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Filósofo Luiz Felipe Pondé discute como marcas vendem significados para vazio existencial
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No recém-lançado "Marketing Existencial" (Editora Três Estrelas), o filósofo Luiz Felipe Pondé
explica aos leitores logo no início que a obra não é sobre marketing, mas existência. Seu objetivo
é trazer uma reflexão, a partir da filosofia, de como as marcas tentam vender sentidos em meio
ao vazio da vida contemporânea.
Resgatando conceitos da filosofia da existência, do século 19, Pondé discute a hipótese de que o
marketing, mais do que vender produtos e imagem de marca, vende cada vez mais significados
como remédio para nossas angústias. Seja por meio de experiências sensoriais, como viagens,
alimentação, vestuário ou comportamento, seja por meio da ideia de ética associada a causas e
propósitos, dando origem ao chamado marketing consciente, por exemplo.
“Eu digo cuidado para não se tornar uma pessoa idiota porque o marketing do bem é um dos
piores. Ele te faz ficar completamente alienado do fato de que você continua consumindo
comportamentos para te dar significado. Quando você acha que está fora do ciclo do consumo,
você só está consumindo uma autoimagem falsa”.
O marketing parte de um fato que o antecede. Nós não sabemos o que é uma necessidade
verdadeira. Você precisa de apenas um vestido ou de 150? Preciso de dois pares de sapatos ou
dez? A gente não sabe mais o que precisa ou não, o que é verdadeiro ou não. Talvez, a gente
nunca tenha sabido. O que o marketing faz disso é transformar em uma indústria.
Como está inserido o consumidor nesse universo, se ele não sabe discernir o que é necessidade
básica?
Não acredito que exista essa capacidade de chegar ao consumo de objetos necessários somente.
Claro que existe a compra por impulso, feita de uma forma enlouquecida. Mas a ideia de que
você consome apenas o essencial é por si só marketing.
O livro traz um olhar da filosofia refletindo sobre como o marketing vende objetos para o prazer.
E mesmo aqueles objetos supostamente comportamentais da consciência, do tipo, “eu sou uma
pessoa que só faz consumo consciente”, eles são vendidos para pessoas ricas e vazias. Elas
acham que são mais verdadeiras porque têm uma casa no meio de uma praia deserta. Enquanto,
elas odiariam que outras pessoas invadissem a praia deserta delas. Elas querem ficar longe de
pobre, apesar de não pensarem mal sobre si mesmas. Acham que são equilibradas, legais e
descoladas. Mas simplesmente adquiriram um tipo de autoimagem que hoje já é vendida pelo
marketing e propaganda do que é ser um consumidor consciente e não consumista.
Isso vai ao encontro com o que o senhor diz no livro sobre o marketing do bem levar a pessoa a
se tornar um idiota?
Exatamente. Você acredita ser do bem porque você consome o marketing consciente, porque
colabora com uma ONG de refugiados e dá dinheiro para crianças sírias pobres, enquanto, na
verdade, você é uma pessoa que nem filho quer ter. No fundo você quer ter uma vida fácil,
tranquila e segura. Ainda assim você adere a uma causa como essa para se sentir legal, quer ser
uma pessoa boa. Eu digo cuidado para não se tornar uma pessoa idiota porque o marketing do
bem é um dos piores. Ele te faz ficar completamente alienado do fato de que você continua
consumindo comportamentos para te dar significado. Quando você acha que está fora do ciclo
do consumo, você só está consumindo uma autoimagem falsa.
E o oposto também acontece? No livro o senhor comenta sobre a moda do marketing do mal.
Como ele funciona?
Ser malvado também vende porque você acaba achando que o legal é ser um escroto que não
está nem aí para ninguém, que não estabelece nenhum vinculo de preocupação com a
sociedade. Todo mundo sabe que ser meio mau é chique. Não é à toa que em muita propaganda
de perfume aparece tanta gente chique abandonando o outro sozinho num quarto de hotel
chique depois de uma noite de sexo. Quer dizer, sou assim mesmo, autosuficiente. Essa é a
imagem que o marketing também vende.
As marcas fazem essa reflexão de bom e mau para desenvolver suas campanhas?
O marketing, cada vez mais, precisa de elementos das ciências humanas porque o mundo está
muito complexo. Apesar de essa pesquisa já estar sendo feita, as marcas ainda acreditam que
precisam o tempo inteiro vender coisas para as pessoas se sentirem bem. E, talvez, nunca
consigam sobreviver a isso porque o mal estar vai ficar cada vez maior. Saiu uma pesquisa na
Alemanha dizendo que a solidão só aumenta na tendência da vida single. Quanto mais as
pessoas ficam sozinhas, mas solitárias elas ficam e mais difícil fica para estabelecer vínculos. Mas
as marcas vão vender um comportamento single como se fosse descolado, como se você fosse
dono da sua vida, livre, ama quando quer, que faz o que quer, quando na verdade, isso não
acontece.
A única coisa genuína numa marca, que é uma empresa, é ter sustentabilidade econômica. Achar
que há alguma coisa genuína, além disso, já é fruto do marketing do bem. O mercado em que a
empresa está inserida vai definir o quanto ela poderá investir em outros valores além da
sustentabilidade econômica. Por exemplo, o empoderamento feminino, para alguns grupos
sociais no mundo é fundamental para a sustentabilidade econômica. Principalmente porque o
público que mais gasta dinheiro consumindo é a mulher. Ao mesmo tempo, o empoderamento
feminino ele está dentro de um contexto de dificuldade de vinculo afetivo, solidão, insegurança
que uma marca, quando vende a temática, não aborda. Ela vende a mulher maravilha, mas as
mulheres podem estar empoderadas, mas também mergulhadas na solidão, insegurança,
carência afetiva. Esse é o lado do mal estar que estou falando.
O desafio do marketing existencial, que vende e busca significado, será ultrapassar a barreira de
vender otimismo, produtos inaltênticos e uma existência falsamente plena. Eu me pergunto se
esse marketing vai ter coragem de vender o medo, que está no fundo da vida contemporânea,
principalmente entre os mais jovens. O desafio é entender se será possível para o capitalismo
ultrapassar a necessidade de só vender otimismo, alegria, significados que te façam se sentir
supostamente pleno.