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Quando Pensar é Fazer

Um dia, o romântico Schiller disse: “Eu fiz o que tu... só pintastes”¹, repetindo antecipadamente o que o pragmatismo utilitário - ou imediatismo
dogmático – contemporâneo jura efetivar, isto é, o sonho idealista de fazer o já pintado – por outrem. Pois, fazer o já pintado é adotar Formas e
Modelos, relegando ao ato o papel de instrumento, mas para um Realismo o ato não é instrumento, é o Ser em pessoa. É o verbo sem sujeito. É o
atributo sem predicado. O verbo. E o humor é como o verbo; impessoal. Nem a alma de Deus, nem a alma dos humanos, o Humor é a alma do mundo. Então um
dia Karl Kraus respondeu e inverteu à Schiller, - e aos dogmáticos e aos imediatistas: “Eu pintei o que eles só fizeram”. O humor não é a vontade de ridicularizar o
outro com ironia, mas o cômico da vida rindo de nós, o humor é a comicidade fatalista da tragédia, que faz de nós, palhaços de Deus, comediantes da vida. A
Sátira não serve para nos proteger do Outro, mas para nos proteger de nossa própria loucura. O humor pinta o mundo do qual só atuamos sem deter os atos e por
isso, colorista que é, exige de nós a construção de novos quadros. Enquanto fazes imediatamente, pintamos mediatamente uma nova imagem do mundo e da vida e
assim, somente assim, o ato nos pertence, quando compomos, não quando fazemos, pois todo ato é efeito de uma Ideia. Fazer sem Ideia é reproduzir, fazer com
Ideia é criar. “Moro em minha própria casa e nada imitei de ninguém. E ainda ri de todo mestre que não riu de si também.”² - Nietzsche.
“O humor não é senão a acusação lançada a si próprio por alguém que não enlouqueceu à ideia de ter suportado testemunhar as coisas deste tempo no seu perfeito
juízo. Além dele, que transfere para a posteridade a vergonha de em tal ter tido parte, ninguém mais tem direito a esse humor. Os contemporâneos, que
consentiram que acontecesse o que aqui fica registrado, renunciem ao direito de rir, em prol do dever de chorar. Os feitos mais inverossímeis aqui relatados
aconteceram na verdade; eu pintei o que eles só fizeram.” - Karl Kraus.
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¹ A Conjura de Fiesco, cena 17, Acto II: “Eu fiz o que tu… só pintaste.”
² A Gaia Ciência, Prefácio.
³ Os Últimos Dias da Humanidade. (1915-1922)

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