RESUMO
ABSTRACT
This article aims to analyze the importance of Neuropsychology in the promotion of elderly’s health. The
focus of this work is based on the assumption that every stage of development includes losses and gains. So
with old age it would not be any different. This means that there are positive factors arising from maturity,
such as wisdom, experience, and improvements, especially in what concerns implicit and semantic memory.
In addition, well-being in old age stems from lifelong habits in addition to habits in old age, and thus
produces immeasurable benefits. These benefits can be personal, material and / or social. Despite the proven
_____________________________
¹ Psicóloga graduada pela Faculdade Ruy Barbosa. Aluna de Pós Graduação em Neuropsicologia. Reside
na Rua Dr Augusto Lopes Pontes, nº 455-B Cond. Costa do Atlântico Edf. Costa do Pacífico Apt. 903
CEP: 41.760-035 Bairro: Costa Azul – Salvador-Ba. Telefones de contato: (71) 3506-2095, (71) 99278-
8461.
existence of declines and other health conditions associated to old age, which are, also, associated with
changes in the brain constitution and are part of human nature in its entirety, they are not necessarily
limiting nor should they constitute a factor of social isolation. It is on the basis of these data that thinking
about health promotion in order to reduce the damage resulting from aging is necessary. Neuropsychology
can contribute with the concepts of neuroplasticity, compensation, and cognitive reserve as tools for active
old age. If stimulated early and continuously throughout life an elderly individual is much more able to
withstand the damage due to age and remain functional. Hence the importance of bringing new studies in the
area to provoke reflection on such an important subject both now and in the future.
1.INTRODUÇÃO
O envelhecimento vem sendo um tema bastante discutido no meio acadêmico e nas produções
científicas em decorrência da transformação de perfil da população brasileira. O país está
envelhecendo e segundo dados do IBGE (2010), a população de idosos vem crescendo
exponencialmente ao longo dos anos e as gerações subsequentes não acompanham este crescimento
em número de nascimentos.
Esse aumento no número de idosos contribui para a mudança na estrutura da pirâmide etária
brasileira. Em 2012 os idosos compunham 8,6% da população (IBGE, 2012). Associado a este
aumento, surgem doenças cognitivas que têm sua prevalência na faixa etária em questão. Segundo
Freitas et al. (2010), o novo cenário em que se encontra a sociedade brasileira contribui para
mudanças no índice de morbidades influenciado pelo aumento da prevalência de doenças crônico-
degenerativas e incapacidades relacionadas ao declínio cognitivo.
No Brasil, o prevalência de declínio cognitivo na população variou entre 4,9% e 34,1% a depender
da localidade e condições como gênero, escolaridade, história e estilo de vida, e condições sócio-
econômicas (MACÊDO et al., 2012; FREITAS et al., 2010; FARIA et al., 2011; FERREIRA et al.,
2014; HOLZ et al., 2013; SANTOS et al., 2013; TRINDADE et al., 2013).
Na atualidade, a demência é o problema de saúde que mais cresce em importância e número. Esta
tem como principais características o declínio da memória, o declínio intelectual e de funções como
a linguagem, entre outras. É sabido que o grau de incapacidade aumenta com o avanço do declínio
cognitivo (MACEDO e RAMOS, 2005).
A prevalência de demência cresce com o aumento da idade. Ela aparece em 5% na faixa etária de
60 anos ou mais e aumenta gradualmente até atingir 20% de casos na parcela da população com 80
anos ou mais (ALMEIDA, 1998; NITRINI, 1999). No geral o Brasil apresenta 7,1% de prevalência
da doença, assim como a América Latina que apresenta o mesmo índice. É maior do que em
continentes como a África (2,2%), Ásia (5,5%) e América do Norte (6,4%), perdendo apenas para a
Europa (9,4%) (LOPES e BOTTINO, 2002).
É possível concluir, com isso, que é preciso resolver a questão das doenças associadas ao declínio
cognitivo na velhice antes que elas apareçam expressivamente. Não se trata de remediar, apenas,
mas sim de buscar alternativas que diminuam o problema antes que ele surja, como forma de
prevenção. E para além disso, ter como meta o bem-estar dos idosos de forma mais ampla com
investimentos na promoção da saúde.
A geração da qual estamos falando é bastante populosa: é a geração dos baby boomers. Segundo
Goldberg (2006), ela foi formada no período de maior taxa de natalidade da história dos Estados
Unidos, após a segunda grande guerra. O que traz como reflexão o fato de que este número
significativo de indivíduos alcançou a terceira idade, e, diante disto, surgem implicações em termos
de saúde pública.
A Neuropsicologia surge nesse contexto trazendo formas de pensar a promoção da saúde cognitiva
quando traz a ideia de plasticidade e estimulação cerebral em todos os períodos da vida. E aponta,
também, o conceito de reserva cognitiva como um grande aliado na prevenção de doenças na
velhice. A reserva cognitiva surge da noção de que um cérebro bem estimulado se desenvolve
criando uma rede mais rica de conexões neuronais que ajudam a retardar o aparecimento de doenças
como as demências, por exemplo (MALLOY-DINIZ, FUENTES e COSENZA, 2013).
2.VELHICE
Os seres humanos são uma das únicas espécies no mundo em que a expectativa de vida ultrapassa, e
muito, a idade de reprodução. É natural se perguntar então, os motivos pelos quais esse curioso
fenômeno evolutivo ocorre e o porquê de a evolução ter se encarregado de manter vivos indivíduos
que já não podem contribuir em nada para a reprodução da espécie. No entanto, os sujeitos idosos
contribuem para a sobrevivência da espécie de outras formas, e uma delas é a transmissão de
conhecimento para gerações mais jovens através da cultura e da linguagem (GOLDBERG, 2006).
O Estatuto do idoso (BRASIL, 2003) diz que a partir dos 60 anos o cidadão já pode ser incluído na
tão famosa “terceira idade”. Aquele que pertence a esta categoria etária possui, assim como
qualquer outro sujeito em outra fase do desenvolvimento, especificidades físicas e
comportamentais.
Segundo Gil e Busse (2009), ocorrem declínios físicos e cognitivos com redução da força física e
desaceleração dos movimentos, dentre outros comprometimentos. Porém, este é um tema que será
tratado mais a diante neste artigo. Os papéis sociais também mudam a partir da aposentadoria que
coloca os idosos numa posição diferente tanto financeiramente quanto na composição familiar
(tornam-se avós, viúvos, etc.) (PAPALIA, OLDS e FELDMAN, 2006).
No entanto, ainda de acordo com Gil e Busse (2009), estes comprometimentos comuns à idade
ocorrem de forma diferenciada entre indivíduos por conta de fatores que incluem principalmente a
história de vida. Por esse motivo, a OMS (2015) considera que não existe um indivíduo idoso
“típico”, a diferença entre as capacidades pessoais de cada um sofre influência dos eventos
ocorridos ao longo da vida e ajuda na diversificação da população idosa.
Ainda que seja uma fase de desenvolvimento como qualquer outra, as questões relacionadas ao
envelhecimento vêm sendo amplamente discutidas no meio acadêmico, devido, principalmente a
uma mudança na pirâmide populacional. Transformação esta, que ocorre mundialmente, inclusive
no Brasil.
A OMS (2005) reconhece, ainda, que a longevidade no Brasil vem crescendo significativamente, e
que esse envelhecimento da população demanda ações por parte da saúde pública. Garrido e
Menezes (2002) complementam estas afirmações quando relatam que no Brasil as iniciativas
direcionadas ao bem-estar da população idosa ainda são incipientes.
A transição da pirâmide populacional brasileira, de um perfil mais novo, para um mais idoso, exige
dos pesquisadores empenho em estudar e criar estratégias para promoção da saúde e entendimento
das especificidades da população idosa (RIBEIRO, 2015).
Em 1991, existiam no Brasil cerca de 4,8% de idosos com 65 anos ou mais. No último censo este
percentual chegou a 7,4%, revelando que o país está tendendo para um envelhecimento
populacional (IBGE, 2010). Segundo a World Health Statistics Annual (WHSA), até 2025 o país
passará ao 6º lugar entre países com maior contingente de idosos (GARRIDO e MENEZES, 2002).
Ocorre, então, uma transformação da pirâmide etária da população brasileira, onde essa deixa de ser
triangular e adquire um formato maior no topo e menor na base.
A percentagem de mulheres idosas no Brasil é maior que a de homens e chega aos 55%. A medida
que a idade vai avançando, essa percentagem de mulheres em relação a homens continua a
aumentar. Este é mais um dado relevante para o entendimento do perfil da população idosa no país,
que ajuda a guiar as ações em políticas públicas de prevenção e promoção da saúde da população
idosa (GARRIDO e MENEZES, 2002).
Por se tratar de um país em desenvolvimento o Brasil torna-se um ambiente árduo para envelhecer.
As dificuldades surgem de uma qualidade de vida precária, afetada por diferentes situações de vida,
dificuldades financeiras, relações familiares e dependência (GARRIDO e MENEZES, 2002).
Além disso, é comprovado que os idosos adoecem mais que os jovens, o que acaba moldando a
experiência de envelhecimento nesses indivíduos. Um inquérito feito em São Paulo em cinco
regiões revelou que 94,4% da população de idosos participantes da pesquisa apresentaram alguma
doença crônica (GARRIDO e MENEZES, 2002).
Porém, nem tudo são más notícias no que tange o envelhecimento. Apesar dos dados que apontam a
prevalência de doenças crônicas, e apesar de, no Brasil, as iniciativas voltadas para o bem-estar do
idoso serem mínimas, o fato é que estamos vivendo mais anos e alcançando maior nível de
longevidade. O que as pesquisas apontam é que o Brasil se tornou um país de idosos e este dado
deve impulsionar políticas adequadas para abranger essa parcela significativa da população
(GARRIDO e MENEZES, 2002).
No que tange o processo de envelhecimento, Neri (2001) afirma que este se inicia logo após a
maturidade sexual, e acelera por volta da quinta década de vida quando cessa a possibilidade de
reprodução da espécie. Neri (2001) reforça, também, a idéia de que o envelhecimento humano
carrega em si uma complexidade e uma variabilidade que depende da genética e da história de vida
comum a cada indivíduo.
Segundo ela, no contexto das sociedades globalizadas e em vias de globalização, existem indivíduos
idosos que agem ou em prol da manutenção de um status social comum à juventude, ou buscam
afastar-se desse mesmo status e assumem o isolamento social atribuído ao idoso.
Ao longo da história a velhice foi encarada de diversas formas, sendo valorizada ou desvalorizada a
depender da cultura e época. Muitos estudiosos também se debruçaram sobre o estudo da
gerontologia e dedicaram preciosas contribuições à área, como Francis Bacon, dentre outros
(ARAÚJO e CARVALHO, 2005).
Aqueles que estudam questões de gênero ainda abordam temáticas como as diferenças no
envelhecimento de homens e mulheres, como é o caso da autora Guita G. Debert (1994). Para ela, a
mulher idosa sofre uma dupla discriminação que se baseia na sua condição enquanto mulher e
enquanto idosa, o que a expõe a uma dupla vulnerabilidade. Porém, a mesma autora pondera em
relação à divergência de ideias, no meio científico, no que tange o envelhecimento feminino.
Segundo Debert (1994), alguns autores falam da mulher idosa de forma mais positiva, e afirmam
que o envelhecimento feminino se dá de forma mais suave do que o envelhecimento masculino, este
fato estando relacionado à ruptura em relação ao trabalho que os homens experimentam mais
bruscamente na aposentadoria. Além disso, segundo a autora, os filhos tendem a ter vínculos
afetivos mais intensos com suas mães e por consequência tornam-se mais dispostos a cuidar delas
na velhice, o que não acontece na mesma frequência em relação aos pais.
Outro dado interessante é que as mulheres por estarem habituadas a mudanças significativas
corporais, como gravidez, parto, lactância e menstruação, estão, também, mais propensas a lidar
melhor com as mudanças físicas decorrentes do envelhecimento (KEITH, 1990 apud DEBERT,
1994).
Estudos como esse vêm para quebrar a ideia de que o processo de envelhecimento é uma
experiência homogênea para todos e principalmente para homens e mulheres, como durante muito
tempo os estudiosos na área de gerontologia acreditavam (DEBERT, 1994). Estas diferenças na
vivência de cada indivíduo, em relação ao próprio envelhecimento, sofrem influência de outros
fatores como classe social e religião, além do gênero (DEBERT, 1994).
Já sabemos que a velhice é, então, uma fase do desenvolvimento que possui características próprias
em termos de funcionalidade, força física, aparência, produtividade e desempenho de papéis sociais
se comparados com adultos não idosos (NERI, 2006). Definir o que é a velhice na atualidade, no
entanto, não é tarefa fácil, pois a cada geração esse conceito se atualiza com novas realidades
culturais e sociais (MASCARO, 1997 apud JUNIOR, 2007).
Em termos gerais, a velhice pode ser encarada como um processo onde ocorrem mudanças
morfológicas, bioquímicas, funcionais e adaptativas, mas que vem acompanhada, também de
mudanças psicológicas. As mudanças físicas e adaptativas nessa fase tendem a aumentar o risco de
morte, devido a promoverem uma condição em que o indivíduo está mais suscetível a doenças e por
consequência mais suscetível a fatalidades (FERREIRA et al., 2012).
No âmbito psicológico, por outro lado, o que se pode afirmar com veemência é que não existe um
padrão para a velhice, ela é mútua, dicotômica, heterogênea e única para cada indivíduo. Ao passo
que podemos encontrar indivíduos de 80 anos com vitalidade e funcionalidade suficientes para
conseguir ainda manterem-se saudáveis, é possível se deparar com indivíduos de 60 anos já
desgastados pela vida em decorrência de variadas contingências (JUNIOR, 2007). Isso deve ser
levado em conta quando analisadas as diferentes estratégias possíveis para trabalhar com promoção
da saúde.
A análise sobre a velhice deve ser feita livre de estereótipos impostos socialmente, levando em
conta as experiências pessoais. "A compreensão do fenômeno do envelhecimento depende de um
olhar sobre o todo dessa questão [...] não somente como um fator biológico, como também cultural"
(JUNIOR, 2007, p. 5). É possível concluir através de todas essas afirmações que a velhice pode ser
uma experiência tão ou mais positiva quanto a juventude a depender da história de vida do sujeito.
Por fim, e como já citado anteriormente, a velhice é uma fase do desenvolvimento que possui
determinadas peculiaridades e que historicamente pôde ser entendida de diversas formas. Na raça
humana ela carrega em si atributos como o da sabedoria, maturidade e experiência, o que explica
sua existência apesar da incapacidade reprodutiva inerente à mesma.
Ocorrem mudanças físicas e diferenças no status social que moldam as experiências e a vivência
nesta fase da vida. As diferenças relacionadas ao gênero, estilo de vida, condições de saúde e
história pessoal também são grandes norteadores que acabam por definir o modo como a velhice
ocorre para os sujeitos na terceira idade.
Com todos esses fatores há que se observar também que vivemos num país que envelhece
gradualmente e impulsiona poucas ações no sentido de resguardar um bom envelhecimento aos seus
cidadãos. Mas, que apesar de tudo tem aumentado sua longevidade e se deparado com novos
olhares para a velhice.
3. ENVELHECIMENTO ATIVO
Em termos de longevidade, uma das formas de garantir que o indivíduo não só viva mais, mas
experimente essa vivência com qualidade, é o envelhecimento ativo (RIBEIRO, 2015). O que se
evidencia tanto na sociedade quanto no meio acadêmico, é uma já existente, tentativa de promover a
funcionalidade do sujeito idoso (RIBEIRO, 2015). Aqui serão utilizados termos diferentes para
designar o envelhecimento ativo (envelhecimento bem-sucedido, envelhecimento saudável, etc.),
todos encontrados em produções de autores diversos.
Ainda segundo Ribeiro (2015), existe uma divisão entre os estudiosos, onde parte defende que o
envelhecimento é sim uma fase de perdas, e outra que garante que este período da vida também
pode ser marcado por uma postura ativa e funcional. Foi no século XX que este conceito de que o
idoso pode manter-se ativo e, assim, beneficiar a sociedade como um todo, foi defendido pela
primeira vez (CAMARANO & PASINATO, 2004).
O respeito pelo idoso se dá a partir do momento em que é reconhecido, também, seu potencial e
suas qualidades, incluindo habilidades que podem ser igualmente positivas e, nesse sentido, olhar
para este indivíduo com um olhar não limitante. Os avanços nos estudos em psicologia a respeito da
velhice denotam uma busca pelo envelhecimento ativo ou bem-sucedido, que é um produto da
experiência de vida e personalidade do idoso (ARAÚJO e CARVALHO, 2005).
A OMS (2005) cita os pilares do envelhecimento ativo como sendo autonomia, independência e
qualidade de vida. Assim, a segurança deve ser mencionada como um dos fatores de promoção da
qualidade de vida do idoso, no que tange o seu local de residência, a comunidade onde habita e as
condições ambientais em torno de onde mora (RIBEIRO e PAÚL, 2011 apud AZEVEDO, 2015).
Ou seja, ao analisar todas as esferas que podem influenciar a ocorrência ou não do bem-estar do
idoso e da sua funcionalidade ao longo da velhice, pode-se concluir que toda comunidade onde o
indivíduo está inserido é responsável pela promoção de um envelhecimento ativo. O objetivo
principal é aumentar a expectativa de vida saudável nesta parcela da população (FERREIRA, 2009).
Outro fator que influencia no processo de envelhecimento, como já dito no capítulo anterior, é o
gênero do indivíduo em questão. Por exemplo, ser mulher em algumas sociedades é determinante
para uma qualidade de vida inferior, pois ser pertencente ao gênero feminino implica num status
social mais baixo e por consequência num acesso precário a educação e saúde. Estes fatores acabam
por trazer resultados na velhice e no bem estar das mulheres idosas (AZEVEDO, 2015).
O termo “envelhecimento ativo” foi adotado pela Organização Mundial da Saúde no final
dos anos 90. Procura transmitir uma mensagem mais abrangente do que “envelhecimento
saudável”, e reconhecer, além dos cuidados com a saúde, outros fatores que afetam o modo
como os indivíduos e as populações envelhecem (Kalache e Kickbusch, 1997, p. 4-5).
Ao tratar do envelhecimento ativo leva-se em conta os princípios dos direitos humanos relacionados
aos idosos, que abrange as noções de independência, dignidade, participação, auto-realização e
assistência, todos estabelecidos pela Organização das Nações Unidas. O que permite concluir que as
estratégias de atuação para o bem-estar da população idosa, deixam de ser focadas nas necessidades,
considerando-os como indivíduos passivos, e passa a ter um enfoque nos direitos, colocando a
pessoa em idade avançada numa posição de igualdade em relação aos outros indivíduos (OMS,
2005).
A World Health Organization (WHO), reafirma o conceito de envelhecimento ativo como algo
amplo e diverso, ao deixar claro que este deve incluir além da saúde física, o estado psicológico, o
nível de independência, as relações sociais, as crenças e a relação do indivíduo com o meio
circundante, de forma complexa (AZEVEDO, 2015). Ribeiro e Paúl (2011) trazem, também, assim
como os demais autores já mencionados, a importância da participação social na estimulação do
bem-estar na velhice.
A OMS (2005) diz que muitas doenças não-transmissíveis típicas da terceira idade podem ser
adiadas ou até evitadas. Não prevenir essas doenças acaba por gerar custos humanos e sociais e
sugar recursos que poderiam ser destinados a outros grupos populacionais. Muitas vezes o que
influencia no aparecimento da doença crônica tem início ainda na infância e sofre forte influência
das condições sócio-econômicas e do histórico de vida.
Até mesmo o nível de escolaridade surge nos estudos como um fator determinante na intensidade
do declínio cognitivo e/ou surgimento de comorbidades associadas à isto (FOSS, VALE e
SPECIALI, 2005). O que denota a influência das atitudes durante o curso da vida sobre o bem-estar
na idade madura, e faz refletir a respeito da importância dos investimentos precoces nesta área.
É com base nestes fatores que surgem ideais para políticas de promoção em prol de um
envelhecimento ativo no âmbito individual e populacional. A OMS (2005) lista possíveis
consequências benéficas do investimento nas políticas em prol do bem-estar do idoso. Dentre elas,
menos mortes prematuras em estágios de vida ainda produtivos, menos deficiências associadas a
doenças crônicas na velhice, mais pessoas desfrutando de uma maior qualidade de vida à medida
que envelhecem, mais indivíduos participando ativamente da vida em sociedade em atividades,
remuneradas ou não, mesmo durante a terceira idade, e diminuição dos gastos públicos com saúde.
Ferreira et.al (2012), citam, também, a importância das atividades físicas para o envelhecimento
ativo em sua pesquisa, sendo essa descrição de atividade física baseada não somente em exercícios
físicos propriamente ditos, mas também afazeres domésticos que representam uma condição de não
sedentarismo.
Os autores dizem que estas atividades ligadas tanto a algo desportivo quanto ao trabalho, são,
segundo os resultados da pesquisa capazes de retardar ou até reverter processos patológicos, o que
traz como benefício o aumento da autoestima e da sociabilidade, dentre outros benefícios ligados ao
envelhecimento ativo (FERREIRA et al., 2012).
É sabido que existe a necessidade dos cuidados consigo mesmo (individuais), para que esse bem-
estar e funcionalidade sejam amplamente atingidos. Mas, ao conseguir impulsionar um grupo
populacional a manter-se ativo mesmo em idade avançada, cria-se um grupo de pessoas que
permanece produtivo economicamente por ser saudável o suficiente para prosseguir atuando em
atividades remuneradas, gerando mais renda e impulsionando a força de trabalho (OMS, 2005).
É importante salientar que idade avançada não é necessariamente sinônimo de dependência como
julgam os estereótipos. Muitas vezes a noção equivocada de que pessoas idosas são um fardo,
implica em discriminação. Este tipo de pensamento errôneo faz, também, com que surja uma crença
de que os problemas relacionados aos idosos sugam a maior parte dos recursos governamentais e
que não há nenhuma contribuição advinda dessa parcela da população (OMS, 2015).
Estes fatores estão ligados ao emocional, ao físico, ao cognitivo, ao econômico e ao social e acabam
por impactar os indivíduos mais fortemente a medida que a idade avança. Esses dados fazem refletir
a respeito dos pontos a serem tratados ao pensar a promoção da qualidade de vida do idoso
(FARIAS e SANTOS, 2012).
Fato é que apesar de as populações em geral estarem vivendo mais, a qualidade de vida nesses anos
a mais ainda não foi evidenciada claramente. Por conta disso e de todos os demais fatores já
listados, os gastos para que haja promoção da saúde a longo prazo e com isso bem-estar na velhice
não devem ser vistos como custos e sim encarados como investimento (OMS, 2015).
Outro termo para designar envelhecimento ativo, utilizado previamente, o de 'velhice bem-
sucedida', foi introduzido pela primeira vez em gerontologia na década de 60 nos Estados Unidos.
Trazia seu conceito relacionado a atividades satisfatórias geradoras de bem-estar e
consequentemente geradoras de melhor saúde. Este conceito sofreu alterações e aprimoramentos ao
longo do tempo sendo acrescentado aos seus componentes fatores culturais (RIBEIRO et al., 2009).
Há que se levar em consideração que o envelhecimento saudável não é um processo linear, ele pode
variar positivamente ou negativamente a depender das escolhas de vida de cada indivíduo, mas
pode ser impulsionado pelo acesso a cuidados de saúde acessíveis e a um ambiente de apoio que
propulsione essa capacidade de envelhecer saudavelmente (OMS, 2015).
O envelhecimento ativo pode ser, então, considerado produto de uma junção de fatores que se
interligam e influenciam a experiência de cada um de forma distinta. Como dito neste capítulo este
conceito possui uma definição biopsicossocial, onde são consideradas questões de saúde no sentido
mais amplo. Esse ideal promove uma maior longevidade vivida com saúde, o que acaba por reduzir
custos nessa área, tendo em vista a diminuição do risco de doenças e aumento da funcionalidade
resultante desse novo estilo de vida.
Qualquer idoso pode ser um forte candidato a viver ativamente, mesmo aqueles com limitações
físicas, pois para além do corpóreo a ideia de envelhecimento saudável se amplia no âmbito
psicológico e social. Assim, os idosos que são ativos socialmente e se engajam em atividades que
estimulam este fator têm possibilidade de desfrutar de uma velhice sadia mesmo com limitações
físicas, assim como aqueles que não sofrem de nenhuma patologia.
Temos a família, o meio circundante, as condições de moradia e meio ambiente, as relações inter-
geracionais, o histórico de vida e demais fatores como grandes aliados no intuito de atingir uma
velhice saudável. Deste modo, ela pode ser entendida com um olhar abrangente para a situação de
vida do idoso e inclui como benefícios o baixo risco de doença, a saúde cognitiva e o engajamento
ativo com a vida.
É com base nessa noção do espaço do idoso na sociedade, e em como ele está atuante na
modernidade, adquirindo seu lugar social, que a Neuropsicologia vai basear seus estudos para
pensar a ideia de promoção da saúde na velhice. E pensar, também, de que forma o estímulo da
autonomia nessa população interfere nas questões cognitivas.
4. ENVELHECIMENTO COGNITIVO/CEREBRAL
No âmbito das perdas, declínios em todos os campos sensoriais são observados durante o processo
de envelhecimento. Ocorrem comprometimentos graduais no campo auditivo, visual, olfativo e
gustativo. A força muscular e de coordenação são diminuídas, e aos 60 anos cerca de 10 a 15% da
força muscular se perde. O tempo de reação a estímulos também aumenta, e os reflexos tornam-se
mais lentos cerca de 20% (PAPALIA, 2006).
Muitas vezes são encontrados, nos estudos, padrões de funcionamento em idosos normais que
chegam a assemelhar-se com processos iniciais de demência. Principalmente no que tange à
memória. Mesmo em idosos saudáveis é possível notar alterações a nível discursivo no que tange à
narrativa e omissão de detalhes a respeito de determinada estória contada. Até mesmo
anatomicamente o limite entre normal e patológico muitas vezes se confunde (DAMASCENO,
1999).
Goldberg (2006) reconhece que o cérebro humano é sim afetado pela velhice, ainda que esta seja
bem-sucedida e saudável, e admite que este é um processo natural, sendo algumas dessas mudanças
processos globais para todos os indivíduos, como é o caso da diminuição do volume de massa
cinzenta em cerca de 2% a cada década vivida, o aumento dos ventrículos e a proeminência dos
sulcos. As ligações entre neurônios e a densidade das sinapses se tornam esparsas e o fluxo
sanguíneo que corre para o cérebro, bem como o oxigênio que circula nele, se tornam mais
escassos, dentre outras partes do cérebro que também são afetadas.
O impacto do envelhecimento tem efeito, até mesmo, sobre as reações à mudanças de temperatura,
sensações táteis e de dor, audição, visão e equilíbrio. Há, também, alterações relacionadas à
frequência cardíaca e fluxo sanguíneo, mudanças na capacidade de funcionamento de alguns
órgãos, e alterações na imunoproteção (CANCELA, 2007). Além disso, no geral, as queixas mais
frequentes dos idosos ainda são relacionadas à memória (SANTOS et al., 2009).
A condição de isolamento social na velhice é outra questão a ser debatida, devido à sua capacidade
de, inclusive, ser causa de diversos transtornos cognitivos, incluindo a depressão. A partir do
momento em que surgem transtornos depressivos em idosos, cerca de 50% dos acometidos por essa
enfermidade evoluem posteriormente para processos demenciais. Essa comorbidade compromete a
capacidade funcional do idoso e muitas vezes o quadro de depressão provoca alterações cognitivas
temporárias, que dificultam o diagnóstico diferencial entre depressão e demência (STELLA et al.,
2002). Fazendo um paralelo com o capítulo anterior, podemos concluir a importância da promoção
do envelhecimento ativo devido, também, a estes fatores.
Todo este processo acontece ainda que o envelhecimento do indivíduo seja normal e junto com as
mudanças cerebrais há sim um declínio cognitivo. Porém, Goldberg (2006) deixa claro, ainda, que
focar-se apenas no lado ruim do envelhecimento restringe o olhar sobre essa fase da vida, pois
segundo o autor, já foi observado que apesar de todo esse prejuízo inerente da velhice, os indivíduos
senis apresentam um bom desempenho em atividades relacionadas ao dia a dia, ao trabalho e à vida
real. Muitas vezes incluindo até atividades profissionais e executivas de alto nível.
Na maturidade, várias esferas da cognição podem sofrer declínios ou não, sofrendo influência de
processos patológicos ou não (AMODEO, NETO e FONSECA, 2010). Porém, alguns domínios
cognitivos podem ser mantidos ou até aprimorados em capacidade, como é o caso da memória
implícita e da semântica (DRAG et al., 2010; GLINSKY & GLINSKY, 2008; PARK & REUTER –
LORENZ, 2009).
As tarefas cognitivas de criação de novas imagens mentais parecem diminuir em capacidade com o
tempo, no entanto, se pensarmos na solução de problemas, o cérebro envelhecido parece demonstrar
maior habilidade. Essa solução de problemas constitui-se num reconhecimento de padrões na
velhice, muito mais que a simples descoberta de uma resposta, sendo este reconhecimento de
padrões um mecanismo poderoso para a cognição bem-sucedida (GOLDBERG, 2006).
A respeito do potencial de funcionalidade dos idosos, Goldberg (2006) defende que não só é
possível manter um perfil ativo e funcional durante todas as fases da vida, como ainda é possível
que hajam indivíduos brilhantes e que atingem seu ponto máximo em uma idade já avançada, e cita
como alguns dos exemplos o escritor alemão Goethe (1749-1832), que publicou a primeira parte de
sua grande obra Fausto aos 59 anos de idade, e o visionário arquitetônico catalão Antoni Gaudí i
Cornet (1852-1926), que construiu a catedral da Sagrada Família em Barcelona, projeto que
culminou apenas no final de sua vida, dentre outros grandes exemplos.
A misteriosa habilidade cognitiva, que tem a estranha capacidade de resistir aos efeitos
indesejáveis do envelhecimento, se reflete em dois outros traços muito estimados,
geralmente associados à idade madura: a competência e a sabedoria. Aqui parece existir um
paradoxo [...] esse paradoxo se torna uma questão neurobiológica a ser resolvida pelo
neurocientista (GOLDBERG, 2006, p. 64).
De acordo com Goldberg (2006), é um erro pensar que o envelhecimento do cérebro é um processo
negativo unicamente, segundo ele, a mensagem central de seu livro é que o envelhecimento cerebral
também traz grandes trunfos. Estamos num momento em que se faz necessária a mudança de olhar
para este processo de senescência como algo que carrega apenas perdas. Ao passo, que ao
envelhecermos perdemos capacidades ligadas à memória e concentração, ainda assim obtemos
ganhos no que tange à sabedoria, habilidade e competência. A Neuropsicologia enquanto área de
conhecimento ligada ao envelhecimento aponta que esta última fase de desenvolvimento é uma das
mais emblemáticas justamente por contrastar perdas cognitivas e ao mesmo tempo ganhos ligados à
sabedoria (GOLDBERG, 2006).
Houve ainda um consenso durante muitos anos de que a perda neuronal decorrente da velhice não
era passível de renovação (STUART-HAMILTON, 2002). No entanto, devido à neuroplasticidade,
que pode ser estimulada pelo histórico de vida dos idosos, já ficou comprovado que mesmo nesta
fase da vida é possível haver renovação (GOLDBERG, 2006).
Goldberg (2006) fala, ainda, de alguns detalhes a respeito do armazenamento de dados no cérebro e
quais desses dados resistem mais fortemente a possíveis danos cerebrais, na velhice ou em qualquer
ocasião em que o indivíduo se depare com uma falha de funcionamento cerebral. Ele diz que quanto
mais genérico for um padrão de memória mais resistente ele será aos efeitos do dano cerebral. Por
exemplo, um idoso com demência irá lembrar-se mais facilmente de um nome genérico para um
animal (ex: “este é um cachorro”), do que do nome de um cachorro específico (ex: “este é o totó”).
O autor explica, ainda, que o cérebro ao longo do desenvolvimento, passa por um processo de
estimulação alternada, onde o Hemisfério direito fica responsável pelos novos aprendizados,
enquanto que o Hemisfério esquerdo é responsável pelo conhecimento já adquirido.
Goldberg (2006) conclui afirmando que este processo de transferência de ativação entre os
hemisférios é um processo que dura a vida inteira e permanece ao longo da velhice, no que ele
chama de “Mudança da direita para a esquerda do centro de gravidade cognitiva” (GOLDBERG,
2006, p. 255). Desta forma, o hemisfério direito do cérebro é o dominante na juventude, enquanto
que na velhice o hemisfério esquerdo ganha lugar.
Finalmente, o processo de envelhecimento cognitivo e cerebral possui uma dinâmica complexa que
envolve diversos fatores intrincados, incluindo mudanças morfológicas cerebrais e mudanças nas
funções cognitivas. Essas mudanças que são gerais para todos, não são únicas, pois mesmo na
velhice é possível que hajam ganhos em diversos âmbitos. Além disso, as perdas e ganhos não são
vividos da mesma forma e na mesma intensidade. Diversos fatores influem na vivência e no
enfrentamento das limitações e mudanças fisiológicas decorrentes da idade avançada. Para cada
indivíduo idoso temos uma situação de vida e de funcionalidade, diferente.
O envelhecimento pode ser uma experiência carregada de eventos positivos em maior ou menor
intensidade. Fatores culturais e da história de vida vão moldar a existência de uma atitude saudável
em relação à vida ou uma atitude oposta à essa. A saúde cognitiva é um dos grandes aliados no
bem-estar e longevidade. Desta forma, a Neuropsicologia pode ajudar na promoção do bem-estar na
velhice, através de suas contribuições para o bom funcionamento cognitivo.
Tendo em vista tudo que já foi tratado a respeito do envelhecimento e dos fatores que estimulam um
processo saudável, de forma a evitar o adoecimento, afastar fatores de risco através da mudança no
estilo de vida, afastar a possibilidade de incapacidade e manter o alto nível de funcionamento físico
e mental, e, após abordar aspectos do envelhecimento cognitivo, podemos, na sequencia, pensar de
que forma a Neuropsicologia pode trazer contribuições para a promoção da saúde cognitiva do
idoso.
Primeiramente a experiência vem dizer que quanto maiores os recursos individuais pré lesões e/ou
possíveis compromentimentos cerebrais, melhor o prognóstico (HAASE e LACERDA, 2004). O
que significa dizer que a importância da postura saudável e estimulante em todo o curso da vida dão
ao indivíduo a capacidade de resistir à danos cerebrais e possivelmente manter sua funcionalidade
mesmo em meio às limitações.
A unidade funcional do sistema nervoso não fica, então, centrada apenas no neurônio, mas sim nas
conexões sinápticas entre unidades neuronais, e que são passíveis de alteração a depender da
experiência individual, do nível de atividade e do tipo e intensidade da estimulação recebida
(KANDEL, 1998 apud HAASE e LACERDA, 2004).
Logo, através desses dados é possível pensar na possibilidade de fornecer aos indivíduos
estimulações precoces mesmo antes da velhice, para que ao chegar nessa fase da vida os mesmos
tenham maior capacidade de enfrentamento das questões que possam advir da condição de idoso.
Em 2004, estudiosos em São Paulo montaram o que denominaram de “Oficina de Memória”. Algo
que não era oferecido para idosos com problemas de saúde cognitiva, e sim, para idosos sem
nenhum déficit. A oficina era composta de atividades, especialmente, leitura, para o estímulo e/ou
manutenção das capacidades mnemônicas dos participantes. Tratava-se de um projeto em promoção
da saúde que acabou por otimizar e desenvolver suas reservas cognitivas e minimizar possíveis
queixas referentes à memória (ALMEIDA, BEGER e WATANABE, 2007).
Ainda segundo Almeida, Beger e Watanabe (2007), as perdas cognitivas estão ligadas à pouca
estimulação e conduta pouco desafiadora perante a vida. O cérebro funciona, então, como
funcionaria um músculo qualquer do nosso corpo. Sem estímulo ele torna-se emfraquecido. Caso
seja estimulado ele ganha força e resistência. Assim, a força das conexões sinápticas é
potencializada a depender da estimulação a que o indivíduo foi exposto (HAASE e LACERDA,
2004).
A história de vida, neste caso, permeia o entendimento que o idoso tem de um envelhecimento bem-
sucedido. Pois, a depender do apoio que possui, do nível de esclarecimento e da estimulação que
recebeu, irá ter maior possibilidade de enfrentamento caso surjam as limitações decorrentes da
idade, e, consequentemente este idoso terá maior abertura para buscar soluções saudáveis para
melhoria da própria saúde.
Ainda em consonância com o capítulo de envelhecimento ativo, a idéia de reserva cognitiva inclui a
possibilidade de que ela possa ser otimizada e melhorada por meio de treinamento. O que pressupõe
que pessoas que estimulam seus cérebros apresentam melhor desempenho em testes de memória,
pensam com mais agilidade e captam melhor conceitos abstratos (ALMEIDA, BEGER e
WATANABE, 2007). O que denota que a reserva cognitiva sofre, de fato, influência dos hábitos de
vida de cada indivíduo.
Segundo Goldberg (2006), “Nossa vida mental está sempre em fluxo, e a palavra em vigor é
aprendizado” (GOLDBERG, 2006, p. 232). O autor afirma ainda que há algum tempo atrás era
crença geral a ideia de que o ser humano nasce com um conjunto fixo de células nervosas no
cérebro (neurônios), que se perdem ao longo do envelhecimento sem possibilidade de surgimento
de novos neurônios, até que os próprios neurocientistas reconheceram que essa linha de pensamento
separa o cérebro do restante do corpo, afinal, os outros órgãos são dotados de capacidade de
produção de novas células a qualquer tempo (GOLDBERG, 2006).
Goldberg (2006) conclui então que a antiga premissa da não formação de novos neurônios é falsa.
Segundo ele, o cérebro é capaz de se restaurar e rejuvenescer, mesmo na velhice. Ele utiliza ainda
um provérbio que serve como metáfora para o cérebro “Use ou Perca”, significando que existem
cada vez mais evidências de que o nível de desenvolvimento de novos neurônios está diretamente
ligado às atividades cognitivas da mesma forma que, assim como dito anteriormente, um músculo
qualquer é estimulado por atividades físicas.
Assim, podemos concluir que para os idosos isso também se aplica, e os anos de estudo entram na
matemática da funcionalidade na velhice. Os impactos do envelhecimento para um idoso com
ensino superior completo (o que equivale a 16 anos de estudo em média) pode ser muito mais
ameno do que para um idoso analfabeto. Este primeiro indivíduo foi continuamente estimulado ao
longo da vida devido aos estudos que se prolongaram por muito tempo.
Prova disso é que durante muitos anos o gênero feminino e a baixa escolaridade tiveram forte
relação com os processos de demência nesse grupo (FOSS, VALE e SPECIALI, 2005). Na
pesquisa encabeçada por Foss, Vale e Speciali (2005), as afirmações referentes à importância do
nível de escolaridade para o desenvolvimento cognitivo se comprovaram através dos resultados que
mostravam que o grupo com 15 anos de escolaridade demonstrava desempenho superior quando
comparado aos demais grupos.
Na mesma pesquisa os autores puderam concluir que a baixa escolaridade influencia, inclusive, o
diagnóstico de demência em indivíduos normais. Os pesquisadores concluem que idosos
analfabetos são comumente classificados de forma errônea como portadores de danos cerebrais
(FOSS, VALE e SPECIALI, 2005).
Goldberg (2006) diz que “A extensão e a qualidade da vida mental de alguém determinarão a
qualidade de seus estágios finais” (GOLDBERG, 2006, p. 343). Ele complementa dizendo que uma
vida mental rica em experiência e que é constantemente confrontada com estímulos mentais
diversos oferece ao sujeito como recompensa um escopo vasto de ferramentas cognitivas que
funcionariam como uma espécie de arsenal para ser usado em favor próprio.
[...] Uma vida mental vigorosa não deveria descansar nunca. Ela pode e deve continuar na
velhice. Quanto mais durar, por mais tempo continuará a conceder suas recompensas, ao
estimular vários processos de crescimento no cérebro, protegendo-o assim contra os efeitos
da deterioração (GOLDBERG, 2006, p. 346).
6. CONCLUSÃO
Goldberg (2006), em seu livro intitulado O Paradoxo da Sabedoria, informa ao leitor logo a
princípio que seu objetivo não é falar apenas das perdas dessa fase da vida, mas inovar trazendo
algo que poucos refletem sobre: os ganhos na velhice e a possibilidade da existência de um
envelhecimento ativo e bem-sucedido. Ele afirma em seu livro que já existem inúmeras produções
que tratam das perdas na velhice, e reforça que sua produção literária não se dedica a tratar disto
quando aponta um equilíbrio entre perdas e ganhos nesta fase da vida. Em confluência com as
ideias do autor, é justamente isto que se busca aqui ao produzir novo material acadêmico respeito
do envelhecimento.
Estamos caminhando para um crescimento cada vez mais expressivo da população de idosos. As
pesquisas são bem claras em relação a isso. E a geração que, atualmente, tem chegado à velhice já é
bastante numerosa. Por conta disso, falar do envelhecimento torna-se fundamental no meio
acadêmico. Junto com o envelhecimento surgem as doenças crônicas e os declínios cognitivos, que
têm grande espaço na literatura como foco de debate.
Mas, pensar numa velhice adoecida sem atrelar a este pensamento formas de promoção da saúde
antes dos prejuízos ocorrerem, traz perdas em todos os sentidos, perdas humanas e materiais. Os
custos em saúde pública destinados a uma população massivamente adoecida são altos, sem dúvida.
Mas, para além disso, o sofrimento e o encurtamento da longevidade entram no leque de
consequências nocivas da falta de estímulo a uma velhice sadia. O envelhecimento ativo e as
políticas que promovem este ideal de vida surgem como solução para a maioria desses possíveis
problemas futuros.
Obviamente os declínios e as dificuldades vão ocorrer, afinal estamos tratando de indivíduos em sua
5ª, 6ª, 7ª, 8ª ou 9ª década de vida. Logo, não são indivíduos que, em sua maioria, possuem toda a
força física e vitalidade inerente aos jovens. Mas, isso não significa dizer que são indivíduos à beira
da morte e que têm a inutilidade como condição cinequanon.
Esta fase da vida também vem acompanhada de ganhos em diversos aspectos cognitivos e um deles
é a sabedoria. Os idosos têm como uma de suas funções transmitir aos mais jovens todo
conhecimento adquirido ao longo da vida. Conhecimento este que supera, e muito, aquele possuído
pelos jovens. Manter-se ativo e funcional nessa fase é um ganho não só para o próprio indivíduo,
mas também para a sociedade como um todo, que pode se beneficiar de tudo aquilo que os baby
boomers , ou como diz Goldberg (2006), “A geração obstinada”, pode oferecer.
Muito dessa funcionalidade depende de um histórico de vida que seja positivo e que funciona como
matéria-prima dos ganhos na velhice. Assim, devemos olhar para o indivíduo ao longo de todo seu
percurso. A Neuropsicologia enquanto ciência vem contribuir trazendo a noção de reserva
cognitiva, plasticidade cerebral e compensação. Essas ferramentas são fundamentais para serem
utilizadas no quesito promoção da saúde, e então, atingir a meta de obter saúde nesta fase final de
vida.
Olhar para o indivíduo idoso como um produto de tudo que viveu, experimentou e sentiu ao longo
da vida, sua noção de mundo, suas vivências e seu entendimento a respeito de uma velhice bem-
sucedida, é papel de todos aqueles que se proponham a analisar o envelhecimento
aprofundadamente. Pensar nos dois lados da moeda (positivo e negativo), e entender o potencial,
inclusive na esfera neurológica, desta fase do desenvolvimento, de ser também uma fase de ganhos
é uma forma de ampliar o pensamento a respeito do assunto.
Finalmente, toda fase da vida carrega em si suas peculiaridades, com a velhice não seria diferente. E
para citar o autor que mais brilhantemente trata da questão:
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