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Capítulo 2

A Inspeção Visual

1. Introdução
A inspeção visual foi provavelmente o primeiro ensaio não destrutivo usado pelo homem, mas
continua sendo o mais usado e geralmente precede qualquer outro ensaio. A sua principal
vantagem é fornecer dados quantitativos (além das informações qualitativas) mais facilmente que
os outros END’s. Alguns testes são baseados nas leis da ótica geométrica e outros fazem uso das
propriedades ondulatórias da luz. Este ensaio tem sido usado principalmente para a inspeção de:
• superfícies expostas ou acessíveis de materiais opacos e equipamentos parcial ou
totalmente montados e objetos acabados e
• interior de objetos transparentes ou translúcidos, como o vidro, quartzo, alguns plásticos,
além de líquidos e gases
para determinação do tamanho, forma cor, acabamento, refletividade, presença de
descontinuidades superficiais grosseiras e funcionalidade, usando a visão a olho nu ou com o
auxílio de instrumentos simples como lupas e gabaritos ou sofisticados aparelhos como
interferômetros e microscópios.

2. Fundamentos
A visão humana envolve uma série de fatores tais como a percepção de luz, forma, cor,
profundidade e distância. A percepção da forma é possível porque a luz vinda de um objeto é
focalizada no olho e uma imagem é formada. Esta imagem visual é afetada pelo sistema de
lentes do olho da mesma forma como é afetada pelas lentes de outros sistemas óticos, como uma
câmara fotográfica, alterando o foco. A íris funciona como um diafragma e controla a quantidade
de luz que é admitida e a retina é o elemento sensível no qual a imagem é formada. O ajuste de
foco é obtido pela variação na espessura e curvatura do cristalino, processo chamado de
acomodação, conseguido pela ação de pequenos músculos associados às lentes.

No olho normal, objetos situados a distâncias acima de 5 m são facilmente focalizados na retina
pela relaxação dos músculos de acomodação. Problemas de acomodação precisam ser corrigidos
por lentes. Num hipermetrope por exemplo, há necessidade de uso de lentes convexas. Já os
míopes precisam usar lentes côncavas, mais espessas nas bordas que no centro, para enxergar
bem objetos distantes.

A visão binocular é que permite a percepção de distância com precisão, ou seja, a visão
estereoscópica, que faz com que a imagem de objetos próximos vista por cada olho seja
ligeiramente diferente, dando assim a percepção de profundidade.

A percepção de luz pela retina e pelos receptores do nervo ótico é bastante complexa e envolve
diversas estruturas e processos fotoquímicos, para que a informação seja levada ao cérebro. Estes
aspectos não serão aprofundados aqui. Cada cor possui três características físicas importantes:
tom, pureza e brilho. O tom é aquela característica que normalmente dá nome às cores, como
azul ou vermelho, associado ao comprimento de onda da radiação. O olho humano é capaz de
distinguir cerca de sete milhões de cores distintas, com comprimento de onda entre cerca de
3900 e 7200 Ǻ (1 Ǻ = 10-10 m ou 10-4 µm), mas somente algumas poucas são normalmente
referidas, como violeta, azul, verde, amarelo, laranja e vermelho. A luz contendo apenas uma
estreita faixa de comprimentos de onda é chamada de luz monocromática.

A saturação normalmente é quantificada em porcentagem e expressa a quantidade de luz de um


certo comprimento de onda, como quando se mistura, por exemplo, tinta azul com diferentes
quantidades de tinta branca.

O brilho indica intensidade da radiação, isto é, a quantidade de energia luminosa. O contraste de


brilho um dos fatores mais importantes da visão. O brilho de uma superfície refletora colorida
depende de seu fator de reflexão e da quantidade de luz incidente. Brilho excessivo causa uma
sensação incômoda, referida como clarão, que interfere na capacidade de visão clara, observação
crítica e julgamento. O clarão pode ser evitado pelo uso de luz polarizada.

Como dito anteriormente, a visão humana é capaz de perceber todas as cores do espectro solar,
com comprimentos de onda entre 3900 e 7200 Ǻ, que é apenas uma fração mínima do espectro
eletromagnético, como mostra a figura 1.

Figura 1 – Espectro eletromagnético.

Entretanto, a resposta do olho humano varia consideravelmente com o comprimento de onda,


estando o máximo de resposta ao brilho na faixa de 5500 a 5600 Ǻ, que é a faixa da luz do dia. A
acuidade e a sensibilidade ao contraste diminuem rapidamente quando o nível de iluminação
diminui e a fadiga visual cresce quando o nível aumenta, quando ocorrem clarões e quando a
intensidade de iluminação é muito baixa ou está fora da faixa de 4700 a 6100 Ǻ.

A avaliação crítica das cores e variações destas é um dos princípios básicos em quase todos os
tipos de inspeção visual. Corrosão e oxidação de metais e ligas ou deterioração de materiais
orgânicos geralmente estão associados com variações de cores. Por exemplo, variações mínimas
da cor da superfície de carne fresca, não perceptíveis ao olho humano, podem ser percebidas por
dispositivos fotoelétricos e usados no controle de qualidade de carnes, antes de seu embalamento
ou consumo.
Outro aspecto importante é que a visão varia de pessoa para pessoa em termos de velocidade,
acuracidade e segurança da visão, bem como aspectos psicológicos e emocionais podem alterar
sensação visual e julgamento de um mesmo observador.

3. Equipamentos
Os equipamentos usados na inspeção visual são usados para captar ou amplificar a luz, formar ou
ampliar imagens, facilitar o acesso, permitir comparações medições ou gerar sinais elétricos e
podem variar de simples espelhos e lupas a colorímetros e refratômetros.

A formação de imagens em instrumentos simples segue, em geral as leis básicas da ótica


geométrica e da trigonometria, como em lentes, lupas e espelhos. Em alguns casos, como os
telescópios ou microscópios, o sistema pode ser mais complexo, envolvendo lentes, prismas,
espelhos, filtros, dentre outros.

As fontes de luz, podem ser de espectro contínuo (luz branca natural ou artificial) ou
monocromáticas (lâmpadas de vapor de mercúrio, sódio, por exemplo, e filtros adequados).
Fontes estroboscópicas podem ser usadas para permitir observação de objetos em movimento
muito rápido ou periódico como se estivessem em repouso.

Sinais provenientes de uma fonte de luz, após passarem pelo componente em teste, são
armazenados de forma visual ou eletrônica. A detecção dos sinais pode ser feita, por exemplo,
por células fotoelétricas ou diodos multiplicadores, os sinais podem ser convertidos por
dispositivos eletrônicos tais como câmaras de vídeo ou circuitos internos de TV ou ainda serem
registrados por filmes ou câmaras fotográficas, normais ou digitais. Radiação invisível também
pode ser utilizada e registrada por sistemas adequados, como no caso de radiação ultravioleta e
dispositivos fluorescentes.

Os principais instrumentos usados em inspeção visual são:

• Lupas: em geral possuem aumentos de 1,5 a 10 vezes e são constituídas por uma única lente
biconvexa, de diferentes tamanhos e formatos, dependendo do uso pretendido. Suas
principais características são o poder de ampliação, distância de trabalho, campo de visão,
correção cromática e visão mono ou bi ocular. Quanto maior o poder de ampliação, menor o
campo de visão e a distância de trabalho. Algumas vezes elas podem combinadas com
escalas de medição, como mostra a figura 2 e/ou terem um sistema próprio de iluminação.

(a) (b)

Figura 2 – Lupa de medição (a) com escala associada (b)


• Microscópios: Podem ser portáteis e de baixa ampliação, entre 10 e 30 vezes, como o
mostrado na figura 3, até os de bancada ou mesa com ampliação média ou alta, entre 20 e
2000 vezes. Os mais simples possuem em geral apenas uma ocular e uma objetiva, montadas
em um tubo, e produzem imagem invertida e reversa. Outros mais complexos usam prismas
para corrigir a imagem.

Figura 3 – Microscópio portátil com iluminação própria e ajuste de foco.

• Telescópios: São instrumentos usados para ampliar a imagem e permitir observação de


objetos em locais não acessíveis diretamente aos olhos. Podem ser de vários tipos, flexíveis
ou angulados, por exemplo, como os boroscópios e periscópios. Os boroscópios são
instrumentos de precisão, dotados de fonte de iluminação própria, usados para inspeção de
superfícies internas e podem permitir visão frontal, oblíqua, perpendicular ou retrospecta.
Periscópios permitem ver locais inacessíveis ou através de paredes. Instrumentos modernos
fabricados a partir de fibras óticas, micro câmaras e monitores portáteis, analógicos ou
digitais têm substituído os aparelhos convencionais, como o mostrado na figura 4.

Figura 4 – Fibroscópio moderno.

• Projetores óticos: Projetores são muito usados em controle dimensional, de forma e de


condições superficiais, muitas vezes de maneira rápida e eficaz. Diversos tipos de projetores
estão disponíveis no mercado, com diferentes tamanhos, capacidades e usos. Um projetor
típico é mostrado na figura 5. Eles são dotados de uma tela com possibilidade de rotação,
uma mesa móvel na horizontal e vertical, sistemas de medição nos eixos horizontais x e y e
sistemas de iluminação e projeção com aumentos conhecidos.

Figura 5 – Projetor ótico típico.

As medições são feitas, em geral, pela comparação do perfil ou sombra do objeto projetada
na tela com um desenho em escala superposto a essa imagem. Outra possibilidade é a
medição por deslocamentos da mesa e do objeto ensaiado, usando-se como referência pontos
ou linhas da tela.

• Gabaritos e comparadores: Na indústria de fabricação é muito comum o uso de gabaritos e


comparadores ao invés de instrumentos de medidas como paquímetros e micrômetros, por
exemplo, que são instrumentos mais delicados e de custo elevado. Existem diversos tipos de
gabaritos, para aplicações gerais e específicas.

Um tipo muito usado é o “passa-não passa”, para inspeção dimensional de furos, rasgos e
dimensões em geral, cmo diâmetro de eixos, por exemplo. Este tipo de gabarito apresenta
duas pontas de medida, uma das quais com a dimensão mínima e a outra com a dimensão
máxima admissível do componente, de forma que uma ponta deve passar pelo furo ou rasgo
ou a peça deve pasar por ela e a outra não deve passar ou deixar que a peça passe por ela.

Outros são usados em aplicações específicas, como os conhecidos “canivetes” de roscas,


usados para determinação do padrão e dimensões de roscas de parafusos e porcas. Em
soldagem são usados diversos gabaritos específicos para a medição dimensões de soldas,
como os mostrados na figura 6.
(a) (b) (c)

Figura 6 – Gabarito para medida de (a) reforço de soldas, (b) garganta e (c) perna de filetes.

• Sistemas especiais: Sistemas especiais formados por diversos componentes de uso geral e
componentes específicos podem ser montados para aplicações específicas. Por exemplo, a
inspeção visual remota do interior de tubulações pode ser realizada com o auxílio de carros
motorizados de diversos tamanhos, com câmaras de vídeo em cores, com controle de foco,
“zoom”, orientação e rotação, como o ilustrado nas figura 7.

(a) (b)

Figura 7 - Sistema para inspeção remota de tubulações de grande diâmetro.

Para tubulações com diâmetros entre 100 e 250 mm são utilizadas câmeras de orientação
fixa e visão axial e para diâmetros entre 250 mm e 1500 mm são utilizadas câmeras com
controle de orientação e rotação, podendo inspecionar tubulações com inclinações de até
20%, como o sistema mostrado na figura 8.

(a) (b) (c)

Figura 8 – (a) Carro para inspeção de tubulações com menores diâmetros e


(b) e exemplos de imagens obtidas
A figura 9 mostra um sistema formado por um mini-submarino com câmeras de televisão,
fonte de iluminação e pinças articuladas, permitindo a obtenção de imagens de alta
qualidade e o manuseio de pequenos objetos, usados na inspeção e manutenção de
centrais nucleares.

Figura 9 – Sistema para inspeção de centrais nucleares.

4. Aplicações
Como dito no início deste capítulo, a inspeção visual tem sido usada principalmente na inspeção
de superfícies expostas ou acessíveis de materiais metálicos e não metálicos e o interior de
objetos transparentes ou translúcidos, para determinação do tamanho e dimensões, formato, cor,
grau de acabamento e de ajuste, refletividade, brilho e transparência, presença de
descontinuidades superficiais relativamente grosseiras em materiais opacos, ou internas em
materiais translúcidos e funcionalidade de equipamentos parcial ou totalmente montados e ainda
de peças acabadas.

5. Normas
A inspeção visual é normalizada por várias associações técnicas, como a ASTM e ASME, por
exemplo, para diversas aplicações.

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