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AGRONOMIA Bases da Fisiologia Animal Metabolismo e Transporte de Nutrientes 2006 61

REGULAÇÃO DO METABOLISMO ENERGÉTICO NOS ANIMAIS.

Denise Rangel da Silva Sartori

Animais onívoros e carnívoros


Os animais não se alimentam continuamente. Quando eles comem, o alimento chega
ao intestino e, após ter passado pelo estomago, os nutrientes que são provenientes da
digestão enzimática, como a glicose, aminoácidos e triglicerídios, vão sendo aí absorvidos
por um período de tempo após a refeição. Este período é denominado de absortivo (ou
estado de alimentação). Uma vez que o estômago e intestino são esvaziados, os nutrientes
não estão sendo mais absorvidos, e este período é referido como pós-absortivo (ou estado
de jejum). Este período pode ser de maior ou menor duração, dependendo do tipo de
animal e manejo.
Apesar de os animais não apresentarem ingestão continua de alimento, os tecidos
necessitam continuamente de energia. Há uma necessidade vital por um suprimento
constante de nutrientes fornecedores de combustíveis para manter as funções metabólicas
basais do organismo. Os principais substratos energéticos utilizados pelos tecidos para
produção de energia são a glicose e os ácidos graxos livres (AGL), que circulam no
plasma ligados à albumina. A quantidade diária de calorias derivadas da oxidação dos AGL
é maior que a da glicose, tanto em condições de repouso como no estado alimentado. Por
outro lado, os AGL do plasma não são utilizados pelo cérebro, que tem, portanto, um
requerimento absoluto de glicose, embora possa, em certas condições, satisfazer
parcialmente suas necessidades energéticas oxidando corpos cetônicos.
Então, para que os tecidos tenham garantido o fornecimento de energia, parte dos
nutrientes absorvidos no intestino delgado deve ser acumulada em reservas durante o
período absortivo. O destino destes nutrientes absorvidos deve ser bem controlado para que
as reservas acumuladas durante o período absortivo sejam usadas apropriadamente durante
o período pós-absortivo.

O metabolismo anabólico predomina no estado absortivo


No estado absortivo os nutrientes absorvidos no intestino delgado podem ter 3
destinos: 1) ser imediatamente utilizados como energia; 2) entrar na síntese de componentes
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básicos necessários para o crescimento e manutenção de células e tecidos; e 3) ser


armazenado como glicogênio e gordura, garantindo energia para o período pós-absortivo.
Mas afinal, como os nutrientes absorvidos no intestino delgado chegam até às
células? Os nutrientes podem deixar as células intestinais pela veia porta hepática ou pelo
sistema linfático. Aqueles que são solúveis em água, como a glicose, os aminoácidos e
ácidos graxos de cadeia curta (10 ou menos carbonos) atingem os capilares sanguíneos e,
pelo sistema porta hepático, passam obrigatoriamente pelo fígado antes de atingirem a
circulação sistêmica (Figura 3.1). Por outro lado, os nutrientes com baixa solubilidade em
água como os triglicerídios, fosfolipídios e colesterol deixam o intestino na forma de
quilomicrons, pelo sistema linfático. Estes são lançados à corrente sanguínea ao nível das
veias do pescoço e alcançam os tecidos periféricos ao mesmo tempo em que o fígado.

Papel do fígado no período absortivo.

O fígado tem um papel importante no controle do metabolismo energético. Este


órgão tem a capacidade de direcionar os nutrientes que são fontes de energia, dando a eles
um destino adequado. Durante o período absortivo quantidades elevadas de glicose e
aminoácidos provenientes da dieta chegam ao fígado.
As moléculas de glicose são captadas pelas células hepáticas por um processo de
difusão facilitada, já que a membrana celular não é permeável aos monossacarídeos. A
transportador de glicose predominante no hepatócito é o GLUT-2. Após ter entrado na
célula, a glicose pode ser diretamente oxidada para fornecer energia (por meio de vias
aeróbicas), pode ser armazenada como glicogênio, mas o excesso é convertido em ácidos
graxos (glicose → piruvato → acetil CoA → ácidos graxos) que entrarão na formação de
triglicerídios (também chamados de triacilgliceróis), que consistem de três moléculas de
ácidos graxos ligadas a uma molécula de glicerol por ligações éster. A quantidade de
glicose destinada para a formação de gordura é proporcional à quantidade de carboidratos
ingeridos na dieta. Os triglicerídios formados no fígado são transportados até o tecido
adiposo pelas VLDL (lipoproteínas de muito baixa densidade), onde ficam aí armazenados.
Estas lipoproteínas são de grande importância para o transporte dos triglicerídios na
circulação, já que estes apresentam baixa solubilidade no plasma.
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Figura 3.1- Sistema porta hepático. Todos os nutrientes que deixam o intestino pelo sangue
passam pelo fígado antes de entrarem na circulação sistêmica.

Grande parte dos aminoácidos que passa pelo fígado fica aí retida, nunca atingindo
a circulação sistêmica. Os aminoácidos captados pelos hepatócitos podem entrar na síntese
de proteínas. Em cães, 14% dos aminoácidos vão entrar na formação de proteínas hepáticas
e 6% na formação de proteínas plasmáticas. A maior parte dos aminoácidos que entra no
fígado é convertida em carboidratos. Vamos ver como isto acontece.
Inicialmente os aminoácidos são desaminados, ou seja, os grupos amino são
removidos e as moléculas são convertidas em seus análogos ceto. Estes entram nas vias de
metabolismo de carboidratos, onde podem ser metabolizados para fornecer energia,
convertidos em glicose ou glicogênio, ou entrar na síntese de ácidos graxos (Figura 3.2). A
dieta natural de carnívoros, como cão e gato, contém uma grande quantidade de proteína e
pouco carboidrato. Porém a necessidade de glicose nestes animais não é menor que aquela
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dos outros animais, e por isso é extremamente importante que eles sintetizem glicose a
partir de aminoácidos.
Então, no estado absortivo, a maioria dos aminoácidos absorvidos pelo fígado é
convertida em carboidratos.

Lipoproteínas – as lipoproteínas são partículas formadas por gordura e colesterol,


que se encontram na porção central, cobertas por uma camada de proteínas, o que as
torna solúveis em água. As maiores lipoproteínas são os quilomicrons produzidos no
intestino pela mucosa intestinal, que transportam a gordura e o colesterol na
circulação. Quando os quilomicrons circulam pelo fígado e tecidos adiposos
distribuídos por todo o organismo, receptores na parede dos capilares reconhecem sua
caps de proteínas e lípases começam a hidrolisar a gordura, liberando ácidos graxos.
Estes são então absorvidos pelo fígado e tecido adiposo. Então a capa de proteínas das
lipoproteínas além de tornar a gordura solúvel em água serve como um endereçar as
moléculas e gordura para um tecido específico. Outras lipoproteínas são formadas
pelo fígado e são classificadas de acordo com a sua densidade:
VLDL (very-low-density-lipoproteins): contem principalmente triglicerídios
que estão sendo transportados para o tecido adiposo;
LDL (low-density-lipoproteins): contêm cerca de 50-60% de colesterol que
são transportados aos tecidos para uso na síntese de outras moléculas, como
hormônios esteróides e para estocagem;
HDL (hight-density-lipoproteins): serve de aceptor de colesterol e são
liberados para remover o colesterol dos tecidos e trazê-los de volta para o
fígado, quando podem ser utilizados para a síntese da bile.

Os quilomicrons representam uma fonte importante de ácidos graxos para o tecido


adiposo.

Como visto anteriormente, os triglicerídios deixam o intestino na forma de


quilomicrons. Os quilomicrons são grandes gotas de gordura contendo triglicerídios
combinados com colesterol, proteínas e lipoproteínas formadas no interior das células
intestinais. Uma vez que estejam no espaço extracelular, seu tamanho impede que entrem
nos capilares. Desta forma, os quilomicrons são absorvidos pelos vasos linfáticos das
vilosidades, os lácteos. Eles passam através do sistema linfático e finalmente entram no
sangue exatamente antes de entrarem no coração direito (o ducto torácico, vaso linfático
mais calibroso, desemboca na veia cava). Assim, os vasos linfáticos têm a importante
função de pegar a gordura absorvida no intestino e transferir para o sistema circulatório.
Ao passarem pelos capilares do tecido adiposo, os triglicerídios sofrem hidrólise e
liberam os ácidos graxos que entram nas células adiposas e vão ser utilizados na síntese de
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novas moléculas de triglicerídios, que ficam aí armazenadas, como será visto mais adiante.

Sistema linfático- os vasos do sistema linfático interagem com três


sistemas fisiológicos: o sistema cardiovascular, o sistema digestório e
o sistema imune. As funções do sistema linfático incluem:1) restaurar
fluídos e proteínas filtrados para fora dos capilares para o sistema
circulatório; 2) pegar as gorduras absorvidas no intestino delgado e
transferir para o sistema circulatório e 3) servir como um filtro para
auxiliar na captura e destruição de patógenos externos.

Participação dos tecidos extra-hepáticos no período absortivo.

Outros tecidos extra-hepáticos também participam da regulação do metabolismo


energético. O músculo esquelético e o tecido adiposo conseguem estocar grandes
quantidades de moléculas energéticas, que serão mobilizadas durante o período pós-
absortivo.
No músculo esquelético, a captação de glicose é feita por um transportador, o
GLUT 4. A glicose pode ser oxidada para fornecer energia, além de ser estocada na forma
de glicogênio. Os aminoácidos que não foram captados pelo fígado entram na formação de
proteínas no músculo esquelético. As moléculas de proteínas são continuamente degradadas
e seus aminoácidos adicionados em um depósito intracelular (Figura 3.3).
Simultaneamente, novas proteínas estão constantemente sendo feitas, obtendo seus
aminoácidos do mesmo depósito. Na fase de absorção o depósito de aminoácidos é grande
porque eles estão sendo absorvidos pelo sangue. Além disso, poucos aminoácidos que saem
dos depósitos são direcionados para o catabolismo oxidativo porque há muita glicose
disponível para a oxidação e geração de energia. Como resultado, o depósito é amplo, e
uma grande proporção de aminoácidos é direcionada á síntese protéica. Então, durante a
fase de absorção, a taxa de síntese excede à taxa de degradação e os aminoácidos são
armazenados na forma de proteína muscular, que possui um papel fundamental não apenas
para a locomoção e postura, mas também como depósito de aminoácidos.
No tecido adiposo, durante a fase de absorção, a glicose pode fornecer glicerol e se
juntar aos ácidos graxos para formar triglicerídios, que ficarão temporariamente
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armazenados neste tecido. Os


ácidos graxos que formam os
triglicerídios podem ser
provenientes de duas fontes: da
síntese direta de lipídios a
partir de glicose no próprio
tecido adiposo ou da captação
de quilomicrons e VLDL. Os
ácidos graxos dos triglicerídios
são transferidos dos
quilomicrons e VLDL para o
Figura 3.2- Vias do metabolismo de glicose indicando os locais de
entrada dos vários aminoácidos. tecido adiposo pela ação da
enzima lipase lipoprotéica.
Esta enzima é encontrada no
endotélio de capilares e quando ativada liga-se aos triglicerídios, catalisando a hidrólise de
ácidos graxos, os quais podem entrar no tecido adiposo e se juntar ao glicerol, formando os
triglicerídios.

A glicose é o substrato energético utilizado em grandes quantidades pela


maioria dos tecidos no estado absortivo.

A grande disponibilidade de glicose no sangue, proveniente da absorção intestinal,


presente no estado absortivo faz com que ela seja utilizada imediatamente como fonte de
energia na maioria dos tecidos, da mesma forma que para as células do sistema nervoso
central. Ela é utilizada pela via Embden-Meyerhof, também denominada glicólise. A
glicólise é a etapa inicial de oxidação e leva diretamente ao ciclo de Krebs, o local de
complete oxidação e a principal via metabólica de produção de energia no organismo
(Figura 3.4).
Ao mesmo tempo, no fígado e o músculo esquelético estão sendo armazenados
gligogênio e no tecido adiposo gordura na forma de triglicerídios. Desta forma, o estado
absortivo é caracterizado como uma fase de armazenamento de combustíveis, que serão
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utilizados no período em que os amimais


não estão ingerindo alimentos, ao
mesmo tempo em que há grande
utilização imediata de glicose como
fonte de energia.
Assim, a elevação da
concentração sanguínea de glicose
observada logo após a ingestão de
alimentos é temporária, retornando aos
seus valores basais à medida que ela vai
sendo captada pelos tecidos.
Figura 3.3- Reservatório intracelular de aminoácidos.

O metabolismo catabólico predomina no estado pós-absortivo.

No período de tempo em que o animal fica sem se alimentar (período pós-absortivo)


a absorção intestinal de nutrientes, principalmente glicose, é baixa e os depósitos de
combustíveis começam a ser queimados para atender às necessidades de energia dos tecidos
metabolicamente ativos. Este período relativamente breve (apenas algumas horas entre as
refeições) é caracterizado por alterações a curto prazo que mobilizam nutrientes
armazenados para manter a disponibilidade de combustível para tecidos metabolicamente
ativos. O objetivo destas alterações é manter as concentrações plasmáticas de glicose em
uma faixa aceitável de normalidade, para que o cérebro e os neurônios tenham quantidades
adequadas de substrato.
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glicose

glicose 6-P
GLICÓLISE

piruvato

acetil- CoA

Ciclo
de CO2
Krebs

Figura 3.4- Relação entre a glicólise e o ciclo de Krebs, o local de


completa oxidação da glicose.

Papel do fígado no período pós-absortivo

O fígado é a primeira fonte de glicose no estado pós-absortivo. O glicogênio


armazenado no fígado durante a fase absortiva é quebrado para fornecer glicose ao sangue.
Este processo de quebra de glicogênio é denominado glicogenólise. O fígado é a primeira
fonte de produção de glicose neste período. O glicogênio pode fornecer glicose suficiente
para satisfazer às necessidades energéticas do corpo por cerca de quatro a cinco horas. O
fígado também consegue sintetizar novas moléculas de glicose pela via gliconeogênese, a
partir de aminoácidos, glicerol e lactato. A glicose resultante destas duas vias (glicogenólise
e gliconeogênese) é lançada pelo fígado ao sangue. Desta forma, o organismo consegue
atender à demanda energética do sistema nervoso central e, ao mesmo tempo, manter seus
níveis de glicose no sangue dentro de uma faixa de normalidade.

O músculo esquelético e tecido adiposo fornecem substratos para a gliconeogênese


hepática.
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Os estoques de glicogênio do músculo esquelético podem contribuir com a glicose


adicional no plasma no estado pós-absortivo, mas o glicogênio não pode ser convertido
diretamente em glicose. As células musculares, como outras células, não possuem enzimas
que transforma a glicose–6-fosfato em glicose, de modo que elas metabolizam glicose–6-
fosfato em piruvato ou lactato. Estes então são transportados para o fígado que os utiliza
para produzir glicose.
O tecido adiposo quebra seus estoques de triglicerídios em ácidos graxos e glicerol.
Esta quebre é feita pela enzima lípase hormônio sensível. Esta enzima recebe este nome
porque a sua atividade é controlada por alguns hormônios. O glicerol resultante vai para o
fígado e pode ser convertido em glicose. Os ácidos graxos são liberados para o sangue e
podem ser captados pelos tecidos.

Os ácidos graxos livres são utilizados como fonte de energia pela maioria dos tecidos
no período pós-absortivo.

Os ácidos graxos liberados na corrente sanguínea são utilizados como fonte de


energia por muitos tecidos, exceto o sistema nervoso central. Assim, no período pós-
absortivo, a maioria dos tecidos substitui os seus requerimentos energéticos em glicose
pelos ácidos graxos plasmáticos, contribuindo de forma significativa para que não ocorre
queda nos níveis de glicose e venha faltar suprimento energético para o sistema nervoso
central.

O metabolismo energético é controlado pelos hormônios Insulina e Glucagon.

Como vimos acima, durante o período absortivo o fígado capta a glicose do sangue
e converte-a em glicogênio e gordura; as células adiposas captam a glicose do sangue e
convertem-na em gordura estocada na forma de triglicerídios e as células do organismo
utilizam glicose preferencialmente como fonte energética.
Durante o período pós-absortivo estes processos são revertidos. O fígado quebra o
glicogênio para fornecer glicose ao sangue; o fígado e o tecido adiposo fornecem ácidos
graxos ao sangue e a maioria das células do organismo utiliza preferencialmente os ácidos
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graxos como sua fonte de energia. As proteínas musculares também são quebradas e os
aminoácidos liberados para a corrente sanguínea.
Um tecido que não muda a sua fonte de energia durante o período pós-absortivo é o
sistema nervoso central (SNC). As células nervosas requerem um constante fornecimento
de glicose. Esta dependência do SNC em glicose é a razão pela qual as outras células do
organismo tenham que mudar seus requerimentos energéticos para gordura durante o
período pós-absortivo. Esta mudança preserva a glicose disponível e os estoques de
glicogênio para o sistema nervoso por muito tempo.
O que então dirige esta mudança do metabolismo energético? A insulina e o
glucagon, dois hormônios produzidos e liberados pelo pâncreas, são responsáveis por
controlar as direções que as moléculas energéticas tomam. O mais importante destes
hormônios é a insulina, que é liberada em resposta a níveis elevados de glicose no sangue.
O pâncreas libera insulina para a circulação sistêmica quando a glicose no sangue
aumenta acima do nível normal pós-absortivo. A insulina facilita a entrada de glicose para
maioria das células do corpo. Quando a insulina está presente, quase todas as células usam
a glicose como fonte de energia; as células adiposas usam a glicose para fazer gordura e as
células hepáticas convertem a glicose em glicogênio e gordura. A ação da insulina se dá
ativando enzimas envolvidas nestes processos de armazenamento de combustível e
oxidação da glicose. Ao mesmo tempo, a insulina inibe a quebra de glicogênio, a quebra de
gordura (lipólise) e a quebra de proteínas nos tecidos (proteólise) e a síntese de glicose
(gliconeogênese)
Tão logo a glicose retorna ao seu nível normal, isto é, quando a absorção intestinal
está bastante reduzida, a liberação de insulina diminui rapidamente e a entrada de glicose
nas células é inibida, exceto nas células nervosas. A mobilização de combustível em tecidos
periféricos ocorre quando as concentrações sanguíneas de Insulina diminuem.
A queima de reservas de combustíveis nesta fase está sob o controle do hormônio
Glucagon, também produzido pelo pâncreas. O glucagon age preferencialmente em dois
tecidos: fígado e tecido adiposo. No fígado, ele vai estimular a quebra de glicogênio
armazenado e a síntese de novas moléculas de glicose (ativa a gliconeogênese). Desta
forma, a glicose é lançada na corrente pelo fígado, já que não pode ser utilizada como
energia, nem ser armazenada como glicogênio devido a falta de insulina. No tecido
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adiposo, o glucagon estimula a quebra de triglicerídios, e os ácidos graxos livres são


lançados na corrente sanguínea para serem oxidados nos tecidos para produção de energia.
Outros hormônios, como o cortisol e as catecolaminas (adrenalina e noradrenalina),
sintetizados pela córtex da glândula adrenal, podem auxiliar o glucagon nesta queima de
combustíveis. A redução nos níveis de glicose sanguínea estimula a liberação de glucagon
no pâncreas.

REGULAÇÃO DO METABOLISMO ENERGÉTICO EM ANIMAIS


HERBÍVOROS

Como visto anteriormente, nos herbívoros ruminantes a degradação de carboidratos


da dieta pelos microrganismos leva à formação de ácidos graxos voláteis (acético, butírico e
propiônico) que são absorvidos no próprio rúmen e caem na corrente sanguínea. Então,
uma desvantagem do metabolismo microbiano é que quase todo o carboidrato da dieta é
transformado em ácidos graxos voláteis e muito pouca glicose chega no intestino para ser
absorvida.
Apesar da grande oferta de ácidos graxos voláteis para os tecidos, o sistema nervoso
central requer glicose para satisfazer as suas exigências energéticas, como ocorre nos
animais monogástricos. Como conseqüência disto, os ruminantes são dependentes da
gliconeogênese hepática para a manutenção dos níveis de glicose no sangue. Assim, o
fígado está continuamente lançando glicose na corrente sanguínea.
Mas como isto ocorre? O fígado quebra o glicogênio estocado, converte
aminoácidos, glicerol e ácido propiônico em glicose e libera esta glicose vagarosamente á
circulação. O ácido propiônico é um ácido graxo volátil resultante da digestão fermentativa,
que pela veia porta hepático chega ao fígado e é transformado em succinil CoA. Este entra
no ciclo de Krebs e é transformado em glicose, pela gliconeogênese. Desta forma, os níveis
de glicose sanguínea são mantidos dentro de uma concentração normal.

Propionato → propionil CoA→ metilmalonil CoA → succinil CoA →


ciclo de Krebs → glicose
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Os outros dois ácidos graxos voláteis, o ácido acético e butírico vão entrar na
formação de ácidos graxos de cadeia longa (principalmente no tecido adiposo) e de corpos
cetônicos (fígado) que serão utilizados como energia pela maioria dos tecidos. Estes ácidos
graxos voláteis representam cerca de 70-80 % da fonte de energia nestes animais.

Insulina e glucagon participam na regulação do metabolismo energético.

Nos ruminantes a insulina aumenta a síntese de proteínas e de gordura na maioria


dos tecidos e a gliconeogênese não é muito sensível ao efeito inibitório da Insulina, como
acontecem nos animais monogástricos. O aumento de ácidos graxos voláteis no sangue
representa um estímulo para a liberação de insulina. Já o glucagon aumenta a captação
hepática de aminoácidos favorecendo assim a síntese hepática de novas moléculas de
glicose.

Metabolismo energético em animais em lactação.

As fêmeas de ruminantes em lactação, principalmente aquelas com alta produção de


leite, requerem grandes quantidades de glicose para a produção do leite. Esta glicose entra
na formação do carboidrato do leite – a lactose (formada por galactose + glicose) e também
na formação da gordura do leite – o triglicerídio. Na glândula mamária das fêmeas em
lactação, a glicose é transformada em glicerol, que se junta a 3 ácidos graxos para formar o
triglicerídio. Então, em vacas produtoras de grande quantidade de leite a gliconeogênese
hepática é necessária não apenas para atender os requerimentos de glicose para o cérebro e
eritrócitos e outros tecidos, mas principalmente para manter a produção do leite.

Metabolismo energético nos herbívoros não ruminantes

Nos animais herbívoros não ruminantes como os eqüinos, que ficam o tempo todo
no pasto ou recebem volumoso, os carboidratos vão ser transformados em ácidos graxos
voláteis (acético, butírico e propiônico) no ceco pelo processo de digestão fermentativa
semelhante àquele que ocorre no rúmen. e são aí absorvidos. Estes nutrientes vão ter o
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mesmo destino que os ácidos graxos voláteis absorvidos pelo rúmen. Se o animal recebe
parte de sua dieta na forma de concentrado, um pouco de amido pode ser degradado e
absorvido no intestino, na forma de glicose. Nesta situação, o intestino estaria contribuindo
um pouco com a gliconeogênese hepática na manutenção da a glicemia. Mesmo assim, os
eqüinos são dependentes do fígado para a síntese de glicose (através da gliconeogênese).

TRANSPORTE

Maria de Lourdes Mendes Vicentini-Paulino

Os nutrientes absorvidos pelo trato gastrintestinal, bem como os hormônios


liberados pelas diferentes glândulas e o próprio oxigênio respirado devem alcançar
diferentes órgãos e tecidos do organismo. Além disso, o dióxido de carbono gerado pelo
metabolismo celular e outros produtos do metabolismo devem também ser removido da
proximidade dos tecidos.
O transporte destas substâncias se faz pelo sangue e as vias que conduzem o sangue
são as artérias e as veias, de diferentes calibres, além dos pequenos capilares que, juntos,
formam o sistema circulatório. As artérias são os vasos pelos quais o sangue sai do coração.
Como a pressão do sangue no lado arterial é maior, comparando com as veias, a parede das
artérias é mais espessa. As veias são os vasos que trazem o sangue para o coração. Os
capilares são vasos microscópicos, com paredes finas e que são responsáveis pelas trocas de
gases e nutrientes entre o sangue e o meio interno (Figura 3.5.).

Figura 3.5. – Vias que conduzem o sangue pelo sistema circulatório.


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O sangue. O sangue consiste em vários tipos de células em suspensão em complexo


conhecido como plasma. O plasma é constituído por água (93%), com vários solutos
dissolvidos, incluindo proteínas, lipídios, carboidratos, aminoácidos, vitaminas, minerais,
hormônios, gases e eletrólitos.
As células sanguíneas incluem os eritrócitos (hemácia), os leucócitos (glóbulos
brancos) e as plaquetas (trombócitos). Os eritrócitos são especializados em transportar
oxigênio até os tecidos, os leucócitos participam da defesa do hospedeiro e as plaquetas
participam do processo da coagulação.
O sangue que irriga os tecidos é transportado por artérias e entra nos capilares que
são os vasos sanguíneos de menor calibre. Através das paredes dos capilares ocorre a troca
de substâncias solúveis em lipídeos (O2 e CO2) que está no sangue e o líquido que banha os
tecidos, chamado de líquido intersticial. Entretanto, as substâncias que são solúveis em
água cruzam a parede dos capilares por meio de fendas (espaços) existentes entre as células
que revestem a parede dos capilares.
Resumindo, podemos dizer que os nutrientes presentes no sangue devem, em
primeiro lugar, alcançar os diferentes tecidos, o que ocorre devido à diferença de pressão
gerada no coração que propulsiona o sangue através do sistema continuamente. Em
segundo lugar, os nutrientes devem passar através das paredes dos capilares e alcançar os
tecidos.
Para que o sangue possa alcançar os diferentes tecidos deve haver um gradiente de
pressão, que força o sangue pelo sistema de vasos. A pressão é gerada pela contração do
coração (sístole) e é mantida pelo sistema de controle da pressão nas artérias.

O coração O coração é considerado uma bomba que ejeta sangue para os pulmões onde
ocorre troca do dióxido de carbono pelo oxigênio e para os demais tecidos do organismo.
Ele é dividido em quatro câmaras; dois átrios e dois ventrículos. No átrio direito
desembocam a veia cava superior e inferior, no átrio esquerdo desembocam as veias
pulmonares. No ventrículo direito sai o tronco pulmonar, que após um curto trajeto bifurca-
se em artérias pulmonares direita e esquerda, do ventrículo esquerdo sai a artéria aorta
(Figura 3.6.). Entre os átrios e os ventrículos existem estruturas denominadas válvulas
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atrioventriculares que permitem que o sangue flua em uma única direção, ou seja, do átrio
para o ventrículo.

Aorta

Veia cava
superior Artéria pulmonar

Átrio Átrio esquerdo


direito

Ventrículo
esquerdo
Ventrículo
direito

Figura 3.6. – Estrutura do coração.

Dá-se o nome de circulação pulmonar ao circuito do sangue que vai do ventrículo


direito para os pulmões e retorna ao átrio esquerdo. A circulação do sangue que sai do
ventrículo esquerdo para os tecidos e volta para o átrio direito é chamada de circulação
sistêmica (Figura 3.7).

Figura 3.7. – Circulação sistêmica e Figura 3.8. – Marcapasso natural do coração


circulação pulmonar.
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A ejeção de sangue para os vasos se dá pela contração cardíaca. Primeiro contraem


os átrios e logo a seguir os ventrículos. Depois da contração ventricular ocorre um
relaxamento e o coração se enche novamente de sangue. A contração ocorre em resposta a
um estímulo elétrico originado no marca-passo natural do coração (nodo sinoatrial) e que é
propagado a todo músculo cardíaco (Figura 3.8).

Controle da pressão arterial A pressão arterial é controlada eficazmente pelo organismo.


Existem vários mecanismos de controle, mas destacaremos o Reflexo do baroreceptor
arterial. Os barorreceptores são terminações nervosas sensíveis à pressão, localizados em
grandes artérias.
Os mecanismos baroceptores são rápidos, neuralmente mediados, que tentam
manter constante a pressão arterial, por meio de variações dos efeitos dos sistemas nervosos
simpático e parasimpático sobre o coração e vasos sanguíneos.
Uma vez estimulados, os barorreceptores enviam impulsos ao sistema nervoso
central, o qual determina alterações do débito cardíaco e da resistência periférica total, no
sentido de corrigir a pressão. O débito cardíaco é o volume de sangue bombeado por
minuto pelo coração, que sofre influencia da freqüência de contração, da contratilidade do
coração e da duração da contração (diuração sistólica). A resistência periférica é
determinada pela contratilidade dos vasos. As respostas do organismo para correção da
pressão arterial é mediada por ativação do sistema nervoso autônomo (Figura 3.9) .

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Figura 3.9. - Reflexo barorreceptor - RPT = resistência periférica total;DC = débito cardíaco
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A difusão através da parede capilar A força que gera o transporte de substâncias através
da parede capilar é a diferença de concentração. A substância deve estar mais concentrada
no sangue para que possa ocorrer difusão para o interstício. A depender do tamanho e da
solubilidade em gordura, as substâncias podem se difundir através de poros ou da própria
da parede. Substâncias hidrossolúveis como glicose, aminoácidos e a própria água movem-
se através de poros. Substâncias lipossolúveis como o oxigênio, o dióxido de carbono e os
ácidos graxos podem difundir através da parede capilar.

A troca de oxigênio e dióxido de carbono O sangue arterial que chega nos capilares é rico
em oxigênio que vem da respiração. O oxigênio é transportado em solução no plasma
(1,5%) porém, a maior parte do oxigênio é transportada no sangue em combinação química
com a hemoglobina (98,5%), que é uma proteína contida nas células vermelhas do sangue.
Nos capilares, o oxigênio se difunde para o líquido intersticial, enquanto que o dióxido de
carbono é transportado no sentido inverso, do interstício para o sangue. O dióxido de
carbono é transportado no sangue em solução no plasma (7%) assim como em combinação
química (ligado a hemoglobina (23%) ou sob a forma de íon bicarbonato (70 %)) (Figura
3.10). A maior parte do dióxido de carbono que entra no sangue difunde-se para as
hemácias para serem transportados até os pulmões. Nas hemácias, grande parte se combina
com a água formando ácido carbônico, que depois se dissocia em hidrogênio e bicarbonato.
Portanto, podemos dizer que o CO2 é transportado principalmente na forma de bicarbonato
(HCO3-).
CO2 + H2O H2CO3 H+ + HCO3-

Quando o sangue chega nos pulmões ocorre reação contrária, com a passagem de
CO2 para os pulmões e sua troca pelo O2 vindo da respiração.
AGRONOMIA Bases da Fisiologia Animal Metabolismo e Transporte de Nutrientes 2006 78

células Capilar

Figura 3.10. Toca gasosa.

Controle da respiração

A respiração é controlada por reflexos que se originam em receptores de volume nos


pulmões, receptores de estiramentos em músculos respiratórios e em quimioreceptores que
monitoram as pressões parciais CO2, O2 e H2.

PO2
Músculos PCO2
Controlador Central Ventilação
respiratórios
PH

Receptores de
estiramento

Receptores
pulmonares e das
vias áreas

Quimioreceptores
centrais e
periféricos

Figura 7 Controle da ventilação.

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