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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Gerson Alves de Freitas Jr.

Recursos naturais e desenvolvimento econômico:


uma revisão do debate teórico

MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA

São Paulo
Agosto - 2012
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP

Gerson Alves de Freitas Jr.

Recursos naturais e desenvolvimento econômico:


uma revisão do debate teórico

Dissertação apresentada à Banca


Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre em
Economia Política sob a orientação do Prof.
Carlos Eduardo Ferreira de Carvalho.

MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA

São Paulo
Agosto - 2012
BANCA EXAMINADORA

_________________________________

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_________________________________

_________________________________

_________________________________
Ao meu eterno amor, Tatiana.
AGRADECIMENTOS

A todos que contribuíram, direta ou indiretamente, com a realização deste trabalho, em


especial o professor Carlos Eduardo Ferreira de Carvalho, que me orientou e incentivou
durante todo o processo, e o professor João Batista Pamplona, pela inspiração e importante
contribuição teórica.

Aos demais professores do Programa de Economia Política da PUC-SP e aos colegas com
quem convivi ao longo dessa jornada acadêmica, em especial Marcelo Figueiredo, Cristiane
Mancini, Rosângela Vieira e Fernando Gdikian.

À minha querida família, sobretudo meus pais, pelo apoio e compreensão incondicionais, e
aos amigos que se mantêm sempre por perto.

Obrigado.
RESUMO

O objetivo desse trabalho é revisitar o debate sobre o papel dos recursos naturais no
desenvolvimento econômico. Trata-se de uma pesquisa exploratória, de caráter ensaístico, que
analisa teses e fatos estilizados sobre o tema – sobretudo aqueles que estabelecem uma
relação negativa entre a dotação de recursos naturais e o crescimento econômico – à luz das
mudanças estruturais na economia mundial e à alta nos preços internacionais dos produtos
primários na última década. Sua primeira conclusão é que não há, na literatura, trabalhos
capazes de atestar de maneira conclusiva a “maldição dos recursos naturais”, embora alguns
dos pressupostos a ela associados, tal como a existência de uma tendência secular de queda
nos termos de troca dos produtos primários, tenham se mostrado verdadeiras no século
passado – ainda que não o sejam nesse curto começo do século 21. As características técnicas
e econômicas do atual processo de globalização sugerem, pelo contrário, uma tendência
crescente de dinamização dos mercados de recursos naturais, o que pode representar uma
janela de oportunidades para economias ricas em produtos primários.

PALAVRAS-CHAVE: Recursos naturais. Commodities. Deterioração dos termos de troca.


Prebisch-Singer. América Latina. Doença Holandesa.
ABSTRACT

The aim of this work is to revisit the debate surrounding the role of natural resources in
economic development. This is an exploratory essay, which examines theses and stylized facts
on the topic – especially those that establish a negative relationship between natural resource
endowment and economic growth – in light of structural changes in the global economy and
the rise in international primary product prices in the last decade. Its first conclusion is that
there isn’t any conclusive literary evidence of the so-called "resource curse," although some
of the assumptions associated with it, such as the existence of a secular trend of decline in
terms of the primary goods trade, have been proven true in the past century – although,
perhaps, not in the 21st century so far. The technical and economic characteristics of the
current globalization process suggest, on the other hand, an increasing trend of dynamic
natural resource markets, which may represent a window of opportunity for commodity-rich
economies.
KEYWORDS: Natural resources. Commodities. Deteriorating in terms of trade. Prebisch-
Singer. Latin America. Dutch Disease.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Índice de preços das commodities não energéticas, 1865-2009 40

Figura 2 – Termos de troca por grupos de commodities, 1865-2009 41

8
LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Relação entre os preços de produtos primários e industrializados 28

Tabela 2. Os superciclos de preços das commodities 44

9
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CEPAL: Comissão Econômica para América Latina e Caribe

PIB: Produto Interno Bruto

MUV: Índice do Valor Unitário de Manufatura

OPEP: Organização dos Países Exportadores de Petróleo

FOB: Free on board

CIF: Cost and freight basis

10
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 12

1. A ECONOMIA E OS RECURSOS NATURAIS: FUNDAMENTOS TEÓRICOS 15


1.1. Os recursos naturais e o princípio da escassez 15
1.2. A abordagem institucionalista: “recursos não são; se tornam” 18
1.3. A maldição dos recursos naturais 20
1.4. A tese Prebisch-Singer 25
1.5. A Doença Holandesa e impacto dos recursos naturais sobre o crescimento 30

2. RECURSOS NATURAIS E OS TERMOS DE TROCA 35


2.1. Questões metodológicas 36
2.2. Fatores envolvidos 37
2.3. A deterioração dos termos de troca no século 20 39
2.4. Os superciclos de preços 43
2.5. Os anos 2000 e a alta nos preços das commodities 47

3. RECURSOS NATURAIS E DESENVOLVIMENTO:


CONTRAPONTOS À “MALDIÇÃO” 53
3.1. Recursos naturais e crescimento econômico 53
3.1.1. A questão da produtividade 57
3.1.2. Maldição dos recursos ou da dívida externa? 59
3.1.3. Recursos naturais e capital humano 60
3.2. A revolução dos recursos naturais: as ideias de Carlota Perez 64

CONSIDERAÇÕES FINAIS 71
REFERÊNCIAS 75

11
INTRODUÇÃO

A percepção de que a dotação de recursos naturais impõe uma barreira ao desenvolvimento


está presente no pensamento econômico há pelo menos 200 anos, embora suas raízes sejam
ainda mais antigas. Entre os economistas políticos do fim do século 18, imperava a ideia de
que a abundância de terras férteis e riquezas minerais produzia um comportamento indolente e
preguiçoso nos povos agraciados, o que desestimulava o trabalho e a produção. Em
contrapartida, as dificuldades impostas aos habitantes de regiões menos abastadas serviam
como impulso ao trabalho árduo, à produção dos itens necessários à sobrevivência e,
consequentemente, ao desenvolvimento econômico.

Com o passar dos anos, o debate ganhou novos e sofisticados elementos. Nos anos 1950, os
economistas Raul Prebisch e Hans Singer formularam a teoria segundo a qual os produtos
primários – as chamadas commodities –, exportados pelos países periféricos da economia
mundial, sofriam uma depreciação em relação às manufaturas que compravam dos países
industrializados, o que contribuía para aumentar o abismo entre as nações ricas e pobres. A
famosa tese Prebisch-Singer, como ficou conhecida, recomendava aos países em
desenvolvimento que perseguissem a industrialização como forma de aumentar sua
produtividade e melhorar as condições de vida de suas populações.

De fato, o século 20 experimentou uma profunda deterioração nos preços relativos dos
recursos naturais. Diferentes índices demonstram que, na média, produtos agrícolas, metálicos
e combustíveis ficaram até 50% mais baratos em relação aos produtos industrializados –
tendência que deu sustentação ao modelo fordista de crescimento, intensivo em recursos
naturais. Países especializados na produção de produtos primários se encontraram em
dificuldades e viram nações pobres em recursos naturais, como Japão e Coreia do Sul,
alcançarem elevados padrões de desenvolvimento com base na manufatura.

Nos anos 1970, economistas defenderam que a dotação de recursos naturais tendia a
sobrevalorizar a taxa de câmbio, comprometendo a competitividade da indústria e alocando
todo o capital e trabalho que poderiam ser utilizados pela produção manufatureira para o setor
de serviços, menos dinâmico, resultando em um processo de desindustrialização – mais
conhecido como “Doença Holandesa”. Nos anos 1990, estudos demonstraram empiricamente
12
que países em desenvolvimento exportadores de commodities tinham seu potencial de
crescimento sufocado. Tais teses e pressupostos só fizeram alimentar a antiga percepção de
que existe uma “maldição” associada à abundância de recursos naturais.

Contudo, os pressupostos sobre recursos naturais passam por uma revisão diante das
mudanças estruturais na economia global. A escalada das chamadas economias emergentes
fez aumentar substancialmente a demanda por commodities e seus preços nos mercados
internacionais, enquanto a globalização da produção e a difusão dos ganhos de produtividade
levaram a uma queda dos preços dos produtos industrializados. Apesar dos preços mais altos,
barreiras técnicas e ambientais impõem dificuldades crescentes à expansão da oferta de
produtos primários. A extração de recursos minerais torna-se mais difícil, a disponibilidade de
terras férteis e água diminui, e a pressão por fontes renováveis e menos poluentes de energia
aumenta, o que demanda soluções cada vez mais complexas e caras.

Teriam as recentes mudanças criado um espaço novo para inovação na produção e no


consumo de recursos naturais, tornando os setores correlatos mais dinâmicos e intensivos em
tecnologia do que no passado e permitindo que os países abundantes em recursos naturais
adotem estratégias de desenvolvimento com base na exploração, produção e processamento
de produtos primários? É possível que as mudanças estruturais de que tratamos acima tenham
invalidado os pressupostos relacionados à “maldição”? Estes são alguns dos problemas sobre
os quais se debruça o presente trabalho, cujo objetivo central é revisitar o debate sobre o papel
dos recursos naturais no desenvolvimento econômico.

Trata-se de um estudo exploratório, de natureza qualitativa, delineado por pesquisa


bibliográfica e análises de caso. Em seu primeiro capítulo, vamos promover um resgate do
pensamento econômico acerca do problema dos recursos naturais, ressaltando os conceitos e
teorias mais relevantes para a discussão proposta, como as associadas à “maldição” dos
recursos naturais.

Em seguida, nos aprofundamos sobre o comportamento dos termos de troca dos produtos
primários, procurando compreender sua dinâmica.

No terceiro e último capítulo, discutimos a literatura contemporânea sobre o debate proposto,


com ênfase nos trabalhos que oferecem um contraponto à tese da maldição e evocam uma

13
“nova era” para a produção de recursos naturais. Por fim, segue-se a conclusão, com as
percepções gerais do autor.

14
1 – A ECONOMIA E OS RECURSOS NATURAIS: FUNDAMENTOS TEÓRICOS

A complexa relação entre a dotação de recursos naturais e o desenvolvimento das nações é


discutida pelo menos desde meados do século 18, com ênfase em suas implicações políticas,
institucionais e até comportamentais ou apenas em seus efeitos estritamente econômicos. Em
todo esse tempo, a ideia aparentemente contraditória de que a abundância de terras férteis,
fontes de energia, metais preciosos e básicos1 representa um obstáculo ao desenvolvimento
econômico esteve sempre presente, assim como os temores relacionados ao aparentemente
inevitável esgotamento desses recursos.

A discussão ganhou novos e importantes elementos a partir da década de 1950, com a tese de
Prebisch-Singer sobre a deterioração dos termos de troca dos produtos primários, e 1970, com
a tese da Doença Holandesa, que explorou os efeitos negativos da produção de recursos
naturais sobre a indústria manufatureira. Os trabalhos que apresentaram demonstrações
empíricas da existência de uma correlação negativa entre a exploração de recursos naturais e o
crescimento do PIB, a maioria dos quais publicados nos anos 1990, encerram o que a presente
dissertação considera a literatura básica sobre o tema.

1.1. Recursos naturais e o princípio da escassez

Os recursos naturais ocuparam um lugar central no debate entre os economistas ingleses dos
séculos 18 e 19. Tal como capital e trabalho, a terra foi descrita como um dos fatores
essenciais à produção capitalista, fonte dos alimentos e matérias-primas indispensáveis ao
desenvolvimento econômico e ao processo civilizatório. Sua importância para os clássicos é
sintetizada por Thomas Malthus (1996a, p. 85), quando o economista político descreve que a
terra produz os “meios mediante os quais – e somente mediante os quais – um aumento de
população pode ocorrer e ser mantido”.

No entanto, os clássicos descreviam a terra com um fator de produção finito e escasso que,
diferentemente do capital e do trabalho, não se podia reproduzir. Desse modo, haveria um

1
São metais básicos: minério de ferro, bauxita, cobre, níquel, zinco, chumbo e outros frequentemente usados
como matérias-primas na produção industrial
15
limite para o crescimento da produção de alimentos e minérios, o que serviu de base para
projeções catastróficas. Em seu famoso Ensaio sobre a População (1996b, p.251), Malthus
prevê que uma grande fome inevitavelmente sobrecairia sobre a sociedade, não fossem
impostos rígidos controles sobre o aumento populacional. Enquanto a população (demanda)
tendia a crescer em progressão geométrica, dizia Malthus, os meios de subsistência (oferta)
aumentavam em progressão aritmética.

O caráter esgotável e finito dos recursos da terra implicava ainda que seus rendimentos seriam
decrescentes, o que novamente distinguia esse fator de produção do capital e do trabalho. A
explicação era que a produção de recursos naturais precisaria incorporar terras cada vez
menos produtivas e onde mais trabalho se faria necessário para satisfazer a demanda crescente
por matérias-primas imposta pelo aumento da renda e da população.

Em compensação, a remuneração da terra cresceria, progressivamente, à medida que tais áreas


fossem exploradas. Isso porque, segundo David Ricardo (1996), os preços das mercadorias
oriundas da terra teriam de ser suficientemente elevados para viabilizar economicamente a
produção demandada em condições menos favoráveis. No entanto, o aumento da renda
decorrente dos preços mais altos seria apropriado pelos proprietários das terras agrícolas ou
minas mais produtivas, onde os custos fossem mais baixos e menos esforço se fizesse
necessário para produzir.

O valor de troca de todas as mercadorias — manufaturadas, originárias das minas ou obtidas da terra — é
sempre regulado não pela menor quantidade de trabalho que bastaria para produzi-las em condições
altamente favoráveis, desfrutadas por aqueles que têm particulares facilidades de produção, mas pela
maior quantidade necessariamente aplicada por aqueles que não dispõem de tais facilidades e continuam a
produzi-las nas condições mais desfavoráveis (RICARDO, 1996, p. 53).

Desse modo, os economistas clássicos previam que, sendo a terra um bem escasso, os termos
de troca dos alimentos e minérios tendiam a se valorizar em relação aos produtos
manufaturados, uma vez que a indústria não estava sujeita à lei dos rendimentos decrescentes
e incorporava relativamente mais progresso técnico. Tal percepção foi, por muitos anos,
hegemônica entre os economistas ingleses.

Conforme Hochstetler (2001), a questão dos recursos naturais perdeu relevância no debate
econômico durante a primeira metade do século 20, tendo ficado circunscrita aos estudiosos
do tema. Embora não se contrapusessem às ideias de seus antecessores, os economistas
16
neoclássicos consideravam que a questão havia sido superestimada e que os fatores de
produção reproduzíveis (capital e trabalho) e a inovação tecnológica eram mais relevantes
para a determinação do crescimento. É o que demonstra o fato de os principais modelos de
crescimento, tais como os de Harrod, Domar e Solow, negligenciarem a terra como um fator
de produção relevante para o crescimento. Todos desconsideram o caráter esgotável dos
recursos e contemplam a possibilidade de um estado estacionário de crescimento perpétuo.

Como observa Hochstetler, a mudança de ênfase tem uma explicação simples: mais de um
século após a publicação de Ensaio sobre a População, a economia industrial continuava a
crescer vigorosamente, sem qualquer evidência de esgotamento dos recursos naturais, queda
nos rendimentos da produção ou elevação nos preços dos produtos primários. Na verdade,
tanto os preços dos recursos quanto sua participação na renda total apenas diminuíram, de
modo que as profecias de Malthus se mostraram, em grande parte, equivocadas.

Evidentemente, os temores de esgotamento dos recursos naturais nunca foram completamente


abandonados, sendo frequentemente retomados em períodos de desajuste entre oferta e
demanda e aumento nos preços das matérias-primas. Jevons (1965, apud HOCHSTETLER,
2001) previu, em 1906, que as reservas de carvão economicamente viáveis do Reino Unido se
esgotariam em poucos anos, colocando em risco a soberania britânica. Em 1952, a Comissão
Paley da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos publicou um relatório chamado
“Resources for Freedom”, em que indagava se os americanos detinham os meios materiais
para sustentar sua civilização e alertava para uma possível piora nos padrões de vida da
população em decorrência do eventual esgotamento de seus recursos naturais.

In area after area the same pattern seems discernible: soaring demands, shrinking resources, the
consequent pressure toward rising real costs, the risk of wartime shortages, the ultimate threat of an
arrest of decline in the standard of living we cherish and hope to help others to attain. If such a threat
is to be averted, it will not be by inaction. After successive years of thinking about unemployment,
reemployment, full employment, about factory production, inflation and deflation, and hundreds of
other matters in the structure of economic life, the United States must now give new and deep
considerations to the fundamental upon which all employment, all daily activity, eventually rests: the
contents of the earth and its physical environment (RESOURCES FOR FREEDOM, apud DE
GREGORI, 1987, p. 1245).

Alertas semelhantes ganharam força nos anos 1970, com destaque para a publicação, pelo
Clube de Roma, do famoso “The Limits to Growth” (DONELLA H. MEADOWS ET AL,
1974, apud DE GREGORI, 1987), que demonstrou, por meio de modelos computacionais,
17
que as reservas mundiais de petróleo e outros recursos naturais se aproximavam da exaustão e
que seus preços subiriam drasticamente nos anos seguintes. Contudo, mais uma vez, a
previsão foi desmentida pelo aumento da produção e queda nos preços dessas mercadorias nos
anos 1980 e 1990.

1.2. A abordagem institucionalista: “recursos não são; se tornam”

Os economistas da escola institucionalista rejeitaram o pressuposto dos economistas clássicos


de que os recursos da terra sejam finitos ou dados e propuseram outra abordagem para a
questão. Sua ideia central é que “recursos naturais não são, mas se tornam” em um processo
de interação com o homem. De Gregori (1987, p. 1247) afirma que os recursos não são dados
ou finitos porque não são naturais. Para ele, os diferentes materiais presentes na natureza só
podem ser considerados recursos quando submetidos a um processo criativo capaz de torná-
los úteis, funcionais e acessíveis pelo ser humano – um processo determinado pela ciência,
pela tecnologia e pelo próprio desenvolvimento econômico. Como ilustração, ele pondera que
as pedras, embora sempre abundantes na natureza, apenas se tornaram um recurso quando os
proto-hominídeos começaram a usá-las como utensílios. “The stones had not changed, but
ideas, skills, and behavior had, and these literally created the resource” (DE GREGORI,
1987, p.1242).

Embora nunca tenham se esgotado, as pedras deixaram de ser um recurso à medida que o
homem conseguiu transformar minérios sem valor em metais, com os quais foi capaz de criar
outras ferramentas e abrir novas fronteiras de interação com o meio ambiente e de criação de
recursos. Em seu “The Growing Abundance of Natural Resources”, Jerry Taylor (1992)
lembra que, há 200 anos, o petróleo era apenas um “lodo inútil”, que desvalorizava as
propriedades, até que o esforço, o conhecimento, a tecnologia e a criatividade humana o
transformaram em um recurso valioso. Do mesmo modo, o carvão apenas se tornou um
recurso essencial para o desenvolvimento quando da invenção da máquina a vapor, enquanto
o desenvolvimento dos motores abastecidos com combustíveis líquidos determinou a sua
substituição muito antes que se extinguissem suas reservas.

18
O desenvolvimento de tecnologias de extração capazes de viabilizar o acesso a reservas
minerais antes inacessíveis, a substituição de materiais escassos por outros abundantes e o uso
mais eficiente dos materiais são rotineiros na história da civilização humana, o que significa
um processo contínuo de criação de recursos. O homem literalmente constitui novas reservas
de petróleo, quando se torna capaz de extrair o combustível escondido a quilômetros do fundo
do mar, ou novas terras agricultáveis, quando desenvolve tecnologias capazes de intensificar a
produção agrícola, encurtando seus ciclos, utilizando sementes mais produtivas ou plantas
geneticamente modificadas para resistir ao ataque de pragas, tolerar estiagens e produzir
alimentos mais nutritivos.

The ideas of science-based agriculture, or of certain technologies as "land-augmenting" or that


investment creates arable land, make sense in a functional theory of resources, but not in one that
assumes land as "natural" or as the non-human, non-manmade factor of production. (DE GREGORI,
1987, p. 1242)

De Gregori observa que os alertas de esgotamento dos recursos naturais em meados dos anos
1970 ignoravam o fato de que as reservas conhecidas da maioria dos minerais, assim como a
produção de alimentos, haviam crescido de modo expressivo nas décadas anteriores2. Sustenta
ainda que, embora os economistas do chamado mainstream fossem capazes de explicar as
tendências de curto prazo determinadas por mudanças técnicas e pelo aumento da eficiência, a
teoria básica dos recursos finitos os impedia de conceber a ideia de uma expansão infinita dos
recursos naturais.

Unchanging technology is resource-using. Changing technology is resource-creating. The history of


technology and human societies today testify to these basic conditions. Thus, the growth in resources
and the decline in their real price are not fortuitous, or accidental, or temporary, or paradoxical, but
fundamental to the process of technological change (DE GREGORI, 1987, p. 1256).

Porque os recursos naturais tornavam-se cada vez mais abundantes – e não menos, como
haviam antecipado os clássicos –, argumenta De Gregori, praticamente todas as categorias de
produtos primários haviam experimentado, com poucas exceções, declínios persistentes em

2
Entre os anos 1940 e 1960, as reservas de minério de ferro cresceram 122,1%, manganês, 27%, cromita, 675%,
cobre, 179% e chumbo, 115%. (DE GREGORI, 1987, p.1249).
19
seus preços reais, de modo que, em meados dos anos 1980, a maioria dos minérios e produtos
agrícolas custava menos do que em 1950 (1987, p.1251).

1.3. A maldição dos recursos naturais

Embora considerassem os recursos naturais essenciais à sobrevivência dos povos e ao


desenvolvimento econômico, os pensadores clássicos acreditavam haver uma relação inversa
e paradoxal entre a abundância de recursos naturais e o desenvolvimento econômico e
político-institucional das nações – uma noção que remonta ao pensamento econômico grego.
Montesquieu (2004) sustentou, em 1748, que o clima e a fertilidade do solo desenvolvem um
papel fundamental na formação do caráter humano. Ambientes muito favoráveis, pensava o
filósofo, tornavam as pessoas ociosas e despreocupadas, enquanto condições inóspitas
estimulavam o trabalho e a valorização da liberdade.

A esterilidade das terras torna os homens industriosos, sóbrios, persistentes no trabalho, corajosos,
próprios para a guerra; é preciso que obtenham o que a terra nega. A fertilidade de um país proporciona,
com o conforto, a indolência e certo amor à conservação da vida. (MONTESQUIEU, 2004, p.133)

Montesquieu argumentou que a decadência de Espanha e Portugal estava diretamente


associada à descoberta das grandes reservas de ouro e prata em suas colônias na América.
Para ele, as duas monarquias haviam se iludido com uma riqueza artificial, obtida com a
exploração de escravos e sem qualquer vínculo com a vida econômica da metrópole – uma
situação oposta à das minas na Alemanha e na Hungria que, embora menos rentáveis, estavam
no Estado principal e empregavam um grande contingente de trabalhadores, que demandavam
uma grande quantidade de produtos e estimulavam o cultivo das terras ao redor. “São,
propriamente, uma manufatura do país”. (2004, p.180)

É um mau tipo de riqueza um tributo acidental que não depende da indústria da nação, do número de
seus habitantes ou do cultivo de suas terras. O rei da Espanha, que recebe grandes somas de sua
alfândega de Cádis, é apenas, neste sentido, um particular muito rico num Estado muito pobre. Tudo
acontece entre os estrangeiros e ele praticamente sem que seus súditos participem; esse comércio é
independente da boa ou da má fortuna de seu reino. Se algumas províncias em Castela lhe dessem
uma soma igual à da alfândega de Cádis, seu poder seria muito maior: suas riquezas só poderiam ser o
efeito das do país; estas províncias animariam todas as outras e estariam todas juntas m melhores
condições de sustentar os encargos respectivos: em vez de termos um grande tesouro, teríamos um
grande povo (MONTESQUIEU, 2004, p. 180).

20
Em 1777, David Hume (1987, p. 286 apud BOIANOVSKY, 2013, p.6) observou que a
indústria se desenvolveu em todas as nações europeias após as descobertas de ouro no
continente americano, exceto nos países que exploravam as minas. Espanha e Portugal se
tornaram importadores dos produtos manufaturados produzidos pela Inglaterra e outros
países. Por essa razão, observa Boianovsky, o efeito que a descoberta de ouro teve sobre as
economias de Portugal e Espanha é descrito como uma das primeiras ilustrações históricas do
fenômeno que, no último quarto do século 20, ficou conhecido como “Doença Holandesa”.

Hume também atribuiu à relativa abundância de recursos naturais a pobreza de grande parte
das populações de França, Itália e Espanha, em meados do século 18. Para ele, os solos férteis
e o clima agradável do Sul do continente europeu tornavam a agricultura uma “arte fácil”, que
requeria pouco esforço, capital e técnica, e estimulavam uma postura “indolente” em seus
habitantes, satisfeitos com as condições de sobrevivência oferecidas pela natureza.

All the art, which the farmer knows, is to leave his ground fallow for a year, as soon as it is
exhausted; and the warmth of the sun alone and temperature of the climate enrich it, and restores its
fertility. Such poor peasants, therefore, require only a simple maintenance for their labor. They have
no stock or riches, which claim more; and at the same time they are forever dependent on their
landlord, who gives no leases, nor fears that his land will be spoiled by the ill methods of cultivation
(HUME, 1987, p. 266, apud BOIANOVSKY, 2013, p.5 ).

As condições eram menos favoráveis na Inglaterra, onde os custos e os requisitos técnicos da


produção eram mais altos. Contudo, os investimentos e o grande número de trabalhadores
empregados para viabilizar a produção no país dinamizavam a economia, distribuíam a renda
e, assim, compensavam essa desvantagem competitiva.

Adam Smith (1996), em 1776, chamou atenção para fraco desempenho econômico de
Espanha e Portugal e também para a dificuldade de suas colônias, abundantes em recursos
naturais, em se desenvolver, enquanto as colônias inglesas da América do Norte pareciam
prosperar em condições inferiores de clima e solo. Para Smith, a resposta para essa
contradição estava no grau de amadurecimento das instituições políticas.

Não existem colônias cujo progresso tenha sido mais rápido que o das colônias inglesas da América do
Norte. A abundância de terra de boa qualidade e a liberdade de conduzir suas atividades a seu próprio
modo parecem ser as duas grandes causas da prosperidade de todas as novas colônias. No que tange,
21
porém, à abundância de terras de boa qualidade, as colônias inglesas da América do Norte, embora
sem dúvida estejam abundantemente providas, são inferiores às colônias dos espanhóis e dos
portugueses, e não superiores a algumas das colônias de propriedade dos franceses antes da última
guerra. Entretanto, as instituições políticas das colônias inglesas têm sido mais favoráveis ao
desenvolvimento e ao cultivo dessa terra do que as instituições políticas de qualquer uma das três
outras nações citadas. (Smith,1996, p. 71)

Smith (1996, p.72) observou que, ao contrário da América Latina, as colônias inglesas ao
norte limitaram o açambarcamento de terras não cultivadas e obrigaram seus proprietários a
desenvolver e plantar, dentro de um tempo restrito, certa porcentagem de suas terras, sob o
risco de serem desapropriados. As heranças eram divididas de modo relativamente igualitário
entre os filhos, enquanto nas colônias latinas prevalecia o direito do majorazzo “incluído na
sucessão de todas as grandes propriedades às quais está anexado qualquer título honorífico”.
Por fim, as leis nas colônias do norte favoreciam a alienação da terra em troca de pagamentos
fixos ou outros serviços ao proprietário, o que fomentava os arrendamentos, a produção e o
acúmulo de capital na agricultura.

As interpretações de Smith sobre o problema latino-americano foram compartilhadas por


Alexander von Humboldt (1972 apud BOIANOVSKY, 2013), que publicou, no início do
século 19, seus relatos sobre a recém-emancipada economia do México, que visitou entre
1803 e 1804, depois de conhecer também as regiões onde hoje se encontram Venezuela, Peru,
Equador, Colômbia e Cuba, entre 1799 e 1803. O geógrafo alemão observava que tanto a
população quanto a produção da ex-colônia espanhola cresciam a taxas inferiores àquelas
permitidas por seus recursos naturais e certamente menos do que nos Estados Unidos. Para
ele, o fraco desempenho da economia mexicana em relação ao país vizinho era explicado
pelos diferentes graus de perfeição de suas respectivas instituições sociais. Humboldt
destacou a extrema desigualdade na distribuição dos recursos no México, que mantinha os
nativos em condições de absoluta miséria e indolência.

Mexico is the country of inequality. Nowhere does there exist such a fearful difference in the
distribution of fortune, civilization, cultivation of the soil and population... The capital and several
other cities have scientific establishments, which will bear a comparison with those of Europe. The
architecture of the public and private edifices, the elegance of the furniture, the equipages, the luxury
and dress of the women, the tone of society, all announce a refinement to which the nakedness,
ignorance, and vulgarity of the lower people form the most striking contrast... The Mexican Indians,
when we consider them en masse, offer a picture of extreme misery. Banished into the most barren
districts, and indolent from nature, and more still from their political situation, the natives live only
from mouth to mouth (HUMBOLDT, 1811-1812, pp. 184-85, apud BOIANOVSKY, 2013, p.10).

22
Segundo ele, a imensa desigualdade na região devia-se, em grande parte, ao sistema de
encomiendas, modelo baseado na distribuição de grandes blocos de terra, recursos naturais e
força de trabalho entre poucos colonizadores ligados a clãs poderosos, responsável pelos
elevados índices de concentração da terra e da riqueza nos territórios ocupados pela Espanha.

Apesar de sua crítica às instituições, Humboldt também acreditava haver uma relação inversa
entre o grau de civilização dos povos e a abundância de recursos naturais. Ao “multiplicar os
meios de subsistência”, acreditava, a riqueza do solo retardava o progresso das nações rumo à
civilização.

Under so mild and uniform a climate the only urgent want of man is that of food. It is the feeling of this
want only, which excites him to labor; and we may easily conceive, why in the midst of abundance,
beneath the shade of the plantain and breadfruit tree, the intellectual faculties unfold themselves less
rapidly than under a rigorous sky, in the region of corn, where our [European] race is in a perpetual
struggle with the elements (HUMBOLDT, 1818, p.14, apud BOIANOVSKY, 2013, p.12).

Humboldt também sugeriu que a grande quantidade de ouro e prata proveniente das minas
mexicanas, concentrada nas mãos de poucos indivíduos, retardava o desenvolvimento
industrial, à medida que estimulava a importação de produtos manufaturados. Seus cálculos
indicavam que a produção doméstica de metais preciosos, descontando-se o montante
apropriado pela Espanha, correspondia exatamente ao déficit comercial do país. Por essa
razão, pouco dinheiro circulava nas minas e os salários pagos aos trabalhadores continuavam
muito baixos (1811-1812, p. 106, apud BOIANOVSKY, p. 14).

Influenciado pelos relatos de Humboldt, Malthus (1996a, pp.180-181) sustentou que


habitantes de solos muito ricos “com uma divisão inicial distorcida da propriedade e com uma
localização desfavorável em relação aos mercados” teriam um crescimento de riqueza e
população “muito lento e provavelmente adquirirão o hábito da indolência”. Para o fisiocrata,
tratava-se de uma aparente contradição: a abundância de terra e a fácil obtenção dos itens
essenciais para a sobrevivência deveriam representar uma vantagem econômica, à medida que
liberassem trabalhadores para a produção de bens mais sofisticados e de maior valor. No
entanto, o pressuposto deixaria de ser verdadeiro se “o trabalhador considerasse a indolência
um luxo muito mais aprazível que os artigos que provavelmente obteria com mais trabalho” –

23
uma escolha “muito comum nos períodos primitivos da sociedade” e “de forma alguma rara
nos países mais desenvolvidos”.

Também seria natural que países onde o solo fosse mais pobre tivessem de empregar mais
trabalhadores na agricultura, liberando poucos deles para a produção de manufaturas. No
entanto, a lógica mais uma vez parecia desmentida pela experiência inglesa. Embora a
qualidade de suas terras estivesse “longe de ocupar o posto mais alto numa escala de riqueza
comparativa”, a Inglaterra do século 18 era o país onde a agricultura mais havia se
desenvolvido e onde a proporção de trabalhadores ocupados na produção de “bens de conforto
e artigos de luxo” superava a de qualquer outro país agrícola. Paradoxalmente, conclui
Malthus, “é a insuficiência dos bens de primeira necessidade que estimula as classes
trabalhadoras a produzir artigos de luxo” (1996a, p.181).

Não há a menor dúvida de que é uma característica física de todas as terras férteis, quando trabalhadas
por pessoas que possuem determinado grau de operosidade e de habilidade técnica, proporcionar
grande quantidade de produtos, comparativamente ao número de braços empregados; mas se a
facilidade de produção proporcionada pela terra fértil tem como resultado, em certas circunstâncias,
impedir o desenvolvimento da operosidade e da habilidade técnica, a terra pode se tornar, na prática,
menos produtiva, comparativamente ao número de pessoas nela empregada, do que se não se
caracterizasse por sua fertilidade. (MALTHUS, 1996a, pp.181-182).

Em síntese, o economista acreditava que uma produção excessiva em relação ao trabalho nela
empregado tendia a manter os habitantes de uma região em estado de indolência, o que
imporia um obstáculo ao crescimento da riqueza e das populações. Essa condição era
agravada pelas condições políticas, embora também pudesse ser revertida mediante estímulos
de demanda. Foi o que concluiu Malthus ao tomar conhecimento do rápido crescimento da
atividade agrícola nas proximidades das minas latino-americanas, “onde se cria uma demanda
efetiva e vigorosa de trabalho e produtos”.

Assim como Humboldt e Smith, Malthus entendia que a situação de miséria e atraso das
colônias espanholas poderia ser combatida com uma melhor distribuição da propriedade entre
os nativos. “Terras que poderiam sustentar milhares de pessoas sustentam apenas umas
poucas centenas de cabeças de gado”. Para ele, a desigualdade fundiária tendia a “perpetuar a
insuficiência comparativa de comércio de manufaturas” e impedir o crescimento da demanda

24
de trabalho e de produtos, “crescimento esse que é a única possibilidade de corrigir a falta de
estímulo ao aumento da população, ocasionada por essa desigualdade” (1996a, pp.184-186).

John E. Cairnes (1873) também se debruçou sobre a questão do subdesenvolvimento


associado à abundância de recursos naturais, tendo manifestado particular interesse pela
interpretação de Humboldt sobre os efeitos que as minas de ouro e prata3 tiveram sobre a
economia das colônias espanholas. Cairnes compreendia que o fraco desempenho de outros
setores em relação à mineração era perfeitamente compatível com a teoria ricardiana das
vantagens comparativas, uma vez que a posse dessas riquezas tornava mais vantajoso ao país
importar os bens de que necessitasse a produzi-los em seu próprio território.

I therefore find it impossible to believe that the mineral resources of the Spanish American States did
not exercise in these countries an influence prejudicial to the progress of their agriculture, and that
these were among the causes which contributed to that backward state of cultivation which Humboldt
notices and describes (CAIRNES, 1873, pp. 32-33).

Cairnes identificou uma tendência semelhante na Austrália, que fizera grandes descobertas de
ouro em meados do século 19. De acordo com o autor, a “febre do ouro” provocou uma
desorganização generalizada na indústria e na agricultura em todo o país, à medida que fez o
nível médio dos salários reais subir a um nível incompatível com a produtividade desses
setores. Por essa razão, a Austrália, mesmo possuindo solos mais férteis que muitos de seus
competidores, passou a importar mais da metade dos alimentos que consumia à época.

The extension of agriculture in Australia has thus (…) suffered a real check from the gold discoveries;
and the same influence has been felt throughout every branch of industry in that country, gold mining
excepted. (…) nothing in the nature of a manufactured product, even of the coarsest kind, being now
made in the colony, which can by any possibility be imported (…) All in strict conformity with the
established principles of economic science ... See chapter on “Foreign Trade” in Ricardo’s Works ...
(CAIRNES, 1873, pp. 35-37).

1.4 – A tese Prebisch-Singer: a tendência de deterioração dos termos de troca

Embora tenha perdido relevância na primeira metade do século 20, pelos motivos já expostos,
a discussão sobre os efeitos econômicos de uma produção abundante de recursos naturais

3
É preciso ponderar que, devido à sua função de moeda, ouro e prata representam um caso particular entre os
recursos naturais.
25
ressurgiu com força nos anos 1950. Foi quando Raúl Prebisch (1949) e Hans Singer (1950)4
publicaram suas ideias sobre a deterioração dos termos de troca das matérias-primas. A
chamada “tese Prebisch-Singer” rompeu com a tradição secular dos economistas ingleses, que
previam uma apreciação dos termos de troca dos recursos naturais devido aos rendimentos
decrescentes da terra, e estabeleceu um novo marco teórico para o debate. Mais do que isso,
influenciou de modo decisivo a política dos países em desenvolvimento nas décadas
seguintes.

Na análise de Ocampo e Parra (2010, p.13), a tese Prebisch-Singer se resume em torno de


duas hipóteses centrais, relacionadas ao funcionamento dos mercados de bens e às assimetrias
existentes entre os mercados dos países centrais e periféricos. A primeira hipótese é que o
consumo mundial de recursos naturais tendia a crescer relativamente menos do que o de
produtos manufaturados, o que se devia tanto à baixa elasticidade-renda5 dos produtos
primários quanto pela tendência, determinada pelo progresso técnico, de economia crescente
no uso de recursos naturais pela indústria. Por essas duas razões, o processo de crescimento
econômico tendia a culminar em uma participação cada vez menor dos setores primários na
produção total.

A segunda hipótese era a de que os ganhos do comércio internacional e do progresso técnico


eram distribuídos de forma desigual entre os países centrais, que exportavam produtos
industrializados, e países periféricos, exportadores de produtos primários (de acordo com a
divisão internacional do trabalho na época), o que refletia, em grande parte, suas diferentes
estruturas de produção e formação de preços.

An important difference is that, whereas the first hypothesis applies only to commodities (or, more
generally, to goods and services that exhibit a low-income elasticity of demand), the second applies to all
goods and services produced by developing countries. In other words, in the first case what matters is the
goods and services being traded; in the second, where they are produced. (OCAMPO; PARRA, 2010, p.
13)

4
À época, tanto Prebisch quanto Singer trabalhavam para a Organização das Nações Unidas (ONU) – Prebisch,
na Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), em Santiago, e Singer, no Departamento de
Assuntos Econômicos (DAE), em Nova York.
5
Fenômeno conhecido como Lei de Engel, formulada pelo estatístico alemão Ernst Engel, de acordo com a qual
o aumento da renda diminui proporcionalmente a despesa com alimentação (mesmo que esta cresça em termos
absolutos).
26
Exceto por uma mudança estrutural na economia mundial, essa tendência tendia a se acentuar,
quanto maior fosse o comércio entre os dois blocos. Por isso, recomendaram os economistas,
os países periféricos deveriam perseguir industrialização por meio da substituição de
importações6.

Em seu “Desenvolvimento Econômico da América Latina e seus Principais Problemas”,


também conhecido como “Manifesto Latino-Americano”, publicado em 1949, Prebisch
sustenta que as vantagens teóricas da divisão internacional do trabalho – com as quais
concordava, em tese – eram “terminantemente” negadas pelos fatos. A tese clássica
sustentava que os frutos do progresso técnico, onde quer que fossem obtidos, seriam
repartidos entre os países por meio do intercâmbio de produtos, à medida que os preços na
indústria e na agricultura se ajustassem aos seus respectivos níveis de produtividade. Prebisch
sustentou, porém, que esses frutos não haviam chegado aos países periféricos – ao menos, não
na medida em que se estenderam às populações dos países centrais. Essa era a explicação para
o abismo social que separava os dois blocos e as “notórias discrepâncias entre suas
respectivas forças de capitalização” (PREBISCH, 1949, p.48).

Prebisch concordava que a divisão internacional do trabalho favorecia o progresso técnico e a


distribuição de remunerações crescentes, como defenderam os clássicos, mas apenas quando a
divisão era feita “entre iguais ou quase iguais”. Não era o caso da relação entre os países
centrais e os da periferia. Na primeira metade de século 20, o progresso técnico havia sido
mais acentuado na indústria do que na produção primária. Tal disparidade não constituiria um
problema para o desenvolvimento dos países mais pobres se os preços de ambas as categorias
de produto tivessem caído em sintonia com seus respectivos ganhos produtividade. Neste
caso, os países periféricos pagariam relativamente menos pelas manufaturas importadas e
teriam mais recursos para investir em seu território. Por essa razão, não precisariam se
industrializar.

6
Singer (1999) argumenta que a tese Prebisch-Singer, em si, não emite qualquer opinião sobre se os países em
desenvolvimento deveriam se industrializar por meio da substituição de importações ou pelo estímulo à
exportação. No entanto, as condições da época tornavam natural a escolha pela primeira alternativa, uma vez que
os países em desenvolvimento precisavam a) construir uma capacidade doméstica de produção para exportar
manufaturas e b) seria inicialmente mais fácil produzir para um mercado conhecido do que se arriscar a vender
para o desconhecido mercado global.
27
Os frutos do progresso técnico ter-se-iam repartido, igualmente, em todo o mundo, segundo a premissa
implícita no esquema da divisão internacional do trabalho, e a América Latina não teria nenhuma
vantagem econômica em sua industrialização. Pelo contrário, sofreria uma perda efetiva, enquanto não
alcançasse eficácia produtiva igual à dos países industriais. (PREBISCH, 1949, p.55)

Mas a teoria das vantagens comparativas não havia se confirmado. Entre 1876 e 1947, as
relações de troca haviam se movido de forma adversa aos países da periferia, como demonstra
a tabela abaixo.

TABELA 1 - RELAÇÃO ENTRE OS PREÇOS DE PRODUTOS PRIMÁRIOS E


INDUSTRIALIZADOS

Quantidade de artigos finais da indústria


que se podem obter com uma quantidade
Período determinada de produtos primários

1876-80 100

1881-85 102,4

1886-90 96 ,3

1891-95 90,1

1896-1900 87,1

1901-05 84,6

1906-10 85,8

1911-13 85,8

1921-25 67,3

1926-30 73,3

1931- 35 62, 0

1936-38 64,1

1946-47 68,7

Fonte: NAÇÕES UNIDAS, 1949. Relação de termos de troca entre países em desenvolvimento e
industrializados. Documento EjCN, 1949

28
Prebisch relacionou ainda a deterioração dos termos de troca dos produtos primários aos
diferentes impactos que os ciclos econômicos, de crescimento e retração da produção, tinham
sobre os países centrais e os periféricos. Os períodos de expansão, quando havia excesso de
procura em relação à oferta, eram acompanhados de aumento nos preços dos produtos, nos
lucros dos empresários e da pressão dos trabalhadores organizados por salários mais altos.

Esse benefício era estendido aos produtores de recursos naturais, cujos preços tendiam a subir
relativamente mais do que no centro em virtude do tempo necessário para se aumentar a
produção e se recomporem os estoques. Em contrapartida, na fase decrescente do ciclo
econômico, os preços das matérias-primas caíam com mais intensidade do que os produtos
acabados – e, mais importante, de modo desproporcional aos ganhos obtidos anteriormente.
“Dessa forma, os preços finais se vão apartando, progressivamente, dos preços primários”.
(1949, p. 58)

Segundo Prebisch, o fenômeno era explicado pela maior organização dos trabalhadores nos
países centrais. Durante a fase crescente do ciclo, eles obtinham aumentos salariais maiores
do que os trabalhadores da periferia, e a conhecida rigidez dos salários impedia que os
benefícios fossem devidamente corridos nos períodos de depressão. Por essa razão, a pressão
por custos mais baixos era transferida para a periferia, onde a desorganização dos
trabalhadores, especialmente na agricultura, lhes impedia de conseguir aumentos comparáveis
aos obtidos nas nações industrializadas ou de conservá-los nos períodos de desaceleração.

Mesmo que se conceba na periferia uma rigidez parecida à do centro, a consequência disto seria aumentar
a intensidade da pressão deste sobre aquela. Pois, se não se comprime o benefício periférico, na medida
necessária para corrigir a disparidade entre a oferta e a procura nos centros cíclicos, continuarão a
acumular-se estoques de mercadorias nestes e a contrair-se a produção industrial, e, por conseguinte, a
procura de produtos primários. Esta diminuição da procura será tão forte quanto seja preciso para
conseguir a necessária compressão das remunerações no setor primário (PREBISCH, 1949, p. 58).

O economista conclui que o fruto do progresso técnico obtido pelos países centrais não se
traduziu, portanto, em preços mais baixos para os produtos exportados à periferia, mas em
aumento da remuneração dos fatores de produção no centro, de modo que os preços subiram
ao invés de cair. Se tais remunerações tivessem crescido, tanto no centro quanto na periferia,
proporcionalmente aos respectivos ganhos de produtividade, a evolução dos termos de troca

29
teria beneficiado os produtores de matérias-primas, uma vez que a produtividade cresceu mais
rapidamente nas manufaturas.

Mas os produtores de matérias-primas não apenas haviam fracassado em absorver os


benefícios do aumento de produtividade obtido nos países centrais, como transferiram parte
de seus próprios ganhos, via preços mais baixos, para os consumidores dos países centrais.
“Ao passo que os centros retiveram integralmente o fruto do progresso técnico de sua
indústria, os países da periferia transpassaram-lhes uma parte do fruto de seu próprio
progresso” (1949, p. 57).

Prebisch acreditava que, como os preços não cediam em função dos ganhos de produtividade,
apenas a industrialização poderia levar os países da América Latina a aproveitar amplamente
as vantagens econômicas do progresso técnico, oferecendo empregos mais produtivos às
massas de trabalhadores, aumentando o nível geral de renda e o padrão de vida da população.
A industrialização da América Latina não era, contudo, incompatível com o desenvolvimento
da produção primária. Pelo contrário, Prebisch argumentava que a exportação de matérias-
primas era o meio de financiar a importação de bens de capital para a indústria e para a
própria agricultura. “Quanto mais ativo for o comércio exterior (...), tanto maiores serão as
possibilidades de aumentar a produtividade de seu trabalho, mediante intensa formação de
capitais” (1949, p. 49)

Outros argumentos se somaram à tese Prebisch-Singer contra a especialização dos países


periféricos em matérias-primas. Nurske (1958) sugeriu que a instabilidade nos preços das
matérias-primas representava um fator adicional de vulnerabilidade para os países em
desenvolvimento, causando oscilações bruscas na renda, nas taxas de câmbio e nos
investimentos. Hirschman (1958) alertou ainda que os lucros obtidos com os recursos naturais
não eram reinvestidos nos países periféricos, mas remetidos para o exterior pelas empresas
multinacionais que os exploravam, limitando os encadeamentos econômicos da atividade
(apud MARIN; NAVAS; PEREZ, p.4).

1.5 – A Doença Holandesa e impacto dos recursos naturais sobre o crescimento

30
O termo “Doença Holandesa” foi cunhado pela revista The Economist, em 1977, para
descrever os efeitos negativos da descoberta de um imenso campo de gás natural, em 1959,
sobre a indústria manufatureira da Holanda. Basicamente, diz respeito ao processo de
apreciação das taxas reais de câmbio decorrente da descoberta de um recurso natural
abundante e valorizado no exterior, o que compromete a competitividade da indústria e
culmina em seu encolhimento relativo ou absoluto no produto de um país – processo
conhecido como desindustrialização7.

Embora a expressão seja relativamente nova, o fenômeno é antigo, como fica evidente nos
relatos de Cairnes (1873) sobre a Austrália do século 19, ou mesmo nas observações de David
Hume (1987), sobre o declínio de Espanha e Portugal durante o período colonialista. Como
observa Furtado (2008, p. 34), fenômeno semelhante foi observado em todas as economias
especializadas da América Latina muito antes da descoberta de gás na Holanda, provocado
pela carne argentina, a lã uruguaia, o nitrato e o cobre chilenos, o petróleo venezuelano, o
estanho boliviano e os minérios peruanos.

Conforme Gelb (1988, p. 22), a Doença Holandesa implica em uma realocação dos fatores de
produção em resposta ao aumento da renda decorrente da exploração de recursos naturais 8.
Quando essa renda é consumida, duas consequências são observadas: um “efeito de
movimento de recursos” (“resource movement effect”), que desloca capital e trabalho de
outras atividades para o setor em expansão, e um “efeito de gasto” (“spending effect”), que
provoca um deslocamento semelhante para o setor de serviços. A variável de equilíbrio nesse
processo é a taxa real de câmbio.

Em uma economia dividida entre produtos transacionáveis (commodities e manufaturas) e não


transacionáveis (serviços), o primeiro grupo obedece à chamada “lei do preço único”, de
acordo com a qual seus preços tendem a se igualar aos preços internacionais por meio do
intercâmbio comercial, enquanto o segundo grupo reflete basicamente fatores domésticos.
Neste modelo, a taxa real de câmbio pode ser definida como o preço relativo dos produtos não
transacionáveis em relação aos transacionáveis.

7
Ou, no caso dos países não industrializados, uma barreira à industrialização.
8
O aumento da renda pode ser provocado tanto pela descoberta e exploração de novas reservas de recursos
naturais quanto por uma elevação nos preços dessas mercadorias.
31
Quando ocorre um aumento brusco no poder doméstico de compra, os preços tendem a subir
relativamente mais no setor de produtos não transacionáveis (que não enfrenta competição
externa) do que no de produtos transacionáveis (que enfrenta competição externa),
provocando, portanto, uma apreciação da taxa real de câmbio. Nesse cenário, o setor de
produtos não transacionáveis tende a crescer e absorver mais capital e trabalho, com reflexos
sobre o nível geral dos salários reais. Em compensação, o setor de produtos transacionáveis
perde competitividade, em função tanto do câmbio apreciado quanto do aumento dos salários
reais, o que dificulta seu crescimento.

Conforme Wijnbergen (1984), a realocação dos fatores de produção para os setores de


recursos naturais e de serviços não seria, em si, um problema, não fosse o progresso técnico
na indústria mais rápido do que em qualquer outro setor. O acúmulo de capital explica apenas
uma pequena parte do crescimento econômico, sendo que a maior parte está associada ao
progresso técnico decorrente da experiência acumulada (processo conhecido como “learning-
by-doing” ou “aprender fazendo”, na tradução literal) que caracteriza os setores industriais.
Trata-se de um conhecimento cujo retorno não se restringe à firma, mas se difunde, à medida
que novos processos e inovações aplicados por uma empresa produzem uma informação
rapidamente assimilada por todos os participantes do mercado, que passam a adotar a melhor
técnica disponível.

Por essa razão, uma queda de participação do setor industrial no PIB em decorrência da
Doença Holandesa tenderia a reduzir o progresso técnico e, consequentemente, o potencial de
crescimento da economia. Não à toa, argumenta Wijnbergen, todas as histórias de sucesso
econômico após a segunda Guerra mundial foram contadas por países que investiram
agressivamente em sua produção de bens manufaturados.

It is a well-established ‘stylised fact’ the technological progress is faster in the traded non-sheltered
factors of an economy than in the non-traded sector. (…) Since Solow (1957) e Denison (1962) we know
that capital accumulation explains only a small part of the economic growth. If most of economic growth
is caused by Learning by Doing induced traded goods sector, a temporary decline in that sector may
permanently lower income per head compared with what could otherwise have been attained
(WIJNBERGEN, 1984, p. 41).

32
Os argumentos contra a especialização em recursos naturais ganharam um reforço com a
publicação, nos anos 1990, de trabalhos que demonstraram empiricamente uma relação
negativa entre a exportação de produtos primários e o crescimento econômico. O de Sachs e
Warner (1995, 1997) foi, sem dúvida, o mais influente. Os pesquisadores apontaram, com
base em uma amostra de 95 países, que economias com elevadas taxas de exportação de
recursos naturais em relação ao PIB no ano-base de 1970 apresentaram taxas de crescimento
relativamente mais baixas nos 20 anos seguintes. Para os autores, o diagnóstico apenas
reforçava os precedentes históricos, de acordo com os quais economias com baixa dotação de
recursos superam aquelas onde os recursos são abundantes.

The oddity of resource-poor economies outperforming resource-rich economies has been a constant
motif of economic history. In the seventeenth century, resource-poor Netherlands eclipsed Spain,
despite the overflow of gold and silver from the Spanish colonies in the New World. In the nineteenth
and twentieth centuries, resource-poor countries such as Switzerland and Japan surged ahead of
resource-abundant economies such as Russia. In the past thirty years, the world´s star performers
have been the resource-poor Newly Industrializing Economies (NIEs) of East Asia – Korea, Taiwan,
Hong Kong, Singapure – while many resource-rich economies such as the oil-rich countries of
Mexico, Nigeria and Venezuela, have gone bankrupt. (SACHS; WARNER, 1995, p. 3)

Sachs e Warner (1995) argumentaram que a disponibilidade de recursos naturais era essencial
para o nascimento de uma nova indústria ou tecnologia quando os custos de transporte eram
muito altos, de modo que possuir reservas de carvão e minério em seu território foi uma pré-
condição para Grã-Bretanha, Alemanha e Estados Unidos desenvolverem sua indústria a
partir do século 19. Mas, com a queda desse custo, no século 20, a dotação de recursos dentro
do território nacional perdeu relevância, de modo que Japão e Coreia se transformaram em
grandes produtores de aço, apesar de sua total dependência das importações de minério de
ferro junto aos países periféricos. De todo modo, os autores afirmam que é uma contradição o
fato de a presença de recursos naturais ter um efeito negativo sobre o crescimento, o que se
explica principalmente por causa da Doença Holandesa.

Também Gylfason, Herbertson e Zoega (1999) observaram uma relação negativa entre o
tamanho do setor primário (medido pela participação inicial da produção primária na força de
trabalho) e a taxa média de crescimento econômico entre 1960 e 1992, a partir de uma base de
dados de 125 países. Segundo os autores, duas hipóteses podem explicar esse comportamento.
A primeira seria a de que um grande setor de recursos naturais, devido ao seu efeito sobre as

33
taxas reais de câmbio, inibe a criação de um setor secundário e, consequentemente, a demanda
por capital humano e educação formal. A outra hipótese, não excludente, é a de que um
sistema educacional ruim desencoraja o setor secundário por meio de uma elevação dos custos
de treinamento, contribuindo para a predominância do setor primário.

Embora não tenham minimizado os efeitos da Doença Holandesa, Robinson, Torvik e Verdier
(2005) deram ênfase às consequências políticas e institucionais da abundância de recursos. Os
autores argumentam que governantes tendem a sobre-explorar os recursos naturais em relação
aos níveis de extração eficientes e a alocar os recursos de modo equivocado, com objetivos
estritamente políticos. Por isso, argumentam, o tipo de impacto causado por um eventual
aumento nas rendas advindas dos recursos naturais depende “criticamente” da existência de
instituições capazes de fiscalizar o uso público e a alocação desses recursos.

34
2. RECURSOS NATURAIS E OS TERMOS DE TROCA

A tese de que a abundância ou, mais especificamente, a especialização na produção de


recursos naturais impõe uma barreira ao desenvolvimento econômico abrange uma grande
variedade de pressupostos, tanto de natureza política quanto econômica. Neste capítulo,
vamos nos debruçar especificamente sobre a questão da evolução dos termos de troca dos
exportadores de produtos primários desde o século 19. O objetivo é discutir a validade da
hipótese central da tese Prebisch-Singer, de acordo com a qual os preços relativos dos
produtos primários tendem a se deteriorar em relação aos dos manufaturados.

Os termos de troca são a razão entre o preço das exportações e o das importações de um país.
Basicamente, indicam quanto uma economia pode adquirir em bens e serviços produzidos no
exterior com a receita proveniente de um determinado volume de bens e serviços vendidos a
outros países. Se os volumes de comércio exterior e outros fatores se mantêm constantes, uma
depreciação nos termos de troca contribui para uma piora relativa no padrão de vida no país
exportador, à medida que imponha restrições à capacidade de importar e absorver as
vantagens do comércio internacional.

Even if the income terms remain constant (i.e. expansion of export volume maintains export revenue in
the face of declining barter terms of trade) this would still amount to international divergence, since the
poorer countries would have to mobilize greater resources for the increase in export volume. These
increased resources would have to be diverted from domestic consumption or investment increasing
divergence between countries in the world economy. (SINGER, 1999. p.912)

Por essa razão, a tese de que as economias periféricas, exportadoras de recursos naturais,
experimentariam uma deterioração contínua de seus termos de troca foi compreendida como
um alerta de que seu abismo em relação aos países centrais, exportadores de produtos
manufaturados, apenas faria crescer caso não se industrializassem. Há evidências que
confirmem a tese da deterioração dos termos de troca? Os dados coletados durante o século 20
demonstram que sim, mas não são conclusivos ou inquestionáveis. Além disso, a expressiva
alta nos preços relativos dos recursos naturais durante a última década e as mudanças em
curso na economia mundial deixam abertas as portas para uma mudança na tendência de

35
longo prazo. Neste caso, a deterioração apontada por Prebisch e Singer teria sido um
fenômeno localizado no tempo.

2.1. Questões metodológicas

Prebisch e Singer desenvolveram sua teoria sobre os termos de troca dos países periféricos
com base na evolução favorável dos intercâmbios do Reino Unido – um exportador líquido de
manufaturas e importador de matérias-primas – entre 1876 e 1947. Se os preços relativos das
exportações britânicas haviam subido, concluíram os autores, o inverso necessariamente teria
acontecido com os países que lhes exportavam matérias-primas.

Economistas da época apontaram pelo menos três problemas metodológicos com essa
generalização. O primeiro deles é que os termos de troca britânicos não eram representativos
do conjunto dos países industrializados; o segundo é que as economias centrais também eram
grandes exportadoras de recursos naturais, de modo que a relação inversa dos termos de troca
britânicos não era uma boa medida para se mensurarem os preços relativos das commodities;
além disso, o valor das exportações britânicas não contabilizava os custos de transporte, que,
por sua vez, estavam embutidos nos preços de importação9. Assim, a expressiva queda desses
custos durante o período averiguado teria melhorado os termos de troca do Reino Unido e
superdimensionado a queda dos preços relativos dos produtos primários (CUDDINGTON;
LUDEMA; JAYASURIYA, 2007, p.115).

Tais questionamentos foram postos de lado com o método elaborado por Grilli e Yang (1988)
e reproduzido por diversos autores desde então. Grilli e Yang construíram um índice de preço
(conhecido como índice GY) para 24 commodities10 não combustíveis, negociadas
internacionalmente, abrangendo o período entre 1900 e 1986. O índice levava em conta 11
produtos comestíveis (banana, carne bovina, cacau, café, cordeiro, milho, óleo de palma,
arroz, açúcar, chá e trigo), sete commodities agrícolas não comestíveis (algodão, couro, juta,

9
Os preços de exportação geralmente são “free on board” (FOB) e os de importação, base “cost, insurance and
freight” (CIF).
10
Os preços nominais foram retirados de uma base de dados do Banco Mundial, que continha informações sobre
24 commodities não combustíveis, mais petróleo e carvão, que ficaram de fora do índice de GY.
36
borracha, madeira, tabaco e lã) e seis metais (alumínio, cobre, chumbo, prata, estanho e
zinco). No fim da década de 1970, esses produtos respondiam por 54% das commodities não
combustíveis, 49% dos alimentos, 83% dos produtos agrícolas não comestíveis e 45% dos
metais comercializados internacionalmente.

Grilli e Yang ponderaram os preços nominais dos 24 produtos selecionados por seus
respectivos pesos no comércio mundial de commodities entre 1977 e 1979 e os deflacionaram
pelo índice do Valor Unitário de Manufatura (“Manufacturing Unit Value” – MUV), que
mede o valor dos produtos manufaturados exportados dos países industrializados para os
países em desenvolvimento.

O método utilizado por Grilli e Yang vem servindo de base para outros autores, em estudos
que ampliam o período e o escopo da análise. Ocampo e Parra (2010), por exemplo,
acrescentaram à lista original sete produtos que ganharam participação no comércio
internacional de commodities nas últimas décadas (soja, óleo de soja, aves, suínos, peixes,
níquel e minério de ferro, com dados disponíveis a partir de 1962), anteciparam o início da
série para 1865 e a estenderam até 2009. Os produtos foram divididos em quatro índices:
total, metais, produtos agrícolas tropicais11 e não tropicais. Para o período entre 1865 a 1960,
os preços foram deflacionados pelo índice Arthur Lewis (1978) de exportação dos
manufaturadores e, a partir de então, pelo MUV. A mesma base de Ocampo e Parra (2010) foi
utilizada por Erten e Ocampo (2012), que atualizaram a série até 2010 e adicionaram ainda os
preços do petróleo à cesta analisada.

McKinsey (2011) construiu uma série com os preços de 28 produtos (índice GY mais
petróleo, gás natural, carvão e aço) para o período entre 1900 e 2011, divididos em quatro
subíndices (energia, metais, alimentos e matérias-primas agrícolas), ponderados por seu peso
no comércio mundial entre 1999 e 2001 e deflacionados pelo MUV.

2.2. A deterioração dos termos de troca no século 20

Todos os estudos apontam para uma expressiva deterioração dos termos de troca dos recursos
naturais no século passado, respaldando a tese Prebisch-Singer. De acordo com McKinsey

11
Banana, cacau, café, juta, oleo de palma, arroz, borracha, açúcar e chá.
37
(2011), os preços relativos das commodities cederam, em média, 48% durante todo o período.
Ocampo e Parra (2010) demonstram que os produtos primários não combustíveis acumularam
uma queda de 53% na comparação entre a média das duas primeiras décadas e a verificada
entre 1998 e 2003 – uma taxa de desvalorização pouco inferior a 1% ao ano.12 Grilli e Yang
(1988) haviam concluído que os termos de troca dos produtos primários haviam caído, em
média, 0,6% ao ano entre 1900 e 1986.

Contudo, os preços relativos dos recursos naturais não apresentaram uma tendência contínua
de queda, como o tamanho das perdas acumuladas faz supor. Há um razoável consenso na
literatura recente que a evolução dos termos de troca foi afetada por duas quedas acentuadas
de preço – ou quebras estruturais de tendência (“structural breaks”) –, em 1921 e em algum
ponto entre as décadas de 1970 e 1980 (OCAMPO; PARRA, 2010. CUDDINGTON;
LUDEMA; JAYASURIYA, 2007. MCKINSEY, 2011).

Ocampo e Parra (2010, p. 31) demonstram que os termos de troca dos recursos naturais
tiveram uma significa apreciação entre 1865 e 1920 – taxa de valorização de 0,3% ao ano –,
caíram de forma abrupta em 1920 e oscilaram sem tendência definida até 1979, quando
sofreram uma nova quebra de tendência – desvalorização de 0,7% ao ano até 2003.
Cuddington, Ludema e Jayasuriya (2002, p. 35)13 observam dois possíveis choques, em 1921
e 1974, mas consideram o segundo estatisticamente insignificante, de modo que a evidência
mais forte aponta para uma única mudança estrutural, em 1921, sem qualquer tendência,
positiva ou negativa, antes e depois. Conforme Lederman e Maloney, tais resultados colocam
em xeque a ideia de que exista uma tendência à deterioração dos termos de troca das
commodities no longo prazo, como sugere a tese Prebisch-Singer14.

This evidence is of practical interest, because it tells us that the best predictor of future relative prices of
commodities is today’s prices, although random breaks that push prices down or up could occur (…);
these breaks, however, tend to be unpredictably random and thus are irrelevant for policy formulation.
(LEDERMAN; MALONEY, 2007, p.7).

12
Resultado próximo ao obtido por Cashin e McDermott (2002), que apuraram uma queda de 1,3% ao ano para
o período entre 1862 e 1999.
13
Os autores utilizaram o índice GY como base para sua pesquisa.
14
Singer (1999, p.911) minimiza a questão e afirma “não importar muito” se os dados sobre a evolução dos
termos de troca dos produtos primários são interpretados como uma tendência persistente de queda ou uma
tendência essencialmente estacionária, com quebras intermitentes. Para ele, as evidências empíricas dão suporte
à tese Prebisch-Singer ou, pelo menos, não a refutam.

38
Além disso, a queda dos preços relativos, em seu conjunto, esconde comportamentos bastante
distintos entre os diferentes produtos. Embora os preços do algodão e do trigo, por exemplo,
entre 1900 e 1999 tenham caído, em média, 1% e 0,8% ao ano, respectivamente, o aço não
apresentou qualquer tendência significativa e o petróleo subiu, em média, 0,3% ao ano, por
exemplo. (MCKINSEY, 2011, p.23)

Ocampo e Parra (2010, p.31) observam uma clara distinção entre o comportamento dos preços
dos produtos agrícolas (sobretudo, aqueles de origem tropical) e os dos minerais. Entre 1865 e
1920, apontam, os metais subiram, em média, 0,6% ao ano; os produtos agrícolas não
tropicais, 0,3%; e os agrícolas tropicais, apenas 0,1%. Entre 1921 e 1979, os preços agrícolas
não apresentaram qualquer tendência significativa, mas os metais tiveram uma valorização
média anual de 0,3% que, embora tímida, foi suficiente para praticamente reverter o tombo
sofrido em 1921 – do qual as agrícolas não se recuperaram. Entre 1979 e 2003, as
commodities registraram uma taxa média de desvalorização de 0,7% ao ano, mais uma vez
liderada pelos produtos agrícolas tropicais, que caíram 0,9%, mas os metais apresentaram uma
tendência estatisticamente insignificante (queda de 0,1% ao ano) no período.

Tropical agriculture did not enjoy the improvement in commodity prices of the late 19th and early 20th
centuries and the commodity group was most affected by adverse shocks, particularly that of 1920. In
contrast, mineral prices performed better: the early boom was stronger, the 1921-drop was gradually
reversed in the following decades and there was no statistically significant drift in the late 20th century.
(OCAMPO e PARRA, 2010, p.. 31-33).

2.3 – Fatores envolvidos

Ocampo e Parra (2010, p. 19) sustentam que, embora o poder de compra das commodities
tenha se deteriorado de modo significativo no século passado, nem o tamanho da queda
acumulada, nem as taxas de crescimento anuais fornecem uma base sobre a qual seja possível
fazer quaisquer projeções sobre o comportamento futuro dos preços no longo prazo. Para eles,
mais importante do que discutir se há ou não uma tendência secular de piora nos termos de
troca é compreender as dinâmicas por trás dos movimentos de preço. Para os autores, a
valorização dos termos de troca observada entre 1865 e 1920 decorreu de uma mudança
estrutural na tendência geral de preços da economia mundial (de deflacionária para
inflacionária), a partir de 1897, e do surgimento de demandas específicas advindas de algumas
39
revoluções tecnológicas do fim do século 19 (automóveis, eletricidade). Já as rupturas dos
anos 1920 e 1980 seriam decorrentes de eventos que deprimiram o ritmo de crescimento da
economia global: a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e a Crise do Petróleo (1973-1979)15
(OCAMPO; PARRA, 2010, p. 31).

FIGURA 1

ÍNDICE DE PREÇOS DAS COMMODITIES NÃO ENERGÉTICAS, 1865-2009

(1970-1979=100)

Fonte: Ocampo e Parra (2010)

15
Mais especificamente, do choque monetário perpetrado pelo Federal Reserve, em 1979, para conter a inflação
e que ocasionou a crise da dívida do mundo em desenvolvimento nos anos 1980.
40
FIGURA 2. TERMOS DE TROCA POR GRUPO DE COMMODITY, 1865-2009

Fonte: Ocampo e Parra (2010)


41
Embora haja dinâmicas específicas por trás do comportamento de preço de cada commodity,
de modo geral a demanda por recursos naturais cresceu menos que o produto da economia
mundial no século 20. A primeira explicação para esse fenômeno é que a fatia da renda
mundial destinada ao consumo intensivo em recursos naturais decresceu 16 ao longo do
período, sobretudo nos países onde a renda per capita anual excedeu o patamar entre US$ 15
mil e US$ 20 mil, que foram os principais responsáveis pelo crescimento econômico do
período (MCKINSEY, 2011, p.23).

A segunda explicação para o menor consumo relativo foram os ganhos de eficiência no


consumo de recursos naturais. Entre 1980 e 2000, período para o qual há dados disponíveis, a
intensidade no uso de recursos naturais (energia, terra, minérios e água) do crescimento
econômico caiu, em média, de 0,5% a 2% ao ano. Nos Estados Unidos, por exemplo, a
participação do petróleo na geração de energia elétrica caiu de 12%, em 1970, para 3%, no
ano 2000, e apenas 1%, atualmente. A queda do muro de Berlim e o desmonte do bloco
soviético, em 1991, também contribuíram para esse processo, à medida que culminaram na
redução ou fechamento de setores industriais pouco eficientes e intensivos em recursos
naturais. (2011, pp. 25-26)

No lado da oferta, o acesso a novas e baratas fontes de recursos naturais em diversas partes do
mundo17 e os ganhos de produtividade, sobretudo na agricultura, também contribuíram para a
queda dos preços relativos dos produtos primários. De acordo com McKinsey (2011, p. 23),
embora a demanda mundial por grãos tenha crescido a uma taxa média de 2,2% ao ano entre
1961 e 2000, a área plantada aumentou em apenas 0,1% ao ano no mesmo período – reflexo
de um incremento médio anual de 2,1% no rendimento das lavouras em virtude da adoção de
melhores práticas agrícolas.

De acordo com Ocampo e Parra (2010), baseados em dados da OCDE, desde os anos 1960 a
produtividade agrícola cresce mais rápido que a da indústria manufatureira, o que explicaria
uma queda de aproximadamente 0,2% ao ano nos termos de troca da agricultura. Esse
comportamento contraria um dos pressupostos centrais da tese Prebisch-Singer, de acordo
com o qual a indústria tendia a apresentar ganhos mais acentuados de produtividade na

16
Comportamento condizente com a Lei de Engel.
17
No caso do petróleo, o aumento da produção em diversos países fez reduzir o poder de barganha da Opep, que
viu sua fatia na produção global cair de 51%, em 1974, para menos de 42%, em 2000 (MCKINSEY, 2011).
42
comparação com a produção primária. Em contrapartida, é condizente com a tese de que os
países em desenvolvimento repassam para os consumidores do centro os ganhos obtidos com
seu progresso técnico via preços mais baixos.

Outro aspecto apontado por McKinsey (2011, p.26) como relevante para a estabilidade ou
queda dos preços dos recursos naturais no último século é o fato de esses preços não
refletirem o seu real valor econômico, uma vez que muitos governos – sobretudo nos países
desenvolvidos – subsidiam o custo de produção dos produtos primários. Além disso, os
preços raramente levam em conta as consequências secundárias de sua produção e uso,
incluindo as emissões de gases do efeito estufa e a perda de biodiversidade.

2.4. Os superciclos de preços

Erten e Ocampo (2012) demonstraram a existência de quatro “superciclos” de preços de


commodities entre 1865 e 2009. Com duração de 30 a 40 anos cada, esses superciclos seriam
compostos por uma fase de elevação e outra de retração nos preços das matérias-primas, com
amplitudes de 20% a 40% para cima ou para baixo da tendência de longo prazo. Além disso,
seu comportamento teria uma relação estreita com as taxas de crescimento do PIB global – o
que significa dizer que seriam determinados preponderantemente pela demanda. Embora a
existência de um comportamento cíclico, com a alternância entre fases de valorização e
desvalorização, possa parecer incoerente com a ideia de uma tendência secular ou contínua de
queda nos preços, os autores ponderam que o preço médio observado em cada uma dessas
ondas é decrescente, um comportamento que condiz com a tese Prebisch-Singer.

O primeiro desses ciclos para as commodities não energéticas começa em 1894, atinge seu
pico de preço em 1917, durante a Primeira Guerra, e se encerra 1932, com fases agudas de
alta e baixa. O segundo ciclo começa em 1932, atinge seu ápice em 1951, durante a
reconstrução da Europa, e termina em 1971. Aquele ano marca o início de um terceiro ciclo,
que atinge seu ponto mais alto já em 1973, ano do primeiro Choque do Petróleo, e se estende
até 199918. A análise sugere ainda o surgimento de um novo ciclo em 1999, ainda incompleto,

18
Trata-se de um ciclo mais curto, com apenas 28 anos – o primeiro e o segundo ciclos tiveram uma duração
total de 38 e 39 anos, respectivamente. É também o que apresenta o menor período de elevação dos preços
43
cujas características serão discutidas em um item específico neste capítulo sobre os termos de
troca das commodities nos anos 2000.

Heap (2004, p.2) define os superciclos como tendências prolongadas de alta nos preços das
commodities, determinadas pelo processo de urbanização e industrialização de uma grande
economia, que torna o processo de crescimento econômico intensivo em recursos naturais. A
queda na intensidade de uso das matérias-primas conduz os superciclos para um fim, à medida
que o crescimento econômico se torna menos dependente dos investimentos massivos em
formação bruta de capital fixo e passa a se basear mais no setor de serviços. Para o autor,
houve apenas dois superciclos nos últimos 150 anos: o primeiro tendo início no fim do século
19, com a emergência dos Estados Unidos como potência econômica; e o segundo, entre 1945
e 1975, resultado da reconstrução da Europa e do Japão após a Segunda Guerra e,
subsequentemente, do “renascimento” da economia japonesa.

Os superciclos de preços variam de modo considerável, tanto em duração quanto em


amplitude, de acordo com o grupo de produtos observado. Os metais se destacam em relação
às demais commodities não combustíveis, enquanto os produtos agrícolas de origem tropical
apresentam o pior desempenho. Contudo, a análise das séries mostra que a média dos preços
de cada superciclo é, em todos os grupos de commodities não energéticas, sempre inferior à
do ciclo anterior. A exceção19 é justamente o petróleo, que apresenta não apenas preços
médios mais altos a cada ciclo, mas também uma tendência de valorização no longo prazo.

TABELA 2. OS SUPERCICLOS DE PREÇOS DAS COMMODITIES


Total20

1894-1932 1932-1971 1971-1999 1999-atual


Ápice 1917 1951 1973 2010
Valorização durante a fase de alta 50,2% 72,0% 38,9% 81,3%
Desvalorização durante a fase de queda -54,6% -43,3% -52,5% -
Duração do ciclo (anos) 38 39 28 -
Fase de alta (anos) 23 19 2 11

(apenas dois anos, ante 23 e 19 anos nos ciclos anteriores) e, consequentemente, o maior período de
desvalorização (26 anos, ante 15 e 20 anos nos ciclos anteriores).
19
Também os metais apresentam, no superciclo iniciado em 1999, uma média de preço superior à observada no
período anterior. Contudo, Erten e Ocampo (2012) lembram que o ciclo atual ainda não iniciou sua fase de baixa,
o que pode derrubar a média.
20
Apenas não combustíveis.
44
Fase de queda (anos) 15 20 26 -
Média (de todo o ciclo) 157,3 119,4 86,2 82,2

Metais

1885-1921 1921-1945 1945-1999 1999-atual


Ápice 1916 1929 1956 2007
Valorização durante a fase de alta 105,7% 66,6% 98,0% 202,4%
Desvalorização durante a fase de queda -70,2% -51,9% -47,4% -
Duração do ciclo (anos) 36 24 54 -
Fase de alta (anos) 31 8 11 8
Fase de queda (anos) 5 16 43 -
Média (de todo o ciclo) 151,6 95,7 85,2 109,3

Produtos agrícolas

1894-1932 1932-1971 1971-1999 1999-atual


Ápice 1917 1951 1973 2010
Valorização durante a fase de alta 52,8% 90,3% 52,0% 76,6%
Desvalorização durante a fase de queda -56,2% -49,6% -56,0% -
Duração do ciclo (anos) 38 39 28 -
Fase de alta (anos) 23 19 2 11
Fase de queda (anos) 15 20 26 -
Média (de todo o ciclo) 163,2 127,0 87,5 74,3

Produtos agrícolas tropicais

1891-1933 1933-1972 1972-1999 1999-atual


Ápice 1910 1951 1977 2010
Valorização durante a fase de alta 54,5% 116,6% 74,3% 85,4%
Desvalorização durante a fase de queda -72,8% -50,9% -65,2% -
Duração do ciclo (anos) 42 39 27 -
Fase de alta (anos) 19 18 5 11
Fase de queda (anos) 23 21 22
Média (de todo o ciclo) 170,6 106,7 74,8 56,8

Produtos agrícolas não tropicais

1894-1932 1932-1971 1971-1999 1999-atual


Ápice 1917 1951 1973 2010
Valorização durante a fase de alta 119,8% 81,7% 66,1% 59.7%
Desvalorização durante a fase de queda -57,4% -49,5% -58,0% -
Duração do ciclo (anos) 38 39 28 -
Fase de alta (anos) 23 19 2 11
Fase de queda (anos) 15 20 26 -
Média (de todo o ciclo) 156,8 138,0 93,8 86,5

Petróleo

1892-1947 1947-1973 1973-1998 1998-atual


Ápice 1920 1958 1980 2008
Valorização durante a fase de alta 402,8% 27,4% 363,2% 466,5%
Desvalorização durante a fase de queda -65,2% -23,1% -69,9% -
Duração do ciclo (anos) 55 26 25 -
45
Fase de alta (anos) 28 11 7 10
Fase de queda (anos) 27 15 18 -
Média (de todo o ciclo) 36,9 24,8 53,2 91,2

Fonte: (ERTEN; OCAMPO, 2012)

Para Erten e Ocampo (2012, p.15), a dinâmica dos superciclos está diretamente associada a
choques de demanda, que funcionam como gatilhos para os preços. A correlação entre os
preços das commodities e as taxas de crescimento econômico é bastante significativa, de
0,53%, em relação aos países da OCDE, e 0,58%, em relação à economia mundial. No caso
dos metais, essa correlação é ainda maior, de 0,61% e 0,73%, respectivamente. Já os preços
do petróleo destoam, com uma correlação de apenas 0,19% e 0,46%, na mesma comparação.

Conforme Erten e Ocampo (2012), Nikolai Kondratiev e Joseph Schumpeter desenvolveram


os primeiros grandes quadros analíticos sobre os ciclos de longa duração21. Kondratiev
documentou a existência de grandes ondas, com duração de 40 a 60 anos, a partir da análise
de séries com preços de commodities, dados sobre produção industrial, taxas de juros e
comércio exterior. Em seus estudos sobre os determinantes dos ciclos longos, o economista
russo descartou alterações provocadas por fatores exógenos, como guerras e revoluções, e
priorizou a análise de fatores endógenos, tais como mudanças tecnológicas inerentes à
acumulação de capital. Para Schumpeter, o comportamento dos ciclos de Kondratiev estava
associado ao processo de destruição criativa.

Schumpeter acreditava que mudanças nas oportunidades de investimento advindas de


inovações tecnológicas geram crescimento em setores emergentes da produção e a decadência
dos setores ou métodos de produção antigos ou obsoletos. A transformação da economia por
meio desses clusters de inovação em setores emergentes constitui uma fase de prosperidade,
que é posteriormente acompanhada por uma fase de estagnação, durante a qual as inovações
são assimiladas pelas indústrias e as tecnologias se tornam mais padronizadas.

Durante a fase de prosperidade, com taxas crescentes de investimento e inovação na economia


real, a competição inicial por matérias-primas tende a impulsionar seus preços em relação aos

21
Antes deles, no entanto, Clarke, Jevons, Tugan-Baranovski e Wicksell já haviam reconhecido, ainda no século
19, a presença de flutuações de longo prazo nos preços das commodities (ERTEN; OCAMPO, 2012, p.2)
46
produtos diretamente beneficiados pela inovação. À medida que as inovações são
disseminadas e a rentabilidade dos investimentos diminui, a economia entra em uma fase de
estagnação, na qual a demanda por matérias-primas diminui e os preços recuam. Assim, os
preços das commodities estariam diretamente relacionados às fases de expansão e retração
dos ciclos de Kondratiev. Schumpeter esperava ainda que, devido os ganhos de produtividade
advindos da inovação, os preços das matérias-primas ficassem sempre abaixo do mesmo
ponto do ciclo anterior (ERTEN; OCAMPO, 2012, p.3).

The lags involved in responding to a relative rise in food or raw material prices, and the fact that
the response often required the development of whole new regions, led to an overshooting of world
requirements and a period of relative surplus. A relative fall in the prices of food and raw
materials then followed … until expanding world requirements caught up with the excess capacity
(ROSTOW, 1979, p. 22 apud ERTEN; OCAMPO, 2012, p; 3).

Quando escreveu seu Business Cycles, em 1938, Schumpeter havia identificado três grandes
ciclos econômicos na história capitalista. O primeiro, entre 1786 e 1842, foi aquele em que se
deu a primeira revolução industrial na Grã-Bretanha. O segundo, de 1842 a 1897, foi marcado
pela exploração de novas oportunidades em carvão, ferro, ferrovias, estaleiros e têxteis. Uma
nova fase, iniciada em 1897 e considerada então incompleta por Schumpeter, estava associada
à emergência de negócios envolvendo aço, eletricidade, químicos orgânicos, máquinas de
combustão interna e automóveis. Rostow (1979), citado por Erten e Ocampo (2012), observou
longos ciclos de 50 anos nos preços das commodities, com fases de valorização entre 1790 e
1815, 1848 e 1873 e, finalmente, 1896 e 1920, e quedas acumuladas entre 1815 e 1848, 1873
e 1896 e 1920 e 1936.

Rosenberg e Frishtak (1983), também citados por Erten e Ocampo (2012), criticaram a tese
dos ciclos longos, argumentando que se trata de uma interpretação equivocada de mudanças
aleatórias na produção. Becker (1988, apud ERTEN; OCAMPO, 2012, p.5) afirmou que
seriam necessários mais 200 anos para determinar se ciclos de Kondratieff existem de fato ou
se são apenas uma invenção estatística de uma imaginação superativa.

2.5. Os anos 2000 e a alta nos preços das commodities

Os anos 2000 são marcados por uma forte reversão na tendência de queda dos termos de troca
observada nas duas décadas anteriores e, a rigor, em todo o século 20. Até 2008, os preços
47
relativos dos recursos naturais não combustíveis haviam subido, em média, 109% em relação
a 2003 e 130% ante as mínimas de 1999, um aumento sem precedentes, de acordo com o
Banco Mundial (2009, p. 55). Segundo McKinsey (2011), as commodities combustíveis
dispararam 190% e os alimentos, 135%, entre 2000 e 2011, o suficiente para corrigir a queda
acumulada ao longo de todo o século 20.

A recente alta dos produtos primários foi sustentada por um choque global de demanda
proveniente das chamadas economias emergentes, com destaque para a China. Como nos
ciclos anteriores, o movimento foi interrompido por uma queda abruta nas taxas de
crescimento, desta vez, decorrente do estouro da bolha imobiliária dos Estados Unidos, em
2008. Contudo, os preços se recuperaram rapidamente após 2009 e, embora não tenham
retornado aos níveis pré-crise, se mantêm, de modo geral, em patamares historicamente
elevados. A intensidade e a duração desse movimento refletem a resiliência do crescimento
econômico dos países em desenvolvimento, ávidos consumidores de recursos naturais. Tal
resiliência é, em parte, explicada pela relativa facilidade com que essas economias
acomodaram o choque de preço das commodities – ela própria, resultante de condições
macroeconômicas extremamente favoráveis, com taxas de juros historicamente baixas e
extraordinária liquidez. (ERTEN; OCAMPO, 2012; BANCO MUNDIAL, 2009)

Outro fator que ajudou a sustentar a guinada nos preços dos recursos naturais foi o
crescimento limitado da oferta. A resposta dos produtores de recursos naturais aos estímulos
da demanda foi relativamente tímida, sobretudo nas indústrias extrativas, depois que os preços
persistentemente baixos dos anos 1980 e 1990 haviam desestimulado a exploração de novas
reservas e os investimentos no capital físico e humano necessário para se expandir a oferta.
As consequências do subinvestimento foram consideráveis, principalmente sobre a produção
de petróleo, que havia atravessado um longo período de grande ociosidade (BANCO
MUNDIAL, 2009, p. 57).

Após o choque de oferta dos anos 1970, os esforços conservacionistas e a busca por outras
fontes de energia deprimiram a demanda pelo produto, de modo que foram necessários 15
anos para que o consumo retomasse os níveis observados em 1979. Além disso, o aumento da
produção no Mar do Norte, México e Alasca minou o poder de barganha que a OPEP usava

48
para manter os preços elevados mesmo em momentos de queda da demanda. Por volta de
1986, a cotação nominal do barril havia caído para menos de US$ 10 e a capacidade ociosa
nos países membros do cartel correspondia a mais de 13% da demanda mundial da época. A
ociosidade cresceu ainda mais na década seguinte. Depois da queda do Muro de Berlim,
muitas das indústrias intensivas em energia dos países que formavam o bloco soviético foram
fechadas ou reduzidas, o que fez a demanda por petróleo da região declinar de maneira
acentuada. De modo geral, a demanda por petróleo caiu 40%, ou cerca de 5 milhões de barris
por dia – o equivalente a 7% da demanda global em 2000 – entre 1987 e 1999.

The buildup of excess capacity meant that the real price of oil during the 1990s remained low, at $16 a
barrel, equivalent to half the price experienced during 1985. It also meant that there was little incentive
to invest in new, higher-cost oil fields. Overall spending by major American multinational oil companies
on exploration for new wells and the development of existing wells declined by more than 50 percent,
from $72 billion in 1980 to $30 billion in 1999 (figure 2.6).5 As a result, demand for the inputs required
for oil exploration and extraction was weak, and capacity in these supporting industries declined, as did
the number of new engineers trained to find and extract oil (BANCO MUNDIAL, 2009, p. 58).

A ociosidade gerada pelo declínio do consumo na antiga União Soviética foi reabsorvida
apenas por volta de 2004. Quando a economia mundial se recuperou da crise gerada pelo
estouro da bolha da internet, em 2001, a oferta de petróleo já não era suficiente para fazer
frente ao crescimento da demanda. Da mesma maneira, os preços dos metais – também
afetados pelo declínio da demanda no Leste Europeu – voltaram a subir, o que não refletia
uma demanda excepcionalmente forte, mas um cenário de estoques apartados e limitada
capacidade de expansão (BANCO MUNDIAL, 2009, p. 59).

A escalada dos preços reativou os investimentos. Os aportes globais anuais na produção de


metais não ferrosos, por exemplo, saltou de US$ 2 bilhões, em 2002, para US$ 9 bilhões, em
2007. No mesmo período, as multinacionais americanas aumentaram em 75% o nível de
investimento na produção de petróleo. Contudo, a demanda por insumos e serviços utilizados
na atividade petroleira cresceu muito além da oferta, de modo que os custos de investimento
do setor dispararam. Segundo dados da OIE, apresentados por McKinsey (2011, p. 6), o custo
médio real de explorar um novo poço dobrou entre 2000 e 2010 – um acréscimo de mais de
7% ao ano. Em alguns casos, a alta foi bem mais acentuada. O preço diário de uso de uma
plataforma semissubmersível no Golfo do México, por exemplo, saltou de US$ 36 mil, em
2000, para US$ 325 mil no início de 2008, tendência observada em vários outros insumos.

49
Além disso, os prazos de entrega para as indústrias petroleira e mineradora mais que
triplicaram em alguns casos (BANCO MUNDIAL, 2009, p. 60).

Ainda conforme o Banco Mundial, os preços agrícolas começaram a subir em reação ao


aumento dos custos com insumos intensivos em energia (combustíveis, fertilizantes e
defensivos químicos), que representam até um terço dos custos de uma lavoura de milho nos
Estados Unidos. Além disso – e mais importante – a escalada do petróleo também pressionou
os preços dos alimentos ao estimular a produção de biocombustíveis à base matérias-primas
como o milho e a soja nos Estados Unidos e na Europa, com impacto indireto sobre outras
commodities agrícolas. Entre 2004 e 2008, aproximadamente dois terços do crescimento da
produção americana de milho foram destinados à fabricação de etanol, limitando a
disponibilidade de grãos para a produção de alimentos e rações. Estimativas sugerem que o
impacto dessa demanda adicional sobre os preços do milho tenham oscilado entre 47% e 70%.
(2009, p. 61)

O cenário agravou-se com uma sequência de quebras de safra decorrentes de intempéries


climáticas em países como Estados Unidos, Austrália, Brasil, Argentina, Rússia e Ucrânia nos
últimos anos. Antes da escalada dos preços, em 2007, os estoques globais de trigo haviam
caído para o menor patamar em 40 anos. Embora tenham aliviado o efeito da alta dos preços
sobre a pobreza, os controles de preço e subsídios praticados por vários países reduziram os
estímulos ao aumento da produção – e também os incentivos para que consumidores
substituíssem os produtos mais caros por outros mais baratos. Distorções também foram
criadas por barreiras à exportação, que limitaram a oferta de grãos nos mercados
internacionais – caso da Índia, que, em 2008, suspendeu os embarques de arroz e estimulou
outros países, notavelmente as Filipinas, a aumentar suas importações para compor estoques
de segurança. Como resultado, os preços do arroz saltaram de US$ 376 por tonelada, em
janeiro de 2008, para US$ 907, em abril do mesmo ano (BANCO MUNDIAL, 2009, p. 62).

Por fim, a desvalorização do dólar também colaborou para a guinada dos preços das
commodities nos anos 2000. De acordo com o Banco Mundial (2009, p.54), o preço real em
dólar dos metais e minerais comercializados internacionalmente subiu 158% entre 2000 e
2007, mas apenas 78% nos países em desenvolvimento (preços em moeda local,

50
deflacionados pela inflação local). No caso dos alimentos, os preços reais em dólar avançaram
64% no mesmo período, mas apenas 14% nos países em desenvolvimento. Também podem
ter contribuído para a alta dos preços o aumento exponencial de recursos aplicados por
investidores financeiros nos mercados futuros de commodities ao longo da última década,
embora não haja consenso de que a especulação tenha efetivamente estimulado esse
movimento.

Heap (2005), Erten e Ocampo (2012) argumentam que a recente apreciação dos termos de
troca indica o início de um novo superciclo de commodities, determinado pelo intenso
processo de urbanização e industrialização da China, que teve um grande impacto sobre a
demanda por recursos naturais na última década. Entre 2002 e 2007, por exemplo, a fatia do
país no consumo global de minério de ferro saltou de 22,3% para 43,9%; no de cobre, de
18,2% para 27,1%; e no de alumínio, de 21,1% para 33,2%. Neste período, os preços dessas
matérias-primas saltaram 184,7%, 356,5% e 95,4%, respectivamente (JENKINS, 2011, p. 75).
.
Mckinsey (2011) sustenta que o atual choque nos preços das commodities possui diferenças
importantes em relação aos anteriores e que a escala dos desafios que impõe à economia
global não tem precedente. A primeira razão é o ritmo e a dimensão do crescimento asiático.
De acordo com a OCDE, a economia global deve incorporar quase 3 bilhões de pessoas às
classes médias de consumo até 2030. Isso significa que a parcela da população com renda
diária entre US$ 10 e US$ 100 – uma faixa intensiva em consumo de recursos naturais –, que
em 2009 somava 1,8 bilhão de habitantes, deverá chegar a 4,8 bilhões em apenas 20 anos.
Cerca de 90% desses novos consumidores estarão na Ásia e no Pacífico, preponderantemente
em China e Índia.

The increase in average income is happening on an unprecedented scale and at a speed that has
never before been witnessed. The pace of real per capita income growth has been increasing as
the world economy develops and is happening on a different scale. For instance, the United
Kingdom doubled real per capita GDP from $ 1,300 to $ 2,600 in PPP terms in 154 years with a
population of less than ten million. The United States, starting 120 years later, achieved this feat
in 53 years with a population of a little over ten million. In the 20th century, Japan doubled its real
per capita income in 33 years with a population of around 50 million. Now China and India,
whose combined population today is more than 2.5 billion, are doubling real per capita incomes
every 12 and 16 years, respectively. This is about ten times the speed at which the UK achieved
this transformation – and on around 200 times the scale (MCKINSEY, 2011, p. 32).

51
Ainda segundo a consultoria, a expansão do consumo na Ásia deve levar a um aumento de
33% na demanda primária global por energia até 2030 – o correspondente ao consumo atual
dos Estados Unidos e dos países europeus membros da OCDE. Trata-se ainda de um
crescimento 62% maior do que o observado nas duas últimas décadas do século 20. No caso
do aço, o crescimento de demanda esperado é de aproximadamente 80%, embora o consumo
de cereais deva crescer relativamente menos: 27%. Os autores sustentam que, embora as
reservas comprovadas de petróleo, carvão, gás, minérios, metais e terras agricultáveis sejam
suficientes para sustentar essa expansão, os custos marginais de produção tendem a crescer à
medida que a exploração de reservas de difícil acesso – como a de petróleo em águas
profundas ou areias betuminosas – ou o uso de terras menos produtivas ou localizadas em
regiões com infraestrutura precária se torne necessária. A complexidade e o custo de se
explorar esses recursos também tende a tornar a oferta menos elástica, tornando os preços
mais sensíveis mesmo estímulos tímidos no lado da demanda (2011, p. 45).

Contudo, o Banco Mundial (2009, pp. 64-66) minimiza a possibilidade de o mundo estar
caminhando para um cenário de preços de commodities permanentemente altos ou mesmo em
constante elevação devido à escassez dos recursos. A instituição lembra que, desde os anos
1970, a economia global cresce com uso menos intensivo de energia e alimentos22 – embora,
no caso dos metais, essa tendência tenha começado a se reverter em meados dos anos 1990.
Ou seja, nos últimos 40 anos, o PIB global cresceu mais que o consumo de matérias-primas,
embora o ritmo de expansão do consumo tenha sido maior do que o do crescimento
populacional.

Além disso, as taxas de crescimento da população e da renda mundiais serão mais baixas no
período entre 2015 e 2030 do que nos 15 anos anteriores, o que deve frear a taxa de expansão
da demanda por recursos naturais. Em contrapartida, a economia mundial não deve continuar
a se mover na direção do setor de serviços. Depois de bater recorde nos anos 2000, a
participação desse setor no PIB mundial deve recuar entre 2015 e 2013, uma tendência que
deve limitar o ritmo de queda nas taxas de intensidade de uso das commodities.

22
De modo geral, entre 1970 e 2004, as mudanças tecnológicas reduziram a demanda por energia em 56% em
relação ao que seria se tais transformações não tivessem acontecido. A expectativa é que, até 2005, a eficiência
energética mais do que dobre (BANCO MUNDIAL, 2009).
52
3. RECURSOS NATURAIS E DESENVOLVIMENTO: CONTRAPONTOS À
“MALDIÇÃO”

O presente capítulo tem o objetivo de apresentar e discutir os contrapontos às teses e fatos


estilizados sobre a “maldição dos recursos naturais”, de acordo com a qual a abundância de
recursos representa, por diferentes razões, políticas e econômicas, um empecilho ao
desenvolvimento dos países com abundância de terra, minérios e petróleo. Na esteira das
mudanças estruturais na economia mundial e da consequente elevação dos preços relativos
dos produtos primários nos últimos anos, diversos autores revisitaram o debate sobre o papel
dos recursos naturais no desenvolvimento econômico e o horizonte das possibilidades a eles
associadas.

A primeira parte deste capítulo destaca as contribuições de autores como Lederman e


Maloney (2007), Marin e Mitra (1999), Manzano e Rigobon (2001) e Bravo-Ortega e De
Gregório (2005), que testaram a validade de algumas das teorias consagradas sobre o tema a
partir de análises empíricas e históricas. A segunda parte é dedicada às ideias da economista
britânico-venezuelana Carlota Perez (2010a, 2010b; MARIN, NAVAS e PEREZ, 2009), que
propõe uma nova abordagem à discussão sobre o papel dos recursos naturais no
desenvolvimento (sobretudo, na América Latina) ao situá-la no contexto dos paradigmas
técnicos e econômicos contemporâneos.

3.1. Recursos naturais e crescimento econômico

Um dos trabalhos mais influentes a defender a influência deletéria dos recursos naturais sobre
o desenvolvimento é o de Sachs e Warner (1995; 1997), já apresentado no capítulo 1. Os
autores defenderam haver uma correlação negativa entre a dotação de recursos naturais e o
ritmo de crescimento econômico, a partir da análise de dados econômicos de um grupo de 95
países em desenvolvimento durante o período entre 1970 e 199023 – possivelmente, a mais
contundente demonstração empírica da “maldição dos recursos” já apresentada. Contudo, suas
conclusões vêm sendo submetidas a críticas de caráter metodológico que, de maneira geral,
apontam para problemas de endogeneidade e enviesamento.

23
Cabe lembrar que o período escolhido para análise foi marcado por uma expressiva deterioração nos termos de
troca dos recursos naturais.
53
Uma das críticas mais fortes a esses achados é a realizada por Lederman e Maloney (2007). A
primeira ponderação diz respeito à decisão de Sachs e Warner de utilizar a participação das
exportações de produtos primários no PIB como critério para quantificar a abundância de
recursos naturais de um país. Embora reconheçam que ainda não exista um consenso sobre o
método empírico mais apropriado para se calcular essa dotação, Lederman e Maloney
defendem que a medida mais apropriada e aceita na literatura é a utilizada por Leamer (1984),
ou seja, a exportação líquida de recursos naturais por trabalhador.

Sachs e Warner (1997, p.15) explicam que a escolha pelo critério envolve questões teóricas e
de mensuração. Eles argumentam que, no modelo da Doença Holandesa (uma dos canais
pelos quais a dotação de recursos poderia afetar o crescimento), o que importa é a parcela da
força de trabalho empregada no setor de bens não transacionáveis em relação àqueles
empregados na manufatura. Essa proporção está diretamente relacionada com o nível da
demanda por produtos não transacionáveis, o que, por sua vez, depende do efeito riqueza
gerado pelos recursos naturais. As exportações de recursos como proporção do PIB seria a
melhor maneira de capturar o tamanho dessa riqueza.

A definição desse parâmetro está longe de ser uma escolha trivial. De acordo com o método
usado por Sachs e Warner, os países mais abundantes em recursos naturais são República do
Congo, Cingapura, Papua Nova Guiné e Malásia. Pela medida de Leamer, são Noruega, Nova
Zelândia, Canadá, Trinidad e Tobago, Finlândia e Austrália (LEDERMAN; MALONEY,
2007, p.17). Obviamente, as conclusões sobre as consequências de uma grande dotação de
recursos sobre o desenvolvimento também mudam consideravelmente.

Um dos problemas com o critério adotado por Sachs e Warner é o fato de medir as
exportações em termos brutos, o que produz algumas distorções. Por essa razão, Cingapura,
um grande reexportador de matérias-primas produzidas em outros países, aparece entre os
países mais abundantes em recursos naturais – o que de maneira alguma reflete sua real
dotação nesse setor. Em uma revisão de seu trabalho, Sachs e Warner (1997 p. 29) corrigiram
parcialmente esse problema ao adotar, nos casos específicos de Cingapura e Trinidad e
Tobago (pelas mesmas razões do país asiático), a exportação líquida de recursos naturais em
relação ao PIB, um critério mais parecido com o de Leamer.

54
Lederman e Maloney (2007, pp.17-22) sustentam, porém, que o ajuste deveria ser estendido a
todo o conjunto de países analisados, uma vez que diversas economias asiáticas e latino-
americanas possuem zonas especiais que apenas montam e reexportam componentes
industriais fabricados em outras origens, de modo que suas exportações brutas
superdimensionam seu real grau de industrialização. Além disso, ao adotar como base para
seu estudo as exportações em relação ao PIB em 1970, Sachs e Warner podem ter ignorado
mudanças na composição das pautas de exportação ao longo das quase duas décadas
analisadas. Lederman e Maloney também consideram inadequado, para esse tipo de estudo, o
uso de regressões do tipo cross-section, modelo que, segundo eles, enfrenta problemas
intrínsecos de endogeneidade e enviesamento, e sugerem que resultados muito diferentes aos
obtidos por Sachs e Warner são alcançados com a simples mudança do método de
estimação24.

Lederman e Maloney estudaram a influência da estrutura de comércio – particularmente da


especialização em recursos naturais, do grau de concentração das exportações e do comércio
intraindústria – sobre o crescimento econômico e concluíram que, embora tais variáveis sejam
importantes determinantes do crescimento econômico, muitos dos fatos estilizados,
particularmente em relação aos recursos naturais, não são robustos quando submetidos à
técnica de estimação ou a variáveis condicionantes. Mais do que isso, sugerem que a dotação
de recursos naturais, medida tanto pelo critério sugerido por Leamer quanto pelo adotado por
Sachs e Warner, aparece positivamente correlacionada com o crescimento econômico.

Os pesquisadores estudaram o efeito da estrutura de comércio sobre o crescimento econômico


em uma amostra de 65 países para o período entre 1975 e 1990. Para demonstrar quão
sensíveis os resultados das regressões são às técnicas de estimação, utilizaram tanto o método
cross-section quanto o de dados em painel com coeficientes individuais. Às variáveis
condicionantes básicas aplicadas por Sachs e Warner (nível inicial de renda e grau de abertura
da economia), foram acrescentados controles para acumulação de capital físico e humano

24
Essa crítica é condizente com o trabalho de XAVIER (1999), que comparou o uso das regressões em sistemas
de equações cross-section com regressões em painéis com coeficientes individuais em estudo sobre
determinantes do crescimento econômico e encontrou resultados bastante distintos em cada um dos métodos de
estimação. Segundo o autor, a metodologia do cálculo de coeficientes individuais, em comparação com o sistema
cross-section, “possui a vantagem de destacar a importância das características específicas a cada país que
contribuem para determinar o comportamento das taxas de crescimento” (p.27).

55
(medidos, respectivamente, pela taxa média de investimento em relação ao PIB e o número de
anos de estudo da população adulta), evolução dos termos de troca e taxa efetiva de câmbio
(apresentada como uma medida de macroestabilidade). O objetivo era compreender de que
forma e por quais canais a especialização em recursos naturais poderia afetar o crescimento.

Pelo método cross-section, o efeito da abundância de recursos naturais (segundo o critério de


Leamer, ou seja, a exportação líquida de recursos por trabalhador) sobre o crescimento não é
significante sob nenhuma condição, exceto quando o grau de concentração das exportações e
o comércio intraindústria são introduzidos na análise. A leitura dos dados em painel sugere,
por outro lado, que a exportação líquida de recursos naturais possui um efeito positivo
(embora pouco significativo) quando observadas as variáveis condicionantes principais. Esse
efeito torna-se mais positivo e significante quando são aplicados os controles para
acumulação de capital humano e físico, termos de troca e macroestabilidade. Estes seriam,
portanto, os três canais por meio dos quais os recursos naturais poderiam influenciar
negativamente o crescimento. Os dois métodos sugerem, ainda, que países exportadores de
produtos primários podem ter estruturas de exportação mais concentradas e menor incidência
de comércio intraindústria, efeitos também negativamente correlacionados ao crescimento.
Contudo, mesmo observados esses efeitos, a influência dos recursos naturais sobre o
crescimento permanece positiva.

The mystery now is no longer what the channels are through which resources reduce growth, but rather
why, once we have controlled for these channels, resource abundance continues to have such a positive
impact on growth. One possibility is through higher rates of productivity growth. (LEDERMAN;
MALONEY, 2007, p.29)

De modo geral, os resultados obtidos são semelhantes quando se aplica a medida de


abundância adotada por Sachs e Warner, ou seja, a participação das exportações de recursos
naturais no PIB. Pelo método cross-section, os recursos naturais parecem não ter qualquer
influência sobre o crescimento, independentemente das variáveis condicionantes aplicadas,
mas os dados em painel revelam um efeito positivo significativo quando se aplicam os
controles básicos. Quando se empregam as variáveis de acumulação de capital, esse efeito se
torna menos positivo e significativo, sugerindo que a exportação de recursos naturais pode,
neste caso, ser um fator de estímulo à acumulação de capital físico e humano. E, ao contrário
56
do que observa no exercício com o método de Leamer, a abundância de recursos naturais aqui
não parece exercer qualquer influência sobre as variações dos termos de troca, a
macroestabilidade, a concentração das exportações e o comércio intraindústria.

Strikingly, broadly similar findings emerge using Sachs and Warner’s measure of resource exports
over GDP once enforcing a consistent processing of the data: there is no evidence in cross-section
of a negative impact of this variable on growth, and in the panel systems estimator, again, it enters
positively always, if not always significantly. At very least we should abandon the stylized fact that
natural resource abundance is somehow bad for growth and even perhaps consider a research
agenda on the channels through which it may have a positive effect, possibly through inducing
higher productivity growth (LEDERMAN; MALONEY, 2008, p.32)

Os autores também demonstram que a concentração das receitas de exportação, medida tanto
pelo índice de Herfindahl quanto pela participação dos recursos naturais nas exportações
totais, tem um efeito negativo sobre o crescimento, extremamente robusto no método cross-
section, embora menos no de painel. Para eles, as evidências mostram que é a concentração,
em si, e não os recursos naturais, em particular, que afetam negativamente o desempenho da
economia. Assim, a dependência de um único produto – seja o cobre no Chile ou,
hipoteticamente, microchips na Costa Rica – deixa os países vulneráveis a declínios
expressivos nos termos de troca.

3.1.1 . A questão da produtividade

Um dos argumentos mais utilizados contra a especialização em recursos naturais é o de que os


ganhos de produtividade no setor primário da produção são inferiores aos obtidos na indústria,
razão pela qual, como observou Prebisch (1949), a população dos países centrais gozava de
um padrão de vida superior ao verificado na periferia. Contudo, dados sugerem que este pode
ser mais um fato estilizado a respeito dos recursos naturais.

Marin e Mitra (1999) compararam o crescimento e a convergência dos fatores de


produtividade da agricultura e da indústria para o período entre 1967 e 1992. Com base em
informações sobre valor adicionado, capital físico, mão de obra e uso da terra de um conjunto
de 50 países, os autores encontraram evidências de que ambos os setores experimentaram
taxas elevadas de progresso técnico no período e que, surpreendentemente, o ritmo parece ter
sido mais acelerado na agricultura do que na indústria. Eles observaram ainda uma tendência
57
mais forte de conversão dos níveis e taxas de crescimento da produtividade total dos fatores
na agricultura do que na indústria transformadora, sugerindo que a disseminação internacional
de inovações foi relativamente mais rápida nesse setor.

De acordo com o estudo, a produtividade total dos fatores da indústria cresceu, em média,
entre 1,13% e 1,86% ao ano, de acordo com a metodologia empregada, em toda a amostra.
Esse desempenho é superior nos países desenvolvidos, nos quais a taxa anual oscilou entre
1,91% e 3,29%. Nas economias em desenvolvimento, o ritmo foi bem inferior, tendo oscilado
entre 0,62% e 0,92%. Dividindo-se este grupo por faixa de renda, os autores observaram uma
taxa de crescimento de 0,22% a 0,93%, nos países de baixa renda, e de 0,76% a 0,97%, nos de
renda média.

Já a produtividade total dos fatores da agricultura apresentou uma taxa anual média de
crescimento de 2,34% a 2,91% para toda a amostra. Novamente, o ritmo de expansão foi mais
intenso nos países desenvolvidos, 3,35% a 3,46%, do que nos países em desenvolvimento,
1,76% a 2,62%. Entre as economias em desenvolvimento, observa-se uma taxa de 1,44% a
1,99% para os países de baixa renda e de 1,78% a 2,91% para os de renda média. Em todas as
comparações, portanto, a produtividade total dos fatores apresentou taxas mais elevadas na
agricultura do que na indústria.

Para os autores, seu achado enfraquece o argumento que dá sustentação a políticas que
preterem a agricultura em favor do setor manufatureiro, supostamente mais dinâmico, assim
como a tese de que países com grandes setores agrícolas tendem a crescer menos. No entanto,
eles reconhecem que, apesar do rápido progresso técnico na agricultura, não há razões para
acreditar que a participação do setor na economia mundial possa crescer ao longo do tempo.

At the global level, Engel's Law will clearly operate strongly, reducing the share of final spending
on agriculture, and hence the share of agricultural output in global income. In individual high-
growth developing economies, the share of agriculture can be expected to fall even more rapidly
because capital deepening will tend to pull resources out of agriculture and into more capital-
intensives sectors. For the world as a whole, rapid technical advances in agriculture facilitate the
flow of resources out of agriculture and into other sectors (MARIN; MITRA, 1999, p. 18).

58
Para Lederman e Maloney (2007), os elevados ganhos de produtividade no setor agrícola são
o provável canal por meio do qual a presença de recursos naturais pode estimular o
crescimento econômico, a despeito de sua influência possivelmente negativa sobre outros
fatores.

3.1.2. Maldição dos recursos ou da dívida externa?

Manzano e Rigobón (2001) sustentam que os achados obtidos por Sachs e Warner e outros
autores foram influenciados por fatores que, embora correlacionados com a dotação de
recursos naturais, foram omitidos nas regressões. Em sua pesquisa, os autores sugerem que a
“maldição dos recursos naturais” sobre o crescimento desaparece quando se adota a dívida
externa como uma variável de controle. Sua conclusão é que foi o excesso de dívida, e não a
dotação de recursos naturais, a causa do fraco desempenho econômico dos países
exportadores de matérias-primas entre as décadas de 1970 e 1990.

Os autores defendem que durante a forte alta nos preços das commodities na primeira metade
da década de 1970, os países exportadores de produtos primários usaram seus recursos
naturais como uma garantia implícita – aceita pelos credores – para ampliar seu nível de
endividamento. Com a forte desvalorização dos produtos primários ao longo dos anos 1980 e
a consequente queda dos influxos de dólares provenientes do exterior (decorrente também do
choque monetário de 1979), esses países se viram excessivamente endividados, sem crédito e
obrigados a adotar medidas recessivas, que os conduziram a um longo período de estagnação.

Por essa razão, o fraco desempenho econômico dos países exportadores de produtos primários
parece não estar relacionado à dependência dos recursos naturais, em si. Antes, foi uma
consequência da conhecida imperfeição dos mercados de crédito, que tendem a correr mais
riscos e a se sobrealavancar em períodos de bonança econômica, criando distorções nos
preços de ativos.

In this respect, a boom-bust cycle in a commodity price is no different from a bubble in stock markets, as
was the case of Japan, or a bubble in real estate prices, as was in New England and Thailand. Our
interpretation is that the curse of natural resources, in this data, is another example of the curse on asset
prices bubbles (MANZANO; RIGOBON, 2001, p. 26)

59
3.1.3. Recursos naturais e capital humano

Bravo-Ortega e De Gregório (2005) defenderam que a abundância de recursos naturais exerce


um efeito positivo sobre a renda per capita, embora esteja negativamente correlacionada com
a taxa de crescimento econômico. Ou seja, países exportadores de commodities primárias
tenderiam a crescer menos que seus pares especializados em produtos industrializados, mas
poderiam desfrutar de um bem-estar social maior.

De acordo com o modelo desenvolvido pelos autores, o crescimento econômico é uma média
ponderada entre as taxas de crescimento do setor de recursos naturais e da indústria, sendo
que o setor primário emprega uma quantidade constante de capital humano e não cresce25,
enquanto o setor secundário pode adicionar capital humano indefinidamente e crescer a taxas
positivas. Por essa razão, uma maior dotação de recursos naturais aumenta a renda per capita,
mas reduz o ritmo de crescimento da economia ao provocar a expansão do tamanho do setor
primário.

Ainda segundo o modelo, uma maior quantidade de capital humano produz taxas de
crescimento mais altas para uma determinada dotação de recursos naturais, de modo que sua
abundância apenas limita o crescimento econômico quando o nível de capital humano é baixo
e não há recursos humanos suficientes para serem empregados em atividades que melhorem o
crescimento.

Bravo-Ortega e De Gregório aplicaram seu modelo em regressões de crescimento para o


período entre 1970 e 1900, utilizando a mesma medida de abundância de recursos utilizada
por Sachs e Warner, e concluíram que o impacto negativo dos recursos naturais sobre o
crescimento é neutralizado ou mesmo revertido em países com elevados níveis de capital
humano.26 Elevados índices de capital humano, demonstram, se contrapõe ao efeito negativo
que o deslocamento de fatores de produção da indústria para a exploração de recursos naturais
exerce sobre o crescimento econômico. Em outras palavras, a educação seria o remédio mais
adequado para tratar a Doença Holandesa.

25
Um pressuposto condizente com o pensamento econômico clássico.
26
Os autores utilizaram como medida o número médio de anos de estudo da população com mais de 25 anos de
idade.
60
Os autores alegam ainda ser possível formalizar a ideia de um desenvolvimento conjunto de
setores industriais de alta tecnologia simultaneamente aos de recursos naturais, em um modelo
multissetorial, desde que a economia seja rica em capital humano – caso de países como
Estados Unidos, Austrália e Canadá. Em particular, a experiência dos países escandinavos,
onde o desenvolvimento dos recursos naturais foi acompanhado do crescimento de uma base
industrial ligada ao setor primário – por exemplo, a indústria de madeira e celulose que
emergiu a partir da exploração de produtos florestais – parece validar esse pressuposto.

A country would not benefit from giving away its natural resource endowment, as one might mistakenly
conclude from models that emphasize only the growth effect. A country that is rich in natural resources
can start with a high level of income, accumulate human capital, and see its growth accelerate. In this
sense, natural resources need not be a curse. However, extremely low levels of human capital may cause
such an economy to stagnate, because it then tends to specialize in natural resources extraction.
(BRAVO-ORTEGA; DE GREGÓRIO, 2005, p. 27)

Os autores comparam a experiência de países escandinavos e sul-americanos, ambos


exportadores líquidos de recursos naturais. Eles observam que, por volta de 1870, as duas
regiões possuíam economias relativamente próximas em tamanho. Naquele ano, a renda per
capita de Finlândia, Noruega e Suécia era muito semelhante àquela de Argentina e Chile
(ambos os grupos na faixa entre US$ 1.1 mil e US$ 1,6 mil). Em 1990, no entanto, esse valor
alcançou a faixa entre US$ 16 mil e US$ 17 mil nos países escandinavos, mas ainda se
encontrava no intervalo dos US$ 6 mil nos vizinhos sul-americanos. Para eles, o estoque
inicial de capital humano das duas regiões foi um fator decisivo – embora, certamente, não o
único – por trás dessa desigualdade. Entre 1870 e 1890, ponderam, a taxa média de
alfabetização era de 99% na Dinamarca, 98%, na Noruega e na Suécia, e 89%, na Finlândia,
mas não passava de 46%, na Argentina, 30,3%, no Chile e 14,8%, no Brasil.

It is difficult to explain the greater persistence of growth in Scandinavia than in Latin America without
remarking on the educational gap that emerged between the two groups of countries over the period
1870-1910, and which remained large throughout the twentieth century (BRAVO-ORTEGA; DE
GREGÓRIO, 2005, p. 7).

O elevado nível educacional da força de trabalho nos países nórdicos teria facilita a alocação
de trabalhadores entre diferentes atividades econômicas e o desenvolvimento de segmentos

61
industriais atrelados ao processo de exploração dos recursos naturais: ainda no século 19, a
Dinamarca começou a substituir a exportação de grãos pela de carnes; Suécia e Noruega
migraram do comércio de madeiras para o de celulose e a Suécia foi capaz de adotar e
aperfeiçoar as técnicas metalúrgicas britânicas, que lhe permitiram constituir sua própria
indústria metalúrgica.

Situações que teriam causado uma crise social na América Latina, como a provocada pela
crise do nitrato, que levou a uma migração em massa para as cidades no Chile, se mostraram,
na Escandinávia, um episódio schumpeteriano de destruição criativa (BRAVO-ORTEGA; DE
GREGÓRIO, 2005, p. 9). A distinção entre o desempenho da América Latina e da
Escandinávia também teria relação com questões institucionais. Já no começo do século 19,
escandinavos empreenderam reformas agrárias e educacionais, além de práticas políticas
favoráveis ao livre comércio, na contramão da maioria dos países latino-americanos.

Blomström e Kokko (2007) afirmam que o processo de transformação de Suécia e Finlândia,


de países agrícolas subdesenvolvidos em economias avançadas e de bem-estar social, sugere
ser possível às economias exportadoras de produtos primários construírem fundamentos
sólidos para o desenvolvimento sustentável, a diversificação e o crescimento de indústrias
avançadas com base na exploração de seus em recursos naturais.

Ainda de acordo com os autores, embora tenham perdido espaço na produção, nas
exportações e na geração de empregos ao longo das últimas décadas, as indústrias baseadas
em recursos naturais ainda respondem por uma fatia significativa da economia dos países
escandinavos – as indústrias madeireira e siderúrgica empregam, juntas, quase um quinto da
força de trabalho industrial e garantem cerca de um quarto das exportações da Suécia, com
participação ainda mais relevante na Finlândia.

The continuing prominence of these sectors implies that raw-material-based production is not only a
temporary stage in economic development, but can instead be a sustainable element of an advanced
industrial structure (BLOMSTRÖM; KOKKO, 2007, p.214).

Conforme lembram Wright e Czelusta (2007), a história revela uma série de casos bem-
sucedidos de desenvolvimento baseado na produção e exploração de recursos naturais, que
desafiam a tese de uma associação intrínseca entre a dotação de recursos naturais e o
subdesenvolvimento. Os Estados Unidos, maior economia do mundo, são o principal
62
exemplo. De acordo com os autores, os americanos eram os maiores produtores de
praticamente todos os principais recursos minerais entre o fim do século 19 e início do século
20, exatamente quando se transformou também no maior produtor de produtos
manufaturados. Para os autores, o rápido desenvolvimento industrial americano não ocorreu
apesar da abundância de recursos naturais, mas também em função dela, como demonstra o
fato de que a intensidade mineral relativa das exportações americanas cresceu de modo
expressivo entre 1879 e 1914.

The American economy may have been resource abundant, but Americans were not renters living
passively off of their mineral royalties. Clearly the American economy made something of its abundant
resources. Nearly all major U.S. manufactured goods were closely linked to the resource economy in one
way or another: petroleum products, primary copper, meat and poultry packing, steel works and rolling
mills, coal mining, vegetable oils, grain mill products, sawmill products, and so on. The only items not
conspicuously resource-oriented were various categories of machinery. Even here, however, some types
of machinery (such as farm equipment) serviced the resource economy, while virtually all were
beneficiaries in that they were made of American metal.These observations by no means diminish the
country’s industrial achievement, but they confirm that American industrialization was built upon natural
resources. (WRIGHT E CZELUSTA, 2007, pg. 185 e 186)

David e Wright (1997, apud WRIGHT; CZELUSTA, 2007) argumentam que a abundância de
recursos minerais dos Estados Unidos não foi o resultado exclusivo de sua dotação geológica,
mas refletiu um processo intensivo de prospecção, de investimentos massivos em tecnologias
de extração, refino e aplicação, educação nas áreas de mineração, minérios e metalurgia,
desenvolvimento de mercado e infraestrutura de transporte, além de estruturas legais,
institucionais e políticas favoráveis ao desenvolvimento do setor, de modo que, em 1913, a
participação norte-americana na produção superava, em grande medida, sua fatia nas reservas
mundiais conhecidas.

Como observado em International (2009), muitos dos mercados emergentes no período que
antecedeu a segunda Guerra Mundial eram exportadores de commodities, cresceram mais
rápido que qualquer outro grupo durante a década de 1930 e hoje figuram entre as economias
mais desenvolvidas do mundo. Entre os países de alta renda membros da OCDE, alguns são
grandes exportadores líquidos de recursos naturais. São os casos notórios de Noruega, onde o
balanço das commodities corresponde a 64% das exportações, Austrália (41,8%), Nova
Zelândia (17,3%) e Canadá (15,7%).

63
3.2. A revolução dos recursos naturais: as ideias de Carlota Perez

Dentro do debate recente sobre desenvolvimento e recursos naturais, as ideias apresentadas


pela economista britânico-venezuelana Carlota Perez merecem destaque. Em trabalhos
desenvolvidos no âmbito da Cepal, individualmente ou em parceria com Anabel Marin e
Lizbeth Navas-Aleman (2009), Carlota Perez propõe uma nova abordagem sobre o tema e a
revisão de alguns dos principais pressupostos aceitos ao longo das últimas décadas sobre a
especialização em recursos naturais.

Seu argumento central é que as teorias sobre o papel dos recursos naturais no
desenvolvimento não são definitivas ou universais, mas estão sujeitas a condições que são
históricas. O grande salto de desenvolvimento experimentado por países como Estados
Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, no fim do século 19, deram aos economistas da
época boas razões para considerar que a dotação de recursos naturais representava um
estímulo ao desenvolvimento.

Mas as condições mudaram radicalmente na primeira metade do século 20, o que transformou
o debate a partir dos anos 1940 e 1950, com o surgimento da tese Prebisch-Singer, e seus
desdobramentos teóricos nas décadas seguintes. Por uma série de razões, a abundância de
recursos naturais parecia não mais favorecer o desenvolvimento em um período em que as
grandes histórias de sucesso econômico, como Japão, Coreia do Sul e China, foram baseadas
em processos de industrialização.

Contudo, os argumentos que pautaram a discussão nos últimos 50 anos parecem não ser mais
adequados para discutir a relação entre recursos naturais e desenvolvimento no começo do
século 21. De acordo com a economista, o processo de globalização associado à última revolução
tecnológica alterou a estrutura econômica mundial e criou uma janela de oportunidade para que os
países da América Latina cresçam e se desenvolvam tecnologicamente com base na exploração,
produção e processamento de recursos naturais.

Para Carlota Perez, uma economista da escola neo-schumpeteriana, as oportunidades de


desenvolvimento associadas aos recursos naturais mudam conforme novos paradigmas
técnicos e econômicos emergem e se estabelecem, o que demanda o surgimento de teorias
capazes de contemplar a questão em sua devida época.

64
Essa visão está inserida em sua abordagem sobre as chamadas revoluções tecnológicas,
grandes surtos de desenvolvimento marcados pelo surgimento de todo um conjunto de novas
indústrias, princípios organizacionais e externalidades de infraestrutura e conhecimento, que
levam à modernização de praticamente todos os setores da economia e trazem consigo um
novo paradigma técnico-econômico, isto é, um novo senso comum sobre a melhor maneira de
se organizar a produção. Ao todo, a economia capitalista experimentou cinco revoluções
tecnológicas, a começar pela Revolução Industrial do século 18 (PEREZ, 2010a).

Assim, muitos dos fatos estilizados a respeito dos recursos naturais seriam, de fato,
condizentes com os paradigmas estabelecidos pela quarta revolução tecnológica, iniciada no
começo do século passado, com o fordismo nos Estados Unidos, e que deu forma àquela que
ficou conhecida como a Era do petróleo, dos automóveis e da produção em massa – uma era
intensiva no consumo de recursos naturais e que, por isso, demandava uma oferta abundante e
barata de produtos primários.

Contudo, esses pressupostos pouco dizem respeito aos parâmetros da quinta revolução,
iniciada nos anos 1970, e que deu origem à Era das Tecnologias da Informação e
Comunicação (TICs), marcada por um intenso processo de globalização da produção.
Segundo Marin, Navas e Perez (2009), a era das TICs criou um novo espaço para a
dinamização tecnológica e organizacional da produção e do consumo de produtos de origem
natural.

Essa mudança está diretamente associada aos novos propulsores da demanda por recursos
naturais. Uma das características da era das TICs foi a reorganização das cadeias produtivas,
em escala global e baseada em vantagens comparativas, que destinou aos países populosos da
Ásia, sobretudo a China, com grande oferta de mão de obra barata e qualificada, o papel de
“fábrica do mundo” (PEREZ, 2010b). Essa etapa do processo de globalização culminou na
transferência de diversas indústrias antes situadas nos países desenvolvidos (e mesmo em
alguns países em desenvolvimento, como o Brasil) para o Oriente e na obtenção de ganhos
expressivos de escala naquela região.

A primeira consequência, que vai de encontro a um dos argumentos centrais da tese Prebisch-
Singer, foi a queda nos preços relativos das manufaturas exportadas a partir da Ásia,
revertendo a tendência que prevaleceu ao longo de praticamente todo o século passado. Esse

65
movimento impôs um obstáculo adicional à industrialização dos países com menor densidade
populacional, como é o caso dos latino-americanos, que passaram a ter cada vez mais
dificuldades para competir com a barata manufatura da região.

Os países asiáticos também foram bem-sucedidos à medida que desenvolveram capacidades e


acumularam conhecimento em setores estratégicos na área das TICs, de modo que hoje
possuem companhias multinacionais capazes de inovar em setores de ponta relacionados a
esse paradigma tecnológico – uma porta que já se fechou para os países da América Latina27.
(MARIN, NAVAS E PEREZ, 2009, p.8)

Em contrapartida, o crescimento econômico gerado por esse padrão de globalização em países


como China e Índia, com suas grandes populações e relativa escassez de recursos naturais,
teve impactos importantes sobre a demanda mundial por minérios, energia e alimentos, com
seu efeito já descrito sobre os preços relativos dessas matérias-primas. Isso permitiu que os
países da América Latina e da África ampliassem suas exportações para a Ásia, estabelecendo
uma forte relação de complementaridade econômica entre as duas regiões e abrindo um novo
leque de oportunidades de desenvolvimento baseadas em recursos naturais (PEREZ, 2010b,
p.125).

Partindo de um pressuposto clássico, de acordo com o qual a produção de recursos naturais


cresce mediante a incorporação de terras e reservas minerais em condições menos favoráveis
do que aquelas já exploradas – e, portanto, a custos crescentes –, Marin, Navas e Perez (2009)
argumentam que o forte aumento da demanda por produtos primários decorrente do “viés
asiático” do atual processo de globalização deve multiplicar consideravelmente os estímulos
econômicos à inovação em toda a cadeia de recursos naturais, especialmente se os preços se
mantiverem em patamares elevados.

Essa tendência é acentuada ainda pelas crescentes preocupações com o aquecimento global e
a preservação ambiental, que devem aumentar a pressão (por meio de novas taxas, aumento
dos custos de energia e movimentos civis organizados) por ganhos de produtividade na
extração, transporte, processamento e consumo de recursos naturais, de modo a reduzir seu
impacto sobre as condições de vida no planeta.

27
Em 1998, Rosemary Thorp (apud CUDDINGTON, LUDEMA, JAYASURIYA, 2007) alertava que a
economia globalizada empurraria a América Latina ainda mais na direção da produção de recursos naturais,
especialmente petróleo e minérios.
66
If prices increase enough, pushing against the limits of natural resource availability can make it
attractive to access almost unreachable deposits, under the sea, deep underground or in inhospitable
landscapes such as the Arctic or Siberia. Major innovation is required in those cases for exploration,
extraction and transport. The case of the deep ocean oil reserves found in Brazil and the complexities of
its exploitation are a vivid example of this. In a previous occasion, when the OPEC price rise in the
1970s drove the developed economies to try to increase their own reserves, Norway not only became an
important producer of undersea oil but it promoted the emergence of a whole network of specialised
suppliers of equipment and services that are today moving to participate in the Brazilian fields. (MARIN;
NAVAS;PEREZ, 2009, p.10)

O crescimento da demanda representa também uma janela de oportunidade para que países
ricos em recursos naturais se especializem nas indústrias de processamento, tais como
siderúrgicas, petroquímicas, esmagadoras de grãos e fábricas de celulose, e invistam em
sistemas de transporte e telecomunicação que aumentem sua eficiência. Isso porque a alta nos
preços de energia pode fazer com que o processamento de matérias-primas, hoje realizado
preferencialmente perto dos mercados consumidores, fique mais competitivo nas regiões
produtoras.

Materiais não processados têm valor muito baixo em relação ao seu peso (o que significa altos
custos energéticos e ambientais no transporte), de modo que transportar o produto acabado
pode significar uma economia importante para os mercados consumidores. Como tornar essas
indústrias, tradicionalmente intensivas em energia, mais flexíveis, relativamente móveis e
menos dependentes das economias de escala é apenas um desafio de inovação que os países
produtores de recursos naturais devem enfrentar (MARIN, NAVAS; PEREZ, 2009, p.11)

É possível afirmar que a produção de recursos naturais sempre demandou, em maior ou menor
grau, algum processo de inovação e a busca por ganhos de produtividade, como demonstrou a
Revolução Verde dos anos 1970, na agricultura. Responder se as recompensas de preço têm
sido historicamente compatíveis com o investimento e o esforço de inovação não é tão
simples.

No cenário descrito por Prebisch e Singer, os ganhos de produtividade obtidos pelos


produtores de recursos naturais se traduziam em preços mais baixos aos consumidores. A
literatura clássica sugere ainda que é o produtor mais bem localizado, que colhe mais e com
menos esforço, quem aufere os lucros da inovação demandada para se produzir em áreas
menos produtivas. Tais observações ajudaram a alimentar a desconfiança sobre a condução de
estratégias de desenvolvimento baseadas em recursos naturais.
67
Marin, Navas e Perez (2009, p.12) sugerem que algumas das características intrínsecas à era
das TICs devem não apenas intensificar os estímulos endógenos à inovação nos setores de
recursos naturais, mas também abrir caminho para que alguns dos tradicionais obstáculos que
limitam a aferição dos lucros sobre esses investimentos sejam superados. Um desses atributos
é o que os autores chamam de hipersegmentação (ou fragmentação refinada) do mercado em
todos os setores da economia, uma tendência que, cada vez mais, permite criar, comercializar
e distribuir, para qualquer lugar do mundo, produtos customizados, em segmentos muito
específicos e com baixos volumes – algo impensável no paradigma da produção em massa.
Essa característica, argumentam, facilita a criação semimonopólios temporários, condição
favorável à amortização dos esforços de inovação.

Desse modo, a produção de recursos naturais passa a contar com novos estímulos de
diferenciação ou “descommoditização”, que pode ser alcançada por meio da criação de
marcas associadas a produtos de qualidade superior e característicos de uma região em
particular (tais como vinhos, cafés gourmet e queijos) ou inseridos em um determinado modo
de produção (alimentos orgânicos), que atendem às exigências de consumidores preocupados
com a saúde e o meio ambiente. É o caso, ainda, de produtos desenvolvidos para atender a
necessidades específicas de determinados clientes ou mercados, como os chamados aços
especiais (ou de “boutique”).

One of the characteristics of the current paradigm that enables taking advantage of niche products
is the ease of direct communication with the specialised users or distributors. This allows both the
acquisition of information about the precise characteristics of a required material, for example,
and the identification of sufficient clients to build a reasonably sized niche. At the same time, the
transformation of the transportation services to handle small quantities and special requirements
with high efficiency and decreasing costs makes it possible to cater to a globally disperse niche
(MARIN; NAVAS; PEREZ, 2009, p.12).

Obviamente, a quase totalidade da produção de recursos naturais continua a ser composta por
commodities. Carlota Perez (2010b) pondera que o mesmo pode ser dito em relação à
indústria28. Os enormes ganhos de escala, a queda nos custos de produção e a forte

28
O próprio Hans Singer, em um artigo recente, (1999, p.2), chamou a atenção para o fato de que os termos de
troca das manufaturas exportadas pelos países em desenvolvimento estavam se deteriorando em relação aos
produtos importados dos países centrais (tanto ou mais do que os produtos primários), devido aos diferentes
graus de conteúdo tecnológico. Por essa razão, sugeriu uma extensão da tese Prebisch-Singer, com mudança de
ênfase: em vez de industrialização e diversificação das exportações, em sua formulação original, os países
deveriam perseguir aumento de capacidade tecnológica, das habilidades empreendedoras e do capital humano.

68
concorrência, decorrentes do atual processo de globalização, tendem a transformar uma série
de bens de consumo, tais como discos rígidos, celulares, computadores, eletrodomésticos e
autopeças em commodities, isto é, em produtos com baixíssima diferenciação, grande volume
de produção, baixas margens de lucro e competição por custo.

Desse modo, a divisão entre “recursos naturais” e “manufatura” – que fazia sentido no
paradigma da produção em massa – perde força a dá lugar a uma divisão entre produtos
“básicos” e “diferenciados”, ou ainda, “padronizados” e “inovadores”, em todos os setores da
economia – recursos naturais, indústria e serviços.

One of the consequences of this complex structure of all markets is the switch from
considering “industrialization” as the top of the range in development, to perhaps
having to coin a term such as “technologization” to refer to the more advantageous
positions in the world market maps. This, together with the growth of raw materials
prices, driven by the advance of globalization, can contribute to eliminate or
significantly diminish the traditional disadvantage of raw materials. (PEREZ,
2010b, p. 129)

Marin, Navas e Perez (2009, p.16) sugerem ainda que um cenário de relativa escassez,
aumento dos preços e da volatilidade nos mercados de metais, energia e alimentos pode
alterar a relação de forças e ter consequências positivas para as estratégias comerciais dos
países produtores de recursos naturais. De um lado, há uma crescente competição entre os
países importadores para assegurar seu abastecimento, o que significa um maior poder de
barganha, por parte dos exportadores, na atração por investimentos estrangeiros, aquisição de
tecnologia e abertura de mercados. Do outro, para as companhias globais de recursos naturais,
o acesso às melhores terras, minas ou campos de petróleo torna-se um elemento cada vez mais
importante para a sua estratégia. Trata-se, portanto, de um contexto favorável à criação de novos
modelos de negócio, mecanismos de financiamento e políticas governamentais.

Finalmente, Perez (2010b) argumenta que a escolha por uma estratégia de desenvolvimento
baseada em recursos naturais pode colocar a América Latina em condições favoráveis para a
próxima revolução tecnológica, já em gestação e com grandes chances de ocorrer nas
próximas duas ou três décadas, respeitados os padrões das revoluções anteriores. De acordo
com a pesquisadora, a próxima revolução deve ser determinada por uma combinação de

69
biotecnologias, nanotecnologias, bioeletrônicos, novos materiais e novas fontes de energia,
todas possivelmente associadas à indústria de processamento e recursos naturais – razão pela
qual é fundamental, desde já, desenvolver habilidades neste setor. Contudo, a autora afirma
que a janela de oportunidade para que esse salto seja dado é custo – talvez, não mais do que
uma década –, de modo que os primeiros passos precisam começar a ser dados.

Latin America can now make a start on enhancing its capabilities in preparation for the next revolution,
using its current resource-based exports as a platform for leading-edge innovation and as a source of
funding. It is important to note that Japan and the “Asian tigers” acquired their initial experience by
assembling transistors and electronic equipment in the 1950s and especially the 1960s and early 1970s.
At the time, these were being used in products typical of the mass production revolution: radios,
televisions, record players, etc., with the portable versions constituting a market-expanding innovation.
This placed those countries in an advantageous position in terms of experience and capabilities when the
microprocessor inaugurated the ICT revolution. Something similar could take place in Latin America the
next time around, not however by chance but because of a conscious drive in this direction (PEREZ,
2010b, p.135).

70
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O papel dos recursos naturais no desenvolvimento econômico ainda é alvo de inúmeras


controvérsias. De modo geral, as evidências são incapazes de demonstrar categoricamente a
existência de uma “maldição”, que sempre dificulte ou mesmo até impeça o desenvolvimento
econômico de países com elevada dotação de recursos naturais. Por outro lado, a simples
existência da controvérsia é suficiente para atestar que a dotação de recursos em abundância
não representa uma vantagem óbvia, como seria natural supor.

Como vimos no capítulo 3, estudos empíricos sobre a influência dos recursos naturais sobre o
crescimento econômico apresentam resultados bastante distintos de acordo com o método de
estimação, a medida de abundância e as variáveis de controle empregadas. Fatores como
elevado grau de concentração das exportações, excesso de endividamento e baixos níveis de
capital humano podem ter comprometido o desempenho econômico de países exportadores de
produtos primários nas últimas décadas. Os mecanismos de interação entre essas variáveis,
contudo, continuam a requerer estudos mais aprofundados.

É provável que, como argumenta Carlota Perez, as teorias sobre recursos naturais e
desenvolvimento não sejam universais ou seculares, mas pertinentes às condições econômicas
e aos paradigmas técnicos da época em que são elaboradas. De fato, a dotação de recursos
teve um papel crucial para o desenvolvimento de países como Estados Unidos, Canadá,
Austrália, Nova Zelândia, Suécia, Noruega e Finlândia no século 19, ainda que não tenham
contribuído decisivamente para um maior grau de desenvolvimento na América Latina. No
entanto, faltam exemplos de economias que tenham dado grandes saltos com estratégias
baseadas em recursos naturais na segunda metade do século 20.

Talvez, como argumentam Sachs e Warner (1995), a disponibilidade de recursos fosse


realmente essencial para o nascimento de novas indústrias e tecnologias em uma época em
que os custos de transporte eram muito elevados, mas tenha se tornado irrelevante à medida
que esses gastos caíram. A mesma lógica sugere, porém, que a forte elevação nos preços de
energia e, consequentemente, dos fretes marítimos, como se observou nos últimos anos, pode
tornar a dotação de recursos mais uma vez relevante para o desenvolvimento de indústrias
71
locais, inviabilizando o transporte por longas distâncias de matérias-primas não processadas,
de baixo valor agregado, conforme argumenta Carlota Perez.

Do mesmo modo, a tese da deterioração dos termos de troca dos recursos naturais,
apresentada por Prebisch e Singer nos anos 1950, carece de uma revisão em virtude das
mudanças estruturais observadas na economia mundial nas últimas décadas. A divisão
internacional do trabalho mudou radicalmente, de modo que o esquema centro-periferia não
mais oferece uma compreensão adequada do mundo de hoje.

Com a migração de boa parte da indústria para a China, os custos de mão de obra da produção
manufatureira desabaram e os frutos do propagado progresso técnico industrial, antes
capturados pelos trabalhadores organizados dos países desenvolvidos, foram finalmente
repassados para os preços dos bens manufaturados – condição que, segundo Prebisch (1949),
tornava a industrialização desnecessária e até indesejável onde não houvesse as devidas
vantagens comparativas. O processo de “commoditização” da produção manufatureira,
descrito por Carlota Perez, apenas reforça essa tendência.

Além disso, a análise da evolução dos termos de troca dos recursos naturais nos últimos 140
anos mostra que a deterioração anunciada por Prebisch-Singer não foi homogênea. Como
demonstram Ocampo e Parra (2010) e Erten e Ocampo (2012), no capítulo 2, a queda ficou
praticamente restrita aos produtos agrícolas, sobretudo aqueles de origem tropical, como café,
açúcar, cacau, banana e óleo de palma. Eles apresentaram a menor valorização nos ciclos de
alta dos preços das commodities e as quedas mais acentuadas nos ciclos de contração.

O fato de serem produtos típicos de países pouco desenvolvidos, com menor grau de
organização de seus trabalhadores e mecanismos adequados de comercialização talvez
explique, ao menos parcialmente, esse comportamento. Outra possível explicação, sem
respaldo na literatura, é que a maioria dos produtos agrícolas tropicais são culturas perenes,
uma característica que dificulta o ajuste da oferta em períodos de retração na demanda. Em
comparação, os preços relativos dos metais e do petróleo experimentaram uma apreciação ao
longo de todo o período e, na última década, atingiram os maiores níveis da história.

72
É impossível antever o comportamento futuro dos preços das commodities. Obviamente, o
forte crescimento da China e da Índia impõe uma enorme pressão sobre a oferta de recursos
naturais, o que deve manter os preços dos produtos primários em patamares elevados por mais
alguns anos, até que a oferta se ajuste aos novos patamares da demanda. Em todas as partes do
mundo, diversos investimentos estão sendo feitos na exploração de petróleo, minérios e terras
agricultáveis. É uma questão de tempo até que esses investimentos maturem e comecem a
produzir.

Além disso, é de se esperar que a intensidade do uso de recursos naturais no crescimento


econômico continue a diminur nos próximos anos, com o amadurecimento da economia
chinesa – menor participação dos investimentos na composição do PIB e uma maior
participação do consumo –, a redução no ritmo de crescimento da população mundial e os
ganhos de eficiência na indústria se contraponham, em alguma medida, à tendência altista dos
últimos anos.

Durante os dois primeiros superciclos de preço das commodities (1894-1932 e 1932-1971), os


termos de troca subiram por 23 anos e 19 anos, respectivamente, antes de começarem a cair.
Como comparação, a atual fase de alta dos produtos primários começou há 11 anos, o que
sugere haver espaço para pelo menos mais uma década de elevação, desde que os países em
desenvolvimento continuem a puxar o crescimento mundial.

Contudo, é plausível a hipótese de que o mundo esteja caminhando para uma era de recursos
escassos, que produza uma valorização duradoura dos termos de troca dos produtos primários
– tal como sugeriram os pensadores do fim do século 18. Embora essa tese tenha sido
desmentida inúmeras vezes, por sucessivos aumentos de produção, as restrições ambientais,
técnicas e econômicas ao aumento da oferta são crescentes e exigem soluções custosas. Se o
século 20 testemunhou a descoberta de imensos campos de petróleo com baixíssimo custo de
extração no Oriente Médio, o século 21 pode depender do óleo escondido a milhares de
quilômetros abaixo do nível do mar na costa brasileira.

Neste sentido, é bastante clara a tendência de dinamização do setor de recursos naturais, com
maior incorporação de tecnologia, capital físico e humano nos próximos anos, como sugere

73
Carlota Perez. Aplicações nas áreas de biotecnologia e nanotecnologia, possíveis veículos de
uma nova revolução tecnológica, tendem a ser tornar cada vez mais frequentes na produção e
no consumo de matérias-primas agrícolas, combustíveis e metálicas, o que coloca os países da
América Latina em condição privilegiada para traçar estratégias de desenvolvimento
tecnológico com base em sua abundância de recursos naturais. Contudo, não se pode descartar
que nos tornemos meros usuários de tecnologias desenvolvidas no exterior – como ocorre
com a transgenia na agricultura brasileira, por exemplo.

De todo modo, o aumento da renda advindo da alta dos preços relativos das commodities cria
condições excepcionais para que países como o Brasil invistam em sua infraestrutura de
transportes, telecomunicações e na formação de capital humano, ampliando os níveis de
competitividade de sua economia como um todo e se contrapondo aos efeitos potencialmente
negativos da abundância de recursos sobre o crescimento.

A produção de recursos naturais não precisa e não deve ser um fim, mas pode ser a base para
financiar o desenvolvimento e aumento da capacidade produtiva em outros setores, o que
depende da formulação de políticas públicas e da construção de arcabouços institucionais
adequados. Em contrapartida, os países com dotação de recursos naturais terão desperdiçado
uma grande oportunidade se utilizarem esses recursos de maneira inadequada, financiando tão
somente o consumo e o aumento das importações e satisfazendo anseios rentistas. O papel das
instituições é, portanto, fundamental.

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