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6 l O GLOBO l País l Domingo 1 .7.

2018

Grupo Globo divulga diretrizes sobre


comportamento de jornalistas nas redes sociais
João Roberto Marinho explica em carta que as recomendações
visam a reforçar o princípio da isenção jornalística

Caros companheiras e companheiros, como fazer livremente escolhas, uma atividade que devem levar isso em conta em suas atividades públi-
nós, sem modéstia, consideramos absolutamente cas, evitando tudo aquilo que possa comprometer a
Ninguém discordará de que o advento das redes so- nobre. O ônus é justamente aquele que nos impo- percepção de que exercem a profissão com isenção e
ciais é um dos fenômenos que definem o século XXI. mos para poder fazer um bom jornalismo: em resu- correção.”
De uma maneira inédita na história da humanidade, mo, tentar ao máximo nos despir de tudo aquilo Desde então, porém, o uso de redes sociais se uni-
elas conectaram pessoas em nível planetário, permi- que possa pôr em dúvida a nossa isenção. versalizou de tal forma que é necessário detalhar me-
tindo a formação de comunidades, o compartilha- Sei que não é preciso, mas dou aqui um ou dois lhor como nós jornalistas devemos utilizá-las de mo-
mento de ideias, fatos e opiniões, a aproximação de exemplos. Todos os jornalistas que cobrem econo- do a não ferir, de maneira alguma, aquele que é um
pessoas que frequentemente nem se conhecem. É al- mia (e aqueles que compõem a chefia da redação), pilar da nossa profissão: a isenção. É por essa razão
go extremamente positivo e bem-vindo. por exemplo, se privam da liberdade de aplicar em que estamos acrescentando uma seção aos nossos
Como tudo, porém, logo descobrimos que elas papéis de empresas específicas para que jamais le- Princípios Editoriais sobre o uso das redes sociais.
têm também um lado sombrio: podem ser usadas vantem a suspeita no público de que determinada Essas recomendações sobre como devemos nos
para manipular grupos, disseminar boatos e menti- notícia sobre esta ou aquela empresa tem por trás comportar nas redes não têm nada de idiossincrático
ras com fins antidemocráticos e permitir que a inti- um interesse pessoal. Um jornalista de cultura que ou exclusivo. Na verdade, estão rigorosamente em li-
midade das pessoas seja clandestinamente conhe- seja parente de algum artista se considerará impe- nha com o que praticam os mais prestigiados veículos
cida. Com a consciência desses defeitos, porém, dido de cobrir as atividades dele. Nós conhecemos jornalísticos do mundo, como The New York Times e
seus usuários se tornam cada vez mais capazes de bem as nossas restrições, aliás descritas em nossos BBC, para citar apenas dois de dezenas de exemplos.
produzir anticorpos para esses males. Na balança princípios editoriais que o Grupo Globo publicou É fundamental que todos leiamos com atenção es-
entre o bem e o mal, nós acreditamos que o lado em 6 de agosto de 2011. E nada disso nos perturba sas diretrizes e as sigamos com o rigor que nos carac-
bom das redes sociais supera o lado mau, embora ou incomoda porque temos a consciência de que o teriza em nossas atividades profissionais.
seja necessário ainda muito estudo e atenção para propósito é permitir que façamos um bom jornalis- Dito isso, a Seção II de nossos Princípios Editoriais
combater os malefícios. Somos, enfim, entusiastas mo e que sejamos reconhecidos por isso. terá um novo item, de número 5, apresentado ao fim
do potencial positivo das redes sociais. As redes sociais nos impõem também algumas res- desta carta.
Nós, jornalistas, como todos os cidadãos, pode- trições. Diferentemente das outras pessoas, sabemos Tenho absoluta convicção de que todos nós enten-
mos fazer parte delas seja do ponto de vista pessoal que não podemos atuar nelas desconsiderando o fato deremos as razões dessas diretrizes mais detalhadas e
ou profissional. Podemos compartilhar im- de que somos jornalistas e de que precisamos agir de as seguiremos. Agradeço pela atenção e disponibilizo
pressões, sentimentos, fatos do nosso dia a dia, as- tal modo que nossa isenção não seja questionada. Já a seguir o texto que será acrescentado, a partir de ho-
sim como utilizá-las para fazer fontes, garimpar no- no lançamento dos princípios editoriais, previmos is- je, aos nossos Princípios Editoriais.
tícias, descobrir tendências. Não é novidade para so quando estabelecemos o seguinte: “A participação
nenhum de nós, no entanto, que o jornalismo traz de jornalistas do Grupo Globo em plataformas da in- Rio de Janeiro, dia 1 de julho de 2018
bônus e ônus. ternet como blogs pessoais, redes sociais e sites cola-
O bônus é o prazer de exercer uma atividade fas- borativos deve levar em conta três pressupostos: (...)
cinante cujo objetivo último é informar o público, 3- os jornalistas são em grande medida responsáveis JOÃO ROBERTO MARINHO
para que possa escolher melhor como quer viver, pela imagem dos veículos para os quais trabalham e Presidente do Conselho Editorial do Grupo Globo

AS NOVAS DIRETRIZES
Seção II: fesa de ideias ou projetos for fundamental para a cober- zarem as redes sociais como valioso instrumento pa-
Como o jornalista deve proceder diante das fontes, do tura jornalística, é permitido que o jornalista siga as su- ra se aproximar de seu público, ampliá-lo, reforçar a
público, dos colegas, do veículo para o qual trabalha e as páginas ou contas (mas não se deve curtir os seus imagem de credibilidade de que já desfrutam, divul-
das redes sociais posts). Quando for assim, o jornalista deve seguir todos gar os seus conteúdos, encontrar notícias, fazer fon-
os candidatos a um cargo majoritário e, nos outros ca- tes. Nessa atividade, devem, porém, observar as re-
(...) sos, partidos e movimentos que defendam ideias opos- gras até aqui descritas. E outras deste código;
tas ou essencialmente diferentes, para que fique claro
5) Diante das redes sociais: ao público que a iniciativa de os seguir não se deve a l Os jornalistas do Grupo Globo devem sempre priori-
preferências pessoais. Da mesma forma, esses jornalis- zar os seus veículos na divulgação de notícias, ou seja:
l O Grupo Globo considera que toda rede social é po- tas devem avaliar se sua imagem de isenção estará sen- noticiar os fatos sempre em primeira mão nos veículos
tencialmente pública. Mesmo que alguém permita o do comprometida ao compartilhar material de tercei- para os quais trabalham. Somente então, poderão dis-
acesso ao que nela diz ou publica a apenas um grupo ros. Agir de modo diferente compromete de forma irre- ponibilizar as notícias nas redes sociais, mas seguindo
de pessoas, há uma alta possibilidade de que tal con- mediável a isenção do jornalista e mancha a reputação regras: as notícias devem ser brevemente resumidas e
teúdo se torne público. E, quando essa pessoa é um do veículo para o qual trabalha, com a consequência já acompanhadas de um link que permita ao leitor ler a
jornalista, a sua atividade pública acaba relacionada mencionada; sua íntegra no veículo que a publicou. Quando a notícia
ao veículo para o qual trabalha. Se tal atividade man- não dispuser de um link específico, é obrigatória a pu-
char a sua reputação de isenção manchará também a l Como em todos os veículos de imprensa, há no Grupo blicação de um link do veículo para o qual trabalha,
reputação do veículo. Isso não é admissível, uma vez Globo jornalistas cuja função é analisar fatos e contro- com a especificação da editoria, para que o leitor possa
que a isenção é o principal pilar do jornalismo. Perder vérsias e opinar sobre eles. Por óbvio, tais jornalistas buscar mais detalhes. Devem agir de forma igual os co-
a reputação de que é isento inabilita o jornalista que não ferem o princípio da isenção. Primeiramente, por- mentaristas, analistas e colunistas de opinião em rela-
se dedica a reportagens a desempenhar o seu traba- que agem com transparência, deixando explícito que ção ao que produzirem para os veículos para os quais
lho. Isso se aplica a todas as redes – Twitter, Insta- não fazem uma reportagem objetiva sobre os fatos, mas trabalham;
gram, Facebook, WhatsApp ou qualquer outra que a partir deles os analisam e opinam sobre eles (ver Se-
exista ou venha a existir; ção I, item 1, letra t). É uma atividade jornalística diversa l A publicação de reportagens certamente vai gerar
da reportagem, mas que atende também a uma deman- comentários dos leitores. O jornalista do Grupo Glo-
l Em alguns casos, a perda da reputação de isenção é da do público: ter acesso a opiniões e análises sobre fa- bo deve tratar todos com respeito. Pode esclarecer
evidente de imediato. Em outros, é preciso uma análise tos e controvérsias para que possa formar a sua própria dúvidas e comentar críticas. Se estas forem ofensivas,
criteriosa. Essa avaliação deve ser feita pelas chefias opinião. Tais jornalistas, normalmente chamados de talvez seja melhor simplesmente não responder. Se se
imediatas e compartilhada com a direção de redação, comentaristas, analistas ou colunistas de opinião, de- sentir vítima de abuso, é legítimo que o jornalista do
que decidirá quando é o caso de encaminhar a questão vem ter uma atuação na rede social que não permita a Grupo Globo bloqueie os ofensores. Mas é preciso
ao Conselho Editorial do Grupo Globo; percepção de que são militantes de causas e que fazem critério: não confundir críticas contundentes, mas le-
parte da luta político-partidária ou de ideias. A eles, co- gítimas, com ofensas e abusos;
l É evidente que, em aplicativos de mensagens, como mo a todos, é vedado apoiar candidatos ou partidos,
WhatsApp e outros, em que há mais controle sobre o dentro e fora de eleições; l O jornalista do Grupo Globo, sem exceção, não pode,
acesso, todos têm o inalienável direito de discutir o por óbvio, criticar colegas de suas redações ou de reda-
que bem entender com grupos de parentes e amigos l Colaboradores, em seções de análise e opinião, que ções de competidores nas redes sociais. O crítico acaba
de confiança. Mas é preciso que o jornalista tenha em não sejam jornalistas, mas profissionais de outras sempre por se diminuir diante do público. Da mesma
mente que, mesmo em tais grupos, o vazamento de áreas de atuação, devem julgar como atuar nas redes forma, chefias não devem usar as redes sociais para elo-
mensagens pode ser danoso à sua imagem de isenção sociais, conscientes de que a sua reputação, funda- giar os próprios veículos ou criticar concorrentes. Elogi-
e à do veículo para o qual trabalha. E que tal vaza- mental para sua condição de colaborador, é afetada os e críticas podem ser interpretados como arrogância,
mento o submeterá a todas as consequências que a por essa atuação. Não é permitido declarar voto ou fa- algo que deve sempre ser evitado. Nesses dois casos,
perda da reputação de que é isento acarreta. Assim, zer propaganda para candidatos ou partidos no mate- com propósitos construtivos, devem ser sempre priori-
compartilhar mensagens que revelem posiciona- rial produzido especificamente para os veículos para zados os canais internos;
mentos políticos, partidários ou ideológicos, mesmo os quais trabalham;
em tais grupos, exige a confiança absoluta em seus l Essas regras são válidas para todos os jornalistas do
participantes – confiança que só pode ser avaliada l Por razões correlatas, é imprescindível que o jorna- Grupo Globo e devem ser rigorosamente observadas.
pelo jornalista; lista do Grupo Globo evite a percepção de que faz pu- As chefias diretas ficam com a incumbência de imple-
blicidade, mesmo que indiretamente, ao citar ou se mentá-las, torná-las uma realidade e, em caso de fal-
l Em sua atuação nas redes sociais, o jornalista deve associar a nome de hotéis, marcas, empresas, restau- tas por parte de jornalistas, dividir os episódios com a
evitar tudo o que comprometa a percepção de que o rantes, produtos, companhias aéreas etc. Isso tam- direção de redação do veículo, que decidirá então se é
Grupo Globo é isento. Por esse motivo, nas redes soci- bém não deve acontecer em contas de terceiros, e o o caso de levá-los à apreciação do Conselho Editorial
ais, esses jornalistas devem se abster de expressar opini- jornalista deve zelar para evitar tais ocorrências. Par- do Grupo Globo;
ões políticas, promover e apoiar partidos e candidatu- ticipantes de programas esportivos televisivos, radio-
ras, defender ideologias e tomar partido em questões fônicos ou transmitidos pela internet seguirão neste l O Grupo Globo tem a compreensão de que, muitas
controversas e polêmicas que estão sendo cobertas jor- quesito a política comercial de seus veículos. O jorna- vezes, o jornalista pode se sentir em dúvida sobre se
nalisticamente pelo Grupo Globo. Em síntese, esses jor- lista deve evitar criticar hotéis, marcas, empresas, res- um texto seu nas redes sociais resvala na tomada de
nalistas não devem nunca se pôr como parte do debate taurantes, produtos, companhias aéreas etc., mesmo posição, ferindo o princípio da isenção. A única solu-
político e ideológico, muito menos com o intuito de que tenha tido uma má experiência. O motivo é sim- ção é consultar a chefia.
contribuir para a vitória ou a derrota de uma tese, uma ples: a posição que ocupa nos veículos do Grupo Glo-
medida que divida opiniões, um objetivo em disputa. bo pode levar a que tenha um tratamento preferencial
Isso inclui endossar ou, na linguagem das redes sociais, no reparo de danos sofridos; VEJA NO SITE A ÍNTEGRA
“curtir” publicações ou eventos de terceiros que partici-
pem da luta político-partidária ou de ideias. Quando l Essas diretrizes em nada diminuem a importância
ATUALIZADA DOS PRINCÍPIOS
acompanhar a atividade nas redes sociais de candida- que o Grupo Globo vê nas redes sociais. O Grupo Glo- EDITORIAIS DO GRUPO GLOBO
tos, partidos, entidades ou movimentos em torno da de- bo estimula o seu jornalista e os seus veículos a utili- https://glo.bo/2tQALVU

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