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Relação entre Teoria de Hamilton-Jacobi e a Mecânica Quântica.

As bases da Mecânica Quântica foram estabelecidas por Faraday, Kirchoff e Boltzmann


com seus trabalhos sobre raios catódicos, radiação do corpo negro e discrição de energia
de sistemas físicos, respectivamente.
Em 1900, Max Planck introduz a ideia de que a energia é emitida ou absorvida em
quantidades discretas denominadas de quanta, sendo proporcionais à frequência da
radiação absorvida ou emitida, cuja constante de proporcionalidade é chamada de
constante de Planck (h). Baseando seu trabalho na hipótese de Planck, Albert Einstein
(1905) postulou que a própria luz é formada por pacotes individuais de energia (fóton).
Posteriormente, Louis de Broglie levou mais afundo todas as ideias desenvolvidas e
postulou a teoria ondulatória da matéria definindo que partículas também possuem um
comprimento de onda, cujo qual é dado por
ℎ (1)
𝜆=
𝑝
onde h é a constante de Planck e p é o momento linear da referida partícula.
Em decorrência da proposta de de Broglie, tem-se então postuladas em 1915 as regras de
quantização de Wilson-Sommerfeld. Essas regras eram utilizadas para obter os níveis de
energia de sistemas atômicos a partir da hamiltoniana do sistema escrita em termos das
variáveis de ação Ji. Tais regras são definidas por
1 (2)
𝐽𝑖 = ∮ 𝑝𝑖 𝑑𝑞𝑖 = 𝑛 ℏ
2𝜋

onde ℏ é a constante de Planck reduzida e n = 1, 2, 3, ...


Tomando como exemplo o átomo de hidrogênio, seu elétron possuía uma infinidade de
órbitas contínuas, dado que isso era uma permissão obtida classicamente. Contudo, as
regras de quantização restringiam tais órbitas a valores que fossem apenas múltiplos
inteiros da constante de Planck reduzida. Tanto para o átomo de hidrogênio (o átomo mais
simples) quanto para outros sistemas simples, as regras de quantização funcionavam
muito bem. Contudo, quando aplicadas a sistemas mais complexos (átomo de hélio, por
exemplo) ou a moléculas diatômicas, essas regras se mostravam falhas e não
apresentavam resultados teoricamente consistentes com as observações experimentais.
Durante todo esse período, apesar do que já existia até então, e ainda com a comprovação
das falhas das regras de quantização de Wilson-Sommerfeld, era perceptível que essas
ideias não tinham um caráter definitivo e, portanto, não poderiam representar de forma
“completa” a teoria quântica.
A teoria de Hamilton-Jacobi desempenhou um papel muito importante para a formulação
da Mecânica Quântica feita pelo físico austríaco Erwin Schrödinger em 1926. No sentido
de “procurar” algo que representasse de forma mais geral e mais consistente sistemas
arbitrários, um dos caminhos foi desenvolvido por Schrödinger que, em um de seus
trabalhos, para justificar a equação que leva seu nome, se apoiou no trabalho desenvolvido
por Hamilton, cujo qual fazia uma analogia entre Mecânica Clássica e Óptica Geométrica
Mecânica Clássica e óptica geométrica
A teoria de Hamilton-Jacobi (HJ) pode ser considerada como o auge da mecânica
analítica. A equação de HJ surge ao considerarmos o problema de se encontrar uma
transformação canônica no espaço de fase capaz de levar a resolução das equações
dinâmicas de Hamilton a forma mais elementar possível. O formalismo é tratado, então,
como um mero meio para se encontrar soluções para as equações de Hamilton.
A equação de HJ é dada por
𝑑𝑆 𝑑𝑆 (1)
𝐻 (𝑞𝑖 ,
, 𝑡) + =0
𝑑𝑞𝑖 𝑑𝑡
onde S é a uma função geradora de uma transformação canônica da forma S(q, P, t),
𝑑𝑆
conhecida como solução completa da equação de HJ, e = 𝑝𝑖 que são os momentos
𝑑𝑞𝑖
canônicos conjugados.
Quando a hamiltoniana H não depende explicitamente do tempo, uma maneira de buscar
a função S é aplicar o método de separação de variáveis supondo que a solução seja uma
soma de duas outras funções das referidas variáveis, ou seja,
𝑆 = 𝑊(𝑞) + 𝑇(𝑡) (2)
A fim de entendermos a analogia entre a Mecânica Clássica e a Óptica Geométrica,
tomemos como exemplo uma partícula que está sob a ação de uma força conservativa
com energia potencial V = V(x, y, z). Sendo a hamiltoniana dada por H = T + V, onde T
é a energia cinética da partícula, então a hamiltoniana da partícula referida será dada por
1 (3)
𝐻= (𝑝2 + 𝑝𝑦 ²+𝑝𝑧 ²) + 𝑉(𝑥, 𝑦, 𝑧)
2𝑚 𝑥
e a equação de HJ para o sistema será do tipo

1 𝑑𝑆 2 𝑑𝑆 2 𝑑𝑆 2 𝑑𝑆 (4)
[( ) + ( ) ( ) ] + 𝑉(𝑥, 𝑦, 𝑧) + =0
2𝑚 𝑑𝑥 𝑑𝑦 𝑑𝑧 𝑑𝑡
Sendo assim, uma solução completa para esse sistema seria
𝑆 = 𝑊(𝑥, 𝑦, 𝑧) − 𝐸𝑡 (5)
e considerando que o gradiente da função W é dado por
𝑑𝑆 𝑑𝑆 𝑑𝑆 (6)
⃗ 𝑊(𝑥, 𝑦, 𝑧) =
∇ + + = 𝑝(𝑥, 𝑦, 𝑧)
𝑑𝑥 𝑑𝑦 𝑑𝑧
então podemos reescrever a equação de HJ para essa partícula como sendo
1 2 (7)
⃗ 𝑊| + 𝑉(𝑥, 𝑦, 𝑧) = 𝐸
|∇
2𝑚
Com isso, podemos então dizer que
𝑆 = 𝑊(𝑥, 𝑦, 𝑧) − 𝐸𝑡 = 𝜎 (8)
onde σ é uma constante, é uma família de superfícies. Ou seja, para cada instante t, a
equação acima representa uma superfície móvel. Logo, cada superfície corresponde ao
mesmo valor da função S (S=σ) mas a valores diferente da função W (Figura) de modo
que a trajetória C do sistema intercepte ortogonalmente a cada uma das superfícies. Sendo
assim, qualquer trajetória possível do sistema sempre interceptará ortogonalmente as
superfícies pois o gradinte da função W, 𝑝(𝑥, 𝑦, 𝑧) = ⃗∇𝑊(𝑥, 𝑦, 𝑧), é sempre
perpendiuclar à superfície em cada uma delas em cada instante.
Quando observamos a figura, percebe-se que as superfícies se assemelham com frentes
de onda de um processo ondulatório cuja trajetória da propagação dessa onda é dado pelo
trajeto (raio) C na figura abaixo.

Todo o exemplo desenvolvido aqui é uma situação mecânica que não possui nenhuma
característica ondulatória associada. Porém, Hamilton propôs que o problema mecânico
pode ser visto como um processo ondulatório fictício com S sendo a fase desse processo
e os raios de propagação como sendo a trajetória C da partícula.
Uma vez que essas superfícies são dinâmicas, então, pode-se, ainda, calcular uma
velocidade de fase u para tal sistema. Para isso, considera-se duas superfícies
consecutivas separadas por uma distância dS em um intervalo de tempo dt. Logo, u é dado
por
𝑑𝑆 (11)
𝑢=
𝑑𝑡
Como
𝑆 = 𝑊(𝑥, 𝑦, 𝑧) − 𝐸𝑡 = 𝜎 (12)

onde σ é constante, então


𝑑𝑊 − 𝐸𝑑𝑡 = 0 (13)

ou
𝑑𝑊 = 𝐸𝑑𝑡 (14)

Mas, de modo geral


⃗ 𝑊|𝑑𝑆
𝑑𝑊 = |∇ (15)
Então igualando (14) e (15)
⃗ 𝑊|𝑑𝑆 = 𝐸𝑑𝑡
|∇ (16)
e, portanto
𝑑𝑆 𝐸 (17)
=
𝑑𝑡 |∇⃗ 𝑊|
De (9), obtém-se que
⃗ 𝑊| = √2𝑚(𝐸 − 𝑉)
|∇ (18)

Substituindo (18) e (17), resulta que


𝑑𝑆 𝐸 (19)
𝑢= =
𝑑𝑡 √2𝑚(𝐸 − 𝑉)

Equação de Schrödinger
Há muito já era sabido que a mecânica clássica fracassava quando posta no domínio
microscópico (átomos e moléculas). Contudo, até então, já se sabia que que a óptica
geométrica podia ser entendida como apenas uma aproximação da óptica ondulatória e
por isso ela não podia dar conta de explicar fenômenos de natureza ondulatória tais como
difração, interferência, etc.
Através do teorema de Hamilton-Jacobi pôde-se perceber a relação interpretativa
existente entre Mecânica Clássica e Óptica Geométrica considerando que a função S
(solução completa da equação de HJ) podia ser entendida como uma fase de um processo
ondulatório fictício. No entanto, na tentativa de estabelecer uma relação existente entre a
Óptica Ondulatória e uma Mecânica Ondulatória (Mecânica Quântica), Schrödinger, em
seus trabalhos, propunha considerar a função S como uma fase de um processo
ondulatório verdadeiro, cujo qual é representado por uma função Ψ, não por menos,
denominada de função de onda, dada por
𝑖 𝑖 (20)
(𝑊(𝑥,𝑦,𝑧)−𝐸𝑡)
𝜓 = 𝑒 ℏ𝑆 = 𝑒 ℏ
Como Ψ representa, agora, um processo ondulatório verdadeiro, então tal função deve
satisfazer
1 𝑑2𝜓 (21)
∇2 𝜓 −2 2
=0
𝑢 𝑑𝑡
que é a equação de uma onda tridimensional com velocidade de fase u dada por
𝐸 (22)
𝑢=
√2𝑚(𝐸 − 𝑉)

Vale ressaltar que ∇2 𝜓 é o laplaciano da função Ψ definido por


𝑑2𝜓 𝑑2𝜓 𝑑2 𝜓 (23)
∇2 𝜓 = + +
𝑑𝑥 2 𝑑𝑦 2 𝑑𝑧 2

Fazendo a segunda derivada temporal de (20), obtém-se


𝑑2𝜓 𝐸² (24)
2
= (− ) 𝜓
𝑑𝑡 ℏ²

Substituindo (13) e (15) em (12)


2𝑚(𝐸 − 𝑉) 𝐸²
∇2 𝜓 − 2
(− ) 𝜓 = 0
𝐸 ℏ²

2𝑚 (25)
∇2 𝜓 − (𝐸 − 𝑉)𝜓 = 0
ℏ²


Multiplicando o resultado acima por − 2𝑚, e reorganizando os termos resulta

ℏ² 2 (26)
− ∇ 𝜓 + 𝑉𝜓 = 𝐸𝜓
2𝑚

Fazendo apenas a primeira derivada temporal de (20), obtém-se


𝑑𝜓 𝑖𝐸
=− 𝜓
𝑑𝑡 ℏ
Que gera
𝑑𝜓 (27)
𝐸𝜓 = 𝑖 ℏ
𝑑𝑡
Substituindo (18) em (17), resulta
ℏ² 2 𝑑𝜓 (28)
− ∇ 𝜓 + 𝑉𝜓 = 𝑖 ℏ
2𝑚 𝑑𝑡

Onde as equações (26) e (28) representam a equação de Schrödinger independente e


dependente do tempo, respectivamente.
Tal equação quando aplicada aos sistemas simples, como o átomo de hidrogênio, por
exemplo, a equação de Schrödinger conseguia calcular os níveis energéticos já obtidos
pelas regras de quantização de Wilson-Sommerfeld e, ainda, funcionava muito bem
quando aplicada a sistemas mais complexos, como o átomo de hélio ou moléculas mais
complicadas por exemplo, esta equação concordava plenamente com os resultados já
obtidos por observações espectroscópicas. Portanto, tal equação passou a representar uma
teoria completa para sistemas físicos em níveis microscópicos, níveis nos quais a
mecânica clássica sempre fracassou.
É importante lembrar que todos relações utilizadas para desenvolver a equação de
Schrödinger foram obtidas com resultados da equação de HJ para apenas uma partícula.
Contudo a equação de Schrödinger pode ser modificada para sistemas com n partículas
sem nenhuma perda.

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