Pública
Administração
Pública
Jackson de Toni
Conselho Editorial EAD
Dóris Cristina Gedrat (coordenadora) Andréa Eick
Mara Lúcia Machado André Loureiro Chaves
Astomiro Romais Cátia Duizith
O surgimento do Estado
e a administração pública
1.1 A origem do Estado
A gestão pública é o modo como administramos as coisas públicas,
particularmente como são gerenciadas as organizações públicas, sejam
elas municipais, estaduais ou federais. Por isso, antes de entrar no assunto
propriamente dito temos que compreender onde se realiza a gestão pública,
em que contexto institucional, que regras e estruturas a condicionam. Ou seja,
temos que compreender inicialmente o que é o Estado, como ele surgiu e como
ele funciona, qual é seu papel na sociedade democrática contemporânea. Vamos
trilhar este caminho logo a seguir.
Para estudar e entender o que é a gestão pública inovadora vamos ver neste
primeiro capítulo como tudo começou, isto é, o que é o Estado, qual sua origem,
função e papel numa sociedade complexa e heterogênea como a nossa. A palavra
Estado vem do latim status e significa “estado” ou “situação”.
O seu conceito está associado ao de ordem política e social que mantém
uma determinada sociedade estável. Desde a Antiguidade o conceito de Estado
também está associado ao de dominação, isto é, de um grupo de indivíduos
ou grupos organizados que, através do Estado, domina os demais grupos e
indivíduos. Esta dominação não é necessariamente ruim porque ela pode ser,
10 O surgimento do Estado e a administração pública
Há ainda muitas outras teorias que tentam explicar por que ou como o
homem organizou e construiu o Estado. Alguns teóricos dizem que o Estado
não passa de um prolongamento em escala das relações já estabelecidas pela
estrutura familiar. A sociedade civil seria apenas um desdobramento normal e
previsível da sociedade natural, o Estado apenas refletiria a ampliação dos laços
de dependência familiares. Além da família, podem ser considerados neste
enfoque a própria comuna, ou comunidade, corporações baseadas nas relações
familiares e outros grupos como possíveis fontes para o poder do Estado. Na
base deste poder estaria o poder fundante e original de um “Pai” ou de um “Rei”.
A legitimidade deste poder é de origem divina: “é Deus que quis assim”, ou na
ordem natural das coisas: “sempre foi assim e sempre será”.
A crítica que a ciência política mais moderna fará a esta abordagem é a de
que a sociedade humana não é igual ou sinônimo de sociedade política. Aliás,
somente quando o homem se emancipa das organizações básicas, como a família,
ele passa a intervir e atuar de uma forma não tutelada nos assuntos da civitas, da
coletividade, da comunidade em que está inserido, ou seja, passa a ser um ser
político, a fazer política com consciência. Além disso, a fonte e a legitimidade
do poder de Estado não está na ideia da paternidade, mas de uma opção não
natural feita por homens e mulheres, muito menos na inspiração divina. Cabe
lembrar que uma das grandes conquistas das chamadas “revoluções burguesas”
do século XVIII, em especial da Revolução Francesa, foi a separação entre o
poder religioso e o poder político, criando a ideia do Estado laico e da liberdade
de culto religioso.
Uma outra vertente na teoria sobre o Estado nos diz que o Estado surge
como que um “contrato” entre os indivíduos. Este contrato teria sido inspirado
12 O surgimento do Estado e a administração pública
na necessidade que os homens têm em preservar e tutelar seus direitos uns dos
outros, em troca da proteção de um soberano. Um dos autores mais famosos dos
chamados “contratualistas” foi Rousseau, que viveu entre 1712 e 1778. Ele foi
autor de uma obra chamada O Contrato Social, em que defende que o contrato
entre os homens e o soberano deveria ser geral e unânime, baseado na igualdade
entre os homens, que abririam mão de suas vontades individuais para ceder
a uma “vontade geral” acima de todos. Esta nova condição poria um fim ao
chamado “estado natural”, pré-Estado, em que todos estavam à mercê da própria
sorte. Outro pensador importante desta escola foi Hobbes, que viveu entre 1588 e
1679. Hobbes dizia que o “homem é o lobo do próprio homem”, isto é, o homem
deixado à sua própria sorte estaria condenado a uma vida torpe, violenta e breve.
Outro autor, Locke, que viveu entre 1632 e 1704, era menos pessimista, dizia
que o homem era pacífico, mas vivia em guerra potencial se permanecesse no
estado de natureza. Todos defendiam a ideia de que um contrato deveria ser
feito transferindo parte dos direitos e das liberdades individuais para o Estado.
Devemos lembrar aqui que a ideia de um “contrato” é uma metáfora, isto é, uma
figura de linguagem para ilustrar o processo de formação do Estado.
Hobbes, Locke e Rousseau partilhavam do mesmo diagnóstico, mas tinham
ideias diferentes sobre qual seria a solução ideal para o problema. Hobbes,
por exemplo, acreditava que a titularidade e o exercício dos direitos naturais
deveriam ser transferidos ao soberano com uma única exceção, a segurança
da sua própria vida. O soberano, para Hobbes, não seria obrigado a respeitar
as leis civis por ele constituídas, sua limitação seria apenas o direito natural. O
poder do Estado seria absoluto. Por isso se diz que Hobbes defendia o modelo
absolutista, baseado no poder de um rei.
Locke, por sua vez, entendia que os indivíduos conservariam todos seus
direitos naturais exceto um, o de fazer justiça por suas próprias mãos; isto
caberia ao Estado. Para este pensador o principal direito a ser garantido pelo
Estado seria o direito à propriedade e à liberdade individual. Para ele o poder
poderia ser revogado se o governante não cumprisse as leis, e defendia o direito
à rebelião contra o mau governo.
Por fim, para Rousseau, que era o mais radicalmente democrático dos três,
os indivíduos deveriam transferir todos seus direitos ao Estado em troca da
liberdade individual. Os conflitos existentes no estado de natureza resultavam
O surgimento do Estado e a administração pública 13
por exemplo, a elaboração dos planos plurianuais a cada quatro anos em todos
os níveis administrativos.
Um princípio associado intimamente ao primeiro é o da “coordenação”.
Esta orientação nos diz que as várias organizações do governo e os milhares
de funcionários públicos federais, estaduais e municipais devem agir
coordenadamente, com harmonia, com sincronicidade. Esta orientação implica
que os processos de hierarquia, comunicação, monitoramento e avaliação das
ações deva ser uma constante na gestão pública.
O terceiro princípio nos fala da “descentralização”. Num país como o Brasil,
com mais de oito milhões de quilômetros quadrados, com quase duzentos milhões
de habitantes, perto de 6 mil municípios e 23 estados é impossível não pensar
que as funções públicas devam ser descentralizadas. Ela é entendida em vários
planos. Há a descentralização da administração federal para as administrações
estaduais e destas para as municipais. Mas também há descentralização de
funções dentro de cada nível administrativo e do setor público para o setor
privado. Por exemplo, quando um município faz uma licitação para um
particular operar uma linha de ônibus, ele está descentralizando, ou quando
o governo federal faz um convênio com o Estado para repassar recursos para
combater a fome, há também um processo de descentralização. Este princípio
está associado a um outro muito próximo, é o chamado princípio da “delegação
de competência”. Ele segue a máxima de que as decisões devem se situar o mais
próximo possível do contexto em que elas vão ser executadas. Isso objetiva
assegurar mais agilidade, eficiência e eficácia na prestação de serviços. É por
este motivo que a educação superior fica na esfera federal e a educação básica
e fundamental é encargo dos municípios.
É importante não confundir a descentralização com a desconcentração. Esta
última significa apenas uma técnica (não um princípio) que a administração,
tanto a direta composta pelos Ministérios ou Secretarias, como a indireta,
composta por empresas, autarquias e fundações, utiliza para distribuir
competências. Mas esta distribuição, ao contrário da descentralização, fica dentro
de sua própria estrutura ou organização. Por exemplo, quando o Ministério da
Agricultura cria representações nos Estados ele está desconcentrando tarefas,
competências e atribuições.
18 O surgimento do Estado e a administração pública
público seja apenas um cumpridor de leis, um autômato; pelo contrário, ele deve
ter uma atitude inovadora, um comportamento criativo e uma postura aberta
a novos desafios. Só assim ele conseguirá interpretar todos estes princípios de
acordo com cada contexto ou situação.
funcionar. Estes recursos não são financeiros propriamente ditos, mas sobretudo
a capacidade de governo instalada, representada pelas suas instituições,
processos de trabalho e burocracia. Todos eles orientados e regidos pelo direito
administrativo e pelo direito constitucional.
Assim, Estado, governo e aparelho de Estado são conceitos semelhantes,
entrelaçados, mas diferentes. Saber fazer a distinção ajuda a compreender melhor
como funciona a gestão pública.
Questões
1. Tente fazer um definição sua do que é o Estado e qual sua importância
para a sociedade atual. Justifique.
2. Qual a relação entre Estado e administração?
3. Na sua opinião, há diferença entre a esfera pública e o Estado?
Por quê?
Referências comentadas
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. Saraiva:
São Paulo, 1981.
Este livro traz um novo enfoque sobre os problemas do Estado, vai muito
além da mera exposição de conceitos teóricos para apresentá-lo como realidade
viva, concreta e dinâmica. Examina, em detalhes, a sociedade, a origem e
a formação do Estado, sua personalidade jurídica, o Estado Moderno e a
Democracia, a separação de Poderes, as funções do Estado e os problemas do
Estado contemporâneo, bem como as relações internacionais, a intervenção
estatal, o socialismo, o capitalismo e o Estado democrático.
ECONOMICIDADE
EFICIÊNCIA
EFICÁCIA
definida, têm acesso aos cargos públicos não por indicações políticas, mas por
processos seletivos impessoais e igualitários.
Outra característica forte do modelo weberiano é sua ênfase clara na
disciplina e na hierarquia. Weber teria adaptado estes elementos a partir de
sua observação de como se organizava o exército prussiano e as razões de seu
sucesso militar. As relações de trabalho são piramidais, verticalizadas. No modelo
meritocrático há uma separação total entre propriedade pública e propriedade
privada ou particular. O estado não tem donos, os cargos não tem donos, pelo
contrário, estão acima de todos seus ocupantes. Este tipo de estrutura supõe
que tudo seja planejado nos mínimos detalhes, e que tudo seja previsível,
antecipadamente conhecido. Como podemos deduzir, o mundo weberiano da
administração pública é um mundo muito árido de relações humanas, é quase
uma condenação à perfeição.
O modelo burocrático de administração garantiu a estabilidade e a
previsibilidade tão importantes para a expansão do comércio e da indústria. Um
Estado eficiente e funcionando como uma máquina poderia ser muito útil para
o liberalismo econômico. Devemos ressaltar, como já foi assinalado antes, que o
modelo burocrático não eliminou o modelo patrimonialista. Há casos, inclusive,
como é o do próprio Brasil, em que elementos dos dois modelos convivem numa
contradição aparente, mas reveladora da forma imperfeita como evolui nossa
gestão pública. Um exemplo é a própria gestão de pessoas na administração
pública federal. Ao mesmo tempo em que a estruturação de carreiras burocráticas
típicas no núcleo estratégico avançou, há ainda milhares de cargos ocupados por
indicações políticas com pouca preocupação sobre o mérito ou a conveniência
destas indicações para a qualidade do serviço público.
Questões
1. O chamado modelo de gestão racional-legal ou burocrática não atende
às demandas da sociedade moderna, mas cumpriu um papel na história
da administração importante. Você sabe por quê?
2. No modelo gerencialista o cidadão é tratado também como cliente.
Explique.
3. Quais são as tendências de evolução da escola chamada “nova gestão
pública”?
Referências comentadas
ABRUCIO, F. L. O impacto do modelo gerencial na administração pública:
um breve estudo sobre a experiência internacional recente. Caderno ENAP,
n. 10, Brasília, 1997.
Nesta publicação o professor Abrucio da FGV faz um rápido apanhado
das experiências internacionais tendo como referência a expansão do modelo
gerencial puro. Ele destaca a flexibilidade de gestão, a qualidade dos serviços e
as prioridades ao consumidor como aspectos centrais na tendência dominante
nos anos 80. Em seguida analisa a abordagem do public service oriented e as
transformações da administração norte-americana. É uma excelente leitura para
quem quiser se situar no debate sobre a gestão pública inovadora.
Questões
1. Os valores predominantes na administração pública, até a Revolução
de 30, eram totalmente compatíveis com uma visão patrimonialista do
Estado. Justifique.
2. Durante os governos militares houve um impulso modernizador
na gestão pública federal. Quais foram os principais avanços do
período?
3. A história da gestão pública brasileira foi marcada por avanços e
retrocessos nas últimas sete décadas. Explique.
Referências comentadas
NUNES, Edson. A gramática política do Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 1997.
Este livro, originado de uma tese de doutorado do autor na Universidade de
Berkeley, na Califórnia, aborda os modelos básicos que explicam as relações entre
Estado e Sociedade no Brasil. Seriam quatro as “gramáticas”: o clientelismo, o
corporativismo, o insulamento burocrático e o universalismo de procedimentos.
A partir delas o autor analisa a trajetória do Estado Brasileiro, de Vargas até o
final da ditadura militar. Leitura indispensável para entender a influência que
os padrões políticos e estilos de governo têm na gestão pública brasileira.
A gestão pública no Brasil 51
Governabilidade e accountability
na gestão pública
4.1 Governabilidade e governança
A gestão pública é influenciada diretamente por duas variáveis fundamentais
da política e da institucionalidade: a governabilidade e a governança. Vamos
analisar mais um pouco o significado delas.
A “governança” está relacionada aos supostos institucionais para que
ocorra a otimização do desempenho administrativo. Ela seria o conjunto de
instrumentos e ferramentas técnicas de gestão que assegurariam a eficiência e a
democratização das políticas públicas. Alguns autores encaram a “governança”
como a capacidade de ação estatal na implementação de políticas e projetos, na
execução de metas coletivas.
Há também uma dimensão participativa na governança. Ela pode significar
os procedimentos para lidar com a pluralidade da sociedade, com os múltiplos
interesses sociais. O fator determinante para avaliar a governança de um
determinado Estado ou governo é a competência dos gerentes e administradores
públicos no cumprimento das metas. E esta avaliação deverá sempre ser feita
considerando a complexidade do mundo atual e a grande heterogeneidade de
interesses e posicionamentos da sociedade.
A “governabilidade” por sua vez se refere às condições e ao contexto do
ambiente político em que se efetivam as ações administrativas. Ela se relaciona
54 Governabilidade e accountability na gestão pública
Fica evidente para nós que os padrões da boa governança dependem muito
do contexto em que o Estado está inserido e quais as relações que estabelece.
Neste sentido, é impossível dissociar a governança da governabilidade. Não
existem técnica ou modelos administrativos universais, como receitas genéricas,
válidos para todos os contextos. O contexto implica saber qual é a cultura
política, qual o padrão de articulação do Estado com a sociedade, como os três
poderes interagem, qual a capacidade do Estado em resolver os problemas reais
e assim por diante.
final dos bens e serviços públicos, nunca foi consultada. A burocracia do Estado
funcionava como se estivesse trabalhando para seus chefes, no fundo para si
mesma, e não para um cliente-cidadão, sujeito de direitos.
O próprio comportamento dos servidores públicos contribui para baixos
níveis de accountability. Ora desprezados pela sociedade, considerados parasitas
e ociosos, ora temidos como tecnocratas, os servidores públicos quase nunca
tiveram uma imagem positiva. Normalmente, associamos a carreira pública a
uma espécie de “sorte grande”, como se fosse uma premiação ou recompensa
que garantisse um futuro tranquilo sem muito trabalho e responsabilidade.
Neste clima a cultura da prestação de contas, da responsabilidade pessoal, nunca
pode prosperar.
Hoje em dia a presença do Estado é sentida e percebida em todas as
dimensões da vida humana, independente de origem, cor, gênero, raça ou
posição social. Viver sem o Estado ou contra o Estado é virtualmente impossível.
Neste ambiente a accountability torna-se um valor ainda mais precioso. A
gestão pública inovadora deve incorporar a accountability como elemento
fundante de seu aperfeiçoamento. O próprio valor da democracia diminui e se
enfraquece sem uma cultura de responsabilidade. A burocracia pública atua
verdadeiramente como se fosse um ator político, influenciando os rumos dos
governos legitimamente eleitos pelo povo. A cidadania precisa ter garantias
contra o uso arbitrário do poder e as condutas antiéticas.
A única forma de accountability é praticamente o processo eleitoral. Na
eleição o eleitor faz implicitamente um juízo de valor sobre o governo. Ele
poderá premiar o governante mantendo-o ou puni-lo não o elegendo. Contudo
as eleições são formas altamente imperfeitas de avaliação dos governos. Nem
sempre os cidadãos-eleitores estão bem informados sobre os resultados do
governo, há processos claros de manipulação da opinião pública com técnicas
de marketing e publicidade. Por outro lado, o controle é feito sempre ex post, isto
é, o cidadão-eleitor só saberá se suas preferências e interesses foram respeitados
depois que os erros ou omissões dos governos aconteceram, nunca antes, nem
durante. Os partidos políticos, por exemplo, deveriam ser verdadeiras escolas
de governo, mas não são. Eles contribuem para o monopólio do poder político,
são dominados por grupos e oligarquias e não têm uma cultura de prestação
de contas à sociedade.
58 Governabilidade e accountability na gestão pública
Questões
1. A governabilidade é muito importante nos regimes democráticos.
Por quê?
2. Quando os governos tem problema de governança a capacidade de
execução das políticas é reduzida. Você concorda com esta afirmação?
Justifique sua resposta.
3. A accountability é um conceito relativamente novo na gestão pública
brasileira. Este conceito tem relação com a eficiência e a eficácia na
gestão inovadora? Por quê?
Referências comentadas
ARAÚJO, Vinícius de Carvalho. A conceituação de governabilidade e
governança, da sua relação entre si e com o conjunto da reforma do Estado e
do seu aparelho. Cadernos ENAP, nº 45. Brasília: ENAP, 2002.
O objetivo deste curto mas significativo trabalho foi introduzir o leitor às
principais abordagens feitas sobre os conceitos de governabilidade e governança.
Para isso o autor tomou como referência a elaboração de importantes autores no
campo da gestão pública no Brasil: Bresser Pereira, Eli Diniz e Caio Marini.
Entretanto, estas enormes diferenças não impedem que a gestão pública adote
cada vez mais instrumentos e ferramentas de gestão já testadas e aplicadas há anos
pelo setor privado. Boa parte delas é aplicável em qualquer tipo de organização
que tenha uma burocracia, recursos disponíveis e finalidades claras para executar.
Neste sentido, grandes corporações privadas têm muita semelhança no plano
organizacional, com grandes organizações públicas. Por exemplo, ferramentas
de avaliação de recursos humanos, técnicas de elaboração de projetos, conceitos
de organização de organogramas ou sistemas de informações gerenciais são
muito parecidos nas duas esferas.
O programa é articulado sempre em parceria, formando redes entre
organizações públicas. A partir de 1999 ele mudou de nome no governo
federal para “Programa de Qualidade no Serviço Público” e está orientado
para a distribuição de uma premiação nacional, à semelhança das organizações
privadas. No início o programa teve uma função mais de sensibilização e
capacitação com foco em técnicas e ferramentas. Depois evoluiu para o foco
na gestão de resultados e finalmente hoje o programa se estrutura com foco na
satisfação do cidadão, que é um conceito abrangente e estratégico.
da Fazenda podem não contemplar esta ação ou isso não ser importante no
momento para aquele setor. Outra ação poderia ser “implantar infraestrutura de
transporte no distrito industrial da zona leste”. Ora, o departamento municipal
que cuida das ruas e do transporte pode não ter na sua agenda este objetivo. E
assim por diante.
Um outro passo importante é o fortalecimento e a integração das funções de
planejamento, orçamento e gestão. Em uma perspectiva orientada para resultados
é recomendável que se dê ênfase ao planejamento e à gestão estratégica, à
elaboração e execução orçamentária e financeira orientada pelos resultados
dos programas, a um processo contínuo de evolução organizacional, que tenha
o objetivo de agregar à gestão por programas todas as estruturas formais e os
processos decisórios da organização.
Na gestão por programas o papel do gerente ganha relevância e importância. É
ele quem garante a articulação e tem a liderança para viabilizar a transversalidade
entre órgãos e departamentos diferenciados. O gerente deve ter a um só tempo
perfil técnico e político, um perfil tecno-político. Técnico porque deve entender
com profundidade do assunto que vai gerenciar, suas variáveis, dinâmica e fatores
críticos de sucesso. E político porque deve saber transitar entre as várias esferas
de governo e ter legitimidade perante os gestores públicos.
As funções do gerente do programa devem ser múltipla, ele deve ser
capaz de:
• planejar a execução do programa;
• formar e motivar a equipe;
• negociar os compromissos com as parcerias externas e internas;
• manter um sistema de informações gerenciais para o controle do
desempenho e da gestão de restrições;
• promover a execução das ações para obter os resultados desejados;
• participar da administração orçamentária e financeira;
• comunicar-se com o público-alvo do programa;
• Avaliar e aperfeiçoar continuamente o programa.
68 A excelência dos serviços públicos
Questões
1. Para você o que significa ter excelência na gestão pública?
2. Se você é um servidor público, sua organização poderia participar do
GesPública? Justifique a resposta.
3. Na sua opinião, que adaptações devem ser feitas nos modelos gerenciais
empresariais para que possam ser utilizados na esfera pública?
Referências comentadas
LIMA, Paulo Daniel Barreto. Excelência em gestão pública – a trajetória e a
estratégia do Gespública. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2007.
O livro é um verdadeiro manual de avaliação do sistema de gestão. Paulo
Daniel destaca alguns aspectos essenciais da proposta do GESPÚBLICA,
referentes ao entendimento do Modelo de Excelência em gestão pública proposto
pelo Programa e dos critérios de avaliação dele desdobrados. Segundo o autor,
a obra é o primeiro registro do desenvolvimento de um programa, que tem a
intenção de transformar a prática de gestão do setor público brasileiro.
A gestão de pessoas
nas organizações
Os modelos tradicionais de gestão de pessoas são cada vez mais inadequados
para enfrentar as novas necessidades e expectativas das organizações públicas
modernas. Aqueles velhos princípios da administração científica, baseados
no controle e na unidimensionalidade da pessoa, não são mais adequados. A
globalização, a complexidade, a imprevisibilidade levaram à maior flexibilidade
e mudança rápida de sistemas e referências.
Segundo estudos da União Europeia, a moderna Gestão de Recursos
Humanos (GRH) relaciona-se fortemente com a visão, a missão e os objetivos
operacionais da organização. Os seguintes elementos da política e estratégia
de GRH são características importantes e a diferenciam da administração de
pessoal tradicional:
1. os empregados são considerados os recursos mais valiosos da
organização;
2. a GRH é uma responsabilidade direta dos gestores de linha e está
intimamente ligada à gestão de desempenho;
3. a GRH baseia-se em valores, fortalecendo o compromisso com a missão
e os valores da organização;
4. a GRH pauta-se por políticas expressas e documentadas;
72 A gestão de pessoas nas organizações
fontes e na prática é uma combinação variável de cada uma delas. O fato é que
uma atitude de liderança implica acumular recursos de poder sobre as equipes
e as organizações.
Responsabilidade:
• obrigação de uma pessoa fazer algo para alguém;
• necessidade de prestação de contas pelo trabalho realizado;
• quanto maior a demanda de prestação de contas, maior será a quantidade
de autoridade delegada.
Autoridade:
• o direito de fazer alguma coisa;
• uma ordem, uma referência, um direito, pode ser qualquer coisa que
exerce influência;
• varia conforme o nível hierárquico.
Comunicação:
• rede por onde fluem as informações e o conhecimento;
• pode ser formal se planejada, ou informal se espontânea;
• o fluxo informal pode ser negativo ou positivo para a organização.
Uma série de amarras legais e institucionais, por exemplo, que servem como
proteção do cidadão contra eventuais usos clientelistas do governo, também
criam um efeito colateral de maior rigidez administrativa.
Normalmente, a especialização vertical e horizontal andam juntas. O
tamanho do organograma de uma organização depende do tamanho da
própria organização e da complexidade dos resultados que ela deve produzir.
A departamentalização funcional, a que predomina, é mais indicada quando as
funções da organização mudam muito pouco e suas tarefas são continuadas e
repetitivas. É a mais utilizada no setor público. Quando os departamentos são
organizados por produto ou serviço, há uma facilitação da coordenação interna
e do processo de cooperação entre especialistas.
Um outro tipo de organização é aquele que se forma através de uma
combinação da organização de linha com um staff. Mantém-se a linha de
comando e controle, mas cada órgão em seu nível recebe a assessoria horizontal
de um grupo, chamado de staff. Geralmente, estes órgãos de assessoria prestam
informação especializada, ajudam no processo decisório e fazem o planejamento
e a gestão das determinações superiores.
O quadro a seguir ilustra algumas das principais diferenças entre staff e
linha.
É quem dá consultoria e
Atuação É quem cuida da execução
assistência
Comando Recomendação
Tipo de atividade Ação Alternativas
Trabalho de campo Trabalho de gabinete
Pela operação e pelos Pelo planejamento e pelas
Responsabilidade
resultados sugestões
Exemplo Gerente de departamento Gerente de staff
A gestão de pessoas nas organizações 87
Questões
1. Porque a chamada “gestão de competências” é mais adequada ao estilo
gerencial de administração? Justifique sua resposta.
2. Como deve ser a estrutura organizacional nas organizações públicas
inovadoras?
3. Na sua visão a liderança é importante para a gestão inovadora?
Justifique.
A gestão de pessoas nas organizações 89
Referências comentadas
CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2006.
Este livro foi elaborado originalmente para auxiliar os estudantes de nível
superior nos concursos públicos relacionados às carreiras federais que são muito
exigentes na área da gestão pública. Na verdade, o livro adquiriu uma densidade
e uma abrangência ímpares na literatura disponível. Inicia comentando as
escolas clássicas da administração para em seguida entrar nos assuntos típicos
da gestão pública: processo administrativo, gestão de pessoas, comportamento
organizacional até as novas abordagens da recente reforma gerencial. É
indispensável para quem quiser se aprofundar no assunto.
Melhoria com muitas metas. É bom lembrar que a organização tem suas metas
finalísticas e precisa compartilhar a melhoria da gestão com vistas ao aumento
da capacidade de desempenho.
Vale ressaltar algumas recomendações no momento da priorização das
oportunidades de melhoria:
• resistir à vontade de considerar todas as oportunidades de melhoria
como prioritárias;
• priorizar, pelo menos, uma importância, não se deixar seduzir pelas
urgências;
• identificar objetivamente o principal critério de priorização a ser
utilizado;
• a melhoria da qualidade dos serviços disponibilizados aos cidadãos
deve levar em consideração a eficiência da ação pública com ênfase na
capacidade de fazer o máximo com os recursos disponíveis;
• as atividades finalísticas da organização são preferenciais como estratégia
de atingir mais rapidamente o cidadão-usuário;
• as ferramentas auxiliam, mas não substituem a percepção da organização
sobre si mesma;
• considerar os fatores críticos de sucesso na busca da excelência em
gestão;
• fatores críticos para o sucesso são condições fundamentais que precisam
necessariamente ser satisfeitas para que a instituição ou a estratégia
tenha sucesso, tais como: credibilidade; compromisso e aceitação.
esforço adicional, uma ruptura, uma visão ousada, porém atingível, dentro de
um tempo previamente estabelecido:
• formuladas a partir das oportunidades de melhoria (OM);
• quantificadas, portanto, mensuráveis;
• desafiadoras, mas exequíveis.
1) Identificação
Esta é a fase para preparação do projeto, quando são checadas as condições
de possibilidade para sua elaboração e execução. O planejador deve fazer uma
primeira abordagem da situação problemática, investigar os limites institucionais
de atuação, saber se o âmbito de solução do problema está dentro ou fora da
governabilidade imediata do ator que planeja.
O resultado imediato da fase de identificação do projeto é saber se há
viabilidade para o projeto diante da problemática trabalhada no início do
planejamento. O processo de planejamento – no qual o projeto se insere como
peça fundamental – já indicou a identificação de uma situação problemática,
descortinando um fluxograma explicativo para cada problema analisado. A
identificação do projeto é o primeiro “descobrimento” das grandes linhas de ação
para enfrentar o problema; cabe perguntar, portanto, até que ponto o projeto
tem sustentabilidade política, institucional, financeira, etc... Trata-se, pois, de
uma “identificação inicial” de grandes linhas e oportunidades de ação.
2) Elaboração
1º passo: identificar os objetivos do projeto
Uma das maiores fontes de fracassos dos projetos é a possibilidade de leituras
contraditórias sobre os objetivos que o projeto quer alcançar, feitas às vezes por
setores diferentes da mesma organização ou empresa. A precisão e a exatidão das
formulações, portanto, devem ser bastante rigorosas. Um projeto sem objetivos
fica sem foco de atuação, dificulta qualquer processo de monitoramento ou
avaliação de desempenho, não há como medir o grau de sucesso ou fracasso,
nem responsabilizar os responsáveis pela sua execução. Recomenda-se por
102 Metodologias de gestão inovadora
o método ZOPP não é um fim em si mesmo, deve ser visto como parte de um
sistema de gestão em que o realmente importante é a execução do projeto, ou
seja, o constante replanejamento diante dos imprevistos e das incertezas da
realidade.
Os gestores não devem esquecer que a simplicidade e a elegância do método
não garantem, por si só, a qualidade daquilo que é feito e implementado. Talvez
um dos maiores resultados do método seja a construção de um nível de consenso
e acordo entre os participantes.
2 ESTRATIFIQUE
3 COLETE DADOS
(DESDOBRAMENTO)
OS PROBLEMAS JÁ ESTÃO NUM TAMANHO
? QUE POSSAM SER RESOLVIDOS A NÍVEL
DE CHEFIA DE SEÇÃO?
ATRIBUA RESPONSABILIDADES
5 PELA SOLUÇÃO DOS
PROBLEMAS
Comunicando e estabelecendo
vinculações Feedback e aprendizado estratégico
Metodologias de gestão inovadora
Ele pode ser utilizado também para mapear e identificar processos. Como
não requer maior fundamentação teórica ou assessoria externa, é de emprego
universal. A ideia é sua aplicação de origem a um “plano de ação” para enfrentar
uma situação problemática ou aproveitar uma oportunidade. Como segue:
PLANO DE AÇÃO
1. O que fazer?
2. Por que fazê-lo?
3. Quem o fará?
4. Quando será feito?
5. Onde será feito?
6. Como será feito (método)?
7. Quanto custará a ação?
Questões básicas:
• Existem operações ou procedimentos que podem ser melhorados?
• No que ou por que seus concorrentes operam melhor que a sua
organização?
• Existe algo inoperante de que sua empresa deveria estar ciente?
• Seus concorrentes têm um certo segmento de mercado conquistado?
Análise Interna
Desativação: Melhoria:
Pontos fracos área de risco acentuado área de aproveitamento potencial
Aproveitamento:
Enfrentamento:
Pontos fortes área de domínio
área de risco enfrentável
da empresa
A análise SWOT pode ser muito útil como ferramenta auxiliar para
fomentar um brainstorming no início de um debate sobre cenários futuros
para a organização ou seminários de planejamento estratégico. O SWOT é
especialmente útil para a gestão de riscos, porque permite visualizar num mesmo
quadro fontes internas e externas de riscos para os projetos e ações.
Deve-se ter o cuidado para não congelar a análise, a realidade é dinâmica e
os pontos mais importantes devem ser monitorados o tempo todo. Ainda mais
porque boa parte das informações dependem de eventos externos, muitos fora
da governabilidade da organização.
Metodologias de gestão inovadora 117
observa e faz a análise. Ser objetivo não é “ser neutro” ou “imparcial”, mas
analisar a realidade com a máxima consciência possível dos próprios
vieses e distorções de foco (admitir uma certa “cegueira situacional”);
• completa: significa uma negociação permanente entre o que é viável e
factível e o que é ideal e perfeito, dados coletados à exaustão geralmente
tornam o processo avaliativo nebuloso e difuso, a necessidade de
focalização é permanente;
• validade e confiabilidade: exige coerência entre os instrumentos e
conceitos usados pela medição e o que se pretende medir. Depende da
estabilidade e da qualidade dos dados coletados;
• qualidade: é a adequação entre a informação obtida e o uso que se quer,
é uma condição necessária para a boa avaliação;
• estabilidade: desde que sejam adotados os mesmo métodos e conceitos,
os resultados da avaliação não devem variar com o avaliador.
não seja formativa (isto é, que não contribua para a tomada de decisão
aprimorada) é irrelevante e constitui uma perda de recursos;
• a responsabilidade é uma condição que permite governar melhor, e a
avaliação é um dos instrumentos mais importantes para a melhoria
do setor público, pois possibilita a tomada e a prestação de contas pela
atribuição de responsabilidade;
• para ser eficiente, a avaliação precisa ser sustentada por uma cultura
de aprendizado: sem esta, corre o risco de se tornar um exercício
irrelevante, ou, pior, uma restrição burocrática sufocante;
• como parte integrante do aprendizado organizacional, a avaliação é um
processo contínuo e interativo – uma conversa ou um discurso crítico
com as pessoas envolvidas na execução ou atingidas pelas políticas,
programas, projetos avaliados e, principalmente, com os que podem
tomar decisões pertinentes;
• no setor público, a avaliação é ao mesmo tempo um medidor de eficácia
e um veículo de responsabilidade. Nesse sentido, é um instrumento
indispensável ao governo.
Questões
1. Por que utilizar uma metodologia na gestão inovadora é importante?
Justifique.
2. Na sua opinião, existe um método ideal para resolver problemas da
organização? Justifique.
3. Num plano de melhoria gerencial, qual seria a importância do plano
de capacitação?
126 Metodologias de gestão inovadora
Referências comentadas
MARINHO, Sidnei. Uma proposta de sistemática para operacionalização da
estratégia utilizando o Balanced Scorecard. Tese de Doutorado no Programa
de Pós-Graduação em Engenharia da Produção da UFSC, 2006.
O objetivo deste excelente trabalho de pesquisa (disponível na web) foi o de
aprofundar os princípios e as práticas da utilização da medição de desempenho,
o trabalho busca consolidar uma sistemática para operacionalização da
estratégia utilizando o Balanced Scorecard por meio de análise crítica da pesquisa
bibliográfica e da utilização do Método Delphi para consultar especialistas da
área. O autor utiliza técnicas como o SWOT e o Método da Global Business
Network para enriquecer a aplicação prática do BSC.
Momentos e método
Algumas advertências metodológicas prévias e cautelares são necessárias
para o encadeamento do roteiro proposto:
• Mais do que um conjunto de técnicas, o que se pretende é construir
e disponibilizar coletivamente um enfoque metodológico baseado na
visão estratégica e situacional que incorpore radicalmente elementos de
140 Planejamento e gestão inovadora
A missão: o que é?
É a atividade essencial da finalidade e razão da existência de uma organização.
Esta definição serve para qualquer instituição pública, seja da administração
direta ou da indireta ou organizações sociais e sem fins lucrativos.
Contudo, há uma distinção que se deve adotar na caracterização deste
conceito, em relação a como é entendido pelo setor privado ou mercantil.
Esta caracterização é importante em razão da reduzida produção teórica desse
conceito, vinculando-o à atividade pública.
No setor privado, pode-se escolher livremente a missão que se desejar,
desde que atenda ao reclame de seu público-alvo, a um determinado foco, a
uma certa qualificação ou excelência, e se incorpore isso à imagem via missão
de valores dignificantes, apontando em direção à aceitação social – e sobretudo
mercadológica – da empresa pela relevância da atividade. Em última instância,
no setor privado a “razão de existência” da empresa é sancionada ou não pelo
mercado, é a perspectiva de demanda presente ou expectativa futura de realização
que justifica a existência da entidade.
No setor público, a missão de qualquer de suas instituições deriva de um
permissivo legislativo. Ela está condicionada às regras de responsabilidade
do jogo macroinstitucional, não há liberdade imediata de arbítrio por parte
do gestor na definição da “razão de existência” de uma organização pública.
Uma disfunção de tal natureza geraria tensões entre a conduta do governo e a
legalidade pré-constituída, o que pode, inclusive, ser uma opção consciente que
forma parte da direcionalidade do governo.
146 Planejamento e gestão inovadora
Quem participa?
É o momento instituinte da direção do órgão, indelegável e indispensável
para desencadear todo o processo de planejamento e gestão estratégica. Não se
pode delegar a outras instâncias da organização uma possível “interpretação”
das diretrizes da direção, ela mesma deve traduzir sua leitura do programa de
governo para o processo de planejamento.
Como fazer?
Deve decorrer da adaptação reflexiva, sobre a instituição a ser planejada,
deduzindo das diretivas fundantes, a Missão, uma Visão de Futuro, as Diretrizes
Políticas do Programa de Governo. Tais diretivas, para se constituírem num corpus
148 Planejamento e gestão inovadora
AMEAÇAS OPORTUNIDADES
MISSÃO
(Limites) (Potencialidades)
VISÃO de futuro
VALORES
INSTITUCIONAIS
DIRETRIZES ESTRATÉGICAS
Qual objetivo?
O objetivo deste passo é crucial para viabilizar o processo do planejamento
estratégico, com enfoque participativo. Em primeiro lugar, é preciso reconhecer
150 Planejamento e gestão inovadora
Como fazer?
O facilitador – consultor externo, moderador ou coordenador – (não
é aconselhável a apresentação por membro da direção) deve apresentar o
planejamento institucional que contém as principais informações sobre a
avaliação situacional do órgão. A seguir, deve-se debater a partir da Missão,
Visão de futuro, Valores, análise de oportunidades e ameaças até chegar nas
Diretrizes Estratégicas.
É importante deixar claro que as diretrizes são prerrogativas da direção,
porém elas não estão acima, nem abaixo, da crítica do coletivo presente ao
seminário. Este deve, se for o caso, propor formulações alternativas com leituras
diversas para convergência de expectativas e acordos internos.
Planejamento e gestão inovadora 151
Quem faz?
O Grupo de Planejamento em plenária, a princípio. Pode-se, conforme
as circunstâncias (para ganhar tempo, por exemplo), dividir o grande grupo
em grupos menores para análise de oportunidades e ameaças. É vital para o
planejamento que a direção política do organismo esteja totalmente envolvida
desde este primeiro debate.
Planejamento e gestão inovadora 153
Qual objetivo?
O problema é fundamentalmente uma situação desconfortável para o ator
que pode ser evitada. Isto é, o problema deve tornar-se um centro prático de
ação, mesmo que existam variáveis ligadas à explicação do mesmo, sobre as
quais possuímos baixa governabilidade. A identificação, seleção e explicação do
problema (através do fluxograma explicativo ou “árvore do problema”) é passo
fundamental porque dele deriva toda a construção posterior da metodologia.
Na percepção de Matus:
(2) permite construir uma visão mais sistêmica e holística sobre possíveis
estratégias.
(3) contribui para hierarquizar recursos escassos e focalizar as energias de
gestão.
(4) ajuda pedagogicamente nos processos de aprendizagem e participação
internos.
Como fazer?
A identificação do problema segue, normalmente, uma sequência onde:
• o grupo define uma listagem de problemas com liberdade total de
critérios. Pode-se estimular o debate a partir da análise do “triângulo de
governo”, que relaciona nos vértices as categorias “Projeto de Governo”,
“Governabilidade” e “Capacidade para Governar”. Normalmente, o
debate sobre estes três pontos enseja uma “chuva de ideias” sobre os
problemas da organização;
• o facilitador ou o monitor promove a “limpeza” de problemas mal-
formulados ou confusos, inquirindo o grupo e provocando a reflexão
sistemática sobre os resultados da produção coletiva;
• o uso de tarjetas (pedaços retangulares de cartolina colorida onde
os participantes escrevem seus argumentos) ou outro método de
visualização é fundamental, pois garante a participação de todos. Aqui
cada palavra ou frase pode ter múltiplos significados;
• a descrição ou a redação de um problema deve ser feita de forma
negativa, isto é, expressando um sentido de negatividade de não
conformidade, etc.;
• tradicionalmente, iniciamos por definir soluções mesmo sem
saber quais problemas elas supostamente estão tentando resolver.
No planejamento estratégico, com enfoque participativo ocorre o
contrário da reflexão convencional;
• é fundamental colocar um só problema por tarjeta, facilitando a
recomposição visual das ideias durante o processo de seleção. Na
medida em que os problemas de redação são filtrados e corrigidos, o
entendimento e validação das declarações e o processo de seleção ou
priorização pode iniciar;
• devemos passar, em todas as fases ou passos, de uma situação de
reflexão extensiva para outra de priorização e seleção intensiva, ou
seja, de focalização permanente naquilo que é sempre prioritário, que
é anterior;
• o grupo deve separar três categorias analíticas que envolvem a
identificação de problemas: as causas, os efeitos e os sintomas do
Planejamento e gestão inovadora 157
Algumas analogias ilustram as diferenças entre estes três tipos de causas dos
problemas ditos “quase-estruturados”. Na hidráulica as regras seriam o regime
de chuvas, as acumulações a água dos rios e os fluxos a correnteza; nas finanças
as regras seriam os regulamentos do mercado de capitais, a acumulação o capital
financeiro e o fluxo a aplicação do capital, que pode gerar novas acumulações
ou não.
Exemplos de problemas quase-estruturados na administração pública:
“Ineficiência dos serviços de transporte coletivo”, “Excessiva concentração
da renda”, “Baixa produtividade do funcionário público”, “Inviabilidade do
modelo previdenciário atual”, “Inexistência de mecanismos participativos
na gestão”, “Baixo desenvolvimento econômico regional”, “Poucos recursos
tributários próprios do município”, “Baixa consciência política da população”,
“Sistema de monitoramento do governo é precário”, “Relação desqualificada
entre administração e sindicatos”, “Planejamento burocrático e normativo é
dominante”.
A explicação situacional de um problema gera um conjunto de causas
interligadas (fluxograma situacional), se selecionarmos, por exemplo, dois
problemas centrais para cada diretriz estratégica, dependendo do número de
diretrizes haverá dezenas de causas a serem resolvidas. É aqui que operamos
mais uma vez com o conceito de seletividade e hierarquia do método, devemos
160 Planejamento e gestão inovadora
DIRETRIZ ESTRATÉGICA
PROBLEMA(s) SELECIONADO(s)
(CAUSAS DO PROBLEMA)
(DESCRITORES DO PROBLEMA) (EFEITOS DO PROBLEMA)
regras – acumulações – fluxos
Este quadro (em ambas as formas) deve registrar com precisão quais são os
problemas escolhidos para enfrentamento. A sinalização dos descritores ajuda no
momento de debater indicadores e monitoramento, enquanto que a precisão das
causas é fundamental para o desenho normativo do plano. Um problema central
para cada diretriz ou dois a três problemas para o conjunto de diretrizes.
Agora temos vários problemas, todos verdadeiros, bem redigidos,
compreensivos e de enfrentamento necessário para atingir ou aproximar-nos das
diretrizes. Apesar do pressuposto metodológico de que os debates e construção
de consenso de grupo são objetivos permanentes, estes dependem do tempo
disponível e do grau de divergência que se apresente no momento e de qual é a
maturidade do grupo para processá-la. O consultor deve priorizar os problemas,
o ideal é um ou dois problemas em cada diretriz. Para isso utilizam-se técnicas
de priorização, como, por exemplo, aquelas baseadas em pontuação livre dos
participantes, em um sistema de apostas, com valor máximo e mínimo.
PROBLEMAS
P1 P2 P3 P4
DIRETRIZ
D1
D2
D3
utilidade fica evidente no auxílio à decisão sobre quais problemas têm maior
impacto negativo nas diretrizes. As noções de governabilidade, capacidade de
governo e projeto político surgem com intensidade neste tipo de debate, pois a
valorização dos problemas é sempre situacional e distinta entre os membros da
organização. A natureza do problema selecionado determina em grande medida
a qualidade do processo de planejamento e do modelo de gestão.
PROGRAMA
OPERAÇÕES/
PROJETO: RECURSOS PRODUTO RESULTADO RESPONSÁVEL PRAZOS APOIO
AÇÕES
P1
P2
P3
Planejamento e gestão inovadora
167
168 Planejamento e gestão inovadora
AÇÕES OU
PROJETOS
Projeto 1 Projeto 2 Projeto 3
Ação... Ação... Ação...
DIRETRIZES
PROBLEMAS
DIRETRIZ 1
PROBLEMAS
DIRETRIZ 2
PROBLEMAS
Este quadro retrata uma relação muitas vezes difícil de perceber ou esclarecer:
a relação entre as ações adotadas pelo grupo e sua relação de impacto sobre
os problemas que objetivam resolver, organizados por Diretrizes Estratégicas.
Cabe lembrar que a cada diretriz estratégica proposta pela equipe dirigente um
conjunto de problemas foram identificados, selecionados e explicados. Se o
grupo ou a organização adotou um único macroproblema para resolver, então
na primeira coluna poderão ser listadas as principais causas do problema (os
nós-críticos).
VARIÁVEIS
OTIMISTA (B) PROVÁVEL (A) PESSIMISTA (C)
SELECIONADAS
1....................
2....................
3....................
CENÁRIO
Provável
CENÁRIO
Pessimista
Esta matriz está vinculada à anterior na medida em que, após análise de cada
cenário, muitas operações que anteriormente foram pensadas e desenhadas sem
esta reflexão agora serão modificadas com mais ciência e precisão a partir dos
cenários colocados. Conforme o balanço entre os três cenários e principalmente
o cenário provável, o grupo de planejamento terá teoricamente uma noção
maior da vulnerabilidade do plano diante da provável conjuntura futura do
jogo. Por exemplo, ações de alto impacto no problema que são rejeitadas no
cenário provável estão demandando nova reflexão sobre produtos, recursos ou
resultados esperados.
com o uso do poder que ela faz numa situação? Liberdade de ação é
poder? A variedade do possível para um ator expressa seu poder na
situação? Quanto vale o poder? Seu valor é absoluto ou é relativo
ao âmbito de seu uso? O poder é sempre relativo a outros? Qualquer
acumulação social é redutível a poder? Então, o que não é poder?
A informação, o domínio das ciências, o carisma, a simpatia, a
organização, os recursos econômicos, a ideologia assimilável, os
meios de comunicação, os meios de repressão, a adesão popular,
os deputados e senadores no Congresso Nacional e o controle do
aparelho de Estado são poder? Tudo isso, tão vago e tão complexo,
pode ser expresso em categorias operacionais que sejam úteis para
uma análise de viabilidade política?
Será necessário analisar a capacidade real “de jogo” dos atores, pois ela confere
poder real (ou não) às suas motivações e intenções. A motivação e a capacidade
de um ator conformam sua capacidade de pressão no jogo social, isto é, um
ponto de aplicação da força do ator.
• Deve-se proceder uma análise dos recursos controlados por cada
ator já analisado. Os recursos no campo do debate estratégico podem
ser de múltipla natureza, por exemplo, recursos econômicos, adesão
popular, controle dos meios de comunicação, controle de bancadas
parlamentares, etc. Uma técnica de visualização gráfica simples consiste
em montar uma matriz de dupla entrada com os recursos relevantes na
primeira coluna e os atores na primeira linha, as casas são preenchidas
com alguma graduação que pode ser quantitativa (percentual, por
exemplo) ou qualitativa (alto, médio e baixo). Os atores mais críticos
para o problema estratégico são os que representam a um só tempo
os maiores graus de motivação, contra e a favor, com as maiores
capacidades expressas como controle de recursos críticos.
180 Planejamento e gestão inovadora
Motivação
Pressão Ação
Força
AÇÕES
A1 A2 A3 A4 A5
RECURSOS
FINANCEIROS
COGNITIVOS
POLÍTICOS
Outros...
ATORES SELECIONADOS
Projetos e operações
AÇÃO 1
AÇÃO 2
AÇÃO 3
Quem acumulou poder? Por quê? Quais as estratégias adotadas? O que estava
realmente em jogo?
A seguir algumas perguntas orientadoras que o facilitador ou consultor
pode desenvolver junto ao grupo para estimular a reflexão sobre o debate de
estratégias:
1. Quais as motivações dos nossos oponentes ou concorrentes?
2. Quais os motivos dos nossos aliados ou parceiros?
3. Quais projetos ou ações nossas têm maior oposição ou concorrência?
Por quê?
4. Quais estratégias possíveis viabilizarão as operações mais críticas (que
mobilizam mais oposição e recursos)?
5. Quais recursos os demais atores controlam e que são importantes para
o êxito do nosso plano?
6. Como podemos usar/neutralizar suas capacidades?
7. Devemos redesenhar as operações e projetos? Repensar os cenários?
Como se comportam nos cenários?
8. Estamos preparados para adotar a melhor estratégia?
Segundo Matus:
original. Geralmente, este período tem sido de seis meses ou um ano, a depender
do ritmo e da evolução das ações e da situação do problema.
mais variabilidade de impactos positivos que outros, e devem vir antes, devem
ser prioritários. A leitura vertical desta matriz sugere uma visão do conjunto
de dependências de cada projeto em relação aos demais (teste de coerência
interna).
O problema fundamental do gestor na estratégia situacional é desenvolver a
perícia tecno-política necessária para conduzir e calcular a conjuntura, tendo em
vista o conjunto de análises elaboradas sobre o impacto das ações ou projetos.
Como nos diz mais uma vez Matus:
Op. 1
Op. 2
Op. 3
Questões
1. O planejamento estratégico é uma das funções mais complexas e
importantes na gestão inovadora. Você concorda? Justifique sua
resposta.
196 Planejamento e gestão inovadora
Referências comentadas
MATUS, Carlos. Política, planejamento e governo. Tomo I e II. Brasília: IPEA,
1993.
Esta é a obra fundamental de Carlos Matus, traduzida e publicada pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada do Ministério do Planejamento em
1993. Matus expõe sistematicamente o que ficou conhecido como Planejamento
Estratégico e Situacional. Mais do que um método, o PES é uma metalinguagem
sobre planejamento, é filosofia de planejamento. O autor se propõe a uma
critica demolidora do estilo de planejamento governamental dos governos da
América Latina e propõe uma visão mais contingencial ou situacional, baseada
na complexidade da administração pública e na imprevisibilidade dos cenários
sociais, políticos e econômicos.
MATUS, Carlos. O líder sem estado maior. São Paulo: FUNDAP, 2000.
Neste livro o já falecido economista chileno Carlos Matus elabora com
maestria e brilhantismo uma profunda crítica ao funcionamento dos governos na
América Latina. Ele desenvolve a tese de que a democracia se enfraquece quando
os governos são incapazes de resolver os problemas concretos dos cidadãos. Para
isso três variáveis são fundamentais: a governabilidade, a capacidade de governo
e o projeto de governo. Matus analisa também o funcionamento do Gabinete
Presidencial, mas sua reflexão vale para todas as estruturas de direção pública.
É de leitura obrigatória para quem trabalha ou quer conhecer a função pública,
especialmente se desempenhar funções de liderança e direção.
Temas emergentes
na gestão pública inovadora
O período que estamos vivendo no Brasil desde os anos 90 é um período de
reformas e de ajuste do Estado. Muitos temas emergem neste debate, as ideias
ainda não estão consolidadas e as conclusões ainda padecem de um saber
provisório.
Entre estes temas selecionamos alguns de especial relevância, para ajudar a
compor este mosaico de novos insights e potencialidades para a gestão pública
inovadora.
Neste capítulo vamos abordar os seguintes temas:
• o impacto das novas tecnologias, em especial os temas do governo
eletrônico;
• a gestão do conhecimento no setor público;
• os processos de participação social e parceria; e
• os novos formatos organizacionais criados pelo movimento de reforma
do Estado nos anos 90.
200 Temas emergentes na gestão pública inovadora
lugares muito distantes, sem prejuízo da sua qualidade. Imagine, por exemplo, no
benefício da educação e da disseminação de conhecimentos através da educação
a distância. Ainda mais num país com milhões de habitantes e dimensões
continentais como é o Brasil.
Devemos centralizar os serviços em portais, por exemplo, mas descentralizar
o poder por meio da difusão de informações. Há perdas ao não descentralizar
que devem ser contrabalançadas.
Esta é exatamente a lógica dos portais em que o cidadão, em tese, tem uma
oferta integrada de serviços de acordo com suas demandas e não de acordo
com as divisões administrativas e departamentais. Atualmente, as tecnologias
204 Temas emergentes na gestão pública inovadora
ainda são usadas de forma verticalizada, cada organização pública tem seu site,
seus serviços, seus contact centers. O problema não é somente colocar todos os
serviços juntos virtualmente, é fazer com que troquem informações.
Quase não há compartilhamento de cadastros ou informações complementares,
serviços prestados com base na residência, por exemplo, o que obriga o cidadão
a percorrer labirintos virtuais e uma verdadeira burocracia eletrônica. É como se
cada órgão tivesse um silo de informações do cidadão, independente dos demais
órgãos. Será de muito pouca eficácia substituir certidões e atestados em papel
pelos seus equivalentes eletrônicos, estes documentos não deveriam passar de
simples pontos automatizados em um workflow interdepartamental.
O governo eletrônico não se resume a um site público para pagar impostos
ou emitir certidões. A “lógica do guichê” não deveria ser reproduzida por meio
eletrônico, a tecnologia disponível permite criar uma nova relação com os
cidadãos, mais dialógica, de mão dupla, com interatividade. Estas facilidades
viabilizam algumas diretrizes da administração gerencial, inclusive a maior
participação dos cidadãos.
Em qualquer cenário futuro a presença da administração eletrônica será
uma constante. A virtualidade, a portabilidade, a miniaturização, os processos
em tempo real e os serviços públicos on-line serão expressões cada vez mais
naturalizadas e incorporadas no dia a dia. A conectividade ajudará a romper as
fronteiras do organograma, tornando as organizações mais flexíveis e permeáveis
hierarquicamente. Grupos e redes se formarão com maior fluidez, teremos
teletrabalho e telerreuniões com maior frequência.
Para resumir o impacto das novas tecnologias nas organizações, inclusive no
setor público, vamos apresentar os pontos colocados por Chiavenato:
• cadeias de comando mais curtas: a antiga cadeia escalar e linear de
comando está terminando. Os níveis hierárquicos mais enxutos
e flexíveis serão dominantes. As estruturas serão mais achatadas,
flexíveis e fluidas, proporcionando maior capacidade de adaptação das
organizações à conjuntura;
• menos unidades de comando: a autonomia das equipes nas relações
horizontais ou diretamente com os clientes está reduzindo a quantidade
de chefes e as unidades no topo da pirâmide;
• amplitude de controle mais ampla;
Temas emergentes na gestão pública inovadora 205
As organizações sociais
As organizações sociais, ou simplesmente OS, como ficaram conhecidas,
são um dos modelos de organização pública não estatal destinada a absorver as
atividades passíveis de publicização, ou seja, de se converteram em atividades
públicas, embora não estatais. Trata-se de uma propriedade pública não estatal,
constituída por associações civis sem fins lucrativos, que não são propriedade de
um indivíduo ou grupo e estão orientadas prioritariamente para o atendimento
de um interesse público.
No fundo as OS são um modelo de parceria entre o Estado e segmentos da
sociedade. O Estado emite as diretrizes e faz o controle, repassa recursos públicos
e em troca tem demandas sociais atendidas com menores custos coletivos e
maior qualidade dos serviços.
As OS têm autonomia administrativa bem maior que os órgãos da
administração direta ou indireta como as empresas, fundações ou autarquias
públicas. Em compensação, elas contratualizam metas e resultados com o poder
público, através de um Contrato de Gestão que estabelece objetivos, formas de
incentivo ou penalidades aos seus dirigentes. Juridicamente, elas são associações
sem fins lucrativos, com pessoa jurídica de direito privado. Normalmente, sua
qualificação como OS acontece mediante decreto do Poder Executivo, após o
atendimento de uma série de quesitos.
O modelo das OS não é um simples convênio de transferência de recursos
públicos para o setor privado não lucrativo. Os conselhos administrativos devem
ter representantes do Estado e da sociedade, e a gestão, ainda que privada, deve
atender os princípios da administração pública, além da orientação para os
resultados contratados.
Temas emergentes na gestão pública inovadora 215
O contrato de gestão
O contrato de gestão é um instrumento utilizado pelo poder público e pelas
entidades não estatais, mas com funções públicas para prestação de serviços,
como as OS e as agências executivas. O contrato deve ser assinado entre a
organização e um Ministério da administração direta que funciona como órgão
supervisor das metas, resultados e desempenho previstos.
Os resultados do contrato são aferidos periodicamente através de relatórios e
comissões conjuntas que publicam os resultados. Os órgãos de controle interno
e externo também auditam os resultados do contrato.
As agências reguladoras
Este formato institucional também precisa de uma qualificação por decreto
do executivo, criando uma autarquia especial para prestação de serviços
exclusivos do Estado. Elas foram uma das maiores inovações do plano de reforma
do Estado, foram inspiradas no modelo britânico conhecido como “Next Steps”.
Elas seriam autônomas, flexíveis e teriam as condições institucionais para
viabilizar a nova cultura gerencial proposta pelo Plano Diretor da reforma do
Estado. Deveriam ter contratos de gestão e um tipo de administração voltado
para obtenção de resultados.
Na gestão do presidente Fernando Henrique, quando foram criadas, apenas
o INMETRO foi qualificado como agência executiva. No modelo original
concebido pelo Plano Diretor as agências executivas têm:
• flexibilidade de gestão dos seus recursos humanos;
• reordenamento de sua estrutura organizacional, respeitando os limites
quantitativos autorizados para cargos comissionados;
• gestão orçamentária e financeira agregando os recursos em apenas um
projeto e/ou atividade, observando os demais grupos de despesa de
pessoal e outros custeios e capital.
Temas emergentes na gestão pública inovadora 217
Agências executivas:
• natureza jurídica de direito público;
• personalidade jurídica própria;
• sujeição aos princípios e regras da administração pública: licitação,
concurso, orçamento, controles interno e externo;
• qualificação: processo e requisitos;
• contrato de gestão – relação hierárquica x relação contratual;
• flexibilidades: autonomia financeira, limites de licitação, contratação
de servidores, controles de resultado;
• receitas próprias e flexibilidade salarial.
Organizações sociais:
• entidades criadas por “indução” e sob controle do Estado;
• natureza jurídica de direito privado;
• personalidade jurídica própria, não integra a administração;
• sujeição parcial aos princípios da administração pública;
• administração privada do patrimônio público;
• redução do aparelho estatal: substituição de entes estatais;
• qualificação: processo e requisitos;
• contrato de gestão;
Temas emergentes na gestão pública inovadora 219
• promoção do voluntariado;
• promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à
pobreza;
• experimentação, não lucrativa, de novos modelos socioprodutivos e de
sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito;
• promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e
assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar;
• promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da
democracia e de outros valores universais;
• promoção de estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias
alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos
técnicos e científicos nas áreas de atuação.
Questões
1. O processo de inovação na gestão pública passa pelo uso das novas
tecnologias de informação na área de gestão. Você poderia citar e
comentar alguns exemplos desta utilização que você conhece?
2. No processo de modernização do Estado surge com muita força a
importância da gestão do conhecimento. Um dos pilares desta gestão
é a transformação de conhecimento tácito em conhecimento explícito.
Que estratégias podem viabilizar este processo?
3. A participação dos cidadãos deixou de ser uma bandeira ideológica
ou política para tornar-se um dispositivo desejável e normal de gestão
eficiente e eficaz. Você concorda com esta afirmação? Justifique a
resposta.
Referências comentadas
NOGUEIRA, M. A. Um Estado para a sociedade civil: temas éticos e políticos
da gestão democrática. São Paulo: Cortez, 2004.
O Estado, atualmente, está em crise: tem desafetos à direita e à esquerda.
Marco Aurélio, porém, adverte contra os riscos de um “Estado sem sociedade
civil” e também contra os riscos de uma “sociedade civil sem Estado”. Nas
condições em que nos encontramos, arrastados num processo de mundialização
que não corresponde às nossas aspirações, temos, entretanto, a chance de
aproveitar importantíssimos avanços técnico-científicos, de promover uma
desprovincianização.
Por tudo isso, mesmo em plena globalização neoliberal, Marco Aurélio
Nogueira recusa a sedução de uma perspectiva catastrofista ou apocalíptica e
busca delinear um reformismo democrático radical, para que possamos vir a
ter acesso a formas de vida mais justas e mais inteligentes.
222 Temas emergentes na gestão pública inovadora
Questões
1. Quais elementos comuns podemos identificar nas experiências dos
governos de Porto Alegre, de Minas Gerais e no Ministério da Educação,
em termos de gestão pública inovadora?
2. Pense na sua cidade; que tipo de projeto, programa ou atividade
poderia ser desenvolvido pelo governo ou pela sociedade para tornar
a administração pública mais efetiva, eficiente e eficaz?
3. Se você fosse um gestor público na sua cidade, responsável pela prestação
de um serviço importante para a população, quais as principais medidas
a serem tomadas para modernizar a gestão pública? Justifique sua
resposta.
240 Experiências na gestão inovadora
Referências comentadas
CORRÊA, Izabela Moreira. Planejamento estratégico e gestão pública por
resultados no processo de reforma administrativa do estado de Minas
Gerais. Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro 41(3):487-504,
maio/jun. 2007
Reformar uma organização já é, administrativamente, uma tarefa árdua.
Reformar uma organização como o Estado pode ser ainda mais complicado.
Essa tarefa pode tornar-se menos complexa quando o governo é capaz de
estabelecer estratégias claras de intervenção no modelo de administração pública
e negociação com o Legislativo. Neste artigo o autor desenvolve o argumento
de que o processo de reforma do estado em Minas Gerais foi viabilizado pelo
desenvolvimento do planejamento estratégico e facilitado pela política de gestão
pública por resultados – acordo de resultados –, que garantiu o alinhamento
estratégico dos órgãos, entidades e servidores às metas do governo.
Referências
PERDICARIS, Priscilla; FORMOSO JUNIOR, Aurélio; NOGUEIRA, José
Marcelo Maia. Limites e desafios do uso do BSC em organizações públicas:
o caso da Prefeitura de Porto Alegre. II Congresso Consad de Gestão Pública
– Painel 13, Brasília, 2009.