Você está na página 1de 11

Princípio Variacional de Ekeland

Neste trabalho, nosso principal objetivo é apresentar um resultado clássico


conhecido como o Princípio Variacional de Ekeland (P.V.E). Desde sua publi-
cação em 1972, o P.V.E. vem sendo utilizado em diversas aplicações em diferentes
campos da Análise, Geometria Diferencial, etc.

O P.V.E. e algumas consequencias

Enunciaremos à seguir o Princípio Variacional de Ekeland.

Teorema 1 (P.V.E). Considere (X, d) um espaço métrico completo e Φ : X → IR


um funcional limitado inferiormente e s.c.i.. Sejam  > 0 e x ∈ X tais que

Φ(x) < inf Φ + .
X 2
Então, para cada δ > 0, existe y = y(δ) ∈ X tal que

(i) Φ(y) ≤ Φ(x),

(ii) d(x, y) ≤ δ,

(iii) Φ(y) < Φ(u) + d(u, y) para todo u ∈ X com u 6= y.
δ

O Princípio Variacional de Ekeland garante a existência de um sequência


minimizante de um tipo particular (sequência quase-crítica).

Sobre as hipótese do teorema acima (com δ = 1), suponha que X seja um


espaço de Banach e que Φ seja G-diferenciável. Então, para cada v ∈ X com

1
||v|| = 1 e t > 0,

Φ(y + tv) − Φ(y) = t · DΦ(y) · v + o(t).

Tomando u = y + tv em (ii) concluímos que

Φ(y + tv) > Φ(y) − t.

Deste modo,
tDΦ(y) · v + o(t) ≥ −t

isto é,
DΦ(y) · v ≥ −.

Trocando v por −v obteremos

|DΦ(y) · v| ≤ .

Como isto vale para qualquer v ∈ X com kvk = 1, obtemos kDΦ(y)k ≤ . Assim,
podemos resumir esse resultado no seguinte

Corolário 1. Sejam X um espaço de Banach e Φ : X → IR um funcional limitado


inferiormente e s.c.i.. Se Φ é G-diferenciável então, para cada  > 0, existe
x ∈ X tal que
inf Φ ≤ Φ(x ) ≤ inf Φ + ,
X X

kDΦ(x )k < .

O resultado acima garante a existência de uma sequência (xn ) em X satis-


fazendo
Φ(xn ) → c := inf Φ, n → ∞
X

DΦ(xn ) → 0, n → ∞.

Teorema 2. Sejam X um espaço de Banach e Φ : X → IR um funcional C 1


limitado inferiormente satisfazendo a condição (P.S). Então, existe x ∈ X tal
que
Φ(x) = inf Φ
X

DΦ(x) = 0

2
Demonstração:

Considere uma sequência (xn ) ⊂ X tal que

Φ(xn ) → inf Φ, n → ∞
X

DΦ(xn ) → 0, n → ∞.

Então, a menos de subsequência, xn → x em X. Como Φ ∈ C 1 , temos

Φ(xn ) → Φ(x) (= inf Φ), n → ∞


X

DΦ(xn ) → DΦ(x) (= 0), n → ∞.

Assim, pela unicidade do limite, segue o resultado.

Observe que, quando Φ não é necessariamente suave, a condição (ii) se torna


uma conveniente formulação de solução aproximada. De fato, (ii) apenas expressa
que x é uma solução exata do problema de minimização

min{Φ(y) + d(y, x); y ∈ X}. (P )

Considere o seguinte problema de minimização

min{Φ(x); x ∈ X}. (Pm )

Se não dispomos de ferramentas para resolver o problema (Pm ), surge uma questão
natural: podemos pelo menos provar a existência de soluções aproximadas (note
que se x é solução de (Pm ) então x é solução de (P), -quase-solução). Neste
contexto, o P.V.E. afirma que para cada  > 0, o problema (Pm ) admite uma
-quase-solução.

3

Figura 1: (P.V.E) O cone delimitado por Φ̃(y) = Φ(y) − d(y, x) toca o gráfico
δ
de Φ abaixo de y.

Os itens (i) e (iii) do Teorema 1 admitem uma idéia geométrica bastante


intuitiva ( Figura 1). De fato, se o mínimo de Φ : X → IR é atingido em u ∈ X,
então o gráfico de Φ ficará inteiramente contido no conjunto

{(x, λ) ∈ X × IR; λ ≥ Φ(u)}.

O Princípio Variacional de Ekeland afirma que dado  > 0, existe y ∈ X tal que

Φ(y) < inf Φ + 


X

e
graf Φ ⊂ {(x, λ) ∈ X × IR; λ ≥ Φ(y) − d(y, x)}.

4
0.1 Aplicação

Nesta seção utilizaremos o Princípio Variacional de Ekeland para garantir


existência de solução para o seguinte problema


 −∆u = |u|q−2 u em Ω,
(P)
 u=0 sobre ∂Ω,

onde Ω ⊂ IRN é um domínio limitado e 1 < q < 2∗ .

Denotemos por Φ : H01 (Ω) → IR o funcional energia associado ao problema


(P), dado por

Z
1 1
Φ(u) = kuk2 − |u|q dx,
2 q Ω
1
onde, em particular, Φ ∈ C (H01 (Ω), IR) e
Z Z
0
Φ (u)v = ∇u∇vdx − |u|q−2 uvdx.
Ω Ω

Observe que

1) O funcional Φ é fracamente semicontínua inferiormente.


De fato, seja (un ) ⊂ H01 (Ω) tal que un * u em H01 (Ω). Da imersão compacta
temos que un → u em Lq (Ω). Assim,
Z  Z 
1 2 1 q 1 2 1 q
Φ(u) = kuk − |u| dx ≤ lim inf kun k − |un | dx
2 q Ω 2 q Ω
≤ lim inf Φ(un ).

2) Φ é coercivo.
De fato, isto segue do seguinte fato
Z
1 1
Φ(un ) = kun k2 − |un |q dx
2 q Ω

1 C
≥ kun k2 − kun kq
2 q
 
2 1 C q−2
= kun k − kun k .
2 q

5
Além disso, observe que se Φ é coercivo e fracamente semicontínuo inferior-
mente então Φ é limitado inferiormente.

3) Φ satisfaz a condição (P S)c com c := inf


1
Φ.
H0 (Ω)
Desde que Φ é coercivo e limitado inferiormente, existe uma sequência Palais-
Smale limitada (un ) no ,nível c. Deste modo, existe u ∈ H01 (Ω) tal que

un * u em H01 (Ω),

un → u em Lq (Ω)

Do Teorema de Vainberg, existe (unj ) ⊂ (un ) e h ∈ Lq (Ω) tais que

unj (x) → u(x) q.t.p em Ω

e
|unj (x)| ≤ h(x) q.t.p em Ω

Daí, segue que,

|unj (x)|q−2 unj (x) · (unj (x) − u(x)) → 0 q.t.p em Ω

|unj (x)|q−2 · unj (x)(unj (x) − u(x)) ≤ |h(x)|q q.t.p em Ω.

Do Teorema da Convergência Dominada de Lebesgue


Z
|unj |q−2 unj (unj − u)dx → 0.

e portanto, como (unj ) é limitada e (unj ) é uma sequência (P S)c , temos

Φ0 (unj )(unj − u) = on (1)

isto é,

Z
∇unj ∇(unj − u)dx = on (1).

6
Assim, kunj k2 → kuk2 e

Z
2
kunj − uk = ∇(unj − u)∇(unj − u)dx

Z Z
= ∇unj ∇(unj − u)dx − ∇u∇(unj − u)dx = on (1).
Ω Ω
Isto mostra que Φ satisfaz a condição (P S)c . Segue do Teorema 2 que u é solução
fraca do problema (P).

0.2 Demonstração do P.V.E

Nesta seção faremos a demonstração do Teorema 1. Iniciaremos apresentando


o seguinte lema.

Lema 1. Sejam (X, d) um espaço métrico completo e Fn , n ∈ IN, uma sequência


de subconjuntos fechados (6= ∅) tais que diamFn → 0. Então existe um único
x ∈ X tal que

\
Fn = {x}.
n=1

Demonstração:

Para cada n ∈ IN tome xn ∈ Fn . Mostraremos que (xn ) é uma sequência de


Cauchy em X. Com efeito, dado  > 0, existe n0 ∈ IN tal que diamFn0 < .
Assim, se n, m ≥ n0 , como Fn , Fm ⊂ Fn0 segue-se que xn , xm ∈ Fn0 ,e portanto

d(xn , xm ) ≤ diamFn0 < 

. Logo, (xn ) é uma sequência de Cauchy em X e como (X, d) é completo, existe


x ∈ X tal que xn → x. Como Fn é fechado e contém todos os pontos xn exceto
para um número finito de índices, temos

\
x ∈ Fn , ∀n ∈ IN, portanto x ∈ Fn .
n=1

7

\
Mostraremos agora que x é o único ponto em Fn . De fato, se existisse
n=1
outro ponto y ∈ X tal que

\
y∈ Fn
n=1

então x, y ∈ Fn para todo n ∈ IN, e portanto,

d(x, y) ≤ diamFn , ∀n ∈ IN.

Como diamFn → 0 então d(x, y) = 0, isto é, x = y.

(Demonstração do P.V.E)
1
Para cada x, y ∈ X e δ > 0, faça dδ (x, y) = d(x, y), . Definamos agora a
δ
seguinte relação em X

u ≤ v ⇔ Φ(u) ≤ Φ(v) − dδ (u, v).

Afirmação: ≤ define uma relação de ordem parcial em X.

De fato,

1) Reflexiva: (u ≤ u) (óbvio).

2) Antisimétrica: Se u ≤ v e v ≤ u então u = v.

Com efeito, se u ≤ v e v ≤ u então

Φ(u) ≤ Φ(v) − dδ (u, v) e Φ(v) ≤ Φ(u) − dδ (u, v)

e portanto
Φ(u) + Φ(v) ≤ Φ(u) + Φ(v) − 2dδ (u, v)

0 ≤ −2dδ (u, v).

Logo, dδ (u, v) = 0, isto é, u = v.

8
3) Transitiva: Se u ≤ v e v ≤ w então u ≤ w.

De fato, note que se u ≤ v e v ≤ w, então

Φ(u) ≤ Φ(v) − dδ (u, v) e Φ(v) ≤ Φ(w) − dδ (v, w).

Deste modo
Φ(u) ≤ Φ(w) − (dδ (u, v) + dδ (v, w)),

Φ(u) ≤ Φ(w) − dδ (u, w)

e concluímos então que u ≤ w.

Considere agora a sequência Sn de subconjuntos de X definidas da seguinte


maneira: tome u1 = x e seja

S1 = {u ∈ X; u ≤ u1 }.

Pela definição de ínfimo, segue que existe u2 ∈ S1 tal que


Φ(u2 ) < inf Φ +
S1 22

Definamos
S2 = {u ∈ X; u ≤ u2 }.

Note que se u ∈ S2 , então

Φ(u) ≤ Φ(u2 ) − dδ (u, u2 )

e como u2 ∈ S1 ,

Φ(u2 ) ≤ Φ(u1 ) − dδ (u1 , u2 ).

Assim,

Φ(u) ≤ Φ(u1 ) − (dδ (u, u2 ) + dδ (u1 , u2 ))

9
≤ Φ(u1 ) − dδ (u, u1 )

e u ∈ S1 , isto é, S2 ⊂ S1 . Continuando indutivamente, construímos a sequência


Sn , com
Sn = {u ∈ X; u ≤ un }

com

un+1 ∈ Sn tais que Φ(un+1 ) ≤ inf Φ +
Sn 2n+1
e
S1 ⊃ S2 ⊃ S3 ⊃ . . .

Mostraremos agora que cada Sn é fechado. Com efeito, se (xj ) ⊂ Sn é uma


sequência tal que xj → x ∈ X então

Φ(xj ) ≤ Φ(un ) − dδ (xj , un ).

Tomando o limite inferior e usando o fato de que Φ é s.c.i, segue que

Φ(x) ≤ lim inf Φ(xj ) ≤ lim inf (Φ(un ) − dδ (xj , un )) = Φ(un ) − lim dδ (xj , , un ).
j→∞ j→∞ j→∞

Usando a continuidade da função distância dδ obtemos

Φ(x) ≤ Φ(un ) − dδ (x, un ),

isto é, x ≤ un e x ∈ Sn . Isto mostra que Sn é fechado. Mostraremos agora que


diamSn → 0. Com efeito, se x ∈ Sn então x ≤ un e

Φ(x) ≤ Φ(un ) − dδ (x, un ).

Por outro lado,


 
Φ(un ) ≤ inf Φ + n
≤ Φ(x) + n
Sn−1 2 2
pois x ∈ Sn ⊂ Sn−1 . Assim,

Φ(x) ≤ Φ(x) + − dδ (x, un )
2n
e logo
1
dδ (x, un ) ≤ .
2n

10
Deste modo, se x, y ∈ Sn ,

1 δ
dδ (x, y) ≤ dδ (x, un ) + dδ (un , y) ≤ ⇒ d(x, y) ≤ ,
2n−1 2n−1
ou seja, diamSn → 0. Aplicando o Lema 1 concluímos que existe um único y ∈ X
tal que


\
Sn = {y}.
n=1

Mostraremos agora que y satisfaz as condições (i), (ii) e (iii) do Teorema 1.


Observe que de y ∈ S1 segue que y ≤ u1 = x, isto é

Φ(y) ≤ Φ(x) − dδ (y, x) ≤ Φ(x).

Seja agora u ∈ X com u 6= y. Afirmamos que u  y pois se u ≤ y, então u ≤ un


para todo n ∈ IN, e teríamos u ∈ Sn ∀n ∈ IN. Ou seja,

\
u∈ Sn = {y}.
n=1

Portanto,
u  y e Φ(u) > Φ(y) − dδ (u, y).

Resta-nos mostrar o item (ii).

11

Você também pode gostar