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O Titanic Lava Jato - Política - Estadão

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Eliane Cantanhêde
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O Titanic Lava Jato


Gilmar Mendes está na posição de ‘quem ri por último ri melhor’, mas...

Eliane Cantanhêde, O Estado de S.Paulo


29 de setembro de 2019 | 03h00

Com a sucessão de eventos da semana passada, a Lava Jato começa a ir a pique como o Titanic.
Hackers, The Intercept Brasil, Supremo, Congresso, Planalto e, agora, a absurda, inacreditável,
chocante história do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que entrou armado na
mais alta corte do País para assassinar o ministro Gilmar Mendes.

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Depois das “fechadas” contra Michel Temer, Janot queria assassinar Gilmar a tiros. Não tirou o
mandato de um nem a vida do outro, mas acaba de matar sua própria reputação. Procuradores
são servidores públicos e ele não era apenas um procurador qualquer, era o procurador-geral e
estava disposto a cometer não um crime qualquer, mas o mais grave de todos: assassinato. E de
um ministro do Supremo!

Janot agia como justiceiro, Gilmar era o crítico mais feroz dos personagens, métodos e atos da
Lava Jato. O procurador era endeusado e o ministro, trucidado, principalmente nas redes sociais.
Mas a gangorra inverteu. Janot cai do pedestal, Gilmar está exultante e a maior operação
anticorrupção da história afunda fragorosamente.

Com seu partidarismo, arrogância e falta de limites, Janot foi o pivô da gravação que Joesley
Batista, da J&F, fez com o ex-presidente Michel Temer. O resultado foi uma conversa mole,
induzida, picada, que não conseguiu derrubar Temer, mas derrubou a reforma da Previdência e a
retomada do crescimento. O País pagou um alto preço.

https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,o-titanic-lava-jato,70003029456[29/09/2019 22:07:34]
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A J&F virou gigante internacional com o ex-presidente Lula, mas Janot e sua turma atiraram em
Temer. Como a gravação não fcou forte o sufciente, eles adulteraram a ordem das frases e
correram ao STF sem aprofundar as investigações, seguir o dinheiro ou sequer fazer perícia no
áudio. E que acordo camarada com os irmãos Batista! Foi, portanto, uma ação política, que fca
ainda mais irritante com a confssão de Janot justamente na semana da inversão da gangorra
também no STF.

A força-tarefa ganhava todas. Lula, por exemplo, perdia todas. A mudança começou com
liminares monocráticas (contra o uso de dados do antigo Coaf e investigações de poderosos pela
Receita). Evoluiu com a Segunda Turma derrubando a condenação de Aldemir Bendine, sob o
pretexto de que delatados falam após o delator. Por fm, o plenário consolida a guinada, com
maioria a favor dessa tese, perfeita para favorecer dezenas de condenados.

A partir daí, é fazer a festa nas próximas votações: prisão após condenação em segunda instância,
suspeição do então juiz Sérgio Moro, revisão ou anulação de sentenças e ações contra Lula... Os
mocinhos da Lava Jato vão sendo transformados em bandidos, os réus viram vítimas.

Do outro lado da rua, o Congresso aprova uma lei de abuso de autoridade que, apesar de
necessária, chega num momento, e num formato, que exala revanche e soa como ameaça a juízes,
procuradores, delegados e auditores que ousem mexer com poderosos.

E no Planalto? O presidente Jair Bolsonaro tenta parecer mero espectador do naufrágio da Lava
Jato, mas soltou a voz contra a PF, deixou suas digitais nas mudanças no Coaf (agora UIF) e na
Receita Federal e só vetou várias partes da Lei de Abuso de Autoridade para inglês ver. Ou
melhor, Moro ver, seus seguidores verem.

Gilmar Mendes passou esses anos todos como Judas nacional, por enfrentar Janot, Dallagnol,
Moro e o “lavajatismo”. Hoje, os Judas passam a ser Janot e Dallagnol. Gilmar está na posição de
“quem ri por último ri melhor”. Mas... com erros maiores ou menores, personagens maiores ou
menores, o fato é que o petrolão existiu, há montanhas de provas da corrupção sistêmica e era
preciso dar um basta vigoroso. A Lava Jato afunda, mas a história saberá calibrar erros e acertos,
reconhecendo o enorme bem que fez ao País.

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