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Dos paRtaniTos CONGRESSO NO POLIGONO DAS SECAS: (Gitmo sender, stague sista) = Cemitérios gerais onde nio s6 esto, os mortos. = Eles so muito mais completos do que todos os outros. = Que no sio s6 depésito da vida que recebem, morta. = Mas cemitérios que produzem fe nem mortos importam. = Eles mesmos transformam a matériacprima que tém. = Trabalham-na em todas as fases, do campo aos armazéns. = Cemitérios autirquicos, se bastando em todas as fases. = Sio cles mesmos que produzem os defuntos que jazem. onde nao ¢ possivel qui 0 que € de todo cemitério: ST Aeon e Doss PaRLAMENTOS = Onde 0 morto nao & 36, 0 homem motto, o defunto. = De mortos muito mais gerais, bichos, plantas, tudo. —Nem mesmo podem ser inspiragio para os artistas, estes cemitérios sem vida, frios, de estatistica = De mortos tio gerais ~ Se muito, podem ser prea tae tema para as artes retéricas, a Py ‘O feito € mesmo consagrar que os celebram porém do Sul, peu darren Tonge da tumba toda. Fasadea haere ~ Isto é, para a retérica Tet Gilead Beton de cimara (cimara politica) Tone ‘ er rs ni = Consagrar tudo um cemitério ese exercita humanizando é tudo © que se pode. estes mortos de cifra. a, 9 2 4 = Nestes cemitéris gerais = Cemisérice gers Se EK eas conde nao se guardam os mortos Ela nio di a0 morto a0 alcance da mio, a0 pé eee s peso. 4 beeita de seu dono. eR onget tome oNde nes See te «em que, a0 aleance lo corpo, Ca = Aqui, ela € 0 vazio aque faz. com que se murche a saca. = Que esvazia mais uma saca logo o Sertio desapropria, ee a is Nao quer defuntos privados - reuated W a iS eo ose ie fe 4: morte aqui, jamais © emprenha ~ Eas reconhece = A morte aqui no indigest, © direito a timulos estanques, mais bem, é morte azia. ‘© que come por den mas socializa seus defuntos ae oe a oa tumba grande. © invélucro qu 13, 6 — Nestes cemitérios gerais = Cemitérios gerais ae a ‘onde nio cabe fazer cercas. wok mon —Nenhum revezo caberia eine © que dentro devera, com aura, ar de banho morno, 258 299 Jodo Cabrat de Melo Nero — Certo bafo que banha os vivos em volta da banheira dentro da qual © morto banha na sta anréola espessa. =A morte aqui é ao ar livre, seca, sem o ressaibo natural noutras mortes e no sabor de Rilke ou de cravo. — Ela no é nunca a presenga trayosa de um defunto, morte escancarada, mistério, sem nada fund, 10 — Nestes cemitérios gerais no hi morte isolada ‘mas a morte por ondas, para certas classes convocadas. — Nunca ela vem para um s6 morto, ‘mas sempre para a classe, a de Setenta-c-sete, mas sempre cada ano ‘6 recrutamento se repete — E grande ou nao, a nova classe, designada pelo ano, segue para a milicia de onde ninguém se viu voltando, 14 — Nestes cemitérios gerais no ha morte pessoal. —Nenhum morto se viu ‘com modelo seu, especial 260 Doss part amentos = Vao todos com a morte padrio, em série fabricada. — Morte que nio se escolhe ¢ aqui é fornecida de graga. — Que acaba sempre por se impor sobre a que ji medrasse. = Vence a que, mais pessoal, alguém jf trouxesse na carne = Mas afinal tem suas vantagens esta morte em série, — Faz defuntos fancionais, préprios a uma terra sem vermes. 3 = Nestes cemitérios gerais ‘0s mortos nfo variam nada. = E como se morrendo nascessem de uma raga. = Todos estes mortos parece gue sio irmios, é 0 mesmo porte — Se no da mesma mie, imios da mesma morte. s ainda: que irmios gémeos, le igual do mesmo ovitio. = Concebidos durante a mesma seca-parto. — Todos filhos da morte-mae, fou mie-morte, que & mais exato. — De qualquer forma, todos, agémeos, € morti-natos. -E do mi de vestir-se a rigor cou mesmo de domingo. 261 Jodo Cabral de Melo Neto — Os mortos daqui vao despidos no s6 da roupa correta mas de todas as outras, = Daquelas poucas que se exigem para se entrar em tal sero, mortalha, para todos, ¢ rede, aos sem caixio, = Por isso é que sobram de fora, sem entrar nos saldes da terra, entre pedras, gravetos no sereno da festa. ra — Nestes cemitérios gerais atris, a0 passar. cligente, , ‘que muitos tém, de ter descoberto ‘0 que s6 eles véem e nao dizem, discretos. — Eis um defunto nada humano, que nem lembra um homem, se 0 foi, eno qual nada mostra as pedras que no lembram nada de bicho ou gente. 15 — Nestes cemitérios gerais (08 mortos no mostram surpresa. — A morte para les foi coisa rotineira. 262 ors parLanetos —Nenhum tem o ar de ter morrido ‘em instantineo ou guilhotina. = Poréim de um sono lento que adorme, nio fulmina. — Em nenhum deles hé as posturas esses que morrem sob protesto. Sheena sem nenhum grito, gesto. — Entre eles, gestos de elogiiéncia rio se véem nunea, quando a morte. = Todos morrem em prosa, ‘como foram, ou dormem, 4 — Cemitérios gerais que nio exibem restos. — Tio sem ossos que até parece que cachorros passaram perto pouquissimos sinais. — Muito menos do que se espera __ Foctn seus proprios mortos. — E como se, como um cachorro, apés roer, cobrissem os oss0s. — Eis porque eles sio para o turista um logro. — Se pensa: no pensei que a morte houvesse desfeito tio poucos. 8 — Cemitérios gerais que os restos nio largam até que os tenham trabalhado com sta parcial matemitica. 263 Joao Cabral de Melo New ~ B terem dividido © resto pelo nada, e entio restado do que festa a pouica coisa que restava. ~ Aqui, toda aritmética dio resultado nada, pois dividir ¢ subteair silo as operagdes empregadas, — E quando alguma coisa € aqui multiplicada sera sempre para clevar © resto 3 poténcia do nada. 12 — Cemitérios gerais que dos restos no cuidam nem fazem prorrogar avi ainda nos mortos, porventura, = E cujos restos sio de defuntos defuncos, por falta de folhas, formigas, para prolongar seu cireuito, — Nem conhecem a fase, prima, da podridio, em que os defuntos se projetam, quando nada, em exalagio, — Sé restos minerais, que aio toleram restos = Nei mesmo um pouco que se possa encomendar a0 céu ou ao inferno, 264 ors paetanenros — Eles, todos os restos da mesma forma tratam. = Talvez porque os mortos que tém pio tenham tal residuo, a alma, —Talvez porque esta tem consisténcia mais rala. —E seja no ar facil sorvida como uma gota em outra de Agua. — No hi € porque usar, aqui, a imagem da Agua. — Melhor dizer: como uma gota dle nada em outra de nada Festa NA Casa-GRANDE rims deptsd;stgue nord) 1 — O cassaco de engenho, ‘0 cassaco de — O cassaco é um so com diferente rima. = © eassaco de engenho bangiié ou fornecedor: — A condigio cassaco € 0 denominador. © cassaco de engenho dle qualquer Pernambuco: = Dizendo-se cassaco ‘Seja qual for seu nome, seu trabalho, seu soldo: = Dizendo-se cassaco se tera dito todos. Jodo Cabral de Melo New Dos pac aneros 6 16 — © cassaco de engenho — O eassaco de engenho quando é um velho: quando é erianga: — Parece cruzamento = Somente por acaso de canigo com cana. cle alcanga esse teto. — O cassaco de engenho = O cassaco de engenho crianga € mais canigo: vyelho nem € acaso: — Puxa mais bem ao pai f — E que um cassaco novo porque nao é macigo. apressou-se no prazo. — O eassaco de engenho = O eassaco de engenho quando € crianga: quando é um velho: — Nao 6 tal — Entio, chegado ai, “2 puxa também A cana. se apressa em esqueleto. — Mas & cana de soca, = Se apressa a descarnar repetida e sem forga: = A cana fim de raga, de quarta ou quinta folha. seu esqueleto € faxina. n 2 ~ O cassaco de engenho = © ceassaco de engenho guando é mulher: de longe é como gente: — Bum saco vazio = De perto é que se vé ‘mas que se tem de pé 1 que ha de diferente. = O eassaco de engenho = O cassaco de engenho, mulher é como um saco: de perto, a0 olho esperto: — De agticar, mas sem ter = Em tudo é como homem, acticar ensacado. 86 que de menos prego. = O cassaco de engenho = Nio hi nada de homem quando é mulher: que nao tenha, em detalhe, — Nio é um saco capaz « tudo por inteiro, de conservar, conter. nada pela metade. = Euum saco como feito — E igual, mas apesar, para se derramar: parece recortado, = De outros que nio se sabe com a tesoura cega como se fazem la. de alfaiate barato, 266 267 Jodo Cabral de Melo Neto ois paRLamen tos: ? 7 — © cassaco de engenho — © cassaco de engenho de longe € de osso e carne: de Jonge é branco ou negro: — De perto & que se vé — De perto & que se vé que de outra qualidade. que é amarelo mesmo. = O cassaco de engenho = O cassaco de engenho se se chega a toc: € amarelo sempre: — E outra a consisténcia = Mas do amarelo inchado de seu corpo, é mais ralo, {que € verde levemente, — Tem a textura bruta — Desse verde amarelo € a0 mesmo tempo frouxa, fem que o azul nao entra menos que algodiozinho, € que nio fosse nele sim propria das estopas. se diria doenga. — E dos panos puidos — Um verde especial, chegados ao estado espécie de auriverde, em que, no portugués, 36 dele, branco ou negro, Pano passa a ser trapo. de receita s6 dele. 12 3 = O cassaco de engenho — © ceassaco de engenho de longe & 0 mesmo barro: quando esti dormindo: = De perto é que se vé = Se vé que é incapaz que © dele foi mais bago. de sonhos privativos. — O cassaco de engenho = Nele nio hi esse ar E opaco e mortiso: distante ou distraido — Nunca aprende com os agos de quem detris das pillpebras Eats tum filme esti assistindo, = Detras de suas pilpebras haverd apenas treva de uma usina, nas tachas em que mexe ede certo nenhum nos engenhos bangi sonho ali se projeta. = Sequer aprende o brilho — O cassaco de engenho dlo cabo das enxadas dorme em sala deserta que ele enverniza em seco — A nenhum sonho-filme com a lixa da mio aspera. assiste, nem tem tela. 268 269 Jodo Cabral de Melo Neto Doss aRLAwENTos 8 18, = O cassaco de engenho = O cassaco de engenho guando nio ests dormindo: quando nio trabalha: = E como se seu sono ainda o encharcass = As coisas continuam sendo-lhe bem pesadas. = Gramlasbaoieictitsenitc = Pot sua pouica roupa nio é que esti acordado, esti sempre esmagado € apenas que caminka ¢ pesalhe no pé ‘onde o sono is aso. inexistente sapato. — Nio tem como evitar = Pesa-the a mio que leva que 0 marasmo 0 embeba se nio leva nada, 0 impega de subir pesathe igualmente A consciéncia seca. se se move ou parada. = O cassaco de engenho — Ao cassaco de engenho nunca acorda de todo: pest o ar que respira: — Anda sempre nos pintanos — E até mesmo the pesa do sono, por seu lodo, © chio sobre que pisa. 13, 4 = O cassaco de engenho = O cassaco de engenho quando no trabalho: faz amarelamente = Tudo com que trabalha toda coisa que toca Ihe parece pesado, tocando-a, simplesmente. — E como se seu sangue, 0 contrario do barro aque entretanto é mais ralo, das casas-de-purgar the pesasse no corpo, que se bota no agticar espesso como ealdo. a fim de o branquear. — Como o caldo de cana — O cassaco de engenho ja muito cozinhado purga tudo ao contririo: que vai-se espessando — Como o barro, se infiltra, no gesto do melago, mas deixa tudo barro, = O cassaco de engenho = Limpa tudo do limpo tem 0 ritmo pesado: e deixa em tudo nédoa: = O do gesto do mel = A que hi em sua camisa, deixando 0 tiltimo tacho. em sta vida, no que toca, Joao Cabrat de Melo Neto ors paeianestos: 9 19 — O cassaco de engenho — O cassaco de engenho vé amarelamente vai amarelamente centre todo esse azul todo o rosa-Brasl que € Pernambuco sempre. que ele habita e nao sente. (Memo gontzao,amarelo ~ Para ele, a 4gua do io ‘da patha canavial, no € azul mas barro, ainda é mais amarelo € as nuvens, aniagem, © seu, porque moral, pardas, de pano saco. = O cassaco de engenho — Ao cassaco de engenho nunca a terra é de vargem: — Eamarelo de corpo — Eo dia mostra sempre € de estado de espirito. desbotada folhagem. — E outra & a morte que vem é 0 amare tipo: = De onde a calma que as vezes parece sabedoria: retratar seu trespasse: — Mas nio é calma, nada, = Nio usa pano preto, €0 nada, é calmaria, , cobre-se, sim, de ciqui. 4 5 — © ceassaco de engenho — O cassaco de engenho quando doente-comefebre: — Nio de febre amarela € amarelamente mesmo no mundo em cor {que bebe na aguardente. mas da de sezies, vere = Primeiro, a aguardente = Por fora, se se toca Ihe di um certo azul no seu corpo de gente: ¢ esquecido o amarelo, = Se pensa que a caldeira dele afinal se acende. ele quer ir-se a0 Sul, — Contudo se se toca — Ao cassaco de engenho depois o azul é roxo: esse corpo por dentro: Sears ah — Se ve que, se é caldeira, dleseja& ir-se motto, nem tem assentamento, — Por fim, ineviave — Que se é engenho, é volta a vida amarela: de fogo frio ou morto: — No amargor amarelo — Engenho que nio méi dda ressaca que o espera, que s6 fornece aos outros. Joao Cabrat de Melo Neto Dots pxrLaseenTos 10 20 ~ 0 cassaco de engenho = 0 cassaco de engenho quando vai morrendo: defunto ¢ ja no chio: E — Para ripido acabé-lo tudo faz mutitio, — Adquite a transparéneia = O massapé, pigarea, propria ao cristal anémico: ea Mata faz Sertio. — Aquela de que a cera — Eo sol, para ajudar, dé'0 melhor exemplo. se € inverno faz. verao. = Adquire a transparéncia — Para roer os ossos propria de qualquer vela os vermes viram cio: = Da mesma em cuja ponta — E outra vez vermes, vendo plantam a chama que 0 vel, © giz que os oss0s sto. — Eo vento canavial a carne dessa vela: da também sua demio: — Ea chama se pergunta = Varre-Ihe 08 gases da alma, por que nio a acendem nela. levando-a (lavando), so. 1s = O cassaco de engenho juando 0 carregam, morto: — Boum caixio vazio metido dentro de outro. = E motte de vazio a que carrega dentro: — E-como é de vazio, ei-lo que nao tem dentros. = Do caixio alugado nem chega a ser miolo: 0 enterro de um coco: — Uns poucos envoltérios ‘em volta do centro oo. a4 as

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