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25/06/2018 Solidariedade - À Luz do Espiritismo

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Solidariedade
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O que caracteriza a solidariedade? Somos pessoas solidárias? Qual a


contribuição do espiritismo para o desenvolvimento do sentimento solidário? A
solidariedade nos proporciona vantagens?

Solidariedade é o “sentimento de simpatia, ternura ou piedade pelos pobres, pelos


desprotegidos, pelos que sofrem, pelos injustiçados etc.” [1]. Ela é, assim, essa
disposição favorável para com aquela pessoa, ou grupo de pessoas, que está
passando por algum tipo de necessidade ou de dificuldade.

Mas ela não é somente sentimento. A solidariedade se define, sobretudo, pela


ação. Por isso ela é também a “manifestação desse sentimento, com o intuito de
confortar, consolar, oferecer ajuda etc.” [1], caracterizando-se pela “cooperação ou
assistência moral que se manifesta ou testemunha a alguém, em quaisquer
circunstâncias (boas ou más).” [1]

Entretanto, em nossa sociedade, o que está prevalecendo é justamente o oposto


da solidariedade. E o que seria? O individualismo, ou, conforme um ditado
popular: “cada um por si e Deus por todos”. E isso está ocorrendo porque nós
ainda não sabemos pensar e agir coletivamente. Valorizamos muito mais os
próprios interesses, numa clara manifestação de exclusivismo. Quantas não são
as vezes em que, diante de problemas comuns, cada um pensa e age
isoladamente, sem cogitar a hipótese de uma ação conjunta, de um esforço
solidário?

Contudo, nessa lei do “cada um por si”, deixamos de perceber que, ao buscarmos
o bem comum, todos são indistintamente beneficiados.

Quando, enfim, compreendermos que, isoladamente, não conseguimos


verdadeiramente vencer, que juntos somos melhores e muito mais sábios do que
cada um sozinho, teremos, finalmente, aprendido que a solidariedade beneficia
tanto aquele que a pratica como aquele que a recebe.

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Na questão 799, de O Livro dos Espíitos, Allan Kardec pergunta:


“De que maneira o Espiritismo pode contribuir para o progresso?”

Resposta:
“Destruindo o materialismo, que é uma das chagas da sociedade, ele faz os
homens compreenderem onde está o seu verdadeiro interesse. (...) Destruindo os
preconceitos de seitas, de castas e de cor, ele ensina aos homens a grande
solidariedade que deve uni-los como irmãos. [2]

Será somente através desse interesse pelo bem estar geral, que conseguiremos,
como sociedade, estabelecer uma nova ordem de convivência social, em que as
necessidades naturais de todo ser humano – alimentação, moradia, lazer, família,
conhecimento... – serão direitos garantidos a todos que aqui renascerem.

O francês Léon Denis (1846-1927) – um dos principais continuadores do


espiritismo após a morte de Allan Kardec –, argumenta que o Espiritismo, através
da lei da reencarnação:

(...) ensina-nos que os homens são solidários uns com os outros, unidos
por uma sorte (destino) comum. As imperfeições sociais, de que todos
mais ou menos sofremos, são os resultados de nossos erros coletivos no
passado. Cada um de nós traz a sua parte de responsabilidade e tem o
dever de trabalhar para o melhoramento do destino geral. [3]
A doutrina das reencarnações aproxima os homens mais do que
qualquer outra crença, ensinando-lhes a comunidade de origens e ns,
mostrando-lhes a solidariedade que os liga a todos no passado, no
presente, no futuro. Diz-lhes que não há, entre eles, deserdados nem
favorecidos, que cada um é lho de suas obras, senhor de seu destino.
Nossos sofrimentos, ocultos ou aparentes, são consequências do
passado ou também a escola austera onde se aprendem as altas
virtudes e os grandes deveres. [4]

A crença na reencarnação nos desestimula, veementemente, a cuidar de nossos


exclusivos interesses. Ao nos conscientizarmos de tal realidade, sentimo-nos
imbuídos pelo trabalho de aprimoramento de nossos deveres para com todas as
criaturas – incluindo, também, a natureza e os animais –, porque passamos a
compreender que a construção de uma saudável interdependência entre todos
necessita de um alicerce fortemente estruturado na igualdade, na fraternidade e
na solidariedade.

****

A solidariedade – esse sentimento, portanto, de identificação (de reconhecimento)


das dificuldades/necessidades alheias e consequente boa vontade para a
cooperação – nos habilita a sairmos de nós mesmos e a nos colocarmos no lugar

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do outro. E, ao deixarmos de lado nossos egoísticos desejos, é-nos possível até,


em determinadas circunstâncias, abrir mão de alguma satisfação nossa em
benefício do bem estar alheio.

Para ilustrar a maneira como ocorre essa dinâmica da solidariedade – beneficiar


tanto aquele que faz como aquele que recebe –, temos o seguinte conto, inspirado
no escritor russo Léon Tolstoi:

Depois de castigar os campos da Rússia por meses ininterruptos em


1860, o inverno parecia nalmente dar sinais de enfraquecimento.Vendo
que a neve se mantinha estável ao longo de sua imensa propriedade, o
senhor mandou chamar dois de seus melhores camponeses e lhes deu a
incumbência de viajar a uma aldeia distante para tratar de um contrato
de extrema importância para o futuro de seus negócios.
Pushkin e Martuin foram os encarregados. Acordaram cedo numa fria e
escura manhã, atrelaram um robusto cavalo ao trenó e seguiram. A
viagem deveria durar sete ou oito horas.
Antes do meio-dia, no entanto, começou a nevar. Logo a nevasca tornou
pior a visibilidade e di cultou ainda mais o trote do animal. Hábeis e
experimentados, Pushkin e Martuin mesmo assim faziam o trenó
prosseguir. Mas, um dos patins do carro caiu numa vala e foi impossível
tirá-lo dali. Eles tiveram de livrar o cavalo e retomar a caminho a pé.
O frio era cortante. Envolvidos em seus pesados casacos e afundando na
neve que atingia seus joelhos, os camponeses caminhavam sem ver
casa ou aldeia em que pudessem pedir abrigo. As horas passavam e a
situação não se alterava.
(...) Estavam nessa situação terrível quando avistaram dois corpos
jogados na neve. Aproximaram-se e viram uma mulher ao lado de uma
criança de dois ou três anos. A mãe falecera. Mas o menino ainda
respirava, com extrema di culdade. Martuin apanhou-o e o trouxe aos
braços.
- Que você está fazendo? Ficou louco? – perguntou-lhe Pushkin
- Ele ainda está vivo.
- Sim, e daí? Como é que você vai levar a criança, se não aguenta o peso
do próprio corpo?
- Eu pensei que poderíamos fazer um revezamento...
- Comigo? Já estou tendo trabalho demais para salvar minha vida!
E dizendo isso, Pushkin se afastou e sumiu atrás de um monte de neve.
Martuin acomodou o pequeno em seu colo. Para esquentá-‑lo, colocou-o
em contato direto com sua pele e o cobriu com suas roupas. E agora,
duplamente trôpego em função do novo peso que agregava ao seu,
seguiu adiante.
A tarde passou lentamente e a neve não deu tréguas. O frio começava a
adormecer os membros de Martuin e a convencê-lo a parar de andar. A
ideia de que precisava salvar aquela vida em seu regaço, no entanto, o

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fazia prosseguir. 
Assim foi que à noite, extenuado, enregelado e faminto, chegou a uma
pequena aldeia. Foi recebido magni camente pelos aldeãos, que
tomaram todas as medidas necessárias à acomodação e à restauração
da saúde dele e da criança.
Ali cou vários dias. Quando as condições do tempo permitiram, um
médico veio à aldeia.
Todos estavam maravilhados de que Martuin tivesse sobrevivido àquela
terrível tempestade e pediam para ele contar inúmeras vezes sua
aventura na neve. Achavam um verdadeiro milagre que estivesse vido
depois de uma nevasca que vitimara centenas de pessoas em toda a
região, segundo dados do governo.
Após ouvir o que seu cliente narrara, o doutor concluiu:
- A sorte do Martuin foi ter achado o menino. Ao colocá-lo de encontro
ao peito, dava calor para ele, mas também recebia. Os dois mantinham-
se alimentados por essa fonte interna de calor. E foi por isso que
resistiram ao frio.
E na lista das vítimas do inverno daquele ano, constava o nome de
Pushkin. Seu corpo fora encontrado a poucos metros do lugar onde
Martuin resgatou a criança. [5]

Esse conto enfaticamente nos demonstra as vantagens da solidariedade: o


amparo recíproco, a troca de benefícios, a criação de genuínos laços de amizade,
o intensificar das qualidades humanas, o desenvolvimento do amor.

Quanto mais saímos de nós mesmos, mais vencemos o próprio egoísmo, e mais
satisfação e alegria podemos encontrar em ajudar, em compartilhar. Maiores
passam a ser também nossas possibilidades de trabalhar pelo próprio bem-estar.

Assim, imprescindível é que nos conscientizemos de que nosso íntimo se ilumina


a cada pensamento de benevolência, a cada ímpeto de solidariedade. E se esses
gestos de interesse se repetirem e se multiplicarem, mais cresceremos, mais
evoluiremos.

O psicólogo e escritor espírita Adenáuer Novaes nos oferece o seguinte incentivo,


defendendo que:

A felicidade conquistada por alguém pode ser compartilhada, de tal


forma, que ela venha a contagiar outras pessoas. É necessário que
pensemos na formação de redes de ajuda mútua, que se estruturam a
partir do tempo livre de cada um. É necessário que não entreguemos a
melhoria da sociedade aos outros ou mesmo às instituições para isso
criadas. Elas farão o papel delas, mas não irão além daquilo a que se

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propuseram como organizações o ciais. A criatividade de cada ser


humano sempre será a grande alavanca para seu próprio
desenvolvimento social e espiritual.
(...) É preciso lembrar que, quanto mais nos empenharmos em favor da
sociedade, mais estaremos fazendo por nós mesmos. O trabalho em
favor do social deve ser levado a efeito, ao mesmo tempo em que o
realizamos por nossa melhoria pessoal.
Forme redes de ajuda. Organize grupos de apoio a causas humanitárias.
Engaje-se em trabalhos organizados por instituições conhecidamente
sem ns lucrativos. Ocupe parte de seu tempo com atividades nas quais
seu benefício seja a felicidade alheia. Faça a sua parte, independente de
quem seja o responsável pelo todo.
Seja feliz enquanto proporciona a felicidade alheia. Faça-o por si mesmo
e não para alívio de sua culpa. Sua culpa é uma questão interna e o
trabalho em favor do próximo é algo externo. O sentimento de utilidade
gerado no serviço à sociedade pode conectá-lo ao que há de melhor em
si mesmo, fortalecendo-o para os momentos em que se defrontar com as
di culdades internas. Dessa forma, somos recompensados pelo bem que
fazemos aos outros. [6]

O indivíduo que se envolve com o trabalho voluntário é aquele que, em razão de


seu impulso solidário, presta serviços não remunerados em benefício de uma
causa ou de uma comunidade, doando seu tempo, conhecimentos e disposição,
para atender tanto às necessidades do próximo quanto às próprias motivações
pessoais, sejam estas de caráter religioso, cultural, filosófico ou emocional.
Atualmente, ser voluntário significa ser uma criatura engajada, participante e
consciente da importância de sua contribuição para a construção de uma
sociedade mais equilibrada.

****

Podemos afirmar que Jesus foi um indivíduo que viveu, sobretudo, para confortar
a dor alheia. Principalmente em uma época em que as dificuldades eram tão
grandes e as diferenças entre as classes sociais tão intensas, sua atitude foi a de
alguém que sempre buscou agregar todos no Todo. E sua mensagem, até hoje,
nos concita à comunhão e à consolação.

Quando ensinou que “quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que
vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo; tal como o
Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir” (Mt 20: 26-28),
enfaticamente nos conclamou à prática da ajuda mútua e da assistência recíproca,
numa época em que a solidariedade e o trabalho eram tão pouco valorizados.

Quando recomendou “ameis uns aos outros, assim como eu vos amei” (Jo 15:12),
proclamou que a boa vontade desinteressada é o único caminho para o
desenvolvimento da confiança e do entendimento recíproco, requisitos essenciais
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à conquista de uma harmoniosa convivência social.

CONVITE À SOLIDARIEDADE

“Trata-o, e quanto gastares de mais, na volta eu te pagarei.”


(Lc 15:35)

São muitos os necessitados que des lam a ições, aguardando


entendimento e socorro.
 
Uns estão assinalados rudemente por deformidades visíveis que
constituem a cruel recidiva de que precisam para aprender conduta e dever.
 
Outros se encontram sitiados por limitações coercitivas que funcionam
como presídio correcional, a m de os habilitarem para futura convivência
social.
 
Alguns se apresentam com di culdades no raciocínio e na lucidez, embora
a aparência harmoniosa, como se fossem estetas da forma emparedando
misérias mentais que os ensinam a valorizar oportunidade e bênção.
 
Diversos conduzem feridas expostas, abertas em chagas purulentas, com
que drenam antigas mazelas e corrigem paixões impressas nos painéis do
perispírito, submetido à terapêutica renovadora...
 
Vários estão estigmatizados a ferro e fogo, padecendo dores morais quase
superlativas, em regime de economia de felicidade, exercitando as
experiências da esperança.
 
Um sem número de atados à fome e à discriminação racial, sob acicates
poderosos, estão treinando humildade para o futuro.
Todos aguardando piedade, ensejo para conjugarem os verbos servir e amar.
 
Há outros, porém, esperando solidariedade.
 
São os construtores do ideal edi cante, os servidores desinteressados, os
promotores da alegria pura, os trabalhadores da fraternidade, os
governantes honestos, os capitães da indústria forjados no aço da honradez,
os pais laboriosos, os mestres e educadores éis ao programa do bem...
 
Sim, não apenas os que pagam o pretérito culposo, mas, sobretudo, os
que estão levantando o Mundo Novo dos escombros que jazem no chão
daHumanidade. Nobre e fácil chorar a dor ao lado de quem sofre.

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Felizes, também, os que podem oferecer-se, solidários, aos que servem e


amam ao Senhor, não obstante os diversos nomes e caminhos pelos quais
se desvelam, operários da Era Melhor do amanhã ditoso.
 
Solidariedade, também, para com os que obram no bem.

Silvia Helena Visnadi Pessenda


sivipessenda@uol.com.br (mailto:sivipessenda@uol.com.br)

REFERÊNCIAS

[1] HOUAISS: dicionário. Solidariedade. Disponível em: www.uol.com.br


(http://www.uol.com.br/). Acesso em: 18.09.2010.

[2] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Salvador Gentile, revisão
de Elias Barbosa. 100. ed. Araras, SP: IDE, 1996.

[3] DENIS, Léon. O problema do Ser, do Destino e da Dor. 18. ed. Rio de Janeiro:
Federação Espírita Brasileira. Cap. XVI: As vidas sucessivas. Objeções e críticas.

[4] idem. Cap. XVIII: Justiça e responsabilidade. O problema do mal.

[5] LEAL, Marconi. O amor é uma via de duas mãos. Revista Internacional de
Espiritismo. Matão: Casa Editora O Clarim. Ano LXXVII, nº 10, Novembro/2002.

[6] NOVAES, Adenáuer M. F. de. Felicidade sem culpa. 2. ed. Salvador: Fundação
Lar Harmonia. 2002. Cap: Felicidade em rede.

[7] ÂNGELIS, Joanna de (espírito); FRANCO, Divaldo Pereira (psicografado por).


Convites da vida. Salvador, BA: Livr. Espírita Alvorada. Cap. 55.

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