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então, à posição adotada por Husserl, o mestre de Heidegger, que não tinha
ainda chegado ao ponto de ultrapassar a noção de consciência subjetiva
existente primordialmente em si, e penetrado no sentido do fenômeno do
"mundo" heideggeriano, Binswanger deu mesmo um outro nome à nova
orientação de sua pesquisa, intitulando-a de "fenomenologia antropológica".
Estimulado pelos trabalhos de Binswanger e descontente também, com a
obscuridade dos fundamentos sobre os quais se apoiava a psiquiatria
tradicional, o psiquiatra e o psicoterapeuta Medard Boss voltou-se também para
o pensamento de Martin Heidegger. Certamente, existia, desde o início, uma
diferença importante entre suas motivações. Enquanto Binswanger foi antes de
tudo, levado a penetrar no pensamento desse filósofo por um "impulso
puramente científico" e não, como Freud, por um interesse de ordem terapêutica
foram, sobretudo preocupações terapêuticas que determinaram a escolha de
Boss. Esperava em primeiro lugar, que as recentes considerações filosóficas de
Heidegger lhe fossem úteis no domínio da terapêutica.
sua essência o homem tem não somente a possibilidade de escolher ele mesmo
que tipo de relação quer estabelecer com os diferentes entes que se
apresentam a ele em meio a multiplicidade de dados do mundo, mas também
porque lhe é necessário a todo momento tomar pessoalmente tais decisões, o
ser humano e só ele deve ser qualificado de ser si mesmo. Esta possibilidade
de existir no modo de ser si mesmo, não somente não exclui, mas na realidade
inclui que todo homem se encontra primordialmente e sempre, co-existindo com
outras pessoas. Nunca o homem se encontrou primordialmente como um sujeito
individual, subsistindo apenas para si mesmo, sozinho, e que apenas mais tarde
teria sido levado a entrar em contato com outras pessoas. Os homens estão
primordialmente e sempre co-existindo perto das mesmas coisas de um mesmo
mundo; contribuem sempre primariamente em comum, embora cada um a seu
modo, para manter aberto este mundo "descoberto". É isto que constitui o
caráter fundamental de ser com o outro primordial e é sobre isto que se fundam
os modos mais diversos de desdobramento do ser com o outro e notadamente a
possibilidade de uma ciência como a sociologia. Assim, o existir humano
também se apresenta primordialmente e sempre como ser em relação seja com
alguma coisa que o toca de perto, seja com outra que o toca de longe e o deixa
indiferente. Esse modo de ser primordial e sempre situado numa relação de
proximidade ou de afastamento face a face com o que se apresenta no mundo,
caracteriza a natureza original do homem. E, ao mesmo tempo, o existir humano
vive o tempo que lhe é dado situando se de alguma maneira em relação ao que
aparece, e correspondendo-lhe seja no modo da percepção do pensamento ou
da ação. É assim que ele vive no tempo, ou dito de outra forma, que o existir
tem um fim e se completa ao término da vida terrena. Podemos dizer que o
homem tem uma boa morte quando ele soube aceitar o destino de seu ser
primordial e foi capaz de dispor, de modo adequado, de sua qualidade de
abertura iluminante na qual tudo o que "há para ser" pode aparecer. Por outro
lado, que tem uma morte má se não foi capaz de aceitar o destino de seu ser
primordial. É contudo precisamente quando o homem morre que fica
evidenciado algo também característico do ser humano. De repente, aquilo que
justamente constituía a corporeidade do homem vivo mudou de característica de
ser e tornou se um corpo inanimado, no espaço físico mensurável. Por muito
tempo, foi freqüente a medicina querer compreender a homem sadio ou doente
a partir da redução de seu existir a cadáver. Mas isto oferecia uma perspectiva
de pesquisa unicamente para o estudo de anatomia. Ora, enquanto um homem
ainda existe, sua corporeidade é de uma natureza completamente diferente e
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não pode ser comparada ao cadáver. Qualquer corpo vivo não pode portanto
ser compreendido, conforme sua natureza, a não ser que seja considerado
como a corporeidade da relação com aquilo que se desvela ao homem. Se, por
exemplo, um sapateiro coloca sola num sapato, sua mão direita não constitui
uma parte objetivada de seu corpo mas é primordialmente integrante do todo
relacional da tarefa em que ele está empenhado. Só se pode dizer de se corpo
que ele é, no existir humano, aquilo que pode ser percebido também pelos
sentidos e por isso mesmo medido e calculado até certo ponto como todo objeto
inanimado. Entretanto, a verdadeira essência da corporeidade escapa sempre e
imediatamente no momento exato em que se faz uso da possibilidade de vê-la
como qualquer objeto inanimado mensurável.
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Etimologicamente a palavra alemã Langweile, tédio, se descompõe
em Lang: comprido e Weile: o tempo, a duração.
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estranho e imposto de fora. É por isso que tão freqüentemente têm a impressão
de que o que a eles se oferece é ditado por vozes exteriores e que tudo o que
fazem e pensam é feito e pensado por outra pessoa. Ainda mais do que nos
esquizofrênicos, parece haver uma perturbação da liberdade existencial nos
neuróticos obsessivos. De fato, o que existe de mais oposto à liberdade do que
a obsessão? Na realidade entretanto, a obsessão nunca é o contrário da
liberdade, ainda que muito deficiente. Também só podemos falar de obsessão
em relação aos seres que são, por natureza, dotados de liberdade. Uma pedra
por exemplo, que é uma coisa desprovida de liberdade e de abertura, não
poderá nunca apresentar um comportamento obsessivo mesmo que, conforme
as leis da natureza, caia sempre igualmente de cima para baixo. As
manifestações patológicas da neurose obsessiva e o caráter obsessivo fazem
parte de um comportamento de defesa semelhante à atitude de afastamento, já
mencionada a propósito dos esquizóides e dos autistas. Nos neuróticos
obsessivos igualmente, a liberdade e a abertura do existir são atingidos: essas
pessoas de fato só podem ocupar-se com as coisas em relações distante que
consistem em reflexões controladas e objetivas sobre aquilo que percebem.
Essa distância controlada é sobretudo marcante em relação às coisas que lhes
aparecem como sujas, em decomposição ou patogênicas. Os neuróticos
obsessivos são forçados a se manter rigorosamente à distância dessas coisas e
delas se proteger porque seu próprio ser si mesmo está ameaçado soçobrar
naquilo que eles julgam indigno do homem. Entretanto, nos neuróticos
obsessivos, a realização do ser aberto e do ser livre nunca é atingida da mesma
maneira que nos esquizofrênicos. Os neuróticos obsessivos jamais são
completamente absorvidos pelo percebido e não se perdem, enquanto ser
humano, quase que totalmente nele.
A TAREFA DO ACONSELHAMENTO E
ORIENTAÇÃO A PARTIR DA DASEINSANALYSE
SPANOUDIS, Solon (1997) “A tarefa do aconselhamento e orientação a partir
da daseinsanalyse.” Revista da Associação Brasileira de Daseinsanalyse, nos.
1,2 e 4.
A Daseinsanalyse é um novo método de entendimento do existir humano,
desenvolvido por Medard Boss. Quando dizemos método queremos nos referir
ao significado original desta palavra, encontrado no antigo grego. Método vem
de META ODÓS. META quer dizer APÓS E ÒDÓS significa CAMINHO. A
expressão após o caminho não se refere a estar além, fora de nosso mundo. Ao
contrário, ela significa continuar um caminho que nos conduz a ver o nosso
existir simplesmente como ele se mostra. A Daseinsanalyse também não é uma
nova teoria, se entendemos TEORIA como um conjunto de hipóteses e
suposições para confirmar modelos pré estabelecidos e baseados numa
explicação causal e determinista. Este é o sentido, por exemplo, da teoria
freudiana. A Metapsicologia, proposta por Freud, é o equipamento teórico da
psicanálise, isto é, a base para as afirmações causais psicanalíticas. Foi o
próprio Freud, em seu trabalho "O Inconsciente", que disse ser o inconsciente
uma noção fictícia para servir para a construção causalista e determinista da
psicanálise independente dos fenômenos tais como se mostram. Estes
fenômenos que muito freqüentemente são distorcidos e sacrificados para
satisfazer a construção teórica causalista. Por outro lado, se considerarmos o
conceito original do grego antigo onde THEORIA quer dizer plenitude de
desvelamento, podemos então dizer que a Daseinsanalyse é uma teoria.
Partindo dessa noção do grego antigo de THEORIA, não podemos avaliar a
Daseinsanalyse comparando-a aos sistemas e conceitos científíco-tecnológícos
que partem de afirmações pré estabelecidas. Também será inútil querer
entender a Daseinsanalyse como uma nova teoria psicológica que serve para
completar as já existentes, a partir de um ecletismo que constrói um mosaico
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