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*(..) Para @ msioria dos lek tores, @s notes de rodapé exercem um papel diferente. Em uma sociedade moderna, impessoal, na qual os in 4 ous en esonfien AS ORIGENS TRAGICAS DA ERUDICAO : q PEQUENO TRATADO SOBRE A fm ues os quae nada NOTA DE RODAPE pis teittta pablice, as notas ° de rodapé conferem autoré- dade a um escritor, Diferentemente de outras formas de credencial, to- davia, as notas de rodapé podem &s vezes ser divert . das ~ normaimente na forma ge facas cravadas nas Costas dos colegas do autor. Cy" Anthony Gratton (excerto do cap. 1) me "noite min ape congo ts Life 00 ae “gen petiaren nae Tape: rN Dabeteny adn hrsrcios de Ctangee na utes (IP) "Gaver eee do Leo, Bra tase gous oa sss: Pagiro nad ce seine need om Sr acs od As Bo brancy canon, 3 Pape Isp asog.cenea Needed Ranke expr SRL Tue DITOR RESERLADOS PARK A LING PORTUGUESA ‘Cimgrtc™ Rie ene 0287 as Pea: Bs, Prt repo el pra rac ASC ‘SUMARIO. PREFACIO. 7 AGRADECIMENTOS 9 1. NOTAS DE RODAPE: A ORIGEM DE UMA ESPECIE. 3 RANKE: UMA NOTA DE RODAPE SOBRE A HISTORIA CIENTIFICA 4 }- COMO O HISTORIADOR ENCONTROU SUA MUSA: ATRILHA DE RANKE PARA A NOTA DE RODAPE 63 NOTAS DE RODAPE E PHILOSOPHIE UM. INTERLUDIO ILUMINISTA 83 DE VOLTA AO FUTURO 1: DE THOU DOCUMENTA, ‘OS DETALHES OU COMO UM HISTORIADOR PRE-CRITICO ESCREVEU HISTORIA CRETICA 109 6. DE VOLTA AO FUTURO 2: © TRABALHO DE, PORMIGA DOS HISTORIADORES E ANTIQUARIOS ECLESIASTICOS 129 7. CLAREZA E DISTINGAO NAS PROFUNDEZAS DA ERUDIGAO: AS ORIGENS CARTESIANAS DA MODERNA NOTA DE RODAPE 197 8, EPILOGO: ALGUMAS NOTAS DE RODAPE FINAIS 183, PREFACIO ‘Muitos livros fornecem notas de rodapé & histéria: narram histérias marginais, reconstroem batalhas menos importantes ou descrevem detalhes cusiosos. Que cu saiba, no entanto, jamais alguém dedicou um livro hist6ria das notas de rodapé que realmente aparecem nas margens das obras hist6ricas modernas. Todavia, as notas de rodapé so importantes para os historiadores. De certo modo, elas constituem nas ciéncias humanas um equiva- lente das referéncias a dadas nos relatérics cientficos: fornecem suporte empirico para as hist6rias contadas © os argumentos aptesentados. Sem elas, pode-se admirar ou desaprovar as teses historicas, mas nao verifici-las ou refutdlas. Como pritica elemen- tar profissional ¢ intelectual, elas merecem o mesmo tipo de escrutinio que as anotagdes de laborat6rio e 0s artigos cientificos seceberam de historiadores da ciéncia. Afirmagdes acerca cla natureza e das origens da nota de rodapé aparecem em hist6rias da historiografia e nos manuals para cseritores de dissertagbes hist6ricas. S40 particularmente mais frequentes em polémicas sobre os bons dias de outrora, quando os hhistoriadores eram homens ¢ nolas de rodapé eram notas ce rodapé. Essas discussdes sugerem muitas vezes que uma época ~ geralmente o século XIX ~ e um lugar ~ na maioria das vezes, as universidades alemas do perfodo imediatamente anterior & Primei- ra Guerra Mundial — especificos marcaram 0 auge das notas de rodapé, caracterizadas por sua solidez.¢ exatidao, Tais afirmagbes, no entanto, raramente se assentam sobre uma pesquisa ampla e muitas vezes sto feitas com o intuito antes de apoias ou atacar as préticas de uma dada escola do que de reconstruir suas fontes ¢ seu desenvolvimento. Os estudos dispersos realmente existentes, além disso, reflerem naturalmente as limitagdes do treinamento ¢ das perspectivas especiais de seus autores. Os estudiosos situaram co nascimento da nota de rodapé nas séculos XI, XVII, XVIII e XIX, © sempre por um bom motivo, mas geralmente sem se deter nos ontros capitulos dessa histéria. Um objetivo de meu ensaio € simplesmente reunit essas correntes dispersas de pesquisa. Um outro, mais importante, é mostrar que, quando inter-relacionadas, compdem uma historia tao rica em insuspeitado interesse humano € inteleciual quanto muitos episddios mais famosos dla histéria intelectual. A nota de rodapé nao é to uniforme nem to confiavel quanto acreditam muitos historiacores. Porém, & criagto de um gnupo diversificado ¢ talentoso, que inclutu tanto filésofos quanto historiadores. Seu desenvolvimento levou muito tempo e Seguin um camiaho cheio de obeticulos. E sua histéria langa uma nova luz sobre muitos recantos obscuros da hist6ria no escrita dos estudos historicos. AGRADECIMENTOS Meu interesse sobre esse assunto se iniciou na graduagao, quando li partes do Dictondrio de Bayle os Fsitidos ein bistorion grafia cle Momigliano, Uni plano, concebido com amigos, dle criar um jomal pseudo-erndito e dedicat um mimero inteiro a0 16pico infelizmente fracassou. Porém, Jentamente continuel 4 coletar in- formagdes. Por fim, uma conferéntia sobre prova ¢ persuasio em histéria, realizada em 1993 ao Davis Center for Historical Studies, na Universidade de Princeton, forncceu 9 impulso para reunir meu material © avangar na sua ioterpretacio, Devo muito. a Sue Mar- chand, com quem orginizei a conler@ncia, e a Matk Phillips © Randolph Starn, que me auxiliaram com eriticas precisus no msnus- tito original. Um rascunho revisado desse waballio aparece, com. outros apresentados na conferéncia, em Hisioryrand theory, nmne- ro tematico 33 (1994). Richard Vann gentilmente permitin que, neste livro, eu me apoiasse em michas formulagdes originatis. 1m convite para passat 0 ano académico de 1993-1994 no Wissenschafiskolleg zu Berlin permitiu e estinnulou o ataque 2 nota de rodapé uma segunda vez, O Wissenschafiskolleg propiciou tempo livre para wabalhar ma cidade de Ranke e de Meinecke. Gesine Bottomley e sua equipe na biblioteca do Wissenschafiskolleg, encontraram 05 tipos de material mais comuns ¢ mais obscuros com a mesma facilidade e rapidez. Eles também me guiacam pelo muagnifice labirinto das colegdes de manuscritos ¢ de livros raros de Berlim, Tenho uma divida especial para com a equipe do Handschrifienabteilung da Saatsbibliothek zu Berlin Preussischer Kulturbesitz, Haus IT, que me auxiliou a explorar as caixas pretas, cada uma delas uma caverna de Ali Baba, que hospedam o rico Nachlass de Ranke; para com as bibliotecas universitarias da Freie Universitit e da Humboldt Univessitit, ¢ mais ainda para com as bibliotecas do Meinecke Institut ¢ do Seminar fiir Klassische Philologie ca Freie Universitit, Uma pesquisa anterior foi feita principalmente na Biblioteca Firestone da Universidade de Prince- ton e na Biblioveca Nacional da Franga; outeas pesquisas coniple- mentares na Biblioteca Britinica, na Fundagio Hardt, no Instituto ‘Warburg e, sobretudo, aa Biblioteca Blodletana, em Oxford, Muitos amigos contribuiram com criticas € informagdes Meus agradecimentos a JW. Bians, Robert Darnton, Henk Jan de Jonge, Erhard Denninger, Carlotea Dionisotti, John Fleming, Simon Hornblower, Reinhart Markner, Reinhart Meyer-Kalkus, Wilhelm Schmnidt-Biggemann, |B. Trapp, Giuseppe Veltri, David Wootton ¢ Paul Zanker, que contrbuiram com sugestées valiosas ou fizeram Perguntas irrespondiveis. Francois Hartog, Glenn Most e Nancy Strats! fizeram a critica de versdes anteriores do texto. Tim Breen, Christopher Ligota € Wilfried Nippel convidaram-me a apresentar mieus argumentos a um piblico de seminarios bem informnado critico, Nao tivesse Arnaldo Momigliano me ensinado tanto sobre 98 assuntos tratados aqui, eu jamais teria me aventurado a fazer ressalvas a uma ou duas de suas teses. Christel Zahimann, cuja morte foi um golpe 0 duro para tantos amigos na Alemanha e 10 fora dela, viv o potencial de um livro acerca da nota de sodapé muito antes de mim; Petra Eggers ¢ Maurice Olender ajudaram-me a tomé-lo tealidade. Finalmente, meus agradecimentos aqueles que leram a pri- meira verso deste livro, publicado pela Berlin Verlag em 1994 sob © titulo Die tragischen Unpringe der deutschen Pusenote, € ofere- cceram sugestdes para a edi¢ao em inglés: Sue Marchand e Wilhelm Schmidt-Biggemann, com os quais minha divida {4 era grande, & Peter Miller. Como sucessives dirctores do Davis Center, Lawrence Stone Natalie Davis fizeram do Departamento de Historia de Princeton um cenuo para reflex2o critica sobre o método hist6rico. Como historiadores, ambos fizeram uma reflexto séria e escreveram trabalhos esclarecedores sobre a natureza dos documentos de arquivo € os problemas cla documentagdo hist6rica. Como amigos ¢ consetheiros, ambos me deram, assim como muitos outres, um apoio itrestrito, muitas vezes na melhor de todas as formas para 0 historiador: a critica construtiva. E ambos escreveram — € ico escrever - muitas notas de rodapé magnificas. Este livro é dedicado como vm pequeno tibuto a dois mestres da arte que ele discute. u 1 NOTAS DE RODAPE: A ORIGEM DE UMA ESPECI, No século XVIII, a nota de rodapé das obras histéricas constitula uma forma nobre da arte literaria) Nenhum historiadar iluminists ating uma escala mais épica ou um estilo mais clissico do que Edward Gibbon em Declinio e queita do Império Raman. Ennada nessa obra divertia seus amigos ou enfureceu seus inimigos ais do as nolas de rodapé.' Com justica, sua irreveréacia religiosa e sexual tornou-se célebre. “Em suas meditagoes", diz Gibbon, historiador do imperador Marco Aurélio, marido éa notoriamente “galante" Faustina, “ele agradece aos deuses, que the haviam coneedido uma esposa tio fiel, to amvivel ¢ de maneitas to maravilhosamente simples*.’ “O mundo”, reflete cortesmente Gib- bon, o comentarista, “‘riu da credulidade de Marco Aurélio; porém 1. Ver, em gel, GW. Bowerock, “The art of the foorate”. Avimcan Scbolar 33, 198)-1584, pp_ 5442. Pars o rane mala ample, er 9 nosivel esto anterior de W ‘Bernays, ‘Zu Lehre voa dem Claten und Nowen', Sebrifes str RRO ond Leranr- gesichte TV Berlin. 1899, pp. 253.347 e 302i. 2. B.Gibban, The biston?2) be delin aa al of tbe Raman Brypire Organiza poe 8, iomeley, Londres, 1994, e8P. 41, ps 10109, B Madame Dacier nos assegura (e podemos acreditar em uma dama) que o marido seré sempre enganado se a esposa se dignar a fingit’.* “O dever do historiador”, observa Gibbon em sua ostensi- vamente franca investigagao dos milagres da Igreja primitiva, “nao cexige dele que insira seu julgamento privado sobre essa bela importante controvérsia." “Pode parecer notavel,” comenta Gib- bon numa nota de rodapé que abandona toda pretensio de decoro, “que Bernard de Clairvaux, que registra tantos milagres de ‘seu amigo sto Malaquias, nunca se dé conta dos seus proprios, 05 ‘quais, por sua vez, no entanto, esto cuidadosamente relatados por seus companheiros e discipulos’.” “O culto Origenes" e alguns ‘outros, explica Gibbon em sua andlise da habilidade dos primeiros cristaos a permanecer castos, “julgavam ser mais prudente desar- mar o tentador’.° Apenas a nota de rodapé esclarece que 0 tedlogo evitara a tentagho pelos meios dristicos da autocastragio —e revela © julgamento de Gibbon sobre essa operaglo: “Como era sua pritica geral alegorizar as escrituras, parece uma infelicidade que, apenas nesse caso, ele devesse ter adotado o sentido literal.” Tais comentirias jocosamente sarcdsticos gravaram-se como excrescén- cias nas meménias ortodoxas € reapareceram para assombrar seu autor nos inumeraveis panfletos de seus eriticos.* A arte de Gibbon tinha uma finalidade tanto erudita quanto polémica ~ exatamente na medida em que suas notas de rodapé subvertiam, mas ndo apoiavam, o magnifico arco de sua historia? 3 ap. 4m 4 tid, p09. 4, hid. cap. 153, 0. 473 5. Cap 150.81 til, pA 5 Ad, 480 7. Cap" 15, 0.96, tid Para wma deseo cxfea secon da hina da asrocatagte de Grigenes,verP. Brown, The Body and society. Nea Yea, 1988, 168 e m8 18 Bemays enfati2s mole e8sa questig. Pom extuoe mal rventes ma means lin ver Panett, The site foomexes of Swi and Gibbon’, The Eigbteenib Cry 3, 1990. pp: 245.202, eB, Cosgrove, ‘Uindemining the fate: Esa Cbaon,Aexondes Pope, and the anteanthenticating foctncte", wm S. Bamey (org). Asmotation an texte Orford 1991, pp 130-151. 9. Pom dos esuidos do xe0 te, ver}. Gant, Cait andthe Teecbercs engage of panes”, Zhan. Cary Snubs 11 1977197% pp. AML: Gane “Lively ad abr Conon a bon scan’ Mer Peby%, 19703979 pp Ele podia revestir uma citagio bibliogrifica com a grave simetria de uma peroragao ciceroniana: “No telato dos gnésticos do segun- do € terceito séculos, Mosheim € inventive @ sincero; Le Clerc, tedioso, porém exato; Beausobre, quase sempre um apologista; € femos fortes motivos para crer que os pais primitivos fossem muito frequientemente caluniadores."” Ele podia acrescentar um paralelo Omico com uma gravidade comumente reservada para o elogio ‘ow a condenacio de um herd: “Para a enumeragao das divindades sitias € Grabes, devemos observar que Milton comprimiu, em 130 versos belfssimos, os dois sintagmas longos ¢ cultos que Selden havia composto sobre aquele assuunto abstruso.”" Ou podia saudar 198 primeiros cruditos, todos eles bons cristdos, em cujas obras ele se baseava para milhares cle dletalhes curiosos, com uma combina- ‘ao singular de despreocupada rejeigio de suas crengas com respeito genuino por sua erudi¢ao."* Gibbon sem étivida estava certo em julgar que wm relato abrangente de suas fontes, escrito no ‘mesmo estilo, teria “proporcionado tanto diversao quanto informa- 40°." Embora suas notas de rodapé ainda nao fossem romanticas, apresentavam tudo aquilo que o estilo altamente roméntico pode oferecer. E sua “profuse informativa” recebeu o elogio do brilhan- te erudito do século XIX, Jacob Bernays, assim como 0 de seu snnio, o germanista Michael Bernays, cujo ensaio pioneiro sobre a hist6ria da nota de rodapé ainda fornece mais informagdes intuigdes do que a maioria de seus concorrentes.”* 10. Gap tan 32 1p 458, Me Sap. 15m. id, p49, 412. Ver, por exzapl, 1 goa 98 dp cap. 70, ra qual Giben faz via reisto acurads @ aptedaiks es cra do incssavelhitenaio® e sor de texton Uaconee. ATOMS Morton “meu gala meare na bits ca abe” “Er cas a sa ds coment ‘Gibbon, “Marien jlgrse um esettordligente¢laboroso, que aera eta alo dos precanoetan de tm tacertae alton” Cksnn ter aftmade ge excrever ma ‘pease death stants compreencic no3deveres de ui Bot se167, x gARIEASO or Womerey, Hp, 1.05L. 18 “Adverisement. 1, SCesse tra agorece pela primer vez sob mesa tle no vaso Al subi pac nots finan da prntiraedgao co primeco volime de Deco‘ ‘gueda Tondres, (770) 14, © sinmgara Yehiexhe Tolle" € de Jacob, étido como bom exemplo por Aikhact ‘Bermayatp. 405, 8). A ela ete os Jol merece unseatdo Jacob panteou se limo com mono quando eee se concerey ae cians, pore Neel ermal sl anilee de rea ds tadughe manusrka de Lures no se prbpio Hae 5 ‘Atualmente, os argumentos dos historiadores ainda devem saltar para a frente ou oscilar para trés em suas notas de rodapé. Porém, 0 chumbo da prosa oficial substituiu o ouro da oratoria ctissica de Gibbon, No mundo moderno ~ como explicam os ‘manuais para escritores de dissertagdes -, os historiadores realizam «luas tarefas complementares.”* Devem examinar todas as fontes relevantes para a soluglo de um problema e construir uma nova narrativa a pamtit delas. A nota de rodapé prova que ambas as tarefas tm sido levadas a cabo. Ela identifica tanto a prova primaria que garante a solidez da novidade da historia quanto as ‘obras secundarias que nao minim a forma e a lese de sua novidade. Contude, ao fazt-o, ela identifica a obra de histéria em questao come a criagao de um profissional. Como o suido da hroca do dentista, o murmirio da nota de rodapé na pagina do historia- dor reafirma: © tédio que ela inflige, como a dor inlligida pela broca, niio avanga aleatoriamente, mas diretamente, como parte do custo exigido pelos beneficios da ciéncia modema e da tecnologia. ‘Como supere essa analogia, a nota de rodapé est ligada, na vida moderna, 2 ideologia ¢ As priticas técnicas de uma profissao, ‘Uma pessoa se toma historiadora como se torna denuista, pasando por um treinamente téenico: continua-se a ser historiador, como se continue a ser dentist, se seu tralzalbo recehe a aprovagao de seus professores, de seus pares €, sobretudo, de seus pacientes (ou seus leiores), Aprender 2 redigir notas de rockapé constitui parte dessa versto modema de aprendizade. A maiona dos historiadores comeca em pequena escala, durante as semanas frenéticas em que se dedicam a escrever amigos que devem ser lidos em vor alta nos semindrios de _geuealagion dos odigces de Goethe. Para Jeeah, ver A. Momiiino, “rcab Beenays" [Duin contaburo ata sore deg sad clase «del ona anica. Rona, 19°, pp 127.458: par sua abet sobre Lucréo, 5. Tenpanate, at genes del ractxdo ct acbraann. 2 cdcao, Pichia, 1985. Pam Michaol Bernays, vet Relan, Spite Staion emia ¢ Alumiue, 16%, pp 355-858, e HL Weigel, Nur twas ate le aeebn wird ence aner. Felogo, 198). Tanto quarts seh o teresa in, ogra de rewd. Beinn, 1 aiscou uta opine sobre ae netas de cocape Ce Cibo 15, Ver, por exemple, E. Faber @ 1 Gels, AriRbuch zn) Geechichnstadiinn 2 ei. Heidelberg e Wiesbaden, 1992, 16 seu professor. Nesse ponto, suas notas de rodapé slo apenas vistas, no lidas. Flas formam uma massa indistinta dle texto impresso em caracteres mintisculos, vista de relance no pé da pagina, que se move para cinta ¢ para baixo nas mios témulas do balbuciante e nervosa orador. Mais tarde, nes longos meses gastos na composicio de uma dissentagio, os estudantes passam do estilo artesanal para o industrial ‘na produgo de notas de rodapé, na esperanga de que seu orientador outros membros da banca exaiinem sua obra e até mesmo foturos colegas © empregadotes fiquem impressionados com as horas de Arduo uabalho no arquivo ¢ na biblioteca, atestadas pelz longas notas. Uma vez algados ao doutorado e empregados, finalmente, os his:o- riadlores ativos continuam produzir nots de rodapé. Infelizmente, 0s historiadores para os quais a redaclo de anotagées se tornou uma segunela natureza — como os dentistas que se tornaram totalmente habinzados a infligit dor e derramar sangue — cificilmente tomam ‘conhecimento de que ainda expelem nomes de autores, titulos de livros © quantiéades de pastas ou de folhas em textos inéditos. No fim, a produgio de notas de rodaps, por vezes, assemelha-se menos 0 traballio habilidoso de win profissional que exerce uma fung3o precisa com vistas a um fim mais alto do que produglo e 20 arranjo descuidedo de objetos imiteis Como o banheiso, a nota de rodapé moderna é essencial a vida hist6rica civilizada; como o banheiro, ela parece ser um assunio entediante para # conversacao polida e chama a aten- g80, na maioria das vezes, quando funciona mal. Como o banheiro, a nota de rodapé perinite lidar privadamente com tarefas feias; como o banheito, as notas de rocapé descem suavemente pela tubulagao — muitas vezes, recentemente, nem mesmo no pé da pagina, mas no fim do livro. Fora da vista, ¢ ‘até mesmo fora das reflexes, parecem ser exatamente o lugar & qhie um dispositivo to banal deve pertencer, Contudo, © historiador muitas vezes precisa penetrar nos lugares escuros € malcheirasas que as pessoas civilizadas evitam. A exploragto cos banhciros € clos esgotos foi comprovadamente v sempre compensedora para historiadores da populacio, do plane- jamento urbano ¢ dos cheitos. Os estégios cle seu desenvolvimento distinguem a textura da vida social moderna da textura pré-moder- na de modo muito mais vivido do que as periodizagdes mais grandiosas encontradas nas histérias politicas e intelectuais.!% Quem quiser aprender como uma sala de aula do século XVI na Franca difere mais fortemente de uma sala de aula moderna no deve examinar os manuais populares de Petrus Rantus, mas pon- erat sobre a afirmagio de que ele se banhava uma vez por ano, no solsticio de verdo.'? Do mesmo moda, o estudo daquelas partes da histéria que jazem abaixo do nivel do chao pode revelar fendas ‘ocultas e tubulagdes esquecidas tanto na pritica moderna quanto nas tradigdes milenares da erudi¢ao histérica, AE mesmo um breve exercicio de comparagao revela unia classe espantosa de priticas divergentes sob os trilhos da historia A primeira vista, é claro, todas as notas de rodapé parecem muito semelhantes, Em todo © mundo hist6rico moderno, os artigos comegam con um equivalente da civilizaglo industrializada para a antiga invocagto da Musa: uma longa nota na qual o autor agradece a professores, amigos ¢ colegas. Essas notas evocam uma confraria da Republica das Letras — ou, pelo menos, um grupo. académico de apoio ~ reivindicada pelo escritor. Uma vez que tais notas, na verdade muitas vezes, descrevem algo muito mais sutil, © grupo daqueles que © autor gostaria que uvessem lido sua obra, ofereceu-hhe referencias ou, pelo menos, as pontos cardeais, essas notas introdutdrias conservam algo da qualidade literaria — para nao dizer ficcional - das tadicionais, Porém, a grave luz do dia logo dispersa as sombras frias, pesfumadas, da autobiografia letra- da, Longas listas de livros ¢ artigos anteriores © séries de eeferéncias codificacas a documentos inéditos supostamente provam a solidez 16, Vera Contin, te mien tf jore Pacts, 1980, L. Chevalier, Clases aborieues ct lasses damgereuses & Parts pendant fapromfve mets die estes Pas, 1984 17. ¥. Sharan, “Nicolaus Nancelius, Fer amt sr, ead com uaa radish ines Phonaassiea Lovansensia 24,1975, pp. 132-29. 18 da pesquisa do autor ao apresentar um relato das fontes utilizadas. Na verdade, entretanto, apenas os relativamente poucos leitores que langaram suas reces nas mesmas 4guas podem decifrar qual- ‘quer série determinada de notas com facilidade e mestria."" Para a maioria dos leitores, as notas de rodapé exercem um papel diferente. Em uma sociedade moderna, impessoal, na qual os individugs precisam, para a maioria dos oficios, confiar em outros dos quais nada sabem, as credenciais fazem o que a recomendagio pessoal costumava fazer: elas dio legitimidade. Como a tribuna fasta, a garrafa cle agua e a apresentagao desconexa e imprecisa, que revelam que uma pessoa em particular merece ser ouvida quando se apresenta para uma conferéncia ptiblica, as notas de rodapé conferem autoridade a um escritor.” Diferentemente de otras formas de crecencial, todavia, as notas de rodapé podem, 2s vezes, ser divertidas ~ normalmente na forma de facas cravadas nas costas dos colegas do autor. Algumnas dessas facas s20 enfiadas com polidez. Algumas vezes, os historia- dores simplesmente citam uma obra; em outras, silenciosamente ‘poem o sutil, mas moral, *ef." C’compare”, alemao “vgl.”) antes dela. Isso indlica, pelo menos ao leitor experiente, que tanto uma visio alternativa aparece na obra citada quanto que ela esté errada Mas nem todo mundo que 18 o livro conhece © eédigo. Desse modo, as vezes, 2 punhalacia precisa ser mais brutal, mais diceta Pode-se, por exemplo, descarar uma obra ou tese de mode facdnico © definitivo, com uma iinica frase ou adjetivo bem escolhido. Os ingleses cometem essa forma de assassinato com uma construglo adverbial ir6nica: “estranhamente superestiniada” Os alemaes usam o direto ganz abwegig; os francescs, um discr- table mais frio, mas menos barulhento. Todas essas formas indis- Penséveis de ofensa aparecem na mesma posicia proeminente perpetram @ mesina verso erucita de assassinio, Quem quer que 18. C1. V. Lacentin, “Geheime Zeichen und Botscaen", Siddeusche Zeiteng, 89 de outro ve 1994 19. Cf, Bruce Lincoln, Atuborty. Chicago © Lends, 1994. 9 tenha lide um exemplo comum de hist6ria profissional recente- memte produzido na Europa ou na América pode fornecer detalhes desses procedimentos © de outros andlogos, Os cédigos ¢ as ‘écnicas profissionais que subjazem a eles parecem ser tho univer- sais no que diz respeito a seu uso quanto limitados no que diz respeito @ seus atratives.”” ‘Um exame mais detathado, no entanto, revela que 25 aparén- das de uniformidade sto enganadoras. Para 0 no especialista, as otas de rodapé parecem-se com sistemas radiculares profindas, sOlidos e iméveis; para 0 connoisseur, entretanto, elas revelam sez formigueitos que pululam de atividade constcutiva ¢ belica, Na ttia, por exemplo, a noia de rodapé muitas vezes funciona tanto por ‘omissio quanto por afirmacao. Deixar de se referir a um erudlto ou uma obra em particular equivale a uma afirmagao polémica, a una damnatio memonae, que o circulo de partidos interessados itd imedintamente reconhecer ¢ decodificar. O autor, desse mosio, marca uma posiglo para a pequena comuinidade de especialistas que conhece 0 idioma nativo, e uma outra para a comunidade muito maior de historiadores © outros leitows que poderiam pegar a estranka cOpia da Riviva Storica haltana ov dos Quaderni Storict Apenas aqueles que memorizeram os sinais em cédigo morse da Gitagio - um eédigo que muda, naturalmente, sem cessar — io ler as lacunas como inflamacas e argumentativas, Para o paiblico externo, as mesmas notas pareverio calmas © informativas. Muitos textos Ihistéricos talianas com notas de radapé, ent outras palavras, contam, ‘no apenas as duas histOrias teoricamente exigidas, mas ts, Elas se dirigera nao apenas ao priblice de historiadores teoricamente univer- sal, 2 “comunidade dos competentes” em qualquer pais, mas a um grupo muito menor, © coneifio dos bem informados, 20. Pora wm esto fe una shthaelegarte desis peiteas na jrigpudénets ale, ver Riess, Vorsuchon me einor Thoone der Pusinote Beilss 2 Nova York, 162-1584, por ‘exenplo, p. $"Die ucsnore ist (oder gt vor, eS ma sein) Tier wivensctalichen Sifonmaion." A nota de rodapé 6 (am das ues gata ost fase), solve w pals “nto das "der auch nicht. Vertaabén pp. 20-21 € U Holbein, Samabase ‘ond Odaek racks, 1890, pp. 1823. 20 Na Alemanha, ao conirario, a omissto parece ser menos uma questo de declaragio particular do que geral. Os historiadores da ‘Alemanha Ocidental adorevam condenas outros por terem deixado de citar “a literatura alema mais antiga”. Eles proprios, no entanto, regularmente deixavam de citar obras mais recentes — especialmen- te sobre hist6ria alema — emt outras linguas que nao o alemao, € muitas vezes também de notar ov assimilar as formas mais novas, interdisciplinares, de histéria que floresciam na Franga © nos Estados Unidos. Ao fazé-lo, no revelavam ignosfincia (isso nunca). Pelo contririo, demonsteavam uma conviceao: a de que habitavam um Reino Médio da mente histérica, organicamente ligado com a disciplina Begnff-siicken, de hegemonia germanica, do século XIX. Por conseguinte, no precisavam admitir os barlaaros de fort ~ exceto naqueles casos privilegiados em que os hrbaros tivessem dominado suficientemente os procedimentos e os mistérios da erudigao alema para se tomar civilizadas. A comunidade histérica assim revelada coincidia claramente, em todas as suas divisbes, com as fronteiras nacionais, Ap mesnio tempo, contudo, os historiadores da Alemanha Ocidental no apenas perpetuaram um preconceito, mas deram continuidade a uma pritica de pesquisa que se harmonizava perfeitamente com a percepcho de sua prépria posigao ne mundo do conhecimento. Eles (ou seus assistentes de pesquisa) comu mente trabalhavam em uma biblioteca de seminério destinada a fornecer a literatura bisica de uma Gnica disciplina. O acervo dessa colecao limitada, eles o citavam detalhada e extensivamente. Obras ndo representadas no semindsio, por outro lade, poderiam ser trazidas para inforumgio, se 0 estudante assistente de algném conseguisse encontré-las na biblioteca da universidade ou obte-las por empréstimo entre bibliotecas. Porém, elas nao exerciam um Papel importante na fornagio dos debates hist6ricos e comumente ‘ocupavam pouco espaco nas notas de redapé. Naturalmente, bevia uma probabilidade maior de que os livros estrangeitos repousas- sem nas estantes mais inacessiveis ca hiblioteca universitiria em vez de ficar a vista nas prateleiras abertas do semindtio. As a dificuldades praticas de acesso, desse modo, reforgavam as guardlas alfandegérias intelectuais j6 postaclas pelas tradigdes da instrugao € da emdigao. Os historiadores da Alemanha Oriental, por sua vez, tinham guardas alfandegérias reais, ridimensionais, com as quais se defrontar. Eles Faziam suas declaragdes de centralidade © de subordinacao intelectual de modo mais direto — sobretudo, talvez, pelo ato de colocar as obras de Marx ¢ Engels, fora da ordem alfabética, no inicio de suas listas de citagdes. A hist6ria da nota de rodapé que as forgas conjuntas da erudi¢ao oriental e ocidental irao, criar em uma Alemanha unida ainda est4, é claro, por ser escrita. ‘Como sugerem tais casos, a nota de rodapé varia to ampla- mente em natureza e conteddo quanto qualquer outra pratica cienti- fica ou teenoégica complexa. Como “medida quantitativa exata’, “experimento controlado" e outtas gatantias de que uma dada afirmago sobre o mundo natural é rigorosa e valida, as notas de rodapé aparecem em formas suficientes para desafiar a engenhosida- de de qualquer taxonomista. Cada uma possui uma relagio organica com a comunidade histérica particular na qual fol gerada — uma relago pelo menos tao importante quanto a de sua relago com a ‘comunidade supostamente internacional de historiacores, essa qui- mera imaginada pelo historiador catélico inglés lorde Acton, que tanto fez para introduzir o método da histéria centifica alema na Inglaterra. Acton esperava editar uma Gantbridge modern history na ‘qual as nacionalidades dos colaboradores nao pudessera scr inferidas do método ¢ da substincia de seus artigos — uma histéria que sera cescrita quando as vacas voarem.”! ‘Alés disso, as notas de sodapé no variam apenas quanto a0 estilo, mas também quanto as condigées de sua producto. Algumas Tongas listas de citagdes de arquivo documentam um eonhecimento individval arduamente conquistado por um estudante pesquisador acerca de uma questio obscura; outras, como as que adornaram os 21, Pars progsoaa de Acton, wr Tae sarieses of bistory. Ogantzado pac F. Stem. 2 ed. Loses, 197, p. 269; © ocomentnode H, Bumteeld, Marton be: pt, Boston, 3950. artigos eruditos de Walter Ulbricht sobre a hist6ria dos sindicatas ¢ dos poltticas alemas em Beltrdge zur Geschichte der deutschen Arbei- lerbewegung, resuiltam ce um trabalho em equipe fornecem infor magdes obtidas depois, ¢ no antes que ela fosse escrita, a fim de apolar uma tese preexistente. Os dois tipos de nota parecem seine Ihantes, mas obviamente tém relagdes distintas tanto com 0 texto que supostamente sucpiram para apolar quanto com as concepgdes histéricas que supostamente regulam sua produgio.” As citagdes em obras cientificas - como mostraram intimeros estudos ~ fazem mito mais do que identificar as origens clas idéias e as Fontes dos dadlos. Elas refletem os estilos intelectuais de diferentes comunida- des cieniificas nacionais, os métodos pedagdgicos de diferentes programas de geaduagao € as preferéncias literitias de editores de periddicos influentes. Blas podem se referir no apenas as fontes exatas dos dados dos cientistas, mas também 2 teortas mais gerais © a escolas te6ricas com as quais desejam ou esperam ser associadas.”’ As citagGes em escritos histéricos mostram, pelo menos, tantos sinais de sua origem em esforcos humanos faliveis € preconceituasos quanto esses. Do mesmo modo, quem realmente segue as notas de rodapé dos histoniadores até suas fontes, tendo paciéncia para perseguit 25 raizes profundas, tortuosas, das drvores desbastadas ca polémica académica, pode efetivamente descobrir mais objetos de interesse humano do que se poderia esperar enterrados no subsolo dspero. Consiclere-se apenas um procedimento, felizmente raro, mas infe- lizmente comprovado: 0 do punguista erudito. Quando pego no ato, o criminoso adepto suplica a sua vitima que tome sua cartelra de volta silenciosamente: assim que a vitima estende a mio, € claro, 2 Ver, por exemple, W. Ulbicht, ‘Die Nexemnbemeseletion nnd der natoaale Kampf ‘gegen den deutschen Inperhllsnus’, Betnige sur Goschicbte der deutschen arb Bewegung 1, 1959, pp. 625, em 17-18 O "Precio", p. 7, asebém eniai. que 0 percdics i publica “unvevoenicite, fir dar Ferachuing, ne far due Propane bar wertvelle Daturncate und Materlallen, como fez en atiges agropadce sob otis Dokamense usd Neri’ 23, Ver, em geal, B. Conia, Te ctavon process. Londres, 1984, com extensa biogas % 9 ladnio grita: “Socorro, ele esti me roubando". Do mesmo modo, mais de um estudioso plagiou material de um outro, enquanto simultaneamente acusava a vitima, na nota de rodapé pertinent, de ter feito o mesmo. Poucos leitores terio a tenacidade de verificar a hist6ria, e a maioria ird aceitar que 0 ekcgante punguista, € nao a desgrenbada vitima, disse a verdade, O caminho de um filo ou facidide do arquivo para © caderno de anotacdes, da nota de rodlapé para a resenha, é, em suma, exiremamente curto, Nesse caso, assim como em ouiros, 0 leitor erttico pode muito bem descobrir que “o que importa é a jornada, € no a chegada”. ‘Annota de rodapé exige atengio também por outros motives: indo apenas como wma parte generalizada da pritica da ciéneia e da crudigao, mas também camo um objeto de nostalgia aguda e de um debate acirrado. Os historiadores do século XX acrescentaram ‘uma sala moderna depois da outra as mansbes tradicionais de sua Nem mesmo as qualidides dos melhores historiaclores modesnos tinham uns importincia maior do que as das fontes primarias, os documen- tos que revelavam as verdadiiras intengdes das polticos « genetais. Abti-los deveria tornar-se a vocagho de umn eleita, que viajatia com a ousadia do explorador da Arabia, no século XVM, Carsten Niebuhr, Ro para um deserto da Africa ou do Oriente Proximo, mas para Amago alemto da escurido das arquivos: (© que precisamos # de um homem equipade com um coaheci- mento rzolvel, cxmas de recomendagio pomposa e lioa satide, que crmaria a Alemanha de pons a ponta para cagar os reste eae mundo, que est meio imerso ¢ no entanta Go préxima de ni6s, Persegtimos pastos desconhecidos nos deserton da Libis: NBO deve 2 Sd Ge nasi anepteentoe, em nose proprio fa 22, 11 Ato [Pt Tec), cose de Ranke, Rigtnsuaber ur Jnticben Algemeen aerater een 18, 1908, 1738 cok. 129-440, ems 338. A Beige mar Kath neues Geachichtschreisr de tare, e's Basie un, Rahs Abe, ud oeigen neigens rig von mannuhacher Vergleleing det venchiedenen Exespe> ner sich 23. Hanke, Zur rip. 177, Bs sie Sher dete Zeit Acten, Briefe, Lebenstescueibungen, Cronin von der grtssen Wichigheit verhnaddem Ide die es aber ke. als wave die Buchdruckerkeast nock ger niche fund.” 18: Fer wireeln aon erfderich, deat edicher Rennes, sasctem Ampieblurgen nd guter Gesundher awgewsiet, Dostchland nach len Selten Suche, md dle Rese eiger halb untergegengnen ume 20 nale liegendca Welt 53 © homem certo, é lato, era o proprio Ranke. Sua inspiragio foram as primeiras publicages do jovem G.H. Pertz, um erudito mais bem situado que jé havia comegado @ invasta germanica das bibliotecas italianas ¢ que lideraria o maior de todos os empreen- dimentos histéricos alemaes, os Montumenia germamiae historica, que produziu ~ ¢ ainda produz — edigdes criticas exaustivamente preparadas das fontes da hist6ria medieval.” Ranke estava também enlusiasinado com © sucesso de seu primeiro Livro. Mandou uma ciruva de cartas © c6pias complementares a eruditos, ministros € 20 intelectual e estadista Barthold Georg Niebuhs, que foi simultanea- mente embaixador em Roma e historiador. Fm suma, Ranke procurou todos aqueles que, segundo julgava, pudessem ajuds-to a obter um cargo num universidade, subsidios para viagens € as chaves dos teins dos arquivos no pais ¢ no exterior. A-exploragio e a utlizacio das fontes prinvirias cla histéria a principio, os relatos dos embabxaclores venezianos ao governo, mas, no fim, muitos tipos de papéis pitblicos € privados ~ tornaramese © principio o:ientacior do trabalho de Ranke para toda a vida, Desde © fim dos anos 1820, Ranke enclausurouse no matetial original da hist6ria. Ele viajava segukarmente, com auxilio oficial, para ter acesso ag que cram ainda, nos primeiros anos, arquivos bem guardades.” Ble explorava com rigor o mercado de livros pés-revolucionario, no qual os papéis cle muitas familias italianas estavam a venda, Usava sisteusaticamente as méquinas humanas de cépit que surgiram muito antes cla cimert de microfilmagem ¢ da Rank Xcrox. os cseribas profissionais. A aquisicic continua de novas edighes importantes como a8 contidas nes Monunenia procuzin 2 montanka de livros © imanuscritos agora preservados na Universidade de Syracuse. Um “pufsehte. Wir gen unbkennten Crise bia dle WattenTubyens nae sole das Tleben unserer Alworder niche denseloen Eller in smaerm eigenen Lied seh aes 25, Ronke, Dar Brigiteré organzada por fuelm 70. Pare Peete ver D, Knarsles, Get ioral enrrprac, Proteins (if monastic bidory, Berge, 1963, cap. 3, com feferbncas Iecatra toa oni. Ver, por xeapl, Ranke, Neve Bree, onganteace par Hoeft ¢ Heated, pp. 6-39. Para wm eanidn fscinante sole 9 dgeln de un dos arguivos mas nes da Bacop, ser Chadwick, Caoticcn ana bison. Cambedge, 197, ye 4 fotografia mostra 0 velho histosiador encolhido, quase esmagado, pela concretude material de sua erudicaio.* Ranke mio acumulava simplesmente: o que lia € copiava, cle usava, Descrevia sua histGria da Alemanha durante a Reforma, por exemplo, sua principal obra dos anos 1830 ¢ 1840, como o resultado de um progresso triunfal pelos arquivos alemies. Em palavras que se tornarum célebres, Ranke profetizou que esse livro pesado era apenas a primeira andorinha, o aravlo de uma revolugi histérica: ojo aproximarse a época em que | nao teremos de basear a histéria moderna em relatos, nem mesmo nos dos historisdores Cconremporinaos ~ exceto na medida em. que tenhaia um cone inento de primeirnio -, pam nto falar nas reelahoragoes erivadas das fortes. Ac contrario, 08s a construlremos dos relatoe das testemunhas oculaces e das Toates mais genuinas © diretas Seu entusiasme subsistiu durante anos de trabalho arduo, de busca e copia, exame ¢ revisto, comparago de edicdes impressas com textos manuscrites. Quando preparava 0 apéndice documental a historia da Reforma, por exemplo, Ranke fez repetidos rascunhos para uma invocucto na qual apelaria para “leitores que pasticipam do wabalho’, “leitores participantes”. Fle admitia que no podia lmprimir todas as foates zelevantes, ou todas as que usara: “Ninguém 28, Pars os procedimenios de Ranke, ver U. Tucci, ‘Banke and the venetian document uke em Giger Rowe ong ven Rene ade shpeg of e incr acne Scio 159, po. 39 1 pares igen dee Ae Dibsigec, vero Ronin tad Yertimbemncthe tionsae Mate Toe ped ‘oer mamisencaltenon of Sree Bacay. Sve aS 29, Ranke, Douce Gest ear Refrain, oped poe Jochen ok Muu, oS 0H. 1 Ge sleh che die Zon ert, tw tie te Geshahenis me ace sb ci vers Hoc mt stsover fate che orale Keminn beivatme. gextncge denn a ie weer atgeetzan Beawetungen mn groncen hasen,scndety aus den fehuren ter Ageneugen und den aes mien i aon seen” Apo Sei te pry yen le are «des Nr ges en ‘evtam cm porate eneghes para de oachinsen ese seradres, ti evedog seas cio contr tees tne eis inom dor ends £4 peraamen de Ranke Ha ov winds em Gammon ado por X-aomessein, Ale, 1971186. pp G27734, sore 0 pene ees ec de Hanke, vr ombin app. 8 8 desejaria publicar arquivos inteiros.” Porém insistia em que esse material era vital para letores inteligentes. Instava-os a superar o que em seriem Iocorum classeonim = eo: legendas preponcrem, Dieu, ‘ae Tegentbus offendine, eric tlle curarem. Eadem rsnone hisqram medi evi 1H. Ibid, 3 pp. 83-84 Cl. oun aspecto mais geral, Gescbichiuisumschaft x Barn ine 29 ‘und 20, Jabrbsinder.. Beclin, 1992, € para © vemindrto Sybel em Yhmique, ver. Detterweich, Hemrich nom Sb Getingen. 1978, pp. 255.24, 35, Ver Berg: L von Ranke, Aut Werks una Nach ewgmizado por WP. Fuchs etal ‘unique e Viena, 19661975, 1, Ss? base em meras selegdes, ou do que os proprios arquivistas, quais, Ppreciosidades os Gocumentas inéditos poderiam fernecer,® Mais importantes ainda do que seu fecundo génmen de enudigao, € claro, erum os livros nele geraclos: a infinita série de histérias da Europa medieval e de inicios da era modema (e muito mais) assistidas, cacla uma, Dor uma majestose série de documentos © sustentadas por uma massa de notas de rodapé que fornecem nao apenis referencias, mas passagens inteiras das fontes. Ranke criou uma nova teoria da histéria € escreveu com um cosmopoli tismo no igualado durante um século, quando Braudel o aleangou ~ porém nio © supercu, Nao me ocuparei diretamente dessas realizagdes aqui.” Mas ele também criou ¢ deu @nfase a uma nova ritica, bascada num novo tipo de pesquisa ¢ manifestada por uma nova forma de documentagzo. Toda obra séria de hisria deve agora Vigjac num barco de casco impermesvel, como uma tartaruga de costas, O fracasso em alcangar esse ileal de descoberta € de apresentagao trouxe a desgraca para adeptos do método tradicio- nal (ou da aus€ncia de método) como Froude — que deu seu nome, como Holland, a uma enfermidade detectavel.* Alcangalo signifi- cou produzir um rico instrumental, uma série de suculentas notas de rodapé que os novos estudiosos podiam espremer com proveito — como indicou Ranke na pritica, quando Fazia seu secvetitio fer eM voz alla extratos no «lo texto, mas das notas de rodapé, da Historia da Prissia de Droysen, enquanto preparava sua propria abordagem do mesmo assunto.” © homem, © momento ¢ 0 método surgiram conjuntamente com uma nitidez que imediata- mente levanta suspeitas. 36. Wiedemann, “Sechzeha jhe in dor Werent Leopold von Ranke’, Deuiicbe Revue, anovessbee de 18591, pp 17218, 37. Ver a apreciagio magiaral de P Gilbert, Misery: Pebics ou cunure? Minceten, 1990 ‘Yam wn gone de sia mus erkieo, que enti 9 estensso © 2 orginaidade Inszoriogralis co século XVI (e tz 3 Lz aspecos des Wadiglo, came au Interest pel bistiia culate sock, que teko € sbordaco aq), ver P. Burke, "Ranke te eacuonury’, em lege € Powell (orga, [agpedd von Rar, pp. 36-44 238. Para o “wal de Froude, ver GV. Langlals © C. Seabos, inaducnn t the saty of ‘sory. Trad, de GG. Bemy. Londes € Nova Yorks IBBS, reimpr 1ST2, pp. 124 128, 38. T-Wiedeman, “Sechacha flue in der Wekstaa Leopold von Rakes", Deutch Fevue, dezemnbco de 191, p 522. Ranke insistia em que esse tipo de histéria nao reproduzia nenhum modelo existente — nem mesmo a erudigio critica ckissica da geragdo imediatamente anterior @ sua, a obra de Wolf © Niebuhr. Retomaremos a essa afimiaclo, que agora parece Ho provocadora ‘quanto a insisténcia do grande historiador da antiga Inglaterra, Ronald Syme, em que a obra de Lewis Namier sobre a histéria inglesa, que amtecipara seu uso dos métodos prosopogrifices, nao causara nele impacto algum.® Em sua propria Epoca, « retérica de Ranke geral- mente convencia, Cagadores experientes de arquivos, como o histo riador de Kénigsberg Johannes Voigt, sentiam que Ranke havia de certo modo thes dado voz, ov uma hnguagem com a qual podiam explicar a importinea do que ha muito tempo estavam fazendo.' Profissionais de diversos campos reconheceram que o tipo de hist6ria de Ranke era algo radicalmente novo. Em 1863, 0 classicista Heinrich Nissen propés-se a mostrar, em seu célcbre estuclo sabre Tito Livio © suas fontes, que os historiadores antigos haviam noomalmente traba- thado nfo como os historiadores, mas como os joralisias atuais. Haviam obtido suas informagdes, argumentou ele, de uma fonte Principal e apenas ocasionalmente usaram outros textos para cortigi- as ou complementé-las. Nissen bascou sua tese em parte num uso tengenhoso de diversas fornias de provas colaterais — como o fato de que 0s livros antigos, na forma de rolos, teriam praticamente impossibilitado sua confrontacao com outros de manera sistema- “ Woake, Samenlche Werke, 35, p. yf 1. Sone, the ps and te poco reed Toadies, 158" 41. Vera ci de Voigt» Ranke, susprcendenteaente hurd pao conpador de tedo © Gide jaimance prasiunn © sur dos mene docametiages © . merle invades Gcbicie Marburg Reiger. 1824 Fdebrand ews 115, em Vanentrap, 9p. 127128 ¢ tt cago eas dass de Ware see stem naga de dt busca cin ara, ccs aa et eu Brig ‘ter berubnasen Golebro dee Zatlers der Rejoraon mi Hite Abrect ro. Prous: Konigborg, isi, Wh Resoctacnate voy caf krona ‘ncenscniginal eerieo do que Rake cso deta, nian decir pense burs paneer, e ulaapassada em au tdaiea cen Ver, or enero, o mgs eben aera ‘supe sobre Youn Alpercne Dito Fyne Prac, Die onjcte alters Cnwerit aw Kondgserg 4. Pr tm rcwterbe fabricar cnpsbers, 189, gp. IS6IK8, G. von Selle, Gecbicte der Aborto “Kongabory Paton Ronipserg, 194%, pp 27290 Aas emis ep ‘se tdy oats arent, 59 tea Porém cle recebeu seu maior estimulo de Ranke — que, juigava ele, mostrara que os bistoriadores medievais ¢ renascentistas ainda trabslhavam do mesmo modo, alé mesmo em sitvacées literérias inteiramente WOhL ‘dh mir bei grossen Minera laser Art Beall vereprach = n Ranke nao eram de todo compiladores inoventes e pouco esiticas. Uma pesquisa recente mostrour que muiias das técnicas criticas uuilizadas por Ranke ~ eomparagao sistematica de todas as fontes para um dado acontecimento, identificago das que foram produvcidas ‘mais proximamente a ele ou se apoiaram em documentacto oficial, eliminaglo de fontes posteriores cujas informagdes sto herdadas — surgiram na Renascenca. Humanistas italianos © nérdicos, seguinda pistas cm modelos clissicas, denunciaram textos canclusivos como falsificagdes, ao fazec aplicagées sistemticas desses procedimentos. Lorenzo Vala, por exemplo, demoliu a Daagdo de Constantino, Bisse texto, durante muito tempo guardade como um tesouro na cticia Papal, passava pela narrativa de como o grato imperadac Constantino, curade de sua lepra pelo papa, deu a0 papado, com reconhecimento, tod a parte ocidental do Império Romano e corre para Constanti- nopla. Villa provou que esse texto mencionava instituigdes e costu- mes ¢ wilizava uma linguagem que no poderiam ser encontrados na Roma da qual supostamente viera.' No século XVI, Jean Bodin © outros escreveram manuais detalhados sobre como ler ¢ utilizar fontes histéricas, antigas ¢ modemas. Eles incluiam instrugdes precisas sobre como selecionar historfadores com base na exatidao, assim como na profundidade, © sugeriam que um critério til era avaliar até que ponto um dado esctitor se baseata em fontes oficiais para consiruir sua narrativa ‘ou relatar discursos ¢ deliberagécs.” Esses livros chegaram até varios enuditos e imelectuais de fins do século XVI e exerceram influéncia sobre eles, que aplicaram os eritérios de Bodin quando Jian: histotladores antigos. Ranke, com efeito, citou Bodin no inicio de sua discuss sobre os discursos de Guieciardini: "Cinco anos apés a primeira publicagto da obra de Guicciardini, Jean Bodin 19. Para um Jevancumento renee des decensolvimentos reauridos 293, ver U, Mablack, SGescbicbinwasencchap in Humayisoms tnd in der Aafataraag, MuniQue, 131, 20, er, por exemplo, J. Reanim, fw Bodin aad the sum comsury rere the ethology of far andtbastory, Nova Yorke Landes, 1963. 7 dlescreveu-a em seu Methadus ad factlem bistoriarum cognitionem: "Seu rigor ma descoberta da verdade € notivel. Dizem que ele ‘obteve cartas, leis tratados das fontes originais ¢ os copiou. Portanto, cle muitas vezes usa termos como ‘Ele disse estas alavras’.. ou, se 0 texto original estava perdido, ‘Toi esse o sentido de suas palavras'. A opiniio de Bodin nic deixa dtividas: os dliscursos em Guicciarclini so genuinos... E essa opiniae se man- teve, embora nfo sem alguma contestagao, até a época presente." Como se sabe, Ranke citou a opinito de Bodin para refutéela Porém, © fato de ter citado um dos primeiros tratados sisterAticos sobre como ler textos histéricos mostra que ele sabia nto estar adentrando terit6rio desabitado quando atacou © problema do uso que Guicciardini fazia das fontes.” Mais tarde, quando Ranke expds sua avaliago da sutileza politica da retGrica posta por Guieciardini na boca de seus falantes, citou tanto Bodin quanto um leitor contempo- Fanco de Bodin, Michel de Montaigne.” Essa tradiclo humanista tardia de debate historiogrifico, sobretudo, nao estava absolutamente extinta na Alemania de fins do século XVII e inicios do XIX. © tedlogo de Halle, Johann 21, ake, Zur Krk never Gatrohsebveer, pp. 20-21: Fin ob, alice das Werk, Ghlcelareinis ze enschienen, sebreb Joba Sacin to meodkh ad feel bieriie oprianen exp. is, von dewaelbeo: EX anim in & iakin Serta ixpatettne Fore epitlis, deren, Feeders, ex spe Sn leucine st express, linque feequerter oecore sd lors et faee vera gu span sorb delueits locus 58 to hare enfentiem’ Man sone dle Meytung Bodin st, dle Reda bel Goiceardins even sci Diese Neyoni. bah nicht ohne enigen Wars et il lor bBeaur den teudgen Tap erhalten 22, Para outea etna cries, over revelador, de Bodin, vet tH, p. 78. n 2. Thi pp. S47. "Es i Wall rc ene Zest gewesen, srelcbe i eaencger Thelnabine an dam éffentichen Leben, an jee Weinsien Brcigiss die Jetse Hilfe des 16. Dibehunless ctertrolien, Allenitalben Selbsatindigkely ad doch dich die beyer Panheyen eine 60 exye Vereinmgging, dete fet keine Geschicte geachnicten wenden oan, sie Wire dean allgemene Webyextirate Rewerden. Da kamen enn dic Dascorse Guiccindine, diose Borachtungen feler Degebenkek Yoo allen Seiten sr vechten Stance. Ubi guid in deliberatemnem cad, mg? Bodin, ice inexplicable ear le aeiabilem sn insererco auld isters Getta” Mn fObte soy dass ess di Huptsahc in dene Wek sea pa’, age Montaigne, ‘de quot ve semble solo prévulok fe plu, sont ses egress et es dicts” 24, Ver esp, PH, Rel, The Gorman ondgshinanert ana the re of Ports, Bethel, B Salomo Semler, analisou as fontes para 2 hist6ria medieval em um ensaio amplamente divulgido, © erudito de Géttingen Johann Chtistoph Gaterer fundou © primeiro seminario hist6rico da Ale- ‘manha, no qual os estudantes zprendiam a p6r em prética as regras da critica elementar e avangada, E seu colega August Ludwig von Schidzer, que realizou um estudo exemplar sobre os primeiros historiadores russos, também criou um notivel programa geral para coleta e amilise de fontes histéricas.* Ludwig Wachler, professor em Marburg, de erudi¢ao eneiclopédica, produziu, proximo a0 perfodo do escrito de Ranke, ums histéria de cinco volumes da escrita histérica, cheia de notas de rodapé, um livro que abarcava cronologicamente descle a Renascenca até sua prépna época, ¢ gcograficamente desde a Finldindia até Portugal. Ranke o admirava, ‘Wachler nao antecipou o ataque de Ranke & confiabilidade © & erudicio de Guicciardini conto eseritor: “Guicciandini narra de um modo adequadamente sério e franco, muitas vezes como testemu- nha ocular e participante ative, sempre com um conhecimento exato das pessoas e das condigdes sociais. Por conseguintc, ele pode teivindicar um alto grau de credibilidade.” Porém percebeu que Guicciardini impuscra sua propria visto das situagoes € dos motivos 2 seus atores, mais do que lhes permitira expressar suas priprias visoes pescepgoes. F clogiow Guicciardini, sobretudo, pelo fato de que seu livro exprimia de modo extremamente vivido 197%: © HW Blane, “Audbbsnanpshitere, Hisorimss, vod hisiorsche Kell, Eine Skina’, em FLW. Blinke J Rasen (orgs), Vow der aalavany, su 1dormus Paderbown, £964, pp. 167 186, cormncementiiode W. Weber, pp. 186-189, en pasta se Blank. pp. 189-190. 25, "Schthver uber dle Geschictasvesfassung (Slueiben ther Maly an acinen deutechen Herausgeber", om JG. Heicanain, Litransche Chvorit Bera, 1785, pp. 28.209, tesevado pars o agit com umn comentina inane de WD. Schmet come “Senionet fon hiserlograshy", Hutory and Ybeory 18, 1979, pp. 37-31. ver lem Rell. Hbmmenten, “Der Antod des 1& Jatubundans ander Ausbidung der htorchen Sculen der 19, Jlchundens”. Historische Forschung in 18 jabrhunders,orpinizsda Por. Barmer2]. Vass. Bans, 17%, pp. 432490; 6 Sin, Lie Entel der Alen (Geschicue are er Philtfeticivcrsit Aeariurg. Sebi, 2977. pp. TsLi6, Hl, 02 enslos om Aura inal Geecbiche organtmda por HE Bde, I. Kouden. etingen, 1985 4 © carater da época que o produzira: “Quando consideramos essa ‘obra de histéria, a descricio do periode delineia-se em nosso espfrito, em um desenho nitido € expressivo.” Ranke. que viu & percepglo que tinha Guicciardini de seu ambiente como crucial tanto para suas realizagSes quanto para suas falhas, certamente teria concordado ~ e padia ter encontrado em Wachler 0 nticleo de parte de sua propria critica e avaliacao de Guicciardini, assim come, algumas das idéias estabelecidas que ele atacava.”’ Ranke também conhecia outras obras de lteratura hist6rica que podem, de um modo mais geral, @o estimulado a ver mais clara- mente do que seus antecessores que os métodos ¢ as metas de Guicciandini diferiam clos seus. Por exernplo, ele conhecia a Scienza nnota de Giambatista Vico, na waducao alema que ele citou, de ‘passagem, em sua discussie sobre um outto historiador italiano, Paolo Giovio.” Além disso, Ranke, como jé vimos, estava longe de Sef 0 Unico jovem historiador alemao a perceber que a historia das temas germinicas, assim como a ¢la Idade Méclia e 2 do inicio dos tempos moclernos de um modo mais geral, devi ser remodelack & sreconstruida sobre uma base documental. Todos eles haviam apren- dido pelo menos parte de seu oficio leno 0 primeiro cissico da literatura histérica em lingua alema, a histéria da Sniga de Johannes von Miller. Bla se apoiava em bases solidamente documentais, como cabia a obra de um autor que, segundo acreditava Ranke, jubgeva serem os prdprios céus umn arquivo infinito ¢ intocado.”* 26. L Wachler, Geschuche der bstorchon Forschung wd Suns sot der Wadorborsiang lr seth Kaar ree |, 1-aoemgen, 1812. pp. 174175: 1m er of ole ‘nugenseuge ved thitiger Wheeler, sets mais genaver Kenainisy dee Penonen ul ‘Veringsee, wUndig emt und freymthig ereahl, ao kaon er auf einen seh hohen Grd con Glastmumdigken Anepmich mochen...Das Bid des Zeraters tnt in rine Umrissen, chart und ausdhuekscall geerichnes, vor unset Geri, ween ie dieses GGeschiehsbuch aus der Hand legen. Pars ume descicao apreciated Wachler, ae ceriaiza seu exforgo em sitar hetoendores passados em seus contexts histones espeios vee TLC Blanks, £ttoriogaplegestichie as Hor Pemdamenta Histrica, 3 SurigarBad Crt 1991, pp. 194-204 Ranke, Zur Kad nouoror Gccbichtchretie, 2. %, 3. [Bemaps, pp. 16-33; tobne 4 sproprino ce Niilen pox Ranke, ver ep. 1. Kringe, Rake The raring of tory, Chirag © Loadres 1977, pp 366-367, m. 3% BN Sobretudo, devemos ter em mente um fato simples que muitos alunos de Ranke ignoraram, Ele tratava da historia da Walia durante a Renascenga. Esse campo atraira muitos dos maiores eruditos italianos do século XVII, poca de ouro da catalogagio dle manuscritos, da edigao de fontes ¢ de outras fontes de erudi- 20. Exatamente no fim do século, o reitor da Universidade de Pisa, Angelo Fabroni, publicou vidas eruditas de Cosimo, de Lorenzo de Médici e de Leto X. Cada um desses livros inclaia uma série enorme de notas documentsis no final, Na sua vida de Lorenzo, Fabroni até mesmo vislumbrou algumas das mais célebres afimmagées iniciais de Ranke sobre a hist6ria, insistindo em que 3 caracieristica de sua obra residia nfo em suas solugdes para problemas controversos de interpretagio histérica, mas em sua tica apresentagao de documentos de arquivos."” Ranke — até entio inexperiente em. pesquisa de arquivo — estava mais inclinado lamentar a enorme quantidade de outros documentos que, como admitia Fabroni, cle tivera de omitir, do que # reconhecer seus méritos."' Nem Fabroni nem o erudite renascentista inglés William 29, Ver cra era, Cocheane, “The semeceoro eievalia,Jourataf the History of Ideas 19, 1958, pp. 5441 30. Ver A. Fibroni, atoent Medces maynfet ita Pisa, ITB, “Lect, 1, til [Drecreverdo na Gbea de M. Brutus que nao dera acess, F.esereye: "Nan quart le non admedum exiet Necice’s armicus, suspesr cuoen semper in Fsurento noble tater ot ragmitodiner ani, snguavencus peudentam qua ccnsclit pore Heme rinse Reipublice in tempers, quibus diiertescives dedmique lus aque lsd fo pervenerut, ut oec vita nec retedia pat anole pose vidersnanr, Sed hace eis Salis due nos expeabirns, utecmpgue peat eu, magnopere borabiens, ‘lor content, qo in naan res neon eran gstorbn moe nna eC Ronn. Ex he soc cpetis vakunen confisbhur, quodque «crv pletaque sipervenur ip Florentino tbolari, quod Mfediceum vel Sogatena Yecceea appellac folet, que ominavimus volumina, seu iz ald spectre exttimabis.” Vertambém fms Loonie X Porificts pass ita Piss, 197. 31 Ne fir de eeu Zauronsi ua, Tp. 399, depcis ds nota 227, Fabrons arescentou Uo sls fin: "Cave puter, lige hoimaniesime, nes ors mactentt, ae ad Taare him percent, quceque nos muulcas collogss, tn oe vokumen reli. Inuoers finn pee act qune. coleater ee, edefe praefermisims, Ne Mina exeroscert ‘Begala volominie Uliano quae presi, sequieualiecbas miaime displieact” Em Zi Atk pp, 175174, Ranke iskala em que a6 mesmo pars om fkxeraines oF locumesten de relazoes exaseren tina nd era teesfvels em quannidaes sucks: {es 2 stungso dpe dnewnenigs interns era elon). Sobre Faron, esreveu:“Fabto0 YBekenni, 2 2ey im kein moglicn sgeveaon, all ine Useunden abausebeaen, 15 76 Roscoe, historiador amador de Liverpool que continuou sua obra sobre os Médici, leu as fontes com 0 olhar eritico de Ranke. No entanto, sua obra the ofereceu um material muito mais vitai e lhe proporcionou o que se tornou seu modelo habitual de apresenta- lo — 0 texto seguido de um longo apéndice documental ** Mais importante aincla, os historiadores alentes que aplica- vam um método critico s fontes da histéria medieval € do inicio da era moderna imitavam o que os eruditos ckissicos alemaes ja haviam feito em relagio As fontes da histdria antiga literiria politica.* De 1760 em diante, classicistas alemaes como Christian Goitlob Heyne ¢ Friedrich August Wolf cralvillvaram incansavel= mente para demolir 0s Idolos cio neoclassicismo. Bles nic atacavam a autoridace cultural dos antigos. Pelo contério, insistiam em que © espirito greyo, tal como manifestado na arquitetura € nz eseultu~ ra, na poesia € na religio, ainda er vigotoso e estimulante © ‘deren cine fst unzahlbaceNienge sey, nod wenn ec sch in selnem Lorenzo beech bt 29 fat ees at Leben lace X noch mehr geihan. In Hitsiche uf den Zmeck eines Biograpien inst man ess biligen och wern an der genauicen Kents cheser De elegans, der wird hiemt niche befrecig(p. 1700" Bssisafsmagnes 2 neu vero injrsns ~ e ceramente refletem a ihexperécca de Ranke em Felco 205 ‘peblemas peaicgs do Fommecimenta de docementagio, 82. Ver W. Rescos, The Me and pondfcaie of Les tbe Tenth. uverpod, 1805, emp. seu preficia, pp Fata, em Hh, 89 qual antecipa Ranke 20 agumentae que Giowo Fiver todas as oponunidades de obtet as invonmugies als exatase aericas sobre ‘cossunto de sua hist pp. x ohne Falvonl, loglando se uso de “anes gre ‘quanta de ormagno oiginalsp_ av, sabre as questors eri, quats Rosaoe Sima ter cao apanas fonts origins Tania qua se permutear isoporuidades Dp. ves, sobned wtingio por pare de Rescoe de "documentos origi dos anuivas Fiorentan, do: Vateena © de cutror lygree, Konone ina um grnde aprego pelos cradle talianos que o bavinm antecedilo na explorigao dese tertécio. Agrade S.A Bars tor do grande catilogo dos manuserine da Laureaabna, pos fomnecer “divessce documents dicts de encontrar e vali, ans mpressos qvanin manus clos” (pp. xvi), a J Sotell, pox a muxio‘em Vena (pp. een) um amigo nalts qe tomon nea de “alversés extos interests’ Uo SS parsonse dean dos ‘rita papa, Paris de Gracie (pp. on a, O 218 ents das totes ro fi des seus ‘quay colores foram anplanese veadca sees bioradanes mas emtcce Gh gee 2 Sex anbesn sea Tho eof Lorenzo de dic, eae ibe magryicat Lverp0o. o 438. Para un dete are o ue sx crue, ves U. Mublack, “Von der plalololacben zur hizarschen Alethevde’, Taare dor Gescbichte, Berio aur iio V- Historische erode, crganiado poe C. Nlcr J. Risen. Munigue, 188. pp. 154-180 possuia um valor moral ¢ educative Gnico para os leitores moder- nos — especialmente os alemaes. Mas insistiam igualmente em que 05 leitores modemos que tinham a expectativa de conhecer esse espitito tal como ele realmente existira, deviam adotar uma atitude iconockaste para depois reverencif-los da maneira adequada. Pois 08 exuditos ¢ historiadores antigos haviam tentado néio preservar, amas adornar © que permanecera dos periodos anteriores na histé- ria de suns civilizagbes. Do mesmo modo, 0 estudante moderno no pocletia penetrar no verdadeiro carster novo e estimmulame dos poemas épicos de Hometo ou dos ideais funcadores de Roma sem risgar © véu que os escritores posteriares haviam tecido em volta dele, © estudante da épica grega, demonstrou Wolf, deve perceber que a Miada e a Odisséia baviam originalmemte citculado de uma form radicalmente diferente: em primeiro lugar, mais como can- 605 do que como textos escritas fixes. Apés terem softido nvilti plas mudangas na transmissio oral, passaram por remodelaglo & intexpolago na Atenas dos séculos VI © V aC. Os mesmos estadistas atenienses que ordenarm a fixagio dos textos nia forma escrita também Ihes acrescentaram versos com objetivos politicos. Mais tarde ainda, os poemas épicos foram remodelados de modo mais radical pelos primeiros eruditos profissionais da histOria ockdental, os freqdentadores do Museu na cidade grega helenizada de Alexandria, Esses homens haviam tentado nao estabelecer os textos originals escritos por Homero, mus adequar os poemas épivos herclados aos scus proprio padrées mais modemos no que diz respeito B estética e a ética, *O Homero que temos em noasas Mas agori ndo € o que florescen nas vores dos grepos de sua préptia época, mas uma versio alterada, interpolada, corrigica emendada desde os tempos de S6lon até os alexandsinos."" BM. EA. Woll, Polggomena ad Homerum, 1 Halls, 1795, cap. xi °abemus rune Fomeroma mcibus, soa qui viguit in ore Graeccrim suet, sed ide & Solos emporitus vse ad hare Alesandlint muta sore, ites, eastgatam et ‘eroendatucn| Niebuhr demoliu a hist6ria tradicional da fundacao de Roma por dois jovens alimentados por uma loba, R6mulo € Remo, Go habilmente quanto Wolf fez com a idéia de que Homero havia escrito poems épicos claborados, classicamente coerentes.”* Am- bos, Finalmente, insistiram em que seu trabalho de demoligao era apenas o prefiicio a uma verdadeira apreciagao do mundo antigo. E repetidamente argumentaram que o leitor critico tinka por dever abandonar todos os preconceitos, ler as fontes na ordem € no contexto hist6ricos e ouvir atentamente a voz da hist6ria antes de tentar escrever sobre passaclo. A publicagio do texto de Wolf fez com que tanto escritores quanto filélogos considerassem que a enudigao estava passando por uma revolugio, As descobertas de Wolf ¢ Niebuhr fascinaram Goethe e Herder, 0s dois Schlegel ¢ um Liumboldt sua excitagto, na verdade, foi tanta que se esqueceram de que Wolf ¢ Niebuhr, por sua vez, estavam repetinco um trabalho feito muito tempo antes pelos huntanistas ¢ fildsofos eriticos desde 9 século XVI alé 9 inicio do séeulo XVII.” Nesse context, a afirmagao de Ranke de que 10 imixara ov empregana o método de Niebuhr ede Hermann, merece um exame especial. A primeira afirmacao € questionads por uma carta envia- da por Ranke a Niebuhr em dezembro de 1824, acompanhando cépias dos seus Geschichten € Kritile Nela, 0 historiador moderng descrevia a si mesmo como diseipulo do antigo historiador. Nao deixou dividas de que havia lido, estado, copiade e dissecado a obra de Niebuhr com toda a atengfio que poderia ter dispensado a uma fonte primstia: “A Histéria romana de Vossa Exceléncia foi ‘uma das primeiras obras historicas alemas que realmente estudei. Ja [como estudantel na universidade, fiz anotagdes sobre ela ¢ centei tanto quanto pude absorvé-la." Ranke explicou que conti ra obra de Niebuhr quanclo ensinava no Gymmnasiten € manifestou a esperanga de que “os prescates livros possam nao 35. Ver Wether 36. Ver A Gmfion, Defonders of te tet Cambridge, Massichusas,¢ Tones 1991, cap, 9. 0 parecer de todo indignos de seu ensinamento, do qual me benefi- ciei sem que Vossa Exceléncia soubesse.’” Suas palavras nto deixam nenhuma chivida quanto & divida do autor de Zur Kritik neurerer Geschichiscbreiber, no que diz. respeito 20 método, para ‘com @ homem 2 quem chamou de “o fundador de uma nova forma de critica”. Como se sabe, a leitaza da carta deve levar em conta as circunstancias que a envolveram. Ranke queria subsidios de viagem para seguir as indicagdes de Pertz entre os manuseritos da biblioteca da familia Alfieri em Roma ¢ esperava que Niebuhr, que era um politico © um erudito, pudesse ajudi-lo.” ‘Todavia, sua divida parece evidente © bastante para que tanto admiradores quanto detratores de Ranke a tenham levado em conta muitas vezes - ainda que, uo fezé-lo, tenham precisado moderar o tesiemunho do préprio Ranke.” Gottfried Hermann, 6 outro historiador mais velho cuja influneia Ranke negou, exerceu um papel no minimo tio grande quanto 9 de Niebubr na sua formacio. Quando Ranke entrou na Universidade de Leipzig, no verao de 1814, imediatamente come- sou a assistir as prelegdes de Hermann sobre Esquilo ¢ Pindaro, Hermann —um discipulo brilhante e austero de Kant — é amalmente Jembrado por seus estdos extracrdinariamente originals sobre métrica grega e critica textual, Supostamente, porém, ele mostou Pouce interesse em quesides histGricas mais amplas © pouca 37. L_von Ranke, Des Brigheek erganicado poe W.P. Fuchs. Haraburao, 19, pp. 69-70: “Bo Bxcaleiz eine ROmiche Geschichee ist eins der erson deutschen Fitetsches Werke, die kel elgentich atudien hae. Schoa au! der Univer habe ich diesel ecerpien und mit af alle Weise 70 eigen ma machen graucht. dass geceneamize ‘Bacher des Unters. den jel ehne Thy Wssen von Thren goozscen, aiche vlig “unwutdlg eschemen eager.” Ted, p. Tear Urheber einer newer Si” Ver Vscher. "Nieboh upd Ranke’, Schucizeriche Zatechrf fir Gouichto39, 198), pp. 248-365: no fi dato, os documents Alter acaba send de pouca vse ra Ranke, was 0 concn é faseinante, como mes Vische, val zndo docienentes rectm-desccbeston 40. Pore um aumitades, ver, Varercrapp, “Briefe aa Rocke, Historche Zonschrf 105, 1810, p. 108, paca wm detest, W. Welw, Presto der Kitaro © Nowa Yer, 1984, pms ee volexincia para com erudites que nao partilhavam de suas priori- dades ¢ pontos de vista. Na verdade, como mostram as notas de Ranke sobre as aulas de Hermann, ele ensinou muito seus alunos acerca das dotes e dos prazeres da critica histérica.” Ranke aparentemente comegou a freqentar o curso de Hermana sobre Os persas de Esquilo em 26 de maio de 1814, quando 2s aulas jé haviam avangado trés quartos da pega. Quase imediatamente, levantou-se uma questo. O espirite do rei persa Dario famenta o fato de que a desrota de seu filho Xerxes representa a pior calamicade que se abatera sobre os persas desde ‘que Zeus fundara sua deseencéncia real, “Pois Medos' lz ele, “foi © primeizo lider do exército persa” (p. 765); ento, ele arrola os outros, Cito 60 terceiro. Mas Herédoto forneceu uma lista diferente dos reis persas (1.98). Bm quem se deveria confiar, no dramarurgo ou no historisdor? “Aqui*, disse Hermann seus alunos, ‘vemos o erro daqueles que sustentam ser Esquilo uma fonte histériea precisa e contidvel porque, segundo julgam, é mais velho do que Heréidoto. Como poeta, tinha a liberdade de adaptar tudo, aqui e Acoli, a seus objetivos’ “Lima outen discussto mais longa eviden- ciou a dificuldade em deciclt se a historia persa podtica de Esquilo coincidia com o relato em prosa de HerSdoto ou com o divergente de Xenofonte; uma segunda descreveu como as historiadores da Persia haviam “se torturado’, tentando dar algum sentido aos nomes reais num poema escrito pouco tempo depois." As imple cages desses problemas de detalhe eram claras: as verdades 41. Pas emote camp Ranke mals tarde secordon Homann ¢ seus outs professors em Lelpa, ver seu Nowe Bree ergaizado por B. Hoch © K.Hersiele. Hambargo, 1959, pp. 16-477; all cle fala de {dhe geisvollen nterpetaionen der Klasskes, = B. des ‘dat oleh der ursenliche Kermana vortug”(p. 17) 42, Ranke Nachloss, Statsibliothek m1 Berlin, Preuasechar Krusee Hans M38 2 C *Koltegnackschriten aus Leipaig’, 1: “Obserationes Gadofredi Hermann ad Aeschl, Penas av. 758 usque ad fine, a die X90 mess NEA ad diem XIV mensie tah NIDGCXIV. 2 sere “Hie fru 4 sane, qi hiatorican idem ex cemtudinea Aeschylo queer, com, uf puta, sotiqlbe se pat Herooto. sede poxtae ef bet tin onal re ta hi es ad ebnaltum suum adtempeare” 48. find, WL 3 Nemo tea, 81 histéricas podiam ser estabelecidas somente mediante um estado ctitico, comparativo das fontes que as atcstavam, 0 que, por sua ve7, levava a resultados surpreendentes. Ranke também freqientou as prelecdes de Hermann sobre as odes de Pindaso acs vencedores das olimpiadas gregas, dessa vex desde inicio. Aqui, especialmente na inuodugio, Hermann nig apenas discute problemas hist6ricos especifices, mas tarubém levanta questdes gerais sobre o métoxlo hist6rico —e, de fato, sobre a qualidade e a amplitude do conhecimento que se pode esperar obter sobre 0 passado. Ele iniciou contando a seus alunos, em tom de lamento, que “os monumentos da poesta grega que chegaram até nds constituem os fragmentes salvos depois do naufrigio grego’."' Lembrou o que triste mas expressivamente descreveu como “a historia da poesia grega que no possuimos” ~ isso em uma seco cujo titulo ele cu seu aluno mudou posteriormente, de modo ainda asais pungente, ‘Sobre as dificuldades com que se defronta quem se pe a escrever a histéria da poesia grega”.” No. caso de Pindaro, esclareceu Hermann, as obras que sobreviverarn solteram uma alteraclo to radical no curso da twansmissa0 que no se paderia cle modo algum ter a expectativa de ler exatamente ‘© que Esquilo escreveu, Os fildlogos da Alexandria helentstica haviam perpetado uma cevisio editorial deliberada, forcando Pindato a se adequar 2 seus propsios padrées de gosto € refina- mento, Apenas a erudigio poderia remover 2 patina falsa e revelar © texto genuiino subjacente a ela: “Os escritos de Pindaro foram editados na Anugtixlude por Anstuco © oulzes grunativas di escola alexandrina, Sua inteng2o foi tanto explici-los quanto cor- rigi-los para que se adequassem aos padroes gramaticais e éticos ‘que esses senhores haviam estabelecido para si préprios. Como o 44. Bil, cxdemo 2, “Godotredl Hermaant Prof. Lips. Praclecones In Piedamas.” p. 3 “Quae nobst ream gece poseees monument, rueera sunt ex magn rauragio 45. Did. “stora prserne poeszos quam con aberus’, euéada para “De dficukathus jose se hitoram grace poereos scripture bikin” fizeram, simplesmente nio sabemes, uma vee que uma grande parte de seus comentirios foram perclidos. Por conseguinte, no clevemos julgar que o texto desses poemas que :igora temos diante de nosses ulhos é aquele escrito por Pindaro, mas, sim, aquele no qual as cortecdes dos gramiticos foram intoduzidas. Devemos, portanto, reconstmir 0s textos genuinos e remover essas invencOes dos gramiticos.”" 4 obra subsistente foi apenas uma selegao dos originais, feita no pelo poeta ou na época em que viveu, mas pelo erudite alexandrino Aristéfanes de Bizancio, séculos mais tarde. # em mesmo esse estigio na transmissio do texto de Pindaro poderia ser reconstrufdo completamente, uma vez que os manus- critos, embora se distibuam em duas classes distintas, mostram, todos cles, erros métricos to grosseiros que no poderiam provir de Pincaro (ou, presumivelmente, de seus editores alexandrinos).” Essas prelegocs certartente tiveram um impacto explosive sobre Ranke — 0 jovem estudante, recém-saido do Gymnasium, onde aprendera a ler 0s antigos como se tivessem escrito dicetamente pars ele e na crenca de que suas obras sobreviveram praticamente intactas, Ranke aprenden de seu professor de grego, assim como de suas leituras de Walter Scoit, a preferir fatos brutos ¢ fontes historicas a narratives secundétias posteriores, por mais hem eseri- tas que fossem As consideragdes «le Hermann no exam inteiramente origi- nais. Muito embora no apreciasse seu tival belenista, 0 erudito berlinense August Bickh, aprendera muito com o recém-publicado primeiro volume da edigto de Pindaro feita por Béckh (611), que fornecia novas informagoes, assitn como muito estimulo e irtita- 46, tied, p15, “Pindar septa in smtquiake et Astarcnes € ab scholae Alexancinae sramimtlel yactant, #2 ut wes expleagert, tm ad grammmaices et ettiees, asm Sibi fimerart, praccepe corigerent. Quod quoncra fevers non cognate, ‘amp pleraque ex enturt commestarisisesevil. Hine qa tie fn uma haber honum eavminvia vevensionem, ea og pucanda est esse & Pindans nai, se SGeunmmauicesun conectonives ixerpolss. Gerwina ergo eruen snl, ena howe CGaamaricor igen” 7 it pp. 13,15. 83 gio." De um mode mais geral, Hermann evidentemente, em sua breve hist6ria do texto de Pindaro, seguiti a grande hist6ria do texto de Homero que Wolf reconstruira em Prolegomena duas décadas antes. Assim como os discipulos de Ranke imitaram sua critica dos historiadores renascentistas, Hermann imitou o que Wolf fizera com relagio a Homero € a tradigo homérica. O que importa, rng entanto, nao sio as fontes de Hermann, mas seu impacto. Ele mostrou ao jovem Ranke como pensar como um critica histérico: fez com que desconfiasse das tradigdes ¢ dos textos € raciocinasse sobre a idade ¢ 0 valor das fontes. Ranke jd estava quase fadado a fazer tais perguaias em sua obra posterior — embora o velho Ranke, recordande romanticamente sua juventude bem empregada, s¢ recusasse a admitilo. Como Winckelmann e Wolf —¢ Niebulir— ele n&o podia resistir a reivindicagao de originalidace a que todas almejavam ~ até mesmo & custa de censurar suas memérias no que diz respeito 2 uradiglo em que se formara.” Se niio em 1824, entio quando? Se nio Ranke, entio quent Come tantas genealogias, a da nota de rodapé revela ter mais ramos e tortuosicades do que se poderia esperar. A seguinte afasta.se do hisioriador e retorna ao Huminismo, para longe do professor que suplica por livros e subsidies para viagem, introdu- zindo-se nas excelentes bibliotecas de alguns cavalhetras do século xv, 1B hl, pp 25 49. Ver a imeressinte andie de Nicbuhy feta por Wales, pp. 519.329, por sua vez, le selisce om. leperies, “Fas et Poet Johann feachin Wieekelmanns Bessie er Kunmgeschicte”, em Autonet ured Waserachafler at 13, Jabrandore Nuaiye “Vena, 1588, pp. 91-130 4 NOTAS DE RODAPE E PHILOSOPHIE UM INTERICDIO ILUMINISTA, Evidentemente, Ranke nio oficiou 0 casamento da histéria elogiiente com a erudita, J4 entio chegada a hora de uma nova hipdiese; a combinagao «de narrativa reflexto provavelmente estabeleceu-se na historiografia muito antes da aurora do século XIX - ou de Ranke. f verdade que essa (ese pode parecer paradoxat & primeira vista. Um dos mais importantes e influentes istoriadores do século XVII, Voltaise, repetidas vezes explicicou sua aversio a detalhes. Ao preparar as segdes de sua Bra de Luis XIV que watasiam da vida privada do rei, Voltaize disse a0 abade Dubos: “Possuo as memrias de M. Dangeau em 40 volumes, das quais exuaf 40 paginas”, Ele estava escrevendo hist6ria de grandes proporgées, pintando “afrescos dos grandes acontecimentas da Spoca’ e tentando delinear a evolugo do espirito humano na filosofia, na orat6ria, na poesia © na critica; mostrar o progresso na pintura, na escultura ¢ na musica; na ourivesaria, na tapecaria, na vidcaria, na tecelagem com fios de ouro € na relojoatia. Quando se 85 desenha um tal quadso, deseja-se realgar apenas os génios que realizaram grandes faganbas nesses campos. Deus no permita que ‘eu dedique 300 paginas 2 hiswria de Gassendt! Para o filésofo que compds esse ensaio inovador sobre 2 hist6ria cultural e suas bases politicas, a erudiglo técnica natural mente parecia pouco mais co que uma inteztupeao de seus estudos propriamente ditos: “Para o inferno os dletalhies! A posteridade os despreza; eles sto uma espécie de verme que destt6i grandes obras.4 Voltaire, critico historizdor profundo, que tatava suas fontes com uma falta de deferéncia deliberada, sabidamente, no ‘entanto, desprezava a “estéril ciéncia dos fatos € das datas! Nessas questdes, assim como €m muitas outzas, Voltaire 20 mesmo tempo refletia e estabelecia 4 corrente intelectual. Quando S.A, Tissot publicou sev minucioso estudo A satide das erudizos, por exemplo, julgou necessirio defender-se por ter “mantide as citagées, muito embora elas constantemente sofram um banimento ainda mais severo nos escritos franceses’; apenas as autores que haviam escrito uma obra absolutamente completa ¢ que no necessitavam de neahuma desenvolvimento posterior por parte de seus sucessotes, explicava cle, tinbam o direito de dispensar citagzies, No seu caso particular, uma vez que esperava que seus eitgres continassem a atacar os mesmos problemas, julgava ser necessitio inclicar as fontes que utilizara. Afinal, argumentou, "no faria mat” revelar os autores nos quais se apoiara, “dando-lhes o merecido crédito, com algumas palavras A margem, onde nao poderiam prejudicar ninguém’? O tom defensive de Tissot & to 1, Vole a Dubos, 30 de onubro de 1736; tre. de J. Barzan em The varies ofbisory cuganizade per F Stem. Nova Yexk, 1873, pp. 39-40. Ver CFG. Igge, “The europea content of eghteomt-cestry genes lighennsen histovogcaphy cm HLE. Boacker tal (ergs Anping und Gescbicbe, Geingen, 1986, pp. 25215, exp. 28, Voltake 2 Niel, 17/4, apud K. Pominn, Callecnonnars, amar ot curcus. Pats Worse NWIPXVIR sot Pare, 17, 18 3. SA. Tint, *Vowrede” em Vor der Geman der Gelebrten, tig de LR. Resale “usu, 1768, lg [9 Irecte-vess Die Goddonen habe ih beyoebaten, well ie mic fivlenacheinen,ebeleich se igich me ae den frenrbechen Sertien verbaant ‘wenden Scluteteller dhe ven Gepenstand ezschopfen, und den Nachflgecn chs revelador quanto 0 conteddo de seu prefficio. A 4rida, humilde nota de rodapé parece pouco & yontade na companhia encantado- 14 das novas teotias do século XVI sobre a relaclo entre clima ¢ constituigao, a evolugio da cultura material e artislica e a sequiéncia de etapas na evolugo da sociedade humana. Na verdade, contudg, na lima geragio, tornau-se evidente que © século XVI abrigon mais de um tipo de historiografia Colecionadores eruditos de textos € criticos iconoclastas da tradi- (fo histGrica conviviam, por vezes em muito bons termos, com 0s historiadores filosdficos: alguns ~ como William Robertson ~ exer- ciam simultancamente ambos 0s papéis. Parece ser razoavel pro- curar as origens da histéria provida de notas de rodapé nesse cendtio vivide do debate histérico ~ especialmente quando gran- des autoridades ja abricam trilhas para as fontes, no fim das quais co estudante mais tarde pode viajar com cena comodidade. Arnaldo Momigliano, por exemplo, azgumentou, em um ensaio pioneiro, que Edward Gibbon, com quem ele iniciou essa investigacio, fondia tradigGes existentes para criar uma histéria modema, critica, do mundo antigo, Deciiiio e queda, como apontou Momigliano, combinsva a ironia e a perspectiva ampla dos pbtlosophes com a erudiglo rigorosa dos amiquirios, dos estudantes rabugentos & pedantes que cscreviam emt latim sobre os mundos antigo medieval, que muitos phtlosophes adoravam ridicularizar. Gibbon escreveu no grande estilo clissico da historiografia tradicional, mas reportou-se aos detalhes poeitentos das fontes tanto quanto is vidas sinistras dos imperadores. Os rodapés de suas paginas pululam com notas torturantemente exatas e, contudo, frustrantes mehr au sagea Ubelg kssen, Kénnen derseben enthehen, te Werke sind vellendete Gets, am die rem nlemals mehe Haad leben wick zum Unghtc ist Gas mein Fal Dich, so Wenig als vielerandern ihrer, und ennzumell, dni ta, soll man cite, dam man denen welche de eich Arbeit eincal fhe Hol yee wollen, cle Enveckung der Quelen edectere.worans se schipfen Kinen, To Wesken dae des Ifalg meiner egonen Benerkungen sind, habe ches niche get, sey Sea a sichander fires bedien x ind eb aichusboses dann, ween man nen dust enige ‘unten an do Soe Langeseate Wore 80 se niemandem nets schaden, lence Ren dle schakdige Eve bewezet™ para o leitor moderno por sua auséncia de informacées, pois se teferem aos herdis do inicio dos estudos modemos: os enuditos Maffei e Muratori, os confidveis Mosheim e Tlemont, e 0 cuito, porém exagerado, Lipsivs. Esses textos em tipos minUsculos reve- Jam a fusio dos dois tipos de histéria que estava ocorrendo.* Apenas Gibbon, além disso, poderia realizé-la, Em sua juver- tude, ele estuctara, infelizmente, em Oxford, onde se converteu 20 catolicismo aos 16 anos. Enviado por seu pai para morar com um sacerdote calvinista em Lausanne, ele no apenas se recuperou desse acesso de piedade, mas aperfeigoou seu latin, comegou a estudar ‘rego € adquisiu completo dominio da literatura e da lingua francesa = que escrevia € falava fluentemente © com estilo. Desse modo, adquiriu um conhecimento de primeira mio dos padres franceses de gosto e refinamento que dominaramn a literatura do thuminismo. Mais tarde ainda, um perfodo como oficial proporcionou-lhe a experiéncia militar necessiria a um histariadar clissico. Entetanto, acima de tudo, Gibbon amava a enudig20. Na adolescéacia, quando estudava incansavelmente 2 cronologia do mundo antigo, "as dinas- lias da Assia e do Egito cram meu bastio € minha bola de criquete; € meu sono era perturbado pela dificuldade de conciliar a verso grega do Velho Testamento (Septwaginta) com o calculo hebreu."” Ao. retomar do continente para a Inglstena, iniciou um enstlo em que mostrava: que “todas a8 cificuldades do espitito podem ser exercicas © expostas mediante fo] estude cla literatura antiga” —uma rese ieonociasta, especialmente na Fringa, onde “a cultura e a linguagem da Grécia © de Roma eram negligenciadas por uma era filoséfica’® Anos antes de comecara escrever DecTinio e queda, ele iniciara a leitara da literatura erudita extremamente técnica dos altimos ts séculos: intimeras observagdes em seu difrio, em um tom alternadamente céustico € elogioso, delineiam essa evolugo pelas trilhas das modernas discus- Ver princpalmene A. Somighana, “Gitbon't conksbntion to histortal method, Conerburo aller del staat casi Roma. 1958, pp. WS. 5. B. Gitbon, Atemoirs of my ie epanizado por G.A. Bonnard. Nove Yotk, 16, p48. 6. Bid, 9.99) 28 -sbes sobre assuntos tio dridos como a cronulogia © a geografia antigas.” Para Momigliano, © que principalmente dlistingue Gibbon € no tanto ‘seus esforgos para explicar a queda de Roma, em sua grande maiocia lum tanto convencionals, anas sua habilidade para combinar a grande ‘quantidade de conhecimento da traligio enuxita mais antiga como estilo celevaco chs lewas do século XVIII, ¢ somente essa habilidade permtix- the eriar o que parecia, em sua €poca, a sintese extremamente improv vel de historia filoscfica ¢ enudita, O argumento € rentadoramenie claro elanga, como veremos, uma luz revelaciora sobre a posigio histrica de Gibbon. Porém a note de rodapé hist6rica certamente nao se originou de Gibbon, ou mesmo de sua geracto, ‘Tomemos como exemplo apenas um dos escritos mais polémicos de Gibbon — 4 vindication of some passages in the Aificenth and sixteenth chapters of the History of the decline and fait of the Roman Empire (1779). Vim certo senhor Davis, do Balliol College, agora esquecido, por leitores de Deviinio e queda, teve a ‘ousadia de atacar nio somente o texto de Gibbon, mas suas notas de rodapé — 0 que, nesse contexto, significava sua honra: Ométodo notavet de ciagio adotado pelo sr. Gibbon deve cusar um sdbito espanio 2 quem quer que observe suas notas. Ele por vveres mencivna 0 autor, as vezes 0 livro, ¢ frequentements dex: 440 letor o trabalho le deseobrir, ou antes adivinkas, a que passigem se relere. O método, no eatanto, aio deixa de ter seus objetvos€ sua utlidade. Mediante seus esforcos em ros paivar dos mivios de compari-lo com as antoridades que cit, sem drivids algur ele ulgou, lusoriamence, que paderia impunemente recor ee uss embuede? 7. Gib fatal January 26,176), reaps DA Low. Nos Yak, Na Se i sob suas ie PS we 8. HE DA, An esamton of fen sen cis of bb rg cin ond te de Rana re andes Tf ska tem, ‘oka cope parma sheede tance Sip 2S gies de obo bon ak mst tomas ofp qe Das “pcs et tC tana bokSo sneer” Orpen per © Beane Ig Em outro escrito, Davis acusou Gibbon de todos os pecados do catecismo do escritor ck: notas de redapé: acumulando indiscti- minadamente citagdes @ auioridades que na verdade discordavam, citagao parcial com a finalidade de suprimir os fatos ou teses inconvenientes, fundamentagto em fontes secundarias nao citadas € pligio. O método de citaga0 de Gibbon Ihe parecia ter sobrerudo © propésito de “como um bom artifice... escapar a verificacao"* Gibbon nao teve nenhum problema em responder ao que coretamente descreveu como um ataque “rude € excessivo" Converten a preocupacao de Davis com detalhes insignificantes em ‘uma indicagio de inferioridade social e convidou seu oponente a vir a sua casa “em qualquer tarde em que eu ndo esteja". "Mew criado", prometeu, “mostrarthe-a minka biblioteca, que verificard ser razoavelmente bem abastecida com os autores convenientes, tanto antigos quanto moderos, eclesidsticos assim como profanos, que me forneceram diretamente 6 material de minha Histéria’. Mas cle também responden detalhadamente com seus préprios argu- mentos. Gibbon extminov e contou a5 383 notas que havia anexada aos capitulos 15 e 16, sublinhando que continhiam cente- nas de citagdes precisas. Insistiu em que, quando tomara provas emprestadas estuctiosos anteriores, havia “explicitamente reco- nhecido minha (sual divida.” E mostrou que a absoluta maioria des criticas de Davis na verdade se baseavam em erros do proprio Davis: ele deixaia de confirmar as referencias de Gibbon, por exemplo, porque as verificara em edigdes com paginagdes diferen- tes, ou nao conhecia os textos integrais dos quais elas provinham. Gibbon até mesmo seconheceu a inevitével imperfeigho de todas as notas de rodapé; admitiu que em nenhuma das suas 383 notes explicitara inteiramente as premissas que norteavam a utilizagio € @ combinagao de suas fontes. Muitos dos textos citados por cle, come apontou com uma honestidade merecedora de respeito, deviam ser “atenuaclos" caso devessem ser tratados de modo se ‘9. Davis, Beabnination, ¢. 2300 90 harmonizar o bastante para permitir uma narrativa coerente ou ‘uma Unica andlise de uma institigo politica ou de uma evolucao social. Apenas um Ieitar especialista — nao um Davis ~ poderia realmente realizar uma operagio que pariisse das citagdes € dos argumentos para chegar ao pensamento © 2 pesquisa que os produzira.”” © que importa aqui nao € a demoligio de um tolo ou a exceléncia da piosa de Gibbon, mas precisamente a opiniao partilhaca por ambos 0s adversirios. Ambos admitiam — sem discussio ~ que uma obra de histSria sétia deve apresentar notas. Ambos claramente concordavam que essas notas deviam levar 0 leitor a fontes originais ¢ reproduztlas com exatid’0. E ambos implicitamente admitiam que 0 aparato, desse modo, fornecia o teste diagnéstico da competéacia critica cle um historiador, Esses Pressupostos stlo bastante reveladores da postura ¢ do método de Gibbon, Indubitavelmente, a nota de rodapé ja se tornara parte do procedimento padro dos historiadores, antes que os grandes historiadores do Jluminismo o adotassent. O que ajuda a explicat pot que unt resenhista alemio do volume II de Declinio e queda, eserevendo na nova ¢ avangada Universidade de Gottingen, sau- dou Gibbon nao como um criador, mas como um praticante habil a critica hist6rica. Gibbon, disse ele, havia obtido suas informa- oes nas melhores fontes, exercia uma critica de bom nivel ¢ as explicava com um raciocinio sGlido, De um ponto de vista alemao, pelo menos, Gibbon cra mais o mestre de uma arte existente do que o inventor de uma nova"! Outras consideragdes provém de um dos mais ilustres docu- mentos ji dedicados ao humilde problema da nota de rodapé: a carta de David Hume de 8 de abril de 1776 a0 editor Willam Strahan. Strahan publicara o primeiro volume de Declinio e queda ¢ estava enlao impriminda a Histénia det Inglaterra do proprio 10. Para. rao nto make convincente de Davis, vee Amp deat Gibbons sndcanon. Londres. 1779, 11, Gikremgiche Celebre Anzengen, 18 de ono de (783 9 1.704 a ‘Hume, © fildsofo declarou-se ‘extremamente impressionado com 4 hist6ria romana do st. Gibbon” e “feliz. em saber de seu sucesso” Também pediu que “uma cépia de minha nova edicao fosse enviada a0 sc. Gibbon, pois desejaria que um cavalheiro, por quem tenho tanto aprego, examinasse minha obra a fim de que fosse irazida 2 luz na forma mais perfeita possivel” — prova clara do seu respeito pela erudigao € perspicdcia de Gibbon. Porém, Home vambém manifestou algumas quetxas téenicas, que ele esperava que Gibbon levasse em conta 20 preparar a segunda edigao de sua ‘obra, principalmente a fim de tomnd-la mais acessivel ao leitor: Hle indubitwvelnente deve imprimir © nbmero da capitulo no ccabegaliio da marger, © seria melhor se algo dos concetidos purlesse também ser acrescentado, Suas nots, segundo o atual mé:odo de impressto do lio, sto igualmente uma fonte de Cormentes: quand uma nota & anuneiada, dirigitue-nos a0 fro do ‘volume e la muita vezes aio encontramos nada senio a referénckt ‘4 uma autoridace, Todas essas autoridades deveriam apenas ser Iimpressas na margem ou no pé da pigina Esse texto é bastante revelador. Antes de mais nada, cle nos Jeinbra que as notas de rodapé de Gibbon comecaram como notas de fim de volume e s6 aleangaram o que agora julgamos como sua posig2o tradicional de destaque na pagina de Gibbon depois da queixa de Hume. Mas ele igualmente confirma que o lado téenico, documental, das notas de rodapé de Gibbon nao representou inovagao radical quanto a exposigio e ao formato. Hume nao Julgou a idéia de que as citagSes devessem indicar as fontes das afirmagoes em um texto histSrico como radicaimente nova. Ao contririo, instou para que tals notas ocupassem uma posigo conveniente, no rodapé da pagina ou na margem. Ele proprio, afinal, havia aprendido, cerca de uma década antes, a basear suas afirmagdes em referéncias, quando Horace Walpole e outros 0 hhaviam criticado por ter deixado de fazélo em sua Histéria da 12, The deters of Devt Home, organtzado por Y-T. Greig. Oxfor, 1932 1h, p. 313. 92 Inglaterra.” Hume nao pediu que as notas mais longas de Gibbon, aquelas que aprescntavam um comentario satirico, fossem igual mente transferidas, embora essa fosse a solugao adotada por Gibbon; talvez Hume pensasse que a necessidacie de encontrar 03 comlentirios satiricos depois do texto sério realmente realgasse seu impacto. De qualquer modo, também aqui o métado de Gibbon surge mo como inteiramente radical, mas como parte de um procedimento corrente ~ embora sua prépria mistura de referén- cias e comentirios seja comprovadamente Gnica, Gibbon - como Hume e seu colega historiacior filoséfico Robertson ~ foi pioneiro na escrita de narrativas duplas, crticas, na Inglaterra. Porém, esses autores inventivos, ingleses e escoceses, tinham colegas no continente."! Veja-se um historiador muito menos flos6fico ~ ¢ até mesmo muito menos famoso na Alemanha — do que Gibbon, 6 notivel Justus Méser, de Osnabruck, Como Gibbon, Méser possuia uma vasta cultura, falava francés vio bem quanto alemao; diferentemente de Gibbon, Méser usuituira da educagiio mais avangada de sua &poca, obtide na Universidade de Gollingen. L4, Moser estudara direito ¢ aprendera da tradicao erudita da jurisprudéncia, que florescia no Sacro Império Romano desde fins do século XVI até fins do século XVI, como basear uma descrigto de uma transagao social ou legal em uma massa sélida de fontes, citada com detalhes."* As quesides altamente técnicas de dircito piiblico e da geneatogia real que ocupavam os estudantes da constituicdo do Sacro Império Romano exigia que soubessem comparar e citar textos hist6ricos e legais. Desde cedo ensinado a valorizar “os testemunhos de antigos escritores” mais do que "os diferentes @ astutos argumentos genealogicos de escritores mais recentes, que se apGiam apenas em conjeturas ¢ usam a mera concordincia de certes nomes, como se ela fornecesse uma 1A F Palauen, “The sae foomeses of Swat and Gibbon", The Bigheenth Contry 31, 1990, pp. 254-262, ec 26 1, Sabre o wo crescentementesstensico de documensasto na hiserografisingesa do ‘culo XVII, vee D- Hay, Anahi ard historian. Loctes, 1977, pp. 175181 15, Sobre esa ene, vero dco de N. Hunmestan, Jus und stone, Goningen, 1972, 93 fundamentacdo sélida para uma demonstragie”, 08 futeros buro- cratas eram treinados, quando ainda na universidade ou ma acade- mia, 2 basear seus argumentos histéricos em uma longa sézie de probationes, citagdes diretas de fontes primarias, meticulosamente: ordenadas.° Méser dedicou sua vida tanto como servidor civil quanto como historiador ao principada eclesidstico de Osnabriick. Grada- tivamente convenceu-sc de que as instituigdes antiquadas dessa regio também antiquada do Sacro Império Romano funcionavaz, para seus habitantes de uma forma que as inovagées no per riam: « histéria adequara-as & terra, A populagho e As tradigocs da conmmidade. Em sua explicagao, tentou mostrar a formagao da sociedade e das instituigées, observar processos histricos tr vitro. Combinou - como fizera Gibbon, mas de um ponte de vista inteiramente diferente — a erudi¢aa do humanism tradicional cont a hist6ria filosdfica e o pensamento politico de Saint-Evremont e de Montesquieu.” Méser abriu caminho através de uma quantidade enorme de material, incluindo histérias antigas, medievais © mo- demas e as fontes coletadas ¢ impressas por antiquirios eruditos clos séculos XVI © XVII. Copion longos extratas das fontes, alguns dos quais esperava publicar, Moser nao era um critica histérico sagaz. Assumiu pasigdes sobre quesides de proveniéncia e autenticidade com elutincia, uma vex que normalmente nio tisha oportunidade de ter acesso 20 material € 10s registros, mas ldo somenie aos contetides dos textos. ‘Suas proprias reprodugdes de textos muitas vezes eram prejudicadas: 16, Diswertato genealoica de femme Augusta Froncomica quan sub prac o. Davis ‘Reale PP pabice dscoplasdam props Corobus Gustaras Fee dle Hestender] Uekorecnf a dr, Septembre @ MDCCRNM. ler, 1722, Psefoto sig ete "Phe enim aout not valor tot ackiquesum sciptorum lesimoeia... quam vate et tngemosae fed ingenioal recercorum augonem deductinnes genealogiere, que mis \nnitunear canter, et salam egavealcetiam qugrendaas nocunn pro sade fads saemo demonsicuienisadhibent A obra conslte de uma sce de nbelas geneslégieas ‘mn 66 pigias de arobationesdecumnentas 7, Pama ama visto gets, of J Kevaaen, fuss Meer coud dhe germane Bnlightonment ‘Cambridge, 1986. pelo descuido nos detalhes. # por vezes fez toga de sua propria tendéncia a combinar materiais de naturezas e origens extremlamentc diferentes na profustio de suas notas, nas quais respondia no apenas as fontes primérias, mas também 2 literatura histirica altamente erudita do século XVII, ¢ toda vez que se deparava com esse tipo de escrito corria a tomar wma outra tila histérica, “Ontem”, escreveu a ‘Thomas Abbt cm junho de 1765, *citei uma palavra hebraica em uma nola — € sequer conheco a Kingua. Nao é pedante? E no entanto nto pude deivtla de lado. Na verdade, depois de percorer a Geagraphia sacra de Bochan, senti até mesmo a tentagio de fazer uma centena de notas sobre ele e a cortigilo em hebraico e aramaico - eu, que nem mesmo conhego os alfabetos.’* ‘Apesar de toda a auio-zombaria de Maser, ele se pos, de modo mais sistenvitico ainda do que Gibbon, a escrever uma hisséria dupla. Como bom advogado, Méser fomecen a pratica- mente cada afirmagao de fato em sua hist6ria uma nota de rodapé, € niio no fim do livro, na qual as fontes eam citadas € as opiaides divergentes expostas ¢ avaliaclas. Dez anos antes da publicagao por Gibbon do primeiro volume de Declinio e queda com notas no fim, Méser j havia concluido a impresstio da primeira edi¢ao, prelimi- nar, espetacularmente documentada, de seu Osnabriikische Ges- chicbte. No inicio do século KX, 0 historiador da historiografia, Eduard Fueter ~ ainda mais propenso a chamar a atencao para realizacées individuais excepcionais do que a abandonar as cate- gorias uadicionais que elas desafiavam — julgou a faganka de Maser surpreendentemente moderna, até mesmo radical, no metodo ¢ na apresentagae (embora altamente conservadora no contetido). M&- ses, admitia, nao teatou esconder, ¢ sim revelar as fontes com as 1B. Bcer 4 Abts, 26-de joka de 1765; Baer, hsfenebsaexganizado por WE. ek al Hanae, 1992p. 365 “Allein, we Wied nap das alles in einer exsmabwukuchen ‘Geachlche veraragené Doc es sd 12 Bogen Piletung, axl cs kana mir che helen. ‘Geren fuwte icin einer Ncte ela hebmtiedh Wor a9 und kann doch diese Sprache tack sen st das oieht pedaptsen? Und doch Konate fo es nicht lacen: ich war fogat fa dex Veeniehung rachdem ich des Bochat Geographiam sactam durchigeleen bate, eshunder anmerkungen dariber zu riclen und then lin Hebraishen und Arabischen zuecine 20 elven, ch, der die Bochstaben nacht keine” quais trabalhava.” As notas de rodapé, em suma, eram escritas por historiadores que viviam e trabalhavam em mundos, sociedades ¢ até mesmo bibliotecas muito diferentes. A necessidade de docu- mentagio hist6rica estabeleceu-se claramente, paradoxalmente, na era dos phifosopbes, que desprezavam o pedantismo como uma forma de superstigio secular. Se 0 Huminismo viu proliferarem as notas de rodapé, os intelectuais do século XIX nao sentiram por elas 2 admiragao © 0 prego puros que se poderia esperar. Hegel, por exemplo, rebe- lou-se claramente contra a idéia de que 4 texto de um fildsofo deveria utilizar notas de zodapé para exemplificar © desenvolver ‘um argumento dialético. Na verdade, ele tratow as notas de rodapé como uma peste que nao desejava pegar. Aprovava um antecessor, como Tiedemann, que fornecia “extratos preciosos” de livros raros; porém aprovava ainda mais a oportunidade de apontar para 0 fato de que vm ovtro, Tennemann, utilizara suas longas notas de rodapé apenas para atingir um objetivo enudito préprio: "Com grande honestidade, Tennemann coloca a passagem de Arist6teles abatxo de scu texto, de modo que © original e 4 teadugao nuitas vezes se contradizem."" Desse modo retérico, assim como de muitos outros, Hegel desejava distanciar-se de Kant, 0 mais opres- sivo e desafiador de seus antecessores, que fizera um vso magisiral de notas de rodapé para dar forma matcrial a suas ambighidades inerentes. Kant, como Wolfert von Rahden mostrou, confinou deeitos da copia de um ‘munusctto chins ce minha colegao, Depois, complewou urna tradugio nova rgorosa de toda a insxigao, pulavea por pala, comesando pela obea de seu calega Andreas Don Sin, que nascet sa China e conhece lingua moitisime bem, em minha presen Seu deseo fol venficartuda isso na seguinte easta ao leitor, na qual descreves com eratidio toda a seqitacia de sconecmentos & tudo que havia de importante tcliionado 4 esse monumento Decid, com sua concordincia,colocar ease texto antes da trad $80 corno um espléadido testemusho da verdadeira histor, pare reservar pare a posteridade a memoria da questio, E ex passuia ‘monumento de pedra com a insericto, segundo 0 attograpbun tearido ds China, que ets guardaslo até hoje em meu mse, com todas as guns mateas e legs gerunas, tanto chinesas quanto aliens lsacas, © um comentrig.” A carta de Boim estava assinada no fim por Boim e por dois colegas chineses, a quem Kircher descreveu coms "tanto testemunhas: ‘oculares do monumento quanto aqueles que copiaram essa inserigao 7. Richer, Chine p. 7-H deamoen acces P. Mobo oir, pa emnctar proe mis huis Sommers relationem at atl, eames defers in eo dexrberdo, ex manuscript Sinen, qed penes me abeo, emendzez, aovaen denua minutemepse ‘esis Tabulie inepretationem vesbetea fctarm perm soe nal Adc Don Sit ‘pss China rund, nee non linguae naive perlistims oedrus, me peaesente canfet ise quidem cman tevat volt, anquerti eprioe ad lotoron ca, Cb? TEL etiow et qulcquié euler ica uitomod! Memumentim contieraione in fcccane, exacte descapee, quammie vela: laclermum. vevits textwnonkiae. hue Interprebuins, ipso sauce, ad aecemam rei memoriam pracfigercam ceasu apr deur vero Momumenaim festa Auograplaun ex China allabar, quod in Museo m0 in hune usque diem superses est, genins sus oats ec characters Sint, oar Chaldoeis, Schelis eta adds, mexico curv. Blea dna P chat Bost sequitur’ O aviograptum wade da China ea pevaselmerse wa decalgue seeliscte fa lé2neo ao que se enciotra na RBlioteca Varcane Borg. oF 151, se. 20) oer H, Gorwinan, "Paper obi Exe Asis in the Vatican vat, cn A. Graton (ong. Romie bor. Sshington, D.C, Cidade do Veueano, New Haven © Landes, 1998, gravara 185 132 do original’.* Seguiam-sc muitos detalhes mais ¢ outras compro- vagdes, incluindo uma tradugao latina literal comentada do texto, Durante todo o tempo, Kircher teve um cuidado especial em estabelecer localizagSes, identidades € proveniéncias. O fac-simile da inscrigao que aparecia no fim do livro, por exem- plo, dava o local e a data da descoberta da estela © afirmava explicitamente que Matthaeus, 0 Chinés, “copiou esta inscrigio do original com sua préprias mos... em Roma, em 1664"? Kircher nao submeteu esse material a um exame critico inteira- mente metédico: até mesmo quando as fontes prinmvirias que ele reproduzia se contradiziam, ele simplesmente as copiou e deixou ao leitor 0 trabalho de preocupar-se com suas discrepin- cias.”” Porém, tomou o cuidado de documentar tudo da melhor maneira possivel: a descoberta, a transcrigo € a traducdo do monumento foram todas registradas, no em suas palavras, unas nas de suas fontes, até mesmo ao custo de resultarem em um texto constantemente interrompido por quebras de segdo, € pontilhado de diferentes linguas e alfabetos. Kircher apresentou um modelo de obra histérica muito diferente daquele de De Thou - um modelo caracterizaco por uma aspiragao enciclopé- dica a harmonizar o incongruente ¢ o estranho, que permitia que varias vozes falassem na mesma pagina e, sobretudo, que mostrava um interesse maior em estabelecer os fatos do que em entretecé-los em uma hist6ria elogiiente. O sorriso anvivel do alemao do sul substituiu a correcdo dura, gelada do advogado francés. A habilidade de Kircher em coletar ¢ editar esse material — como sua habilidade em ler ¢ explicar a parte sitfaca do texto da 8. Kichet, Gina, p. 10: “Ceuta inpectores Monuments age non bis Tabulae ex Protaype deseripiees " 9. "Plane Tabulam propre mam ex autogrophio descapsit Mathaeus Sina Orundhs ex Siganfa Romae A" 1604" 10. Mungo, Gurions tone, pp. ATEI72 — mas ele exapera e, por vesen, interpret cenadamente o xo dk Kircher, 133, documento = refletia sua posigio eminentemente moderma como membro de uma ordem religiosa agressiva, mundial. Os jesuftas vangloriavam-se de constituir uma esfera cosmopolita tnica de talen- tos € experiencia, assim como um sistema alkamente desenvolvido de comunicagio: Kircher, vivendo em Roma, era constantemente inun- dado e agoitado por um clilivio de informiagdes novas sobre terras € linguas estrangeiras, a um ponto que teria sido impossivel em ‘qualquer parte da Europa um sécuto antes." Porém, a forma literéria adotada por ele era altamente tradicional. Extremamente curioso foi © fato de o livro extraotdinariamente modemo de Kircher sobre a China pertencer a um géneso hisw6rico wadicional, No que diz respeito a forma, 4 preocupagao com a documentaczo € a proveniéncia ¢—& preciso reconhecer ~ & credulidade, China tinha uma semelhanca ‘estreita com muitas compilagdes antigas ¢ atualmente mais bem conhecidas, como a histiria classica da igreja primitiva do padre rego Eusébio (século IV dC), ou com os enozmes Annales do enudito de fins do século XVI, Carlo Baronio. Ao longo de toda a historia da Igreja crista, eradlitos haviam compilado documentos de diferentes tipos, preocupando-se en apreventar garantias de sua auteaticidade ¢ entretecendo sobre essa base 0 que lenominavam de “histGrias eclesiisticas". E as regras hd muito estabelecidas desse jogo bcm cstabelecido academicamente ditaram a forma tomada por China de Kircher. Até mesmo as vividas gravuras de Kircher tinham seus cortespondentes no estuco fiicamente extraordinitie dos mo- ‘numentos cristaos primitives das catacumbas que A. Bosio publicara, alguns anos antes da publicagao de Chiria de Kircher, como Koma sorteranea (Koma subserrimea).” So tentar lidar com um documento novo, em suma, Kircher podia retroceder @ um género hist6rico cexistente, bem estabelecido, 11, Wer Goosdana € U. Heo, The search forthe porbet language. Teaco de J. Feros Oxford e Cambridge, 1995, pp. 156159. 12. G.Wauaghin Coming“ Roanasexerunes: Appin ale cgi del'echeologla cians’, Blorebsdl SrovladellAre\0, 1980, pp. S14, Gamat, Ronasaictsreroodea Koma, 138, 134 A forma fartamente documentada de histéria a que pertence a obra de Kircher antecipa as origens da Cristandade ¢ deverta provavelmente ser teferida por um termo menos restritive do que Seclesistica”. Suas origens so muito antigas e, por isso, obscuras. Podem estar no império persa, cujos governantes apreciavam publicar editos, alguns dos quais foram reproduzidos em obras histéricas por seus stiditos ~ tais como os judeus. A tradi¢lo tomou sua primeira forma clara no mundo helenistico durante 08 séculos 1 ¢ I.a.C,, quando os sacerdotes e os cientistas da Mesopotimiz, do Egito € de Israel viram-se submetidos a poténcias de lingua gtega estranhas 20 mundo do Oriente Médio— primeito, Alexandre da Macedénia © seus sucessores, depois, os romans. Lingua comum clo império sob os sucessores de Alexandre ¢ da cultura sob 05 romanos, o grego penmitiu que os representantes de muitas culturas falassem entte si diretamente pela primeira vez, Bles naturalmente viam uns aos outros como rivais e aqueles que haviam perdido @ gucrra esperavam (como seus correspondentes académicos atualmente) vingar no arquivo suas derrotas no campo de batalha. Tornou-se uma questo urgente mostrar que vieram de um antigo Estado, que possufam uma tradicdo politica e social hé muito estabelecida, registrar sua histéria em uma longa série de documentos, preferivelmente inscritos em pedra, assim como sua religiio venerivel. No século IIL a.G,, 0 sacerdote egipcio Manetho © 0 sacerdote calden Berossus tradluairam para o grego relatos da historia egipcia ¢ do mito ¢ da histéria babilénicos, relatos que enfatizavam a antigiiidade de suas racas @ tradic&es. Por volta do século Tl a.C, no maximo, os judeus haviam seguido esse caminho. O primeira espécime em grande escala desse género a sobreviver talvez seja.a chamada Carta de Aristeas, um texto que explicava as origens da uaduglo grega da Biblia hebraica, a Septuaginta. O autor inseriu diretamente na namrativa uma grande quantidade do que pareciam ser documentos oficiais = por exemplo, o5 memorandos nos quais o bibliotecério de Alexandria, Demétrio de Falero, e 0 rei do Egito, Ptolomeu 135 Filadelfo, 4 no século TH a.C,, discutiram a necessidade de adquirir uum texto grego da Biblia hebraica para sua biblioteca. Esse livro fascinante — como os documentos que ele contém — tem a desvan- tagem de ser uma fraude, mas também as virtudes compensadoras da brevidade e da clareza.™ Fle estabeleceu as principais linhas pelas quais 0 género se desenvolveria. Desde 0 inicio, os historiadores eclesiésticos escreveram como polemistas € crentes: como judeus procurando provar que a ‘Tord era mais antiga do que Homero ou, como cristaos determina- dos a provat a prioridade de uma doutrina ou de uma instituigao. Os objetives do género determinaram sua forma: no a prosa cespojada, classica dos historiacores politices, mas uma mistura de argumentos técnicos e documentos de apoio, os iltimas citados literalmente no proprio texto. Os documentos exerciam duas fungdes, ambas vitiis: apoiavam as teses desenvolvidas pelo autor ¢ davam ao leitor um sentido claro, vivido do que significara ser jude ou cristio fiel em um mundo distante e mais difiel. Esse tipo de hist6ria fol preservado por Beda e outros na Idade Média, ¢ 2¢ desenvolveti desordenadamente no inicio do periodo moderno, Lorenzo Valla deu-the um aspecto caracteristicamente individual em sua Declamagdo sobre a Doagdio de Constantino, que explici- tamente citava cuaisquer documentos, ainda que com a finalidade de mostrar quio ridiculos eram. Valla emxertou a cuidadosa citago de documentos feta pelos historladores eclestisticos na forma classica de um sermo polémico, com resultados perturbadores."* Protestantes ¢ cat6licos praticaram a historia eclesiistica em uma escala muito mais grandiosa € imponente nos séculos imedia- tamente posteriores & Reforma, Protestantes como Scaliger demo- liram a apazente prova aduzida por Eusébio da data recuada do 13. Ver deme aarti &Pbidocrata,ongaizado por A. Peller. Pari, 12: Speyer, De Burarscbe alschoug im bevdoecnen wad chretcsen Aleut. Stange, 191. 14 Scite o uso feito por Vala ds cwmegeria erties para Kes amalitene, ver Gineburg, “Aristonte, Water, la press”, Quademt Storici 29,1994, pp. 5-17, em 12-14 136 monasticismo; catélicos usaram a arte das catacumbas para refutar ‘as teses hist6ricas de protestantes iconoclastas, que afirmavam que 2 igreja primitiva nao usara imagens. Vastas compilagdes ~ sobre- tudo © tratamento protestante em grande escala dado nos Séczilos de Magdeburgo a historia da Igreja de Flacius lyricus, e os Anais do catdlico Baronio — provocaram simetricamente refutagdes eru- ditas."* Os historiadores politicos haviam prezado a percepcao. pragmitica e 0 estilo elevado. Os historiadores eclestésticos preza- vam © conhecimento. Janus Nicius Erythraeus tremeu quando ‘escteveu sua vida cle Baronio, em vittude no da reveréncia diante cla devogio deste, mas, sim, do puro excesso de energia com que “coletei", diz ele, “uma quantidade imensa e variada de materiais, espalhada por uma quanticade quase infinita de livros, dominei-a toda mentalmente, cheguei a uma conclusiio sobre cada questio € finalmente registrei-a por escrito de um modo culto € exato”." Enuditos protestantes mostraram uma enemgia compardvel nas tarefas gigantescas de busca ¢ publicagio das fontes que poderiam revelar que suas supostas inovagies eram na verdade Festauracdes. Matthew Parker, arcebispo anglicano de Canterbury, enviou agentes a todas as partes das ilhas britanicas 2 procura dos restos manuscritos da igreja inglesa medieval, cm anglo-saxio e em asim: esse lider da Igreja da Inglatersa pilhou as bibliotecas das 15. A impordocia da hlsérla eclstsica como un modo de pesquisa de ese envi {elestzbelecida por A. Momigliano em "Pagan and chnslas hssorogtepiy nthe foch ‘cencury 21." Taro conimbus alla sovva deh sud clesc det moro anc Ror 1960, op. 67-109. em SHMIOL_ Moms sublinhow 25 Seventy, esean 299 3 somettangas, enue 9 histsggeila ecististca cis 2 Ieratira beleniaico ucaica ‘ques precedera. Pasa ouras dicussoos ape o desenvolvimento da histra a ere, {er Fh. Zanmemmann,Eccesa als Obett der Hisionegrapbie,Oesiereschische Mkadem= ‘dex Wissenschafen, Phils, Klasse, Slaungaberkaate 255, 4, Viens, 180, Hicorache [rine in der Thecogs, organtaada por G. Sclearger. Gstngen, 1975) & aca, ‘res end bstonography in the takin Rerassemce.Cheago eLondces, (38, cop 1G Momiglhino, The dastca!fartdations of modirn bisoriegrapiy. Berkeley, 1990, cap. 5 B Neveu, Baur erreligion aus XVTP ot NV ste ri, 159A 16. 1K Bnthracus, Penacotace énagintom durin Leigtig. 1592 1, pp. £6.99“. wt infestans vim rerum a verictam, per nfintes pene bros dsspatam stave Glspersar, colligeree, Ineligemta compichendeve, de unnquagve earim judicre, 36 dengue Tiers docte accurateque manda. Ww catedrais de modo to implactivel quanto qualquer invasor. Ao contririo de muitos dos grandes patronos e colecionadores, Parker evidentemente lia todos os tesouros que reunia, assinalando seu progresso nas margens de seus preclosos manuscritos com o que se t6mou © seu lenditio giz vermetho. Imprimiu alguns textos novos ¢ providenciou para que muitos outros manuscritos fossem abrigados na biblioteca do Corpus Christi College, em Cambridge. © secretirio de Parker, Jcha Joscelyn, descreveu seu programa de modo elogiiente: Além disso, cle er cuiladoso © nto sem alguns nus paa procurar os monumemios das tempos antigos para conhecer a religito dos antigos padres ¢ daqueles especialisas da Igrels inglesa. Por isso, a0 procurar as crGnieas dos bretDes © sides Ingleses que jazem excondidas por toda pare, puaidadas e enter- radas no esquecimento ¢ na ignorincie das linguas nto bem ‘sompreendids, no faharam suas proprias diigéncias, em espe cial, e as de seus homens, E wlé que essas anvigidades pudessem durar e ser onidadosarnente preservads, ole as fez uzzer a um Tocal part ser bem encadenadis € encupadas com apuro. E todavia, ainda no contente, ele se esforcow por imprinur alguns daqueles documentos ontigos dos quais sabia existirem poucos ‘exemplars ¢ que julgou serer ttets& postenidade para unstropao 1a fd @ na roligiso dos aneestrnis.” Parker naturalmente nao tabalhava com inteica objetividade quando tentou reconstruir a primitiva Igreja inglesa e apresentar as. fonws para sua histéria a um piiblico europeu, Ele empregou escribas especialistas para que “aperfeigoassem’ seus manuscritos, preenchendo suas lacunas com novas folhas, seus conteddos escritos em fac-similes do documento original. Quando ele publi IF J. Joscelyn, The tie ff he 20 Archbishop of Cansei presealye Stooge. Londs, 1374, sig, C1, ctado em BE. MeKisan, sedteua sory tie Tudor ase Osford. 1971, 39. Para o progeasm de Parker, vere geal, ib, exp. 2 © AJ. Fratizen, Desi for lnpins New Bronowvck ¢ Londres, 1990, pp 43-46. 138 cou a vida do sei Alftedo, do bispo Asser, do século IX, tacitamente mudou a ortogralia € até mesmo o fraseado nao clissico de seu manuscrito, agora perdido. Interpolou passagens de uma outra fonte no texto, que equivocadamente atribuiu 2 Asser. 2 na verdade, fez imprimir toda a obra em caracteres tipogcificos anglo-sax6es, € ndo latinos, em homenagem 2 “venerével antigiii- dace do manuscrito original” - muito embora o proprio manuscrito fosse escrito em um cursive latino normal, a miniiscula carolingia. Desse modo, conseguiu criar o que parecia ser uma genuina ‘antigilidade — mas somente As expensas da mA teprodugio de sua fonte real. No século XVI, finalmente, 2 era da acumulaglo primitiva da cultura eclesiistica gradualmente dev lugar a uma ert de anélise © investimento, Eruditos eatélicos travaram bella diplomatica~ *guerras de documentos” - quando bolandistas ¢ beneciitings sisiematicamen- te debateram sobre que documentos de arquivo eram genuinos, que instituigdes catélicas possuiam alicerces histéricos ¢ que santos ha- viam realmente vivido. Esses conilitos geraram toda uma ordem de disciplinas técnicas modernas, da paleografia 3 esfragistica.” Gibbon conhecia intimamente esse mundo do moderne conhecimento mo- nfistico @ se baseou em seus produtos, muito embort no tentasse emular 2 profunda pesquisa documental de seus criadores. Ele recordau com ironia caracteristica que, nos anos 1760, quando trabalhava nas grandes bibliotecas parisienses, a visio de nos Manusorios de diferentes cris © carocteres induziu-me a consultar as duas grandes Obras beneditins, Diplo matica de Mabillon e Palaeographica de Moatfaucon. Estudei a teoria, sem lograra pritice da are: nem doveria eu me queixar da 18. Vex & Hogedoen, “amnest Parker and Asser Aced regi rer gestae, Princotn: UnivertyLtrary Groniele 31, 198, pp. 7490. 18. Yer PD. Koos, Great binovical emerpre,Prosiems mt monasie bir Rdlmbuag, 1965, eaptulae12;B. Barer heegel, Zee isoriens ola monayebie Pus, 1988, pare zeit, pace. 139 complexidade das abreviagoes gregae e dos alfabetos goticos, uma vez que, todo dia, em uma lingvagem familiar, fico inteiramente porto a0 decifrar os Hieréglifes de uma nota feminiaa,”” A histria eclesifstica, em outras palavras, forneceu boa parte da substincia e do modelo da pesquisa eradita que os histotiadores ilumninistas fundiram com a narrativa elegante. Quer tenbam apren- dido com o grande editor e compilador Muratori, quer com © historiador da Tgreja primitiva, Mosheim, historiadores iluministas como Gibbon revelaram ser eles proprios os discipulos contradité- ros «los préprios pais sagrados de quem adoravam togar. Nin- guém fez mais do que Le Nain de Tillemont — 0 jansenista do século XVII que empilhou documentos para « historia do império romano € da Igreja, pedra por pedra — para reunir os materiais britos com base nos quais Gibbon ergueu a grande casa de campo neocldssica € of mirantes espiritiosos de Deciinio ¢ queda" Gibbon julgou “muito melhor” estudar a hist6ria dos \ihimos imperadores “em ‘uma compilagio mais enidita ¢ exata do que as originais, que no ‘Possuem métoda, preciso, eloqiéncia ou cronoiogia®.” Até mcs mo Eusébio fornecewlhe um material Wo vitel como a lista de todas os habitantes de Alexandria ‘com dircito a recebet a rage de millio” — assim como seu famoso gracejo sobre Origenes € 2 interpretagao literal. ssa literatura tina mais a ensinar do que mera necessica- de de documentacdo; além disso, ela também insistia na importan- 28. E Gibbon, Memos of my bi, cxgunlendo po G.A. Benard Nowa York, 1969, p. 131 21, Sobre 3 eradcto nsenssa da seelo NVI, vez Neveu, soln Tillemont, wor sev clsseo festa anterior, Ti ascnten @ cele do Fort Rat als, IE, 22 isn sass 2b 175 orgie por DML Low. Noe York Sp 23, E. Gibhon, The datoryf the decline ad fal ofthe Hons Empire, cap. 10, orgaade por. Womersley. Lonires, 994, 1, p. 294 ap, 5,0. $6: "Cusebnus, Lita ATs Que 2 uma de Origenes thesse provecaia aver persegigio, ease ao exeterdinasi fol mais admaado do que ceneurudo Cibon referese 8 Herona eclenasten 62.12 de Ee, requ Origes cesurdo po tomar Jen em ta Gena ens 140 cia dos repositérios € no valor supremo da fonte primdria. J6 na Antigtidade, em outras palavras, alguns historiadores haviam des- coberto os prazeres do arquivo.” Josephus, o lider judeu que aderiu aos romanos durante a terrivel guerra comano-judaica de 70 AC. e passou o resto de sua vida escrevendo a histéria de seu povo, usou numerosos documentos de arquivo para mostrar que © erudite prego Apianos e 0 egipcio Manetho haviam massacrado os judeus. Alguns desses textos, Josephus simplesmente leu, jf teaduzidos, em obras gregas mais antigas, hoje perdidas, Outros, no entanto, ele afirmon ter encontrado nos arquives de cidades reais. Mais de uma vez citou documentos tirios que remontavam a milhares de anos antes de sua época“? Josephus nao deixou Giividas 2 qualquer leitor quanto a0 fata de que os documentos de arquivos mereciam crédito porque foram preservados por sacerdo- tes, € nao meros historiadores, em lugares publicos. Argumentou também, inteligentemente, que um documento escrito por um inimigo dos judeus que, nao obstante, sustentava as reivindicagoes judaicas, merecia um crédito e um respeito especiais.” O cristo Eusébio, embora menos critico, também afirmou usar material das colegdes oficiais @ em linguas estrangeiras — como a célebre correspondéncia entre Cristo e Abgar de Edessa.” O poder dessas afirmagocs ~c do raciocinio erudito que as justificava ~ nae deveria ser subestimado, ainda que a natureza curiosa dos documentos que enuditos judeus e cristios citavam tao profusamente tena algumas veres feito sua disciplina parecer mais unxt fone de problemas 24. Dore wi tesenfes do desensolimenta © do ino de argivos antigay, ver Afni ft ithe und Crater, sv Archiv, de K. Grex sobre 08 anquives egos, <0 feetanto, Re Thesmas, Inenacy and oral im ancient Gsooce Caeibage 1982, e297 25, Ver Contra dpionem, de Jouephus, 173, pp. 1017, ¢ Avaigutiates 85055 e ours ppaesigens. A oature destes auquves tm sda lasante diets ver, par exer, Mills, ‘The phowoicln eties A cose sty ix hellenlzation”, Procecings of te Cambridge Piolo Soci, 1863, pp. 55-71, e:n 63466, J. an Seer, Jr serch of ‘usar. New Haver Losdees, 1983, pp. 185-19. Cora Apsonern 1418, pp. 2-29, 74, 14. Hsia eletsica, de Bastbin, 1135-21. Bastblo ebsena que “nao hé mala como ‘OWN Of propricsreTOs ongnas Be 14 criticas do que de métocos para soluciond-los. Annius de Viterbo — que ja encontramos em nosso capitulo anterior, forjando alegre- mente os historiacores perdidos do mundo antigo ~ apzendev, exatamente com Josephus, @ afirmar que seus escritores mereciam mais crédito do que 0s gregos porque eram os sacerclotes quem guardavam registros oficiais durante séculos. A publicagao brilhan- te de Kircher de novos documentos chineses adequa-se conforta- velmente a essa uadigao milenar ~e ilistra suas fraquezas assim como sus forg, Os capftulos 15 © 16 de’ Declinio e queda mostram quao intimamemte Gibbon conhecia ambas ~ a primeira corporifi- cada por Eusébio, a tltima por Mosheim. Kircher também trabalhava dentro de uma segunda tradica0. crudita, que enfatizava a citagho explicita e a andlise de prova histérica, Isso, come ele sustentava, constituia uma das muitas reliquias egipcias — embora de longe a mais importante e mais bem preservada delas — a conter os tracos de uma antiga filosofia natural © metafisica que ainda possuia verdades profundas a oferecer 20 imelecmal moderne, cristo. Ele constrviu uma complexa interpre- tacao das inscrigdes hieroglificas do obelisco, baseada em grande parte cm sua leitura dos didlogos egipcios em grego forfados, atribuidas ao lendario Hermes Trimegisto. As referencias a esses e @ oulros textos foram complementadas por Kircher com comenté- tios marginais precisos (ele citou fontes em muitas Knguas dentro do texto também) * Kircher insistiv em que usara apenas as fontes mais antigas e mais genuinas para reconstruir ¢ restabelecer os elos da cadeia rompida da sabedoria egipcia.” B.A Kircher, Obwiiscus pampbitus, Rows, 1650. mop. ier ¥, pp. 391-560 ct sew Prodomus cops suo gypitars Rewen, 1636; Cedppusgegypsiacts. Ren, 1852-1654 Sphane mystegega. Asner’, 1676, 2, Richer, Obeleus pampbts, p. 391 “hector vera ipso Facto cempeset. Now me sot omestints. v8 quam ib insigintl possent, tndulsiste sed ex verenum probs ‘sm horn monurtecs, doslaam hae Aegypocrvan depron i, a fl, the Felictze combionsse, Fa stccessu temporum ciipatam connexuisc, ut vel inde crema iam hierglyphici contents hvcusqis dicen reuse vdeagnt” 142 Na pritica, Kircher nao citou todos 0s textos antigos relevantes ou forncceu deserigbes completas de todos os argumentos modernos «que recusau. Para usar os didloges de Hermes Trimegisio como fontes para a sabedloria do antigg Egito, teve de refutar a tese do eredito calvinista Isaac Casaubon ¢ de outros, de que os textos em questo eran fraudes gregas tarcias, O capitulo dedicado por Kircher a esse. questio comegava com uma eloqiente defesa da tadigo contra certos iconoclastas que, dizia ele, csperavam conquistar grande sepulaglo mediante a destruigio do crédito de textos hé muito considerados genufnos. Porém, ele nem apresentou o arguinento de Casaubon em detalhes nem lidou com 2 enorme documentagao lingiiistica compilada por este para mostrar que as textos em questo nao podiam ter a antigdidade que Kircher julgava.”’ Porém Kircher produziu um instrumental mais impressionan- te do que qualquer conjunto de comenticios imaginitios. Ele reuniy as inscrigdes quebradas do obelisco, decidindo que nem uma tinica pega fora perdida, ¢ fez com que fossem reproduzidas integralmente € por partes em seu liv, Infelizmeate, Kircher, ‘como muitos antiquirios, via provas visuais através de um véu de testemunhos verbais. Os artistas usados por ele julgaram imposs!- vel reproduzir imagens egipcias semi introduzir convengdes oc deniais que as distorciam. Suas citagdes de provas visuais, do mesmo mado, dificilmente serviram come uma garantia contra erro na desctigio dos dados ~ muito menos contra eros em sua andlise.** Nao obstante, os livros de Kircher eram sempre visual- 6 ed, ops SH, Ver cpp. 5: tad Ingenta nia compan pests es, quae longo sector eine & quibuns dornsatodbus frat ot seatoatone vena, suangue audwstste scldasna dont fue fe violets susie, ls, penbicque able ope Snpencant. que quem nla ald po Seopa haere econ, nis ur docnar ok tugdam pevlanie vionim aeeimatone param prorsr aboot, alaeque boc taco omalira pecieruonan smporum sctgures coor (vba, ve vero sols Aare Sor dod aus ep slice lentes, ole sane et ice oweraone ttuadp verte ac a efcas mo wea por Kirche, ver Ac Graton, fonder Of the txt Cage, Nasachuset, Loge 18). capinlos 58 2. Ver ll Whtenouse, “towards Hind of egypslogy The graphic documeniation of 183 miente assomibrosos; ¢ desti vez ele conseguiu colocar 0 proprio monumento diante do pitblico. No centro dessa sinfonia eliptica em lnranja € amarelo, a Piazza Navona, a nnultico romana ainda gira em toro da fonte de Bernini, com suas estéiuas dos quatro tios do mundo. As figuras sustentam © obelisco que Kircher desenterrara, © as inscrigdes em latim cleganiemente lapidadas explicam como passantes enuclitos deveriam interpretar esse “obe- lisco hermético", Nem mesino os espléndidos (6lios egiptologicos de Kircher se equiparam, em beleza, a0 conjunto que ele ajudou & criar para 0 documento original: ele constitui talvez a mais impres- sionante, € certamente a mais fascinante, pice justificative posta em exposiclo para sustentar as ousadas teses da arqueologia renascentista."* Como sua sinologia, 2 egiptologia de Kircher encerrava-se nas fronteitas de uma tracligio hist6rica teconhecivel, pois histéria critica, baseada em documentos, nao estava absolutamente confinada ao mundo dos polemistas judeus ¢ cristaos, beneditinos € jesuitas. Por volta do sécalo V 2.C., no maximo, intelect: regos haviam comecado niio apenas a escrever narrativas histori- cas de grandes acontecimentos, mas também a produzir monogra- fias huistoricas nas quais discutiam problemas técnicos. Os erucitos romanos seguiram seu exemplo no primeiro século a.C. ¢ nos séculos seguintes. Esses eruditos, tradicionalmente conheciclos como antiquérios, atacaram uma imensa esfera de assuntos. Tenta- ram estabelecer as datas precisas nas quais acontecimentos impor- antes haviam oconrido, Reconstrufeam priticas religiosas c institui 60s politicas, rituais pubbicos ¢ vidas privadas de seus ancestrais, Homens como Varrio, que escreveu sobre a vida global do povo Ancient Eeypt, 1587-1656", ea B. Cropper eral orgs), Documentary cute, Fleveice Land Rome fron: Grand-Dube Ferdinand | fo Pope skeemder Vi, Soko, 192, 9. 62:78: para contento, ver P. Haskell, #uory aad ws tages. Nese Haven Landes, 1534, 32. VP. tveren, The myth of feypt and brreglps ir enropenn ie. Copenbaane, 1964; ¢ Ghelists in ce, The ones of Rome. Copentague, 1958. Ma fomano a que pertencia, foram os ancestrais intelectuais de histo- tiaclores que fizeram da Paris do século XX o objeto cle estudo, de uma perspectiva social ¢ cultura ampla, como Marc Bloch e Lucien Febyre. Nao é facil dizer como eram os antigos livros antiquiios, uma vez que muito pouco dessa literatura erudita sobreviveu, exceto na forma de citagdes ou de epitomes. Porém, é provavel. mente certo que incluiam no somente textos coerentes, mas também grande quantidade dle material de forte priméria. Um ‘exemplo € fornecido pela obra, agora em grande paxte perdida, de Crateros da Macedénia, um estudante de histécia ateniense que provavelmente tinha ligagdes com Arist6teles. O grande filssofo também era, como se sabe, um grande erudito. Ele colecionava textos histéricos e juridicos de todo o mundo grego 4 fim de realizar seus estudos compurativos de sociedades e constituigzes, Crateros, provavelmente, aplicava um método cmpirico semelhan- te 20 estudo da histéria ateniense. Para estabelecer a verdade acerca de questoes polémicas de historia ¢ de cronologia, ele se Citigin a0 arquivo ateniense € copiou as inscrigdes que registravain as decisées piblicas do pove ateniense e outros textos." Plutarco, que escreveu seus livros sobre os grandes lideres atenienses alguns séculos depois de Crateros, cilou-o duas veres. Uma vex, ele obteve um documento “dentre os decretos coletades par Crateros" para refutar um outro historiador, Calistenes, certa vez, atacou uma 83. O leantamenro cisccn desa erature ainda 60 de A AMeniglno, “Ancient hioey ane the anniquarian’ Conibuie ada sore el ot clack. Roma, 1955, ver tame ss testament deset miter ex Clasica! foundations of modems haope. ep. ass dsoussbesrecetes er Cochrane, strane and bastarearapiy, ep V5; ed, “Toe Fbtebung der Archtclogt und cas Rinseoen der newolichen Geschichsbetilaung Gexchicacisturs, organtado poe W. Riis, J Risen ¢ ES, I: Afgan ‘estriceen Donkens Prk 2. M, 19%, pp. 96-18, W. Weber, “Zur Bodevuune det Anuquaransnms Rr be Earwicidnrg der nnleren Gevchicinswrssenschat, Ibid, pp. 129-135; M. Daly Davis, Ancdolage der Ane. WoHfenbutel, 1992; e, pars dapeavol iments posteiores,Lianticamsai. a eollection dunia sey VALE ef XX ‘organize por AF Laveens eK. Poa. Pas 1992 34 Os textos emo compliadcs e comentadon pot F. Jacoby em FrGrHi, M2; . (Chambers em Classical Poilogy 32, 1959. pp. 0122 145 afirmacdo do prdprio Crateros, observando que o historiador anterior no citara nenhuma “prova.., escrila, embora ele habitual- mente regisire cometamente tais coisas em sua integra € cite aqueles que sustentam seu relato."* Ambas 25 citagdes variam quanto a0 tom, mas coincidem na insinuagio de que Crateros escreveu algo semelhante a uma obra de hist6ria baseada em documentos, cuidadosamente detalhaca, diferentemente dos docu- ‘mentos subsistentes — embora cificilmente se possa tirar conclusées precisas, dada a natureza fragmentiria dos textos e 0 fato de que Plutarco possa nao ter usado Crateros diretamente. Pelo mesmo motivo, continua aceso o debate acerca dos historiadores locais de Atenas, ou atidégrafos, que devem ter realizado pesquisas em linhas semelhantes, O género antiquério gerou novos rebentos nos séculos XIV. e XV, € floresceu imoderadamente nos séculos XVI € XVII. Os eruditos percorreram as cidades ¢ os campos da Europa em busca de inscrigdes gregas e romanas, que reuniram em caderos e, desde 0 inicio do século XVI, publicaram em coleges impressas mais ou menos fiéis. Carlo Sigonio, Onofrio Panvinio € outros reconstruiram toda a espinha dorsal cronolégica da histéria romana com base nos fasti ou inscrigées encontracas nos anos 1540 no fSrum romano € reunidas, por ninguém menos do que Michelan- gelo, no Palazzo dei Conservatori.“ A Constitviglo romana e 0 calendiri ateniense, ceriménias nupciais romanas e costumes militares bizantinos tornaram-se objeto de andlise detalhada, siste- matica. Os compassos € 08 cinzéis dos gravadores juntaram-se & 35, As pasayons sho, eespectiamente, Rion 145 (RICH 42 7 13) ¢ Aristides 2.4 (rroviist 42 F'12), Jacoby entende que Phitrco estes dlzendo «qe Catercs rpomalinertect2va autores ancesres,¢ mo os pSpios menomentos de ped. %, Vor % Wels, The Renaisance ciscorery of eesical Aniguty, Ostend, 1988; 2, Mandowsky eC lachell, Pore Ligon #roman agate. Tendtes, 196% Pirro Ligon, longnsds poe RV, Gaston Eomnga, 198%, W. MeCamig, Curb Sigomic. Pane, 1959; McCue “The Fast cptofig and ue study 6 ona chcaology the sixteenth zany, Athenaeum 75, 1981, pp. A159, Anson agate baruven Rerisance ard (Core Before onganican por MA. Cracord. Lets, 1983, M6 pena na caixa de ferramentas do erudito. Os antiquétios nao somente liam textos, inas pesavam ¢ mediam moedas antigas, cscavavam. ¢ iustravam, antigos edificios ¢ estétuas, e tentavam recuperar @ aparéncia de objetos antigos, descle armas e armaduras até a cruz em que Jesus morrera. Os mais ousados dentre eles seguiram o exemplo estabelecido por Cristoforo Buondelmoati e Girfaco de Ancona, desafizndo os piratas do Mediterraneo ¢ as dificuldades cle viver em regides mugulmanas para explorar ruinas gregas em Atenas e outros lugares.” Outros reconstruiram a histéria da Europa medieval, editando ¢ avaliando crénicas comegando a sondar as profundezas de arquivos nacionais € locais.* Gabinetes de antigitidades ¢ Kunst- snd Wunderkammern ofereciam a seus cultos visitantes acervos bem oxganizados de mocdas ¢ fileiras de antigas estituas e inscrigbes. As academias ¢ 08 palicios mediterrineos onde antiquirios franceses ¢ italianos compilavam e debatiam tornaram-se 0 cendtio para uma aventura intelectual, Os métodos interdisciplinares do antiquarianismo avi- varam os curriculos de mukas universidades, especialmente no ‘Sacro Império Romano e na Escardinavia,” 37. Ver. Bosna, Cyrus ofncone and Abs. BrunelaeBerches, 1960: PW. Lehn © ® Lehn, Semodinactan relectore. Panceton, 1, W- tehnene, Cae of ‘Ancona’ egpslan We and its wefcctons in Contle Belin and Lenora Bosch Tout Valey, News Yor, 197 28, Para um exemplo punielarmente complexe de wo elice de fonts, ver A. cle Valois, Rerum franctearcom uspuc ad Clathart setts ora Hr, Bas 1658: Je Yloisenfaiza que preferitfootes mais antigas as acvas 2 un cong de Averaas ‘ecternasateatrmualas ike 1g. wera). Daub sur ee 1eas 2s fooges reevantese ear cvas aquelas ee que se apolara Ue Wy versa). No volume 1, expicow por que sua obra toms tame tempo ~e ao faxiTo aprasenion 0 que (ptveata sels come o erede dee anugeenios “Causa mome align Ra. eames ‘im acters quam cinenlatisimisink, Quane undue exemplais sepa et seiguoe codices membrarasque congusi qa rsuone plunim me obcervaunsin buona ‘olorfous noses, plunos encees iat videbam’ (a Hwee), Paea © nese siento de ervdigto acquit ba Kiger, ver esp. Bigch beterica scholars 2 grt ad eed conus, eben px Pon ores © Nove Yok, 5% Sobve a price antiquis, ver eumbém M. Wegner, Alertamstunde. Fribungo ¢ unique, 1951; A. Denis De arte poegeral, Uppous ¢ Estocolm, 1960, F. Fuchs, ‘Palatinate dewiraas, Meenbeim, 196 Bacret-Krege, WL, pane 2, eats and coins from Bude «0 Moramsen, omgsnizado por LH. Caslord, CR. Ligesa e JB. Trepp. “7 A maioria das obras cruciais nessa wadig20— como 0 brilhsan- te manual de Justus Lipsius, De militia romana, que desempenhou papel fundamental no apenas no estudo da hist6ria romana, mas também na criago dos primeiros exércitas moderos ~ eram mais sisteméticas do que cronolégicas quanto 2 organiza¢io. Todas elas citavam profusamente suas autoridades. Lipsius, por exemplo, consiruiu sua descrico do exército romano com base nas secées relevantes do texto grego do livro WJ da histéria de Roma de Polibio, que ele traduziu e comentou." Desse modo, ele dew uma ligdo sobre a importancia fundamental de usar fontes primérias. O mesmo fizcram, de mado ainda mais direto, os antiquarios dos séculos XVII e XVII, que coletaram textos hist6ricos e juridicos medievais em enormes félios que permanecem partes essenciais de qualquer bifslioteca hist6rica de trabalho ~ ainda que a maioria esses ecitores tenham eles proprios achado os textos, como literatura, fracos, ¢ mais se desculparam do que se vangloriaram Por ter imprimido tais fontes desagracéveis, porém indispenséveis. Muitos antiquirios sublinharam a importinela de bibliografias completas, das citagGes precisas ¢ das transcrigdes exatas (nnuitas ‘vezes seus procedimentos no obedeceram a seus preceitos)."* Os ‘ondies, 1950; Documentary culture, organize por Cropper ea. Sole 0 ensito de antipiidades, ver os esidos de casos de H. Keppoes, Die Gaschichsutseaschag an da Cnet fore wom Hiss bs ur Aung, Ztbchryt des Verein fr Thuriaysche Geschichte und aleruresianide, Neue Folge, Bobet 1c Baitrage 20 Geschichte cer Universit Jona 3, Joa, 1981; L. Hiller, Die Gexcbichmussenschap an de Uno ona dr at der Poybistorie IGM. 769, Zetsebreft das Vere fi nurses Chchiches nd dernanedaenta, Nese Folge, Bee Ue Deg ar Gescbichae der Cnversde jena 6, Jena, 2947; G. Wal, Die BnneteReng der len Gercbicte an der Phipps verse Marouog, Academia Katourgenss, v2 Maubug, 1077, 0. Klin Jensen, ol ior of ecandinanian archawnlegy cer, W975, expt 23, 40. J Lipa, De mutta romana Abrt see. aiden. 1596, Ver A. Somiiisno, ‘Polyots ‘bemven the Engin and the Tur, Sess contrbues ka srr deg ud clasite dt ronda nics Roem, 19D, 1, pp. 125-141 4. Ser, por exerpin, CR Uhenty, Sntedaction: the Dugdale tewcentenary’, agli bistorcal schofarbiycaguoizido por Fox, pp. 15, em ; ICA. Cronne, “Tue sey aed uke of charers y english scholar ithe seventecthvoentury. Sk Henry Selina and Se Willan Taigale” the pp. 7391, em 89-90. Pars wana verso enact mais antiga dows evigencis de cago erat © Inigil, ver an pelos de Joann Georg Beat 18 instrumentos basicos de seu comércio, além disso, tornaram-nos extemamente conscientes da importancia de verificar sua prova em primeira mo. Colecionadores de inscrig6es gregas e romanas tinham o cuidado de dizer a seus leitores quem vira um determi- nado objeto € em que condigées, Janus Gruter, 0 antiquério alemao que produziu o corpus epigrafico padrto do sécula XVII, relatou que seu predecessor, Henricus Smetins, examinara um conjunto de antigos pesos na colecao de Achille Maflei em Roma, em 1562, Em muitos outros casos, Gruter no méximo afirmaria que Smetius havia “visto”, ele mesmo, um certo objeto, ainda que ninguém soubesse onde, Para esclarecer a natureza © 0 uso de um Sbaco de bronze da colegio do eruclito de Augsburg, Mane Welser, escreveu Gruter: “Neda nos impede de ouvir suas proprias palavras muito claras” — que ele imediatamente citou.* A controvérsia antiquéria no foi climinada por esses refina- mentos metodoligicos, mas acabou por girar em tomo de wma interessante verso sofisticada da velha questo: “Bodo, bottio, quem tein o botic?" — “Prova, prova, quem pode citar a prova de priineira mio?”. Quando Ralph Brooke, funciondrio encarregado do registro de brasées em York e antiquério, iniciow uma campanha de descré dito contra seu novo colega, William Camden, antigo director da Winchester School, eitou tanto documentos quanto momumentos para mostrar que Camden deveria ter peemanecido cm seu “campo inferior de espancador de meninas". Camden, que usou a prova material do tvimulo da Rainha Filipa em sua defesa de Britannia, enfatizou que ‘essa fonte primaria fornecia uma prova oculet de sua teoria: “Que ele in Spa yn at mtn ean sy cue ci ent et sre a Aina Sis ia Selene abe rt Retractor adn nico a eg Bnet Okc pe fr etl a seman tan ls a 1-147, ern 140. o. eos AR. Aatersptiorum romanarum corpus absolutisireunt, organlrado por J. Gruter. Heldek Soran us 4 a0 timulo”, ordenou a seu adversirio, “e veja". “Eu fui", respondeu Brooke, ¢ observou que Camden favia “descrito erradamente” as artnas que afirmava ter encontrado." Apesar de toda a sua erudicao, Camden nie estava citando 0 texto ocasionalmente suspeito — como a passagem, supostamente de Asser, que descreve a histéria primitiva de Osford, que ele publicos em 1603, embora soubesse que o antiquirio Long Henry Savile of Banke muito provavelmente a falsificara. Controvérsias € discusses semethantes encheram as paginas latinas da literatura antiquéria do continente — que encontrou muitos leitores fora desses centros de erudigo técnica como a College of Heralds.” Ninguém fidou com os campos minados bibli- ogrificos ¢ momais desse ramo da erudigao de maneira mais profis- sional do que 0 grande filésofo Leibniz - que nao s6 proven por argumentos metafisicos que estava vivendo no melhor de todos os mundos possiveis, mas também provou mediante vasta pesquisa de arquivos € publicagio de todos os textos de cufas excelentes genea- logis seus patronos, a casa cle Braunschweig Lineburg, podiamn se vangloriar. Gibbon ¢ seus colegas puderam, desse modo, apoiar-se em modelos de critica de fontes e de citagio de fontes obtidos de uma tradigao de erudigio secular que remontava 2 Renascenga © até mesmo a €pocas anteriores.” E verdade que Gibbon nao via todos 6s antiquarios como dignos do mesmo respeito. As especulagdes fantisticas de cronologisias carnavalescos como Kircher, que rees- creveu toda a histéria do mundo antige para que se adequasse a seu gosto neopiaténico ou patriélico, pouco entusiasmo nele TD. Kowal, Brsy axel: Lowes, 1950, pp. 152-13 4A Ver} Packer, The cary air of Orford 727-1200. Cond, 85, pp 447; 5. Gen, ‘Bilan Twine", Groner, 10, pp. $4114, cm 98-9, 45, Pars um extudo de cain putculamente etererante, vet. Levine, Dr. Woodard’ sets Bokeley, Los Angeles © Londres, 1577 46, HL chen, Godfhed abc tacinz Serpaores Rerum Srunseicensom Baste td orograpbeche Sedeucing Packt 23, 1971 47 Nomiglano, Casuealfosendarioncof nodarnbusoriography cap 3Yerambém Fuchs, Palotinater Muara 150 despertavam, assim como 0 fanatismo e a credulidade de hagidgra- fos. Ele secau os renavos vigosos de suas recreagdes imaginativas do passado com um desprezo neoclissico enregelante: © ‘timo século foi abundante de antiquirios de profundo conbe- )-"La Vie Ge ce grand Prince publise par St FADE dde Chots ext un bon Tire, et cei beauenep molleut, Ten avo ps la pele de rmarqar: en marge ls snnces de chaque Sat, et les eos dela Bible ou de Jospe pon ounce is on svc. in ete set as bien ae ger eGo ent une souree sacse, ou dune source pte” 26. tbe, “Scioppwes” (720, MT, p. 2551, 13%, 1V, p. 175) 163 as segdes mais escandalosas ¢ irreverentes de sua obra colocando- a8 em seus instramentos, e no no texto. Mas parece certo, como argumentou Walter Rex hé uma geragio, que Bayle no o tentou, Seus leitores mais hosts, afinal, estavam também familiarizados com as obras de erudi¢io, eram exploradores especializados do instrumental eruclito, Nenlium esconderijo ou nenhuma fresta em. um comentirio suspeito poderia ter esperanga de escapar a sua atengao.”” Quando passagens maldosas em suas notas atrafam © fogo das baterias ortodoxas, catdlicas e calvinistas, Bayle no apenas se recusava a adotar medidas evasivas como também expunha uma defesa veemente: Ese 6 um diciondrio hisérieo, com coments, "Lis" deve ter logar aqui, assim como “Tucréca".. E necessro apresenar nele rio apenas a reciagio dos acontecimentas mais contecidos tuna cempingio do que se encont expuhado em diversos fugues, £ aecessiio adorir prewas, examinédas, confiemias © cesclarecé-las, Em suma, este € um wabalbo de compilacto.”* A reivindicacao de ser um compilador, no entanto, significa- va mais do que uma defesa cas partes maldosas das notas de rodapé. O termo compilag20, para Bayle, fot questio de orgulho. per nee as ei sai eta salt agers ea ‘Bayle. sent 90 9308 Ca Ek er mr te hte ee aah Secreta ae ceca Ha Semaine Da en Ngee EE Sera penis sae oe lee oe i tea et fret joey Ss ease hase tegen Bens Se es nda tiniiae hepa icine Sane acea tec TISUAD us eo cctenacs ate cree e EMESIS Spooner” 164 Esctitores mais refinados, que se recusavam a fornecer provas completas, haviam trazido descrédito & erudigio. O enorme act mulo de passagens, em Bayle, de outros textos, de exegese, sumsrio e refutagao, constituia um exercicio profundo de busca da verdade - © tnico, de fato, que podia apaziguar os receios de leitores que, com razio, eram decepeionados pelos métodos nor- mais de erudicto nao critica. Os historiadores do tipo comum distorciam; mas 0 “compilador", que necessatiamente preservava até mesmo 0 que era desagradavel, oferecia ao leitor critico toda a verdade que o esforgo humano podia alcangar. Bayle descreveu esses pesquisadores obsessivos que insistiam em verificar cada fato, com elogiéncia, até mesmo ardor: “Fles tentam tudo verificar, sempre vao A fonte, examinam a inteng2o do autor, nao se deiém 1a passagem de que necessitami, mas examinam atentamente o que a precede ou segue. Tentam exercer stias autoridaces com clogin- cia e as relacionam corretamente. Comparam-nas entre si—ou, com efeito, mostram quando estao em conflito. Além disso, sao pessoas que nao fazem nenhuma afirmacdo que nao possa ser provada.”"* Bayle, em suma, encheu seu dicionério no apenas com fato aleatGrios, diverticlos, mas também com afirmagges decidiclas, explicitas e convincentes das formas previamente desenvolvidas da pritica antiquéria. Ao (oque da pedra dle seu filésofo, o chumbo da pritica transmutou-se no ouro dos preceitos, © passo final foi simples. Bayle afirmou daramente que a forma reduplicada de sua obra tornow-a radicalmente nova: ele se afastara das segras literérias do jogo. Explicou que tivern de manter “nessa massa de todos os tipos de coisas uma personalidade dupla, 19. Bayle, Dctonair, ‘Bpicue’, D UG, | paste 2p. LOK) Bn. (1720 Mp. L077 1730, p. 397) ls veulent wou vérfle, Us vont todjours le source, As examines quel 9 6 fe but de (Auteur, de ae saereent ps a Paseage dont fs ant besoin, is ‘conskdérent avec atenuion ex qui le pebcéde, ce qe su chert de faire de belles plications, ele bien lie leurs Autoriez: i les comparent ene elles ds le eoneient, ‘ou bien fs manent q'lles ae comitene. DTalews ce peavent are des gent 56 foot vne religon, dans les matires de fait de wavancer tien sans preuve,” Eos [puagem € ctada © discida por Never, p71 165 a do historiador e a do comentador’. Come historiadr, ele recon tou no texto suas intimeras histérias estranhas, mal escolhidas, de vidas © mortes, a5 vis0es © as extravagincias de milhares de individuos. Em seu comentétio, conlou a seus leitores, ele tentou “comparar 0s argumenios contra € a favor, com toda a imparciali- dade de um repérter fiel’.” A dupla narrativa do modero histo- siador — a narrativa na qual um texto afirma os resultados Finais ‘enquanto um comentario descreve a jomada necesséria para atin- gilos— foi tanto vislumbrada quanto defendlida por Bayle. Pressio- nado por milhares de inimigos, eat6licos e protestantes; enfurecido diante da prevaléncia dos etros em milhares de livros; e desassisti- do por qualquer instituigao, Bayle tina apenas a autoridade de seu artesanato erudito em que se apoiar. O formato escolhide por ele reforgou ao mAximo sua exitica de erros — ¢ Ihe deu, como a Gibbon, espago ilimitado para ironias subversivas.” Bayle nao foi, ¢ claro, 0 tinico erudite de sua época a usar nots de rodapé. Os polimatas protestantes do Sacro Império Romano se equipararam a ele, nota por nota, J.F. Buddeus usou nnotas de fontes deralhadas para sustentar sua notivel Historia da filosofia dos bebreus, publicada pelo Halle Orphanage em 1702; assim come Christian Thomasius, no tratado perspicaz de 1712 no qual demoliu a Jenda do Sab das Bruxas, ¢ Friedrich Oo Mencke, em sua enorme e informada vida do eradito ¢ poeta do século XV. Angelo Poliziano, que bascou no verbete fartamente decumentada sobre Poliziano do Dictondrio de Bayle.” Os eruditas catélicos 20. Bayle, Dictonaire, ‘clarissmens” (1720, TV, p. 2986; 1730, 1p. 616) "a flu ‘que dans cet amas ce toutes somes de mater e soutmse Gewx personages, cela (lsorien et cru! de Comaneniseur.. clscuer Is cives, et eompacer ender bes Fassons du pout et du contre avoe our le dasineessomant dun Hdlle Raponeus” 2L. Para esa andlse, var aa obras clisslcas de B Caster, Die Ptlorpbre der Aula, 2 ed, Tubingen, 1932, pp. 259-279; Haase, pp. 418-434, 22, ©. Thammats, Wore Laster der Zauberet Cher die Herenpracensy, exganizado por R. Lichersinh, Weimar, 1953, reimpr. Muniqee, 1996, FO. Mencke, Hivorta wfc ttm Taeras marsorim Angele Polat Lapin, 736, sgs.[)() (4 verso -C3 0 (tec, esp.) C70 Crecto:" maxim! neminis Crnicus et Philogus,feiisimursque wera Tistoricanma indagatce, PETRUS BABLIUS, cuivs amplistinsin rebusque optimise 166 Procuravam documentagto pelo menos tio apaixonadamente quanto 0s protestantes. Os jansenistas franceses e italianos ~ como mostrou Momigliano hi muito tempo — anteciparam 0 esforgo de Bayle para fornecer uma base tedrica para a pesquisa documental e alcangaram ou ultrapassaram a precisio de suas peiticas.* Fxatamente como 2 poda primitive faz com que sebes flores- gam e vicejem, assim também a polémica primitiva produziu as desenvelvimentos mais fecundos das notas de fontes. Q exegeta cat6lico Richard Simon enfureceu taro as avtoridades catblicas quanto os sacerdotes protestantes com sua Hisiiria critica do Velbo Testamento, Nessa. obra, ele angumentou que 0 Pentateico repre- sentava no as palavras literais inspiradas cle Moisés, mas uma selecto ta pelos escribas publicos do que fora otiginalmente um conjunto muito maior de documentos. Simon nao somtente repetu 1 hipdwese perigosa, jf arriscada por muites outros, de que Moisés nao poderia ter escrito toda a Biblia, como também apresentou uma teoria alternativa da evolugio do texto, Ele 0 sustentou com uma sica documentagio, fazendo citagdes numerasas em seu liveo™ Crticos cscandelizados de ambas as partes da divisio religiosa afirmaram que Simon citara suas fontes incoretamente ou de modo inexato. A acusagho enfureceu-o, especialmente porque os préprios exticos copiaram acusacdes falsas uns Jos outios e deixaram de verificar as fontes originais de que Simon supostamente fizera uso incometo® “docrina rakinlic vfertam de Vita ot monibur Poidant Commmenentionem habe in {ewes quod stupenco ibe east vr inoor)parabis, Histone akgue Chil eden aera.” (Meocke cia outrs fortes também, mas com adtitos menos Inponetres. 23. A. Momighano, “La fornazioce della stariograia adem sullimpero romana", Con ‘ibaa, pp. 110116, 24. Shon, Aesove critque du Views Teen (segundo a c&pa, npresta em Pais, 16K) breves comentiios mugjrais namesim ce autores ©, sigur vezm, dip or tiulos das fonts is teas de Souon e Weatlirera votes bilons ctados. Sobre © ‘conhecimento de Simon sebre 6 Velho Tesamenen, ver H. Graf Reventow, “Richart ‘lato vad selne Redenang fie dia kite Eset, de Biba ein Schroer (org), Hiacriacbo Rankin der Brel a tber Geschichte, Gecsgen, 1980, Ip. L136, W. MeKune, Selected ebrisian belwaizs, Cambridge, 1989, cp. 4. 25. I Simenl, Apelogic bur Fanteur de Uostote erie du Vow Testament. Rows, 1625, reimpr, anki, 1975, pp. 94-95. "Lenidtion de née copie (Pere le Vassor| 167 Para defender tanto sua honra quanto seus argumentos, Simon planejou o que descreveu como uma nova farma de documentagio para sua Histiria critica do texto do Novo Testamento, publicada em 1689. No texto, explicou em seu prefiicio, citou regularmente suas fontes “em forma abreviada, ¢ seguindo apenas o sentido”. Mas, para satisfazer leitores que desejavam conhecer as palavras exatas de svas fontes, ele colocou texto integrais “no pé de cada pagina, onde qualquer um seri capaz de ler por extenso ena linguagem do autor." Na verdade, Simon fez mais do que isso. Ele indicou fegulamente a fonte precisa de cada citagio ou parlifrase de seu texto com um comentirio marginal, ¢ entio fomeceu o texto integral em ‘questo, e uma segunda indicago de sua origem, em uma nota de rodapé. Os criticos, ainda que nao desarmados, certamente deram um. passo em falso causado por esse golpe antecipado. ‘Todos os autores que fizeram indagagSes controvertidas por volta de 1700 sabiam que estavam pisancdo em terreno minado: 28 notas de rodapé naturalmente atrafam muitos daqueles que discutiam tépicos histéricos e filoséficos como melhor maneita de se proteger contra ataques ocultos ou abertos. Porém, um conjunio de intelectuais de maior porte também ajudou a tomar os intelectwais mais conscien- tes acerca do problema da autoridade em escrever sobre © passado —€, no caso de Bayle, extremamente habilidosos quanto 0 modo de evitar desastres, Bayle, como mostrou Carlo Borghero, foi um dos [Parle enaore mic les oopie au méme endo squat fates des Thogions ‘a Hollands, Cea Nessiours done il admire Ia cxpacté, parce q'l a'en a ase, a8oient ‘objets 1, Seon, que lon tet Jeaephe U a's pas 6 exact 3 mamquer ke LTE tle Chapine.hinis coome Us agissoi de PApologle de cet Histrien cnize Apion, Jnquelle ae content que deux Livres for petits sans aucune ditnetion de Chapies ‘on leur vei repondy, que ceo assez dave ee le ie. Le P. le Vaszor cc es Pie mtrement excet repetant b mésue objection oaraue Ia page. Le malheur eit que ce ‘lle de Vevton Greque Ltine de Josepbe ney rourve point ben quaieaarqué 4 page avec grand coin: Mals seulement dans le Le Frangois dev Theoliens de ‘oltonde qu cot mal tit cet endrot de Josephe, comme M. Simon ler a Ea clr ‘dan reponse” 26, Simon Heo ertngue du tec dh Nonwene Testament Retest, 169, sg. 2 sect Ona ech de les sata Ia-desas, sans neato changer rien de we prerlete rmethode On les 2 aie au bar dex pages, oo chcun pov lea Ire dana toute Isr (hens otcan a anygon des AuseuEs 168 erucitos europens que se viram forgados, no correr da segunda metade do século XVI a enfrentar nfo s6 as formas normats da intolerancia clerical como também um ataque muito mais fundamen- tal 2 sua disciplina como um todo. O imensamente inffuente Discurso sobre o méiodo, de Descartes, como qualquer humanista sabia, incluia uma critica devastadora do conhecimento historio, assim como um programa para uma nova filosofia. Descartes descartava a histéria e as humanidades como um passatempo que, no que diz respeito a informac2o ou ao rigor, valia tanto quanto viagens (ambas mostravam apenas que as opinides e os costumes humanos dlvergiam infinita- mente). Porém ele também fornecia @ seus oponentes armas que poderiam ser usadas contra ele mesmo. Tanto em suas obras mate- éticas quanto flos6ficas, Descartes deixava claro que as qualidades formais dos argumentos matemticos lhe proporcionavam 0 rigor ¢ a abrangéncia que faltavam as bumanisicas. Alguns defensores do ‘conhecimento hist6rico, como Huet € Craig, utilizaram esse argumen- to diretamente em sua obra. Tentaram dar a sua critica histGrica o rigor da forma cartesiana (ou newtoniana) dle cadelas rigorosas de dedi fos? Bayle ¢ seus seguidores das notas de rodapé, a meu ver, responderam a Descartes de um modo mais construtivo. Adotaram os métados que Bodin recomendara ¢ De Thou ¢ outros haviam posto em prética, como um alicerce adequado para a investigasao histérica rigorosa, Eles nao apenas aplicaram, mas estabeleceram as regras que verificavam ou falsificavam as proposigtes histérieas. E cxiaram a forma cuupla da narrativa dupla como recurso que expressaria de modo inequivoco, exatamente como as Kepulae cartesianas, que cack argumento apresentado derivava rigorosamente de todas as provas relevantes.” 27. Barger, La centeza ela sora. Mika, 1985, 2B. Yer tami J. Sol, Religion et méthode crite chins le Ditionsie’ de Bayle, era Feligion, deudib ex crue laf dc XVOF sce ct nus die XVI Pais, 168, pe. 9017, em 104.106. 169 [A hist6ria inicial do projeto de Bayle para seu dicionArio oferece um rico material de apoio para essa andlise. Em seu “Projeto", Bayle insistia em. que sua obra encontraria muitos leito- res, precisamente porque as ciéncias da critica hist6rica e filolégica estavam passando por um florescimento nunca visto: Endo me digam que nosso séeulo, que Foi restaurado e curado do espiito ertien que reine no anterior, consider como mero pedantisme os eseritos daqueles que corrigem erros quanto a fatas, no que diz respelio quer ho vidas individuals de grandes homens, quer aos nomes das cidades ou queswes semelhantes, Pols no resta davida, dle um modo geral, que esse tipo de ilusttagao nunca cenconerou tnais apoio do que no presente, Pars cada investigador de experinientos fisicos ¢ cada matematico, iremos encoatrar cenionas ce esmudantes sérios de histrla ¢ de todks as suas subdisciplinas. A ciéncia das anugaidades, isto ¢, © estuto das medialis, das inserigées, dos bunxos-relevos e assim por diante ‘nunca foi ea eultivade, quanta hoje? A vor de Bayle soa orgulhosa positiva aqui. Porém, ele introduziu essa passagem — 0 que é revelador — como resposta a uma objecao hipotética. Fle sabia pevfeitamente que a opinii popular estava contra ele, Muitos erudlitos dedicados jf haviam perdido a cesperanca de recuperar um lugar central no currictitum, em virtudle da preferéncia geral pels filosofia cartesiana e pela ciéncia experimen- tal, Por sua ver, isso explica por que Bayle sentiu ser necessério aargumentar detalhacamente contra 2 visio em voga de que a mate- ética tinha a sen favor, em detsimenta do conhecimento histérico, © fato de que ela “nos conduz a verdades que milo admites cividas* 25. Bogle, "Proje", Pre, sg. Ml verso "Bt quen ae ave dive pas que ce abe, seven eC er de Teeprit Critique qui regnoi dans le precedent, ne sepante que vorime des pednieris les Eons de ceux qui coregeat les fausiexer de fa, concernant eu Hire ppneutiore des grane’s haces, ou ke nom doa ils, a tlle aus choses car et tain 3 tout prendre, quan aia mam eu pe amachement giarcualay 2 cee sores d'écaxcisernenss. Pour un chexcheur dexperences Phyalgues, pour en Yano: rralien, sous fexver cent percones qe chadient fore [Hise Stee toutes 3e2 ependhances, et jamais Ia slence de Famtiquariy, je vue dre ude des medals, sie mucriplions, des baneliefsete vk A cultese comme elle Text presentemene| 170 Pelo conteirio, insistia Bayle, as “certezas” da historia, embora dife- rentes daguelas di matemtitica, cram muito mais concretas, mais aplicdveis @ vida humana ¢ até mesmo “mais certas, ent um, sentido mietalisico”, do que “as exiremas abstragdes da matematica’.”” Nesse mesmo esquema, embora em um outro contexto, Bayle reconhecia que os problemas de citag4o exerciam um papet importante em fazer com que a histéria parecesse menos certa do que era: ‘Se um autor afiema algo sem citar suas fontes, o leitor tem motives para acteditar que ele Cala apenas com base no ouvir dizer. Se ele ita, 0 Teitor recela que Gite as passagens de forma erruca ou delas faca uma imerpretacao erada... O que, encto, se deve faver para eliminar esses motivos de desconfanga? Exister mui tivras que fnunes foram refutados, ¢ inimerns leitores que nao possuem livros que contém a série completa de polémics lteréiss." © iiltimo dos verbetes do rascunko do diciondrio que Bayle imprimiu com seu “Projeto” foi o hilariante “Zeuxis", com sew brilhante celato irénico das dificuldades com que se defroniou © grande artista grego quando pecliu para ver suas modelos nuas. Na nota de rodapé A, Bayle sublinhou a importincia positiva da citagao adequada. Como de costume, Moré ocupara-se da ques- tdo da maneira cxatamente errada: “Fle acumula todas as suas cchagdes no fim de cada verbete, sem nos informar que um determi- nado autor disse unta coisa e um segundo, outta. Desse modo, ele

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