MATERIAL DIDÁTICO
FILOSOFIA E SOCIOLOGIA DA
RELIGIÃO
SUMÁRIO
UNIDADE 1: INTRODUÇÃO
Concordando com Sponville (2002, p. 11) filosofar é pensar por conta própria;
mas só se consegue fazer isso de um modo válido, apoiando-se primeiro no
pensamento dos outros, em especial dos grandes filósofos do passado. A filosofia
não é apenas uma aventura; é também, um trabalho, que requer esforços, leituras,
ferramentas.
Ressaltamos que o assunto não se esgota e tanto por isso, ao final da
apostila são oferecidas bibliografias complementares para sanar dúvidas que, por
ventura venham surgir no decorrer do estudo, possíveis lacunas e para
aprofundamento dos senhores.
Desejamos a todos uma boa leitura e um estudo proveitoso!
UNIDADE 2: RELIGIÃO
Etimologia e história
Para adentrarmos os campos da filosofia e sociologia da religião, que é o
objetivo desta apostila, torna-se necessário discorrer um pouco sobre a origem tanto
da palavra religião e seus significados quanto das abstrações que a cercam.
Portanto, Religião é:
Um conjunto de crenças relacionadas com aquilo que a humanidade
considera como sobrenatural, divino, sagrado e transcendental. Um conjunto de
rituais e códigos morais que derivam dessas crenças. Derivada do latim “re-ligare”
que significa ‘ligar com” ou “ligar novamente” ou de “religio”, cujo sentido primeiro
indicava um conjunto de regras, observâncias, advertências e interdições, sem fazer
referência a divindades, rituais, mitos ou quaisquer outros tipos de manifestação
que, contemporaneamente, entendemos como religiosas (SILVA, 2004).
Histórica e culturalmente no Ocidente, o conceito de religião foi sendo
construído adquirindo um sentido ligado à tradição cristã. O vocábulo “religião” -
nascido como produto histórico de nossa cultura ocidental e sujeito a alterações ao
longo do tempo – não possui um significado original ou absoluto que poderíamos
reencontrar. Ao contrário, somos nós, com finalidades científicas, que conferimos
sentido ao conceito. Tal conceituação não é arbitrária: deve poder ser aplicada a
conjuntos reais de fenômenos históricos suscetíveis de corresponder ao vocábulo
“religião”, extraído da linguagem corrente e introduzido como termo técnico (SILVA,
2004, p. 4).
Acadêmica e cientificamente o conceito de religião não pode ser vago ou
ambíguo como, por exemplo, “visão de mundo”, porque seríamos levados a
entender que todas as visões de mundo são religiosas, o que não é verdade, bem
como dizer que religião é “sagrado”, pois teríamos que definir sagrado e o seu
oposto, profano. O seu conceito também não pode ser restrito como “acreditar em
Deus”, pois deixaríamos de fora o Budismo e os politeísmos, que acreditam em uma
realidade sobrenatural ou transcendental técnico (SILVA, 2004).
Partindo das inferências acima, Silva (2004) nos propõe que a definição mais
aceita pelos estudiosos, para efeitos de organização e análise, tem sido a seguinte:
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Ver filósofos contemporâneos – capítulo 2.
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Ocorre o neo- quando se alteram partes essenciais, mesmo que seja somente por exclusão, como
por exemplo, o neoplatonismo é um neo- em relação ao platonismo, do qual excluiu algo e
acrescentou outro algo.
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DEFINIÇÃO/CARACTERÍSTICA RELIGIÃO
É a negação da existência de Budismo - Confucionismo –
Ateísmo qualquer tipo de deus e da veracidade Taoísmo
de qualquer religião teísta.
É a dúvida sobre a existência de deus
e sobre a veracidade de qualquer
Agnosticismo
religião teísta, por falta de provas
favoráveis ou contrárias.
É a crença num deus que só pode ser
Deísmo conhecido através da razão, e não da
fé e revelação.
Acreditam na existência de um único Judaísmo – Cristianismo –
Monoteístas
Deus. Islamismo - Espiritismo
Acreditam na existência de mais de Xintoísmo – Hinduísmo -
Politeístas
um deus. Xamanismo
UNIDADE 3: FILOSOFIA
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Cosmo (mundo ordenado e organizado) + logia (pensamento ou discurso racional, conhecimento)
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subida e queda de reis, catástrofes como peste, fome, furacões), as genealogias dos
persas (usadas para dar continuidade às linhagens e dinastias dos governantes), os
mistérios religiosos orientais referentes aos rituais de purificação da alma (para livrá-
la da reencarnação contínua e garantir-lhe o descanso eterno), etc. (CHAUÍ, 2003, p.
29).
Dessa forma, da agrimensura, os gregos fizeram nascer duas ciências: a
aritmética e a geometria; da astrologia, fizeram surgir também duas ciências: a
astronomia e a meteorologia; das genealogias, fizeram surgir mais uma outra
ciência: a história; enfim, dos mistérios religiosos de purificação da alma, fizeram
surgir as teorias filosóficas sobre a natureza e o destino da alma humana.
Os pensadores judaicos, como Filo de Alexandria, e os Padres da Igreja,
como Eusébio de Cesaréia e Clemente de Alexandria defendiam a filiação oriental
da Filosofia porque ela tornara-se, em toda a Antiguidade clássica, e para os
poderosos da época, os romanos, a forma superior ou mais elevada do pensamento
e da moral (CHAUÍ, 2003).
Os judeus, para valorizar seu pensamento, desejavam que a Filosofia tivesse
uma origem oriental, dizendo que o pensamento de filósofos importantes, como
Platão, tinha surgido no Egito, onde se originara o pensamento de Moisés, de modo
que havia uma ligação entre a Filosofia grega e a Bíblia (CHAUÍ, 2003).
Os Padres da Igreja, por sua vez, queriam mostrar que os ensinamentos de
Jesus eram elevados e perfeitos, não eram superstição, nem primitivos e incultos, e
por isso mostravam que os filósofos gregos estavam filiados a correntes de
pensamento místico e oriental e, dessa maneira, estariam próximos do cristianismo,
que é uma religião oriental.
No entanto, nem todos aceitaram a tese chamada “orientalista”, e muitos,
sobretudo no século XIX da nossa era, passaram a falar na Filosofia como sendo o
“milagre grego” (CHAUÍ, 2003, p. 30).
Com a palavra “milagre” queriam dizer várias coisas:
• Que a Filosofia surgiu inesperada e espantosamente na Grécia, sem
que nada anterior a preparasse;
• Que a Filosofia grega foi um acontecimento espontâneo, único e sem
par, como é próprio de um milagre;
John Dewey (1859-1952) pontua que é a crítica dos valores, das crenças, das
instituições, dos costumes, das políticas, no que se refere seu alcance sobre os
bens.
Sucintamente Johann Gottlieb Fichte (1762-1814) define como a ciência da
ciência em geral.
Auguste Comte (1798-1857) conceitua como a ciência universal que deve
unificar num sistema coerente os conhecimentos universais fornecidos pelas
ciências particulares.
Para Chauí (2003) e Oliveira (2008), a Filosofia é um modo de pensar, é uma
postura diante do mundo. Ela não é um conjunto de conhecimentos prontos, um
sistema acabado, fechado em si mesmo. É, antes de mais nada, uma prática de vida
que procura pensar os acontecimentos além de sua pura aparência. Pode pensar a
ciência, seus valores, seus métodos, seus mitos; pode pensar a religião; pode
pensar a arte; pode pensar o próprio homem em sua vida cotidiana.
Quando começamos a colocar em questão tudo que sabemos (ou que
pensamos saber) a filosofia nos apresenta como algo negativo, entretanto, a
possibilidade de questionarmos, de transformarmos os valores e as ideias mostra o
seu lado positivo.
Devido sua natureza, ou seja, dentro do seu modo questionador, investigador,
o pensamento crítico apresentado pela filosofia, gera, a cada resposta, uma nova
pergunta e assim, sucessivamente.
Segundo Chauí (2003), ao filósofo é mais importante perguntar do que
responder, sendo três as perguntas básicas que rodeiam o pensamento do filósofo:
1º. Perguntar ‘o que’ é a coisa, o valor ou a ideia. A filosofia pergunta qual
é a realidade ou a natureza e qual é a significação de alguma coisa, não importando
qual;
2º. Perguntar ‘como’ é a coisa, a ideia ou o valor. A Filosofia indaga qual é
a estrutura e quais são as relações que constituem uma coisa, uma ideia ou um
valor;
3º. Perguntar ‘por que’ a coisa, a ideia ou o valor, existe e é como é. A
Filosofia pergunta pela origem ou pela causa de uma coisa, de uma ideia, de um
valor.
Filosofia não aumenta a quantidade do saber, portanto, não pode ser chamada
propriamente de “conhecimento” (CHAUÍ, 2003).
Segundo Ewing (2008), recentemente, a filosofia crítica tem sido
frequentemente contraposta à metafísica (que nesse caso é às vezes denominada
filosofia especulativa). A filosofia crítica analisa e critica os conceitos pertencentes
ao senso comum e às ciências. As ciências pressupõem certos conceitos que não
são suscetíveis de investigação por meio de métodos científicos, de modo que
passam a integrar o âmbito da filosofia. Nesse sentido, todas as ciências, com
exceção da matemática, pressupõem de alguma forma a concepção de lei natural;
cabe à filosofia, e não a qualquer das ciências particulares, examinar tal concepção.
Enfim, a parte da filosofia crítica que trata da investigação da natureza e dos
critérios de verdade, assim como da maneira pela qual obtemos conhecimento, é
chamada de epistemologia (teoria do conhecimento).
Filosofia da Religião
Para Martins (1994) a Filosofia da Religião é uma das disciplinas que se
constitui numa das divisões da filosofia. Tem por objeto o estudo da dimensão
espiritual do homem desde uma perspectiva filosófica (metafísica, antropológica e
ética), indagando e pesquisando sobre a essência do fenômeno religioso: "o que é
afinal, a religião?".
Para o seu estudo são usados os métodos: histórico-crítico comparativo, o
filológico e o antropológico. O primeiro deles compara as várias religiões no tempo e
no espaço, em busca de seus aspectos mais comuns e suas diferenças, para
verificar o que constitui a essência do fenômeno religioso. O segundo faz o estudo
comparativo das línguas, visando encontrar as palavras utilizadas para descrever e
expressar o sagrado e suas raízes comuns e o terceiro método procura reconstruir o
passado religioso tendo por base a etnologia (estudo dos povos primitivos e atuais,
suas instituições, crenças, rituais e tradições) (PAULI, 1997).
Na realidade, a Filosofia da Religião precisa conjugar adequadamente os
métodos para obter a melhor soma de elementos para chegar à conclusão mais
correta sobre a essência da religião e suas características universais.
Para estudar a filosofia da religião, Pauli sugere sua divisão em duas partes,
sendo a primeira, o estudo dos seus fundamentos e a segunda, o estudo da mesma
enquanto culto, isto porque, todos os indivíduos se ocupam com religião o que
acaba por envolver um fenômeno cultural.
Em termos de fundamentos encontramos no monismo pré-socrático, o
surgimento paulatino do conceito de Deus, como causa externa do mundo.
A ideia filosófica sobre Deus, - como ente ao lado ou acima do mundo, mas
sem se confundir com os deuses mitológicos surgidos do caos, - principiou com as
razões filosóficas que apelam à causa eficiente do mundo (sobretudo para operar o
movimento e estabelecer a ordem das coisas).
Ainda continuando o pensamento de Pauli, os pré-socráticos conceberam as
causas como intrínsecas ao mundo, e por isso não reclamavam um ser exterior para
estabelecer a ordem e o movimento. E por isso eram monistas, e somente neste
plano falavam do divino. A crescente preocupação com as causas gerou finalmente
a filosofia da divindade, ainda que em termos de monismo. Embora os pré-
socráticos não chegassem a ideia de um Deus transcendente, pertence já a eles a
ocupação com o divino nas causas.
Entretanto, os tempos atuais, marcado pelo saber científico e pelo uso
exagerado das técnicas não deixa espaço para que seja dada a devida importância
à Filosofia da Religião devida importância.
Outro fator contribuinte, segundo Zilles (2006) se relaciona com a Teologia
que está muito pulverizada nos dias atuais, ou seja, sobrou quase que somente a
Bíblia para análises e discussões.
Para ele, a racionalidade ocidental é uma cultura de reflexão, orientada pelo
paradigma do monoteísmo, desde Platão até Hegel. Os movimentos críticos contra o
pensamento religioso e o próprio ateísmo só se compreendem dentro do paradigma
monoteísta. A referência à questão de Deus, também ex negativo e indiretamente,
permanece determinante até Marx, Nietzsche e Freud.
Como diz ele: a filosofia da religião não se limita a descrições neutras de
costumes da linguagem religiosa, nem fixa normas arbitrárias para o uso religioso da
linguagem. Sua missão consiste em mostrar sentido e profundidade da religião, na
vida humana, de maneira crítica. Vale usar a razão, para completar a fé, e crer, para
que todo conhecimento deriva de uma consciência intuitiva imediata das coisas
particulares, sugere-se que ele condena toda possibilidade de conhecimento de
Deus.
Guilherme de Ockham faz uma clara separação entre revelação e fé por meio
do conhecimento sensível e abstrato, produzindo impactos de longo alcance no
pensamento filosófico. Contudo, como sua concepção de universo era dependente,
em última instância, da contingência de uma vontade divina, tal estaria além da
apreensão humana, sendo imutável. Enfim, para ele Deus não pode ser objeto de
análises (COLLINSON, 2006).
René Descartes (1591-1650) foi considerado o primeiro pensador moderno,
além de grande matemático. A famosa declaração “penso logo existo” (conhecida
como ‘cogito’) é a prova significativa de sua existência como um ser pensante e o
ponto de partida de sua pesquisa para obter a certeza.
Essa certeza fornece a ele a base requerida para a construção do seu edifício
do conhecimento. Ele oferece dois argumentos para a existência de Deus. O
primeiro argumento parte do reconhecimento de si mesmo como ser existente, que,
em virtude de suas dúvidas, é imperfeito, já que é capaz de conceber a ideia de
Deus como um ser perfeito. No seu entendimento essa ideia perfeita só poderia ser
oriunda de um ser perfeito, portanto, Deus deve existir como sendo a origem desta
ideia.
Essa versão do argumento cosmológico, apóia-se quase que inteiramente no
princípio escolástico de que há, pelo menos, tanta realidade na causa quanto no
efeito, isto é, se a ideia é perfeita, então sua causa é igualmente perfeita.
O argumento ontológico é o segundo argumento de Descartes para a
existência de Deus, argumentando que a ideia de um ser supremamente perfeito é a
de um ser que contém toda a perfeição, e assim, contém a perfeição em todos os
seus graus (COLLINSON, 2006, p. 102).
Para Benedictus ou Bento de Espinoza (1632-1677) pertencente ao grupo de
pensadores do século XVII, que além de filósofos eram matemáticos e cientistas,
incluindo Descartes, Leibniz e Hobbes, afirmava que existe somente uma substância
e que esta seria Deus. Existem comentários de que era obcecado por Deus,
principalmente porque em seus argumentos filosóficos, ele utilizava formas
escrituras não explicam a eficácia desta mediação, mas o fato de ser misteriosa não
deve ser utilizado como um argumento contra ela, visto que a mediação não é senão
uma das muitas matérias que ficam além do alcance natural das nossas faculdades.
Ele argumenta ainda, que há muitas evidências históricas para apoiar o cristianismo;
o todo é perfeitamente crível, e o corpo das evidências positivas para tal não pode
ser destruído, ainda que partes destas possam ser questionadas (COLLINSON,
2006, p. 138).
Dentro da filosofia moderna, Butler faz parte de um movimento que conduz da
confiança na religião revelada para o estudo da natureza humana e da ideia da
consciência individual como o guia para a conduta moral.
Para George Berkeley (1685-1753) a matéria não existe! Ele assegurava que
todos os objetos que percebemos e que tomamos ordinariamente como existentes
no mundo exterior a nós, constituem simples coleções de ideias presentes apenas
nas nossas mentes. Assegura ainda que Deus implanta as ideias em nós, de
maneira ordenada e que, na sua mente, tudo existe em todos os tempos.
Para ele tudo depende da vontade de Deus, sendo Deus quem mantém a
comunicação entre os espíritos, por meio da qual eles estão aptos para perceber a
existência um dos outros.
Em relação ao seu discurso sobre os espíritos, encontra dificuldade para
manter sua coerência, uma vez que as ideias são somente ideias dos sentidos,
então não poderia existir a ideia de um espírito. Ele diz que as ideias são passivas e
inertes e os espíritos, seres ativos e não podem, portanto, ser ideias.
Berkeley é um empirista ao colocar a experiência como a medida do
significado e da realidade. Para Collinson (2006, p. 133) na realidade, Berkeley
espana a sujeira para debaixo dos nossos pés, ou seja, ele funde os conceitos de
matéria e ideia, mas ao final, não convence.
Emanuel Kant (1724-1804) apresentou um trabalho muito original, que lhe
reservou enorme receptividade, além de colocá-lo como um dos mais importantes
filósofos ao lado de Platão e Aristóteles. Suas produções aconteceram num período
em que a filosofia passava por um momento crucial, em que pesava uma tensão
entre a aliança do pensamento racional que florescia no continente europeu e o
empirismo adotado da Grã-Bretanha.
Acreditava na doutrina do Espírito Santo. Para ele, o espírito do homem, sua razão,
são uma vela do Senhor. Essa fé de base religiosa na Razão é o fundamento de
todo o trabalho de Hegel.
Sua obra “O espírito do cristianismo e seu destino, fado” mostra que os
judeus eram escravos da Lei de Moisés, vivendo uma vida sem amor em
comparação com a dos gregos antigos. Jesus ensinou algo inteiramente diferente. O
homem não deve ser escravo de comandos objetivos: a lei é feita para o homem,
porém, fica acima da tensão da experiência moral entre a razão e a inclinação
porque a lei é para ser cumprida com amor a Deus (COBRA, 2008).
O Reino, no entanto, não pode realizar-se neste mundo: o homem não é
somente espírito, mas também carne. Igreja e Estado, adoração e vida, piedade e
virtude, ação espiritual e mundana nunca podem se dissolver em uma coisa só. É a
partir desse pensamento religioso que começa a aparecer sua ideia de uma síntese
de pólos opostos, no amor, - um pré-figuramento do espírito como a unidade na qual
as contradições, tais como infinito e o finito, são abraçadas e sintetizadas. As
contradições do pensamento no nível científico são inevitáveis, mas o pensamento
como uma atividade do espírito ou "razão" pode elevar-se acima delas para uma
síntese na qual as contradições são resolvidas. Este pensamento, escrito em textos
religiosos, está nos manuscritos de Hegel do final de sua estada em Frankfurt
(COBRA, 2008).
Ainda de acordo com os estudos de Cobra acerca do pensamento de Hegel,
há pressuposições de que a história da humanidade é um processo através do qual
a humanidade tem feito progresso espiritual e moral e avançado seu auto-
conhecimento. A história tem um propósito e cabe ao filósofo descobrir qual é.
Alguns historiadores encontraram sua chave na operação das leis naturais de vários
tipos. A atitude de Hegel, no entanto, apoiou-se na fé de que a história é a
representação do propósito de Deus e que o homem tinha agora avançado longe
bastante para descobrir o que esse propósito era: ele é a gradual realização da
liberdade humana.
Em muitos pontos o pensamento de Hegel serviu aos fundamentos do
marxismo, e um deles é sua concepção de que os Estados têm que ser encontrados
por força e violência, pois não há outro caminho para fazer o homem curvar-se à Lei
antes dele ter avançado mentalmente tão longe suficiente para aceitar a
racionalidade da vida ordenada. Alguns homens aceitarão as leis e se tornarão
livres, enquanto outros permanecerão escravos. No mundo moderno o homem
passou a crer que todos os homens, como espíritos, são livres em essência, e sua
tarefa é, assim, criar instituições sob as quais eles serão livres de fato (COBRA,
2008).
Henri Bergson (1859-1941) acreditava que o homem fosse capaz de superar
o domínio da inteligência e de guardar o impulso criador, superando o nível estático
da moral e da religião até transcender plenamente o élan vital, o impulso vital, que,
definitivamente, é de Deus, se não é o próprio Deus.
De acordo com Bochenski (2008) Bergson faz uma divisão: há uma religião
estática e uma religião dinâmica. A religião estática consiste numa reação defensiva
da natureza contra os efeitos da atividade da inteligência, que ameaçam oprimir o
indivíduo ou dissolver a sociedade. A religião estática prende o homem à vida e o
indivíduo à sociedade mediante fábulas que se assemelham a canções de berço. A
religião é obra da “função fabuladora” da inteligência. A inteligência, em sentido
estrito, ameaça desfazer a coesão social, e a natureza não pode opor-lhe o instinto,
cujo lugar foi precisamente substituído no homem pela inteligência. Mas a natureza
ajuda-se mediante a produção da função fabuladora. Se o homem sabe, pela
inteligência, que tem de morrer, coisa que o animal não sabe, e se a inteligência lhe
ensina que entre a tentativa e o êxito desejado existe o espaço desanimador do
insondável, a natureza volta a ajudá-lo a suportar este conhecimento amargo,
fabricando, graças a sua função fabuladora, deuses. O papel da função fabuladora
nas sociedades humanas corresponde ao do instinto nas sociedades animais.
A religião dinâmica, o misticismo, é algo inteiramente diferente. Resulta de um
retorno na direção donde procede o élan vital, e nasce da pressentida captação do
inacessível a que a vida aspira. Este misticismo é próprio somente de homens
extraordinários. Não se manifestou ainda entre os velhos gregos, como nem em
forma perfeita na Índia, onde não deixou de ser puramente especulativo. Contudo
surgiu entre os grandes místicos cristãos, que possuíam uma saúde espiritual que
se pode qualificar de perfeita. A religião cristã aparece como a cristalização deste
misticismo, mas, por outro lado, constitui o seu fundamento, porque os místicos são
todos imitadores originais, embora imperfeitos, daquele que nos deixou o Sermão da
Montanha (BOCHENSKI, 2008).
A experiência dos místicos permite-nos defender não só a probabilidade das
concepções relativas à origem do élan vital, como também a afirmação da existência
de Deus, que não se pode provar com argumentos lógicos. Os místicos ensinam
também que deus é o amor, e nada impede que os filósofos desenvolvam a ideia,
sugerida por eles, de o mundo não ser mais do que um aspecto palpável deste amor
e da necessidade divina de amor (BOCHENSKI, 2008).
Bertrand Russell (1872-1970) exerceu grande influência no desenvolvimento
da filosofia do século XX. Embora tenha se voltado para vários tópicos dentro da
Filosofia, suas maiores contribuições acontecem no campo da lógica matemática e
da filosofia da lógica.
Russell era cético no que se referia à argumentação relacionada com a
existência de Deus, dizendo que não observava nenhuma razão para acreditar numa
deidade, o que podemos encontrar no seu livro “Porque não sou cristão” onde critica
e examina os argumentos sobre a existência de Deus. Igual criticidade encontramos
a respeito da prática e da teologia cristã (COLLINSON, 2006, p. 235).
Como expoente do Existencialismo Ateísta, encontramos Jean-Paul Sartre
(1905-1980). Segundo Sartre, o homem está abandonado; Deus não existe e, para
Sartre, a não-existência de Deus tem implicações extremadas. Aliás, alguns dos
problemas principais que se levantam do abandono parecem também levantar-se
meramente do fato de nós não podermos saber se Deus existe. Se Deus realmente
existe, nós “não estamos abandonados”. O problema do abandono levanta-se
meramente do fato de nós não podermos saber se Deus existe. Sua existência em
tais condições equivale, para Sartre, em uma não-existência efetiva, que tem
implicações drásticas. Primeiro, porque não há Deus, não há nenhum criador do
homem e nem tal coisa como um concepção divina do homem de acordo com a qual
o homem foi criado. Segundo, diz ele, louvando-se em Dostoiévski (na fala de Ivan
Karamazov, na famosa novela daquele escritor russo): Se Deus não existe, então
tudo é permitido. Terceiro, “Não há um sentido ou propósito último inerente à vida
humana; a vida é absurda” (COBRA, 2008).
Isto significa que o indivíduo, foi jogado de fato na existência sem nenhuma
razão real para ser. “Simplesmente descobrimos que existimos e temos então de
decidir o que fazer de nós mesmos.” (COBRA, 2008).
Resta como o único valor para o existencialismo ateu, a liberdade. Afirma que
não pode haver uma justificativa objetiva para qualquer outro valor.
Porque não há nenhum Deus, não há nenhum padrão objetivo dos valores.
Com o desaparecimento dele desaparece também toda possibilidade de encontrar
valores. Não pode, então, haver qualquer bem a priori porque se nós não sabemos
se Deus existe, então nós não sabemos se há alguma razão final porque as coisas
acontecem da maneira que acontecem; não há nenhuma razão final porque
qualquer coisa tenha acontecido ou porque as coisas são da maneira que elas são e
não de alguma outra maneira e nós não sabemos se aqueles valores que
acreditamos que estão baseados em Deus têm realmente validade objetiva.
Consequentemente, porque um mundo sem Deus não tem valores objetivos, nós
devemos estabelecer ou inventar, a partir da liberdade, nossos próprios valores
particulares. Na verdade, mesmo se nós soubéssemos que Deus existe e
aceitássemos que os valores devessem basear-se em Deus, nós ainda poderíamos
não saber que valores estariam baseados em Deus, nós poderíamos ainda assim
não saber quais seriam os critérios e os padrões absolutos do certo e do errado. E
mesmo se nós sabemos quais são os padrões do certo e do errado (critérios),
exatamente o que significam ainda seria matéria da interpretação subjetiva. E assim
o dilema humano que resultaria poderia ser muitíssimo o mesmo como se não
houvesse Deus (COBRA, 2008).
Em Alvin Plantinga (1932- ), filósofo americano da modernidade, encontramos
trabalhos que giram em torno da epistemologia da religião cristã. Ele apresenta uma
crítica detalhada do fundacionalismo4 clássico, das diversas formas de coerentismo
e de confiabilismo, e fornece uma defesa impressionante da racionalidade do teísmo
cristão, incluindo não somente a crença em Deus como também as doutrinas
clássicas do cristianismo. Além disso, apresenta uma refutação importante do
naturalismo filosófico, procurando mostrar que a crença no Darwinismo pressupõe
4
O fundacionalismo baseia-se na observação de que boa parte das crenças que alguém sustenta
baseia-se em outras crenças, ou seja, funda-se nelas, mas isso não pode ser verdade para todas as
crenças; pelo menos algumas delas são aceitas sem base em outras (PLANTINGA, 1992 apud
CARVALHO, 2006).
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Posição filosófica geral, também denominada empirismo lógico, baseada no pensamento empírico
tradicional e no desenvolvimento da lógica moderna. Restringiu o conhecimento à ciência e utilizou o
verificacionismo para rejeitar a Metafísica não como falsa, mas como destituída de significado.
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eterno e absoluto, que não pode ser compreendido e ainda diz que, por não poder
manipulá-lo, os seres devem viver uma vida simples, sem grandes questionamentos
morais ou filosóficos (CAPRA, 1999).
Uma filosofia deste tipo, logicamente quebra todos os conceitos e tentativas
do homem controlar seu destino e demonstra que toda tentativa de se criar uma
religião, uma sociedade política ou moral acaba sempre sendo infrutífera.
Resumidamente Chauí (2003, p. 20) infere que o pensamento chinês toma
duas características (masculino e feminino) existentes em alguns seres (os animais
e os humanos) e considera que o Universo inteiro é feito da oposição entre
qualidades atribuídas a dois sexos diferentes, de sorte que o mundo é organizado
pelo princípio da sexualidade animal ou humana.
São diferenças desse tipo, além de muitas outras, que nos levam a dizer que
existe uma sabedoria chinesa, uma sabedoria hindu, uma sabedoria dos índios, mas
não há filosofia chinesa, filosofia hindu ou filosofia indígena, muito menos uma
filosofia religiosa.
UNIDADE 4: SOCIOLOGIA
sentido objetivo dos fenômenos sociais, e não existe qualquer outro sentido, senão o
insondável sentido subjetivo que, quando expresso, se torna objetivo.
Ao falarmos de sociologia da religião, principalmente em tempos de mudança,
de globalização, se considerarmos que estamos vivendo a transição da
modernidade para a pós-modernidade é preciso entrar, mesmo que brevemente, nas
questões de secularização6 ou dessecularização da religião.Na realidade a questão
gira em torno de teorias que discutem o declínio ou não da religião.
Para Tait (2008), a secularização é um conceito surgido na própria Igreja para
designar coisas que são deste mundo, não pertencem ao mundo milenar ou
sagrado. As ciências humanas acabaram se apropriando do termo para designar um
processo de dessacralização que acontece na modernidade. De maneira geral a
secularização acontece em três níveis: institucional, cognitivo e comportamental. No
nível institucional ocorre a transferência do poder das instituições que têm alguma
referência religiosa para as instituições que operam segundo outros critérios como
os racionais e pragmáticos. O poder passa das instituições religiosas para as
instituições laicas. No âmbito cognitivo, as pessoas deixam de explicar o mundo
através da religião e passam a explicá-lo, fundamentalmente, pela razão e pela
ciência. E, finalmente, em termos comportamentais ocorre a privatização da própria
experiência religiosa. A religião não é mais institucionalizada de forma tradicional, se
desloca para a esfera do indivíduo, já que o sujeito passa a ter uma autonomia
religiosa.
Na Europa, as mudanças ocorridas nos séculos XVII e XVIII, no sentido
epistemológico, filosófico, político e social, levaram a religião a se tornar um objeto a
ser pensado, podendo ser representada como uma realidade positiva, relativa,
histórica, como uma construção institucional ligada a um conjunto doutrinal abstrato,
controlando as práticas, impondo normas (DAMÁSIO, 2005).
Esse processo desenrolou-se lentamente, com elementos que influenciaram
desde o século XIV, relativizando valores que caracterizam nosso universo racional
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Entendido como um processo pelo qual a religião deixa de ser o aspecto cultural agregador,
transferindo para uma das outras atividades desta mesma sociedade este fator coercitivo e
identificador. Ela faz com que tal sociedade já não esteja mais determinada pela religião.
Em outras palavras, trata-se da temporalidade deste mundo, a dimensão mundana da vida humana,
associada à dimensão do pecado. Compreende-se assim, que a expressão “retornar ao século”
significa retornar ao mundo profano, identificando-se desta forma, com a laicização (DAMÁSIO,
2005).
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pelo espírito humano como gêneros separados, como dois mundos entre os quais
nada há em comum (…) uma vez que a noção de sagrado é no pensamento dos
homens, sempre e por toda a parte separada da noção do profano (…) mas o
aspecto característico do fenômeno religioso é o fato de que ele pressupõe uma
divisão e bipartida do universo conhecido e conhecível em dois gêneros que
compreendem tudo o que existe, mas que se excluem radicalmente. As coisas
sagradas são aquelas que os interditos protegem e isolam; as coisas profanas,
aquelas às quais esses interditos se aplicam e que devem permanecer à distancia
das primeiras.” (DURKHEIM, COLEÇÃO OS PENSADORES, 1983).
É possível constatar que a participação na ordem sagrada, como o caso dos
rituais ou cerimônias, dão um prestígio social especial, ilustrando uma das funções
sociais da religião, que pode ser definida como um sistema unificado de crenças e
de práticas relativas às coisas sagradas. Estas unificam o povo numa comunidade
moral (igreja), um compartilhar coletivo de crenças, que por sua vez, é essencial ao
desenvolvimento da religião. Dessa forma, o ritual pode ser considerado um
mecanismo para reforçar a integração social. Durkheim conclui que a função
substancial da religião é a criação, o reforço e manutenção da solidariedade social.
Enquanto persistir a sociedade, persistirá a religião (TIMASHEFF, 1971 apud
RODRIGUES, 2008).
Em outras palavras, no pensamento durkheimiano a religião é definida
enquanto um sistema de crenças e práticas em relação ao sagrado, que unem em
uma mesma comunidade moral todos os que a ela aderem (Formas Elementares da
Vida Religiosa, 1983, p. 79). Assim, não há como negar que a religião funciona
como um forte aspecto moral. E como para Durkheim só pode haver moral se a
sociedade possuir um valor superior a de seus membros, um ato só será moral se
tiver por objeto algo que não o seu autor. Essa realidade superior só pode ser, na
visão de Durkheim, Deus ou a sociedade, o que para ele são a mesma coisa, pois a
religião não passa de adoração da sociedade transfigurada. A religião tem, portanto,
a função de agregar os indivíduos à sociedade, servindo enquanto um instrumento
de controle social, de manutenção da ordem (OLIVEIRA, 1995).
Na realidade, segundo Aron (2000) “As formas elementares da vida religiosa”
representa a solução dada por Durkheim à antítese entre ciência e religião.
PALAVRAS FINAIS
REFERÊNCIAS
MARTELLI, Stefano. A religião sob o ponto de vista do sistema social. In: ______. A
religião na sociedade pós-moderna. São Paulo: Paulinas, 1995.
SCHAEFFER, Francis. O Deus que se revela. São Paulo: Cultura Cristã, p.41-42.
WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. Trad. Waltensir Dutra. 5 ed. Rio de Janeiro:
Guanabara, 1979.
ZILLES, Urbano. Situação Atual da Filosofia da Religião. Rev. Trim. Porto Alegre
v. 36 Nº 151 Mar. 2006.