Você está na página 1de 48
Direcao Benjamin Abdala Junior Samira Youssef Campedelli Preparagao de texto Sérgio Roberto Torres Edigao de arte (miolo) Milton Takeda Divina Rocha Corte Composicao/Diagramacao em video Marco Antonio Fernandes Maria Inés Rodrigues Capa Ary Normanha Antonio Ubirajara Domiencio Impresso nas oficinas da Grafica Palas Athena ISBN 85 08 032609 2002 Todos cs dretos reservados pla Eo Aca Fun Bardo do qua, 110~ CEP 01607-500 (Caixa Post 2337 ~ CEP 0106670 ‘sao Paulo~SP Tes 0 11 3346-3000 ~ Fane OK 11 277-4146 beat hapuhwwatca contr ‘emalt edtora @atica.com.br Sumario 1. Introdugao 2.0 que é 0 espago urbano? 3. Quem produz o espago urbano? Os proprietarios dos meios de produgao Os proprietarios fundiarios Os promotores imobilidrios O Estado Os grupos sociais exclufdos Um exemplo concreto: 0 bairro de Copacabana . Processos ¢ formas espaciais Centralizagdo e Area Central A génese da Area Central O niicleo central ¢ a zona periférica do centro Descentralizagao e os miicleos secundarios O significado da descentralizaco A seletividade da descentralizagao Os nticleos secundarios: 0 comércio e servigos — Os mucleos secundarios: a industria W 13 16 19 24 29 31 36 37 38 40 45 47 49 50 53 Coesio ¢ as areas especializadas 36 Segregacdo e as areas sociais Segregacao ¢ classes sociais Quem produz a segregacao? significado da segregagdo 65 Os padrées espaciais 66 Dinamica espacial da segregagio 69 Mobilidade e segregagio __ _ 70 O padrao latino-americano B Inéreia e as areas cristalizadas _ 16 5. Consideragées finais oo) 6. Vocabulario critico = 82 7. Bibliografia comentada _. 85 1 Introducao O presente estudo aborda a cidade, Trata-se de um te- ma que é extremamente caro aos diversos estudiosos da so- ciedade, historiadores, socidlogos, economistas, antropélo- g0s, urbanistas e gedgrafos, entre outros. A tematica inte- ressa também aos planejadores ¢ politicos e aqueles que de- tém alguma fragdo do capital, seja ele financeiro, industrial, comercial, fundidrio ou imobilidrio. Interessa a todos os ha- bitantes da cidade, entre eles os ativistas das associagoes de bairro, O interesse em conhecer e atuar sobre a cidade deriva do fato de ser ela o lugar onde vive parcela crescente da po- pulagdo, Mas também de ser o lugar onde os investimencos de capital so maiores, seja em atividades localizadas na ci- dade, seja no prdprio urbano, na produsao da cidade. E mais: de ser o-principal lugar dos conflitos sociais- ‘O gedgrafo considera a cidade, de um lado, como um ou varios micleos localizados em uma regido ou pais; neste estudo consideram-se mapas de pequena escala. De outro, a cidade é considerada como espago urbano, sendo analisada a partir de mapas de grande escala. Estas duas abordagens ndo sdo mutuamente excludentes. Nem do am- bito exclusivo dos gedgrafos, apesar das diferengas de abor- dagem em relagao aos demais estudiosos. “No presente estudo consideramos a cidade como espa- ¢0 urbano. Sua anéllise geografica ¢ feita de diferentes mo- dos, de acordo com as diversas correntes do pensamento geografico. Assim, por exemplo, 0 espago urbano pode ser analisado como um conjunto de pontos, linhas e areas. Po- de ser abordado a partir da percepc%o que seus habitantes ou alguns de seus segmentos tém dele e de suas partes. Ou- tro modo possivel de andlise considera-o como forma espa. cial em suas conexdes com estrutura social, processos ¢ fun- des urbanos. Por outro lado ainda, 0 espago urbano, co- ‘mo qualquer outro objeto social, pode ser abordado segun- do um paradigma de consenso ou de conflito> Iniciamos este trabalho. procurando definir 0 espaco urbano. Trata-se de construir © nosso objeto de estudo e in- dicar como seré a sua abordagem. Em segundo lugar consi deraremos os agentes sociais que produzem 0 espaco da ci- dade, A maior parte deste trabalho focaliza os processos € as formas espaciais. As consideragdes finais privilegiardo algumas proposigdes de pesquisa sobre 0 espago das cida- des brasileiras, esperando que suscitem numerosos estudos que contribuam para uma melhor compreensao do urbano €, por conseguinte, da sociedade brasileira. 2 O que éo espaco urbano? “© espago de uma grande cidade capitalista constitu. se, em um primeiro momento de sua apreensao, no conjun- to de diferentes usos da terra justapostos entre si. Tais usos definem areas, como o centro da cidade, local de concentra- 80 de atividades comerciais, de servigos e de gesto, areas industriais, areas residenciais distintas em termos de forma e contetido social, de lazer e, entre outras, aquelas de reser- va para futura expansio. Este complexo.conjunto de usos da terra é, em realidade, a organizagdo espacial da cidade ou, simplesmente, 0 espaco urbano, que aparece assim co- mo espago fragmentado.” + Mas 0 espaco urbano ¢ simultaneamente fragmentado ¢ articulado: cada uma de stias partes mantém relagdes espa- ciais com as demais, ainda que de intensidade muito variavels Estas relacdes manifestam-se empiricamente através de flu xos de veiculos e de pessoas assaciados as operagdes de cat- ga e descarga de mercadorias, aos deslocamentos quotidia- nos entre as areas residenciais e os diversos locais de trabalho, 0s deslocamentos menos freqiientes para compras no centro da cidade ou nas lojas do bairro, as visitas aos parentes ¢ amigos, ¢ as idas ao cinema, culto religioso, praia e parques. “A articulacdo manifesta-se também de modo menos visi- vel. No capitalismo, manifesta-se através das relagdes espa- ciais envolvendo a circulagdo de decisdes ¢ investimentos de capital, mais-valia, salérios, juros, rendas, envolvendo ain- da a pratica do poder e da ideologia\ Estas relacdes espaciais, sio de natureza social, tendo como matriz a prépria socieda- de de classes ¢ seus processos. As relagdes espaciais integram, ainda que diferentemente, as diversas partes da cidade, unin- do-as em um conjunto articulado cujo micleo de articulacao tem sido, tradicionalmente, o centro da cidade. Este é um se gundo momento de apreenso do que ¢ 0 espaco urbano: frag- mentado e articulado. * Ao se constatar que o espago urbano ¢ simultaneamen- te fragmentado e articulado, e que esta divisdo articulada é a expressdo espacial de processos sociais, introduz-se um ter- ceiro momento de apreenséo do espago urbano: é um refle- xo da sociedade. Assim, o espago da cidade capitalista é for temente dividido am areas residenciais segregadas, refletin- do a complexa estrutura social em classes; a cidade medieval, por sua vez, apresentava uma organizacao espacial influencia- da pelas guildas, as corporagdes dos diversos artesfios. Mas © espago urbano é um reflexo tanto de agdes que se realizam no presente como também daquelas que se realizaram no pas sado e que deixaram suas marcas impressas nas formas espa ciais do presente.r Dois pontos devem ser agora indicados. Primeiramente Por ser reflexo social e fragmentado, o espago urbano, espe cialmente o da cidade capitalista, ¢ profundamente desigual: a desigualdade constitui-se em caracteristica prépria do espa g0 urbano capitalista. Em segundo lugar, por ser reflexo so cial e porque a sociedade tem a sua dindmica, o espago urba- no é também mutavel, dispondo de uma mutabilidade que ¢ complexa, com ritmos e natureza diferenciados. * 0 espao da cidade é também um condicionante da so- ciedade. Este ¢ 0 quarto momento de sua apreensdo. O con- dicionamento se da através do papel que as obras fixadas pe lo homem, as formas espaciais, desempenham na reproducao das condigdes de produgao e das relacdes de producdo. Assim, a existéncia de estabelecimentos industriais juntos uns dos ou. tros, e realizando entre si vendas de matérias-primas indus- trialmente fabricadas, constitui-se, pelas vantagens de estarem juntos, em fato que viabiliza a continuidade da produgio, is- to é, a reproducao das condigdes de producdo. As Areas residenciais segregadas representam papel pon- deravel no processo de reprodugao das relagdes de produgao, no bojo do qual se reproduzem as diversas classes sociais ¢ suas fragdes: os bairros so os locais de reprodugao dos di versos grupos sociais. ~ Fragmentada, articulada, reflexo e condicionante social, a cidade é também o lugar onde as diversas classes sociais vi- vem ¢ se reproduzems Isto envolve 0 quotidiano e o futuro préximo, bem como as crengas, valores € mitos criados no bojo da sociedade de classe e, em parte, projetados nas for- mas espaciais: monumentos, lugares sagrados, uma rua espe- cial etc. O espaco urbano assume assim uma dimensao simbd- lica que, entretanto, é varidvel segundo os diferentes grupos sociais, etdrios etc. Mas 0 quotidiano e o futuro préximo acham-se enquadrados num contexto de fragmentacao desi gual do espaco, levando aos conflitos sociais, como as greves operarias, as barricadas e os movimentos sociais urbanos. O espaco da cidade é assim, e também, 0 centio € 0 objeto das lutas sociais, pois estas visam, afinal de contas, o direi- to a cidade, & cidadania plena e igual para todos. 1 Eis 0 que ¢ 0 espaco urbano: fragmentado e articulado, reflexo e condicionante social, um conjunto de simbolos ¢ campo de lutass E assim a propria sociedade em uma de suas dimensdes, aquela mais aparente, materializada nas for mas espaciaist E este 0 nosso objeto de estudo. +0 espago urbano, como se indicou, é constituido por di- ferentes usos da terra! Cada um deles pode ser visto como uma forma espacial. Esta, contudo, ndo tem existéncia autd- noma, existindo porque nela se realizam uma ou mais fun Oes, isto é, atividades como a producao e venda de mercado- rias, prestacdo de servigos diversos ou uma funcdo simbéli- ca, que se acham vinculadas aos processos da sociedade. Es. tes so, por sua vez, 0 movimento da propria sociedade, da estrutura social, demandando fungdes urbanas que se mate- rializam nas formas espaciais', Formas estas que sao social- mente produzidas por agentes sociais concretos. Comegare- mos analisando o papel destes agentes e, a seguir, considera- remos 0s processos e as formas espaciais, que constituirdo a parte central deste estudo. \ Santos, Milton. Espugo e métodio, Sto Paulo, Nobel, 1985. 3 Quem produz O espaco urbano? 10 espaco urbano capitalista — fragmentado, articula- do, reflexo, condicionante social, cheio de simbolos e cam- po de lutas — é um produto social, resultado de ades acu- muladas através do tempo, e engendradas por agentes que produzem e consomem espaco, Sio agentes sociais concre- tos, ¢ ndo um mercado invisivel ou processos aleatérios atuando sobre um espaco abstrato! A agdo destes agentes é complexa, derivando da dinamica de acumulagao de capi tal, das necessidades mutaveis de reprodugao das relacdes de produgao, ¢ dos conflitos de classe que dela emergem.! +A complexidade da acao dos agentes sociais inclui pré- ticas que levam a um constante processo de reorganizagao espacial que se faz via incorporagdo de novas dreas a0 espa- ¢0 urbano, densificacdo do uso do solo, deterioragéo de certas Areas, renovacdo urbana, relocagao diferenciada da infra-estrutura e mudanga, coercitiva ou nao, do conteido social e econémico de determinadas reas da cidade? E pre- ciso considerar entretanto que, a cada transformagao do es- paco urban, este se mantém simultaneamente fragmenta- do e articulado, reflexo e condicionante social, ainda que as formas espaciais ¢ suas fungdes tenham mudado. A desi- gualdade sécio-espacial também nao desaparece: 0 equili- brio social e da organizagao espacial néo passa de um dis- curso techocratico, impregnado de ideologia. ~ Quem sao estes agentes sociais que fazem e refazem a cidade? Que estratégias e agdes concretas desempenham no processo de fazer e refazer a cidade? Estes agentes sio os seguintes: (a) os proprietérios dos meios de produgao, sobretudo os grandes industriais; (b) 0s proprietarios fundiarios; (6) 0s promotores imobiliarios; (d) 0 Estado; ¢ (©) 08 grupos sociais excluidos.» Antes de considerarmos a agdo de cada um destes agen- tes, convém tecer alguns comentarios gerais sobre eles em conjunto. Em primeiro lugar, a apdo destes agentes se faz dentro de um marco juridico que regula a atuagao deles. Este mar- co nao € neutro, refletindo o interesse dominante de um dos agentes, ¢ constituindo-se, em muitos casos, em uma re- térica ambigua, que permite que haja transgressdes de acor do com os interesses do agente dominante. Em segundo lugar, convém apontar que, ainda que possa haver diferenciagdes nas estratégias dos trés primei ros agentes, bem como conflitos entre eles, ha entretanto denominadores comuns que os unem: um deles é a apropria- 40 de uma renda da terra. Por outro lado, a agdo desses agentes serve ao propésito dominante da sociedade capita- lista, que € 0 da reprodugao das relagdes de producao, im- plicando a continuidade do processo de acumulagao e a ten: tativa de minimizar os conflitos de classe, este aspecto ca bendo partigularmente ao Estado. Para isto 0 espaco urba no constitui-se, como aponta Lefébvre (1976), em instru- mento onde sao viabilizados concretamente os propésitos acima indicados, em grande parte através da posse e do con- trole do uso da terra urbana. Em terceiro lugar, necessario ressaltar que a tipolo- gia apresentada ¢ muito mais de natureza analitica do que efetivamente absoluta. No estagio atual do capitalismo, os grandes capitais industrial, financeiro e imobilidrio podem estar intégrados indireta e diretamente, neste caso em gran- des corporacdes que, além de outras atividades, compram, especulam, financiam, administra e produzem espaco ur- bano. Como conseqiténcia desta integragao muitos dos con- flitos entre aqueles agentes supramencionados desaparecem Em quarto lugar, ¢ importante notar que as estraté gias que esses agentes adotam variam no tempo e no espa- 0, ¢ esta variabilidade decorre tanto de causas externas aos agentes, como de causas internas, vinculadas as con- tradigdes inerentes ao tipo de capital de cada agente face a0 movimento geral de acumulacdo capitalista e dos con- flitos de classe. Assim, como exemplo, 0 aumento da com- posicdo organica de capital de uma empresa, aferando a taxa de lucro, pode gerar novas estratégias que incluam mudangas locacionais, afetando, portanto, 0 uso da terra urbana. Os proprietarios dos meios de producao «Os grandes proprietarios industriais e das grandes em- presas comerciais so, em razig da dimensio de suas ativi- dades, grandes consumidores de espago) Necessitam de ter- renos amplos ¢ baratos que satisfagam requisitos locacio- nais pertinentes as atividades de suas empresas — junto ao porto, as vias férreas ou em locais de ampla acessibilida- de a populacdo etcy A terra urbana tem assim, em princi- pio, um duplo papel: 0 de suporte fisico e o de expressar diferencialmente requisitos locacionais especificos as ativi- dades. «Mas as relagdes entre proprietarios dos meios de pro- dugdo ea terra urbana so mais complexas, A especulacao fundidria, geradora do aumento do prego da terra, tem du- plo efeito sobre as suas atividades. De um lado onera os custos de expansdo na medida em que esta pressupée terre nos amplos ¢ baratos. De outro, 0 aumento do prego dos iméveis, resultante do aumento do prego da terra, atinge 0s salarios da forga de trabalho: gera-se assim uma pres- sao dos trabathadores visando salarios mais elevados, os quais incidirao sobre a taxa de lucro das grandes empresas, reduzindo-a.* A especulacdo fundiaria nao é assim de interesse dos proprietarios dos meios de produgao. Interessa, no entan- to, aos proprietdrios fundidrios: a retengdo de terras cria vuma eseassez de oferta e 0 aumento de seu prego, possibili- tando-Ihes ampliar a renda da terra, Esta pratica gera con- flito entre proprietdrios industriais e fundidrios! Os conflitos que emergem tendem a ser, em principio, resolvidos em favor dos proprietarios dos meios de produ ¢40,.que, no capitalismo, comandam a vida econdmica ¢ politica, A solucao desses conflitos se faz através de pres- sdes junto ao Estado para realizar desapropriagies de ter- ras, instalagdo de infra-estrutura necessdria as suas ativida- des e para a criacdo de facilidades com a construgao de ca- sas baratas para a forga de trabalho. Mas torna-se necessario saber quem sao os proprieta rios industriais em cada caso. Sao eles descendentes de imi- grantes, originariamente vinculados ao comércio de exporta- ¢4o-importacdo, ou suas raizes esto na propriedade fundia- ria? E é necessario ainda que se conheca 0 peso positivo dos grupos em conflito ¢ as aliangas que so feitas. E importante também considerar, como lembra Min- gione 2, que os conflitos entre proprietarios industriais & ' CapeL, Horacio. Agentes y estrategias en la produccién det espacio urba: no espaitol. Geografia, 8, 1972. 2 Mincione, Enzo. Theoretical elements for a marxist analysis of urban development. In: HARLOE, M. org. Captive Cities, London, John Wiley, 1977 ~ (6) a propria burgue: 4> (e) a propriedade fundi fundidrios nao mais constituem algo absoluta como no pas- sado. Isto se deve a: ~) (a) 0 desenvolvimento das contradigdes entre capital ¢ traba Iho torna perigosa a aboligdo de qualquer forma de proprie- dade, entre elas a da terra, pois isto poderia levar a que se demandasse a aboligao da propriedade capitalista; 1. (b) através da ideologia da casa prépria, que inclui a terra, podem-se minimizar as contradigées entre capital e trabalho; adquiriu terras, de modo que a pro priedade fundidria passou a ter significative papel no pro cesso da acumulacao; ~/:(d) a propriedade da terra é pré-requisito fundamental para a construgdo civil que, por stia vez, desempenha papel extre- mamente importante no capitalismo, amortecendo areas da atividade industrial; ¢ ria e seu controle pela classe domi: nante tem ainda a funcao de permitir © controle do espa 0 através da segregacdo residencial, cumprindo, portanto, um significativo papel na organizagiio do espaco. Nas grandes cidades onde a atividade fabril expressi- va, a ago espacial dos proprietarios industriais leva & cria cdo de amplas areas fabris em setores distintos das areas re- sidenciais nobres onde mora a elite, porém prSximas a> areas proletarias? Deste modo a agao deles/modela a cida- de, produzindo seu prdprio espago ¢ interferindo decisiva- mente na localizagao de outros usos da terra, E, quando uma industria, localizada em razdo de fato- res do passado, se vé envolvida fisicamente por usos tesi- denciais de gtatus) verifica-se que a relocalizacdo industriah constitui étimo negécio. Desloca-se para reas mais am- plas e baratas, com infra-estrutura produzida, em muitos casos, pelo Estado. Ganha assim uma nova localizacao on- de pode se expandir. Adicionalmente extrai elevada renda fundidria ao realizar 0 loteamento do antigo terreno fabril, altamente valorizado pelo novo uso. A zona Sul da cida- sos, por uma etapa de esterilizagao da terra, Ha entdo um de do Rio de Janeiro oferece alguns exemplos notaveis des- proceso de valorizagdo fundiaria, ta pratica ‘A passagem da terra agricola para terra urbana, no en- tanto, é mais complexa, envolvendo diferenciais de deman- da de terras e habitacdes, de diregdo em que esta transfor- Os proprietarios fundidrios magao se verifica e das formas que ela assume. Estes dife- renciais atuam mais ou menos de modo combinado. Os proprietdrios de terrasfatuam no sentido de obterem j. A demanda de terras e habitagdes depende do apareci- a maior renda fundidria de suas propriedades, interessan- mento de novas camadas sociais, oriundas em parte de flu dose’eim qué estas tenfam o uso que seja o mais remunera xos migratérios e que detém nivel de renda que as torna ca dor_possivel,_especialmente uso comercial ou_residencial pacitadas a participar do mercado de terras ¢ habitacdes. de status Esto particularmente interessados na conversio Depende também das possibilidades de remuneracao do ca- da terra fural em terrairbana, ou seja, tém interesse na ex- pital investido em terras e operagdes imobilidrias. E depen- panséo do espaco da cidade na medida em que a terra urba- de ainda da politica que o Estado adota para permitir a re- na é mais valorizada que a rural. Isto significa que esti produgao do capital, como o reforgo do aparelho do Esta- fundamentalmente interessados no valor de troca da terra | do pelo aumento do ntimero de funcionarios e através da endo no seu valor de uso.’ ideologia da casa propria, conforme mostra, entre outros, Os proprietdriag fundiérios podem entao exercer res.) Durand-Lasserve. sdes junto ao Estado) especialmente na instancia municipal, Ha, portanto, condigdes que interferem na demanda visando interferir no processo de definigao das leis de uso de terras e habitagdes, as quais vao traduzir-se em taxas dis- do solo e do zoneamento urbano. Esta pressdo nao é feita tintas_ de 9 € espacial das “cidades uniformemente nem beneficia a todos os proprietarios fun- de um dado pais ou regito Sa hepetim didrios. Alguns, os mais poderosos, poderao até mesmo ter ' Os diferenciais de diregao em qué’ as ttansformagdes suas terras valorizadas através do invyestimento puiblico em se verificam dependem, Por sua vez, da strutura agra infra-estrutura, especialmente a as cidades brasilei- ras fornecem varios exemplos desta pratica. A propriedade fundiaria da periferia urbana, sobretu- do aquela da grande cidade, constitui-se no alvo de atencaos dos proprietarios de terras.)Isto se deve ao fato de estar ela éstruturas agrarias diferenciadas em setores di diretamente submetida ao processo de transformagao do es- tintos da periferia podem influenciar diferencialmente a paco rural em urbano. As possibilidades dessa transforma- passagem do rural ao urbano. Neste sentido, é convenien- so so, entretanto, dependentes de um confronto entre as te apontar que uma estrutura agraria baseada na propried: rendas a serem obtidas com a produpo agricola e com a de especulativa tende a viabilizar mais rapidamente a trans- venda de terras para fins urbanos. Mais cedo ou mais tar- formacao em questdo. A existéncia de dreas alagadicas em de, gracas ao diferencial da renda, 0 uso agricola da perife: um dado setor da periferia, por outro lado, constitui-se, ria é substituido por um urband,)passando, em muitos ca- via de regra, em um entrave para a valorizagdo fundiaria Os eixos de comunicagdes, outrossim, tém ocorréncia espa- cial de modo seletivo, afetando desigualmente a periferia ru- ral-urbana. Finalmente, hé usos tipicos de periferia, como certas indtistrias que séo ai localizadas, subtraindo® terras, para uma valorizaeao através de uso resideneial. ~ Os diferenciais das formas que a gcupacgd urban na periferia assume so, em relagao ao uso residencial,-os se- guintes: urbanizagdo de status’ urbanizagao opulay. As estratégias dos proprietérios fundidrios variardo segundo suas propriedades se localizem nas areas onde domina uma ou outra forma. ’ Qs-proprietarios de terras bem localizadas, valorizadas por amenidades fisicas, como o mar, lagoa, sol, sal, verde etc; gem pressionando o Estado visando & instalacdo da in- fra-estrutura urbana ou obtendo ¢réditos bancérios para eles préprios instalarem a infra-estrutura. Tais investimentos valorizam a terra que anteriormente fora esterilizada por um razoavelmente longo periodo de tempo. Campanhas:pu- blicitarias exaltando-as qualidades da area so realizadas, a0 mesmo tempo que o prego da terra sobe constantemente, Estas terras da periferia de amenidades so destinadas & populagio de status. Como se trata de uma demanda sol- vavel, € possivel aos proprietérios fundidrios tornarem-se também promotores imobilidrios; loteiam, vendem e cons- troem casas de luxo. Criam-se assim bairros seletivos em se- tores de amenidades: como a palavra “periferia” tem senti- do pejorativo, estes bairros fisicamente periféricos nao’ sio mais percebidos como estando localizados na periferia urba- na, pois afinal de contas os bairros de status ndo sao social- mente periféricos! No Brasil os exemplos de ex-periferias urbanas enobre- cidas so numerosas. Nas cidades litoraneas localizam-se jun- to ao mar, como no Rio de Janeiro, em Salvador, Recife ¢ Fortaleza. Bairros, como Copacabana, Ipanema, Barra da Tijuca, Barra, Itapoa, Boa Viagem e Aldeota jé foram, num passado mais ou menos distante, periferias urbanas: agora sio bairros de status, frutos de valorizagées fundidrias. os proprietarios dos terrenos mal localizados, em peri- ferias sem amenidades, resta apenas outra estratégia. Em uma cidade onde existe uma segregacdo sécio-espacial, com um setor periférieo, ndo apenas distante do centro mas sem amenidades, nao atraindo, portanto, grupos sociais de eleva- do status, nao resta aos proprietarios fundidrios sendo o lo- teamento de suas terras como meio de extrair a renda da ter- ra. E se trata de loteamentos populares, com 0 minimo de in- fra-estrutura. Tendo em vista 0 baixo poder aquisitivo da po- pulagdo que para ai se desloca, nao ha interesse desses pro- prietrios em sé transformarem em promotores imobilirios. Apenas realizarao 0 loteamento: as habitagdes serao constru das pelo sistema de autoconstrugao ou pelo Estado, que ai implanta enormes e monétonos conjuntos habitacionais. Criam-se loteamentos populares na periferia urbana: en- chentes, mosquitos, valas negras, crimes, esquadrao da mor- te, horas e horas perdidas em precarios transportes coletivos, eis alguns dos aspectos,do quotidiano desta periferia urbana, fruto de uma aco espacialmente diferenciada dos proprieté- rios fundidrios. Tais loteamentos sao ilegais face a legislacao urbana em vigor. Em pouco tempo so legalizados, e por pres- sao popular conseguem alguns’ poucos servigos de infra-estru- tura por conta do Estado. Isto gera nova valorizacao fundi ria, atingindo inclusive os terrenos reservados pelos antigos proprietdrios fundidrios, muitos deles intencionalmente situa- dos entre os loteamentos ¢ 0 espago urbano continuo. Os promotores imobilidrios ~Por promotores imobilidrios, entende-se um conjunto de agentes que realizam, parcial ou totalmente, as seguintes ‘operagdes?r ‘/@) incorporagaos que é a operagao-chave da promos imo- bilidria; 0 incorporador realiza a gestao do capital-dinhei- 3 Ver AumetpA, Roberto Schmidt de. In: VALLADARES, Licia, 1982. ro na fase de sua transformacdo em mercadoria, em imé- vel; a localizagao, 0 tamanho das unidades e a qualidade do prédio a ser construido sao definidos na incorporacao, assim como as decis6es de quem vai construi-lo, a propa- ganda e a venda das unidades; Xx) financiamento, ou seja, a partir da formagao de recur- sos monetarios provenientes de pessoas fisicas e juridicas, verifica-se, de acordo com o incorporador, o investimento visando a compra do terreno e & construcdo do imével; Xo) estudo técnico, realizado por economistas ¢ arquitetos, visando verificar a viabilidade técnica da obra dentro de pa- rametros definidos anteriormente pelo incorporador e a luz do cédigo de obras; (d) construcao ou produgdo fisica do imével, que se veriti- * ca pela atuacdo de firmas especializadas nas mais diversas etapas do proceso produtivo; a forga de trabalho esta vin culada as firmas construtoras; e - (e) comercializagao ou transformagao do capital-mercado- ria em capital-dinheiro, agora acrescido de lucros; os corre- tores, os planejadores de vendas e os profissionais de propa- ganda sao os responsaveis por esta operacao. a2 Estas operagdes vao originar diferentes tipos de agen- tes concretos, incluindo 0 proprietario-construtor do terre- < no, um agente classico e que ainda persiste produzindo pou- | COs € pequenos iméveis, as firmas exclusivamente incorpora- {Pdoras, aquelas que se especializam na construgdo ou em Juma etapa do processo produtivo, como a coneretagem de wo cimento, outras que incorporam ¢ constroem, outras mais especializadas na corretagem e aquelas que concentram em suas maos todas as operagdes: algumas destas tltimas con trolam também outras atividades fora do setor fundiario imobilidrio. Por outro lado, do ponto de vista da génese do promo- tor imobilidrio. verificam-se enormes diferengas entre eles. Ha desde 0 proprietario fundidrio que se transformou em ! construtoy e incorporador, ao comerciante prdspero que di- versifica suas atividades criando uma incorporadora, pas- sando pela empresa industrial, que em momentos de crise ou ampliagao de seus negécios ria uma cubsidiria ligada a promogao imobilidri ia Geandes banger o Estado ytuam também com promotores imobiliariés.-> Entre os agentes em questo, particularmente os incor- poradores, ha um diferencial em fungao de dois aspectos, conceitualizados por R. S. de Almeida como “‘escala de operagdes””, ou o ntimero de construgdes simultaneas que 0 incorporador é capaz de gerir, e ‘‘escala espacial de‘atua- do", ou a area onde se localizam as obras ¢ os estoques de terrenos. Estas duas escalas estdo relacionadas: maior a escala de operagdes, maior a escala espacial de atuacdo ¢, adicionalmente, maior o poder politico do incorporador. Quais so as estratégias dos promotores imobilidrios? Na sociedade capitalista nao ha interesse das diferen- tes fracdes do capital envolvidas na producdo de iméveis em produzir habitagdes populares. Isto se deve, basicamen- te, aos baixos niveis dos saldrios das camadas populares, fa- ce ao custo da habitacdo produzida capitalisticamente. De- ve-se também, em parte, conforme argumenta Henri Coing4, a convergéncia de interesses do proprietario fundidrio, do promotor imobilidrio e da industria de material de constru- co no sentido de apenas produzir habitagdes com inova- ¢6es, com valor de uso superior as antigas, obtendo-se, por- tanto, um preco de venda cada vez maior, 0 que amplia a exclusdo das camadas populares. D er Ei ue condisdes, pergunta H. Coing, é possivel ha- a/ ver a produgao de habitagdes para os grupos de baixa ren- \_da? Quando esta producdo é rentavel? (a) é rentavel se so superocupadas por varias familias ou por varias pessoas solteiras que alugam. um imével ou um cémodo; In: DURAND-LassERve, Alain, 1980, — >> (a) dirigir-se, em primeiro lugar, producdo de aac => (b) € rentavel se a qualidade da construgdo for péssima, com 0 seu custo reduzido ao minimo, conforme Engels des- creve para a Inglaterra em relatao ao século XIX; e sos) € rentavel quando verifica-se enorme escassez de habita- goes, elevando os precos a niveis insuportaveis. Mas esta ndo ¢ a situacdo usual nas cidades do Tercei: ro Mundo: o €apital nao tem intetesse,em produzir habit S0es para as camadas populares) Numa sociedade onde par- te ponderavel da populagdio nao tem acesso a casa propria ou mesmo nao tem condigdes de pagar aluguel, a estratégia dos promotores imobilidrios ¢ basicamente a seguinte: para satisfazer a demanda solvavel; eis Wwxsost ~>==>(b) obter ajuda do Estado no sentido de tornar solvavel produgao de residéncias para satisfazer a demanda nao-sol- vavel. Em relagdo a primeira categoria, verifica-se a produ: Gao de iméveis de luxo visando atender aqueles que dispdem de recursos, af incluindo-se a produgo de residéncias secun- darias, em dreas de lazer, para este segmento da populacdo. ‘A produgao de iméveis caros ¢ finos pode chegar mesmo a saturar, havendo, por outro lado, déficit de residéncias populares. Para o segmento da populagdo que constitui o mercado dos promotores imobilidrios, os financiamentos no so dificeis, o mesmo ocorrendo para as incorporado- ras de iméveis, A existéncia de uma demanda solvavel saturada e de uma nao-solvavel insatisfeita explica o interesse do capital imobilidrio em obter ajuda do Estado, de modo a permitir tornar vidvel a construcdo de residéncias para as camadas populares: créditos para os promotores imobilidrios, facili- dades para desapropriagao de terras, e créditos para os futu- ros moradores. A criagdo de érgdos, como foi o caso do Banco Nacional da Habitagdo (BNH) ¢ das Cooperativas de Habitacao (COHABS), e a criagdo de mecanismos juridi- cos ¢ financeiros, como o Fundo de Garantia por Tempo de Servico (FGTS), visam viabilizar a acumulacdo capitalis- ta via producdo de habitagdes, cujo acesso éagora ampliado. Esta estratégia € vidvel em razio da importancia da produgéo de habitagdes na sociedade capitalista. Cumpre ela um papel fundamental, que ¢ 0 de amortecer as crises ciclicas da economia através do investimento de capital da criagio de numerosos empregos: dai ter 0 apoio do Esta- do capitalista, que por sua vez esta fortemente repleto, atra- vés de seus componentes, de interesses imobilidrios. A estratégia dominante, de produzir habitagdes para a populagdo que constitui a demanda solvavel, tem um sig- nificativo rebatimento espacial. De fato, a acao dos promo- tores imobilirios se faz correlacionada a: (a) prego elevado da terra ¢ alto status do bairro; (b) acessibilidade, eficigncia e seguranga dos meios de trans- porte; (©) aménidades naturais ou socialmente produzidas; ¢ (@) esgotamento dos terrenos para construcdo ¢ as condi- Ses fisicas dos iméveis anteriormente produzidos, confor- me indica R. S. de Almeida, Estas caracteristicas em conjun- to tendem a valorizar diferencialmente certas areas da cida- de, que se tornam alvo da acdo maciga dos promotores imo- bilidrios: so as reas nobres, criadas e recriadas segundo 0s interesses dos promotores, que se valem de maciga pro- paganda. Assim, de um lado, verifica-se a manutensao de bairros de status, que continuam a ser atrativos ao capital imobilidrio e, de outro, a criagdo de novas areas nobres em razio do esgotamento de areas disponiveis em outros se- tores valorizados do espago urbano: os novos bairros no- bres so efetivamente criados ou resultam da transforma- 40 da imagem de bairros anitigos que, dispondo de alguns atrativos, tornam-se de status elevado. A atuacdo espacial dos promotores imobilidrios se, faz de modo desigual, criando e reforcando a segregagao resi- dencial que caracteriza a cidade capitalista, E, na medida em que em outros setores do espago produzem conjuntos habitacionais populares, a segregacdo é ratificada. O Estado ~ 0 Estado atua também na organizagao espacial da ci- dade. Sua atuagdo tem sido complexa e variével-tanto no tempo como no espago, refletindo a dinamica da socieda- de da qual é parte constituinte.+Vamos considerar apenas © papel do Estado capitalista, privilegiando a cidade lati- no-americana e, particularmente, a brasileira. ~ Uma primeira observago refere-se ao fato de o'Esta- do atuar diretamente como grande industrial, consumidor de espago e de localizagdes especificas, proprietério fundia- rio ¢ promotor imobilidrio, sem deixar de ser também um agente de regulaga0 do uso do solo e 0 alvo dos chamados movimentos sociais urbanos.‘Assim, ao implantar uma refi- naria de petrdleo, o Estado esta organizando diretamente © espago urbano, ao mesmo tempo que interfere, dada a na- tureza da atividade industrial, no uso da terra das dreas pro- ximas, As terras piiblicas s4o uma reserva fundidria que 0 Estado dispde para usos diversos no futuro, inclusive para negociagdes com outros agemtes sociais. Através de drgdos como a COHAB, por outro lado, o Estado torna-se promo- tor imobilidrio. ~ No entanto, é através da implantagao de servigos: ptt- blicos, como sistema vidrio, calgamento, agua, esgoto, ilu- minago, parques, coleta de lixo etc., interessantes tanto &s empresas como a populacdo em geral, que a atuacdo do Estado se faz de modo mais corrente e esperado! A ela- boracdo de leis e normas vinculadas ao uso do solo, entre outras as normas do zoneamento e 0 cédigo de obras, cons- 1em outro atributo do Estado no que se refere ao espa- so urbano. E é decorrente de seu desempenho espacialmen- te desigual enquanto provedor de servigos piiblicos, especial- mente aqueles que servem A populagdo, que o Estado se torna o alvo de certas reivindicacdes de segmentos da popu- lagdo urbana, -Em realidade, segundo A. Samson’, 0 Estado dispde de um conjunto de instrumentos que pode empregar em re- lagéio ao espago urbano. Sao os seguintes, entre outros: (a) direito de desapropriagdo e precedéncia na compra de terras; 44(b) regulamentagdo do uso do solo; (©) controle’e limitacao dos precos de terras; (@) limitagao da superficie da terra de que cada um pode se apropriar; (©) impostos fundidrios e imobiliérios que podem variar se- gundo a dimens&o do imével, uso da terra e localizacdo; (f) taxagdo de terrenos livres, levando a uma utilizagao mais completa do espaco urbano; (g) mobilizagao de reservas fundidrias publicas, afetando © prego da terra ¢ orientando espacialmente a ocupacdo do espaco; (h) investimento publico na produgdo do espago, através de obras de drenagem, desmontes, aterros e implantaco da infra-estrutura; () organizagao de mecanismos de crédito a habitacdo; ¢ () pesquisas, operagdes-teste sobre materiais e procedimen- tos de construgao, bem como o controle de produgao e do mercado deste material. * Esta complexa ¢ variada gama de possibilidades de acdio do Estado capitalista nao se efetiva ao acaso. Nem se processa de modo socialmente neutro, como se o Esta- do fosse uma instituicdo que governasse de acordo com uma racionalidade fundamentada nos princ{pios de equili- brio social, econdmico ¢ espacial, pairando acima das clas- 5 In: DURAND-Lasserve, Alain, 1980. ses sociais ¢ de seus conflitos. Sua aco é marcada pelos conflitos de interesses dos diferentes membros da sociedadé de classes, bem como das aliangas entre eles. Tende a privi- legiar os interesses daquele segmento ou segmentos da clas- se dominante que, a cada momento, estdo no poder. ~ E preciso considerar que a aco do Estado processa- se em trés niveis politico-administrativos e espaciais: fede- ral, estadual e municipal. A cada um destes niveis sua atua- 40 muda, assim como 0 discurso que encobre os interesses dominantes. E no nivel municipal, no entanto, que estes in- teresses se tornam mais evidentes 0 discurso menos efi- cazs Afinal a legislacdo garante 4 municipalidade muitos po- deres sobre 0 espaco urbano, poderes que advém, ao que Parece, de uma longa tradigdo reforeada pelo fato de que, numa economia cada vez mais monopolista, os setores fun. diario ¢ imobilidrio, menos concentrados, constituem-se em fértit campo de atuacdo para as elites locais. af A atuacdo do Estado se faz, fundamentalmente ¢ em ultima andlise, visando criar condigdes de realizagao e re- produgdo da sociedade capitalista, isto é, condigées que via- bilizem o processo de acumulacao ¢ a reproducao das clas- ses sociais e suas fragdes...% __ Tendo em vista estes propésitos o Estado capitalista cria mecanismos que levam A segregagdo residencial e & sua ratificagdo! Assim, os diferenciais de imposto territorial ¢ predial so um forte fator discriminante, afetando o pre- 0 da terra e dos iméveis e, como conseqiiéncia, incidin- do na segregac&o social: os grupos de renda mais elevada - residem em iméveis mais caros localizados em bairros on- de o prego da terra é mais elevado. Através da alocaco es- pacialmente diferenciada dos equipamentos de consumo co- Ietivo, o Estado também interfere na segregacao residen- cial. Harvey comenta que este tipo de atuagdo tende a am- pliar a renda real daqueles que jd possuem elevada renda monetaria. D. Vetter® e outros fornecem a este respeito um exce- lente exemplo de investimentos publicos espacialmente desi- guais ¢ suas conseqiiéncias. Trata-se da alocacdo concentra- da de recursos em Agua e esgoto na Zona Sul carioca duran- te a década de 1970. Esta é a area melhor servida do espa- go da cidade do Rio de Janeiro: ali reside um econdmica e politicamente poderoso grupo social que teve seus iméveis mais valorizados — acessiveis, portanto, a grupos sociais cada vez mais selecionados. A segregacio residencial pode resultar também de uma acdo direta ¢ explicita do Estado através do planejamento, quando da criagao, a partir do zero, de micleos urbanos. Esta tem sido uma tradi¢&o latino-americana, mas ndo ex- clusiva, que tem suas origens jd no século XVI. A este res- peito, as palavras de Hansen’ sobre a origem e evolucado da cidade de Mérida na peninsula do Yucatan, no México, so dignas de nota: A cidade foi planejada em torno de uma praga central Os quatro quarteires que a delimitavam foram reservados para a catedral, os edificios dos governos provincial ¢ muni- Cipal e a residéncia do chefe dos conquistadores. Aos outros espanhdls foram cedidos lotes dentro de dois ou trés quar- teirdes, em cada diregdo. Esta area espanhola de residéncia constituiu 0 centro. A uma distancia maior, na diregao do ex: terior, e deixando espago para a expansdo deste centro, fo- ram reservada’ areas nas quais os indios podiam estabele- cer-se. Estas areas constituiram os barrios. A medida que a cidade crescia, 0 centro fol absorvendo os barrios € 08 In- dios foram se mudando para mais além. A medida que estes aumentavam em numero, a tea que ocupavam ia se tornan- do maior. Mas o crescimento prossegulu vagarosamente em harmonia com a estrututa social e cultural estabelecida E Brasilia, uma cidade planejada, inaugurada em 1960? A oposigdo entre o Plano Piloto e as denominadas cidades- © In: Macao pa Siva, Luis AntOnio, 1981 ‘7 HANSEN, A. T, Beologia de uma cidade latino-americana, In: PIERSON, D,., org. Estudos de ecologia humana, Sao Paulo, Martins Fontes, 1970. p. 497. { | satélites ¢ notavel; conforme indicam’os varios artigos con- tidos nas coletaneas organizadas por Paviani. Ela é 0 exem- plo acabado do planejamento do Estado capitalista crian- do condigdes distintas de vida e reprodugao das diferentes classes sociais. Neste sentido o planejamento reproduziu, sob outra forma, o velho modelo colonial descrito por Han- sen € 0 padrdo tipico da cidade brasileita, com os pobres na periferia. Através de politica conjugada de renovagao urbana — abertura de modernas vias de tréfego — 0 Estado capita- lista viabiliza simultaneamente varios interesses. De um la- do, via expulsdo dos pobres residentes em cortigos junto a0 centro da cidade, redireciona a segregacao residencial e viabi- liza © capital imobilidrio que tem oportunidade de realizar bons negécios em Areas onde o prego da terra 6, pela proxi- midade do centro, bastante elevado: é a renovacdo urbana, Mas viabiliza também a ampliagdo do capital de empreitei- ras ¢ cria condigdes de uma circulago mais eficiente, viabi- lizando assim a produgdo de novos meios de transporte, en- tre eles aqueles de uso individual. Os exemplos sé numero- sos: 0 mais famoso é aquele de abertura dos boulevards de Paris pelo baréo Haussman no final do século passado. Mas os exemplos brasileiros sdo notaveis: a abertura da ave- nida Rio Branco, a principal do centro do Rio de Janeiro, € a demolicao de corticos nesta area no comeso do século, € um deles, conforme mostra Rocha em seu estudo sobre a “era das demoligdes””. Outros exemplos semelhantes apa- Tecem com a abertura da avenida Presidente Vargas na déca- da de 1940 ¢ com a via expressa ligando o tinel Catumbi— Laranjeiras, portanto a zona Sul da cidade, a principal via de entrada e saida do Rio de Janeiro, O Estado também produz chao, espago tecnicamente passivel de ocupacdo, via obras de drenagem, desmontes aterros. A cidade do Rio de Janeiro é, neste sentido, um exemplo dos mais notaveis, Esta criagdo de espaco insere- se hovamente nos propésitos gerais anteriormente mencio- nados, visando, portanto, tornar viaveis a atividade econd- mica e a diferenciagdo social. Os aterros realizados para a instalagao do porto do Rio de Janeiro, para a criagdo do Jockey Club, de loteamento de status junto a lagoa Rodri- go de Freitas do denominado Aterro, um parkway a beira da baia de Guanabara, so trés dos muitos exemplos de pro- dugao de chao pelo Estado capitalista, atendendo a varios propésitos imediatos. Estes so alguns dos tipos de atuagao do Estado no es- paco urbano, Estamos longe de esgotar assunto; apenas procurou-se trazer & tona alguns resultados de estudos ja realizados. © leitor certamente conhece outros exemplos, a0 menos superficialmente. Sugere-se que este conhecimen- to seja aprofundado, contribuindo para o entendimento do papel do Estado enguanto agente modelador do espaco urbano capitalista. Os grupos sociais excluidos +Na sociedade de classes verificam-se diferencas sociais no que se refere ao acesso aos bens ¢ servicos produzidos socialmente. No capitalismo as diferencas sao muito gran- des, e maiores ainda em paises como, entre outros, os da América Latina, A habitagdo é um desses bens cujo aces- so é seletivot parcela enorme da populacao nao tem acesso quer dizer, ndo possui renda para pagar o aluguel de uma habitagao decente e, muito menos, comprar um imével. Es- te é um dos mais significativos sintomas de exclusdo que, no entanto, ndo ocorte isoladamente: correlatos a ela estéo a subnutricéo, as doencas, 0 baixo nivel de escolaridade, 0 desemprego ou o subemprego ¢ mesmo o emprego mal-re- munerado. 1 Os grupos sociais excluidos t&m como possibilidades de moradia os densamente ocupados cortigos localizados préximos ao centro da cidade -- velhas residéncias que no passada foram habitadas pela elite e que se acham degrada- das e subdivididas —, a casa produzida pelo sistema de au- toconstrucao em loteamentos periféricos, os conjuntos.ha- bitacionais produzidos pelo Estado, via de regra também distantes do centro, e a favela.” ~As trés primeiras possibilidades pressupdem uma vincu- Jaco @ um agente social, como o proprietario de iméveis — em muitos casos sem maior expresso como agente mo- delador —, 0 proprietdrio fundiario da periferia e o Esta- do. Nenhuma delas transforma, em principio, a populagao excluida em agente modelador do espago urban. Nem mes- mo aqueles que produzem iméveis no sistema de autocons- trugao — pelo menos no sentido pleno.* Isto porque estdo submetidos a Idgica dos proprietarios fundiarios da perife- ria, tornando-se, a custa de muito sobretrabalho, proprieta- rios de um terreno ¢ um imovel, de mercadorias com valor de uso e de troca. E na producdo da favela, em terrenos publicos ou pri- vados invadidos, que os grupos sociais excluidos tornam- se, efetivamente, agentes modeladores, produzindo seu pré- prio espago, na maioria dos casos independentemente ¢ a despeito dos outros agentes, A producdo deste espaco ¢, an- tes de mais nada, uma forma de resisténcia e, ao mesmo tempo, uma estratégia de sobrevivéncia. Resisténcia e sobre- vivéncia as adversidades impostas aos grupos sociais recém- expulsos do campo ou provenientes de areas urbanas sub- metidas as operagdes de renovacdo, que lutam pelo direito a cidade Resisténcia ¢ sobrevivéncia que se traduzem na apro- priacdo desterrenos usualmente inadequados para os outros agentes da producao do espaco, encastas ingremes ¢ areas alagadigas, Trata-se de uma apropriagao de fato. No pla- no imediato a favela corresponde a uma solucdo de um du- plo problema, o da habitagao e de acesso ac local de traba- Iho. A cidade do Rio de Janeiro, que possui numerosas Areas ingremes ¢ alagadigas, constitui um excelente exem- plo. A localizagdo de suas numerosas favelas pode parecer, quando distribuidas em um mapa, como que apresentan- do um padrao aleat6rio: cada uma, entretanto, tem uma 16- gica que inclui a relativa proximidade de um mercado de trabalho. ‘A evolugao da favela, isto é, a sua progressiva urbani- zagho até tornar-se um bairro popular, resulta, de um la- do, da ago dos proprios moradares que, pouco a pouco, durante um longo periodo de tempo, vao melhorando suas residéncias ¢ implantando atividades econémicas diversas. De outro, advém da agao do Estado, que implanta algu- ma infra-estrutura urbana, seja a partir de pressdes exerci- das pelos moradores organizados em associagdes, seja a partir de interesses eleitoreiros. Esta urbanizacdo, contudo, desencadeia uma valorizagéo que acaba por expulsar al- guns de seus moradores e atrair outros. A literatura sobre favelas é muito numerosa. Sugeri- mos que, inicialmente, veja-se a resenha bibliografica sobre habitacdo em geral, inclusive as favelas, no trabalho de Val- ladares (1982). : © bairra de Um exemplo concret Copacabana ‘Até entéo focalizamos cada um dos agentes modelado- res do espaco urbano. A atuagio deles, ino entanto, nao se faz isoladamente. Atuam em conjunto, isto ¢, no processo de produc&o concreta de um bairro residencial ou de um distrito industrial, varios agentes esto presentes. Vamos agora, através de um exemplo real, ver esta atuagao conjun- ta. Consideraremos 0 bairro de Copacabana, localizado na Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro, a zona nobre da me- trépole carioca. A andlise estende-se pelo periodo de 1870 a 1930, constituindo-se em um resumo dé uma parte do es- tudo de Elizabeth Dezouzart Cardoso’, O bairro de Copacabana esta localizado ‘numa estrei ta faixa de planicie entre 0 mar ¢ © macigo costeiro que o separa dos bairros vizinhos””. Planicie arenosa ¢ de dificil acesso, ndo teve passado agricola, constituindo-se até fins do século XIX em um arrabalde escassamente povoado por pescadores: 0 “proceso de transferéncia de residéncia das elites do centro da cidade para os arrabaldes, que ocorreu no Rio de Janeiro a partir de meados do século XIX, néo atingiu Copacabana”. Desde a década de 1870, no entanto, verificaram-se ten- tativas de valorizagao fundiaria de Copacabana, envolven- do 0 loteamento das tetras do futuro bairro e a criagdo de linha de bonde a tracdo animal ligando 0 entdo arrabalde ao centro da cidade. Um grande proprietario fundiario esta. va a frente dessas tentativas malsucedidas. Em 1892, a empresa de bondes Botanical Garden, que atuava em toda a Zona Sul carioca, liga Copacabana a sua rede de trilhos depois de, ela propria, ter aberto um tinel ligando o futuro bairro ao de Botafogo: trata-se do Tuinel Velho, aberto nesse ano, Anteriormente, em 1891, ¢ em fun- cdo das obras de implantagao dos trilhos de bondes e da abertura do tiinel, é criada a Empresa de Construgdes Civis que ird realizar a maior parte da valorizacdo do arrabalde E interessante analisar o que era efetivamente a Empre- sa de Construgées Civis. Resultava ela de uma alianga de in- teresses comuns centrades nas valorizagdes fundiaria e imo- bilidria. Eram seus acionistas varios proprietarios de terras em Copacabana, varios bancos — Banco Luso-Brasileiro, Banco Brasil e Norte América, Banco Construtor do Brasil e Banco de Crédito Rural e Internacional —, pelo merios 8 0 capital imobilirio e a expanséo da nialha urbana do Rio de Janeiro; Copacabana ¢ Grajail. Rio de Janeiro, Departamento de Geografia da UFRJ, 1986. Tese de mestrado, datilografada. uma empresa da setor industrial, a Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros, empresas comerciais, entre elas uma de exportagao de café, outras empresas imobiliarias, como a Empresa de Obras Piiblicas no Brasil, que foi a maior acionista, e a prépria Botanical Garden. Participaram ainda da Empresa de Construgdes Civis um ex-ministro da Agricultura, Comércio e Obras Publicas, dois prefeitos da cidade, sendo um o renomado Carlos Sam- paio, também proprietario fundidrio em Copacabana. Va rigs outros acionistas ocupavam importantes cargos publi cos. A antiga nobreza estava também presente na Empre- sa de Construgdes Civis: pelo menos seis bardes ¢ um vis- conde eram sdcios dela. Tratava-se, portanto, de uma alianga entre proprieta- ios fundiarios, promotores imobilidrios, bancos e empre- | sas industriais e comerciais. O Estado fazia-se presente pe- \Uos interesses comuns no poder. Vejamos agora os abjetivos explicitos da Empresa de Construgdes Civis, tais como aparecem nos seus estatutos na época de sua criagao. A Empresa de Construgdes Civis tem por fim efetuar na cidade do Rio de Janeiro e em outras do Brasil toda sor- te de operagdes com referéncia & sua designagdo, tais como: ) |. comprar terrenos para vender depois de beneficiados: I1- abrir ruas e avenidas; Lil constr em terrenos de sua propriedade préaios Jpara alugar ou vender mediante uma ou mais prestagdes; @ bem assim nos arrabaldes do Ro de Janeiro e nas cidades \\ de Petrépolis, Nova Friburgo e em outras localidades, grupos || de habitagées de verdo para alugar ou vender; IV - construir edificios destinados a sanatérios, hoteis. \_teatros e caseiros para arrendamentos a longo prazo E mais: \ acande prédios pot longo oraz pad subioca) por VI- segurar aluguéis de prédios e prédios contra os ri cos de incéndio: Vil - efetuar operagées bancérias, tendo por garantia a hipoteca de prédios ou terrenos. § Unico - todos os trabalhos de construgao que a empre. sa tiver de executar por sua conta ou de terceiros sero con fiados & Empresa de Obras Publicas no Brasil Pode-se ver, pelos estatutos da empresa, 0 porte que se desejava que ela tivesse: uma grande empresa com milti- plas operagées vinculadas aos setores fundidrio e imobilia rio. Fica clara também a percepgao do que se esperava, na época, de Copacabana: um arrabalde onde devia-se cons- truir iméveis para.veraneio, A semelhanga de Petrdpolis e Nova Friburgo, ¢ nao iméveis para residéncia fixa. Ora, nesta época jd era sensivel o problema habitacional das ca- madas populares que residiam em cortigos no centro do Rio de Janeiro. O capital fundidrio-imobiliario, associado a outros capitais, estava, éntretanto, interessado apenas em prodiizit habitagdes para a populacdo de status eleva. do, produzindo mesmé residéncias de veraneio ¢ novos es- pasos, como pretendia, na década de 1890, a Empresa de Construgdes Civis. Copacabana foi criada, tornando-se um elegante e aris- tocrdtico bairro residencial da entdo capital da Reptiblica A Empresa de Construgdes Civis nao apenas fez a partilha de extensa gleba de Copacabana e produziu iméveis. Com base em suas ligagdes econdmicas e politicas induziu a ex- tenso de linhas de bondes por todo o bairro ¢ pressionou a municipalidade e empresas privadas, como a City Impro- vements, para a implantagao de redes de agua, esgoto ¢ ilu- minacao ptiblica, um equipamento de consumo coletivo que valorizou a propriedade fundidria e imobiliaria. Além da Empresa de Construgdes Civis também atua- ram em Copacabana outros proprietarios de tersas que rea- lizaram loteamentos e produziram iméveis. Os interesses destes proprietdrios ¢ os da Empresa de Construgées Civis eram semelhantes. A atuagao do Estado se da de diferentes modos: pres- sionada e permeada de interesses da empresa em considera- ¢40, a municipalidade, além de instalacdo rapida de equipa- mento de consumo — em detrimento de outras partes da ci- dade jé ocupadas ha muito tempo, apenas por uma popula- 40 de status social inferior —, viabiliza a ocupagéo do territério a partir do incentivo de “liberdade de constru- ¢80””, onde nao havia exigéncias para a produgao de imé- veis. Ao longo de administracdes municipais sucessivas, 0 Estado investe em melhoramentos urbanos diversos que ten- dem a valorizar mais e mais as propriedades fundidria ¢ imobilidria. E. D. Cardoso conclu A tela de inter-relagdes que foi formada para a produ- G80 de um novo bairro no Rio de Janeiro — Copacabana — 6 um bom exemplo de como a partir de fins do século XIX 2 cidade tornou-se objeto de lucro. De fato, a acumulagao ur- “bana encontrou na expansao da malha urbana carioca uma boa forma de investimento, quer pela exploragao de servigos de consumo coletivo, quer pelo investimento no imobiliarlo, J Décadas de 1970 e 1980. De modo semelhante repete- (sea pratica de valorizagdo fundidria e imobiliaria da Bar- (1a da Tijuca, 0 novo eldorado residencial carioca. 4 Processos e formas espaciais "A grande cidade capitalista é 0 lugar privilegiado de ocorréncia de uma série de processos sociais, entre os quais a acumulagao de capital e a reproducao social tém impor- tncia basica.’ Estes processos criam funcdes e formas espa- ciais, ou seja, criam atividades e suas materializacdes, cu: ja distribuicdo espacial constitui a propria organizagao espa- cial urbana, ‘Entre processos sociais, de um lado, e as formas espa is, de outro, aparece um elemento mediatizador que via- biliza que os processostsociais originem.as formas espaciais. Este elemento viabilizador constitui-se em urflconjuno de forgas atuantes ao longo do tempo, postas em acdo pelos “diversos-agerives modeladores, e que permitem localizagoes ¢ relocatizagées das atividades e da populagdo na cidade.’ Sao os processos espaciais, responsaveis imediatos pela or ganizacdo espacial desigual ¢ mutavel da cidade capitalista Acrescentar-se-ia que 0s processos espaciais so as forcas através das quais 0 movimento de transformacdo da estrutu- ra social, 0 processo, se efetiva espacialmente, refazendo a espacialidade da sociedade. Neste sentido os processos espa ciais sdo de yatureza socigy cunhados na prépria sociedade. Sobre 0 conceito de proceso espacial ¢ conveniente te- cet um comentario, antes de prosseguirmos, Trata-se de uma expressao empregada por gedgrafos para tentar dar conta do que ocorre no espaco ao longo do tempo. Pode ser visto como sindnimo de processos ecologicos da Escola de Chicago; no entanto, néo admitimos nenhuma analogia, ao nivel explicativo, com base na ecologia vegetal, tal co- mo aparece no conceito de processos ecoldgicos. Visto co- ‘mo conceito geogriifico, tem sido considerado de modo im- preciso ¢ mesmo inadequado: ora € visto como sinénimo de deslocamento, como a jornada para o trabalho ou flu- xos de bens e servigos sobre 0 espaco de uma dada regido, ora de modo vago. Acreditamos ser util repensar € recupe- rar 0 conceito de processos. espaciais devido & sua utilida- de na fonexao acdo human a—tempo—espago—mudanica~, Os processos espaciais ¢ as Fespectivas formas sao os seguintes: \ (a) centralizacao e a area central; (b) descentralizacao e os niicleos secundirios; J (©) coesdo ¢ as areas especializadas; (d) segregagao € as areas sociais; (e) dinamica espacial da segrezacao; (0) inércia e-as Areas cristalizadas. E conveniente deixar claro que estes processos ¢ for mas espaciais nao sao excludentes entre si, podendo ocor- rer simultaneamente na mesma cidade ou no mesmo bair- ro. Assim, um processo de descentralizagao pode estar ocor- tendo, originando, por exemplo, novos subcentros comer- ciais intraurbanos, a0 mesmo cempo que surgem novos bair- ros da elite, fortemente segregados: neste sentido pode-se afirmar que os processos espaciais so complementares entre si. Centralizagao e Area Central + A partir do comego do século XX o proceso de cen- tralizago e a sua correspondente forma espacial, a Area r N \e v Central, passaram a ser sistematicamente considerados pe- los estudiosos do fendmeno urbano.’ Economistas como Hurd ¢ Haig, ¢ socidlogos como Mckenzie abordaram a te- matica em pauta, Este interesse revela a magnitude do pro- cesso e da forma espacial, bem como o seu significado pa- ra a cidade.'De fato, a Area C constitui-se no foco P ‘al ndo apenas da cidade mas também de sua(hinter- ldndig) Nela concentram-se as principais atividades comer- ciais, de servigos, da gestéo ptiblica e privada, e os termi- nais de transportes inter-regionais e intra-urbanos. Ela se destaca na paisagem da cidade pela sua verticalizagao. ! A génese da Area Central Biss fxs bepecsem como frodutos do capitalis- and. Como’ fe se segue pretende résponder”a esta per gunta de um modo geral. 1A cidade mantém uma série de ligagdes com 0 mun do exterior a ela, ligagdes que envolvem fluxos de capitais, mereadorias, pessoas estas Rare-isto ela & um fov0 de transportes imter-regionais. Este é um lugar-comum a res- eito da cidade, mesmo em uma fase pré-capitalista ou na fase mercantilista do capitalismo 'Com a Revolugag Industral, as ligagdes da cidade com mundo exterior a ela ampliaram-se qualitativa e quantitati vamente. Nesta ampligggo as ferrovias tiveram um papel de destaque, tornanda.se, a\partir da segunda metade do sécu- lo XIX, 0 mais importanteyeio.de transporte inter-regional.* Numerosas empresas e linhas Foram criadas pelo capital priva- do, sendo elas razoavelmente independentes, umas das outras. Por outro lado, alguityas cidades tornaram-&e grandes centros metropolitanos, sendd servidas por numerosas linhas ferrovié rias: Londres, Paris e Chicago sao excelentes exemplos. A localizagao dosfermmimats fefrovrariostentro das gran- des cidadesfez-se 0 mais| préximo possivel um_do outro.¢ préximos ainda, quando foi o caso, doiterminal maritimo Isto garantia diminuig&o dos custos de(transbordd we Aan! . evened 9 gh 'Proximas a estes fer vao se localizar aquela: atividades, muitas delas entdo nascentes ou em ampliacao, voltadas parao(mundo exterior 4 cidade o comércio ataca- dista, depésitos, escritérios, ¢ a industria: a localizagao jun. to aos terminais de transporte: era essencial, si minuigao de custos! Estas“atividade: jaca enorme meen dg de trabalho, fazendo com que & Are: reale tornasse, além intra-urbanos) que também, a partir da segunda meta- 3écil0 XTX, foram largamente ampliados. Emerge a sim uma area de maior acessibilidade dentro da grande cidade. {Q, por sua vez, atraiu as nascentes lojas dé departaments— uma criagao visando distribuir' uma ga- ma enorme e crescente de produtos industriais para um cres- cente mercado consumidor constituido predominantemen- te por assalariadds — e de outros géneros do comércio vare- jista, bem como numerosas atividades instaladas em escrité- ios. O mercado de trabalho foi ampliado mais ainda e os transportes intra-urbanos passaram a servir a este setor da nascente Area Central. Verifica-se uma certa sincronia entre o emergir do ca- pitalismo em sua fase plenamente industrial e o aparecimen- to da Area Central. Processo, forma e também as fungdes esto assim conectados. Por que emergiu a Area Central, resultado do proces- so de centralizagao? Dado o esquema centralizador dos meios de transpor- te, que so, no periodo que se estende da-segunda metade do século XIX até meados do século XN, caracterizados por enorme rigidez espacial pelo fato de serem transportes sobre trilhos — trens e bondes —, verifica-se que 0 acesso ao mercado consumidor e as fontes de matérias-primas nao é, no ambito da cidade, uniforme, privilegiando 0 local em_torno dos terminais.de-transporte,-a_Area Central. Ai as empresas passam a dispor d lester alidades) seja decor- rente da acessibilidade, seja do-fato de estarem juntas, ge- rando{economias de aglomeragio. ~Em razao de suas vantagens locacionais, 0 preco da terra e dos iméveis é ai o mais elevado. Isto leva a uma se- lecdo de atividades. Localizam-se na Area Central aquelas que sao capazes de transformar custos locacionais ¢levados © ampla acessibilidade em lucros maximizados: sao as ativi- dades voltadas para um amplo mercado, nacional, regional ou abrangendd toda a cidadé.’As outras atividades, que nao requeriam nem suportavam uma localizacao central, lo- calizavam-se fora da Area Central. O seu aparecimento se deve assim as demandas espaciais do capitalismo em sua fa se concorrencial, onde a localizagdo central constituia-se em fator crucial na competicdo capitalista, A Area Central é assim, ¢ em grande parte, um produto da acdo dos pro- prietarios dos meios de producao, ainda que o Estado fos- se chamado a intervir: O nucleo central e a zona periférica do centro 10 processo de centralizagao ao estabelecer a Area Cen- tral configurou-a de-moda segmentado, com dois setores: de um lado 0 micleo central {core, Central Business District, ou CBD) e, de outro, a'zona pefiférica do, centro (frame, zone in transition, zona de obsolescéncia). ‘A figura | indi- ca a localizacao destes dois setores em uma cidade hipotét ca, cortelacionando-os com os transportes inter-regionais e intra-urbanos, 40 micleo central caracteriza-se, na segunda metade do século XX, quando o proceso de centralizacdo ja nao mais desempenha o papel relevante que desempenhou no passado, pelos seguintes aspectos, conforme apontam Hor- wood e Boyce!: * (a) Uso intensivo do solo. Trata-se da area da cidade de uso mais intensivo, com maior concentragao de atividades eco- | Horwoop, E. M. & BOYCE, R. R. Studies of the central business district and urban freeway development, Seattle, University of Washington, 1959, FIG ie CONVERGENCIA DE TRANSPORTES — A AREA CENTRAL ewrmac) -<—- zona pemiednica fi \ (ee te cern ee FERROVIA © TERMINAL Linwa 08 tonoes | n&micas, sobretudo do setor tercidrio. E ai que se encon- tram os mais elevados precos da terra, justificando-se assim a intensidade do uso do solo. - (b) Ampla escala vertical. O niicleo central apresenta-se com a maior concentracao vertical, facilmente distinguivel na paisagem urbana. A presenca de edificios de escritérios, juntos uns dos outros, viabiliza as ligages interpessoais vin- culadas aos negécios. - (©) Limitada escala horizontal. Em oposigio & caracteristi- ca anterior, o nticleo central é limitado em termos de exten- so, sendo, via de regra, passivel de ser percorrido a pé. ~(@) Limitado crescimento horizontal. Sua expansdo se faz sobretudo por uma mais acentuada verticalizagao, demolin- do-se prédios mais antigos, que sao substituidos por outros mais elevados. Esta caracteristica esté associada as anteriores, > © Concentragao diurna, durante as horas de trabalho, da populagao, sobretudo de pedestres. Por nao constituir érea residencial, apresenta-se deserta 4 noite. * (f) Foco de transportes intra-urbanos. E 0 ponto de conver- géncia do tréfego urbano e, em muitos casos, o ponto de baldeagao para bairros situados ao longo de diferentes dire- goes, * (g) Area de decisées. No micleo central localizam-se as se- des sociais ou escritérios regionais das principais empresas que atuam na cidade e em sua regido de influéncia. O Esta- do tem af muitas de suas instituigdes. E assim 0 ponto fo- cal da gestao do territério. ~ A zona periférica do centro constitui uma area em tor- no do niicleo central. Suas principais caracteristicas, na se- gunda metade do século XX, so: ' ~ (a) Uso semi-intensivo do solo. As atividades que ai se en- contram so, sobretudo, o comércio atacadista, a armazena- gem e as induistrias leves; ha terrenos abandonados, trans- formados, em muitos casos, em estacionamentos. Estas ati- vidades esto fortemente vinculadas as do niicleo central € = (b) Ampla escala horizontal. As atividades ai lo a toda cidade, beneficiando-se da acessibilidade que 0 con- junto da Area Central desfruta. lizadas ocupam prédios baixos, sendo fortemente consumidoras de espago: por isso a zona periférica do centro estende-se por ampla Area, 0 que € possivel pelo fato de 0 prego da terra ser ai menos elevado que o do nticleo central. =(€) Limitado crescimento horizontal. Seu crescimento restri- to deve-se, primeiramente, ao fato de que muitas das novas empresas e atividades, criadas recentemente, ja ndo preci sam mais desta localizagao, instalando-se em outros lugares. Em segundo lugar, outras atividades abandonam a area ‘em busca de terrenos mais amplos e baratos, ao mesmo tem- po que poucas sao aquelas que se instalam na zona periféri ca do centro. ~ (d) Area residencial de baixo status social. A zona periféri ca do centro apresenta um amplo setor residencial caracteri zado por residéncias populares e de baixa classe média, muitas delas deterioradas, como os cortigos, onde reside parcela da populagao que trabalha na area; possui por is- so comércio varejista e servicos para esta populacao ‘Este setor da Area Central constitui-se, por outro la- do, no principal foco da politica de renovagao urbana. Es- comitantemente verifica-se a substituigao do contetido so: cial, isto é, saem os pobres e entra a classe média’ ~(e) Foco de transportes inter-regionais, A area constitui-se no mais importante foco da circulagao inter-regional, ai lo- calizando-se os terminais ferroviarios ¢ rodovidrios, justifi- cando a presenga de numerosos depésitos, garagens e ho téis baratos. Quando se trata de cidade portudria, ai se loca- liza extensa zona de cais, armazéns e atividades conexas. Associado a estas atividades, mas ndo exclusivamente, apa- rece um subsetor mal-afamado de diverstes, —_ +A Area Central tem sofrido o.efeito, desde a década de 1920, e sobretudo apés a Segunda Guerra Mundia), de um crescimento espacialmente, escontalizado) De fato, ati- vidades que até entdo estavam'centratmenteTocalizadas, so transferidas ou criadas fora da Area Centraly Vamos tratar esta tematica em breve. No momento importa dizer que 0 processo de descentraliza¢éo implicou as caracteristicas de “Jimitado crescimento horizontal” tanto do nticleo central como da zona periférica do centro. Os terrentos Vagos exis- tented fieste Ultimo setor devem-se, em parte, & descentrali- zacdo, que certo modo esvaziou a zona periférica do centro. “A tendéncia da Area Central, especialmente do nticleo central, é a de sua redefinigdo funcional, tornando-se 0 fo- co principal das atividades de gestdo e de escritérios de ser- vigos especializados, enquanto 0 comércio varejista e certos servigos encontram-se dispersos pela cidade. Questiona-se entio até que ponto a Area Central nao é uma heranca do passado, ndo sendo mais inteiramente necesséria para 0 ca- pitalismo em sua fase atual.? E a Area Central da cidade brasileira? Acreditamos ter 4 nossa frente um amplo campo para investigaco. Os estudos de Milton Santos sobre 0 centro de Salvador, de Aluizio Duarte sobre 0 Rio de Janeiro, ¢6 de Helena Cor- deiro-sobre Sao Paulo revelam, a despite das diferencas de abordagem e da época.em que foram realizados, uma ri- ca variedade de situagdes. Algumas questdes sio agora indicadas visando suscitar pesquisas sobre o tema em pauta. Primeiramente, como surgiram as Areas Centrais dos diferentes tipos de cidade brasileira — cidades.com passado colonial e cidades novas, om ii dustrializagao relativanreme-amciga-e, por exemple, vidide Tidustial expresiva, cidade espontaneas ¢ planejadas etc.? Em segundo lugar, como evoluiram as Areas Centrais desenvolvidas sob condigdes distintas de si- tio da cidade, tamanho demografico urbano, industrializa- ico e infra-estrutura de transportes inter-regional ¢ intra- urbano? Em outros termos, que singularidades e particula- ridades as Areas Centrais brasileiras apresentam no que se refere a génese ¢ & dindmica? Dentro desta segunda questéo um ponto relevante pa- ra investigago € 0 da redefinigdo funcional ¢ social do nui- cleo.central de muitas cidades. Trata-sede sua transforma- 40 em local de comércio € servigos, em muitos casos aque- les do circuito inferior, para uma populagdo pobre. Redefi- nic&o esta que, em muitos casos, tem sido influenciada pe- la descentralizagao administrativa, envolvendo o investimen- to oriundo de recursos puiblicos escassos, a valorizagao fun- didria ¢ os interesses de firmas empreiteiras e dos promoto- res imobilidrios. Descentralizagao e os nucleos secundarios ' Historicamente 0 processo de flescentralizacao & mais recente que o de centralizagdo. Aparece eit raza0 de-Varios fatores. De um lado, como uma medida das empresas visan- do eliminar as deseconomias geradas pela excessiva centrali- zagdo na Area Central. De outro, resulta de uma menor ri- gidez locacional no 4mbito da cidade, em razdo do apareci- mento de fatores de atracdo em Areas néo-centrais.” Ja na década de 1930, Colby? especificava os fatores de repulséo da Area Central: ~j(a) aumento constante do prego da terra, impostos e alu- / guéis, afetando certas atividades que perdem a capacidade de se manterem localizadas na Area Central; ,j (b) congestionamento e alto custo do sistema de transpor- * tee comunicagées, que dificulta e onera as interagdes entre firmas; 2 Coty, C. C. Centrifugal and centripetal forces in urban geography. In: Maver, H. & Kohn, C. F., orgs. Readings in urban geography. \ © dificuldade de obtencao de espaco para a expansio, que afeta particularmente as indiistrias em crescimento; \é (d) restrigdes legais implicando a auséncia de controle do es. ” pago, limitando, portanto, a acdo das firmas; + (© auséncia ou perda de amenidades. ~A descentralizagao, por outro lado, aponta Colby, sé se verifica quando ha ou sao criadas atragdes em areas nao centrais, como as seguintes: (~ (@) terras ndo ocupadas, a baixo prego e impostos; (b) infra-estrutura implantada; (©) facilidades de transporte; ~ (d) qualidades atrativas do sitio, como topografia ¢ drenagem; ~(@) possibilidade de controle do uso das terras; (f) amenidades. * A descentralizagag) esta também-associada ao cresci- mento da cidade, fanto em termos lemogrdficodcomo(espa- ciaisyampliando a’ distancias entre @Ared Central £ a1i0- vas areas residenciais: a competi¢a pelo mércado-Consumi- dor, por exemplo, leva as Titmas comerciais a descentraliza- rem seus pontos de venda através da triagao de filiais nos bairros.*E necessario, no entanto, que haja um mercado que justifique cada localizagao, bem como acessibilidade as filiais. A competicao entre firmas comerciais pressupu- nha anterjormente uma localizag: central;,agora, adicio- nalmente, varias localizaoes descentralizadas. ‘As novas atividades) por outro lado, ja podem surgir em reas ndo-centraig: ja nascem assim descentralizadas, evitando possiveis desvantagens da Area Central e, ao mes- | mo tempo, beneficiando-se das vantagens de areas distan- tes do centro, ( & _A descentralizacao foi viabilizada pelo desenyolvimen- LS to de meios de transporte mais flexiveis, como Gnibus, ca- 1 minhdo ¢ automével, nao mais presos aos trilhos. Resultou também dos interesses dos proprietarios fundiarios e promo- tores imobilidrios. Mas é preciso considerar, entretanto, a propria dindmica capitalista, que, de modo ponderavel, atua subjacentemente aos fatores de repulsdo ¢ atragao aci- ma mencionados.'Nesta dindmica também estao presentes 08 interesses dos industriais do setor de transporte. O processo de centralizacao do capital, que yerou o apa- recimento de grandes ¢ poderosas empresas, implicou econo- mias internas de escala no-Ambito da unidade fabril, isto é, a grande e moderna Fabrica hao depende mais das externali- dades da Avea Central pafa realizar todas as suas operacées. Sua grande escala’€ suficiente para justificar que nela pré- pria sejam produzidas algumas matérias-primas e bens inter mediarios, ou a localizagao de outras fabricas e servicos jun- to de si, Pode assim localizar-se fora da Area Central, adicio- nando vantagens outras, como 0 custo do terreno e a proxi- midade da forca de trabalho. A sede social da empresa, no entanto, pode localizar-se na Area Central. Esta localizagao, contudo, ndo é mais imperativa como foi no passado: os mo dernos meios de comunicagées levam a uma flexibilidade lo cacional até mesmo das atividades de gestao. A centralizagao do capital, a caracteristica basica da fa- se monopolista do capitalismo, esta associada, no que se re- fere ao setor tercidtio, a criagdo de cadeias de fojas — super mercados, dtica, eletrodomésticos, confecgdes, tecidos, tin- tas, drogaria, de “‘variedades’ (como as Lojas America- nas) etc. — podendo a sede da empresa permanecer na Area Central. Somente o grande capital, em expansao, demanda novos espagos ¢ novos mercados.’A descentralizacdo torna: se um meio de se manter uma taxa de lucro que a exclusiva localizagao central nao mais.¢ capaz de fornecer. Neste senti do constata-se que no/capitalismo mona mntraliza- 40 do capital e descentralizacao espacial, diferente, portan-_ to, do que ocorria no capitalismo cancorrencial, onde'a cen” tralizagao espacial derivava de uma dispersio de capitals» O significado da descentralizagéo "Em primeiro tear a descentralizaedo tora o espago urbano mais'complexo} com varios micleos secundarios de atividades’ Mas o significado‘dela é muito mais amplo. Pa- rao gonsumidon, "0° aparecimento de miicleos secundarios de atividades comerciais gera economias de transporte e tem po, induzindo a um maior consumo, o que é do interesse do. capital produtivo e comercial. = Para 0 capital industrial, além das vantagens da nova localizagao, a8 operagdes de descentralizagdo sao acompa mhadas da venda do terreno do antigo estabelecimento, on de se erguem edificios comerciais ou residenciais! Isto per mite grandes lucros, pois se trata de uma troca que envol ve terrenos com grande diferenca de precos. Lucro que se- 4 ainda maior se os custos da infra-estrutura da nova loca- lizagdo industrial forem socializados através do Estado. +A descentralizacao do capital comercial, por outro la- do, tende a levar aa(@esaparecimento dias firmas dos bair~ Tos» pequenas firmas sem economias de escala, incapazes “de concorrerem com as grandes, estruturadas em cadeias de lojas comandadas da Area Central: isto é particularmen- te marcante para certos géneros comerciaiss Como lembra Castells (1983), deste modo se reproduz na escala intra-ur bana o esquema de dominagao do grande ‘capital dos paises centrais sobre os pequenos capitais da periferia mundial Falamos em rede integrada de lojas dirigida da Area Central. Trata-se, efetivamente, de uma rede de drenagem de salarios da populagdo, Através do consumo os saldrios fluem para as filiais de venda, dai para as agéncias bancérias e destas para as sedes das empresas centralmente localizadas. Tal drenagem viabiliza a acumulacdo capitalista em geral, pois é através dela que se da efetivamente a realizagao do va- lor e da mais-valia. Deste modo a rede de lojas, fruto da des centralizacao, tem um enorme papel no processo de acumula gio de capital. Mas a rede integrada de lojas esta também as- sociada a reprodugdo social em geral, dado que esta reprodu- 40 compreende também o,consumo de bens ¢ servigos. Do ponto de vista dos promotores imobiliarios, a descen- tralizacao representa campo para novos investimentos e repro- dugo-do capital:/isto & particularmente notavel no caso dos shopping centers, em muitos casos planejados, construidos e administrados pelo capital vinculado ao setor/imobiliario’ O processo de descentralizagao tem assim uma ldgica que aquela do capitalismo monopolista. Vejamos agora a natureza seletiva da descentralizacdo. °.| : A seletividade da descentralizacao 1 A descentralizagao é um proceso complexo, caracteri- zando-se por diferentes tipos de seletividade: « (a) Seletividade em termos de atividades> Algumas descentra- lizam-se mais, como a indtistria, enquanto outras s40 pouco propensas & descentralizagdo, como a de diregao dos negdcios? (b) Seletividade em termos temporais. Em relagao a indiis- tria, descentralizam-se primeiramente aquelas que sioCconsu> midoras de espaco ou poluentés;no caso das atividades ter- cidrias, aquelas que atendem demandas mais freqiientes, co- mo as exercidas pelos clinicos geraisy tendem a abandonar © centro anteriormente as atividades que atendem as deman- das menos freqiientes, como aquelas dos médicos especialistas. (©) Seletividade em termos de divisdo territorial do traba- Iho. Atividades que comportam, varias.fungdes complemen- tares, mas com demandas diferentes de espago ¢ capacida- de distintas de pagar pela terra que ocupam, realizam uma descentralizagao seletiva: abandonam o centro, a fabrica © depésito, ali permanecendo as sedes das empresas indus- trial e comercial. (@) Seletividade em termos de tamanho da cidade. A descen- tralizacdo comeca a sé vetificar a partir de uma dimensao urbana que, no entanto, pode variar em razio de peculiari dades do sitio urbano, do sistema de transporte, das fun- Ges urbaiias e do nivel de renda da populacéo. 3 Este t6pico estd caleado em: Halc, R. M. Towards an understanding of the metropolis. In: Smiri, R., TaarFe, E. & KING, L., orgs. Readings in economic geography, Chicago, Rand MeNally & Co., 1968 (original de 1926) = (© Seletividade-em.termos de territério. Certos setores da ci- dade s20 mais procurados do que outros pelas atividades da Area Central; no caso das atividades tercidrias os bairros habitados pela populagdo de renda elevada tendem, em ra- zo do alto nivel de consumo, a receber primeiramente ¢ | em maior numero as filiais de empresas-camerciais do que ‘irros populares; no caso da industria verifica-se 0 con- >{ trdrio, havendo énfase de relocalizagSesnas treas populares, especialmente aquelas dotadas de grandes vias de tréfego. Os nticleos secundérios: 0 comércio e servicos ___ A descentralizacdio, no que se refere ao comércio e ser- vigos, gerou um complexo conjunto de nticleos secundarios, que 0 quadro 1, a seguir, baseado em proposigao de Berry‘, procura descrever: Quadro 1 Os nucleos secundérios de comércio e servigos Fungo | pier a hierarquizada | especializada subcentros: distritos médicos regional distritos de areas debairros | Giversoes de bairro etc. lojas de esquina rua comercial | ruas de de bairros autopegas eixos rua comercial | ruas de méveis de bairro tuas de confecgoes etc. 4 Beary, B. J. L. General features of urban commercial structure. In: Bourne, L., 1971 ¢ 1982, Os niicleos hierarquizados sao uma réplica intra-urba- na da rede regional de localidades centrais. subcentro re: gional constitui-se em uma miniatura do suicleo central Possui uma gama complexa de tipos de lojas e de servigos, incluindo uma enorme variedade de tipos, marcas e pregos de produtos. Muitas de suas lojas sao filiais de firmas da Area Central, ¢, a semelhanga desta porém em menor esca- la, 0 Subcentro regional onstitui-se em importante foco de linhas de transporte’iritra-urbano. ‘A magnitude destes subcentros depende da densidade e do nivel de renda da populacdo de uma area de influéncia. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, os subcentros regionais de Madureira, Méier, Tijuca-e-Copacabana sio exemplos notaveis das diferengas de magnitudes Os outros dois tipos de subcentro 846, por sua vez, ré- plicas menores dos regionais tanto no que se refere ofer ta de bens e servigos como a dimensao da area de influén- cia. As lojas filiais de firmas da Area Central estdo presen- tes mas em menor mimero, e como ponto focal do trafego intra-urbano a magnitude deles é inferior. Por toda a cidade ocorrem pequenos agrupamentos de lojas localizadas em esquinas: duas a cinco lojas, como padaria, acougue, quitanda, farmacia, armazém, borequim, que atendem as demandas muito freqiientes da populasao que habita nos quarteirdes imediatos ao agrupamento. Os ‘comerciantes s40 moradores do bairro e conhecidos dos fre- gueses. E sobre estes pequenos micleos comerciais que inci- dem os efeitos da expansdo dos supermercados: em muitos bairros desapareceram ou diminuitam de importancia. Os niicleos ligados as atividades tercidrias, contudo, no so apenas hierarquizados, mas também especializados. Vamos considera-los em breve, quando abordarmos 0 pro- cesso de coesio. 5 DuarTe, Haidine S. B. A cidade do Rio de Janeiro: descentralizagao das atividades. Os centros funcionais. Revista Brasileira de Geografia, 36(1), 1979 Dois comentarios sdo agora necessarios. Primeiramen te a hierarquia acima indicada foi marcada, aps a Segun- da Guerra Mundial, pelo aparecimento dos shopping cen ters planejados, localizados em areas que retinem duas ca: racteristicas: a forte acessibilidade e 0 status social eleva- dorde seus habitantes. Os efeitos destes empreendimentos, que envolvem poderosos interesses imobiliarios ¢ comerciais, sobre a estrutura comercial das grandes cidades brasileiras esto ainda para ser verificados. Em segundo lugar deve ser apontada a questao da es trutura comercial das cidades do Terceiro Mundo. A estrutu ra acima comentada ndo é exclusiva, correspondendo ela aquilo que Milton Santos® denomina de “circuito superior da economia’’,“o. setor moderno, plenamente capitalista, das cidades dos. paises, subdesenvolvidos: ‘Q circuito superior pode conviver na mesma rua com 0 “‘circuito inferior da economia", com os numerosos ven dedores ambulantes que vendem uma gama cada vez mais variada de produtos industriais, Mas pode também estar espacialmente dissociado, como se indica com o exemplo das duas estruturas comerciais existentes em Manila, nas Filipinas’. Quadro 2 A estrutura comercial de Manila na década de 1950 Elite @ classe média Popular nucleo central subcentros hierarquizados mercado publico central ‘mercados publicos menores lojas especializadas de bairros lojas néo-especializadas de bairto 6 Santos, Milton. 0 espaco dividido. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1979, 7 Mantyre, W. E, The retail pattern of Manila. The Geographical Review. $5.(U), 1955. Esta é, sem duvida, uma tematica para investigagao. A figura 2, por outro lado, indica em linhas muito gerais as formas espaciais derivadas da descentralizacao. a industria Os nticleos secundario: ‘A partir de meados do século XIX a industrializagao vai gerar dois padrdes locacionais intra-urbanos. De um la- do um padrao envolvendo areas que eram periféricas, mas nao distantes do espaco urbanizado de medo continuo. Tal padrdo tinha na industria ¢éxtil um bom exemplo. Tratava- se de fiagdes ¢ tecelagens ldcalizadas junto as fontes de ener- gia hidraulica ¢ de aguas limpidas necessarias as suas diver- sas opéracdes fabris, Isoladas da cidade, tais indiistrias ti- nham junto a si uma forga de trabalho cativa, residindo em vilas operdrias: criou-se assim um espaco industrial cons- tituido de lugar de produgao e de residéncia. Em breve es- te espaco seria efetivamente incorporado a cidade, tornan- do-se um bairro ou um subuirbio®. ‘A cidade do Rio de Janeiro oferece varios exemplos de industrias téxteis que, entre 1850 ¢ 1900, quando foram im- plantadas, eram mais ou menos periféricas. Localizavam-se, entre outros, nos bairros de Jardim Botdnico, Laranjeiras, Tijuca e Andarai, & beira de um riacho e proximo a encosta da Serra da Carioca que divide a cidade em Zona Sul e Nor- te. Na periferia da atual regio metropolitana carioca, varios niicleos tiveram suas origens em inchistrias téxteis ¢ suas vi- las operdrias, So exemplos os de Paracambi, Pau Grande e Santo Aleixo, todos localizados no sopé da Serra do Mar © segundo padrdo locacional envolvia as induistrias que nao eram dependentes da forca hidrdulica. Tais indiistrias lo- calizavam-se no espaco que hoje constitui a Area Central. Em parte derivavam das antigas manufaturas do periodo an- 8 prep, Allan, The intrametropolitan location of American manufacturing. In: BOURNE, L., 1971 ¢ 1982 FIG.2 - DESCENTRALIZACGAO E ESPACIAIS DERIVADAS (simplificado) Usponranea Diarmiro inoueTAlAL ae 20 EsPago uneANe FORMAS | terior a industrializagao, e que se achavam dispersas por to- da a cidade. Em parte surgiram durante a segunda metade do século XIX no bojo do proceso de centralizacao. A descentralizagao industrial inicia-se nos primérdios do século XX. As deseconomias externas da Area Central, aintrodugao de novas técnicas produtivas ¢ o aumento da escala de producao, que exigiam terrenos maiores, tornaram, para muitas industrias, impraticdvel uma localizagao na Area Central, Entretanto, nem todas as indistrias descentralizaram- se. Aquelas que o fizeram, ou que nasceriam longe da Area Central, tornaram mais complexa a organizagao espacial da cidade. Algumas industrias permaneceram centralmente loca- lizadas. Segundo Pred, entre estas predominam as peque- has, pouco consumidoras de espago, que tém como merca- do a Area Central ou toda a cidade, e que suportam pre- gos elevados pelos imoveis que ocupam. Localizam-se na zona periférica do centro, em muitos casos em iméveis adaptados, beneficiando-se das proximidades dos termi- nais de transporte, depésitos, comércio atacadista e das atividades do nucleo central: beneficiam-se, portanto, de externalidades. As pequenas graficas e a industria de con- fecgdes femininas sdo exemplos tipicos de indiistrias central mente focalizadas. Na zona periférica do centro, junto ao porto, estdo as induistrias, incluindo as de grande porte, que sao forte- mente dependentes dos transportes, especialmente em rela- do as matérias-primas:importadas. Os moinhos de trigo so exemplos marcantes deste padrao de localizagéo nas grandes cidades portuarias brasileiras. A localizac&o industrial descentralizada tem nos eixos industriais o principal padrao locacional intra-urbano, tal como procura-se indicar na figura 2. Ao longo de vias fér- Teas OU Vias que conectam a cidade a hinterlandia regio- nal ou a nacional, forma-se um alinhamento de industrias transferidas do centro ou que ali foram criadas: bens de capital, de consumo durvel ¢ ndo-duravel. Todas benefi- ciam-se da acessibilidade aos mercados; dos terrenos ain. plos ¢ baratos, assim como da proximidade da forca de trabalho, O distrito industrial, de localizacdo periférica, resulta de uma agio do Estado visando, através da socializacao de varios fatores de produgéo como terrenos preparados, acessibilidade, agua e energia; e, de acordo com interesses de outros agentes sociais, como proprietdrios fundidrios industriais, criar economias de aglomeragao para as ativida- des de producao industrial. O impacto do Estado sobre a organizacao espacial da cidade é, sem duvida, um importan- te tema de pesquisa. Na estrutura descentralizada da atividade industrial ha ainda numerosas pequenas e médias induistrias distribui- das por quase toda a cidade. Produzem elas bens de consu- mo para o mercado préximo, utilizando, via de regra, maté- rias-primas produzidas na propria cidade: as pequenas fun- digdes que produzem grades, portdes esquadrias metali- cas so um exemplo destas indiistrias dispersas pela cida- de, tal como ocorre no Rio de Janeiro. Coesao e as reas especializadas ' O processo de coesdo pode ser definido como aquele movimento que leva as atividades a se localizarem juntas, E sindnimo de economias externas de aglomeraco. A coe- so ou magnetismo funcional, como se referia Colby, veri- fica-se em relagao as atividades que:' (a) Apesar de nao manterem ligagdes entre si, como as lo- jas varejistas de mesma linha de produtos, formam um con- junto funcional que cria um monopoélio espacial, atraindo consumidores, que tém assim a possibilidade de escolher en- tre varios tipos, marcas e pregos. As ruas especializadas em méveis, autopecas, lustres e confecedes no atacado so exemplos tipicos de coesio de firmas de uma mesma linha de produtos. \\- () Mesmo sendo de natureza distinta, esto localizadas jun- tas umas das outras, formando um conjunto coeso que po- de induzir 0 consumidor a comprar outros bens que nao fa- ziam parte de seus propésitos. O comércio varejista do nui- cleo central, dos subcentros regionais espontaneos ¢ dos shopping centers constituem exemplos de atividades dispos- tas espacialmente de modo coeso. ‘© Sao complementares entre si, como se exemplifica com as associacdes funcionais entre fabricago, atacado de con- fecgdes, companhias de seguros, bancos, sedes de empresa e induistrias com ligagdes entre si tanto 4 montante (maté- rias-primas) como a jusante (mercado consumidor), \, (d) Juntas criam economias de escala. E 0 caso das peque- nas iiduistrias que sozinhas nao teriam escala suficiente pa- ra atrairem outros industriais, produtores, por exemplo, de bens intermedidrios, firmas de servigos de reparagao de méquinas, empresas de transporte etc. As pequenas indis- trias da zona periférica do centro af se localizam em razao das economias de escala que ali existem, e que elas, por es- tarem juntas, ampliam. 4. Exigem contatos pessoais face a face. Tais atividades agrupam-se, como se exemplifica com as sedes das grandes empresas: neste caso a acessibilidade ¢ fundamental. A conseqiiéncia deste proceso ¢ a criagdo de dreas es- pecializadas, tanto na Area Central como em outros seto- res da cidade, Neste sentido é preciso notar que a coesao é um processo que estd presente tanto na centralizagdo co- mo na descentralizacéio, tornando-os de fato mais comple- xos, assim como a organizac&o espacial intra-urbana.- No que se refere ao niicleo central, 0 processo de coe- so aparece através de distritos especializados, tal como in- dicam Murphy, Vance Jr. e Epstein, e como Duarte eviden- ciou em relacdo & cidade do Rio de Janeiro durante a déca- da de 1960: (a) distrito varejista que ocupa parcela significativa do ni- cleo central, sendo caracterizado por ruas com uma seqiién- cia continua de lojas; asruas de pedestres estao ai localizadas; (b) distrito de escritérios em geral, coincidindo geralmen- te com a area de maior crescimento vertical; 0 comércio varejista ai é muito especializado, incluindo-se lojas de ma terial de escritério e papelaria, e servicos, como o de ali mentacao; (c) distrito de bancos e sedes sociais de empresa; (d) distrito de diversdes e hotéis, onde tendem a se concen- trar cinemas e teatros Na zona periférica do centro verifica-se também a exis- téncia de certas atividades que tendem a se apresentar espa- cialmente coesas, como 0. comércio atacadista ¢ os depési. tos, os servigos ligados & circulagao e as pequenas industrias. Fora da Area Central, 0 processo de coesao gera dis- tritos € ruas especializados: de consultérios e clinicas médi- cas, de mdveis, autapecas, eixos industriais etc. Cada um destes distritos e ruas apresenta a mesma importdncia relat va um em relacdio ao outro. Eles nao esto organizados hie- rarquicamente segundo a teoria das localidades centrais mas coexistem na mesma cidade, tornando-a mais comple- xa, mais fragmentada, incidindo assim em uma mais varia- da articulacdo entre areas. Pode-se agora levantar a questdo: se as areas especiali- zadas nado tendem a se constituir em uma forma espacial mais expressiva, de maior importéncia que aquelas hierar- quizadas. E isto em parte porque a citculagao individual tende a se ampliar mais e mais sobre um espaco cujos entra- 9 Moppy, R. E., Vance JR., J. E, & Epstein, B. J. Internal structure of the CBD; economic geography, 3 (1), 1955. ves so cada vez mais reduzidos. Este argumento, contudo, s6 faz sentido quando se considera a populagéo de médio ¢ alto status sociais. Este é, no entanto, um tema para in- vestigacao. Associado a esta tematica, pergunta-se se novas for- mas descentralizadas de coesaio ndo estdo sendo produzidas como 0s distritos administrativos, tal como ocorre em algu- mas capitais brasileiras, como Salvador e Cuiaba, entre ou- tras. E isto para nao falar de Brasilia, onde 0 Plano Pilo- to é, em termos de espaco de atividades, um agregado de setores especializados. Segregacao e as areas sociais Vejamos agora os processos ¢ formas espaciais vineula- dos sobretudo & existéncia e reprodugdo dos diferentes gru- pos sociais. Referem-se, portanto, as residéncias e nao as in- diistrias, comércio e servigos, ainda que destas nao estejam desvinculados. Os processos que se seguem definem especi- ficamente a divisao social do espago, enquanto os conside- rados anteriormente definem a divisdo econdmica do espago. primeiro destes processos ¢ 0 de segregacdo residen- cial, cujo conceito aparece com a Escola de Chicago, pri- meiramente com Robert Park e, a seguir com Mckenzie, gue 0 define como sendo uma concentragao de tipos de po- pulagdo dentro de um dado territério. A expresséo espacial da segregacdo é a ‘area natural’), definida por Zorbaugh como sendo uma area geogratica caracterizada pela indivi- dualidade fisica e cultural; Seria ela resultante do processo de competigao impessoal que geraria espagos de dominagao dos diferentes grupos sociais, replicando ao nivel da cida- de progessos que ocorrem no mundo vegetal. ‘Ao coneeito de areas naturais aparece, mais tarde, par- cialmente liberado de suas raizes naturalistas, 0 conceito de “éreas sociais’” definido por Shevky e Beil como sendo reas marcadas pela tendéncia a uniformidade da popula- cdo em termos de trés conjuntos de caracteristicas: status sécio-econémico (renda, status ocupacional, instrucao ete.), urbanizacao (mulheres na forca de trabalho, fase do ciclo de vida, isto é, solteiros, casais jovens com filhos pequenos etc.) € etnia. A uniformidade de tais caracteristicas origina dreas sociais, isto é, bairros homogéneos, segregados, co- mo por exemplo bairros operarios com modestas residén- cias unifamiliares, de empregados do setor terciario residin- do em edificios de apartamentos, de diretores de empresa em suas residéneias suntuosas ete. A segregacdo residencial é, em realidade, um proces- so que origina a tendéncia a uma organizaco espacial em Areas de “forte homogeneidade social interna e de forte dis. paridade entre elas”, conforme aponta Castells (1983). E um produto da existéncia de classes sociais, sendo a sua es- pacializacdo no urbano. Sua origem remonta ao préprio aparecimento das classes sociais e da cidade, que se verifica- ram de modo simulténeo. McGee! nos fornece um bom exemplo ao descrever a segregagdo nas “‘cidades sagradas”” do sudeste asidtico, considerando a cidade Kmer de Ang- kor Thon, atualmente territério cambojano, no século XIII, num contexto pré-capitalista: © palacio e os principais templos podiam geralmente ser encontrados no centro da cidade, e em torno deles esta: vam localizadas as residéncias da elite da cidade e funciond- rios. Cercando esta area estavam as ruas dos artesdos, ma- nufatureiros, joalheiros e armeiros. As comunidades dos co- merciantes estrangeiros localizavam-se fora dos muros da ci: dade, junto com os elementos mais pobres da populagao. A distribuigao do poder e.a estrutura social espelhavam a dimi- nuigao do prestigio social do centro da cidade paraa periferia. ' Sobre os trabalhos de Mckenzie, Zorbaugh, Shevky ¢ Bell, consultar a coletdnea organizada por THEODORSON, G. A. 11 McGee, Theodore. The southeast Asian city; a social geography of the primate cities of southeast Asia. London, G. Bell and Sons, 1967. p. 35-36. Trata-se, portanto, de um processo que caracteriza a cidade, e nao apenas a cidade capitalista, ainda que sob a égide do capitalismo a segregag4o assumisse novas dimen- sdes espaciais. Segregacao e classes sociais - A segregacdo residencial é uma expressdo espacial das classes sociais! Para se compreender isto melhor, ¢ impor- tante que se conhega como no capitalismo as classes sociais foram estruturadas, De acordo com Marx, Poulantzas ¢ Giddens, "Harvey'? argumenta que no capitalismo ha trés forcas basicas que estruturam as classes sociais:r (a) Uma forca primaria, basica, que vem das relagdes entre capital trabalho, gerando uma estrutura dicotémica de clas- ses: os detentores dos meios de produgéio ¢ os que vendem sua forca de trabalho. sy -(b) Uma forga residual, que é originada de formas pretéri- tas de organizacdo social ou do contato entre um modo de produgao dominantee um subordinado, Traduz-se, por exem- plo, na existéncia de uma aristocracia rural e de campone: ses mais ou menos incorporados ao capitalismo Sf (©) Forcas derivativas, que emergem devido as necessidades de preservar os processos de acumulagao do capital através de inovagdes tecnolégicas ¢ controlar as mudangas na orga~ nizagdo social. Tais forgas geram: — fragmentagao da classe capitalista e proletaria devido & diviso do trabalho ¢ especializagao funcional; — classes distintas de consumo visando a uma demanda va- ridvel e continua; 22 Haavey, David. Class structure in a capitalistic society and the theory of residencial differentiation. In: PeeL, R., CuisHowm, M. & HAGGETT, P., orgs. Processes in physical and human geography. London, Heinemann, 1975, — aparecimento de uma classe média burocrata, trabalhan- do na esfera do Estado e grandes empresas, devido a neces- sidade de organizar produgao, circulacao, distribuigdo e consumo; — desvios de consciéncia de classe e projegio ideolégica, que é a da classe dominante, visando desviar a atengao dos problemas das relagdes capital-trabalho; — controle sobre a mobilidade social através da criagao de barreiras, visando evitar instabilidade social que mudan- gas no proceso de produgdo, troca, comunicagdes e consu- mo poderiam produzir. ‘Na medida em que estas forgas atuam intensamente e durante um longo periodo de tempo, geram uma marcante fragmentagéo da estrutura social, a0 mesmo tempo em'que se verifica crescente concentracao de atividades e populacdo na cidade. Da localizagdo diferenciada no espago urbano destas classes sociais fragmentadas, emerge a segregagao re- sidencial da cidade capitalista. + Mas como se verifica 0 rebatimento no espago das clas- ses sociais fragmentadas? Verifica-se basicamente devido ao diferencial da capacidade que cada grupo social tem de pagar pela residéncia que ocupa, a qual apresenta caracte- risticas diferentes no que se refere ao tipo e a localizagao, Em outras palavras, as dreas sociais resultam das diversas solugdes que as classes sociais e suas fragdes encontraram para solver os problemas de como e onde morar. Mas estas solugdes nao derivam de uma ago auténoma por parte das classes sociais vistas enquanto consumidoras. Pata se entender a questéo do como morar é preciso que se compreenda o problema da produgao da habitagao. Trata-se de uma mercadoria especial, possuindo valor de uso e valor de troca, 0 que faz dela uma mercadoria sujei- ta aos mecanismos de mercado. Seu cardter especial apare- ce na medida em que depende de outra mercadoria especial — a terra urbana —, cuja producdo é lenta, artesanal e cara, excluindo parcela ponderdvel, sendo a maior parte, da populagdo de seu acesso, atendendo apenas a uma pe- quena demanda solvavel A intervengdo do Estado, quer direta, quer indireta- mente, se torna necessdria. Indiretamente, através do finan- ciamento aos consumidores ¢ as firmas construtoras, am- pliando a demanda solvavel ¢ viabilizando 0 proceso de acumulacao capitalista. Diretamente, através da construcdo, pelo préprio Estado, de habitagdes. A sublocacao de resi- déncias deterioradas constitui-se em outra alternativa ao co- mo morar por parte daqueles que ndo conseguem entrar no mercado capitalista de habitacdo; outras alternativas re- ferem-se a autoconstrugao na periferia urbana, ¢ outra, ain- da, 4 construgdo de barracos em favelas. Em relagao ao onde morar € preciso lembrar que exis- te um diferencial espacial na localizagao de residéncias vistas em termos de conforto ¢ qualidade. Esta diferenca reflete em primeiro lugar um diferencial no prego da terra — que é fungdo da renda esperada —, que varia em fungao da aces- sibilidade e das amenidades. Os terrenos de maior prego se- ro utilizados para as melhores residéncias, atendendo a de- manda solvavel. Os terrenos com menores pregos, pior loca: lizados, serao utilizados na construgdo de residéncias inferio- res, a serem habitadas pelos que dispdem de menor renda, © como e o onde se fundem, dando origem a areas que tendem a ser uniformes internamente em termos de ren- da, padres culturais, valores e, sobretudo, em termos dos papéis a serem cumpridos na sociedade pelos seus habitan- tes, Esta tendéncia se afirma de modo mais marcante nos extremos da sociedade, isto ¢, nos grupos mais elevados ¢ mais baixos da sociedade. Quem produz a segregagao? "Ja vimos 0 papel do Estado na segregacdo residencial. Subjacente a acdo estatal esta a classe dominante ou algu- mas de suas fragdes, Sua atuacdo se faz, de um lado, atra- vés da auto-segregacdo na medida em que ela pode efetiva- mente selecionar para si as melhores Areas, excluindo-as do restante da populacdo: ira habitar onde desejar. A ex- pressao desta segregagao da classe dominante é a existéncia de bairros suntuosos e, mais recentemente, dos condom: nios exclusives e com muros e sistema préprio de vigildncia, dispondo de areas de lazer e certos servigos de uso exclusi- vo, entre eles, em alguns casos, 0 servico de escolas puibli- cas eficientes. » A classe dominante ou uma de suas fragdes, por outro lado, segrega os outros grupos sociais na medida em que controla o mercado de terras, a incorporagao imobilidtia e a construgdo, direcionando seletivamente a localizagao dos demais grupos sociais no espaco urbano, Indiretamente atua através do Estado. Em realidade pode-se falar em auto-segregagao e segre- gacdo imposta!, a primeira referindo-se a segregagdo da classe dominante, e a segunda a dos grupos sociais cujas op- Ges de como e onde morar so pequenas ou nulas, A segre- gacdo assim redimensionada aparece com um duplo papél, © de ser um meio de manutengdo dos privilégios por parte da classe dominante ¢ 0 de um meio de controle social por esta mesma classe sobre os outros grupos sociais, especial- mente a classe operdria e 0 exército industrial de reserva, Este controle esta diretamente vinculado 4 necessidade de se manter grupos sociais desempenhando papéis que lhe so destinados dentro da divisdo social do trabalho, papéis que implicam em relagdes antagonicas de classe, papéis impos- tos pela classe dominante que precisa controlar um grande seamento da sociedade, no apenas no presente mas tam- bém no futuro, pois se torna necessario que se reproduzam as relagdes sociais de producao. 3 O'NEILL, M. Monica, Condominios exclusivos: um estudo de caso. Re- vista Brasileira de Geografia, 48 (1), 1986. De fato, de acordo com Lefébvre (1976), a reprodugao das relagGes sociais de produgdo constituiu o papel mais im- portante que a organizacdo espacial da cidade est destina- da a cumprir: ¢ é via areas sociais segregadas que isto po- de ser viabilizado.» O significado da segregagao Harvey, no artigo anteriormente indicado (p. 362), ar- gumenta que: — a diferenciacao residencial deve ser interpretada em ter- mos de reprodugo das relagdes socials dentro da socieda- de capitalista; — as dreas residenciais fornecem meios distintos para a in- teragao social, a partir da qual os individuos derivam seus va- lores, expectativas, habitds de consumo, capacidade de se fazer valet (market capacity) ¢ estado de consciéncia; — diferenciagao residencial significa acesso diferenciado a recursos necessérios para adqulrir oportunidades de ascen- so social. As oportunidades, como educagdo, podem estar estruturadas de modo que um bairro de classe operaria se- Ja “teproduzido" em outro bairro ou no mesmo baitro na pro xima geragéo. A diferenciagao social produz comunidades distintas com valores préprios do grupo, valores estes profun: damente ligados aos cédigos moral, lingJistico, cognitivo, & que fazem parte do equipamento conceitual com 0 qual o in- dividuo “enfrenta” o mundo. A estabilidade de um bairro dos seus sistemas de valores leva & reprodugao e permanén- cia de grupos sociais dentro de estruturas residenciais; — segregagao significa diferencial de renda real — proximi dade as facilidades de vida urbana, como agua, esgoto, areas, verdes, melhores servigos educacionais etc., e auséncia de proximidade aos custos da cidade, como crime, servigos edu- cacionais inferiores, auséncla de infraestrutura etc. Se |é ha diferenga de renda monetaria, a localizagao residencial pode implicar diferenga ainda maior no que diz respeito & renda real. « Em resumo, a segregapao residencial pode ser vista co- mo um meio de reprodugo social, € neste sentido 0 espa- 0 social age como um elemento condicionador sobre a so- ciedade! Neste sentido, enquanto o lugar de trabalho, fabri- cas ¢ escritérios, constitui-se no local de produgao, as resi- déncias e os bairros, definidos como unidades territoriais € sociais, constituem-se no local de reprodugdo. Assim, a segregaco residencial significa ndo apenas um meio de privilégios para a classe dominante, mas tam- bém um meio de controle e de reprodugao social para o futuro. Os padres espaciais A segregacio residencial implica necessariamente em separago espacial das diferentes classes sociais fragmenta- das. A separagdo, por sua vez, origina padrdes espaciais, ou seja, as Areas sociais que emergem da segregacdo estdo dispostas espacialmente segundo uma certa légica, e nao de modo aleatério. Quais sao os padrdes espaciais da segre- gacdo? Existem trés padrdes de segregacdo residencial que so conhecidos pelos nomes daqueles que formalizaram evidén- cias empiricas sobre a distribuigao espacial das classes so- ciais e suas fragdes na cidade: so os denominados mode- los de Kohl, de Burgess e de Hoyt. A figura 3 descreve- os de modo muito simplificado. Vejamos cada um deles. O primeiro modelo de segregacdo foi, possivelmente, aquele formulado em 184i pelo gedgrafo alemao J. G. Kohl. Generalizou ele a maneira como os grupos sociais es- tavam distribuidos nas cidades da Europa continental, nu- ma época ent que os efeitos do capitalismo sobre a organi- zag&o espacial nao se faziam sentir plenamente: tratava-se, em realidade, da cidade pré-industrial. Segundo Kohl a cidade era marcada pela segregacdo da elite junto ao centro, enquanto na periferia viviam os po- 44 Ver, entre outros, Benny, B. J. L. The human consequences of urbani- zation. New York, Saint Martin's Press, 1973. ee FIG.3- ESQUEMAS CLASSICOS DE SEGREGAGAO RESIDENCIAL @) Esquema de Kohl (simplificado) 3 b) Esquema de Burgess (simplificado) ey ©) Esquema de Hoyt (simplificado) T= alto 2- médio Status Social 3~_baixo ee bres. A ldgica deste padtdo residia no fato de que, na meta de do século XIX, assim como anteriormente, a mobilida de intra urbana era muito limitada e a localizagao junto ao centro da cidade constituia uma necessidade para a eli te porque ali se localizavam as mais importantes institui des urbanas: o governo, através do palacio, a Igreja, as instituigdes financeiras € 0 comércio a longa disténcia. A lo calizacdo central da élite se devia, pois, a uma questao de acessibilidade as fontes de poder e de prestigio. Ha numerosas evidéncias empiricas da ocorréncia de> te padrao de segregagdo residencial: cidades africanas do periodo colonial, Moscou no final do século XIX, cidades da América Latina no periodo do colonial ¢ ainda atual mente, no sul dos Estados Unidos anteriormente a Guerra de Secessao ete Com base nas grandes cidades norte-americanas da dé cada de 1920, E. W. Burgess generaliza um padrao de seare gacdo residencial em que os pobres residem no centro e a elite na periferia da cidade, em apraziveis subtirbios. A lite, a partir do momento em que se inicia 0 proces. so de centralizacdo, comeca progressivamente a abandonar suas residéncias centralmente localizadas, indo residir na pe riferia. As areas residenciais localizadas no centro sao des valorizadas e ocupadas por familias e pessoas solteiras, imi grantes recentemente chegados a cidade, que alugam resi déncias ou quartos em iméveis que, na maioria dos casos, tornam-se fortemente deteriorados. E conveniente lembrar que na década de 1840 Engels descrevera a mesma situagdo para a grande cidade inglesa Retomaremos este ponto em breve Trata-se, portanto, de uma evolugao na qual a cidade deserita por Kohl passa, com a fase industrial do capitalis. mo, para uma organizagao espacial da segregacdo de acor- do com o que foi descrito por Burgess. Ter-se-ia, assim, uma seqiéncia evolutiva da organizagao espacial da cida- de. Esta evolugao tem sido um ponto polémico entre os es- tudiosos do espago urbano. ‘A polémica, contudo, ¢ em parte minimizada pelo apa recimento, em 1939, do modelo de Hoyt, um economista norte-americano. Segundo ele a segregagao espacial assui- mia nao um padr&o em circulos em torno do centro, mas em setores a partir do centro. As areas residenciais de alto ‘status localizam-se no setor de maiores amenidades, achan do-se cercadas pelos setores de populagao de médio status. Diametralmente oposto encontra-se um amplo setor habita. do pela populagio de baixo status. ‘A logica do modelo de Hoyt est na tendéncia auto-se- gregativa da populagao de alto starus, que se expande a0 ongo de um eixo de circulacdo que corta as melhores areas da cidade, de onde entao pode exercer um efetivo controle de seu territorio. A partir de sua agao. estabelecem-se os de mais grupos sociais em outros setores. Dinamica espacial da segregacao O segundo processo relativo & existencia € reprodugio das classes sociais é 0 que se refere a mutabilidade da segre- gacdo. Vamos chamé-lo de dindmica espacial da segregagiio Seu correspondente no Ambito da Escola de Chicago ¢ 0 processo de invasdo-sucessao. 'A segregacdo é dinamica, envolwendo espago & tempo, ¢ este processo de fazer e refazer pode ser mais rapide ou mais lento, de modo que uma fotografia, um padrao espa- cial, pode permanecer por um longo periodo de tempo ou mudar rapidamente. A dindmica da segregacao, no entanto, é propria do capitalismo, n&0 sendo tipica da cidade pré-ca- pitalista, caracterizada por forte imobilismo sdcio-espacial 'A questo do fazer e refazer da segregagao foi coloca- da em 1844 por Engels em relagao a cidade inglesa. Mostra ele que os bairros ricos em torno do centro tradicional, en- to em expansio, séo abandonados pela elite que vai resi- dir na periferia, em novas residéncias, enquanto as man- ses do centro so ocupadas por imigrantes pobres, recém- chegados, que vao trabalhar nas novas atividades central- mente localizadas. Verifica-se uma progressiva deterioracao destas mansdes que se transformam em fétidos cortigos densamente ocupados. Esta mesma questo é considerada por David Ward’ ao analisar as cidades norte-americanas no periodo de 1840-1920, quando se da a formacdo dos gue- tos de imigrantes em antigas dreas residenciais nobres jun- to ao centro: guetos de irlandeses, italianos, alemaes, polo- neses, judeus € negros. No caso carioca, Abreu e Rocha & Carvalho mostram também a mesma dinamica a partir da segunda metade do século XIX, Em resumo, a segregacdo tem um dinamismo onde uma determinada area social é habitada durante um perio- do de tempo por um grupo social e, a partir de um dado momento, por outro grupo de status inferior ou, em alguns casos, superior, através do processo de renovacdo urbana. , Mobilidade e segregagao A dinamica espacial da segregagdo gerou, de um lado, aquilo que a literatura registra como sendo a “‘zona em tran. sigdo”’, drea de obsolescéncia em torno do nticleo central, também denominada de ‘‘zona periférica do centro”. A ex- presso ‘zona em transig4o”’, contudo, ndo é mais justificd- vel. Elaborada no ambito da Escola de Chicago, estava ba- seada na expectativa que tinham os proprietarios de imé- veis de, mais cedo ou mais tarde, sofrerem o impacto da ex- pansio do niicleo central, substituindo-os por prédios co- merciais. Enquanto isto nao ocorria, os iméveis eram aluga- '5 In: BOURNE, L., 1971 ¢ 1982, dos aos imigrantes; ndo compensava conservé-los, 0 que ge- rava uma rapida deterioracao'®, A expansao horizontal do nticleo central, no entanto, parou, como ja se indicou anteriormente. O processo de descentralizacao implicou que as atividades como que pulas- sem do nticleo central para dreas mais distantes: a deman- da de espaco na zona em transi¢éo parou. O uso residen- cial com base em uma populacdo de baixo status social e a deterioracdo fisica da area estigmatizaram-na, criando uma imagem de pobreza, vicio e crime. Nao se trata mais de uma zona em transi¢ao, mas sim de uma zona cristaliza- da. Na cidade do Rio de Janeiro os bairros da Lapa, Gam- boa ¢ Satide so exemplos de dreas que passaram pelo pro- cesso acima descrito. De outro lado, a dinamica espacial da segregagao ge- rou novos bairros habitados pelos grupos sociais de alto status. Estes grupos constituem a demanda solvavel para © capital imobilidrio, a eles interessando produzir novos bairros dotados de novos valores de uso, de novas ameni- dades. Reproduz-se assim, através de novas formas, no- vas dreas sociais, segregadas e dotadas de “‘novos estilos de vida’. A figura 4 procura dar conta desta dupla dimenséo da dinamica da segregasao. Refere-se a cidade latino-ameri- cana em geral. Primeiramente indica-se 0 abandono do cen- tro e de suas proximidades pela populacdo de alto status: um setor dotado de amenidades ¢ entdo ocupado. A expan- sio espacial do grupo de alto status, incentivada pelos inte- resses fundidrios e imobilidrios, produz novos bairros seleti- vos ao longo do mesmo setor. Em realidade a dinamica da segregacdo, no que se refere aos grupos de status, signi- fica uma mudanga da estrutura da segregacdo do padrao in- dicado por Koh! para um identificado por Hoyt. ' Grirrin, D, W. & PRESTON, R. E. A restatement ofthe ‘transition zone” concept. Annals of the Association of American Geographers, 56(1), 1966. Em segundo lugar, a figura 4 indica a mobilidade da po- pulacao de baixo status. Da zona rural ou de pequenas cida- | des para a Area Central abandonada pela elite, Neste senti Hl do, € em relagdo a esta area da cidade, passa-se do padrao in- i dicado por Kohl para aquele apontado por Engels e transfor- mado em modelo por Burgess. A zona periférica do centro, contudo, nao se constitui para sempre em receptaculo de cor- rentes migratérias de populagdo de baixo status, Medidas de renovagio urbana, por exemplo, podem encerrar este pa. pel. No caso das cidades brasileiras, como se exemplifica com © Rio de Janeiro, as favelas transformaram-se, em uma fa. se posterior, em receptaculo dos imigrantes ¢ em local de relo- calizagdo daqueles expulsos das areas centrais renovadas, A periferia da cidade, local da populagao de baixo sta- tus social, ratifica, em um momento posterior, este seu pa- statu pel: € 0 locus de correntes migratérias da zona rural ¢ de pequenas cidades, bem como de grupos provenientes de an tigas periferias da cidade, agora valorizadas e que, por is- so mesmo, eliminam parte de seus moradores. E, em parte, através deste proceso que se expande o espago urbano ao longo da periferia popular, sem amenidades FIG.4— DOIS ESQUEMAS DA DINAMIGA _ESPACIAL DA SEGREGAGAO a) Relative ao Grupo de Alto Status b) Relativo ao Grupo de Baixo BC — sainny cenrnac 0 padrao latino-americano ea Os trés padrdes anteriormente comemados, de Kohl, annne or Burgess e Hoyt, podem ser vistos, em realidade, como pos- AMENIDADES 2 sibilidades tedricas, ¢ néo como padrées, caracterizados ca- Pearce, da um pela exclusividade descritiva da realidade urbana Nenhum exclui o outro, podendo conviver entre si, configu- rando o mesmo espago urbano. Cada um deles, contudo, pode também ocorrer em sua plenitude relativa, como foi 1,203-eraras on nosition eae R= x0"s muna © caso sobretudo do padrao identificado por Kohl, que (Co omnis oA croAve - marcou, por muito tempo, numa fase pré-industrial, a orga, : nizagio espacial intra-urbana. Amen cENTRAL © seu ‘A coexisténcia dos trés padrdes aparece claramente na grande cidade latino-americana. A este respeito o trabalho de Yujnovsky é notdvel. Segundo ele a cidade da América 1La- tina passou por trés periods, O primeiro estende-se do sécu- lo XVI até por volta de 1850: trata-se, genericamente, do pe- riodo colonial. A cidade apresentava uma configuragao de acordo com 0 padrao identificado por Kohl, com a elite resi- dindo junto ao centro. A segregagao esta fundamentada ¢ le- gitimada pela Lei das Indias, que contém, entre outros aspec- tos, como deve ser a organizagao sécio-espacial da cidade. O segundo periodo estende-se de mais ou menos 1850 a cerca de 1930. Com a independéncia e a expansdo das ati vidades de exportagao, as principais cidades foram afeta- das tanto em termos funcionais como sociais e espaciais. De um lado emerge uma classe média e firma-se uma clas- se dominante vinculada a propriedade da terra, ao grande comércio e, em muitos casos, a nascente indiistria. De ou- tro, verifica-se uma redugo da fricgdo da distancia, gracas a introdugao de bondes e trens, que permitem o desenvolvi- mento de novas areas residenciais e a reformulagao de outras: (a) parte da elite transforma em residéncia permanente suas chacaras situadas na periferia; criam-se loteamentos “exclu- sivos”’ dotados de toda a infra-estrutura necesséria ¢ usos relacionados ao status da populacao, como parques, hipé- dromos, campos de golfe etc; (b) as correntes migratérias tendem a convergir para 0 cen- tro abandonado pela elite, ocupando as velhas manses ago- ra transformadas em cortigos; (©) aos diversos segmentos da classe média resta uma locali- zagao em certos setores da periferia ou em dreas nao distan- tes do centro. © periodo seguinte inicia-se em 1930 mais ou menos, € vé acentuar os setores preferenciais das populagées de sta- 1us. Ao mesmo tempo, 0 processo migratério se acentua, culminando num poderoso proceso de periferizagdo, com loteamentos populares ¢ autoconstrugao, ou na difusdo de conjuntos habitacionais, também periféricos, construidos pelo Estado. A expansdo das favelas ¢ também notavel. FIG.5 - ESQUEMA DA ORGANIZAGAO ESPACIAL DA CIDADE LATINO - AMERICANA (Adaptado de Mertins e Bahr, 1983) ZONA PERIFERICA 00. CENTRO f1x08 iMoUsTRIAIS © suscentnos aainnos 9E ALTO STATUS SOCIAL wéo1o varus so aaInRos OE BAKO STATUS socIAL TJ oraveua A figura 5, adaptada de Mertins & Bahr’”, procura re- tratar 0 padrao basico da organizacdo espacial da grande ci- dade latino-americana na segunda metade do século XX. Tra ta-se de um padrao complexo, que composta a concretizagao das varias possibilidades tedricas de organizagao do espaco Isto nos remete 4 questdo das relagdes entre processo ¢ forma espacial, bem como aquela da forga de permanén- cia de certas formas, da inércia espacial. Inércia e as areas cristalizadas “ O processo de inéreia atua na organizacdo espacial in- tra-urbana através da permanéncia de certos usos em certos locais, apesar de terem cessado as causas que no passado justificaram a localizacao deles. O proceso em questo vai traduzir-se na preservagao simultdnea da forma e do conteti- do, € néo apenas da forma com mudanga do contetido, pois isto seria, em realidade, o processo de substituigZo ou invasdo-sucessdo. * ) As razOes fundamentais da preservagéo da forma ¢ do contetido sao, entre outras, as seguintes: # (a) uma relocalizagao poderia implicar custos elevados, 0s ganhos adicionais de nova localizagéo nao justificando os riscos do novo investimento; = (b) a.criagdo de novos fatores de permanéneia através do aparecimento de economias de aglomeragao, pela criagdo de unidades de produgdo e servigos situadas & montante ow & ju- sante da unidade em questdo, garantindo vantagens outras que nao aquelas existentes quando da implantacdo original; (c) pela inexisténcia de conflitos com outros possiveis usua- rigs do solo urbano em torno, ou pretendentes aquela por- MerTINs, G. & BAHR, J. Un modelo de la diferenciacién socio-espacial, de las metropolis de América Latina, Revista Geogrdfica, 98, 1983, cao do espaco, ou pelo fato de que os outros usuarios nao detém poder para forgar a remocao daquela unidade; (d) pela forga de sentimentos e simbolismo que se atribui as formas espaciais ¢ a0 seu contetido. Vamos considerar apenas esta tiltima razdo que nos re- mete a esfera do baitro, do cotidiano, ao espaco residen- cial, que envolve a existéncia ¢ a reprodueao dos grupos sociais, Antes, contudo, uma tinica observagio. A inércia, mais do que os outros processos, é marcada por um forte relativismo, A permanéncia de um dado uso do solo pode nos parecer a cristalizagdo daquele uso quando, em realida- de, trata-se de um muito lento processo de mudanca, difi- cil de ser percebido pelo pesquisador em um dado momen- to do tempo. Vinte anos depois um novo pesquisador cons- tata que houve uma profunda mudanga nos tiltimas cinco anos: para ele, nao se trata de um processo de inércia. E preciso, pois, ter muito cuidado quando o processo em pau. ta for abordado.* Vejamos a forca dos sentimentos ¢ simbolismo como fator de inércia e da existéncia de areas cristalizadas. Consi- deraremos o estudo de Walter Firey'® sobre a Area Central de Boston, realizado na década de 1940. Firey argumenta que simbolos ¢ sentimentos sao varidveis que afetam 0 uso da terra, ¢ que 0 espaco nao tem apenas atributos econdmi cos como acessibilidade € amenidades, mas que possui um outro atributo, o de ser, em certas circunsténcias, simbolo de determinados valores culturais que ali se acham associados. Trés areas no centro de Boston séo entdo estudadas: © bairro de Beacon Hill, 0 chamado Boston Common, os cemitérios e o bairro de North End, onde a forga de inércia € muito forte © bairro de Beacon Hill ¢ habitado por uma popula- go de alto status. Dista, no entanto, apenas cinco minutos 1 In: THEODORSON, G. A., 1974. a pé do miicleo central de Boston, estando contiguo a areas deterioradas. E um bairro antigo, do comego do século XIX, situando-se sobre umia colitta com ruas tortuosas. Foi area residencial de elite da cidade e ainda conservava esta tradi- 40 quando Firey 0 estudou. © impacto de sentimentos estéticos, histéricos e fami- liares aparecem na sua preservagao através de trés modos: (a) Retengao. E 0 unico bairro préximo do micleo central que desde o final do século XIX apresentou aumento do nt mero de pessoas de alto status; os demais bairros centrais tornaram-se areas sociais de baixo status e deterioradas fisi- camente. (b) Atragao. As pessoas do bairro passaram a comprar as casas que eram vendidas, reformando-as, mantendo a apa- réncia exterior, e revendendo-as para familias de alto status. (c) Resisténcia. Criagdo de Associacdo para evitar e impe- dir a mudanga do uso do solo, como uso comercial e a cons- trugdo de prédios de apartamentos A forga dos sentimentos é muito forte ¢ se opde a ra- cionalidade econémica vigente: assim, a venda das casas e a mudanga do uso do solo poderiam ser altamente lucrati- vas para os proprietatios do bairro. No distrito central de negdcios de Boston, existe uma rea ai encravada com cerca de 22 hectares, € que no passa- do foi terreno de uso comum para pastagens e campo de treinamento militar. Na época do estudo de Firey, estava cercado por ruas de comércio varejista, com iméveis de al- to prego, O Boston Common, um parque, impede o trafe- go ca expansao do distrito varejista. Sua permanéncia, con- tudo, é garantida por dispositivos legais. Em relago aos cemitérios, no centro de Boston ha trés que datam do periodo colonial, A localizacdo deles in- terrompe a continuidade de lojas comerciais. Sao preserva- dos; ali estéo enterrados membros das familias mais tradi- cionais da cidade. © bairro de North End constitui uma area deteriora- da, sendo © gueto italiano. Seus habitantes mais antigos, naturais da Italia, nao se mudam porque o bairro represen- ta uma série de valores. E muitos deles teriam condigdes de fazé-lo. Os filhos, no entanto, sob influéncia cultural di- ferente mudam-se para outras dreas da cidade. Um comentario deve ser feito. Admitimos que nos ca- sos de Beacon Hill, do Boston Common e dos cemitérios coloniais, trata-se de valores burgueses, da classe dominan- te, que impoe a preservacdo de determinados usos da terra em funcao de sentimentos e simbolismos seus ¢ que sao di- fundidos e aceitos como de todos. No caso de North End, trata-se de um modelo de preservagao que traduz um senti- mento de nostalgia do pais de origem, enquanto nos dois outros casos, de um sentimento que representa 0 poder, 0 status de uma classe dominante, de sua tradigao, ¢ que se traduz na manutengdo de simbolos do passado, de formas espaciais cujo contetido nao se quer mudar; no caso de North End se quer preservar sobretudo 0 contetido, pois a forma ja esta deteriorada, j4 mudou. Eis um tema para investigacdo que parece ser extrema- mente promissor. Introduz 0 pesquisador em uma outra di- mensao da apreensdo da natureza e significado do espaco urbano, rompendo com uma interpretagéo economicista, que via de regra permeia muitas de nossas analises. 5 Consideragées finais Vamos finalizar este trabalho apresentando algumas questées para pesquisa. Est4o organizadas em dois grandes locos. O primeiro refere-se aos agentes modeladores do es- paco urbano, e o segundo aos processos e formas espaciais. Em relacao aos proprietarios dos meios de producao, proprietarios fundidrios, promotores imobilidrios, Estado € grupos sociais excluidos, hd uma unica questdo geral que €a seguinte: — Que estratégias e praticas desempenha cada um dos agen- tes nos diferentes tipos e tamanhos de cidades? Esta ques- to envolve a agéio dos agentes em:cidades industriais, portudrias, centros metropolitanos e centros regionais, entre outros tipos, bem como ntcleos urbanos de diferen- tes dimensoes tanto demografica como de renda. Face ao segundo bloco indica-se 0 seguinte conjunto de questdes: — Que diferencas na organizacao do espaco urbano existem em cidades de diversos tamanhos? Estas diferengas de- vem referir-se & intensidade dos processos espaciais ¢ natureza das fungdes € formas espaciais. Questiona-se, pois, sobre a natureza da Area Central nos diferentes ta- manhos de cidade, sobre 0 proceso de descentralizagao € as formas espaciais derivadas, bem como sobre as areas sociais. A guisa de exemplo, até que tamanho de cidade e sob que condigdes a elite permanece residindo junto a0 centro? — Que relagdes existe entre os diversos tipos funcionais de cidade e a organizacao espacial? Assim, por exemplo, como esta espacialmente organizada uma grande cidade industrial, um centro portuario, uma cidade onde é sig- nificativa a drenagem da renda fundidria do campo etc.? Que processos espaciais ocorrem em cada um dos dife- rentes tipos funcionais da cidade? — E significative também considerar as diferengas de orga- nizagdo espacial de cidades com diferentes taxas de cres- cimento demografico. Quais so as implicagdes deste fa- to? Em relagdo a esta qpesto 0 Brasil tem numerosos exemplos de-cidades na ““fronteira agricola”” que apresen- tam taxas de crescimento muito elevadas, Eis uma longa tarefa cuja realizagao certamente contri- buird para uma melhor compreensao da cidade e, por con- seguinte, da sociedade brasileira, Este é, sem diivida, um passo importante. 6 Vocabulario critico Escola de Chicago: trata-se de uma corrente da sociologia norte-americana também conhecida como Escola de Eco- logia Humana, Nasce na Universidade de Chicago com Robert Ezra Park. O artigo “‘A cidade: sugestdes para a investigagge do comportamento humano no meio urba- no” — publicado em O fenémeno urbano (Rio de Janei- 10, Zahar, 1967), organizado por Otavio G. Velho, pu- blicado originalmente em 1916 — € 0 marco inicial des- ta corrente. Constitui uma tentativa de transposigao dos princi- pios basicos da ecologia vegetal para 0 urbano: competi- do, em razio da luta pela sobrevivéncia; dominacao, dos mais adaptados ao meio ambiente; € sucesso, subs- tituigao de um grupo por outro-no espago. Neste senti- do é uma interpretacdo naturalista da sociedade e de seu espaco. A Escola de Chicago é exemplo de aplicacdo do darwinismo social de Herbert Spencer, onde a ideia de equilibrio social e espacial é parte do idedrio. Entre seus maiores expoentes esto Ernest Burgess ¢ Roderick Mckenzie, As numerosas criticas 4 Escola de Chicago sao plenamente justificadas. Contudo, a contribuigéo de- xs la enorme ¢ passivel de ser recuperada criticamente: 08 conceitos de centralizagdo, descentralizacao segrega- 40, entre outros, foram desenvolvidos pelos ecologistas humanos, ¢ ainda hoje sao considerados pelas diversas correntes que abordam o espago urbano. Externalidades: efeitos econémicos sobre as empresas e ati- vidades decorrentes da agao de elementos externos a elas. A localizagao junto a um né de tréfego confere maior acessibilidade. A co-presenga de outras empresas em um mesmo local cria uma escala que uma tnica empre sa ndo teria: fala-se entdo em economias externas de es- cala ou economias de aglomeracao. A cidade como um todo ¢ um exemplo de economias de aglomeracao. Do mesmo modo a Area Central, um shopping center, um distrito industrial, ou uma rua especializada na venda de autopecas, moveis ou confeccdes. Organizagdo espacial: igual a arranjo espacial, configura gao espacial, estrutura territorial e espago socialmente produzida. E 0 conjunto de objetos ou formas espaciais ctiados pelo homem ao longo da Historia — campos, ca- minhos, minas, dutos, fabricas, lojas, habitagdes, tem- plos, cidade, rede urbana etc. — e dispostos sobre a su- perficie da terra. E a natureza transformada pelo traba- Iho social, de acordo com as possibilidades concretas que cada sociedade tem de transforméd-la e que derivam do desenvolvimento das forgas produtivas ¢ das relagdes sociais de produgdo. Cada sociedade organiza o seu espa- go segundo uma légica que Ihe é inerente. Pode-se assim falar de organizagao espacial feudal e capitalista, como também daquelas vinculadas 4 agricultura, indistria, ao comércio varejista etc. Ver, sobre 0 assunto, Regido e organizacdo espacial (SAo Paulo, Atica, 1986, Série Principios, n. 53), de Roberto Lobato Corréa. Renda da terra: constitui-se na remunerago que se obtém em razdo de: (a) propriedade da terra, que autoriza a0 proprietario extrair uma remuneragao, independentemen- te de qualquer outra coisa: trata-se da renda absoluta; (b) localizagdes privilegiadas que incidem na diminuicao dos custos de producao em razao, por exemplo, da pro- ximidade do porto ou de vias ferrovidrias, ou no aumen- to das vendas pela localizacdo junto ao.centro ou subcen- tros comerciais intra-urbanos: trata-se da renda diferen- cial, que implica superlucro; (¢) localizagdes seletivas, por exemplo, em areas de amenidades, gue possuem ¢ conferem status a0 seu possuidor: trata-se da renda de monopélio, que implica também em superlucro. Sobre © assunto, que € rico em controvérsias, ver, entre outros “Urban ground rent: building a new conceptual frame- work"’ (Antipode, 6 (1), 1974), de Richard Walker e “‘No- tas sobre a renda da terra urbana’? (Chdo, 5, 1979), de Luis Cézar Queiroz Ribeiro. Valor de Uso ¢ Valor de Trocw: conceitos classicos da econo mia politica que foram retrabathados por Marx enrique- cendo-os. Cada mercadoria tem, na sociedade capitalis- ta, um duplo aspecto no que se refere 20 valor. Possui um valor de uso ¢ um valor de troca, O primeiro esta re- lacionado a esfera do consumo e o segundo a da circula- 40, Estes dois conceitos, no entanto, estao dialeticamen- te relacionados entre si: ¢ somente através da troca no mercado que uma mercadoria realiza plenamente seu va lor de uso. Ver sobre o assunto David Harvey, A justi- ¢a social e a cidade, que discute os coneeitos, aplicando- os a terra urbana. 7 Bibliografia comentada A bibliografia esta dividida em duas partes. A primei- ra refere-se as obras gerais, abrangendo tanto contribuigdes tedricas como estudos de casos fora do Brasil. Inclui obras de um tinico autor e coletaneas. A segunda parte diz respei- to aos estudos sobre 0 espago urbano das cidades brasilei- ras. Em nenhuma das partes a bibliografia € exaustiva, Geral BEAUJEU-GARNIER, Jacqueline & CHABOT, Georges. Thaité de géographie urbaine. Paris, Armand Colin, 1963. Livro-texto, considera o plano e a extensdo do espago ur- bano, e a vida na cidade. BERRY, Brian J. L. & HoRTON, Frank E., orgs. Geogra- phic perspectives on urban systems. Englewood Cliffs, Prentice-Hall, 1970. Coletanea de artigos no Ambito da ‘nova’? geografia. Contém numerosos estudos sobre a organizacao espacial da cidade, considerando a distribuigao das densidades de- mogrAficas intra-urbanas, as areas sociais, a mobilidade residencial, a localizagdo das atividades tercidrias e in- dustriais, e a circulagao. Bourne, Larry S., org. Internal structure of the city. To ronto, Oxford University, 1971 e 1982/2. ed, muito mo- dificada. Coletdnea de artigos sobre o espaco urbano. A aborda- gem é na linha da “nova’’ geografia. Contém numero- sos artigos sobre os diversos padrdes de uso da terra, 0s processos determinantes, e os problemas do espaco ur- bano CARTER, Harold. The study of urban geography. London, Edward Arnold, 1972. Livro-texto, possui capitulos onde so abordados o pla- no urbano, os modelos classicos de uso da terra — Bur- gess, Hoyt e Harris-Ullman —, 0 distrito central de negd- cios, as areas residenciais, a periferia rural-urbana e a lo- calizagao industrial intra-urbana. CASTELLS, Manuel, org. Estructura de classes y politica ur- bana en América Latina, Buenos Aires, SIAP, 1974. Coletanea de artigos sobre as relagdes entre classes so- ciais, conflitos de classes, politica publica, habitagao po- pular ¢ 0 espago urbano. CASTELLS, Manuel. A questo urbana. Trad. de Arlene Caetano, Rio de Janeiro, Paz Terra, 1983. A obra de Castells constitui-se em um marco fundamen- tal da literatura sobre o espago urbano, referéncia basi ca para quem estuda a cidade em uma abordagem criti- ca. De especial interesse é a terceira parte do livro, “A estrutura urbana’, bem como a quarta, sobre a politica urbana: em ambas a questdo espacial ¢ tratada. ——. La ciudad y las masas; sociologia de los movimien- tos sociales urbanos, Madrid, Alianza, 1986. Estudo de avaliagdéo dos movimentos sociais urbanos. Contém um histérico da questao e varios estudos de ca- sos: 0s grandes conjuntos habitacionais de Paris, 0s mo vimentos sociais de San Francisco, os pobladores na ‘América Latina, e 0 caso de Madri. O autor finaliza com uma discussdo teorica sobre 0 tema. CLARK, David. Introdugdo a geografia urbana. Trad. de Lu cia Helena de Oliveira Gerardi e Silvana Maria Pintau di. Sao Paulo, Difel, 1985. Livro-texto, contém um excelente capitulo, ‘A estrutu- ra interna da cidade", onde o autor analisa as diferentes abordagens com que 0 espaco urbano tem sido analisado. Dear, Michael & ScorT, Allen J., orgs. Urbanization and urban planning in capitalist society, Londres, Methuen, 1981 Coletanea de artigos que criticamente abordam, entre ou- tros temas, 0 espago urbano: a teoria da acumulasao, 0 Estado capitalista, a terra urbana, estéo entre os temas abordados. DuRAND-LASSERVE, Alain, org. La croissance peripherique des villes du Tiers Monde. Le réle de la promotion fon ciere et immobilitre. Travaux et Documents de Géogra phie Tropicale, 40, Ceget, 1980. Coletanea de artigos sobre o papel dos agentes modelado- res do espago urbano no crescimento das cidades. Os es- tudos referem-se & América Latina, Caribe, Africa, Asia e Oceania, ENGELS, Friedrich. A situacdo da classe trabalhadora na In glaterra. Porto, Apontamento, 1975. Obra classica, descreve as condigdes de vida do operaria. do inglés na década de 1840. Contém uma excelente des- ctigdo ¢ explicagéo das mudangas do contetido social da area central da cidade inglesa, abordando uma tema- tica que seria, cerca de oitenta_anos depois, tratada com outro enfoque por E. Burgess. Leitura fundamental. FarreT, Ricardo L., org. © espaco da cidade. Sao Paulo, Projeto Editores Associados, 1985. Coletnea de artigos sobre 0 espago urbano. Contém uma andlise das abordagens com que cada disciplina tra- ta 0 espago urbano, e outra sobre os paradigmas que norteiam a concepcao de espago; a renda da terra e ar- quitetura ¢ estruturagao social so os outros artigos que compéem o livro em questao. FOLIN, Marino, La ciudad del capital y otros escritos. Mé- xico, G. Gili, 1977. © autor, um urbanista, aborda criticamente a cidade, considerando-a como um produto do capitalismo: é capi- tal fixo, respondendo a légica da exploragdo capitalista © a luta de classes. A forma da cidade é discutida a par tir de proposigdes anteriores, como a de Burgess. Fort, Reginaldo, org. Marxismo e urbanismo capitalista. Sao Paulo, Cigncias Humanas, 1979 Coletnea de artigos sobre temas como 0 papel do Esta- do, a renda da terra e 0 ciclo de reprodugao do capital imobiliario. GEORGE, Pierre. Geografia urbana, Trad. coordenada por Liliana Lagana Fernandes. Sao Paulo, Difel, 1983. Livro-texto, apresenta capitulos sobre a forma, desenvol- vimento e estrutura das cidades. Harvey, David. Society, the city and the space-economy of urbanism. Resource Paper, 18, Association of Ameri- can Geographers, 1972. Neste estudo, Harvey analisa 0 espaco urbano como o foco onde o excedente & gerado e apropriado: 0 lugar da residéncia ¢ privilegiado. A justica social ea cidade. Trad. de Armando Cor- reia da Silva. Sao Paulo, Hucitec, 1980. Coletanea de artigos do autor. Trata-se, juntamente com © livro de Castells, de um dos marcos fundamentais da literatura sobre o espago urbano, dentro de uma visdo critica. De especial importancia sao os artigos sobre re- distribuicdo da renda na cidade e as relagdes entre valor de uso, valor de troca e 0 espaco urbano. KNox, Paul. Urban social geography; an introduction. Lon- dres, Longman, 1982. A cidade é abordada a partir de um posicionamento eclé. tico, onde estfio presentes uma abordagem quantitativa e descritiva, apoiada na economia neoclassica e na socio- logia funcionalista, uma abordagem behaviorista, e uma outra definida como radical. A questdo habitacional é en- fatizada pelo autor. Leréavre, Henri. La production de l’espace. Paris, Maspe- 10, 1974, Outra contribuigao importante para se pensar criticamen- te 0 espago urbano. ___. Espacio y politica. Barcelona, Ediciones Peninsula, 1976. A visio critica do espago urbano tem em Lefébvre o seu maior teérico. No livro em tela sobressaem os capitulos “0 espago, a produgdo do espago, a economia politica do espago”’ e outros, sobre as relagdes entre burguesia, classe operdria e espaco. LoiKINE, Jean, O Estado capitalista e a questdo urbana. Trad. de Estela dos Santos Abreu. Séo Paulo, Martins Fontes, 1981. O autor analisa as relagdes entre a politica urbana e a se- gregagdo social, a luta de classes e os movimentos sociais urbanos. Mayer, Harold & KOHN, Clyde F., orgs. Readings in urban geography. Chicago, University of Chicago, 1959. Coletdnea de artigos, incluindo numerosos sobre 0 espa- 0 urbano, entre eles os de Hoyt (parcial) e 0 de Harris e Ullman, ROCH, Fernando & GUERRA, Felipe. ¢Especulacién del suelo? Madrid, Nuestra Cultura, 1979. Osautores, urbanistas criticos, analisam 0 papel dos agen- tes da produedo imobilidria capitalista — proprietarios do solo, promotores imobilidrios, as empresas de constru- ¢A0 € 08 usuirios — . 0 problema do solo urbano ea res- pectiva politica SANTOS, Milton. Manual de geografia urbana, S40 Paulo Hucitec, 1981 Livro-texto, possui uma parte relativa ao espago inter- no da cidade. A importancia da obra esta, em parte no fato de tratar-se de um estudo focalizado nos paises subdesenvolvidos, ScorT, Allen J. The urban land nexus and the State, Lon dres, Pion, 1980. Contribuigao na linha marxista sobre o espago urbano. O autor enfatiza a questo da ¢erra na cidade, a produ- cdo e reprodugao do espago urbano e o papel do Esta- do no planejamento capitalista. SCHWiIRIAN, Kent P., org. Comparative urban structure. Studies in the ecology of cities. Lexington, D. C. Heath Company, 1974. Coletanea de estudos sobre 0 espago urbano, envolven- do temas como a franja metropolitana, as densidades ur- banas, os fatores da organizacao espacial e a segregacao residencial. THEODORSON, G. A., org. Estudios de ecologia humana. Barcelona, Labor, 1974. 2 v. Coletanea de artigos no ambito da Escola de Ecologia Humana, Contém numerosos estudos clissicos a respel- to do espaco urbano como uma formulacao geral de Ro- bert Park, a classica e polémica proposicao de E. Bur- gess, € artigos de R. Mckenzie, H. Zorbaugh e P. Hatt. As criticas e novas proposigdes, internas a ecologia hu- mana, aparecem através das contribuigdes de A. Hawley, E, Shevky, W. Bell, O. Duncan e W. Firey. Timms, D. W. G. The urban mosaic; towards a theory of residential differentiation. Cambridge, Cambridge Uni- versity, 1971. O estudo focaliza a questao da diferenciagdo residencial a partir da teoria das areas sociais/ecologia fatorial TOPALOV, Christian. La urbanizacion capitalista; algunos elementos para su anélisis. México, Edicol, 1979 De acordo com um enfoque marxista o autor considera as relagdes entre urbanizacdo e reprodugao da forga de trabalho, as politicas publicas relativas aos equipamen- 108 coletivos, ¢ os sistemas de produgdo imobilidria. YUINOVSKY, Oscar. La estructura interna de la ciudad; caso latino-americano. Buenos Aires, Siap, 1971. Importante contribuigéo sobre a organizagao espacial da cidade fatino-americana. Particularmente relevante ¢ a periodizagao do espago urbano onde, em cada perio- do, ha um correspondente arranjo espacial. Sua leitura € de fundamental importancia Brasil Nao serao indicados artigos, que sao numerosos, mas apenas livros. ABREU, Mauricio de Almeida. Evolugdo urbana do Rio de Janeiro, Iplanrio, 1987 Excelente estudo sobre a dinamica urbana carioca, on de é privilegiada a estratificagao social do espago desde © comego do século passado até meados da década de 1960. E de fundamental importancia para quem se inte- ressar pelo tema da dindmica sécio-espacial do Rio de Ja- neiro. ASSOCIAGAO DOS GEOGRAFOS BRASILEIROS, 4 cidade de Sao Paulo, estudos de geografia urbana, Sio Paulo, Na ional, 1958. 4 v. Monumental obra sobre a metrépole paulista, redigida por varios gedgrafos. Trabalho de consulta obrigatéria para quem se interessar em estudar 0 espaco urbano de Sao Paulo. BERNARDES, Lysia M. C. & SOARES, Maria Therezinha S, Rio de Janeiro. Cidade e regidio. Rio de Janeiro, Secreta- ria Municipal de Cultura, 1987. Coletanea de artigos publicados durante as décadas de 1950 ¢ 1960, Contém um estudo sobre o sitio original da metrépole, outro sobre a expansao do espago urba. No, @ outros que abordam os bairros da cidade e a inte. gragdo da periferia a cidade. Constitui também leitura basica para os interessados na metropole carioca BLAY, Eva A., org. A luta pelo espago; textos de so urbana. Petrépolis, Vozes, 1978, Coletanea de artigos que enfatizam a questo habitacio nal para as camadas populares. Os estudos sao referen- tes as cidades de Sio Paulo, Rio de Janeiro, Porto Ale- gre e Brasilia CoRDEIRO, Helena K. O centro da meirdpole paulistana; expansao recente. Sao Paulo, Instituto de Geografia da USP, 1980. Estudo sobre a drea central de Sao Paulo onde a auto- ra mostra © desdobramento do centro em dois nticleos, um antigo ¢ outro nova, tendo como eixo a avenida Pau- lista. A zona em transigao ¢ também analisada. Obra de referencia basica, Duarte, Aluizio Capdeville, org. Area Central da cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, IBGE, 1967. Coletanea de contribuigdes sobre o centro da metrépole carioca. Destacam-se os estudos sobre as fungdes da area central e sua dinamica, a estrutura ¢ delimitacao es- pacial da mesma. Hé ainda um conjunto de anélises so- bre cada uma das funcdes do centro da metrépole, ¢ so- bre as comunicagées ¢ transportes. Obra de referencia baisica. LANGEMBUCH, Juergen R. Estruturacdo da Grande Séo Paulo, Rio de Janeiro, IBGE, 1971 logia Importante contribuigae para a compreensdo da estrutu ragdo do espaco paulistano, analisada desde 0 comeco do seculo XIX até a devada de 1960. MACHADO Da SILVA, Luis Antonio, org. Solo urbano; t6pi cos sobre o uso da terra. Rio de Janeiro, Zahar, 1981. Coletanea de artigos sobre o mercado de terras, a produ- a0 da habitagao, as politicas publicas e os conflitos vin culados a terra urbana. MARICATO, Erminia, org. A produgdo capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial. Sao Paulo, Alfa-Ome ga, 1979 Coletanea de artigos abordando as questdes da habita- 40 popular e o prego da terra em Sao Paulo. PAavIANi, Aldo, org. Brasilia, ideologia e realidade; espa- 0 urbano em questo. Sao Paulo, CNPq/Projeto Edito res Associados, 1985 Coletanea de artigos sobre a organizagao espacial da ca pital do pais. Trata-se de obra de seferéncia basica sobre Brasilia , org, Urbanizacdo e metropolizagdo. Brasilia, Univer- sidade de Brasilia, 1987 Coleténea de artigos sobre a organizacdo espacial da ca. pital federal. E também obra de referéncia basica sobre Brasilia. ROCHA, Oswaldo Porto & CARVALHO, Lia de Aquino, A era das demoligdes; habitagées populares. Rio de Janei- ro, Secretaria Municipal de Cultura, 1986. Trata-se de dois trabalhos abordando as transformacdes verificadas na Area Central do Rio de Janeiro entre 1870 a 1920. O primeiro reporta-se a reforma Passos, enquan to 0 segundo analisa a problematica dos cortigos e vilas operarias. SANTOS, Milton. O centro da cidade de Salvador. Salva- dor, Universidade da Bahia, {959 A Area Central da capital baiana é estudada a partir da formacao da cidade e evolucdo da regiéo. Segue-se uma andlise das fungdes do centro da cidade, ¢ 0 estudo da paisagem e da vida do centro, A estrutura urbana dos bairros centrais é o tema da ultima parte do trabalho. Tendo em vista as mudaneas verificadas na organizagao espacial de Salvador, esta obra adquire enorme importan- cia, pois retrata uma situacdo anterior ScHMIDT, Benicio V. O Estado e a politica urbana no Bra sil. Porto Alegre, Editora da Universidade, 1983 © autor considera a politica piiblica uma ago visando integrar programas de planejamento, investimentos, ins- titucionalizagao e mecanismos eleitorais. Importante con- tribuigao para a compreensao do papel do Estado na or- ganizacdo espacial da cidade brasileira. VALLADARES, Licia do Prado, org. Habitagdo em questao. Rio de Janeiro, Zahar, 1980 Coletanea de artigos sobre a questao da habitagao: auto- construcdo, loteamentos periféricos, favelas, vilas operd- rias e condominios. <_.. Repensando a habitagdo no Brasil. Rio de Janeiro, Zahar, 1982. Coleténea de artigos sobre 2 habitacdo, focalizando tan. to a habitaao popular como a destinada a classe média PRINCIPIOS a Se guntcs eporanie is Peat Monro ‘Wk imapan = sees elongate 20 Riga ero teers seach ts moran tere oto ech te do” Atta ne pan ogra Say Tt o moun sete te ba ~ ions Poth Ma Sten Gendo 8 Sind Mma Omen Uru ya ae +17, Srna ~ tim ence een = slo bh Henrik sons tans 2 mene | fet then tee Aor 9 39 Ota Cot 478 Ngee bu go ot x Amc irc Crofaswen © Coote Eng un 4k ti al Ape 2 3 mben "soso Cnr on 38 enn ua an fous emtrie= fc ioioa 425 Owmce ~ rp Rea = tO Gry + 2, A tise, | Sa ioe Seas eee Cemaeme ae Sit eres pa Tiacneeeeciecee Rie beeen pcan See tome | ieetecltarte. ani anes" Tasos» 61 eqrntfonies Wal ~ Woes =a te Muka Soma ® 2 Sow sateen Sth #9" Xam = a ina 2 Tea Cag poan e ‘ollie ~iegetce +8 apace iin ¢'amaaiggagim= Soe Soi (182198) = bas ane 8 Ce Dees nungen Eas ca Camo 2 Sam t 90 te oe ~ Ge be Cnt ‘Rota cree itera Beano Sum # &7 40) She ef, spt = sia € Sis te on Pin = Cro iraon nena 48 Mn ome so ~ ot ose SPE tt Lane cpr vo hrdene Shunt +51 nd Sa” Gs Etre liane ong eats th A gues ie Gros Se Nato = "OT de Yose Sonics Peabo Baim Moat Ae ng $3 Ft are ‘Monee Pome Nes velo 86 At dpe ~ Ut Hove ity Teena ose! 482 Campammr = Wu hess Oebron aces age Nagas 53 Rees pm eden" Se +88 Ee de tip — ott bio Conds Oops ia ev! Crean on 8 as ‘Mts "once oa Conays een ® i ansunempaa Unt cra wee hs Haves Scag ci 0 Dates raga cite ~ Cos ene «ede bry i ea Peta fas 2 Poem se 37 Cla dope” Pea 458 Ura ong anata Cont 5% Soto (soja dria oor 0 Nedenane ae ‘nari Lon tn» 61 Poem 8 ‘hemmtveinenl = Sn Sena ie hve or +0 a Cates (Cbrai Eve Zc + 6Gwa = Ft © pues 18 Cao he tera — Uk epmdigin fo Enc edo 20) 4 C8. Ae “Seared Canal cemns torn pts = Hal Coes oo ke #10 ‘man’s Once one tet ————_—— Fovma oie Cleared add Fi Sissi 0 Chores mento ts {lows Ove #2 Omer = Sse 1S Ombe aie Tete pea— iG Sues Te Snainenee' enone se Rae eae Bellow rns ‘tact osanaga is Gwe sta rn Sy es es renr 4. ee eninge Pit satan eden ase lo soe TE Feet ann — Sie Vis conaendh™hattmat”™ Texvar anes 3151 Seat pane how Sat 2 utp oat = hae & se ras ig 11: Din pens Se aes Caos Se, #12 Tae Cea a po Sobre ta Sst se Rade = er Ts Wenge 18 Come ‘euro br Emacs Can #18 feboe fe soim 10 inpe p fet irae os oO ls Pn — sien #52 mds Soe Siew hcaaes i) Guma e eens ge ase 13 Oman api Ena Birt - Fone orbn ~ Cs Snot Ge ena gon ema ~ 0 Ste wenn toa sot at fin pean Wc Nt Boirn coevice jet tessa tie tr seth dace ere tee mercemnieenine Satereaet hee Moonee — bg Pn Cvetas Feo igs rie ‘oasenbra geatenn 0 Operon Imo = sh oe cr 8 ‘gina geen Mech 1 a fein meer” Sena Mrs Utes en fnmes at e ~ Du te Pai tds de fo Yar Meri et Netnoamnemet tense fonsoFonite' alge BE ene ae at {asa Sa «6 ON tsuneo "Uso ent Aja es arp = ses Al pb Solar hime ume 118s pro hie He Peo Vrs, ote ao so Ci Pc a 0 ‘isnay #18 Alona 8s ‘ing us #16 Appel Ame 12 Ocoee ~ hey 7h Gunde" ly Fete I Tet Faget pcs — Cn Fora Cong: WTS Gnpeneade ba” Howdonen se 1g Chews ds — His Soe #17 ads de mation» sade tne Pe ‘Sohne TS At = toa Cae 1160 A pe pop made = Sv Be J eminence = Noy ate 1 cma pn sn cesta #12 ticle et — 6 Anes Caton 41, Expt endces erm 4 ts inst Opps atone Rew tants kame ge vin = fo nen iors Sez et eipta «ire noe» "18 Geane ttn ot nS be ed Mins 73 Angee cue” Nome) 1k nag a Ds ot 1 oct err ced “cre aay ¢ 1 As ds ‘ee 10" gt de Co = oe #1 woe siento Coan oe espa 8 ting 6 Tote an Gove it~ Tab oe #1 Inn oagogu tio ac Ce Sousa i Mote So peg pe ahd ieee: diaaaess Seite Sernomtnan sas Sat Hires" inate ooo Shee, Sater een eee ee coy cata ee Sree arctan tn Soars: iene fe a, Saimin ess eee Relea ieee tae Eee rine ee ee a Bee cleeicat: cree Tee eh eects Sot pee cree Be cum mete tece ce ccaenii ae ae ite nieces Sere chen, eg Rioe Saat muss ees toes hate aso Pcs Shae + SP rte Go ee al #11 Som Canes ~ tn os ‘Pape nF ~ Ha ee ‘depo — Ontam o ho Seiya Baty ‘As Mlasbow Bistdueveco O principe ~ Rotate de ture ‘Tnusso Faneteo Moga Primaras onto — Rteke de tature Béla Amma de Casto Sonaton de Carbon — Fotero de tanwre Bntonio Magna Rocigues Frnewea Achoet ‘Autre Casa de Ramis Fotera de thor ‘oes de Paula Ramos J ‘Conautven — De Pag Ella Foret, fear da Grog Arona

Você também pode gostar