federal (SEEDF) buscam superar as adver- EM PSICOLOGIA ESCOLAR:
sidades do cotidiano escolar investindo na RESSIGNIFICANDO METODOLOGIAS
reconstrução da própria história por meio FRENTE AOS DESAFIOS DA ATUAÇÃO
da conscientização de possibilidades e Rejane Maria Barbosa - SEDF
potencialidades forjadas entre avanços e rejmariab@gmail.com
dificuldades, obstáculos e conquistas. A
partir de 2008, a consolidação da atuação Ao longo de 40 anos de história, os psi-
de mais de 120 psicólogos da SEEDF foi cólogos escolares que atuam na rede de
oficializada em portaria governamental e ensino público do Distrito Federal vem ar-
regulamentada nas políticas educacionais ticulando conhecimentos e ações àquelas
do sistema de ensino público do DF para evidenciadas em cada momento histórico
mais de 500 mil alunos na Educação Bá- da Psicologia Escolar no Brasil, de modo
sica, distribuídos em mais de 640 escolas que atualmente evidenciam-se avanços e
públicas. As diretrizes orientadoras das desafios amplamente tratados na litera-
atividades dos psicólogos escolares focam tura da área com as situações cotidianas
a atuação preventiva, relacional e institu- vivenciadas por estes profissionais no es-
cional, favorecendo reflexão e conscienti- paço das escolas do DF, nas quais o psicó-
zação de papéis e responsabilidades da- logo escolar é membro integrante do cor-
queles que atuam no cotidiano da escola po de servidores (Barbosa, 2008). Desta
(GDF, 2010). A gênese dessas orientações forma, acredita-se que a inovação nas re-
e um dos alicerces de sua implementa- flexões e ações para a formação continu-
ção está no projeto de formação conti- ada que vem sendo produzidas no âmbito
nuada em serviço construído há mais de do DF possam contribuir para o enrique-
15 anos em parceria com a Universidade cimento da área e para a construção de
de Brasília, com ênfase ao mapeamen- processos de ressignificação das ações no
to institucional, à escuta psicológica, ao fazer cotidiano da escola em âmbito na-
acompanhamento do trabalho coletivo e cional. Esta mesa redonda tem entre seus

915
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

objetivos apresentar reflexões acerca da SP-LT06 - Simpósio


demanda proveniente do contexto esco-
lar por um profissional capaz de inovar,
por exemplo, nos processos interventivos SP LT06-923 - ACOLHIMENTO
junto aos atores da escola, utilizando-se INSTITUCIONAL E QUALIDADE DO
de espaços coletivos e institucionalizados CUIDADO: O ABRIGO E A FAMÍLIA NO
para favorecer os processos subjetivos da PROCESSO DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E
comunidade escolar e a conscientização AO ADOLESCENTE
das responsabilidades pelo sucesso mui- Maria Clotilde Rossetti-Ferreira - USP
to mais do que pelo fracasso educacional. mcrferre@usp.br
O sistema de ensino solicita um profis- Camila Filocreão - UFPA
sional que, mediante o desenvolvimento milafilocreao@hotmail.com
de novas habilidades de compreensão Celina Maria Colino Magalhães - UFPA
da escola em sua conjuntura social, cul- celina.magalhaes@pesquisador.cnpq.br
tural, política e econômica seja capaz de Laiane da Silva Corrêa - UFPA
planejar estratégias de favorecimento do lai_correa@yahoo.com.br
desenvolvimento dos profissionais que ali Lília Iêda Chaves Cavalcante - UFPA
atuam. Respondendo a esta necessidade liliaccavalcante@gmail.com
evidenciada na produção científica mais Ivy Gonçalves de Almeida - USP
recente, será apresentado o trabalho de- ivy.almeida@uol.com.br
senvolvido em 2009, no âmbito da Secre- Tamires Santos Rufino e Silva - UFPA
taria de Estado de Educação do Distrito tamiresrufino88@gmail.com
Federal (SEDF) com o grupo de psicólogos
escolares, de reelaboração do documento No Brasil, estudos têm mostrado que mui-
norteador da atuação em Psicologia Esco- tas crianças e adolescentes permanecem
lar no DF, denominado Orientação Peda- por longos períodos em abrigos de má
gógica do Serviço Especializado de Apoio qualidade, tendo seus direitos novamente
à Aprendizagem - OP/SEAA (GDF, 2010), violados, freqüentemente, por problemas
bem como o modelo de formação conti- derivados da falta/deficiência de políti-
nuada, desenvolvido à época, que possi- cas públicas que auxiliem suas famílias a
bilitou a interação entre os profissionais enfrentarem suas dificuldades. Nota-se,
e a comissão responsável pela elaboração também, falta de trabalhos efetivos com a
do documento. O modelo inovador do criança, a família e sua rede de apoio du-
trabalho realizado proporcionou a todos rante o acolhimento institucional, que per-
os participantes a discussão acerca das mitam o retorno à família ou, no caso disso
concepções institucionais que balizam a mostrar-se inviável, seu encaminhamento
atuação e a construção coletiva das ações a uma família substituta. Buscando supe-
que hoje estão presentes no cotidiano de rar essa situação, planos, leis e orientações
muitos psicólogos escolares do Distrito técnicas foram formulados e entraram em
Federal. vigor nos últimos anos, introduzindo sérias
mudanças no acolhimento a crianças/ado-
Palavras-chave: psicologia escolar, atuação lescentes privados de cuidados parentais.
coletiva e institucional, formação continuada. A proposta de organização deste Simpósio

916
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

visa fornecer dados que possam contribuir dadores. Os trabalhos acima relacionados
para que abrigos institucionais se adé- dão relevo às diferentes dimensões da
quem às recentes orientações e diretrizes, qualidade que deveria ser a marca de abri-
melhorando a qualidade do acolhimento e gos institucionais que se constituíssem, de
promovendo o desenvolvimento das crian- fato, como contextos de desenvolvimento
ças. Tem também por objetivo fomentar o para as crianças acolhidas. Para atingir esta
intercâmbio entre grupos de pesquisa de qualidade há uma urgente necessidade de
universidades de duas regiões do Brasil, pesquisas na área e de trabalhos de capa-
Norte e Sudeste. O primeiro trabalho, do citação e de apoio para os profissionais
Centro de Investigações sobre Desenvolvi- envolvidos nesse importante momento da
mento Humano e Educação Infantil (CIN- vida das crianças. Cabe, ainda, acrescentar
DEDI) da Universidade de São Paulo (USP), que as novas leis e normativas nacionais
buscou trazer para esse contexto conheci- responsabilizam o abrigo, prioritariamen-
mentos e práticas interessantes, construí- te, pelo trabalho de reintegração familiar.
das nas últimas décadas, na Educação In- Para isso faz-se necessário capacitar seus
fantil. Aborda, especificamente, o momen- profissionais e mobilizar um rede integra-
to de ingresso da criança na instituição e da de serviços que os apoie nessa bela e
a complexa integração abrigo-família. O difícil tarefa.
segundo e o terceiro trabalhos apresen-
tam ações investigativas e interventivas
que, desde 2004, vêm sendo realizadas O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL
no maior abrigo para crianças de zero a ENQUANTO CONTEXTO DE
seis anos da região metropolitana de Be- DESENVOLVIMENTO: O MOMENTO DO
lém, sob a responsabilidade de alunos e INGRESSO E A INTEGRAÇAO ABRIGO –
professores do Laboratório de Ecologia do FAMILIA
Desenvolvimento (LED) da Universidade Maria Clotilde Rossetti-Ferreira - USP
Federal do Pará (UFPA). Um dos trabalhos mcrferre@usp.br
apresenta a experiência de adaptação e Ivy Gonçalves de Almeida - USP
a aplicação da Escala Infant Toddler Envi- ivy.almeida@uol.com.br
ronment Rating Scales (ITERS), revelando Financiamento: CNPq/CAPES
aspectos que concorrem para a qualidade
do ambiente físico e social em instituição Estudos têm mostrado (AASPTJ-SP, 2004;
de abrigo e, consequentemente, para as IPEA, 2005) que muitas crianças e adoles-
interações adulto-criança e criança-crian- centes permanecem por longos períodos
ça. No terceiro estudo foram investigados em abrigos de má qualidade, tendo seus
conhecimentos e concepções sobre desen- direitos novamente violados, frequente-
volvimento infantil e práticas de cuidado mente, por problemas derivados da falta
em situações de brincadeira, observadas ou deficiência de políticas públicas que
entre educadores de uma instituição de auxiliem suas famílias a enfrentarem suas
acolhimento infantil, refletindo-se acerca dificuldades. Nota-se, também, falta de
da qualidade do nicho de desenvolvimen- trabalhos efetivos com a criança, a família
to da criança a partir da integração entre e sua rede de apoio durante o acolhimento
ambiente, psicologia e práticas dos cui- institucional, que permitam seu retorno à

917
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

família ou, no caso disso mostrar-se invi- instituição e a integração instituição - fa-
ável, seu encaminhamento a uma família mília. Quanto à inserção da criança na Edu-
substituta. Buscando superar essa situ- cação Infantil evidenciamos, em nossas
ação, planos, leis e orientações técnicas pesquisas, que a boa adaptação da criança
(Eca, 1990; Conanda & Cnas, 2006; 2009; à creche e o estabelecimento de um bom
Lei nº 12010, 2009) foram formulados relacionamento com a família dependem
e entraram em vigor, nos últimos anos, da qualidade do trabalho de acolhimento
introduzindo sérias mudanças no acolhi- à criança e à família. O processo de aco-
mento a crianças/adolescentes privados lher é planejado e feito quando se prepara
de cuidados parentais. Neste momento, e se inicia um novo ingresso, favorecendo
os abrigos institucionais se defrontam com a gradual integração da criança ao novo
exigências de adequação às novas normas, contexto, com ativa participação da famí-
que seus dirigentes raramente tiveram lia. Descobrimos, também, a importância
oportunidade de conhecer ou enfrentam da organização dos espaços, com o obje-
dificuldades para atendê-las e pô-las em tivo de promover o relacionamento entre
prática. Desta forma, o desafio e os esfor- as crianças e seu envolvimento em ativida-
ços atuais são para que estas instituições des conjuntas ou individuais, que favore-
se constituam, realmente, como espaços çam seu desenvolvimento (Amorim et al.,
coletivos de cuidado e educação de crian- 2004; Vitória & Rossetti-Ferreira, 1993). E
ças e adolescentes conquistando, assim, a no abrigo? Como fazer essa acolhida em
legitimidade de um serviço capaz de pro- situações de ruptura com a família, as
mover seu desenvolvimento, mesmo que quais podem envolver abandono, violên-
em caráter excepcional e provisório. Histo- cia, além de muito sofrimento, revolta e
ricamente, também as instituições de Edu- dor? Há poucas pesquisas nessa área. Os
cação Infantil, em especial a creche, foram dados que vimos obtendo em nosso grupo
e com freqüência ainda são vistas como de pesquisa e intervenção mostram que,
“mal necessário”. Muitos estudos e esfor- ao serem levadas de casa para o abrigo, as
ços foram necessários para tirá-las desse crianças raramente são informadas sobre
status e inseri-las no sistema de ensino, o que está ocorrendo ou do que vai ocor-
com um conjunto de leis e normativas, aos rer com elas ou com sua família (Rossetti-
quais se acrescentou, recentemente, um -Ferreira, Solon & Almeida, 2010; Rossetti-
sistema de avaliação com o objetivo de -Ferreira et al., no prelo). Não há preparo
promover um atendimento de qualidade algum para recebê-las. Os funcionários do
(Soares-Silva, Mello, Pantoni & Rossetti- abrigo, sobrecarregados de múltiplas ta-
-Ferreira, 2009; Souza, Mello & Rossetti- refas e sem orientações sobre o caso, em
-Ferreira, 2009). Quanto esse saber e essa geral, não sabem o que e como conversar
experiência podem nos ser úteis e contri- com a(s) criança(s) naquele momento.
buir para a promoção da qualidade dos Eles têm dificuldade para lidar com as rea-
abrigos institucionais? Quais as semelhan- ções e sentimentos da criança e da família
ças e diferenças entre esses dois contex- diante das separações e rupturas abruptas
tos? Nesta apresentação, dada a restrição impostas pela forma como esta medida
de tempo, decidimos abordar dois pontos de proteção tem sido realizada. Eles men-
interrelacionados: a inserção da criança na cionam seu próprio sofrimento frente ao

918
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sofrimento das crianças. Há uma urgente atue como mediadora em seu processo de
necessidade de pesquisas na área, além de integração no abrigo. Ademais, embora o
trabalhos de capacitação e de apoio para objetivo maior do acolhimento institucio-
os profissionais envolvidos nesse impor- nal seja a reintegração familiar, predomina
tante momento na vida e no desenvolvi- certo preconceito para com as famílias das
mento da criança. A integração instituição- crianças. As visitas dos familiares não são
-família é um tema bastante complexo que favorecidas, sendo marcadas em horários
abordaremos aqui, apenas, para comple- restritos que impedem pais trabalhadores
mentar o item anterior. Na Educação In- de irem visitar os filhos, embora a freqüên-
fantil percebemos que nas instituições fe- cia de visitas seja tomada como índice do
chadas, onde as crianças eram entregues e vínculo existente entre eles. Conforme as
buscadas pela família na porta da rua, não novas leis e normativas, a responsabilida-
se percebia a necessidade de realizar um de pelo trabalho de reintegração familiar
trabalho específico para o momento do cabe, prioritariamente, ao abrigo. É neces-
ingresso da criança nesse novo ambiente. sário, porém, capacitar seus profissionais
Achava-se que, com o tempo, bem ou mal, para isso e mobilizar uma rede integrada
as crianças se adaptavam. O contato com de serviços que os apoie nessa bela e difícil
as famílias se resumia a reuniões com pais, tarefa.
onde estes podiam ver os trabalhinhos dos
filhos e recebiam orientações sobre como Palavras-chave: acolhimento institucional,
proceder com eles quanto à higiene (pio- integração abrigo-família, educação infantil
lho...) e disciplina, dentre outros tópicos. Contato: Maria Clotilde Rossetti-Ferreira,
Nas instituições abertas, pais ou familiares CINDEDI/FFCLRP-USP, mcrferre@usp.br
podiam acompanhar as crianças até sua
sala, havendo um contato mais próximo
com a educadora. Essa proximidade nem AVALIAÇÃO DE QUALIDADE DE UMA
sempre era tranqüila, podendo envolver INSTITUIÇÃO DE ACOLHIMENTO
momentos de conflito e ciúmes. Nessas PROVISÓRIO INFANTIL
instituições, uma boa parceria com a fa- Camila Lima Filocreão - UFPA
mília e a adaptação da criança ao novo milafilocreao@hotmail.com
ambiente dependiam de um cuidadoso Celina Maria Colino Magalhães - UFPA
trabalho de acolhimento às crianças e seus celina.magalhaes@pesquisador.cnpq.br
familiares nos primeiros dias e semanas Lília Iêda Chaves Cavalcante - UFPA
de freqüência na instituição. E como se dá liliaccavalcante@gmail.com.br
esse processo de integração nos abrigos? Financiamento: CNPq
Em nossos estudos e práticas temos veri-
ficado que a retirada da criança da família, O desenvolvimento humano acontece em
em geral, é feita de forma abrupta e sem todos os momentos da vida das pessoas,
explicações para os familiares ou para a através de uma constante interrelação do
criança. Não existe possibilidade de que organismo humano e de seu ambiente,
uma pessoa que tenha vínculo com a crian- em diversos níveis de complexidade.(Bron-
ça, mesmo quando não envolvida na negli- fenbrenner, 1996). Muitos pesquisadores
gência ou violência que levou à separação, questionam qual seria o ambiente mais

919
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

promissor para um bom desenvolvimento justifica-se por certas semelhanças entre


físico, cognitivo e emocional infantil. A le- esses dois nichos, a saber: ambos são am-
gislação brasileira defende a família como bientes de caráter extra-familiar, cujo cui-
espaço ideal e privilegiado para o desen- dado é realizado por profissionais e onde
volvimento integral (Brasil, 2006). Todavia, há ausência de espaços individualizados,
nos casos em que a convivência familiar além de oferecerem uma convivência diá-
ameaça ou viola os direitos de crianças e ria e intensa entre coetâneos (Amorim, Ya-
adolescentes, a instituição será a respon- zlle e Rossetti-Ferreira, 2001). Neste senti-
sável pelo acolhimento provisório, com a do, o presente estudo caracteriza-se como
responsabilidade de suprir as demandas e exploratório, objetivando avaliar, através
oferecer condições a um desenvolvimento da Escala ITERS, a qualidade ambiental
saudável (ECA, citado em Lamarão e Ama- do Abrigo Municipal do Estado do Pará.
ral, 2007). Apesar de se propor como uma Fizeram parte do estudo 42 bebês e 50
medida de proteção, várias são as pesqui- educadoras. Os bebês eram acolhidos nos
sas que demonstram que esta medida tem dormitórios de acordo com o critério de na
potencial tanto para ser um fator de risco faixa etária: D1 (zero a 5 meses), D2 (6 a
quanto de proteção. O que definirá a natu- 11 meses), D3 (12 a 23 meses ) e D4 (24
reza da influência que terá sobre a expe- a 35 meses). A maioria era do sexo mas-
riência de vida da pessoa institucionaliza- culino (60,5%) e a metade tinha irmãos
da será o conjunto das características nas abrigados na mesma instituição. Negligên-
quais acontece (Cavalcante, Magalhães e cia (22,6%), dependência química dos pais
Pontes, 2007; Salinas-Brandão e Willians, (22,6%) e abandono (19,3%) foram os mo-
2009; Siqueira e Dell´aglio, 2006). Reco- tivos mais citados para institucionalização.
nhecendo que a falta de qualidade pode No que se referem às educadoras, metade
ter repercussões negativas sobre o proces- tinha o Ensino Médio Completo, enquanto
so de desenvolvimento, o Governo Fede- 28% tinham Formação Superior, mais da
ral, recentemente, estabeleceu critérios metade eram mães (63%) e o tempo mé-
de qualidade para regulamentar os servi- dio de serviço foi de 48 meses. A ITERS é
ços de institucionalização (Brasil, 2009). uma escala norte-americana criada para
Entretanto, ainda não foram estabelecidos avaliação de ambientes de cuidados coleti-
instrumentos capazes de realizar essa ava- vos a crianças de zero a 30 meses (Harms,
liação de forma padronizada. Na ausência Cryer & Clifford, 1990). São 35 itens que a
de instrumentos formulados para este fim, compõem, agrupados em sete subescalas:
Cavalcante (2008) e a presente pesquisa I - Material e Mobiliário para as crianças;
pensaram a Escala Infant Toddler Environ- II - Rotinas e Cuidados Pessoais; III - Lingua-
ment Rating Scales (ITERS) como uma pos- gem oral e compreensão; IV - Atividades
sibilidade real de se ter, ao mesmo tempo, de Aprendizagem; V - Interação; VI - Es-
critérios e meios de se avaliar, acompanhar trutura do Programa e VII - Necessidades
e melhorar a qualidade de ambientes de dos adultos. Cada item observado pode
institucionalização. Apesar da grande par- receber as seguintes pontuações: (1) Ina-
te dos estudos que utilizaram a ITERS te- dequado (3) Mínimo (5) Bom (7) Excelente
rem sido realizados em ambientes de cre- e as pontuações intermediárias (2) (4) e
ches, o uso desse instrumento em abrigos (6). A pesquisa foi submetida ao Comitê de

920
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Ética e, depois, se contatou a Instituição e etc. O instrumento se revelou sensível tan-


se iniciou um período de habituação. Para to para classificar a qualidade ambiental
a coleta, a maioria dos itens foi pontuada quanto para apontar quais são os pontos
simultaneamente à observação, enquanto que merecem atenção e planejamento
outros necessitaram de entrevistas com as para a melhoria dos serviços. A crítica mais
educadoras e profissionais de outros seto- relevante que se tem da Escala ITERS, en-
res, pela impossibilidade de serem obser- quanto instrumento capaz de oferecer in-
vados diretamente. Ao total foram realiza- dicadores de qualidade para instituições
das onze horas de observação por dormi- de acolhimento provisório, é que ela não
tório. Para a análise dos dados foi extraída engloba todas as características peculia-
a média da somatória de todos os itens res ao processo de institucionalização. Por
avaliados pela ITERS como, também, o va- isso, seria interessante a adaptação desse
lor médio alcançado em cada subescala. A instrumento, com acréscimo de alguns
análise foi realizada com o auxílio de uma itens e alteração de pequenos detalhes
planilha eletrônica. Em uma avaliação ge- para torná-lo, realmente, capaz de atender
ral dos quatro dormitórios, as médias dos as idiossincrasias desse fenômeno dentro
dormitórios D1, D2, D3 e D4 foram, respec- da realidade brasileira.
tivamente, 1,26; 1,34; 1,52 e 1,56. Todos
os itens avaliados nestes dormitórios rece- Palavras-chave: Escala de Avaliação
beram somente as pontuações um, dois e de Ambientes Coletivos para Crianças,
três, dentro de uma escala de Likert com desenvolvimento infantil, crianças
valores que se deslocam de um a sete. Isto institucionalizadas
denota que, dentro dos critérios da escala, Contato: Camila Lima Filocreão, FASPI/UFPA,
nenhum aspecto desse espaço de cuida- milafilocreao@hotmail.com
do coletivo foi merecedor de avaliação de
qualidade considerada boa (quando rece-
be o valor 5) ou excelente (quando recebe CONCEPÇÕES SOBRE DESENVOLVIMENTO
o valor 7). Sobre os fatores relacionados à E PRÁTICAS DE CUIDADO DE
baixa pontuação, poderemos citar: o mau EDUCADORES DE ABRIGO EM SITUAÇÕES
estado e a ausência de imobiliários neces- DE BRINCADEIRA
sários à rotina de cuidados; os hábitos de Laiane da Silva Corrêa - UFPA
higiene precários; a ausência de médico lai_correa@yahoo.com.br
especializado em pediatria e a falta de Lília Iêda Chaves Cavalcante - UFPA
equipamentos de saúde e remédios im- liliaccavalcante@gmail.com
portantes; a desproporção entre o número Celina Maria Colino Magalhães - UFPA
de educadores para o número de crianças, celina.magalhaes@pesquisador.cnpq.br
que afetava a prontidão para que as edu- Tamires Santos Rufino e Silva - UFPA
cadoras atendessem as demandas infantis; tamiresrufino88@gmail.com
cuidado despersonalizado por parte do Financiamento: CAPES/CNPq
adulto; interações marcadas pela agressão
e competitividade entre as crianças; pouca Pesquisas realizadas em ambiente extra-
oferta de atividades lúdicas e de estimula- -familiar são escassas na área do desen-
ção; falta de capacitação das educadoras; volvimento infantil, especialmente, sobre

921
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

práticas de cuidado oferecidas às crian- penho obtido no KIDI: os que acertaram


ças abrigadas e concepções destes pro- mais questões do inventário (G1) e os que
fissionais no que tange a transformações erraram mais (G2). Das sessões observa-
vividas na infância (Cavalcante, 2008). No cionais, foram selecionados momentos em
âmbito das práticas de cuidado encontra- que cada educador esteve envolvido com
-se um conjunto de atividades referentes situações de brincadeira. Os resultados
a formas de atenção e zelo, abrangendo mostram que, entre estes profissionais, a
a dimensão social e psicológica da crian- maioria é mulher (99%), com mais de 35
ça, que têm relativa importância no curso anos, possui filhos, completou o ensino
normal do desenvolvimento. Nesse cená- médio e tem mais de 24 meses de expe-
rio desponta a brincadeira que, por ser tão riência como educador. No que se refere
importante para a saúde física e mental, ao resultado da aplicação do instrumento,
foi reconhecida como um direito que deve 66% dos educadores acertaram em média
ser garantido à criança, conforme propõe o 66 questões. Os educadores apresentaram
ECA (1990). Para Cordazzo e Vieira (2007), desempenho superior a 50% de acerto em
a brincadeira possibilita trocas afetivas e todas as categorias avaliadas. Entretan-
externalização de questões importantes to, os melhores resultados foram obtidos
da história de vida da criança, bem como em assertivas relacionadas às práticas de
estimula o desenvolvimento, proporciona cuidado (80%) e princípios do desenvolvi-
meios para a aprendizagem e funciona, de mento (68%). A escolaridade se apresen-
acordo com Martins e Szysmanski (2004), tou como variável significativa no nível de
como fator de proteção para quem vive conhecimento. Observou-se, ainda, que o
em espaços de acolhimento institucional. conhecimento sobre desenvolvimento in-
Este estudo teve como objetivo investigar fantil se apresenta como variável relevante
conhecimentos e concepções sobre desen- para o tempo dedicado a momentos lúdi-
volvimento infantil e práticas de cuidado cos, na rotina de cuidados e na qualidade
em situações lúdicas, presentes entre edu- das interações mantidas com a criança. As
cadores de uma instituição de acolhimento práticas de brincadeira representam 36
infantil. Fizeram parte do estudo 100 edu- horas, o que correspondente a 30% de um
cadores, responsáveis pelo cuidado diário total de 120 horas de observação. O mo-
a crianças encaminhadas a um espaço de mento é marcado por recreação, entrete-
acolhimento institucional na cidade de nimento e diversão proporcionados pelo
Belém-Pará. Os educadores responderam ato de brincar. Verifica-se que as situações
ao Inventário do Conhecimento de Desen- de brincadeira têm duração de mais de
volvimento Infantil (KIDI); o instrumento 10 minutos sendo que, em alguns casos,
possui 75 questões e abrange quatro cate- chegam a ocupar quase ou toda a sessão
gorias: práticas de cuidado, saúde e segu- observacional, estendendo-se por mais de
rança, normas e aquisições e princípios do 60 minutos. Quanto aos espaços em que
desenvolvimento. Do universo citado, fo- se desenvolvem, as atividades lúdicas po-
ram selecionados 10 educadores, divididos dem ser realizadas nos mais diversos am-
em dois grupos, que participaram das ses- bientes do abrigo. Durante a observação
sões observacionais. O critério para essa das rotinas de cuidado, foram registradas
escolha foi a seleção com base no desem- brincadeiras livres em diversos espaços da

922
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

instituição, sem a condução da educadora, ticas coercitivas. Contudo, é válido ressal-


mas, sob a sua supervisão. Notam-se, tam- tar que não foi identificado nenhum tipo
bém, brincadeiras dirigidas - envolvendo de punição física. No geral, percebe-se
histórias, músicas e jogos - proporcionadas que estas profissionais exigem o cumpri-
e iniciadas, quase sempre, pela educadora. mento de normas e regras, porém, as ex-
No que se refere à disponibilidade de brin- plicações são diretas, com pouca interação
quedos, vê-se que são escassos, especial- verbal e reforço frente ao comportamento
mente, dentro dos dormitórios. Entre as socialmente aceitável e não-aceitável. Ao
educadoras que compõem os dois grupos, que parece, o brincar próximo e/ou junto
identifica-se que a brincadeira está presen- é pouco valorizado neste grupo, as ações
te, frequentemente, na rotina de cuidados estão mais voltadas para a supervisão das
com as crianças, sendo que o tempo de atividades lúdicas com intervenções pon-
dedicação a esta atividade é maior no G1. tuais, dependendo da necessidade. De
Quando se analisa os extratos de práticas, um modo geral percebe-se que práticas
identifica-se que as diferenças entre os voltadas à estimulação, à orientação e ao
dois grupos dizem respeito não só ao tem- ensino de habilidades diversas, no brincar,
po destinado a estas situações, mas, tam- fornecem um conjunto de estímulos que
bém, a aspectos relacionados à interação favorece o processo desenvolvimental da
e qualidade dos diálogos. Para as análises criança (Cole & Cole, 2003) que vive em
das situações de brincadeira foram consi- abrigos (Martins & Szymanski, 2004). Nes-
deradas três categorias (Piccinini, Frizzo & tes termos, um ambiente rico de estimula-
Marin, 2007): orienta quanto à natureza, ções pode ser de suma importância para
função e regras do brincar; estimula, enco- amenizar os efeitos do ambiente de abrigo
raja e desafia quanto à divisão e compar- para as crianças (Bronfenbrenner, 1996).
tilhamento de brinquedos e brincadeiras; E, à primeira vista, as educadoras do G1
e ensino de conceitos e pronúncia correta tendem a adotar práticas de cuidados nes-
ao falar. Os resultados mostram uma di- ta direção. A partir dos resultados encon-
ferença marcante entre os dois grupos de trados neste estudo, verifica-se o quanto
profissionais que cuidam de crianças nas se faz importante conhecer o abrigo en-
situações lúdicas. O que se observa é que, quanto contexto abrangente de desenvol-
em grande parte dos extratos, cada grupo vimento, assim como coloca em debate a
tende a apresentar posturas diferenciadas importância de entender o cuidado insti-
em suas práticas de cuidado. Os dados tucional a partir das concepções e práticas
apontam, entre as educadoras do G1, o de cuidados de educadores (Harkness &
uso comum de práticas de cuidado mais Super, 1996).
indutivas, onde se valoriza a disciplina,
sinalizando à criança as consequências e Palavras-chave: concepções e práticas de
importância do seu comportamento, com cuidado, educadores de abrigo, situações de
o incentivo à cooperação e à negociação. brincadeira
Em termos de estratégias adotadas nos Contato: Laiane da Silva Corrêa, PPGTPC/
momentos da brincadeira, o grupo de edu- UFPA, lai_correa@yahoo.com.br
cadoras que fazem parte do G2 converge
para a adoção de práticas com caracterís-

923
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

CO 20 - LT03 dos estágios e afirmou que nem todas as


pessoas atingem os estágios mais eleva-
Medidas socioeducativas dos. No primeiro nível, denominado pré-
-convencional, estão os estágios 1 e 2. É aí
que estão incluídos a maioria das crianças
LT03-759 - PROMOÇÃO DA AUTONOMIA
menores de 9 anos, alguns adolescentes
DE ADOLESCENTES EM UMA UNIDADE
e muitos adolescentes autores de ato in-
DE ACOLHIMENTO DO DISTRITO
fracional e adultos. As normas morais e
FEDERAL
expectativas não são entendidas e com-
Juliana Castro Benício de Carvalho - SEDEST partilhadas, ficando externas a essas pes-
castrojuli28@yahoo.com.br soas. Já no segundo nível, o convencional,
Sandra Francesca Conte de Almeida - UCB estão os estágios 3 e 4, onde se encontra
sandraf@pos.ucb.br a maioria dos adolescentes e adultos da
sociedade ocidental. Os indivíduos inter-
O trabalho traz o relato de experiência nalizaram as regras sociais, especialmente
em uma Unidade de Acolhimento pública quando estas provêm de uma autoridade.
do Distrito Federal, que recebe crianças e No terceiro nível, o pós-convencional (es-
adolescentes que estão sob medida pro- tágios 5 e 6), alcançado por uma minoria
tetiva do Estado, segundo previsto no Art. dos adultos, as regras da sociedade são
101, VII do Estatuto da Criança e do Ado- aceitas, desde que princípios morais gerais
lescente - ECA. O acolhimento institucio- sustentem essas regras. Caso contrário, as
nal é necessário, pela presença de situa- normas apresentadas são questionadas e
ções de violação de direitos, como maus nem sempre seguidas à risca, daí seu ca-
tratos, negligência ou abuso sexual, por ráter autônomo. Um ponto importante é
exemplo, no ambiente familiar. Tal medida que o desenvolvimento moral do sujeito é
é provisória e excepcional, buscando-se propiciado a partir das interações sociais,
sempre a reintegração familiar e/ou co- nos mais variados contextos; com o pas-
munitária dos acolhidos. Em alguns casos, sar do tempo, diminuem-se as relações de
a reintegração na família de origem ou em coação e aumentam-se as de cooperação.
família substituta não ocorre, sendo então Kohlberg afirma que existe uma atmosfe-
extremamente necessária uma interven- ra moral nos ambientes que oferecem as
ção educativa junto ao adolescente, de condições para esse crescimento. Essas
modo a promover sua autonomia visando condições são: discussão aberta com o
à vida adulta. Buscando o desenvolvimen- foco na justiça e na moralidade; estimu-
to moral e autonomia dos adolescentes lação de conflitos cognitivos estimulados
acolhidos, este trabalho se referencia na pela exposição de diferentes pontos de
teoria de Lawrence Kohlberg, que, após vista e raciocínio num estágio superior,
aprofundar os estudos de Jean Piaget participação na construção de regras e o
sobre heteronomia e autonomia, propôs exercício da autoridade e responsabilida-
seis estágios de desenvolvimento moral. de. A partir da proposta apresentada por
Kohlberg organizou os seis estágios do de- Kohlberg, procurou-se implantar algu-
senvolvimento do julgamento moral em mas ações na Unidade de Acolhimento,
três níveis, enfatizou o caráter universal visando promover a autonomia dos ado-

924
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lescentes acolhidos. A referida Unidade casa lar, foi eleito um representante e um


teve início no ano de 1971, sob a égide vice-representante, sendo em seguida
da Política Nacional do Bem-Estar do Me- realizadas assembleias para discussão e
nor, atendendo, na ocasião, as disposições deliberação dos assuntos de interesse dos
do Código de Menores. Tinha como fun- acolhidos. Eles tinham um caderno para
ção o abrigamento e a triagem de crian- anotar as reivindicações, reclamações e
ças e adolescentes de 0 a 18 anos, do sugestões das crianças e adolescentes da
sexo feminino, e de 0 a 12 anos, do sexo casa e as levavam às reuniões. Represen-
masculino, privados do convívio familiar tantes dos setores da equipe que atuava
por maus-tratos, abandono, negligência, no local também estavam presentes nas
exploração sexual, mendicância, perma- assembleias, que era mediada pela coor-
nência nas ruas, dentre outros problemas. denadora da Unidade. Um dos objetivos
Recebia, do então Juizado de Menores e da realização das assembleias era a busca
da Delegacia de Menor, crianças e adoles- de alternativas frente às situações de con-
centes em “situação irregular”, decretada flito que surgiam no cotidiano da Unidade.
pelo Juiz de Menores. Em 1999, inicia-se o Na maioria das vezes, buscava-se um limite
reordenamento da Unidade e em 2005 a e uma autoridade externas à equipe, com
construção das primeiras casas lares, com o encaminhamento do adolescente à De-
a presença de mães sociais para o cuida- legacia da Criança e do Adolescente - DCA,
do das crianças e adolescentes acolhidos. e consequente enquadramento em algum
No ano de 2007, aumenta-se o número de ato infracional, conforme previsto no ECA.
casas lares e substitui-se a figura da mãe Na primeira reunião, surgiu o tema “dano
social (que residia no local) por cuidadores ao patrimônio em decorrência de briga
sociais, trabalhando em regime de escala. ou agressividade de algum acolhido”. Os
Sobre o público acolhido, vale ressaltar a adolescentes elaboraram alternativas de
presença, atualmente, de grande número reparação do dano, na própria Unidade,
de adolescentes, muitos com vivência de mas os profissionais presentes alegaram
rua, usuários de drogas e/ou autores de que tal ação era ato infracional por dano
ato infracional. Estes precisam de prote- ao patrimônio público, sendo, na visão de-
ção do Estado, mas possuem dificuldade les, necessário o encaminhamento à DCA.
de adaptação em outras instituições, o que Com isso, qualquer negociação junto aos
os leva a serem encaminhados à Unidade adolescentes ficava comprometida. A par-
de Acolhimento em questão. Buscando-se tir desse momento, pensou-se em uma se-
facilitar o desenvolvimento da autono- gunda alternativa: reunião somente com a
mia dos adolescentes acolhidos, a partir equipe, a fim de alinhar a concepção de
da idéia de proteção integral da criança e proteção, segundo o ECA, com o objetivo
do adolescente, preconizada pelo ECA, e da unidade de acolhimento. Percebeu-se,
levando-se em consideração as condições nesse segundo momento, grande dificul-
de contexto que são favoráveis ao desen- dade de muitos profissionais da equipe
volvimento moral dos sujeitos, foram or- em compreender os pressupostos do Es-
ganizadas ações junto aos adolescentes, tatuto, ficando presos à concepção do Có-
visando promover maior participação digo de Menores, que orientava a prática
destes na rotina da Unidade. Para cada da equipe na época da fundação da Uni-

925
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade. Ações de vigilância e punição ainda sante um trabalho acerca do desenvolvi-


estavam bem presentes no discurso e na mento de tais jovens, inclusive, para am-
prática dos profissionais, com grande pre- pliar as discussões e reflexões sobre a sua
sença de relações de coação e pouca de realidade psicológica: O que poderíamos
cooperação. Diante desse cenário, cabe a encontrar ao investigarmos temas morais
seguinte reflexão: para que as crianças e em adolescentes que cometeram deli-
os adolescentes acolhidos possam se de- tos? Que valores estariam presentes em
senvolver em direção à autonomia, pre- suas concepções? Que contornos morais
cisam ser escutados e reconhecidos pela e éticos os adolescentes estariam esta-
equipe da Unidade de Acolhimento como belecendo? Compreendemos, portanto,
sujeitos que têm o direito de discutir e to- que o estudo dos adolescentes em medi-
mar decisões sobre problemas e dilemas das socioeducativas torna-se imperativo
morais que os afetam, aprendendo a au- dentre os temas sociais. Em específico,
torregular suas próprias ações. Rever con- tivemos como objetivo investigar os con-
cepções e práticas sociais, por parte dos teúdos dos juízos e das justificativas dos
profissionais da Equipe, de modo a res- referidos jovens sobre o que admiram em
significá-las em consonância com o ECA, si mesmo, analisando os dados a partir de
faz-se absolutamente necessário, para referenciais da psicologia da moralidade
que as intervenções propostas promovam (La Taille, 2006; Piaget, 1932/1994). Fo-
o desenvolvimento e o julgamento moral ram entrevistados 30 adolescentes, entre
dos adolescentes acolhidos, em direção à 16 e 17 anos, do sexo masculino, internos
autonomia pretendida. do Instituto de Atendimento Socioeduca-
tivo do Espírito Santo (Iases), na região
Palavras-chave: autonomia, acolhimento, metropolitana da grande Vitória/ES. Rea-
adolescência lizamos entrevistas individuais, de acordo
Contato: Juliana Castro Benício de Carvalho, com o método clínico piagetiano (Piaget,
SEDEST, castrojuli28@yahoo.com.br 1926/s.d.;1932/1994). Pudemos notar,
que os participantes ao mencionarem o
que admiram em si mesmos forneceram
LT03-877 - AS ADMIRAÇÕES DE 117 respostas, que foram distribuídas em
ADOLESCENTES EM MEDIDA 16 categorias, sendo as principais: ‘perse-
SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO: UM verança/força de vontade’ (n=16; 13,7%),
ESTUDO NA ÁREA DA MORALIDADE ‘respeito pelas pessoas’ (n=12; 10,3%),
Marcelo Menezes Salgado - PPGP/Ufes ‘bondade/generosidade’ (n=11; 9,4%),
marcelomsalgado@gmail.com ‘beleza’ (n=10; 8,5%), ‘educação’ (n=9;
Heloisa Moulin de Alencar - PPGP/Ufes 7,7%), ‘inteligência’ (n=8; 6,8%), ‘auto-
heloisamoulin@gmail.com controle’ (n=7; 6,0%), ‘extroversão’ (n=7;
Financiamento: CAPES 6,0%), ‘amizade’ (n=6; 5,1%) e ‘afetuosi-
dade’ (n=6; 5,1%). Indagados acerca das
A presente pesquisa consiste em um estu- justificativas para se admirar tais aspectos,
do sobre as admirações de adolescentes os jovens apresentaram 431 argumentos.
que cumprem medidas socioeducativas O grande volume de justificativas permi-
de internação. Entendemos ser interes- tiu que as agrupássemos em 18 catego-

926
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rias: ‘bem-estar próprio’ (n=60; 13,9%), ao desenvolvimento de características que


malefício evitado para si’ (n=49; 11,4%), auxiliem nos relacionamentos sociais? En-
‘reputação’ (n=48; 11,1%), ‘melhora na tendemos não podermos inferir a respei-
qualidade do relacionamento interpesso- to, uma vez que tal processo é por demais
al’ (n=39; 9,0%), ‘resultado positivo em complexo, oriundo de uma construção
geral’ (n=31; 7,2%), ‘auxílio no exercício sistemática e conjunta entre os pares, ao
profissional’ (n=27; 6,3%), ‘mudança de longo do tempo, por meio de adequada
vida’ (n=23; 5,3%), ‘obtenção de ajuda’ interação. Apenas podemos destacar que
(n=21; 4,9%), ‘gosto’ (n=18; 4,2%), ‘am- é possível que o mesmo esteja sendo ini-
pliação de conhecimentos’ (n=17; 3,9%), ciado, bem como é possível ser tido como
‘singularidade própria’ (n=17; 3,9%), ‘aju- projeto pessoal e social dos participantes,
da ao outro’ (n=15; 3,5%), ‘confiança das e construído a partir da referência de um
pessoas’ (n=11; 2,6%), ‘conquista da liber- ideal de um indivíduo harmônico e coope-
dade’ (n=11; 2,6%), ‘reflexão’ (n=8; 1,9%), rativo. Isto é verdadeiro? Sim. É provável?
‘obtenção de respeito’ (n=7; 1,6%), ‘expe- Não sabemos. Outra reflexão importante
riências adquiridas’ (n=7; 1,6%) e ‘outros’ a salientarmos diz respeito a existência de
(n=22; 5,1%). Face ao exposto, uma refle- aspectos imorais nas justificativas emiti-
xão a fazermos é a que se refere ao pro- das por nossos entrevistados. Destarte,
cesso de relações sociais averiguado em verificando as argumentações emitidas
nossos adolescentes. Verificamos que nas pelos adolescentes por meio de uma aná-
justificativas aparecem falas relacionadas lise que identificasse a existência de juí-
à ‘melhora na qualidade do relacionamen- zos imorais nas justificativas emitidas por
to interpessoal’, ‘confiança das pessoas’ e nossos entrevistados, pudemos averiguar
‘obtenção de respeito’, que somadas obte- que havia apenas três justificativas que
riam a percentagem de 13,2 pontos, ou 57 puderam ser consideradas como imorais,
justificativas. Destacamos que as três cate- todas oriundas de uma entrevista de um
gorias remetem de alguma forma à quali- mesmo participante. Tal constatação leva-
dade do relacionamento interpessoal, isto -nos a ressaltar que há poucas associações
é, evidenciam a preocupação dos entrevis- com contornos imorais nos dados con-
tados com a função social e a aspectos que cernentes às admirações dos adolescen-
poderiam estar relacionados à cidadania. tes. Portanto, tendo em vista a incipiente
Os resultados parecem destacar a impor- ocorrência, podemos refletir que os entre-
tância dada pelos adolescentes ao pro- vistados estão apresentando admirações
cesso de socialização, evidenciando que dissociadas, em sua maioria, de aspectos
suas motivações estariam relacionadas ao considerados imorais. Como podemos in-
convívio social. Neste prisma, somos leva- terpretar tal resultado? Parece existir, nos
dos às discussões ponderadas por Piaget adolescentes, um anseio de construção
(1932/1994) a respeito das relações pos- de uma vida que desconsidere aspectos
síveis de serem estabelecidas: de respeito imorais, o que pode indicar a possibilidade
unilateral ou mútuo. Portanto, haveria em dos mesmos conceberem uma ‘vida boa’,
tais categorias a evidência de um proces- em consonância com aspectos morais (La
so, mesmo que incipiente, de relações co- Taille, 2006). Contudo, tais características
operativas, e, nesse sentido, relacionada admiradas são respostas oriundas de ado-

927
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lescentes em medidas socioeducativas de LT03-880 - CARACTERIZAÇÃO DE


internação, isto é, que estão presos por ADOLESCENTES EM MEDIDA DE
não observarem as leis e regras da vida INTERNAÇÃO: UM ESTUDO NA ÁREA DA
em sociedade. Como explicar a ocorrência PSICOLOGIA DA MORALIDADE
de poucos conteúdos imorais em adoles- Marcelo Menezes Salgado - PPGP/Ufes
centes que rompem com determinantes marcelomsalgado@gmail.com
sociais, que contrariam postulados consi- Heloisa Moulin de Alencar - PPGP/Ufes
derados corretos e adequados para o con- heloisamoulin@gmail.com
vívio social? Salientamos que respostas Financiamento: CAPES
a tais questionamentos poderão ser en-
contradas com a análise do plano ético e O presente trabalho consiste em um estu-
moral assumidos pelos jovens. Segundo La do sobre a caracterização de adolescentes
Taille (2006) o aspecto ético destacaria a que cumprem medidas socioeducativas de
‘vida boa’ que os adolescentes desejariam internação. Nosso objetivo foi conhecer a
viver, ou seja, a forma de viver bem, gera- realidade dos internos por intermédio do/
da a partir da “consciência da direção que da: idade; delito cometido; processo esco-
damos às nossas vidas” (La Taille, 2006, p. lar; participação em curso e/ou oficina na
38). As concepções de ‘vida boa’ incidem instituição. Cabe destacar que nosso inte-
sobre o ‘ser’ de cada pessoa uma vez que resse foi analisar os dados de caracteriza-
“escolher um sentido para a vida e formas ção dos jovens a partir de referenciais da
de viver é escolher a si próprio, é definir-se psicologia da moralidade (La Taille, 2006;
como ser” (La Taille, 2006, p. 46), e esse La Taille, Flor & Fevorini, 1991 e Piaget,
sentido nada mais é que a ‘expansão de 1932/1994). Participaram da investigação
si’ próprio: ver a si próprio como pessoa 30 adolescentes, com idade entre 16 e 17
de valor. Assim, o fato da possibilidade de anos, do sexo masculino, internos em uma
haver uma nova elaboração não, necessa- unidade do Instituto de Atendimento So-
riamente, indicará uma desvinculação da cioeducativo do Espírito Santo (Iases), na
criminalidade. Para tanto, teríamos que região metropolitana da grande Vitória/
avaliar se tais aspectos admirados teriam ES. Realizamos entrevistas individuais, de
força suficientemente no ‘sentimento de acordo com o método clínico proposto por
obrigatoriedade’ ante a outros valores da Piaget (1926/s.d.; 1932/1994). O primeiro
autoestima, conforme consideração teó- dado a ser apresentado é relativo à idade
rica de La Taille (2006). Destacamos, por- dos adolescentes. Assim, averiguamos que
tanto, a necessidade de estudos que in- 60% (n=18) dos jovens estavam, no mo-
vestiguem especificamente o ‘sentimento mento da entrevista, com 17 anos e o res-
de obrigatoriedade’ e a ‘expansão de si’ de tante, 40% (n=12), com dezesseis anos. Ve-
jovens que cometem delitos. rificamos, então, uma predominância de
entrevistados com 17 anos, contudo com
Palavras-chave: adolescentes em medida uma frequência não muito além da outra
socioeducativa de internação, admirações, faixa de idade. Quanto aos delitos come-
psicologia da moralidade. tidos, os participantes mencionaram um
Contato: Marcelo Menezes Salgado, UFES, total de 57, os quais originaram oito cate-
marcelomsalgado@gmail.com gorias de respostas: ‘roubo ou furto’ (n=15;

928
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

26,3%), ‘tráfico de drogas ou associação que os resultados encontrados nas justifi-


ou uso’ (n=13; 22,8%), ‘homicídio ou latro- cativas para estudar mencionadas podem
cínio’ (n=9; 15,8%), ‘tentativa de homicídio ser relacionados à conceituação do dever
ou tentativa de latrocínio’ (n=7; 12,3%), circular, hipotético e moral de La Taille et
‘porte ilegal de arma’ (n=5; 8,8%), ‘forma- al. (1991). Notamos nas justificativas dos
ção de quadrilha’ (n=4; 7,0%), ‘sequestro entrevistados que 73,2% (n=115) foram
relâmpago’ (n=2; 3,5%) e ‘quebra de liber- argumentos hipotéticos, 22,3% (n=35) das
dade assistida’ (n=2; 3,5%). Por intermédio justificativas foram fundamentos morais e,
dos resultados encontrados, constatamos, ainda, que as únicas referências ao ‘dever
ainda, que a maioria dos adolescentes es- circular’ estão em sete respostas (4,5%)
tuda e faz cursos e/ou oficinas. No tocante encontradas em ‘outros’. Assim, poderí-
ao processo escolar, sob a indagação se na- amos refletir, que nossos participantes
quele momento estudava ou não, verifica- estariam interessados, prioritariamente,
mos que 76,7% (n=23) responderam posi- em vantagens pessoais privadas e, des-
tivamente e os que afirmaram não estudar ta forma, desconectados de um projeto
contabilizavam 23,3% (n=7). Àqueles que cidadão, de uma função social, podendo
diziam estudar foram questionados sobre existir, portanto, uma carência de relações
a motivação para tal ação. Os argumentos cooperativas. Concordamos com La Taille
totalizaram um número de 157 justificati- et al. (1991) que a referida carência pode-
vas, que geraram nove categorias: ‘atuar ria impedir o desenvolvimento da autono-
em uma ocupação profissional’ (n=34; mia., Assim, é necessário destacar, quanto
21,6%), ‘viabilizar uma vida próspera para aos nossos participantes, que a possível
si’ (n=33; 21,0%), ‘proporcionar aspecto carência da função social em destaque,
positivo a familiares’ (n=26; 16,6%), ‘am- típica das relações cooperativas, pode-
pliar o conhecimento geral’ (n=15; 9,6%), ria prejudicar o pleno desenvolvimento
‘obter diploma’ (n=13; 8,3%), ‘promover da autonomia nos jovens entrevistados.
uma melhor sociabilidade’ (n=7; 4,5%), ‘su- Destarte, teríamos um grave problema,
prir uma necessidade’ (n=6; 3,8%), ‘sair do que é a falta de integração de outrem nos
crime’ (n=4; 2,5%) e ‘outros’, cujo percen- projetos pessoais dos internos. Caracte-
tual foi de 12,1% (n=19), que versa sobre rizamo-lo como grave por a referida falta
a ‘influência familiar’ (n=3), ‘obrigatorie- relacionar-se intimamente com a questão
dade do estudo na instituição’ (n=2), ‘im- da cidadania e função social, bem como
portância do estudo’ (n=2), ‘possibilidade com o desenvolvimento da autonomia.
de ser uma pessoa melhor’ (n=2), ‘poder Chamamos a atenção para o contexto dos
ensinar outrem’ (n=2), ‘obter melhor ren- nossos participantes, ou seja, adolescen-
dimento nos estudos’ (n=2), ‘aquisição de tes envolvidos com o crime. Considerando
família’ (n=2), ‘boas oportunidades’ (n=1), haver indícios de que os jovens não de-
‘adquirir responsabilidade’ (n=1), ‘ocupar senvolveram plenamente a cidadania, po-
a mente’ (n=1) e ‘ser independente de demos, ademais, inferir que suas próprias
outrem’ (n=1). Avaliando os referidos da- trajetórias pessoais rompem, uma vez que
dos, constatamos nos resultados algumas cometeram infrações, com a função social
aproximações com o dever-estudar discu- mais ampla, aquela concebida em socie-
tido por La Taille et al. (1991). Verificamos dade, o que parece permitir a ocorrência,

929
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

predominante, de justificativas relaciona- jovens que cometeram infrações. Tal fator


das ao ‘dever estudar hipotético’. Todavia evidencia a importância de trabalhos que
é delicado estabelecer os graus, medidas investiguem os valores morais de adoles-
e ordem de interferência das variáveis en- centes envolvidos pelo crime e violência,
volvidas no processo, ou o que poderia ser problematizando, inclusive, os ditames
determinante nesse caso: Estaria o proces- presentes nos planos moral e ético (La Tail-
so escolar dos internos deficitário? Ou os le, 2006) de tais jovens.
eventos relacionados à violência seriam
determinantes? Fatores familiares podem Palavras-chave: adolescentes, medida
interferir de alguma forma? Se afirmativo, socioeducativa de internação, moral e ética
como tais questões se associam na condu- Contato: Marcelo Menezes Salgado, UFES,
ção do processo? Consideramos que es- marcelomsalgado@gmail.com
tabelecer ligações entre esses fenômenos
sem maiores cuidados poderia incorrer no
fato de uma análise notadamente simplis- LT03-1064 - ENVOLVIMENTO DE
ta, na qual possivelmente seriam ignoradas CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM OS
outras possíveis influências. Ainda, ponde- DIREITOS HUMANOS E SUA RELAÇÃO
rando sobre os motivos evidenciados pe- COM A EMPATIA
los participantes para estudar, chamamos Cleonice Camino - UFPB,
a atenção para a constatação de que os cleocamino@yahoo.com.br - CNPq
dados evidenciam a preocupação do ado- Anderson Mathias - UFPB,
lescente com algum tipo de benefício a ser anderson.mathias@yahoo.com.br
adquirido por intermédio do estudo. Per- Julian Santos - UFPB,
ceba o leitor que as mesmas justificativas ledjulian@hotmail.com
que definimos como hipotéticas (73,2%) Lívia Braga - UFPB,
também estão relacionadas à aquisição liviabsc@yahoo.com.br
de algum tipo de proveito para si. Desta Philomena Couras - UFPB,
maneira, temos a constatação de que a menacouras@hotmail.com
maioria das fundamentações menciona- Nilton Formiga - Maurício de Nassau/PB
das pelos adolescentes, além de estarem nsformiga@yahoo.com.br
relacionadas a um ‘dever hipotético’, tam- Pablo Queiroz - UFPB,
bém têm seu conteúdo vinculado a algu- pabloqueiroz@live.co.uk
ma vantagem pessoal que o estudo pode Lilian Galvão - UFCG,
trazer aos projetos futuros do participante. liliangalvao@yahoo.com.br
Face ao exposto, é importante reiterar que Leonardo Sampaio - UNIVASF
os dados referentes à escola, cursos e/ou leorsampaio@yahoo.com.br
oficinas sugerem uma carência de relações Financiamento: CNPQ
cooperativas e uma falta de integração de
outrem nos projetos pessoais dos inter- Este estudo investiga o quanto crianças e
nos. Ademais, constatamos que os adoles- adolescentes julgam que irão se envolver
centes conferem grande atenção aos seus com a implementação dos Direitos Huma-
projetos de vida. Ressaltamos a existência nos – DH – e qual a relação desse envolvi-
de argumentações morais no repertório de mento com a empatia. Investiga, também,

930
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se o envolvimento com os DH sofre influ- dos participantes com os DH; e a relação


ência de algumas características dos parti- dos DH com a empatia. A empatia é defi-
cipantes como idade, sexo, tipo de escola, nida neste trabalho como a capacidade do
e gerações dos direitos. A perspectiva de indivíduo de se colocar no lugar do outro e
direitos de diferentes gerações é compre- sentir algo compatível com o que o outro
endida, nesta pesquisa, a partir de Lafer sente. Julga-se que a introdução desses as-
(2009): 1ª geração: direitos individuais pectos no estudo sobre os DH possibilita,
(autonomia); 2ª geração: direitos sociais; além de um maior conhecimento teórico
3ª geração: direitos de grupos minoritá- sobre o tema, um melhor planejamento
rios (não ser discriminado) e 4ª geração: de estratégias relativas à educação sobre
direitos relativos ao meio ambiente. Os os DH. Participaram da pesquisa 282 es-
DH são definidos como princípios basea- tudantes, 144 do sexo feminino e 138 do
dos na justiça social, que são elaborados e sexo masculino divididos em dois grupos
institucionalizados com a finalidade de re- de idade: o grupo I constituído por estu-
gularem as relações sociais gerando bem- dantes de 11, 12 e 13 anos e o grupo II
-estar coletivo. Os DH têm sido estudados, por adolescentes de 14, 15 e 16 anos, que
no âmbito da psicologia social, sobretudo freqüentavam escolas públicas (N=174)
por Willem Doise que, a partir de uma vi- e particulares (N=108). Todos os partici-
são psicossociológica, realizou, juntamen- pantes responderam individualmente, em
te com seus colaboradores, várias pesqui- ambiente de sala de aula, a perguntas so-
sas (Doise, Staerklé, Clémence & Savory, bre aspectos sócio-demográficos e a dois
1998; Spini e Doise, 1998; Doise, Spini e questionários; um contendo uma lista de
Clémence, 1999; Staerklé e Clémence, 25 direitos que avalia o nível de envol-
2004). No Brasil, Camino, Camino, Perei- vimento dos participantes com os DH, o
ra e Paz (2004); Camino, Galvão, Rique & outro, contendo uma lista de 24 itens, que
Camboim (2005) e Camino, Galvão, Quiri- avaliava a capacidade empática dos partici-
no, Moraes, Roazzi & Martin (2007) têm pantes. As respostas para os itens dos dois
também estudado os DH nessa perspecti- questionários foram dadas em uma escala
va. O conjunto desses trabalhos tem con- tipo Likert, de cinco pontos, indicando o
tribuído para esclarecer várias dimensões quanto o respondente faria alguma coisa,
referentes aos DH, como: representações, quando ficasse mais velho, para que todos
conhecimento, envolvimento, princípios tivessem os direitos citados, ou o quanto
organizadores, e a relação dessas dimen- experimentava um certo sentimento. As
sões com variáveis sócio-demográficas e possibilidades de respostas variaram de 1
psicossociais (idéias de força, valores, tipos (nada) a 5 (muitíssimo). Os dados foram
de justiça que os afetam, etc.). Diante da analisados com: o teste “t” para medidas
extensão dos aspectos já estudados sobre independentes e medidas repetidas; uma
os DH, cabe destacar que a contribuição ANOVA; e a correlação de Pearson. Nos
do presente estudo refere-se: a conside- resultados, observa-se que: (1) os parti-
ração dos DH relativos ao meio-ambiente cipantes apresentaram escores médios
e a não-discriminação, dentre os direitos significativamente diferentes (p<.05) em
de outras gerações, como pólos de atração função das gerações de direitos: os direi-
para um maior ou menor envolvimento tos sociais obtiveram o escore médio mais

931
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

elevado (M=4,21), que foi seguido dos ção dos DH em função do sexo confirma
escores médios dos direitos à autonomia estudo anterior (Camino e cols., 2004). Os
(M=3,91), dos direitos ao meio ambiente resultados referentes aos alunos de esco-
(M=3,53) e dos direitos a não ser discri- la pública apresentarem um escore médio
minado (M=3,49); (2) os escores médios maior do que os alunos de escola privada
dos participantes em relação aos DH não em relação a todos os direitos, podem ser
se diferenciaram em função do sexo; (3) os justificados pelo fato dos alunos de escola
escores médios dos participantes diferen- pública serem vítimas, pela sua pertença
ciaram-se significativamente (p<.05) em à classe social desfavorecida, de maiores
função da escola que freqüentavam, tendo opressões sociais, de um poder menor de
os alunos de escola pública obtido escores reivindicação e de constantes catástrofes
médios mais elevados do que os alunos da ambientais. Quantos aos estudantes mais
escola particular em relação aos direitos novos terem obtido um escore médio de
ao meio ambiente (M=3,72 e M=3,19), as envolvimento mais elevado em relação a
conquistas sociais (M=4,38 e M=3,95) e à todas as gerações de direitos, acredita-se
autonomia (M=3,97 e M=3,81); (4) os es- que tem a ver com o fato de, por serem
tudantes de 11 a 13 anos obtiveram, em mais jovens, não pensarem nas dificulda-
relação à todas as gerações de direitos, des de participarem de lutas e pelo fato de
escores médios mais elevados do que os terem uma postura, em geral, mais afasta-
estudantes de 14 a 17 anos, sendo que os da da realidade social. A correlação posi-
escores médios obtidos pelos estudantes tiva encontrada entre os DH e a empatia,
mais novos e mais velhos foram, respec- pode ser explicada pela função motivado-
tivamente, M=3,90 e M=3,39, em relação ra da empatia em relação aos princípios de
aos direitos ao meio ambiente, M=4,47 e justiça (Hoffman, 2003; Sampaio, 2007).
M=4,14, em relação aos direitos sociais,
M=4,10 e M=3,85, em relação aos direitos Palavras-chave: direitos humanos, empatia,
para a autonomia e M=3,85 e M=3,43, em jovens.
relação aos direitos à não discriminação; Contato: Cleonice Pereira dos Santos Camino,
(5) ocorreu uma correlação positiva signi- UFPB, cleocamino@yahoo.com.br
ficativa (r=.416; p<.05) entre a empatia e
todos os direitos estudados. Diante desses
resultados, pode-se concluir que o fato dos LT03-1510 - JULGAMENTO MORAL E
direitos de primeira e segunda geração PERSPECTIVAS PARA O FUTURO DE
apresentarem escores médios mais eleva- ADOLESCENTES EM PRIVAÇÃO DE LIBERDADE
dos deve-se ao fato desses direitos terem Josemar Soares Rosa Filho - UNIVASF
sido os primeiros a serem institucionaliza- josemaar@msn.com
dos. Quanto aos direitos relativos ao meio Leonardo Rodrigues Sampaio - UNIVASF
ambiente terem apresentado um escore leorsampaio@yahoo.com.br
médio superior aos direitos de não ser dis-
criminado, acredita-se que se deva a uma Como uma fase consideravelmente valo-
maior presença de movimentos ecológicos rizada pela sociedade ocidental, a adoles-
nas escolas do que de movimentos relati- cência é vista sob o signo da esperança e
vos a não discriminação. A não diferencia- prosperidade, sendo estes tratados sob o

932
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

discurso de o “futuro da nação”. Contu- política pública ou instituição específica


do, “ser esse futuro” implica no cumpri- para lidar com esse público, sendo apli-
mento de todas as expectativas e deman- cadas aos adolescentes as determinações
das sociais, fazendo com que aqueles do Código do Império. Apenas em 1927
adolescentes que, por algum motivo, não é criado o Código do Menor, apontando
se adéquam ao exigido, sejam excluídos. que nenhum adolescente entre 14 a 18
Essa exclusão se aplica aos adolescen- anos poderia ser julgado a não ser em
tes que cometeram aos infracionais por júri especial. Com o passar do tempo a
diversos motivos, indo desde sua situa- realidade brasileira foi sendo modificada,
ção infracional, até mesmo as diversas exigindo assim que as políticas públicas
outras disparidades sociais nas quais seguissem o mesmo caminho. Em 1941,
aqueles adolescentes se encontram, na segundo Galvão (2005), surge o Serviço
maioria das vezes. Sendo assim, percebe- de Assistência ao Menor, com o objetivo
-se uma modificação paradoxal: alguns de ser uma instituição para modificação
adolescentes deixam de ser vistos como da realidade dos adolescentes. Porém
o “futuro da nação” e são vistos apenas essa iniciativa foi falha, sendo a iniciativa
como um problema social. Porém, é im- considerada como uma verdadeira “fá-
portante ressaltar que, embora a mídia brica de delinqüentes” (Faleiros apud Oli-
venha enfocando com mais veemência as veira e Assis, 1999). Em substituição ao
infrações cometidas pelos adolescentes, SAM, nasce a Fundação Nacional do Bem
dados na UNICEF (2002) apontam que Estar do Menor (FUNABEM) e as Funda-
apenas 10% de todas as infrações co- ções Estaduais de Bem Estar do Menor
metidas no Brasil são de autoria de ado- (FEBEMs), porém, da mesma forma que o
lescentes, sendo a maioria destes casos sistema anterior, tais fundações se mos-
relacionados a crimes contra o patrimô- tram inadequadas. Em resposta a todas
nio, e não a vida. Essa super valorização as falhas supracitadas, e como resultado
da mídia no que se refere a essas infra- de uma série de reivindicações sociais,
ções, resultaram, entre outras coisas, em surge em 1990 o Estatuto da Criança e
um movimento social para redução da do Adolescente – ECA, tentando garan-
maioridade penal. Contudo, assim como tir “todas as oportunidades e facilidades
aponta o CFP (2005), os adolescentes (para as crianças e os adolescentes), a
precisam ser vistos como pessoas em fim de lhes facultar o desenvolvimento
processo de desenvolvimento, sendo a físico, mental, moral, espiritual e social,
redução da maioridade penal uma forma em condições de liberdade e dignidade”
de se perder a oportunidade de promo- (artigo 3). Contudo, mesmo sendo uma
ver mudanças significativas na realidade política muito bem construída a nível
e situação desses adolescentes. Além teórico, o ECA, somado ao Sistema Na-
disso, torna-se necessário reforçar que as cional de Atendimento Socioeducativo –
infrações envolvendo adolescentes não SINASE, ainda são documentos que pos-
são um sintoma contemporâneo, sendo suem diversas lacunas em sua execução,
registrados casos no Brasil desde 1830, havendo uma série de irregularidades
como apontam Oliveira e Assis (1999). na realidade assistencial brasileira. Essas
Nessa época, não havia nenhum tipo de falhas vão desde uma péssima estrutu-

933
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ra física, até a falta de profissionais bem não sendo apresentado porém, de que
qualificados e a péssima qualidade edu- formas esses adolescentes pensam em
cacional disponibilizada a esses adoles- chegar a essa situação. Percebe-se que os
centes (Galvão, 2005; SINASE, 2006; Rosa adolescentes não possuem grandes pers-
Filho e Sampaio, 2009). Avaliando essa pectivas sobre o futuro, o que aponta a
situação, questiona-se: de que forma as necessidade de intervenções que visem
medidas socioeducativas poderiam ser facilitar o processo de construção e or-
melhoradas e mais bem executadas? A ganização de projetos de vida e maiores
resposta é complexa, mas aponta-se que perspectivas para o futuro. No que se re-
atualmente, segundo Sampaio (2007) fere ao julgamento moral, os dados ainda
o campo de pesquisa e educação moral não foram totalmente analisados, sendo
pode contribuir na modificação dessa re- a previsão final para a agosto deste ano.
alidade, havendo um grande número de Porém, os dados categorizados até ago-
pesquisas que comprovam a eficácia de ra apontam uma forte predominância de
procedimentos que visam uma melhoria concepções morais entre os estágios três
nas concepções morais dos indivíduos. e quatro do nível convencional da tipolo-
Considerando que as concepções morais gia kohlberguiana, apontando uma con-
dos adolescentes indicam de que forma cepção de seguimento irrestrito as regras
estes compreendem e lidam com as re- sociais como benéfica e mais bem valori-
gras sociais, tornou-se necessário inves- zada que a relativização ou análise crítica
tigar quais os níveis de julgamento moral das mesmas. Além disso, a desejabilidade
predominantes entre estes, problemati- social, característica marcante do estágio
zando e elaborando estratégias para me- três, foi uma característica evidente nas
lhoria dessa realidade, além de pesquisar entrevistas. Esses resultados apontam
quais as perspectivas para o futuro des- também, assim como no caso das pers-
ses adolescentes, apontando que a ela- pectivas sobre futuro dos adolescentes,
boração de projetos de vida pode contri- uma necessidade de maiores interven-
buir para a melhoria da realidade socioe- ções visando a promoção de níveis de
ducativa dos mesmos. Dessa forma, essa julgamento moral mais elevados, fazen-
pesquisa se delineou utilizando recursos do com que as medidas socioeducativas
qualitativos e quantitativos, sendo des- possam ser executadas de melhor forma
critiva e possuindo como instrumentos e fornecendo contexto para o desenvol-
principais entrevistas semiestruturadas vimento de uma moralidade autônoma e
e o instrumento denominado de Dile- pautada no respeito mútuo.
mas da vida real, produzido por Galvão
(2010). A amostra contou com 32 adoles- Palavras-chave: privação de liberdade,
centes de uma instituição socioeducativa adolescentes, julgamento moral
de Petrolina – PE. Estando em processo
de finalização, essa pesquisa possui ape-
nas resultados parciais, apontando que
as principais perspectivas para o futuro
dos adolescentes dizem respeito a ob-
tenção de uma boa situação financeira,

934
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-1512 - SOCIOEDUCADORES E reinserir os adolescentes na sociedade e


AS INSTITUIÇÕES DE PRIVAÇÃO DE proporcionar uma educação de qualidade
LIBERDADE: PERFIL E JULGAMENTO para estes. Essa lógica educacional foi ain-
MORAL da mais reforçada com o Sistema Nacional
Josemar Soares Rosa Filho - UNIVASF de Atendimento Socioeducativo – SINASE,
josemaar@msn.com reforçando a obrigatoriedade do ensino
Leonardo Rodrigues Sampaio - UNIVASF regular aos adolescentes internos e deli-
leorsampaio@yahoo.com.br mitando o papel de cada profissional da
rede de assistência a esses jovens. Segun-
Após os famosos estudos do educador do o SINASE (2006), os socioeducadores
brasileiro Paulo Freire (1996), foi refor- possuem a função de auxiliar, acompa-
çado entre os pesquisadores em ciências nhar e facilitar o processo de socioeduca-
humanas o poder e o valor das práticas ção dos adolescentes, garantindo todas as
educacionais enquanto transformadoras facilidades para uma possível mudança si-
das realidades sociais e individuais, sendo tuacional por parte dos internos. Contudo,
esta uma ferramenta muito importante alguns estudos apontam que esses profis-
para estruturação de uma sociedade de- sionais não cumprem com seus papéis,
senvolvida e de melhores oportunida- seja por não possuírem uma boa profis-
des para aqueles que não possuem boas sionalização, seja por possuírem concep-
condições de vida. Como resultado deste ções preconceituosas e de descrédito para
reforçamento, nota-se um enfoque atual com os adolescentes e a efetividade dos
do governo na construção e execução de seus próprios trabalhos (Oliveira e Assis,
políticas públicas educacionais que viabili- 1999; Espíndula e Santos, 2004; Monte,
zem o ingresso das populações menos fa- Sampaio, Rosa Filho e Santana, 2011). Es-
vorecidas no sistema educacional. Sendo ses dados reforçam a necessidade de aná-
um dos grupos sociais de maiores inves- lises e investigações mais profundas sobre
timentos por parte do Estado, os adoles- as práticas desses educadores, bem como
centes brasileiros tiveram como marco as- suas concepções e principais obstáculos
sistencial, seja para execução de políticas para a efetividade dos seus trabalhos. É
educacionais ou não, a fundamentação do constatado também que não há trabalhos
Estatuto da Criança e do Adolescente – que investiguem os níveis de julgamento
ECA, em 1990. Tentando garantir “todas as moral desses profissionais, o que se mos-
oportunidades e facilidades” para o pleno tra como uma carência, uma vez que essa
desenvolvimento das crianças e adoles- compreensão pode facilitar a forma como
centes (ECA, 1990), esse documento pro- essas práticas profissionais são pensadas
põe uma série de iniciativas que visam e planejadas. Sob a ótica de Piaget (1932)
incluir os jovens na sociedade e os retirar e Kohlberg (1968), o desenvolvimento da
de quaisquer situações de vulnerabilidade moralidade só se torna possível a partir
social possíveis, como a situação infracio- das interações do indivíduo com o seu
nal. Para esses adolescentes que comete- meio, sendo necessário o contato com
ram atos infracionais, o ECA recomenda concepções e níveis de julgamentos mo-
a aplicação de medidas socioeducativas, rais distintos, possibilitando assim o am-
iniciativas que visam, como prioridade, biente necessário para que haja conflito

935
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cognitivo. Levando em consideração esse pectivas de futuro na instituição e quais


pressuposto, espera-se que os socioedu- foram os critérios que os fizeram escolher
cadores possuam níveis de raciocínios mo- tal trabalho. No que se refere aos níveis
rais mais desenvolvidos que os apresenta- de julgamento moral, os dados foram
dos pelos adolescentes, fornecendo assim parcialmente analisados, apontando que
o contexto necessário (mas não suficien- os profissionais da instituição possuem
te) para que haja desenvolvimento moral. julgamentos morais centrados no nível
Partindo dessa compreensão, o presente convencional, mais especificamente nos
estudo objetivou investigar os níveis de estágios três e quatro da tipologia kohl-
julgamento moral, bem como estabele- berguiana, havendo uma forte valorização
cer um perfil sócio-demográfico desses do cumprimento irrestrito as regras mo-
profissionais. Possuindo um delineamen- rais e da punição como forma de controle
to descritivo-exploratório e utilizando re- social. Essa noção de regulação expiatória
cursos qualitativos e quantitativos, esse citada anteriormente pode ser exemplifi-
estudo contou com uma amostra de 28 cada pelo discurso de um dos socioeduca-
profissionais de uma instituição de priva- dores: Não deveria ser com o sofrimento,
ção de liberdade de Petrolina – PE e em- aos poucos. Mas que deveria ser? Com
pregou como instrumentos entrevistas se- certeza! Ele precisava pagar pelo que fez.
miestruturadas e os Dilemas da vida real, Se fosse uma coisa que ele tivesse feito só
desenvolvidos por Galvão (2010). Esse ins- com uma, aí sim, mas com esse tanto? Até
trumento para mensuração dos níveis de para que os seguidores dele percebessem
julgamento moral consiste basicamente que ele estava sofrendo pelo que ele fez.
na apresentação de duas situações reais (educador 04). Nota-se claramente, por
amplamente divulgadas na mídia e pela parte dos educadores e na fala anterior,
posterior discussão sobre estas, mensu- uma concepção de que a punição deve
rando os posicionamentos apresentados ser aplicada como forma de exemplificar o
a partir da tipologia kohlberguiana. Por que não pode ser feito. Esse é um dado de
se tratar de uma pesquisa em desenvolvi- extrema importância, uma vez que talvez
mento, os resultados se apresentam como reflita inclusive as práticas profissionais
parciais, contudo, mostra-se importante desses socioeducadores para com os ado-
salientar que todos os dados já foram co- lescentes internos. Acredita-se que esses
letados e que a previsão para finalização posicionamentos morais sejam reforçados
das análises é de um mês. Com os atuais pelo clima de coação e cumprimento de
resultados, pode-se apontar que a média regras da instituição, sendo estimulado
de idade dos socioeducadores é de 29 que todos cumpram a lei de forma irres-
anos (d.p. = 2,1); sendo esses profissionais trita. Com a finalização das análises, os ní-
pardos (57%) ou brancos (34%), casados veis de julgamentos dos socioeducadores
ou em relacionamento estável (82%); com serão comparados aos níveis dos adoles-
um ou dois filhos (88%); e moradores em centes, possibilitando uma discussão mais
bairros de classe média (88%). Esses da- ampla sobre os limites da socioeducação
dos ainda serão complementados ao final e investigando formas de desenvolver as
das análises, sendo investigada qual a ren- concepções morais de ambos. Por fim,
da média desses profissionais, suas pers- acredita-se que os dados apresentados

936
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

já possibilitaram um maior conhecimen- NASE, 2006) é o projeto de lei 1627/2007


to sobre as práticas e concepções desses que determina diretrizes para a execução
profissionais. das medidas socioeducativas. Apesar dos
avanços legislativos, o tema da infração
Palavras-chave: socioeducadores, julgamento cometida por adolescentes continua sen-
moral, privação de liberdade do abordado no país predominantemente
de forma reducionista, repressiva e disci-
plinadora e a gestão das medidas socioe-
LT07-1324 - PROCESSOS DE ducativas oscila entre as áreas da Justiça,
DESENVOLVIMENTO DE EDUCADORES da Segurança Pública e da Assistência
SOCIAIS DO SISTEMA DE MEDIDAS Social (Zamora, 2005a). O sistema socio-
SOCIOEDUCATIVAS: INDICADORES DE educativo brasileiro ainda se caracteriza
FORMAÇÃO pela precariedade nos recursos humanos:
Tatiana Yokoy de Souza - UnB profissionais sem formação educativa;
tatiana.yokoy@gmail.com alta rotatividade; reduzida autonomia no
Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB trabalho; dificuldades de comunicação
claudia@unb.br entre grupos profissionais; e insatisfação
com questões trabalhistas (Oliveira e Assis,
Apresentamos um breve ensaio sobre pro- 1999; Zamora, 2005b). O papel do edu-
cessos de desenvolvimento de educadores cador social nas relações cotidianas tem
sociais que atuam no sistema de medidas sido freqüentemente reduzido ao moni-
socioeducativas. O ensaio é parte de uma toramento e à disciplinarização. O próprio
pesquisa de doutorado, em andamento, contexto das ações socioeducativas pode
que se propõe a identificar um conjunto de levar a um forte desgaste psicológico dos
indicadores que possa subsidiar propostas educadores sociais. Muitos enfatizam a
críticas, dialógicas e reflexivas de forma- necessidade de acompanhamento psico-
ção orientadas a profissionais que atuam lógico e repetem discursos de desamparo,
no sistema socioeducativo. A metodologia isolamento, perseguições políticas e sofri-
da pesquisa inclui a análise de narrativas mento no trabalho (Ferreira e Fernandes,
produzidas por educadores sociais em me- 2000; Romans, Patrus e Trilla, 2003; Yokoy
moriais autobiográficos e em entrevistas de Souza, 2008). Além de conhecimentos
narrativas. Caro e Guzzo (2004) entendem técnicos, salários satisfatórios e boas con-
que é educador social todo profissional dições de trabalho, faltam-lhes espaços de
que trabalha com pessoas em programas escuta e reflexão (Zamora, 2005b). Existem
e projetos sociais e que realiza atividades avanços em modelos de atendimento e de
pedagógicas, orientações e aconselha- funcionamento, realizados em conjunto
mentos. Em nosso trabalho, consideramos com os familiares e com a comunidade,
educadores sociais os profissionais de di- que fomentam uma rede de apoio socio-
versos cargos que estabelecem contato emocional e que reconhecem a diversi-
pessoal e promovem o desenvolvimento dade e a complexidade das trajetórias de
dos adolescentes institucionalizados nas envolvimento com a infração (UNICEF,
unidades socioeducativas. O Sistema Na- 2003; Costa, 2005; Gonzales, 2006). No
cional de Atendimento Socioeducativo (SI- entanto, estes precisariam se fortalecer

937
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

para contaminar mais transformações em ativo do sujeito como a mediação da cultu-


outras esferas do sistema socioeducativo. ra e das práticas institucionais nos proces-
Ainda que reconheçamos as contradições sos de desenvolvimento humano (Valsiner,
e dificuldades que hoje cercam o proces- 1989; Rossetti-Ferreira, Amorim & Silva,
so socioeducativo, entendemos que ele 2004). Desse modo, os educadores sociais
tem potencialidade de movimentar trans- são compreendidos neste trabalho como
formações nas vidas dos adolescentes e sujeitos que negociam ativamente senti-
dos educadores sociais (Lopes de Oliveira dos sobre si, a partir das circunscrições dos
e Vieira, 2006; Yokoy e Lopes de Olivei- contextos de que participam e dos lugares
ra, 2008). Para tanto, é necessário que sociais que ocupam em uma matriz sócio-
as práticas socioeducativas se organizem -histórica. O momento pelo qual passamos
de forma a intencionalmente promover sinaliza um maior investimento na área so-
processos de desenvolvimento humano. cial e no sistema socioeducativo, incluindo
Entendemos que processos de formação a formação de recursos humanos. As expe-
de educadores sociais que atuam no sis- riências de formação oferecidas incluem
tema socioeducativo são fundamentais cursos com status de Ensino Superior, pa-
para se atingir essas mudanças (Yokoy de lestras, oficinas e consultorias, fornecidas
Souza, 2008; Yokoy e Lopes de Oliveira, por empresas privadas e por convênios
2008). A formação profissional é apresen- com universidades. Em algumas experiên-
tada explicitamente pelo SINASE (2006) cias, predomina o viés tecnicista e instru-
como diretriz essencial para transformar mental; já outras possuem uma orientação
a realidade atual do atendimento ofere- mais dialógica, transformadora da reali-
cido ao adolescente que cumpre medida dade e emancipatória dos educadores so-
socioeducativa no país. Segundo o SINASE ciais. Com o SINASE (2006), tem ocorrido
(2006), os programas de atendimento de- um maior investimento na qualificação dos
vem oferecer formação inicial, continuada profissionais socioeducativos. No entanto,
e em serviço como parte de uma política poucas pesquisas foram feitas sobre as ca-
de recursos humanos. A perspectiva dia- racterísticas dessas atividades ou sobre o
lógica e narrativa e a Psicologia Histórico- grau em que elas respondem às demandas
-Cultural são consideradas relevantes para do cotidiano nas unidades de execução de
este trabalho, por enfatizarem a natureza medidas socioeducativas. A formação de
ativa, discursiva, interativa e contextual educadores sociais tem interessado alguns
da subjetividade e do desenvolvimento pesquisadores de Psicologia, do ponto de
humano. A partir de um enfoque dialógi- vista teórico e metodológico, mas esse ain-
co (Hermans, 2001; D’Alte, Petracchi, Fer- da é um movimento tímido e expressivas
reira, Cunha e Salgado, 2007) e narrativo lacunas perseveram. Consideramos a ne-
(Wiley, 1994; Bamberg, 2004), visamos cessidade de ampliação das abordagens
compreender significações do cotidiano teórico-metodológicas que tem sustenta-
de trabalho que canalizam culturalmente do atividades de formação de educadores
o desenvolvimento de educadores sociais, do sistema socioeducativo, por meio do
suas identidades profissionais e suas inter- investimento em perspectivas contempo-
venções com os adolescentes. A Psicologia râneas do desenvolvimento humano. De-
Histórico-Cultural enfatiza tanto o papel fendemos a práxis, o enfoque dialógico e

938
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

a subjetividade do educador social como to”, que foi um trabalho desenvolvido na


diferenciais da nossa compreensão sobre conclusão do curso da especialização em
o que é a formação profissional, divergin- Desenvolvimento Humano e Inclusão Es-
do de modelos exclusivamente conteudis- colar da UNB (Universidade de Brasília)
tas, teóricos, tecnicistas, monológicos, que em parceria com a UAB (Universidade
não valorizam as experiências dos profis- Aberta do Brasil) e teve como proposta
sionais. Assim, consideramos importante analisar a real situação inclusiva em sala
compreender quais processos de desen- de aula do adolescente menor infrator
volvimento têm sido promovidos no coti- que está em condição de liberdade as-
diano de trabalho e nas diferentes ativida- sistida que frequenta as escolas públicas
des de formação ofertadas aos educadores da cidade satélite do Recanto das Emas
sociais, a fim de sugerirmos, como produto no DF. O trabalho aborda em seu refe-
final da pesquisa, indicadores para que a rencial teórico os seguintes temas: Leis,
formação colabore para a modificação das Família, Escola, Inclusão e Letramento. A
suas intervenções profissionais e de sua metodologia usada é de predominância
identidade profissional. Como vimos, a for- teórica descritiva de caráter qualitativo,
mação dos educadores sociais que aten- promovendo uma pesquisa bibliográfi-
dem adolescentes em cumprimento de ca de autores e documentos oficiais que
medida socioeducativa é uma necessidade se relacionam com o assunto proposto,
empírica e teórica e é uma diretriz central exemplo: Estatuto da Criança e Adoles-
do SINASE (2006). Essa formação precisa se cente (ECA), Constituição Federal, Jesus
comprometer com modificações criativas (2006), Dalegreve (2006), Mollica (2007),
das práticas e mentalidades institucionais, Maciel & Barbato (2010), autores e do-
promovendo tanto o desenvolvimento dos cumentos que deslancham em uma pro-
educadores quanto dos adolescentes que posta explicativa sobre as concessões, a
cumprem medidas socioeducativas. realidade social da periferia, o ambien-
te escolar, a inclusão e o letramento. O
Palavras-chave: medidas socioeducativas, trabalho pode contar com a análise de
formação profissional, educador social questionários, memoriais, trabalho em
sala de aula de alunos que passaram por
problemas judiciais, visando uma melhor
LT04-1063 - A INCLUSÃO DO MENOR contribuição a pesquisa sobre a real situ-
INFRATOR EM CONDIÇÕES DE ação que envolve o menor infrator, dando
LIBERDADE ASSISTIDA NO TRABALHO uma produção de conhecimento de um
SÓCIOCULTURAL, PEGAGÓGICO ESCOLAR caráter interpretativo-construtivo, a fim
E LETRAMENTO de se ter uma melhor análise da maneira
Amanda Correia Lima - UNB em que vem sendo incluído o menor in-
amandajmorrisson@gmail.com frator em sala de aula, tendo como recur-
so o letramento. A pesquisa além de bi-
A pesquisa tem como tema: “A Inclusão bliográfica, também conta com uma abor-
do menor infrator em condições de liber- dagem qualitativa devido à aplicação de
dade assistida no trabalho sociocultural, questionários, observação e contato com
pedagógico escolar, através do letramen- a realidade dos alunos, tendo como su-

939
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

porte as pesquisas de campo, trabalhado do pela justiça com uma concessão assis-
de forma descritiva. A significação deste tida baseada na inclusão escolar, o que le-
trabalho nos leva a história da legislação, vou ao questionamento e a problemática
todo o contexto que envolve os menores dessa pesquisa. Como ocorre a inclusão
em conflitos com a lei, isso de uma forma do menor infrator em condição de liber-
gradual. A preocupação com esse público dade assistida na vida escolar? Baseado
vem desde a colonização do Brasil, tendo neste contexto de uma vivência profis-
como exemplo às ordens criadas por D. sional e social surgiu a proposta da aná-
Fillipe II (ordenações Fillipinas). Depois lise do tema, tendo como norteamento o
vieram as leis codificadas do Código Mello letramento, que seria a forma funcional
de Mattos, até a então Constituição Fede- da alfabetização. Os resultados obtidos
ral e com ela o Estatuto da Criança e Ado- concluíram que a medida sócio-educativa
lescentes. Jesus, (2006) um dos principais de inclusão escolar por si só não garante
autores que regem esse trabalho, aborda ao adolescente infrator uma reintegração
claramente toda trajetória podendo nos social, já que além dos fatores de estrutu-
dá exemplos do inicio dessa preocupação ra familiar a ser considerado, temos o fa-
com a deliquencia juvenil, (JESUS, 2006, tor social que não garante programas de
p.31). “A preocupação com a delinquen- apoio em parceria com a escola a esses
cia juvenil estava exposta já nas Ordena- jovens e consequentemente a suas famí-
ções Filipinas, que vigoraram no Brasil por lias que vem de uma realidade dura de so-
mais de dois séculos, até a promulgação brevivência e marginalização. O trabalho
do Código Criminal do Império, em 1830”. trouxe informações práticas de observa-
Diante da preocupação e toda trajetória ções a respeito da preparação dos profes-
em volta da delinqüência juvenil em uma sores que trabalham com menores infra-
sociedade contemporânea, pode se pen- tores e que não recebem treinamentos
sar em uma garantia de direitos a uma e desconhecem essa forma de inclusão,
margem de excluídos da sociedade que trabalham com medo e inseguros, envol-
resultavam em crianças e adolescentes. vidos pela realidade sofrida do aluno de
Após a Constituição Federal que foi pro- periferia que chegam às salas de aula sem
mulgada no ano de 1988, na Câmara dos motivação. E a inclusão do menor infrator
Deputados com intuito de garantir cida- através do trabalho pedagógico escolar
dania em suas leis ao individuo brasilei- é minimizada tanto pelo despreparo dos
ro, se pensou em uma lei complementar professores, quanto pela falta de envol-
que fosse destinada ao público infantil. vimento da família no processo inclusivo
Esse ideal se consagrou em Estatuto da de aprendizagem, não existe um coopera-
Criança e do Adolescente no ano de 1990. ção mútua de responsabilidades. A parte
Diante desse contexto que a lei garante as positiva que pode ser observada nessa
crianças e adolescentes uma lei específi- pesquisa, baseia-se na funcionailidade do
ca, onde ocorra a inclusão de jovens em letramento, fator significativo nas discus-
condições de liberdade assistida em sala sões em sala. Através dessa maneira de
de aula, se pode perceber que muitos vivenciar com o aluno os vários gêneros
desses adolescentes voltavam a cometer textuais baseado em sua realidade é que
infrações mesmo depois de ser beneficia- se pode despertar para algumas questões

940
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

condizentes com seu meio, localizando Os autores enfatizam que esse acompa-
assim, esse aluno na sociedade. Constata- nhamento pode ser realizado com proce-
-se que é considerável investir em futuras dimentos de baixo custo, simples e que
pesquisas que trabalhem diretamente todos os profissionais de saúde da rede
com as famílias dos menores infratores, pública têm possibilidade de realizá-los.
discutindo sobre o respeito, às origens, Assim, esse monitoramento tem condi-
cultura e todos os aspectos sociais que ções de ser implementado nos progra-
possam intervir na conduta do adoles- mas públicos, com a função de vigilância
cente com o meio. Através de uma abor- do desenvolvimento. E, para confirmar
dagem mais específica das realidades essa afirmação, documentos do Misté-
existentes, fatores norteadores para uma rio da Saúde (Brasil, 2002; Brasil, 2002a)
melhor qualidade do ensino público para apontam que os Programas de Saúde da
menores infratores, neste caso específico, Família podem ser considerados locais
do Distrito Federal. adequados para a avaliação e o monitora-
mento do desenvolvimento infantil, uma
Palavras-chave: inclusão, menor infrator, vez que são responsáveis pela prevenção
letramento escolar. de doenças, promoção e recuperação da
Contato: Amanda Correia Lima, Universidade de saúde. Ainda, de acordo com o Ministério
Brasília – UNB, amandajmorrisson@gmail.com da Saúde (Brasil, 2002), os profissionais da
saúde devem estar preparados para iden-
tificar os sinais precoces de atraso no de-
CO 43 - LT06 senvolvimento e encaminhar essas crian-
ças para os serviços especializados mais
Saúde adequados para o problema detectado.
Este trabalho teve como objetivos avaliar
o desenvolvimento infantil a partir do re-
LT06-712 - TRIAGEM DO
lato dos pais e verificar se havia ou não
DESENVOLVIMENTO INFANTIL NA SAÚDE
discrepância entre as informações conti-
PÚBLICA
das no prontuário da criança nos Progra-
Ana Regina Lucato Sigolo - UFSCar mas de Saúde da Família e as fornecidas
ginasigolo@yahoo.com.br pelo instrumento, a partir das informa-
Ana Lúcia Rossito Aiello - UFSCar ções relatadas pelo responsável durante
ana.aiello@terra.com.br a sua aplicação. Participaram desta pes-
Financiamento: FAPESP quisa 60 pais/responsáveis de crianças de
zero a dois anos, atendidas em cinco Uni-
Amorin et al. (2009) ressalta que uma dades do Programa de Saúde da Família.
avaliação regular do desenvolvimento in- Em função de não existir um instrumento
fantil é importante para que problemas de avaliação do desenvolvimento infantil
do desenvolvimento sejam identificados baseado no relato dos pais e padronizado
precocemente e as crianças diagnostica- para a população brasileira, optou-se pela
das sejam encaminhadas para programas adaptação da “Ficha de Acompanhamen-
específicos, para que as conseqüências to do Desenvolvimento” (Brasil, 2002),
do seu atraso sejam nulas ou mínimas. disponibilizada pelo Ministério da Saúde.

941
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Foi realizada a aplicação do instrumento pulação em potencial para os programas


selecionado com pais/responsáveis de de estimulação precoce, para evitarem o
12 crianças atendidas em cada Unidade aparecimento de possíveis atrasos no de-
e analisadas as informações contidas nos senvolvimento. Esses resultados devem
prontuários médicos destas crianças. Em ser analisados com cautela; no entanto,
todas as unidades foram identificadas 38 são preocupantes. Apesar do tamanho re-
crianças (63,34%) que falharam em al- duzido da amostra e o fato de ainda ser
cançar algum marco do desenvolvimento de conveniência, ainda assim, 63,34% das
para a sua idade. De acordo com o mate- crianças avaliadas apresentaram falhas de
rial utilizado, estas crianças deveriam ter desenvolvimento que sugerem condutas
um acompanhamento mais sistemático especificas, como: antecipar a próxima
dos profissionais e seus responsáveis, consulta, investigar o ambiente da criança,
orientados quanto à estimulação necessá- a sua relação com o responsável e a oferta
ria a ser realizada com suas crianças. Além de estímulos, sistematicamente. O obje-
disso, três crianças precisariam ser enca- tivo dessas condutas dos profissionais é
minhadas para um centro de atendimento impedir que essas falhas se transformem
especializado, uma vez que não apresen- em persistência do atraso. A recomenda-
taram o marco do desenvolvimento no úl- ção, portanto, é lidar de forma preventiva
timo mês esperado para este. Importante em relação a estas dificuldades e favore-
ressaltar que das 38 crianças que apresen- cer o bom desenvolvimento infantil. Com
taram alguma falha em seu desempenho, a análise dos prontuários dessas crianças
seis eram prematuras. Desta forma, cal- foi possível verificar a predominância de
culando suas idades corrigidas, somente informações sobre saúde nas consultas
uma criança deixaria de apresentar al- médicas, mesmo sendo únicas ou com
guma falha em um marco do desenvolvi- outro tipo de informação. Do total de 444
mento, ainda assim, cinco crianças preci- consultas, 397 (89,4%) foram relacionadas
sariam de um acompanhamento do seu à “saúde”. Pôde-se observar: 11 consultas
desenvolvimento mais sistemático e deta- com registro de algum aspecto relaciona-
lhado dos profissionais. Vale destacar que do à avaliação do desenvolvimento, como
o instrumento não indica a necessidade “aparecimento da dentição” e marcos do
em considerar a idade corrigida da crian- desenvolvimento, porém, realizadas por
ça na sua aplicação. Porém, o fato dessas um profissional que já não trabalhava mais
crianças serem prematuras implica em nas Unidades; e nove crianças da Unidade
uma atenção maior, uma vez que apre- 4 e uma da Unidade 5 tiveram o registro
sentam maior probabilidade de terem da avaliação dos reflexos. Além das pou-
algum atraso em seu desenvolvimento e, cas consultas com anotações sobre o de-
consequentemente, se beneficiariam de senvolvimento da criança (2,48%), não foi
uma intervenção e/ou estimulação preco- observado nenhum registro quanto aos
ces. Outro dado interessante é que quatro marcos evolutivos, que convergiam com
crianças eram prematuras e apresentaram os resultados obtidos pelas crianças que
um desenvolvimento normal tanto para não apresentaram um desenvolvimento
a sua idade cronológica quanto para sua normal, segundo o instrumento utilizado.
idade corrigida sendo, também, uma po- Dessa forma, nenhum prontuário, entre

942
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os das 38 crianças que apresentaram al- LT06-746 - CARACTERIZAÇÃO DA REDE


guma falha de desenvolvimento, tinha DE ATENÇÃO A USUÁRIOS DE CRACK NO
registro de uma avaliação do “problema VALE DO PARANHANA/RS
detectado pelo instrumento” e de alguma Alexandre Herzog, Faccat
orientação específica. Aparentemente os alexandreherzog@hotmail.com
profissionais não “perceberam” a falha de Sílvia Schein, Faccat
desenvolvimento e, ao não perceberem, silviaschein@yahoo.com.br
não realizaram encaminhamentos. O que Laíssa Eschiletti Prati
chama a atenção é que, do total destas Faccat, laissaprati@pq.cnpq.br
crianças, 12 foram consultadas uma ou Financiamento: CNPq
mais vezes ao mês e nove tiveram 10 ou
mais consultas médicas registradas. É ne- A temática do crack vem sendo muito
cessário enfatizar, também, a ausência da discutida, atualmente, motivando e exi-
efetivação de uma proposta do Ministério gindo intervenções políticas do governo
da Saúde, uma vez que o material utiliza- federal, que visem ampliar e fortalecer
do para avaliar as crianças foi criado por a rede de atenção a usuários de crack. A
uma equipe de especialistas, em 2002, a reestruturação da atenção aos usuários
pedido do próprio Ministério, para que de álcool e outras drogas tem ocorrido
fosse inserido nos atendimentos à popu- através da sua ligação com a Rede Inte-
lação infantil, com o objetivo de acompa- gral de Atenção à Saúde Mental, tendo
nhar, sistematicamente, o crescimento e como eixos orientadores a prevenção, o
o desenvolvimento da criança. Porém, em tratamento, a recuperação, a reinserção
2010, oito anos após sua criação, esse ins- social, a redução dos danos sociais e à
trumento não era utilizado no município e saúde, a redução da oferta e a realização
também não era conhecido por dois mé- de estudos, pesquisas e avaliações acer-
dicos e três enfermeiras dos Programas de ca das intervenções realizadas (Duarte &
Saúde da Família. Vale lembrar que esta Branco, 2008). No entanto, o tratamen-
pesquisa foi realizada em uma cidade do to do usuário de crack tem se mostrado
centro do Estado de São Paulo, uma região como um desafio, tanto para a rede de
conhecida como pólo tecnológico. Assim, atenção quanto para as políticas públicas,
do mesmo modo que propostas são cria- pois, exige intervenção e ação de diferen-
das, é fundamental que haja políticas para tes esferas do governo e da própria rede
implementá-las; é preciso que propostas de atenção. Diante desta perspectiva, o
como esta se efetivem, para beneficiarem objetivo desta pesquisa é mapear a rede
a população infantil na sua totalidade. de atenção a usuários de crack do Vale do
Paranhana/RS, identificando as barreiras
Palavras-chave: triagem de desenvolvimento de acesso ao tratamento/ serviço e dos
infantil, avaliação do desenvolvimento, desafios envolvidos na adesão do usuário
Programas de Saúde da Família ao tratamento. O método utilizado para a
Contato: Ana Regina Lucato Sigolo, coleta de dados é o da Inserção Ecológica,
Universidade Federal de São Carlos, proposto por Cecconello e Koller (2003).
ginasigolo@yahoo.com.br Segundo Prati, Paula Couto, Moura, Polet-
to e Koller (2008) a inserção só é possível

943
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

em contextos nos quais os pesquisadores os temas emergentes nos diários de cam-


encontram-se engajados em atividades po. Da mesma forma, quando necessário,
regulares, junto a pessoas que estão en- usa-se o SPSS para a análise dos dados
volvidas, diretamente, com o fenômeno quantitativos. A proposta é realizar uma
pesquisado. A inserção ecológica, além análise integrada dos diferentes instru-
de possibilitar a pesquisa no contexto real mentos utilizados para a obtenção de in-
dos sujeitos, proporciona intervenções formações aprofundadas sobre a rede de
que facilitam o seu desenvolvimento, atenção aos usuários de crack. Em relação
através da interação pesquisador-pes- aos resultados, a pesquisa já foi inserida
quisado. Os locais de inserção foram se- em 4 das 6 cidades que compõem o Vale
lecionados a partir do CNESnet (Cadastro do Paranhana. Até o presente momento,
Nacional de Estabelecimentos de Saúde), permitiu verificar que a rede de atenção
do Guia de Saúde Mental do Rio Grande aos usuários de crack está em processo
do Sul (Rio Grande do Sul, 2008) e do de construção e definição de competên-
site da Federação Brasileira de Comuni- cias de cada serviço de atenção. Há a ten-
dades Terapêuticas (FEBRACT), onde fo- tativa de alguns municípios em articular
ram identificados os serviços de atenção os serviços de maneira integrada, mas,
a usuários de crack, nos seis municípios estas ações ainda estão em nível de pla-
que compõem o Vale do Paranhana. Os nejamento e discussão, gerando muitas
pesquisadores estavam inseridos em ser- dúvidas e questionamentos quanto ao
viços de atenção a usuários de crack du- papel e responsabilidades de cada servi-
rante um período mínimo de três meses, ço. Entretanto, ainda há municípios que
com contatos semanais de uma hora e desconhecem a realidade do crack no seu
meia, proposta que acompanha as diver- território. Com relação ao atendimen-
sas atividades realizadas, contatando os to oferecido, as principais barreiras de
diferentes profissionais envolvidos com a acesso aos serviços e tratamentos identi-
temática e os usuários de crack. O princi- ficadas são: a exigência de familiar para
pal instrumento de coleta de dados tem atendimento e tratamento, a necessidade
sido o diário de campo, que vem sendo de abstinência total de uso se substâncias
redigido individualmente após cada visita para permanecer em tratamento e a fal-
ao serviço. Nesse documento são coloca- ta de abordagens e modelos terapêuticos
dos não apenas os fatos observados, mas, mais flexíveis e adequados à realidade
também, as impressões e sentimentos dos usuários. Para Silva et al. (2009) a
que perpassam a atuação do pesquisador dependência química tem origem mul-
nos momentos em que está inserido no tifatorial e complexa e, por isso, exige
serviço pesquisado. Também podem ser tratamentos em múltiplas abordagens
utilizados questionários e escalas padro- terapêuticas. Entretanto, Passos (2010)
nizados, entrevistas com profissionais e afirma que, apesar das novas diretrizes
usuários do serviço, consulta aos pron- para o atendimento e tratamento a usu-
tuários e formulários disponíveis. Para a ários de crack persistem, ainda, manei-
análise dos dados coletados está sendo ras preconceituosas e valores arraigados
utilizado o software Nvivo 9, que auxilia quanto ao uso da droga. É interessante
na identificação de categorias e identifica identificar alguns profissionais que atuam

944
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

em diversas cidades e como os usuários LT06-809 - O CENTRO DE REFERÊNCIA


transitam entre diferentes serviços. No DA ASSISTÊNCIA SOCIAL CRAS NAS
contexto do Rio Grande do Sul, Oliveira e TRAVESSIAS DA VIDA: REFLEXÕES
Dias (2010) salientam que são observadas SOBRE DESENVOLVIMENTO HUMANO
práticas que desconsideram questões so- E LIBERTAÇÃO
cioculturais, políticas e econômicas rela- Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC
cionadas ao uso do crack, legitimando o naradiogo@hotmail.com
usuário como delinquente-doente e a in- Gislane Karla de Souza - UFC
ternação–isolamento, como o tratamen- gislanekarla.psicologia@yahoo.com.br
to ideal. Muitos membros das equipes Juliana Moita Leão - UFC
de atenção estão buscando formação na juliana_moita@hotmail.com
área da dependência química, identifi- Iollanda Freire Costa - UFC
cando em si uma dificuldade no manejo e iollanda3fcbelchior@yahoo.com.br
atenção ao usuário. Como parte das con- Raíza Ribeiro de Souza - UFC
clusões, esta pesquisa está auxiliando na raiza.psicologia@yahoo.com.br
construção do conhecimento acerca da Susana Maciel Pinto - UFC
realidade dos serviços de atenção, pro- garotinha-susi@hotmail.com
fissionais, tratamentos oferecidos e usu-
ários de crack do Vale do Paranhana/RS. Este texto apresenta algumas reflexões
Portanto, diante da realidade encontrada teóricas sobre as práticas relativas a
e das contribuições previstas da pesquisa, crianças com até seis anos de idade, nos
pretende-se auxiliar os municípios tanto Centros de Referência da Assistência So-
na criação quanto no fortalecimento das cial (CRAS), buscando um diálogo teórico
redes de atenção e dos profissionais que entre as perspectivas de Walter Benja-
trabalham com usuários de crack, através min, pensador ligado à teoria crítica e Lev
de encontros e cursos. Quanto à constru- Vigotski, psicólogo russo fundador da te-
ção de políticas públicas, acredita-se que oria histórico-cultural, e as contribuições
além de capacitar as equipes de atenção de ambas à compreensão da brincadeira
à saúde com novas abordagens terapêu- enquanto atividade da criança, além de
ticas, é necessário construir uma siste- Martin-Baró, psicólogo salvadorenho que
mática de encaminhamento mais eficaz. versa sobre a América Latina e sua luta
Um resultado imediato que o processo de por libertação. Tais considerações situ-
inserção na rede já está possibilitando é o am-se, ainda, no escopo mais amplo das
desenvolvimento de novas relações entre fronteiras entre a Psicologia Comunitária
os serviços facilitando, assim, o desen- e a Psicologia do Desenvolvimento, pro-
volvimento das pessoas que, estando em curando tecer compreensões a respeito
risco e sofrimento, buscam estes espaços. do desenvolvimento humano, em suas
dimensões pessoais e coletivas, tomando
Palavras-chave: políticas públicas, crack, rede como ponto nodal a questão da liberta-
de atenção ção. A Libertação tem sido problemati-
Contato: Alexandre Herzog, Psicologia/Faccat, zada em diversas produções científicas
alexandre.herzog@hotmail.com da América Latina, a saber, a Psicologia
da Libertação (Baró, 1998), a Teologia da

945
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Libertação (Boff), a Filosofia da Liberta- co-cultural de Vigotski, compreendendo


ção (Dussel) e a Pedagogia da Libertação que a brincadeira proporciona à criança
(Freire), dos quais bebem os psicólogos novas leituras da realidade, o que valori-
comunitários do Ceará. Uma leitura in- za a atividade lúdica em si mesma e não
teressada do documento que norteia o somente em seu caráter instrumental. Vi-
Serviço de Convivência e Fortalecimento gotski (1998), em texto que versa sobre a
dos Vínculos para crianças até seis anos brincadeira para os pré-escolares, aborda
(Brasil, 2010) e a vivência de acompanha- a gênese do brincar e seu papel, sendo a
mento da implantação deste serviço atra- brincadeira um dos fundamentos do de-
vés do projeto de extensão “Brincadeiras: senvolvimento psicológico neste momen-
ações em Psicologia do Desenvolvimento to da vida. A teoria histórico-cultural con-
e práticas lúdicas” – do curso de Psicolo- sidera, sobretudo, o interesse da criança,
gia da Universidade Federal do Ceará, na o que motiva sua ação, que necessidades
cidade de Sobral, região norte do Estado estão envolvidas na atividade específica
– também inspiraram as linhas a seguir. do brincar e de que forma esta articulada
Abordar a infância e suas vivências con- às esferas afetivas e cognitivas na direção
temporâneas no contexto urbano trata-se do desenvolvimento. No enfoque socio-
de trabalho complexo, envolvendo múlti- cultural, representado por autores como
plos atores e compreensões. De acordo Werscth e Valsiner, compreende-se que a
com Castro (2001), o lugar da infância é criança reconstrói e transforma a cultura,
como que marcado por um débito social redefinindo a realidade na brincadeira e
e cultural, fruto de uma sociedade refe- indo além do que foi a ela apresentado,
renciada no adulto. Uma aproximação o que ressalta seu papel ativo. Essas con-
da infância pobre do contexto urbano cepções colaboram para afirmar a infân-
evidenciaria mais um déficit advindo da cia a partir do reconhecimento de sua
situação de privação e luta pela sobrevi- visão sobre o mundo como algo de valor
vência, enfrentadas por tais sujeitos, coti- e não apenas como vir a ser. Um olhar
dianamente. A transformação de tais con- crítico alerta-nos, porém, a considerar
cepções e situações parte da discussão de que os espaços das práticas lúdicas são
uma dimensão ético-política da infância, atravessados pelas tensões contemporâ-
desconstruindo a lógica da norma desen- neas e marcam a cultura lúdica em ter-
volvimentista para afirmar a criança como mos de dependência e autonomia, frente
sujeito, ator social, cuja ação é brincar. O aos movimentos de homogeneização ou
“Brincadeiras” foi proposto no sentido de possibilidades de variadas configurações
se pensar, criticamente, os espaços de do brincar e da constituição dos sujeitos
construção dessa lógica diferenciada na nesse processo. A brinquedoteca cons-
cidade de Sobral, articulando-se junto a tituiria-se, portanto, como um espaço
estes espaços e fortalecendo suas ações, de desenvolvimento humano através do
tendo atenção para o lugar da criança brincar; inserida no contexto do CRAS,
como sujeito de direitos. O campo inter- permitiria a discussão e problematização
disciplinar no qual o lúdico se inscreve do desenvolvimento humano como trans-
tem como esteio teórico-metodológico, formação da participação na atividade
no presente projeto, a Psicologia históri- sociocultural, além de uma maior proxi-

946
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

midade com a vivência cotidiana das fa- no quintal da sua brincadeira, exploran-
mílias e um fortalecimento da rede social do, criando história e afetando os profis-
da qual ela faz parte. Este espaço abriu- sionais com os quais se relaciona. Ressal-
-se para a presença do extensionista do tamos, desse modo, seu papel ativo na
projeto “Brincadeiras”, compreendendo co-construção das ações para crianças de
seu lugar de aprendiz e proporcionando 0 a 6 anos. Lembramos, ainda, com Sou-
vivências mobilizadoras de discussões za (1994), que a compreensão do brincar
acadêmicas, que envolvem psicologia do é um processo ativo, dialógico. Assim, o
desenvolvimento, psicologia social, so- sentido que se enuncia nem está no fa-
ciologia da infância, dentre outras temá- lante nem no interlocutor, é efeito da
ticas, qualificando o olhar do psicólogo interação; na metáfora bakhtiniana, é a
em formação e sua contribuição junto a faísca elétrica produzida pelo atrito entre
este contexto, com vistas a colaborar no os pólos.
planejamento, execução e avaliação das
atividades lá propostas, constituindo-se Palavras-chave: Psicologia Comunitária,
campo interativo fundamental para a cir- brincadeira, libertação
culação de saberes e práticas a respeito Contato: Nara Maria Forte Diogo Rocha, UFC,
do brincar. Através da vivência cotidiana naradiogo@hotmail.com
dos extensionistas junto à implementação
dessa vivência nascente, realizamos leitu-
ras do documento norteador já referido. LT06-887 - VALIDADE DA ESTRUTURA DE
O brincar, como modo de comunicação, FATORES DA ESCALA DE APOIO SOCIAL
coloca em pauta: o que teriam as crianças EM GESTANTES E PUÉRPERAS
a dizer e que importância teria esta escu- Gabriela Andrade da Silva - USP
ta para o alcance dos objetivos do CRAS? gabiasilva@usp.br
Tal escuta se confunde com diagnóstico? Tânia Kiehl Lucci - USP
Como pode o brincar, no CRAS, ser liber- tanialucci@usp.br
tação? E a partir das referências já cita- José de Oliveira Siqueira - USP
das e aprofundadas no decorrer do texto, siqueira@usp.br
a seguir, coloca-se a pergunta originária Emma Otta - USP
destas reflexões: como e o que as equi- emmaotta@usp.br
pes dos CRAS podem aprender com as Financiamento: CAPES
infâncias? Ao propor uma nova perspec-
tiva e uma nova práxis para a Psicologia, Apoio social refere-se ao suporte que os
que parta do sujeito e não tome o sujeito indivíduos conseguem obter de sua rede
como alvo, Martin-Baró (2009) fala de um social, formada por familiares, amigos,
trabalho lado a lado, que se constrói ao conhecidos e profissionais. Esse apoio foi
mesmo tempo em que transforma a reali- definido como um conjunto de fatores
dade e os envolvidos. Compreendendo o socioambientais protetivos, que ajudam
CRAS como um espaço educativo, em seu o indivíduo a lidar com dificuldades ou
sentido mais amplo, ele também deve ser estresses ambientais (Lima, 2009). Pes-
lugar para a prática política democrática. quisas têm revelado que falta de suporte
A criança transforma o entorno do CRAS social na gravidez e no puerpério são fa-

947
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tores de risco para o desenvolvimento da O objetivo do presente estudo foi avaliar


depressão pré-natal (Baptista, Baptista, a adequação do modelo psicométrico de
& Torres, 2006; Moreira & Satierra, 2008; cinco fatores previsto por Sherbourne e
Chou, Kuo, & Wang, 2008; Collins, Dunkel- Stewart (1991) a partir das respostas à
-Schetter, Lobel, & Scrimshaw, 1993; Xie, EAS de duas amostras de mães da cidade
He, Koszycki, Walker, & Wen, 2009) e pós- de São Paulo: gestantes atendidas pelo
-parto (Cruz, Simões, & Faysal-Cury, 2005; SUS (N=392); e parturientes atendidas
Moraes et al., 2006; Coutinho, Baptista, por um hospital privado de alto padrão
& Morais, 2002; O’Hara & Swain, 1996; (N=269). Foram critérios de exclusão
Beck, 2001; Robertson, Grace, Wallington, apresentar gestação múltipla e deixar de
& Stewart, 2004). responder um ou mais itens da escala. As
A Escala de Apoio Social (EAS – Sherbour- participantes responderam a versão vali-
ne & Stewart, 1991), que faz parte do dada em português da EAS (Griep, Chor,
Medical Outcomes Study (MOS), conta Faerstein, Werneck, Lopes, 2005) e entre-
com 19 itens, todos iniciando com: “Se vistas estruturadas para obter informa-
precisar, com que freqüência a senhora ções sociodemográficas.
conta com alguém que...”, que admitem Análises exploratórias univariadas foram
cinco possibilidades de resposta: 1.nunca, conduzidas para comparar os perfis das
2.raramente, 3.às vezes, 4.quase sempre, participantes do SUS e do hospital priva-
5.sempre. Os itens foram elaborados es- do, usando teste t para variáveis contínu-
perando-se que pudessem ser agrupados as e teste de qui-quadrado para variáveis
em cinco dimensões teóricas: (a) apoio categóricas. As puérperas do hospital pri-
material, (b) apoio afetivo, (c) interação vado tinham, em média, 33,1 anos, sendo
social positiva, (d) apoio emocional, (e) mais velhas que as gestantes do SUS, que
apoio de informação. A análise fatorial tinham, em média=25,3 anos (t650,685=-
confirmatória das respostas de 2.987 pa- 20,205, p<0,001). Além disso, puérperas
cientes com doenças crônicas nos Estados do hospital privado moravam em residên-
Unidos mostrou que os itens de apoio cias com média de 2,5 pessoas, valor mais
emocional e de informação agruparam-se baixo que a média das gestantes do SUS,
em uma mesma dimensão. de 3,9 pessoas (t500,371=12,689, p<0,001).
No Brasil, a análise fatorial exploratória Testes de qui-quadrado indicaram que
das respostas à EAS de 4.030 funcionários entre as puérperas do hospital privado,
técnico-administrativos de uma universi- havia maior proporção que trabalhava
dade no Rio de Janeiro resultou em três (77,0%, contra 39,3% das gestantes do
dimensões: (a) apoio emocional e de in- SUS) e que morava com o companhei-
formação, (b) apoio afetivo e de interação ro (98,9%, contra 75,3% das gestantes
social positiva, (c) apoio material (Griep, do SUS). Também se observou diferen-
Chor, Faerstein, Werneck, Lopes, 2005). A ça quanto à escolaridade (X21=534,535,
confiabilidade teste-reteste da EAS nessa p<0,001): entre as puérperas do hospital
amostra foi considerada adequada (Griep, particular, 97,4% tinham nível superior
Chor, Faerstein, & Lopes, 2003), bem (completo ou incompleto), enquanto en-
como em uma amostra de 65 gestantes no tre as gestantes do SUS, a proporção foi
Rio de Janeiro (Silva & Coutinho, 2005). de apenas 2,6%. Não foram encontradas

948
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

diferenças entre as amostras quanto à LT06-1214 - TERAPIA COGNITIVO-


paridade e ao número de filhos. Testes t COMPORTAMENTAL PARA PACIENTES
para amostras independentes indicaram COM PSORÍASE: POSSÍVEL INTERVENÇÃO
que as médias de apoio percebido foram NA SAÚDE PÚBLICA
significativamente maiores para as puér- Leonardo Machado da Silva - PUCRS
peras do hospital privado do que para as leonardo.silva@pucrs.br
gestantes do SUS, em todos os itens da Helena Diefenthaeler Christ - PUCRS
EAS (p<0,001). helenachrist@hotmail.com
O modelo psicométrico simultâneo para Tatiana Helena José Facchin - PUCRS
os grupos HU e Einstein foi construído tatyhelena@yahoo.com.br
usando os cinco fatores previstos e sujei- Bruna Ferreira Fernandes - PUCRS
to às restrições das cargas fatoriais serem brufernandes1@hotmail.com
iguais nos grupos concebidos por Sher- Deise Fonseca Fernandes - PUCRS
bourne e Stewart (1991), como variáveis deise.ff@hotmail.com
latentes correlacionadas entre si (mode- Gabriel José Chittó Gauer - PUCRS
lo não ortogonal). A análise foi realizada ggauer@pq.cnpq.br
no software Amos 16. Os índices usados Financiamento: CNPq, CAPES e Pró-bolsa.
como critério para decidir sobre a ade-
quação do modelo basearam-se em Byrne A psoríase é uma doença crônica de pele,
(2010): PCLOSE>0,5, PGFI>0,5, CFI>0,9, que afeta entre 1 e 3% da população
TLI>0,9. Foram encontradas evidências de mundial e, em geral, ocorre na segunda
boa qualidade de ajustamento do modelo ou terceira década de vida. A psoríase do
de cinco fatores, de acordo com os crité- tipo vulgar ou de placas caracteriza-se por
rios de Byrne (2010): PCLOSE = 0,85, PGFI placas sólidas na pele, com bordas bem
= 0,69, CFI = 0,95, TLI = 0,94. definidas, cobertas por finas camadas de
escamas de cor prateada. Além disso, é a
Os resultados indicaram que o modelo de maior incidência (90%) dentre os dife-
psicométrico de cinco fatores, tal como rentes tipos da doença (Consenso Brasi-
havia sido previsto por Sherbourne e leiro de Psoríase e Guias de Tratamento,
Stewart (1991), foi adequado para medir 2006). Apesar de sua etiologia não ser
o apoio social percebido por gestantes clara, acredita-se que siga o modelo mul-
e puérperas, em suas diferentes dimen- tifatorial e que ela possa surgir em decor-
sões. O modelo mostrou ter boa qualida- rência de uma interação genética, fatores
de em ambos os grupos estudados, ape- ambientais e psicológicos (Silva, Müller &
sar das diferenças de perfil observadas Bonamigo, 2006). De cunho inflamatório,
nas análises univariadas. acomete, principalmente, a pele e as ar-
ticulações. Dentre os fatores que podem
Palavras-chave: Apoio social, Gestantes, estar relacionados à sua etiologia estão
Estudos de validação as variáveis psicossociais: alto índice de
Contato: Gabriela Andrade da Silva estresse percebido, falta de suporte so-
Universidade de São Paulo (USP) cial e desajustamento psíquico têm sido
gabiasilva@usp.br implicados tanto ao surgimento quan-
to à exacerbação da doença (Mastrolo-

949
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nardo et al, 2007). O estresse negativo cos como no transtorno bipolar (Reinares
(distress), incapacidade de estabelecer et al, 2008), diminuição dos prejuízos so-
relações sociais saudáveis (Fortune et al, ciais em pacientes com depressão maior
2002), depressão e ansiedade (Koblenzer, (Pinquart, Duberstein & Lyness, 2008) e
2005, Buske-Kirschbaum et al 2007) estão em câncer (revisado por Gundel, Humm-
altamente associados com os portadores ler & Lordick, 2007). Outros exemplos de
de psoríase, principalmente, quando as estudos, no Brasil, demonstram a eficá-
lesões são desfigurantes e em partes mais cia da terapia cognitivo-comportamental
visíveis do corpo, como nas mãos e ros- grupal em pacientes com estresse ocupa-
to (Niemeier et al, 2002). Além do nítido cional (Murta & Tróccoli, 2004) e hiper-
sofrimento em decorrência da própria tensão arterial (Cade, 2001), e individual
psoríase, outras doenças têm sido con- em pacientes com fibromialgia (Brasio et
sideradas comorbidades desta. Em um al, 2003). Observa-se a necessidade de
recente estudo de Gulliver (2008), ficou um tratamento para pacientes com pso-
constatado que, além da artrite psoriáti- ríase, no intuito de prevenir doenças mais
ca, outras doenças de cunho inflamatório graves no futuro, bem como propiciar
estariam a ela associadas, como a síndro- uma melhor qualidade de vida para os
me metabólica, a obesidade e doenças acometidos por esta dermatose. Assim,
cardiovasculares. Todas essas situações este trabalho objetiva avaliar o impacto
evidenciam a necessidade de alguma da intervenção cognitivo-comportamen-
modalidade de tratamento para esses tal, por meio de variáveis clínicas e psicos-
pacientes. Cade (2001) coloca que a te- sociais, em pessoas com psoríase de pla-
rapia cognitivo-comportamental é muito cas. Em relação ao método adotado para
útil, por abranger uma função educativa e este estudo, a amostra foi composta por
contribuir para o desenvolvimento de ha- 5 participantes portadores de psoríase de
bilidades, centrando-se nos aspectos afe- placas em atendimento dermatológico,
tivos, comportamentais e interpessoais. sendo 3 pessoas do sexo masculino e 2
Devido a etiologia multifatorial das doen- do feminino, com idade média de 49 anos
ças crônicas, aspectos ambientais (físicos (DP=12,94), tendo entre 18 e 65 anos e
e sociais) podem funcionar como fatores escolaridade mínima de 5ª série do Ensi-
de risco, uma vez que os comportamen- no Fundamental. Dois participantes eram
tos de risco emitidos geram emoções que casados, 2 solteiros e 1 viúvo, todos com
são prejudiciais ao organismo, aumentan- escolaridade de ensino médio completo.
do a susceptibilidade para as doenças ou No tocante à situação de trabalho, 40%
agravando a condição atual. Alguns estu- dos participantes estavam empregados
dos apontam que a intervenção psicoló- (n=2), 40% eram autônomos (n=2) e um
gica cognitivo-comportamental em doen- estava aposentado (20%). Em relação ao
ças crônicas tem auxiliado na melhora de tempo com a doença, a variação foi entre
diversas variáveis, que incluem processos 18 e 120 meses (média 70,8, DP=37,08).
psicossociais, qualidade de vida e adesão A pesquisa, de delineamento transver-
ao tratamento em pacientes com HIV (Ar- sal, quantitativa e quase-experimental,
nal, 2003, Rousaud, et al 2007), melhora foi realizada no Ambulatório de Derma-
dos sintomas nos transtornos psiquiátri- tologia da Santa Casa de Misericórdia de

950
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Porto Alegre. Como instrumentos, foram Por ser uma modalidade terapêutica de
utilizados: o questionário de dados sócio- curta duração, esperamos que os dados
-demográficos e da situação clínica, a Es- desta pesquisa possam servir como parâ-
cala de Ansiedade de Beck (BAI) (Beck et metro para futuras intervenções em saú-
al., 1988), a Escala de Depressão de Beck de pública.
(BDI2) (Beck et al., 1996), o Inventário de
Sintomas de Stress para Adultos de Lipp Palavras-chave: psoríase, terapia cognitivo-
(ISSL) (Lipp, 2000), um exame clínico PASI comportamental, saúde pública
(Psoriasis Area and Severity Index), além Contato: Helena Diefenthaeler Christ, PUCRS,
de 10 sessões estruturadas de interven- helenachrist@hotmail.com
ção individual, na modalidade cognitivo-
-comportamental. Quanto aos procedi-
mentos, os pacientes com psoríase vulgar LT06-1216 - A TERAPIA DE FAMÍLIA
foram recrutados por conveniência em NUM PROGRAMA AMBULATORIAL DE
ambulatório especializado. Os instrumen- SAÚDE MENTAL PARA ADOLESCENTES:
tos foram aplicados, individualmente, A EXPERIÊNCIA DO PROADOLESCER –
uma semana antes do início da interven- IPUB/UFRJ
ção (tempo 1) e uma semana após o fim Sonia Beatriz Sodré Teixeira - UFRJ
da psicoterapia (tempo 2). A intervenção soniabeso@yahoo.com.br
consistiu de 10 sessões estruturadas na
modalidade cognitivo-comportamental. O presente trabalho tem como objeti-
Os resultados obtidos no BAI apontaram vo apresentar o Programa Ambulatorial
uma diminuição não significativa da an- para Adolescentes de Risco, ressaltando
siedade (p=0,500 para distribuição dupla; as ações desenvolvidas com as famílias. È
p=0,250 para distribuição simples) nos nossa intenção mostrar a importância de
momentos pré e pós intervenção. O mes- uma aproximação com o grupo familiar,
mo resultado foi encontrado nos níveis dado que a família representa o contexto
de depressão (p=0,125 para distribuição interpessoal mais decisivo no desenvol-
dupla; p=0,063 para distribuição sim- vimento juvenil, interferindo de forma
ples). Em relação ao exame clínico PASI, fundamental na possibilidade ou não de
a análise comparativa dos dois tempos se obter autonomia e maturidade para
da pesquisa evidenciou uma diminuição a vida adulta. Sabemos também o quan-
que beirou a significância no teste para to o aparecimento de sintomas graves
distribuição dupla (p=0,063) e revelou nesta faixa etária mexe com o ambiente
uma diferença significativa na distribuição familiar, podendo trazer sérias dificulda-
simples (p=0,031). Os resultados obtidos des na convivência. Escutar e acolher a
neste piloto apontam que a intervenção família tem trazido bons resultados na
cognitivo-comportamental alterou uma clínica com adolescentes e é nosso in-
série de variáveis no sentido esperado. teresse mostrar como desenvolvemos
Sendo assim, espera-se que um número esta prática. A apresentação terá 2 eixos
maior de participantes venha a confirmar básicos de reflexão, que se cruzam e são
relações de efeito mais consistentes e sig- constitutivos do Programa: O primeiro diz
nificativas na segunda etapa da pesquisa. respeito as suas origens, como foi criado,

951
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

seu desenvolvimento no espaço da assis- ções de autoridade causando na dinâmica


tência pública, os aportes teóricos que mais ressentimento e dor. Estes compor-
sustentam a prática e a metodologia uti- tamentos podem vir acompanhados de
lizada. O segundo aponta para o trabalho alguns sintomas como ansiedade exces-
específico com as famílias dos adolescen- siva, estados dissociativos, pensamento
tes atendidos. O Programa Ambulatorial suicida, comportamento maníaco ou hi-
para Adolescentes de Risco – atualmen- pomaníaco, depressão, recusa alimentar
te denominado PROADOLESCER nasceu e desorganização do pensamento; estas
há 20 anos no Serviço Infanto-juvenil do são algumas das formas graves de sofri-
Instituto de Psiquiatria da UFRJ, como um mento psíquico que uma vez inseridas
projeto de atenção à adolescentes em no serviço serão atendidas pela equipe
grave sofrimento psíquico pertencentes à básica do programa. Na experiência a ser
famílias de baixo poder aquisitivo. Trata- apresentada temos como principais quei-
-se de um conjunto de cuidados que inclui xas registradas pelas famílias com relação
intervenções a partir da psicanálise, da aos filhos: atitudes desrespeitosas, auto
psiquiatria e da terapia de família, além e hetero agressividade, isolamento da fa-
de constante atenção aos aspectos reabi- mília em geral, agressividade dirigida aos
litadores e sociais. Diferente das interven- pais, recusa em exercer atividades escola-
ções usuais em ambulatórios públicos, es- res, ausência de cuidados pessoais, con-
ses recursos são utilizados de forma inte- flitos constantes com irmãos e oscilação
grada, visando impedir a entrada desses no humor e nas condutas relacionais. As
jovens num processo de cronificação que famílias que encontramos no PROADO-
os conduza à uma “carreira de doentes LESCER podem ser caracterizadas como
mentais” e que os exclua dos processos desgastadas, desanimadas e despoten-
comuns de sociabilidade. O programa se cializadas, com reduzido convívio social,
dirige à adolescentes entre 12 e 18 anos, muitas vezes apresentando graves pro-
encaminhados pela rede pública de saú- blemas de relacionamento conjugal, in-
de, conselhos tutelares, escolas ou vin- terações destrutivas e padrões confusos
dos de procura espontânea, e desde a de comunicação. Ao lado disso podem
sua criação o PROADOLESCER, já atendeu também apresentar distúrbios psicopa-
a cerca de 500 jovens e suas famílias. A tológicos. É nosso interesse trazer o aten-
partir dessa experiência percebe-se que dimento destas famílias através de vinhe-
muitas vezes o adolescente, tentando tas clínicas onde procuraremos discutir a
sair do circuito familiar característico da metodologia utilizada, os impasses viven-
infância, apresenta dificuldades em esta- ciados, os resultados obtidos e como se
belecer laços sociais mais amplos, o que dá na prática a articulação de diferentes
pode resultar em abandono da escola, fu- vertentes teóricas como a psicanálise e a
gas de casa, além de isolamento social. As terapia sistêmica de família.
ressonâncias dessas situações no âmbito
da família são significativas trazendo de- Contato: Sonia Beatriz Sodré Teixeira -
sorganização entre os membros, conflitos soniabeso@yahoo.com.br
e falência das funções parentais, medo e
receio dos pais que congelam suas posi-

952
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-1457 - LAELON: UMA PRAXIS DE que o desenvolvimento siga seu curso nas
DESENVOLVIMENTO suas diversas formas de expressão huma-
Luciane Alves de Oliveira - UFC-Sobral na de envelhecer, de ser e de se fazer cada
luaoliveira2307@yahoo.com.br vez mais vida e que a longevidade seja
Mariana Silva Paula Amaral - UFC-Sobral uma real possibilidade e uma perspectiva
mariana_spa@hotmail.com de vivermos mais e melhor. Concebemos
Marilia Gabriela Cavalcante Soares - UFC- que a longevidade não deve ser pensada
Sobral apenas numa relação com o envelheci-
cavalcante.marilia@yahoo.com.br mento e seus aspectos multimensionais
Alexsandra Maria Sousa Silva - UFC-Sobral em si, mas também com a complexidade
alelexandra@yahoo.com.br das diferentes relações e tecituras da vida
Franci Iria Servolo Sabóia - UFC- Sobral humana que se desenvolve e cada vez
irya.saboia@hotmail.com mais se alonga na linha do tempo (Olivei-
ra, 2003). O Laboratório de Estudos sobre
Não temos a vida. É a vida que nos tem. a Longevidade, do Curso de Psicologia da
Viemos a esse mundo como as folhas, as UFC-Sobral se propõe a contribuir com re-
plantas, os astros e os demais animais. flexões e ações acerca do desenvolvimento
Cada espécie tem seus limites e possibili- humano sob a perspectiva da longevidade
dades em seu desenvolver (Góis, 2008). implicando-a durante toda a Vida, de for-
Cada individuo, em sua história de com- ma a favorecer a promoção da saúde, a
plexas singularidades, é a expressão de participação social, a cidadania e o enve-
todo o universo. O ser humano traz em si lhecimento ativo, através do tripé ensino,
a história de toda a humanidade em seus pesquisa e cooperação/ extensao. Tem
aspectos etológicos, biológicos, psicológi- como bases epistemológicas as Teorias do
cos e sociais (Merani, 1972). Não devemos Ciclo Vital -Life Span (Baltes, 1993); Teoria
perder isso de vista ao tentar compreender Histórico Cultural de Vigotsky (1924-1934);
o desenvolvimento humano em sua com- Psicologia Comunitária (Góis, 2003); Edu-
plexidade. Por outro lado, sabemos que ao caçao Biocêntrica (2007). Atuamos através
longo da História da humanidade houve- de ações comunitárias, com diferentes fai-
ram muitas mudanças de diversas ordens, xas etárias, mediante o método reflexivo
sejam filosóficas, científicas, culturais, dialógico vivencial, trabalhamos com arte-
através de lutas, contradições, consensos, -identidade, círculos de cultura, filmes, da-
que nos levaram ao alongamento da ciclo tas comemorativas como o “dia do índio”,
da vida humana nos diversos continentes e “dia da mulher”, “dia do Idoso” e outros.
nas diferentes culturas. Tal fenômeno nos Em 2011 seguimos com dois projetos: o In-
coloca diante do envelhecimento. Compre- clusao Digital para o Envelhecimento ativo
endemos esse processo como algo natural e o Vida Longa e Feliz para Todos. No pri-
e inerente ao processo de mudanças mul- meiro Buscamos proporcionar uma aproxi-
tidimensionais e multidirecionais próprias mação de gerações, facilitando a troca de
da vida. Urge a necessidade de cuidado conhecimentos, habilidades, experiências,
frente a essas tantas vidas que se alongam. possibilitando a criação de laços afetivos
Precisamos garantir que o envelhecimento entre estudantes e idosos, favorecendo
seja vivido com toda a sua naturalidade, ao estimulo cognitivo, preservação e am-

953
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pliação da autonomia entre a população ção e saúde no grupo de idosos “Corpo e


de terceira idade, contribuindo ainda com mente sã” no Alto da Brasília, Sobral-Ce;
quebra de preconceito intergeracional e Facilitações de discussões sobre a longevi-
com a desmistificação do processo de en- dade no EJA, no pro-jovem adolescente e
velhecimento. Tal projeto se dá eminen- na casa Rosa Gatorno; Promoção do “I En-
temente no laboratório de informática do contro Dialogando sobre a Longevidade”;
campus e no curso de psicologia, onde Atualmente o projeto atua com encontros
acontece a inusitada variação de idades se quinzenais nos grupos de idosos do Cras/
encontrando no cotidiano da universidade. Saúde da Familia e o de Capoeira nos Bair-
As aulas de informática são dadas pelos ros Vila Uniao e Terrenos Novos com ações
estudantes que se propõem como voluntá- de promoção de saúde e envelhecimento
rios do projeto, chamados “estudantes fa- ativo.Além de contribuir com as temáticas
cilitadores”, de uma forma individualizada da longevidade e do envelhecimento ativo,
e em horários flexíveis combinados entre o buscamos com esse projeto favorecer ao
estudante e a pessoa idosa. Além de facili- estudante de psicologia o desenvolvimen-
tar a inclusão digital, realizamos encontros to de habilidades de facilitação de grupos
periódicos de todo o grupo de estudantes comunitários e etários. Dando atenção es-
facilitadores e estudantes do projeto para pecial a sua formação pessoal (existencial
integração, celebração de datas comemo- e emocional) no que diz respeito ao seu
rativas e rituais de iniciação e finalização do próprio desenvolvimento e futuro envelhe-
curso anual. A produção do material didáti- cimento. O Laelon mantém parceria com
co é dinâmica, coletiva e continuada onde algumas entidades, tais como: Fundação
participam todas as pessoas do projeto, in- de Assistência Social – Sobral/Ce, Escola
clusive os próprios idosos. Há ainda a pre- de Saúde da Família – Sobral/Ce, Núcleo
ocupação com a formação dos estudantes de Psicologia Comunitária – NUCOM (UFC
facilitadores, quanto as questões próprias - Fortaleza), LESC (Laboratório de Estudos
do processo de envelhecimento e temas sobre a Consciência)-UFC-Fortaleza, Cine
relacionados a pedagogia e gerontologia. Filos (UFC - campus Sobral), Casa Rosa
Além de um acompanhamento emocional Gatorno – Sobral/Ce, Instituto Carnaúba -
e afetivo de todas as pessoas envolvidas Sobral/Ce, Conselho Municipal do Idoso.
com o projeto, visando questões vivenciais Além de participar ativamente de even-
e existenciais relacionadas ao tema da lon- tos como as Conferencias dos Direitos do
gevidade. O segundo projeto do Laelon é Idoso, tanto municipais, quanto estaduais.
chamado “Vida longa e Feliz para todos”, Nosso compromisso com a longevidade
que tem uma gama de atuações e varia- diz respeito em ultima instancia ao nosso
ções de tempos em tempos. Podemos citar compromisso com a vida e com o desen-
como exemplos de ações do Vida Longa: volvimento humano em suas inúmeras
A utilização de datas comemorativas, tais dimensões e lutas do cotidiano, sob seus
como dia do idoso, dia das mães, dia da diversos aspectos: ecológica, biológica,
criança, dia do índio, dentre outras para científico, social, cultural e política.
trabalharmos a temática da longevidade
tanto no ambiente universitário quanto na Palavras-chave: ciclo de vida, longevidade,
comunidade sobralense; Ações de promo- envelhecimento ativo.

954
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT07-1233 - O TORNAR-SE PSICÓLOGO cipação no centro acadêmico e em pro-


CLÍNICO EM UMA GRADUAÇÃO gramas extracurriculares oferecidos pela
GENERALISTA instituição, e oportunidades culturais e
Camila Moura Fé Maia - UnB esportivas. Nesse sentido, a entrada na
mila.mfm@gmail.com Universidade marca o início de um longo
Jéssica Helena Vaz Malaquias - UnB processo de construção identitária en-
malaquias.jessica@yahoo.com.br quanto profissional não dissociada dessas
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB experiências. O aluno passa a fazer parte
rpedroza@unb.br do grupo com denominação particular,
símbolos e linguagens próprias. Entre-
O Instituto de Psicologia (IP) da Universi- tanto, este é apenas o primeiro passo. A
dade de Brasília (UnB) estabelece um cur- trajetória traçada na Universidade é única
so de Psicologia generalista, oferecendo e se dará de acordo com suas escolhas na
laboratórios, linhas de pesquisa e discipli- flexibilidade curricular. Reconhecemos a
nas que informam sobre sua abrangência amplitude dos caminhos possíveis e nos
e diversidade. Ou seja, oferece um núcleo questionamos como essa trajetória re-
comum, mas convida o estudante à res- flete na atuação específica do psicólogo
ponsabilidade compartilhada para definir clínico. O aluno chega à Universidade po-
suas escolhas ao longo da construção do voado de representações sobre o tornar-
seu currículo. A partir dessa situação, dis- -se psicólogo, trazendo vivências pessoais
cutimos como se dá a formação do estu- que fornecem elementos consistentes
dante desse curso no tocante à constru- sobre sua escolha profissional. Tais repre-
ção de sua identidade de psicólogo. Se sentações permearão sua relação com as
o IP tem como proposta uma formação disciplinas e influenciarão suas escolhas.
generalista, mas que habilita a atuação A idealização da Psicologia e do ser psi-
em um campo específico, como se dá o cólogo é uma das principais característi-
processo de identificação e formação cas dos estudantes que iniciam sua gra-
nesta área? Baseando-nos nesse ques- duação, o que reflete, muitas vezes, em
tionamento, propomos uma reflexão crí- uma perspectiva do psicólogo herói, sal-
tica acerca do percurso desenvolvido ao vador de almas e mentes (Leite & Silva,
longo da graduação em Psicologia, abor- 2010). Ao longo do curso, as diferentes
dando a formação do psicólogo em um disciplinas possibilitam um processo de
campo específico de atuação: a psicotera- desconstrução e construção do ser psi-
pia na clínica. Como se dá o processo de cólogo de acordo com as identificações.
tornar-se psicoterapeuta? Como ocorre Entretanto, a diversidade de campos de
a formação dos alunos de forma que se atuação e abordagens teóricas tece uma
contemple esta especificidade do campo gama de diferentes conceitos sobre o ser
da ciência psicológica? Há a preocupação psicólogo, complexificando a construção
com a formação pessoal dos futuros clíni- de uma identidade profissional. O estu-
cos? Tornar-se psicoterapeuta compreen- dante se vê requisitado a fazer uma re-
de determinadas atividades no decorrer flexão crítica sobre tais possibilidades. No
do curso que transcendem as rotineiras, entanto, nem sempre encontra esse espa-
tais como: vivências com colegas, parti- ço que possibilite a reflexão e que acolha

955
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

as angústias das escolhas necessárias e rizontes para enxergar aquele indivíduo


da dúvida persistente. Partindo-se para como único. Freud já havia afirmado que
a formação específica do psicólogo clíni- a análise não ocorre no vazio, e que o psi-
co, questionamos os subsídios fornecidos coterapeuta tem um nome, idade, sexo, e
pela estrutura generalista do currículo. A ocupa um lugar (Haynal, 1995). A contri-
partir de uma ampla grade de disciplinas buição da psicanálise para a formação do
e projetos de pesquisa, são as vivências psicoterapeuta na relação com o paciente
reais de cada aluno na Universidade que ultrapassa o estatuto de técnica e aborda
constroem o lugar de psicólogo. Portan- o caráter próprio de relação. Diante desta
to, assim como as demais especialidades, proposta de nos relacionarmos com nos-
a clínica requer uma formação pessoal sos pacientes, buscamos refletir como a
aliada à profissional. Tomamos por base transmissão destas posturas pode ocorrer
o campo teórico da psicanálise por for- aos alunos que procuram seu lugar de psi-
necer um novo paradigma do funciona- coterapeutas. Consideramos, portanto,
mento psíquico do sujeito e da relação fundamental uma formação acadêmica
“médico-paciente”. Freud, precursor da que dê a base teórica para que o lugar
literatura psicanalítica, reconhece a pre- de terapeuta na clínica seja ocupado em
mência dos processos psíquicos incons- constante processo de reflexão epistemo-
cientes, da doutrina da resistência e do lógica, mas também que abarque a im-
recalcamento, além das novas compreen- portância de uma formação pessoal. A te-
sões da sexualidade na atuação do sujei- oria nos faz remeter o olhar ao si-mesmo,
to. Tais formulações foram consideradas onde os indícios do inconsciente se fazem
essenciais a qualquer clínico. Entretanto, presentes não só em um analisando sub-
além destes construtos teóricos, lemos metido à análise, ou somente na técnica
em Freud a preocupação com a imensa e na postura do terapeuta, mas também
complexidade escondida: como o amor e no campo relacional entre os dois prota-
o ódio, o desejo e a lei, os atos de fala, de gonistas. É preciso estar por inteiro nes-
sonho e de fantasia (Nasio, 1995). Além ta relação, exercendo uma escuta atenta
desta postura na compreensão do sujei- e flutuante direcionada aos seus ecos. É
to, vale ressaltar que tal corpo teórico foi preciso refletir qual a ética do psicólogo
gestado na experiência humana concreta não delimitada claramente no Código de
entre dois parceiros, analista e analisan- Ética. Além disso, a teoria psicanalítica
do. Ao reconhecer a troca e essa parceria, enriquece nossa discussão ao colocar a
Freud entende que a descoberta do enig- análise como um espaço de busca da ver-
ma do funcionamento psíquico do outro dade do sujeito, não de uma cura. Ou seja,
não ocorre sem que o sujeito analista em- não se busca unicamente a eliminação de
preste seu desejo ao analisando. Aliado a sintomas, mas o encontro do sujeito com
este modo de ver a clínica, Haynal (1995) seus desejos. Nesta proposta, o terapeuta
cita Balint e sua compreensão sobre a não se coloca como todo-poderoso que
postura do clínico. Este traz a necessi- detém todo o saber sobre o sujeito, bem
dade de apreensão do que caracteriza o como o poder de eliminar seu sofrimen-
indivíduo, indo além dos complexos e sin- to. O lugar de terapeuta precisa então ser
tomas apresentados, expandindo os ho- delineado de forma que estas questões

956
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sejam amplamente discutidas. O tornar- comumente utilizadas como fonte de in-


-se psicólogo clínico vai além da formação formação para auxiliar o seu diagnóstico.
técnica e instrumental, envolvendo os Entretanto, autores apontam um déficit no
processos subjetivos de cada estudante. conhecimento científico desses profissio-
nais, que sem uma bagagem teórica condi-
Palavras-chave: graduação, psicólogo clínico, zente, acabam atribuindo prioritariamente
formação características pejorativas aos indivíduos
Contato: Camila Moura Fé Maia, UnB, mila. com o referido transtorno. Essa questão
mfm@gmail.com suscita preocupações, já que o professor
tem um papel importante na forma como
os alunos se percebem e constroem suas
CO 47 - LT01 relações dentro da escola. Assim, tais es-
tigmas, aumentam o risco destes alunos
Síndromes desenvolverem sentimentos de baixa au-
toestima e de apresentarem queda do de-
sempenho escolar, acentuando possíveis
LT01-1321 - COMO PROFESSORES E consequências decorrentes do referido
GESTORES PENSAM A PARTICIPAÇÃO transtorno. Considerando a importância
DA ESCOLA NO COTIDIANO DE ALUNOS da instituição escolar, em especial do pro-
COM INDÍCIOS DO TRANSTORNO DE fessor, no processo de desenvolvimento e
DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE a escassez de trabalhos que contemplem
(TDAH) a sua compreensão sobre o TDAH, esse
Laís de Almeida Moura - UNIVIX estudo teve por objetivo investigar a con-
lais_almeida90@hotmail.com cepção de professores e gestores escolares
Natasha Moreira Leite - UNIVIX sobre o TDAH e sua participação no coti-
natasha_leite@hotmail.com diano de alunos com indícios desse trans-
Rayanne Suim Francisco - UNIVIX torno. Participaram desta investigação 19
ray.sf@hotmail.com professores e sete gestores da área educa-
Samanta Dassiê Calente - UNIVIX cional de duas escolas do município de Vila
samantacalente@gmail.com Velha – ES. Dos professores participantes,
Simone Chabudee Pylro - UNIVIX e UFES oito atuam em uma escola particular e 11
simone.chabudee@gmail.com em uma escola pública; dos gestores par-
ticipantes, três são de uma escola priva-
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hi- da, enquanto os outros quatro atuam em
peratividade é caracterizado por sintomas uma instituição pública. Entre os gestores
primários de desatenção, hiperatividade participantes estão incluídos pedagogos,
e impulsividade, que afetam a atenção, o diretores e coordenadores das referidas
controle de impulsos e o nível de ativida- escolas. Como instrumentos da coleta de
des do indivíduo, além de comprometer, dados foram utilizados dois modelos de
significativamente, sua vida social, acadê- questionário: (I) Questionário para Profes-
mica e familiar. Seus sintomas são obser- sores, contendo 29 questões que preten-
vados com maior frequência no ambiente deram levantar dados sobre a formação
escolar e as queixas dos professores são do professor, sua experiência profissional,

957
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sua percepção sobre o TDAH, e como con- junto com a família e os demais profissio-
cebem o papel da escola no cotidiano dos nais envolvidos no processo de tratamento
alunos que apresentam indícios do referi- deste transtorno. Para uma melhor com-
do transtorno; e o (II) Questionário para preensão dos dados levantados junto aos
Gestores, contendo 18 questões que ob- professores, foram propostas algumas ca-
jetivaram levantar dados sobre a organiza- tegorias de análise: formação acadêmica,
ção da escola e a atuação da mesma no co- conhecimento do professor sobre o TDAH,
tidiano do aluno com TDAH, se a escola na percepção do professor sobre o aluno que
qual eles trabalham mantém algum tipo de possui indícios deste transtorno, o papel
registro sobre a incidência de alunos com da escola e do professor no desenvolvi-
este transtorno, e quais são as propostas mento e cotidiano de alunos com TDAH e
oferecidas pela instituição de ensino para o auxílio oferecido pelo professor e pela
auxiliar esses alunos e suas famílias. Todos escola a estes alunos. A maior parte dos
os participantes alegaram que suas escolas professores investigados, tanto das escolas
contam com uma equipe multidisciplinar públicas quanto das particulares possui en-
de atuação, sendo que o psicólogo não sino superior completo, tendo participado
está incluído neste grupo, o que também de alguma disciplina durante a graduação
parece ser a realidade dos demais mu- que abordou o tema TDAH. Os professores
nicípios que compõem a Grande Vitória, da escola particular consideraram que o
incluindo Vitória, o que foi demonstrado TDAH afeta tanto a vida escolar quanto a
por um estudo realizado nesta capital. As social e familiar do indivíduo, enquanto os
escolas investigadas mantêm registro de docentes da escola pública acreditam que
alunos com indícios de TDAH, sendo que ele compromete mais a aprendizagem. Os
tais registros indicam uma prevalência do professores das duas instituições demons-
sexo masculino. Em geral, quem primeiro traram uma visão negativa sobre os alunos
comunica à instituição de ensino sobre os com o TDAH, sendo as características de-
possíveis alunos com TDAH são os próprios satenção, hiperatividade/impulsividade
professores. Quanto às características atri- as mais indicadas. Boa parte dos profes-
buídas pelos gestores a estes alunos foram sores participantes atribuiu importância
encontradas prioritariamente as seguintes fundamental à participação da escola no
opiniões: desatento, hiperativo/inquieto, cotidiano de alunos com o transtorno. En-
impulsivo e com problemas de aprendiza- tretanto os professores da escola pública
gem. Dentre as poucas menções às carac- acreditam que não cabe a instituição se
terísticas positivas apareceu prestativo e envolver em questões familiares, enquan-
inteligente. De acordo com os gestores, a to os da escola particular denotaram uma
instituição de ensino em que estão aloca- valorização da inclusão da escola, família e
dos não proporciona nenhum tipo de for- os profissionais (médicos, psicólogos, psi-
mação para os professores a respeito do quiatras) em uma rede de apoio para es-
TDAH ou outros transtornos. Apesar disso, ses alunos. De acordo com os professores,
os gestores entendem que a escola exerce palestras e treinamentos sobre o tema não
um papel importante no cotidiano desses são atividades incorporadas à prática das
alunos com TDAH, educando e auxiliando escolas. Porém, dentro da sala de aula, a
no aprendizado, de modo a atuar em con- maior parte deles busca utilizar atividades

958
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

diferenciadas para facilitar o processo de a como o conhecimento se transforma ao


aprendizagem dos alunos. É importante longo da vida. A explicação piagetiana pos-
pontuar que uma parcela significativa do sui dois princípios básicos: 1) inteligência
professores investigados considerou-se é adaptação ao mundo e 2) o desenvolvi-
implicada no cotidiano dos seus alunos mento se dá por patamares de equilíbrio
com TDAH, valorizando a interação com móvel, em busca de um equilíbrio melhor.
a família e com a escola na busca de me- Como responder as perguntas formuladas
lhorias para a vida dos mesmos. Entre as inicialmente? Segundo Piaget, a Psicologia
principais dificuldades mencionadas para oferece o método para acompanhar as
se auxiliar esses alunos foram indicados transformações do conhecimento durante
à falta de subsídios e investimento do go- a vida de qualquer individuo, ‘sujeito epis-
verno pelos docentes da escola pública, e têmico’, para ele. Assim, ao construir co-
a carência de conteúdos direcionados ao nhecimentos cada vez mais complexos so-
tema na formação acadêmica pelos pro- bre o mundo, os indivíduos desenvolvem
fessores da escola particular. Diante dos sua inteligência, juntamente com a morali-
dados encontrados, percebemos ser ne- dade e a afetividade. Muito se diz sobre a
cessária uma ampliação do estudo, tendo abordagem interacionista e construtivista
em vista a importância do papel da escola de Piaget, afirmando-a ou criticando-a,
no cotidiano de alunos com o TDAH e a ne- mas é consenso no campo da Psicologia
cessidade de aprofundamento das ques- do Desenvolvimento, a idéia de que Pia-
tões investigadas. get apresentou uma criança ativa em suas
relações com o meio físico e social, desde
Palavras-chave: TDAH. Escola. o nascimento até a vida adulta, desenvol-
Desenvolvimento Atípico. vendo-se e transformando-se continua-
mente para superar os desequilíbrios que
as situações lhe apresentam e para conhe-
LT01- 1308 - O AUTISMO cer o mundo e si mesmas. Piaget e seus
COMO CONTEXTO ATÍPICO DE colaboradores, sobretudo Barbel Inhelder,
DESENVOLVIMENTO: UM OLHAR pouco pesquisaram crianças com diagnós-
PIAGETIANO ticos intelectuais ou psicopatológicos. No
Maria Thereza Costa Coelho de Souza - USP entanto a partir de conceitos centrais des-
mtdesouza@usp.br ta perspectiva, pesquisadores contempo-
Camilla Teresa M. Mazetto - USP râneos tem buscado compreender desen-
contato@camillamazetto.com.br volvimentos e contextos atípicos, no sen-
Financiamento: CNPq tido de não corresponderem exatamente
àqueles descritos pelo autor, mas sendo,
A teoria de Jean Piaget focaliza como os sem sombra de dúvida, contextos propi-
indivíduos constroem conhecimento sobre ciadores de construções de conhecimento
o mundo e si mesmos, gradativamente e e de desenvolvimento psicológico. O obje-
ao longo da vida. Duas perguntas episte- tivo deste trabalho é apresentar reflexões
mológicas dirigem a investigação proposta sobre a utilização da perspectiva piagetia-
pelo autor: a primeira se refere a como o na do desenvolvimento para refletir sobre
conhecimento se dá? E a segunda se liga alguns aspectos do autismo infantil, no

959
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que se refere às trocas sociais e às ações e a troca entre criança e terapeuta, troca
e interações de crianças autistas. A discus- esta menos verbal e sustentada mais na
são utilizará como ilustração uma pesqui- ação (acompanhada ou não pela fala), com
sa realizada num contexto denominado a finalidade de propiciar sequências de in-
de ‘terapia da troca e desenvolvimento’ terações significantes e tendo como subsi-
(TED- Thérapie de l’échange et devéloppe- dio a idéia de uma plasticidade neuronal
ment). Como sabido, o autismo, do ponto que viabiliza processos estruturais e fun-
de vista do desenvolvimento é um quadro cionais no cérebro, os quais, por sua vez,
multifacetado de aspectos (neurológicos, possibilitariam uma reorganização funcio-
bioquímicos, psicológicos, sociais) que, por nal interna construída pelas iniciativas e
um conjunto de fatores, tomaram rumos experiências da criança. No referido traba-
diferentes daqueles seguidos pelo desen- lho, a teoria piagetiana permitiu discutir as
volvimento espontâneo ou ‘normal’. Dito relações entre o organismo e o meio, as-
assim, o autismo, ou como preferem os sim como o papel dos aspectos biológicos
especialistas, os quadros do espectro au- e sociais, que podem estar prejudicados
tista, revelam aspectos do desenvolvimen- no autismo, mas que podem ser entendi-
to psicológico que ou estão ausentes em dos no âmbito da base interacionista do
épocas em que deveriam estar presentes modelo elaborado por Piaget, bem como
ou se apresentam deslocados, de maneira quanto ao principio fundamental da TED:
a não produzir boas adaptações ao meio, a troca. Os fatores do desenvolvimento,
sobretudo do ponto de vista afetivo e so- condições necessárias mas não suficientes,
cial. Num trabalho em que buscou investi- sozinhas, pela progressão nas evoluções
gar o que denominou construções cogniti- dos conhecimentos, e também a retoma-
vas no autismo, Mazetto (2010) selecionou da da teorização sobre as primeiras cons-
conceitos da teoria de Piaget para refle- truções cognitivas do bebê (construção do
tir sobre um contexto de atendimento a real), permitiram concluir que no caso do
crianças autistas chamado TED, que se ori- autismo, pode-se falar em contexto atípi-
ginou na França com um grupo de pesqui- co de desenvolvimento no sentido de que
sadores da cidade de Tours, com um cunho as possibilidades de trocas significativas
neuropsicológico e que tem como um dos estão diminuídas, dificultando as assimi-
pressupostos o de que as experiências de lações necessárias para as construções
troca quando provêm condições favoráveis cognitivas. No entanto, estas trocas e as-
tais como, tranquilidade, reciprocidade e similações podem ser retomadas na tera-
disponibilidade, podem favorecer a ação pia, possibilitando estender o período das
orientada para o outro, assim como aqui- ações motoras orientadas para o ambiente
sições cognitivas, afetivas e sociais. Além e para o outro, com o intuito de significar
disso, a TED se baseia na hipótese de que as ações a partir da e na interação, não
seria possível retomar o caminho evolutivo apenas social (quanto à presença de outra
do desenvolvimento com a reconstrução pessoa) mas também epistêmica (no sen-
de noções cognitivas que foram constitu- tido de um outro que é também objeto de
ídas de modo atípico e com a retomada conhecimento). Para a discussão aqui pre-
de experiências com os objetos e com o tendida, serão destacados os conceitos de
outro. É primordial nesta terapia o contato continuidade entre processos biológicos

960
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e psicológicos, as construções das noções grunhidos que elas emitem? Cavalcanti e


de objeto, espaço, tempo e causalidade e Rocha (2007) retomam que na década de
a inter-ação entre sujeito e objeto, quanto 40, período da Segunda Guerra Mundial,
à construção progressiva de estruturas de Leo Kanner cria o termo autismo, a par-
conjunto e procedimentos práticos enca- tir de sua observação de crianças, visan-
deados em sequências de ações diante das do distingui-lo de outros quadros, como
tarefas apresentadas pelo adulto. Todas as a oligofrenia, a esquizofrenia infantil e a
discussões apresentados serão ilustradas demência precoce. Kanner (1943) conside-
com trechos de atendimentos nos quais rava que o autista não possuía linguagem,
as ações e procedimentos parecem revelar contudo, em 1946, na medida em que vai
as construções cognitivas propiciadas pela desenvolvendo seus estudos, passa a afir-
troca neste contexto atípico de desenvol- mar que há sim uma forma de comunica-
vimento. ção destas crianças, definindo-a como uma
linguagem metafórica. Assim como uma
Palavras-chave: teoria de Piaget; contexto metáfora de linguagem precisa ser analisa-
atípico; trocas sociais da e contextualizada para poder ser enten-
dida, as pessoas com barreiras autísticas
também precisam dessa análise e do en-
LT02-903 - GRUNHIDO: UMA FORMA tendimento de seu contexto. É fundamen-
POSSÍVEL DE LINGUAGEM DAS PESSOAS tal conhecer como eles se comunicam e o
COM ASPECTOS AUTÍSTICOS? que algumas expressões reverberam. Mas,
Nara Cristina Resende Gomes - CMAPD diferentemente da metáfora de linguagem
nararesendepsi@gmail.com tradicional, no caso da linguagem no fenô-
Taísa Resende Sousa - UFU meno autístico, conjectura-se que essas
taisa.r.s@hotmail.com pessoas podem ser entendidas de forma
muito particular, compartilhando da ideia
Este trabalho é um mergulho teórico que de que os sons emitidos por elas, inarti-
se propõe a pensar se a comunicação por culados e aparentemente sem sentido,
meio do grunhido, emitido pelas pessoas podem apresentar algum sentido singular,
com barreiras autísticas, pode ser desen- uma forma de linguagem específica. Acre-
volvida, se caracterizando como uma for- dita-se que é preciso muita dedicação e es-
ma de linguagem. Bion (1991) afirma que a forço daqueles que convivem e trabalham
“comunicação é qualquer ‘coisa’ desde um com pessoas com barreiras autísticas. Bion
grunhido inarticulado até construções bas- (1991a, 1991b, citado em Oliveira, 2003, p.
tante elaboradas tais como a escrita de um 32) afirma que “conhece-se e aprende-se
artigo”. Lidar com pessoas que apresen- em um vínculo emocional”. É fundamen-
tam aspectos autísticos e suas formas de tal o estabelecimento de um bom vínculo,
comunicação é um campo ainda a ser in- para que essas pessoas possam se comu-
vestigado. A comunicação dessas pessoas nicar de maneira própria, possibilitando
parece assemelhar a uma língua estrangei- que elas sejam ouvidas e compreendidas
ra que, para ser compreendida, precisa de em suas expressões de linguagem. Manoel
tradução. Poderia então, existir a possibili- de Barros afirma que aprendeu a “gostar
dade de uma tradução dos significados dos mais das palavras pelo que elas entoam do

961
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que pelo que elas informam”. Comparti- gem de alguém com barrreiras autísticas e
lhando desse sentimento, acredita-se que, mais difícil ainda relacionar-se com eles.
dependendo da entonação com que são Winnicott (1978, citado em Laznik, 2010)
emitidos, os grunhidos podem significar pressupõe que um bebê que não respon-
sim ou não, desaprovação ou aprovação, de de maneira convencional, coloca o ou-
acordo ou discordância. Diante desse po- tro à prova, constantemente, e acredita
sicionamento, a expressão de linguagem ser fundamental uma “loucura necessária
das pessoas com aspectos autísticos ad- das mães” (p. 142), que talvez seja possível
quire um valor muito importante. Seria apenas em condições em que haja uma ca-
isto, então, um vislumbre do nascimento pacidade materna e condições de seguran-
de um pequeno espaço mental, para um ça, para poder se relacionar (se vincular)
existir, mesmo que momentâneo? Seria com esses sujeitos. Expandindo o conceito,
isto, a possibilidade de uma pessoa com Alvarez (1994) assevera que é necessário
tal aspecto autístico emergir como sujeito? oferecer uma companhia viva a esses su-
Sujeito do desejo? Os grunhidos particula- jeitos. É preciso oferecer um “colo” para
res, diferenciados, somados aos olhares, as formas de linguagem, as expressões
sorrisos e gargalhadas parecem sugerir corporais, sons, gestos e olhares. Oferecer
uma forma de linguagem, uma marca pró- atenção, vivacidade e alegria podem ser
pria, podendo indicar algo único. Porque primordiais para a entrada nessa relação,
ninguém tem um grunhido igual ao do ou- para se comunicar com tais pessoas , mes-
tro, é como se fosse uma digital sonora, mo que essa linguagem possa parecer algo
uma forma particular de linguagem. Rocha de outra dimensão, inacessível e intocável.
(2010) afirma que Freud (1911) considera Todavia, indaga-se, como se comunicar
o encontro do “bebê com o mundo exter- com uma pessoa que não se comunica da
no como fundamental para o acontecer maneira convencional? Como estabelecer
psíquico” (p.169). E, retoma Winnicott um diálogo articulado por meio de grunhi-
(1978) que propõe que “o meio ambiente dos inarticulados? Os grunhidos emitidos
apresenta o mundo para o bebê” (p. 169). pelas pessoas com barreiras autísticas po-
Sendo assim, é fundamental o investimen- dem ser considerados como uma forma
to no outro para a constituição do sujeito. específica de linguagem? Tustin (1990)
De acordo com a teoria psicanalítica, só é alega que para lidar com pacientes com
possível um indivíduo se constituir como autismo é necessário “empatizar com eles
sujeito, a partir do olhar, do investimento, em suas angústias [...] encontrar pontos de
do gozo necessário do Outro. Lew (2004, contato com eles” (p. 231). A autora (1990)
citado em Laznik, 2010) aponta o “gozo do aponta que essa comunicação pode ser
Outro como um elemento constitutivo do desenvolvida através de conversas, com
aparelho psíquico do filhote de homem” sentimento, de forma que os mesmos se
(p. 143). E, discorre que no caso das pes- sintam entendidos. Assim, eles vão gradu-
soas com autismo, o que acontece é essa almente, se sentindo encorajados a “baixar
não-relação de gozo, de investimento, uma as barreiras de suas reações autistas mais
vez que “o autista estaria preso a um gozo extremas” (p. 231). Rhode (2000) assegura
fálico de seu próprio corpo” (p. 143). Pode que pesquisas recentes mostram que “as
parecer impossível compreender a lingua- funções cerebrais podem ser modificadas

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

por intervenções psicológicas” (p. 251). peciais sejam prestados à criança. Estudos
Então, a comunicação com as pessoas com têm mostrado que as figuras parentais são
autismo pode ser possível, os grunhidos as mais afetadas pelo estresse em casos
podem ser considerados como uma forma de desenvolvimento atípico de um filho,
de expressão da linguagem, na medida em sendo, porém, a mãe mais atingida por sua
que um vínculo é estabelecido com elas. condição de “cuidadora direta” (Hamlett,
Assim, o psicoterapeuta e as pessoas que et al., 1992; Ong et al., 1998, citado por
convivem com estes sujeitos, poderiam Cherubini, Bosa & Bandeira, 2008). Outros
buscar acolher seus grunhidos, essa forma estudos também mostram que a dedica-
única e muito particular de se expressarem ção ao cuidado do filho com autismo leva
no mundo. estas mães a vivenciarem considerável
sofrimento, em virtude da emergência de
Palavras-chave: Autismo; Linguagem; Psicanálise. sentimentos ambivalentes. É comum o la-
Contato: Taísa Resende Sousa,UFU, mento pelo filho, pelas limitações frente a
taisa.r.s@hotmail.com vida que ele permanentemente apresen-
tará, as expectativas frustradas em decor-
rência da idealização de um filho perfeito
LT05-997 - COMPREENDENDO A (Monteiro, 2008), para o qual são feitos
VIVÊNCIA DE SER-MÃE DE UMA planos e construídos sonhos. O cuidado
CRIANÇA AUTISTA: UMA PERSPECTIVA diferenciado e dedicação que uma criança
FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL autista demanda, leva o cuidador a, mui-
Luana Cristina F. de L. Andrade - UFRN, tas vezes, abdicar muito de si, e de seus
luana.cris@globo.com próprios planos de vida. Alguns autores
Symone Fernandes de Melo - UFRN, afirmam que apesar dos mecanismos do
symelo@gmail.com impacto do estresse na saúde ainda serem
subjetivos da vivência de cada sujeito e,
Os estudos sobre o autismo têm se amplia- portanto, não determinados, o excesso de
do ao longo do tempo, apresentando uma tarefas atribuídas que uma pessoa absorve
visível evolução no que diz respeito aos no papel de cuidador gera consequências
conceitos atribuídos e formas de compre- em sua saúde física e psicológica (Bauer et
ensão, sendo possível apontar diferentes al., 2000; Epel et al., 2004; Bandeira et al.,
hipóteses etiológicas, graus de severidade 2007; Bandeira, Gonçalves & Pawlowski,
e características específicas ou não usu- 2006, citado por Cherubini, Bosa & Ban-
ais (Schmidt, Dell’Aglio & Bosa, 2007). A deira, 2008). Carrion, Córdoba e Collado
descoberta de um filho com autismo gera (2003) verificaram que as mulheres são
uma grande sobrecarga emocional para a mais sensíveis e responsáveis diante da
família da criança (Schmidt, Dell’Aglio & necessidade de outras pessoas e se envol-
Bosa, 2007; Monteiro et al, 2008), bem vem emocionalmente mais intensamente
como suscita muitas dúvidas e frustra principalmente quando o cuidado se refe-
expectativas em relação a um filho ideali- re ao filho. Este estudo tem por temática
zado, sendo um momento peculiarmente a maternidade no contexto do autismo. A
delicado. Este diagnóstico trás também a investigação fundamenta-se na fenome-
necessidade de que alguns cuidados es- nologia existencial, mais especificamente

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nas ideias de Martin Heidegger Trata-se são da experiência e reflexão sobre ela,
de uma pesquisa de caráter qualitativo são elas: 1) Impacto do Diagnóstico; 2)
que teve como objetivo geral compreen- Mudanças na Relação com Filhos Não-Au-
der a vivência de ser-mãe de uma criança tistas; 3) O Cuidado Com o Filho Autista; 4)
autista, considerando as características Qualidade de Vida Materna e Importância
do espectro autista e suas implicações no do Apoio Familiar; 5) O Cuidado Consigo;
tocante a maternidade. A pesquisa teve 6) O Olhar do Outro; 7) Angústia Quanto
como participantes três mães de crianças ao Futuro. Trazendo um panorama geral
com autismo, que frequentam a Associa- sobre estas unidades, a primeira busca
ção de Pais e Amigos dos Autistas do Rio apresentar como foi vivenciada por essas
Grande do Norte (APAARN), estando seus mães, a expectativa e o impacto emocio-
filhos com idades entre 5 e 8 anos. Foram nal do diagnóstico, tanto devido ao desco-
realizadas entrevistas individuais, semies- nhecimento sobre transtorno, quanto em
truturadas, tendo como referência o mo- função do sofrimento advindo do rompi-
delo de entrevista fenomenológica pro- mento com sonhos e projetos. A segunda
posto por Szymanski (2002) – a Entrevista retrata as mudanças percebidas na rela-
Reflexiva. As narrativas foram registradas ção materna das entrevistadas com seus
em áudio com o uso de gravador, bem outros filhos, entendendo os sentimentos
como transcritas na íntegra. As mães e envolvidos nesta relação, e as implicações
seus filhos receberam nomes fictícios para destas mudanças para elas e estes filhos.
que o sigilo de sua identidade fosse man- A terceira unidade trás uma compreen-
tido. Utilizou-se, inicialmente, a seguinte são sobre a relação entre a mãe e o filho
pergunta disparadora: “Como é para você autista, apresentando-se pautada primor-
ser mãe de uma criança com autismo?”, dialmente no cuidado, bem como peculiar
com a intenção de suscitar, a princípio, um dependência funcional do filho para com
discurso livre. Contudo, algumas questões a mãe. A quarta unidade procurar refletir
norteadoras direcionaram a investigação, a respeito da sobrecarga vivida pelas en-
a fim de atender aos objetivos propostos trevistadas diante das variadas responsa-
pela pesquisa. Para a análise dos dados, bilidades que lhe são atribuídas para além
foi utilizado o método fenomenológico daquelas que circundam as necessidades
baseado no modelo de Giorgi (1985). Mo- do filho autista, bem como o papel que o
reira (2002) aborda o método afirmando apoio familiar desempenha neste contex-
que ele se configura em quatro passos: a) to. Nesta quinta unidade observou-se que
leitura geral da descrição; b) releitura da estas mães apresentaram certo esqueci-
descrição discriminando as “unidades de mento de si, atribuindo pouca prioridade
sentido” presentes, focando sempre no para a realização de atividades voltadas
fenômeno; c) expressão de forma direta aos seus interesses pessoais. A penúltima
do que cada unidade de sentido contém; apresenta o desconforto e sentimentos
d) elaboração da “estrutura da experiên- emergentes diante do olhar do outro so-
cia” do sujeito, formada pela síntese de bre o comportamento diferenciado de seu
todas as unidades de sentido. A partir da filho. Por fim, a ultima unidade aborda as
análise foram discriminadas sete unidades esperanças e incertezas vividas por estas
de sentido que auxiliaram na compreen- mães diante dos limites e possibilidades

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de seus filhos. Os dados demonstraram de ordem epistemológica, estética, ética


que as mães entrevistadas vivenciam in- e política que se articulam e entrecruzam
tensa angústia e sofrimento em função e que aqui apresentamos como questões
de fatores como a sobrecarga inerente ao específicas. A primeira questão que colo-
cuidado com o filho autista, o abalo nas camos, e a partir da qual queremos fazer
relações familiares e as incertezas que o desdobrarem-se as seguintes, refere-se ao
diagnóstico de autismo trás com relação estatuto do “cultural” nos processos de
ao futuro. Foi possível, a partir dos resul- desenvolvimento humano e, como conse-
tados, refletir sobre formas de interven- qüência, na teoria e prática da Psicologia
ção no sentido de promover o aumento do Desenvolvimento voltada para a com-
na qualidade de vida destas mulheres e preensão da construção dos processos
auxiliá-las a enfrentar as dificuldades ad- identitários no contexto da diversidade
vindas desta inesperada realidade. latino-americana. A segunda questão que
escolhemos refere-se à diversidade de
Palavras-chave: autismo infantil, relação mãe- caráter estético-artístico interna a cada
filho autista, fenomenologia-existencial país, e àquela existente entre os países
Contato: Luana Cristina Fernandes de da América Latina, ao processo histórico
L. Andrade, UFRN, luana.cris@globo.com que caracteriza seu desenvolvimento e
aos possíveis processos culturais, formais
ou informais, que dão voz a essas diferen-
CO 46 - LT07 ças. A terceira questão que orienta nossa
reflexão refere-se ao papel de cada país
Estado da arte da pesquisa no jogo da alteridade/identidade que
possibilita o desenvolvimento de uma éti-
ca calcada na diferença e na cooperação,
LT07-865 - PSICOLOGIA DO que dê conta de lidar com os processos de
DESENVOLVIMENTO E AMÉRICA LATINA: construção conjunta, ainda que conflituo-
REFLEXÕES CONTEMPORÂNEAS sa, de uma política voltada para os Direi-
Lúcia Helena Cavasin Zabotto Pulino - UnB tos Humanos na América Latina. A quarta
luciahelena.pulino@gmail.com questão refere-se ao papel das línguas/
culturas portuguesa e espanhola, implan-
Pensar a questão da diversidade na cons- tadas no processo colonizador, na produ-
trução de processos identitários na Amé- ção de processos identitários na América
rica Latina contemporânea, no escopo da Latina, e o lugar que vêm ocupando as
Psicologia do Desenvolvimento, consiste, línguas originais dos povos autóctones
efetivamente, num repensar deste campo colonizados, especialmente, nos proces-
teórico-prático do conhecimento. Neste sos de socialização e educação formais e
trabalho, propomo-nos a lançar algumas informais. A quinta questão refere-se à
questões que consideramos os pilares a autoconsciência crítica desenvolvida por
partir dos quais possamos orientar nossa cada um dos países, a partir da constru-
reflexão sobre os processos de constitui- ção, interpretação e preservação de sua
ção de identidade no contexto da diver- memória, e dos possíveis diálogos entre
sidade, na América Latina. São questões os países na construção de uma memória

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

latino-americana, complexa e critica, que e como atores do processo de mudança


dê um sentido para suas relações mútuas. do mundo. A última questão assume essa
A sexta questão diz respeito à existência proposta de reconstrução com um olhar a
e às possibilidades de construção e imple- partir do colonialismo cultural, que critica
mentação conjunta de políticas públicas a epistemologia calcada na colonialidade
nos países da América Latina que se in- do saber e propõe novas configurações
cumbam de lidar com questões contem- teórico-práticas para se redesenhar a
porâneas ligadas aos processos de educa- Psicologia do Desenvolvimento na Ame-
ção de suas populações. Tais programas rica Latina. Em síntese, vamos tratar da
políticos seriam voltados para considera- questão da diversidade da América Lati-
rem, ao mesmo tempo, o caráter inter e na como espaço/tempo de construção de
intranacional, de modo a lidarem com a identidade, desconstruindo o caráter na-
complexidade da construção da identida- tural e universal dos processos de desen-
de/diversidade dos povos latino-america- volvimento humano, para inserí-los numa
nos. Já A sétima questão problematiza as perspectiva multi e intercultural, marcada
implicações epistemológicas de se repen- pela especificidade latino-americana. Esse
sar a Psicologia do Desenvolvimento, con- repensar a Psicologia do Desenvolvimento
siderando as questões colocadas anterior- envolve a participação desta ciência num
mente, sintetizando-as na perspectiva do processo de transformação da América La-
colonialismo cultural e da colonialidade tina, ao mesmo tempo em que vai além de
do saber, no contexto da America Latina. mera contextualização geográfica, política
Dessas sete questões eleitas para orientar e cultural das teorias e ideias desta ciência
a discussão que queremos propor aos es- humana e social. Neste sentido, nosso es-
tudiosos da Psicologia do Desenvolvimen- forço consistirá em explorar as possibilida-
to, a primeira se refere especificamente à des desse campo de construção da com-
concepção de cultura e a seu status nos preensão dos processos de desenvolvi-
processos de desenvolvimento e ao valor mento humano, superando as dicotomias
epistemológico que ela ocupa na Psicolo- local/glogal, específico/geral, nacional/
gia do Desenvolvimento. Trata-se de uma internacional, subjetivo/social, cultural/
questão abrangente, por tomar a Amé- multicultural, assumindo um pensamen-
rica Latina como contexto, mas não se to que se apóie na mútua determinação
restringir a ele. As outras são destinadas desses pares conceituais, a partir de um
a propor um desenho do espaço/tempo compromisso epistemológico-estético-
de contextualização latino-americano, no -ético-político. Nossa proposta, portanto,
sentido de nos dar subsídio para repen- consiste em refletir sobre as possibilida-
sarmos a Psicologia do Desenvolvimento des e os limites da Psicologia do Desenvol-
e para que este campo de conhecimento vimento diante da tarefa de se repensar a
teórico-prático possa se constituir em um si mesma ao repensar a América Latina.
instrumento que nos permita reprojetar O compromisso apresenta-se como epis-
as relações entre os países latino-ameri- temológico– reconsiderar seu estatuto
canos e assumirmos o compromisso ético- científico e o caráter multidisciplinar que
-político de nos colocarmos como estu- pode assumir; estético– reconsiderar sua
diosos de Psicologia do Desenvolvimento visão de mundo e a perspectiva que ado-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ta para pensar o desenvolvimento huma- LT01-1256 - ESTUDOS LONGITUDINAIS


no; ético– reconsiderar sua concepção de DO DESENVOLVIMENTO HUMANO:
humano, de identidade e de diversidade; REVISÃO DE ARTIGOS BRASILEIROS
político– reconsiderar seu caráter teórico- André de Carvalho-Barreto - UNB,
-prático e os compromissos com o desen- andrecarvalhobarreto@yahoo.com.br
volvimento da vida pública e da cidadania,
no contexto da America Latina, considera- O objetivo deste estudo é apresentar uma
da em sua complexidade cultural, em ní- revisão da literatura em periódicos nacio-
vel intra e internacional. Nesse sentido, as nais de psicologia relacionados a estudos
concepções de infância, juventude, idade longitudinais sobre desenvolvimento hu-
adulta e velhice se inserem numa compre- mano. Tradicionalmente na ciência do
ensão da existência como um tornar-se, desenvolvimento, a passagem do tem-
um processo de devir que não se prende a po é percebida como idade cronológica,
limites de estágios ou de expectativas liga- como uma escala crescente de quanto
das a modelos universais, ou a processos as pessoas vivem, sendo muitas vezes
hegemônicos, mas que se produz na mul- compreendida também como um cons-
tiplicidade de relações históricas, culturais tructo da personalidade, não relacionada
e sociais, na perspectiva do jogo plural, às condições ou eventos externos (Block
de grupos minoritários, de vertentes dis- & Block, 2006). Atualmente, no entanto,
sonantes que, longe de serem exceções, compreende-se que a passagem do tem-
configuram-se como possibilidades de po está ligada à relação entre mudanças
mudança, que tem trazido para a ordem ambientais e da pessoa, sendo que a últi-
do dia a importância da especificidade, da ma adquire tanto quanto perde habilida-
diferença, da singularidade, para se pro- des e capacidades distintas em todas as
mover uma conversão do olhar, que possi- fases do seu desenvolvimento (Damon &
bilite uma transformação no processo de Lerner, 2006). Evidenciado isto, conside-
construção do conhecimento teórico-prá- ra-se o que pode ser a pedra angular do
tico da Psicologia do Desenvolvimento. estudo sobre o desenvolvimento huma-
Portanto, nosso esforço se dará no sentido no, apropriadamente introduzida como
de problematizar a teorização-atuação da “Definição 1”. Embora diversos estudos
Psicologia do Desenvolvimento na Ame- teóricos da ciência do desenvolvimen-
rica Latina, o que esperamos que resulte to tenham tentado fornecer há décadas
num diálogo profícuo e emancipador en- uma definição formal, somente no fim
tre o campo científico e o contexto políti- dos anos 1990 surge uma comunicação
co-cultural, do qual nenhum dos dois sai organizada pelos autores Cairns, Elder
ileso, pois acreditamos numa transforma- e Costello (1996) que conseguem apre-
ção mútua. sentar uma definição consistente com as
investigações e teorias adotadas por esta
Palavras-chave: Psicologia do ciência. A Ciência do Desenvolvimento
Desenvolvimento, América Latina, identidade/ é a síntese que foi gerada para orientar
diversidade as pesquisas nas áreas social, psicológi-
Contato: Lúcia Helena Cavasin Zabotto Pulino, ca e biocomportamental. Ela descreve
UnB, luciahelena.pulino@gmail.com uma orientação geral para ligar conceitos

967
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e achados em disciplinas consideradas vida que ocorrem no curso do desenvol-


ainda díspares na investigação sobre o vimento da pessoa (Baltes & Nesselrode,
desenvolvimento humano. Esta Ciência 1979; Bronfenbrenner, 1988, 1989). São
enfatiza igualmente a interação dinâmica dois os tipos de delineamentos cronos-
dos processos pelos modelos de tempo, sistêmicos longitudinais: curto prazo e
níveis de análises e contextos. O tempo longo prazo, a diferença essencial entre
e o timing são centrais nesta perspectiva. estes estudos é que, no primeiro, o inter-
Os modelos de tempo utilizados são refe- valo de tempo é maior, pelo menos, mais
rentes à vida do fenômeno a ser compre- de dois anos. No segundo, a obtenção
endido. As unidades de foco podem ser das informações é realizada em interva-
curtas, como milissegundos, ou longas, los menores de tempo, como dias, sema-
como anos, décadas e milênios. Nesta nas e meses (Baltes & Nesselrode, 1979;
perspectiva, os fenômenos do funciona- Bronfenbrenner, 1988, 1989). No Brasil,
mento individual são vistos em múltiplos os estudos usando os delineamentos
níveis, desde subsistemas genéticos, neu- cronossistêmicos longitudinais ainda são
robiológicos e hormonais até os níveis poucos. Isto é o que revela um levanta-
familiares, redes sociais, comunidades e mento realizado sobre a produção nacio-
culturas. (p. 1) Podem ser considerados nal nos últimos 10 anos (2000 até 2009)
três os delineamentos gerais que consi- nos dois principais indexadores nacionais
deram o tempo como fator de análise: de periódicos online de Psicologia: Index-
(a) transversal, (b) longitudinal de curto -Psi e PePSIC. Neste levantamento foi
prazo e (c) longitudinal de longo prazo. utilizado como verbete apenas a palavra
Dentre os três tipos de delineamentos “longitudinal”, que possui tradução ho-
cronossistêmicos, o transversal é o mais mônima nas línguas inglesa e espanhola.
empregado pelos cientistas do desen- Não foram incluídos nesta revisão teses,
volvimento humano, especialmente por livros e capítulos, trabalhos de conclusão
requerer poucos custos (Magnusson & de curso, revistas de divulgação científi-
Cairns, 1996). O delineamento cronossis- ca, estudos estrangeiros e produções que
têmico transversal é utilizado para com- se repetissem nas duas bases de dados.
preender fenômenos do curso de vida no Ao todo esta revisão localizou 44 artigos:
espaço de tempo que ocorrem ou pelo 16 do Index-Psi e 28 do PePSIC. Muitas
resgate histórico e projeção de informa- destes estudos, todavia, não atendiam a
ções. A perspectiva de coleta de dados Definição 1 de ciência do desenvolvimen-
longitudinal, diferentemente da trans- to e aspectos de continuidade e mudan-
versal, tem por característica geral o uso ça; outro refinamento, portanto, foi reali-
de repetidas medidas com os mesmos zado na leitura dos objetivos, métodos e
respondentes em períodos de tempo dis- resultados dos artigos. O resultado final
tintos (Jenson, 2007). No desenvolvimen- identificou nove investigações (Beltrão
to humano, os estudos longitudinais têm & Carvalho, 2008; De Felice, 2006; Diaz,
por característica, ainda, medir aspectos 2007; Krob e cols., 2009; Linhares e cols.,
de continuidade e mudança, como exa- 2003; Nobre e cols., 2009; Oliveira-Mon-
minar os efeitos cumulativos de uma se- teiro, 2008; Pérez-Ramos e Maia, 2002;
quência de transições ou experiências de Sá e cols., 2009), dessas três foram pes-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

quisas longitudinais de longo prazo (De LT04-1385 - PSICOLOGIA DO


Felice, 2006; Oliveira-Monteiro, 2008; Sá DESENVOLVIMENTO NA AMÉRICA
e cols., 2009) e também três utilizaram o LATINA: O CASO DO MÉXICO, AMÉRICA
delineamento de estudo de caso (Beltrão CENTRAL E CARIBE
& Carvalho, 2008; Diaz, 2007; De Felice, Cândida Beatriz Alves - UnB
2006). Os outros estudos foram longitu- candida.alves@gmail.com
dinais de curto prazo e/ou utilizaram o Marcella Brasil Furtado - UnB
delineamento empírico. Finalmente, nos marcellabrasil@gmail.com
estudos longitudinais investigados, qua- Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB
tro efetuaram sua coleta em somente mcsloliveira@gmail.com
dois períodos distintos de tempo (Krob, Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB
Piccinini & Silva, 2009; Linhares, Carva- rpedroza@unb.br
lho, Machado & Martinez; Oliveira-Mon-
teiro, 2008; Sá, Curto, Bordin & Paula, Há décadas, a Psicologia do Desenvolvi-
2009), e nenhum realizou análises que mento é uma área consagrada das ciências
considerassem mais de dois níveis de psicológicas e constitui o universo de in-
interferência sobre o desenvolvimento. vestigação de inúmeros pesquisadores ao
Todas as análises destas pesquisas fo- redor do mundo. Nos últimos anos, houve
caram somente no nível individual dos uma significativa melhora na velocidade e
aspectos de continuidades e mudanças facilidade no intercâmbio de informações
que ocorreram ao longo do tempo das com pessoas de todas as partes do globo,
pessoas investigadas. Até o ano de 2006 e tal transformação teve forte influência
eram mínimos os estudos longitudinais também na pesquisa em Psicologia do De-
brasileiros indexados que se preocupa- senvolvimento. De fato, o acesso, por um
vam em compreender os fenômenos do maior número de pessoas, às atividades e
desenvolvimento humano, indicando que publicações realizadas por pesquisadores
este tipo de delineamento cronossistêmi- na área aumentou também o impacto des-
co tem ganhado gradualmente interesse sas atividades e publicações sobre a pro-
recentemente pelos cientistas do desen- dução científica no campo em questão. O
volvimento. Este aumento nacional indi- intercâmbio de experiências, de relatos de
ca uma tendência mundial, expressa pelo pesquisa e de intervenções, entre outros,
levantamento de Singer e Willett (2005) certamente veio enriquecer a disciplina,
e indicada por Chen e Miller (2005), que explicitando a tendência à internaciona-
vem constatando no delineamento cro- lização da pesquisa na área – a mesma
nossistêmico longitudinal propriedades observada, ainda que em ritmos distintos,
que melhor definem as trajetórias do de- em outros ramos da ciência. Com base no
senvolvimento. interesse por investigar a maneira como
está estruturada e os resultados ofereci-
Palavras-chave: desenvolvimento humano; dos pela pesquisa em Psicologia do Desen-
métodos de pesquisa; estudo longitudinal volvimento em outras regiões do globo, a
presente pesquisa centrou-se no caso la-
tino-americano, mais especificamente no
México e nos países da América Central e

969
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Caribe. Objetivou-se realizar, na região ci- informações sobre linhas de pesquisa ou


tada, um mapeamento da pesquisa nesse publicações se revelaram demasiadamen-
ramo da ciência verificando programas de te escassas. Já a Costa Rica, Cuba e México
pós-graduação em universidades, grupos destacaram-se, dentre os países investiga-
contemplados por fomento estatal, além dos, pelo número de professores atuantes
de eventos científicos na área. O instru- em pós-graduações na área, pelo número
mento utilizado para tal objetivo foi a in- de publicações, pela diversidade de temas
ternet, com visitas a páginas de universida- de interesse em pesquisa e pelas redes de
des, páginas governamentais de incentivo cooperação internacional na qual estão
à pesquisa e páginas de associações e con- envolvidos, permitindo-nos colocá-los no
gressos, sobretudo a Sociedade Interame- patamar de grupos de status e impacto
ricana de Psicologia (SIP). Foram seleciona- internacional, ao menos potencialmente.
dos ao todo 11 países (Costa Rica, Cuba, El No entanto, também esses pesquisadores
Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, Mé- raramente apresentavam, disponível na in-
xico, Nicarágua, Panamá, Porto Rico e Re- ternet, uma sistematização abrangente de
pública Dominicana) e mais de 15 univer- seu trabalho, exigindo assim um esforço de
sidades, sobretudo no México e em Cuba. busca em páginas diversas de universida-
Os pontos investigados foram fundamen- des, congressos e revistas eletrônicas. Com
talmente os nomes dos pesquisadores em base nos resultados que foram encontra-
Psicologia do Desenvolvimento, sua área dos, a presente pesquisa indicou algumas
específica de atuação, seus projetos atuais, considerações sobre o contexto investi-
o grupo de pesquisa do qual fazem parte gado. Em primeiro lugar, é notável a falta
(quando o fazem), as últimas publicações de acesso e de sistematização de informa-
encontradas online e outras informações ções dos pesquisadores (como currículos,
consideradas relevantes, como por exem- grupos de pesquisa, produção acadêmica,
plo, sua formação acadêmica ou vínculos projetos atuais e orientações de mestrado
internacionais a outros grupos. Em todos e doutorado). Por outro lado, no entanto,
os países verificou-se a existência de cur- observa-se sim uma produção de relevo no
sos de graduação em Psicologia, porém em ramo da ciência em questão aqui – sobre-
El Salvador e no Haiti não se encontraram tudo na Costa Rica, em Cuba e no México
informações específicas sobre pós-gradua- –, com predominância da pesquisa em Psi-
ção em área própria ou afim à Psicologia cologia do Desenvolvimento no contexto
do Desenvolvimento. Na Guatemala, em escolar, chamada de Psicologia Educati-
Honduras, na Nicarágua e na República Do- va, Escolar ou Educacional (o que mostra
minicana, apesar de haver pós-graduação a necessidade de uma investigação mais
em Psicologia do Desenvolvimento (ainda aprofundada sobre que tipo de pesquisa e
que nem sempre denominada Psicolo- objetos de estudos se encontram abarca-
gía del Desarrollo), não foi possível obter dos por essas denominações). Destacou-se
informações sobre professores ou linhas também o grande número de projetos de
de pesquisa. No Panamá e em Porto Rico extensão realizados pelas universidades,
foram encontrados dados sobre professo- o que demonstra uma importante preo-
res (não mais que três) com pesquisa em cupação com a realidade sócio-cultural
Psicologia do Desenvolvimento, porém as local, que se reflete também nos temas

970
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de interesse de pesquisa. A partir desse Alguns marcos históricos recentes indi-


quadro, salta aos olhos a necessidade e a cam o crescimento da Psicologia do De-
importância de que universidades e pes- senvolvimento, no Brasil. A realização do
quisadores se mobilizem para sistematizar Primeiro Congresso da Sociedade Brasi-
e disponibilizar online suas atividades e leira de Psicologia do Desenvolvimento
produções em documentos como: organi- e a criação da Sociedade Brasileira de
zação da graduação e da pós-graduação, Psicologia do Desenvolvimento (ABPD),
suas linhas de pesquisa, seu histórico e ob- em 1996, foram acontecimentos que de-
jetivos, seu quadro docente, bem como os monstraram a existência de uma quan-
currículos completos e atualizados desses tidade significativa de pesquisadores na
pesquisadores. Observou-se que, nos paí- área, bem como de produções especifi-
ses em foco no presente estudo, há traba- camente voltadas a ela. Estes eventos
lhos, pesquisas, publicações e projetos de são indicadores da existência de um nú-
extensão de enorme interesse e relevância mero crescente de estudiosos construin-
para o campo da Psicologia do Desenvolvi- do conhecimento nessa área a partir da
mento, mas que frequentemente não es- realidade brasileira. Com a finalidade
tão ao alcance de pesquisadores que não de conhecer as produções científicas na
vivem naquela mesma realidade nacional área da Psicologia do Desenvolvimento,
ou local. Apesar das dificuldades financei- no Brasil, o presente estudo traz um le-
ras e técnicas que certamente existem, é vantamento das produções nos periódi-
importante que os pesquisadores dessas cos nacionais na área da Psicologia, en-
universidades se mobilizem, pois o com- tre os anos de 1998 e 2010, contendo a
partilhamento de seu trabalho certamente temática “desenvolvimento infantil”. Foi
contribuirá sobremaneira para o enrique- utilizada a base de dados da Scientific
cimento da Psicologia do Desenvolvimento Electronic Library Online - SciELO (www.
na América Latina e no mundo. scielo.br) para pesquisar a temática do
Desenvolvimento Infantil nas publicações
Palavras-chave: América Latina, Psicologia brasileiras, no mês de fevereiro de 2011,
do Desenvolvimento, compartilhamento de digitando a expressão “desenvolvimento
experiência. infantil”, no índice de assuntos na base
Contato: Cândida Beatriz Alves, UnB, candida. de artigos da coleção do Brasil. Diante
alves@gmail.com desta busca apareceu um total de 183 ar-
tigos. Nessa amostra, optou-se por inves-
tigar, apenas, os artigos que estavam em
LT06-758 - A TEMÁTICA “PSICOLOGIA periódicos direcionados à área da Psico-
DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL” NAS logia, totalizando 45 artigos, distribuídos
PRODUÇÕES NACIONAIS: ESTADO DA nos seguintes periódicos: Paidéia; Psico-
ARTE logia em Estudo; Psicologia: Teoria e Pes-
Adinete Sousa da Costa Mezzalira - PUC/ quisa; Estudos de Psicologia (Campinas);
Campinas Psicologia Escolar e Educacional; Estudos
adinetecosta@hotmail.com de Psicologia (Natal); Psicologia: Refle-
Raquel Souza Lobo Guzzo - PUC/Campinas xão e Crítica; Psicologia USP; Psicologia
rguzzo@mpc.com.br Clínica. Nos artigos foram investigados

971
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os seguintes aspectos: características da geral, as abordagens mais utilizadas fo-


autoria, uso de referências e abordagem ram o modelo bioecológico do desenvol-
utilizada. Com base no levantamento re- vimento e a abordagem sócio-histórica,
alizado, constatou-se uma concentração histórico-cultural ou sociocultural. Com
de autorias vinculadas a instituições pú- relação ao tipo de pesquisa, teórica ou
blicas: dos 45 artigos analisados, 78,3% empírica, dos 45 artigos, 32 correspon-
eram de universidades públicas; 15,2%, diam a estudos empíricos (71,1%) e 13,
de universidades particulares e 6,5% es- a estudos teóricos (28,9%). Nas pesqui-
tavam vinculados a universidades inter- sas empíricas verificou-se o cenário de
nacionais. No tocante à posição geográ- pesquisa, a técnica de coleta de dados,
fica das universidades em que os autores a análise dos dados e os participantes. A
estavam vinculados, 38,5% encontrava- respeito do cenário de pesquisa ou o lo-
-se na região Sul; 38,5%, na região Su- cal onde foi realizada a pesquisa, nos 32
deste; 11,5%, na região Nordeste; 9,6%, artigos empíricos, 17 pesquisas desenvol-
na região Centro-Oeste e 1,9%, na região veram-se dentro de uma escola; quatro,
Norte. Com relação aos estados que mais em um posto de saúde ou hospital; duas,
produziram trabalhos nesta temática, de dentro de um bairro ou uma comunida-
acordo com este levantamento, foram: de; em outras duas, os participantes fo-
São Paulo (23,1%), Rio Grande do Sul ram entrevistados na instituição de ensi-
(21,1%) e Santa Catarina (13,4%); estes no superior em que os autores atuavam;
três estados corresponderam a 57,6% e, por último, uma pesquisa foi realizada
do total das produções. Em relação ao em um centro de atendimento à criança.
número de autores por artigo, prevalece- Ressalta-se que em seis estudos não foi
ram pesquisas com dois autores (48,9%), possível identificar o cenário da pesqui-
três autores (22,2%) e um autor (15,5%); sa, porque os autores não mencionaram
os trabalhos com 4, 5, 6 e 9 autores cor- como chegaram aos participantes esco-
responderam a 16,8% das produções. No lhidos e onde foi realizada a pesquisa. No
que diz respeito às referências utilizadas, que se refere à quantidade de técnicas
pôde-se verificar um número significati- empregadas na coleta de dados, dos 32
vo de fundamentos e produções interna- artigos analisados, 15 trabalhos (28,4%)
cionais sendo utilizados na discussão de utilizaram uma técnica; 13 artigos (49%)
temáticas a respeito do desenvolvimento utilizaram duas técnicas; e quatro tra-
na realidade brasileira. No levantamento balhos (22,6%), três técnicas. Em geral,
realizado, do total de 1.346 referências, os dados demonstram que a opção pelo
50,1% eram internacionais e 49,9%, na- uso de entrevistas (35,9%) é bastante co-
cionais; em geral, prevaleceram artigos, mum. Na sequência, aparecem o uso de
livros, capítulos de livros e, depois, dis- escalas, protocolos, testes, inventários e
sertações e teses. Com relação às abor- baterias (24,5%), questionários e fichas
dagens utilizadas nas produções investi- (15,1%), registro das observações / diá-
gadas, 25 trabalhos (55,5%) continham a rios de campo (11,3%), vídeogravação /
informação da abordagem empregada e filmagem (7,5%) e outros (5,7%). Com
20 trabalhos (44,5%) não mencionaram, relação às técnicas de coletas de dados
diretamente, a abordagem escolhida. Em mais utilizadas com crianças foram: es-

972
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

calas, protocolos, testes, inventários e CO 05 - LT01


baterias (30,4%); entrevistas (21,7%), re-
gistros das observações / diário de cam-
Abrigamento e adoção
po (21,7%), filmagens (13,1%) e outros
(13,1%). Quando analisadas as técnicas
LT01-817 - A CONSTRUÇÃO DE
utilizadas com os familiares, profissionais
VÍNCULOS NO ACOLHIMENTO DE BEBÊS
e professores foi constatado o uso de: en-
EM ABRIGOS: UM OLHAR PARA AS
trevistas (42,9%), questionários e fichas
POSSIBILIDADES.
(25%), escalas / inventários (21,4%), fil-
magens (7,1%) e outros (3,6%). Ao inves- Gabriella Garcia Moura - USP
tigar o tipo de procedimento de análise gabigmoura@yahoo.com.br
dos dados, foi possível verificar que em Kátia de Souza Amorim - USP
18 trabalhos (56%) foi empregado algum katiamorim@ffclrp.usp.br
tipo de quantificação e em 14 trabalhos
(44%), empregada a análise qualitativa. Na psicologia, há forte difusão da teoria
Com relação aos participantes das pes- de apego (Bowlby, 1990), que discute a
quisas, 17 trabalhos (53,1%) contaram inclinação dos seres humanos para a cons-
com crianças e ou adolescentes e 15 tra- trução de vínculos e que considera ainda
balhos (46,9%) com os familiares, profis- o não estabelecimento ou o rompimento
sionais e professores como participantes. precoce dos laços afetivos como importan-
É importante considerar a continuida- te fator etiológico de distúrbios emocio-
de deste levantamento preliminar, bem nais e desordens psiquiátricas. Essa teoria
como questionamentos a seu respeito, a tem influenciado a perspectiva de consi-
partir da realização de novas pesquisas. derar o desenvolvimento cognitivo, emo-
Acredita-se que a investigação realizada cional, afetivo e social sadios como produ-
possa contribuir para uma breve descri- to de uma relação estável com um adulto,
ção de como vem se consolidando a Psi- preferencialmente a mãe, num ambiente
cologia do Desenvolvimento Infantil no doméstico-familiar. Nessas condições, se
país e futuras pesquisas direcionadas a garantiria um apego seguro, mesmo em
mapear a situação da Psicologia do De- se tratando de “pais muito ruins”, uma vez
senvolvimento Infantil tornam-se essen- que, para o autor, “algo pior do que um lar
ciais para a construção da história da pes- insatisfatório é a (...) inexistência de um
quisa científica na área. lar” (ibid, 2006, p.72). Predominantemen-
te, a discussão sobre desenvolvimento de
Palavras-chave: Psicologia do crianças que vivem alijadas do convívio
Desenvolvimento Infantil; produções familiar, especialmente as abrigadas, está
científicas; Psicologia no Brasil atravessada por essas vozes, carregando
Contato: Adinete Sousa da Costa Mezzalira, a ideia de predição de prejuízo do desen-
PUC-Campinas, adinetecosta@hotmail.com volvimento, pressupondo que, nesses am-
bientes, entre outros problemas, há im-
possibilidade de construção de vínculos.
Na contramão dessas concepções e previ-
sões, partindo-se da perspectiva histórico-

973
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-cultural – que também considera o víncu- de vida), os vídeos indicam que os bebês
lo como central e fundante – entende-se utilizam determinados recursos comuni-
o desenvolvimento humano a partir das cativos (como o andar em direção, seguir,
relações estabelecidas com o outro e o se aproximar ou permanecer ao redor de
ambiente, sendo essas mediadas pela lin- determinada pessoa; o olhar, o balbucio, o
guagem e engendradas num determinado choro e o sorriso direcionado; o estender
contexto histórico-cultural. No entanto, os bracinhos; entre outros recursos) na
ao considerar a diversidade de contextos interação. Esta se dá com pessoas espe-
a que a criança pode estar submetida his- cíficas, as mesmas ocorrendo, prioritaria-
tórica e socialmente, nos questionamos mente, com funcionários do abrigo, ain-
sobre processos de relações, em termos da que haja outros adultos e voluntários
de comunicação e construção afetiva de presentes. Tais comportamentos indicam
bebês que se encontram em contextos de preferências e especificidades, revelando
acolhimento institucional: como o bebê comportamento possível de seletividade
se relaciona com e nesse ambiente? Foi na escolha dos parceiros de interação. O
com essa problematização que nos pro- mesmo acontece nas interações com as
pusemos a investigar, através de um es- outras crianças. Para discutir esses modos
tudo de caso, envolvendo um ambiente de relações, foi selecionada uma cena. No
de acolhimento institucional, os modos episódio, Lucas estava no berço, interagin-
de co-construção das relações e dos vín- do de longe com um bebê de outro berço,
culos afetivos de bebês com os adultos por meio de olhares e balbucios. Quando
cuidadores e com as outras crianças que Elaine (funcionária) passa pelo berçário
compartilham do mesmo contexto. A pes- e segue em direção à cozinha, ele a vê e
quisa foi guiada pela perspectiva teórico- começa a chorar, olhando para o corredor
-metodológica da Rede de Significações. onde ela entrou. Seu choro dura alguns
O estudo foi realizado numa cidade de minutos, atraindo a atenção de uma vo-
médio porte do interior de São Paulo. Fo- luntária. Esta tira o bebê do berço e o co-
ram realizadas vídeogravações, durante loca no chão, oferecendo um brinquedo.
três meses, tendo como foco três bebês, Mesmo assim, Lucas continua chorando,
cujos nomes fictícios e idades são Lucas (3 agora com mais intensidade (“berrando”).
meses); Guilherme (10 meses); e, Rosa (5 A diretora do abrigo aproxima-se e o pega
meses). A fim de acompanhar mudanças e no colo, dizendo “pronto, pronto, pronto”.
(trans)formações ocorridas nas formas de Embora o choro diminua, não é suficiente
se relacionar e se comunicar dos bebês, para que ele pare de chorar. Nesse mo-
tem sido feita uma análise microgenética mento, Elaine volta ao berçário, mas sai
das cenas. Isto é, descrição minuciosa de rapidamente. E ele, novamente, começa a
eventos e acontecimentos e acompanha- chorar gritando e olhando na direção dela.
mento das mudanças, que tal como dis- Por fim, a funcionária reaparece e o pega
cute Lyra (2000), marcam a história dos no colo, após ele inclinar o corpo em sua
participantes em termos de momentos direção. No colo, imediatamente, Lucas
de quase estabilidade ou de mudanças. para de chorar. Ela o leva para a cozinha e
Como resultados parciais obtivemos: para a diretora do abrigo diz: “olha aí o remédio
a faixa etária em questão (primeiro ano dele (...) oh! Meu amor, tá acostumado,

974
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

né?”, na qual fica clara a preferência do LT01-872 - O DESENVOLVIMENTO NO


bebê (Lucas) por uma funcionária-moni- GRUPO DA BRINCADEIRA: ESTUDO
tora específica (Elaine). Bussab (2000) nos DE CASO SOBRE UMA CRIANÇA EM
alerta sobre a armadilha metodológica em SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO
que podemos cair ao atribuir, de modo Priscila Fernandes do Prado - UnB
simplista, relação causal entre o desenvol- pprifp@gmail.com
vimento do apego com o comportamento Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB
de cuidado para satisfação de necessida- rpedroza@unb.br
des básicas (alimentação, cuidados com
a saúde e higienização). No entanto, no Este trabalho refere-se ao relato de uma
contexto do abrigo, a condição dependen- experiência de extensão universitária re-
te do bebê faz com que a proximidade dos alizada num Projeto de Extensão de Ação
adultos, exigida nos cuidados básicos, po- Contínua por estudantes de graduação em
tencialize a construção de relação e pos- Psicologia da Universidade de Brasília em
síveis vínculos. Em outras palavras, nos um abrigo do Distrito Federal para crianças
momentos de interação, subjacentes aos e adolescentes socialmente abandonados
cuidados básicos, novos elementos po- e encaminhados pela Vara da Infância e Ju-
dem surgir na relação, como brincadeiras, ventude. A metodologia de relato escolhi-
sorrisos, entre outras trocas afetivas que da foi o estudo de caso por permitir maior
envolvem o adulto na história de desen- aprofundamento e análise dos conteúdos
volvimento, com conquistas e descober- relacionados ao desenvolvimento de uma
tas do bebê, viabilizando a construção de menina de 8 anos participante do projeto
vínculos. Embora a cena seja apenas um realizado na instituição durante o ano de
recorte da história relacional, ao longo dos 2010. Tal proposta consistiu na utilização
vídeos, é possível observar esse tipo de da brincadeira como forma de intervenção
troca afetiva entre Lucas e Elaine e entre psicológica com um grupo de crianças, a
outros bebês e funcionários. Ela evidencia partir da concepção de que a brincadeira é
que, ao contrário do que é previsto, mes- atividade fundamental para o desenvolvi-
mo em situação considerada por princípio mento da criança, visto como um processo
adversa, as interações entre as crianças permeado por descontinuidades, constitu-
e adultos e entre as próprias crianças es- ído por avanços e retrocessos. Entende-se
tão carregadas de afeto, com intensas o brincar como possibilitador da constru-
reações emocionais e evidente conforto ção da autonomia, formação de vínculo,
proveniente desses contatos. Ainda que reelaboração de experiências vivenciadas,
estes vínculos não tenham as característi- construção e seguimento de regras e ex-
cas que Bowlby (1990) compreende como pressão de sentimentos e fantasias. Nessa
pré-requisitos para um apego seguro, é atividade, surgem conflitos que podem,
claramente observável que as crianças por meio da mediação do adulto e da pró-
têm figuras de referências nesses contex- pria situação de brincadeira, promover
tos. E é na relação com essas figuras de desenvolvimento de recursos de persona-
referência que surgem as possibilidades lidade que possibilitam maiores condições
de construção de vínculos e apego no con- de interação afetiva nas relações interpes-
texto de acolhimento institucional. soais. O grupo de crianças foi composto de

975
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

acordo com as indicações das pedagogas vam sua saída, sendo que algumas vezes o
do abrigo, que priorizaram para a atividade mais novo até chorava. Em casa e na brin-
aquelas com dificuldades na escolarização quedoteca, os primeiros encontros com
e nas relações com outras pessoas (tanto Bela foram marcados por muito silêncio e
com outras crianças quanto com as cuida- recatamento de sua parte. E assim que o
doras da instituição). Outro critério para a grupo acabava, Bela logo voltava para per-
formação do grupo foi a idade das crian- to dos irmãos, sempre cuidando dos dois.
ças, sendo a faixa etária escolhida a de 8 No transcorrer dos dias e das brincadeiras,
e 9 anos. Com a observação desses aspec- o relacionamento com a criança foi se tor-
tos, fizeram parte do grupo da brincadeira nando cada vez mais pessoal, sem tantas
um menino e cinco meninas, sendo que resistências dela e dos irmãos para as sa-
uma delas participou apenas em seus perí- ídas de casa e com maior comunicação
odos de férias, por estudar no mesmo tur- visual e corporal. Já a comunicação verbal
no de realização do trabalho. No primei- demorou um pouco mais de tempo para
ro semestre de atividades com o grupo, ser compreensível. No início, Bela apon-
duas extensionistas eram as responsáveis tava seus desejos e sentimentos com sons
por estar com as crianças. Já no segundo de impaciência e grunhidos, revelando na
semestre, a equipe contou com mais três maioria das vezes apenas os momentos de
extensionistas. Foram realizadas visitas descontentamento. Apesar dessas expres-
semanais ao abrigo durante todo o perío- sões terem perdurado por grande período,
do letivo da universidade, nas quais eram nos últimos encontros do grupo, era possí-
dedicadas uma hora e trinta minutos para vel perceber que Bela expressava com pa-
estar com esse grupo na brinquedoteca lavras sua tristeza e suas contrariedades.
da instituição. As brincadeiras, seus parti- Além de ter sido ouvida e entendida, o gru-
cipantes e suas regram eram escolhidas e po analisou o falar da criança importante
conduzidas conjuntamente, sendo o brin- por ter proporcionado a ela a melhor per-
car concebido como um fim em si mesmo. cepção das suas sensações e a organização
Ao brincar com o grupo, os extensionistas de possíveis soluções. Outras mudanças de
procuraram criar espaços de interação Bela foram em relação à vivência de mo-
com as crianças nos quais elas pudessem mentos felizes, os quais, no início, parecia
se desenvolver de forma espontânea e au- evitar ao se isolar do grupo, permanecen-
tônoma, a partir da vivência dos conflitos do calada e quieta. Tal distanciamento foi
que surgiam, das fantasias proporcionadas diminuindo ao longo dos encontros e, ao
pelas brincadeiras e das demais possibili- final, a criança brincava todo o período
dades experienciadas. A criança do pre- com os outros componentes do grupo e
sente estudo de caso foi a última a entrar expressava contentamento com risos, can-
no abrigo, seu ingresso ocorreu aproxima- tos e interações animadas. Ademais, Bela
damente um mês antes do início do grupo. em vários momentos chamava as outras
Com 8 anos, Bela tinha dois irmãos mais meninas de amigas ou deixava evidente o
novos, um de 5 e outro de 3 anos. Os três seu carinho por elas. Também foi possível
foram abrigados na mesma casa-lar. Quan- perceber diferenças nos comportamentos
do a criança era buscada em sua casa para de Bela nos outros contextos do abrigo,
participar do grupo, os irmãos estranha- como nas saídas na brinquedoteca, quan-

976
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do a criança escolhia permanecer brincan- gem o mais breve possível. Caso isso não
do no parquinho, na companhia de outras possa ocorrer, deve ser procurada uma
crianças, em vez de ir logo para casa ao en- família adotiva. A adoção deve ser prece-
contro dos irmãos. O acompanhamento do dida de um estágio de convivência com a
desenvolvimento e a convivência com Bela família adotante (Brasil, 1990; 2009), com
mostraram a importância da postura dos o objetivo de facilitar uma adaptação à
extensionistas de suporte para as crianças nova situação familiar, tanto nos casos de
do grupo poderem se expressar e agir de adoção nacional como internacional, nes-
forma espontânea, como sujeitos de seus te último caso devendo ocorrer no país de
desejos, a partir do vínculo de confiança e origem das crianças, por um período de no
respeito estabelecido com elas. Além dis- mínimo um mês. Apesar dos avanços nos
so, observou-se que a atividade em grupo estudos sobre adoção, permanecem ain-
auxiliou o desenvolvimento da individua- da muitas lacunas a serem preenchidas,
ção da criança, por possibilitar posiciona- principalmente com relação às dinâmicas
mentos e escolhas pessoais, e que foi pos- e estratégias de interação que propiciam
sível desenvolver uma escuta terapêutica um ambiente familiar saudável. Palacios
por meio de uma prática clínica reflexiva e (2007) afirma que os estudos têm enfo-
transformadora. cado mais os resultados da adoção e as
características dos envolvidos, mas pouco
Palavras-chave: desenvolvimento, brincadeira, tem sido estudado sobre os processos que
abrigamento. envolvem a adoção. Assim, neste estudo
Contato: Priscila Fernandes do Prado – utilizou-se como aporte teórico e meto-
Universidade de Brasília – pprifp@gmail.com dológico a Teoria bioecológica do desen-
volvimento (Bronfenbrenner & Morris,
1998), para investigar de forma qualitativa
LT01-1258 - ADOÇÃO NACIONAL E os processos proximais entre adotantes e
INTERNACIONAL: PROCESSOS PROXIMAIS adotados durante o período de convivên-
NO PERÍODO DE CONVIVÊNCIA cia anterior à adoção. Para compreender
Elisa Avellar Merçon-Vargas - UFES o desenvolvimento nesta perspectiva de-
elisa.amv@gmail.com vem ser considerados quatro níveis que se
Edinete Maria Rosa - UFES relacionam entre si: o processo, a pessoa,
edineter@gmail.com o contexto e o tempo (PPCT). Os proces-
Débora Dalbosco Dell’Aglio - UFRGS sos proximais são o primeiro mecanismo
dalbosco@cpovo.net produtor de desenvolvimento, são formas
Financiamento: CAPES duradouras de interação entre um indiví-
duo ativo e outras pessoas, objetos e sím-
O Estatuto da Criança e do Adolescente bolos. Podem ter efeitos de competência
(ECRIAD; Brasil, 1990) assegura o direi- ou disfunção dependendo dos ambien-
to à convivência familiar e comunitária a tes em que acontecem. As características
toda criança e adolescente. Nos casos em da pessoa são vistas como produtoras e
que estes direitos estão sendo violados, a produto do desenvolvimento. O contexto
criança ou adolescente deve ser acolhida e considera a relação entre pessoa e am-
deverá ser reinserida na sua família de ori- biente como multidirecional, com ambos

977
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se interinfluenciando, possui quatro níveis cos (Yin, 2005) previamente construídos a


de interação: 1) microssistema - ambien- partir da Teoria bioecológica (Bronfenbren-
tes frequentados pela pessoa, e nos quais ner & Morris, 1998). Os dados indicaram
estabelece relações face a face; 2) mesos- uma diferença entre os processos proxi-
sistema - inter-relações entre os micros- mais competentes e disfuncionais nos dois
sistemas; 3) exossistema - ambientes em casos estudados. Na adoção nacional os
que a pessoa não frequenta como partici- processos proximais competentes se de-
pante ativo, mas que possui influência no ram pela convivência anterior que os ado-
seu desenvolvimento; e 4) macrossistema tantes tinham com as adotadas, e na inter-
- composto pelo padrão global de ideolo- nacional pela percepção dos pais adotivos
gias, crenças, valores, religiões, formas de de que as crianças estavam engajadas no
governo, culturas e subculturas. O tempo processo de adoção, percebendo os víncu-
permite examinar a influência para o de- los como contínuos e duradouros, além da
senvolvimento de mudanças e continuida- capacidade de comunicação das crianças.
des que acontecem no decorrer da vida. Já os processos disfuncionais na adoção
A partir destas considerações, realizou-se nacional estavam ligados a uma mudança
um estudo de caso múltiplo com dois ca- de comportamento da criança mais nova
sais em processo de adoção, um nacional e e na adoção internacional ao fato de esta-
outro internacional, e as respectivas crian- rem hospedados em um apart-hotel, em
ças/adolescentes adotadas (nos dois casos um país diferente, fora do seu cotidiano.
adoção múltipla - dois irmãos). Para coleta Com relação às características pessoais,
de dados utilizou-se a estratégia da inser- nos dois casos destacou-se a questão da
ção ecológica (Cecconello & Koller, 2003). afetividade nos processos proximais, que
Assim, as famílias foram acompanhadas se mostraram competentes. Em ambos os
por um período de cerca de quatro meses, casos nas características pessoais de recur-
tendo sido realizados cinco encontros em so foram apontadas questões relativas ao
cada caso. Foram realizadas entrevistas diálogo, estabelecimento de regras e limi-
semiestruturadas com os adotantes e os tes. Os microssistemas frequentados no
adotados. Foram feitas visitas às duas ins- caso da adoção nacional eram próximos da
tituições de acolhimento onde as crianças realidade da família, enquanto que na ado-
encontravam-se antes da adoção e um ção internacional, estes microssistemas es-
encontro informal no país de acolhida, no tavam limitados, uma vez que não estavam
caso da adoção internacional, três meses em sua casa e cotidiano onde iriam morar
após a ida das crianças. As observações du- com as crianças de fato e falavam línguas
rante os encontros foram anotadas em diá- diferentes. No caso de adoção nacional,
rio de campo. Houve autorização prévia do o fato da adotante trabalhar com ques-
juiz da Vara de Infância e Juventude, o pro- tões ligadas ao acolhimento institucional
jeto foi aprovado por Comitê de Ética e os influenciou na maneira como lidava com
participantes assinaram o Termo de Con- as questões da adoção. Foi possível verifi-
sentimento Livre e Esclarecido. Foi realiza- car, ainda, com relação ao macrossistema,
da uma análise qualitativa dos dados por que as vivências e contatos com a temá-
meio de agrupamentos de sentidos emer- tica da adoção por parte dos adotantes,
gidos, sendo organizados em eixos temáti- nos dois casos, influenciavam na forma

978
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de lidar com a nova situação, tanto em sociedade tem, notadamente, avançado


relação à realidade social em que vivem, neste começo de milênio, sobretudo ado-
como na forma como a questão é tratada tando um discurso em prol da aceitação
nos dois países, Brasil e Itália. No que diz das diferenças. Isto é percebido no nosso
respeito ao tempo, houve uma adaptação país pelo número crescente de Grupos
à situação adotiva nas duas famílias, tan- de Apoio à Adoção (GAAs); da freqüência
to na estrutura e dinâmica familiar, como desta temática permeando enredos de
nas relações entre pais e filhos. Assim, foi filmes, novelas e programas televisivos;
possível observar que estas as relações se da Nova Lei da Adoção (Lei nº 10.012/
constituem com o tempo, sendo importan- 2009); da criação do Cadastro Nacional de
te que os processos proximais sejam cons- Adoção (CNA) como política pública; e do
truídos de maneira que assegurem certa aumento de estudos e publicações sobre
estabilidade, propiciando engajamento, a temática. Esse novo status da condição
laços duradouros e recíprocos. Observou- de aceitação positiva da adoção é perme-
-se ainda que tanto as características dos ado por uma tensão entre esse discurso
adotantes como dos adotados influenciam social considerado politicamente correto
neste processo. Ademais, por essa relação e aquilo que é valorado intra-individual-
se constituir num processo de construção mente. Inúmeros exemplos demonstram
diária, o período de convivência torna-se esta tensão que pode ser sugerida em
importante, devendo, no entanto, ser re- alguns comportamentos dos pais assim
alizado com maior suporte através de um exemplificados: “não revelar a condição
acompanhamento de uma equipe prepa- de adoção ao filho nem a outras pessoas”,
rada e considerando as particularidades “justificar as dificuldades de aprendizagem
de cada caso. do filho pela adoção” e “não participar de
movimentos pró-adoção para proteger o
Palavras-chave: adoção nacional, adoção filho e a si próprio”. Adotando uma pers-
internacional, Teoria bioecológica do pectiva sociocultural construtivista (Val-
desenvolvimento. siner, Vigotski) concebemos a cultura e o
indivíduo como constituídos mutuamente,
inseridos em um processo semiótico que
LT01-1338 - SIGNIFICADOS SOBRE cria valores para os significados atribuídos
ADOÇÃO NUMA PERSPECTIVA às diversas construções sociais. Procura-
SOCIOCULTURAL CONSTRUTIVISTA: mos, assim, neste trabalho, identificar as-
ANÁLISE DE DOIS CASOS
pectos dessas tensões que emergem dos
Maria C.D.P. Lyra - UFPE processos reflexivos de interpretação do
marialyra2007@gmail.com narrador sobre o significado da adoção.
Tatiana Alves de M. Valério - IFPE - Campus Com o objetivo de explorar valores ine-
Belo Jardim rentes ao significado da adoção, entre-
tatiana.valerio@belojardim.ifpe.edu.br vistamos dois alunos do Instituto Federal
Fiananciamento: CNPq de Educação, Ciência e Tecnologia de PE
(IFPE) – Campus Belo Jardim, de cursos
A temática da adoção de crianças e ado- técnicos na modalidade subseqüente ao
lescentes e sua discussão no contexto da Ensino Médio. As entrevistas abertas re-

979
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

alizadas nesse estudo ocorreram em um ponde: “... ele já sabe que ele não é. Ape-
contexto de conversação, tendo a seguin- sar de que ele sabe que não é... que é ado-
te questão deflagradora do tema a ser in- tado.” Esse excerto revela a “intolerância
vestigado: “Quando você ouve a palavra eliminativa” que é quando se busca trans-
adoção, o que te vem à mente? Elegemos formar aquilo que está em conflito em alvo
como categoria de análise, neste trabalho, de eliminação. A palavra filho não tem es-
a atribuição de valor às ações advindas da paço no discurso de “X”. Essa mesma es-
distinção entre “A” (valores legitimados tratégia é identificada na entrevista de “Y”,
pelas instituições e presentes naquilo que aluno do Curso Técnico de Informática, 21
o discurso social pretende significar como anos, solteiro, mora com os pais e possui
“politicamente correto” sobre adoção) e história de adoção na família. Ele elimina a
“B” (significados sobre adoção a partir de condição de adotivo do primo: “Todo mun-
discursos valorados intra-individualmen- do trata ele como se ele... é, esse fato (a
te). Para análise, seguimos as concepções adoção) não existisse.” Assim, elimina-se a
de Valsiner que nos apresenta três estra- condição de ser do outro (adotivo) e colo-
tégias de ação quando atribuímos valor ao ca-o na mesma e desejável condição dos
efetivar a distinção A e B, avaliando A não entes nascidos desta família. Identificamos
de forma positiva ou neutra, mas negati- também a “Intolerância Assimilativa” que
vamente. São elas: intolerância eliminativa é transformar algo desfavorável (condição
– o outro deve ser eliminado; intolerância adotiva) em algo favorável. Para tanto o
assimilativa – mudamos o que era desfa- entrevistado lança mão de elementos que
vorável em favorável através de diferentes descrevem a filiação/perfilhação bio-gené-
meios (aculturação, educação); e tolerân- tica – parto, DNA: “Como se fosse nascido
cia – eliminamos o contraste entre A e B da minha tia normalmente, é como se ti-
e a distinção torna-se, por avaliação, po- vesse tido parto”.“Como se ele realmente
sitiva ou neutra. Ambos os entrevistados fosse do sangue da família e tivesse o mes-
selecionados para este estudo, em um mo DNA”. Desta forma ele traz o ente ado-
primeiro momento, avaliaram positiva- tivo à condição de “normalidade” familiar,
mente a perfilhação adotiva. No entanto, como ele mesmo se refere. Dessa forma,
no decorrer da entrevista, foi possível de- por meio dessa análise, foi possível identi-
tectar as estratégias intolerância elimina- ficar, em ambos os entrevistados, as estra-
tiva e intolerância assimilativa que estão, tégias de ação utilizadas face à tensão que
segundo Valsiner, ligadas a uma atribuição a adoção desperta, uma vez que elaborar
negativa de valor quanto às distinções (A e significados sobre adoção implica trazer
B). Destacamos os seguintes exemplos: na para o discurso pessoal um significado co-
entrevista de “X”, aluna do Curso Técnico letivo que é valorado como positivo, mas
de Enfermagem, 23 anos, casada, grávida que, ao mesmo tempo, implica em adição
do primeiro filho, e com experiência de de valores negativos advindos, neste caso,
adoção na família (uma prima adotou uma da história da adoção que no passado era
criança), observamos que a palavra “filho” carregada de mitos e preconceitos.
não foi mencionada, foi omitida, silenciada
no discurso dela. Perguntamos como era a Palavras-chave: adoção; construção de
relação da família com a criança e ela res- significados; socioculturalismo;

980
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT01-1441 - FAMÍLIA SOB A PERSPECTIVA de 1990; Lei nº. 12.010, de 3 de agosto


DE CRIANÇAS EM ACOLHIMENTO de 2009). É então que o presente estudo
INSTITUCIONAL buscou investigar processos de significa-
Pedro Paulo Bezerra de Lira - UFPE ção de família em crianças de 3 a 7 anos
pedropaulo_v@yahoo.com.br acolhidas institucionalmente na cidade
Maria Isabel Pedrosa - UFPE do Recife. Partiu-se da observação de seis
icpedrosa@uol.com.br sessões videogravadas, com média de 33
Financiamento: FACEPE minutos de duração, que foram realizadas
em quatro instituições de acolhimento e
Este trabalho compreende a criança como contaram com a participação de 24 crian-
construtora ativa de significações sobre ças, sendo 15 meninos e 9 meninas, com
objetos sociais diversos, na medida em idades entre três anos (3;0) e sete anos
que sua participação na sociedade instiga e um mês (7;1). Os participantes estavam
a apropriação e reelaboração de informa- há pelo menos um mês acolhidos e suas
ções do mundo adulto de forma a aten- histórias de vida e situação processual no
der, entretanto, aos interesses próprios Poder Judiciário não foram conhecidas
de sua idade (Carvalho & Pedrosa, 2002; pelo pesquisador. As sessões videogra-
Corsaro, 2002, 2009). Tomar o objeto fa- vadas foram chamadas de oficinas, uma
mília para investigação implica deparar-se vez que se dizia que eles deveriam ‘brin-
com um fenômeno multifacetado, que car de família’. Quatro ou cinco crianças
assume ao longo da história, em diferen- eram convidadas a participar da situação
tes sociedades e culturas, uma diversida- num setting lúdico previamente organi-
de de configurações (Nascimento, 2009). zado com objetos à disposição, desem-
Entretanto, investigar significações que penhando ‘personagens’ que admitissem
crianças atribuem a família pode revelar integrar um grupo familiar. Inicialmente,
como elas apreendem esse objeto social escolhiam e negociavam em conjunto o
e salientar os aspectos de maior visibili- ‘personagem’ da família que cada uma
dade, de acordo com suas perspectivas, desempenharia na brincadeira. Ao lon-
ainda que a família implique um processo go da sessão, perguntas do pesquisador
de contínuas transformações de valores instavam-nas a referir, entre outras coi-
e normas culturais. Pensando na criança sas, que ‘personagem’ vivenciavam, quais
em acolhimento institucional, torna-se atividades este fazia e o que acontecia no
sobressalente a importância de elevá-la a faz de conta. Essas perguntas poderiam
uma posição de sujeito ativo e de direi- ser consideradas uma ‘entrevista’, mas
tos dentro do processo de institucionali- realizada de modo não habitual, ou seja,
zação (Rossetti-Ferreira, Solon, & Almei- com roteiro flexível ajustado às ações das
da, 2009), escutando-a atentamente em crianças, tornando-as semelhantes àque-
suas próprias percepções, especialmen- las feitas em uma conversa informal. Dois
te diante de um contexto sociocultural dias após a oficina de que participou,
em que documentos legais prezam pela cada sujeito individualmente conversou
preservação do direito infanto-juvenil à com o pesquisador acerca de ideias sobre
convivência familiar e comunitária (Bra- família que surgiram na situação de brin-
sil, 2006; Lei nº. 8.069, de 13 de julho cadeira. Três fotografias escolhidas de

981
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

momentos significativos da sessão e lápis que outros ‘personagens’ (mãe e filhos)


e papel foram utilizados como material estavam “perturbando”. Os garotos pare-
de apoio. A análise partiu da transcrição ceram entrecruzar vivências particulares
de recortes das oficinas e das conversas, e percepções a esse respeito com as sig-
perpassando significações construídas, nificações em curso nas interações com
negociadas e relacionadas pelas crianças os parceiros. Como construção coletiva,
a família. De início, a exploração de quais relações entre membros da família, pa-
‘personagens’ compuseram as brincadei- péis sociais desempenhados, atividades
ras, incluindo-se aqueles que foram ape- presentes no cotidiano familiar compu-
nas citados, mas não desempenhados, seram os enredos lúdicos. Situações de
pelas crianças, ofereceu as primeiras pis- cuidado, de autoridade e obediência e
tas a respeito das significações de família demonstrações de afeto foram observa-
sob a ótica dos sujeitos observados. No dos. Algumas crianças claramente explici-
grupo familiar podiam existir pai, mãe, taram nas conversas que estavam em um
filho, filha, irmão, irmã, avô, avó, tio, tia. abrigo. Por vezes, disseram os bairros em
Ressalta-se que a negociação inicial dos que moravam suas famílias biológicas. E,
‘personagens’ a desempenhar e as pos- dessa forma, demonstraram compreen-
síveis transformações de papéis ao longo der a existência da família e do abrigo, re-
da brincadeira fizeram parte de um cerne ferido como um local de morada com “as
de competências sociais e comunicativas tias” (educadoras). Em suma, ‘brincando
(Pedrosa, 2004) mais amplo em que co- de família’ e falando de seus ‘persona-
nhecimentos sobre os parceiros baliza- gens’, as crianças sinalizaram elementos
ram as interações estabelecidas. Proces- que perpassam esse grupo social. Signi-
sos de significação entrecruzados a partir ficações foram alçadas a partir da expli-
dos diferentes parceiros constituíram um citação daqueles que julgaram compor
campo interacional em que elementos uma família, da consideração de diferen-
sobre família puderam ser alçados, por ças nas atividades desempenhadas por
meio de uma análise microgenética. Um estes, da referência às distintas relações
dado interessante é que o irmão garantiu estabelecidas entre os ‘personagens’, e,
espaço nas considerações sobre família: especialmente, do próprio modo como
como ‘personagem’ da brincadeira, a conduziram suas construções lúdicas com
exemplo de uma menina que disse ser a os parceiros. Além disso, elementos apa-
irmã em uma oficina; e, na referência di- rentemente advindos de suas histórias
reta aos irmãos reais, caso de um menino pessoais circunscreveram alguns relatos
que relatou fragmentos de uma vivência e ações. Para finalizar, evidencia-se neste
na companhia destes em que todos esti- estudo que o processo de significação é
veram na Gerência de Polícia da Criança alçado como uma construção microge-
e do Adolescente (GPCA). Desperta aten- nética, ao mesmo tempo circunscrito pe-
ção que esse mesmo garoto e também las interações em curso. Tais interações
um irmão seu, participantes de oficinas apresentam-se imprevisíveis enquanto
distintas, protagonizaram breves situa- um desdobramento de processos de sig-
ções de faz de conta parecidas: ‘histórias’ nificação que se entrecruzam a partir dos
de um pai que ligava para a polícia por- distintos parceiros interacionais. E a pró-

982
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pria compreensão da criança sobre a di- evolução da capacidade de tomada de


nâmica relacional da rede social na qual perspectiva (role-taking) está relaciona-
está inserida, isto é, suas compreensões da ao desenvolvimento dos julgamentos
acerca dos parceiros e do meio, figura morais, sendo uma condição necessária,
como o substrato a partir do qual as signi- mas não suficiente para as crianças evo-
ficações de família se efetivam. O estudo luírem de um nível de julgamento moral
realizado contribui para a percepção de pré-convencional para um convencional,
que mais do que crianças institucionali- segundo a tipologia de Kohlberg (1992).
zadas, estas são crianças, e, assim sendo, Neste sentido, pode-se supor que outras
são socialmente competentes (Pedrosa, variáveis, além do role-taking, poderiam
2004) como quaisquer outras. estar relacionadas à evolução dos julga-
mentos morais e, mais especificamente,
Palavras-chave: processos de significação; às concepções de justiça distributiva. Re-
família; crianças em acolhimento institucional. centemente, Sampaio, Monte, Camino e
Roazzi (2008) e Sampaio, Camino e Roazzi
(2007) desenvolveram estudos com ado-
LT01-854 - TOMADA DE PERSPECTIVA, lescentes brasileiros objetivando testar al-
EMPATIA E JUSTIÇA DISTRIBUTIVA EM guns dos pressupostos de Hoffman (2000)
CRIANÇAS DE 7 A 12 ANOS. a respeito das relações entre empatia e
Michelle França Dourado Neto Pires - UNIVASF a justiça distributiva. Em linhas gerais,
chelle_fd@hotmail.com os resultados destas pesquisas demons-
João Marcos Fonseca Nogueira - UNIVASF traram que indivíduos com níveis mais
jmfonsecanogueira@yahoo.com.br elevados de empatia são mais propensos
Leonardo Rodrigues Sampaio - UNIVASF a aderir ao princípio da necessidade e a
leorsampaio@yaho.com.br comportar-se em conformidade com ele,
Financiamento: CNPq/UNIVASF enquanto que indivíduos menos empáti-
cos tendem a considerar como mais justo
Os primeiros trabalhos sobre o desen- o princípio da equidade, favorecendo pes-
volvimento da justiça distributiva foram soas que se esforçam ou que contribuem
realizados por Piaget (1932/ 1994) e de- mais. Apesar de evidências anteriores
monstraram que ao longo da infância as apontarem para uma relação entre em-
crianças consideram alguns princípios patia e os julgamentos distributivos, não
distributivos mais justos que outros e que se tem notícias de trabalhos que tenham
esta preferência está relacionada a avan- objetivado avaliar como estas variáveis es-
ços na idade e ao desenvolvimento moral. tão relacionadas durante a infância. Ade-
Outros estudos (Damon, 1980; Dell’ Aglio mais, há uma lacuna empírico-teórica no
& Hutz, 2001; Sales, 2000; Sigelman & que diz respeito à compreensão sobre as
Waitzman, 1991) confirmaram uma ten- relações entre o desenvolvimento do role-
dência desenvolvimentista da justiça dis- -taking e da empatia e a maneira como as
tributiva e expandiram o trabalho de Pia- crianças raciocinam com respeito à justi-
get. A partir de outra perspectiva, os tra- ça distributiva. Neste sentido, o presente
balhos de Robert Selman (Selman, 1971; trabalho objetivou abordar esta questão
Selman & Byrne, 1974) indicaram que a a partir de uma pesquisa na qual partici-

983
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

param 98 meninos e meninas, com idades produtivo diminuiu à medida que a idade
variando entre sete e doze anos de idade, dos participantes aumentou. Além disso,
estudantes de escolas públicas e particu- constatou-se uma interação significativa
lares de Petrolina (PE). Os instrumentos entre a idade e o nível de role-taking dos
utilizados foram: uma tarefa para avaliar participantes, sobre a quantidade dada à
a capacidade de Role-taking desenvolvida professora. Mais especificamente, obser-
por Flavell (1968), o Index of Empathy for vou-se que entre as crianças mais velhas
Children and Adolescents (Bryant, 1982) e (11 a 12 anos), aquelas que atingiram
um dilema distributivo hipotético. Este di- role-taking mais elevado tenderam a dar
lema envolvia a distribuição de lanche em menos lanche para a professora do que as
uma situação de piquenique, na qual os com menor nível de role-taking. Ademais,
personagens tinham diferentes caracterís- constatou-se uma correlação negativa e
ticas: um era mais produtivo, o outro era significativa entre o nível de role-taking e
mais pobre, o terceiro era a professora e o a quantidade de lanche distribuída para si
último era o próprio participante. De uma mesmo (r = -2,38; p = ,01). Esses resulta-
maneira geral, os resultados preliminares dos sugerem que as decisões distributivas
indicam que o nível de empatia dos par- de crianças entre os 7 e 12 anos podem
ticipantes variou significativamente em ser influenciadas pela empatia e pelo seu
função do seu sexo (as meninas pontua- nível de role-taking, especialmente quan-
ram mais alto na escala de empatia que do estas decisões envolvem a produção
os meninos) e que houve uma tendência de benefícios para elas mesmas. Sugere-
desta aumentar com o avanço na idade. -se que crianças com maior nível de role-
Além disso, que os participantes de es- -taking são capazes de coordenar mais ha-
colas públicas pontuaram mais que os de bilmente diferentes perspectivas em uma
escola particular na tarefa de role-taking. situação de dilema distributivo, fazendo
Os resultados das MANOVAS indicaram com que elas foquem não apenas o auto-
que o personagem pobre recebeu mais benefício, mas busquem adotar um mode-
que os outros e que a professora recebeu lo distributivo mais igualitário. Além disso,
menos que os demais. As quantidades acredita-se que o aumento na empatia es-
distribuídas não foram influenciadas pelo teve associado a preferência por modelos
sexo ou tipo de escola dos participantes. distributivos que enfoquem menos a pro-
Por outro lado, houve diferença significa- dução/ contribuição pessoal e considerem
tiva na quantidade dada a si mesmo, em a igualdade como um modelo mais justo.
função da idade: crianças com 11 e 12 Por outro lado, as interações entre idade
anos deram uma quantidade média de e estas duas variáveis sugerem que seus
lanches significativamente inferior aquela efeitos não podem ser isolados de outros
dada por crianças com 7 e 8 anos para si provocados pelo desenvolvimento sócio-
mesmas. Houve interações significativas -cognitivo das crianças. Diferentemente
entre o nível de empatia e a idade dos do que era esperado, o role-taking e a
participantes sobre a quantidade dada empatia, isoladamente, não influenciaram
para o personagem mais produtivo: en- a maneira como as crianças fizeram suas
tre os participantes com nível mais alto distribuições entre os personagens e, nes-
de empatia, a quantidade dada ao mais te sentido, faz-se necessário a realização

984
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de outros estudos para que se possa com- La variabilidad en los patrones de desar-
preender melhor em que extensão o role- rollo cognitivo micro y macro encontrados
-taking e a empatia estão relacionados às en bebés que crecen en barriadas pobres
decisões distributivas durante a infância. de Colombia y la tendencia a presentar un
desarrollo cognitivo normal y alto, inde-
Palavras-chave: empatia, role-taking, justiça pendientemente de su edad (medida en
distributiva. meses) permite en primer lugar, rebatir la
Contato: Leonardo Rodrigues Sampaio. idea de un desarrollo deficiente, ocasio-
Laboratório de Desenvolvimento - nado por la pobreza y en segundo lugar,
Aprendizagem e Processos Psicossociais. presentar procesos más difusos y cualita-
Universidade Federal do Vale do São Francisco tivamente distintos de los que presenta la
(UNIVASF). leorsampaio@yahoo.com.br visión lineal de la concepción por etapas
(Fischer & Bidell, 1998). La tendencia a
identificar una valoración positiva en los
intercambios y la relación afectiva entre
15/11 - Terça-feira la madre y el bebé, independientemen-
te de la edad del bebe y la relación que
se establece entre esta tendencia positi-
8h30-10h va y niveles diferenciados de desarrollo,
tanto resolutorios como no resolutorios,
permite cuestionar la relación propuesta
por otros autores entre relaciones po-
CONFERÊNCIA sitivas madre bebé y su desarrollo cog-
nitivo. Probablemente la concepción de
desarrollo adoptada y las metodologías
DYNAMICS IN THE “SABOR” OF utilizadas permitieron relacionar trayec-
VYGOTSKY torias variadas de desarrollo y de relación
Bernd Fichtner afectivas entre madre y bebé y llegar a
estos resultados. Los cambios metodoló-
gicos adoptados son: 1. Análisis micro de
las trayectorias y movilizaciones del de-
CONFERÊNCIA sempeño de los bebés en tiempo real, en
cinco intentos, al resolver cada una de las
situaciones correspondientes a su edad y
RELACIÓN MADRE BEBE Y DESARROLLO
más, de dos subescalas de la Escala Ordi-
COGNITIVO
nal de Desarrollo Uzgiris Hunt: objeto per-
Mariela Orozco Hormaza - Universidad del manente y causalidad. 2. Análisis macro
Valle, Colombia de las trayectorias y movilizaciones de de-
orozcohormaza@gmail.com sempeño al resolver las situaciones de las
Financiamento: COLCIENCIAS/Universida- subescalas, a través de cuatros aplicacio-
des del Valle, del Magdalena, Tecnológica nes a lo largo de tres meses. 3. Análisis de
de Bolívar y la Corporación Niñez y Cono- la relación madre bebe empleando el gra-
cimiento. fo ‘state space grid’ (Hollenstein, 2007).

985
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Se partió de la concepción que propone: adoptan las teorías del cambio, que per-
1) el desarrollo humano tiene lugar en ni- miten identificar fenómenos y datos que
chos ecológicos en los cuales se producen muestran que el acceso al conocimien-
acoplamientos de orden social, cuando to supone procesos variados, analizar
“los individuos se envían reiteradamen- tanto los cambios locales como globales
te una sucesión de perturbaciones tal propios de la concepción de estadios y
que uno se convierte en medio necesario profundizar en el análisis de estrategias
para la producción y mantenimiento de la – entendidas como programas de acción
organización del otro” (Perinat, 2007, p. de los bebés – para develar la naturale-
53); 2) la relación del bebé con la madre za de sus desempeños. Sin embargo las
y/o su cuidador como ejemplo de acopla- relaciones entre desarrollo y cambio aún
miento social (Maturana y Varela, 1990, no son claras. Algunos autores sostienen
citado por Perinat, 2007) para estudiar la que el cambio cognitivo constituye un es-
posible relación entre desarrollo cognitivo pacio de avances y retrocesos, en el cual
de los bebés y los tipos de intercambios lo nuevo y lo antiguo coexisten y registran
y relaciones afectivas que las madres es- el uso simultáneo de estrategias débiles y
tablecen con ellos durante el primer año fuertes (Miller & Coyle, 1999). En contras-
de vida. Por nicho ecológico se entiende te, Fischer y Bidell (1998) sostienen que
la red de relaciones sociales en las que se las relaciones entre desarrollo y cambio
ubica el desarrollo; desde esta perspecti- implican posiciones teóricas distintas que
va se considera que los vínculos que esta- requieren niveles de análisis diferencia-
blecen los bebés con las personas que los dos del desarrollo micro y macro. El de-
rodean, les permite entrar en un tejido de sarrollo muestra la evolución del cambio
relaciones familiares y de parentesco im- en un período amplio de tiempo y se cen-
pregnadas de afectividad, que constituye tra en las transformaciones permanentes
su primer nicho ecológico social. Durante y estructurales que se pueden observar
el primer año de vida, esta trama o tejido tanto a nivel macro como de dominio ge-
de relaciones tiende a manifestarse o ex- neral: en algunos dominios, ligadas con
presarse en las modalidades de intercam- cierta edad. En tanto que el cambio cog-
bios de la madre con el bebé y viceversa, nitivo se define en un nivel micro y se ocu-
en el marco de rutinas dirigidas a su cuida- pa de modificaciones en los procesos de
do, como la alimentación, el baño y la lim- funcionamiento de la actividad cognitiva
pieza y el juego, que son orientadas por la del sujeto en tiempo real (Yan & Fischer,
madre o el/los adulto/s que los atienden 2002). Para estos autores, las modificacio-
hacia metas o propósitos que enmarcan nes se dan en dominios específicos y lue-
y dan sentido a los intercambios. Se en- go se reflejan en habilidades de dominio
tiende entonces que la dinámica entre las general. Cambio, variabilidad y transición
modalidades de actividades que la madre constituyen conceptos claves en la ruptu-
adopta para asumir las rutinas y los tipos ra con la secuencialidad y el orden de las
de intercambios afectivos que ella y el teorías del desarrollo de dominio general
bebé establecen, configuran un compo- (Puche, 2008) El análisis de la variabilidad
nente fundamental de su nicho ecológico. encontrada en los patrones de moviliza-
En relación con el desarrollo cognitivo se ción o cambio de los desempeños de los

986
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

bebés en tiempo real al resolver cualquier psicológicas superiores, que se exteriori-


situación en cualquier aplicación permite za pela linguagem. Nesta perspectiva, a
discutir la relevancia de estos conceptos ludicidade é identificada como uma for-
en relación con su desarrollo cognitivo. ma de linguagem, podendo estar presen-
te como signo e ferramenta na mediação
de instrumentos físicos ou simbólicos que
CO 04-LT01 dinamizam a apreensão do conhecimen-
to e a configuração da afetividade na or-
Ludicidade/Brincar ganização do desenvolvimento humano.
Julgando-se relevante elucidar o papel
do lúdico como um dos elementos funda-
LT01-730 - O PAPEL DA LUDICIDADE NO mentais na atividade humana e como di-
PROCESSO DE ORGANIZAÇÃO AFETIVA mensão necessária para integrar os cam-
DO DESENVOLVIMENTO HUMANO pos constituintes do desenvolvimento
Bernadete Souza Porto - UFC psicológico, os objetivos do presente en-
www.ufc.br saio são norteados pelas seguintes ques-
Sueli Barros da Ressurreição - UNEB tões: Qual a relação entre afetividade e
www.uneb.br ludicidade no desenvolvimento humano?
Como os elementos lúdicos colaboram na
O estudo da ludicidade como dimensão organização afetiva do processo de de-
do desenvolvimento humano tem sido senvolvimento? Ancorado nestas ques-
objeto de investigação de muitos teóricos tões tem-se como objetivo central refletir
e pesquisadores dentre os quais Huizinga sobre o papel da ludicidade como organi-
(2004), Wallon (1964), Chateau (1987) e zadora do processo de desenvolvimento
Elkonin (1988), Vygotsky (1988), Freinet afetivo numa perspectiva sócio-histórica.
(1998) Negrine (2001), Benjamim (1984) Do ponto de vista metodológico, o estudo
e outros. Segundo estes estudos, o ho- aqui empreendido caracteriza-se como
mem se desenvolveu por intermédio do uma revisão teórica de literatura dividida
trabalho e das atividades lúdicas, a evo- em dois eixos de análise, centrados nas
lução do homo-ludens (o homem que obras dos clássicos do desenvolvimento
brinca) advém da atividade criativa do psicológico: Henri Wallon e Lev Vygotsky
homo-faber (homem que trabalha). No e dos pesquisadores que abordam a lu-
processo de desenvolvimento, o homem dicidade como dimensão humana. No
se apropria do mundo envolvendo todos primeiro eixo a afetividade é discutida
os campos de sua subjetividade: senti- como função organizadora do processo
dos, movimentos, pensamentos, senti- de desenvolvimento mediante o “par-
mentos e ações. Desse modo, a ludicida- to dialético”, segundo a abordagem de
de é também uma forma de apropriação Wallon (1964), e ora como reguladora
do mundo, ela participa ativamente da das funções psíquicas, conforme a teo-
constituição sócio-histórica do homem, ria de Vygotsky (1988). Em seguida, no
estando presente na produção dos meios segundo eixo, conceitua-se a ludicidade
de vida, na sociabilidade, no processo de e seus elementos presentes na ativida-
comunicação e na formação das funções de humana, especialmente a sua relação

987
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

com a trajetória histórica da afetividade 2001; Vasconcelos, 2003) indicam que o


e do desenvolvimento da consciência so- desenvolvimento humano é permeado
cial, destacando o papel do jogo no pro- por ações que compõem as atividades lú-
cesso formativo. O marco conceitual bási- dicas como o brincar e o jogar: “O brincar
co para análise deste tema é ancorado na para a criança não é só lazer como para o
abordagem sócio-histórica, empregada adulto, mas se constitui como a própria
como sinônimo da abordagem sociocul- atividade, surge liberada, livre, gratuita e
tural, definida por Wertsh (1998) como depois vai se aperfeiçoando, se estrutu-
aquela cujo objetivo é de explicar as re- rando em regras e em cadeias mais com-
lações entre o funcionamento da mente plexas.” (Wallon, 1986, p. 86). No brincar,
humana e as situações culturais institu- a ação está subordinada ao significado, os
cionais e históricas, nas quais este funcio- objetos são deslocados de uma posição
namento ocorre. Os resultados deste es- dominante para uma posição subordina-
tudo levam a afirmar que Wallon (1964) da e, com isto, a atividade lúdica atua na
e Vigotski (1988) enfatizam os campos Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP),
emocionais e sociais como centrais na or- permitindo que a criança atue além do
ganização do desenvolvimento da criança habitual de sua idade. (Vygotsky, 1988).
(interativa e construtora de sua própria Segundo Brougère (1998), Elkonin (1988)
subjetividade). Para ambos, as funções e Manson (2002) a origem histórica do
psicológicas têm um suporte biológico, jogo está no trabalho dos adultos e seu
pois são produto da atividade cerebral, conteúdo está relacionado com a vida, o
porém, tal suporte não é suficiente para trabalho e a atividade dos membros adul-
o seu desenvolvimento. Estas funções tos da sociedade. O jogo nasce das condi-
são edificadas na dinâmica entre a natu- ções de vida da criança na sociedade no
reza e as relações sócio-históricas estabe- decorrer do seu desenvolvimento históri-
lecidas. Afeto e intelecto se relacionam co. Portanto é um elemento cultural, tem
dinamicamente. À medida que o sujeito origem e natureza social, sendo assim
se apropria do conteúdo cultural, emerge decorrente do lugar ocupado pela criança
um plano intrapsicológico, tornando um nas diversas formas de produção de tra-
instrumento próprio que passa a servi-lo balho. Nos estudos focados na ludicidade
no seu pensamento, planejamento, coor- e no desenvolvimento pessoal do adulto
denação e administração de suas emo- (Luckesi, 2002; Negrine, 2001; Oliveira,
ções. Nesta dinâmica, os vínculos afetivos 2002; Pereira, 2005; Ressurreição, 2005)
demandam interações mais complexas observou-se que as atividades lúdicas
exigindo novos canais de comunicação, atuam nas tensões corporais, favorecem
a brincadeira e o jogo se inserem nesse a ampliação da consciência e reconfigu-
campo como linguagem que “ensina a ram as emoções, assumindo um papel
seguir cegamente as emoções, a com- interativo e cultural para o processo de
biná-las com as regras do jogo e do seu evolução humana. Mostram-se também
objetivo final” (Vygotsky, 2001, p. 147). como uma forma de autoconhecimento e
Os achados de pesquisas realizadas com aprendizagem, sua vivência proporciona
crianças (Dantas, 2002; Kischimoto, 1998; a ressignificação de valores, autoestima
Maturama & Verden-Zöller, 2004; Porto, e inclusão social. Baseando-se nos estu-

988
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos revisados é possível concluir que a criança. Na opinião de Rocha (2007), é


ludicidade tem papel muito importante comum e ‘natural’ ensinar às crianças a
no processo evolutivo do ser humano, preferirem brincadeiras determinadas
apresentando-se como elemento cultural socialmente para seu gênero e evitar
mediador das relações humanas. Assim, aquelas vistas como inadequadas. Estu-
o salto ontológico do lúdico do homem dos como o de Lira e Pedrosa (2007) re-
em relação aos animais reside no modo velam que crianças de 3-4 anos reconhe-
de brincar, pois os brinquedos, como ins- cem objetos marcados socialmente pelo
trumentos significativos, registram a vida gênero. Além disso, elas transgridem
psíquica e cultural como um testemunho. regras sociais, em situações protegidas
Deste modo, o caráter coletivo do traba- de brincadeiras, pois o lúdico permite de-
lho e do lúdico sugere um vínculo, con- sempenhar papéis que não são ‘de ver-
creto ou abstrato, e é sempre mediado dade’. Ainda assim, resultados discutidos
por outro sujeito. Este vínculo se nutre por Rocha (2007) apontam que meninos
da afetividade, como organizadora e re- transgridem menos as regras sociais em
guladora da mais simples ação humana. atividades lúdicas do que meninas. Há,
portanto, evidências de apropriação des-
Palavras-chave: ludicidade, afetividade, sas regras na construção da microcultu-
desenvolvimento humano. ra de pares e na tensão provocada pelo
Contato: Sueli Baros da Ressureição. desafio dessa construção. Este trabalho
Universidade do Estado da Bahia (UNEB). buscou investigar em duas situações de
suelibarros13@gmail.com. brincadeira a compreensão e a apropria-
ção cultural de papéis e valores relaciona-
dos ao gênero em crianças de 3-4 anos.
LT01-1045 – A COMPREENSÃO DE Ambas foram realizadas em um Centro
GÊNERO EM CRIANÇAS EM DUAS Municipal de Educação Infantil (CMEI)
SITUAÇÕES DE BRINCADEIRA do Recife, que atende prioritariamente
Melina de Carvalho Pereira - UFPE a famílias de camada de renda baixa e
melinacpereira@yahoo.com.br média. Na primeira situação, as crianças
Pedro Paulo Bezerra de Lira - UFPE compuseram trios que foram videogra-
pedropaulo_v@yahoo.com.br vados em brincadeira livre, perfazendo
Maria Isabel Pedrosa - UFPE um total de 22 sessões. A sala foi pre-
icpedrosa@uol.com.br viamente organizada com brinquedos e
Financiamento: PIBIC/UFPE/CNPq - PIBIC/ sucatas, constando, entre outros, obje-
FACEPE/CNPq tos socialmente marcados pelo gênero
(bonecas, carrinhos, pulseiras, gravata,
Corsaro (2009) denomina reprodução in- etc.). A outra situação consistiu em ofici-
terpretativa o processo pelo qual a crian- nas de brincadeira com grupos de quatro
ça ativamente se apropria, com seus pa- ou cinco crianças, sendo quatro oficinas
res de idade, de informações do mundo de meninos e quatro de meninas. A cada
adulto, reconstruindo-as, com potencial grupo sugeriu-se brincar de casinha com
de alterações e mudanças culturais, que os seguintes ‘personagens’ previamente
atendem aos seus interesses enquanto definidos: pai, filho, mãe e filha. Não foi

989
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

indicado pelos pesquisadores que papel Nessa direção, os distintos procedimen-


cada criança deveria desempenhar, tam- tos permitiram alçar informações dife-
pouco qual seria o quinto ‘personagem’. renciadas, por vezes, complementares.
Chama-se atenção, entretanto, que exis- Nas oficinas se partia, desde o seu início,
tiam papéis de gênero diferente do da do convite do pesquisador a uma entrada
criança a serem desempenhados, uma numa situação de faz de conta de casi-
vez que as oficinas eram formadas ou nha, com a escolha de ‘personagens’ e a
somente por meninos ou somente por oferta de objetos que proporcionassem o
meninas. Esse planejamento foi feito no clima lúdico. A situação, então, como um
intuito de promover uma situação que todo, era ‘de mentirinha’. Qualquer ação,
instigasse a discussão e o posicionamen- objeto manipulado, etc. fazia parte do
to do grupo em relação às questões de contexto; tudo convergia para um enredo
gênero, pois, concebendo a criança como de fantasia. Diferentemente, na situação
intrinsecamente motivada para o brincar de trio, apesar de ser um setting lúdico,
(Pedrosa, 2005), tinha-se a expectativa de com objetos disponíveis para livre ma-
que ela iria enfrentar e negociar conflitos nuseio, o faz de conta não estava posto
para participar de uma atividade lúdica. de antemão, embora pudesse ser ocasio-
Para incitar a brincadeira de faz de con- nalmente criado ao longo da sessão. Essa
ta e a caracterização dos ‘personagens’, diferença entre as duas situações talvez
estavam à disposição dos participantes ajude a esclarecer a observação, nos trios,
roupas e outros objetos relacionados ao de maior recriminação das crianças aos
tema casinha. Um dos pesquisadores es- parceiros quando estes ‘transgrediam’
teve encarregado de instigar as crianças a as normas da macrocultura em relação
participarem da brincadeira, escolherem ao gênero. A crítica ao outro serviu mui-
os ‘personagens’, solucionarem possíveis tas vezes como estratégia de constrangi-
conflitos gerados, etc. A análise de ambas mento para obtenção de um objeto com
as situações teve um caráter microgené- o argumento de que ele era ‘de menino’
tico e partiu da seleção de episódios, ou ou ‘de menina’ em oposição ao gênero da
seja, segmentos de videogravação em criança que o possuía. Os meninos foram
que foram recortadas interações cons- alvo de maior número de ‘xingamentos’
pícuas com a temática de gênero. Nas e demonstraram maior incômodo com
duas situações observou-se expressivo isso. Nas oficinas, observou-se menos re-
envolvimento das crianças em brincadei- criminação social ao comportamento de
ras e discussões relacionadas ao gênero crianças que assumiam ‘personagens’ do
e foram evidenciadas compreensões de gênero oposto. Somente em 24% dessas
elementos da macrocultura no grupo de situações não ficou evidente a aceitação
brinquedo (Carvalho & Pedrosa, 2002) do(s) parceiro(s); nas demais ocorrências
no que diz respeito, por exemplo, ao re- houve sugestão ou concordância de pelo
conhecimento de papéis e objetos social- menos um deles. Ao assumir o papel do
mente marcados como masculinos ou fe- gênero oposto, houve maior necessidade
mininos. Realça-se, entretanto, que cada de negociação. Pode ser citado o exem-
procedimento de coleta permitiu ganhos plo de uma garota que afirmou ser “o pai
circunscritos ao seu escopo de realização. de mentirinha”, embora não precisasse

990
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dessa ressalva ao assumir ‘personagens’ LT01-1198 – PREFERÊNCIAS POR ESPAÇOS


considerados femininos. Percebeu-se dis- PARA BRINCAR ATRAVÉS DE FOTOS: UM
ponibilidade imediata dos participantes ESTUDO EM 3 CIDADES DA BAHIA
para desempenharem um papel do seu Silvia Sales Medeiros - UFBA
gênero, mais precisamente um ‘perso- silvias.med@gmail.com
nagem’ de autoridade (mãe para meni- João Gabriel Nunes Modesto - UFBA
nas e pai para meninos). Observaram-se jg.modesto@gmail.com
estratégias e artifícios das crianças para Dhiego Alves França - UFBA
não assumirem papéis do gênero opos- dhiegopsi@gmail.com
to por meio de rearranjos da proposta Ilka Dias Bichara - UFBA
- repetição, criação ou exclusão de ‘per- ilkadb@ufba.br
sonagens’. Os achados apontam para a Financiamento: FAPESB
dificuldade de assumir o ‘personagem’
da brincadeira quando ele fez parte de A importância do brincar tem sido um
negociação entre participantes e corro- tema bastante discutido, sobretudo por
boram ainda a ideia de que a criança é estudiosos da Psicologia do Desenvolvi-
intrinsecamente motivada para o brincar, mento. As investigações neste campo têm
pois mesmo lhe sendo imposta uma re- resultado em perspectivas diversificadas
gra, aparentemente conflituosa, ela se e muitas vezes conflitantes acerca da fun-
utiliza de meios de se safar daquela regra cionalidade da brincadeira. Embora não
para que a atividade lúdica seja mantida. haja um consenso a esse respeito, alguns
O não assumir um determinado papel autores como Pellegrini e Smith (1999),
mostra o quanto as crianças se importam propõem o brincar enquanto um com-
com os ‘personagens’ que vão represen- portamento que prescinde a obtenção de
tar na brincadeira e as suas concepções benefícios futuros (um fim), ao invés dis-
de gênero que embasam tais comporta- so, o valor reside no brincar pelo brincar,
mentos. Observaram-se, nas duas situa- ou seja, no processo (meio) de realização
ções de coleta, outros elementos da ma- da brincadeira. Outra consideração muito
crocultura trazidos pelas crianças durante cara ao presente estudo é a de que o brin-
a brincadeira. É a partir do envolvimento car, embora seja uma prática constante na
no enredo lúdico que se torna possível espécie humana, não acontece sempre
reconstruir significações advindas da rea- da mesma maneira. Dito de outra forma,
lidade compartilhada entre os parceiros. o brincar varia conforme com o contexto.
As duas situações examinadas permiti- Assim, a concretização de uma brincadeira
ram observar que as crianças flexibilizam pressupõe adaptação a uma série de fato-
regras compartilhadas socialmente e evi- res contextuais tais como, espaço físico,
denciar seu envolvimento na temática do tempo, quantidade de brincantes, regras,
gênero. etc. Neste universo, o contexto se destaca
em termos de importância para esse estu-
Palavras-chave: compreensão social; do, porque diz respeito também aos espa-
marcadores de gênero; interação de crianças. ços utilizados pelas crianças durante ativi-
Contato: Melina de Carvalho Pereira (UFPE) - dades lúdicas, podendo os mesmos serem
melinacpereira@yahoo.com.br escolhidos por elas ou não. Bichara (2006)

991
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cita a existência de delimitações implícitas crer que existem “lugares para crianças”
e/ou explícitas por parte da criança que (places for childrens) e “lugares das crian-
se propõe a brincar. Pode-se inferir, deste ças” (children´s places). Assim, os espaços
modo, que o estabelecimento de uma si- mais apropriados (lugares das crianças)
tuação de brincadeira implica em escolhas. para as brincadeiras nem sempre são os
No entanto, cada vez menos os brincantes formais, planejados por adultos (espa-
têm liberdade suficiente para realizar tais ços para crianças), embora estes possam
demarcações uma vez que os espaços ex- coincidir em determinadas situações. Os
ternos, sobretudo nas grandes cidades, estudos sobre a utilização de espaços para
tornam-se cada vez mais inapropriados brincadeiras, principalmente em ambien-
como consequência dos perigos que os tes abertos, geralmente estão mais volta-
mesmos oferecem (Bichara e cols, 2006), dos para os arranjos que pais e professores
dentre os quais se destaca a violência. A podem fazer para facilitar que as crianças
sensação de insegurança vivida por pais brinquem ou para incentivar alguns tipos
e responsáveis repercute no modo como de brincadeiras. No entanto, o presente
as crianças vivenciam suas atividades co- estudo investe em uma perspectiva dife-
tidianas e tem reforçado uma tendência renciada baseando-se nos pressupostos
marcante da interferência dos adultos na de Rasmussem (2004) de dar voz à crian-
realização das brincadeiras. Pais, educado- ça. Investigar como as crianças apropriam
res e poder público parecem tentar aten- e ressignificam espaços diversos (tanto os
der à demanda das crianças por atividades privados como sua casa ou escola, quan-
lúdicas e ao mesmo tempo atender à de- to àqueles públicos como ruas, parques e
manda do mundo adulto de manter certa praças) se constituiu como um interessan-
vigilância às crianças (a fim de garantir-lhes te meio de obter conhecimento sobre a
mais segurança). Para tanto, delimitam relação da criança com o espaço. Associa-
espaços formais destinados às brincadei- do a isto, a literatura específica relaciona
ras (Mekideche, 2005, Karsten, 2003) tais faixa etária, gênero e status socioeconô-
como parquinhos e playgrounds. As crian- mico como sendo variáveis definidoras de
ças, porém, como indivíduos ativos tanto diferenças associadas á usos dos espaços
se adaptam aos espaços formais (que, em brincadeiras, assim, meninos preferi-
em geral, são reduzidos) como também riam espaços amplos e brincadeiras com
se apropriam de espaços pouco conven- muita movimentação, enquanto meninas
cionais dando-lhes nova configuração. Tal prefeririam espaços mais restritos e brin-
tendência criativa foi comprovada por Ras- cadeiras com grandes cenários e enredos
mussen (2004) em seus estudos na Dina- mais longos. O objetivo do presente traba-
marca. Através da perspectiva das próprias lho de pesquisa foi investigar a relação de
crianças, o autor investigou a preferência crianças de 4 a 10 anos, residente em cida-
delas em relação aos espaços para realiza- des do interior da Bahia, com seu espaço
ção das brincadeiras. Com este objetivo, de brincadeiras sob o olhar dela própria.
Rasmussen (2004) utilizou um método no Para tanto se utilizou a mesma metodo-
qual os participantes fotografavam suas logia adotada por Rasmussen (2004) que
predileções em três ambientes distintos: consistia em solicitar que as crianças fo-
escola, casa e rua. Seus achados levam a tografassem seus lugares preferidos para

992
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

brincar em casa, na escola e fora de casa e Ades (2007) discute a relevância de o


da escola. Para tal, lhes era fornecida uma pesquisador debruçar-se, de modo mi-
máquina fotográfica descartável, instru- nucioso, sobre as situações cotidianas a
ções sobre o manuseio e objetivos da pes- fim de alçar dados que esclareçam certos
quisa. Após essa etapa, o filme era revela- fenômenos em estudo. Seguindo essa
do e se retornava a criança para que esta perspectiva, Pedrosa (2005), em seus es-
fornecesse esclarecimentos sobre os locais tudos sobre competência social infantil,
fotografados, as brincadeiras efetivamen- realça o espaço da brincadeira como um
te brincadas neles com quem brincavam, lugar primordial para observar crianças,
entre outras informações que ela julgasse uma vez que estas, seguindo o curso de
relevante. A amostra foi composta por 25 suas motivações, se esforçam para brin-
participantes (13 meninos e 12 meninas) car com os parceiros, mesmo quando ain-
com idade média de 8,04 anos. As crianças da não conseguem enredar verbalmente
residiam nas cidades de Barreiras, Vitória o caminho que organiza suas ações em
da Conquista e Feira de Santana. Os acha- face dos propósitos do brincar. Esse enre-
dos principais desta pesquisa corroboram do é construído com as próprias ações e
o que é apontado pela literatura: i) em mímicas, gesticulações, gritinhos, risos e
casa, meninas preferem brincar em locais choros, entre outros recursos, que infor-
mais reservados e meninos em locais mais mam o que está em pauta entre as crian-
amplos; ii) meninos utilizam mais do que ças. O pesquisador da criança torna-se
meninas as ruas como cenários para brin- um “oportunista”, capturando todas as
cadeiras, iii) na escola, meninos preferem
pistas possíveis para compreender as sig-
locais mais abertos e as meninas preferem
nificações subjacentes. Tomasello (2003),
locais menos movimentados. As crianças
em um estudo comparativo entre pri-
do interior demonstraram imensa capaci-
matas humanos e não humanos, aponta
dade criativa esboçada na transformação
que os primeiros são seres intencionais e
dos espaços com a finalidade de realizar
causais, e conseguem olhar seus coespe-
suas atividades lúdicas. Esses achados se
cíficos também como seres de intenções.
juntam a outros obtidos pelo mesmo gru-
po de pesquisa na cidade de Salvador que Segundo o autor, agentes intencionais
indicam resultados semelhantes. são seres que assumem posições ativas
nas escolhas de meios comportamentais
Palavras-chave: espaços de brincadeira, e na direção de sua atenção em função
preferências, ressignificação. dos objetivos a serem alcançados. Este
autor aponta duas vantagens iniciais por
se ter um raciocínio causal/intencional: a
LT01-1199 – CONFLITOS E RESOLUÇÕES primeira seria a capacidade de resolução
EM BRINCADEIRAS DE CRIANÇAS COM de problemas de maneira mais criativa e
3-4 ANOS flexível; a outra, seria um melhor desem-
Mayara Lacerda de Mello - UFPE penho em controlar e prever eventos,
mayara__mello@hotmail.com como por exemplo, distrair o parceiro
Maria Isabel Pedrosa - UFPE para que este não consiga obter um ob-
icpedrosa@uol.com.br. jeto que seja almejado por ambos. Como
Financiamento: CNPq seres que olham o mundo a partir de um

993
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

viés intencional, as crianças podem infe- esses recortes, tinha-se a expectativa de


rir um possível comportamento do ou- se observar negociações e estratégias
tro, estando assim mais preparadas para para a resolução desses impasses. Em
ajustarem seu próprio comportamento seguida, a transcrição e análise microge-
de acordo com o posicionamento do par- nética desses episódios foram realizadas.
ceiro. Apoiado neste referencial teórico Um exemplo desses procedimentos pode
e levando em consideração as situações ser aqui relatado de modo a ilustrar o tra-
que parecem maximizar ganhos observa- balho empreendido. O episódio foi deno-
cionais, o presente trabalho teve como minado de Tentativas de negociação. Lica
objetivo examinar o uso de estratégias (menina de 3 anos e10 meses) pega uma
sociais em crianças de 3-4 anos para a das bonecas que está próxima a Tâmara
consecução de objetos que compunham (menina de 3 anos e 9 meses), enquanto
um setting lúdico compartilhado e que esta está distraída, e começa a penteá-
eram de interesse de seus parceiros. Des- -la. Logo depois, Tâmara pede: “me dá a
se modo, caracterizava-se uma situação minha boneca, Lica. Me dáá”. “Tiooo, ela
de conflito instaurada no grupo. Estraté- quer ficar com duas bonecas” Lica diz e
gias são aqui consideradas formulações olha para o pesquisador. “Mai (mas) eu
feitas de modo intuitivo, em uso, postas não tenho pente” Tâmara replica. “Oa
à prova na interação e que terão na ação um pente aqui que eu achei”, Lica pega
do outro os parâmetros para os ajustes o pincel de barbear e demonstra como
que se fizerem necessários à ação pró- usá-lo; depois o põe perto de Tâmara,
pria (resposta). Não se tratam, portanto, oferecendo-o. Tâmara não o aceita. Tâ-
de formulações conscientes (MEDEIROS, mara insiste, Lica responde: “Eu peguei
2011). Para isso, foram observadas e vi- primeiro”. Adiante, Tâmara diz: “Me dá
deogravadas 17 crianças, de ambos os aí Lica, depois eu te dou esse pente aí”.
sexos, com idade entre 3-4 anos, de um Lica diz: “Não”. Tâmara apela à autori-
Centro Municipal de Educação Infantil dade do pesquisador, “ô tio, ela não quer
(CMEI) da cidade do Recife. Foram rea- me dá” Quando Lica deixa o pente sobre
lizadas 11 sessões de trios de crianças, a mesa, imediatamente, Tâmara o pega.
convidadas a brincarem em uma sala da Lica percebe e tenta reavê-lo, mas Tâma-
instituição preparada para as observa- ra deixa, em troca, o batom. Lica o pega,
ções. Sobre uma mesinha, foram disponi- manipula-o, e fala: “depois tu me dá, o
bilizados brinquedos e sucatas sugestivos pente?”. Tâmara diz baixinho: “Dou”. Tâ-
de um espaço de faz de conta. As sessões mara começa a pentear a boneca. Vê-se
tinham duração de 20min e os trios eram que a noção de troca de objeto aparece
organizados aleatoriamente, com repe- em dois momentos no episódio. A pri-
tição de crianças em até três sessões. A meira situação não é tão explícita, para
pesquisadora esteve presente realizando isso, destaca-se a fala de Tâmara “mai
as videogravações. A análise partiu da ob- (mas) eu não tenho pente”, quando Lica
servação repetida desses registros para pega uma de suas bonecas. Tâmara pa-
identificar possíveis episódios, ou seja, rece querer propor uma negociação: ela
segmentos que apresentavam situações não se importaria em ceder uma das bo-
de conflitos por disputas de objetos. Com necas se Lica cedesse seu pente – seria

994
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

uma troca. No último momento do epi- LT01-1200 – ESTRUTURA, REGRAS


sódio, Tâmara consegue pegar o pente EXPLÍCITAS E IMPLÍCITAS EM
aproveitando-se da distração da parcei- BRINCADEIRAS DE FAZ DE CONTA: UM
ra e quando esta tenta reaver o objeto, ESTUDO EXPLORATÓRIO
Tâmara lhe dá o batom – como ‘moeda João Gabriel Nunes Modesto - UFBA
de troca’. Essa estratégia parece eficaz, jg.modesto@gmail.com
pois Lica tenta negociar a futura posse Silvia Sales Medeiros - UFBA
do pente (“depois tu me dá, o pente?”). silvias.med@gmail.com
Há outras formas de negociação: quando Ilka Dias Bichara - UFBA
Lica percebe o interesse de Tâmara em ilkadb@ufba.br
seu pente, ele já apresenta uma solução
e propõe a utilização do barbeador como O mundo infantil não pode ser investiga-
pincel. Tâmara, mais adiante, retoma as do sem que se faça referência ao brincar.
negociações (“Me dá aí Lica, depois eu A existência de diferentes brincadeiras em
te dou esse pente aí”). As duas parceiras diferentes culturas, e até mesmo em ani-
também utilizam a estratégia de apelo à mais, permite que se considere a presença
autoridade e Lica traz a noção de justifi- de alguma predisposição biológica para a
cativa de posse (“Eu peguei primeiro”). realização desta atividade (Pontes, Bicha-
Esse episódio, entre vários outros ana- ra e Magalhães, 2006). A brincadeira de
lisados, apresenta a criança como um faz de conta, por sua vez, é considerada
parceiro competente socialmente para estritamente uma atividade humana por
ajustar suas estratégias em função do ou- utilizar meta-representação (Leslie, 1987),
tro, tentando resolver ou “prevenir” situ- ou seja, a realidade é fantasiada mental-
ações de conflitos. Notam-se estratégias mente. Lillard (2001) aponta que além da
de negociação, justificativas, incluindo existência de uma meta-representação,
ajustes no enredo da brincadeira, impo- é necessária, no faz de conta, a projeção
sição pela alteração de voz, apelo à au- dessa representação mental na realidade,
toridade do adulto, distração do parceiro assim como a consciência, por parte do
entre outras, a fim de conseguir o objeto brincante, do que é real e do que é ima-
de interesse. O uso dessas estratégias ginário. Para o presente estudo, interessa
por crianças já foi indicado em vários tra- analisar o fazer de conta em grupo, o que
balhos do desenvolvimento infantil (cf., implica que a realidade fantasiada men-
por exemplo, LEAL, 2004). talmente seja partilhada com os demais
brincantes, nesse sentido, as crianças de-
Palavras-chave: brincadeira infantil; vem ter um certo desenvolvimento cogni-
estratégias comportamentais; disputa de tivo e lingüístico (Andresen, 2005). Nesta
objetos. modalidade de brincadeira, há dois tipos
Contato: Mayara Lacerda de Mello (UFPE) - de mensagens: uma sobre a natureza da
mayara__mello@hotmail.com atividade (que se trata de uma simulação);
e outra referente ao conteúdo da brinca-
deira (a criança diz ser um policial), sendo
que toda comunicação no faz de conta é
chamada metacomunicação (Andresen,

995
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

2005). A metacomunicação emerge então implícitas seriam: 1) a distinção realidade/


como responsável pela organização da fantasia deve ser mantida; 2) os jogadores
brincadeira, ao passo que inicia, mantém devem envolver uns aos outros no jogo;
e termina a atividade. Apesar de estudos 3) a sequência do jogo deve ser mantida
sobre o faz de conta terem contribuído por meio da adição e aceitação das pro-
com a compreensão de sua importância postas dos outros. Para fins da coleta de
para o desenvolvimento infantil, há uma dados, dois pesquisadores, devidamente
lacuna no conhecimento na área: existe treinados em observação e no uso de fil-
escassa literatura que trate da estrutura madora, foram a campo, sendo que um era
e regras no faz de conta. Admite-se, como responsável pela filmagem e o outro pelo
pressuposto, que as regras, principalmente registro cursivo dos episódios. Finalizada
as implícitas, parecem contribuir com a es- a observação, as crianças eram entrevista-
truturação da brincadeira de faz de conta. das para maiores esclarecimentos sobre a
Nesse sentido, o objetivo deste estudo é brincadeira. Os sujeitos de pesquisa foram
descrever as principais regras, explícitas e escolhidos por acessibilidade, sendo que a
implícitas, em episódios de brincadeiras de família das crianças, e estas mesmas, eram
faz-de-conta, buscando identificar elemen- esclarecidas sobre a finalidade do estudo e
tos estruturais das mesmas, citando os consentiam a participação. Foram analisa-
papéis assumidos, analisando o processo dos, através dos métodos combinados de
de negociação e verificando aspectos que análise microgenética das filmagens e aná-
determinam o início e o fim dos episódios. lise de conteúdo das transcrições e regis-
Para tal, entende-se como estrutura da tros observacionais, três episódios, sendo
brincadeira os elementos gerais que per- dois de grupos de meninos e um de grupo
mitem perceber uma determinada ordem misto, sendo cada grupo composto por 3
ou organização da brincadeira em questão, brincantes. As idades dos sujeitos varia-
de modo que se possa identificar relações ram de 4 a 9 anos. O tempo de observação
entre outras brincadeiras de natureza se- variou em função do tempo que as crian-
melhante, e assim, perceber as caracterís- ças destinavam ao faz de conta. Os princi-
ticas ou as funções ou o funcionamento pais achados do estudo, até o momento,
do todo (Pontes e Magalhães, 2002). Para apontam para possíveis reavaliações e
fins de comparação, os resultados prelimi- desdobramentos das regras propostas por
nares do presente estudo serão discutidos Curran (1999), como, por exemplo, no que
a partir do estudo de Curran (1999) sobre concerne à regra explícita 1. Observamos
regras em faz de conta. Para o autor, o faz que nos episódios analisados, o critério
de conta é composto pelas regras explíci- para ser líder era a idade, não importando
tas: 1) um líder (diretor) chega primeiro à quem chegou primeiro ao local, ou quem
área designada para a brincadeira ou é o deu a primeira sugestão atraente, a crian-
primeiro a sugerir idéias atraentes para a ça mais velha era identificada como a líder.
trama; 2) todas as crianças devem pedir Nos grupos de meninos, estes afirmaram
para brincar; 3) todas as crianças devem que, necessariamente, a palavra final é
ter um papel na sequência/sucessão do do mais velho, enquanto no grupo misto,
fazer de conta; 4) todas as crianças de- as crianças admitiram haver um processo
vem brincar regularmente. Já as regras de negociação maior entre líder e demais

996
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

brincantes. Os episódios permitem ainda e prolongados desde a infância (Bichara,


avaliar a importância do líder na delimita- Lordelo, Carvalho & Otta, 2009). Os pri-
ção dos papéis, e no início da fantasia. Veri- meiros registros da associação entre brin-
ficou-se também que grupos com alto grau cadeira e infância foram obtidos por meio
de intimidade estruturam o faz de conta de de escavações e datam da época em que
maneira mais sutil, a partir de comandos e o meio de sobrevivência da nossa espécie
vocalizações indiretas. O presente estudo, era predominantemente a caça e a coleta
ainda com dados preliminares, parece pro- (Pontes & Magalhães, 2002). Na contem-
missor em contribuir para um melhor en- poraneidade, considera-se que o brincar
tendimento do fenômeno do faz de conta. tem um valor imediato à infância (Pelle-
grini & Smith, 1998), possuindo um papel
Palavras-chave: faz-de-conta, estrutura da de extrema relevância para o desenvolvi-
brincadeira, regras. mento global da criança, assim como em
seus aspectos motor, cognitivo, afetivo
e social (Cordazzo, Martins, Macarini &
LT01-1292 - BRINCADEIRAS CANTADAS: Vieira, 2007; Gosso, Morais & Otta, 2006;
REFLEXÕES SOBRE CULTURA E Johnson, Christie & Yawkey, 1999). A brin-
DESENVOLVIMENTO cadeira é um fenômeno complexo e, ape-
Côrtes Andrade - UFBA sar de facilmente reconhecível ao ser ob-
andrade_nara@yahoo.com.br servada, sua definição não é consensual na
Neri Côrtes - UFBA literatura, sendo que uma definição única
cleliacn@yahoo.com.br faz-se muitas vezes insuficiente. Burghardt
(2005) considera cinco características prin-
A brincadeira e a música são fenômenos cipais que, em conjunto, ajudam a identifi-
universais e intrinsecamente ligados ao car o brincar: 1) trata-se de um comporta-
desenvolvimento infantil e suas manifes- mento espontâneo, voluntário, prazeroso,
tações são extremamente diversificadas recompensador e com fim em si mesmo;
conforme os contextos ecossocioculturais sendo que 2) tem utilidade imediata limi-
em que ocorrem. A prática coletiva brin- tada, referindo-se à ocorrência do com-
cadeiras, assim como dos jogos, sempre portamento fora do contexto original; 3)
esteve presente na história das diferen- difere temporalmente e estruturalmente
tes sociedades e sempre foi reconhecida das atividades funcionais; 4) é repetitivo,
como parte da infância (Pontes & Maga- porém não estereotipado e, 5) se manifes-
lhães, 2002). O brincar é inerente à espé- ta em situações em que o indivíduo não
cie humana ocorrendo em todas as faixas tem como foco necessidades motivacio-
etárias, contextos sócio-econômicos e nais primárias e está livre de stress. Apesar
culturais, encontrando-se presente tam- do fenômeno da brincadeira ser universal
bém em outras espécies, especialmente na espécie humana, sua manifestação é
mamíferos e algumas aves. Entre huma- extremamente diversificada conforme os
nos, as brincadeiras emergem a partir da contextos em que ocorrem. Neste sentido,
complexidade cada vez maior da espécie e os sistemas culturais são elementos fun-
da interação e adaptação ao meio, através damentais para a compreensão do brincar
de processos de aprendizagens complexos entre crianças. Desde os romanos, para os

997
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

quais Colere (cultura) significava cultivar o aprendizagens próprias, torna-se referen-


espírito como uma planta, ou seja, “uma cial constituinte na formação do sujeito.
autoeducação do indivíduo” natural, es- (Côrtes, 2001). Cada contexto cultural pos-
pontânea e cumulativa, a palavra cultura sui imagens consideradas expressivas com
passou por significações múltiplas em di- as quais a criança se relaciona, manifesta e
versos espaços, justificando várias cons- recria. Entre os povos tradicionais, as brin-
truções teóricas. A dimensão cultural nos cadeiras e jogos são formas de socializar e
referencia à própria humanidade e seu de- inserir a criança e ou adolescente em um
senvolvimento em diversas coletividades. contexto no qual aprenderá a respeitar
Enquanto experiência humana, a cultura é regras traçadas pelo grupo, estabelecer
universal, entretanto é singular, específica vínculos e relações para o reconhecimen-
e diversa para cada grupo humano. Nem to do outro e possibilitam a participação
mesmo dentro de um grupo ela pode ser na vida comunitária. Consideramos, como
considerada homogênea. Apesar de ser- pontuam os autores citados, que o univer-
mos iguais enquanto seres humanos, nos so lúdico dos cantos, brincadeiras, entre
diferenciamos na maneira com a qual nos outras expressões, são de fundamental im-
relacionamos e estamos no mundo (Cunha, portância para desenvolvimento humano
1994). Segundo a UNESCO (2002), cultura e, sobretudo, na infância. O ser humano é
é:conjunto dos traços distintivos espiritu- um ser brincante e a brincadeira é a mais
ais e materiais, intelectuais e afetivos que concreta forma de expressão da infância.
caracterizam uma sociedade ou um grupo A música, assim como a brincadeira, é um
social e que abrange, além das artes e das fenômeno universal, sendo um elemento
letras, os modos de vida, as maneiras de vi- recorrente em todas as culturas conhe-
ver juntos, os sistemas de valores, as tradi- cidas (Schellenberg, Peretz & Vieillard,
ções e as crenças (p.2). Os fenômenos cul- 2008) com a qual a criança interage com
turais mostram concomitantemente uma os diversos outros e consigo mesma. Ilari
estabilidade entre gerações, no decorrer (2007) salienta que este é um saber/fazer
do tempo e espaço, e uma dinamicidade cultural muito antigo e rico, sendo perme-
de continuo processo de mudança (Pontes ado por canções, danças, brincadeiras e
& Magalhães, 2003; Johnson et al, 1999). práticas musicais de temáticas, gêneros,
Trata-se de uma dimensão dinâmica que períodos e origens diversas que formam
ultrapassa um conjunto de traços, já que parte do patrimônio imaterial da cultura
estes são continuamente gerados. Entre humana. Muitas das brincadeiras observa-
sociedades ou em uma mesma sociedade, das entre crianças são permeadas por mú-
a heterogeneidade cultural no interior dos sicas e cantos, a exemplo da brincadeira de
variados espaços — concretos, imaginá- corda, brincadeiras de roda, amarelinha,
rios e cibernético — origina universos so- parlendas, jogo de bater palma, entre ou-
cioculturais semelhantes e diferenciados: tras. Entretanto, apesar da riqueza cultural
cultura infantil, cultura juvenil, cultura fe- do nosso país e da diversidade de brinca-
minina, cultura masculina, cultura familiar, deiras cantadas (aqui consideradas como
cultura escolar, cultura midiática. Cada es- brincadeiras que têm na música um dos
paço ecossociocultural, interagindo com os seus elementos estruturais), uma grande
demais, com seus conteúdos e formas de lacuna é verificada na literatura no que

998
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se refere aos estudos que têm estas como CO 21 - LT03


seu objeto, especialmente dentro da psi-
cologia, e, em específico da psicologia do
Educação Moral
desenvolvimento. Um levantamento bi-
bliográfico na base de dados virtual Scielo, LT03- 1064 - ENVOLVIMENTO DE
efetuado pelas autoras, constatou-se que CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM OS
dos 61 artigos que tiveram como palavra DIREITOS HUMANOS E SUA RELAÇÃO
chave de pesquisa “brincadeira”, apenas COM A EMPATIA
09 abordavam alguma dimensão da rela- Cleonice Camino - UFPB
ção entre música e brincadeira. Destes, cleocamino@yahoo.com.br - CNPq
dois referiam-se à presença de canto du- Anderson Mathias - UFPB
rante a brincadeira de faz-de-conta; cinco anderson.mathias@yahoo.com.br
apenas citavam brincadeiras cantadas, Julian Santos - UFPB
entretanto estas brincadeiras não eram ledjulian@hotmail.com
descritas e a sua dimensão musical não era Lívia Braga - UFPB
ressaltada ou discutida. Apenas um, dos liviabsc@yahoo.com.br
61 artigos, debruça-se um pouco sobre o Philomena Couras - UFPB
tema, descrevendo-as, sendo desenvolvi- menacouras@hotmail.com
do por Pinto e Lopes (2009). Ressalta-se, Nilton Formiga - Maurício de Nassau/PB
entretanto que nenhum dos artigos teve nsformiga@yahoo.com.br
as brincadeiras cantadas ou a relação en- Pablo Queiroz - UFPB
tre música e brincadeira como objeto de pabloqueiroz@live.co.uk
estudo. Concluímos, portanto que, apesar Lilian Galvão - UFCG
da presença significante e diversificada das liliangalvao@yahoo.com.br
brincadeiras cantadas entre crianças brasi- Leonardo Sampaio - UNIVASF
leiras, especialmente no que se refere às leorsampaio@yahoo.com.br
brincadeiras tradicionais, pouquíssimas
são as investigações na área da Psicologia Financiamento: CNPQ
que têm voltado seu olhar para questões
como: quais são as brincadeiras cantadas Este estudo investiga o quanto crianças e
presentes entre crianças e quais as suas adolescentes julgam que irão se envolver
variações em contextos culturais diversos? com a implementação dos Direitos Huma-
Quais as relações entre música e brincadei- nos – DH – e qual a relação desse envolvi-
ra na infância? Como as crianças, através mento com a empatia. Investiga, também,
das brincadeiras cantadas, mantém (re) se o envolvimento com os DH sofre influ-
significam, criam e transmitem cultura? ência de algumas características dos parti-
Quais as dimensões de gênero presentes cipantes como idade, sexo, tipo de escola,
nas brincadeiras cantadas? Como as brin- e gerações dos direitos. A perspectiva de
cadeiras cantadas expressam diversidade direitos de diferentes gerações é compre-
cultural brasileira? endida, nesta pesquisa, a partir de Lafer
(2009): 1ª geração: direitos individuais
Palavras-chave – Brincadeiras cantadas; (autonomia); 2ª geração: direitos sociais;
contexto cultural; desenvolvimento infantil. 3ª geração: direitos de grupos minoritá-

999
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rios (não ser discriminado) e 4ª geração: melhor planejamento de estratégias re-


direitos relativos ao meio ambiente. Os lativas à educação sobre os DH. Partici-
DH são definidos como princípios basea- param da pesquisa 282 estudantes, 144
dos na justiça social, que são elaborados e do sexo feminino e 138 do sexo masculi-
institucionalizados com a finalidade de re- no divididos em dois grupos de idade: o
gularem as relações sociais gerando bem- grupo I constituído por estudantes de 11,
-estar coletivo. Os DH têm sido estudados, 12 e 13 anos e o grupo II por adolescen-
no âmbito da psicologia social, sobretudo tes de 14, 15 e 16 anos, que freqüentavam
por Willem Doise que, a partir de uma vi- escolas públicas (N=174) e particulares
são psicossociológica, realizou, juntamen- (N=108). Todos os participantes respon-
te com seus colaboradores, várias pesqui- deram individualmente, em ambiente de
sas (Doise, Staerklé, Clémence & Savory, sala de aula, a perguntas sobre aspectos
1998; Spini e Doise, 1998; Doise, Spini e sócio-demográficos e a dois questioná-
Clémence, 1999; Staerklé e Clémence, rios; um contendo uma lista de 25 direi-
2004). No Brasil, Camino, Camino, Perei- tos que avalia o nível de envolvimento dos
ra e Paz (2004); Camino, Galvão, Rique & participantes com os DH, o outro, con-
Camboim (2005) e Camino, Galvão, Quiri- tendo uma lista de 24 itens, que avaliava
no, Moraes, Roazzi & Martin (2007) têm a capacidade empática dos participantes.
também estudado os DH nessa perspecti- As respostas para os itens dos dois ques-
va. O conjunto desses trabalhos tem con- tionários foram dadas em uma escala
tribuído para esclarecer várias dimensões tipo Likert, de cinco pontos, indicando o
referentes aos DH, como: representações, quanto o respondente faria alguma coisa,
conhecimento, envolvimento, princípios quando ficasse mais velho, para que todos
organizadores, e a relação dessas dimen- tivessem os direitos citados, ou o quanto
sões com variáveis sócio-demográficas e experimentava um certo sentimento. As
psicossociais (idéias de força, valores, ti- possibilidades de respostas variaram de
pos de justiça que os afetam, etc.). Dian- 1 (nada) a 5 (muitíssimo). Os dados foram
te da extensão dos aspectos já estudados analisados com: o teste “t” para medidas
sobre os DH, cabe destacar que a contri- independentes e medidas repetidas; uma
buição do presente estudo refere-se: a ANOVA; e a correlação de Pearson. Nos
consideração dos DH relativos ao meio- resultados, observa-se que: (1) os parti-
-ambiente e a não-discriminação, dentre cipantes apresentaram escores médios
os direitos de outras gerações, como pó- significativamente diferentes (p<.05) em
los de atração para um maior ou menor função das gerações de direitos: os direi-
envolvimento dos participantes com os tos sociais obtiveram o escore médio mais
DH; e a relação dos DH com a empatia. A elevado (M=4,21), que foi seguido dos
empatia é definida neste trabalho como escores médios dos direitos à autonomia
a capacidade do indivíduo de se colocar (M=3,91), dos direitos ao meio ambiente
no lugar do outro e sentir algo compatível (M=3,53) e dos direitos a não ser discrimi-
com o que o outro sente. Julga-se que a nado (M=3,49); (2) os escores médios dos
introdução desses aspectos no estudo so- participantes em relação aos DH não se di-
bre os DH possibilita, além de um maior ferenciaram em função do sexo; (3) os es-
conhecimento teórico sobre o tema, um cores médios dos participantes diferencia-

1000
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ram-se significativamente (p<.05) em fun- pertença à classe social desfavorecida, de


ção da escola que freqüentavam, tendo os maiores opressões sociais, de um poder
alunos de escola pública obtido escores menor de reivindicação e de constantes
médios mais elevados do que os alunos da catástrofes ambientais. Quantos aos estu-
escola particular em relação aos direitos dantes mais novos terem obtido um esco-
ao meio ambiente (M=3,72 e M=3,19), as re médio de envolvimento mais elevado
conquistas sociais (M=4,38 e M=3,95) e à em relação a todas as gerações de direi-
autonomia (M=3,97 e M=3,81); (4) os es- tos, acredita-se que tem a ver com o fato
tudantes de 11 a 13 anos obtiveram, em de, por serem mais jovens, não pensarem
relação à todas as gerações de direitos, nas dificuldades de participarem de lutas
escores médios mais elevados do que os e pelo fato de terem uma postura, em ge-
estudantes de 14 a 17 anos, sendo que os ral, mais afastada da realidade social. A
escores médios obtidos pelos estudantes correlação positiva encontrada entre os
mais novos e mais velhos foram, respec- DH e a empatia, pode ser explicada pela
tivamente, M=3,90 e M=3,39, em relação função motivadora da empatia em relação
aos direitos ao meio ambiente, M=4,47 e aos princípios de justiça (Hoffman, 2003;
M=4,14, em relação aos direitos sociais, Sampaio, 2007).
M=4,10 e M=3,85, em relação aos direitos
para a autonomia e M=3,85 e M=3,43, em Palavras-chave: direitos humanos, empatia,
relação aos direitos à não discriminação; jovens.
(5) ocorreu uma correlação positiva signi- Contato: Cleonice Pereira dos Santos Camino,
ficativa (r=.416; p<.05) entre a empatia e UFPB, cleocamino@yahoo.com.br
todos os direitos estudados. Diante desses
resultados, pode-se concluir que o fato
dos direitos de primeira e segunda gera- LT03 – 1245 - EDUCAÇÃO MORAL:
ção apresentarem escores médios mais A CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NO
elevados deve-se ao fato desses direitos ÂMBITO ESCOLAR
terem sido os primeiros a serem institu- Ana Lidia Felippe Guimarães - UFRJ
cionalizados. Quanto aos direitos relativos alfelippe@gmail.com
ao meio ambiente terem apresentado um Maria Judith Sucupira da Costa Lins - UFRJ
escore médio superior aos direitos de não mariasucupiralins@terra.com.br
ser discriminado, acredita-se que se deva a Monique Maiques de Souza Alves Rezende -
uma maior presença de movimentos eco- UFRJ
lógicos nas escolas do que de movimen- moniquemaiques@yahoo.com.br
tos relativos a não discriminação. A não
diferenciação dos DH em função do sexo Esta apresentação deriva de uma pesqui-
confirma estudo anterior (Camino e cols., sa com interesse pelas diferentes formas
2004). Os resultados referentes aos alunos possíveis de ensino e aprendizagem de Éti-
de escola pública apresentarem um esco- ca em escolas nacionais e internacionais,
re médio maior do que os alunos de escola cuja motivação estava não só na literatura
privada em relação a todos os direitos, po- específica, mas em observações continua-
dem ser justificados pelo fato dos alunos mente realizadas em diferentes instituições
de escola pública serem vítimas, pela sua neste mesmo foco. Dentre as escolas pes-

1001
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

quisadas, destacamos uma delas para esta gindo por longos períodos com os sujeitos,
discussão. Trata-se de uma escola pública em que partilha do cotidiano destes para
da rede municipal do Rio de Janeiro. O sentir o que significa estar naquela situa-
objeto da pesquisa é o ensino/aprendiza- ção (Alves-Mazzotti, 1998). Esta pesquisa
gem de Ética por meio da modalidade de se fundamenta na filosofia de Alasdair Ma-
Tema Transversal, conforme orientação dos cIntyre, considerado “um dos autores que
Parâmetros Curriculares Nacionais. Consi- tem escrito, de forma mais inteligente so-
deramos como hipótese que é possível se bre ética, constituído uma das vozes mais
ensinar e se aprender ética. Deste modo, autorizadas e singulares neste domínio”
partimos do pressuposto de que os pro- (Marques, 2006, p. 38). A obra do Filósofo
fessores podem contribuir na construção Alasdair MacIntyre se destaca pelo exercí-
da cidadania dos alunos visando a apren- cio da virtude na exigência de uma defini-
dizagem de Ética em suas práticas pedagó- ção clara em relação a questões sociais e
gicas. O processo ensino /aprendizagem da políticas. A Desordem Moral existente na
Ética representa um constante desafio para sociedade está especialmente ligada a um
os educadores. A observação de violência estado de emotivismo no plano da vida éti-
presente nas escolas é um fator que nos ca. O emotivismo é uma doutrina de juízos
leva a refletir sobre o ensino/aprendiza- morais pessoais de sentimento ou atitudes
gem de ética. Há uma “desordem moral” de prazer individual e de caráter valorativo
(Macintyre, 2001) na sociedade de tal or- (Macintyre, 2001). Em se tratando de edu-
dem que se faz necessária uma ação para cação e Ética a obra de Jean Piaget (1973)
que este quadro seja revertido. O ensino/ continua contribuindo, especificamente
aprendizagem de ética por meio de virtu- quanto à compreensão do desenvolvimen-
des é proposto (idem) para que a cidadania to do juízo moral da criança e do jovem. Se-
seja possível. Ao inserir a prática das virtu- gundo relato da professora regente da tur-
des no cotidiano escolar, o professor pode ma foi utilizado o livro “Histórias de Crian-
contribuir para a formação de cidadãos que ças”, cujo autor é Vinayak Krishna Gokak.
modifiquem este estado da sociedade. Os As histórias apresentadas neste livro propi-
objetivos desta pesquisa são os seguintes: ciam o trabalho sobre valores humanos e
observar como se organiza o processo de permite a construção da virtude, levando
ensino/aprendizagem da ética; e identi- deste modo o aluno à aprendizagem de Éti-
ficar a aprendizagem da ética nos alunos ca. Partindo de uma técnica de meditação
do terceiro ano do Ensino Fundamental. e apresentação oral das cenas positivas das
Trata-se de uma pesquisa qualitativa com histórias, nas quais os valores humanos são
base na metodologia da “Escuta Sensível” ressaltados, a professora conseguiu uma
desenvolvida na por René Barbier (1997). dinâmica nas aulas favorável ao ensino da
A Escuta Sensível promove uma prática de Ética. A partir desta dinâmica, observamos
compreensão e de explicação da práxis dos que os alunos conseguiam se concentrar,
grupos sociais de uma instituição de for- mostrando um comportamento contrário
ma que permite o conhecimento de cada ao inicial, no qual a turma se apresenta agi-
participante. Desta forma, a observação tada. No segundo momento há leitura de
participante, permite ao pesquisador se textos que apresentam mensagens de vida
torne parte da situação observada, intera- baseada na prática das virtudes. O terceiro

1002
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

momento se refere à atividade de desenho agir” (Brasil, 1998, p. 89). Concluímos que
sobre a história contada. No final da sema- a dimensão pedagógica nessa sala de aula
na (sextas-feiras) os alunos montavam um nos ofereceu condições de compreender a
mural com as suas produções. No segundo prática escolar e nos mostrou a realização
semestre estas histórias eram re-significa- do processo de aprendizagem da Ética que
das e a professora regente indagava se já apontaram a vivência prática das virtudes
haviam vivenciado algumas das histórias como orientação curricular. Considera-se
contadas, isto é, com questionamentos e que os objetivos inicialmente propostos
reflexões diante das situações morais co- foram alcançados, entretanto, destacamos
tidianas que surgiram no decorrer da sua que a formação Ética e Moral deve ser con-
prática. Esta pedagogia permite que além tinuada na prática escolar. Com a continui-
do desenho, os alunos passem a escrever dade de nossas observações, apresentare-
suas próprias histórias. A partir de nossas mos um quadro mais completo. Entretan-
observações, ressaltamos que a profes- to, é possível desde já afirmar que a pre-
sora regente, por seu agir com os alunos sença da Ética na prática pedagógica desta
demonstrou ter um compromisso social professora tem surtido efeitos positivos na
e político. Como exemplo, destacamos o vida dos alunos.
fato de um de seus alunos ter comparecido
à escola com marcas de agressão, por ter Palavras-chave: Ética, Educação Moral, Ensino/
sofrido violência doméstica pelo padrasto. Aprendizagem
A professora chamou da mãe e da avó que Contato: Monique Maiques de Souza A.
negaram relatando o fato de forma con- Rezende, UFRJ, moniquemaiques@yahoo.com.br
traditória. Diante da situação, a professora
escreveu um relatório relatando o estado
físico do aluno e a baixa freqüência nas au- LT03 – 1388 - A EDUCAÇÃO PARA OS
las. Em seguida, encaminhou o relatório ao DIREITOS HUMANOS: UMA ANÁLISE DA
conselho tutelar com apoio da direção, que PRÁTICA EDUCATIVA EM TRÊS ESCOLAS
inicialmente havia resistido a este procedi- PÚBLICAS DO DISTRITO FEDERAL
mento. A professora, no entanto, argumen- Divaneide Lira Lima Paixão - UCB
tou que havia ocorrido fundamentalmen- divaneide@ucb.br
te a violação dos direitos da criança. Com Tatiana da Silva Portella - UCB
esta atitude de perseverança e coragem, a tatiana@ucb.br
professora fortaleceu a dimensão Ética de Nina Cláudia de Assunção Mello - UCB
seus alunos que culminou em um trabalho nclaudia@ucb.br
sobre Estatuto da Criança e do Adolescen- Rosana Márcia Rolando Aguiar - UCB
te. Nesta prática pedagógica, a inserção zanaguiar@gmial.com
da Ética teve como objetivo conhecer e
reconhecer as atitudes pautadas por prin- Acredita-se que a escola, enquanto institui-
cípios de solidariedade, respeito, e respon- ção representante do Estado é reconheci-
sabilidade contribuindo para a construção da, consensualmente, como um lugar so-
da virtude da justiça e perseverança. “Ao cial privilegiado para o desenvolvimento de
ancorar a Educação Moral na vivência so- estratégias capazes de contribuir a médio
cial, reatam-se os laços entre pensar, falar e e longo prazo para a valorização dos direi-

1003
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tos humanos e, consequentemente, para a nizado, explosão de conflitos nas relações


redução dos altos índices de violação aos pessoais e intersubjetivas e, em especial,
direitos humanos no país, nesse sentido, o graves violações de direitos humanos. Em
estudo ora apresentado se propõe a inves- meio ao sentimento de insegurança, frente
tigar as práticas de ensino e aprendizagem a uma violência difusa, o cidadão comum é
em três escolas públicas do Distrito Federal colocado cotidianamente diante de estatís-
voltadas para a educação dos direitos hu- ticas assustadoras que retratam a violência
manos. A pesquisa também prevê a realiza- entre jovens brasileiros. Uma pesquisa re-
ção de ações integradas entre as escolas e alizada por Waiselfisz (2004) revela ainda
a universidade para intensificar as práticas que, em 2002, mais de 75% dos homicídios
pedagógicas capazes de promover a educa- foram causados por arma de fogo. Homicí-
ção para os direitos humanos. Este estudo dios, suicídios e acidentes automobilísticos
envolve três grandes temas, que têm a vio- são as causas das mortes de 59,9% dos jo-
lência como pano de fundo: direitos huma- vens do país. No ranking internacional de
nos, direitos das crianças e adolescente e homicídios de jovens, o Brasil fica em 5º
cidadania. Cada um desses temas abran- lugar entre os 67 países em que há levan-
ge distintas questões teórico-conceituais, tamentos semelhantes, atrás da Colômbia,
tornando-se necessário selecionar aque- Ilhas Virgens, El Salvador e Venezuela. Con-
las cujos debates se aproximaram mais da siderando a taxa de assassinatos cometidos
discussão educacional e psicossociológica contra a população em geral, o Brasil fica
que se pretende aqui erigir. Nesta direção, em 4º lugar, atrás apenas de Colômbia, El
entre as discussões teóricas procedidas Salvador e Rússia. Diante deste cenário, a
tratamos de elaborar uma reflexão acer- família, a sociedade e o Estado têm papel
ca da história jurídica brasileira e da efi- fundamental de orientar e educar para a
cácia das políticas de proteção à infância cooperação, à solidariedade, à tolerância,
e adolescência implantadas no Brasil, de para o respeito às diferenças e aos direitos
modo a promover a “lei e a ordem”, bem adquiridos pelos cidadãos na história jurídi-
como garantir os direitos fundamentais ca brasileira. A escola, enquanto instituição
da pessoa humana. Também mostrou-se representante do Estado é reconhecida,
importante proceder com uma discussão consensualmente, como um lugar social
sobre infância, adolescência e violência no privilegiado para o desenvolvimento de
cenário brasileiro, já que cotidianamente estratégias capazes de contribuir a médio e
esse tripé tem sido foco de reportagens longo prazo para a valorização dos direitos
e debates públicos, sendo extremamen- humanos e, consequentemente, para a re-
te importante para compor discussões no dução dos altos índices de violação aos di-
cotidiano das escolas, uma vez que a re- reitos humanos no país. Seja enquanto fru-
presentação acerca desses fenômenos in- to de uma construção histórica, seja como
terfere, sobremaneira, no trabalho voltado reação a uma conjuntura socioeconômica,
para as temáticas acima descritas. No con- tem-se, de fato, assistido ainda com mui-
texto da sociedade brasileira, mostram-se ta freqüência atos de violação dos direitos
crescentes as taxas de violência nas suas humanos, em especial dos direitos desti-
mais distintas modalidades: crime comum, nados às crianças e adolescentes, como se
violência fatal conectada com o crime orga- estes não fossem cidadãos, cujos direitos

1004
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

não precisassem ser respeitados, já que o cionais, por meio da aplicação de questio-
imaginário popular elege os jovens e ado- nários de livre associação e entrevistas de
lescentes como responsáveis pelo incre- grupo focal, bem como se utilizando dos
mento da violência urbana (Paixão, 2008). recursos da observação. As análises par-
Ser jovem em um mundo violento não é cialmente engendradas apontam que as
tarefa fácil e se a vida lhes tiver reservado estratégias e recursos utilizados pelos ato-
espaços de pobreza, de desigualdades e de res do cenário educativo, por vezes, não
repressão, a dificuldade só aumenta. Ao favorecem uma educação para valorização
examinar as políticas públicas voltadas para dos direitos humanos de um modo geral, e
o adolescente e para a juventude como um dos direitos das crianças e adolescentes de
todo, Castro e Abramovay (2002) atestam modo particular, uma vez que a própria ins-
mudanças positivas, com alguns avanços tituição escola é palco de violações aos di-
na área da juventude, ainda que existam reitos humanos, o que se percebe fruto de
ações sendo implementadas sem levar em posturas autoritárias e baixa qualificação
consideração a diversidade de direitos dos da adolescência como uma fase positiva.
adolescentes, o que é lamentável, já que Isto é, o modo como os atores do cenário
essa parcela da população vai ter que es- educativo concebem a adolescência e seus
perar ainda mais para ter seus direitos res- direitos parecem influenciar nas relações
peitados e a sociedade inteira continuará sociais que ocupam o ambiente escolar e
pagando por isso. As violações aos direitos nas praticas educativas ai desenvolvidas.
humanos, apesar de serem freqüentes e
amplamente divulgadas pelos meios de Palavras-chave: educação para os direitos
comunicação, como observa Cardia (1995), humanos, infância e adolescência, prática
não têm alcançado um debate mais amplo. educativa nas escolas públicas.
Assim, diante do exposto, cabe evidenciar
a importância e necessidade de trabalhos
voltados para a educação dos direitos hu- LT03 – 1389 - DIREITOS DOS
manos, especialmente nas escolas, cujo ADOLESCENTES: POSICIONAMENTOS
espaço e práticas devem ser favorecedores INDIVIDUAIS E GRUPAIS
do desenvolvimento da cidadania e das Divaneide Lira Lima Paixão - UCB
ações promotoras de desenvolvimento divaneide@ucb.br
pessoal, intelectual e social. O estudo da Angela Maria de Oliveira Almeida - UCB
DUDH, bem como do Estatuto da Criança e aalmeida@unb.br
do Adolescente (ECA) deve estar presente Financiamento: CAPES/CNPq
nas escolas brasileiras para despertar o in-
teresse de crianças e adolescentes pela te- Os direitos humanos se constituem em
mática, contribuindo para que, desde cedo, uma produção histórica, submetida aos
eles aprendam a respeitar os direitos das interesses das instituições que os definem
pessoas com as quais convivem e a exigir e cuja aplicação depende também dos Es-
o respeito que lhes cabe. A pesquisa utiliza tados. Os direitos humanos são os direitos
a uma abordagem qualitativa de estudo de fundamentais de todas as pessoas, sem
caso. Os dados estão sendo coletados com nenhuma distinção. Essa ótica, instituída
professores, alunos e orientadores educa- quando da elaboração da Declaração Uni-

1005
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

versal dos Direitos humanos (DUDH), de contra membros de minorias e outros


1948, coloca a condição de pessoa como grupos vulneráveis, de bases étnicas, na-
requisito único para a titularidade de di- cionais, religiosas e lingüísticas; além de
reitos, considerando o ser humano como, violações aos direitos fundamentais e aos
essencialmente moral, dotado de unicida- direitos internacionais humanitários. Seja
de existencial e dignidade. Tal Declaração enquanto fruto de uma construção histó-
foi criada com o propósito de atingir o ho- rica, seja como reação a uma conjuntura
mem todo e todos os homens e defende socioeconômica, tem-se assistido ainda
sua felicidade e bem-estar, tal como ob- com muita freqüência aos atos de violação
serva Piovesan (2005). Os direitos huma- dos direitos humanos, em especial dos di-
nos compõem uma racionalidade de resis- reitos destinados às crianças e adolescen-
tência, na medida em que revelam artifí- tes, como se estes não fossem cidadãos,
cios que abrem e estabilizam espaços de cujos direitos não precisassem ser respei-
luta pela dignidade humana, ideia central tados, já que o imaginário popular elege
para a compreensão dos direitos huma- os jovens e adolescentes como responsá-
nos. Para Doise (2002), a DUDH, logo após veis pelo incremento da violência urbana
a Segunda Guerra, evidenciou em seu (Paixão, 2008). Diante do cenário erigido e
corpo alguns princípios que não se res- da importância que esse tema assume na
tringem apenas à garantia de direitos dos atualidade, propõe-se com este trabalho
cidadãos, eles geram como conseqüência apresentar os resultados de uma pesqui-
uma responsabilização do Estado diante sa realizada com 288 policiais militares e
desses mesmos cidadãos. Esta Declara- 298 jovens estudantes do Distrito Federal,
ção não defende apenas as liberdades cujo objetivo foi identificar as possíveis
individuais como pensam alguns críticos. variações nos posicionamentos dos indi-
Na verdade, ela revela a necessidade de víduos e grupos acerca dos direitos dos
os Estados cuidarem para que se concreti- adolescentes. As análises foram realizadas
zem condições adequadas para o bom de- a partir dos dados obtidos pelas respostas
senvolvimento da igualdade social e a re- dos participantes com relação ao grau de
distribuição de recursos para garantir mi- responsabilidade de sete agentes sociais
nimamente a satisfação das necessidades (governo, escola, família, eu mesmo, au-
básicas dos cidadãos. O século XX deixou toridades judiciais, associação de volun-
uma trágica marca nos direitos humanos, tários e polícia) diante de 23 artigos da
conforme postula Trindade (1997). Nunca Convenção Internacional dos Direitos da
se verificou tanto progresso na ciência e Criança. De posse das médias obtidas com
tecnologia, acompanhado paradoxalmen- as respostas dos participantes à escala de
te de tanta destruição e crueldade. Persis- responsabilidade, buscou-se, identificar
tiram violações graves e maciças dos direi- padrões de respostas hierarquizadas que
tos humanos mesmo com todos os avan- pudessem ser agrupadas em diferentes
ços registrados na proteção internacional categorias. A média individual foi calcu-
destes. Continuam a ocorrer violações de lada para eliminar o efeito da pertença
direitos civis e políticos, como as liberda- sócio-profissional dos participantes. Se-
des de pensamento, expressão e informa- gundo Doise (2002) quando a média geral
ção; ocorrem ainda graves discriminações dos grupos (PMs e jovens separadamen-

1006
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

te) é subtraída da média individual de posicionamentos dos policiais diante dos


cada PM ou jovem, tem-se uma média direitos dos adolescentes ficam prejudica-
individual livre do efeito dessas pertenças. dos em função da sua pertença sociopro-
O posicionamento dos sujeitos quer em fissional, uma vez que são autorizados a
uma análise geral quer em uma análise in- fazer uso da violência (“legítima”) pelo Es-
dividual, possibilitou a organização de três tado, ao passo que são chamados a prote-
classes bem definidas, a saber: otimistas, ger os adolescentes. Já o posicionamento
céticos, paradoxais. Provavelmente, os dos jovens ancora-se na forma como eles
participantes que compõem a classe dos constroem a própria identidade a partir
Otimistas marcaram os valores do extre- do discurso presente na sociedade.
mo positivo da escala por acreditarem que
o respeito aos direitos dos adolescentes é Palavras-chave: direitos dos adolescentes,
algo que pode vir a acontecer com mais posicionamentos individuais e grupais,
intensidade desde que haja o compro- policiais militares e jovens estudantes.
metimento e envolvimento de todos os
setores da sociedade. O oposto acontece
com relação aos participantes alojados LT03 – 1415 - INTERVENÇÃO
na segunda classe que demonstram estar PSICOPEDAGÓGICA E PSICOLOGIA DOS
tomados por uma descrença generaliza- VALORES
da com relação à efetivação dos direitos Nelson Pedro-Silva - UNESP
dos adolescentes. A terceira classe, que nelsonp1@terra.com.br
tem o maior número de adeptos, apre- Anne Caroline Lima Pereira - UNESP
senta as respostas paradoxais atribuídas annecarolinelp@hotmail.com
pelos participantes. Aqui estão reunidos Bruna Gomes Garcia - UNESP
sujeitos que apresentam medias superio- bruna.gomes.garcia@gmail.com
res extremadas em algumas dimensões e Isis Bagnhatori Valsecchi - UNESP
médias inferiores igualmente extremadas isis_valsecchi@hotmail.com
em outras. A ocorrência dessas classes se
deu na mesma proporção, tanto na análi- Várias políticas educacionais foram im-
se do tipo “pancultural” quanto na análi- plantadas, com a intenção de melhorar o
se individual. É relevante evidenciar que, rendimento escolar, como a do Ciclo Bási-
de um modo geral, na análise individual, co. Apesar disso, o fracasso escolar (indis-
neutralizou-se o efeito da pertença sócio- ciplina, desinteresse, problemas de apren-
-profissional, portanto, é acertado con- dizagem e violência) continua a ser o fenô-
cluir que as diferenças de inserção social e meno mais grave a preocupar o sistema
profissional – ou seja, o fato de uns serem educacional brasileiro. Por esse motivo,
policiais e outros serem estudantes – não indagamos se uma intervenção psicopeda-
são os únicos fatores causadores de varia- gógica contribuiria para a superação desse
ção sistemática das respostas entre indiví- quadro. Segundo Ferreira (1986), a psico-
duos, fato também comprovado por Doise pedagogia, é definida como a “aplicação
(2002) ao eliminar o efeito da pertença da psicologia experimental à pedagogia”. A
nacional para sujeitos de 38 países. De um partir da década de 1980, ela passou a as-
modo geral os resultados apontam que os sumir novo significado e status no Brasil.

1007
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Tal mudança decorreu de sua intenção em Por exemplo, ainda há certos profissionais
se constituir como nova ciência, preocupa- que tendem – diante do fato de os alunos
da em estudar e em solucionar problemas não corresponderem as suas expectativas
de aprendizagem. Apesar destas defini- – rotulá-los de incapazes, chegando, inclu-
ções, entendemos Psicopedagogia como a sive, a excluí-los (eles permanecem na
área responsável pela formação de clínicos classe, mas é como se não existissem. Ape-
gerais das escolas; auxiliar do aluno na su- nas passa a ser considerado quando apre-
peração da fobia escolar e na construção senta condutas de indisciplina e/ou violen-
do desejo de saber, além de organizador tas). Com o passar do tempo, tais aprendi-
da vida escolar do aprendiz, auxiliar na zes acabam por internalizar a idéia da in-
aquisição dos conteúdos escolares tradi- competência. Assim, um problema decor-
cionais e no desenvolvimento psicológico. rente da relação professor/aluno, acaba
Por clínico geral, o psicopedagogo deve au- por se transformar em algo pessoal (uma
xiliar o docente e a escola a diagnosticar, fobia). Como afirma Macedo (1992, p.125),
intervir e encaminhar sujeitos que fracas- “o fracasso escolar produz fracassados.
sam na escola. Tal procedimento se justifi- Uma vez fracassado, mesmo que se com-
ca em razão de os docentes não estarem batam as causas desse fracasso, o indiví-
conseguindo realizar tal trabalho, por vá- duo dele vitimado tem problemas que pas-
rios motivos: falta de formação adequada; sam a ser pessoais.”. Outra função diz res-
número excessivo de alunos por sala de peito ao psicopedagogo auxiliar a criança a
aula; infra-estrutura material precária; re- desenvolver o desejo de construir conheci-
muneração aquém do necessário e desva- mento. Entendemos que, para isso, é ne-
lorização do trabalho docente. Em nossa cessário o estabelecimento do vínculo en-
prática, inclusive, observamos que vários tre a criança e o psicopedagogo, pois de
pacientes apresentavam problemas auditi- acordo com Freud (1909/1973) e Piaget
vos, oftalmológicos, fonoaudiológicos, de (1932/1994), só se aprende por amor a al-
coordenação motora, além dos afetivos, guém. Dessa forma, ao estabelecer o vín-
cognitivos e morais. Em razão disso, o psi- culo com o paciente e se esse, por sua vez,
copedagogo pode realizar um primeiro levar em consideração o nível de desenvol-
diagnóstico e, em decorrência, solicitar aos vimento, a probabilidade de ele seguir o
pais e/ou as instituições o encaminhamen- caminho indicado pelo psicopedagogo au-
to para especialistas. Quanto à fobia esco- menta, mas não necessariamente garante
lar, frequentemente as crianças acabam que tal fato acontecerá. Quanto a ser um
desenvolvendo um medo desmedido em auxiliar no processo de desenvolvimento e
relação ao aprendizado escolar. Acredita- de superação de seus problemas, não esta-
mos que esse temor decorra de algum fra- mos diminuindo a importância do trabalho
casso que o escolar tenha apresentado, do professor e a do psicopedagogo. Afinal,
uma ou reiteradas vezes, na própria insti- para que o desenvolvimento ocorra, é ne-
tuição. Ao malograr no seu intento, acaba cessário que o sujeito construa conheci-
internalizando-o como algo pessoal. Em mento, processo que ocorre internamen-
decorrência, afasta-se ou mostra-se, a par- te. Logo, ele é apenas provável no sujeito.
tir daquele momento, extremamente te- Segundo La Taille (1996, p.151-152), signi-
merário diante do referido aprendizado. fica dizer que “a construção é a única for-

1008
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ma de os homens se apoderarem dos di- e oficinas de leitura, escrita, ciências físicas


versos conhecimentos. Portanto, não se e humanas. Quanto ao procedimento, 1º
trata de opção pedagógica, mas sim de um realizamos triagem; 2º buscamos estabele-
mecanismo psicológico. [...] Vale dizer que cer vínculo com os sujeitos que estão em
o construtivista pensa que seja qual for o atendimento; 3º concomitantemente, rea-
método de ensino empregado, está haven- lizamos atividades com o fito de observar
do construção de conhecimento. [...]”. as suas condutas; 4º aplicamos as provas
Acontece que essas construções só são psicológicas; 5º oferecemos devolutiva aos
possíveis se o sujeito interagir com o meio. pais e/ou responsáveis; 6º realizamos ses-
Isso significa, na prática, que não é o do- sões de intervenção, cujo teor é o de auxi-
cente que ensina, mas é o aluno que liar às crianças a superarem seus proble-
aprende. Dessa forma, o sujeito poderá ou mas de aprendizagem, construir estruturas
não construir o seu conhecimento, inde- e valores que pautem pela vida boa; 7º
pendentemente do método pedagógico reaplicamos as provas psicológicas, com o
empregado e do professor. Auxiliar os alu- fim de verificar se a intervenção levou ao
nos a superarem o fracasso escolar; contri- desenvolvimento e/ou a superação das di-
buir para que eles sejam desejantes de sa- ficuldades escolares e dos problemas de
ber; propiciar situações que os levem a se conduta. Para a análise dos dados, eles fo-
desenvolverem afetiva, cognitiva e moral- ram transcritos para ficha padrão e, em
mente. São informantes, 21 sujeitos que seguida, foram montadas categorias exclu-
estão submetidas à intervenção psicope- sivas. Por fim, as analisamos segunda a Psi-
dagógica desde 2009, de ambos os sexos, cologia moral de Piaget (1932/1994) e a
com idade entre cinco e 14 anos, de nível dos valores, sistematizada por La Taille
sócio-econômico da classe D e que apre- (2002). No que se refere à cognição, foi
sentam problemas de aprendizagem e/ou possível verificar que, dos 21 sujeitos diag-
de comportamento. Para a avaliação do nosticados, 60% se desenvolveram cogniti-
nível de desenvolvimento, empregamos vamente. No início, alguns dos sujeitos não
provas derivadas do método clínico piage- conservavam quantidades, indicando que
tiano (Carraher, 1994), de realismo nomi- ainda não tinham construído estruturas
nal (Ferreiro, 1985), dilemas morais (Pia- operatórias (mostravam-se egocêntricas e
get, 1932/1994) e, eventualmente, testes com raciocínio transdutivo). Já no tocante
projetivos e observação das condutas no ao afetivo/moral, mais de 80% dos partici-
espaço da intervenção (resistência à frus- pantes se desenvolveram, sobretudo, no
tração, habilidade para lidar com desafios, que concerne ao respeito às regras, ao au-
segurança, capacidade de memorização e mento da resistência à frustração e da coo-
de concentração, relacionamento com os peração entre os membros do grupo, além
membros da intervenção, coordenação do desenvolvimento de virtudes (generosi-
motora; compreensão das explicações da- dade, justiça e prudência). Isso não signifi-
das, capacidade de comunicação, discipli- ca que eles são autônomos, no sentido
na e senso crítico). Quanto ao trabalho, o piagetiano. Apenas indicia que construí-
desenvolvemos em grupo, duas vezes por ram valores necessários a auto determina-
semana (de 1h30m). As atividades realiza- ção e, por conseqüência, acabaram se
das envolvem jogos regrados, “bate-papo” mostrando menos heterônomos. Quanto à

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

leitura e a escrita, quase 90% se desenvol- lógico de Henri Wallon (1975) e os recen-
veram significativamente. Alguns chega- tes estudos da sociologia da infância (Oli-
ram a passar do estágio pré-silábico para o veira, 2004; Vilarinho, 2004). A instituição
alfabético. Outros até já tinham construído que fica na região metropolitana de Belo
estruturas alfabéticas, todavia ainda apre- Horizonte atendia em período integral
sentavam problemas relacionados à orto- 126 crianças de 02 (dois) a 06 (seis) anos,
grafia e durante a intervenção tiveram divididas em cinco turmas conforme a fai-
uma visível melhora em seu desempenho, xa etária. Durante a pesquisa realizou-se
enriquecendo seu léxico. Concluímos que uma entrevista com a coordenadora e ob-
a intervenção realizada tem contribuído servações participantes durante três me-
para auxiliar no desenvolvimento cogniti- ses (Haguette, 1992) na turma escolhida.
vo, afetivo-moral e da leitura e da escrita. Essa turma era composta de 12 meninas e
Além disso, tem propiciado condições para 14 meninos. Como as demais era atendida
que as crianças superem a fobia escolar e por quatro educadoras, uma professora
construam o desejo de saber. Tendo em e uma auxiliar no turno da manhã e uma
vista que o trabalho ainda está em anda- professora e uma auxiliar no turno da tar-
mento, os resultados são preliminares. de. Como resultados e discussão apresen-
tamos a seqüência das atividades constan-
Palavras-chave: psicopedagogia, psicologia tes da rotina da instituição que era a mes-
moral e ética, psicologia das virtudes ma para todas as turmas, seguida de uma
Contato: Nelson Pedro-Silva, UNESP, análise dos comportamentos das crianças,
nelsonp1@terra.com.br professoras e auxiliares da Turma 2. Entra-
da e café da manhã; Chamada, roda para
contar novidades e atividades diversas:
CO 51 - LT04 desenho, pintura, montagem, colagem,
brincadeira com carrinhos ou na casinha
Infância 2 de bonecas de conjunto; Brincadeiras no
pátio interno ou no parque; Arrumação
dos colchões para o descanso; Almoço;
LT04 – 1218 - RELAÇÕES ENTRE Repouso com duração de uma hora e trin-
CRIANÇAS E ADULTOS E ROTINAS NA ta minutos a duas horas; Lanche; Banho;
EDUCAÇÃO INFANTIL Estória; Brincadeiras no pátio interno ou
Iza Rodrigues da Luz - UFMG/NEPEI no parque; Sopa/Jantar; e Saída. A análise
izaluz@bol.com.br da seqüência das atividades constantes da
rotina sem os registros do diário de cam-
Este trabalho teve como objetivo conhe- po poderia induzir a avaliação de que a
cer o comportamento de uma turma de rotina estava bem organizada compreen-
crianças de três durante as atividades dendo cuidados corporais, alimentação,
previstas na rotina de uma instituição de atividades de pintura, desenho, colagem,
educação infantil pública. Como referen- brincadeiras e estórias. Entretanto, com-
cial teórico utilizou-se os estudos sobre partilhando das experiências das crianças
Educação Infantil (Barreto, 1998; Oliveira, e adultos da instituição, verificou-se que
2002), a teoria de desenvolvimento psico- em muitos momentos do dia as ativida-

1010
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

des repetitivas (concepção de rotina para Evidenciando a dificuldade de perceber as


o senso comum) aborreciam as crianças e crianças como sujeitos ativos e capazes de
desgastavam a relação delas com os adul- participar das decisões que lhes afetam,
tos. Oliveira (2002) ressalta a importância ponto de vista reforçado pelos estudos
da regularidade de atividades na educa- da sociologia da infância (Sarmento e Ce-
ção infantil, reiterando o entendimento de risara, 2004; Sirota, 2001). Oliveira (2004)
que essa “rotinização” tem também sua ressalta a resistência dos adultos em ver
função de garantir um sentimento de se- as crianças enquanto “Outros”, porque
gurança para as crianças, fruto do desem- isso enfraquece e dificulta a manutenção
penho de atividades conhecidas. Pensan- das práticas pedagógicas voltadas para
do na faixa etária das crianças atendidas a preparação da criança para um tem-
pela Educação Infantil e na importância de po futuro e para a domesticação de seus
lhes auxiliar a desenvolver os movimentos corpos e mentes. Pensando desse modo
e a linguagem (Wallon, 1975) entende- podemos entender o incômodo que algu-
-e que a rotina referente à seqüência em mas crianças provocavam nas professoras,
que se desenvolvem as atividades não pois dificultavam o alcance da tarefa que a
deveria engessar o modo como essas modernidade atribuiu à escola: “burilar” a
atividades são feitas. Durante a pesquisa capacidade cognitiva das crianças (Silva Fi-
constatamos um dos problemas comuns lho, 2004). Ao analisar as dificuldades das
da educação infantil brasileira conforme professoras em conseguir estabelecer re-
apontado por Campos (2006) que é jus- lações menos tensas com as crianças que
tamente a pouca preocupação por parte desafiavam suas ordens, um aspecto se
das instituições com a programação de destacou como relevante, durante a pes-
atividades com as crianças, avaliada como quisa foram raros os momentos de aten-
pouco diversificada, rígida e presa a ro- ção individualizados às crianças. Apesar
tinas empobrecidas, levando-as à ocio- das professoras dedicarem a maior parte
sidade e representando pouco estímulo do tempo às crianças que dão “trabalho”,
ao desenvolvimento motor, cognitivo, essa dedicação se restringia às atitudes
afetivo, cultural e social delas. Ao obser- de repreensão. Essa dificuldade estava
var que a freqüência de comportamentos atrelada ao grande número de crianças na
indesejados pelas professoras aumentava sala e ao modo como as atividades eram
durante os intervalos entre as atividades organizadas, por isso, novamente se rei-
ratificamos as impressões de que essa tera a necessidade de um incrementar o
postura estava relacionada ao modo de planejamento pedagógico da instituição e
organização das atividades na institui- a formação das professoras. Retomando
ção. Essa ratificação reforça a importância as idéias de Wallon (1975) um trabalho
dos fatores situacionais, na manifestação educativo para as crianças nesses anos
dos comportamentos infantis, implican- iniciais de vida deveria privilegiar o movi-
do assim todos os atores presentes no mento, a linguagem, a expressão artística,
contexto. O modo como as professoras a criatividade e a afetividade, por meio do
agiam demonstrava um maior interesse ensino de formas de convivência respeito-
pela manutenção da “disciplina” do que sas com os colegas, os objetos, a natureza.
pela promoção de interações educativas. Verificou-se que o uso do modelo escolar

1011
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tradicional com um controle excessivo (UFTM) é uma formulação interministe-


sobre o movimento e a fala das crianças rial que objetiva valorizar a formação em
se distanciava bastante do que a teoria serviço de profissionais para o fortaleci-
do referido autor indica. Essas constata- mento da humanização da assistência, da
ções foram referendadas por pesquisas defesa dos princípios do Sistema Único de
recém publicadas (Martins Filho, 2008; Iza Saúde (SUS) e da ampliação da concepção
e Mello, 2009) que demonstram o quan- e prática da integralidade. Tal estratégia
to as crianças na educação infantil são tem contribuído para a reflexão sobre a
cobradas a controlar seus movimentos e atuação na Atenção Básica e colabora para
sua fala e têm sua participação restrita nas a qualificação e resolutividade da atenção
rotinas das instituições. Pelo exposto, con- prestada aos usuários do sistema (Brasil,
clui-se que a instituição pode aprimorar 2007). Em Uberaba, especificamente, o
seus modos de organização dos tempos e programa da residência multiprofissional
espaços para melhor atender as funções foi gestado em 2009 e sua primeira turma
de promoção do desenvolvimento integral de residentes iniciou suas atividades em
das crianças conforme estabelecido na março de 2010. Foi estruturado segundo o
atual Lei de Diretrizes e Bases da Educa- ciclo de vida, a saber: assistência à criança
ção (Brasil, 1996) e proporcionar relações e ao adolescente, ao adulto e ao idoso. A
mais apropriadas e prazerosas delas entre proposta é formar especialistas multipro-
si e com os adultos. fissionais com foco na promoção de saú-
de, na educação em saúde e no cuidado
Palavras-chave: educação infantil, crianças, integral, envolvendo gestão e organização
comportamento, relação adulto-criança. do trabalho e visando à melhoria da qua-
Contato: Iza Rodrigues da Luz, Faculdade de lidade de vida de pessoas e comunidades.
Educação - Universidade Federal de Minas Neste sentido, este trabalho objetiva pro-
Gerais, izaluz@bol.com.br blematizar a atuação do psicólogo da área
da criança e do adolescente, na RIMS/
UFTM, a partir dos subsídios teóricos e
LT04 – 1229 - ATENÇÃO À CRIANÇA E metodológicos para a prática profissional
AO ADOLESCENTE: A PSICOLOGIA DO oferecidos pela psicologia do desenvol-
DESENVOLVIMENTO E A CONSTRUÇÃO vimento, analisando também como essa
DO CUIDADO INTEGRAL prática pode contribuir para a construção
Caroline G. C. da Silva - UFTM de novos saberes. Metodologicamente,
carol_gcs@yahoo.com.br foram realizadas análises da atuação de
Wanderlei Abadio de Oliveira - UFTM dois psicólogos inseridos no Programa de
wanderleio@hotmail.com Residência, no período de março de 2010
Conceição Aparecida Serralha - UFTM a junho de 2011. As intervenções ocorre-
serralhac@hotmail.com ram no Hospital de Clínicas da UFTM e em
Financiamento: FAPEMIG uma unidade básica de saúde da cidade
de Uberaba/MG, a partir de informações
O programa de Residência Integrada Mul- clínicas e discussões em equipe sobre os
tiprofissional em Saúde (RIMS) da Uni- casos concernentes à atuação multipro-
versidade Federal do Triângulo Mineiro fissional. No delineamento do trabalho

1012
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

multiprofissional, em equipe, os psicólo- dade de ampliação do conceito de famí-


gos realizam o acolhimento de crianças, lia, das dinâmicas entre seus membros e
adolescentes e familiares, avaliação clíni- como o arranjo familiar contribui ou não
ca de aspectos emocionais envolvidos em para a saúde de crianças e adolescentes,
processos de adoecimento, tratamento, bem como auxiliam na compreensão inte-
cura e reabilitação, suporte psicológico gral destes sujeitos. Na atenção primária,
em situações de vulnerabilidade, auxílio essa possibilidade de intervenção com
na exteriorização de sentimentos e angús- as famílias se intensifica, uma vez que a
tias, criação de condições para a vivência proximidade com os diversos contextos
e compreensão do processo saúde-doen- socioculturais brasileiros permitem uma
ça-cuidado, leituras sobre as realidades abordagem mais integral e na essência da
experimentadas pelas crianças, adoles- problemática. Questiona-se o quanto esse
centes e familiares diante de situações- contato permite uma ação de promoção
-problema e ao mesmo tempo de mu- ou prevenção à saúde, considerando que
danças corporais, psicológicas e sociais. O é possível um trabalho multiprofissional
viés do desenvolvimento humano norteia ampliado nos diferentes contextos de
a prática profissional, contribuindo para atenção primária, mas também de inter-
o entendimento de como as condições venções pontuais e urgentes em situações
internas e externas das pessoas afetam de vulnerabilidade social. Destaca-se ain-
e promovem mudanças que atravessam da que, no Programa de Residência Mul-
temporalmente o ciclo de vida. Sabe-se tiprofissional é importante conhecer as
que as mudanças no desenvolvimento são atividades e atribuições dos outros mem-
adaptativas, sistemáticas e organizadas, e bros da equipe, pois se propõe uma aten-
terminam por refletir essas situações in- ção integral à saúde dos pacientes e seus
ternas e externas no processo de adapta- familiares. Assim, atuar com outros pro-
ção ao mundo cujas mudanças também fissionais convoca o psicólogo a contribuir
são constantes (Aspesi et al., 2005). No para a construção de espaços de ajuda e
cenário hospitalar, o psicólogo tem sido compreensão humana, que muitas vezes
requerido, constantemente, para avaliar amenizam dores, valorizam a escuta de
relações familiares e, especificamente, re- fantasias e do desmoronamento do coti-
lações entre a díade mãe-filho. Para tan- diano, aspectos estes que são tratados de
to, são realizados atendimentos no mo- maneira secundária em muitos momen-
delo de consultas terapêuticas, atividades tos. Evidencia-se que o processo de ado-
lúdicas com pacientes e acompanhantes, ecimento ou as situações de vulnerabili-
orientações e escuta psicológica. No que dade, em que as famílias se encontram,
se refere à atuação multiprofissional, o exigem reestruturações na dinâmica do
psicólogo propõe intervenções junto aos cotidiano e, muitas vezes, no redesenho
usuários alicerçadas em proposições te- do andar a vida. O psicólogo se insere
óricas e que oportunizam o surgimento como elemento essencial para a com-
de estratégias de enfrentamento e res- preensão destes processos, do complexo
significação do processo de adoecimento. desenvolvimento humano e da importân-
A atuação do profissional da psicologia cia de evidenciar esses pormenores aos
junto à equipe representa uma possibili- cuidadores e familiares, atravessado por

1013
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

questões sociais, culturais e econômicas, Palavras-chave: Psicologia do


influenciados, por sua vez, pela condição Desenvolvimento Humano, Saúde Coletiva,
de saúde das pessoas. A compreensão Criança e Adolescente
dos pressupostos que norteiam os pro- Contato: Conceição A. Serralha, UFTM,
gramas de residência multiprofissional e serralhac@hotmail.com
incluem o psicólogo em sua estruturação,
engloba questões relacionadas à perspec-
tiva teórica da psicologia do desenvolvi- LT04 – 1486 - JOGOS, BRINQUEDOS,
mento, posto que as questões relaciona- BRINCADEIRAS E GAMES: UMA ANÁLISE
das ao processo saúde-doença-cuidado DA PRODUÇÃO ACADÊMICA
traz implicações para o desenvolvimento M. G. B. Botelho - UFRG
humano, especificamente de crianças e gloriab.ufrj@gmail.com
adolescente. O psicólogo evidencia a rele-
vância de sua prática profissional em uma Desenvolvendo trabalhos de pesquisa, ex-
equipe multidisciplinar, na medida em tensão e ensino, na área, desde 2004 no
que esta oportuniza melhora nos estados Rio de Janeiro, esta autora também con-
emocionais de usuários, grupos familia- sidera que apesar dos esforços que vêm
res e equipes profissionais, e facilita a te- sendo empreendidos, “no Brasil, termos
rapêutica e o contato dos usuários com a como jogo, brinquedo e brincadeira ain-
gestão do trabalho no SUS. O enfoque no da são empregados de forma indistinta,
desenvolvimento humano, na assistência demonstrando um nível baixo de concei-
à criança e ao adolescente, possibilita tuação deste campo” (Kishimoto, 1996).
compreender os fenômenos relacionados Se tomados como objetos culturais, no
a ele e a densidade de elementos que os campo da historiografia a obra de P. Ari-
constituem, além da orientação aos fami- és, particularmente a “História social da
liares acerca da importância das fases de família e da infância” (1960), bastante di-
desenvolvimento e de suas ações com as vulgada no Brasil a partir dos anos oitenta,
crianças. No que se refere à produção de constituiu um marco divisório passando
saberes, a residência tem sido um espaço a ser referência obrigatória. Nesta o es-
de estudo do desenvolvimento humano tudo de jogos, brinquedos e brincadeiras
influenciado pela diversidade cultural do se fizeram presentes em um capítulo pró-
Brasil, e de proposição de intervenções prio- “Pequena contribuição à história dos
em saúde alicerçadas em modelos de jogos e brincadeiras”- bem como o capí-
defesa da vida, que assumem uma dinâ- tulo “Brincando na história” por Raquel Z.
mica próxima à realidade concreta dos Altman (2006) na publicação “História das
sujeitos. Neste sentido, a reunião de di- Crianças no Brasil”. Em ambos, inquestio-
ferentes profissões no grupo de assistên- nável parece ser que para conhecer a(s)
cia à criança e ao adolescente valorizou infância(s) há que se conhecerem os jogos,
os saberes das diferentes experiências e as brincadeiras e também os brinquedos
abordagens, integrando e/ou ampliando daquelas crianças, embora a sua pertinên-
o sentido do saber/fazer, para uma pers- cia ao âmbito da história cultural não seja
pectiva que afirma a produção do cuida- amplamente aceita. Conforme Kishimoto
do integral em saúde. (1996, p.30) é “dentro dos quadros do Ro-

1014
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mantismo que o jogo aparece como con- ao papel dos brinquedos e brincadeiras
duta típica e espontânea da criança”, fruto na educação pré-escolar”. Percebe-se que
da “nova percepção de infância a consti- após apresentar um conceito geral ao cam-
tuir-se no Renascimento”, quando “surge po, e sob o nome de jogo, estranhamente
a metáfora que correlaciona a infância do a mesma Kishimoto (op.cit.35-40) ao res-
indivíduo à da humanidade por influência saltar algumas modalidades presentes na
de J. J. Rousseau” e nos quais Fröebel (o educação infantil, as apresenta agrupadas
propositor dos jogos de construção) pode sob outras denominações, “brinquedo
ser inserido. Entre os paradigmas constru- educativo (jogo educativo)”, “brincadeiras
ídos posteriormente, a partir do século tradicionais infantis”, “brincadeiras de faz
XIX, pela psicologia científica da criança de conta” e “brincadeiras de construção”
(Claparède, Piaget, Melanie Klein, entre (grifos nossos). O primeiro grupo “remete-
outros), prossegue a autora, “a brincadeira -nos para a relevância deste instrumento
da criança aparece como um processo me- para situações de ensino-aprendizagem
tafórico relacionado a comportamentos e de desenvolvimento infantil”, ou seja,
naturais e sociais” onde, segundo a mes- “quando as situações lúdicas são intencio-
ma, “ geralmente não há uma discussão do nalmente criadas pelo adulto com vistas a
jogo em si mas um uso metafórico sem a estimular certos tipos de aprendizagem,
explicitação de seu significado” (Kishimo- surge a dimensão educativa”. Já o segundo
to, 1996, p.34, grifo nosso). Sem qualquer grupo responde pela ”brincadeira tradicio-
menção nesta obra aos jogos pedagógicos, nal infantil, filiada ao folclore” expressan-
por exemplo, de M. Montessori a auto- do-se, sobretudo, pela oralidade e é con-
ra afirma que tal uso, metafórico e sem siderada como parte da cultura popular.
profundidade, também se faz presente A terceira abordagem a das “brincadeiras
na Antropologia e na Sociologia. Será em de faz de conta” que é “também conheci-
Henriot (1989) que Kishimoto encontrará da como simbólica, de representação de
“uma espécie de definição stricto sensu” papéis ou sócio-dramática é a que deixa
já que para este, jogo é “ todo processo mais evidente a dimensão imaginária (...)
metafórico resultante de decisão tomada o conteúdo das representações simbólicas
e mantida como um conjunto coordenado recebe, geralmente, grande influência do
de esquemas conscientemente percebi- currículo e dos professores [de educação
dos como aleatórios para a realização de infantil]”. Por fim, as brincadeiras de cons-
um tema deliberadamente colocado como trução, também consideradas pela autora
arbitrário” (Kishimoto, 1996, p.7). Assim, jogos de construção possibilitam a cons-
lembra a autora, para que exista jogo é trução de cidades e bairros que estimulam
necessário que o sujeito tenha consciên- a imaginação infantil, pois “construindo,
cia de que está jogando e que manifeste transformando ou destruindo a criança ex-
conduta (subjetiva, intencional) compatí- pressa seu imaginário (...) suas representa-
vel com a situação (objetiva, constatável) ções mentais além de manipular objetos.”
e conclui: “o aparecimento de novos para- Para qualquer destas perspectivas, vale
digmas como os de Bruner e Vygotsky, par- lembrar, é necessário considerar tanto a
tindo de pressupostos sociais e da linguís- fala como a ação da criança, que revelam
tica, oferece novos fundamentos teóricos complexas relações. Embora a autora seja

1015
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

coerente em sua busca por maior rigor são dos campos simbólicos - no sentido de
conceitual ao campo de estudos e pesqui- P. Bourdieu- ligados ao tema e assim evitar
sas sobre jogos, brinquedos e brincadei- sua banalização, em busca de maior rigor
ras, tal quadro será desafiado se tiver que conceitual no âmbito da Psicologia do De-
considerar a inclusão de outros termos senvolvimento e da Educação.
- ou quem sabe conceitos- tais como brin-
quedo pedagógico, brincadeiras escolares Palavras-chave: Psicologia da Educação;
e jogos educativos, peculiares ao campo Lúdico; Educação da infância.
da Psicologia do Desenvolvimento e da
Educação. A estes serão agregados o que
mais recentemente vem sendo chamado LT04 – 1487 - INTERVENÇÃO LÚDICA
de games, que já se fazem presentes por NAS PRÁTICAS CULTURAIS DE
exemplo, no Portal do Professor, oficial- CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE ESTRESSE
mente disponibilizados pelo MEC/Brasil EDUCACIONAL E HOSPITALAR:
em parceria com o MCT/Brasil ( “Game da ESTUDO COMPARATIVO PRELIMINAR
reforma ortográfica”, “Amino Acids Game” DE DUAS BRINQUEDOTECAS
etc.). Talvez se contraponham a estes, M. G. B. Botelho - UFRJ
os brinquedos e jogos terapêuticos bem gloriab.ufrj@gmail.com
como os de lazer, recreação e/ou entre- Katiline Carneiro Silva - UFRJ
tenimento, entre outros, que em sentido katilinecarneiro@gmail.com
amplo, todos eles, também são consi-
derados recursos de “ludicidade”, termo A importância do brincar para o desen-
apreciado particularmente pelos falantes volvimento infantil indicada por diversos
de língua espanhola e francesa. A fim de autores tais como L. S. Vygotsky, J. Piaget,
contribuir para este quadro de discussões seguidores e outros, foi tão intensamente
pretende-se apresentar pesquisa explora- publicada e debatida no âmbito da Psico-
tória e descritiva, em andamento, acerca logia que chega a dar a impressão de que
da presença e do significado de todos es- pouco resta (Silva & Botelho, 2009) para
tes termos nas publicações da primeira dé- se falar, pesquisar e acrescentar a respei-
cada, deste século, das associações nacio- to, em termos acadêmicos. No entanto,
nais de pesquisa e pós-graduação ANPEPP no âmbito da formação de professores, as
(Psicologia) e ANPED (Educação), bem contribuições do conhecimento a respeito
como da ABPD. Para efeito de análise, dar- das diversas práticas culturais do brincar,
-se-á atenção, em princípio, aos resumos em espaços de educação não-formal (brin-
e quando possível, aos textos completos quedotecas hospitalares, comunitárias,
ou artigos, dos GT32 (Os jogos e sua im- em museus etc.) para a educação formal
portância em Psicologia e Educação) e GT9 e da infância (em creches e pré-escolas),
(Brinquedo, aprendizagem e saúde) da ainda estão por serem sabidas ou aprimo-
ANPEPP e aos GT 07 (Educação de Crianças radas. É dentro deste quadro que se pre-
de 0 a 6 anos) e GT20 (Psicologia da Educa- tende apresentar um estudo exploratório
ção), da ANPED. Já a análise do material da e comparativo entre duas brinquedotecas
ABPD, terá como recorte inicial, os títulos. situadas na cidade do Rio de Janeiro as
Pretende-se promover melhor compreen- quais foram observadas pelas autoras en-

1016
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tre os anos de 2007 e 2009. A primeira au- to. A segunda, atendia aproximadamente
tora, enquanto orientadora da pesquisa e dez (10) crianças por dia, umas na sala/
mentora/ coordenadora de uma das brin- brinquedoteca e outras no próprio leito.
quedotecas analisadas, a brinquedoteca O principal objetivo observado foi a otimi-
do tipo comunitária, e a segunda na condi- zação do processo de hospitalização da-
ção de estudante de Pedagogia e bolsista quelas crianças, numa tentativa de tornar
PIBEX. Através de observação participante, sua estada ali o menos dolorosa possível.
portanto enquanto pesquisa qualitativa Quanto aos objetivos da pesquisa nestes
(Ludke & André, 1986), as duas brinquedo- locais, o primeiro foi escolhido por favore-
tecas observadas foram dos tipos: 1. Brin- cer um estudo sobre a intervenção lúdica
quedoteca comunitária. Situada na Vila nas práticas culturais das crianças em situ-
Residencial da UFRJ era parte integrante ação de estresse educacional e/ou social.
do Projeto Brincar e Aprender, projeto de E o segundo por ser um espaço onde seria
extensão da FE/UFRJ; 2. Brinquedoteca possível promover uma intervenção lúdica
hospitalar. Localizada na enfermaria infan- no processo de internação das crianças em
til de um hospital público federal de alta situação de estresse hospitalar e/ou so-
complexidade. A primeira foi implantada cial. Percebeu-se que frente às diferenças,
pelo Projeto Brincar e Aprender em um a serem elencadas com maior grau de de-
galpão de aproximadamente duzentos me- talhamento na comunicação oral, ambas
tros quadrados (200 m²), posse da Asso- as experiências nas duas brinquedotecas
ciação de Moradores daquela localidade. apresentaram alguns aspectos em comum.
A equipe que compunha o Projeto contava O primeiro, o reconhecimento da brinque-
com duas moradoras e cinco (5) estudan- doteca como espaço efetivo de ludicidade,
tes da UFRJ, inicialmente todos do curso de crianças, com crianças e para crianças.
de Pedagogia e mais tarde com alunos dos O segundo aspecto foi a percepção de que
cursos de Psicologia e Educação Física e a estes locais enquanto espaços de respeito
professora-orientadora - tendo, portanto, à infância ( E.C.A.: 1990, Art. 16), podem
uma equipe multidisciplinar. Já a segunda e devem contribuir para a inclusão social
preexistia à nossa chegada e era situada em espaços públicos (escola e hospital, no
em uma pequena sala de cerca de 25m² caso). O terceiro aspecto foi a confirmação
do andar da enfermaria infantil. Quando de que estes espaços têm forte potencial
lá chegamos, havia um ambiente favorável de expansão como espaço de trabalho e
à assimilação da presença de estagiários de produção de conhecimento interdisci-
(as) e já contava com uma profissional de plinar para pedagogos(as), psicólogos(as),
Terapia Ocupacional atuando integralmen- terapeutas ocupacionais e enfermeiros(as)
te na brinquedoteca, a qual participou da - enquanto abertura de diálogo efetivo
sua implantação. Quanto às crianças usuá- entre os campos da educação e da saúde,
rias, a primeira recebia cerca de trinta (30) sem que haja reserva a priori, de mercado
crianças todos os dias no espaço, com o de trabalho. Por fim vale lembrar que as
objetivo de (re)significar a relação com a autoras da presente pesquisa concordam
escola e com a aprendizagem, contribuin- com Paula e Fortran (2008), no sentido
do assim para o processo de otimização da de reconhecerem estes espaços como de
escolarização dos participantes do Proje- formação da cidadania, principalmente se

1017
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

for levada em conta a possibilidade de di- (1995) uma preocupação em demons-


ferentes mediações se fazerem presentes trar a fusão afetiva que existe entre mãe
e reconhecidas nestes espaços (Botelho et e bebê, em Ajuriaguerra identificamos a
al., 2007). Por fim, entende-se que o aces- definição de diálogo tônico como a fusão
so às diversas práticas culturais de jogar e que se exprime através de fenômenos
de brincar com brinquedos e brincadeiras tônico-emocionais e posturais num di-
não exclui as práticas culturais ligadas à álogo que preludia o diálogo verbal pos-
cultura escrita (Botelho et al., 2009). terior. Assim, o diálogo tônico acontece,
por exemplo, nos momentos em que o
Palavras-chave: Brinquedoteca; Intervenção bebê, por alguma razão, busca encontrar
lúdica; Educação da infância. uma sensação de bem estar ou formas
para exprimir algo, constituindo-se como
um dos primeiros modos de vinculação
LT01-802 - DIÁLOGO TÔNICO E (Ajuriaguerra, 1985). A partir da revisão
RELAÇÃO MÃE-BEBÊ NA PERSPECTIVA bibliográfica realizada, pôde-se notar que
WALLONIANA: REFLEXÕES A PARTIR DE Wallon constrói uma teoria dos estágios
UMA PESQUISA EMPÍRICA do desenvolvimento – sistemas de relação
Rodolfo Luís Leite Batista - UFSJ funcional entre o indivíduo e o meio – e
rodolfo_rllb@hotmail.com da emoção, ressaltando que a vida psíqui-
Dener Luiz da Silva - DPSIC/UFSJ ca é consequência dinâmica da interação
densilva@ufsj.edu.br dos meios geográfico e humano em que
o indivíduo se insere (Galvão, 2002; Tran-
Financiamento: FAPEMIG
-Thong, 1987). Ele também apresenta os
fatores do desenvolvimento psíquico da
Na presente comunicação, são ofereci-
criança e identifica as leis deste desenvol-
das as contribuições da pesquisa ‘Relação
vimento, apontando que a idade cronoló-
mãe-bebê e as implicações do diálogo
gica da criança não necessariamente coin-
tônico: uma contribuição da abordagem
cide com a idade funcional por ela atingi-
walloniana’ realizada pelos autores, na
da (Wallon, 2007). No primeiro trimestre
qual se objetivou estudar a interação de
quatro díades mãe-bebê durante o pri- de vida, estágio da impulsividade motora,
meiro trimestre de vida à luz da teoria psi- a vida psíquica do bebê se reduz a movi-
cogenética de Henri Wallon (1879-1962), mentos sem objetivo externo, sendo que
de modo especial a partir de sua concep- seu psiquismo tende a se relacionar com
ção de ‘diálogo tônico’. Para entender a o meio social no qual o indivíduo se insere
dimensão que o conceito ‘diálogo tônico’ através de modificações no tônus muscu-
pode assumir na teoria walloniana, foi lar, expresso pela execução de movimen-
preciso que adentrássemos na leitura das tos. Afirmando a inabilidade funcional do
seguintes obras: As origens do caráter na bebê humano, Wallon (1995) considera
criança (1995), A evolução psicológica da que a emoção se relaciona diretamente ao
criança (2007) e A função proprioplástica aspecto tônico do movimento, ocupando,
(1986) e de autores que ampliam a discus- assim, o papel de protolinguagem. A emo-
são proposta (Ajuriaguerra, 1985; Toledo, ção é uma reação organizada a modifica-
2009). Ainda que seja notada em Wallon ções no ambiente da criança, sejam elas

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no meio externo ou interno ao indivíduo. -bebê, cuidando-se para a descrição dos


Assim, as emoções podem ser diferencia- eventos ocorridos neste intervalo e c) re-
das conforme a função por elas ocupada, gistro de condições ambientais e comen-
bem como pelo grau de variação tônica tários dos observadores. A partir do tra-
ocasionada, tendo cada uma delas sua balho empreendido, notamos limites no
razão específica de existir. Sob o ponto de uso da técnica de registro cursivo: tal re-
vista metodológico, Wallon (2007) afirma gistro foi ‘desafiado’ pelo grande número
que o estudo da criança não deve se res- e variabilidade dos comportamentos emi-
tringir a descrições de comportamentos tidos; a ausência de categorias de obser-
e, consequentes, enumerações cronológi- vação pré-definidas não permitiu o treino
cas. Pelo contrário, o modo como o desen- antecipado dos observadores; limites no
volvimento humano se dá deve ser pro- contato com as díades para permissão de
blematizado pelo pesquisador, a fim de videogravação – supomos que a utilização
compreendê-lo melhor e de maneira mais desta técnica permitiria maior aproxima-
adequada. A etapa empírica da pesquisa ção com o fenômeno estudado. Após o
se fez mediante observações nos domicí- levantamento conceitual, coleta e análi-
lios de quatro díades que se voluntariaram se de dados empíricos, é possível afirmar
para consecução do projeto após recruta- que o diálogo tônico se caracteriza como a
mento em agência do Programa de Saúde primeira interação estabelecida pelo bebê
de Família e mediante assinatura de Ter- humano. Enquanto forma de comunica-
mo de Consentimento Livre e Esclarecido. ção existente entre mãe e bebê, o diálogo
O grupo de bebês observados constituiu- tônico se constrói de modo processual, no
-se de dois meninos e duas meninas, nas- qual há a expressão da emoção median-
cidos a termo e com resultados entre nove te a modificação do tônus muscular. Logo
e dez no teste de Apgar. As observações que tal modificação ocorre, ela é interpre-
se estenderam no período compreendido tada pela mãe e se manifesta na resposta
até o terceiro mês de vida da criança, com comportamental que é dada. Identifica-
no mínimo uma e no máximo duas ses- mos igualmente que, como em qualquer
sões de 50 minutos de observação sema- outra interação humana, há momentos
nais, e encerrado com entrega de cópia do em que o diálogo instaurado é mais inten-
material coletado para a mãe. Procedeu- so, existindo momentos de maior atenção
-se a observação sistemática de tipo parti- e manutenção de contato entre a díade.
cipante e a técnica de registro cursivo que Por fim, afirma-se que entre mãe e bebê
foi empreendida por um casal de pesqui- se estabelece uma intensa comunicação
sadores simultânea e sincronicamente, ou afetiva, isto é, um diálogo baseado em
seja, ao mesmo tempo e buscando a com- componentes corporais e expressivos que
plementação dos pontos de vista e dados nos permite entender como a criança se
coletados. Cada sessão de observação foi comporta no primeiro trimestre de vida.
dividida em três momentos, sendo: a) es- A pesquisa empreendida pôde contribuir
tabelecimento do rapport e instrução para sob três pontos: a retomada da discussão
que a díade mantivesse sua rotina de ati- teórica esboçada inicialmente por Wallon,
vidades; b) observação propriamente dita a possibilidade de irmos a campo, fato
em que foi registrada a interação mãe- que permitiu entender como tal conceito

1019
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

existe na realidade passível de estudo e as miradas, señalamientos y movimientos de


supracitadas dificuldades metodológicas cabeza. Este estudio intenta llevar al plano
encontradas para atingi-lo. experimental el problema de la inferencia
de deseos, avanzando con dos situaciones
Palavras-chave: Diálogo Tônico; Relação mãe- de resolución de problemas que permiten
bebê; Wallon. capturar en la acción la actividad mental
Contato: Rodolfo Luís Leite Batista. Graduando del niño. Lo característico y que identifica
em Psicologia pela Universidade Federal de esta investigación es el uso y comparación
São João del-Rei, UFSJ. de dos escenarios, el humor y situaciones
rodolfo_rllb@hotmail.com del área de la Teoría de la Mente común-
mente validadas. Participaron del estudio
38 niños de 2;8 a 3 años pertenecientes a 4
LT02-908 - INFERENCIA DE DESEOS preescolares de la ciudad de Palmira, Valle
EN NIÑOS PEQUEÑOS: UN ESTUDIO del Cauca, Colombia, de un nivel socioe-
MICROGENÉTICO conómico medio-alto. La intervención con
los niños se llevó a cabo con previa autori-
Mónica Roncancio Moreno - UV
zación de los padres y su participación fue
monikarm83@gmail.com
voluntaria. Se utilizaron dos situaciones ex-
En el presente trabajo se documenta la perimentales: una de humor gráfico (series
aparición de la comprensión de deseos de imágenes chistosas donde diferentes
en niños pequeños y sus modos de fun- personajes proyectaban un estado mental)
cionamiento inferencial con el uso de dos y una de preferencias (situación adaptada
situaciones experimentales: preferencias y de la literatura donde el niño usaba infor-
humor gráfico. En esta investigación parti- mación de diversas fuentes para inferir
mos de una visión desde el cambio cogniti- deseos). En total se realizaron 10 sesiones
vo, intentando capturar las pequeñas mo- de aplicación de ambas tareas para todos
dificaciones que ocurren cuando los niños los sujetos, con intervalos de 8 días entre
se enfrentan a una situación dada. Igual- sesión. Las aplicaciones se extendieron por
mente, estamos interesados en el uso del un periodo de dos meses y medio. La apli-
método microgenético con miras a la va- cación fue individual y el orden de las ta-
riabilidad, fenómeno que actualmente es reas fue contrabalanceado. Se diseñó una
considerado fundamental para dar cuenta escala de nueve puntajes para cada tarea.
de la actividad cognitiva del sujeto (Siegler, Al interior de la escala se definieron tres
2007). La comprensión del deseo viene ar- niveles de desempeño: implícito, transicio-
ticulada al estudio de los procesos inferen- nal y explícito. Con los datos colectados se
ciales, pues en ella se indaga la forma cómo realiza: (1) un análisis intraindividual que
el sujeto, a partir de información específica permite capturar los diversos caminos por
que se le proporciona, logra representarse los cuales transitan los niños al enfrentar-
los estados mentales de otros. La inferen- se a las tareas y en esos términos observar
cia de un deseo se puede realizar a partir la variabilidad como una característica del
de diferentes elementos y entre ellos los funcionamiento inferencial, y (2) un análi-
más estudiados han sido tres: los deseos sis intragrupo, que permite ver en térmi-
conflictivos, las preferencias y las claves de nos generales el desempeño de todos los

1020
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sujetos en todas las sesiones y una compa- sesiones de aplicación de dos situaciones
ración entre las dos tareas. Los resultados de resolución de problemas. Esos modos
intraidividuales se analizaron con la técni- de funcionamiento se traducen en térmi-
ca de gráficos de movimientos mínimos y nos del tránsito de los niños por los nueve
máximos (van Geert & van Dijk, 2002) y ar- criterios de medición, fluctuaciones que se
rojaron tres tendencias principales en los observan tanto en el grupo como intrain-
desempeños de los niños: Tendencia Es- dividualmente. Las tendencias forman
table, Tendencia Ascendente y Tendencia parte de los análisis detallados necesarios
Descender. Estas tendencias representan para conocer la no linealidad del sistema
tres modos de resolución de la tarea y tres cognitivo. Autores como Siegler y Svetina,
formas de funcionamiento. Se evidencia (2002, 2006) han definido tres patrones en
como los niños abandonan desempeños las formas de resolución de algunos niños
eficientes de resolución para reemplazar- en tareas matemáticas (aprendices, no li-
los por unos menos avanzados, cambian su neales y precoces), de igual forma, Yan y
combinación de desempeños de un inten- Fischer (2002) mostraron como tres suje-
to a otro y luego retornan a un desempeño tos expertos al enfrentarse a una situación
anterior (Miller, 2002). Cada uno de los su- problema transitaban diferentes vías y ca-
jetos posee particularidades en el momen- minos de resolución los cuales respondían
to de enfrentarse a la situación es por esto a ciertas regularidades que llamaron pa-
que a pesar de que existen los tres grupos trones. En términos generales, las tenden-
de niños con tendencias similares, los ca- cias son las respuestas a esas regularida-
minos seguidos por cada uno son distintos. des presentadas por los sujetos dentro de
Esas tendencias sugieren que al interior la variabilidad, mediante ellas es posible
de la variabilidad subyacen regularidades describir la naturaleza del sistema cogniti-
que pueden ser visualizadas y dan cuenta vo como un sistema dinámico en constan-
de los funcionamientos inferenciales. Los te cambio. Para concluir, el puente tendi-
resultados intragrupo muestran moviliza- do entre las situaciones humorísticas y la
ciones permanentes del grupo entre una comprensión de estados mentales resulta
sesión de aplicación y otra. No hay con- ser de gran beneficio metodológico para
sistencia en los niveles transitados por los desarrollar investigaciones conducidas a
niños, incluso no se observa ninguna ten- capturar la actividad mental del niño en
dencia al avance por parte del grupo. Otro función de esta comprensión. Adicional-
hallazgo importante es que ninguno de los mente, se sabe que el humor hace parte
niños se mantuvo en el mismo nivel duran- de la cotidianidad del sujeto y por lo tan-
te las 10 sesiones de aplicación, siempre to es posible observar socialmente como
se presentaron cambios entre los niveles, el niño aprecia los intereses y expectativas
y específicamente entre los puntajes que de otros (Reddy, 2008).
subyacen a ellos. No se encontraron dife-
rencias significativas entre la tarea de hu- Palavras-chave: Inferências; Deseos; Método
mor gráfico y la de preferencias. La eviden- Microgénetico.
cia empírica encontrada en este estudio da Contato: Mónica Roncancio Moreno,
cuenta de los modos de funcionamiento monikarm83@gmail.com
presentes en los niños a lo largo de las 10

1021
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02 – 927 - REFLEXÕES SOBRE A como representação de elementos men-


CONSTITUIÇÃO DIALÓGICA DO tais. Relata-se aqui um estudo de caso de
DESENHO INFANTIL uma criança de três anos. Os dados foram
Angelina Nunes de Vasconcelos - UFPE produzidos na residência da criança após
vasconcelos.angelina@gmail.com obtenção do Termo de Consentimento Li-
Nadja Maria Vieira - UFAL vre e Esclarecido (TCLE). Para situação de
vieira_nadja@hotmail.com registro dos dados criança e pesquisadora
se envolveram na atividade de desenhar.
Segundo Vygotsky (2005) a ação media- Depois que a criança desenhou a pesqui-
da liberta o homem da necessidade de sadora a questionou sobre seu desenho
interação concreta com os objetos, per- com fazendo-a compor narrativas sobre
mitindo que ele opere sobre coisas pas- sua produção. Estes dados foram video-
sadas, futuras, inexistentes ou ausentes grafados. Apresentamos a análise de um
do espaço onde ele se encontra. Vygotsky episódio de interação entre esta criança,
também observa que o recurso simbólico seu irmão (7 anos) e a pesquisadora, o
qual foi denominado como Construindo
utilizado por excelência pelos seres hu-
desenho sobre uma escada. A transcrição
manos é a linguagem. Ressalta-se aqui a
abaixo apresenta o momento. Episódio:
capacidade da criança para operar com
Construindo desenho sobre uma escada7
este sistema simbólico através do de-
senho. Nessa perspectiva, o desenho é
L 1. P: E isso daqui é o que? [Olhando
concebido como atividade que se cons-
para a criança e apontando para o
titui de forma dialógica no processo de
desenho que ela fez.]
interação entre criança e interlocutor.
Pesquisas diversas vêm evidenciando a L2. C: (\her) é uma (...) [Olhando para
relação entre o desenho e funcionamen- o papel e subindo na mesa que es-
to psicológico das crianças. Greig (2007), tava sendo usada como apoio para
por exemplo, apresenta um detalhado desenhar.]
estudo no qual reflete sobre o desenho L3. P:É uma escada ou é uma casa?
infantil na perspectiva da representação [Olhando para a criança.]
mental, considerando-o dentro de metá-
foras que expandem a dicotomia entre L4. C: É(\her) para é (...\) [Ficando em
interno e externo. Outros pesquisadores pé sob a mesa.]
como Silva (1998) compreende o dese- L5. I: Não suba (\imp) [Olhando para a
nho infantil destacando o papel da fala da irmã.]
criança como constituindo e sendo consti-
tuída pelo desenho. No presente estudo, L6. P:Cuidado! [Olhando para criança e
discute-se o desenho infantil compreen- segurando sua mão.]
dendo-se que ele constitui-se no contexto
de interação entre a criança que desenha 7
Legenda: (L)-Refere-se ao número da linha. (P)-Pesquisa-
e um interlocutor para quem ela os des- dora. (C)-Criança. (I)-Irmão da criança. (\her)- Hesitação/
creve. Essa compreensão contrapõe-se repetição. (\!)-Enunciado exclamativo. (...)-Fala incompre-
ensível. (...\)-Fala incompleta. Entre colchetes descrições
as perspectivas que definem o desenho dos elementos não-verbais.

1022
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

L7. C:É pra subir assim. [ Ficando em pé ações e fala da criança e o seu desenho.
sob a mesa.] A criança passa a agir sobre o ambiente
(com palavras, gestos e ações) organizan-
L8. P:E é ? [Olhando para a criança e se-
do elementos semióticos discursivos que
gurando sua mão.]
constituem seu desenho, fazendo “surgir”
L9. C: aaalcança (\her) (...) o negócio lá uma escada e explorando quais as fun-
em cima. [Ainda em cima da mesa ções de uma escada, no movimento para
fica na ponta dos pés. Desce da mostrar para a pesquisadora o desenho
mesa e senta-se no chão.] que produziu. Ou seja, o desenho surge a
partir da pergunta; na regulação entre fala
L 10. P:Tem o que lá em cima? [Olhando
e ação, na tentativa de explicar o dese-
para a criança.]
nho para a pesquisadora. Reflete-se com
L 11. C:Escada aqui. [Olha para cima, os dados do presente, a regulação entre
aponta, se levanta e vai em direção fala e ação incidente quando se solicita a
a uma parede alta onde um sino criança para falar do desenho por ela pro-
de vento estava pendurado. Fica na duzido. Características do desenho infan-
ponta dos pés e levanta os braços na til, como indefinição de traços e formas,
tentativa de alcançar o objeto.] suportam a compreensão de que ele só
L 12. P: O que é isso que tem lá em cima? seja constituído pelo autor, na medida em
[Olhando para o sino de vento pen- que é apresentado para um interlocutor.
durado na parede.] Essa observação não é difícil de ser reco-
nhecida. Frequentemente experimenta-
L13. C:Pega, pega, (\her) pe... [Ainda na -se a complexa descrição de crianças de
ponta dos pés e com os braços le- seus desenhos que, sem essa descrição,
vantados fica dando saltos na tenta- eram visualizados apenas como traços, ra-
tiva de pegar o objeto. Pára e volta biscos, pontos. Essas situações suportam
para sentar-se no chão novamente.] a interpretação de que o desenho é cons-
L 14. P:Há( \! ) Você sobe para pegar uma tituído na linguagem (fala e/ou gestos) e
coisa que ta lá em cima, né? [Olhan- que por sua vez, não pode prescindir da
do para a criança.] sua propriedade, o endereçamento. Isto
é, a linguagem funciona como endere-
L 15. C:É, Assim ó. [Olha para cima, come- çamento. Ela transita entre fronteiras do
ça a subir na mesa novamente.] eu e do não-eu. Ao subir na mesa para
completar sua fala, ao agir olhando para
Neste episódio observou-se fala elabora- cima, apontando e se deslocando em di-
da unida com gestos e ações constituindo reção ao sino de vento unindo à sua fala,
o desenho infantil. Sugere-se que a re- ou ainda, quando fica na ponta dos pés e
gulação entre fala e ação manifesta pela com os braços levantados, dando saltos
criança está relacionada com a pergunta enquanto fala “Pega, pega, pe” a criança
da pesquisadora “É uma casa ou é uma estava constituindo o desenho, que ainda
escada?”, frente ao desenho da criança. não existia nos traços que a pesquisado-
Isto é, observam-se inter-constituição ra tinha em mãos. Na descrição da crian-
entre a indagação da pesquisadora, as ça pressupõe-se o desenho em ação, em

1023
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

resposta ao questionamento da pesquisa- cognitivamente. Ao nascer, o primeiro nú-


dora, que por sua vez, refletia a apresen- cleo de socialização que o bebê mantém
tação gráfica do desenho. Nesta perspec- contato é a família. Esta por sua vez irá
tiva este estudo reflete a multiplicidade influenciar significativamente no desen-
de fatores envolvidos na constituição do volvimento saudável da criança. Assim, a
desenho e correlacionam-se com o desen- família consolida-se como um importante
volvimento infantil, enfraquecendo os ar- nicho para o desenvolvimento global do
gumentos que o estruturam numa dimen- indivíduo, devido às influências que exer-
são essencialmente interna, traduzido nos cer para o seu desenvolvimento (Baptista,
limites do organismo biológico humano. Baptista & Dias, 2001; Conte, 2001; For-
man & Forman, 1981). Cada membro da
Palavras-chave: Criança; Desenvolvimento; família tem uma função essencial para o
Desenho. desenvolvimento psicossocial da criança,
Contato: Angelina Nunes de Vasconcelos, no entanto, quando existe a presença de
UFPE, vasconcelos.angelina@gmail.com. algum transtorno mental podem alterar
o desenvolvimento infantil. A depressão,
por exemplo, influencia o funcionamen-
CO 52 - LT05 to familiar, principalmente quando esse
transtorno acomete a figura materna. Al-
Relações Familiares 2 guns estudos mostram que quadros de
depressão materna têm grande influência
em todos os ambientes familiares, com o
LT05-1204 - A DEPRESSÃO MATERNA aumento das chances de desenvolver pro-
E O AMBIENTE FAMILIAR: UMA blemas de comportamento infantil confli-
CORRELAÇÃO ENTRE O INVENTÁRIO tos familiares ou outro transtorno psiqui-
BECK DE DEPRESSÃO E O átrico devido à depressão da mãe. As re-
FAMILIOGRAMA lações familiares funcionam em sistemas
Mariângela Santos de Jesus - UFRB/CCS de díades (relação entre dois membros da
mariangela.santos@msn.com família) e tríades (relação entre três mem-
Gustavo Marcelino Siquara - UFRB/CCS bros da família), do bom funcionamen-
gustavosiquara@hotmail.com to dessas relações decorre o equilíbrio
Ana Ribeiro Santana - UFRB/CCS no ambiente familiar. Em famílias onde
ana.ribeiro_22@hotmail.com um dos membros, especialmente a mãe,
Thiago da Silva Gusmão Cardoso - UFRB/CCS tem sintomas depressivos as interações
thiago_gusmao1@hotmail.com tendem a ficar instáveis. Tendo em vista
Patrícia Martins de Freitas - UFRB/CCS estes dados e entendendo que a família
pmfrei@gmail.com desempenha um papel essencial tanto no
desenvolvimento psicológico quanto na
Segundo algumas abordagens (como a do promoção da qualidade de vida de seus
desenvolvimento no ciclo vital de Baltes), membros, o presente trabalho objetiva
o ser humano é social e vive desde o seu demonstrar a correlação existente entre
nascimento dentro de um contexto que depressão materna e conflitos familiares.
possibilita desenvolver-se social, física e Os participantes do estudo foram 21 su-

1024
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

jeitos, sendo 42% (9) do sexo feminino, lisa inicialmente as relações entre as día-
com idade média de 8,90 anos (dp=0,91) des (pai-mãe, filho-mãe, filho-pai e filho-
e entre 7 e 11 anos, que freqüentam uma -irmão) procurando com isso obter uma
escola pública da cidade de Santo Antônio visão geral da família. O relacionamento
de Jesus-BA. O projeto teve a aprovação existente entre cada díade é descrito em
no Comitê de Ética. Os dados foram obti- termos adjetivos, dados em uma escala Li-
dos em uma reunião na escola na qual o kert que vai desde “não corresponde” até
filho da participante estuda. Foi explicado “corresponde totalmente”, representan-
as participantes todos os procedimentos tes de duas dimensões mais amplas, sen-
do projeto e aquelas que aceitaram parti- do eles afetividade e conflito. Para análise
cipar assinaram o Termo de Consentimen- de dados foi utilizado o programa estatís-
to Livre e Esclarecido (TCLE). Os instru- tico SPSS 18.0. Os dados foram analisados
mentos utilizados foram o Inventário Beck através da correlação de Pearson. Os re-
de Depressão (Beck Depression Inventory- sultados do estudo apontaram as seguin-
-BDI) e o Familiograma. O BDI é um ins- tes correlações: afetividade pai-mãe (r= -,
trumento originalmente desenvolvido por 765 e p=, 000), afetividade filho-mãe (r=,-
Beck, Ward, Mendelson, Mock e Erbaugh 630 e p= ,003), conflito filho-mãe (r= ,307
(1961), que tem como propósito fazer um e p= ,188), afetividade filho-pai (r= -,742
levantamento da intensidade dos sinto- e p= ,000), conflito filho-pai (r= ,536 e p=
mas depressivos através de uma escala ,018), afetividade filho-irmão (r= -,600 e
de autorrelato composta de 21 itens cada p= ,023), conflito filho-irmão (r= ,626 e
um com quatro alternativas com esco- p= ,017). Os dados sugerem que há uma
res de zero a três os quais subentendem carga de correlação positiva significativa
graus crescentes de depressão. Esses entre os sintomas de depressão identifica-
21 itens fazem referência a 19 fatores, a dos pelo BDI os conflitos existentes entre
saber, tristeza, sentimento de fracasso, as díades familiares filho-mãe, filho-pai e
pessimismo, punição, insatisfação, autoa- filho-irmão, e uma carga de correlação ne-
versão, idéias suicidas, retraimento social, gativa entre os mesmos sintomas e a afe-
irritabilidade, choro, indecisão, mudança tividade. Esses dados sugerem que existe
na autoimagem, dificuldade de trabalhar, uma relação importante entre os níveis de
fatigabilidade, insônia, perda de apetite conflito e afetividade nas díades familiares
e peso, preocupações somáticas e perda e que influenciam os níveis de depressão
da libido. Trata-se de um inventário ini- materna. Essas alterações no funciona-
cialmente pensado para uso em pacientes mento familiar podem gerar conseqüên-
psiquiátricos, mas que, no entanto vem cias como problemas de comportamento
sendo amplamente utilizado em pesqui- infantil ou psicopatologias como o au-
sas com pacientes não psiquiátricos. O mento dos níveis de ansiedade. Um ponto
outro instrumento utilizado, neste estudo importante a ser ressaltado é a limitação
foi o Familiograma, este se constitui como do estudo para investigar outras variáveis
um instrumento capaz de avaliar díades que possam influenciar na percepção ma-
familiares com base em duas idéias prin- terna acerca do seu funcionamento fami-
cipais: a terapia sistêmica estrutural e a liar. O fato a ser ressaltado é que as rela-
Teoria dos Gráficos. O Familiograma ana- ções familiares podem influenciar muito a

1025
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

vida de todos os membros da família tanto viços de saúde, da comunidade de pais e


de forma positiva quanto de forma nega- de parceiros diversos. Esta perspectiva traz
tiva, e as relações conflituosas estão cor- uma nova visão para a área educacional,
relacionadas à sintomatologia depressiva considerando que o desenvolvimento do
da mãe mostrando que quando este tipo escolar está ligado a questões ambien-
de transtorno se faz presente as relações tais, de convivência com a família e com
entre as díades se tornam inadequadas. a sociedade em geral, de alimentação e
nutrição adequadas, as oportunidades de
Palavras-chave: relações familiares, Inventário aprendizagem de habilidades, de constru-
Beck de Depressão, Familiograma ção de conhecimento e de acesso a recre-
Contato: Mariângela Santos de Jesus, UFRB, ação e as condições de segurança que lhes
mariângela.santos@msn.com são oferecidas (Iervolino, 2000). De acordo
com Catalán apud Moura et al. (2007), po-
dem ser consideradas estratégias e ações
LT05-1332 - PRATICAS EDUCATIVAS de uma escola promotora de saúde o di-
PARENTAIS: UM PROJETO DO álogo na resolução de problemas, o evitar
PROGRAMA ESCOLA PROMOTORA situações constrangedoras e não recorrer
DA SAÚDE à coerção e punição como instrumento
Andréia Arruda Guidetti - UNICAMP educativo, estar atento na elaboração da
Prefeitura Municipal de Itatiba estrutura curricular, à adequação de con-
deia.arruda@ig.com.br ceitos, habilidades e atitudes que permi-
tam realizar ações individuais e coletivas
O presente trabalho pretende demons- que melhorem a qualidade de vida e favo-
trar o funcionamento de uma prática de reçam as relações interpessoais, disponi-
intervenção que acontece dentro de um bilizar veículos de expressão para todas as
Programa da Secretaria de Educação do pessoas que convivem na escola, propor-
município de Itatiba, estado de São Paulo, cionar programas ergonômicos que privi-
chamado “Escola Promotora da Saúde”. O legiem cuidados com o corpo e a mente e
objetivo principal do programa é promo- desenvolver atividades que envolvam co-
ver a mudança do paradigma tradicional munidade educativa e família. Como des-
para enfoques integrais de saúde escolar, taca Bronfenbrenner (1996), num modelo
proporcionando discussões sobre educa- ecológico do desenvolvimento humano
ção e promoção da saúde que possibili- atuam sistemas e subsistemas, onde des-
tem o aumento da qualidade de vida dos taca a cultura e a natureza, que operam
seus participantes. Além disso, tem uma na família, na escola, na criança, na co-
visão global do ser humano e considera as munidade, entre outros, de forma equi-
pessoas dentro de seu ambiente familiar, librada, encaixada como um todo e que
comunitário e social (Sociedade Brasileira não podem ser desconsideradas. Assim,
de Pediatria, 2005). Segundo o Programa acredita-se que as práticas educativas na
Nacional de Saúde Escolar (Brasil, 2006), escola devem ir além de ações pedagógi-
uma escola que se proponha a promover cas e transformarem-se em possibilidades
a saúde, deve mobilizar a participação di- de transformações individuais e sociais,
reta e o envolvimento da escola, dos ser- contribuindo para a formação de sujei-

1026
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tos éticos e cidadãos em busca constante atual, os pais podem sentir-se inseguros
de uma vida melhor. O ambiente escolar, em relação ao que devem fazer para um
como espaço de convivência e intensas melhor desenvolvimento dos filhos. A in-
interações sociais, apresenta-se como um tervenção aconteceu com pais ou respon-
terreno fértil para implantação de propos- sáveis de alunos regularmente matricula-
tas, estratégias e ações que envolvam pro- dos em uma escola de educação infantil
moção de saúde. A educação para a saúde da cidade de Itatiba, estado de São Paulo,
com enfoque integral objetiva responder com idades entre 3 e 6 anos. Participaram
às necessidades do aluno em cada etapa em média 45 familiares, incluindo pai,
do seu desenvolvimento. Desta forma, o mãe, avós ou tios. Foram realizados quatro
projeto é realizado com toda comunida- encontros semanais, dentro do ambiente
de educativa de três escolas da cidade de escolar, com duração de 1 hora e 30 minu-
Itatiba no interior do estado de São Pau- tos, onde se tratou de temas relacionados
lo. Por comunidade educativa entende-se ao suporte familiar para as questões dis-
a equipe gestora, alunos e familiares da ciplinares. O primeiro encontro abrangeu
creche à educação de jovens e adultos. o comportamento infantil e algumas pos-
Dentro do contexto do ‘Programa Escola síveis causas para o bom ou mau compor-
Promotora da Saúde’ algumas propostas tamento. O segundo dia chamou atenção
de intervenção foram pensadas como for- dos pais para as características pessoais
ma de investir na promoção de saúde do dos filhos, tanto positivas quanto negati-
ser humano na sua totalidade e pretende- vas e destacou a importância de transfor-
-se com este trabalho apresentar uma de- mar o tempo junto com os filhos em algo
las, intitulada como ‘Oficinas de Práticas prazeroso. Por ultimo, o terceiro encontro
Educativas Parentais’, que visa o desen- tratou das estratégias educativas que po-
volvimento de iniciativas familiares como dem ser utilizadas pelos pais na educa-
fatores de proteção infantil, visto que não ção dos filhos. Os participantes avaliaram
se pode negar a importância da família como excelente a iniciativa e manifesta-
para seus membros, especialmente para ram disposição para tentar mudar. Este
as crianças que vivem nesse ambiente. Se- trabalho se justifica, pois visa reduzir a
gundo Bee (1996) a forma como a família prevalência de fatores de risco e aumentar
está organizada evidencia o funcionamen- os fatores de proteção relacionados com
to da mesma, entretanto, é o processo de os estilos de vida. Além disso, acredita-se
interação familiar que tem maior impacto que a médio e longo prazo, como indica o
sobre o comportamento infantil. Na mes- Programa Nacional de Saúde Escolar (Bra-
ma direção, Macedo (1994) enfatiza que sil, 2006), o custo-efetividade das inter-
a família é, para a psicologia, revestida de venções preventivas de hoje representem
uma importância capital, visto ser o pri- um ganho em serviços de saúde amanhã.
meiro ambiente no qual se desenvolve a Pretende-se ainda, que a construção deste
personalidade nascente de cada novo ser projeto reforce a ação parceira estratégica
humano. Contudo, Fini (2000) evidencia para o desenvolvimento de ações interse-
que por causa de alterações pelas quais toriais e reafirmação de compromissos e
tem passado a família, da popularização co-responsabilidades entre os setores en-
da psicologia e das complexidades da vida volvidos, educação e saúde.

1027
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: família, intervenção, dente assume o papel de transmitir à sua


educação infantil sucessora seus valores, crenças e modos
Contato: Andréia Arruda Guidetti, UNICAMP, de agir. E, nesse processo de transmissão,
Prefeitura Municipal de Itatiba, as concepções passadas de uma geração
deia.arruda@ig.com.br a outra nesta cadeia geracional abrem
sempre uma brecha para se acrescentar
algumas variações, que seriam marcas
LT05-1346 - TRANSMISSÃO próprias de cada geração. Segundo Pais
INTERGERACIONAL E A PATERNIDADE (1998) de uma geração a outra há saberes
Jôse Peixoto da Rocha Souza da Cunha - UERJ e posições que se herdam e transmitem,
joseprsouza@ig.com.br garantindo certa continuidade geracional.
Angela Donato Oliva - UERJ Mas há lugar para a transformação dos
angeladonatoliva@uol.com.br valores sem que estes tenham que estar
necessariamente polarizados em torno de
A transformação da família é influenciada gerações distintas. Visto desta forma, as
por diversos fatores sociais, conseqüente- gerações que se seguem nunca são exa-
mente, ela se torna um palco para o con- tamente iguais às anteriores, até porque
flito entre o moderno e o tradicional e, os indivíduos que compõem uma geração
nesse embate, ocorre simultaneamente a têm em comum sua posição no processo
mistura de valores individuais e coletivos. histórico e social devido à experimentação
Segundo Laraia (2009) cada mudança, por dos mesmos acontecimentos, o que acaba
menor que seja, representa o desenlace por delimitar suas possibilidades de esco-
de numerosos conflitos. Isto porque em lha e, logo, seus modos de atuação. Hoje
cada momento as sociedades humanas vivemos um momento em que, devido ao
são palco do embate entre as tendên- aumento da expectativa de vida da popu-
cias conservadoras e as inovadoras. As lação, pode-se observar a convivência de
primeiras pretendem manter os hábitos três ou até quatro gerações de uma mes-
inalterados, muitas vezes atribuindo aos ma família. Esse fenômeno não pode ser
mesmos uma legitimidade de ordem so- confundido com a antiga família extensa,
brenatural. As segundas contestam a sua já que, os mais velhos eram autoridade
permanência e pretendem substituí-los maior dentro de casa e todas as gerações
por novos procedimentos. São aparente- abaixo lhes deviam respeito. Ao longo do
mente pequenas mudanças que cavam o processo de globalização, que traz consigo
fosso entre as gerações, que faz com que uma extrema velocidade no trânsito das
os pais não se reconheçam nos filhos e es- informações e transformações que estão
tes se surpreendam com a “caretice” de ocorrendo no núcleo familiar, e sob a in-
seus progenitores, incapazes de reconhe- fluência de uma ideologia democrática e
cer que a cultura está sempre mudando. igualitária, a geração mais velha perdeu
Por isto, num mesmo momento é possível sua posição hierárquica dentro da famí-
encontrar numa sociedade pessoas que lia, aumentando-se as trocas intergera-
têm juízos diametralmente opostos sobre cionais. De acordo com Pais (1998) hoje
um novo fato. A transmissão geracional as relações intergeracionais são mais pa-
acontece quando uma geração prece- cíficas do que outrora e que os conflitos

1028
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

acontecem basicamente por motivos coti- bre alguns aspectos relacionados à pater-
dianos e não por uma disparidade de va- nidade contemporânea, pode-se dizer de
lores. Para Teykal (2007) estamos presen- uma forma geral, que quando se recorre
ciando uma mudança brusca no processo à literatura nacional e internacional sobre
de transmissão, já que pela primeira vez crenças a respeito dos cuidados parentais
se assiste uma inversão no sentido trans- paternos algumas indagações e lacunas
missional – este aspecto por si só repre- ficam em aberto. E em relação à trans-
sentaria uma ruptura nunca antes vista – o missão intergeracional, a predominância
que propicia não só a imposição dos va- é também de pesquisas relacionadas às
lores da cultura jovem sobre as gerações mães e avós ou pesquisas que privilegiam
mais velhas, como torna possível a esco- os resultados dessa transmissão. Por es-
lha do que seria importante receber das sas razões, este estudo visou atender,
gerações anteriores. Podemos pensar que em parte, essas lacunas, ao investigar as
cada pessoa traz consigo crenças que são crenças sobre práticas de cuidados pa-
passadas através de gerações, sobre como rentais paternos que são privilegiadas na
devem ser os cuidados parentais e como atualidade. Além de relacionarmos como
o homem deve desempenhar o seu pa- são percebidas as práticas de cuidados
pel na paternidade. Porém, percebemos parentais paterno entre duas gerações
que essas crenças sofrem mutações, isto distintas. Participaram desta pesquisa 100
é, não há apenas uma influência geracio- pessoas residentes na cidade de Magé
nal, as próprias crenças perpassadas pelas (estado do Rio de Janeiro), divididas em
gerações estão sujeitas às modificações dois grupos: 50 (homens e mulheres) de
devidas transformações históricas, sociais 25 a 35 anos e 50 (homens e mulheres)
e ambientais, o microssistema familiar é de 55 a 65 anos. O estudo incluiu ques-
submetido ao macrossistema social, um tionário sociodemográfico, questionário
exemplo disto é o fato de na atualidade, sobre Função Paterna, aplicação da Escala
com a rápida disseminação das informa- sobre Crenças e Práticas Paterna (ECPP) e
ções resultante do processo de globaliza- Escala sobre Crenças e Práticas Paterna –
ção, essa idéia de que se pode escolher o Pretéritas (ECPP-P). As análises dos dados
que deve ser transmitido é reforçada, na foram realizadas por meio do software
medida em que viabiliza a ilusão de que SPSS. Foram realizadas análises descritivas
o saber está logo ali disponível para todos (média, desvio-padrão, valores mínimo e
e basta ter acesso a ele para adquiri-lo. máximo), bem como análise de compara-
Desta forma, o indivíduo capta saberes ção de médias (Teste t de Student e Anova
que não necessariamente foram passados Oneway) e correlações r de Pearson. Após
por seus ascendentes e sente-se livre para análise de variância ANOVA, foi utilizado o
fazer suas escolhas individuais acerca do teste post hoc de Scheffé (Dancey & Rei-
que seria relevante para ele. Essa situa- dy, 2006). Observamos durante a pesqui-
ção é, ao mesmo tempo, uma liberação sa que as crenças geracionais estão em
da cadeia transmissional e uma exaltação uma via de mão dupla, interferindo em
do individualismo, que pode trazer como novas gerações e sofrendo influências da
conseqüência a desvalorização daquilo mesma, isto reflete que embora gerações
que é passado de geração em geração. So- mais velhas tenham determinados posi-

1029
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cionamentos acerca das práticas parentais externo e a perspectiva de consumo das


paternas, elas foram se adaptando às mo- famílias. Se a filosofia vai à raiz das coisas,
dificações da sociedade e incorporando então se questiona como os aspectos ma-
novos valores a respeito dos papéis de- croeconômicos são base para as políticas
sempenhados pela tríade pai-mãe-filho. públicas de planejamento familiar e não
relacionadas ao “eu” das famílias? Talvez
Palavras-chave: psicologia evolucionista, uma leitura atenta de Habermas (1987)
transmissão geracional, cuidados parentais em seu livro “Conhecimento e Interesse”
paternos esclareça filosoficamente essa indagação.
Contato: Jôse Peixoto da Rocha Souza da Habermas (1987) cita Marx para dizer so-
Cunha, UERJ, joseprsouza@ig.com.br bre a formação do interesse e da verda-
de. Para o autor é no interesse e não na
neutralidade da ciência, confundida como
LT05-1501 - EPISTEMOLOGIA EM conhecimento que a pretensão pela uni-
METODOLOGIA QUALITATIVA versalidade do saber pode ser avaliada.
DESENVOLVIMENTO FAMILIAR Em 1798 vai se estabelecendo a Primeira
Júlio César dos Santos - UFRB Revolução Industrial e as mudanças do
economiadasaude@ufrb.edu.br modelo tradicional de famílias advindas
das longas jornadas de trabalho, do traba-
Financiamento: CAPES
lho feminino e infantil, da ênfase familiar
na conquista econômica em detrimento
Considerando a metodologia e epistemo-
da qualidade de vida. Há um aumento
logia processo cíclico e estudo da constru-
de vulnerabilidades no campo, entendida
ção de conhecimento respectivamente,
aqui como aplicação de políticas públi-
buscou–se, neste resumo, as proximida-
cas no meio urbano em detrimento das
des da pesquisa qualitativa em desenvol-
áreas rurais, nesse sentido, construindo
vimento familiar. O estudo foi de revisão
a ideologia que é melhor viver no meio
teórica sobre a expressão planejamento
urbano – estabelecendo o êxodo rural e
familiar. A hipótese é que dependendo
as grandes metrópoles. A linguagem da
do construto epistemológico e do método
ciência internacional passou a ser os rela-
que eu seleciono para investigar o fenô-
tórios de encontros, resoluções e acordos
meno familiar, o pesquisador observará a
realidade de uma determinada maneira; da união dos países pós-segunda guerra.
o método vai influenciar na análise do fe- No período pós Segunda Guerra Mundial,
nômeno, de acordo com a teoria que eu nasce a Organização das Nações Unidas
escolhi dentro de um paradigma episte- (ONU), através da Conferência de Paz em
mológico. Para o mainstream em Ciências 1945, em São Francisco. Como conse-
Humanas a maioria da pesquisa conside- qüência, portanto, foi revisitada a teoria
rada científica advém de ênfase quantita- malthusiana, como Teoria Demográfica
tiva. Lendo os textos de Mesquista (2008), Neomalthusiana. Essa teoria, explica o
Berquó e Rocha (2005), Cipriano (2002) e subdesenvolvimento pela explosão po-
Lima (2010), o planejamento familiar no pulacional e propõe sua redução através
Brasil tem relação com os aspectos macro- de métodos contraceptivos. Em resposta
econômicos, como as influências do setor aos neomalthusianos, Karl Marx ques-

1030
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tionou Thomas Malthus, afirmando que da linguagem como entidade constitutiva


a superpopulação mundial atenderia as do espaço social; Habermas (1987) com
necessidades do capital industrial criando a inclusão do interesse na construção do
um exército de trabalhadores potenciais conhecimento. Resultados desses estudos
gerando disputas por postos de traba- estão em Lima (2010) embasado em estu-
lhos e conseqüentemente em reduções dos de Lesthaeghe 1986 a 2009, Reis 1975
salariais (apud Habermas, 1987, p.276). a 2000; Rios-Neto 1987 a 2005; Carvalho
Isso regularia as pressões populacionais 1974 à 2004; Lamounier 1975 à 1980; Fa-
demográficas. Surgem hipóteses de que ria 1975 à 1999 (citados por Lima, 2010);
a melhoria da qualidade de vida estaria sobre os estudos sobre fecundidade e sua
ligada ao número de filhos e não a uma relação com eleições. Primeiramente, o
redistribuição dos recursos de uma dada autor buscou analisar “os diferentes ní-
população capitalista, onde muitos têm veis de fecundidade entre os municípios
pouco e vice-versa. Observe que o cres- brasileiros em 1980 e, por conseguinte,
cimento dos estudos do desenvolvimento sua relação com a distribuição espacial do
familiar vai obtendo contribuições de to- eleitorado do partido Movimento Demo-
das as áreas como na Filosofia Economia, crático Brasileiro (MDB) em 1976. Num
demografia e História. Uma das razões é segundo momento, investigou-se como
o processo histórico de aceitação das Ci- o efeito eleitoral comunitário emedebista
ências Humanas pelas ciências, chamado associou-se negativamente com variações
movimento da verdade científica positi- reprodutivas individuais e comunitárias,
vista, diferenciando da verdade religiosa. durante a década de oitenta. Por fim,
Rey (1997) apresentou em linhas gerais analisaram-se as variações reprodutivas
as características do positivismo como (a) municipais de períodos subseqüentes ao
subjetividade e afetividade são conside- bipartidarismo, e suas relações com o pas-
radas de forma pejorativa; (b) o método sado eleitoral brasileiro”; o resultado polí-
de investigação científica é o mesmo para tico deste estudo aponta que o declínio do
todas as ciências; (c) objetivos da ciência número de filhos guarda relação com a ur-
seriam a descrição imparcial, a predição e banização, o idealismo político do Partido
o controle sobre a realidade. Nos séculos Movimento Democrático Brasileiro - MDB
XVIII e XIX só era científico estudos que ca- e até mesmo a saída do homem rural do
racterizavam-se metodologicamente pela seu espaço geográfico. Pergunta-se como
neutralidade, distanciamento entre sujei- ficam as atividades agrárias? Por que não
to e objeto, matematização da análise e criar políticas em desenvolvimento fami-
resultados. O objetivo do conhecimento liar que considere os aspectos da inclu-
para os positivistas é explicar a realidade são de grupos como os do meio rural? O
através de leis universais, de causa-efeito. avanço dos estudos em Thomas Robert
Exclui-se então a criação de teorias a partir Malthus (1798, apud Lima, 2010) com os
dos princípios que não são percebidos ob- estudos sobre crescimento populacional;
jetivamente. Os avanços do pensamento ou mesmo estudando a família como em
científico são estudados em Kuhn (1992) Lima (2010) dá se conta que o desenvol-
com a revolução científica; Foucault vimento ocorreu – mas não se observa
(1992) com a reflexividade e a dimensão como. Para tanto é necessário uma me-

1031
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

todologia que considere o processo de mide, 2004). Ao conjunto de práticas edu-


mudança com os descritos nos estudos do cativas parentais ou atitudes parentais Go-
desenvolvimento humano de J. Valsiner mide (2006) define como Estilo Parental.
(Kindermann & Valsiner, 1989; Valsiner, Intervenções que promovam a otimização
2007) e L. Vygotsky (Vygotsky, 2008) que das práticas parentais, ou seja, a aquisição
adotam o desenvolvimento como proces- e/ou manutenção das práticas parentais
so dinâmico e a mudança como o foco de positivas e a diminuição das práticas nega-
pesquisa. Esse desenvolvimento é caracte- tivas, podem auxiliar no desenvolvimento
rizado como dialógico e/ou trialógico; pela adequado das crianças. Esta pesquisa visa:
visão do contexto, por meio de processos descrever os efeitos de um programa de
multilineares da seta tempo-espaço. Para intervenção de estilos e práticas parentais
essa metodologia surge a possibilidade de de mães de bebês mediante comparações
utilização dos seguintes métodos como pré e pós-teste realizado com dois grupos,
intervenção, etnografia, observação, mi- mães adolescentes e mães adultas; e re-
crogenética, análise do discurso, estudo alizar comparações entre os grupos. Par-
de caso, análise da narrativa, grupo focal. ticiparam da pesquisa 40 mães de bebês
São métodos de pesquisa em que sujeito de até 24 meses de idade, sendo 20 mães
e objeto interagem e se constroem no mo- adolescentes (Grupo 1) e 20 mães adultas
mento da pesquisa – e que tentam supe- (Grupo 2). O projeto ocorreu no Centro de
rar o passado positivista e estigmatizado Psicologia Aplicada (CPA), da UNESP-Bau-
de previsão de futuro na temática. ru, e foi aprovado pelo Comitê de Ética lo-
cal. Para a coleta de dados foi utilizado o
Contato: Júlio César dos Santos, UFRB, Inventário de Estilos Parentais para Mães
economiadasaude@ufrb.edu.br de Bebês (IEPMB), adaptado de Gomide
(2006), devido a faixa etária dos filhos,
bebês com até 24 meses. O IEPMB consta
LT01-780 - EFEITOS DE UM PROGRAMA de 25 itens, sendo cinco de cada um dos
DE INTERVENÇÃO NOS ESTILOS conjuntos de práticas identificados: mo-
PARENTAIS DE MÃES DE BEBÊS nitoria positiva, negligência, abuso físico,
ADULTAS E ADOLESCENTES. disciplina relaxada, punição inconsistente.
Elisa Rachel Pisani Altafim - UNESP A pesquisa contou com três etapas: pré-
altafim.elisa@gmail.com (Bolsistas FAPESP ) -teste; grupo de intervenção; e pós-teste.
Sária Cristina Nogueira - UNESP A partir do cálculo do índice de Estilo Pa-
sariacris@yahoo.com.br rental observa-se qual estilo parental é
Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues - predominante. Os estilos parentais são
UNESP classificados em: Ótimo, com presença
olgarolim@uol.com.br marcante das práticas parentais positivas
e ausência das práticas negativas; Bom,
As práticas parentais têm como objetivo com presença de práticas parentais posi-
educar, socializar e controlar o compor- tivas e utilização com baixa frequência de
tamento das crianças, visto que se cons- algumas práticas negativas; Regular: pre-
tituem o “alicerce” para a aquisição dos sença de práticas parentais positivas e fre-
repertórios comportamentais futuros (Go- quência média de práticas parentais nega-

1032
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tivas; Ruim, média ou baixa frequência de tal Ruim. Os resultados demonstram que
práticas parentais positivas e frequência 65% (n=13) das participantes mantive-
média ou alta de práticas parentais negati- ram o mesmo estilo, sendo cinco o estilo
vas. O programa de intervenção realizado parental ótimo, três o estilo bom, duas
no presente estudo constituiu-se de oito o estilo regular, e três o estilo ruim; 20%
encontros, que ocorreram uma vez por se- (n=4) pioraram de estilo parental uma de
mana, tendo duas horas de duração cada ótimo para bom, uma de ótimo para re-
encontro e conduzidos por três estudan- gular, uma de bom para regular, e uma de
tes do último ano de psicologia. O obje- regular para ruim; e 15% (n=3) melhora-
tivo dos encontros foi promover reflexões ram de estilo, uma do estilo bom para o
sobre os temas: família; maternidade; prá- ótimo, uma do estilo regular para ótimo,
ticas parentais; desenvolvimento infantil; e uma do regular para o bom. A partir do
e projeto de vida. E no grupo de mães teste de Wilcoxon foi verificado que não
adolescentes foi trabalhado o tema ado- existe diferença significativa, em ambos
lescência. As mães adolescentes iniciaram os grupos, nos estilos parentais antes e
o programa de intervenção apresentando: após a participação no grupo de interven-
Estilo Parental Ótimo 50% (n=10); Estilo ção, Grupo 1 (T=79, p = 0,332) e Grupo 2
Parental Bom, 35% (n=6), e Estilo Parental ( T= 30, p = 0,456). Também foi realizada
Regular, 20% (4). Nenhuma participante uma comparação entre os grupos e foi ve-
apresentou Estilo Parental Ruim. Após o rificado que existe diferença significativa,
programa, quando o instrumento foi apli- entre os grupos de mães adolescentes e
cado novamente nas mães adolescentes, adultas, nos estilos parentais na primeira
observou-se que 55% (n=11) das mães e na segunda aplicação do inventário, con-
apresentaram Estilo Parental Ótimo; 35% forme o teste de Mann Whitney, 1ª apli-
(n=7) Estilo Parental Bom e 10% (n=2) Es- cação (U=127, p = 0,048) e 2ª aplicação (
tilo Parental Regular. A maioria das partici- U= 122, p = 0,035). Os resultados revelam
pantes 90% (n=18) após o grupo apresen- que as mães adultas apresentam estilos
tou estilo parental ótimo ou bom. Os re- parentais piores do que as mães adoles-
sultados demonstram que 65% (n=13) das centes na primeira e na segunda aplicação
participantes mantiveram o mesmo estilo, do Inventário. Nota-se que antes e após a
sendo oito o estilo parental ótimo, quatro participação no programa de intervenção
o estilo bom e uma o estilo regular; 10% as mães adolescentes apresentam estilos
(n=2) pioraram de estilo parental, uma de parentais mais adequados que os estilos
ótimo para regular e uma de ótimo para parentais apresentados pelas mães adul-
bom; e 25% (n=5) melhoraram de estilo, tas. Para a maioria das participantes o pro-
duas do estilo regular para o bom, duas do grama de intervenção foi eficaz, promo-
estilo bom para o ótimo, e uma do estilo vendo a aquisição e/ou manutenção das
regular para ótimo. As mães adultas nas práticas parentais positivas e a diminuição
duas aplicações, antes e depois da inter- das práticas negativas. Considera-se que o
venção apresentaram: 35% (n=7) Estilo programa foi efetivo para aquelas partici-
Parental Ótimo, 25% (n=5) Estilo Parental pantes que mantiveram o estilo parental
Bom, 20% (n=4) Estilo Parental Regular ótimo ou bom, e para as participantes que
e 20% (n=4) apresentaram Estilo paren- melhoraram seus estilos para ótimo ou

1033
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

bom. No grupo das mães adolescentes o educação ambiental, computação, apoio


programa foi efetivo para 12 participantes espiritual, através de dinâmicas e oficinas.
que mantiveram o estilo parental ótimo O programa foi organizado no 1º. Semes-
ou bom e para cinco participantes que tre de 2011, no intuito de oportunizar uma
melhoraram de estilo para bom ou ótimo, visão mais ampla e abrangente do mundo
totalizando 85% das participantes (n=17). contemporâneo através da observação,
No grupo das mães adultas o programa reflexão e análise dos fenômenos e even-
foi efetivo para 8 participantes que man- tos pontuais e significativos nas diversas
tiveram o estilo parental ótimo ou bom e atividades humanas, visando mudanças
para 3 participantes que melhoraram de e transformações psicossocioculturais,
estilo para bom ou ótimo, totalizando 55% levando em conta as características que
das participantes (n=11). O programa não modelam a sociedade atual, como relacio-
foi efetivo para aquelas participantes que namento casual, postura transcendental,
pioraram seus estilos parentais ou man- linguagem digital, poder minutal, realida-
tiveram os estilos regular e ruim. Nesses de virtual, predomínio espiritual. O tema
casos seria interessante realizar uma in- que norteou esses encontros foi a Sus-
vestigação de outras variáveis. tentabilidade, possibilitando discussões e
trocas em função de descobertas simples
Palavras-chave: estilos parentais, mãe de para problemas complexos do cotidiano
bebê e intervenção. na atualidade. Muitas dessas soluções
Contato: Elisa Rachel Pisani Altafim – altafim. passam por um resgate de hábitos anti-
elisa@gmail.com gos, que se mostram passíveis de revisões
como, por exemplo, o uso de sacolas não-
-descartáveis. O grupo dos idosos se adap-
LT04- 934 - RECICLAGEM ta de um modo mais fácil nesse quesito,
SOCIOCULTURAL NUMA DINÂMICA tendo em vista um hábito que já fez parte
INTERGERACIONAL da sua formação. Experiências intergera-
Maria Helena Novaes - PUC-Rio cionais como essas, congregando pessoas
suelesp@uol.com.br idosas, adultos, jovens e crianças facili-
Suely de Almeida Batista Dessandre - PUC/Rio tam a troca de lembranças, depoimentos,
suelesp@uol.com.br tradições, favorecem a escuta mútua e a
utilização da memória como ação social
Esta proposta teve como meta promover a (Novaes, 2003). Dentre diversos autores
integração de grupos intergeracionais reu- que desenvolvem o tema da contempora-
nindo, na Pontifícia Universidade Católica neidade, destaca-se Italo Calvino, a partir
– PUC-Rio, idosos participantes do Pro- de seis propostas para o 3º. Milênio – a
grama Sistêmico Integrado Global – PSIG leveza, a rapidez, a exatidão, a visibilida-
e adolescentes do NEAM – Núcleo de Es- de, a multiplicidade, a consistência – vir-
tudo e Ação sobre o Menor, Vice-Reitoria tudes a nortear não apenas a atividade
para Assuntos Comunitários, coordenados dos escritores, mas, cada um dos gestos
pela Professora Marina Lemette Moreira, de nossa existência. É um livro importan-
que neste ano completa 30 anos de ati- te, também, para ajudar a descobrir quem
vidades, dentre as quais, aulas de artes, somos nós: “...quem é cada um de nós

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

senão uma combinatória de experiências, Professora Marina Lemette Moreira (Mes-


de informações, de leituras, de imagina- trado em Psicossociologia – Departamen-
ções? Cada vida é uma enciclopédia, uma to NEAM – PUC-Rio). Os objetivos gerais
biblioteca, um inventário de objetos, uma foram: (a) favorecer o desenvolvimento
amostragem de estilos, onde tudo pode humano e a qualidade de vida, através da
ser continuamente remexido e reordena- análise das diversas linguagens da Arte e
do de todas as maneiras possíveis” (Calvi- da interação entre Ciência, Tecnologia e
no, 2005, p. 138). Esse programa desen- Crença, e os processos de produção do sa-
volveu, sobretudo, criatividade dos parti- ber na construção da identidade cultural
cipantes, troca entre as diversas gerações, brasileira; (b) resgatar a memória histórica
socialização e resgate da capacidade de e artística, destacando a importância de
refletir e de fazer trabalhos práticos pes- educação, da tecnologia a serviço do meio
soais a respeito do tema escolhido: “Como ambiente, da preservação e estética am-
Vivemos Agora: Eu e A Sustentabilidade biental, e estimulando processos criativos,
do Planeta Terra”. Foram propostos três incentivos na educação formal dos pais;
eixos de ações norteadoras relacionadas: (c) apresentar novos paradigmas, modelos
A Natureza, O Homem e A Cultura, no sen- teóricos e posturas biocientíficas, como
tido de interligá-las e configurar situações contraponto da nova realidade socioeco-
positivas no relacionamento humano, no nômica e política brasileira. Os resultados
aproveitamento dos materiais e resíduos foram obtidos a partir do desafio de tran-
produzidos pelo homem e na transfor- sitar pelos campos da Arte, Ciência, Tecno-
mação ambiental e cultural. No progra- logia e Religião, a fim de encontrar pontos
ma, os temas foram desenvolvidos pelos de equilíbrio entre necessidades, valores,
palestrantes convidados, dentre eles: (a) desejos e atividades. A partir de um olhar
A Intergeracionalidade na Vivência Hu- transdisciplinar criativo, possibilitou a ge-
mana – Professora Maria Helena Novaes ração de uma maior energia vital, tanto de
(Pós- Doutorado Psicologia); (b) Empreen- natureza estética quanto psicológica, so-
dedorismo Social e a Construção de um cial, cultural e mística através do saber, do
Mundo Moderno – Paulo P. Ferraz (MBA fazer, do sentir, do mudar e do produzir.
pela Universidade Harvard); (c) Arte Diá- O grupo demonstrou muita participação
logo Eterno do Imaginário – Audir Bastos com a temática, que oportunizou o enri-
Filho (Pós - Graduação em Arte Educação quecimento das capacidades cognitivas,
– Mestre em Pedagogia); (d) O Poder da de organização de pensamento, de per-
Comunicação e a Responsabilidade Social cepção de realidade e dos processos de
– Professor Miguel Pereira; (e) O Humor e mudanças, tanto pessoais, quanto sociais.
o Riso sua influência no Bem Estar Social – A motivação dos grupos foi grande e, ao
Professor Bernardo Jablonski (Doutor Psi- final, para concretizar as atividades, foi
cologia Departamento de Psicologia); (f) A confeccionado um alfabeto ecológico com
Historia ao Alcance de Todos – Prof. Ilmar as propostas trabalhadas e desenhos dos
Rohloff de Mattos (Departamento de His- adolescentes envolvidos para divulgar nas
toria – Professor e Coordenador de Edu- escolas e outros espaços educacionais. A
cação à Distância); e (g) Percorrendo uma promoção da qualidade de vida e saúde
Estrada de Conquistas: NEAM 30 anos – mental é que permeia os programas de

1035
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

políticas de atendimento e apoio à tercei- sa, utilizando a técnica de estudo de caso.


ra idade. O Programa Sistêmico Integrado Este estudo de caso teve como sujeito um
Global – PSIG/PUC-Rio – destaca-se como aluno de 14 anos, que apresentava com-
um dos pioneiros nesta área, dentre ou- portamento agressivo no universo escolar,
tros desenvolvidos por instituições como passando durante este estudo por duas
a Universidade Aberta da Terceira Idade – escolas, devido a problemas de agressivi-
UNATI da Universidade Estadual do Rio de dade. O sujeito e sua família receberam,
Janeiro – UERJ, a Universidade Federal do durante este período, acompanhamento
Rio de Janeiro – UFRJ, assim como associa- multidisciplinar da equipe do Centro de
ções de Geriatria e Gerontologia. Referência de Assistência Social (CREAS),
de um médico psiquiatra e da equipe do
Palavras-chave: relações intergeracionais, Conselho Tutelar. Foram realizados entre-
sustentabilidade, contemporaneidade vistas e testes psicológicos, que permiti-
Contato autor responsável: Suely de Almeida ram organizar as seguintes categorias: (a)
Batista Dessandre, PUC-Rio, como o adolescente é percebido; (b) como
suelesp@uol.com.br o adolescente se apresenta no quesito re-
lacionamento interpessoal; e (c) interven-
ções feitas em relação ao comportamento
CO 40 - LT06 agressivo do adolescente. Verificou-se, a
partir dos resultados, que a percepção do
Maus-tratos/Educação adolescente pelos entrevistados e pelos
testes feitos com ele confirma a literatura
citada, pois, ele reagiu diferentemente a
LT06-731 - O COMPORTAMENTO cada ambiente e, desta maneira, foi per-
AGRESSIVO E SUAS RELAÇÕES cebido. No universo escolar, no quesito
Maria Elisa Takahashi - UAB/UNB rendimento, o adolescente foi avaliado
despertar@terra.com.br como mediano, fato confirmado pelo tes-
Sílvia Ester Orrú - UNB te de inteligência, no qual ele apresentou
seorru@unb.br um rendimento médio inferior. Trazendo,
ainda, o resultado do teste de inteligên-
O desenvolvimento do ser humano ocorre cia, este informou a respeito de sua defi-
a partir na interação do indivíduo com o ciência, em regras gramaticais e lentidão
meio e isto se dá como um processo. Con- no seu processamento intelectual; além
forme Bronfenbrenner (1999), o indivíduo disso, na fala da coordenadora, ele pos-
vai se adaptando, progressivamente, aos sui defasagem em ortografia. Sobre isto,
estímulos e reforços com o qual convive e utiliza-se a afirmação de Vygotski (1994),
vai aprendendo a construir e a estabele- para quem as leis do desenvolvimento
cer relações, de acordo com os diferentes são as mesmas para todas as crianças:
contextos onde vive. Este trabalho tem o que mudam são os caminhos para al-
como objetivo discutir e investigar ques- cançar esse desenvolvimento. Pode-se
tões inerentes a comportamentos agres- analisar que os caminhos propostos por
sivos, na escola, que foram abordadas Vygotski estão relacionados aos estímulos
através do método qualitativo de pesqui- oferecidos no ambiente escolar, familiar

1036
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ou nos demais universos frequentados em primeiro lugar dentro de casa, depois


pelo adolescente. Assim, se ele tem uma na escola, quando recebe gozações dos
inteligência “normal” e apresenta certa colegas e não consegue expressar o que
deficiência em conteúdo, e isto ocorre realmente sente para os professores e,
em função dos estímulos oferecidos a ele, posteriormente, pode se transformar no
isto sugere a necessidade de um maior e abusador, agressor, repetindo ou repro-
melhor acompanhamento escolar, tanto duzindo o que aprendeu e viveu nas ex-
por parte da escola quanto por parte da periências anteriores. Verifica-se que o
família. No quesito relacionamento inter- comportamento do referido adolescente
pessoal, constatou-se que a dificuldade tem componentes tanto biológicos quan-
de relacionamento e o comportamento to emocionais e relacionais, conforme
agressivo foram detectados por todos os já citados anteriormente, demandando,
entrevistados e, também, evidenciados portanto, ações conjuntas em todas essas
tanto no teste de inteligência quanto no áreas. Por esta razão buscou-se analisar, a
teste de personalidade. Analisando-se o seguir, o tipo de intervenção oferecido ao
comportamento relacional do aluno pe- adolescente em questão. Verifica-se que,
los relatos da família, em primeiro lugar, no universo escolar, não existe uma preo-
pode-se constatar que o adolescente foi cupação em realizar alguma intervenção
vítima de violência por parte da mãe e específica com o aluno, pois, nele acredi-
que havia, ainda, um componente com- tam que a atuação deva ser pontual, isto é,
portamental hereditário relatado tanto se intervém quando o problema do com-
pelo pai quanto pela mãe. Conforme Me- portamento agressivo acontece. Segundo
neghel (1998), crianças vítimas de vio- Olweus (1993), apesar da sua dimensão e
lência doméstica demonstram ser mais das suas consequências, a agressividade
agressivas que as outras, menos empá- escolar e o bullying, enquanto fenôme-
ticas em comparação aos seus colegas nos, têm sido negligenciados socialmente
e apresentam dificuldade em expressar e não têm sido alvo de prioridades nas
emoções e identificar as emoções dos co- políticas públicas, fato este confirmado
legas. O ambiente escolar foi o local onde nos relatos apresentados. Segundo Sal-
mais se evidenciou os comportamentos mivalli (1996, 2004), no contexto escolar,
descritos acima, com atitudes agressivas os comportamentos devem ser encarados
do adolescente para com certos colegas e, como fenômenos de grupo e, desta ma-
ao mesmo tempo, atitudes de esquiva e neira, merecem ser analisados dentro de
de respeito para com os professores. Se- uma perspectiva sistêmica e ecológica. A
gundo Lisboa (2005), alunos que viveram informação da conselheira tutelar, de que
experiências de violência familiar podem as ações comprometidas do adolescente
levar para a escola o mesmo padrão, uti- em questão devem receber intervenção
lizando de condutas agressivas para com a partir do foco na família e que, para
os colegas e atitudes evitativas para com isto, tanto o adolescente quanto a famí-
os professores, sendo interessante ana- lia foram encaminhados para um acom-
lisar sistêmica e ecologicamente este fe- panhamento, coincide com a informação
nômeno, pois, o ambiente onde o aluno do médico psiquiatra, que afirma que a
vive colabora para que se sinta vítima; melhora da conduta do adolescente, sem

1037
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

prescindir do uso adequado das medi- assinalamento (notificação) aos órgãos de


cações psiquiátricas, acontecerá a partir proteção infantil, com vistas ao desenca-
da mudança de postura da família. Esta deamento de ações de responsabilização
proposta de intervenção vem de encon- dos cuidadores/responsáveis, bem como
tro com a sugestão de Salmivalli (1996, de ajuda à criança e à família, de modo
2004), já citada acima. Os dados investi- a garantir que tais ações aconteçam. Pelo
gados e analisados a partir da pesquisa Estatuto da Criança e do Adolescente
realizada ampliam o entendimento sobre (ECA), instituições sociais/serviços e pro-
as questões referentes ao comportamen- fissionais ligados à área da infância passa-
to agressivo em contexto escolar. ram a ser obrigados, por lei, a agirem fren-
te a situações suspeitas ou confirmadas
Palavras-chave: contexto escolar, de maus-tratos infantis. No estado de São
relacionamento interpessoal, comportamento Paulo, especificamente, a Lei 10.498/00
agressivo regulamentou o indicativo nacional e,
Contato: Maria Elisa Rezende Queiroz inclusive, propôs um formulário padrão
Takahashi, UAB/UNB, despertar@terra.com.br para a realização de notificação. Vale su-
blinhar que as leis dão destaque especial
ao papel a ser desempenhado, na prote-
LT06-1034 - A IDENTIFICAÇÃO E O ção infantil, pelos profissionais da saúde
MANEJO DOS MAUS-TRATOS INFANTIS e da educação. De acordo com pesquisas
NA EDUCAÇÃO: O QUE SABEM E O QUE recentes, a prática da notificação é bas-
FAZEM OS ESTUDANTES DE PEDAGOGIA? tante tímida em meio a tais profissionais,
Marina Rezende Bazon - FFCLRP-USP sobretudo os da educação que, a rigor,
mbazon@ffclrp.usp.br por entrarem em contato com um grande
Daniela Zayat Lopes - FFCLRP-USP contingente de crianças e jovens diaria-
danizayat@gmail.com mente, seriam os mais bem posicionados
Paola Gonzales Valladão - FFCLRP-USP para atuar nesse sentido. As investigações
paola_gonzales16@hotmail.com sobre as razões pelas quais educadores/
professores deixam de notificar casos dos
A violência contra crianças e adolescentes, quais suspeitam sugerem, reiteradamen-
praticada pelos cuidadores principais em te, a necessidade de que a formação des-
âmbito doméstico, constitui o fenômeno ses profissionais leve em conta tal temáti-
denominado maus-tratos infantis (OMS/ ca, de modo a prepará-los para isso. Com
ISPCAN). Este fenômeno tem merecido base nesses apontamentos, desenvolveu-
atenção científica e social de modo cres- -se um estudo para investigar o conheci-
cente, e sendo considerado como uma mento de estudantes de Pedagogia sobre
problemática importante em termos de o tema e sobre o quanto a formação rece-
conseqüências negativas para o desenvol- bida contemplaria ou não a temática. Vale
vimento humano, além de um problema informar que, nesse primeiro momento
de saúde pública, porque atinge um nú- da investigação, decidiu-se estudar alunos
mero significativo de famílias. O enfrenta- de uma universidade pública do estado
mento dessa problemática implica na de- de São Paulo, mais especificamente, estu-
tecção dos casos, na comunidade, e seu dantes do curso de um curso de Pedago-

1038
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

gia, tendo como pressuposto a importân- (68,31%). Quando, todavia, indagados so-
cia assumida pela instituição em questão, bre o fato de terem recebido informações
em termos paradigmáticos, no plano das sobre o tema em âmbito acadêmico, 60%
proposições de um projeto político-peda- do total de participantes responderam
gógico de formação na área da educação. negativamente. Em torno de 40% dos es-
Esta pesquisa de natureza quantitativa, tudantes indicaram terem tido aulas, 25%
descritiva, contou com a participação de palestras, 13% disseram terem efetuado
142 estudantes dos quatro anos do curso leituras e 5% afirmaram que tiveram in-
(66%), regularmente matriculados no ano formações sobre maus-tratos infantis no
de 2011. Após consentirem em participar contexto de congressos científicos. É im-
do estudo, os estudantes responderam a portante revelar que 91% dos responden-
um questionário de escala multi-item, o tes afirmaram que a temática devia ser
qual demandava por informações visando integrada à sua formação como um dos
caracterizá-los sócio-economicamente, conteúdos desta formação. Com relação
assim como caracterizar seu conhecimen- à detecção de possíveis casos de maus-
to sobre o fenômeno, suas opiniões e -tratos, 27% referiram ter contato com
suas atitudes. Os dados coletados foram crianças de quem suspeitavam sofrerem
compilados em planilha elaborada no pro- maus-tratos domésticos. Levando-se em
grama Excel e analisados por meio de es- conta somente o subgrupo que referiu
tatística descritiva. Cumpre informar que exercer atividade remunerada (trabalho
do total de participantes, 91% eram do na área da educação), a proporção foi su-
sexo feminino; a idade média dos alunos perior, 60%, sendo que em meio aos que
era de 25,15 anos, sendo que a menor e estagiavam a proporção foi de 51%. De
a maior idade eram, respectivamente, 17 acordo com os participantes do estudo,
e 45 anos; quanto ao perfil socioeconô- os indicadores considerados para levantar
mico, 44% dos estudantes pertenceriam a suspeita de maus-tratos eram, na maior
à classe B2, o que equivale a uma renda parte das vezes, comportamentais (74%),
familiar em torno de 3 salários mínimos; seguidos pela expressão verbal da criança
31% seriam da classe B1, cujo rendimento (72%) e por evidências como marcas no
mensal gira em torno de 5 salários míni- corpo da criança (44%). Quando indaga-
mos; 16% pertenceriam à classe C, com dos sobre como lidaram com a “suspei-
2 salários mínimos; 11% à classe A2, com ção”, 38% referiram encaminhar o caso
8 salários mínimos; 1% à classe D, com à direção, 26% disseram ter notificado o
um salário mínimo e 1% à classe E, cuja caso ao Conselho Tutelar e 21% afirma-
renda é de menos de um salário mínimo. ram ter decidido não se envolver com a
De modo geral, 45,77% dos alunos da Pe- situação. Proporções semelhantes foram
dagogia disseram já trabalhar e 54,23% encontradas quando se perguntou, a to-
estavam realizando estágios na área da dos, qual seria a ação ideal a empreender
educação. Os resultados obtidos indica- frente a casos suspeitos de maus-tratos.
ram que, para a maioria dos estudantes Vale dizer que a grande maioria dos estu-
(94,37%), a principal fonte de informação dantes (92%) afirmou desconhecer o con-
sobre a temática dos maus-tratos é a “mí- teúdo da Lei estadual SP nº 10.498/00.
dia”, seguida pelas “conversas informais” Em síntese, pode-se dizer que os estudan-

1039
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tes de Pedagogia tendem a lidar com a Crianças e adolescentes, pela Constituição


temática dos maus-tratos de forma seme- Federal (1988), deveriam estar a salvo de
lhante aos profissionais da educação: em- toda forma de negligência, discriminação,
bora já entrem em contato com situações exploração, violência, crueldade e opres-
relacionadas aos maus-tratos infantis, são. Entretanto, esse segmento é muito
baseando suas suspeitas em indicadores vulnerável, tendo boa parte de seus direitos
comportamentais e na própria expressão violados em âmbito doméstico, pelos pró-
da criança, consideram que a ação mais prios cuidadores/responsáveis. Tais even-
apropriada fosse encaminhar o caso à tos constituem o fenômeno denominado
direção e deixar a seu critério a tomada maus-tratos infantis (OMS/ISPCAN). O
de decisão. Embora ainda estejam fre- enfretamento dessa problemática requer,
qüentando o ambiente acadêmico, eles numa primeira instância, que determina-
parecem não estar tendo acesso ou inte- das situações sejam identificadas como tal,
gração com a produção de conhecimento na comunidade, e sejam notificadas aos ór-
científico sobre o tema ou, tão pouco, as- gãos de proteção infantil (Conselhos Tute-
similando uma postura crítica quanto ao lares, Promotoria e/ou Juizado da Infância
papel da educação com relação à prote- e Juventude), de modo que processos de
ção infantil estando, como a maior parte averiguação, intervenção, ajuda e respon-
da população leiga, à guisa da influência sabilização sejam instalados. No que con-
de informações de senso comum. Frente cerne à identificação, especificamente, um
a esse quadro, parece fundamental uma dos obstáculos à proteção infantil remete
revisão do projeto político-pedagógico, de à percepção comunitária das situações e
modo a fomentar ações consistentes, no sua apreciação como sendo uma violação
sentido de implementar transformações dos direitos infanto-juvenis. Pesquisado-
na mentalidade e na atitudes dos futuros res da área colocam que, dependendo do
educadores/professores. nível de desenvolvimento sócio-cultural,
uma parte considerável dos eventos, prin-
Palavras-chave: maus-tratos infantis, cipalmente no âmbito doméstico, não é
desenvolvimento humano, educação nem mesmo percebido como maus-tratos
Contato: Marina Rezende Bazon, FFCLRP-USP, infantis. Com base nisso, na presente pes-
mbazon@ffclrp.usp.br quisa decidiu-se investigar a percepção
de estudantes de Pedagogia, no tocante a
situações relativas à “negligência, discrimi-
LT06-1035 - PERCEPÇÕES E ATITUDES nação, exploração, violência, crueldade e
DE ESTUDANTES DE PEDAGOGIA COM opressão”, envolvendo crianças e adoles-
RELAÇÃO AOS MAUS-TRATOS INFANTO- centes e suas atitudes com relação à no-
JUVENIS tificação. A opção por investigar esse seg-
Marina Rezende Bazon - FFCLRP-USP mento advém do fato de os profissionais
mbazon@ffclrp.usp.br da educação, além de serem obrigados por
Daniela Zayat Lopes - FFCLRP-USP Lei a empreender a notificação de casos
dani.zayat@gmail.com de maus-tratos, suspeitos ou confirmados,
Paola Gonzales Valladão - FFCLRP-USP com quais tenham contato no contexto de
paola_gonzales16@hotmail.com seu trabalho, serem considerados os me-

1040
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lhor posicionados à identificação de casos, a primeira, com 12 vinhetas contendo a


uma vez que compartilham o quotidiano descrição de situações de maus-tratos,
com crianças e adolescentes, podendo demandando assinalamento de gravidade
observar-lhes numa gama variada de situ- (1- muito grave a 7- pouco grave) e a ação
ações. Ademais, em se pensando no status ideal a ser implementada (“nada fazer”,
de estudante, o grupo investigado refere- “notificar”, “encaminhar a profissional”);
-se a indivíduos que experienciam um e a segunda, constituída por 9 vinhetas,
processo ativo e estruturado de formação demandando pelo assinalamento de apro-
estando, portanto, mais permeáveis à re- vação/desaprovação do comportamento
flexão sobre diferentes temas. Num futuro adulto (com -3 igual a “desaprova forte-
próximo, enquanto jovens profissionais, mente” a + 3 igual “aprova fortemente”).
eles poderão concorrer para provocar de- De modo geral, as vinhetas procuravam
terminadas alterações no “meio profissio- apreender: (a) as percepções das situa-
nal” ou, dependendo de suas concepções/ ções, no sentido de aferir o quanto cada
percepções, reforçarem as já existentes. A uma era percebida como grave; (b) a ati-
pesquisa foi realizada com 142 alunos, re- tude frente a cada uma, sendo que o teor
gularmente matriculados em um curso de das vinhetas variava em função da idade
Pedagogia de uma universidade pública de da criança envolvida na situação descrita,
São Paulo, no ano de 2011. É importante do comportamento apresentado por ela
ressaltar que do total dos participantes, e do que motivava a ação do adulto; (c) a
91% eram do sexo feminino, sendo a idade ação do adulto, se de natureza física e di-
média de 25,15 anos, em que a menor e reta sobre o corpo da criança ou não, qual
a maior idade foram, respectivamente, 17 a intencionalidade do adulto em agir da
e 45 anos; com relação ao perfil socioeco- forma como agia, as conseqüências desta
nômico, 44% dos participantes eram da ação para a criança, se concorria para al-
classe B2, correspondendo a uma renda gum dano físico, evidente ou potencial...
familiar em torno de 3 salários mínimos; Os resultados obtidos indicaram que, de
31% pertenciam à classe B1, em que o ren- modo geral, a maioria dos estudantes con-
dimento mensal era de 5 salários mínimos; cebeu todas as situações representadas
16%, à classe C, com 2 salários mínimos; como grave, sendo que quanto mais nova
11%, à classe A2, cujo rendimento era de a criança envolvida na situação maior a
8 salários mínimos; 1%, à classe D, com um tendência a avaliar o comportamento pa-
salário mínimo; 1%, à classe E, com rendi- rental como muito grave e, diante disso, se
mento inferior a um salário mínimo. Entre mostrarem mais favoráveis à ação de no-
os estudantes, 45,77% disseram trabalhar tificar a situação no intuito de proteger a
e 54,23%, que já estavam realizando está- criança. Por outro lado, quando a situação
gio na área da educação. Após consenti- envolvia um adolescente e a ação parental
rem em participar do estudo, os estudan- correspondia à “correção de comporta-
tes responderam a um questionário multi- mentos tidos como inadequados”, a ten-
-item, que damandava por informações de dência era de caracterizarem a situação
caracterização socioeconômica e a duas como sendo de gravidade moderada e se
escalas do tipo Likert, traduzidas a partir mostrarem menos favoráveis à ação de
do instrumento proposto por Vicki Ashton: notificar, indicando que a ação mais perti-

1041
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

nente seria a de indicar a necessidade de LT06-1210 - SINTOMATOLOGIA


procurar ajuda profissional. Cumpre frisar ASSOCIADA À VIOLÊNCIA SEXUAL
que quando a ação parental parecia asso- INFANTIL NO CONTEXTO PERICIAL
ciada ao “descontrole emocional”, mesmo PSICOLÓGICO
que causando dano físico, embora fosse Lara Gava - UFRGS e DML/RS
considerada muito grave pela maioria, os laralagesgava@gmail.com
respondentes tenderam a indicar que a Doralúcia Silva - UFRGS
ação mais pertinente era a de “sugerir a doralu.gil@gmail.com
ajuda de profissional”. Ademais, indepen- Débora Dell’Aglio - UFRGS
dentemente da idade da criança/adoles- dalbosco@cpovo.net
cente envolvido na situação, notou-se que
quando o comportamento infanto-juvenil A violência sexual infantil é definida como
podia ser caracterizado como “desobedi- qualquer interação entre a criança ou
ência à autoridade dos pais”, esse pareceu adolescente e alguém em estágio sexual
justificar, em boa medida, que a prática de desenvolvimento mais adiantado, que
parental disciplinar se valesse de punições tenha por fim a satisfação sexual deste úl-
corporais, desde que não concorresse para timo. Apresenta-se sob a forma de práti-
danos físicos evidentes e/ou potenciais. cas eróticas e sexuais impostas à criança
Assim, a ação tendia a ser considerada ou adolescente pela indução ou coerção.
moderadamente grave pela maioria dos Este tipo de violência também se apresen-
respondentes e a atitude diante da notifi- ta através do uso da criança ou adolescen-
cação era menos favorável. Outra variação te para realização de performances sexu-
observada relacionou-se às conseqüências ais, produção de materiais pornográficos e
para as crianças, indicadas nas vinhetas. exploração sexual. As interações, portan-
As ações parentais eram apreciadas como to, podem variar desde atos em que não
mais graves se deixavam marca (ou tem se produz o contato sexual (voyeurismo,
grande potencial para ferir), evidenciando exibicionismo, produção de fotos) até atos
o dano, ao passo que ações que podiam que incluem contato sexual com ou sem
deixar “marcas psicológicas” tendiam a ser penetração. Em se tratando de casos de
apreciadas como menos graves. Tais resul- suspeita de violência sexual contra crian-
tados corroboram os de outros estudos re- ças e adolescentes, a avaliação psicológica
alizados em outros contextos sócio-cultu- pericial se constitui como elemento fun-
rais. Novos estudos devem ser conduzidos damental para que seja provada a mate-
na realidade brasileira, envolvendo outros rialidade do delito, uma vez que apenas
segmentos de profissionais que trabalham uma pequena parcela dos casos produz
com crianças, bem como com amostras da vestígios físicos. Um dos objetivos da pe-
população em geral. rícia psicológica consiste em avaliar o pos-
sível dano psíquico, sofrido pela suposta
Palavras-chave: notificação de maus-tratos vítima, em decorrência da situação viven-
infanto-juvenis, percepção comunitária, ciada. O estabelecimento deste objetivo
violação de direitos é extremamente razoável, uma vez que
Contato: Marina Rezende Bazon, FFCLRP-USP, muitos estudos têm investigado as pos-
mbazon@ffclrp.usp.br síveis conseqüências psíquicas do abuso

1042
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sexual no desenvolvimento de crianças e é problemático porque enquanto algumas


adolescentes e apontado uma variedade vítimas desenvolvem severos problemas
de prejuízos emocionais, comportamen- emocionais ou psiquiátricos, outras apre-
tais, sociais e cognitivos, associada à ocor- sentam conseqüências mínimas ou ne-
rência deste tipo de violência. Pesquisas nhuma conseqüência aparente. Se pode
apontam que crianças vítimas de violência acontecer de uma criança ou adolescente
sexual podem apresentar sentimentos de ser vítima de abuso sexual e não apresen-
culpa, dificuldade em confiar no outro, tar nenhuma consequência aparente, en-
comportamento hipersexualizado, medos, tão, uma avaliação que possui como foco
pesadelos, isolamento, sentimentos de principal a identificação de sintomas, cer-
desamparo e ódio, fugas de casa, abuso tamente, não será capaz de avaliar con-
de substâncias, baixa autoestima e agres- sistentemente a situação em foco. Além
sividade, dentre outros sintomas. Trans- disso, a concepção de que a presença de
tornos psicológicos como Transtorno de um sintoma pode se constituir num meio
Estresse Pós-Traumático (TEPT), depres- de prova do crime é falha no contexto
são, ansiedade e Transtorno de Déficit de pericial, em segundo lugar, porque não
Atenção e Hiperatividade (TDAH) também há um único quadro sintomatológico que
têm sido associados à ocorrência de abu- caracterize a maioria das vítimas abusa-
so sexual na infância. Considerando estas das sexualmente, sendo extremamente
evidências, na área pericial, muitas vezes, variada a gama de possibilidades de al-
as avaliações psicológicas - que, neste terações emocionais e comportamentais
contexto, possuem um cunho investigati- apresentada. Por fim, não se pode con-
vo - são realizadas a partir de uma abor- cluir a ocorrência do abuso sexual a partir
dagem da psicologia clínica, com enfoque da identificação de sintomas na realização
na presença ou ausência de sintomas que de uma perícia, uma vez que estes, quan-
são esperados nas vítimas, em decorrên- do presentes, não são específicos, isto é,
cia da vivência desse tipo específico de podem ser decorrentes, também, de ou-
trauma. A lógica subjacente que parece tra situação que não a sexualmente abu-
justificar este modo de realização da pe- siva. Considerando as peculiaridades da
rícia é esta: assim como um dano físico, identificação das consequências do abuso
identificado numa perícia física, pode se sexual para o desenvolvimento da criança
constituir em um meio de prova da vio- e do adolescente, em relação ao contexto
lência sexual, também um dano psíquico, forense, este estudo possui como objeti-
identificado numa perícia psíquica, pode- vo analisar a sintomatologia encontrada
ria vir a se constituir em um meio de pro- em crianças e adolescentes, supostamen-
va do fato delituoso. Contudo, este tipo de te vítimas de abuso sexual, submetidas à
raciocínio, que parece ter sentido quando perícia psicológica por solicitação de auto-
se considera a série de prejuízos psíquicos ridade jurídica. Para tanto, foram analisa-
associados à ocorrência do abuso sexual, é dos 162 laudos do Departamento Médico-
problemático do ponto de vista da produ- -Legal do Rio Grande do Sul, resultantes
ção da prova pericial, podendo prejudicar de perícias psiquiátricas e psicológicas re-
ou mesmo deturpar os resultados da ava- alizadas em supostas vítimas entre 7 a 17
liação. Em primeiro lugar, este raciocínio anos (M=10,92; DP=2,61), sendo 20,4% de

1043
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

meninos e 79,6% de meninas, com 64,8% LT06-1394 - PERFIL DOS AGRESSORES DE


de abuso do tipo intrafamiliar e 26,5%, BULLYING
extrafamiliar. Estes laudos foram decor- Cláudia de Moraes Bandeira - UFRGS
rentes de avaliações solicitadas por dele- kkbandeira@hotmail.com
gados de polícia, promotores de Justiça e Claudia Giacomoni - UFRGS
juízes de todo o Estado do Rio Grande do giacomon@uol.com.br
Sul. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Cláudio Simon Hutz - UFRGS
Ética em Pesquisa do Instituto de Psicolo- claudio_hutz@terra.com.br
gia da Universidade Federal do Rio Grande
Financiamento: CAPES
do Sul e pelo Conselho Técnico-Científico
do Departamento Médico-Legal. Os da-
dos foram digitados em planilha eletrô- Bullying é uma subcategoria do com-
nica para análises estatísticas descritivas portamento agressivo, que ocorre entre
e inferenciais. Verificou-se que, nos lau- os pares (Olweus, 1993) e, comumente,
dos em que foi possível afirmar a proba- é um problema enfrentado por crianças
bilidade de ocorrência do abuso (n=119), e adolescentes, nas escolas ao redor do
prevaleceram as seguintes alterações mundo. Caracteriza-se por ser uma cruel-
emocionais e comportamentais: medo ou dade sistemática, voltada diretamente
pânico (47,3%), ansiedade (38,7%), sinto- para alguém, por parte de uma ou mais
mas depressivos (46,2%), prejuízo no de- pessoas, com a intenção de obter po-
sempenho escolar (28,6%), alterações do der sobre o outro ao lhe infligir, regu-
sono (21%) e isolamento social (20,2%). larmente, sofrimento psicológico ou fí-
Também foram observadas reações pa- sico. O bullying pode ser definido como
tológicas relacionadas ao estresse, em uma agressão persistente e prolongada
18,5% dos casos. Não foram encontradas de um aluno ou mais, denominado(s)
diferenças significativas entre os sexos e agressor(es), sobre outro que se apre-
por tipo de abuso. Conclui-se que, embo- senta mais fraco e vulnerável, denomina-
ra não exista um quadro único sintomato- do vítima (Bandeira, 2009). O agressor é
lógico em vítimas de abuso sexual, alguns aquela criança que age de forma agressi-
sintomas apresentam maior prevalência e, va contra outra, supostamente mais fra-
por isso, devem ser observados na avalia- ca, com o intuito de machucar, prejudi-
ção destes casos. No entanto, é importan- car, sem ter havido provocação por parte
te considerar que a avaliação deve incluir da vítima (Berger, 2007). Alguns autores
outros aspectos, além do levantamento (Olweus, 1993; Smith & Brain, 2000)
dos sintomas, principalmente, no que se consideram o bullying como sendo um
referem às características contextuais e poderoso processo de controle social e
do relato da suposta vítima sobre o even- entendem o agressor como um indivíduo
to abusivo. que procura poder e liderança dentro
do grupo de iguais. O agressor tem sido
Palavras-chave: sintomatologia, violência apontado como aquele aluno que, apesar
sexual, perícia psicológica de popular e bem aceito pelos colegas, se
Contato: Lara Gava, UFRGS e DML/RS, envolve em comportamentos antissociais
laralagesgava@gmail.com (Lopes, 2005); sente prazer e satisfação

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

em dominar, controlar e causar dano aos mento agressivo reativo, tipo de agressão
outros e, geralmente, é mais forte que a utilizada pelas vítimas/agressores, é um
vítima e apresenta uma tendência maior ato impulsivo em resposta a uma provo-
para comportamentos de risco, como cação ou ameaça percebida (Gini & Po-
consumir tabaco, álcool ou outras drogas zzoli, 2006) e consiste em uma resposta
e porte de armas; vê sua agressividade defensiva de raiva (Lisboa, 2005). O pre-
como qualidade, tem opiniões positivas sente estudo teve por objetivo investigar
sobre si mesmo e possui boa autoestima. algumas das características dos agresso-
Autoestima é uma avaliação que o indiví- res de bullying. A amostra foi compos-
duo efetua e, comumente, mantém, em ta por 465 adolescentes, de ambos os
relação a si mesmo (Rosenberg, 1989). sexos, com idades entre nove e dezoito
Algumas crianças se posicionam tanto anos (M = 13,4 anos; dp = 1,47), estudan-
como vítimas quanto como agressores, tes de quartas a oitavas séries do Ensino
sendo denominados de vítima/agressor. Fundamental de três escolas, públicas e
Conforme Lopes (2005), estas crianças privadas, da cidade de Porto Alegre, RS.
apresentam uma combinação de baixa Dentre estas crianças, 52,7% pertenciam
autoestima, atitudes agressivas e provo- ao sexo masculino. Os instrumentos uti-
cativas e prováveis alterações psicológi- lizados foram um questionário sobre
cas, merecendo atenção especial. Podem bullying, com 15 questões de múltipla
ser depressivos, ansiosos, inseguros e escolha e a Escala de Autoestima de Ro-
inoportunos, procurando humilhar os senberg (Hutz & Zanon, 2011). Os dados
colegas para encobrir suas limitações. foram coletados de forma coletiva nas
Juntamente com o grupo de agressores, escolas, após autorização das mesmas e
as vítimas/agressores estão mais suscetí- consentimento dos adolescentes e dos
veis ao uso excessivo de cigarros, álcool e pais. Foram calculadas estatísticas des-
outras substâncias. Este grupo apresenta critivas e testes Qui-quadrado. Os resul-
risco mais elevado para apresentar se- tados mostraram que 50,0% dos ataques
veras ideações suicidas, além de vários foram realizados por meninos; 31,2%,
tipos de comportamento de risco, anti- tanto por meninos quanto por meninas
-social e de violência, quando compara- e 18,8%, por meninas. Foram encontra-
das a crianças que não estão envolvidas das diferenças significativas entre os se-
em bullying (Liang, Flisher & Lombard, xos, mostrando que os meninos são mais
2007). Em se tratando de vítimas/agres- agredidos por meninos e as meninas são
sores, é importante fazer distinção entre mais agredidas por meninas (χ²=47,2,
comportamento agressivo proativo e re- df=2, p<0,05). Além disso, os meninos se
ativo. O comportamento agressivo pro- identificaram mais como agressores do
ativo, utilizado pelos agressores típicos, que as meninas (χ²=15,4, df=4, p<0,05).
envolve tentativas de influenciar o ou- Os ataques foram realizados por dois ou
tro através de meios aversivos, em uma mais alunos em 67,7% dos casos. O tipo
situação não provocada (Gini & Pozzoli, de bullying mais utilizado pelos agresso-
2006); é um comportamento voluntário, res foi o do tipo verbal, com a utilização
deliberado e influenciado por reforços de apelido, insulto ou deboche (70,7%),
externos (Lisboa, 2005). Já o comporta- seguido do tipo físico, com a utilização de

1045
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

empurrão, chute ou soco (15,4%). Quan- LT06-1450 - CARACTERÍSTICAS


to ao sentimento dos agressores em re- SOCIAIS E COGNITIVAS DE CRIANÇAS
lação aos ataques, 35,9% afirmaram que E ADOLESCENTES VITÍMAS DE MAUS
o fato foi engraçado; 24,4% disseram TRATOS
que se sentiram mal; 18,7% acreditaram Josiane Puchalski - UCPEL
que os outros fariam o mesmo com eles; josipuchalski@hotmail.com
13,4% afirmaram que não sentiram nada; Vera Lúcia Figueiredo - UCPEL
12,6% disseram que as vítimas mere- verafig@terra.com.br
ciam; 6,1% se sentiram bem e 3,4% fica-
ram com medo de serem descobertos. A As estatísticas evidenciam que a questão
ANOVA apontou para uma interação en- dos maus tratos é um grave problema de
tre sexo e papéis de bullying em relação saúde pública, exigindo que providências
à autoestima [F(3,398)= 2,95; p<0,05]. sejam tomadas por todos os segmentos
Testes Post Hoc (Tukey) demonstram que da sociedade. A violência contra crianças
as meninas agressoras têm maior média pode ser considerada um fator de risco
de autoestima (M=3,01, dp=0,40) que o para o desenvolvimento, devido às conse-
grupo das vítimas/agressoras (M=2,78, qüências cognitivas, emocionais, compor-
dp=0,37, p<0,05, d=0,6). Em relação aos tamentais e sociais que são relacionadas
meninos não foi encontrada a mesma à sua ocorrência. A reflexão sobre os con-
relação, pois, de acordo com os resulta- ceitos dos diferentes tipos de maus-tratos
dos, os meninos agressores não possuem e as idéias a eles associadas contribuem
melhor imagem corporal nem melhor para o entendimento de quanto esses
autoestima que os demais envolvidos atos estão presentes em nosso cotidia-
em bullying. Com os resultados encon- no. Tais práticas variam desde a privação
trados no presente estudo, é possível de cuidados e abuso sexual, até inciden-
afirmar que os agressores possuem ca- tes nos quais as crianças são fisicamente
racterísticas distintas, quando são anali- maltratadas por um adulto, muitas vezes,
sadas algumas diferenças entre os sexos. resultando em trauma e, freqüentemente,
Concluiu-se, por exemplo, que a maioria levando ao óbito. Estudos apontam que
dos agressores é de meninos e realiza os crianças violentadas apresentam diminui-
ataques com outros colegas. Além disto, ção de QI e são dez vezes mais suscetíveis
os agressores tendem a agredir mais co- à deficiência mental. Além disso, demons-
legas do mesmo sexo e se utilizam mais tram comportamento pró-social diminu-
da agressão verbal. Desta forma, progra- ído, compartilhando menos com outras
mas de prevenção que visam atingir os crianças, quando comparadas com crian-
agressores devem levar em consideração ças não abusadas. O risco de drogadição,
as diferenças existentes entre os sexos, prostituição, problemas de aprendizado,
quanto ao fenômeno em estudo. promiscuidade e queixas somáticas, dis-
túrbios na sexualidade, depressão, suicí-
Palavras-chave: bullying, agressores, perfil dio e dificuldades de relacionamento são
Contato: Cláudia de Moraes Bandeira, UFRGS, manifestações tardias de todas as formas
kkbandeira@hotmail.com de violência contra a criança e o adoles-
cente. Considerando, essencialmente, as

1046
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

questões ligadas aos problemas de apren- forças e fraquezas em diferentes habilida-


dizagem e ao déficit cognitivo, a avaliação des específicas, assim como avaliar os tra-
psicológica apresenta-se como um méto- dicionais QIs Verbal, de Execução e Total,
do para a obtenção de dados relativos às além dos Índices Fatoriais de Compreen-
capacidades de indivíduos, em diferentes são Verbal, Resistência à Distratibilidade,
áreas. A investigação da inteligência au- Organização Perceptual e Velocidade de
xilia no diagnóstico de quadros de super Processamento, dimensões relevantes no
e infra dotação, permitindo identificar o processo de aprendizagem. O termo de
funcionamento intelectual e possibili- consentimento livre e informado foi as-
tando o planejamento de recursos psico- sinado pelos responsáveis das crianças e
pedagógicos que estimulem o desenvol- adolescentes avaliados. Com os pais ou
vimento de habilidades defasadas. Uma responsáveis foi realizada uma entrevista
das estratégias empregadas na avaliação de anamnese. A grande maioria era com-
psicológica, nas diferentes áreas de atua- posta de pais separados e que não tinham
ção profissional, é o teste psicológico. O Ensino Fundamental completo. Além dis-
estudo objetivou identificar o potencial so, mais da metade das crianças violen-
cognitivo de crianças e adolescentes víti- tadas tinha algum familiar com problema
mas de violência intra/extra familiar, ofe- de alcoolismo. Entre estas crianças, 55%
recendo subsídios à orientação de profis- já havia apresentado repetência escolar.
sionais sobre o potencial intelectual desta Segundo informações dos cuidadores, as
população. Foram estudados 67 crianças crianças avaliadas demonstravam com-
e adolescentes, de ambos os sexos, víti- portamento agitado, ansiedade e irritabi-
mas de maus-tratos, da cidade de Pelotas lidade. Sobre a avaliação da inteligência,
(RS), recebidos em um núcleo que oferece apresentaram capacidade intelectual ge-
atendimento especializado a vítimas de ral (QIT) Média Inferior. Quanto às habili-
violência. Os participantes tinham entre 6 dades específicas avaliadas nos subtestes,
e 16 anos, com idade média de 11 anos, os resultados indicaram defasagens na
sendo a maior parte da amostra do sexo área verbal, como: raciocínio verbal preju-
feminino. O instrumento utilizado foi a Es- dicado, amplitude de informações limita-
cala Wechsler de Inteligência para Crian- da, memória e concentração diminuídas,
ças (3ª edição) WISC-III, o qual apresenta raciocínio concreto e rigidez de pensa-
uma multiplicidade de tarefas cognitivas, mento. Na área de execução houve prejuí-
com itens diversificados, de natureza ver- zos quanto à noção temporal, organização
bal e de execução (manipulação de vários perceptual, atenção a detalhes, coordena-
objetos), tendo em vista a medida de uma ção visomotora, conceitualização abstrata
globalidade funcional. A escala é compos- e capacidade de planejamento. Sabendo-
ta por seis subtestes verbais (Informação, -se que quanto mais precoces as inter-
Compreensão, Aritmética, Semelhanças, venções realizadas em crianças e adoles-
Dígitos e Vocabulário) e seis subtestes de centes, melhor o prognóstico; o apelo por
execução (Completar Figuras, Arranjo de fazer cessar a violência não pode ignorar
Figuras, Cubos, Armar Objetos, Código e que ela é plural: sua dinâmica e suas ma-
Procurar Símbolos). Os escores alcançados nifestações são diversas e, como tal, exi-
nos referidos subtestes permitem estimar gem combate diferenciado. Desta forma,

1047
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

percebe-se a necessidade de programas entretanto, tem encontrado inúmeras


de intervenção psicopedagógicos e ações dificuldades para cumprir suas funções
interdisciplinares no sentido de estimu- psicossociais. Vivemos um momento de
lar capacidades cognitivas defasadas, as intensas e rápidas mudanças sociais – o
quais podem prejudicar a adaptação e o trabalho de ambos os pais, alto índice de
desempenho escolar. Assim como, novas divórcios e recasamentos, perda do sen-
pesquisas neste campo para que os pro- tido de tradição, valores culturais pouco
fissionais da área da saúde e educação te- claros, mudança dos papéis dentro da fa-
nham melhores condições para formular mília, etc. – que interferem nos padrões
e adaptar estratégias de prevenção, trata- de relacionamento entre os membros
mento e promoção de fatores de resiliên- da família e requerem, dessa instituição,
cia para essa população específica. uma capacidade de adaptação e reestru-
turação muito rápida para continuar cum-
Palavras-chave: características, crianças, maus prindo as novas exigências e solicitações
tratos que lhe são apresentadas. Dessa forma, a
Contato: Josiane Puchalski, josipuchalski@ família, que deveria ser o principal ponto
hotmail.com de apoio do indivíduo, muitas vezes, aca-
ba se tornando a maior fonte de violência,
principalmente para mulheres, crianças e
LT01-938 - O CICLO DE VIDA FAMILIAR adolescentes. Os dados sobre a violência
E O DESENVOLVIMENTO DE CRIANÇAS intrafamiliar estão estampados, constan-
E ADOLESCENTES VÍTIMAS DE temente, na mídia, nos relatórios policiais
VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR: PESQUISA E e estatísticas governamentais, porém, é
INTERVENÇÃO de conhecimento geral que estes mostram
Maria Alexina Ribeiro - UCB apenas uma parte do problema, pois um
alexina@solar.com.br grande número de casos é mantido em se-
Heron Flores Nogueira - UCB gredo dentro da família, devido ao medo,
vergonha ou conivência de familiares,
O reconhecimento de que os primeiros vizinhos e da própria vítima. O objetivo
anos de vida são cruciais para o desenvol- do presente trabalho é apresentar dados
vimento emocional do indivíduo, focalizou de 10 anos de pesquisas sobre violência
a família como o lócus potencialmente intrafamiliar em Brasília/DF, envolvendo
produtor de pessoas saudáveis, emocio- famílias que são encaminhadas pela Justi-
nalmente estáveis, felizes e equilibradas, ça para acompanhamento psicossocial no
ou como o núcleo gerador de inseguran- Centro de Formação em Psicologia Apli-
ças, desequilíbrio e desvios de compor- cada da Universidade Católica de Brasília
tamento. Nesta perspectiva, poderíamos - UCB. As pesquisas têm mostrado que há
dizer que a principal função da família um padrão de comportamento dos mem-
é a defesa da vida, cabendo a ela a res- bros da família que tem como desfecho a
ponsabilidade pela criação e formação de violência e, portanto, todos estão envolvi-
seus membros, assegurando-lhes não só a dos, seja de forma ativa (tendo um com-
manutenção da vida, mas também a qua- portamento violento) passiva (sofrendo
lidade de vida. A família contemporânea, a violência) ou como observador do que

1048
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

está acontecendo entre duas ou mais pes- municação e expressão de afetividade, au-
soas, mas todos sofrendo as consequên- toestima, perspectiva de futuro da família.
cias diretas ou indiretas da convivência em
um contexto onde a violência permeia as Palavras-chave: família, violência, violência
relações entre as pessoas. A partir desses intrafamiliar.
dados, observamos que é difícil desagre- Contato: Maria Alexina Ribeiro
gar as diferentes formas de violência, físi- alexina@solar.com.br
ca, psicológica e sexual que acontecem no
contexto familiar, para compreender suas
características e consequências, uma vez LT05-1401 - PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA
que aparecem concomitantemente. As- FÍSICA INTRAFAMILIAR CONTRA
sim, não consideramos razoável afirmar CRIANÇAS: A VISITA DOMICILIAR NA
que os comportamentos dos filhos são PESQUISA-AÇÃO
consequência da violência praticada pe- Alciane Barbosa Macedo Pereira - UEG/UnB
los pais ou o contrário, ou seja, que a vio- barbosaalciane@gmail.com
lência dos pais tem como consequência o Maria Inês Gandolfo Conceição - UnB
comportamento problemático dos filhos. inesgandolfo@gmail.com
Preferimos afirmar que todos os membros Financiamento: CAPES
da família fazem parte de uma dinâmica
onde suas relações são permeadas pela A prevenção da violência contra crianças
violência, o que vem confirmar a visão se torna necessária tendo em vista que
da violência intrafamiliar como um sinto- atos violentos são praticados contra aque-
ma de um sistema disfuncional. As pes- les que deveriam ser protegidos em seu
quisas adotam a metodologia do Grupo desenvolvimento, com base na exigência
Multifamiliar (GM) e utilizam técnicas de legal da proteção integral preconizada
levantamento de dados e intervenção da pelo Estatuto da Criança e do Adolescente
terapia familiar sistêmica. Essa metodolo- de 1990. Essa prevenção pode dar-se de
gia permite o conhecimento da dinâmica diferentes maneiras e nos mais diferentes
das famílias onde há violência, ao mesmo espaços. Na família, onde ocorre a prática
tempo em que oportuniza uma reflexão da violência contra crianças, particular-
sobre a qualidade dos vínculos familia- mente a de cunho físico, justificada pela
res e sociais estabelecidos pelos sujeitos, necessidade de “educar”, intervenções a
culminando na busca de novas formas fim de promover saúde e prevenir violên-
de relacionamento. Os encontros do GM cia se tornam extremamente necessárias.
têm objetivos específicos que estão rela- Nesse contexto, a pesquisa-ação é uma
cionados com problemas que são comuns maneira de produzir conhecimento e via-
às famílias participantes, tais como: rela- bilizar as mudanças necessárias. Além dis-
cionamento pais/filhos, relacionamento so, uma estratégia de intervenção possível
conjugal, ciclo de vida familiar, o cuidado dentro da perspectiva da pesquisa-ação é
e a proteção da criança e do adolescente, a visita domiciliar. A violência é um fenô-
formas de educação dos filhos, construção meno interacional (Brandão, 2001), que
da história da família, padrões transgera- apresenta implicitamente a noção de con-
cionais de comportamento violento, co- trole, numa demonstração de poder na re-

1049
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lação estabelecida (Guerra, 1985; Faleiros 9 e 10 anos que são atendidos por um dos
& Faleiros, 2007), por meio do uso da for- programas de extensão de um instituto es-
ça, objetivando excluir, abusar e aniquilar pecializado nas temáticas da Infância, Ado-
(Minayo, 2002). A violência contra crianças lescência, Juventude e Família, de uma uni-
e adolescentes implica uma transgressão versidade particular de Goiânia. De acordo
no poder/dever de proteção do adulto e com Brandão e Costa (2004), a visita do-
da sociedade em geral e numa coisificação miciliar é um meio para ajudar a família a
da infância. Ou seja, a negação do direito encontrar um caminho para a solução dos
que crianças e adolescentes têm de serem problemas para aquilo que gera preocupa-
tratados como sujeitos e pessoas em con- ção. Nas famílias visitadas a temática cen-
dições especiais de crescimento e desen- tral que foi o objeto da pesquisa é a pre-
volvimento (Minayo, 2002). As alternati- venção da violência física. Dos resultados
vas encontradas para tal fenômeno estão encontrou-se que uma alternativa encon-
relacionadas à adequação do poder sob trada pelas visitadoras na pesquisa-ação
a criança e o adolescente para a proteção estudada para mudar as práticas “educati-
dos mesmos e não a reprodução da coisifi- vas” violentas, principalmente em relação
cação da infância a partir de um olhar adul- à violência física, foi o estabelecimento de
tocêntrico. Outro ponto importante é dife- “combinados”. Neles, as visitadoras junto
renciar a autoridade da violência. E, além a os participantes de cada família estabe-
disso, partir do princípio de que crianças e leciam acordos para substituir as práticas
adolescentes são sujeitos de direito e por violentas por maneiras de educar que par-
isso, portadores de cidadania. O estudo é tissem do respeito ao outro e do diálogo.
um recorte da dissertação de mestrado de- De acordo com classificação de Martins
nominada de “Desligamento entre partici- e Bucher-Maluschke (2005), nas famílias
pantes e pesquisadores de uma pesquisa- onde não há a violência, o diálogo é a base
-ação sobre violência física intrafamiliar” das relações entre pais e filhos e não há a
e objetivou discutir a utilização da visita agressão física com o intuito de educar e
domiciliar como estratégia metodológica e com o poder disciplinador. Dessa forma,
prática educativa na pesquisa em questão. nas famílias em que a possibilidade de ex-
O trabalho realizado se deu a partir da aná- tensão do diálogo entre os participantes
lise das informações construídas, gravadas foi possível, provavelmente viabilizou-se
e transcritas em uma pesquisa-ação sobre também a prevenção de práticas educa-
prevenção da violência física intrafamiliar, tivas não violentas e assim, a busca pela
desenvolvida junto a famílias de crianças prevenção da violência física intrafamiliar
de um bairro de camada popular de Goi- contra crianças como forma de educar. As
ânia. Foram analisadas as transcrições de visitas domiciliares realizadas às famílias
oito visitas domiciliares realizadas em cada estudadas não somente ensejaram a bus-
uma das cinco famílias visitadas por uma ca de outras vias que não aquela do uso
das duplas de pesquisadores. A escolha da violência física, bem como para tentar
das visitas da dupla de entrevistadores evitar outros tipos de violência, tais como
se deu devido à possibilidade de acesso a negligência, e a violência emocional ou
a todo o material construído por elas. As psicológica. As ações junto às famílias po-
famílias em foco têm filhos(as) crianças de deriam ter sido potencializadas se fosse

1050
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

realizado o que Brandão e Costa (2004) Nosso estudo integra uma pesquisa coleti-
chamam de “Devolução” e que se trata va que investiga as condições de desenvol-
de uma carta que os visitadores escrevem vimento humano e as relações de ensino
para a família sobre o assunto conversado na contemporaneidade, cujo campo em-
na visita, objetivando mostrar novas ma- pírico é uma escola pública do município
neiras de pensar sobre a temática dialo- de Campinas/São Paulo. Interessados na
gada. No entanto, os momentos de fecha- constituição social do corpo a partir da
mento e o aquecimento a cada nova visita, perspectiva histórico-cultural, nosso es-
além da visita de encerramento também tudo aborda os impactos das políticas de
buscaram levar a novas reflexões. São ne- educação inclusiva no desenvolvimento
cessários ainda mais estudos e propostas de corpos/sujeitos com deficiência. Con-
para se pensar em alternativas para edu- tudo, inseridos no contexto de uma escola
car crianças e adolescentes nos mais dife- pública de periferia, outras questões se
rentes contextos, sem o uso da violência. abrem. Não só os alunos com deficiência
A visita domiciliar inserida na pesquisa- nos chamam atenção, mas também outros
-ação se mostra como boa alternativa para corpos que, mesmo não marcados pela
a realização de novos trabalhos sobre a te- deficiência, vão ocupando posições mar-
mática. Conclui-se que a visita domiciliar é ginais neste contexto. O lugar de nossas
uma ferramenta clínica privilegiada, devi- indagações foi uma sala de aula de quin-
do seu caráter terapêutico na capacitação to ano do ensino fundamental, composta
das famílias para utilizarem seus próprios por 35 alunos, sendo 03 com deficiências.
recursos a fim de lidarem com as proble- No decorrer de um ano, freqüentamos a
máticas cotidianas. sala semanalmente. Os registros do vivido
em campo foram realizados por meio de
Palavras-chave: visita domiciliar, pesquisa- videogravações, audiogravações, diário de
ação, violência intrafamiliar campo, fotografias, entre outros. Do mate-
Contato: Alciane Barbosa Macedo Pereira, rial empírico analisado, trazemos para este
UEG/UnB, alcianebarbosa@gmail.com trabalho uma situação na qual a “melhor
aluna da sala”, empoderada pela câmera
de filmagem, vai apresentando os colegas
CO 44 - LT07 de classe. Deste corpus, destacamos um
trecho no qual esta nos apresenta Luciana
Inclusão/Deficiência
(nome fictício). Luciana possui uma histó-
ria de alternância entre duas escolas do
mesmo bairro e, segundo um relatório de
LT07 – 868 - O DESENVOLVIMENTO DO
2005, apresentava um quadro de dificul-
CORPO/SUJEITO NO CONTEXTO DA
dade de aprendizagem e de agressividade.
EDUCAÇÃO INCLUSIVA: CONTRIBUIÇÕES
No ano de 2009, Luciana retornava à esco-
TEORICO-METODOLÓGICAS DA
la pesquisada após os dois anos na outra
PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL
escola, considerada mais “fraca”. A aluna,
Flavia Faissal de Souza - FE/UNICAMP que reside em uma região do bairro mais
ffaissal@unicamp.br empobrecida, teve, no decorrer do ano le-
Financiamento: CNPq tivo, um desempenho pedagógico coeren-

1051
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

te com a maioria da classe e sua postura vel nas relações sociais vivenciadas, nos
era bastante retraída, ficava quase sempre afeta. Neste ato est(ético) de acabamen-
sozinha. O objetivo desta apresentação é to do lugar de onde o outro não pode se
colocar em discussão como os concei- ver, é produzido um conhecimento sobre
tos de vivência/experiência, acabamento o sujeito observado. Vigotski (2001, 2009)
estético e agir ético, elaborados por L.S. também nos traz elementos para pensar-
Vigotski e por M. Bakhtin, podem contri- mos a atividade/experiência estética. Ao
buir para analisar a constituição do corpo/ levantar questões sobre as possibilidades
sujeito posto/que se põe à margem nas de conhecer esteticamente uma obra de
diversas práticas do cotidiano escolar. Nas arte, o autor nos coloca frente a questões
palavras de Vygotsky (2000, p.03) “Torna- da constituição do psiquismo humano: a
mo-nos nós através do outro”. Assumimos atividade construtiva complexa, na qual
que o corpo/sujeito vai se constituindo o contemplador constrói e cria o objeto
na incorporação de sentidos e significa- estético. Para se entender o que está re-
dos antes postos entre, no mínimo, dois presentado, requer-se reunir e sintetizar
sujeitos. Contudo, o que é incorporado os elementos dispersos da sua totalida-
do vivido/experenciado “[...] é resultante de; os sentimentos não estão contidos na
daquilo que impacta e é compreendido, obra em si, mas em como quem percebe
significado, pela pessoa. [...] Não existe é afetado pela obra. O ato de produzir um
experiência sem significação. [...] Falar de conhecimento sobre o outro o qual eu
experiência é falar de corpo/sujeito afe- contemplo é um ato intermitente de cria-
tado pelo outro/signo [...] É falar da vida ção e recriação do outro. Ato no qual este
impregnada de sentido” (SMOLKA, 2006, conhecimento se torna matéria/condição
p. 107). Bakhtin (1995) nos fala do corpo de vida, se torna uma experiência vivida.
signo. Organismo e mundo encontram-se As múltiplas experiências vivenciadas pelo
no signo. O corpo é signo, uma arena de corpo/sujeito nas relações com os outros
lutas sociais, pois traz em seus significa- vão constituindo o seu desenvolvimento.
dos índices de valores contraditórios, en- A experiência vivida vai sendo significada
quanto se constitui na disputa de valores e o que se torna incorporado pelo sujeito
ideológicos. Na dinâmica do mundo, nas não é simplesmente o “como o outro me
relações interpessoais, corpos interagem vê”, mas sim o “como o corpo/sujeito” sig-
afetando o outro e se afetando. Vigarello nifica o olhar do outro e se apropria desta
(1978, p.09) afirma que o corpo “[...] é o experiência com o outro. Por esse prisma
emblema onde a cultura escreve seus sig- do signo, do significado, da significação,
nos tanto como um brasão”. Detrez (2002) do corpo marcado pelo olhar do outro,
assume que o corpo é o lugar de todos da recíproca constituição entre subjetivo/
os paradoxos. Marzano (2007), por meio coletivo, nos indagamos sobre imagens e
dos diversos olhares, nos aponta que o conceitos que vão sendo veiculados sobre
corpo é a evidência da existência huma- ser um corpo/sujeito: Como são lidas/in-
na. O corpo é polissêmico, é uma reali- terpretadas algumas marcas no corpo – da
dade histórica, mutável e multifacetada. cabeça aos pés? O que se torna significa-
Bakhtin (2003, 1993) ainda nos instiga a tivo nas relações entre colegas? Do lugar
pensar em como o olhar do outro, possí- que Luciana ocupa nas relações, o que –

1052
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

imagens, afetos, conhecimentos - se mos- significativas com relação à determinação


tra por ela incorporado? da maneira como essa condição deve ser
compreendida e trabalhada no contexto
Palavras-chave: constituição do corpo/sujeito, da educação. Entendemos que é essen-
estética, ética cial conferir-lhe o direito a seu papel ativo
Contato: Flavia Faissal de Souza, Faculdade de na construção de seu desenvolvimento, a
Educação/UNICAMP, ffaissal@unicamp.br partir de sua capacidade individual de se
apropriar e internalizar formas sociais de
comportamento como sujeito histórico.
LT07-1359 - ABORDAGEM HISTÓRICO- Assim, ela passa a ser percebida e com-
CULTURAL E O PROCESSO EDUCACIONAL preendida como indivíduo possuidor de
DE ESTUDANTES COM NECESSIDADES diferentes capacidades e potencialidades
ESPECIAIS em emergência que devem ser encora-
Ricardo Alain Leyva-Nápoles - UnB jadas como alicerce do desenvolvimento
confie.fisio@gmail.com das funções psicológicas superiores. É evi-
Sílvia Ester Orrú - UnB dente que a apropriação do conhecimen-
seorru@hotmail.com to é construída historicamente e mediada
em sua relação com o professor pela lin-
A abordagem histórico-cultural como re- guagem, cerne de tudo o que é social, que
ferencial teórico para o trabalho junto a interage, dialoga e colabora para o exer-
estudantes com necessidades especiais cício da cidadania. Adota-se uma com-
nos incita a compreender que o processo preensão de homem em sua totalidade e
de ensino e aprendizagem deve contem- uma educação em que se resguarda o es-
plar uma criteriosa relação entre media- paço do sujeito. Enfatiza-se que o sentido
ção pedagógica, cotidiano e formação de para o homem se constrói na linguagem e
conceitos, possibilitando o encontro/con- que nela se encontram o diálogo e a inte-
fronto das experiências diárias no contex- ração em que estão presentes o sujeito e
to em que ocorrem para a formação de o outro, a todo instante (Orru, 2009). Por-
conceitos numa internalização conscien- tanto, o objetivo educacional é o desen-
te do que é vivenciado e concebido. O volvimento da linguagem como atividade
educador no processo de mediação deve constitutiva do sujeito pela mediação do
explorar sua sensibilidade para perceber professor numa perspectiva não reducio-
quais os significados construídos por seus nista a simples troca de informações ou
estudantes com referência aos conceitos de comunicação mecanizada, mas numa
que estão sendo formados, sejam es- perspectiva que compreende as situa-
tes mais elementares ou complexos (Vi- ções dialógicas com significado cultural.
gotsky, 2000). Quando falamos de apren- Valorizamos o trabalho educativo a par-
dizagem, entendemos estarem implícitas tir da relação com o outro, em busca da
todas as formas de conhecimento, acadê- construção deste sujeito que está imerso
micos, do cotidiano, as ações de afeto e na cultura de uma sociedade e em que,
sentimento e de valor. As proposições de através da mediação pelo outro, pela lin-
Vigotsky acerca da pessoa com necessida- guagem, proporciona à criança ser reco-
des especiais e seu desenvolvimento são nhecida como sujeito que, dentro de suas

1053
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

possibilidades e recursos, também inte- habilidades, mas também tem especifici-


rage (Vigotsky, 1989). Neste contexto, o dades a serem atendidas. É esperado que
educador contribuirá em suas ações me- a escola tenha uma proposta educacional
diadoras na reconstituição e na melhora genuinamente inclusiva nesse mesmo
da vivência emocional de seu estudante, contexto. Os processos de ensino e de
para que seu ser, revelado em suas ações, aprendizagem precisam estar centrados
transcenda as reações afetivas imediatas no estudante. As avaliações necessitam
para outras mais duradouras. Sob uma ser adaptadas e compreendidas dentro
metodologia fundamentada na perspec- de seu contexto, de potencial de cada
tiva do desenvolvimento da linguagem, estudante, mas também de seus limites.
o estudante passa a ser compreendido Uma avaliação que atente àquilo que o
de outra forma, implicando ações dife- estudante realmente aprendeu e que re-
renciadas por parte dos educadores que tome as demais questões de uma forma
também se transformam, a partir de seu e em uma linguagem que ele possa rever
papel de agentes de mediação. A lingua- e aprender. Percebemos que a interação
gem contribuirá para a compreensão e o social, nas escolas, tende a ser maior na
estabelecimento de regras que são for- hora dos intervalos; nos momentos des-
muladas nas relações com o outro, por tinados às atividades escolares, junto aos
meio do diálogo. Nesta abordagem, con- demais, ela praticamente não ocorre, pois
cebe-se o ser humano como ser eminen- o estudante com necessidades especiais,
temente simbólico e a linguagem como em muitos momentos, se encontra à
responsável pelo processo de mudança parte, certas vezes sozinho, sem ter real
de funções psicológicas interpessoais atenção do educador no tocante às suas
em intramentais, constituindo o pensa- singularidades referentes ao aprendiza-
mento, a consciência e as outras funções do de conhecimentos escolares.É preciso
psíquicas superiores, próprias da espécie que a escola desenvolva uma postura de
humana. Quando falamos em educação valorização à diversidade. A escola é para
inclusiva tendo em vista a abordagem todos não porque somos todos iguais,
histórico-cultural, remetemos-nos a uma mas porque temos os mesmos direitos,
educação de todos e para todos. Não é mesmo sendo diferentes, e temos expe-
uma educação centrada apenas no estu- riências diversas de nossos lares, diversos
dante com necessidades especiais, mas costumes, valores, princípios e preferên-
uma educação de qualidade para todos cias pessoais. Portanto, a escola não deve
os estudantes da escola. Neste sentido, é se ater apenas à educação do comporta-
necessário atentar para que essa inclusão mento e à verificação de conhecimentos
não seja precária, marginal e pouco visível aprendidos a partir de avaliações homo-
(Amaral, 1995). Não basta o estudante ser gêneas e inflexíveis. Ao contrário, deve
aceito na escola; isto não significa que ele frisar a flexibilidade e a mediação da
está incluído. Ele precisa ter acesso a con- aprendizagem, valorizando o que real-
dições adequadas oferecidas pela escola mente foi aprendido e construindo novas
para ali permanecer e, de fato, se desen- formas de aprender. Entendemos que ela
volver, buscando-se o seu êxito e respei- deve respeitar as diferenças tendo como
tando-se seus limites. Ele tem potencial e meta um ensino de qualidade para todos.

1054
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: abordagem histórico-cultural, dos resultados da conduta pelo próprio


necessidades educacionais especiais, ensino e sujeito (Luria, 1987; Díaz et al., 1993). Tem
aprendizagem sua gênese nas interações sociais, sendo
Contato: Ricardo Alain Leyva Nápoles, UnB, a linguagem o instrumento que media a
confie.fisio@gmail.com internalização dos comandos da conduta
voluntária. Sua consolidação se dá com o
uso da percepção generalizante, gerada
LT01-1436 - CONSCIÊNCIA REFLEXIVA E pela consciência reflexiva na elaboração
AUTORREGULAÇÃO: UM ESTUDO SOBRE conceitual. Para a investigação foram se-
CRIANÇAS COM BAIXO RENDIMENTO lecionados doze alunos do ensino funda-
ESCOLAR mental, regular, de uma escola municipal
Mônica Dorrenbach Luna - Faculdade Dom de Curitiba. Seis alunos apresentavam bai-
Bosco/PR xo rendimento escolar, entre os quais ha-
monicaluna@uol.com.br via cinco meninos e uma menina com, ao
menos, dois anos de atraso escolar. Dos
O seguinte estudo teve como objetivo seis alunos com alto rendimento escolar,
diagnosticar as condições da atividade quatro eram meninas e dois eram meni-
reflexiva e da regulação de conduta em nos com notas iguais ou acima de 80,0
crianças com baixo rendimento escolar e (oitenta) em todas as matérias, durante o
compará-las com as condições de crianças ano letivo em curso. Todos cursavam a ter-
com alto rendimento escolar. Os proces- ceira série, três com oito anos e três com
sos psicológicos centrais nessa investi- nove anos de idade. Os procedimentos de
gação foram consciência reflexiva e au- coleta e registro de dados foram aplicados
toregulação, formulados pela Psicologia em um encontro individual de, em média,
Escola Soviética (Vigotsky, Leontiev, Luria) uma hora e meia: uma entrevista semia-
e de seus intérpretes (Díaz et al., 1993). A berta com treze questões, um problema
consciência reflexiva foi considerada como lógico para resolver escrevendo, um que-
a função psicológica que se ocupa da au- bra-cabeça com palitos de fósforo (para
topercepção das diferentes atividades reconfiguração espacial), uma tarefa que
da mente, permitindo sua classificação, reproduzia uma prova pedagógica com
seu isolamento e controle. É consolidada oito questões envolvendo as cinco discipli-
no processo de intelectualização (signi- nas escolares. A suposição de partida era
ficação, abstração e generalização) que de que as crianças com baixo rendimen-
se dá durante a formação dos conceitos to escolar apresentariam dificuldades de
científicos, apresentados pela escola. A atividade reflexiva e de autoregulação em
intelectualização e a consciência dos pro- situações de aprendizagem, quando com-
cessos mentais, por sua vez, engendram paradas às crianças com alto rendimento
um crescente domínio voluntário sobre o escolar. Observou-se que o processo de
próprio psiquismo (Vigotsky, 1987). Outro autorregulação, avaliado pelo nível de re-
processo enfocado foi o de autorregula- gulação da fala e por subcategorias liga-
ção. Trata-se do processo psicológico de das à regulação da conduta, encontrava-
regulação deliberada da conduta. Inclui -se igualmente heterogêneo em ambos os
planejamento, monitoração e avaliação grupos, não se caracterizando como um

1055
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

processo correlacionado ao rendimento escolar foram capazes de mobilizar ativi-


escolar. De outro lado está a consciência dade mental para providenciar resposta
reflexiva, avaliada em sua capacidade de às perguntas autorreflexivas, mesmo que
ativação, em sua ação sobre o próprio in- as respostas não fossem avançadas. Na
telecto e em sua ação sobre os conceitos atividade reflexiva sobre o próprio intelec-
científicos. Apresentou, na dimensão de to houve freqüente restrição do conceito
ação sobre os conceitos científicos, uma de atividade intelectual aos elementos
diferença intergrupal significativa para da vida escolar; freqüente ausência de
discussão: o prejuízo da capacidade vo- consciência da própria atividade mental;
luntária dos alunos com baixo rendimento presença da noção de intelecto invariável
escolar de formular explicações genéricas apesar da concepção de aprendizagem
acerca de conhecimentos científicos que controlável, como se fossem aspectos
circulam no cotidiano escolar. As condi- distintos; presença da noção de controle
ções da atividade reflexiva e da regulação da aprendizagem por insistência, por re-
da conduta avaliadas apontaram, antes petição e freqüente atribuição de com-
de tudo, diferenças interindividuais que, petência de avaliação da aprendizagem
provavelmente, compõem as dinâmicas a outrem, que não o próprio sujeito. Na
particulares de cada criança. A combina- atividade reflexiva sobre conceitos cien-
ção diversificada de condutas nas várias tíficos observou-se dificuldade de abs-
categorias examinadas sugere estilos de tração para elaboração de conceitos em
funcionamento diferentes de cada sujeito todos os sujeitos do grupo e na regula-
com baixo rendimento escolar, os quais, ção da conduta, freqüente dificuldade de
supostamente, engendram os avanços, antecipar verbalmente as ações a serem
os retrocessos ou a estabilidade psicológi- encaminhadas em uma determinada ati-
cos. Apesar disso, regularidades puderam vidade. A diferença mais significativa in-
ser observadas e encontraram, no quadro tergrupos, no processo de formação de
teórico deste estudo, ressonância para conceitos científicos, certamente não en-
discussão. Apenas a categoria atividade cerra a idéia de que as crianças de baixo
reflexiva sobre os conceitos científicos rendimento estejam desprovidas de pro-
apresentou regularidade significativa em cessos intelectuais, mas sim que estes se
todos os sujeitos examinados com bai- encontram qualitativamente diferencia-
xo rendimento. No entanto, as seguintes dos dos de outras crianças. Ao chegarem à
características, apesar de não terem sido escola, as crianças apresentam conceitos
identificadas em todos os estudantes em de outra natureza (cotidianos – Vigotsky,
foco, também marcaram presença no 1987) e são capazes de promover ativida-
grupo de baixo rendimento, por exclusivi- de reflexiva sobre este tipo de conceito e
dade ou por maior freqüência do que no sobre o próprio intelecto. A hierarquia e
outro grupo. Na ativação da consciência a subordinação de classes de significados,
reflexiva houve presença, em todas as entretanto, é uma característica particular
crianças estudadas, de ativação da cons- dos conceitos científicos e é a esta natu-
ciência reflexiva, quaisquer que sejam as reza de construção intelectual que se re-
condições desta atividade. Significa dizer fere a diferença entre grupos encontrada
que todos os alunos de baixo rendimento nesta investigação. Uma vez prejudicada a

1056
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

formação de conceitos científicos, o pro- Rohde e colaboradores (2000), estudos


cesso de intelectualização encontra-se nacionais e internacionais realizados
também implicado, segundo trabalho de majoritariamente com crianças em ida-
Vigotsky (1987) já mencionado. Segue-se de escolar, apontam uma prevalência do
a limitação da atividade reflexiva e do mo- TDAH entre 3 e 6%. Essas crianças apre-
vimento de autoregulação que qualificam sentam grande possibilidade de apresen-
o pensamento e a personalidade. tar co-morbidades, cujo curso chega a
estender-se à adolescência e, por vezes,
Palavras-chave: rendimento escolar – à vida adulta (Rohde et. al, 2000; Pinna
autoregulação – atividade reflexiva et. al, 2007). Ora, se as dificuldades esco-
lares constituem a principal queixa apon-
tada pelos pais e portadores de TDAH
LT02-1475 - PSICODIAGNÓSTICO DE (Pastura et. al, 2005), fazendo com que
CRIANÇAS PORTADORAS DE TDAH E estes procurem atendimento especiali-
SEUS RESPONSÁVEIS zado, a importância de se fornecer um
Petruska Oliveira Baptista - UFPA bom psicodiagnóstico é de que possamos
petruska@ufpa.br oferecer a esta demanda a possibilidade
Cindy Magrinelli de conhecer melhor o problema e tratá-
-lo adequadamente, buscando auxiliar o
As primeiras referências ao Transtorno paciente, a família e a escola. O aspecto
de Déficit de Atenção e Hiperatividade, da desinformação da população sobre o
citado pela literatura médica como Trans- assunto, fazendo com que acreditem, por
tornos Hipercinéticos, surgiram em me- vezes – e erroneamente –, que os pacien-
ados do século XIX. Na década de 1940, tes não conseguirão ter uma vida normal,
surgiu a denominação lesão cerebral pode também traduzir a importância do
mínima, substituída em 1962 por disfun- diagnóstico. Há um desconhecimento
ção cerebral mínima, quando passaram a acerca do TDAH na própria esfera da saú-
reconhecer que as alterações caracterís- de, assim, diagnosticando, ampliaremos
ticas da doença relacionavam-se mais a o conhecimento da doença aos demais
disfunções em vias nervosas do que pro- profissionais da equipe (Ballone, 2002).
priamente a lesões nas mesmas (Rohde Respaldados, os profissionais da saúde
et. al, 2000). Embora com nomenclaturas poderão expandir seus conhecimentos
diferentes, os principais sistemas clas- em direção ao atendimento especializado
sificatórios de doenças mentais atuais – e às demandas da comunidade, propor-
DSM-IV denomina a doença em questão cionando a troca de saberes, atendendo,
de Transtorno de Déficit de Atenção e desta maneira, os objetivos da extensão
Hiperatividade – TDAH, enquanto que o que se dá na medida em que estendemos
Sistema de Classificação Internacional de o conhecimento produzido na academia
Doenças (CID-10) a nomeia como Trans- à população. O objetivo deste estudo foi
tornos Hipercinéticos – eles convergem realizar psicodiagnóstico de crianças com
em grande parte no que diz respeito às diagnóstico de TDAH, encaminhadas pelo
diretrizes diagnósticas para este transtor- Caminhar, sendo estes atendimentos
no (Rohde et. al, 2000). Ainda segundo extensivos também aos seus familiares,

1057
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

caso necessário. Participaram do estudo LT06-805 - O DESAFIO DA


crianças e adolescentes com diagnóstico EDUCAÇÃO ESPECIAL: QUAIS SÃO AS
confirmado de TDAH segundo os critérios CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA?
do DSM-IV, encaminhadas pelo serviço Ana Paula Gomes Moreira - PUC/Campinas
de neuropediatria do HUBFS, com ou sem aana.moreira@yahoo.com.br
prescrição medicamentosa. Duas salas Adinete Sousa da Costa Mezzalira - PUC/
destinadas ao atendimento psicológico. Campinas
Foram utilizados como instrumentos ro- adinetecosta@hotmail.com
teiro de entrevista de anamnese psico- Raquel Souza Lobo Guzzo - PUC/Campinas
lógica; o Achenbach Child Behavior Che- rguzzo@mpc.com.br
cklist (CBCL) e o Teacher’s Report From
Ages 6-18 (TRF); Escala de Maturidade O cotidiano do psicólogo que privilegia a
Mental (Columbia) e o Teste das Matrizes escola como espaço de atuação e inter-
Progressivas de Raven. A maior parte dos venção é revelador de uma infinidade de
pacientes apresentou um quadro clínico aspectos que, de alguma forma, circuns-
limítrofe para o diagnóstico de TDAH, não crevem o desenvolvimento infantil. Esta
satisfazendo, portanto, os critérios para caracterização decorre da compreensão
este diagnóstico, embora alguns tenham de que a escola funciona como um orga-
apresentado muitos dos sintomas que nismo vivo e dinâmico, em cujo cenário
caracterizam o transtorno em questão. as relações humanas são explicitadas,
Desta forma, vale salientar o que dizem enquanto constituem e são constituídas
Cypel (2000 citado em Brogio & Correda- pelos sujeitos, especialmente, as crian-
to, 2003) e Rohde et. al (2000), no que diz ças. Dentre esses aspectos, destacamos
respeito ao cuidado que se deve ter ao aqueles referentes à educação especial.
diagnosticar uma criança como portadora No interior da escola, os professores de
de TDAH, pois a desatenção, a hiperati- educação especial representam a corpo-
vidade ou impulsividade como sintomas rificação da Política Nacional de Educação
isolados podem indicar a presença de Especial na Perspectiva da Educação In-
tantos outros problemas no ambiente ao clusiva, publicada em setembro de 2008.
qual a criança está circunscrita. Obser- Historicamente, contudo, a temática dos
vou-se que os pacientes apresentavam alunos com necessidades educacionais es-
muitos sintomas, mas não preenchiam peciais tem sido incorporada nos registros
os critérios diagnósticos para o TDAH em legais e nos textos de políticas públicas, no
si. Logo estes pacientes e familiares fo- Brasil, desde a constituição de 1988 até a
ram encaminhados para redes de serviço, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-
com objetivo de dar continuidade ao psi- cional, promulgada em 1996. Enquanto
codiagnóstico, oferecendo os encaminha- prática profissional, esta área vem se con-
mentos necessários para a melhor assis- figurando como campo de expressão da
tência ao alcance desta população. interface entre os saberes da Psicologia e
da Educação. Nos termos da Lei, o Decre-
Palavras-chave: Transtorno de Déficit to nº 6.571, de 17 de setembro de 2008,
de Atenção e Hiperatividade (TDAH); regulamentou o atendimento educacional
Psicodiagnóstico; Psicopediatria. especializado aos alunos com deficiência,

1058
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

transtornos globais do desenvolvimento legitima esta configuração ao receber as


e altas habilidades ou superdotação, que ‘queixas’ oriundas das instituições esco-
estejam matriculados na rede pública de lares e rotular as crianças (e não apenas
ensino regular. Com relação às nuances as queixas) com códigos que indicam suas
da prática, uma série de produções con- ‘doenças’ ou classificá-las como portado-
tundentes na área tem chamado a aten- ras de problemas de aprendizagem que,
ção para as contradições e incoerências por sua vez, atestam sua incapacidade
dos processos de inclusão nas escolas de para aprender e, portanto, para serem
educação básica. Nesse sentido, muitas dignas da escola. O peso desta realidade
ações produzidas no interior das escolas surpreende ao indicar que a Psicologia não
brasileiras têm respondido à necessidade se desvencilhou, completamente, das tris-
de melhoria dos indicadores nacionais, tes características que a introduziram no
em detrimento da garantia da qualidade universo escolar como uma disciplina nor-
do ensino oferecido nas salas de aula. As matizadora e remediativa. No contexto do
linhas das Diretrizes Nacionais para a Edu- surgimento da figura do psicólogo escolar,
cação Especial, promulgadas em 2001, ele foi convocado à escola para resolver os
preconizam a ampliação do conjunto de problemas que emergissem neste cená-
educandos com necessidades especiais rio, a fim de ajustar as crianças que, por-
para aqueles que apresentem ‘dificulda- ventura, não se adequassem aos padrões
des no processo de aprendizagem ou li- de aprendizagem definidos pelo sistema.
mitações no processo de desenvolvimen- Assim, a sociedade estaria isenta de suas
to não vinculado a uma causa orgânica responsabilidades educativas enquanto a
ou relacionadas a condições, limitações Psicologia se constituiria como ciência que
ou deficiências’. Este formato sustenta o referendava, por meio de seus recursos, os
risco do aumento das questões identifi- traços da perspectiva liberal e positivista.
cadas como necessidades especiais, para A reprodução desta configuração nos dias
abarcar os “alunos problema”, sob o pre- de hoje, todavia, se adéqua aos novos dis-
texto de enfraquecer o foco nas condições positivos, legais e práticos, como é o caso
deficientes. Este trabalho representa um das políticas de educação especial. Os de-
ensaio reflexivo sobre a nossa inserção safios da prática têm nos mostrado as fa-
cotidiana como psicólogos escolares, por cetas de um processo de inclusão que ser-
meio de um projeto de extensão existen- ve à exclusão, ao agregar as crianças que
te nas escolas da rede de educação bá- incomodam sob o rótulo de portadoras de
sica em um município do interior de São necessidades especiais. Não estamos pro-
Paulo. Ele visa revelar a concretude deste movendo a desconsideração de possíveis
risco e as suas trágicas conseqüências. À dificuldades e limitações; ao contrário,
educação especial tem sido oferecida a estamos enfatizando que toda e qualquer
responsabilidade primeira de educar toda educação deva ser especial, no sentido de
e qualquer criança para moldá-la ao ideal garantir o desenvolvimento saudável de
de criança bem comportada, que aprende toda e qualquer criança. Assim, por outro
domesticada e silenciosamente. Por outro lado, a constatação de que as crianças que
lado e de maneira não menos aviltante, inquietam, desconsertam e incomodam
a Psicologia, alocada na área da saúde, são excluídas sob a proteção do termo

1059
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

especial, revela a possibilidade de ação. ciais foram deixando de ser excluídas para
Do ponto de vista psicológico, evidencia- fazerem parte da sociedade, mas, ainda
-se que estas crianças estejam vivencian- encontram muitos empecilhos para ve-
do situações-limite e que não as tornam, rem seus direitos garantidos no seu dia a
necessariamente, vulneráveis, mas, que dia; a tendência inclusiva está contida nos
sugerem a oportunidade de articulação documentos oficiais, mas, na prática, não
dos elementos de proteção, os quais, feliz- é o que acontece no interior das escolas.
mente, muitas vezes são ofertados pelos Desde 1991, a Lei 8213 vem garantindo
profissionais de educação especial e pelos uma participação mais efetiva no mercado
próprios psicólogos. Estes profissionais, de trabalho, pois, garante ao portador de
que se envolvem mais com as crianças do necessidades especiais uma cota de vagas
que as queixas devem, por conseqüência, em empresas, variando de 2% a 5% do
assumir a tarefa de lutar para que este seja quadro de funcionários, dependendo do
um horizonte para a escola e para todos total de empregados que a mesma pos-
aqueles que a constroem. suir. Entretanto, ainda existem alguns obs-
táculos para que essa lei seja cumprida,
Palavras-chave: psicologia escolar, educação que são as barreiras físicas e psicológicas.
especial, situação-limite A primeira diz respeito à falta de rampas,
Contato: Ana Paula Gomes Moreira, PUC- corredores e portas com mais de 80 centí-
Campinas, aana.moreira@yahoo.com.br metros, banheiros próprios, dentre outras.
As barreiras psicológicas são ainda mais
difíceis de serem ultrapassadas, pois, du-
LT06-1009 - A INCLUSÃO DA PESSOA rante muito tempo, os portadores de ne-
COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS cessidades especiais foram tratados como
ESPECIAIS NO ENSINO PROFISSIONAL incapazes, sendo-lhes negado o direito ao
Alice Maria de Oliveira Souza - CEPA desenvolvimento de suas potencialidades.
alice.souza@cepeduc.com Para a realização deste trabalho, foi esco-
Ana Claudia Rodrigues Fernandes - UNB lhida a abordagem qualitativa de pesquisa,
anacrf@ibest.com.br buscando uma compreensão da Inclusão
da Pessoa com Necessidades Educacionais
Este trabalho surgiu das reflexões que Especiais no Ensino Profissional, além de
foram realizadas durante o trabalho de buscar compreender como os profissio-
uma das autoras, enquanto coordenadora nais que atuam em um instituto de edu-
pedagógica em uma instituição de ensi- cação profissional de Anápolis/GO vêm
no profissional, com pouquíssimos aten- lidando com a possibilidade de atender a
dimentos a alunos com deficiência. Tem esse alunado. O instrumento utilizado para
como objetivo identificar as dificuldades a coleta de dados foi a entrevista semi–es-
encontradas no processo de inclusão de truturada, constando de 09 questões ob-
alunos com necessidades educacionais jetivas e 04 subjetivas, que foi aplicada a
especiais, possibilitando reflexão e so- 20 profissionais, entre eles professores e
cialização de idéias inclusivas com outros funcionários técnico-administrativos. Na
profissionais. Com a evolução da Humani- entrevista, era solicitado ao participante
dade, as pessoas com necessidades espe- demonstrar sua opinião sobre a inclusão

1060
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do aluno com Necessidades Educacionais dades especiais na educação Profissional


Especiais no Ensino Profissional e Mercado e no mercado de trabalho, 85% disseram
de Trabalho Formal. Percebemos, durante conhecê-la e 15% afirmaram não conhe-
as entrevistas, que embora a maioria dos cer tal legislação. A maior parte dos en-
profissionais possuísse bastante experiên- trevistados demonstrou ter conhecimento
cia em educação na rede regular de ensi- acerca da inclusão, respondendo ser esta
no, buscaram se informar sobre a inclusão “o direito do ser humano de aprender jun-
por conta própria, já que a instituição não to com todos sem discriminação”; outros
tem promovido discussões acerca deste responderam ser de suma importância
processo. Dos profissionais entrevistados, para a participação social das pessoas com
13 ou 65% deles, relataram acreditar que necessidades especiais. Somente 01 dos
para que o aluno com necessidades espe- entrevistados respondeu ser totalmente
ciais tenha acesso e permaneça na insti- contra a inclusão: “sou totalmente contra,
tuição de ensino profissional, precisa que pois o professor não está preparado para
os profissionais sejam capacitados, sendo tal, nem o aluno acompanha os demais co-
que 18 deles ou 80% não tiveram acesso legas”. Outra entrevistada relatou acredi-
à formação docente voltada para o aten- tar que da forma como vem acontecendo
dimento a alunos com necessidades es- nas escolas regulares, a inclusão não está
peciais. Com relação ao conhecimento de sendo efetiva. Quando perguntados acer-
instituição de educação profissional que ca do currículo, 13 dos entrevistados ou
trabalhe com inclusão, 11 ou 55% dos en- 65% respondeu que deve ser flexibilizado
trevistados disseram não conhecer nenhu- de forma a atender a todas as diferenças;
ma instituição que atendesse a este pú- 04 pessoas ou 20% responderam que deve
blico, enquanto os outros 09 ou 45% já ti- ser diferente e outros 02 ou 10% respon-
nham ouvido falar de instituição de ensino deram que deve ser diferente do que é
profissional que trabalhasse com Inclusão oferecido aos demais alunos, além de fle-
da pessoa com Necessidades Especiais no xibilizado; apenas 01 participante respon-
Ensino Profissional. Dos 20 entrevistados, deu que “não deve ser flexibilizado, pois, o
18 ou 90% não tiveram acesso a cursos de aluno com necessidades especiais tem as
formação docente para atendimento a alu- mesmas habilidades racionais”. A maioria
nos com Necessidades Especiais voltados dos entrevistados acredita ser importante
para Educação Profissional e, apenas 02 para a pessoa com necessidades especiais
ou 10% dos entrevistados, já tinham tido ser incluída, tanto no ensino profissional
acesso a esse tipo de formação. Sobre a como no mercado de trabalho, para que
questão da oferta de apoio pedagógico es- se sinta útil e integrada à sociedade; 01
pecializado, por parte da instituição, para participante relatou acreditar “que falta in-
atendimento aos casos de pessoas com teresse dos profissionais da educação para
necessidades especiais, 75% dos entrevis- ofertar essa modalidade de educação e,
tados (15) responderam que sim, enquan- também no mercado de trabalho em pro-
to 05, ou seja, 25% responderam que não, mover essa inclusão”; outro, que acredi-
que a instituição não oferecia apoio peda- tava que “é uma realidade ainda distante,
gógico. Com relação à legislação que versa pois as pessoas com deficiência adentram,
sobre a inclusão da pessoa com necessi- as empresas na maioria das vezes sem um

1061
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

curso profissionalizante”. Como podemos Este ensaio reflete sobre a realidade das
perceber, em toda a pesquisa, ficou evi- pessoas com (d)eficiência, pois, embora
denciado que a instituição não está pro- tenha aumentado a quantidade de leis
movendo discussões acerca da inclusão direcionadas a esse coletivo, nosso país
para os profissionais que ali atuam. Com continua, consideravelmente, ainda mui-
relação à inclusão no ensino profissional to longe de tornar-se inclusivo. Ao longo
e no mercado de trabalho, vemos grande do século XX, especialmente nos últimos
divergência nas respostas, já que enquan- sessenta anos, foram firmados e ratifica-
to temos 01 entrevistado que acredita ser dos mais de dez tratados internacionais
a escola especial ainda a mais adequada oriundos, essencialmente, do pós-guerra
para promover a profissionalização do alu- europeu, quando foram assassinadas mi-
no com necessidade especial, enquanto lhões de pessoas, entre judeus, negros e
outro acredita que as escolas profissionais deficientes. Nesse contexto, o papel da
não fazem a verdadeira inclusão, fazendo Psicologia, enquanto uma ciência que
“arranjos” quando recebem alunos com ainda se estabelecia, foi o de legitimar o
necessidades especiais. Se quisermos, re- processo de exclusão social. Assim, au-
almente, fazer a inclusão verdadeira, pre- tores consagrados, tais como Galton e
cisamos nos preparar para recebermos os McDougall, chegaram a publicar obras em
alunos com necessidades especiais e capa- que defendiam, abertamente, a eugenia.
citá-los para serem inseridos no mercado A eugenia era necessária, pois, favorecia a
de trabalho, em igual condição com os de- criação de uma sociedade em que predo-
mais alunos. Com este estudo concluímos minassem os indivíduos mais fortes. Para
que o instituto de educação profissional Galton, a eugenia deveria ser considerada
em questão não se encontra preparado como uma teoria científica; já McDougall
para realizar o atendimento a alunos com afirmava que a Psicologia deveria propor-
necessidades especiais precisando, ainda, cionar os instrumentos necessários para
de uma discussão mais aprofundada sobre o desenvolvimento da eugenia. Assim, o
o assunto, capacitação dos profissionais estabelecimento da eugenia, enquanto
envolvidos, além de uma política voltada ciência, contemplava diversas ações por
para a formação integral da pessoa. parte do governo. Criaram-se, nos Esta-
dos Unidos da América (EUA), comitês
Palavras-chave: inclusão, educação em prol do “movimento eugenista”, tais
profissional, mercado de trabalho como o comitê sobre a hereditariedade
Contato: Alice Maria de Oliveira Souza, CEPA, da deficiência intelectual e da surdo-mu-
alice.souza@cepeduc.com dez, e o comitê de esterilização de pesso-
as com deficiência. Em 1907 chegou-se a
aprovar, no estado da Indiana-EUA, uma
LT06-1470 - LEIS PARA PESSOAS COM lei que permitia a esterilização de pessoas
(D)EFICIÊNCIA: UMA PROTEÇÃO com deficiência intelectual, sem qualquer
NECESSÁRIA? tipo de consulta prévia ao que corres-
Sara Marques Bringel - Universidade de ponderia ao desejo real dessas pessoas.
Salamanca/Espanha Essa lei foi aprovada, posteriormente, na
sara.marques.10@hotmail.com Suécia em 1922, na Noruega em 1923, na

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Suíça em 1928 e na Dinamarca em 1929. mos – medidas políticas específicas. Entre


Ironicamente, mesmo com a ascensão elas, podemos destacar o que foi explici-
do nazismo, essa lei só foi aprovada na tado pela Constituição de 1988, que reco-
Alemanha em 1933 (Ovejero, 2003). Lo- nhece a pessoa com deficiência como um
gicamente, essas leis eram alteradas em ser em condição de igualdade de direitos
função do país de aprovação. Assim, o (Honora, 2008). Essa igualdade também
que começa nos EUA como a primeira lei vai se refletir no mercado de trabalho por
eugênica de “esterilização dos deficien- meio de leis, tais como a Lei Federal nº
tes mentais” (termo utilizado até os dias 8.112/90, que garante a reserva de vagas
atuais e, geralmente, confundido com o de 5% para concursos públicos e a Lei Fe-
que deveria ser utilizado, que é “deficiên- deral nº 8.213/91, que garante que exista
cia intelectual) passa a ser concebido, na uma quantidade mínima de funcionários
Alemanha, como uma lei de esterilização com (d)eficiência nas empresas privadas
para qualquer pessoa com deficiência. (Assis, 2005). Outra lei essencial é a Lei
Mas, o que é deficiência? A palavra de- n.º 7.853, que institui a Política Nacional
ficiência está longe de ser o termo ideal para a Integração da Pessoa Portadora
para tratar esse coletivo; o “d” entre pa- de Deficiência. Essa política tem como
rêntesis reflete um jogo de linguagem e diretrizes básicas favorecer o processo
uma posição ideológica de perceber as de inclusão e merece destaque por: via-
pessoas como competentes (em oposição bilizar a participação da pessoa porta-
às características negativas que, histori- dora de deficiência em todas as fases de
camente, foram construídas e associadas implementação dessa Política, por inter-
a esse coletivo, tais como: inválidos, in- médio de suas entidades representativas
competentes, incompletos, imperfeitos, (Art. IV, Lei n.º 7.853). Assim, as pessoas
defeituosos...). Pode ser entendida como com (d)eficiência puderam se posicionar
“perda ou anormalidade de uma estru- (e criticar) os princípios da Convenção.
tura ou função psicológica, fisiológica ou “Concede-se” à pessoa com (d)eficiência
anatômica do individuo que restrinja limi- a possibilidade de falar sobre suas neces-
te ou impossibilite a capacidade do indi- sidades diárias, e falar em nome próprio
viduo de realizar uma atividade conside- é algo fundamental, quando se busca a
rada como normal. Essa deficiência pode, inclusão e se constitui como norteador
em alguns casos, atuar como desvanta- para a Convenção da ONU, que tem como
gem social, limitando ou impedindo que principio reconhecer a importância, para
esse indivíduo desenvolva um rol social. as pessoas com deficiência, de sua auto-
Essa desvantagem social será maior ou nomia e independência individuais, inclu-
menor em função dos fatores ambientais sive, da liberdade para fazer as próprias
e do contexto em que essa pessoa está escolhas. Além disso, foram criadas “me-
inserida” (OMS, 1980). Se a desvantagem didas de controle”, nas quais os países
é social, é através da adaptação do meio que ratificaram o tratado poderiam fazer
que conseguiremos minimizar os defei- denúncias em caso de descumprimento
tos decorrentes da deficiência de cunho dos acordos. No entanto, resta-nos a per-
biológico. Assim, poderemos inserir esse gunta inicial: as leis para a(s) pessoa(s)
coletivo ao adotarmos – e concretizar- com (d)eficiência são realmente neces-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sárias (e eficazes) ou são apenas fruto de exploram e brincam menos e ficam mais
um assistencialismo paternalista distante ansiosas quando separadas da mãe (Vi-
da realidade de milhões de pessoas que a cente, 2009). Especificamente neste con-
necessitam diariamente? texto, efeitos sobre o desenvolvimento
da linguagem têm sido pouco estudados.
Palavras-chave: leis, inclusão social, Importante salientar a reconhecida im-
deficiência portância do contexto sócio-afetivo para
Contato: Sara Marques Bringel, Universidade o desenvolvimento cognitivo e emocional
de Salamanca/Espanha, sara.marques.10@ da criança. O processo interacional repre-
hotmail.com senta condição promotora básica para
este desenvolvimento e para a inserção
social da criança, como participante de
PO-LT02 um processo histórico e cultural. A lingua-
gem tem merecido atenção diferenciada,
uma vez que é desenvolvida a partir da
LT02 – 734 - A INFLUÊNCIA DA interação social e, por sua vez, se torna
DEPRESSÃO PÓS-PARTO NO um instrumento poderoso de interação e
DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM DE de inserção social, podendo, portanto, ser
CRIANÇAS DE 36 MESES entendida como produto e instrumento
das trocas sociais. O diálogo é a expressão
Beatriz Servilha Brocchi
viva desse jogo de papéis, delimita e orga-
Vera Silvia Raad Bussab
niza o processo de enunciação. A palavra
Financiamento: FAPESP é sempre dialógica, evoca significações
que a antecedem, ao mesmo tempo em
A influência da depressão pós-parto (DPP) que desencadeia reações subsequentes.
no desenvolvimento da criança tem sido Desta forma, a atividade discursiva em
objeto de diversas investigações. No con- um processo de interação é a condição
texto do projeto longitudinal no qual a de subjetivação e essência da vida social
presente pesquisa está inserida (“Depres- humana (Colaço, 2004). Neste contexto
são pós-parto como um fator de risco da ontogênese da linguagem, a interação
para o desenvolvimento do bebê: estudo com as figuras de apego, em especial com
intedisciplinar dos fatores envolvidos na a mãe, também ocupa posição central,
gênese do quadro e em suas conseqüên- pois o diálogo mãe-filho tem se revelado
cias”, (temático FAPESP, Nº 06/59192), elemento fundamental deste processo. A
identificaram-se efeitos da DPP na intera- mãe é considerada coautora no desenvol-
ção mãe-bebê e em aspectos do desenvol- vimento comunicativo-linguístico do filho,
vimento cognitivo, emocional e neuropsi- uma vez que a criança vivencia, a partir do
comotor da criança: aos 4 meses, arranjos discurso da mãe, as mais variadas cons-
interacionais mãe-bebê mostraram-se truções gramaticais, enriquecendo seu
menos estruturados (de Felipe, 2009), repertório verbal. O entrosamento linguís-
prejuízos na sensibilidade e estruturação tico favorece o desempenho desejado em
da interação diádica (Fonseca et al., 2010); níveis de emissão e apreensão semântica.
aos 12 meses, as crianças do grupo DPP Esta interação diádica mãe-criança pode

1064
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ser prejudicada quando a mãe apresenta abaixo do esperado para a idade, e ape-
DPP, associada à tristeza intensa e a ou- nas quatro (28,6%) obtiveram desempe-
tros incapacitantes (Schwengberger & Pic- nho esperado. Na ausência de DPP, 57,1%
cinini, 2003). A falta de habilidade da mãe estiveram abaixo do esperado, enquanto
deprimida em lidar com os próprios pro- que menos da metade (42,9%) esteve
blemas e a falta de persistência necessária dentro do esperado. Apesar do desem-
para estabelecer uma interação sensível penho abaixo do esperado apresentar-se
com a criança são fatores que comprome- para o grupo como um todo, de um modo
tem a disponibilidade desta para o filho, geral as crianças do grupo sem DPP mos-
com potenciais conseqüências para o seu traram melhores resultados (60%) do que
desenvolvimento cognitivo e afetivo (Fri- as demais e o número de crianças abaixo
zzo & Piccinini, 2005). Objetivo: Analisar a do esperado para a idade foi maior nas
influência da depressão pós-parto no de- mães depressivas (55,6% versus 44,4%). O
senvolvimento da linguagem de crianças teste do qui-quadrado não mostrou dife-
de 36 meses. Método: Foram analisadas rença significativa. Apesar de não ter sido
vinte e oito mães e crianças de três anos, constatada diferença significativa entre os
participantes do projeto que acompanha grupos, a maior parte das crianças cujas
díades atendidas pelo sistema público de mães apresentaram DPP estiveram abaixo
saúde, no distrito do Butantã, São Paulo, do esperado para a idade, o que é com-
a partir da gestação. Das participantes, patível com os dados prévios da influên-
14 apresentaram indicativos de DPP, ava- cia da depressão pós-parto na interação
liada pela Escala de Depressão Pós-parto mãe-criança e, consequentemente no de-
de Edinburgh, (Cox, Holden & Sagovsky, senvolvimento da criança, como relatado
1987); validada por Santos, Martins e Pas- por De Felipe (2009), Fonseca et al (2010)
quali, 1999). Foi realizada uma avaliação e Vicente (2009). Os dados sugerem que
do aspecto pragmático do desenvolvimen- as mães com DPP, possam ter sido menos
to de linguagem das crianças (Fernandes, responsivas e consequentemente estimu-
2000), em filmagens de quinze minutos de lado menos a linguagem de seus filhos.Em
brincadeira livre com a mãe, em função de outro contexto que não o da DPP, Taylor et
informações colhidas desde o nascimento. al (2008) verificaram que a sensibilidade
O resultado do teste foi avaliado em fun- e a responsividade materna contribuem
ção do esperado para a idade, quanto ao para desenvolvimento da linguagem du-
número de atos comunicativos por minuto rante o processo de interação entre a lin-
de interação. De acordo com a autora do guagem da criança e a da mãe. Foi cons-
teste, crianças na faixa de 3 anos devem tatado, porém, que ambos os grupo apre-
apresentar entre 6 e 8 atos comunicativos sentaram-se aquém do esperado, o que
por minuto. No teste de pragmática, mais pode ser explicado por fatores adicionais
da metade das 28 crianças, (64,3%) apre- que também influenciam a relação diádi-
sentaram desempenho abaixo do espe- ca, como: idade, emprego, nível intelec-
rado, enquanto que 10 (35,7%) apresen- tual, renda familiar e estresse emocional
taram resultado esperado para a idade. materno (Klein & Linhares, 2006; Mendes,
Na presença de DPP, constatou-se que a 2006; Fan, 2008). Com os dados obtidos,
maior parte das crianças (71,4%) estavam conclui-se que os aspectos relacionados

1065
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ao contexto sócio-afetivo de criação, in- parental, aceitação do comportamento


cluindo os fatores da DPP influenciam, de da criança e disponibilidade de brinque-
forma direta na interação diádica e, con- dos pode reduzir ou compensar os efeitos
sequentemente no desenvolvimento da adversos do risco perinatal, promovendo
linguagem infantil. o aparecimento de sinais precoces de re-
siliência na criança. Em particular, os com-
Palavras-chave: Depressão pós-parto; portamentos maternos em interação com
Linguagem; Interação; Responsividade. a criança atuam como variáveis modera-
doras do risco biológico do nascimento, à
medida que exercem efeito diferencial em
LT02 -735 - DESENVOLVIMENTO DA grupos de crianças vulneráveis, podendo
LINGUAGEM DE PRÉ-ESCOLARES tanto atenuar quanto agravar os efeitos
PREMATUROS AO NASCIMENTO: A adversos dos fatores de risco. Objetivo:
INFLUÊNCIA DA INTERAÇÃO MÃE- caracterizar o desenvolvimento da lingua-
CRIANÇA NESTE PROCESSO gem oral de crianças pré-termo em idade
Beatriz Servilha Brocchi pré-escolar e verificou o impacto da inte-
Maria Isabel da Silva Leme ração mãe-criança neste processo. Méto-
do: Participaram da pesquisa 20 díades de
A construção do conhecimento e da mães e filhos de 5-6 anos com diagnósti-
linguagem resulta de um processo de co de prematuridade ao nascimento que
interação e configura-se de um modo são acompanhadas pelo Ambulatório de
particular entre o bebê prematuro e os Alto Risco de um Hospital no interior do
pais. Conceitua-se recém-nascido pré- Estado de São Paulo. Realizou-se, primei-
-termo como todo aquele que nasce an- ramente, uma anamnese com a mãe a
tes de 37 semanas completas de idade fim de conhecer a constelação familiar, o
gestacional (Vaz, 1986). De acordo com histórico materno, histórico da criança e
Mello e Meio (2003), os recém-nascidos a interação diádica desde o nascimento.
de risco são aqueles que desde o nasci- Posteriormente, aplicou-se uma avaliação
mento têm maior chance de apresentar da linguagem oral das crianças, utilizan-
algum problema em seu desenvolvimen- do um teste fonoaudiológico chamado
to, crescimento ou comprometimento ABFW, verificando os aspectos de voca-
clínico. Apesar de algumas crianças que bulário, fonologia, pragmática, fluência e
não estiveram internadas na UTI neona- uma sequência lógica e de ação para ava-
tal poderem apresentar alterações em liar o desenvolvimento discursivo. Para o
seu desenvolvimento neuromotor ou no teste de pragmática e fluência, foram re-
crescimento, as que permaneceram in- alizadas filmagens de 15 minutos de brin-
ternadas geralmente foram expostas a cadeira livre entre a avaliadora e a criança
situações (prematuridade, baixo peso ao com brinquedos diversos (casinha, bola,
nascimento, infecções, etc.) que podem brinquedos de encaixe, bonecos). O tes-
acontecer isoladamente ou em associa- te de vocabulário foi verificado através
ção e aumentam as chances dessas alte- da nomeação de figuras de diferentes
rações acontecerem. Um ambiente fami- campos semânticos (vestuário, alimentos,
liar adequado, que inclui responsividade meios de transporte, formas e cores, brin-

1066
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

quedos e instrumentos musicais, animais) versado com outras mães (55%). Quinze
e o de fonologia de acordo com a nomea- mães (75%) informaram sentimentos de
ção de figuras e repetição de palavras com tristeza, medo e até desespero durante
fonemas balanceados. O teste de pragmá- a estadia do bebê na Unidade de Terapia
tica foi analisado em função do esperado Intensiva Neonatal (UTIN), havendo uma
para a idade, quanto ao número de atos expectativa pessimista com relação à me-
comunicativos por minuto de interação. A lhora da criança. Apesar da maioria das
fluência verificou a tipologia das disfluên- mães relatarem que as crianças não apre-
cias (comuns e gagas), velocidade de fala sentaram comprometimento no desenvol-
(fluxo de sílabas e palavras por minuto) e vimento e a metade destas considerarem-
frequência de rupturas (porcentagem de -se as principais cuidadoras, observou-se
descontinuidade de fala e de disfluências que as crianças apresentaram desempe-
gagas), sendo esperado para a idade ou nho abaixo do esperado para os testes
não. Todos os testes foram transcritos em de fonologia, vocabulário, pragmática e
protocolos específicos. A prova de voca- fluência e desempenho esperado para o
bulário foi classificada de acordo com o discurso oral. Estes resultados podem ser
tipo de nomeação realizada pela criança: explicados pelo fato de que quase a meta-
designação por vocábulo usual (nomea- de das entrevistadas considerou mais im-
ção correta), não designação ou processo portante na educação seguir regras (10%)
de substituição por outro vocábulo. Este e ser obediente (30%). Apesar de estar
resultado também foi observado em fun- bem desenvolvido para a idade ser um fa-
ção da idade dos sujeitos da pesquisa. Na tor considerado importante para 10% das
fonologia, foi observado se os sujeitos mães, o saber se comportar é o aspecto
apresentaram trocas fonêmicas durante fundamental na educação da criança para
os testes de nomeação e repetição e se mais da metade das entrevistadas (60%).
estas estão dentro do esperado para o Apesar do fator biológico (prematurida-
desenvolvimento da criança. Para avalia- de, baixo peso) estar relacionado com o
ção do discurso oral, foram transcritas as desenvolvimento infantil, como relatado
histórias realizadas pelas crianças e poste- por Melo e Meio (2003), a aquisição e
riormente analisadas de acordo com o es- o desenvolvimento de todos os aspec-
tudo de Spinillo e Martins (1997) que ob- tos relacionados à linguagem (lexical,
servaram os elementos do discurso, per- sintático-semântico, discursivo, fonético-
sonagens, manutenção do tópico, trama/ -fonológico) são fortemente influenciados
evento principal e desfecho. Observou-se pelo processo interacional, pois a lingua-
que a maioria das crianças nasceu abaixo gem ocorre no contexto em que se está
de 1.500g. (65%) e quase metade com exposto. Os aspectos sócio-pragmáticos e
idade gestacional (IG) de 27 a 30 sema- as habilidades cognitivas são fundamen-
nas (55%), caracterizando recém-nascidos tais para o desenvolvimento linguístico
prematuros extremos e de muito baixo da criança (Naigles, 2002). Os achados
peso ao nascimento. A maioria das mães da pesquisa sugerem que estes aspectos
(85%) informou ter recebido orientações também influenciaram no desempenho
durante o período de internação de mé- verificado nos testes de linguagem, uma
dicos (40%), enfermeiros (40%) e con- vez que todas as crianças apresentaram

1067
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

um desempenho muito abaixo do espe- Há evidência de uma relação entre a ha-


rado para a idade. Apesar da maior parte bilidade de leitura e a habilidade mate-
das mães relatarem que são as principais mática (Krajewski & Schneider,2009; He-
cuidadoras das crianças, verifica-se que cht et al., 2001; Durand et. al,2005; Fuchs
sua disponibilidade consiste em apenas et al., 2006). Por exemplo, é comum que
um ou dois períodos para ficar com a crianças com dificuldades na aprendiza-
criança e a maioria, como analisado an- gem da leitura e da escrita também apre-
teriormente, prioriza a obediência e as sentem dificuldades na aprendizagem
regras, embora brinquem e conversem da matemática (Krajewski & Schneider,
com seus filhos. Conclui-se, com os dados 2009; Fuchs et al., 2006). De acordo com
acima que, além dos fatores biológicos e alguns autores (Hecht et al., 2001), essa
socioeconômicos, que podem influenciar relação deve-se ao fato de que, como a
no desenvolvimento, a qualidade da in- habilidade de ler e escrever palavras, a
teração materno-infantil e a estimulação resolução de operações matemáticas su-
materna foram fatores determinantes na bentende habilidades de processamento
aquisição e desenvolvimento da lingua- fonológico. O processamento fonológico
gem dos participantes, uma vez que a refere-se à habilidade de processar os
mãe é considerada o modelo e a prove- elementos sonoros da fala. Ele é comu-
dora de conhecimento e desenvolvimen- mente descrito em termos de três habili-
to para seu filho. O estímulo à leitura e à dades distintas, porém inter-relacionadas
brincadeira conjunta da mãe com a crian- (Wagner & Torgesen, 1987): 1) a consci-
ça podem ser orientados por profissionais ência fonológica, ou seja, a habilidade
de diversas áreas e serão uma forte refe- de prestar atenção consciente aos sons
rência para o desenvolvimento da lingua- que compõem as palavras que ouvimos e
gem, do discurso e, futuramente, para o falamos; 2) a habilidade de codificar, ar-
aprendizado da linguagem escrita. mazenar e processar códigos fonológicos
na memória de trabalho; e, finalmente,
Palavras-chave: Linguagem; Pré-escolares; 3) a velocidade de acesso a códigos fo-
Interação Mãe-criança. nológicos na memória de longo prazo.
Há ampla evidência de que variações em
todas essas habilidades correlacionam-se
LT02-907 - A RELAÇAO ENTRE O estreitamente com variações na apren-
PROCESSAMENTO FONOLÓGICO E dizagem da leitura e da escrita (Durand
A HABILIDADE DE COMPUTAÇÃO et al., 2005). Por outro lado, a evidência
MATEMÁTICA: UM ESTUDO de uma relação entre as habilidades de
LONGITUDINAL processamento fonológico e a habilida-
Daniela Teixeira Gonçalves - UFMG de de resolver operações matemáticas
danitg6@gmail.com é mais controvertida. Por exemplo, ao
Roberta Benedini Vecchi - UFMG contrário de Hetch et al. (2001), Durand
bvroberta@yahoo.com et al. (2005) não encontraram uma as-
Cláudia Cardoso-Martins - UFMG sociação significativa entre a consciên-
cardosomartins.c@gmail.com cia fonológica e a habilidade de resolver
Financiamento: CNPq e FAPEMIG operações matemáticas em um estudo

1068
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que envolveu crianças inglesas de 7 a 10 cessamento fonológico, de inteligência e


anos de idade. Resultados discrepantes de habilidade de leitura, escrita e mate-
têm também sido encontrados para as mática. Todos os processos fonológicos
outras habilidades fonológicas (Fuchs et contribuíram significativamente para a
al.., 2006). No presente estudo avaliamos habilidade de leitura e escrita de pala-
a contribuição do processamento fonoló- vras. Com exceção da memória fonoló-
gico na pré-escola para a habilidade de a gica, o mesmo ocorreu para a habilidade
criança resolver operações matemáticas de matemática. Contudo, é possível que
no final do 2º. ano do ensino fundamen- esses resultados tenham sido mediados
tal. Ao que tudo indica, este é o primeiro por diferenças individuais na inteligência.
estudo a investigar essa questão em uma Conforme ilustrado na Tabela 1, a medida
amostra de crianças brasileiras. A amos- de inteligência verbal correlacionou-se
tra foi constituída de 60 crianças (24 em geral com as medidas de processa-
meninos, 36 meninas), as quais foram mento fonológico e com as medidas de
avaliadas em várias ocasiões diferentes. leitura, escrita e matemática. A medi-
Neste relato descrevemos os resultados da de inteligência não-verbal, por outro
das avaliações que ocorreram quando lado, correlacionou-se apenas com as
as crianças tinham, em média, 5 (Idade medidas de matemática e do executivo
média em meses = 62,53; DP = 0,08) e 7 central. Em vista desses resultados, uma
anos de idade (Idade média em meses = série de regressões hierárquicas foi reali-
92,95; DP = 3,86). Na primeira ocasião, as zada com o intuito de controlar o efeito
crianças foram submetidas a testes que de variações na inteligência verbal e/ou
avaliavam a consciência fonológica (De- não verbal das crianças. Os resultados
tecção de rima), a velocidade de acesso dessas análises mostraram que, após
a códigos fonológicos (Nomeação seriada esse controle, a consciência fonológica,
rápida – NSR – de figuras de objetos e de a memória fonológica e a velocidade de
dígitos), e dois componentes da memória acesso a códigos fonológicos na memória
verbal de trabalho: a memória fonológi- de longo prazo continuaram a predizer
ca (Repetição de dígitos: ordem direta) significativamente o desempenho nas ta-
e o executivo central (Repetição de dígi- refas de leitura e escrita de palavras. Por
tos: ordem inversa). Na segunda ocasião, outro lado, apenas a nomeação seriada
avaliou-se a habilidade de ler e escrever rápida de dígitos continuou a contribuir
palavras e a habilidade matemática atra- para as variações na habilidade mate-
vés dos subtestes do Teste de Desempe- mática. As implicações desses resultados
nho Escolar (Stein, 1994). Finalmente, para a nossa compreensão dos processos
em ambas as ocasiões, avaliamos a inte- fonológicos envolvidos na aprendizagem
ligência verbal (Subteste de Vocabulário inicial da matemática são discutidas.
da Escala de Inteligência Wechsler para
crianças- WISC-III) e não-verbal (Subteste
de Cubos da Escala de Inteligência We-
chsler para crianças- WISC-III) das crian-
ças. A Tabela 1 apresenta os resultados
das correlações entre as medidas de pro-

1069
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Tabela 1: Correlações entre as diversas medidas

Inteli- Inteli- Consciên- Memó- Execu- NSR: NSR: TDE: TDE: TDE:
gência gência cia ria tivo Dígitos Objetos Leitura Escrita Mate-
Verbal Não Fonoló- Fonoló- Central mática
verbal gica gica

Inteligência
1 0,19 0,49** 0,34** 0,30* -0,22 -0,40** 0,29* 0,26* 0,28*
Verbal

Inteligência
1 0,13 0,21 0,31* -0,00 -0,15 0,11 0,25 0,37**
Não verbal

Consciência
1 0,44 0,55** -0,32 -0,39** 0,48** 0,58** 0,31*
Fonológica

Memória
1 0,41** -0,14 -0,24 0,40** 0,43** 0,09
Fonológica

Executivo
1 0,10 -0,27* 0,29* 0,40** 0,36**
Central

NSR: Objetos 1 -0,62** -0,48** -0,50** -0,32*

NSR: Dígitos 1 0,49** -0,44** -0,37**

TDE Leitura 1 0,67** 0,35**

TDE Escrita 1 0,37**

TDE
1
Matemática

* p < 0,05; **p < 0,01.

Palavras-chave: Processamento Fonológico; matemática; leitura.


Contato: Daniela Teixeira Gonçalves, UFMG, danitg6@gmail.com.

1070
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-924 - EFEITOS DE CONTEÚDOS tenderiam a raciocinar probabilisticamen-


VALORATIVOS DE ENUNCIADOS te utilizando diferentes heurísticas, inclu-
DE PROBLEMAS NO RACIOCÍNIO sive e chamada heurística de similaridade,
PROBABILÍSTICO DE ALUNOS ou seja, o raciocínio probabilístico pode-
ria sofrer a influência da semelhança dos
DO SEGUNDO CICLO DO ENSINO
exemplos destacados nos enunciados dos
FUNDAMENTAL problemas com os exemplares mais proto-
Simone Cagnin - UERJ típicos de um grupo ou conceito. Nosso es-
scagnin@oi.com.br tudo visa assim investigar, especificamen-
Thamires de Abreu Emmerick - UERJ te, os efeitos, no raciocínio probabilístico,
thataemmerick@hotmail.com dos conteúdos de enunciados de proble-
Financiamento: FAPERJ mas, que apresentam concepções valora-
tivas desfavoráveis e neutras em relação
Diversos estudos na área da Psicologia ao gênero, à nacionalidade e à faixa etária
Cognitiva apresentam evidências de que próxima ou distante da dos participantes
não apenas a estrutura profunda dos pro- da pesquisa. Participaram da pesquisa 103
blemas, ou seja, a seu esqueleto lógico, crianças de uma escola pública do municí-
mas também as características de super- pio do Rio de Janeiro, cursando o 7° Ano
fície, ou seja, as características periféricas do Ensino Fundamental, com idade média
que não são essenciais para a solução do de 12 anos e meio, sendo 50 do sexo fe-
problema podem influenciar o raciocínio, minino e 53 do sexo masculino. Os instru-
a resolução de problemas, o julgamento, mentos utilizados na pesquisa foram: um
a memória e a tomada de decisão. Muitos questionário inicial que visou obter dados
destes estudos sugerem que caracterís- sócio-demográficos da população estuda-
ticas como os conteúdos semânticos dos da, quatro tarefas que envolviam a resolu-
enunciados (Ross, 1989; Bassok, 2003), as ção de problemas de probabilidade e um
tonalidades afetivas dos enunciados (Hes- questionário complementar com pergun-
se, Kauer & Spies, 1997; Cagnin, 2008), tas sobre a concordância ou discordância
dentre outras características de superfí- dos participantes em relação aos conte-
cie, teriam nítida influência nos processos údos valorativos depreciativos presentes
inferenciais humanos, em especial nos nos enunciados dos problemas. Houve a
processos de resolução de problemas, no divisão da amostra em 6 subgrupos, sendo
raciocínio analógico e na transferência de 3 compostos por meninas e 3 compostos
aprendizagem. Por outro lado, autores por meninos. Destes, 2 grupos, um com-
como Kahneman e Tversky (1982) e Tver- posto por meninas e outro, por meninos,
sky e Kahneman (1983), dentre outros, resolveram problemas de probabilidade
também apresentaram evidências de que com enunciados neutros. Os outros 4 sub-
o raciocínio indutivo e probabilístico cos- grupos foram assim divididos tendo em
tuma sofrer a influência de conteúdos va- vista o gênero (masculino e feminino) e
lorativos de enunciados que apresentam o tipo de conteúdo depreciativo apresen-
estereótipos e características prototípicas tado (conteúdos depreciativos ao gênero
de indivíduos que compõem determina- feminino ou conteúdos depreciativos ao
dos grupos. Sendo assim, os indivíduos gênero masculino). Foram apresentados

1071
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

também a estes 4 subgrupos problemas mais ricos e equilibrados que dêem su-
de probabilidade que continham conteú- porte a estas operações mentais. O teste
dos depreciativos em relação à naciona- estatístico qui-quadrado foi utilizado para
lidade brasileira ou a outra nacionalidade comparar a frequência de respostas apre-
não-brasileira, bem como problemas de sentadas pelos subgrupos. Alguns achados
probabilidade que continham conteúdos apontam para efeitos dos conteúdos va-
depreciativos em relação a uma faixa etá- lorativos dos enunciados especialmente
ria próxima ou distante da idade média no raciocínio probabilístico envolvido em
dos participantes da pesquisa. No que se tarefas que demandavam o julgamento
refere aos procedimentos éticos de pes- da habilidade técnica para mexer em apa-
quisa, houve, inicialmente, a aprovação da relhos eletrônicos, ou seja, a maioria dos
pesquisa pela Comissão de Ética em Pes- participantes concordou com os enuncia-
quisa da Universidade do Estado do Rio de dos que apresentavam conteúdos valora-
Janeiro. Foi apresentado o Termo de Com- tivos depreciativos e estereotipados em
promisso Livre e Esclarecido aos pais dos relação à habilidade técnica de indivíduos
alunos participantes, bem como também mais idosos. Em outras palavras, em uma
houve a autorização da direção da escola tarefa que envolvia o julgamento da habili-
para a realização da testagem em sala de dade técnica de indivíduos de faixas etárias
aula. No que diz respeito ao perfil sócio- diferentes (idosos e crianças), houve o jul-
-demográfico dos participantes, foi obser- gamento desfavorável ao indivíduo idoso
vada uma equivalência na distribuição dos do ponto de vista probabilístico. De modo
participantes nas classes baixa (49,9%) e complementar, os meninos, em contrapo-
média (50,06%), tendo em vista os crité- sição às meninas, demonstraram maior
rios sócio-demográficos utilizados. A maio- sensibilidade aos conteúdos depreciativos
ria dos indivíduos demonstrou praticar em relação ao seu próprio gênero em uma
esporte (83,3%), especialmente os meni- tarefa que envolvia o julgamento da habili-
nos, sendo que esta prática contrasta com dade matemática em homens e mulheres.
a pouca atividade de leitura extraclasse No que se diz respeito aos conteúdos de-
(40,6%). De modo complementar à prática preciativos relativos a nacionalidade brasi-
esportiva, as atividades de lazer também leira e a outra nacionalidade não-brasileira
foram destacadas pela maioria dos parti- apresentados em alguns problemas, não
cipantes (77,6%). Em relação ao acesso à foram encontrados resultados significati-
internet, a quase totalidade das crianças vos, como também aconteceu nas tarefas
(92,2%) menciona este acesso. Já no que que envolviam conteúdos depreciativos
se refere ao contato com outro idioma, em relação ao comportamento de mulhe-
apenas 39,5% dos participantes destaca- res e de homens no trânsito. Por fim, acre-
ram esta opção. Os principais resultados ditamos que os resultados dessa pesquisa
encontrados sugerem que os alunos par- possam ter particular relevância para o
ticipantes não adquiriram ainda um racio- contexto escolar, na medida em que as
cínio probabilístico proficiente e que, tal- situações-problema vivenciadas pelos alu-
vez, as estruturas cognitivas subjacentes a nos em sala de aula podem, muitas vezes,
este tipo de raciocínio possam estar ainda revestir-se de valores desfavoráveis ou não
demandando a construção de esquemas ao seu gênero, nacionalidade, faixa etária

1072
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

e grupo social e isso pode ter influência problemas no desenvolvimento da crian-


na resolução de problemas que envolvem ça. Por volta dos 5 anos espera-se que a
julgamento e probabilidade, bem como no criança já tenha dominado todos os sons
raciocínio indutivo em geral. da fala (Zorzi, 2000). Isso é possível devi-
do a maturidade neurológica que permite
Palavras-chave: Raciocínio; Probabilidade; uma relativa estabilidade no desenvolvi-
Resolução de Problemas. mento da linguagem. Dentro do presente
estudo o referencial teórico utilizado é o
da neuropsicologia cognitiva que se pro-
LT02 – 1191 - AVALIAÇÃO põe a estudar a relação entre os processos
NEUROPSICOLÓGICA: IDENTIFICAÇÃO cerebrais e cognitivos, (Caramazza, 1984).
DE DIFERENÇAS DESENVOLVIMENTAIS Na neuropsicologia cognitiva, a linguagem
DA FUNÇÃO PSICOLINGUISTICA EM é avaliada em indivíduos em diferentes
CRIANÇAS ENTRE 4 E 8 ANOS fases do desenvolvimento humano e tem
Zelma Freitas Soares - UFRB como objetivo avaliar o desenvolvimento
soareszelma@gmail.com de habilidades psicolinguísticas preser-
Gustavo Marcelino Siquara - UFRB vadas e deficitárias após acometimentos
thiago_gusmao1@hotmail.com neurológicos ou distúrbios no desenvolvi-
Társis Cajado Chaves da Silva - UFRB mento (Serafini et al., 2008). Segundo es-
tcajado@hotmail.com ses autores a função linguagem é conside-
Verônica Santos da Silva - UFRB rada como sistema complexo de símbolos
s.s.veronica@hotmail.com e regras que permite a comunicação, com
Patrícia Martins de Freitas - UFRB o envolvimento de habilidades de compre-
pmfrei@gmail.com ensão e expressão. Dessa forma, envolvem
Financiamento: CNPq/FAPESB/PIBEX-UFRB tomar uma representação como um input,
executar algum tipo de processamento so-
A linguagem é um sistema finito de prin- bre esse input, e então produzir uma nova
cípios e regras que permitem ao falante representação, o output, (Capovilla, 2006).
codificar significados em sons e ao ouvin- Segundo Fletcher (2009) o desenvolvi-
te decodificar sons em significado (Brain, mento da linguagem está no centro da
2002). Seu desenvolvimento depende, compreensão leitora. Diante disso, o pre-
portanto, de um ato complexo que envol- sente trabalho teve como objetivo avaliar
ve a cognição (França et al., 2004). Os pri- a existência de diferenças desenvolvimen-
meiros anos de vida são considerados os tais da função psicolinguistica em crianças
mais importantes para o desenvolvimento em fase pré-escolar e escolar inicial a parir
das habilidades da linguagem, pois nesse de avaliação dos componentes específi-
período ocorre a maturação do sistema cos (Fonológico, Lexical e Semântico) da
nervoso, com maior crescimento cerebral linguagem por meio de uma bateria de
e formação de novas conexões neuronais avaliação neuropsicológica. Participaram
(Santos et al.,2008). A ausência de lin- da avaliação neuropsicológica 221 crianças
guagem dentro dos limites cronológicos com idade entre 4 e 8 anos, das quais 126
esperados ou um processo de aquisição (57 %) do sexo masculino sendo a média
muito lento e dificultoso podem indicar da idade de 6,49 anos (dp = 1,28), todos

1073
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de escolas públicas na cidade de Santo An- volvimento da linguagem, pois foi possível
tônio de Jesus-Ba. A avaliação iniciou-se a notar que em concordância com estudos
partir da assinatura do Termo de consen- sobre maturação do sistema nervoso as
timento Livre e Esclarecido (TCLE) pelos crianças avaliadas apresentaram estabili-
pais. Para a avaliação foi utilizada a Bateria dade do desenvolvimento da linguagem a
de Avaliação Neuropsicológica do Proces- partir dos 6 anos. Estudos com esse cará-
samento Lexical (BANPLE) (Freitas, 2009). ter podem contribuir para o processo de
Com a BANPLE foram avaliados aspectos escolarização formal, uma vez que oferece
dos componentes Fonológico, Lexical e Se- elementos relevantes no que diz respei-
mântico da compreensão e produção oral to o desenvolvimento da linguagem em
da linguagem (Freitas et al., 2010). Portan- crianças. Compreender as diferenças de-
to, as Tarefas da Produção Oral do compo- senvolvimentais da linguagem nas crianças
nente Fonológico foram Discriminação de permite saber o que se deve esperar em
Fonemas (DF) e Detecção de Rimas (DR), nível de aprendizado em cada faixa etária,
do Componente Lexical foi a Tarefa de De- considerando também os aspectos gerais
cisão Lexical (DL) e do Semântico foram As- do desenvolvimento individual.
sociação Semântica Palavra-Figura (ASPF)
e Associação Semântica Figura-Figura Palavras-chave: Avaliação Neuropsicológica;
(ASFF). As Tarefas da Compreensão Oral do Psicolinguística; Diferenças Desenvolvimentais.
componente Fonológico foi Julgamento de
Rimas (JR), do Lexical foi a Tarefa de Repe-
tição de Palavras e Pseudopalavras (RPP) e LT02 – 1192 -IDENTIFICAÇÃO DE DÉFICITS
do componente Semântico foram Nomea- PSICOLINGUISTICOS CARACTERIZADORES
ção de Figura (NF) e Fluência Verbal (FV). DE DISLEXIA EM CRIANÇAS DE 4 A 8ANOS
A análise de dados foi feita por meio do Zelma Freitas Soares - UFRB
software SPSS (Statistical Pachkage for So- soareszelma@gmail.com
cial Sciences) versão 18.0. Através da ANO- Thiago da Silva Gusmão Cardoso - UFRB
VA, com o scheffe tests buscou observar a thiago_gusmao1@hotmail.com
existência de diferenças desenvolvimen- Társis Cajado Chaves da Silva - UFRB
tais da linguagem nas crianças, conforme tcajado@hotmail.com
cada idade (4, 5 , 6, 7 e 8 anos). A partir Jacqueline Miranda Pereira - UFRB
dos resultados da ANOVA, com o scheffe acquedja@yahoo.com.br
foi possível identificar diferenças desen- Patrícia Martins de Freitas - UFRB
volvimentais significativas no desempe- pmfrei@gmail.com
nho das crianças em tarefas da função psi- Financiamento: PIBEX/PIBIC/CNPq/FAPESB/CNPq
colinguística de acordo com suas idades. A
ANOVA apontou diferenças significativas A Avaliação neuropsicológica busca inves-
(p= 0,000) entre os grupos formados. Com tigar quais são as funções cognitivas que
o scheffe foi possível notar a formação de estão comprometidas e conservadas. Os
dois grupos: grupo 1 (4 e 5anos) e o gru- principais eixos de atuação da neuropsico-
po 2 (6, 7 e 8 anos). O presente estudo logia são: a avaliação e a reabilitação (Am-
mostra que a BANPLE é sensível para de- brózio, et al 2009). Dessa forma, o presen-
monstrar aspectos relevantes do desen- te trabalho se restringe a discussões de

1074
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dados a partir da avaliação neuropsicoló- com perfil de dislexia, considerando seus


gica. A neuropsicologia cognitiva focaliza subtipos. Metodologia: Participaram do
o processamento da informação, ou seja, presente estudo 303 crianças na cidade de
as diferentes operações mentais que são Santo Antônio de Jesus-Ba, sendo 68,6%
necessárias para a execução de determi- de escolas públicas, 53,1% do sexo mas-
nadas tarefas (Capovilla, 2006). As dificul- culino com idade entre 4 e 8 anos (média
dades de linguagem referem-se a altera- = 6,08 anos; dp=1,37). A partir da assina-
ções no processo de desenvolvimento da tura do Termo de consentimento Livre e
expressão e recepção verbal e/ou escrita, Esclarecido (TCLE) pelos pais, as crianças
(Schirmer, 2004), sendo que para Bene- foram avaliadas por meio de três encon-
det, (2002), para que uma informação que tros com duração média de 1 hora cada.
se deseja transmitir possa ser processada Os instrumentos utilizados na avaliação
como linguagem, tem que primeiro ser foram tarefas que compõem a Bateria de
processada como mensagem em um sis- Avaliação Neuropsicológica do Processo
tema de pensamento. Na neuropsicologia Lexical (BANPLE) (Freitas, 2009). A BAN-
cognitiva, a linguagem é avaliada em indi- PLE avalia aspectos da compreensão e
víduos de diferentes fases do desenvolvi- produção oral da linguagem (Freitas, et al,
mento humano e objetiva distinguir habi- 2010). As tarefas que fazem parte do com-
lidades lingüísticas preservadas e defici- ponente fonológico foram: Discrimina-
tárias após acometimentos neurológicos, ção de Fonemas (DF), Detecção de Rimas
(Serafini, 2008). Diante disso, na aborda- (DR) e Julgamento de Rimas (JR); tarefas
gem neuropsicológica cognitiva a dislexia do componente lexical foram Decisão Le-
é investigada com o intuito de constatar xical (DL) e Repetição de Palavras e Pseu-
que parte ou partes do processo normal dopalavras (RPP); tarefas do componente
de leitura foram danificadas ou perdidas semântico - Associação Semântica Pala-
por meio de modelos do processo normal vra-Figura (ASPF), Associação Semântica
e hábil de leitura (Ellis, 1995). Consideran- Figura-Figura (ASFF), Nomeação de Figura
do os modelos de dupla rota têm-se como (NF) e Fluência Verbal (FV). Na análise de
tipos clássicos de dislexia, a fonológica e dados foram identificadas as crianças que
a de superfície (lexical). Pessoas com dis- ficaram abaixo do primeiro desvio padrão
lexia fonológica possuem graves dificulda- nas tarefas da BANPLE que avaliavam o
des em leitura de estímulos não familiares componente fonológico e lexical. Resulta-
e pseudopalavras, além de prejuízo na dos: Os resultados demonstraram que das
consciência fonológica. Os disléxicos de 303 crianças avaliadas, 13 apresentaram
superfície apresentam dificuldade no nível desempenho de déficits psicolingüísticos
do tratamento ortográfico da informação, semelhantes ao da dislexia. Das 13 crian-
e consequentemente apresentam incapa- ças, cinco tiveram baixo escore nas tarefas
cidades na leitura de palavras irregulares que avaliam especificamente o compo-
(Salles, 2004). A partir da avaliação de fun- nente fonológico e quatro crianças apre-
ções psicolingüísticas dos componentes sentaram baixo escore nas tarefas que
Fonológico, Lexical e Semântico, por meio avaliam o componente lexical. As referidas
de tarefas específicas o presente trabalho tarefas avaliam aspectos do processamen-
teve como objetivo, identificar crianças to psicolinguísticos comprometidos nos

1075
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dois tipos clássicos de dislexia, a dislexia ram do estudo e foram avaliadas em dife-
fonológica e a lexical, demonstrando que rentes tarefas de teoria da mente, em um
a BANPLE apresenta sensibilidade no em teste de vocabulário receptivo e em uma
identificar funções comprometidas na tarefa de compreensão de ironia traduzida
dislexia, diferenciando os dois subtipos e adaptada para o presente estudo. A tare-
clássicos. Além disso, embora a BANPLE fa de compreensão de ironia consistiu na
não tenha a função de avaliar para um apresentação de oito histórias que repre-
diagnóstico, ela permite identificar défi- sentavam situações familiares para a crian-
cits precoces do desenvolvimento e dessa ça e envolviam sempre conversas com
forma, contribui, para evitar que a criança pais, irmãos ou amigos. Em todas elas,
apresente futuras conseqüênciasdesfavo- um dos personagens fazia um comentá-
ráveis no seu contexto escolar e social. rio irônico dirigido a outro personagem. A
tarefa avaliou quatro componentes socio-
Palavras-chave: neuropsicologia cognitiva, cognitivos para a compreensão de ironia:
linguagem oral, dislexia. significado da sentença, crença, intenção e
motivação do falante. Além disso, a tarefa
avaliou um componente sociocomunica-
LT02 – 1220 - COMPREENSÃO DE IRONIA tivo por meio do julgamento feito pelos
E TEORIA DA MENTE: UM ESTUDO COM participantes sobre o quão gentil, maldoso
CRIANÇAS BRASILEIRAS ou engraçado havia sido o comentário do
Nadia Villa - UFSCar personagem. A ironia presente em cada
nadinhav@hotmail.com história podia variar quanto ao tipo (con-
Débora de Hollanda Souza - UFSCar trafactual x hiperbólica) e quanto à valên-
debhsouza@uol.com.br cia (crítica x elogio). Essas quatro variações
Financiamento: FAPESP foram, portanto, cruzadas de forma a criar
quatro diferentes categorias de ironia: elo-
A teoria da mente é a habilidade de prever gio hiperbólico (EH), elogio contrafactu-
e explicar o comportamento humano por al (EC), crítica contrafactual (CC) e crítica
meio da compreensão dos próprios esta- hiperbólica (CH). Todos os participantes,
dos mentais e dos outros (e.g., intenções, portanto, ouviram duas histórias repre-
crenças e emoções). Estudos recentes têm sentando cada uma dessas categorias. Os
demonstrado uma relação clara entre o resultados do presente estudo mostraram
desenvolvimento da teoria da mente e a que, como esperado, há uma correlação
linguagem. Em especial, há um interesse positiva entre o desempenho dos partici-
crescente em investigações sobre a relação pantes nas tarefas de teoria da mente e
entre teoria da mente e compreensão de de compreensão de ironia (r = 0.454, p <
ironia em crianças de idade escolar. O pre- 0.05), bem como um efeito de idade no
sente estudo foi uma replicação do estudo desempenho em todas as tarefas (F(2,19)
conduzido por Filippova e Astington e tem = 12.43, p < 0.05). Em relação ao escore
como objetivo principal investigar a rela- total na tarefa de compreensão de ironia,
ção entre compreensão de ironia e teoria uma diferença significativa foi encontrada
da mente em crianças brasileiras. Quaren- entre as crianças de 7 anos (M = 27.75) e
ta e três crianças de 7, 8 e 9 anos participa- 8 anos (M = 37.58) e entre as crianças de

1076
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

7 anos e 9 anos (M = 37.73). Uma ANOVA mais da metade dos participantes não jul-
de medidas repetidas foi realizada, com gou a ironia como engraçada (65% na cate-
tipo de ironia (contrafactual x hiperbólica) goria elogio contrafactual, 74% para crítica
e valência (crítica x elogio) como variáveis contrafactual e 69% na crítica hiperbólica).
intra sujeitos e idade como varíavel en- Mais uma vez, os dados das crianças brasi-
tre sujeitos. Os resultados não revelaram leiras foram muito semelhantes aos dados
um efeito significativo de valência (crítica obtidos com crianças canadenses. Consi-
x elogio), F(1, 40) = 0.38, p > 0.05), mas derando a escassez de estudos brasileiros
sim um efeito significativo de tipo de iro- sobre o tema, espera-se que o presente
nia (contrafactual x hiperbólica), F(1, 40) estudo possa contribuir para o campo de
= 13.73, p = 0.05, além de uma interação estudos sobre teoria da mente no Brasil e,
entre valência e tipo, F(1, 40) = 23.43, p < de maneira mais abrangente, que ele pos-
0.05). ANOVAs de medidas repetidas fo- sa avançar o conhecimento atual sobre a
ram também realizadas para cada um dos relação entre essa habilidade sociocogniti-
quatro componentes sociocognitivos da va e o desenvolvimento da linguagem.
compreensão de ironia. Os resultados in-
dicaram uma interação entre as variáveis Palavras-chave: Teoria da Mente; Ironia;
tipo de ironia e valência (elogio x crítica) Crianças Escolares.
em dois dos quatro componentes (crença Contato: Nadia Villa, UFSCar,
e intenção), ps < 0.05. Os dados obtidos nadinhav@hotmail.com
corroboram os resultados de Filippova e
Astington obtidos com crianças canaden-
ses. Assim como as crianças canadenses, LT02-1333 - ERA UMA VEZ: OS CONTOS DE
as crianças brasileiras apresentaram uma FADAS E A INFÂNCIA CONTEMPORÂNEA
facilidade maior para entender a ironia Iollanda Freire Costa Belchior - UFC
contrafactual, ou seja, quando o falante iollanda3fcbelchior@yahoo.com.br
diz o contrário daquilo que pretende dizer, Juliana Moita Leão - UFC
do que para entender a ironia hiperbólica, Juliana_moita@hotmail.com
quando o falante exagera aquilo que pre- Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC
tende dizer. Em relação ao julgamento do naradiogo@hotmail.com
conteúdo pragmático da ironia (quão gen- Maria Sandra Braz Marques - UFC
til, maldoso, engraçado foi o comentário), msbmarques@hotmail.com
as análises revelaram uma interação entre Raíza Ribeiro de Souza - UFC
tipo de sentença e valência nas três condi- raiza.psicologia@yahoo.com.br
ções analisadas (gentil, p < 0.001, maldoso,
p < 0.001, engraçado, p = 0.04). A categoria O presente trabalho tem como objetivo
elogio hiperbólico foi considerada como a discutir o conto de fadas como forma de
mais gentil pelos participantes e a crítica problematizar a infância contemporânea,
hiperbólica como a menos gentil. Na mes- apresentando as considerações de uma
ma direção, a crítica hiperbólica foi julga- pesquisa em andamento. As reflexões são
da como a ironia mais maldosa e o elogio suscitadas a partir de discussões ocorridas
hiperbólico como a ironia menos maldosa. nos encontros do projeto de extensão
Finalmente, em três das quatro categorias, “Brincadeiras: ações em Psicologia do De-

1077
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

senvolvimento e práticas lúdicas”, da Uni- atribuindo significados à realidade da


versidade Federal do Ceará (UFC). O proje- criança. Pois estas, nos primeiros anos de
to faz estudos na direção da compreensão vida, entram em contato com diversos sen-
da infância contemporânea e suas relações timentos que até então são desconhecidos
com a linguagem, examinando as perspec- e, com isso, precisam receber alguma aju-
tivas dialógicas, histórico-culturais e críti- da para que possam entender e dar senti-
cas, a partir do texto de Jobim e Sousa do a esses sentimentos. Por meio das leitu-
(2009). Partimos desse referencial teórico ras realizadas dos atuais estudos feitos so-
para pensar esta problemática que envol- bre a infância, percebemos a importância
ve a infância na contemporaneidade e os das pesquisas sobre a infância na contem-
contos de fadas. Nesse sentido, surgiu o poraneidade e como os contos de fadas
desejo coletivo de pesquisar sobre os sen- podem estar inseridos neste contexto, o
tidos e significados atribuídos pelas crian- que nos levou a escolha do tema e ao en-
ças aos contos de fadas e suas releituras. tendimento da relevância deste. As crian-
Nessa perspectiva, acreditamos que as ças conhecem o mundo na medida em que
crianças, enquanto sujeitos sociais pos- o cria. A criação desse mundo nos revela
suem plenas condições de expressar suas diversos sentidos diferentes para objetos
concepções através de sua cultura, suas que já possuíam significados atribuídos
falas e ações. Em uma breve pesquisa bi- pela cultura dominante (Jobim & Souza,
bliográfica observamos que outros estu- 2009). A criança está exposta à sociedade
dos realizados no contexto atual eviden- em que vive, e certamente aprenderá a en-
ciam a importância de pesquisas no que frentar as condições que lhe são próprias,
diz respeito à infância na contemporanei- desde que seus recursos interiores o per-
dade, a linguagem e a sua relação com os mitam. Contudo, para conseguir êxito nes-
contos de fadas. Estes estudos nos mos- te aspecto, deverá receber ajuda para que
tram que as crianças possuem necessida- possa dar algum sentido coerente ao seu
des em relação à cultura em que estão in- turbilhão de sentimentos. Necessita de
seridas e que o conto de fadas pode ser idéias sobre a forma de colocar ordem na
instrumento propício para a elaboração da sua casa interior, e com base nisso, ser ca-
fantasia na criança atendendo, portanto, a paz de criar ordem na sua vida. Nessa pers-
essas necessidades. Segundo Bettelheim pectiva, a criança encontra este tipo de
(2011), os contos de fadas são obras de significado nos contos de fadas. O conceito
arte integralmente compreensíveis para as de infância é bastante recente, tratando-se
crianças, como nenhuma outra forma de de uma criação da sociedade e que está
arte. E como ocorre com toda grande arte, sujeita a mudança sempre que surgem
o significado do conto de fadas será dife- transformações sociais mais amplas. A in-
rente para cada pessoa, e diferente para fância, nos séculos XII ao XVIII, era definida
cada pessoa em vários momentos de sua pelas pessoas da época como a idade em
vida. Com isso, a criança extrairá significa- que surgem os dentes. Nessa idade aquilo
dos diferentes do mesmo conto de fadas, que nasce é chamado de enfant (criança),
dependendo de seus interesses e necessi- que quer dizer não falante, pois nessa ida-
dades do momento. Nesse sentido, os con- de a pessoa não pode falar. (Ariès, 1981). A
tos de fadas atuarão como mediadores, infância seria caracterizada pela ausência

1078
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

da fala e de manifestações consideradas tabelecendo comparações e colocando a


“irracionais”. Dessa forma, a infância se infância como fase pouco desenvolvida e
contrapõe a vida adulta, pois os comporta- imatura. Dessa forma, as crianças são vis-
mentos considerados racionais seriam en- tas como sujeitos, que pensam e agem so-
contrados apenas nos indivíduos adultos, bre o mundo. Este projeto tem como pro-
identificando o homem como um ser pen- posta ouvir o que as crianças têm a dizer
sante e que possui a capacidade de agir sobre o que as cercam e o sentido atribuí-
sobre o mundo em que está inserido. A in- do por elas. Contudo, percebemos ainda
fância ainda hoje é compreendida através nos dias de hoje uma ênfase na valorização
de uma concepção desenvolvimentista, do discurso do indivíduo adulto, excluindo
formalista, sendo vista como uma fase de as crianças dos diversos setores e espaços
preparação para a vida adulta, como se o sociais. A concepção de criança é vivida e
ser humano estivesse ainda incompleto, apreendida a partir das construções feitas
tendo que tornar-se. As práticas educati- pelos adultos, nas quais, muitas vezes, a
vas e familiares, nestes termos, são pensa- criança não pode defender-se ou falar so-
das a fim de promover o desenvolvimento bre si mesma. Prevalece a idéia de que a
da criança, fazer com que ela cresça e che- criança não possui a capacidade de com-
gue a sua finalidade, que é ser adulto. Essa preender o mundo e expressar-se nele e
lógica desenvolvimentista usada como re- acerca dele. Entendemos que ouvir as
ferencia para se estudar e compreender a crianças é importante e elucidará muitas
infância tem sua razão de ser, principal- de nossas questões, como buscar compre-
mente nos dias atuais onde estão arraiga- ender como elas atribuem sentidos aos
dos valores como desenvolvimento, pro- contos e suas releituras e observar como
gresso e evolução. Na perspectiva desen- elas percebem certas mudanças. É através
volvimentista o homem tenderia a passar de suas falas que poderemos investigar
de estágio menos desenvolvido para um como elas pensam, o que sentem, como
mais desenvolvido, o homem se tornaria percebem as coisas. A maneira singular e a
cada vez mais perfeito. Para tanto se sub- especificidade de cada uma delas. Pois em-
meteria a certos valores e padrões cultu- bora as histórias sejam iguais, múltiplas
rais vigentes que o enquadrariam social- serão as interpretações e os significados
mente e caracterizariam sua evolução atribuídos por cada uma. Nesse sentido, a
como o autocentramento e o racionalis- partir das falas das crianças poderemos
mo. Desconstruir a lógica desenvolvimen- analisar as visões de mundo que elas pos-
tista é de grande importância para que se suem, e observarmos a complexidade das
compreenda as especificidades da infân- relações sociais que envolvem as crianças.
cia, encarando-a não somente como uma Dessa forma há de se perceber que as
“preparação” para a fase adulta, tomando crianças produzem significados e sentidos
esta como referência para, a partir de com- sobre tudo o que entram em contado, e
parações entre ambas, estabelecer as ca- que os produtos das análises das crianças
racterísticas da infância. Compreendemos devem ser ouvidos e considerados de for-
e procuramos estudar a infância fora da ma adequada, assim não havendo desqua-
lógica desenvolvimentista que sempre lificação dos discursos desses sujeitos. As
contrapõe a infância com a fase adulta, es- crianças adquirem seus saberes por meio

1079
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos produtos (filmes, desenhos, livros) em Palavras-chave: Criança; Contos de Fadas;


que entram em contato. Os contos de fa- Infância Contemporânea.
das fazem parte desses produtos, de onde
as crianças adquirem seus saberes e os
aplicam em seu cotidiano. Dessa forma, LT02 - 1440 - PARALISIA CEREBRAL E
podemos entender por que devemos ouvir LINGUAGEM: UM ESTUDO DE CASO
as crianças a cerca dos contos de fadas, Ana Ribeiro Santana - UFRB/CCS
pois só a partir dessa escuta é que enten- ana.ribeiro_22@hotmail.com
deremos o real significado atribuído pelas Gustavo Marcelino Siquara - UFRB/CCS,
crianças para as histórias contadas a elas. gustavosiqura@hotmail.com
Tendo em vista a concepção de infância, Thiago da Silva Gusmão Cardoso - UFRB/CCS
como se concebe a cultura lúdica e a parti- thiago_gusmao1@hotmail.com.
cipação dos contos de fadas na mesma, Mariângela Santos de Jesus - UFRB/CCS
deparamo-nos com os seguintes questio- mariangela.santos@msn.com
namentos: Qual a interpretação que as Patrícia Martins de Freitas - UFRB/CCS
crianças dão aos contos de fadas? Qual o pmfrei@yahoo.com.br
papel dos contos de fadas para a infância Financiamento: FAPESB, CNPq
contemporânea? Como as crianças perce-
bem as mudanças de comportamento das A Paralisia Cerebral é uma desordem do
personagens nas releituras dos contos de movimento e da postura, persistente,
fadas? Qual a julgamento dado pelas crian- porém não fixa que ocorre nos primeiros
ças ao comportamento das personagens anos de vida pela interferência no desen-
do conto tradicional? Com qual persona- volvimento do Sistema Nervoso Central
gem as crianças na contemporaneidade se (SNC) secundária a lesões cerebrais ou
identificam mais, com as presentes nos malformações causadas quando o cérebro
contos tradicionais ou em suas releituras? está imaturo. Quanto à sintomatologia, a
Qual o sentido atribuído pela criança a his- PC difere na gravidade dos sintomas de
tória para ela contada? Esse sentido atri- uma pessoa para outra, o que depende
buído corresponde ao significado social- da expansão e localização da lesão. En-
mente construído da mesma história? Ten- tretanto, caracteriza-se basicamente por
do estas perguntas como base, iniciamos distúrbios motores, atraso ou interrupção
um projeto de pesquisa em fase de realiza- do desenvolvimento sensório-motor, com
ção, que não tem como objetivo atribuir mecanismo de reação postural insuficien-
valores sobre as histórias dos contos de te; presença de reflexos em épocas em que
fadas, contrapondo a história tradicional e já deveriam estar inibidos; alteração do tô-
a releitura, mas aponta como finalidade nus muscular e inabilidade na realização
apenas ouvir as crianças a cerca do que dos movimentos. OuviLer foneticamen-
elas têm a dizer sobre os contos de fadas, teA prevalência da síndrome é de 2 a 2,5
para que, a partir da análise das compre- crianças para da 1.000 nascidos vivos. A PC
ensões das crianças a cerca dos contos de diplégica trata-se de um comprometimen-
fadas, possamos entender como as crian- to dos membros inferiores, comumente
ças atribuem sentido aos contos de fadas e evidenciando uma a hipertonia acentuada
sua visão de mundo. dos adutores, que configura em alguns do-

1080
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

entes o aspecto semiológico denominado foram utilizadas as tarefas para avaliação


síndrome de Little (postura com cruzamen- do processamento lexical que constituem
to dos membros inferiores e marcha “em a Bateria de Avaliação do Processamen-
tesoura”. A diplegia espástica é associada a to Lexical (BANPLE). Nível Fonológico da
prematuridade e as complicações perina- Compreensão: (DF) Tarefa de Discrimina-
tais. Embora as Paralisias Cerebrais sejam ção de Fonemas (DR) Tarefa de Detecção
caracterizadas por sua disfunção motora, de Rimas. Nível Lexical da Compreensão:
elas podem vir acompanhadas por outros (DLA) Tarefa de Decisão Lexical Auditiva.
distúrbios da função cerebral, como alte- Nível Semântico da Compreensão: (ASPF)
rações nos componentes da linguagem. A Tarefa de Associação Semântica Palavra-fi-
linguagem é definida a partir de aspectos gura; (ASFF) Tarefa de Associação Semân-
biológicos e sociais que exprimem seu ca- tica Figura-figura. Nível Semântico da Pro-
ráter essencial de favorecer adaptação do dução Oral: (FV) Tarefa de Fluência Verbal;
indivíduo ao ambiente. Estudos mostram (NF) Tarefa de Nomeação de Figuras. Nível
que crianças e adolescentes com Parali- Lexical da Produção Oral: (RPP) Tarefa de
sia Cerebral podem apresentar alteração Repetição de Palavras e Pseudopalavras.
em pelo menos um aspecto da linguagem, Nível Fonológico da Produção Oral: (JR)
como fonologia e sintaxe e preservação da Tarefa de Julgamento de Rimas e Anam-
semântica e da pragmática. A partir desse nese. A análise de dados foi realizada por
enfoque, o objetivo do trabalho caracteri- técnicas descritivas quanto ao desempe-
zar o perfil linguístico de uma criança de nho nas tarefas de avaliação da linguagem.
05 anos com Paralisia Cerebral conhecen- Quanto ao aspecto da Compreensão oral
do assim a linguagem nos seus aspectos foram observados os seguintes resultados:
semânticos, fonológicos e léxicos, quanto 1.Nível Fonológico-(DF) 14%; (DR) 26%. 2.
à produção e compreensão oral. O estudo Nível Lexical-(DLA) 23%. 3. Nível semânti-
foi realizada no IBR- Instituto Baiano de Re- co-(ASPF) 27%; (ASFF) 28%. Para a Produ-
abilitação- BA, sendo o participante uma ção oral: 1.Nível Semântico- (FV) 88%; (NF)
criança do sexo masculino (T.M.), 05 anos, 24%. 2. Nível fonológico-(JR) 15%. Nos
da cidade de Salvador/Ba, com diagnóstico resultados descritos acima o foi possível
de Paralisia Cerebral do tipo diplégica, que perceber que T.M, teve um bom desempe-
foi detectada mediante tomografia. Du- nho nas tarefas que avaliavam a compre-
rante a gestação a mãe não fez pré-natal, ensão e a produção oral quanto ao aspec-
aos seis meses começou a perder líquido to semântico e léxico, mas duas tarefas de
amniótico e tomou soro por aproximada- avaliação fonológica apresentaram uma
mente 11 dias até completar sete meses, porcentagem abaixo da média em duas ta-
quando, o parto foi induzido. Os marcos do refas correspondentes a fonologia. Embo-
desenvolvimento mostram que não ocor- ra se espere que as crianças com Paralisa
reram atrasos significativos na linguagem. Cerebral tenham alta incidência de altera-
Segundo a mãe a criança não apresenta di- ções cognitivas, alguns tipos de PC como
ficuldades auditivas ou visuais. Para iniciar a diplégica apresentam uma deficiência
a avaliação foi assinado o Termo de Con- cognitiva leve ou moderada. A linguagem
sentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pela tem seus aspectos preservados pela neu-
mãe. Para traçar, o perfil da linguagem roplasticidade que é responsável por uma

1081
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

reorganização estrutural e funcional, o que ma, menor unidade de significado da lín-


pode ser entendido como resultado das gua - é necessariamente considerada du-
interações com o ambiente para compen- rante o seu processamento. Desse modo,
sar e recuperar os déficits ocasionados por uma palavra complexa é reconhecida e,
lesões. Embora as alterações sejam peque- posteriormente, pronunciada, a partir das
nas, essas diferenças são relevantes para o seguintes etapas de reconhecimento visu-
desempenho comunicativo das crianças al (Taft & Foster, 1975): (1) o leitor realiza
com Paralisia cerebral que estão em ida- um procedimento de decomposição mor-
de escolar. Sendo, de muita importância fológica pré-lexical, que resulta no isola-
o contexto e as relações interpessoais na mento dos morfemas constituintes, antes
determinação dos significados, na promo- de se completar o acesso ao léxico: a pala-
ção de estimuladores que provocam moti- vra desatar, por exemplo, seria decompos-
vação e bem estar em atividades comuni- ta em des- (prefixo) atar (raiz); (2) em se-
cativas, bem como favorecer o desenvolvi- guida, a representação da raiz é localizada
mento dos processos neuronais, afetando e, por último (3) é realizado um teste para
a maturação e plasticidade do SNC. verificar a legalidade da combinação entre
o afixo e o morfema lexical. Um impasse
Palavras-chave: Avaliação; Linguagem; procedimental é desencadeado quando
Paralisia Cerebral. o leitor encontra uma palavra pseudo-
Contato: Ana Ribeiro Santana, ana. -afixada que tornará sua leitura mais len-
ribeiro_22@hotmail.com ta e sujeita a erros. Isto ocorrerá porque
este procedimento de decomposição é
relativamente automático e desencadea-
LT02-1485 - PADRÕES DE do para todas as palavras potencialmente
SEGMENTAÇÃO LINGUÍSTICA NA complexas, ou seja, nas quais se identifi-
LEITURA DE PALAVRAS EM VOZ ALTA cam segmentos que lembram a estrutura
Daniela Tankevicius Ferraz - IPUSP de afixos como, por exemplo, deserto, em
danitf12@gmail.com que o des- não é um prefixo. A aplicação
Ticiana Chiarastelli Salomão - IPUSP automática desse procedimento levará à
tici_salomao@hotmail.com leitura mais eficiente da palavra desatar,
Fraulein Vidigal de Paula - IPUSP que é de fato composta por prefixação,
frauleindepaula@gmail.com do que a palavra deserto, que é pseudo-
Financiamento: CNPq -afixada (Paula, 2007). Atualmente há mo-
delos mais flexíveis quanto à consideração
Este estudo teve o objetivo de verificar de que a decomposição morfológica não
que padrões de segmentação linguística seria o único procedimento ativado em to-
podem ser observados na leitura de pala- dos os casos (Caramazza, Laudanna & Ro-
vras por crianças entre 7 e 9 anos de idade. mani,1988; Schereuder & Baayen, 1995).
A esse respeito, Taft e Foster (1975, 1976) Estes passam a considerar que dois proce-
apresentam a hipótese da decomposição dimentos distintos de acesso ao léxico são
morfológica, de que a informação sobre ativados em paralelo: (1) um deles leva em
a estrutura morfológica das palavras com- conta a forma global da palavra complexa,
plexas - formadas por mais de um morfe- enquanto outro (2) lança mão da repre-

1082
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sentação e discriminação dos morfemas, e delineamentos experimentais: Carlisle


afixos e raiz. Porém, a via de acesso global (2000), Carlisle e Stone (2003) e Mann e
seria mais eficaz para acesso de palavras Singson (2003), em inglês, Burani, Marco-
familiares, enquanto que as raras, ou en- lini e Stella (2002), por exemplo, verifica-
contradas pela primeira vez, seriam lidas ram que tanto leitores do italiano, adultos
pela via da decomposição morfológica. e crianças, utilizam os processos de de-
A maior parte desses estudos focalizou o composição morfológica. Scliar-Cabral e
processamento de palavras complexas em Trindade (2004) evidenciam a sílaba como
leitores adultos e proficientes (Taft & Fos- unidade principal de segmentação na lei-
ter, 1975; Caramazza et al., 1988). Laxon, tura em português e Correa e Dockrell
Rickard & Coltheart (1992), foram os pri- (2007) identificaram padrões convencio-
meiros investigar o processamento mor- nais e não convencionais (supra e infra-
fológico em atividades de crianças entre 7 lexical) na escrita de texto por crianças.
e 9 anos, seguidos de estudos em francês Neste sentido, para verificar se padrões de
(Marec-Breton 2003; Marec-Breton et al., decomposição morfológica aparecem na
2005b) com leitores iniciantes, com idade leitura de palavras do português, são apre-
entre 6 e 8 anos e italiano (Burani, Marco- sentados e analisados os dados referentes
lini & Stella, 2002), com idade entre 8 e 10 a dez crianças matriculadas no 2° e 4° ano
anos. Em todos foram encontrados resul- do ensino fundamental, de uma escola de
tados semelhantes quanto à utilização da São Paulo. As mesmas fizeram a leitura
segmentação morfológica como critério em voz alta de uma lista de 72 itens, sen-
que permite a leitura de palavras, de modo do estes igualmente distribuídos e quatro
mais rápido e com menos erro. O estudo categorias: pseudopalavras não afixadas;
original de Laxon et al. (1992), assim como palavras pseudo-afixadas; pseudopalavras
o de Marec-Breton (2003) foram nortea- afixadas e palavras afixadas, conforme de-
dos pelas seguintes hipóteses: As crianças finido introdução, incluindo itens afixados
são sensíveis à estrutura morfológica das por prefixo e por sufixo. Sua aplicação é
palavras. Ou seja, a estrutura morfológica individual. A tarefa consistiu em solicitar
das palavras deve aparecer como unidade que as crianças lessem os quatro grupos
sonora na análise dos padrões de vocaliza- de itens lexicais, alternando a ordem de
ção das crianças, durante a leitura de pa- apresentação dos mesmos. Tratava-se de
lavras: O tempo de leitura de uma palavra itens construídos morfologicamente (pre-
composta deve ser menor do que de uma fixo + base; base + sufixo), subdivididos
palavra não composta morfologicamente; em: palavras afixadas (palavras constru-
tempo de leitura das pseudopalavras, de ídas pela associação de uma base e de
um modo geral, deve ser maior do que o um afixo disponível na língua avaliada) e
das palavras afixadas e não afixadas; Po- pseudopalavras afixadas (construídas com
rém, nas pseudopalavras, além do padrão um afixo e uma base disponível na língua
de leitura por sílabas, devem aparecer avaliada, mas o resultado desta construção
padrões correspondentes aos morfemas. não é atestado - não existe). E também de
Outros estudos também investigaram o itens não-construídos morfologicamente:
papel da morfologia na leitura no início da palavras pseudo-afixadas (palavras que
alfabetização, sob diferentes perspectivas têm por inicial ou final um grupo de letras

1083
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

homófonas de um afixo, mas não sendo de jogador profissional de futebol está em


afixadas) e, por último, pseudopalavras terceiro lugar, após s profissões de advoga-
não afixadas (construído pela combinação do e médico. Isso é um indicador de que,
de um grupo de letras homófonas de um entre os jovens da sociedade brasileira,
afixo em português à uma pseudo-base). ser jogador de futebol é visto como uma
Os dados são referentes à leitura de pa- profissão de sucesso (Damo, 2005). É co-
lavras isoladas áudio gravadas e tratadas mum estes jogadores receberem salários
conforme um software livre, que permite bem maiores do que muitos executivos.
a transcrição gráfica dos padrões sonoros A meta do sucesso financeiro já é grava-
de pronúncia (leitura dos itens do instru- da na consciência do jovem desde o início
mento) dos participantes. A leitura de cada da sua carreira futebolística, ainda quando
palavra por cada participante recebeu eti- criança. Na carreira do futebol, entende-
quetas relacionadas ao item e padrão de -se por categorias de base as categorias
leitura identificado. Estes resultados são amadoras que servem para a formação do
discutidos em relação aos padrões identifi- elenco dos clubes com atletas profissio-
cados - segmentação morfológica, de divi- nais. Os jovens atletas categorias de base
são silábica e decodificação letra a letra - e possuem uma precoce responsabilidade,
em termos de aspectos analisados a partir pois treinam de segunda a sexta, estu-
desta amostra para refinamento do instru- dam em escolas regulares e participam de
mento e ampliação do estudo, envolvendo competições nos períodos de abril a de-
um número maior de crianças e de outros zembro. Participam também de atividades
anos escolares. socioculturais programadas e acompanha-
mento psicológico, por exemplo, por meio
Palavras-chave: Leitura; Processos Cognitivos; de dinâmica de grupo. Vários moram no
Habilidades Linguísticas. próprio Centro de Treinamento, onde têm
folgas nos finais de semana e feriados. Os
atletas até 15 anos dispõem de uma ajuda
PO-LT07 de custo até os dezesseis anos, passando
a ter contrato e salário. Esses jovens atle-
tas também vivenciam sua adolescência
LT07-743 - AVALIAÇÃO nesse contexto, enfrentando essa fase
COMPORTAMENTAL DE JOGADORES DE de mudanças, rupturas, conflitos e crises.
FUTEBOL CATEGORIA SUB-15 DE UMA Como resposta a complexidade do proces-
EQUIPE PROFISSIONAL DE SÃO PAULO so maturacional e biopsicossocial viven-
Paulo Roberto Pereira de Souza - UPM ciado, alguns adolescentes apresentam
paulosouza70@terra.com.br um desenvolvimento saudável, enquanto
Renata dos Santos Francisco - UPM outros podem apresentar problemas de
rena.francis@hotmail.com comportamento (Silva & Hutz, 2002). O
Maria Cristina Triguero Veloz Teixeira - UPM objetivo do nosso trabalho é descrever o
mcris@mackenzie.br perfil comportamental dos atletas de fute-
bol de um clube profissional de cidade de
Dentre as três profissões mais valorizadas São Paulo. Para tanto, analisamos o perfil
nas escolas públicas e privadas, a carreira de dois atletas de futebol de base de um

1084
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

clube profissional da cidade de São Paulo, sultados para problemas externalizantes,


da categoria Sub-15. Os materiais utiliza- embora esteja dentro do limite da norma-
dos para a avaliação do perfil comporta- lidade. Considera-se com muitas qualida-
mental são o Inventário de Auto Avaliação des positivas e que a sua interação social
para Jovens entre 11 e 18 anos, Youth Self- é intensa. Já seu psicólogo incomoda-se
-Report – YSR (YSR/11-18), de Achenbach com seu jeito questionador e com com-
e Rescorla (2001) e o Teacher Rating Form portamentos inadequados, o que confere
(TRF 6/18), que investiga a percepção do com os resultados obtidos para os proble-
perfil comportamental conforme relato mas externalizantes no TRF/6-18. Os resul-
de professores/cuidadores de crianças e tados da YSR para o segundo atleta, MHB,
adolescentes entre 6 e 18 anos (Achen- também indicam que sua competência to-
back, 2001). O perfil comportamental dos tal e sua pontuação na escala de ‘ativida-
atletas foi traçado com auxílio de progra- de’ e ‘social’ estavam no intervalo normal
ma Assessment Data Manager/ADM do para os relatos de meninos com idade en-
Sistema de Avaliação Empiricamente Ba- tre 11 e 18 anos. O TRF do segundo atleta
seado de Achenbach (ASEBA). Os resulta- sugere que o seu desempenho acadêmico
dos apontam que o YSR do primeiro atleta foi dentro do normal para as classificações
(GPM) evidenciam que sua competência dos professores em meninos com idade
total bem como a sua pontuação na es- entre 12 e 18 anos. Apesar da pontuação
cala de ‘atividade’ e ‘social’ estavam no para funcionamento adaptativo total ter
intervalo normal para os relatos de meni- sido dentro do normal, o psicólogo relatou
nos com idade entre 11 e 18 anos. Apesar mais problemas de ansiedade ou depres-
do resultado apresentado em relação aos são que a média relatada por professores
problemas internalizantes e externalizan- de meninos com idade entre 12 a 18. O
tes estar dentro da normalidade, pode- jogador MHB se julga preocupado consigo
-se observar tendência para problemas mesmo, com os outros e com sua família,
de comportamentos de externalização. em tirar boas notas e apresenta resulta-
Com relação ao TRF, o psicólogo avaliou o dos no YSR e no TRF dentro da normali-
desempenho de GPM quanto ao esforço, dade, porém com tendência a problemas
aprendizagem e felicidade como dentro internalizantes. Seu psicólogo preocupa-
da média e considerou seu comporta- -se com seu comportamento introvertido
mento ligeiramente menos adequado em e passivo, apontando sinais de ansiedade
comparação aos estudantes típicos da e depressão. Apesar disto, o psicólogo re-
mesma idade. Nas escalas de problemas conhece que MHB é um garoto dedicado,
do TRF, todos os escores de GPM em todas responsável e disciplinado. Concluímos
as escalas classificadas, inclusive para pro- que os nossos resultados mostram que os
blemas externalizantes e internalizantes, dois adolescentes avaliados não apresen-
estavam na faixa normal para os meninos tam problemas de comportamento; en-
de idade entre 12 e 18. Sua pontuação nos tretanto, algumas respostas que indicam
externalizantes estava na faixa limítrofe tendências a problemas de internalização
clínica. De maneira geral, o jogador GPM em um e leves sinais de comportamentos
julga-se um pouco desatento e hiperativo de desafio e oposição no outro. É impres-
e apresentou pontuação maior nos re- cindível que os pais e todas as pessoas

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

responsáveis pela educação destes jovens (identidade) e aos jogos infantis. Todo
atletas estejam atentos a esses sinais para ser humano possui características físicas
que medidas preventivas sejam tomadas determinadas por genes provenientes da
para evitar problemas psicológicos em mãe e do pai. Os indivíduos portadores
sua fase adulta. Sugerimos outros estudos de síndrome de Down possuem um cro-
mais detalhados a respeito do desenvol- mossomo adicional no par 21; por conta
vimento dos jovens atletas das categorias disso, suas características físicas se asse-
de base, comparando os resultados com melham mais entre si do que com os seus
outras populações de jovens atletas. pais. Essa semelhança pode interferir no
desenvolvimento da representação de sua
Palavras-chave: futebol, avaliação individualidade (PUESCHEL, 1998). Ana-
comportamental, categorias de base lisamos os aspectos sociais e cognitivos
em duas crianças do sexo feminino, cujos
nomes fictícios são Maria e Clara, com
LT07-855 - FORMAÇÃO DO EGO EM onze anos de idade, residentes da cidade
CRIANÇAS PORTADORAS DE SÍNDROME de Itaitinga, na região metropolitana de
DE DOWN Fortaleza. São alunas de escola pública,
Isadora Leite Ribeiro Alves - UFC cursando o segundo ano do Ensino Funda-
isadora_alves@hotmail.com mental em salas de inclusão, sem, todavia,
Natália Araújo da Silva - UFC a assistência de uma equipe multidiscipli-
nads_araujo@hotmail.com nar de suporte para o desenvolvimento de
Rachel Xavier de Faria Vecchio - UFC suas potencialidades. Tais crianças podem
ra_vecchio@hotmail.com ser consideradas um grupo de estudo di-
Rebeca Barros de Lima - UFC ferenciado por se inserirem em grupos
rebecabdl@hotmail.com sociais restritos às suas famílias e esco-
la. Um fator determinante na escolha da
O presente resumo é resultado de uma amostra parece ser a sua condição bioló-
pesquisa desenvolvida como prática na gica comum. Porém, podemos considerar
disciplina de Psicologia do Desenvolvimen- que o incentivo de suas potencialidades
to I, ministrada no curso de Psicologia da ao desenvolvimento implicará em respos-
Universidade Federal do Ceará pela pro- tas particulares. Tal condição as aproxima
fessora Susana Kramer, com a colaboração do estudo de Erik Erikson, em que o de-
do monitor Eduardo Alverne. A pesquisa senvolvimento humano se dá de forma
(em andamento) tem como objetivo iden- contínua, dinâmica e criativa, organizado
tificar, em situação de brincadeira coleti- a partir de três dimensões centrais: bioló-
va, o desenvolvimento do ego em crianças gica, individual e social (ERIKSON, 1976).
portadoras de Síndrome de Down, a partir A identidade é construída nas experiên-
da ideia de conflitos nucleares propostos cias vividas nessas três dimensões, sendo
por Erik Erikson. Abordamos fatores so- o ego uma síntese desse processo, o qual
ciais (família e escola) e fatores biológicos pode ser observado através de jogos in-
(síndrome de Down) relacionando-os ao fantis (brincadeira coletiva), adentrando-
modelo teórico-prático de Erikson, que -se ao universo lúdico dessas crianças. Nos
se refere à formação da personalidade estudos sobre a Teoria Psicossocial do De-

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

senvolvimento de Erik Erikson, vimos que ximidade a ele, o que não foi percebido
há uma transferência por parte da crian- em relação à figura materna. Também se
ça em suas brincadeiras, pois, através do destaca na brincadeira coletiva sua busca
lúdico, representará suas relações sociais. de comando sobre a situação proposta, o
Este é o modo como consegue expressar que não se deu na vivência interpessoal,
a realidade e se libertar das censuras con- na qual Clara revelou ter medo de Maria.
solidadas na sociedade, o que implica em A pesquisa permitiu a observação da for-
uma representação do ego. Realizamos mação do ego em crianças portadoras de
jogos com as duas meninas, no espaço da síndrome de Down, destacando-se alguns
brinquedoteca da escola. Foram disponibi- conflitos durante a brincadeira coletiva.
lizados jogos de montagem, bonecas, casi- O primeiro desses foi o de “autonomia x
nha de boneca e fantoches, permitindo a vergonha e dúvida”, superado por Clara ao
livre escolha da dupla participante, diante demonstrar independência e extroversão,
da presença das pesquisadoras. De um enquanto Maria assumiu uma posição de
modo geral, observamos que Maria orga- dependência ficando sempre à espera de
nizava seu espaço, enquanto brincava. No autorização para brincar, evidenciada em
início, não queria brincar; porém, ao inte- sua postura física (cabeça baixa com ges-
grarmos o lanche dela à brincadeira, suge- tos que demonstravam vergonha). Outro
rindo que também oferecesse comida às conflito interpretado é o da “iniciativa x
bonecas, ficou menos retraída. Durante culpa”, em que observamos a iniciativa de
toda a brincadeira, não ouvimos a voz de Clara durante a brincadeira, aproximan-
Maria, que apenas gesticulava e apontava do os bonecos que representavam o pai
para o que queria fazer. Na brincadeira e ela própria, afastando a que represen-
com os fantoches, Maria colocou-os para tava a sua mãe, remetendo ao Complexo
beijarem na boca constantemente, rindo de Édipo. Maria demonstra retraimento,
de sua própria ação. Quando propusemos na brincadeira, o que pode ser resultado
que desenhasse sua família, rabiscou um de relações em que lhe faltaram tempo
bonequinho triste, recusando-se a conti- e espaço que permitissem o desenvolvi-
nuar o desenho. Depois, quando solicita- mento de suas atividades com autonomia.
da a representar o seu pai, continuou o Ela não tomou a iniciativa em nenhum
desenho apresentando um bonequinho dos jogos propostos, imitando, inclusive,
feliz. Não quis desenhar a mãe, reagindo certas atividades executadas por uma das
com batidas na mesa e gestos de negação pesquisadoras. Foi observada também, no
com as mãos, sugerindo um contexto de conflito da “identidade x confusão de pa-
reprimendas. Clara, por sua vez, apresen- péis”, uma identificação por parte de Clara
tou-se de forma alegre e comunicativa. com o pai, devido à sua incapacidade de
Durante a brincadeira de casinha, despiu fixar uma identidade própria. Já em Ma-
as bonecas, diversas vezes, sugerindo in- ria, embora isso não tenha emergido cla-
terações sexuais entre elas. Também apre- ramente no contexto da brincadeira, o seu
sentou a ação de aproximar o boneco-pai papel na família ou na escola é problema-
da boneca-filha e afastar a boneca-mãe. tizado, ao se observar seu sentimento de
Verbalmente, também mencionou o pai inadequação e inferioridade na dinâmica
de forma carinhosa, demonstrando pro- proposta, o que pode constituir, segundo

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Erikson (1976), empecilho à sua identifi- pois inclusão não se reduz ao aluno se en-
cação nos contextos sociais em geral. O quadrar no espaço escolar, mas a escola
contexto social das duas meninas parece estar preparada para acolher as diferen-
corroborar tal situação, diante de relato ças. Assim, impulsionado por tais inquie-
das professoras das meninas sobre a evi- tações, o estudo teve como objetivo geral
tação dos demais alunos na interação com compreender como a escola inclusiva atua
as crianças das salas de inclusão. Além frente à necessidade de atender e ofere-
disso, notamos que, em Clara, a resolu- cer uma prática educativa que respeite as
ção dos conflitos é mais evidente do que diferenças, no intuito de favorecer o de-
em Maria. Neste sentido, segundo Erikson senvolvimento e aprendizagem dos seus
(apud Steiner, 2008), “o desenvolvimento alunos com necessidades educacionais
humano impõe conflitos nucleares que especiais – ANEE’s. Partindo dessa meta,
desencadeiam crises... [com] duas saídas os objetivos específicos propuseram: a) in-
possíveis: se o conflito é resolvido de ma- vestigar práticas educativas que procuram
neira satisfatória, a qualidade positiva é padronizar os processos de aprendizagem
construída no ego e o desenvolvimento é no espaço escolar e que comprometem o
sadio, se o conflito é resolvido de manei- desenvolvimento e aprendizagem do alu-
ra insatisfatória, a qualidade negativa se no; b) identificar tratamentos especiais es-
incorpora ao ego e o desenvolvimento é tigmatizados e preconceituosos para com
prejudicado” (p. 55). os alunos com necessidades educativas
especiais; c) registrar práticas e concep-
Palavras-chave: síndrome de Down, ções realizadas no espaço educativo que
brincadeira coletiva, ego não tenham preconceitos com as diferen-
Contato: Rebeca Barros de Lima, UFC, ças e otimizem uma aprendizagem signi-
rebecabdl@hotmail.com ficativa; e d) identificar as principais dife-
renças entre práticas educativas inclusivas
e não-inclusivas, verificando a relevância
LT07-1309 - EDUCAÇÃO INCLUSIVA OU dessas diferenças para a efetivação e qua-
EXCLUSIVA: REFLEXÕES SOBRE UMA lidade da política da inclusão escolar. Pes-
PRÁTICA EDUCATIVA QUE RESPEITE ÀS quisadores na área de desenvolvimento
DIFERENÇAS humano e educação vêm constantemente
Franciene Soares Barbosa de Andrade - UnB salientando a necessidade de uma educa-
Geane de Jesus Silva - UnB/UAB ção de qualidade para todos, no sentido
de respeitar as diferenças, sejam elas, cog-
No contexto educacional, verificou-se nitivas, culturais, afetivas e outras. Portan-
certa dificuldade da equipe escolar em to, como pressupostos teóricos, a pesqui-
compreender e aceitar as diferenças, pois, sa baseia-se em autores como: Vygotsky,
na maioria das vezes, são vistas como um Taylor, Mendes, Kelman, além da legisla-
problema que precisa ser melhorado e ção brasileira referente à educação e edu-
ajustado diante do processo de ensino- cação inclusiva. Para tanto, a construção
-aprendizagem homogêneo. Essa proble- empírica teve como suporte metodológico
mática revela que, no âmbito escolar, a de pesquisa a abordagem qualitativa, por
educação inclusiva requer um novo olhar, meio da análise documental, entrevista

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

semiestruturada e observação não-es- LT07-1400 - PESQUISANDO COM AS


truturada com o corpo docente, gestores CRIANÇAS: COMO ELAS REPRESENTAM
e organização pedagógica de uma Escola A INFÂNCIA A PARTIR DO USO DE
Classe em Taguatinga Norte-DF. Como re- DESENHOS DE UM DIA LIVRE
sultado da pesquisa, observou-se que a Márcia Elisabette Wilke Franco - CESUCA
padronização da aprendizagem deve ser marcia.franco@cesuca.edu.br
desconstruída em favor da igualdade de
oportunidades e, independente do como Este trabalho é resultado de uma pes-
se aprende, ocorra a aprendizagem e o de- quisa de doutorado realizada no Progra-
senvolvimento do aluno. Em relação aos ma de Pós-graduação em Educação da
tratamentos especiais estigmatizados e Universidade do Vale do Rio dos Sinos e
preconceituosos para com ANEE’s, foi evi- tem como objetivo compreender como,
denciada pela pesquisa a importância de na visão das crianças de 6 a 12 anos de
distinguir o “tratamento” do “respeito”. Gravataí-RS, se articulam e aparecem as
Sobre práticas e concepções pedagógicas possibilidades de infância. Observações
que demonstram preconceitos com as di- realizadas previamente acerca das ações
ferenças, percebeu-se maior otimização das crianças em diversos espaços sociais
da aprendizagem quando as limitações mobilizaram-me a estudar as mudanças
biológicas não são vistas como determi- na concepção da infância ao longo dos
nantes para o não desenvolvimento biop- tempos Ao ver crianças compartilhando
sicosocial dos ANEEs. Quanto às principais os mesmos espaços sociais dos adultos,
diferenças entre práticas educativas inclu- ao dar-me conta que as questões histó-
sivas e não-inclusivas, observou-se que, rico-sociais acabam por conformar uma
se a escola realizar um trabalho diversifi- nova infância, assim como as propostas
cado em grupo e incentivar a socialização pedagógicas (ou a falta destas propos-
dos ANEEs, contribuirá para a diminuição tas) favorecem a homogeneização dos
dos tratamentos especiais estigmatizados espaços escolares, organizei o presente
e preconceituosos que comprometem o trabalho de pesquisa.Uma pluralidade
desenvolvimento e aprendizagem desses de olhares para a dimensão social da in-
alunos. No que concerne à qualidade da fância se faz necessário. Pinto (1997), em
política de inclusão, os resultados mos- seu artigo sobre a infância como cons-
traram que a comunidade escolar precisa trução social, nos leva a refletir sobre a
participar mais das mudanças das políticas aparente naturalidade que caracteriza a
educacionais em prol de uma aprendiza- infância e nos mostra como essa etapa da
gem mais contextualizada e significativa vida possui uma importante dimensão de
para todos os alunos; contudo, ficou evi- construção social. Ao analisarmos as con-
denciado também que, isso só será possí- cepções sobre o mundo infantil, em es-
vel caso haja um Projeto Político Pedagó- pecial a criança, encontramos comumen-
gico condizente com a realidade de uma te diferentes discursos. Para esse autor,
Escola inclusiva. a perspectiva que melhor olha a criança
é aquela que foca as dimensões sociais
Palavras-chave: inclusão, diversidade, da infância no conjunto de processos so-
aprendizagem, educação, prática ciais. “A infância emerge como realidade

1089
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

social, realidade essa que também pro- preciso problematizar os dados etnográ-
duz, em certa medida, a própria socieda- ficos, de modo a permitir transitar entre
de” (Pinto, 1997, p.34). O conceito de in- universos culturais diversos – o nosso e
fância na perspectiva histórica nos indica o do nosso sujeitos” (1996, p.67). O mé-
que não podemos compreender a criança todo utilizado foi o quanti-qualitativo.
fora de suas relações com a sociedade na Neste momento, considero fundamental
qual está vivendo e desvinculada de suas reafirmar minha convicção de que infân-
interações com os sujeitos e com a cultu- cia não pode ser entendida como uma
ra do grupo social no qual está inserida. categoria natural, mas histórica e cultu-
As crianças, através de suas narrativas, ral, ainda que não determinada de modo
não expressam uma representação única absoluto pelo social. E que, por isso, há
de infância, mas seus distintos olhares. É diversos modos de “ser” criança e “viver”
importante nos darmos conta de que a a infância, não se podendo falar dessas
cumplicidade entre sociedade, educação categorias no singular ou se entender
e infância faz surgir discursos e saberes que exista um lugar específico, distintivo
que produziram e produzem o “ser infan- de infância e de criança. Este trabalho
til” de hoje, do presente. Buscando re- procurou compreender e destacar valo-
flexões com as crianças e entrecruzando res e significados das vozes infantis, obje-
diferentes saberes disciplinares, psicoló- tivando conhecer a criança e suas carac-
gicos, pedagógicos, sociológicos, filosófi- terísticas atuais. Procurou ver a criança
cos, pediátricos, e com o uso de um ins- enquanto sujeito histórico, que produz
trumento conhecido como “teste de epi- cultura. “O olhar das crianças permite re-
sódios” utilizado por Elsa Schmid-Kitsikis velar fenômenos sociais que o olhar dos
em suas pesquisas em Genebra, procurei adultos deixa na penumbra ou obscure-
conhecer e ampliar a compreensão de ce totalmente” (Sarmento, 1997, p.25).
suas relações com o conhecimento, a cul- As pesquisas com as crianças vêm sendo
tura e os modos de subjetivação da crian- realizadas de modo especial pelos pes-
ça e com quem ela estabelece relações quisadores representantes da sociologia
na contemporaneidade. Ao se produzir da infância. Estes consideram a criança
conhecimento, cada nó, cada ponto al- como ator social e buscam ultrapassar a
cançado, acaba por sugerir um caminho e dicotomia das outras abordagens. Acre-
que vai se transformando. De uma forma ditam que as crianças como seres sociais
séria e sem abrir mão do rigor e da busca representam certos papeis sociais que
de uma explicação como uma forma de estão internalizados na sua subjetivida-
conhecer essa infância que se torna um de. As crianças dispõem de um conheci-
dos fios desta tapeçaria, tomo a criança mento, fazem várias relações, são capa-
com um ator social, a partir do olhar da zes de avaliar e vivenciar vários papéis e
sociologia da infância. Muito são os ris- inventam suas estratégias. Transgridem
cos de ver, ouvir, descrever, registrar e in- as regras atribuindo outros significados
terpretar as falas das crianças sem o de- para suas atividades. Pesquisando com as
vido rigor teórico-metodológico, salienta crianças, precisamos reconhecê-las como
Gusmão, ressaltando ainda que devemos sujeitos de cidadania. Seus conhecimen-
ir além das aparências dos fenômenos. “É tos são válidos, elas elaboram juízos acer-

1090
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ca do que as rodeia. Nesta perspectiva, LT07-1434 - ARTICULANDO


as crianças não são idiotas culturais. Para RELAÇÕES ENTRE AS CRIANÇAS E OS
Ferreira (2004), toda investigação supõe PROFISSIONAIS DA ESCOLA MUNICIPAL
uma relação com as crianças na qual o DE EDUCAÇÃO INFANTIL CHAPEUZINHO
pesquisador deve estar com e não apenas VERMELHO DE CACHOEIRINHA/RS
estar lá. Tentar compreender a compre- Camila Francisco Zanette - CESUCA,
ensão do outro. Criar um espaço o mais camilafzanette@hotmail.com
espontâneo possível para que a criança Felipe Pereira de Assis - CESUCA
se revele. Ter consciência da necessidade Simone Wurzel - CESUCA
de uma refletividade metodológica como Márcia Elisabette Wilke Franco - CESUCA
pesquisadora, buscando escapar da po-
sição adultocêntrica, foi uma vigilância O presente trabalho de iniciação científi-
metodológica que fiz permanentemen- ca foi desenvolvido pelos acadêmicos do
te. Essas são algumas das questões que IV semestre do curso de psicologia do CE-
busquei compreender a partir da inser- SUCA – Complexo de Ensino Superior de
ção ao campo. Como a criança percebe Cachoeirinha, no intuito de, através da
o ser criança? Como ela representa os prática observacional, empregar a teoria
cotidianos da criança através do teste de estudada em curso. Esta pesquisa foi re-
episódios adaptado? Quais as possibili- alizada em Escola Municipal de Educação
dades de infâncias que encontramos nas Infantil Chapeuzinho Vermelho situada
cenas representadas em um dia livre? Os na cidade de Cachoeirinha/RS região me-
dados coletados indicam claramente que tropolitana de Porto Alegre. O quadro de
a dinâmica das interações na casa, na rua servidores da escola é composto por um
e na escola é própria. Para elas, a escola, total de 28 profissionais, sendo: 01 dire-
por exemplo, é mais um lugar para crian- tora, 01 vice-diretora, 01 articuladora pe-
ças viverem suas infâncias. As crianças dagógica, 01 secretária, 14 atendentes de
não são passivas nas situações de entre- educação infantil, 05 atendente de creche,
tenimento; elas são ativas protagonistas. 02 cozinheiras, 01 auxiliar de cozinheira e
Meninos e meninas têm presente que a 03 serventes. Os objetivos deste traba-
não-ludicidade faz parte da vida e, por- lho são: possibilitar que os profissionais
tanto, das suas infâncias, marcando as que atuam na instituição de ensino in-
relações sociais e afetivas com adultos, fantil descubram sua importância nesse
crianças ou outros. O lúdico e as formas espaço; que possam ter consciência dos
de viver esse lúdico constituem uma das papéis que cada um desempenha dentro
possibilidades das crianças viverem suas da escola de acordo com a sua especifi-
infâncias. cidade; resgatar a sua autoestima e sua
valorização, fazendo com que eles possam
Palavras-chave: criança, infância, sociologia perceber o quanto são fundamentais para
da infância que a instituição se desenvolva e para o
Contato: Márcia Elisabete Wilke Franco, melhor desenvolvimento das crianças.
CESUCA, marcia.franco@cesuca.edu.br Ao consideramos o meio como um fator
importante no desenvolvimento como
um todo, torna-se imprescindível com-

1091
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

preender que o meio não é estático e é e as habilidades sociais para um bom con-
múltiplo e que o desenvolvimento infantil vívio, potencializando um ambiente sadio
está diretamente ligado ao meio em que para as crianças e para os adultos. Para a
a criança está inserida. Logo, é necessá- finalização do projeto, foi feita uma dinâ-
rio compreender o processo de aprender mica de grupo que consistia em reunir um
como um processo contínuo e intermiten- pequeno grupo no meio do grande grupo.
te, em que o individuo é capaz de recons- Os integrantes do pequeno grupo que es-
truir novas realidades. Existem diversos tavam no centro deveriam realizar ativida-
sistemas que têm capacidade de intervir des propostas pelos demais (como fechar
no ambiente infantil e no aprendizado das a porta da sala, segurar um participante
crianças. Ao iniciarmos as observações, foi no colo) com um único cordão amarrado
possível compreender que todos os pro- na cintura de cada um dos participantes,
fissionais que ali trabalham interferem no unindo-os em um círculo. A realização da
ambiente das crianças. O objetivo inicial dinâmica possibilitou a compreensão de
da proposta de intervenção foi resgatar as que, para funcionar de forma eficiente,
capacidades de cada um dos profissionais o grupo deve ter a participação de todos
que atuam na escola, visando fortalecer e que cada um tem um papel definido e
as suas relações sociais e as suas habilida- insubstituível. A proposta de intervenção
des sociais para que, desta forma, todos possui fundamentação teórica na psicolo-
possam se sentir melhor na instituição em gia de grupos e nas práticas em grupo de
que convivem e em que passam uma boa Pichon Rivière. Foi possível analisar e re-
parte de sua vida diária. Foram realizadas fletir junto com todos os profissionais da
entrevistas individuais com cada um dos instituição observada sobre como é amplo
profissionais que atuam na escola, anali- o número de microssistemas que interfe-
sadas de forma qualitativa. Aplicou-se um rem no processo de conhecimento e de
questionário com perguntas semiabertas relacionamento entre todos os participan-
e as entrevistas foram realizadas dentro tes da educação infantil. Os participantes
da instituição de ensino infantil, com re- se deram conta que, em uma sala de aula,
gistro de imagem e som. A entrevista foi o professor, as crianças, os faxineiros, os
composta por três perguntas-chave: a) há pais, os serventes, a direção e até mesmo
quanto tempo trabalha na instituição; b) a estrutura física podem ser estímulos ca-
qual é a função que exerce atualmente no pazes de interferir no ambiente social e
local (falar um pouco sobre a sua rotina); psicológico de todos os integrantes. Como
e c) quais as principais lembranças que se articulam, se estabelecem e se constro-
possuem da escola durante o período que em as relações entre as crianças e os pro-
trabalham ali. Em um segundo momen- fissionais da educação infantil dessa Esco-
to da pesquisa, foi feita uma montagem la Municipal de Educação Infantil é alvo a
áudio-visual com os dados já coletados. ser trabalhado em conjunto com o projeto
Esse material foi trabalhado em uma reu- de pesquisa chamado “Possibilidades de
nião feita trimestralmente no próprio lo- Viver as Infâncias na Contemporaneida-
cal, visando trabalhar as particularidades de”, orientado pela professora Márcia
de cada profissão, a interdependência de Elisabette Wilke Franco. O problema de
cada um dos indivíduos dentro da escola pesquisa desse projeto é compreender

1092
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como aparecem, na perspectiva das crian- de forma mais produtiva aos desafios em
ças, as possibilidades de infância. Faremos sua vida pessoal e profissional. Não obs-
um trabalho onde as crianças irão mostrar tante o reconhecimento do valor de se
como percebem os profissionais que con- cultivar a criatividade discente e a criati-
vivem com elas neste espaço educacional. vidade almejada por educadores e gesto-
res, nem sempre essa meta se reflete nas
práticas pedagógicas. A escassez de infor-
mação sobre criatividade e as lacunas na
formação do professor explicam esse qua-
DIA 15/11 - Terça-feira dro. Reconhece-se a necessidade de mu-
danças substantivas na educação de modo
10h30-12h a garantir uma cultura de ensino e apren-
dizagem voltada para a criatividade. Cabe
ao docente assumir o papel de catalisador
do potencial de seus estudantes e a estes
LT04 - Mesa Redonda incorporar novos hábitos de produção, ex-
Convidada pressão e implementação de novas ideias.

DESENVOLVIMENTO DA CRIATIVIDADE CRIATIVIDADE NA DOCÊNCIA SUPERIOR:


NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PESQUISAS RECENTES
Eunice Soriano de Alencar - UCB Eunice Soriano de Alencar - UCB
Denise de Souza Fleith - UnB
Sheyla Blumen - UC/Peru RESUMO
Esta apresentação inicia-se com a apre-
RESUMO sentação das razões para a importância de
É o objetivo do simpósio discutir questões se promover um ambiente propício à cria-
referentes à criatividade na educação su- tividade na educação superior. Ressalta
perior. Reconhece-se que cabe à educação que, apesar de a criatividade ser conside-
superior preparar os estudantes para um rada um elemento chave para a realização
mundo que exige mais do que amplitude e do indivíduo e prosperidade de organiza-
profundidade de conhecimento. Há carac- ções e países, a atenção a ela na educação
terísticas desejáveis em profissionais de superior é ainda limitada, Considera que a
distintas áreas, as quais caberiam a educa- ênfase maior tem sido na transmissão do
ção superior, fomentar. Entre elas, as com- conhecimento e no pensamento crítico e
petências comportamentais, perceptuais, racional, desconhecendo a grande maioria
afetivas e simbólicas. De forma similar, dos professores universitários o que vem
em discussões sobre o profissional ideal, sendo pesquisado sobre criatividade na
a criatividade ocupa um lugar central. Esta educação superior e ambientes de apren-
se constitui em recurso fundamental para dizagem, ensino e avaliação que levem os
o indivíduo, possibilitando-lhe tirar maior estudantes a tomarem consciência de seu
proveito das oportunidades e responder potencial para criar e expressarem a sua

1093
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

criatividade. Será apresentada ainda uma CREATIVIDAD Y DESARROLLO DE


síntese de pesquisas recentes a respeito TALENTOS HACIA LA TRANSFORMACIÓN
de criatividade na educação superior, as SOCIAL
quais focalizaram tópicos diversos, como Sheyla Blumen - PUCP
avaliação do nível de criatividade de pro-
fessores universitários, características do Se reflexiona acerca de la importancia de
professor facilitador e inibidor da criati- la creatividad como expresión de salud
vidade, barreiras apontadas por profes- en el desarrollo humano y su desarrollo
sores do magistério superior ao fomento en entornos de diversidad etnolingüística
da criatividade nas disciplinas sob sua res- para la transformación social, a partir de
ponsabilidade e formas de avaliação que datos empíricos. Asimismo, se analiza la
estimulam o pensamento criativo. construcción social del concepto talento
en Perú, Chile y Colombia considerando la
influencia de la psicología positiva en su
CRIATIVIDADE NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: concepción actual, así como la necesidad
TENDÊNCIAS E DESAFIOS de fomentar su desarrollo desde el esfuer-
Denise de Souza Fleith - UnB zo individual y grupal hacia la mejora del
bien común. Posteriormente, se discute
la relación de los conceptos creatividad y
RESUMO
talento, considerando estudios empíricos
Muito tem sido debatido acerca da neces- y el análisis de un caso, con el fin de com-
sidade de uma reorganização das práticas prender las contribuciones particulares
docentes na educação superior a fim de de aquellas personas que utilizaron su ta-
se proporcionar um ensino criativo, desa- lento para hacer de éste, un mundo mejor
fiador, motivador, integrado e interdisci- para vivir, enfatizando el importante rol
plinar. No mundo do século XXI, marcado que juegan las oportunidades y servicios
pelo crescente avanço tecnológico, pelas complementarios a los que están expues-
rápidas mudanças sociais e culturais, pelas tos las y los jóvenes potencialmente ta-
turbulências econômicas, pelo fenômeno lentosos. Asimismo, se proponen diversas
da globalização, pela complexidade das estrategias de aceleración pedagógica en
relações interpessoais e pelo declínio dos el entorno escolar y universitario, para
valores, é imperativo o investimento no apoyar el desarrollo del talento en niñas,
potencial criativo humano. Embora o va- niños y jóvenes, tomando consciencia de
lor de se cultivar a criatividade em sala de nuestra responsabilidad en la formación
aula seja reconhecida e almejada por edu- intelectual, ética y moral de las y los lí-
cadores e gestores, nem sempre as prá- deres del futuro. Finalmente, se subraya
ticas docentes implementadas refletem la necesidad de mejorar la comprensi-
esta meta educacional. Portanto, o objeti- ón de las y los profesionales de la salud
vo dessa apresentação é discutir obstácu- y educadores acerca de las y los jóvenes
los ao desenvolvimento da criatividade na talentosos, tomando en consideración la
educação superior e propor estratégias de diversidad etnolingüística característica
estimulação do potencial criador de estu- del contexto en que crecen y se desar-
dantes e professores universitários. rollan, asumiendo que la gran mayoría

1094
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se encuentra en espacios de pobreza, ca- gênero, etc). O processo de desenvolvi-


rentes de oportunidades para desarrollar mento se dá nas múltiplas e simultâneas
sus capacidades. Se recomienda el plan- interações entre as condições e recursos
teamiento de lineamientos formales de pessoais e as condições e recursos con-
fomento al talento en sus diferentes ma- textuais. É através das interações que os
nifestaciones, con el compromiso de los agentes de socialização - pais, educadores
diferentes agentes de la sociedad civil y - transmitem crenças e práticas veiculadas
del estado, así como de las universidades no meio social ao qual pertencem, que são
y empresas, con el fin de asegurarles un essenciais para a constituição do sujeito.
espacio comunitario, social y laboral, evi- Essas práticas educativas são, portanto,
tando la fuga de talentos y apoyando su culturalmente organizadas e interpelam
desarrollo para la transformación social. o campo de estudos sobre o desenvolvi-
mento humano acerca do modo como as
Palabras-clave: creatividad, talento, bienestar relações intergeracionais oferecem anco-
social, diversidad etnolingüística, aceleración ragem para as transições juvenis. Faz-se
necessário refletir sobre a crise de senti-
dos que questiona instituições tais como a
MR LT05 - Mesa Redonda família e a escola, pela fragilidade do seu
contrato social, que não mais responde às
Convidada novas demandas juvenis por espaços de
participação político-culturais. Pretende-
-se aqui abrir o debate sobre as formas de
MR LT05-1345 - TRANSIÇÕES JUVENIS E sociabilidade e participação juvenil, tra-
LAÇOS GERACIONAIS: ENTRE TRADIÇÃO zendo como elementos para discussões
E INOVAÇÃO temáticas como sexualidade, vulnerabi-
Miriã Alves Ramos de Alcântara - UCSa lidades, violência, protagonismo e auto-
miria.alcantara@gmail.com nomia como espectro que alarga o foco
Mirela Figueiredo Iriart - UEFS sobre as transições juvenis, nas tensões
mifis36@gmail.com entre passado, presente e futuro, num
contexto de múltiplas referências cultu-
A socialização do jovem na contempora- rais e identitárias e atravessado por um
neidade acontece através da família, da ethos individualista. São nas transações
escola e do trabalho centrada, sobretudo, geracionais, em meio às tensões entre
em padrões marcadamente adultocêntri- tradição e inovação, que tais referências
cos nos quais há relativa autonomia para são negociadas, de acordo com uma ética
sua inserção sócio-profissional e político- com menor investimento na dialética e na
-cultural. Entre a influência sócio-cultural ontologia que perpassam os vetores da
da família, da comunidade, da escola e a democracia e da cidadania. Favorecer o
trajetória individual existe uma margem protagonismo juvenil pode ser uma estra-
“relativa de escolha”, que se dá dentro de tégia na formulação de projetos de vida
um campo de possibilidades circunscritos por parte dos jovens, em diferentes con-
por determinantes sociais de diferentes textos e condições sócio-econômicas e na
ordens (classe social, local de moradia, emergência de novas discursividades que

1095
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

questionem os lugares pré-estabelecidos nuidades e descontinuidades, conflitos e


e as posições estereotipadas. Os jovens contradições, representam distintas pos-
dificilmente serão agentes de construção sibilidades de transmissão e recepção na
do seu próprio destino, com capacidade negociação entre tradição e inovação, no
de influir sobre as políticas públicas, na processo de individualização, implicando
ausência de instituições capazes de mobi- mudanças sociais, na dialética intergera-
lizar sua ação solidária. Aposta-se, ainda, cional. A fragilidade do laço intergeracio-
na inversão das posições hierárquicas na nal (de solidariedade e de reciprocidade)
transmissão cultural, quando se reconhe- na contemporaneidade questiona o posi-
ce que os mais velhos podem e devem cionamento das novas gerações frente à
aprender com os mais novos, convidan- tradição, quando os mais novos têm de
do-os à cena, como interlocutores A mesa “se encarregar de construir seu próprio
redonda é composta por pesquisadores destino, dar sentido às suas ações e de-
da Universidade Católica do Salvador, da cisões, se afirmar como singularidade”,
Universidade Estadual de Feira de Santana (Castro, 2006, p.256). A partir da análise
e da Universidade Federal do Recôncavo da autora, observam-se prováveis “racha-
Baiano alinhados a perspectivas teóricas duras” entre a transmissão da herança
interdisciplinares que tangenciam a psico- cultural por parte dos mais velhos e a sua
logia cultural e sistêmica, a sociologia e a recepção pelos mais jovens, colocando
filosofia da juventude, contribuindo para em risco as trocas geracionais. Reconhe-
se pensar a educação formal e não formal, ce-se que estas trocas nunca são pacíficas,
familiar, crítica e sensível a linguagens cul- pois não se trata de uma mera recepção,
turais juvenis, formatadas na dialogia. mas de uma reconstrução negociada de
sentidos, cuja agencia do sujeito deve ser
reconhecida. A trajetória biográfica, como
A DIALÉTICA INTERGERACIONAL: memória ou legado cultural, tenciona-se
NEGOCIANDO O PASSADO, O PRESENTE com o ideário de um projeto individual,
E O FUTURO com ênfase na autodeterminação, nas
Mirela Figueiredo Iriart - UEFS escolhas pessoais e na autonomia do su-
mifis36@gmail.com jeito, sendo a trajetória individual o lugar
Financiamento: FAPESB onde estão inscritas as marcas das esco-
lhas que o sujeito assume ao longo da sua
A debilidade dos laços sociais e a fragili- biografia. A transição desenvolvimental,
dade das agências socializadoras - sobre- ora entendida como percurso linear e
tudo a família, a escola e o trabalho - nos normatizador do curso de vida, hoje deve
interpelam sobre como as relações inter- ser pensada como uma trajetória descon-
geracionais oferecem ancoragem para tínua, ou trajectiva (Pais, 2006), denotan-
as transições juvenis, numa sociedade do um percurso sinuoso, construído nos
marcadamente adultocentrica, com pou- intersticiais domínios da cultura, da socia-
ca ou relativa autonomia dos jovens na bilidade, dos laços de amizade e das con-
construção de mecanismos de inserção dições estruturais, num horizonte tempo-
sócio-profissional e político-cultural. As ral caracterizado pelas inconstâncias do
transações geracionais, envolvendo conti- presente e pelas incertezas do futuro. A

1096
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

globalização, o pluralismo dos valores e campo de possibilidades é tangenciado


das autoridades, o individualismo institu- pelas tensões entre a tradição familiar, o
cionalizado e a ausência de controle sobre ethos coletivista e o ideal urbanocêntri-
riscos, envolvem o futuro com um caráter co, apostando no sucesso individual, em
de incerteza e um sentimento de verda- que a cultura de massa, os meios de co-
deiro temor (Leccardi, 2005). A maior par- municação e os grupos de pertencimento
te dos jovens encontra refúgio, sobretudo (inclusive, virtuais) passam a dividir as ta-
em projetos de curto ou curtíssimo prazo. refas de educar com as tradicionais agên-
Nas tensões existentes entre distintas cias socializadoras. O estudo da juventude
temporalidades: passado, como memória rural supõe a compreensão da complexa
biográfica, presente, como tempo da ex- dinâmica social que relaciona a casa (a
periência/consciência geracional e futuro, família), a vizinhança (a comunidade) e a
como tempo do por vir, projetado a partir cidade (o mundo urbano-industrial), não
do presente aberto como campo de possi- como espaços distintos, mas sim como
bilidades, compreender o papel da escola espaços de vida que se entrelaçam e que
e da família na construção negociada de dão conteúdo à experiência dos jovens
estratégias de alcance do futuro e de sig- (Wanderley, 2007). A escola é um contex-
nificação do presente, nos anos finais do to privilegiado para se pensar a juventu-
ensino médio, em um contexto rural é o de, como comunidade de prática, que me-
que se propõe aqui neste trabalho. Tal re- diatiza as experiências de vida através do
corte emerge do conjunto de dados pro- compartilhamento de idéias, memórias,
duzidos através da pesquisa “Juventude, emoções, fornecendo recursos cogniti-
Escolarização e Inserção social: um estu- vos/simbólicos que favoreçam a produção
do em diferentes contextos da rede públi- de narrativas de si, onde sentidos subje-
ca de educação do município de Feira de tivos são criados nas interações, em es-
Santana8. Entre a influência sócio-cultural paços discursivos múltiplos, configurados
da família, da comunidade, da escola e a por elementos de natureza psicológica,
trajetória individual, há uma margem “re- histórica, cultural, ideológica e institucio-
lativa de escolha”, que se dá dentro de um nal. Vale ressaltar que a escola ainda assu-
campo de possibilidades (Velho, 1981), me um papel importante para os jovens,
circunscritos por determinantes sociais de sobretudo na ausência de outros equipa-
diferentes ordens (classe social, local de mentos sociais (de lazer, esportivos, de
moradia, gênero, etc), tendo como con- participação política), que favorecem os
texto de referência sociedades complexas laços geracionais, a sociabilidade juvenil e
caracterizadas pela coexistência de distin- o senso de pertencimento, como é o caso
tas instancias produtoras de valores e de de jovens moradores de um contexto na
referências culturais. Em relação mais es- fronteira entre o urbano e o rural9. Proble-
pecificamente a comunidades rurais, este mas estruturais da escola pública apare-

9 O lócus escolhido para a pesquisa é uma escola pública,


8
Pesquisa realizada pelo NETTE, Núcleo de Estudo e Pes- localizada num distrito rural distante cerca de 12 quilô-
quisa Trabalho, Trajetórias e Educação, da Universidade metros da sede da cidade de Feira de Santana. A localida-
Estadual de Feira de Santana (UEFS), com financiamento de vive basicamente da agricultura familiar ou comercial
da FAPESB no período de 2008-2009. de pequena escala.

1097
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cem de forma ampliada para estes jovens, ENTRE O PASSADO E O FUTURO:


seja na deficiência da formação específica CONSIDERAÇÕES SOBRE JUVENTUDE EM
dos docentes, na infra-estrutura, no trans- TRÊS GERAÇÕES
porte, ou ainda na ausência de políticas Miriã Alves Ramos de Alcântara - UCSal
públicas culturais que valorize a memória miria.alcantara@gmail.com
local e universal. Sendo depositaria da Patrícia Caldeira de Queiroz - UCSal
esperança de um futuro melhor, a escola patrícia.caldeira@yahoo.com.br
apresenta-se desconectada da realidade e
Financiamento: CNPq, FAPESB
dos anseios da maioria dos jovens. O sen-
tido de “ser alguém na vida” é o que os
O diálogo intergeracional requer que se
motiva a permanecer na escola, dividindo
ultrapasse a visão de gerações como com-
o seu cotidiano com o trabalho doméstico
posta por indivíduos da mesma faixa etária
e no roçado. Vislumbram a qualificação
ou condição social, o que implica conside-
profissional, e a passagem pela escola,
rar elos que ligam quem precede e se su-
como condição para a ruptura com a tra-
cede na genealogia familiar. A família con-
jetória biográfica e o ethos familiar, ne-
temporânea, contexto fundamental para
gociando no interior da família a tradição
o desenvolvimento humano, influencia e
e a inovação. Imprimem também outros
sofre profundas alterações do contexto so-
sentidos paradoxais à instituição escolar,
ciocultural, processo que se evidencia nas
ao questionarem a qualidade do ensino
relações entre gerações. Portanto, é inte-
oferecido e a invisibilidade das suas de-
ressante aprofundar o estudo das intera-
mandas, tais como: maior abertura ao
ções entre famílias e jovens como cenário
diálogo, professores mais comprometidos
que, de um lado, atualiza padrões do mer-
com o ensino, valorização dos espaços
cado globalizado e, de outro, manifesta o
de sociabilidade, conteúdos acadêmicos
fenômeno da dádiva. Definido pela trocas
mais significativos, que favorecem a inser-
entre os membros da família, o conceito de
ção sócio-profissional. Põe-se em questão
dádiva viabiliza compreender o convívio, a
se a escola está sendo capaz de atender a
integração e o conflito da cultura familiar
demandas sociais complexas e heterogê-
com a lógica do mercado. Discute-se, com
neas, e como favorece que o jovem nego-
base nas categorias dádiva, autonomia e
cie as suas referências pessoais, culturais
liberdade, a posição de adolescentes e jo-
e familiares na construção de projetos de
vens nos dinamismos familiares, a fim de
vida, apostando, ainda na horizontalidade
indicar permanências, conflitos e rupturas
da transmissão cultural.
para com as perspectivas de socialização
de pais e avós. Um estudo empírico foi
Palavras-chave: transições juvenis, dialética
conduzido junto a 20 famílias residentes
intergeracional, escola
na cidade do Salvador, entrevistadas com
Contato: Mirela Figueiredo Iriart, UEFS,
base em um roteiro semiestruturado cons-
mifis36@gmail.com
truído especialmente para esta pesquisa,
com o objetivo de caracterizar o conceito
de juventude entre membros de três gera-
ções (avô, pai e filho) diferenciados segun-

1098
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do gênero e grupo sociocultural. A partir incipiente agenda pública. Este paradoxo


da perspectiva dialógica a análise revelou insere-se nos processos que caracterizam
distintas considerações a respeito da ju- a sociedade globalizada no capitalismo
ventude entre membros de uma mesma avançado, descortinando elementos ino-
família. Os resultados mostram que avós vadores das trocas intergeracionais que
reconhecem maior iniciativa e avanço dos desafiam as estratégias educativas em seu
jovens especialmente quanto a tecnolo- potencial de socialização. A família é um
gia e educação formal. Consideram valo- dos objetos centrais das Ciências Humanas
res e costumes atuais negativos devido a e Sociais Aplicadas, marcada pela comple-
influências como TV, drogas e liberdade xidade, o que exige tratamento interdis-
sexual, o que requer vigilância e acompa- ciplinar e transversal. O contexto familiar
nhamento dos pais. A atitude dos jovens acolhe os diversos olhares que a atraves-
para com os mais velhos é vista como sam e que reconhecem nela a origem e a
descomprometida, pois embora possuam convergência de processos fundamentais
liberdade e acesso ao conhecimento, têm para as relações humanas e para a subjeti-
menos ideais que as gerações anteriores; vação. Constitui espaço social no qual seus
supostamente lutam menos, pois possuem membros são instados a participar de in-
tudo. Esta perspectiva diverge dos pais que tercâmbios que lhes conferem identidade
apresentam uma imagem mais positiva (Levi-Strauss, 1967). Suas relações carac-
das conquistas da juventude. Na sua visão, terizam-se por elementos próprios do fato
os jovens ocupam espaço social significati- social total a partir do qual os indivíduos
vo, usufruem da liberdade alicerçando um vivenciam os acontecimentos constitutivos
mundo em construção (responsabilidade); da vida (Mauss, 1932; Donati, 2008). O en-
representam uma geração preocupada contro de diferentes gerações é marcado
com problemas ambientais e com o mun- pela vivência do tempo geracional no qual
do. Por outro lado, os pais apresentam crí- ocorrem a transmissão cultural e a educa-
ticas mais contundentes com relação aos ção dos membros mais jovens. A reunião
gostos e interesses do jovem por temas de diferentes gerações no contexto fami-
considerados vazios e sem estética, o que liar revela que a família integra condições
reflete ausência de ideal e de razões para de desenvolvimento de relações de cida-
lutar. Eles ponderam ainda acerca do aces- dania (Pereira, 2004; Donati, 2003). Tudo
so a informação diversificada, a existência isto consolida seu estatuto de fundação e
de múltiplas tendências de comportamen- fundamento social (Giddens, 2005). A es-
to, de distintas formas de pensar, a divisão truturação psíquica contribui nas relações
em tribos e guetos e a juventude como fundamentais da família pelas quais o su-
valor ligado ao bem estar como elementos jeito dá seu aporte para desenvolver-se
a serem considerados na socialização. Em psicologicamente (Mizhari, 2001). A socia-
seu conjunto, as considerações evidenciam bilidade de seus membros expressa-se na
que, em meio a diferentes tendências, a fa- capacidade de assumir as tarefas relativas
mília ainda se reconhece como responsá- ao trabalho e ao afeto, características da
vel por favorecer a inserção do jovem. No vida do adulto, processo que revela sua
entanto, as profundas desigualdades so- atribuição de promotora das normas de
ciais dificultam este processo evidente na conduta (Braganholo, 2005).

1099
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: família, gerações, juventude didos, compreendidas como sujeitos de


Contato: Miriã Alves Ramos de Alcãntara, direitos e de desejos, mais também su-
UCSal, miria.alcantara@gmail.com jeitos a criar direitos, tipo de orientação
que é frustrada na educação familiar e
escolar corrente. Recorrendo ao conceito
JUVENTUDES, FAMILIAS E ESCOLAS: de representações em Moscovici, Melluci
DESENCONTROS EM RELAÇAO À e Jodelet o texto se modela por enfoque
SEXUALIDADE E À ETICA DO CUIDAR interdisciplinar, privilegiando entrelaces
Mary Garcia Castro - UCSal da psicologia política e social e a sociolo-
castromg@uol.com.br gia de Bourdieu (reflexiva) na analise de
falas de jovens de diferentes inscrições
O texto em proposição combina ensaio ou ‘tribos’. Assim tem-se como referencia
e analises que decolam de pesquisas. O o Brasil na virada do texto para o empí-
ensaio mais reflexivo discute os conceitos rico, reacessando pesquisas construídas
de vulnerabilizações (limites materiais e por grupos focais e entrevistas, alem de
sistêmicos) e vulnerabilidades ou neces- surveys, que co-coordenei com Miriam
sidades dos seres humanos e a relativida- Abramovay entre 2004-2010 com jovens
de e o impulso por busca por autonomia, entre 15 a 29 anos. Assim analisam-se
que entre os jovens tem na dimensão discursos de diferentes grupos de jovens
da sexualidade, configuração de rito de como ativistas em grupos identitários—
passagem e de pertença a fratrias (Kehl), LGBT e jovens feministas; jovens (homens
assim como afirmação identitária. A cri- e mulheres) em gangues em Brasília, jo-
tica as instituições escola e família pas- vens no ensino médio e na população
sam por resgatar os debates propostos em geral. Discutem-se representações de
por Martha Nussbaum sobre o sistema jovens sobre família e escola e como os
escolar ocidental, mais voltado para o conceitos de vulnerabilidade e autono-
mercado e projetos desenvolvimentistas, mia têm referencias conflitivas quando
deixando de lado a formação democrá- discursos de jovens e adultos são rela-
tica, por cidadania ativa e solidaria e so- cionados e ainda se pautam por estere-
bre suas teorias baseadas na perspectiva ótipos quanto a gênero. Defende-se por
liberal10 que combina o lugar do Estado outro lado que o debate sobre sexualida-
no plano de garantir capacidades para de e cuidado, passa por discutir ethos in-
que os indivíduos possam fazer livres es- dividualista, resistências à diversidade e
colhas, baseadas na razão ética, ou seja, à alteridade. Alinha-se o texto à perspec-
em que o outro, e em particular a outra, tiva de Nussbaum sobre a importância de
mais que respeitados sejam compreen- uma educação formal (escolar) e familiar
critica e sensível a linguagens culturais
10 Serão acessados em particular os trabalhos de Goldstein, juvenis, mais voltadas para performáticas
Pierre “V”Vulnerabilité ET Autonomie dans La pensée e sensações (Nussbaum discute sobre o
de Martha Nussbaum”. Philosophies, PUF, Paris, 2011
e Nussbaum, Martha “Not for Profit. Whay democracy
conhecimento critico em Platão e o co-
needs the humanities”, Princeton University Press, New nhecimento interdisciplinar que combina
Jwrsey, 2010 e ; Nussbaum, Martha “Introduction” in arte e humanidades em Tagore). Sexua-
Winnicott “The Fam,ily and Individual Development”,
Routledge, London, 1965 lidade e ética de cuidar são saberes que

1100
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tendem a ser ativados nas relações inter em relação ao jovem pobre, da periferia),
generacionais de forma moralista, mas a geração de um clima de histeria e senti-
sem a preocupação em como se cons- mentos fatalistas, e para a proposição de
troem na moral da modernidade con- soluções baseadas em raciocínio unicau-
temporânea e com pouco investimento sal e linear. Concomitantemente, muitas
em combinações dialéticas, que tenham escolas vêm tomando iniciativas de en-
como vetor a democracia e formação de frentamento às violências – iniciativas
cidadãos e cidadãs solidários. Por outro de distintas naturezas, abordagens, graus
lado a ênfase na razão critica combina- de complexidade e eficácia. Na mesma
da com o cultivo das sensibilidades, da trilha, organizações não-governamentais
beleza, ou seja, da arte afasta o texto de (ONG’s) direcionam os trabalhos que de-
conceitos como tolerância e respeito, se senvolvem com crianças e adolescentes
não formatados em dialógica, ou seja, na para enfoques que dêem conta dos de-
comunicação. O debate epistemológi- safios impostos pela cultura de violência.
co subjacente é sobre possibilidades de Em meio a esse panorama de incertezas,
estimulo à solidariedade e ao cultivo do tentativas e aprendizados, reconhece-se
exercício de individualidades não ego- a emergência de novas “práticas culturais
cêntricas, portanto sensíveis a gênero, e profissionais” (Testa, 1994, p.135) no
reconhecendo a interação entre vulnera- contexto das organizações educacionais.
bilidades e buscas por autonomia dos e Essas novidades, no entanto, permane-
das jovens e a complexidade para as fa- cem, na maioria das vezes, no nível do
mílias e a escola com o tema sexualidade. “conhecimento comum ou pré-conheci-
mento pré-científico” (idem). No intui-
Palavras-chave: sexualidade, ética do cuidar, to de contribuir para a identificação de
dialogia práticas fomentadoras de uma cultura de
Contato: Mary Garcia Castro - UCSal paz, em curso em escolas e organizações
castromg@uol.com.br não-governamentais, realizou-se pesqui-
sa em três organizações educacionais
cujo trabalho em prol da prevenção da
PROTAGONISMO JUVENIL COMO violência e/ou promoção de uma cultura
ESTRATÉGIA DE INCLUSÃO E de paz têm obtido reconhecimento so-
PROMOÇÃO DA PAZ cial. As organizações situam-se em distin-
Feizi Masrour Milani - UFRB tas Unidades Federativas do Brasil – uma
feizi.milani@gmail.com escola pública em bairro periférico, um
projeto de educação em Saúde desenvol-
No Brasil, o aumento das preocupações vido por um órgão oficial em parceria com
da população, autoridades, especialistas uma ONG, num bairro de baixa renda, e
e educadores com o fenômeno das vio- uma escola internacional privada. Todas
lências nas escolas tem, por um lado, le- têm como público alvo os adolescentes.
vado esses atores sociais a se engajarem A análise de dados foi orientada pelo
em discussões em busca de alternativas modelo ecológico do desenvolvimento
e, por outro, contribuído para o agrava- humano proposto por Bronfenbrenner
mento de estereótipos (principalmente (1977, 1996), o qual enfatiza a necessi-

1101
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade de considerar-se o desenvolvimen- parte do adolescente (Sousa, 2004). Es-


to humano em seu contexto social, num ses aprendizados constituem-se em ele-
processo dinâmico e contínuo de intera- mentos-chave de qualquer estratégia de
ções entre os fatores biológicos, psicoló- prevenção à violência nessa faixa etária.
gicos e ambientais. O indivíduo e o seu Na realidade, uma parcela da juventude
ambiente não são vistos como entidades brasileira já está integrada a alguma for-
separadas, ao contrário, o indivíduo é ma de participação coletiva, a exemplo
uma parte ativa e intencional do ambien- de grupos artísticos, culturais, desporti-
te com o qual interage e pelo qual é in- vos ou religiosos, ONG’s, movimentos es-
fluenciado. É através das interações que tudantis, ecológicos, sociais ou comuni-
os agentes de socialização - pais, edu- tários, escotismo e serviços voluntários.
cadores - transmitem crenças e práticas Rua (1998) constata que, “em geral, o
veiculadas no meio social ao qual perten- jovem se mobiliza a partir das agregações
cem, que são essenciais para a constitui- estabelecidas por instituições preexisten-
ção do sujeito. Essas práticas educativas tes” (p.748). Portanto, se as instituições
são, portanto, culturalmente organizadas forem incapazes de “mobilizar a ação
(Bastos, 1994). Identificou-se como ca- solidária dos jovens, é bastante possível
racterística em comum às três organiza- que eles continuem a ser objeto de polí-
ções educacionais estudadas o fato des- ticas, sem capacidade de influir sobre as
tas criarem espaços de participação dos mesmas” (idem). O modelo proposto por
adolescentes/educandos, promoverem Bronfenbrenner permite ao pesquisador
o seu engajamento ativo em atividades transitar entre os vários níveis de atuação
intra e extra-muros, reconhecerem sua e interação da pessoa, assumindo que ela
liderança e valorizarem suas iniciativas. é um sujeito com sua própria identidade e
Em outras palavras, elas adotam o pro- capaz de fazer escolhas – dentre as quais,
tagonismo juvenil como princípio nortea- agir/reagir com violência ou promover a
dor e estratégia educativa, reconhecendo paz – reconhecendo, ao mesmo tempo,
ser o jovem não apenas beneficiado, mas que essa pessoa se insere em determina-
também o promotor da transformação do ambiente familiar, classe econômica,
social (Milani, 2004). O conceito de pro- situação social e contexto histórico, os
tagonismo juvenil busca “uma forma de quais exercerão grande influência em sua
ajudar o adolescente a construir sua au- trajetória de vida, inclusive expandindo
tonomia, através da geração de espaços ou reduzindo drasticamente seu rol de
e situações propiciadoras da sua partici- escolhas. Por outro lado, as escolhas que
pação criativa, construtiva e solidária na ela fizer repercutirão sobre as pessoas e
solução de problemas reais na escola, na ambientes com os quais interage, levan-
comunidade e na vida social mais ampla” do a distintas consequências. Cada uma
(Costa, 2000, p.22). Favorecer o prota- das organizações educacionais analisadas
gonismo juvenil pode ser uma estratégia promove o protagonismo juvenil através
eficaz de promoção da saúde. Seus bene- de abordagens distintas: (1) A escola pú-
fícios são múltiplos – contribuindo, inclu- blica em questão fomenta a inclusão –
sive, para a autoestima, a assertividade e reintegrando estudantes anteriormente
a formulação de um projeto de vida, por expulsos ou desistentes e confiando-lhes

1102
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tarefas relacionadas à disciplina escolar; MR LT01


disponibilizando suas quadras e salas
nos fins de semana para jovens do bairro
Mesa Redonda
praticarem esportes e estudantes da es-
cola ministrarem oficinas artísticas; ofe-
MR LT01-766 – O ENSINO DA
recendo oportunidades de estágio aos
PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
estudantes e de trabalho aos egressos;
NA CONTEMPORANEIDADE: LIMITES E
encorajando a meta de cursar a univer-
POSSIBILIDADES
sidade. (2) O projeto observado fomenta
duas vias interligadas – a descoberta de Ana Maria Monte Coelho Frota - UFC
um novo olhar do adolescente sobre si Ercília Maria Soares Souza - FANOR
mesmo e sua comunidade, e a atuação Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC
como multiplicadores de Educação em Terezinha Teixeira Joca - UNIFOR
Saúde. (3) A escola internacional estuda-
da enfatiza a “unidade na diversidade” e Esta mesa se propõe a discutir a especifi-
gera situações e oportunidades nas quais cidade da área da Psicologia do Desenvol-
os estudantes exercitam a autonomia – vimento, questionando seus paradigmas,
cooperando para a realização de projetos metodologias e livros-texto. A primeira
transversais e organização de festivais; autora discute a importância dos estudos
cultivando o voluntariado dentro da es- na área, acreditando que a ela compete
cola e em instituições sociais; fomentan- trazer questões sobre transformações e
do a integração entre estudantes de di- processos do homem. Assinala que o de-
ferentes nacionalidades, grupos étnicos senvolvimento vem sendo estudado em
e religiões. As três organizações educa- classes etárias e que, na contemporanei-
cionais apresentam inúmeras diferenças dade, existe uma desconstrução da ideia,
entre si, no que tange a estrutura física, que se fez universal e a-histórica, de ser
número de educadores e adolescentes, este o formato da existência concreta.
contexto sócio-cultural, objetivos e his- Acredita que esta é uma divisão aleató-
tóricos institucionais, dentre outras. No ria, construída histórica e socialmente,
entanto, o foco da análise realizada foi a além de transitória. Apesar disso, muitas
busca por aquilo que existe em comum teorias tentam explicar, compreender,
a esses programas. Todos promovem a predizer, avaliar o desenvolvimento. As te-
“difusão de uma ética da solidariedade, orias são tantas e tão diversas, que pare-
cuja base seja o respeito ao outro” e re- ce possível dizer que existem psicologias
presentam “linhas de fratura no dispositi- com paradigmas distintos. A autora ainda
vo da violência” que possibilitam “pensar salienta que é a clareza dos paradigmas
a construção de uma cidadania mundial” adotados na práxis acadêmica, que nor-
(Tavares dos Santos, 2002, p.23). teia a escolha de livros para estudos, me-
todologias, avaliação e conteúdos a serem
Palavras-chave: juventude, protagonismo, discutidos. A segunda autora defende que
cultura da paz a disciplina Psicologia do Desenvolvimen-
Contato: Feizi Masrour Milani, UFRB, feizi. to é um dos sustentáculos do curso de
milani@gmail.com graduação em Psicologia, tornando seu

1103
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ensino um desafio constante. Tentando vida na disciplina Psicologia da adolescên-


superá-lo, apresenta um relato de experi- cia, fase adulta e velhice, com estudantes
ências, com o objetivo de tornar cotidiano do curso de Psicologia, que vivenciaram
os questionamentos e a profusão de res- o papel de coparticipes de seu processo
postas e perguntas. A maior conquista foi de aprendizagem e entraram em contato
ressaltar indicadores de desenvolvimento, com suas próprias histórias de vida. Ado-
considerando quadros clínicos específi- tou a proposta do Método (Con)texto de
cos. Para os estudantes foi estruturante Letramentos Múltiplos, levando estudan-
poder aprender a teoria e exercitá-la sem tes a refletir e construir suas autorias, par-
rigidez. Por fim, revelou uma maneira de tindo dos textos evocativos indicados pelo
aliar conhecimento, desejo de saber e curso, na bibliografia. Esperamos, com
relações sensíveis, produzindo interroga- este espaço, proporcionar uma troca de
ções mais do que respostas, conduzindo experiências entre profissionais da área,
a formas de acessar um mundo com dife- ampliando questionamentos e pensando
rentes linguagens. O terceiro autor identi- em possibilidades de melhoria do ensino
fica a dificuldade de bibliografia que seja (teórico e prático) desta disciplina.
capaz de apresentar os estágios do de-
senvolvimento, ao mesmo tempo em que
desperta o prazer de ler e de aprender. PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO OU
Além disso, desenvolve uma metodologia PSICOLOGIAS DO DESENVOLVIMENTO? –
que considera o aprendiz como sujeito de DO QUE FALAMOS?
sua expressão verbal, numa universidade Ana Maria Monte Coelho Frota - UFC
que não priva o estudante de seus dese- anafrota@ufc.br
jos de ser e de pertencer, dando-lhe auto-
nomia no desencadear de seus esforços. A Psicologia do Desenvolvimento vem se
Adota uma perspectiva interacionista do debruçando sobre o estudo do desen-
sujeito-palavra, considerando os aspec- volvimento, focada, principalmente, na
tos da interlocução, intersubjetividade e perspectiva temporal, ou seja, na idade
interpessoalidade indispensáveis no de- cronológica. Porém, o tempo em si não é
senvolvimento da aprendizagem. Usa a uma característica psicológica, o que nos
aplicação do Método (Con)texto de Letra- possibilita afirmar que as idades se cons-
mentos Múltiplos nas disciplinas de Psico- tituem como categorias sociais, a partir
logia do Desenvolvimento da Infância e da de um contexto histórico e socialmente
Adolescência. Apresenta o livro Odisseia constituído (Figueiredo, 1993). Da mesma
do Desenvolvimento Humano: navegando forma, é possível refletir que o que é tido
pelos 12 estágios da vida, cuja excelente como características essenciais de cada
recepção pelos estudantes tem desper- uma das idades ou fases da vida huma-
tado interesse sobre a função do livro na na, também é construção histórica, uma
aprendizagem exitosa da Psicologia do De- vez que o que ocorre em cada idade, e
senvolvimento. Finalmente, o quarto au- sua expressão, dependem do contexto no
tor discute a escassez de livros que tratem qual os indivíduos estão inseridos. A partir
do desenvolvimento humano. Apresenta disso, é possível afirmar que a idade cro-
uma prática docente inovadora, desenvol- nológica não é o mais determinante para

1104
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se estudar o crescimento humano, e sim sempre são o mesmo. Para nós, profes-
as mudanças vividas pelo humano, no seu sores da área, coloca-se uma indagação:
tempo de vida. As fases de desenvolvi- quando damos aula, de qual psicologia
mento, suas conceituações e caracteriza- falamos? A clareza dos paradigmas das
ções, as diversas teorias que se detém a teorias adotadas por nós, na nossa práxis
compreendê-las e analisá-las, têm em si a acadêmica, é disparadora da escolha de li-
“leveza da falsidade”, são somente “sinto- vros que norteiam nossos estudos, da me-
mas do homem”, pois que representações todologia adotada nas aulas, das formas
sociais e, portanto, sempre precárias e em de avaliação e dos conteúdos a serem dis-
transformação (Frota, 2007). A descrição cutidos com nossos alunos. Porém, mui-
do desenvolvimento humano em fases ou tas vezes esta clareza não existe, e nos
estágios parece perder-se na sua aparente flagramos trabalhando com manuais de
concretude e naturalidade, deixando de Psicologia do desenvolvimento Humano
lado a busca de entender realmente como que apresentam estudos e resultados a
se processa o desenvolvimento humano. partir de uma visada maturacional e bio-
Cabe-nos refletir: o que, especificamente, logicista, como os Manuais de Helen Bee
cabe à Psicologia do Desenvolvimento? O (2003), Papalia (2008), e outros, enquanto
que a ela, importa estudar? Como estudá- defendemos uma perspectiva, por exem-
-la com nossos alunos? Biaggio (2009) plo, dita “interacionista”. A ausência de
aponta 3 fases históricas dentro da evolu- livros-texto construídos dentro da nossa
ção do campo da Psicologia do Desenvol- realidade brasileira também é outro pro-
vimento: (a) a primeira, dos anos 20 a 40 blema encontrado por docentes da área.
do século passado, caracterizada por um Finalmente, é importante ressaltar a ca-
saber centrado na maturação biológica; rência de uma teoria do desenvolvimento
(b) a segunda, que contempla os anos 40 humano organizada, acompanhada de es-
a final dos anos 50, afirma uma psicologia tudos, discussões e aplicação prática, das
mais preocupada com a correlação dos di- novas tendências apontadas por Biaggio
versos saberes, mas ainda sem conseguir (2009), tais como as teorias da psicolo-
correlacioná-los; e (c) a última fase, dos gia sócio-histórica, referidas acima. Par-
anos 60 até a atualidade, centra-se no in- tindo de uma perspectiva crítica, Kramer
teresse em explicação das causas das mu- (1997) assinala a ruptura da Psicologia do
danças do comportamento, mais que na Desenvolvimento com a vertente mecani-
sua descrição ou associação de variáveis. cista da ciência positivista, enfatizando a
Aponta, ainda, para novas tendências da crítica à visão naturalizante, biologizante,
Psicologia do Desenvolvimento, trazidas universalista e abstrata da concepção de
pela Teoria de Processamento de Infor- criança e de infância, que atravessam as
mações, pela Psicologia Dialética, pela teorias de desenvolvimento divulgadas
Sociobiologia e pelo Enfoque Ecológico de até os anos setenta do século passado.
comportamento. Falamos, assim, não de Apresenta, como contraposição, a criança
Psicologia do Desenvolvimento, mas de como sujeito da própria história, produ-
PsicologiaS do Desenvolvimento, configu- zida e produtora de cultura. Dentro des-
radas com pressupostos distintos, meto- ta perspectiva Vasconcellos (2007), por
dologias diferentes, conteúdos que nem exemplo, se nega a ver a criança como

1105
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

fazendo parte de uma categoria genérica, (Piaget, Vygotsky, Wallon), sócio-histórica


na qual a incompletude e a imaturidade (Bock e Ozella), e/ou outra, adotando o
sejam as características basilares. Acredi- estudo das teorias defendidas por seus
ta que uma das causas da invisibilidade da criadores, ao invés de estudar o processo
criança se faz pela segmentação da vida do desenvolvimento humano. Questiono
em etapas cronológicas, naturalizadas, e a possibilidade de se estudar a psicologia
não como construção social. Vasconcelos do desenvolvimento de um modo que
(2008) apresenta alguns dos marcos teó- não nos percamos da sua especificidade,
ricos da psicologia do desenvolvimento da deixando de lado o processo, para estu-
criança na perspectiva sócio-interacionis- darmos a teoria de alguns de seus ícones.
ta, as quais reforçam a indissociabilidade Volto a indagar: o que importa mesmo à
homem-mundo. É neste caminho que a Psicologia do Desenvolvimento? Qual a
Psicologia do Desenvolvimento vem se melhor metodologia a ser trabalhada?
constituindo na contemporaneidade: afir-
mando a interação homem-mundo social. Palavras-chave: Psicologia do
O desenvolvimento humano se dá através Desenvolvimento, perspectiva crítica, teorias.
de uma rede de relações e interações, na
qual os indivíduos se constituem enquan-
to sujeitos, negociando significados (Ros- RELATO DE EXPERIÊNCIAS: ELABORAÇÃO
setti-Ferreira et al, 2004). Dentro desta DE UM PLANO DE TRABALHO PARA
perspectiva, não pode ser visto como um ANÁLISE DO DESENVOLVIMENTO
processo individual, a-histórico e passivo. DE CRIANÇAS, CONSTRUINDO
Ao contrário, o processo de desenvolvi- POSSIBILIDADES.
mento é dinâmico, com possibilidades Ercília Maria Soares Souza - FANOR
constantes de transformações, criações e esouza3@fanor.edu.br
recriações. A pessoa, como assinala Silva
(2003), é considerada sujeito múltiplo, e A disciplina Psicologia do Desenvolvimen-
não como produto/objeto de sua história. to é um dos sustentáculos do curso de
Ele tem a possibilidade de se transformar, graduação em Psicologia, visto que apre-
assim como de transformar seu mundo. A senta descrição (e problematização) das
partir dessas premissas, algumas questões características, particularidades, especi-
merecem ser assinaladas: é marcante a ficidades do desenvolvimento humano.
ausência de livros que orientem o estudo Lecionar esta disciplina é um desafio, ao
das disciplinas da área de desenvolvimen- mesmo tempo em que se constitui uma
to humano, seja de crianças, adolescen- imersão em uma complexa rede de sabe-
tes, adultos ou idosos. Continuamos a uti- res, desejos e possibilidades de aprendi-
lizar os mesmo manuais oferecidos numa zagem. Este trabalho apresenta um relato
orientação maturacionista, apesar de his- de experiências, ditas significativas, com
toricamente ter sido superada. Fugindo a o objetivo de tornar cotidiano na sala de
esta orientação, muitos dos professores aula questionamentos, profusão de res-
da área escolhem trabalhar numa pers- postas e perguntas, inquietações frente às
pectiva psicanalítica (Freud, Lacan, Win- teorias e a descoberta de como apreen-
nicott ou Ericsson), sócio-interacionista der um conteúdo, tornando-o “um saber”.

1106
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Ao buscar embasamento teórico para es- já atendida em clínica especializada (per-


tas questões, deparamo-nos com auto- tencente à mesma Faculdade). As crian-
res como Freire (2003), Moreira (2005) e ças atendidas tinham um “diagnóstico”,
Pellizzari et al (2002), que demonstram, não informado aos alunos, para que eles
teórica e tecnicamente, que os aprendizes tivessem como parâmetro o desenvolvi-
não são receptores passivos e que, quan- mento de cada criança e não seus trans-
do supomos que um novo conhecimento tornos e/ou impedimentos. Desta forma,
é pautado em um conhecimento prévio, o foco principal desta atividade foi, desde
e que, a partir desta interação, é possível o início, promover a apreensão de saberes
criar condições extremamente favoráveis sobre desenvolvimento infantil. Contudo,
na construção de saberes, temos a chance no momento em que os estudantes se
de instigar os atores envolvidos (apren- depararam com quadros que ainda não
dizes, mesmo que estudantes e/ou pro- (re)conheciam, como Paralisia Cerebral,
fessores) a criar suas metáforas, ou suas Autismo, Dislexia, Síndrome de Rett, Sín-
formas de (de) codificar o mundo. Além drome de Asperger, Transtorno de Déficit
disso, podemos articular mais um tema, de Atenção e Hiperatividade, dentre ou-
presente em nossa prática: o desejo de tros, inquietaram-se, questionaram-se e
saber. Márcia Tiburi (2006) é brilhante foram buscar estudos que favorecessem
quando afirma que o que move o huma- seu percurso teórico e o discernimento
no é sua curiosidade, portanto seu desejo entre as várias nuances do desenvolvi-
de saber sobre algo “obscuro” (em algum mento infantil. Eis aqui a primeira contri-
momento). Esse desejo está vinculado, buição desta experiência: o desconhecido
segundo a autora, ao outro e ao universo instigou os alunos em direção ao saber. Os
da linguagem, ou aquilo que ela chama de Planos de Trabalho foram elaborados em
“espaço intersubjetivo, o intervalo que é pequenos grupos, supervisionados por
espaço aberto e conexão que há entre Eu mim, tanto na fase de elaboração quan-
e Tu”. Fica assim demarcado nosso cam- to na fase de execução. A execução do
po de trabalho: o encontro entre huma- Plano foi programada para acontecer em
nos, suas diferenças e semelhanças e o horários antes ou após os atendimentos
conhecimento, em um exercício contínuo das crianças, já realizados na clínica, e de
de sensibilidade. Tendo estas referências acordo com a disponibilidade e aceitação
como retaguarda, dedico-me a relatar um das crianças e seus responsáveis. Em ter-
trabalho realizado na disciplina “Psicolo- mos práticos, primeiro foram realizadas
gia do Desenvolvimento I: Infância” com observações iniciais, que deveriam ser
alunos do 2º semestre de um curso de “silenciosas”. Depois os estudantes deve-
graduação em Psicologia. Além do percur- riam conhecer/estudar os autores indica-
so teórico, promovido por meio de aulas dos e fazer um levantamento, desenvolver
dialogadas, seminários temáticos e semi- descrições e estabelecer critérios e finali-
nários clínicos, foi proposta aos alunos, a dades para as atividades que proporiam.
elaboração de um Plano de Trabalho, com Depois deste momento inicial, acontece-
tarefa principal de estruturar um roteiro ram as primeiras interações propriamente
de intervenção, que os permitissem ana- ditas com as crianças, e a proposição das
lisar o desenvolvimento de uma criança atividades: brincadeiras infantis, jogos,

1107
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dramatizações, fantoches, uso de provas tas. Ao tentar saber quem eram as crian-
piagetianas, etc. Toda semana, após as ças e não exatamente quais seus diagnós-
tarefas realizadas e seu detalhado relató- ticos, produziram estratégias de interven-
rio parcial, reservávamos um tempo das ção ancoradas no exercício do que chamei
aulas para discussão em grupo e partilha aqui de sensibilidade. A maior conquista
de experiências, promovendo calorosos desta experiência parece ter sido ressal-
debates em como e o que avaliar/anali- tar os indicadores de desenvolvimento,
sar. Ao final do trabalho foram elabora- considerando quadros clínicos muito es-
dos relatórios, e um deles era destinado pecíficos, garantindo às crianças a valori-
às crianças e seus familiares. O direcio- zação de seu potencial criativo. Por outro
namento desta etapa foi promover um lado, para os estudantes, foi estruturante
encontro para indicar o desempenho das poder aprender a teoria e exercitá-la sem
crianças nas diversas atividades, conside- rigidez, com delicadeza e seriedade. Por
rando os indicadores estudados do de- fim, esta experiência revelou uma manei-
senvolvimento infantil, relacionando-os ra (ou pelo menos uma tentativa) de aliar
aos quadros apresentados pelas crianças. conhecimento, desejo de saber e relações
Nestas ocasiões, os estudantes também sensíveis, produzindo muitas mais inter-
sugeriram aos pais atividades que estimu- rogações do que respostas. Sem dúvida,
lavam o desenvolvimento, a partir das ob- esta proposta de trabalho sugere que de-
servações e do desempenho nas tarefas e sejar saber pode ser uma linha que con-
brincadeiras realizadas pelas crianças. Os duza a formas de acessar um mundo com
Planos de Trabalho de cada grupo foram diferentes linguagens.
apresentados em seminários em sala. Os
ouvintes, também motivados pelas suas Palavras-chave: relato de experiência,
próprias experiências, se tornaram per- desenvolvimento infantil, intervenção.
guntadores incansáveis. Todos desejavam
saber como foi a interação com as crian-
ças, quais as dificuldades, que conceitos e EM BUSCA DO LIVRO IDEAL PARA
preconceitos estavam presentes, que situ- O ENSINO DE PSICOLOGIA DO
ações inusitadas enfrentaram, que adap- DESENVOLVIMENTO
tações precisaram fazer, que sentimentos Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC
vivenciaram, o que aprenderam, o que se fscavalcantejunior@gmail.com
tornou belo, o que continuou difícil, que
critérios de avaliação usaram, quais dife- Esta comunicação emerge da necessidade
renças identificaram, quais suas conclu- de se refletir sobre a utilização de livros no
sões, etc. Ao final da disciplina foi possível ensino da Psicologia do Desenvolvimento
identificar que os estudantes manejaram em cursos de graduação de universidades
de forma criativa seu conhecimento pré- brasileiras. Identificamos a dificuldade en-
vio, acrescido dos novos conhecimentos, contrada por muitos professores na esco-
transformando-os em saberes. A partir de lha de uma bibliografia que seja capaz de
interrogações sobre os quadros “clínicos” apresentar os estágios do desenvolvimen-
das crianças observadas, tornaram sua to humano ao mesmo tempo em que des-
aprendizagem um contínuo de descober- perta no leitor o prazer de ler e de apren-

1108
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

der. Insatisfeitos com os relatos ouvidos profunda do lido, estética, também, do


de estudantes sobre a ineficiência do lido”. Objetivamos com esta comunicação
ensino dessa disciplina em cursos de gra- apresentar observações empíricas sobre
duação, desenvolvemos uma metodologia a importância da utilização de livros que
que considera o aprendiz como sujeito de despertam no estudante universitário o
sua expressão verbal, numa universidade desejo de querer conhecer e aprender
que não priva o estudante de seus desejos conteúdos da Psicologia do Desenvolvi-
de ser e de pertencer, dando-lhe autono- mento e criar um espaço, durante a mesa
mia no desencadear de seus esforços para redonda, para que os professores presen-
o estudo da Psicologia do Desenvolvimen- tes compartilhem as bibliografias adota-
to. Adotamos uma perspectiva interacio- dos em suas disciplinas. Apresentaremos
nista do sujeito-palavra, considerando os nossas reflexões sobre o ensino da disci-
aspectos da interlocução, intersubjetivi- plina em foco, nos cursos de bacharelado
dade e interpessoalidade indispensáveis e licenciatura em Educação Física, com a
no desenvolvimento da aprendizagem. A utilização do livro Odisseia do Desenvol-
expressão linguística sujeito-palavra ex- vimento Humano: navegando pelos 12
traímos do léxico de Alain Touraine para estágios da vida, de autoria do psicólogo
denotar o sujeito que verbaliza suas emo- norte-americano Thomas Armstrong, cuja
ções, numa escola/universidade centrada excelente recepção pelos estudantes tem
na comunicação inter e intrapessoal. Com despertado o nosso interesse sobre a fun-
a aplicação do Método (Con)texto de Le- ção do livro na aprendizagem exitosa da
tramentos Múltiplos, nas disciplinas de Psicologia do Desenvolvimento. Escrito ao
Psicologia do Desenvolvimento da Infân- longo de 25 anos de pesquisas e de prática
cia e da Adolescência, chegamos a três docente, o autor conseguiu um feito fan-
importantes constatações: (1) a concep- tástico na sua obra: sintetizou os estágios
ção comunicativa constitutiva da mente e do desenvolvimento físico, psicológico e
de um potencial inerente ao sujeito que espiritual, utilizando-se de conteúdos das
é capaz de fazer objeções no processo de mais diversas áreas do conhecimento, tais
leitura e escrita, na aprendizagem e nas como neuropsicologia, antropologia, bio-
reações sobre esta aprendizagem; (2) per- logia evolutiva, psiquiatria, folclore, socio-
cepção de educação que se volta para a logia, religião e literatura. Os treze capítu-
cultura da aprendizagem constitutiva da los abordam os estágios da vida, desde o
mente na formação da consciência do su- pré-nascimento até a experiência da mor-
jeito, a partir de suas crenças no proces- te e do morrer. Ilustrado com narrativas
so de apreensão do conhecimento e (3) de sua vida pessoal, o texto torna-se uma
concepção de liberdade constitutiva da leitura prazerosa, informativa e transfor-
mente que se justifica pela reação do su- madora para os estudiosos do desenvol-
jeito como verbalizador de suas emoções vimento humano e para os interessados
e pensamentos. Neste trabalho focamos em conhecer os estágios da vida humana.
nossas reflexões na terceira premissa, a Cada capítulo sugere uma lista de ativida-
libertadora, que se inspira em Paulo Frei- des e de filmes para o aprofundamento da
re, para quem “ler não é passear por cima fase da vida em estudo. A adoção do livro,
das palavras, ler é ter uma compreensão disponibilizado no mercado editorial bra-

1109
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sileiro em meados do primeiro semestre cia e da Adolescência, com a utilização do


de 2011, possibilitou-nos renovar a cons- Método (Con)texto, adotamos um postu-
tatação que publicamos anteriormente ra pedagógica de empoderamento huma-
em Letramentos para um mundo melhor, no capaz de promover aprendizagens e de
sobre a importância da utilização de bons transformar vidas por intermédio da livre
livros para despertar no estudante univer- comunicação e expressão de idéias, pen-
sitário, o desejo de ler e de escrever. Da samentos e sentimentos. Os resultados
angustiante leitura de manuais densos e obtidos indicam o valor da escrita espon-
enfadonhos para o estudo da Psicologia tânea e do registro dos estágios de vida
do Desenvolvimento no Brasil, conta- dos estudantes, em um processo de au-
mos, agora, com um livro que consegue toconhecimento que impulsiona a emer-
fomentar no aprendiz o seu interesse de gência da aprendizagem e da educação,
ler. Melhor ainda, um livro que consegue numa concepção formadora do sujeito
suscitar no sujeito-aprendiz a expressão que aprende. Atribuímos à interdepen-
da palavra que comunica a sua alegria de dência da mediação do professor, do en-
aprender e de querer saber mais sobre gajamento dos estudantes e da relevância
os conteúdos estudados: “professor, que da bibliografia estudada, o êxito obtido no
livro maravilhoso!” A formação do estu- ensino de Psicologia do Desenvolvimento
dante-leitor é uma prioridade nas discipli- em cursos de graduação.
nas que ministramos na Universidade. Em
um processo conjunto de conhecimento Palavras-chave: ensino, livros, letramentos.
e autoconhecimento, que congrega senti-
mentos e pensamentos numa prática de
letramentos, onde o sujeito-palavra deixa UMA EXPERIÊNCIA REFLEXIVA COM
de ser espectador e torna-se interpretan- ESTUDANTES DE PSICOLOGIA SOBRE AS
te, planeja suas idéias, transaciona com o FASES DO DESENVOLVIMENTO
texto, transformamos, juntos, professor e Terezinha Teixeira Joca - UNIFOR
estudantes, a sala de aula em uma comu- terezinhajoca@unifor.br
nidade de aprendizagens cooperativas e
significativas para o empoderamento de O ensino da Psicologia do Desenvolvimen-
vidas. Inseridos no contexto que empode- to reduzia-se, inicialmente, ao estudo da
ra e transforma todos os agentes envolvi- infância e da adolescência. Somente, mais
dos na aprendizagem da Psicologia do De- recentemente, incluímos no programa
senvolvimento, constatamos, a cada nova desta disciplina a adultez e a velhice como
aula, o que definiu Concha Delgado-Gai- fases do desenvolvimento humano. Cons-
tan como resultado de uma prática de em- tatamos, todavia, uma escassez biblio-
poderamento humano: a “revelação dos gráfica que apresente todos os estágios
potenciais de uma pessoa, através da re- da vida de uma forma mais abrangente.
flexão coletiva e diálogo contínuo, onde as No Brasil, embora haja um interesse cada
diferenças cedem espaço para propósitos vez maior no desenvolvimento ao longo
e objetivos comuns – consequentemente, do ciclo vital, há ainda uma concentração
transformando vidas”. Em nossas aulas de no estudo da infância e da adolescência
Psicologia do Desenvolvimento da Infân- (Mota, 2005). Esta comunicação objetiva

1110
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

apresentar uma prática docente inovado- tários. Posteriormente, os aprendizes de


ra, desenvolvida na disciplina Psicologia pesquisadores fizeram a compilação dos
da adolescência, fase adulta e velhice, du- dados coletados, identificando categorias
rante o primeiro semestre de 2011, com nas entrevistas transcritas, analisando os
estudantes do quinto período do curso de dados com a orientação da professora,
Psicologia, em uma Universidade da rede culminando com apresentações dos estu-
particular de ensino. Os estudantes ma- dos realizados pelas equipes de pesquisa.
triculados vivenciaram o papel de copar- A redação de um artigo científico concluiu
ticipes de seu processo de aprendizagem a experiência do estudo com a composi-
e entraram em contato com suas próprias ção de trabalhos portadores de excelente
histórias de vida. Passaram a expressar os qualidade para apresentações em eventos
seus sentimentos de forma transparente, científicos. Enquanto isso, as quartas e
atribuindo sentido a cada texto lido: “tor- sextas-feiras, no mesmo semestre, traba-
na-se até engraçado a forma em que per- lhamos com os textos propostos na biblio-
cebo cada texto retratado sobre os adoles- grafia, servindo de referencial teórico para
centes e acredito que de alguma forma a a análise das pesquisas realizadas. Com
dúvida de saber em que fase eu estou, dei- o diferencial da metodologia proposta,
xa muito a desejar”. Para alcançar o nosso não se fez mais necessário a aplicação de
intuito, adotamos a proposta do Método provas que foram substituídas por apre-
(Con)texto de Letramentos Múltiplos de- sentações das leituras dos textos sugeri-
senvolvido por Francisco Cavalcante Junior dos e a exibição de filmes abordando as
(2001, 2002, 2003), levando os estudantes temáticas das fases do desenvolvimento
a refletir e construir suas autorias a partir humano. Não foi nossa intenção fugir do
dos textos evocativos indicados pelo cur- conteúdo proposto pelo curso, mas de-
so, na bibliografia unificada da disciplina, senvolver uma metodologia que nos pos-
que compreende as visões naturalistas, sibilitasse evocar conteúdos significativos
históricas e culturais, somada a uma pes- no estudante e incentivar, cada um deles,
quisa com o objetivo de discutir as repre- à produção de textos-sentido, “uma es-
sentações sociais de jovens universitários, crita autêntica, que passa pelo aluno, to-
entre 17 e 27 anos, sobre a adolescência, mando significados diferenciados a partir
a adultez e a velhice. Durante o decorrer da experiência singular com a leitura por
do semestre caminhamos semanalmente ele realizada” (Cavalcante Jr., 2003a, p.
com os estudantes, todas as segundas- 87). Dessa forma, abdicamos da visão de
-feiras, na condição de pesquisadores. Re- um ensino fragmentado, focado no uso de
alizamos uma coleta de dados com três vi- provas, atribuição de notas e transmissão
sitas ao campus, entrevistando jovens dos de conteúdos. Convidamos cada estudan-
diversos Centros (Ciências Administrati- te para assumir a corresponsabilidade na
vas, Ciências Humanas, Ciências Jurídicas, construção do saber. Evidencia-se nesta
Ciências da Saúde e Ciências Tecnológi- experiência, conforme nos mostram os
cas) e seus respectivos cursos, atribuindo relatos dos estudantes, que a metodologia
a cada dupla a responsabilidade por seis adotada, apesar ter causado um estranha-
sujeitos, as quais, ao final da pesquisa, mento inicial, imprimiu um novo sentido
realizaram entrevistas com 108 universi- às leituras realizadas, passando o leitor a

1111
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

assumir a responsabilidade de significação Como profissional é preciso ter um olhar


do texto lido com a redação de textos- aberto sobre a infância, adolescência,
-sentido, ricos em reflexões sobre a ado- adulto e velhice”. Se a disciplina despertou
lescência de cada estudante e, ao mesmo um olhar mais apurado, ampliado e cui-
tempo, geradores de inquietações sobre o dadoso sobre cada fase da vida humana,
processo de tornar-se adulto e o medo da consideramos que a finalidade maior de
velhice. Constatamos o desenvolvimento nossa proposta foi alcançada.
de uma aprendizagem vivida e plenamen-
te experienciada por cada aprendiz que se Palavras-chave: pesquisa-ação, letramentos,
fez autor de seus próprios pensamentos, desenvolvimento humano.
idéias e sentimentos. Nos meses seguintes
do semestre letivo, em uma atmosfera in-
timista propiciada pela metodologia ado- MR LT01
tada, os participantes da disciplina em- Mesa Redonda
barcaram na Odisseia do desenvolvimento
humano (Armstrong, 2011) e navegaram
pelos estágios de suas vidas, de seus pais e MR LT01-1054 – PROCESSO DE
de seus avós. Esta vivência deu-se enquan- ENVELHECIMENTO HUMANO E
to elaboravam os seus textos, entravam APOSENTADORIA: PROJETOS DE VIDA E
em contato com suas fases de desenvol- OS PROGRAMAS DE PREPARAÇÃO PARA
vimento, seus medos e suas angústias, ao O PERÍODO PÓS-CARREIRA
mesmo tempo em que se envolviam com Jacqueline F. C. Marangoni - GDF
os seus processos de aprendizagem e de- jac.marangoni@gmail.com
monstravam um maior engajamento com Maria Eugênia de Athayde Nunes - Instituto
a proposta da disciplina: “O trabalho de Agilitá
pesquisa deixou-nos envolvidos durante eugeniaagilita@gmail.com
todo o semestre com algo que certamen- Ana Maria Freitas Coelho - Instituto Agilitá
te nos levou a uma forma de aprendizado anamaria.agilita@gmail.com
mais ampla” (G.M). Com este modelo in- José Eustáquio Moreira de Carvalho - CEFIBRA
trodutório de pesquisa-ação, libertamo- jeustaquio@cefibra.com.br
-nos de um formato de ensino que nos
faz lembrar um “prato-feito” e pudemos O envelhecimento da população mundial,
constatar o nascimento e a descoberta de em particular, no Brasil, apresenta-se em
grandes potencialidades humanas desve- múltiplas experiências de envelhecimento
ladas nas múltiplas formas de expressão e traz importantes desafios para as políti-
do sujeito aprendente em Psicologia do cas públicas de saúde, para o sistema de
Desenvolvimento. Testemunhamos a des- previdência social, para as organizações
coberta de estudantes construtores dos de trabalho, para o sistema familiar e para
seus caminhos acadêmicos. A fala de uma as ciências que tratam do desenvolvimen-
estudante sintetiza o valor da experiência to humano. Na literatura, não há uma de-
aqui apresentada: “essa disciplina é fun- finição consensual sobre velhice, devido
damental para se entender o mundo e a à heterogeneidade das “velhices” expe-
subjetividade que gira pelo ser humano. rimentadas pelos sujeitos. Em um senti-

1112
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do amplo, a velhice pode ser entendida CURSO DE VIDA E PROCESSO DE


a partir de um conjunto de aspectos que ENVELHECIMENTO HUMANO
envolvem múltiplas dimensões, de caráter Jacqueline F. C. Marangoni - GDF
biológico, social, econômico, histórico e jac.marangoni@gmail.com
psicológico. Nesse sentido, esse momento Maria Eugênia de Athayde Nunes - Instituto
do curso de vida consiste em uma cons- Agilitá
trução social e histórica, portanto como eugeniaagilita@gmail.com
tal não pode ser tratado como uma cate- Ana Maria Freitas Coelho - Instituto Agilitá
goria natural. Em grande parte do século anamaria.agilita@gmail.com
XIX, a velhice foi considerada uma fase José Eustáquio Moreira de Carvalho -
de involução e estava vinculada a uma CEFIBRA
visão biomédica que permeava os estu- jeustaquio@cefibra.com.br
dos sobre o desenvolvimento humano e
o envelhecimento, sendo estes processos O envelhecimento da população mundial,
considerados antagônicos. Pode-se dizer em particular, no Brasil, apresenta-se em
que avanços teóricos significativos sobre múltiplas experiências de envelhecimento
o processo de envelhecimento ocorreram, e traz importantes desafios para as políti-
sobretudo a partir da segunda metade do cas públicas de saúde, para o sistema de
século XX, quando a Gerontologia começa previdência social, para as organizações
a marcar seu espaço no campo científico e de trabalho, para o sistema familiar e para
estudos anunciam que o processo de en- as ciências que tratam do desenvolvimen-
velhecimento é também desenvolvimen- to humano. Quando se fala em velhice
to. Um dos elementos significativos desse não há uma definição consensual, devido
cenário refere-se aos preconceitos dire- à heterogeneidade das “velhices” expe-
cionados à população idosa. Entre os mais rimentadas pelos sujeitos. Em um senti-
marcantes, tem-se a percepção de que a do amplo a velhice pode ser entendida
experiência de envelhecer está associada a partir de um conjunto de aspectos que
à dependência e à perda de autonomia, envolvem dimensões biopsicossociais. De-
bem como da capacidade produtiva. A bert (2003) chama atenção para o fato de
proposta em questão tem como objetivo que a velhice consiste em uma construção
central analisar e debater: a) o curso de social e histórica e como tal não pode ser
vida e o processo de envelhecimento hu- tratada como uma categoria natural. Em
mano; b) trabalho, identidade profissional grande parte do século XIX, a velhice foi
e projetos de vida na sociedade contem- considerada uma fase de involução, a qual
porânea; c) o potencial de propostas em estava associada somente a perdas quanto
grupo: uma atividade preventiva para o aos aspectos físico, cognitivo, social e psi-
envelhecimento saudável e o preparo cológico. Esta concepção estava vinculada
para a aposentadoria; d) os programas de a uma visão biomédica que permeava os
preparação para o período de pós-carreira estudos sobre o desenvolvimento huma-
como estratégia de desenvolvimento. no e o envelhecimento, sendo estes pro-
cessos considerados antagônicos (Araújo
Palavras-chave: envelhecimento; & Carvalho, 2005). Até a década de 1940,
aposentadoria; pós-carreira. um número pequeno de pesquisas sobre

1113
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

desenvolvimento se voltou para as temáti- Não há mais espaço para visões que frag-
cas relacionadas à vida adulta e à velhice, mentam o desenvolvimento humano em
sendo esta uma época marcada pela pri- períodos pré-estabelecidos, sucessivos e
mazia dos estudos da Psicologia da Infân- universais (infância, adolescência, maturi-
cia (Rosseti-Ferreira, 2006). Pode-se dizer dade e velhice), nem para abordagens que
que avanços teóricos significativos sobre tomem os grupos de idades segundo uma
o processo de envelhecimento ocorreram, lógica sequencial e linear. Tal movimento
sobretudo a partir da segunda metade do reflexivo emergente oferece espaço para
século XX, quando a Gerontologia começa uma concepção diferenciada acerca do de-
a marcar seu espaço no campo científico. senvolvimento humano no curso de vida
Outro aspecto relevante refere-se ao en- (Castro & Souza, 1995; Rosseti-Ferreira,
tendimento de que o desenvolvimento 2006). Atualmente, a velhice não pode ser
humano é entendido como um processo mais associada a características negativas,
dinâmico que se constitui a partir de uma isto é, esse momento do curso de vida não
rede sistêmica de interações, na qual as está necessariamente vinculado a doenças
dimensões sociais, históricas e culturais e incapacidade. A velhice bem sucedida
estão imbricadas dialeticamente. Compre- consiste em uma realidade concreta e que
ender a gênese social do desenvolvimento transforma a imagem das pessoas idosas
humano implica em considerar que as rela- no século XXI (Neri, 1995, 2002, 2004;
ções sociais constituem “arena e motor do Freire, 2000; Rocha-Coutinho, 2006). Esta
processo de desenvolvimento” (Rosseti- nova imagem sobre o envelhecimento
-Ferreira, Amorim & Silva, 2004, p. 24). A configura-se tanto na literatura específica
partir dessa compreensão, o processo de quanto na rede de significações que atra-
envelhecimento é visto como também de vessa o cotidiano popular, e é divulgada
desenvolvimento. Nesse contexto, Erikson principalmente na mídia e nos mercados
(1976) é um autor de extrema relevân- econômico e estético. Portanto, para se
cia na compreensão de como a velhice entender o processo de envelhecimento e
tornou-se alvo de investigações em Psico- a velhice é fundamental considerar esses
logia. Sua teoria foi inovadora ao integrar fenômenos em associação com o contex-
a experiência do envelhecimento como to sociocultural e histórico no qual estão
parte do processo de desenvolvimento inseridos e entender que a velhice supera
humano, insistindo que este não cessa atribuições cronológicas. Cada pessoa ex-
após a adolescência, como preconizavam perimenta o meio social de forma singular,
as pesquisas tradicionais. Neste novo mi- do qual participa de forma mais ou menos
lênio, novos processos de construção de ativa, conforme os condicionantes históri-
significados sobre a velhice se constituem co-culturais para as oportunidades de par-
na prática científica e no senso comum. A ticipação. É preciso levar em conta toda
nova concepção de desenvolvimento hu- uma realidade imaginária dependente de
mano que respeita as idiossincrasias e o juízos de valor, crenças, atitudes, ações, re-
contexto no qual o indivíduo está inserido presentações sociais relacionadas a épocas
exige um “olhar” interdisciplinar e contex- históricas, enfim, um leque de situações
tualizado sobre os fenômenos humanos em que o pensar, o sentir e o agir afetam
investigados ao longo do curso de vida. e são afetados por múltiplos fatores. Um

1114
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos elementos de grande expressão desse inserção social e status atribuído ao cargo
cenário relaciona-se aos preconceitos dire- e função exercida pelo trabalhador. Além
cionados à população idosa. Entre os mais de ser fonte de sobrevivência é também
marcantes, tem-se a percepção de que a organizador da vida diária e instrumento
experiência de envelhecer está associada de realização. Existe, portanto, valorização
à dependência e à perda de autonomia, pela sociedade das pessoas inseridas em
bem como da capacidade produtiva. Em uma vida produtiva. O fato é que o ser hu-
uma sociedade em que o fenômeno do mano prescinde do trabalho para se inserir
aumento da longevidade é significativo, no mundo contemporâneo, permitindo-
torna-se indispensável rever valores, cren- -lhe a expressão de si mesmo, o desen-
ças e atitudes frente ao processo de desen- volvimento de competências, assim como
volvimento humano e de envelhecimento, favorece a concretização de projetos de
identificando seus desafios para esse novo vida e realizações pessoais e profissionais.
século, sobretudo, em razão das distintas Borges e Tamayo (2001, p. 13) afirmam
experiências de envelhecer. Assim, é pre- que o trabalho “é meio de produção da
ciso que os contextos relacionais e edu- vida de cada um, promovendo a subsistên-
cativos assumam a temática em questão cia, criando sentidos existenciais ou contri-
como prioridade, na tentativa de se cons- buindo na formação da personalidade e da
truir uma sociedade que trate as pessoas identidade”. A identidade de uma pessoa
ao longo de todo o curso de vida a partir é a constituição psíquica que a distingue
de princípios éticos, de cidadania e justiça. das outras e está fortemente relacionada
às relações sociais que cada um estabelece
Palavras-chave: curso de vida; com o mundo. Um sistema de habilidades
desenvolvimento; envelhecimento; desenvolvidas ao longo da vida, que define
e a faz ser o que é. O trabalho e as rela-
ções interpessoais são aspectos que estão
TRABALHO, IDENTIDADE PROFISSIONAL vinculados ao processo de construção da
E PROJETOS DE VIDA NA SOCIEDADE identidade. Desta maneira, a pessoa cos-
CONTEMPORÂNEA. tuma perceber seu valor ligado àquilo que
Jacqueline F. C. Marangoni - GDF produz. Assim, a ocupação profissional é
jac.marangoni@gmail.com parte da autoimagem, da autoestima e do
Maria Eugênia de Athayde Nunes - Instituto sentimento de pertencimento. Vale con-
Agilitá siderar que o aumento da expectativa de
eugeniaagilita@gmail.com vida na sociedade contemporânea promo-
Ana Maria Freitas Coelho - Instituto Agilitá ve diferentes desafios qualitativos, entre
anamaria.agilita@gmail.com eles a aposentadoria. Uma situação a ser
José Eustáquio Moreira de Carvalho - CEFIBRA confrontada: aposentadoria X mais tem-
jeustaquio@cefibra.com.br po no mercado de trabalho. O fenômeno
do aumento da longevidade faz com que
O trabalho configura-se como questão as pessoas vivenciem o papel profissional
central para o desenvolvimento da socie- por um período maior de tempo, exigin-
dade e do indivíduo. Ocupa um papel im- do novas posturas das organizações de
portante na vida das pessoas, é razão de trabalho e dos trabalhadores. O desliga-

1115
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mento por motivo de aposentadoria não O POTENCIAL DE PROPOSTAS EM


significa improdutividade. As experiências GRUPO: UMA ATIVIDADE PREVENTIVA
de envelhecimento ativo provocam novas PARA O ENVELHECIMENTO SAUDÁVEL E
necessidades e demandam novos enga- O PREPARO PARA A APOSENTADORIA
jamentos sociais. O trabalhador precisa, Jacqueline F. C. Marangoni - GDF
então, investir em novos projetos de vida jac.marangoni@gmail.com
que possam organizar sua vida pessoal e Maria Eugênia de Athayde Nunes - Instituto
profissional na fase de pós-carreira. Uns Agilitá
precisam continuar em trabalhos remune- eugeniaagilita@gmail.com
rados, como fonte de complementação de Ana Maria Freitas Coelho - Instituto Agilitá
renda, outros poderão se preparar e pla- anamaria.agilita@gmail.com
nejar outras atividades que independem José Eustáquio Moreira de Carvalho -
de remuneração. Uma alternativa para as CEFIBRA
questões abordadas poderá ser o desen- jeustaquio@cefibra.com.br
volvimento do aprendizado voltado para a
elaboração de projetos de vida, que servirá Do ponto de vista biológico, o envelheci-
tanto para cuidar do aspecto relacionado mento é um processo que acarreta uma
à trajetória de vida quanto nas dimensões maior fragilidade ao organismo e a dimi-
pessoal e profissional. O projeto de vida é nuição gradual da sobrevivência, não sig-
um instrumento de planejamento voltado nificando o adoecimento patológico (Vit-
para a trajetória de vida. Um exercício que ta, 2000). Para uma considerável parcela
leva a ressignificação da historia pessoal, da população idosa é possível manter uma
bem como a definição de novas metas. A boa qualidade de vida e um razoável fun-
preparação para a aposentadoria, as defi- cionamento do organismo ao longo desse
nições de novos rumos, um plano de ação período. A qualidade vida nessa fase irá
em andamento, afetarão positivamente depender da forma como cada pessoa vi-
os elementos profissionais, familiares, fi- veu o seu processo de desenvolvimento e
nanceiros, sociais e culturais de maneira a de cuidados para consigo mesma. O en-
propiciar autonomia, realização pessoal e velhecimento saudável implica em apren-
qualidade de vida. Enfim, o trabalho con- der a lidar com as perdas e as mudanças
siste em importante ponto de referência e biopsicossociais que envolvem esta fase
pertencimento na sociedade contemporâ- da vida. Para que isso ocorra, não basta
nea, sendo fundamental para o processo apenas que o indivíduo tome consciên-
de construção da identidade. Consideran- cia de si mesmo, é importante também,
do isso, torna-se indispensável a promo- que a sociedade, as organizações e as
ção de espaços de debate e reflexão sobre instituições invistam em trabalhos pre-
o tema, com foco no desenvolvimento de ventivos que preparem as pessoas para
novas metas, redes sociais e projetos de aprenderem a lidar com o envelhecer e o
vida no período de transição vivido com a processo de aposentadoria que costuma
experiência da aposentadoria. chegar acompanhado de sentimentos de
baixa autoestima, desvalorização do eu e
Palavras-chave: trabalho, identidade, projetos de outras perdas, muitas vezes acompa-
de vida. nhadas de doenças físicas e emocionais

1116
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

comprometendo o desempenho profis- de criação de possibilidades e projetos


sional. Em alguns casos chegando a cau- de vida (Zimerman, 1997). Diante do ex-
sar outros danos pessoais como o afasta- posto, criamos o projeto: grupo, atividade
mento precoce da vida produtiva, devido preventiva para o envelhecimento sau-
a doenças como a depressão, alcoolismo dável e o preparo para a aposentadoria,
e outros transtornos mentais. Diante do é uma proposta de trabalho através de
exposto, os grupos são apontados como técnicas das oficinas em dinâmica de gru-
um recurso muito utilizado pela psicolo- po. O nome dado ao grupo foi Viva bem
gia para trabalhar conflitos emocionais, a velhice e tem como público alvo pesso-
favorecendo um espaço de escuta, de as que estão se aproximando da fase que
apoio e de trocas de experiências entre chamamos de terceira idade, com idade a
as pessoas. Nesse sentido, a Organização partir de 58 ou superior a 60 anos ou em
Mundial da Saúde estipulou a idade de 60 fase de preparo para a aposentadoria. O
anos para marcar o início da velhice em foco do grupo é trabalhar temas referen-
países em desenvolvimento, e 65 anos, tes ao envelhecimento e a aposentadoria
em países desenvolvidos. Por volta dessa visando à promoção e à prevenção da
idade, acentuam-se as transformações saúde mental e a qualidade de vida na ve-
biológicas e costuma acontecer o afasta- lhice. Os objetivos deste grupo são: traba-
mento do mundo do trabalho – a aposen- lhar temas referentes á aposentadoria e
tadoria . A afiliação a grupos possibilita à ao envelhecimento saudável e as formas
pessoa idosa dispor de uma rede social, de prevenção. A metodologia envolve dis-
onde se sente compreendida pelas outras cussões de temas escolhidos pelos parti-
participantes, fazendo-a se sentir acolhi- cipantes, técnicas de dinâmica de grupo,
da e importante. A intervenção grupal é filmes, associação livre de idéias, entre-
uma das formas consideradas eficazes vistas, dramatizações, uso da música, co-
para trabalhar os sintomas do envelheci- lagens, pequenos textos para discussão
mento, pois proporciona aos idosos uma no grupo, depoimentos dos participantes.
rede de suporte e apoio, um espaço aco- Este trabalho aconteceu em uma clínica
lhedor para falar sobre suas vidas e para privada em Brasília-DF, durante 5 anos, os
melhorar os relacionamentos interpesso- encontros eram semanais. Era realizado
ais, a qualidade de vida, a autoestima e por uma dupla de psicólogas. O grupo es-
autoconfiança, bem como a diminuição colhia os temas para serem trabalhados.
de sentimentos de impotência e solidão Foram feitos muitos encaminhamentos
(Kaplan & Sadock, 1997). Podemos pre- para o psiquiatra, devido a problemas de
venir o processo de adoecimento com depressão e ansiedade. Outro elemento
intervenções de prevenção para promo- para debate e intervenção psicológica evi-
ver saúde e qualidade de vida, sendo as denciou-se: relacionamento conjugal e fa-
atividades grupais as mais indicadas. Os miliar; queixas de solidão e falta de apoio
grupos permitem aos idosos a abertura dos filhos, que muitas vezes eram agressi-
de um novo espaço adequado ao extra- vos e exploradores na área financeira. O
vasamento de emoções, pois estimulam grupo teve uma função de acolhimento,
o sentimento de valorização facilitando apoio, compreensão para as dificuldades
o processo de novos contatos sociais e trazidas. No decorrer do processo grupal

1117
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

eram feitas avaliações junto ao grupo. En- realidade profissional pode ocasionar
fim, o trabalho terapêutico e em grupo processos de sofrimento, sobretudo para
possibilitou o enfrentamento das dificul- as pessoas que não se prepararam para a
dades apresentadas pelos participantes. aposentadoria. A criação de espaços de
fala e reflexão no ambiente de trabalho
Palavras-chave: idosos, grupo, aposentadoria. pode propiciar a oportunidade para a pre-
paração para o período de pós-carreira,
especificamente, no que se refere ao estí-
PROGRAMAS DE PREPARAÇÃO PARA O mulo e apoio quanto a elaboração de um
PERÍODO PÓS-CARREIRA projeto de vida consistente e responsável.
Jacqueline F. C. Marangoni - GDF Neste sentido, o Estatuto do Idoso, no ar-
jac.marangoni@gmail.com tigo 28 declara que o poder público criará
Maria Eugênia de Athayde Nunes - Instituto e estimulará o desenvolvimento de pro-
Agilitá gramas de preparação para a aposenta-
eugeniaagilita@gmail.com doria: “II - Preparação dos trabalhadores
Ana Maria Freitas Coelho - Instituto Agilitá para a aposentadoria, com antecedência
anamaria.agilita@gmail.com mínima de 1 (um) ano, por meio de es-
José Eustáquio Moreira de Carvalho - tímulo a novos projetos sociais, confor-
CEFIBRA me seus interesses, e de esclarecimento
jeustaquio@cefibra.com.br sobre os direitos sociais e de cidadania”.
Os Programas de Preparação para a Apo-
O período que antecede a aposentadoria sentadoria possuem caráter educativo e
é um momento a ser considerado como ainda configuram-se como ferramenta
uma fase importante no ciclo de vida dos importante na política de Gestão de Pes-
trabalhadores. Ocorre no período em que soas das organizações de trabalho con-
o envelhecimento se expressa com mu- temporâneas. O desenvolvimento destes
danças marcantes e significativas. Princi- programas traz benefícios importantes
palmente, para aqueles que tiveram o tra- para a organização, tais como: clima or-
balho como uma das importantes fontes ganizacional favorável; contribuição para
de realização. Aspectos psicossociais refe- a Gestão do Conhecimento, sem ruptura
rentes ao processo de envelhecer estarão entre as gerações e perdas de valores tec-
presentes, questões relacionadas à dinâ- nológicos e culturais da organização; fa-
mica familiar: o reencontro do casal, os fi- cilita o processo de sucessão, além de se
lhos que ainda permanecem em casa, ou constituir em uma prática de Responsabi-
que começam a sair de casa, a divisão dos lidade Social Interna. Entre os benefícios
espaços emocionais e físicos, a retoma- para o trabalhador tem-se visualização da
da de projetos, sonhos, o redimensiona- pós-carreira como um conjunto de novas
mento das finanças pessoais, os aspectos possibilidades e de autorrealização; ofe-
legais envolvidos fazem parte do proces- rece subsídios para a tomada de decisão,
so de tomada de decisão. Diante de um manutenção da autoestima e ampliação
processo que permeia a noção de perda dos horizontes pessoais e funcionais;
de status e poder, uma ruptura com uma motivação para substituir a satisfação de-
rivada do trabalho para a elaboração de

1118
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

um projeto de vida com a perspectiva de nas mais diversas sociedades. Porém,


uma aposentadoria ativa; valorização da investigações sistemáticas sobre o tema
experiência e reconhecimento; ameniza começaram há um pouco mais de um sé-
conflitos internos e tensões, ao tempo culo e desde então muitas controvérsias
em que permite a adoção de atitude posi- têm permeado as pesquisas. Uma ampla
tiva, participativa e responsável até o dia discussão no campo diz respeito à concei-
da aposentadoria/desligamento; melhor tuação da superdotação, principalmente
preparo para o retorno ao lar e o conví- quando se salientam conceitos como in-
vio com a família. Enfim, as organizações teligência, talento e criatividade. Contu-
de trabalho contemporâneas assumem do, como inteligência e criatividade não
importante papel no processo de prepa- têm uma definição única e global, os pro-
ração para o período pós-carreira, contri- fissionais da área pontuam a necessidade
buindo para uma transição responsável e de uma definição operacional da super-
consciente para novos momentos do cur- dotação e do talento para tornar possível
so de vida pessoal e profissional. a aplicabilidade destes conceitos em sala
de aula. É objetivo desta mesa abordar al-
Palavras-chave: organizações de trabalho, gumas variáveis que permeiam o desen-
pós-carreira, programas de preparação para a volvimento do potencial humano, salien-
aposentadoria, tando aspectos da inteligência, criativida-
Contato: Jacqueline Ferraz da Costa de e altas habilidades que nos ajudem a
Marangoni – Especialista em Políticas Públicas entender a complexidade do sujeito em
do Governo do Distrito Federal – GDF – jac. seu ambiente afetivo e sócio-cultural.
marangoni@gmail.com Embora ainda não se tenha chegado a um
consenso sobre as intrincadas teias de re-
lação entre aspectos inatos e aprendidos
MR LT01 no desenvolvimento, a identificação dos
fatores internos e externos que impulsio-
Mesa Redonda nam ou inibem o pleno desenvolvimento
de um talento excepcional deve ser apre-
endido. Modernas teorias do desenvolvi-
MR LT01-1517 – INTELIGÊNCIA, mento destacam que os seres humanos
CRIATIVIDADE, E ALTAS HABILIDADES: possuem potenciais genéticos muito além
DESDOBRAMENTOS PARA A PSICOLOGIA do que são capazes de manifestar e tais
DO DESENVOLVIMENTO potenciais não realizados podem ser atu-
Angela M. Rodrigues Virgolim - UnB alizados por meio da exposição a proces-
Jane Farias Chagas - UnB sos proximais ou oportunidades ambien-
Mônica Souza Neves-Pereira - UnB tais que tornem tais processos maxima-
Vera Lucia Palmeira Pereira - UnB mente efetivos. Teorias contemporâneas
da superdotação incluem a criatividade
O interesse pelas pessoas que se desta- como um dos fatores essenciais para o
cam por suas capacidades superiores ou desenvolvimento do talento. No entanto,
inusitadas em algum campo do conheci- torna-se fundamental perceber a criati-
mento não é novo e tem sido observado vidade em suas origens e processos, en-

1119
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tendendo os caminhos desenvolvimen- O DESENVOLVIMENTO SÓCIO-


tais que orientam a imaginação criativa EMOCIONAL E ASSINCRÔNICO DA
no encontro do sujeito com a cultura. Na PESSOA COM ALTAS HABILIDADES/
essência do processo criativo encontra-se SUPERDOTAÇÃO NA PERSPECTIVA DE
a função imaginativa que, intimamente KAZIMIERZ DABROWSKI
vinculada às emoções e à realidade, per- Angela M. Rodrigues Virgolim - UnB
mite ao sujeito retirar fragmentos da rea- angela.virgolim@gmail.com
lidade e, por meio de novas significações
subjetivas destes fragmentos, devolver à A literatura mais moderna na área de su-
cultura leituras renovadas desta mesma perdotação tem se voltado, nos últimos
realidade. Na mesma direção, o estudo anos, para o estudo e a descrição do de-
e o entendimento dos aspectos afetivos senvolvimento sócio-emocional da pessoa
da pessoa com altas habilidades/super- com altas habilidades. No entanto, pesqui-
dotação se torna essencial, se quisermos sas nesta área indicam que este grupo é
abarcar a complexidade do seu universo altamente heterogêneo e apresenta uma
psicológico. A literatura mais moderna na enorme variabilidade de características,
área do talento indica que este grupo é sejam elas no campo cognitivo, emocional
altamente heterogêneo e apresenta uma ou social, o que dificulta, inclusive, o uso
enorme variabilidade de características; de uma única definição de superdotação
mas quanto maior a capacidade intelec- (Callahan, 2009; Cross, 2005; Fertig, 2009;
tual da pessoa, maior é a sua assincronia Gillespie, 2009; Klein, 2007; Neihart, Reis,
com relação aos pares, e maior a sensibi- Robinson & Moon, 2002; Silverman, 1993;
lidade e intensidade com que vivenciam Strip & Hirsch, 2000; Webb, Gore, Amend
o mundo. Mas é na sala de aula que o ta- & DeVries, 2007). No entanto, os autores
lento passa efetivamente a ser valorizado parecem concordar que a pessoa super-
ou desprezado pelo ambiente cultural, dotada e talentosa demonstra habilidades
trazendo conseqüências para o sentimen- (ou potenciais) em um ou mais domínio
to de “pertencer” desse grupo de alunos socialmente aceitável e são suficiente-
em seus contextos educacionais. Pesqui- mente avançadas para requerer adapta-
sas indicam que, em muitos ambientes ção do ambiente para suprir suas neces-
que se dizem inclusivos, os alunos com sidades especiais (Robinson, 2002), entre
altas habilidades e talentos diferencia- elas as necessidades sócio-afetivas. Para
dos permanecem transparentes e imunes Silverman (1993, 2009) a superdotação
ao ensino de qualidade para todos, que não é meramente uma precocidade, mas
deixa de atender os estudantes em suas uma diferença na experiência interna e na
necessidades especiais. Desta forma, consciência desses indivíduos, a que ela
torna-se imperativo entender a educação denomina assincronia. Ter um desenvolvi-
do superdotado em um contexto de reno- mento assincrônico significa, literalmente,
vação pedagógica atento às diferenças in- não estar em sincronia com os pares; ou
dividuais, à construção da cidadania e da ter um desenvolvimento desigual da idade
participação social. mental com relação à idade cronológica, o
que pode se dar tanto interna quanto ex-
ternamente. Roeper (2000) assinala que,

1120
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

quanto maior a capacidade intelectual da traços é também responsável por deter-


pessoa, maior é a sua assincronia com re- minar o nível de desenvolvimento moral a
lação aos pares, e maior sua sensibilidade que uma pessoa pode chegar em circuns-
e consciência das suas diferenças. O de- tâncias ideais (Fortes, 2004; Tieso, 2009).
senvolvimento assincrônico também assi- Assim, é a grande complexidade cogniti-
nala habilidades cognitivas avançadas que va que permite a ela assumir o ponto de
se combinam com a grande intensidade vista dos outros, a reconhecer injustiças,
com que estas pessoas vivenciam o mun- a criar um forte sistema de valores, e a
do, proveniente da facilidade com que se tornar mais emocionalmente reativa
elas acumulam informações e emoções, ao ver comportamentos que violam esse
mas em uma quantidade maior do que sistema (Silverman, 1993). Segundo Da-
ela pode absorver e processar. A intensi- browski, a criança superdotada já vem ao
dade emocional do superdotado tem sido mundo equipada com um sistema nervo-
estudada por vários pesquisadores, sen- so supersensível, que a permite assimilar
do a Teoria da Desintegração Positiva do uma quantidade extraordinária de estí-
psiquiatra e psicólogo polonês Kazimierz mulos sensoriais. Esta supersensibilida-
Dabrowski (1902-1980) a mais discutida de11 (a que seus tradutores denominam
pela literatura contemporânea (Daniels overexcitability) faz a criança superdotada
& Piechowski, 2009; Piechowski, 1997; ser bastante perceptiva e sensível, discri-
Piechowski & Colangelo, 1984; Silverman, minando mais acuradamente os detalhes
1993, 2008; Tieso, 2009; Tillier, 2008). de um estímulo, o que acaba por torná-la
Esta teoria passou também a ser conhe- mais analítica e crítica de si mesmo e dos
cida por Teoria do Desenvolvimento Emo- outros. Esta supersensibilidade é respon-
cional, pela ênfase colocada no papel das sável pela forma com que a pessoa en-
emoções no desenvolvimento da pessoa tende, atua e responde ao mundo (Tieso,
com altas habilidades. O ponto principal 2009) e pode ser entendida como uma su-
da teoria diz respeito ao desenvolvimen- perabundância de energia ou capacidade
to cognitivo avançado do indivíduo, o qual de exuberância e maiores possibilidades
requer a ruptura das estruturas psicológi- de processar uma experiência (Silverman,
cas existentes a fim de formar outras es- 2008). Piechowski (1997) acredita que as
truturas mais desenvolvidas. O conflito in- super-sensibilidades podem ser mais pre-
terior gera uma grande tensão que impele valentes em indivíduos criativos e com
o indivíduo a níveis mais elevados de fun- altas habilidades do que na população ge-
cionamento. Assim, a desintegração posi- ral, especialmente à luz das necessidades
tiva se traduz pela passagem do descon- sociais e emocionais deste último grupo.
tentamento com as formas de ser e estar Dabrowski afirma que a expressão de cada
no mundo para uma forma mais altruísta, forma de supersensibilidade nestas pesso-
de maior integridade e maior compaixão. as se dá em um maior nível que a média e,
A preocupação com os sentimentos do como resultado, uma pessoa dotada com
outro, com outras formas de vida e com o diferentes formas de supersensibilidades
futuro da humanidade são constantemen- vê a realidade de uma forma diferente,
te observados ainda na infância da pessoa
superdotada. Esta dotação genética de 11
Tradução nossa.

1121
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mais forte e multifacetada. A sensibilida- pectiva ambiental proclamam a educação


de aumentada significa assim uma forma e o treinamento precoce como fatores de
de interação mais frequente com uma preponderância para o desenvolvimento
gama maior de experiência com o mundo do talento (Dai & Coleman, 2005). Nesse
(Silverman, 2008). A supersensibilidade a sentido, postulam que o talento é produto
que se refere Dabrowski pode se manifes- do ambiente, sendo construído e amplia-
tar em cinco grandes áreas: a psicomoto- do por meio de estimulação precoce ou
ra; a intelectual; a área da imaginação; a treinamento intensivo. Estudos clássicos
área sensual; e a área emocional (Daniels desenvolvidos por Bloom (1982) e Erick-
& Piechowski, 2009; Daniels & Meckstro- son, Kramer e Tesch-Romer (1993) pare-
th, 2009; Piechowski, 1997; Piechowski & cem indicar que os participantes de suas
Colângelo, 1984; Silverman,1993, 2008; pesquisas começaram como crianças co-
Tieso, 2009; Tillier, 2008). É objetivo des- muns, que tinham pais e professores de-
te artigo discutir as diferentes formas e a dicados que os motivaram ao treinamento
complexidade com que essa supersensibi- intensivo de habilidades específicas e à
lidade se manifesta no indivíduo com altas prática deliberada visando desempe-
habilidades/superdotação, refletindo so- nho de alta eficiência. Estudos realizados
bre as necessidades sócio-afetivas deste por Thompson e Plomin (1993) e Plomin
grupo e as implicações de um desenvol- (1999) sobre a influência genética nos
vimento assincrônico para o indivíduo em níveis de inteligência demonstram que a
seu meio sociocultural. variação genética tem correlação com a
inteligência elevada. Os fatores hereditá-
Palavras-chave: superdotação, assincronia, rios tendem a influenciar de maneira di-
Teoria de Dabrowski versa os processos cognitivos superiores
ao longo do curso de vida, criando efeitos
fenótipos, levando os indivíduos a selecio-
O DESENVOLVIMENTO DO TALENTO AO nar ou criar ambientes que promoveriam
LONGO DO CURSO DE VIDA: QUESTÕES suas propensões genéticas (Gagné, 2004;
GENÉTICAS E AMBIENTAIS Gagné & Schader, 2006; Plomin, 2000;
Jane Farias Chagas - FTBB/UnB Simonton, 2004). Apesar dos resultados
janefcha@gmail.com encontrados pelos dois grupos de pesqui-
sadores confirmarem seus pressupostos
De acordo com Simonton (2002, 2005a, iniciais, esses achados demonstram a im-
2005b), a definição e desenvolvimento portância do trabalho árduo ou estímulo
do talento giram em torno das questões precoce no desenvolvimento de habilida-
genéticas e ambientais. De um lado, há des superiores, porém não invalidam ou
aqueles que consideram o talento como descartam o papel das habilidades inatas
resultado de superestimulação ambiental para o desenvolvimento do talento. Para
ou modelagem de demandas sócio-histó- Bronfenbrenner (1994), os seres humanos
rico-culturais. Por outro lado, há aqueles possuem potenciais genéticos muito além
que descartam a capacidade ambiental de do que são capazes de manifestar e tais
modificar os traços genéticos herdados. potenciais não realizados podem ser atua-
Os pesquisadores que adotam uma pers- lizados por meio da exposição a processos

1122
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

proximais ou oportunidades ambientais monton, 2001, 2002; Winner, 1998, 2000).


que promovam estabilidade e recursos Podemos destacar, ainda, uma crescente
que tornem tais processos e potenciais valorização das bases biológicas para o
maximamente efetivos. Na mesma dire- desempenho cognitivo superior associada
ção, as análises genéticas multivariadas de forma complexa a variáveis ambientais
relacionadas às habilidades cognitivas de contextos compartilhados e não-com-
específicas têm indicado que os mesmos partilhados (Simonton, 2002). A combina-
fatores genéticos influenciam um grande ção entre uma configuração de interesses,
número de habilidades diferentes e que, capacidades e valores em permanente
por outro lado, qualquer que seja a ha- evolução e os nichos familiares, educacio-
bilidade, ela não pode ser atribuída ao nais e ocupacionais, em constante trans-
efeito principal de um único gene, mas à formação, produzem múltiplos efeitos
associação de múltiplos genes (Palácios, e conjugam aspectos subjetivos e mul-
2004; Simonton, 2001). Essas descober- tidimensionais tanto para forjarem uma
tas trazem algumas implicações ao estu- trajetória de vida única, quanto certos
do do desenvolvimento do talento: (a) o tipos de talento (Papierno, Ceci, Makel &
domínio de algumas habilidades especí- Williams, 2005; Simonton, 2002, 2005b).
ficas depende da configuração de vários Dentro de uma concepção bioecológica
componentes genéticos; (b) um mesmo do desenvolvimento, segundo Papierno,
traço pode contribuir para o desenvolvi- Ceci, Makel e Williams (2005), o talento
mento de mais de um tipo de talento; (c) ou a ontogenia das competências excep-
dois indivíduos com o mesmo talento não cionais estariam fundamentadas em dois
possuem no mesmo nível ou ordem os princípios: (a) a ação de efeitos múltiplos
mesmos traços genéticos; (d) a distribui- sobre as interações recíprocas entre os
ção do talento na população não segue, indivíduos e os ambientes que pavimen-
necessariamente, a curva normal, uma tam os padrões de desenvolvimento de
vez que não se trata de adição linear de habilidades superiores e (b) as condições
traços, mas de uma configuração múltipla; iniciais que são derivadas da combinação
(e) um componente que pode desencade- entre traços inatos e aprendidos que cons-
ar o processo de desenvolvimento do ta- tituem o potencial máximo a ser realizado
lento em uma pessoa pode ser irrelevante ou atualizado. Nessa direção, os proces-
para o desenvolvimento do mesmo talen- sos proximais assumem papel de extre-
to em outra pessoa; (f) a capacidade inata ma relevância, uma vez podem facilitar e
para uma performance excepcional pode ampliar as possibilidades de aquisição de
mudar, desaparecer ou estabilizar ao lon- habilidades relevantes para um domínio
go do tempo; (g) a mediação ou interven- específico e prover diversidade de condi-
ção educativa precoce é necessária para o ções iniciais, endógenas e exógenas, para
desenvolvimento do talento; (h) a posição o desenvolvimento dessas habilidades. É
na família, ordem biológica ou funcional, possível que a falta de consenso entre os
precisa ser investigada à luz da dinâmica pesquisadores sobre a qualidade e quan-
familiar e (i) alguns traços ou tipos de ta- tidade da influência dos fatores genéticos
lento emergem apenas quando uma con- e ambientais para a realização máxima
figuração total de genes é transmitida (Si- do potencial inato de cada indivíduo ou o

1123
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aparecimento de certos talentos ao longo científico, a construção de distintos cami-


do curso de vida ainda persista por mais nhos metodológicos que buscam inves-
alguns anos. No entanto, é relevante reco- tigaro ato de criar como expressão típica
nhecer a complexidade multidimensional do homem. Este trabalhorepresenta um
dos processos inerentes ao desenvolvi- destes caminhos, onde optaremos poru-
mento do talento, que vão tecendo uma ma leitura sociogenética do fenômeno
rede intricada de relações que formatam criativo, inserido na história do comporta-
trajetórias de vida únicas e que ampliam mento do homem, com destaque para as
os tremendos recursos genéticos e am- instâncias sociais e culturais que definem
bientais à disposição da civilização hu- os processos de subjetivação humana,
mana. Nesse sentido, as palavras finais sempre circunscritos ao tempo histórico
de Terman, proferida em conferência re- e seus respectivos contextos. Criatividade,
alizada na Universidade da Califórnia em sob esta ótica, é fenômeno desenvolvi-
1954 nos parecem muito atuais: Identifi- mental mediado por significados culturais
car os fatores internos e externos que aju- que dialogam com outras instâncias cons-
dam ou dificultam a fruição de um talento titutivas do homem, como: a construção
excepcional, e medir a extensão de suas do sujeito, seus processos de desenvolvi-
influências, estão certamente entre os mento e aprendizagem, a ação educativa
grandes problemas de nossa época. Esses e, especialmente, o desenvolvimento do
problemas não são novos: sua existência potencial criativo que emerge deste cal-
tem sido reconhecida por um número sem do relacional e contextual. Acreditamos
fim de homens, desde Platão até Francis que somente por meio de um diálogo sis-
Galton. O que é novo é a consciência geral temático, sistêmico, dialético e profundo
de sua existência causada pela escassez entre estas instâncias será possível com-
de cientistas, engenheiros, líderes morais preender a criatividade em suas origens
e estadistas, literatos e professores de que e processos. Para Vygotsky, autor com
precisa o país para sobreviver num mundo enfoque sociogenético, criatividade e ima-
ameaçado (Terman, 1971, p. 22). ginação são funções psicológicasque se
desenvolvem de modo paralelo e que se
Palavras-chave: desenvolvimento, talento, encontrarão muitas vezes ao longo da vida
curso de vida. do sujeito, articulando-se, rejeitando-se,
ajustando-se até formarem um sistema,
por ele denominado Imaginação Criativa.
A IMAGINAÇÃO CRIATIVA: ONDE Vygotsky compreende as funções psicoló-
SUJEITO E CULTURA SE ENCONTRAM gicas como processos interdependentes,
PARA MODIFICAR O MUNDO. dialeticamente relacionadas e destaca a
Mônica Souza Neves-Pereira - UnB presença da emoção e do afeto como in-
monicasouzaneves@yahoo.com.br tegrantes da função pensamento. Para
ele, a imaginação também atua como
A Psicologia vem, ao longo do tempo, função psicológica intimamente vincu-
destacando o papel da criatividade como lada às emoções. Todas estas funções se
fenômeno humano de grande relevância desenvolvem e operam de modo inter-
para a sociedade. É notória, no campo dependente, muitas vezes em processos

1124
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cooperativos ou concomitantes, outros senvolvimento da imaginação com a linha


em processos competitivos ou desencon- do pensamento, que são distintas em suas
trados. Porém, quando a imaginação e a trajetórias. A fala interna é que funciona-
criatividade se encontram em certa etapa rá como mecanismo de elevação da ima-
do desenvolvimento infantil e se unem, ginação ao status de função superior no
geram um sistema denominado Imagina- psiquismo humano. Do mesmo modo que
ção Criativa que vai, por sua vez, trilhar regula as funções mentais humanas, a fala
seus caminhos desenvolvimentais até interna vai regular a expressão da imagi-
encontrar as linhas do pensamento e da nação, colaborando nas interações que
linguagem e, aí sim,alcançar o status de ocorrerão entre imaginação e pensamen-
Função Psicológica Superior. Neste mo- to conceitual, lógico e formal. As relações
mento, segundo Vygotsky, o sujeito está estabelecidas por Vygotsky entre a fala, o
pronto para intercambiar com a cultura os brincar e a imaginação pressupõem a ori-
sentidos, significados e mensagens recebi- gem sociogenética da imaginação criativa.
das, de uma direção interpsicológica para Sendo assim, torna-se difícil compreender
a internalização intrapsicológica, prepa- os processos de imaginação desvincula-
rando o cenário para a geração do novo. dos da realidade. No senso comum, e para
Vygotsky compreende a imaginação como grande parte de pesquisadores e cientis-
atividade mental totalmente compatível tas de diversas áreas, os processos imagi-
com a realidade. Os conteúdos que cons- nativos correspondem a delírios oníricos,
tituem a imaginação são retirados da re- oriundos de necessidades emocionais in-
alidade e, posteriormente, transformados dividuais, sem correspondência com a re-
e/ou recombinados pela função imagina- alidade e com os processos de pensamen-
tiva, construindo novas realidades. Sendo to formal. Para Vygotsky, a imaginação só
assim, a atividade criativa, originária da é possível se alimentada pelos elementos
função da imaginação, é uma ação relacio- da cultura, pelo conhecimento, saberes,
nada com a interpretação da realidade fei- informações, conceitos, sentidos e sig-
ta pelos sujeitos e depende, diretamente, nificados. Desta forma, todo e qualquer
das experiências do homem em contato produto novo não passa de fruto concreti-
com sua vida cultural objetiva e subjetiva. zado de um processo imaginativo, porém
A imaginação está ligada à emoção. Ela re- construído a partir de leituras da realida-
tira fragmentos da realidade e, por meio de, seja lá como ela for compreendida por
de novas significações destes fragmen- cada cultura. Finalizando, os caminhos de-
tos, devolve à cultura leituras renovadas senvolvimentais que orientam a imagina-
desta mesma realidade. Esta é a essên- ção criativa se alteram, invertendo-se, ora
cia do processo criativo na concepção de indo da dimensão interpsicológica para
Vygotsky. A imaginação é, ao mesmo tem- a dimensão intrapsicológica, ora percor-
po, intelectual e emocional e é este fato rendo o caminho oposto. O sujeito que é
que favorece a emergência dacriatividade. criado pela e na cultura passa a criar cul-
Os processos que permitem à imaginação tura também, em um processo dialético
galgar novos patamares, constituindo-se e sistêmico.A criatividade não representa
como função psicológica superior, relacio- mera ação adaptativa, pois tal ação está
nam-se com o encontro das linhas de de- presente no reino animal, mas caracteriza-

1125
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-se por ser ação combinatória, onde diver- de ação que refletem mudanças em uma
sos elementos simbólicos produzidos pela sociedade que começa a perceber a di-
cultura são reorganizados e reconstruídos, versidade mais como norma do que como
gerando novos produtos e contribuições exceção. Em se tratando de alunos com
culturais.É a atividade criadora que faz do altas habilidades/superdotação Barrera
homem um ser capaz de se projetar no fu- Pérez (2004), em uma análise sobre a re-
turo, de pensar, imaginar e criar o novo, alidade da inclusão de pessoas com altas
de buscar respostas e soluções para dile- habilidades, ressalta que estes cidadãos
mas e problemas humanos. Por meio da permanecem “transparentes e imunes ao
imaginação criativa, esta função psicológi- ensino de qualidade para todos” (p.1). Ao
ca que surge do encontro do sujeito com a refletir sobre a realidade desses alunos, é
cultura, é que emerge o enorme potencial possível perceber a distância da escola em
criativo humano, capaz de transformar ci- fornecer o apoio necessário para garantir
vilizações e garantir nossa sobrevivência. a inclusão de “todos” os alunos com ne-
cessidades educacionais especiais, como
Palavras-chave: Imaginação Criativa, Cultura, ressaltado por Tessaro, Waricoda, Bolo-
Desenvolvimento Humano. nheis & Rosa (2005), cuja ênfase apresen-
tada nos contextos escolares, diz respeito
à atenção e estratégias de ações voltadas
ALUNOS COM ALTAS HABILIDADES/ prioritariamente aos alunos com deficiên-
SUPERDOTAÇÃO E SUA INCLUSÃO cias. Grupos de alunos de altas habilida-
EDUCACIONAL: CONTEXTOS, DESAFIOS E des/superdotação convivem entre o hiato
PERSPECTIVAS da legislação educacional, que ampara
Vera Lucia Palmeira Pereira - SEE/DF práticas pedagógicas flexíveis, e a realida-
veralppereira@gmail.com de de muitos educadores, que geralmente
desconhecem as características e estilos
O movimento de educação inclusiva ga- de aprendizagens de seus alunos e não
nhou força no início da década de 90 oportunizam, nos ambientes de ensino, a
como resposta às mudanças aos mode- qualidade educacional de que necessitam.
los e serviços educacionais oferecidos Segundo Carvalho (2000; 2005), a inclu-
aos alunos com necessidades especiais. são educacional se configura não somente
Esse movimento enfatiza a valorização como dados numéricos de matrícula ou
da diversidade e a expressão de todos os como um elemento a mais em sala de aula,
alunos - independentemente de talento, mas, sobretudo, como acesso, ingresso e
deficiência, origem socioeconômica ou permanência de alunos como aprendizes
cultural - e com elas se estabelecem o de sucesso, referindo-se ao sentimento de
respeito aos ritmos, habilidades e estilos “pertencer” ao grupo, como aspecto pon-
de aprendizagem de cada estudante. Ka- tual dessa inclusão. O pertencimento se
ragiannis, Stainback e Stainback (1999) qualifica no sentimento de acolhimento.
afirmam que a inclusão é muito mais do Em várias situações alunos superdotados
que um modelo de prestação de serviços não se percebem acolhidos no ambiente
em educação especial. Constitui-se em educacional (Barrera Perez, 2008). Rela-
um novo paradigma de pensamento e tos apresentados em distintos estudos

1126
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

revelam que muitas de suas indagações e potencialidades. O reconhecimento das


contribuições em sala têm sido interpre- particularidades dos alunos superdota-
tadas como exibicionismo e falácia, ou dos transcende divergências conceituais,
que, sua vivacidade e fluência têm sido idéias pessoais e tendências políticas a
percebidas como falta de limites, quando respeito das necessidades educacionais
essas monopolizam o discurso com seus de pessoas com potenciais superiores. As
professores. Para seus educadores e pares propostas de atendimento educacional
a resistência desse aluno na realização de em vigor em nosso país para esses estu-
atividades de fixação de conteúdos refle- dantes fundamentam-se em princípios
te um comportamento de resistência às filosóficos e ideológicos que embasam a
normas. Seu ritmo rápido de aprendiza- educação inclusiva: valorização da diver-
gem, muitas vezes, percebido como um sidade como elemento enriquecedor do
problema a ser resolvido. Suas atitudes desenvolvimento pessoal e social; pro-
e comportamentos são, repetidamen- moção do desenvolvimento de currículos
te, alvos de críticas por seus professores amplos, flexíveis e abertos que possibi-
em conselhos de classe ou em reuniões litem a aprendizagem e participação de
com seus responsáveis na escola (Pereira, todos; respeito às diferentes formas de
2008). Estudos apontam que muitos as- aprender; atendimento às necessidades
pectos do desenvolvimento dos alunos de educacionais de todos os alunos e desen-
altas habilidades/superdotação se encon- volvimento do trabalho cooperativo entre
tram desconhecidos de seus professores e os diversos segmentos que compõem a
equipes pedagógicas, os quais tendem a comunidade escolar (Mittler, 2003). Pes-
esperar desses estudantes os comporta- quisadores (Camargo & Silva, 2004; Ferrei-
mentos que estão freqüentemente acos- ra & Nunes, 1997) apontam a importância
tumados a encontrar, quando convivem da formação de professores e os proble-
com os demais alunos, ou exigir condutas mas relacionados à educação dos alunos
que correspondem a um alto grau de exi- com necessidades especiais, uma vez que
gência nas áreas cognitivas, sociais e/ou a educação depende, sobretudo, da ação
emocionais, ignorando as especificidades dos professores que irão atuar em salas de
de sua natureza (Chagas, 2008; Ourofino, aula. Em se tratando de alunos superdota-
2005; Vieira, 2005). Colangelo (1997) já dos, a inclusão pretendida é apoiada, não
ressaltava que a percepção de professo- nas bases de acesso e garantia de educa-
res, ou das pessoas que se dispõem a de- ção, mas na permanência desses alunos
senvolver atividades com alunos de altas em ambientes educacionais que permi-
habilidades/superdotação, seja no campo tam tanto o atendimento de suas neces-
social ou pedagógico, devem ser nortea- sidades educacionais, como o estímulo de
das pela compreensão de que muitos su- suas habilidades. Carvalho (2000) ressalta
perdotados “vivem em contextos de am- ainda que seja importante pontuar que
bigüidades acerca deles mesmos e acerca “especiais” devem ser consideradas as
da percepção dos outros” (p. 110), e que alternativas e as estratégias que a prática
como tal, necessitam de um programa de pedagógica deve assumir para remover
aconselhamento na escola com vistas a barreiras para a aprendizagem e participa-
minimizar as ambigüidades e liberar suas ção de todos os alunos. Assim, afasta-se o

1127
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

foco do especial ligado ao aluno para o en- aspectos de reconhecimento de fala em


foque do especial atribuído à educação. A crianças em fase de escolarização e a uti-
superdotação é, sem dúvida, uma questão lização de uma bateria de avaliação neu-
desafiadora e controvertida no contexto ropsicológica e de um teste de aquisição
educacional da atualidade. Ressaltada por de leitura, desenvolvidos para avaliar as
aspectos da natureza heterogênea, assin- funções preditoras da leitura nessas crian-
crônica e multidimensional da expressão ças. São debatidas na presente mesa a
humana, reveste-se de desafios. As ca- importância do conhecimento dos meca-
racterísticas específicas de aprendizagem nismos atencionais envolvidos no proces-
desse alunado sugerem ações pontuais, so de escolarização de crianças, visto que
posturas pedagógicas flexíveis, organiza- dificuldades de aprendizagem estão dire-
ção administrativa e gestão educacional, tamente ligados a capacidade de focar a
eficientes, que os estimulem a ampliar atenção, além da importância da percep-
seus talentos. As estratégias de ensino, os ção auditiva como aspecto fundamental
modelos de atendimento especializado e na interpretação e compreensão dos estí-
o dinamismo de nossa sociedade confi- mulos sonoros a elas apresentados, visto
guram e provocam nas equipes educacio- que falhas na percepção dos sons da fala
nais e de apoio escolar e seus psicólogos, podem resultar em uma representação fo-
novas reflexões sobre caminhos possíveis nológica inadequada e erros de produção,
para o desenvolvimento de talentos e o afetando o desenvolvimento da lingua-
sentimento de pertencer desse grupo de gem e, posteriormente, a alfabetização.
alunos em seus contextos educacionais. São abordados um teste de aquisição de
leitura (ALER) e uma bateria neuropsicoló-
Palavras-chave: superdotação, altas gica, desenvolvidos para avaliar e analisar
habilidades, inclusão educacional a prontidão da criança para a leitura em
processo de alfabetização, com vistas a
identificar a prontidão para aprendizagem
MR LT02 e subsidiar ações preventivas. Tais discus-
sões visam uma maior compreensão dos
Mesa Redonda aspectos cognitivos durante o processo
de escolarização, bem como divulgar me-
todologias inovadoras de acesso a estes
MR LT02-1372 – DESENVOLVIMENTO DE
aspectos em escolares.
CRIANÇAS EM FASE DE ESCOLARIZAÇÃO:
PERCEPÇÃO AUDITIVA E VISUAL E
PRONTIDÃO PARA LEITURA ONTOGENIA DA ATENÇÃO VISUAL
Valéria Reis do Canto Pereira - UnB
Muitos estudos foram realizados com o vrcantopereira@unb.br
objetivo de compreender o complexo
processo de desenvolvimento durante a A atenção tem sido objeto de estudo de
infância. A presente mesa redonda abor- muitos pesquisadores desde o século XIX.
dará os aspectos cognitivos e perceptuais A partir do advento da psicologia cogniti-
do desenvolvimento visual e auditivo, os va os estudos sobre atenção foram inten-

1128
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sificados. Defini-se Atenção Visual como a posições que não àquela selecionada pre-
capacidade neural de selecionar determi- viamente. Uma medida clássica e muito
nada área do campo visual em detrimento utilizada em estudos psicofísicos para ava-
das demais. A atenção pode distribuir-se liação de mecanismos atencionais envol-
pelo campo visual tanto de forma locali- ve Tempo de Reação (TR). É uma medida
zada ou focalizada como de forma difusa. que possibilita ao pesquisador observar
A primeira seria a habilidade de proces- a latência e a acurácia de respostas a es-
sar de forma mais seletiva determina- tímulos apresentados ao observador. Em
da região, enquanto na segunda o foco psicofísica visual, medidas obtidas por
atencional estaria representado de forma meio de TR a estímulos luminosos, podem
aproximadamente igual por todo campo auxiliar na compreensão do processo de
visual (Eriksen & St James, 1986; Posner, seleção de informações relevantes para
1980). A atenção desempenha um papel o sistema visual, priorizando o processa-
de seleção de determinados estímulos mento de alguns atributos de um dado es-
proporcionando o melhor processamento tímulo em detrimento de outros (Posner
destes. Para que informações importan- & Raichle, 1997). Conhecer o desenvol-
tes sejam reconhecidas prioritariamente, vimento de habilidades mentais, desde a
é necessário que haja esta seleção. Este infância até a vida adulta, é fundamental
processo de seleção denomina-se Aten- para compreender a organização e função
ção Seletiva (Desimone & Duncan, 1995). cerebral, visto que o ser humano sofre
Pode-se dividir a atenção em duas formas, mudanças significativas ao longo do seu
diferentes em suas propriedades e seus desenvolvimento, em especial mudanças
mecanismos neurais, são elas: atenção vo- relacionadas à cognição. Durante mui-
luntária e atenção automática (Gazzaniga, tos anos, desde o nascimento até a vida
Ivry & Mangun, 2006). Defini-se atenção adulta, ocorre o desenvolvimento cogniti-
voluntária ou “atenção endógena” como vo, porém algumas funções cognitivas se
sendo a habilidade ou intencionalidade tornam maduras em tempos diferentes,
em prestar atenção em algo. Já a atenção i. e., diferentes regiões cerebrais amadu-
automática ou “atenção exógena” por sua recem mais cedo do que outras, conceito
vez, é descrita como o fenômeno no qual denominado Heterocronicidade. Métodos
alguma coisa capta nossa atenção, sendo que correlacionam a maturação destas
esta de ordem sensorial. A capacidade de funções cognitivas a um estágio específi-
dirigir a atenção voluntariamente para um co do desenvolvimento neural são usados
determinado local do espaço enquanto em humanos. Assim, analisar o desenvol-
se ignora outros é chamada de atenção vimento nos fornece informações sobre
espacial. Essa capacidade propicia uma a circuitaria cerebral, suas estruturas e
melhora no desempenho do observador sistemas, bem como processos cognitivos
quando ele tem o conhecimento prévio que ela mantém, possibilitando também
da posição em que irá aparecer um alvo estudos sobre a origem e o desenvolvi-
para o qual ele deve emitir uma resposta. mento de diversos fenômenos cognitivos.
Esta concentração de recursos atencio- Um exemplo é o conhecimento de que a
nais também conduz a um processamento atenção automática se desenvolve antes
menos eficiente dos estímulos em outras da atenção voluntária, o que nos traz in-

1129
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

formações preciosas a respeito das formas pacial da atenção visual em voluntários de


distintas de comportamentos atencionais 18 a 30 anos por meio de testes avaliando
(Gazzaniga, Ivry & Mangun, 2006). Com a atenção explícita (foco atencional coinci-
relação ao desenvolvimento cognitivo, dente ao ponto de fixação) e dividida (foco
Surnina e Lebedeva (2001) realizaram um atencional dividido à esquerda e à direita
estudo com 296 sujeitos na faixa etária de do ponto de fixação, simultaneamente. Os
3 a 28 anos, divididos em 5 grupos (3 - 4 autores demostraram que tanto a atenção
anos, 5 - 6 anos, 7 - 8 anos, 10 - 12 anos e explícita como a atenção dividida estavam
16 - 28 anos) utilizando medidas de tem- presentes no grupo estudado. Reis (2010)
po de reação. Os resultados mostraram utilizou o mesmo protocolo para mape-
que há uma tendência de diminuição, sem ar a atenção visual de crianças de 8 a 15
contudo clara significância, dos tempos anos. Os resultados demonstraram que há
de reação com o aumento da idade. Es- melhora no desempenho em função da
sas autoras também observaram que os idade, sendo que na situação de atenção
tempos de reação de meninos apresen- explícita todos os voluntários apresenta-
tam uma tendência a serem menores do ram menores TR na área atendida, como
que das meninas, mas novamente sem esperado. Na situação de atenção dividida
significância estatística. Kolb e Whishaw apenas a maior faixa etária estudada (15
(2002) sugerem que o desenvolvimento anos) apresentou divisão atencional, tare-
das habilidades motoras mais complexas fa esta mais demandante cognitivamente.
ocorre na faixa etária de 6 a 10 anos pelo Estes dados suportam a hipótese de que
aprendizado motor proporcionado pela diferentes estruturas cerebrais amadu-
maturação da área pré-frontal associado recem em diferentes idades, compreen-
às experiências da criança. Nesta faixa dendo de forma mais detalhada de como
etária ocorreria uma maturação progres- ocorre o desenvolvimento neuromatura-
siva da região pré-frontal permitindo um cional destes voluntários.
melhor planejamento do movimento e
conseqüentemente permitiria associar Palavras-chave: Atenção visual; Crianças;
de forma mais elaborada dois ou mais Escolares.
movimentos, associação esta que se tor-
na com o passar do tempo mais refinada,
possibilitando uma aprendizagem motora PERCEPÇÃO AUDITIVA E
mais eficiente. Esses autores relatam que RECONHECIMENTO DE FALA
na idade de 10 a 20 anos o comportamen- EM CRIANÇAS EM IDADE DE
to caracteriza-se pela fase de habilidades ESCOLARIZAÇÃO
motoras especializadas. Ocorreriam mu- Keila Jacob da Silva - UnB
danças nessa faixa etária não relacionadas keilajacob.s@gmail.com
ao padrão motor, porém na precisão, exa-
tidão e no controle motor. Canto-Pereira A percepção auditiva é um aspecto fun-
e Ranvaud (2004) desenvolveram um pro- damental na interpretação e compreen-
tocolo para mapear a atenção utilizando são dos estímulos sonoros do ambiente.
uma série de experimentos psicofísicos. Crianças com desenvolvimento típico
Os autores realizaram o mapeamento es- mostram muito precocemente, sensibili-

1130
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dade aos estímulos acústicos e, logo nos ças faladas, os sinais acústicos de entrada
primeiros três anos de vida apresentam devem ser decodificados. Essa análise é
capacidade auditiva suficiente para dis- então traduzida em um código fonológico
criminar contrastes lingüísticos relevantes que possibilita o acesso léxico às informa-
na fala, o que é similar à capacidade apre- ções sobre as palavras e, posteriormente,
sentada por adultos com desenvolvimento seu significado. Observa-se uma distinção
normal (Bailey & Snowling, 2002). A fala é entre a interpretação dos sinais da lingua-
um estímulo acústico complexo, compos- gem falada e escrita. Na leitura, ressalta-se
to por uma ampla faixa de freqüências e a importância dos aspectos gráficos, como
intensidades que variam ao longo do tem- por exemplo, as letras e os espaços entre
po. Sua percepção envolve a identificação as palavras. De acordo com Gazzaniga, Ivry
e interpretação dos estímulos acústicos & Mangun (2006), na compreensão da lin-
de forma adequada sendo que, a audi- guagem falada o ouvinte se depara com
bilidade, recepção, discriminação, reco- uma série de sons e precisa identificar e
nhecimento, memória e compreensão da distinguir: a) os sinais relevantes da fala
mensagem da falada são fundamentais de outros ruídos presentes no ambiente,
nesse processo. O estímulo auditivo deve b) os diferentes sons produzidos pela fala
ser suficientemente audível e possibilitar em relação às características do aparelho
a discriminação, envolvendo sua segmen- fonador, c) os vários fonemas produzidos
tação em unidades menores, como os fo- em uma palavra/sentença, considerando a
nemas, que serão armazenados e poste- modificação de sua pronúncia quando se-
riormente utilizados no reconhecimento e guido por diferentes vogais/consoantes; d)
compreensão da fala escutada (Carvalho, as características que diferenciam a produ-
2007). A aquisição da linguagem abrange ção de um mesmo som por diferentes pes-
principalmente a percepção da fala das soas e principalmente, de sexo diferente.
pessoas que fazem parte do ambiente. A A compreensão da linguagem oral envolve
complexidade dessa habilidade requer do aspectos relacionados ao sinal da fala e ao
ouvinte a capacidade de extrair informa- contexto no qual é produzida. A importân-
ção quanto à forma espectral do som, a cia do contexto é sinalizada em situações
detecção e discriminação de modulação em que uma mesma palavra pode assumir
de amplitude e frequência, e identifica- diferentes significados, dependendo do
ção de alterações temporais que ocorrem seu uso. É importante que essa capacida-
tanto em mudanças lentas presentes ao de seja desenvolvida, tendo em vista sua
longo de um enunciado, quanto em mu- importância para o estabelecimento da
danças relativamente rápidas, resultantes comunicação com outras pessoas. Crian-
da rápida articulação consonantal (Bailey ças com problemas de aprendizagem fre-
& Snowling, 2002). A integridade do siste- quentemente apresentam dificuldades
ma auditivo central e periférico é funda- para processar sinais auditivos complexos,
mental para o sucesso de todo este proce- como discriminar as mudanças acústicas
dimento. A percepção dos sinais acústicos que ocorrem rapidamente na fala (Kraus
da fala envolve a representação das pala- et al., 1996). O período em que a criança
vras e a integração destas às sentenças. Ao inicia o processo de escolarização é ca-
tentar compreender as palavras e senten- racterizado por constantes mudanças na

1131
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

representação fonológica a partir da fala DESENVOLVIMENTO DE UMA BATERIA


escutada. Falhas na percepção dos sons NEUROPSICOLÓGICA PARA AVALIAÇÃO
da fala podem resultar em uma represen- DE FUNÇÕES PREDITORAS DE
tação fonológica inadequada e erros de AQUISIÇÃO DA LEITURA EM CRIANÇAS
produção, afetando o desenvolvimento da SUBMETIDAS À ALFABETIZAÇÃO
linguagem e, posteriormente, a alfabeti- Kátia Estevão Rodrigues da Silva - CECEPAZ
zação (Tallal, 2004; Mengler, Hogben, Mi- katiaers@gmail.com
chie & Bishop, 2005). Além disso, podem
refletir em problemas de aprendizagem, O processo da alfabetização é um campo
concentração, atenção e nas interações de estudo explorado por diversas áreas
sociais, visto que a percepção incorreta de do conhecimento, expressando, assim, a
uma palavra pode prejudicar e dificultar a importância e a complexidade do tema.
comunicação com outras pessoas, diante Atualmente, na literatura são encontradas
de uma limitação para processar a men- várias metodologias, linguagens e abor-
sagem falada. Vários fatores podem con- dagens, muitas vezes divergentes, para a
tribuir para que esse entendimento não realização destes estudos, não alcançan-
ocorra de forma adequada, dentre eles do um esclarecimento conciso do assun-
alterações físicas (auditiva, neurológicas), to (Parente & Salles, 2006). Busca-se aqui
emocionais e ambientais. Gary Sieben, discutir, sob o olhar amplo da ciência da
Gold, Gleen Sieben e Ermann (2000) des- Neuropsicologia, baseado na abordagem
tacam que características relacionadas à sistêmica de Alexander Luria, a prontidão
acústica do ambiente podem influenciar neuropsicológica da criança para a aqui-
a inteligibilidade dos sinais da fala e com- sição da leitura. A Neuropsicologia é uma
prometer o aprendizado. É importante ciência que busca compreender o dina-
considerar que, algumas habilidades audi- mismo e as especificidades das diversas
tivas da criança em idade de escolarização estruturas do sistema nervoso central,
ainda se encontram em desenvolvimento com maior enfoque às estruturas corticais,
e tendem a melhorar com a idade. Até os analisando esse como um sistema interde-
dois anos de idade, a percepção de estímu- pendente, dinâmico e complexo. Este tipo
los auditivos simples está desenvolvida, de estudo tem um papel importante na
entretanto, muitas funções auditivas ain- compreensão das ligações fundamentais
da permanecem imaturas até os dez anos do cérebro e do comportamento, o que
(Moore, Halliday & Amitay, 2009). Assim, permite determinar a relação entre os re-
o desempenho em algumas tarefas pode sultados dos testes neuropsicológicos e o
ser limitado tornando-se fundamental que comportamento do ser humano, identifi-
o professor conheça os principais aspectos cando e predizendo alterações dos trans-
que podem influenciar a percepção de fala tornos neurológicos (Glozman, 2006). O
em faixas etárias específicas, planejando alto índice de distúrbios de leitura tem exi-
intervenções adequadas às capacidades gido maior compreensão sobre eles, ações
de seus alunos. preventivas e estratégias de intervenção
adequadas (Guardiola, Ferreira & Rotta,
Palavras-chave: Percepção auditiva; 1998). avaliação neuropsicológica fornece
reconhecimento de fala; linguagem. informações, através de testes padroniza-

1132
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dos, que identificam alterações focais ou Stuart, 2002) que afirmam que o processa-
sistêmicas do sistema nervoso. A aquisição mento fonológico é a principal função neu-
da leitura é um processo neuropsicológico ropsicológica preditora da leitura. As outras
complexo que exige o amadurecimento de funções também preditoras são memória
diversas funções preditivas básicas para semântica e articulação da fala. Sexo, QI e
a sua habilitação, além de sofrer interfe- idade não são fatores que apresentaram
rência de diversas varáveis como sócio- correlação com a aquisição da leitura.
-cultural, biológica, ambiental, educacional
e afetivo-emocional, por exemplo (Silver, Palavras-chave: Avaliação Neuropsicológica;
Ruff, Iverson, Barth, Broshek & Bush et al., Leitura; Processamento Auditivo.
2008). Para avaliar e analisar a prontidão Contato: Valéria Reis do Canto Pereira, UnB,
da criança para a aquisição da leitura, foi vrcantopereira@unb.br
construída uma bateria neuropsicológica
para avaliar as funções preditoras da leitura
(BANLER), com vistas a identificar a pron- MR LT04
tidão para aprendizagem e subsidiar ações
preventivas, e um teste para avaliação da Mesa Redonda
aquisição da leitura (ALER). Ficou eviden-
te que, após estimulação para habilitação
da função da linguagem escrita, enquanto MR LT04-1317 - EXCELÊNCIA,
leitura, outras funções neuropsicológicas EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
foram habilitadas, que, em contrapartida, HUMANO
aqueles que se submeteram a mesma es- Mônica Souza Neves-Pereira - UnB
timulação, mas não adquiriram a leitura, monicasouzaneves@yahoo.com.br
também não desenvolveram as outras fun-
ções neuropsicológicas. A bateria neuropsi- O presente trabalho objetiva discutir as
cológica é constituída de 18 subtestes, den- relações, interfaces e interferências entre
tre eles, cinco avaliam funções preditoras, os fenômenos da Excelência, Educação e
12 avaliam funções que foram adquiridas Desenvolvimento Humano compreendidos
intrinsecamente ao processo da aquisição como processos socioculturais originados
da leitura e apenas um não apresentou da mediação, aqui compreendida como
correlação com o processo de aquisição da ação inerente à experiência humana. As
leitura (memória visual). Os resultados da abordagens sociogenéticas do desenvol-
avaliação neuropsicológica através destes vimento buscam compreender os proces-
instrumentos corroboram os estudos teó- sos de construção da natureza humana
ricos (Lyytinem, Erskine, Kujala, Ojanem & partindo do pressuposto central de que a
Richardson, 2009; Tunmer, 2008; Shaywitz, gênese das estruturas psicológicas do ho-
Shaywitz, Fullbright, Mencl, Constable & mem situa-se na dimensão histórica, so-
Skudlarski et al., 2001; Termine, Stella, Cap- cial e cultural onde os sujeitos se inserem.
soni, Rosso, Binda & Pirola et al 2007; Ca- A biologia, por si só, não é suficiente para
povilla, Gütschow & Capovilla, 2004; Ger- definir um estatuto de humanidade. Para
rits & Bree, 2009; Spugevica & Hoien, 2003; alcançar as potencialidades específicas da
Hulme, Hatcher, Nation, Brown, Adams & espécie homo sapiens, o ser humano ne-

1133
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cessita pertencer a grupos sociais, precisa ceitos de desenvolvimento humano, edu-


apropriar-se da cultura. A educação, em cação e excelência é possível propor diá-
seu sentido amplo, é o processo pelo qual logos que investiguem as relações, interfa-
ocorre essa apropriação em toda sua com- ces e interferências entre estas instâncias,
plexidade. É, portanto, um processo social, destacando perguntas inevitáveis, como:
cultural, histórico, político, econômico e, (a) A escola tem ciência de seu papel não
principalmente, subjetivo. O sentido res- só formativo e instrutivo, mas constitutivo
trito de educação, compreendido em sua da dimensão humana? (b) Ciente ou não
forma instituída, materializada nas práticas da complexidade de sua atuação, a escola
de ensino formal e se define pelas ideias de considera a busca da excelência e do su-
“formar, instruir ou ensinar” um ser. Um cesso em suas ações e práticas? (c) Como
conceito de educação é sempre resultado implementar um olhar transdisciplinar so-
de uma ampla reflexão sobre concepções bre as práticas escolares, se seus profissio-
específicas de ser humano, de sociedade e nais se tornam reféns dos planos políticos
de natureza. Apresenta uma perspectiva, e econômicos descompromissados com o
uma intenção para a vida humana e ideais desenvolvimento humano, com o estudo
para o desenvolvimento da sociedade, com das realidades específicas das instituições
uma ponta de transcendentalidade que e com a formação desses profissionais?
propõe ir além do concreto e do objetivo. (d) Tem a escola proporcionado espaço
Pensar sobre educação implica sempre adequado ao amplo desenvolvimento das
em considerar esses aspectos: o que é da potencialidades de seus alunos? Mergulhar
ordem do humano, do social, do transcen- nestas questões teóricas consiste na pro-
dental. Paulo Freire sempre diz que “edu- posta desta mesa redonda.
car é conscientizar”, é lidar com a integra-
lidade do ser humano, despertando-o para
uma elevação espiritual com o objetivo de NA ESCOLA NOS TORNAMOS PESSOAS.
torná-lo sensível ao mundo e aos seus se- EXCELENTES PESSOAS OU PESSOAS COM
melhantes. Esses propósitos compõem os PADRÕES DE EXCELÊNCIA?
ideários educacionais dos grupos culturais, Mônica Souza Neves-Pereira - UnB
em suas trajetórias históricas. Bruner ar- monicasouzaneves@yahoo.com.br
gumenta que a educação não é uma ilha,
mas parte do continente da cultura. Dentre A escola tem respondido, ao longo da
suas funções destacam-se a construção e História, pelo processo de instrução e de
a distribuição de recursos, em especial os educação formal do ser humano. Em uma
humanos, favorecedores de estratégias de leitura evolutiva, percebe-se que esta ins-
sobrevivência e posicionamento dos sujei- tituição enfrenta dificuldades em ampliar
tos, agentes e receptores destes recursos, seu caráter “formador e estruturador”
no âmbito sociocultural. A escola, como das competências cognitivas humanas,
motor de desenvolvimento humano e local abrindo-se para novas práticas mais abran-
privilegiado de aprendizagem reflete sua gentes e complexas e que contemplem o
importância na constituição dos sujeitos e homem em suas múltiplas facetas. No que
na percepção que cada um vai elaborar a diz respeito ao ensino formal, estruturado
respeito de si mesmo. Articulando os con- por meio de currículos, metodologias e

1134
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

políticas públicas não há dúvidas de que a cas, econômicas, sociais e ideológicas que
escola venha cumprindo sua função, mes- permutam trocas e negociações contínuas
mo que precariamente (em muitos mo- com o sujeito em desenvolvimento; e (b)
mentos). Mas, e quanto aos outros aspec- em uma perspectiva micro, olhar esta cul-
tos constituintes do “ser integral” que ela tura como palco onde sujeitos se movem,
inscreve em seus objetivos educacionais? se posicionam e são afetados por todos os
Como a escola tem tratado a afetividade, componentes de um sistema cultural que
as emoções, a imaginação, a criatividade e toca, mobiliza, transforma, muda o ho-
a busca da excelência de seus alunos? Na mem, não importa em qual direção. Neste
escola nos tornamos pessoas, para o bem caldo relacional os seres humanos constro-
ou para o mal. É neste cenário, onde passa- em leituras da “realidade”, posicionando-
mos grande parte de nossas vidas, que va- -se como sujeitos agentes e receptores dos
mos aprender a ler, escrever, pensar, com- significados culturais, em uma dança dialé-
preender o mundo e a nós mesmos, além tica que revela a complexidade investida no
de nos tornarmos sujeitos de uma cultura, desenvolvimento humano e na construção
sujeitos de valores, crenças, premissas mo- da cultura. A escola, como agência social de
rais e princípios estéticos e éticos. Ensinar extrema relevância, faz parte desta dinâmi-
e aprender são processos que exigem se- ca. Passar por ela traz consequências aos
riedade, retidão e excelência. Não só por- homens, consequências que podem ser
que estas dimensões são constitutivas do transformadas em recursos que habilitam
humano, mas, especialmente, porque me- para a vida e que interferem em nossas es-
recemos qualificar nossa existência e a dos colhas, dando-nos instrumentos para nossa
nossos semelhantes. Ao experimentarmos sobrevivência. Na escola ocorre o encontro
a vida escolar somos profundamente trans- entre a cultura formalizada por meio de
formados por suas práticas, pelas media- currículos e o sujeito que necessita (dese-
ções presentes, pelas mensagens culturais ja?) “ser educado”. Na realidade, ocorre o
recebidas, internalizadas e ressignificadas. encontro entre os cânones culturais, que
A escola é lugar de desenvolvimento hu- são frutos de uma cultura coletivamen-
mano, espaço onde nos transformamos te construída, com a individualidade em
em sujeitos de uma cultura, onde ascen- busca de expressão e compreensão, tanto
demos à nossa condição de humanidade, destes legados e mensagens, como de si
por meio do desenvolvimento de nossas mesma. De acordo com Bruner, nada está
funções psicológicas, nossa consciência, isento de cultura, porém, os indivíduos não
nossa subjetividade. Apropriar-se de uma são meros espelhos das mensagens cultu-
leitura sociogenética de desenvolvimento rais. Viver em cultura exige este equilíbrio,
humano e por meio dela buscar compre- esta negociação entre o que é da ordem
ender o fenômeno educativo e a busca da individual e o que é da ordem coletiva. E
excelência implica na consideração de dois exige mais: demanda preparo do sujeito
aspectos básicos de uma visão culturalista, não só para internalizar estas mensagens,
que são: (a) em uma perspectiva macro, como para mantê-las posteriormente,
compreender a cultura como um sistema transformadas e readaptadas a outro mo-
de valores e significados em permanente mento histórico. A escola se insere nesta
transformação, com suas instâncias políti- missão, a de promover capacidades, esti-

1135
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

los de pensar, de sentir, de falar e de viver novar a existência, sempre orientados por
que, posteriormente, serão transacionados princípios humanos e éticos, com vistas ao
pelo sujeito em formas de trabalho, de pro- bem-comum e ao cultivo de um espírito de
dução, de criação, de renovação cultural. solidariedade, cooperação e fraternidade
Como agência sociocultural, a escola en- entre os povos.
frenta desafios gigantescos, muitos, talvez,
impossível de serem alcançados. Ela se pro- Palavras-chave: Desenvolvimento, Educação e
põe a formar pessoas em sua integralidade, Excelência.
transmitindo-lhes o legado cultural da hu- Contato: Mônica Souza Neves Pereira, IP/UnB,
manidade e construindo hábitos que, pos- monicasouzaneves@yahoo.com.br
teriormente, gerarão resultados cognitivos,
intelectuais e mentais. Se a educação ofer-
tada for eficiente, estes resultados passam CULTURA ESCOLAR E OS PROCESSOS DE
a caracterizar “zona de perigo”. O saber de SIGNIFICAÇÃO DE SI: RECUPERANDO O
qualidade modifica o mundo, os valores, os ELO PERDIDO
princípios, as nações. Este tipo de interfe- Sandra Ferraz de C. D. Freire - FE/UnB
rência no tecido sociocultural é, de modo sandra.ferraz@gmail.com
geral, mal visto. Uma escola excelente é Angela Cristina Uchoa Branco - IP/UnB
desejo de todos, mas causa medo e inquie- ambranco@terra.com.br
tação. Somos este paradoxo: buscamos a
manutenção do nosso status e desejamos O presente trabalho aborda os processos
modificações em nossas vidas, ao mesmo de desenvolvimento na escola enfatizando
tempo, mobilizando forças antagônicas que a interface entre práticas pedagógicas e a
terminam por ceder ao lado mais forte, em constituição de si. Tem por objetivo identi-
geral representado pelos setores dominan- ficar aspectos relacionados ao processo de
tes em uma sociedade. Talvez por esta ra- mudança no desenvolvimento das significa-
zão básica e por outras tantas periféricas, a ções de si no contexto das experiências es-
excelência não se constitua como um valor colares por meio da caracterização de Con-
no cenário educacional, especialmente em cepções Dinâmicas de Si. Fundamenta-se
países com atrasos em seu desenvolvimen- na abordagem sociocultural construtivista,
to. Por excelência compreendemos a cons- de base sistêmica, que considera o sujeito
trução de padrões intelectuais, cognitivos, ativo em seu processo de desenvolvimento
estéticos, éticos e emocionais diferencia- por meio das interações com o outro social
dos da média e que fornece instrumentos e significativo em contexto e em constante
recursos para que o sujeito se expresse de mudança. As demandas complexas postas
modo destacado em uma sociedade, pro- pela pesquisa psicoeducacional revelam a
movendo mudanças profundas e de qua- necessidade de estudar as categorias dinâ-
lidade em suas estruturas. Necessitamos micas dos processos de desenvolvimento
e temos o direito de lutar por uma escola de si no contexto escolar. As instituições e
onde possamos nos tornar excelentes pes- os grupos sociais são agentes de canaliza-
soas com padrões de excelência em nossos ção cultural e lançam mão de sofisticadas
estilos de pensar, agir, vivenciar, compre- estratégias de discriminação e exclusão,
ender, contestar, criticar, criar, inovar e re- na maioria das vezes veladas e silenciosas,

1136
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mas altamente eficazes em posicionar o base em uma perspectiva dialógico-desen-


outro de forma inferior. São estratégias que volvimental. As CDS permitiram ressaltar
contaminam as práticas socioculturais de a plasticidade, a pluralidade e ao mesmo
forma que nem seus membros conseguem tempo, a singularidade do processo de sig-
compreender a dialogicidade entre suas nificação de si em contexto. Por ser uma
ações e as ações de outrem, nem quais categoria que emergiu de forma integrada
os mecanismos de opressão envolvidos. entre sujeito e experiência, nos permitiu
Diante do emergente debate sobre for- compreender a relação entre os processos
mas de violência, nos questionamos como de mudança da criança e as práticas esco-
podemos tornar a escola e a experiência lares. Os resultados sugeriram que a posi-
escolar contextos significativos para o au- ção da professora foi fundamental para a
todesenvolvimento e para a transformação promoção de CDS integradoras capazes de,
da sociedade. Propomos as Concepções em diálogo com as outras CDS, mobilizar a
Dinâmicas de Si (CDS) como categoria ana- criança ao desenvolvimento construtivo de
lítica para o estudo dos processos de signi- si. No estudo do caso Kelly, transformações
ficação de si em mudança e representam significativas ocorreram com o apoio parti-
a dimensão reflexiva do sistema semiótico cipativo e intencional da professora quanto
subjetivo. Ilustramos a situação com o caso à qualificação positiva sistemática do tra-
Kelly. Uma menina negra e pobre com uma balho escolar em associação à valorização
história escolar problemática que passa das atitudes de Kelly. A ação mediadora
por uma mudança radical com relação ao da professora no processo de emergência
trabalho escolar e ao seu desenvolvimento e re-significação da subjetividade da alu-
psicossocial. O caso Kelly foi acompanhado na esteve relacionada inicialmente com o
ao longo do 5º. ano. Foram realizadas duas estabelecimento de relação afetiva e de
entrevistas formais, individuais, gravadas confiança da professora não só com Kelly,
em vídeo, observações das suas intera- mas com todas as crianças. A mediação
ções nos diferentes momentos escolares, também utilizou o reconhecimento público
incluindo a participação em quatro fóruns e individualizado do desempenho positivo
de avaliação coletiva denominado Conse- frente a tarefa escolar e com o estabeleci-
lho de Classe Participativo. Também foram mento de objetivos palpáveis, construídos
realizadas duas entrevistas individuais com e compartilhados com a turma – embora
a professora. A partir da análise da narrati- diferenciados no plano da subjetividade
va de Kelly sobre si e sobre seu desenvolvi- – com base em elaborados processos de
mento escolar em articulação com a análi- significação. A perspectiva de adentrar a
se da narrativa da professora, foi possível quinta série, por exemplo, constituiu-se
construir um sistema representativo das como importante mediador semiótico que
relações entre as Concepções Dinâmicas mobilizou e orientou, de acordo com a no-
de Si e as práticas escolares. A metodolo- ção de ‘orientação para objetivo, determi-
gia usa análise dos posicionamentos pre- nadas CDS de Kelly, considerando o alcance
sentes nas narrativas, priorizando relações da meta, um futuro desejável. Dado o ca-
dialógicas envolvendo CDS diferentes ao ráter dialógico das CDS, observamos que
longo do tempo, enfatizando processos de algumas práticas pedagógicas e institucio-
construção semiótica e reflexiva do eu com nais de intensas negociações interpessoais

1137
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

se mostraram relevantes na emergência, dança. Para concluir, é muito importante


re-significação e mudança nos posiciona- ressaltar que a construção de sentido da
mentos pessoais de Kelly. Atividades avalia- experiência escolar está relacionada ao
tivas convencionais – provas, trabalhos de sentimento pessoal positivo nutrido em
grupo, apresentações – previam momen- relação ao contexto mediado pela mobi-
tos de autoavaliação sistemática das crian- lização de CDS integradoras. É esse sen-
ças em contexto coletivo mediada por uma timento que possibilita o sujeito, em sua
profissional (professora, coordenadora), complexidade socio-psíquica, lidar com os
por escrito individualmente, ou em grupo paradoxos e contradições, desconfortos,
sem a mediação intencional da professora. assimetrias, exclusões, discriminação e pre-
Foi possível observar que os momentos de conceitos e relações de poder inerente às
reflexão e autorreflexão se apresentaram relações humanas, à vida em sociedade e à
como contextos produtivos na emergência convivência nas instituições. Este é o eter-
de novos significados, sentidos e ações. Em no desafio das instituições escolares, re-
especial, as sessões de Conselho de Clas- conhecer e dar conta dessa complexidade
se Participativo representou uma prática visto que a escola tem imenso poder sobre
transformadora a julgar pelas negociações a promoção ou a desqualificação de cada
valorativas sobre situações conflituosas. A um de seus estudantes.
preocupação com a vida familiar da crian-
ça também pode ser considerado aspecto Palavras-chave: Concepções Dinâmicas de
relevante para o processo de significação Si; Práticas Pedagógicas; Desenvolvimento
de si e de construção de Concepções Dinâ- Humano.
micas de Si. A socialização de experiências
familiares no contexto escolar foi produti-
va para a re-construção social e dialógica EXCELÊNCIA COMO CONCEITO
da história pessoal de Kelly na medida em PROMOCIONAL DA QUALIDADE
que sua agencialidade passou a também EDUCATIVA E O CONCEITO DE PROLEPSE
ser promotora de mudanças no espaço Fancisco Rengifo Herrera - UI-Colômbia,
familiar. A relação do processo de significa- frengifoherrera@gmail.com
ção de si no contexto do trabalho escolar
envolve: desenvolvimento de sentimentos Os currículos escolares são planejados
de segurança e autoconfiança a partir da levando em conta os critérios estabeleci-
compreensão e domínio das ferramentas dos pelos Ministérios de Educação, pelas
notacionais; do sentimento de pertenci- tendências teóricas em voga e/ou pelos
mento; da mediação semiótica dos valores, interesses de dirigentes e proprietários de
crenças referentes aos papéis sociais e às instituições de ensino. Muitas vezes a exe-
perspectivas de futuro. Entre os aspectos cução desses planos curriculares é alheia à
envolvidos nos processos de mudança, realidade específica da escola, não apenas
sintetizamos: a participação ativa de pes- dos conteúdos, mas das condições e neces-
soas significativas da escola e fora dela, o sidades sociais, culturais e humanas espe-
reconhecimento público, a expressão mais cíficas dos alunos. Mas pouco se leva em
ativa da agencialidade da criança, e princi- consideração as propostas, experiências e
palmente, sua motivação e desejo de mu- conhecimentos dos professores, pais, co-

1138
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

munidades ou estudantes. Além disso, as alunos. Sua necessidade de planejar cada


escolas como contextos, poderiam ser con- ação e desconsiderar os contextos nos
sideradas espaços que oferecem o desen- quais os estudantes estão imersos faz com
volvimento pretendido e promover a diver- que os percursos dos estudantes fiquem
sidade das características de cada um dos restritos e limitados a planos pré-conce-
participantes, mas no final, Na maioria das bidos, frequentemente alheios às salas de
vezes, a escola fica reduzida a um espaço aula. Estabelecer o critério de excelência
para abrigar simples dispositivos de repro- nas escolas, têm se convertido numa forma
dução dos sistemas de conhecimento for- promocional da qualidade do ensino, das
mal, esquecendo-se de que nelas existem políticas dos ministérios da educação o das
relações, significações, emoções e formas agencia de avaliação da qualidade educati-
específicas que podem permitir aos atores va, mas principalmente das escolas. Mas,
principais gerar formas de ação transfor- se procurar outros significados da palavra
madora, tornando-se estes agentes impul- excelência nos dicionários é possível des-
sores da sua própria realidade. Cole desen- cobrir acepções diferentes, tais como algo
volveu o conceito de prolepse, a partir do apreciável ou transcendente. Nesse sen-
latim, para explicar como as ações huma- tido, o futuro do desenvolvimento deverá
nas estão, de forma inexorável, ligadas à levar em conta esses significados, e não
antecipação do futuro. Do mesmo modo, aqueles relacionados apenas à competição,
autores como Valsiner e Branco também seleção e exclusão. Utilizar o conceito de
sugerem ferramentas para compreender o prolepse pode gerar reflexões produtivas
papel do tempo, da antecipação e dos sis- sobre os currículos, as relações dos agen-
temas semióticos no desenvolvimento de tes da escola, os conteúdos, as rotinas e até
sistemas de regulação das ações, emoções mesmo as formas de avaliação escolares. É
e formas de interagir em diferentes contex- por isso que nos sistemas educativos preci-
tos, incluindo o contexto educativo. Usar o sam se delinear e se pôr em prática currícu-
conceito de prolepse exige desconstruir a los que considerem o papel da canalização
ideia de teleologia dos planejamentos cur- cultural e do planejamento do ensino sobre
riculares e compreender que as divergên- as ações, emoções, valores e experiências
cias entre planejamento e expectativas das do individuo. Tais ações se relacionam de
pessoas é o que pode dar sentido às ações perto com a coconstrução de significados e
pedagógicas. Considerar a diversidade in- a apropriação de sentidos específicos para
dividual, do aprendizado, e reconhecer o desenvolvimento integral do estudante.
que apenas quando existe espaço para o Esses processos de canalização e signifi-
surgimento da novidade é que a escola é cação são amplamente explicados desde
capaz de atingir os seus objetivos. Assim, é a Psicologia Cultural e a discussão destes
essencial que a escola promova o desenvol- processos precisa ser feita entre os inte-
vimento, e não apenas reproduza conheci- grantes da escola, incluindo aí os educado-
mentos, práticas e valores sociais. A escola res e também a família dos alunos. Esses
atual fica presa a antigas amarras e impos- processos permitem a compreensão das
sibilitada de oferecer os necessários espa- formas como os sujeitos se apropriam dos
ços de tensão entre currículo e autonomia, valores, crenças, motivações e emoções
por parte tanto dos professores como dos que definem o seu relacionamento consi-

1139
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

go mesmo, com outros e com o mundo. outros resultados, expressão escrita criati-
Se fossem utilizados de forma produtiva va e bem organizada, em alunos de diferen-
como pilares fundamentais do ensino e do tes séries; do mesmo modo e em propor-
aprendizado, com certeza a excelência se- ção maior, redações “padronizadas” e com
ria uma condição sine qua non na vida das informações incorretas. Na semana seguin-
crianças e adolescentes. te foram realizados sociodramas em cada
uma das turmas. As narrativas propostas
Palavras-chave: prolepse, escola, foram lidas pelos autores, escolhidas dez
desenvolvimento, novidade, currículo. pela turma e dramatizadas por atores es-
pontâneos. Cada autor pode retornar ao
seu texto e modificá-lo apreendendo o sen-
MR LT04 tido e criando novas possibilidades de ex-
pressão de suas ideias. No segundo traba-
Mesa Redonda
lho é apresentada experiência com jovens
de 15 a 19 anos, alunos do ensino médio.
No contexto da formação de multiplicado-
MR LT04-1464 - PSICODRAMA E O
res na prevenção das DST/AIDS, o tema dos
ALUNO EM DESENVOLVIMENTO
líquidos corporais (sêmen, sangue, suor) é
trabalhado através do teatro e do sociodra-
O psicodrama constitui abordagem teóri- ma. Nessa fase do desenvolvimento a “irre-
co-metodológica com ampla utilização na verência” e a “transgressão”, compartilha-
educação. Proposto por J. L. Moreno, no dos na linguagem teatral se transformaram
início do século XX, foi utilizado nos últi- em um discurso articulado e compromis-
mos cem anos em diferentes ambientes sado com a prevenção e a atenção à saú-
de aprendizagem, formais e informais. O de. Como consequência, por iniciativa dos
objetivo desta mesa redonda é apresentar próprios alunos, ações de cidadania foram
três experiências educativas, em diferentes propostas e executadas, como a distribui-
níveis de ensino, que utilizam esta referên- ção de mais de 40 mil camisinhas durante
cia, além de discutir sua importância no o carnaval e formação do laço simbólico no
âmbito da psicologia do desenvolvimento. dia dos namorados e no dia da luta contra a
No primeiro trabalho, um modelo de ação AIDS. Finalmente, o terceiro trabalho obje-
foi empregado para se ensinar conteú- tiva discutir, refletir e apresentar o empre-
dos relacionados à água a alunos do ensi- go da metodologia educacional psicodra-
no fundamental. Cerca de 400 alunos de mática, como alicerçada em Moreno e na
seis aos 14 anos foram levados ao teatro, proposta educacional de Romaña, no curso
onde apreciaram uma peça didática infan- de pedagogia, na disciplina Socionomia,
til. De maneira interdisciplinar, na mesma Psicodrama e Educação. Enfoca o emprego
semana, realizaram redações livres sobre dos recursos de ação, envolvendo desde a
o tema nas aulas de português. Nas aulas dramatização e recursos multissensoriais,
de ciências o conteúdo ainda foi reforçado como jogos, textos, música, dança, etc, Os
apresentando-se cartilha com os persona- temas que emergiram, em sala de aula fo-
gens da peça. As redações foram analisadas ram os seguintes: bullying, inclusão, assé-
quanto ao conteúdo, verificando-se, entre dio moral no local de trabalho, sexualidade

1140
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do adolescente, entre outras. Os alunos to e a organização de atividades em espa-


relataram que o método educacional psi- ços de aprendizagem formais e informais.
codramático possibilita aos educadores, Nesse contexto, o espaço lúdico tem sido
trabalharem com os aspectos criativos, considerado por diversos autores (Mo-
espontâneos, além da motricidade, afeti- reno, 1984; Romaña, 1985; Wechscler,
vidade e o grupo, em um campo relaxado. 1991) como lócus para a compreensão
Paralelamente, ocorre a aprendizagem, de do desenvolvimento humano e da orga-
uma proposta filosófica e metodológica, nização da aprendizagem sócio-cognitiva.
utilizando técnicas específicas, para inter- Dentre seus mais importantes aspectos
venção na realidade. Em suma, o grupo é podemos destacar o sentido de liberda-
fonte de aprendizado, de realização e reso- de, de espontaneidade e de criativida-
lução de problemas. de. O objetivo deste artigo é apresentar
e discutir um experimento pedagógico
realizado em Brasília com alunos do en-
O PAPEL DOS JOGOS TEATRAIS NO sino fundamental. A perspectiva sociop-
DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES sicodramática oferece interpretação da
SOCIO-COGNITIVAS EM ALUNOS DO interação a partir das ações. Cada ato
ENSINO FUNDAMENTAL corresponde a um tecido ou complexo
Paulo Bareicha - UnB psicodramático, que integra pensamento
paulo.bareicha@gmail.com e ação através de diferentes linguagens
expressivas. Na Figura 1 apresentamos o
A abordagem sociopsicodramática é im- esquema teórico como proposto por Ro-
portante referencial para o entendimen- maña (1998):

Figura 1 – Tecidos ou complexos psicodramáticos

Fonte: Romaña, 1998.

1141
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

A proposta de ação foi organizada como Depois da apresentação, uma cartilha,


um PEAC (Projeto de Extensão de Ação elaborada por alunos da UnB foi entregue
Contínua) tendo características interdisci- aos alunos com conteúdo especialmen-
plinares e multirreferenciais. Participaram te relacionado ao lixo jogado na água. A
professores e alunos dos cursos de Peda- experiência funcionou como uma campa-
gogia, Artes Cênicas e Sociologia; partici- nha para a despoluição do lago Paranoá.
param ainda alunos de Letras, Psicologia e Foram distribuídas cerca de 10.000 (dez
Antropologia. O modelo de ação, como ob- mil) cartilhas aos participantes especta-
servado na Figura 2, foi organizado a partir dores. Organizados em suas próprias salas
de uma peça teatral. Esta peça contou com de aula, alunos e professores realizaram
a participação dos alunos de artes cênicas “sociodramas da água”. A plateia oscilou
e a direção de uma professora. Também entre 50 e 400 pessoas, sendo realizadas
participaram alunos e professores da pe- no total 163 (cento e sessenta e três) apre-
dagogia. A peça foi apresentada para 40 sentações em salas de aula das escolas.
escolas de tempo integral no complexo Fu- Nas aulas de ciências os alunos tinham
narte. As apresentações mobilizaram toda aula expositiva sobre o lago Paranoá e
a escola e atingiram perto de cinco mil alu- realizaram projetos individuais apresen-
nos. O aprendizado decorrente do desafio tados em grupo nas semanas seguintes.
constante de adequação das metodologias Era feita uma comparação entre o que os
do teatro-educação, demandado pelos alunos tinham de conhecimento sobre o
diferentes espaços e públicos, instigou a tema e a visão posterior à atividade. Nas
curiosidade dos alunos e professores, ge- aulas de português foi realizado um con-
rando, inclusive, a organização de ciclos de curso de redações sobre o Lago Paranoá.
leituras e debates sobre o tema. Foram produzidas quase 5 mil redações

Figura 2 – Modelo de Ação realizado nas escolas

Fonte: Bareicha, 2006.

1142
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cujo conteúdo foi analisado conforme a estudantes como protagonistas na refle-


metodologia proposta por Bardin (2002). xão e na transformação de sua realidade.
Os resultados apresentaram erros como Foram utilizadas diferentes metodologias
afirmar que o Lago foi “obra de Deus” pedagógicas. Tais iniciativas mostraram
ou foi feita “na época do império” ou que o tema da “morte pela falta de água”
“na época dos militares”; também houve protagoniza uma preocupação social veri-
respostas estereotipadas como o “lago ficada no pronto engajamento de profes-
é azul”, “é bonito”, “tem peixes”; houve sores e alunos na proposta. A diversidade
respostas munidas de preconceito, como metodológica otimizou diferentes formas
afirmar que “são as pessoas que moram de ação social e elucidou a importância
ao redor do lago que poluem o lago”; e do Protagonismo Juvenil como forma de
houve respostas criativas, criação de en- superar os limites e desafios. O trabalho
redos, tramas e circunstancias que utili- conjunto de professores e alunos viabili-
zaram o contexto do lago Paranoá como zou maior aproximação da universidade
pano de fundo de suas narrativas. Para com a comunidade. Nas salas de aula, o
os sociodramas, as redações foram lidas aprendizado mediado por adultos e jo-
pelos autores em sua classe, que elege- vens fez que os juvenis fossem motivados
ram dez para serem dramatizadas. Após a expressarem melhor suas ideias ofere-
exercício teatral, alunos se transforma- cendo espaço para crescimento e apren-
ram em atores espontâneos e dramati- dizagem.
zaram as propostas redigidas. Nesse mo-
mento os tecidos psicodramáticos foram
esgarçados e observou-se desenvoltura CIDADANIA: PARA APRENDER NO ATO
(qualidade dramática) dos jovens atores, Fernando de Assis Alves - EDUCAVIDA
ao improvisarem textos e cenas novas, fernando.educavida@gmail.com
dando novo colorido, nova forma e con-
teúdo aos textos. Os primeiros autores O desafio da formação de jovens, em edu-
se divertiram ao ver sua redação drama- cação e saúde em HIV/Aids é permanen-
tizada e presenciaram a apropriação de te. Congressos, encontros, cursos, even-
sua proposta pelo coletivo, transformada tos, palestras e demais espaços de com-
em sociodrama. A arte, de modo geral, e partilhamento de experiências e conheci-
o teatro, em diferentes variações, foram mentos contribuem ao desafio diário no
identificadas tanto como importantes ins- âmbito da prevenção, do tratamento e de
trumentos metodológicos, quanto como assistência. Partindo desse pressuposto e
sensíveis linguagens na expressão, na da relevância que tem a extensão univer-
transmissão, na difusão e na construção sitária enquanto eixo central da formação,
coletiva e experimental de conhecimen- se faz extremamente necessária a parti-
tos, qualidades essenciais à realização de cipação dos estudantes em espaços que
ações afirmativas de cidadania em uma contribuam para o aprimoramento com
perspectiva ecopedagógica (Bareicha, o trabalho na ponta, nas suas respectivas
2006). A falta de água como drama cole- áreas de atuação e interesse. A formação
tivo mundial foi o tema central abordado. permanente é pilar para a formulação de
O objetivo geral foi o de implicar jovens políticas públicas que atendam as deman-

1143
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

das apresentadas e articuladas com as após as apresentações havia a coordena-


universidades, organizações da sociedade ção do sociodrama, momento em que a
civil, organizações governamentais e or- plateia podia, não só sugerir alteração de
ganismos internacionais. Em 2005/2006, determinadas cenas, como também par-
tem início uma adaptação do texto de Ni- ticipar delas, nesse caso com foco em DST
colai Gogol, por Paulo Bareicha e direção e Aids. O teatro ecopedagógico também
de Clarice Costa, da peça “o Nariz”, com o utilizou método baseado na Pedagogia
objetivo de trabalhar os “líquidos corpo- do Drama. Desenvolve uma divertida co-
rais”: sangue, suor e sêmen. A peça retra- média em que aspectos da sexualidade
tava, de forma bem humorada em críticas humana são abordados incluindo-se bri-
sociais, o dia de um egocêntrico Major gas de casal, assédio, moralismo, abuso
que, inexplicavelmente, acordou sem o de poder e outras vicissitudes da vida
seu nariz. A peça esta dentro da proposta sexual cotidiana, onde a platéia entende
ecopedagógica, que provoca uma série de como quiser as metáforas “do nariz” e se
inquietações, reflexões, relações com seu identifica com os personagens durante o
interior, seus papéis e relações sociais. O espetáculo. Foram desenvolvidas, ainda,
tema da água perpassava de modo trans- ações durante o carnaval, dada a neces-
versal, por todo o trabalho, enfatizando sidade de um trabalho de prevenção em
os fluídos corporais. O trabalho contou espaços de maior vulnerabilidade frente
com a participação de estudantes e pro- à gravidez não planejada, a infecção por
fessores no elenco e foi apresentada di- DST/HIV/Aids, ao uso abusivo de álcool e
versas vezes. Dentre as diversas ações outras drogas, dentre outros problemas.
que compunham a preparação, o grupo Momentos de diversão por vezes fazem
teve aulas de maquiagem. Essa prepara- com que as pessoas tenham comporta-
ção, num formato completo, foi extrema- mentos que podem contribuir para uma
mente relevante, porquanto nem todos maior propensão a atitudes vulneráveis.
que participavam dos trabalhos eram alu- O projeto Teatro Ecopedagógico, desde
nos de artes cênicas. Havia, no entanto, 2004, desenvolve ações no campo da
a necessidade, não só de “uniformizar” educação e promoção da saúde, com ati-
conceitos, métodos e técnicas, mas, aci- vidades diversas. Durante o carnaval os
ma de tudo, aprimorar de modo holístico estudantes de Projetos 3 e 4 coordena-
toda a produção do trabalho. Os exercí- ram ações de prevenção. No ano de 2005
cios corporais trabalhavam a expressão, o houve a primeira inserção do grupo nos
improviso, o foco e a atenção. Essa parte trabalhos, onde se desenvolveu ações
do projeto foi importante para a formação que variaram entre palestras, oficinas,
individual e coletiva, refletindo na própria cursos e até a disponibilização de insumos
execução das apresentações, que exigiam de prevenção (preservativo masculino, fe-
bastante performance de improviso. Exer- minino, gel lubrificante) durantes os dias
cícios de improviso eram muito utilizados de intervenção. Essas ações demandavam
nos encontros, uma vez que, durante as planejamento e preparação por meio de
técnicas de sociodrama e teatro-fórum revisão de literatura, discussão de técni-
realizadas após as apresentações se fa- cas e estratégias de intervenção educa-
ziam necessárias para os trabalhos, onde, tiva, preparação do ambiente (cenário),

1144
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dentre outras questões que são neces- movimento, da afetividade, do social, da


sárias para realização dos trabalhos. Ga- história de vida das pessoas se concatena
rantir a participação juvenil nos espaços com os aspectos cognitivos. As técnicas
democráticos de planejamento, avalia- didáticas devem então buscar a integra-
ção, implementação e compartilhamento ção da condição humana e suas relações
de experiências no tocante as políticas de interpessoais. Sendo, então, imprescindí-
educação e saúde é imprescindível. vel que o educador possa empregar várias
linguagens para facilitar e mediar os co-
nhecimentos. Estas competências e habi-
O PSICODRAMA NA UNIVERSIDADE: lidades são direcionadas ao uso de recur-
ESPAÇO DE APRENDIZAGEM E sos multissensoriais e linguagens diversas
DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS como exemplos, metáforas, imagens, ex-
E HABILIDADES PARA INTERVENÇÃO EM periências, depoimentos que são funda-
GRUPOS mentais para produção e conexões signifi-
Ana da Costa Polonia - UnB cativas entre os conhecimentos prévios e
polonia@unb.br os novos (Romanã, 1992). Neste sentido,
os alunos e alunas, em todas as aulas, têm
A disciplina Socionomia, Psicodrama e oportunidade de experienciar e se apro-
Educação, ofertada para o curso de Pe- priar do método educacional psicodramá-
dagogia, tem um caráter, eminentemente tico, já que o espaço da aula é divido em
vivencial, e em todos os momentos, se dois momentos: fundamentação teórico-
busca a articulação teórico-prática. Sua -metodológico e cenas, onde tais funda-
vocação é promover a constante inter- mentações são explicitadas por meio da
locução entre o conteúdo e a sua forma dramatização. Nas primeiras aulas, se em-
de aplicação, ou melhor, intervenção no pregou recursos disponíveis no ambiente,
espaço educativo. Neste sentido, as vá- com o objetivo de demonstrar que o psi-
rias linguagens, os recursos de ação e a codrama não necessita de materiais sofis-
dramatização, são potencializadores do ticados, espaços fechados ou mesmo, de
conhecimento e da capacitação profissio- script para se desenvolver. Paralelamen-
nal. Facilitando a emergência da criativi- te, a esta noção de ampliação de recursos
dade e da espontaneidade, a qualidade de ação, os estudantes podem superar a
dramática presente nas cenas que pos- ‘conserva cultural’, termo cunhado por
teriormente, os futuros docentes podem Moreno, que não há planejamento ou
empregar nos espaços de trabalho. A ar- organização, por parte do diretor, já que
ticulação entre a didática, a dramatização a cena é escolhida pelo próprio grupo.
e o espaço pedagógico, é reconhecida Na verdade, eles assimilam que o dire-
Romanã (1987, 1992, 1996 e 1998), apon- tor deve ter um preparo, fomentando a
tando a colaboração direta dos recursos espontaneidade e criatividade e dominar
do psicodrama pedagógico para o proces- as técnicas (duplo, solilóquio, inversão de
so ensino-aprendizagem. Esta proposta papéis, interpolação de resistências, etc)
de trabalho integrativo, característica para manejar e desenvolver a proposta
do método educacional psicodramático, do grupo. Reconheceram que a prepara-
resgata os conhecimentos oriundos do ção do diretor, seu conhecimento teórico,

1145
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

didático e metodológico asseguram tra- tir a aquisição do conhecimento em nível


balhar com o improviso, incrementando intuitivo e intelectual, ainda possibilita a
os estados espontâneos, desenvolvendo participação ativa e ressalta-se de forma
o trabalho em um campo relaxado e pos- proativa ao aluno, em um contexto gru-
sibilitando a ação dramática. Entre os te- pal. O método educacional psicodramáti-
mas que surgiram entre os alunos tanto co, uma proposta com fins pedagógicos,
para dramatizar quanto para implementar apresenta as etapas (aquecimento, ação
a vivencia entre os seus colegas, se pode dramática e comentários), resgatando os
listar: disciplina em sala de aula, assédio contextos (social, grupal e dramático) e
moral no espaço de trabalho, processo de por meio dos instrumentos (diretor, ego-
inclusão, sexualidade e escola, bullying, -auxiliar, protagonistas, cenário e platéia),
jogos dramáticos, etc. Wallon (1986 ci- propostos por Moreno, como retomado
tado em Nascimento, 2004) postula que por Romanã (1992), aciona os recursos
além dos conteúdos, a escola deve tra- criativos, por vezes, estagnados nas pes-
balhar para formação integral do ser hu- soas. A metodologia psicodramática é um
mano e, com isso, os aspectos ligados à instrumento fundamental para aprendi-
cidadania, à personalidade, à expressão zagem, seja ela formal ou informal. Tanto
da subjetividade e, o interjogo entre o nas organizações, na saúde, na escola e
individual e o coletivo. Ele ainda amplia na comunidade, o sujeito e o seu grupo
esta discussão apontando que os campos estão em constante aprendizagem. En-
funcionais: afetividade, movimento e cog- fim, a metodologia psicodramática fo-
nição estão interligados para promover o menta a ação, o potencial ativo e, assim
desenvolvimento e aprendizagem. Ainda, está focalizado no interesse do aluno e de
sobre o processo de aprendizagem, Ro- suas experiências, aliada a uma situação
manã (1992) ressalta a sua preocupação viva, que permite ao professor empregar
quanto à artificialidade dos conteúdos os mais variados recursos para construir
educacionais, isto é, a distância do que é o conhecimento. A espontaneidade e a
aprendido no espaço educativo formal e a criatividade como aspectos inerentes ao
vida dos alunos. E assim, ela enfatiza algu- psicodrama e o trabalho num campo re-
mas características da utilização pedagó- laxado facilita a apreensão de uma dada
gica dos conhecimentos do psicodrama: experiência e conteúdo. E o que se reco-
como método no processo de construção menda que ela esteja aliada com outras,
de conhecimento, o role playing ou jogo por exemplo, meios audiovisuais, filmes,
dramático de papéis empregados na es- textos, com qualquer técnica grupal e de
truturação daqueles papéis ligados ao ensino programado entre outras. Romanã
espaço educativo, os sociodramas para (2004) amplia a perspectiva do psicodra-
focalizar e interferir em situações de con- ma pedagógico por meio da ‘pedagogia
flito, o jornal vivo para dar tratamento do drama’, que emprega a proposta so-
diferenciado às notícias veiculadas pela cionômica de Moreno aplicada à educa-
mídia e refletir sobre elas, e por último, o ção, buscando a transformação pela ação
teatro espontâneo para a percepção dos torna-se uma ação pedagógica estrutura-
conteúdos ocultos na compreensão da da sobre três pilares: a teoria sócio-histó-
realidade. O psicodrama, além de garan- rica de Vygotsky, a ética presente na Pe-

1146
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dagogia da Autonomia de Paulo Freire e çou a ser utilizado por pesquisadores com
a didática sociopsicodramática inspirada o objetivo de diferenciar estudos sobre o
na socionomia de Moreno. Consiste, en- impacto social da escrita dos estudos em
tão, em uma abordagem educacional que alfabetização, que se ligavam quase que
aglutina ao saber adquirido na aprendiza- espontaneamente à escolarização e ao
gem formal com a experiência vivida. Em desenvolvimento de competências indi-
resumo, articula os saberes ditos formais viduais. Diante dessa preocupação com
com as experiências afetivas e culturais o impacto social da escrita e das práticas
dos estudantes, visando o desenvolvi- sociais em que ela é central, os estudos
mento de uma postura crítico-reflexiva em Letramento desligam-se do individual
para compreender o mundo e as relações e centram-se no social, investigando não
interpessoais, ressaltando o compromisso apenas quem é alfabetizado, mas todos
e autonomia nos indivíduos. Ainda, possi- os sujeitos que de certa forma se enga-
bilitando alternativas didáticas e criativas jam em atividades de escrita, mesmo que
com a participação ativa de todos os ato- dominem ou não as habilidades de leitu-
res no espaço educacional, por meio de ra e escrita. O conceito de Letramento,
diálogos e projetos que visem trabalhar portanto, focaliza os aspectos sócio-his-
valores e a ética, além das mediações cul- tóricos que são vistos como intrínsecos
turais e sociais. à aquisição da escrita. Ao abordar-se a
compreensão da criança sobre a funcio-
nalidade da língua escrita, é ressaltada a
CO 53 - LT02 importância do texto enquanto unidade
mínima de sentido lingüístico. O uso da
Cognição linguagem escrita em sociedade se faz
prioritariamente pelo texto. Dessa for-
ma, foi investigado o nível de Letramento
LT02-824 - O CONHECIMENTO DE dos alunos em relação aos portadores de
ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO texto – objetos para serem lidos ou ob-
FUNDAMENTAL SOBRE OS PORTADORES jetos que carreguem um texto impresso
DE TEXTO (jornal, receita de remédio etc.) (Moreira,
Kaline Jurema Jambeiro Rocha - UNIVASF 1992). O conhecimento sobre portadores
rocha.kaline@yahoo.com textuais será aqui tomado como um indi-
Maria Tarciana de Almeida Barros - UNIVASF cador de Letramento. O presente estudo
mariatarciana@yahoo.com.br nasceu da preocupação crescente com a
qualidade do ensino da linguagem escrita
Os estudos sobre Letramento no Brasil são no que se refere ao fenômeno do Letra-
recentes, datando de duas ou três déca- mento. Diante desse cenário, objetivou-
das e seguindo as preocupações com gru- -se identificar o nível de letramento pre-
pos sociais marginalizados que não domi- sente em estudantes do primeiro ano do
nam a escrita. Por seu próprio estado de ensino fundamental de escolas públicas
construção, é um conceito que enfrenta do Vale do São Francisco. Participaram do
dificuldades em sua definição. De acordo estudo 50 crianças de baixa renda, de 6 a
com Kleiman (1995), tal conceito come- 7 anos, todas alunas do primeiro ano do

1147
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Ensino Fundamental I de Escolas Públicas texto apresentados. Quanto à função do


Municipais da região do Vale do São Fran- portador, pode-se dizer que a maioria dos
cisco. Foram aplicadas tarefas, em entre- participantes encontra-se no Nível II (58,3
vistas individuais, que avaliaram o conhe- %), p<0,001, ou seja, as crianças atribuem
cimento sobre portadores de textos dos função ao portador levando em conside-
alunos. Eram apresentados 14 portadores ração situações particulares de contatos
de texto separadamente, cada um geran- com o objeto ou considerando que a fun-
do quatro perguntas: (1) Gostaria que ção dos portadores possui um fim em si
você me desse o portador X; (2) Como mesma, mas não identificam uma função
você sabe que este é o portador X?; (3) O comunicativo social dos mesmos. Os da-
que você acha que tem escrito no porta- dos trazidos revelaram que apesar dos es-
dor X? e (4). Pra que a gente usa o porta- tudantes investigados conseguirem fazer
dor X?. Com isso, obteve-se 2800 respos- a identificação dos portadores de textos,
tas para o grupo total de participantes. mostraram ainda não ter desenvolvido
Assim, focalizou-se o conhecimento dos conhecimentos sobre a função comuni-
alunos sobre a identificação do portador, cativo-social da escrita, assim como sobre
suas características, seu conteúdo, usos o conteúdo que os portadores possuem.
e funções. Inicialmente, o grupo de pes- Portanto, pode-se questionar: qual o
quisa estudou a bibliografia referente à sentido que tais crianças estão produ-
temática da pesquisa. A seguir, o proje- zindo sobre portadores de texto? Os da-
to foi submetido ao Comitê de Ética em dos apontam que os mesmos consistem
Pesquisa com Seres Humanos. Sendo as- em objetos extrínsecos, porém não são
sinado o TCLE, realizaram-se entrevistas utilizados de fato como objetos comuni-
com os alunos participantes. A análise cativos no cotidiano das crianças. Sendo
dos resultados foi realizada por meio de assim, destaca-se a importância de tornar
categorizações das repostas em níveis a experiência com portadores de textos
hierárquicos, os quais foram posterior- mais significativa para as crianças, o que
mente avaliados estatisticamente (análi- pode ser realizado em várias agencias de
se de variância). As análises foram feitas Letramento, inclusive na escola, conside-
com base em estudo de Moreira (1992). rada como uma das agências de letramen-
Quanto à identificação dos portadores to. As dimensões da escrita ultrapassam
de texto, notou-se uma maior freqüên- as barreiras da relação grafofônica, sendo
cia de respostas concentradas no Nível III preciso pensar em outras dimensões tais
(47,4%), p<0,001, ou seja, a maior parte como: a compreensão de textos, as habi-
do alunado em questão consegue identi- lidades cognitivas e metacognitivas e os
ficar corretamente os portadores, tendo conhecimentos sobre textos envolvidos
como critérios as características inerentes neste processo, propondo novas estraté-
aos mesmos. Já quanto ao conteúdo dos gias de ensino-aprendizagem.
portadores, notou-se que a maioria dos
participantes encontra-se no Nível I (50,9 Palavras-chave: alfabetização; letramento;
%), p<0,001, ou seja, os alunos erram portadores de textos .
ou nada dizem em relação às previsões Contato: Kaline Jurema Jambeiro Rocha,
quanto ao conteúdo dos portadores de UNIVASF, rocha.kaline@yahoo.com.

1148
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT02-902 - COGNIÇÃO, BILINGUISMO E relativo à surdez, e nenhuma relativa ao


PESQUISA NO BRASIL bilinguismo indígena. Uma análise das
Ana Catharina Lima palavras-chaves realizadas neste estudo
anaclc@yahoo.com.br revelou que 50% delas faziam referência à
Luciana Hodges - UFPE déficits ou distúrbios (fala, escrita, etc.) e
lucianahodges@gmail.com apenas 21% delas relacionavam-se à cog-
Alena Nobre - UFPE nição. Embora este estudo seja um recor-
alenacabral@gmail.com te limitado sobre o tema, ele revela algo
Antônio Roazzi - UFPE já perceptível nas práticas educativas: as
roazzi@gmail.com especificidades da aquisição de um se-
gundo idioma, enquanto segunda língua
O Brasil é tradicionalmente considera- e em situação de educação bilíngue, no
do um país monolíngue; entretanto, é Brasil, parecem não receber suficiente
um país multicultural formado a partir atenção de pesquisadores brasileiros, ha-
da colonização e imigração de vários po- vendo, portanto muito a ser esclarecido
vos, que trouxeram consigo suas línguas nesse domínio. Isso é ainda mais agravan-
e culturas. Desta forma, como afirma te quando se confirma o baixo número de
Moura (2009), compreender a identida- estudos que relacionam bilinguismo com
de nacional brasileira, a despeito desta aspectos cognitivos. Isso resulta em que
formação multifacetada, como uma na- os educadores e outros profissionais inte-
ção uniforme, de convivência pacifica e ressados sobre o assunto têm necessaria-
monolíngue, trata-se de ilusão. O Brasil, mente que se apropriar como referência
portanto, pode ser considerado um pais para seus estudos, das pesquisas realiza-
multilíngue. Isso é reforçado pela presen- das fora do país. Entretanto, esses estu-
ça crescente das escolas bilíngues, esco- dos, inevitavelmente, trazem consigo par-
las internacionais, e escolas localizadas ticularidades culturais, políticas, sociais
em fronteiras de países com o Brasil. Há do contexto onde o estudo foi realizado e
também que se levar em consideração que interferem no desempenho cognitivo
a Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS, as do sujeito. Essas particularidades podem
170 línguas ainda presentes nas comuni- não se igualar aos contextos brasileiros,
dades indígenas (ainda que minoritárias), fazendo com que a generalização dos re-
bem como uma variedade de dialetos sultados desses estudos para a realidade
existentes (Moura, 2009). Se por um lado brasileira deva ser feita, no mínimo, com
há argumentos apontando o Brasil en- muita cautela, podendo até se tornar in-
quanto pais multilíngue, é difícil discutir viável como referência. Um exemplo dis-
a relevância dada a isso no país. Nobre, so são os estudos realizados fora do país
Hodges e Roazzi (2011) realizaram um com imigrantes. Em muitas pesquisas, o
levantamento de estudos publicados em contexto de imigração traz consigo ele-
português nas bases de dados de psicolo- mentos tais como nível sócio-cultural e
gia e educação veiculada pela CAPES nos econômico muito diferentes do que se
últimos dez anos (2000 – 2010). Foram costuma encontrar no Brasil. Enquanto
encontradas apenas 28 publicações sen- na realidade brasileira atual os estrangei-
do a maioria voltada para o Bilinguismo ros que têm uma educação bilíngue são

1149
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aqueles com boas condições econômi- serção num mundo globalizado, deve-se
cas e que optaram por essa modalidade considerar outras características relativas
educativa, na realidade de outros países a essa amostra que podem influenciar na
é mais comum encontrar estrangeiros cognição, tais como: acesso fácil e orien-
com baixo nível sócio-econômico e cujas tado aos meios de comunicação (livros,
cultura e língua de origem não são valori- jornais, revistas, programas de televisão
zadas socialmente; para estes últimos, o aberta e a cabo, internet); conhecimen-
bilinguismo aparece mais como uma ne- to e vivências culturais possibilitadas
cessidade do que uma escolha. Esse sta- por viagens para outros países, uso da
tus do imigrante perante a cultura de seu tecnologia da informação, entre outros.
país de migração vai interferir de modo Portanto, estudar este tipo de amostra
particular na vivência que tem da situa- requer cuidados metodológicos que pos-
ção bilíngue, o que é fator que influencia sam estar apropriados para o estudo das
os resultados de pesquisas. Há que se especificidades do mesmo. A psicologia
considerar ainda que o bilinguismo no cognitiva é uma área que pode ser con-
Brasil (em se tratando da aquisição de um siderada como uma importante contri-
segundo idioma no contexto da educação buidora dos estudos sobre bilinguismo e
bilíngue) é vivenciado, em geral, não por educação bilíngue, uma vez que há forte
imigrantes, mas por uma parte minori- tendência dos estudos realizados fora
tária da população que tem condições do Brasil correlacionarem bilinguismo e
de custear seus estudos numa Escola de cognição. Em geral, os resultados desses
Educação Bilíngue e que vê no bilinguis- estudos indicam que em comparação
mo oportunidades de um futuro profis- aos monolíngues, os bilíngues apresen-
sional melhor. O próprio conceito de Bi- tam ganhos nas funções executivas, tais
linguismo não tem uma definição unâni- como: atenção, inibição, monitoramento
me entre os estudiosos, o que ocasiona e alternância de tarefas (Bialystok, 2007,
estudos que se referem a níveis de habili- 2008). Pesquisas anteriores só considera-
dade linguística muito variados. Também vam a existência de tais diferenças cogni-
o conceito de Educação Bilíngue é amplo, tivas quando os sujeitos bilíngues eram
devido à existência de várias modalidades proficientes nas duas línguas. Mas hoje,
(Megale, 2005). Podemos dizer que, em levam-se em consideração os diferentes
geral, no Brasil privilegia-se um modelo níveis de domínios em diferentes habi-
de Educação Bilíngue de enriquecimento lidades (ler, escrever, falar, compreen-
por imersão, cujas motivações produzem der). Reforça-se, mais uma vez, que para
um tipo de Bilinguismo denominado, fa- entender essas diferenças cognitivas, é
zendo referência ao critério cultural, de preciso levar em consideração os fatores
elitista (Harmer & Blanc, 2000). Se, por- que cercam o individuo bilíngue no per-
tanto, apresenta-se como característica curso do seu desenvolvimento, tais como
principal da educação bilíngue no Brasil aspectos sociais, culturais, contextuais, e
uma amostra pequena da população que mudanças biológicas. Chama-se para as
possui condição financeira diferencia- ampliações de pesquisas neste sentido
da e que tem como objetivo principal a contribuem não só à psicologia cognitiva,
aquisição de uma segunda língua para in- na medida em que ajuda a compreender

1150
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

as especificidades do desenvolvimento desse discurso interior é apoiar processos


cognitivo e linguístico de sujeitos expos- psicológicos como planejamento da ação
tos a duas línguas. Elas oferecem também e processos de pensamento. Quanto a
elementos a favor do fortalecimento de utilização do diálogo interno em adultos,
uma cultura de Educação Bilíngue no país; há indícios que essa prática se relaciona
bem como sugere as especificidades que diretamente com o autoconhecimen-
devem ser observadas numa intervenção to e resolução de problemas. Contudo,
psicopedagógica com sujeitos bilíngues, um estudo alemão sobre a frequência
que porventura, necessitem de apoio no de oração, autoeficácia e o diálogo in-
percurso do seu desenvolvimento cogniti- terno apontou uma correlação negativa
vo ou acadêmico. entre autoeficácia e oração. Todavia, o
próprio pesquisador ressalta que esses
Palavras-chave: Bilinguismo; cognição, resultados podem ter sido enviesados
pesquisas brasileiras. pelo fato de que alguns participantes te-
Contato: Ana Catharina Lima de Carvalho, rem declarado que oravam nunca ou às
anaclc@yahoo.com.br. vezes. Tais estudos tem se concentrado
primordialmente em participantes adul-
tos. Investigar a faixa etária adulta jovem
LT02-940 - CONVERSAR COMIGO E pode levantar evidências importantes
CONVERSAR COM DEUS: A PERCEPÇÃO sobre o papel da oração no processo de
DE ADULTOS JOVENS SOBRE A FUNÇÃO pensamento em um momento em que o
DA ORAÇÃO E DO DIÁLOGO INTERNO individuo está vivenciando eventos im-
Laís Almeida Ambrósio - UFES portantes como a entrada na vida adulta
lais.ambrosio@gmail.com e muitas vezes também no mercado de
M. Lima de Souza - UFES trabalho e o início da vida universitária.
limadesouza@gmail.com Definimos como objetivo geral desse tra-
balho identificar e descrever a percepção
Financiamento: CAPES
de adultos jovens protestantes sobre a
função da oração e do diálogo interno e,
Em psicologia, há um interesse crescente
mais especificamente, se há semelhanças
em estudar as relações que o ser humano
e ou diferenças entre a prática religiosa
estabelece com a religião. Estudos suge-
e o processo reflexivo de pensamento.
rem que pessoas mais religiosas apresen-
Nessa pesquisa, de caráter qualitativo,
tam um melhor enfrentamento de situa-
participaram 8 indivíduos, sendo quatro
ções estressantes e traumáticas, como no
homens e quatro mulheres, com idades
caso de uma doença, e a oração se mos-
entre 20 e 30 anos. Dos participantes,
tra eficiente em auxiliar esse processo.
duas haviam terminado ensino superior,
Isso porque a oração funciona também
5 ainda estavam em formação e um em
como uma forma de elaboração de situa-
curso preparatório para o vestibular. Com
ções vivenciadas. Por outro lado, estudos
exceção de um participante, todos eram
sobre o processo psicológico do diálogo
envolvidos ativamente na igreja, ou seja,
interno indicam que a fala interior seria
uma forma de linguagem de grande im- que frequentam a igreja ao menos uma
portância para o pensamento. A função vez por semana e/ou estão envolvidos no

1151
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que o protestantismo denominada minis- com Deus eu também tô falando comigo


tério (canto, dança, lecionar). O contato mesmo, automaticamente. Eu tô refletin-
com os participantes foi feito de forma di- do sobre... sobre mim mesma”, Fem2).
reta e as entrevistas realizadas em locais Foi possível definir dois focos proble-
escolhidos pelos próprios participantes. máticos. O primeiro é a interferência da
Para as entrevistas foi criado um roteiro personificação do interlocutor no funcio-
semiestruturado dando a liberdade de namento da reflexividade. Ao relatarem a
serem acrescidas perguntas ao longo da respeito de oração e discurso interno, os
entrevista a fim de se obter melhor escla- participantes declararam que existe uma
recimento durante a narrativa dos partici- forma diferente em realizá-las. A oração
pantes. As entrevistas foram gravadas em é realizada de forma também verbaliza
áudio, com duração média de dez minu- e existe uma preocupação em manter
tos, e transcritas na íntegra para posterior uma estrutura narrativa necessariamente
análise. O método escolhido de análise na sequencia “Exaltar-agradecer-pedir”
foi o método fenomenológico que con- (“Primeiro eu exalto a Deus, depois eu
siste em três etapas: descrição, redução agradeço por tudo, depois eu falo o que
e interpretação. A descrição fenomenoló- tá me preocupando, peço alguma coisa e
gica fez emergir seis temas: 1) diálogo in- peço perdão em nome de Jesus, amém”,
terno como forma de autoconhecimento Fem2). Além disso, por estar sendo dirigi-
(“Conversar comigo mesmo é uma forma do a uma entidade divina, há ainda uma
de eu me conhecer um pouco mais, eu preocupação em construir uma exposição
saber dos meus planos, dos meus obje- de forma mais cuidadosa do que no diá-
tivos”, Masc1); 2) diálogo interno como logo interno. (“E quando você conversa
ferramenta de planejamento e resolução com Deus, você conversa geralmente de
de problemas (“É o seu pensamento, o forma diferente do que você faz consigo
seu modo de pensar que daí você vai to- mesmo. Por exemplo, comigo mesmo eu
mar uma decisão, das várias formas que falo de qualquer jeito”, Fem3). Uma expli-
você tá pensando pra saber sobre o me- cação possível é que existe uma diferença
lhor pra gente”, Fem3); 3) diálogo interno entre a linguagem externa e interna. A
como prática de escrita (“A minha forma linguagem externa necessita da utilização
de conversar comigo mesmo é escreven- de significados que são consenso entre
do e lendo o que eu escrevi e pensando falantes de mesma língua. Internalizada,
e... E as respostas ali escritas”, Masc4); ela funciona em um campo que pode-
4) oração como conversar com Deus e mos chamar abstrato, aonde prevalece
experiência espiritual (“Ah, oração é fa- o sentido individual da palavra sobre o
lar com Deus, né? Você tem que ter fé, significado generalizado. O segundo foco
né, não adianta fazer sem fé”, Masc3); problemático é a diferenciação entre sen-
5) oração como garantia de certeza para tir que tomou a melhor decisão e pensar
vida cotidiana e futura (“Oração é con- em qual a decisão melhor a tomar. Tan-
fiável, oração é certeza. Agora, quando to a oração quanto o diálogo interno são
você para e faz uma análise você pode usados como ferramenta para resolução
errar”, Masc2); 6) oração como diálogo de problemas. Contudo, o diálogo inter-
consigo mesmo (“Então, quando eu falo no não oferece um sentimento de certeza

1152
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que precisa ser complementado pela ora- Os pressupostos centrais sobre os quais
ção. A oração possivelmente garante uma se ancora esta pesquisa são duplos. Por
convicção vinculada à fé e a uma experi- um lado, o estudo se fundamenta em
ência religiosa de vida que garante mais Fuentes (2009), que considera que a
crédito a essa atividade em detrimento da participação e prática em atividades de
outra, criando um sentimento de certeza “debate crítico” mobilizam operações es-
em relação as escolhas feitas. Do ponto pecíficas de raciocínio que possibilitam o
de vista psicológico, pode-se pensar que desenvolvimento do pensamento crítico.
essas pessoas precisam de uma vivência Por outra parte, o estudo se ancora no
afetiva que as assegure de que tomaram consenso encontrado entre teóricos e
a decisão certa (“E eu converso com Deus pesquisadores sobre o papel mediador
geralmente quando eu tomo uma posição da argumentação no desenvolvimento
nas minhas reflexões. A partir daí que eu cognitivo dos indivíduos. Tal mediação
converso com Deus, pra poder ver se isso, é observada na medida em que o enga-
se a minha decisão é dele ou não é muitas jamento do indivíduo na argumentação
vezes, entendeu?”, Fem3). incrementa a tomada de consciência e a
reflexão sobre seu próprio discurso, assim
Palavras-chave: Diálogo interno; oração; como do de outros, propiciando um cená-
adulto jovem. rio favorável para a construção de novas
Contato: Laís de Almeida Ambrósio, UFES, concepções e pontos de vista relativos ao
lais.ambrosio@gmail.com tema em questão (Ascione, 2000; Saíz &
Rivas, 2008; Fuentes, 2009; Leitão, 2010).
Reconhecer o “debate crítico” como uma
LT02-1215 - DESENVOLVIMENTO atividade discursiva, caracterizada pela
DO PENSAMENTO REFLEXIVO: oposição dialógica em que se enfrentam
TRANSFORMAÇÕES NA QUALIDADE distintos usuários da linguagem que sus-
DE ARGUMENTOS DE ESTUDANTES tentam diferentes pontos de vista em
PARTICIPANTES DO DEBATE CRÍTICO relação a um conflito de opinião (Fuen-
Nancy Lizeth Ramírez Roncancio - UFPE tes, 2009, Plantin, 2004), leva a pensá-lo
nalyrra@hotmail.com. como processo particular de negociação
Selma Leitão Santos - UFPE discursiva que privilegia o pensamento.
selma_leitao2001@yahoo.com As trocas contínuas que acontecem du-
Financiamento: CNPq/CAPES-Reuni rante a negociação de um conflito de opi-
nião e exigem do indivíduo que se volte
Este trabalho visa analisar o desenvolvi- sobre seu próprio pensamento e o tome
mento do pensamento reflexivo de estu- como objeto de reflexão (Ascione, 2000;
dantes universitários através da analise Ascione & Rolando, 2002; Fuentes, 2009;
das possíveis transformações na quali- Leitão, 2007b). A ideia anteriormente
dade dos argumentos que apresentam citada permite destacar o caráter de au-
enquanto participantes de uma experiên- torreferencialidade da linguagem –o dis-
cia pedagógica que proporciona intensi- curso em si mesmo– como possibilitador
va reflexão e exercício de argumentação do movimento autorregulador do pen-
(Fuentes, 2009) sobre temas curriculares. samento, ou seja, o papel regulador do

1153
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

discurso favorece a mudança do pensa- tes, 2009) como recurso para discussão
mento para um plano reflexivo, no qual o do conteúdo da disciplina. Os dados uti-
próprio indivíduo se volta sobre os funda- lizados para a análise foram construídos a
mentos e limites de seu próprio discurso partir dos registros videográficos e o ma-
(Leitão, 2007b). Das acepções aqui abor- terial pré-existente pertencentes ao ban-
dadas sobejassem três princípios teóricos co de dados gerado no contexto do pro-
que são assumidos dentro desta pesqui- jeto “O Debate Crítico como contexto de
sa: a) A cognição vista como um sistema desenvolvimento do pensamento reflexi-
complexo de funcionamentos psicoló- vo”, desenvolvido pelo Núcleo de Pesqui-
gicos construídos a partir da relação de sa da Argumentação da UFPE (NupArg/
interdependência entre o sujeito e o am- Diretório de Grupos de Pesquisa-CNPq).
biente histórico-cultural que possibilita Atendendo aos critérios de participação
a interpretação e compreensão da reali- no papel de avaliador e participação ativa
dade circundante (Vigotsky, 1934/2001; nos debates, foram escolhidos de forma
Bruner, 1997); b) Desde uma perspecti- intencional (Morse, 1991) dentre os es-
va histórico-cultural (de base dialógica), tudantes matriculados naquela discipli-
se ressalta o papel da linguagem como na oito (8) participantes. Neste trabalho
fundamental na constituição da cognição serão apresentados dois casos como um
humana e como parte relevante na cons- recorte da analise dos dados construídos,
trução e transformação do pensamento no qual se busco observar a emergência
(Leitão, 2010), e c) A natureza metacogni- de variações tanto na qualidade dos argu-
tiva da argumentação como o mecanismo mentos de cada sujeito (trajetória indivi-
que instaura a reflexão sobre o próprio dual), como nas trajetórias de desenvolvi-
pensamento (Leitão, 2007b). Portanto, a mento de diferentes sujeitos. Este estudo
natureza eminentemente metacognitiva privilegia a análise qualitativa, visto que
que caracteriza o pensamento reflexivo seu objetivo é estudar possíveis trans-
define-o como um “processo autorregu- formações que acontecem na qualidade
lador do pensamento constituído quando de argumentos produzidos por estudan-
um indivíduo toma suas próprias con- tes inseridos numa experiência pedagó-
cepções sobre os fenômenos do mundo gica intensiva de reflexão e exercício de
(conhecimento), como objeto de pensa- argumentação sobre temas curriculares
mento e considera as bases em que estas (debate crítico). Devido às características
se apoiam e os limites que as restringem” discursivas próprias do debate critico e
(Leitão, 2003, pp. 455). O presente es- ao objetivo antes mencionado, a análi-
tudo se caracteriza como uma pesquisa se qualitativa se deu em dois níveis: Na
qualitativa de tipo longitudinal de serie primeira fase da microanálise, se avaliou
de casos (Stake, 2000; Yin, 2001, Flick, a qualidade dos argumentos produzidos
2009) cujos participantes eram estudan- pelos participantes durante a realização
tes de primeiro período da graduação em de debates como em outras situações
psicologia de uma universidade publica, de argumentação que aconteceram em
matriculados em uma disciplina que teve sala de aula ao longo do semestre aca-
como proposta pedagógica central a utili- dêmico, tomando-se como referencia as
zação do Modelo do Debate Crítico (Fuen- concepções de força e solidez definidas

1154
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

por Govier (2010). A preocupação desta LT02 – 1257 - DESENVOLVIMENTO DO


autora pela estrutura e a avaliação dos ar- RACIOCÍNIO NO CAMPO DA HISTÓRIA:
gumentos levá-a a propor como critérios ARGUMENTO BASEADO EM EXEMPLO
de valoração qualitativa, tanto na cons- Dayse Souza - UFPE
trução quanto na produção do argumen- dayse_arianne@hotmail.com
to, as condiciones ARS – aceitabilidade, Selma Leitão - UFPE
relevância e suficiência –, que permitem selma_leitao2001@yahoo.com
avaliar o grau de apoio que as premissas Financiamento: CNPq
oferecem para a conclusão; portanto, um
argumento racional seria aquele que ofe- O presente estudo investigou relações
rece como apoio boas razões para a con- entre argumentação em sala de aula e o
clusão. Na segunda fase da macroanálise, desenvolvimento de formas de raciocínios
procurou-se observar possíveis trajetó- que possibilitam a construção de conheci-
rias de desenvolvimento do pensamento mento em domínios específicos. O objeti-
reflexivo de cada participante através da vo específico consistiu em investigar como
análise de se e como se transforma a qua- a ação epistêmica de contestar ou justifi-
lidade de seus argumentos. Dado que na car uma afirmação recorrendo ao exemplo
atualidade não se conhecem resultados (raciocínio característico do campo da his-
de pesquisas voltadas a indagar o impac- tória) é gerado na argumentação em sala
to do programa de intervenção baseado de aula. O pressuposto subjacente ao es-
no “Modelo de Debate Crítico” (Fuentes, tudo é que ‘aprender’ num determinado
2009), nem medições sistemáticas que campo do conhecimento implica não só a
mostrem o impacto no funcionamento apropriação de conteúdos e informações
psicológico dos sujeitos engajados neste específicos daquele campo, mas, também,
tipo de atividades no contexto de sala de de raciocínios e procedimentos típicos e
aula. Apresenta-se uma pré-análise que aceitáveis naquela área (Leitão, 2003).
mostra uma descrição exploratória sobre Na presente perspectiva a argumentação
o desenvolvimento e aquisição do pen- é compreendida como uma atividade de
samento reflexivo a partir das possíveis natureza dialógico/dialética que ocorre a
transformações que acontecem na qua- partir da justificação de pontos de vista
lidade dos argumentos. Por outra parte, e consideração de perspectivas opostas
com o intuito de contribuir no entendi- com o objetivo último de promover acei-
mento do funcionamento psicológico dos tabilidade das concepções apresentadas
sujeitos que participam em experiências (Van Eemeren, et al.,1996). A necessida-
pedagógicas intensivas de reflexão e exer- de de defender um ponto de vista para
cício argumentativo caracterizou-se como torná-lo aceitável aquele com quem se ar-
acontecem tais mudanças. gumenta, e de responder a idéias alterna-
tivas que emergem no diálogo ocasionam,
Palavras-chave:Desenvolvimento; no discurso argumentativo, um espaço de
pensamento reflexivo; qualidade dos negociação no qual perspectivas contrá-
argumentos. rias a respeito do mundo (físico ou simbó-
Contato: Nancy Lizeth Ramírez Roncancio, lico) são continuamente formuladas, re-
UFPE, nalyrra@hotmail.com. vistas e (trans)formadas. Segundo Leitão

1155
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

(2003/2007), esse processo de negociação típicos daquilo que pretendem exemplifi-


confere a argumentação uma dimensão car. Este tipo de argumento é geralmente
epistêmica que a institui como recurso usado como apoio quando se pretende fa-
privilegiado na construção do conheci- zer uma generalização. Vale ressaltar que
mento. No que se refere à epistemologia nem todo uso de exemplo pode ser con-
da História, Pontecorvo e Girardet (1993) siderado um caso de argumento baseado
apontam um mínimo de dois grupos de em exemplo. Os ‘exemplos’ são também
ações epistêmicas característicos deste utilizados em explicações e outras ações
campo: (1) raciocínios e procedimentos verbais que não se caracterizam como
metodológicos que servem de base para argumentação. Portanto, é considerado
a atividade interpretativa; (2) raciocínios como parte de um argumento apenas o
e procedimentos utilizados na explicação exemplo utilizado para fortalecer (justifi-
de eventos históricos particulares. Con- car, fundamentar) ou enfraquecer (contra-
siderando esse conjunto de raciocínios e -argumentar) um ponto de vista. (Walton,
procedimentos, constatam-se como ações 1996). Método: O estudo ora proposto foi
epistêmicas típicas da História: as defini- realizado com dados obtidos durante a
ções, as categorizações, as predicações primeira fase do projeto Argumentação e
(não avaliativas), avaliações e a justifica- processos de construção de conhecimen-
ção de afirmativas, sendo esta última a to (CNPq/processo no. 501259/2004-0),
ação de interesse particular aos propósi- atualmente pertencentes ao Banco de Da-
tos do estudo em questão devido à sua dos do Núcleo de Pesquisa da Argumen-
natureza argumentativa. Dentre os recur- tação (NupArg) da Pós-Graduação em Psi-
sos tipicamente usados na justificação de cologia Cognitiva da UFPE, cujo conteúdo
afirmativas (apelos a analogias, exemplos, total abrange dois anos de registros vide-
condições, regras e princípios gerais, au- ográficos de aulas de História de uma tur-
toridade (especialistas, fontes), motivos/ ma do ensino fundamental (no percurso
intenções/metas, conseqüências/implica- da 6º, 7º e 8º série) de uma escola pública
ções) o estudo priorizou a ação epistêmica experimental do Recife. O presente estu-
de justificar ou contestar uma afirmação do visou, especificamente, a análise dos
apelando-se a exemplos. A escolha do dados do primeiro semestre da 7ª série.
raciocínio baseado em exemplo está dire- O procedimento de análise efetivou-se em
tamente relacionada a resultados obtidos quatro fases: (1) transcrição; (2) identifi-
em fase preliminar do estudo, durante a cação dos episódios argumentativos com
qual foi observado que exemplos eram base na unidade de análise (Leitão, 2007)
freqüentemente invocados por professora composta pela tríade: argumento (ponto
e alunos. O propósito deste estudo foi en- de vista mais justificativa de um propo-
tão definido como sendo o de investigar nente), contra-argumento (ponto de vista
em que medida exemplos eram invocados contrário de um oponente ao ponto de
em sala de aula com o intuito de funda- vista inicial) e resposta (resposta do pro-
mentar afirmações (argumento baseado ponente ao contra-argumento), (3) iden-
em exemplo). No argumento baseado em tificação do uso de exemplos; e (4) iden-
exemplo o mais importante não é o nú- tificação de exemplos usados como parte
mero de exemplos usados, mas sim se são de um argumento ou contra-argumento.

1156
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Resultados e Discussão. A partir das aná- to, espera-se que os resultados obtidos
lises realizadas constatou-se que: 50% das no presente estudo incentivem reflexões
aulas analisadas apresentavam episódios direcionadas para a importância da dis-
argumentativos, das quais 10% foram ini- cussão em sala de aula, e contribua com
ciadas por algum aluno e os outros 40% a produção de novas estratégias didáticas
foram iniciados pelo professor. Verificou- que valorizem o discurso argumentativo
-se argumento baseado em exemplo em e que tornem cognitivamente produtivo
apenas 20% dos episódios argumentativos esse tipo de interação verbal no contexto
identificados. O uso de exemplos não ar- instrucional.
gumentativos, mas para fins explicativos/
elucidativos, foi observado em 60% das
aulas analisadas. Os resultados apresen- Palavras-chave: argumentação; construção de
tados evidenciam que, naquele contexto conhecimento; ensino de história
instrucional, a argumentação foi gerada, Contato: Dayse Arianne de Souza; UFPE;
principalmente, pelo professor. Ocorria a dayse_arianne@hotmail.com
freqüente utilização de exemplos para fins
não argumentativos. O argumento base-
ado em exemplo surgiu com pouca fre- LT02-1395 - ESTUDO DE REVISÃO
qüência, sendo essa forma de raciocínio, SISTEMÁTICA: UM LEVANTAMENTO
embora considerada típica no campo da SOBRE COMO O TESTE DE DESEMPENHO
história, pouco utilizada para fundamen- ESCOLAR (TDE) TEM SIDO UTILIZADO
tar e/ou contestar afirmações de modo a NOS ÚLTIMOS DEZESSEIS ANOS
favorecer a elaboração de pontos de vista Claudia Giacomoni - UFRGS
e a (re)construção do conhecimento so- giacomon@uol.com.br
bre o tema em discussão. Em consonân- Luiza Feijó - PUCRS
cia com Pontecorvo (2005), a análise dos lulufeijo@gmail.com
dados legitima a idéia de que a potência Pilar Petrasi Guahnon - FFCMPA
dos contextos de conflito de opiniões para pilarpetrasi@gmail.com
explicar e argumentar, ainda é pouco utili- Lilian Milnitsky Stein - PUCRS
zada na escola para fins de aprendizagem. lilian@pucrs.br
A instituição escolar freqüentemente Financiamento: CAPES
mantem a estrutura usual das conversa-
ções em sala de aula, com a típica seqüên- A avaliação da aprendizagem escolar tem
cia “pergunta do professor - resposta do como objetivo acompanhar a aquisição
aluno - comentário do professor”, que res- de conhecimento do aluno de uma forma
ponde, sobretudo, ao objetivo de avaliar o sistemática e gradual, verificando as mu-
aluno, verificando os conhecimentos que danças que o ensino produz no desempe-
ele já possui, ao invés de favorecer a con- nho. O processo de avaliação constitui-se
traposição dos pontos de vista e a constru- numa peça importante da educação, pois
ção do conhecimento.Tendo em vista que sem ela não é possível acompanhar o pro-
a argumentação comporta processos lin- cesso ensino-aprendizagem. A avaliação
güísticos e sociocognitivos relevantes para possibilita verificar o cumprimento dos
a aquisição e construção de conhecimen- objetivos, uma vez que averigua mediante

1157
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

um processo gradual, contínuo, sistemáti- uma escala de itens em ordem crescente


co e acumulativo as mudanças que o en- de dificuldade que são apresentados à
sino produziu no conhecimento do aluno. criança independentemente de sua série,
Somente ao identificar os objetivos e ex- uma vez que a criança interrompe o sub-
pressá-los claramente em termos de com- teste assim que os itens apresentados em
portamentos específicos, é que podemos determinado nível da escala forem muito
estabelecer um melhor direcionamento difíceis de serem resolvidos. Para a cons-
ao processo de ensino e estabelecer pa- trução de cada um dos subtestes do TDE
râmetros para a avaliação dos produtos processos distintos foram desenvolvidos.
da aprendizagem. No entanto, a realida- O processo de normatização foi realizado
de brasileira no que tange a avaliação de com uma amostra estratificada em três ti-
desempenho escolar é caracterizada por pos de escolas de Porto alegre: estaduais,
uma escassez de instrumentos psicope- municipais e particulares. Os dados nor-
dagógicos, psicometricamente adequa- mativos do TDE derivam-se das médias
dos e construídos para a nossa realidade. dos Escores Brutos (EB) e Desvio Padrão
Os instrumentos existentes atualmente (DP) que foram calculados com base no
destinam-se quase que exclusivamente à desempenho das crianças para cada um
medição de aptidões específicas e não ao dos extratos da amostra por série e para a
processo de aprendizagem escolar amplo, idade cronológica. Deste modo, o objetivo
ou seja, de conhecimentos básicos adqui- do presente trabalho foi realizar uma revi-
ridos na escola. Com o objetivo de preen- são sistemática da literatura científica bus-
cher parte dessa lacuna, e inspirados no cando estudos publicados que utilizaram
Wide Range Achievement Test, uma ba- o TDE. A metodologia empregada foi um
teria publicada pela Psychological Corpo- levantamento da literatura nacional em
ration, cujo objetivo é identificar déficits bases de dados nas áreas de psicologia,
nas habilidades básicas de leitura, escrita pedagogia e medicina. Foram consultadas
e aritmética, há dezesseis anos construiu- cinco ferramentas de busca de referências
-se o Teste de Desempenho Escolar (TDE). científicas: Google Acadêmico, Scielo, Li-
O TDE é um instrumento psicométrico de lacs, Pepsic e Banco de Teses CAPES. As
aplicação individual que possibilita avaliar palavras chave “Teste de Desempenho Es-
de forma objetiva o desempenho escolar colar” e “TDE” foram utilizadas em todos
de crianças de 1ª à 6ª séries do ensino fun- os anos disponíveis desde 1994. Foram
damental, fornecendo uma visão ampla analisados os dados de 201 publicações,
dos elementos fundamentais da aprendi- entre artigos, dissertações, teses, resu-
zagem da leitura, escrita e aritmética. O mos em anais, após adotados critérios de
teste é composto por três subtestes: es- inclusão (i.e. referência bibliográfica com-
crita – escrita do nome próprio e de pala- pleta). Entre as publicações analisadas:
vras isoladas apresentadas sob a forma de 55% foram provenientes do Google Aca-
ditado; aritmética – solução oral de pro- dêmico, 22% do banco de Testes CAPES,
blemas e cálculo de operações aritméticas 13% do Scielo, 8% Lilacs e 2% Pepsic. Ao
por escrito; e leitura – reconhecimento verificar-se o número de publicações do
de palavras isoladas do contexto (Stein, TDE por tipo de referência foram obtidos
1994). Cada um dos subtestes apresenta 111 artigos em revistas qualis A, B e C, 49

1158
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

dissertações, 21 teses de doutorado, 18 Pessoas com deficiência intelectual (DI)


resumos em anais e duas referências de foram “tratadas”, historicamente, por
outro tipo. Foi analisado o número de pu- pressupostos preconceituosos na crença
blicações por ano, ao longo de treze anos, de sua incapacidade. Estudos redirecio-
e observou-se um aumento gradativo do naram essa concepção equivocada, de-
número de publicações, com especial des- monstrando as inúmeras possibilidades
taque para o biênio 2008-9 com um total de desenvolvimento desses sujeitos. Atu-
de 74 publicações científicas. Observou-se almente, existem diversas leis de apoio à
o uso do instrumento por diversas áreas, inclusão escolar, porém o sistema de
além da psicologia. Dentre algumas das educação pública do Distrito Federal ain-
críticas apontadas nos estudos destaca- da apresenta um quantitativo considerá-
-se a necessidade de renormatizar o teste vel de alunos com D.I. frequentando ape-
para a nova realidade do ensino funda- nas o ensino especial, principalmente jo-
mental brasileiro de nove anos, fazendo- vens e adolescentes. Assim, pergunta-se:
-se necessária a realização de uma re- por que tais alunos estão excluídos da
construção, validação e normatização do educação regular? Será a educação espe-
TDE. Outras variáveis foram analisadas e cial expressão de seu próprio desejo ou
contribuíram para a constatação de que, do de seus pais? Ao responder a essas
mesmo após dezesseis anos, e sem sofrer perguntas, esse estudo pretendeu dar
nenhuma atualização, o TDE continua sen- voz a uma minoria escolar que pode estar
do bastante utilizado, mostrando-se ainda sendo privada de exercer seus direitos.
muito relevante. Também visou contribuir para a efetivi-
dade da educação inclusiva, que deve le-
Palavras-chave: TDE; desempenho escolar; var em conta as reais necessidades dos
revisão sistemática. alunos com D.I, bem como apreender as
Contato: Lilian Milnitsky Stein, PUCRS, lilian@ preocupações e concepções de seus pais.
pucrs.br O objetivo da pesquisa foi o de investigar
as concepções de alunos diagnosticados
com Deficiência Intelectual e de seus pais
CO 26 - LT04 sobre as razões de sua não inclusão nas
classes regulares de ensino. O referencial
Inclusão 1 teórico apoiou-se na perspectiva da psi-
cologia sócio-histórica. A pesquisa foi
qualitativa e o instrumento de coleta de
LT04-706 - A INCLUSÃO/EXCLUSAO dados a entrevista semiestruturada. As
ESCOLAR: CONCEPÇÕES DE PAIS E DE respostas foram analisadas estabelecen-
JOVENS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA do-se categorias temáticas por meio da
INTELECTUAL análise dos núcleos de significação e sen-
Fabíola Ribeiro de Souza - Secretaria de tidos. Participaram 22 pessoas: 10 alu-
Educação do Distrito Federal nos, entre 12 e 17 anos de idade, e 12
fabiquilt@ig.com.br responsáveis. Os núcleos de significação
Sandra Francesca Conte de Almeida - UCB foram nomeados como seguem. O diag-
sandraf@pos.ucb.br nóstico. Foram identificadas concepções

1159
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

equivocadas acerca da D.I., como, por reza acerca do que consistia a inclusão
exemplo, ser considerada um problema escolar. Os pais a concebiam como sendo
irreversível, sem possibilidades significa- a inserção dos alunos nas classes espe-
tivas de desenvolvimento e aprendizado. ciais, sendo que alguns acreditavam que
Segundo os participantes, as informações os filhos já haviam sido incluídos ou esta-
eram repassadas por médicos, professo- vam em classes inclusivas. Mesmo que
res e psicólogos, sendo raramente ques- fossem insultados pelos colegas e não
tionadas pelos alunos e seus responsá- estarem alfabetizados, a maioria dos alu-
veis. Assim, o poder médico e pedagógi- nos disse querer participar da escola re-
co parece não encontrar resistência na gular e apenas dois afirmaram temer os
maioria dos participantes, influenciando maus tratos por parte de colegas e pro-
sobremaneira na escolarização e nos re- fessores. Alguns alunos e responsáveis
lacionamentos dos alunos com D.I. A relataram ter solicitado à direção de Cen-
educação especial: motivos e justificati- tros de Ensino a transferência para o regi-
vas. Os alunos afirmaram que sua escola- me de integração, mas isto lhes foi nega-
rização acontecia apenas na educação do pelos profissionais que avaliavam os
especial por haver recusa das escolas re- estudantes. Esclarecidos acerca da inclu-
gulares em os aceitarem ou da escola es- são escolar, a metade dos pais afirmou
pecial em liberá-los, pelo “mau compor- que não deixaria seus filhos estudar na
tamento” e por não saberem ler ou es- educação regular, a despeito do desejo
crever. Os pais relataram o medo de que dos mesmos, por temor dos maus tratos
seus filhos fossem descriminados na es- e pela não alfabetização. Outros relata-
cola regular, que tende a excluir aqueles ram que gostariam que os filhos estives-
que destoam de seu modelo homogenei- sem na inclusão, mas que não poderiam
zante. As potencialidades e dificuldades atender ao desejo dos mesmos porque a
dos alunos. Pais e alunos reconheciam decisão não dependia deles e sim da di-
inúmeras potencialidades, sendo o prin- reção da escola. Apenas duas mães afir-
cipal problema apontado o fato de os alu- maram que lutariam pelo direito dos fi-
nos não conseguirem ler e escrever. A lhos, caso eles manifestassem o desejo
educação especial: avaliação. Pais e alu- de frequentar a escola regular. Concep-
nos disseram gostar do ambiente em que ções acerca do desempenho escolar. So-
os filhos estudavam, em especial nos bre o sentimento que nutriam frente às
centros de ensino, devido à ausência de sucessivas reprovações e a permanência
preconceitos. Porém, se queixaram de no ensino especial, alguns alunos disse-
pouco investimento na aprendizagem ram sentir-se bem e outros com “raiva”.
formal dos alunos (notadamente leitura e Algumas mães relataram sofrer de forma
escrita). Inclusão escolar: de direito, mas isolada frente às dificuldades encontra-
não de fato. Este núcleo remete a duas das pelos filhos e outras alegaram indife-
questões importantes: o desconheci- rença, pela certeza de que seu desenvol-
mento acerca do que consistia a inclusão vimento seria sempre lento e limitado.
escolar e a ausência de empoderamento Expectativas presentes e futuras. A maio-
dos alunos em relação à sua escolariza- ria dos alunos projetava grandes realiza-
ção. Nenhum dos entrevistados tinha cla- ções de cunho profissional e pessoal para

1160
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

seu futuro. A maioria dos pais, por sua lhes é essencial e deve ser valorizada. As-
vez, esperava que executassem tarefas sim, sugerimos a inclusão de alunos com
braçais, manuais, angustiando-se a res- D.I. nas séries regulares de ensino, por
peito do “que aconteceria com os filhos, meio das adequações curriculares, com
ao fim da escolarização especial”. Os re- oferta de educação especial nos centros
sultados da pesquisa indicam que, de de ensino, ou classes especiais, em turno
fato, os alunos encontravam-se na educa- contrário, e reiteramos a importância da
ção especial por “decisão” de outrem. aquisição da leitura e escrita, habilidades
Esta imposição suposta demanda uma fundamentais no processo de escolariza-
série de questões e sugestões. Com rela- ção. Com relação ao desejo e direito dos
ção às equivocadas concepções acerca da alunos de participar das classes regula-
D.I. e aos direitos e deveres referentes à res, frustrado por pais e professores, essa
inclusão escolar, sugerimos que as auto- atitude pode ser interpretada como con-
ridades competentes utilizem os meios seqüência da concepção hegemônica de
de comunicação para divulgar junto à co- que os alunos não se beneficiariam desta
munidade informações corretas e conhe- escolarização. Os jovens alunos com D.I.,
cimento científico acerca da D.I. e no que se empoderados, poderiam optar pela
consiste o direito à inclusão escolar; que escolarização de sua conveniência, o que
investigações sejam feitas com profissio- lhes é garantido por resolução legal. Alia-
nais da área de saúde sobre suas concep- da a isto, a necessidade de interação so-
ções e atuação, no que se refere à D.I.. cial destes alunos com pares mais capa-
Com relação às queixas dos pais sobre o zes, para seu desenvolvimento cultural,
não investimento na aprendizagem for- reforça a perspectiva da inclusão escolar.
mal dos filhos, se considerados os estu- Sugerimos experiências de inclusão com
dos de Vigotsky sobre a escolarização, o esses alunos, de modo a que possam par-
desenvolvimento e o aprendizado desses ticipar da educação regular e lhes seja
alunos, somos forçadas a reconhecer que garantida uma educação de qualidade.
o sistema educacional vigente pode não Os jovens e adolescentes com D.I., e suas
os estar promovendo da melhor forma mães, participantes desta pesquisa, mos-
possível. A intervenção pedagógica rela- traram-se desejosos de serem escutados.
tada pelos entrevistados tem privado os Alguns poucos, aqui, tiveram voz, mas
estudantes de dois fatores primordiais eles são muitos e resta saber se outro, de
para o seu desenvolvimento: a aprendi- fato, acolherá suas demandas e desejo.
zagem formal e a interação social com
pessoas mais capazes. Com relação à Palavras-chave: deficiência intelectual;
“imposição” da escolarização apenas na inclusão
modalidade educação especial, justifica-
da pela idade avançada dos filhos e pelas
baixas aquisições acadêmicas, é preciso
que tal posição seja repensada pelos
pais. Pessoas com D.I. devem interagir
com o ambiente social e cultural e com os
que dele fazem parte e esta interação

1161
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-714 - BARREIRAS A INCLUSÃO Federal. Para a realização da pesquisa foi


DE ALUNOS COM NECESSIDADES adotada a metodologia qualitativa com a
EDUCACIONAIS ESPECIAIS EM UMA participação de vinte e duas pessoas, sen-
UNIDADE PÚBLICA DE ENSINO DO do treze professores, três mães, um pai,
DISTRITO FEDERAL três alunas ANEEs e duas profissionais da
Gina Vieira Ponte de Albuquerque - SEEDF Sala de Recursos. Empregou-se como ins-
ginaponte@ig.com.br trumento o questionário aberto, a entre-
Rute Nogueira de Morais Bicalho - UAB vista semiestruturada e a observação. As
arutebicalho@gmail.com informações apreendidas a partir de tais
instrumentos foram analisadas buscando
As discussões acerca da Educação Inclusi- evidenciar a construção de significados
va e da Educação Especial estão em franco dos participantes sobre as barreiras que
processo de ampliação. A cada ano, novos dificultam a efetivação da Educação Inclu-
estudos são publicados sobre o tema e siva. Os resultados alcançados apontaram
várias mudanças são propostas na busca para a existência de várias barreiras à in-
por um atendimento que se adéque às ca- clusão dos ANEEs no contexto escolar. Es-
racterísticas e particularidades dos alunos sas barreiras foram organizadas em cinco
com necessidades educacionais especiais categorias. Ilustrando a primeira barreira
(ANEEs). Apesar disso, ainda registram- – A falta de apoio às famílias dos ANEEs,
-se muitas práticas desenvolvidas na es- uma das mães entrevistadas menciona o
cola e na sociedade que sinalizam para seu trabalho de acompanhamento da vida
a existência do preconceito, da discrimi- escolar da filha, referindo-se a esse pro-
nação e da estigmatização daqueles que cesso como “minha batalha”. É recorrente
se convencionou chamar de deficientes. nas falas de todas as entrevistadas desse
Pesquisadores, como González Rey, Go- segmento, um sentimento de abandono
mes (2007) e Carvalho (2007) utilizam e de resignação frente aos desafios que
o termo barreiras para se referir a todas precisam enfrentar para assegurar que o
essas práticas e situações que se tradu- direito que os seus filhos têm à escolarida-
zem em obstáculos para que os ANEEs de seja respeitado. Elas mencionam ainda
tenham assegurado o seu direito à esco- a tendência da escola de tentar se eximir
larização, de inserção em classes regula- da responsabilidade de atender aos alu-
res e de atendimento adequado às suas nos considerados difíceis. Dubet, (2003),
características. A construção de uma es- Ribeiro, Mieto e Silva (2010) esclarecem
cola que seja cada vez mais aberta à diver- que é uma prática comum nas escolas res-
sidade e que tenha melhores condições ponsabilizar pelo seu próprio insucesso o
de atender aos alunos, oferecendo-lhes aluno que represente um maior desafio
intervenções pedagógicas diferenciadas, àqueles que respondem por sua aprendi-
passa pela necessidade de se identificar zagem e desenvolvimento. Na segunda ca-
e refletir sobre esses obstáculos. O pre- tegoria - Instrucionismo e Preleção como
sente estudo teve por objetivo investigar práticas pedagógicas predominantes em
essas barreiras no contexto específico de sala de aula, observa-se na unidade de en-
uma unidade pública de ensino funda- sino pesquisada a predominância de um
mental, series finais, localizada no Distrito modelo pedagógico muito mais centrado

1162
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

no professor e no ensino do que no aluno sobretudo, porque as exigências que lhes


e na aprendizagem. As falas dos professo- são apresentadas demandam uma cultu-
res entrevistados evidenciam que dadas ra profissional que não foi e ainda não é
as circunstâncias enfrentadas em sala de a cultura tradicional do universo docente.
aula, a construção de ações pedagógicas Salgado (2002) lembra que para superar
compatíveis a uma escola que respeita as limitações recorrentes nos programas
a diversidade, se torna algo muito difícil de formação de professores é fundamen-
de ser concretizado. Para Demo (2006) o tal se redimensionar a forma de perceber
modelo educacional pautado no Instrucio- os profissionais da educação. Para a au-
nismo mostra-se ineficiente na promoção tora, é necessário que os educadores se-
de aprendizagens significativas porque jam vistos como pessoas de capacidade
não fomenta a autonomia do aluno e não crítica, plenos de condições de transfor-
o coloca como protagonista do processo marem eles mesmos a escola em um es-
pedagógico. Na perspectiva do Instru- paço de formação permanente. A última
cionismo as diferenças e especificidades categoria – A negação da subjetividade do
dos alunos são muitas vezes ignoradas. A ANEE- refere-se à dificuldade que as pes-
terceira categoria diz respeito à Violência soas que atuam em classes inclusivas têm
simbólica imposta ao professor. Segundo de reconhecer a subjetividade dos alunos
os professores, as salas de aula superlota- com necessidades educacionais especiais.
das, as cargas horárias exaustivas, a falta A narrativa dos professores entrevistados
de recursos materiais e humanos se cons- revela que alguns percebem os ANEES
tituem em fatores que desestimulam o como indivíduos que sempre agem den-
professor, o submetem a violência e, por- tro de um padrão determinado segundo
tanto, o impedem de fazer um trabalho a o diagnóstico que eles apresentam. Re-
contento, dentro dos princípios de uma lacionada a esta barreira foi identificada
Escola Inclusiva. Segundo Nóvoa (2001), também a atitude de alguns professores
o fato de a sociedade hoje não conseguir de associar o atendimento aos alunos
estabelecer com clareza o que espera da com necessidades educacionais especiais
escola, faz com que os professores sintam- a partir da perspectiva do humanitarismo
-se confusos e cobrados de forma des- e da caridade. Atitudes similares a essas
proporcional às condições que lhes são tornam-se um impedimento para a efetiva
dadas para desenvolver o seu trabalho. A inclusão, porque fazem com que, de for-
quarta categoria versa sobre A formação ma sutil, os alunos estejam na escola, mas
insuficiente e ineficiente do professor. não recebam um atendimento que torne
Neste sentido, tanto os professores que possível o seu desenvolvimento e a sua
responderam ao questionário, quanto os aprendizagem. Todas as barreiras identifi-
professores e pais entrevistados, apontam cadas evidenciam que para se construir de
a falta de formação adequada dos profis- fato uma educação pautada pelos princí-
sionais da educação como um dos maio- pios da escola inclusiva, há a necessidade
res obstáculos à efetivação de uma escola de oferecer apoio e orientação às famílias
que se adéque às necessidades de todos dos alunos inseridos em classes inclusivas,
os ANEEs. Charlot (2008) esclarece que as de promover a ressignificação do espa-
lacunas na formação do professor se dão, ço escolar, a reestruturação dos progra-

1163
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mas de formação inicial e permanente relação ao comportamento agressivo do


dos professores, a superação do modelo adolescente. Conclui-se que a contribui-
educacional ligado ao Instrucionismo e à ção da psicologia na inclusão escolar ocor-
preleção e a revisão e reorganização das re quando ela atua como um agente escla-
condições de trabalho oferecidas aos pro- recedor das subjetividades, auxiliando na
fessores para o cumprimento de suas res- resolução dos conflitos presentes e, den-
ponsabilidades. tro de um enfoque multidisciplinar, cola-
bora com a efetividade dos processos que
Palavras-chave: Educação Inclusiva, Educação caracterizam o espaço escolar. No Brasil,
Especial, Barreiras a história da psicologia, conforme Patto
(1984), apud Guzzo (2010), divide-se em
três grandes períodos: o primeiro, de 1906
LT04-732 - CONTRIBUIÇÃO DA a 1930, na 1ª República, marcado por estu-
PSICOLOGIA PARA A INCLUSÃO ESCOLAR dos de laboratório num modelo europeu e
Maria Elisa Takahashi - UAB/UnB sem a preocupação de intervir na realida-
despertar@terra.com.br de; o segundo, de 1930 a 1960, marcado
Sílvia Ester Orrú - UnB pelo tecnicismo de origem norte-america-
seorru@unb.br na; e o terceiro, a partir de 1960, quando
o trabalho do psicólogo passa a ter uma
Este trabalho tem como objetivo discutir forma mais adaptacionista. O que referen-
a contribuição da psicologia na inclusão ciava a prática dos psicólogos na educação
escolar, especificamente de alunos com era o atendimento a crianças em clínicas
comportamentos agressivos. Foram abor- de psicologia centrada no modelo médico
dadas questões inerentes a comporta- de atendimento. De acordo com Tanama-
mentos agressivos na escola, através do chi (2000), apud Guzzo (2010), somente a
método qualitativo de pesquisa, utilizan- partir da década de 1990 é que a grande
do a técnica de estudo de caso. Este estu- diversidade do trabalho do psicólogo edu-
do de caso teve como sujeito um aluno de cacional, para além dos muros da escola,
14 anos, que possui um comportamento trouxe reflexões mais críticas acerca da
agressivo no universo escolar, passando formação e atuação desse profissional. Es-
durante este estudo por duas escolas, de- sas últimas décadas foram mais marcadas
vido a problemas de agressividade. Rece- por novos encontros entre Psicologia e
beu, nesse período, juntamente com sua Educação, assumindo um direcionamento
família, acompanhamento multidisciplinar dialético da compreensão do desenvolvi-
pela equipe do Centro de Referência de mento humano e não apenas das dificul-
Assistência Social (CREAS), por um médico dades de aprendizagem e comportamen-
psiquiatra e pela equipe do Conselho Tu- to, mas as que perpassam ambientes mais
telar. Foram realizados entrevistas e testes amplos do contexto educacional como,
psicológicos que permitiram organizar as por exemplo, espaços comunitários, nú-
seguintes categorias: 1 - Como o adoles- cleos, associações, entre outros. Segundo
cente é percebido; 2 - Como o adolescen- Ribeiro (2008), um dos mais significativos
te se apresenta no quesito relacionamen- desafios exigidos das novas práticas em
to interpessoal; 3- Intervenções feitas em psicologia tem relação com as questões

1164
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

em torno da inclusão social e escolar. Es- enxergar a deficiência como uma constru-
sas questões dizem respeito a todo um ção social e não como algo pertencente
contexto mundial, como a Declaração de apenas ao sujeito, conceber o sistema es-
Salamanca (1994), da qual o Brasil é sig- colar como um contexto social complexo
natário, que definiu diretrizes mundiais que envolve a aprendizagem e o desen-
para a educação inclusiva bem como as volvimento dos indivíduos que a ele per-
interfaces com a legislação nacional sobre tencem. A escola, como representante do
a inclusão escolar. As discussões atuais, universo maior que é a sociedade, repete
tanto políticas quanto educacionais, estão nas devidas proporções tudo o acontece a
transformando a temática da inclusão em sua volta. O comportamento agressivo nas
um projeto de valorização e respeito às escolas, por exemplo, pode ser analisado
diferenças humanas, buscando alterar o dentro desse viés das contradições e mu-
universo sócio-histórico que tem embasa- danças. Fante (2003, 2005), apud Francis-
do, até os dias atuais, as instituições esco- co (2009), aponta que o comportamento
lares. De acordo com a Política Nacional agressivo nas escolas nas últimas décadas
de Educação Especial (2008), a educação adquiriu crescente dimensão em todas as
inclusiva constitui um paradigma educa- sociedades. O que o torna questão pre-
cional fundamentado na concepção de ocupante é a grande incidência de sua
direitos humanos, que conjuga igualdade manifestação em todos os níveis de esco-
e diferença como valores indissociáveis, laridade. Alunos hiperativos, com baixo li-
e que avança em relação à ideia de equi- miar para frustrações, com uma ordem de
dade formal, ao contextualizar as circuns- problemas escolares decorrentes do baixo
tâncias históricas da produção da exclusão rendimento escolar, de dificuldade de re-
dentro e fora da escola. A inclusão escolar lacionamento com os colegas e com sig-
coloca ao psicólogo um conjunto de desa- nificativos problemas familiares são vistos
fios específicos que devem ser assumidos como sujeitos diferentes, problemáticos.
crítica e criativamente. Segundo Maluf Apresentam comportamentos agressivos
(2003), apud Mitjáns (2005), os psicólogos e, como consequência dessas ações, são,
devem dar ênfase aos contextos nos quais na grande maioria dos casos, pouco com-
o indivíduo está inserido, pela emergência preendidos, e muitas vezes excluídos so-
de novas áreas de atuação que ampliam o cialmente. Esses alunos, com o passar do
campo de trabalho muito centrado, inicial- tempo, acabam sendo afastados do pleno
mente, nas queixas escolares e seus con- e bom convívio com os colegas e também
dicionantes, para o trabalho com a equi- com os professores. Como um fenômeno
pe pedagógica e outras áreas de atuação gerador de problemas emocionais, rela-
mais abrangentes e por uma procura da cionais e consequentemente cognitivos o
multidisciplinaridade, visando dar conta enfrentamento do comportamento agres-
da complexidade dos processos que carac- sivo e suas consequências demanda uma
terizam o espaço escolar. Mitjáns (2005) intervenção efetiva orientada sobre os
avalia que, além da própria representação princípios da inclusão e do respeito à di-
da inclusão escolar, é necessário que ou- versidade. Esta intervenção sobre o com-
tras mudanças aconteçam: a valorização portamento agressivo deve levar em conta
da singularidade no contexto educacional, a subjetividade do indivíduo e tudo mais

1165
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que o envolve, isto é, o contexto onde ele dos sobre a inclusão educacional? Assim,
convive, sua família e o ambiente escolar. estudamos as versões que o nosso cola-
A contribuição da psicologia se faz presen- borador, pseudônimo José, tem diante do
te ao identificar e permitir a compreensão tema: os processos formativos de docen-
do comportamento agressivo como um si- tes em educação inclusiva. Ele é professor
nalizador da existência de problemas com em uma instituição federal e atua com a
crianças e adolescentes que se encontram temática da educação inclusiva. Como ins-
em situação de risco, e que têm sido ali- trumento de pesquisa, utilizamos a entre-
jados do convívio escolar possibilitando vista narrativa, que foi gravada, transcrita
ações efetivamente inclusivas para ele. e textualizada (Gatazz, 2006). Conforme
Caixeta (2006, p. 69), nesse modo de pes-
Palavras-chave: inclusão escolar, psicologia, quisar, o conhecimento é produzido a par-
comportamento agressivo. tir da “relação dialógica” entre a pesquisa-
dora e o participante, e é nessa interação
que os sentidos vão sendo produzidos.
LT04-767 - UMA COMPREENSÃO DOS Trazer a lume as lembranças, memórias
SENTIDOS CONSTRUÍDOS POR UM e recordações do educador-participante
PROFESSOR SOBRE A INCLUSÃO DE possibilitaram uma compreensão dos sen-
PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS E OS tidos (Barbosa, 2006) construídos por ele,
PROCESSOS FORMATIVOS VIVIDOS na relação com a pesquisadora, sobre o
Madalena Maria Barbosa Tsyganok - UFES trabalho com as crianças e adolescentes
mada_sy@hotmail.com com deficiência em sala de aula regular, o
Juliana Eugênia Caixeta - UnB seu próprio processo de inclusão na esco-
eugenia45@hotmail.com la, no trabalho e na vida. Nessa perspecti-
Hiran Pinel - UFES va, entendemos que a escola precisa pos-
hiranpinel@ig.com.br sibilitar um processo educativo embasado
nos valores humanos, na perspectiva da
Este trabalho consiste em refletir sobre transformação da sociedade e, sobretudo,
a construção do processo formativo re- na crença de que as crianças e adolescen-
lacionado à inclusão educacional de um tes possuem diferentes possibilidades e
educador, sua trajetória pessoal-profis- caminhos para elaborar as suas aprendi-
sional-formativa e as experiências como zagens. No sentido dessas reflexões, res-
docente. O que nos interessa são os senti- gatamos a necessidade de transformação
dos produzidos e como eles se entrelaçam pedagógica da escola tendo em vista a
com o acontecer da sala de aula inclusiva. inclusão. Conforme Mantoan (2006): “A
Trata-se de um estudo qualitativo inspira- inclusão implica em uma mudança de pa-
do na metodologia de História Oral na mo- radigma educacional, que gera uma reor-
dalidade História de Vida (Portelli, 1997, ganização das práticas escolares” (p.207).
em Puntel, 2002, p. 63). As indagações Assim, defendemos que os processos for-
de pesquisa foram: quais são as vivências mativos docentes também tenham como
e experiências mais significativas da tra- referência as experiências e vivências de
jetória narrada pelo docente? O que ele outros educadores. A idéia é de valoriza-
narra sobre os processos formativos vivi- ção da pessoa do docente (Nóvoa, 2007),

1166
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

seus sentimentos, pensamentos, emoções nominalismo como perversão – nomeio


e crenças. Nesse contexto, as histórias de o outro de algo que acabo diminuindo-o
vida possuem um valor formativo, porque – o outro é disléxico, é deficiente mental,
podem contribuir com a construção da tem problemas familiares, é gênio etc. As
identidade como docente. Acreditamos narrativas nos possibilitaram refletir sobre
que um processo formativo que conside- os atos e os modos cotidianos de educar,
ra os sentidos e significados atribuídos às as concepções pessoais, valores e ideais,
vivências e experiências docentes abre e os modos como José produziu sentidos
possibilidades para a expansão do movi- na própria existência e no desenrolar das
mento de inclusão educacional na escola. atividades que propiciam uma educação
A nossa visão é que precisamos enrique- inclusiva. A nosso ver, a formação docente
cer o desenvolvimento pessoal e profis- requer a apropriação dos saberes e mo-
sional a partir de um processo gerador dos de agir intencionais, produtores de
de reconhecimento do humano. O “[...] processos sociais-políticos-educacionais-
humano que pode ser construído junto -éticos, que considerem a presença do ou-
ao exercício da profissão. Profissão que tro, que tem uma visão diferenciada e nos
exige assegurar a vivência completa do ensina quando não sabemos, objetivando
sujeito. Para isso é preciso que o sujeito autonomia nos processos de criação e
vivencie a totalidade de sua afetividade e prática de uma escola inclusiva. Para José,
emoção para poder trabalhar os aspectos a inclusão tem [...] muitos sentidos, mas
sócios educativos (Puntel, 2002, p. 12-13). sempre comovidos ou conduzidos por
Queremos pontuar, também, que o edu- posturas de diálogo, respeito, tolerância,
cador tem um papel importante nesses permissão do outro ser, perseverança no
processos de formação docente, e que sentido também de persistir [...]. As expe-
isso depende de suas escolhas, desejos, riências de vida e o ambiente sociocultural
interesses, projetos, pois eles possuem são fundamentais na formação pessoal-
suas especificidades e singularidades, na -profissional, conforme “o ‘quanto’ inves-
pluralidade de ser (Pinel, 2010). Nos resul- timos o nosso ‘eu’ no nosso ensino, na
tados, encontramos os seguintes sentidos nossa experiência e no nosso ambiente
que foram construídos pelo colaborador sociocultural, assim como concebemos a
no diálogo com a pesquisadora: I - O sen- nossa prática” (Goodson, 2007, p. 72). II
timento de sentir-se estranho e o quanto - Outro sentido forte revelado nas narrati-
isso desafia José a sustentar uma atitude vas do José é o de se opor ao estabelecido.
de envolvimento com os sujeitos e os pro- Para José, [...] opor é uma boa e agradável
cessos educativos. Para José: O estranho ação, mas que também traz complicações.
não deixa o familiar fixar-se. O estranho Você fica mais aguerrido e tenso. Por isso
é o não-familiar. O estranho não deixa falo que eu fico aberto aos meus modos
quieto a normalização, as regras preten- de ser de oposição no mundo junto ao ou-
samente sólidas como rochas. Talvez por tro. Ao narrar sobre a sua vida e os sen-
isso eu produza tanta crítica à Psicopato- tidos construídos ao longo da trajetória
logia tradicional quando presentes nas pessoal-profissional-formativa, José nos
práticas escolares: a classificação como instiga a refletir sobre o saber e a educa-
regra única e válida universalmente. O ção inclusiva, associando a uma atuação

1167
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como oposição a tudo que é conformati- Marcos Paulo Alves de Oliveira - Bolsista
vo. A sua história de vida contribui para o PAPq/UEMG (FUNEDI/UEMG)
desenvolvimento de uma modalidade de Marilene Tavares Cortez - (FUNEDI/UEMG),
“investigação-ação” (Goodson, 2007), ou (UFMG)
seja, sendo investigador e nos fornecendo
dados e conhecimentos sobre o que é e A atual classificação do Transtorno de Dé-
como é ser oposição. Nesse processo de ficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH)
reflexão sobre o sentido de ser opositor ao foi proposta pelo Manual Diagnóstico e
estabelecido José revela que o ato de edu- Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-
car e praticar a educação inclusiva na sua -IV, 1994), sendo considerado por muitos
trajetória requer coragem para se erguer pesquisadores o diagnóstico infantil mais
ou reerguer das quedas. Concluímos que comumente estabelecido (Mcinnes & cols,
“a maneira como cada um de nós ensina 2003; Cohen & cols, 2000; Martinussen e
está diretamente dependente daquilo que Tannock, 2006; Rapport & cols, 2008, den-
somos como pessoa quando exercemos tre outros). As características mais comuns
o ensino” (Nóvoa, 2007, p. 17). Diante desse transtorno, relatados pelo DSM-IV,
das resistências e rigidez dos professo- são a desatenção, a hiperatividade e a im-
res, esse autor propõe que os docentes pulsividade. Contudo, as pesquisas mais
se apropriem dos seus próprios saberes, recentes sobre o TDAH estabelecem que
como também trabalhem as perspectivas esse transtorno envolve, necessariamen-
teóricas e conceituais. Nas narrativas per- te, algum déficit no processo cognitivo
cebemos a forte ligação com os contextos (Rapport & cols, 2008; Pennington, 2005;
sociais, culturais, político e econômico re- Willcutt, Doyle, Nigg, Faraone, Penning-
lativo ao tempo-espaço de suas vivências. ton, 2005). Ou seja, para que uma pessoa
José tornou públicas as suas experiências receba o diagnóstico de TDAH, ela tem
e abriu possibilidades de diálogo com elas, que apresentar algum comprometimento
mostrando os sentidos construídos em re- na sua atenção, funções executivas, lin-
lação aos processos profissionais-formati- guagem e em sua memória de trabalho,
vos em educação inclusiva. processos cognitivos identificados como
deficitários pelas pesquisas sobre o TDAH.
Palavras-chave: História de Vida; Educação Diante dos resultados das pesquisas sobre
Inclusiva; Processos Formativos. o TDAH acerca da relação desse transtorno
com déficits no processamento cognitivo,
e sabendo que toda a atividade acadêmica
LT04-835 - O TRANSTORNO DE DÉFICIT depende consistentemente de processos
DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE E O cognitivos, o Grupo de Pesquisa Cognos-
CONHECIMENTO DAS PROFESSORAS cere, no ano de 2010, fez um piloto para
DA REDE MUNICIPAL DO ENSINO verificar o conhecimento das professoras
FUNDAMENTAL SOBRE ESSE da rede pública de ensino na cidade de Di-
TRANSTORNO vinópolis de Minas Gerais, sobre o envolvi-
Cláudia Lúcia Carazza - Bolsista PAEx/UEMG mento dos processos cognitivos no TDAH.
(FUNEDI/UEMG) Os resultados encontrados justificam a
Lúcia Maria Silva Arruda - (FUNEDI/UEMG) preocupação de vários pesquisadores em

1168
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

relação à maneira como o TDAH tem sido bre os déficits cognitivos ligados ao TDAH.
tratado pela Educação, Saúde, Governo A partir desta revisão e dos resultados de
e mesmo pela sociedade civil. Tais resul- pesquisas que investigam os processos
tados confirmam também a hipótese por cognitivos no TDAH, elaboramos um ques-
nós estabelecida de que as professoras tionário piloto que explorou o conheci-
não conseguem perceber a relação entre mento das professoras sobre os processos
os déficits no processamento cognitivo cognitivos envolvidos no TDAH. Aplicou-se
no TDAH e o pior desempenho escolar esse questionário em professoras que tra-
da criança TDAH. Realizar um estudo de balham com crianças de diferentes faixas
cunho exploratório sobre o conhecimento etárias. O resultado aqui apresentado é
das professoras de quatro escolas da rede parcial, uma vez que a pesquisa envolveu
pública de ensino de Divinópolis de Minas apenas a realização de um piloto, o qual
Gerais quanto aos processos cognitivos está sendo expandido, atualmente, pelo
envolvidos no TDAH. Cruzar os dados obti- Cognoscere. Assim, foram identificadas
dos sobre esse conhecimento das profes- respostas contraditórias fornecidas pelas
soras pesquisadas com o conhecimento professoras. Por exemplo, 61% das pro-
fornecido sobre as pesquisas sobre a rela- fessoras consideram que a criança TDAH
ção do TDAH com os processos cognitivos não apresenta um desempenho acadêmi-
disfuncionais. Um levantamento mais am- co pior, mas 53% das professoras afirmam
plo sobre o conhecimento da professora que a criança TDAH tem dificuldade em
sobre os déficits cognitivos envolvidos no processar o conteúdo ministrado em sala
TDAH está sendo feito para que, em um de aula. Claramente há uma contradição
próximo momento da pesquisa, o Grupo nessas respostas, pois se 53% das profes-
Cognoscere faça um mapeamento sobre soras afirmam que a criança TDAH tem
as atividades acadêmicas exigidas das dificuldade em processar o conteúdo mi-
crianças, entre nove e onze anos, em sala nistrado em sala de aula, como é possível
de aula e a dependência de tais atividades que 61% das professoras consideram que
escolares dos processos cognitivos, como a criança TDAH não apresenta um desem-
as funções executivas, memória de traba- penho acadêmico pior? Portanto, respos-
lho e linguagem. Quando tal correlação tas como essa confirmam a nossa hipó-
for realizada, buscaremos desenvolver tese de que as professoras não sabem da
estratégias para auxiliar a comunidade importância dos processos cognitivos nas
acadêmica sobre uma melhor compreen- tarefas acadêmicas, nem do envolvimento
são do transtorno e também serão criadas de déficits cognitivos no TDAH. Diante do
propostas pedagógicas de intervenção resultado que obtivemos em nosso piloto,
mais adequadas para abordar o TDAH em confirmamos a nossa hipótese de que as
sala de aula. Especificamente crianças en- professoras não conseguem perceber a
tre nove e onze anos. Os procedimentos relação entre déficits no processamento
metodológicos se dividiram em duas eta- cognitivo no TDAH e o pior desempenho
pas distintas. A primeira etapa envolveu a escolar da criança TDAH. Corroboramos
revisão de literatura, buscando encontrar, também a importância da ampliação da
especificamente, pesquisas que investiga- investigação do tema da pesquisa aqui
ram o conhecimento das professoras so- apresentada, para que seja possível de-

1169
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

senvolver estratégias de intervenções pe- tada por Vigotski? É importante conside-


dagógicas mais consistentes em relação rar que o conceito de compensação vem
ao TDAH, como já é feito em relação à sendo trabalhado por pesquisadores con-
criança disléxica, por exemplo. Vale res- temporâneos e assim assumindo diversos
saltar que atualmente o Cognoscere está sentidos a partir dos diferentes pontos de
iniciando essa pesquisa mais sistematiza- vistas analíticos. García e Beatón (2004),
da envolvendo o tema aqui apresentado. ao propor uma tentativa de aplicação pe-
dagógica do conceito, concebem a ideia
Palavras-chave: TDAH; Processamento de compensação como correção de um
cognitivo; Conhecimento das professoras. defeito, apresentando assim um programa
educativo corretivo. Cunha, Ayres e Mora-
es (2010) entendem os processos com-
LT04-1005 - PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO pensatórios como niveladores no desen-
INCLUSIVA E CONDIÇÕES DE volvimento da criança, o que pressupõe
DESENVOLVIMENTO: O CONCEITO DE uma ideia de desenvolvimento contínua,
COMPENSAÇÃO EM DISCUSSÃO linear. Rivière (1985) comenta que, para
Débora Dainêz - UNICAMP Vigotski, a criança deficiente requer uma
ddainez@yahoo.com.br educação especial devido ao seu funcio-
Ana Luiza Bustamante Smolka - UNICAMP namento psíquico que também é especial,
asmolka@unicamp.br pois, devido à existência do déficit tem-
-se uma reorganização psicológica que é
Financiamento: FAPESP
peculiar. Uma educação baseada nas ca-
racterísticas positivas da criança é uma
A proposta apresentada está ancorada
educação com objetivos fundamental-
na perspectiva histórico-cultural que con-
mente compensatórios. Carvalho (2004)
cebe o desenvolvimento humano como
aborda o princípio da compensação como
apropriação cultural. Com base nos ques-
a variação dos vínculos interfuncionais
tionamentos de situações experienciadas
do sistema psicológico, indicando que a
no cotidiano de uma escola pública, situ-
ada no contexto da inclusão escolar, o ob- fonte e os meios da compensação são as
jetivo é colocar em discussão o conceito interações sociais. Góes (2002) destaca
de compensação (Vigotski,1997). Refletir a ideia de compensação sociopsicológica
sobre a problemática da compensação do déficit, ou seja, a compensação nesse
do desenvolvimento, sobretudo na exis- caso depende da qualidade de instrução.
tência de uma alteração de ordem orgâ- Essa multiplicidade de olhares nos insti-
nica, implica indagar sobre os (efeitos de) ga à apurar conceitualmente a noção de
sentidos do termo desenvolvimento na compensação a partir da problematização
obra de Vigotski. Desenvolver é melhorar, do núcleo das proposições vigotskiana e
aperfeiçoar, progredir, consertar, sanar, das situações empíricas.Esse estudo adota
evoluir, superar, mudar, transformar? Por como campo empírico uma escola da rede
outro lado, compensar é desenvolver? municipal de Campinas/SP. O material de
Como podemos conceber essa relação (in) análise foi construído a partir do registro
tensa entre compensação da deficiência (videogravação e diário de campo) do
e (concepção de) desenvolvimento apon- convivido semanalmente durante os anos

1170
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de 2010. Os casos acompanhados foram: e como fazer com Gustavo. Vale destacar
Mário (8 anos), 2o Ano (professora Sara), uma situação: A professora planeja com a
diagnóstico de Síndrome de Down e apre- classe um trabalho em grupos sobre tópi-
senta problemas motores como sequela cos acerca da cidade de Campinas. No dia
de um acidente vascular cerebral; Gustavo em que a classe, organizada em grupo,
(10 anos), 4oAno (professora Marta), diag- prepara cartazes para apresentar no dia
nóstico de Síndrome de Down e Hiperati- posterior, Gustavo faltou. No dia seguinte,
vidade, comunica-se por uso de gestos e a fim de incluir Gustavo na apresentação,
algumas poucas palavras. Como pensar a professora faz com ele um trabalho com
a educação inclusiva frente à história de recortes sobre alguns lugares de Campi-
relações desses casos? Como olhar para nas e apresenta com ele. Fala por ele, para
cada um, Gustavo e Mário? O que cada ele e para os alunos. Gustavo se envolve
caso revela? O que o conceito de com- nas apresentações, participa das discus-
pensação ajuda a enxergar? Quais são as sões, ajuda a segurar os cartazes de ou-
possibilidades e os limites das discussões tros grupos... Esses pequenos momentos
defectológicas? Mário entrou na rede vivenciados no cotidiano e condensados
regular de ensino em 2009, ano em que nos gestos dos professores e nos gestos
era, constantemente, colocado sentado dos alunos vão sendo significativos pelo
em cima da mesa da professora, por ser que revelam de possibilidades e também
agitado, cuspir saliva e derrubar os mate- de impossibilidades criadas pelas (faltas
riais dos colegas. Ao perceber que Mário de) condições concretas. A ação das pro-
apresentava medo de altura, essa foi uma fessoras orientada pela preocupação em
saída encontrada pela professora a fim de trabalhar a especificidade do aluno na
conseguir dar aula sem ser interrompi- relação com o todo nos instiga a refletir
da. No ano de 2010, Mário rastejava pelo sobre como é vislumbrada as potenciali-
chão da sala de aula, derrubava os mate- dades desses sujeitos e como isso afeta,
riais escolares... A professora tenta de to- ou seja, produz efeitos diferenciados nos
das as formas atender Mário. Em uma de- sujeitos que respondem a isso. Concebe-
terminada situação em que Mário estava mos a deficiência como o lugar de exce-
deitado no chão da sala, a professora que lência ao que enxergamos como natural.
lia uma história em um livro para a classe A presença da criança deficiente na sala
se aproxima do garoto, pega na sua mão, de aula agudiza, intensifica a necessidade
o levanta e anda pela sala com ele, drama- de problematizar as relações de ensino
tizando e contando a história. Em outros e as condições que (in)viabilizam. Consi-
momentos, em que faz roda de leitura deramos que o potencial do conceito de
com a turma, a professora pega Mário no compensação na educação inclusiva esta
colo a fim de evitar que ele corra pela sala na premissa da perspectiva de Vigotski
e envolve o aluno na leitura juntamente que articula o psicológico e a educação,
com os demais alunos. Gustavo é consi- o individual e o social, a dinâmica do ser
derado o aluno impossível da escola, que humano em se fazer-se nas relações so-
causa problemas, que foge da sala, que é ciais. Contudo, apontamos para os limites
agressivo. A professora Marta questiona da ideia de compensação como correção
em muitos momentos sobre o que fazer do déficit, como qualidade de instrução,

1171
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

como inclusão e adaptação ao meio, re- drões de normalidade. Assim, a prática do


lacionadas à noção de uma educação profissional de Psicologia baseava-se em
compensatória ou de uma compensação instrumentos que podiam medir a capaci-
sócio-psicológica do desenvolvimento. O dade dos alunos, dentre eles os testes de
estudo e as discussões levadas a efeito até QI e de personalidade, separando aque-
o momento indicam que a noção de com- les que eram aptos dos não aptos para a
pensação trazida por Vigotski demanda aprendizagem3. Tal atitude excludente fa-
um adensamento dos pressupostos que vorecia uma série de problemas, como a
sustentam a idéia de desenvolvimento estigmatização de alunos que faziam uso
cultural do sujeito humano e de (trans) desse tipo de serviço. Inúmeros outros
formação do funcionamento psíquico; ao argumentos foram utilizados para justi-
mesmo tempo em que requer um refina- ficar o fracasso desse aluno pela escola,
mento conceitual e uma re-elaboração do desde a “família desestruturada” até a
próprio termo/conceito em questão. presença de deficiências2. Nesse momen-
to, então, cabia ao psicólogo atuar como
Palavras-chave: Práticas de educação clínico em uma sala de atendimento den-
inclusiva, Condições de desenvolvimento, tro da escola, cuja intervenção focava a
Perspectiva histórico-cultural saúde e a doença mental, bem como o
Contato: Débora Dainêz, UNICAMP, diagnóstico e a cura dos problemas de
ddainez@yahoo.com.br comportamento do aluno desviante. Ao
romper com todo esse paradigma, o psi-
cólogo passa a ser um agente de mudan-
LT04-1424 -PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO ças dentro da instituição escolar, atuando
INCLUSIVA: A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO frente às relações que se estabelecem
NA PERSPECTIVA DA EQUIPE nesse espaço3. A partir dessa perspectiva,
PEDAGÓGICA a Psicologia demonstra inconformidade
Jucineide Della Valentina de Oliveira - FPL com a exclusão de pessoas com deficiên-
jucineidedella@yahoo.com.br cia, manifestando-se a favor da inclusão
Poliana Sfalsin Zatta - FPL social e escolar e defendendo um ensino
polly-rcc@hotmail.com de excelência a alunos reunidos pelo fun-
damento da diversidade. Nesse contexto
Sabe-se que o psicólogo, no âmbito esco- o psicólogo pode atuar, no acompanha-
lar, tem como função aprimorar o proces- mento das crianças com deficiência, no
so ensino-aprendizagem no seu aspecto esclarecimento técnico sobre a inclusão
integral (motor, social, emocional, cog- escolar para os educadores da instituição,
nitivo) por meio de intervenções a indi- na relação professor-aluno, nos processos
víduos, grupos, famílias e organizações1. cognitivos e emocionais da criança, entre
No entanto, durante muito tempo, as pri- outros4. Na educação inclusiva, a escola
meiras disciplinas de Psicologia Escolar le- passa a se preparar para receber a criança
cionadas em universidades examinavam com deficiência, alterando sua estrutura
os problemas de aprendizagem a partir física, adequando seu projeto pedagógico
de uma perspectiva na qual o aluno era à realidade de cada sujeito e, sobretudo,
culpabilizado por não se adequar aos pa- transformando suas crenças a respeito

1172
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

do processo ensino-aprendizagem e do que a escola possui. Existem três frentes


desenvolvimento infantil5. Em consonân- de atuação: os alunos, a família e a equi-
cia com a proposta de Educação Inclusiva pe escolar. Dentre as intervenções com o
a Secretaria Municipal de Educação de aluno estão: conhecer a criança, por meio
Aracruz (ES) implantou desde 1998 um de observação e propor atividades gru-
programa para atender os alunos com ne- pais, objetivando perceber as potenciali-
cessidades especiais incluídos nas esco- dades do aluno. O trabalho com a família
las municipais. Em 2004 foi constituída a envolve esclarecimento, conscientização
primeira equipe multidisciplinar formada e orientação em relação à necessidade
por psicólogo, fonoaudiólogo, pedagogo, especial apresentada pela criança; o en-
psicopedagogo e assistente social, com- caminhamento para atendimentos espe-
pondo assim Centro de Referência Edu- cializados, quando necessário; realização
cacional Multiprofissional. No período de de grupos reflexivos e a visita domiciliar,
2004 a 2006 as intervenções da equipe em casos de negligência e/ou violência.
eram clínicas e institucionais e a partir de Com a equipe escolar são realizados estu-
2007 passaram a ser focadas na institui- dos com os professores, analisando, den-
ção escolar, sendo abolido, desse projeto tre outras coisas, a necessidade especial
o atendimento clínico. Atualmente a equi- apresentada pelo aluno assim como, suas
pe é formada por 14 psicólogos, 11 fono- potencialidades; atividades grupais visan-
audiólogos, 2 terapeutas ocupacionais e do a efetivação de um clima de aceitação
1 assistente social que atuam em 30 das do aluno especial em sala de aula; análise
44 escolas do município. O objetivo desse da coerência entre as atividades dispo-
estudo é identificar as atribuições do pro- nibilizadas ao aluno e a necessidade que
fissional de psicologia nas escolas, assim este possui; e a elaboração interdiscipli-
como o que os profissionais da equipe nar da Proposta Educativa do Aluno. No
pedagógica, das escolas nas quais há a final do ano letivo de 2010 foi realizada
presença do psicólogo, pensam a respei- uma avaliação da atuação do profissional
to da atuação desse profissional. Nesse de psicologia na escola, por meio de um
projeto, o profissional de psicologia tem questionário enviado aos diretores, peda-
como foco de atuação o processo de in- gogos, professores e auxiliares de profes-
clusão de crianças com necessidades es- sor da educação especial (APEE). Ao todo,
peciais, incluindo alunos com deficiência 19 escolas se dispuseram a participar da
(física, mental ou sensorial), transtornos avaliação respondendo ao questionário. A
globais do desenvolvimento e altas habi- partir da análise dos dados chegou-se aos
lidades/superdotação. Hoje, são identifi- seguintes resultados: em relação ao en-
cadas nas escolas municipais de Aracruz volvimento do psicólogo com as ativida-
(ES) 389 crianças com algum desses qua- des desenvolvidas na escola, 37% avaliam
dros. O psicólogo é encaminhado à escola como muito boa, enquanto 32% analisam
quando esta possui três ou mais crianças como boa. 74% afirmam que o relaciona-
com necessidades especiais, perfazendo mento do psicólogo com os demais pro-
uma carga horária mínima de 5 horas e fissionais da escola é muito bom. Quanto
máxima de 30 horas em cada escola, de à responsabilidade e compromisso com o
acordo com o número de alunos especiais desenvolvimento das atribuições relativas

1173
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ao profissional de psicologia, 63% avaliam Atualmente, tem-se observado a prolife-


como muito boa. A iniciativa do psicólo- ração de comportamentos desajustados,
go na resolução de situações-problema externados em forma de desrespeito às
na maior parte das vezes (58%) também regras sociais, inversão de valores morais
foi considerada muito boa. A partir des- e menosprezo à vida humana. No con-
se estudo pode-se perceber que há um texto escolar, por exemplo, muitos são os
bom nível de satisfação da equipe esco- alunos que não respeitam professores e
lar (diretor, pedagogo, professor e APEE) colegas e que não cumprem suas obriga-
em relação à atuação do profissional de ções acadêmicas (Fonseca, 2008). Nesse
psicologia na escola e que as atribuições sentido, entende-se urgente e necessá-
do psicólogo, frequentemente estão em ria a realização de pesquisas científicas
consonância com o que é esperado. O para compreensão de variáveis envolvi-
trabalho do psicólogo, numa equipe mul- das nesses comportamentos, subsidiando
ti, quiçá, interdisciplinar pode auxiliar no propostas de programas de prevenção e/
planejamento e realização de ações que ou promoção do ajustamento escolar.
atendam o aluno de acordo com sua ne- Este pode ser compreendido como o
cessidade, objetivando sempre, o desen- comportamento acadêmico e disciplinar
volvimento de suas potencialidades. Nes- satisfatório dos alunos, segundo as nor-
te contexto, os profissionais de psicologia mas da escola, considerando também as
envolvidos no projeto de inclusão são relações interpessoais harmoniosas com
instigados a buscar soluções para proble- colegas e professores e aspectos relacio-
mas que não estão descritos em manuais nados à escola, como, por exemplo, as
de psicologia, (re)construindo, assim suas atividades desenvolvidas (Conduct Pro-
práticas a partir das vivências cotidianas. blems Prevention Research Group, 1997).
Nesse sentido, objetivou-se conhecer os
Palavras-chave: Psicólogo, Educação Inclusiva, correlatos pessoais (bem-estar subjetivo
Psicologia Escolar. e percepção parental) e escolares (per-
cepção da escolar como comunidade) do
ajustamento escolar, que é uma variável
LT04-1478 - CORRELATOS PESSOAIS E importante no processo ensino-aprendi-
ESCOLARES DO AJUSTAMENTO ESCOLAR zagem. Para lograr tal objetivo, contou-se
Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB com uma amostra de conveniência (não-
patyfonseca@hotmail.com -probabilística) formada por 588 estu-
José Farias de Souza Filho - UFPB dantes procedentes, eqüitativamente, de
farias.mp@hotmail.com escolas particulares e públicas da cidade
Deliane Macedo Farias de Sousa - UFPB de João Pessoa (PB), a maioria do sexo fe-
delianemfs@gmail.com minino (57,7%) com idades entre 12 a 20
Marina Pereira Gonçalves - UNIVASF anos (m = 14,4; dp = 1,97). Com relação
marinapgoncalves@gmail.com à escolaridade, 33,7% cursavam a sexta e
Viviany Silva Pessoa - UFPB 33% a oitava série do ensino fundamental;
viviany.pessoa@gmail.com outros 33,3% cursavam o segundo ano do
Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB ensino médio. Aproximadamente metade
geninha-gba@yahoo.com.br dos participantes, (49%) se avaliou como

1174
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

bom estudante, tendo relatado médias de < 0,001); porém, o fez inversamente com
7,6 e 7,3 nas disciplinas de português e a percepção do estilo negligente desta (r
matemática, respectivamente. Os partici- = -0,20, p < 0,001). No que diz respeito à
pantes responderam um livreto contendo correlação entre o ajustamento escolar e
os seguintes instrumentos: Escala de Ajus- a percepção da escola como comunidade,
tamento Escolar (CPPRG, 1997); Escala de compreende-se que à medida que o estu-
Percepção da Escola como Comunidade dante percebe a escola como um espaço
(Roberts, Hom & Battistich, 1995); Ques- de colaboração e aprendizagem, com ati-
tionário de Percepção dos Pais (Pasquali & vidades agradáveis, terá a tendência a se
Araújo, 1986; Schneider, 2001); Indicado- envolver mais nas atividades oferecidas
res de Bem-Estar Subjetivo (Chaves, 2003) pela escola, a ajudar os pares, a respeitar
obtido a partir de das seguintes medidas: os professores, a cumprir as normas esta-
Escala de Satisfação com a Vida, Escala de belecidas pela instituição, enfim, apresen-
Afetos Positivos e Negativos e Escala de tar um comportamento mais adaptado ao
Vitalidade; Questionário de Saúde Geral contexto escolar. No que se refere à rela-
(QSG-12) (Pasquali, Gouveia, Miranda & ção entre o ajustamento escolar e o bem-
Ramos, 1994); e por fim o Questionário -estar subjetivo, alguns autores (Batista &
Sócio-Demográfico e Educacional (idade, Oliveira, 2005; Cassady & Johnson, 2002;
sexo, escolaridade, tipo de escola, notas Giacomoni, 1998) relatam que indivíduos
em Português e Matemática, classificação satisfeitos com a vida e experimentando
acadêmica autopercebida). Inicialmente, mais afetos positivos que negativos, apre-
entrou-se em contato com as escolas para sentam um estado de bem-estar que se
apresentar o projeto às direções, a fim de reflete no comportamento, quer no am-
solicitar autorização para encaminhar o biente familiar ou escolar. Por exemplo,
Termo de Consentimento Livre e Esclare- poder-se-ia destacar o estudo de Arteche,
cido para os pais dos alunos. Em seguida, Bandeira e Gonzalvo (2003), realizado
os pesquisadores aplicaram os questio- com adolescentes que estavam envolvidos
nários aos alunos que tiveram o termo em projetos públicos e privados. À medida
de consentimento assinado pelos pais ou que estes jovens participavam de tais pro-
responsáveis. Os questionários foram res- jetos, demonstravam melhor autoestima,
pondidos de forma individual, em sala de mais satisfação com a escola e maior nível
aula, tendo sido necessários, em média, de emoções positivas e, consequentemen-
30 minutos para que os estudantes ter- te, menos ansiedade, depressão e afetos
minassem. Para efetuar as análises esta- negativos. Esses componentes de mal-es-
tísticas, empregou-se o Pacote Estatístico tar subjetivo, conforme Lourenço e Paiva
para as Ciências Sociais (PASW, versão 18). (2006), são preditores de comportamen-
Como resultados, obteve-se que a pontu- tos inadaptados, como \aqueles denomi-
ação geral em ajustamento escolar se cor- nados como antissociais. Portanto, pode-
relacionou diretamente com a percepção -se supor que estudantes que passam por
da escola como comunidade (r = 0,40, p < situações frequentes de baixo desempe-
0,001), pontuação geral de bem-estar sub- nho podem estar sofrendo de ansiedade
jetivo (r = 0,50, p < 0,001) e a percepção e depressão, gerando um mal-estar que,
do estilo autoritativo da mãe (r = 0,18, p possivelmente, influenciará nas relações

1175
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sociais e no próprio ajustamento escolar Palavras-chave: Ajustamento Escolar; Estilos


(Batista & Oliveira, 2005). A literatura rela- Parentais; Bem-Estar Subjetivo.
ta uma correlação do ajustamento escolar Contato: Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira,
com os estilos parentais autoritativo (posi- UFPB, geninha-gba@yahoo.com.br
tiva) e negligente (negativa) (Englund, Lu-
ckner, Whaley & Egeland, 2004), aspecto
evidenciado no presente estudo. De acor- CO 34 - LT04
do com a literatura os pais têm por objeti-
vo fundamental a introdução dos filhos no Afeto
contexto social, sendo que o modo como
cumprem essa missão pode acarretar em
benefícios ou prejuízos para o comporta- LT04-720 - O PROFESSOR DO 6º ANO E
mento desses. Pais autoritativos tratam a SUAS CONCEPÇÕES SOBRE AFETIVIDADE:
questão da disciplina e da autoridade de EFEITOS NA PRÁTICA DOCENTE E NA
forma clara, fazendo os filhos cientes das APRENDIZAGEM
regras a serem observadas, das obriga- Leandro Batista da Silva - UCB
ções a serem cumpridas e dos direitos a leandroletras@gmail.com
serem gozados. Em consequência de tais Sandra Francesca Conte de Almeida - UCB
atitudes, criam filhos com comportamen- sandraf@pos.ucb.br
tos mais ajustados ao contexto social e
escolar. Por outro lado, pais negligentes, Estudar o processo ensino-aprendizagem
que permitem aos filhos fazerem o que é refletir sobre os aspectos que interferem
desejarem, sem limite pré-determinado na constituição das principais pessoas en-
e efetivo controle, parecem não estimular volvidas no processo: professor e aluno.
o respeito às regras sociais, fundamental Durante o processo de aprendizagem, pro-
para uma convivência social equilibrada, fessor e aluno desenvolvem trocas relacio-
levando seus filhos a não apresentarem nais, profundamente influenciadas pelas
ajustamento ao contexto escolar. Destar- questões da afetividade. É essencial, pois,
te, considera-se que este estudo contribui que se busque conhecer as concepções
para o conhecimento das variáveis que es- que o docente, pessoa privilegiada na fun-
tão relacionadas ao ajustamento escolar. ção de mediador do conhecimento, tem a
Isso é relevante, sobretudo na atual reali- respeito da afetividade. Vale ressaltar que
dade escolar, em que os índices de violên- as concepções são determinantes da ação
cia e de indisciplina nas escolas brasileiras e preditoras de comportamento; em virtu-
têm sido ascendentes. Assim, saber que de disso, estudar as concepções docentes
promover o bem-estar subjetivo e ofere- sobre afetividade esclarece muitos acon-
cer uma escola que desperte nos jovens tecimentos que têm a sala de aula como
o sentimento de pertencimento pode locus. A afetividade, não raro, é compre-
ser útil à medida que auxilia os diretores endida, no contexto educacional, de forma
educacionais a prevenir comportamen- contraditória. Por vezes, acredita-se que
tos desajustados na escola, a exemplo do seja somente emoções (expressões plás-
bullyng, das condutas antissociais e do uso ticas), ou somente sentimentos (represen-
potencial de drogas (Chaves, 2006). tação psicologizada); não se percebe que

1176
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

emoção e sentimento são, em conjunto seus desdobramentos na prática pedagó-


com as paixões, as bases da afetividade, gica e na aprendizagem dos seus alunos,.
não podendo ser, sozinhas, afetividade em Após as entrevistas, procedeu-se à análise
si. Partindo dessa ideia diretriz, esta pes- e discussão dos dados, estabelecendo-se,
quisa teve como objetivo geral investigar inicialmente, pré-indicadores discursivos
as concepções de professores do 6º Ano das concepções dos docentes entrevis-
do Ensino Fundamental a respeito da afeti- tados. A análise dos pré-indicadores pos-
vidade e do papel que atribuem aos aspec- sibilitou a construção de indicadores que
tos afetivos em sua prática pedagógica e na embasaram a constituição dos seguintes
aprendizagem dos alunos. De forma mais núcleos de significação e sentido: “Os inte-
específica, a pesquisa pretendeu: identifi- resses e motivações do docente em traba-
car o papel que os professores atribuem lhar no 6º Ano do Ensino Fundamental”, “
ao aspecto afetivo na relação professor- ‘Meu aluno’: a pessoa que está no 6º Ano
-aluno; analisar de que modo professores do Ensino Fundamental”, “O lugar da afeti-
do 6º Ano do Ensino Fundamental com- vidade na formação dos professores do 6º
preendem os efeitos da dimensão afetiva Ano do Ensino Fundamental”, “O professor
em sua prática pedagógica e na aquisição do 6º Ano do Ensino Fundamental e suas
do conhecimento pelos alunos; e verificar concepções sobre afetividade”, “Manifes-
se o tempo de atuação docente e a área tações de afetividade na escola”, “Afetivi-
de formação interferem nas concepções dade, aprendizagem e relação professor-
que os professores têm a respeito da afe- -aluno” e “Afetividade e a prática do do-
tividade. Os sujeitos do estudo foram pro- cente do 6º Ano do Ensino Fundamental”.
fessores do 6º Ano do Ensino Fundamental A partir dessa análise, apreenderam-se, no
de uma escola militar. A base teórica são discurso docente, suas concepções acerca
os pressupostos de Henri Wallon e pesqui- da afetividade e seus efeitos no processo
sas recentes, decorrentes da aplicação de ensino-aprendizagem. A investigação das
sua teoria, relacionadas à constituição da concepções dos docentes mostrou que
pessoa concreta e à interface pedagogia- os professores do 6º Ano do Ensino Fun-
-psicologia. Tendo em vista o contexto damental acreditam ser a afetividade um
histórico-social a que Wallon esteve vincu- dos elementos que pode influenciar sua
lado e às suas convicções ideológicas, bus- prática pedagógica. Apesar disso, a afeti-
cou-se compreender a pertinência do ma- vidade ainda é percebida, pelos professo-
terialismo histórico-dialético, em virtude res, de maneira contraditória: ora como
do método e suas implicações na análise emoção, ora como sentimento, o que vai
e construção dos dados da pesquisa, que ao encontro da visão dialética da teoria
visava à apreensão das concepções docen- walloniana. No entanto, os núcleos de sig-
tes, a partir da elaboração de núcleos de nificação obtidos demonstraram que esses
significação e sentido. Após contato com a profissionais ainda não conseguem expres-
escola e com os professores que aceitaram sar, de forma clara e concreta, como se dá
participar do estudo, realizaram-se entre- a influência da afetividade em sua práxis.
vistas semiestruturadas, individuais, com Mostra-se presente, portanto, também
vistas a identificar as concepções desses uma visão dicotômica entre afetividade e
professores a respeito da afetividade e cognição (ainda que mudanças nesse pa-

1177
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

radigma já se prenunciem, como se verifi- da fala dos professores, uma grande pre-
cou no estudo). Em se tratando do locus ocupação em não se perder a autoridade
da sala de aula, afetividade e cognição se- e o status de educador perante os alunos.
riam dois constructos independentes, com Por fim, foi muito presente nas concep-
espaços e momentos próprios de expres- ções desses professores a noção de que o
são. Quanto aos efeitos da afetividade na educador deve respeitar o seu aluno e es-
relação que os alunos estabelecem com os tar atento às suas demandas.
objetos de conhecimento, verificou-se que
os professores concebem que a aprendi- Palavras–chave: Afetividade. Concepções
zagem do aluno será tanto melhor quanto docentes. Aprendizagem.
sua relação com o docente for calcada na
afetividade. No entanto, essa relação com
os objetos de conhecimento sinalizou, com LT04-911 - AFETIVIDADE E
uma exceção, que os docentes não trazem APRENDIZAGEM: PRODUÇÃO DE TESES E
em suas concepções a noção de que o pro- DISSERTAÇÕES NO PED-PUCSP
fessor deve apresentar-se como uma via Laurinda Ramalho de Almeida - PUC/SP
que conduz o aluno ao conhecimento e laurinda@pucsp.br
que este deve ser o principal objetivo do Andrea Jamil Paiva Mollica - PUC/SP
educador e do educando. Quanto à for- ajmollica@uol.com.br
mação, no tocante à área da Psicologia do Priscilla Andrea Glaser - PUC/SP
Desenvolvimento e Aprendizagem, pouca priglaser@yahoo.com.br
alteração significativa se produziu na for- Fátima B. M. Cintra - PUC/SP
mação docente ao longo das últimas déca- fbissoto@gmail.com
das, haja vista o fato de professores com Glaucia C. R. Medrado - PUC/SP
grandes diferenças de tempo de formação glaucia.medrado@yahoo.com.br
apresentarem respostas muito semelhan- Lilian Corrêia Pessôa - PUC/P
tes a respeito do lugar da afetividade em lilipessoa@hotmail.com
sua formação. Infere-se que, ao adentra- Márcia T. C. Necyk - PUC/SP
rem na escola, os docentes acabam ten- mnecyk@uol.com.br
do suas concepções moldadas pelas in- Yuska N. B. Felicio-Garcia - PUC/SP
terações com o meio e, portanto, com as yuskinha@hotmail.com
concepções recorrentes nesse meio, que Financiamento: CNPq/CAPES
exercem mais influências em sua prática
do que a sua própria formação. Confir- Por compreender a afetividade como uma
mou-se, nos relatos, que o professor, por dimensão tão importante quanto a di-
vezes, ainda percebe seu aluno de forma mensão cognitiva na constituição do ser
contraditória: ora ele é uma criança, ora humano e, portanto, acreditar que am-
um adolescente; já é positiva, contudo, a bas devam ser igualmente valorizadas no
ênfase dada ao fato de considerarem esse processo ensino-aprendizagem do aluno
discente como uma pessoa em transição. no contexto escolar, o estudo de que trata
Também mostrou-se muito forte a associa- este texto, denominado estado do conhe-
ção entre afetividade e os anos iniciais da cimento, identificou a produção de teses
escolarização. Ainda se observou, ao longo e dissertações que priorizaram questões

1178
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

relativas à afetividade no contexto escolar, temática “afetividade” tem despertado o


defendidas no Programa de Estudos Pós- interesse dos pesquisadores, intensifican-
-Graduados em Educação: Psicologia da do-se a partir de 1995, especialmente,
Educação da Pontifícia Universidade Cató- nas pesquisas de mestrado. Os resultados
lica de São Paulo – PED-PUCSP, no período obtidos neste estado do conhecimento
de 1969 a 2009. Este estudo teve por ob- evidenciam o quanto a dimensão afetiva
jetivo mapear pesquisas sobre a temática precisa ser levada em conta, da creche à
“afetividade” para, a partir de análises, universidade, pois, em todos os níveis de
oferecer possíveis encaminhamentos, para ensino, professores e alunos se referiram
potencializar a prática educativa docente. à importância da relação afetividade-
Para sua realização, foram estabelecidos -aprendizagem. Cabe ressaltar que apenas
critérios para nortear a seleção dos traba- quatro pesquisas incidem na educação in-
lhos que comporiam o corpus do estudo: o fantil e que o maior número de pesquisas
primeiro deles foi a definição de descrito- está centrado no ensino superior. Nota-se,
res relacionados à afetividade no contexto ainda, um pequeno número de pesquisas
escolar, abrangendo diferentes aborda- (nove) sobre outros atores que atuam na
gens teóricas; o segundo critério referiu-se escola, ao lado de alunos e professores:
à seleção dos trabalhos, a partir de títulos, diretores, coordenadores pedagógicos e
palavras-chave, resumos e, em caso de orientadores educacionais. O estudo evi-
dúvida, leitura das pesquisas na íntegra; denciou, pelo número expressivo de pes-
o terceiro critério foi quanto à fonte que quisas que tratam da temática afetividade,
seria utilizada, o catálogo “30 anos de Pro- a importância da mesma e o interesse que
dução em Psicologia da Educação – Disser- vem despertando nos pesquisadores. Dele
tações e Teses” (Moroz, 1999); Biblioteca também emerge a compreensão de que
Digital da PUC-SP – Sapientia ou visitas à as diferentes maneiras pelas quais o pro-
biblioteca da PUC-SP. Estes critérios possi- fessor expressa afetividade repercutem
bilitaram a identificação de 71 pesquisas, diretamente no aluno, tanto no que se
sendo 17 teses e 54 dissertações. Em re- refere à dimensão cognitiva, como no que
lação aos resultados, a primeira evidência tange à forma de relação que estabelece
do estudo foi que a temática “afetivida- com a disciplina curricular e com a esco-
de” foi pesquisada em toda a trajetória la. As pesquisas chamam, ainda, atenção
do PED-PUCSP: na década de 1970 (o PED para o fato de que um clima favorável à
foi criado em 1969), com a predominância expressão de sentimentos, bem como ao
da abordagem rogeriana, introduzida por aprimoramento das relações interpessoais
uma das primeiras professoras do progra- entre os vários agentes educativos, provo-
ma, Abigail Alvarenga Mahoney. Outros re- ca avanços no desenvolvimento do aluno e
ferenciais foram empregados nas décadas de todos os que estão implicados no pro-
seguintes, mas, a teoria que fundamenta cesso educativo.
o maior número de pesquisas sobre afeti-
vidade é a psicogenética walloniana, tam- Palavras-chave: afetividade, estado do
bém introduzida no PED pela mesma pro- conhecimento, contexto escolar
fessora, na década de 1980. Outra cons- Contato: Laurinda Ramalho de Almeida, PUC/
tatação propiciada pelo estudo foi que a SP, laurinda@pucsp.br

1179
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT04-977 - MAPAS AFETIVOS DA dade, através do Pro-Jovem. Esta pesquisa


JUVENTUDE SOBRALENSE foi iniciativa no Observatório da Infância
Verônica Salgueiro do Nascimento - UFC e Juventude de Sobral, como extensão do
vesalgueiro@gmail.com Curso de Psicologia da Universidade Fe-
Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC deral do Ceará, que tem como principais
naradiogo@hotmail.com objetivos construir saberes e articular par-
Alexsandra Maria Sousa Silva - UFC ceiros em torno da questão da infância e
alelexsandra@yahoo.com.br juventude de Sobral. Como um espaço de
troca, criação e reflexão de ações voltadas
O presente trabalho visou investigar os a crianças e jovens, o Observatório tem
sentimentos dos jovens participantes do como um de seus pressupostos a desna-
Pró-Jovem Adolescente em Sobral, sobre turalização destes momentos da vida, das
esta cidade. Juventude e adolescência, categorias de análise a elas associadas,
apesar de serem termos, muitas vezes, primando pelas diversas formas de per-
utilizados de forma intercambiável, têm tencimento de crianças e jovens em nos-
sido referência de grupos populacionais so mundo. O objetivo geral deste estudo
distintos. Na década de 1980 emergiram foi o de investigar os sentimentos dos jo-
políticas voltadas para a garantia de direi- vens do ProJovem Adolescente de Sobral
tos de crianças e adolescentes, sendo a sobre a cidade. Especificamente, foram
adolescência legalmente posta entre 12 e construídos os mapas afetivos com os jo-
18 anos. No Brasil, as políticas de juventu- vens participantes do projeto, em Sobral,
de têm avançado desde a década de 1990 e procedeu-se à análise dos mesmos, di-
devido, principalmente, à visibilidade que vulgando os resultados no meio científico,
este segmento populacional tem conse- bem como junto aos participantes. Infân-
guido focalizando, sobretudo, aqueles cia, adolescência e juventude constituem-
depois dos 18 anos e suas questões, rela- -se como categorias sociais de relevância
tivas à construção da autonomia na vida a partir da modernidade, tendo emergido,
adulta. Em 2005, o governo federal lançou cada uma ao seu tempo, como momento
a Política Nacional de Juventude, da qual estratégico do desenvolvimento humano
faz parte o Programa Nacional de Inclu- e, portanto, tornando-se alvo de diversas
são de Jovens: Educação, Qualificação e intervenções, muitas delas fundamenta-
Ação Comunitária – ProJovem. O presente das em saberes da Psicologia. Portanto,
trabalho de pesquisa abordou, especifica- consideramos tais noções como históricas
mente, o ProJovem Adolescente; assim, e socialmente construídas, cujas confi-
não pretendemos nos deter nos demais, gurações são influenciadas pela Psicolo-
afirmando apenas que cada um deles des- gia e, também, afetadas pelas mudanças
tina-se a uma faixa etária e enfoca ques- sociais, indicando formas pelas quais a
tões ligadas à especificidade retratada na sociedade cuida de sua transformação/
sua nomenclatura. Dessa forma, tal inves- manutenção. Com a redemocratização do
tigação torna-se relevante, posto que os país, na década de 1980, infâncias e juven-
jovens envolvidos, que estão em situação tudes, assim como outras minorias passa-
de exclusão, procuram assumir ações de ram a compor, diferentemente, o quadro
protagonismo no desenvolvimento da ci- de preocupações sociais. Contemporane-

1180
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

amente, o reconhecimento das diversas que a construção dos dados se estabelece


condições e situações destes momentos no diálogo entre participante e pesqui-
da vida, bem como o avanço das discus- sador (Gonzalez-Rey, 2002), o critério de
sões no sentido de uma análise crítica e escolha dos participantes é fazer parte do
contextualizada de tais aspectos, tem exi- Pro-Jovem Adolescente, em Sobral, e de-
gido do saber psicológico um constante sejar produzir o mapa afetivo. Os mapas
repensar de sua práxis. A cidade de Sobral afetivos, de acordo com Bomfim (2010),
foi criada em 1772; situa-se a noroeste constituem uma metodologia que visa, a
no Estado do Ceará, a 224 Km² da capital partir da captura de imagens e palavras,
do estado. O acesso é feito pela rodovia utilizar as representações para compreen-
Br 222, que liga o Ceará ao Piauí e, con- der as relações entre os sentimentos e o
sequentemente, ao Maranhão e ao Pará. espaço. Foi entregue a cada participante
Existe também uma ferrovia, atualmente uma folha de papel A4, e pedido que eles
usada, sobretudo, pelo grupo Votorantim. representassem, através de um desenho,
Em 2009 registrou o total de 182.431 mil a cidade onde moram. Foram disponi-
habitantes. A população urbana é de 103. bilizados materiais como lápis de cor e
868 mil habitantes (81,47%), enquanto a canetas hidrocor e, no verso desta folha,
rural é de 23.621 mil habitantes (18,53%). encontravam-se algumas questões visan-
Possui uma área absoluta de 2.122,98 do explorar o sentido do desenho. Os ma-
Km². Tem altitude de 69,49m². O clima pas foram analisados mediante o quadro
tem uma variação entre tropical quente de análise apresentada por Bonfim (2010,
semiárido e tropical quente semiárido p. 151). Como resultados, identificou-
brando. Em 2007, o seu Produto Interno -se a relação entre subjetividade e espa-
Bruto (PIB) foi de 1.752.648,00 obtendo o ço construído, enfatizando o afeto como
posto de 3ª economia do estado. O Pro- grande agregador da percepção e do co-
Jovem Adolescente em Sobral é executa- nhecimento sobre a cidade. As imagens
do pela Fundação de Ação Social (FASM), apresentadas pelos participantes, em sua
órgão administrativo da Prefeitura de So- maioria, revelam o sentimento de agrada-
bral, que conta com 1400 jovens em 56 bilidade pela cidade, indicando satisfação
coletivos. São 30 coletivos de 25 jovens em viver nesse lugar. Outro sentimento re-
na sede e 26 coletivos nos distritos. Os velado pelos mapas indica a presença de
coletivos se encontram, diariamente (ex- contrastes, ou seja, o jovem afirma gostar
cluindo sábados, domingos e feriados), de sua cidade, mas, também, apresenta
com o apoio dos Centros de Referência preocupações com a degradação ambien-
da Assistência Social. Há um orientador tal, ausência de paz e aumento do vanda-
contratado pela FASM, que coordena os lismo. Entendemos que os jovens podem
encontros e é responsável por cada cole- assumir papel de protagonistas de ações
tivo, além de um facilitador, responsável inclusivas e solidárias; para tanto, faz-se
por trabalhar temáticas ligadas à Saúde, necessária a inclusão destes atores na re-
Educação, Cultura, Meio Ambiente, den- flexão e construção de referenciais para
tre outras, definidas pelo Ministério do intervenções públicas e privadas, interes-
Desenvolvimento Social. Como se trata de sadas no aumento da qualidade de vida
uma pesquisa de natureza qualitativa, em nas regiões urbanas.

1181
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: juventude, mapas afetivos, de controle dos alunos e da conservação


protagonismo da antiga concepção hierárquica das rela-
Contato: Verônica Salgueiro do Nascimento, ções escolares. A autoridade é vista como
Universidade Federal do Ceará – Campus de uma necessidade natural quando o educa-
Sobral, vesalgueiro@gmail.com dor se depara com a criança que requer
um apoio e que está chegando ao mundo
novo. Ainda há a possibilidade de a autori-
LT04-1380 - O CORPO APRENDIZ: A dade ser uma necessidade política, sendo
VISÃO SOBRE O CORPO NO PROCESSO a educação dos recém-chegados uma for-
DE EDUCAÇÃO INFANTIL ma de garantir a continuidade de uma civi-
Isabelle Borges Siqueira - Unb lização pré-estabelecida. Nessas relações
ibs.siqueira@gmail.com de quem tem o poder e de quem obedece
Regina Lúcia Sucupira Pedroza - Unb ambos já têm seus lugares definidos, não
rpedroza@unb.br existindo nenhuma possibilidade de per-
suasão e argumentação (Arendt, 1968).
Na atual sociedade capitalista, a escola é Essa visão opressora que a escola exerce
apresentada como um ambiente impor- sobre seus alunos também é uma preocu-
tante para a socialização e educação da in- pação de Paulo Freire (2005) que critica
fância. Nesse espaço a criança amplia suas a concepção “bancária” da educação nos
relações sociais e se apropria e manifesta dias atuais, na qual os educadores apenas
conteúdos vivenciados em sua realidade. depositam conhecimento e os alunos os
Diante disso, quando surge o interesse em recebem de maneira passiva sem desen-
estudar a infância e o processo de desen- volver um olhar reflexivo e criativo sobre
volvimento humano é necessário compre- os conteúdos. Considerando que na esco-
ender sobre o papel histórico e social da la realmente exerce-se a lei da autoridade
escola na sociedade. Considerando que a e da hierarquia, os alunos reconhecem
escola deve ser um espaço privilegiado na seu papel e não se arriscam no processo
infância, Pinto (2007) busca compreender de persuasão e, desse modo, como não há
a condição da criança nesse âmbito e na argumentação, não há o desenvolvimento
sociedade em geral. Em seu estudo a au- da criticidade e do conhecimento constru-
tora discorre sobre o fenômeno do confi- tivo. Ressalta-se ainda que a supressão da
namento da infância, no qual a criança é liberdade e da capacidade de expressão é
confinada em instituições especializadas uma forma sutil, porém violenta de opres-
voltadas à educação e que se baseiam são. Contesta-se, portanto, as relações de
em uma estrutura autoritária, burocrática autoridade nas escolas, pois, seguindo os
e hierárquica, onde as crianças perdem argumentos de Arendt (1968), onde há
seu espaço de socialização e produção violência não há autoridade. Nesse mudo
de cultura. Nesse contexto, é o adulto, o real de opressores e oprimidos o corpo da
professor, que organiza o tempo e os es- criança é visto como objeto do controle e a
paços da criança, construindo regras e disciplina como mecanismo de manuten-
modelos de disciplina que devem ser se- ção desse domínio social. Para Foucault
guidos. Nesse sentido, encara-se que os (1987), no processo de disciplina, há uma
professores assumem a responsabilidade coerção mecânica sobre o corpo ativo,

1182
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

incluindo gestos, movimentos, comporta- ocupação em disciplinar o corpo do aluno


mentos e atitudes. Essa manipulação cal- para uma transmissão de informações não
culada é o que acontece nas instituições permite que o professor crie os espaços
educacionais que não permitem ao aluno adequados para a construção do conhe-
se manifestar e se expressar usando sua cimento. As crianças não são estimuladas
linguagem corporal. Diante disso, os “cor- a desenvolver sua emancipação e autono-
pos aprendizes”, aqueles que estão em mia, pois não participam da autoria dos
um interessante e estimulador processo pensamentos. Há a necessidade de a co-
de descoberta e aprendizagem, se tornam munidade educativa perceber sua impor-
“corpos dóceis”, que são corpos submis- tância para a qualificação do ensino e seu
sos e dominados. Contrapondo a idéia de papel no desenvolvimento de um espaço
um domínio do corpo para se estabelecer de aprendizagem criativo. Dessa forma, o
a educação da infância, Fernandez (1991) espaço educativo deve se apropriar da li-
acredita que a aprendizagem passa pelo berdade e do jogo e o corpo aprendiz ser
corpo e que não há aprendizagem se o incorporado como parte do ensinamento
corpo está inibido. O corpo é o primeiro integral da criança. Diante disso, por meio
contato do indivíduo com o mundo e o de uma revisão bibliográfica, o objetivo
“brincar” um ato que permite o corpo se desse estudo é analisar e propor as ma-
expressar e comunicar com esse mundo neiras de se receber o corpo aprendiz no
exterior. Para Fernandez (2001), quando a universo do cotidiano escolar.
criança joga, ela participa de um processo
de construção e reconstrução permanen- Palavras-chave: corpo, escola,jogo.
te, onde há uma transformação da reali- Contato: Isabelle Borges Siqueira, Universidade
dade e o pensamento surge para resolver de Brasília, ibs.siqueira@gmail.com
desafios. No entanto, no ambiente escolar
a criança não tem a liberdade de realizar
suas próprias manifestações corporais, LT04-1403 -PADRÕES DE INTERAÇÃO
sendo, muitas vezes, o brincar encarado SOCIAL E COMUNICAÇÃO: UMA
como um ato transgressor. Baseado nes- ANÁLISE DE SISTEMAS DE SIGNIFICADOS
sa visão, Soares e Figueiredo (2009) refle- CONSTRUÍDOS NA SITUAÇÃO GEMELAR
tem sobre a tentativa da escola capitalista Alessandra Oliveira Machado Vieira - UFG
de reprimir os corpos pensantes, sendo avieira@fe.ufg.br
mais interessante para a manutenção do Angela Uchoa Branco - UnB
sistema, os corpos analfabetos e metódi- ambranco@terra.com.br
cos. Vislumbra-se, portanto, que o corpo
aprendiz não é bem recebido, pois esse Este trabalho propõe apresentar resulta-
é o corpo que brinca, que aprende, que dos de uma pesquisa de doutorado que
fala e que, conseqüentemente, contrapõe buscou investigar acerca dos processos
um sistema há anos construído. Todo esse de socialização orientadores para as si-
contexto gera na criança um sentimento milaridades e diferenciações de crianças
de incompetência e fracasso, resultado gêmeas. A pesquisa em questão dedicou
de uma insatisfação e negação pela escola especial atenção às dinâmicas de inte-
(Soares e Figueiredo, 2009). A grande pre- ração social, relacionamentos, padrões

1183
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

comunicativos e metacomunicativos, en- dagem etnográfica e observações diretas


quanto orientadores dos processos de no contexto da escola; (b) quatro sessões
co-construção de significados pessoais estruturadas, com cada par e diferentes
e culturais na infância. Relações entre participantes nessas sessões (professora,
crenças, expectativas sociais e práticas mãe, colegas e pesquisadora), onde se
educativas de pais e educadores em re- buscou analisar as dinâmicas socioafeti-
lação ao desenvolvimento das crianças vas, comunicativas e metacomunicativas
também foram consideradas. A geme- em contextos de brincadeiras e desenhos;
laridade monozigótica (Stewart, 2003), e (c) entrevistas semiestruturadas com
objeto deste trabalho, é entendida como mães e professoras. As informações fo-
fenômeno biológico e social, e também ram analisadas de acordo com os parâme-
psicológico e cultural, daí o interesse pela tros de estudos microgenéticos (Lavelli &
compreensão dos sistemas de significa- cols., 2005), a partir dos quais três níveis
dos construídos no jogo intersubjetivo, de análise foram construídos para com-
narrativo e dialógico entre posições pes- parar as interações e narrativas das mães
soais e sociais da situação gemelar (Viei- e professoras em relação às duas duplas
ra, 2010). Fundamentado na psicologia de crianças. Desse modo, o sistema de
cultural (Bruner, 1998; Rogoff, 2005; Val- significação dos adultos, sobre a gemela-
siner, 2007; Vygotsky, 1962/1993, 2000), ridade e o desenvolvimento das crianças,
o objetivo principal foi investigar a dinâ- construídos a partir de tais níveis de aná-
mica relacional e os padrões de intera- lise compõe o foco de nossa apresentação
ção social entre cinco pares de crianças nesse trabalho. Os resultados e discus-
gêmeas (entre 5 e 6 anos de idade), dos sões indicam que: (1) os contrastes e in-
quais dois compõem os estudos de caso consistências de objetivos e dos sistemas
aqui apresentados. Como objetivos espe- de crenças entre o contexto da família, da
cíficos buscaram-se analisar a dinâmica escola e seus diversos atores, em relação
interacional entre as crianças e os adultos às expectativas para o comportamento,
em situações estruturadas; identificar e desempenho e relacionamentos de crian-
analisar, a partir das narrativas das mães e ças gêmeas comprovam a importância e
professoras, as orientações para crenças o valor da relação de interdependência
(Valsiner, Branco & Dantas, 1997), valores entre escola e família, podendo tais con-
e expectativas em relação à socialização textos de tensão permitir trajetórias flexí-
e desenvolvimento das crianças gême- veis de desenvolvimento e possibilitarem
as; e finalmente, identificar e analisar os mudanças orientadas à não sameness;
contextos orientadores para as similari- (2) o clima emocional das interações le-
dades ou diferenciações assumidos nos gitima o fenômeno afetivo como tendo
momentos de comunicação entre todos. posição central nos processos de trans-
A partir de uma abordagem metodológica formação semiótica das experiências;
qualitativa (Branco & Rocha, 1998; Branco (3) sameness não é uma característica
& Valsiner, 1997; González Rey, 1997; Kin- imposta ou transmitida à criança gêmea,
dermam & Valsiner, 1989; Madureira & mas coconstruída em suas relações com
Branco, 2001), vários procedimentos fo- o co-gêmeo e outros sociais, e depende
ram utilizados e criados, a saber: (a) abor- da qualidade da mediação semiótica em

1184
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cada contexto; (4) na gênese sociocultural temas pertinentes à gemelaridade, como


da gemelaridade (Vieira, 2011), os siste- separação de irmãos, imitação, tratamen-
mas psicológicos (que envolvem crenças, to igualitário; sameness, “extraordinária
afetos e emoções) são metacomunicados amizade”, dependência e outros. A pes-
intersubjetivamente, regulam e transfor- quisa demonstra o valor da abordagem
mam as práticas educativas e os padrões sociocultural construtivista para o estudo
de interação social, tendo em jogo, sobre- deste tópico, e sugere a necessidade de
tudo, a dialogicidade constituída através mais estudos sobre as dinâmicas intera-
da co-existência de diferentes versões tivas entre crianças e adultos, especial-
narrativas sobre o desenvolvimento de mente a partir de um delineamento longi-
crianças gêmeas, nas vozes dos adultos e tudinal. Aponta como sugestões de novos
das próprias crianças; (5) as práticas edu- estudos, (a) a investigação da presença
cativas das professoras e sua ação me- hegemônica das mídias sobre a gemela-
diadora podem ser potencialmente sig- ridade, na construção do sistema psicoló-
nificativas para a conscientização sobre a gico de gêmeos, falsas expectativas, equí-
importância de se promover experiências vocos, enfim, no processo de canalização
e trajetórias distintas para cada criança, cultural do desenvolvimento de crianças
capazes de favorecer o desenvolvimen- gêmeas, e (b) a análise dos processos de
to pleno e integrado da criança gêmea, formação de identidade e posições de
desconstruindo mitos e ressignificando self nos contextos de desenvolvimento de
concepções equivocadas sobre o fenôme- crianças gêmeas.
no da gemelaridade. O presente estudo
contribui com uma apresentação teórico- Palavras-chave: gemelaridade, psicologia
-metodológica de investigação sobre a ge- cultural, crenças e padrões de interação social.
melaridade, destacando a importância de Contato: Alessandra Oliveira Machado Vieira,
abordagens qualitativas e idiográficas na UFG, avieira@fe.ufg.br
psicologia (Molenaar & Valsiner, 2008),
que considera a variação interindividual e
intraindividual do fenômeno psicológico, LT04-1426 - DIMENSÕES ACADÊMICAS
permitindo revelar continuidades e rup- E SOCIAIS DA SALA DE AULA E CRENÇAS
turas de padrões na micro e ontogenê- MOTIVACIONAIS DE ADOLESCENTES
nese das interações sociais. Como contri- Pedro Eugênio Pereira Aloi - UFSCar
buições sociais, o estudo promove a auto- pedropaloi@yahoo.com.br
reflexão dos pais e mobiliza a construção Tânia Maria Santana de Rose - UFSCar
de novas perspectivas para a socialização, tmsrose@terra.com.br
orientação e educação dos filhos(as). À
escola, um conhecimento sobre possí- O papel do contexto da sala de aula e das
veis circunstâncias e ações mediadoras crenças motivacionais tem sido demons-
que dificultam às crianças gêmeas expe- trado como relevante para o entendimen-
rimentarem posicionamentos de si e suas to do engajamento adaptativo nas tarefas
identidades. À cultura, a desconstrução de aprendizagem de sala de aula e, conse-
de mitos e estigmas, e a construção e quentemente, do sucesso acadêmico dos
circulação de novos significados sobre estudantes. As teorias sócio-cognitivas de

1185
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

motivação têm mostrado que as percep- auxílio e respeito mútuo) esta relacionada
ções das dimensões acadêmicas e sociais à meta aprender e a autoeficácia. Dada a
da sala de aula influenciam as crenças dos importância da verificação de como estas
alunos sobre si mesmos e as metas de re- dimensões do contexto de sala de aula
alização relativas ao trabalho escolar. Es- influenciam a motivação de estudantes
tas por sua vez influenciam a natureza e brasileiros e o fato de serem raros os es-
extensão do engajamento nas tarefas. Os tudos nacionais que abordem tais ques-
estudos apoiados na Teoria de Metas de tões, pretendeu-se no presente estudo
Realização e na Teoria Social Cognitiva evi- identificar como o seguinte conjunto de
denciam o papel dos construtos motiva- variáveis se relacionam: tarefas motiva-
cionais metas de realização e a autoeficá- doras, apoio a autonomia, avaliação por
cia. Os alunos que adotam a meta apren- domínio, relação professor-aluno, relação
der (focada no aprimoramento pessoal e entre colegas, meta aprender e autoeficá-
ganho de entendimento e ou habilidade, cia. A amostra foi composta de 41 alunos
com a aprendizagem sendo um fim em si do Ensino Médio de uma escola pública
mesma) e apresentam autoeficácia (julga- do interior do estado de São Paulo. Os da-
mentos positivos de suas capacidades para dos foram coletados de forma coletiva por
desempenhar uma tarefa bem sucedida) meio das respostas dos alunos a sete es-
tem maior probabilidade de se esforçarem calas do tipo Likert elaboradas para medir
e persistirem nas tarefas escolares. Duas tais variáveis. Foram realizadas análises
linhas de investigação vêm sendo condu- acerca da consistência interna dos itens
zidas de forma independente. Uma sobre das escalas e análises correlacionais entre
as associações entre as crenças motiva- as variáveis. Os resultados indicam terem
cionais do aluno e suas percepções acerca sido significativas e positivas as correla-
das dimensões acadêmicas. Esta procura ções entre os escores da meta aprender
investigar como as percepções dos alunos aproximação e relação professor-aluno,
acerca das tarefas da sala de aula conside- meta aprender aproximação e tarefas mo-
radas motivadoras (conjunto de práticas tivadoras, meta aprender aproximação e
em que os alunos percebem as tarefas da- avaliação por domínio, autoeficácia e rela-
das como interessantes, significativas e re- ção professor-aluno, autoeficácia e apoio
levantes), do apoio a autonomia (promo- a autonomia e também foram significati-
ção de atividades que forneçam escolhas vas e positivas as correlações entre a re-
e desenvolvam responsabilidade) e da uti- lação professor-aluno e as três dimensões
lização de avaliação por domínio (práticas acadêmicas avaliadas. Apesar da amostra
avaliativas que sejam justas e não enfati- reduzida, os resultados do presente estu-
zem a competição), estão relacionadas a do sugerem que os achados da literatura
adoção da meta aprender e a autoeficácia sobre a influência das dimensões acadê-
por parte dos alunos. A outra sobre as re- micas e sociais podem ser generalizados
lações entre as crenças motivacionais e as para este grupo de alunos brasileiros. O
dimensões sociais tem explorado como a estudo oferece uma contribuição original
percepção dos alunos acerca da relação ao mostrar conjuntamente a importância
professor-aluno e da relação entre colegas das dimensões sociais e acadêmicas para
(como sendo fornecedoras de suporte, as crenças motivacionais e as associações

1186
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

entre ambas dimensões. Entende-se que rada, há um aumento em seu potencial


este tipo de estudo contribui para subsi- nefasto, o que exige dos familiares diver-
diar a identificação de aspectos do con- sos níveis de ajustes. Neste contexto, a
texto escolar (dimensões acadêmicas e rede social de apoio constitui um recurso
sociais) que deveriam ser foco de atenção importante no enfrentamento e recupe-
dos professores tendo em vista o aprimo- ração dos enlutados. Pais e irmãos, por
ramento da motivação dos alunos. exemplo, podem recorrer à ajuda de pa-
rentes, vizinhos, colegas e amigos para
Palavras-chave: Motivação; Relação Professor- driblar as necessidades afetivas e fazer
Aluno; Estrutura de Meta; Sala de Aula. frente aos gastos e despesas decorrentes
das mortes. Por outro lado, as instituições
presentes nas comunidades, como igreja
PO-LT03 e escola, além do próprio Estado, também
podem ser uma fonte de apoio financeiro,
espiritual ou terapêutico aos familiares. O
LT03-795 - REORGANIZAÇÃO FAMILIAR presente trabalho apresenta as transfor-
E REDE SOCIAL DE APOIO PÓS mações enfrentadas por famílias vitima-
HOMICÍDIO JUVENIL das pela violência e o papel da rede social
de apoio neste contexto. O estudo teve
Daniela Fontoura Domingues - UnB
por objetivo investigar as transformações
danydom61@gmail.com
nos sentimentos, nas relações sociais e
Maria Auxiliadora Dessen - UnB
na rede social de 8 famílias que perderam
dessen@unb.br
jovens vitimados por homicídio por arma
Financiamento: CAPES de fogo no Distrito Federal. Participaram
do estudo duas pessoas de cada uma das
A morte de jovens, vítimas de homicídio, é famílias: uma do sistema parental (mãe:
um problema grave e complexo que afeta n=8) e outra do fraternal (irmão: n=5).
anualmente centenas de famílias e a so- Em duas destas famílias, o jovem faleci-
ciedade como um todo. As perdas provo- do era o único filho e, em uma, o irmão
cam não apenas mudanças no cotidiano não pode participar. As famílias eram de
dos sobreviventes, alterando seus modos nível socioeconômico baixo, procedentes
de organização e suas redes de relações de regiões periféricas do Distrito Federal.
interpessoais, como também modificam Todas se encontravam em um período de
o dia a dia das comunidades. Após even- luto compreendido entre os primeiros 30
tos dessa natureza, o processo de luto dos dias e os 12 meses após o episódio. Em
parentes e amigos costuma ser carregado razão das circunstâncias ambientais im-
de forte conteúdo emocional, em razão plicadas nas mortes, tais como tráfico de
da precocidade das mortes e da violência drogas e disputas entre gangues, algumas
do ato, incluindo desde ideias retaliatórias famílias do estudo foram indicadas por
para com os perpetradores dos homicí- pessoas que pertenciam a organizações
dios até fantasias autodestrutivas. Além não-governamentais (ONGs) que atuavam
disso, pelo fato de os óbitos geralmente na prevenção da violência no DF. Outras
acontecerem de forma abrupta e inespe- foram selecionadas por profissionais da

1187
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

área do Direito e da Psicologia compondo, ção das categorias empíricas (tratamento,


portanto, uma amostra por conveniência. inferência e interpretação dos resultados).
Das 16 famílias convidadas, apenas 8 ade- Os resultados do estudo apontaram que,
riram à pesquisa. Dentre os motivos ale- devido às circunstâncias envolvidas nos
gados para a recusa estava a falta de con- homicídios, o processo de luto dos fami-
dições emocionais e psicológicas e o re- liares mostrou-se distinto ao daqueles que
ceio de represálias, em virtude de alguns enfrentam a perda de um ente por morte
perpetradores dos homicídios não terem natural. Os sobreviventes, por exemplo,
sido encarcerados até a época da reali- expressaram sentimentos exacerbados de
zação do estudo. A coleta de dados ocor- desespero, dor, culpa, revolta e medo. O
reu na residência dos participantes, após episódio alterou o funcionamento fami-
aprovação do Comitê de Ética. O trabalho liar, acarretando em desorganização nas
consistiu na aplicação de dois instrumen- relações conjugais e parentais. Entretan-
tos: (a) Questionário de Caracterização do to, as famílias demonstraram que mesmo
Sistema Familiar, respondido pelas mães, as perdas que envolvem situações de vio-
incluindo perguntas sobre idade, nível de lência são capazes de promover mudanças
escolaridade e ocupação dos participan- positivas no indivíduo e na família. Entre
tes, além de questões específicas sobre elas está o aumento da empatia, da soli-
as relações familiares e sobre aspectos de dariedade no ambiente intra e extra-fami-
infraestrutura e recursos disponíveis aos liar, a expressão de sentimentos afetuosos
moradores das comunidades; (b) roteiro e a aproximação com os filhos e entre os
de entrevista semiestruturada, respon- irmãos. Os resultados indicam, ainda, que
dido pelas mães e irmãos, a respeito das as instituições das comunidades tiveram
circunstâncias dos homicídios, do impacto uma pequena atuação no período pós-
da perda na organização familiar, da rede -homicídio, o que demonstra a fragilidade
social de apoio, dos padrões de comuni- ou até ausência de vínculos entre os enlu-
cação na família, bem como dos valores e tados e as organizações públicas. A rede
expectativas dos familiares para o futuro. de apoio institucional deveria ser capaz
Os dados do questionário de caracteriza- de oferecer assistência legal, psicológica e
ção do sistema familiar foram tabulados, e financeira, sobretudo, à população oriun-
as entrevistas gravadas em áudio, com du- da de classe socioeconômica menos favo-
ração média de duas horas, foram trans- recida. Neste sentido, o estudo salienta
critas, na íntegra, totalizando 13 entrevis- a necessidade de fortalecimento da rede
tas e 26 horas de gravação. O material foi social de apoio de pessoas vitimadas pela
identificado e digitalizado para viabilizar o violência, no que se refere às instituições
processo de escuta e transcrição. Todas as das comunidades, e investimentos em po-
verbalizações foram submetidas à técnica líticas dirigidas aos jovens e suas famílias.
de Análise de Conteúdo e, em seguida, o
material passou por nova categorização, Palavras-chave: Família; homicídio juvenil;
envolvendo quatro etapas, a saber: (a) rede social de apoio
seleção e exploração do material (pré- Contato: Daniela Fontoura Domingues, UnB,
-análise); (b) codificação; (c) agrupamento danydom61@gmail.com
e reagrupamento de temas; e (d) defini-

1188
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT03-879 - DESENVOLVIMENTO MORAL: moralidade, apesar das suas diferenças,


REVISÃO DOS ARTIGOS BRASILEIROS a psicanálise e o comportamentalismo
PUBLICADOS NO CAMPO DA têm em comum, a desvalorização da
PSICOLOGIA consciência (Freitas, 2003). Ambas as
Letícia Lovato Dellazzana - UFRGS abordagens entendem a consciência mo-
leticiadellazzana@gmail.com ral como uma interiorização por parte da
Gabriela Sagebin Bordini - UFRGS criança dos valores morais dos adultos,
gsagebin@hotmail.com seja por meio de identificações, seja por
Tania Mara Sperb - UFRGS meio de prêmios e castigos. A formação
sperbt@terra.com.br moral seria, então, um processo no qual
Lia Beatriz de Lucca Freitas - UFRGS o indivíduo tem pouca participação ativa.
lblf@ufrgs.br Para o construtivismo, por outro lado, a
Financiamento: CAPES formação da consciência moral é enten-
dida como uma construção do sujeito
Desde que a psicologia consolidou-se em interação com seu meio e não como
como uma ciência autônoma, o fenôme- mero produto das influências do ambien-
no moral tem sido um dos seus objetos te (Freitas, 2007). Diante dessa variedade
de pesquisa (Freitas, 2007). Dentre os de abordagens teóricas no campo do de-
trabalhos que inauguraram a investi- senvolvimento moral, acredita-se haver,
gação empírica da moralidade humana também, diversidade de focos de inte-
pode-se destacar O Julgamento Moral resse e dos métodos utilizados nas pes-
na Criança, de Piaget (1932/1977). Esta quisas sobre esse tema. O objetivo deste
obra tornou-se um clássico da literatura trabalho é traçar um panorama das con-
em psicologia (Freitas, 2003; Kesselring, tribuições da psicologia brasileira para
1990; La Taille, 1992) e é leitura obriga- o estudo do desenvolvimento moral, na
tória para todos os pesquisadores que se primeira década do século XXI, investi-
dedicam a estudar a moralidade e as in- gando-se o foco de interesse dos pesqui-
terações sociais (Freitas, 2007; La Taille, sadores e os tipos de estudo. Realizou-se
1992). Desde então, a psicologia tem pro- um levantamento dos artigos científicos
duzido constantemente novas pesquisas sobre desenvolvimento moral, produ-
sobre o desenvolvimento moral (Killen & zidos no Brasil, desde o ano 2000 até o
Smetana, 2006; Sampaio, 2007). De acor- primeiro semestre do ano 2010. A busca
do com Piaget (1954/2005), o desenvol- dos artigos foi realizada na Biblioteca Vir-
vimento moral ocorre graças à interação tual de Saúde (BVS) através das seguintes
da criança com outros indivíduos e na bases de dados: (a) Index Psi Periódicos
medida em que novas aquisições no cam- Técnico-Científicos, (b) Periódicos Eletrô-
po cognitivo e afetivo são conquistadas nicos em Psicologia (PePSIC), e c) Scienti-
pelo sujeito. Ao longo do século XX dife- fic Eletronic Librery Online (Scielo). Para
rentes perspectivas teóricas dedicaram- tal, utilizaram-se os seguintes descrito-
-se ao estudo dos fenômenos morais, tais res: desenvolvimento moral, psicologia
como a psicanálise, o comportamenta- moral, moralidade, juízo moral, justiça
lismo e o construtivismo (Biaggio, 2006; distributiva, justiça retributiva, sentimen-
Lourenço, 1992). No que diz respeito à tos morais, valores morais e virtudes mo-

1189
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rais. Foram considerados apenas os arti- qualitativos, 10 (31,2%) quantitativos


gos publicados em revistas específicas de e 4 (12,5%) qualitativos-quantitativos.
psicologia e disponíveis online na íntegra. Tais resultados indicam que, na primei-
No levantamento realizado, foram iden- ra década do século XXI, predominaram
tificados 62 artigos cujos temas estavam estudos sobre o juízo moral do tipo qua-
relacionados ao desenvolvimento moral. litativo. Isso sugere que persiste ainda
Através de uma primeira análise, os ar- uma forte influência das contribuições
tigos foram divididos entre empíricos e de Piaget (1932/1977) e seus sucessores
teóricos. Foram identificados 32 artigos nas pesquisas brasileiras sobre desen-
empíricos e 30 teóricos (51,6% e 48,4%, volvimento moral. Pode-se pensar que o
respectivamente). Neste trabalho, são construtivismo exerce tal influência nes-
apresentados resultados referentes aos se campo de pesquisa, pois, conforme sa-
artigos empíricos. A unidade de análise lientou Lourenço (1992), esta abordagem
foram os artigos, os quais foram lidos na é a que mais enfatiza uma perspectiva de
íntegra. Inicialmente, analisaram-se os desenvolvimento psicológico.
artigos em função do foco de interesse
dos pesquisadores, identificando-se o Palavras-chave: desenvolvimento moral,
aspecto central da investigação empírica psicologia moral, moralidade
relatada em cada artigo. Encontraram-se Contato: Letícia Lovato Dellazzana, UFRGS,
os seguintes focos de interesse: juízo mo- leticiadellazzana@gmail.com
ral, comportamento moral, concepções
sobre aspectos do desenvolvimento mo-
ral e avaliação de instrumentos que exa- LT03-882 - ANÁLISE DE EXPERIÊNCIA
minam o desenvolvimento moral. O juízo DE EDUCAÇÃO EM VALORES MORAIS
moral foi o foco de interesse de 71,9% NA MESORREGIÃO LITORAL NORTE
dos artigos. Estes examinavam como o ESPÍRITO-SANTENSE
participante julgaria uma determinada si- Barbara Frigini De Marchi - UFES
tuação, a partir de uma história ou de um barbara.fdm@hotmail.com
dilema. Os demais focos de interesse fo- Heloisa Moulin de Alencar - UFES
ram: (a) comportamento moral (12,5%), heloisamoulin@gmail.com
que relatavam o estudo das atitudes dos Leandra Lúcia Moraes Couto - UFES
participantes, como, por exemplo, práti- leandrabj@hotmail.com
cas parentais; (b) concepções dos parti- Mayara Gama de Lima - UFES
cipantes a respeito de algum aspecto do mayaragl@gmail.com
desenvolvimento moral (9,4%), como, Mariana Santolin Romaneli - UFES
por exemplo, regras no contexto escolar; marianaufes@yahoo.com.br
e (c) avaliação de instrumentos de medi- Financiamento: FACITEC
da de julgamento moral para o uso em
contextos específicos (6,2%). A seguir, os A presente pesquisa buscou descrever e
artigos foram classificados conforme o analisar uma experiência “bem sucedi-
tipo de estudo: (a) qualitativo, (b) quan- da” de Educação em Valores Morais em
titativo ou (c) qualitativo-quantitativo. uma escola pública, localizada na mesor-
Foram encontrados 18 (56,2%) artigos região Litoral Norte Espírito-Santense.

1190
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Este estudo fez parte de um trabalho modalidade de ensino regular nos turnos
mais abrangente, que contou com um matutino, vespertino e noturno, e ao EJA
grupo de pesquisadores participantes da (Educação para Jovens e Adultos) no perí-
ANPEPP (Associação Nacional de Pesqui- odo noturno. Recebe alunos de todos os
sa e Pós-Graduação em Psicologia) e com bairros e distritos do município em que
apoio do CNPQ (Conselho Nacional de está localizada, em um total de 1.170,
Desenvolvimento Científico e Tecnológi- sendo a maior parte deles proveniente
co). Entendemos por moral a concepção de classe média baixa. O projeto teve iní-
de La Taille (2006) segundo a qual refere- cio em 2007, destinado apenas ao turno
-se a um conjunto de deveres, princípios noturno e idealizado pela então pedago-
e regras que devem ser obrigatoriamente ga do colégio. Ele foi motivado por recla-
observados, o que é bom ou mau, certo mações dos profissionais de educação do
ou errado numa cultura, corresponden- turno em questão, feitas em reuniões,
do à pergunta “como devo agir?” (p.29). conselhos de classe e outros encontros
Desde os estudos pioneiros de Jean Pia- acerca dos desafios encontrados em sala
get (1932/1994), consideramos a exis- de aula em relação aos alunos, tais como
tência de um desenvolvimento do juízo evasão, desinteresse, cansaço e dificul-
moral no ser humano. Dessa forma, uma dades de aprendizagem. A maior insatis-
criança pode passar de uma consciência fação referia-se à falta de respeito que
heterônoma das regras para a moral da enfrentavam tais profissionais no dia-a-
autonomia. Assim sendo, os métodos da -dia da sala de aula; que estava caracteri-
educação moral são fundamentais e, ne- zada como ausência de respeito entre os
cessariamente, não podem ser realizados próprios alunos e, também, para com os
de maneira autoritária, mas ativos, tendo professores. Além disso, valores, como
como objetivo a construção da autono- amizade e solidariedade, foram deixados
mia moral nos alunos. Para a descrição de lado, o que dificultava a convivência
da experiência, realizamos entrevistas escolar. Diante desse quadro, implemen-
com a ex-diretora da escola, a diretora tou-se o projeto, com o apoio de 18 pro-
atual, uma supervisora pedagógica, uma fessores. Os temas trabalhados foram os
pedagoga, duas professoras, uma auxiliar mais variados: drogas, sexualidade, direi-
de secretaria e três alunos. As entrevis- tos da mulher, perspectiva de vida, cultu-
tas, com roteiro semiestruturado, foram ras, dentre outros. Quanto aos procedi-
organizadas nos seguintes blocos de per- mentos adotados, a pedagoga elaborava
guntas: a) caracterização do participante; as atividades, que tinham dia e horário
b) descrição do ambiente; c) motivação/ específicos para serem trabalhadas em
contexto do projeto; d) caracterização da sala com os alunos, a partir das sugestões
experiência propriamente dita e e) con- dadas pelos docentes. A execução e o an-
siderações finais. Em relação à caracte- damento do projeto foram de responsa-
rização da experência propriamente dita bilidade de toda a comunidade escolar,
(item d) analisamos os seguintes aspec- mais diretamente dos professores, que
tos: avaliação dos resultados, dificulda- exerciam o papel de mediadores. Dessa
des/limites e apreciações gerais. A escola forma, cabia a eles criarem situações, por
em questão atende ao ensino médio na meio das atividades propostas, em que

1191
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os alunos pudessem se expressar. Já em e teve que funcionar em outro prédio,


relação aos demais funcionários, esses bastante danificado. Além disso, alguns
davam suporte, por meio de materiais, às docentes, mais conservadores, apresen-
atividades desenvolvidas, assegurando a taram resistência em executar o projeto,
estrutura necessária. Quanto às famílias alegando que este era sinônimo de perda
dos alunos, essas tiveram participação de tempo. Essas dificuldades foram tra-
restrita, que se resumia a prestigiar os balhadas pelos alunos juntamente com
eventos. A escola não contou com par- os professores, alcançando um resulta-
cerias externas, mas recebeu o apoio do satisfatório. Isto posto, consideramos
de várias pessoas nas atividades, princi- que a referida experiência contribuiu
palmente, nas palestras, como médicos, para a formação moral e ética dos alunos.
pastores, padres, policiais e psicólogos da
comunidade. Dentre as atividades desen- Palavras-chave: educação em valores morais,
volvidas, destacaram-se desfiles, danças, valores morais, moral e escola.
paródias, visitas – à Câmara Municipal e à Contato: Barbara Frigini De Marchi, UFES,
Casa de Cultura do município, por exem- barbara.fdm@hotmail.com
plo – idas ao cinema, dinâmicas e mostra
cultural. Além disso, visando facilitar o
aprendizado dos alunos, os professores LT03-1072 - ASSÉDIO MORAL: A
se esforçavam em aproximar os conteú- QUESTÃO DA VULNERABILIDADE DE
dos escolares da realidade dos mesmos. GÊNERO
Como resultado da referida experiência, Helena Diefenthaeler Christ - PUCRS
a visão que a sociedade local tinha da helenachrist@hotmail.com
escola mudou. Antes de sua implantação Tatiana Helena José Facchin - PUCRS
e de seus primeiros resultados positivos, tatyhelena@yahoo.com.br
a qualidade da escola era vista como du- Deise Fonseca Fernandes - PUCRS
vidosa e se acreditava que qualquer alu- deise.ff@hotmail.com
no, se empenhando ou não, passava de Bruna Ferreira Fernandes - PUCRS
ano. Por sua vez, verificamos outros re- brufernandes1@hotmail.com
sultados: (1) desenvolvimento do autor- Gabriel José Chittó Gauer - PUCRS
respeito e da autoestima; (2) criação de ggauer@pq.cnpq.br
condições propícias para o exercício da Financiamento: CNPq /CAPES
cidadania, com conhecimento de direitos
e deveres; (3) aumento da responsabili- As relações no trabalho e com o trabalho
dade e do conhecimento dos limites; (4) têm sido alvo crescente de estudos, so-
valorização e incremento da solidarieda- bretudo em função da importância que
de e (5) estabelecimento de relações de o labor exerce na vida das pessoas, seja
respeito mútuo. No decorrer do projeto, na formação da identidade, status social,
contudo, os propositores enfrentaram satisfação pessoal, realização profissional
dificuldades no que diz respeito à infra- e/ou financeira. Juntamente com isso, as-
-estrutura da instituição e à participação pectos negativos também encontram um
do corpo docente. Durante a realização campo fértil nas organizações, tais como
do projeto, a escola passou por reformas alta competitividade, estipulação de me-

1192
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

tas inacessíveis, entre outros aspectos gimento de traços paranóides, podendo


que auxiliam no adoecimento dos traba- chegar a uma autêntica patologia deliran-
lhadores e de suas relações no trabalho. te, dentro de uma atmosfera de mania e
O assédio moral é um tema que abrange perseguição, chamada de psicose aluci-
o entendimento e a ação interdisciplinar, natória crônica. Hirigoyen (2005, p.100)
pois, por se tratar de um problema que afirma que “as mulheres não somente
ocorre no âmbito ocupacional, deve ser são frequentemente vítimas, como tam-
percebido e trabalhado preventivamente bém são assediadas de formas diferentes
pela gestão organizacional. E por gerar dos homens: as conotações machistas ou
conseqüências de desgaste emocional e sexistas estão muitas vezes presentes”.
sofrimento psíquico deve ser diagnosti- Segundo a Organização Internacional
cado e tratado por profissionais da saú- do Trabalho – OIT, o número de vítimas
de, e por configurar prejuízo da vítima, de assédio moral varia de 5 a 8%, den-
deve ser apurado pelos atores do direito. tre estes, 70% são mulheres (Jacques e
O assédio destrói a capacidade de traba- Amazarray, 2006). Estudo realizado por
lho e a resistência psicológica das víti- Barreto (2006) com 2072 trabalhadores
mas, numa tentativa do agressor de “in- constatou que 870 (42%) foram assedia-
timidar, diminuir, humilhar, amedrontar e dos no ambiente de trabalho, sendo que
consumir emocional e intelectualmente deste total, 65% foram mulheres. Por-
a vítima, com o objetivo de eliminá-la tanto, estudos têm demonstrado que o
da organização (Piñuel & Zabala, 2003, gênero feminino apresenta uma maior
p.32). Guedes (2004) explicita as condu- vulnerabilidade ao assédio moral. Para
tas de assédio moral tais como: recusar a Barreto (2000, p. 242) “quando o homem
comunicação, desqualificar, destruir a au- prefere a morte à perda da dignidade, se
toestima, cortar as relações sociais, vexar percebe muito bem como a saúde, traba-
e constranger. Mas nem sempre é fácil lho, emoções, ética e significado social se
aferir estas situações bem como averi- configuram num mesmo ato, revelando a
guar as conseqüências na vítima, mesmo patogenicidade da humilhação”. Embora
que também conhecidas como sintomas não sejam encontradas muitas pesquisas
de estresse, de ansiedade, de depressão, com este tema no nosso país, as já rea-
confusão, síndrome de burnout, entre lizadas apontam uma alta incidência de
outros. Quanto às conseqüências para a casos de assédio moral, ao mesmo tem-
vítima, segundo Piñuel & Zabala, (2003), po em que esse assunto ainda seja pouco
elas vão desde alterações mais super- esclarecido para a maioria da população
ficiais e imediatas, tais como: confusão e, portanto mais difícil de ser detecta-
mental, confusão que gera estresse re- do, tratado e evitado. Assim, o presente
forçado pela dúvida e pelo medo, levan- projeto visa verificar se estes achados
do esta a isolar-se socialmente. Com o correspondem à população geral pesqui-
passar do tempo, tais alterações chegam, sada em Porto Alegre. Tais pesquisas se
muitas vezes, a modificações psíquicas tornam importantes para que haja dados
mais intensas: desvitalização, levando a relevantes para a criação de programas
um estado depressivo crônico; uma “ri- preventivos. A amostra é composta por
gidificação” da personalidade com o sur- 200 estudantes universitários que exer-

1193
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cem atividade laboral, nos cursos de Ad- outras. Portanto, os resultados encon-
ministração de Empresas e Ciências Con- trados apontarão se realmente mulhe-
tábeis da Pontifícia Universidade Católica res são mais vulneráveis que homens ao
do Rio Grande do Sul e 200 estudantes do assédio moral no ambiente de trabalho,
EJA. São homens e mulheres com idades bem como se há diferenças significativas
entre 18 a 59 anos, que estão no mesmo nos fatores avaliados entre os gêneros.
emprego há no mínimo 1 ano, ou que
no último emprego permaneceram pelo Palavras-chave: Assédio moral, Gênero,
período mínimo de 1 ano. A pesquisa NAQ-R.
foi realizada por meio de delineamento Contato: Helena Diefenthaeler Christ, PUCRS,
transversal, quantitativo de correlação helenachrist@hotmail.com
entre o resultado do instrumento e a va-
riável sócio-demográfica sexo. Foram uti-
lizados como instrumentos questionário LT03-1275 - DEFICIÊNCIA E POLÍTICAS
de dados sócio-demográficos e Negative PÚBLICAS: UM ESTUDO SOBRE A
Act Questionnaire (NAQ-R), o qual está PERCEPÇÃO DE GESTORES PÚBLICOS E
sendo validado para o português. Após DEFENSORES DE DIREITOS
leitura e assinatura do Termo de Con- Liliane Cristina Gonçalves Bernardes - UnB
sentimento Livre e Esclarecido (TCLE), lilicgb@gmail.com
os questionários foram entregues aos Tereza Cristina Cavalcanti Ferreira de Araujo
participantes, na sala de aula, para que - UnB
estes respondessem de forma individual araujotc@unb.br
e autoaplicável. Todos os dados foram di-
gitados no programa SPSS 17.0, para as Historicamente, na organização adminis-
análises estatísticas de freqüência, mé- trativa do Estado brasileiro, as questões
dias e desvios padrões por meio do Qui- sociais envolvendo pessoas com defici-
-quadrado e da correlação de Spearman. ência eram objeto de interesse e ação
Este estudo está aprovado pelo Comitê de setores da assistência social, saúde e
de Ética em Pesquisa da PUCRS sob o nú- educação. Porém, nas últimas décadas,
mero CEP 10/05295. Como análise dos houve uma mudança paradigmática e a
resultados, identificou-se que a literatura luta pelos direitos das pessoas com de-
aponta que mulheres são frequentemen- ficiência foi deslocada para o campo dos
te mais assediadas no ambiente de traba- Direitos Humanos. Isso gerou modifica-
lho do que os homens, sendo que o tipo ções no desenho institucional do Estado
de assédio varia conforme o gênero. Os e a questão da deficiência passou a ser
fatores de assédio moral possivelmente abordada transversalmente por várias
mais praticados contra mulheres sejam o áreas, estendendo-se para aquelas vol-
isolamento social e as medidas relaciona- tadas para o trabalho e emprego, ciência
das com o trabalho, tais como: retenção e tecnologia, previdência social, comuni-
de informações relevantes ao desempe- cação, habitação, cultura, esporte, turis-
nho profissional, realização de atividades mo, transporte, arquitetura e urbanismo.
em nível inferior a sua competência, ex- Sendo assim, são cada vez mais comple-
clusão do grupo, opinião ignorada, entre xos os desafios impostos à elaboração,

1194
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

implantação e avaliação de políticas pú- deficiência, constata-se a hegemonia do


blicas coerentes, eficazes e justas. No modelo médico, em detrimento do mo-
Brasil, existe um número considerável de delo social de deficiência. No campo da
políticas destinadas a este segmento da saúde, a prevenção das deficiências por
população e, essencialmente, dois mo- meio de medidas de saúde pública ainda
delos distintos norteiam os programas já recebe atenção e recursos insuficientes.
implantados: o modelo médico, também Quando a eliminação da deficiência não
conhecido como modelo individual, e o é possível por meio de medidas preventi-
modelo social de deficiência. Segundo o vas, a abordagem se volta para o manejo
modelo médico, a abordagem da defici- da deficiência. Mas, ao invés de aumentar
ência fundamenta-se no substrato bioló- o acesso e o controle do indivíduo quanto
gico do impedimento diagnosticado. Em- ao tipo de ajuda que ele pode vir a pre-
bora doença e saúde possam ter origens cisar, como, por exemplo, equipamentos
no ambiente físico e social do indivíduo, de tecnologia assistiva, as ações estão
é no corpo que a doença está situada e voltadas para a dissimulação da deficiên-
se manifesta. Neste modelo, a deficiência cia. Evidentemente, existem políticas vol-
é considerada como atributo ou caracte- tadas para pessoas com deficiência em
rística pessoal, causados diretamente por situação de pobreza. Quanto à educação,
infecção, trauma ou outra condição de programas, projetos e ações destinados
saúde, que requer algum tipo de inter- aos alunos com deficiência nos sistemas
venção por parte de profissionais espe- públicos de ensino, são realizados pela
cialistas que irão “corrigir” ou “compen- Secretaria Nacional de Educação Especial.
sar” o problema para que o indivíduo se Recentemente, foi criada a Secretaria Na-
adapte à sociedade previamente constru- cional de Promoção dos Direitos da Pes-
ída e organizada. Em oposição, o modelo soa com Deficiência, no âmbito da Secre-
social foi desenvolvido por pessoas com taria de Direitos Humanos da Presidência
deficiência, em resposta ao modelo mé- da República. Na administração pública
dico e ao impacto negativo que este tinha nacional, os gestores públicos figuram
tido em suas vidas. Para o modelo social, como responsáveis, dentre outras ativi-
a deficiência é um produto das barrei- dades típicas de Estado, pela formulação,
ras físicas, organizacionais e atitudinais execução e monitoramento de políticas
presentes na sociedade e não pode ser públicas. Mas, outros atores participam
concebida como conseqüência de limi- da arena decisória das políticas públicas,
tações provocadas por uma mera fatali- dentre eles, os Conselhos de Direitos, os
dade da existência de alguém. No que se quais muitas vezes buscam o equilíbrio
refere à temática da deficiência humana, na disputa por recursos, defendendo
outros debates se somam aos dilemas e os interesses de minorias. Em síntese, a
impasses anteriores, tais como: eutaná- institucionalização do tema é um refle-
sia, aborto, infanticídio e alocação de re- xo da crescente relevância das questões
cursos em saúde perpassam o debate e vinculadas à deficiência na esfera pública.
afetam a vida de um grande contingente Todavia, permanecem impasses cruciais
da população. Em nosso país, apesar da diante de uma demanda social em ex-
vulnerabilidade social das pessoas com pansão. É preciso, portanto, ampliar os

1195
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

conhecimentos teóricos e técnicos com o ou separado’ (n=1). Doze conselheiros


desenvolvimento de mais estudos sobre (57%) afirmaram ter deficiência. Apenas
o assunto. Sendo assim, realizou-se uma um gestor declarou ter deficiência física
pesquisa de natureza descritiva e explo- ou motora moderada. Dentre os resul-
ratória com objetivo geral de conhecer, tados obtidos, destaca-se que, para os
analisar e compreender a percepção de conselheiros, a deficiência é uma questão
gestores e conselheiros de direitos sobre social que deve ser compartilhada com o
modelos de deficiência, políticas públicas restante da sociedade; ao passo que, para
direcionadas a pessoas com deficiência e os gestores, trata-se, sobretudo, de uma
questões bioéticas concernentes. A inves- tragédia pessoal, circunscrita à esfera in-
tigação foi previamente autorizada pelo dividual e familiar. Hipotetiza-se, então,
Comitê de Ética em Pesquisa da Facul- que essa visão diferenciada decorre de
dade de Ciências da Saúde da Universi- perspectivas diferentes em relação à alo-
dade de Brasília e todos os participantes cação dos recursos públicos. Destaca-se,
expressaram sua concordância por meio também, a importância da vivência da
da assinatura de um Termo de Consen- deficiência, ou da convivência com pes-
timento Livre e Esclarecido. A amostra soas com deficiência, para fundamentar a
definitiva reuniu 21 gestores públicos e avaliação da qualidade e a satisfação com
29 conselheiros de direitos. A coleta de a vida experimentada pelas pessoas com
dados foi feita por meio da aplicação pre- deficiência e contribuir para a elaboração
sencial, ou pela internet, de um questio- de políticas públicas. Recomendam-se es-
nário composto por 24 enunciados, cujas tudos semelhantes, com amostras mais
possibilidades de resposta eram: ‘concor- abrangentes e diversificadas, assim como
do’, ‘concordo parcialmente’ ou ‘discor- a adoção de metodologias qualitativas e
do’. Os dados obtidos foram submetidos participativas.
à análise quantitativa e os resultados indi-
caram que os dois grupos se distinguem. Palavras-chave: deficiência, políticas públicas,
O grupo de conselheiros reuniu 66,7% modelos de deficiência.
(n=14) participantes do sexo masculino Contato: Tereza Cristina Cavalcanti Ferreira
e 33,3% (n=7) do sexo feminino; 66,7% de Araujo, UnB, araujotc@unb.br
(n=14) informaram ser casado ou viver
com companheiro, 19% (n=4) comuni-
caram ser solteiro, 14,3% (n=3) divorcia- LT03-1353 - PERSPECTIVA DE DIRETORES
do ou separado. Quanto à escolaridade, DE ESCOLAS PÚBLICAS SOBRE JUSTIÇA
52,4% (n=11) alcançaram o ensino supe- RESTAURATIVA
rior, 38,1% (n=8) fizeram pós-graduação Letícia Lovato Dellazzana - UFRGS
e 9,5% (n=2) cursaram o ensino médio. A Tatiana Dias Lawrenz - FACCAT
subamostra de gestores foi integrada por Paula Grazziotin Silveira Rava - FACCAT
65,5 % (n=19) participantes do sexo mas-
culino e 34,5% (n=10) do sexo feminino. A essência da justiça restaurativa é a re-
Em relação ao estado civil, 75,9% (n=22) solução de problemas de forma colabora-
informaram estar casado, 20,7% assina- tiva. Práticas restaurativas proporcionam,
laram ‘solteiro’ (n=6) e 3,4% ‘divorciado àqueles que foram prejudicados por um

1196
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

incidente, a oportunidade de reunião ou no olhar medroso do grupo de pais


com os envolvidos para expressar seus em vigília em torno das escolas, impede
sentimentos, descrever como foram afe- a realização de uma reflexão séria sobre
tados e desenvolver um plano para repa- suas causas, que são múltiplas e, por isso,
rar os danos ou evitar que se repitam. A sumamente complexas de serem compre-
abordagem restaurativa é reintegrado- endidas (Codo, 1999). O principal objeti-
ra e permite que o transgressor repare vo do procedimento restaurativo é o de
danos e não seja mais visto como tal. O conectar pessoas além dos rótulos nas
engajamento cooperativo é elemento es- necessidades determinantes e emergen-
sencial da justiça restaurativa, que trata tes do conflito, de forma a aproximar e
de suprir as necessidades emocionais e corresponsabilizar todos os participantes,
materiais das vítimas e, ao mesmo tem- com um plano de ações que visa restau-
po, fazer com que o infrator assuma res- rar laços sociais, compensar danos e ge-
ponsabilidade por seus atos, mediante rar compromissos futuros mais harmôni-
compromissos concretos. É fundamental cos entre vítima, ofensor e testemunha;
salientar que as práticas restaurativas desenvolvendo ações construtivas que
pressupõem um acordo livre e plenamen- beneficiem a todos. Sua abordagem tem
te consciente entre as partes envolvidas. o foco nas necessidades determinantes
Sem esse consenso, não há alternativa a e emergentes do conflito, de forma a
não ser recorrer ao procedimento tradi- aproximar e corresponsabilizar todos os
cional. Portanto, a capacidade da justiça participantes (Branchier, 2006). O mes-
restaurativa de preencher essas necessi- mo autor, Branchier (2006), comenta que
dades emocionais e de relacionamento é a justiça restaurativa tem como valores
o ponto chave para a obtenção e manu- fundamentais: participação, respeito,
tenção de uma sociedade civil saudável, honestidade, humildade, interconexão,
a qual será responsável, através deste responsabilidade, empoderamento e es-
processo, por uma participação ativa de perança. Estes valores distinguem a jus-
todos os cidadãos envolvidos, promoven- tiça restaurativa de outras abordagens
do, desta forma, o efetivo exercício da mais tradicionais de justiça como resolu-
cidadania (Vasconcelos, 2008). A impor- ção de conflitos. A mesma se dá através
tância de se aprofundar neste assunto do círculo restaurativo. O objetivo deste
reside no fato de que cada vez mais au- estudo é explorar o entendimento que
menta o número de violência nas escolas, diretores de escolas públicas têm sobre
sendo que os professores muitas vezes a justiça restaurativa, buscando-se, por-
não estão preparados para enfrentar esta tanto, responder o seguinte problema de
realidade. As escolas públicas em geral pesquisa: qual é a percepção de diretores
parecem estar sendo abandonadas pelos das escolas públicas de uma cidade ser-
usuários e funcionários perante o avanço rana do Rio Grande do Sul, sobre justiça
da agressividade física e emocional por restaurativa nas escolas? Participaram
parte de alunos e também dos professo- desse estudo quinze diretoras de escolas
res. A forma de a mídia apresentar o fe- públicas de uma cidade serrana do Rio
nômeno da violência, na medida em que Grande do Sul. Foi realizado um grupo
se concentra nos episódios truculentos, focal, que segundo Morgan (1988), é um

1197
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

método de pesquisa qualitativa e trata-se em geral. As pesquisas relacionadas ao


de um tipo especial de grupo em termos assunto revelam-se importantes, pois se
de seu propósito, tamanho, composição trata de um tema atual e relevante na
e dinâmica. Basicamente, o grupo focal nossa sociedade, uma vez que a violên-
pode ser considerado uma espécie de en- cia escolar está cada vez mais evidente,
trevista de grupo, embora não no sentido não somente nas escolas, mas na família,
de ser um processo no qual se alternam nos grupos de amigos e na comunidade
perguntas do pesquisador e resposta dos em geral. Sugere-se que sejam realizadas
participantes. Diferentemente, a essência palestras e grupos de estudos sobre jus-
do grupo focal consiste justamente em se tiça restaurativa em escolas privadas, já
apoiar na interação entre seus participan- que a violência se manifesta em todas as
tes para colher dados, a partir de tópicos classes sociais.
que são fornecidos pelo pesquisador, no
caso, o moderador do grupo. Este grupo Palavras-chave: justiça restaurativa,
foi gravado e transcrito para posterior diretores, escolas públicas.
análise e interpretação, com base no mé- Contato: Letícia Lovato Dellazzana, UFRGS,
todo de Análise de Conteúdo de Bardin leticiadellazzana@gmail.com
(1977), que é um método que recorre a
“indicadores não frequenciais suscetí-
veis de permitir inferências, sendo que a PO-LT06
presença ou ausência pode constituir um
índice tanto ou mais frutífero que a frequ-
ência da aparição” (Bardin, 1977, p. 114). LT06-708 - INDICADORES DE DEPRESSÃO
Os resultados mostraram a dificuldade INFANTIL APRESENTADOS POR UMA
que as diretoras de escolas públicas en- COORTE DE CRIANÇAS, ESTRATIFICADA
frentam para resolver os conflitos escola- PELA ADEQUAÇÃO DO PESO AO NASCER
res no dia a dia. Outro aspecto relevante À IDADE GESTACIONAL
é a preocupação que as diretoras de esco-
Claudia Mazzer Rodrigues - FFCLRP/USP
las públicas sentem em trazer os pais e a
claudiamr@usp.br
comunidade para participação mais ativa
Sonia Regina Loureiro - FMRP/USP
nas escolas. Pôde-se perceber também
srlourei@fmrp.usp.br
que o grau de agressividade é preocupan-
te já na educação infantil, tornando-se ur- Financiamento: FAPESP, CNPq
gente a elaboração de um projeto como a
justiça restaurativa para a resolução dos Dentre as diversas abordagens que se
conflitos escolares. Verificou-se que, em- ocupam do estudo do desenvolvimento
bora já tenham tido algum contato com o humano, a psicopatologia do desenvol-
tema, a justiça restaurativa ainda é pou- vimento se caracteriza por focalizar as
co conhecido pelas diretoras das escolas condições de vulnerabilidade e proteção
pesquisadas. As diretoras mostraram um aos processos básicos de adaptação do
grande interesse sobre o tema e a neces- indivíduo, se ocupando das trajetórias
sidade da realização de futuros projetos do desenvolvimento típico e atípico. Sob
tanto nas escolas como na comunidade tal perspectiva, focaliza os fatores que

1198
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

podem favorecer (fatores de proteção) cer e idade gestacional, tendo por base
ou dificultar (fatores de risco) o funcio- a curva de crescimento intra-uterino,
namento dos indivíduos, especialmente, como parâmetro de adequação do peso
frente a situações adversas, enfatizando ao nascer à idade gestacional. Diversas
as trajetórias e a multiplicidade de variá- curvas têm sido propostas e, dentre es-
veis que concorrem para desfechos diver- sas, inclui-se a curva de Alexander, Himes,
sos (Bee, 1996). Nesse sentido, a investi- Kaufman, Mor e Kogan (1996), em que as
gação acerca desses fatores, que podem crianças são classificadas, de acordo com
se figurar como risco ou proteção ao de- os ajustes do peso ao nascer em relação
senvolvimento, é importante por permitir à idade gestacional, da seguinte forma:
compreender como eles afetam o modo “Pequena para a Idade Gestacional” (PIG)
de funcionamento e a adaptação do indi- - abaixo do percentil 10; “Adequadas para
víduo diante de condições adversas, favo- a Idade Gestacional” (AIG) - entre os per-
recendo a vulnerabilidade ou a resiliên- centis 10 e 90; e “Grandes para a Idade
cia (Masten & Gerwitz, 2006). Assim, tal Gestacional” (GIG) - acima do percentil
perspectiva se propõe a conhecer as difi- 90. Estudos evidenciam que crianças nas-
culdades que podem ocorrer na trajetória cidas pequenas para a idade gestacional
do desenvolvimento, como condição fun- (PIG) apresentam maior risco de déficit
damental para que se possa atuar sobre cognitivo e problemas comportamentais
as mesmas, evitando que os problemas ao longo da infância e adolescência (Bear,
se estabeleçam e interfiram no processo 2004; O’Keeffe et al, 2003; Pryor, Silva,
de adaptação do indivíduo (Achenbach, Brooke, 1995). Porém, o risco para o de-
1992). Dentre as condições reconhecidas senvolvimento de problemas emocionais,
como de risco biológico ao desenvolvi- como a depressão infantil, ainda é pou-
mento infantil incluem-se o baixo peso ao co pesquisado. Ademais, no Brasil, pes-
nascer e o nascimento em idade gestacio- quisas voltadas para a identificação dos
nal prematura. Considera-se que desvios efeitos psicológicos de vulnerabilidade
nesses parâmetros possam comprometer biológica ao nascer, especialmente, aque-
os processos normais de desenvolvimen- les relacionados ao seguimento a médio
to, além de expor esses bebês a uma ca- e longo prazo, são escassos (Linhares et
deia de adversidades decorrentes destas al, 2005). Ressalta-se que investigações
condições (Klein & Linhares, 2006). Nota- realizadas com crianças em período esco-
-se, na literatura, a predominância de es- lar são consideradas relevantes, uma vez
tudos que se ocupam dos efeitos do baixo que este consiste em um período de gran-
peso ao nascer e da prematuridade sobre des demandas e desafios para a criança,
os aspectos comportamentais, cognitivos com exigências de produtividade e rea-
e emocionais, utilizando de modo inde- lizações que se expressam pelo desem-
pendente os seguintes critérios de inclu- penho acadêmico e pela socialização em
são: peso ao nascer e idade gestacional contexto social diverso ao ambiente fa-
da criança. Contudo, mais recentemente, miliar (Linhares, Bordin, Carvalho, 2004).
alguns estudos têm utilizado como crité- Nesse contexto, definiu-se como hipó-
rio de inclusão uma medida combinada tese norteadora do estudo que crianças
que relaciona as variáveis: peso ao nas- expostas ao risco biológico do nascimen-

1199
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

to “Pequeno para a Idade Gestacional” tuação igual ou superior a 17, como indi-
(PIG) apresentariam, na idade escolar, cadora de provável depressão infantil. Os
mais indicadores de depressão infantil. grupos foram comparados pelo teste Qui-
Objetivou-se comparar os indicadores de -Quadrado, adotando-se p<0,05. Foi veri-
depressão infantil avaliados em uma co- ficada uma taxa de 13,2% de indicadores
orte de crianças em idade escolar, estrati- de depressão infantil para crianças PIG,
ficada pela adequação do peso ao nascer enquanto a taxa em AIG foi de 5,8% e em
à idade gestacional. Foram avaliados 665 GIG não foram encontradas crianças com
escolares, com 10 e 11 anos de idade, de tais indicadores e, no total, verificou-se
ambos os sexos, nascidos em 1994 em que 7% das crianças apresentaram indi-
Ribeirão Preto-SP. Os participantes foram cadores de depressão infantil. Constatou-
classificados conforme a curva de peso ao -se que os indicadores de sintomatologia
nascer em relação à idade gestacional de depressiva foram significativamente mais
Alexander et al (1996), sendo distribuídos freqüentes no grupo de crianças nascidas
em três grupos: PIG- 136 crianças nasci- PIG, em comparação aos grupos de crian-
das pequenas para a idade gestacional, ças nascidas AIG e GIG (p=0,002). Portan-
AIG- 485 crianças nascidas adequadas to, confirmou-se a hipótese de associação
para a idade gestacional e GIG- 44 crian- entre a vulnerabilidade biológica relativa
ças nascidas grandes para a idade gesta- ao nascimento PIG e a suscetibilidade à
cional. O estudo foi aprovado pelo Comi- depressão infantil, na idade escolar. Tais
tê de Ética em Pesquisa do HCFMRP-USP achados sugerem que crianças nascidas
e as participações ocorreram mediante PIG apresentam desvantagens em rela-
assinatura do Termo de Consentimento ção a indicadores emocionais, quando
Livre e Esclarecido pelos pais ou respon- comparadas com seus pares. Evidencia-se
sáveis. Procedeu-se a avaliação dos indi- a importância de investigações longitudi-
cadores de depressão infantil por meio nais acerca de indicadores emocionais de
do Inventário de Depressão Infantil-CDI, crianças em condições de vulnerabilidade
respondido pelas crianças. Tal instrumen- biológica ao nascer considerando-se, de
to, elaborado por Kóvacs (1983), foi adap- acordo com a perspectiva da psicopatolo-
tado e normatizado para o contexto brasi- gia do desenvolvimento, a importância da
leiro por Gouveia et al. (1995) e validado identificação de dificuldades e recursos,
para Ribeirão Preto por Hallak (2001). de modo a contribuir para a proposição
Para obtenção de informações referentes de medidas preventivas e terapêuticas
às condições clínicas, à idade gestacional voltadas para a promoção do desenvolvi-
e o peso ao nascer, utilizou-se dos dados mento e da saúde mental infantil.
dos prontuários das crianças por ocasião
do nascimento e os pais responderam a Palavras-chave: recém-nascido pequeno para
um questionário sobre as condições só- idade gestacional, fatores de risco, depressão
cio-econômicas da família. Os dados re- infantil
ferentes aos indicadores emocionais ob- Contato: Claudia Mazzer Rodrigues,
tidos pelo CDI foram codificados confor- Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
me as proposições técnicas, adotando-se Ribeirão Preto – USP, claudiamr@usp.br
como nota de corte do escore total a pon-

1200
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT06-724 - REPERCUSSÕES DA 2007) resultam em dados alarmantes que


DEPRESSÃO NA ADOLESCÊNCIA estimam, para as próximas duas décadas,
Grace Hossni Sarkis - FMU um aumento considerável para o número
grace.sarkis@gmail.com de novos deprimidos. Em 2020, por exem-
Gabriela Lara da Cruz Lucas - FMU plo, a depressão representará a segunda
gabilcl@hotmail.com afecção que mais perpassará os anos de
Luana Ariga Regis Coelho - FMU vida útil da população mundial, poden-
luan_arc@yahoo.com.br do ultrapassar o número de afetados por
Vanessa Mendonça Lima Borba - FMU doenças cardiovasculares. Atualmente, é
vmlima@gmail.com relacionada como a quarta causa mundial
de deficiência e o segundo lugar na faixa
Segundo o Estatuto da Criança e do Ado- etária compreendida entre 15 a 44 anos,
lescente (ECA), a adolescência é o perío- podendo se tornar um problema crônico
do que compreende a faixa etária de doze ou recorrente que venha a impossibilitar
a dezoito anos: Art. 2º, “Considera-se o sujeito de cuidar de si mesmo e de suas
criança, para efeitos dessa Lei, a pessoa atividades diárias. Dessa forma, este tra-
até doze anos de idade incompletos, e o balho tem como objetivo correlacionar o
adolescente aquela entre doze e dezoito período da adolescência e a depressão,
anos de idade.” Nessa fase, o adolescente avaliando as causas e as repercussões da
vivencia diversas situações, possivelmen- depressão na adolescência, além de le-
te, desencadeantes de comportamentos vantar algumas contribuições de teóricos
conflitantes e até patológicos, tais como: da Psicanálise sobre o tema. A metodolo-
gravidez precoce, uso de drogas lícitas gia utilizada nesta pesquisa foi de levanta-
ou ilícitas, conflitos familiares, bullying, mento bibliográfico e o referencial teórico
transtornos alimentares e a depressão que dá corpo a este trabalho constitui-se
propriamente dita, que poderá surgir por de autores da Psicologia do Desenvolvi-
questões orgânicas, ou seja, as mudanças mento, autores consagrados da Psicaná-
hormonais devido à puberdade e, tam- lise e da Psiquiatria, além de estudos atu-
bém, por influências sociais. A depressão, ais difundidos em sites como o do Scielo.
segundo Holmes (2001), enquadra-se na- Partindo do entrecruzamento entre os
quilo que se entende por transtornos de clássicos da Psicanálise (Freud; Klein), a
humor. A depressão envolve um aumento interface entre a Psicanálise e a Psiquia-
no nível de energia, de modo que até as tria (Zimerman; Carvajal) e autores da
tarefas mais comuns possam parecer mui- Psicologia do Desenvolvimento (Berger;
to difíceis e, algumas vezes, impossíveis Papalia & Olds), este trabalho procurou
de serem realizadas. É importante distin- conceituar Depressão e Adolescência, a
guir a depressão normal, que poderá ser fim de compreender as repercussões do
vivida por todos os indivíduos (tristeza, quadro clínico da Depressão na Adoles-
pesar, etc), da depressão mais profunda e cência. Recorreu-se a autores clássicos
prolongada do que o justificado pela cau- como Freud (1917) e Klein (1921-1945).
sa original. As estatísticas da Organização A frase conhecida de Freud acerca dos
Mundial de Saúde (apud Monteiro & Lage, estados melancólicos, “a sombra do ob-
jeto recai sobre o ego”, ainda é conside-

1201
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

rada como imprescindível aos estudos do seu lugar adolescente, assim com a
psicanalíticos acerca da depressão, assim extensão edípica que se dá na dupla: in-
como a posição depressiva teorizada por fantilização e erotização dos filhos. As re-
Klein contribui para a compreensão do percussões da depressão na adolescência
funcionamento psíquico do depressivo. são inúmeras; o jovem pode manifestar
Teóricos mais atuais, que buscam enten- irritabilidade, instabilidade, humor depri-
der as correlações entre a depressão e o mido, perda de energia, desmotivação e
adolescente contemporâneo, entre eles, desinteresse, retardo psicomotor, senti-
o psiquiatra e psicanalista de crianças e mentos de desesperança, culpa, altera-
adolescentes, Guillermo Carvajal (1998), ções do sono, isolamento, dificuldade de
também foram abordados neste traba- concentração, prejuízo no desempenho
lho. É interessante definir depressão, a escolar, baixa autoestima, ideação, com-
fim de esclarecer a complexidade diag- portamentos suicidas e agressividade. Os
nóstica, já que se assiste, na atualidade, quadros polimórficos podem estar acom-
certa confusão entre sofrimento psíquico, panhados de distúrbios psicossomáticos,
luto e depressão, levando a diagnósticos alterações de peso e do comportamento
precipitados de um quadro depressivo. alimentar, falta de reatividade, anedonia
Carvajal (2001) tece distinções importan- e fadiga (Bahls, 2002). Considerando o
tes entre mudança, perda e luto patoló- quadro exposto, este trabalho ressalta a
gico; este último, segundo o autor pode, importância do conhecimento e reconhe-
de fato, levar ao estado depressivo. As cimento das repercussões da depressão
mudanças no púbere são, muitas vezes, na adolescência, para um possível enca-
intencionais e saudáveis, desmistificando minhamento do tratamento terapêutico
a ideia de que todo adolescente sofre um e, quando necessário, psiquiátrico, assim
luto doloroso na passagem da infância como a necessidade de diagnóstico clíni-
para a adolescência. O que pode ocor- co eficaz, já que a depressão consiste em
rer, em termos de patologia, segundo o um quadro patológico específico e que,
autor, seriam lutos mal elaborados: (a) por sua vez, requisita tratamento próprio.
“luto por identificação” devido à identi- Nesta pesquisa, procurou-se compreen-
ficação inconsciente com o luto dos pais der o fenômeno da depressão no con-
que não aceitam “a perda de seu bebê”; texto da adolescência e pode-se concluir
(b) “luto patológico por regressão”, quan- que esse fenômeno é mais recorrente do
do o adolescente tem dificuldade de lidar que se imagina nessa fase da vida, devido
com as mudanças de seus esquemas cor- tanto a fatores sociais, que estão presen-
porais; (c) “lutos infantis mal elaborados tes na dinâmica do jovem, quanto a uma
da infância” que são caracterizados por série de lutos que devem ser elaborados
conflitos infantis que emergem na adoles- pelo adolescente. Há, ainda, questões
cência; (d) “luto parental”, que consiste hormonais envolvidas, devido ao desen-
em identificações negativas dos pais, que volvimento biológico. Portanto, pode-se
vêem no filho o espelho de seu envelhe- afirmar que nessa fase de transição para
cimento e a possibilidade de morte, le- a vida adulta, há uma série de contingên-
vando à inveja do corpo do adolescente, cias multifatoriais, determinantes para o
negação do crescimento deste, ocupação desencadeamento da patologia.

1202
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: adolescência, depressão, Dessa forma, ressalta-se que nem todas as


desenvolvimento humano crianças que convivem com mães depres-
Contato: Grace Hossni Sarkis, Complexo sivas apresentam, necessariamente, pro-
Educacional FMU, grace.sarkis@gmail.com blemas de adaptação, observando-se uma
grande variedade de trajetórias desenvol-
vimentais. Contudo, estudos indicam que
LT06-728 - ESTRESSORES FAMILIARES desfechos negativos podem estar associa-
DE CRIANÇAS QUE CONVIVEM COM A dos à presença de um maior número de
DEPRESSÃO MATERNA estressores associados à depressão ma-
Isabela Mendes Vilanova e Silva - USP terna e de maior cronicidade de tais even-
isabelamendesesilva@hotmail.com tos. Neste estudo, objetivou-se caracteri-
Fernanda Aguiar Pizeta - USP zar as condições contextuais do ambiente
fepizeta@usp.br de famílias que convivem com a depres-
Sonia Regina Loureiro - USP são materna recorrente, identificando os
srlourei@fmrp.usp.br principais estressores atuais e crônicos,
Financiamento: CNPq e CAPES segundo a percepção das mães. Foram
avaliadas 40 díades mãe-criança, distribu-
A Psicopatologia do Desenvolvimento ídas em dois grupos, a saber, G1 (25 crian-
configura-se como um modelo da ação ças com dificuldades de socialização) e G2
humana e da ação social, que respeita a (15 crianças com indicadores positivos de
complexidade de ambas. Baseia-se no socialização). Incluíram-se crianças de am-
pressuposto de que, através do estudo bos os sexos, na faixa etária de sete a 12
do ambiente, obtém-se uma melhor com- anos, cujas mães biológicas apresentavam
preensão do individual e, por meio do diagnóstico psiquiátrico confirmado de
estudo do indivíduo, tem-se uma melhor Depressão Recorrente, com episódios mo-
compreensão do ambiente. Isto evidencia derados ou graves nos últimos dois anos
a relação mútua que se estabelece entre e sem sintomas nos seis meses anteriores
esses campos de pesquisa e a complexi- à coleta de dados. As mães responderam
dade do desenvolvimento humano. Com aos seguintes instrumentos: (a) Entrevista
base nessa perspectiva, a partir da década Clínica Estruturada para o DMS-IV - visa a
de 1980, começaram a surgir estudos, vol- confirmação do diagnóstico de Depressão;
tados para a compreensão de condições (b) Questionário de Capacidades e Dificul-
favorecedoras tanto o desenvolvimento dades (SDQ) - relativo ao comportamento
de competências quanto de dificuldades, da criança; (c) Escala de Eventos Adversos
com ênfase para a utilização de conceitos e Escala de Adversidade Crônica que vi-
como resiliência, vulnerabilidade e risco. sam, respectivamente, identificar eventos
Dentre tais condições, destaca-se a de- adversos que podem ter ocorrido na vida
pressão materna, que vem sendo identi- da criança, abrangendo três domínios:
ficada como condição de risco ao desen- vida escolar, vida familiar e vida pessoal e
volvimento infantil e pode estar associada eventos adversos que podem ter ocorrido
a outros eventos estressores e a fatores na vida da criança, com duração ou ocor-
de proteção, que interagem de forma a rência repetida por um ano ou mais; (c)
interferir no comportamento das crianças. Questionário Geral – relativo aos aspectos

1203
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

sócio-demográficos; e (d) Entrevista com tamento. A análise dos eventos estresso-


Roteiro Semiestruturado, elaborado para res sinalizou, com diferença significativa, a
as finalidades do estudo e relativo à per- presença de maior número de estressores
cepção sobre os estressores e a rede de em G1 em comparação ao G2, expresso
apoio social. As crianças responderam aos por: (a) um número total de eventos es-
testes: (a) Matrizes Progressivas Coloridas tressores (G1=69,2%; G2=30,8%); (b) pre-
de Raven, para avaliação do nível intelec- sença de maior número de estressores
tual e (b) Teste do Desempenho Escolar, relativos ao contexto geral do ambiente
para a avaliação do desempenho acadêmi- familiar, caracterizados por dificuldades fi-
co. Procedeu-se às avaliações em sessões nanceiras, inclusão de membros estranhos
individuais, face a face; os dados foram no lar e mudanças de cidade, residência,
quantificados e os grupos, comparados bairro ou escola (G1=66,3%; G2=33,7%);
(p<0,05), em relação aos estressores do (c) doenças, perdas e organização fami-
ambiente familiar de crianças com e sem liar (G1=66,2%; G2=33,8%); (d) interações
dificuldades de socialização. Os instru- familiares e práticas educativas expressas
mentos psicométricos foram codificados por conflitos conjugais e familiares, sepa-
conforme as normas. As entrevistas foram ração e recasamento, práticas educativas
transcritas, categorizadas e submetidas à negativas e violência no lar (G1=69,9%;
concordância quanto à classificação. Fo- G1=30,1%); e (e) problemas de saúde e de
ram pontuadas quanto à presença ou au- comportamento das crianças (G1=74,0%;
sência de estressores e eventos adversos, 26,0%). Na comparação dos estressores
relativos a: (a) o contexto geral do ambien- crônicos, verificou-se a presença, com
te familiar; (b) doenças, perdas e organi- significância estatística, de mais adversi-
zação familiar; (c) interações familiares e dades crônicas no ambiente familiar das
práticas educativas; e (d) problemas de crianças de G1 em relação às de G2. Cons-
saúde e de comportamento das crianças. tatou-se que, além da depressão mater-
Com relação ao perfil sócio-demográfico, na - adversidade reconhecida e condição
não foram observadas diferenças estatisti- de inclusão no estudo - as famílias estão
camente significativas quanto às variáveis: expostas a um extenso número de estres-
ocupação, estado civil, número de filhos e sores; alguns, inclusive, de gravidade com-
classificação socioeconômica, idade e es- parável à psicopatologia materna, o que,
colaridade das crianças. Considerando-se possivelmente, concorre para as dificul-
a amostra total, evidenciou-se como perfil dades observadas. A presença de mais es-
predominante de mães casadas, com até tressores no ambiente familiar de crianças
três filhos, trabalhadoras assalariadas e com dificuldades de socialização chama a
da Classe C, de acordo com os critérios atenção para o efeito potencializador dos
de classificação econômica e crianças na riscos, concorrendo para tal desfecho ne-
faixa entre 10 e 12 anos, 55% cursando gativo. Por outro lado, a presença de um
os primeiros quatro anos do Ensino Fun- menor número de estressores no ambien-
damental. Os indicadores de socialização, te familiar das crianças sem dificuldade de
avaliados por técnicas específicas, aponta- socialização chama a atenção para a pre-
ram 64% das crianças com dificuldades es- sença de fatores protetores, que podem
colares e 72% com problemas de compor- estar funcionando como suporte para

1204
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

estas crianças e famílias; neste sentido, los entre a população e o seu contexto co-
são necessários mais estudos. Tais dados munitário, articulando-os. O objetivo des-
evidenciam a necessidade de práticas de te estudo é o de relatar uma experiência
saúde mental que levem em conta a multi- com arte-terapia, realizada com um “Gru-
plicidade de estressores, os quais concor- po de mulheres artesãs” do CRAS, para
rem para os desfechos comportamentais compreender a “eficácia percebida” pela
das crianças expostas a condições adver- população participante. De janeiro a de-
sas, como a depressão materna. zembro de 2006, esta pesquisa qualitativa
e antropológica foi realizada no contexto
Palavras-chave: depressão, estressores, do CRAS do município de Itarema/Ceará,
comportamento. cidade de origem indígena com 37462 mil
Contato: Isabela Mendes Vilanova e habitantes e localizada a 220 km da cidade
Silva, Universidade de São Paulo – USP, de Fortaleza. O nome Itarema vem do tupi
isabelamendesesilva@hotmail.com guarani e significa “pedra de cheiro agra-
dável” ou “pedra cheirosa” e associa-se
ao nome dado à localidade pelos índios,
LT06-993 - TECENDO HISTÓRIAS DE por causa de uma pedra com forma de
VIDA: VIVÊNCIA COM MULHERES obelisco em alto mar e que só era visível
ARTESÃS NO CENTRO DE REFERÊNCIA DA em maré baixa. Entre os procedimentos
ASSISTÊNCIA SOCIAL (CRAS) adotados para a formação do grupo, re-
Roxane Mangueira Sales - UNIFOR alizou-se uma “cartografia” da população
roxane_mangueira@hotmail.com de Itarema em parceria com a Secretaria
Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC de Ação Social (SAS) do Município (carto-
naradiogo@hotmail.com grafar é conhecer paisagens e capturar in-
Márcio Silva Gondim - FANOR tensidades em que se registram os encon-
mgondim@fanor.edu.br tros). Identificou-se, com isto, um grande
índice de desemprego e alto percentual
O Centro de Referência da Assistência So- de mulheres donas de casa, em situação
cial (CRAS) é um serviço público de prote- de risco, que utilizavam o artesanato (cro-
ção social básica, cuja atuação ocorre na chê) como fonte de renda e “passatempo”,
perspectiva da prevenção de situações enquanto muitos homens viviam da pes-
de risco. Localiza-se em territórios onde ca. Foram abertas inscrições para àquelas
há presença de vulnerabilidades sociais, mulheres que estivessem interessadas
enfocando a família e os vínculos comuni- em participar do grupo de artesãs, que
tários (Ministério do Desenvolvimento So- funcionaria em parceria com a SAS, com
cial e Combate à Fome, 2006). Portanto, o número máximo de 30 participantes,
seu objetivo concerne à responsabilidade que tivessem entre 15 e 65 anos de idade.
pela execução de serviços, programas e O grupo foi conduzido por três profissio-
projetos que potencializem a família como nais: assistente social, educadora física e
unidade de referência, reconhecendo a psicóloga e composto por 30 mulheres de
diversidade sócio-cultural e referendando diversas faixas etárias, com idades entre
particularidades do grupo social em que 17 a 65 anos; a maioria, com baixo grau
está inserido. Sua ação fortalece os víncu- de escolaridade e vivendo em situação de

1205
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

extrema pobreza. Os encontros ocorriam as colegas sentiam o mesmo: “Daí os cur-


duas vezes por semana; no primeiro deles, sos ajuda a gente a melhorar a nossa qua-
as mulheres recebiam um kit com linhas lidade, vejo que a bichinha da Maria tam-
e agulhas de crochê e, no outro dia, rea- bém nem enxerga direito, não sou só eu.
lizavam-se rodas de conversa e vivências Com os cursos e a arte que a gente faz pra
arte-terapêuticas. Para a coleta de dados, relaxar, o fechar os olhos pra relaxar, eita
utilizaram-se as descrições semanais dos é bom demais, saio feliz”; 3: Desfiando o
grupos, que eram transcritas após sua sofrimento: o compartilhar de vivências
realização. Além disso, foi feita uma en- intersubjetivas. Maria, muito cabisbaixa
trevista aberta, com o objetivo de avaliar nas atividades, passa a compartilhar sua
como as participantes percebiam o efeito história, mobilizando as outras a fazerem
do grupo na sua situação de vida. A aná- o mesmo; 4. “Melhorando a autoestima e
lise dos dados ocorreu através da análise capacidade laborativa”: Joana e as demais,
de conteúdo temática de Bardin, método com o passar do tempo, construíram uma
que consiste em descobrir os núcleos de intimidade, onde era visível até por suas
sentido que compõem a comunicação, e aparências físicas, um aprimoramento do
cuja presença ou freqüência de aparição autocuidado, como se sentiam melhores
pode significar algo para o objetivo analí- com seu corpo: “Quando a gente dança e
tico escolhido (Bardin, 1979). A interpre- faz relaxar, como tu diz aí, ‘boli’ o corpo
tação transcorreu à luz da antropologia vem tudo, tudo pra fora, fica leve, chega
interpretativa. O sigilo e o anonimato dos em casa e concentra melhor.” Conclui-se
informantes foram garantidos - portanto, que o trabalho do grupo de mulheres com
os nomes citados são fictícios - tendo sido arteterapia, que ocorreu de modo integra-
assinado o Termo de Consentimento Livre do e de forma interdisciplinar com os de-
e Esclarecido, de acordo com Resolução mais profissionais do CRAS (assistente so-
nº. 196/96 do CNS/Ministério da Saúde, cial e educador físico), foi percebido pelas
Brasil. Como parte dos resultados, com a mulheres artesãs como geradores de um
intenção de conhecer as singularidades “bem viver” (qualidade de vida), trazendo
e o cotidiano do CRAS, foram encontra- melhorias tanto na autoestima como na
das especificidades e semelhanças nos capacidade laborativa de cada uma delas.
discursos dessas mulheres; tais discursos Percebe-se, no entanto, a necessidade de
foram divididos nas seguintes categorias, consolidação da articulação da rede sócio-
as quais serão ilustradas com falas das -assistencial, uma vez que mesmo com
participantes: 1. Soltando o novelo de lã: toda regulamentação política do CRAS e
proseando entre amigas: “aqui nós fala de das políticas públicas, ainda é árdua a ta-
tudo um pouco, dos menino, dá risada a refa de articulação dos trabalhos desen-
baita, fala dos homens, de tudinho... pa- volvidos pelos diversos profissionais.
rece até que nós se conhece mais aqui do
que antes de todo mundo se juntar”; 2. Palavras-chave: arteterapia, diversidade
Melhorando habilidades: desenvolvendo cultural, qualidade de vida
a arte com as linhas e com a vida: Ruth, Contato: Roxane Mangueira Sales,
42 anos, revela que se sentia insegura com Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
suas habilidades e pôde compartilhar que roxane_mangueira@hotmail.com

1206
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

LT06-1010 - AS CONDIÇÕES SÓCIO- em uma instituição de abrigo, localizada


FAMILIARES DE CRIANÇAS ACOLHIDAS na Região Metropolitana de Belém, atra-
EM ESPAÇO INSTITUCIONAL vés de estudo comparativo entre os anos
Érica Luana Carneiro Góes - FASS/UFPA de 2004 e 2009, ressaltando as principais
erica.goes17@gmail.com mudanças ocorridas após cinco anos do
Djane Cristina Ribeiro de Araújo - FASS/UFPA primeiro levantamento. Os dados foram
djanecris@yahoo.com.br coletados utilizando o instrumento adap-
Lília Iêda Chaves Cavalcante - PPGTPC/UFPA tado por Cavalcante (2008), retirando as
liliaccavalcante@gmail.com informações dos prontuários das crianças
Celina Maria Colino Magalhães - PPGTPC/UFPA e das fichas de atendimento médico. As
celina.magalhaes@pesquisador.cnpq.br respostas aos formulários foram analisa-
das com base nas categorias de caracteri-
Financiamento: CNPq zação das crianças, criadas por Cavalcante,
referentes ao ano de 2009, comparando-
Estudos referentes às condições sócio- -os com outros 287 já analisados em 2004,
-familiares de crianças institucionalizadas sendo utilizado o mesmo formulário em
apontam para diferentes aspectos presen- ambas as pesquisas. No período de 2009-
tes no cotidiano de suas famílias, que vão 2010 foram preenchidos 249 formulários.
desde a privação material - sendo precá- Os principais resultados indicam uma di-
rias as condições de moradia, de alimen- minuição no número de ingressos, quando
tação e higiene - perpassando, também, comparados os anos 2004 e 2009 com 287
pela privação afetiva, na qual os vínculos e 249, respectivamente. Na atual pesqui-
estão ameaçados ou já foram rompidos. sa, constatou-se que há um predomínio
Este processo deriva de fatores internos, da população de sexo masculino (54,62%)
presentes nas relações pessoais e exter- sobre o feminino (45,38%), diferentemen-
nos, no que diz respeito à vulnerabilidade te da pesquisa realizada em 2004, na qual
social e econômica colocadas às famílias. havia uma ligeira prevalência do sexo fe-
Usualmente, as crianças estão expostas minino (51,22%). Observou-se, ainda, que
a problemas relacionados à pobreza e à a maioria das crianças que deu entrada
precariedade da renda, principalmente, nesse espaço de acolhimento encontrava-
dos pais, como a fome, a desnutrição, a -se no segundo ano de vida (18,88%). Ao
mortalidade infantil, entre outros. A litera- se tomar como base as faixas etárias de
tura que aborda essa temática se remete à dois a quatro anos, percebeu-se um acrés-
construção histórica de que a criança não cimo nesse percentual, o qual passou a
era percebida pelos responsáveis familia- ser de 53,83%. Dado este que se distan-
res enquanto um ser em desenvolvimen- cia do estudo anterior, o qual demonstrou
to; ela era vista, apenas, como incapaz. que 34,84% das crianças se encontravam
Assim, acolher em instituição significava no primeiro ano de vida, no momento
recolher os enjeitados, aquelas crianças em que foram acolhidas. Isto pode estar
que não eram bem quistas pela sociedade, associado a um maior cuidado que as fa-
bem como por sua família. Este trabalho mílias estariam despendendo às crianças
debate aspectos relacionados às condi- nas primeiras etapas do desenvolvimento,
ções sócio-familiares de crianças cuidadas assim como uma maior busca para mantê-

1207
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

-las sob os seus cuidados. No que se refe- de grande parte dos sujeitos pesquisados
re à pessoa de referência na família, em não exerciam nenhum tipo de atividade
63,46% do universo pesquisado, havia a remunerada (35,34%), o que deve estar
presença do pai ou da mãe ou de ambos; ligado ao fato de muitas mães ainda exer-
em 38,56% dos casos, a criança estava sob cerem apenas o papel de dona de casa;
o convívio dos pais, ora sob os cuidados nesses casos, somente o homem traba-
da mãe (23,3%) ora do pai (1,6%). Ao se lhava fora, alcançando um percentual de
comparar com a pesquisa precedente, 27,72%, incluindo o trabalho informal.
observou-se que houve um acréscimo sig- Muitas pesquisas indicam que as situa-
nificativo na variável que mostrou o per- ções de miséria e pobreza levam os pais
centual de convívio com os pais, passando a maltratarem e abandonarem seus filhos,
de 13,24% em 2004 para 38,56% em 2009, deixando-os vulneráveis à institucionaliza-
o que pode estar ligado ao maior número ção. Logo, essas condições de pobreza le-
de casamentos civis realizados nos últi- vam-nos a se omitirem e falharem no cui-
mos anos em todo o país. Outra discussão dado e atenção aos filhos, desencadeando
relevante é o reconhecimento da paterni- várias situações que afetam diferentes ní-
dade no registro civil, sendo que na atual veis do desenvolvimento infantil. Assim, a
pesquisa esse percentual foi de 46,58%, família não é somente responsável pelos
havendo um ligeiro aumento nesse reco- cuidados diários, mas, também, deve ser
nhecimento, ao se tomar por base a aná- fonte de estímulos e estabilidade emocio-
lise anterior (43,91%). Contudo, houve nal, além de propiciar meios para o pleno
um acréscimo no número de crianças que desenvolvimento da criança, o que pode
não possuíam a paternidade reconhecida, estar comprometido devido ao risco e à
passando de 28,57% para 34,94%. Já em degradação humana que são advindas da
relação à idade, notou-se que a maioria pobreza. Essa análise de resultados admi-
das mães possuía idades entre dezenove te concluir que a família exerce um papel
e trinta anos (58,24%), mesma faixa etária fundamental para o desenvolvimento das
na qual se encontrava a maioria dos pais crianças. Pontos importantes são discu-
(15,26%). Ao se referir à escolaridade dos tidos a partir do modelo bioecológico de
pais, percebeu-se que, em mais da meta- Bronfenbrenner (1996) permitindo, assim,
de dos casos (51,81%), a mãe possuía o compreender aspectos sociais, econômi-
ensino fundamental incompleto, nível de cos e culturais que envolvem a família e o
escolaridade no qual também prevaleceu espaço de acolhimento enquanto contex-
o percentual entre os pais (12,86%), de- tos de desenvolvimento. A idéia é cons-
monstrando a baixa escolaridade na qual truir uma série histórica que possa moni-
os pais dessas crianças se encontravam, torar a evolução de aspectos implicados
o que, muitas vezes, estaria dificultando na institucionalização, se são mais meni-
o acesso a bons empregos, para que os nos e meninas os acolhidos, em que idade
mesmos pudessem garantir o sustento isso ocorre, dentre outras categorias e, a
dos filhos, o que poderia estar associado partir desse estudo, contribuir para a apli-
a própria condição de pobreza na qual se cação de políticas públicas na garantia dos
situavam a maioria das famílias dos aco- direitos tanto das crianças institucionaliza-
lhidos. Ressaltando, ainda, que as mães das como de seus familiares.

1208
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: condições sócio-familiares, manifestações conscientes ou inconscien-


acolhimento institucional, desenvolvimento tes das tendências de vida-morte, a saber:
infantil o desejo de matar, o desejo de ser morto
Contato: Érica Luana Carneiro Góes – FASS/ e o desejo de morrer. Desse modo, pode
UFPA – erica.goes17@gmail.com decorrer de uma série de fatores ineren-
tes a cada pessoa e ao seu contexto de
vida, manifestando-se não só em um ato
LT06-1031 - ATOS SUICIDAS: VIDA E suicida, mas, em outros comportamentos
MORTE PELO TESTE ZULLIGER autodestrutivos de menor ou maior letali-
Luana Gasparetto Fontanella - Fundação dade. Tentativas de menor letalidade são
Hospitalar Santa Terezinha, Erechim/RS, cometidas por mulheres; são elas, tam-
luluzinhagf@erechim.com.br bém, que procuram mais ajuda. Os ho-
Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS mens, em contrário, fazem tentativas mais
silvanalba@upf.br letais e, menos frequentemente, procu-
ram ajuda psicológica. Em ambos os ca-
As tentativas de suicídio compreendem sos, os principais fatores psicossociais de
todos os atos pelos quais um indivíduo risco são: nível socioeconômico e de edu-
causa lesão a si mesmo, independente- cação baixos, dinâmica familiar conturba-
mente do grau de intenção letal e da sua da, experiências adversas ou traumáticas,
motivação. Estima-se que ocorram entre 8 baixa autoestima, falta de controle da
a 10 tentativas de suicídio para cada morte impulsividade e da agressividade, humor
consumada. As situações podem emergir lábil. Entre as perturbações mentais mais
de forma mais sutil, a partir de pensamen- evidentes encontram-se os transtornos
tos de autodestruição, tornando-se mais borderline, a esquizofrenia, a dependên-
graves por ameaças, gestos, tentativas de cia química e os quadros depressivos. Es-
suicídio e finalmente, o suicídio. Verifica- sas organizações permitem perceber que
-se que apenas um quarto dos pacientes os atos suicidas podem ter motivações
que tentam suicídio quer, realmente, totalmente diversas, e que têm relação
morrer. Embora isso não seja admitido com rupturas em diferentes períodos do
em uma parcela dos casos, o comporta- desenvolvimento afetivo-emocional. Con-
mento suicida parece querer alterar uma siderando ser esse um problema de saúde
situação de desadaptação e sofrimento, pública e a escassez de estudos com esses
e influenciar pessoas significativas. Nessa pacientes que, frequentemente, encon-
perspectiva, pode ser considerado como tram-se nas emergências dos hospitais e,
um grito de socorro, que busca provocar em sua maioria, sobrevivem às tentativas
um movimento de apoio e reestruturação de seus atos lesivos, há necessidade de
familiar ou que, em contrário, pode inci- se verificar a validade de instrumentos de
tar mais hostilidade e agressão de pesso- avaliação psicológica, eficientes e rápidos,
as próximas e da equipe de assistência. É para que possam auxiliar na compreensão
importante considerar que esse fenôme- da estrutura e da dinâmica psíquica dos
no não se resume a um ato de impulsão mesmos. Com esse propósito, o presente
incidental, inexplicável ou lógico, mas, a estudo buscou investigar as característi-
algo que deve ser compreendido como cas de personalidade de pacientes com

1209
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

várias tentativas de suicídio, os fatores de um menino de 18 anos. A baixa hospitalar


risco relacionados e a validade do Zulli- deu-se pelo consumo de 18 comprimidos
ger nesse contexto. Foram participantes de diazepam, sua quarta tentativa de sui-
duas mulheres, de 41 e 47 anos de idade, cídio, com uma anterior, ao tentar atirar-
divorciadas, auxiliares de serviços gerais -se do quarto andar de um prédio. O início
e de indústria, com Ensino Fundamental desses episódios foi relacionado com o
e Médio, respectivamente. Utilizaram-se excesso de trabalho, quando também co-
como critérios de inclusão: (a) tentativas meçou a apresentar sintomas psicóticos.
de suicídio anteriores; (b) hospitalização, Dados da família de origem revelaram a
em decorrência da tentativa de suicídio, presença de irmãos usuários de drogas,
em um período de no mínimo três dias; (c) sendo um deles morto por overdose; e de
não fazer uso de medicações que pudes- morte por suicídio dos dois avôs, tanto por
sem interferir na fidedignidade dos acha- parte de pai quanto de mãe. O Caso “B”
dos. Como instrumentos utilizaram-se a pensa em se matar porque não tem outra
entrevista clínica semiestrutura e o teste opção; além de querer morrer, quer ma-
Zulliger no Sistema Compreensivo ZSC. tar seus filhos. A análise comparativa dos
Os dados foram analisados quanti e qua- protocolos de entrevista permitiu verificar
litativamente, trazendo elementos sobre a que as pacientes apresentaram várias ten-
leitura da realidade, defesas psicológicas, tativas de suicídio, sobretudo, pela inges-
autopercepção, percepção interpessoal e tão de medicamentos, possuem histórico
história de vida. A entrevista semiestrutu- familiar disfuncional e de perdas traumáti-
rada revelou que o Caso “A”, de 41 anos, é cas, além de diagnóstico de transtorno de
divorciada, mas vive, atualmente, com um personalidade borderline. A interpretação
companheiro, é mãe de um menino de 15 dos protocolos do ZSC, por sua vez, pos-
anos e de uma menina de 25 anos. A baixa sibilitou confirmar a história do desenvol-
hospitalar deu-se pela intoxicação de 20 vimento pessoal, por meio dos dados de
comprimidos de carbamazepina e de ami- personalidade, e a identificar prejuízos na
triptilina, sendo sua terceira tentativa de apreensão da realidade, de si mesmo, do
suicídio. As duas tentativas anteriores fo- outro e nas interações sociais, por meio
ram: uma por ingerir veneno, aos 20 anos de atribuições de aspectos subjetivos,
de idade, ocasião em que começou a sen- distorcidos e falhos. Os dois casos apre-
tir vontade de se matar e, a outra, quando sentaram, ainda, dificuldades de controle
tentou cortar os pulsos, por sua perícia emocional, impulsividade, instabilidade
ter sido negada. O início desses episódios nos relacionamentos e isolamento. Esses
foi relacionado com a morte de seus dois resultados podem ser úteis para ampliar a
irmãos, que foram assassinados com um compreensão de pacientes com tentativas
tiro na cabeça. O Caso “A” pensa em se de suicídio, para predizer as possibilidades
matar porque acredita que irá para um de novas ocorrências e, ainda, para dire-
lugar melhor, mas, ao mesmo tempo, em cionar programas de tratamentos mais efi-
que quer morrer quer melhorar para cui- cientes e adequados. Além disso, conclui-
dar de seu neto. O Caso “B”, de 47 anos, é -se que o ZSC pode ser útil em contextos
divorciada e mãe de duas meninas, uma de avaliação clinica e hospitalar, respei-
de 14 e outra de 27 anos de idade, e de tando-se as limitações de seu emprego.

1210
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Palavras-chave: teste Zulliger, tentativa de Considera, também, que a dimensão do


suicídio, fatores de risco tempo, para estes adolescentes sem so-
Luana Gasparetto Fontanella, Fundação nhos nem horizonte, é muito diferente da
Hospitalar Santa Terezinha, Erechim/RS, dimensão do tempo para aqueles que têm
luluzinhagf@erechim.com.br oportunidades. Somado a este fator, há
um alto índice de gravidez na adolescência
e isso não é visto, por eles, como impró-
LT06-1237 - ADOLESCENTES EM prio para sua condição de adolescente. Há
SITUAÇÃO DE RISCO SOB UMA NOVA uma tradição familiar de gravidez precoce:
PERSPECTIVA DE FUTURO mulheres de trinta anos são avós e garotas
Camila Fernandes Ferreira - UFU de treze anos são mães. Pela experiência
camila.ff.psi@gmail.com com estes adolescentes do Bairro Shop-
Glenda Matias de Oliveira - UFU ping Park, foi possível constatar que, em
glenda_matias@hotmail.com geral, eles vivem um cotidiano que parece
Lara Cristina Furtado Morais - UFU não favorecer a constituição de projetos
laracfmorais@gmail.com de vida que incluam a preocupação com
a escolha de um curso superior ou com os
O presente trabalho aborda a perspectiva caminhos que levam à inserção no mer-
de vida de adolescentes em situação de cado formal de trabalho; não sonham in-
risco, procedentes de população empo- gressar em uma Universidade, tampouco
brecida. Relatamos, aqui, nossa experiên- no Ensino Médio; não vislumbram para si
cia no desenvolvimento de projetos sociais um emprego, portanto, não se importam
voltados para adolescentes com idade en- com a disputa por uma vaga no mercado
tre 11 a 15 anos, que participam da ONG de trabalho. Quando falamos de sonhos
“Estação Vida”, no bairro Shopping Park para o dia de amanhã, muitos garotos
da cidade de Uberlândia-MG. Ali, estes manifestaram o desejo de se tornarem
adolescentes são recebidos por educado- “craques” de futebol; as garotas não de-
res e voluntários que os acompanham na monstraram perspectiva alguma para os
feitura de tarefas escolares, introdução ao dias vindouros; tampouco há, para eles,
mundo da computação, atividades físicas modelos de pessoas que se preparam
orientadas, atividades esportivas, recrea- para participar do mercado formal de tra-
tivas e refeição comunitária, com o intuito balho. A Universidade, enquanto Sede da
de acolhê-los em seu período não escolar, Sabedoria, não pode se colocar alheia a
de modo que não perambulem pelas ruas este cenário de desenvolvimento dos nos-
enquanto suas famílias estão no trabalho. sos adolescentes. Acreditamos que, onto-
Conforme comenta Burlamaqui (2006), logicamente, o homem é um ser de TELOS,
o futuro dos jovens, no Brasil, está ame- portanto, necessário se faz o diálogo entre
açado. Pesquisas revelam números que as academias de Psicologia para a busca
comprovam a falta de perspectiva de vida de saberes que ajudem os adolescentes
da juventude pobre brasileira. Esta autora brasileiros empobrecidos a constituírem
ainda comenta que jovens e adolescen- a sua teleologia de vida. Nesse sentido,
tes sem perspectiva tornam-se pessoas nosso trabalho focaliza, prioritariamente,
sem horizontes e sem o direito de sonhar. a criação de oportunidades de discussão,

1211
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

delineamentos e constituição de sonhos senbaum, Lee, & Lester, 2009). A com-


para um futuro de cidadania e dignidade. preensão e pesquisa empírica da PP com
jovens representa um grande desafio aos
Palavras-chave: adolescentes, futuro, pobreza pesquisadores e clínicos (Hare & Neu-
Contato: Glenda Matias de Oliveira, mann, 2008; Salekin & Lochman, 2008)
Universidade Federal de Uberlândia-MG, e diversas pesquisas demonstram-se co-
glenda_matias@hotmail.com erentes com sua compreensão na pers-
pectiva do desenvolvimento (Forth et al.,
2003; Frick, 2002). A partir de princípios
LT06-1254 - INVENTÁRIO DE PSICOPATIA consistentes com essa recomendação, foi
DE HARE: VERSÕES JOVENS (PCL:YV): desenvolvido o Inventário de Psicopatia
ESTRUTURA FATORIAL PARA AMOSTRA de Hare: Versão Jovens (PCL:YV; Forth et
BRASILEIRA al., 2003), baseado nos mesmos 20 itens
Tárcia Rita Davoglio - PUCRS do PCL-R (Hare, 2003). Os títulos e as
tarciad@gmail.com descrições dos itens, as fontes de infor-
Deise Fonseca Fernandes - PUCRS mação e os critérios de pontuação foram
deise.ff@hotmail.com modificados, visando refletir os diferentes
Marina Davoglio Tolotti - PUCRS contextos adolescentes e garantir atenção
matolotti@hotmail.com adequada às normas de desenvolvimento.
Gabriel José Chittó Gauer - PUCRS O PCL:YV avalia características interpesso-
gabrielgauer@gmail.com ais, afetivas, comportamentais e antisso-
Financiamento: CAPES e CNPq ciais da psicopatia, utilizando o formato
de pontuação por perito, valendo-se de
A psicopatia é um transtorno de perso- informações de diversas fontes e con-
nalidade multifatorial, que se manifesta textos e sendo pontuado de zero a dois,
nas relações interpessoais e afetivas pela por meio de entrevistas. Ao contrário das
ausência de empatia ou remorso, gran- versões adultas, não utiliza ponto de cor-
diosidade, manipulações, mentiras reinci- te considerando, especialmente, caracte-
dentes, dificuldades em aceitar responsa- rísticas intrínsecas do construto, quando
bilidade e uma gama de comportamentos associado à adolescência (Forth et al.,
eticamente incorretos e antissociais que 2003). O PCL:YV está traduzido/adaptado
não são, necessariamente, criminosos para o português do Brasil (Gauer, Vas-
(Hare & Neumann, 2008). Apesar da per- concellos, & Werlang, 2006) e há alguns
sonalidade psicopática (PP) ser detectável resultados psicométricos com amostras
em adultos e, presumivelmente, iniciar-se adolescentes brasileiras já disponíveis
durante a infancia e adolescência (Frick, (Ronchetti, 2009; Ronchetti, Davoglio, Sal-
2009), o diagnóstico de Psicopatia não é vador-Silva, Vasconcellos, & Gauer, 2010)
descrito pelas atuais classificações diag- que, embora incipientes, mostram-se sig-
nósticas. Contudo, a literatura emergente nificativos e similares aos internacionais
aponta evidências que sugerem valida- (Forth et al., 2003). No entanto, estudos
de de construto para o transtorno entre de validação de instrumentos psicométri-
os adolescentes (Forth, Kosson, & Hare, cos representam um processo de longa
2003; Frick & Marsee, 2006; Salekin, Ro- duração, envolvendo diferentes etapas e

1212
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

amostras populacionais. Dessa forma, é consolidados. Segundo a literatura atual,


recomendável que instrumentos que se a estrutura fatorial das Escalas Hare pode
propõem a avaliar a PP, como o PCL:YV, ser testada nos modelos de três e quatro
passem por sucessivas etapas de valida- fatores (Cooke e Michie, 2001; Forth et al.,
ção, afim de serem produzidas evidências 2003; Hare, 2003), desenvolvidos a partir
psicométricas substanciais. Considerando dos anos oitenta, com a maior parte das
que qualquer medida psicométrica é em análises realizada com amostras mascu-
algum grau falível, sofrendo influências linas adultas e presidiárias, tornando re-
tanto das variáveis latentes quanto do comendável a cautela nas generalizações
erro das mensurações, a análise fatorial dos resultados para outros grupos. Cooke
(AF) representa uma técnica estatística & Michie (2001), usando a AFC e a teoria
muito importante para a compreensão de resposta ao item, em 13 dos 20 itens
de um construto psicopatológico. A AF PCL-R, encontraram uma solução deno-
contribui para explicitar a relação das minada Modelo de Três Fatores: estilo de
múltiplas variáveis latentes que formam vida interpessoal arrogante e enganoso;
o construto e que, juntas, influenciam a experiência afetiva deficitária; compor-
classificação dos itens (Cooke, Michie, & tamento impulsivo e irresponsável. Esta
Skeem, 2007). Esta pesquisa, desenvol- estrutura reflete um modelo em que os
vida no Programa de Pós Graduação da traços do geral para o mais específico
Faculdade de Psicologia (FAPSI) da PUCRS, são estruturados de maneira hierárquica,
objetiva obter evidências psicométricas porém, exige que os fatores investigados
do Inventário de Psicopatia de Hare: Ver- sejam realmente componentes do cons-
são Jovens em adolescentes brasileiros, a truto. Por isso, cinco itens que refletem,
partir das análises fatoriais exploratórias principalmente, o comportamento anti-
(AFEs) e confirmatórias (AFCs). A amos- -social, devem ser excluídos para a análise
tra será composta por 217 adolescentes deste modelo. Os argumentos divergentes
masculinos, que cumprem medida socio- ao modelo anterior levaram ao desen-
educativa de restrição de liberdade na Re- volvimento do Modelo de Quatro Fato-
gião Metropolitana de Porto Alegre, com res (Hare, 2003; Hare & Neumann, 2005;
idade média entre 16 e 17 anos. Os dados Neumann et al., 2007). Os fatores identi-
são provenientes de estudos prévios, que ficados por Cooke e Michie (2001) perma-
embasaram outras etapas do processo de necem idênticos, sendo acrescentado um
validação e pesquisas com traços de psico- quarto fator, composto por cinco itens que
patia em amostras jovens, desenvolvidos avaliam o comportamento antissocial e o
no Programa de Pós Graduação da FAPSI/ fraco controle comportamental, excluídos
PUCRS, atendendo aos protocolos éticos no modelo precedente. São propostas, en-
e institucionais recomendados à pesqui- tão, quatro dimensões latentes: Interpes-
sa científica. As AFEs serão realizadas soal, Afetiva, Estilo de Vida e Comporta-
utilizando-se o pacote estatístico SPSS, mento Antissocial. Os resultados deste es-
versão 18.0, rotação promax e técnica de tudo ainda se encontram em fase de ela-
eixo principal. As AFCs serão rodadas no boração. Espera-se que pesquisas como
programa de modelagem Mplus, 5.0, a esta: (a) estimulem a aprender mais sobre
partir das AFEs e dos modelos teóricos já as características do construto em popu-

1213
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

lações jovens; (b) aumentem a compreen- A legislação brasileira determina que o re-
são e o debate relativos aos múltiplos fa- cém nascido de mães aprisionadas deverá
tores que se associam ao construto e suas permanecer com sua mãe, no cárcere, até
implicações, e (c) promovam subsídios uma determinada idade. A Constituição
à pesquisa sistemática, visando o desen- estabelece o período que durar a ama-
volvimento de programas de prevenção mentação, enquanto a Lei de Execução
e intervenção precoce. É válido ressaltar Penal (11.942/09) preceitua às mães o
que os pesquisadores consideram legí- direito de permanecerem com os filhos,
tima a preocupação com a potencial má no mínimo, até os seis meses de idade.
utilização de instrumentos desta natureza, Porém, na prática, os estabelecimentos
em especial, quanto à rotulação e/ou ex- prisionais convencionam diferentes ida-
clusão à atenção integral ou terapêutica. des e critérios de organização, pautados
O PCL:YV não se propõe a ser um critério em referenciais pouco explorados cienti-
único para a tomada de decisões acerca ficamente. Se por um lado, esse direito é
de um jovem em desenvolvimento ou de assegurado e é indiscutível a importância
qualquer prescrição relativa ao sistema de para o bebê do contato constante com
saúde ou justiça, sendo que o próprio ma- a mãe, por outro, é possível supor, com
nual técnico contra-indica esta utilização. base na Psicologia do Desenvolvimento,
A integração de informações originárias que a estadia na prisão pode interferir de
de fontes variadas, e não apenas de uma maneira peculiar na formação psicosso-
ferramenta, proporciona um quadro mais cial de uma criança. Assume-se, então, a
compreensivo e ecologicamente válido a hipótese da existência de um ponto óti-
respeito do jovem (Forth et al., 2003). mo, para além do qual a criança atinja
uma idade em que dita permanência na
Palavras-chave: adolescentes brasileiros, cadeia viria a ser iatrogênica devendo,
PCL:YV, estrutura fatorial então, a criança ser retirada do estabele-
Contato: Tárcia Rita Davoglio, PUCRS, cimento prisional. Porém, este momento
tarciad@gmail.com mais oportuno para ocorrer o afastamen-
to mãe-filho ainda não está empiricamen-
te definido e justificado, demandando
LT06-1255 -INFÂNCIA CONFINADA AO por estudos que abordem a questão con-
CÁRCERE: A PERCEPÇÃO DAS MÃES siderando todas as contingências, o que
APENADAS E O DESENVOLVIMENTO implica em uma abordagem interdiscipli-
PSICOSSOCIAL DAS CRIANÇAS nar, que contemple não apenas o jurídico,
mas, também, o psicológico. As questões
Tárcia Rita Davoglio - PUCRS
que se colocam a partir daí são: Como as
tarciad@gmail.com
Daniela Canazaro de Mello - PUCRS mães lidam com as demandas próprias da
danielacanazaro@hotmail.com relação mãe-bebê em um ambiente não
Marina Davoglio Tolotti - PUCRS familiar? Como as mães percebem o de-
matolotti@hotmail.com senvolvimento do filho dentro do cárce-
Gabriel José Chittó Gauer - PUCRS re, a partir de sua relação com o próprio
gabrielgauer@gmail.com filho? Que implicações isto tem para o
Financiamento: BPA/PUCRS desenvolvimento psicossocial da criança

1214
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

“encarcerada”? Para exemplificar, um es- envolvendo os Programas de Pós Gradu-


tudo atual sobre as mães que vivem com ação em Ciências Criminais da Faculdade
seus filhos em regime prisional fechado de Direito e Pós Graduação em Psicologia
revelou que 51% das prisões femininas da Faculdade de Psicologia. A temática
brasileiras com berçários possuem locais geral do estudo centra-se sobre a relação
improvisados para as crianças, geralmen- da mãe apenada com o filho que vive,
te, restritos às próprias celas (Armelin, conjuntamente, no cárcere. Por se tratar
Mello, & Gauer, 2010; Mello, 2010). As de um estudo interdisciplinar, há tanto o
crianças, diretamente ou por implicação, interesse no debate das questões jurídi-
são afetas por essa realidade, uma vez cas e penais quanto das psicológicas e so-
que o espaço das celas é dividido com ciais envolvidas, sendo uma pesquisa que
outras mulheres e seus filhos e o ritmo se complementa a partir do vértice do Di-
de sono, alimentação e choro das crian- reito e da Psicologia. Portanto, sob o foco
ças durante a noite acaba por ocasionar da Psicologia, este estudo tem por objeti-
desavenças e estresses. O modo como vo conhecer os padrões de manejo e en-
as mães administram e percebem as de- frentamento de situações cotidianas e in-
mandas físicas e psicológicas do filho, trínsecas à relação mãe-bebê nas díades
neste espaço muito distinto do lar tradi- mãe-filho encarceradas, a partir do relato
cional, tende a se evidenciar na interação materno e, se possível, da observação da
mãe-bebe que está sendo construída. A interação com o bebê, a fim de analisar
literatura descreve inúmeras abordagens suas implicações no desenvolvimento psi-
para a interação pais-bebês e seu papel cossocial à luz da literatura. Em relação
no desenvolvimento, entendendo-se por ao método, esta pesquisa transversal terá
interação a ação recíproca, de co-cons- delineamento misto e será realizada na
trução e bidirecionalidade, que não en- Unidade Materno Infantil da Penitenciá-
volva, apenas, ações explícitas (Piccinini ria Feminina Madre Pelletier, localizada
et al, 2001). O modo como os padrões de em Porto Alegre/RS. Serão incluídas no
apego (Bowlby, 1969/ 1984; Brazelton, estudo todas as díades mães-bebês reclu-
1988) se estabelecem está fortemente sas no convívio do cárcere durante o pe-
associado com a sensibilidade materna às ríodo da coleta, de março a setembro de
necessidades infantis. Além disto, o com- 2011, envolvendo a capacidade máxima
portamento materno, em geral, constitui- de lotação do local (cerca de 25 mulhe-
-se no primeiro contexto para o desen- res). Serão realizadas entrevistas com as
volvimento do bebê e, por isto, continua mães, durante as quais será preenchido
merecendo atenção especial (Piccinini um questionário semiestruturado abor-
et al, 2001). Inúmeros autores, psicana- dando, além de dados sociodemográficos
listas ou não, têm trazido contribuições e penais, temas referentes às rotinas in-
relevantes para uma leitura aprofunda- trínsecas à relação mãe-filho, envolvendo
da dos elementos que entram em cena aspectos tais como: sono, alimentação,
nesta construção. Esta pesquisa se insere linguagem, hábitos de higiene, interação
no projeto de integração interdisciplinar social, vinculação afetiva, lazer e proble-
BPA/PRAIA- 07/2011, da Pontifícia Uni- mas de saúde da criança. Quanto aos
versidade Católica do Rio Grande do SUL, procedimentos, este estudo foi aprovado

1215
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

pela Comissão Científica da Faculdade de LT06-356 - A INFÂNCIA NA MPB:


Direito e pelo o Comitê de Ética em Pes- TRABALHO INFANTIL E SITUAÇÃO DE RUA
quisa da PUCRS e pela Direção da Institui- Luna Pinheiro Valle - UFRN
ção onde será realizado o estudo. Segue, labellaluna20@gmail.com
portanto, todos os procedimentos éticos Dandara Morais - UFRN
recomendados pela comunidade cientí- dandaramrs@gmail.com
fica, quanto à confidencialidade das in- Daniele de Souza Paulino - UFRN
formações e ao consentimento expresso, dandinhapaulino198@hotmail.com
livre e esclarecido de cada participante. Cíntia Asfora Fernandes - UFRN
A participação é voluntária e não implica cintiaasfora@hotmail.com
em nenhum ganho direto ao participante. Dayany Ribeiro de Oliveira - UFRN
As entrevistas e observações serão rea- dayribeiro19@gmail.com
lizadas nas dependências da instituição Rosângela Francischini - UFRN
prisional, por graduados ou acadêmicos rfranci@uol.com.br
de Psicologia, seguindo todos os procedi-
mentos protocolares estabelecidos pelo A situação do trabalho infantil, no Brasil,
local para o acesso dos pesquisadores. Os em suas diversas formas (seja através dos
dados qualitativos serão analisados atra- três setores da economia, da chamada
vés da análise categorial de acordo com “economia informal”, das atividades do-
Bardin, o qual consiste em operações de mésticas ou mesmo nos ramos ilegais),
desmembramento do texto em unidades, tem ganhado visibilidade, apenas do pe-
com o intuito de descobrir os diferentes ríodo entre o final da década de oitenta
núcleos de sentido que constituem a co- e início da década de noventa até os dias
municação e, posteriormente, realizar o atuais. Dentre os fatores que impulsio-
seu agrupamento em classes ou catego- naram o interesse, as discussões, pesqui-
rias. Os dados quantitativos serão ana- sas e denúncias sobre essa temática, no
lisados por meio de técnicas estatísticas Brasil, temos o nascimento do Estatuto
variadas, descritivas e inferenciais, atra- da Criança e do Adolescente (ECA), em
vés do SPSS, versão 18.0. Quanto aos re- 1990, e a criação dos Conselhos de Direi-
sultados esperados, este projeto, que no tos (Municipais, Estaduais e Nacional) e
momento encontra-se em fase de coletas dos Conselhos Tutelares (Ferreira, 2001).
preliminares, reveste-se de grande rele- O presente trabalho objetiva traçar uma
vância, por abordar temática pouco estu- “linha do tempo”, acompanhando o tra-
dada, podendo gerar subsídios empíricos balho infantil, no país, desde a década
e teóricos que fomentem o debate e as de 1960 até recentemente, através de
políticas públicas dirigidas à realidade das exemplos da música popular brasileira
crianças de mães apenadas. sobre esta temática, em cada momento
histórico. “Menino das Laranjas”, de 1965,
Palavras-chave: infância, cárcere materno, escrita por Théo de Barros, relata o coti-
desenvolvimento psicossocial diano cansativo de um menino que vende
Contato: Tárcia Rita Davoglio, Programa laranjas na feira, sob pena de ser substi-
de PÓS Graduação em Psicologia / PUCRS, tuído por outro irmão na venda e de ser
tarciad@gmail.com castigado caso não cumpra sua “função”

1216
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

direito, como na estrofe: “é madrugada drogas e a morte precoce (Cipola, 2001).


(...), se o cesto não voltar vazio/A mãe já A década de 1980, também chamada de
arranja um outro pra laranja/Esse filho década perdida, é marcada por estagna-
vai ter que apanhar”. Pouco antes, em ção econômica, altos índices de inflação e
1959, ocorria a Declaração Universal dos conseqüente perda do poder de consumo
Direitos da Criança, ampliando o leque da população, aumento da dívida externa
de direitos voltados a essa população. Em e do desemprego. Temos, então, a cria-
1964, o país tinha sofrido o Golpe Militar ção do Movimento Nacional dos Meninos
e passava por uma atmosfera de intensa e Meninas de Rua (em 1985, trazendo a
repressão à sociedade, em todos os níveis noção de protagonismo juvenil), a Frente
(físico, ideológico, político etc). Ano em de Defesa dos Direitos das Crianças e dos
que também é criada a FUNABEM (Fun- Adolescentes (em 1986). De 1981, “O Meu
dação Nacional de Bem-estar do Menor), Guri”, do compositor Chico Buarque, fala
marco da postura assistencialista à criança de uma criança inserida em outra moda-
e ao adolescente, mas que, na prática, não lidade de trabalho ilegal: o contrabando.
trouxe benefícios para essa população (e O “guri” da música é admirado de manei-
não há registros históricos de mobilização ra desproporcional (e ingênua) pela mãe,
em favor desta, na década) (Patiño, 2010). como nos trechos “chega suado e veloz do
Em 1979, há o segundo Código de Meno- batente, traz sempre um presente pra me
res, com nova concepção assistencialista. encabular” e “de repente acordo, olho pro
De 1978, “Tiro de Misericórdia”, de João lado e o danado já foi trabalhar”. Há indí-
Bosco, retrata o trabalho ilegal com o cios, nessa e outras músicas sobre o tema,
tráfico de drogas, em que um menino de de outra dinâmica familiar, que vem se
treze anos é o próprio traficante, dono de constituindo nas famílias em que a criança
muitas favelas, como as citadas no trecho ou adolescente é o principal provedor do
“borel, juramento, urubu, catacumba...”. sustento e o trabalho é naturalizado sob o
O trabalho com o tráfico, apesar de ilegal, nome de “ajuda”, como evidencia o estudo
tem ganhado expressividade no cenário de Campos e Francischini (2007). Ao final
nacional, em especial, nas favelas. Muitas da canção, “chega estampado, manchete,
são as funções possíveis para uma criança retrato (...) acho que tá lindo de papo pro
no tráfico (como olheiro ou fogueteiro, o ar” mostra a morte precoce entre crianças
falcão, aviãozinho) e o número de garotos que contrabandeiam. O início dos anos 90
alistados no tráfico era de 73 mil, no Brasil, foi marcado, fortemente, por movimentos
dados do IBGE (Cipola, 2001). Exemplos sociais, luta por direitos (ampliados pela
como o da música têm sido retratados em Constituição de 1988) e, com relação ao
outras produções artísticas mais recentes trabalho infantil, mais especificamente,
(mostrando que a situação ainda se man- pela proibição - como previsto no ECA
tém), como no personagem “Zé Pequeno” (Brasil, 1990) - da utilização de mão-de-
do filme “Cidade de Deus” e no documen- -obra de menores de 14 anos. É o início
tário “Falcão: meninos do tráfico”, ambos de um processo de mobilização da opinião
apresentando forte caráter de denúncia. pública e “pressão política” para a imple-
Dentre as principais consequências des- mentação das determinações do Estatuto
sa realidade estão uso e possível vício em (Carvalho, 2008). Ferreira (2001), em con-

1217
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

trapartida, reconhece que as denúncias e 15/11 - Terça-feira


o desvelamento do fenômeno, através de
estudos amplos e genéricos, não foram
acompanhados de conhecimento suficien- 12h-14h
te quanto às estratégias de combate difi-
cultando, assim, a intervenção. “Pivete”,
de Chico Buarque (1993), mostra o traba- SP LT01 - Simpósio
lho informal infantil através do cotidiano
do garoto Pelé, que vende chicletes no
sinal e, eventualmente, comete infrações SP LT01-996 - DESENVOLVIMENTO E
para ganhar mais dinheiro e desfrutar da EDUCAÇÃO: ASPECTOS SOCIAIS, MORAIS
idade como os garotos ricos, como em E AFETIVOS.
“agita numa boca, descola uma mutuca e
um papel. Sonha aquela mina...”. “Mala- Luciana Maria Caetano - UEM/PR
baristas do Sinal Vermelho”, de João Bos- Maria Theresa Costa Coelho de Souza - USP
co, 2003, denuncia uma realidade perver- Maria A. Belintane Fermiano - Faculdades
sa de contrastes sociais e exclusão, através NetWork-SPe LPG/FE/Unicamp-SP
da imagem dos jovens que aproveitam os Sonia Bessa - LPG/FE/Unicamp-SP e Centro
sinais fechados do trânsito para fazer seus Universitário Adventista-SP
malabares, ganhando algumas moedas,
as humilhações e reações que eles têm Considerando as mudanças que são ob-
diante disso. Nesse ano ocorre a aprova- servadas no comportamento das pessoas,
ção do Plano Nacional de Prevenção e Er- possivelmente por influência da globali-
radicação do Trabalho Infantil e Proteção zação, se faz necessário que profissionais
ao Trabalhador Adolescente e, em 2006, que trabalham com o ser humano investi-
do Plano Nacional de Promoção, Proteção guem estratégias que as pessoas utilizam
e Defesa do Direito de Crianças e Adoles- para lidar com novas solicitações no cam-
centes à Convivência Familiar e Comunitá- po social, moral e afetivo. Desde modo, é
ria e do Sistema Nacional Socioeducativo possível encontrar caminhos, com ênfase
(Sinase): ambos buscando garantir o pre- na educação, para favorecer o processo
visto no ECA, mas, encontrando dificulda- de desenvolvimento da pessoa em todos
des na efetivação. Uma vez demonstrado os seus aspectos. O objetivo desse sim-
que a arte reflete a realidade, sugerimos pósio é o de apresentar estudos e dados
uma maior exploração da produção artís- de pesquisas cujas implicações represen-
tica brasileira como subsídio para a pro- tam excelente contribuição para a prática
dução científica não só de denúncia, mas, pedagógica de profissionais da educação
também, de intervenção. e orientação educacional familiar, pesso-
al e infanto-juvenil. O referencial teórico
Contato: Luna Pinheiro Valle, UFRN, da Epistemologia Genética de Jean Piaget
labellaluna20@gmail.com fundamenta os estudos apresentados e
pretende-se demonstrar que sua teoria
não se limita ao estudo dos estágios do
desenvolvimento cognitivo, A pesquisa

1218
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Luciana M. Caetano, discorre sobre o re- já que a noção do bem, segundo ele, diz
lacionamento entre pais de adolescentes respeito ao bem estar comum: “constitui
e sua formação moral. Maria Thereza talvez a última tomada de consciência
C.C.de Souza apresenta um estudo teó- do que é condição primeira da vida mo-
rico sobre moral e sua intersecção entre ral: a necessidade de afeição recíproca”
inteligência e afetividade. Maria A. Belin- (p.141). Portanto, para Piaget a própria
tane Fermiano apresenta dados sobre o tomada de consciência de si é estimulada
cotidiano econômico dos pré-adolescen- pela cooperação, na medida em que, é
tes e utilização de dinheiro. Sonia Bessa fruto da conduta social e não da psicolo-
descreve o nível de alfabetização econô- gia individual, pois as próprias opiniões,
mica de estudantes universitários e os sentimentos e vontades, se constituem,
resultados pós intervenção pedagógica. modificam-se e se constroem na opo-
sição, nos conflitos e na compreensão
mútua. Para Piaget (1948/2000, p.48), os
RELAÇÃO PAIS E FILHOS E A EDUCAÇÃO dois problemas essenciais da educação
MORAL. moral são: (1) assegurar a descentraliza-
Luciana Maria Caetano - UEM/PR ção: a pessoa ser capaz de situar o seu
luma.caetano@hotmail.com eu na verdadeira perspectiva em relação
Financiamento: FAPESP aos outros; (2) estabelecer a disciplina
autônoma: inserida num sistema de re-
Para a teoria do desenvolvimento de Jean ciprocidades; (3) Os pais para educarem
Piaget, o processo de construção de au- bem moralmente, necessitam ter clareza
tonomia moral é o caminho de evolução a respeito de quais valores querem que
possível para todo adolescente, que, deve os seus filhos construam e, mais que
construir um plano de vida, o que signi- isso, quais são as boas intervenções, ou,
fica organização autônoma das regras, conforme a teoria piagetiana, como esta-
afirmação da vontade como regulariza- belecer com os filhos relações de coope-
ção das tendências, inserção do jovem ração que, de fato, lhes permitam tomar
no mundo adulto. Para teoria piagetiana consciência das regras, refletir sobre elas
que tem uma abordagem deontológica, e incorporar os seus princípios como va-
o tema da moral diz respeito aos deve- lores que os constituirão como pessoa. A
res, e, portanto, responde as perguntas: autonomia moral é produto das relações
como se deve agir e o que se deve fazer. A de cooperação que propiciam a descen-
evolução da moralidade depende, dessa tração e a troca de pontos de vista. Sendo
forma, das relações que se estabelecem a cooperação fonte de personalidade, na
com o outro. Quando o sujeito constrói mesma ocasião as regras deixam de ser
o respeito mútuo e os princípios de jus- exteriores. Tornam-se, ao mesmo tempo,
tiça como dever, e as regras são funda- fatores e produtos da personalidade, se-
mentadas em tais princípios e cumpridas gundo um processo circular tão frequente
por opção racional de tais sujeitos, outro no decorrer do desenvolvimento mental.
nível de desenvolvimento moral é atingi- A autonomia sucede assim à heterono-
do, a autonomia, também denominada mia. (Piaget, 1932/1994, p. 82). Confor-
por Piaget (1932/94) de moral do bem, me se pode constatar segundo a teoria

1219
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

de Piaget, para que os jovens tenham a um recorte, apresentando apenas as


oportunidade de evoluir da heteronomia discussões do construto autonomia. “A
para autonomia, as relações sociais re- autonomia é um poder que se conquista
presentam um fator importante, embora de dentro e que só se exerce no seio da
não único. “Para que o meio social atue cooperação”. (Piaget, 1932/1994). Para
realmente sobre os cérebros individuais, ser autônomo, dessa forma, é necessá-
é preciso que estes estejam em condi- rio que a pessoa tenha as suas próprias
ções de assimilar as contribuições desse experiências. Se as relações com os pais
meio”. (Inhelder e Piaget, 1970/1976, são tão autoritárias que os adolescentes
p.251). Portanto, a convivência com a necessitam ser autorizados pelos primei-
família tem uma influência importantís- ros para o que quer que desejem fazer,
sima no desenrolar do desenvolvimento fica vedada a essência da construção da
do adolescente, seja no aspecto cognitivo autonomia: a ação do sujeito. Os resul-
(quando suas intervenções permitem ao tados revelam a dificuldade em conciliar
jovem pensar e refletir), no aspecto afeti- o juízo e ação se explicita mais uma vez.
vo (que respeita e interage sem humilha- Por exemplo, os pais admitiram em una-
ções ou depreciações), e no aspecto so- nimidade (99%) que é fundamental que
cial (relações de cooperação). Portanto, o os pais conversem com os filhos, todavia,
interesse dessa investigação foi elaborar 67,5% dos mesmos pais, admitiram que
um mapeamento das concepções de edu- não podem ou não conseguem, ouvir os
cação dos pais, especialmente, no que próprios filhos. Ora, se a autonomia é
diz respeito aos quatro construtos: obe- fruto de relações de cooperação, o diá-
diência, respeito, justiça e autonomia, logo é absolutamente indispensável para
apresentados por essa pesquisa como fa- o processo de troca de pontos de vista,
tores responsáveis pela possibilidade da de argumentação racional a respeito dos
construção da moral autônoma. Trata-se princípios norteadores das regras e até
de uma investigação com uma amostra mesmo, a atenção e o afeto disponibiliza-
de 860 pais e mães oriundos das cinco dos no momento de ouvir o adolescente
regiões brasileiras. A análise dos concei- são significativos para o desenvolvimen-
tos e intervenções dos pais em relação to moral. Os outros resultados caminham
às suas atitudes educativas, procurando pelo mesmo caminho, demonstrando a
apontar quais foram as facilidades, as di- intenção dos pais em educar de modo
ficuldades, as tendências, os encontros cooperativo, com o desejo de favorecer o
e desencontros dos adultos nas relações desenvolvimento moral dos filhos, entre-
com seus filhos adolescentes, permitiu tanto, suas intervenções concretas con-
o conhecimento das atitudes educativas tradizem os seus objetivos iniciais.
dos pais e mães brasileiros. Os pontos de
Palavras-chave: pais e filhos, educação
partida dessa investigação foram os cons-
moral, teoria de Piaget.
trutos piagetianos: obediência, respeito,
justiça e autonomia, fatores para os quais
foram criados itens que puderam avaliar
as concepções educativas dos participan-
tes. Entretanto nesse trabalho, fazemos

1220
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

A COMPLEXA INTERAÇÃO ENTRE tão complexo, mas são insuficientes para


JULGAR, SENTIR E AGIR: UM OLHAR sua compreensão integral, promovendo
PIAGETIANO. somente uma apreensão e entendimen-
Maria Thereza Costa Coelho de Souza - USP to ilusórios. No âmbito das perspectivas
mtdesouza@usp.br denominadas psicogenéticas quanto às
relações entre afetividade e inteligência,
O objetivo desta apresentação é discutir, observamos diferentes ‘equações’ en-
tomando como referência a afirmação de tre estes elementos. Poderíamos dizer
Piaget de que a moral é a intersecção en- que, segundo a abordagem de Wallon, a
tre inteligência e afetividade , como sen- equação proposta para as relações entre
timentos e julgamentos se apresentam julgar e sentir seria: ‘Sentir para julgar’, já
nos diferentes momentos do desenvolvi- que a gênese da cognição está, para ele,
mento e como se relacionam em contex- nas primeiras emoções, as quais, por sua
tos nos quais o DEVER está presente. Para vez, estão diretamente ligadas ao desen-
contextualizar a temática proposta, serão volvimento do tônus (aspecto orgânico).
abordadas outras perspectivas psicoge- O desenvolvimento é concebido como a
néticas para indicar diferentes modos de passagem do eu orgânico ao eu psíquico,
conceber as relações entre sentimentos e pela via das primeiras emoções que são,
pensamentos, a partir de diferentes me- em essência, o instrumento para a inte-
diações entre os indivíduos e o meio. É an- ração com o outro, antes que a cognição
tiga na história da Psicologia a questão da seja construída. Se tomarmos a teoria de
prevalência da razão ou da cognição sobre Vygotsky, a equação parece se inverter,
a emoção ou afetividade, ou, o inverso, podendo ser assim definida: ‘Julgar para
revelando visões dicotômicas herdadas de sentir’. A razão teria a capacidade de con-
posições filosóficas e gerando pesquisas trolar as emoções mais primitivas, graças
com orientações diversas sobre a nature- ao domínio dos instrumentos culturais, em
za humana. Neste contexto, o interesse especial a linguagem. Este autor diferencia
da Psicologia passou da discussão sobre emoções primitivas originais, tais como
predominâncias da razão ou da emoção alegria, medo e raiva, das emoções ditas
para a pesquisa sobre as influências da ‘superiores’, complexas, como, por exem-
experiência, em sentido amplo, do que foi plo, a melancolia e o respeito, apontando
denominado o ‘vivido’ sobre o desenvolvi- também que a qualidade das emoções
mento psicológico, buscando romper com sofreria mudanças à medida que o conhe-
a ideia de que a afetividade romperia os cimento conceitual e os processos cogniti-
limites estabelecidos pelo homem lógico, vos se desenvolvem. Considerando as teo-
tendo exclusivamente um efeito negati- rizações de Piaget, a equação tomaria uma
vo. Vários autores se debruçaram sobre o terceira forma, assim apresentada por ele
tema das relações afetividade-inteligência, próprio: ‘Julgar e sentir para agir’. Sua tese
apresentando diferentes arranjos entre é a de que haveria correspondência entre
estes aspectos e imprimindo estatutos di- afetividade e inteligência durante todo
ferentes a cada um. Consideraram que vi- o desenvolvimento, desde o nascimento
sões dicotômicas podem parecer vantajo- até a vida adulta. Em todas as condutas,
sas para a apresentação didática de tema ‘o que’ fazer seria diretamente ligado à

1221
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

afetividade e ‘como’ fazer seria definido heteronomia e para ações ligadas ao dever
prioritariamente pela inteligência. Quanto regidas, sobretudo, pelos sentimentos de
às ações de cunho moral, estas também obediência, amor e temor. À inteligência
seriam reguladas por sentimentos e julga- operatória (reversível e flexível) corres-
mentos, pela razão e pela afetividade, não ponderia uma afetividade regulada por
podendo haver nenhuma ação somente sistemas de valores hierarquizados, bem
afetiva ou apenas cognitiva. Para compre- como uma afetividade que coordena con-
ender as concepções piagetianas sobre flitos entre tendências de forças diferen-
afetividade, devemos retomar a ideia de tes. Os sentimentos se tornam normativos
‘valor’, como a expansão da atividade do incorporando em sua dinâmica, as regras,
eu na conquista do universo; como o in- a reciprocidade de interesses e os valores.
tercâmbio afetivo com o exterior (objeto Neste cenário, a moral autônoma poderá
ou pessoa); como o aspecto qualitativo do ser construída e as ações morais se pau-
interesse; e, sobretudo como o ponto de tarão muito mais por sentimentos de jus-
partida para os sentimentos (no caso dos tiça do que de obediência, como bem de-
valores atribuídos às pessoas). Piaget insis- monstrou Piaget. Da ‘regulação superior’
tiu em afirmar que a vida afetiva, tal como promovida pela força de vontade resultará
a vida intelectual seria adaptação contínua a priorização das valorizações, num siste-
e que as duas adaptações são interdepen- ma móvel que se articulará a julgamentos
dentes, já que os sentimentos expressam morais pautados em princípios e não mais
os interesses e os valores das ações, das em pessoas. Quando as operações formais
quais a inteligência constitui a estrutura. são construídas, permitindo o desligamen-
Assim sendo, toda conduta possui um ele- to do real, por um lado, e, simultaneamen-
mento energético (afetivo) e um elemento te, sua submissão ao universo do possível,
estrutural (intelectual) que se relacionam a afetividade se desloca mais ainda das
mutuamente e que possuem naturezas di- pessoas e das normas enquanto objetos,
ferentes. Buscando estabelecer uma cor- para as teorias e ideais que o pensamen-
respondência entre as evoluções afetiva e to pode agora constituir. São os denomi-
cognitiva, Piaget afirmou que à evolução nados sentimentos ideológicos. Podemos
cognitiva do período sensório-motor, cor- concluir, então, que no âmbito do DEVER,
responderiam os afetos perceptivos com pensar, sentir e agir estão intrinsecamen-
vistas a enfrentar as necessidades fisio- te ligados, visto que pensar o que é certo;
lógicas e as novidades trazidas pela per- reconhecer o que é o dever; valorizar me-
cepção. São basicamente sentimentos de tas morais/princípios, parecem elementos
agrado e desagrado, êxito e sucesso, de- incontornáveis da ação moral, o que traz
correntes das ações no mundo. Às repre- implicações tanto para a Psicologia como
sentações pré-operatórias, rígidas e infle- para a Educação.
xíveis, corresponderiam sentimentos tam-
bém rígidos e inflexíveis (simpatias e anti- Palavras-chave: teoria de Piaget; julgamento;
patias), bem como sentimentos ligados às afetividade.
pessoas como objetos privilegiados (o que Contato: Maria Thereza Costa Coelho de Souza
não ocorria antes). Esta configuração afeti- Instituto de Psicologia da Universidade de São
va e cognitiva será a base para a moral da Paulo - mtdesouza@usp.br

1222
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

EDUCAÇÃO E SOCIALIZAÇÃO organizados em três eixos: Identidade e


ECONÔMICA AUXILANDO A relações interpessoais, Cotidiano econô-
COMPREENSÃO DO COMPORTAMENTO mico, Mídia. Os resultados quantitativos
DE PRÉ-ADOLESCENTES foram submetidos à análise exploratória
Maria A. Belintane Fermiano - Faculdades dos dados em relação à sua frequência
NetWork/LPG-FE/UNICAMP e porcentagem e as variáveis categóricas
maria.belintane@gmail.com foram comparadas através de teste Qui-
-Quadrado, o que forneceu suporte aos
Nos últimos 60 anos a estrutura e as rela- pressupostos da pesquisa, os quais são: a
ções familiares têm sido influenciadas, por homogeneização de comportamentos dos
vários fenômenos, em especial o da globa- “tweens”; a necessidade de construção
lização. Uma das mudanças que se pode de novas alfabetizações, estratégias e co-
observar é a posição de maior destaque nhecimentos para agir no contexto social.
que pré-adolescentes ocupam no espaço Os dados desse artigo caracterizam o eixo
familiar. A partir da década de 80 tem iní- “Cotidiano econômico”. A pesquisa teve
cio o processo de socialização econômica como objetivos caracterizar, nos diversos
dos filhos, que passam a ser consumido- níveis socioeconômicos, as crenças, os
res a partir do modelo dos pais. Esses pré- valores, os costumes que os participantes
-adolescentes são alvo do marketing que têm a respeito do manejo com o dinheiro;
os considera um mercado promissor, pois considerar a necessidade de um currículo,
recebem dinheiro para seus gastos e agem de uma proposta pedagógica de interven-
como consumidores. Esse panorama deu ção e de um programa de formação de
origem à pesquisa de Fermiano (2010) professores para a Educação Econômica.
Pré-adolescentes (“tweens”) desde a pers- Socialização econômica, um grande desa-
pectiva da teoria piagetiana à da Psicologia fio para os pré-adolescentes. A compre-
Econômica. Os pré-adolescentes também ensão da realidade econômica e também
são chamados de “tweens”, termo deri- a da política, pela criança, é de grande
vado da palavra inglesa “between”, que importância para o estudo do desenvol-
significa “entre”. Estão na faixa etária de 8 vimento da psicologia infantil, por ser um
a 14 anos. Pesquisa, metodologia e objeti- eixo da organização social e por estar em
vos: A pesquisa é um “survey” com carac- contato com essa realidade diariamente,
terização sócio-demográfica que investi- desde muito cedo. Os pequenos têm co-
gou uma amostra de 423 participantes, de nhecimento sobre o dinheiro e também
8 a 14 anos, estudantes de escolas pública fazem perguntas sobre como os produtos
e particular, de cidades da Região Metro- surgem. A seguir, apresenta-se os resulta-
politana de Campinas/São Paulo. Quanto dos de análise de 4 questões sobre o coti-
à classificação socioeconômica, os parti- diano econômico dos pré-adolescentes ou
cipantes foram distribuídos da seguinte “tweens”. Os resultados. A - Os “tweens”
forma: classe A1 e A2, 19,4%; B1, 27,4%; recebem dinheiro. A maioria dos partici-
B2, 32,4%; C1, 14,2%; C2, D, E, 6,6%. Os pantes de todas as classes afirmou rece-
dados coletados descreveram hábitos fa- ber dinheiro “só quando pedem”, 39,2%.
miliares, culturais de consumo, televisivos A porcentagem de respostas para “nunca
em diferentes níveis socioeconômicos, recebe dinheiro para os gastos” foi ligei-

1223
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

ramente maior para os participantes das dos participantes quando vão comprar
classes C2/D/E. É significante o percentual algo para a casa” (χ2(8)=10,35, p=0,241).
de “tweens” que recebem dinheiro e, ao Nas categorias “sim”, 44,2%, e “às vezes”,
mesmo tempo, a frequência de recebi- 38%, respectivamente, os resultados de-
mento não é constante, apontando a falta monstram que os pais concedem espaços
de sistematização de orientação econômi- nos quais os filhos podem ou não influen-
ca que as famílias dão a seus filhos. B – Os ciar nas decisões de compra para a casa.
“tweens” necessitam de mais dinheiro. Considerações: Cotidiano econômico dos
A maioria dos participantes, para todas pré-adolescentes. Pode-se observar anali-
as classes sociais, afirmou “necessitar de sando as respostas que os pré-adolescen-
mais dinheiro, às vezes”, 62,8%. Quando tes estão inseridos no mundo econômico
se analisam os dados, observando-se os e, como possuem recursos para comprar
percentuais daqueles que dizem “sim”, sozinhos além de capacidade de influência
12,4% e os que dizem “às vezes”, infere- no seio familiar, são tratados como clien-
-se que a amostra tem uma tendência a tes pelo mercado. Verificar as compras
necessitar de mais dinheiro. Essa informa- que os “tweens” fazem com seu dinheiro,
ção é significativa e pode provocar, pelo onde e porque compram, os produtos que
menos, duas perguntas: Se os pais são solicitam a seus pais e aqueles comprados
provedores das necessidades dos filhos, na escola, quantia dispendida para isso,
porque lhes dão dinheiro? Se as necessi- necessidade ou não de ter mais dinheiro,
dades são satisfeitas, quais seriam aquelas participação nas compras para si e para
que não estão sendo satisfeitas, a ponto casa, tem grande significado para mapear
de necessitarem de mais dinheiro? C – O o universo econômico do qual eles partici-
que o “tweens” compram com o dinhei- pam e os comportamentos que manifes-
ro. As classes A1/A2, B1 e B2 apresentam tam. Os pressupostos referentes à socia-
percentual significativo para a categoria lização econômica e do consumidor dos
compram “brinquedos, eletrônicos, en- “tweens” desta pesquisa são confirmados.
tretenimento”, comparadas às demais. A Estes “tweens” apresentam, também, os
porcentagem de respostas para compram mesmos hábitos e valores, independente
“alimentos” foi maior nas classes sociais do nível socioeconômico. Os comporta-
C2/D/E. Os gastos com “brinquedos, ele- mentos estão mudando provocando re-
trônicos, entretenimento” foram quase flexos na família, escolas, instituições reli-
nulos para a classe C2/D/E e muito pe- giosas, trabalho e outros lugares no quais
quenos para a classe C1. Infere-se que, se há convívio social. Não é possível analisar
houvesse uma renda maior, tais classes o que está ocorrendo fora do contexto da
consumiriam as mesmas coisas, pois a ca- globalização e todas as mudanças prove-
tegoria de resposta com maior incidência nientes desse fenômeno possui aspectos
sobre o que gostaria de ganhar no dia das positivos e negativos. É, portanto, neces-
crianças foi “brinquedos” e “eletrônicos”. sário intervenção pedagógica para que fa-
D – Os pais pedem a opinião dos “tweens” mílias, filhos e profissionais da educação
na compra de coisas para casa. Não foi construam estratégias de resistência ao
encontrada associação significativa entre marketing e para lidar com o dinheiro. Os
classe social e “se os pais pedem opinião pré-adolescentes agem no mundo econô-

1224
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

mico e necessitam de oportunidades para cedido da aplicação de Teste de Alfabeti-


refletir sobre ele. É na família que ocorre a zação Econômica para adultos TAE-A e da
socialização econômica, se nela há analfa- escala de hábitos e condutas de consumo.
betismo econômico, então ele é reprodu- Os eixos temáticos da intervenção foram:
zido, já que as crianças imitam seus pais “reconhecendo-se como Consumidor”;
nas atividades de compras e expressão de “comportamento compulsivo”; “neces-
outros valores. sidades humanas”; “consumo e impacto
ambiental”; “direitos e deveres do consu-
Palavras-chave: socialização-econômica; pré- midor”; “influência dos meios de comuni-
adolescentes; educação econômica. cação de massa”; “publicidade e marke-
ting”; “recursos da publicidade”; “iden-
tificação de estereótipos” e “estrutura e
EDUCAÇÃO ECONOMICA DE funcionamento das sociedades de consu-
ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR: mo”. Educação e alfabetização econômica.
UMA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO A educação econômica se constitui em
Sonia Bessa - LPG/FE/UNICAMP ações educativas que tem como objetivo
soniabessa@gmail.com favorecer a construção de noções econô-
micas básicas e estratégias para tomada
Pesquisa, metodologia e objetivos: A com- de decisões pertinentes que permitam
preensão do mundo econômico requer crianças e adolescentes posicionarem-se
que o indivíduo construa uma visão sistê- diante da sociedade de consumo como
mica do modelo financeiro social em que pessoas conscientes, críticas, responsá-
está inserido, o que implica manejar uma veis e solidárias. Denegri (2007) dividiu
série de informações específicas e desen- a educação econômica em três grandes
volver atributos e atitudes que lhe possi- linhas de pesquisa. Socialização Econômi-
bilite um uso adequado de seus recursos ca, que é o processo de aprendizagem das
econômicos, incluindo hábitos e condutas formas de relacionamento com o mundo
de consumo e de uso do dinheiro de for- econômico mediado pela família, escola,
ma racional e inteligente. Essa investiga- nas relações com os pares e pelos meios
ção é de natureza quase-experimental e de comunicação. Alfabetização Econômica
teve como objetivos identificar, caracteri- corresponde àqueles elementos concei-
zar e descrever a compreensão econômica tuais e práticos que permitem ao sujeito
de estudantes do Ensino Superior, avaliar compreender as várias atividades econô-
os hábitos e condutas de consumo relacio- micas a que está exposto diariamente. E
nando o nível de alfabetização econômica a Psicologia Econômica, que também é
e os hábitos de consumo antes e depois conhecida como psicologia do consumo.
do programa de intervenção. A amostra Para Yamane (1997) o processo de alfabe-
intencional não-aleatória constituiu-se tização econômica se refere a aprendiza-
de 47 estudantes do último semestre do gem e ao desenvolvimento de conceitos,
curso de Pedagogia, com idade entre 23 e habilidades e destrezas que permitam ao
49 anos, de nível sócio econômico baixo. indivíduo a compreensão do seu entorno
O grupo foi submetido a um programa de econômico e o ajude a tomar decisões
intervenção de 4 meses antecedido e pre- econômicas que venham de alguma forma

1225
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

melhorar sua qualidade de vida. Alfabeti- segundo Denegri (2007) é necessário que
zação econômica e a educação para o con- a pessoa construa uma visão sistemática
sumo podem proporcionar ferramentas do modelo econômico social no qual está
para que as pessoas entendam seu mundo inserida e, ao mesmo tempo, seja capaz
econômico, interpretem os eventos que de manejar uma série de informações es-
podem afetá-los direta ou indiretamente pecíficas que possibilitem agir de manei-
e melhorem as competências para toma- ra eficaz. Resultados e considerações. No
rem decisões pessoais e sociais sobre a pré-teste verificou-se que vários conceitos
multiplicidade de problemas econômicos econômicos, entre eles, o de bens, servi-
que se encontram na vida cotidiana. A al- ços, inflação, sistemas econômicos, mer-
fabetização econômica e a educação para cado, oferta, demanda, preços, funciona-
o consumo devem ser iniciadas desde a mento bancário, bolsa de valores, consu-
educação infantil através do desenvolvi- mo, utilização do dinheiro, estavam muito
mento de hábitos básicos de consumo e o distantes da realidade dos estudantes do
reconhecimento do uso do dinheiro; isso ensino superior do curso de pedagogia.
deve ser aprofundado na Educação Bási- Após a intervenção pedagógica os índices
ca, Ensino Médio e Ensino Superior. Para de acertos mudaram sensivelmente con-
a compreensão de conceitos econômicos, forme tabela 1.

Tabela 1 - Acertos TAE-A Pré e pós-teste.

Mínimo de Máximo de Índice de


Grupos Média Desvio Padrão Mediana
acertos acertos significância

Pré Pós Pré Pós Pré Pós Pré Pós Pré Pós
teste teste teste teste teste teste teste teste teste teste

Estudantes 7.7 13.6 2.4 1.9 8.0 14.0 2.0 8.0 12.0 17.0 <0.0001

Foi utilizado o teste Wilcoxon para amostras relacionadas p < 0,05

1226
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

O teste de alfabetização econômica (TAE O desvio padrão de 2.3 foi para 1.9 e a me-
A) está dividido em quatro subtemas: Eco- diana 10.0 foi para 11.3 respectivamente.
nomia geral; Micro economia e economia
financeira; Macroeconomia; Economia in- Grafico 2 – Hábitos e condutas de consu-
ternacional. mo – condutas do consumo reflexivo.

Gráfico 1 – Subtemas do TAE A Responderam SIM no pré teste Responderam Sim no pós teste
Condutas de consumo reŇexivo

Economia Geral
Micro economia
Macro economica
Economia Internacional

Os estudantes que foram submetidos


Quanto à escala de hábitos e condutas ao programa de intervenção pedagógica
de consumo os estudantes mostraram- desenvolveram condutas mais reflexi-
-se pouco reflexivos no pré-teste. Apre- vas diante do consumo. Por exemplo, a
sentaram pouco conhecimento quanto compra a crédito ficou mais consciente e
aos direitos e deveres dos consumidores; reflexiva, pois, antes 41,18% perguntava
somente 27% faz planejamento de com- pelas taxas de juros, no pós-teste este ín-
pras; 76% não lê a etiqueta dos produtos; dice aumentou para 55,88%. A interven-
mais de 50% compra no mercado ambu- ção foi capaz de provocar um processo de
lante, 40% acreditam que gastam mais do tomada de consciência quanto aos conhe-
que ganham e compram no crédito, mas cimentos econômicos implícitos no dia-
somente a metade deles pergunta pelas -a-dia e agregou atitudes mais austeras
taxas de juros. Observa-se uma sensível quanto à seleção e qualidade dos produ-
mudança no pós-teste, conforme consta tos e importância da compra. A pesquisa
no Gráfico 2, após intervenção pedagógi- demonstrou a necessidade de ampliação
ca. Para comparação das medidas avalia- das intervenções para que as pessoas se-
das nos dois momentos (pré e pós-teste) jam alfabetizadas economicamente e sai-
foram aplicados o teste de McNemar e o bam atuar com consciência de seus direi-
teste de Wilcoxon para amostras relacio- tos e deveres.
nadas. O nível de significância adotado
para os testes foi de 5%. Quando conside- Palavras-chave: educação econômica;
radas as duas condutas, houve um índice alfabetização econômica; consumo
de significância p<0.0001 para a conduta consciente.
reflexiva. A média da conduta reflexiva no
pré-teste foi de 9.5 e no pós-teste de 10.7.

1227
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

SP LT04 - Simpósio ensino de Psicologia nessas esferas, apon-


tando uma contribuição insuficiente para
a formação docente, por apresentar-se
SP LT04-1222 - DESAFIOS DA PSICOLOGIA de forma descontextualizada da realidade
EDUCACIONAL EM DIFERENTES educacional, dentre outros fatores. Nessa
CONTEXTOS DE FORMAÇÃO DOCENTE direção, pretendemos discutir aspectos
de ordem teórico-metodológica, compre-
endendo que essa disciplina propicia um
Neste Simpósio pretendemos discutir
espaço particularmente relevante para a
estudos e experiências desenvolvidas no
constituição do professor, por meio do es-
ensino de Psicologia em diferentes con-
tudo sobre a relação entre os processos
textos de formação de professores. O
de desenvolvimento e de aprendizagem
referencial teórico-epistemológico nor-
humana, e a complexidade dos fatores
teador dos participantes do Simpósio se
que constituem os contextos educativos,
fundamenta na perspectiva sócio-histó-
considerando os aspectos sociais, cultu-
rico-cultural do desenvolvimento huma- rais e históricos. E também visamos am-
no. Serão temas de discussão as possi- pliar a discussão sobre a qualificação de
bilidades de contribuição do ensino de práticas profissionais no ensino de Psi-
Psicologia, a partir de práticas que visam cologia com o intuito de contribuir com
mobilizar processos de desenvolvimento os processos de desenvolvimento adulto
docente em diferentes cenários, a saber: que podem ocorrer em diferentes contex-
a) um curso de especialização lato sensu tos de formação docente.
em docência universitária; b) um curso de
licenciatura em Letras: Libras; c) um curso
de licenciatura em Letras; e d) um curso A PSICOLOGIA NA FORMAÇÃO
de pedagogia e na formação continuada CONTINUADA: CONTRIBUIÇÕES
de professores de uma instituição privada PARA A QUALIFICAÇÃO DO DOCENTE
de ensino fundamental. Os contextos de UNIVERSITÁRIO
formação docente favorecem a constru- Alba Cristhiane Santana - UEG
ção de conhecimento que orientam o de- albapsico@gmail.com
senvolvimento pessoal e profissional dos
professores e engendram processos de O presente trabalho tem como objetivo
significação acerca da identidade docen- discutir os estudos e as experiências de-
te. Nesse cenário o ensino de Psicologia senvolvidas em uma disciplina de Psico-
historicamente tem ocupado um espaço logia da aprendizagem, inserida em um
privilegiado, estando presente tanto na curso de especialização lato sensu em
formação inicial, através de disciplinas docência universitária. Pretendo ainda
obrigatórias nos cursos de licenciatura, refletir sobre as contribuições dos conhe-
como na formação continuada, por meio cimentos psicológicos em contextos de
de disciplinas e atividades que abordam formação de professores, destacando as
os conhecimentos psicológicos. Porém, possibilidades de mediação que as disci-
nas últimas décadas têm sido realizados plinas relacionadas à Psicologia podem
estudos que evidenciam limitações no gerar aos processos de desenvolvimento

1228
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

docente. O ensino de Psicologia passou a plexidade dos contextos sócio-culturais e


fazer parte dos cursos de formação de pro- históricos e, principalmente, desvinculada
fessores na criação das Escolas Normais, das experiências concretas no contexto
em 1830. Antunes (2007) aponta que tais escolar. Uma Psicologia teórica e abstrata
instituições propiciaram as condições para não chega aos espaços educativos, essa
a inserção dessa disciplina nos primeiros disciplina só poderá contribuir efetivamen-
cursos de pedagogia das Faculdades de te com a formação dos professores a partir
Filosofia, Ciências e Letras, na década de de uma imersão na realidade, dialogan-
1930. E por volta de 1960 a disciplina Psi- do com a prática vivenciada no cotidiano
cologia da Educação, junto com outras dis- educacional. Algumas discussões (Larocca,
ciplinas da área pedagógica, passou a ser 2002; Sadalla et al., 2002) apontam para a
obrigatória nos cursos de licenciatura no necessidade de desenvolver disciplinas de
Brasil (Guedes, 2002). Nessa trajetória, o Psicologia a partir de uma perspectiva dia-
ensino de psicologia foi se transformando, lética de ação e reflexão, a qual ultrapassa
a concepção inicial de oferecer fundamen- a noção de fundamento teórico na forma-
tos para a prática docente tem sido discu- ção docente, pois se ampliam as possibili-
tida e ressignificada em função da busca dades de compreensão e de contribuição
por uma formação que contribua efetiva- com a Educação, já que se traduz na in-
mente com a realidade concreta dos varia- terlocução entre teorias e práticas. Nessa
dos contextos educativos (Bzuneck, 1999; perspectiva, a ação e a reflexão são fatores
Oliveira, Sadalla & Azzi, 2002). O papel da constituintes das disciplinas de Psicologia
Psicologia na formação inicial e continuada em contextos de formação docente. Par-
dos professores tem sido tema recorrente tindo dessa proposta, tenho trabalhado
entre os profissionais que lidam com a for- uma disciplina de Psicologia com turmas
mação docente, uma vez que reconhecem de um curso de especialização, com vis-
as contribuições dos conhecimentos rela- tas a promover uma articulação entre as
tivos aos processos de desenvolvimento dimensões da teoria e da prática. E para
humano e de aprendizagem para o fazer alcançar tal objetivo foi desenvolvido um
pedagógico (Cunha, 2008; Maluf & Cruces, projeto de pesquisa de campo, no qual os
2008). Porém, desde os anos oitenta são alunos são instigados a realizarem investi-
realizadas críticas contundentes sobre as gações sistematizadas no contexto educa-
limitações do ensino de Psicologia nesses tivo, por meio de observações e entrevistas
espaços, sendo destacada a distância entre qualitativas. Nesta discussão apresentarei
o seu conteúdo e a prática escolar, levando a experiência desenvolvida com uma tur-
a uma contribuição insuficiente na forma- ma de 32 alunos de um curso de docência
ção docente, restringindo-se ao contexto universitária, que se caracterizou por ser
psicológico, sem alcançar o pedagógico e constituída por profissionais de diferen-
muito menos o social (Gatti, 2003; Patto, tes áreas do conhecimento, como: enge-
2005; Sadalla, Bacchiegga, Pina & Wisni- nharia, direito, fisioterapia, contabilidade,
vesky, 2002). Larocca (2000) assinala que informática, filosofia, pedagogia e diferen-
em muitos casos a Psicologia na formação tes licenciaturas. Essa heterogeneidade
docente é trabalhada em seu aspecto estri- abrangia alunos que já haviam estudado
tamente teórico, de forma isolada da com- psicologia na graduação (licenciaturas) e

1229
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

os que nunca estudaram (bacharelados). E diação pedagógica foram ressignificadas


em relação à prática profissional, 60% dos a partir das reflexões propiciadas pela ar-
alunos dessa turma atuavam na educação ticulação entre a realidade concreta e os
básica e 40% não tinham experiência na conhecimentos acerca dos processos de
docência. Considerando essa diversidade, ensinar e de aprender; c) o contato com os
o primeiro passo foi investigar os significa- docentes e os discentes da educação su-
dos e as concepções dos alunos acerca da perior (nas entrevistas) gerou discussões
Psicologia em sua relação com o processo sobre as possibilidades de a formação aca-
educativo. Essa investigação foi realizada dêmica mobilizar processos de desenvol-
por meio de um questionário com ques- vimento profissional. Entendo que a rela-
tões abertas. As análises dos significados ção entre teoria e prática é mais complexa
apresentados no instrumento apontaram que uma relação de implicação causal, na
como indicador que os alunos entendiam qual os saberes científicos mantêm uma
os conhecimentos psicológicos como solu- relação constitutiva com os saberes da
ção de problemas relativos aos alunos e ao experiência. A complexidade do contexto
seu processo de aprendizagem, a partir de educativo exige do professor algo mais do
uma visão da Psicologia como fundamen- que simplesmente tomar conhecimento
to para a prática docente. Esse indicador das teorias psicológicas, implica em dialo-
emergiu da maioria da turma, inclusive gar criticamente e produzir significados a
dos alunos que já haviam estudado essa partir da articulação entre conhecimentos
disciplina nas licenciaturas. A identificação científicos, realidade concreta e prática do-
desse indicador orientou a elaboração do cente. Assim, é necessário repensar o lugar
próximo passo, cujo objetivo foi colocar o da Psicologia no processo de formação de
aluno em contato com o contexto da edu- professores, revendo as especificidades da
cação superior, por meio de observações e relação entre Psicologia e Educação.
de entrevistas com docentes e discentes.
A tarefa dos alunos foi identificar a com- Palavras-chave: psicologia da educação,
plexidade dos fatores que constituem esse formação continuada de docentes, teoria e
espaço formativo e problematizar as ques- prática.
tões destacadas, tendo como base o diá- Contato: Alba Cristhiane Santana, UEG,
logo com o conhecimento psicológico. E a albapsico@gmail.com
finalização do projeto foi a elaboração de
um memorial, ou seja, uma narrativa auto-
biográfica sobre a experiência vivenciada PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO DE SURDOS
na disciplina de Psicologia e na pesquisa E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE
de campo. Na análise dos memoriais foi LETRAS-LIBRAS
possível levantar alguns indicadores sobre Juliana Guimarães Faria - UFG
as contribuições que essa disciplina pode julianagf@yahoo.com.br
trazer para a formação docente, a saber: a)
a pesquisa de campo contribuiu para des- A presença da Língua Brasileira de Sinais
mistificar o contexto da educação superior, (Libras) se faz necessária em todos os cur-
evidenciando a diversidade de fatores que sos de formação de professores no Brasil,
o constitui; b) as concepções sobre a me- pelo cumprimento da Lei 10.436/2002,

1230
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que a reconhece como meio legal de co- do Curso de Letras-Libras da UFG e bus-
municação e expressão, próprios da co- ca identificar qual a perspectiva do curso
munidade surda. E, também, por conta e de que forma a Psicologia da Educação
do Decreto 5.626/2005, que regulamenta de Surdos pode contribuir com a forma-
e determina como se dará a formação de ção do egresso. Além disso, faz-se um es-
docentes para o ensino da Libras, devendo tudo teórico sobre a questão da Libras e
ser realizada em nível superior, em curso da surdez e as especificidades desse cam-
de graduação de Licenciatura Plena em po para as práticas educativas. O Projeto
Letras-Libras. Este estudo nasce de inquie- Pedagógico do Curso de Letras-Libras da
tações e desafios em relação à disciplina UFG ainda não foi aprovado nas instâncias
de Psicologia da Educação de Surdos na superiores da UFG e está em fase de con-
formação de professores para o ensino clusão. Mas, já é possível perceber suas
da Libras. Especificamente, em relação à nuances. É possível identificar que não há
formação de professores no recém cria- explicitação da concepção de formação de
do curso de Letras-Libras da Universidade professores, mas traz esclarecimentos so-
Federal de Goiás (UFG). A partir de 2009, bre a exposição de motivos em relação à
inicia-se o curso de Letras-Libras na UFG criação do curso e dos princípios em rela-
com a perspectiva de formar professores ção à interdisciplinaridade e a integração
para o ensino da Libras, que tem como re- entre teoria e prática na formação do pro-
ferência o sujeito surdo, aquele que é na- fessor. Em relação ao perfil do egresso, o
tivo nesta língua. A disciplina está na sua PPC traz as seguintes considerações: “Pre-
segunda oferta. A disciplina de Psicologia vê-se, sobretudo, a formação de um pro-
da Educação na formação de professores, fissional crítico, reflexivo e investigativo,
nesse curso, ganha roupagem desafiado- que esteja preparado para exercer uma
ra. Mesmo alguns cursos incluírem a edu- prática cotidiana de formação continuada,
cação especial como conteúdo formativo, considerando o eixo epistemológico do
no curso de Letras-Libras o eixo articula- curso: a linguagem. Espera-se, também,
dor da Psicologia da Educação é o sujei- que o egresso desenvolva competências
to surdo, sua língua e sua cultura. Nesse em práticas e legislações inclusivas, es-
cenário, objetiva-se compreender sobre pecialmente em relação à educação de
quais seriam as contribuições da discipli- surdos” (PPC de Letras-Libras, UFG, 2011,
na de Psicologia da Educação de Surdos na p. 16). O eixo epistemológico do curso é
formação do professor de Letras-Libras na a linguagem e as capacidades práticas na
UFG, a partir de um estudo dos documen- educação de surdos. Quadros e Karnopp
tos que orientam o desenvolvimento do (2004), explicam que as línguas propagam
curso e de um estudo teórico em relação a a capacidade específica dos seres huma-
Libras, a sua constituição e o sujeito surdo. nos para a linguagem, e que as diferentes
Para o desenvolvimento desse estudo, a línguas que existem expressam bem mais
metodologia utilizada possui uma aborda- do que essa capacidade para a linguagem.
gem qualitativa (Bogdan & Biklen, 1999) Elas expressam padrões sociais, valores,
tendo como estratégia a análise de conte- ideais e culturas. Sendo assim, as línguas
údo (Bardin, 2010). A análise de conteúdo são epifenomenais, o que significa que re-
tem como referência o Projeto Pedagógico presentam uma multiplicidade de fatores

1231
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que as tornam diferentes e caracterizam realizada com professores de classes mis-


grupos sociais específicos. Essa concepção tas, com crianças ouvintes e surdas, que a
está presente no PPC do curso. Em relação dificuldade de linguagem da criança surda
à Psicologia da Educação de Surdos, apa- leva, muitas vezes, o professor a construir
rece na proposta no formato de duas dis- uma percepção equivocada do aluno sur-
ciplinas, correspondendo a 128 horas do do. Essa percepção acaba por refletir nas
currículo proposto. A oferta da disciplina suas ações em relação às crianças. Nesse
é anterior ao Estágio Supervisionado e na sentido, a Psicologia da Educação de Sur-
ementa constam os mesmos conteúdos dos pode contribuir com a formação de
que estão presentes nos outros cursos de um profissional que seja capaz de ensinar
formação de professores da UFG, mas traz mais do que uma língua, mas uma per-
o termo ‘Educação de Surdos’ como dife- cepção do surdo dentro da escola. Além
rencial. A bibliografia básica do curso apre- disso, muito ainda precisa ser estudado
senta produções em relação à psicologia sobre a forma pela qual a disciplina pode
da educação e à construção da identidade contribuir com o professor de Libras, sen-
do sujeito surdo. Mas, não há produções do necessário o avanço nos estudos sobre
específicas de pesquisas no campo da Psi- educação de surdos.
cologia da Educação. Com esse cenário,
acredita-se que o curso ainda necessita Palavras-chave: psicologia da educação,
expressar no seu PPC a própria concepção formação de professores, Libras.
de formação de professores e os desafios Contato: Juliana Guimarães Faria, UFG,
da profissão e da construção da identida- julianagf@yahoo.com.br
de docente. Percebe-se, ainda, que a disci-
plina de Psicologia da Educação de Surdos
pode contribuir com o desenvolvimento FORMAÇÃO DOCENTE E INCLUSÃO
da percepção de linguagem enquanto ESCOLAR
expressão de valores e uma cultura pró- Candice Marques de Lima - UFG,
pria da comunidade surda (Skliar, 1997). candicemarques1@gmail.com
Além disso, a área possui poucos estudos
sobre a psicologia da educação de surdos O processo de inclusão escolar não se cons-
e, essa realidade, acaba por impactar na titui mais como novidade no cenário das
construção da identidade e na estrutura escolas brasileiras. Desde o ano de 1994,
da própria disciplina. Compreende-se que com a Declaração de Salamanca, a inclusão
se faz importante, na prática docente do tem sido pauta importante na educação.
ensino de Libras, compreender a relevân- Um dos pontos importantes dessa declara-
cia dessa língua dentro do contexto políti- ção propõe que escolas regulares que pos-
co social que garante os direitos humanos suam orientação inclusiva constituem os
linguísticos como mecanismo de inserção meios mais eficazes de combater atitudes
e integração social da comunidade surda. discriminatórias, criando-se comunidades
Essa integração social passa pelo processo acolhedoras, construindo uma sociedade
educacional e pela escola, atingindo a for- inclusiva e alcançando educação para to-
mação e a prática docente. Silva e Pereira dos; além disso, tais escolas provêem uma
(2003) argumentam, a partir de pesquisa educação efetiva à maioria das crianças e

1232
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

aprimoram a eficiência e, em última instân- teóricas a respeito da inclusão e de esta


cia, o custo da eficácia de todo o sistema ser uma realidade nas escolas comuns de
educacional. A inclusão escolar, ou como ensino, tanto públicas quanto privadas, a
tem sido chamada atualmente, Educação inclusão ainda não tem garantido o seu
para a diversidade do desenvolvimento espaço na formação docente. A partir da
humano, é uma proposta de inserção de realidade que observamos no Estado de
todos os alunos nas escolas comuns de en- Goiás, a Universidade Federal de Goiás não
sino. Na proposta inclusiva é a sociedade propõe em sua matriz curricular dos cursos
que se organiza para receber todos, tanto de licenciatura disciplina sobre Inclusão
pessoas com deficiência quanto pessoas Escolar. Tendo em vista esse déficit na for-
sem deficiência. A inclusão diferencia-se mação docente, trabalho conteúdos refe-
do paradigma da integração, pois neste a rentes a inclusão nas disciplinas de Psicolo-
pessoa com deficiência é quem deve lutar gia da Educação I e II no curso de Letras da
por seus direitos e somente os alunos ap- UFG. Essas discussões acontecem de for-
tos devem ir para a escola regular. A pro- ma breve para não prejudicar o conteúdo
posta inclusiva tem seu respaldo legal na extenso das duas disciplinas. Nestas aulas
Constituição Brasileira de 1988, no Estatu- são trabalhados: o conceito de inclusão, as
to da Criança e do Adolescente (ECA) de leis que respaldam o processo inclusivo e
1990 e na Lei de Diretrizes e Bases da Edu- a terminologia inclusiva necessária para o
cação de 1996. Em todas essas leis indica- tratamento das pessoas com necessidades
-se que todas as crianças devem freqüen- educacionais especiais (n.e.e.). Infelizmen-
tar a escola comum de ensino, pois todos te não há tempo disponível para trabalhar
são iguais perante a lei, com os mesmos di- possibilidades de metodologias em sala de
reitos e deveres. O paradoxo da educação aula que favoreçam o ensino de pessoas
inclusiva é que apesar de sermos iguais com n.e.e. No curso de Letras da Univer-
perante a lei, somos todos diferentes nas sidade Federal de Goiás, há uma discipli-
características físicas e especialmente nas na semestral - Prática como Componente
subjetivas. Cada pessoa se constitui num Curricular (PCC), com carga horária de 50
meio socioeconômico e cultural específico horas, em que cada professor oferece uma
e cada um vai subjetivar suas vivências de proposta de pesquisa aos alunos. Na ten-
forma diferente, sendo que isto nos tor- tativa de possibilitar uma melhor compre-
na seres únicos. O grande desafio para a ensão do processo de inclusão escolar, te-
educação é conseguir compreender cada nho oferecido essas disciplinas dirigidas ao
sujeito diferente e educar a todos, pois na tema da inclusão. No semestre de 2010/2,
proposta inclusiva sugere-se que o profes- alunos inscritos na pesquisa entrevistaram
sor trabalhe com metodologias diferencia- professores e produziram relatório sobre
das para que todos os alunos aprendam. Inclusão Escolar e Formação Docente. Nes-
Neste sentido, a psicologia tem importan- sas entrevistas os professores expuseram
te contribuição, pois diferentemente da a necessidade de uma formação que pos-
educação, que tenta padronizar o aluno, a sibilite sua atuação em sala de aula com a
primeira compreende o sujeito constituído diversidade. No semestre de 2011/1, alu-
socialmente, embora com características nos fizeram entrevistas com pessoas com
diferenciadas. Apesar de várias discussões necessidades educacionais especiais que

1233
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

desde o início de sua vida escolar estuda- brasileiros à educação na rede regular de
ram em escolas comuns de ensino e que ensino, tenham eles deficiências, neces-
atualmente estão em cursos superiores sidades educacionais especiais (n.e.e.) ou
ou já terminaram a graduação. O tema não. A escola regular precisa atender a
da pesquisa era Histórias de Sucesso em todos os alunos, desde que eles possam
Inclusão Escolar, entendendo-se como su- aprender e beneficiar-se da convivência
cesso o fato de pessoas com n.e.e. terem em um ambiente social comum como é a
acesso a cursos de graduação. As análises escola. Esse atendimento está previsto na
das entrevistas apontaram como indicado- Constituição Federal de 1988, art. 208: “o
res que as pessoas estão satisfeitas com dever do estado com a educação será efeti-
os cursos de graduação; um dos entrevis- vado mediante a garantia de (...) III- atendi-
tados, com deficiência visual, já concluiu o mento educacional especializado aos por-
curso em Direito e é concursado no Tribu- tadores de deficiência, preferencialmente
nal de Justiça de Goiânia, e todos os dez na rede regular de ensino”. De acordo com
entrevistados disseram ser pessoas felizes. a LDB 9394/96, no artigo 58, “entende-se
Uma das entrevistadas, que era surda, dis- por educação especial, para efeitos dessa
se ser “a pessoa mais feliz do mundo”. Nos- lei, a modalidade de educação escolar ofe-
sa tentativa é possibilitar que os alunos de recida preferencialmente na rede regular
licenciatura em Letras possam ter acesso de ensino para educandos portadores de
a informações básicas sobre inclusão esco- necessidades especiais”. São consideradas
lar. Entretanto seria necessário que a insti- necessidades educacionais especiais: defi-
tuição pudesse propor disciplinas voltadas ciência mental, deficiência auditiva, defi-
para a compreensão do processo inclusivo ciência visual, deficiência física, deficiên-
nas escolas e para o desenvolvimento de cias múltiplas, altas habilidades, condutas
metodologias de ensino aos alunos. típicas (síndromes, quadros psiquiátricos
e/ou neurológicos). Além das descritas
Palavras-chave: inclusão escolar, formação anteriormente, há o fracasso escolar, as
docente, necessidades educacionais especiais dificuldades e distúrbios de aprendizagem
Contato: Candice Marques de Lima, UFG, - multirrepetência – a condição dos sujei-
candicemarques1@gmail.com tos pertencentes às minorias e em situa-
ções atípicas: alunos circenses, alunos ad-
vindos da zona rural, migrantes. Segundo
EDUCAÇÃO INCLUSIVA, A FORMAÇÃO Mantoan (1997) “inclusão refere-se à vida
CONTINUADA E A PRÁTICA DOCENTE: social e educativa; todos devem ser inclu-
UM DESAFIO PARA A ESCOLA. ídos (ritmos e modalidades de aprendiza-
Ádria Assunção Santos de Paula - UFG/CESJ gem); supõe mudanças físicas no ambien-
adriapsi1@yahoo.com.br te; adoção de segunda língua para todos
os alunos; apoio técnico e instrumental
O contexto educacional brasileiro atraves- para professores e alunos.” Sabemos que
sa grandes mudanças após a criação da úl- a escola, da forma como está organizada,
tima Lei de Diretrizes e Bases da Educação não conseguirá atingir a meta proposta
Nacional (LDB 9394/96). Esse documento pela lei. É preciso que haja uma profunda
reafirma o direito de todos os cidadãos reorganização epistemológica, curricular e

1234
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

metodológica para que consigamos pro- formação dos futuros professores. Embora
porcionar o desenvolvimento a todos os não tenha o objetivo de aprofundar-se em
alunos. O processo inclusivo só ocorrerá temas específicos relacionados às defici-
de fato quando toda comunidade educati- ências, oferece oportunidade para que os
va estiver envolvida e, sobretudo, quando graduandos construam uma base teórica
os diversos segmentos da escola – admi- importante para buscarem o aperfeiçoa-
nistração, direção, professores e funcioná- mento em cursos de pós-graduação. Atu-
rios – se conscientizarem de que todos são ando, concomitantemente, como psicólo-
responsáveis pela aprendizagem e pelo ga escolar/educacional em uma instituição
desenvolvimento de cada aluno. Além da privada de ensino fundamental, constatei
conscientização, é necessário que ações que há a necessidade de que a escola pro-
práticas, efetivas, previstas pedagógica e mova a formação continuada de seus pro-
financeiramente, sejam implementadas fessores e de todos aqueles que compõem
de forma planejada, de acordo com a de- o ambiente escolar, uma vez que a maioria
manda vivenciada pela instituição. Neste deles não cursou nenhuma disciplina que
contexto, formar, capacitar e instrumen- discutisse a perspectiva da educação inclu-
talizar o professor para contribuir com a siva em seus cursos de graduação. Com o
promoção de aprendizagem e de desen- objetivo de intervir nesta realidade elabo-
volvimento de todos os alunos, inclusive rei o projeto de Educação Inclusiva da es-
daqueles com necessidades educacionais cola, o qual prevê, dentre outros objetivos,
especiais é uma condição básica para a promover a capacitação teórico-prática
construção de uma educação efetivamen- dos professores e funcionários, de acordo
te inclusiva. Diante desta necessidade, com a demanda do cotidiano pedagógico
ministrando aulas no curso de Pedagogia e do funcionamento da escola em geral,
em uma Instituição de Ensino Superior realizada por uma equipe multiprofissio-
na cidade de Goiânia, elaborei, no ano de nal composta por psicólogo (a), fonoaudi-
2003, o programa da disciplina Educação ólogo (a), professores com formação para
Inclusiva, cujo referencial teórico se apóia atuarem junto aos alunos com as diferen-
na perspectiva da psicologia Histórico- tes n.e.e.’s, além de outros profissionais
-Cultural. Tal disciplina é ministrada em que colaboram com a formação docente
dois semestres - Educação Inclusiva I e mediante as necessidades da escola. Além
Educação Inclusiva II - cujos objetivos são: disto, o projeto almeja instituir e viabili-
compreender a inclusão escolar como um zar grupos de estudo permanentes com
processo dialético, constituído a partir de objetivo de promover o desenvolvimento
pressupostos históricos, epistemológicos, das equipes de profissionais da escola e a
teóricos e das políticas públicas; Discutir construção de novas práticas docentes, de
o processo de aprendizagem dos sujeitos material pedagógico, práticas avaliativas e
com necessidades educacionais especiais adequações curriculares as quais respon-
a partir dos conhecimentos produzidos dam à demanda que a sala de aula inclusi-
pela psicologia; Discutir o processo de for- va nos apresenta. Ao trabalhar diretamen-
mação do profissional inclusivo na escola, te com a formação teórica dos graduandos
enfatizando a formação do professor. A e, simultaneamente, vivenciar o cotidiano
disciplina colabora sobremaneira para a da escola, foi possível compreender a ne-

1235
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

cessidade da formação continuada para a realidade social e cotidiana, em que de


capacitação do professor, uma vez que o uma sociedade quase marcadamente ru-
professor só atribui sentido à teoria quan- ral estamos caminhando a passos largos
do esta se articula à sua prática pedagógi- para a sociedade da informação (SI). Te-
ca. Mediante minha atuação na formação mos sido confrontados com os ambientes
docente, tanto no âmbito do ensino supe- virtuais de aprendizagem (AVA) que têm
rior, quanto no contexto da escola, con- implicado em uma verdadeira revolução
cluo que a educação tornar-se-á menos de transformações que escapam a nossa
excludente na medida em que o professor compreensão e poder de explicação. De
contar com possibilidade de aprender e de uma cultura marcadamente oral, estamos
desenvolver habilidades e competências sendo lançados em uma cultura digital
para lidar com a diversidade humana, as- produtora e produzida pelos avanços tec-
sim como quando conseguirmos diminuir nológicos. Tal revolução nos suportes da
a dicotomia que ainda existe entre a teoria informação têm criado novas formas de
e a prática. relacionamento e novas formas de apren-
der e produzir conhecimento, assim como
Palavras-chave: Educação inclusiva, formação novos agentes educativos. Essa nova re-
docente, prática pedagógica. alidade nos confronta com desafios mar-
Contato: Ádria Assunção Santos de Paula, cantes, especialmente no que se refere a
UFG/Colégio Externato São José, adriapsi1@ necessidade de repensar a formação de
yahoo.com.br um professor capaz de atuar capaz de nela
atuar. Por outro lado, o olhar investigati-
vo do professor sobre o cotidiano esco-
lar tem sido entendido por nosso grupo
SP LT04 - Simpósio como condição necessária a uma forma-
ção comprometida com práticas pedagó-
gicas inclusivas e transformadoras. Nessa
SP LT04-1444 - O DESENVOLVIMENTO perspectiva, a pesquisa no e do ambiente
DE COMPETÊNCIAS NA EAD DIGITAL E escolar pode ser vista, ao mesmo tempo,
A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO como princípios, científico e educativo.
EM AMBIENTES VIRTUAIS DE Hoje, não cabe mais ao professor apenas
APRENDIZAGEM: REFLEXÕES SOBRE reproduzir os conhecimentos para seus es-
UMA EXPERIÊNCIA EM PÓS-GRADUAÇÃO tudantes, mas buscar a compreensão dos
SOBRE EDUCAÇÃO E INCLUSÃO problemas concretos que se colocam no
Susana Silva Carvalho - SEDF/EAPE cotidiano educacional. Co-construir ferra-
susanaxedas@gmail.com mentas que permitam ao professor olhar
Diva Albuquerque Maciel - UnB sua própria prática e investigar as ques-
diva@unb.br tões reais presentes em seu cotidiano, de
forma reflexiva e sistematizada em bases
A presença cada vez mais marcante das teóricas consistentes, constituiu a base
novas tecnologias da informação e comu- curricular de um curso de especialização
nicação (TIC) tem contribuído para uma sobre desenvolvimento humano e inclu-
revolucionária transformação da nossa são escolar, na modalidade EaD, oferecido

1236
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

por uma universidade pública brasileira. Nesta sessão, refletiremos sobre o papel
O objetivo do presente simpósio é trazer do tutor na negociação e na construção
à reflexão e debate três diferentes contri- de conhecimentos sobre a área docente
buições de estudos sobre o referido curso e sobre a identidade profissional, em um
com vistas a contribuir para a formação Curso de Especialização sobre Desenvol-
de educadores. Nesse contexto, são ob- vimento, Educação e Inclusão, realizado a
jeto de estudo o processo de tutoria por distância (EaD) em ambiente digital, por
meio dos fóruns de discussão - salas de meio de uma universidade pública brasi-
conversa entre os alunos pós-graduandos leira, cujo público alvo era formado, na
(professores de redes públicas, psicólogos sua maioria, de educadores. Partiremos
e outros profissionais da educação) e seus da perspectiva sociocultural para compre-
tutores e professores supervisores os te- ender como esse conhecimento está sen-
mas abordados nas pesquisas realizadas do construído e seu impacto para as trans-
pelos professores e as avaliações do curso formações da identidade docente. Esta
pelos cursistas ressaltando as transforma- abordagem concebe o desenvolvimento
ções em seu trabalho na escola. Os temas humano como um fenômeno complexo
mais recorrentes observados nesses estu- que integra aspectos biológicos, culturais
dos dizem respeito as referências dos par- e subjetivos, pressupondo a participação
ticipantes à oportunidade de participarem ativa da pessoa no sistema simbólico da
da própria construção do curso por meio cultura. Nas múltiplas interações sociais,
da discussão nos fóruns, e a possibilidade a pessoa co-constrói com os outros uma
de ressignificarem a sua prática pedagó- compreensão do mundo e de si-mesmo,
gica por meio da pesquisa, sendo estes constituindo uma forma própria e espe-
apontados como os principais fatores de cífica de funcionamento psicológico. Este
comprometimento com a qualidade do processo é possibilitado pela aprendiza-
curso. Trazemos para debate alguns prin- gem que ocorre no cerne das interações
cípios pedagógicos construídos neste exer- estabelecidas, envolvendo diretamente,
cício de análise que consideramos uma aquele que aprende – em nosso caso,
contribuição importante para o tema da os educadores e aquele que ensina, aqui
inclusão de alunos na escola básica e de especificamente, o tutor. Consideramos
professores em curso na modalidade EaD. o espaço da EaD como um micromundo,
onde alunos e tutores se deparam com
um contexto que se caracteriza pela uti-
O PAPEL DO TUTOR NA CONSTRUÇÃO DE lização das tecnologias de comunicação e
CONHECIMENTOS E NA CONSTITUIÇÃO informação (TIC) como ferramenta; pela
DA IDENTIDADE DOCENTE inclusão de indivíduos que, muito possi-
Ana Paula Carlucci - UnB velmente, não teriam outra possibilidade
apcarlucci@gmail.com de realizar uma formação continuada;
Silmara Carina Dornelas Munhoz - UnB pela flexibilidade dos horários; pela não
silmaracarina@gmail.com) obrigatoriedade da frequência diária;
Diva Albuquerque Maciel - UnB pela distância física encurtada pelas TIC
diva@unb.br que conectam professores, alunos e tuto-
Financiamento: CAPES/PROF res; pela ampliação do tempo de estudo

1237
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

que está diretamente relacionada com a atividades propostas pelo curso, que po-
‘quebra’ da temporalidade, já que o alu- dem ser coletivas (fóruns) ou individuais
no pode acessar o material em diversos (tarefas) os alunos são convidados a re-
momentos, inclusive, de madrugada e solverem uma situação problema que, no
aos domingos; pelas orientações e aulas primeiro momento, pode ser a de opinar
que estão no ar, ininterruptamente, per- ou expressar ideias, conceitos e experiên-
mitindo ao aluno aproveitar o momento cias pessoais sobre o assunto discutido.
mais adequado para interagir com o ma- Nesta de interação com o outro, não são
terial e pela construção de conhecimento desenvolvidos e estabelecidos apenas ins-
num processo de partilha mútua de pro- truções, apontamentos, palavras, ideias,
blemas e necessidades. Nesta relação, o mas também emoções, sentimentos e
tutor é visto como alguém que está ali ações que geram a construção de signifi-
para orientar o aluno na execução de suas cados sobre o ser professor e sua prática,
atividades, auxiliando-o e tirando dúvidas como podemos observar no momento de
em relação à organização do tempo e dos trocas entre o tutor X e o cursista Y: “Olá,
estudos, como podemos observar na fala cursista Y...Tudo bem? A discussão nos
do cursista W: “Tutor, aqui estão minhas leva por esse caminho mesmo: Vygotsky
dúvidas: 1) No caso de revistas e sites da nos leva à refletir que os educandos com
internet, como se faz a citação nas refe- necessidades especiais tem um “tempo”
rências bibliográficas, segundo o modelo de resposta diferenciado, sem que isso
proposto? 2) O texto de Gil Pena e Macha- seja impedimento para que aprendam.
do de Assis tem uma atividade específica Adentrando um pouco mais nas suas
ou são para enriquecer o fórum? Obriga- afirmações, gostaria que você nos dis-
da, um abraço, Cursista W”. Porém, o pa- sesse o que quis dizer com “aspectos so-
pel do tutor não fica restrito, apenas, ao ciais”. Te aguardo! Tutor X”. “Oi Tutor X!!
de ser responsável pela construção do co- Respondendo...A inclusão é uma questão
nhecimento. Estudos e a própria experi- social porque esse assunto atinge a socie-
ência por nós vivida apontam, ainda, que dade. Grande parte da sociedade precisa
para o sucesso na aprendizagem e para a mudar diversas visões e ações precon-
manutenção da presença do aluno, o tu- ceituosas e segregadoras a cerca daque-
tor precisa promover e desenvolver um le que foge de um “padrão”. Aqui, neste
espaço de acolhimento, apoio e incentivo caso, estamos falando dos portadores
ao diálogo e à negociação, como revela a de necessidades especiais, mas também
fala da cursista: “Saudações querida pro- sabemos que há outros “diferentes” que
fessora, gostaria de agradecer mais uma sofrem com tais comportamentos. É social
vez por toda a dedicação, tenho consciên- por isso, porque exige mudança de posi-
cia que você foi uma pessoa chave para a cionamento da sociedade em respeitar o
conclusão deste curso, você é um exemplo outro em suas diferenças e dificuldades
de professora, espero um dia ser um pro- e passar a conviver de forma pacífica. A
fissional do seu calibre. Espero um dia ter inclusão exige novos valores, compromis-
o privilégio de te encontrar novamente, sos, desafios...e a escola deve está imbu-
você é uma pessoa realmente encantado- ída nisso, mas isso seria apenas a nível
ra. Um forte abraço”. Ao participarem das micro e esse compromisso precisa pene-

1238
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

trar a nível macro à sociedade como um entre os estudantes – em especial, os


todo. São muitas as mudanças, principal- educadores – e tutores, nos vários recur-
mente a mudança cultural. Um abraço. sos tecnológicos da educação a distância,
Cursista Y”. Este diálogo evidencia que o estruturam as fronteiras espaciais, sociais
modo como estudantes e tutores com- e culturais na produção de significados e
partilham e constroem suas opiniões ou posicionamentos sobre o ser professor,
ideias, conceitos e experiências sobre o possibilitando condições para que o es-
assunto discutido irá direcionar e impac- tudante construa seus conhecimentos
tar não apenas a construção coletiva e in- sobre a área e também se constitua, ele
dividual do saber prático e teórico sobre próprio, como professor.
a área de estudo, mas também o próprio
(re)pensar a atividade docente, possibili- Palavras-chave: Papel do Tutor; Ensino a
tando ressignificar o ser professor/tutor. Distância; Identidade Profissional Docente.
Entendemos que o estudante, na sua rela-
ção com o tutor e com os outros colegas,
também professores, resgata suas memó- CONTRIBUIÇÕES TEÓRICO-PRÁTICAS DE
rias educativas, refletindo sobre quem ele UMA PÓS-GRADUAÇÃO A DISTÂNCIA
é, quem ele gostaria de ser e quem ele EM DESENVOLVIMENTO, EDUCAÇÃO E
não queria ser como profissional. Nesta INCLUSÃO
tensão e negociação entre novos e anti- Patrícia C. Campos-Ramos - UnB
gos significados, o estudante vai se identi- pcamposramos@uol.com.br
ficando ou se diferenciando com o grupo Alia Barrios - UnB
em questão, num constante processo de aliabarrios@gmail.com
apropriação do contexto circundante, em Financiamento: CNPq/CAPES
que esses significados não serão apenas
reproduzidos, mas, também, irão mediar A EaD em meio digital é, atualmente,
e regular o processo de constituição da um recurso importante para a formação
identidade profissional. Acreditamos que continuada de profissionais envolvidos e
esses conhecimentos e significados cons- comprometidos, direta ou indiretamente,
truídos localmente e situados nos diver- com a necessidade de mudanças efetivas
sos recursos tecnológicos da educação a na realidade sociocultural da educação
distância nos indicam as formas que seus brasileira. Este compromisso reflete-se
participantes lidam com os aspectos ide- na participação ativa destes profissionais,
ológicos acerca da área de atuação e es- em diferentes cursos, procurando atuali-
tabelecem seus significados na interação. zação de conhecimentos, competências e
Nessa relação, as posições individuais são habilidades, profissionais e pessoais, que
construídas pelo impacto dos aspectos permitam reflexões e avaliação crítica dos
ideológicos, isto é, dos significados sociais contextos educativos nos quais atuam, as-
expressos em discursos hegemônicos pe- sim como, condições de propor mudanças
los interesses concretos, definidos histori- fundamentais para esses contextos. Tam-
camente na contradição de classe e pelos bém, um consistente diálogo entre as áre-
aspectos emocionais. Dessa forma, en- as de Psicologia do Desenvolvimento e da
tendemos que as diversas interlocuções Educação tem contribuído, historicamen-

1239
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

te, com e para o estudo das necessidades borado para promover a especialização
educacionais especiais, e por meio da e o desenvolvimento de competências
participação de seus profissionais em in- para a atuação de professores em espa-
tervenções, debates e pesquisas voltados ços inclusivos, como escolas, hospitais e
para temáticas como: desenvolvimento, outras instituições, os educadores desen-
aprendizagem, adequações curricula- volveram estudos que envolveram áreas
res, propostas e estratégias pedagógicas, como Psicologia, Educação e Tecnologia.
orientação profissional, diagnóstico e ava- Suas pesquisas foram realizadas, em ge-
liação, prevenção, diálogo com a família e ral, nos contextos em que estes educa-
a escola, inclusão social, qualificação de dores atuavam, tendo como temáticas
educadores, entre outros aspectos. Isto questões específicas relacionadas à práti-
porque, há profissionais comprometidos ca docente do dia-a-dia e à reflexão sobre
com uma cultura de promoção humana a mesma, com consequentes propostas
que contemple a qualidade de vida a to- de inovações na área Aqui, apresentamos
dos, sem exclusão e preconceito; além um recorte dos múltiplos aspectos do cur-
disto, preocupados com a acessibilidade so, cujo foco centra-se em uma reflexão
de cada indivíduo e sua família ao con- sobre os temas abordados nas pesquisas.
vívio social e aos bens culturais, visando Uma breve classificação desses temas nos
dirimir posturas discriminatórias e con- mostram que as escolhas mais frequentes
dutas estigmatizantes. Na perspectiva do recaíram sobre: (a)aspectos gerais do pro-
desenvolvimento humano e da inclusão, cesso de inclusão; (b)aspectos específicos
assim como na da formação docente deste processo, como acessibilidade de
continuada objetivamos, com este traba- alunos com diferentes necessidades edu-
lho, refletir a respeito das contribuições cacionais especiais (NEEs); (c)alfabetiza-
teórico-práticas de profissionais da área ção e letramento, sob a ótica da inclusão;
da psicologia do desenvolvimento e da (d)impacto e alcances da adequação curri-
educação, entre outros, propostas em um cular em diferentes séries/disciplinas; (e)
curso de especialização a distância, rea- modos de avaliação dos alunos com NEE,
lizado por uma universidade pública bra- rendimento e aprovação/reprovação; (f)
sileira. O público-alvo formou-se de edu- concepções que diferentes participantes
cadores que se especializaram sobre as das pesquisas tinham de termos como
relações entre desenvolvimento humano deficiência, inclusão e diversidade, refor-
e inclusão escolar. As atividades curricu- çando uma tendência atual, nas pesqui-
lares do curso foram estruturadas a partir sas sobre desenvolvimento, de valorizar
de três eixos temáticos: (1) Desenvolvi- as opiniões, inclusive, de crianças com ou
mento humano; (2) Cultura e diversidade; sem deficiência, e de como lidam com es-
e (3) Inclusão escolar. Transversalmente tas questões a partir de suas concepções;
aos módulos temáticos e após a conclu- (g)diferentes contextos de inclusão, que
são da etapa teórica do curso, os educa- vão desde a educação precoce, passando
dores participantes realizaram pesquisas pelos níveis de educação infantil, ensino
empíricas sobre questões relativas ao fundamental e médio, até cursos de edu-
desenvolvimento humano, a educação e cação profissional, educação de jovens e
a inclusão escolar. Tendo o curso sido ela- adultos e incluindo, também, as salas de

1240
VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

recursos e ambientes voltados ao lazer e para: (a)perceber as necessidades educa-


aos esportes; (h)aspectos legais, como os cionais especiais dos alunos e valorizar a
tipos de deficiências contemplados nas educação inclusiva; (b)flexibilizar a ação
leis e a importância atribuída a um diag- pedagógica nas diferentes áreas de co-
nóstico médico para efetivação do aten- nhecimento de modo adequado às neces-
dimento educacional especializado nas sidades especiais de aprendizagem; ava-
salas regulares de ensino, bem como pre- liar continuamente a eficácia do processo
juízos enfrentados por aqueles que não educativo para o atendimento de necessi-
têm um diagnóstico preciso; (i)processos dades educacionais especiais, como pro-
de ensino-aprendizagem em situações de põe a Resolução CNE nº 2/2001, art. 18,
inclusão, dificuldades surgidas e habilida- § 1º. Além disto, que muitos profissionais
des para lidar com elas, além da relação se tornaram especializados para: identi-
(ou não) com o fracasso escolar; (j)exercí- ficar as necessidades educacionais espe-
cio da prática docente e a necessidade da ciais para definir, implementar, liderar e
formação continuada, visando melhoria apoiar o desenvolvimento de estratégias
na qualidade do ensino e da educação in- de flexibilização, adaptação curricular,
clusiva, envolvendo aspectos como novas procedimentos didáticos pedagógicos
possibilidades e experiências voltadas ao e práticas alternativas, adequados aos
uso de tecnologias na educação, além de atendimentos das mesmas, bem como
técnicas e atividades como uso de litera- trabalhar em equipe, assistindo o pro-
tura infantil, atividades lúdicas e psico- fessor de classe comum nas práticas que
motoras; (l)o mercado de trabalho para são necessárias para promover a inclusão
pessoas com necessidades educacionais dos alunos com necessidades educacio-
especiais; comunicação, interações e re- nais especiais, como propõe a Resolu-
lações entre adultos e crianças, entre ção CNE nº 2/2001, art. 18, § 2º (MEC).
crianças, entre diferentes contextos como Neste sentido, podemos concluir que as
escola e família, ou áreas como educação atividades curriculares estruturadas para
e saúde, envolvendo aspectos como so- um curso de pós-graduação que tratou,
cialização, afetividade e, por outro lado, principalmente, de desenvolvimento hu-
violência e, por fim, (m) reflexões sobre a mano, educação e inclusão, realizadas a
educação, de maneira mais ampla. Estes distância, possibilitaram importantes re-
temas estiveram presentes em pesquisas, flexões a partir da prática dos educadores
em geral, baseadas na metodologia qua- participantes, tanto no nível teórico como
litativa, e com diferentes focos, embora no nível prático, abrindo espaço para o
diversos deles estejam interrelacionados desenvolvimento de uma visão crítica e
(por exemplo: inclusão - adequação cur- reflexiva em relação às necessidades reais
ricular - participação da família; acessibi- e contextualizadas da educação e, espe-
lidade - deficiência física - prática docen- cialmente, da educação inclusiva, condu-
te). Essas observações nos mostram que zindo-os, portanto, a práticas inovadoras
os educadores/pesquisadores desenvol- em suas áreas de atuação.
veram algumas competências durante o
percurso, conforme proposta do curso e Palavras-chave: EaD em Meio Digital,
questões legais, tornando-se capacitados Inclusão, Reflexões Teórico-Práticas.

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

PERCEPÇÕES DOS DOCENTES SOBRE SEU volvimento pessoal/profissional, após a


DESENVOLVIMENTO A PARTIR DE UM conclusão do referido curso. Seguindo a
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EAD EM teoria sócio-cultural, o aprendizado de
MEIO DIGITAL maior relevância é aquele anterior ao
Susana Silva Carvalho - SEDF/EAPE desenvolvimento. Portanto, cabe refletir
susanaxedas@gmail.com que a proposta da formação em questão
Rosania Aparecida Stoco de Oliveira - SEDF promoveu aprendizado e, posteriormen-
rosaniastoco@terra.com.br te, o desenvolvimento pessoal e profis-
sional de seus participantes. O currícu-
O presente trabalho parte de nossa ex- lo proposto foi norteado por três eixos
periência como tutoras/orientadoras na temáticos, a saber: 1) Desenvolvimento
formação docente, em um curso de espe- humano e aprendizagem; 2) Cultura e di-
cialização na modalidade de educação a versidade e 3) Inclusão escolar. Tendo por
distância por meio digital, realizado por base estes eixos, especialmente o primei-
uma universidade pública brasileira. O ro, foram selecionadas e classificadas al-
curso, que objetivou colaborar com mu- gumas falas dos educadores cursistas, em
danças efetivas na educação brasileira, dois momentos do curso: (a) ao final da
apresentando temas sobre Desenvolvi- primeira fase, no fórum de encerramen-
mento Humano, Educação e Inclusão Es- to do último módulo de conteúdo teóri-
colar, teve como público alvo educadores co e (b) posteriormente ao momento de
que pretendiam conhecer e atuar sobre defesa de monografias de conclusão de
uma perspectiva da educação inclusiva. curso, realizada em um evento científico
Vale ressaltar, que diante da grande de- especialmente planejado e realizado para
manda de formação adequada de profes- este fim, simultaneamente, em diversas
sores e da carência de oferta de cursos de cidades/estados brasileiros. Consideran-
especialização nas regiões interioranas do o proposto pelo currículo do curso, e
brasileiras, o curso possibilitou o desen- a partir das expressões de opiniões emi-
volvimento sócio-cultural destas regiões, tidas nos fóruns de avaliação, pelos es-
já que acreditamos que a formação dos pecialistas, podemos concluir que houve
professores no eixo epistemológico edu- significativa aprendizagem por parte dos
cação, psicologia e tecnologias contempo- sujeitos envolvidos na rede colaborati-
râneas contribui para a concretização de va, através das seguintes categorias de
uma transformação do cenário educacio- percepção: (a) desafio de co-contruir o
nal, na promoção dos direitos humanos conhecimento: Esta pós-graduação trou-
e da igualdade. A articulação de projetos xe para mim novas perspectivas e abor-
interdisciplinares, fundamentados em dagens. Sempre gostei de trabalhar com
propostas curriculares atuais, possibilitou conceitos da psicologia. O novo desafio
aos educadores, em diferentes contextos que a prof … propos […] me deixou sem
de atuação, a construção de uma prática chão e me fez crescer como professional.
inclusiva extensiva a todos. Pretendemos (Aluna P); Aprendi muito como profissio-
discutir a percepção de profissionais, em nal e como pessoa a ver um mundo mais
geral, da área de psicologia do desenvol- bonito em que eu vivia passei a dar mais
vimento e da educação, sobre seu desen- valor às pequenas coisas. (Aluna AB); (b)

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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento

Aprendizagem colaborativa: Ouvir as su- o meu tempo de estudo (…) O curso, além
gestões do outro com possibilidades de de ensinar-me a ser independente quanto
intervenções foi riquíssimo também. (Alu- à busca de conhecimento, trouxe-me um
na VPC); Como aprendi com você (colega crescimento profissional muito rico e a
de curso)! Te acho de uma competência e qualidade de atendimento oferecido aos
uma dedicação tamanha. Sempre fiz ques- alunos só tende a melhorar (Aluna GS);
tão de ler tudo que você escrevia e sempre Aprendi muito, cresci muito com esse cur-
me deu base para a reflexão. Espero que so, tive oportunidades de vencer algumas
possamos estender essa amizade de cole- barreiras e derrubar alguns mitos, princi-
gas de curso em uma amizade mais sóli- palmente em relação o que muitos dizem
da. (Aluna JD); … Curso para todos nós é que estudar a distancia é muito fácil, e
apenas o marco inicial para pensarmos e pude perceber que não é tão fácil assim,
repensarmos a educação inclusiva, agora mais é enriquecedor, pois depende do es-
estamos engatinhando com a inquietude tudante querer e de um bom tutor e isso
de querer andar, voar e poder fazer muito nós tivemos, boa tutora e bons orientado-
mais e contribuir com uma educação de res. (…) fiquei surpresa comigo mesma no
qualidade para todos. O curso nos pro- final do curso! e continuo dizendo para-
porcionou momentos de estudo, reflexão béns a vocês e a todos nós que consegui-
e mudança de pré-conceitos e conceitos mos com toda a dificuldade chegarmos a
sobre educação em nosso país. Com cer- conclusão deste curso. (Aluna M.L). Dian-
teza a partir do curso somos educadores te desses depoimentos podemos concluir
diferentes e preocupados com educação que o curso de pós-graduação em estudo,
inclusive; Encerramento dá sensação de que versou sobre desenvolvimento hu-
despedida, mas, acredito que hoje nos mano, educação e inclusão escolar, e foi
tornamos uma rede de apoio. (Aluna MS); realizado pela modalidade a distância por
(c) Aprender a Aprender em EAD: Conhe- meio digital, contribuiu significativamen-
cer um pouco mais sobre as deficiências te para o aprendizado e desenvolvimento
e as possibilidades de trabalho, bem pessoal/professional dos educadores que
como as leis que muito podem contribuir nele se especializaram atingindo, inclusi-
para a garantia de Direitos foi muito im- ve, outros contextos de seu desenvolvi-
portante para mim neste módulo. Dessa mento, como a escola e a família.
forma, considero que o que mais “ fica”
apreendido é que muito ainda precisamos Palavras-chave: Formação Docente;
buscar de informações, mas

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