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Ainda no “Ensaio sobre a Dádiva”, Mauss ressalta que nunca foi constatada a
existência de sociedades que sequer se assemelhassem ao que é concebido como
“economia natural”, de simples trocas de bens, produtos ou riquezas entre indivíduos. São
sempre as “coletividades que se obrigam mutuamente, trocam e contratam” (2003, p.
190), num processo que envolve não apenas a troca de bens ou riquezas, móveis ou
imóveis, de coisas que tenham, de fato valor ou utilidade econômica; mas objetos como
os do kula, que, como Malinowski destacara, não possuíam tal valor ou utilidade; mas
eram dotados do simbolismo ritual que permeia este tipo de contrato.
Trata-se, antes de tudo, de gentilezas, banquetes ritos, serviços,
militares, mulheres, crianças, danças, festas, feiras em que o mercado é
apenas um dos momentos e onde a circulação de riquezas constitui
apenas um termo de um contrato muito mais geral e muito mais
permanente (MAUSS, 2003, p 191).
Mauss chama este sistema de “sistema de prestações totais”, que tem como
característica principal o fato de as prestações e serem feitas sobretudo de forma
“voluntária”, embora sejam, na realidade, obrigatórias, sob pena de guerra privada ou
pública no caso das sociedades estudadas. O sistema de prestações totais também
pressupõe a aliança entre duas tribos, em que tudo é complementar - ritos, casamentos,
sucessão dos bens, postos militares ou sacerdotais etc. - e supõe a colaboração das duas
metades da tribo. Destarte, é a complementaridade que une os grupos por meio da dádiva,
que opera necessariamente no ciclo de “dar, receber e retribuir”, complementaridade que
também é observada por Malinoswki (1976, p.80) , conforme apontamos, quando afirma
sobre o dever em se “receber” um presente equivalente após ter sido receptor da “doação
de um presente cerimonial”: “Dar, receber e retribuir”.