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Sociologia da Educação AULA 10

Leandro José dos Santos


Josali Amaral

INSTITUTO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
PARAÍBA

Da reprodução à
emancipação: desafios para
as práticas educativas

1 OBJETIVOS DA APRENDIZAGEM

„„ Problematizar o papel da Sociologia frente ao senso comum;


„„ Discutir o conceito de reflexividade;
„„ Apresentar a educação como mecanismo de liberdade e
emancipação humana.
Da reprodução à emancipação: desafios para as práticas educativas

2 COMEÇANDO A HISTÓRIA

Caro aluno, como já era de se esperar, chegou o momento de nossa despedida.

Desde a primeira aula, quando iniciamos a discussão sobre o pensamento


sociológico e as formas de aprender-ensinar-aprender, reflexões importantes
foram realizadas.

A partir da definição sociológica do conceito de educação, ampliamos o debate


sobre os processos de socialização e problematizamos o papel da educação
escolar nas sociedades modernas. Em nossos diálogos, esperamos ter deixado
claro que a escola pode ser o lugar de cultivo da liberdade e do pensamento
autônomo, como também pode ser um lugar de reprodução de relações de
poder e submissão.

Durante esse percurso, nos tornamos íntimos dos intelectuais que fundaram a
Sociologia e, após conhecer os autores, tivemos acesso a conceitos e ao universo
teórico-metodológico da Sociologia.

Sabemos agora que, tal como qualquer outra área do conhecimento, a Sociologia
possui um léxico próprio e que, no campo sociológico, as palavras possuem
significados próprios à natureza científica. Disso concluímos que é o consenso
sobre a significação das palavras – conceitos –, empregadas no interior do
campo, que permite o diálogo, o debate, enfim, é a especificidade dos conceitos
analíticos que garante a comunicação entre os sociólogos e, consequentemente,
a coerente compreensão da realidade.

Obviamente, sabemos que as discussões aqui realizadas não garantem a sua


filiação a nenhum “clube dos sociólogos”, já que a entrada no campo exige
– tanto do ponto de vista quantitativo quanto do ponto de vista qualitativo –
o domínio de um conjunto de saberes (conceitos, categorias de classificação,
teorias, métodos, etc.) que não cabem na estrutura do Curso de Letras, muito
menos caberiam na dinâmica do nosso componente curricular.

Mas, apesar das limitações, temos a convicção de que, com as discussões aqui
realizadas, você não verá o mundo tal como o via antes. Esperamos que, a partir
de agora, você veja o mundo social com outros olhos. De agora em diante, a
sua postura será – expectativa nossa – a típica postura daqueles indivíduos que
desconfiam da manifesta superficialidade dos fenômenos. Isso não quer dizer,
necessariamente, que você deverá ser o “chato da turma”, muito menos que foi
a Sociologia, sozinha, que tenha “aberto os seus olhos”. Não é isso!

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A sua postura tenderá a ser mais reflexiva, analítica, quiçá, questionadora não
porque você cumpriu a carga horária relativa ao componente curricular de
Sociologia da Educação, mas porque agora você está mais próximo de concluir
o seu curso. E, apesar de parecer paradoxal, é nessa hora que muitos conceitos/
reflexões/temas começam a fazer sentido. Não porque os autores e temas
discutidos nos últimos períodos são mais importantes, mas porque começamos
a perder o medo de manejar/manipular/aplicar os conceitos, temas, autores e
teorias estudados ao longo do curso.

3 TECENDO CONHECIMENTO

Pois bem, já que estamos em momento de despedida, esperamos que, durante


as nossas aulas, você tenha percebido, em nosso componente curricular, que
a educação foi abordada a partir de duas perspectivas distintas: a primeira, de
caráter holístico, filiada à Sociologia de Durkheim; e a segunda, que segue a
perspectiva do individualismo metodológico, baseada nos escritos de Weber;
entremeios, também abordamos, com Pierre Bourdieu, a maneira como os
processos de socialização podem ser encarados a partir da intersecção de diversos
eixos teóricos, a marxiana principalmente.

Como vimos nas aulas 1 e 2, os sociólogos holísticos advogam pela supremacia


da coletividade sobre o individual. Para os adeptos dessa corrente, os indivíduos
nada são além de meros receptáculos de normas e valores que lhes são impostos
de fora para dentro. Sob essa ótica, a educação se efetivaria através da imitação
e do condicionamento. Os sujeitos, passivos, se curvam à coação da sociedade,
que determinaria as ações individuais por meio de uma lógica que ultrapassa
as disposições individuais.

Para os seguidores de Durkheim, a Sociologia pode oferecer “uma espécie


de controle sobre as instituições sociais semelhantes àquela proporcionada
pelas ciências físicas no domínio da natureza”. Visto sob esse ponto de vista, “o
conhecimento sociológico mantém uma relação instrumental com o mundo social
com o qual se relaciona; tal conhecimento pode ser aplicado de uma maneira
tecnológica para intervir na vida social” (GIDDENS, 1991, p. 23).

Os defensores do individualismo metodológico, por outro lado, argumentam


que as normas e valores são apenas algumas das possibilidades oferecidas ao
indivíduo, que conserva sempre uma margem de liberdade no exercício dos
seus papéis sociais. Sob esse prisma, a ação individual se explicaria em termos
de estratégias racionais, o que significa dizer que, nas escolhas individuais, reside
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o interesse de maximização dos resultados. A lógica que rege as práticas e as


ações individuais é a do homo econômicus.

Por fim, na esteira do marxismo, não se pode perder de vista a ideia de que
poderíamos “usar a história para fazer história”. O que quer dizer que, conscientes
da nossa condição de seres explorados, teríamos condições de “alterar os rumos
da história”, fazendo-a agir em nosso favor. Aqui, a tomada de consciência é a
chave para a transformação social.

3.1 O lugar do senso comum


Igualmente, ao chegar neste ponto, esperamos que você tenha percebido que
a maneira como a maioria das pessoas vê o mundo nem sempre condescende
com a visão sociológica. Isso acontece porque o não sociólogo costuma acessar
o mundo de maneira “despretensiosa”, “natural”. E, quando o mundo é acessado
sem a pretensão de interpretá-lo e/ou compreendê-lo cientificamente, os sentidos,
os conceitos e as representações do senso comum, que utilizamos para agir no
mundo, podem gerar distorções sobre a real profundeza dos fenômenos.

Vimos que, apesar de as categorias socialmente partilhadas permitirem a entrada


e a participação em contextos determinados, elas consentem tão somente uma
visão parcial e fragmentária da realidade. Nas aulas iniciais, demonstramos que
o senso comum não permite a compreensão holística do social, pois cada um
de nós possui repertórios sociais limitados, distintos, desiguais.

O sociólogo, por sua vez, quando se põe a analisar a sociedade, assume,


necessariamente, uma atitude crítica e questionadora. Ele rompe com o senso
comum e adota uma postura orientada por categorias, metodologias, conceitos
e teorias cientificamente validadas por seus pares. Dessa maneira, a reflexão
sociológica só parece ocorrer quando o cientista caminha em sentido oposto
ao senso comum. O mesmo acontece nas outras ciências e, consequentemente,
essa também deve ser a postura do professor.

Apesar disso, não podemos esquecer que o senso comum desempenha papel
essencial nas atividades sociais. Conforme aprendemos com Max Weber, o
senso comum é o elemento que nos permite orientar subjetivamente as nossas
ações em relação às ações dos outros. Por isso, é prudente dizer que “o senso
comum põe em jogo um verdadeiro saber social partilhado pelos membros
de uma sociedade e que lhes permite reconhecer as pessoas e as situações em
função de certas características típicas, como a profissão, o estatuto social, as
finalidades e as normas de ação ligadas a funções institucionais” (SCHUTZ, 1971
apud BOUDON et al., 1990, p. 221).
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Ora, todos nós criamos representações da realidade, são essas representações


que fornecem as explicações momentâneas dos fenômenos observados, por
isso acreditamos que elas são justas e aceitáveis. Neste caso, as representações
coletivas parecem servir de guias e/ou referência em nossa atividade social
cotidiana, dando-nos a impressão de que compreendemos o mundo que nos cerca.

Por isso, o senso comum é um elemento indispensável à vida em sociedade e,


no contexto do nosso componente curricular, as categorias do senso comum
são um ponto de partida importante para a reflexão sociológica. As categorias
com as quais descrevemos o social, atuamos e representamos o mundo não são
meros produtos do capricho individual, elas são produtos coletivos, ou seja, são
fatos sociais.

Tanto quanto as questões mais complexas da sociedade, interessa ao sociólogo/


professor saber como se constituem as categorias de representação “mais
banais”. Sabem os sociólogos que os esquemas de percepção criados pelo senso
comum costumam adentrar a linguagem cotidiana e adquirem variados graus de
evidência, atuando como suporte para certas visões de mundo. Compreendidas
essas visões de mundo, revelam-se as condições para a transformação social.

Sabemos que, quando indagados, a maioria dos indivíduos é capaz de apresentar


explicações plausíveis sobre o sentido de suas ações. Porém, tanto o cientista social
quanto o professor devem agir com prudência e perspicácia diante do significado
que os agentes/alunos atribuem às suas condutas. Convém, portanto, a ambos
perceberem que o sentido da ação não é falso, mas pode ser incompleto. Por isso
deve-se atentar que, dependendo da natureza das práticas visadas (finalidade
da ação), a explicação para determinada ação pode variar conforme a idade,
o sexo, o estado civil, a escolaridade, a profissão ou a classe social do agente.

Perceba, então, caro aluno, que tanto a Sociologia quanto o senso comum
permitem, cada um à sua maneira, uma interpretação da sociedade. Por isso,
não cabe à Sociologia tentar corrigir os “erros” ou as limitações do senso
comum, mas estudar as suas regras de funcionamento e as minúcias de suas
propriedades formais.

Mas, na medida em que realiza esse movimento, o sociólogo se aparta


imediatamente dos processos próprios do senso comum e acaba delineando a
sistematicidade e especificidade do trabalho científico, o que justifica a postura
metodológica de afastamento das ideias preconcebidas, delineada por Durkheim.
Contudo, romper com o senso comum não significa apenas o afastamento das
interpretações parciais e fragmentadas; significa, sobremaneira, a dissolução dos
automatismos verbais. Dito de outra forma, quebrar os automatismos verbais
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Da reprodução à emancipação: desafios para as práticas educativas

pressupõe um rompimento definitivo com a semântica social do discurso


espontâneo.

3.2 O lugar das instituições

Ao retomar a discussão que realizamos nas aulas 6 e 7, você verá que nelas há
reflexões importantes sobre as instituições sociais modernas. Notadamente,
estudamos o papel da escola, do Estado e do mercado, como também apontamos
as consequências relativas aos sistemas educacionais quando ocorre, sob a batuta
desse último, a imbricação entre essas três importantes instituições modernas.

Vimos que para os autores ligados à corrente marxista, a principal força


transformadora do mundo moderno é o capitalismo. Conforme a teoria marxiana,
o modo de produção capitalista industrial é um sistema voltado para grandes
mercados nacionais e internacionais. Ao estudarmos os escritos de Marx, vimos
que o capitalismo não é apenas um sistema econômico, pois a sua lógica de
funcionamento atravessa as demais instituições modernas.

Conforme Giddens (1991), o ponto de vista marxiano foi bastante criticado


por outros autores, que criaram novos modelos explicativos. Durkheim, por
exemplo, rastreou a natureza das primeiras instituições modernas até o impacto
do industrialismo. Para o sociólogo francês, a competição capitalista não é
o elemento central da ordem industrial. Para Durkheim, “o caráter de rápida
transformação da vida social moderna não deriva essencialmente do capitalismo,
mas do impulso energizante de uma complexa divisão de trabalho, aproveitando
a produção para as necessidades humanas através da exploração industrial da
natureza” (GIDDENS, 1991, p. 20). Para Durkheim, não vivemos sob a égide da
ordem industrial, como sugeria Marx.

Já Marx Weber, mesmo falando de capitalismo, em vez de ordem industrial,


também possui uma concepção que não coaduna com o pensamento marxiano.
Para Weber, a ordem moderna inaugura o que ele chama de capitalismo racional,
que, mesmo compreendendo os mecanismos econômicos especificados por
Marx, não tem o mesmo significado compreendido pelo seu contemporâneo. A
chave do entendimento de Weber está na racionalização das atividades humanas,
pronunciada sob a forma da organização burocrática.

Giddens (1991, p. 21) resolve esse impasse argumentando que “a modernidade


é multidimensional no âmbito das instituições”. Para esse autor, cada um dos
elementos especificados nas diferentes interpretações – marxiana, durkheiminiana
e weberiana – tem alguma coisa a dizer sobre a modernidade. Assim, não devemos
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enfrentar as caracterizações dos clássicos como expressões contraditórias e


excludentes de um mesmo processo, é preciso pensar o que cada uma das linhas
interpretativas representa para a reflexão sociológica atual.

Para Giddens, a chave interpretativa para as sociedades modernas é o que ele


chama de reflexividade. Conforme o autor, a reflexividade é uma ação inerente
aos seres humanos. Justamente por isso, nós, seres sociais, realizamos monitoração
constante da ação nossa reflexiva. Mas, em condições de modernidade, a
monitoração da reflexividade se distancia das formas de monitoração tradicionais.

Segundo Giddens (1991, p. 44), “nas culturas tradicionais, o passado é honrado e


os símbolos valorizados porque contêm e perpetuam a experiência de gerações.
A tradição é um modo de integrar a monitoração da ação com a organização
tempo-espacial da comunidade”. Ainda conforme esse autor:
A tradição é uma maneira de lidar com o tempo e o espaço,
que insere as atividades coletivas ou as experiências
individuais dentro da continuidade do passado, presente
e futuro, que são estruturados por práticas sociais periódicas
[...]. A tradição não é inteiramente estática, porque ela tem
que ser reinventada a cada nova geração conforme esta
assume sua herança cultural dos precedentes. (GIDDENS,
1991, p. 44).

Assim, nas culturas pré-modernas, a reflexividade está mais ligada à interpretação


dos acontecimentos presos ao espaço e ao tempo, ela está intimamente ligada
à reinterpretação da tradição e tem a sua face voltada para o passado.

Na modernidade, a reflexividade assume outro caráter. Ela constitui a própria base


do sistema. Mesmo na modernidade, a tradição tem o seu lugar, mas sua função
é bem menos significativa. “A reflexividade da vida social moderna consiste no
fato de que as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas
à luz de informação renovada sobre estas próprias práticas, alterando assim
constitutivamente seu caráter” (GIDDENS, 1991, p. 45). Ou seja, na condição de
modernidade, adotamos uma prática constante de revisão de nossas convenções.

Desta maneira, a face da modernidade está voltada para o futuro. A reflexividade


e a segurança institucional não residem mais na tradição, mas na ciência, que,
na modernidade, ganhou o status de provedora de conhecimento. O problema
é que na modernidade, alerta Giddens, nem mesmo o conhecimento científico
pode trazer a segurança que os indivíduos reclamam. Na modernidade, “nenhum
conhecimento no sentido ‘antigo’, em que ‘conhecer’ é estar certo” (GIDDENS,
1991, p. 46), tem condições de asseverar os fundamentos da nossa existência.

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3.3 A escola e o lugar do professor

Considerando o que vimos, a escola e, consequentemente, o professor seriam os


promotores de ações visando ao desenvolvimento de uma consciência autônoma
nas gerações futuras.

Autonomia, neste caso, não pode ser vista como um elemento estático, pois ela é
um processo, um eterno devir. Ela é um verdadeiro vir a ser, que, no entendimento
da teoria marxista, só poderá ser alcançada quando conseguirmos construir
relações sociais conscientes, de forma coletiva e “desalienada”.

Ou seja, a liberdade, para Marx, pressupõe a diferenciação e o afastamento


humano dos processos que ocorrem no plano das atividades estritamente
aparentes, superficiais, naturais. Conforme nossa interpretação, a liberdade só
será alcançada quando conseguirmos estabelecer relações fundamentadas na
reciprocidade e no afeto mútuo, pautadas pelo respeito à dignidade humana.

A escola, nesse sentido, pode desempenhar um papel fundamental para a


conquista da verdadeira liberdade e da autonomia. Isso porque, para a teoria
marxiana, as atividades especificamente humanas, que, em linhas gerais, podem
ser resumidas como o processo de produção, reprodução e apropriação da
cultura, são uma atividade fundamentalmente coletiva, que recebe a mediação
do fator trabalho.

Conforme Marx, o trabalho que realizamos possui um conjunto de características


que nos define como humanos. A característica inicial está relacionada ao fato de
os seres humanos agirem para produzir – primeiramente – os meios de satisfação
de suas necessidades, ao passo que os animais agem para prover satisfação
imediata das necessidades. Para nós, seres da cultura, “entre a necessidade de
alimento dada no ponto de partida e a chegada, há um elemento intermediário,
há uma atividade mediadora: a produção de instrumentos” (DUARTE, 2004, p.
49). É justamente no interstício entre o ponto de partida e o ponto de chegada
que encontramos os elementos que diferenciam os seres da natureza dos seres
da cultura.

Se, durante a leitura do parágrafo anterior, você se manteve atento ao que foi
dito, saberá que é no interstício mencionado acima que se localizam os processos
socializadores. Isto é, é justamente no espaço compreendido entre a vontade de
comer e a ingestão do alimento que a educação encontra guarida.

Ora, se, como vimos até agora, a educação se caracterizar pela transmissão e
partilha das formas de ser, pensar, agir e fazer de uma determinada sociedade, e
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se admitirmos que os mecanismos empregados pela educação são indispensáveis


para a produção, manutenção, reprodução e transformação das sociedades em
que vivemos, precisamos admitir que essa ideia de educação está tão próxima
da ideia do conceito de cultura descrita por Marx quanto aquela desenhada por
Durkheim. Pois, conforme vimos nas aulas anteriores, é a educação que transmite
determinadas formas de pensamento, cria um conjunto de categorias que
tornam possível a comunicação. É por intermédio da educação que determinadas
categorias de conhecimento são lançadas às gerações futuras.

Da mesma maneira, se concordarmos com Bourdieu e aceitarmos a ideia de que


a socialização engendra sistemas de disposições que permitem aos indivíduos
certas atitudes e/ou inclinações para perceber, sentir, fazer e pensar o mundo,
também temos que aceitar a ideia de que é a educação que vai configurar a
produção de instrumentos.

Diante disso, percebe-se que tanto a condição humana quanto o aparecimento


de sua consciência só foram possíveis mediante o aparecimento das relações
sociais em condições sócio-históricas específicas, que formulam novas formas de
ação e de interação humana, a saber, a socialização e a aprendizagem mediante
a realização da comunicação como atividade educativa, na qual o indivíduo
apropria-se do conhecimento e da cultura socialmente construída. Apropriar-se
da cultura significa, nesse quadro, tornar-se parte do grupo.

A comunicação, neste caso, é o elemento central, pois as relações humanas são,


sempre, mediadas por ela. Num quadro como esse, o papel do educador é de
grande relevância, pois ele é portador de cultura e, em razão disso, o responsável
pela transmissão dessa cultura.

Notadamente, você deve ter percebido que, neste caso, o educador pode ser
qualquer indivíduo que seja capaz de objetivamente transmitir a sua cultura às
gerações futuras. Todavia, diante das especificidades da economia de mercado,
que exige que dominemos um conjunto de conhecimentos e técnicas às vezes
desconhecidas pelo nosso próprio grupo, confia-se à escola e, consequentemente,
ao professor a responsabilidade pela formação das gerações vindouras.

Exercitando

Como atividade avaliativa, sugerimos que você faça uma reflexão sobre o uso
de recursos tecnológicos no contexto da educação escolar. A ideia é que você
faça uma rápida pesquisa em periódicos científicos da área da educação (ex.
Revista Brasileira de Educação), identifique algum artigo sobre esse tema, leia-o
e estabeleça um diálogo entre educação escolar e tecnologia.

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Você pode analisar as consequências do uso da internet ou telefone celular no


processo educativo, atividades de leitura, etc., como também pode refletir sobre
as possibilidades de atuação professoral a partir do uso das novas tecnologias.

Feitas as leituras e as suas reflexões, produza um texto e o envie ao seu tutor.

4 APROFUNDANDO SEU CONHECIMENTO

Para concluir as nossas reflexões, sugerimos


que você assista ao filme Narradores de Javé.
Trata-se de uma produção brasileira, dirigida
por Eliane Caffé. O filme narra a trágica estória
dos moradores do vilarejo de Javé. Prestes a
perderem as suas terras, em razão da criação
da barragem de uma hidroelétrica que será
instalada na região do vilarejo, os moradores
se veem obrigados a recorrer à ciência
para tentarem impedir o avanço das obras
e a consequente destruição de suas casas.
Narradores de Javé não é um filme qualquer.
Figura 1
Ele é uma espécie de xodó dos professores
de Sociologia, Antropologia, História, Língua
Portuguesa, Geografia e outras disciplinas
das Ciências Sociais. Este parece ser um
autêntico material “inter/trans/multidisciplinar”.

No que tange à discussão desta aula, a película nos ajuda a compreender


o lugar da educação no contexto das sociedades modernas, dada a
possibilidade de incluirmos os esforços dos moradores de Javé no rol
daquelas atividades de mediação entre a necessidade (energia elétrica) e
a consumação dessa necessidade (lâmpada acesa/TV ligada/utilização de
eletrodomésticos/etc.). Para além dessa possibilidade, outras leituras são
possíveis sobre o filme. Só para citarmos outro ponto de vista, poder-se-ia
estabelecer um diálogo entre o conceito de reflexividade – analisado nesta
aula – e a maneira como os personagens constroem as suas identidades
ao longo da narrativa, contrastando essa construção, evidentemente,
com a nova perspectiva de identidade que se abre ao término do filme.

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5 TROCANDO EM MIÚDOS

Chegamos ao fim deste componente curricular e aproveitamos para reforçar as


principais ideias que nortearam nossas aulas. Retomamos a visão coletivista e
coercitiva de Durkheim, a individualista e racionalista de Weber e a conflitualista,
isto é, a de Marx. Lembramos que, em cada um desses autores, é preciso
compreender as palavras como conceitos, considerando o caráter analítico
com que a Sociologia observa o meio social. A categorização dos fenômenos
sociais nos permite compreender a sociedade para além do senso comum e nos
habilita a identificar os problemas e refletir sobre mecanismos de intervenção.
Também discutimos o conceito de reflexividade, proposto por Giddens (1991), a
partir do qual passamos a compreender que é a capacidade de rever e reavaliar
o real que instrumentaliza o homem para modificar a realidade. Para Giddens
(1991), mais que a competição capitalista, é a reflexividade que impulsiona a
modernidade. Por fim, ressaltamos o papel fundamental da educação para a
manutenção e continuidade da sociedade. Paradoxalmente, por meio dela, a
sociedade se reproduz e se modifica. O lugar ocupado pela educação nos leva
a reforçar que o papel do professor é fundamental como agente de construção
da consciência e da emancipação das gerações futuras.

6 AUTOAVALIANDO

Esta aula selou as discussões propostas pelo componente curricular Sociologia


da Educação. Após a leitura desta aula, você deve estar apto a responder aos
questionamentos abaixo. Leia as questões e tente responder a elas.

„„ Sou capaz de problematizar os conhecimentos utilizados pelo senso comum,


comparando-os aos conhecimentos científicos?

„„ Tenho condições de discutir o conceito de reflexividade, criado por Giddens?

„„ Sou capaz de delinear a importância da educação para o desenvolvimento


de mecanismos para o exercício da liberdade e emancipação humanas?

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REFERÊNCIAS

BOUDON, Raymond. Dicionário de Sociologia. Lisboa: Publicações Dom


Quixote, 1990.

DUARTE, N. Formação do indivíduo, consciência e alienação: o ser humano na


psicologia de A. N. Leontiev. Campinas: Cadernos Cedes, vol. 24, n. 62, p. 44-63,
abril, 2004.

GIDDENS, Antony. As consequências da modernidade. São Paulo: Ed. UNESP, 1991.

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