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Assombro

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Chuck Palahniuk

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Assombro
Um romance de contos

Tradução de Érico Assis

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Copyright © 2016 Chuck Palahniuk
Tradução para a língua portuguesa © 2016 LeYa Editora Ltda., Érico Assis
Título original: Haunted

Produção Editorial
Oliveira Editorial | Anna Beatriz Seilhe

Preparação
Nina Lopes e Carolina Vaz

Revisão
Juliana Pitanga e Sheila Louzada

capa
Rodrigo Corral

adaptação de capa
Leandro Dittz

diagramação
Filigrana

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


ANGÉLICA ILACQUA CRB-8/7057

Palahniuk, Chuck
Assombro: um romance de contos / Chuck Palahniuk ; tradução de Érico Assis. –
São Paulo: LeYa, 2016.
512 p.

ISBN 978-85-441-0483-5
Título original: Haunted

1. Literatura norte-americana 2. Ficção 3. Morte I. Título II. Assis, Érico

16-1166 CDD 813

Índices para catálogo sistemático:

1. Literatura norte-americana

LEYA EDITORA LTDA.


Av. Angélica, 2318 – 12º andar
01228-200 – Consolação – São Paulo – SP
www.leya.com.br

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“Havia muito de beleza, muito de libertinagem,
muito de extravagância, algo de terrível e um
tanto daquilo que poderia despertar repulsa.”

A máscara da Morte Rubra


Edgar Allan Poe

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Cobaias

Era para ser um retiro de escritores. Era para ser seguro.


Uma colônia de autores isolada, onde poderíamos traba-
lhar sob os cuidados de um velho muito velho e moribundo
chamado Whittier, até que não era mais.
E deveríamos escrever poesia. Poesia bonitinha.
Essa turma, os alunos talentosos, três meses trancados
longe do mundo comum.

E um chamava o outro de “Casamenteiro”. E de “Elo


Perdido”.
Ou de “Mãe Natureza”. Rótulos bobos. Nomes por livre
associação.
Da mesma forma que você – quando pequeno – inventa-
va nomes para as plantas e
os animais do seu mundo. Você chamava as peônias –
pegajosas de néctar, cheias de
formigas – de “flor-formiga”. Você chamava os cães da
raça collie de “Lassie”.
Mas, mesmo hoje, da mesma maneira que ainda chama
alguém de “aquele homem com uma perna só”.
Ou: “A negrinha, sabe…”

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Nós nos chamávamos de:
“Conde Calúnia”.
Ou: “Irmã Justiceira”.
Nomes que fizemos por merecer, com base em nossas
histórias. Os nomes que dávamos uns aos outros,
com base em nossa vida, em vez de em nossas famílias;
“Lady Mendiga”.
“Agente Fuxico”.
Nomes baseados em nossos pecados, em vez de em nos-
sos empregos:
“São Sem-Pança”.
E “Duque dos Vândalos”.
Baseados em nossas falhas e crimes. O inverso dos nomes
de super-herói.

Nomes bobos para gente de verdade. Como se rasgasse


uma boneca e encontrasse lá dentro:
Intestinos de verdade, pulmões de verdade, um coração
pulsante, sangue. Muito sangue. Sangue viscoso, quente.
E deveríamos escrever contos. Contos engraçadinhos.
Éramos muitos, à parte do mundo durante
primavera, verão, inverno, outono – uma estação inteira
daquele ano.

Não importava quem éramos como indivíduos. Isso não


importava para o Sr. Whittier.
Mas no princípio não sabíamos disso.
Para o Sr. Whittier, éramos ratinhos de laboratório. Um
experimento.

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Mas não sabíamos.
Não. Era só um retiro de escritores até ser tarde demais
para sermos qualquer outra coisa
que não suas vítimas.

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14. Quando o ônibus para na esquina em que Camarada Es-
15. cárnia combinou esperar, ela está lá, usando uma jaqueta
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17. militar – verde-oliva – e uma calça camuflada larga, a bainha
18. dobrada deixando à mostra os coturnos. Uma mala de cada
19. lado. Com a boina preta afundada sobre a testa, ela podia
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ser qualquer um.
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22. – A regra era… – diz São Sem-Pança no microfone que
23. pende sobre o volante.
24. E Camarada Escárnia interrompe:
– Tá bem.
Ela se abaixa para desafivelar o identificador de bagagem
de uma das malas. Camarada Escárnia enfia a etiqueta no
bolso verde-oliva, ergue a segunda mala e entra no ônibus.
A primeira mala fica no meio-fio, abandonada, órfã, solitá-
ria. Camarada Escárnia se senta e diz:
– Ok.
Ela fala:
– Pode ir.
Naquela manhã, todo mundo ia deixar bilhetes. Antes da
alvorada. Sair na ponta dos pés, carregando uma mala, descer
a escada às cegas, andar pelas ruas no escuro tendo por com-
panhia apenas os caminhões de lixo. Nem vimos o sol nascer.

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Sentado ao lado de Camarada Escárnia, Conde Calúnia
escrevia algo em seu bloquinho, o olhar pulando dela para
a caneta e vice-versa.
Virando a cabeça para ler, Camarada Escárnia diz:
– Meus olhos são verdes, não castanhos, e o tom avermelha-
do do meu cabelo é natural. – Ela o observa escrever verde,
depois acrescenta: – E eu tenho uma rosa vermelha tatuada
na bunda. – Os olhos dela se fixam no gravador prateado
despontando do bolso da camisa dele e no microfone com
telinha quadriculada, então ela diz: – Não escreva cabelo pin-
tado. As mulheres tonalizam ou tingem o cabelo.
Perto deles está sentado o Sr. Whittier, com as mãos trê-
mulas e cheias de manchas agarradas à estrutura cromada
da cadeira de rodas. Ao lado dele está a Sra. Clark, cujos
seios enormes quase caem no colo.
De olho neles, Camarada Escárnia se debruça sobre a
manga de flanela cinza do casaco do Conde Calúnia. Ela diz:
– Puramente ornamental, presumo. E sem valor nutritivo…
Foi nesse dia que perdemos nosso último nascer do sol.
Em outra esquina às escuras, onde Irmã Justiceira aguar-
da, ela exibe seu relógio de pulso preto e grosso e diz:
– Combinamos 4h35. – Ela bate no mostrador do relógio
com a outra mão. – São 4h39…
Irmã Justiceira trouxe um estojo de couro falso com alça,
uma aba que fecha num estalo e que protege a Bíblia ali den-
tro. Uma bolsa artesanal para carregar a Palavra de Deus.
Por toda a cidade, nós aguardamos o ônibus. Nas esqui-
nas e nos pontos de ônibus, até São Sem-Pança aparecer. O
Sr. Whittier está sentado perto da frente com a Sra. Clark.
Conde Calúnia. Camarada Escárnia e Irmã Justiceira.
São Sem-Pança puxa a alavanca que faz a porta se abrir,
e lá no meio-fio está a pequena Miss Espirro. As mangas de

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seu casaquinho estão cheias de lenços de papel sujos. Ela
ergue a mala, que faz um barulho tão alto quanto pipoca
estourando no micro-ondas. A cada degrau na entrada do
ônibus, a mala chocalha como uma metralhadora ao longe,
e Miss Espirro olha para nós e diz:
– Meus remédios. – Ela sacode a mala com força. – Três
meses inteiros garantidos…
Por isso a regra do limite de bagagem. Para todo mun-
do caber.
A única regra era uma mala por pessoa, mas o Sr. Whittier
não falou de que tamanho nem de que tipo.
Quando Lady Mendiga subiu a bordo, ela usava um anel
com um diamante do tamanho de um milho de pipoca, e
sua mão segurava uma coleira, que, por sua vez, arrastava
uma mala de couro de rodinhas.
Balançando os dedos para o anel brilhar, Lady Mendi-
ga diz:
– É meu finado marido, cremado e transformado em dia-
mante de três quilates…
Diante disso, Camarada Escárnia apoia-se sobre o bloqui-
nho no qual Conde Calúnia escreve e diz:
– Facelift é uma palavra só.
Algumas quadras à frente, passados alguns semáforos e
dobradas algumas esquinas, Chef Assassin aguarda, carre-
gando uma maleta de alumínio moldado que contém todas
as suas cuecas elásticas, camisetas e meias dobradas em qua-
drados perfeitos como um origami. Além de um kit de facas
profissionais. O fundo da mala está forrado com maços de
dinheiro presos por elásticos, todas notas de cem. É tão pesa-
da que ele precisa das duas mãos para erguê-la até o ônibus.
Descendo outra rua, atravessando uma ponte e dando a
volta num parque, o ônibus parou num meio-fio onde apa-

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rentemente ninguém esperava. Lá, o homem que chama-
mos de “Elo Perdido” saiu do meio dos arbustos próximos
à calçada. Ele carregava no ombro um saco de lixo preto e
rasgado, de onde vazavam camisas de flanela listradas.
Olhando para Elo Perdido, mas falando com o canto da
boca com Conde Calúnia, Camarada Escárnia diz:
– A barba dele parece coisa que Hemingway caçaria…
O mundo que ainda sonha diria que ficamos loucos. Essa
gente que ainda está na cama, que ia dormir mais uma hora,
depois ia lavar o rosto, as axilas e entre as pernas antes de
sair para o mesmo trabalho para o qual ia todos os dias. Que
vivia a mesma vida todos os dias.
Essa gente choraria ao perceber que sumimos, mas
também choraria se embarcássemos num navio e cruzás-
semos o oceano para começar uma nova vida. Emigran-
tes. Pioneiros.
Naquela manhã, éramos astronautas. Desbravadores.
Despertos enquanto eles dormiam.
Essa gente choraria, mas depois voltaria a ser garçonete,
a pintar casas, a programar computadores.
Na parada seguinte, São Sem-Pança abriu as portas do
ônibus e um gato subiu os degraus e trilhou o corredor
entre as poltronas. Atrás do gato veio Diretora Negação,
dizendo:
– O nome dele é Cora. – O nome completo do gato era
Cora Reynolds. – Não fui eu quem deu esse nome – acres-
centou a mulher, com o terninho e a saia salpicados de pelo
de gato. Uma das lapelas era mais cheia que a outra.
– Coldre de ombro – falou Camarada Escárnia, aproxi-
mando-se do gravador no bolso da camisa de Conde Calúnia.
Tudo aquilo – sussurros no escuro, deixar bilhetes, guar-
dar segredo – era nossa aventura.

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Se você tivesse planos de ficar ilhado durante três meses,
o que levaria?
Digamos que só pode levar uma mala, porque serão mui-
tos, e o ônibus que levará todos à ilha deserta não é tão
espaçoso assim.
O que você colocaria na mala?
São Sem-Pança trouxe caixas de torresmo e salgadinho
sabor queijo, seus dedos e seu queixo alaranjados com o pó
salgado. Com uma das mãos agarrada ao volante, ele virava
a embalagem para derramar os salgadinhos no rosto esguio.
Irmã Justiceira trouxe uma sacola de compras cheia de
roupas, com uma bolsa por cima.
Apoiando-se nos seios gigantescos, aninhando-os como
um bebê, a Sra. Clark perguntou:
– Irmã Justiceira, você trouxe uma cabeça aí dentro?
E Irmã Justiceira abriu a mochila o bastante para mos-
trar os três buracos de uma bola de boliche preta e disse:
– Meu hobby…
Camarada Escárnia desvia os olhos de Conde Calúnia
rabiscando em seu bloquinho e olha para o cabelo preto e
bem trançado de Irmã Justiceira, nem um único fio esca-
pando dos grampos.
– Aquilo que é cabelo tingido – diz Camarada Escárnia.
Na parada seguinte, Agente Fuxico estava com uma câme-
ra de vídeo grudada no olho, filmando o ônibus estacionar.
Ele havia trazido uma pilha de cartões de visita, que distri-
buiu para provar que era detetive particular. Com sua câme-
ra cumprindo a função de máscara, já que cobria metade de
seu rosto, ele nos filmou andando pelo corredor até uma pol-
trona vazia nos fundos, cegando todos com o refletor.
Uma quadra depois, o Casamenteiro subiu a bordo, ar-
rastando esterco nas suas botas de caubói. Com um chapéu

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de palha nas mãos e uma bolsa de lona no ombro, ele se
sentou, abriu um pouco a janela e cuspiu sumo de tabaco
na lateral de aço escovado do ônibus.
Foi isto que trouxemos para passar três meses longe do
mundo. Agente Fuxico: a câmera. Irmã Justiceira: a bola
de boliche. Lady Mendiga: o anel de diamante. É disso que
vamos precisar para escrever nossas histórias. Miss Espirro:
remédios e lenços. São Sem-Pança: salgadinhos. Conde Ca-
lúnia: bloquinho e gravador.
Chef Assassin: facas.
À fraca luz do ônibus, todos espiávamos o Sr. Whittier,
o organizador da oficina. Nosso professor. Dava para ver o
brilho e as manchas de sua careca por baixo dos poucos fios
grisalhos. A gola abotoada da camisa estava erguida, uma
cerca branca e engomada em volta do pescoço magro e
manchado.
“As pessoas de quem vocês fugiram de fininho”, dizia o
Sr. Whittier, “não querem que vocês sejam esclarecidos.
Elas querem saber o que esperar.”
O Sr. Whittier dizia: “Vocês não podem ser as pessoas
que elas conhecem e as pessoas fantásticas, gloriosas, que
querem ser. Não ao mesmo tempo.”
As pessoas que nos amavam de verdade, segundo o Sr.
Whittier, implorariam que fôssemos. Para realizar nosso
sonho. Praticar nosso ofício. E nos amariam quando vol-
tássemos.
Dali a três meses.
Um pedacinho de vida que cada um iria apostar.
Que iríamos arriscar.
Com tanto tempo, ficaria a cargo de nossa competência
produzir obras-primas. Um conto ou um poema ou um ro-
teiro para cinema ou um livro de memórias que daria sentido

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à nossa vida. Uma obra-prima que seria a passagem para
nos livrar da escravidão a um marido, a um pai ou a uma
empresa. Que valeria nossa liberdade.
Todos nós, conduzidos pelas ruas desertas no escuro.
Miss Espirro puxa um lencinho úmido da manga do casaco
e assoa o nariz. Ela funga e diz:
– Saindo escondida desse jeito, fiquei com muito medo
de que me vissem. – Ela enfia o lenço de volta na manga. –
Eu me sinto a… Anne Frank.
Camarada Escárnia puxa o identificador de bagagem do
bolso da jaqueta, os restos de uma mala abandonada. Sua
vida abandonada. E, revirando a etiqueta na mão, ainda
com os olhos nela, fala:
– Do meu ponto de vista…
Ela continua:
– Anne Frank tinha uma vida boa.
E São Sem-Pança, com a boca cheia de salgadinho de mi-
lho, vendo todos nós pelo retrovisor, mastigando sal com
gordura, pergunta:
– Como assim?
Diretora Negação acaricia o gato. A Sra. Clark acaricia os
seios. E o Sr. Whittier, a cadeira de rodas cromada.
Sob a luz de um poste, uma esquina à frente, a silhueta
escura de outro pretenso escritor nos aguarda.
– Pelo menos Anne Frank nunca precisou sair em turnê
para divulgar seu livro… – diz Camarada Escárnia.
E São Sem-Pança pisa nos freios e gira o volante para pa-
rar no meio-fio.

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Monumentos
Um poema sobre São Sem-Pança

– Esse é o emprego que eu larguei para vir para cá – diz


Sem-Pança. – E a vida de que desisti.
Ele dirigia um ônibus turístico.

São Sem-Pança no palco, com os braços cruzados – tão


magro
que suas mãos se tocam no meio das costas.
Lá está São Sem-Pança, só uma demão de pele sobre o
esqueleto.
Suas clavículas saltam do corpo, grandes como guidões.
Suas costelas aparecem por baixo da camiseta branca, e é
o cinto – não a bunda – que mantém a calça jeans no lugar.

No palco, em vez do refletor, o fragmento de um filme:


as cores de casas e calçadas, placas de trânsito e carros
estacionados
limpam seu rosto. A máscara do tráfego. Vans e caminhões.

Ele diz:
– Aquele emprego, o do ônibus turístico…
Eram só japoneses, alemães, coreanos, todo mundo com
inglês de segunda, agarrando livrinhos

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de conversação numa das mãos, sorrindo e assentindo
para tudo que ele dizia
no microfone enquanto conduzia o ônibus, dobrando es-
quinas, descendo ruas, passando por casas de
artistas de cinema ou palcos de assassinatos sangui-
nolentos, apartamentos onde astros do rock tiveram
overdose.
Todos os dias a mesma excursão, o mesmo mantra de
homicídios, artistas, acidentes. Lugares
onde tratados de paz foram assinados. Onde presidentes
passaram a noite.
Até o dia em que São Sem-Pança para diante de uma casa
grande, com cerquinha branca, um desvio
para conferir se o Buick de quatro portas de seus pais está
lá, se ainda é lá que os dois moram,
e vê um homem caminhando pelo quintal com o corta-
dor de grama.
Então, ali, com seu microfone, o santo diz à sua carga no
ambiente refrigerado:
– Este é São Mel.
E seu pai, forçando a vista para enxergar pelas janelas es-
curecidas do ônibus.
– O Santo Padroeiro da Vergonha e da Raiva – diz Sem-
-Pança.

Depois daquele dia, a excursão passou a incluir “O Altar


de São Mel e Santa Betty”;
Santa Betty, no caso, a Santa Padroeira da Humilhação
Pública.
Estacionado diante do condomínio da irmã, São Sem-
-Pança
aponta para

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um andar alto. Lá em cima, o altar de Santa Wendy.
– A Santa Padroeira do Aborto Terapêutico.

Estacionado na frente do próprio prédio, ele diz aos pas-


sageiros do ônibus:
– Este é o altar de São Sem-Pança.
O santo em si, o peito estufado, os lábios de borracha, a
camisa larga,
o reflexo no retrovisor ainda menor.
– O Santo Padroeiro da Masturbação.
Enquanto cada assento do ônibus, balançando a cabeça,
inclinando o pescoço, se estica para ver
uma coisa divina.

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