Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Modo verbal
2.1
Modo e modalidade de um ponto de vista descritivo
2.1.1
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
Gramática tradicional
Entende-se por MODO [...] a propriedade que tem o verbo de indicar a atitude (de
certeza, de dúvida, de suposição, de mando, etc.) da pessoa que fala em relação ao
fato que enuncia; e, por TEMPO, a de localizar o processo verbal no momento de
sua ocorrência, referindo-o seja à pessoa que fala, seja a outro fato em causa.
(CUNHA & CINTRA, 1985, p.436).
Cunha & Cintra (op. cit.), então, arrolam os três modos verbais citados
acima. Segundo os autores, o modo indicativo é utilizado para exprimir uma ação
ou um estado que envolva realidade ou certeza, seja no presente, passado ou
futuro e tal modo é encontrado, em especial, em orações principais. No caso de
20
orações completivas, pode ser usado para completar o sentido de verbos, tais
como: afirmar, compreender, comprovar, crer (no sentido afirmativo), dizer,
pensar, ver, verificar.
O modo subjuntivo, em contrapartida, é usado com fatos incertos, duvidosos
ou irreais, podendo completar o sentido de verbos que veiculem idéias de ordem,
de proibição, de desejo, de vontade, de súplica, de condição e outras correlatas,
como as expressas pelos verbos: desejar, duvidar, implorar, lamentar, negar,
ordenar, pedir, proibir, querer, rogar e suplicar.
As duas sentenças abaixo, sintaticamente idênticas, exemplificam tais
observações. Na primeira, o indicativo completa o sentido do verbo dizer, uma
vez que Maria expressa sua opinião. Na segunda sentença, o subjuntivo está
ligado à idéia de uma ordem transmitida por Maria:
Quanto ao modo imperativo, Cunha & Cintra (op. cit.) pontuam que em
português há dois tipos de imperativo: um afirmativo e outro negativo. O
afirmativo conta com formas próprias apenas para as segundas pessoas: do
singular e do plural; as demais formas correspondem às do presente do subjuntivo.
No negativo, todas as formas correspondem às do presente do subjuntivo1. O
Quadro 1, a seguir, ilustra a questão com um verbo de primeira conjugação,
embora o mesmo se dê com as demais:
1
Esta particularidade será retomada na seção 2.3.
21
táxis4 e evidência5.
Estabelecidas as categorias verbais, esta é a definição de modo verbal,
segundo o autor:
Modo – Assinala a posição do falante com respeito à relação entre a ação verbal e
seu agente ou fim, isto é, o que o falante pensa dessa relação. O falante pode
considerar a ação como algo feito, como verossímil – como um fato incerto –,
como condicionada, como desejada pelo agente, como um ato que se exige do
agente, etc., e assim se originam os modos: indicativo, subjuntivo, condicional,
optativo, imperativo. (BECHARA, 2002, p. 213).
Para Bechara (op. cit.), então, os modos verbais são cinco. O indicativo é o
modo verbal utilizado, em geral, em orações independentes, bem como nas
dependentes que fazem referência a fatos verossímeis ou tidos como tais [canto,
cantei, cantava, cantarei]; o subjuntivo ou conjuntivo é o modo que se refere a
fatos incertos, duvidosos ou impossíveis de se realizar [talvez cante, se cantasse];
o imperativo expressa um ato que se exige do agente [cantai]; o condicional, fatos
2
Este é, aliás, um dos fatores de complexidade para a análise do chamado “complexo TAM”: um
único morfema pode veicular informações de tempo, aspecto e modo.
3
Estado: afirmativo, negativo, interrogativo e negativo-interrogativo.
4
Táxis: posição de um acontecimento em relação a outro sem se considerar o ato de fala; série de
ações simultâneas ou não: comer cantando; comer depois de ter cantado, etc.
5
Evidência: o falante se refere a uma informação indireta, isto é, ele experimenta um
acontecimento não vivido por ele mesmo: teria partido = eu não o asseguro, ouvi de outra pessoa;
serão duas horas (Ver nota 14, página 31).
22
2.1.2
Lingüística descritiva
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
caracteriza uma neutralização que vem ocorrendo há muito entre estes dois modos
verbais no PB6.
No mais, os três modos que Perini (op. cit.) cita são os essenciais, vistos
anteriormente: indicativo, subjuntivo e imperativo.
No Dicionário de lingüística e gramática, Camara Jr. (2002, p. 169) assim
descreve o modo verbal:
Modo – propriedade que tem a forma verbal de designar a nossa atitude psíquica
em face do fato que exprimimos: <<a função lógica da modalidade é exprimir a
reação do sujeito pensante à sua representação>> (Bally, 1950, 216).
6
Ver seção 2.3.
7
Ver seção 2.3.
24
respeito, Camara Jr. (2006) observa que no português, ao contrário das flexões
nominais, as flexões verbais impõem verdadeira complexidade, no que tange ao
seu estudo semântico, e complementa (p. 97): “É talvez onde melhor se evidencia
a incapacidade dos métodos da gramática tradicional para fazer justiça a uma
interpretação adequada do sistema gramatical português”. O autor diz que a
dificuldade na interpretação do morfema flexional no português reside no fato de
que o mesmo abriga informações de tempo, modo e aspecto ao mesmo tempo (ver
nota 2) e assim distingue tempo de modo: o primeiro diz respeito ao momento da
ocorrência do processo visto do momento da comunicação, enquanto o último se
refere ao julgamento implícito do falante a respeito da natureza, subjetiva ou não,
da comunicação que faz.
Em Estrutura da língua portuguesa, Camara Jr. (2006) menciona apenas os
três modos essenciais. No entanto, expandindo sua investigação, descreve dois
tipos de “assinalizações”: (1) tomada de posição subjetiva do falante em relação
ao processo verbal comunicado e (2) subordinação sintática.
O subjuntivo apresenta ambos os tipos de assinalizações, isto é, a tomada de
posição subjetiva do falante em relação ao processo verbal e uma subordinação
sintática ao advérbio talvez, preposto, ou a um verbo da oração principal. O
8
Cf. nota 6.
25
Mais duas considerações faz Camara Jr. (2006) acerca do modo subjuntivo.
A primeira envolve sua proposta de um sistema temporal bipartido para o referido
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
(13) Qualquer notícia que surja sobre este caso provoca polêmica.
(14) Qualquer notícia que surgir sobre este caso provoca polêmica.
10
Camara Jr. não trata deste tipo de oração.
28
e aspecto), sendo que de todas, apenas a noção de voz não é expressa por meio de
uma flexão, mas por um processo sintático. O modo verbal, segundo ele, além de
poder ser expresso por meio de desinências (fales, falavas, falasse), também o
pode por meio de composição (tenho falado, tenha falado) ou tom de voz (Eu
falei. / Eu falei? / Eu falei?!).
A explanação de Ribeiro (op. cit.) acerca da função do modo verbal e dos
seus tipos não difere das demais já mencionadas. Por outro lado, aborda a questão
da modalidade, dizendo que esta pode se realizar não só nos modos verbais, como
também por meio de palavras modais, tais como: enfim, talvez; de adjetivos:
provável, possível, certo; ou, ainda, de outras construções ou entoações11. Esta
consideração do autor apenas reitera a de Mário Villela e Ingedore Villaça Koch
(2001 apud RIBEIRO, 2004, p. 190) acerca da modalidade: esta representa a
gramaticalização [isto é, a expressão por meio da morfologia] das atitudes
subjetivas do falante e sua [conseqüente] transposição para o conteúdo do
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
enunciado.
Ainda no âmbito da modalidade, Medeiros (op. cit.) acrescenta uma noção
importante: a distinção entre modal e modalizador. Para tanto, menciona as
definições contidas no Dicionário de Dubois et al. que se seguem (MEDEIROS,
1996, p. 54-55):
11
Para Palmer (2001), os marcadores gramaticais de modalidade são: (1) sufixos individuais,
clíticos e partículas; (2) flexão; e (3) verbos modais.
29
ser o caso; expressam crenças do falante (Está chovendo; Acho que está
chovendo; Talvez esteja chovendo);
Diretivos: têm como propósito, em graus variáveis, levar o ouvinte a fazer
algo (Venha aqui imediatamente; Quero que você venha aqui; Gostaria muito que
você viesse aqui; Não permito que você venha aqui);
Compromissivos: comprometem o falante, em graus variáveis, com uma
determinada linha futura de ação (Prometo que compro seu carro; Pretendo
comprar o seu carro);
Expressivos: expressam estados psicológicos (sentimentos) do falante a
respeito de um estado de coisas (Lamento que você tenha se machucado;
Agradeço muito o seu convite; É uma pena que ele tenha perdido o vôo);
Declarações: têm como propósito fazer com que um estado de coisas exista
(Renuncio ao cargo; Eu vos declaro marido e mulher; Você está demitido).
12
Embora o modo indicativo esteja presente, também, nos outros atos de fala.
30
13
A modalidade alética, nas palavras da autora, “tem pouca relevância quando se trata da análise
de línguas naturais, uma vez que não há nenhuma distinção entre o que é logicamente verdadeiro e
o que o falante acredita ser verdadeiro” (GONÇALVES, 2003, p. 30).
31
14
Diferentemente do português, a língua Central Pomo (Palmer, 2001), por exemplo, apresenta um
sistema evidencial que possui não só uma forma não-marcada, como formas com marcadores
referentes a: conhecimento geral, experiência pessoal (geralmente visual), evidência auditiva,
‘ouvir dizer’ e inferência.
15
Este tipo de ambigüidade em termos de interpretação, considerado por muitos lingüistas como
um caso de homonímia ou de extensão do sentido deôntico para o epistêmico (Gonçaves, 2003),
foi estudado por Butler (2003), que demonstrou que a diferença de sentido (epistêmico ou
deôntico) de um mesmo modal se deve, na verdade, ao escopo ou posição que ele ocupa na árvore
sintática.
32
16
Jussivos: imperativos de 1ª e 3ª pessoa: “Let me drink”, (cf. Palmer, 2001, p.81).
33
(22) Kate may be at home [It is possible (possibly the case) that Kate is
at home now]
(23) Kate must be at home [It is necessary the case that Kate is at home
now]
(24) Kate may come in now [It is possible for Kate to come in now]
(25) Kate must come in now [It is necessary for Kate to come in now]
principal e que pode mostrar uma independência da raiz verbal, como nos
exemplos (30-32)17. Isto fica claro quando o falante faz uso do indicativo no
exemplo (30), uma vez que o conectivo se, tendo a interpretação de quando,
requer o indicativo. Por outro lado, nas sentenças dos exemplos (33-36), a escolha
do modo parece depender do tipo de verbo (se de atitude mental, factivo, entre
outros). Um verbo de atitude mental costuma deflagrar o uso do subjuntivo, ao
passo que um factivo, deflagra o indicativo18. No exemplo (33), entretanto, seria
perfeitamente possível dizer “Imagino que Maria aprende facilmente”, no caso de
se considerar algo que aconteça com regularidade. Neste caso, mesmo um verbo
de atitude mental desencadearia a utilização do indicativo:
Como se pode ver, toda esta flexibilidade no uso dos modos verbais faz
parte da intuição do falante.
No segundo caso, quanto ao sentido epistêmico ou deôntico de um mesmo
modal, o falante sabe, intuitivamente, a diferença entre os valores das sentenças
abaixo:
(37) Ele não pode estar no escritório agora. (sentido epistêmico, conclusão)
(38) Ele pode entrar agora. (sentido deôntico, permissão)
(39) Ele pode correr uma milha em quatro minutos. (sentido dinâmico,
habilidade)
17
Exceções são encontradas em orações relativas, como apontado por Medeiros (1996).
18
Ver seção 2.3.
36
2.2
Modo na teoria lingüística gerativista
2.2.1
Quadro teórico gerativista
19
Terminologia utilizada por Deen & Hyams (2006). Ver capítulo 3.
20
Interfaces são concebidas como níveis de representação nos quais a informação proveniente do
módulo cognitivo lingüístico é reconhecida por outros sistemas cognitivos (Corrêa, 2006a).
37
2.2.2
Concepção minimalista de língua
21
Uma numeração é, segundo Chomsky (1995), um conjunto de pares (LI, i), onde LI é um item
do léxico e i, um índice correspondente ao número de vezes que LI é secionado durante a
derivação. Uma derivação só estará concluída quando todos os índices forem reduzidos a zero.
38
22
O Princípio da Interpretabilidade Plena (PIP) é responsável por assegurar a interpretação
semântica de uma expressão lingüística, garantindo que somente traços do léxico que sejam
legíveis pelos sistemas de desempenho cheguem às interfaces fônica e semântica. Os traços não-
interpretáveis, úteis apenas à computação sintática, são eliminados ou valorados no curso da
mesma.
23
O Axioma da Correspondência Linear (ACL) de Kayne (1994) estabelece que a estrutura
hierárquica de uma sentença invariavelmente determina a ordem linear de seus nódulos terminais.
De acordo com o ACL, quando um elemento precede outro em uma ordenação é porque o primeiro
c-comanda assimetricamente o segundo. Assim, existe uma ordem universal envolvendo as
relações eSPECificador/Núcleo/Complemento, mas a ordenação linear final dos constituintes de
uma dada sentença se dá em função da ordenação canônica da língua em questão.
24
No inglês, respectivamente, Phonetic Form (PF) e Logical Form (LF).
39
2.2.3
Modo como categoria funcional
Lohnstein & Bredel (2004), em seu estudo sobre a língua alemã, assumem o
modo verbal como uma categoria funcional. Segundo os autores, após longo
período de negligência da teoria lingüística (nas décadas de 80 e 90) acerca da
natureza composicional da combinação modo-proposição, Chomsky (1995), Rizzi
(1997) e Cinque (1999) propuseram uma projeção ForceP, cuja intenção é a de
estabelecer uma relação entre um componente de modo e proposições finitamente
marcadas:
Sentença
/ \
/ \
Modo Proposição
Atitude
Assim, de acordo com Lohnstein & Bredel (op. cit.), devido a uma
necessidade de combinação do modo verbal com o modo sentencial, tem-se que:
(1) O modo verbal constitui uma categoria funcional que estabelece a mais
alta projeção dentro de IP. Portanto, as categorias funcionais que deflagram as
40
2.2.4
Categorias funcionais
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
As categorias funcionais são classes fechadas, cujos elementos são feixes de traços
predominantemente formais. Seus traços semânticos não atuam no estabelecimento
de relações temáticas, mas veiculam informação pertinente à referência ou à força
ilocucionária da oração; e caracterizam-se por prover posições estruturais
relevantes para o comportamento sintático de categorias lexicais. As principais
categorias funcionais são D (determinante), I (flexão) e/ou T (tempo verbal) e C
(complementizador), as quais delimitam os domínios nominal, verbal e oracional,
respectivamente. Numa derivação sintática, concebida de forma ascendente
(bottom up), núcleos funcionais e lexicais são projetados em camadas hierárquicas
mais altas, mantendo suas propriedades formais. Assim, NP, VP, constituem
projeções máximas dos núcleos lexicais N e V; e DP, IP/TP e CP, projeções
máximas dos núcleos funcionais D, I/T e C.
41
Cada um destes níveis era identificado com uma única projeção X-barra:
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
25
A hierarquia das projeções funcionais aqui apresentada foi retirada de Cinque (1999, p. 106).
Vale ressaltar que Cinque trabalha modo e modalidade conjuntamente por dois motivos: (1) por
uma tradição na caracterização geral e tipológica segundo Palmer (1986 apud Cinque 1999, p. 78)
e (2) pelo fato de que uma mesma categoria pode ser expressa via modo em uma língua e com um
modal em outra.
42
26
Quadro extraído de Muysken (2008, p. 57). Esta é uma representação simplificada da estrutura
frasal de Rizzi (1997). Este último autor identifica o sistema Force-Fineteness como a parte
essencial do sistema complementizador, de modo que se encontra presente em todas as estruturas
oracionais não-truncadas, ao passo que o sistema Tópico-Foco se apresenta na estrutura somente
se necessário. Assim sendo, se as posições de Tópico e Foco forem ativadas, posicionar-se-ão
entre Force e Fineteness. Em adição, Rizzi (op. cit.) assume que uma oração pode conter tantas
posições de Tópico quanto necessárias, ao passo que somente uma única posição de Foco. Em
outras palavras, Tópico seria recursivo e Foco, não. Tanto Tópico quanto Foco envolvem um
esquema X-barra, mas apenas Tópico admite que o comentário (isto é, o complemento do seu
núcleo) seja articulado a uma outra estrutura do tipo Tópico-comentário. No caso de Foco, o
mesmo procedimento geraria um conflito. Assim, Rizzi (op. cit.) propõe que a estrutura do sistema
complementizador seja: (ForceP > TopP > FocP > TopP > FinP), o que permite dar conta de um
número de restrições de ordem que envolvem elementos no sistema complementizador. Vale
acrescentar que posições de Tópico e Foco também foram consideradas em IP. Belletti (2004)
43
Muysken (op. cit.) explica que a justificativa teórica para estes conjuntos de
projeções vem: (a) da semântica: pela necessidade de unir uma variedade de
distinções semânticas e pragmáticas a núcleos funcionais específicos na árvore
sintática, correspondentes aos diversos constituintes; e (b) da ordem das palavras:
pela necessidade de posições para a variedade de constituintes que podem ser
movidos para a periferia esquerda da sentença.
Para melhor entender a estrutura geral da sentença proposta por Rizzi (op.
cit.) no Quadro 3 acima, necessário se faz seguir os passos do autor. Este
considerou que, assim como IP se desdobrou em uma série de projeções
funcionais, cada qual correspondendo a uma única especificação de traço expressa
de forma explícita ou não no sistema verbal (Agr, T, Asp, entre outros) e que
níveis VPs múltiplos surgiram para dar conta de verbos multi-argumentais,
também CP deveria ser desdobrado, uma vez que a periferia esquerda da sentença
parecia constituir bem mais do que um simples esquema X-barra.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
defende que a área imediatamente acima de VP mostra uma semelhança significativa com a
periferia esquerda da sentença, identificando, portanto, uma posição de Foco cercada por posições
de Tópico internas à IP (TopP > FocusP > TopP > vP). A autora faz uso do fenômeno do sujeito
pós-verbal em inversão livre para validar sua proposta, uma vez que este tipo de inversão se dá
internamente à oração. Belletti (op. cit.) demonstra, assim, que as posições de Tópico e Foco em IP
estariam relacionadas a tipos diferentes de interpretação e entonação, ou seja, a relações
discursivas.
44
27
Confrontar com os capítulos 3 e 5.
28
As noções realis e irrealis serão abordadas em maior detalhes no capítulo 3.
45
2.3
Modo no português do Brasil
29
Ver seção 2.1.1.
30
Ver seção 2.1.2.
47
31
Os exemplos 43 a 45 foram extraídos da Coluna “Dicas de Português” de Dad Squarisi. Jornal
Correio Braziliense Online, 23 de abril de 2003. Disponível em
http://www2.correioweb.com.br/cw/EDICAO_20030423/col_dad_230403.htm.
48
Pereira (op. cit.) mostra também que não só o indicativo, mas o infinitivo, o
gerúndio, um substantivo abstrato, uma construção elíptica e o pretérito-mais-que-
perfeito podem substituir o subjuntivo:
perfeito)
Os exemplos (53) a (57) mostram casos em que uma sentença que abriga o
subjuntivo é substituída por outra, com outra construção, mas que mantém o
mesmo sentido. A perda progressiva do uso do modo subjuntivo mencionada
anteriormente é aquela na qual o indicativo substitui o subjuntivo em um ambiente
em que só o último poderia ocorrer, como nos exemplos (46) a (52), construções
estas que estão se tornando cada vez mais freqüentes na fala coloquial do
brasileiro.
Pereira (op. cit.), ao estudar os falantes da cidade de Juiz de Fora, verificou
que onde deveriam fazer uso de uma forma subjuntiva, a substituíam por uma
forma indicativa como, por exemplo, na seqüência de perguntas: “Como está em
tempo de eleição, todos têm desejos, aspirações quanto ao novo governo
municipal, não é? Você já tem candidato? O que você espera que ele faça?” Um
falante assim respondeu: “que ele cumpre o que ele falou, né? Que ele faz e
acontece...”. Em outro exemplo, o entrevistado que deveria completar a frase
“Tenho um bom candidato, embora ...” utilizando uma forma subjuntiva,
respondeu: “estou certo de que nem tudo que ele diz será cumprido”. A autora diz
que “ao fazer esta troca, o falante tem o fato como real, certo, livre de
questionamentos”. Em seu trabalho, outros aspectos são apresentados, mostrando
49
(ii) Função gramatical: esta função diz respeito ao subjuntivo que, neste caso,
representa marca de subordinação. A oração matriz condiciona o modo da
encaixada, o que significa que o valor verdade desta última oração não determina
seu modo verbal. Como exemplo, tem-se:
Assim, como observa Oliveira (op. cit.), “como o indicativo é a única forma
possível, além do valor semântico, sua ocorrência adquire um valor gramatical”
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
(p. 514).
Retornando ao estudo de Rocha (op. cit.), a autora verifica que não só a
semântica do verbo da oração matriz é responsável pela determinação do modo da
oração encaixada, mas também, a faixa etária do falante; a assertividade da oração
matriz; a regularidade verbal e o tipo de verbo da oração encaixada; o tempo do
verbo da oração matriz e o tempo do verbo da oração encaixada.
Oliveira (op. cit.) explica que uma possibilidade para a variação constatada
por Rocha (op. cit.) pode estar relacionada ao fato de a oposição modal não
acarretar oposição de interpretação por parte do falante, isto é, tanto uma forma
quanto outra apresentariam o mesmo valor verdade. Oliveira (op. cit.) diz que
muitos falantes, ao serem indagados sobre a eventual diferença de significado
entre os dois tipos de construção, freqüentemente não identificam tal contraste. A
autora aponta tal fato como uma neutralização da oposição entre o modo
indicativo e o subjuntivo, o que faz com que o falante faça uso de outros
mecanismos gramaticais para codificar a modalidade do enunciado, tais como:
recursos lexicais, modificadores adverbiais e recursos prosódicos.
Por outro lado, Oliveira (op. cit.), em seu estudo sobre a oposição
indicativo/subjuntivo no Nordeste, descobriu que, diferentemente do que ocorre
no Rio de Janeiro e em Brasília (onde o indicativo invade o campo de atuação do
subjuntivo), na Paraíba, o subjuntivo é mais produtivo nas orações completivas,
51
Assim, uma vez que a distinção morfológica de modo está se tornando cada
vez menos manifesta na fala coloquial do Estado do Rio de Janeiro, pode-se
pensar que o que marca a distinção de modo para a criança seja o ambiente
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0710543/CA
sintático, por meio das orações completivas, e as noções realis e irrealis expressas
pelos verbos destas.
Há, ainda, mais duas dificuldades com as quais a criança precisa lidar no
processo de aquisição do modo verbal. A primeira diz respeito ao tipo de distinção
conceitual que modo expressa. Freqüentemente, o falante precisa posicionar-se
com relação à possibilidade de ocorrência de um evento, independentemente de
tempo como, por exemplo, em: “Eu quero que Maria venha” (evento passível de
ocorrer no futuro) / “Eu queria que Maria viesse” (evento passível de ocorrer no
futuro ou que pode não ter se realizado no passado).
Outra dificuldade é a que envolve o modo verbal e sua interação com a
Teoria da Mente (ToM) – um dos sistemas intencionais que interage com a língua
e que permite ao individuo inferir o estado mental de outrem (emoções, intenções,
desejos, atitudes, crenças verdadeiras ou falsas, conhecimento e ponto de vista),
de modo a explicar um comportamento observado ou predizer aquele que ainda
está por ocorrer (de Villiers, 2004; 2007). A ToM pode ser entendida como um
módulo cognitivo que se desenvolve paralelamente à aquisição da língua,
atingindo seu ápice a partir da idade consensual de 4 anos, em que a criança
adquire a habilidade de atribuir ao outro uma crença falsa.
Em suma, nesta seção foi abordada a finitude e as noções realis e irrealis
expressas pelo modo verbal no português, bem como a questão de a criança, em
52