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16/10/2019 John Austin

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John Austin
Pythagoras Lopes de Carvalho Neto

Tomo Teoria Geral e Filosofia do Direito, Edição 1, Abril de 2017

John Austin (1790-1859) foi um jurista inglês que buscou determinar o escopo da ciência do direito por meio da combinação do utilitarismo de Jeremy Bentham com o
teóricos do pandectismo alemão no estudo do direito romano. Fundador da jurisprudência analítica anglo-saxã, é geralmente entendido como uma das principais fig
jurídico do século XIX, especialmente nos países de língua inglesa.

1. Notas biográficas e influências1 

2. A teoria do Direito de J. Austin

2.1. O escopo da teoria: a delimitação do direito positivo pela general jurisprudence

2.2. Os conceitos-chave da teoria: comando e seus correlatos, dever e sanção

2.3. O objeto da teoria: direito positivo e figuras assemelhadas

2.4. O desenvolvimento (incompleto) da teoria: noções jurídicas fundamentais e a classificação do direito

2.4.2. Um mapa do sistema jurídico

3. As críticas de H. Kelsen e de H.L.A. Hart à teoria austiniana

3.1. A crítica kelseniana

3.2. A crítica hartiana

4. A teoria austiniana e o problema da aplicação e interpretação do direito

5. Conclusão

1. Notas biográficas e influências1 

J. Austin nasceu em 1790 em uma família de classe média do condado de Suffolk, na Inglaterra.  Aos 16 anos de idade, alistou-se no exército, tendo servido em Malta
22 anos de idade, deixou a carreira miltar para estudar direito.

Aprovado no exame da ordem (Bar) em 1818, começou uma carreira sem sucesso como advogado em Londres.  Em 1819, casou-se com Sarah Taylor, que foi sua gra
incentivadora ao longo dos anos.  Juntos tiveram, em 1821, uma única filha, Lucie Austin (posteriormente Lady Duff-Gordon).  

Logo após o casamento, mudaram-se para Queen Square, onde se tornaram vizinhos não só do grande filósofo utilitarista Jeremy Bentham, mas também de James M
adolescente, John Stuart Mill.  J. Austin e o jovem Mill começaram ali uma intensa amizade, tendo J. Austin sido encarregado por James Mill a iniciar seu filho no estud
recordações do pupilo, estudavam juntos não só os comentários de Blackstone à common law inglesa, mas também direito romano, especialmente as Instituições de

À época, J. Austin já se declarava um discípulo do utilitarismo benthamista, bem como um admirador da economia política de David Ricardo, a qual tomava como mo
direito.  Seu campo de estudos incluía ainda não só a filosofia política de T. Hobbes, mas também as teorias populacionais malthusianas, que entendia serem importa
entendimento do funcionamento do mercado de trabalho e das condições necessárias para o aprimoramento da condição de vida da classe trabalhadora inglesa.

Nesse período, J. Austin publicou dois artigos de cunho jurídico.  No primeiro, criticava as regras relativas à primogenitura no direito de sucessão.2  No segundo, trata

societário.3 

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Em 1826, com a criação da University of London (atualmente University College London) por um grupo de reformistas ingleses com inspirações utilistaristas, J. Austin
cargo de professor (chair) de teoria do direito (jurisprudence).  Dedicou, então, os dois anos que se seguiram a preparar seu curso, estudando em Bonn, Alemanha, o
não só de aprofundar seu conhecimento de direito romano, mas também de entrar em contato direto com os trabalhos recentes da Escola Histórica alemã, represen
Savigny.

Retornando a Londres, em 1828, concluiu a preparação de suas aulas, que se iniciaram em novembro de 1829.  Em sua primeira apresentação, o curso de J. Austin fo
da elite política e intelectual londrina (inclusive por seu amigo e pupilo J.S. Mill), mas não tiveram sucesso em atrair novos alunos, de modo que foram descontinuada
resultando em sua renúncia do cargo de professor.  Nesse ano, J. Austin publicou uma versão expandida da primeira parte de seu curso, com o título de The Province
Determined, seu único livro publicado em vida.

Sendo um grande apoiador da reforma do direito inglês, em 1833, foi indicado, graças à influência de amigos do círculo utilistarista, como membro da Comissão de D
renunciou, frustrado pela baixa repercussão de seus dois primeiros relatórios.

Em 1834, voltou a dar aulas, dessa vez no Inner Temple, uma das tradicionais associações inglesas de formação de advogados.  Nessa segunda tentativa, não obteve
primeira, acabando por abandonar em definitivo suas pretensões didáticas.

Em 1836, foi indicado para compor a comissão que trabalhou na elaboração da reforma legal e constitucional de Malta.  O trabalho final da comissão foi adotado pelo
embora seu contrato tenha sido abruptamente terminado de forma antecipada, J. Austin foi pago a quantia de três mil libras esterlinas, no que parece ter sido o maio
recebido em contrapartida por seu trabalho.

De 1840 a 1844, os Austin voltaram a morar na Alemanha, indo depois para Paris, onde permaneceram até a Revolução de 1848.  Tendo J. Austin limitado sua produç
publicação de artigos menores,4 o sustento material e as amizades da família nesse período foram em grande parte decorrentes da atuação incansável de sua espos
como tradutora do alemão para inglês, mas ainda mantinha contatos e amizades com a pessoas influentes no meio cultural e político continental.

A reação de J. Austin contrária à Revolução de 1848 na França marcou de forma intensa seu afastamento em relação aos progressistas utilitaristas.  J. Austin não apen
passando a viver em Weybridge, cidade a cerca de 25 km de Londres, mas também condenou publicamente os desenvolvimentos políticos na França.  Essa condenaç
frustrante para J.S. Mill, e é apontada como uma das causas do afastamento entre os dois no final da vida de J. Austin.5 

De seu retorno à Inglaterra em 1848 até sua morte em 1859, J. Austin viveu recluso em Weybridge.  Negou-se peremptoriamente a aceitar as diversas ofertas de publ
de seu The Province of Jurisprudence Determined sob a alegação de que a obra carecia de uma profunda revisão.  Nesse período publicou um panfleto político, A Ple
(1859), em que deixou clara sua posição contrária à continuidade das reformas constitucionais na Inglaterra — novamente, em contradição com a posição dos utilitar

trabalhar em um novo projeto, que buscaria explicar as relações entre o direito e à moral, mas jamais chegou a desenvolvê-lo de fato.6  

Após sua morte, sua mulher dedicou-se a compilar seus trabalhos.  Em 1861, publicou uma segunda edição de The Province of Jurisprudence Determined, enquanto
das notas de J. Austin e das anotações de seus alunos quanto às aulas de seu curso na University of London, finalmente publicadas em 1863, sob o título Lectures on
Philosophy of Positive Law, posteriormente revista e completada por Robert Campbell, discípulo do autor.  Publicou ainda, também em 1863, o preâmbulo a suas aul
London, sob o título de The Uses of the Study of Jurisprudence.

De modo geral, a vida J. Austin foi marcada por poucos sucessos, em grande parte devido ao perfeccionismo do autor, que o sobrecarregava mentalmente e acabava
capacidade de trabalho.  Tampouco lhe foram leves as restrições de ordem financeira, decorrentes do fluxo inconstante e instável de trabalho remunerado.

Em que pese suas frustrações em vida, seu trabalho foi largamente aceito nos meios jurídico-acadêmicos anglo-saxões.  Até meados do século XX, a teoria austiniana
da teoria do direito inglesa, seja em sua metodologia analítica, seja em seu modelo do direito como comando (H.L.A. Hart 1998, p. ix-xv; N. Duxbury 2005, W.E. Rumbl
influência sobre o realismo jurídico norte-americano (W.E. Rumble 1981; W.L. Morison 1982, p. 163-70) por meio de O.W. Holmes, um dos principais precursores e infl
movimento, assim como pela inspiração à obra de W.N. Hohfeld sobre as relações jurídicas.

Essa posição de destaque foi superada apenas na segunda metade do século XX, em razão da intensa crítica de H.L.A. Hart a J. Austin nos três capítulos iniciais de seu
(1961).  Desde então, a teoria austiniana passou a ser estudada principalmente como uma forma mais primitiva e incorreta do positivismo analítico, em uma espécie
hartiana, ainda que críticas a esse desenvolvimento tenham também alcançado alguma voz (V. R. Moles 1985; S. Fish 1989; F. Schauer 2001; F. Schauer 2015).

2. A teoria do Direito de J. Austin

A fim de compreender a teoria austiniana do direito, pretendo analisá-la em quatro partes.  Na primeira, abordo o escopo da teoria e a determinação do direito posit
geral do direito (general jurisprudence).  Estes temas são abordados principalmente nas lições que compõem The Province of Jurisprudence Detemined, bem como n
Study of Jurisprudence, incluído nas Lectures on Jurisprudence como a lição XI.

Já na segunda parte, explico o conceito de comando e seus correlatos dever e sanção, a partir dos quais J. Austin, ponto de partida da teoria.  Na terceira parte, apres
classificação dos comandos proposta pelo autor para isolar o direito positivo dentre outras formas de comando. Estes assuntos formam o núcleo das lições que com
Jurisprudence Detemined. 

Por fim, na quarta parte, descrevo em linhas gerais as complementações a essa concepção do direito positivo, por meio das quais o autor pretendia mostrar a aplicaç
conceitual a ordens jurídicas concretas, especialmente a common law inglesa e ao direito romano.  Essas noções são desenvolvidas nas lições remanescentes das Lec
(Lições XII a LVII), recompostas com base nas anotações de aula de J. Austin e seus alunos e publicadas após sua morte.

Nessas quatro partes, pretendo ressaltar o que me parecem ser as principais características do modelo austiniano do direito. Uma dessas características é o caráter a
do direito, entendida não apenas como descrição do conteúdo das ordens jurídicas nacionais (particular jurisprudence, ou, em termos atuais, como dogmática jurídic
dos conceitos formais pelos quais se descreve o funcionamento de qualquer ordem jurídica positiva (general jurisprudence, ou em termos  atuais, teoria geral do dire
conceitual leva a uma segunda característica relevante, que é sua natureza analítica, com foco no esclarecimento dos conceitos principais do direito.  Ainda um tercei
vinculação do direito à decisão política, fornecendo uma explicação da forma pela qual o conteúdo do direito é alterado. Trata-se, enfim, de um modelo extremamen

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por um lado, indica com clareza alguns aspectos importantes do direito positivo (como seu formalismo, variabilidade e imposição forçada), por outro lado, não conse
outros aspectos relevantes (como a estruturação interna das normas jurídicas e as dificuldades de interpretação e aplicação do direito na sociedade complexa).

2.1. O escopo da teoria: a delimitação do direito positivo pela general jurisprudence

A teoria austiniana do direito pode ser vista como um esforço conceitual7  de esclarecimento terminológico a respeito da matéria jurídica.  Seu objetivo é identificar a
específicas do direito positivo, de forma que possa ser corretamente entendido.  Para esse fim, J. Austin adota o método da análise lógica (Moles 1985, p. 9-34), pelo q
de estudo em vários aspectos, distinguindo aqueles necessários daqueles acidentais, e, dentre os necessários, os que são característicos do direito daqueles que são

A escolha desse objetivo e método não deve ser confundida com menosprezo por assuntos não jurídicos, nem com a tese de que o direito existiria isolado de outras
claro seja no comprovado interesse do autor por questões de economia, política e ética, seja em sua intenção, ao final da vida, de dedicar-se a nova obra voltada a es
moral e o direito.  A posição de J. Austin é de que a identificação das especificidades do direito positivo seria um requisito de esclarecimento conceitual, a fim de que
sua relação com as áreas afins.  Em resumo, seria preciso separar conceitualmente o direito da moral para poder entender como, de fato, esses campos estão interlig

Nesse intuito, J. Austin parte de uma distinção inicial, de inspiração benthamiana, entre a descrição do direito como é e a descrição do direito como deve ser.  Esta últ
campo da ciência da legislação, que visa a aprimorar o conteúdo do direito.  Já a primeira, a descrição do direito como é, teria caráter expositivo e visaria a explicar o
vigente.  Esse seria o campo próprio da ciência do direito (science of jurisprudence), a cujos contornos o autor dedica seu único livro publicado em vida.

No campo ciência do direito (jurisprudence), J. Austin distingue ainda a análise geral da análise particular (J. Austin 1998b; D. López Medina 2004, p. 91-6).  Enquanto e
descrição do funcionamento de ordens jurídicas concretas existentes, como o direito inglês ou o direito francês, aquela visa a identificar aspectos do funcionamento
por todas as ordens jurídicas existentes — ou, ao menos, aquelas mais desenvolvidas, dentre as quais o autor inclui, especialmente, o direito inglês e o direito roman
perspectiva austiniana, cabe à teoria geral do direito (general jurisprudence) a descrição da forma como as ordens jurídicas desenvolvidas operam, sem ater-se às car
funcionamento dos direitos nacionais.

Em linha com seu objetivo e método, J. Austin buscou delimitar o escopo de sua análise de forma a buscar um entendimento mais completo do direito positivo, que l
de partida para esclarecer seu modo de funcionamento, e para, em etapa subsequente (por infortúnio, nunca desenvolvida), expor as relações entre o direito positivo

2.2. Os conceitos-chave da teoria: comando e seus correlatos, dever e sanção

A fim de especificar o conceito de direito positivo, objeto da teoria geral do direito (general jurisprudence), J. Austin adota a noção de comando como conceito-chave.
expressão, o comando é a chave para a ciência do direito (The key to the science of jurisprudence) (J. Austin 1998, p. 13).  Para ele, é a partir dessa noção que se pode
direito.

J. Austin define comando como a expressão de um desejo de que alguém faça ou não faça algo, acompanhado de um mal a ser imposto pelo emissor ao destinatário
desejo (J.Austin 1998, p. 13-8).  A característica específica que diferencia o comando dos outros tipos de desejos é capacidade de o emissor punir o destinatário em ca
expressa. Assim, a definição austiniana de comando implica as noções de dever e sanção.  

Dever, para o autor, é a conduta do destinatário desejada pelo emissor do comando.  Esse conceito exprime a mesma ideia que aquela de comando, mas de outra fo
comando expressa o fenômeno na perspectiva do emissor, o dever expressa-o na perspectiva do destinatário, que se sujeita ao comando.  Assim, comando e dever i
só existirá um se houver também o outro.

Essencial à noção de comando é estar acompanhado de sanção.  A sanção é entendida como um mal8 imponível ao destinatário do comando em caso de descumprim
imposto.  Note-se que, para o autor, não é preciso que a sanção seja, de fato, imposta para que se caracterize o comando.  A simples possibilidade de imposição, por
seria suficiente para caracterizar o comando (J. Austin 1998, p. 16).  Nesse sentido, J. Austin pode ser visto como um expoente não só do imperativismo (a definição da
comando), pelo qual é principalmente conhecido, mas também do coercitivismo (a definição do direito a partir da sanção). 

J. Austin adota, assim, a ideia de um desejo expresso por um emissor poderoso a destinatários sujeitos a punição como o conceito central a partir do qual se deve pro
conceitual que permite localizar o direito dentre as diversas formas de regulação da conduta humana. É nesse sentido que o autor designa a noção de comando com
da jurisprudência.

2.3. O objeto da teoria: direito positivo e figuras assemelhadas

A partir da noção central de comando, J. Austin desenvolve sua teoria do direito positivo com base em três sucessivas classificações conceituais de ordem lógica.  A pr
conteúdo do comando e distingue comandos gerais de comandos particulares.  Já a segunda classificação aponta para o emissor do comando a fim de separar coma
comandos sem emissores.  Por fim, a terceira distinção classifica os comandos com emissores de acordo com a natureza do emissor, dividindo os comandos entre aq

pelo soberano e por homens não soberanos.9  É com esses três movimentos lógicos, acompanhados de alguns refinamentos, correções e esclarecimentos adicionais
especificar o direito positivo.  Vejamos então cada um deles.

A primeira classificação austiniana distingue comandos gerais de comandos particulares.  Nessa distinção, comandos gerais aplicam-se a uma uma classe de atos e p
particulares aplicam-se a indivíduos, grupos ou ações específicos.  O autor classifica os comandos gerais como leis, mas não reconhece comandos particulares  como
indicar a necessidade de algum grau de estabilidade temporal para a caracterização das leis.  Nesse esquema, essa permanência mínima decorre da generalidade do
autor admite que comandos particulares fazem parte do direito, se bem que não atinjam o mesmo grau de relevância que os comandos gerais.  As decisões judiciais
comando particulares no âmbito jurídico. 

A segunda classificação proposta por J. Austin ocorre no campo dos comandos gerais.  O autor distingue, então, comandos com emissor de comandos sem emissor (o
emissor definido).  Comandos com emissor são leis em sentido próprio.  Comandos sem emissor são leis em sentido impróprio, porque não é possível determinar de
expresso no comando, nem quem será o responsável por aplicar a punição em caso de seu descumprimento.  Cada um dos lados dessa distinção apresenta subdivis

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De um lado, comandos sem emissor são subdivididos em comandos em sentido metáfórico (sem emissor algum) e comandos por analogia próxima (sem emissor esp
difuso). Na primeira classe encontram-se as leis da natureza (no sentido de ordem física), enquanto na segunda encontram-se os costumes e regras sociais.  Os coma
próxima formam parte da moralidade positiva, em conjunto com uma subespécie dos comandos em sentido próprio.

De outro lado, dentre as leis em sentido próprio, devem-se distinguir três categorias.  A primeira consiste naquelas cujo emissor é deus.  A segunda compõe-se daque
soberano.  Finalmente, a terceiro comporta as leis em sentido próprio cujo emissor são autoridades humanas não soberanas.  As primeiras formam as leis de deus o
as últimas compõem, junto com os comandos por analogia próxima, a moralidade positiva.  Já as leis do soberanos consistem no direito positivo, objeto próprio da te
(general jurisprudence).

As leis de deus definem o certo e o errado para os homens.  No pensamento austiniano, elas exercem o papel de moralidade crítica, servindo como critério para defin
é, mas daquilo que o direito deve ser.  Nesse sentido, J. Austin afirma que as leis de deus são a designação correta para o direito natural, termo por ele rejeitado com
confusões terminológicas.

As leis de deus dividem-se em leis reveladas e leis tácitas.  As primeiras são a vontade divina comunicada expressamente aos homens e correspondem, para o autor,
as leis tácitas consistem nas noções de certo e errado a serem descobertas pelos homens.  Neste tópico, J. Austin distingue três métodos para determinação das leis
do senso moral, o método da utilidade e o método misto.  

O método do senso moral pressupõe a existência de um instinto moral inato nos homens, determinado pela vontade de deus.  J. Austin rejeita esse método, com a a
conseguiu encontrar comprovação empírica da existência de tal instinto.  Pelo mesmo motivo, o autor rejeita as teorias mistas, que combinam, em variados graus, o s
método da utilidade. 

O método da utilidade corresponde ao princípio da maximização da utilidade geral preconizado por J. Bentham.  Segundo J. Austin, esse é o método mais adequado p
leis divinas não-reveladas, uma vez que se sujeita ao esforço racional do homem.  É, portanto, por meio do princípio da utilidade, ponderado pelas eventuais correçõe
provenientes das leis divinas reveladas, que se estabelece a ciência da legislação, ou seja, a definição de como o direito positivo deveria ser.

No outro extremo das leis em sentido próprio encontram-se os comandos emitidos por autoridades humanas não soberanas.  Dentre essas, podem ser citadas as or
dos patrões aos empregados, dos líderes da comunidade ao seus seguidores.  Elas se caracterizam por não contarem com a mesma possibilidade de imposição força
soberano — salvo, é claro, na medida em que autorizadas e adotadas pelo soberano.

Finalmente, os comandos emitidos pelo soberano compõem a característica específica do direito positivo.  O direito positivo, portanto, é marcado por comandos gera
para seus súditos em uma sociedade política independente.  Para compreender o conceito austiniano de direito positivo, é preciso, pois, avançar na definição de sob

Para formular seu conceito de soberania, J. Austin inspira-se na filosofia política hobbesiana.  Assim como T. Hobbes, o autor entende a soberania como absoluta, sem
externos.  Na visão austiniana, porém, a soberania não decorre de contrato algum, mas se revela como simples questão de fato.

Nesses termos, sua definição de soberania possui dois elementos: de um lado, o hábito de obediência da generalidade dos súditos; de outro lado, a ausência de hábi
soberano para qualquer outra pessoa.  O conjunto do soberano e seus súditos forma a sociedade política independente, que é independente por não se subordinar
e é política por se estruturar de forma hierárquica na divisão entre o soberano superior e súditos inferiores.

No pensamento austiniano, a noção de soberania assenta-se, como já mencionado, em uma questão de fato: o hábito de obediência por parte dos súditos e a falta d
soberano.  Essa noção político-sociológica da soberania foi, como se verá, um dos principais aspectos criticados pelos principais positivistas do século XX.  Do ponto d
o recurso ao hábito de obediência permite marcar os limites da especulação teórica jurídica, deixando de fora do direito a discussão a respeito das causas da obediên
pleito do soberano pela obediência dos cidadãos.

É interessante notar que, apesar de sua teoria parecer, à primeira vista, desenhada para abrigar um monarca absoluto de  corte hobbesiano, J. Austin frequentement
não apenas como um indivíduo, mas como um grupo de indivíduos.  Exemplos disso são suas referências ao período republicano da Roma Antiga (em que o soberan
Populus Romanus, composto pela plebe e pelo Senado), assim como aos Estados Unidos da América (cujo soberano seria o conjunto dos eleitores das assembleias d
a federação) e, principalmente, à Inglaterra.  Nesta última, segundo o autor, a soberania seria compartilhada entre o rei, a Câmara dos  Lordes (House of Lords) e os e
Comuns (House of Commons).  Esse compartilhamento, no entanto, traz uma série de dificuldades no que tange às regras jurídicas sobre o exercício conjunto da sob
discutidas por J. Austin com profundidade suficiente para esclarecer sua posição sobre o assunto, muito menos para lidar com a complexidade alcançada nas democ
contemporâneas (P. Eleftheriadis 2013).

O autor enfrenta, porém, uma objeção relevante a sua noção de direito como comando do soberano.  Na prática do direito, encontram-se com frequência leis e outro
não são aprovados diretamente pelo soberano.  É o caso de regulamentos definidos por autoridades subordinadas e — especialmente nos países da common law —
precedentes judiciais (judicial law, conforme a designação de J. Austin, que busca distanciar-se do termo depreciativo usado por J. Bentham, judge-made law).  O auto
normas a seu conceito de soberania por meio da tese da admissão tácita.  Essa tese sustenta que as normas expedidas por autoridades públicas não soberanas seria
pelo soberano, já que esse poderia tê-las revogado, mas optou por não o fazer.  Desse modo, também seriam normas do soberano, uma vez que aprovadas por sua

Uma última decorrência a mencionar da concepção austiniana de soberania consiste na exclusão do direito constitucional e do direito internacional do âmbito estrito
o direito constitucional, v. J. Austin 1998, p. 257-64; já para o direito internacional, v. J. Austin 1998, p. 200-1).  Com efeito, uma vez que o direito positivo seja entendid
por alguém que não está subordinado a mais ninguém (o soberano), então o direito internacional, na condição de conjunto de regras de coordenação entre soberano
considerado direito positivo, visto que não é ordenado por um superior político a seus inferiores.  Tampouco pode o direito constitucional ser visto como direito posi
soberano para si mesmo a respeito da divisão de seu poder não seria vinculante, pois comandante e comandado seriam a mesma pessoa (o soberano).  J. Austin não
áreas da regulação de condutas humanas sejam importantes na sociedade moderna.  Nega apenas que elas sejam parte do direito positivo, cuja característica distint
por parte do superior político.  Nesse sentido, o direito internacional e o direito constitucional são relegados à moralidade positiva, sendo vinculantes do ponto de vis
ponto de vista jurídico.

Ainda que pretenda valer-se dos comandos emitidos pelo soberano para demarcar a característica específica do direito positivo, o autor não deixa de reconhecer que
compõem de regras que não são comandos.  Nessa linha, para além do direito judicial e dos comandos dos subordinados (reconduzidos ao conceito central por meio

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tácita, acima comentada), J. Austin cita as leis declaratórias e revogatórias como exemplo de partes do direito positivo que não seriam comandos (J.Austin 1998, p. 183
teriam caráter residual e de menor importância, não comprometendo, em sua visão, a correção do modelo proposto.

As classificações dos comandos por J. Austin formam, assim, um conjunto logicamente organizado que estabelece um campo bem delimitado para o direito positivo e
para a teoria geral do direito.  Para melhor visualização dessas classificações, verifique-se o quadro sinóptico que acompanha o texto como Anexo.10

Com base nessa combinação de distinções, J. Austin consegue formular um esquema conceitual de caráter lógico relativamente simples para localizar o objeto princip
teórica: o direito positivo, entendido como o conjunto dos comandos emitidos pelo soberano para seus súditos em uma sociedade política independente. 

2.4. O desenvolvimento (incompleto) da teoria: noções jurídicas fundamentais e a classificação do direito

Uma vez esclarecido o campo da ciência do direito nas aulas iniciais de seu curso, reelaboradas nos seis capítulos de The Province of Jurisprudence Determined, e esc
teoria geral do direito (general jurisprudence) e dogmática jurídica (particular jurisprudence) na aula introdutória, resumida no artigo The Uses of the Study of Jurispru
Austin prosseguiu com outras 46 aulas, de um total de 120 aulas originalmente planejadas.11  

Essas aulas dividiram-se em (i) uma análise de conceitos jurídicos fundamentais, que completaram a primeira parte do curso, voltada para o estudo das definições da
análise das fontes do direito, compondo a segunda parte do curso, em que se discutiu especialmente o direito judicial, e (iii) a análise dos fins e temas do direito, em
classificação geral do direito, na terceira e última parte do curso.  O texto dessas aulas, que chegou até nós na forma das Lectures on Jurisprudence, não foi resultado
autor, mas produto do esforço de Sarah Austin e, posteriormente, Robert Campbell, que reuniram o material de preparação de aula de J. Austin e as anotações dos a
quais J.S. Mill.

Nessas aulas subsequentes, é notável a maior influência dos autores romanos e do pandectismo alemão (A. Lewis 2013; M. Lobban, 2013), nem sempre bem harmon
utilitarista adotada em The Province of Jurisprudence Determined.

Nas duas subseções que seguem, pretendo expor as noções jurídicas fundamentais que complementam a Parte I do curso e a classificação geral do direito proposta
das fontes do direito será postergada para seção 4, em que considero as ideias do autor a respeito do problema da aplicação e interpretação do direito.

2.4.1. Noções jurídicas fundamentais

Nas 15 aulas que compõem a seção III da Parte I do curso, J. Austin dedica-se a explicar determinadas noções, princípios e distinções que entende serem necessárias
jurídico refinado, assim entendidos, principalmente, o direito romano e o direito inglês, assim como os direitos alemão e francês.  Nesse propósito, o autor elabora u
conceitual do direito, de forma semelhante àquela posteriormente realizada por H. Kelsen na estática jurídica de sua Teoria Pura do Direito (H. Kelsen 1998, p. 121-21

Interessante notar a ambiguidade da referência austiniana a "noções necessárias" do direito.  Se, de um lado, essa necessidade for entendida como necessidade lógic
ser lido como uma espécie de jusnaturalista conceitual, uma vez que sua teoria implicaria a existência de noções jurídicas inalteráveis, não contingentes — ainda que
formal.  De outro lado, uma leitura mais caridosa pode interpretar essa necessidade em sentido fraco, entendendo-se que essas noções são tão úteis para o funciona
que acabam por ser, em sua maioria, adotadas pela maioria dos sistemas jurídicos desenvolvidos.  Corrobora essa segunda versão a afirmação do autor de que tais n
ainda que nem sempre, presentes nos direitos dos países mais avançados.

É possível dividir as noções analisadas por J. Austin em dois grandes grupos.  No primeiro, enquadram-se as noções relacionadas ao conceito de dever.  Nesse grupo
principalmente, a noção de direito (subjetivo).  Já no outro grupo estão as noções relacionadas à sanção e à violação do dever.  Aqui se discutem as ideias de intenção
ou wrong), culpa e imputabilidade.  Dever e sanção, não é demais frisar, são correlatos do conceito de comando, que se implicam mutuamente.  Assim, pode-se vincu
em exposição a sua exposição anterior sobre o campo da ciência do direito.

J. Austin inicia sua estática jurídica com uma discussão do conceito de direito subjetivo (right).  Direito, nesse sentido, é sempre um correlato de dever (duty).  No enta
correlato a um direito.  O autor distingue, nesse passo, os deveres em relativos e absolutos.  Enquanto os deveres relativos dirigem-se a alguma pessoa determinada,
se sujeitam a essa dependência.  Os direitos (subjetivos) são, portanto, correlatos de uma espécie de deveres — os deveres relativos, em oposição aos direitos absolu
correlatos a direitos (subjetivos).

Dentro do conjunto dos direitos, o autor introduz uma nova distinção relevante.  É a distinção entre jus in rem e jus in personam, proveniente do direito romano.  J. A
terminologia adotada pelos romanos é enganosa, uma vez que tais classificações não se referem ao objeto do direito, isto é, a um direito sobre coisas ou sobre pesso
interpretação do autor, é direito que vale contra todas as pessoas, de forma indeterminada (against the world at large).  Já jus in personam, por oposição, é direito qu
pessoas específicas.  Nesse sentido, podem ser encontrados direitos in rem sobre pessoas (e.g., o direito do pai de retomar seu filho de quem o detenha injustament

Tendo distinguido as duas espécies de direito (subjetivo), J. Austin anota que os direitos in personam podem ser tanto negativos, quanto positivos, isto é, podem tant
(forbearance), quanto uma ação (act).  O direitos in rem, por outro lado, somente admitiriam a forma negativa (abstenção), visto que seria impraticável, segundo o au
conjunto indeterminado de pessoas.

Nesse quadro teórico, portanto, direito (subjetivo) é definido como a capacidade de exigir de alguém (determinado ou indeterminado) o cumprimento de um dever (d

No outro grupo de noções analisadas por J. Austin, estão os conceitos relacionados às sanções e ao descumprimento do dever.  Nesse campo, o autor interpõe, como
preliminar, uma breve exposição de conceitos da filosofia da mente, com o fim de distinguir as noções de vontade (restrita aos movimentos do próprio corpo do agen
abarca as consequências de um determinado ato, abstenção ou omissão), bem como de esclarecer o conceito de negligência e suas modalidades, conforme a lei ingle

Em seguida, anota que a sanção é necessariamente uma ação que importa um mal imposto àquele que descumpriu um dever, distinguindo a ação em que a sanção c
em razão do descumprimento) do mal que dela decorre (o qual é apenas presumido em vista da natureza da ação imposta ao infrator).  Nesse sentido, a imposição d
restrita à ação prevista no comando do soberano, ainda que o infrator não a perceba como prejudicial.

J. Austin prossegue indicando que o ilícito (injury ou wrong) corresponde apenas à violação de um dever, e implica culpa e imputação da sanção ao infrator.  Esses trê
imputação) são, a seu ver, correlatos e se implicam mutuamente.  Em linha com o pensamento liberal de seu tempo, o autor entende que a ilicitude tem como uma d

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necessárias (mas não suficientes) a disposição subjetiva do agente, seja ela intencional (dolo) ou negligente (culpa).  Nessa linha, procura reconduzir as exceções típic
(menoridade, incapacidade mental, embriaguez, erro, ignorância dos fatos ou da lei) a esse elemento mental subjetivo.

Na conclusão dessa seção, J. Austin ainda apresenta uma classificação das sanções.  Sua distinção principal consiste naquela entre sanções civis e criminais (ou públic
distingui-las, contudo, não está no interesse das partes, já que, segundo o autor, todas as sanções interessam, imediatamente, a pessoas específicas e, remotamente
critério está na discricionariedade da parte ofendida.  Civis são aquelas sanções cuja imposição depende da escolha da parte ofendida.  Já penais ou públicas são as s
depende apenas na decisão do poder público.  Subsidiariamente, o autor ainda menciona, sem se aprofundar, a nulidade como forma de sanção por violação das reg
jurídicos, e a responsabilização por fatos de terceiro.

Com essa análise das modalidades de sanção, J. Austin conclui a Parte I de seu curso sobre a ciência do direito.  Nessa parte, o autor analisa as definições fundament
esclarecendo os conceitos com base nos quais o direito deve ser abordado por quem quiser compreendê-lo de forma clara e precisa, poupando-se das confusões e o
do mal uso conceitual e terminológico pelos juristas do passado (especialmente os defensores da common law tradicional, como W. Blackstone).

2.4.2. Um mapa do sistema jurídico

Após analisar conceitos jurídicos fundamentais na Parte I do curso, e depois de discorrer sobre as fontes do direito na Parte II (que será considerada na seção 4 deste
restante de seu curso sobre a ciência do direito a expor sua proposta de classificação do ordenamento jurídico.  Infelizmente, essa parte de sua teoria permaneceu in
curso foi interrompido antes de seu fim e o autor jamais reuniu forças suficientes para completá-lo em forma escrita.  Ainda assim, as aulas dadas, combinadas com a
das aulas vindouras, fornecem uma visão razoavelmente clara do projeto austiniano.

A distinção fundamental proposta pelo autor consiste na divisão do ordenamento entre direito das pessoas (jus personarum) e direitos das coisas (jus rerum).  Essa d
exemplo da distinção entre direitos in rem e direitos in personam acima descrita, não se refere propriamente ao objeto das normas, mas aos sujeitos a quem se aplic
das pessoas são direitos especiais, aplicáveis a grupos específicos, diferenciados do público em geral por uma condição ou status juridicamente regulado.  Exemplos
regras relativas aos menores e incapazes, aos comerciantes (ou empresários), aos estrangeiros, aos agentes públicos.  Já o direito das coisas, por sua vez, caracteriza-
indistinta para todos.  Nesses termos, o direito das coisas abarca parte substancial do ordenamento jurídico, com o qual se identifica, exceto pelas regras especiais do

Observando a distinção austiniana após quase 200 anos, é recomendável readequar sua nomenclatura a fim de facilitar o entendimento do leitor moderno.  Com efe
o jus rerum do autor corresponde, grosso modo, ao que atualmente se chama direito geral ou comum, enquanto seu jus personarum corresponde aos direitos espec
regras específicas para grupos sociais delimitados.  É verdade que, no mundo contemporâneo, a distinção vem perdendo poder explicativo, como procura explicar N.
conceitos de microssistemas e descodificação.  Na primeira metade do século XIX, porém, a ideia ainda estava em ascensão, e era particularmente atraente para aqu
defendiam a simplificação do ordenamento jurídico por meio da codificação.   

J. Austin prossegue decompondo cada um dos lados dessa distinção fundamental em subclasses específicas.  Embora direito geral e direitos especiais pressuponham
que a compreensão de um exija o conhecimento do outro, é no campo do direito geral (direito das coisas) que se encontra a maior quantidade de noções fundament
que, segundo o autor, deve-se iniciar o estudo do direito.

O direito geral pode ser decomposto em direitos primários e direitos sancionatórios ou secundários.  Enquanto os últimos decorrem da violação de um direito anteri
primários) existem de forma independente de qualquer violação.  Nesse sentido, direitos primários incluem direitos reais, como a propriedade, e direitos decorrentes
direitos sancionatórios incluem o direito criminal, a responsabilidade civil e os direitos processuais (civil e criminal).

A terminologia austiniana não é clara nesse passo.  Uma forma talvez mais clara de captar a intuição por trás da distinção proposta seria equiparar os direitos primár
de atos lícitos e os direitos sancionatórios a direitos decorrentes de atos ilícitos (incluídos, para esse propósito, tanto os ilícitos civis, quanto os criminais, assim como

Sob essa perspectiva, a subclassificação proposta para os direitos primários parece fazer mais sentido.  J. Austin separa os direitos decorrentes de atos lícitos em qua
rem (ou seja, válidos erga omnes, como visto acima) existentes isoladamente; (ii) direitos in personam (ou seja, válidos inter partes, como visto acima) existentes isola
combinações de direitos in rem e in personam de modo individualizado; e (iv) universalidades de direitos decorrentes de sucessão universal.

O autor passa, então, a considerar a primeira dessas quatro espécies, qual seja, os direitos in rem, analisando a propriedade e os direitos reais sobre coisa alheia, bem
sua aquisição, quando o curso é, enfim, interrompido.  Apesar de J. Austin não ter desenvolvido suas ideias quanto ao restante das categorias, é possível reconstruir a
classificação com base nos esboços por ele deixados para o restante do curso.

Nesse sentido, os direitos sancionatórios, ou seja, aqueles decorrentes de atos ilícitos, seriam subdivididos em (i) direitos sancionatórios (todos in personam, isto é, re
sancionatórios (relativos e absolutos).  Enquanto os primeiros (direitos sancionatórios) compreenderiam os ilícitos civis, os últimos (deveres sancionatórios) abarcaria

Nesse ponto, vale ressaltar a prevalência, no esquema austiniano, das classificações romanísticas tradicionais sobre a conceitualização imperativista adotada na Parte
apesar de ter afirmado, no início do curso, que a noção de dever, assentada sobre a ideia de comando, é mais fundamental que a noção de direito (a qual correspond
deveres), J. Austin constrói sua classificação geral do direito com base na noção mais específica, seguindo, nesse passo, os modelos conceituais tradicionais.

Além da classificações do direito das coisas (direito geral), J. Austin também pretendia propor uma classificação para o direito das pessoas (direito especial).  Nesse se
os status em privados, públicos ou anômalos.  Nos primeiros, incluiria os status decorrentes de situações doméstico-familiar, como as condições de marido e mulher
senhor.  Já nos segundos (status públicos), incluiria as condições atinentes aos agentes públicos.  Nesse passo, o próprio autor ressalva que, de acordo com sua meto
em sentido próprio, compreendendo o direito constitucional, não deveria ser considerado direito, mas sim mera moralidade positiva, uma vez que não seria possível
poder do soberano.  No entanto, por questões de mera comodidade, entende adequado incluir as regras sobre os status dos agentes públicos no campo dos direitos
imprescindíveis para a compreensão do funcionamento do direito como um todo.  Por fim, entre os status anômalos, incluiria as regras relativas aos estrangeiros, be
aos indivíduos incapacitados por razões religiosas ou criminais.

Dessa forma, J. Austin concluiria sua análise conceitual do direito positivo com uma classificação abrangente do ordenamento jurídico que visava a promover a clarez
meio de sua organização racional.  Como trabalho conceitual, essa classificação pretendia ser um primeiro passo em direção à posterior codificação do direito inglês,
defendido pelo autor e por outros discípulos de J. Bentham.

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3. As críticas de H. Kelsen e de H.L.A. Hart à teoria austiniana

A teoria austiniana, resumida na seção anterior, representa um modelo bastante simplificado do funcionamento do direito positivo.  Da mesma forma como muitos a
mundo anglo-saxão, adotaram esse modelo e procuraram desenvolvê-lo, outros autores buscaram superar suas limitações por meio da crítica ao pensamento de J. A

Nesta seção, pretendo analisar as críticas dirigidas à teoria austiniana por dois dos principais autores do positivismo jurídico no século XX: H. Kelsen e H.L.A. Hart.  A c
dedicada uma parte desta seção.

3.1. A crítica kelseniana

H. Kelsen resumiu os principais aspectos de sua crítica à teoria austiniana em um artigo intitulado A teoria pura do direito e a juriprudência analítica, publicado na Ha
1941.  Tendo se mudado para os Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial, H. Kelsen encontrou um ambiente acadêmico jurídico um tanto diferente daque
Europa Continental do pré-guerra.  Uma dessas diferenças consistia na prevalência, no campo positivista, da jurisprudência analítica de J. Austin, em muitos aspectos
alemão, visto como ultrapassado pelo austríaco.  Natural, então, que procurasse esclarecer ao público as divergências entre a posição positivista tradicional anglo-sax
moderna do positivismo (L. Vinx 2013) — versão essa, segundo H. Kelsen, mais coerente com os próprios fundamentos da jurisprudência analítica.

A crítica mais central de H. Kelsen a J. Austin refere-se a adoção do comando como conceito fundamental da ideia de direito.  H. Kelsen objeta que a norma jurídica va
expressão de vontade que dá ensejo a sua criação.  Cita como exemplo o monarca absoluto cuja vontade deixa de existir por sua morte ou mudança de opinião.  Not
na utilização do conceito de vontade em decisões assembleares, tão frequentes no processo legislativo moderno, em que muitos integrantes do órgão colegiado sequ
conhecimento da matéria em votação.  Nessa linha, a noção de comando, expressando fatos pontuais no tempo, não se prestaria, segundo H. Kelsen, a explicar a per
 Essa estabilidade temporal somente seria explicável a partir da distinção entre ser e dever ser, ponto de partida da teoria pura do direito.  A norma seria, assim, no m
despsicologizado, forma metafórica de exprimir o dever ser normativo.

H. Kelsen nota ainda que a teoria austiniana corretamente vê a sanção como essencial ao direito.  Contudo, J. Austin representa a sanção como uma forma de coerçã
conduta humana.  Motivação da conduta, porém, é um problema sociológico, não normativo.  A jurisprudência normativa, de acordo com H. Kelsen, deve limitar-se a
não devida em razão da ocorrência do fato ilícito (a conduta prevista na hipótese de fato da norma).  O direito consistiria apenas na vinculação entre o ilícito e a sançã
austiniana de questões sociológicas e psicológicas nessa relação dificultaria o entendimento de como funciona a norma jurídica.

Outro aspecto destacado pela crítica kelseniana refere-se ao conceito de dever jurídico.  J. Austin reconhece que o conceito de dever é mais primordial para o direito
(subjetivo).  Mas não separa claramente dever e responsabilidade.  Enquanto o primeiro consiste na conduta cuja ocorrência torna a sanção devida, a última (isto é, a
representa a sujeição à sanção em caso de violação do dever.  Do ponto de vista de H. Kelsen, a noção de comando confunde essas noções, uma vez que indica como
sujeita seu autor à sanção do soberano.  Dessa forma, a teoria austiniana admitiria apenas a responsabilidade individual, deixando de lado as formas coletivas de res
a responsabilidade individual seja a mais comum no direito contemporâneo, a ordem jurídica moderna ainda mantém resquícios da responsabilidade coletiva comum
primitivas.  A fim de corrigir essa limitação, a teoria pura do direito define o dever como a conduta contrária àquela que torna a sanção devida, indepedente de a que
imposta.  

Nesse passo, é interessante notar que a objeção acima resumida não é inteiramente procedente.  Se é bem verdade que a estrutura conceitual do comando induz o l
dela toma H. Kelsen, não se pode deixar de observar que J. Austin admite formas não-individuais de responsabilização, mencionado expressamente a responsabilida
(vicarious liability) (J. Austin 1913, p. 252-3). Ainda que o autor não se aprofunde no tema, não se pode negar que foi por ele reconhecido.

Passando dos deveres aos direitos (subjetivos), H. Kelsen alega que a teoria austiniana não especificaria corretamente a peculiaridade do direito subjetivo, qual seja, a
confere ao titular o poder de exigir (ou não) a conduta objeto do dever.  Tanto para a jurisprudência analítica quanto para a teoria pura do direito, o conceito de direit
um subconjunto dos deveres, aqueles que J. Austin chama de deveres relativos.  Esses deveres são aqueles que consistem em uma ação ou omissão em favor de terc
 No entanto, segundo H. Kelsen, o autor não restringiria o conceito de direito (subjetivo) àqueles deveres relativos cuja imposição forçada depende da atuação do par
direito).  

Novamente, a crítica kelseniana não parece completamente justa.  J. Austin esclarece em seu conceito de dever relativo, que tais deveres definem-se em função de um
Austin 1913, p. 161-2, 197-8).  Nesse ponto, a posição austiniana parece apenas ser um tanto menos refinada que a teoria pura.

H. Kelsen prossegue alegando que J. Austin apresenta o direito como um conjunto pronto para sua aplicação.  A jurisprudência analítica austiniana seria uma teoria e
o processo de criação do direito. Já a teoria pura do direito dá maior ênfase ao aspecto dinâmico na descrição do direito positivo, destacando como o sistema jurídico
criação de suas próprias normas.  Daí sua descrição do sistema jurídico como uma ordem escalonada, aspecto pouco enfatizado por J. Austin, que trata do tema apen
admissão tácita pelo soberano.

Também essa crítica não parece inteiramente procedente.  Para J. Austin, a descrição do direito deve partir do comando, expressão de vontade do soberano que cria
política independente.  Nesses termos, o autor não só se ocupa do processo de criação do direito, como o torna o centro de sua teoria.  Não obstante, é forçoso acom
observação de que a explicação austiniana do processo criador de normas é muito pobre para refletir o grau de elaboração atingido pelo processo legislativo modern

Em seguida, H. Kelsen objeta que J. Austin não apresenta um conceito jurídico de estado, valendo-se do conceito político-sociológico de sociedade política independe
súditos e pelo soberano (seja esse um indivíduo ou um grupo de indivíduos).  Nessa linha, o autor não reconhece limitação jurídica ao poder do soberano.  Assim, de
sociedade só é possível se houver uma ordem que regulamente a conduta recíproca dos indivíduos por meio da decretação de medidas de coerção.  Essa ordem, de
teoria pura, é o conceito jurídico de estado, que constitui a sociedade política — não a pressupõe.  A soberania, nesses termos, seria uma característica do estado, nã
da sociedade política, e o conceito de soberano de J. Austin seria insuficiente.

Na mesma linha, H. Kelsen critica a posição de J. Austin contra o status de direito para o direito internacional, relegando-o à condição de moralidade positiva.  A teoria
ao contrário, que o direito internacional é direito positivo no mesmo sentido que os direitos nacionais.  Apesar de gozar de um caráter mais primitivo, porque menos
julgamento e aplicação da sanção para as próprias partes (estados) ofendidas, o direito internacional também possui caráter coercitivo, decorrente das sanções aplic

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(retaliações e guerra).  A posição austiniana, assim, padeceria de uma dificuldade inerente de explicar o funcionamento do direito como um todo, uma vez que deixa
aspecto do sistema jurídico moderno: o direito internacional. 

Com base nas críticas acima resumidas, é possível concordar com H. Kelsen que a jurisprudência analítica de J. Austin realmente apresenta um modelo demasiado sim
direito positivo da sociedade moderna.  Ainda que em vários pontos a crítica kelseniana não seja inteiramente justa, nem leve em conta todos os matizes do pensame
do comando como noção fundamental do modelo teórico austiniano parece limitar a força explicativa desse modelo, especialmente em temas importantes ao positiv
conceito de norma e o processo autorregulado de criação de normas no sistema jurídico.

3.2. A crítica hartiana

A crítica mais famosa à teoria austiniana é aquela desenvolvida por H.L.A. Hart nos capítulos II, III e IV de seu O conceito de direito, publicado em 1961.  Apesar de H.L
expressamente seu compromisso mais com o tipo de abordagem adotado por J. Austin que com a literalidade da exposição do autor, sua descrição crítica do autor a
como um resumo fiel da posição austiniana, a ponto de tornar-se um dos principais fatores pelos quais a teoria de J. Austin é atualmente conhecida (W. Morrison 199
2001, p. 1-2).

É possível classificar a crítica hartiana em três grandes grupos, cada qual tratado em um capítulo de O conceito de direito.  O primeiro grupo, abordado no capítulo II
tentativa atribuída a J. Austin de compreender o direito como uma ordem coercitiva (orders backed by threats).  Sob a perspectiva hartiana, a noção de comando usa
se à imposição de condutas por meio da força, e não incorpora a ideia de autoridade e convencimento implícitos no uso comum da noção de comando.  Essa ideia é
distinção por ele proposta entre "ter uma obrigação" e "ser obrigado".  Nesse sentido, segundo H.L.A. Hart, o modelo de J. Austin não permitiria distinguir o direito da
Para fazê-lo, é necessário incorporar ao modelo as características de generalidade e permanência (em oposição ao caráter individual e pontual da ordem do assaltan
geral, isto é, de reconhecimento pelo grupo social.  Essas características apontam para a transformação das ordens coercitivas em regras sociais — as quais, para H.L
verdadeiro conceito central da teoria do direito.

A bem da verdade, esta crítica é menos persuasiva do que parece à primeira vista.  Como nota R. Moles (1985, p. 41-56), o próprio J. Austin já havia incorporado as no
permanência (lembre-se que a primeira classificação austiniana é aquela entre comandos gerais e particulares), e a noção de eficácia geral pode ser reconduzida, com
de hábito de obediência ao soberano (que será objeto de crítica com base em outros argumentos).  De modo geral, contudo, resta a percepção de H.L.A. Hart de que
podem ser corretamente entendidas sem que se leve em consideração uma postura ativa não só por parte do emissor (o soberano), mas também por parte do destin

O segundo grupo de críticas, abordado no capítulo III de O conceito de direito, alega que o direito compõe-se não de um único tipo de regras, mas de vários tipos dife
austiniano do comando, assim, não seria capaz de representar adequadamente a diversidade das normas jurídicas, ainda que fosse um modelo adequado para um t
identificada com as regras do direito penal). 

Nessa linha, uma objeção apresentada refere-se à condição jurídica do costume.  As regras consuetudinárias, como anota H.L.A. Hart, não são expressamente prescr
reconhecimento geral no grupo social quanto a seu caráter vinculativo.  As tentativas de reconduzir esse tipo de norma ao modelo comando — por meio do reconhec
soberano à admissão do costume pelos tribunais — parecem pouco convincentes, na medida em que não incorporam os motivos que levaram os tribunais a adotá-la

Outra objeção pertinente sustenta que nem todas as normas jurídicas impõem deveres.  Além daquelas que o fazem, existem também normas que conferem podere
rules).  Essas normas não exigem uma conduta, mas apenas estabelecem procedimentos para que um ato jurídico seja praticado.  Bom exemplo são as normas que r
 Ninguém é obrigado a fazer um testamento — e, nesse sentido, tais normas não impõem deveres.  Mas quem desejar fazê-lo deve seguir o rito previsto em lei.  

A exemplo do costume, também as normas que conferem poderes foram alvo de tentativas de absorção pelas normas que impõem deveres.  Uma dessas tentativas
nulidade como um tipo de sanção, um mal aplicado ao agente que pratica o ato inválido.  Outra tentativa é a interpretação das normas que conferem poderes como
que somente estariam completas se lidas com as normas impositivas de deveres a elas relativas.  Essas tentativas, porém, resultam no aumento da complexidade do
no seu afastamento em relação à forma como os praticantes do direito veem sua própria atividade.

Ainda outra objeção pertencente a este grupo afirma que determinadas normas aplicam-se não só aos agentes privados, mas também aos agentes públicos.  Em out
não apenas aos súditos, mas também ao soberano.  Na mesma linha da crítica formulada por H. Kelsen quanto à ausência de um conceito jurídico de estado e da apl
de direito na jurisprudência analítica, H.L.A. Hart pontua que algumas normas jurídicas estabelecem deveres não para os súditos, mas para os órgãos públicos.  Ness
menos a comandos que a promessas.

É claro que, em alguns casos, é possível refutar essa objeção distinguindo entre o agente público na condição de emissor e o agente público na condição de destinatá
distinção, contudo, nem sempre é clara, como nos casos em que a norma se aplica ao próprio processo de criação de normas e atos jurídicos (e.g., tome-se o art. 60,
Federal: "Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III
Poderes; IV - os direitos e garantias individuais.").  Mais que isso, essa distinção requer sejam incorporadas ao modelo regras sobre a distinção de papéis públicos e p
nos afasta do modelo simples do comando.

Por fim, um terceiro grupo de objeções, expostas no capítulo IV de O conceito de direito, ataca a noção austiniana de soberania.  H.L.A. Hart reconhece que o próprio
soberano não se confunde necessariamente com o poder legislativo.  Enquanto este pode ser legalmente limitado, aquele é juridicamente ilimitado, porque pode imp
poderes constituídos.  É nesse sentido que J. Austin indicava como soberano da Inglaterra não a conjunção do rei e do Parlamento (King-in-Parlament, no jargão cons
combinação do rei, da Câmara dos Lordes e dos eleitores dos membros da Câmara dos Comuns.  H.L.A. Hart objeta, nesse passo, que esse modelo mais sofisticado d
pode ser reconciliado com a noção de hábito de obediência, que parece ser muito mais intuitiva quando aplicada aos poderes legislativo e executivo constituídos.  Pa
noções, é preciso, segundo H.L.A. Hart, valer-se da noção de regra social, que traz mais complexidade para a explicação do direito. 

H.L.A. Hart também objeta que a noção de hábito, em que J. Austin baseia seu conceito de soberania, não serve para explicar a mudança de soberano, já que o novo
de obediência habitual, nem a persistência das leis após a troca do soberano, já que o novo soberano raramente emite novo comando ratificando todas as leis passa
críticas hartianas assemelham-se à argumentação de H. Kelsen a respeito das normas como comando despsicologizado.  Para solucionar esses problemas, é preciso,
introduzir a noção de regras de revogação, apelando, novamente, para a ideia de regra social.

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16/10/2019 John Austin
Em resumo, a crítica de H.L.A. Hart pode ser apresentada como a objeção de que a teoria de J. Austin não inclui a ideia de regra social.  Essa ideia, de acordo com H.L.
três elementos principais: (i) pressão social em caso de descumprimento da regra,  (ii) reconhecimento social da regra como padrão de conduta, e (iii) comportamento
grupo conforme um padrão geral visto como aplicável a todos, ou seja, uma atitude crítica reflexiva em relação ao comportamento regulado. Esse último elemento, d
interno das normas, concentra a ideia central das regras sociais como constitutivas do direito.  O modelo austiniano da norma como comando é demasiado estreito p
regras sociais.  Por isso, diz H.L.A. Hart, esse modelo deve ser abandonado.

Conquanto a crítica hartiana tenha alcançado imenso sucesso no meio acadêmico jurídico, especialmente no mundo anglo-saxão, não se pode deixar de notar que ta
de críticas relevantes.  Uma primeira crítica vem do próprio campo positivista.  F. Schauer (2001; 2015) procura recuperar a noção de ordens coercitivas como elemen
Schauer, a ideia de obediência por medo da sanção é mais comum e está mais próxima da forma como as pessoas vivenciam as normas jurídicas que a atitude crítica
 Por consequência, o modelo de J. Austin seria mais plausível e mais persuasivo do que a teoria hartiana.

Sob outra perspectiva teórica, S. Fish (1989) também se contrapõe à tentativa de H.L.A. Hart de expurgar a coerção do conceito de direito.   Para S. Fish, as regras não
indeterminação do direito, uma vez que as próprias regras sujeitam-se à intepretação e, dessa forma, à força persuasiva dos participantes do direito.  Em virtude des
inarredável, o direito está permanentemente aberto a certo grau de arbitrariedade e, portanto, pode ser utilizado como instrumento de força.  Por consequência, o m
estaria tão distante do funcionamento do direito quanto H.L.A. Hart quer fazer crer.

Uma análise destinada especificamente a reabilitar J. Austin em face da crítica hartiana foi desenvolvida por R. Moles (1985).  Essa análise sustenta que H.L.A. Hart nã
objetivo, nem a metodologia de J. Austin.  Enquanto  H.L.A. Hart interpreta a teoria austiniana como uma descrição geral do direito, J. Austin, em verdade, teria apena
instrumento conceitual que permitisse identificar os elementos que diferenciam o direito de outras atividades humanas.  Nesse sentido, as várias deficiências aponta
deveriam ser entendidas não como falhas da teoria, mas como limitações de escopo a serem posteriormente complementadas por investigações adicionais.  Essa ab
explicar as inconsistências aparentes entre o método conceitual adotado em The Province of Jurisprudence Determined e as classificações jurídicas de cunho mais tra
lições subsequentes das Lectures on Jurisprudence.

Ao contrário do que sustentou H.L.A. Hart, o balanço da revisão crítica da teoria austiniana não revela uma derrota total.  Mas as críticas modernas à jurisprudência a
apontam para fatores cada vez mais relevantes no desenvolvimento do sistema jurídico que são pouco enfatizados na teoria de John Austin.  Isso torna o modelo do
nem tanto errado, mas antes pouco esclarecedor como instrumento explicativo do funcionamento do direito positivo na sociedade moderna.

4. A teoria austiniana e o problema da aplicação e interpretação do direito

Na seção anterior, foram analisadas as principais críticas realizadas à teoria austiniana por dois dos mais relevantes juspositivistas do século XX.  Essas críticas buscav
do modelo de J. Austin na explicação do funcionamento da validade e alteração do direito na sociedade moderna, foco principal das teorias do positivismo jurídico (P
 A fim de complementar esse ponto de vista, nesta seção, pretendo analisar a resposta austiniana ao problema central da teoria jurídica contemporânea, a saber, o p
interpretação do direito. 

É interessante notar, de princípio, que J. Austin concentra suas considerações sobre o assunto na Parte II de suas Lectures on Jurisprudence, cujo título refere-se às fo
modos como ele começa e termina (Law in relation to its sources, and to the modes in which it begins and ends).  Destaca-se, assim, a preocupação central do autor n
aplicação do direito, mas antes com o problema de sua criação.

Nessa parte, o autor discorre sobre algumas noções tradicionais do pensamento, tais como a noção de "fontes do direito" e a de equidade (comparando a equity ingl
Roma Antiga).  Também aborda algumas distinções usuais no campo do ordenamento jurídico, como aquela entre direito escrito e não escrito, e direito natural e pos

A distinção que lhe parece central, contudo, é aquela entre direito judicial (judiciary law) e direito legislativo (statutory law).  J. Austin logo esclarece que essa distinção
compreendida na perspectiva do emissor da lei (juízes ou poderes legislativos), já que também os juízes podem criar normas legislativas (por exemplo, quando um tr
regulamento interno).  A seu ver, a distinção assenta-se sobre o contexto da criação da norma.  Enquanto o direito judicial é criado no processo de decisão de um cas
legislativo é criado em abstrato, de modo desvinculado de qualquer situação concreta.

Partindo dessa divisão, J. Austin apresenta seus argumentos pela superioridade da legislação em relação ao direito judicial.  Este é sempre e necessariamente confuso
claramente, segundo o autor, os fatores que compõem a norma.  Já aquele (o direito legislativo) pode ser claro, se bem redigido.  A preferência de J. Austin pela legisla
sua alegada capacidade de ser claro, e, portanto, imediatamente compreendido pelos súditos e imediatamente aplicado pelos juízes, sem questionamentos interpret

Na visão de J. Austin, desse modo, a interpretação é uma forma de suprir uma deficiência do direito, a qual poderia — e deveria — ser corrigida por outros meios.  A p
esse problema é a codificação.  Com um direito legislado criado de forma sistemática e racional, a aplicação do direito deixaria de ser problemática, ao menos na ma

Note-se, porém, que o próprio autor reconhece que sua codificação racional não eliminaria por completo o problema da ambiguidade e obscuridade no direito.  Se u
lado, sistematizaria o direito existente, eliminando ambiguidades e lacunas, esse diploma legal não seria, segundo o autor, capaz de antecipar problemas futuros.  É n
distingue a forma (sistemática) do código de seu conteúdo, destacando que, mesmo sob um código bem feito, problemas não regulados continuarão a surgir.  Nessa
processo de permanente atualização do texto legal, à medida em que soluções sejam dadas a esses novos problemas.

Essas soluções, por sua vez, deveriam ser esperadas não só no âmbito legislativo, mas também no campo do direito judicial.  J. Austin é enfático, em várias passagens
valorizar o trabalho do jurista (lawyer) na elaboração do direito, bem como em criticar a falta de técnica e conhecimento especializado daqueles que criam direito.  Nã
portanto, que o autor valorize a contribuição dos juízes na formulação de soluções para novos problemas jurídicos — ainda que, a seu ver, a participação do judiciário
constantemente reduzida em razão da consolidação do direito vigente por meio da legislação.  O direito judicial revela-se, sob o ponto de vista austiniano, um import
evolução do direito rumo à crescente clareza e inteligibilidade (W.E. Rumble 1977; W.L. Morison 1958-9).

A caracterização austiniana do direito judicial mostra, contudo, uma concepção pouco desenvolvida desse processo.  Ainda que o autor aponte contextos diferentes p
legislada e da norma adjudicada, para J. Austin — assim como para vários positivistas depois dele — a decisão judicial em casos de disputa interpretativa não se distin
processo legislativo de criação de normas.  Em ambas as situações, o criador da norma é visto como exercendo discricionariedade na formulação da nova norma.  J. A
alegação de que os juízes não criam direito, alegando tratar-se de mera desculpa para disfarçar o uso do arbítrio.  Essa crítica simplista impede o autor de abordar o
e argumentos com base nos quais as normas são criadas no âmbito judicial — isto é, o problema próprio da interpretação do direito.

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16/10/2019 John Austin
No pensamento de J. Austin, o problema da criação de normas é abordado apenas na perspectiva do direito como deve ser, isto é, em sua terminologia, no âmbito da
método adequado para tanto, como visto nas seções anteriores, é a aplicação do princípio da utilidade, que permite à razão identificar qual regra traz maior benefício
pessoas.  Sob essa perspectiva, J. Austin não se dá conta de que o próprio corpo do direito vigente atua como fonte para a reformulação de regras e princípios de mo
para casos imprevistos.  Sendo um reformista (ao menos no que tange ao âmbito jurídico), o autor parece estar mais ocupado com a aplicação racional do princípio u
amarras argumentativas que condicionam as decisões judiciais.  Com isso, deixa de fora uma parte importante da prática jurídica, e fornece uma descrição bastante s
decisões judiciais são tomadas.

5. Conclusão

A jurisprudência analítica austiniana merece ser incluída entre as mais importantes teorias do direito positivo.  Apesar de suas várias limitações, a teoria de J. Austin f
relevantes não só para a compreensão do direito, mas também para a definição do método e do escopo da teoria geral do direito que se seguiu.

Uma dessas vantagens consistiu em seu enfoque no caráter generalista da teoria do direito, apresentada como descrição do funcionamento do sistema do direito po
limitar às características de qualquer direito nacional em especial.  Com isso, J. Austin pode desvincular os conceitos jurídicos de seu conteúdo, contribuindo para a ad
formal e independente das modificações materiais decorrentes das opções políticas das diferentes ordens jurídicas nacionais.

Na mesma linha, a busca por uma descrição formal dos conceitos jurídicos reforçou o escopo de uma teoria voltada para a exposição e explicação do direito positivo
julgamento valorativo do direito.  A divisão de J. Bentham entre ciência do direito (jurisprudence) e ciência da legislação foi não só adotada como desenvolvida por J. A
uma das marcas características do positivismo jurídico que seria desenvolvido nos séculos XIX e XX tanto no continente europeu quanto no mundo anglo-saxão.

Ademais, a descrição austiniana do direito como comando do soberano pôs ênfase na vinculação entre o direito, de um lado, e a política, de outro.  Esse modelo forn
simples — talvez simplista — da mudança do direito ao reportá-la diretamente à decisão política.  Ainda que a forma de descrever a ligação entre direito e política ten
desenvolvida de maneira muito mais complexa, a intuição original dessa ligação é outro mérito que não se pode negar a J. Austin.

Em que pesem essas contribuições, parece difícil negar que o modelo austiniano revela-se por demais simplificado para esclarecer aspectos de crescente importância
 Nessa linha, são limitações importantes seu pouco caso com as regras de estruturação e divisão de funções do exercício do poder, que pode ser notado, por exempl
constitucional à moralidade positiva, ou ainda na implausível teoria da admissão tácita, pelo soberano, das normas criadas por seus subordinados, bem como sua vis
judiciais como um processo arbitrário, similar ao processo legislativo.  Pode-se discutir se essas posições teóricas são aceitáveis na descrição do funcionamento do di
centralizado e absolutista, como aquele encontrado na Europa dos séculos imediatamente anteriores à época em que J. Austin escreveu.  Mas o agigantamento da bu
XX certamente requer uma explicação mais atenta e detalhada da forma como o poder é atualmente regulado pelo sistema jurídico.

Notas
1 As referências biográficas desta seção podem ser encontradas em W.L. Morison 1982; H.L.A. Hart 1998; R. Campbell 1913; W.E. Rumble 2005, pp. 13-24. 

2 AUSTIN, John. Disposition of property by will — primogeniture in The Westminister Review, vol. 2, 1824, p. 503.

3 AUSTIN, John. Joint Stock Companies in Parliamentary History and Review. 1826, p. 729.

4 AUSTIN, John. Review of Friedrich List's 'Das Nationale System der Politische Oekonomie' in The Edinburgh Review. vol. 75, 1842, p. 515; Idem, Centralization in The E
1847, p. 221.

5 Outra causa comentada para esse afastamento foram as fofocas nos meios ingleses a respeito de críticas de Sarah Austin a Harriet Taylor, amiga de J.S. Mill que, ma
sua esposa.

6 Essas indicações de mudança de posicionamento no fim da vida levaram à polêmica sobre se J. Austin teria renegado suas ideias anteriores, especificamente aquela
publicado postumamente como Lectures on Jurisprudence, de que The Province of Jurisprudence Determined compõe a parte inicial.  Para uma análise crítica a essa
 Independente de qual tenha sido a avaliação do autor sobre sua obra ao final da vida, são as ideias por ele elaboradas e expostas nas décadas de 1820 e 1830 que lh
meio jurídico e, portanto, são elas que exigem exposição e análise no âmbito da história do pensamento jurídico.

7 É ainda curioso notar que J. Austin considera a ideia de sanção premial, mas apenas para rejeitá-la. Em sua visão, prêmios podem até induzir o destinatário à condu
servem para constrangê-lo a adotar tal conduta. A esse respeito, vide AUSTIN, John. 1998, p. 16-7.

8 A divisão tríplice dos comandos com emissores (ou, conforme a nomenclatura do autor, leis em sentido próprio) procura seguir de forma mais clara a estrutura con
Austin.  É também possível interpor a divisão entre comandos divinos e humanos, fazendo dos comandos dos soberanos e dos não soberanos uma subcategoria des
apresentação, contudo, parece-me indicar uma maior proximidade entre a moralidade positiva (comandos dos não soberanos) e o direito positivo (comandos do sob
de deus, o que não me parece refletir corretamente o foco do autor na especificidade do direito positivo. 

10 Nota da Edição: para visualizar o Anexo, acessar o texto do verbete em formato .pdf.

11 Os seis capítulos de The Province of Jurisprudence Determined corresponderam a dez aulas do curso, perfazendo, pois, 57 aulas no total.

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Citação
CARVALHO NETO, Pythagoras Lopes de. John Austin. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (c
Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Ca
Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/43/edicao-1/john-austin

Edições
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16/10/2019 John Austin
Tomo Teoria Geral e Filosofia do Direito, Edição 1, Abril de 2017

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Enciclopédia Jurídica da PUCSP - PUC - Pontifícia Universidade Católica

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