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Da Meso cotsocae: (05 GATOS ~ Fania 2 \vTASI8, SNHO OU RERLIOADE? e0igho= CGrusntana St nicoxbise rere ay Ue O CARRO Enquanto se prepara part s conversa com a isi — Hoje no me posso es jornal. E sexta-feira, 13! E hoje que sai a lista dos niimeros premiados daquele sorteio® — Qual sorieio? Desde quando é que compras esse tipo de coisas? — Lembras-te que eu comprei aqui hi tempos ‘um bilhete para ajudar Associagao dos Bombei- ros Voluntérios.., E nfo sei porqué, mas tenko um pressentimento que me vai sair qualquer coisa... Era bom que fosse 0 carro. — Pois sim... vai esperando*... — respondeu- -lhe a irm —Tu as vezes és tio ingénuo® que até d& pena, Pedro, J4 reparaste que hoje € dia de azar) Sexta-feira, 13! —*Tébem, nto acredites... Quando eu aparecer sm um carrinho novinho em folha* logo vés* se € azar — Nilo sejas ridfculo! Pens: primeiro, era preciso teres mui sair logo* o primeiro prémio... de isso acontecer & mfnima; depois, niio tens carta de conduco, nfo podes aparecet com 0 carro aqui & porta; a menos que* contrates um moto~ bocadinho sé: — Pois sim! goza* A vontade... Até logo. E claro que a primeira que saiu de casa verificar se, de facto, isa que 0 Pedro fez, ‘comprar © jornal € tha 0 ntimero do a gue o fez no conseguiu encontrar a p: deveriam estar os resultados. Decidiu sentar-se numa esplanada ali perio. , La estava: «GRANDE SORTEIO DE NATAL DOS BOMBEIROS VOLUNTARIOS. 1.2 Prémio, UM automével ROVER 3000 para 0 n.° 534 256 675», Que decepetio! Aquele a ver com* o dele! Ab! como ele detestava ter de dar razdio & Te~ resi... ‘Mas 0 segundo e terceito prémios também eram dois automéveis; € certo que eram mais pequenos, mas cram Sptimos também. Prim comprado: 836 851 065; e, de repente, viu o mes- ‘mo némero no jomal! Era. Bra o terceiro prémio, Confirmou: 836 851 065, Nao havia davidas, ¢, sem se controlar, gritou para (0 Pedro nao cabia em si de contente. Bem volta, as poucas pessoas que estavam na esplanada aquela hora, ndo puderam deixar de sorrit ¢ associar-se mentalmente a felicidade daquele jovem. Apenas ‘o-empregado nto gostou, porque o Pedro quando se levantou fez cair a chévena de café que se partiu no chio, E além disso, saiu a corer ¢ esque- couse de pagar... Ainda pensou ir a casa para vera cara da Teresa, mas depois achou melhor ir directamente & AS- sociagfo e confirmar tudo, Nada como® ter a cer- teza do prémio e saber 0 que era preciso para 0 evantar, como se fazia, quando poderia ter 0 carro, etc E se assim 0 pensou, melhor 0 fezt Meteu-se no Metro, na Estagdo das Laranjeiras, em direcgaio 4 Rotunda e foi A sede da Associagto, Levava consigo o bilhete premiado e sorria para toda a gente; 86 que como ninguém sabia a razdo da sua alegria todos 0 consideravam um jovem tonto* acabado de sair do Jtilio de Matos*, Houve mesmo quem deliberadamente* se afastasse dele para nfo se sentar a seu lado. 3 Quando recebeu a confismagiio de que ex um legitimo proprietdrio de um vefculo de quatro rodas com motor (ainda que fraquinho, era capaz de 0 ¢ a telefonar* aos amigos todos da ne publica que encontrou. Era uma cabine que ficava um pouco escondida num recanto do passeio. Mas a sua alegria exuberante* chamava a.atengo de quem passavae, talvez por isso, alguém fo & sua conversa, u, foi arrastado para um canto mais escondido, entre a cabine e a parede. Um rapaz, um pouco mais velho do que ele, encos- tou-o discretamente & parede, prendeu-the os mo- vimentos e com uma répida ¢ habil* busca* nas, algibeiras tirou-lhe pura e simplesmente o seu querido bithete premiado. E pelos vistos* nfo queria mais nada. S60 bilhete! 0 Pedro ficou sentado no chi sem forgas e sem. querer perceber 0 que se havia pasado‘. Sexta-feira, dia 13, parecia ser um dia de sorte eafinal estava atransformar-se em dia de azar. Serd que a Teresa tinha raz80?.. Alguns transeuntes* que passavam olha- vam curiosos mas poucos ousavam* perguntar alguma coisa; apenas uma senhora de idade* in- sistiu: — Sente-se mal? Precisa de ajuda? Mas o Pedro, totalmente desanimado, nem conseguia articular palavra. S6 encolhia os om- bros* e algumas légrimas teimavam* em correr- -Ihe pela cara, Estava com uma expresséo de desfnimo tal* que a senhora olhou mais demo- radamente para ele, ajudou-o a levantar-se e dis- se-the: — Venha tomar um cid ou uma agua ¢ depois conte-me o que s¢ passou. Porque se passou alguma coisa com certeza, nfo foi? Ninguém fica nessa apatia® sem razao, Conte-me, Diga-me 0 que se passa, Pouco a pouco o Pedro foi recuperando & comegou a contar o que se tinha pasado: o bilhete, a descoberta do mimero premiado, 0 carro, a ve~ rificago do prémio, os telefonemas aos amigos, 0 roubo... E, de repente, lembrou-se: — A verificagio do prémio! £ isso! Estou salvo! Eu jé deixei os meus dados todos na Associagiio. Eles jé sabem que 0 carro é meu. Portanto* o Jadrio niio me vai poder tirar nada! Obrigado minha senhora. A senhora ciagGo comunicar 0 que se passou... 4. Reencontrou um pouco da sua alegria inicial ‘mas ainda estava bastante preocupado*. Quando chegou a porta da Associagio muitas interrogagoes, Ihe enchiam a cabega: Seré que eles se Lembram que eu j4 Id estive? E se, quando o ladrito If chegar, falar com outro funcionério que nfo sabe que o prémio j& foi atribuido? Ainda por cima* cu no, fiquei com nenhum papel comprovativo de que prémio € meu! Ai! se eles nfo acreditarem em mim... 0 que € que eu hei-de fazer? Quando ia a entrar na porta da Secretaria deu de caras* com 0 que 0 tinha assaltado e que vinha a sair precipitadamente*. O Pedro néio resi ele nao podia perder aquela oportunidade tinica de se encontrar frente a frente com 0 seu assaltante — ‘agarrou-o pelo colarinho cam todas as forgas que péde reunir naquele momento ¢ arrastou-0 para deniro da Secretaria, Estava vermelho de rai mas Id muito no fundo sentia alguma alegria ... Fez-se um siléncio dentro da sala quando 0 Pedro entrou; mas, depois da suxpresa inicia irrompeu* uma estrondosa* salva de palmas* ao mesmo tempo que alguns funciondrios safram das suas mesas de trabalho e vieram ajudar o Pedro no seu enorme esforgo para tentar segurar* o largpio* {que entretanto j4 se conseguira* libertar das mos do Pedro e tentava fugir... © Pedro fora* reconhecido de imediato pelo proprio empregado que o tinha atendido antes ¢ que Ihe disse: — Pode estar descansado. Jé est tudo sob controlo, Felizmente voce jé ef tinha vindo e vinha ug Go contente que era impossivel esquecer a sua da csquadra* préxima, chegaram 14 De facto, nfo € fécil imaginar este jovem bastante sereno*, recém-entrado* na Universidade e ji inteiramente dedicado aos seus estudos de Hist sonhando vir a ser* acima de tudo um excelente investigador da época medieval, metido em actos mais violentos. Ele gosta de ler e interpretar documentos antigos, ¢ j4 um assiduo* utilizador da Torre do Tombo* e de outros Arquivos, mas nfo tem muita paciéncia, nem talento, para grandes esforgos 6. Agora que jé tem carro precisa da carta de condugio, Tem que tratar disso rapidamente. Vai ser facilimo*. Tenciona tirar a carta num abrir € fechar de olhos* e anseia* por poder comegarasair no seu carro novo... Conduzit j4 € um sonho antigo. Ele sempre gostou de se imaginar a passear no seu carro: umas vezes mais depressa outras mais devagar. Como seria bom entrar em competigdes desportivas, fazer curvas espectaculares, “voar baixinho” em alta velocidade por estradas de terra! Mas também seria dptimo poder deslizar com o seu carro por montes € vales, junto das margens dos rios, suave e cal- ‘mamente... Era bom imaginar esses momentos... Mas passé-1os & prética jé ndo era assim to urgente porque nunca pensou que pudesse ter um carro to cedo. Gm Comegou na quarta-feira passada e foi directa- que estavam parados atrés nar¥ © 0 Pedro ficou tao 0 Pedro, habitualmente to seguro de si tin-se envergonhado, incapaz.de dizer uma pal ha de nervos. Era muito mais fil 18 1. O rio tocava urna miisica suave ¢ 0 Pedro nfo parava de mastigar batatas fritas enquanto con- tinuava a olhar para uma revista qualquer sem mostrar grande interesse pela leitura. Crrac., .crrae... crrac... crrac —Que vicio, Pedro! Fazes tanto barulho a mastigar que nfo me deixas ouvir a misica! Nao & capaz de parar um bocadinho? —Adoro fazer crrr-crmr... Sabe bem. Queres uma? —Nio obrigada, Sabes perfeitamente que de- testo batatas fritas, O que & que tu tens? Nestes ‘iltimos dias tens andado um bocado nervoso. Pas- sa-se alguma coi: —Nio, nada de especial —Uhmm! Nao acredito, Nao pode estar tudo bem porque sendio tu nfo estavas em casa ao sAbado A tarde, a comer batatas fritas © a Ter uma revista feminina. - Isto € wma revista feminina? Ah! Pois 6... Por que € que nfo me disseste hé mais tempo? — Nao me pediste opinifiol... Estds a ver? Tens, que concordar comigo! Passa-se que tu nao queres dizer... Mas, se calliar*, se dis- sesses era melhor! Vé Ié"! Conta A tua maninha* que estd aqui para te ajudar... — Vou vender o carro e desistir das aulas de condugio. — O que? “Tés a gozar comigo... — Ba sério. JA decidi. — Ah no! Nessa néo acredito, O que foi que te aconteceu? Atropelaste® alguém? — Néo, nfo aconteceu nada de especial. Che- guei A concluséo que um carro 86 traz problemas. E preciso dinheiro para a gasolina e para a oficinas é preciso espago para estacionar, paciéncia para os engarrafamentos ¢ uma grande capacidade de encaixe* para aturar os outros automobilistas... ifs tenho a sensagio que j6 ninguém respeita ninguém... ultrapassam pela direita, metem-se na frente, apitam, insultam, eu sei 1¢ —Deves ter feito alguma* ns ligdo! Tu sempre chaste que és a tnica pessoa perfeita neste mundo © 86 agora é que descobriste que se cathar nio é bem assim, Portanto, vingas-te nas batalas fritas, ficas frustrado... queres desistir... sso nem parece teu — Cala-te! — Gritou 0 Pedro ja desesperado com a lig#o de moral da irma E jé nem ouviu 0 resto da conversa. Levan- tou-se furioso, com o pacote de batatas fritas na mio, e saiu da sala batendo com a porta, Mas Id bem no fundo também ele concordava com a Teresa. Ah! como ele detesiava ter de reconhecer que ela tinha razio! Afinal 0 Pedro dos dias maus das primeiras experiéncias fez os exames sem mais problemas dignos de nota, ‘Noentanto, ainda hoje no pode deixar de pensar nas mudangas que uma simples brincadeira*, como ve ade comprar um nimero de sorteio para ajudar uma Gia-a-dia no tinham grande Mas, tanto 0 assalto de que foi alvo como as primeiras aulas de condugio fizeram-no descabrir limitagées humanas que até af Ie eram totalmente desconhecidas, E verificou, com surpresa, que foi a partir do momento em que recebeu o seu carro comegou a prestar mais alengdo a realidade dos ior hoje Se cruzar na rua com uma a yénuo inocente; erédulo; pessoa que acredita em tudo dar pena ser comovente; ser triste busca habilidosa; eficiemte sea procura; pesquisa pelos vistos aparentemente hhavia passado tinh pasado m) —Fanila. (MEAN 10 transeuntes pessoas que andam na run; poses a 17 13 15 16 ousar ter coragem de; atrever-se a uma pessoa de idade que tem mais de 60 anos encolher os ombros subir os ombros em direc ‘¢20 2 cabega; mostrar indiferenga teimar_insistir fal tio grande apatia. falta de energia portanto por conseguinte preocupado inquieto; apreensivo ainda por cima (fam.) além disso; e para mais, dar de caras com encontrat-se frente a frente ipitadamente a pressa; imprudentemente irromper surgi de repente estrondosa_ruidosa salva de palmas.aplauso segurar prender; agarrar larapio ladi%o; assaltante tinh conseguido malandrice vigarice; mentira; algo que nao esta cortecto esquadra posto da pK azarada infeliz; com menos sorte tipo (fam.) pessoa; homem serena calmo; tranguilo recém-entrado que entrou ha pouco tempo ir a Ser tornar-se; ser no futuro assiduo frequente Torre do Tombo Arquivo facilimo muito fécil num abrir e fechar de olhos rapidamente ansear desejar muito; aarrancar pdr 9 carro a andar meter a primeira fazer entrar a primeira mu danga na alavanca das vetocidades ome is ea embraiagem pedal accionado pelo pé que fa- cilita 2 entrada das mudangas solavancos.salios bbuzinar apitar r talvez ) expressdo para encorajar 0 outro a ua reagir 1a (fam,) isms mana atropelar bater com 0 carro em alguém eapacidade de eneaixe Fam.) muita paciéneia para suportar eu set le muito mais; eu nfo sei que mais; fazer alguma (fam.) fazer algum disparate, guma asnei nao. paree em ti brineadeira acto div feu nd0 6 uma reacedo normal dos graga

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