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Nina Caetano1
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Nina Caetano é performer e pesquisadora, professora do PPGAC-UFOP.
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EVELIN, Marcelo. Programa de Mão. Disponível em http://www.nucleododirceu.com.br/programa-de-
mao/. Acesso em 04/02/2014.
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GREINER, 2009:184.
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Do mesmo modo que entre cultura e natureza, ou ainda entre teoria e prática.
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GREINER, 2009: 183.
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FOSTER (1996) apud GREINER, 2009: 180.
experiências já reconhecidas, causando estranhamento. Para definir estes
novos modos de organização não é suficiente (nem desejável) emaranhar-se na
teia das novas ou antigas nomeações a não ser quando, ao invés de mistificar
ou criar regras estritas de codificação, estas possam ajudar a iluminar
passagens pouco conhecidas alimentando o caráter processual do corpo,
reconhecendo-o como uma rede complexa e entrópica de informações capazes
de aliar múltiplas imagens e conceitos ao mesmo tempo, ou seja: isso ocorre
quando a própria coreografia constrói conexões teóricas e não quando se
submete a elas. Este entendimento de coreografia não se restringe a uma
coleção de passos já organizados previamente, mas a uma organização
neuromuscular que dá visibilidade a um pensamento7.
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GREINER, 2009: 181.
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GREINER, 2009: 184.
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Criação de Marcelo Evelin/Demolition Inc. (Amsterdam/Holanda), para performers de diversas partes do
mundo: Teresina, Ipatinga, Kyoto, São Paulo e Amsterdam.
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Canetti (1995) chama atenção, ainda, para outra questão: “Na multidão, o indivíduo não tem rosto e ganha
coragem para projetar suas frustrações e ressentimentos. O próprio indivíduo tem a sensação de que, na
massa, ele ultrapassa as fronteiras de sua pessoa”. Esse aspecto “fascista” das massas pode ser observado
no recente caso, ocorrido no Rio de Janeiro, do grupo de moradores do Flamengo que espancou e amarrou
a um poste, um suposto assaltante das redondezas, negro e menor de idade.
barreiras que nos separam, de juntar as diferenças num mesmo corpo. Pensar
que todas as diferenças formam uma totalidade.
(...) Aconteceu o que o Canetti descreve: essa necessidade vital que temos de
nos juntar, de unir as distinções. Ali eu vi pessoas de todas causas e cores
unidas (...). Ele fala que buscamos a pretidão, que são os lugares mais escuros
onde a gente se mistura e perde as cores. É aí que a gente vira um corpo junto,
uma potência, esse preto de gente a que ele se refere 11.
Radicado na Europa desde 1986, Marcelo Evelin foi estagiário de Pina Bausch,
em Wuppertal na Alemanha e, atualmente, vive entre Amsterdam-Holanda, onde, com
sua companhia, Demolition Inc., dedica-se à pesquisa da dança/performance,
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Marcelo Evelin, em entrevista concedida a Luiz Felipe Reis, está se referindo, aqui, a um trecho bastante
conhecido da obra do filósofo: “A massa é uma aparição tão enigmática quanto universal que, de repente,
está lá onde antes nada havia. Algumas poucas pessoas podem ter estado reunidas, cinco ou dez ou doze,
não mais. Nada foi anunciado, nada esperado. De repente, tudo ficou preto de gente” (CANETTI apud
EVELIN). Disponível em http://oglobo.globo.com/cultura/diferencas-que-se-desfazem-no-encontro-dos-
corpos-9868100. Acesso em 04/02/2014.
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MAKEREEL, Catherine. Comentário disponível em:
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=709266742438255&set=a.685446031486993.1073741828.68
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GREINER, 2005: 81.
colaborando com artistas de diversas linguagens; e sua cidade natal, Teresina, no Piauí,
no qual, desde 2006, coordena o Núcleo do Dirceu.
Criado por Evelin durante sua gestão como diretor do Teatro Municipal João
Paulo II, esse núcleo de criação funciona, hoje, como uma plataforma independente
voltada à pesquisa e ao desenvolvimento das Artes Performáticas Contemporâneas,
trabalhando, muitas vezes, em parceria com a companhia holandesa. Fruto desse
intercâmbio, Matadouro (2010) é a terceira parte da trilogia iniciada com Sertão (2003) e
seguida por BULL DANCING (2006). Para cada uma das obras, Marcelo Evelin
trabalhou com uma parte do romance Sertões, de Euclides da Cunha: em Sertão, a terra;
em BULL DANCING, o homem. E em Matadouro, a luta.
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EVELIN, Marcelo. Matadouro: final cut.
Disponível em: http://www.nucleododirceu.com.br/matadouro-final-cut/. Acesso em 04/02/2014.
palavra, e também a improvisação do ator para superar uma falha de memória
ou uma impossibilidade de falar15.
Mono propõe ao espectador três espaços distintos e isolados, ocupado por três
homens engajados em uma ação contínua, que se mantêm como suspensão ou
insistência no decorrer de duas horas. O público pode entrar e sair a qualquer
hora, e pode escolher a sequência de como e por quanto tempo ver cada ação.
A obra propõe assim, uma reorganização do lugar e do olhar do espectador,
dando a ele a possibilidade de um entendimento próprio.
O que existe em comum entre esses três artistas instalados é a ausência de
música e a exposição do corpo nu. Corpo simplesmente despido de sua
aparência social, despojado de qualquer noção estética e de qualquer
possibilidade de eroticismo. Três corpos dispensados, demitidos da função de
“fazer e mostrar” comumente aplicado na dança, para se fazer presente como
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AGAMBEN, 2008: 13-14.
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-“Corpo alheio, corpo cera, corpo sem corpo, corpo matável, corpo estranho, corpo suicida, corpo pacote,
corpo dormente, corpo sem ar, corpo murcho”;
-“Corpos entre significação e sentido”;
-“Corpos que lutam em suas lutas silenciosas, veladas, lutas que escapam ao controle ou ao querer, lutas
que são travadas no, com e pelo corpo”;
-“Corpo que não resiste mais, corpo sem olho, cabeça, mão... (EVELIN apud ALBUQUERQUE, 2010:
29).
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EVELIN, Marcelo. Mono Cancelado. Disponível em: http://www.nucleododirceu.com.br/mono-
cancelado/. Acesso em 04/02/2014.
ação de “ser e estar”. Três corpos sem identidade fixa, sem classificação ou
referência, apenas como materialidade e desejo de “presentificação” nessa
atemporalidade oscilante. Daí a opção quase que inevitável de mostrá-los
nus18.
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EVELIN, Marcelo. Mono Cancelado. Disponível em: http://www.nucleododirceu.com.br/mono-
cancelado/. Acesso em 04/02/2014.
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Disponível em http://www.nucleododirceu.com.br/1000-diferentes-casas/ . Acesso em: 04/02/2014.
Referências
AGAMBEN, Giorgio. Notas sobre o gesto. In: Revista ArteFilosofia. Ouro Preto:
Instituto de Filosofia, Artes e Cultura/Universidade Federal de Ouro Preto, n.4,
(jan.2008).
ALBUQUERQUE, Iara Cerqueira Linhares. Estratégias coreográficas no processo
artístico de Marcelo Evelin. Dissertação (Mestrado em Dança). Escola de Dança da
Universidade Federal da Bahia, 2010.
CANETTI, Elias. Massa e Poder. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
GREINER, Christine. O corpo e suas paisagens de risco: dança/performance no Brasil.
In: Revista ArteFilosofia. Ouro Preto: Instituto de Filosofia, Artes e
Cultura/Universidade Federal de Ouro Preto, n.7, (out.2009).
_________________. O Corpo: pistas para estudos indisciplinares. São Paulo:
Annablume, 2005.
KATZ, Helena. Um, Dois, Três: a dança é o pensamento do corpo. Belo Horizonte: FID
Editorial, 2010.
Sites Consultados
www.nucleododirceu.com.br
www.oglobo.globo.com
https://www.facebook.com/MostraInternacionaldeTeatroSP?fref=ts