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Brasil quer regulamento global sobre uso de armas

autônomas
País teme que a humanidade perca o controle de tecnologias
letais e que outras nações extrapolem no desenvolvimento de
armas com inteligência artificial

LC Leonardo Cavalcanti RS Renato Souza


postado em 08/09/2019 09:00 / atualizado em 08/09/2019 09:31

Candeas: ''Este é o momento, senão


nossos filhos viverão em um mundo mais perigoso''

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Em seus últimos anos de vida, o físico britânico Stephen Hawking se dedicou a alertar a
humanidade sobre os perigos do desenvolvimento indiscriminado e sem limites da
inteligência artificial. Para ele — uma das mentes mais brilhantes da história —, o caminho
do avanço tecnológico poderia levar à destruição da civilização. Três anos após a morte dele,
o governo brasileiro tem preocupações semelhantes, embora mais moderadas. Os
representantes do país tentam, na Organização das Nações Unidas, regulamentar, em nível
global, o desenvolvimento de armas inteligentes. Atualmente, a tecnologia não chegou ao
patamar ameaçador como visto no filme O Exterminador do Futuro. Mas, neste momento,
nações industrializadas e até mesmo países em desenvolvimento trabalham para criar armas
com capacidade de tomar decisões.

A depender do controle sobre o desenvolvimento desse tipo de tecnologia, nos próximos


anos ou décadas, seres robóticos podem ter o poder sobre a vida e a morte. O assunto está
causando um debate profundo entre as nações filiadas à ONU, tanto que foi criada, em
Genebra (SUI), a Convenção sobre Certas Armas Convencionais. A expectativa da entidade é
de que, entre 2030 e 2050, existam desde armas comuns automatizadas até robôs
humanoides — com capacidade de raciocinar —, empregados em conflitos armados. O tema
é tão polêmico que, dentro da própria organização, já se formaram grupos de países com
diferentes correntes de pensamento. O Brasil está numa ala intermediária, que pede a
regulamentação sobre essa tecnologia, mas não é contra o uso da IA no desenvolvimento de
armas autônomas, que podem funcionar parcial ou totalmente sem o auxílio humano.

Se por um lado essa tecnologia pode ajudar a evitar mortes de inocentes em guerras e até
mesmo reduzir o sofrimento humano em conflitos bélicos, por outro, há o risco de serem
usadas na dominação de uma nação sobre a outra. Até mesmo, tomar um rumo apocalíptico,
se os humanos derem total liberdade e capacidade para que redes neurais artificiais decidam
sobre o alvo de ataques sem a necessidade de consultar um operador humano. Caso essa
novidade caia nas mãos de grupos terroristas, rebeldes ou religiosos radicais, o estrago pode
ser imprevisível.

Na ONU, os países mais industrializados, com exceção do Japão, se manifestam contra a


criação de um protocolo para regular o desenvolvimento dessa tecnologia. Organizações civis
internacionais, como a Human Rights Watch e a Cruz Vermelha mobilizam uma força-tarefa
para impedir o avanço dela. Juntas, entidades de diversas nações lançaram a campanha Stop
Killer Robots (parem os robôs assassinos), com o objetivo de protestar contra o
desenvolvimento de sistemas letais robóticos. Elas rejeitam a criação e a continuidade do uso
de qualquer arma autônoma.

Protocolo
O Brasil defende uma série de regras sobre quais tecnologias podem ser criadas e a aplicação
de direitos internacionais para normatizar o uso e o desenvolvimento da tecnologia. A nação
tem liderado os debates e recebe apoio de países como Chile, Alemanha, Áustria, Austrália.

O diretor do Departamento de Defesa do Ministério das Relações Exteriores, Alessandro


Candeas, afirma que, em âmbito nacional, estão em andamento estudos e avaliações para
criar um modelo de protocolo a ser apresentado à ONU, com a proposta de que seja assinado
pelo resto do mundo. “O Brasil está conversando com a academia, com universidades,
institutos militares, Forças Armadas, ONGs do setor. Tudo isso para criar a posição do país
que será levada para Genebra”, diz. “Vamos fazer uma convenção de juristas para discutir a
necessidade de um protocolo que normatize a aplicação do direito internacional nesse tema.”

Candeas lembra que a humanidade vive numa corrida contra o tempo. Num cenário em que a
tecnologia evolui rápido, os debates não podem travar, sob risco de que novas armas e
sistemas sejam colocados em prática antes de regulados seus efeitos. Governos de diversos
países e empresas privadas trabalham para avançar nesse campo. “Este é o momento, senão,
nossos filhos viverão em um mundo mais perigoso”, ressalta.

Apesar da preocupação, Candeas afirma que o Brasil também tem interesse no setor. “Já
existe, em menor escala, o desenvolvimento dessa tecnologia em empresas privadas por aqui.
Mas o Brasil pretende ser um comprador e desenvolvedor. É um mercado que nos interessa.
A própria Embraer, por exemplo, investe muito no que existe de ponta em tecnologia de
defesa.”

O assunto está sendo levado tão a sério pelo governo brasileiro que o Executivo criou uma
força-tarefa para tratar do tema. O grupo envolve Itamaraty, Ministério da Defesa, Forças
Armadas, Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Ministério da Ciência e Tecnologia e
Secretaria de Assuntos Estratégicos. Atualmente, a ONU tem quatro protocolos que
regulamentam o uso de armas e sistemas de defesa. O último deles cita o laser, que tem a
capacidade de ser usado, por exemplo, para ofuscar a visão de pilotos em combate. (LC e RS)

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